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Sexta-feira, 14 de Junho de 1996 I Série - Número 82

DIÁRIO da ASSEMBLEI da REPÚBLICA

VII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1995-1996)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 12 DE JUNHO DE 1996

Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Exmos. Srs.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação das propostas de lei n.os 39 a 43/VII e dos projectos de deliberação n.os 15 e l6/Vll, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Foi aprovado o voto n.º 29/VII - De saudação e congratulação pela passagem do septuagésimo aniversário da Ordem dos Advogados (PSD), ao qual o Sr. Presidente se associou, em nome da Mesa e da Câmara, tendo o Sr. Deputado Francisco Martins (PSD) produzido uma intervenção.
O projecto de deliberação n.º 16/Vll - Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República (Presidente da AR, PS, PSD, CDS-PP, PCP e Os Verdes) foi igualmente aprovado.
A Câmara aprovou ainda diversos pareceres autorizando vários Deputados a deporem em tribunal e denegando autorização a um outro.
Em declaração política, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira (PS) condenou a actuação do PSD, como maior partido da oposição, tendo, no final, respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Sá (PCP), Carlos Encarnação (PSD), Silva Carvalho (CDS-PP) e Manuela Ferreira Leite (PSD) e dado explicações a esta Sr.ª Deputada e ao Sr. Deputado João Amaral (PCP).

Ordem do dia. - O projecto de lei n.ºl33/VII - Garante o direito à igualdade de tratamento no trabalho e no emprego (PCP) foi discutido na generalidade, tendo-se pronunciado, a diverso título, além da Sr.ª Deputada Luísa Mesquita (PCP), que procedeu à sua apresentação, os Srs. Deputados Maria Eduarda Azevedo (PSD). Helena Roseta (PS), José Costa Pereira (PSD), Isabel Castro (Os Verdes), Victor Moura (PS), Pedro Vinha da Costa (PSD) e Ismael Pimentel (CDS-PP).
Foi igualmente apreciado, na generalidade, o projecto de lei n.º 93/VII-Alteração à Lei n.º 108/91, de 17 de Agosto (Conselho Económico e Social). Fizeram intervenções os Srs. Deputados Eduarda Azevedo (PSD), Ismael Pimentel (CDS-PP). Joel Hasse Ferreira (PS). Lino de Carvalho (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes).
Procedeu-se ao debate conjunto, na generalidade, dos projectos de lei n.os 155/VII - Associações de família (PS), 156/VII - Lei das associações de família (PSD), 157/VII - Apoio à maternidade em famílias carenciadas (PSD), 163/Vll - Reforça os direitos das associações de mulheres (PCP), l69/VII - Acompanhamento familiar de deficientes hospitalizados (Os Verdes) e 171/VII - Altera a Lei n.º 4/84, de 5 de Abril (Protecção da maternidade e da paternidade) (CDS-PP) e dos projectos de resolução n.os 23/VI1 - Instituição do cartão família (PS) e 24/VII - Política global de família (CDS-PP). Intervieram, a diverso título, as Sr."' Deputadas Maria do Rosário Carneiro (PS) e Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), o Sr. Deputado Pedro Vinha da Costa (PSD) e as Sr.ªs Deputadas Filomena Bordalo (PS), Maria Luísa Ferreira (PSD), Isabel Castro (Os Verdes), Luísa Mesquita (PCP) e Helena Roseta (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 e 45 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e.15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Filipe Mesquita Vital.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Soares Palmeiro Novo.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Lacado Costa.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Pinto Simões.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.

iguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Raúl d' Assunção Pimenta Rego.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Humberto Rocha de Avila.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.

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João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Povoas.
José de Almeida Cesário .
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Manuel Fernando dá Silva Monteiro.
Manuel Maria Mendonça da Silva Carvalho.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Maria Manuela Guedes Outeiro Pereira Moniz.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Paulo Sacadura Cabral Portas.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: propostas de lei n.os 39/VII - Estabelece critérios relativos à atribuição de verbas destinadas a certas entidades provenientes da exploração do totobola; que baixou às 5.ª, 7.ª e 8.ª Comissões, 40/VII - Altera o regime jurídico relativo à distribuição das receitas do totobola, passando a promoção e o desenvolvimento do futebol a receber a sua totalidade, sendo que 50 % desta verba é afectada ao pagamento das dívidas referentes a impostos e contribuições para a Segurança Social contraídas pelos clubes até 31 de Maio de 1996; que baixou às 1.ª, 6.ª e 11.ª Comissões, 41/V1I Altera os Estatutos da Santa Casa da Misericórdia, que baixou à 8.ª Comissão, 42/VH - Altera a legislação que regula os processos especiais de recuperação da empresa e da falência, que baixou à 1.ª Comissão e 43/VII - Estabelece o regime jurídico do contrato individual de trabalho a bordo das embarcações de pesca, que baixou à 8.ª Comissão; projectos de deliberação n.os 15/VH - Debate parlamentar sobre o ambiente (Os Verdes) e 16/VH Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República (Presidente da AR, PS, PSD, CDS-PP, PCP e Os Verdes).
Foram apresentados na Mesa, na última reunião plenária, os seguintes requerimentos: à Secretaria de Estado da Inserção Social, formulado pelo Sr. Deputado Afonso Candal; aos Ministérios do Ambiente e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelos Srs. Deputados Antão Ramos, Luís Veríssimo, Arnaldo Homem Rebelo e Jorge Ferreira; à Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, aos Ministérios das Finanças e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; à Secretaria de Estado das Obras Públicas e ao Ministério da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Carlos Marta; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho, e ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Mendes Bota.
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Macário Correia, na sessão de 15 de Março; Lino de Carvalho, na sessão de 3 de Abril, e Isabel Castro, na sessão de 23 de Maio.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, com a vossa concordância, poderíamos, desde já, resolver dois assuntos que consideramos prioritários. Em primeiro lugar, refiro que temos a honra de ter na nossa companhia muitos ilustres representantes da classe dos advogados, incluindo o Sr. Bastonário e membro, da Direcção da respectiva Ordem.
Em segundo lugar, o PSD apresentou um voto - o n.º 29/VH - De saudação e congratulação pela passagem do septuagésimo aniversário da Ordem dos Advogados.

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Se estiverem de acordo, darei a palavra a quem a pedir, por um período de 3 minutos, findo o que procederíamos de imediato à respectiva votação.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para interpelar a Mesa no seguinte sentido: o Sr. Deputado Francisco José Martins, que é um dos subscritores do voto e seu principal redactor, tinha preparada uma intervenção sobre este assunto para fazer no período de antes da ordem do dia em tempo do PSD, mas que excede os 3 minutos. Se V. Ex.ª lhe der a palavra de imediato, consumindo o tempo do meu Grupo Parlamentar, ele apresentaria o voto, excedendo porém os 3 minutos.

O Sr. Presidente: - Excede em muito tempo ou em pouco?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Um pouco mais do que os 3 minutos, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Se isso significa uma economia de tempo, tem, então, a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: No dia 24 de Outubro de 1254, nasceu em Teguier, na Bretanha, Yves Helory de Kemartin, filho dos senhores de Kemartin da pequena aristocracia local. Com catorze anos, foi para Paris, estudou na Sorbonne, onde teve por mestre São Tomás de Aquino. Magistrado e advogado, Yves de Kemartin veio ainda no século XIV - por iniciativa dos estudantes da Sorbonne, com quem indistintamente partilhou a casa, o pão e o saber - a ser proclamado santo. Pouco mais se conhece da vida de Yves Helory de Kemartin. Sabe-se contudo que, no século XIII, para além do exercício da magistratura num tribunal eclesiástico (função naqueles tempos ainda não incompatível com a defesa e representação judiciárias), privilegiou a defesa dos pobres e dos desamparados, a muitos salvando da forca e do degredo, tudo fazendo com paixão, total desapego a bens materiais, unicamente pela vontade e pelo desejo de exercitar as virtudes cristãs da ajuda e do amor ao próximo.
Foram certamente estas qualidades que elevaram Yves Helory de Kemartin aos altares e que, seis séculos mais tarde, fizeram com que os advogados portugueses - revendo-se nelas - o invocassem como seu patrono. Consagrado 0 19 de Maio como Dia do Santo .e do Advogado, a Ordem dos Advogados comemora também, neste ano e hoje mesmo, 12 de Junho, o septuagésimo aniversário da publicação do Decreto n.º 11.715 que, subscrito pelo então Ministro da Justiça, Professor Doutor Manuel Rodrigues, a criou.
A Ordem dos Advogados - é bom lembrá-lo, à luz do respectivo Estatuto - exerce funções públicas, a ela especialmente devolvidas pelo Estado, no convencimento esclarecido de que a regulamentação da advocacia e do seu exercício é mais eficaz quando organizada, dentro de parâmetros previamente definidos, pelos seus próprios membros.
Mas se aquele 19 de Maio e este 12 de Junho são para os advogados dias de festa e de alegria, constituem também momentos de reflexão sobre os problemas que o exercício da advocacia suscita e sobre os desafios que, no presente e no futuro, se lhes colocam. A massificação da advocacia, a segurança social e a formação profissional, o acesso ao direito e aos tribunais, o funcionamento dos tribunais, o sigilo profissional, a cobertura dos riscos profissionais, a defesa do Estado de Direito, dos direitos e garantias individuais e a proliferação da procuradoria ilícita são questões que preocupam os advogados e às quais eles têm que dar as respostas adequadas.
Estão hoje inscritos na Ordem dos Advogados cerca de 15 mil advogados - o que significa um acréscimo de 50 % nos últimos cinco anos - distribuídos pelos Distritos Forenses de Lisboa, com cerca de metade do total, do Porto, de Coimbra, de Évora, de Faro, da Madeira e dos Açores. Desses IS mil advogados, 65 % são do sexo masculino, muito embora se note, desde o início dos anos 90, uma tendência crescente para o aumento da componente feminina que não passava então dos 25 %.
A massificação da advocacia - resultante da proliferação de universidades - impõe um maior controle deontológico e técnico. Deseja-se que os advogados conheçam e apliquem, com transparente correcção e lealdade, as regras próprias da profissão e que sejam cada vez mais competentes, conhecedores e esclarecidos. Têm por isso dado prioridade à formação profissional. Foi reorganizado o estágio. Foram criados os cursos de formação. Multiplicaram-se os seminários sobre temas de actualidade jurídica e as conferências no âmbito da formação permanente para valorização e actualização. Pretende-se aumentar a dignidade e o rigor dos testes e das provas de agregação que o advogado estagiário tem de cumprir para ser inscrito como advogado. No campo da segurança social, a dignidade e a saúde dos advogados exige um sistema mais eficaz. Foram aumentadas as pensões de reforma, alargados os benefícios prestados pela Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores no campo da assistência médica, com postos próprios em Lisboa, Porto e Coimbra. Os advogados podem hoje beneficiar do regime geral da segurança social. Mas não chega. Também aqui o Estado terá de intervir, contribuindo para a melhoria daquelas prestações, apoiando o sistema e eliminando as dificuldades existentes.
O acesso ao direito e aos tribunais, direito fundamental dos cidadãos, deve ser, como tal, facultado a todos, mesmo àqueles que o não podem pagar. O Estado tem de assegurar a consulta jurídica e a representação profissional dos economicamente mais débeis, mas deve suportar os seus custos sem colocar nos ombros dos advogados o peso dos mesmos. Impõe-se em ambos os casos, a reorganização e a actualizarão das tabelas de remuneração e o imediato pagamento dos serviços prestados, em obediência ao princípio constitucional que prevê «igual remuneração para igual trabalho», e para concretização do direito do cidadão a escolher o seu próprio advogado.
Causam preocupação as difíceis condições de funcionamento dos tribunais. O número de processos adstritos a cada magistrado - mais de dois mil no Tribunal Cível de Lisboa - ultrapassa em muito o admissível. Exigem-se a magistrados e funcionários esforços acima das suas possibilidades em termos susceptíveis de afectar a boa administração da justiça. O parque judiciário - mau grado alguns esforços que têm vindo a ser feitos - é ainda insuficiente e está mal dimensionado. Cabe ao Estado promover com urgência - e como nos prometeu o Sr. Ministro da Justiça na sessão da tomada de posse dos membros dos actuais órgãos da Ordem dos Advogados as actuações necessárias para ultrapassar essas dificuldades e criar as condições adequadas para que os tribunais, possam administrar a justiça de uma forma digna e célere.

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O sigilo profissional é o fundamento último do exercício da advocacia. O cidadão que recorre ao advogado - e que, como a um sacerdote, a ele se confessa - tem de sentir que lhe está garantido o secretismo da consulta. Apenas nos estreitos parâmetros da lei (dos quais a Ordem dos Advogados deve ser a única guardiã) e apenas no interesse do cliente, deve ser facultada ao advogado a possibilidade de - se ele assim o entender - revelar as informações de que por força da profissão teve conhecimento. Não deveria, por isso, ser permitido aos tribunais - ainda que de órgãos de soberania se trate - determinar e mesmo impor ao advogado, como hoje ainda acontece face ao estabelecido no artigo 135.º do Código de Processo Penal, a dispensa e a quebra desse sigilo. Felizmente que, neste campo, podem os cidadãos ficar descansados pois os advogados - que já têm os seus mártires - têm sido incansáveis defensores desse princípio basilar da profissão.
O exercício da advocacia envolve, como quase tudo na vida, riscos de que os cidadãos devem ser protegidos. A cobertura dos riscos profissionais, ou seja, a responsabilidade civil por danos provocados no exercício da profissão deve ser prevista e salvaguardada pelos próprios advogados. Muitos contrataram já o respectivo seguro. Contudo, os prémios elevados, a exiguidade do capital seguro admitido pelas seguradoras e as exigências que estas têm vindo a fazer quanto à idade e experiência profissional dos segurados, tornam difícil, por vezes impossível, a sua contratação. A Ordem dos Advogados tudo tem feito - e talvez em breve o sonho seja possível - para assumir ela própria esses riscos, tornando os advogados auto-suficientes e reforçando a credibilidade dos serviços que prestam.
Aos advogados compete também a defesa do Estado de Direito, dos direitos e das garantias individuais. Nessa defesa tem sido, ao longo dos seus 70 anos, intransigível a Ordem dos Advogados. Foi-o nos Tribunais Plenários do Estado Novo e continua a sê-lo em todos os tribunais. Não podem por isso os advogados descansar enquanto a lei estabelecer a possibilidade de os arguidos, ainda que em circunstâncias excepcionais, serem aconselhados e defendidos por um qualquer defensor que não seja advogado, e muito menos que esse defensor possa ser - como tantas e tantas vezes acontece um funcionário da secretaria do tribunal onde corre o processo. A defesa do arguido, em processo penal, merece maior e melhor respeito do que lhe é conferido pelo artigo 32.º da Constituição da República - cuja alteração os advogados reclamam anseio que encontra eco em propostas de revisão constitucional já apresentadas por algumas forças partidárias.
Finalmente, a proliferação da procuradoria ilícita através de curiosos e de sociedades que oferecem serviços que só os advogados - e os solicitadores, no âmbito do seu estatuto próprio estão aptos a prestar, constitui um perigo para os direitos dos cidadãos. Na verdade, empresas de «cobranças difíceis» têm escondido autênticas associações para a prática de crimes. Cidadãos vêem os seus direitos frustrados pela intervenção de pessoas sem conhecimentos técnicos e sem vínculo a qualquer responsabilidade ou referência ética.
Também a abertura à Europa trouxe para os advogados dificuldades, esperanças e exigências específicas. Os advogados portugueses têm vindo a adaptar-se aos novos princípios da livre circulação de pessoas e bens e da livre prestação de serviços e de estabelecimento. A Ordem dos Advogados é membro do CCBE (Conselho das Ordens de Advogados da Comunidade Europeia) - do qual foi Presidente até há pouco o advogado José Manuel Coelho Ribeiro - cuja organização integra delegações dos 15 Estados membros da União Europeia e constitui o vínculo entre as Ordens dos Advogados nacionais e entre estas e as instituições da União Europeia. A globalização da economia, o desenvolvimento das comunicações e a consciencialização dos consumidores confrontam hoje os advogados com um conjunto de problemas em cuja solução o CCBE se encontra empenhado. Por um lado, a formação do advogado, quer a universitária quer a pós universitária, tem de ser mais intensa - para possibilitar a prestação de melhores serviços e responder à concorrência de outras profissões; e homogénea - para lograr a integração dos advogados europeus. As regras deontológicas têm de ser uniformizadas pela adopção comum do Código Deontológico da Advocacia Europeia, aprovado pelo CCBE em 1988 e pela Ordem dos Advogados em 1989.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que condense o seu pensamento. Acabou por fazer uma intervenção longa. Já atingiu 10 minutos, Sr. Deputado!

O Orador: - Quer ao nível nacional, quer no plano europeu, os advogados dão especial ênfase à forma como a profissão deve ser exercida. Como disse, e bem, o advogado Ramón Mullerat, actual Presidente do CCBE, em recente intervenção na Ordem dos Advogados, «a ética é o bem mais precioso do advogado»!
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Os 70 anos da Ordem dos Advogados, que hoje se comemoram, estão repletos de escolhos e de glórias. Vultos tão diversos como Pedro Pitta, Bustorff Silva, Acácio Gouveia, Azeredo Perdigão, Abel de Andrade, Adelino da Palma Carlos e Francisco Sá Carneiro - que já partiram deixando-nos mais pobres -, para além de tantos outros, são marcos perenes da advocacia e da defesa dos direitos e das liberdades da pessoa humana.
Também os advogados prestaram o seu tributo à política: Jorge Sampaio, que é hoje a primeira figura do Estado mas com quem tive, ao longo de tantos anos, o privilégio de trabalhar; António Almeida Santos, actual Presidente desta Assembleia; Fernando Amaral, que já o foi; Ângelo Almeida Ribeiro, que foi Provedor de Justiça; Mário Raposo, antigo Ministro da Justiça - são figuras que, entre outras, com o seu exemplo e dedicação honram a advocacia e a democracia, e que esta Casa jamais esquecerá.
A administração da justiça - fim último do Estado que, em nome do Povo, a Lei Primeira comete aos tribunais, apenas pode ter realização plena através da intervenção dos advogados, aos quais compete a defesa da liberdade, da honra e da fazenda dos cidadãos, bem como da sua Ordem. Na palavra de outro advogado ilustre, Vera Jardim, hoje Ministro da Justiça, «sem advocacia livre e dignificada não há justiça digna desse nome». E, como também já foi dito: «Aqui está! Os advogados não param! O seu espírito humanista campeará e reforçará a luta na defesa dos direitos do Homem. Sempre com o espírito de missão, sem outro objectivo que não seja o altruísmo que é apanágio da profissão».

O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente, em 30 segundos, se me é permitido, com a sua bondade!

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Estão, pois, os advogados e a sua Ordem hoje duplamente de parabéns: pelo papel activo que desempenham na sociedade civil e pela passagem do seu septuagésimo aniversário. Permito-me por isso felicitar, neste momento e desta Tribuna, a Ordem dos Advogados na pessoa do seu Bastonário, Dr. Júlio de Castro Caldas, do Presidente do seu Conselho Superior, Dr. Guilherme da Palma Carlos, e do Presidente do seu Conselho Distrital de Lisboa, Dr. Soares Machado, que nesta sessão nos honram com a sua presença.
Sendo Deputado por eleição mas advogado por vocação, não quero deixar de manifestar desde já o meu apoio e o do meu partido ao voto de congratulação e de saudação à Ordem dos Advogados, proposto pelo PSD e já apresentado na Mesa desta Assembleia, de que eu próprio sou subscritor, na certeza de que - tal como até agora a Ordem dos Advogados continuará a ser um dos garantes da liberdade e da justiça, valores nobres em democracia que encontram total expressão nesta Assembleia da República.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Dado que não há mais pedidos de palavra, a Mesa e o seu Presidente desejam associar-se ao júbilo natural pela passagem do 70.º aniversário da Ordem dos Advogados, que é a Ordem da profissão que foi a minha paixão durante muitos anos. Depois, passeia estar emprestado à política por uma épocas e sou capaz de não regressar mais à origem, mas continuo a ter da profissão da advocacia a ideia que não se pode deixar de ter: a de que é uma profissão de inteligência, de generosidade, de abnegação, uma profissão que honra quem a exerce.
Quero saudar todos os membros da Ordem dos Advogados aqui presentes e advogados que honram a profissão, a começar pelo seu Bastonário, Dr. Castro Caldas.
Se todos concordarem, passaremos de imediato à votação deste voto, ficando aqui a nossa saudação, que é de todos os Deputados desta Assembleia, revelando o seu apreço pela Ordem dos Advogados e por aqueles que exercem esta profissão.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Voto n.º 29/VII

De saudação e congratulação pela passagem do septuagésimo
aniversário da Ordem dos Advogados

Considerando que se completam hoje setenta anos sobre a publicação do Decreto n.º 11 715, que institui a Ordem dos Advogados;
Considerando que o dia 19 de Maio, recentemente passado, é comemorado como o Dia Nacional do Advogado;
Considerando que a Ordem dos Advogados pugna, como sempre pugnou, pela defesa do Estado de Direito, pela liberdade, pela justiça e pela democracia, muitas vezes com sacrifício pessoal dos seus membros quer durante o Estado Novo quer após o restabelecimento da ordem democrática;
Considerando que a Ordem dos Advogados é detentora da Ordem da Liberdade;
Considerando que os advogados lutam, como sempre lutaram, pela defesa dos direitos individuais e pelas garantias de liberdade da pessoa humana e pela boa administração da justiça, quantas vezes com prejuízo da sua própria liberdade, honra e fazenda;
Considerando que a Ordem dos Advogados, os advogados e a advocacia livre são pilares indispensáveis para a realização de uma justiça digna desse nome e própria do Estado de Direito;
Propomos que seja aprovado um voto de saudação à Ordem dos Advogados pela passagem do seu septuagésimo aniversário e de congratulação pelo papel que tem desempenhado na defesa intransigente da liberdade, da justiça e dos valores da democracia.

Sr. Presidente da Ordem dos Advogados, considere-se desde já notificado desta votação, que muito nos honra.

Aplausos gerais, de pé.

Caso também haja concordância, vamos votar de imediato o projecto de deliberação n.º 16/VII - Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República (Presidente da AR, PS, PSD, CDS-PP, PCP e Os Verdes).

Pausa.

Srs. Deputados, vamos proceder à respectiva votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário da Mesa vai dar conta de pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, de acordo com o solicitado no ofício n.º 791, de 96.12.24, da Procurador-Geral da República (processo n.º 247/95, LH8), enviado à Assembleia da República, esta Comissão decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Paulo Portas a prestar declarações no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Dado que não há pedidos de palavra, vamos passar à respectiva votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - De acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto, processo comum n.º 805/95, 3 º Juízo, 3.ª Secção, (ofício n.º 1453, de 96.03.19), enviado à Assembleia da República, esta Comissão decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Saraiva a prestar depoimento na qualidade de testemunha no âmbito dos autos em referência, em data a designar pelo tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Dado que não há pedidos de palavra, vamos passar à respectiva votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Cabrita Neto a depor (por escrito, querendo,) na qualidade de testemunha no processo n.º 128-D/CP que corre seus termos no Tribunal Judicial de Albufeira.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

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Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias emitiu parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Elisa Damião a depor (por escrito, querendo) na qualidade de testemunha no processo n.º 40 180/90.0 TD LSB 2.º Juízo, que corre seus termos no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa

Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade. .

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias emitiu ainda parecer no sentido de não autorizar o Sr. Deputado Joaquim Sarmento a ser ouvido como arguido no processo n.º 906/94-MP que corre seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lamego.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos o prazer de ter na nossa companhia um grupo de 50 alunos da Escola C+S de Olival, um outro grupo de 50 alunos da Escola n.º 3 da Amora-Seixal e um grupo de 60 alunos da Escola Secundária da Maia.

Aplausos gerais, de pé.

Tem a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista recebeu nas eleições de 1 de Outubro passado um claro mandato dos eleitores para governar Portugal. Formou-se uma nova maioria suficiente e necessária para desalojar o Governo de Cavaco Silva da altura estonteante onde se encontrava.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Estonteante?!

O Orador: - O novo Governo, presidido por António Guterres, tomou posse algumas semanas mais tarde e apresentou-se perante esta Assembleia. Nenhuma força aqui representada avançou com qualquer moção de rejeição.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Apenas o Deputado Mota Amaral, ao tomar a palavra em nome da sua bancada na discussão do programa do Governo, em 10 de Novembro, teorizou sobre a estratégia do PSD ao afirmar convicto e por escrito que: «se, no decorrer da legislatura, verificar que não pôde cumprir as promessas feitas pelo PS e mantidas agora no seu programa, o Governo terá de vir ao Parlamento propor uma moção de confiança ou, então, o PSD avançará com uma moção de censura!», como se lê no Diário da Assembleia da República. Esse lance político mereceu os «Aplausos do PSD.».

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Já foi há muito tempo!

O Orador: - Não foi!
Acontece que o Governo de António Guterres logo começou a cumprir o seu Programa perante o mal-estar crescente das oposições. O Orçamento do Estado foi aprovado inclusive com os votos favoráveis da maioria dos Deputados insulares do PSD.
Quando o Grupo Parlamentar do PS apresentou e agendou os seus projectos de lei sobre a regionalização, a recém-eleita direcção do PSD recorreu ao gesto teatral do abandono do hemiciclo no dia 2 de Maio quando se procedeu à votação. Acto extremo! Seguiu-se a dramatização sobre os perigos que o País corria caso se cumprisse um preceito da Constituição que resistira, por unanimidade, a três revisões constitucionais. Percebeu-se que o PSD tinha medo de se pronunciar sobre a regionalização e por isso começou a protelar o processo.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Exactamente!

O Orador: - Parece que esta madrugada «o seu líder sem sono» terá cedido aos mínimos do bom senso e abriu uma porta que ainda não se sabe onde levará. Adiar e ganhar tempo para depois ceder, como até agora, não o levará muito longe. E deste modo se chegou à obstrução da Comissão Eventual para a Revisão da Constituição, a cujas duas primeiras sessões não assistiram os Deputados do PSD, que tudo fizeram depender dos referendos sobre a regionalização. A Comissão Eventual para a Revisão da Constituição realizou até hoje oito reuniões sem que o PSD tivesse apresentado até ao momento qualquer proposta de alteração do Regimento ou sobre a boa condução dos trabalhos. Como declararam na reunião do passado dia 4, entendem, passado um mês sobre o início dos trabalhos da Comissão que o processo de revisão constitucional não está atrasado! De facto, o processo de revisão não está atrasado, somente ainda não principiou propriamente.
Não cuido agora da necessidade de se acelerar ou não os trabalhos de revisão, mas chamo a atenção da Câmara, para a diferença de comportamentos do PSD e do PS na história das revisões da Lei Fundamental: já se operaram três revisões, em 1982, em 1989 e em 1992, sempre com o PSD no Governo e o PS na oposição. O PS, por entendimento altruísta dos superiores interesses do regime democrático e da sociedade portuguesa, sempre ofereceu ao PSD a oportunidade de governar em paz enquanto se elaboravam as leis de revisão. Por uma vez que o PSD está na oposição este faz sentir ao PS que só colabora quando tira proveito partidário. Quando o PSD está no Governo tudo é interesse nacional. Quando está na oposição, nunca o encontra! Mau sinal para o futuro.

Aplausos do PS.

Mesmo no que diz respeito às maiorias circunstanciais que se formam nesta Assembleia da República com os partidos das extremidades do leque político, o PSD só se escandaliza por demagogia tacticista: achou horroroso o PS

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votar em conjunto com o PCP os projectos de regionalização e anatemizou a postura do PP na votação do Orçamento do Estado mas não se rala nada de votar com os partidos do isolacionismo nacionalista, o PCP e o PP, contra a alteração da Lei das Privatizações só para impedir o governo da nova maioria de se dotar de um instrumento mobilizador do mercado financeiro e assim realizar mais receitas públicas durante as próximas privatizações. Não o choca sequer colocar o Estado português numa situação difícil perante os seus compromissos internacionais, assinados, aliás, por altos responsáveis passados e futuros do PSD.

Risos do PS.

A propósito, não quererá o Professor Cavaco Silva ilustrar-nos agora com a sua douta opinião sobre o escárneo da bancada do PSD às posições tomadas pelo seu Governo em 7 de Setembro último sobre esta matéria? Será que se reconhece na «força de bloqueio» em que o seu partido se compraz nesta Assembleia da República?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - O PSD empurra, na oposição, o Estado português para um litígio com a comunidade europeia, sabendo de antemão que as transgressões aos Tratados já estão elencadas e reconhecidas pelas partes. Com efeito, e como já aqui foi referido pelo Deputado Joel Hasse Ferreira, mas não é demais repetir, o Secretário de Estado das Finanças do último Governo de Cavaco Silva, Esteves de Carvalho, aflito com um parecer fundamentado da Comissão Europeia, datado de 29 de Maio de 1995, respondeu a esta a 7 de Setembro pedindo-lhes tréguas até às eleições de 1 de Outubro com o sentido premonitório que já fizera Cavaco Silva não se candidatar de novo a Primeiro Ministro!
Tal Primeiro-Ministro, tal Secretário de Estado! Quem viesse a seguir que se danasse com as questões pendentes. Esse alto sentido das responsabilidades há-de ficar gravado nos anais das nossas vidas paralelas contemporâneas. O voto anti-europeu do PSD dá a medida do que este partido é capaz na oposição. É facto que o PSD não perdeu apenas as legislativas, também sucumbiu nas presidenciais, onde finalmente apresentou um candidato próprio após 15 anos de abstinência. Mas nem assim entendeu que o novo ciclo político exige uma verdadeira mudança na direcção dos destinos da República. Pelo contrário, debate-se na oposição como um peixe fora de água só pensando em regressar rapidamente às águas de «S. Bento de Cima».
Mas é óbvio que não sabe lá chegar em segurança. Tanto se agita na obstrução à acção governativa como recua nos meios constitucionais à sua disposição. O PSD não sabe ainda comportar-se como o maior partido da oposição, nem sequer nas questões europeias. Estes últimos meses são a prova dessa falta de sentido do que deve ser uma oposição durável: há demasiados agastamentos, uma tendência para a política da cadeira vazia, para o protesto estridente, para a obstrução da actividade parlamentar e governamental que tornam legítima a pergunta: o PSD não quererá apresentar uma moção de censura, como foi aqui avançado pelo Deputado Mota Amaral, ao Governo?

Vozes do PS: - Queriam!

O Orador: - Sempre era mais clarificador e obrigava cada um a responsabilizar-se pelos seus actos.
O drama da oposição reside aqui: está a perder substância política e só sabe jogar para o empate!

Aplausos do PS:

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Medeiros Ferreira, os Srs. Deputados Luís Sá, Silva Carvalho, Carlos Encarnação e Manuela Ferreira Leite.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, esperaria naturalmente da craveira intelectual que é reconhecida a V. Ex.ª que num momento tão importante para o país trouxesse aqui questões verdadeiramente importantes, questões que têm a ver com o futuro do País. Porém, em vez disso, referiu factos que neste momento já estão desactualizados e fez referências a partidos em termos que, francamente, não esperaríamos da parte de V. Ex.ª.
Por exemplo, recusamos` de todo em todo que sejam referidos partidos políticos como partidos das extremidades do leque político porque é francamente de mau gosto e obrigaria, naturalmente, a qualificar o PS e o PSD como os partidos do centro do leque político, tirando daí as ilações devidas, designadamente a respeito de um conjunto de coincidências. Além disso, teríamos que levantar uma outra questão: se o PP é um partido da extremidade do leque político, por que razão - e gostaria de ouvir um comentário da parte de V. Ex.ª -, ele é, constantemente - no Orçamento do Estado, e não apenas nesse caso -, um aliado preferencial do Partido Socialista?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Uma outra questão é a seguinte: V. Ex.ª e sabe perfeitamente que não corresponde à posição do Partido Comunista Português defender o isolacionismo nacionalista pois temos dito e redito que não colocamos a questão de Portugal abandonar o processo de integração europeia. Todavia, há uma questão que colocamos e que é completamente diferente, que é a de Portugal estar no processo de integração europeia com firmeza, de espinha direita, não a discutir quem é bom aluno e quem é mau aluno, mas a defender o interesse nacional e não se remeter, a pretexto da posição de bom aluno ou de qualquer outra, a uma posição subserviente e que não tem em conta comportamentos de outros países, de outros governos, que no quadro da integração europeia não deixam de defender o interesse do seu próprio país.
V. Ex.ª referiu também o processo de revisão constitucional para afirmar que não está atrasado, somente ainda não principiou propriamente, mas creio que esta referência reflecte eventualmente alguma distracção. V. Ex.ª escreveu esta intervenção eventualmente ontem ou há dias e não teve em conta aquilo que se passou ontem à noite, aquilo que se passou esta manhã. E o que se passou esta manhã foi que, apesar de o Partido Socialista ter dito durante semanas a fio que não aceitava o referendo, acabou por dizer sim ao Partido Social Democrata.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já passaram 3 minutos.

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O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
E na sequência disso a revisão constitucional disparou, e disparou no fundamental de acordo com o PSD.
Parece, portanto, que a sua intervenção tem aspectos deslocados e outros que estão atrasados.
Já agora, queria estranhar que, tendo V. Ex.ª a responsabilidade de ser presidente da Comissão de Assuntos Europeus, não tenha trazido a esta Casa uma questão que nos devia preocupar a todos e a respeito da qual estamos extremamente atrasados, que são as conferências intergovernamentais que estão a debater a revisão do Tratado da União Europeia.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, em primeiro lugar, depois de ter sido reprovado na prova escrita por V. Ex.ª, vou ver se consigo passar na prova oral.
Quero dizer-lhe que também fico muito satisfeito e surpreendido que se tenha insurgido contra duas caracterizações que fiz sobre o Partido Comunista Português dizendo que era um partido da extremidade do leque político. Basta olhar para este anfiteatro, mas tomo nota de que essa posição incomoda os elementos do Partido Comunista Português, o que poderá significar um tropismo de mudança em termos de comportamento que, aliás, seria muito útil para o país.
Quanto às outras questões colocadas, também fico surpreendido que esteja satisfeito com o que está a acontecer na Comissão Eventual para a Revisão da Constituição, que tenha ficado, pelo menos esta manhã, com a convicção de que a revisão constitucional se irá fazer num bom sentido e no sentido que o regime democrático necessita.
Também tomo nota que não aceita a caracterização de partido do isolacionismo nacionalista. Fico também satisfeito que assim seja.
Em relação à votação que ontem teve lugar, sobre a lei das privatizações, só tenho pena que o Partido Comunista não tenha entendido o que verdadeiramente estava em jogo com a alteração dessa lei, ou seja, no fundo, a possibilidade de o Estado vir a arrecadar muito maiores receitas públicas com o processo de privatização, que não é imposto pela Comunidade Europeia, como consta do artigo 222.º do Tratado de Roma, que foi, aliás, invocado pela Comissão para dizer que, enquanto vigorasse esse artigo, não havia problemas com a propriedade accionista dessas empresas mas, desde que elas fossem privatizadas, então sim, o capital da Comunidade Europeia, dentro da letra e do espírito do Tratado, deveria e poderia concorrer a essas privatizações. Ou seja, dentro do vosso ponto de vista, não me parece que a votação que ontem teve lugar tenha sido a mais esclarecida.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Pára que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Sá (PCP): - S. Presidente, é para defender a honra da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Desculpe, mas tenho de perguntar-lhe se pertence à direcção da bancada.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, não pertenço, mas algum elemento da direcção pode fazê-lo, na medida em que a minha bancada foi desonrada ao ter sido afirmado que estava contente com o resultado da revisão constitucional desta manhã. Obviamente que não está.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, ou estou enganado ou tem de ser um elemento da direcção a defender a honra da sua bancada.

O Sr. João Amaral. (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. João Amaral (PCP): - Se o Sr. Presidente não me permite que delegue, eu defendo a honra da bancada.

O Sr. Presidente: - A honra não é delegável.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, o que está em questão, na afirmação feita pelo Sr. Deputado Medeiros Ferreira, é uma falsidade.
Do nosso ponto de vista, o que foi dito pelo Sr. Deputado Luís Sá - e tenho pena que o Sr. Presidente não tenha permitido que fosse ele a dizê-lo - foi muito claro: consideramos que a forma como o processo de revisão constitucional está a ser construído tem na base uma gravíssima cedência de princípios por parte do Partido Socialista e um entendimento quanto a essa cedência de princípios entre o PS e o PSD. Não é um processo desejável, não é um processo que dignifique a Constituição, não é um processo que responda aos princípios de direito constitucional em que assenta a nossa Constituição.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, limitei-me a dizer que me parecia que a Comissão Eventual para a Revisão da Constituição não tinha avançado nos seus trabalhos de revisão. O Partido Comunista é que parece acreditar que sim!
É tudo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, quando o Sr. Deputado tomou a palavra ainda pensei que, como presidente ilustre que é da Comissão de Assuntos Europeus, ia, como dizia o Sr. Deputado Luís Sá, falar sobre um tema dominante, qual fosse o da CIG.
Depois, pensei «não vai falar sobre isso, vai falar sobre outra coisa. Vai falar sobre a sardinha...», porque é um problema momentoso e instante, e com certeza que V. Ex.ª o traz no seu subconsciente.
Mas como não falou sobre esse problema, pensei «bom, vai falar sobre o Sr. Ministro das Finanças e vai defendê-lo, perante os ataques que o Partido Socialista lhe desfere quotidianamente...». Mas também não falou sobre isso!
Então, pensei «de que é que vai falar?».
E pensei ainda «se calhar, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, como é um homem bom, um político de grande experiência e como sabe apreciar bem os actos políticos e

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a sua grandeza, vai aqui fazer um elogio à posição que o PSD tomou ontem em relação à Comissão Eventual para a Revisão da Constituição. Como é um homem justo, um homem bom, vai dizer que, de facto, o PSD acabou com este folhetim, acabou com o alibi do Partido Socialista de não fazer a revisão constitucional, acabou com aquele argumento e vai concluir que, sim senhor, vamos lá fazer a revisão constitucional, vamos encerrar este capítulo sobre a regionalização e vamos ter boa fé para que o Partido Socialista depois, na lei ordinária, consiga resolver, a contento de todos os portugueses, o magno problema da sua consulta, dizer qual é a sua opinião sobre o referendo nacional».
Julguei, na minha boa fé, que o Sr. Deputado Medeiros Ferreira ia fazer uma coisa destas e, afinal, também não fez. Ao contrário, o que veio fazer foi uma recriminação, que eu não compreendo, Sr. Deputado, porque V. Ex.ª - e eu peço-lhe muita desculpa por ter uma opinião discordante da sua, abalizada como ê a sua opinião - colocou o problema exactamente ao contrário. É que, Sr. Deputado, as três revisões constitucionais anteriores só foram feitas porque houve um acordo político entre o maior partido da oposição e o partido do Governo e porque o partido do Governo tomou a responsabilidade de o propor, tomou a responsabilidade de o fazer e, até agora, não houve revisão constitucional porque o partido do Governo recusou isso ao maior partido da oposição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Até agora, não houve revisão constitucional porque o maior partido da oposição é excluído pelo partido do Governo do acordo constitucional que, pelos vistos, o partido do Governo quer fazer com os partidos representados na Assembleia que não lhe asseguram os dois terços necessários para fazer a revisão constitucional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se o Sr. Deputado Medeiros Ferreira pensasse um bocadinho nisto - e eu sei que pensou e que vai continuar a pensar - dar-me-ia, com certeza, razão.

O Sr. Presidente: - Já esgotou 3 minutos, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, não abusarei da sua paciência. .

O Sr. Presidente: - Agradeço.

O Orador: - Se o Sr. Deputado Medeiros Ferreira se permite dizer que o PSD não sabe ser o maior partido da oposição, eu devolvo-lhe o argumento: o PS não sabe ser partido do Governo!
Mais, o Partido Socialista escusa de estar com problemas de consciência em relação à moção de censura. Eu sei que a única coisa que VV. Ex.as queriam agora e que vos fazia jeito era terem uma moção de censura. Mas os senhores estão condenados a governar e têm de mostrar o que valem.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, eu só gostava de esclarecer a Câmara, porque é a segunda vez que é feita referência ao facto de eu ser presidente da Comissão de Assuntos Europeus - e fico satisfeito com isso - que eu não fiz esta declaração política nessa qualidade.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Mas também!

O Orador: - Foi um argumento do Deputado Luís Sá, retomado pelo Deputado Carlos Encarnação, obviamente para lhe dar tempo a que o seu raciocínio se desenvolvesse durante o pedido de esclarecimento, coisa que compreendo em termos de metodologia parlamentar, mas não me coloque falsos problemas...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - E para o louvar, Sr. Presidente!

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Presidente: - Sem diálogo, Srs. Deputados.

O Orador: - Sabe que a estima é mútua.
Todos os problemas que invocou são sectoriais importantes, mas não vejo por que razão iríamos falar hoje da CIG 96, quando o Sr. Deputado Carlos Encarnação, que é um ilustre membro da Comissão de Assuntos Europeus, sabe da regularidade, da frequência com que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, pessoalmente, vem à Comissão ou, mesmo, do envio atempado de documentação sobre o que se passa nas reuniões da CIG 96, documentação essa que é distribuída aos coordenadores de todos os grupos parlamentares e que, certamente, estará à sua disposição. Penso que não há problemas de comunicação interna entre o Partido Social-Democrata!?...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - No Governo de V. Ex.ª é que há problemas de comunicação interna!

O Orador: - Não, não. Pelos vistos, não!
Sobre o problema da revisão constitucional, a situação é muito simples: quem afirmou que não haveria revisão constitucional se não se tratasse previamente a questão da regionalização e do referendo nacional foi o novo líder do seu partido, Marcelo Rebelo de Sousa. Ele é que, obviamente para se afirmar como dirigente do seu partido, declarou imediatamente que não haveria revisão constitucional enquanto o Partido Socialista não aceitasse o referendo nacional - e eu diria anticonstitucional, nos termos em que foi colocado pelo constitucionalista Marcelo Rebelo de Sousa, mas é um parecer como outros que ele tem dado. Portanto, a revisão não se fez até agora porque o Partido Socialista teve de partir das vossas posições inconstitucionais para encontrar um compromisso que honrasse a Constituição e vos levasse, após inúmeras discussões, ontem quase de madrugada, a balbuciar algo que, confesso, estou ainda à espera de entender na sua plenitude. Ou seja, não está dito que o PSD já aceitou...

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado, se faz favor.

O Orador: - ... a questão da regionalização e não está dito qual é a vossa posição sobre a regionalização. Até lá, estamos numa «floresta de enganos», em que o seu partido, com certeza, se há-de meter muitas vezes.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Carvalho.

O Sr. Silva Carvalho (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, sabe V. Ex.ª que tenho por si consideração e estima pessoais. Permita-me que lha manifeste aqui, no Plenário. No entanto, a sua intervenção surpreendeu-me. E surpreendeu-me, infelizmente, pela negativa.
Teve apenas uma consequência positiva, que realço, desde já: é que das palavras do Sr. Deputado Carlos Encarnação, ficamos a saber que o PSD acabou com o folhetim da revisão constitucional. Essa foi uma confissão positiva que aqui ouvimos.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - É melhor corrigir. Foi ali o PS que fez!

O Orador: - No entanto, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira referiu-se ao Partido Popular em termos que, obviamente, não posso deixar passar em claro, nomeadamente, ao dizer que nos encontrávamos na extremidade do leque político e ao apelidar-nos de isolacionismo nacionalista.
Quanto a encontrarmo-nos na extremidade do leque político, não me incomoda. Depende sempre do leque político que estamos a falar, embora eu ache, Sr. Deputado, que não lhe fica muito bem a utilização desses termos, até porque se for procurar Deputados oriundos de ambas as extremidades a que se referiu, encontra-os na sua bancada e, portanto, penso que a moderação da linguagem por vezes é boa conselheira.
Já quando nos fala de isolacionismo nacionalista julgo, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, que está a referir-se àquilo que o Partido Popular tem vindo a defender em matéria de questões europeias, nomeadamente na Comissão a que V. Ex.ª preside. É que se assim é, Sr. Deputado, então vamos continuar a ser nacionalistas, sobre isso não tenha a menor dúvida, porque vamos continuar a não abdicar que o Governo português deve e tem obrigação de defender os interesses nacionais em sede de Comissão Europeia, custe a quem custar, doa a quem doer. Têmo-lo dito em sede de Comissão de Assuntos Europeus e dizêmo-lo em sede de Plenário.
Estou a ver o Sr. Deputado Francisco Torres a sorrir. Sei que estes assuntos o incomodam e admito que possam incomodar cada vez mais gente. Só que desta postura nós não vamos abdicar, chamem-nos o que chamarem.
Hoje de manhã chamaram-nos proteccionistas e disseram que nós queríamos estar «orgulhosamente sós». Acho que, infelizmente, cada vez mais estamos mais acompanhados, nomeadamente por aqueles que estivemos a ouvir na audição parlamentar que a Comissão de Assuntos Europeus realizou. Sentimos que as preocupações dos sindicatos, dos empresários são as mesmas que as nossas e, nesse sentido, estamos cada vez mais acompanhados.

O Sr. Presidente: - Já esgotou 3 minutos, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Quanto às privatizações, ficámos a saber que o problema do Partido Socialista é de encaixe, independentemente de onde vem o dinheiro e de quem fica dono das empresas, o que achamos lamentável.

Quanto à moção de censura, é muito simples: o Partido Socialista tem sempre a «arma» da moção de confiança.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Silva Carvalho, depois deste seu pedido de palavra sinto-me obrigado a dizer em público aquilo que penso de si: considero-o um homem de bem, sinceramente considero-o - porque acho que sei julgar as pessoas alguém que prossegue o bem público, que pretende o bem público. E como isso escasseia hoje em dia, sobretudo entre nós, não quero deixar de fazer-lhe essa referência.
Mas, exactamente porque é um homem de bem e porque é um homem que pretende prosseguir na vida política para atingir objectivos relacionados com o bem público, há algo na votação do PP sobre as privatizações que eu não compreendo. E vou dizer-lhe porquê, embora já tenha dito parte ao Deputado Luís Sá.
O artigo 222.º do Tratado de Roma não obriga às privatizações. Enquanto certas empresas fossem nacionalizadas, tinham o chamado controle estratégico nacional. Porém, aquelas individualidades que mais utilizam, a torto e a direito, a expressão «interesse nacional» não têm o mesmo sentido de bem público que V. Ex.ª. Portanto, quando estão a falar de interesse nacional e promovem uma política de privatizações sistemática, o corolário disso é que se corre o risco de se abandonar o controle estratégico dos capitais, porque estamos na União Europeia e somos obrigados, pelos tratados que assinamos, à livre circulação de capitais, à livre utilização do mercado de capitais, para as privatizações. E a isso não há volta a dar. Está consagrado no Tratado de Roma e no Tratado de Adesão de Portugal às Comunidades Europeias, que o seu partido e o PSD votaram nesta Assembleia, fazendo, aliás, muita questão de dizer que sempre defenderam mas foram para lá arrastados. Seria bom que esse ponto também ficasse esclarecido.
Quanto à caracterização, que tanto os ofendeu, de extremidade do leque político, confesso que acho uma expressão eufemística, fraca e, sinceramente, nada ofensiva para aqueles nomes com que costumamos referir algumas atitudes de alguns partidos políticos. Creia, Sr. Deputado, que quando falei de extremidade do leque político não quis exactamente levantar uma celeuma sobre a caracterização do comportamento de certos partidos políticos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, vi que o meu companheiro de bancada Carlos Encarnação tentou imaginar o conteúdo do seu discurso, vi também que outros colegas de outras bancadas ficaram desiludidos com o seu discurso, o que significa que tinham imaginado algo que o senhor ia dizer.
Devo dizer que não estava em qualquer dessas posições mas, sim, estava a imaginar aquilo de que o senhor nunca iria falar. E imaginei que o senhor nunca mais iria falar, nesta Câmara, sobre o problema das privatizações. Por isso, fiquei espantada por se ter lembrado de voltar a referi-lo. E digo-lhe por que razão admitiria que o senhor não tor-

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passe a falar nesse assunto. É que este tema é razoavelmente incómodo, do ponto de vista político, para os Srs. Deputados do Partido Socialista. E, assim sendo, pensei que seria preferível ficarmos todos calados, depois de cada um ter tomado a posição que entendeu, e que entendeu como correcta, mas não transmitirmos para a opinião pública mais e mais, e cada vez mais, o problema que estava em causa.
Sr. Deputado Medeiros Ferreira, já que trouxe esse problema para a Assembleia, gostaria' de lhe fazer uma pergunta concreta. Se este processo era tão urgente que tinha por base fazer qualquer venda imediata ao estrangeiro de uma empresa nacional, pergunto-lhe: qual foi o prejuízo concreto provocado pela reprovação do projecto de lei, ontem? Isto é, qual é a empresa que não foi vendida ao estrangeiro por causa da não aprovação do projecto de lei, ontem? Nomeadamente, pergunto-lhe se foi o caso da Tabaqueira, ou, se não foi, qual delas foi. Agradeço-lhe uma resposta concreta para eu perceber onde está o problema grave da reprovação desse projecto de lei.
Por outro lado, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, quero dizer-lhe o seguinte: toda a gente reconhece que o senhor é um democrata, pelo que não está correcto que chame força de bloqueio à oposição democrática que é feita nesta Casa. Se o senhor acha que existe força de bloqueio, não a deve procurar nesta Casa. Sugiro-lhe que a procure no seio do seu próprio Governo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, também tento antecipar o que os outros Deputados vão dizer quando pedem a palavra. Já que todos estão surpreendidos com aquilo que eu disse, quero referir que também estou surpreendido com a sua intervenção, porque pensei, sinceramente, que me iria falar, com a objectividade de análise financeira que se lhe reconhece, dos prejuízos para as receitas públicas da vossa decisão de ontem.
Na verdade, com o vosso sentido de voto, ontem, acabaram por impedir que as leis do mercado, que, presumo, a acompanham insistentemente desde as lições do Quelhas, pudessem ser aplicadas. O vosso voto político impediu que as regras do mercado financeiro se exercessem, aliás, dentro das regras da Comunidade Europeia e em geral, não sabendo nós com que prazos, porque nos sucessivos diplomas do Governo do PSD toda essa matéria foi tratada com grande casuísmo. Teríamos dificuldade em entender, nas vossas leis, o que há de geral, o que há de fixo, quanto a uma posição sobre as privatizações. Diríamos que cada decreto-lei, cada regulamentação, cada operação de privatização feita no Governo do PSD, tinha sempre um cliente...

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Exactamente!

O Orador: - ..., tinha dois, havia uma escolha a fazer, havia a administração dos interesses clientelares. Ao passo que, com o projecto de lei que não foi aprovado ontem, o que o Partido Socialista pretendia, nesta fase de privatizações, era exactamente que elas, ao menos, servissem para duas coisas ao mesmo tempo: reforçar a capacidade de modernização das empresas que se vão privatizar e fazer com que o processo de privatizações nos honrasse na Comunidade Europeia e se saldasse por receitas públicas qualificadas e melhoradas pelo simples jogo da concorrência e do investimento.
No entanto, noto que a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, embora reconhecendo-lhe a sua formação tecnocrata, também tem tendência para descambar para a expressão política, porque, em vez de dizer aquilo que, com certeza, nas suas análises financeiras diria - por exemplo, que o valor das acções aumentaria se houvesse mais compradores, admitindo que a abertura dos mercados aos capitais estrangeiros iria fazer elevar a procura das acções em venda -, a Sr.ª Deputada não disse que se esperaria um aumento do preço das acções, utilizou, antes, uma expressão que fica muito bem, em termos políticos, dentro de uma linha de bloqueio à modernização, a de venda ao estrangeiro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Espero que, quando voltar a Bruxelas, quando a alternância democrática se operar, daqui a muitos anos, consiga dizer aos seus pares da ECOFIN que se continua a opor à venda ao estrangeiro das acções e do mercado de capitais, nos países da União Europeia.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, pede a palavra para que efeito?

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Para exercer o direito regimental de defesa da honra pessoal.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, uma vez que estamos no fim do debate.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Deputado Medeiros Ferreira, disse que nos processos de privatizações havia defesa de interesses clientelares. A esse respeito, Sr. Deputado, penso que é preciso que nos entendamos. Houve realmente, e com muita honra, a negociação caso a caso das diferentes empresas, mas com transparência, portanto, penso que a sua expressão «interesses clientelares» é bastante abusiva e não deveria ser invocada neste momento.
Por outro lado, o Sr. Deputado disse que eu, a despeito da minha capacidade técnica, alguma que possa ter, descambava, às vezes, para aspectos políticos. Devo dizer-lhe que não gosto da palavra «descambar», porque estou eleita democraticamente pelo povo português, tal como o senhor, e não me parece que, quando aqui defendemos os interesses que consideramos dos nossos eleitores, estejamos a descambar seja para que lado for. Portanto, «descambar» é uma palavra desadequada para quem exerce um mandato político.
Finalmente, Sr. Deputado, se alguma competência técnica tenho, poderia também dizer-lhe que, quanto ao problema das privatizações, as receitas não são receitas públicas que prejudiquem a execução do Orçamento.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, vou apenas referir-me à expres-

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são que utilizou e que me chocou por se estar a falar do processo de privatizações e da nossa integração na União Europeia. Referiu-se ao processo de privatizações como de venda ao estrangeiro. Acho que é uma expressão técnica e politicamente incorrecta. É tudo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 25 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 133/VII - Garante o direito à igualdade de tratamento no trabalho e no emprego (PCP).
Como sabem, temos hoje uma agenda muito exigente, portanto, apenas sugiro - não posso impor nem quero que limitem as vossas intervenções, por forma a pouparmos algum do tempo distribuído a todos os grupos parlamentares. Se assim for, a Mesa ficará muito grata, pois, caso contrário, a sessão terminará muito tarde.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, para apresentar o projecto de lei n.º 133/VII.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ªs Srs. Deputados: Mais uma vez, o PCP apresenta a esta Assembleia o projecto de lei que garante o direito à igualdade de tratamento no trabalho e no emprego.
A igualdade de tratamento entre mulheres e homens é um princípio fundamentai do Direito. O respeito da dignidade humana, a participação plena e inteira das mulheres, numa base de igualdade na vida política, económica, social e cultural e nos processos decisórios são exigências fundamentais da democracia.
Estamos perante inquestionáveis afirmações de princípios e, como diria o escritor, para evitar repetições, vide tratados, recomendações, pareceres, ditos e escritos.
No entanto, verifica-se que adquiridos os dados, reconhecidos os princípios em documentos e instrumentos jurídicos e políticos, nacionais e internacionais, a realidade é outra e bem diferente.
Poder-se-á afirmar que a igualdade de direitos e de oportunidades para mulheres e homens é teoricamente reconhecida sem dificuldade como um direito inalienável da pessoa humana e uma exigência absoluta dos princípios de justiça social e democracia. Mas da teoria à prática persistem os actores que da humanidade não têm senão uma visão abstractizante, assexuada, desprovida de identidade, alheia à história e à cultura.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A luta das mulheres pela igualdade no trabalho e no emprego insere-se na luta de todo um povo, que à beira do século XXI se confronta, quotidianamente, com os detractores do desenvolvimento, da paz e da justiça social.
Se o ontem das manifestações das tecelãs nova-iorquinas ou o ontem da luta das sufragistas pelo direito ao voto podem parecer factos históricos arquivados na gaveta do esquecimento, outros se colocam tão próximos, hoje e agora, que deixam claro que muitas outras lutas ainda esperam as mulheres portuguesas na defesa da igualdade e da justiça social.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - É a feminização da pobreza, da exclusão social, do desemprego e até a idade da reforma, que aumentou dos 62 para os 65 anos, que representava um património adquirido pelas mulheres portuguesas, que o Governo do PSD entendeu retirar-lhes em 1993, em nome de uma falaciosa igualdade, e que o PS, recentemente, chancelou, ao rejeitar o projecto de lei n.º 8/VII, apresentado pelo PCP, que objectivava a reposição desse direito.
Reconhecem-se, a nível nacional e internacional, os princípios e as leis que garantem formalmente o estatuto de igualdade à mulher, mas, em simultâneo, constroem-se obstáculos que limitam essa igualdade.
Reconhece-se a importância que as mulheres assumem, enquanto protagonistas do desenvolvimento, através da sua intervenção na vida económica, social, política e cultural, mas impedem-se ou ignoram-se as medidas e as acções que concretizem essa participação nas diferentes áreas da vida nacional.
No fim do milénio, para além da inovação tecnológica, a solidariedade é para alguns tão-só um baile de máscaras flexíveis e polivalentes, onde a fraternidade só tem avaliação medíocre.
Só assim é possível entender que a maternidade não seja reconhecida como um valor eminentemente social e não se adoptem medidas concretas que facilitem a compatibilização da vida familiar com a realização pessoal e profissional das mulheres.
Só assim é possível entender como e porque se justificam iniciativas legislativas que enunciam os direitos que todos dizem saber mas só alguns exercem e defendem.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A história e as histórias que envolveram a apresentação, na anterior legislatura, do projecto de lei n.º 99/VI, do PCP, com a mesma epígrafe daquele que hoje apresentamos, constituem o melhor exemplo do que temos vindo a afirmar.
Vale a pena relembrar que foi exactamente o conhecimento público de práticas discriminatórias em relação às mulheres numa conhecida instituição bancária que motivou o aparecimento daquele projecto de lei.
No entanto, a certeza de que as discriminações não habitavam, nem habitam, exclusivamente no BCP mas em muitos outros locais de trabalho determinou também que o conteúdo de ambos os diplomas tivesse e continue a ter um carácter muito mais abrangente do que aquele que poderia ser exclusivamente causa imediata da actuação do BCP.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - Acordando memórias, vale a pena registar que o Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas apresentou nesta Assembleia uma petição na qual solicitava, nomeadamente, a adopção de medidas legislativas adequadas para o saneamento da, situação verificada no referido banco. E afirmava ainda este Sindicato que, dos 3152 trabalhadores, 23 eram mulheres, o que correspondia a uma percentagem de 0,7 %. E para verificar a abissal e chocante diferença, referiam-se outras instituições bancárias onde a percentagem de mulheres variava entre os 22 e os 50 %.
Chegava assim, em 1989, ao País, a denúncia do exercício de práticas discriminatórias, questionadoras, da legislação portuguesa, da legislação comunitária, dos princípios e dos direitos nacionais e internacionais.

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Em Janeiro de 1991, a CITE aprovava, por maioria, um parecer claramente condenatório da política de admissões do BCP e afirmava nas conclusões o seguinte: «Existe discriminação em função do sexo e violação do princípio geral da igualdade de tratamento entre homens e mulheres na política de admissões de pessoa] prosseguida selo BCP». E, mais adiante, continuava: «Esta instituição bancária infringe designadamente o disposto no Decreto-Lei n.º 392/79, artigos 3.º, 4.º e 7.º».
Este parecer foi remetido, para aprovação, ao Secretário de Estado do Emprego e da Segurança Social, que, 4 meses depois, se limitava a tecer a ambígua consideração: < Da sua leitura parece resultar a existência de indícios de actuações que, na prática, têm conduzido a uma situação objectivamente não consentânea com os propósitos para que aponta alei...». E ficava por aqui o Governo, contemporizando perante as infracções do BCP.
Entretanto, o Sr. Provedor de Justiça, Dr. Mário Raposo, produz um despacho de conteúdo muito claro e que, em forma de ofício, é dirigido ao Ministro do Emprego e da Segurança Social. Para além de questionar directamente a responsabilidade do Governo nesta matéria, afirma que a Inspecção-Geral do Trabalho deve exercer os seus poderes de fiscalização e conclui que se a estes não corresponderem meios legais já configurados no Decreto-Lei n.º 392/79, o Governo deverá adoptar as medidas legislativas competentes pois está vinculado a instrumentos internacionais que ingressaram na ordem jurídica portuguesa, designadamente a Convenção n.º 111, da OIT, e a Directiva do Conselho das Comunidades 76/207/CÉE, tendo como perspectiva uma democracia paritária fundada na dignidade da pessoa humana.
E, continuando a agir qual romeiro de viagens em terra nossa e terra estranha, o Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, apresentou também uma petição ao Parlamento Europeu e uma queixa junto do Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia.
Depois de todos os pareceres, da condenação da CITE, da recomendação do Sr. Provedor de Justiça, seria lícito pensar que o projecto de lei apresentado na anterior legislatura pelo Partido Comunista Português, constituiria, hoje, mais um eficaz instrumento legislativo no combate à discriminação das mulheres no trabalho e no emprego.
Mas, na oratória anti-socrática e anti-dialógica de alguns parlamentares, a teoria e a prática, as intenções e as acções estão sempre em disjunção. Só assim se entende que, aprovado na generalidade, por unanimidade, o projecto de lei do PCP tenha baixado à Comissão de Trabalho para apreciação na especialidade, tenha acolhido as propostas de alteração apresentadas pelo PSD, que votou em comissão o texto final, e, inexplicavelmente, o mesmo PSD venha em votação final global, no Plenário da Assembleia, votar contra o diploma e, obviamente, contra, as suas próprias propostas.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Era a era Silva Marques!

A Oradora: - E é esta peripécia, mais quixotesca do que trágica, ocorrida no final da anterior legislatura, que determina a apresentação do projecto de lei n.º 133/VII, que retoma os mesmos objectivos do diploma rejeitado, acolhendo ainda alterações, entretanto surgidas, e pretendendo, hoje como ontem, contribuir para uma melhor eficácia do sistema legal vigente.

Apresentado em 1992, rejeitado pelo PSD em 1995, volta agora em 1996, por convicção de que o saber se acumula, se selecciona e transforma. E, apesar de errar ser humano, permanecer em errância por vontade própria é, com certeza, alheio ao homem.
Tal como dissemos anteriormente, reafirmamo-lo hoje: este diploma é um contributo para o reforço do ainda frágil edifício da igualdade e da democracia e por isso disponível para integrar todas as disposições que o tornem mais perfeito e mais actuante.
O facto de esta iniciativa ter nascido como resposta à prática discriminatória do BCP relativamente às mulheres e do seu enunciado não se poder alhear, porque não o pretende, quer do parecer da CITE, quer do relevante parecer do Sr. Provedor de Justiça, leva a que os traços mais pertinentes deste diploma objectivem o preenchimento dos supostos vazios que, na perspectiva do Governo, impediram a sua intervenção através da Inspecção-Geral do Trabalho.
Partindo do Decreto-Lei n.º 392/79, de 20 de Setembro, o actual projecto assegura a intervenção da Inspecção de Trabalho nos casos de práticas discriminatórias, ainda que as mesmas não se apurem em relação a qualquer trabalhador individualizado. Dizia o Sr. Provedor de Justiça, no seu parecer, que a prática continuada de discriminação é suficiente para dar lugar à fiscalização pela Inspecção-Geral do Trabalho. No entanto, não foi assim entendido pelo Governo.
Confere ainda o diploma legitimidade às associações sindicais para, nesses casos, proporem acções tendentes a provar as práticas discriminatórias e também para se constituírem assistentes no processo contraordenacional, beneficiando da isenção do pagamento da taxa de justiça e das custas; obriga à manutenção, por cinco anos, dos registos dos processos de recrutamento de pessoal, com os dados considerados 'necessários para a averiguação práticas discriminatórias, impedindo que, a partir de agora, nenhuma instituição possa invocar não possuir registos, como 0 fez, na altura, o BCP; estabelece presunções de práticas discriminatórias resultantes da desproporção entre a taxa de feminização nos serviços do empregador e a taxa existente no mesmo ramo de actividade e ainda a verificada nos estabelecimentos de ensino ou nos cursos de formação profissional, cujo curriculum dê acesso aos lugares para que houve recrutamento; estabelece o princípio da inversão do ónus da prova relativamente aos processos baseados nas práticas discriminatórias; define a discriminação indirecta e estabelece também um cadastro das empresas condenadas pela violação do princípio da igualdade; contém ainda um conjunto de disposições de carácter penal, assinalando-se, como mais pertinente, aquela que obriga à publicação das condenações, a expensas do empregador, num dos jornais mais lidos do País.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Esperamos, e esperam as mulheres portuguesas, que nenhum outro incidente impeça que esta iniciativa chegue a bom porto e que, com a sua aprovação, se preencham as lacunas no sistema legal vigente, que permitiram que, até este momento, os empregadores do BCP e de todos os BCP, que infelizmente poluíam pelo País, continuassem impunes, apesar do reconhecimento do seu estatuto de infractores.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Esperamos, e esperam as mulheres portuguesas, que este diploma possa obstar a qualquer leitura

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enviesada da legislação existente, inviabilizando atitudes de passividade expectante por parte do Governo e que são seguramente denunciadoras do acolhimento dos infractores e da aceitação da sua impunidade.
Esperamos, e esperam as mulheres portuguesas, que o cumprimento das leis e a criação de mecanismos de fiscalização não possam mais ser adiados, porque a vida é uma praxis social que não permite deixar para amanhã o que já ontem deveria ser uma realidade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para o caso de algum dos Srs. Deputados não ter ainda sido informado, lembro que, na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, houve consenso no sentido de não se proceder hoje a qualquer votação. Oportunamente será anunciado o dia em que se efectuarão as votações previstas para hoje.
Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, as Sr.ªs Deputadas Maria Eduarda Azevedo e Helena Roseta.
Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, a igualdade de oportunidades é claramente um princípio fundamental de uma cidadania democrática e, por isso mesmo, deve ser consagrada na lei e assegurada na prática, só que consagrada e assegurada de forma consistente e responsável. Esta é a postura que sempre assumimos e que continuamos a defender.
O projecto de lei que acaba de apresentar faz depender a eficácia das medidas propostas da inversão do ónus da prova, que é, no fundo, um pilar essencial do ordenamento jurídico português. Por outro lado, V. Ex.ª faz essa inversão e esse arrepio à ordem jurídica portuguesa de uma forma que eu diria tímida e, além do mais, inconsequente, porque acaba por legitimar a utilização de critérios subjectivos, que são, no fundo, aqueles que, aparentemente, diz querer combater. Em que ficamos, Sr.ª Deputada? Quer a inversão do ónus da prova, mas não quer ir tão longe quanto aquilo que deveria querer, dada a consistência do seu pensamento, ou reconhece que, efectivamente, há alguma leviandade na proposta que apresenta?
Gostaria também de saber qual o entendimento que a Sr.ª Deputada tem relativamente ao papel das instituições europeias. Será que as instituições europeias, nomeadamente o Parlamento Europeu, são entidades «lobbistas»?! Eu não as tenho nessa conta, mas provavelmente a Sr.ª Deputada terá! Digo «a Sr.ª Deputada» e também os Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, porque, como terá conhecimento, houve, a coberto de uma reunião de trabalho, na semana passada, uma reunião da Comissão para a Paridade e Igualdade de Oportunidades com a comissão homóloga, digamos assim, do Parlamento Europeu, que foi desencadeada por dois eurodeputados, um da Partido Comunista - o eurodeputado Sérgio Ribeiro - e outro do Partido Socialista - a eurodeputada Helena Torres Marques -, que mais não fizeram do que vir cá, como digo, a coberto de que se trataria de uma reunião com a comissão homóloga do Parlamento nacional, fazer lobbying, no sentido de hoje passar, mais facilmente, este projecto de lei. Penso que isso em nada dignifica as instituições em causa, designadamente a Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, pretende responder já ou no final dos dois pedidos de esclarecimento?

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - No final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, quero dizer-lhe que a posição da bancada do Partido Socialista sobre o vosso projecto de lei vai ser apresentada por outro colega meu, e será no sentido de que o iremos viabilizar. No entanto, como ele me suscita algumas dúvidas, gostaria de lhe pedir alguns esclarecimentos.
O conceito de discriminação indirecta que avançam neste diploma parece-me bastante correcto. Ele, aliás, é colhido na jurisprudência do Tribunal Europeu, e 'fala concretamente em práticas que prejudiquem, de modo desproporcionado, os indivíduos de um dos sexos: Portanto, tanto podem ser homens como mulheres. Só que todo o diploma fala apenas nas trabalhadoras, nas mulheres e na discriminação feminina.
É evidente que temos hoje alguns sectores de actividade onde já pode existir discriminação contra homens, por isso penso que a defesa da paridade nos obriga a pegar neste conceito de discriminação indirecta e aplica-lo indistintamente quer a homens quer a mulheres. A Sr.ª Deputada conhece-me e sabe que não há nisto qualquer cinismo da minha parte. Não vou aqui fazer o número de dizer que há tanta discriminação para um lado como para outro, porque não é verdade, pois há mais discriminação contra as mulheres do que contra os homens, mas, na verdade, já há alguns sectores - e o diploma, se quer acolher isso, terá de pensar em todos os casos - em que já se pode verificar uma discriminação ao contrário.
A minha primeira pergunta é, pois, esta: aceita o PCP, em sede de especialidade, que a redacção do diploma desse, indistintamente, para ser considerada a discriminação contra um dos sexos e não apenas contra o sexo feminino?
A segunda questão tem a ver com os indícios da discriminação. Esta matéria também é difícil. Neste momento, a União Europeia está a promover estudos sobre indicadores da discriminação contra as mulheres nos vários países, que é uma matéria que nós ainda sabemos muito pouco. Penso que um dos indícios que referem aqui a própria prática portuguesa já trouxe ao de cima, que é a desproporção entre a taxa de um dos sexos nos serviços de um determinado empregador e a mesma taxa no mesmo ramo de actividade. Foi o caso do sector bancário, onde havia um banco em que a taxa das mulheres era brutalmente inferior à que se verificava em todos os outros bancos. Portanto, neste caso, havia mesmo uma discriminação.
O outro indício que citam no diploma é a comparação entre a taxa de um dos sexos num curso e a taxa do mesmo sexo na respectiva profissão. Este indício é, a meu ver, muito mais complicado, pois não é linear a relação entre curso e emprego. Penso que, em sede de especialidade, temos de reflectir sobre este indício com algum cuidado, porque, se criamos indícios insuficientemente fundamentados, sobre os quais, ainda por cima, vai cair uma sanção de contraordenarão, podemos estar a criar

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efeitos perversos, ou seja, podemos criar uma lei que, para ser tão igualitária e tão defensora de um determinado sexo, acabará por não ser cumprida, porque o indício pode não ser muito real e pode haver outros factores muito relevantes. Para mim, por exemplo, há um factor muito mais relevante de práticas indiciadoras de discriminação, que é a gestão do tempo na sociedade, isto é, a maneira como se gere o tempo das mulheres e dos homens, que não consta do vosso diploma.
Portanto, perguntava-lhe se, em sede de especialidade, admitiriam discutir esta questão dos indícios com bastante prudência, tendo em conta, nomeadamente, a experiência da Comissão para a Igualdade do Trabalho é do Emprego, que já tem muitos casos de discriminação em dossier.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, começaria por dizer que, muitas vezes, a adjectivação em discussão política é perigosa ou, como diz o nosso povo, pode «voltar-se o feitiço contra o feiticeiro». A Sr.ª Deputada começou por utilizar adjectivos extremamente perigosos, como sejam «responsabilidade», «irresponsável» e «responsável». Ora, estes são exactamente os adjectivos que encontraria para caracterizar, de algum modo, a postura que o Partido Social Democrata teve aquando daquela farsa, mais quixotesca do que trágica, na anterior legislatura, em que ora dizia que sim ora que não, ora dizia que estava com o projecto ora que não, ora propunha alterações na especialidade ora não aprovava as suas próprias alterações, ou, por exemplo, o seu comportamento aquando da discussão do Orçamento do Estado, em que teve o mesmo tipo de atitude. É quase como oferecer o chocolate à criança, para ver se ela o vem comer, e depois retira-o.
Portanto, penso que em discussão de natureza política os adjectivos são, de facto, perigosos. E, por isso, reenviaria, exactamente com a mesma pertinência com que a Sr.ª Deputada enviou à bancada do Partido Comunista, os adjectivos «responsável» e «irresponsável», para, de algum modo, caracterizar o comportamento do Partido Social Democrata de há um ano e que hoje esperamos seja completamente diferente.
Concretamente, quanto ao artigo 7.º do diploma em discussão, que tem a ver com o ónus da prova, diria, Sr.ª Deputada, que foi exactamente um acolhimento retirado da directiva do Parlamento Europeu, que já fizemos questão de explicitar aquando do debate deste mesmo diploma há um ano.
Quanto aos comentários que a Sr.ª Deputada teceu à reunião da Comissão para a Paridade e Igualdade de Oportunidades e à presença dos Deputados europeus nesta Casa, há cerca de uma semana, como poderá entender, não é este o motor da discussão, não é isso que, hoje, estamos aqui a discutir, e, portanto, pura e simplesmente, não tomarei qualquer posição relativamente a todo o enunciado expressivo que operou no que tem a ver com essa presença.
Relativamente às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Helena Roseta, que são, efectivamente, de grande importância, queria deixar muito claro - e penso que isso já ficou suficientemente claro na minha intervenção - que todas as alterações que possam acontecer em discussão na especialidade serão bem-vindas, no sentido de tornar este documento mais eficaz e mais actuante, desde que não sejam para demorar ou retardar a sua aprovação e sejam apresentadas com a celeridade necessária. Portanto, serão bem-vindas, desde que não desvirtuem os pressupostos ou as traves-mestras do próprio documento que apresentámos.
Como também disse na minha intervenção, elas baseiam-se, de algum modo, no parecer, que consideramos extremamente relevante e muito claro, do Sr. Provedor da Justiça e também na própria atitude condenatória do parecer da CITE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Costa Pereira.

O Sr. José Costa Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei hoje em discussão pretende reeditar neste Parlamento uma questão inquestionável: a igualdade de tratamento que ambos os sexos devem merecer perante o trabalho e o emprego, como perante todas as situações da vida.
Para o PSD, esta matéria não apresenta qualquer dúvida. Para nós, todos os cidadãos merecem a igualdade, tal como se encontra consagrado na Constituição. Mas, mais do que isso, trata-se de um valor fundamental para a nossa concepção de sociedade, que a lei, apenas veio a consagrar.
Já no passado a Câmara se debruçou sobre esta matéria. O quadro legislativo neste domínio é já claro e não deixa dúvidas. Existem mecanismos formais e de fiscalização suficientes para que o princípio da igualdade encontre resguardo na lei ordinária.
Os problemas que se levantam respeitam mais à forma do que ao conteúdo. O que se pretende com esta iniciativa, de cuja bondade não se duvida, é apreciar a paridade na sociedade e perante o trabalho, com o que podemos concordar.
Mas esta iniciativa corre alguns riscos, por andar à frente do seu enquadramento social, por se encontrar deslocada no tempo e por produzir afirmações que não se coadunam com a realidade. Corre-se ainda o risco de contribuir para minimizar o papel da mulher na sociedade actual. Se existe algum sector onde, nas duas últimas décadas, se verificaram avanços extraordinários, foi neste. Não obstante as declarações públicas, nomeadamente na Conferência de Pequim do ano passado, os actos de discriminação positiva podem produzir efeitos nefastos.
Não negamos que existem alguns sectores de actividade onde o papel da mulher não é ainda visto num plano de igualdade com o dos homens. Mas não é por via legislativa que tal objectivo será alcançado, nem com maior rapidez ou profundidade. É por recurso à mudança de mentalidade, pela conquista pelas próprias mulheres do seu espaço, até porque o que é conquistado tem seguramente mais valor do que o que é «concedido», termo, aliás, que reprovamos claramente, dado que a igualdade é pressuposto da vida em sociedade mais do que qualquer direito reconhecido.
Perante este projecto de lei, o que importa é discutir estas questões, torná-las prioritárias para a opinião pública, contribuir para a sua difusão na sociedade portuguesa, mas não impô-las como uma vitória, quando afinal não passa de uma constatação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 133/VII é um pretexto para discutir a problemática da igualdade de tratamento perante o trabalho e o emprego. Mas que sirva, igualmente, para alertar os poderes públicos e, nomeadamente, o Governo, para que ponha os meios de

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fiscalização a agir nesta matéria e acompanhe este acto com campanhas de sensibilização dos agentes económicos e da opinião pública para os propósitos positivos que a mesma encerra.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A defesa do direito à igualdade da mulher não passa, como o preconiza o PCP, pela inversão do ónus da prova. Permitam-nos que questionemos a jurisdicidade e a correcção desta solução, que atropela os direitos dos empregadores, sem, contudo, defender ou melhorar a defesa dos direitos em análise.
Sejamos claros: a inversão do ónus da prova é, para nós, causa bastante e suficiente para acharmos este diploma incorrecto e reprovável. E, ao afirmarmos isto, não podemos deixar de lamentar que uma formulação como essa possa vir a inviabilizar o que para nós é importante e substantivo. Por isso, solicitaremos que o projecto de lei, ora em discussão, baixe à comissão da especialidade sem qualquer votação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Costa Pereira, penso que a intervenção que acabou de fazer, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, traduz aquilo que é a atitude de «fechar os olhos» do PSD, em relação à discriminação.
O Sr. Deputado, aliás, ousou exprimir, rio fundo, um pouco a ideia de que o PSD assume que há discriminação. Só faltaria que a negasse, pois ela entra pelos olhos dentro, não sendo, portanto, essa uma constatação que faça com alguma benevolência.
A questão que lhe coloco é se a concepção do PSD de alteração da realidade passa, e só, como disse, pela mudança de mentalidades; se é nesse plano que o PSD, em relação a tudo, defende os interesses das mulheres, a igualdade de oportunidades, e se pensa que, desse modo, a sociedade se altera.
É esta, tão-só, a minha pergunta.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O $r. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Costa Pereira.

O Sr. José Costa Pereira (PSD): - Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada Isabel Castro, provavelmente não esteve atenta à minha intervenção. Não reduzimos a igualdade homem/mulher apenas à questão de ordem mental. O que dissemos é que já existe um vasto conjunto de legislação que refere esse assunto e, como tal, é nela que temos de encontrar as respostas adequadas. Para lém disso, há todo um outro conjunto de situações que, do ponto de vista de ordem cultural e mental, podem levar-nos à situação que efectivamente desejamos.
E veja que nós, em questões de princípio, não estamos contra este diploma. Fui claro quanto a isto na parte final da minha intervenção. A única condição que colocámos, para podermos melhorar este diploma, é que ele baixe à Comissão, porque, quanto à questão de base, de principio, concordamos com ela, mas há uma questão de ordem jurídica, da qual discordamos, por pensarmos que, tecnicamente, é importantíssima e que não está correcta.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, dispondo de 1 minuto, tempo concedido pelo Partido Ecologista Os Verdes.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, começo por agradecer o tempo concedido pelo Os Verdes.
Sr. Deputado José Costa Pereira, a intervenção que acabámos de ouvir, em nome do PSD, é aquilo que, em termos de análise linguística, se designa por discurso circular e, em termos populares, de uma forma muito mais simplista, por discurso da hipocrisia.
O Sr. Deputado veio aqui alargar o leque de análise que a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo já há pouco tinha realizado. À «responsabilidade e irresponsabilidade» o Sr. Deputado acrescentou «incorrecto e reprovável». Não foi capaz de apontar um único exemplo dessa incorrecção e dessa atitude reprovável. Não foi capaz, quer em termos de generalidade, quer em termos de especialidade, de apresentar qualquer alternativa. Agora, Sr. Deputado, ficou claro. É cada vez mais claro para o PCP a necessidade da apresentação desta iniciativa. Ficou claro quão estão recuadas as mentalidades no PSD, e quão necessário, urgente e célere há que tomar medidas legislativas para que a mentalidade dos Deputados e das Deputadas do PSD possam de algum modo acelerar-se para que estejamos no século XX com mentalidades não do século XVI ou XVII mas à altura do milénio que se avizinha.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Costa Pereira.

O Sr. José Costa Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, esse é um discurso já muito batido. O discurso de sermos os conservadores, de termos as mentalidades atrasadas, é muito batido. Temos de mudar de linguagem, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Deputada é uma pessoa que tem conhecimentos e é capaz de falar de forma diferente. Estamos tão ou mais avançados que V.V. Ex.as nesta matéria, não duvide disso. Temos tanta ou mais experiência, a nível legislativo, do que V.V. Ex.as. A única coisa que eu disse no que toca à inversão do ónus, é que, em nosso entender, tecnicamente isso não está correcto, e, como tal, para melhorar o diploma, sobretudo nesse número, nessa alínea, propusémos a baixa à Comissão, para, na discussão na especialidade, podermos, nós próprios, dar um contributo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: -- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Moura.

O Sr. Victor Moura (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: O regime democrático instaurado em 25 de Abril de 1974 só estará plenamente concretizado e consolidado quando for conseguida a plena participação das mulheres e dos homens em pé- de igualdade em tudo o que respeita à vida social, política, económica e cultural.
Nessa data começou a erguer-se um novo edifício jurídico com grandes e rasgadas janelas abertas à consagração da igualdade e da não discriminação em função do sexo.
A Constituição de 1976 que consagrou tratamento igual para a mulher e marido, para a mãe e para o pai, motivou

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as necessárias e profundas alterações dos Livros da Família e das Sucessões, do Código Civil, expurgando, corrigindo e acrescentando articulados, nos quais se consagrou definitivamente a plena igualdade e a não discriminação em função do sexo.
À consumada abertura interna de pleno reconhecimento dessa igualdade, Portugal abriu-se ao Mundo, assumindo novas responsabilidades e novos compromissos: desde a Convenção para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres, na Organização da Nações Unidas, e da Declaração sobre a Igualdade das Mulheres e dos Homens, do Conselho da Europa, até às convenções da Organização Internacional do Trabalho relativas à igualdade de remuneração e protecção da maternidade e igualdade de oportunidades e de tratamento para trabalhadores de ambos os sexos.
Também na Comunidade Europeia deparámos com um quadro jurídico e de medidas, visando assegurar paulatinamente a consagração da igualdade de direitos, nomeadamente em matéria de emprego e de segurança social, em todos os seus estados. Aliás, o projecto europeu assumiu, desde a sua génese, o princípio da igualdade de remuneração entre homens e mulheres; a história da União Europeia é um continuo afirmar da cidadania plena das mulheres e dos homens. O porvir da União passa, igual e necessariamente, pelo reforço do papel da mulher e pela, promoção da igualdade de oportunidades.
Neste sucinto enquadramento dir-se-á então que esta questão não necessita no nosso país de qualquer alteração ou inovação dos normativos legais. Infelizmente, as janelas que «Abril» abriu à emancipação das mulheres não alcançaram todos os seus objectivos. Portas houve que continuaram fechadas à plena assunção da cidadania das mulheres. Alguns empresários, pese embora a sua sabida formação cristã, corporizam uma visão retrógrada que culpabiliza Eva pelo dito «pecado original) contra os Mandamentos de Deus... Empresários que só o são porque gerados pela mulher que discriminam; e que continua a gerar a força do trabalho que lhes permite continuarem empresários; e que, para eles, na sua lógica puramente mercantilista, só deveria gerar homens se tal não pusesse em causa as leis naturais que permitem a reprodução da força de trabalho.
Parece-nos assim que, embora tendo em consideração o acerto legislativo evoluído em termos de direito comparado, não tem o mesmo correspondência com a situação verificada e constatada no nosso quotidiano. De facto (e nos factos), estas questões radicam, entre outros, em aspectos sociológicos e psicossociais da nossa cultura ocidental que 50 anos de ditadura ainda agravaram, plasmaram e consagraram na lei, secundarizando a mulher e relegando-a para papéis socialmente desfavorecidos. Perante o desfavor do poder político, nem às benesses da consideração social poderiam almejar. O sistema a todos atingiu, mas às mulheres com maior rudeza. Foi-lhes consentido o «direito» de serem boas donas de casa e domésticas de profissão. A cidadã plenamente assumida ficava para os folhetos clandestinos, heroína de poemas trauteados baixinho e só de quando em vez, ou, mais frequentemente, para conversas ditas sociais de índole infamante, alimentadas pela cultura dominante e machista. Mulheres que, no dizer de Sofia de Melo Breyner «Pois não deste homem por ti/E não ficaste em casa a cozinhar intrigas/Segundo o antiquíssimo método oblíquo das mulheres/Nem usaste de manobra ou de calúnia/E não serviste apenas para chorar os mortos.» Foi ainda o tempo da «Luísa que subia a calçada», mas também, ainda e sempre da idílica «Leonor que ia pela verdura».
Ultrapassada essa fase em termos cronológicos, dela restam traumas e resquícios nas atitudes e comportamentos que os normativos legais ainda não conseguiram demover. Bem mondaram os nossos legisladores do pós 25 de Abril: trabalho indómito, sereno e honroso, direi mesmo, gratificante. Sendo certo que permaneceram resistências, discriminações, preconceitos, alguém esperaria que estes desaparecessem por arte divina na ponta da caneta do legislador? Ninguém de bom senso o esperaria. Às escolas, às famílias, à comunicação social cabe também um relevante e não despiciendo contributo para que consigamos dominar o fantasma da discriminação presente ainda em tantos e tantos detentores de poder. Como alguém disse, «O problema é de raiz cultural. Se não fora, bastaria a lei. Sendo apenas ajuda».
Este é o desafio: construir uma nova parceria entre os homens e as mulheres, visando a participação em plena igualdade e em todos os domínios, mas assegurando uma equilibrada repartição dos benefícios dos progressos obtidos, entre uns é outras. Para tal ser atingido não basta a letra da lei; antes, pressupõe uma transformação cultural dos comportamentos individuais e das atitudes e práticas colectivas. Tal será exigido também pela plena integração na União Europeia; esta tem contribuído há muito e de forma activa no plano internacional para o reforço do papel da mulher e na promoção da igualdade de tratamento, nomeadamente na Conferência das Nações Unidas, de Viena, do Cairo, de Copenhaga e, por último, de Pequim. Os Conselhos Europeus de Essen, Cannes e Madrid valorizaram igualmente o tema e impuseram-no como tarefa prioritária da União e dos seus Estados membros. Foi elaborado um novo programa de acção até ao ano 2000 para concretização e apoio a acções específicas a favor da igualdade de oportunidades.
Qualquer política tendente à prossecução da igualdade entre homens e mulheres tem de ter em conta a situação de uns e outras nas diferentes situações do quotidiano e das transformações em curso nas sociedades. É um objectivo a prosseguir perante a aceitação prévia da identidade feminina e da identidade masculina e com a vontade determinada e firme de implantar uma partilha equilibrada das responsabilidades entre homens e mulheres. Para tal é imperiosa a activa participação de ambos, valorizando os respectivos papéis como indispensáveis ao progresso e garante da democracia e do pluralismo.
Para tal não se torna apenas necessário a adopção de iniciativas positivas em relação às mulheres mas também a adaptação da organização social para possibilitar uma mais equitativa repartição desses papéis entre mulheres e homens. Quanto tal conseguirmos estamos a libertar as sinergias que tão indispensáveis são para prosseguirmos com êxito na via de desenvolvimento que neste momento trilhámos.
Ora, o trabalho e o emprego constituem de facto domínios essenciais da igualdade de oportunidades e de tratamento. Afirmamos mesmo que o acesso ao emprego é uma componente fundamental da emancipação das mulheres e simultaneamente um impulso e um contributo indispensável para o futuro do nosso país.
Na V Legislatura, o Grupo Parlamentar do PS apresentou o projecto de resolução n.º 21/V, que visava a constituição de uma comissão eventual para a elaboração de um «Livro Branco sobre as discriminações existentes entre homens e mulheres na sociedade portuguesa que geram

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desigualdades de oportunidades». A presente iniciativa legislativa do PCP, visa garantir a igualdade de tratamento no trabalho e no emprego, dando resposta a um problema que atinge, sobretudo, as mulheres trabalhadoras e que tende a agravar-se em situações de crise do mercado de emprego.
A promoção da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, a todos os níveis, figura hoje como uma prioridade não apenas no plano nacional como no contexto internacional.
A OIT aprovou a Convenção n.º 111, ratificada pelo Estado português, sobre discriminação no emprego e profissão, estabelecendo claramente no seu artigo 2.º que «Todo o Estado membro (...) compromete-se a definir e aplicar uma política nacional que tenha por fim promover, por métodos adequados às circunstâncias e aos usos nacionais, a igualdade de oportunidades e de tratamento em matéria de emprego e profissão, com o objectivo de eliminar toda a discriminação». Também a Convenção n.º 156, igualmente ratificada por Portugal, estabelece no seu artigo 3.º que «A fim de instaurar a igualdade efectiva de oportunidades e tratamento para os trabalhadores de ambos os sexos, cada Estado membro deve, entre os seus objectivos de política nacional, ter em vista permitir às pessoas com responsabilidades familiares e que ocupem ou desejem ocupar um emprego que exerçam o seu direito, de o ocupar ou de o obter sem serem alvo de discriminação e, tanto quanto possível, sem conflito entre as responsabilidades profissionais e familiares».
Por seu lado, a União Europeia tem vindo a dedicar particular atenção às questões da igualdade, o que levou à aprovação do programa de acção comunitária para a igualdade de oportunidades, a ser desenvolvido no período de 1996 a 2000, e que visa apoiar os esforços dos Estados membros, em matéria de igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, nos domínios da educação, formação profissional, no acesso e condições de trabalho.
Reconhecendo o trabalho não apenas como fonte de rendimento mas também como meio de realização pessoal de cada cidadão, o Partido Socialista e o Governo da nova maioria têm como preocupação basilar, como consta do seu programa eleitoral, garantir a todos os portugueses a oportunidade de trabalhar, o que passa, entre outras medidas, pelo combate a todas as formas de discriminação no trabalho, designadamente as que atingem as mulheres.
A verificação de práticas discriminatórias em função do sexo, seja qual for o domínio onde possam ocorrer, não têm qualquer justificação social, económica, política ou cultural, colocando em causa a própria noção de Estado social de direito e os direitos de cidadania.
Nesse sentido, a matéria versada no projecto de lei em, análise, assume grande relevância no plano da efectivação dos direitos fundamentais dos trabalhadores, com particular destaque no acesso ao emprego das mulheres, domínio onde se têm verificado a maior ocorrência de violações ao princípio da igualdade de tratamento.
Não obstante o princípio da igualdade entre os sexos gozar de tutela constitucional, quer de forma genérica no artigo 13.º, quer por referência ao mundo do trabalho nó artigo 58 º, n.º 3, aliena b), ambos da Constituição, e existir um regime jurídico que visa garantir a igualdade de homens e mulheres no trabalho e no emprego introduzido com a aprovação do Decreto-Lei n.º 392/79, de 20 de Setembro, aplicável somente ao sector privado, e do Decreto-Lei n.º 426/88, de 18 de Novembro, aplicável à Administração Pública, verifica-se que as mulheres portuguesas continuam, ainda, na prática, a ser objecto de diversas formas e práticas discriminatórias no domínio das relações laborais, quer seja no sector privado, quer mesmo na Administração Pública.
A aprovação do Decreto-Lei n.º 392/79, de 20 de Setembro, constituiu um importante passo para a efectivação da igualdade de oportunidades e de tratamento entre mulheres e homens, tendo representado na época, uma aproximação do regime jurídico-laboral português a outras ordens jurídicas. Todavia, volvidos que são cerca de 16 anos sobre a sua vigência, reconhece-se que o mesmo carece de legislação complementar que dê resposta aos problemas que afectam as mulheres neste domínio e para os quais o regime jurídico vigente não conseguiu, dar resposta.
Com efeito, os instrumentos jurídicos existentes no domínio do direito à igualdade. de tratamento no trabalho e no emprego têm-se revelado insuficientes e ineficazes na prevenção e no combate às discriminações, o que, aliado à existência de uma Inspecção-Geral de Trabalho, por agora pouco actuante, e à dificuldade das mulheres trabalhadoras fazerem prova da discriminação, tem aproveitado a muitas empresas prevaricadoras.
Por outro lado, as entidades empregadoras jamais reconheçam, até por razões de censura social, a existência de práticas discriminatórias em função do sexo nas várias áreas, designadamente no acesso ao emprego, orientação e formação profissional, promoção profissional, remuneração e condições de trabalho em geral.
Veja-se o caso paradigmático do BCP, que esteve na origem da apresentação do projecto de lei ora em apreço, que, mesmo após a emissão de vários pareceres por distintas entidades, como seja a Provedoria da Justiça e a CITE, que consideraram a existência de práticas discriminatórias relativamente às mulheres, nunca as reconheceu nem as corrigiu.
Todos estes factores recomendam que efectivamente sejam adoptadas medidas legislativas, que efectivem o direito à igualdade e sejam adequadas para combater e sancionar práticas de discriminação das mulheres no trabalho e no emprego, que ainda hoje, infelizmente, ocorrem no nosso país.
Com efeito, as mulheres portuguesas continuam a ser as mais atingidas pelo flagelo do desemprego. Segundo as estatísticas oficiais: a taxa de desemprego feminino é de 8,2 % contra 6,9 % do desemprego masculino; são vítimas de maior precarização dos vínculos laborais; a sua progressão na carreira é normalmente mais lenta; continuam a acumular com o trabalho as tarefas domésticas e de educação dos filhos. Muitos destes constrangimentos, com os quais as mulheres portuguesas ainda se debatem, actualmente, no acesso e condições do mercado de trabalho, têm a sua origem em práticas discriminatórias levadas a cabo por algumas empresas, que viram, durante muito tempo, o seu comportamento legitimado pela ex-maioria PSD, que, se recusou sistematicamente a viabilizar toda e qualquer alteração neste domínio.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine de imediato, pois já ultrapassou em muito o tempo regimental.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Com o seu voto favorável, o Partido Socialista viabilizará uma iniciativa legislativa, não obstante reconhe-

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cer, tal como os seus autores, que a mesma não é perfeita nem deve ser tido como um produto acabado, devendo, antes, ser vista como um contributo para uma reflexão alargada que possibilite, pela via do consenso, a adopção de um diploma que promova realmente o direito à igualdade de tratamento no trabalho e não constitua antes um obstáculo no acesso ao emprego.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Está inscrito, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa, mas o Sr. Deputado Victor Moura já não dispõe de tempo para responder, nem a Mesa está em condições de poder cedê-lo, a menos que o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa lhe ceda algum do tempo de que o PSD dispõe.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, tem a palavra, Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, a pergunta que tenho para fazer ao Sr. Deputado Victor Moura vai ser muito rápida, pelo que a resposta que terá de me dar também o será. Assim, creio, não haverá praticamente hipótese de contabilizar o tempo da resposta, mas, em qualquer dos casos, temos muito interesse em ouvi-Ia.
Sr. Deputado Victor Moura, o PSD colocou, relativamente a este projecto de lei do PCP, uma questão que tem a ver com a inversão do ónus da prova. O Sr. Deputado fez, da Tribuna, uma intervenção e nada disse acerca desse aspecto, disse apenas que o diploma merecia, presumo eu, se bem percebi, da vossa parte a aprovação, mas não esclareceu se os melhoramentos que pretende abarcam a questão do ónus da prova.
A questão que coloco, muito concretamente, ao Sr. Deputado é a de saber se a bancada do Partido Socialista aceita a ideia da inversão do ónus da prova ou se, pelo contrário, essa é uma das áreas onde pretende introduzir melhoramentos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Victor Moura.

O Sr Victor Moura (PS): - Sr. Deputado, como já dissemos, estamos dispostos a colaborar na melhoria deste articulado, tal como esperamos que o PSD o faça. Não vamos ter, com certeza, o mesmo comportamento que teve o PSD na legislatura anterior quando votou a favor de um novo articulado na especialidade e, depois, contra em votação final global. Não vamos fazer isso, porque estamos dispostos a contribuir para introduzir neste diploma todas as melhorias que forem possíveis. Não faremos, de certeza, a figura que fez o PSD nessa altura!

Vozes do PS: - Muito bem!.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tema palavra o Sr. Deputado Ismael Pimentel.

O Sr. Ismael Pimentel (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A igualdade de oportunidades entre homens e mulheres já não é, hoje em dia, uma qualquer expressão vã, se bem que consagrada constitucionalmente, mais um objectivo que a sociedade devia prosseguir más cuja prossecução se afigura difícil, distante, quase uma miragem.
Apesar da actual situação não ser a ideal, temos assistido, com indisfarçável satisfação, a alguns passos muito positivos neste capítulo, mormente no que concerne à existência de um sentimento social generalizado, alheio a idades e sexo, raças e credos, sentimento esse que se pode caracterizar como sendo de repulsa por práticas discriminatórias baseadas no sexo.
No entanto, não é nossa opinião que a existência de situações excepcionais, que precisamente pela sua excepcionalidade confirmam a regra, possa servir de pretexto para que se queira alterar pela via legislativa aquilo que deve ser alterado, sim mas como consequência, como tradução de um modo de sentir, de uma opção social não forçada.
Devemos, por isso, apostar na formação cultural do indivíduo, na evolução lógica da nossa sociedade que se traduzirá impreterivelmente em escolhas baseadas em factores como a qualidade e o mérito, ultrapassando, assim, de modo natural a questão do sexo como critério motivador ou desmotivador dessas mesmas escolhas.
Todavia, esta aposta no indivíduo e na sua formação, sendo aquela que se nos afigura mais lógica e correcta e que pode trazer a prazo melhores dividendos, poderá ser complementada por meios auxiliares. Nesse conjunto de meios a que nos referimos incluímos a criação de normas legais. Tal facto, como já dissemos, não deve ter como único fundamento a existência de situações de excepção mas, sim, o objectivo de prevenir, criando um enquadramento legal que deixe transparecer que atitudes discriminatórias baseadas no sexo dos indivíduos não serão toleradas, quer social quer legalmente.
Numa primeira análise seria, assim, de louvar uma iniciativa legislativa de suporte à defesa (que entendemos dever ser feita) da igualdade de direitos e oportunidades entre homens e mulheres.
Deste modo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o projecto de lei hoje apresentado pelos Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português seria merecedor, pelo menos no que ao escopo respeita, do nosso aplauso. No entanto, assim não é e a expectativa de aplauso esvai-se ultrapassada que seja a superficialidade das primeiras análises e mal nos detenhamos no articulado que dá copo aos objectivos enunciados.
Detenhamo-nos, pois, no articulado do projecto de lei n.º 133/VII. Não se tendo verificado em relação a uma trabalhadora em concreto uma prática discriminatória em função do sexo, como pode a lei prever a aplicação de. uma coima entre cinco e 10 salários mínimos mensais quando a existência de uma prática discriminatória em função do sexo constitui uma contra-ordenação punível com coima?
Cabe, pois, perguntar se, para efeitos de interposição de acção de recurso ou de reclamação, não é suposto existir uma prática discriminatória relativa a um sujeito em concreto, sendo que este deve alegar a discriminação de que foi alvo.
Por outro lado, em nosso entender, cabe perguntar por que motivo podem as associações sindicais constituir-se como assistentes nos processos contra-ordenacionais, que para o efeito beneficiam ainda de. isenção do pagamento da taxa de justiça e das custas.
Perguntámos por que motivo podem as associações sindicais constituir-se como assistentes nos processos contra-

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ordenacionais, beneficiando para o efeito de isenção do pagamento da taxa de justiça e das custas, mas podemos também perguntar se os subscritores do projecto de lei não temem que à utilidade, objectivo ou lógica do mesmo possa acrescer o facto de este ter como consequência o recurso excessivo a processos contra-ordenacionais, muitos deles sem qualquer fundamento, que teriam como único mérito contribuir com a sua quota parte para o entupimento dos nossos tribunais.
Por último, e sendo de referir que muitas mais reticências nos merece este projecto de lei, gostava de dizer que nos parece manifestamente excessivo ser punível com o crime de desobediência qualificada o facto de entidades públicas ou privadas não manterem pelo período mínimo de cinco anos ou sonegarem o registo de todos os recrutamentos feitos, donde constem, por sexos, uma série de elementos que permitam analisar a existência de eventuais discriminações das mulheres nesse local de trabalho ou emprego.
Concluindo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, ficamos na expectativa de que este projecto de lei seja significativamente melhorado, sendo, para tal, necessário introduzir importantes alterações.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei que hoje estamos a discutir, que garante o direito à igualdade de tratamento no trabalho e no emprego, teve por base a situação particularmente chocante do BCP, que lamentavelmente, em nossa opinião, não é uma excepção que venha confirmar a regra. Com efeito, independentemente de haver situações não tão gritantes noutras empresas, a realidade é que a discriminação existe e ignorá-la é fazer «política do faz de conta», é «meter a cabeça na areia», é não querer agir para que a mudança aconteça.
Como a experiência já demonstrou que é importante encontrar novos mecanismos legislativos capazes de contribuir para que a mudança ocorra e porque não podemos cruzar os braços à espera de que num qualquer dia a sociedade venha a despertar para a necessidade de alterar comportamentos, pensamos que é importante - e essa é uma responsabilidade deste Parlamento, dos Deputados que aqui estão e que assumiram, em relação aos seus eleitores, um compromisso de actuar para corporizar a igualdade de oportunidades e para garantir uma igualdade de tratamento nesta sociedade - agir para encontrar soluções legislativas.
Por isso, em nossa opinião, este diploma, independentemente de ter e de poder ser aperfeiçoado na especialidade, deve ser aprovado por esta Câmara.
Em relação à questão da inversão do ónus da prova que tem estado aqui em discussão, e que muito mexeu com a sensibilidade de algumas bancadas, pergunto aos Srs. Deputados se já se interrogaram sobre quantos é que são os casos respeitantes à desigualdade que efectivamente existe que estão neste momento em tribunal. Só quem ignora, quer ignorar ou finge ignorar aquilo que é a situação que se vive nalgumas empresas, a precaridade dos laços laborais existentes, a fragilidade em que as mulheres se colocam se quiserem pôr as entidades patronais em tribunal ao haver manifestamente - como é o caso - uma violação de direitos constitucionais ou uma violação da Convenção da Organização Internacional de Trabalho e o parecer do Provedor de Justiça que, sem tibiezas, é muito claro, é que não sabe que a realidade que se vive nas empresas não permite que individualmente seja fácil utilizar outros mecanismos. Porventura a não credibilidade dos tribunais é também algo que explica o não recurso à aplicação da lei, mas, efectivamente, em nosso entender, há que encontrar soluções, novos mecanismos e este é o momento adequado para o fazer, saldando aquilo que é uma dívida que existe em relação a muitas pessoas que votaram e que elegeram os Deputados deste Parlamento e que são, no fundo, aquelas que constituem a maioria da população portuguesa, as que continuam, quer esse facto nos incomode ou não, a ser quotidianamente discriminadas.

O Sr. Presidente: - Para fazer um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Ismael Pimentel.

O Sr. Ismael Pimentel (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, embora saiba que este projecto de lei não é da iniciativa de Os Verdes, gostava de colocar-lhe a seguinte questão: V. Ex.as não concorda comigo quando digo que não são situações de excepção que devem provocar uma situação legislativa?
O projecto de lei do Grupo Parlamentar do PCP, na sua exposição de motivos, diz o seguinte: «Este mesmo projecto de lei, e aquele que já tinha sido apresentado na legislatura anterior, diz: 'a qual nasceu da triste prática discriminatória desencadeada numa instituição bancária contra as mulheres'». Esta mesma exposição de motivos tem, depois, duas páginas completas em que só fala desta instituição bancária e rigorosamente de mais nada. Pergunto-lhe se isto me autoriza ou não a dizer que o Partido Comunista Português concorda também comigo nesta matéria, no sentido de que, de facto, há um carácter de excepção, que, inclusivamente, é utilizado na exposição de motivos, e não outro.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro, que, para o efeito, dispõe de 2 minutos cedidos pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, a questão relativa aos motivos que podem ter levado o PCP a elaborar nestes termos o preâmbulo deve ser dirigida a esse grupo parlamentar.
Na minha intervenção disse que o caso do BCP, pela dimensão, pelo carácter particularmente chocante que teve e que foi o que, de algum modo, mais marcou a opinião pública, terá sido porventura...

O Sr. Ismael Pimentel (CDS-PP): - É o único!

A Oradora: - Não é o único! Ou o Sr. Deputado vive num país «do faz de conta» ou, se vive com os pés assentes na terra, tem de entender que, independentemente daquilo que gostaria, que desejaria - e não sei se o que o Sr. Deputado deseja é o mesmo que eu... Aquilo que desejo, efectivamente, é a vivência de direitos e não a sua proclamação tão só em texto. E a vivência dos direitos e da igualdade não é só marcada negativamente no BCP. O BCP transvasou, foi para além das nossas fronteiras, chegou ao Parlamento Europeu e teve, pela sua dimensão, um

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carácter peculiar de tratamento, mas na realidade das empresas, e naquilo que tem a ver com o pagamento de salários, coma diferenciação, coma dificuldade de acesso e com a igualdade de tratamento, há diferenças muito significativas.
Por isso, ao contrário daquilo que o Sr. Deputado pensa, este caso para nós não é uma excepção mas, sim e lamentavelmente, uma parte integrante da regra.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito de defesa da honra, tem a palavra a Sr' Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, V. Ex.ª referiu-se à mentalidade retrógrada dos Deputados e Deputadas do PSD. Como fui eu que fiz a intervenção a que se referiu, em nome da minha bancada gostava de dizer-lhe que creio que a crítica que fez foi infundada e fácil. Nessa observação, tal como na pretensa resposta que deu às questões incómodas que foram por mim colocadas, foi gongórica no estilo e relativamente vaga no conteúdo.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, depois de toda a adjectivação que utilizou na intervenção que aqui fez no início do debate, agora os adjectivos ficaram, de algum modo, mais escassos. Daí que provavelmente não tenha ouvido a minha intervenção, mas está desculpada.
Efectivamente, limitei-me a retirar uma ilação hipotética da intervenção do Sr. Deputado do PSD. Ora, se o referido Sr. Deputado assumiu um discurso que não tem a ver com a posição da Sr.ª Deputada só temos de ouvir mais uma intervenção do PSD que não se alinhe com aquela que o mesmo Sr. Deputado há pouco aqui proferiu.
Quanto ao gongorismo da minha resposta, Sr.ª Deputada, ele terá a ver com a tal posição quixotesca e, simultaneamente, trágica do PSD na anterior legislatura. Não gostaria tanto do gongorismo; optaria mais pelo barroco.

Risos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 133/VII.
Entretanto, deu entrada na Mesa um requerimento, subscrito pelo PSD, para que este projecto de lei baixe à comissão sem prévia votação, pelo que ele só será votado na próxima quinta-feira, dia das votações.
Srs. Deputados, vamos dar início ao debate do projecto de lei n.º 93/VII - Alteração à Lei n.º 108/91, de 17 de Agosto (Conselho Económico e Social) (PSD).
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Hoje, estamos numa época de mudança em que há a convicção de que os valores democráticos, os requisitos de uma gestão eficaz dos recursos humanos e a procura de respostas cabais para os interesses e as necessidades de mulheres e homens exigem que se reconheçam, respeitem e valorizem as vertentes masculina e feminina da Humanidade.

Hoje, a questão da igualdade de tratamento entre mulheres e homens constitui reconhecidamente um princípio fundamental de direito e a igualdade de oportunidades assume-se enquanto uma componente essencial de uma cidadania democrática. Igualdade de oportunidades que não deve ser encarada como um mero objectivo lateral e periférico, reivindicado por franjas ou grupos minoritários do tecido social, correspondendo antes a um vector nuclear do desenvolvimento humano. Igualdade de oportunidades que também não se traduz num mero objectivo tecnocrático, nem num capítulo acessório das políticas sociais, mas sim num novo pressuposto da vivência democrática.
No ano transacto, teve lugar, em Pequim, a IV Conferência Mundial da ONU sobre as Mulheres que visou, essencialmente, contribuir para a realização da efectiva igualdade de género enquanto igualdade de direitos, de responsabilidades e de oportunidades. Por sua influência, é hoje clara a convicção de que para que mulheres e homens possam ser agentes e beneficiários do desenvolvimento sustentável centrado na pessoa humana é indispensável promover a real igualdade de oportunidades e a efectiva participação paritária de mulheres e homens na vida cívica, política, económica, social e cultural.
Esta a mensagem da declaração final e da plataforma de acção aprovadas na Conferência de Pequim por todos os países, em que ficou enfatizada a necessidade de incentivar a adequada mobilização e conjugação de recursos a nível dos Estados e da comunidade internacional e, bem assim, a indispensável articulação entre os governos e os vários sectores da sociedade civil, em obediência, aliás, ao novo paradigma, integral e sistémico, das sociedades modernas.
Esta, também, a mensagem do 4.º Programa de Acção para a Igualdade de Oportunidades, aprovado pelo Conselho de Ministros da União Europeia em Dezembro de 1995, onde se sublinha que a igualdade entre homens e mulheres deve ser promovida no conjunto das acções e das políticas a todos os níveis. Daí que tivesse sido acolhido o principio do mainstreaming, no sentido de introduzir, de forma activa e visível na definição das acções e das políticas, a consideração dos seus efeitos possíveis na situação respectiva de homens e mulheres.
Na senda das conclusões do Conselho Europeu de Essen, o Programa de Acção assume, assim, que a concretização da igualdade de oportunidades deve ser prosseguida pela União Europeia como uma tarefa fundamental, constituindo a participação de homens e mulheres em pé de igualdade um elemento-chave do desenvolvimento duradouro e um símbolo do grau de maturidade política das sociedades.
Mas também a União Europeia não pode, nem deve, monopolizar as acções concretas em ordem a essa promoção. A acção comunitária pode ser catalisadora, mas não deve dispensar o envolvimento dos Estados, dos poderes públicos, da sociedade civil, dos media e, não menos importante, a aliança entre mulheres e homens.
Em face, pois, de uma sociedade em clara mutação, impõe-se construir a parceria, estimulando a mudança nas vivências das mulheres e dos homens e nas suas aspirações nos domínios público e privado: integrando a igualdade no diálogo social; integrando a igualdade no discurso e na prática política; promovendo a mudança de atitudes através da educação, da cultura e dos meios de comunicação.

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É neste contexto que, atendendo à necessidade de mobilizar em torno da promoção da igualdade todos os agentes da vida económica e social e considerando os objectivos e as atribuições do Conselho Económico e Social e, consequentemente, o seu potencial para encorajar activamente a referida mudança, contribuindo para o respectivo desenvolvimento, aprofundamento e consolidação, o Partido Social Democrata toma a presente iniciativa legislativa, propondo que na composição daquele Conselho tenham obrigatoriamente assento estruturas orgânicas representativas da paridade e igualdade de oportunidades.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Não havendo inscrições para pedidos de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ismael Pimentel, para uma intervenção.

O Sr. Ismael Pimentel (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação a esta matéria, o Partido Popular não tem muito a acrescentar ao que foi proposto pelo Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata.
No entanto, não queremos deixar de pronunciar-nos em relação à proposta que é feita no sentido de «Que um dos oito representantes do Governo que integram o CES, designados por Resolução do Conselho de Ministros, seja em representação do Alto Comissariado para as Questões da Promoção da Igualdade e da Família (Artigo 3.º, n.º 1, alínea c))». Assim, lembramos que na alínea p) do mesmo artigo 3.º já está estabelecido que haja um representante das associações de família e, portanto, terá de haver algum cuidado para não enveredarmos pela duplicação de representatividade.
Quanto à proposta da entrada de representantes das associações para a igualdade de oportunidades para homens e mulheres, entendemos que está correcta porque, de facto, até agora, o Conselho Económico e Social não integrava nenhum representante destas mesmas associações e, portanto, estamos de acordo.
Não posso deixar de salientar, relativamente ao Alto Comissariado para as Questões da Promoção da Igualdade e da Família, que gostaríamos de ver maior dinâmica neste Alto Comissariado e, portanto, que o respectivo representante a ser nomeado para o Conselho Económico e Social pudesse promover alguma dinâmica que, repito, não temos visto até agora.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou tecer algumas breves considerações sobre esta questão da proposta de alteração da composição do Conselho Económico e Social.
O Conselho Económico e Social tem vindo a ganhar importância através de toda a sua actuação pela representatividade contida no seu seio e pela prática que vai desenvolvendo e, pela nossa parte, entendemos que, reflectindo na composição do Conselho, poderemos encontrar alguns aspectos que merecem correcção.
Devo dizer que partilhamos boa parte das considerações feitas sobre o interesse e a fundamentação da introdução de um representante das associações na área da igualdade de oportunidades para mulheres e homens. Pensamos que há um conjunto de aspectos que têm de ser ponderados quanto à composição do Conselho. Sabemos que, por parte dos vários parceiros sociais e dos seus sectores representativos, têm surgido sugestões e propostas e que tem havido alguma discussão em torno dessa representação. No entanto, entendemos que deve ser extremamente bem ponderada a arquitectura do próprio Conselho Económico e Social porque julgamos que a proposta agora apresentada pode constituir uma das pedras de toque desta recomposição, tal como também poderá sê-lo, por exemplo, a revisão do processo de representação das organizações agrícolas, já que sabemos que, no que diz respeito a esta área, há a necessidade de procedermos a alterações. O mesmo poderá dizer-se quanto à provável abordagem da eventual ampliação ou modificação do sistema de representação das associações de família.
Em suma, julgamos que, sendo importante a inclusão no Conselho de um representante das organizações representativas da área da igualdade de oportunidades para mulheres e homens, há outros aspectos da composição do Conselho Económico e Social que devem ser ponderados.
Quanto à representação do Governo, não partilhamos das opiniões expressas pelo PP e, aliás, julgamos que este não é contexto adequado para proceder a essa discussão. Pensamos é que há que ponderar muito bem e que, por uma questão de mínima delicadeza, talvez devêssemos ouvir o Governo antes de procedermos a alterações relativamente ao critério de atribuição da respectiva representação, tal como entendemos que deveriam ser ouvidos alguns elementos do próprio Conselho Económico e Social, nomeadamente o próprio presidente actualmente em funções, antes de alterarmos a composição.
Portanto, consideramos que o projecto de lei em apreço é uma peça no sentido da introdução de maior representatividade na composição do Conselho Económico e Social embora não seja a única, pois, como referi, pensamos que há que ter em conta a representatividade da área agrícola e das associações de família.
Assim, se vier a mexer-se na composição do Conselho, pensamos que esse deverá ser um processo muito bem ponderado e discutido, para o que manifestamos a nossa disponibilidade no sentido de, em sede de especialidade, procedermos à respectiva discussão. Em consonância, apresentaremos oportunamente um requerimento exprimindo esta orientação que aqui referi.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que, hoje, a necessidade de ponderar a composição do Conselho Económico e Social está bastante generalizada nesta Câmara, tal como em muitos sectores sociais e profissionais que ali não se vêem devidamente representados, sem prejuízo das opiniões de fundo de cada bancada sobre o papel, o funcionamento e a actividade do Conselho no quadro da sociedade portuguesa.
Nesse âmbito, somos favoráveis ao alargamento da representação no Conselho à participação das associações representativas da igualdade de oportunidades para mulheres e homens ou às próprias associações de mulheres especificamente consideradas. Aliás, o nosso projecto de lei n.º 163/VII, que vai ser discutido a seguir, que reforça os direitos das associações de mulheres, embora de âmbito mais vasto do que o deste que discutimos agora, também inclui um ponto expresso em que propomos que seja consagrado o direito de representação das associações de mulheres no Conselho Económico e Social. Contudo, re-

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pito que se trata de um projecto de lei com um âmbito mais vasto, que abrange outros aspectos, com vista ao reforço dos direitos das mulheres, mas, neste aspecto particular, sobre o qual me debruço agora, converge com esta ideia da necessidade de reponderação da composição do Conselho Económico e Social em função destes interesses que acabei de referir.
Por outro lado, estamos ainda de acordo em que é importante aproveitar esta oportunidade para procedermos a uma reflexão mais global acerca da futura presença de outras entidades no Conselho Económico e Social, designadamente, algumas das referidas pelo Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, como as associações representativas do sector agrícola e, porventura, outras cuja reivindicações nesse sentido têm chegado à Assembleia da República de há uns tempos a este parte.
Assim, sendo claramente favoráveis ao projecto de lei apresentado pelo PSD que aponta para a participação das associações de mulheres no Conselho Económico e Social, somos também favoráveis a que se aproveite este momento para uma reponderação global da composição do mesmo.
Portanto, daremos o nosso voto favorável a uma solução que, em sede de especialidade, permita fazer esta reponderação global, sem prejuízo do objectivo central do debate em curso.

O Sr. Octávio Teixeira (PC P): - Muito bem!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Tomo a palavra para manifestar a opinião do Grupo Parlamentar de Os Verdes sobre o projecto de lei apresentado pelo PSD.
Efectivamente, um maior papel interventor das mulheres na sociedade pressupõe que as suas organizações representativas tenham assento em múltiplas instâncias que desempenham um papel importante na sociedade portuguesa. Por isso,, parece-me ser uma questão pacifica e consensual que as organizações de mulheres estejam presentes no Conselho Económico e Social.
Aliás, independentemente da opinião manifestada por alguns Srs. Deputados quanto à reponderação da composição do Conselho Económico e Social, penso que também é tempo de começarmos a discutir e a reflectir sobre o alargamento da participação das organizações de mulheres noutros órgãos consultivos que, quanto a nós, não têm tido mas devem ter um papel mais activo na defesa do meio ambiente. Refiro-me, em concreto, ao IPAMB (Instituto Português do Ambiente) cuja composição actual não inclui organizações de mulheres e que, em termos de política ambiental, muito beneficiaria com a participação das associações de mulheres, com vista à modificação de padrões de consumo e de padrões culturais, em relação aos quais nos parece óbvio que as mulheres, pelo seu papel, pela forma como estão na sociedade, dariam seguramente um contributo extremamente enriquecedor.
Assim, quero manifestar a nossa concordância em relação a este projecto de lei em apreço.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que está encerrado o debate do projecto de lei n.º 93/VII.

Vamos passar à discussão conjunta dos projectos de lei n.os 155/VII Associações de Família (PS), 156/VII - Lei das Associações de Família (PSD), 157/VII - Apoio à maternidade em famílias carenciadas (PSD), 163/VII - Reforça os Direitos das Associações de Mulheres (PCP), 169/VII - Acompanhamento Familiar de Deficientes Hospitalizados (Os Verdes), 171/VII - Altera a Lei n.º 4/84, de 5 de Abril (Lei da Protecção da Maternidade e da Paternidade) (CDS-PP) e do projecto de resolução n.º 23/VII - Sobre a instituição do Cartão-Família (PS).
Os Srs. Deputados usarão da palavra de acordo com a ordem de entrada dos diplomas.
Tem então a palavra a Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro.

A Sr.ª Maria do Rosário Carneiro (PS): Sr. Presidente, Srs. Deputados: É hoje apreciado, em Plenário, um conjunto de projectos relativos a áreas fundamentais para a construção de uma sociedade que se quer mais justa, equilibrada e coesa. Estão em causa projectos relativos à igualdade de oportunidades entre mulheres e homens, projectos relativos à família, pelo que quase poderíamos dizer que se trata de um raro momento de humanização deste nosso quotidiano, em que a dominante da reflexão se centra em valências já bem pouco comuns, como a das comunidades dos afectos e a da igualdade, valências essas determinantes para o desempenho da cidadania plena.
O Grupo Parlamentar do PS apresenta hoje dois projectos que são expressão inovadora do reconhecimento da função insubstituível da família enquanto geradora vital de frágeis e indispensáveis equilíbrios sociais e da consequente definição de instrumentos que reconhecem a sua importante função social, quer viabilizando a sua participação a nível da construção colectiva, quer encontrando meios de reforço dos quotidianos domésticos.
Estes projectos são uma sequência natural de preocupações já expressas no passado e de princípios enunciados e consagrados nos Estados Gerais, no programa eleitoral do PS, e no Programa do XIII Governo Constitucional.
A família é a comunidade de afectos onde toda a vida social se estrutura, onde se inicia a socialização, onde se pratica a solidariedade e se aprende a cidadania. E porque assim é, ao Estado cabe reconhecer-lhe claramente as funções, os direitos e os deveres, definir-lhe o quadro jurídico e institucional de viabilização daquelas funções, daqueles direitos e daqueles deveres.
A Constituição da República consagra-a como elemento fundamental da sociedade, considera-a como realidade social objectiva, garante-a como instituição jurídica necessária, estabelecendo que incumbe ao Estado, para protecção da família, «definir, ouvidas as associações representativas das famílias, e executar uma política de família com caracter global e integrado».
Incumbe assim ao Estado a definição e aprovação prioritárias do quadro jurídico de criação e de actuação das associações de família, o qual representa o instrumento que irá viabilizar às famílias, de forma coordenada e concertada, a participação na feitura das políticas que lhes respeitam, o primeiro passo para que se dê, de facto, início à formulação sistemática das políticas de família e da sua respectiva execução.

O Sr. António Maninho (PS): - Muito bem!

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A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei relativo às associações de família é a expressão da efectivação de direitos e deveres de coresponsabilização na construção de um projecto comum, é o reconhecimento do importante papel daquelas associações enquanto actores na sociedade civil «sujeitos de mediação» entre o indivíduo e a comunidade geral, é a devolução à sociedade civil das competências que visam o seu envolvimento real no processo de tomada de decisão.
Este projecto de lei visa ainda, e pelo conjunto de direitos atribuídos às associações, devolver às famílias a responsabilidade do desempenho da sua função social, progressivamente reduzido e substitutivamente assegurado pelo Estado e outras instituições sociais.
Confere-lhes, assim, a dignidade e o enquadramento legal necessários para á defesa dos direitos e interesses da família, enquanto parceiro social que participa na formulação das políticas que lhe respeitam e que se pretendem de carácter global e integrado, a autonomia na elaboração, aprovação e modificação dos respectivos estatutos, bem como a liberdade de se associarem ou filiarem em uniões e confederações; assegura-se-lhes representatividade genérica, de âmbito nacional, seleccionadas pela estrutura governamental responsável e consagra-se ainda o direito ao tempo de antena, o direito de informação, bem como a extensão da aplicação do mecenato associativo.
Este projecto corresponde a uma já velha ambição das associações de família, insere-se no quadro institucional previsto na Constituição da República e inscreve-se num movimento europeu de longas tradições de participação democrática, preenchendo uma lacuna importante de envolvimento da sociedade civil.
O projecto de resolução n.º 23/VII, também da iniciativa do Grupo Parlamentar do PS, relativo à instituição do cartão-família, visa formular uma solução possível, entre muitas outras, de desagravamento dos encargos domésticos quotidianos das famílias portuguesas. Não se trata de encontrar fórmulas de viabilização das despesas familiares mas, simplesmente, se delineia um modelo concreto que, apelando à participação solidária da sociedade civil, através de fórmulas diversas de acordos ou protocolos, pretende introduzir alguma redução nos pesados encargos diários - em alimentação, vestuário, transportes, despesas escolares, entre outras - e, simultaneamente, a possibilidade de acesso a alguns bens, de natureza mais recreativa, habitualmente arredados das rotinas familiares.
Este projecto de resolução pretende ser um sinal de evidente reconhecimento do papel único e insubstituível das famílias enquanto geradoras dos indispensáveis equilíbrios sociais e inequívocos repositórios de esperanças para a permanência e renovação das sociedades; sinal que, ao propor a introdução dei' um mecanismo, bem simples, de desagravamento de cus os quotidianos, rotineiros, quer significar às famílias a evidência inquestionável da sua importância.
A sociedade que Criámos, Srs. Deputados, é um estranho lugar desertifidado da nossa mais profunda humanidade, dominado por poderosas valências económicas, determinado por critérios privilegiadamente materialistas ou contabilistas. O sonho ou, pelo menos, a possibilidade de sonho, capital mágico para a feitura e desenvolvimento solidário dos projectos, progressivamente está mais arredado da construção colectiva. Cada vez mais difícil se torna encontrar sinais desta nossa humanidade perdida.
Os projectos que hoje se discutem são contributos reais para a recuperação deste capital humano e são, também, sinais de um sonho que se recupera e que reintroduz, pouco a pouco, as frágeis e poderosas valências dos nossos quotidianos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Maria José Nogueira Pinto e Pedro da Vinha Costa.
Antes de dar a palavra ao próximo orador, informo que, em relação ao projecto de lei n.º 93/VII, deu entrada na Mesa um requerimento, nos termos do artigo 158.º do Regimento, que será votado na próxima reunião plenária.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro, o projecto de lei n.º 155/VH levanta-me uma dúvida que me causa alguma perturbação. É que, sendo a família a primeira sociedade e a base de tudo, nele prevê-se que pode ser-lhe dada representatividade através de um processo de selecção pela estrutura governamental responsável! A Sr.ª Deputada considera que é possível que entreguemos a uma estrutura governamental, seja ela qual for, a selecção das famílias e da sua representatividade?

A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Não é nada disso!

A Oradora: - Neste momento, como sabe, existem muitas associações e confederações de família com assento no Conselho Económico e Social e, também, no Conselho Económico e Social da União Europeia, mas a Sr.ª Deputada traz hoje, aqui, um projecto de lei que vai entregar a uma estrutura governamental, a quem cabe fazer a apreciação dos respectivos estatutos, o poder de decidir sobre se tal ou tal associação de família tem capacidade para participar naquilo que lhes diz respeito! Considero que isso é andar para trás, Sr.ª Deputada.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, havendo mais um orador inscrito, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

A Sr.ª Maria do Rosário Carneiro (PS): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Então tem a palavra o Sr. Deputado. Pedro da Vinha Costa.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro, a questão que lho queria colocar prende-se com o projecto de resolução que prevê a instituição do cartão-família. Ora, tendo em conta que a família é, em muitos casos, composta por pessoas de vários escalões etários, que existe um cartão jovem e, ao que se sabe, vem aí o cartão do idoso, pergunto se a intenção que está por detrás da criação deste cartão-família é a de substituir todos os outros e abarcar, num só, todas essas situações ou, pelo contrário, o que se pretende é separar as questões de uma forma que, sinceramente, não compreendo muito bem.
Faço esta pergunta, porque me parece que o que se pretende com a vossa proposta é a criação de um «cartão jovem» para toda a família. Se assim é, não se percebe muito bem que haja uma panóplia de cartões, o que,

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porventura, trará o custo adicional de arranjar uma «embalagem» para colocar todos os cartões necessários a uma família que abarque, pelo menos, mais do que uma geração.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro.

A Sr.ª Maria do Rosário Carneiro (PS): Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, não creio que a interpretação que fez acerca da apreciação, pelo órgão governamental, dos estatutos das associações de família seja à mais correcta.
Com efeito, não se pretende fazer depender a aferição da bondade e das finalidades associativas ou, sequer, da representatividade da mesmas. O que está em causa é a atribuição de um estatuto novo, finalmente tratado legalmente, que diz respeito à representatividade e participação a nível da feitura das políticas de família, aspecto que já carece de alguma ponderação na apreciação de critérios. Aliás, e tal como decorre da discussão de todos os outros diplomas, este projecto também terá de ser objecto de alguma melhoria, em sede de especialidade, nomeadamente naquilo que se refere à precisão dos critérios para a atribuição deste estatuto efectivo de participação na feitura das políticas de família, no Conselho Económico e Social, como parceiro social.
Permita-me que lhe diga que a CNAF é a única confederação das associações de família que está representada no Conselho Económico e Social, por negociação quase privada, entre ela e os órgãos próprios. A representação que encontramos, a nível internacional, coincide com o facto de ser a mesma pessoa a desempenhar as funções de presidente da CNAF e do IOF. Também existem associações de família representadas nas ONG, mas com um estatuto muito diferente do da participação em feitura de políticas ou de legislação.
O Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa referiu-se ao cartão-família e à necessidade de termos de comprar um «saquinho» para guardar uma multiplicidade de cartões de desconto - no fundo, é disso que se trata. Suponho, e permita-me que brinque um pouco com a sua ideia do «saco», que a generalidade das famílias não se importaria de fazer esse adicional de despesa para colocar os cartões com os respectivos descontos!
É evidente que a figura que aqui está subjacente precedeu a criação do cartão jovem ou do cartão do idoso, pois o que se pretende é desagravar os quotidianos das famílias, como referi, ainda há pouco, na minha intervenção e como está subjacente no corpo do projecto. No fundo, o objectivo é retornar aos grupos familiares e recuperar as unidades sociais, privilegiando-as em detrimento dos indivíduos.
O cartão jovem e o cartão do idoso vão abranger estratos etários de uma população com características específicas, e o que se pretende é que as famílias, pelo facto de terem uma sobrecarga nas suas despesas reais, por se constituírem como tal, tenham, de forma privilegiada, este tipo de desoneração nas respectivas despesas. Não se trata de procurar criar uma multiplicidade de cartões mas, sim, de reconhecer que há alguma dificuldade quotidiana para quem tem de fazer um volume de despesas muito significativo para a manutenção do seu agregado doméstico.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, de apresentação do projecto de lei n.º 156/VII, tem a palavra a Sr.ª Deputada Filomena Bordalo.

A Sr.ª Filomena Bordalo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É aceite, pelo menos em termos de princípios, que a família é a instituição fundamental da sociedade, é uma realidade educativa, cívica, económica e social, é uma realidade dinâmica, mantendo, simultaneamente, traços essenciais de transmissão de vida, de valores e de princípios, é também o espaço para a aprendizagem da prática da democracia, da participação e da igualdade de oportunidades, é ainda o agente e parceiro social educativo e económico, em suma, é a garantia da coesão social.

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Pela sua natureza e responsabilidade, a família é sujeito de deveres entre os seus membros, perante o País e a sociedade.
É igualmente reconhecido no ordenamento jurídico que a família tem direito à protecção da sociedade e do Estado.
Mas se o reconhecimento teórico e ideológico do papel e importância da família é indispensável, não é, contudo, suficiente.
O reconhecimento daqueles direitos exige a definição e o desenvolvimento de uma política de família que seja, simultaneamente, global e autónoma, coerente e integrada.
É um imperativo político que uma política de família, que se quer para as famílias , seja definida com as famílias. Daí a importância que reveste, para aquela definição, a participação das famílias, através das suas organizações, que importa sejam estimuladas e regulamentadas.
Com o presente projecto de lei, o PSD pretende definir á constituição, os direitos e deveres das associações de família, enquanto associações de apoio, promoção e defesa dos direitos e dos valores da família.
O incentivo ao associativismo familiar previsto no projecto de lei n.º 156/VI1 é, simultaneamente, o reconhecimento do direito de a família se associar para defender os seus interesses e valores e também o reconhecimento do seu dever de participação.
Consideramos que a aprovação do sistema de associativismo familiar é um passo importante que irá certamente contar com a adesão e a participação das famílias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é um grande passo, é um passo determinante. Mas é igualmente fundamental um esforço colectivo na tomada de consciência da família, enquanto valor, considerando-a não apenas como objecto de políticas mas também como sujeito.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Filomena Bordalo, peço desculpa, mas «volto à carga» com o artigo 4.º, que se repete e agrava neste projecto de lei do PSD.
Sabemos que as políticas de família são diferentes das políticas sociais e uma das razões por que são substancialmente diferentes é porque reconhecemos à família uma autonomia e uma anterioridade ao próprio Estado. Portanto, a participação das famílias na definição das políticas sociais é uma vantagem para o Estado e, se assim não for entendido, tudo o mais, Sr.ª Deputada, desculpe que lhe diga, é folclore e pode ser perverso.

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Neste sentido, e havendo já o associativismo familiar, estando já as famílias, melhor ou pior representadas aos diferentes níveis - isso já não é um problema nosso -, o que lhe pergunto é se um reforço da participação das famílias nos órgãos que vão, eventualmente, tratar das políticas familiares, pode ser feito em troca deste sentido de autonomia, deste sentido de espaço de liberdade anterior ao Estado e, porventura, contra o Estado. É que quando falamos de políticas sociais, falamos de uma coisa; quando falamos de políticas familiares dizemos, com muita frequência, que o que é preciso é que o Estado não agrida as famílias. A maioria das políticas anti-familiares seria, no fundo, fazer desaparecer as políticas familiares, e a Sr.ª Deputada sabe isso muito bem.
Todos os dias se legisla com total indiferença pelas famílias, criando, por conseguinte, muitas vezes, agressões às famílias. É o caso da fiscalidade, é o caso da habitação e do urbanismo, é o caso do trabalho, etc.
Por isso, se queremos reivindicar políticas familiares que assentem, sobretudo, na não agressão à família, como se explica que se considere que algum serviço público, ou direcção-geral, ou alto comissário para as questões de promoção possa ser o avaliador da idoneidade dessas associações? Imagine que essas associações se constituem para se defenderem do Estado, Sr.ª Deputada. É óbvio que, nesse caso, não estão lá sentadas. Imagine que se constituem umas associações «fantoche». Nesse caso, sentam-se lá e nós, aqui, neste Plenário, passaremos a dizer que temos associações de família onde devemos ter e que temos políticas de família, quando isso não é verdade.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Filomena Bordalo.

A Sr.ª Filomena Bordalo (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, a questão que colocou é muito pertinente e a propósito dela gostava de deixar muito claro que este projecto de lei que o PSD apresentou não põe em causa, de todo, a liberdade de associação que, aliás, está consignada na Constituição.
Os limites que são colocados relativamente aos estatutos, à idoneidade dos outorgantes, à legalidade de uma associação existem, tão-somente, em função dos benefícios que são concedidos a essas associações. Mas, repito, não está minimamente em causa o direito de associação de qualquer entidade, de qualquer pessoa, no nosso país. Aliás, esta «limitação», se quiser entendê-la assim, não é inovadora neste projecto de lei, pois já sucede assim com as associações de estudantes, com as associações de pais e encarregados de educação.
De qualquer forma, também nesta matéria, parece-me importante manifestar a abertura e a disponibilidade do grupo parlamentar para, em sede de comissão, se poderem aperfeiçoar estes aspectos e outros que eventualmente surjam.
Ainda a propósito das políticas, gostava também de reforçar que, para o PSD, uma política de família não é um somatório de políticas sectoriais, é muito mais do que isso.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Almeida Santos.

O Sr. Presidente: - Para apresentar o projecto de lei n.º 157/VII - Apoio à maternidade em famílias carenciadas (PSD), tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Luísa Ferreira.

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No escasso tempo de que dispomos para apresentar o projecto de lei n.º 157/VII, de apoio à maternidade em famílias carenciadas, propomo-nos fazer uma ligeira reflexão sobre a necessidade, a justiça e o direito dos seus destinatários às medidas ora em discussão.
São elas destinadas a famílias não abrangidas pelo regime contributivo da segurança social, sinónimo, quase sempre, de não existência de vínculo laboral, com fraquíssimos ou inexistentes recursos económicos.
Esta vulnerabilidade não pode deixar de reflectir-se negativamente, e de forma ainda mais aguda, no momento da maternidade, sobre todo o agregado familiar e, de forma muito particular, sobre a criança que nasce em tão adversa quanto injusta situação. E seja-me permitida uma especial referência às famílias monoparentais, na, sua maioria mulheres, mães solteiras, que, em certas camadas da população portuguesa, vivem em extrema pobreza ou mesmo em situação de marginalidade.
Há casos de jovens mulheres, por vezes quase crianças, sem habilitação para trabalhar nem idade para ter vínculo laboral, seres profundamente desprotegidos e carentes de solidariedade, que vivem a maternidade - momento alto das suas vidas, que deveria ser de alegria e esperança - em situação de angustiante incerteza e abandono.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Constituição da República, no seu artigo 13.º, reconhece a todos os cidadãos o direito à não discriminação em função da situação económica, entre outras. Mas é um facto que estas crianças, ao não serem totalmente abrangidas pela legislação em vigor, que protege todas as outras, estão a ser discriminadas por razões de ordem económica a que são alheias, no pró rio momento em que nascem.
É nosso entendimento que o Estado deve reconhecer a sua função social, em todas as circunstâncias em que a maternidade ocorre, e não pode alhear-se de situações que, na prática, violam princípios básicos de solidariedade.
Compete-lhe agir pela positiva, criando os instrumentos legais que concorram para minorar situações adversas como são as destas famílias.
O desenvolvimento social de um povo e o seu bem-estar, bem podem medir-se, Sr. Presidente e Srs. Deputados, pelos cuidados que presta às suas crianças não só ao longo do seu crescimento e desenvolvimento mas, desde logo, nos primeiros tempos de vida e em situação de igualdade para todas.
As medidas ora em discussão constituem, por isso, uma gritante exigência moral e legal.
É este o nosso entendimento e esperamos que também seja o da Câmara, ao permitir que as propostas vertidas neste projecto tomem forma de lei.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para apresentar o projecto de lei n.º 169/VII - Acompanhamento familiar de deficientes hospitalizados (Os Verdes), tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Apesar de os direitos das pessoas portadoras de deficiência estarem, de há muito, consagrados em importantes documentos das Nações Unidas, da União Europeia ou no próprio texto constitucional, a verdade é que a esse património de direitos proclamados não corresponde, de modo algum, um património de direitos vividos.

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Assim, não só se constata mais de uma década volvida sobre a adopção pelas Nações Unidas - em 1983 - de um programa mundial de acção relativo às pessoas deficientes, sendo certo que a prevenção, a reabilitação e a equiparação de oportunidades, como objectivos nele definidos, continuam por atingir, como, no plano interno, a própria Lei de Bases de Prevenção, Reabilitação e Integração de Pessoas com Deficiência, aprovada neste Parlamento em 1989, permanece, em muito, esvaziada de conteúdo.
Uma evidência que o confronto da realidade, a cada passo, no quotidiano, vem inequívoca e brutalmente comprovar, através dos mil e um obstáculos que, no contexto das diferentes esferas da sua vida, às pessoas deficientes se colocam, provando-se, assim, que, mais do que as próprias incapacidades, é o complexo sistema de inacessibilidades do meio ambiente, as atitudes sociais, não raro hostis, a incapacidade de organização da sociedade, sem atender à diferença, que impedem efectivamente as pessoas deficientes de assumirem um estilo de vida comparável ao do das não deficientes.
Uma situação de discriminação institucional inaceitável, visível nas mais diversas situações, numa sociedade que teima em permanecer insensível e em continuar a estigmatizar, incapaz de garantir a igualdade na diferença, de adoptar medidas, de discriminar positivamente, de adequar soluções que salvaguardem o efectivo exercício do direito à educação, à saúde, ao emprego e à não discriminação dentro dele, à habitação, à vida sexual, à paternidade e a ter e criar filhos, à comunicação, à participação cívica e política, à própria mobilidade.
A mobilidade, um direito que, aparentemente, de tão elementar se julgaria já assegurado, mas que, mesmo neste Parlamento, numa Casa que a todos os portugueses pertence, insiste em não ser pensado e em não ser adequado às limitações de cada um, proibindo-se e interditando-se, de facto, o livre acesso de todos os cidadãos portugueses, no caso, das pessoas deficientes, a um espaço que é também seu.
Situações inaceitáveis que traduzem mais do que uma efectiva recusa da igualdade de oportunidades entre cidadãos, uma autêntica negação de direitos humanos a um significativo número de cidadãos discriminados deste modo. Uma discriminação que atinge nada mais nada menos, segundo a Organização Mundial de Saúde, do que 10 % da população portuguesa, isto é, um milhão de portugueses, número porventura subavaliado se tivermos em conta o elevadíssimo número de acidentes de viação, de trabalho e o envelhecimento da população.
Razões, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que Os Verdes entendem, para se reflectir seriamente sobre a questão, razões sobretudo para não cruzar os braços mas para sensibilizar e agir. Assim o começámos a fazer com a inclusão no nosso projecto de revisão constitucional de propostas concretas, assim o fazemos hoje, assumindo o compromisso de, em múltiplos domínios, continuar a apresentar propostas de que o presente projecto de lei se assume como parte integrante.
Trata-se, pois, no caso concreto, de atender às necessidades específicas da pessoa deficiente quando internada em hospital ou unidade de saúde, propondo uma medida que, em nosso entendimento, em muito pode contribuir positivamente para a corporização dos seus direitos nessa condição peculiar, através do reconhecimento do direito de acompanhamento familiar permanente à pessoa deficiente hospitalizada. Acompanhamento que possa ser assegurado pelos pais, mãe ou pai, cônjuges ou quem os substitua normalmente, tendo em conta que a sua presença é comprovadamente susceptível não só de facilitar a reabilitação do doente, de favorecer o seu equilíbrio psicológico, mas também de contribuir objectivamente para minimizar todo o vasto conjunto de constrangimentos que as pessoas deficientes, nessa situação, acrescidamente, têm de ultrapassar e que, deste modo, melhor podem enfrentar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é um projecto de lei que, nos termos da Lei de Bases de Prevenção, Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência, assenta no pressuposto e no reconhecimento do papel da família e na importância que o seu envolvimento tem para o processo de reabilitação. Um projecto de lei, em síntese, que se não tem a pretensão de esgotar o conjunto de iniciativas que sobre os direitos das pessoas deficientes urge tomar, identifica uma situação, um problema, propõe uma solução que, estamos convictos, este Parlamento não irá desperdiçar.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, há pouco fez uma afirmação com a qual concordo inteiramente, que é a preocupação da vivência dos direitos. Como sabe, existe legislação que permite o acompanhamento das crianças que estão internadas em hospitais, mas também, como deve saber, não se consegue que isso se torne efectivo na maioria das situações, uma vez que os pais não podem estar ao pé dos filhos.
Na medida em que aqui não temos só a incumbência de legislar e «letra morta», perguntava-lhe se fez algum levantamento de situações de incumprimento da legislação já existente para o acompanhamento de crianças internadas, sob pena de este seu projecto acabar também por se tornar uma «letra morta».

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, efectivamente, a Lei n.º 28/81 estabelece a possibilidade de acompanhamento das crianças por parte dos seus pais. Independentemente de haver algumas situações em que as unidades hospitalares não têm condições de espaço e em que se torna difícil a vivência deste direito, outras há em que é salvaguardado, ainda que com dificuldades - assumo-o -, designadamente em relação à permanência nocturna, que esse mesmo diploma admite para os pais de crianças hospitalizadas.
De facto, tivemos oportunidade de, antecipadamente à apresentação deste projecto, debater a questão com as associações de deficientes, constatando-se que o problema se coloca, de algum modo, em relação à permanência nocturna. No nosso projecto, se a Sr.ª Deputada teve oportunidade de o ler, coloca-se a questão, que tem de existir em qualquer uma destas situações, de vir a ajustar, no futuro, as novas unidades hospitalares, criando condições de espaço efectivas para que o exercício deste direito possa acontecer.
Há situações peculiares que têm de ser complementadas com o exercício deste acompanhamento, designadamente - e são aspectos que o nosso projecto contem-

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pla - a identificação de doentes entrados que são portadores de deficiência e que, actualmente, se não faz e que devem ter, desde logo, reflexos em termos dos próprios locais em que são colocados, portanto, do ratio em relação a doentes e a todo a equipa de cuidados que lhe está associada. De qualquer modo, por aquilo que é a experiência vivida, não por nós mas pelas próprias associações, a existência desta lei, no fundamental, tem possibilidades de ser exercida.

O Sr. Presidente: - Para apresentar o projecto de lei n.º 163/VII - Reforça os direitos das associações de mulheres (PCP), tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Luísa Mesquita.

A Sr.ª Maria Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Gostaria de começar por referir que nos parece consensual, e ninguém negará, que muitos dos avanços conseguidos na humanidade, concretamente na sociedade portuguesa, se devem a movimentos, a associações de mulheres. A listagem seria imensa, não podemos negar esse facto, apesar de muitas vezes esses mesmos movimentos virem afectados de imagens caricaturais, assexuadas, dessas mesmas mulheres que, de uma forma clara, ao longo das últimas décadas, tem assumido a defesa de uma sociedade mais justa, de uma sociedade paritária e mais igualitária.
De facto, penso que todos concordarão que, nessa luta, têm desempenhado um grande papel as organizações de mulheres, concretamente do nosso próprio país, contra a discriminação e no sentido de uma sociedade mais digna e mais justa.
Já hoje aqui, neste Plenário, se falou de dois aspectos que, por si só, justificam a apresentação do nosso projecto de lei, por um lado, a questão das mentalidades e, por outro, a feminização da pobreza. Eu diria que estes dois vectores são, de algum modo, os traços mais pertinentes que justificam o conteúdo da nossa iniciativa legislativa que hoje repomos e que retoma o texto de projecto de lei n.º 100/VI, que apresentámos na anterior Legislatura, exactamente com a mesma epígrafe. Aliás, conviria registar que o PSD decidiu não agendar, na anterior legislatura e, apesar de o projecto ter sido aprovado na generalidade, acabou por restar no esquecimento e no alheamento em sede da Subcomissão da Igualdade, sem que tivesse subido a Plenário da Assembleia da República para ser votado na especialidade.

O Sr. Ismael Pimentel (CDS-PP): - Exactamente!

A Oradora: - Eu diria que, provavelmente, talvez ainda, nesta altura, o PSD não tenha desenvolvido o tal traço de mentalidades necessário, de que há pouco falei, à discussão do reforço dos direitos de associações de mulheres que permita o alargar dos seus direitos e da garantia desses mesmos direitos.
Todavia, gostaria de referir, de uma forma muito sucinta, dois aspectos que nos parecem importantes e que se ligam exactamente à mudança de mentalidades. Um deles tem que ver com o facto de o nosso projecto prever que as associações de mulheres possam gozar de direito de tempo de antena na rádio e na televisão. Consideramos que este pode ser um excelente princípio para a concretização da vertente adjuvante da mudança das mentalidades, isto é, transmitir efectivamente a outras mulheres, a todos os homens, à família, ao País, essa mulher livre, essa mulher lutadora, essa mulher íntegra e inteira, capaz efectivamente de prosseguir a mutação em termos de mentalidades.
Um outro aspecto e uma outra vertente que o nosso projecto reitera tem que ver com a consagração do estatuto de parceiro social para as associações de mulheres, conferindo-lhes nomeadamente o direito à representação directa ou indirecta no Conselho Económico e Social. E este direito tem que ver com a triste realidade que já hoje também aqui referimos e que é a feminização de pobreza. De facto, é imprescindível consagrar o estatuto de parceiro social às associações de mulheres no Conselho Económico e Social, no sentido de obstar ao aumento dessa feminização da pobreza.
Além disso, um outro aspecto que o nosso projecto de lei avança e que nos parece importante, tem que ver com a presença de associações regionais de mulheres e a sua participação em termos de discussão de planos regionais e locais de desenvolvimento económico. Em outros países, concretamente em França, na Inglaterra e na Grécia esta participação tem constituído uma experiência positiva.
Parece-nos, pois, também aqui importante a presença das mulheres no sentido de encontrarem as justas medidas de desenvolvimento económico, local e regional que, de algum modo, possam responder àquilo que a mulher, na sua vertente própria de ser humano, entende como o melhor local, a melhor região, a melhor cidade, a melhor aldeia, para a fruição da vida, a tempo inteiro, da família, da mulher, da criança e do homem.

O Sr. Ismael Pimentel (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Penso que, em termos das vertentes mais importantes que caracterizam este projecto de lei, nada mais temos a acrescentar. A nossa firme convicção é que, efectivamente, ele possa ter um destino sobejamente diferente daquele que teve na anterior legislatura e que não possa merecer, concretamente da parte do PSD, um estatuto de menorização de forma a poder percorrer um caminho similar àquele que teve de alheamento e esquecimento em termos de discussão na especialidade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, para apresentar o projecto de lei n.º 171/VII - Altera a Lei n.º 4/84, de 5 de Abril (Protecção da Maternidade e da Paternidade) (CDS-PP).

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Por decisão das Nações Unidas, 1994 foi instituído Ano Internacional da Família. O seu repto foi o de construir a mais pequena democracia no coração da sociedade. O seu logotipo era uma casa, símbolo do bem estar e da segurança, com um telhado incompleto, sinal dos riscos e agressões que hoje vitimam inúmeros famílias no mundo inteiro.
Procurar formas de vencer tais riscos e agressões foi o trabalho que, ao longo de mais dois anos, mobilizou cidadãos e governantes de diferentes países.
Apelou-se à necessidade de não confundir políticas sociais com políticas familiares, às vantagens de políticas coerentes globais e integradas, à mais valia de uma política familiar preventiva.
Obrigou-se ao balanço de mais de duas décadas de desgaste do tecido familiar e dos fracos resultados obti-

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dos com a transferência para o Estado de funções tradicionalmente cometidas às famílias.
Acentuou-se o núcleo de benefícios que advêm do funcionamento equilibrado da família: a prevenção de problemas sociais; soluções mais humanas; o desenvolvimento das comunidades e o fortalecimento da sociedade; a formação e educação das novas gerações.
Proeurou-se que os governos dos diferentes Estados promovessem o desenvolvimento de políticas de família baseadas nos princípios da concertação, coordenação, eficácia e flexibilidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em Portugal, o balanço do Ano Internacional da Família foi fraco. Não obstante o grande empenhamento de quantos foram chamados a colaborar, o governo de então pouco ou nenhum seguimento deu ao trabalho realizado pela comissão e organismos ligados à família.
Mas como mais vale tarde do que nunca, não posso deixar de manifestar o meu regozijo e da minha bancada ao ver chegar a este Hemiciclo um conjunto de projectos que reflectem, pelo menos, estas preocupações.
Regozijo sim, mas também muitas dúvidas. É que, para além da intenção, dificilmente se poderá considerar este conjunto de projectos o embrião de uma política familiar.
E que, nesta matéria, a primeira grande preocupação deverá ser a de não confundir políticas sociais com políticas familiares. As primeiras, como sabemos dirigem-se aos indivíduos, são verticais e neutrais. As políticas familiares são transversais, dão dimensão familiar às políticas sectoriais, dirigem-se à família enquanto instituição própria e são, portanto, subsidiárias, na medida em que à família se reconhece um importante e relevante papel de parceiro social, com individualidade e identidade próprias, simultaneamente una e autónoma.
E é por tudo isto que, nesta matéria e nos próximos anos, o principal objectivo terá de ser o do reajustamento das políticas social e redistributiva, no sentido de atenderem aos encargos familiares e favorecerem a prevenção das disfunções de natureza familiar, contribuindo assim para a sua unidade e estabilidade.
Se os três objectivos de uma política familiar são facilitar a coesão internada família, estabelecer a equidade na repartição das riquezas e restabelecer o equilíbrio intergeracional, podemos, então, salientar como três dos mais relevantes pilares de uma política familiar a fiscalidade, o urbanismo e a habitação e a conciliação da vida familiar e profissional.
Senão, vejamos: o reconhecimento do valor sócio-económico da função educativa e do trabalho de casa deve ter como corolário, como expressão efectiva, o reajustamento da política social e redistributiva, de acordo com os encargos familiares, e também a conciliação da vida familiar com o emprego, facilitando igualmente a partilha de responsabilidades entre pai e mãe.
Finalmente, há que realçar o urbanismo como política integrante de espaços habitacionais, sociais e de lazer e a efectiva garantia do acesso à habitação como condição básica da própria dignidade humana e familiar.
É neste entendimento que o Partido Popular propõe hoje, a este Plenário, para discussão, duas medidas de grande importância. A primeira traduz um apoio inequívoco aos pais com vista a tornar eficaz o direito já reconhecido mas reduzido letra morta, a uma licença para assistência a filhos menores.
Como é sabido, esta licença, tal como se encontra na Lei n.º 4/84 e diplomas regulamentares, resulta altamente penalizadora ao cortar totalmente os rendimentos do trabalho, interromper a contagem de tempo de serviço para efeitos de reforma e não prever qualquer esquema de reinserção no posto de trabalho.
Em sede de lei, e posteriormente em sede regulamentar, propõem-se as necessárias alterações.
Acrescenta-se ainda um regime especial para uma situação que; para o Partido Popular, merece especial tratamento: o acompanhamento de filhos deficientes e doentes crónicos. Todos sabemos como estas situações são extremamente penosas ara os pais em particular e para as famílias em geral pois um imperativo de justiça que se lhes atribua um regime próprio.
A segunda - sob a forma de um projecto de resolução - tem como objectivo o estabelecimento do equilíbrio na repartição das riquezas, visando uma igualdade de sacrifícios, impedindo que as pessoas sejam fiscalmente prejudicadas por constituírem uma família e reforçando a solidariedade geracional, ao permitir a possibilidade de serem englobadas no agregado familiar os rendimentos dos ascendentes, ao mesmo tempo que os elementos do agregado familiar contariam para efeitos de criação e aplicação de um quociente familiar.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Uma política de família é, num primeiro momento, uma política cara. Tal não nos deve, porém deter.
Os custos ocultos - mas bem reais - da desagregação da família são, em muito, superiores. Limito-me a referir apenas um: o declínio do crescimento natural (1 % em 1970 e 0,12 % em 1991), explicado pela rápida queda da fecundidade (2,2 em 1980 e 1,4 em 1991), que já não assegura a substituição das gerações.
Portugal envelhece e perde a sua mais importante riqueza, o seu factor humano, e é neste país envelhecido que vimos enfraquecer a solidariedade geracional das famílias.
Aumenta a pobreza e exclusão social e desagrega-se o seu principal amortecedor, analisam-se as deficiências do sistema educativo e minimiza-se o veículo mais estável de transmissão e aprofundamento dos valores éticos, culturais e educacionais e é por tudo isto, Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputado que, para o Partido Popular, uma política de família terá sempre uma factura pagável: porque é o melhor investimento a médio e longo prazo que o País pode e deve fazer.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Apalavra à Sr.ª Deputada Helena Roseta, para uma intervenção, dispondo de mais três minutos que lhe, foram concedidos por Os Verdes.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, gostaria de começar por fazer uma constatação, ao fim desta tarde de debate. Estivemos aqui a discutir temas relacionados com a mulher e com a família, ou seja, quase obrigatoriamente fomos conduzidos a juntar a mulher e a família, o que significa duas coisas, aliás, contraditórias: por um lado, que a presença de mulheres no Parlamento leva a que da agenda política conste á matéria social, familiar e privada; por outro lado, que isto tem também uma leitura perversa, a de confinarmos a intervenção das mulheres ao espaço familiar.
Penso que a primeira leitura é a mais interessante e prende-se com aquilo que aqui pretendia salientar, ou seja, o privado é político, como dizem as feministas america-

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nas, o espaço do privado, o espaço da família é também um espaço do político, da intervenção política, porque se não corrigirmos desigualdades e problemas com o acesso às oportunidades, que surgem nesse mesmo espaço, não conseguimos concretizar os objectivos generosos da Constituição da República e da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
A segunda constatação que queria fazer é que assistimos aqui à apresentação de diplomas em três sentidos diferentes: diplomas dirigidos à discriminação com base no sexo, diplomas dirigidos à ampliação dos direitos sociais, designadamente à introdução de medidas positivas relativamente a estratos da população que têm discriminações reais, como o seja o dos deficientes e respectivos pais, e, finalmente, diplomas dirigidos ao reconhecimento do espaço da família e aos modos de articulação desse espaço no diálogo com as estruturas oficiais e com as políticas governamentais.
Nesta matéria gostaria de dizer, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, que é quase inevitável, quando falamos em direitos sociais, que se fale também em família, havendo alguma confusão entre as duas coisas, embora elas não se sobreponham completamente.
Temos de ter em conta que vivemos num país em que o Estado providência nunca existiu; o que existe, como diz o Professor Boaventura Sousa Santos, são famílias providência, ao que costumo acrescentar que o que existe são as mulheres providencia. É por causa de não termos um Estado providência que estamos aqui a discutir os problemas da família e das mulheres, porque elas é que têm de ir «a todas». Portanto, todas estas questões surgem relacionadas, quando pegamos nestes problemas.
Mas ainda bem que estamos a pegar nestes problemas, embora não de uma forma total e global, ou seja, estamos a tentar cobrir lacunas da legislação portuguesa e, efectivamente, temos de lhes pegar muito mais para irmos muito mais longe.
Para finalizar, gostaria de dizer que, segundo penso, este debate vai ter de ter uma expansão importante neste Parlamento, até porque a questão da família é, hoje, está hoje a sofrer uma grande alteração. Falámos aqui em família como se houvesse um só modelo, mas a verdade é que, hoje, existem n modelos de família e o papel da mulher está relacionado com essa alteração de modelos.
Em suma, em meu entender, temos de caminhar para uma sociedade mais plural, mais diversa, mais rica, em que as diferenças sejam aceites e até estimuladas, desde que sejam diferenças que contribuam para a realização da pessoa; se forem diferenças que contribuam para a discriminação, elas têm de ser combatidas.
Assim, neste objectivo, independentemente das nossas diferenças partidárias, todos temos de fazer um esforço para que, nesta Casa, o social seja também político.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos. A próxima sessão terá lugar na quarta-feira, dia 19, pelas 15 horas, dela constando o debate sobre o pacto educativo, da iniciativa do Governo.
Antes de encerrarmos a sessão, o Sr. Secretário vai dar uma informação.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, é apenas para informar que, por lapso, não foi referenciado na ordem do dia de hoje o projecto de resolução n.º 24/VII, apresentado pelo CDS-PP, sobre política global de família, que, no entanto, vai ser votado na próxima quinta-feira, dia 20.
Entretanto, deram entrada na Mesa dois requerimentos, que foram distribuídos, no sentido de baixa à Comissão dos projectos de lei n.os 169/VB e 171/VII, os quais serão igualmente votados na próxima quinta-feira.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 45 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Fernando Marques Ribeiro Reis.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Vital Martins Moreira.

Partido Social Democrata (PSD):

Álvaro dos Santos Amaro.
António da Silva Antunes.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Gilberto Parca Madail.
José Guilherme Reis Leite.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Durão Barroso.
Manuel Castro de Almeida.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
António José Gavino Paixão.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
João Rui Gaspar de Almeida.
José Alberto Cardoso Marques.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Rita Maria Dias Pestana Cachuxo.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.

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Partido Social Democrata (PSD):

Carlos Alberto Pinto.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Rúben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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