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Sexta-feira, 24 de Maio de 1996 I Série - Número 74
DIÁRIO
Da Assembleia da República

VII LEGISLATURA

1.A SESSÃO LEGISLATIVA (1995-1996)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 23 DE MAIO DE 1996

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.

Antes de ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos e da resposta a alguns outros.

Foi aprovado o voto n.º 26/VII - De pesar pelo falecimento do cidadão Rui Coelho Mendes no Estádio do Jamor, na final da Taça de Portugal, apresentado por rodos os partidos, fendo proferido intervenções os Srs. Deputados Guilherme Silva (PSD), António Braga (PS), Bernardino Soares (PCP) e Silva Carvalho (CDS/PP).
A Câmara aprovou ainda o voto n.º 27/VII - De protesto pela actuação do sargento-ajudante comandante do posto da GNR de Sacavém, presumível autor de crime de homicídio voluntário e de outros ilícitos criminais na pessoa do cidadão Carlos Rosa, igualmente apresentado por todos os partidos. Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputadas José Magalhães (PS), Guilherme Silva (PSD), Silva Carvalho (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes).
Em declaração política, o Sr. Deputado Bernardino Soares (PCP) deu conta à Câmara das críticas jeiras ao Governo e das propostas apresentadas durante o V Congresso da Juventude Comunista Portuguesa e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Afonso Candal e António Galamba (PS).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto (PS) abordou as questões mais salientes debatidas no X Congresso Nacional da Juventude Socialista, tendo respondido a pedidos de esclarecimento dos Sus. Deputadas Sérgio Vieira (PSD), Nuno Carreia da Silva (CDS-PP) e Bernardino Soares (PCP).
O Sr. Deputado Paulo Neves (PS) congratulou-se com as acções que o Governo tem previstas pára o Algarve, tendo respondido a pedidos de esclarecimento e à defesa da honra e consideração do Sr. Deputado António Vairinhos (PSD).
Ordem do dia. - Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 27/VII - Estabelece o princípio a que deve obedecer o regime de recrutamento e selecção de directores de serviço e chefes de divisão para os quadros da Administração Pública e dos projectos de lei n.º 115/VII - Ateração do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro (Revê o Estatuto do Pessoal Dirigente da Função Pública) (CDS-PP)e 158/VII - Altera o Estatuto do Pessoal Dirigente (PSD), tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro Adjunto (Jorge Coelho), os Srs. Deputados Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Luís Marques Guedes. Miguel Macedo e Carlos Encarnação (PSD), Nuno Abecasis (CDS-PP), Nuno Baltazar Mendes (PS) e Odete Santos (PCP).
Foram aprovados, na generalidade, a proposta de lei n.º 23/VII Cria o Conselho Consultivo para as Comunidades Portuguesas e os projectos de lei n.os 21/VII - Conselho das Comunidades Portuguesas no Mundo (PSD) e 44/VII - Cria os órgãos representativos dos portugueses residentes no estrangeiro (PCP) - que baixaram à 2.ª Comissão e ainda a proposta de lei n.º 3/VII - Atribuição de pensão extraordinária ano trabalhadores abrangidos por acordos internacionais na Região Autónoma dos Açores (AGRA)- que baixou à 8.ª Comissão.
Em votação final global, foi aprovado o texto final, com as alterações aprovadas em sede de Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, relativo ao Decreto-Lei n.º 334/95, de 28 de Dezembro, que altera o Decreto-lei n.º 448/91, de 29 de Novembro (aprova o regime jurídico dos loteamentos urbanos) [Ratificações n.os 14/VII (PS) e 15/VII (PCP)].
O projecto de lei n.º 62/VII - Prorrogação do prazo limite para submissão a inquérito público dos regulamentos municipais previstos no Regime Jurídico de Licenciamento de Obras Particulares (PS) foi aprovado em votação final global.
Também em votação final global, foi aprovado o projecto de lei n.º 64/VII - Permite a constituição como assistentes em processo penal no caso de crime de índole racista ou xenófoba por parte das comunidades de imigrantes e demais associações de defesa dos interesses em causa (PS).
Foi igualmente aprovada, em votação final global, a proposta de lei n.º 20/VII - Cria no ordenamento jurídico algures mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais.
Ainda em votação final global, foi aprovada a proposta de lei n.º 17/VII - Estabelece o regime legal aplicável à defesa dos consumidores e revoga a lei n.º 29/81, de 22 de Agosto.
A Câmara concedeu autorização a três Srs. Deputados para deporem em tribunal e denegou autorização a um nutro.
O Sr. Presidente declarou encerrada a sessão eram 20 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Maninho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António Rui Esteves Solheiro.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Filipe Mesquita Vital.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Raúl d' Assunção Pimenta Rego.
Rita Maria Dias Pestana Cachuxo.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.

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Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugênio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madail.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Povoas.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Manuel Maria Mendonça da Silva Carvalho.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Maria Manuela Guedes Outeiro Pereira Moniz.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de requerimentos e de respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa os seguintes requerimentos: ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Aires de Carvalho; aos Ministérios da Economia e da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; a diversos Ministérios e às Secretarias de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território e das Obras Públicas, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; aos Ministérios do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco; aos Ministérios da Saúde e do Ambiente, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Aires de Carvalho; ao Ministério da Cultura, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Pereira Marques; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Mota Amaral; aos Ministérios da Saúde e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado Luís Sá; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado José Calçada; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa; à Secretaria de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, formulado pelo Sr. Deputado Nuno Abecasis; ao Ministério do Ambiente e à Secretaria de Estado da Indústria e Energia, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Luís Sá, no dia 12 de Dezembro; José Cesário, na sessão, de 14 de Dezembro; Fernando Pereira Marques e António Brochado Pedras, nas sessões de 21 de Dezembro, 7 de Fevereiro é 14 de Março; Artur Sousa Lopes, na sessão de 24 de Janeiro; Álvaro Amaro, na sessão de 25 de Janeiro; Ricardo Castanheira, no dia 6 de Fevereiro; José Carlos Tavares, na dia 12 de Fevereiro; Maria da Luz Rosinha, na sessão de 16 de Fevereiro; Helena Santo, na sessão de 5 de Março; António Filipe e Bernardino Soares, na sessão de 14 de Março;

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Fernando Pedro Moutinho, nas sessões de 20 de Março e 11 de Abril; Francisco José Martins, na sessão de 21 de Março; Lino de Carvalho, na sessão de 17 de Abril; Luís Marques Mendes, na sessão de 9 de Maio.
Deram ainda entrada na Mesa dois votos, um de pesar e outro de protesto, apresentados por todos os partidos com assento no Parlamento.
O voto n.º 26/VII, de pesar pelo falecimento do cidadão Rui Coelho Mendes no Estádio do Jamor, na final da Taça de Portugal, é do seguinte teor:
No dia 18 de Maio de 1996, no Estádio do Jamor, na final da Taça de Portugal, o jovem adepto do Sporting Rui Coelho Mendes foi atingido por um projéctil que foi causa directa e imediata da sua morte.
O País tem vindo a assistir a um incremento de violência e a cenas condenáveis nos recintos em que se realizam espectáculos desportivos.
Tem sido frequente, durante a após a realização de diversos jogos de futebol, a prática de actos de agressão e vandalismo por parte de indivíduos afectos a «claques» de clubes desportivos, que transformam eventos desportivos, que se pretendem pacíficos e de lazer, em ocasiões de violência gratuita. Se a tendência assim manisfestada não for travada com medidas claras e precisas que possuam efeitos dissuasores, corre-se o risco de ver os campos de futebol transformados em palcos privilegiados de violência, com consequências sempre irreparáveis.
Assim, a Assembleia da República, considerando que importa prevenir que acontecimentos funestos possam continuar a ocorrer nos recintos desportivos:
Expressa o seu pesar pelo falecimento do cidadão Rui Coelho Mendes e transmite condolências à família enlutada;
Manifesta o seu empenhamento na ponderação de medidas que evitem a instrumentalização dos associados de clubes desportivos para actos de violência e na adopção de providências que assegurem a prevenção dos fenómenos de delinquência que ameaçam desnaturar a prática desportiva;
Exprime o seu apoio a iniciativas de promoção cívica que oficialmente e com a cooperação dos clubes desportivos posam contribuir para a promoção de uma prática saudável da competição desportiva.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão o voto de pesar que acaba de ser lido.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É sempre doloroso para a Assembleia da República ter de se associar nestes momentos a estas situações difíceis e à dor que atravessa mais uma família portuguesa. E neste caso particular é para nós ainda mais doloroso quanto é certo que estas ocorrências se registam em momentos que deviam exactamente de sentido oposto, deviam de ser momentos de alegria, de entusiasmo, próprios de manifestações desportivas, às quais queremos associar cada vez mais a juventude por forma a que ela se centre em matérias e interesses que a desvie de outras atracções negativas, infelizmente também bem acentuadas na nossa sociedade, como a marginalidade e a droga.
Mas se vamos consentir que estes momentos, que deviam de ser, repito, de prazer e alegria, se transformem neste tipo de situações e se alarguem, estamos a contribuir para que a nossa sociedade seja cada vez mais uma sociedade doente e estamos, acima de tudo, a arrastar para este campo, onde se quer que se projecte a juventude num amanhã melhor, aquilo que de pior as sociedades têm.
O Grupo Parlamentar do PSD lamenta profundamente esta ocorrência, que aquela festa tenha sido ensombrada com uma situação bastante negativa e formula, acima de tudo, um voto de congregação de esforços, que não tem, não tem de ter, nem deve ter, qualquer prevalência partidária mas, sim, nacional e um sentido geral de responsabilidade, para que sejam tomadas medidas de forma a que estas situações não se repitam e que o fenómeno das claques, que hoje é generalizado, se processe como frentes de apoio à parte positiva do espectáculo desportivo, com distanciamento, sem paixão exacerbada e, acima de tudo, sem forma de encobrir - e esperemos que isto não aconteça neste caso - a impunidade, o anonimato, a massificação de actos como este.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao subscrever o voto de pesar, o Grupo Parlamentar do PS quer, antes de mais, significar o seu inconformismo perante o trágico desaparecimento de uma vida humana, nas circunstancias conhecidas, no Estádio do Jamor.
No momento em que já são conhecidas as medidas anunciadas pelo Governo, no tocante a colmatar lacunas da lei que regula as entradas nos recintos desportivos, justamente no sentido de impedir a. repetição de acontecimentos semelhantes, a Assembleia da República não poderia ficar indiferente àquele trágico incidente.
A elaboração de legislação a impor restrições no acesso aos estádios de material que possa pôr em risco o bem-estar e a vida das pessoas é um contributo inegável e muito positivo para pôr termo quer à existência de meios para a expressão de qualquer forma de violência nos recintos desportivos quer para prevenir acidentes resultantes do uso desprevenido ou incompetente desse material, que originariamente até pode pretender exprimir um regozijo, mas cujas probabilidades de resultar em tragédia, por menores que sejam, devem ser eliminadas.
Neste tipo de manifestações está inscrita muitas vezes uma violência a que também é preciso pôr cobro.
Por isso, uma reflexão, no âmbito da Assembleia da República, sobre o fenómeno em geral da violência nos estádios é também uma urgência no sentido de se criar as melhores condições para a cooperação de todos os intervenientes no fenómeno desportivo na .pedagogia do desporto como atitude saudável e, na prevenção de comportamentos condenáveis e contrários ao espírito desportivo.
O apelo à cooperação é mais do que um voto, Sr. Presidente, é uma necessidade urgente. A violência associada ao desporto tem raízes profundas, históricas e sociais que não podemos escamotear. Não é ainda o momento de as abordar em profundidade.
No caso concreto do futebol deve ser feito um esforço no sentido de podermos ter os estádios como local de encontro aprazível dos adeptos, onde a ideia de lazer, descontracção e divertimento possa ter tradução concreta. Há notícias de verdadeiros motins, ainda nos finais do século XIX na Inglaterra, entre a assistência de jogos de futebol, que hoje têm alguma tradução - actualizado o

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tempo e as circunstâncias - pela existência dos, infelizmente, famosos hooligans, que, como todos sabemos, levou a drásticas penalizações dos clubes ingleses, em termos de competições europeias.
Vários estudos têm sido feitos para perceber e combater estas manifestações aberrantes. A assistência a um jogo não é uma situação neutra, como diz Jacques Selosse, num estudo publicado pelo Ministério da Educação, subordinado ao tema Violência dos Espectadores nos Estádios. Este autor identifica várias categorias de público nos recintos desportivos, distinguindo desde aqueles que assistem apenas para presenciar uma vitória aos ditos paradesportistas, que assistem ao jogo, dado o seu carácter espectacular, e o aproveitam para trocai - opiniões sobre o desenvolvimento do jogo, libertando-se assim das tensões acumuladas durante a semana.
Trata-se de uma abordagem na tentativa de perceber também a natureza dos diferentes públicos e que nos pode permitir identificar melhor o método de combate à violência.
Em Portugal, Sr. Presidente, há já alguns indicadores que nos devem fazer agir sem demora. Segundo os relatórios da GNR, resultantes dos policiamentos a diversos espectáculos desportivos, o número total de jogos com incidentes, em 1995, foi de 387, praticamente igual a 1994, onde foi de 385. Dos incidentes ocorridos em 1995, 253 foram provocados pelo público. Mas, quanto ao número total de incidentes, registou-se um aumento de 266, ou seja mais 13,20% do que no ano anterior. Há, em média, 2,83 incidentes por jogo, isto a somar aos dados da PSP, que regista, em 1995, 379 incidentes nos policiamentos que fez a jogos.
São, naturalmente, dados que reforçam o sentido da expressão deste voto, a fim de que todos nos esforcemos para que as circunstâncias que levaram à morte de um espectador no Estádio do Jamor e outras manifestações de violência, organizadas ou não, que todos lamentamos, não possam repetir-se noutro qualquer recinto desportivo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP associa-se igualmente a este voto de pesar e também a esta condenação da violência nos estádios, que não é o primeiro caso no nosso país e que tem tido, noutras situações, consequências igualmente funestas. Esta situação reflecte evidentemente a sociedade em que vivemos, mas consideramos que não é uma situação incontornável que tenha de existir, devendo-se fazer todos os esforços para que o espectáculo desportivo seja preservado, criando-se as condições para que decorra da melhor maneira, traduzindo assim o espírito de festa, de convívio e de participação desportiva que deve encerrar.
Uma palavra também para a necessidade e o carácter fundamental da educação cívica nestas matérias, que ensina a entender o desporto como uma festa e a participar nela da melhor maneira, prevenindo deste modo a existência de outras situações do tipo da que hoje aqui abordamos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Carvalho.

O Sr. Silva Carvalho (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Popular subscreveu e associa-se a este voto de pesar com o coração e a alma constrangidos. A morte, ainda que natural, é sempre um fenómeno difícil de compreender e de suportar. A morte de um inocente, a morte por um acidente - perdoem-me a expressão -, por um estúpido acidente, nestas condições, é sempre trágica.
O Partido Popular vê os espectáculos desportivos em Portugal, nomeadamente os de futebol, como um espectáculo de que os portugueses obviamente gostam, de que se servem muitas vezes para passar momentos mais despreocupados, mas não pode, de forma alguma, deixar que aos espectáculos de futebol se associe a imagem de violência, de intolerância, da tragédia. As claques, as jovens claques de apoio aos clubes de futebol necessitam de um enquadramento legal restritivo urgente. Há que ter a coragem de o dizer. É urgente regulamentar esse fenómeno, restringi-lo, inclusive, Sr. Presidente, se me permite, pois é a própria imagem da nossa juventude que está em causa e os jovens que, nas galerias, assistem à sessão não merecem que a juventude portuguesa seja associada a esta imagem.
O momento é de pesar, de nos associarmos às condolências à família do vitimado, mas também de profunda reflexão, que deve ser positiva, no sentido de vermos o que poderemos fazer, porque todos somos igualmente responsáveis, para evitar incidentes desses no futuro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de palavra, vamos votar o voto n.º 26/VII.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Para proceder à leitura do voto n.º 27/VII - De protesto pela actuação do sargento-ajudante comandante do posto da GNR de Sacavém, presumível autor de crime de homicídio voluntário e de outros ilícitos criminais na pessoa do cidadão Carlos Rosa, subscrito também por Deputados de todos os partidos.
Tem a palavra o Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto n.º 27/VII é do seguinte teor:
Encontra-se sob prisão preventiva o sargento-ajudante comandante do posto da GNR de Sacavém, presumível autor de crime de homicídio voluntário e de outros ilícitos criminais na pessoa do cidadão Carlos Rosa, atingido na cabeça com um tiro de pistola e posteriormente abandonado em lugar ermo, após decapitação. Aguardam igualmente julgamento, por envolvimento no processo, cinco outros membros daquela força de segurança.
Os relatos publicamente disponíveis referem que os actos criminosos, de especial gravidade e desumanidade, tiveram lugar na sequência de interrogatório policial e foram acompanhados de ulterior tentativa de encobrimento.
Tendo a Polícia Judiciária reunido com celeridade os indícios que permitam levar a tribunal os presumíveis implicados, a GNR, o Ministro da Administração Interna e o próprio Primeiro-Ministro tornaram pública a inequívoca condenação do homicídio, das atitudes que o antecederam e das que se lhe seguiram, justamente qualificadas como aberrantes.
Sendo certo que os mais diversos quadrantes da opinião pública partilharam este repúdio do crime e das práticas a ele associadas, foi igualmente generalizado o reconheci-

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mento de que os gravíssimos actos não se podem confundir com toda a corporação e a sua acção em prol da segurança e da tranquilidade dos cidadãos.
A Assembleia da República, manifestando o seu entendimento de que devem ser, extraídas todas as consequências da grave ocorrência, considera urgente: o rigoroso apuramento das responsabilidades que ao caso cabem; a divulgação pública dos respectivos resultados; a adopção de medidas que garantam o cumprimento estrito das disposições legais que proíbem o uso abusivo de armas de fogo e outros meios de coacção por parte das forças de segurança; o reforço das garantias de defesa de cidadãos sujeitos a interrogatório policial; a mais precisa definição de parâmetros e códigos de ética que asseguram o normal exercício de direitos cívicos, a eficácia no combate ao crime e a erradicação de práticas policiais contrárias à Constituição e à lei.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O voto agora apresentado e subscrito por representantes de todos os partidos com assento na Assembleia da República representa uma reacção institucional de condenação inequívoca, que é importante sublinhar, adoptada no momento próprio, pela forma própria e de maneira inteiramente adequada. Pela nossa parte, tomámos a iniciativa, de o apresentar e de o fazer subscrever por todas as bancadas ontem mesmo, tomando assim uma posição rápida e de condenação enérgica de um acontecimento que é insólito pela sua brutalidade e absolutamente excepcional, urgindo retirar dele todas as ilações institucionais.
O voto salienta, por um lado, a natureza do acontecimento; por outro, assinala a maneira como o Governo, a GNR, as instituições reagiram prontamente e como a Polícia Judiciária conduziu à detecção e identificação de responsáveis e, por outro lado ainda, saúda essa prontidão e assume um compromisso.
Era para dois aspectos desse compromisso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que gostaria de chamar a vossa atenção: por um lado, a Assembleia da República, através deste voto, assume o compromisso de contribuir, dentro do limite da sua competência, para extrair todas as ilações necessárias para a erradicação nas forças de segurança portuguesas deste tipo de fenómenos que, pelo seu carácter anticonstitucional, anormal, desumano e aberrante, não podem ter lugar num Estado de Direito democrático.
É uma tarefa sobre a qual o Governo (e o Sr. Primeiro-Ministro) teve ocasião de anunciar que há empenhamento governamental pleno - as medidas estavam já a ser preparadas e estão agora em execução num sentido que o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro da Administração Interna anunciaram ontem em primeira mão. Pela nossa parte, não só gostaria de corroborar, em nome da bancada socialista, o nosso pleno empenhamento em viabilizar todas essas medidas na parte em que passem pela Assembleia da República como de fazer um apelo e de dar uma garantia.
Começo pelo apelo, Sr. Presidente, dizendo que manifestações de brutalidade que violem direitos, liberdades e garantias e ofendam direitos de cidadãos, quaisquer que eles sejam, não são aceitáveis num Estado de Direito democrático; devem ser combatidas por todos os meios e um desses meios fundamentais é a própria indignação dos cidadãos e a sua não passividade perante esses fenómenos. Nesse sentido apelávamos, Sr. Presidente, aos partidos da oposição, por um lado, aos cidadãos em geral, por outro, a trazerem ao conhecimento da Assembleia da República e, em particular, ao da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias quaisquer situações de irregularidade, de abuso, de prepotência, de incumprimento da Constituição e do Código de Processo Penal no tratamento de situações em quaisquer instituições ou forças de segurança na dependência de qualquer das forças existentes. A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias terá a porta aberta para examinar qualquer queixa, representação ou informação, verificar a sua gravidade e proceder em conformidade junto do Provedor de Justiça, do Governo, dos tribunais ou do Plenário. É um compromisso que assumimos solenemente!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à garantia, direi que, no passado, a reacção da maioria parlamentar perante situações deste tipo nem sempre primou pela prontidão, pela rapidez, pela frontalidade e pela verdade plena, ainda que seja dura e dolorosa, embora no caso concreto não manche uma corporação mas apenas um elemento dessa corporação.
Isso não queremos que aconteça nunca mais e, por essa razão, Sr. Presidente, não só tomámos esta medida de imediato como assumimos a garantia de que ouviremos diversas entidades. Para esse efeito, proporemos a vinda à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias de representantes da Ordem dos Advogados, dos sindicatos de magistrados, da Amnistia Internacional, de outras organizações de defesa de direitos humanos para que esta Comissão examine todas as medidas que possam vir a contribuir para erradicar definitivamente práticas deste tipo da face das esquadras de Portugal. Não queremos isso mas não basta não querer.
Esta maioria vai adoptar, e esperamos que o faça por consenso, medidas de carácter prático de forma a garantir que essas práticas desapareçam para sempre da face das esquadras portuguesas e este compromisso, Srs. Deputados, é solene e será honrado até ao último minuto.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela segunda vez hoje, associamo-nos, solidarizamo-nos com situações extremamente dolorosas para a nossa colectividade. Contudo, a propósito deste voto de protesto, de condenação, pela ocorrência no posto da GNR de Sacavém, a nossa preocupação é ainda mais profunda do que relativamente às questões de há pouco por estar em causa uma actuação cruel e inqualificável da parte de agentes que têm a missão de proteger e defender os cidadãos.
Ontem no Governo, hoje na oposição, sobre esta matéria a nossa postura é a mesma de não instrumentalização destas questões do ponto de vista político-partidário.
Há pouco, o Sr. Deputado José Magalhães acusava a conduta do PSD enquanto maioria e governo mas não vai ouvir-nos fazer coro no mesmo sentido do seu partido,

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enquanto oposição, nesta Assembleia a respeito destas matérias. Não vamos pedir, como VV. Ex.as fizeram, perante uma ocorrência destas, a demissão do Ministro da Administração Interna porque distinguimos as situações. Sabemos o que é uma ocorrência condenável, isolada, de determinados agentes da GNR que tiveram um comportamento a todos os títulos condenável mas não foi, com certeza, com a conivência do Ministro da Administração Interna nem dos comandos da GNR que tal sucedeu. Não aceitamos que a instituição nem o Ministro sejam, pura e simplesmente, associados a este aspecto negativo; não faremos o mesmo que VV. Ex.as fizeram no passado perante um acontecimento verificado numa esquadra da PSP, que não teve a crueldade deste.
Sabemos distinguir as situações, mas sempre adiantamos que nos preocupa o facto de começarem a ocorrer com alguma frequência por recearmos que as mesmas indiciem uma quebra da autoridade do Estado a que, eventualmente, não está alheia a postura que aqueles que hoje são Governo tiveram quando foram oposição. Estas coisas não são estanques pelo que as relações entre os comandos das forças de segurança e o Ministro, as crises que, cada vez mais, se avolumam nessa área, preocupam-nos como fonte eventual de desautorização dessas cúpulas, dessas forças de segurança e, portanto, como a semente de um clima propício à multiplicação destas situações. Esperamos que essas relações institucionais melhorem.
Não queremos, de um ponto de vista meramente político-partidário, que se verifique uma deterioração dessas relações para acusarmos o PS. Queremos, com sentido de Estado, que as relações entre o Ministro e estas instituições melhorem, se clarifiquem e que o ambiente de autoridade seja restabelecido, de forma a que situações como estas não se repitam e não tenhamos, mais uma vez, de associar-nos a um protesto destes.
Queremos que a autoridade do Estado seja restabelecida e que esta conduta menos feliz que, no passado, o Partido Socialista teve, porque ocorrida numa guerrilha de oposição nem sempre clarividente, seja de uma vez por todas esquecida e reassumida a responsabilidade do Estado pelo Governo.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostava que pudesse ficar averbada na acta desta sessão que o n.º 80 do Diário, I Série, de 17 de Junho de 1994, regista rigorosamente, na página 2606, a posição que o Grupo Parlamentar do PS adoptou aquando do bárbaro assassinato de uma pessoa na esquadra de Matosinhos e em que de maneira alguma foi dito aquilo que o Sr. Deputado Guilherme Silva, com grave falta à verdade, acabou de insinuar. Dissemos rigorosamente o contrário e apresentámos um voto, pelo qual nos batemos e que veio a ser aprovado, demarcando-nos totalmente desde tipo de coisas e propondo, letra por letra, o que consta deste, o que, aliás, foi intencional.

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, Sr. Presidente, é pelo menos bárbaro introduzir hoje a inventada questão de uma putativa quebra de autoridade do Estado, o que é ridículo vindo de uma bancada que deixou o Estado quebrado e numa situação lamentável em matéria de segurança.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a acta registaria sempre a sua intervenção, por mais passiva que fosse a Mesa. Portanto, esteja tranquilo a esse respeito.

O Sr. Guilherme Silva (PSD). - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, quero dizer-lhe que conhecia e conheço muito bem esse voto, mas V. Ex.ª certamente não quer «tapar o sol com uma peneira» ...
Protestos do Deputado do PS Jorge Lacão.

O Orador: - ... nem quer garantir à Assembleia da República que foi essa a única posição tomada pelo Partido Socialista relativamente a situações deste jaez e deste teor que ocorreram no passado. V. Ex.ª sabe muito bem que, devido a situações similares, o seu partido pediu a demissão do então ministro Dias Loureiro.
V. Ex.ª refere-se agora a uma situação isolada mas oculta todas as outras situações similares e as respectivas posições tomadas pelo Partido Socialista. Não queira apagar a História, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, assegurou, de facto, a forma da interpelação à Mesa mas não a substância.
Aliás, a este propósito, estranho por que razão os Srs. Deputados utilizam tão pouco a figura regimental do protesto e contra protesto que me parece que, muitas vezes, caracterizaria melhor o que pretendem quando recorrem à figura da interpelação à Mesa. O protesto existe para protestar e é isso mesmo que os Srs. Deputados habitualmente fazem quando pedem a palavra para uma interpelação. Portanto, peço-vos que, de futuro, sempre que queiram usar da palavra para um protesto, o caracterizem assim mesmo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Carvalho.

O Sr. Silva Carvalho (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Popular associou-se a este voto de protesto que é, em simultâneo, um voto de pesar por mais uma vida perdida, sacrificada em condições de desumanidade e de violência inenarráveis.
Permita-me, Sr. Presidente, que, deste voto de protesto e de pesar, faça também um voto de lamento veemente pelo comportamento, nesta matéria, quer do Partido Socialista quer do Partido Social-Democrata.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Ao associarmos o Partido Popular a este voto de protesto, jamais esperaríamos que, quer o PS quer o PSD, fizessem esta cena de chicana política sobre um acontecimento tão trágico.

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

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O Orador: - A segurança dos portugueses é algo que sempre preocupou o Partido Popular. As forças de segurança, a sua eficácia, a sua formação - e julgamos que é essencialmente isto que aqui está em causa -, de forma a que seja sobretudo garantida a segurança mas também os direitos dos cidadãos portugueses, constituem algo que sempre preocupou o Partido Popular.
Aliás, ainda ontem, no debate mensal com o Primeiro-Ministro, eu próprio tive oportunidade de dizer que nos parecia que não é sob a influência de situações emocionais deste tipo que esta questão deveria ser discutida.
Repito, portanto, que o Partido Popular se associa ao voto veemente de protesto pelo que se passou na esquadra da GNR em Sacavém, ao voto de pesar por mais uma vida humana perdida nestas circunstâncias, mas acrescenta um lamento profundo pelo comportamento das bancadas do PS e do PSD relativamente a esta matéria.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, suponho que é esta a altura apropriada para exercer o direito de protesto, a que V. Ex.ª aludiu há pouco, em relação à intervenção que acaba de ser produzida.

O Sr. Presidente: - O momento é esse mesmo, Sr. Deputado.
Tem a palavra.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, lamentamos que a última intervenção tenha sido feita nos termos em que o foi porque entendíamos que tinha sido positivo o facto de termos reunido ontem a assinatura de todos os partidos com vista à aprovação unânime do presente voto. Tomámos essa iniciativa e fizemo-lo precisamente para conseguir o mais completo consenso que fosse possível, naturalmente sem prejuízo do pensamento próprio de cada partido, em torno do repúdio de um acto que é bárbaro em si mesmo e em relação ao qual a condenação unânime é um bom incentivo pedagógico e uma manifestação política de que esse tipo de acto não tem guarida em nenhuma bancada desta Casa. Esse trunfo, esse capital de reconhecimento institucional é importante que não seja dissipado e, sobretudo, Sr. Deputado Silva Carvalho, é importante que não seja dissipado pela tentação fácil de fazer a pior das políticas que é a chamada chicana que se faz contra a pseudo chicana: o político que faz política criticando os políticos.
Esse vício do político que faz política, criticando os políticos e dizendo que o bom político é aquele que faz política dizendo que não faz política é um método detestável de fazer política.

O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Está sempre a fazer confusão!

O Orador: - Mais ainda, Sr. Deputado, é uma coisa que, nesta matéria, não tem qualquer cabimento.
Sr. Deputado, repare no conteúdo deste voto de protesto que V. Ex.ª subscreveu: ele implica o repúdio deste tipo de actos; ele saúda o conjunto de medidas que foram tomadas; ele aponta para a responsabilização de quem tiver de ser responsabilizado; ele assume o compromisso de aprovação de medidas contra os abusos de todo o tipo; ele apela à participação dos cidadãos; ele pronuncia-se contra o interrogatório ilegal de detidos. E tudo isto deveria ser património de todos nós.
Ora, V. Ex.ª não pode impedir os partidos, todos nós, de decidirmos aqui e discutirmos livremente um aspecto que, neste domínio, nos separou. O Sr. Deputado Guilherme Silva lançou acusações totalmente despropositadas contra esta bancada e nós refutámo-las por imperativo de verdade e de idoneidade, porque sempre, no passado, nos demarcámos deste tipo de actos e sempre nos batemos para podermos fazer, em democracia, rigorosamente o mesmo que estamos a fazer aqui, neste momento. Sr. Deputado, isto não deveria merecer-lhe qualquer censura, pelo contrário deveria merecer-lhe aplauso porque essa divergência é natural, mas mais importante ainda é o consenso sobre estas medidas a que o Sr. Deputado adere. Ou quer dissociar-se delas agora?

O Sr. Presidente: - Antes de prosseguirmos, recordo aos Srs. Deputados que assistem hoje à sessão 18 alunos da Escola Preparatória de Santa Comba Dão, 125 alunos da Escola EB 2/3 Vieira da Silva, de Carnaxide, 50 alunos da Escola C+S Dr. António de Sousa Agostinho, de Almansil, 30 alunos da Escola Secundária de Patrício Prazeres, de Lisboa, 50 alunos da Escola Secundária Barbosa du Bocage, de Setúbal, e 20 alunos dos Estudos de Formação Profissional Santos Silva, de Setúbal.
Saudêmo-los, até porque muitos deles vieram de longe.

Aplausos gerais, de pé.

Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Silva Carvalho para um contra protesto.

O Sr. Silva Carvalho (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, não percebeu o conteúdo da minha intervenção ou, melhor, fingiu que não percebeu, algo em que também é hábil - aliás, reconheço-lhe essa habilidade. No entanto, permita-me que lhe diga que ao classificar de bárbaro este acto com a veemência com que o fez ...

O Sr. José Magalhães (PS): - É a verdade!

O Orador: - ..., como se nós não o classificássemos também assim, praticou rima habilidade quase ilegítima.
Subscrevemos este voto e tudo o que cá está escrito e vamos votá-lo favoravelmente - é óbvio, Sr. Deputado! -, mas isso não impede que, no exercício da tal liberdade democrática, eu manifeste o meu desacordo pelo facto de, a este propósito, o PS e o PSD se digladiarem desta maneira.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva igualmente para um protesto.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Silva Carvalho, quis o acaso que a ordem de inscrições para intervir sobre este voto de protesto tenha determinado que o primeiro orador fosse o Sr. Deputado José Magalhães.
Ora, Sr. Deputado, se o seu grupo parlamentar tivesse sido visado, ofendido e atacado da forma como o Sr. Deputado José Magalhães o fez relativamente à minha

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bancada, pergunto-lhe se não responderia a esse ataque. Como referi, o primeiro a fazer uma intervenção acerca deste voto de protesto foi o Sr. Deputado José Magalhães, o qual teve o comportamento que se viu, mau grado perante o protesto que lhe dirigi ter procurado fazer o papel de «virgem ofendida» que as suas barbas contrariam, tendo-me imputado a iniciativa de acusações dirigidas à bancada do Partido Socialista. Mas as actas registam que foi exactamente o contrário ...

O Sr. José Magalhães (PS): - As actas registam o que eu disse! Tenho-as aqui comigo!

O Orador: - Ou seja, a propósito da sua intervenção sobre o voto de protesto em apreço, o Sr. Deputado José Magalhães atacou a bancada do PSD.
Assim, Sr. Deputado Silva Carvalho, peço-lhe imensa desculpa mas não lhe assiste o direito de censurar a liberdade que os partidos devem ter de, em sede do debate parlamentar, terem direito de réplica e de resposta às acusações que lhes são dirigidas. Portanto, tenho de protestar pela circunstância de V. Ex.ª, a propósito desta matéria, entender ser censor das intervenções dos restantes grupos parlamentares, o que, manifestamente, não lhe fica bem.

O Sr. Presidente: - Para fazer um contra protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Carvalho.

O Sr. Silva Carvalho (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, penso que o tom da sua intervenção me serve como um pedido de desculpas.
Muito obrigado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira para pronunciar-se sobre o voto de protesto em apreciação.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também nós queremos associar-nos, clara e seriamente, a este voto de protesto por um crime hediondo, fosse ele praticado por quem fosse, muito mais ainda tendo sido praticado por alguém que deveria ser um garante da segurança dos cidadãos.
Ao manifestarmos de forma clara e séria este nosso protesto, consideramos inadequado que se aproveite um voto deste tipo para se fazerem declarações políticas de natureza e carácter de arremesso interpartidário.

O Sr. Luís Sá (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Há situações em que é lícito, justo e correcto fazê-lo, aliás, pensamos que há muitas situações nesta Câmara em que é correcto fazê-lo, mas não por altura de um voto de protesto relativo a um crime hediondo de que resultou uma vítima.
Estamos de acordo em que, tal como se diz no voto de protesto, se extraiam todas as consequências deste facto e, pela nossa parte, estamos disponíveis para fazê-lo. Já ontem aqui afirmámos, e reafirmamos hoje, que interviremos nesse sentido e, mais uma vez, chamamos à atenção de que todas as consequências deste acto não são apenas as que vêm expostas no voto de protesto mas outras que, repito, já ontem tivemos oportunidade de referir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar de Os Verdes, quero dizer que apoiamos o sentido deste voto.
É na exacta dimensão do apoio ao voto de protesto e ao que ele significa que quero pronunciar-me porque, no mínimo, parece-me de mau gosto fazer de um acontecimento tão violento e tão bárbaro quanto este um pretexto para as considerações políticas que, manifestamente, aqui não cabem neste momento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Quero, pois, dizer que me parece que este crime, que, pela sua natureza de excepcional violência, surpreendeu e atingiu em cheio a opinião pública, deve ser averiguado e, como tal, os seus responsáveis devem responder perante a sociedade.
Mas mais do que este crime e do que o carácter excepcional de que se revestiu, há questões que nos preocupam que são as dos abusos das forças policiais relativamente a violações constantes dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos pelas mais diversas razões. Hoje, estas violações constituem algo de verdadeiramente preocupante na sociedade portuguesa e julgo que será tempo de se fazer a reflexão sobre isto. É porque, quanto a nós, defender a segurança e a autoridade não tem nada a ver com a violação de direitos dos cidadãos. Pelo contrário, visa garantir, a cada momento, a salvaguarda dos direitos dos cidadãos, não podendo as forças de segurança, seja a que pretexto for, extravasar os limites exactos daquilo que a sua intervenção deve ser.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 27/VII.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Realizou-se no passado fim de semana o V Congresso da Juventude Comunista Portuguesa, no Pavilhão Carlos Lopes em Lisboa.
Presentes estiveram mais de 700 delegados, vindos de todos os distritos do País e das regiões autónomas, eleitos por toda a organização da JCP, bem como várias centenas de militantes e convidados. Estiveram ainda presentes cerca de 30 delegações internacionais, integrando jovens dos cinco continentes.
Pela primeira vez, o pavilhão dos desportos foi palco de um congresso de uma organização partidária de juventude e foi a JCP a única com a força e a audácia suficiente para o fazer.
Este Congresso começou há vários meses com a discussão preparatória em torno da análise da situação política, das linhas de intervenção para os próximos três anos, das propostas a apresentar em diversas áreas, das questões de organização e direcção. Foi um amplo espaço de discussão com dezenas de debates, reuniões e iniciativas por todo o País, donde resultaram centenas de propostas concretas, permitindo que o Congresso aprovasse um conjunto de riquíssimos documentos contendo as posições e as propostas da JCP.

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Foi também eleita a nova Direcção Nacional com uma renovação de mais de 50% dos seus membros em relação à Direcção Nacional cessante.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Passados seis meses de Governo PS, o V Congresso da JCP fez, obviamente, uma análise daquilo que tem sido a política governativa. Ficou claro que em questões fundamentais se mantêm as orientações dos anteriores Governos.
Assim é na política, económica, intimamente ligada às opções europeias. Neste campo, o Partido Socialista e o seu Governo mantém a submissão aos critérios da convergência nominal à custa do verdadeiro desenvolvimento económico e social do País. E em que afecta isto a juventude? Afecta através de um desemprego crescente, com especial incidência junto dos jovens, muitos deles à procura do primeiro emprego, ou da precaridade laboral, sentença a que estão condenados quase todos os jovens que iniciam a sua vida activa.
E como se não fosse já suficientemente grave a indiscriminada proliferação de contratos a prazo, recibos verdes, ou até trabalho sem contrato, eis que o Partido Socialista deixa mais uma marca da sua governação: a desregulamentação das leis laborais através da flexibilidade e da polivalência. Ou será que alguém tem dúvidas de que os jovens pagarão a factura agravada de mais esta benesse ao patronato e ao grande capital? Sobre esta matéria, o V Congresso da JCP aprovou, por unanimidade, uma resolução que condena esta medida e exige o seu abandono.
Outra das temáticas abordadas foi a da política educativa nas suas diversas vertentes. No ensino superior, com a rejeição liminar das apregoadas intenções do Governo e do Ministério da Educação de repor o pagamento de propinas, negando o direito ao acesso de todos os jovens ao ensino superior. Os jovens comunistas afirmam-se contra todo e qualquer princípio de desresponsabilização do Estado do financiamento do ensino superior. O investimento no ensino superior é factor indispensável do progresso económico e social, nega-lo é hipotecar o futuro do País e de milhares de jovens portugueses.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - No que diz respeito à acção social escolar, a par da diminuição do investimento em infra estruturas essenciais, como cantinas e residenciais, assiste-se a uma operação de marketing, em que o Ministério tenta dourar a pílula das bolsas-empréstimo e prefere dizer que os jovens vão passar a emancipar-se mais cedo. Será a emancipação o endividamento junto de instituições bancárias?
Do que necessitamos é de uma verdadeira acção social escolar com o reforço do número de bolsas de estudo, o aumento dos seus montantes e a construção de infra estruturas de apoio social escolar; do que precisamos é de uma verdadeira valorização do ensino politécnico, acabando com o estatuto de menoridade a que está votado; do que precisamos é de um novo estatuto para o ensino superior particular e cooperativo que defina, claramente, a sua missão e as condições de existência.
No ensino básico e secundário o Governo continua a agir como se não estivesse a ser implementada, com os resultados negativos que já se conhecem, a reforma educativa do PSD. Aliás, os estudantes viram ainda o Ministério implementar, sem auscultar os interessados, um novo regime de acesso ao ensino superior, em que tiveram de se inscrever ainda antes de lhes ser devidamente explicado.
É mais um filtro no acesso à formação superior, assente na profusão de exames e na desvalorização quase completa da avaliação contínua.

O Sr. José Calçada (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Em resposta a tudo isto, o Governo apresenta o pacto educativo, documento genérico e abstracto, em que as poucas concretizações objectivas trazem maus augúrios em relação às intenções do Governo. Não permitiremos que com o pacto se desvie a atenção dos verdadeiros problemas da educação em Portugal.

O Sr. José Calçada (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Falámos também do serviço militar obrigatório, sem complexos nem discussões facilitistas, concluindo pela necessidade de o defender não nos termos em que actualmente existe mas dignificado e inserido numa concepção de defesa nacional que não vê com bons olhos a restrição das Forças Armadas a um corpo profissionalizado, fortemente vocacionado para pseudo operações de paz, como é o caso da Bósnia.
Da toxicodependência, concluímos que é um cada vez maior flagelo social que não tem sido verdadeiramente combatido e que, necessitando de muitas medidas específicas, não se resolverá enquanto não se resolverem problemas mais vastos da sociedade.
Mas nem só de críticas e também de propostas se fez o V Congresso da JCP. Propostas de uma política económica virada para o desenvolvimento social, para o combate ao desemprego e para a defesa do aparelho produtivo; de combate ao trabalho infantil, através da fiscalização mas, sobretudo, da criação de condições sociais para que ele não prolifere; de uma educação para todos, em que se acabe com o numerus clausus no ensino superior público e com um regime de acesso em que a avaliação contínua seja factor predominante; da assunção pelo Estado do financiamento do ensino superior público conjugado com um verdadeiro investimento na acção social escolar, em infra-estruturas e apoio financeiro; de um ambiente defendido e preservado, como factor essencial à qualidade de vida, de uma sexualidade assumida com naturalidade, chamando a atenção para a necessidade de informação profusa e despida de falsos moralismos; de um verdadeiro combate à toxicodependência com medidas de prevenção concretas e dirigidas aos principais grupos de risco, bem como a criação de condições para que possa haver recuperação e reinserção social dos jovens toxicodependentes.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Propostas de um serviço militar, obrigatório verdadeiramente dedicado à formação para a defesa nacional e como um direito à participação dos jovens nesta defesa; de um associativismo forte e participado, em que seja possível a participação plena de todos os jovens como verdadeira forma de democracia participativa; da necessidade da regionalização como reivindicação antiga das populações e prevista há mais de 20 anos na Constituição.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

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O Orador: - De uma intervenção na União Europeia no sentido de um verdadeiro e harmonioso desenvolvimento económico e social e da defesa dos interesses do País e das populações, com especial atenção para a revisão do Tratado da União Europeia em curso.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A JCP sai deste Congresso mais forte, mais renovada e enriquecida, pronta a lutar, agora e sempre, pelos interesses dos jovens portugueses, na busca incessante de uma sociedade mais justa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Afonso Candal e António Galamba.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Bernardino Soares vem aqui apresentar-nos um exaustivo relato das posições e medidas saídas do V Congresso da Juventude Comunista Portuguesa, realizado no último fim-de-semana, bem como uma sempre interessante análise estatística sobre a composição do Congresso.
No entanto, pelo que aqui foi anunciado, parece-me que o Congresso da JCP mais não fez do que ratificar as já conhecidas propostas do Partido Comunista. Mas, possivelmente, e peço que me esclareça se estiver enganado, o Sr. Deputado Bernardino Soares ainda terá uma outra medida na manga, que lançará neste momento para nos surpreender pela inovação dessa mesma proposta!

O Sr. José Calçada (PCP): - A JS é de uma criatividade incrível!

O Orador: - De outra forma, o Congresso da JCP acaba por servir apenas de caixa de ressonância das propostas do Partido Comunista ...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ..., o que nos faz pensar sobre o porquê da existência da JCP, enquanto organização política, ou então, com o devido respeito, sobre o porquê da existência do Partido Comunista.

Aplausos do PS.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - No âmbito da estupidez, vai bem lançado!

O Sr. Presidente: - Havendo mais um orador inscrito para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Bernardino Soares deseja responder já ou no fim?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado António Galamba.

O Sr. António Galamba (PS): - Sr. Presidente, como é natural, esta Câmara estava expectante por saber as novidades do Congresso da JCP, mas o Sr. Deputado

Bernardino Soares desiludiu-nos, porque não nos trouxe qualquer novidade.
De qualquer modo, em relação ao serviço militar obrigatório, já que nos anunciou que a JCP, à semelhança do PCP, mantém a posição intransigente de defender o serviço militar obrigatório e, até, a sua constitucionalização, gostaria de saber se a JCP também está de acordo com algumas correntes ligadas às Forças Armadas, que vão no sentido de defender que o serviço militar obrigatório deve ter a duração de 9 meses.
Seria bom que o Sr. Deputado pudesse esclarecer a Câmara em relação à dimensão e extensão da posição da JCP nessa matéria, isto é, se está disponível para evoluir para a desconstitucionalização do serviço militar obrigatório ou, pelo contrário, se continua a defender o serviço militar obrigatório de 9 meses, que é a posição defendida pelas chefias militares.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Afonso Candal fez aqui um comentário algo sarcástico...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito!

O Orador: - ... acerca da consonância entre as posições do PCP e da JCP, pondo até em causa a necessidade da existência das nossas organizações. Fique sabendo, Sr. Deputado, que na JCP, ao contrário do que pretendem fazer transparecer, muitas vezes, outras organizações de juventude, temos muito respeito pelo partido em que estamos inseridos.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Só lhe fica bem!

O Orador: - Fique sabendo, também, que este partido onde estamos inseridos dá à JCP um protagonismo na discussão e na apresentação de propostas relativas à juventude que, julgo, dificilmente terá paralelo nos outros partidos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado, se é de originalidade que falamos - e fique sabendo que discutimos sempre com o PCP as matérias a abordar quanto às questões de juventude -, deixe-me dizer-lhe que se ser original é estar, como a JS esteve, ainda há poucos dias, ainda mais à direita do Partido Socialista, o que não é fácil, em questões tão directamente ligadas à juventude, como é o caso da antecipação da reforma das mulheres aos 62 anos ...

Aplausos do Deputado do PCP José Calçada.

..., então dispensamos esse tipo de originalidades e deixamos que sejam os senhores a tê-las!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em relação ao serviço militar obrigatório, e respondendo ao Sr. Deputado António Galamba, entendo que nesta matéria temos a legitimidade e o direito de dizer que a nossa posição é tudo menos demagógica e populista.

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Em resultado da análise que fazemos das circunstâncias que rodeiam este aspecto e de acordo com a nossa concepção de defesa nacional e de serviço militar, chegámos à conclusão que acabei de expor, posição que defendemos e justificamos sem qualquer necessidade de entrar por vias facilitistas de mera negação, sem medir as consequências, do que é hoje o serviço militar obrigatório e da relevância que tem no conceito de defesa nacional.
Já agora, para terminar, tendo em conta a falta de novidade que os Srs. Deputados apontaram à minha intervenção e à conclusões do Congresso da JCP, devo dizer-lhe que uma das grandes novidades, porque é matéria nova, é a condenação da flexibilidade e da polivalência.

O Sr. José Calçada (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Se calhar, isso não é novidade para os senhores!
Aliás, também estou ansiosíssimo, à espera das novidades que nos vai apresentar a Juventude Socialista nas conclusões do seu congresso. É que, tanto quanto me foi dado perceber pela análise do que dizem os meios de comunicação social, e ao contrário do que se faz na JCP, a discussão foi muito menos de ideias e muito mais de listas de candidatos, de protagonismos ...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - De facto, essa não é a nossa maneira de estar nem de intervir na política e na sociedade.

O Sr. José Calçada (PCP): - Há boys e «boyzinhos»!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as, e Srs. Deputados: Na sequência do seu X Congresso Nacional, não poderia a Juventude Socialista, nesta Assembleia representada por 13 Deputados, deixar de aqui dar conta das três ou quatro questões políticas mais salientes que nos ocuparam ao longo dos trabalhos.
Queria, no entanto, e em primeiro lugar, saudar a Juventude Comunista Portuguesa por ter, entretanto, reunido também o seu V Congresso Nacional.
Nos últimos anos, rompendo uma longa agonia, foi a JS que repôs as juventudes partidárias no seu lugar, incontornáveis enquanto espaços de participação dos jovens na vida política e insubstituíveis na defesa dos seus interesses e aspirações. Mas se não temos angústias existenciais em relação ao nosso papel na vida política, também reafirmamos intransigentemente unia das bandeiras que nos é mais cara: a defesa de um movimento associativo estudantil livre de tutelas partidárias ou governamentais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Tutelas que insultam a sua autonomia, ofendem a sua legitimidade, e contribuem para uma incompreensão dos partidos políticos.
Não repetiremos os erros que outros cometeram no passado, porque as organizações partidárias de juventude não são todas iguais, e queremos que a diferença se vá impondo no dia-a-dia, com a força de uma evidência, seja nas escolas secundárias, seja nas universidades, seja nas autarquias, seja na própria Assembleia da República.
Os jovens portugueses não são, para nós, uma entidade abstracta, estatística ou retórica. São aqueles cidadãos concretos que vivem hoje a sombra da desigualdade no acesso à educação, a sombra da desigualdade no financiamento dos seus estudos, a sombra do desemprego e da precaridade do emprego, a sombra de, ao fim de uma vida de trabalho, não terem a sua reforma garantida.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Como dissemos no nosso Congresso, os jovens de hoje têm a vida facilitada nas pequenas questões quotidianas, que também fazem a qualidade de vida; mas nas questões fundamentais experimentam novas dificuldades, algumas dramáticas, que as anteriores gerações desconheceram. A educação está em crise enquanto principal factor de mobilidade social, o diploma já não é garantia fiável de emprego; o emprego também não garante casa e autonomia familiar e as profissões acabaram, juntamente com os empregos para toda a vida.
É tarefa da JS fazer uma abordagem própria dos problemas dos jovens na sociedade portuguesa, mas não nos deixamos isolar no ghetto das questões ditas juvenis.
Há organizações de juventude que funcionam como verdadeiros apêndices etários dos respectivos partidos e que defendem corporativamente os jovens, como uma espécie de clientela social. A JS não é um sindicato de jovens, da JS espera-se que saiba exprimir uma visão jovem sobre problemas que, muitas vezes, não têm idade e que, fatalmente, herdaremos.
Por isso, não reconhecemos a ninguém, e já demos provas disso, o direito de decretar as fronteiras do nosso discurso político.
Por isso, elegemos uma grande causa, estruturante de toda a nossa intervenção política: a reforma do principal legado da passagem da esquerda pelo poder em Portugal, o Estado-Providência.
Temos à nossa frente um desafio de renovação em que se jogará o futuro de dois domínios fundamentais do Estado-Providência: o da segurança social e o do ensino superior público.
A situação da segurança social diz profundamente respeito aos jovens e a todas as organizações que os pretendam responsavelmente representar, pois é a retribuição do seu esforço contributivo que estará em causa no futuro, se não houver uma séria e corajosa defesa da viabilidade do sistema.
Por seu lado, o ensino superior público há muito que deixou de servir a justiça e a igualdade de oportunidades. Só a sua urgente racionalização permitirá ao sistema gerar qualidade e favorecer a democratização dos níveis superiores de ensino.
Defendemos sempre uma participação dos estudantes no esforço de financiamento de um ensino superior público de qualidade e justiça.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Defendemos um sistema de propinas, no início quase sozinhos, e contribuímos para um ambiente favorável à reforma do financiamento. Assistimos à destruição desse ambiente pelos governos do PSD, obstinados na imposição de leis injustas, que denunciámos, salvaguardando o princípio.

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O Sr. José Junqueiro (PS): - Exactamente!

O Orador: - Mantemo-nos fiéis a essa convicção: a gratuitidade que temos não traz justiça, antes reproduz a desigualdade na sociedade portuguesa. Não são os jovens de origem social mais humilde que vencem o estrangulamento do numerus clausus, a estes é dada uma opção: ou frequentam o privado, pagando propinas elevadíssimas, ou são empurrados precocemente para o mercado de trabalho, contribuindo, com os seus impostos, para pagar a gratuitidade dos outros.

Aplausos do PS.

O nosso Congresso serviu também para renovarmos a legitimidade com que vimos reclamando quer a extinção dos Tribunais Militares, com sujeição dos crimes essencialmente militares à jurisdição civil, quer o fim, definitivo, do nosso obsoleto serviço militar obrigatório trata-se de proceder à sua desconstitucionalização, seguida da respectiva extinção, em sede de lei ordinária.

Aplausos do PS.

A orientação política que saiu deste Congresso é a mesma que inspirou a participação da JS na elaboração do Programa Eleitoral do Governo do PS. Estamos, portanto, profundamente comprometidos com o Programa do Governo e com as grandes tarefas de reforma da sociedade portuguesa, todas elas com decisiva projecção no futuro.

Aplausos do PS.

Mas também prezamos a nossa autonomia política, como algo que decorre de cultivarmos um pensamento próprio, nem sempre necessariamente coincidente com o do partido ou o do Governo.
Sucede que o conceito de autonomia política varia diametralmente de uma juventude partidária para outra. Veja-se a JSD, que, pelas 11 horas da manhã, exige o regresso do PSD à Comissão Eventual para a Revisão da Constituição, sendo que, pelas 15 horas, já o PSD tomou ordeiramente assento na dita Comissão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Foi este o contributo da JSD, na elaboração do conceito de autonomia: exercitar a política do número combinado, dentro de uma margem de irreverência consentida.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Bem observado!

O Orador: - Mas se não dedico aqui uma reflexão à forma como a JCP, também ela, gere a sua autonomia política, desculpar-me-ão, mas é por evidente falta de objecto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também a JS venceu-as eleições de 1 de Outubro, ganhando novos espaços de intervenção. Temos uma importante representação parlamentar. Não é certo que uma futura reforma do sistema eleitoral seja compatível com a manutenção, por partes das organizações partidárias de juventude, de um palco parlamentar semelhante àquele de que dispomos hoje. Isso comporta, para os representantes da JS na Assembleia da República, uma estimulante responsabilidade: a de, em quatro anos, saberem deixar um rasto próprio, um legado inovador e criativo na sociedade portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, os Srs. Deputados Sérgio Vieira, Nuno Correia da Silva e Bernardino Soares.
Tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Vieira.

O Sr. Sérgio Vieira (PSD): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, em nome da JSD, quero felicitar a Juventude Socialista pela realização do seu congresso, bem como a Juventude Comunista Portuguesa. Há muita coisa que nos divide, mas, certamente, o interesse e a importância que damos à participação dos jovens na política é consensual.

Vozes do PSD e do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, mais do que um pedido de esclarecimentos, o que vou fazer é um repto, um desafio.
Como sabe, Sr. Deputado, a JSD, em 1994, teve oportunidade de apresentar aqui, na Assembleia da República, um projecto de revisão constitucional autónomo. Fomos a primeira organização política de juventude deste país a fazê-lo, voltamos a fazê-lo este ano e continuamos a ser a primeira e a única organização política de juventude a apresentar um projecto de revisão constitucional, onde expomos aquelas que são as nossas propostas, aqueles que são os nossos pensamentos e opiniões sobre o Estado que queremos em Portugal.
O projecto de revisão constitucional da JSD é complementar ao do PSD, mas é um projecto autónomo que exprime uma visão diferente sobre o que a JSD entende acerca da reforma do sistema eleitoral, acerca da simplificação e responsabilização do sistema político, acerca da clarificação da função educativa do Estado.
Em relação ao que o Sr. Deputado disse na tribuna, não quero entrar em grande controvérsia, que, de resto, o Sr. Deputado pretendia suscitar, mas quero tocar num ponto específico a que o Sr. Deputado se referiu e que tem a ver com a questão do serviço militar obrigatório.
V. Ex.ª sabe que o único projecto de revisão constitucional que existe nesta Assembleia da República que termina de vez com o serviço militar obrigatório é o projecto de revisão constitucional da JSD.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - Trata-se do único projecto de revisão constitucional que propõe um serviço militar voluntário, assente na componente profissional e de voluntariado e que termina, de vez, com o regime da conscrição.
Mas, como já disse, a minha intervenção lança um repto, um desafio: se VV. Ex.as, como nós, entendem que este serviço militar obrigatório tem de terminar, então, o repto, o desafio, o pedido que faço a V. Ex.ª e a todos os Deputados da Juventude Socialista, nesta Assembleia, é que, a bem de um anseio e de uma expectativa profunda da juventude portuguesa, se juntem à JSD e votem favoravelmente o seu projecto de revisão constitucional.

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É este o desafio que deixo aos Srs. Deputados da Juventude Socialista.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Para terminar, o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto fez menções pouco agradáveis quer à JSD, quer à JCP, nomeadamente acerca da realidade associativa.
Julgo que mais tarde, quando estivermos aqui a apreciar a Lei n.º 33/87, teremos oportunidade de debater a visão que têm do movimento associativo, mas quero dizer-lhe o seguinte: quanto a repor as juventudes partidárias no seu lugar, quanto a questões de autonomia, para nós, a autonomia face ao partido não significa desenhar bonecos ou animais em órgãos oficiais do partido.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, responde pedido a pedido ou acumula vários pedidos?

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Acumulo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero também saudar a Juventude Comunista Portuguesa, pelo congresso que realizou e pela boa participação que aqui nos relatou, e a Juventude Socialista, pelo congresso que reelegeu, como Secretário-Geral, Sérgio Sousa Pinto.
Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, recordo-me dos comícios que todas as organizações políticas de juventude realizaram nas docas de Lisboa, e que a JC - Gerações Populares ganhou, porque fez o maior ...

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - ..., e recordo-me de que, no comício de juventude do Partido Socialista, o Sr. Deputado fez três promessas aos jovens portugueses, dizendo, nomeadamente, que havia três razões objectivas para que os jovens portugueses votassem PS, uma das quais era a de que o PS iria institucionalizar a acção social para todos os jovens estudantes, fossem eles do ensino privado ou do ensino público.
Sr. Deputado, pergunto: qual foi a medida legislativa, qual foi o projecto de lei que a JS apresentou nesta Câmara, no sentido de abranger ou integrar os estudantes do ensino privado no âmbito da acção social escolar, a que também têm direito, pois também pagam impostos?
Sr. Deputado, não basta ter muitos Deputados, o que conta são as iniciativas legislativas e a eficácia do nosso trabalho, porque a representatividade da juventude que queremos significar, essa, é aferida ou apreciada por aquilo que fazemos e não pela quantidade de Deputados que temos.
Por outro lado, Sr. Deputado, o desemprego continua a aumentar, sobretudo na camada dos mais jovens, e a única contribuição que a Juventude Socialista deu para o combate ao desemprego foram os 13 Deputados que tiveram assento nesta Assembleia e que, naturalmente, fizeram baixar o índice.

Risos do CDS-PP e do PSD.
Protestos do PS.

O Sr. António Braga (PS): - Não diga isso! Isso é muito feio!

O Orador: - Não houve um projecto de lei, não houve uma palavra da bancada desses 13 Deputados, não houve uma medida, não houve uma ideia para combater esse flagelo, que é vivido hoje, diariamente, por todos os jovens portugueses.
Por isso, Sr. Deputado, não bastam as palavras, não basta sermos muitos, é preciso apresentar soluções, é preciso desenvolver acções.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Campanha eleitoral!

O Orador: - Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, falemos de propinas. Sei que o seu pensamento, não de hoje mas de há alguns anos a esta parte, porque já o conheço há algum tempo, está em conformidade com o pensamento da JC - Gerações Populares. Entendemos que existe um proveito para aqueles que frequentam o ensino superior, ao qual deve corresponder também um dever de pagamento de uma contribuição financeira a que se chama propina. Mas, Sr. Deputado, onde está o projecto de lei da Juventude Socialista para a questão das propinas? Eu votei com a bancada do Partido Socialista a suspensão das propinas, porque o diploma antigo tinha inúmeras injustiças, mas não vejo onde está, da parte da bancada da Juventude Socialista, com 13 Deputados, o projecto alternativo. Onde está a alternativa da Juventude Socialista?
Sr. Deputado, os jovens precisam destas respostas e esperam-nas de nós, que estamos aqui a representa-los.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, depois dos pedidos de esclarecimento que, há pouco, a vossa bancada me fez, fiquei ansiosíssimo pelas novidades do congresso da Juventude Socialista, mas, pelos vistos, as novidades não são muitas. Não falo daquele que vai sendo um característico desrespeito pelo associativismo e pelos dirigentes associativos com que o Sr. Deputado normalmente se posiciona, mas quero dar-lhe os parabéns pela descrição correcta do quadro social que existe hoje na nossa sociedade e em que o Partido Socialista tem também responsabilidades, herdando, como é evidente, algumas coisas do passado.
Sr. Deputado, gostaria que me dissesse se quando fala no fim das carreiras e no problema em que se traduz o fim das carreiras se está a referir à questão da polivalência, que já foi aprovada, na generalidade, na Assembleia da República, e está em discussão na comissão especializada, e se a preocupação da Juventude Socialista com o fim das carreiras irá levar à tomada de alguma atitude em relação a essa proposta de lei.
O Sr. Deputado falou também do Estado-Providência, como objectivo de análise fundamental da Juventude Socialista nos próximos anos, referindo-se, nomeadamente, à segurança social e ao ensino superior público.
O Sr. Deputado já disse aqui, várias vezes, nesta Câmara, aquando da grande contestação social que o pagamento de propinas gerou, que a JS sempre foi contra

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as leis das propinas existentes e não contra o princípio do pagamento das propinas. Devo dizer-lhe; aliás como já disse noutras ocasiões, que, se, de facto, era essa a sua opinião e a opinião da Juventude Socialista, expressavam-na tão baixinho, tão baixinho - com certeza, por opção -, que não se conseguia ouvir nem distinguir uma coisa da outra.
Mas quero questioná-lo mais especificamente em relação às questões da segurança social. É que, Sr. Deputado, voltando ainda à questão da antecipação da reforma das mulheres, quando se nega e se vota contra um projecto de lei que antecipa a reforma das mulheres - o qual mereceu, inclusive, o apoio do Partido Socialista na última legislatura -, com base em argumentos de lógica contabilista, repito, de lógica contabilista, como foi aqui dito, está a fazer-se aquilo que considero uma coisa gravíssima, que é a negação dos sentimentos e da generosidade característicos da juventude, bem como da solidariedade entre as várias gerações, que é, e sempre foi, apanágio da juventude, concretamente da juventude portuguesa.
Por último, o Sr. Deputado referiu-se a algumas juventudes como meros apêndices dos partidos políticos, mas devo dizer-lhe que, nesta situação, mais do que um «apêndice», a JS é um «inchaço».

Vozes do CDS-PP: - Violento!

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, dispondo para o efeito de 5 minutos, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sérgio Vieira, muito obrigado pelas questões e pelo repto que teve a amabilidade de me lançar.
Devo dizer-lhe que a Juventude Socialista não apresentou um projecto próprio de revisão constitucional, pela circunstância simples de que fez constar as suas propostas no projecto do Partido Socialista, que as acolheu. Portanto, as propostas da JS valem 112 votos e as vossas valem apenas 3. Esta é a questão fundamental nesta Assembleia.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, estou disponível para o número conjunto que nos sugeriu em matéria de extinção do serviço militar obrigatório. Se a JSD precisar dos nossos votos para fazer aprovar a proposta de extinção, expressa na Constituição, do SMO, votaremos convosco, Sr. Deputado!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Grande vitória!

O Orador: - Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, quando fizer uma interpelação séria sobre emprego, terá uma resposta por parte da Juventude Socialista.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em matéria de acção social, se o Sr. Deputado tem informações, que não trouxe a esta Câmara, respeitantes às intenções do Governo nesta matéria e contraditórias com as que temos, que são públicas, que são claras e que são no sentido de alargar progressivamente a acção social aos estudantes do ensino superior privado, como aliás já vem acontecendo, peço-lhe que as traga à Câmara, se forem inovadoras, de forma a contribuírem para o nosso esclarecimento e para o cabal esclarecimento da opinião pública nesta matéria.
Foram tomadas medidas legislativas nesta matéria, o Governo tem avançado no sentido do alargamento progressivo da acção social escolar aos estudantes que beneficiam e que frequentam o ensino superior privado. O Sr. Deputado não tem qualquer razão para a angústia que, repentinamente, tomou conta de si nesta matéria.
Sr. Deputado Bernardino Soares, tenho alguma dificuldade em responder às questões que me colocou, pelo cinzentismo, pelo cansaço com que venho há longos meses a ouvir rigorosamente o mesmo, sem ponta de arejamento, de originalidade e de diferença. Tenho a consciência que os meus camaradas do PS, que têm neste momento 40 anos, há 20 anos atrás respondiam precisamente o mesmo aos camaradas da JCP. Devo confessar um cansaço particular em responder às questões que me colocou.

O Sr Ruben de Carvalho (PCP): - Tão jovem e já cansado!...

O Orador: - Respeito a sua organização pelo trabalho que desenvolve, pelo contributo que dá ao protagonismo da intervenção política juvenil na sociedade. Merece-me o respeito, toda a consideração e mesmo a estima da JS, mas é também uma organização silenciosa, clandestina...

Vozes do PCP: - Clandestina?...

O Orador: - ..., empenhada constantemente num trabalho de colonização do movimento associativo, na qual, aliás, tem também recebido o estímulo da JSD, sempre empenhada na mesma política colonizadora e tutelar do movimento associativo...

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Dessa conversa é que já estou cansado!

O Orador: - ..., mas, de resto, pouco ou nada tem sabido acrescentar ao debate político juvenil.
Por outro lado, Sr. Deputado, ninguém falou no fim das carreiras, mas, sim, no das profissões.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É igual!

O Orador: - Qualquer jovem, hoje em dia, sabe que, ao longo da vida, vai ter de mudar várias vezes de emprego e desempenhar actividades completamente diferentes. Sr. Deputado, o fim das profissões no sentido tradicional, na acepção principal do termo, não é o fim das carreiras.
O Sr. Deputado lançou também algumas questões respeitantes à segurança social, falou, nomeadamente, da sua preocupação e especial sensibilidade à questão da solidariedade intergeracional. Devo dizer-lhe que não pomos em causa a solidariedade intergeracional! É óbvio que os jovens de hoje financiem o sistema que paga as reformas dos actuais reformados. Essa questão não se põe nem ninguém a contesta, só que a solidariedade intergeracional também funciona ao contrário, e os mais velhos hoje em dia não se podem demitir de pensar, de equacionar e de se preocupar com a viabilidade e com o futuro da segurança social. E isso também é solidariedade intergeracional!

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - O Sr. Deputado perdoar-me-á mas não poderia concluir a resposta à sua interpelação sem saudar, uma vez que a Juventude Comunista Portuguesa não tem autonomia política que justifique a existência de um secretário-geral próprio - o que é público e notório -, a recondução do secretário-geral da JCP, o sempre jovem camarada Dr. Carlos Carvalhas, que continua a ser o Secretário-Geral conjunto do PCP e da Juventude Comunista, porque esta não tem autonomia política, não tem pensamento político próprio, distinto do partido e, portanto, não se justifica que tenha também uma liderança própria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Bernardino Soares pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Para exercer o meu direito de protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, quero, sob a forma de protesto, dizer ao Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto que as questões de orgânica interna de cada organização e de cada juventude partidária a ela devem dizer respeito. Além disso, na minha organização, tendo havido um debate, como aliás há em todas as questões sobre os modos de organização, inclusive sobre a necessidade ou não, a nossa concordância ou não, com a existência desse tão necessário para V. Ex.ª cargo de secretário-geral, decidimos, com a esmagadora concordância dos delegados ao nosso congresso, que não se justificava esta existência. E mais, que o nosso modo de funcionamento muito assente na discussão colectiva, no espírito de trabalho de grupo e no contacto permanente com os jovens, com os militantes de base e com toda a organização, não necessitando desta figura tão necessária para outras organizações, não se coadunava com ela. Portanto, em consciência, decidimos pela não inclusão dessa figura, não inclusão essa que tanto preocupa as outras juventudes partidárias.
Já agora deixe-me dizer que registo como um elogio, porque tenho a certeza que assim foi, o facto de o Sr. Deputado encarar o Secretário-Geral do PCP, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, como um dirigente partidário com uma postura e um espírito abertamente jovem, facto com que me congratulo, e espero que tenha a mesma opinião em relação aos dirigentes partidários do seu partido.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Ah, mas é verdade o que disse o Sérgio!?

O Sr. Presidente: - Para contra protestar, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, admito a possibilidade de, porventura, não ter interpretado correctamente as suas palavras, mas o que me pareceu foi que veio aqui reconhecer o estatuto político menor da Juventude Comunista Portuguesa por não ter um secretário-geral na qual se identifique a actual organização e que protagonize um discurso para si próprio.
O que a Juventude Comunista Portuguesa não tem na sociedade portuguesa, ao fim de 20 anos de reflexão colectiva, é uma ideia própria que justifique a existência de uma liderança e de uma organização com uma identidade própria, distinta do PCP.
Como não tem, Sr. Deputado Bernardino Soares, a pergunta é simples: qual é a utilidade política, qual é o interesse político para os portugueses na existência de uma Juventude Comunista Portuguesa? Qual é o apport, qual é a mais valia que a JCP traz à sociedade portuguesa no âmbito político? Qual é, Sr. Deputado? Não é nenhuma!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Isso é a sua interpretação!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar ao tratamento de assuntos de interesse político relevante.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Paulo Neves.

O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: Seis meses passados sobre a tomada de posse do XIII Governo Constitucional e já se afirmou evidente uma nova forma de estar na política e de exercer o poder.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Governo da nova maioria, liderado pelo Engenheiro António Guterres, tem vindo a alterar uma postura que cultivava a distância e a arrogância do poder, substituindo-a pela acção em diálogo, de forma serena mas convicta, descomprimindo a relação com as pessoas e com os diversos agentes da sociedade.
É assim que, quem esperava que a acção do Governo a seguir às eleições se resumisse à gestão de projectos e à situação herdados do anterior rapidamente percebeu que este Governo tem, claramente, um projecto para Portugal. Um projecto que, afinal, foi assumido com os portugueses, que recebeu o seu apoio e que, agora, está a ser executado, sem frenesim mas com segurança e estabilidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sem demagogias, defendendo os interesses nacionais, a nova maioria tem vindo, de forma clara e certeira, a concretizar as suas promessas eleitorais em tempo muito mais breve do que alguma vez pensaram os que lhe lançaram as maiores dúvidas sobre as capacidades de execução das políticas que nos propusemos.
Seja na área dos transportes, seja na da educação ou na da administração pública, nó desenvolvimento regional ou na relação com a comunidade e na afirmação de Portugal no mundo, este Governo já provou ser muito mais capaz do que o maior partido da oposição pretende, sem êxito, fazer crer, obrigando-se a todas as posições tácticas, que resultam sempre na demonstração das suas próprias incapacidades de se constituir como uma oposição credível e construtiva para ultrapassar uma conjuntura que contribuiu significativamente para se instalar na sociedade portuguesa.
Se esta é uma evidência no panorama político nacional, torna-se ainda mais profunda quando o Governo decidiu, desde já, portanto arredado de quaisquer critérios eleitorais, assumindo as dificuldades que perpassam os diversos sectores da sociedade e das diferentes regiões do País,

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deslocar-se, indo ao encontro dos destinatários das suas políticas, preparando em diálogo as melhores opções necessárias à resolução dos problemas das pessoas e assumindo frontalmente as acções a implementar.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - No passado fim de semana, tivemos mais uma oportunidade, neste caso no Algarve, de ouvir as críticas e sugestões dos pescadores de Olhão a Portimão, dos agentes turísticos e empresariais regionais e ainda dos autarcas e das populações em geral, que se exprimiram em defesa dos seus interesses em particular, mas tendo em conta a defesa desta região e, portanto, do País.
É para isto mesmo que o Primeiro-Ministro decidiu governar em diálogo, adoptando as medidas necessárias que interessem às pessoas e ao seu desenvolvimento e não aquelas que possam ter mais impacto na, opinião pública e que, pretensamente, dirigidas a este ou a outro grupo de cidadãos, não cheguem, afinal, a atingir os objectivos que se propõem.
O Governo assumiu e calendarizou de forma clara as principais acções para o Algarve, no domínio das infra estruturas de transportes rodo e ferroviário, aéreo e marítimo, uma opção de evidente desenvolvimento regional integrado. Uma opção que sirva a afirmação do futuro da região, não só dando-lhe mais condições para o crescimento da sua componente turística, mas possibilitando a diversificação coerente da sua base económica e produtiva, criando um novo quadro de envolvimento dos agentes públicos e privados na potenciação dos recursos e das capacidades do Algarve.
O arranque da auto-estrada e a conclusão da via longitudinal podem ser os exemplos mais conhecidos, mas muitos outros são agora assumidos como fundamentais nesta estratégia, seja o desenvolvimento e a protecção florestal, a adequação dos sistemas de incentivos à especificidade da região, a segurança quanto ao abastecimento de água às populações, seja uma política correcta de adequação de portos marítimos a actividades de recreio e da pesca, que são pontos convergentes da integração destes compromissos, os quais constituem, de forma evidente, a vontade de promover concorrencialmente a região, face a um quadro de competição acelerada e diversificada no contexto comunitário.
Porque, ao invés dos que pensam no Algarve como uma região privilegiada, de facto, além do sol e da praia e das suas gentes, o Algarve não tinha tido até agora a possibilidade e as infra estruturas necessárias para alterar a sua estrutura económica sem um porto comercial adequado e acessos que facilitem o fornecimento de matérias-primas e o escoamento de produtos acabados. E talvez por isso mesmo os agentes empresariais pouco tenham privilegiado, esta região com os seus investimentos.
Esperamos a alteração desta situação em breve, acrescido pela modernização da ferrovia e da redução dos custos energéticos com a desejada ligação da rede de gás natural ao Algarve.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Afinal, o que se vislumbra agora para o Algarve é um exemplo coerente da actuação política deste Governo, do desenvolvimento integrado que se pretende para as diferentes regiões do País, orientando os recursos nacionais e colocando-os ao serviço de uma estratégia de afirmação das nossas capacidades, enquanto cidadãos activos na concretização do nosso futuro.
Trata-se de um Governo que dialoga mas que actua sabendo assumir e concretizar os compromissos, como o tem feito até ao momento. O que se espera de todos nós é que saibamos encarar as nossas responsabilidades e a participação neste projecto nacional.
Partilhar o poder político com os cidadãos não é uma benesse, é parte deste projecto. Assumir a sua participação na gestão dos seus problemas e nas acções que lhes dêem satisfação não pode ser encarada como uma mera concretização de mais uma promessa eleitoral, mas, sim, como uma necessidade e uma visão de futuro para a vida da nossa sociedade que temos de saber assumir.
Neste caso, o que o PSD tem de assumir é aceitar que este projecto de sociedade não é pior por ser encarnado convictamente pelo PS mas, sim, porque é o melhor para Portugal. Foi aquele que os portugueses votaram!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Vairinhos.

O Sr. António Vairinhos (PSD): - Sr. Deputado Paulo Neves, em primeiro lugar; gostaria, como Deputado eleito pelo círculo de Faro, futura região do Algarve ...

Aplausos do PS.

Agradeço os aplausos do PS, mas como o meu tempo é limitado, solicito que isto seja descontada, Sr. Presidente.
Dizia eu que, como Deputado eleito pela futura região do Algarve, gostaria de referir que é sempre com muito gosto que ouço nesta Câmara levantarem-se questões que se prendem, efectivamente, com o desenvolvimento da nossa região, pelo que me congratulo e o quero felicitar.
No entanto, gostaria que o Sr. Deputado tivesse trazido á esta Câmara algo de novo, porque, tirando a demagogia linguística utilizada pelo PS, nada é novo e V. Ex.ª terá oportunidade de consultar as actas desta Assembleia para verificar que, durante os últimos anos, todos os projectos de que hoje aqui veio falar e todas as questões que abordou - desde o desenvolvimento regional integrado à diversificação da base económica e produtiva - têm sido alvo, por parte dos Deputados do PSD, de intervenções nesta Câmara.
Mais: o Sr. Deputado, em termos de programação de acções, não traz nada de novo. Todas as obras que aqui referenciou, e que até parece que apareceram só após a visita do Sr. Primeiro-Ministro, no último fim de semana, ao Algarve, são obras que estavam previstas e programadas no PIDDAC, desde o arranque da auto-estrada, à VLA, ao abastecimento de água - cujo sistema, como sabe, está a ser desenvolvido, e o Beliche, que constitui um grande investimento de mais de 40 milhões de contos, está praticamente concluído -, à ligação à ETAR de Tavira, etc., são tudo projectos que vêm dos 10 anos de governação social-democrata.
Ora, tudo aquilo que aqui referenciou e que mencionei, assim como as docas de recreio e outro tipo de aproveitamentos, são obras programadas' pelo governo social-democrata.
O Sr. Deputado conhece bem a situação e se tem dúvidas pode consultar o PIDDAC de 1995, como o de 1994, etc. Portanto, não vejo que tenha acontecido essa viragem que anunciou, como não vejo qualquer inversão estratégica em termos de modelo de desenvolvimento.

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Assim, gostaria que, para além daquilo que veio aqui referenciar, que não é nada de novo, repito, relativamente ao que foi programado e ao desenvolvimento integrado, dizendo que o Governo ia apostar em modelos de diversificação, por exemplo, no desenvolvimento do interior, que vinha a seguir ideias e programas que estavam a ser levantados no sentido de corrigir as assimetrias intra-regionais entre o litoral, o barrocal e a serra, nos dissesse mais. Mas o Sr. Deputado falou apenas num conjunto de acções programadas e, por azar, só falou de obras ligadas ao litoral. Portanto, falou em desenvolvimento integrado mas utilizou essa linguagem só para obras no litoral, como se o objectivo do PS não fosse o desenvolvimento integrado mas o aumentar as assimetrias intra-regionais.
Finalmente, sobre turismo, o PS há seis meses que não toma uma medida sobre este sector. Os empresários estão em pânico, os investidores estrangeiros chegam a Portugal, nem desfazem as malas e vão-se embora. Os senhores não ratificaram a lei hoteleira, estão a prejudicar o sector e este ano está a prever-se que seja um mau ano turístico pela fraca promoção que foi feita pelo Governo socialista e pelo facto de não ter permitido que a legislação sobre esta matéria avançasse.
Sr. Deputado, a situação é preocupante. É este o desenvolvimento integrado que os senhores pretendem para o Algarve? Isto é muito mau par os algarvios!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves, para responder.

O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Vairinhos, a diferença entre este Governo e o seu governo é que os senhores tiveram 10 anos para fazer e aproveitaram-nos para anunciar, e nós, nos primeiros seis meses, necessariamente, apenas anunciámos aquilo que vamos fazer de imediato.
Não foi este Governo que bloqueou a continuação da Via do Infante até Lagos, foi o seu governo, que fez apenas 50% dessa Via, até à Guia. O resto, somos nós que o vamos fazer e não o seu governo, que teve 10 anos para o concretizar!

Aplausos do PS.

Relativamente à auto-estrada para o Algarve, está também enganado porque ela não existe mas vai existir até 1999, tendo sido anunciada, com muito orgulho, pelo Governo do PS, através do Ministro João Cravinho. E ela vai ser feita, como certamente sabe, partindo de norte para sul, até Grândola, e, ao mesmo tempo, de sul para norte, para vencer precisamente a parte mais difícil do acesso ao Algarve, constituída pela serra algarvia, onde o Sr. Deputado passa todas as semanas, pelo que devia reconhecer este esforço de integração e de calendarização do actual Governo.
Uma das coisas que os senhores fizeram, e muito bem, mas que não conseguiram suportar, pelo que tivemos de ser nós a arranjar soluções, foi o Matadouro Regional do Algarve. Sr. Deputado, foi este Governo que teve de interferir para que o matadouro não fechasse e para que os produtores de gado desta região não tivessem de ir abater o seu gado ao matadouro de Beja, que é o que fica mais próximo. O seu governo fez este matadouro, mas as dívidas ficaram para este assumir; durante dois anos não se fez representar no conselho de administração, embora detendo a maioria do capital social daquela sociedade anónima.
No que se refere à programação e promoção do turismo algarvio, devo dizer-lhe que essa é, precisamente, a única competência da Região de Turismo do Algarve, e os senhores e o PCP manipularam-na de tal maneira que os vossos representantes naquele importante órgão regional têm feito a promoção que se conhece. O turismo algarvio, até agora, tem sido promovido, a nível internacional, juntamente com os sapatos e os têxteis do norte - é tudo ao molho! Sendo o turismo algarvio tão importante para a economia nacional, foi essa a importância que lhe atribuíram durante os 10 anos que estiveram no governo!
Sr. Deputado, falou em desenvolvimento integrado e no desenvolvimento do interior do Algarve, mas em 1994 e em 1995 o seu governo apenas destinou 2% das verbas disponíveis para a formação profissional e empresarial do País para apoiar os algarvios e o desenvolvimento do tecido empresarial desta região. Foi apenas de 2% a importância que o vosso governo deu ao Algarve, em matéria de apoio à formação profissional dos algarvios! Foi essa a importância que os senhores lhes atribuíram, mas não será essa a importância que este Governo e o PS vão dar ao Algarve, e se ler os jornais verá os compromissos que assumimos agora, não na altura das eleições mas seis meses depois da tomada de posse do Governo. É isso que nos faz orgulhar e foi por isso que produzi a minha intervenção.

Aplausos do PS.

O Sr. António Vairinhos (PS): - Peço a palavra para defesa da consideração, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Dado que chegámos ao fim do debate e porque presumo que se refere à sua consideração pessoal, faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Vairinhos (PSD): - Sr. Presidente, efectivamente, houve um conjunto de afirmações feitas pelo Sr. Deputado Paulo Neves que, talvez por ser novo nestas «andanças» ...

Protestos do PS.

Quem costuma utilizar faltas de respeito e linguagem desapropriada, a começar pelo cimo, não é o PSD mas o PS.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - O senhor é que faltou ao respeito!

O Orador: - Sr. Deputado, gostaria de o esclarecer sobre o seguinte: o Sr. Deputado desconhece completamente, tenho de o dizer, as obras que foram feitas nos últimos 10 anos e desconhece como funciona um conjunto de coisas.
Por exemplo, o Sr. Deputado falou na promoção do turismo algarvio mas não sabe que a competência de uma região de turismo, seja ela qual for, é a promoção a nível interno, como não sabe também que o Algarve é essencialmente um destino de turismo externo, competindo ao ICEP fazer a sua promoção. Por outro lado, desconhece também que as verbas do ICEP foram reduzidas num milhão de contos, que agora andam a tentar repor.

O Sr. Paulo Neves (PS): - Sei isso muito bem!

O Orador: - Então, se sabe, não foi isso que disse, enganou-se!

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Depois, o Sr. Deputado, que critica a mistura das batatas com o turismo, sabe muito bem que o PS pretende incluir a promoção do turismo no âmbito de IAPMEI, do apoio à pequenas e médias empresas.
O Sr. Deputado sabe também que, em desrespeito total pelo Algarve e, inclusivamente, pela maioria dos autarcas do seu partido, o Governo, quando dizia que pretendia uma política horizontal de promoção do turismo, pensando-se assim que a Secretaria de Estado do Turismo poderia ter um maior papel, juntou-a à do Comércio, criando uma Secretaria de Estado do Comércio e Turismo, estando todos os algarvios, desde empresários aos próprios socialistas e representantes da região, contra isto, pois acham que é um desprestígio.
É esta a grande aposta do Governo socialista no desenvolvimento do Algarve?! Sr. Deputado, não nos jogue areia para os olhos! Já houve um tempo em que vocês diziam que andavam a jogar areia para os olhos das pessoas, não tente isso comigo que eu conheço bem a minha região, tanto nas funções que tinha antes de ser político como agora, depois de o ser, nesta Câmara.
O Sr. Deputado disse que não houve apoio a empresas. Porém, o Sr. Deputado fez parte de um projecto: a criação do nicho de empresas, pelo qual era o principal responsável, e julgo que ainda é, tendo agradecido muito e reconhecido o mérito do governo anterior por ter apoiado esta iniciativa.
Sr. Deputado, como está mudado! Por amor de Deus, no mínimo tem de haver coerência! E deixe-me dizer-lhe, como Deputado eleito pelo Algarve, que já aqui tivemos muitos debates, com dignidade e elevação, em prol do desenvolvimento do Algarve e da unidade dos Deputados da minha região e espero que continuemos a tê-los, pois por muito que se tenha feito nos governos do PSD muito há ainda a fazer - lembro que, quando os governos PSD tomaram posse, o distrito de Faro, em termos de PIDDAC, estava na cauda dos distritos do continente, tendo chegado, depois, a estar em terceiro lugar, inversão que se deve aos governos do PSD.
O Sr. Deputado conhece bem esta situação, pelo que se quiser debater estas questões, agradeço-lhe que faça com elevação e na defesa dos interesses da nossa região, que é isso que aqueles que votaram tanto em nós como em vós pretendem, não camuflando as verdades.
É este o apelo que lhe deixo: defenda os interesses da região e eu estarei a seu lado!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não me levem a mal que lhes peça o favor de me ajudarem a reconduzir, a figura da defesa da honra à sua finalidade regimental pois estamos a banalizá-la.
Por mais boa vontade, não consegui ver como é que o Sr. Deputado defendeu a sua honra pessoal nos assuntos que referiu. Não me leve a mal, mas talvez o protesto fosse mais adequado. Não devemos abusar da figura de defesa da honra quando, de facto, ela não esteve de modo nenhum em causa.
Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves.

O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Vairinhos, tenho muita honra em ser novo nestas «andanças», mas já o conheço há oito anos e ainda bem para o Algarve que isso acontece e que o senhor anda nestas «andanças» há muito tempo. Porém, durante esse tempo, infelizmente o Algarve não mereceu a atenção que devia ter merecido.
Relativamente à promoção da região, é evidente que sei que é o ICEP que faz a promoção do turismo nacional, e também do Algarve, mas também sei que é a Região de Turismo do Algarve que a paga, através do seu IVA turístico, tendo sido o seu governo a entender que assim seria.
Sr. Deputado e caro conterrâneo, é evidente que em relação ao nicho de empresas; enquanto responsável, que fui mas já não sou, por uma associação empresarial do Algarve, reconheci a importância dessa infra-estrutura na região. Quando é de justiça, reconheço-o, mas quando entendo criticar também tenho todo o à-vontade para o fazer, e neste caso referi-me àquilo que os senhores, afinal, não fizeram e deveriam ter feito pelo Algarve nos últimos 10 anos.
De qualquer modo, relevo tudo isto ao ter ouvido da sua boca que vamos ter a região administrativa do Algarve. Não sei é onde é que o Sr. Deputado e os outros Deputados algarvios estavam no passado dia 2 de Maio!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia, tendo já ultrapassado largamente o limite de uma hora e meia consignado, pelo que o Sr. Deputado Correia de Jesus fica inscrito para intervir no próximo período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 20 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Do período da ordem do dia consta a discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 27/VII - Estabelece o princípio a que deve obedecer o regime de recrutamento e selecção de directores de serviço e chefes de divisão para os quadros da Administração Pública e dos projectos de lei n.os 115/VII Alteração do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro (Revê o Estatuto do Pessoal Dirigente da Função Pública) (CDS-PP) e 158/VII - Altera o Estatuto do Pessoal Dirigente (PSD).
Para apresentar o projecto de lei do CDS-PP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço desculpa por ter solicitado esta interpelação à Mesa no momento em que deu a palavra à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, mas a questão tem a ver com a deliberação que foi aprovada sobre estas matérias na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
O que foi aprovado nesta deliberação significa que a Comissão é de parecer que a legislação em questão carece do prévio exercício do direito constitucional das organizações de trabalhadores de participarem na sua elaboração. Ora, se a Comissão reconhece que existe aqui esse direito, então, ela tem de aceitar as imposições da lei quanto ao seu exercício.
A lei diz que quando existe este direito, nenhum projecto ou proposta pode ser discutido antes do período de participação por parte das organizações de

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trabalhadores. Aliás, do nosso ponto de vista, assim deverá ser, pois as opiniões expressas pelas organizações de trabalhadores devem poder influenciar e reflectir-se no próprio debate, na generalidade, que se vai processar.
Sr. Presidente, do nosso ponto de vista, a questão que está colocada leva até às últimas consequências o significado e as decorrências desta deliberação aprovada na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e a que não entremos num debate que não vai ter a sua sequência normal porque, depois dele ter lugar, depois de eventualmente os grupos parlamentares e o Governo manifestarem aqui as suas posições, os diplomas vão ser discutidos pelas organizações sociais respectivas e só posteriormente a isso é que estarão em condições de ser votados na generalidade.
Para além dos problemas legais que há pouco referi, creio que este não é um processo que possa e venha dignificar o trabalho da Assembleia da República, designadamente em matérias deste género.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, longe de mim subalternizar a sua memória à minha; antes pelo contrário.
Quero lembrar-lhe que o que se passou na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares foi diferente daquilo que disse. Surgiu a dúvida de saber se neste caso se exigia ou não a prévia consulta aos sindicatos dos trabalhadores. Pronunciámo-nos genericamente no sentido de que provavelmente isso deveria ser feito, mas não houve uma certeza. Foi, então, apresentada uma proposta, que obteve consenso, para que estes diplomas baixassem à comissão sem votação para, dessa forma, poder dar-se cumprimento a esse direito fundamental dos trabalhadores. Reconheço, no entanto, que seria mais lógico e mais razoável que a própria discussão na generalidade não precedesse essa consulta. Estou de acordo com isso, mas o consenso estabelecido na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares foi esse e não outro, mas se quiserem formar outro terei muito gosto em sobrepô-lo ao inicialmente firmado. Enquanto estiver vinculado ao consenso estabelecido não posso tomar outra atitude que não seja a de dar a palavra a quem a pedir.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, não ponho em causa aquilo que V. Ex.ª acaba de dizer.
Recordo que há mais uma questão e que é esta: quando eu próprio coloquei esta questão na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares suscitou-se a dúvida que o Sr. Presidente referiu agora de saber se esta matéria seria ou não obrigatoriamente objecto de discussão pública pelas respectivas organizações dos trabalhadores e decidimos pedir a opinião e o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, parecer esse que foi dado através desta deliberação.
Suscito de novo esta questão porque me parece que seria mais útil e mais correcto actuarmos de uma forma mais clara e transparente do que fazer neste momento a discussão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se houver um consenso de sentido contrário àquele que se formou não tenho nenhuma objecção a colocar.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, apesar de o Governo não concorrer para o consenso necessário, mas tendo em conta que tem uma proposta de lei sobre esta matéria cujo debate está agendado para hoje, se V. Ex.ª e me permitisse gostaria de dizer alguma coisa sobre esta questão.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Quero acrescentar algo ao relato que o Sr. Deputado Octávio Teixeira aqui fez sobre o que se passou na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares de ontem.
Tanto quanto me recordo, o que ficou decidido foi que, havendo a dúvida sobre a obrigatoriedade ou não da audição prévia, se iria pedir um parecer ao auditor jurídico ou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Se o parecer fosse no sentido de que a audição era obrigatória far-se-ia o debate e depois disso a proposta de lei e os dois projectos de lei baixariam à comissão sem votação. Lembro-me até que o Sr. Deputado Carlos Coelho, do PSD, disse que, estando já fixada, seria desagradável alterar a agenda. O princípio de não alteração da agenda mereceu consenso total na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares sobre essa matéria. Entretanto foi entregue o parecer, que sugere que os diplomas de lei baixem à comissão sem votação.
Creio que o processo de audição deve decorrer, mas nada impede que o debate se faça hoje, sem votação. A Assembleia da República ouvirá as organizações sindicais e, depois disso, os projectos de lei serão votados. A audição tem de se fazer antes da votação mas sem prejudicar este debate, que para o Governo é de extrema importância e urgente, não só porque se trata de um compromisso fundamental como também porque tem a ver com a organização da Administração Pública, que é imprescindível.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostava de exprimir a opinião da minha bancada em relação à questão que está suscitada.
Desde logo, começo por exprimir a nossa surpresa porque, como agora acaba de ser reproduzido e invocado perante a Câmara, tudo o que está aqui a ser feito obedeceu a um procedimento definido e, julgava-se, acordado anteriormente: acordado no âmbito da Conferência - e disso são testemunhas os participantes - e na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias - e disso somos testemunhas nós, membros da comissão. E de que é que somos nós, nesta narrativa agora justaposta e sucessiva, testemunhas? Somos testemunhas do seguinte: é que, tendo sido a Comissão confrontada com a interrogação «é necessária uma consulta pública sobre a matéria da proposta de lei que está agora agendada?» e tendo a questão sido equacionada pelo relator ou pelo designado relator (na altura o Sr. Deputado Luís Marques

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Guedes), a Comissão discutiu a questão, pronunciou-se expressamente sobre ela, tendo concluído, em primeiro lugar, que uma consulta pública era adequada, apropriada, necessária e, em segundo lugar, proposto em letra de forma (e isso não suscita seguramente nenhuma dúvida) a deliberação que está na Mesa e que aventa que, após a discussão na generalidade e antes da votação em Plenário, a proposta possa ser objecto de consulta e, portanto, que não seja votada hoje, fixando-se ou sugerindo-se, se V. Ex.ª e entender, um prazo para a realização dessa consulta.
Foi assim que ontem na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem discrepância, sem discordância, julgávamos nós por absoluto consenso, e pacificando tudo e conciliando todos os interesses eventualmente contrapostos, demos resposta à questão da consulta.
Segunda linha de argumentação: sendo assim, estamos em condições de começar o debate na generalidade, trazendo para o Plenário aquilo que já começou a ser discutido na Comissão. Mais ainda: temos alternativa para esta discussão? Resposta: não, porque o princípio constitucional e regimental da estabilidade da ordem do dia, que impede vazios, cancelamentos de supetão e coisas desconcertadas, obriga, aconselha, impõe que discutamos o que está agendado, que é para o que estamos convocados a esta hora, não havendo outro objecto de agenda. E nada justifica que vamos para casa em antecipação, fechando o Plenário como se não houvesse matéria para discutir. Mais: é terrível (para não dizer uma perda de tempo) estar a discutir na forma aquilo que deve ser discutido na substância. Se alguém tem coisas a debater - e todos temos - sobre a materialidade da proposta de lei, sobre as consultas públicas a fazer, discutamo-lo normalmente mas não discutamos a discussão da discussão da discussão infindavelmente ao longo de uma série de minutos quando há uma solução de consenso aprovada por todos os partidos, de que nenhum até agora tinha decaído.
É este apelo que fazemos em nome do Regimento e das regras de procedimento normais e razoáveis nesta Câmara.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, gostava de fazer duas pequenas precisões quanto àquilo que foi dito aqui sobre esta matéria.
De facto, fui relator desta proposta de lei. Na. apresentação à l.ª Comissão do relatório referente a esta proposta de lei, eu próprio suscitei o problema que estamos agora a analisar.
Assim, nos termos da legislação parece-me inequívoco que é necessário uma consulta às associações sindicais dos trabalhadores da função pública, prévia à votação ou à discussão na generalidade destes diplomas. A proposta que apresentei na l.ª Comissão, e que, como disse o Sr. Deputado José Magalhães, teve o acolhimento favorável de todos os seus membros, foi a de que, uma vez que à Comissão não competia propor desagendamentos porque essa é matéria da competência da Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, a única saída possível (e isso foi aceite por todos) para a situação que estava criada face ao agendamento já marcado pela Conferência era a de pedir à Mesa do Plenário que não votasse o diploma para não se cair numa ilegalidade maior que, do meu ponto de vista, seria, em qualquer circunstância, proceder-se a uma qualquer aprovação, ainda que na generalidade, sem cumprimento do formalismo legal.
Do ponto de vista do PSD, é evidente que o processo legal correcto não é este mas, sim, o de fazer em todas as circunstâncias a audição prévia das associações sindicais antes do diploma subir a Plenário.

O Sr. Presidente: - Peço que não eternizem a discussão porque há mais Srs. Deputados que já pediram a palavra.
No fundo, tudo isto se reconduz à simples questão de saber se há outro consenso que desfaça o anteriormente estabelecido. Estamos todos de acordo que o consenso existiu. A divergência sobre o que se passou não o destrói enquanto consenso, tendo apenas diferenças irrelevantes.
Assim, das duas uma: ou há outro consenso, e eu sobreponho o segundo ao primeiro, ou, então, fico vinculado ao inicialmente estabelecido e a única saída para este caso é um recurso da decisão da Mesa, decisão essa que dá prevalência ao primeiro porque não existe qualquer outro que o destrua.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, não vou repetir aquilo que já afirmei várias vezes. Há determinado tipo de declarações que aqui foram feitas que não aceito minimamente, pois são completamente estultas e não têm nada a ver com a situação. Não aceito, sobretudo, que se diga que a questão que está aqui a ser discutida é meramente formal. Não é formal porque ela tem a ver com os direitos dos trabalhadores, que, de acordo com a lei, têm o direito de se pronunciar antes da discussão que tem lugar na Assembleia da República. Se para o Sr. Deputado José Magalhães ou se para o PS um direito dos cidadãos, o direito dos trabalhadores das organizações sindicais, é uma questão formal para nós não é. É substancial!
A segunda questão é que a lei, face à deliberação da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, diz que devia e deve ser feita a audição antes do debate na generalidade.
A terceira questão é que o nosso problema aqui não é o de pretender atrasar o que quer que seja, porque a urgência que, há pouco, foi referida pelo Governo, e que pode haver por parte do Governo ou de qualquer grupo parlamentar, é a urgência na votação, na aprovação da lei, não é no debate. E a questão da aprovação ou não aprovação está dirimida, porque primeiro tem de haver a audição, senão, há um problema de tentarmos aqui acelerar ou desacelerar uma via, um processo de uma lei que está neste momento em curso.
Não é essa a questão. Pela nossa parte repomos aqui o que expusemos ontem na Conferência, apesar de tudo o que se passou e que não está posto em causa, por ninguém. E repomos a questão para ver se é possível, porque não haverá atraso por causa disso na aprovação da lei que vier a ser decidida pela Assembleia da República, termos um pouco de flexibilidade e de bom senso - permitam-me a expressão, pois não quero que ninguém fique ofendido - no sentido de este debate ser feito depois das audições. Apenas isso e mais nada.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe que lhe diga mas devia ter colocado esse problema em Conferência

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de Representantes dos Grupos Parlamentares dizendo: se se vier a provar que, de facto, é necessária a consulta, como veio - aliás, eu próprio estudei o problema, cheguei a essa conclusão e ouvi o meu auditor jurídico que também chegou à mesma conclusão -, então não se desagenda. Mas não foi isso o que foi consensualizado. O que foi consensualizado, tendo consciência de que podia vir a ser necessária a consulta, porque raciocinámos em alternativa, foi que se se viesse a revelar necessária, nesse caso, baixaria à comissão sem prévia votação.
Este consenso, para mim, foi muito claro. Portanto, não vejo necessidade de estarmos aqui às voltas. Estou habilitado a decidir e os Srs. Deputados farão o favor de recorrer da deliberação da Mesa, que é um direito vosso que não me molesta coisa nenhuma. Mas, estarmos aqui a dar a palavra, motu contínuum, para dizer as mesmas coisas, quando temos uma ordem de trabalhos prolongadíssima, desculpem, mas penso que não vale a pena.
Assim, darei ainda a palavra aos dois Srs. Deputados que já a pediram mas não aceitarei, sobre esta matéria, mais nenhuma inscrição.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, quero fazer uma sugestão à Mesa, se me é permitido, em relação a matérias e questões deste género: usualmente, a Divisão de Apoio ao Plenário capeia os projectos de lei e propostas de lei que entram nesta Casa com uma nota informativa. Uma vez que a 1.ª Comissão, geralmente, aprecia e discute os relatórios sobre estas matérias muito próximo e até já depois, muitas vezes, do agendamento para Plenário, sugiro que essa nota informativa contenha obrigatoriamente a eventual necessidade legal de consulta a entidades que é suscitada pela matéria objecto da proposta de lei ou do projecto de lei. Isso, porque é feito no início da admissão do projecto de lei ou da proposta de lei na Assembleia da República, poderia evitar, no futuro, situações do género daquela que estamos a viver hoje aqui, no Plenário.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, lembro-lhe que V. Ex.ª faz parte da 1.ª Comissão e que essa sua intervenção será utilíssima nessa Comissão. Neste momento, aqui, foi útil mas não tanto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, peço desculpa por regressar, ainda que brevemente, à questão que suscitou, a fim de dar conta da deliberação da 1.ª Comissão que foi, uma vez colocada a questão da consulta pelo Deputado relator, no sentido de que a consulta era absolutamente imprescindível; mas, de acordo com o consenso estabelecido na Comissão, por unanimidade dos grupos parlamentares e pelos Deputados presentes, ela far-se-ia, sendo absolutamente necessária, após o debate e baixando à Comissão sem votação, como, aliás, consta da deliberação que apresentámos ao Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, o que se passou na Conferência está clarificado e ninguém põe isso em causa, mas, tendo sido dirimida, de ontem para hoje, uma questão que na altura não estava clara - pelo menos para alguns grupos parlamentares - e que é a de ser necessária ou não a audição, senti-me no direito e no dever de a suscitar de novo. Já referi que esta é uma matéria que tem a ver com os direitos dos cidadãos, mas não há consenso para a alterar. A última coisa que gostaria de dizer sobre isto é que tal não sirva de precedente, que nunca mais haja quaisquer consensos sobre matérias que têm a ver com a postergação de direitos dos cidadãos!

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Isto simplifica as coisas. Não está no meu espírito que isto se transforme numa regra, mas a verdade é que a responsabilidade dos consensos que se formam em Conferência de Representantes dos Grupos Parlamentares é precisamente desses representantes.
Vamos passar à discussão do diploma agendado para hoje.
Se me permitem, vou fazer distribuir pelas bancadas o parecer do auditor jurídico que, de algum modo, corrobora a conclusão a que chegámos agora.
Assim, para apresentar o projecto de lei n.º 115/VII, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A recente discussão, em torno do preenchimento dos cargos de direcção e chefia da Administração Pública, deixou junto dos cidadãos a ideia, degradante, de que tais cargos e o seu preenchimento apenas se condicionavam ao interesse político-partidário. Porém, tal não é nem deve ou pode ser assim.
De facto, considerando o enorme peso da Administração Pública, em Portugal, abrangendo sectores de actividade muito diversos, e com preponderância de áreas operacionais não burocráticas; considerando também o peso dos funcionários públicos enquanto classe profissional na sociedade portuguesa, dependendo do seu bom desempenho a qualidade dos serviços públicos e a satisfação dos cidadãos; considerando por fim que cada governo e cada titular deverá poder contar não com lugares para distribuir, mas com uma estrutura hierárquica sólida, funcional e operante, o Partido Popular propôs uma alteração ao Decreto-Lei n.º 323/89, nomeadamente no que se refere aos artigos 3.º e 4.º, isto é, alterando tão só as formas de recrutamento e provimento dos cargos de direcção e chefia.
Considerou-se que os cargos de director de serviço e chefe de divisão serão sempre providos por concurso. Aqui não se vislumbra qualquer razoabilidade em matéria de excepções. Quem conhece o conteúdo funcional destes cargos, saberá que o seu preenchimento se fará sempre melhor de entre os funcionários públicos cujo mérito aliado a qualidades de chefia os tornam, naturalmente, os mais adequados e seguros candidatos, quer pelo conhecimento das matérias, quer pelo conhecimento da máquina.
Quanto aos subdirectores e directores gerais, considera-se igualmente o concurso como a melhor e mais adequada forma de provimento: pela estabilidade que imprimirá à Administração Pública; pela profissionalização, versus partidarização da primeira linha da Administração Pública e consequente dignificação da mesma; pela autonomia tão necessária a um procedimento isento e a uma direcção apta a apoiar a acção governativa na perspectiva de interesse público. Aqui, no caso do director e subdirector geral, a consideração de alguma excepcionalidade prende-se com situações muito específicas e particulares e que, portanto, carecerão de fundamentação.

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Para terminar, direi apenas que esta medida, por si só, não modificará a actual situação do funcionalismo público. Deverá, do nosso ponto de vista, proceder-se a uma efectiva articulação entre formação académica e curricular e as carreiras, bem como, no geral, proceder a uma avaliação do actuai regime de concursos.

O Sr. Presidente: - Seguir-se-ia agora a leitura do parecer, mas o relatório não foi votado por maioria. Foi apenas aprovada uma conclusão em forma de parecer que diz o seguinte: «a proposta de lei n.º 27/VII reúne condições regimentais e constitucionais para a sua discussão e votação em Plenário», pelo que está ultrapassada a necessidade de dar a palavra a quem quer que seja.
Para apresentar a proposta de lei n.º 27/VII, originária do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.

O Sr. Ministro Adjunto (Jorge Coelho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Efectuar uma profunda reforma da Administração Pública em Portugal é um objectivo enunciado no Programa do Governo apresentado a esta Assembleia e a que este Governo tem dedicado grande importância e empenho nestes meses iniciais de actividade.
Nesse sentido, foram efectuadas negociações de que resultou um acordo global assinado com todos os sindicatos do sector. Nas negociações em curso, estão a discutir-se e a aplicar-se medidas que irão, estou certo, mudar, de forma muito vincada, quer as relações internas na Administração quer o seu relacionamento com os cidadãos, por forma a que estes possam ser servidos de um modo mais correcto e mais célere.
Queremos hoje em Portugal uma Administração Pública moderna e transparente ao serviço das pessoas, sendo para isso determinante encontrar novas formas de gestão e de mobilização dos funcionários. Mais objectividade, mais igualdade, melhor serviço, menos burocracia, mais inovação e mais criatividade são os objectivos centrais do Governo.
Face a esta meta global definiram-se, com rigor, dois objectivos estratégicos centrais: em primeiro lugar, gerar um modelo de Administração Pública democrático, transparente, participado, desburocratizado, despartidarizado e desgovernamentalizado, em que se acabe de uma vez por todas com a suspeição de a mesma estar sujeita ao partido do poder, seja lá ele quem for, como infelizmente aconteceu nos últimos dez anos; qualificar, dignificar, motivar e profissionalizar os recursos humanos da Administração, através de uma política coerente e adequada de carreiras, remunerações e formação profissional, é o segundo objectivo estratégico.
É neste sentido, e numa medida que reputamos de grande importância, porque corresponde ao cumprimento de uma promessa eleitoral, que o Governo apresenta uma proposta de lei que visa consagrar o concurso público como regra para o recrutamento dos directores de serviço e chefes de divisão.
Esta é também a grande diferença entre o Governo do PS e os anteriores governos do PSD. Durante mais de dez anos os governos do PSD não abriram um só concurso. Durante mais de dez anos os governos do PSD, apesar dos protestos sistemáticos dos funcionários públicos em geral e dos sindicatos, não disseram uma palavra sobre o assunto. Nomearam mais de seis mil pessoas como directores de serviço e chefes de divisão, a seu bel-prazer e com critérios que nunca ninguém soube quais eram, mas que todos desconfiavam.
Há, nos nomeados, com certeza, funcionários competentes e que muito têm dedicado das suas vidas ao serviço público e à sua profissão. Mas quem nos garante, quem garante aos Srs. Deputados que, nas dezenas de milhares de técnicos que existem hoje na Administração Pública, não há pessoas com mais formação, mais capacidade, mais empenho para as tarefas que se tornam necessárias efectuar? Como é possível manter motivados funcionários pelo simples facto de, no exercício legítimo dos seus direitos, nada terem a ver do ponto de vista político com o governo do PSD e, por isso, terem sido sistematicamente preteridos por outros, nomeados só pelo facto de serem afectos ao partido que então estava no poder?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os lugares que estamos a analisar, de directores de serviço e chefes de divisão, são lugares com características exclusivamente técnicas. Nunca podem ser preenchidos por razões de natureza política. Foi isso que partidarizou a Administração Pública. Para acabar de vez com essa situação, só há uma maneira de o fazer e nós não hesitamos: concursos públicos para desgovernamentalizar definitivamente a Administração Pública. Só assim se pode conseguir uma Administração Pública moderna e transparente.

Aplausos do PS.

Foi isso que o PSD não quis durante mais de dez anos e agora, como se os portugueses, e em particular, os cerca de 700 mil trabalhadores da Administração Pública não tivessem memória e não se lembrassem da forma totalmente clientelar e governamentalizada como geriu a Administração Pública, tenta atirar poeira para os olhos dos observadores mais incautos. O PSD quer agora surgir como o campeão dos concursos. Vêm tarde, vêm pelo menos com dez anos de atraso, Srs. Deputados do PSD. Ao menos tenham pudor e deixem passar mais algum tempo para ver se os portugueses se esquecem do que fizeram nos últimos dez anos.
O diploma agora apresentado pelo Governo vai mais longe. Alarga a base de recrutamento a um universo mais amplo e possibilita a participação de personalidades exteriores à Administração Pública no júri dos respectivos concursos. É também uma forma de criar mais interacção entre outras actividades e a Administração Pública, contribuindo assim para que a modernização se faça de forma mais célere e mais positiva. Refira-se que, na área de recrutamento, esse já é o sistema em vigor relativamente aos directores e subdirectores gerais, sendo evidente que, cada vez que há um concurso em qualquer empresa pública ou privada, os trabalhadores da Administração Pública também podem concorrer. É colocar todos os portugueses em igualdade de circunstâncias.
Percebe-se que o PSD esteja em desacordo. O sistema que agora propõe, quer no recrutamento quer na constituição de júris, tem um único objectivo: mudar alguma coisa para que tudo fique rigorosamente na mesma! Percebe-se, Srs. Deputados!

Aplausos do PS.

Percebe-se muito bem! Durante todos estes anos, VV. Ex.as e o vosso governo encheram a Administração Pública de dirigentes e de quadros nos topos das carreiras. Agora queriam que os júris fossem exclusivamente constituídos pelos mesmos dirigentes e os lugares dos funcionários que poderiam concorrer aos mesmos seriam, na sua maioria,

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funcionários que, pela antiguidade e experiência nesses lugares, ou nos topos das carreiras, teriam prioridade sobre os outros. Os governos de VV. Ex.as clientelizaram e governamentalizaram a Administração Pública e queriam agora, sem ter ganho as eleições, manter a clientela «laranja». Não acham que já chegou?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mas agora o PSD também se lembrou, contrariando tudo o que disse e fez, que eram precisos concursos para directores gerais e subdirectores gerais. Para quem, durante dezasseis anos no governo, nunca fez um único concurso, demonstra uma grande coerência!... Mas também nisto já nada há a admirar de um partido que chega a dar várias conferências de imprensa por dia, com posições contraditórias, umas relativamente às outras.
Mas, face a esta questão, este Governo tem hoje, como sempre, uma posição clara. As funções que estão atribuídas aos directores e subdirectores gerais, nomeadamente no que respeita à necessidade da sua participação na elaboração das políticas governamentais de cada sector, levam a que tenham, e bem, uma forte componente de confiança política. Q regime de incompatibilidades, recentemente aprovado nesta Assembleia, demonstra essa componente de responsabilidade política.
Também aqui a proposta do PSD tinha um objectivo claro: ao consagrar de forma absoluta o critério da antiguidade, facto que tem como consequência que só os indivíduos nos escalões mais elevados das suas carreiras pudessem concorrer, tinha mais uma vez um lema - continuarem lá sempre os mesmos. Era continuar com a mesma governamentalização do passado, mesmo sem estar no governo. Pelo menos original, era, Srs. Deputados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, o País e os portugueses, nas eleições de Outubro, disseram claramente que querem uma mudança política. O Governo a que me orgulho de pertencer, tem procurado corresponder às expectativas criadas. Para isso, queremos cumprir com rigor, tudo aquilo que prometemos aos cidadãos.
Assim, tenho hoje o maior prazer de apresentar, em nome do Governo, esta proposta de lei que vem acabar com um sistema velho e promíscuo que está em vigor no nosso país. Mas, Sr.as e Srs. Deputados, não somos ingénuos nem temos qualquer receio dos fantasmas que o PSD lança sobre a necessidade vital de mudança de protagonistas para aplicar as novas políticas. Queremos, no fim da legislatura, ser julgados pelo que fomos ou não fomos capazes de cumprir relativamente ao que nós - repito, nós - prometemos aos portugueses. Não queremos alibis de deficiente funcionamento e boicote de responsáveis da Administração Pública para justificar a eventual não realização de algumas promessas. E aqui, Sr.as e Srs. Deputados, há que ter sentido de Estado.
Pedi aos serviços que de mim dependem que me efectuassem uma análise do que se passa nos restantes países da Europa e verifica-se que, na Alemanha, na Áustria, na Bélgica, em Espanha, na Itália, em França, no Luxemburgo, na Holanda, na Dinamarca, em todos esses países analisados, o preenchimento destes lugares, de directores gerais e subdirectores gerais, é feito por escolha da exclusiva responsabilidade dos governos de cada país. Exige-se, contudo, clareza e transparência, e não politiquices à volta de questão tão importante. O tacticismo não pode nem deve ser em lado nenhum, e muito menos nesta matéria, a pedra de toque da orientação de um partido como o PSD que esteve dez anos no poder.
O Governo pensa que esta orientação corresponde ao sentir da esmagadora maioria dos portugueses e dos trabalhadores da Administração Pública que quero aqui saudar, por vezes tão incompreendidos, com tão poucos meios e com salários abaixo daquilo que todos nós queríamos que tivessem, executam um trabalho globalmente meritório e que têm uma grande vontade de contribuírem para a modernização de um sector de que a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos depende de forma tão importante.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas, como ao contrário de outros admitimos que nos podemos enganar e que também temos algumas dúvidas, incluímos no artigo 25.º da proposta de lei uma comissão de observação e acompanhamento dos concursos com a participação das associações sindicais da função pública que deverá apresentar, ao fim de alguns meses, um balanço para verificar da necessidade, ou não, de introduzir alterações neste novo sistema.
Sr. Presidente. Srs. Deputados: Com a consciência de que será com certeza possível no âmbito da discussão da especialidade melhorar alguns aspectos desta proposta de lei, nomeadamente tendo em conta sugestões das organizações sindicais e de diplomas ou ideias de outros partidos, temos hoje a certeza de que esta importante iniciativa legislativa venha acabar, de uma vez por todas, com a governamentalização da Administração Pública, venha ela de onde venha, contribuindo assim para uma transformação profunda na Administração, modernizando-a, dinamizando-a e consequentemente colocando-a de forma mais decisiva ao serviço de todos os cidadãos e das suas necessidades.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro Adjunto, os Deputados Maria José Nogueira Pinto, Luís Marques Guedes e Miguel Macedo.
Aplicando a lei da alternância, a palavra ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, pela enésima vez, permita-me o gosto de lhe recordar que quando vem a este Plenário é para falar das suas iniciativas, para discutirmos a sua actividade governativa e não para fingir que recuamos no tempo e que estamos aqui para falar do governo do PSD.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Má consciência!

O Orador: - Não lhe fica bem...

Protestos do PS.

... a prática de tentar aligeirar as suas responsabilidades, atirar as culpas para cima de outros quando tem dificuldade em justificar as iniciativas que aqui nos traz.
E, já agora, Sr. Ministro, também não lhe fica bem, nas suas intervenções, incorrer em inverdades ou falsidades, neste caso é uma falsidade, quando afirmou - e, se bem percebi no seu discurso, disse-o duas vezes - que nunca, durante 10 anos de governação do PSD, teria havido

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concursos para os cargos de que hoje aqui estamos a falar, ou seja, directores de serviço e chefes de divisão.

O Sr. Ministro Adjunto: - Quantos houve?

O Orador: - Temos aqui na sala e com a devida vénia, uma Deputada do Partido Popular que foi membro do Governo nos tais 10 anos que referiu e que é testemunha de que, ela própria, só para chefes de divisão no seu departamento...

Protestos do PS.

O Orador: - Gostava que não me interrompessem.
Sr. Ministro, só ela própria, como poderá testemunhar a seguir, abriu durante o seu período de governação, três concursos, ou coisa que o valha, para chefes de divisão.

Protestos do PS.

Portanto, Sr. Ministro, não preste aqui declarações que depois são desmentidas porque isso não fica bem a um membro do Governo.
Mas vejamos a proposta do Governo que é aquilo que o Sr. Ministro aqui nos trouxe. Do ponto de vista do PSD, desde logo, a proposta oferece-nos algumas objecções fundamentais que gostava de enunciar.
Em primeiro lugar, a proposta de lei apresentada pelo Governo não honra a promessa eleitoral formulada pelo Partido Socialista com o qual o PSD está à-vontade porque desde o início não concordou, se bem que o Governo tenha de ser confrontado, prestar contas e assumir as responsabilidades daquilo que prometeu. E todos nos lembramos daquilo que o Partido Socialista prometeu sobre esta matéria durante a campanha eleitoral.
Em segundo lugar, Sr. Ministro, a proposta de lei do Governo opera uma separação entre os cargos dirigentes de topo na Administração - a saber os directores gerais e os subdirectores gerais - e os cargos dirigentes intermédios, digamos assim, os directores de serviço e os chefes de divisão, para curar apenas na proposta, ao arrepio daquela que tinha sido a promessa eleitoral, dos directores de serviço e chefes de divisão.
E, como o Sr. Ministro aqui nos enunciou na exposição sobre os objectivos que presidiram à proposta de lei, desses objectivos inclui-se a maior transparência da Administração, a necessidade de desgovernamentalização, a necessidade de despartidarização e de desburocratização. Ora, das duas uma: ou esses objectivos, no entender do Governo, não se devem aplicar aos directores gerais e subdirectores gerais ou o Governo entende que esses efeitos indesejáveis são apenas apanágio das tristes figuras dos directores de serviço e dos chefes de divisão.
Em terceiro lugar, Sr. Ministro, no afã de abrir vagas para o controle político da Administração Pública, que foi mais ou menos aqui confessado e que resulta claro da proposta de lei apresentada, o Governo pretende, por esta via, permitir o ingresso na Administração, pelos nossos cálculos, de 1000 a 1500 pessoas sem vínculo, e isto por ano.

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente, só mais 30 segundos.

Isto é, não hesitando em frustrar as expectativas legítimas dos actuais funcionários públicos.

Protestos do PS.

E chegando ao ponto de propor que os próprios júris sejam integrados por pessoas não vinculadas à Administração Pública numa clara partidarização daquilo que serão os concursos a realizar nesta matéria.

Protestos do PS.

As minhas perguntas são as seguintes. Entende o Sr. Ministro que a proposta de lei que aqui nos traz dignifica e motiva os funcionários públicos quando são eles próprios a, frontal e rispidamente, contestarem a proposta do Governo?

Protestos do PS.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Oiçam o Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado.

O Sr. Presidente: - Tem de terminar. Devia ter formulado as perguntas mais cedo.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
A segunda e última pergunta. Tem o Sr. Ministro consciência de que da aprovação desta proposta de lei resultariam, em média, quatro ou cinco concursos públicos por dia? Acha que isto é exequível? Ou a lei é para alterar depois de fazer a varridela que se propõe fazer no momento inicial?

O Sr. Presidente: - A palavra ao Sr. Ministro, para responder.

O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, tenho o maior gosto em responder às suas questões.
Em primeiro lugar, constato que, de 6000 lugares que são os que existem pois foi Secretário de Estado...
Já agora, gostaria de saber quantos concursos abriu enquanto foi Secretário de Estado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não tinha serviços!

O Orador: - Não tinha serviços e os seus colegas aí à frente que foram todos membros do Governo quantos abriram? Nenhum?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A Dr.ª Maria José Nogueira Pinto.

O Orador: - Ah! A única pessoa que abriu concursos, por acaso já é Deputada de outro partido, o PP. É a vida, Sr. Deputado!

Aplausos do PS.

Segunda questão: o Sr. Deputado faz aí alguma confusão. Relativamente a esta questão da dignificação dos funcionários era muito simples para nós, se quiséssemos seguir os critérios que seguiram os governos anteriores, não trazíamos aqui esta proposta de lei e não havia concursos para nada porque ficávamos com o critério da livre escolha que foi sempre o que os governos de que V. Ex.ª fez parte

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tiveram. Nomearam quem quiseram para todos os sítios, para estes 6000 lugares durante estes anos sem qualquer tipo de critério conhecido publicamente!
Portanto, Srs. Deputados, nesta matéria estamos à vontade, estamos a cumprir rigorosamente o que prometemos na campanha eleitoral.

Protestos do PSD.

Srs. Deputados, compreendo que isto lhes doa porque estar a perder é complicado. Compreendo que doa, como compreendo que doa ouvir falar naquilo que fizeram quando estiveram no Governo. Nós estamos a cumprir o que prometemos na campanha eleitoral mas os senhores ficam tão preocupados e tão desnorteados! Se estavam contra porque não apresentaram propostas?! Se estavam contra, apresentassem uma proposta.
Por outro lado, não percebo porque apresentou a sua proposta que está a favor do concurso para tudo. Está tão preocupado com o facto de haver tantos concursos mas vai mais longe do que a nossa proposta e também quer concursos para directores e subdirectores gerais. A ser como propõe, em vez dos números que aí esteve a referir, aumenta-se muito mais.
Sr. Deputado, veja lá se se organiza naquilo que diz porque num minuto entra em contradição total com o que disse antes.

Aplausos do PS.

Sobre a questão da motivação dos trabalhadores só lhe digo uma coisa: desmotivados estão os trabalhadores da Administração Pública quando, durante anos e anos, milhares e milhares de técnicos deste país nunca tiveram qualquer oportunidade de serem chefias pelo simples facto de não serem do partido do poder e não haver concurso para serem nomeados pela sua competência.

Aplausos do PS.
Protestos do PSD.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defender a honra da bancada.

O Sr. Presidente: - Faça favor de a defender, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quero, num tom muito mais moderado do que o do Sr. Ministro...

Protestos do PS.

...tentar colocar o nível do debate noutra dimensão.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Na quarta dimensão.

O Orador: - Sr. Presidente, talvez fosse conveniente V. Ex.ª intervir.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como calculam, o que o Sr. Deputado quer é tão simples como isto, quer ser ouvido. Por isso agradeço que lhe facultem condições para isso.

Protestos do Deputado do PS Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, acabo de pedir...

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, o senhor vem aqui, como tem ido a todos os sítios, dizer aquilo que entende ser um número mágico de nomeações. Desse número mágico de nomeações quantas é que VV. Ex.as já fizeram sem concurso público desde que estão no Governo?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - E daí o que é que concluí?

O Orador: - Significa, no mínimo, que VV. Ex.as estão a copiar eventualmente um erro já cometido.

Protestos do PS.

Gostava também de lhe dizer, já que V. Ex.a me interpelou directamente quando consultou esta bancada e perguntou quem é que daqui tinha feito nomeações, que na área em que estava nunca fiz nenhuma nomeação que não fosse por concurso público...

O Sr. José Junqueiro (PS): - Há excepção há regra.

O Orador: - ...para estes cargos.

O Sr. Ministro Adjunto: - Para estes cargos?

O Orador: - Exactamente, Sr. Ministro. V. Ex.ª pode duvidar mas garanto-lhe que assim foi.

O Sr. Ministro Adjunto: - Não duvido.

O Orador: - Se não duvida, ainda melhor porque ficará certo da minha resposta.
Também gostaria de dizer ao Sr. Ministro que esta matéria não se resolve assim, nem se resolve com essa superficialidade.

O Sr. António Braga (PS): - Superficialidade?!

O Orador: - Sr. Ministro, o senhor não pode vir aqui dizer que o meu colega acabou de entrar em contradição com os concursos públicos que exigimos e com o número de concursos públicos. Lembro-lhe apenas um pormenor técnico que é muito importante VV. Ex.as esqueceram-se de pôr no vosso diploma uma questão simples que eliminava toda essa azáfama, ou seja, que poderia haver renovação automática e, havendo renovação automática, não havia o número de concursos que o meu colega sugeriu. Escusa, portanto, V. Ex.ª de entrar em transe em relação a essa matéria e dizer que ó meu colega estava equivocado porque não estava.
Resumindo e concretizando, em primeiro lugar, Sr. Ministro, não diga mais esse número, que é um número mágico que V. Ex.ª porventura continua a insistir que é inventado.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Foi inventado pelo Fernando Nogueira.

O Orador: - Em segundo lugar, não continue a dizer que só outrem nomeou sem concurso. VV. Ex.as também nomearam várias pessoas, muitas pessoas sem concurso. Gostava de saber quantas, se tem algum inventário.
V. Ex.ª, de facto, porque o nosso projecto é diferente e tem efeitos completamente diferentes do vosso porque não introduz o nível de burocratização que o vosso introduz,

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tem de concordar também que as observações que o meu colega acabou de fazer são perfeitamente pertinentes em relação à vossa proposta.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para dar explicações, o Sr. Ministro Adjunto.

O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, com o respeito e a estima que sabe que tenho por V. Ex.ª, só não percebo uma coisa. Se está hoje tão convencido daquilo que está a referir como sendo aquilo que é importante e necessário fazer, porque é que não fez isso nos últimos 10 anos?! Porque é que ninguém fez isso?! Isso é que eu e os portugueses gostaríamos de saber.

Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Posso interrompê-lo?

O Orador: - Não, Sr. Deputado. Também me apeteceu interrompê-lo mas não o fiz.
Sobre a questão do número, vou-lhe dizer os números oficiais: directores gerais, 296; subdirectores gerais, 422; directores de serviços, 1635; chefes de divisão, 2326; outro género de dirigentes, 2773. Total, 7452 cargos dirigentes - números oficiais da Direcção Geral da Administração Pública, não são meus.
Portanto, todos estes lugares são nomeados, até agora, sem ser por concurso mas por livre nomeação. Posso dizer-lhe, também para informação desta Casa que, entre directores gerais e subdirectores gerais, que dá um total de cerca de 700 lugares, o actual Governo nomeou, até ao momento, 42 pessoas.

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - E sem concurso, porque defendemos que para directores-gerais e subdirectores-gerais não haja concursos.

Protestos do PSD.

Sr. Deputados do PSD, essa é que é a questão. É que se não há concursos hoje em dia é porque os senhores não aprovaram a lei que estamos agora a apresentar. Aprovem-na e passará a haver concursos!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Que concursos?!

O Orador: - É o desafio que vos deixamos: aprovem-na.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Não aprovamos!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Sr. Ministro Jorge Coelho referiu que uma ilustre membro do antigo governo pertencia, por acaso, à nossa bancada.
Quero dizer que a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto não é Deputada do PP por acaso, é de livre e esclarecida vontade de ambas as partes.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, nunca uma interpelação terá estado tão longe da figura regimental. Peço-lhe desculpa, mas isso nunca foi, nem será, uma interpelação.
Faça favor de responder, Sr. Ministro Adjunto, porque uma interpelação pede outra, necessariamente.

O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Abecasis, é sempre um prazer ouvir V. Ex.ª desde há muitos anos aliás, até foi bom para nós ficarmos a saber, também hoje, uma das razões por que a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto está hoje nessa bancada! Foi elucidativo para toda a Câmara e para mim também. Muito obrigado.
Quero ainda felicitar a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto por ter tido essa forma de trabalhar, que é correcta e com a qual estamos totalmente de acordo. Aliás, queremos seguir o seu exemplo e fazer isso para toda a Administração Pública.

O Sr. Presidente: - Também não foi uma interpelação, Sr. Ministro.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Ministro, como o tema não tem a ver com o que eu fiz ou deixei de fazer quando dirigi organismos públicos, vou debruçar-me sobre a proposta de lei apresentada para dizer que estou bastante desiludida por não se ter considerado que o preenchimento dos cargos de subdirector-geral e de director-geral também poderia ser, em regra, por concurso, reservando obviamente. alguma margem de excepcionalidade que poderia ser razoável. Tanto quanto sei em França e em Inglaterra são esses directores-gerais que chegam ao fim de uma carreira que seguram a máquina da Administração Pública e que, certamente, são de muito mais-valia a um governo do que, apesar de tudo, o espólio de alguns lugares para preencher.
Em relação à proposta de lei, há ainda dois aspectos que, penso, estragam o conjunto.
O primeiro é o facto de se abrirem concursos para chefe de divisão e director de serviço a pessoas não pertencentes à função pública. Penso que só faz sentido abrirem-se concursos, se eles significarem uma progressão numa carreira e a possibilidade de quem está nessa careira poder vir a ter as funções de um chefe de divisão ou de um director de serviço. Além do mais, é um lugar, como acentuou, de carácter técnico e vejo com dificuldade um quadro de uma empresa privada poder, amanhã, ser chefe de divisão ou director de serviço. Basta pensarmos no que é a Contabilidade Pública e no que é a emaranhada legislação da Administração Pública para vermos que esse quadro precisaria de uma longa formação e que teria, porventura, muito pouca eficiência.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

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A Oradora: - Portanto, penso que a possibilidade de se abrirem concursos a pessoas que não pertencem ao funcionalismo público estraga quer o espírito desta proposta de lei, se bem entendi, quer as expectativas dos funcionários públicos, quer a dignificação do funcionalismo público.
O segundo aspecto, que, penso, é gravíssimo, tem a ver com a excepção que o Sr. Ministro abre e, se me permite, vou ler-lhe o n.º 2 do artigo 3.º da proposta de lei: «Sempre que da aprovação de leis orgânicas decorra a criação de novas unidades orgânicas podem os seus dirigentes ser providos, a título excepcional, nos termos do n.º 2 do artigo 6.º», ou seja, sem concurso. Por exemplo, acabou de ser aprovada a Lei Orgânica do Ministério da Cultura, que criou, pelo que vi - aliás, com pasmo e com pena! -, uma quantidade enorme de lugares. Então, a título excepcional, vão ser todos convidados? Mas quem garante a quem que não vai ser assim, Sr. Ministro?

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Exacto!

A Oradora: - Abrem-se aqui duas portas, porque também diz que se «Quando ao concurso não se apresentem candidatos, estes não satisfaçam os requisitos de admissão ou não tenha havido admissões, o recrutamento é feito por escolha do membro do Governo...». Nesse caso, o que se costuma fazer é abrir-se um novo concurso.
Portanto, estas duas excepções levantam-me muitas dúvidas e vão levantar, certamente, a muita gente. Abertura ao universo, que já é tão vasto, do funcionalismo público para os cargos de chefes de divisão e de directores de serviço parece-me irrealista, porque, por um lado, admito que muito dificilmente alguém de fora da função pública possa ocupar um cargo técnico como esse sem que tenha de fazer uma formação prévia ou uma integração em serviço que demorará meses e, por outro, parece-me que isso vai frustrar muito as expectativas dos funcionários públicos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.

O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, começando pela última questão sobre as nomeações quando há saídas de leis orgânicas novas, devo dizer que as pessoas ficam em regime de instalação até decorrerem os prazos de concurso.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não está bem explicado!

O Orador: - Se não está bem explicado, admito que, em sede de comissão, aquando da discussão na especialidade, essa parte possa ser melhorada. No entanto, a ideia do diploma, como é óbvio, nem outra coisa faria sentido, é só a de as pessoas ficarem até decorrerem os prazos de concurso.
Quanto a abrirem-se concursos a pessoas não pertencentes à função pública, é evidente que o universo é mais alargado mas é uma experiência que está a ser seguida em alguns países da Europa, nomeadamente em França, com boa aceitação e com bons resultados. O que se pretende é entrelaçar, digamos assim, experiências de gestão diferentes...

Protestos do PSD.

Os Srs. Deputados não percebem isto, mas pode ser que venham a perceber!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Percebemos bem demais!

O Orador: - Como dizia, pretende-se entrelaçar experiências de gestão diferentes por forma a que, com essa interacção, se possa modernizar e arejar a função pública nesta matéria.
Penso que tal medida vem também dignificar os trabalhadores da Administração Pública, porque hoje, em Portugal, há a ideia errada de que os trabalhadores da Administração Pública não têm o mesmo nível de qualificação dos outros. Os trabalhadores da Administração Pública são tão bons como os outros e nestes concursos vai provar-se, pela sua admissão, que estas pessoas conseguem disputar esses lugares com outros do mesmo nível e terem níveis de capacidade de realização diferentes.
Quanto à questão dos directores-gerais e subdirectores-gerais é nossa opinião que são lugares para os quais tem de haver uma confiança política grande, porque eles colaboram na definição das políticas para os sectores - é isso que está na lei, é isso que consta das suas atribuições -, e, como há pouco referi, em todos os países da Europa os directores-gerais e os subdirectores-gerais são escolhidos por nomeação. Aliás, tenho comigo um estudo de direito comparado desses países e em nenhum é feito de outra maneira, pelo que achamos que este é o modo como a Administração Pública pode funcionar de forma mais eficiente e como os governos podem ser responsabilizados pelas suas políticas. No entanto, admito que na comissão possam ser alteradas algumas coisas, se entretanto houver ideias mais correctas que possam melhorar este diploma.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, é para, ao abrigo das disposições regimentais em vigor, em nome do meu grupo parlamentar, solicitar uma interrupção da sessão por 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Pergunto aos grupos parlamentares se há consenso no sentido da interrupção.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, pela nossa parte, não iremos obstaculizar o pedido feito pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista. No entanto, permitia-me fazer uma sugestão.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Orador: - Como já ultrapassámos a hora das votações, podíamos fazer desde já as votações previstas e depois o Sr. Presidente interrompia a sessão.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Braga concorda com esta sugestão?

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O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, requeremos a interrupção ao abrigo do artigo 70.º do Regimento. Assim, em nosso entendimento, a interrupção deve ser imediatamente deferida pela Mesa.

O Sr. Presidente: - Qual é a posição do PSD?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas não percebi o que o Sr. Deputado António Braga acabou de dizer.

O Sr. Presidente: - Pediu a interrupção com efeito imediato, pelo que as votações se fariam depois.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, nós temos por princípio, no Grupo Parlamentar do PSD, excepto razões ponderosas, nunca inviabilizar a interrupção dos trabalhos quando é pedida por um grupo parlamentar e desta vez não o vamos fazer, com certeza.
No entanto, faria um apelo último ao Partido Socialista no sentido de permitir que se façam as votações antes da interrupção da sessão, para que não haja dúvidas sobre a bondade das intenções que levam o Partido Socialista a requerer a interrupção dos trabalhos.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, o meu pedido de palavra é só para garantir a V. Ex.ª e aos Deputados dos vários grupos parlamentares que pedimos a interrupção da sessão antes das votações mas que no momento das mesmas os Deputados do PS virão todos à Sala, ao contrário do que às vezes acontece com os do PSD.

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, certamente que os Srs. Deputados do Partido Socialista estarão presentes aquando das votações mas, na medida em que a solicitação de interrupção dos trabalhos é feita num momento em que já ultrapassámos a hora das votações, fica certo e seguro que as votações que vão ter lugar hoje são as que constam da última folha que nos foi distribuída.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, nessa folha - e não fui eu que elaborei a lista -, como devem ter conhecimento, consta uma nota, que diz «Serão submetidos a votação outros diplomas a divulgar». Não sei quais são, mas depois se verá.

O Orador: - A questão é a de saber quais são.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, depois se verá: Eu não sei.

O Orador: - Sr. Presidente, estamos na hora das votações e os diplomas que estão em condições de serem votados são os que constam da lista. O Partido Socialista pede a interrupção dos trabalhos neste momento mas, na hora da votação, vamos votar apenas os diplomas que estão em condições de serem votados, estes e apenas estes.

O Sr. Presidente: - Eu não sei se os Srs. Deputados estão, em relação à Mesa, a pronunciar-se com alguma reserva mental. Peço-lhes que sejam claros porque não tenho nenhuma, mas gostaria de saber o que se passa. Nada impede que as votações se façam às 19 horas. Eu marcarei uma nova hora para as votações, como é normal nestas circunstâncias.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, nós pedimos a interrupção dos trabalhos ao abrigo de uma disposição regimental que confere esse direito a qualquer grupo parlamentar e em momento anterior ao anúncio das votações de hoje por parte do Sr. Presidente e da Mesa.
Nessa circunstância, julgamos ter o direito regimental de que o nosso pedido de interrupção da sessão possa ser de imediato deferido e que depois, a seguir à retoma dos trabalhos, seja anunciada a votação que tiver de haver nessa ocasião.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - As votações cujos diplomas constam da lista que nos foi distribuída!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, sempre se entendeu que...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, para facilitar o andamento dos trabalhos, vou deixar sem resposta a observação insolente do Sr. Deputado Jorge Lacão...

Aplausos do PSD.
Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado, isso não é seu. Desculpe que lhe diga, mas não estou a reconhecê-lo hoje, pelo respeito e grande amizade que tenho por si.

O Orador: - ... quanto à participação das diversas bancadas no momento das votações.
Quero também fazer uma rectificação àquilo que acabou de dizer o Sr. Deputado Jorge Lacão sobre o direito dos grupos parlamentares. O que o Regimento diz é que se a Assembleia o deliberar...

O Sr. Presidente: - Claro!

O Orador: - ... há interrupção.
Tornei claro que, da parte do PSD, não há qualquer impedimento de princípio a concordar com a propositura

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de uma interrupção, seja ela feita por que grupo parlamentar for, e portanto, relativamente ao pedido do Partido Socialista, o PSD não vai inviabiliza-lo. Fiz um apelo ao PS, que foi recusado e está discutido.
Sr. Presidente, não vale a pena voltar atrás, porque isso só iria prolongar inutilmente os nossos trabalhos. O PS entende que o seu pedido tem eficácia imediata e sob esse ponto de vista não voltamos atrás.
Porém, a questão levantada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira tem toda a pertinência, porque o que o Regimento diz é que se às 18 horas não estivermos em condições de votar, o Presidente fixa outra hora para as votações. Agora, fixa uma determinada hora para as votações que constam da lista, pelo que peço ao Sr. Presidente que, sem prejuízo daquilo que o Sr. Deputado Jorge Lacão acabou de dizer, fixe a hora das votações e as iniciativas sobre as quais os Srs. Deputados vão ser chamados à Sala para exercerem o seu direito de voto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente; o Sr. Deputado Carlos Coelho classificou como classificou a observação que eu há pouco tive ocasião de fazer, e que mantenho, para explicar ao Sr. Deputado Carlos Coelho e ao seu grupo parlamentar que se alguma coisa é profundamente ilícita do ponto de vista dos nossos deveres parlamentares é bloquear o normal exercício das nossas responsabilidades como representantes.

Protestos do PSD.

Isso, Srs. Deputados, foi o que ocorreu recentemente com a vossa manifesta recusa de participação numa votação onde deveriam ter participado.

Protestos do PSD.

Isso é algo que não está...

Protestos do Deputado do PSD Fernando Pereira..

Esteja calado! Tenha juízo!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, têm de respeitar o lugar onde estamos!

O Sr. Fernando Pereira (PSD): - O Sr. Deputado insultou-me!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tenha paciência, mas não tem o direito de tomar essa atitude! Peça a palavra e use dela! Quem está no uso da palavra é o Sr. Deputado Jorge Lacão, a quem solicito que continue.

O Orador: - Sr. Presidente, ao usar da palavra para repudiar formalmente o tipo de insinuação feita pelo Sr. Deputado Carlos Coelho,...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Que tipo de insinuação é que fiz?!

O Orador: - ... estou a falar no exercício da dignidade de defesa da minha bancada, porque tivemos de suportar, da parte do Grupo Parlamentar do PSD, muito recentemente, um bloqueio sistemático a votações nó Plenário, à participação na Comissão da Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, à participação na Comissão Eventual para a Revisão da Constituição, e tudo isto contra o Regimento da Assembleia da República!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Neste momento, Sr. Presidente e Srs. Deputados, mais não fazemos do que invocar um direito regimental para a suspensão dos trabalhos em momento anterior a uma votação.
Sr. Presidente, o Regimento não comina a necessidade de fundamentar este pedido. No entanto, se o Sr. Presidente entender que, para pleno esclarecimento da Câmara, devemos comunicar as razões pelas quais estamos a pedir a interrupção, terei todo o gosto em dar, ao Sr. Presidente e à Câmara, esses esclarecimentos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, essa é uma liberdade que tem, não preciso de lhe pedir que o faça. O Sr. Deputado é que sabe.

O Orador: - Sr. Presidente, estão neste momento em curso trabalhos na Comissão Permanente de Trabalho, Solidariedade, Segurança Social e Família,...

Vozes do PSD: - Ah!...

O Orador: - ... com vista à votação na especialidade do diploma sobre a redução do horário de trabalho para as 40 horas semanais.

Vozes do PSD: - Já tínhamos percebido!

O Orador: - Os trabalhos na especialidade foram ontem adiados, por 24 horas, por iniciativa do Grupo Parlamentar do PSD. Os trabalhos foram, de novo, suspensos esta tarde, durante algum tempo, por iniciativa desse mesmo grupo parlamentar, que agora se escandaliza por procurarmos ganhar aqui tempo, para vermos se é possível fazer a votação final global.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, continuamos coerentes com aquilo que temos feito, a trabalhar construtivamente para aprovarmos os diplomas de que o País precisa, enquanto o PSD tudo faz para bloquear o normal exercício das responsabilidades da Assembleia da República!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - A intervenção do Sr. Deputado Jorge Lacão traduziu-se num defesa da honra da bancada, pelo que tem a palavra para dar explicações o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, tudo ficou claro agora!

Vozes do PS: - Ah!...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Exactamente!

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O Orador: - Aquilo que o Sr. Deputado Jorge Lacão insinuou tratar-se de um qualquer arremedo de deslealdade parlamentar, como insinuação minha, ficou claro. O que o Sr. Deputado Jorge Lacão acabou de dizer é que a interrupção dos trabalhos que propõe destina-se a que o Plenário espere pelos trabalhos que estão a decorrer numa comissão parlamentar. Sob esse ponto de vista, tínhamos razão. Havia uma razão política que levou à iniciativa do Grupo Parlamentar do PS, que não tinha sido explicitada ou confessada anteriormente e que o foi na sequência da interpelação que, em boa hora, fiz à Assembleia da República.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, quanto a isso, do ponto de vista político, as coisas são claras.
Agora, há duas questões que ficam de pé. A primeira tem a ver com o problema da fixação da hora das votações e da matéria que vai ser votada. A Assembleia da República tem de trabalhar com segurança, com previsibilidade, Sr. Deputado Jorge Lacão. Todo o nosso Regimento, quer em relação ao processo de votações, quer em relação à fixação da ordem do dia, defende o valor da estabilidade. Não pode estar a Assembleia da República condenada a, a qualquer momento, no exercício das suas responsabilidades, ser confrontada com textos que ninguém conhece.

O Sr. António Braga (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Portanto, à hora regimental das votações, o Sr. Presidente dirá, se fizer o favor, à Assembleia da República, quais são os textos finais das comissões distribuídos pelos Srs. Deputados e em condições de se fazer a sua votação final global. E são apenas esses que podemos votar. Não me parece que sobre isso haja qualquer outra interpretação. Como sempre foi, aliás.

O Sr. António Braga (PS): - Não, não!

O Orador: - A menos que haja consenso, Sr. Deputado António Braga. Sem haver consenso não pode haver outra regra.
A segunda e última questão, Sr. Presidente, tem a ver com a última intervenção que fez o Sr. Deputado Jorge Lacão, na qual expendeu argumentos de natureza política, aos quais já respondi. Mas acabou, no final da sua intervenção, por não resistir à tentação de, mais uma vez, fazer uma picardia parlamentar, acusando o Grupo Parlamentar do PSD de obstrução aos trabalhos parlamentares.

O Sr. António Braga (PS): - Pois não! E é o que têm feito!

O Orador: - E porquê? Porque, diz o Sr. Deputado Jorge Lacão - e é verdade - que ontem o Grupo Parlamentar do PSD, na Comissão de Trabalho, Solidariedade, Segurança Social e Família; pediu o cumprimento do direito regimental, que temos, de adiar por 24 horas de uma votação na especialidade.
Sr. Presidente, peço desculpa, mas permita-me este desabafo: esta é a prova mais acabada da arrogância socialista neste Parlamento. O exercício de um direito regimental legítimo nunca pode ser considerado como qualquer tipo de boicote dos trabalhos parlamentares.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Vou agora dar a palavra ao Sr. Deputado Jorge Lacão, para interpelar a Mesa, mas solicito aos Srs. Deputados o favor de me facilitarem o fim deste jogo de ping-pong, senão nunca mais saímos daqui.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, como compreenderá, mantemos o nosso pedido de suspensão dos trabalhos, ao abrigo de um direito que inequivocamente temos, e votaremos o que votarmos, de acordo com as matérias que a Mesa, no momento próprio, anunciar que estão em votação.

Vozes do PSD: - Não, não!

O Orador: - Politicamente, não deixaremos de retirar uma consequência: se não for possível fazer a votação a que há pouco aludi, é porque, mais uma vez, um grupo parlamentar tudo fez para impedir o normal andamento de um processo legislativo.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O Sr. Presidente, numa interpelação que lhe fiz há pouco, suscitou a questão de saber o que estaria por detrás disto, porque não estava a perceber nada - permita-me a expressão - do que se estava a passar.
Julgo que o Sr. Deputado Jorge Lacão já teve a oportunidade de explicitar o que se estava a passar. Não vou entrar aqui no debate sobre obstaculização aos trabalhos da Assembleia, ou chicana política, porque isso poderá estar mais ou menos visível.
A questão que gostaria de colocar é esta: foi dito, em concreto pelo Presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que pretendem o intervalo de 30 minutos para dar, eventualmente, tempo a que se acabe o processo de discussão e votação na especialidade de um diploma. Julgo, Sr. Presidente, que o Plenário da Assembleia da República não pode estar dependente disso,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... tanto mais que não se trata de um caso de vida ou de morte.
Por isso, Sr. Presidente, mais uma vez ponho a questão: todos deram acordo, salvo erro e omissão, ao pedido do Partido Socialista para a interrupção dos trabalhos, mas solicito ao Sr. Presidente que indique quais são os diplomas legislativos...

O Sr. António Braga (PS): - E a tradição?!

O Orador: - Não vamos pelas tradições, Sr. Deputado. Conhece certamente o anúncio que diz: «A tradição já não é o que era!». Muitas vezes, é preciso muda-la.

Risos do PSD.

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Dizia eu que é preciso fixar, neste momento, antes da interrupção dos trabalhos, quais são os diplomas em condições de serem hoje votados pelo Plenário da Assembleia da República, e com isso resolveríamos o problema, dentro do princípio de que não podemos estar a adiar indefinidamente esta questão e muito menos pôr o Sr. Presidente na posição de adiar por tempo indefinido, digamos assim, as votações que vão ter lugar hoje no Plenário, à espera que comissões acabem eventualmente processos de discussão na especialidade. Isso não pode ser! Estar-se-ia a colocai o Sr. Presidente, a Mesa e a Assembleia da República numa posição inaceitável.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, e espero que seja a última sobre este assunto, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, os factos que acabei de ouvir relatados pelos diferentes grupos parlamentares suscitam-me uma questão delicada, diria mesmo, a mais delicada que, no relacionamento entre e Governo e a Assembleia, na actual Legislatura, enfrentamos.
Assim, permito-me sugerir a V. Ex.ª a convocação urgente de uma Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, porque o que está a ocorrer neste momento quanto a uma proposta de lei do Governo põe em causa, infelizmente, a forma correcta como o relacionamento entre estes dois órgãos de soberania tem vindo a ocorrer - e bem - nesta Legislatura.
Permito-me recordar a V. Ex.ª que o Governo, em devido tempo, suscitou a urgência de um debate e uma deliberação sobre uma proposta de lei que, nos termos de um acordo de concertação social, prevê-se que entre em vigor seis meses após a sua publicação e produzir efeitos ainda no presente ano civil.
Recordo ainda que o adiamento decorrente do tempo, que não gostaria de qualificar, em que esteve para discussão pública e um atraso na aprovação ou na rejeição, no juízo soberano desta Assembleia, terão consequências inevitáveis, ao impedir que esta proposta de lei, caso viesse a ser aprovada, produza efeitos no presente ano civil, como foi acordado entre os parceiros sociais - e esta é uma forma particularmente grave de evitar a produção de efeitos.
O Governo sabe que a Assembleia é naturalmente soberana em aprovar ou chumbar um diploma. Agora, creio estarmos todos de acordo que não é aceitável que, não havendo maioria para rejeitar um diploma, se provoquem incidentes, de forma a evitar que o diploma produza efeitos em tempo útil.

Aplausos do PS.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado Octávio Teixeira, tenha pena da Mesa!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, tenho pena da Mesa, mas peço-lhe que também tenha um pouco de compreensão por mim, porque quero fazer um protesto relativamente às declarações do Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, o meu protesto é neste sentido: o Sr. Secretário de Estado acusou o meu grupo parlamentar de pretender impedir que a proposta de lei, que venha a ser aprovada por maioria nesta Assembleia, entre em vigor na data que nela própria se prevê. Ora, o meu protesto, Sr. Presidente, é contra esta afirmação, que não é verdadeira,...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... não é real, porque se a votação não for feita hoje, em termos regimentais, sê-lo-á na próxima quinta-feira, dia 30 de Maio. Há tempo para ser feita a publicação até ao final de Junho, pelo que não se coloca aqui qualquer problema de tempo.
E, no âmbito deste protesto, gostaria de dizer que temos estado a colocar a questão da fixação dos diplomas a votar do modo que temos, devido a uma forma de tratamento, normalmente existente nesta Assembleia, de cooperação com todas as forças parlamentares.
Porém, Sr. Presidente, se o PS e o Governo continuarem a fazer questão de pretender prolongar os trabalhos e a hora da votação para votar a tal proposta de lei, que ainda está a ser votada na especialidade, recordaria o artigo 164 º, n.º 2, do Regimento, que diz: «Se aprovado em comissão, o texto é enviado ao Plenário para votação final global na segunda reunião posterior à sua publicação no Diário ou à sua distribuição em folhas avulsas aos grupos parlamentares».
Isto só pode ser ultrapassado com consenso. E, desde já, quero afirmar, Sr. Presidente, que se for esse o caso, não há consenso por parte do Grupo Parlamentar do PCP.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontro-me perante uma nova «floresta de braços». Se os senhores não têm a compreensão de que, de facto, já está tudo discutido e de que o melhor é fazermos, uma reunião da Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares para nos entendermos sobre isto, nunca mais saímos daqui.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um contra protesto relativamente às afirmações do Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, registo com satisfação que o Sr. Deputado e o seu grupo parlamentar estão empenhados em manter o cordial relacionamento que tem havido entre o Governo e esta Assembleia na actual Legislatura.
Gostaria, no entanto, de dizer ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, até para ter isso em conta no seu calendário e nas suas contas, que o respeito que o Governo tem pelo órgão de soberania Assembleia da República tem-no igualmente pelo órgão de soberania Presidente da República.

Vozes do PS: - Claro! É evidente!

O Orador: - Portanto, não desconhecemos que, após a eventual aprovação deste diploma nesta Casa, ele tem

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ainda de ser enviado a Sua Ex.ª o Sr. Presidente da República para promulgação, a qual também tem um prazo constitucional.
Ora, como não desconhecemos as contas e respeitamos não só alguns mas todos os órgãos de soberania, não podemos antecipar, como, creio, V. Ex.ª também não pode, qual vai ser o juízo do Presidente da República sobre um diploma que saia desta Casa.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados Carlos Coelho e Jorge Lacão pediram a palavra para interpelar a Mesa. Devo dizer que não darei a palavra a mais ninguém, antes da interrupção dos trabalhos, uma vez que nenhum grupo parlamentar inviabilizou essa mesma interrupção para a realização de uma reunião da Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, não quero criar mais nenhum incidente regimental ou parlamentar e vou colaborar construtivamente, de acordo com o apelo de V. Ex.ª, no sentido de, com serenidade, discutirmos esta questão na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.
Agora, o Sr. Secretário de Estado fez uma intervenção no Plenário da Assembleia da República, que pode dar a ideia de que há menor interesse de qualquer bancada parlamentar, relativamente...

Vozes do PS: - Que ideia!

O Orador: - Sr. Presidente, está provado que não vale a pena fazer intervenções serenas porque se é igualmente interrompido. É, pois, preferível fazer intervenções contundentes para confrontar alguns Srs. Deputados com as nódoas que têm na sua consciência.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, neste momento, esse é um problema de todas as bancadas.
Faça o favor de continuar.

O Orador: - Sr. Presidente, como já foi recordado, se nós fizermos esta votação na próxima semana, isso ainda ocorrerá no mês de Maio e há todo o mês de Junho para se desenvolverem os processos de promulgação e respeitar o calendário que o Sr. Secretário de Estado fez questão de sublinhar agora perante a Câmara.
Ainda se podem estabelecer outros consensos, que o PSD está disposto a assumir nesta Câmara, como, por exemplo,...
Protestos do Deputado do PS Joel Hasse Ferreira.

Sr. Deputado, assim, não consigo falar. Abancada do PS está, de facto, muito nervosa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe-me que diga, mas, em relação ao habitual, até acho que está a beneficiar de um razoável silêncio.
Faça favor.

O Orador: - Sr. Presidente, eu estava a tentar dizer que o PSD se dispunha a dar mais um consenso, mas a bancada do PS não mo permitiu. De facto, é muito complicado dar consensos desta forma.
Ora, o consenso do PSD é no sentido de se dispensar a redacção final, para, a partir do momento, em que a Assembleia da República fizer a votação final global, estarmos em condições de remeter de imediato o texto, para promulgação, a Sua Ex.ª o Presidente da República.
Agora, Sr. Presidente, não estamos dispostos a admitir que se faça tábua rasa daquilo que o Regimento determina, no que diz respeito ao funcionamento desta Casa, e que se possa confundir o exercício legítimo de direitos regimentais de qualquer grupo parlamentar com supostas atitudes de boicote ou obstrução aos trabalhos parlamentares. É uma questão de princípio e nessas nunca cedemos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, será talvez necessário encontrar num qualquer novo dicionário, a aprovar, outra forma que não «boicote» ou «obstrução» para aqueles actos que significam «não participação em reuniões de comissões de forma deliberada» ou «não participação deliberada em votações que tenham lugar na Assembleia da República».

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - Mas, Sr. Presidente, jamais atropelaremos os direitos regimentais de quem quer que seja - fique disso o PSD inteiramente ciente. Respeitaremos, pois, todos os direitos regimentais do PSD.
Porém, há direitos regimentais que se invocam, cuja causa de invocação pode revelar disponibilidade para a cooperação política ou falta dela. Nessa matéria, Sr. Presidente, sabê-lo-emos daqui a pouco, para dar inteiro acordo à sua sugestão de que se faça de imediato a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares. Depois, saberemos por que é que não terá sido eventualmente possível fazer hoje a votação global, que estava previsto pudesse vir a fazer-se.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estaremos de regresso às 19 horas e 30 minutos, hora a que se farão as votações a que houver lugar, de acordo com o que se passar na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.
Srs. Deputados, está interrompida a sessão.
Eram 18 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 19 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados, a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares clarificou ainda mais o problema que, há pouco, foi aqui debatido. E, para que todos os Srs. Deputados fiquem devidamente esclarecidos, o que estava em causa era a possibilidade de se votar, ainda hoje, o chamado diploma das 40 horas, por forma a que, prevendo ele que só entre em vigor seis meses após a sua publicação, pudesse entrar em vigor ainda antes do fim deste ano.
O Governo e o PS explicitaram, uma vez mais, as razões por que solicitavam a votação hoje; o PSD e o PCP explicitaram as razões regimentais por que não podiam aceitar a votação hoje e, não tendo havido consenso, a votação deste diploma não se fará hoje.

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Porém, houve consenso no sentido de que se ganhe o tempo possível, quer agendando a votação para a próxima quinta-feira, colaborando todos os grupos parlamentares nesse sentido, quer poupando tempo ao nível da redacção final, que se faria ou se dispensaria mesmo.
Por outro lado, chegámos a acordo em que, dado o tempo que se gastou com questões laterais, relativamente à ordem de trabalhos, a discussão conjunta da proposta de lei n.º 24/VII - Altera a Lei n.º 33/87, de 11 de Julho (Lei das Associações de Estudantes) e do projecto de lei n.º 59/VII - Alteração da Lei n.º 33/87, de 11 de Julho (Regula o exercício do Direito de Associação) (CDS-PP) seja agendada, na próxima Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, para outro dia. Isto, sem prejuízo de continuarmos, até ao fim, a discussão dos diplomas, cujo debate já foi iniciado.
Por isso, Srs. Deputados, sem necessidade de mais, vamos dar início às votações dos diplomas, cuja lista já foi distribuída.
Começamos pela votação, na generalidade, de quatro diplomas.
Em primeiro lugar, a proposta de lei n.º 23/VII - Cria o Conselho Consultivo para ás Comunidades Portuguesas.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Em segundo lugar, o projecto de lei n.º 21/VII Conselho das Comunidades Portuguesas no Mundo (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Em terceiro lugar, o projecto de lei n.º 44/VII - Cria os órgãos representativos dos portugueses residentes no estrangeiro (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, os três diplomas acabados de votar baixam à 2.ª Comissão.
Em quarto lugar, a proposta de lei n.º 3/VII Atribuição de pensão extraordinária aos trabalhadores abrangidos por acordos internacionais na Região Autónoma dos Açores(ALRA).

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Este diploma baixa à 8.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos agora passar à votação de cinco diplomas em votação final global.
Começamos pelo texto final, com as alterações aprovadas em sede de Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, relativo ao Decreto-Lei n.º 334/95, de 28 de Dezembro, que altera o Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro (Aprova o regime jurídico dos loteamentos urbanos) [Ratificações n.os 14/VII (PS) e 15/VII (PCP)].

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Segue-se o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, do projecto de lei n.º 62/VII - Prorrogação do prazo limite para submissão a inquérito público dos regulamentos municipais previstos no Regime Jurídico de Licenciamento de Obras Particulares (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos ao texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 64/VII - Permite a constituição como assistentes em processo penal no caso de crime de índole racista ou xenófoba por parte das comunidades de imigrantes e demais associações de defesa dos interesses em causa (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Temos agora o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 20/VII - Cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Por último, o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 17/VII - Estabelece o regime legal aplicável à defesa dos consumidores e revoga a Lei n.º 29/81, de 22 de Agosto.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário da Mesa vai dar conta de vários relatórios e pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (José Reis): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Viseu, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Cesário (PSD) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, por escrito, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário (José Reis): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo Cível da Comarca de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Octávio Teixeira (PCP) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, por escrito, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário (José Reis): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Júlio Faria (PS) a

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prestar, declarações num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes

O Sr. Secretário (José Reis): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 2.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Ourém, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de não autorizar o Sr. Deputado Mário Albuquerque (PSD) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, na altura da interrupção dos trabalhos ainda havia uma inscrição da nossa bancada para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro Adjunto, o que não chegou a acontecer.

O Sr. Presidente: - Quem é, Sr. Deputado?

O Orador: - É o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Presidente: - Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, a pergunta que lhe quero formular é a seguinte: recentemente, aqui nesta Assembleia da República, como todos os Srs. Deputados se recordarão, aquando da discussão do diploma da exclusividade dos directores-gerais e de outros cargos dirigentes da Administração Pública, o Sr. Ministro Adjunto, aqui presente nesta sessão, teve a oportunidade de demitir, por telefone, o Director do Gabinete de Estudos do Ministério das Finanças, que, nesse mesmo dia, tinha visto a sua nomeação para o Conselho de Fiscalização do INE publicada no Diário da República.
Neste momento, confesso que não sei ainda se a demissão oral já tem tradução no Diário da República, ou se já foi passada a escrito. Mas não é essa, obviamente, a matéria que me suscita a pergunta que quero fazer.
Muito recentemente, há dias, o Conselho de Ministros aprovou dois diplomas, dois decretos-leis: o decreto-lei que define o quadro orgânico do Ministério da Agricultura e o decreto-lei que define o quadro orgânico das Direcções Regionais de Agricultura. O que se passa nestes dois diplomas, que têm a ver com a matéria que hoje estamos aqui a discutir, é o seguinte: no último diploma, respeitante ao quadro orgânico das Direcções Regionais de Agricultura, definem-se as Direcções Regionais de Agricultura como serviços do Ministério da Agricultura, dotados de autonomia administrativa, que dependem directamente do Ministro. Até aqui nenhum problema.
Segunda questão: neste mesmo diploma prevê-se a existência de zonas agrárias e definem-se como sendo serviços operativos locais, em princípio de âmbito concelhio. Também aqui não existe qualquer problema nem praticamente qualquer inovação.
Terceira questão: as zonas agrárias podem estar agrupadas para efeitos de coordenação e supervisão a nível sub-regional. Também não há qualquer questão em relação a esta matéria.
Mas agora vem a questão que quero colocar ao Sr. Ministro Adjunto. É que, a seguir, neste diploma se diz que «estes agrupamentos de zonas agrárias serão supervisionados por um técnico, a designar por despacho do Ministro, equiparado a director de serviços». E o que quero perguntar ao Sr. Ministro é se faz sentido que, tendo, há dias, o Conselho de Ministros aprovado este diploma, tanto quanto esta Assembleia foi informada - não sei se houve alterações -, onde se prevê expressamente que cargos equiparados a directores de serviços sejam designados por despacho do Ministro, V. Ex.ª venha aqui fazer algumas das afirmações que fez no início deste debate.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto. Informo-o que o Sr. Deputado José Junqueiro desistiu do seu pedido de esclarecimento, pelo que pode utilizar todo o tempo de que dispõe.

O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, VV. Ex.as bem se esforçam para se desviarem do facto de, durante 10 anos, nunca terem feito concurso para nada, mas disso ninguém se vai esquecer!

Vozes do PS: - É verdade!

Protestos do PSD.

O Orador: - Já vi que agora se especializou em assuntos agrícolas, o que é também uma notícia nova neste Parlamento!
A minha resposta sobre a matéria é muito simples: quando este diploma for aprovado na Assembleia da República tem de se aplicar a toda a gente! É muito simples! Não é preciso tanta demonstração de tantos diplomas! É claro como a água, Sr. Deputado!

Aplausos do PS.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, não queria utilizar a figura do protesto, mas. tenho de o fazer.

O Sr. Presidente: - Faça favor. Prefiro o protesto à interpelação.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Se me permite, Sr. Presidente e Sr. Ministro, faço-o pelo seguinte: é que o Sr. Ministro Adjunto não respondeu à questão que coloquei.
Eu li o diploma - e não fiz mais do que a minha obrigação, já que é obrigação dos Deputados lerem este

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tipo de questões que são importantes - e a questão que se coloca é a seguinte: o Sr. Ministro Adjunto não pode responder a esta matéria dizendo que, quando esta lei for aprovada, ela se aplica. Não se aplica coisa nenhuma, porque este decreto-lei que aqui evidenciei em relação a esta matéria tem uma solução completamente diferente para matérias que são idênticas àquela que hoje se sujeita à discussão no Plenário da Assembleia da República!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para um contra protesto, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.

O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, quando esta lei for aqui aprovada, uniformizam-se os procedimentos. Não tenha problemas, pois tudo vai correr bem! Não se preocupe!

Risos.

O Sr. Presidente: - Para apresentar o projecto de lei n.º 158/VII - Altera o Estatuto de Pessoal Dirigente (PSD), tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto: Já tinha ouvido várias explicações para aquilo a que já chamei uma vez «governação por apalpação», mas esta última foi, de facto, o cúmulo dos cúmulos!

O Sr. Ministro Adjunto: - Obrigado!

O Orador: - Mas admito perfeitamente que seja assim a sua forma de governar!
Gostaria de dizer algo em relação a algumas perguntas que deixou latentes na sua intervenção de há pouco e de fazer uma brevíssima súmula introdutória em relação ao que nos traz aqui.
No fundo, se o Sr. Ministro Adjunto me permitir, até consigo elogiar a sua imaginação fértil. Hoje ouvi tantos e tais argumentos por parte de V. Ex.ª em relação à apresentação desta lei que fiquei com a seguinte ideia: este Ministro está com o complexo do cerco e vem aqui à Assembleia apresentar um diploma porque entende que toda a Administração Pública está contra ele, isto é, 700 000 funcionários públicos estão contra o Governo do Partido Socialista; 700 000 funcionários públicos estão contra as soluções do Governo socialista; 700 000 funcionários públicos estão contra aquilo que o Partido Socialista apresenta; 700 000 funcionários públicos não deixam o PS governar. Eu fiquei com esta ideia, porque a veemência com que, hoje, na rádio, V. Ex.ª disse estas coisas levou-me a pensar assim! E isso é natural, porque, se V. Ex.ª entender esta desculpa como mais uma desculpa hábil para justificar o que você ou o Governo a que pertence não conseguem fazer, só tenho de elogiar a sua imaginação.
Porém, não me parece que seja esse o problema, porque, verdade verdadinha, o que aqui temos são três iniciativas legislativas, que se caracterizam muito simplesmente da seguinte forma: na do Governo, suportado pelo Partido Socialista,...

O Sr. António Braga (PS): - E bem!

O Orador: - ... refere-se: «nós, ao contrário do que dissemos no programa eleitoral, não vamos aplicar a regra geral do concurso público, vamos aplica-la apenas para duas categorias: directores de serviços e chefes de divisão».

Vozes do PSD: - Nem isso!

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Onde é que isso está?!

Vozes do PS: - Leia o programa!

O Orador: - A pedido, vou ler o Programa Eleitoral do Partido Socialista, que diz assim: «Para tanto, assumiremos como objectivo inverter a tendência para a governamentalização, partidarização e instrumentalização clientelar de cargos, em especial no âmbito da Administração Pública, onde a regra deverá ser a do concurso em vez da nomeação».

Vozes do PS: - Continue, continue!

O Orador: - É igualmente a mesma coisa! «De igual modo, o combate à corrupção impõe (...)».

Vozes do PS: - Onde é que estão os directores-gerais?!

O Orador: - Eu explicarei!

Vozes do PS: - Ah!...

O Orador: - Sr. Presidente, a bancada do Partido Socialista...

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não têm o direito de interromper a propósito de tudo e de nada. Tenham paciência!

O Orador: - Sr. Presidente, eu até gosto que a bancada dó Partido Socialista tenha apartes quando eles são engraçados, mas não é este o caso! A bancada do PS está muito exigente hoje e tenho de ter uma dupla paciência para tentar explicar aquilo que quero e para tentar ouvir a bancada do Partido Socialista e, depois, responder.

O Sr. Presidente: - Conforte-se comigo, Sr. Deputado!

O Orador: - Tenho toda a paciência para o fazer, e V. Ex.ª também tem uma boa dose dela!
Gostaria de dizer que este princípio é importante. A questão dos directores-gerais ou dos chefes de serviço ou dos chefes de repartição não interessa, o que interessa é o princípio geral e esse é o do concurso público. E se assim é, então, só faz sentido que a solução a adoptar em relação a esta matéria seja a da regra geral do concurso público. Porque é que há-de ser em relação aos directores de serviços e aos chefes de divisão e não há-de ser em relação aos subdirectores-gerais e aos directores-gerais?
Gostaria de dizer ao Sr. Ministro, até para ver bem a abertura com que colocamos esta questão, que o artigo 3.º do nosso diploma diz o seguinte - e preste atenção, Sr. Ministro, vai ver que não se escandaliza com toda a certeza: «Recrutamento de Directores-Gerais e de Subdirectores-Gerais. O recrutamento para os cargos de

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director-geral, subdirector-geral e equiparados é feito por concurso, em regra de entre os dirigentes, assessores, (...) para cujo provimento seja exigível uma licenciatura, que possuam aptidão (...)». E diz o n.º 2: «Excepcionalmente, e mediante despacho fundamentado do membro do Governo competente, o recrutamento pode ainda fazer-se entre indivíduos licenciados não vinculados à Administração».
Ora aqui está, Sr. Ministro, como cumprimos uma regra e permitimos uma excepção. Porque entendemos que, porventura, entendendo a Administração desta maneira e o Sr. Ministro sabe muito bem, já que construiu essa solução pelo Direito Comparado, mas ele ficou-se nos países que tinham um modelo igual ou perto daquele que V. Ex.ª queria e não abrangeu os outros países, como a Itália e a Inglaterra; que têm um modelo diferente daquele que V. Ex.ª propugna, ou seja, em que há concurso geral para a classe dirigente da Administração Pública -, V. Ex.ª poderia chegar à conclusão de que, na verdade, a regra do concurso continuaria a aplicar-se ou a dever aplicar-se e haveria para alguns níveis de cargos de dirigentes da Administração Pública a excepção da nomeação sem concurso público.
A questão que agora queremos colocar, Sr. Ministro, advém da querela política entretanto instituída. Há aqui acusações cruzadas de nomeações, de centenas de nomeações, de milhares de nomeações, de não sei quantos milhares de cargos políticos, que V. Ex.ª várias vezes repete até à exaustão, e, na minha opinião, é extraordinário como V. Ex.ª acha admissível que, num regime democrático e de alternância, de um momento para o outro, com uma substituição de governo, milhares de cargos sejam substituídos.

Vozes do PS: - Oh!...

O Orador: - Então, isso significaria que todos esses cargos seriam de nomeação política, o que é absurdo e absolutamente recusável.

O Sr. José Magalhães (PS): - Então, e o Dr. Nogueira?!

O Orador: - E, portanto, a solução que propomos, Sr. Ministro, para resolver a sua dificuldade e a querela política institucionalizada, é uma despartidarização da função pública,...

O Sr. Ministro Adjunto: - Boa confissão!

O Orador: - ..., com concursos públicos, para que ninguém possa queixar-se de ninguém em relação a esta matéria, porque, Sr. Ministro, vamos lá ver: quer V. Ex.ª; quer o Partido Socialista, quer o Governo, muitas vezes acusam o PSD e os seus governos de terem feito muitas malfeitorias, designadamente em relação às nomeações e também às nomeações de cargos dirigentes, mas eu gostaria de recordar-lhe uma coisa que, a meu ver, é essencial, Sr. Ministro. É que o Governo a que V. Ex.ª pertence - e desminta-me se assim não for - tem cerca de 70 membros, dos quais cerca de um quinto foram nomeados pelos governos anteriores do PSD para titulares de altos cargos da função pública,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - .. . o que significa que nem todas foram assim más, Sr. Ministro.

Protestos do PS.

Porque, na verdade, se esses homens e mulheres serviram para membros do Governo actual e se tinham sido nomeados pelo PSD ou pelos seus governos,...

Vozes do PSD: - Claro!

O Orador: - ... então, foi porque não houve clientelismo, não houve nomeação política no sentido estrito do termo, não houve abuso nas nomeações e VV. Ex.as conseguiram aproveitar toda essa gente.

Aplausos do PSD.

Sr. Ministro, gostaria apenas de dizer-lhe uma outra coisa. V. Ex.ª diz que os trabalhadores se louvam na sua legislação e que faz isto por causa dos trabalhadores. Então, se assim é, por que é que os trabalhadores e o sindicato lhe querem tanto mal?

Risos do PSD.

Por que é que os sindicatos passam a vida a desdizer das suas medidas? Por que é que o Sr. Ministro nem sequer ouviu os sindicatos antes de trazer aqui esta proposta de lei?

Vozes do PS: - É mentira!

O Orador: - E, se quiser, posso ler-lhe o que diz um membro do sindicato, mas poupo-o a essas palavras, porque são demolidoras para V. Ex.ª, mas digo-lhe só isto:...

Vozes do PS: - Qual é o sindicato?

O Orador - ... «o que este ministro quer é acabar com o prestígio da função pública».

O Sr. Ministro Adjunto: - Ah!...

O Orador: - E incompreensivelmente, Sr. Ministro! E com isto acabarei, porque se não, depois, não terei tempo, eventualmente, para lhe responder.
Quando colocamos a questão dos concursos públicos, em princípio limitados ao âmbito da função pública, isso significa, em primeiro lugar, que V. Ex.ª não encontra na função pública, que tem 700 000 funcionários, pelo que é incompreensível, dirigentes à altura, excepto se houver, como é evidente, regras de excepção, como não pode deixar de ser, e que são aqui claramente inscritas. Mas o principal problema também é este: como é que V. Ex.ª consegue explicar aos funcionários da Administração Pública, que nesta altura estarão eventualmente em condições de aceder a estes cargos dirigentes, a razão pela qual não considera que eles estiveram durante estes anos todos regras de acesso à carreira, ao escalão seguinte da carreira, todas por concurso público? V. Ex.ª esquece-se que a progressão na carreira da função pública, nas várias carreiras, é feita por concursos públicos. Estas pessoas estão nesses lugares da carreira não por ter sido o PSD a

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nomeá-las ou a designa-las mas, sim, por terem subido na carreira, por terem chegado ao topo das carreiras...

Protestos do PS.

O Sr. Ministro Adjunto: - Não! Olhe a lei!

O Orador: - Sr. Presidente, se me dá licença...

O Sr. Presidente: - Eu dou, mas não lha posso dar sozinho...
Peço à Câmara o silêncio necessário para que o Sr. Deputado se faça ouvir.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Srs. Deputados, esses funcionários chegaram ao topo da carreira pela via dos vários concursos públicos.
Portanto, V. Ex.ª e não pode pôr em causa os concursos públicos que existiam,...

O Sr. Ministro Adjunto: - Está um pouco baralhado!

O Orador: - ... nem pode dizer que não havia concursos públicos, porque existiam. E agora todos esses funcionários sentem-se profundamente desautorizados por V. Ex.ª dizer que vai buscar pessoas fora da função pública, quando elas existem dentro e deviam ser aproveitadas.
Por outro lado, V. Ex.ª também disse no seu programa eleitoral que iria trabalhar com os funcionários que estão, que não iria pôr ninguém fora, ou seja, que iria aproveitar toda a gente - se quiser, recordo-lhe a página do seu programa eleitoral -,mas agora, com esta proposta de lei; V. Ex.ª está a desdizer o que disse.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não apoiado!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, antes de colocar-lhe uma questão, não posso deixar de dizer-lhe, com toda a frontalidade, que só V. Ex.ª, Sr. Deputado, é que podia fazer a intervenção que acabou de fazer.

O Sr. António Braga (PS): - Exactamente, mais ninguém na bancada!

O Orador: - O Sr. Deputado acaba por confessar, na sua intervenção, reconhecendo-o, que é preciso despartidarizar a função pública. Foi V. Ex.ª que o disse!
V. Ex.ª confessou o crime!

Aplausos do PS.

Aquilo que acusamos, aquilo que denunciamos, V. Ex.ª acabou por reconhecer que tínhamos razão. Tínhamos razão!
Ó Sr. Deputado, onde é que V. Ex.ª estava quando o seu ex-líder, o Dr. Fernando Nogueira, chamou demagógico e outras coisas mais ao Secretário-Geral do meu partido e actual Primeiro-Ministro, quando no debate que houve com o seu líder anunciou precisamente estas medidas, que devia ser feito concurso para os dirigentes da função pública? Os senhores apelidaram-nos de demagógicos, de irresponsáveis, por propormos medidas que não eram passíveis de concretização! Passados sete meses, são os senhores a virem. propor esses mesmos concursos, que nós tivemos a coragem de propor?!

O Sr. Ministro Adjunto: - Pior!

O Orador: - Sr. Deputado, ao fim de todo este tempo de debate, chegamos à conclusão que os senhores, em 10 anos, fizeram três concursos ...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Lá vem ele!

O Orador: - Três concursos!

O Sr. António Braga (PS): - E um deles de «totobola»!

Risos do PS.

O Orador: - Mas, Sr. Deputado, há ainda uma pergunta que gostaria de fazer, já que V. Ex.ª aludiu ao sindicato. Em primeiro lugar, qual é o sindicato, embora eu saiba a resposta? Em segundo lugar, a este propósito, o Secretário-Geral desse sindicato não é membro da Comissão Política do seu partido?

Protestos do PSD.

Eu gostaria de saber, Sr. Deputado!

Aplausos do PS.

É muito bonito virmos aqui invocar a ética, invocarmos essas coisas todas, mas o senhor pegou em argumentos do sindicato em causa, divulgados por um membro do seu partido, membro da Comissão Política do seu partido, que eu saiba.

Uma voz do PS: - Mas está para ser despromovido!

O Orador: - Ó Sr. Deputado, há ainda uma coisa muito grave: V. Ex.ª citou o programa eleitoral do PS.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Isso é grave, gravíssimo!

O Orador: - É gravíssimo o que o Sr. Deputado disse. Mas passo a explicar, porque estas coisas explicam-se muito facilmente.
V. Ex.ª citou,...

O Sr. José Magalhães (PS): - E citou mal!

O Orador: - ... porque o obrigamos a citar, que o PS tinha dito, nesse programa, que propunha o concurso para directores-gerais e subdirectores-gerais. Mas, mais.. .

Protestos do PSD.

Sr. Deputado, vou, com muito gosto, citar-lhe, embora vá falar disso na minha intervenção, aquilo que diz...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradecia que fosse breve...

O Orador: - Acabarei já, Sr. Presidente, peço apenas 30 segundos, para dizer uma coisa muito simples.
No contrato de legislatura apresentado pelo PS diz-se: «no que se refere aos quadros superiores da administração central, deverá substituir-se a livre nomeação pela carreira e concurso, como vias de acesso a funções de direcção,

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com excepção dos cargos de directores-gerais ou equiparados». Foi isto, Sr. Deputado, o que se disse.

Protestos do PSD.

É esta chicana que os senhores andaram durante todo este tempo a fazer que tem de ser denunciada hoje, porque os senhores não têm autoridade moral para o fazer.

Aplausos do PS.
Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputado, peço que não entrem em diálogo directo.
Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, nunca imaginei ouvir o que acabei de ouvir.

Vozes do PS: - Ah!...

O Orador: - É que o Sr. Deputado não só fez uma desconsideração objectiva para todos os líderes sindicais do PS, que, pelos vistos, se portam como dirigentes partidários,...

Vozes do PS: - Vocês é que são bons, os outros são maus!

O Orador: - ... o que me parece inadmissível,...

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Está em Acta!

Protestos do PS.

O Orador: - ... como ainda ousou - veja bem, Sr. Presidente, «ousou» - ofender o Sr. Primeiro-Ministro, dizendo: «o nosso Primeiro-Ministro» - o Primeiro-Ministro do PS.
De duas uma: ou não leu o contrato de legislatura, ou na televisão se pronunciou ao contrário, ou o princípio geral vale exactamente o inverso daquilo que acabou de dizer.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, quer resumir o relatório de que é relator, relativamente a este projecto de lei?

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Assim, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Começo esta intervenção com um esclarecimento, para que não fiquem quaisquer dúvidas, na sequência do facto falso aqui referido pelo Sr. Deputado Carlos Encarnação, a propósito «do Primeiro-Ministro do PS». Sempre pensei que o Primeiro-Ministro fosse o Primeiro-Ministro de Portugal, mas ficamos a saber que o Sr. Deputado Carlos Encarnação considera-o o «Primeiro-Ministro do PS».
Srs. Deputados, vou citar as palavras textuais - textuais porque não temos medo da verdade -...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... do Sr. Engenheiro António Guterres, ditas aquando do debate havido no Canal 1 da RTP, realizado em 7 de Dezembro de 1995:...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Ouçam!

O Orador: - ... «por forma a evitar o clientelismo na Administração Pública, vamos limitar as nomeações dos dirigentes da função pública e instituir o concurso, com júri, até aos directores-gerais».
Foi isto o que o Sr. Primeiro-Ministro disse...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Inclusive ou exclusive?!

O Orador: - ... e não outra coisa.

Aplausos do PS.

Eu citei, Srs. Deputados, e fi-lo para que não restassem dúvidas quanto ao que o Sr. Primeiro-Ministro disse.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados do PSD estão agora a cometer a mesma falta que, há pouco, lamentavam. Peço que criem as condições necessárias para que o Sr. Deputado no uso da palavra se faça ouvir.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Se os Srs. Deputados do PSD se acalmarem, talvez possa continuar a minha intervenção apesar de saber que estas palavras são eventualmente complicadas...
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PS dá o seu apoio à proposta do Governo que estabelece os princípios a que deve obedecer o regime de recrutamento e selecção de directores de serviços e chefes de divisão para os quadros da Administração Pública.
Fazemo-lo antes de mais porque o Governo cumpre um dos seus objectivos estratégicos tendentes à reforma da Administração Pública, qual seja o de despartidarizar e desgovernamentalizar a própria Administração e a consagração do concurso como regra de recrutamento de director de serviço e chefe de divisão constitui um importante contributo para atingir tal desiderato.
É significativo que seja o Governo a apresentar à Assembleia da República alteração tão importante, não que os concursos para o recrutamento de director de serviço e chefe de divisão não estivessem já previstos no Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, ainda que de forma residual.
Ainda assim, importa perguntar: quantos concursos foram abertos nos últimos 10 anos? Quantos directores de serviços e chefes de divisão foram recrutados para tais cargos? A resposta é uma: até agora, tivemos conhecimento de três através de uma Subsecretária de Estado que não pertencia ao PSD pelo que todos ficámos a perceber a razão por que abandonou o Governo mais cedo.
É por essa razão que o Grupo Parlamentar do PS não pode deixar de denunciar a extrema - o que digo com toda a frontalidade - hipocrisia política do PSD. Ou será que o PSD, para além do rigor e da verdade que não tem, perdeu agora a memória? Será que o PSD adoptou como método político o recurso à amnésia?
Nos últimos 10 anos de governação, o PSD burocratizou, partidarizou e governamentalizou a Administração

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Pública, nomeadamente ao nível dos seus altos dirigentes, o que fez sem escrúpulos ou atenção por quaisquer critérios que não fossem o do cartão laranja e o das fidelidades pessoais e políticas.
O PSD limitou-se a preencher e a ocupar lugares da Administração Pública, nomeadamente os dos seus. dirigentes, com o único objectivo de controla-la. Nada foi feito para criar uma Administração Pública ao serviço do desenvolvimento harmonioso do País.
A qualificação, a dignificação, a motivação e a profissionalização dos recursos humanos da Administração é um objectivo estratégico fundamental com vista à prossecução da reforma da Administração Pública que o Governo assumiu e como tal consagrou no seu programa eleitoral.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não é possível levar a sério quem há sete meses considerava demagógicas as propostas eleitorais do PS no que à reforma da Administração Pública diz respeito, nomeadamente aquelas que se prendiam com o combate ao clientelismo na Administração Pública, e que agora vem não só adoptar como - pasme-se! - tentar até ultrapassa-las. É caso para dizer que o PSD já nem a sua razão estima ou preserva. A isto chama-se falta de seriedade política!

Aplausos do PS.

O PSD não conseguiu concretizar qualquer plano congruente de modernização administrativa, comprometeu-se a melhorar e a tornar mais leve a Administração Pública e o que aconteceu? Nada! Os governos do PSD ainda agravaram mais a situação.
Em 1988 o total dos efectivos da função pública na administração central era cerca de 405 000 funcionários; em 1994 esse número passou para 536 552.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - E sabe porquê?

O Orador: - Grande número destas novas admissões não pretendeu prosseguir a finalidade da melhoria do serviço público. Muitas corresponderam a um mero interesse de servir clientelas. Não é, pois, de estranhar que a desmotivação se tenha instalado no seio dos funcionários públicos, particularmente daqueles que dedicaram a sua vida ao serviço público.
Os governos do PSD protagonizaram um processo gradual de divórcio entre os cidadãos e a sociedade civil e a Administração Pública, desprezando todas e quaisquer contribuições construtivas que eram feitas.
Os governos do PSD confundiram, porque isso ia de encontro aos seus interesses, a decisão ao nível político da decisão ao nível administrativo, nomeando e controlando, sem excepção, todos os dirigentes.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, consideramos absolutamente necessário enraizar na sociedade e no Estado uma ética prática de dedicação ao interesse público e separação entre os partidos e o Estado. O concurso proposto pelo Governo para ser a regra para o recrutamento de directores de serviço e chefes de divisão é um importante meio para viabilizar a desgovernamentalização na Administração Pública ao nível dos seus dirigentes.
Consideramos correcta a posição do Governo de não aplicar o concurso ao recrutamento de directores-gerais e subdirectores-gerais. Com efeito, trata-se de cargos em que os seus titulares exercem funções que implicam um elevado grau de confiança política. Não pode ignorar-se que o director-geral tem, entre outras funções, a de participar na elaboração das políticas governamentais na parte correspondente ao sector a seu cargo. Ora, a especificidade destas funções não se confunde com as dos directores de serviços e chefes de divisão, as quais se desenvolvem em áreas bastante diferentes.
O que pretendemos é garantir uma separação ao nível predominantemente político, como é o caso dos directores-gerais e dos subdirectores-gerais, da decisão ao nível administrativo, como é o caso dos directores de serviço e chefes de divisão.
O recrutamento por concurso destes dirigentes da Administração Pública permitirá que seja viabilizada a desgovemamentalização na Administração Pública ao nível destes dirigentes.
Aliás, no contrato de legislatura apresentado aos portugueses o PS propôs, e cito: «No que se refere aos quadros superiores da Administração Central, deverá substituir-se a livre nomeação pela carreira e concurso, como vias de acesso a funções de direcção, com excepção dos cargos de directores-gerais ou equiparados».
Esta proposta de lei admite que o recrutamento para os cargos de director de serviço e chefe de divisão possa ser feito entre cidadãos exteriores à Administração. Cremos que é uma inovação importante que nada afecta ou põe em causa os legítimos direitos e interesses dos trabalhadores da Administração Pública.
As reformas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, são dirigidas ao cidadão, razão última da existência dos serviços públicos e em face de cujos direitos e interesses as reformas devem ser encaminhadas.
Não é admissível criar um estado de suspeição em relação aos cidadãos sem vínculo à Administração Pública. A reforma da Administração em Portugal não deve envolver apenas a máquina administrativa do Estado, deve também envolver a sociedade civil, a própria comunidade dos cidadãos, abrindo a porta a uma participação interactiva de uma e outra.
Quem provocou deliberadamente a crise da Administração Pública, quem promoveu a auto-suficiência a critica, quem nada fez para contrariar situações generalizadas de sub-qualificação profissional, de desinteresse ou apatia profissional e de funcionamentos discricionários não tem hoje legitimidade para criticar o Governo pelo cumprimento de mais um dos compromissos que assumiu perante os portugueses.
Srs. Deputados do PSD; é momento de perguntar-lhes: onde estiveram nos últimos 10 anos ?

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - A governar!

O Orador: - Por que é que em 10 anos de exercício do poder com maioria absoluta não fizeram concursos para os dirigentes da Administração Pública? Em suma, porque é que nomearam praticamente todos os dirigentes da Administração Pública?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tendo-lhe sido concedidos cinco minutos pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - É mais do que um minuto por Deputado!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, começo por agradecer ao Partido Popular a cedência de

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tempo sendo certo que procurarei ser rápido em qualquer circunstância.
Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, começou a sua intervenção citando a entrevista do Dr. António Guterres, que também conhecemos, mas digo-lhe com toda a franqueza ficar-lhe mal ter citado apenas a parte que lhe interessava pelo que complementarei o que referiu. O Engenheiro António Guterres disse na RTP, no debate em causa, o seguinte: «Vai haver uma fortíssima redução das nomeações directas do Governo e vai ser restabelecido o concurso com júri até ao nível de director-geral e mesmo até a alguns directores-gerais». Ora, considero esta uma questão essencial.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - O essencial é «alguns» ou os outros?

O Orador: - O projecto de lei do Partido Social Democrata, no que, de resto, é acompanhado pelo do Partido Popular, permite, contrariamente à proposta de lei,
que o Engenheiro Guterres honre as promessas que fez ao eleitorado português e possa nomear alguns directores gerais por concurso público. Assim, quando o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes citou o Primeiro-Ministro ficava-lhe bem não ter omitido o que não lhe fazia jeito.
Para além desta precisão e a propósito da proposta de lei, de que o Sr. Deputado falou muito pouco, limitando-se, em vez disso, a tecer considerações sobre o passado, atitude a que já estamos habituados, como não tive oportunidade de colocar uma questão ao Sr. Ministro, aproveitava para formular-lha. Tem ela a ver com o facto de ser inconcebível, do nosso ponto de vista, o novo critério de selecção que pretende introduzir-se. É um «novo método de selecção - é este o termo empregue - que pretende avaliar a capacidade para garantir a execução das orientações superiormente fixadas e a realização dos objectivos previstos». Como na proposta de leio outro método de selecção consiste na avaliação curricular, estamos de acordo que, quando se fala em avaliar a capacidade para garantir a execução das orientações superiores, não está a pensar-se com certeza na capacidade habilitacional porque essa é cumprida através da avaliação curricular.
Portanto, caso o diploma fosse aprovado, estaria a pretender-se apenas criar um mecanismo de avaliação política da capacidade das pessoas, uma vez que a capacidade habilitacional é verificada noutra sede.
De resto, os senhores foram copiar estas palavras do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, que tem a ver com a cessação das comissões de serviço e no qual se diz que estas podem, a todo o tempo, ser dadas por findas por despacho fundamentado do membro do Governo competente, podendo tal fundamentação basear-se na não comprovação superveniente da capacidade adequada a garantir a execução das orientações superiormente fixadas. Copiaram este texto retirando a palavra «supervenientes». Mas, Sr. Deputado, não concorda que a avaliação da capacidade para garantir a execução das orientações superiormente fixadas faz-se de uma de duas formas, ou curricular ou supervenientemente?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, muito obrigado pelas questões colocadas. Antes de mais, gostava de referir-lhe, porque é importante que fique registado nas actas desta sessão, que o Partido Socialista assumiu um compromisso eleitoral perante os portugueses: o Partido Socialista, através do seu Governo, propõe-se, decorridos sete meses da sua tomada de posse, assumir integralmente esse compromisso ao vir aqui apresentar esta proposta de lei.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mostrei-lhe que não!

O Orador: - Para a opção relativa aos directores-gerais e subdirectores-gerais há uma justificação política que assumimos mas o Sr. Deputado não contestou...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E não contesto!

O Orador: - ... o que disse a esse respeito na minha intervenção. E sabe por que é que não contesta? Porque sabe que eu e o Governo temos razão nesta matéria. Trata-se do exercício de funções políticas e não é exigível a quem é opositor de um concurso a prática de determinadas funções políticas porque as mesmas só podem ser desempenhadas por quem tem a confiança política do membro do Governo respectivo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Com o devido respeito, o Sr. Deputado pode fazer a chicana política que quiser mas sabe que tenho razão.
E digo-lhe mais: tanto o Partido Socialista como o Governo usaram de boa fé, o que o senhor reconhece, mas vou provar que os senhores não usaram da mesma boa fé. Para tal, basta ler o n.º 2 do artigo 3.º do vosso projecto de lei, que diz esta coisa brilhante: «As nomeações do pessoal dirigente para os cargos referidos no presente diploma ficam suspensas até à entrada em vigor do regulamento previsto no número anterior, sendo as respectivas funções asseguradas pelos actuais titulares».
Rigorosamente, os senhores pretendem protelar este debate porque exigem que essas alterações e normas sejam aprovadas por decreto-lei. Para quê? Para requererem a ratificação desse decreto-lei na Assembleia, de forma a impedirem que entrem em vigor os diplomas que vão regular esta matéria. Os senhores querem algo muito simples: sob a capa dos concursos públicos, pretendem evitar que o compromisso do Partido Socialista, que está no poder e é Governo, seja assumido até às últimas consequências. O que os senhores querem, no fundo, é manter, sem mais, aqueles que nomearam ao longo de 10 anos e digo-o com toda a franqueza.

Aplausos do PS.

Termino dando uma boa notícia: em sede de Comissão e no âmbito da discussão na especialidade, estamos disponíveis para considerar com toda a certeza as melhores soluções que devem ser consagradas no âmbito deste diploma. O Partido Socialista não é um partido fechado nem tem a arrogância que, como o senhor sabe, outros tiveram noutras condições nesta Assembleia, pelo que assumimos que, na especialidade, beneficiaremos este diploma.
É o que faremos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, inscreveu-se para que efeito?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é para fazer um protesto porque fui acusado de má fé.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, acusou a minha bancada e eu próprio de má fé na apresentação do nosso projecto de lei. Mais uma vez, incorreu no lapso a que há pouco fiz referência e que, como é evidente pois outra coisa não podia acontecer da sua parte, não desmentiu quando, invocando as palavras do Sr. Engenheiro António Guterres, só falou do que lhe interessava. Ao acusar de má fé o projecto de lei do PSD, o senhor também só citou o que lhe interessava. Assim, pela segunda vez no espaço de 10 minutos, vejo-me obrigado a corrigir o Sr. Deputado porque é reincidente numa prática de só dizer o que lhe interessa para tirar as conclusões que lhe interessam, o que, do meu ponto de vista, não é debater com seriedade.
O Sr. Deputado acusou o PSD de má fé por apresentar o artigo 3.º do projecto de lei, tendo lido o seu n.º 2 e tirando a conclusão de que a má fé resultava do facto de a nossa intenção ser a de protelar o mais possível a realização do concurso para perpetuar as situações actualmente existentes. Ora, o Sr. Deputado sabe perfeitamente que aquele n.º 2 é antecedido por um n.º 1 no qual se diz que esse regulamento é aprovado pelo Governo...

Protestos do Deputado do PS Nuno Baltazar Mendes.

O Orador: - Assim, pergunto: se é o Governo que aprova o regulamento, como é possível esta Assembleia ou o PSD protelarem o que quer que seja? Só se o Governo não quiser regulamentar os concursos.

O Sr. Presidente: - Para um contra-protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, sejamos claros: o n.º 1 em nada afasta o que diz o n.º 2.
Sr. Deputado, tem de ser rigoroso! Eu também leio!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas não leu!

O Orador: - O Sr. Deputado sabe perfeitamente que o n.º 1 diz o seguinte: «As normas regulamentares do disposto no presente diploma, nomeadamente sobre o júri, a abertura e funcionamento dos concursos, são aprovadas por decreto-lei, mediante adaptação do regime geral de recrutamento e selecção em vigor na Administração Pública.» E o que diz o n.º 2 é muito simples: «(...) ficam suspensas até à entrada em vigor (...)» do presente regulamento todos e quaisquer concursos...

Protestos do Deputado do PSD Luís Marques Guedes.

O Orador: - O que os senhores querem é evitar que os concursos sejam feitos para, com isso - e isto tem de ser dito aqui -, prolongar o mandato de quem está nestes lugares e que os senhores nomearam. O senhor tem de reconhecer isto!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só há prolongamento se o Ministro quiser!

O Orador: - O Sr. Deputado também não percebeu o que eu disse acerca da ratificação.
Nós não somos ingénuos e quando os senhores vêm exigir que as normas regulamentares sejam aprovadas por decretos-leis o que querem é sujeitá-los a ratificação da Assembleia da República para evitar...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A ratificação não é suspensiva!

O Orador: - Os senhores têm de ouvir o que vos digo porque isto é verdade!

Aplausos do PS.

E os senhores querem usar isto como uma chicana política para, ao fim e ao cabo, protelarem...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é ridículo!

O Orador: - Não é ridículo, é a verdade!
O que os senhores querem é evitar que os concursos sejam feitos, prolongando o mandato de quem está a exercer funções.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não tem razão!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, na sessão de hoje, a simples invocação do direito de protesto e contra-protesto «inflacionou» os pedidos de palavra para o efeito. Assim, tentando recuar um pouco, recordo que não há lugar a protesto nem a contra-protesto relativamente a pedidos de esclarecimento e às respectivas respostas.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Governo diz querer prosseguir o objectivo de maior transparência na Administração Pública.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Diz, diz!

A Oradora: - Tenha calma, Sr. Deputado!
Para isso, apresenta na sua proposta de lei uma alteração, consagrando a regra do concurso como método normal e obrigatório para recrutamento e selecção de directores de serviços e chefes de divisão. Com isto visa substituir o método da escolha consagrado no diploma de 1989, em vigor durante os mandatos dos governos do PSD.
A este propósito, convirá salientar, como primeira nota importante, o seguinte: o PS, nos recrutamentos a que procedeu desde que é Governo, bem poderia ter usado um dos artigos do diploma de 1989 para fugir às acusações de que tem sido alvo, consagrada na expressão jobs for the boys...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Não, Sr. Deputado, não é muito bem para nenhum lado!
Tal expressão, como ia a dizer, portuguesmente falando, tem traduções vicentinas mais ao gosto popular.
De facto, o n.º 3 do artigo 4.º do actual Decreto-Lei n.º 323/89 já estabelece o concurso, em vez da escolha, por opção da entidade competente. Assim, o PS não se pode escudar na legislação actual, para justificar o uso, até agora, do critério da escolha. Não pode escudar-se nessa legislação para justificar a menor transparência em recrutamentos efectuados. Valerá, a este propósito, o aforismo popular, sempre que o bom senso não preside à tomada de decisões: «guardado está o bocado».
Em segundo lugar, importa dizer que, mais uma vez, a prática vem desmentindo algumas afirmações feitas a propósito daquilo que se tornou refrão em certos discursos: o diálogo.

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Na verdade, o Governo, que, a propósito de outras matérias como a flexibilidade e a polivalência, diz só admitir aquilo que resultou de acordo na concertação social, operando a submissão do poder político, representado pela Assembleia da República, ao poder económico, nesta matéria que hoje estamos a discutir, faz tábua rasa do acordo que celebrou com os sindicatos da função pública relativamente a medidas de curto prazo.

O Sr. José Calçada (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - Com efeito, consta do acordo que matérias como a da revisão do regime de carreiras e cargos dirigentes seriam objecto de negociação em mesas parcelares. E, no entanto, este diploma chegou à Assembleia da República sem ter sido objecto de qualquer negociação com os sindicatos da Administração Pública, contra o que tinha sido acordado. É claro que aqui não existia o lobby da CIP, da CAP e da CCP e, assim, o Governo sentiu-se à vontade para violar o acordo. A palavra de honra do Governo parece funcionar apenas em relação àqueles lobbies.
Não fora a Assembleia da República a dar-se conta de que tinha de proceder-se à consulta pública das organizações representativas dos trabalhadores, o diploma teria passado, inconstitucionalmente, à revelia de protagonistas deste regime proposto pelo Governo.
O diploma parece ter disposições que, de facto, não concretizam os objectivos anunciados no preâmbulo.
Defendemos também, para o recrutamento e selecção dos directores de serviços e chefes de divisão, a regra do concurso como forma de assegurar os princípios da transparência, da despartidarização e da desgovernamentalização.
Importa saber se o Governo cria na proposta de lei os mecanismos necessários para que tais objectivos sejam atingidos ou se, mais uma vez, nos fala da «nuvem» e apenas nos dá «Juno».
Com efeito, o artigo 5 º do diploma permite uma área ilimitada de recrutamento. Permite-se que o recrutamento seja feito fora da Administração Pública, retira-se a exigência de licenciatura para se admitir que os recrutados tenham apenas curso superior ou equiparado adequado. O universo é, assim, enorme, sendo lícita a dúvida - para quem a coloque - sobre o número dos boys visados que não poderiam ser abrangidos pelo actual diploma se o Governo tivesse usado da possibilidade, prevista no mesmo, de optar pelo concurso. Pode perguntar-se, e haverá quem pergunte: será isto o que faz correr o Governo ao fazer tábua rasa da mesa negocial com os sindicatos?
Com este mesmo assunto está relacionado o que o Governo propõe relativamente ao júri.
De facto, permite-se na proposta de lei que o júri tenha pessoas não vinculadas à Administração Pública, alheias à realidade funcional e orgânica da mesma, por nomeação política, logo, pessoas, à partida, marcadas com o estigma de dependência do poder executivo. Donde se conclui que, afinal, o diploma contém os mecanismos que permitem que se chegue a resultados perversos contrários aos princípios proclamados, aos princípios da desgovernamentalização, da despartidarização, da transparência.
Mas também a proposta de lei permite o ingresso na carreira técnica superior a indivíduos que não tenham a licenciatura, exigência que, ao contrário, se faz para os trabalhadores da Administração Pública.
Com efeito, em artigo do actual diploma, que o Governo não altera e se manterá em vigor, os directores de serviços e os chefes de divisão, finda a comissão de serviço, respeitados que estejam os outros requisitos, podem ingressar na carreira técnica superior. Mas, no actual diploma, isto compreende-se porque é requisito de recrutamento para os referidos cargos a licenciatura, requisito igual ao de ingresso na carreira técnica superior.
Como o Governo se quer bastar apenas com curso superior ou equiparado adequado, temos, então, que pessoas sem licenciatura poderão vir a ingressar na carreira técnica superior sem os requisitos exigidos para o ingresso normal nessa carreira, o que evidencia uma clara situação de favor para aqueles e uma restrição grave no direito de acesso à carreira técnica superior, relativamente aos trabalhadores da Administração Pública. Isto certamente teria sido notado na mesa negocial que o Governo se comprometeu a realizar, mas que ficou «no tinteiro». E, mais uma vez, pode perceber-se porquê.
De resto, as preocupações avolumam-se quando se repara que é o tal júri, que pode ser externo à realidade concreta da Administração Pública, o júri dependente de nomeação política, que vai decidir se as pessoas sem vínculo à função pública têm desempenhado funções, no exterior da Administração, correspondentes a curso superior ou equiparado adequado, formulações estas que se não são canhestras revelam perícia na vacuidade dos conceitos que tudo permitem.
A proposta de lei, para além de, em nosso entender, não primar pela anunciada transparência, torna possível o recrutamento entre candidatos sem experiência, alguns que o júri considere com perfil profissional ou, como diz a proposta, com a adaptação profissional ao lugar a desempenhar. Mas como é que um júri, alheio à Administração Pública, pode fazer esta avaliação relativamente a pessoas exteriores à mesma?
Para além de permitir o recrutamento entre pessoas sem experiência, a proposta de lei acaba por permitir a essas mesmas pessoas o ingresso na carreira técnica superior, num verdadeiro salto, como já atrás notámos. Digamos que é insustentável defender que o diploma se insira no objectivo de qualificar e dignificar a Administração Pública pois tem, pelo menos, os condimentos que podem pôr em causa essa dignificação e qualificação.
Se o Partido Socialista não pode louvar-se neste diploma, para o qual acabou por usar da opacidade de não o colocar em negociação, também ao PSD) não assiste qualquer argumento ético para se envolver na querela dos jobs ...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Lá vem o passado!

A Oradora: - ... porque usou e abusou da opacidade enquanto foi Governo.
De resto, divergimos relativamente aos projectos de lei do PSD e do CDS-PP por considerarmos que os cargos de directores-gerais e de subdirectores-gerais são, de facto, cargos de confiança política.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Mas temos também o entendimento de que esta confiança política não pode depois desenvolver-se em tentáculos noutros patamares da Administração Pública. Este não é, nem pode ser, o retrato do Governo, mas tem de ser o retrato do Estado de direito democrático. E quando a transparência não está assegurada, mal vai à democracia.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o debate conjunto da proposta de lei n.º 27/VII e dos

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projectos de lei n.os 115/VII e 158/VII, que baixam à Comissão respectiva sem votação na generalidade, de acordo com um requerimento nesse sentido, subscrito por Deputados do PS, que é do seguinte teor: Nos termos do artigo 156.º do Regimento, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista requerem a baixa à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da proposta de lei n.º 27/VII e dos projectos de lei n.os 115 e 158/VII, sem votação na generalidade, a fim de permitir a consulta legal necessária, por um prazo de 15 dias.
Srs. Deputados, a próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 10 horas, e constará de uma sessão de perguntas ao Governo.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 55 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD):

António Fernando da Cruz Oliveira.
João Álvaro Poças Santos.
José Augusto Gama.
José Manuel Nunes Liberato.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Nuno Kruz Abecasis.

Partido Comunista Português (PCP):

João António Gonçalves do Amaral.
Maria Odete dos Santos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Carlos Justino Luís Cordeiro.
Francisco José Pinto Camilo.
Henrique José de Sousa Neto.
João Soares Palmeiro Novo.
José Carlos das Dores Zorrinho.
Luís António do Rosário Veríssimo.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Sérgio Humberto Rocha de Ávila.

Partido Social Democrata (PSD):

Hugo José Teixeira Velosa.
João Bosco Soares Mota Amaral.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Paulo Sacadura Cabral Portas.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Lino António Marques de Carvalho.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.

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