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10 DE MAIO DE 1996 2203

Belém e aí dedicar-se à peregrina tarefa de saber como fazer oposição à oposição!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não admira: embalados pela exibição de uma propaganda que parece não se ter dado conta que terminou já a campanha eleitoral, o Primeiro-Ministro, o seu Governo e o seu partido, incapazes de estabelecer uma orientação política clara, vêm-se dedicando naturalmente a fazer apenas relações públicas. Parece que têm todo o tempo e todo o espaço; que podem fazer o que lhes vier à cabeça, decretar todos os caprichos, ressarcir todas as frustrações pessoais ou partidárias e pôr em prática todas as fantasias. Estão enganados: no prazo certo pagarão o preço justo!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O que se tem passado nestes seis meses de governação socialista não é apenas um mau começo. Revela, antes, uma maneira de estar, uma maneira de ser. Tem um princípio: a eternidade no poder do Engenheiro Guterres. Subentende uma política - a virtude não discutível do Partido Socialista; usa um método - os famosos «empregos para os rapazes»; exibe uma desculpa - os malefícios dos anteriores governos do Partido Social Democrata.
Aplausos do PSD.

Não é de admirar, por isso, que o Governo, nascido aos solavancos e desprovido de coesão interna, dê já sinais de fadiga e que o próprio Primeiro-Ministro tenha já erguido, por duas vezes, o espantalho da crise política, sem que nada ou alguém tenha impedido ou tentado impedir o Governo de governar. Ao proceder assim, o Primeiro-Ministro revelou uma grande insegurança e, de caminho, aproveitou para fazer um pouco de chantagem. A mistura das duas dá a dimensão da sua política.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é ainda o momento para fazermos, desta Tribuna, uma balanço sistemático da acção do Governo e do partido que o apoia. É preciso dar tempo ao tempo e escolher as circunstâncias apropriadas, mas vale a pena reter alguns dados que permitam ir avaliando o que se tem passado.
O mundo sabe e aprecia que a paixão do Engenheiro Guterres vai para a Educação. Mas que paixão é esta que até agora se limitou a avançar e recuar nas propinas, a decidir que a nota mínima de acesso à universidade é de 9,5 (a não ser que, por falta de número suficiente de alunos que satisfaçam este requisito, possa ser de 5, 1, ou de menos 10), a dar à luz um pacto educativo que mais parece um saco de generalidades e de pias intenções?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A paixão começa a revelar-se platónica e assim não iremos a lado algum. Os primeiros sinais de desencanto já se notam, prenúncio de que tudo pode acabar num sarilho sentimental de más consequências para o País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Prometeu o Partido Socialista que um seu Governo conseguiria mais emprego e melhor emprego. O que está a acontecer com um Governo socialista? Mais e mais desemprego, o que é grave, Srs. Deputados! É especialmente grave porque este é um domínio que mexe muito directa e intensamente com as inquietações mais profundas dos cidadãos. Fazer promessas irresponsáveis no domínio do emprego é uma afronta e revela uma preocupante insensibilidade social. De nada vale o Primeiro-Ministro explicar-nos que não fora ele e os restantes Primeiros-Ministros da União Europeia não teriam despertado para a grave questão do desemprego que assola toda a Europa. De nada vale a Sr.ª Ministra da Qualificação e do Emprego vir a esta Câmara tentar sossegar o País com a exibição de uma linguagem tecnocrática, recheada de «derivas estratégicas» e de vários «eixos» de intervenção. A realidade nua e crua, Srs. Deputados, é que o Orçamento do Estado apresentado pelo Governo e aprovado na Assembleia da República, com os votos do PS e do PP, não fomenta a criação de emprego; a verdade é que o super Ministério da Economia conheceu já dois titulares, tendo-se perdido meses a assistir a uma luta entre o Ministro e o Secretário de Estado (há quem diga entre independentes e aparelho do PS) a propósito do horário de abertura aos domingos dos hipermercados. O que não acontece é a criação de um clima de confiança nos consumidores e nos agentes económicos, condição fundamental ao crescimento da economia. De resto, Srs. Deputados, a situação tende a agravar-se, conforme se pode depreender das últimas estimativas do Banco de Portugal quanto à taxa de crescimento do produto no ano corrente.
Também nas Obras Públicas, nos Transportes e nas Comunicações tudo parece adiado. Enquanto prosseguem algumas das obras lançadas pelo anterior Governo, tudo o resto repousa nos gabinetes de estudo, trazendo à lembrança tempos idos e que julgávamos definitivamente enterrados, em que se faziam muitos projectos mas não se realizava obra nenhuma.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Curiosamente, ainda há dias, o Sr. Primeiro-Ministro, o criador da «teologia anti-betão», se queixava da falta do dito e optava por se deslocar de helicóptero.
Risos do PSD.

Mas não vou correr ministério por ministério. Aliás, pouco ou nada poderia dizer; porque pouco ou nada se sabe do que se passa, por exemplo, pelas bandas da Cultura, do Ambiente ou da Investigação Científica.
No fundo, Srs. Deputados, o Governo parece estar em estágio, aguardando uma melhor oportunidade para aparecer a governar. É que, entretanto, já se esgotou mais de um semestre dos oito que preenchem a legislatura.
Mas temos de reconhecer um facto: o Governo pôs mesmo em prática uma «nova cultura democrática». Se não vejamos: as interferências já verificadas nos órgãos de comunicação social do Estado; os despudorados saneamentos políticos em todo o aparelho do Estado - nunca tal se tinha visto após os anos de 74 e de 75 (mas alguém ainda se lembra das promessas eleitorais sobre esta matéria?); o silêncio cúmplice que se tem abatido sobre este autêntico escândalo deveria sobressaltar todos aqueles que no passado se erguiam, corajosos e tonitruantes, contra o que apelidavam então de «Estado laranja». Agora, meus senhores, até nas disputas internas do PS se usa como mais-valia a promessa de mais lugares para os militantes.