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710 I SÉRIE - NÚMERO 25

campanha política eleitoral, contra cidadãos em relação aos quais se ergue o fantasma da suspeição política, do favorismo, da procura de obtenção de facilidades junto do anterior Primeiro-Ministro e, agora, de mudança suspeita de campo, para apoiarem o Dr. Jorge Sampaio. A que título é que estas cartas não estão onde deviam estar, ou seja, nos arquivos públicos da Administração Pública, do governo, da Presidência do Conselho de Ministros, para onde foram dirigidas?! Ou, então, que conceito de «carta» tem o personagem que entende que tudo o que é dirigido ao Primeiro-Ministro é pessoal?!
Não aceitamos esta concepção, Srs. Deputados, mas ela chama a atenção para a importância de assegurar que o que é património público não seja furtado aos cidadãos e que os documentos públicos transitem de governo para governo, aceitando e acatando a vontade democrática e legítima do povo português e permitindo aos governantes prosseguirem a acção governativa com continuidade, sem terem de andar a reconstituir dossiers. Isto, Srs. Deputados, alerta para a balbúrdia que foi a transição governativa, a forma como o PSD retirou dossiers, não permitindo a transmissão adequada de poderes em muitos departamentos, contando-se pelos dedos de meia mão as excepções a esta atitude.
As soluções legais que propomos, Srs. Deputados, são soluções abertas. A lei dos arquivos prevê algumas mas não as prevê todas e, por isso, propomos que se complementem e aclarem alguns aspectos desse regime jurídico.
O Sr. Presidente da Assembleia da República, ao admitir o projecto de lei, o que significa que não viu objecções que impedissem a sua admissão, reparou pertinentemente que poderia ter uma normatividade superior -e, obviamente, também poderia ter uma normatividade inferior - e somos sensíveis a essa observação. Chamo, no entanto, a vossa atenção, Srs. Deputados, para o facto de ser totalmente ridícula a acusação lançada pelo PSD na 1.ª Comissão, num projecto que foi rejeitado pela maioria dos seus membros, no sentido de que o projecto seria uma ordem, uma instrução concreta e não teria conteúdo normativo.
Infelizmente, Srs. Deputados, a lei dos arquivos é muito lacunar. O PS, na legislatura passada, lutou para a alterar e conseguiu algumas alterações ao diploma que, mediante autorização legislativa, foi aprovado por decreto-lei pelo governo. Mas não conseguimos várias coisas: primeira, não conseguimos a qualificação legal, como arquivos para todos os efeitos jurídicos, dos arquivos electrónicos; segunda, também não conseguimos que, no Código Penal, fosse punida com pena de prisão a destruição de arquivos electrónicos nos mesmos termos em que é punido o furto de documentos de papel - é um atraso da nossa legislação, basicamente devido à atitude conservadora do PSD exibida em vários momentos da legislatura passada, mas constitui uma lacuna séria que, por exemplo, impede a punição dos responsáveis pela destruição física e magnética dos arquivos de que falei; em terceiro lugar, não está estabelecida claramente (e este é um ponto para o qual fui especialmente sensibilizado pelo despacho do Presidente da Assembleia da República) a modalidade através da qual se faz a destrinça entre um documento privado e um documento público. O Sr. Deputado Guilherme Silva, há pouco, dizia que, se o ex-Primeiro-Ministro tem cartas, são cartas pessoais, se lhe foram dirigidas é porque são pessoais.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não. Não foi isso o que eu disse!

O Orador: - Nada mais errado! A carta que um industrial dirige ao Primeiro-Ministro de Portugal, expondo uma determinada situação e pedindo uma determinada solução é um documento que passa a integrar os arquivos correntes, num primeiro momento, intermédios, num segundo momento, e históricos, num terceiro momento. Há regras definidas para a sua conservação, há regras definidas para a sua destruição e eles não podem ser apropriados pela entidade que é titular, num determinado momento, do lugar como se fossem uma carta de amor mandada por uma admiradora desvairada num êxtase orgásmico numa tarde de Setembro, de Outubro ou de Novembro. Não é possível, Srs. Deputados!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Então, e essas? Essas também têm de ficar!

O Orador: - Não é possível e nós não aceitaremos essa solução. Mas não deve ser a Assembleia da República a fazer a destrinça em concreto dessa situação. Por isso, propomos - e isso consta do nosso projecto - que seja a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos a fazer essas destrinças. Noutros países, designadamente nos Estados Unidos da América, a luta de ex-membros do governo para reaverem documentos fez correr rios de tinta e levou a decisões judiciais famosas, a mais famosa das quais é, porventura, aquela que opôs Kissinger ao State Department americano no sentido da obtenção de peças de correspondência que ele próprio tinha recebido e enviado enquanto responsável governamental norte-americano. No caso português, é natural que precisemos e, em nossa opinião, era recomendável que houvesse uma solução legislativa como aquela que propomos.
Gostaria de dizer que estamos inteiramente abertos a sugestões no sentido de melhorar esse articulado e de incorporar outras soluções.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas não tem conserto!

O Orador: - Nós próprios temos já aditamentos e outras qualificações, tendo em conta observações como as feitas pela Sr.ª Relatora Odete Santos no seu parecer e outras produzidas durante o debate na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Recusamos duas coisas, liminarmente: primeiro, a atitude irresponsável que diz que nada aconteceu, nada do que aconteceu é importante, tudo o que aconteceu é normal.
Srs. Deputados do PSD tudo o que aconteceu é anormal e traduz uma atitude de desprezo pelo património arquivístico nacional que esta bancada não subscreve.
Foi com orgulho que lutámos por uma lei dos arquivos nacionais, foi com orgulho e esforço, embora sem o sucesso que desejaríamos, que lutámos pela correcção de aleijões decorrentes de atitudes prepotentes como as do Director da Torre do Tombo, que nos levou a apresentar aqui iniciativas de emergência, de que nos orgulhamos também, contra a tentativa de recusa de acesso, contra a tentativa de secretismo, contra a desnaturação da memória histórica da luta contra a ditadura.
Continuaremos esse esforço agora e apelamos, Srs. Deputados, ao consenso mais alargado que seja possível para corrigir o que foi desnaturado e para conseguir uma solução que defenda o património arquivístico nacional. Confiamos no vosso voto, confiamos num bom resultado!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

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