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21 DE JUNHO DE 1996 2857

Direito - a dignidade da pessoa humana -, se fundamenta em razões de natureza humanitária a que o Estado se encontra estruturalmente vinculado.
O tema da libertação antecipada dos reclusos com doenças em fase terminal está na ordem do dia por toda a Europa e nos demais países que se preocupam com os direitos humanos.
Como acaba de ser afirmado no âmbito do seminário «Reclusos em fase terminal: mudar a lei», organizado pelo Observatório Internacional das Prisões, em Aix-en-Provence, nos passados dias 6 e 7 do corrente mês de Junho, com a participação de 32 Estados membros do Conselho da Europa, embora os problemas sejam idênticos, as respostas variam de país para pais, os procedimentos são longos, complexos e aleatórios e o aperfeiçoamento das legislações constitui tarefa imposta à generalidade dos Estados por força dos quadros normativos de direito internacional em que se movem.
Citam-se, designadamente, as normas e recomendações extraídas da Declaração Universal dos Direitos do Homem, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e de Recomendações editadas pelo Conselho da Europa e pela Organização Mundial de Saúde.
A proposta de lei que está na presença de VV. Ex.as vem acompanhada de uma longa exposição de motivos, que procura contextualizar o quadro genético desta iniciativa.
Permitir-me-ão, no entanto, que sintetize aqui o ambiente normativo estruturante e adicione alguma informação complementar, que se afigura pertinente.
A questão da libertação antecipada de cidadãos condenados em pena de prisão afectados por doença grave e irreversível em fase terminal passou a assumir especial visibilidade nos últimos anos, face à emergência e desenvolvimento do fenómeno da SIDA no meio prisional.
Tradicionalmente, os problemas graves de saúde dos reclusos e a avaliação da possível conciliação da doença com a realização das finalidades das penas - fosse a dominante colocada na vertente da retribuição, fosse na vertente da prevenção -, reconduziam-se, na sua análise e relevância jurídico-processual, aos quadros dos institutos clássicos do indulto ou da liberdade condicional.
O aumento explosivo do número de doentes em estado grave no seio dos estabelecimentos prisionais, por virtude da SIDA, veio concentrar a atenção dos Estados, das organizações internacionais e das associações preocupadas com a promoção dos direitos do homem.
O problema da SIDA nas prisões foi objecto de especial atenção dos trabalhos da 8.ª Conferência dos Directores da Administração Penitenciária, organizada pelo Conselho da Europa, em 1987, ocasião em que foram apresentados os resultados de um inquérito sobre a SIDA nas prisões, com referência ao final do ano de 1986, nos Estados membros do Conselho da Europa.
Já então foi possível constatar que, na maioria dos países, se encontrava prevista a possibilidade de transferência de reclusos afectados para um centro penitenciário especializado, se existente, ou para um hospital civil, e que, em alguns deles, era mesmo possível a própria libertação antecipada.
Muito importante, neste domínio, tem sido, desde então, a acção do Conselho da Europa.
O tema da libertação antecipada ou das medidas alternativas à prisão conexiona-se com o estatuto e os direitos dos reclusos e as suas projecções ao nível da protecção da dignidade da pessoa humana e de direitos fundamentais e da sua conciliação com a realização das finalidades das penas e medidas privativas de liberdade.
Embora privado do direito de liberdade, todos o sabemos, o detido mantém a titularidade dos demais direitos fundamentais garantidos pela Constituição, pela lei e pelas normas de direito internacional vigentes nesta matéria.
Enquadrado pelo regime constitucional de tutela da dignidade humana e dos direitos e liberdades fundamentais, de que se destacam o direito à saúde e proibição de sujeição a tratamentos desumanos ou degradantes (artigo 25.º da Constituição), o estatuto do detido encontra-se definido no Decreto-Lei n.º 265/79, de 1 de Agosto, em que se proclama o princípio essencial de que o recluso mantém essa titularidade dos direitos fundamentais, apenas sujeito às limitações resultantes do sentido da condenação, da ordem e da segurança do estabelecimento.
Consagra-se também a regra de que a execução das penas privativas de liberdade deve orientar-se de forma a reintegrar o recluso na sociedade e a prevenir a prática de futuros crimes, preparando o recluso para, no futuro, conduzir a sua' vida de modo socialmente responsável sem cometer crimes.
Assim se reproduzem no direito interno normas de direito internacional convencional de tutela de direitos fundamentais, em que particularmente se destaca a Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
A Recomendação n.º R 1080 (1988) da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa - adoptada na sequência da Resolução n.º 812 (1983), relativa ao Síndroma da Imunodeficiência Adquirida, e da Recomendação n.º R (87) 25 do Comité de Ministros, relativa a uma política europeia comum de saúde pública de luta contra a sida considera a conveniência de se conceder uma atenção particular à população prisional, onde o número de casos de infecção é considerado preocupante, e adopta um conjunto de recomendações aos governos dos Estados membros, entre as quais a de permitir a libertação definitiva dos detidos condenados pela doença, por razões humanitárias.
Em 18 de Outubro de 1993, o Comité de Ministros adoptou a Recomendação n.º R (93) 6, relativa aos aspectos penitenciários e criminológicos do controle das doenças transmissíveis, nomeadamente da SIDA, e aos problemas conexos da saúde nas prisões.
Esta Recomendação veio contemplar especialmente os aspectos referentes à libertação antecipada dos reclusos, incitando os Estados membros a adoptarem medidas, na medida do possível, de modo a possibilitar a libertação antecipada dos detidos afectados pelo VIH, em fase terminal, e a permitir-lhes receber um tratamento apropriado fora da prisão.
No mesmo sentido se tem orientado a intervenção da Organização Mundial de Saúde. Cito, designadamente, as directivas sobre seropositividade e SIDA nas prisões (Genève, Março de 1993), que recomendam a libertação antecipada de reclusos com SIDA avançada, de modo a facilitar o contacto com a família e os amigos, permitindo ao recluso encarar a morte com dignidade e em liberdade.
O direito comparado fornece-nos subsídios á merecer a nossa atenção.
A possibilidade de libertação antecipada encontra-se prevista em sistemas nacionais diversificados como ó argentino, o egípcio ou o polaco ou em sistemas mais próximos como o espanhol, o francês, o alemão, o belga, o italiano, o finlandês, o islandês ou o inglês.

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