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3070 I SÉRIE - NÚMERO 90

Creio que, se não houve comedimento da parte do Comandante, da parte da hierarquia e do Sr. Secretário de Estado deveria ter havido, como membro do Governo, o comedimento suficiente para não prestar tais declarações,
apurando primeiro os factos é respondendo depois às questões.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais do que nunca, mais do que ontem ou no passado, torna-se imperioso falarmos de educação. Este tema, tantas vezes aqui referenciado como uma paixão, não tem passado de amor platónico.
A educação incomoda, porque entra em casa de todos nós com a violência do inevitável. Por ela sofrem os pais, queixam-se os alunos, são incompreendidos os professores. Por ela se batem os filósofos, os pedagogos e os homens das ciências da educação.
A educação de qualidade é algo de tão importante que nada nem ninguém pode ficar-lhe indiferente: uns, porque lhes enche a alma de esperança, outros, porque a sentem com a angústia do irrealizável.
A educação, no nosso País, tem cumprido, umas vezes mal, outras menos mal, o acto do ensino. As escolas têm sido chamadas a trabalhos oficinais. Os alunos são, no actual sistema de ensino, os eternos condenados às experiências avulsas. Basta que alguém ou algum sistema de ensino lá de fora faça ou tente ensaiar uma «nova moda» e lá vamos todos a correr, para fazer algo igual, sem sequer cuidarmos de saber se as condições sociais e económicas são as mesmas, se o clima o permite, se a personalidade individual e colectiva tal consente. Porque parecem bem lá fora, então, também têm de dar resultado em Portugal. Erros como estes têm proporcionado desvios e distorções de todo o tamanho e feitio.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A escola dos nossos dias anda desnorteada, às cegas, tacteando fantasmas, fantasiando sem bem saber o quê, navegando à vista como se não houvesse a certeza do rumo certo. E a verdade é esta: se perguntássemos que modelo de ensino existe em Portugal, julgamos que seria pergunta sem resposta.
A escola dos nossos dias não pode deixar de considerar os desmandos que estão a produzir-se diariamente na sociedade portuguesa. Deve olhar-se para eles com a certeza e a responsabilidade de quem tem obrigação de intervir. A escola, Sr.ªs e Srs. Deputados, não educa para a solidariedade humana como caminho duma postura assumida de paz. As guerras trazem-nos diariamente testemunhos de como as próprias crianças já pensam em egoísmos e em vinganças. Se elas reagem assim, é porque o clima de conflito que presenciam à sua volta lhes forma uma consciência desta natureza.
Vamos, então, encontrar outro caminho para penetrar na alma das nossas crianças, não com ódios e vinganças, não com armas ou roubos, não com egoísmos e consumos supérfluos, mas com abnegação para as coisas nobres, com doação para os mais necessitados. Preguemos a paz em tempo de guerra, mas façamos nas nossas escolas uma guerra diária à violência, ao conflito e ao egoísmo.
Mas como será isto possível, se as crianças das nossas escolas não se sentem seguras dentro ou fora dos recreios? Como podemos dizer-lhes que acreditem num mundo

melhor, se elas vêem os seus professores serem insultados diariamente pelos próprios pais e desautorizados pelos seus superiores?
Reina nas nossas escolas um permanente estado de intranquilidade. Os alunos estão intranquilos, porque não sabem como se devem livrar da violência gratuita dos recreios. Os professores estão intranquilos, porque, se cumprem as exigências dos programas, são acusados de exigentes; se são disciplinadores, são acusados de salazarentos; se são justos na avaliação, estão obsoletos; se deixam correr, são ineficazes, e, assim, são julgados num jogo em que estão sempre a perder, por qualquer dos ângulos que se analise a questão.
O sistema educativo é outro manancial de intrincados pressupostos. Fala-se em descentralização e verifica-se que as direcções regionais de educação pouco mais são do que meros entrepostos burocráticos. Existem vazios de competência por todos os lados. Umas vezes dizem que a competência é do Ministério, outras vezes é o Ministério a dizer que a competência é das direcções regionais.
Faz-se grande barulho com as propinas, com a investigação, com as cantinas universitárias, e ninguém quer saber das crianças de seis anos que andam quilómetros para ter escola, que não têm cantina para comer no intervalo para a refeição, que regressam a casa cheias de fome e frio.
Ninguém apoia a investigação no ensino básico, como se o insucesso escolar só existisse a partir do ensino superior.
Contestam-se os transportes públicos, porque os utentes vão «à pinha» e raramente se contestam os transportes escolares onde igualmente os alunos vão a pé. Apenas se fala de quando há um desastre, e depois tudo volta à mesma, naquela indiferença que só não é farisaica porque é pior do que isso: é calculadamente malévola.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: E que dizer da legislação? Uma manta de um pobre não tem mais remendos. Aquilo é um tal emaranhado de leis e decretos, de decretos e portarias, de portarias e despachos normativos, de despachos normativos e circulares, que não há quem se encontre neste labirinto. Manta de retalhos, disse eu? Muito pior, porque a manta velha ainda se pode deitar fora e substituir por outra. Mas aquela legislação, que ninguém sabe, que também quase ninguém consegue cumprir, não se pode deitar fora. Está lá e veio para ficar. Pedimos, uma vez mais, aos responsáveis pelo Ministério da Educação que criem uma comissão especializada para fazerem menos legislação e melhor legislação. A continuarmos assim, não há quem resista. Façam-se leis que se entendam, leis que todos saibam interpretar, que se saibam ler, sem a necessidade de recorrer a artifícios linguísticos. Os professores deste País merecem este esforço.
Os professores são os principais agentes da mudança. Não são funcionários públicos. As escolas não são repartições públicas. Os alunos não são utentes dos serviços. A docência não é uma prestação de serviço a termo certo, ainda que, quanto a isto, tenhamos de ter vergonha por possuirmos no sistema educativo professores pagos como mulheres a dias. Que desgraça, que vergonha, para um País que se diz querer entrar e estar no pelotão da frente dos países europeus. Está na frente como máquina, e o resto do comboio fica de fora?
Os professores querem que se lhes reconheça a diferença. Os professores não dizem que são melhores do que os funcionários públicos. 0 que eles afirmam - e é

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