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10 DE MAIO DE 1996 2215

Analisemos esta crítica. A presente proposta de lei diz expressamente no artigo 5.º que a atribuição da prestação depende de várias condições. Uma delas é a de que só é titular de rendimento quem se encontre numa situação em que a sua exclusão do emprego não resulte da falta de disponibilidade pessoal mas de factores objectivos imputáveis à sua saúde, idade ou ao próprio mercado de trabalho.
Por outro lado, Sr.as Srs. Deputados, tenho grande dificuldade em compreender tal discurso fora de um quadro algo cínico. Acaso pensa algum dos Srs. Deputados que há reforço da competitividade das empresas que não gere níveis, por muito baixos que sejam, de exclusão? Acaso acredita algum de vós que esta sociedade possa gerar o pleno emprego e a plena inserção social? E o que deve fazer-se corri esse segmento de excluídos? Abandoná-los à sua sorte, como se tem feito até aqui? Deixar que tendam para uma vida progressivamente mais exposta à marginalidade social? Acham que uma sociedade europeia pode manter o seu modelo social e cultural, se estes fenómenos de exclusão que podem ser geradores de uma dualização social persistente se mantiverem por muito tempo?
Temos que ser rigorosos na verificação da condição de disponibilidade para o trabalho, é certo, e o actual Governo tem créditos em matéria de exigência das verificações de acesso a prestações sociais. Mas não podemos deixar que essa exigência nos cegue quanto ao fundo do problema. Há, hoje, marginalizados que o são por fenómenos imputáveis à própria dinâmica social contemporânea e inerentes ao próprio reforço da competitividade da economia, à adaptação tecnológica, à dificuldade de acompanhar o ritmo progressivamente mais exigente das sociedades contemporâneas.
O que hoje está em causa para essas pessoas não é o «pecado da preguiça» mas, sim, que as sociedades que geram estes fenómenos têm também de gerar o esforço solidário que os minore, e é a isso que uma medida como o rendimento mínimo está indissociável mente ligada.
O problema da rigidez nos salários parece-me ser de resposta relativamente fácil. Atentemos nos números. Portugal tem hoje um salário mínimo de 54 600$. O referencial de atribuição da prestação de rendimento mínimo é o da pensão social - 20 000$ -, portanto, bastante abaixo de limites que possam ser economicamente competitivos com esse rendimento.
Cumpre perguntar: alguns dos Srs. Deputados acham que alguém abandona uma remuneração do trabalho para a trocar por uma prestação de 20 000$ mensais que lhe exige, adicionalmente, que esteja disponível para o trabalho?
Uma segunda linha de crítica dos pressupostos do rendimento mínimo assenta na defesa de que este projecto terá enormes custos financeiros para o Estado, tornando-o ingerível.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estimamos hoje que se gastará anualmente com o rendimento mínimo menos de 50 milhões de contos, ou seja, metade do que se gasta com o subsídio de doença e pouco mais de 3% dos gastos totais do País com segurança social. O impacto desta medida no orçamento da segurança social é, pois, negligenciável quando confrontado com o significado social de dar a todos os cidadãos a garantia de um nível mínimo, muito embora seja efectivamente mínimo, de subsistência. Os ganhos de coesão social, alguns deles quantificáveis também em números mas que são sobretudo imateriais, superam incomensuravelmente os gastos. Devo dizer-vos que estas críticas são relativamente menores. Uma é apenas mais uma manifestação de um modo de entender a protecção social, que é completamente contraditório do modelo europeu de protecção social. É apenas uma manifestação localizada de uma contestação genérica ao nosso modelo de procura de maior coesão social e, portanto, não se justifica que a discutamos excessivamente nessa manifestação localizada; ela tem que ser discutida nos seus pressupostos globais.
A outra é meramente uma crítica de circunstância, o resultado de uma tentativa de negar a evidência da possibilidade orçamental e da utilidade social da criação do rendimento mínimo garantido.
Aliás, argumentos socialmente injustos como estes não podem servir para negar a evidência de que os excluídos não podem ser condenados a uma marginalização para toda a vida. A paralisia que implicaria nas respostas sociais seria, na realidade, o equivalente a um abandono. Nós também pensámos que é no desenvolvimento económico que está a chave da questão. No desenvolvimento e não apenas no crescimento, sublinho, mas enquanto esse desenvolvimento sustentado e sustentável não chega, há imperativos sociais que não podem ser ignorados.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas também estaremos despertos para outras observações do outro lado do espectro da opinião, que poderíamos designar como sendo provenientes de uma exigência do rendimento mínimo garantido.
A primeira dessas observações focaliza-se no montante das prestações, que considera insuficientes para a garantia de um nível mínimo de subsistência. Não posso deixar de dizer que reconheço que é extremamente difícil o quotidiano de uma família que dependa do rendimento mínimo garantido. Mas convém não esquecer que esse quotidiano é ainda mais difícil hoje, quando o rendimento mínimo não existe.
A fixação do valor do rendimento mínimo não pode ser o resultado de um exercício bem intencionado mas extremamente voluntarista, do qual se concluísse que se deveria garantir um nível de rendimentos considerado aceitável. Ela tem de obedecer à resposta à pergunta: qual é o nível de protecção social que o País pode conceder aos cidadãos?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Essa resposta já estava encontrada para certas categorias de beneficiários e numa base individual: é a pensão social, que o governo de Maria de Lurdes Pintasilgo aprovou e o governo da AD começou a executar. O que agora fazemos é adaptar essa fórmula ao cálculo de base familiar. Se e quando os diferentes governos entenderem que há condições económicas e sociais para que esse patamar se eleve, ele será elevado e, com o aumento das pensões sociais, aumentar-se-á o valor da prestação de rendimento mínimo e o nível de rendimento das famílias que dele sejam beneficiárias. É, aliás, o que este Governo já fez, aumentando no ano transacto a pensão social em cerca de 14%. Mas, sobretudo, não nos parece que se possa ligar o valor do rendimento mínimo ao salário mínimo nacional. Fazê-lo seria aceitar criar a lógica de um salário substitutivo dos rendimentos do trabalho. Entendemos - e fizemos a lei nesse sentido - que o rendimento mínimo deve ser um subsídio social e por isso ligado à lógica global dos subsídios sociais.

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