9 DE FEVEREIRO DE 1996 1069
o mais. Mas há aqui uma coisa que é perfeitamente clara: é que os planos de ordenamento e expansão da actividade portuária têm de ser obrigatoriamente cumpridos e respeitados pelas próprias câmaras municipais. É por isso que a sua argumentação é um contra-senso absoluto.
Sr.ª Deputada, a sua argumentação, embora parecendo lógica, esbarra num dado concreto e óbvio: é que as câmaras municipais estão obrigadas a cumprir os planos de ordenamento e expansão da actividade portuária, como era o caso do POZOR e de outros semelhantes. E a pertinência e razão de ser da nossa iniciativa é tão bem evidenciada e demonstrada que o PSD "chumbou" o nosso projecto de lei, em Janeiro de 1995, precisamente porque entendia que era um projecto inovador c criava obviamente uma situação nova relativamente àquela que existia. Por isso mesmo, estamos aqui novamente, com coerência, a apresentar, enquanto Governo, aquilo que apresentámos enquanto oposição.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral); - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia.
A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, penso que andamos sempre um pouco à volta das mesmas questões que aqui já debatemos. Apesar do pouco tempo que tivemos para analisar o diploma do PS - foi-nos dado hoje de manhã e, de facto, não lenho a capacidade "repentista" para analisar projectos e fazer pareceres, etc., que o Professor Marcelo Rebelo de Sousa eventualmente terá -, li a vossa iniciativa e verifiquei que havia, efectivamente, uma preocupação em identificar aquilo que deve ser entendido como .actividade portuária. Só que o problema não é esse, mas, sim, o facto de não nos parecer que as zonas do litoral que não estão afectas a essas actividades devam passar automaticamente para os municípios, ou seja, que estes sejam os depositários mais adequados para essas parcelas do domínio público. É essa a nossa diferença.
E relativamente ao parecer do Professor Marcelo Rebelo de Sousa dado cm 1994, com o devido respeito pela sua autoridade jurídica, nesse caso, não lhe darei muito boa nota.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.
O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. São-nos aqui presentes três projectos de lei e começaria por dizer que um deles é substancialmente diferente dos outros dois: refiro-me ao projecto do PS e não quero com isto dizer que estou de acordo com ele.
Antes de mais, gostaria de fazer uma observação, já que fiquei atónito quando li estes projectos de lei, pois pareceu-me que uma maldição tinha caído sobre este país. Pobre país, que tem o azar de possuir alguns dos melhores portos naturais do mundo, mas feliz país, porque a actividade marítima está a desaparecer, já não se pesca, a marinha mercante está a desaparecer, acabemos com os portos e façamos a felicidade na terra, aqui! Isto é inacreditável!...
Chamo a atenção desta Assembleia para o facto de estarmos a discutir um problema de vida ou de morte para Portugal. O que estamos a tratar não é brincadeira nenhuma, nem pode ter a desculpa daqueles arrazoados que correram nesta terra, clamando contra "cortinas de betão"
que separariam a cidade do rio. Basta chegar ao espaço entre Alcântara e Belém para ver quais são as "cortinas de betão" que estavam prometidas! E tanto assim é que, curiosamente, municípios como o Montijo acabam de estabelecer acordos com a Administração do Porto de Lisboa, certamente porque reconheceram alguma coisa de que esta Assembleia não fala: as virtudes da cooperação.
Desculpem que lhes diga, Srs. Deputados, que, pêlos cargos que desempenhei, conheço este problema como ninguém aqui presente. Mas também os conheço pela minha profissão, pois sou engenheiro hidráulico, trabalhei cm portos e sei que se queremos destruir uma das maiores riquezas deste país, que são as nossas áreas estuarinas, então, vamos fraccionar a gestão dessas áreas.
Quero dizer-lhes, Srs. Deputados - e acho que esta Assembleia deveria fazê-lo, pois não é longe; é bem perto -, que deveriam ir ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil ver o que é o modelo, a fundo fixo e a fundo móvel, do porto de Lisboa, para poderem verificar que uma simples ponte, colocada num sítio qualquer, pode inutilizar para sempre, por exemplo, um cais de contentores. Não sei se esta Assembleia tem a noção disto. Não sei se tem a noção de que a gestão integrada das áreas estuarinas é uma regra da técnica que nos países onde não foi cumprida tornou inevitável a morte de todos os portos que lá existiam.
Srs. Deputados, os nossos melhores portos estão em áreas estuarinas. Se querem ter, perante os nossos descendentes, a responsabilidade de acabar com o porto de Lisboa, o porto de Aveiro e o porto de Setúbal, fraccionem pêlos municípios a gestão e a capacidade de licenciar projectos e não têm via mais segura para cumprir aquele ideal que parece ressaltar destas iniciativas que é o de atingir o "paraíso", pois nessa altura já não haverá pescas, navegação e portos,... talvez não haja nada!
Mas, então, não se esqueçam de uma coisa: sobra um problema, que muitas vezes é esquecido e que é o mais importante para os autarcas, qual seja o da ecologia humana, que passa pelo direito ao trabalho. Os autarcas não podem esquecer isto. E não podem esquecer que há muitas maneiras de resolver os problemas. Na minha gestão na Câmara Municipal de Lisboa, passei peto tempo em que a Administração do Porto de Lisboa vivia de costas voltadas e fazendo de propósito o contrário do que a Câmara queria. Lutei sempre pela cooperação c quero recordar aqui o Engenheiro Conceição Rodrigues, a quem se deve o início da cooperação entre a Câmara Municipal de Lisboa e Administração do Porto de Lisboa. A partir daí, foi possível realizar reuniões permanentes entre os serviços de urbanização da Câmara e os serviços do porto de Lisboa. Não sei se isto foi aqui dito, mas essas reuniões realizam-se desde 1986, sem interrupção, incluindo todo o tempo em que foi feito o POZOR, com a participação dos técnicos municipais nesses projectos.
Por isso e porque conhecia os técnicos municipais, nunca acreditei nos "muros de betão". Os técnicos estavam lá, com instruções muito claras para defenderem os interesses da cidade. Foi possível fazê-lo, é possível fazê-lo! Mas não cometamos o erro de passar daquela altura em que as administrações-gerais dos portos eram de facto todas poderosas e não ligavam nenhuma as câmaras, como também não ligavam nenhuma ao Estado e como lambem, na maior parte dos casos, não ligavam nenhuma sequer aos interesses nacionais... Não se esqueçam que a nossa história ensina-nos muitas coisas.
Talvez os Srs. Deputados nunca tenham reflectido por que e que as Canárias são o que são hoje, verdadeiro