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490 I SÉRIE - NÚMERO 17

de atribuir um estatuto de quase endeusamento aos planos emanados da administração central e indirecta do Estado e menorizar os planos directores municipais, sem qualquer razão para o efeito. Mais, o regime que está em vigor, em relação a um conjunto de planos especiais - refiro-me, designadamente, aos planos de ordenamento da orla costeira, de albufeiras e águas públicas, e de áreas protegidas -, é o de estes terem de se subordinar e de ter em conta os planos directores municipais.
O governo defunto, com este decreto-lei, não veio apenas criar mais um conjunto de planos especiais, ditos de ordenamento do território, mas também inverter, em relação aos planos existentes, a lógica que estava presente em legislação anterior e que é revogada por este diploma. Isto é, onde se dizia, anteriormente, que os planos especiais tinham de ter em conta os planos directores municipais, diz-se agora que os planos directores municipais, praticamente, nada valem perante a toda-poderosa administração central e indirecta do Estado.
Este mesmo problema é levantado, de uma forma clara, no parecer da Associação Nacional de Municípios Portugueses, que considera inaceitável este diploma.
Mas não se trata apenas disto. Para além de inverter a lógica presente nos planos especiais já existentes, é criado um conjunto de planos especiais adicionais nesta matéria, nomeadamente no que diz respeito a ordenamento florestal, ordenamento e expansão dos portos, planos integrados de habitação e planos ditos de salvaguarda do património culturais. Ou seja, no fim de contas, é retirada aos municípios urna parcela cada vez maior do respectivo território, com uma ideia: a de que os municípios são perigosos, o poder local é perigoso e a defesa de um conjunto de valores ambientais, patrimoniais e florestais só pode vir da administração central.
Ora, nós recusamos inteiramente esta lógica, tanto mais que verificamos, através do n.º 2 do artigo 7.º deste diploma, que o objectivo do governo anterior, ao apresentar esta legislação, ia muito para além - eu diria que o ambiente é mesmo um pretexto - da proclamada preocupação ambiental e patrimonial. Na verdade, se virmos esta disposição, verificamos que aparecem como parte possível dos planos especiais do ordenamento do território, entre outras, matérias como o parcelamento, os alinhamentos, a implantação de edifícios, o número de pisos ou cérceas, o número de fogos e respectiva tipologia, a área total de pavimento e respectivos usos, a demolição e a manutenção ou reabilitação de construções existentes.
De resto, tivemos um exemplo muito claro. do que podem ser os planos especiais de ordenamento do território, através da apresentação do POZOR, designadamente do chamado POZOR I, que consagrava, para a área sob jurisdição da Administração do Porto de Lisboa não afecta à exploração portuária, um conjunto de empreendimentos de carácter urbanístico e habitacional, com alta densidade urbanística, e que era tudo menos preservação de valores ambientais ou patrimoniais.
Como é natural, pode perguntar-se, numa visão simplista: «mas, então, não é necessário que os diferentes departamentos da administração central e indirecta do Estado tenham instrumentos paia intervir no território? Os municípios são donos do seu território?» A lógica prevista na legislação sobre planos municipais de ordenamento do território, a nosso ver, é extremamente clara. É uma lógica que dá a iniciativa e a condução de processos aos municípios, mas com uma comissão de acompanhamento, da qual fazem parte os diferentes departamentos da administração central, institutos públicos e pessoas colectivas públicas integradas na administração indirecta do Estado. Isto significa que as diferentes entidades que é suposto poderem ter preocupações ambientais e de preservação de património cultural têm toda a oportunidade, através das comissões de acompanhamento, de exprimirem os respectivos pontos de vista para que sejam integrados nos planos directores municipais.
Como se não fosse suficiente haver comissões de acompanhamento que permitem uma negociação permanente com os municípios e uma integração das preocupações patrimoniais, ambientais e culturais nos planos directores municipais, estes planos acabam por ter de ser ratificados em Conselho de Ministros.
Portanto, temos uma situação perfeitamente bizarra. Os PDM têm de ser feitos com uma comissão de acompanhamento onde está praticamente toda a administração central e indirecta do Estado que é relevante para o efeito. Depois do plano aprovado, em negociação permanente com todas estas estruturas, tem de ser ratificado em Conselho de Ministros. E após o dinheiro gasto, a negociação feita e a ratificação em Conselho de Ministros, os planos especiais de ordenamento do território podem, pura e simplesmente, «mandar às malvas»- passe a expressão - os PDM que foram aprovados. É uma situação inadmissível, intolerável.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Naturalmente, poderia dizer-se: «mas, então, os valores ambientais não têm de ser preservados? Se for recusada a ratificação a este diploma, se forem repristinadas as normas anteriores, não haverá um risco de vazio legislativo nesta matéria?» Em nossa opinião, não há, porque basta ver a extensa norma revogatória deste diploma para verificar que há um conjunto de legislação sobre os pontos fundamentais que estão em causa, designadamente no domínio do património cultural, das áreas protegidas, das águas públicas e da orla costeira, que assegura completamente, ou deve assegurar, a defesa dos valores ambientais. O que está em causa, nesta matéria, é o seguinte: por não haver uma ideia de ordenamento do território ao nível governamental e da administração central, são multiplicados os planos, frequentemente até contraditórios entre si e sem qualquer coordenação, com o fim de não haver qualquer plano e tudo ficar dependente do arbítrio, do autoritarismo e do centralismo existente a cada momento, podendo favorecer a corrupção.
A nosso ver, importa dignificar os municípios enquanto donos do seu território, dando a oportunidade - que já existe - aos diferentes departamentos da administração central de, através das comissões de acompanhamento, integrarem as preocupações que tenham a respeito do planeamento do território de cada município no conjunto das preocupações que cada plano director municipal expressa devidamente.
Neste sentido, propomos que seja recusada a ratificação a este diploma e sejam repristinadas as normas revogadas até ao cumprimento do objectivo, que foi proclamado, de aprovar uma lei de bases de ordenamento do território, a qual, a nosso ver, tem de devolver o poder de planear aos municípios, em estreita conexão com o poder central e as regiões administrativas que queremos criar. Até lá, é escusado «aumentar a selva» e, a pretexto de defender valores ambientais, acabar por vir aqui sustentar a manutenção de um diploma que, de todo em todo, nos parece insustentável e não vem defender os valores am-

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