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Quarta-feira, 12 de Junho de 1996 I Série - Número 81

DIÁRIO da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1995-1996)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 11 DE, JUNHO DE 1996

Presidente: Exmo. Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Maria Lusa Lourenço Ferreira

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de diversos diplomas, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Foi aprovado o voto n.º 28/VII - De protesto pela atitude do Reino Unido de falta de sensibilidade em relação à urgência da adopção da posição europeia sobre Timor leste (PS, PSD, CDS-PP, PCP e Os Verdes), tendo feito intervenções os Srs. Deputados Maria Carrilho (PS), Carlos Encarnação (PSD), Paulo Portas (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes).
A Câmara aprovou também pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativos à retoma de mandato de um Deputado do PS e às substituições de Deputados do PS e do PSD.
O Sr. Deputado Jorge Ferreira (CDS-PP) interpelou a Mesa, inquirindo das razões pelas quais a Comissão Eventual de Inquérito à utilização de verbas provenientes do FEOGA ainda não tinha iniciado os seus trabalhos, tendo também feito interpelações os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Joel Hasse Ferreira (PS) e Carlos Encarnação (PSD).
Procedeu-se a um debate de urgência, requerido pelo PSD, sobre a execução dos projectos financiados pelos fundos estruturais, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (João Cravinho), os Srs. Deputados Ferreira do Amaral (PSD), Paulo Portas (CDS-PP), Joel Hasse Ferreira (PS), Lino de Carvalho (PCP), Henrique Neto (PS), Manuela Ferreira Leite (PSD), Isabel Castro (Os Verdes), Carlos Zorrinho (PS) e Francisco Torres (PSD).
Ao abrigo do n.º2 do artigo 8l.º do Regimento, usou da palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Correia (PS), destacando o início do processo de legalização de imigrantes clandestinos em resultado de lei aprovada pela Assembleia e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes) e António Filipe (PCP).

Ordem do dia. - A proposta de lei n.º3l/VII-Revê o Código de Processo Civil, designadamente com as alterações nele introduzidas pelo Decreto-Lei n.º329-A/95, de 12 de Dezembro, foi discutida na generalidade, tendo produzido intervenções, a diverso título, além do Sr. Ministro da Justiça (José Vera Jardim), os Srs. Deputados Helena Santo (CDS-PP), Osvaldo Castro (PS), Miguel Macedo (PSD), Odete Santos (PCP), Guilherme Silva (PSD) e Nuno Baltazar Mendes (PS).
Entretanto, a Câmara rejeitou, na especialidade, o projecto de lei n.º151/VII - Alteração à Lei n.º11/90, de 5 de Abril (Lei-Quadro das Privatizações) (PS).
Foi ainda discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º34/VII - Altera o artigo 85.º da Lei n.º38/87, de 23 de Dezembro, e o artigo 112.º da lei n.º47/86, de 15 de Outubro (Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais e do Ministério Público), tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro da Justiça (José Vera Jardim), os Srs. Deputados Guilherme Silva;(PSD), Helena Santo (CDS-PP), Nuno Baltazar Mendes (PS) e António Filipe (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 20 minutos.

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O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
João Soares Palmeira Novo.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Laçado Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueira.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Pinto Simões.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro
Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rita Maria Dias Pestana Cachuxo.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Humberto Rocha de Ávila.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.

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Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madail.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Povoas.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel Maria Mendonça da Silva Carvalho..
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Maria Manuela Guedes Outeiro Pereira Moniz.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Paulo Sacadura Cabral Portas.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá. Maria
Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Secretário para dar conta dos diplomas, dos requerimentos e das respostas a requerimentos que foram apresentados à Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 38/VII - Jogo instantâneo (ALRA), que baixou à 4.ª Comissão; projectos de lei n.º5 171/VII- Altera a Lei n.º 4/84, de 5 de Abril (Protecção da Maternidade e Paternidade) (CDS-PP), que baixou às 8.ª e 12.ª Comissões; 172/VII - Publicidade da qualidade da água de abastecimento (PS), que baixou à 4.ª Comissão, e 173/VII - Utilização de papel reciclado pela Administração Pública (PS), que baixou à 4.ª Comissão; ratificação n.º 21/VII - Decreto-Lei n.º 63/96, de 28 de Maio, que aprova o processo de reprivatização do capital social da Tabaqueira -,Empresa Industrial de Tabacos, SA (PCP); projecto de resolução n.º 24/VII - Política global de, família (CDS-PP); projecto de deliberação n.º 16/VII - Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República, o qual será votado na sessão de amanhã.
Foram apresentados, à Mesa, na última reunião plenária, os seguintes requerimentos: ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Mota Amaral e Macário Correia; ao Ministério da Solidariedade e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado José Costa Pereira; ao Ministério para, a Qualificação e o Emprego, formulado pelo Sr. Deputado Cruz Oliveira; ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Pacheco Pereira; aos, Ministérios do Equipamento, Planeamento e da Administração do Território e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado Luís António Veríssimo; às Secretarias de Estado da Juventude e dos Desportos e ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Ricardo Castanheira e Nuno Correia da Silva; à Câmara Municipal de Barcelos, formulado pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

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O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: No dia 04/06/96, Heloísa Apolónia, nas sessões de 9 de Novembro, 15 de Março e no dia 23 de Fevereiro; Isabel Castro, nos dias 14 de Novembro e 12 de Dezembro e nas sessões de 15 de Dezembro e 24 de Abril; João Amaral, na sessão de 29 de Novembro; Eurico Figueiredo, na sessão de 6 de Dezembro; Lino de Carvalho, na sessão de 21 de Dezembro; Luísa Mesquita, na sessão de 22 de Dezembro; Jorge Roque Cunha, nas sessões de 3 de Janeiro e 28 de Março; António Martinho, na sessão de 4 de Janeiro; Cruz Oliveira, na sessão de 25 de Janeiro; António Galvão Lucas, nas sessões de 31 de Janeiro e 24 de Abril; Roleira Marinho e Miguel Miranda Relvas, nas sessões de 8 e 29 de Fevereiro; Octávio Teixeira, no dia 11 de Março; António Filipe, na sessão de 14 de Março; Fernando Pedro Moutinho, Elisa Damião, Nuno Abecasis e Carlos Pinto, nas sessões de 15 e 20 de Março; João Poças Santos, na sessão de 27 de Março; Manuel Alegre, na sessão de 3 de Abril; António José Dias, na sessão de 18 de Abril; Bernardino Soares, nas sessões de 24 e 26 de Abril; Jorge Ferreira, na sessão de 2 de Maio.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa o voto n.º 28/VII - De protesto pela atitude do Reino Unido de falta de sensibilidade em relação i3 urgência da adopção da posição europeia sobre Timor Leste (PS, PSD, CDS-PP, PCP e Os Verdes).
Assim, para proceder i3 apresentação deste voto de protesto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Carrilho.

A Sr.ª Maria Carrilho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Passo a apresentar o voto de protesto que, conforme V. Ex.ª referiu, conta com o apoio de Deputados de todos os partidos presentes na Assembleia da República.
É o seguinte o texto deste voto de protesto: A situação em Timor Leste registou, segundo notícias de hoje, mais um episódio dramático.
Ao mesmo tempo, um parceiro de Portugal na União Europeia e nosso antigo aliado - o Reino Unido - continua a bloquear a divulgação da posição comum europeia, aprovada há cinco meses, em relação a Timor Leste.
Sabe-se que tal posição comum da União Europeia apela à obtenção, por via do diálogo, de uma solução justa, global e internacionalmente aceitável, para Timor Leste.
O boicote selectivo do Reino Unido atingiu 38 documentos internacionais, como instrumento de pressão, em nosso entender inadequado, para resolver o problema daquele País em relação à questão das vacas loucas.
No entanto, também é certo que o Reino Unido permitiu que fosse assinado um acordo de cooperação com a Eslovénia e aprovou o apoio às eleições na Bósnia.
Considerando que o esmagamento dos mais elementares direitos humanos em Timor Leste é um assunto de extrema relevância, a Assembleia da República:
- reprova a atitude do Reino Unido pela falta de sensibilidade em relação à urgência da adopção da posição comum europeia sobre Timor Leste;
- espera que seja dada prioridade ao desbloqueamento deste importante processo de decisão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção sobre este voto de protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tomo a palavra para, em nome da bancada do Partido Social-Democrata, associar-me a este voto de protesto.
Pertencemos ao grupo dos que se têm batido desde sempre pela resolução da questão de Timor e também nos é muito difícil compreender como é que o Reino Unido consegue colocar no mesmo plano coisas que são substancialmente distintas, como é que consegue boicotar decisões comunitárias que têm a ver com direitos humanos, sendo certo que os problemas que estão sobre a mesa nesta altura são fundamentalmente de natureza económica, ainda por cima limitados por problemas de saúde pública.
Não faz sentido a limitação aos problemas económicos aventados pelo Reino Unido nesta matéria nem faz sentido ligar a incapacidade de solução desta teimosia do Reino Unido com o nítido prejuízo de uma questão essencial.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os problemas essenciais do mundo não podem reduzir-se apenas às questões relacionadas com as oportunidades de exploração. Há algo de mais essencial e de mais importante que tem de ser tomado na devida conta e o caso de Timor é um vivo exemplo disso mesmo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD):- Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Popular dá a sua concordância ao voto de protesto proposto pelos Deputados do Partido Socialista, na medida em que consideramos ser de interesse vital para a política externa portuguesa o avanço da causa de Timor em todas as sedes, incluindo, necessariamente, a sede comunitária.
Em nome dessa consideração de prioridade e de tudo fazermos sempre que possível para que nesta Assembleia seja unânime a posição nacional relativamente à causa de Timor é que subvalorizamos, ou não damos a devida importância a uma frase do texto do voto de protesto com a qual não podemos concordar. Refiro-me à frase na qual está expresso o entendimento de que o procedimento geral do Reino Unido em relação à União Europeia é «inadequado». Os Srs. Deputados do Partido Socialista terão de aceitar a nossa divergência nesta matéria, embora não a valorizemos o suficiente para divergirmos no voto.
E porque temos nós esta divergência? O Reino Unido entende que a doença das vacas loucas é uma questão de interesse vital para a defesa dos seus produtores, tendo adoptado, perante a União Europeia, um procedimento que é legal e que está longe ainda, por exemplo, do procedimento que o General De Gaulle adoptou nos anos 60, a que se chamou «política da cadeira vazia», e que terminou num compromisso juridicamente relevante chamado «compromisso do Luxemburgo» que permite a cada Estado, quando estiver em causa o seu interesse vital, adiar as negociações até ver satisfeito esse seu interesse.
Portanto, o que o Reino Unido está a fazer, embora por uma má causa, é legítimo. Aliás, tenho muita pena que Portugal não tenha tomado atitudes parecidas por boas causas e, assim, não considero que seja boa ideia este Parlamento entender como inadequado um procedimento que não sabemos se, no futuro, teremos ou não de utilizar.
À excepção desta divergência, evidentemente que a nossa adesão à causa de Timor Leste é completa e a nos-

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sã solidariedade parlamentar e institucional com tudo aquilo que vise defender a causa de Timor Leste é igualmente completa, pelo que têm o nosso voto, embora não a nossa concordância quanto àquele ponto em particular.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem agora a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela nossa parte, subscrevermos e apoiamos inequivocamente o voto de protesto que está em discussão. Fazemo-lo fundamentalmente porque o que está em causa nesta matéria é, mais uma vez, a questão de Timor Leste e os problemas que são suscitados ao povo timorense.
Pensamos que o Reino Unido tem mostrado que há muitas e variadas formas de se defenderem os interesses nacionais no seio da União Europeia, independentemente da vontade da generalidade dos outros países. No entanto, consideramos que essas formas de defesa dos interesses nacionais não podem ultrapassar certos limites, designadamente - e por isso subscrevemos este voto e apoiamo-lo -, não podem pôr em causa direitos de outros povos. Ora, os direitos do povo timorense há muito que estão em causa.
Assim, consideramos que, neste caso, o Reino Unido actua mal ao tentar colocar como contrapartida às suas posições noutras matérias problemas do povo timorense que são de direitos humanos e não apenas de direitos cívicos e políticos. Eis, pois, a razão que nos levou a apoiar e a subscrever o voto de protesto em apreciação.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Verdes subscreveram o voto de protesto apresentado hoje, na medida exacta em que traduz a condenação da utilização da questão de Timor, quanto a nós eticamente inaceitável, em defesa de interesses de um determinado país.
É legítimo que qualquer país tenha autonomia para defender os seus interesses no. seio da União Europeia, mas consideramos politicamente inaceitável que alguém faça uso desse facto para não tomar posição em relação à questão de Timor e dos direitos dos timorenses, pois o que está em causa, mais do que uma questão de direitos humanos, é o direito do povo maubere de escolher livremente o seu país e os seus próprios caminhos.
Assim, subscrevemos este voto de protesto na mesma medida em que subscreveríamos qualquer outro que condenasse um país, ainda que não da União Europeia, que, com hipocrisia, não quisesse tomar posição em relação a Timor.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que está encerrado o debate.
Vamos, então, passar à votação deste voto n.º 28/VII De protesto pela atitude do Reino Unido de falta de sensibilidade em relação à urgência da adopção da posição europeia sobre Timor Leste (PS, PSD, CDS -PP, PCP e Os. Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai ler um relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à retoma de mandato do Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, do PS, a partir de 11 de Junho corrente, inclusive, cessando Filipe Mesquita Vital, e à substituição dos Srs. Deputados Luís António do Rosário Veríssimo, do PS, e Figueiredo Lopes, do PSD, ambos com início em 11 de Junho corrente, inclusive, respectivamente, pelos Srs. Deputados Filipe Mesquita Vital e Adriano Azevedo.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
O parecer vai no sentido de que a retoma de mandato e as substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetidos à votação, foi aprovado por unanimidade.

Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Assembleia da República vai hoje proceder a um debate de urgência, a requerimento do Grupo Parlamentar do PSD, sobre a execução dos projectos financiados pelos fundos estruturais. Parece-me, por isso, azado o momento para fazer uma verdadeira interpelação à Mesa sobre um tema, ao qual o Grupo Parlamentar do CDS-PP atribui a maior gravidade.
No dia 16 de Fevereiro de 1996, a Assembleia da República aprovou, por unanimidade, a constituição de uma Comissão Eventual de Inquérito à utilização de verbas provenientes do FEOGA, em decorrência de um acórdão do Tribunal de Contas da União Europeia que apontava diversíssimas irregularidades na gestão dessas verbas em anos precedentes. A constituição desta comissão, repito, foi votada por unanimidade e, nos termos regimentais, publicada no Diário da Assembleia da República.
No dia 26 de Março de 1996, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, foi fixado um prazo de 90 dias para a respectiva constituição, posse e realização do inquérito parlamentar, propriamente dito. Na sequência deste despacho, o Grupo Parlamentar dó CDS-PP indicou dois Srs. Deputados para integrarem a comissão, indicou acordo com a composição definida em conferência de líderes. Após a indicação desses dois elementos para a comissão eventual de inquérito, o que sucedeu no dia 2 de Abril, por carta datada desse mesmo dia, até hoje, nem o meu grupo parlamentar nem a Assembleia da República voltaram a ter notícia da evolução do cumprimento desta deliberação unânime da Assembleia da República.
Uma vez que está a terminar o prazo fixado no próprio despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República para a realização do inquérito, hoje, o Grupo Parlamentar

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do CDS-PP limita-se a perguntar a V. Ex.ª se houve ou não a indicação, por parte dos outros grupos parlamentares, dos respectivos membros para a comissão eventual de inquérito, a fim de que ela pudesse tomar posse? Se sucedeu essa indicação, por que razão a comissão eventual de inquérito à utilização de um fundo estrutural não tomou posse? Ou, então, a não ter sucedido essa indicação, por que razão não procedeu a Mesa às diligências necessárias ao cumprimento do despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República, no sentido de que essa indicação fosse feita?
A resposta a estas questões parece-nos da maior importância, porque não podemos discutir as taxas de execução e de aplicação dos fundos estruturais em Portugal se não dermos, nós próprios, Assembleia da República, o exemplo do cumprimento rigoroso já não da legislação aplicável aos fundos comunitários mas das nossas próprias deliberações sobre a transparência da aplicação dos fundos comunitários, neste caso concreto do FEOGA.
Não faz, pois, sentido que, tendo a Assembleia da República admitido, por unanimidade, que havia um problema que merecia a realização de um inquérito parlamentar - o da utilização de verbas do FEOGA -, problema esse que decorria de um acórdão do Tribunal de Contas da União Europeia que apontava diversas irregularidades a essa matéria, estejamos, quase três meses depois, à espera de que essa comissão tome posse, realize o inquérito e - não sei se é pedir muito - tenha as suas conclusões aprovadas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O Sr. Deputado Jorge Ferreira coloca um conjunto de questões rigorosas que merecem, também, uma resposta rigorosa. Não estou em condições de a apresentar neste momento, por razões que me parecem evidentes perante o Plenário.
Por isso, vou procurar apurar o que se passou com a execução da deliberação tomada pela Assembleia da República podia 16 de Fevereiro, designadamente no que diz respeito à apresentação dos nomes dos Deputados dos diversos grupos parlamentares que devem integrara comissão.
Transmitirei, por isso, ao Sr. Presidente Almeida Santos as perguntas que acaba de formular, para o efeito de garantir a verificação do cumprimento do mandato que foi atribuído.
De qualquer modo, Sr. Deputado Jorge Ferreira, acabam de me informar que a referida comissão eventual de inquérito já tomou posse, tendo sido indicados os membros respectivos. Sobre os trabalhos da mesma nada poderei adiantar, mas procurarei obter esses elementos para que sejam transmitidos pela Mesa, na próxima reunião plenária.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Se me permite, Sr. Presidente, faço esta intervenção para avivar a memória do PP, porque, às vezes, por excesso de protagonismo, esquece-se das coisas em que ele próprio é co-responsável.
De facto, Sr. Presidente, a Comissão Eventual de Inquérito à utilização de verbas provenientes do FEOGA já tomou posse e, nessa altura, houve acordo no sentido de ser o PP, como subscritor do pedido de inquérito, a promover a diligências necessárias para a realização da primeira reunião da comissão.
Enquanto membro da referida comissão de inquérito, estou à espera que me convoquem para a reunião, Sr. Presidente.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, sob a forma de interpelação, queria dar um contributo à Mesa e à Assembleia para o esclarecimento desta questão. De facto, tivemos oportunidade de, em tempo útil, indicar os elementos do Grupo Parlamentar do PS que integrariam a comissão, elementos esses que tomaram, efectivamente, posse na data marcada pelo Sr. Presidente da Assembleia da República. Aliás, na altura solicitei uma clarificação ao Sr. Presidente da Assembleia da República sobre a que partido competiria a presidência da comissão, e a informação que obtive foi a de que caberia ao Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, queria apenas corroborar as intervenções dos Grupos Parlamentares do PCP e do PS. De facto, a comissão está constituída, tomou posse e a única questão que agora se coloca é a da constituição da Mesa. E nisso que os partidos devem estar empenhados, e o PP ainda mais do que todos, porque fez aqui esta chamada de atenção aos demais partidos. Estou convencido de que amanhã mesmo a Mesa estará constituída, Sr. Presidente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, se me permite, queria apenas dizer que, evidentemente, não há memória, pelo menos nesta sessão legislativa, de que alguma comissão não tenha tido Mesa por falta de indicação, pelo PP, dos elementos necessários para o seu funcionamento. Que me conste, não faz parte do direito interno da Assembleia da República que seja da competência dos partidos que têm apenas um lugar de secretário na Mesa a convocação ou a inauguração dos trabalhos de uma comissão.
Sei que alguns Deputados esperarão, eventualmente, ver um dia o Partido Popular com maioria na Assembleia da República. Então, talvez, nos caiba pôr as comissões a funcionar.

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O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Vai ser mais difícil!

O Orador: - Mas, como ainda não chegou esse dia, é aos grupos parlamentares a que são atribuídas as presidências que cabe essa tarefa, nos termos gerais de todas as comissões.
Por isso, apesar de o Sr. Deputado Lino de Carvalho ter tentado pôr-nos bem dispostos com a «bizarria» de tentar atribuir essa competência a um grupo parlamentar com 15 Deputados, como é o caso do PP - e registamos com agrado esse seu precedente -, devo esclarecer que pelas normas internas da Assembleia da República isso não é possível.
Assim, apesar de se ter realizado a posse, a verdade é que a comissão ainda não funcionou e esse facto não se deve ao Grupo Parlamentar do Partido Popular. Aliás, o interesse de a pôr a funcionar deve ser de todos os grupos parlamentares que votaram favoravelmente a sua constituição: o PP limitou-se a propor aquilo que V.V. Ex.as votaram favoravelmente. Como presumo que não votaram com reserva mental, penso que todos têm interesse no seu funcionamento.

O Sr. Carlos Encarnação (PS): - Todo o interesse!

O Orador: - Uma vez que está a terminar o prazo para a realização do inquérito, achei por bem levantar este problema. E se a presidência da comissão pertence ao Grupo Parlamentar do PSD, gostaria de dizer que assim que o presidente da comissão, que ainda não sabemos quem é, nos solicitar a indicação do secretário da mesa, no mesmo momento ele será indicado e formalizado.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, as diversas intervenções a que assistimos permitiram clarificar a questão que o Sr. Deputado Jorge Ferreira havia suscitado na sua interpelação à Mesa. É, portanto, desejável que os diversos grupos parlamentares tomem as iniciativas conducentes ao início dos trabalhos da comissão, o mais breve possível.
Em todo o caso, transmitirei ao Sr. Presidente Almeida Santos a questão aqui suscitada, para que possa assegurar, pelos meios adequados, a garantia do cumprimento do prazo para a conclusão dos trabalhos da Comissão, designadamente através de uma prorrogação do prazo fixado no seu primeiro despacho.
Antes de passarmos ao debate de urgência agendado para hoje, e conforme a tradição respeitada pelo Sr. Presidente Almeida Santos, gostava de assinalar que se encontram a assistir à reunião plenária um grupo de 25 alunos da Escola Cooperativa de Vale S. Cosme, de Vila Nova de Famalicão, para os quais peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Sr.- e Srs. Deputados, vamos passar ao debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do PSD, sobre a execução dos projectos financiados pelos fundos estruturais.
Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O debate de urgência sobre a questão dos fundos comunitários, solicitado pelo PSD, tem inteira justificação.
Por um lado, pela importância do assunto em si, pois interessa a todo o País, diz respeito praticamente a todas as áreas da vida colectiva, toca, por assim dizer, a todos.
Por outro lado, porque todos temos consciência de quanto é decisivo poder aproveitar esta oportunidade de desenvolvimento. Muito do nosso futuro joga-se na forma como soubermos aproveitar os meios que hoje se encontram à nossa disposição.
Este é, aliás, um assunto que gostaríamos de não ter de suscitar aqui. Seria bom sinal. Mas as circunstâncias que parecem estar a envolver a utilização dos fundos, as declarações que, a propósito, vêm sendo feitas por membros do Governo, as informações que chegam de Bruxelas e, sobretudo, a falta de informação oficial sobre a matéria, transformam a questão dos fundos comunitários em problema muito urgente. Tão urgente, quanto é urgente emendar o que está a correr mal, e parece que é muito.

O Sr. José Cesário (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Começo justamente pela falta de informação oficial. Não deixa de ser espantoso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que nem o Sr. Primeiro-Ministro, nem nenhum membro do Governo tenham tido até agora a mais pequena preocupação em vir a esta Assembleia dar conta da forma como estão a ser utilizados os fundos comunitários.
Estranhando tão despropositado silêncio, o Grupo Parlamentar do PSD solicitou, por escrito, informação ao Governo. Já lá vão três semanas. Nada! Dir-se-ia que o Governo esconde do País o que se passa.
Recordo, Srs. Deputados, os antecedentes.
O governo anterior, após difíceis negociações no campo político e no campo técnico, obteve para o nosso País uma excelente participação no chamado Il Quadro Comunitário de Apoio. Trata-se, como todos sabemos, de um vasto programa de apoio financeiro ao. desenvolvimento, destinado a vigorar até 1999. Através da sua aplicação e da sua boa execução, esperava-se que melhorassem substancialmente as nossas capacidades para enfrentar o mundo de concorrência é de competição a que, no futuro, nenhum País à face da terra poderá escapar.
Através de programas apropriados, destinados a garantir a utilização desses recursos nas mais diversas áreas, desde a educação até ao reforço da capacidade produtiva, desde a formação profissional ao ambiente, o País passaria a dispor de meios excepcionais para se libertar de algumas das debilidades de que sofria cronicamente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O sucesso obtido pelo Governo anterior, no que foi este histórico acordo, veio a ser unanimemente reconhecido. Os nossos interesses tinham sido devidamente acautelados e bem se pode dizer que, a partir da aprovação do lI Quadro Comunitário de Apoio, o futuro de Portugal se apresentou mais esperançoso.

Aplausos do PSD.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Vê-se!...

O Orador: - Os programas concretos para aplicação desses recursos começaram desde logo a ser preparados. Em muitos casos foram criados programas inovadores, projectados para atender especificamente à realidade por-

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tuguesa. Muito poucas terão sido as áreas realmente carecidas, que não ficassem devidamente contempladas com programas adequados.
No último trimestre de 1994, praticamente todos os programas estavam em marcha. Arrancava, então, no terreno, a aplicação do II Quadro Comunitário de Apoio.
Durante 1995, a entrada de recursos comunitários por via da execução dos programas foi naturalmente acelerando. As dificuldades no arranque de alguns dos programas, sobretudo daqueles em relação aos quais não havia ainda experiência, foram sendo vencidas. E, no fim de 1995, os números relativos à' aplicação dos fundos comunitários acabam por nos ser extraordinariamente favoráveis, em comparação com os que se referem aos restantes Estados membros da União.
Antecipo aqui, Sr. Presidente e Srs. Deputados, as conclusões que se podem extrair do relatório que a Comissão europeia irá em breve publicar sobre a aplicação do II Quadro, em todos os Estados membros, até 1995. De acordo com esses números, Portugal nessa data estava à frente de todos os outros Estados membros, no que se refere à capacidade de aplicação dos fundos, quer no que respeita a compromissos garantidos, quer no que respeita a pagamentos efectivamente verificados. Repito: Portugal foi, de todos os Estados membros, aquele que mais aceleradamente aplicou os recursos a que tinha direito pelo II Quadro Comunitário de Apoio.

Aplausos do PSD.

O Orador: - Enquanto decorria tudo isto, a oposição de então - hoje Governo - criticava e prometia.
Em primeiro lugar, afirmava, nessa altura, a oposição socialista - e recordo aqui essas afirmações - que nenhuma das carências de que o País sofria podia continuar a ter justificação. Interrogavam, então, os socialistas, nomeadamente pela voz do seu Secretário-Geral, hoje Primeiro-Ministro - e todos, nesta Câmara, se lembrarão disso -, como era possível que o desemprego não baixasse vertiginosamente, se entravam no País, vindos da Europa, cerca de dois milhões de contos por dia. Quantas vezes foi isto repetido?!...
Essa pergunta, Sr. Presidente e Srs. Deputados, podemos agora devolvê-la a quem a fazia. Só que, agora, quando 0 desemprego não só não desce mas, infelizmente, cresce todos os dias, podemos devolvê-la com muito mais razão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Chegamos, assim, ao «Governo rosa» da nova maioria.
Encontra o novo Governo uma situação particularmente favorável, no que respeita aos fundos comunitários: um Quadro Comunitário de Apoio inteiramente negociado e disponibilizando recursos substanciais para o País; os programas destinados a aplicar esses recursos já em marcha, vencidas e ultrapassadas as dificuldades de arranque; e uma gestão dos fundos em condições tais que nos colocou no primeiro lugar entre todos os Estados membros da União. Só que, com o novo Governo, instala-se a confusão e, simultaneamente, abate-se sobre o País um silêncio oficial misterioso.
Que se passa na realidade com os fundos comunitários? Como é possível, passados sete meses, que ninguém saiba ao certo como decorre a sua aplicação? Vão ser desperdiçados recursos por não haver quem os gaste? Existem programas que ainda não despenderam um tostão dos recursos que lhes cabem?
A única informação governamental de que dispomos são as abundantíssimas declarações à imprensa que vão fazendo os diversos membros do Governo. Mas isso não nos adianta nada. Umas vezes dizem uma coisa, outras vezes dizem outra. Dão o dito por não dito, com a mesma facilidade com que se esquecem do cumprimento das promessas.

Vozes do PSD:- Muito bem!

O Orador: - Se passarmos em revista essas declarações, verifica-se que, de início, começaram pelas atitudes de sobranceria: tudo estava mal, era necessário mudar tudo, «sanear» o aparelho, mudar as pessoas, criar uma nova atitude, criar objectivos comuns, fazer uma gestão integrada, «destribalizar» a gestão dos fundos, criar um novo espirito, enfim, outras tantas banalidades ocas que, em si mesmas, não seriam graves e não trariam grande mal ao mundo, se não fosse o que revelam de alheamento e ignorância das questões verdadeiramente importantes.

Aplausos do PSD.

Mas, a esta fase de «Conselheiro Acácio», seguiu-se outra mais séria, à medida que começava a ser claro que a máquina «saneada» e «destribalizada» não estava a dar conta do recado. A fraquíssima utilização dos fundos é revelada, não oficialmente, porque essas informações parece não as dar o Governo a ninguém, mas apenas através das desculpas que começam a ter de ser dadas.
Tal como na década de 60, começamos por saber que as coisas correm mal não pelos factos em si, mas por aquilo que o Governo diz deles.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - As entrevistas passam agora a dar justificações do insucesso: é a chuva, que não deixa gastar dinheiro; é o atraso do Orçamento, que prejudica o consumo dos fundos; e é até, último dos últimos recursos, a tentativa de apresentar os fraquíssimos resultados como se se tratassem de um facto inteiramente previsto e natural, controlado e programado, quase como se se desse o contrário é que seria de estranhar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Começam a surgir nos jornais, repito, nos jornais, os primeiros avisos públicos feitos por membros do Governo a outros membros do Governo. Estranha forma de governar! ... Não tarda, teremos mais chás em Seteais! ...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quem não gasta - ameaça o Ministro responsável, através dos jornais -, fica sem dinheiro.
Fixam-se agora metas. Objectivo inicial: despender cerca de 50% dos recursos até Junho. Perante a manifesta impossibilidade de lá chegar, deixa-se cair o objectivo sem uma palavra de contrição e baixam-se as ambições nas entrevistas seguintes. A última meta anunciada seria a de chegar aos 30% em Maio e, finalmente, surge a triste realidade: parece que se chegou aos 20%.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, chamo a sua atenção para o facto de que se está a esgotar o tempo conferido ao seu partido para este debate. Deve resumir as suas conclusões.

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O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente. Vou abreviar.
A desorientação atinge, assim, graus quase caricatos. Chega a anunciar-se o reforço financeiro de programas que apresentam execução zero! Ao certo, ao certo, não se sabe nada e ao cidadão comum tudo isto chega como um sintoma de que as coisas estão a correr mal.
A meio do mês de Abril passado, o panorama que se oferecia era, de facto, muito preocupante: três meses e meio decorridos do ano, a execução financeira verificada era de cerca de 15%. Repito: a execução financeira era de cerca de 15%! Pior ainda, se verificarmos com cuidado de que forma foi alcançada mesmo essa modestíssima percentagem. Os programas que consumiram recursos em bom ritmo foram ainda praticamente os dos transportes e infra-estruturas, as minhas bem conhecidas estradas e pontes de betão, cujas obras este Governo se lamentou de vir apanhar já em curso e não conseguir, por isso, pará-las, como gostaria. Ainda bem que não conseguiu, acrescento eu! Parou, aliás, as que pôde, as que ainda não tinham começado, e não foram poucas!

Aplausos do PSD.

Quanto ao mais, o panorama é desolador. Veja-se, por exemplo, o mais importante dos quatro eixos em que se apoia o Quadro: o eixo 1 do Quadro Comunitário de Apoio. Trata-se de um capítulo que tem como objectivo qualificar os recursos humanos e o emprego. Face às circunstâncias de crescimento do desemprego que actualmente atravessa o País, talvez seja o eixo cuja execução se revela de maior urgência. Nele se incluem os programas de educação, de qualificação inicial e inserção no mercado de emprego, de melhoria da qualidade e nível do emprego, de formação e gestão dos recursos humanos e ainda outros.
O total da despesa pública desse eixo, que estava programada para este ano, era de cerca de 124 milhões de contos. Sabem os Srs. Deputados quanto tinha o Governo despendido até 15 de Abril, passados três meses e meio? Cerca de 3% do total! Ou seja, não despendeu praticamente nada!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Ferreira do Amaral, desculpe mas o seu tempo terminou. Tenho de lhe pedir que termine.

O Orador: - Sr. Presidente, se me der tempo apenas para me despedir dos Srs. Deputados, terminarei agora o meu discurso.

Risos do Deputado do PSD Luís Marques Guedes.

Mas o que é essencial para que não se perca esta oportunidade de ouro para a modernização do País, através dos fundos que o Governo anterior garantiu, é que, de facto, os investimentos comecem. O Governo, nesta matéria, não tem qualquer desculpa. Num país a atravessar tantas dificuldades e com tanta urgência de desenvolvimento, é um crime imperdoável deixar investimentos por fazer, para os quais existem recursos suficientes e disponíveis.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Ferreira do Amaral, o Sr. Deputado Paulo Portas. Desde já o advirto de que o Sr. Deputado Ferreira do Amaral não tem tempo para lhe responder.

O Sr. José Magalhães (PS): - Má gestão! Má gestão do tempo!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Até do tempo!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Mas, em todo o caso, talvez o Sr. Deputado possa ceder-lhe algum minuto do seu tempo.
Tem a palavra, Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ferreira do Amaral, ouvi-o com atenção, tive alguma esperança de que tivesse pensado seriamente sobre a política europeia, incluindo a de fundos estruturais da última década, mas tenho de reconhecer que, infelizmente, V. Ex.ª continua a cometer exactamente o mesmo erro de raciocínio que cometeu o Governo a que pertenceu e em face do qual deve, em boa parte, a derrota nas urnas.
V. Ex.ª vem aqui dizer que o Partido Socialista deu cabo do investimento público, o que é parcialmente verdade; mas não explicou por que é que V.V. Ex.as deram cabo do investimento privado, o que é inteiramente verdade.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª veio aqui falar dos desempregados que aumentam todos os dias, e é verdade, V. Ex.ª poderá ter razão, mas não tem qualquer autoridade para falar nisso, porque arrasta consigo 200 000 desempregados, apenas na última legislatura.

Protestos do PSD.

E não se trata de uma acusação sobre o passado, é uma acusação sobre uma política de convergência, que é a vossa política económica e a do Partido Socialista, a qual gera desemprego todos os dias. Sobre isso o Sr. Deputado não disse uma, palavra.

Protestos do PSD.

Srs. Deputados, serão capazes de ouvir?!

A vossa política económica é igual à do Partido Socialista, é determinada em Bruxelas e gera desemprego todos os dias! E o senhor não tem uma palavra de reconhecimento ou, sequer, de análise crítica em relação à política económica que foi seguida nos últimos quatro anos.
Mas é mais grave ainda, Sr. Deputado!

Protestos do PSD.

Srs. Deputados, acalmem-se!
V.V. Ex.as estão em fase de revisionismo...

Risos do PSD.

... e, por isso, pensei que trariam aqui uma reflexão diferente. Como estão em fase de revisionismo, já não pensam o que pensavam, já não dizem que fizeram o que efectivamente fizeram e, por isso mesmo, pensei que, em matéria de fundos estruturais, V. Ex.ª traria aqui o produto dessa revisão, mas não trouxe.
- Vou dizer-lhe uma coisa, com toda a sinceridade, aliás, sabe que sempre o defendi, a si, em particular, mesmo nessa matéria. É o seguinte: nunca duvidei de que, grosso modo, o dinheiro empregue em auto-estradas foi bem empregue. Exceptuando gastos excessivos à beira de elei-

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ções, exceptuando concursos que tenham corrido mal, penso - como todo o País, segundo me parece - que, grosso modo, o dinheiro gasto em auto-estradas foi bem gasto.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Mas...

O Orador: - Agora, Sr. Deputado, julgo, e creio que o País também, que o dinheiro que os senhores empregaram na economia, supostamente para a modernizar, foi, em grande medida, um desastre.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Ora, como o Sr. Deputado veio aqui fazer um debate sobre a essência ideológica da vossa política nos últimos 10 anos, que são os fundos estruturais, o senhor tem um dever de honestidade perante esta Câmara, para que se possa acreditar em si e nas críticas que faz.
Nessa medida, quero perguntar-lhe, com toda a sinceridade - não discutindo o dinheiro das auto-estradas, porque, como sabe, e já o repeti, sempre o considerei bem empregue -, quantos portugueses conseguiram um emprego nos últimos 10 anos, porque tenham frequentado cursos apoiados pelo Fundo Social Europeu? Quantos, Sr. Deputado?

Aplausos do CDS-PP.

Que eficiência ou ineficiência, que bom gasto ou desperdício, que seriedade ou corrupção estiveram associadas ao Fundo Social Europeu, a que os senhores, e não eu, ligaram a essência da modernização da nossa economia?!

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Paulo Portas, esgotou o tempo de que dispunha para pedir esclarecimentos.

O Orador:- Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Ferreira do Amaral, posso aceitar muitas das críticas que faz quanto ao presente, mas tenho, então, o direito de lhe exigir que faça uma análise crítica sobre o seu próprio passado e que me diga, quanto ao Fundo Social Europeu, que é um dos fundos em que este Governo mais falha, quantos portugueses conseguiram emprego à custa dos cursos de formação profissional do Fundo Social Europeu.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - No dia em que me responder a isto, considero que o Sr. Deputado tem autoridade para falar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Em bom rigor, o Sr. Deputado Ferreira do Amaral não dispõe de tempo para responder ao pedido de esclarecimentos do Sr. Deputado Paulo Portas, mas a Mesa concede-lhe dois minutos para esse efeito.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Ferreira do Amaral (PSD): - Sr. Presidente, agradeço a sua generosidade.

Sr. Deputado Paulo Portas, ouvi as suas perguntas e julgo que se trata de uma matéria susceptível de debate, ao qual não me furtarei na altura própria, quando ele se suscitar. Hoje, não vim aqui trazer esse problema, trouxe outro mais comezinho, mais directo, mais gritante e, talvez, mais escandaloso, que tem a ver com o facto de, como eu demonstrei, o Governo dispor, neste momento, de fundos comunitários preparados para investir e não o estar. a fazer. Esses fundos estão à ordem e não estão a ser utilizados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado há-de concordar comigo que, apesar de poder contestar a origem e a forma como esses fundos foram obtidos, já que eles existem, com certeza, é qualquer coisa de pecaminoso não os utilizar. Desse pecado não se livra o Governo, porque os números estão aqui. E sabe que, nestas matérias, quando as palavras não substituem a realidade, o Governo lida especialmente mal, como é o caso, pois temos dinheiro da Comunidade que não estamos a utilizar. .

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para fazer uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, parece-me relevante a consideração de um debate político, mas, se estamos a tratar de opções políticas de fundo, não se pode cindir a nossa actividade política entre o que agora está em causa e a continuidade de uma política essencial como é o caso das políticas europeias do anterior e do actual Governo.
Não quero antecipar as perguntas que tenho a fazer ao Governo, mas há uma questão para a qual, infelizmente, nem o Sr. Deputado Ferreira do Amaral, nem o Partido Socialista têm resposta substantiva. É que os Srs. Deputados do PSD, nos últimos anos, como estes senhores agora; não podem aplicar os fundos europeus; porque a União Europeia os manda cortar no défice e na despesa. Ora, os senhores sabem que, quanto mais fundos, mais despesa e, quanto mais despesa, menos moeda única. É por isso, Sr. Deputado, que tanto vocês como o Partido Socialista não podem aplicar eis fundos europeus. Foi por isso que os senhores já não executaram a fase final do anterior Quadro Comunitário de Apoio de forma eficiente e estes senhores estão agora com rácios de aplicação baixíssimos. É que os senhores têm critérios a cumprir e a União Europeia dá-vos com uma mão o que vos tira com a outra.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Paulo Portas, devo adverti-lo de que a sua intervenção não é manifestamente uma interpelação à Mesa e não posso, de forma alguma, consenti-la, sobretudo no seguimento do entendimento unânime da conferência de líderes realizada recentemente. Peço-lhes que não persistam nesta prática, contra a qual o Sr. Presidente Almeida Santos se tem insurgido em diversas ocasiões.
O Sr. Deputado Ferreira do Amaral inscreveu-se para usar da palavra, mas, com certeza, já está abrangido por esta chamada de atenção.

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O Sr. Ferreira do Amaral (PSD): - Sr. Presidente, julgo que é da essência do debate e das interrogações que são feitas que a última palavra pertence ao interrogado. Portanto, não sei bem que figura regimental foi utilizada pelo Sr. Deputado Paulo Portas, mas gostaria de utilizar exactamente a mesma.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, o Sr. Deputado Paulo Portas utilizou, abusivamente, a figura regimental da interpelação à Mesa. Por via disto, adverti-o. Não posso consentir, de forma alguma, que o Sr. Deputado Ferreira do Amaral peça a palavra, dizendo, à partida, que não vai fazer uma interpelação à Mesa. Para esse efeito, Sr. Deputado, não posso dar-lhe a palavra.

O Sr. Ferreira do Amaral (PSD): - Sr. Presidente, se não me dá a palavra, evidentemente não a uso, mas gostaria de ser esclarecido, antes de começar a discussão propriamente dita, sobre quais são os Srs. Deputados que podem ser abusivos e quais os que não podem.

Risos.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Os Srs. Deputados que aceitam o apelo da Mesa evitam ser advertidos, o mesmo não acontecendo com os que prevaricam.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Gostaria de fazer algumas breves considerações sobre os temas que começam a ser focados neste debate.
Acho interessante que, ao longo da legislatura passada, o Ministro Valente de Oliveira sempre tenha fugido a debater, com profundidade, estes temas, pois dizia generalidades, muito vagas, banalidades de base e quando se perguntavam coisas mais específicas ele dizia que só os gestores do programa é que sabiam. Porém, quando se perguntava se não podiam vir à Assembleia as pessoas que sabiam, ele dizia que não fazia sentido.
De facto, o que se passou aqui, na última legislatura, nomeadamente quanto à análise da aplicação dos fundos comunitários foi uma fuga completa do Ministro Valente de Oliveira e da sua Secretária de Estado à discussão destes temas. Atirar outro tipo de coisa para a frente é querer lançar-nos poeira para os olhos.
Por outro lado, não há dúvida de que alguma coisa estaria mal na aplicação dos fundos comunitários, até na parte da gestão de um conjunto de verbas, sendo já sabidos os exemplos da ponte do Freixo, da praça da Portagem, etc. Pensamos que é justo, é legítimo, é obrigatório, que este Governo tenha um cuidado, uma atenção, um controlo, que não houve nalgumas áreas por parte do anterior governo.
Não precisamos que a propaganda «gire» tão bem como no anterior governo, como alguns dos ministros fizeram, o que precisamos é, que controlem, com rigor, para que não haja delapidação grave nos fundos públicos.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Além disso, é preciso chamar a atenção para a «máquina» que estava montada - e isso já ficou claro noutros debates -, pois era uma «máquina» que, nesta óptica «pecaminosa», «triturava» tudo, ou seja, ia dinheiro fosse para onde fosse. Foi mal gasto dinheiro nalguns apoios a empresas, foi muito mal gasto nalguns casos do Fundo Social Europeu e houve pouca selectividade num conjunto de apoios feitos. Este resultado é hoje já claro, razão por que pretendemos que esses aspectos sejam corrigidos.
A questão que tem sido focada do desemprego, merece uma referência importante. Quem conheça minimamente alguma coisa de como funcionam as sociedades sabe que não é em meia dúzia de meses que se inverte a questão do desemprego. É óbvio que é a débil situação da indústria e de uma boa parte da economia portuguesa que faz com que o desemprego tenha aumentado nesta fase e, por enquanto, não é atribuível responsabilidade a este Governo. Estaremos atentos quando essa responsabilidade lhe puder ser atribuível.
Fala-se ainda aqui de descoordenação. Isso é risível! Assistimos a isso no passado, por exemplo, na questão da Renault e até nalguns aspectos do PEDIP, entre o Ministério da Indústria e Energia e outros, nomeadamente com o do Comércio e Turismo e o do Planeamento e da Administração do Território, o que foi perfeitamente evidente na anterior legislatura. Não se pode querer continuar a ignorar isso. Para além de ser evidente essa descoordenação nem sequer havia a seriedade e a frontalidade de assumirem que ela existia. Ora, é efectivamente relevante que se ponha essa questão em cima da mesa.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Ferreira do Amaral veio dizer, primeiro, que não tinha números e, depois, apresentou um conjunto de números escolhidos como entendeu. Quando o Governo intervier, certamente que a situação será clarificada.
Em primeiro lugar, estamos convencidos que depois de este Governo ter tomar posse, ainda no ano passado, se verificou uma forte aceleração na aplicação dos fundos comunitários.
Em segundo lugar, vamos pôr a questão daqui a pouco, pois, pelos dados que temos - e supomos que o Sr. Deputado Ferreira do Amaral também os tem, porque os trouxe para cima da mesa -, está a verificar-se uma maior aplicação de fundos comunitários do que no tempo do governo anterior. Esta questão será detalhada quando o Governo usar da palavra.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Essa é boa!

O Orador: - Essa é boa, não, essa é óptima! Já lá chegaremos!
A concluir, direi que não faz qualquer sentido uma coisa que aqui foi dita há pouco tempo. Pretendemos controlar a inflação, reduzir os juros para facilitar a vida às empresas, aumentar o investimento público e a aplicação de fundos comunitários, controlar as despesas correntes, porque é desta forma que se ajudará a dinamizar a economia.
Aliás, um crítico relativamente insuspeito, o Sr. ex-Deputado Rui Carp, ainda hoje chamava a atenção para o facto de haver indicadores de que a retoma económica se estava efectivamente a verificar. Remeto, no conjunto, os Srs. Deputados, que tanto simpatizavam com o Sr. Deputado Rui Carp, para a declaração que ele fez, hoje de manhã, à TSF sobre esse assunto.

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É, pois, preciso que fique claro que o investimento público tem de aumentar. Queremos que este Governo acelere o investimento público e a aplicação de fundos comunitários. Daqui a pouco, o Governo explicará o que está a fazer nesse domínio.
Estamos atentos, compreendemos as dificuldades que ainda existem em resultado da má «máquina» que estava «montada» do governo anterior, percebemos que tem de haver algum tempo para se modificar, mas queremos também dizer, com muita clareza, que não reconhecemos autoridade moral ao PSD para tomar aqui qualquer atitude crítica neste domínio. O que se tem passado, a maneira como ele deixou esta situação em termos de fundos comunitários, é extremamente grave. Portanto, não lhe reconhecemos qualquer autoridade moral!
Para terminar, queremos não só que se gastem mais fundos comunitários como queremos que se verifique, diferentemente do que aconteceu no governo anterior, uma melhor aplicação de fundos comunitários.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este debate de urgência, pedido pelo PSD ao Governo, faz-me lembrar aquele ditado popular «diz o roto para o nu: olha como vais tu!».
De facto, Srs. Deputados, se é verdade que hoje existem atrasos preocupantes da parte do Governo em relação i3 taxa de execução dos fundos comunitários, embora por uma razão de honestidade de princípio se tenha de admitir que houve eleições, que o Governo tomou posse quando tomou e que o Orçamento foi aprovado quando foi, apesar disso - e já lá vamos - a verdade é que o PSD devia ser o último partido nesta Assembleia a levantar esta questão num debate de urgência.
Os Srs. Deputados sabem que, no conjunto do ciclo do I Quadro Comunitário de Apoio, ficaram por realizar cerca de 25% dos investimentos programados inicialmente. Os Srs. Deputados do PSD sabem que, no conjunto do ciclo, para a agricultura, ficaram por executar cerca de 14% das verbas programadas para o sector. Os Srs. Deputados sabem que, no conjunto do ciclo do I QCA, o PSD saiu do governo com cerca de meio milhão de desempregados, dos quais mais de 200 000 cresceram ao longo da execução do I QCA.
Põe-se aqui um problema, em relação ao PSD, de execução quantitativa, mas também de eficácia na qualidade da forma como os fundos comunitários foram orientados. Nesta matéria, Srs. Deputados do PSD, os senhores ainda têm de fazer um longo caminho até ao Monte das Oliveiras para que um dia possam trazer aqui debates em que estejam perfeitamente à vontade nesta matéria.
Mas, se isto é verdade em relação ao PSD, diria até que ele era o último que poderia aqui trazer este debate, não é menos preocupante o facto de que, no que se refere. ao Governo, há razões para estarmos seriamente preocupados e críticos quanto i3 forma como os fundos têm vindo a ser geridos ao longo deste primeiro período. Alguns exemplos concretos.
No Fundo Social Europeu há, neste momento, um atraso sistemático na transferência das verbas que competem ao Estado para as entidades promotoras, que está a criar embaraços e dificuldades às várias entidades promotoras dos fundos de formação profissional; dossiers de saldo final, que foram entregues em Fevereiro, em Janeiro e em Março, já passaram os prazos há bastante tempo e esses saldos não foram pagos , apesar das fiscalizações terem sido feitas e de os dossiers estarem completamente organizados e vistos pelo Instituto do Emprego e da Formação Profissional. Como sabe, Sr. Ministro, isto está a criar seríssimas dificuldades a muitas entidades que estavam a fazer formação no quadro dos calendários que a Administração se tinha obrigado a cumprir e que não tem vindo a cumprir.
A nível da agricultura, o problema do PAMAF é outra área que também merece preocupações. Como sabe, Sr. Ministro, há atrasos, particularmente na transferência dos apoios para os agricultores, para o agravamento de defesas sanitárias, na aprovação de projectos de investimento na área florestal e noutros, o que também está a atrasar e muito o investimento no sector agrícola, que já estava programado para este ano. Há, portanto, atrasos sérios nesta matéria, noutras também haverá e é sobre esses que queremos saber o que é que o Governo se propõe fazer para os ultrapassar e para desbloquear a situação, que está não só a causar dificuldades às entidades, que legitimamente tinham a expectativa de receber o dinheiro ou fazer os investimentos - o que acontece nalguns casos mas também a pôr em causa muitos projectos de investimento.
A questão não é meramente quantitativa, embora importante, é também uma outra mais funda, que nem o PSD nem o Governo, aliás, nem o PP, têm vinda a pôr e que é o problema da orientação dos fundos, da sua eficácia e da qualidade da sua aplicação. Essa é que é a discussão que vale a pena fazer, isto é, se vamos ou não fazer uma revisão dos critérios de acesso aos apoios comunitários.
Por exemplo, em matéria agrícola, se vamos fazer uma revisão dos critérios que faz com que, hoje, cerca de metade dos agricultores portugueses não tenham acesso aos apoios comunitários, ou que faz com que, em Portugal, um terço das explorações agrícolas que deveriam receber indemnizações compensatórias não as recebam tendo, portanto, um menor grau de participação do que noutros países da União Europeia, sabendo-se, como se sabe, que este é um elemento fundamental para o apoio ao rendimento dos agricultores.
Outro exemplo, Sr. Ministro, é em relação ao Fundo Social Europeu, onde deve haver uma reorientação dos apoios, de modo a que o FSE não seja - como foi ao longo destes anos, em muitos casos, ou mesmo na maioria dos casos - um instrumento para resolver dificuldades de tesouraria de muitas empresas e entidades, mas, sobretudo, um instrumento de formação, de educação e de criação real de emprego. É essa reorientação, Sr. Ministro, que é preciso aqui discutir.
Poderia dar ainda outro exemplo, que é o problema do acesso dos comerciantes ao PROCOM. Quando se quer hoje apoiar o pequeno comércio, não se percebe porque é que o patamar de acesso aos apoios financeiros está colocado em cerca de 10 mil contos, o que afasta muitos pequenos comerciantes que precisam de fazer pequenos investimentos para modernizarem as suas lojas e os seus estabelecimentos.
Ou ainda, Sr. Ministro, o acesso ao PEDIR É preciso afastarmos alguns critérios completamente absurdos, como seja o facto de uma entidade promotora de uma empresa numa zona rural querer apresentar um projecto de desen-

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volvimento industrial e ser recusado, por exemplo, porque essa zona não tem vocação industrial. É outro critério que temos de alterar, entre outros, Sr. Ministro.
Portanto, a questão fundamental que vale a pena discutir é, naturalmente, para além da taxa de execução dos programas, que orientação ou que reorientação vamos dar aos fundos comunitários para que eles tenham eficácia no reforço da estrutura; reorientá-los no sentido de ter mais intervenções nas áreas sociais e no reforço do sistema produtivo do que tem tido e, por esta via, na criação de emprego, que é a questão central com que hoje se debate a sociedade portuguesa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, esta é que é a questão que, em nossa opinião, vale a pena debater, não tanto se a taxa de execução é muito pequena ou grande - é importante, obviamente -, mas, sobretudo, a questão da eficácia e da qualidade na aplicação.
Penso, aliás, que a motivação do debate de urgência proposto pelo PSD tem este defeito à partida, que é o defeito que acompanhou o PSD ao longo destes quatro anos. O que interessa é saber se se aplicou muito dinheiro, mas onde se aplicou, com que eficácia, com que consequência no tecido produtivo e na crise do emprego, isso não interessa. O que interessa é dizer que se aplicou muito dinheiro e que os fundos comunitários foram todos absorvidos.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador: - Mas depois olhamos para o País e verificamos que, para além das estradas que são necessárias, o País não mudou em matéria de tecido produtivo. O nosso receio fundado é que, nesta matéria, também muito pouco se altere com as alterações que estão a ser traçadas pelo Governo quanto aos fundos comunitários.
É esta matéria que vamos acompanhar aqui na Assembleia, porque é no caminho da alteração da orientação que exigimos uma nova postura do Governo, consonante com as expectativas de mudança que se criaram em Outubro.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto (PS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quis intervir anteriormente, fazendo perguntas ao Sr. Deputado Ferreira do Amaral, mas não pude fazê-lo pelo facto de o Sr. Deputado ter gerido mal o seu tempo, nada tendo restado para, depois, me responder, o que me levou a compreender mais facilmente as causas da desgraça a que chegaram muitas empresas públicas sob a sua orientação, nomeadamente a TAP, CP, etc.
Por outro lado, esperava que o Sr. Deputado. Ferreira do Amaral, ao fazer uma intervenção com a importância que certamente tem tratar dos fundos comunitários nesta Casa, o fizesse de uma maneira mais exaustiva, dada a competência e a experiência governativa que tem, vindo aqui apresentar um conjunto de dados sobre os atrasos, onde é que eles se registavam, em que sectores, onde é que poderia concordar ou não com eles.
Ainda que eu concorde com o Sr. Deputado Lino de Carvalho sobre o facto de não ser o aspecto quantitativo dos investimentos que está em causa, mas a sua qualidade e eficácia, apesar de concordar com isso, não deixaria de ser relevante que alguém como o Sr. Deputado aqui nos desse mais dados ou demonstrasse mais correctamente onde estão esses atrasos.
Provavelmente, o Sr. Deputado não o fez porque tem má consciência e sabe que, neste momento, a execução do Governo do PS não é pior do que aquela que existia por parte do PSD, apesar de, como todos sabemos, o Orçamento ter sido aprovado muito mais tarde do que era a experiência anterior.
Por outro lado, o Sr. Deputado também sabe que o PS não poderia ter, em muitos casos, as mesmas prioridades incorrectas do anterior governo e que teria de as alterar.
Além disso, o Sr. Deputado sabe também que o Governo está a alterar muitas das regras existentes, por serem ineficazes, as quais este Governo herdou do seu e está a procurar corrigir, como, por exemplo, as que se referem aos concursos públicos, que são, hoje, um factor de atraso no lançamento de obras, no investimento, pois são burocráticas e incorrectas.
O Sr. Deputado sabe ainda que este Governo está a recuperar atrasos de 1994 e de 1995, muitas vezes com a preocupação de não perder fundos comunitários, trabalho que está a exercer no sentido de corrigir a acção incorrecta do governo de V. Ex.ª.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, o Sr. Deputado também não desconhece que com os aparentes atrasos que existem neste momento têm muito a ver o sistema de contabilização, porque o sistema de contabilização dos fundos comunitários que V.V. Ex.as deixaram a este Governo é ineficaz em muitas áreas. V.V. Ex.as sempre cortaram todas as despesas, por exemplo, na informatização e temos de reconhecer de forma realista que a Administração Pública, no que se refere ao tratamento da informação, não é eficaz neste momento; daí que o Governo esteja a tomar medidas para conseguir ter um sistema de informação que a forneça de forma mais atempada e mais correcta.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em resumo, esperávamos mais da sua intervenção mas penso que esse mais que aqui não demonstrou é a falta de razão quanto àquilo que nos quis apresentar hoje.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para intervir no debate, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (João Cravinho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para responder ao debate de urgência pedido pelo PSD e atendendo ao discurso do Sr. Deputado Ferreira do Amaral, começo por dirigir-me ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, realçando a seriedade e importância da sua intervenção, independentemente de me parecer que, nalguns casos, não tem nitidamente razão, suponho eu que por deficiência de informação quanto àquilo que o Governo vem fazendo.

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De qualquer modo, as questões que levantou foram importantes, tiveram a orientação correcta e gostaria de o felicitar porque, de todas as intervenções havidas, depois da do PS, foi aquela que melhor contributo trouxe.
Gostaria de lhe dizer que encontrámos o Quadro Comunitário de Apoio como o Sr. Deputado muito bem descreveu e empenhámo-nos a fundo em renová-lo, estando a trabalhar exactamente no sentido que há pouco enunciou, de modo a- tornar o sistema mais claro, mais dirigido às necessidades reais, evitando que, para além das estradas, os dinheiros do Fundo Social Europeu, entre outros, se fundam no próprio betão, aparecendo em contas e agentes que, porventura, não terão dado o contributo necessário a este país.
Assim, temos em curso uma amplíssima revisão do sistema de incentivos, havendo já projectos consistentes, alguns em consulta aos próprios agentes interessados, que terei muito gosto em lhe facultar, porque tudo quanto disse tem, desse ponto de vista, plena aplicação.
Sr. Deputado, Ferreira do Amaral, permita-me que lhe diga, visto que esgotou o seu tempo e para lhe dar uma oportunidade de responder, se assim o entender, sob a figura que melhor lhe aprouver, porventura a de defesa da honra, que V. Ex.ª falou, falou, mas não disse rigorosamente nada de substantivo. Assim sendo, aqui fica o pretexto para usar da palavra, apesar de já ter gasto 2.5 minutos e de se ter insurgido contra a disponibilidade da Mesa relativamente. ao Sr. Deputado Paulo Portas, quando ela foi generosa para com V. Ex.ª.
Mas indo ao fundo da questão, devo dizer que quando tomámos conta do Quadro Comunitário de Apoio estava em vigor o Decreto-Lei n.º 99/94, o quadro orgânico de todo o sistema, o qual tinha um artigo 4.º que previa uma comissão ministerial de acompanhamento e coordenação que nunca reuniu, pela simples razão de este articulado ser tão bem feito e tão propositadamente feito que, como poderá ver na versão do seu governo, dizia que existia uma comissão para acompanhar e coordenar o Quadro Comunitário de Apoio, mas quanto à designação e à especificação que lhe permitisse reunir nada havia.
Assim, a primeira coisa que fizemos foi alterar isto, através de um decreto-lei publicado em Janeiro, havendo hoje uma responsabilização política, contra a «tribalização» em que estava o Quadro Comunitário de Apoio.
Porém, como V. Ex.ª nem sequer sabe como estava o Quadro Comunitário de Apoio no seu tempo, gostaria de entregar à Mesa, para ser distribuído à Assembleia, o relatório sobre a execução do Quadro Comunitário de Apoio, de Fevereiro de 1996, que mostra que faltavam 356 milhões de contos na sua execução, mostra o seu descalabro e descoordenação e o tipo de medidas que era preciso tomar. Deixo o relatório à disposição da Mesa, para ser distribuído aos Srs. Parlamentares.

Aplausos do PS.

Gostaria também de pedir à Mesa que fizesse chegar aos grupos parlamentares um esclarecimento do conceito de execução sobre o Fundo Social Europeu (FSE), através do qual se verifica que, de facto, não se pode de maneira nenhuma avaliar a execução do Fundo Social Europeu como se avalia a execução do FEDER, ou seja, através daqueles mapas que são do seu conhecimento e que comentou, visto que o FSE funciona por adiantamentos, não havendo obrigatoriedade de declaração - a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite conhece isto muito bem, o Sr. Deputado Falcão e Cunha também, mas o Sr. Deputado Ferreira do Amaral, pelos vistos, não.
Portanto, deste modo fica esclarecida a razão de por que é que só no segundo semestre, por força da máquina montada anteriormente, é que se poderá dizer alguma coisa acerca desta matéria, limitando-me eu a referir agora, por exemplo, que os tais famosos 0% iludiram completamente o Sr. Deputado Ferreira do Amaral pela ignorância que ele tem quanto ao assunto - isto não é propriamente uma auto-estrada.

Risos, do PS.

Quero ainda acrescentar que o Programa Pessoa, que tem, em 1996, uma dotação de 36 milhões de contos, já aprovou 34 milhões, isto é, 95% do que lhe competia aprovar.

Aplausos do PS.

Risos do Deputado do PSD Ferreira do Amaral.

O Sr. Deputado não conhece estas questões, ri-se, não as conhece... mas gostaria de deixar também à disposição da Mesa este esclarecimento.
Finalmente, quanto a problemas que estamos a atacar, chamo ainda a atenção do Sr. Deputado Ferreira do Amaral e do PSD para o Diário da República, I Série, de 4 de Janeiro de 1996, onde consta a alteração ao Decreto-Lei n.º 99/94, para a Resolução do Conselho de Ministros n.º 50/96, sobre o novo sistema de informação (assim já o Sr. Deputado Ferreira do Amaral não seria enganado, pois é para evitar que as pessoas que não conhecem bem os assuntos sejam enganadas que estamos a trabalhar), publicada a 22 de Abril, para a Resolução do Conselho de Ministros n.º 51/96, sobre reprogramações, publicada na mesma data, para a Resolução do Conselho de Ministros n.º 69/96, sobre as, graves insuficiências atribuídas aos gestores - por enquanto, regista-se a mudança de 10 gestores, mas alguns outros estão já a caminho.
Para terminar, refiro o decreto-lei já aprovado em Conselho de Ministros e que está para publicação, criando 0 supervisor financeiro. Posso facultar-lhe este decreto-lei, que, repito, está para publicação, onde poderá ver que não se repetirá, sob este Governo, a perda de dezenas de milhões de contos - atente bem no número - por total, gravíssima e irresponsabilíssima gestão financeira do Quadro Comunitário de Apoio, como qualquer dos Srs. Gestores que tenha o mínimo de experiência bancária lhe poderá dizer.
Relativamente à execução dos números, de que o Sr. Deputado Ferreira do Amaral tanto gosta, a situação é a seguinte: o Sr. Deputado compara percentagens de 1994/1995 com as de 1996. Os senhores, nesse biénio de 1994/1995, ficaram em 72%, deixando por executar 356 milhões de contos. Valem-se de dizer que estavam no início, mas o I Quadro Comunitário de Apoio, que era extremamente mais difícil de executar no início do que o II, por razões óbvias, ficou em 81%, no seu primeiro biénio. Portanto, os senhores ficam quase LO pontos. abaixo dos vossos melhores tempos. Imagine como isto é!
Quanto a percentagens, estamos a falar de coisas que não têm comparação possível, porque, enquanto a percentagem é mesma, os montantes são totalmente diferentes. Por força dos vossos atrasos, enquanto que nós nos propomos executar quase 900 milhões de contos este ano, os 'senhores executavam quase 200 milhões de contos menos e, portanto, a mesma percentagem significa uma muito maior execução da nossa parte.

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Assim, gostaria que tomasse nota do seguinte: toda a vossa gestão, em 1995, já no segundo ano do Quadro Comunitário de Apoio, executou, em 10 meses e meio, desde 1 de Janeiro a 15 de Novembro de 1995, 407 milhões de contos, ou seja, uma média de 39 milhões de contos por mês. Nós, desde que tomámos posse, de 15 de Novembro a 15 de Maio, em seis meses, executámos mais 10% do que os senhores nos 10 meses e meio anteriores, ou seja, 445 milhões de contos.

Aplausos do PS.

Fizemos uma média de 74 milhões de contos por mês, quando os senhores não passaram de 39 milhões de contos!
Quanto ao ano de 1995, comparado com 1996, o seu governo apenas conseguiu executar, de 1 de Janeiro a 31 de Maio de 1995, 969 mil contos por dia; nós estamos a executar 1,315 milhões de contos por dia.
Se isto não lhe chega, não sei, então, o que lhe poderá chegar!
Finalmente, Sr. Deputado, acerca da média de gestão deste Governo, contando de 15 de Novembro de 1995 a 15 de Maio de 1996, nos tais seis meses de que falei há pouco, devo dizer que executámos 74 milhões de contos por mês; em 1996 temos de gastar 894 milhões contos, ou seja, em média, exactamente 74 milhões de contos por mês. Isto é mera coincidência, é verdade, mas mostra que a média que já provámos realizar nos últimos seis meses é aquela que iremos concretizar.
Gostaria de, agora, dar uma notícia ...

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Ministro, chamo a atenção de V. Ex.ª para o facto de o seu tempo se estar a esgotar e haver já Deputados inscritos para pedirem esclarecimentos.

O Orador: - Sr. Presidente, conto com a benevolência de V. Ex.ª, embora não queira invocar o motivo de defesa da honra. .
Para terminar, Sr. Deputado, gostava de dizer-lhe que pensamos que é preciso acelerar a execução do QCA. Os senhores deixaram 356 milhões de contos por realizar, executaram uma média de 72% e, devido a uma entrada financeira tardia no País, perderam-se milhões de contos. É isso que temos de conseguir recuperar, mas para já estamos 36% acima da vossa melhor performance.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para exercer o direito de defesa da consideração da bancada, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, em nome da minha bancada não quero deixar de reagir à sua intervenção, pois ficámos espantados com o estilo que utilizou.
Em primeiro lugar, o senhor tem direito de ter ideias diferentes das nossas e de discordar das opções que fizemos no passado, mas não pode tentar enganar-nos. V. Ex.ª é uma pessoa competente, sabe que há certas análises que não podem ser feitas - e foi precisamente isso que aqui tentou fazer.
Em segundo lugar, não devia ter utilizado um tom jocoso ao falar de coisas tão sérias para este país.

Aplausos do PSD.

O Sr. Ministro felicitou o PCP e isso é, de alguma forma, sintomático, porque na intervenção que aqui produziu disse que o PSD era o último partido que podia ter levantado este problema. Sr. Deputado Lino de Carvalho, o PSD é o único que tem capacidade para o fazer,...

Aplausos do PSD.

...na medida em que foi ele que fez a negociação deste QCA.

Vozes do PS: - E mal!

A Oradora: - Não sei se foi mal ou bem. Foi o único que fez!
Utilizou os dinheiros que estão à vista e só a história poderá julgar se o fez bem ou mal.
Creio que se o Sr. Ministro tivesse vindo dizer ao Parlamento que este ano a execução era inferior à de 1994 e à de 1995 nem sequer precisaria de estar aqui presente, porque as execuções de 1996 e de 1997 vão ter de ser superiores às desses anos. Mal fora que isso assim não fosse!
Sr. Ministro, o que está em discussão não é o ritmo de crescimento, que, como é evidente, tem de ocorrer; o que está aqui em debate não é a comparação entre as execuções de 1994 e 1995 e as de 1996 e 1997, mas, sim, a questão de saber se este ritmo é ou não suficiente para conseguir captar os fundos comunitários negociados no 11 QCA.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Quanto à má execução feita pelo governo do PSD, a única coisa que lhe desejo é que se mantenha - como nós nos mantivemos! - no primeiro lugar de entre todos os países da Europa. Não é necessário que se chegue aos 100% (o que é quase inviável), mas que Portugal esteja sempre em primeiro lugar. Quando deixar de estar aqui estaremos para fazer-lhe uma observação.
Agradeço que não invoque, tal como fez o Sr. Deputado Henrique Neto, a entrada tardia do Orçamento do Estado como desculpa para o atraso na captação dos fundos comunitários. O senhor ainda há pouco afirmou aqui que eu sabia - portanto, nós dois sabemos - que a entrada em vigor do Orçamento do Estado não tem rigorosamente nada a ver com a captação dos fundos comunitários e que temos de ter, inclusivamente, em conta a possibilidade da existência de adiantamentos. Portanto, como é evidente, esse argumento não pode ser invocado.
Há um ponto que não posso deixar de referir neste momento e que tem a ver com aquilo que dissemos na discussão do Orçamento do Estado para 1996. O Sr. Ministro foi apontado pela comunicação social como tendo sido o grande artífice desse instrumento financeiro, com o que estou plenamente de acordo. E porquê? Porque V. Ex.ª conseguiu gizar o PIDDAC com um crescimento, sem ter qualquer intenção de o executar. E tanto assim é que neste momento o senhor, nas suas reprogramações, está a reforçar programas com execução zero. Por algum motivo é, Sr. Ministro! Na altura da discussão do Orçamento do Estado afirmámos que para a execução desse instrumento havia dois pontos fracos: a não opção dada ao investimento teria implicações ao nível do desemprego e consequências fatais na captação dos fundos estruturais, o que já está a acontecer, Sr. Ministro!

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, tenho por si a maior consideração e se fez esta intervenção foi porque a sua própria consciência assim o ditou, pelo que não vou, de forma alguma, abordar esse assunto.
Gostava de dizer-lhe duas coisas.
Em primeiro lugar, todos os números que citei são comprováveis, verificáveis e verídicos.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Não são comparáveis!

O Orador: - Têm por base fontes oficiais controláveis e são exactos, rigorosos. A última coisa que faria seria dar ao Parlamento um só número que não fosse verdadeiro! Nunca o fiz e insurgi-me sempre contra quem o fez.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A minha linha de argumentação foi linear e clara. Ao ser acusado expliquei que já tínhamos 36% de execução acima do melhor que fez o PSD em período idêntico. Contra factos não há argumentos, Sr.ª Deputada!
Gostava ainda de dizer-lhe que não invoquei o Orçamento do Estado, pelo que não vou analisar nem reproduzir matéria sobre a qual fui omisso.
Finalmente, quero dizer-lhe que na sua boca a palavra «gizar» não tem nada a ver com nada - noutras bocas talvez tivesse, uma vez que fui membro de uma organização chamada GIS. Reconheço que na sua boca a expressão «gizar» não tem essa conotação, mas, de qualquer forma, digo-lhe que este Orçamento do Estado, do ponto de vista do Governo e sem qualquer sofisma, é para executar. Quando chegar a devida altura aqui estaremos para explicar como é que o executámos e se, porventura, houver qualquer desvio procuraremos apontar a razão de ser desse facto. Nenhum de nós tem o futuro como certo e seguro na sua mente. Haverá aleatoriedade, desvios, mas o que não há é intenção. E, sobre juízos de intenção, está previsto um mecanismo que pode chegar ao mais ínfimo detalhe e à repetição até à exaustão.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PS D): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tema palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, era só para dizer ao Sr. Ministro que não pus em causa os números que citou. Apenas disse que eles não eram comparáveis e mais nada.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, em relação a esta matéria dos fundos comunitários há, desde logo, uma divergência quase definitiva
entre os senhores e nós e uma convergência profunda entre os senhores e o PSD. Os senhores entendem que os fundos comunitários são uma generosidade da União Europeia para com Portugal; nós pensamos que os fundos comunitários são a contrapartida bastante insuficiente da abertura dos mercados feita por Portugal. São duas atitudes completamente distintas e é por isso que não sentimos nenhum complexo de inferioridade em relação à concessão de fundos estruturais pela União Europeia. O que nos é dado é-nos dado e falta muito para ser o que era devido.
Portanto, não temos nem de nos calar, nem de diminuir a nossa voz na União Europeia, nem de ter uma atitude complexada só porque nos concedem fundos comunitários. Esta divergência é quase definitiva entre nós e condiciona os raciocínios políticos quanto à questão dos fundos comunitários.
Mas quero colocar-lhe uma questão, Sr. Ministro, e que é esta: há cerca de um mês houve uma reunião do PS, a que compareceram os Drs. Vítor Constâncio e Daniel Bessa - um esteve para ser seu Primeiro-Ministro e outro foi seu colega do Governo -, que, presumo, têm autoridade em matéria de socialismo, de Europa e de fundos estruturais. Foram a essa reunião do PS (já não sei se na qualidade de socialistas ou de economistas) esclarecer os socialistas, em particular o Governo, de que há uma incompatibilidade no limite entre o uso dos fundos comunitários e o cumprimento da política de convergência. Foi isso que disseram, não o desmentiram e é provavelmente o que pensam desde o momento em que transitaram do Governo para os fóruns de natureza mais académica. Compreendemos que seja assim e que os Drs. Vítor Constâncio e Daniel Bessa digam isso, porque para cumprir a política de convergência das duas uma: ou os senhores congelam despesas ou aumentam os impostos.. Ora, como já disseram que não vão aumentar os impostos, vão ter de congelar as despesas que, como é evidente, têm a ver com o investimento público.
Portanto, aquilo que está aqui em debate não é uma omissão conjuntural, não é luma. falha técnica mas, sim, uma política que os senhores não desejam mas à qual estão obrigados. De facto, V.V. Ex.as sofrem de uma incoerência profunda: por um lado, querem cumprir, custe o que custar, a política de convergência, mas, por outro lado, admitem que o cumprimento dos critérios de convergência tem de ser feito à custa do investimento e, assim, no que ao investimento público concerne, à custa do atraso do País e de uma divergência real entre Portugal e a média europeia.
Por isso, ou o Drs. Vítor Constâncio e Daniel Bessa não conhecem bem estes assuntos ou estão mal informados ou, então, V. Ex.ª já não pensa como o seu antigo candidato a Primeiro-Ministro e como o seu ex-colega do Governo. Agora, a verdade é que os dois dizem que no limite há uma incompatibilidade entre a utilização completa dos fundos comunitários - que é o que está aqui em debate - e o cumprimento do critério de convergência e que se o Governo quer mais fundos tem de abandonar a política da moeda única. Repito, isto é dito académica e autoritariamente por dois socialistas eminentes.
Pergunto-lhe: o que pensa das advertências feitas pelos Drs. Vítor Constâncio e Daniel Bessa? Será que o Sr. Ministro vai dizer-nos que para cumprir o critério de convergência e usar completa ou substancialmente os fundos, não podendo congelar mais despesas, o Governo vai ter de aumentar os impostos?

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Quero perguntar-lhe, com muita sinceridade, o seguinte: é ou não incompatível a utilização completa dos fundos comunitários com o cumprimento da política de convergência? É aí que está o cerne da questão e não na «guerrilha» estatística - aliás, V. Ex.ª aderiu a um dos vícios de maior categoria do cavaquismo e que tem a ver com a utilização política das estatísticas - para saber quem aplicou mais ou menos. Ambos deixaram de aplicar, porque se comprometeram a uma política que os obriga a não usar completamente os fundos comunitários.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, não irei situar a pergunta nos termos do «duelo» que, de algum modo, optou por marcar asna intervenção porque me parece que o problema da utilização dos fundos não é uma discussão neutra. Não se trata de saber se se gastou muito ou pouco, não se trata de discutir números, mas sim de saber em função de quê, com que perspectiva de desenvolvimento, para que melhoria dos padrões de vida das pessoas, para que resolução da crise ecológica, para que desenvolvimento autónomo, ou não, do País os fundos servem enquanto existirem. Parece-me que essa é que é a questão central, além do mais, porque os fundos não são eternos e deveria haver um' olhar mais alargado sobre esta questão, que não ouvi presente na sua intervenção.
Uma outra questão que gostaria que tornasse clara também na sua resposta, mais do que a informação que vai distribuir aos grupos parlamentares, era um olhar crítico, um olhar retrospectivo sobre aquilo que foi a utilização dos fundos; ou seja, em termos económicos, saber se geraram ou não emprego e, mais do que isso, em que medida é que os fundos, que têm uma expressão diferente no território, serviram ou não, ou que reflexos tiveram do ponto de vista regional. Julgo que seria interessante ter esta questão em conta num debate desta natureza.
Uma última questão que gostaria de ver respondida - porque tenho curiosidade nisso - refere-se a algo que a comunicação social tem divulgado. Uma das críticas generalizadas, e é conhecida do passado, é a opacidade que envolveu a utilização dos fundos, a corrupção, os negócios, a formação profissional que não existiu. A comunicação social tem referido repetidamente contactos havidos entre o Governo e o PSD, nomeadamente, que indiciariam a. hipótese de se pretender arquivar e lançar uma cortina de silêncio sobre corrupção, sobre utilização abusiva de fundos.
Gostaria, pois, que o Sr. Ministro dissesse que razoabilidade ou que veracidade existe em relação ao que os jornais têm noticiado e que compromisso assume em relação a este Parlamento de que a investigação será levada até ao limite e que não será permitido que os processos sejam arquivados.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro: 0 PSD tem acusado, nesta Câmara, por várias vezes, o Governo de não decidir, de governar conjunturalmente, de navegar à vista. Com a essência da interpelação que foi aqui hoje feita pelo PSD, este nega-se a si próprio e anula esta peça recorrente do seu argumentário.
De facto, se há demonstração de que este Governo tem uma estratégia e se há demonstração de que essa é uma estratégia de legislatura, o comportamento que foi adoptado na gestão do Quadro Comunitário de Apoio, é disso 0 mais correcto penhor. Poderia o Governo ter adoptado aqui uma solução fácil, poderia não mudar regras, poderia não mudar procedimentos, poderia manter o status quo, poderia aceitar quebras sucessivas de execução, quebras sucessivas de eficácia, como houve no governo anterior, até ao descalabro final, mas não o fez. Preferiu afinar a,«máquina», preferiu corrigir erros, preferiu modificar as prioridades - exactamente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, porque não negociou este QCA, pois se o tivesse negociado tê-lo-ia feito melhor e de forma diferente. E, ao fazê-lo, isso poderá ter como consequência alguns custos quantitativos, de curto prazo, mas terá certamente enormes ganhos qualitativos, de médio e longo prazo que, em muito, os suplantarão.
Por isso, Sr. Ministro, penso que a pergunta que faz sentido neste debate, é: que diferença qualitativa, prospectiva existe para a economia portuguesa, pelas alterações que lhe foram formuladas na gestão do QCA por este Governo, em relação àquilo que sucederia se nenhuma alteração tivesse sido implementada, se a linha de execução dos anteriores governos tivesse prosseguido? Essa é a avaliação que faz sentido, esse é o julgamento que faz sentido, esse é o único sentido para esta interpelação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Ainda para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, agradeço o tempo que me foi concedido pela Mesa. Sr. Ministro, sublinho o acordo do Governo com a reflexão que aqui trouxemos, designadamente, com a necessidade de uma reorientação da aplicação dos apoios dos fundos comunitários, com vista a dar-lhes mais eficácia nó reforço da estrutura produtiva e na criação de emprego. Mas não basta, naturalmente, haver acordo, é preciso que esse acordo passe à prática, e nós estamos aqui para verificar se o acordo do Sr. Ministro com aquilo que trouxemos aqui se traduz numa prática nova e numa reorientação nova, o que, até agora, ainda não vimos nem temos essa informação.
A questão que coloquei levanta um problema. Referi que é necessário aumentar ou generalizar mais o acesso dos mais necessitados aos apoios, dos agricultores, do pequeno comércio e, também, ao nível do PEDIP, o que levanta uma questão: ou o Governo, estando de acordo com esta ideia, coloca plafonds, tectos, limites aos apoios a certo tipo de investimentos e a certa dimensão de investimentos para fazer uma reafectação da verba sem aumento da despesa pública nacional ou não faz isso e, portanto, alarga a base de acesso aos fundos, o que implica aumento da despesa pública nacional, e o aumento da despesa pública nacional é, obviamente, incompatível com as obrigações decorrentes de Maastricht.

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É esta contradição que gostaria de ver aqui traduzida e clarificada.
Penso que, em muitos casos, é possível reafectar e reorientar fundos sem aumento da despesa pública nacional, criando até, por exemplo, ao nível da agricultura, plafonds. Na Europa, hoje, discute-se muito a necessidade de criar plafonds, limites, tectos, à dimensão dos apoios a conceder para poder reorientar a verba para aqueles que mais necessitam. Mas, se não for essa a intenção do Governo - e é isso que é preciso que o Governo esclareça -, como é que pensa compatibilizar o apoio em relação ao qual diz estar de acordo com o PCP e com a reflexão que aqui trouxemos, ou seja, o aumento do acesso dos beneficiários aos apoios, com o que isso traz de aumento da despesa pública e a contradição com as condicionantes que decorrem das políticas de Maastricht. É esta questão, esta quadratura do círculo que gostava que o Sr. Ministro resolvesse, se for capaz disso.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, em tempo cedido pela Mesa.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, muito obrigado pequeninos!
As contribuições das várias bancadas foram muito interessantes e revejo-me em muitas das considerações que antecederam as perguntas, em particular a que fez o
Sr. Deputado Carlos Zorrinho, pelo que me identifico, desde já, na resposta, com a orientação política que ele aqui traçou, o que me poupa tempo na resposta!
Sr. Deputado Paulo Portas, compreendo o seu problema, mas poderia ter encontrado escritos meus sobre a mesma matéria. No entanto, teve a gentileza de não o fazer
ou omitiu o assunto por agora. Verá, pelo Orçamento de 1997, como é possível vencer, em boa parte, as contradições apontadas, e verá isso como um grande exercício prático nesse Orçamento.
A questão-chave, Sr. Deputado Lino de Carvalho, está no facto de ser necessário oferecer contrapartidas nacionais até um certo montante para se poder receber os fundos comunitários. Essa quadratura do círculo resolver-se-á de algum modo no Orçamento de 1997, como exemplo prático que espero poder vir a apresentar, no que me diz respeito quanto ao investimento, nesta Assembleia.
Sr.ª Deputada Isabel Castro, opacidade, nenhuma complacência perante o desperdício, nenhuma; pactos, apenas um contra a negligência e «o deixar andar». Aliás, por alguma razão criámos a figura original do supervisor financeiro do QCA, dotado de certos poderes, e vamos pôr à frente dessa supervisão quem conhece a fundo os mecanismos de execução dos fundos comunitários de apoio.
Espero que, desse ponto de vista, lhe dê absoluta tranquilidade aquilo que o Governo se propõe fazer e as pessoas que o Governo tem escolhido para gerir os fundos. Desde já, quero dizer-lhe que qualquer suspeita fundamentada, qualquer indício fundamentado de má utilização, quanto mais desvio fraudulento, serão investigados a fundo, doa a quem doer. É um compromisso pessoal que assumi e
que manterei sempre. Entendo que o patriotismo está precisamente em não pactuar com a fraude veja que fui acusado de falta de patriotismo exactamente por não pactuar com isso... Agora, que estou no Governo, faço ponto de honra absoluto em prosseguir nessa mesma via.
Sr. Deputado Carlos Zorrinho, perguntou que diferença fundamental, bem como a Sr.ª Deputada Isabel Castro e outros, entre os quais o Sr. Deputado Lino de Carvalho. Gostaria de dizer que está em curso um processo de avaliação do QCA feito por equipas independentes, seleccionadas em concurso público; traremos a esta Assembleia essas avaliações, assim como o nosso próprio pensamento e proposta de acção. Isso ocorrerá no fim deste ano, visto que só nessa altura teremos as propostas de avaliação.
Entretanto, já há várias medidas em curso. Por exemplo, o Sr. Secretário de Estado poderia falar do campo que lhe interessa, se tivesse tempo para isso, mas digo-lhe desde já que estão a ser estudadas medidas que vão no sentido de dar eficácia à aplicação dos fundos estruturais. No entanto, não concordo com a ideia dos fundos pequeninos para o «Portugal dos pequeninos».

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Porquê? Os pequeninos não têm direito?

O Orador: - Não, não é isso. É I que isto não é o «Portugal dos pequeninos».

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas também é dos

O Orador: - Não; isto é o Portugal dos portugueses, que é um bocado diferente.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas os pequeninos também são portugueses!

O Orador: - Com certeza! São pequeninos e são considerados como portugueses, e é como portugueses que os trataremos e não com o parti gris de andar a fazer distribuição dos dinheiros comunitários às fatias, metade para isto, um terço para aqueloutro e um quarto para aqueloutro, segundo clientelas. Temos de considerar os equilíbrios vários de que o País precisa.
Com isto, terminaria dizendo à Assembleia que quanto à falta de informação, reconhecemos que esta. não tem circulado, efectivamente, da melhor forma, até porque não está bem organizada: Estamos empenhados fortemente em fazer com que a informação esteja disponível não só para á Assembleia mas para cada português que o pretenda. Para isso, estamos a tomar disposições no sentido de transformar a informação existente do QCA num bem acessível a qualquer cidadão por forma a que, indo a um terminal de computador e pedindo o que entenda, receba a informação imediatamente. Isso vai levar um ano, mas, até lá, estaremos sempre à disposição e, desde já, gostaria de ser convidado - não me posso oferecer, mas insisto que gostaria de ser convidado - pela Comissão dos Assuntos Europeus, ou de Economia, Finanças e Plano, ou por quem entender, pelo Plenário mesmo, para vir explicar aqui em pormenor exactamente o que é que estamos a fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Francisco Torres, pede a palavra para que efeito?

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O Sr. Francisco Torres (PSD): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, queria apenas dar conta a V. Ex.ª, dado que o Sr. Ministro acaba de dizer que teria muito gosto em ser convidado, que o grupo parlamentar do PSD acabou de entregar uma proposta na Comissão de Assuntos Europeus exactamente para ter oportunidade de ouvir o Sr. Ministro esclarecer sobre toda a execução dos investimentos comunitários.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Desta vez ganhou iniciativa!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - A Mesa fica esclarecida.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território pede a palavra para que efeito?.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, para bem entender o que acaba de ser dito.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, gostava de saber se é uma espécie de replay ou de aditamento ao debate de urgência falhado que o PSD acabou de fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para defesa da honra da bancada, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, não lhe fica bem, falar em interpelações falhadas ou bem sucedidas, quando foi o senhor a confessar que talvez daqui a um ano tenhamos informações sobre a execução do QCA. É que tantas são as reorganizações, os estudos, as preparações até à data que o Sr. Ministro até sabe que não sabemos nada.
Sr. Ministro, não queríamos mais nada a não ser saber como estava a execução do QCA e, por isso, só tinha que nos dizer como estava essa execução, e não tem que falar em interpelações falhadas ou não falhadas. Penso que está a desprestigiar a Assembleia da República e não é correcto da sua parte utilizar essa fraseologia.

Aplausos do PSD.

Em segundo lugar, Sr. Ministro, lamento ter que lhe dizer que não sei se é falhado ou não é falhado mas conseguimos transmitir ao país, que é aquilo que interessa já que a sua Internet pelos vistos só vai funcionar daqui a um ano, que com esta velocidade o senhor não vai conseguir captar o QCA.ª que tem direito.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, há um equívoco da sua parte na interpretação daquilo que eu disse. O que afirmei é que, dentro de um ano, qualquer português, indo a um certo número de escritórios acessíveis em todo o país, terá informação on line sobre todo o QCA, designadamente, no que se referir ao seu projecto, o que é mais do que qualquer informação dada por qualquer Administração Pública dependente de governos do PSD.
Por outro lado, não estou à espera de levar a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite ou quaisquer outros Deputados ao on line, porque estou à disposição deste Parlamento. Todavia, como estou num órgão político e não numa câmara corporativa posso, legitimamente, ,considerar falhado o debate de urgência.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, para defesa da sua honra, o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, na sua intervenção, visou-me directamente e julgo que tenho toda a legitimidade para invocar a defesa da consideração pessoal.
O Sr. Ministro veio ao Parlamento usar de uma argumentação que tenho de considerar desonesta ou incompetente. Desonesta, porque sabe que os argumentos que utilizou não são verdadeiros e sabe isso melhor que ninguém, porque foi sempre um homem de gabinete de planeamento, conhece bem como é que se manipulam os números e o que significam. E, mais, sabe perfeitamente que os argumentos que utilizou não são verdadeiros quando compara, por exemplo, percentagens com valores absolutos, quando compara fase de arranque com fase de velocidade de cruzeiro ou, então, incompetência. Mas não reconheço no Sr. Ministro incompetência; pois é pessoa que vem aureolada de competente em matéria de planeamento.
O Sr. Ministro tem uma característica que é talvez um pouco surpreendente para os portugueses: tem funcionado como uma espécie de rei Midas ao contrário, ou seja, em tudo o que toca desvaloriza. É curioso como conseguiu arranjar um problema, hoje muito difícil de resolver, na barragem do Alqueva; prepara-se para arranjar um sarilho gigantesco com a ponte Vasco da Gama, onde conseguiu, depois de um acordo firmado, da velocidade de cruzeiro em que o assunto seguia, arranjar um problema complicadíssimo; conseguiu dificultar e tornar difícil a execução do Plano Rodoviário Nacional, acabando com a auto-estrada Aveiro-Vilar Formoso.
Em suma, em tudo ó que mexe, estraga. Na realidade esta situação acaba por ter uma consequência e talvez a pior de todas seja esta que estamos aqui a debater. É de facto um escândalo estarmos a assistir a uma baixíssima execução dos fundos comunitários verificada até agora. E quais são os standards de que me estou a socorrer? São os seus, Sr. Ministro. Disse que fixava como objectivo 50% para Junho, mas quando verificou que isso era impossível, baixou para 30% em Maio e, hoje, 'verificamos que são 20% em Maio. Estou a usar, como lhe disse, os seus próprios critérios, estou a usar os critérios do Sr. Ministro para dizer como está esse Ministério, e como ele está a funcionar não serve.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, nunca me vi na figura do rei Midas, por razões óbvias. Quero apenas dizer ao Sr. Deputado Ferreira do Amaral que «o rei vai nu». Será Midas ou não, não me interessa porque vai nu.

Risos do PS.

Quanto à matéria da ponte, numa altura em que lutamos até ao limite das nossas capacidades para prestar esclarecimentos sobre a gestão do governo em que participou o Sr. Deputado Ferreira do Amaral e por factos que são alegados em relação à sua gestão, considero espantoso que venha agora dizer que embrulhei o assunto. Quanto ao Alqueva não falo, já falei. Quanto à execução apenas tenho que justificar uma coisa e que este debate mostrou: falei de números absolutos ou de números relativos, mas, em todo o caso, sob forma, digamos assim, numérica não percentual. A única pessoa que falou de percentagens foi o Sr. Deputado Ferreira do Amaral. Há, portanto, aí qualquer confusão que mostra que o Sr. Deputado, ao fim do debate, ainda não compreendeu.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD:- Muito fraco!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, está encerrado o debate de urgência requerido pelo Grupo Parlamentar do PSD sobre a execução de projectos financiados pelos fundos estruturais.
Para tratar de um assunto de interesse relevante, ao abrigo do artigo 81.º do Regimento,- tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Correia.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começa hoje, dia 11, e prolongar-se-à durante seis meses, o período de regularização extraordinária dos imigrantes clandestinos.
O Governo cumpriu mais uma das suas promessas eleitorais ao apresentar a esta Câmara uma proposta de lei sobre a regularização dos imigrantes clandestinos e esta Câmara decidiu, por unanimidade, que esta matéria justificava uma lei da sua responsabilidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - O significado desta postura e deste acto do Parlamento são inequívocos do ponto de vista político. Tal significa que os Deputados da Nação, de todos os quadrantes políticos, reconhecem que a inserção dos imigrantes na sociedade portuguesa é uma questão nacional e é um imperativo ético, social e político. Esta lei permitirá que numerosos estrangeiros já residentes no nosso país, sejam reconhecidos na sua existência, enquanto tal, e logo, nós seus direitos cívicos e laborais.
Com efeito, como todos sabem, numerosos trabalhadores e famílias têm vivido aqui em Portugal privados da possibilidade de obter contrato de trabalho e de arrendamento de habitação, de inscrição na segurança social e da normal escolaridade dos seus filhos, além de viverem no constante receio das autoridades policiais. O Parlamento não poderia deixar de ser sensível à necessidade de criação de condições de dignidade de vida a milhares de pessoas, como também não poderia deixar-se alhear da segurança de todos os cidadãos, porque, como disse na apresentação da proposta o Ministro Alberto Costa conde há marginalização e exclusão, há rancor e ressentimento».
A lei prevê a colaboração, particularmente das comunidades imigrantes, através das suas organizações representativas. Estas e as associações anti-racistas e de defesa dos direitos humanos, que entendem, tal como esta Câmara, que este é um problema de todos nós, já se encontram no terreno, em trabalho voluntário, aguardando os apoios estabelecidos pela lei, a atribuir pelo Governo, através dos governos civis. Os postos de recepção dos pedidos estão abertos e muitos locais de esclarecimento e apoio estabelecidos pelas associações e, também, pelas câmaras vão funcionar em benefício deste processo que a lei determina que seja totalmente gratuito.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Destes apoios não. posso deixar de destacar, desde já, os que foram decididos pela Câmara Municipal de Lisboa, através dos seu Conselho Municipal de Imigrantes e Minorias Étnicas. Um dos postos de recepção dos pedidos de regularização extraordinária dos imigrantes clandestinos funciona aqui mesmo em frente desta Assembleia, no espaço «Por Timor>.
Exortamos todos as Sr.ªs e Srs. Deputados a passarem por aquele espaço, e por outros, dignificando o acto de regularização extraordinária, fiscalizando-o e demostrando o empenhamento dos seus partidos e desta Assembleia na lei que aprovou. O acto de regularização extraordinária dos imigrantes é em si mesmo um acto libertador, um acto que faz emergir para a vida democrática e cívica cidadãos que estavam condenados à obscuridade, à clandestinidade.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - A feliz oferta da Câmara Municipal de Lisboa do espaço «Por Timor» para um posto de regularização extraordinária associa e carrega um potencial e simbólico desejo libertador que a presença dos Srs. Deputados muito avivará. A Assembleia da República sabe muito bem que as relações de cooperação e solidariedade para com os países lusófonos é também avaliada pela forma como tratarmos aqui os imigrantes oriundos dessas origens. As pessoas têm de ser tratadas como cidadãos de parte inteira, com os direitos e deveres que a Constituição e a lei lhes atribui, mas também sem quaisquer paternalismos.
Por tudo isto, daqui apelamos aos imigrantes clandestinos para que aproveitem esta única é extraordinária oportunidade de regularização, na certeza de que tudo faremos para que este processo tenha êxito e que aqui o acompanharemos a par e passo.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Um outro assunto motiva a minha intervenção. Decorreu na noite de ontem, dia 10 de Junho, o aniversário dum acontecimento que horrorizou este país. Alcind0 Monteiro, jovem cidadão português, trabalhador, de origem cabo-verdiana, foi barbaramente assassinado e mais 16 pessoas ficaram então feridas pela simples, obscura e primitiva razão de serem negros. Não foi um crime resultante de um acto fortuito de índole racista. Se aqui levanto essa memória e não a de outros acontecimentos de igual motivação que, aqui

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e ali, infelizmente, vão aparecendo no nosso país, é porque este crime foi diferente segundo a nossa opinião, a dos media e a da generalidade do senso comum.
Houve nele indícios de premeditação e isso faz a diferença. Segundo alguns testemunhos, o Bairro Alto foi estrategicamente ocupado, com as saídas cortadas e o grupo agressor dos Skins veio expressamente de vários pontos do país para executar esta acção. Após meses de investigação por parte da Direcção de Central de Combate ao Banditismo, estão detidos a aguardar julgamento 14 indivíduos, estando os restantes arguidos, quarenta e cinco no total, a aguardar julgamento em liberdade.
Por estas razões, mas também por outras, é que não podemos dizer, como alguns insistem em afirmar, que em Portugal não há manifestações de discriminação resultantes da cor da pele. É verdade que não existem formações políticas que defendam o racismo nem a discriminação em função da cor da pele nem da nacionalidade; é verdade que temos uma sociedade cuja cultura é fundamental e intrinsecamente humanista, que se insere numa arreigada visão de carácter universal e, logo, de abertura aos outros. Mas é também verdade que algum racismo e alguma xenofobia, aqui e ali vão ousando afirmar-se.
Contudo, a sociedade portuguesa faz ainda e pode continuar a fazer, sem hipocrisias, a diferença relativamente a outros países. Viu-se, por exemplo, na forma enérgica como a sociedade portuguesa respondeu, cívica e determinadamente, ao crime de Alcindo Monteiro, elevando bem alto a sua voz, afirmando «Não ao Racismo», na maior manifestação anti-racista que se fez no nosso País. Brancos, negros e mestiços elevaram as suas vozes para afirmar que todos somos iguais na diferença e que todos temos de travar a batalha da cidadania.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Portugal assinou no passado dia 3 de Maio a nova Carta Social Europeia, revista pela primeira vez desde o ano de 1961, a qual introduz novos direitos como o da protecção contra a pobreza e a exclusão social. Os temas «Racismo e Xenofobia» foram enfatizados na declaração aprovada no final da reunião dos Ministros dos Negócios Estrangeiros, dos 39 países membros do Conselho da Europa. Este organismo solicita a integração da aprendizagem da tolerância na formação dos professores, dos trabalhadores sociais, dos responsáveis pela formação, dos agentes dos serviços públicos e, designadamente, dos agentes dos serviços policiais.
Reconheceram-se alguns resultados positivos na campanha europeia da juventude contra o racismo, anti-semitismo e a intolerância, mas reconheceu-se, por igual, que esses fenómenos persistem e convém reagir energicamente contra eles e contra a banalização de comportamentos xenófobos.
O Partido Socialista entende que a batalha pela inserção das comunidades imigrantes em Portugal e a batalha contra o racismo não se trava com retórica anti-racista, trava-se com actos, tais como o que nesta Assembleia foi aprovado, com a unanimidade dos partidos nela representados, referente à possibilidade de as associações de imigrantes e de defesa dos direitos do homem se constituírem como assistentes em caso de crime motivado por discriminação resultante da cor da pele ou da nacionalidade. O PS, que propôs esta lei à Assembleia, continuará a batalhar pela inserção dos imigrantes e contra o racismo com actos, seja nesta Casa seja no Governo.

Vozes do PS:- Muito bem!

A Oradora: - Os portugueses, mesmo os de origem imigrante, como no caso do Alcindo Monteiro, os imigrantes, em particular os lusófonos, continuam a confiar nas instituições portuguesas e esperam, naturalmente, que a justiça seja feita com a proporcional aplicação das penas consoante a gravidade dos crimes cometidos e efectivamente comprovados. Os portugueses e as comunidades lusófonas residentes em Portugal confiam em que serão adequadamente punidos os crimes de índole racista qualquer que seja a cor desse racismo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Pessoalmente e em nome do PS, reafirmo aqui, hoje, o nosso empenho em lutar e a nossa determinação em fazer tudo o que esteja ao nosso alcance, dentro do Estado de direito democrático, para que a justiça seja feita, para que a solidariedade seja real no dia-a-dia, para que a cidadania se alargue, se instale e seja plenamente vivida por todos.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: As duas questões que motivaram esta minha intervenção são duas questões que podem ser tratadas, como acabo de fazer, de modo separado, formal e metodológico. Apesar desta necessária abordagem e apesar da diversidade dos assuntos, eles interligam-se entre si e fazem parte de nexos muito mais significativos. São aspectos diversos duma política determinada, global e de inserção real dos imigrantes e das minorias étnicas na sociedade portuguesa, que o PS e o governo da nova maioria vem levando a cabo e que continuará, convicta e coerentemente, a prosseguir em consonância com as suas promessas eleitorais e o seu Programa de Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mora Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Celeste Correia, gostaria de ver clarificados dois aspectos que estiveram ausentes na sua intervenção, embora pense que ela foi importante.
Em primeiro lugar, o processo de regularização que agora se inicia deveria ter coincidido com a regulamentação da lei - este aspecto foi por demasiadas vezes criticado no passado e essa foi uma das razões que não permitiu que o processo anterior corresse bem -, designadamente, porque isto tem a ver com o apoio efectivo às associações de imigrantes que dele necessitam e com a utilização dos grandes meios de comunicação social em grandes campanhas que permitam vencer a barreira do medo e a falta de esclarecimento das associações.
Pergunto se, na sua opinião, este é ou não um aspecto negativo e em relação ao qual o Governo está atrasado.
Em segundo lugar, embora haja o compromisso e o início do respeito do compromisso eleitoral do Partido Socialista em matéria de imigrantes é uma questão que apoiamos e aplaudimos , a questão que vou colocar tem a ver com o seguinte aspecto que não tenho visto equacionado: a regularização de imigrantes vai permitir, numa perspectiva de intervenção global, a integração de pessoas que se encontram em situação irregular e clandestina, passando o Estado a ter de lhes garantir o direito à habitação. O PER foi um plano visto numa determinada perspectiva, ou seja, tendo em conta um universo de cida-

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dãos, que não estes que agora é natural venham, face ao processo de regularização, a exigir aquilo que é um direito seu, que é o direito à habitação, o que coloca às autarquias, quaisquer que elas sejam, problemas complexos. Em consequência do PER, é natural que apareçam famílias de imigrantes que estão a iniciar o seu processo de regularização a exigir uma habitação.
Pergunto se tem conhecimento da forma como o Governo vai equacionar esta questão, porque, estando eu plenamente de acordo com o que disse, o facto de as pessoas viverem em condições de marginalização, segregadas e num autêntico apartheid social gera fenómenos de contestação, numa sociedade que não tenha em conta os direitos dos cidadãos.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Informo que a Sr.ª Deputada Isabel Castro gastou três minutos do tempo cedido pelo Partido Comunista.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Celeste Correia, de forma breve, gostaria de colocar-lhe questões que têm a ver com algumas preocupações que temos relativamente ao processo de regularização dos imigrantes, que hoje se inicia. Tive, aliás, oportunidade de, na passada semana, no período de antes da ordem do dia, dar conta de algumas dessas preocupações, na medida em que pudemos observar, em várias visitas e reuniões que tivemos em bairros maioritariamente habitados por cidadãos imigrantes e mesmo junto das suas associações, que está a verificar-se, no terreno, um atraso na aplicação do processo de regularização, o que nos causa profundas apreensões.
Em primeiro lugar, porque não estão a ser visíveis campanhas de divulgação. pública e de esclarecimento junto dos cidadãos imigrantes, tal como foi prometido pelo Governo - isso de facto não está a verificar-se, isso não é visível. Nota-se que as pessoas têm um grande défice de informação relativamente aos termos da regularização e às suas possibilidades.
Também estão a verificar-se atrasos gritantes na concessão de apoio às associações representativas de imigrantes para participarem. Contactámos várias associações que apresentaram projectos a fim de intervirem no processo para um melhor esclarecimento dos imigrantes e, na semana passada, ainda não tinham obtido resposta. Isto é muito preocupante, porque o processo começa hoje e o Governo tem vindo a dizer que esta é a última oportunidade.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - O Governo disse isso?!

O Orador: - Ora, se esta é a última oportunidade, tem de ser efectivamente uma oportunidade, não pode ser deitada à rua.
- Há aspectos de regulamentação que não foram cuidados até agora, designadamente, aspectos muito complicados que se relacionam com a passagem de atestados de residência por parte das juntas de freguesia em que ou há uma uniformização de procedimentos para serem seguidos por .todos de forma segura ou, então, poderão criar-se obstáculos muito complicados de superar neste processo de regularização. Nós estamos preocupados.
Apelei aqui, na semana passada, em nome do meu grupo parlamentar, para que o Governo, rapidamente, tome as medidas necessárias para que este processo possa ser levado a bom termo e gostaria de saber a opinião da Sr.« Deputada quanto a estas preocupações e quanto às medidas necessárias que deverão ser tomadas para que o processo não seja uma oportunidade deitada à rua.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Correia, por um período máximo de cinco minutos.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados Isabel Castro e António Filipe, agradeço as questões que me colocaram. Há uma que é coincidente e refere-se à campanha e ao apoio às associações.
Eu disse, na intervenção, que esta é uma questão de todos nós e que as associações de imigrantes, associações anti-racistas e de defesa dos direitos humanos já se encontram no terreno em trabalho voluntário, aguardando os apoios estabelecidos pela Ida atribuir pelo Governo através dos governos civis. Portanto, as associações estão à espera do apoio dos governos civis.
Relativamente à campanha, devo dizer que, em conjunto com as associações, ela está a arrancar - aliás, penso que arrancará hoje - e, penso, em breve será visível à população portuguesa e à população imigrante.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Relativamente ao PER, devo dizer à Sr.ª Deputada Isabel Castro que o direito à habitação é também uma das nossas preocupações. As comunidades imigrantes estão incluídas no PER e, portanto, vamos aguardar - eu, pessoalmente, estou a aguardar e as comunidades imigrantes também - o desenvolvimento desse plano para ver como é que este processo seguirá.
De momento, é o que vos posso responder.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.ªs e Srs. Deputados, dou por terminado o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 40 minutos.

ORDEM DO DIA

Vamos dar início ao período da ordem do dia, com a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 31/VII - Revê o Código de Processo Civil, designadamente com as alterações nele introduzidas pelo, Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro.
Para fazer a apresentação, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O' Sr. Ministro da Justiça (José Vera Jardim): Sr. Presidente, antes de mais, os meus cumprimentos a V. Ex.ª e à generalidade dos Srs. Deputados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como é sabido, começou a ser publicado, em Dezembro do ano passado, uma reforma do Código de Processo Civil. Em relação a essa reforma, tivemos ocasião de, em várias intervenções que aqui fizemos, na altura ainda como Deputados da bancada socialista e como membros da Comissão de Assuntos

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Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, saudar os muitos aspectos positivos dessa reforma do Código de Processo Civil.
É sabido que essa reforma se arrastou durante vários anos e teve várias saídas falsas: projectos e contraprojectos, que acabaram por não ver a luz do dia, ou melhor, acabaram por não ter a chancela legislativa. Tratou-se, portanto, de alguma saga à volta da reforma do processo civil.
Mas também não desconheço, nem nenhum de nós pode desconhecer, as dificuldades próprias de uma reforma de um Código que, por um lado, se mantém praticamente incólume desde o fim da década 30, profundamente influenciado pelos ensinamentos e pelas concepções de então e que, por outro, dificilmente reúne o consenso da generalidade dos profissionais do foro.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Se há código que seja difícil reformar é precisamente 'o de Processo Civil, em especial, e os códigos de processo, em geral.
Na verdade, os códigos de processo têm como objectivo traçar os procedimentos que as partes devem tomar na apresentação das suas pretensões em juízo e o rumo, digamos assim, quer às partes, quer aos componentes do tribunal - magistrados judiciais, magistrados do Ministério Público e advogados.
Ao longo dos últimos anos, tem havido nestes vários intervenientes, sobretudo nos profissionais do foro, perspectivas muitas vezes diversas do que deve ser um código de processo. Por isso mesmo, eu disse e penso que as reformas do processo são reformas especialmente difíceis em que, já o tenho dito e repito aqui, dificilmente se conseguirá um consenso alargado entre todos os profissionais do foro. Mas quando esta reforma do processo civil veio a lume, ainda na última legislatura, tive ocasião de, nesta Assembleia, apoiar os princípios fundamentais em que essa reforma se baseava. São princípios de um processo moderno que, por um lado, têm em atenção fundamentalmente que o processo é um instrumento e não um fim, é um instrumento para alcançar a justiça material e não é em si mesmo um fim...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... e, por outro, que tenha em consideração que as partes, todos os intervenientes no processo, devem adoptar posturas de cooperação na busca da verdade material. Esses dois princípios fundamentais, bem como outros, foram consagrados nessa reforma do processo civil.
Daí que a bancada socialista, a que na altura pertencia, tivesse dado o seu apoio genérico à reforma do processo civil. Ela acabou por ser publicada, como todos sabem, tardiamente, a partir de Dezembro, publicação essa que só terminou decorridas quase duas semanas, íamos já quase em meados de Janeiro. E propunha-se entrar em vigor em 1 de Março deste ano.
Desde logo, entendi, e entendeu o Governo, que seria de intervir, para alargar a vacatio legis do Código de Processo Civil. Não se compreenderia, efectivamente, que uma reforma tão ampla como aquela que se anunciava e estava publicada pudesse ter apenas, para os profissionais do foro, um curto prazo de mês e meio para ponderação, estudo e adaptação.
Mas, mais do que isso, interessou ao Ministério da Justiça aquilo que não tinha sido possível até então, que era o estudo aprofundado e sistemático da reforma do processo civil, designadamente, do conteúdo do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro.
A verdade é que, ao confrontarmos a comissão que tinha trabalhado na reforma do processo civil com um estudo sistemático do texto da reforma, deparámos com um conjunto de soluções que, sem ferir os princípios, os quais, insisto, são positivos, estava longe, na sua globalidade, de ser tecnicamente aceitável.
A reforma do Código de Processo Civil continha um conjunto de erros graves, de omissões graves, de contradições graves. Tudo isto foi fruto, ao que foi possível apurar, da relativa pressa com que se pretendeu pôr a reforma «cá fora». Aliás, já nos habituámos a que a pressa não é boa conselheira em matéria de reformas legislativas, se é que o é em qualquer outra matéria. Mas sobretudo reformas legislativas desta profundidade não se coadunam manifestamente com calendários eleitorais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ora, o que sucedeu, sem que com isto se pretenda atingir pessoalmente quem quer que seja, é que se pretendeu publicar à pressa o Código de Processo Civil, para que ele ficasse a constar também das obras, neste caso não de cimento, do anterior governo.
Os resultados estão à vista para quem os quiser analisar com o mínimo de objectividade. E são de tal ordem que a própria comissão, confrontada com o texto que fizera, reconheceu que muitas dezenas de disposições necessitavam de ser profundamente alteradas. Aliás, V.V. Ex.as têm, porque para aqui o enviámos, o projecto de decreto-lei para que pedimos neste momento autorização legislativa e, naturalmente, se fizerem um exame objectivo das soluções desse projecto de diploma e das que constam do Decreto-Lei n.º 329-A/95, chegarão facilmente à conclusão de que se melhorou muito.
Para além disso, o Código continha também omissões, a principal das quais era não ter atentado o legislador e só essa análise aprofundada que fizemos do texto nos permitiu verificar isso - nas implicações que a nova regra da continuidade da contagem dos prazos iria ter no processo penal, como se refere, aliás, na exposição de motivos do projecto que apresentámos nesta Assembleia. Daí a necessidade, para que fomos alertados pela comissão de reforma do processo penal, de introduzir no diploma um normativo que mantenha em vigor a redacção do actual artigo 144 º, n.º 3, do Código de Processo Civil, por forma a que na contagem dos prazos em processo penal se não incluam os domingos, sábados e feriados.
Com efeito, como todos sabem, uma das reformas da última revisão é precisamente a chamada contagem contínua. Ora, havendo, como há - aliás, isto é tradicional no direito processual português -, uma aplicação das regras de contagem dos prazos ao processo penal, teríamos a situação bastante gravosa de os prazos do processo penal passarem a ser «comidos», digamos assim, pela regra da contagem contínua dos prazos.
Essa alteração, que, naturalmente, é da competência da Assembleia da República, visto que se trata de matéria que se relaciona com direitos, liberdades e garantias, como 0 é toda a matéria que diz respeito ao Direito Processual Penal, só por si, já seria suficiente para que aqui viéssemos pedir uma autorização legislativa que nos permita intervir nesta matéria.

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Esta a razão primeira da presente proposta de lei de autorização legislativa.
Cautelarmente, e no que respeita aos pontos da revisão do Decreto-Lei n.º 329-A/95, com maior grau de atinência nos direitos, liberdades e garantias, estes são integrados agora no pedido de autorização legislativa, partilhando-se o entendimento de que, na estrutura dos órgãos de poder, é na Assembleia da República que radica, em primeiro lugar, a legitimidade democrática para legislar. esse o nosso entendimento, que sempre seguiremos nestas matérias.
Assim, e muito sinteticamente, integrámos na lei de autorização legislativa, que apresentamos a esta Assembleia, os pontos a que me vou referir.
Na tutela dos interesse difusos, adequa-se o artigo 26.º-A ao preceito homólogo do artigo 2.º da Lei n .º 83/95, de 31 de Agosto (direito de participação procedimental e de acção popular);
Na perspectiva de uma desejável economia processual, dispensa-se no artigo 365.º -A o acordo das partes, fazendo preceder a sua audição à actividade oficiosa do juiz;
Insere-se no artigo 288.º do Código, que não fora abrangido pela reforma, disposição que privilegia o conhecimento de mérito nos casos em que o vício de forma seria imputável à parte vencida, concedendo-se à parte que não lhe deu causa a obtenção de decisão que regule directamente a questão de fundo;
Por outro lado, podendo a parte vencedora litigar de má fé, mesmo no plano substancial, elimina-se a restrição do n.º 3 do artigo 456.º, que só consentia a condenação do vencedor por má fé instrumental, com o que se enfatiza o dever de lealdade e de cooperação das partes, que são, aliás, princípios da reforma do processo civil;
Altera-se o n.º 1 do artigo 623.º, para minorar as consequências gravosas da reforma nos casos em que a área do círculo judicial compreende várias ilhas. Por exemplo, evita-se que se desloque a Angra do Heroísmo testemunha residente nas Flores, ou ao Funchal testemunha residente em Porto Santo. Ao invés, afigura-se de toda a conveniência, até por se tratar de zonas de maior movimento processual e em que as deslocações são fáceis, fazer comparecer as testemunhas residentes nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto quando tiverem de depor em tribunais nelas sediados;
No cumprimento de um dever básico de protecção dos executados economicamente desfavorecidos, estende-se aos vencimentos ou salários o regime que a reforma introduzira no n.º 3 do artigo 824.º quanto às pensões de aposentação ou de reforma, por manifesta paridade de razão;
Finalmente, para protecção do direito à habitação do executado, permite-se que o juiz, em prudente critério, defira para o acto da venda a desocupação da casa que foi objecto de penhora.
São estas, Srs. Deputados, as razões que nos trazem perante V.V. Ex.as, a solicitar a aprovação desta lei de autorização legislativa, que irá permitir-nos, como já disse, fazer intervenções várias, que julgamos positivas e vão beneficiar altamente a reforma do processo civil.
Não queremos terminar sem mais uma vez dizer que com esta reforma não estará pronta a reforma do processo civil que todos desejamos. Faltam, naturalmente, intervenções legislativas mais profundas, quer no capítulo do processo executivo, quer no dos recursos. É matéria que logo após a entrada em vigor da reforma do processo civil iremos afrontar, aprofundar, no sentido de pudermos levar por diante uma reforma global, que sirva aos cidadãos, fundamentalmente nas pretensões que manifestam junto do sistema judicial.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Presidente, Almeida Santos.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Justiça inscreveram-se os Srs. Deputados Helena Santo, Osvaldo Castro, Miguel Macedo e Odete Santos.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Santo.

A Sr.ª Helena Santo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, compreendo que através da presente proposta de lei o Governo se proponha rever algumas das alterações que o Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, veio introduzir no Código de Processo Civil, no sentido de fazer correcções, esclarecer alguns pontos duvidosos e completar o próprio decreto-lei.
Congratulamo-nos com algumas das propostas apresentadas, todavia, o projecto de decreto-lei que a acompanha, no seu preâmbulo, informa-nos que o Governo assumiu o papel de «advogado do Diabo», pois não revogou o Decreto-Lei n.º 329-A/95 apenas para não ser acusado nem apelidado de contra-reformista, sendo certo que não acompanha nem sufraga algumas das soluções nele consagradas.
É nosso entender que melhor seria que o tivesse feito, pois algumas correcções introduzidas, mesmo que se entenda que não desvirtuam completamente o regime instituído pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, denotam claramente essa discordância, constituindo uma tentativa de readaptação da reforma às soluções processuais ainda em vigor.
É o caso, por exemplo, do aditamento do n.º 2 do artigo 508.º-B, em que introduz no fundo um mecanismo, em nosso entender, destinado a recuperar de algum modo o papel tradicional do despacho saneador. Desde logo, Sr. Ministro, este n.º 2 levanta-nos sérias dúvidas, que gostaria de lhe colocar.
O facto de o n.º 2 do artigo 508.º-B vir relegar as reclamações para a audiência final nos casos em que o juiz pode dispensar a audiência preliminar obriga-me a questionar sobre que prova vai indiciar a parte quando é confrontada com uma reclamação provida no início de uma audiência final, que eventualmente admita um novo quesito ao questionário. O que é que acontece se a prova que tiver requerido não se adequar à prova do novo facto?
Por outro lado, é nossa convicção que a alteração prevista - e ainda bem - no artigo 1696.º do Código Civil, que consagra o desaparecimento da moratória em relação às dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges, põe um problema muito delicado em termos de aplicação das leis no tempo, que, em nosso entender, devia ser resolvido por via legislativa. Que tratamento vão ter os casos precedentes em que a moratória está a funcionar? Das alterações ora introduzidas ou que se propõe introduzir não se vislumbra, de facto, uma solução plausível para esta questão, estando certos, como estamos, de que isto vai originar na vida prática dos tribunais imensos problemas e imensos processos.
Finalmente, V. Ex.ª terminou dizendo que tem a consciência de que, de facto, muito há ainda para fazer e para reformar. Concordamos consigo, mas permita-me uma

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sugestão: porque não criar uma comissão de acompanhamento da entrada em vigor desta reforma, que se prepare convenientemente para levar por diante a reforma cabal do processo civil? É que, Sr. Ministro, ao analisar a reforma que agora se vai fazer, é minha convicção que um dos principais problemas com que, neste momento, se debatem os nossos tribunais - a celeridade processual -, não irá, infelizmente, ser resolvido. De facto, proliferam audiências preliminares e tentativas de conciliação, mas penso que não é enchendo as agendas dos advogados e dos magistrados que vamos resolver um problema tão preocupante como o da celeridade do processo nos nossos tribunais.
Fundamentalmente, eram estas as questões que lhe queria colocar.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro da Justiça responde pedido a pedido ou responde no fim a todos os pedidos de esclarecimento?

O Sr. Ministro da Justiça: - Respondo no fim, Sr. Presidente,

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo Castro.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, quero saudá-lo pela sua presença e pelo cumprimento das promessas que nos fez aqui há alguns meses, tendo em conta exactamente o pacote de iniciativas legislativas que estão nesta Casa para serem agora discutidas.
Nas audiências que fizemos na Subcomissão de Justiça, a propósito do Código de Processo Civil, foram discutidas duas questões relevantes que levantam alguns problemas. Uma delas é se, atenta a complexidade deste diploma, será ou não - e a nós pareceu-nos unanimemente que talvez isso deva suceder, sem prejuízo das nossas competências - de alargar a vacatio legis. Como sabe, a Lei n.º 9/96, de 29 de Fevereiro, prorrogou a data de entrada em vigor do Código de Processo Civil para 15 de Setembro, no entanto a generalidade dos operadores judiciais tem vindo a dar a indicação de que, atenta a republicação que vai cair, provavelmente, em Julho ou Agosto, tal será difícil. Gostava de ouvir a sua opinião sobre isto.
Por outro lado, uma das questões principais que tem sido posta, designadamente pelos magistrados, é a de que a audiência preliminar se vai reconduzir, no fundo, à velha audiência preparatória, que nada vai resolver, porque, nessa altura, os advogados - dizem os magistrados - não estarão preparados como estariam para a fase do julgamento e não há condições nem meios para que a audiência preliminar possa produzir os resultados que se propõe. Por isso, a questão que ponho é se vai ou não ser possível melhorar os meios humanos - e os magistrados, por exemplo, falam na velha questão das assessorias - e criar salas para tribunais, já que dizem que uma audiência preliminar tem se der feita numa sala com condições suficientes para o efeito.
A última questão que lhe quero colocar é esta, Sr. Ministro: o Código de Processo Civil que vai entrar em vigor tem implicações com muita legislação avulsa, mas implica necessariamente com a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais. É certo que, daqui a alguns minutos, iremos discutir uma alteração de natureza cirúrgica à Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais, que, aliás. me parece relevante, mas o problema que se põe é o seguinte: vai ou não haver uma revisão de fundo nesta matéria?

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, quero colocar aqui duas questões breves que me são suscitadas pela intervenção de V. Ex.ª sobre a proposta de lei que estamos hoje a discutir, que tem a ver com alterações ao Código de Processo Civil.
Em primeiro lugar, surpreende-me ouvir no discurso de V. Ex.ª que a reforma do processo civil teria sido publicada à pressa para se deixar obra, quando me recordo que V. Ex.ª, então Deputado nesta Casa, várias vezes reclamou - e fê-lo com a autoridade de jurista que tem - a reforma urgente e a entrada em vigor do Código de Processo Civil, sobretudo tendo em conta que - e V. Ex.ª conhece muitíssimo bem essa realidade - a resposta que os tribunais e o direito dão hoje aos cidadãos é, em grande medida, insatisfatória, também porque, no processo civil que ainda temos na País, há regras que são perfeitamente arcaicas e não correspondem às necessidades dos cidadãos, das empresas e da actividade económica, sendo, portanto, urgente a sua mudança.
Esta mudança não foi feita à pressa, porque uma coisa é dizer que houve pressa na publicação e outra que a reforma foi feita à pressa. Esta reforma começou há muitos anos e foi estudada por comissões, cuja composição se foi sucedendo no tempo, que nem sequer tinham a mesma filosofia de base em relação a ela, por isso houve algum trabalho importante a fazer neste domínio.
Portanto, a primeira nota que quero deixar aqui é de algum espanto, porque me parece que há alguma contradição entre o que V. Ex.ª disse hoje e aquilo que me recordo de lhe ter ouvido enquanto parlamentar nesta Casa, designadamente na legislatura anterior.-

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não é verdade!

O Orador: - A segunda questão que lhe quero colocar, Sr. Ministro, é a seguinte: quando o Governo trouxe aqui a proposta de autorização legislativa, um dos argumentos fundamentais que apresentou, entre outros, foi o de que não lhe parecia bem, e era até desaconselhado pelos vários intervenientes do mundo judiciário, que uma reforma desta profundidade e envergadura pudesse entrar em vigor a meio do ano judicial - estamos a falar, como estava previsto nessa altura, na entrada em vigor em 15 de Março de 1996 - e, portanto, o Governo entendia que, para além de alterações que veio agora a apresentar à Assembleia da República, era de todo aconselhável que essa reforma só entrasse em vigor no dia 15 de Setembro, proposta a que o Partido Social Democrata deu o seu assentimento, por julgar pertinente esse tipo de argumentação e de razões.
Ora, o que neste momento se passa é que hoje mesmo na Comissão se admitiu - e começa também a ser admitido aqui nesta Assembleia por vários Deputados do Partido Socialista - que esta reforma não entrasse em vigor já no dia 15 de Setembro, mas apenas em Janeiro de 1997. Pergunto-lhe, por isso, se agora não militam as mesmas razões que fundamentaram a posição do Governo, que

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apoiámos, de adiar de Março para Setembro de 1996 a entrada em vigor do Código de Processo Civil.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, quero colocar-lhe algumas questões muito breves.
Penso que todos estarão de acordo que é importante uma reforma do processo civil, creio, no entanto, que prioritária a essa reforma será a questão da reformulação da organização judiciária. É que, ao longo dos últimos anos, foram feitos vários remendos na orgânica judiciária de tal forma que ela hoje já não corresponde às necessidades de realização e de administração da justiça. Pergunto, por isso, a V. Ex.ª, uma vez que já se referiu a este assunto, se está ou não previsto o repensar da orgânica judiciária e a adopção de um modelo que sirva os interesses dos cidadãos portugueses na utilização da máquina judiciária.
Uma outra questão que quero colocar a V. Ex.ª, concretamente em relação a esta reforma, é esta: de facto, vê-se que a Comissão Revisora teve a preocupação de adoptar linhas modernas em relação ao processo civil. Isso está fora de dúvida, embora em relação a uma ou outra questão eu não esteja de acordo. Não estou de acordo, por exemplo, com alguma limitação no direito ao 2.º grau de jurisdição, ou seja, no direito de recurso. Verdadeiramente não estamos de acordo em relação a isso.
Por outro lado, depois de ter tido mais tempo para analisar aquilo que se propõe nesta reforma, devo dizer que há uma coisa que me deixou muito preocupada, que são os poderes discricionários do juiz. V. Ex.ª», num ou noutro caso, limitou-os, mas noutros aumentou-os. Ora, entendo que os poderes discricionários do juiz, tal como estão configurados, não são um meio de conduzir à justiça material. Vejo que se quis isso, mas dizer que o juiz pode convidar as partes a completar, pode inventar uma forma de processo para a adequar à questão concreta, pode muitas outras coisas, que, depois, na minha intervenção terei ocasião de referir, é extremamente perigoso para os magistrados judiciais e para a sua imagem e pode deixar dúvidas sobre se conduzirá a uma igualdade de partes. Pelo menos, as dúvidas subsistem.
Devo dizer que em processo de trabalho, onde isto já é possível, tem-se sentido, na prática, que os magistrados, pela posição em que se encontram, não gostam, sequer, de recorrer a esses poderes.
Portanto, pergunto a V. Ex.ª se esta questão dos poderes discricionários tem ou não de ser revista, a fim de permitir uma justiça material de outra maneira, onde o poder fosse um dever e não apenas um poder.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peço-lhe que termine.

A Oradora: - Vou terminar, Sr. Presidente.
A minha última questão tem a ver com a entrada em vigor das alterações ao Código de Processo Civil, uma vez que, a meu ver, os funcionários judiciais, que trabalham com muito esforço, mas não tiveram a preparação jurídica dos magistrados e dos advogados, vão ter algumas dificuldades para pôr isto em prática tão depressa quanto parece que algumas pessoas querem. Assim, pergunto se essa rápida entrada em vigor não irá provocar, pela adaptação que as pessoas têm de ter, novos congestionamentos.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente; se me dá licença, suponho que a maioria dos Srs. Deputados presentes terá interesses que extravasam a audição das explicações que o Ministro da Justiça tem a dar aos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-lhes que façam silêncio para ouvirmos o Sr. Ministro da Justiça.
Faça favor de continuar, Sr. Ministro.

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Santo, agradeço as suas perguntas.
Eu disse, e repito, que não há qualquer Código de Processo Civil que possa ser publicado com o consenso de todos os operadores judiciários. Mas há outra coisa que também lhe quero dizer: este Código de Processo Civil, como qualquer outro, vai exigir das partes, dos seus advogados, dos magistrados judiciais e dos magistrados do Ministério Público um posicionamento perante o processo completamente novo, o que, naturalmente, levará algum tempo e exigirá, sobretudo da parte dos advogados e dos magistrados, um esforço de adaptação importante. Muito daquilo que é hoje o truque processual vai desaparecer. E felizmente que vai desaparecer, Sr.ª Deputada!
Há tempos, um advogado meu amigo, que exerce há tantos anos como eu, infelizmente, dizia-me: «Já não vou saber advogar, porque aquilo para que fui preparado, que é para o truque processual, não vai ter lugar neste Código». Digo-lhe, Sr.ª Deputada, que é bom que assim seja, porque os advogados, sendo, como são, peças fundamentais no funcionamento do tribunal, têm de se habituar à ideia de que daqui para afrente, com este Código, a verdade material vai ser o padrão fundamental da sua actuação e da dos outros intervenientes processuais e não 0 truque processual.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, mau grado os esforços de V. Ex.ª, insisto que as condições de audição não são as melhores. Suponho que a maioria dos Srs. Deputados estará interessada noutra temática que não a de ouvir as explicações do Ministro da Justiça.

O Sr. Presidente: - Renovo as minhas solicitações aos Srs. Deputados para fazerem o silêncio necessário, por forma a que o Sr. Ministro da Justiça se faça ouvir.

O Orador: - Tanto mais que entendo, Sr. Presidente, que, em matéria da Justiça, esta não é a mais viva e palpitante. Realmente, o processo civil é, pelo contrário, uma matéria um pouco seca.
Sr.ª Deputada, com respeito à moratória, ainda bem que a refere, é uma parte positiva do Código. Fizemos um esforço, como terá visto, nesta última reforma, para fazer entrar imediatamente em vigor aquilo que fosse possível de forma a aproveitar o que de positivo tem a reforma. O mesmo não se passa, naturalmente, em relação à moratória, como compreende, porque, em meu entender, não é para entrar em vigor imediatamente, nem pode ser.
Sr.ª Deputada, em relação à Comissão de Acompanhamento, agradeço a sua sugestão, mas a decisão já está tomada. Há uma comissão, que, aliás, é constituída pela

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Comissão que elaborou a reforma do Código e por mais duas pessoas, que vai acompanhar a par e passo a execução do Código. Mas vai mesmo, Sr.ª Deputada, pode ter a certeza disso! E esta resposta dirige-se também à Sr.ª Deputada Odete Santos.
Sr.ª Deputada, eu sei - e assumo - que há efectivamente neste Código um conjunto de poderes importantes para os magistrados judiciais. O que eu já disse para os advogados é válido para os magistrados judiciais: têm de ter uma nova postura, sendo certo que muitos desses poderes são poderes/deveres e não simples poderes. Quem ler bem verificará que são poderes/deveres. O que posso prometer-lhe, Sr.ª Deputada, é que faremos um acompanhamento a par e passo desta reforma, para que não suceda aquilo que sucede ou tem sucedido neste país com muitas outras reformas, cujos defeitos visíveis e conhecidos de toda a gente se arrastam no tempo, por seis, sete, oito anos - e dou-lhe o exemplo do processo penal, que, em meu entender, é um bom exemplo, onde há mais tempo podíamos ter visto os defeitos e ter actuado mais rapidamente.
Com respeito à celeridade do processo, questão que me foi colocada pela Sr.ª Deputada Helena Santo, não é o Código de Processo Civil que vai resolver, por si, a celeridade do processo, mas, a meu ver, irá ser uma boa ajuda. Se vir, há um conjunto de disposições no Código de Processo Civil sobre um conjunto de matérias que farão com que tenhamos celeridade, desde logo, só para lhe dar um simples exemplo, a ausência do despacho liminar, mas há muitas outras. No entanto, eu preferia guardar essa matéria, bem como a pergunta feita pela Sr.ª Deputada Odete Santos sobre a orgânica judiciária, para a discussão do diploma que se irá seguir, porque aí terei ocasião de dizer alguma coisa mais sobre o que está previsto em matéria de orgânica judiciária.
Sr. Deputado Osvaldo Castro, agradeço as suas perguntas, mas tal como acabei de dizer, no que diz respeito à Lei Orgânica, teremos ocasião de discutir isso mais profundamente a seguir..
No que diz respeito à vacatio legis, e com isso envolvo também o Sr. Deputado Miguel Macedo, se ele prestar a atenção devida, porque estou a responder a uma pergunta que me fez, devo dizer que o Ministério da Justiça não coloca qualquer problema em ser alterada a vacatio legis, muito pelo contrário.

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Ministro. Tem de fazer o favor de condensar o seu pensamento.

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Muito pelo contrário, entendemos que deve haver um período tão longo quanto possível de preparação de todos os intervenientes no processo. Se V.V. Ex.as entenderem que assim é, nós, pela nossa parte, não levantamos qualquer problema.
O Sr. Deputado Miguel Macedo talvez esteja um pouco equivocado. O que se passava na anterior reforma é que entre a sua publicação e a sua entrada em vigor - e era uma reforma bastante mais ampla do que esta - decorria um simples mês e meio, e ainda por cima apontava para uma data que não era nada. Não era nada! Tanto podia ser 1 de Março, como 31 de Março. Ora bem, se a entrada em vigor for numa altura de férias judiciais ou a seguir a elas - e para mim tanto me faz quando seja penso que devemos fazer o possível para que esta reforma seja feita com o máximo de ponderação dando possibilidade a todos de a poderem estudar e assimilar. Por mim, não porei qualquer problema.

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Ministro.

O Orador: - O Sr. Presidente está a dar-me ordem para terminar, e como ainda tenho outro diploma, terei ocasião...

O Sr. Presidente: - É um pedido, Sr. Ministro.

O Orador: - Um pedido de V. Ex.ª é uma ordem para mim.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado.
Srs. Deputados, vamos passar à votação, já anunciada, na especialidade e final global, do projecto de lei n.º 151/VII - Alteração à Lei n.º 11/90, de 5 de Abril (Lei-Quadro das Privatizações). (PS), pelo que, a partir de agora, considero as portas encerradas para efeitos de entrada na Sala.
Não tendo sido apresentadas propostas de alteração durante a fase de debate, há apenas a proposta originária, de aditamento de um n.º 5 ao artigo 13.º da Lei n.º 11/90, de 5 de Abril, com a - redacção conhecida e distribuída por todos os grupos parlamentares.
Vamos, pois, proceder à votação na especialidade.

Submetido à votação, registaram-se votos contra do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos a favor do PS.

Srs. Deputados, visto a Mesa não ter a certeza quanto ao resultado da votação, vai proceder-se à contagem dos votos fila por fila.

Submetido à votação, foi rejeitado, com 107 votos contra do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e 103 votos a favor do PS.

Srs. Deputados, não tendo sido aprovado na especialidade, não haverá lugar à votação final global.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para informar a Mesa de que apresentarei uma declaração de voto por escrito no sentido de que votei por disciplina partidária.

O Sr. Presidente: - Muito bem!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, para fazer uma declaração de voto em nome da bancada do PS.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

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O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Acabámos de assistir a um acto relativamente grave nesta Assembleia.
Enquanto alguns partidos e grupos parlamentares...

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço que deixem ouvir o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira. Tem esse direito.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Enquanto alguns partidos e grupos parlamentares procederam em coerência com o que será a sua posição ... .

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, peço desculpa, mas confundi a votação na especialidade com a votação final global. Ou seja, só em caso de votação final global é que há lugar a declaração de voto oral. Fica, pois, registada a sua intenção de fazer uma declaração de voto por escrito, que será, naturalmente, publicada em Diário.
Peço desculpa, Sr. Deputado.

O Orador: - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Para quê, Sr. Deputado? Não pode fazer uma declaração de voto oral.

O Orador: - Sr. Presidente, queria fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Não pode interpelar no fim de uma votação. Peço-lhe desculpa.

O Sr. António Braga (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. António Braga (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de informar a Mesa de que a bancada do Grupo Parlamentar do PS apresentará uma declaração de voto por escrito. Esta era, portanto, a interpelação que o meu camarada de bancada há pouco queria fazer.

O Sr. Presidente: - Mas eu já tinha interpretado a intervenção do seu camarada nesse sentido, Sr. Deputado. Eu próprio dei essa interpretação, mas a seguir a uma declaração de voto oral não me pareceu que houvesse lugar a uma interpelação com o mesmo conteúdo, Sr. Deputado. Só isso.
Srs. Deputados, vamos prosseguir os nossos trabalhos com a continuação do debate da proposta de lei n.º 3/VII.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. José Magalhães (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para, ao abrigo das disposições regimentais - peço-lhe desculpa, Sr. Deputado Guilherme Silva, mas houve um hiato -, por necessidades de tomada de uma posição pública do Grupo Parlamentar do PS sobre a votação que acabámos de fazer, pedir a V. Ex.ª a interrupção dos trabalhos pelo período regimental, ou seja por meia hora.
É um pedido que, obviamente, tem de ser deferido, porque, se o não for, não haverá interrupção...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não posso deferir sem consultar o Plenário.
Pergunto aos diversos grupos parlamentares se há oposição à interrupção.

Protestos do PSD.

Parece-me que há, Sr. Deputado José Magalhães, pelo que não vale a pena procedermos à votação. Há grupos parlamentares que se opõem à interrupção.
Tem a palavra, Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quem na anterior legislatura ouviu aqui tantas vezes, como activo parlamentar da oposição, o actual Ministro da Justiça zurzir nos responsáveis pela mesma pasta nos Governos do PSD, acusando-os de excessiva morosidade na implementação das reformas e na revisão dos códigos...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, peço desculpa por o interromper, mas o PS acaba de me informar que requer a votação do requerimento de suspensão dos trabalhos, o que temos de fazer de imediato.
Peço, por isso, aos Srs. Deputados que não saiam nem entrem na Sala a partir de agora.

O Orador: - Sendo assim, Sr. Presidente, vou para a minha bancada.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado, e mais uma vez peço-lhe desculpa.
Srs. Deputados, considero encerrada a porta para efeitos de votação. Já declarei que vamos votar, pelo que não pode haver fila à porta, como é evidente. Façam favor de encerrar as portas. Quem entrar a partir de agora não poderá votar.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Coelho, já anunciei a votação.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Mas é para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:- Faça favor.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Uma interpelação legítima, como V. Ex.ª verificará.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

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O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, queria registar, perante a Câmara, a cortesia do meu companheiro de bancada, Sr. Deputado Guilherme Silva, que aceitou o convite de V. Ex.ª para interromper a intervenção a fim de se proceder à votação anunciada por V. Ex.ª. Gostaríamos, no entanto, nesta bancada, que esse facto não constituísse precedente e que a regra que V. Ex.ª, tão bem e
tantas vezes anunciou, de que as intervenções não são interrompidas para este efeito, pudesse vigorar, de futuro, nesta Assembleia.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não tenho a memória do Sr. Deputado mas a minha chega para não ter a menor ideia de alguma vez ter defendido tal coisa. Pelo contrário, penso que os requerimentos são de votação imediata, e quando solicitei ao Sr. Deputado Guilherme Silva que interrompesse a intervenção, não foi de facto uma cortesia mas o Presidente pode interromper, quando entender, quem está no uso da palavra, se houver uma razão regimental para o efeito, como de facto há.
Não é a primeira vez que o faço, já o fiz inclusivamente em relação a um Sr. Secretário de Estado, tenho-o feito várias vezes sempre que há uma razão regimental, e penso que esse é o caso da votação imediata de um requerimento. Peço, pois, aos Srs. Deputados que compreendam a necessidade desta interrupção.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, não quero eternizar esta questão e proporia que a dirimíssemos em sede da Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, Contudo, apresentado um requerimento, aquilo que me parece que faz todo o sentido é a sua votação de imediato sem prejuízo das intervenções que estiverem a ocorrer.

O Sr. Presidente: - Não vejo isso em parte nenhuma do Regimento mas discutiremos esse assunto na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, o que não me parece que exista em parte nenhuma é a ideia de que a apresentação de um requerimento faz interromper
uma intervenção. Isso é que me pareceria totalmente bizarro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, «imediatamente» só pode ter um significado gramatical, o de imediatamente mesmo e não depois de qualquer outra coisa, mas discutiremos isso na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, os requerimentos, de acordo com o Regimento, são votados sem discussão após a sua apresentação. Lógica e naturalmente, nunca podem ser votados interrompendo uma intervenção de quem quer que seja e, nessa altura, não há lugar a votação.

Aplausos do PCP, do PSD, do CDS-PP e de Os Verdes.

Segunda questão, ainda no âmbito da interpelação à Mesa: o Sr. Presidente mandou encerrar as portas para efeitos de votação, mas gostaria de chamar a atenção para o facto de que, como o período de votações tinha terminado, tanto mais que um Sr. Deputado começou a fazer a sua intervenção, têm de ser accionados os meios normais de chamamento dos Deputados ao Plenário e só depois podem encerrar-se as portas.

Aplausos do PCP, do PSD, do CDS-PP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, discutiremos isso na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares. A minha opinião não coincide com a sua...

Protestos do PSD.

Srs. Deputados, peço que façam silêncio pelo menos quando o Presidente está a usar da palavra.
Como estava a dizer, a minha interpretação não é essa porque nunca vi ser accionado o sinal sonoro para votação de requerimentos nesta Sala. Seria a primeira vez. Também podemos consagrar essa prática, mas não há memória disso ter sucedido.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, é apenas para sublinhar que porventura teria efeito útil accionar o sinal sonoro se algum grupo parlamentar - não será o caso do meu, que apresentou um requerimento para a interrupção dos trabalhos - requeresse novamente a votação nominal. O que nos interessa neste momento e para este efeito é conhecer o ponto de vista dos outros grupos parlamentares sobre o pedido que fizemos de interrupção dos trabalhos e, em caso da sua não aprovação, não requereremos a votação nominal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do requerimento propondo a interrupção dos trabalhos, apresentado pelo PS.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos a favor do PS.

Vamos prosseguir a discussão da proposta de lei, tal como estava previsto.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva, a quem peço mais uma vez desculpa por tê-lo interrompido.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quem na anterior legislatura ouviu aqui tantas vezes, como activo parlamentar da oposição, o actual Ministro da Justiça zurzir nos responsáveis pela mesma pasta dos governos do PSD, acusando-os de excessiva morosidade na implementação das reformas e na revisão dos códigos, não pode deixar de ficar atónito e surpreendido com o que se vem passando agora, por iniciativa deste Governo, em matéria de legislação processual civil.
O anterior governo concluiu a reforma do Código de Processo Civil, tendo a Assembleia aprovado a Lei n.º 33/95, de 18 de Agosto, que o autorizou a rever aquele Código.

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Por sua vez, pelo Decreto Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, o governo, no uso da referida autorização legislativa, aprovou as alterações que operaram uiva profunda revisão do Código de Processo Civil, introduzindo uma nova filosofia e novos princípios, como os da prevalência da substância sobre a forma, da simplificação, da cooperação e da maior celeridade. Unia primeira reforma do processo civil, de há muito ansiada, estava assim feita.
Apesar disso, o então Deputado José Vera Jardim bradava pelo excessivo atraso na sua implementação e pela timidez das alterações.
Que fez agora, como Ministro, o apressado Deputado José Vera Jardim?
O que antes devia ser mais célere é agora objecto de medidas tipicamente socialistas. Qual «Foz Côa» ou quais «propinas», o Código de Processo Civil também foi suspenso, ou seja, adiada a sua entrada em vigor e consequente aplicação.
O Deputado José Vera Jardim correu depressa demais como parlamentar e chegou já cansado a Ministro! Por isso, estamos hoje aqui a debater um esboço de contra-reforma ou de correcção e adenda à reforma do processo civil.
Não está em causa a bondade de algumas das alterações (quase todas de ordem meramente formal), que se pretendem agora introduzir na lei de revisão do processo civil, cuja entrada em vigor o Governo adiou através de proposta de lei apresentada nesta Assembleia.
O que está em causa é um estilo de governação, a contradição do Partido Socialista entre reclamar pressa quando está na oposição e lentidão no fazer e no decidir quando está no poder. O que está em causa, relativamente a rima reforma que visa também combater os adiamentos e os atrasos, é a sua transformação num adiamento.
Sr. Ministro da Justiça, oito meses para «rever a revisão» do Código de Processo Civil não é um bom augúrio para o passo das reformas da justiça em Portugal que V. Ex.ª tanto acusava de ser lento ao tempo do Ministro Laborinho Lúcio.
Ao intervir neste debate, e por ser elementar dar o seu a seu dono, é inevitável enaltecer os méritos da revisão do processo civil, que não é sua, Sr. Ministro, e que continuará a dever-se ao esforço e ao empenho do governo anterior.
As reformas dos grandes códigos, pese embora a celeridade com que hoje ocorrem as mutações sociais associadas e muitas vezes decorrentes de profundos avanços e transformações tecnológicas, só devem ser levadas a cabo de muitos em muitos anos.
Se a inflação legislativa é, quase sempre, perniciosa por ser geradora de instabilidade e incerteza, no que toca aos diplomas fundamentais do nosso ordenamento jurídico, ela deve ser a todo o custo evitada. Confesso que, a tal respeito, sou dos que preferem á acusação de omissão do que a censura do excesso. Porém, no que se refere ao Código de Processo Civil, de há muito que todos sentíamos ser chegada a hora de fazer-se uma profunda revisão.
Seria, contudo, de uma enorme ingratidão não reconhecer, com toda a clareza, quanto a justiça em Portugal deve ao insigne mestre Professor José Alberto dos Reis por uma obra ímpar como o Código de Processo Civil ainda hoje vigente. Mas as coisas são como são e não é possível, com as exigências, designadamente de celeridade processual que é legítimo aos cidadãos verem asseguradas pelos tribunais, manter, ainda que comas alterações que ao longo dos anos lhe foram sendo introduzidas, por mais tempo o actual Código de Processo Civil.
Proceder à simplificação do processo e da sua tramitação e à desburocratização dos procedimentos, actualizando e introduzindo uma nova filosofia no velho Código do Professor Alberto dos Reis é ainda uma forma de prestar-lhe justa e merecida homenagem, dando uma nova alma a um corpo que, apesar disso, continuará a ser o que ele criou.
Sou dos que defendem a reforma gradativa da lei processual e, por isso, aplaudia opção pela revisão em prejuízo, no imediato, da ideia da elaboração de um novo código, que não deve, no entanto, ser abandonada e que o Sr. Ministro da Justiça, por certo, não perderá de vista.
As reformas graduais permitem a conciliação das soluções experimentadas do passado que se revelem ainda adequadas com soluções novas e de cuja prática e execução havemos de tirar os ensinamentos úteis para a oportuna elaboração de um novo código. Mas é bom ter presente que, enquanto profunda alteração da sua filosofia, a revisão - aprovada na última legislatura - conduz praticamente a um novo código.
Um Código de Processo Civil, sendo um instrumento adjectivo essencial para a garantia e efectivação dos direitos em concreto, é também uma das leis sem a qual não é possível proporcionar aos cidadãos o adequado acesso ao direito, aos tribunais e à justiça com a eficiência, isenção e prontidão que a Constituição pretende assegurar.
Importa, pois, verificar em que medida os princípios que se introduziram e as novas soluções que se consagraram contribuem para melhor se atingirem tais objectivos. A acentuação do princípio da igualdade e do princípio do contraditório, a atenuação do princípio da preclusão, a sanabilidade da falta de pressupostos processuais, o afastamento dos impedimentos fiscais, de preparos e de custas como condição de acesso aos tribunais, a facultativa simplificação da tramitação processual, a atendibilidade de factos relevantes decorrentes da discussão, ainda que não alegados, a flexibilização da citação, a possibilidade de se ultrapassarem mais facilmente questões de litisconsórcio, de coligação e de formas de cumulação, o alargamento dos títulos executivas e uma maior colaboração do tribunal na identificação e localização de bens penhoráveis, a eliminação da venda em hasta pública, a garantia geral da prevalência do fundo sobre a forma associada a um maior poder de intervenção do juiz e a introdução do princípio da cooperação envolvendo uma participação mais activa das partes, e a introdução da audição preliminar com uma amplitude de intervenção do juiz e das partes, que poderá simplificar em muito a posterior tramitação processual ou até mesmo permitir pôr termo ao processo, são avanços e inovações da maior relevância que as alterações agora propostas não põem em causa.
Todo este conjunto de princípios e de alterações, entre outros, vão no sentido de que a revisão do Código de Processo Civil, agora sujeito a correcções, garantirá, sem prejuízo da certeza e da segurança do direito e do respeito pelas partes e pela sua vontade, maior celeridade e maior prontidão na decisão e composição dos litígios.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, se há sectores em que não basta legislar, mesmo consagrando as soluções dominantemente tidas por mais acertadas para que se operem melhorias significativas no funcionamento da administração ou dos serviços, a justiça é um deles: É preciso legislar, criar melhores condições de trabalho, instalações e apetrechamento, mas

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é necessário também a boa vontade e o empenho de todos os operadores judiciários. Desde os funcionários judiciais aos advogados, passando pelos magistrados, todos têm uma quota-parte importante no êxito ou no cumprimento das reformas.
Ao revermos agora a revisão do Código de Processo Civil compete lembrar que a justiça é algo que, por força do princípio da separação de poderes, passa por uma particular compreensão da intervenção do Executivo nestas matérias, a qual deve ter a ver, acima de tudo, com um adequado proporcionar de meios aos tribunais.
Não se afigura, pois, possível falar de reforma de processo civil sem ter uma palavra de registo e de lembrança do papel que cabe na sua implementação aos vários agentes judiciários.
Na verdade, a obra da justiça é sobretudo protagonizada pelos agentes intervenientes na sua efectivação, com justificado realce para os juízes, para os advogados, para os magistrados do Ministério Público e para os funcionários judiciais.
É aos juízes que cabe a «suprema autoridade na aplicação do direito», que, ao contrário do que erradamente se possa pensar, não é uma tarefa mecânica de mera aplicação da lei aos factos. Como muito bem salientou Castanheira Neves, o direito que histórico-socialmente se realiza é bem mais vasto e rico do que aquele que apenas a legalidade define no seu sistema formalmente positivo.
E esta tarefa árdua e espinhosa só pode ser elevadamente cumprida com independência e razoáveis condições materiais e logísticas. Aos advogados cabe também uma função insubstituível e a forma como sentem a sua posição no processo e na relação forense reflecte-se num sentir social de uma profissão que sempre defendeu as liberdades e os direitos fundamentais que a Ordem tem prestigiadamente representado.
Do Ministério Público diz, lucidamente, Calamandrei: «Entre todos os cargos judiciários o mais difícil segundo me parece é o do Ministério Público. Este, como sustentáculo da acusação, devia ser tão parcial como um advogado; como guarda inflexível da lei, devia ser tão imparcial como um juiz. Advogado sem paixão, juiz sem imparcialidade, tal é o absurdo psicológico no qual o Ministério Público, se não adquirir o sentido do equilíbrio, se arrisca, momento a momento, a perder, por amor da sinceridade, a generosa combatividade do defensor ou, da polémica, a objectividade sem paixão do magistrado».
Mas não tenhamos ilusões de que a justiça a que todos têm direito não será pronta e eficaz sem a prestimosa cooperação dos funcionários judiciais. Permitam-me que, humildemente, mas com inesquecível gratidão, recorde aqui os ensinamentos práticos que recolhi junto de experientes e dedicados funcionários judiciais quando iniciei a minha actividade profissional, então como delegado do Ministério Público, sobre importantes aspectos da prática processual que a universidade não ensina.
Entre outras tarefas, tais como a de apetrechamento do parque judiciário e a formação de magistrados e funcionários, cabe também ao Ministério da Justiça a responsabilidade na preparação de leis que melhorem o funcionamento dos tribunais, aproximando-os do cidadão e garantindo-lhe um mais fácil acesso ao direito. Trata-se de uma tarefa de Estado da maior responsabilidade, eivada de particulares dificuldades e a realizar em diálogo com os vários agentes profissionais envolvidos.
Sr. Ministro da Justiça, não posso esconder-lhe a nossa preocupação pelo patente mal-estar que anunciadas reformas vêm gerando nas relações da Polícia Judiciária com o Ministério Público e deste com os magistrados judiciais. órgãos do Estado que têm por missão compor e dirimir conflitos não podem, sob pena de perda de credibilidade, entrar em conflitos entre si.
O Partido Socialista, quando na oposição, disse que sim a todas as reivindicações corporativas dos vários sectores da justiça. Tem de se reconhecer que V. Ex.ª tem dado mostras de alguma habilidade mas receio bem que não seja capaz, como homem e mortal que é, de satisfazer simultaneamente reivindicações de sinal contrário e, consequentemente, contraditórias entre si. Por isso o nosso justificado receio de que, em lugar de decisão atempada e eficaz, se assista mais uma vez ao característico flutuamento socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente : - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, fiquei realmente espantado - e o termo é mesmo «espantado» - com a intervenção de V. Ex.ª, árida na exposição de argumentos e de princípios de tal maneira genéricos e comuns que ninguém pode contestá-lo - e V. Ex.ª reconhecê-lo-á. Fiquei ainda espantado quando V. Ex.ª, para não dizer ao Sr. Ministro da Justiça que tem sido competente na forma como tem. resolvido e encarado os problemas que surgem ao nível da justiça, resolve dizer que o Sr. Ministro é habilidoso em vez de reconhecer que é competente. É esta a nova fórmula que o PSD vem ensinar-nos para reconhecer o que é óbvio.
É que o Sr. Ministro da Justiça tem sido eficaz no tratamento destas questões e V. Ex.ª sabe-o perfeitamente...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Ele é que tem de dizer isso!

O Orador: - E como V. Ex.ª não quer reconhecê-lo, porque não pode ou não o deixam, vem aqui dizer que o Sr. Ministro tem sido habilidoso.

Aplausos do PS.

Por outro lado, Sr. Deputado, devo dizer-lhe que vir acusar o Governo de lentidão é uma atitude de V.V. Ex.as que começa a perturbar-nos. É que, umas vezes, os senhores criticam-nos, dizendo que queremos tudo, que queremos governar depressa, que não estamos a ter em atenção os interesses que os senhores entendem que devemos ter e, por outro lado, quando, em tempo útil, nós apresentamos os projectos de lei e as medidas que nos comprometemos a apresentar, V.V. Ex.as vêm acusar-nos precisamente do contrário.
Sr. Deputado Guilherme Silva, responda-me sinceramente. De entre as alterações que aqui são propostas pelo Governo à reforma do Código de Processo Civil, aponte-me uma única com que não concorde. Faço-lhe esta pergunta porque, como o Sr. Deputado acabou por afirmar na sua intervenção, todas as alterações propostas são efectivamente pertinentes. Por que razão é que estas coisas hão-de ser feitas da forma rápida que os senhores pretendem? Então estas coisas não são para ser feitas com reflexão?

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Também votaram a Lei n.º 6/96!

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O Orador: - Não era perfeitamente óbvio que, a propósito desta autorização legislativa, tinham de ser ouvidas as entidades competentes como a Ordem dos Advogados, o Ministério Público, o Sindicato dos Magistrados Judiciais e outras? V. Ex.ª considera que foi um desperdício de tempo?
V. Ex.ª considera uma lentidão o facto de o Governo e o Grupo Parlamentar do Partido Socialista estarem sensíveis às diversas entidades que reclamam e defendem uma vacatio legis suficientemente determinada no tempo por forma a que um diploma tão importante possa ser devidamente assimilado e estudado? Considera que o Partido Socialista está a ser lento? É por isto que os senhores vêm condenar-nos agora?

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, receio bem que V. Ex.ª tenha sido «mais papista do que o Papa».
Penso que o Sr. Ministro, que, aliás, é um distinto advogado, não precisava de advogado de defesa nesta questão e que não se sentiu minimamente atacado na sua competência pela minha intervenção. Mas V. Ex.ª entendeu assumir a «defesa oficiosa» e quero dizer-lhe que não foi brilhante nessa defesa.
V. Ex.ª veio levantar algumas questões que têm a ver com as alterações que se pretende introduzir, mas não é isso que está em causa. Na verdade, o que está em causa é o pretexto para mais um atraso, mais um protelamento, mais um adiamento na entrada em vigor do Código de Processo Civil.
V. Ex.ª sabe muito bem que 90% destas alterações têm a ver com a redacção e, como tal, são discutíveis. Por exemplo, lendo o artigo 511.º, considero que ó texto tem um carácter muito mais obscuro e muito menos correcto do que tinha na anterior redacção, mas há muitos outros exemplos. Significa isto que uma coisa ou outra que eventualmente houvesse conveniência em corrigir poderia perfeitamente vir a sê-]o através de um diploma intercalar, sem necessidade de ser suspensa a entrada em vigor deste Código.
Para além disto, ainda quero falar-lhe dessas razões que V. Ex.ª, com um sentido superior de senso, vem trazer à liça no sentido de que uma vacatio legis mais alargada, uma reflexão mais aprofundada, resultam a bem da comunidade jurídica e dos cidadãos. O problema, Sr. Deputado, é que quando o Partido Socialista era oposição e o governo invocava essas mesmas razões, os senhores consideravam tudo errado e argumentavam que tinha de ir-se mais depressa e que o Ministério. da Justiça não dava resposta atempada. Ora, foi exactamente para essa atitude de dois pesos e duas medidas que chamei a atenção na minha intervenção, atitude que V. Ex.ª acabou de confirmar pelas suas palavras. É que, agora, todas essas razões são consideradas perfeitamente pertinentes mas não eram anteriormente, quando V.V. Ex.as estavam na oposição. Nessa altura, consideravam que se tratava de protelamentos injustificados e perfeitamente inadmissíveis. Assim, pergunto: não é muito mais inadmissível esta «revisão» da revisão que poderia ser feita, através de um diploma intercalar?
V.V. Ex.as quiseram a vacatio legis porque consideravam inadmissível que o novo Código de Processo Civil entrasse em vigor a meio de um ano judicial e, agora, preparam-se para que essa entrada em vigor se processe precisamente a meio de um ano judicial!
Efectivamente, como ontem dizia, com algum amargor, o Deputado Pacheco Pereira ao Deputado José Magalhães, no programa de televisão Flashback, o grande problema de V.V. Ex.as não é a herança do PCP, é a herança do vosso passado como oposição.

Protestos do PS.

Esse é que é o vosso grande problema.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Releia as declarações do então Deputado José Vera Jardim! E releia também as suas!

O Orador: - Posto isto, quero dizer-lhe que fiz um elogio à habilidade do Sr. Ministro da Justiça porque penso que a habilidade é uma vertente da competência. S6 que, infelizmente, o Sr. Ministro não se libertou dos vícios socialistas, designadamente deste dos protelamentos e dos adiamentos, mas essa é outra questão. É pena!
O Sr. Ministro já teve a vantagem de não ter sido vítima da «falta de comunicação interna» do Governo e reconheço-lhe a habilidade de ter gerido muito bem a questão da amnistia, com a qual penso que não esteve de acordo, que lhe «caiu em cima» sem ter sido tido nem achado. Portanto, presto homenagem à habilidade do Sr. Ministro mas antevejo que vai ser difícil levá-la muito longe com o rol de promessas contraditórias que o Partido Socialista fez em matéria de justiça.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo Castro, para uma intervenção.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Deputados: Permita-me, Sr. Presidente, que, antes de iniciar a minha intervenção, e visto que fui relator do relatório e parecer da 1.ª Comissão sobre esta matéria, leia a parte final do referido documento, que, aliás, teve também a douta contribuição do Sr. Deputado Guilherme Silva, relatório e parecer este que foi aprovado por maioria, embora o PSD se tenha abstido.
Diz, então, a parte final deste relatório: «Por último, resultou das auscultações e audiências efectuadas um generalizado sentimento de que o Decreto-Lei n.º 329-A/95 deveria ver alargado, para além do prazo fixado pela Lei n.º 6/96, de 29 de Fevereiro, (...)» - lei esta que o PSD votou - «(... ) o período de vacatío legis, questão que deverá ser examinada na especialidade».
Esta é que é verdade. Quanto ao demais, Sr. Deputado, é tripudiar sobre a verdade, é pisotear o que fizemos na Comissão.

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem lembrado!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - E qual foi a posição do PSD sobre o relatório?

O Orador:- Já disse, Sr. Deputado. O PSD absteve-se. Mas não foi por causa disto, foi porque não tinham lido!

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Posto isto, Sr. Presidente, passo à intervenção propriamente dita.
Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Deputados: A presente autorização legislativa, sem deixar margem a qualquer dúvida, visa, no essencial, introduzir benfeitorias ao nível da redacção e proceder à uniformização e condensação de diversos preceitos legais que, a não serem aperfeiçoados, corriam o sério risco de gerar dúvidas interpretativas no âmbito do Decreto-Lei n.º 329-A/95.
Beneficiando do alargamento de prazo para a entrada em vigor daquele diploma, o Governo, e bem, aproveitou o tempo para continuar a trabalhar com a Comissão Revisora e daí resultou um apuramento formal e a introdução de claras melhorias substanciais e formais no aludido diploma.
Como é evidente, e é o próprio Governo que o assume no anexo da proposta de lei hoje em debate, do que se trata, não é «de uma segunda reforma de processo civil e muito menos de uma contra-reforma». E tudo sem embargo de o próprio Governo reconhecer que não acompanha nem sufraga alguma das soluções decorrentes do novo Código de Processo Civil. Só que, revelando um elevado sentido de Estado e sabedor da urgência de intervir na área do direito adjectivo civil, bem andou o Governo em optar pela manutenção do Código já publicado,, ainda que sem prejuízo das correcções solicitadas pela presente autorização legislativa. É que a pura revogação do actual diploma, em nome de uma eventual reformulação e aperfeiçoamento das suas bases conceituais e sistemáticas, poderia em nome de «um utópico perfeccionismo», nas palavras do Governo, agravar ainda mais os anseios renovadores dos operadores judiciários e da comunidade jurídica.
É bem certo, e tal decorre de inúmeras opiniões de relevantes sectores da comunidade jurídica, que o presente Código não é, seguramente, o instrumento devidamente adequado para corresponder às novas realidades sociais e jurídicas dos alvores do século XXI.
Só que, em certas circunstâncias, mais vale um conjunto inovatório gradualista que a ruptura sistemática e estrutural. Por isso, e sem perder de vista a indispensável continuação do aprofundamento conceitual e do aperfeiçoamento do direito processual civil em todas as suas vertentes, parece-nos positivo que, com o acréscimo valorativo da presente autorização legislativa, se parta com o novo Código de Processo Civil para a prova de fogo da vida judiciária e para a sua experimentação e manuseamento instrumental pelos operadores judiciários.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas seria para estultícia não estar atento ou fazer ouvidos duros às críticas que já hoje lhe são, feitas por sectores importantes da comunidade jurídica, marcadamente por magistrados.
E se, para muitos dos operadores judiciários, provera uma fatia maioritária, os mecanismos processuais previstos para as fases do despacho liminar e de audiência preliminar são a verdadeira matriz e corolário da reforma introduzida, para outros, tais inovações são exactamente o «calcanhar de Aquiles» das novas medidas adjectivas em matéria civil.
E se, para muitos, os juízes adquirem incomensuráveis poderes substanciais, embora vendo reduzidos os seus poderes de natureza formal, para outros, neste Código, o papel do juiz fica secundarizado ou até surgirá a reboque dos acontecimentos: Esta última asserção pode parecer, à primeira vista, uma reflexão de natureza corporativa, mas, na verdade, as novas exigências criadas no concernente à maior intervenção dos magistrados judiciais, de que a audiência preliminar, prevista no artigo 508.º-A, será um dos principais afloramentos, implicam forçosas alterações no plano da organização judiciária.
E que, a título de mero exemplo, será de não esquecer que a média de pendências por juiz nos tribunais cíveis de Lisboa e do Porto é de 2000 e de 1600 processos, respectivamente. Ora, por mais perfeita que fosse a legislação processual civil, e nem sequer será o caso deste Código, óbvio se torna que qualquer reforma profunda só poderá lograr êxito se a organização judiciária lhe conseguir responder qualitativa e quantitativamente, no quinhão que lhe cabe.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Desde a formação e contínua actualização de todos os operadores judiciários, passando pelo aumento dos meios e condições de funcionamento dos tribunais, até à reclassificação e reordenamento dos diversos tribunais e juízos, e culminando no necessário desafogo dos, tribunais de segunda instância, tudo valerá por dizer que se torna imprescindível reponderar e reactualizar, à luz do novo Código, a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais e a demais legislação processual avulsa atinente com as inovações do Decreto-Lei n.º 329-A/95.
De facto, de acordo com o n.º 1 do, artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que constitui direito interno em Portugal desde 1978, «toda a pessoa tem direito a que a sua causa seja julgada equitativa e publicamente, e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei que decidirá dos seus direitos e obrigações de carácter civil (...)». Preceito e fundamento que, aliás, está de algum modo constitucionalizado no artigo 20 º da Constituição da República, através do princípio do acesso ao direito e aos tribunais, e que o Professor Gomes Canotilho, nas suas lições de Direito Constitucional, interpreta nas seguintes palavras: «O direito de acesso aos tribunais não só pressupõe a existência de uma via processual mas também exige a justeza e adequação do processo concretamente instituído, isto é, um processo que, entre outras coisas, garanta os direitos fundamentais processuais, de natureza penal ou civil».
Tudo para dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o verdadeiro desiderato da legislação processual civil consiste na rápida realização do direito material através dos tribunais e uma adequada composição dos litígios, visando um eficaz restabelecimento da paz jurídica. Por isso, na esteira e nas palavras do Professor Miguel Teixeira de Sousa, «uma reforma do processo civil nos tempos actuais deve orientar-se essencialmente pelos seguintes objectivos gerais: por um lado, a efectividade da justiça administrada pelos tribunais através de uma decisão rápida, % oportuna e legitimada pelo consenso das partes e do público em geral sobre a sua adequação à composição do litígio concreto; por outro, o aumento de operacionalidade dos sujeitos processuais através da subordinação da actividade processual das partes e do tribunal a um princípio de colaboração ou de cooperação».
Ora, seria fugir à verdade se não se reconhecesse que, numa apreciação genérica, o novo Código de Processo Civil, mormente com as correcções que aqui se visam introduzir, persegue na sua substância tais eixos essenciais.

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E não é menos verdadeiro reconhecer que o presente Código institui a primeira tentativa de ruptura com algumas das tradições napoleónicas e liberais que atravessaram todo o direito adjectivo civil nacional, mormente no tocante ao predomínio da discussão escrita sobre a oral e quanto ao âmbito da disponibilidade das partes sobre ó processo.
É um facto que as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, na sua larga maioria, são positivas - e já o dizia o então Deputado José Vera Jardim, aquando da sua discussão - e decorrem do amplo debate público que, a propósito do direito processual civil, se vem travando no nosso país, desde 1983.
Entre as inovações mais significativas são de sublinhar a ampliação do princípio do contraditório, a atenuação do princípio de preclusão, a introdução da regra da sanabilidade da falta de pressupostos processuais, a supressão de entraves de natureza fiscal em matéria de acesso aos tribunais, designadamente em matéria de pagamentos de preparos e custas, uma maior flexibilização de muitas regras de tramitação processual, de prazos peremptórios e de cominações, a atendibilidade de factos não alegados mas resultantes da instrução e discussão da causa; a permissão do arresto contra comerciantes, a flexibilização do acto de citação, a admissão da prorrogação de prazos e de suspensão de instância por acordo das partes, o registo dos depoimentos e a redução e a simplificação de inúmeras tarefas do juiz são, indiscutivelmente, algumas das principais alterações de carácter positivo deste Código.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Muito bem!

O Orador: - Tudo a poder significar que, de ora em diante, magistrados, advogados, oficiais de justiça e demais intervenientes processuais se regerão por princípios assentes na cooperação, na boa fé e na busca de verdade material, o que inevitavelmente tornará a lide mais frontal, mas também mais transparente e com claro reforço de responsabilização de todos os operadores judiciários.
Sem embargo das já referidas alterações inovatórias, o Decreto-Lei n.º 329-A/95 sempre seria e continuará a ser susceptível de benfeitorias, o que em boa hora a presente proposta de lei n.º 31Nn pretende alcançar.
E assim, no pedido de autorização legislativa em apreço, são objecto de reponderação, ao nível dos princípios, várias e significativas matérias, sendo que a proposta de lei inclui, desde já, as alterações concretas que visa introduzir, o que melhor dimensiona os parâmetros da autorização legislativa solicitada.
Deste modo, introduzem-se correcções na adequação da regra da legitimidade activa no âmbito da tutela de interesses difusos, por compatibilização necessária com a Lei n.º 85/95, de 31 de Agosto; facilita-se a economia processual em matéria do princípio de adequação formal, tornando suficiente para a decisão de mérito a prévia audição das partes, dispensando-se o acordo destas, como condicionante da actividade oficiosa do juiz; visa-se a prevalência da decisão de fundo em detrimento da forma ao fazer constar do artigo 288.º, aliás não contemplado no anterior decreto-lei, disposição que permita ao juiz conhecer de mérito em caso de decisão inteiramente favorável à parte em cujo interesse se estabelecera o pressuposto processual; acentua-se a igualdade de deveres de probidade e de lealdade processuais das partes, através da eliminação do n.º 3 do artigo 456.º, o que vale por. dizer que a parte vencedora pode também ser condenada como litigante de má fé, independentemente dos requisitos anteriormente exigíveis.
Para além de esclarecimentos e rectificações em sede de disciplina de citação, de procedimentos cautelares, da instância em sede de depoimentos da parte, permite-se igualmente que sigam a forma de processo sumaríssimo as acções emergentes de acidente de viação, cujo valor não seja superior a metade da alçada dos tribunais de primeira instância.
Além do mais, a proposta de lei em apreço regulamenta em preceito autónomo, no artigo 508.º-B, a eventual dispensa de audiência preliminar, deixando embora inequívoco que a regra é a da sua realização. Ao mesmo tempo que se procurou clarificar o regime do recurso per saltum para o Supremo Tribunal de Justiça, bem como salvaguardar, em sede de acção executiva, com carácter excepcional, a penhora de vencimentos ou pensões do executado ou a penhora da sua casa de habitação quando nela resida habitualmente, neste caso se possibilitando ao juiz a faculdade de sustar a desocupação até ao momento da venda.
Por último, a proposta de lei ora em exame retoma a regra de continuidade dos prazos, embora dilatando-os, e em sede de disposições finais e transitórias introduz relevantes alterações, nomeadamente no que se refere à aplicação no tempo dos novos regimes processuais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O eminente processualista italiano Chiovenda, que no passado terá sido o verdadeiro inspirador do velho código de Alberto dos Reis, escreveu algures que «o processo civil é o organismo mais delicado dos institutos jurídicos, ele tem uma posição central entre os institutos do direito privado e do direito público como meio de atribuir os bens de vida mediante a aplicação da lei. E dado que se trata de uma relação tão complexa que tanto abarca o lado jurídico, como o político e o social, assim, também as mais leves mudanças nas condições morais, políticas e sociais do tempo reflectem-se no seu funcionamento».
Tais palavras de tão eminente jurista proferidas na primeira metade do século permanecem hoje verdades lapidares. Daí a necessidade de se acentuar que, por mais dificuldades e até eventuais perturbações que a entrada em vigor do novo Código possa trazer aos diversos operadores judiciários, pior seria a paralisia estática de se continuar a regular adjectivamente com ideias e conceitos ultrapassados as novas realidades substantivas dos tempos de hoje.
Também em matéria de processo civil urgem respostas novas para os novos problemas, razão por que, Sr. Presidente, me permito aqui citar, também à laia de homenagem, as palavras, proferidas no Porto no Congresso da Ordem dos Advogados, em 1990, de um saudoso e ilustre advogado que também honrou esta Câmara com o seu afinco e labor parlamentares, quantas vezes em defesa da liberdade e da justiça. Refiro-me ao inesquecível Dr. Salgado Zenha.
Dizia Salgado Zenha, no citado Congresso da Ordem dos Advogados: «O processo civil, que não é um fim em si, mas um método para atingir a justiça, não pode ficar indiferente ao ideal democrático de se conseguir melhor justiça através de maior liberdade».

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E culminava: «A justiça não está só nos livros, está também nos corações. Não acredito numa justiça sem liberdade, como também não creio em liberdade sem justiça. Liberdade e justiça são para mim a essência da democracia». Que as palavras do saudoso Deputado

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socialista Salgado Zenha, que aqui de novo ecoam, possam contribuir para desbravar os caminhos da justiça célere, de modo a que a justiça material se sobreponha à formal, para calcorrear definitivamente as novas estradas de modernização e da simplificação, sempre em estreita cooperação entre as partes e o julgador, na busca da efectiva justiça que os cidadãos anseiam e merecem.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Justiça: Já tive ocasião de deixar dito, ou pelo menos subentendido, que, em nossa opinião, o limite temporal do dia 15 de Setembro para a entrada em vigor da reforma do processo civil irá provocar perturbações no funcionamento da máquina judiciária, com uma vida já tão atribulada por sucessivas experimentações relativamente à sua orgânica; experimentações essas com que alguns teóricos se divertiram, sem cuidarem dos reflexos dessas medidas sobre os cidadãos.
Somos de opinião de que a tarefa mais urgente é a de repensar a orgânica judiciária, reestruturá-la, por forma a aproximar a justiça dos cidadãos e a dotar os tribunais dos meios adequados à célere realização dessa justiça. A organização judiciária que temos hoje constitui, de facto, o maior travão àquela realização.
Aproximando-se a data que esta mesma Assembleia já definiu para a entrada em vigor da reforma do processo civil, pode questionar-se se estão reunidas as condições para que essa reforma entre em vigor sem sobressaltos.

O Sr Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Os operadores judiciários dispuseram e dispõem de tempo suficiente para, sem perturbações no regular funcionamento dos tribunais, fazerem aplicar as novas regras? A resposta é, decididamente, negativa.
Dir-se-á que a aprovação da autorização legislativa já data de fins do ano passado; melhor se diria: só data de fins do ano passado. E só por teimosia se poderá afirmar que menos de 1 ano é tempo suficiente para que funcionários judiciais, magistrados e advogados possam preparar-se para um código com alterações de vulto e que, além do mais, exige por parte de todos uma maior disponibilidade para os actos processuais.
Entendemos assim, já depois de uma maior maturação sobre as soluções da reforma, que o prazo de que dispomos não é suficiente para a adequação da máquina judiciária às novas exigências.
A verdade é que durante o mandato dos governos do PSD não foi sequer dada, de uma maneira geral, aos funcionários judiciais a formação adequada para que pudessem manusear os actuais Códigos, sem sobressaltos de maior, o que, a ter sido feito, seria meio caminho para a aplicação, sem constrangimentos de maior, de reformas às leis processuais.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Muito bem!

A Oradora: -- A verdade é que não foram criadas condições de trabalho que tornem possível que o aparelho judiciário se adapte, facilmente, a novas soluções; a verdade é que os magistrados continuam a perder horas ,e horas em tarefas burocráticas.

O Sr. Osvaldo Castro (PS):- Muito bem!

A Oradora: - A verdade é que não é possível colocar um remendo novo num pano já muito puído. Urgente é, de facto, reformar a orgânica judiciária e dotar os tribunais dos meios técnicos e humanos adequados.
Relativamente ao processo civil, as soluções apontadas pela Comissão Revisora do Código têm em vista, como é óbvio, um novo figurino de processo civil, menos dominado pela justiça formal, filosofia que sempre defendemos.
As alterações ora propostas, com uma ou outra excepção, melhoram o que consta do Decreto-Lei n.º 329-A/95. Continuamos, no entanto, a questionar algumas das soluções que, parecendo visar o objectivo da justiça material, desenham, em nossa opinião, uma figura de magistrado judicial dotada de poderes discricionários excessivos. Esta solução é rejeitada pelos próprios magistrados, que nela vêem ameaças ao seu estatuto de independência. A verdade é que, num ou noutro caso, a proposta que hoje discutimos ainda reforça esses poderes, embora noutros se explique que se trata de um dever, mas isso não acontece em todos os casos.
O diploma de 1995 previa poderes discricionários do juiz na determinação de tramitação processual quando a forma de processo não fosse adequada em caso de coligação e de cumulação de pedidos. Pergunta-se se esta solução não comportará soluções diferentes para os cidadãos, consoante o tribunal onde litigarem.
O mesmo acontece em relação à cumulação de execuções. A este propósito, gostaria de introduzir uma reflexão em termos de casos concretos, porque penso que já existem conhecimentos e experiência suficientes para se propor algumas formas de processos novos que resolvam os problemas dos cidadãos. Por exemplo, nos divórcios por mútuo consentimento em que as partes estejam de acordo na partilha, por que razão não se faz, simultaneamente, o divórcio e a partilha?
Creio que não se aproveitaram os conhecimentos para introduzir processos especiais novos, mas perfeitamente definidos perante os cidadãos.
Relativamente. à dispensa de multa em caso de justo impedimento, anotam-se os mesmos poderes discricionários, designadamente no poder de o magistrado não alterar a data da audiência quando os advogados aleguem impedimento; no poder, e não dever, de investigação oficiosa dos factos instrumentais; no poder, e não dever, de considerar factos não alegados pelas partes que sejam complemento ou concretização de outros; no poder de adequar livremente o processo; no poder de dispensar actos que ele magistrado julgue inidóneos; no poder, e não dever, de ouvir as partes para esclarecimentos sobre matéria de facto ou de direito; no poder de arredar um pedido reconvencional, apenas com base na inconveniência que ele próprio afere, de instrução e julgamento conjunto com a acção; no poder de não ficar adstrito à providência cautelar requerida; no poder de ordenar a prestação de caução pelo requerente da providência cautelar, mesmo que não tenha sido requerida; no poder, e não dever, relativamente a alargamento da matéria de facto, no termo dos articulados, através de despacho irrecorrível; no poder de determinar, oficiosamente, o depoimento de parte; no poder, e não dever, de ordenar oficiosamente perícias; no poder, e não dever, de declarar a total impenhorabilidade de salários e pensões, em certos casos - pensamos que este último deveria ser um dever, sempre que as pessoas atingidas fiquem, de facto, em situação económica extremamente débil.

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Na proposta de lei que hoje discutimos chegam a alargar-se, por vezes, os poderes discricionários. Tal acontece quando se deixa nas mãos do magistrado o ajuizar da desnecessidade de ouvir as partes em questões de direito ou de facto;...

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr.ª Deputada, agradeço que abrevie.

A Oradora: - Sr. Presidente, como falo mais devagar do que os outros Srs. Deputados, sou sempre prejudicada!
Ou ainda, quando no artigo 31.º, relativo à adequação da forma processual, se substitui «absolutamente» por «manifestamente». Em nosso entender, deveriam trata-se de poderes, mas de poderes-deveres, claramente!
Os anos de vigência do actual Código de Processo Civil já tornam possível resolver muitos dos problemas que impedem a justiça material sem recurso a estes poderes discricionários.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, quero apenas informar que dispõe de mais 3 minutos, concedidos pelo Grupo Parlamentar do PS.

A Oradora: - Muito obrigada, Sr. Presidente.
Esta matéria é, a nosso ver, a que mais críticas merece.
É claro que outras questões são suscitadas pela reforma. Aliás, vou dar um exemplo - talvez muito concretizado, mas gostaria de o referir porque me choca bastante -, que é o de, a determinada altura, se ter permitido 0 desaforamento de processos por formas ínvias. Refiro-me à situação em que se torna possível que um juiz não use de uma excepção quando essa excepção possa beneficiar a pessoa que vai ganhar a acção. Ora, isso pode conduzir a desaforamentos em relação à incompetência territorial ou, então, a que as pessoas procurem um determinado tribunal!
O que acontece - e peço licença para o dizer - no caso da «lei dos chequem, é que as alterações introduzidas para facilitar a posição dos credores permitem que estes se dirijam aos tribunais mais severos, que aplicam maiores punições. E isso é um escândalo!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É verdade!

A Oradora: - Também não concordamos, como já dissemos, com as limitações ao direito de recurso, que consideramos inadmissíveis.
Embora, em nossa opinião, a maioria das propostas do actual Governo não constitua, de facto, alterações significativas, convém que se diga que, por exemplo, em relação à questão do recurso nos arrendamentos para habitação, foi esta proposta de lei que veio permitir que houvesse sempre recurso, porque isso não era possível pelo texto anterior.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É uma excepção!

A Oradora: - O' que perguntamos é se isto só deve ser assim nos arrendamentos para habitação. É que entendemos que os arrendamentos comerciais e para o exercício de profissões liberais e outros, de que as pessoas necessitam para exercer a sua profissão, devem, efectivamente, merecer a mesma protecção.
Polémica continua a ser a audiência preliminar, mas, nesse caso, entendemos que o problema tem a ver com os meios dos tribunais - os meios técnicos e humanos
com o estado em que está a máquina da justiça, porque, de facto, esta audiência preliminar pode significar muito e dar um grande avanço ao processo civil. Aliás, nas audições a que procedeu a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias - nas anteriores e, agora, nestas -, sobre a reforma do processo civil, o que sempre se sobrepôs à discussão das linhas da reforma, foi o estado da justiça.
Daí as queixas de magistrados, funcionários e advogados relativamente a um sistema que, em vez de ser gratificante, por visar a concretização dos direitos dos cidadãos, faz acrescer às angústias desses mesmos cidadãos as angústias dos que com ele convivem. Isto não é figura de retórica, e quem conhece os tribunais sabe que assim é!
Sendo a justiça uma questão de Estado, impõem-se medidas que verdadeiramente combatam a crise.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Tem tempo!

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não era minha intenção usar novamente da palavra, mas como lembra o Sr. Deputado Guilherme Silva, tenho tempo e quem tem tempo tem direito. Aliás, neste caso, diria até que tenho o dever, visto que alguns Srs. Deputados fizeram afirmações que merecem algum comentário. Portanto, uso estes últimos minutos para me permitir fazer esse breve comentário.
O que quero dizer tem a ver com o problema da pressa nas reformas e das reformas atempadas. O anterior Governo andou sete anos «enrolado» na reforma do. processo civil. Sete anos, Srs. Deputados!

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - E não queria aqui dizer isto, até pela grande estima e consideração que tenho pelo anterior titular do Ministério da Justiça, mas a isso sou obrigado: o anterior. governo, em desespero de causa, acabou por pegar num diploma que existia e que não estava suficientemente discutido e publicou-o antes das eleições.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Aprova disso têm-na os Srs. Deputados no seguinte: como é possível que os membros da mesma Comissão que acabou de publicar o Código revejam cento e não sei quantos artigos desse mesmo Código e confessem várias vezes que não viram esta matéria porque não tiveram tempo?

Aplausos do PS.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Boa pergunta!

O Orador: - Portanto, quando os Srs. Deputados do PSD afirmam que o que fizemos em cinco ou seis meses, em matéria de Código de Processo Civil, dá ideia da forma de governar do PS ou da forma como o PS encara a governação, na versão dos Srs. Deputados do PSD...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - São ciúmes!

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O Orador: - ..., devo dizer que o que fizemos foi um trabalho extremamente útil. Aliás, verão as opiniões dos comentadores que vão comentar as alterações feitas ao diploma que existia.
Trata-se de um trabalho que foi feito em tempo record, porque foi um trabalho de quatro ou cinco meses - é preciso não esquecer que há todo um procedimento legislativo que demora tempo e este diploma já está na Assembleia há mais de um mês -,foi feito em conjunto com a Comissão e melhorámos substancialmente o Código. Só a título de exemplo, se os Srs. Deputados virem as disposições transitórias, segundo as quais praticamente a maior parte dos operadores judiciários iriam andar durante muitos anos com dois códigos de processo civil...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Verdade! Completamente verdade!

O Orador: - ..., verão que fizemos um enorme esforço para que tudo aquilo que pudesse ser de aplicação imediata o fosse precisamente a bem de um melhor entendimento da lei processual civil.
Não me parece, portanto, que tenham qualquer admissibilidade os pretensos argumentos invocados por alguns Srs. Deputados da oposição quanto à forma de governar do PS.
Por outro lado, quero também dizer a alguns Srs. Deputados o seguinte: não reivindico direitos de autor de coisíssima nenhuma. A cada um a sua obra! Nesta, que fiz, tenho orgulho, os outros dirão qual a sua posição perante as suas!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi, com muita atenção, esta segunda intervenção do Sr. Ministro da Justiça.
Todos sabemos que a reforma dos códigos leva tempo e, muito sinceramente, prefiro as que são mais demoradas do que as precipitadas.

O Sr. Ministro da Justiça:- Ora bem!

O Orador: - V. Ex.ª, Sr. Ministro da Justiça, referiu que a Comissão que elaborou esta revisão do Código de Processo Civil ficou, ela própria, surpreendida com imperfeições e incorrecções que terá detectado agora nesta revisão da revisão que V. Ex.ª promoveu. Ora, como se trata de uma revisão da revisão, quero dizer que oito, meses foi demais, Sr. Ministro. Para uma revisão da revisão, repito, oito meses foi demais!

O Sr. José Magalhães (PS): - Queria a revisão da revisão em dois meses?! Para sair novamente asneira?!

O Orador: - Em todo o caso, quero dizer-lhe que se, eventualmente, a Comissão for ler agora estas alterações - eu já as li e também já detectei algumas imperfeições vai, com certeza, deparar-se novamente com imperfeições de que ela própria não deu conta. E será assim sempre, sucessivamente! Além disso, há aqui alterações para pior, Sr. Ministro, e nós, na especialidade, teremos também de fazer algumas correcções.
De qualquer forma, quero dizer a V. Ex.ª, Sr. Ministro, que essa é uma falha reconhecida da Comissão e não uma falha do anterior Governo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Quem propôs à Assembleia?!...

O Orador: - A Comissão que assuma as suas responsabilidades, como parece ter assumido, mas não se confundam as responsabilidades do Governo, por um lado, e da Comissão, por outro.
Pela nossa parte, vamos dar o nosso contributo na especialidade, já que temos, aliás, a confissão da Comissão relativamente a algumas falhas, o que nos vai deixar ainda mais alerta para esse trabalho.
Como disse na minha intervenção, é óbvio que algumas das correcções que foram agora feitas são pertinentes, correspondem a melhorias, a questão, repito, é saber se valia a pena um adiamento da entrada em vigor do diploma ou se eram compagináveis com um diploma avulso de alteração intercalar. Aliás, agora, no desenho que está projectado de nova ampliação da vacatio legis, vai suscitar-se a questão de saber se, efectivamente, o mês de Janeiro, depois de umas curtíssimas férias judiciais, que são as férias do Natal, será o momento próprio ou se não será novamente um momento perturbador para a entrada em vigor de uma nova lei processual civil que tem muitas alterações e que vai necessariamente trazer alguma perturbação a um ano judicial que se inicia sob a vigência do actual Código de Processo Civil. Essa questão, se calhar, terá de ser também reponderada, porque, de dilação em dilação, de vacatio legis em vacado legis, vamos, cada vez mais, ao estilo socialista, prolongado as medidas que são urgentes e que todos reconhecemos serem importantes para a simplificação e melhoria da nossa lei processual, bem como para a resposta dos tribunais aos problemas que se colocam.

O Sr. José Magalhães (PS): - E o que é que o PSD propõe?

O Sr. Alberto Martins (PS): - Deve ser uma vacatio sem legis!

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo Castro.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É um pedido de esclarecimento?!...

O Orador: - Não, não, é uma intervenção, mas, se quiser, também pode ser um pedido de esclarecimento.
Aliás, Sr. Deputado, o que quero dizer-lhe traduz-se numa correcção.
Como sabe, a Lei n.º 6/96, de 29 de Fevereiro, que foi a que permitiu dilatar o prazo, foi aprovada aqui em Fevereiro. Ora, só depois disso é que era possível o Governo ter a certeza de que iria reexaminar a situação...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Conhecendo o grau de inteligência do Sr. Ministro, ele deve ter começado a trabalhar muito antes!

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O Orador: - ..., o que vale por dizer que o Sr. Deputado conta mal os meses.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Meses à Marcelo!

O Orador:- Isto significa que não foram oito meses, foram exactamente três meses e dez dias, porque hoje é dia 11.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Ainda é pior! Quatro meses para fazer alterações desta natureza?!...

O Orador: - O problema, Sr. Deputado Guilherme Silva, é o seguinte: o governo anterior e o próprio Ministro da Justiça de então, foram obrigados a trabalhar a «mata-cavalos» para esticar o «betão». E aqui também se tratava de esticar o «betão» só que era com pessoas, era ao nível de problemas que dizem' respeito às pessoas.

Protestos do Deputado do PSD Guilherme Silva.

Sr. Deputado, a Comissão Revisora tem exactamente as mesmas pessoas, menos uma Sr.ª Juíza que era adjunta do então Ministro e, de facto, todos chegaram à conclusão de que havia um conjunto grande de alterações. Aliás, o Sr. Deputado sabe - e se não sabe, sabem os Srs. Deputados Antonino Antunes ou Miguel Macedo, que também por lá passaram - que, no âmbito da Subcomissão de Justiça, nas audiências que fizemos até hoje - e já fizemos audiências com a Ordem dos Advogados, com o Conselho Superior da Magistratura, com a Associação Sindical dos Magistrados e com a Associação dos Oficiais de Justiça -, as questões que se colocaram têm a ver com as inovações anteriores, porque, no geral, o entendimento foi sempre o de que há agora nítidas melhorias e correcções com esta alteração legislativa.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ora aí está!

O Orador: - E o Sr. Ministro da Justiça salientou-lhe há pouco uma delas: se nas disposições finais e transitórias, em matéria de entrada em vigor das leis, não houvesse uma nova alteração, não tenha dúvidas nenhumas de que os juízes e os advogados passariam a vida com dois códigos na mão, sem saber o que fazer. Isto são lapsos... Aliás, repare: os senhores não falam, desde logo, no lapso da remissão para o artigo 104.º do Código de Processo Penal, .mas os senhores, com essa alteração, retiravam direitos aos arguidos e à defesa! Isso não foi visto e é um lapso!

O Sr. José Magalhães (PS): - E é grave!

O Orador: - Não faço essa injúria ao Ministro Laborinho Lúcio, porque isso foi fruto do trabalho a «mata-cavalos». E, numa coisa destas, a pressa faz < parir os cachorros cegos», Sr. Deputado!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminou o debate, na generalidade, da proposta de lei n .º 31/VII.
Passamos à apreciação, também na generalidade, da proposta de lei n.º 34/VII - Altera o artigo 85.º da Lei n.º 38/87, de 23 de Dezembro, e o artigo 112.º da Lei n.º 47/86, de 15 de Outubro (Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais e do Ministério Público).
Para introduzir o tema, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Trata-se de uma alteração pontual, como V.V. Ex.as terão visto e, aliás, como o Sr. Deputado Guilherme Silva apontou no seu relatório. Mas, por se tratar de uma alteração pontual, isso não significa que não tenha a sua importância e convém dar aqui alguma explicação adicional.
Hoje, dada a situação de carência nos tribunais, existe um conjunto muito grande de magistrados auxiliares. Para vos dar uma indicação actualizada, existem, neste momento, 135 magistrados judiciais auxiliares e 68 magistrados do Ministério Público em situação de auxiliar, o que significa, naturalmente, que esta situação se usa para fazer face a problemas que existem nos tribunais que não são capazes de dar vazão ao volume de serviço que têm, o que sucede quer em tribunais de 1.º , de 2.º e de 3.º instâncias e refiro-me apenas ao problema dos tribunais comuns.
Sucede que - e espero que V. V. Ex.as possam aprovar esta proposta de lei -, nos termos do artigo 85.º da Lei Orgânica dos Tribunais, sob a epígrafe «juízes auxiliares», e no que diz respeito aos magistrados judiciais, diz-se o seguinte: «l - Quando o serviço o justifique, designadamente o número e a complexidade dos processos, o Conselho Superior da Magistratura pode destacar, temporariamente para um tribunal ou juízo os juízes que se mostrem necessários. 2 - O destacamento caduca no fim de um ano, pode ser renovado por dois períodos de. igual duração e depende da anuência do magistrado e de prévia autorização do Ministro da Justiça.».
O que acontecia é que, até há pouco tempo, o Conselho Superior da Magistratura tinha o entendimento de que o destacamento para juiz auxiliar produzia vacatura no lugar de origem. Acontece, no entanto, que, recentemente, um parecer da Procuradoria Geral da República foi elaborado no sentido de que esse mesmo destacamento não abrisse vaga no lugar de origem. Assim sendo, o Conselho Superior da Magistratura chamou a atenção do Governo de que era muito urgente a alteração dos termos do artigo 85.º para que não caíssemos numa situação que corre o risco de se dar a partir do próximo movimento judicial. Isto é, destacado um juiz para outro tribunal ou juízo, na impossibilidade legal de vacatura do lugar de origem, decorre o seu preenchimento por outro juiz auxiliar, e assim sucessivamente, numa cadeia que é manifestamente perturbadora dos serviços e da gestão que o Conselho Superior da Magistratura faz do movimento dos tribunais.
Por outro lado, dependendo o destacamento da anuência do magistrado, visto que os magistrados só podem ser nomeados para juízes auxiliares com a sua expressa anuência, o lugar deixado deserto corria o risco de não ser ocupado por falta de interesse de qualquer outro magistrado, uma vez que também não ia ocupar um lugar definitivo, mas iria ser nomeado como juiz auxiliar.
Com esta proposta de lei, fica ao prudente arbítrio do Conselho Superior da Magistratura a declaração de vacatura do lugar de origem, ou mantém-se, naturalmente, a possibilidade de não haver vacatura e, portanto, apenas poder ser nomeado um magistrado, também auxiliar, para esse lugar.

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A entender-se que é declarado vago o lugar, está o Conselho Superior da Magistratura apto a, compulsivamente, em movimento judicial, preenchê-lo com o juiz em provimento efectivo, visto que aí o magistrado não pode negar-se a ocupar essa vaga. Porquê a mera possibilidade dada ao Conselho Superior da Magistratura? Ou seja, porque é que não se adoptou aqui a regra de que a nomeação como auxiliar abre, ope legis, sistematicamente, vacatura do lugar? Por entre outras razões, a falta de juízes pode aconselhar a que o lugar de origem não seja provido, lançando-se mão do expediente previsto no n.º 3 do artigo 84.º da Lei Orgânica dos Tribunais, exercício de funções pelo juiz em acumulação em mais de um juízo ou tribunal, como já vem sucedendo em muitos casos, ou ainda que o lugar de origem seja preenchido por um auxiliar, designadamente porque a deslocação do primeiro dos juízes destacados tem um horizonte temporal de curta duração.
Efectivamente, em muitos casos, os juízes auxiliares são designados para situações que vão ser, ou prevê-se que sejam, de curta duração, porque basta haver um atraso em determinado tribunal, basta haver, como sabem, muitas vezes, um julgamento muito prolongado para que o tribunal entre em ruptura ou em pré-ruptura, portanto, é por vezes necessário designar um juiz auxiliar para períodos limitados no tempo.
Por outras vezes - e também queria falar-vos disto a verdade é que notamos que há tribunais que vêm sistematicamente sendo ocupados com juízes auxiliares, o que nos parece ser mau, denota naturalmente uma deficiente organização dos tribunais, a que já vários Srs. Deputados fizeram menção. Quero, pois, aqui anunciar-vos várias coisas em matéria de Lei Orgânica dos Tribunais, aproveitando o facto de estarmos a discutir um artigo que é naturalmente limitado, embora, repito, de grande importância para a gestão que o Conselho Superior da Magistratura pode fazer dos tribunais.
A primeira medida que tomámos - e está tomada porque já assinámos a portaria - diz respeito a algo que alguns Srs. Deputados, designadamente a Sr.ª Deputada Odete Santos, já referiram, que é a reclassiricação de uma série de comarcas. Como sabem, as comarcas são classificadas em três categorias: comarcas de ingresso, comarcas de acesso e comarcas de acesso final. Havia aí uma série de distorções. Muitas vezes, comarcas que eram classificadas como comarcas de ingresso mereciam uma classificação superior, superior no sentido de que os magistrados se mantêm mais tempo nas comarcas que não são de mero ingresso. Assim, de acordo com o Conselho Superior da Magistratura e com estudos que o Conselho fez a nosso pedido, mandando os seus inspectores fazer o levantamento sistemático da situação de todas as comarcas, temos já preparada e accionada uma portaria com uma reclassificação das comarcas.
A segunda medida que queria anunciar é a criação de mais uma série de juízos, quer cíveis quer criminais. E porquê? Porque se trata de situações em que, precisamente, os juízes auxiliares já estão há vários anos designados como tal. O que é que isso significa? Significa que se trata de um tribunal em que não é apenas uma situação episódica e conjuntural mas um tribunal que necessita de reforço de magistrados e também de funcionários judiciais. Nesse sentido, tenho a informar V.V. Ex.as que, numa primeira medida que será completada pelo estudo que ainda continua a ser feito pelo Ministério da Justiça em conjunto com os inspectores do Conselho Superior da Magistratura, vão ser criados 25 novos juízos por todo o País, juízos cíveis e criminais, o que significa que essas situações em que tinham juízes magistrados auxiliares há muitos anos vão ser consolidadas, criando novos juízos.

O Sr. Osvaldo Castro (PS):- Muito bem!

O Orador: - Estamos agora a fazer o estudo do movimento de funcionários judiciais que é necessário para que esses juízos possam funcionar.
Isto são, naturalmente, medidas importantes mas não são as grandes medidas da organização judiciária. A grande medida é, a meu ver, como já o tenho dito várias vezes - e suponho que merece o consenso nesta Câmara, como o tem merecido, na generalidade, por parte dos operadores judiciais -, é terminarmos de vez com a experiência maléfica dos tribunais de círculo. Estamos a preparar o diploma, e, como sabem, não é muito fácil preparar um diploma, mas difícil, sim, é estudar cuidadosamente - cuidadosamente, Sr. Deputado Guilherme Silva! - e com tempo necessário, de forma a aproveitarmos os próximos meses antes da reabertura dos trabalhos da Assembleia para, na altura de apresentarmos aqui a reforma da Lei Orgânica dos Tribunais, podermos simultaneamente já ter pronta a lei de execução, visto que esta é a mais difícil, para não suceder desta vez aquilo que sucedeu quando os tribunais de círculo foram implantados, ou seja, milhares de conflitos de competência nos tribunais.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Bem verdade!

O Orador:- Queremos fazer um grande esforço para que seja obviado aquilo que foi uma desgraça nos tribunais portugueses, de que muitos de nós, para não dizer todos, temos ainda uma lembrança a todos os títulos negativa e nefasta.
Por outro lado, Srs. Deputados, vamos, aliás em cumprimento do Programa do Governo, encarar a criação de novos tribunais de 2.ª instância. Permitir-me-ão que não o diga aqui, visto que o problema da localização é sempre sensível, mas a única coisa que posso dizer é que não nos deixaremos orientar por quaisquer pressões, venham elas de onde vierem, mas faremos essa intervenção onde for necessário e segundo dados objectivos, estatísticos, que estamos também a preparar.
Finalmente, Srs. Deputados, devo dizer-lhes que o ciclo de aumentar, exponencial e permanentemente, o número de magistrados está, tem de estar, a terminar. Aliás, os próprios magistrados estão também de acordo em que não podemos, no futuro, continuar a aumentar sistematicamente o número de magistrados, quer judiciais quer do Ministério Público. Temos de intervir noutras zonas - e alguns Srs. Deputados já o referiram -, temos de criar nos tribunais as assessorias necessárias, os meios necessários, para que o número de juízes que temos - e não estou a dizer que não queremos mais meia dúzia de lugares de magistrados judicial, não é isso - e que hoje já são, para vos dar os últimos números, 1275 magistrados judiciais, não continue a aumentar indefinidamente.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Muito bem!

O Orador: - Somos, manifestamente - e supomos que a Câmara também nos acompanhará nesta nossa consideração -, contra a massificação da Magistratura Judicial e da Magistratura do Ministério Público.

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Portanto, teremos de imaginar e pôr no terreno outros meios para que os magistrados possam efectivamente dedicar-se àquilo que se devem dedicar, mas ter o apoio necessário para os libertar de tarefas secundárias em que andam sistematicamente ocupados. Temos já preparados, Srs. Deputados, um ante-projecto sobre as assessorias, que vamos discutir com os Srs. Magistrados Judiciais e do Ministério Público, os Srs. Funcionários e, naturalmente, no momento oportuno, com V.V. Ex.as. É uma matéria em que mesmo a generalidade dos magistrados não está inteiramente de acordo, há uns que defendem um tipo de assessoria e outros defendem outro. Quando se fala em assessorias referimo-nos a um universo em que por vezes pensamos que estamos todos a falar da mesma coisa e, afinal, não estamos. Portanto, temos de discutir isto com muita calma, com tempo - mais urna vez, Sr. Deputado Guilherme Silva, com tempo! -, mas não vai demorar oito nem nove anos, irá demorar naturalmente os oito ou nove meses que tanto afligem V. Ex.ª e que não chegam a ser oito ou nove meses.
Por fim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não queria terminar esta minha intervenção - e há pouco esqueci-me -, já que tanto falei de magistrados judiciais e de magistrados do Ministério Público, sem deixar de sossegar o Sr. Deputado Guilherme Silva quanto ao clima que se vive nas magistraturas. Como V. Ex.ª sabe, nos quatro anos da última legislatura, o clima nem sempre foi muito saudável. V. Ex.ª lembrar-se-á de que magistrados judiciais, magistrados do Ministério Público, Polícia Judiciária, funcionários de justiça, bradavam aos quatro ventos, se V. Ex.ª me permite, as suas discordâncias com o titular da pasta da justiça, Dr. Laborinho Lúcio. Neste momento, não creio que a situação seja inteiramente idêntica e quanto ao mal-estar entre as polícias e o Ministério Público, etc., permita-me um conselho: não tenha como bom tudo aquilo que lê. Olhe que se vai dar bem com este meu conselho!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Pará uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: A proposta de lei que estamos aqui a debater e a analisar tem a ver com o instrumento que o Sr. Ministro referiu de grande importância relativamente ao descongestionamento de situações de atraso é acumulação nalguns tribunais. Lembro-me que na anterior legislatura, tal como refiro no relatório que elaborei no âmbito da 1.ª Comissão, houve até o cuidado de, a par da figura do destacamento, se criarem mesmo juízos e secções auxiliares, numa visão integrada destas situações que o simples destacamento de magistrados não satisfazia, não sendo bastante para dar lhes dar resposta.
Os problemas que se levantaram e que foram suscitados por um parecer da Procuradoria Geral da República têm toda a pertinência. A prática do Conselho Superior de Magistratura não era conforme à lei, sendo clara a diferença de redacções entre a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais e a Lei Orgânica do Ministério Público e, portanto, havia uma prática não inteiramente conforme à lei por parte do Conselho Superior da Magistratura.
Há uma questão que eu gostaria que aqui fosse esclarecida pelo Sr. Ministro da Justiça, relativa a uma das alíneas desta proposta de lei, que diz o seguinte: «adoptar metodologia que permita a intervenção do Ministro da Finanças quanto à cabimentação orçamental do destacamento quando os respectivos encargos passarem a ser assumidos de facto» (expressão que vem sublinhada) «por aquele ministério.»
Gostaria que V. Ex.ª explicitasse melhor o que quer dizer com o enfatizar desta expressão «de facto», sublinhando-a na redacção da proposta de lei.
Por outro lado, registo com agrado aquilo que V. Ex.ª aqui anunciou como reformas, designadamente a revisão mais aprofundada da Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais. Penso, porém, que grande parte dos problemas que se colocaram com a implementação dos tribunais de círculo está hoje ultrapassada e, portanto, a sua reforma ou a sua substituição deve ser ponderada, cuidada e pensada.
Aliás, tanto quanto tenho ouvido a magistrados judiciais...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Opiniões certamente da Madeira!

O Orador: - ..., hoje, muitos daqueles que estiveram contra os tribunais de círculo já tem uma receptividade quanto a eles e já lhes encontram algumas virtualidades e mexer constantemente nestas matérias nem sempre é a melhor solução...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Tem de ir ao Barreiro e a Portimão!

O Orador: - ..., mas V. Ex.ª também já aqui disse que isso será com tempo, com calma, ponderação e reflexão, ou seja, sem o frenesim que V. Ex.ª tinha quando estava na oposição...

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Isto é que é um trauma!

O Orador: - ... acautelando esta matéria.
Por outro lado, descansou-nos ao dizer quer não ia levar sete, oito ou nove anos. Aliás, apesar de toda a longevidade que desejo a V. Ex.ª também não o antevejo como Ministro da Justiça durante tão longo tempo e, portanto, também não o considero em condições de fazer reformas num tempo tão prolongado, pelo que acho bem que V. Ex.ª encontre um meio termo, para não ficar a meio das reformas.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Aos costumes disse nada!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Helena Santo.

A Sr.ª Helena Santo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: A proposta de lei que agora nos é apresentada parece-me que, de facto, vem ao encontro de algumas carências que hoje se sentem nos tribunais, mas não queria deixar passar esta oportunidade, após a exposição do Sr. Ministro, que ouvi atentamente, para referir outro problema que também se vive hoje nos nossos tribunais, a falta de meios humanos e físicos.
Se esta questão não for rapidamente ultrapassada de nada adianta colocarmos mais juízes nos tribunais, quando é certo que quer o juiz titular quer o auxiliar estão, na

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grande parte dos tribunais, a trabalhar em pequenos gabinetes onde mal cabe um juiz, mal cabe um computador, mal cabe um funcionário.
Portanto, a bondade destas propostas, que não ponho em causa, pode, de facto, na prática, vir a não ter qualquer êxito se, rapidamente, não se pensar que é necessário implementar nos tribunais outras capacidades físicas e técnicas que não têm.
Por outro lado, também não queria deixar de recordar aqui - e isto não foi falado pelo Sr. Ministro - o problema da reforma do processo penal. Sabemos que, hoje, grande parte dos nossos tribunais estão «entupidos» de processos por uma coisa que se chama a contumácia. Este é, de facto, um grave problema que se vive nos tribunais, em Portugal, pois, sendo os julgamentos adiados consecutivamente, as secretarias ficam inundadas de actos que têm de praticar e, portanto, uma vez mais, mesmo tendo mais juizes auxiliares - que, registo, é uma boa medida -, na prática; depois, os processos chegam à secretaria e a falta de funcionários e a repetição, em nosso entender desnecessária, de tantos actos acaba por deixar em «letra morta» a bondade das propostas que aqui estão a ser apresentadas e com as quais também nos congratulamos.
Assim, não queria deixar passar este momento - uma vez que o PP, em sede própria, já pediu a ratificação das alterações então introduzidas ao processo penal, propondo a alteração da contumácia, o que não mereceu o acolhimento desta Casa - para, uma vez mais, alertar para este problema grave que os nossos tribunais atravessam hoje. Aliás, todos aqueles que têm de recorrer aos tribunais conhecem-no e, portanto, chamo atenção também para a reforma do processo penal.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Antes de mais, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista quer congratular-se com a alteração legislativa que aqui nos é apresentada por via da proposta de lei do Governo, que nos parece inteiramente correcta face ao Parecer da Procuradoria Geral da República de 8 de Janeiro de 1996, que, de alguma forma, veio plasmar um entendimento diverso daquele que existia quanto à matéria - em causa.
Portanto, nessa medida, estamos em crer que esta solução proposta contribui também, necessariamente, para uma maior rapidez no que diz respeito à substituição nos próprios lugares que ficam vagos por via dos destacamentos dos juízes auxiliares.
Agora, não queria deixar de aproveitar esta oportunidade para saudar as alterações que, de alguma forma, aqui foram anunciadas no que respeita à Lei Orgânica dos Tribunais, à criação de novos tribunais, à criação de novas comarcas e também de novos tribunais de 2' instância.
Todavia, há uma questão que é importante ter em conta, principalmente por todos aqueles que têm de trabalhar com a justiça todos os dias, e com muito gosto: o mau funcionamento dos tribunais que neste momento existe está, como V.V. Ex.as sabem, suficientemente determinado, está definido, só que nos últimos 10 anos, de governo do PSD - e por muito que o Sr. Deputado Guilherme Silva se esforce por demonstrar que o que existe é uma herança da oposição e não do PSD, há uma herança do PSD -, pouco ou nada foi feito.
Continuamos a ter tribunais à volta desta cidade de Lisboa que funcionam em vãos de escada, continuamos a ter juízes que não têm o mínimo de condições para funcionar, continuamos a ter alguns juízos cíveis, no próprio Palácio da Justiça, vagos por tempo absolutamente indeterminado, havendo processos que aguardam sentenças há quatro anos - e estamos a falar de processos cíveis! -, depois de ter sido feito o julgamento, com resposta aos quesitos. Estas situações passam-se em juízos cíveis da cidade de Lisboa!
Estes factos foram sempre do conhecimento dos governos anteriores. O que é que foi feito nestes últimos 10 anos? Além das famosas inaugurações de palácios da justiça por esses país fora, o que é que foi feito para suster e, de alguma forma, minorar estas situações? Rigorosamente nada!
Sr. Ministro, estou convencido e quero dizer-lhe muito francamente que esta alteração que aqui nos é proposta, no tempo do governo do PSD, teria sem qualquer dúvida demorado um ano ou dois a ser implementada. Não tenho a mínima dúvida porque quem andou sete anos a estudar, a tentar implementar, a tentar definir e concretizar uma reforma do Código de Processo Civil e tem a ousadia só assim é que a posso qualificar - de vir aqui acusar o Sr. Ministro da Justiça de lentidão relativamente às reformas apresentadas, sinceramente não se pode justificar de outra maneira!
Por outro lado, não posso deixar de aproveitar esta oportunidade para registar o quase trauma do Sr. Deputado Guilherme Silva no que respeita à forma como se refere sempre ao Deputado José Vera Jardim na anterior legislatura, ou seja, à celeridade e à forma de ele fazer oposição nessa altura.

O Sr. Osvaldo Castro (PS):- Muito bem!

O Sr. Ministro da Justiça: - São saudades!

O Orador: - Penso que o Sr. Deputado está claramente necessitado de um curso de reciclagem para o exercício das suas novas funções como Deputado da oposição, porque ainda a propósito de uma intervenção absolutamente pacífica, categórica e clara do Sr. Ministro da Justiça o ouvimos aludir novamente ao papel do Sr. Ministro enquanto Deputado na anterior legislatura e à rapidez e forma como queria fazer as coisas.
Sr. Deputado, deixe-me dizer-lhe, com toda a sinceridade e respeito que me determina, que não posso deixar de registar que essa reciclagem é absolutamente indispensável, sob pena de V. Ex.ª, sempre que o Sr. Ministro da Justiça aqui vier, aludir novamente à forma diferente de ele agora fazer política relativamente àquela que tinha quando era Deputado da oposição.

O Sr. Osvaldo Castro (PS). - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, V. Ex.ª continua a fazer a defesa oficiosa do Sr. Ministro da Justiça, que não necessita dela porque é um brilhantíssimo parlamentar e advogado...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): Isso é verdade, a única verdade que disse aqui hoje!

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O Orador: - ... e não necessita do seu empenhado esforço oficioso de defesa.
Mas quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que esta minha insistência relativamente à actuação parlamentar do Sr. Deputado José Vera Jardim nestas matérias tem a ver com uma coisa que V. Ex.ª começa também já a revelar e, naturalmente, com o tempo, isso vai ainda acentuar-se: a falta de memória de V.V. Ex.as.
É preciso, efectivamente, lembrar-vos esse comportamento, não se podem livrar dele assim, Sr. Deputado, e, portanto, continuarei a fazê-lo. Aliás, vejo que isso é eficiente, pela forma como V. Ex.ª reage, dado que esta minha lembrança produz os seus efeitos e, portanto, não queira V. Ex.ª que eu desista de a utilizar, porque ela produz os efeitos desejados.
Se V. Ex.ª tiver o cuidado de ler as intervenções do Sr. Deputado José Vera Jardim - e estou convencido que, para continuar o seu papel de defensor oficioso do Sr. Ministro, vai fazê-lo - verificará que aquilo que eu hoje aqui disse insistentemente é verdade ...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não é verdade!

O Orador: - ... e não se trata de qualquer trauma, pelo contrário, foi uma atenção que tive para com o comportamento do Sr. Dr. José Vera Jardim enquanto Deputa do da oposição.
Nalguma medida, vou procurar seguir esse exemplo, porque parece que produziu os seus efeitos e não me vou preocupar em que, depois, V.V. Ex.as venham também
lembrar as actas quanto a esse meu frenesim.
Este comportamento do Sr. Dr. José Vera Jardim produziu efeitos, pois ele estava deste lado e hoje está daquele e, portanto, é um exemplo a seguir e não me peçam
para não o lembrar.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Está a ver se chega o secretário de Estado!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, muito obrigado pelas questões que me colocou. Deixe-me dizer-lhe que fico muito
satisfeito que já se apresente claramente como candidato, em próximas eleições, ao cargo de Ministro da Justiça ou de Secretário de Estado da Justiça (não sabemos é se será do Professor Marcelo Rebelo de Sousa ou se de qualquer
outro).

Risos do PS.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não há candidaturas a ministro!

O Orador: - Em relação à exibição das actas, já deu, de alguma forma, para perceber.
Ó Sr. Deputado, compreendo perfeitamente que V. Ex.ª tenha ficado muito marcado pela intervenção que o então Deputado José Vera Jardim fez nesta Câmara - e, como perceberá, não estou a fazer uma defesa oficiosa do Sr. Ministro, porque já vi que nesse aspecto o Sr. Deputado compartilha rigorosa e absolutamente dessas minhas ideias.
Quanto à falta de memória, o Sr. Deputado e o PSD não podem atacar em absolutamente em nada o PS ou o Governo. E sabe porquê? Vou dar-lhe um pequeno exemplo: há pouco acabámos de assistir a uma votação reveladora dessa falta de memória dos senhores - e não me refiro ao PCP ou ao CDS-PP, porque relativamente a essa situação têm posições absolutamente coerentes e plausíveis com aquilo que defendem. Mas o PSD acabou de demonstrar que não tem memória rigorosamente nenhuma e que deixou de ter passado, o que, de resto, é claramente demonstrado pelo facto de, inclusivamente, o Sr. Deputado Francisco Torres ter dito aqui que tinha votado por disciplina partidária. Veja bem o que é que isso significa, Sr. Deputado! Portanto, quando atacar o Governo ou o Partido Socialista de falta de memória pense sempre muito bem naquilo que o PSD tem feito nos últimos anos. Os senhores ainda há pouco tentaram «matar» o Professor Cavaco Silva. Não sei se o conseguiram assassinar, mas isso é outra questão.

Aplausos do PS.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito. Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Para defesa da honra da bancada, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Ó Sr. Deputado Guilherme Silva, já cá não está a imprensa, portanto não há honra a defender!

Risos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Com essa vossa atitude os senhores confirmam que quando falam aqui é para a imprensa. Não faço isso; falo para fazer a defesa efectiva da honra da minha bancada, independentemente da imprensa e dos assistentes, e essa é uma questão de princípio.
Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, V. Ex.ª foi muito infeliz no exemplo que aqui deu para elucidar uma eventual falta. de memória da minha bancada. E porquê? Porque o que aqui trouxe foi um exemplo da actuação contraditória e incoerente do Partido Socialista. Fez um estardalhaço acusatório, disse que o antigo governo era demasiado bom aluno em Bruxelas, que dizia a tudo que sim, mas, de repente, e em relação às coisas mais relevantes e essenciais, e desnecessariamente, quer à força pôr o Parlamento a dizer que sim a Bruxelas. Não pode ser, Sr. Deputado! Os senhores ainda não perceberam ou não querem perceber que, em relação ao compromisso feito pelo governo do Professor Cavaco Silva com Bruxelas sobre esta matéria, foi uma habilidade diplomática em defesa de Portugal o ter-se dito, numa carta que foi enviada para Bruxelas, que, depois, o novo Parlamento iria votar e resolver esse problema (como se o anterior não 0 pudesse fazer).

O Sr. Osvaldo de Castro (PS): - O senhor esta a revelar segredos de Estado!

O Orador: - Têm falta de imaginação para, com este protelamento ou outro, continuarem a defender Portugal nestas circunstâncias. É fácil de ver que o Parlamento

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anterior tinha tanta legitimidade como este para votar contra essa solução, que V.V. Ex.as, por razões que não têm a ver de certeza com a defesa do País ou do Estado português, queriam que fosse votada de uma determinada maneira, em conformidade com aquilo que servirá mais interesses estrangeiros do que portugueses.
O Sr. Deputado não pode esquecer-se que o que está em causa é um problema de reprivatização. Quando tiveram lugar as nacionalizações não são se nacionalizaram bens estrangeiros, e nos casos em que isso aconteceu foram feitas as respectivas restituições. Não faz sentido que agora essa reprivatização seja aberta indiscriminadamente aos países estrangeiros, mesmo àqueles que façam parte da Comunidade. Esta é a questão que está aqui em causa e que não tem nada a ver com os princípios gerais de circulação de capitais e de investimentos, que se colocam, sim, noutro quadro mas não neste quadro específico das reprivatizações.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, é óbvio que tenho de dar algumas explicações ao Sr. Deputado Guilherme Silva, que deve estar esquecido de alguns factos. No fundo, tudo isto tem a ver com a tal falta de memória.
O Sr. Deputado não pode esquecer-se daquilo que foi trazido à colação não hoje mas, sim, no debate de quarta-feira passada. V. Ex.ª sabe perfeitamente que o Governo do PSD assumiu compromissos e isso é que é importante. Pese embora não esteja aqui presente a comunicação social, é importante que fique registado que para os senhores os compromissos e a coerência são algo que não têm valor algum.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Isso não tem nada a ver!

O Orador: - É essa a forma que os senhores têm de fazer política e foi por causa disso que conseguiram ser tão arrogantes como foram. São valores que não existem para V.V. Ex.as! Para os senhores, os compromissos que assumiram perante a Comissão no que respeita à alteração da própria legislação - e o senhor sabe por que é que os assumiram e em que casos é que o fizeram - não têm valor nenhum. Sei que assim é, mas é importante que esta Câmara saiba que para os senhores esses compromissos não têm valor, que a coerência não significa rigorosamente nada. Isso é que é decisivo, Sr. Deputado!

O Sr. Guilherme Silva,(PSD): - Isso não tem nada a ver!

O Orador: - Agora, isso não afasta nem apaga a falta de memória de que eu os acusei, porque os senhores nunca mais vão ter legitimidade - como já não tinham no passado - para nos acusar de falta de respeito pelo nosso passado. Isso é que os senhores não têm legitimidade para fazer e é importante que isso fique aqui registado. Quando faz essas afirmações o Sr. Deputado sabe perfeitamente que esse é um argumento estafado, em que ninguém acredita. Os senhores não podem andar lá fora a dizer que nós andamos a vender o País a retalho. V. Ex.ª sabe perfeitamente que não pode dizer isso e os senhores é que são irresponsáveis nessa matéria e demonstraram-no bem aquando da última votação.
Portanto, Sr. Deputado, com o devido respeito, V. Ex.ª não defendeu a honra porque se a tivesse não podia ter dito aquilo que disse, com referência a essa parte do seu discurso.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr: Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Deputados: Não há muito para dizer sobre a proposta de lei que o Governo aqui nos trouxe e a prova disso é que os Srs. Deputados já estão quase há uma hora a falar de outras coisas.
Aliás, os termos da proposta de lei estão mais ou menos dissecados, quer no seu texto, quer na explicação que o Sr. Ministro aqui deu, quer no relatório que a 1.ª Comissão hoje mesmo aprovou, que considerou que esta proposta de lei é pacífica, que não suscita objecções e que vem resolver um problema.
O Sr. Ministro da Justiça anunciou aqui outras medidas que tenciona tomar no plano da organização judiciária para resolver problemas que, de facto, são dramáticos no funcionamento dos tribunais, iniciativas essas que naturalmente aguardamos. Consideramos também que existem situações dramáticas no funcionamento dos tribunais, algumas delas já aqui referidas. Um dos problemas que tem assumido grande dramatismo, e que tem justificado por diversas vezes a preocupação aqui manifestada pela minha bancada, é o que tem a ver com os tribunais de círculo. Já se referiram vários aspectos relacionados com o funcionamento dos tribunais, mas não resisto a contar aqui o facto de há alguns meses atrás ter encontrado um colega de curso, que é juiz no tribunal de círculo do Barreiro, que me disse que, para além da falta de outras medidas que consigam desbloquear o seu funcionamento, aquele tribunal decidiu tomar uma medida e que foi a de comprar um carimbo que diz «não é engano». E porquê? Porque quando as pessoas viam julgamentos marcados para 1988 iam à secretaria, porque julgavam que havia ali um engano. Portanto, o tribunal teve de comprar um carimbo a dizer «não é engano» para que as pessoas acreditassem que, de facto, aquele julgamento estava mesmo marcado para 1988. De facto, há problemas dramáticos, como este e outros que foram aqui referidos, que têm de ser resolvidos.
Aguardarmos, portanto, que as medidas aqui anunciadas pelo Sr. Ministro da Justiça sejam, de facto, tomadas rapidamente para que estas situações não se arrastem e porque uma justiça que não é célere acaba, efectivamente, por não o ser.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: -- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, não quero fazer propriamente uma intervenção, mas tão só dar um esclarecimento ao Sr. Deputado Guilherme Silva, na medida em que já não tenho outra ocasião para poder responder à questão que aqui colocou.
Como sabe, Sr. Deputado, os juízes auxiliares até agora têm sido pagos através do Gabinete de Gestão Finan-

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cerra do Ministério da Justiça, contrariamente às magistraturas efectivas, que são pagas pelo Ministério das Finanças. Com este diploma, e tornando-se lugares de efectivo aqueles que vagam com a nomeação de um juiz auxiliar, esse lugar de efectivo passará naturalmente a entrar nas responsabilidades do Ministério das Finanças e, por isso mesmo, é que está no diploma que teria de ser feito com a concordância do Sr. Ministro das Finanças.
Quanto à frase, de facto o Ministério da Justiça entende que de direito todos os magistrados deveriam ser pagos pelo Orçamento do Estado. Não é isso que acontece hoje, mas esperamos que passe a ser.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminado o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 34/VII, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 15 horas. Além de um período de antes da ordem do dia, da ordem do dia consta a discussão conjunta dos projectos de lei n.ºs 133 e 93/VII e ainda dos projectos de lei n.ºs 155, 156 e 157/VII e do projecto de resolução n.º 23/VII.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 20 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas à votação, na especialidade, do projecto de lei n.º 151/VII.

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista votou favoravelmente o projecto de lei n.º 151/VII pelas seguintes razões:
Impunha-se revogar a legislação em vigor, alterando a Lei-Quadro das Privatizações, de forma a compatibilizá-la com o direito comunitário.
A situação que se verificava, aparentemente protegendo interesses portugueses, abria o caminho à utilização de «testas de ferro» veiculando interesses nem sempre recomendáveis.
Os grupos económicos europeus sólidos preferem intervir com quadros legais claros; os interesses pouco recomendáveis preferem as deliberações arbitrárias e casuísticas. Os políticos oportunistas protegem estes últimos e erguem abandeira pseudo-nacionalista contra aqueles.
Daí que este projecto de lei resolvesse com seriedade o problema da compatibilizaçãoentre a legislação portuguesa e o direito comunitário.
Encontra-se o Estado português em relação à União Europeia numa situação que justificou a evolução para uma situação de pré-contencioso.
Para evitar o agravamento da situação de conflito existente, o anterior Governo, algumas semanas antes das eleições legislativas, solicitou que fosse sustida a apreciação do processo em causa de forma a que a nova Assembleia da República e o Governo resultantes do sufrágio de 1 de Outubro de 1995 tivessem a oportunidade de se pronunciarem sobre as medidas a adoptar.
Ou seja, o anterior Governo tomou uma atitude que poderia ser uma manobra dilatória ou o caminho para uma cambalhota oportunista que veio a dar o PSD, base numericamente mais significativa da perversa aliança que se formou conjunturalmente no Plenário.
O PS não poderia tomar outra atitude que não fosse a da defesa condigna das suas atitudes de coerência europeia e de firmeza na fidelidade à transparência das regras de mercado.
Tendo o Plenário da Assembleia rejeitado a ratificação do Decreto-Lei n.º 24/96, o Grupo Parlamentar Socialista apresentou imediatamente um projecto de lei, visando a resolução da mesma questão. A apresentação deste projecto de lei n.º 151/VII era, aliás, coerente com a defesa do Decreto-Lei n.º 24/96.
Alguns argumentaram, na altura, que estariam contra por ser uma competência reservada da Assembleia da República legislar nesta matéria. Demos-lhes a oportunidade de corrigirem a sua atitude, apresentando um projecto de lei. Uns mudaram de argumentação, retomando estafados argumentos «chauvinistas»; outros refugiaram-se atrás de declarações de voto que recobrem a obediência à disciplina partidária mesmo contra o que consideramos o interesse político e económico nacional.
O PS manteve uma posição clara e coerente. Outros terão que explicar melhor as suas atitudes.
«A situação existente é inaceitável e violadora dos compromissos assumidos por Portugal aquando da adesão às Comunidades». Por isso propunha o Provedor de Justiça, em Junho de 95, em recomendação enviada ao anterior Ministro das Finanças «a revogação de todas as normas, constantes dos diversos diplomas existentes».
Os Deputados socialistas mantêm-se firmes no seu apoio a um programa de privatizações coerente com o modelo económico e social que preconizam e na adopção séria das regras que Portugal aceitou no âmbito da sua integração na União Europeia.
A reforma da Administração Pública, a modernização urgente do aparelho produtivo nacional têm que ser prosseguidos com seriedade, no respeito pelo projecto europeu e pelos acordos e compromissos existentes.
A votação favorável dos Deputados socialistas exprime também esse conjunto de atitudes.

Os Deputados do PS, Joel Hasse Ferreira - José Leitão - Francisco Valente - Henrique Neto - João Carlos da Silva - Laurentino Dias.

Sendo favorável à necessidade (e estando de acordo quanto à bondade) de respeito pela legislação comunitária em matéria de privatizações, porque penso que é isso que é melhor para o País por razões de transparência e eficiência, mas tendo votado contra o projecto de lei n.º 151/VII, na especialidade, com o Grupo Parlamentar do PSD, esclareço que o fiz apenas por razões de disciplina partidária.

Os Deputados do PSD, Francisco Torres - Lalanda Gonçalves.

Votámos contra o projecto de lei n.º 151/VII na medida em que os princípios comunitários relevantes para a matéria em causa podem ser respeitados sem que se empreenda a modificação legislativa pretendida pelo PS. Basta, para tanto, que nos diplomas correspondentes a cada privatização o Governo não utilize a faculdade concedida pela Lei n.º 11/90, isto é, não limite a participação de

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capitais oriundos de entidades residentes na União Europeia.
Sendo assim, a iniciativa legislativa em referência representa um excesso de zelo injustificável.

Os Deputados do CDS-PP, António Lobo Xavier - António Galvão Lucas.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Eduardo Ribeiro Pereira.
Filipe Mesquita Vital.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Vital Martins Moreira.

Partido Social-Democrata (PSD):

Antonino da Silva Antunes.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
José Macário Custódio Correia.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido Comunista Português (PCP):

Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António José Gavino Paixão.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Mário Manuel Videira Lopes.

Partido Social-Democrata (PSD):

Carlos Alberto Pinto.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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DIÁRIO da Assembleia da República

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