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Quinta-feira, 23 de Novembro de 1995 I Série - Número 9

VII LEGISLATURA l.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1995-1996)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 22 DE NOVEMBRO DE 1995

Presidente: Ex.º Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
José Ernesto Figueira dos Reis

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.

Antes de ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de diversos diplomas e de requerimentos entretanto apresentados.
Em declaração política, a Sr.ª Deputado Helena Roseta (PS) debruçou-se sobre a problemática da regionalização e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Sá (PCP), Luís Filipe Menezes (PSD) e Silva Carvalho (CDS-PP).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Lino de Carvalho (PCP) falou sobre o projecto da barragem do Alqueva. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Joel Hasse Ferreira (PS) e Teresa Patrício Gouveia (PSD), tendo, sobre o mesmo tema interpelado a Mesa o Sr. Deputado Nuno Abecasis (CDS-PP).
Foi aprovado um relatório e parecer do Comissão Eventual de Verificação de Poderes relativo à substituição de Deputados do PS, PSD e CDS-PP.
O Sr. Deputado António Martinho (PS) condenou a política agrícola conduzida pelo anterior Governo, tendo respondido a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Carlos Duarte (PSD).
O Sr. Deputado Mendes Bota (PSD) alertou a Câmara para a situação do Matadouro Regional do Algarve e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Filipe Madeira (PS) - que também usou da palavra em defesa do honra e consideração - e Lino de Carvalho (PCP).

Ordem do dia. - Procedeu-se à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 15/VII - Revoga e substitui o Estatuto do Direito de Oposição (PS), que foi depois, aprovado. Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Alberto Martins (PS), Isabel Castro (Os Verdes), Guilherme Silva (PSD), Jorge Ferreira (CDS-PP). Luís Sá (PCP) e Miguei Macedo (PSD).
Foi ainda aprovado, na generalidade, o projecto de lei n.º 17/VII - Reforça as competências do Conselho de Fiscalização do Serviço de Informações (PS), tendo sido rejeitado o projecto de lei n.º 7/VII - Reforça o sistema de fiscalização dos serviços de informações, clarifica os limites das actividades que estes podem desenvolver e revoga as alterações legislativas promovidas no termo da VI Legislatura pelo Governo (PCP).
O Sr. Presidente declarou encerrada a sessão eram 18 horas e 20 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista ( PS ):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António Jorge Mammerickx da Trindade.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Pedro da Silva Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Domingos de Ascensão Cabeças.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Oliveira de Sousa Peixoto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão.
José Pinto Simões.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Meio Duarte.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amado Sequeira.
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosario Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Raúl d'Assunção Pimenta Rego.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Brás e Silva.
Sérgio Humberto Rocha de Ávila.
Victor Brito de Moura.

Partido Social-Democrata (PSD)

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Alvaro dos Santos Amaro.
Alvaro José Brilhante Laborinho Lúcio.
António da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.

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Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Gilberto Parca Madail.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Fernando Nogueira.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Manuel Durão Barroso.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mano de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Fernando de Mira Amaral.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinte.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Sergio André da Costa Vieira.
Vasco Pulido Valente.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Alda Maria Antunes Vieira.
António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
António Carlos Brochado de Sousa Pedras.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Maria Mendonça da Silva Carvalho.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Paulo Sacadura Cabral Portas.
Silvio Rei Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão Carvalho e Silva.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas e dos requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 21/VII - Cria o conselho dás comunidades portuguesas no mundo (PSD); ratificações n.º 3/VII, relativa ao Decreto-Lei n.º 145-A/95, de 19 de Junho, que altera o processo de reprivatização da sociedade de Petróleos de Portugal, PETROGAL, S.A. (PCP), 4/VII, relativa ao Decreto-Lei n.º 151/95, de 24 de Junho, que harmoniza o regime jurídico dos planos especiais de ordenamento do território (PCP), 5/VII, relativa ao Decreto-Lei n.º 167/95, de 15 de Julho, que aprova a alienação, em duas fases, da totalidade das acções representativas do capital social da Tabaqueira Empresa Industrial de Tabacos, S.A. (PCP) e 6/VII, relativa ao Decreto-Lei n.º 27/195, de 23 de Outubro, que aprova a Lei Orgânica da Inspecção-Geral da Educação (PCP); e, ainda, projecto de resolução n.º 4/VII - Sobre a proposta da Comissão Europeia de reforma do sector dos frutos e produtos hortícolas (PCP). Estas iniciativas legislativas baixaram às comissões competentes em razão das matérias respectivas.
Nas últimas reuniões plenárias, foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: aos Ministérios do Ambiente, da Saúde e do Equipamento Social, formulados pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia; ao Governo, a diversos ministérios e à Câmara Municipal de Lisboa, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; aos Ministérios da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas e das
Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há duas inscrições para declarações políticas, uma da Sr.ª Deputada do PS Helena Roseta e uma outra do Sr. Deputado do PCP Lino de Carvalho...

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, esta interpelação tem a ver com o facto de, através de V. Ex.ª, pretendermos fazer um requerimento ao Governo no sentido de um dos Membros do Governo vir urgentemente à Assembleia da República prestar alguns esclarecimentos.
Passo a concretizar.
Nos últimos dias, vários dirigentes do Partido Socialista - a título de exemplo, aponto um conjunto de dirigentes do Algarve -, no final de uma reunião partidária, vieram afirmar publicamente que exigiam ao Governo ser ouvidos no que toca à substituição e à nomeação de um conjunto de pessoas para cargos da Administração a nível regional. Ontem mesmo, num debate público, difundido através de uma estação de rádio, o Sr. Ministro João Cravinho e um dirigente do Partido Socialista, o Sr. Narciso Miranda, teorizaram sobre qual o perfil que deveriam ter novos titulares de cargos da Administração para ocuparem este ou aquele posto. Hoje, em vários órgãos de comunicação social, particularmente na imprensa escrita, o presidente da federação do Porto do Partido Socialista anuncia publicamente a iminente substituição do Presidente da Comissão de Coordenação da Região Norte (CCRN).
Assim, gostaríamos que o Sr. Ministro João Cravinho viesse à Assembleia da República dizer qual o âmbito em que tenciona fazer alterações na Administração, que critérios vai utilizar e ainda se o Governo deu algum mandato a dirigentes do Partido Socialista para serem eles a anunciar ao País a substituição de membros da Administração Pública...

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, interrompo-o para lhe recordar que não está a fazer uma interpelação à Mesa mas sim, por via oral, um requerimento ao Governo. Assim, agradeço-lhe que o formule por escrito e prometo-lhe que ainda hoje o farei chegar ao Governo.

O Orador: - Sr. Presidente, concluo já.

O Sr. António Martinho (PS): - Está a fazer uma declaração política! Já não se lembra como é uma interpelação à Mesa?

O Orador: - Sr. Presidente, o meu grupo parlamentar vai fazer isso mesmo..

O Sr. Presidente: - Não é tradição anunciar de véspera os requerimentos que irão ser dirigidos ao Governo, mas faça favor.

O Orador: - Sr. Presidente, como dizia, o meu grupo parlamentar vai entregar hoje mesmo um requerimento na Mesa, solicitando que, no início da próxima semana, o Sr. Ministro João Cravinho venha prestar os esclarecimentos que referi h Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente.

O Sr. Presidente: - Farei chegar o requerimento ao Governo, Sr. Deputado.
Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O diálogo entre o poder central e o poder local, prometido por António Guterres e pela nova maioria, ficou ontem marcado por um episódio que aqui quero sublinhar: o encontro do Governo com as Juntas Metropolitanas de Lisboa e Porto.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Para lá da cordialidade das relações que se desejam, o facto merece ser salientado por se inscrever numa nova prática do poder, num novo conceito de desenvolvimento e numa nova atitude perante problemas que são de todos.
Herdámos de governos anteriores um país mais pequeno e que se atravessa mais depressa mas também, costumo dizê-lo, mais desordenado e mais feio. E de nada adianta atirar as culpas dos muitos abusos e desleixos para cima das autarquias locais. A salvaguarda do território, da qualidade do ambiente e dos valores da paisagem são obrigações constitucionais, que o artigo 66.º da Constituição consagra, não apenas como um direito mas como dever que a todos cabe.
Para tanto, temos de pôr em prática um novo modelo de desenvolvimento que seja, como se diz no Programa de Governo, sustentável, regionalmente equilibrado e socialmente justo. E se podemos estar todos de acordo com esta adjectivação, é fundamental que os nossos actos, no exercício do poder e da cidadania, com ela se conformem.
Não foi a isso que assistimos no passado recente. Ainda há dias aqui ouvimos o Deputado Ferreira do Amara] estranhando que o Programa do Governo não indicasse os prazos de conclusão das auto-estradas e vias estruturantes previstas. Aí está, Srs. Deputados, uma abissal diferença de atitudes perante o desenvolvimento. «Auto-estradas» - se me permitem o neologismo - não é tudo, nem sequer é para nós a prioridade das prioridades, como sabem. Nem admitimos vir a andar a acabar obras à pressa, com empreitadas adicionais, por conta de calendários eleitoralistas. Nem aceitamos que o traçado das principais acessibilidades seja decidido no segredo dos gabinetes, sem a participação dos responsáveis locais, sem estudos de impacte isentos e desprezando planos de ordenamento existentes. Nem nos passa pela cabeça que possa voltar a repetir-se o que aconteceu com a nova ponte sobre o Tejo, cuja localização foi unilateralmente assumida pelo Ministério das Obras Públicas, Transporte e Comunicações, contrariando as recomendações do Plano Regional de Ordenamento do Território (PROT) e as chamadas de atenção dos sectores ambientalistas.
Por isso nos congratulamos com uma das decisões ontem saídas da reunião entre o Governo e as juntas metropolitanas: a necessidade de rever o dito PROT da Área Metropolitana de Lisboa, encerrado na gaveta desde a decisão de o ultrapassar, tomada pelo mesmo governo que o tinha encomendado e pago.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Igualmente nos regozijamos com a confirmação dos compromissos eleitorais deste Governo em

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matéria de acessibilidades nas áreas metropolitanas. Estamos conscientes de que o tempo perdido em transportes pelas populações suburbanas é um dos mais graves factores de stress quotidiano das pessoas e de perda de produtividade geral.
O nosso conceito de desenvolvimento passa por uma nova atitude perante a salvaguarda do ambiente. Documentos essenciais, como o Plano Nacional de Política do Ambiente, elaborado durante o mandato do anterior executivo, não poderão deixar de ser sujeitos à apreciação do Parlamento. Os Deputados não podem alhear-se das traves-mestras de políticas que aqui lhes cabe aprovar e fiscalizar, sob pena de esta Casa prescindir do desempenho do seu papel e de assim nos desprestigiarmos todos perante quem nos elege. O diálogo entre poderes também passa por aqui e a minha bancada tudo fará para que o Parlamento seja uma instância privilegiada de diálogo, não apenas entre partidos mas também com a sociedade civil, os movimentos e as organizações de cidadãos.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - A estratégia sigilosa e quase policial subjacente ao Plano de Desenvolvimento Regional do último Quadro Comunitário de Apoio, que foi apresentado pelo anterior governo em Bruxelas, antes ainda de o Parlamento e a massa crítica nacional sobre ele se pronunciarem, está profundamente obsoleta. Nenhuma instância internacional, do FMI à OCDE, passando pelo BEI ou pela União Europeia, se esquece de inscrever em todos os seus programas e recomendações as palavras «participação» e «integrado». Palavras que estão em todos os manuais de gestão, pública e privada, mas que foram as grandes ausentes na prática política que nos antecedeu.
Para nós é impossível dissociar o conceito de partilha do poder do novo modelo de desenvolvimento. Partilha que inclui o cumprimento do imperativo constitucional da regionalização, ponto de honra deste Governo, desta maioria e da minha bancada.

Aplausos do PS.

Como é possível que, por iniciativa de uma só pessoa, ainda que ela fosse Primeiro-Ministro, tivesse sido arredada da agenda política uma matéria consagrada na Lei Fundamental e no próprio programa do partido então no poder? Como pode o hoje candidato presidencial apresentar-se subitamente partidário de soluções referendárias que nunca defendeu? Trata-se de habilidade ou simplesmente de falta de memória?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem! É estranhíssimo!

A Oradora: - Pela nossa parte, não acreditamos em seres predestinados para salvar o País. Nem qualquer forma de despotismo, ainda que pseudo-iluminado, tem cabimento no nosso século.
Somos partidários da regionalização por convicção, mas não a faremos contra as pessoas ou h porta fechada.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Assumiremos aqui, no Parlamento, à vista de todos, a responsabilidade de propor e debater as linhas mestras deste processo, na certeza de que é a este órgão de soberania que incumbe aprová-las.

Aplausos do PS.

Mas não deixaremos de solicitar a cooperação do Governo, dos poderes locais e da opinião pública, já que não somos donos do País e uma reforma como esta só resultará se se lhe aliar uma ampla mobilização nacional.
Também não alinhamos no coro daqueles que pensam que a regionalização se pode fazer sem o poder local ou contra o poder local. Escalão intermédio da hierarquia do Estado, tal como a Constituição o prevê, o poder regional será mais um elo na malha de segurança da nossa democracia, malha que até hoje tem sido assegurada pelas autarquias locais, verdadeira escola de cidadania para milhares de portugueses. Que os erros de alguns autarcas não nos permitam desprezar o mérito indiscutível do poder local ao longo das duas últimas décadas.
E neste quadro - e, com isto, quero responder h preocupação do Deputado Luís Filipe Menezes, ainda hoje aqui manifestada - que entendemos ser absolutamente correcta a opção governamental de conferir um papel meramente técnico às actuais Comissões de Coordenação Regional, a quem, por inexistência de um poder regional eleito, foram no passado atribuídos poderes excessivos sobre o território e sobre os recursos comunitários.
É extraordinário que o Sr. Deputado do PSD venha aqui pedir explicações ao Ministro sobre o perfil dos futuros dirigentes das Comissões de Coordenação Regional quando, no caso dos actuais e passados dirigentes, nunca nos foi dada qualquer explicação quanto ao seu perfil, nem de longe, nem de perto!

Aplausos do PS.

É extraordinário que fique chocado com o facto de os militantes de um partido pedirem explicações ao Governo sobre os nomes e o perfil das pessoas, quando os militantes do seu próprio partido sempre o fizeram, só que h porta fechada e sem o dizerem para os jornais! É esta falta de transparência que sempre verberámos.

Aplausos do PS.

Nós sabemos que o Partido Socialista não é, não pode ser e nunca será uma «correia de transmissão» do poder, mas os militantes do Partido Socialista não prescindem de dialogar com o poder - com este ou com qualquer outro! - tal como, no passado, tentaram dialogar com poderes que, infelizmente, nunca abriram a porta ao diálogo quando, muitas vezes, lá íamos bater à porta para pedir informações.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Há que inverter este processo!
O processo das Comissões de Coordenação Regional, diga-se em abono da verdade - e há muitos anos que o sustento! -, estava a conduzir a uma criação absurda em democracia: à criação de uma espécie de «poder cinzento», designado pelo Governo, sem controlo pelos eleitores e muitas vezes até desconhecido da opinião pública. Entendemos que é tempo de acabar com esta prática. As Comissões de Coordenação Regional serão, e devem ser, órgãos de desconcentração do Ministério do Planeamento e da Administração do Território e nada mais! Quanto ao poder regional, vamos ter de criá-lo aqui, nesta sede, através da aprovação de uma lei das regiões e pelo desencadear do processo da regionalização no País. Não há outra

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maneira de o fazer, nem vamos criar regiões «pela porta do cavalo».

Aplausos do PS.

Do mesmo modo, pensamos que deverão ser extintos a prazo os lugares de governadores civis. Consideramos que são resquício de uma concepção paternalista de poder, incompatível com os princípios da partilha e da subsidiariedade que subscrevemos. Naturalmente, estes cargos ainda existem e vão continuar a existir a título transitório, mas são lugares que, numa democracia de «alta intensidade», não faz sentido que existam. E é numa perspectiva de extinção destes cargos que, neste momento, o Governo está a proceder à escolha e à nomeação de algumas pessoas.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Orgulhamo-nos de ver incluídas, no elenco governamental, pessoas que sempre se assumiram como militantes do poder local. Desde logo, o actual Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território, militante autarca, convicto e conhecido, que nos dá a garantia de que, daqui para a frente, haverá um diálogo entre poder central e poder local.
Permitam-me que recorde mais. O actual Ministro das Finanças é autor daquela que foi a primeira, e porventura a melhor, lei das finanças locais depois do 25 de Abril. Sublinho ainda o anúncio feito pelo Ministro do Planeamento e da Administração do Território, em entrevista televisiva, de que no próximo Orçamento do Estado rectificativo a verba para as autarquias locais irá ser reforçada, dando cumprimento a uma sistemática reivindicação do poder local, no sentido de ver cumprida a lei nesta matéria.
Não podemos admitir que volte a instaurar-se em Portugal um clima de suspeição recíproca entre poder central e poder local. Essa suspeição é prejudicial ao desenvolvimento. Não podemos ficar de braços caídos com o sistemático adiamento do cumprimento da lei em matéria de transferência de recursos para os municípios. Durante 20 anos, os recursos locais passaram de 6% para 7% no total dos recursos públicos. Esta é uma das áreas em que tarda cumprir um dos grandes desígnios do 25 de Abril - descentralizar. Temos a certeza de que não se poderá democratizar mais e desenvolver melhor sem descentralizar recursos que São de todos e não apenas do poder central.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sabemos que o crescimento desordenado do litoral se tem vindo a processar, ao longos de três décadas, à custa da desertificação do interior. Um novo modelo de desenvolvimento não pode ignorar o mal que se vive, hoje ainda, nalgumas das zonas mais abandonadas do interior do País, onde falta sobretudo a esperança. Mas tão-pouco pode esquecer-se que é nos subúrbios das nossas maiores cidades, em bairros legais ou clandestinos onde se acumulam populações de milhares de pessoas, que hoje se concentram os piores ghettos sociais e urbanos.
Nenhum Governo, até hoje, foi capaz de lançar verdadeiras políticas urbanas dirigidas a estas áreas de «cidade mínima», onde pode faltar tudo, desde casas decentes até ao simples nome da rua e número da porta. Terras de ninguém, os subúrbios são, no entanto e ao mesmo tempo, o local das grandes oportunidades: aí se concentram os jovens, a revolta, as necessidades e o espaço livre. É urgente que se olhe para estas zonas do nosso país numa perspectiva de verdadeira solidariedade nacional, que terá de ser do litoral com o interior, das cidades com as aldeias, do centro com as periferias.
O diálogo com as juntas metropolitanas, que conhecem este problema como ninguém, é para nós sinal de esperança para que se criem novos instrumentos de intervenção dirigidos aos subúrbios, onde a energia humana é muita e pode associar-se à resolução dos problemas que todos sentem.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mário Soares, ao realizar uma presidência aberta na Arca Metropolitana de Lisboa, contribuiu para que fosse revelado ao País muito do que está mal nesta região e carece de ser corrigido. Possamos nós, Deputados, fazer desta Casa um verdadeiro Parlamento aberto, procurando aqui dar visibilidade e resposta aos problemas dos que menos acesso têm tido a um ambiente humano, sadio e ecologicamente equilibrado. Que através da nossa voz e do nosso trabalho possamos levar por diante, dando força aos que nos elegeram, uma nova maneira de praticar a solidariedade nacional, sem a qual o desenvolvimento será uma palavra vã.

(A Oradora reviu.)

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Luís Sá, Luís Filipe Menezes e Silva Carvalho. Este último Sr. Deputado, do CDS-PP, disporá de 3 minutos para usar da palavra, utilizando tempo que lhe foi cedido pelo Grupo Parlamentar do PS.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Roseta, ouvimo-la com extrema atenção, como conhecedora que é dos problemas do poder local e do ordenamento do território. Naturalmente, o que podemos desejar, e ardentemente, é que nunca venha a desiludir-se com a actuação deste Governo e do grupo parlamentar de que o mesmo provém quanto ao processo de regionalização e às autarquias.
Vou colocar-lhe três breves questões relativamente às quais gostaria que clarificasse o seu pensamento.
A primeira é sobre o estatuto das áreas metropolitanas, relativamente às quais é sabido que a lei actual teve um determinado papel, embora os meios e as competências aí previstos sejam extremamente diminutos. No Programa do Governo do PS está prevista a possibilidade de as áreas metropolitanas se transformarem em regiões administrativas ou em associações de municípios, o que, como é evidente, são realidades completamente diferentes. Assim, gostaria de saber qual é a sua opinião - se possível, a sua opinião pessoal e, eventualmente, também a do Grupo Parlamentar do PS - nesta matéria.
A segunda questão, que é extremamente importante, diz respeito às acessibilidades, problema que a Sr.ª Deputada referiu, e muito bem.
Nesta matéria, há poucas horas, foi aprovada por unanimidade, na Assembleia Municipal de Almada, uma moção no sentido da abolição da portagem da ponte sobre o Tejo. O próprio PSD teve um acto de arrependimento -

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às vezes, estar na oposição tem vantagens! - e votou a favor dessa abolição.
Assim, no que diz respeito a este problema das portagens, que não é tudo em matéria de acessibilidades da Área Metropolitana de Lisboa mas é uma parte importante, gostaria de saber o que pensam a Sr.ª Deputada e o PS, quer quanto à portagem da ponte sobre o Tejo quer quanto a uma outra promessa eleitoral do PS, a da abolição da portagem na CREL (Circular Rodoviária Exterior de Lisboa).
A terceira questão é sobre o PIDDAC para 1996.
As áreas metropolitanas têm direitos de participação nesta matéria, direitos esses que nunca foram respeitados pelo anterior governo. Por outro lado, temos conhecimento da posição que ontem foi adoptada, e que é positiva, de disponibilidade para o diálogo com as áreas metropolitanas nesta matéria. Assim, tendo em conta o subinvestimento que se tem verificado nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, pergunto-lhe o que pensa a Sr.ª Deputada sobre este diálogo e ainda se entende ou não que ele deve traduzir-se num investimento muito maior do que aquele que foi feito no passado, a fim de compensar as grandes dificuldades existentes, já que, como a Sr.ª Deputada bem disse, vive-se mal nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, é muita a exclusão social, é muita a pobreza, são muitas as dificuldades ao nível de equipamento, situação que exige a tomada urgente de medidas, começando desde já pelo PIDDAC e pelo Orçamento do Estado para 1996.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Helena Roseta, pretende responder já ou no fim dos pedidos de esclarecimentos?

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Menezes.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Roseta, não lhe vou fazer perguntas tendo em vista a sua intervenção, porque já conheço o pensamento político de V. Ex.ª sobre estas matérias e a Sr.ª Deputada compilou um conjunto de declarações de que já no passado a ouvi afirmar, quer na Assembleia da República, quer noutros locais.
Inscrevi-me para lhe pedir esclarecimentos, porque a Sr.ª Deputada, a meio da sua intervenção, afirmou que o Sr. Deputado do PSD que tinha falado no início da sessão havia tido o descaramento - penso que foi este o termo que utilizou - de solicitar ao Sr. Ministro João Cravinho que viesse aqui prestar esclarecimentos sobre os critérios que iriam presidir à eventual substituição de altos funcionários a nível regional.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Essa é boa!

O Orador: - A Sr.ª Deputada entendeu aquilo que eu disse? Não está em causa o direito do Sr. Ministro de fazer substituições, desde que elas sejam devidamente fundamentadas e visem dar melhores condições ao cumprimento do Programa do Governo. O que está em causa é o facto de dirigentes socialistas, em nome do Governo, anunciam publicamente essas substituições. A Sr.ª Deputada concorda com isso?! Alguma vez viu isso no tempo dos governos do PSD?!

Vozes do PS: - Viu!

O Orador: - Não! Não viu, Srs. Deputados! Nunca viu isso, porque o PSD e os seus governos sabiam como defender a dignidade do Estado de direito!

Aplausos do PSD.

Sr.ª Deputada, as minhas palavras referem-se a uma declaração do Sr. Narciso Miranda, feita ontem, onde disse taxativamente que está iminente a substituição do Presidente da Comissão de Coordenação da Região Norte por outra personalidade.

Vozes do PS: - Ainda bem!

O Orador. - Sabe que na Região Norte, durante a maior parte dos 1O anos de governo do PSD, houve uma troika dirigente constituída pelo Sr. Professor Braga da Cruz, professor universitário independente, de competência técnica indiscutível, e duas vice-presidências ocupadas, respectivamente, pela Dr.ª Elisa Ferreira, Ministra do Ambiente, e pelo Sr. Engenheiro Ricardo Magalhães, Secretário de Estado dos Recursos Naturais, ambos do Governo socialista?
Gostava de saber se isto é ou não isenção, se isto é ou não a forma, de dignificar o Estado de direito...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: -... e se V. Ex.ª está de acordo com o comportamento agora indiciado pelo Presidente da Federação do Porto do Partido Socialista, caso venha a generalizar-se.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Silva Carvalho.

O Sr. Silva Carvalho (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Roseta, antes de mais, quero manifestar o meu regozijo pela forma como falou do processo de regionalização, sobretudo por ouvir aqui consagrado um princípio que nos é, a nós, Deputados do Partido Popular, particularmente caro: o de que a regionalização não pode ser feita nas costas dos portugueses, nem contra eles. Em todo o caso, temos de assegurar que assim seja - não basta dizê-lo! - e, nomeadamente, temos de assegurar que o Partido Socialista, com a regionalização, não venha, eventualmente, a cometer o mesmo erro que hoje reconhece que cometeu, por exemplo, com o Tratado de Maastricht. É que não chega a regionalização estar consagrada constitucionalmente, pois ela já está consagrada constitucionalmente há muito tempo mas, com maiorias ou sem elas, nunca foi feita e, mais, foi até ilegitimamente declarada como morta pela última maioria.
Assim, gostaria de perguntar à Sr.ª Deputada Helena Roseta até que ponto é que o Partido Socialista se comprometerá no sentido de que a regionalização venha a ser feita com os portugueses e com o empenhamento dos portugueses e se estará ou não disposta a referendar a regionalização e a realizar referendos locais, no que respeita à delimitação das futuras regiões.
Por outro lado, seria também importante ficarmos, desde já, a saber o que pensa o Partido Socialista sobre o princípio da simultaneidade da criação das regiões. Como todos sabemos, esse princípio tem sido o travão fundamental da regionalização, porque, como é óbvio, não é possível criar simultaneamente todas as regiões, pelo que o seu abandono será, provavelmente, o passo fundamen-

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tal para que, por exemplo, a região do Algarve possa começar a desenvolver o seu processo de regionalização muito rapidamente.

O Sr. António Martinho (PS): - E Trás-os-Montes também!

O Orador: - Finalmente, não posso deixar de chamar a atenção para o facto de o comportamento, já aqui realçado, de colocar dirigentes partidários a realizar nomeações para a direcção de órgãos da administração local ser o pior dos princípios. Não diria que o PSD está isento de culpas, pois todos sabemos que, muitas vezes, para a nomeação de um simples director de hospital as distritais do partido reuniam.

O Sr. José Magalhães (PS): - Esse é um hábito da bancada do PSD!

O Orador: - Se me permite Sr. Deputado só para terminar...
Sei que o tempo que estou a usar foi gentilmente cedido por vós,...

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas pode bater à vontade!

O Orador: ... mas, já agora, se me permite, gostaria de terminar.
A isenção de culpas do passado deve servir de exemplo para o futuro e não para repetição.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente, vou tentar ser sintética, até porque as questões que me foram colocadas...

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Helena Roseta, permita-me que a interrompa.
Tem estado entre nós um grupo de crianças da Escolinha Tia Ló, em Cascais, que vão abandonar-nos e, por isso mesmo, entendo que devíamos ter para com elas, até pelo diminutivo do nome da escola, um gesto de ternura.

Aplausos gerais.

Faça favor de prosseguir, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Sr. Presidente, como estava a dizer, vou tentar ser sintética para conseguir responder a todas as questões que me foram colocadas, porque algumas são de âmbito bastante alargado e não poderão ser esgotadas na minha resposta.
Sr. Deputado Luís Sá, agradeço muito as perguntas que me fez. Em relação ao seu considerando, sobre se não tenho receio de vir a ficar desiludida com o Governo, digo-lhe que me parece tal considerando que se coloca a todos nós, em relação a qualquer governo. Somos todos portugueses e qualquer governo do nosso país nos pode encantar ou desiludir. O que espero, como Deputada - e, certamente, V. Ex.ª também -, é que nenhum de nós, Deputados eleitos, fique desiludido com este Parlamento. E é ao Parlamento que me dirijo em primeiro lugar.
Em relação às três questões que me colocou - o estatuto das áreas metropolitanas, as acessibilidades e o PIDDAC para 1996 -, vou tentar dar algumas notas muito breves.
No que diz respeito ao estatuto das áreas metropolitanas, penso que se trata de uma matéria que ainda não está completamente desbravada. Pessoalmente, entendo que as áreas metropolitanas podem vir a constituir regiões com especificidades próprias, no futuro quadro das regiões do País. Quanto a mim, essa seria a solução mais acertada, mas esta matéria tem de ser debatida com as pessoas das áreas metropolitanas e também a nível nacional.
Quanto à questão das acessibilidades, tanto quanto sei, da reunião de ontem com as juntas metropolitanas resultou a criação de uma comissão para as estudar, no seu conjunto, isto é, para estudar as acessibilidades quer da Área Metropolitana de Lisboa, quer da Área Metropolitana do Porto. Portanto, tem toda a relevância o problema de saber o que vai acontecer com a portagem na ponte 25 de Abril. O compromisso eleitoral deste Governo, como sabe, não envolve a abolição dessa portagem, mas, em todo o caso, temos de ter uma política concertada em relação a todas as portagens da mesma área metropolitana. Penso que o estudo concertado das consequências dessas abolições tem de ser feito e não está ainda concluído, pelo que, neste momento, nem sequer podemos saber quais os custos económicos e financeiros que uma solução dessas teria. Julgo que o Governo tem abertura para a discussão dessa matéria, mas ainda não há uma solução pré-definida.
No que se refere ao aumento de peso das áreas metropolitanas no PIDDAC para 1996, parece-me que isso seria o desejável. No entanto, não se esqueça de que o PIDDAC é um bolo nacional e que, ao aumentarmos uma fatia de bolo para uns, vamos diminui-la para outros, pelo que isso tem de ser feito com muito critério, em diálogo com os grupos parlamentares e, na medida do possível, pelo menos com a Associação Nacional dos Municípios, que é a representante de um dos poderes a quem mais se dirigem as intervenções do PIDDAC.
Pessoalmente, aquilo por que me vou bater no âmbito do PIDDAC para 1996 é para que se abra um programa dirigido às áreas suburbanas, programa esse que actualmente não existe e relativamente ao qual, ainda que neste momento não se possa prever uma verba muito elevada, já poderão começar a fazer-se estudos para o desencadear com maior vulto.
Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, o senhor tem o direito de pedir a todos os ministros que venham aqui dar todos os esclarecimentos que entender. Sobre isso não temos qualquer dúvida!

Vozes do PSD: - Ainda bem!

A Oradora: - E, como é evidente, não posso concordar que dirigentes socialistas falem em nome do Governo. É evidente que não posso! Nunca concordei que dirigentes de partido nenhum falassem em nome do governo e, portanto, não seria agora que mudaria de posição. Isso está fora de causa! O que não posso aceitar é que o senhor tivesse uma posição, quando o seu partido estava no poder, e agora, quando o seu partido está na oposição, tenha outra. Esta é que é a questão!

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - O Sr. Deputado lembrou, e muito bem, que dois membros do actual Governo fizeram parte da Comissão de Coordenação da Região Norte, e sei disso, pois trabalhei com a Comissão nessa altura e tenho conhecimento do trabalho que eles fizeram, mas esqueceu-se de

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dizer por que é que eles, entretanto, saíram. Esqueceu-se de dizer que eles foram substituídos por outros e esqueceu-se de dizer quem foram os outros que os foram substituir.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Deputada?

A Oradora: - Se as Comissões de Coordenação Regional tivessem trabalhado sempre na perspectiva de isenção que alguns dos respectivos dirigentes tiveram, eu não suscitava aqui o problema que suscitei.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Deputada?

A Oradora: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Eu posso dizer por quem foram substituídos. Foram substituídos por dois credíveis técnicos, militantes do Partido Socialista, e por um terceiro, militante do PSD, que antes de ter sido membro do governo já era técnico da Comissão de Coordenação da Região Norte.

A Oradora: - Agradeço os seus esclarecimentos, Sr. Deputado, mas isso continua a não resolver o nosso problema, que é o seguinte: as Comissões de Coordenação Regional devem ser órgãos meramente técnicos e não de decisão político-financeira. E o senhor sabe muito bem que não foi essa a posição do seu partido enquanto esteve no poder, pois os senhores tentaram, inclusivamente, colocar os presidentes das Comissões de Coordenação Regional no Comité das Regiões da União Europeia, em nome dos eleitos locais. E isso é que não pode ser, de forma nenhuma!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Silva Carvalho, agradeço as suas questões e, de facto, partilho da sua preocupação. Não tenho certezas absolutas sobre nenhuma matéria e também não as tenho sobre a regionalização e a melhor forma de a levarmos a cabo.
A questão que colocou relativa à simultaneidade é uma questão real. Aliás, em 1987, quando estive aqui como Deputada independente, propus precisamente acabar com esse princípio, num projecto de revisão constitucional que apresentei a título pessoal. Trata-se de uma questão que levanta muita polémica, tenho reflectido sobre ela e hoje penso que é muito arriscado eliminar a simultaneidade, pelo que devemos ir para uma solução que permita uma espécie de dois tempos: um tempo de criação do quadro regional e um tempo de instituição prática de cada região. Entre esses dois tempos, poderemos realizar alguns dos mecanismos referendários que defendeu sobre os limites e a concertação dos mesmos em cada região.
Porém, não me parece que o processo da regionalização enquanto tal, com toda a sua complexidade, possa ser submetido a referendo do modo como referiu. O referendo é uma arma muito importante, mas também é muito importante que as perguntas sejam bem feitas e que as pessoas possam responder de uma forma que não seja ambígua. Sobre esta matéria também apelo para um debate aqui no Parlamento, na Comissão que vai preparar todo este processo, no sentido de que se encontre a melhor forma de ouvir as pessoas, pois tenho muito receio de que aconteça aquilo que ainda esta semana o meu grande amigo arquitecto Nuno Teotónio Pereira referiu, num artigo, no jornal Público: que o acessório possa tapar o essencial e que, por causa de uma guerra de fronteiras, se perca a energia necessária para estabelecer uma reforma institucional.
Temos de encontrar, com bom senso e com diálogo, uma solução que nos permita, por um lado, ouvir as pessoas e, por outro, não prescindir do desiderato da partilha do poder pelo escalão regional, o qual me parece um desiderato constitucional que se mantém absolutamente actual.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, terminou o seu tempo

A Oradora: - Finalmente, queria apenas dizer ao Sr. Deputado Silva Carvalho que, evidentemente, não posso aceitar, como princípio, nem como regra, nem como comportamento, que haja dirigentes partidários a nomear pessoas em nome do Governo - isto não pode ser. Os espaços de intervenção dos partidos são uns, os espaços de intervenção dos órgãos de soberania são outros, o que não quer dizer que não haja diálogo entre os partidos e o Governo e que esse diálogo não deva fazer-se, inclusivamente, só com o partido que apoia o Governo, mas com todos os partidos. O que penso é que estas matérias são susceptíveis de ser discutidas por toda a gente, sem qualquer espécie de inibição, e que não devemos confundir os planos, para que não se tomem práticas que são viciosas em democracia.

(A Oradora reviu)

Aplausos do PS e de público presente nas galerias.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontra-se entre nós um grupo de 75 alunos da Escola António Arroio, de Lisboa. Lembro aos jovens que nos quiseram dar a honra de estar connosco que não podem manifestar-se. Para isso. têm de preencher algumas condições: atingir os 18 anos, candidatarem-se a Deputados, vencer as eleições e vir para o meio de nós, o que será um privilégio ter-vos connosco.
Srs. Deputados, para eles peço uma saudação.
Aplausos gerais.

Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A história parece repetir-se. Sempre que se aproxima a possibilidade de concretizar esse sonho e essa obra estratégica que é Alqueva, eis que pressões daqueles que sempre se lhe opuseram e que são responsáveis pelas dificuldades de desenvolvimento da região, polémicas artificialmente alimentadas, dúvidas sem fundamento, hesitações na vontade política surgem com o objectivo de travar e impedir a concretização de um empreendimento sem o qual o Alentejo não terá água armazenada suficientemente nem será possível desenvolver a agricultura, a região e criar emprego. Iniciativas recentes, aparentemente com origem em Espanha, e as notícias divulgadas na comunicação social este fim-de-semana levantam ao PCP legítimas preocupações e interrogações sobre o que eventualmente estará em curso quanto ao futuro de Alqueva.
Alqueva é um projecto de gerações, necessário como reserva estratégica de água para garantir o abastecimento às populações, mas também necessário, como parte integrante de Plano de Rega do Alentejo, para uma profunda

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modificação da agricultura alentejana que permita substituir, nos 140 000 h a regar (110 000 mais 30 000 numa segunda fase), uma agricultura de sequeiro pobre, sem futuro, extensiva e absentista, por uma agricultura de regadio que aproveite as reais capacidades produtivas dos solos, apostando em produções em que Portugal e a União Europeia são deficitários e onde temos vantagens competitivas. Mas Alqueva encerra igualmente capacidades de produção energética, de abastecimento de água ao Algarve, de valorização turística, bem como valias na área agro-industrial e piscícola. Alqueva permitirá criar milhares de postos de trabalho desde a fase de construção e é condição necessária para suster o processo de despovoamento e desertificação do Alentejo.
Por isto tudo, Alqueva não é só um projecto que diga respeito ao Alentejo; é um empreendimento de interesse nacional. Empreendimento que significa uma profunda revolução na sua área de influência e é por isso mesmo que, desde a sua concepção nos anos 50, nunca viu a luz do dia. Logo na época, o então o Governador Civil de Évora, em representação dos grandes proprietários latifundiários, foi recebido por Salazar a quem explicou, segundo os documentos de então, «os graves e incontroláveis perigos de, através da água, aumentar e vivificar a população alentejana». O então Primeiro-Ministro, Cavaco Silva, em 1987, chegou a dizer, em Beja. que Alqueva «só será possível depois de aprovadas alterações à legislação sobre o uso e posse da terra». E de facto, só depois de destruída a reforma agrária, só após a luta persistente e tenaz dos alentejanos, de as autarquias e de todos os quadrantes da vida regional e nacional terem feito ouvir, a uma só voz, a sua exigência de construção de Alqueva, só perante as gravíssimas consequências de quatro anos seguidos de seca é que, então, o Governo do PSD acabou por decidir avançar com Alqueva.
Para trás, ficaram as comparações de Cavaco Silva sobre o número de quilómetros de estrada que poderiam ser construídos com o valor do investimento de Alqueva ou as declarações do então Ministro Valente de Oliveira de que os alentejanos não sabiam fazer agricultura de regadio. Para trás, ficaram anos de atraso na obra, com prejuízos incalculáveis. Alqueva já podia estar a garantir hoje a água que falta nas barragens e nas torneiras, já podia estar hoje a ser suporte de uma nova e diversificada agricultura. Para a frente, ficou uma perspectiva de esperança apesar de o projecto, tal como foi aprovado, ter sido diminuído em termos da dimensão e área possível de rega.
Mas, desde logo, também se começaram a levantar falsos argumentos com o objectivo de impedir a obra. Primeiro argumento: que não haveria água disponível e que a solução alternativa seria as pequenas e médias barragens. As pequenas e médias barragens são seguramente necessárias e, para tanto, é necessário construir as que, incluídas no PRA, ainda o não foram. Mas a vida já provou que as cerca de 2000 pequenas e médias barragens, agora existentes, em anos consecutivos de seca, esgotam os seus recursos hídricos se não tiverem ligada a barragem-mãe que é Alqueva.
Quanto à falta de água, é verdade que o desleixo e incúria de sucessivos governos, designadamente do PSD, a não construção atempada do Alqueva e a falta de um plano nacional de gestão dos recursos hídricos permitiram que a Espanha retivesse no seu território caudais de égua em volume muito superior ao permitido pelo Convénio de 1968. É preciso por isso - e essa é que é a atitude certa - exigir que a Espanha cumpra o Convénio e que, nas negociações em curso com vista a um novo acordo, sejam garantidos os caudais e a qualidade de água a que temos direito.
A verdade é que, apesar disso e mesmo tendo já em conta o Plano Hidrológico de Espanha, há água suficiente para o empreendimento. Di-lo o Estudo de Impacte Ambiental, promovido pela União Europeia. Dizem-no conceituados especialistas, quando afirmam que as afluências médias futuras ao sistema de Alqueva são de cerca de 2475 hm3/ano, quando as necessidades identificadas para o empreendimento se situam na ordem dos 1680 hm3/ano.
Outro argumento: os impactes ambientais negativos. Eles existem e todas as medidas devem ser tomadas para os minimizar e compensar. Mas por que não se fala nos impactes ambientais positivos. A garantia de água, a redução da perda de solo que actualmente se verifica, os efeitos benéficos a nível climático, a diminuição de risco da desertificação física, todas estas consequências positivas estão identificadas no já referido estudo integrado de impacte ambiental, onde se lê que os impactes positivos superam os negativos. Mas é curioso que muitos dos que falam nos impactes ambientais esqueçam frequentemente a razão central de uma política ambiental: o Homem e a sua qualidade de vida. Não há vida sem água. E Alqueva é o instrumento decisivo para dar água e vida ao Alentejo, para dar emprego a homens e mulheres, para travar e inverter o processo de despovoamento e desertificação. Este, sim, é o mais importante e decisivo impacte ambiental do projecto e quem o omite, esquece deliberadamente a verdadeira razão de ser das preocupações ambientais.
Terceiro argumento: a incompatibilidade com a Política Agrícola Comum. É espantoso que alguém argumente com os condicionalismos da PAC de hoje, quando os novos sistemas culturais que Alqueva vai proporcionar só começarão a ser implantados, de acordo com o calendário da obra, infelizmente daqui a 20 anos. Mas, mesmo nesse contexto absurdo, a agricultura e o desenvolvimento rural alentejano só têm futuro e viabilidade na base da água, das culturas regadas.
Quarto argumento: o custo da obra e o preço da água. Mas, Srs. Deputados, em que estado de desenvolvimento estariam as regiões de Colorado, no Texas, da Califórnia, do Egipto ou de Israel se os responsáveis pela realização de enormes obras hidráulicas raciocinassem em termos semelhantes? E os custos da não construção, do despovoamento, da desertificação, do não desenvolvimento? Bem podemos utilizar aqui uma frase estafada, mas verdadeira: a água é vida e a vida não tem preço.
E chegamos aos dias de hoje. O Governo vem dizer agora que a obra não tem financiamento assegurado, depois de, no debate do Programa do Governo, o Ministro João Cravinho ter já deixado a ideia de que também não estariam garantidas as disponibilidades hídricas necessárias. A ser verdade o que diz o Ministro do Planeamento, estaríamos perante uma gravíssima irresponsabilidade do PSD e confirmaria o que muitos desconfiavam: que o arranque das obras em Setembro passado correspondia, antes de mais, a propósitos eleitoralistas do PSD e da então ministra do Ambiente, candidata por Beja. O PSD deve aqui dizer hoje qual é a sua versão desta triste história em que, a confirmar-se, mais uma vez se teria tentado jogar eleitoralmente com as legítimas aspirações dos alentejanos.
Mas, neste quadro, o que se exige do Governo do PS é que, em vez de lançar dúvidas sobre a obra, negoceie e assegure o seu financiamento e a sua realização. Alqueva não pode ficar sujeito a obscuros jogos políticos. Tendo já demonstrado que a água existe e que sem Alqueva é que não haverá água, o que exigimos do Governo do PS é que garanta, nas negociações com a Espanha, o cum-

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primento dos convénios existentes. E isto para que não ganhe corpo a ideia de que o PS hesita quanto a Alqueva e que está a querer criar na opinião pública o ambiente necessário a qualquer eventual decisão negativa sobre a obra. Quando o PS, no seu Programa Eleitoral e de Governo, afirma que irá realizar Alqueva e quando, na semana passada, o actual Secretário de Estado da Agricultura afirmou em Beja que Alqueva seria construído e até encurtando os prazos, não pondo quaisquer reservas, já conhecia todos os pressupostos do projecto. É que também são conhecidas as vozes contraditórias que existem no Governo e no PS sobre esta matéria.
O que significa a opinião do então Deputado e agora Secretário de Estado do Ambiente de que o projecto devia ser revisto? Que significado têm as palavras ambíguas do actual Primeiro-Ministro quando, em campanha eleitoral, ora dizia que Alqueva era para se fazer, ora dizia que era preciso repensar o projecto? Ou que significado tem o facto de o Ministro João Cravinho acentuar agora exclusivamente a função de Alqueva como reserva estratégica de água omitindo as restantes valias, designadamente a valia agrícola?
Srs. Deputados, esperamos do PS que, hoje e aqui, assegure sem hesitações, de uma vez por todas, que Alqueva se fará, à quota que está definida «porque de outra maneira perderá a função de reserva estratégica», com todas a valias previstas, designadamente com a dimensão de regadio que está aprovada. Do Governo e do Primeiro Ministro exigimos uma declaração formal de compromisso com a realização da obra. Não venham dizer que é preciso parar para pensar ou estudar. Alqueva é a obra hidráulica mais pensada e mais estudada do País. O que se exige, Srs. Deputados, é que se antecipem os prazos de construção e que, desde já, se trabalhe num plano integrado de desenvolvimento que permita, com tempo, preparar o aproveitamento de todas as potencialidades do Alqueva.
Aproveito para anunciar que uma delegação do Grupo Parlamentar do PCP visitará amanhã mesmo a obra, após o que requereremos a presença na Assembleia da República do Ministro do Planeamento para esclarecimento final desta
questão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tanto o PCP como os alentejanos não aceitarão qualquer atraso, suspensão ou amputação do Alqueva. Alqueva tem de ser feito! O Alentejo não pode ser mais adiado!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Joel Hasse Ferreira e Teresa Patrício Gouveia.
Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, em função do que ouvi, dir-lhe-ei, para começar, que considero que o Alqueva tem de se fazer e de forma urgente. Efectivamente, constitui-se com esse empreendimento não só uma importante reserva estratégica de água como se obtém outros efeitos relevantes para o desenvolvimento da região, alguns dos quais referiu.
Aproveito então a oportunidade para lhe formular as seguintes questões: sabe o Sr. Deputado que o acordo quanto ao esquema global de financiamento do empreendimento do Alqueva não está fechado, ou seja, que não está feito o acordo final com a Comissão Europeia? Não julga o Sr. Deputado que, numa obra que vai custar cerca de 100 milhões de contos até 1999 e 200 milhões mais a partir do ano 2000, dos quais perto de 130 milhões entre 2000 e 2003, se deveria ter assegurado o financiamento anteriormente ao arranque da obra? Ou considera o Sr. Deputado que o financiamento ainda não garantido por fundos europeus para este empreendimento deve ser negociado junto de bancos europeus ou inscrever-se no Orçamento do Estado, caso não viessem a conseguir obter-se os financiamentos que, em tempo, o governo do PSD não garantiu? E se a parcela de financiamento cobrir as eventuais faltas de fundos europeus, cuja negociação não foi fechada, não está concluída, tiver de ser coberta pelo Orçamento do Estado, concorda o Sr. Deputado com o arranque de uma obra que implica envolvimento do Orçamento do Estado sem o adequado debate e deliberação da Assembleia da República? Ou seja, ela já arrancou e o financiamento não foi garantido.
Sr. Deputado, quanto à água, Portugal tem todos os direitos quanto à água do Guadiana que o Convénio de 1968 assegura; mas acontece que, em duas décadas, o caudal do Guadiana, segundo estimativas acessíveis, terá diminuído cerca de 50%. Acha o Sr. Deputado que o anterior governo defendeu os interesses portugueses face aos espanhóis, no domínio da água, da melhor maneira? E, se os espanhóis fizerem todas as obras de regadio que têm previstas, estima-se que poderá ainda perder-se cerca de 23% a 25% do caudal actual, ou seja, ficarmos com um terço da água de há duas décadas? Não acha que esta situação exige, para serem respeitados os direitos portugueses, um forte empenhamento do actual Governo nas negociações com Espanha, rompendo com a prática demissionista do anterior governo?

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, segundo as informações de que disponho, e V. Ex.ª certamente, procedeu-se ao licenciamento da construção da barragem do Alqueva em 4 de Setembro de 1995; ao contrato de escavações, ao protocolo de colaboração com a EDP, em 11 de Setembro último; à inauguração das obras de escavação, em 26 de Setembro, portanto, na semana anterior às eleições legislativas. Tendo em conta a situação referida quanto ao financiamento e alguns aspectos que abordei e V. Ex.ª também, certamente concorda comigo que se tratou de uma manobra eleitoralista a inauguração de um empreendimento desta importância nas vésperas das eleições. Não teria sido mais urgente garantir completamente o financiamento? Consideramos que os portugueses têm direito a conhecer inteiramente o que se passou até agora. Mas concluo, afirmando, Sr. Deputado: não tenha V. Ex.ª dúvidas de que o PS não hesita e de que este Governo irá para a frente com o Alqueva mas com os pés assentes na terra e recusando os pântanos da baixa política e do eleitoralismo sórdido, que são prática de outros.

(O Orador reviu.)

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, pretende responder já ou no final dos pedidos de esclarecimento?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Respondo no final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia.

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A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, congratulo-me com a questão levantada por V. Ex.ª porque, como temos assistido nos últimos dias, os portugueses, de facto, precisam de ser esclarecidos sobre esta questão dos financiamentos, já que recentes declarações do Governo não têm feito mais do que confundi-los. O Governo está a inventar um problema que não existe, provavelmente para poder aparecer depois como o autor da solução; só que a solução já existe.
No Quadro Comunitário de Apoio, aprovado pela União Europeia, está previsto o financiamento do Alqueva como um projecto estratégico para Portugal, faltando acertar apenas a componente de uma pequena fatia desse financiamento, correspondente ao Fundo de Coesão, e em relação à valia ambiental do empreendimento. Ora, é isso que está em curso neste momento. Não há sequer nenhuma ideia de que a Comissão não aprovasse um projecto como este, que é do interesse nacional e que Portugal erigiu como instrumento do seu próprio desenvolvimento. As obras em curso estão a ser financiadas pela própria empresa, são obras sem expressão financeira, são obras preparatórias.
Penso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, nesta como noutras questões, o Governo está muito mais preocupado em continuar a fazer oposição ao anterior governo do que em governar ou em esclarecer os portugueses. E isto continuará a ser verdade até ao dia 14 de Janeiro, se não me engano!

Aplausos do PSD.

O Governo não tem mais senão que fazer aquilo que está previsto que seja feito, ou seja, continuar a acompanhar o processo administrativo de desbloqueamento das verbas, de modo a que, quando estiverem concluídos os prazos dos concursos agora em vigor, não haja mais atrasos nesta obra, e nós sabemos que não está claro o empenhamento do PS, como nunca esteve o seu entusiasmo relativamente a esta obra.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, sublinho a afirmação com que começou a sua intervenção: considero que Alqueva tem de ser feito. Sublinho positivamente, embora preferisse que V. Ex.ª tivesse começado por dizer: consideramos, nós, PS, e nós, Governo, que Alqueva será feito nos termos, na dimensão, na quota e com as valias que estão aprovadas. Preferia uma resposta desse tipo, em vez de uma resposta meramente de ordem individual.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Mas eu não pertenço ao Governo!

O Orador: - Tomo nota que V. Ex.ª está a falar em nome do PS, e registo essa resposta como tal.
Quanto à água, Sr. Deputado, já colocámos aqui, na anterior legislatura, essa questão. Efectivamente, consideramos que é grave, que foi uma grave irresponsabilidade e uma grave incúria que, ao longo dos anos, não se tivesse tido a atenção necessária e suficiente para impedir, para evitar que sucedesse o que sucedeu, que é o facto de, como eu disse, a Espanha ter retido no seu território caudais de água em quantidade muito superior àquilo que o Convénio estabelecia. Foi uma grave omissão de todos os governos anteriores. porque esta retenção de caudais em Espanha já começou há cerca de 20 anos. Mas, Sr. Deputado. apesar disso, o que me custa compreender é por que é que o Partido Socialista põe tanto acento tónico nesta questão quando V. Ex.ª e o Governo têm nas mãos um estudo - que eu também tenho! - de impacte ambiental que já tem em conta o Plano Hidrológico Espanhol e as perspectivas futuras e em que se diz que «os estudos efectuados apontam para valores que asseguram água suficiente para o empreendimento». Portanto, há água, mas é preciso construir a barragem do Alqueva, sobretudo com esta ideia: é que se ela não for construída então é que, seguramente, não haverá água, Sr. Deputado!
A segunda questão tem a ver com o financiamento. A Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia trouxe aqui outra versão: disse que isso consta do PDR aprovado e que estão previstos com a União Europeia todos os mecanismos para o seu financiamento. E. pois, preciso esclarecer quem fala verdade, se o Governo do PS ou se os anteriores governantes e actuais Deputados do PSD. Será que ternos de chamar aqui alguém da União Europeia para nos esclarecer?
Sr. Deputado, não me parece que as obras, em Portugal, se façam só porque há co-financiamento. Com ou sem financiamento comunitário, esta obra, pela sua importância estratégica no plano regional e nacional, terá de ser feita. O PS deve assegurar que assim se fará porque esse propósito já estava em cima da Mesa quando, antes das eleições, o prometeu concretizar.
Pela nossa parte, Sr. Deputado, continuaremos a lutar e a intervir - e vamos fazê-lo já amanhã - para que a barragem do Alqueva se faça e não seja mais um sonho irrealizável.

Aplausos do PCP.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente. gostava de assinalar à Assembleia da República que é bem melhor a situação em que nos encontramos hoje, em que há três partidos a discutir a primazia do interesse pela barragem do Alqueva.
Recordo aqui que, em 1976, defendi neste Parlamento a barragem do Alqueva, mas, manda a verdade dizer, só tive o apoio do Partido Comunista.
Passaram-se vários anos e já nesta Assembleia. com grande escândalo (e nessa altura não me encontrava aqui presente), ouvi levantar todos os argumentos ecológicos possíveis contra a barragem do Alqueva. Foi dito que essa barragem iria destruir a paisagem alentejana, que nunca seria um êxito porque não havia água para a encher, enfim todos os argumentos possíveis, esquecendo-se todas as forças que estavam contra de que a maior ou uma das maiores ameaças que vai recair sobre nós dentro de muito pouco tempo é a da falta de água, o que nos pode levar a morrer de sede.
Quero, por isso, Sr. Presidente. participar-lhe a minha alegria por ver que finalmente, as grandes forças políticas portuguesas acordaram para esta realidade. Espero que não tenha sido demasiado tarde!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a figura que acabou agora de utilizar não foi a de uma interpelação à Mesa. Não

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o interrompi pelo respeito que me merece, mas peço a todos os Srs. Deputados que, no futuro, reconduzam as suas intervenções à finalidade invocada quando pedirem a palavra. Se assim não procedermos, deturparemos as figuras regimentais, o que não prestigiará os nossos trabalhos.
O Sr. Secretário vai proceder à leitura de um relatório e parecer da Comissão Eventual de Verificação de Poderes.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer é do seguinte teor:

Em reunião da Comissão Eventual de Verificação de Poderes, realizada no dia 21 de Novembro de 1995, pelas 12.00 horas, foram observadas as retomas de mandato dos seguintes Deputados:
Nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Deputados:
Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata (PSD):
Arlindo Gomes de Carvalho (Círculo Eleitoral de Lisboa), em 17 de Novembro corrente, inclusive, cessando José Luís Campos Vieira de Castro;
Gilberto Parca Madail (Círculo Eleitoral de Aveiro), em 18 de Novembro corrente, inclusive, cessando José Júlio de Carvalho Ribeiro;
António Fernando da Cruz Oliveira (Círculo Eleitoral de Bragança), em - 18 de Novembro corrente, inclusive, cessando António dos Santos Pires Afonso.
Foram observadas as seguintes substituições de Deputados:
a) Nos termos do artigo 5.º, n. 2, alínea b), do Estatuto dos Deputados:
Solicitada pelo Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata (PSD):
Arlindo Gomes de Carvalho (Círculo Eleitoral de Lisboa), por José Luís Campos Vieira de Castro, com início a 17 de Novembro corrente, inclusive.
b) Nos termos do artigo 5.º, n.º 2, alínea d), do Estatuto dos Deputados:
Solicitada pelo Grupo Parlamentar do Partido Popular (CDS-PP):
Manuel Fernando da Silva Monteiro (Círculo Eleitoral de Braga) por António Carlos Brochado de Sousa Pedras, com início a 18 de Novembro corrente, inclusive.
c) Nos termos do artigo 2O.º, n.º 1, alínea g), do Estatuto dos Deputados:
Solicitadas pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS):
Antero Gaspar de Paiva Vieira (Círculo Eleitoral de Aveiro) por João Carlos da Costa Ferreira da Silva, com início a 18 de Novembro corrente, inclusive;
António Manuel do Carmo Saleiro (Círculo Eleitoral de Beja) por António José Gavino Paixão, com início a 18 de Novembro corrente, inclusive;
José de Sampaio Lopes (Círculo Eleitoral de Castelo Branco) por Maria do Carmo de Jesus Amado Sequeira, com início a 18 de Novembro corrente, inclusive;
Joaquim Américo Fialho Anastácio (Círculo Eleitoral de Faro) por Jorge Manuel Fernandes Valente, com início a 18 de Novembro corrente, inclusive;
Júlio da Piedade Nunes Henriques (Círculo Eleitoral de Leiria) por João Pedro da Silva Correia, com início a 18 de Novembro corrente, inclusive;
Silvino Manuel Gomes Sequeira (Círculo Eleitoral de Santarém) por Nelson Madeira Baltazar, com início a 18 de Novembro corrente, inclusive.
Parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente. - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos entrar no período de antes da ordem do dia que tem a ver com assuntos de interesse político relevante.
Os Srs. Deputados dispõem rigorosamente de 30 minutos, que é o tempo do prolongamento do período de antes da ordem do dia.
Para fazer intervenções, inscreveram-se os Srs. Deputados António Martinho e José Leitão, do PS, Mendes Bota e José Cesário, do PSD, e Bernardino Soares, do PCP.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que, antes de mais, dirija ao Sr. Presidente as minhas saudações, que são mais que protocolares pelo facto de serem dirigidas por um socialista a um grande socialista, que é uma referência para todos nós e um exemplo que se nos impõe e nos impele a seguir; depois, e na minha qualidade de Deputado eleito por um distrito da região de Trás-os-Montes e Alto Douro, saúdo-o pois V. Ex.ª quis, por opção, ser também transmontano. Constitui para nós motivo acrescido de regozijo vê-lo presidir à Assembleia da República.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - As minhas saudações são, ainda, extensivas aos restantes membros da Mesa, assim como às Sr.as e aos Srs. Deputados, ao mesmo tempo que faço votos para que saibamos fazer jus à confiança que os portugueses em nós depositaram.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: 10 anos passaram sobre o início de um período governativo que assentou em alguns princípios e ideias-base que, progressiva e sistematicamente, têm vindo a perder credibilidade, a desmoronar-se, como se de um castelo de cartas se tratasse.
Factos recentes como os que constam do relatório do Tribunal de Contas Europeu são disso prova cabal. Afinal, a expressão «nunca me engano e raramente tenho dúvidas» do ex-Primeiro Ministro Cavaco Silva não tinha razão de ser nem conteúdo efectivo. E o «bom aluno» face à Europa, como Portugal era considerado na expressão de alguns, corre o risco de vir a ser reclassificado em péssimo aluno.
Todos os dias surgem dados novos, que constituem outras tantas surpresas para a generalidade dos portugueses. Mas não para todos, certamente: para nós, Grupo Parlamentar do PS, não constituem novidade.
O Relatório Especial n.º 4/95 do Tribunal de Contas Europeu traz a lume situações e factos já anteriormente aqui tratados por iniciativa de Deputados socialistas - só para citar alguns refiro António Guterres, António Campos, Capoulas Santos e eu próprio.
Tais situações e factos, hoje como ontem, são motivo de grande preocupação para o meu grupo parlamentar e, certamente, para todos os portugueses.
Algo está mal, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quando o Tribunal é levado a concluir que, e cito, «a eficácia das medidas foi especialmente decepcionante» ou «no caso de muitos sub programas verificou-se uma deficiente se-

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lecção dos projectos, devido à abundância dos recursos e ao facto de nos critérios formais de elegibilidade não terem sido incluídos critérios de qualidade».
Porquê esta «deficiente selecção»? Por que houve favoritismos, clientelismo, compadrio?...
O Feoga/Garantia serviu para montar a rede de importação, quando devia ter possibilitado a criação dos mercados abastecedores, das zonas de concentração, assim como a constituição de empresas do sector agro-industrial.
A eficácia do PEDAP ficou também comprometida por «não terem sido tomadas de forma adequada as medidas necessárias para uma reorganização, reorientação e reestruturação mais eficientes das actividades agrícolas ou terem sido tomadas demasiado tarde».
Os resultados estão à vista: menos produção agrícola, menos bem-estar e qualidade de vida e desertificação progressiva do mundo rural.
É ou não assim, Srs. Deputados do PSD, Srs. ex-membros do Governo?
No que respeita «às medidas destinadas a melhorar a transformação e comercialização dos produtos agrícolas», as principais deficiências «resultaram do facto de a viabilidade económica dos projectos subvencionados não ter sido verificada com a necessária atenção, em larga medida em consequência de não se terem procurado estabelecer planos de comercialização correctamente desenvolvidos para o aumento de produção resultante das novas instalações de transformação».
E, assim, houve projectos megalómanos, autênticos elefantes brancos, subvencionados, enquanto outros, muito mais realistas, ficaram por aprovar.
É ou não verdade, Srs. Deputados do PSD, Srs. ex-membros do Governo?
No que se refere às medidas destinadas a melhorar a estruturas agrícolas, «as principais deficiências resultaram de uma falta de rigor na aplicação dos critérios de elegibilidade».
E, quanto à execução de alguns programas operacionais, constata-se que houve, por exemplo um «progresso muito lento na execução do emparcelamento» - e isto num país em que, numa grande parte da sua área, predomina a pequena propriedade. De igual modo se constata «uma irregularidade manifesta no programa operacional relativo às medidas florestais», ainda mais grave «por ter sido cometida, ao que parece, por funcionários do Instituto Florestal», diz o relatório a que me refiro.
Que têm a dizer a tudo isto, Srs. Deputados do PSD, Srs. ex-membros do Governo de Cavaco Silva? Sabiam ou não destas situações? Por que não viabilizaram os inquéritos propostos? Por que não votaram favoravelmente o nosso pedido de inquérito parlamentar n.º 10/VI, apreciado nesta Câmara em 12 de Março de 1993?
O seu enunciado era bem explícito: «Inquérito Parlamentar sobre a extensão, natureza e implicações das irregularidades, ilegalidades e operações de traficância política na gestão, pelo Governo e pela Administração Pública, de subsídios provenientes de fundos comunitários e outras verbas públicas destinadas à reconversão e modernização da agricultura portuguesa, bem como à intervenção nos mercados agrícolas».

Vozes do PS: - Muito bem!

Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Situações destas foram, mais do que uma vez, denunciadas, nesta Assembleia, por Deputados socialistas, não só quando se falou do caso Odefrutas/Thierry Roussel ou do caso das florestas em Trás-os-Montes como também em várias sessões plenárias ou em muitas reuniões da Comissão de Agricultura e Mar.
Recordo a interpelação n.º 4/VI. ao Governo, quando se escalpelizaram as razões da crise do sector agrícola e se afirmava haver uma «ausência continuada de uma política agrícola» e um «desbaratar da oportunidade de ouro dos fundos comunitários» (esta declaração foi proferida pelo então Deputado António Guterres).
Lembro, também, as afirmações de António Campos, quando, em Fevereiro de 1993, afirmava que a quebra de produção era de cerca de 24% nos dois últimos anos, a baixa de rendimento de 25% no mesmo período e a taxa de cobertura passava de 50% para 38%. São números de 1993, - Srs. Deputados!
Não digam, pois, agora, que não foram alertados; não culpem agora quem não tem culpa. Assumam as vossas responsabilidades e esclareçam o que no passado, nunca mereceu a vossa cabal explicação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Foram os agricultores portugueses os grandes prejudicados. E, por efeito dessa política desastrosa, ainda podem continuar a ter alguns prejuízos.
Da nossa parte, continuaremos a pugnar pelos interesses dos agricultores portugueses e por um efectivo desenvolvimento do mundo rural numa perspectiva de desenvolvimento harmonioso do País.
Aplausos do PS.

Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Duarte.

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Martinho, para mim e para todos portugueses esta sua intervenção deve levantar algumas dúvidas e suspeições.
Depreende-se que o PS continua cada vez mais a ser oposição ao PSD. O PS e o Governo não querem governar o País, não estão preocupados com os problemas dos portugueses, estão preocupados.. sim, em assumir o seu papel de oposição, em serem oposição ao PSD.
Após 1 de Outubro compete-vos cumprir as promessas eleitorais e trabalhar para o País, para os portugueses e, também, para os agricultores.
Lamento, pois, a continuação deste tipo de estratégia.
Quero lembrar ao Sr. Deputado António Martinho que certamente não leu o relatório integral mas, sim, um parecer do Tribunal de Contas, que vai ser sujeito à apreciação do Conselho Europeu de Agricultura, no qual estará presente um responsável do Governo português.
Esse parecer não faz referência a qualquer irregularidade, a qualquer desvio de dinheiro, a qualquer má aplicação. O que diz é que há deficiências no quadro legislativo e que a responsabilidade deve ser assumida pela Comissão Europeia e pelo Governo português para que, no futuro, haja mais eficácia na sua aplicação.
Lamentamos, pois, que vá por esses caminhos, que faça insinuações sem concretizar a que tipo de situações se refere.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado devia apontar claramente quais são os casos, alguns da responsabilidade do próprio Partido Socialista.

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Lembro-lhe que o P.O. dos temporais, cuja expansão para outras zonas o Partido Socialista reclamou, foi concretizado pelo Governo através de portaria e é uma das referências do parecer do Tribunal de Contas.
Mas o Partido Social Democrata foi sempre um partido aberto ao contributo dos partidos da oposição, o que parece não ser o caso actualmente.
Quero dizer ao Sr. Deputado António Martinho que, através dos fundos estruturais, nomeadamente do Regulamento n.º 797, foram apoiados 45 000 agricultores e que, através de indemnizações compensatórias, foram apoiados 300 000 agricultores. Ora, aquilo que o senhor está aqui a fazer é a insultar todos esses agricultores, dizendo que não conseguiram aproveitar tais benefícios, que desviaram o dinheiro e que não tiveram capacidade nem competência para aproveitar a oportunidade que o Governo português conseguiu dar-lhes.
Srs. Deputados, é com este insulto que não devem continuar, devem, antes, assumir as vossas responsabilidades para que o Quadro Comunitário de Apoio, que o Governo do Prof. Cavaco Silva negociou, seja aplicado com uma eficácia pelo menos igual à dos últimos quatro anos.
Sr. Deputado António Martinho, em vez de falar neste parecer, que não traz nada de concreto, porque é que não se preocupam, tanto V. Ex.ª como o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, em tentar apurar outras situações, relacionadas com responsáveis do Partido Socialista, que, segundo notícias vindas a público ultimamente e segundo dados na posse da Comissão de Agricultura e Mar, pronunciam a eventualidade de uma má gestão de dinheiros. Lembro o caso do Matadouro da Guarda, cujo presidente do conselho de administração foi um alto responsável do Partido Socialista. Era em relação a isso que deviam preocupar-se, a fim de terem autoridade para dizer alguma coisa. E deviam preocupar-se em governar e em trabalhar, pois é isso o que os portugueses esperam de vós.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Deputado Carlos Duarte, parece que continua distraído! Eu quis lembrar-lhe alguns factos, tais como o inquérito proposto pelo Grupo Parlamentar do PS, e a vossa resposta foi o inquérito à Cooperativa Agrícola de Torres Vedras. É caso para perguntar quem é que insulta os agricultores e por que motivo.
O Grupo Parlamentar do Partido Comunista propôs um inquérito à maneira como foram aplicadas as verbas nas florestas em Trás-os-Montes e eu, nesta Câmara, lamentando que Trás-os-Montes fosse importante por maus motivos, estava à espera que tivessem votado favoravelmente o inquérito para que se soubesse, efectivamente, como é que foram gastos os dinheiros públicos do Orçamento do Estado português...

O Sr. Fernando Pereira (PSD): - Proponha agora!...

O Orador: - ... e dos fundos comunitários. E VV. Ex.as, displicentemente, abusando de uma maioria absoluta, votaram contra um inquérito parlamentar que só queria aclarar as questões.
Sr. Deputado Carlos Duarte, lembra-se também da polémica gerada nesta Câmara aquando dos «parlamentos abertos»? Por que é VV. Ex.as não concordaram com a proposta do então líder da minha bancada no sentido de visitarmos a Odefuta, do Sr. Roussel? Não convinha! Claro que não convinha!... Mas, agora, digam lá: sabiam ou não destas situações? Se sabiam, por que é que não concordaram com a realização dos inquéritos? Se não sabiam, por que é que não o dizem agora?

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Digam agora que não sabiam!.. É que, Sr. Deputado, o povo português linha conhecimento de que vocês sabiam e, a seguir, infringiram-vos uma estrondosa derrota no dia 1 de Outubro.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, insultar os agricultores é dizer que eles utilizaram mal os dinheiros destinados ao investimento na agricultura.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador. - Essa foi a vossa atitude.

Aplausos do PS.

Nós, como o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas disse de outra forma, saberemos utilizar o dinheiro e arranjar mecanismos para potenciar os investimentos e os fundos comunitários.

Aplausos do PS.

O Sr. Fernando Pereira (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra e consideração.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, dar-lhe-ei a palavra no final deste debate.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A única estrutura de abate existente no Algarve encontra-se em situação de autogestão e corre o risco eminente de ter de fechar as portas.
O Matadouro Regional do Algarve é fruto dos investimentos da pré-adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia. Ali foi aplicado um milhão de contos, dos quais 517 000 decorrentes de um empréstimo da Caixa Geral de Depósitos, pagável em 10 anos, que ora expira sem que tivessem sequer sido liquidados os juros dessa dívida.
A dívida actual, entre capital e juros vencidos, cresceu até cerca de um milhão de contos.
Inaugurado a 22 de Maio de 1992, com pompa e circunstância, gravada para a posteridade em placa alusiva ao acto, que se destaca na frontaria principal do empreendimento, ninguém se preocupou com o garrote financeiro que já então ameaçava de morte tão esperançoso quanto necessário investimento para a região do Algarve.
Bem dito, bem feito. À falta de pagamento das obrigações e até mesmo A falta de interlocutor válido que respondesse pelo incumprimento do serviço da dívida, a Caixa Geral de Depósitos accionou a execução em Janeiro deste ano e em Junho procedeu à avaliação de bens para penhora.
Tudo leva a crer que se nada for feito que obste a tal desiderato, dentro em breve serão levados à praça públi-

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ca os equipamentos, as viaturas, os terrenos e os edifícios do Matadouro Regional do Algarve.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Isso é uma autocrítica!

O Orador: - O insólito de toda esta situação é que se assiste a unia disputa financeira, impiedosa e crua, em que o Estado acciona o próprio Estado, ou seja, a Caixa Geral de Depósitos, de capital exclusivamente público, vai levar à praça o Matadouro Regional do Algarve S.A., cujo principal accionista, detentor de 66% do capital, é a PEC - Produtos Pecuários e Alimentação, S.A., criada pelo IROMA e pertencente ao sector empresarial do Estado.
O insólito transforma-se em incompreensível quando se sabe que o principal accionista, a PEC, desertou de todo este processo, demitiu-se irresponsavelmente das suas responsabilidades, não integra a administração, como seria de esperar, nem comparece a qualquer reunião do conselho geral, há cerca de um ano.
Pode dizer-se, com propriedade, que o Matadouro Regional do Algarve está em autogestão. O que não significa, necessariamente, má gestão.
Da visita que efectuámos ao empreendimento recolhemos uma sensação de eficácia, de salubridade e de potencialidades - ainda por desenvolver no domínio da transformação e comercialização das carnes.
Se descontamos o serviço da dívida, o resultado operacional de 1994 saldou-se positivamente em perto dos 30 000 contos e em 1995 aponta-se para números semelhantes. Ali se abatem, anualmente, mais de 4600 toneladas de carne. Ou seja, o Matadouro Regional do Algarve é viável, pode ser rentável, mas carece urgentemente de uma injecção de capital fresco, que permita um aumento do fundo de maneio e uma renegociação da dívida com o seu principal credor.
O Estado não pode alienar as suas responsabilidades. E se interveio noutras situações ainda mais gravosas, como foi o caso do Matadouro de Souzel, não se compreenderá porque motivo fecharia as portas aos produtores e comerciantes de carne do Algarve, que se verão na contingência de terem de deslocar-se para Beja, onde se localiza a estrutura de abate mais próxima.
O alerta aqui fica lançado. Continuaremos a acompanhar de perto o destino desta unidade industrial da qual dependem 70 famílias e que tem condições para prestigiar o tecido empresarial algarvio. Poderíamos mesmo sintetizar: o Algarve não consentirá que lhe «matem» o Matadouro!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Chama-se a isso um verdadeiro tiro no pé!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PSD): - Sr. Deputado Mendes Bota, regozijo-me com a sua intervenção, que subscrevo inteiramente. Aliás, subscrevê-la-ia ainda com mais entusiasmo se V. Ex.ª tivesse tido o cuidado de salientar que no contexto político-eleitoral, esta intervenção vem atrasada. Na realidade, tudo o que referiu passou-se nos anos de 1994 e 1995 e já era conhecido antes das férias parlamentares de 1995
V. Ex.ª falou, por exemplo, na falta de cumprimento do serviço da dívida e na falta de interlocutor, em quem devia assegurar o serviço da dívida e em quem devia ser o interlocutor. Também disse, não explícita mas implicitamente, que a PEC... 0 que é a PEC, Sr. Deputado? Quem tutela e quem dirige a PEC? Quem nomeia as pessoas que dirigem a PEC? É algum fantasma? É a União Europeia? É Bruxelas? Não é, é o Governo português, o mesmo Governo português que permitiu, deu instruções e autorizou que a PEC- como também o Sr. Deputado disse implicitamente apoiasse, com uma política exactamente ao contrário daquela que teve para com o Matadouro Regional do Algarve, o matadouro de Souzel. Porque será? Haverá aqui alguém de Souzel que possa explicar esta estranha diferença de fazer política? Talvez haja, Sr. Deputado, aí, na sua bancada.
De facto, o Governo do PSD, que foi o único alvo da sua intervenção - só que o Sr. Deputado não o disse, embora devesse tê-lo dito e levado até ao fim as consequências da sua intervenção -, é o responsável pela gravíssima situação do Matadouro Regional do Algarve.

Aplausos do PS.

E o Algarve, que pretende ser - e há-de ser - uma região administrativa, não pode dar-se ao luxo, não pode permitir que o Governo central, por desmazelo, por discriminação política e não por motivos financeiros ou económicos, deixe morrer um matadouro que é uma arma estratégica importante numa região que deve ser equilibrada e coerente no seu todo político, social e económico.
Sr. Deputado, com este pedido de esclarecimento quis apoiar a sua intervenção, mas também quis abrir as lacunas que o senhor não teve a coerência total de levar até ao fim e daí apontar o dedo para quem acusa. Devia ter feito isso, que lhe ficava bem, como pessoa que está ao corrente da situação, tal como me apercebi.
E, já agora, deixe-me informá-lo que o actual Governo vai cuidar do assunto com certeza melhor do que o anterior.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente:- Srs. Deputados, o Sr. Deputado Lino de Carvalho pretende usar da palavra para pedir esclarecimentos Como o PCP já não dispõe de tempo, o partido Os Verdes cede-lhe um minuto.
Peço-lhe, Sr. Deputado, que não ultrapasse esse minuto.
Tem a palavra.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente. Sr. Deputado Mendes Bota, estou de acordo com o que disse. Só que o Sr. Deputado esqueceu-se de um pequeno pormenor: dizer quem é que construiu a mega-rede nacional de abate deste País. Só lhe faltou esse pormenor!
De facto, como o Sr. Deputado sabe, o que se passa com o Matadouro Regional do Algarve passa-se com muitos outros matadouros regionais em consequência de um sobredimensionamento da rede nacional de abate, várias vezes aqui debatida. Aliás, na última legislatura trouxemos aqui uma proposta de inquérito parlamentar e à forma como isso estava a ser feito, que o PSD negou. Uma evidência há muitos anos provada aqui nesta Casa foi que a dimensão dessa rede nacional de abate não servia os interesses do País, estava sobredimensionada em relação às necessidades, e a demonstração disso é que há uma série de matadouros pelo País fora que estão nessas condições. Isto, para além dos processos de falta de transparência existentes em toda a rede nacional de abate.
Sr. Deputado, como disse há pouco, em aparte, o senhor deu aqui um verdadeiro tiro no pé!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

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O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de começar por responder ao meu caro conterrâneo ou coprovinciano, Dr. Luís Filipe Madeira, dizendo-lhe que o atraso não é meu. Se o Sr. Dr. Luís Filipe Madeira, como Deputado pelo Algarve, acha que esta situação deveria ter sido denunciada há muito tempo, então ele foi o primeiro a falhar, inclusivamente como Deputado da oposição, porque não consta dos registos desta Câmara qualquer intervenção sua a denunciar a situação que, hoje, aqui vim expor.
Portanto, o atraso é seu, é da sua bancada, é de todos aqueles que confundem as maneiras de fazer política. É que enquanto os senhores olham para esta questão do matadouro inserindo-a numa questão mais global do abate político em que querem transformar a actualidade portuguesa, os senhores estão mais interessados na revanche,...

O Sr. José Magalhães (PS): - Qual revanche?

O Orador: - ... e estão mais interessados em olhar para os erros do passado do que em construir o futuro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, recuso-me a entrar nessa dialéctica de abate político, porque o matadouro político que o Partido Socialista quer instalar em Portugal neste momento, visando apenas a cabeça dos responsáveis, não é a lógica que me traz aqui. O que aqui me traz é, uma lógica regional, de defesa da minha região. Seja quem for o culpado, a minha região está aqui porque tem um problema grave. E se a culpa é do Governo do PSD que seja ele o culpado, mas se o culpado, no futuro, for o Governo do Partido Socialista, o dedo ser-lhe-á também apontado.
Srs. Deputados, esta é uma lógica diferente de fazer política. Eu não dou tiros nos pés!... Eu estou de acordo com a minha consciência, Sr. Deputado Lino de Carvalho. Mas há Deputados que, em nome da solidariedade para com a sua bancada, em nome da disciplina partidária, calam aquilo que é verdade, calam aquilo que deviam de denunciar. Eu, com o devido respeito, não me calo. A minha bancada não me impõe essa disciplina por achar que é importante tratar aqui estas questões regionais e porque nós temos uma perspectiva de futuro e não de passado.
Quero também dizer-lhe, Sr. Deputado, que muito bem fez o Governo ao criar uma mega-rede de abate e que ainda bem que o Matadouro Regional do Algarve está feito. Mau seria ele desaparecer, porque, no passado, o que havia era uma rede de matadouros clandestinos, sem condições higiénicas e de salubridade, com os esgotos a correrem para as ribeiras e para os rios do Algarve. Era essa a realidade. Se o senhor quer voltar ao passado, volte, mas com o apoio do Partido Social Democrata não volta, de certeza.
Sr. Deputado, nós não temos alvos a abater, o que queremos é resolver as situações. Foi em nome dessa resolução que aqui fiz esta intervenção, sem ataques a ninguém, nem sobre o passado nem para o futuro. Apenas vim aqui alertar para uma situação que era do conhecimento do Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, a quem quero dizer, com toda a honestidade, que fui instado pela direcção do Matadouro Regional do Algarve, já depois das eleições de 1 de Outubro, a aperceber-me da situação dramática que se vive neste momento com o perigo iminente de ser executada a penhora por parte da Caixa Geral de Depósitos o que porá o Matadouro Regional do Algarve numa situação que não serve nem o Algarve nem o País.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Filipe Madeira pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Para defesa da honra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Terá a palavra no fim, Sr. Deputado.
O Sr. Deputado Fernando Pereira tinha também pedido a palavra para defesa da honra, mas notificou a Mesa de que desiste porque entende haver dualidade de critério dado que, anteriormente, segundo disse, dei a palavra ao Sr. Deputado Nuno Abecasis logo a seguir ao seu pedido e que com ele não fiz o mesmo.
Sr. Deputado, a justificação que a Mesa lhe dá com muita honra, é que a regra consiste no deferimento para o fim. A excepção só se pode justificar por duas razões: ou quando o deferimento faz diluir o efeito e deixa no ar uma ofensa grave ou, então, quando a gravidade é tanta e se justifica que, mesmo que o tempo de deferimento seja pouco, se dê a palavra imediatamente.
Quis-me parecer que, desta vez. o deferimento era de alguns minutos - no caso do Programa de Governo era de horas - e, se me permite, também me quis parecer que a gravidade não era assim tanta que o Sr. Deputado não pudesse arcar com a ofensa durante mais uns minutos.
Entretanto, Srs. Deputados, hoje é dia de muitas alegrias. Temos connosco os alunos da Escola Secundária da Cidade Universitária de Lisboa para quem peço o habitual aceno de simpatia.

Aplausos gerais.

Srs. Deputados, depare-se-me o seguinte problema: esgotámos o tempo destinado ao período de antes da ordem do dia e, tanto quanto possível, desejo cumpri-lo. Mas o Sr. Deputado José Leitão tinha-se inscrito e diz-me agora que a sua intervenção perderá alguma eficácia uma vez que se refere ao antigo embaixador Aristides Sousa Mendes. Não quero assumir a responsabilidade de aumentar o tempo do período de antes da ordem do dia, mas pergunto aos grupos parlamentares se acham que posso fazê-lo com o vosso assentimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, não temos nada a objectar quanto à intervenção do Sr. Deputado José Leitão, mas trata-se, obviamente, de um critério que põe em causa outros Deputados.
Há um Deputado da minha bancada que tem uma intervenção preparada já há quase duas semanas, não pôde intervir no período de antes da ordem do dia da semana passada, não poderá intervir no de hoje. Aquilo que solicito, pois, ao Sr. Presidente é que tenha um critério comum para as várias inscrições.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, ao passar para os grupos parlamentares a decisão, o critério deixa de ser meu para ser vosso. Mas desde que o Sr. Deputado levanta esse problema fica entendido que o Sr. Deputado José Leitão não terá a palavra e que o critério será rigorosamente seguido.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, dada a inquietação que se verifica na bancada do PS, se a intervenção do Sr. Deputado José Leitão for tão urgente que tiver de ser feita agora, não nos opomos.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, ficamos pela decisão anterior. As intervenções ficarão para a próxima sessão.
Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, terminado o debate, tem a palavra para defesa da honra.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Deputado Mendes Bota, o senhor insinuou ou afirmou que eu teria sido menos diligente a zelar pelos interesses da região que represento na Assembleia da República. Aparentemente assim é, e muito embora só recentemente, tal como V.Ex.ª , tivesse tido conhecimento em pormenor dos dados da situação, há mais de uma ano que sabia da grave situação por que passava o Matadouro.
Porque é que, então, não intervim aqui? Esta é uma explicação que devo dar e suponho que muitos de nós devemos dar. Não intervim porque na última legislatura me habituei a que sempre que o fazia em relação a um assunto de interesse para o Algarve o efeito no Governo, na maioria absoluta, era contraproducente, havia retaliação, e aquilo que mesmo justo, devesse ser tratado imediatamente era, por essa razão, e para que o Deputado da oposição não mostrasse que a sua intervenção era válida, prejudicado. E eu não queria prejudicar a minha região, em especial numa altura em que o seu partido e o Governo, que o senhor também representava nessa altura, eram contra a regionalização.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, agradeço a sua gentileza em ter dado as explicações que deu a esta Câmara e que permitiram tomar mais claro o porquê de um certo silêncio que, como líder do Partido Socialista no Algarve, lhe temos notado nos últimos tempos, nomeadamente nos últimos anos. Ficou agora explicado o silêncio do Sr. Deputado Luís Filipe Madeira verificado ao longo dos últimos anos como parlamentar, que se encontra radicado no facto de ser sua opinião quanto a mim errada - de que as suas intervenções eram contraproducentes para a região. Penso que, de facto, não era isso que se passava pois sou de opinião que o Governo do PSD actuou em prol do Algarve dentro do que lhe era possível, e que aceitou as sugestões e até as observações que lhe eram feitas, viessem de onde viessem.
Penso, pois, que essa opinião conduziu estrategicamente a um sítio errado. No entanto, isso faz parte do passado. Vamos esquecer o que passou, vamos é olhar para o futuro.
Espero, com toda a sinceridade, que o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, mesmo com o Governo do Partido Socialista. se daqui para a frente tiver que fazer intervenções críticas as faça e que, apesar de estarmos em bancadas diferentes, estejamos do mesmo lado, ou seja, ao lado do Algarve

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 55 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, do período da ordem do dia de hoje consta a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 15/VII (PS), que revoga e substitui o Estatuto do Direito de Oposição.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que dirija as primeiras palavras para saudar Almeida Santos. Presidente da Assembleia da República, o qual é hoje, por direito próprio, pela sua biografia e pelas suas responsabilidades, o primeiro parlamentar da República, desta nova República fundada com o 25 de Abril.
Permitam-me, caros colegas, que ao assumir a tarefa e a honra de apresentar. e defender, um novo estatuto do direito de oposição - em nome do Partido Socialista - o faça desde logo, invocando o seu verdadeiro e real inspirador, e autor, que é, nem mais nem menos, do que V. Ex.ª, Sr. Presidente, a quem presto as minhas homenagens. no reconhecimento de uma proposta que tem tanto de ousadia como de exigência de responsabilidades democráticas, e isto quer para o partido que suporta parlamentarmente o Governo, quer para os partidos da oposição em geral.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Constitui um ponto de honra para o Partido Socialista iniciar esta legislatura com a apresentação de uma iniciativa legislativa respeitante ao exercício do direito de oposição democrática. Queremos dar um sinal ineludível de se ter inaugurado um novo ciclo no funcionamento das instituições democráticas. Pela nossa parte, terminou a situação paradoxal de uma Assembleia da República que em vez de fiscalizar foi fiscalizada, em vez de legislar foi legislada, e em vez de inquirir foi inquirida.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O estatuto da oposição que apresentamos é um roteiro e um compromisso político, é sobretudo um pacto de relacionamento institucional com vista ao exercício democrático e à governabilidade. A democracia exige pluralidade, participação e o reconhecimento do papel essencial das oposições na conformação da vontade colectiva.
Ora, as oposições e as minorias políticas só cumprem o seu papel institucional se dispuserem de todos os meios e de todas as armas legítimas para o combate político. Pela nossa parte, acabou a atitude de menorização do papel dos partidos de oposição. Com este projecto de lei que retoma, com os adequados ajustamentos, idêntica iniciativa apresentada na última legislatura, e discutida em Junho de 1994, pretendemos consagrar uni conjunto de regras precisas de participação e induzir unia nova prática política. E queremos, de uma vez por todas, dar plena e adequada execução à garantia constitucional do princípio da separação de poderes e da interdependência dos órgãos de soberania que também se realiza, como se sabe, ao nível organizatório específico da participação partidária.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados. A existência de um Parlamento digno deste nome exige, assim, aos diversos níveis, a adopção de procedimentos onde o exercício de confrontação e do consenso tenham espaços próprios para se exercer e dirimir. Um novo impulso ao prestígio dos partidos políticos, do Governo e da oposição, a valorização do debate e da crítica democrática, o estímulo aos exercícios dos direitos e deveres de acompanhamento dos «principais assuntos de interesse público», são ingredientes necessários à revalorização do exercício político e parlamentar. E não perturbam, nem fazem esquecer, as responsabilidades próprias de quem governa, o risco das suas opções executivas e, naturalmente, o exercício da autoridade democrática própria da acção governativa.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Data de Agosto de 1977 o Estatuto do Direito de Oposição que hoje se visa substituir. Dezoito anos é o tempo longo da maioridade que, entretanto, tem vindo a ser percorrida com diversas e naturais alterações. A versão constitucional originária, a que o estatuto inicial se reportou, confinava-se ao reconhecimento da participação dos partidos políticos e ao reconhecimento de oposição democrática às minorias. Mas com a revisão de 1982 passou a consagrar-se que «os partidos políticos representados na Assembleia da República e que não façam parte do Governo gozam, designadamente, do direito de serem informados regular e directamente pelo Governo sobre o andamento dos principais assuntos de interesse público...» e com a revisão constitucional de 1989 a abóbada constitucional completou-se com o acrescento de que «igual direito gozarão os partidos políticos representados em quaisquer outras assembleias designadas por eleição directa relativamente aos correspondentes executivos de que não façam parte».
Mas o impulso constitucional à cooperação com a oposição parlamentar foi no passado, sob o Governo do PSD, quase sempre letra morta, vogando ao sabor de um estatuto desactualizado e sobretudo de uma prática governativa inspirada por um estilo de fazer política que identificou o conflito como traço distintivo, foi incapaz de ouvir a oposição, e sempre entendeu as instituições fiscalizadoras como força de bloqueios, como VV. Ex.as sabem.
O próprio processo de construção da União Europeia, apesar de haver para o efeito legislação específica, e agora recentemente, que a enquadra, apenas deu lugar a consultas tardias, reticentes e muitas vezes impróprias e insuficientemente documentadas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Com o estatuto da oposição que hoje apresentamos, propomo-nos o reconhecimento de direitos específicos da oposição parlamentar, sem prejuízo, designadamente, do direito de fiscalização e de crítica no âmbito da Assembleia da República, dos direitos constitucionais e legais de participação na organização e funcionamento do próprio Parlamento. E sem esquecer, ainda, que os direitos de oposição não se limitam aos partidos parlamentares.
Assim, no quadro constitucional vigente vincula-se o Governo, os governos regionais, as câmaras municipais, as juntas de freguesia e os futuros executivos regionais (por exemplo), ao cumprimento perante os partidos não representados nos respectivos governos aos deveres resultantes do direito de oposição.
E que deveres são estes? A que direitos a oposição parlamentar nos mais diversos níveis e instâncias se pode e deve arrogar? Desde logo o direito à informação, atempada e autorizada sobre questões essenciais de interesse público, que se tornam agora taxativas no projecto apresentado; o direito de consulta prévia sobre matéria eleitora] e orientação geral de política externa, e designadamente sobre orientação geral de política de defesa nacional no que respeita ao Governo; os direitos de participação em geral e de participação legislativa em especial; direitos de depor, de autor, de resposta e de réplica política, bem como a identificação actualizada de garantias de liberdade e independência dos meios de comunicação. Tudo se complementa com relatórios de avaliação do grau de observância das garantias da presente lei.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como vão longe e soam a dislate histórico as palavras do PSD pela voz sempre autorizada, mas desta feita menos feliz, do Sr. Deputado Guilherme de Silva quando disse, em Maio de 1994, no debate parlamentar de então, referindo-se ao projecto do Partido Socialista, homólogo do actual: «VV. Ex.as... tentam um certo golpe de Estado constitucional através do estatuto do direito de oposição". E disse mais: «Na verdade, há nele duas vertentes que é preciso denunciar: por um lado V. Ex.as...» (dirigia-se ao Partido Socialista) «... pela via do estatuto da oposição querem ser aquilo que não conseguem pela via eleitoral, ou seja, querem ser governo e querem assumir uma co-decisão nas decisões governamentais; por outro lado, sabem estar condenados à oposição, querem, nesta sede e neste local, ganhar poderes que não conseguem pela via eleitoral; querem ainda, por via deste projecto, fazer sair do centro próprio, que é o Parlamento - é nele que se deve exercitar, em primeira linha, o papel fiscalizador, sobretudo com o protagonismo dos partidos de oposição - mas, para sedes aliás obscuras e pouco claras, o ponto central de oposição política».
Acabei a citação impressiva do Sr. Deputado Guilherme Silva!
Sr.as e Srs. Deputados do PSD. VV. Ex.as enganaram-se, como é manifesto e por certo reconhecem, e é porventura o momento de reconhecerem o erro até ao fim. Se o não fizerem, negam a evidência e não se ilustram por isso.
O Partido Socialista, manifestamente, não pretendeu, como agora se prova à sociedade, obter ganhos de poder que seria incapaz de alcançar pela via eleitoral.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E, pelo contrário, vem propor a todos os partidos da oposição parlamentar, inclusive nesta matéria ao relapso PSD, que votem o estatuto de oposição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O PS e o seu grupo parlamentar têm a mesma voz e a mesma cara, na oposição ou no exercício do poder. Não mora em nós o hábito fagueiro de mudar de opções, de pose, de convicções e de identidade ao sabor das conveniências e de duplicidades de batota eleitoral.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: É em nome de uma cultura democrática de poder que retomamos este projecto. Somos dos que pensam que o exercício político é a um tempo confrontação e consenso, conflito e diálogo, concertação e autoridade. Somos dos que perfilham que no limite da ideia democrática «a democracia é um sistema político que pressupõe a dissidência. Exige consenso apenas em tomo de um único ponto: as regras da competição.»
São estas regras cuja abertura propomos a todas VV. Ex.as, na convicção de uma autoridade política de quem na oposição e no poder apenas pretende dignificar a conflitualidade do diálogo político democrático e de quem sabe que um poder e uma maioria que respeita as oposições e as minorias está, desde logo, a respeitar-se a si próprio.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Isabel Castro, Luís Sá e Guilherme Silva.

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Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, registo com agrado a intervenção que fez e no sentido exacto que lhe pretendeu atribuir, ou seja, o início de um novo cicio.
Não falaria em nova cultura política porque tal poderia conduzir-nos erradamente à ideia de que houve uma velha cultura democrática, o que me parece não ter existido. E é precisamente nesse exacto contexto que saúdo a modificação que o Partido Socialista, através deste projecto de lei, pretende introduzir.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - E registo-o positivamente tanto mais que, não há muitos meses, li num semanário um artigo de opinião escrito por um seu colega de bancada que falava dos partidos inúteis e que não reputo como um exemplo da chamada cultura democrática.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Dito isto, Sr. Deputado, face aos tempos que nós queremos ver enterrados e que a nova prática política, e tão só, poderá permitir quantificar na sua exacta dimensão, e passando por cima do que presumo tenha sido um lamentável lapso da intervenção do Sr. Primeiro-Ministro, aquando do encerramento do debate do Programa do Governo, quando se referiu a todos os grupos parlamentares, à excepção do Grupo Parlamentar de Os Verdes, que com a sua pequenez - é certo - existe e é uma corrente de opinião tão respeitável quanto qualquer outra, gostaria que se referisse com maior precisão a um aspecto. Parecendo-me que este projecto pretende reforçar e clarificar e, portanto, dar novos passos no sentido de dar corpo e sentido àquele que era o preceito constitucional estabelecido do direito de oposição, em relação ao espaço de intervenção na comunicação social, como é que, através do vosso projecto de lei, ele se articula com a representatividade?
Coloco-lhe esta questão com grande clareza, dado que, há cerca de um ano, o programa televisivo «Parlamento», que é suposto reflectir o que os vários grupos parlamentares fazem nesta Câmara, por razões que desconhecemos, deixou de incluir a representação do Grupo Parlamentar de Os Verdes no debate.
Ora, admitindo eu que estamos a falar em representatividade, no sentido de precisar os exactos termos em que o exercício do direito de oposição dos partidos políticos se vai fazer nesta Câmara, pergunto-lhe, Sr. Deputado, se entende que, com a entrada em vigor deste projecto, este será um cenário passível de vir a acontecer numa televisão pública e se, em sua opinião, colocar nos termos deste diploma a questão da representatividade pode ou não, de modo perverso, ser diferentemente entendido e levado à prática, contrariando o que me parece estar subjacente quer na sua intervenção quer na que o Sr. Presidente, então Deputado Almeida Santos, proferiu nesta Câmara na anterior legislatura ao proceder à apresentação deste mesmo projecto de lei.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Alberto Martins, antes de dar a palavra à Sr.ª Deputada Isabel Castro, esqueci-me de lhe dirigir duas palavras inúteis - inúteis porque dispensáveis.
V. Ex.ª quis cumprimentar-me e foi muito amável. Vou dar o desconto imposto às suas palavras pela amizade que nos une e dizer-lhe que, apesar disso, fiquei muito cativado e que lhe pago na mesma moeda.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, na perspectiva da bancada do PCP, é indiscutível que se impõe substituir o Estatuto do Direito de Oposição de 1977. Como é sabido, as normas constitucionais sobre esta matéria foram objecto de duas revisões constitucionais e o facto de a lei ordinária não ter sido alterada configura-se, como de resto já foi apontado no debate de 1994, como inconstitucionalidade por omissão que se impõe colmatar, pelo que, na nossa perspectiva, esta iniciativa é oportuna.
Entretanto, como o Sr. Deputado teve oportunidade de sublinhar, o Estatuto do Direito de Oposição tem que ver com o conjunto do sistema político e com o alcance dos direitos, liberdades e garantias, com a situação na comunicação social e com os poderes do Parlamento, tratando-se, portanto, de uma questão global e não apenas do problema de uma concreta lei, por muito importante que seja, tal como é este Estatuto.
A primeira questão que quero colocar-lhe é exactamente esta: o que é que o PS pensa fazer, nesta perspectiva global, por exemplo em questões como a dos meios de comunicação social? Neste Estatuto são previstas normas relativamente a essa matéria, normas e princípios cuja aplicação teria importância, mas, entretanto, não esqueço que a lei de 1977 refere exactamente a participação dos partidos de oposição representados na Assembleia da República no controlo e superintendência dos meios de comunicação social, expressão esta que tem um sentido técnico muito preciso. No entanto, como é sabido, os anteriores governos não aplicaram minimamente este princípio, pelo que não posso deixar de observar que as normas propostas significam um recuo em relação a esta situação. Gostaria, pois, de ouvir o Sr. Deputado.
Segunda questão: tendo o Sr. Deputado sublinhado, e muito bem - não poderia acompanhá-lo mais nesta matéria! -, a importância do papel da Assembleia da República para o Estatuto do Direito de Oposição, configurado de forma global, gostaria de saber qual é disponibilidade da bancada do PS para um trabalho no sentido do fortalecimento sistemático desse papel aos mais diferentes níveis.
A terceira questão, talvez a mais importante quanto ao diploma em si (há várias observações que terei oportunidade de fazer aquando do debate na especialidade), deve-se ao facto de este projecto me parecer insuficiente em matéria de integração europeia. O Estatuto do Direito de Oposição de 1977 foi feito num momento em que Portugal não era parte da Comunidade Europeia.
Pergunto-lhe, pois: que disponibilidade existe por parte do PS, quer relativamente a esta matéria quer a outras, para, aquando da discussão na especialidade, aceitar alterações que possam aperfeiçoar este Estatuto, tanto neste aspecto como noutros que terei oportunidade de referir?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, em primeiro lugar, quero, sem falsa modéstia, agradecer-lhe o facto de ter valorizado a

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sua intervenção citando anteriores intervenções minhas proferidas nesta Assembleia.

O Sr. José Magalhães (PS): - Inesquecíveis!

O Orador: - Sr. Deputado, esta iniciativa do PS, bem como a sua intervenção e outras já aqui feitas até hoje revelam, efectivamente, que o seu partido não se conseguiu ainda libertar do complexo de partido de oposição. Ainda não assumiu inteiramente a veste de partido no poder.
Uma outra questão que esta iniciativa também revela e confirma é que o PS - e presto homenagem à habilidade que tem tido em gerir esta questão - tem sempre o cuidado de fazer o discurso de abertura, o discurso do diálogo, o discurso da tolerância..., apresenta um projecto com mais poderes para a oposição... Mas apesar de ainda terem passado poucas semanas de exercício do actual Governo, infelizmente, este tem uma prática que recua em relação a esse discurso. Veja-se o que está para aí a acontecer no que diz respeito aos saneamentos e às nomeações de pessoas cada vez mais identificadas com o Partido Socialista!

Risos do PS.

Veja-se as declarações que fazem responsáveis do PS e do Governo, dizendo que é necessário que nos lugares tais e tais haja gente da confiança do PS, identificada com o programa do PS! Todas as acusações que foram feitas ao PSD, ao «Estado laranja» e às «nomeações laranja» para os vários cargos públicos estão hoje a ser desencadeadas pelo PS, prática contrária ao seu discurso!
E o que receio, Sr. Deputado Alberto Martins, é que este projecto seja mais um passo nessa linha de «vamos fazer uma lei assim, mas vamos ter a prática que muito bem entendermos», que é a de manter o discurso do diálogo e a prática do não diálogo.
Mas quero dizer-lhe mais: há princípios constitucionais que regem o nosso sistema, designadamente o Estatuto do Direito de Oposição, que são desvirtuados neste projecto de lei.
Não nos podemos esquecer que o acento principal da oposição é parlamentar.

O Sr. José Magalhães (PS): - E então?!

O Orador: - E o Dr. Silva Leitão, que fez um estudo interessantíssimo sobre esta matéria, chama exactamente a atenção para o cuidado que é necessário ter na regulamentação do Estatuto do Direito de Oposição, de forma a que não se desvirtue e não se retire para outras sedes aquilo que deve ser de sede parlamentar. Ora, este projecto está eivado de várias preocupações visando desviar desta Casa, coração da oposição e da democracia...

O Sr. José Magalhães (PS): - Quais?

O Orador: - Queria perguntar-lhe, aliás na linha do que fez o Sr. Deputado Luís Sã, se não considera que se coloca o problema de se ver este Estatuto e as prerrogativas da oposição que contempla num âmbito mais global do que deveria ter este projecto de lei. Refiro-me, designadamente, ao direito de resposta e de réplica, ao Regimento da Assembleia da República, às comissões de inquérito - VV. Ex.as, que não obtiveram a maioria absoluta, querem que as respectivas conclusões sejam aprovadas por maioria de dois terços, compreendendo-se perfeitamente essa preocupação...

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto! Devia aplaudir!

O Orador: - Gostava, pois, que esclarecesse todas estas questões que o projecto de lei suscita.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, fiquei muito sensibilizado com as suas palavras.
Quanto à cultura democrática, devo dizer-lhe que me referia particularmente a uma expressão concreta dessa cultura, ou seja, a uma prática política de diálogo, de participação, de capacidade de ouvir o outro, que é uma nova fase que se está a abrir na Assembleia da República.
Relativamente à ideia dos partidos inúteis, como sabe, no meu grupo parlamentar e no Partido Socialista há absoluta liberdade de opinião individual, não há delito de opinião. Por isso, neste domínio posso transmitir-lhe a minha própria opinião. considerando que todas as associações cívicas, partidárias e políticas ou partidos políticos são úteis enquanto os seus elementos considerarem que realizam essa utilidade.
A democracia parlamentar é pluripartidária e policêntrica. Toda a agente faz falta. 0 Partido Socialista, a este nível, tem um projecto de revisão constitucional altíssimamente estimulante da participação cívica em geral e até, de forma acrescida, da participação de cada cidadão. individualmente considerado, não havendo, por isso, para o PS, em Portugal, um cidadão que seja inútil na participação cívica.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à matéria respeitante à comunicação social - e permita-me que, neste ponto, entronque já as considerações que o Sr. Deputado Luís Sã teceu sobre este ponto -, creio que vai ser aprofundada. Quer no âmbito de legislação própria. que o PS, em tempo, irá apresentar, quer neste âmbito, estamos, em absoluto, disponíveis para, em sede de trabalho de especialidade, podermos aprofundar as sugestões e os aperfeiçoamentos que os diversos grupos parlamentares e Deputados queiram trazer ao nosso projecto de lei.
Relativamente a este ponto, queria também dizer que é objectivo central deste projecto. que não o esgota necessariamente mas é componente dele, o reforço do papel e do prestígio da acção parlamentar e do Parlamento. Para nós, o Parlamento é o coração da democracia, é o coração da participação política. A participação política faz-se com os partidos parlamentares e faz-se também com os Deputados enquanto titulares individuais de um órgão de soberania e, como tal, pessoas livres.
A ideia de uma Câmara muda, como o foi no passado, que não fiscalizou mas foi fiscalizada, que não inquiriu mas foi inquirida, que não legislou mas foi legislada, é algo que, efectivamente, pertence ao passado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Essa é boa!

O Orador: - Como disse, naturalmente que estamos de acordo - e respondo também, desde já, ao Sr. Deputa-

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do Guilherme Silva - que o Estatuto do Direito de Oposição, enquanto lei, define, de uma forma específica, um conjunto de regras jurídicas e induz uma prática, mas não esgota, necessariamente, todos os aspectos da acção parlamentar e extraparlamentar, bem como da acção política. A oposição tem regras de participação que estão contidas na Constituição, nas leis em geral, nas leis sobre comunicação, sobre réplicas e sobre o direito de antena, no Regimento da Assembleia da República, no Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares e em diversas leis avulsas, e no que respeita à matéria relativa à construção da União Europeia está contida na Lei n.º 20/94, que chama a Assembleia da República a um papel particularmente activo, empenhado e que carece de ser praticado e realizado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Carlos Encarnação(PSD): - Só que essa lei é de 1994!

O Sr. José Magalhães (PS): - E a prática?

O Orador: - Creio ter respondido às questões do Sr. Deputado Luís Sá, com cujo enquadramento geral me identifico quando aponta para esta ideia de que o estatuto da oposição é algo que se percorre no sistema político e que, como sabemos, não se esgota nesta lei.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Entretanto, o Sr. Deputado Guilherme Silva não tem que me agradecer a citação extensa que fiz. Os méritos de V. Ex.ª e da citação justificavam-no plenamente.

Risos do PS e do PCP.

O Orador: - V. Ex.ª não pode é pretender fazer agora este discurso, que é particularmente significativo de que o PS não tem uma cultura de poder. E V. Ex.ª quase que se assume como o libertador do PS para o exercício dessa cultura de poder!

Risos do PS.

O Sr. Deputado esteja descansado porque não é necessário! O povo português, com o voto que nos deu no dia 1 de Outubro, situou-nos nesse papel de exercício de poder e dessa cultura de poder.
Mas esteja também o Sr. Deputado ciente do seguinte: a nossa cultura de poder não é, em circunstância alguma, uma cultura de poder que preze o autoritarismo, a autocracia, a ocultação, o clientelismo, o desprezo pela participação e pela separação de poderes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não é essa cultura de poder.

Aplausos do PS.

Há outra questão que é singular na intervenção de V. Ex.ª: o problema das nomeações e a preocupação com os saneamentos políticos. É um defeito de algumas pessoas e de alguns partidos não se «verem ao espelho». Inclusive, há pessoas - não é o caso de V. Ex.ª - que se consideram «príncipes encantados», porque não se «viram ao espelho», e são pessoas modestas, vulgares e, em alguns casos, têm uma imagem negativa. O Partido Social-Democrata, se se «visse ao espelho» - V. Ex.ª, passando em fuga, poderia melhorar essa imagem -, pelo seu passado, o espelho reflectiria uma imagem profundamente negativa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Toda a imagem clientelar do Partido Social Democrata não é particularmente estimulante. Como V. Ex.ª sabe, há duas áreas,...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Aconselho-o a começar a olhar para o espelho!

O Orador: -... na acção política, que são absolutamente distintas. Há os cargos de nomeação política, que dependem indiscutivelmente da confiança política - e é bom que não haja dissimulações, são cargos de confiança política -, que devem ser assumidos como tal, apenas têm como exigência o serem preenchidos por pessoas de confiança política, mas competentes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E há, naturalmente, os outros cargos, a começar desde logo pelo Governo. V. Ex.ª não quereria que o Governo tivesse uma composição que satisfizesse, em grande medida, os seus interesses e anseios. Isto é, há outros cargos que são de nomeação institucional e que obedecem a regras, de Administração Pública, de isenção. Quando V. Ex.ª puder citar um caso em que esta regra seja transgredida, faça o favor.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - São dois!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, gostaria de terminar dizendo o seguinte: é o regresso à velha questão do Estatuto da Oposição e à sua consagração constitucional... O que estamos a definir é uma parcela de acção da oposição na actividade extraparlamentar. Ora, o que lhe custa, em grande medida, é o facto de não criarmos exigências apenas para o Governo mas criamos também exigências para o Governo quanto aos partidos da oposição parlamentar nesta Câmara; para os governos regionais, em relação aos partidos parlamentares, nas assembleias regionais;...

Vozes do PS: - Ora, ora!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É preciso ouvir as regiões!

O Orador: - ... para as câmaras municipais e para os partidos que não fazem parte dos executivos municipais; e para as juntas de freguesia.
Como V. Ex.ª sabe, a democracia, para nós, não tem, neste caso, limites institucionais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O direito de ser e de fazer oposição democrá-

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tica é um direito fundamental de qualquer associação de cidadãos legalmente constituída como partido político, pelo que, no nosso entender, nem careceria de consagração na lei ordinária.
A liberdade de associação é uma das liberdades fundamentais dos cidadãos, cujo desenvolvimento em sede de direitos, liberdades e garantias de participação política compreende o direito de constituir ou participar em associações e partidos políticos e de, através deles, concorrer democraticamente para a formação da vontade popular e a organização do poder político.
A formulação das premissas do preceito constitucional é clara.
Impende sobre qualquer executivo emergente de uma assembleia designada por eleição directa, na expressão dos autores do projecto, o dever de dar cumprimento ao imperativo constitucional em todas as suas implicações.
Se tiver a vontade e a benquerença de o fazer, não lhe será difícil alcançar as conclusões correspondentes, que o legislador ordinário, na Lei n.º 59/77, consagrou como direitos dos partidos da oposição.
É impossível desligar o contexto desta lei que nos propomos alterar do clima revolucionário que presidiu à sua elaboração.
Com uma Constituição ainda jovem, e uma democracia que o não era menos, o predomínio ideológico dos partidos com maior envolvimento no processo revolucionário carecia de ser temperado com a promulgação de uma lei que, para além da Constituição da República, reafirmasse os ideais de tolerância e de liberdade que a democracia deveria honrar na sua sede mais nobre.
É por isso mesmo que a Lei n.º 59/77 se refere apenas à oposição democrática parlamentar, por ser essa a sua principal preocupação nesse momento conjuntural da democracia portuguesa.
Infelizmente, passados 18 anos, não é igualmente possível deixar de fazer a ligação com a orientação seguida nesta matéria pelos XI e XII Governos Constitucionais, que não quiseram ou não acharam necessário fazer aquele raciocínio dedutivo, baseando-se na sua legitimidade maioritária para pura e simplesmente fazerem letra morta, quer da Lei n.º 55/77, quer da Constituição da República.
A análise desse período de crise da oposição democrática é que não se afigura importante neste momento e no contexto deste debate, cujo objectivo é o de rever positivamente um estatuto legal e não o de reflectir negativamente sobre o desprezo a que foi votado no passado recente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Popular congratula-se com a iniciativa legislativa que estamos a apreciar, particularmente com a sua importância para o reforço do papel da Assembleia da República enquanto órgão fiscalizador e de acompanhamento da actuação do Governo, que não carece de ser salientada.
Congratula-se igualmente com a extensão da previsão legislativa ao plano autárquico e ao dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas.
Queremos dizer uma palavra apenas sobre as assembleias regionais.
Não temos dúvidas de que as assembleias regionais, se e quando vierem a existir, devem obedecer às regras de relacionamento democrático com as oposições que vinculam todas as restantes assembleias previstas na Constituição e na lei. O que não é líquido é que possa resultar algum proveito da antecipação de regras específicas para os órgãos representativos das regiões administrativas quando estas não estão ainda criadas, as suas atribuições não estão definidas e as competências daqueles órgãos não estão distribuídas. Sendo boa a intenção, teremos, não obstante, de concluir que nomeadamente a definição do conteúdo do direito de consulta prévia, estatuído no artigo 9.º, fica incompleta e assim se manterá por força deste vício de procedimento, se assim lhe podemos chamar.
Quanto ao direito de informação, a sua regulamentação no que toca à forma e ao prazo de cumprimento do dever de informar representa um avanço positivo em relação à Lei n.º 59/77, nomeadamente quando propõe um prazo mínimo para o cumprimento deste dever em matérias como as das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado. Não podemos deixar de notar, todavia, que se confunde com o dever de consulta prévia por parte do Governo naquelas matérias, na medida em que a consulta implica o fornecimento, pelo consulente, de todos os elementos de informação necessários à pronúncia sobre estas matérias.
No âmbito dos direitos de antena, de resposta e réplica política, previstos no artigo 14.º o que propomos ao Partido Socialista é que explicite o alcance prático da norma, nomeadamente se o que aqui se prevê é um direito efectivo da oposição a responder às comunicações ao País do Sr. Primeiro-Ministro ou dos Srs. Ministros.
Perguntamos ainda ao Partido Socialista que entidade é aquela a quem incumbe dar parecer vinculativo sobre a qualificação política das declarações do Governo e cuja existência vem prevista no n.º 3 daquele artigo.
Quanto ao direito de participação, previsto no artigo 11.º, o que queremos ver esclarecido é se tem correspondência num dever de reunião do Governo com os partidos da oposição, em matéria de acompanhamento da política europeia, em momento anterior e posterior às reuniões do Conselho Europeu.
Este ponto é absolutamente fundamental para o Partido Popular, pelo que, caso a resposta seja negativa, perguntamos igualmente ao Partido Socialista se está disposto a alterar o seu projecto de lei neste sentido.
Do nosso lado, e como contributo para o aperfeiçoamento do presente projecto de lei, sugerimos a inclusão de uma alínea no artigo relativo à consulta prévia dos partidos da oposição, a qual respeitará às propostas de nomeação para cargos como os de Presidente do Tribunal de Contas, Procurador-Geral da República e Ministros da República para as Regiões Autónomas.
Sugerimos ainda que o conteúdo do direito de informação venha a ser regulamentado no sentido de que as oposições, em particular a oposição parlamentar, possam beneficiar da informação estatística, de análise prospectiva e dos estudos de impacto económico e social das medidas que o Governo pretende, em cada momento, adoptar, tendencialmente através da garantia de acesso directo das oposições aos correspondentes serviços da Administração Pública.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio termos deixado suficientemente expresso o nosso empenho na elaboração de um estatuto da oposição que realmente contribua para dignificar o seu papel e que incuta neste Governo, e noutros vindouros, a ideia de que governar num clima de participação e com espírito de diálogo não se pode traduzir se não num engrandecimento da nossa democracia e, consequentemente, do nosso país.
Maior participação é sinónimo de maior responsabilização da oposição, e é esse estatuto de responsabilização que para nós reclamamos.

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Não havendo pedidos de esclarecimento, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sã.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O funcionamento do sistema político democrático é inseparável da existência e papel de uma oposição forte, responsável e com direitos, única forma de assegurar uma efectiva fiscalização do poder e a construção de alternativas democráticas.
Em tempos era o Parlamento no seu conjunto que era oposição ao Rei e ao poder executivo. Foi nessa base que se concebeu a teoria da separação de poderes, em Montesquieu. Locke e no constitucionalismo liberal. Hoje, porém, na época do Estado de partidos, a coincidência de posições entre Governo e maioria parlamentar desloca a separação de poderes e o controlo dos executivos da dicotomia legislativo/executivo para a dicotomia Governo e maioria parlamentar, por um lado, e oposição, por outro.
Como é natural, o estatuto e o papel da oposição não resultam exclusivamente de um diploma legal. São inseparáveis do elenco de direitos, liberdades e garantias e do modo como são exercidos. Passam decisivamente pelo pluralismo, igualdade de oportunidades e direitos efectivos de expressão democrática na comunicação social, tribuna fundamental na nossa época. Reclamam um Parlamento activo e interveniente, questão particularmente importante em época de crise do parlamentarismo. Mas exigem também um elenco de direitos específicos e claros, já que nem tudo se resolve através das questões que foram referidas, sobretudo na nossa época.
Ora, a verdade é que o Estatuto da Oposição em vigor é velho de 18 anos, não foi alterado e enriquecido na sequência de duas revisões constitucionais, que se debruçaram sobre esta matéria, e da experiência acumulada. Mantêm-se mesmo claras inconstitucionalidades por omissão.
Daí que o Grupo Parlamentar do PCP considere oportuna a revisão que é proposta, tal como já o entendeu em 1994.
Duas observações são, porém, fundamentais. A primeira é a de que não basta legislar. A verdade é que nem o relativamente magro Estatuto da Oposição que tem estado em vigor foi cumprido em alguns pontos fundamentais.
Nesta matéria, podem ser dados exemplos relevantes. Onde esteve, por exemplo, o direito de «superintendência e controlo» dos órgãos de informação directa ou indirectamente pertencentes ao Estado? Onde estiveram os relatórios da observância do Estatuto da Oposição pelo Governo, previstos no actual Estatuto no artigo V?
Por outro lado, em relação às alterações propostas, entendemos que há várias de sentido positivo, mas também há insuficiências e interrogações que não podemos deixar de formular. Alinhamos algumas, a título exemplificativo, na esperança de que venham a ser analisadas e tidas em conta no debate na especialidade.
Em primeiro lugar, não compreendemos por que razão o poder de superintendência e controlo da comunicação social, directa ou indirectamente pertencente ao Estado, é substituído por normas sobre a comunicação social cujo sentido e alcance global não contestamos, mas que ficam muito aquém do que está disposto (embora nunca cumprido) no Estatuto em vigor. A formulação actual não é perfeita, mas importa corrigi-la e densificá-la e não recuar, sobretudo num momento em que não se descortinam os contornos de uma alteração radical no modo de gestão e
orientação dos meios de comunicação social directa ou indirectamente pertencentes ao Estado.
Em segundo lugar, os partidos nas regiões autónomas devem ser consultados, até por imposição da Constituição, sobre os tratados e negociações internacionais que digam respeito à região, mas não se compreende que o mesmo não seja estabelecido em relação ao País, designadamente quanto aos tratados instituintes das Comunidades Europeias e a outros tratados e acordos fundamentais para Portugal. Aliás, a questão dos direitos dos partidos de oposição face à integração comunitária deveria ser devidamente tratada neste diploma, sobretudo tendo em conta a experiência existente nesta matéria. Recorde-se, por exemplo, a assinatura do II Quadro Comunitário de Apoio, pelo Governo do PSD, sem intervenção e informação prévia a este Parlamento e sem acompanhamento por parte do conjunto dos partidos de oposição.
Em terceiro lugar, entendemos que é positivo o alargamento do direito de participação legislativa a mais matérias, mas não compreendemos por que razão se refere o Código Administrativo e não o Código de Procedimento Administrativo (que, como se sabe é uma imposição constitucional), e a elaboração, de outras propostas, nomeadamente sobre a Lei de Finanças Locais, a revisão da Lei das Autarquias Locais a delimitação de responsabilidades em matéria de investimentos entre a administração central, regional e local, e outras semelhantes. Na verdade, são estes os diplomas que existem, que podem ser revistos eventualmente nos tempos mais próximos, e não um inexistente Código Administrativo, cuja elaboração é mais distante e hipotética.
Em quarto lugar, não é compreensível que o artigo IV, na sua epígrafe, transforme em «deveres dos partidos» a informação ao Presidente da República ou aos diferentes executivos sobre os pontos de vista dos partidos da oposição quanto às respectivas áreas de competência.
Em quinto lugar, não entendemos por que razão os relatórios de avaliação da observância do Estatuto da Oposição, que é positivo que sejam obrigatórios, deverão deixar de ser publicados no Diário da Assembleia da República.
Entendemos, por outro lado, que várias normas limitam-se a repetir formulações da Constituição ou a reverter para outra legislação que não existe. Seria preferível uma maior densificação dos direitos da oposição neste mesmo diploma.
Também julgamos que deve ser cuidadosamente examinada a questão dos direitos dos partidos sem assento parlamentar por princípio e de modo a não serem criadas dificuldades constitucionais, que, aliás, tanto foram apontadas nesta matéria por alguns constitucionalistas.
Por último, gostaríamos de observar que o alargamento do Estatuto da Oposição à administração autárquica é compreensível, porque, desde logo, passou a ser constitucionalmente obrigatório. Mas não apostaríamos de ver esta alteração associada à defesa a que o PS e alguns partidos procedem, do fim de executivos municipais eleitos por representação proporcional, substituindo-os por executivos ditos homogéneos que excluam a contribuição directa para a resolução dos problemas locais dos diferentes partidos, em maioria ou minoria, no seio dos próprios executivos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na esperança de que se verifique a abertura do partido proponente para as questões e interrogações que aqui colocamos, e outras que colocaremos, votaremos a favor, atendendo a que é oportuna a revisão do Estatuto da Oposição e fundamental, em face das alterações introduzidas por duas revisões cons-

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titucionais. Estaremos atentos ao desenvolvimento deste processo e a nossa votação final dependerá do que entretanto se passar na especialidade.
A participação e o exercício dos direitos das oposições não significam co-responsabilização pela governação nem a criação de dificuldades, são antes essenciais para que não se verifique a concentração e o abuso de poder, sem possibilidades efectivas de controlo democrático e sem real alcance do direito e da necessidade de propor alternativas, o que é fundamental num Estado democrático.
Por isso, este projecto de lei valerá para nós como base de trabalho. Mas vamos ao trabalho para melhorá-lo, para que a vida e o regime democrático saiam fortalecidos e dignificados deste processo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, ouvi com muita atenção a sua intervenção e verifico, desde logo, que ela vai ao encontro da disponibilidade por nós manifestada para o aperfeiçoamento do diploma em apreço. Pensamos que ele é susceptível de aperfeiçoamento, com os contributos de todos os grupos parlamentares.
Uma dúvida que a pergunta que me fez há pouco suscitou e que agora não vi de todo aclarada na sua intervenção tem a ver com reinstitucionalização do direito de espaço dos partidos parlamentares ao nível da imprensa. Ora, sendo certo que V. Ex.ª conhece, com pormenor e rigor, as alterações entretanto ocorridas, desde o Estatuto de 1977, gostaria de ouvir, com mais precisão, o seu entendimento sobre essa matéria, porque julgo tratar-se de uma questão vital em todo o processo de comunicação e de participação do exercício do direito de oposição.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sã.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, muito obrigado pela questão que me colocou.
Sem dúvida alguma, temos a opinião de que, neste momento, a comunicação social é fundamental num Estado de direito democrático. É sabido, inclusive, que ela desempenha um papel de concorrência em relação ao próprio Parlamento. E, de resto, não é por acaso que, muito frequentemente, há uma antecipação na comunicação social de intervenções aqui feitas e dos factos políticos que os partidos criam no Parlamento, dando lugar, como é natural, a uma situação que é bem conhecida. Daí que, neste momento, a tribuna comunicação social seja fundamental, e diria até tão fundamental como o próprio Parlamento, embora sem a legitimidade democrática que o Parlamento tem, resultante do voto popular, que é insubstituível.
Como estamos numa sociedade fortemente mediatizada, acentuei, tanto na pergunta que tive oportunidade de lhe fazer como nesta intervenção, que este é para nós um ponto fundamental no quadro desta lei e do conjunto de diplomas que o Partido Socialista, no seu programa, anunciou que iria rever.
Daí entendermos que, para além das normas que estão previstas neste diploma e das formas de participação dos partidos da oposição em relação ao controlo dos meios de comunicação social, o problema do direito de espaço e de todos os direitos dos partidos da oposição deva ser devidamente tratado e densificado, porque que creio que a alternativa disto é haver um sistema que, no fundamental, funcionará com uma nota só, independentemente de todo o pluralismo que possa haver no Parlamento.
Em relação a esta matéria há que apelar à consciência democrática, desde logo da bancada do PS, com as responsabilidades que contraiu perante o povo português, no sentido de que estes direitos sejam efectivamente assegurados. Não basta, como tive oportunidade de referir, um bom estatuto da oposição, embora ele seja extremamente importante, é preciso também uma prática democrática constante ao longo do tempo, ao longo do dia-a-dia, para que o sistema político seja efectivamente democrático.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, permita-me que comece por o saudar nas funções que V. Ex.ª hoje tem nesta Câmara, fazendo votos em termos pessoais, que são uma certeza em relação a V.Ex.ª, para que, no seu desempenho, possa contribuir para a dignificação do Parlamento português.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 15/VII, da iniciativa do Partido Socialista, pretende regular e substituir o Estatuto do Direito de Oposição, consagrado na Lei n.º 55/77, de 5 de Agosto, e em vários normativos constitucionais.
Num breve relance pelo Estatuto em vigor, salientaremos que o mesmo traduz um conjunto de direitos políticos específicos, que devem ser reservados, nos termos da Constituição, aos partidos políticos de expressão parlamentar, sem prejuízo do direito geral de oposição reconhecido aos partidos não representados na Assembleia da República. São, portanto, direitos políticos que integram o direito de oposição democrática.
Compreende-se, por isso, que a Lei actual consagre como direitos de oposição democrática os direitos parlamentares - previstos, como tal, na Constituição e no Regimento da Assembleia da República - de informação, de participação, de consulta prévia, de colaboração legislativa, de depoimento e outros quanto aos órgãos de comunicação social.
Este Estatuto é igualmente aplicável às regiões autónomas e prevê-se ainda a possibilidade de elaboração. por iniciativa dos partidos da oposição ou do Governo, de relatórios anuais sobre o grau de observância destes direitos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A presente iniciativa legislativa do Partido Socialista, no essencial, propõe o alargamento do âmbito dos direitos de oposição às futuras regiões administrativas, aos municípios e às freguesias e pretende inovar, quando acresce aos direitos já previstos o direito à informação prévia e o direito de antena em períodos eleitorais.
De resto, o projecto de lei n.º 15/VII, ora em discussão, mais não faz do que retomar as propostas já inscritas no projecto de lei n.º 404/VI, da anterior Legislatura, igualmen-

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te da iniciativa do Partido Socialista, com pequenas, mas não menos curiosas, diferenças entre os dois projectos de lei, desde logo, no seu artigo 1.º, cujo âmbito e alcance são agora bem mais precisos - e reduzidos, diga-se quando comparados com a iniciativa legislativa anterior.
Com efeito, ao voluntarismo impetuoso do reconhecimento às minorias políticas - todas elas, tivessem ou não representação parlamentar - do direito de oposição democrática, conforme constava do texto do artigo 1.º do projecto de lei n.º 404/VI, sucedeu a prudência e a cautela de assegurar aos partidos não representados no Governo o direito de oposição democrática.
Outras alterações, de pormenor, é certo, ou de adequação, como também lhe chamou aqui o Sr. Deputado Alberto Martins, podem igualmente ser anotada aos artigos 8.º, 10.º, 12.º, 14.º e 17.º.

O Sr. José Magalhães(PS): - Em quê?!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao encenar a apresentação deste projecto de lei, o Partido Socialista disfarçou mal a concepção paternalista que tem da democracia e extravasou a ambição de se constituir em virtual tutor dos méritos do regime.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A não ser assim, e estando, com estamos, a tratar de matéria que goza de especial protecção no nosso texto constitucional - recorde-se que constitui não só reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República como é também um limite material de revisão -, como compreender, então, que, em matéria desta importância, o Partido Socialista persista em ignorar o diálogo, em esquecer o consenso e em iludir a disponibilidade para encontrar soluções com os outros parceiros parlamentares.
Não está em causa, escusado seria afirmá-lo, o direito de iniciativa legislativa própria, que, obviamente, respeitamos. No entanto, não deixa de causar uma certa estranheza que, admitindo, como admitiu, no anterior debate sobre esta matéria, a validade dos reparos sobre este procedimento, o Partido Socialista venha agora, afinal, a reproduzir esse mesmo comportamento.
E não se responda com o já estafado argumento, que fundamenta tudo na nova forma de fazer política porque nada do que hoje é consagrado no Estatuto da Oposição impediria a maioria socialista de traduzir na prática os ímpetos de fraterna partilha de poder que jura ainda a animam.
E também não ensaiem o argumento que tudo reconduz ao simbolismo desta iniciativa, sobretudo quando, como é o caso, esta proposta de pouco vale sem uma visão integrada do conjunto de alterações que pretendem introduzir no Regimento da Assembleia da República e ainda na regulação, por exemplo, do direito de resposta e de réplica política, aqui só genericamente reconhecidos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma das inovações mais proclamadas pelo Partido Socialista nesta sua iniciativa legislativa é a que se traduz no alargamento do âmbito do Estatuto da Oposição aos partidos não representados nos executivos das freguesias, dos municípios e das futuras se vierem a ser constituídas - regiões administrativas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Virão!

O Orador: - Compreende-se a preocupação do Partido maioritário em relação às autarquias locais, tanto mais quanto não se pode ignorar a prática reiterada de desprezo pelos mais básicos direitos de oposição que verificamos em muitas autarquias de maioria socialista.

Aplausos do PSD.

E é pela constatação destes maus exemplos - e neste particular sei bem do que falo - que o Partido Social Democrata não se enternece hoje com a mera proclamação, bem intencionada, de direitos para a oposição onde ontem só havia displicência, arrogância e sistemática violação das regras mínimas de convivência democrática.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não é, pois, de admirar, que o discurso proclamatório que enforma todo este projecto de lei seja manifestamente insuficiente para quem, como nós, pretende avaliar o comportamento da maioria socialista muito mais pelos actos e atitudes concretas do que pelas intenções que sistematicamente propagandeia.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Acresce que o projecto de lei n.º 15/VII, ora em discussão, não é isento de reparos e críticas às soluções que defende, nas formulações que emprega e nas consequências que autoriza.
Desde logo, como compreender que sejam garantidos aos partidos políticos da oposição apenas representados nas assembleias regionais, municipais e de freguesia mais direitos do que àqueles outros que, estando também na oposição, têm, pela sua expressão eleitoral e por força da proporcionalidade do sistema eleitoral, representantes seus nos correspectivos executivos?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Com efeito, que sentido faz defender que partidos com menor representatividade eleitoral vejam mais protegidos os seus direitos de oposição do que aqueles outros que, embora também na oposição, participam, por força de lei, nos executivos autárquicos?
E, no entanto, é o que resulta evidente do cotejo quer do artigo 3.º do projecto de lei em apreço, que define os sujeitos passivos do direito de oposição, quer dos artigos 7.º, 8.º, 9.º, 13.º e 15.º.
Exemplificando: defende o PS, neste projecto de lei, que o executivo municipal - sendo o mesmo aplicável mutatis muantis para as juntas de freguesia e executivos regionais - só tem de proceder à consulta prévia dos partidos da oposição não representados nos executivos municipais matérias como o orçamento e plano de actividades.
Assim, chegamos à absurda conclusão de que um partido da oposição, porventura com um só membro na assembleia municipal, tem um direito de consulta prévia sobre aquelas matérias, direito esse não consagrado aos partidos igualmente da oposição que, pela força conjugada da sua expressão eleitoral e do princípio da proporcionalidade, têm, por força de lei, vários representantes na câmara municipal. É estranho, Sr. Deputado, mas foi aquilo que os senhores propuseram.
E não se argumente, neste caso, que basta aos partidos da oposição com representação no Executivo a faculdade de ali discutir e votar o plano de actividades e o orçamento, porque se trata, como bem reconhece a própria exposi-

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ção de motivos do projecto de lei em apreço, de situações diferentes que têm também objectivos diferentes.
Não menos questionável para nós é a solução consagrada no artigo 18.º, quando atribui às empresas públicas de radiotelevisão e de radiodifusão - hoje transformadas em sociedades anónimas, como sabem - a incumbência de elaborar e remeter à Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relatórios semestrais sobre a forma como «foram ou deixaram de ser efectivados, no âmbito da respectiva actividade, os direitos e garantias de objectividade, rigor, independência e pluralismo de informação asseguradas pela Constituição e pela Lei». Acabei de citar o vosso diploma.

O Sr. José Magalhães (PS): - Citou, mas o Sr. Deputado Marques Mendes não percebe!

O Orador: - Recordo aqui que, nos termos do artigo 10.º da Lei em vigor, era já reconhecido aos partidos com representação parlamentar o direito de elaborar anualmente relatórios sobre o grau de observância dos direitos previstos naquela lei.
Entretanto, que me recorde, nunca o Partido Socialista usou este direito legal, mesmo quando histrionicamente reclamava o respeito pelos seus direitos de partido da oposição. Desconhecimento deste mecanismo legal! - afirmarão, de forma tímida, alguns. Impensável! - respondo eu, quando conheço a valia jurídica e política de tantos Deputados do Partido Socialista. Descrença nos efectivos
resultados práticos deste prerrogativa legal - contraporão, cabisbaixos, outros. Porquê manter então, no essencial, este direito no actual projecto de lei?! - replico eu.

O Sr. José Magalhães (PS): - Imagine que o retirávamos!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As razões invocadas, os argumentos expendidos e o mal fundado de muitas das soluções preconizadas, sobretudo, a convicção de que o respeito pelos direitos dos partidos da oposição exigem, mais do que pias proclamações de princípio, afectam irremediavelmente o juízo de valor que fazemos deste projecto de lei.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Coerentes com o que afirmámos no passado, quando fomos poder, não podemos se não votar contra este projecto de lei, apesar de agora sermos o maior partido da oposição.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Que novidade!

O Sr. José Magalhães (PS): - Má consciência! Muito má consciência!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, a sua intervenção foi surpreendente.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Ainda bem!

O Orador: - ... porque é, em grande medida, um remake de uma situação que pensei estar ultrapassada. V. Ex.ª, faz uma intervenção com tiques de poder, que já perdeu.

Risos do PS.

A intervenção que fez foi semelhante a uma que já, no passado, tinha feito no âmbito de uma pergunta aquando do debate desta lei, quando com o seu colega Guilherme Silva estava muito preocupado com aquilo que, no entender de VV. Ex.as, era a cultura subjacente ao nosso projecto, que era o querer ser poder. Nessa altura, na hipótese para os senhores assegurada de que não teríamos a maioria eleitoral nas eleições de 1 de Outubro, V. Ex.ª disse: «como nunca conseguirão ser poder, querem, por uma via ínvia, aceder a mecanismos de participação, decisão e poder».

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Disso não podemos ser acusados!

O Orador: - Ora, a realidade mostrou que VV. Ex.as estavam erradas, mas o Sr. Deputado mantém o tique. No entanto, faço a pergunta, que é de pasmar: V. Ex.ª, como Deputado da oposição - e lembro-lhe que já não é Deputado do poder, não se esqueça disso -, não quer mais poderes de intervenção política? Não quer prestigiar o Parlamento? Não quer combater aquilo que VV. Ex.as, em grande medida fizeram, numa interpretação hipócrita da lei, que foi fazer tábua rasa dos poderes de participação parlamentar nas assembleias legislativas regionais, nas assembleias autónomas?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª quer que a Lei de 77 continue a não ser cumprida? Se é isso que quer, faça o favor de dizer.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Eles têm medo!

O Orador: - Nós não queremos e não deixamos. Contra a sua vontade, queremos mais democracia.

Aplausos do PS.

Por último, queremos deixar vincada uma outra questão. No anterior debate, quando o PS tomou esta iniciativa, foi-nos dito: «os senhores, como são o partido da oposição, deveriam ouvir todos os outros partidos da oposição para a iniciativa legislativa». Nós não fizemos isso, aliás, nesse momento, o meu colega e camarada Almeida Santos ao intervir disse: «Enfim, tomamos a iniciativa, poderíamos eventualmente, se nos tivéssemos lembrado, ouvir, dado que temos uma cultura de diálogo, de participação e audição, o que VV. Ex.as não têm, mas não o fizemos. Ouviremos agora. Mas agora V. Ex.ª retoma o argumento. Afinal, já não é o partido da oposição, porque esse seria o vosso, se quisessem tomar essa iniciativa, mas como partido do Governo - e foi dito, no debate - esta iniciativa deve ser tomada no início da sessão legislativa e da Legislatura. Pois é, é essa a exigência de VV. Ex.as e é a ela que estamos a responder. Isto é, o partido do poder assume a responsabilidade no início da Legislatura e quer maiores poderes de participação para VV. Ex.ª. Veja a nossa generosidade! Não é generosidade porque é apenas o cumprimento de um rigoroso sentido de responsabilidade democrática.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

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O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, não tenho qualquer pretensão de dar a V. Ex.ª, que respeito e por quem tenho amizade, qualquer lição de democracia, mas, permita-me que lhe diga, também não aceito qualquer lição de democracia desta Câmara nem em relação aos nossos comportamentos neste Parlamento.

Vozes do PS: - Mas devia aceitar!

O Orador: - Olhe, Sr. Deputado, começo por responder-lhe da maneira que, porventura, não quereria, dizendo-lhe que conheço suficientemente bem, por experiência própria,...

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - ... a distância que vai entre a proclamação das vossas boas intenções e a prática efectiva dessas palavras tão bonitas com que todos os dias enchem os vossos discursos políticos.
Na autarquia onde trabalho, onde sou vereador, conheço bem a diferença enorme que vai entre as boas intenções que os senhores aqui proclamam, com esforço, reconheço, e aquilo que na prática se traduz em respeito efectivo pelos direitos da oposição.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Não me diga!

O Orador: - Eu sei bem, Sr. Deputado, o que é o Partido Socialista no poder, e no poder com maioria absoluta, e que poderes efectivos reconhece de oposição aos outros partidos e aos vereadores da oposição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

E, Sr. Deputado Alberto Martins, não diga que não responde aqui por comportamentos de camaradas seus de partidos que têm responsabilidades enormes naquilo que é a prática do Partido Socialista, porque justamente neste projecto de lei VV. Ex.as querem alargar - e eu devo dizer que não discordo disso, como não discordei na minha intervenção - ...

Vozes do PS: - Ah!...

O Orador: - ... o Estatuto do Direito de Oposição aos órgãos autárquicos e aos futuros, a existirem, órgãos regionais. Não discordei disso.

O Sr. José Magalhães (PS): - Começou mal, mas está a terminar bem!

O Orador: - Agora, Sr. Deputado, não peça, a mim ou ao meu grupo parlamentar, para hoje, pela circunstância de sermos partido da oposição, viabilizarmos aqui um projecto de lei que tem - e procurei explicitá-lo daquela tribuna -, do nosso ponto de vista, graves inconvenientes de técnica legislativa,...

Vozes do PS: - Quais?!

O Orador: -... tem graves deficiências de soluções que mais à frente os senhores poderão verificar. E refiro-me, desde logo, a um tratamento injustificado para os partidos que, nas autarquias locais, estando por força da expressão eleitoral representados nos executivos municipais, não têm, por exemplo, o direito à consulta prévia sobre diplomas tão importantes, como o plano de actividades e o orçamento de cada autarquia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Têm mais do que isso!

O Orador: - Não têm, não. É como vocês dizem: vocês fizeram algumas adequações...

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

Ó Sr. Deputado José Magalhães, V. Ex.ª é um parlamentar ilustre mas não me consta que alguma vez tenha sido um autarca ilustre.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas sei ler!

O Orador: - Vou explicar-lhe como é que, na generalidade dos casos, numa câmara municipal - repito, na generalidade dos casos -, se procede à elaboração do orçamento e do plano de actividades. O partido maioritário, designadamente através do presidente da câmara, manda os serviços fazer, com as orientações que obviamente lhes dá, os documentos preparatórios quer do plano quer do orçamento, e quando os partidos da oposição representados no executivo camarário recebem esses documentos recebem-nos só, pura e simplesmente, para a discussão e votação no executivo camarário. Ora, aquilo que VV. Ex.as querem consagrar neste diploma...

Protestos do PS.

Peço-lhe, Sr. Deputado, que acabe de me ouvir.

Protestos do PS.

Deixe-me terminar, Sr. Deputado.
Como dizia eu, aquilo que querem consagrar neste diploma é tão-só isto: VV. Ex.as concedem aos partidos representados na assembleia municipal...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Miguel Macedo, peço-lhe que termine, pois já ultrapassou o tempo regimental.

O Orador: - Sr. Presidente, peço-lhe que me conceda apenas mais meio minuto.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Orador: - Ora, o que VV. Ex.as querem fazer é conceder, por exemplo, a um partido que está só representado na assembleia municipal o direito de consulta prévia, mas já não concedem esse direito de consulta prévia, estranhamente e foi isso o que eu ali disse -, aos partidos que estão no Executivo e que recebem tabelionicamente o plano de actividades e o orçamento proposto pela maioria da autarquia.

Protestos do PS.

Ora, Srs. Deputados, permitam-me que vos diga: esta é uma solução inaceitável. Já o dissemos no outro debate. VV. Ex.as tiveram tempo para reflectir sobre esta matéria e poderiam ter feito marcha atrás quando reconheceram que valia a pena discuti-la previamente, mas não o fizeram. Essa

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23 DE NOVEMBRO DE 1995 241

responsabilidade é vossa. Nós, nessa matéria, não temos qualquer responsabilidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro, dispondo para o efeito de 2 minutos e 12 segundos.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Peço a palavra, para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, gostaria de pedir a V. Ex.ª, com todo o respeito, que transmitisse ao PSD que, se a zona de divergência é aquela que acabou de ser enunciada, estamos disponíveis para a integrar no nosso projecto.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Alberto Martins, o Presidente da Mesa não é porta-voz de V. Ex.ª, mas penso que o Sr, Deputado Miguel Macedo o ouviu.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Peço a palavra para não ter a deselegância de não responder ao Sr. Deputado do Partido Socialista.

Risos do PS.

O Sr. Presidente: - Deselegância não é! Respeitar o Regimento nunca foi deselegância.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Peço então a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, gostaria que V. Ex.ª desse a conhecer aos Deputados do Partido Socialista, designadamente ao Sr. Deputado Alberto Martins,...

Risos do PS.

... que o meu grupo parlamentar e eu próprio não precisaríamos deste repto para colaborar na elaboração da lei que, eventualmente, venha a sair desta Assembleia.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Mas parecia!

O Sr. Presidente: - O Partido Socialista fica notificado da auto-suficiência do Grupo Parlamentar do PSD.
Tem, enfim, a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Utilizando o tempo que nos resta, gostaria de dizer que acolhemos positivamente esta iniciativa na justa medida em que uma nova prática política, que rompa com a passada, lhe dê corpo e sentido.
Acolhemos positivamente esta iniciativa na justa medida em que instrumentos e mecanismos sejam integrados e acolhidos no sentido de lhe dar eficácia. Acolhemos positivamente esta iniciativa se o livre acesso e o direito à informação de todos os partidos políticos, sem excepção, com representação parlamentar seja garantido, para que o exercício do direito de oposição tenha validade.
Por outro lado, pensamos que esta medida é tão-só parte integrante daquilo que é a construção de uma sociedade e de uma democracia participativa, de onde, tendo em conta os direitos de todos os partidos com representação parlamentar, ela é importante como parte integrante dos direitos mais gerais de todos os partidos e dos cidadãos em geral.
Para concluir, porque também pensamos e somos partidários do debate, da diversidade, da discussão e do confronto de opiniões - utilizando a expressão do Sr. Presidente -, eles são o sal da democracia, e nós queremos que o sejam e que não estejamos a correr o risco de ter no futuro uma democracia insossa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Luís Afonso Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Afonso Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, na sua intervenção, o meu colega de bancada Jorge Ferreira colocou algumas questões e apresentou diversas sugestões sobre o estatuto do direito de oposição (a matéria que aqui nos traz hoje) à bancada do Partido Socialista e a verdade é que, talvez por lapso ou distracção - não sabemos -, não foi dada qualquer resposta.
Peço, pois, ao Sr. Presidente que solicite ao Partido Socialista um esclarecimento sobre se tenciona ou não responder a essas sugestões, o que é essencial para a determinação do sentido do voto da nossa bancada relativamente ao projecto de lei n.º 15/VII.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como sabe, a formulação de pedidos de esclarecimento e respectivas respostas é um direito e não uma obrigação regimental; quando muito, poderá tratar-se de uma obrigação política ou ética mas não jurídica. Ora, desconheço mesmo se o Grupo Parlamentar do PS pretende dar alguma satisfação e não compreendo ao abrigo de que figura poderá fazê-lo.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, apenas queremos dar público testemunho de que a intervenção do Sr. Deputado Jorge Ferreira, do CDS-PP, levantou questões pertinentes e não foi particularmente polémica. Em sede de discussão na especialidade, daremos um tratamento adequado e discutiremos as sugestões e propostas apresentadas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do projecto de lei n.º 15/VII - Revoga e substitui o Estatuto do Direito de Oposição (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP e de Os Verdes, votos contra do PSD e a abstenção do CDS-PP.

Srs. Deputados, iremos de seguida votar os projectos de lei n.º 7 e 17/VII, apresentados, respectivamente, pelo PCP e pelo PS.
Começaremos por votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 7/VII - Reforça o sistema de fiscalização dos serviços de informações, clarifica os limites das actividades

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242 I SÉRIE - NÚMERO 9

que estes podem desenvolver e revoga as alterações legislativas promovidas no termo da VI Legislatura pelo Governo (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS.

Segue-se a votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 17/VII - Reforça as competências do Conselho de Fiscalização do Serviço de Informações (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e de Os Verdes, votos contra do PSD e abstenções do CDS-PP e do PCP.

Este projecto de lei baixará à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da (1ª Comissão).

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, apresentarei uma declaração de voto escrita.

O Sr. Presidente: - De acordo, Sr.ª Deputada.
Srs. Deputados, o dia de amanhã destina-se à instalação e posse das comissões parlamentares permanentes.
A próxima reunião plenária realiza-se na sexta-feira, rigorosamente às 10 horas. O período de antes da ordem do dia será preenchido por um debate de urgência sobre Foz Côa, requerido pelo Grupo Parlamentar do PSD; na ordem do dia terá lugar a apreciação e votação do projecto de resolução n.º 2/VII- Constituição de uma comissão eventual para a fiscalização da utilização de recursos públicos no projecto EXPO 98 (CDS-PP).

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 20 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista ( PS ):

Cláudio Ramos Monteiro.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Garcia dos Santos.
Mário Manuel Videira Lopes.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.

Partido Social Democrata (PSD):

António Fernando da Cruz Oliveira.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Macário Custódio Correia.
José Maria Lopes Silvano.
Luís Carlos David Nobre.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.

Partido Comunista Português (PCP):

Maria Luísa Raimundo Mesquita.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
Eduardo Ribeiro Pereira.
José Carlos das Dores Zorrinho.

Partido Social Democrata (PSD):

António Roleira Marinho.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
João Álvaro Poças Santos.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Guilherme Reis Leite.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
José Fernando Araújo Calçada.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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