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Sexta-feira, 11 de Outubro de 1996 I Série - Número 108

DIÁRIO da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 1.A SESSAO LEGISLATIVA (1995-1996)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 10 DE OUTUBRO DE 1996

Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Maria Lusa Lourenço Ferreira

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos:

Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da entrada na Mesa de requerimentos e da resposta a alguns outros, dos projectos de lei n.os 210/VII e 211/VII e do voto n.º 42/VII-De protesto pela atitude do Governo e do Primeiro-Ministro na campanha eleitoral dos Açores.
Em declaração política o Sr. Deputado Pacheco Pereira (PSD) fez a análise dos resultados do 19.º Congresso do seu partido e teceu críticas à acção governativa. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Francisco de Assis (PS), Octávio Teixeira (PCP) e Jorge Ferreira (CDS-PP).
No âmbito do debate de urgência, requerido pelo PCP, sobre as ameaças para Portugal resultantes da 2.ª fase da integração dos produtos têxteis e vestuário nas regras, da Organização Mundial de Comércio, usaram da palavra, a diverso título, além dos Srs. Secretários de Estado dos Assuntos Europeus (Francisco Seixos da Costa) e da Competitividade e Internacionalização (Fernanda Freire de Sousa), os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Fernando José de Moura e Silva (CDS-PÉ), Francisco Torres (PSD), Carlos Pinto (PSD), Carlos Lavrador, Henrique Neto, José Saraiva e Carlos Zorrinho (PS).

Ordem do dia.- Os projectos de lei n.os 208/VII - Criação de vagas adicionais no ensino superior, reposição de justiça no acesso ao ensino superior (PSD), 209/Vll-Cria vagas adicionais para os estudantes que realizaram a 2.ª fase dos exames nacionais (CDS-PP), 215/VII- Criação de vagas adicionais no acesso ao ensino superior (PCP), a proposta de lei n.º27/VII - Estabelece o principio a que deve obedecer o regime de recrutamento e selecção de directores de serviço e chefes de divisão para os quadros da Administração Pública e os projectos de lei n.os 115/VII-Alteração do Decreto-Lei n.º323/89, de 26 de Setembro (Revê o Estatuto do Pessoal Dirigente da Função Pública) (CDS-PP) e 158/VII-Altera o Estatuto do Pessoal Dirigente (PSD) foram aprovados na generalidade.
A Câmara aprovou também três pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando três Deputados a prestarem depoimento em tribunal na qualidade de testemunhas.
Foram aprovados ainda os n.os 97 a 101 do Diário.
Procedeu-se à discussão do inquérito parlamentar n.º5/VII-Ao acordo estabelecido entre o Estado e o Sr. António Champalimaud (PCP). Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Octávio Teixeira (PCP), Manuel dos Santos (PS), António Galvão Lucas (CDS-PP), Vieira de Castro (PSD), João Carlos da Silva (PS) e Carlos Pinto (PSD).
O Decreto-Lei n.º63/96, de 28 de Maio - Aprova o processo de reprivatização do capital social da Tabaqueira-Empresa Industrial de Tabacos, S.A. [ratificação n.º21/Vll (PCP)] foi apreciado, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças. (Teixeira dos Santos), os Srs. Deputados Rodeia Machado (PCP), António Galvão Lucas (CDS-PP), Duarte Pacheco (PSD), Joel Hasse Ferreira (PS), Octávio Teixeira (PCP) e Macário Correia (PSD).
Procedeu-se também à apreciação conjunta dos Decretos-Leis n.os 74/96, de 18 de Junho - Cria a Lei Orgânica do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas ¡ratificação n.º22/VII (PSD)J e 75/96, de 18 de Junho - Fixa a lei quadro das direcções regionais de agricultura [ratificação n.º23/VII (PSD)], sobre os quais se pronunciaram, além dos Srs. Secretárias de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural'(Capoulas Santos) e dos Assuntos Parlamentares (António Costa), os Srs. Deputados Cruz Oliveira (PSD), Helena Santo (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP), Gavino Paixão (PS), Carlos Duarte e Carlos Coelho (PSD), Jorge Lacão (PS); Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP) e Manuela Ferreira Leite (PSD).
Foi ainda debatido o Decreto-Lei n.º 84/96, de 29 de Junho - Define as condições legais aplicáveis à concessão de apoios por parte do Estado ao sector da comunicação social, bem como à coordenação e à distribuição da publicidade do Estado, em especial pelas rádios locais e regionais e pela imprensa regional [(ratificação n.º24/Vll (PCP)]. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social (Arons de Carvalho), os Srs. Deputados António Filipe (PCP), Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP), Miguel Macedo (PSD) e António Reis (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 20 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueira.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raimundo Pedro Narciso.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Teresa Maria Gonçalves Gil Oliveira Pereira Narciso.
Victor Brito de Moura.
Vital Martins Moreira.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.

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Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madail.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
João Álvaro Poças Santos.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Povoas.
José de Almeida Cesário.
José Gonçalves Sapinho.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas. .
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Augusto Torres Boucinha.
Carlos Manuel de Sá Correia.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas, dos requerimentos e das respostas a requerimentos que foram apresentados à Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: projectos de lei n.os 210/VII Sobre o Financiamento do Ensino Superior (CDS-PP) e 211/VII - Estabelece o Regime, de Acesso ao Ensino Superior (CDS-PP), que baixaram ambos 6.ªComissão.
Na sessão plenária de 2 de Outubro, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: à Secretaria de Estado da Cultura, formulado pela Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha; ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Costa Pereira; ao Ministério para a Qualificação e o Emprego e à Secretaria de Estado das Pescas, formulados pelo Sr. Deputado António Rodrigues; aos Ministérios do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e das Finanças, formulados pelos Srs. Deputados Macário Correia e Luís Sá; a diversos Ministérios e ao Governo, formulados pelas Sr.as Deputadas Luísa Mesquita e Isabel Castro; a Sua Excelência o Sr. Presidente da Assembleia da República, formulado pelo Sr. Deputado Afonso Candal.
Na reunião plenária de 3 de Outubro, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: aos Ministérios da Economia e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelo Sr. Deputado Pedro Baptista; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Arnaldo Homem Rebelo; ao Ministério para a Qualificação e a Emprego, formulado pelo Sr. Deputado José Reis; ao Ministro Adjunto, formulado pela Sr.ª Deputada Filomena Bordalo; ao Ministério para a Qualificação e o Emprego e às Secretarias de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território e da Educação e Inovação, formulados pelo Sr. Deputado Soares Gomes; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Bernardino Vasconcelos; ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados José Calçada e Jorge Ferreira; ao Ministério da Saúde, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.

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No dia 3 de Outubro: Adriano Azevedo, nas sessões de 3 e 4 de Julho; Macário Correia, no dia 23 de Julho.
No dia 8 de Outubro: Fernanda Costa, na sessão de 22 de Maio; Fernando Pedro Moutinho e Manuel Alves Oliveira, na sessão de 11 de Julho; Manuela Aguiar, no dia 16 de Julho; Lino de Carvalho e Carlos Luís, na Comissão Permanente de 18 de Julho; Arménio Santos, no dia 23 de Julho; Rodeia Machado, no dia 24 de Julho; Sílvio Rui Cervan e Isabel Castro, no dia 30 de Julho, e Jorge Ferreira, no dia 4 de Setembro.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Realizou-se, no passado fim-de-semana, o XIX Congresso do PSD.
Os portugueses acompanharam esse congresso com o interesse que todos os congressos do PSD suscitam. Os portugueses habituaram-se a ver nos congressos do PSD o mais dinâmico retrato da vida política partidária e têm sido os congressos do PSD que mais fizeram para dar a conhecer todas as forças e fraquezas desse elemento essencial da democracia representativa que são os partidos políticos. Os congressos do PSD não podem ser reduzidos a um espectáculo mediático, nem interessam aos portugueses apenas pelo seu lado incidental. Interessam aos portugueses, porque lá se encontra o pulsar da nossa democracia e cada um se pode reconhecer, seja qual for o partido ou as opiniões, nos debates que aí se travam. Eles mostram que a vida política em democracia é feita por homens e com os defeitos dos homens e nada têm da sacralização reverente dos comícios unanimistas das ditaduras.
O XIX Congresso alterou profundamente os estatutos do PSD, realizando, deste modo, a primeira revisão estatutária aprofundada de um partido na década de 90.
Nessa revisão estatutária foram tornadas medidas de reforço de democraticidade interna, de transparência financeira, de verdade, quanto à implantação e à militância do partido a nível nacional. Em muitos aspectos desta revisão estatutária, traduz-se a preocupação, que, desde o 25 de Abril, tem vindo a ser manifestada, de que os partidos políticos, que têm um papel hegemónico na vida pública portuguesa - quiçá excessivo -, tenham regras estatutárias que garantam a sua democracia interna e a transparência dos seus procedimentos face aos portugueses.
Este é um mérito indiscutível do Presidente do PSD, Marcelo Rebelo de Sousa, e que exigiu coragem política. Estas mudanças, exactamente por serem verdadeiras mudanças, geram sempre incompreensão e atingem interesses instalados, que fecham o partido à sociedade, o isolam dos melhores e mais capazes e lhe retiram credibilidade. Esta revisão estatutária e o processo de actualização dos ficheiros mostram que o PSD compreende, também nestas questões, o que os portugueses lhe disseram a 1 de Outubro de, 1995.
O facto de o PSD defrontar, com clareza e pela política - e através da política, no sentido mais nobre do termo -, as suas dificuldades é que dá lugar ao retomo da sua credibilidade pública. Dá, assim, um exemplo a outros partidos, que têm nalguns casos idênticos problemas e que os escondem debaixo do tapete do poder.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Entre estes problemas, avulta o do financiamento dos partidos políticos. 0 PSD reitera aqui o apelo feito aos outros partidos para que se chegue a um acordo urgente, no sentido de alterar a lei de financiamento partidário. Não haverá saúde no sistema partidário português nem qualquer renovação da vida pública, enquanto nos partidos políticos existir esse verdadeiro cancro, que é a falta de transparência no financiamento partidário.

Aplausos do PSD.

Aceitem, pois, participar num esforço comum que, sem aumentar de um tostão o apoio estatal, que é pago com o dinheiro dos contribuintes e dele devem ser prestadas boas contas, recentre o financiamento dos partidos nos seus militantes e permita o controlo dos gastos partidários pelos «sinais exteriores de riqueza».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dirigimo-nos também ao Governo. Sabemos distinguir quando é que ele é Governo de Portugal e quando é Governo do PS.
Ao Governo de Portugal, escolhido pelos portugueses e que é também o nosso Governo, manifestamos a nossa inteira disponibilidade para tudo o que signifique a defesa dos interesses de Portugal no plano externo e para o reforço de todos os acordos de regime necessários em matérias de Estado, esperando«que esses acordos se materializem na revisão constitucional.
Reafirmamos o nosso compromisso com os objectivos do Tratado da União Europeia e com a concretização da moeda única, com a construção de uma Europa que tenha sentido político e civilizacional e possa ser um travão ao caos e à barbárie.
Sabemos que a pertença de Portugal, de parte inteira, no núcleo duro da União Europeia é essencial para a defesa da nossa soberania e do nosso interesse nacional. Por isso, temos orgulho de afirmar que o cumprimento dos objectivos do Tratado da União Europeia só se tornou possível devido à política dos governos. do PSD e de Cavaco Silva. Foi o arranque de medidas difíceis, tomadas a tempo e com firmeza, que o tornou possível. E não há hoje indicador saudável no plano macro-económico que não tenha tido como base a política dos últimos 10 anos, uma política pela qual pagámos um elevado preço em termos eleitorais, mas que serviu, em primeiro lugar, os interesses de Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - O preço ainda foi pequeno!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, para o Governo do PS temos uma mensagem clara e dura: é altura de acabar a campanha eleitoral. Deixem de governar para as sondagens; governem para o País. E desiludam-se da tentativa de provocar o PSD a dar-vos uma mão para uma crise política que traria custos pesados para os portugueses. Mas tenham cuidado com a tentativa de chantagear os partidos da oposição para que não o sejam e não a exerçam. O Governo é minoritário nesta Assembleia, convém que não se esqueça disso e há muitos meios de lhe ensinar alguma humildade sem cair nas óbvias armadilhas que ele estende.

Aplausos do PSD.

O que aconteceu, ontem, como drástico abaixamento das tarifas da TAP para as viagens aos Açores e à Madeira é um bom retrato da política socialista.

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Vozes do PSD: - É um escândalo!

O Orador: - Tocaram todas as sirenes da facilidade e do eleitoralismo. Não é a preocupação com os custos da insularidade que move o Governo, mas a directa, brutal e inadmissível participação do Governo socialista na campanha eleitoral das ilhas.

Aplausos do PSD.

Como, com o descuido de quem acha que pode dizer e fazer tudo, afirmou o candidato socialista açoriano, ele, Carlos César, pediu ao António Guterres um presente para a campanha e recebeu uma prenda no sapatinho socialista, dada logo pelo Primeiro-Ministro.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma vergonha!

O Orador: - Um Primeiro-Ministro que responde a um pedido de um líder local do seu partido para, abusando do Estado, o favorecer eleitoralmente, viola não só a lei como todas as regras de isenção e independência partidária a que é suposto um governo obedecer. Esperamos, por isso, que a Comissão Nacional de Eleições cumpra o seu papel e ponha o Governo na ordem.

Aplausos do PSD.

Por tudo isto, o PSD apresentará nesta Assembleia um voto de protesto e pedimos a todos os partidos que dêem o seu consenso para que ele seja votado hoje, para que ele seja votado em tempo útil de efectivamente ser conhecido pelos açorianos,...

O Sr. José Saraiva (PS): - E madeirenses!

O Orador: - ...de modo a que o Governo compreenda que não pode passar impune perante esta Assembleia e a opinião pública por tão grosseiro acto de intromissão.

Aplausos do PSD.

Neste momento, o Sr. Deputado Pacheco Pereira fez entrega do texto do voto na Mesa da Assembleia.

Esperamos que o PS dê o seu consenso para que ele seja votado hoje e não utilize os adiamentos para impedir que esta Assembleia possa tomar uma posição.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos que façam o silêncio necessário para que o Sr. Deputado Pacheco Pereira se consiga fazer ouvir.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os socialistas não se apercebem do que estão a semear. Contentes com a popularidade nas sondagens, assumem um estilo de arrogância e displicência,...

Vozes do PS: - Olha quem fala!

O Orador: - ... ao mesmo tempo que vão prometendo todas as benesses.

Protestos do PS.

Repito, de arrogância e displicência.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Mais, a combinação de semear expectativas, ao mesmo tempo que se adiam as reformas de fundo, é verdadeiramente explosiva do ponto de vista social. Eles estão sentados em cima de uma bomba-relógio social,...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Que vocês deixaram armadilhada!

O Orador: - ... de que o desemprego, a ignorância que cresce a cada exame facilitado, a superficialidade de uma acção política que obedece apenas a regras de sucesso mediático, a incompreensão face à insegurança dos cidadãos, o desacreditar das polícias, tudo, são sintomas claros de anomia social, que fazem crepitar o relógio.
É que eles não se limitam a favorecer uma expectativa social vaga e indeterminada quanto à forma das melhorias e das benesses. Eles estão a prometer - e, em alguns casos, a oferecer a fundo perdido com o erário público - a grupos e a indivíduos, a lobbies e a centros de pressão, a sindicatos e a associações patronais, coisas concretíssimas e a prazo, que se percebe curto.

Aplausos do PSD.

O defraudar destas expectativas será, por isso, tão concretíssimo como as promessas que fazem e atingirá não só o PS mas a saúde da democracia no seu conjunto.

Protestos do PS.

Eles não ouvem, como os senhores não ouvem, de tão contentes que estão, mas estão a semear na sociedade as sementes de um processo de protesto inorgânico, de conflitos inorgânicos, e que podem, a prazo; ser violentos. E dizemos isto na convicção de que ninguém e nenhum partido ganhará com isso. Perdemos todos. Por isso, é preciso evita-lo.
Os senhores, que convinha deixarem de estar sentados em cima das sondagens e serem um pouco menos autistas, estão prevenidos, a tempo e por causa do tempo.
Depois não se queixem.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Francisco de Assis, Octávio Teixeira e Jorge Ferreira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pacheco Pereira, folgo muito em ouvi-lo hoje, porque, depois de, no último Congresso do PSD, no passado domingo, ter ouvido as abundantes citações, feitas pelo Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, do discurso do pensador socialista António Barreto, cheguei a temer pelo seu futuro como ideólogo oficial do PSD.

Risos do PS.

E folgo muito em ouvi-lo hoje introduzir aqui uma verdadeira ruptura conceptual em relação ao seu passado. Se há coisa em cima da qual V. Ex.ª continua a estar sentado é de uma profunda incoerência política, que só tem coerência no serviço que procura prestar ao PSD, no sentido de permanentemente procurar lançar factores de confusão e de perturbação na vida nacional.

Vozes do PS:- Muito bem!

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O Orador: - Disse V. Ex.ª, Sr. Deputado Pacheco Pereira, que este Congresso do PSD democraticamente - e muito bem - foi um congresso que não consistiu apenas num ritual de sacralização de lideranças. Mas nós não vamos esquecer que, durante 10 anos, o PSD fez congressos atrás de congressos, que foram meros rituais de sacralização de uma liderança.

Aplausos do PS.

E não vamos esquecer, Sr. Deputado Pacheco Pereira, que V. Ex.ª era um dos sacerdotes que mais activamente participava nesses congressos de celebração e de sacralização de uma liderança.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, temos o direito de pensar que o problema, hoje, no PSD, não é o de estarem distanciados do desejo da sacralização, mas o de estarem distanciados da liderança, que, neste momento, não conseguem sacralizar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Compreendo perfeitamente o seu discurso e até tenho alguma solidariedade íntima em relação à dificuldade do seu papel aqui hoje. É que o seu papel foi o de dar um tom grandiloquente àquilo que foi minúsculo; foi procurar fazer crer ao País, através desta Câmara, que, de facto, no Congresso do PSD se discutiram questões essenciais, quando todos sabemos que só se discutiram questões acessórias. É fazer crer ao País que, no Congresso do PSD, foi o País que esteve em causa, quando, no Congresso do PSD, foram estreitamente os problemas internos do PSD que estiveram em causa.

Aplausos do PS.

É fazer crer ao País que o PSD resolveu os seus problemas de liderança, quando basta abrir uma revista e ler a entrevista daquele que é um dos homens do futuro do PSD, o líder da JSD, para perceber que nada verdadeiramente ficou resolvido neste Congresso, a começar. pela sua própria liderança.
E V. Ex.ª prestou-se aqui a este difícil e complexo papel, que foi justamente o de dar um tom diferente, o de procurar atribuir uma importância maior àquilo que, de facto, não passou de um congresso doméstico, para não dizer um congresso de cozinha, já que me repugna um pouco usar as expressões que o vosso prócere distrital do Porto costuma utilizar, quando se refere ao Congresso que os senhores levaram a cabo no passado fim-de-semana.
Estamos dispostos a contribuir para a transformação da vida política portuguesa e a introduzir-lhe novos factores de moralização. Só que, Sr. Deputado Pacheco Pereira, há uma diferença: é que nós não precisamos de passar do poder para a oposição para estarmos preocupados com essas questões, para compreendermos as preocupações do País e para manifestarmos interesse em encontrar resposta e em garantir a resolução desses mesmos problemas. A nossa diferença é que nós agimos em função da convicção e os senhores em função da posição que conjunturalmente ocupam na vida política portuguesa.

Aplausos do PS.

E os portugueses sabem distinguir isto.

O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador:- Termino já, Sr. Presidente.
E já que está tão preocupado com as questões da democraticidade nas ilhas, posso dizer-lhe que não está seguramente mais preocupado do que eu. Por isso, desafio-o, Sr. Deputado Pacheco Pereira, em nome do seu sentido democrático e da sua cultura liberal - e não me atreveria a chamar-lhe, alguma vez, um homem ainda prisioneiro da mentalidade estalinista -, da cultura liberal a que chegou - e chegou a tempo, porque se chega sempre a tempo a uma cultura liberal e democrática - desafio-o, repito, a que denuncie e se afaste do estilo, do comportamento e da atitude profundamente antidemocráticas e antiliberais, que, dia-a-dia, são assumidas pelo vosso candidato à presidência do Governo Regional da Madeira.

Aplausos do PS.

Faça isso! É em nome da seriedade que lhe faço este apelo. O seu voto de protesto, o voto de protesto do seu partido, é um voto de protesto hipócrita e sem sentido, se não for acompanhado. de uma declaração clara nessa matéria. Mostre que está realmente preocupado com estas questões e que a sua preocupação não é meramente de conjuntura. Mostre que é um democrata de sempre e um homem preocupado como acho que foi sempre e não apenas nos momentos eleitorais.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, V. Ex.ª disse que mudávamos de posição em relação à nossa situação face ao poder e, como passámos do poder para a oposição, mudámos de atitude em relação a uma série de questões de Estado.
Devo dizer-lhe que, se aprendemos alguma coisa com a perda do poder, ainda bem que assim foi, porque esse é o caminho certo. O caminho errado é passar-se da oposição para o poder e, nas primeiras semanas ou nos primeiros meses em que se exerce esse poder, esquecer-se tudo o que se disse de certo durante os muitos anos em que se esteve na oposição.

Aplausos do PSD.

Esse é que é o pior dos caminhos!
Porque, a nós, ainda nos podem dar o benefício da dúvida de que, quando chegarmos outra vez ao poder, seremos coerentes com aquilo que estamos a dizer quando estamos na oposição, mas os senhores, neste momento, não podem ter qualquer benefício da dúvida, porque, ao fim de 10 anos de oposição, mostraram que tudo aquilo que de certo disseram nesse período esqueceram no dia seguinte ao da vossa chegada ao poder.
E não é preciso ir mais longe: um fenómeno que os senhores menosprezam também, com a arrogância e displicência que têm, é o clientelismo e os saneamentos sistemáticos na função pública, criando uma espiral e uma continuidade de vingança no comportamento dos partidos

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políticos quando ganham as eleições, que é de todo inadmissível e que vos tira, se quiserem, mais credibilidade do que qualquer outro acto.

Aplausos do PSD.

Quanto à Madeira, deixe-me dizer-lhe o seguinte: lembro-me de, nesta Casa, se discutir o chamado défice democrático da Madeira e também me lembro do papel que, nessa discussão, tiveram alguns dos actuais dirigentes do Partido Socialista, a começar pelo actual Primeiro-Ministro, mas quero dizer-lhe que a melhor desautorização do entendimento completamente absurdo da .Madeira como uma pequena ditadura, foi dada pelo Primeiro-Ministro que, tendo ido à Madeira antes das eleições, teve ocasião de saudar a obra feita pelo Presidente do Governo Regional, em termos que, evidentemente, implicavam um acordo, que vos incomoda, mas que nos deixa muito sossegados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas há uma diferença entre muita coisa que acontece na Madeira e o que aconteceu nos Açores. Muitas das coisas que acontecem na Madeira podem ser controversas e há algumas com as quais não estamos de acordo. Eu, pessoalmente, não estou e não tenho qualquer problema em dizê-lo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - De qualquer modo, nenhuma tem a dimensão, que vos devia envergonhar a todos - porque acredito que ainda haja aí alguém com capacidade de vergonha -, de ver um candidato socialista a anunciar, num comício, uma medida de Governo e de Estado, dizendo: «Eu telefonei ao Primeiro-Ministro, pedindo-lhe isto e ele deu-mo. Tomem-no lá, açoreanos, e votem em mim, porque o Sr. Primeiro-Ministro António Guterres dá-nos ó que precisamos, basta eu telefonar.»
No dia em que houver um despedimento na TAP, no dia em que a TAP apresentar prejuízos pela vossa política absolutamente irresponsável, os senhores pagarão caro estas brincadeiras que estão a fazer com os Açores!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pacheco Pereira, como é nossa norma, temos mantido e queremos continuar a manter o princípio de não interferirmos e de não nos imiscuirmos na vida interna dos outros partidos e, por conseguinte, não faremos apreciações sobre as formas como correm ou deixam de correr, por exemplo, os congressos e outras questões.
De qualquer modo, Sr. Deputado Pacheco Pereira, há uma questão que V. Ex.ª levantou na sua intervenção que interessa a toda a Câmara, mas omitiu outra que, a meu ver, tem igualmente esse interesse. São essas questões que irei referir de seguida.
A primeira questão tem a ver com o anúncio feito pelo Sr. Deputado sobre a posição do PSD em relação à problemática do financiamento dos partidos. Segundo bem entendo, pelas declarações que tenho ouvido, o PSD defende, neste momento, que os partidos não devem ser financiados pelas empresas, sejam elas públicas ou privadas.

Nesse sentido, e em relação a esta questão, gostaria, neste momento, de saudar o PSD e o Sr. Deputado Pacheco Pereira, porque anteriormente votaram contra o nosso projecto de lei que proibia o financiamento dos partidos por empresas e agora reconheceram, que, de facto, nós estávamos certos e os senhores errados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esperemos, com toda a sinceridade, que esta mudança de opinião não se deva apenas e exclusivamente ao facto de terem deixado de ser Governo e terem passado para a oposição! Esperemos que seja uma posição para manter!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Já na liberdade condicional é o mesmo.

O Orador: - A segunda questão, que é a tal omissão, tem a ver com o problema da regionalização, porque sempre esperámos - pelo menos, eu esperei - que, face ao momento em que estávamos, realizando agora, o vosso congresso, iriam finalmente decidir sobre a posição do partido como um todo em relação à questão da regionalização. Ora, isso não sucedeu, ou, pelo menos, não tenho informação de que tenha havido qualquer resolução nesse sentido, o que lamentamos, porque gostaríamos de saber, desde já, qual é, de facto e definitivamente, a posição do PSD sobre o problema da regionalização. Porém, todos nós estamos atentos não ao interior dos partidos mas àquilo que se passa na sociedade e sabemos que continua a haver muita gente, incluindo, certamente, pessoas do PSD, que continuam a estar de acordo com o Professor Cavaco Silva.
De qualquer forma, queremos lamentar esta omissão, porque a posição do PSD sobre a regionalização seria importante para a clarificação das posições sobre uma questão política também importante.
Sobre a última questão que o Sr. Deputado aqui trouxe à colação, ou seja, o voto de protesto, que já tive a oportunidade de ler, o que posso e quero dizer neste momento é que, em relação à possibilidade de ele ser agendado e votado hoje, pela parte do meu grupo parlamentar, nós daremos esse consenso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sobre essa matéria interviremos depois para clarificar a nossa posição.
Uma última nota, Sr. Deputado Pacheco Pereira: apesar de tudo - e este apesar de tudo compreendê-lo-á por aquilo que vou dizer a seguir -, e tendo em conta aquilo que referi inicialmente de que não nos imiscuímos nos assuntos internos dos outros partidos, gostaria de saudar o novo Presidente do PSD.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, em primeiro lugar, quero agradecer-lhe a saudação que dirigiu ao Presidente do meu partido,...

Vozes do PS: - Ao novo! Ao novo!

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O Orador: - ... saudação essa de que interpretámos plenamente o significado político.
Em segundo lugar, quero dizer-lhe que é verdade que nos aproximámos da posição do Partido Comunista em relação a não haver financiamentos das empresas aos partidos políticos não necessariamente pelas mesmas razões do Partido Comunista, mas também não de todo pelas mesmas razões. Dito de outra maneira: se houvesse em Portugal uma tradição empresarial que implicasse que os financiamentos das empresas aos partidos políticos se podiam fazer em condições de completa transparência, verificabilidade e inclusão nas contas das empresas não teríamos aí uma objecção de princípio a que ela se mantivesse.
No entanto, temos de reconhecer que não só isso não corresponde à nossa tradição como as tentativas de o fazer de forma verificável e conforme com a lei, temos de o reconhecer com realismo, não se conseguem implementar na prática. ,
Por isso, pensamos ser mais saudável, porque percebemos até que ponto a falta de transparência na questão do financiamento é um cancro interior da nossa democracia, que pode, efectivamente, conduzir a sérios problemas para o conjunto do sistema político, acompanhar a posição de pôr cobro aos financiamentos dos partidos políticos por parte das empresas.
Devo dizer-lhe que esperamos que o Partido Socialista, que reconhece a gravidade desta questão - muitos dos seus responsáveis reconhecem, porque, no passado, tomaram atitudes corajosas sobre a matéria -, aceite, em tempo útil, por forma a poder ser aplicado nas próximas eleições, o nosso repto de o financiamento dos partidos políticos poder ser feito apenas pelo Estado, pela democracia, como sua obrigação, e pelos próprios militantes.
E mais: para garantir que a violação da lei não prejudique eleitoralmente qualquer partido, que o PS aceite que haja uma autoridade independente que possa controlar o comportamento e os gastos nas campanhas eleitorais, a partir do único controlo possível, que são os sinais exteriores de riqueza nas campanhas eleitorais. Ou seja: quem puser cartazes, placards e papéis e utilizar tempos de antena que valham mais do que aquilo que é suposto e declara como recebido, obviamente está a violar a lei. É o único mecanismo que permite defender quem efectivamente aplica a lei em detrimento de quem não a aplica.
Faço-vos um apelo sério para que mostrem disponibilidade para esta alteração de fundo, que é boa para todos os partidos, que é boa para a democracia portuguesa e que não tem quaisquer condições para ser alterada caso qualquer um de nós chegue ao poder no futuro.
Em relação à regionalização, apenas lhe quero dizer o seguinte: a posição do nosso partido é muito clara!

Risos do PS.

O Orador: - É claríssima! É tão simples como isto: se há referendo para decidir se há ou não regionalização em Portugal, deve-se ao Partido Social Democrata. Este o primeiro aspecto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E, defendendo o referendo, a nossa atitude só pode ser, em coerência, que exactamente porque o referendo atravessa todos os partidos, que haja liberdade de voto no Partido Social Democrata em relação à questão da regionalização.

Vozes do PS: - Até que enfim, já é alguma coisa!

O Orador: - Portanto, o que nós entendemos é que não tem sentido haver posição partidária em relação à regionalização.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pacheco Pereira, gostava de lhe fazer três pedidos de esclarecimento.
Em primeiro lugar, começaria por lhe dizer que concordo integralmente com as afirmações que proferiu acerca do verdadeiro escândalo que consiste na diminuição das tarifas das viagens da TAP das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira para o continente. Estou integralmente de acordo com as afirmações que proferiu a esse respeito, mas digo mais: depois das afirmações que foram feitas pelo líder do PS/Açores, considero inexplicável como é que o Primeiro-Ministro de Portugal está calado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sobre o Primeiro-Ministro de Portugal não pode recair qualquer suspeita de favorecimento partidário nas decisões de Estado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E o Engenheiro António Guterres, se fosse na legislatura anterior, estaria, porventura, aqui hoje ou, inclusive, nos Açores a exigir ao Primeiro-Ministro na altura que dissesse alguma coisa sobre as acusações que, neste momento, impendem sobre o Primeiro-Ministro.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado Pacheco Pereira, não se manipulam só eleições com actos como aqueles que a TAP acaba de praticar, manipulam-se também eleições com actos como os que a SATA praticou, diminuindo as tarifas das viagens interilhas a pouco tempo das eleições. A SATA é uma empresa regional, por isso, é legítimo que pergunte ao Sr. Deputado Pacheco Pereira se não estende também a sua indignação ao comportamento do Governo Regional da Madeira relativamente aos preços das viagens efectuadas pela SATA entre as várias ilhas da Região Autónoma dos Açores. Nós estendemos a nossa indignação também a essa decisão, que é, certamente, da responsabilidade do Governo Regional dos Açores. Pergunto-lhe muito directamente qual a sua posição sobre esta matéria.
Em segundo lugar, gostaria de lhe fazer uma pergunta que decorre da coerência que sempre lhe reconhecemos em matéria da lei das incompatibilidades. Embora discordemos de muitas das suas posições de fundo sobre estas matérias, temos de reconhecer-lhe alguma coerência na defesa dos seus pontos de vista. E, exactamente por isso, também lhe pergunto directamente: independentemente do que pensa sobre a lei das incompatibilidades na sua essência, na sua substância, está de acordo que esta lei seja aplicada de forma desigual a vários Deputados desta Assembleia da República?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

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O Orador: - Não pensa que é de elementar justiça que a lei das incompatibilidades, antes de ser revista, seja aplicada por igual, com igual severidade, a todos os Deputados da Assembleia da República, para evitar que Portugal tenha Deputados de primeira e Deputados de segunda?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Isto, repito, independentemente de se considerar a lei como boa ou má.
Em terceiro lugar, Sr. Deputado Pacheco Pereira, pergunto-lhe: tendo nomeadamente em consideração o que acaba de dizer sobre a regionalização, e havendo certamente no PSD, como V. Ex.ª reconheceu, defensores da regionalização e pessoas que estão contra ela, para quando um referendo interno, para o PSD,...

O Sr. Marques Guedes (PSD): - Referendo interno!? Essa é boa!

O Orador: - ... à semelhança do que o Partido Popular fez? Para quando uma posição de substância sobre este problema?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, em relação à primeira questão, devo dizer-lhe que a informação que tenho é a de que a SATA desmentiu aquilo que referiu, e,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... a partir do momento em que não tenho mais informações, tenho de aceitar como válido esse desmentido. Como teremos, com certeza, oportunidade de esclarecer todos estes aspectos, podemos perfeitamente reservar a opinião quanto ao comportamento da SATA até conhecermos exactamente as circunstâncias em que tudo se passou.
Pronuncio-me sobre a atitude do Primeiro-Ministro e do líder dos Açores do PS por ela ser conhecida em primeira mão por gravação, em discurso directo, pelo que, sobre essa matéria, não há qualquer dúvida sobre o que aconteceu.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No entanto, estou inteiramente disponível, como penso que todos estamos, para analisar o que aconteceu com o eventual abaixamento das tarifas da SATA.
Quanto à segunda questão, a resposta é muito simples: «sim». Não estou de acordo com a lei, mas enquanto a lei for lei ela deve ser rigorosamente aplicada em todas as circunstâncias, quanto a isto não tenho qualquer dúvida.

Aplausos do PSD e do Deputado do CDS-PP Jorge Ferreira.

Em relação à terceira questão, sobre a regionalização, o Sr. Deputado pergunta-nos por que não fizemos um referendo interno. É a altura de explicar, mais uma vez, aquilo que o PSD anda a dizer há muito tempo. A nossa aproximação à questão da regionalização é diferente da dos outros partidos. Estamos de acordo numa coisa, que deve haver referendo. Nisto estamos todos de acordo, os que são contra e os que são a favor. E esse acordo não precisa de ser referendado, porque nos une a todos. É evidente que, no momento em que houver um referendo nacional, vai encontrar pessoas do PSD a defender a regionalização e outras a criticá-la,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... mas isso é inerente à coerência do nosso pedido de referendo. Mas também vai encontrar pessoas do PP a fazerem o mesmo, pessoas do PS e pessoas do PCP a fazerem o mesmo. E, desse ponto de vista, prescindimos, como elemento da nossa coerência na defesa do referendo, de tomar uma posição unitária, enquanto partido. Isto é muito claro. Representa uma opção política e, se quiser, pode dizer que ela também traduz as dificuldades em termos uma opinião de conjunto sobre esta matéria, mas isso é natural porque os portugueses estão divididos sobre ela, e, assim, é natural que o partido que representa uma parte significativa dos portugueses também esteja.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, a nossa posição sobre a regionalização é de inteira coerência, não se formou nos mesmos termos das posições dos outros partidos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, pergunto aos diversos grupos parlamentares se estão de acordo, se há consenso, em que se proceda hoje mesmo à votação do voto n.º 42/VII - De protesto pela atitude do Governo e do Primeiro-Ministro na campanha eleitoral dos Açores, apresentado à Mesa pelo Sr. Deputado Pacheco Pereira, durante a sua intervenção, uma vez que foi por ele proposto a todos os grupos parlamentares.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PS não dá consenso para que se proceda à votação...

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah...!

O Orador: - Os Srs. Deputados estão preocupados por usarmos um direito legítimo e regimental? Estão preocupados por cumprirmos as regras?

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Estamos preocupados com o significado!

O Orador: - O Sr. Deputado Pacheco Pereira sabe bem que, muitas vezes, a forma também guarda a substância, e, neste caso, é importante que a substância seja inteiramente conhecida, pelo que, neste momento, o meu Grupo Parlamentar não dá o consenso solicitado, Sr. Presidente.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Basta que um partido não dê consenso para que não se possa proceder à respectiva votação, Srs. Deputados.

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O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, é apenas para informar a Mesa e a Assembleia de que acabo de ter a confirmação de que o Governo Regional dos Açores confirmou ontem algumas diminuições de tarifas em algumas viagens interilhas da SATA, pelo que o problema está resolvido.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado, o esclarecimento fica dado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, é evidente que aquilo que se passou é regimental, não há consenso para que se possa fazer a votação deste voto de protesto. No entanto, gostaria de, em nome do meu grupo parlamentar, lamentar a posição assumida aqui pelo Grupo Parlamentar do PS sobre esta matéria.

Vozes do PCP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Porque de facto aquilo que se passou já ontem tivemos oportunidade de referir e agora com mais conhecimento de causa - e se está a passar é uma pura fraude eleitoralista. É o anúncio de uma descida de preços para apenas um mês, que nem sequer é de época baixa e não atinge todos os vôos, designadamente os das ilhas ocidentais, e é apenas para lugares que existam, sem possibilidade de reserva. E uma fraude eleitoralista que devia de ser debatida e levada até às últimas consequências neste Plenário.

Aplausos do PCP e do PSD.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, pedi a palavra apenas para lamentar não o exercício de um direito regimental pelo Grupo Parlamentar do PS mas, sim, o significado político do exercício desse direito regimental.
Isto significa que aquele grupo parlamentar, ao contrário do que muitas vezes quer fazer crer, acaba de ratificar um novo record nacional de eleitoralismo e manipulação eleitoral, o que lamentamos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD,

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, .peço-lhe que seja mesmo para uma interpelação e não para uma intervenção igual às anteriores, porque não posso consentir que se alastre aqui uma discussão sobre esta matéria. Lamentar o exercício de um direito não é ume interpelação, Sr. Deputado, peço desculpa.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, é, com certeza, para uma interpelação 'à Mesa, nem eu faria de outra maneira, depois dos avisos de V. Ex.ª

O Sr. Presidente: - Tenha o obséquio.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Se bem ouvi, Sr. Presidente, e interpelo a Mesa a este propósito, o Sr. Deputado Francisco de Assis condicionou a sua posição à do Deputado Pacheco Pereira, acerca do acordo ou não com determinadas atitudes que se verificam nas ilhas por parte dos governos regionais. Se bem ouvi, o Deputado Pacheco Pereira disse que não concordava com essas atitudes, e, em face disso, pergunto se a posição do Deputado António Braga se mantém, porque pode ser que ele não tenha ouvido o que eu ouvi e, então, estávamos a cair num equívoco. Porém, se se mantiver essa posição, tenho de deplorar o PS por ter de facto conhecimento de uma violação grave por parte do Primeiro-Ministro e querer ocultá-la a esta Assembleia.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. António Braga (PS): - Para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Pensei que quisesse defender a honra, mas, se é para interpelar a Mesa,...

Risos do PSD e do CDS-PP.

... vou, primeiro, dar a palavra ao Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, porque já se tinha inscrito.
Tem a palavra, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, quero também lamentar profundamente...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que seja conciso, porque não posso consentir nisto.

O Orador: - Sr. Presidente, peço a sua atenção e compreensão para o que aqui gostaria de dizer.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Orador: - Em primeiro lugar, torna-se evidente que o PS quer prejudicar, em tempo útil, alguma decisão que a Assembleia da República possa tomar nesta matéria.

Protestos do PS.

E, como é evidente, tratando-se embora de um uso legítimo, que tem face ao Regimento, não impede naturalmente essa inconsequência. para a Assembleia da República. Na prática, o PS coloca-se na posição de, por um lado, falar muito de tolerância e de liberdade, mas sempre na de invocar instrumentos legais para a negar em tempo útil quando ela é necessária.

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Mas, Sr. Presidente, queria também lançar daqui um convite solene à Comissão Nacional de Eleições. É que mesmo sem a apreciação de voto desta Câmara, possa ser tão lesta a observar o que se passou nos Açores quando se mostrou pronta a pronunciar-se sobre matéria nas eleições regionais na Madeira. É um convite solene que o PSD faz à Comissão Nacional de Eleições para que não fique dúvidas de que, em primeiro lugar, não há receio de contrariar o Governo nesta matéria e o PS e, em segundo, de que há verdadeiramente isenção.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Braga, para formular uma interpelação à Mesa.

O Sr. António Braga (P S): - Sr. Presidente, pedi a palavra apenas para dizer que todos sabemos o que estamos a dizer, ninguém está a enganar ninguém, e tudo o que dissemos está bem dito e está claro. É o uso de um direito, fazêmo-lo e mantêmo-lo.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar ao debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do PCP, sobre «As ameaças para Portugal resultantes da 2.ª fase da integração dos produtos têxteis e vestuário nas regras da Organização Mundial de Comércio».
Tem a palavra, para introduzir o debate, o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Recentemente, em Nova Iorque, no Congresso da Internacional Socialista, o Primeiro-Ministro e Secretário-Geral do PS, Engenheiro António Guterres, manifestou-se contra, e cito, «o actual fundamentalismo do livre comércio».
Belas preocupações para propaganda e consumo mediático interno, mas sem qualquer tradução nas práticas concretas do Governo. Bem pelo contrário.
No acordo comercial com Marrocos, na repartição das quotas da palmeta, nos acordos sobre têxteis com a Índia e o Paquistão e agora com a antecipação da aplicação dos próprios acordos do GATT, no que se refere à liberalização do mercado têxtil, sempre o Governo do Engenheiro Guterres cedeu em toda a linha e, sem reciprocidade, ao tão criticado «fundamentalismo do livre comércio», aos interesses dominantes no processo de desregulamentação dos mercados e das economias.
Aquando das negociações do GATT, o PCP afirmou que o acordo, e cito, «tal como foi negociado» iria «causar problemas ao sector e às regiões de mono-indústria têxtil», designadamente no Vale do Ave, e na zona de lanifícios da Covilhã.
Disseram-nos que, não - e alguns aproveitaram até para repetir a habitual cassete de acusações contra o PCP -, que não, que a transição de 10 anos, em três etapas, negociadas para a integração plena dos têxteis nas regras do GATT, em que a União Europeia tem liberdade de escolha dos produtos a integrar no início de cada fase, criava as condições para que «as categorias têxteis mais sensíveis para Portugal, constituindo um núcleo representativo de 80 % das nossas exportações, só venham a ser integradas no GATT, por iniciativa da União Europeia, no fim do período transitório».

Pois é, aí está a demonstração de que os vendedores de ilusões mais uma vez se enganaram e enganaram o País!
Na 2.ª fase de integração dos produtos têxteis e vestuário nas regras do GATT, a iniciar em 1 de Janeiro de 1998, mas cujas negociações vão já começar em Singapura, em Dezembro próximo, a liberalização das trocas deve corresponder, de acordo com o que foi acordado em 1993, a 17 % do volume das importações comunitárias em 1990.
A lista dos produtos a liberalizar é da exclusiva responsabilidade da Comunidade Europeia que pode optar por aqueles que não estejam já sujeitos a quotas ou sejam considerados sensíveis para a economia e o emprego dos Estados-membros. É, aliás, o que faz os EUA, que transferiu para a última fase de integração, a partir de 1 de Julho de 2005, todos os produtos sensíveis que poderiam fazer concorrência com as suas próprias produções nacionais.
É mesmo o que ficou de certo modo concluído no Conselho de Ministros da Indústria da Comunidade de 28 de Março de 1996, quando foi aprovada, e cito, «a integração progressiva e equilibrada do sector dos têxteis e do vestuário no sistema da Organização Mundial do Comércio» só deve ser feito com base «na análise e estudo cuidadosos de todos os aspectos do impacto económico no sector - incluindo a competitividade, o emprego, o interesse dos consumidores e a incidência que estes factores podem ter sobre cada produto».
Esta linguagem ambígua, aceite pelo Ministro da Economia, foi interpretada, então, em declaração de Portugal para a acta, como devendo aquela integração, e cito, «respeitar o período de transição negociado no quadro da OMC». Ora, respeito pelo período de transição significa respeito não só pelo calendário de todas as fases mas também pelos produtos a integrar que não prejudicassem o sector e o emprego em Portugal.
Pois bem, a prova de que tudo isto não passa de um manto enganador de palavras, com vista a iludir o País e a travar os protestos; a prova de que a voz do Governo PS não é ouvida ou de que - é outra leitura - o Governo concorda e é cúmplice das decisões da Comunidade gravosas para o nosso País, enquanto cá dentro vai dizendo o contrário, a prova de tudo isto está no percurso dos acontecimentos que temos, hoje, aqui em debate.
A Comissão começa por elaborar uma lista com base quase exclusivamente na proposta da organização europeia de importadores, cujo cabaz era maioritariamente composto por produtos altamente sensíveis para a indústria têxtil e de vestuário portugueses correspondentes a 25 % das exportações do sector.
O que fez o Governo pára mobilizar, em Portugal, os sindicatos e as estruturas empresariais, com vista à recusa desta proposta? Nada. O Governo preparava-se para aceitá-la no segredo alcatifado dos gabinetes de Bruxelas. Foram os trabalhadores e a sua federação sindical, foi o Grupo Parlamentar do PCP, foram os Deputados comunistas ao Parlamento Europeu que tiveram de assumir a denúncia da proposta que a Comissão preparava e desencadear o protesto e a luta. As próprias organizações empresariais pareciam estar numa situação de expectativa. E foi este processo que levou a Comissão, a 2 de Outubro, a ter de alterar a lista a propor à Conferência Ministerial de Singapura num sentido, apesar de tudo, aparentemente mais favorável ao nosso país.
Mas é falso que esta nova proposta de abertura do mercado comunitário a produtos têxteis de outros países

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«não coloque problemas à indústria portuguesa», como afirmou o Comissário Deus Pinheiro ou, pior ainda, que seja boa para Portugal, como tem dito o Ministro da Economia.
Sem qualquer necessidade, a lista engloba ainda muitas categorias de produtos sensíveis para Portugal tais como lãs, pêlos finos cardados, penteados e tecidos de lã, fatos para sky, cordame, cordas, cabos em fibras sintéticas, tecidos têxteis impregnados, etc., produtos tanto mais sensíveis quanto dizem respeito, em grande parte, a produções concentradas em zonas muito restritas do país (distritos do Porto e Aveiro e na Covilhã) e a produções em que Portugal é produtor exclusivo, caso do cordame e das cordas.
A indústria de cordas emprega 5000 pessoas e ó respectivo volume de negócios atinge os 48 milhões de contos, 85 % dos quais são para exportação, estando as respectivas fábricas localizadas quase todas nos distritos do Porto e de Aveiro.
A indústria laneira, outro subsector directamente afectado pela lista, concentra-se em Seia, Gouveia, Manteigas e Covilhã e aqui são 15 000 os trabalhadores que sofrerão o impacto desta liberalização, numa zona sem alternativas industriais.
A questão não é só a dos mercados externos mas também a da invasão do nosso mercado interno nem é só a da lista aprovada mas também a do ponto 4 do memorando da Comissão que lhe reserva o direito de rever a lista dos produtos se, no quadro das negociações de Singapura, assim entender conveniente. Isto é, nada obsta a que por esta via, na prática, a liberalização de produtos se amplie tornando-se total nesta segunda fase.
A pergunta que os Srs. Deputados do Partido Socialista, para procurarem desculpar o Governo, se preparam para me fazer é: qual a lista alternativa? Poupo-vos esse trabalho. Eis alguns exemplos: fios de seda, fios de fibras artificiais, tecidos de tios de metal ou de papel, tecidos de seda, roupas de cama de linho, etc. Aliás, podem pedir a lista completa à Direcção-Geral da Indústria que a elaborou como alternativa à proposta da Comissão mas que o Governo não levou para a frente.
Mais, Srs. Deputados, os acordos do GATT só estão a ser cumpridos para além do que ficou estabelecido por Portugal. Os Estados Unidos da América, sempre que lhes convém, lançam mão das cláusulas de salvaguarda ou da sua própria lei comercial para restringir a entrada no seu território de produtos que possam fazer concorrência à sua indústria. Os países asiáticos e outros não cumprem, por sua vez, o princípio da reciprocidade e da abertura dos respectivos mercados nos termos do artigo 7.º do acordo têxtil como, aliás, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, aqui presente, o reconheceu na intervenção que fez no Conselho de Assuntos Gerais da Comunidade, em 26 de Fevereiro de 1996.
Então, se assim é, por que tem de ser sempre Portugal, por que tem de ser sempre a nossa indústria ou a nossa agricultura, por que têm de ser sempre os trabalhadores portugueses e o emprego os sacrificados no altar dos interesses da União Europeia, das grandes potências económicas e das multinacionais?
Por que razão aceita o Governo português que os têxteis (bem como a agricultura), que representa 30 % das nossas exportações e 25 % do emprego da indústria transformadora - e no qual estão, obviamente, muito interessados os países em vias de desenvolvimento -, sejam utilizados sistematicamente como moeda de troca para pagar a abertura de terceiros mercados a outros sectores
de alta tecnologia em que estão interessados a Alemanha, o Reino Unido ou a França, entre outros? Lembremos que, só entre 1991 e 1995, a bacia do Ave perdeu cerca de 25 000 empregos líquidos no sector do têxtil, vestuário e calçado.
Por que razão o Governo nunca intervém antes dos factos estarem consumados e não cria condições para, com outros países, organizar blocos de defesa dos interesses dos países menos desenvolvidos da União Europeia?
Por que razão o Governo português nunca utiliza instrumentos que, apesar de tudo, tem à sua disposição, como o da invocação do interesse vital para bloquear. decisões que nos são altamente prejudiciais?
Eu sei que são muitas perguntas sem resposta. Porque a única resposta é que o Governo português, na linha da actuação anterior do PSD, submete os interesses estratégicos do País à miragem da construção de uma Europa onde a nossa economia e o nosso emprego são permanentemente sacrificados. Porque a única resposta é que deve ser posto termo à ilusão desta Europa sem coesão nem solidariedade batendo-nos por um novo rumo para as condições em que está a processar-se a liberalização do comércio mundial, por uma Europa do progresso, da coesão e do emprego com direitos.
E vital trabalharmos para a reestruturação, modernização e aumento da competitividade da nossa indústria têxtil. Mas não tenhamos ilusões. Não há reestruturação nem competitividade que nos valha no quadro desigual em que está a processar-se a liberalização dó comércio mundial e a concorrência internacional.
Ora, é este combate que o Governo, evidentemente, não quer nem está em condições de travar porque, no essencial, concorda com os pressupostos em que assenta esta construção europeia. Por isso, deixamos aqui dois desafios ao Governo.
Em relação aos têxteis e à lista aprovada em Comissão, desafiamos o Governo, em sede de Conselho, a propor a sua alteração ou a exigir reciprocidade, no mínimo, a exigir respeito pelo período e condições de transição para alterar o acordo têxtil ou, em última análise, a invocar o interesse vital. Desafiamos o Governo em relação à Conferência de Singapura da Organização Mundial do Comércio e à liberalização do comércio mundial a abandonar a política de isolamento, de confidencial idade, e a abrir um debate nacional sobre as condições em que devem processar-se as trocas mundiais no quadro da defesa dos interesses de Portugal e dos portugueses.
Para esse debate e para essas propostas de defesa, podem contar o Partido Socialista e o Governo com o nosso empenhamento no reforço da posição negocial e da defesa dos interesses dos portugueses. Esperamos pela vossa resposta a estes desafios.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus (Seixas da Costa): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este debate de urgência, promovido pelo Partido Comunista Português, tem, na perspectiva do Governo, uma dupla virtualidade. Por um lado, traz para a discussão pública, uma vez mais, a situação que envolve um sector da maior importância no tecido económico nacional, que representa ainda hoje uma apreciável percentagem das nossas exportações e tem uma dimensão significativa ao nível do emprego na área industrial.

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Por iniciativa do Partido Popular discutimos há escassos meses este problema numa aproximação então menos marcada pela conjuntura. Mas nunca será demais a discussão que se faça nesta Câmara sobre as perspectivas de futuro deste sector, porque essa é a forma certa de o País ter consciência dos desafios inescapáveis com que esse mesmo sector se defronta e é também o modo de os responsáveis políticos poderem pronunciar-se sobre as opções e as decisões que todos - os políticos, os empresários e os trabalhadores do sector - terão de assumir neste contexto. Nisto creio que todos poderemos estar de acordo.
Mas esta iniciativa do PCP tem, como disse, uma outra virtualidade, essa provavelmente involuntária, a de ser a demonstração cabal de que este Governo continua bem atento ao tratamento da questão têxtil no âmbito da União Europeia, que actuou a tempo e de forma responsável e eficaz, enfim, que procurou salvaguardar os interesses tradicionais do sector, Muito antes de, o Sr. Deputado Lino de Carvalho se ter pronunciado em conferência de imprensa relativamente à proposta da Comissão, o Governo estava em contacto com a Comissão na tentativa de apresentar uma lista de produtos em que as sensibilidades nacionais mais preocupantes pudessem estar excluídas. Muito antes dessa conferência de imprensa promovida pelo, Sr. Deputado Lino de Carvalho, o Governo mantinha contactos directos com alguns comissários europeus no sentido de procurar que, no âmbito da discussão no colégio de comissários, esses produtos fossem afastados.
Penso que o que se passa hoje em relação à última proposta da Comissão, que o Sr. Deputado Lino de Carvalho conhece, e àquela que apresentou na sua conferência de imprensa demonstra bem o trabalho que o Governo desenvolveu neste período.
Tudo aponta agora para que o resultado final do exercício de liberalização, que está em curso no âmbito da União com vista a ser presente à Organização Mundial de Comércio, possa vir a ter uma dimensão muito menos dramática para o têxtil português do que aquela que o PCP anunciou ao propor este debate.
Se o PCP concordar com esta análise não estará apenas em sintonia com o Governo; estará também de acordo com a avaliação muito positiva que a generalidade. dos industriais do sector têxtil fazem desta nossa intervenção no seio da União Europeia, tanto nesta questão como em momentos anteriores. E não tenho a mais pequena dificuldade em recordar o processo relativo aos acordos com a índia e com o Paquistão pois também nessa altura os industriais têxteis, ao contrário de muitos dos Srs. Deputados da oposição, valorizaram positivamente aquilo que o Governo fez, e vale a pena lembra-lo nesta Câmara!
Não posso, contudo, nem devo entrar em pormenores sobre o modo como o Governo actuou neste caso e, melhor do que os meios, os resultados que se prevêem falarão por si.
Mas não desejaria deixar de referir - e o Sr. Deputado Lino de Carvalho sabe-o bem - que o Governo desencadeou um conjunto de acções, a variados níveis, junto da Comissão em conjugação estreita com os empresários têxteis nacionais, no sentido de procurar retirar das listas de produtos que a Comissão se propunha liberalizar todas as categorias sensíveis para o sector em Portugal.
As melhorias até ao momento introduzidas na proposta da Comissão face ao texto inicial são evidentes- os riscos de perdas apontam hoje para cerca de 1/15 dos que eram previsíveis em Junho e da lista que o Sr. Deputado Lino de Carvalho apresentou na sua conferência de imprensa - e, se alguns produtos de certa sensibilidade ainda hoje se mantêm nessa lista (trata-se apenas de dois escassos os produtos), igualmente se mantém a pressão portuguesa para o respectivo afastamento.
Ontem mesmo, durante a reunião do Comité 113 Têxteis, a delegação portuguesa alertou para as escassas categorias sensíveis ainda remanescentes na lista da Comissão. Essa pressão continuará em todas as instâncias apropriadas e o Governo, posso assegurar-lhe, manterá essa pressão. Não estamos satisfeitos com o resultado e continuaremos a dizê-lo.
Gostava, no entanto, de deixar claro nesta Câmara que o tipo de intervenção, franca e aberta, por que o Governo optou no seu relacionamento com a Comissão, muito em particular na questão dos têxteis, parece começar a produzir resultados concretos, muito embora não possamos esquecer que estamos perante um dos mais difíceis dossiers do comércio internacional e nos defrontamos com uma conjuntura globalmente adversa.
Sr, Presidente e Srs. Deputados, independentemente dos aspectos de conjuntura que esta questão suscitou, em relação a alguns dos quais o Governo estará disponível para pronunciar-se ainda durante este debate, penso que é útil termos todos presente o essencial, ou seja, que o futuro do têxtil português está na sua capacidade de encontrar uma afirmação no mercado internacional em termos competitivos.
Todas as protecções temporárias de mercado que possamos continuar a garantir só se justificam desde que, neste período de transição, a indústria seja capaz de reestruturar-se em termos eficazes, existindo hoje mecanismos financeiros de apoio por todos conhecidos. Sem esse esforço, que passa pela modernização, pela busca da qualidade e pelo aproveitamento das aberturas conseguidas pela União em terceiros mercados, tudo o restante não passará de paliativos.
Todos nós sabemos, e reconhecemos, que o esforço de liberalização da economia mundial que está em curso assenta em bases (concordo com parte das afirmações do Sr. Deputado Lino de Carvalho) frequentemente desregradas, em condições sociais de produção desequilibradas que não raramente tornam o comércio livre num comércio injusto.
Portugal tem sido dos países mais afirmativos na denúncia da ineficácia dos sistemas de vigilância nos processos de importação de países terceiros, nas práticas desleais de comércio, dos desvios de tráfego, da necessidade de respeito pelos direitos humanos e, em particular, dos direitos sociais e sindicais nos países produtores.
O Primeiro Ministro português - e ainda bem que o Sr. Deputado Lino de Carvalho teve a gentileza de assinalá-lo - disse em Nova Iorque durante a reunião da Internacional Socialista qual era a sua opinião relativamente a esta questão e tem vindo a alertar noutros fora para este assunto e os Ministros dos Negócios Estrangeiros e da Economia têm sido muito claros na apresentação do problema no seio da União Europeia.
Uma coisa são os nossos desejos, outra é frequentemente a realidade e, hoje, o sistema da Organização Mundial do Comércio padece de imensas lacunas que são exploradas por grande número de países para quem a ausência ou a não observância de regras traz óbvias vantagens. E não vale a pena esconder que esta mentalidade está hoje instalada em muitos sectores da União Europeia.

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A questão que hoje nos traz aqui é disso uma evidência: estamos, dentro da União - e vale a pena que todos tenhamos consciência disso - perante uma luta entre lobbies económicos de consumidores no sector do têxtil e das confecções, desejosos de ter produtos mais baratos tão rapidamente quanto possível no seu mercado e de lobbies de produtores comunitários representados por organizações que, no seu seio, têm também as suas próprias contradições de interesses.
Estes lobbies são totalmente legítimos e naturais num sistema de mercado. A gestão desta conflitualidade potencial de interesses, nesta como em outras áreas da competência da União, é da responsabilidade da Comissão Europeia. É uma tarefa difícil e somos os primeiros a reconhecer a delicadeza do exercício dentro da própria Comissão Europeia.
O que é importante é que essa mesma Comissão Europeia, que gere a política comercial da União, procure compatibilizar estes diferentes interesses de forma equilibrada, repartindo os custos e garantindo equidade nos ganhos. apenas isso que exigimos. E a forma como 0 Governo tem vindo a expressar esta sua posição junto da Comissão Europeia continua a afigurar-se-nos a mais eficaz e a mais consequente, como a gestão deste dossier parece provar de forma clara.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Moura e Silva, Lino de Carvalho e Francisco Torres.
Tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva.

O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, sabemos que a postura de Portugal no âmbito da Comunidade tem sido de alguma subserviência, deixando-se influenciar pelas estratégias comunitárias, que, geralmente, pouco interesse têm para Portugal e para os portugueses. Gostava, pois, de saber se o Governo pretende trazer a esta Câmara a sua proposta e, ainda, consultar os parceiros sociais no sentido de elaborar o seu cabaz para depois defender-se no âmbito da Comunidade.
Por outro lado, e tendo em consideração que o aumento do desemprego resulta em grande medida do encerramento do nosso sector produtivo e da abertura das fronteiras aos produtos provenientes de outros países, os quais, geralmente, não têm obrigações sociais, pergunto que medidas pretende o Governo impor no âmbito da Comunidade para travar ou, pelo menos, para obrigar esses países a prosseguirem a sua actividade com preocupações de maior protecção e acuidade sociais, o que tornará os respectivos produtos menos competitivos.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado responderá no final dos três pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra ó Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, já que o Partido Socialista, muito prudentemente, resolveu não envolver-se neste debate no qual parece não ter confiança, vamos nós esclarecer algumas das suas afirmações.
Um dos problemas do Governo, bem como do Sr. Secretário de Estado, é estes discursos redondos não corresponderem à prática nem aos resultados das negociações ou ao comportamento do Executivo em Portugal. O Sr. Secretário de Estado sabe tão bem ou melhor ainda do que eu que em todas as negociações desta matéria em que nos temos envolvido nos últimos meses os resultados têm sido gravosos para Portugal. Protestamos a posteriori cá dentro, até apresentámos recurso, no caso da índia e do Paquistão, para o Tribunal da Comunidade Europeia, mas na altura em que é preciso negociar e valermo-nos do poder negociai do Governo, na altura em que seria possível o Governo invocar, se necessário fosse, interesses vitais que bloqueassem o processo, o Governo sistematicamente não o faz. Protesta a posteriori e tarde demais porque, entretanto, as consequências gravosas desses acordos já estão a fazer-se sentir na indústria e no emprego em Portugal.
Aliás, o Sr. Secretário de Estado disse que, muito antes de tornarmos a lista pública, já o Governo estava a movimentar-se. Poder-lhe-ia responder que, como certamente tem conhecimento, muito antes desse evento, ainda em Junho, os Deputados comunistas ao Parlamento Europeu, quando tiveram conhecimento da primeira lista, tentaram que a mesma não fosse para a frente. Mas, Sr. Secretário de Estado, se porventura é verdade o que afirmou - e, se o afirmou; com certeza que é verdade -, gostava de saber de que forma mobilizou as estruturas empresariais, os trabalhadores, esta Assembleia para, apoiando o Governo, ser reforçado o poder negociai de Portugal de forma a não atingirmos uma fase em que, apesar de tudo, ainda se encontram, como o Sr. Secretário de Estado reconheceu, vários produtos sensíveis, e não apenas dois, para a indústria têxtil portuguesa. É que esta estratégia de confidencialidade é de isolamento prosseguida pelo Governo de não envolvimento do país nas, negociações não nos favorece, enfraquece-nos e prejudica os resultados finais. É o que se tem vindo a passar e que criticamos.
Diz o Sr. Secretário de Estado que esta lista é menos dramática. Eu também disse ria minha intervenção que a segunda lista, depois das movimentações que se fizeram, é aparentemente mais favorável a Portugal, apesar de não conter apenas dois produtos mas, pelo menos, quatro ou cinco categorias (a 46, a 50, a 77, a 90 e a 100) que são prejudiciais à indústria portuguesa. E não iluda a questão de estes produtos serem em menor número porque são quase tão gravosos como os anteriores e repercutem-se em zonas muito restritas do País que têm uma dependência quase exclusiva dos sectores que vão ser atingidos. É o caso da Covilhã, do Porto, de Aveiro.
Estou a falar de 1/15, Sr. Secretário de Estado! Mas quantos milhares de empregos, quantos milhares de trabalhadores vão ser afectados com a redução do número de produtos sensíveis agora colocados na lista? Por que razão os Estados Unidos não incluem nenhum produto sensível, antes os transferem para o ano 2005, e nós, apesar de tudo, somos obrigados a aceitá-los - o que fazemos para a indústria têxtil e o emprego em Portugal? É essa a diferença de comportamento.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
A verdade é que a brecha continua a abrir-se e, pouco a pouco, o nosso sector têxtil vai desaparecendo no quadro da indústria portuguesa.
Aliás, a propósito da lista, e o Sr. Secretário de Estado não me respondeu a esse ponto, devo dizer que, apesar de tudo, não interessa só a lista, mas também o ponto n.º 4

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do regulamento, que reserva à Comissão o direito de rever a lista dos produtos no decurso das negociações se tiver contrapartidas da parte de outros países, o que significa que a lista é uma, mas no decurso das negociações a Comissão pode introduzir outros produtos que a alarguem e que, na prática, liberalizem na 2.ª fase o que só deveria acontecer no ano 2005.
Prudentemente, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus passou ao lado desta questão vital para o processo negociai que está em curso. Por isso, não me parece que haja razões para falar de grandes vitórias neste momento; há, sim, motivos para grandes preocupações e para continuarmos a insistir na necessidade de se rever a lista e de reavaliar os termos em que se está a processar ó comércio mundial nesta fase.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, ouvi com agrado que o Governo está a dar-se bem com a Comissão e a desenvolver um trabalho construtivo para tentar defender os nossos interesses. Ou seja, a actual situação é muito melhor. E digo que o ouvi com agrado porque, de facto, nesta matéria, o Governo começou por actuar de maneira diferente, chegando mesmo a negar o trabalho político desenvolvido ao longo dos anos anteriores e a afirmar que ia adoptar uma nova postura, atitude que deu maus resultados em vários sectores, designadamente neste, ao sermos surpreendidos pelo acordo celebrado com a Índia e o Paquistão alertámos, aliás, em conferência de imprensa dada pelo PSIT e, mais tarde, na própria Comissão de Assuntos Europeus, em reunião com os parceiros sociais, de que isso poderia acontecer.
Também folgo em ouvir que a lista está restrita a um número mais reduzido de produtos sensíveis para Portugal. Todavia, como não sabemos se são dois ou mais produtos, gostávamos que o Sr. Secretário de Estado nos prestasse um esclarecimento cabal.
Sr. Secretário de Estado, gostava ainda que nos desse garantias de que, durante as negociações que agora se vão iniciar e que serão conduzidas pela Comissão Europeia, o Governo está em condições de assegurar o trabalho político anterior, isto é, estavam previstas três fases, com duas passagens à 2.ª e à 3.ª fases, para a liberalização total até ao ano 2005, acompanhadas de uma avaliação técnica e política, e daí o nosso peso na negociação. Ou seja, está o Governo em condições de garantir que, ao conduzir as negociações através da Comissão Europeia, o comissário encarregue de o fazer terá em conta, de foram intransigente, a defesa destes produtos sensíveis para Portugal?
Além do mais, esses produtos já estavam defendidos anteriormente, por isso estão criadas todas as condições para que possam continuar a ser defendidos da mesma maneira. Não há qualquer razão para uma alteração das condições, antes, pelo contrário, verifica-se um reforço desta posição por parte de alguns países que também vieram protestar nesta matéria.
Condenamos a posição do Partido Comunista, que gostaria de regressar autua espécie de proteccionismo, porque não é essa a nossa postura nesta matéria. Já quanto à confidencialidade do Governo como estratégia de condução deste tipo de negociações, devo dizer que criticamos, tal como já fizemos no passado, a outra estratégia do Governo, a de afrontamento sem trabalho político, em que se afirmava não estarmos mais em tempo de ser «bons alunos» e que agora iríamos defender os nossos interesses de forma mais frontal.
Pois bem, Sr. Secretário de Estado, com «bons, maus ou médios alunos», a verdade é que herdou todas as condições para defender estes produtos sensíveis e, em suma, os produtos portugueses. Gostávamos, por isso, de ter garantias de que, de facto, as negociações serão conduzidas pela Comissão com uma posição portuguesa intransigente nesta matéria.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus. Dispõe de 5 minutos para o efeito.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando José de Moura e Silva, gostava de dizer que a proposta da Comissão é apenas do conhecimento formal do Governo português há escasso tempo. E uma coisa é o conhecimento que se possa ter de algumas deliberações internas da Comissão relativamente às quais se possa actuar de forma discreta, outra coisa é o conhecimento formal que implica uma reacção pública às propostas da Comissão. São dois tempos diferentes e a vida comunitária tem esses dois modelos de intervenção.
Não é, pois, possível trazer a um debate público um conjunto de posições e categorias no domínio do têxtil que esteja ligado a propostas internas que estão a ser objecto de discussão no seio da Comissão, mas já é possível foi o que fizemos - comunicar à Comissão Europeia quais os produtos que considerávamos passíveis de integração nesta fase de liberalização e que não continham produtos, sensíveis para a indústria portuguesa. Essa lista foi apresentada, com base em elementos fornecidos pelo Ministério da Economia, e serviu, de facto, para a elaboração da nossa proposta junto da Comissão. Contrariamente ao que o Sr. Deputado Lino de Carvalho disse, tivemos em conta todas as informações que nos foram dadas pelos projectores responsáveis e técnicos nesta matéria.
Também tivemos em conta, e isso é extraordinariamente importante, todas as consultas que fomos mantendo, sistematicamente e com a maior abertura, com os industriais do sector, que tiveram, por mais de uma vez - e continuam a ter -, uma atitude de grande reconhecimento pelo modo como o Governo tem vindo a conduzir estas negociações, porque sabem que as suas posições são tidas em conta durante os contactos havidos com a Comissão Europeia.
Relativamente à defesa dos direitos sociais e à política comercial da União Europeia e, nomeadamente, ao facto de haver países que não cumprem determinado tipo de regras básicas em termos de direitos sociais de produção, o Governo português tem vindo a defender em várias instâncias, e não apenas no âmbito da União Europeia, a necessidade de esse tipo de direitos sociais ser respeitado, porque se assim não for o comércio deixa de ser justo e passará a ser selvagem.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, lamento informá-lo de que está desactualizado porque, neste momento, subsistem apenas duas categorias, a 50 e a 90, que são sensíveis para a indústria portuguesa e que estão incluídas na proposta da Comissão Europeia. Não digo que a proposta da Comissão esteja, em absoluto, estabilizada, mas por agora,

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pelo menos tanto quanto pudemos apurar ontem, no final da reunião do Comité 113-Têxteis, apenas essas duas categorias estão em risco. Estamos, por isso, a manter uma pressão a todos os níveis, o que vamos continuar a fazer até ao Conselho, no sentido de evitar, se possível, que mesmo estas duas categorias possam ser retiradas.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, penso que toda a sua intervenção teve como objectivo concreto procurar esquecer e fazer desaparecer a diferença que existe entre o dramatismo da proposta inicial da Comissão Europeia, apresentada pelo Sr. Deputado durante uma conferência de imprensa, e a situação que existe hoje, que é completa e radicalmente diferente.
Mas, sejamos claros e modestos, essas alterações não acontecem necessariamente por obra e graça de qualquer conferência de imprensa do Partido Comunista Português! Acontecem, sim, porque há uma intervenção concreta e objectiva por parte do Governo português nas várias instâncias. Naturalmente, são bem-vindas todas as formas de pressão que possam existir, por via política, para apoiar este tipo de intervenção oficial mas, como é evidente, foi na discussão concreta com a Comissão, a variados níveis, que se conseguiu ir afastando várias dessas categorias que estavam incluídas na lista e que seriam, essas sim, extremamente gravosas para a indústria nacional.
Portanto, penso que não há razão para o Sr. Deputado fazer uma litania contra a atitude do Governo. Aliás, deve reconhecer, intimamente, que a acção do Governo nesta matéria foi responsável, firme e conseguiu levar a cabo uma profunda alteração na proposta inicial da Comissão, alteração essa que tem um efeito extremamente positivo naquilo que está hoje em cima da Mesa em termos negociais.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E a cláusula que reserva à Comissão a introdução de novos produtos?!

O Orador: - O Sr. Deputado Lino de Carvalho continua desactualizado. O parágrafo da proposta de regulamento que dava à Comissão a possibilidade de também alargar a lista de produtos a liberalizar na 2.ª fase, em função da declaração de intenção de países terceiros de vir a abrir os seus mercados, foi retirado da proposta aprovada em colégio de comissários - talvez o Sr. Deputado Lino de Carvalho não soubesse, mas fica a saber! Este foi um dos aspectos fundamentais pelo qual o Governo se bateu nas diligências efectuadas junto da Comissão. Convém que isto fique claro.
Também quanto às duas categorias pautais que estão em causa, a 50 e a 90, queria dizer que a situação é menos grave do que, muitas vezes, se diz. De facto, quando se afirma que a inclusão da categoria 50 na lista dos produtos a integrar tem efeitos muito negativos a nível regional, nomeadamente na Beira Interior, porque atinge cerca de 15 000 trabalhadores que dependem da indústria de lanifícios, há que ter em atenção um ponto importante, Sr. Deputado. E que com o processo de reestruturação no sector de lanifícios, a produção nacional centra-se actualmente na categoria 3 - tecidos de lã com mistura de fibras sintéticas -, categoria essa que não está incluída na lista dos produtos a liberalizar na actual fase, o que torna muito menos gravosa a situação relativamente à categoria 50.
Contudo, não gostaria de desenvolver muito este ponto, precisamente porque a discussão ainda continua e nós estamos a procurar retirar também a categoria 50.

Quanto à pergunta formulada pelo Sr. Deputado Francisco Torres, diria apenas que é intenção do Governo prosseguir um diálogo com a Comissão exactamente com o mesmo espírito que tínhamos quando tomámos posse; não alterámos uma vírgula relativamente ao nosso comportamento, nem procurámos dramatizar a nossa atitude com a Comissão.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Mas o discurso mudou muito!

O Orador: - Não, Sr. Deputado, o que acontece, muito claramente, é que este Governo tem denunciado, frontal e abertamente, as propostas apresentadas pela Comissão que são gravosas para Portugal. Disse-o aqui, nesta Assembleia, e sempre o direi até ao fim!
Sr. Deputado Francisco Torres, não gostaria de falar
- e digo-o pela terceira vez nesta Câmara - na questão dos acordos de têxteis celebrados com a índia e o Paquistão nem de dizer em que altura é que o Governo português e que Governo português, teve conhecimento dessas propostas.
A verdade, Sr. Deputado, é que o Governo limitou-se a herdar uma situação que tem gerido na medida do possível. Além disso, recorremos ao tribunal e esperamos que a decisão nos seja favorável. Em todo o caso, repito, nesta questão dos acordos com a índia e o Paquistão, não gostaria de ir muito mais longe..
Finalmente, Sr. Deputado Francisco Torres, penso que no futuro teremos as mesmas condições políticas do anterior governo português relativamente às negociações que a Comissão vai empreender com países terceiros, nomeadamente no campo da Organização Mundial de Comércio.
Neste momento, temos credibilidade para poder influenciar as opiniões da Comissão no mesmo grau que o anterior governo. Mas, como sabe muito bem, há limitações consideráveis relativamente à possibilidade de influenciar a política comercial da União Europeia, que é hoje uma política comum, limitações essas que fazem com que haja alguma influência possível nos trabalhos da Comissão.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Mas a possibilidade de intervenção dos Estados tem um limite, e o Sr. Deputado sabe-o tão bem como eu.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pinto.

O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados. O debate proposto pelo PCP, sobre as consequências resultantes para Portugal da 2.ª fase de integração dos produtos têxteis e vestuário nas regras da Organização Mundial de Comércio, traz-nos a oportunidade de debater a situação do sector e avaliar a actuação do Governo no plano comunitário e no acompanhamento das suas repercussões na área do emprego, na competitividade e na capacidade exportadora das empresas nacionais.
Em 1994, Portugal subscreveu a criação da Organização Mundial de Comércio depois de um longo período de negociação. Tivemos, nessa altura, a oportunidade de defender a necessidade de estabelecimento de novas regras

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e de um quadro muito claro de condutas comerciais para os próximos anos. Mas estas regras não dispensavam, como então afirmámos, o acompanhamento detalhado das questões emergentes da liberalização do comércio mundial, designadamente quanto aos têxteis.
E a verdade é que, se compreendemos a iniciativa comunitária de avançar com novo pacote de produtos, no âmbito da próxima reunião de Singapura, torna-se de todo em todo incompreensível que se incluam algumas das principais categorias com peso mais significativo nas exportações nacionais.
A selecção de produtos feita pela Comissão não teve em conta a sensibilidade para a indústria europeia e o seu impacto regional em termos dê emprego e esqueceu as dificuldades de adaptação a uma concorrência acrescida, reduzindo o tempo desta adaptação, prevista até 2005. E perguntamos: qual a posição do Governo português sobre esta matéria? No dossier inicial deixou incluir sete classes de produtos que, no seu conjunto, representavam 165 milhões de contos. Ou seja, o Governo, que vem discursando internamente com afirmações de grande determinação perante Bruxelas, não colhe qualquer efeito no que apresenta ao País e aos sectores económicos envolvidos.
O Governo, aqui, como noutros momentos, tem vindo a falar muito e a realizar pouco...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Você julga que ainda está a falar para o anterior governo!

O Orador: - ... e, neste caso, ao permitir, .ainda que em hipótese de trabalho, que se admitisse a liberalização para produtos com .peso tão significativo na indústria exportadora portuguesa, demonstrou que vem falhando na sua estratégia de aluno «mal comportado» que julga impressionar, para logo a seguir ceder por insuficiência de credibilidade.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Nesta decisão de Bruxelas, corrigida depois para produtos que, apesar de tudo, representam 17 milhões de contos de exportações, está em causa o futuro de alguns milhares de empregos em regiões de menor desenvolvimento no nosso país. E o que não compreendemos é a passividade do Governo em responder com medidas adequadas, no plano económico e social, às consequências previsíveis desta abertura antecipada do mercado europeu a mais produtos têxteis.
Quando a indústria têxtil está a meio de um, processo de transição, visando a sua modernização, não faz qualquer sentido alterar as regras de jogo e impor hoje o que os industriais pensavam que só aconteceria daqui a alguns anos.
Há regiões, em Portugal, que vão sofrer particularmente o impacto das medidas propostas por Bruxelas e não é de surpreender que o desemprego, aí, tenha um aumento significativo.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Leia as estatísticas! Cultive-se!

O Orador: - As áreas do sector da lã, sediadas no interior, designadamente em Covilhã, Castelo Branco, Guarda, Seia e Gouveia, e as empresas de cordoaria do norte do País devem merecer uma atenção cuidada que o Governo não pode ignorar.

Todos os países com produção têxtil significativa vêm criando apoios que visam uma resposta às circunstâncias decorrentes do acordo multilateral da OMC. Em Portugal, quando ouvimos a Sr.ª Ministra do Emprego falar sobre o crescente desemprego e as suas propostas para o combater, fica-se com a sensação de que os têxteis, em particular, e os sectores tradicionais, em geral, estão abandonados à sua sorte.
Este Governo produz teoria sobre o emprego, enquanto cresce o desemprego. Este Governo proclama a necessidade de criar emprego, nada fazendo para alcançar este objectivo.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não apoiado!

O Orador: - Ler o acordo de concertação social de curto prazo, prometendo mais 1 % de emprego, é constatar e perceber o descrédito do Governo para obter qualquer concertação estratégica para o futuro.
O emprego, segundo o que o Governo mostrou até agora, é um acto de voluntarismo dos governantes, antes de ser fruto da criação de condições favoráveis e de apoio às empresas e a um bom clima de confiança na economia.

O Sr. José Magalhães (PS): - É a «noite da má-língua»!

O Orador: - Não admira, deste modo, que, nesta matéria, o Governo português nada aprenda com os parceiros europeus.
Os governos, lá fora, negoceiam com exigências de protecção a áreas sectoriais e regionais sensíveis à população. Em Portugal, aceitam-se consequências decisórias, ainda que resultantes de compromissos multilaterais, sem que se acompanhem devidamente esses sectores e as empresas atingidas.
Está em causa o futuro e não o passado, mas importa recordar que, em 1994, Portugal soube envolver os países comunitários na defesa da nossa indústria transformadora, 'antes de encerradas as negociações do Uruguay Round. O que teria acontecido se descuidássemos a defesa dos nossos interesses, como hoje acontece, se tivéssemos usado do laxismo que hoje está bem patente?
O Governo tem esquecido que se torna necessário acompanhar com grande atenção o facto de não haver coincidência entre regiões atingidas pelo impacto negativo das importações no nosso País, resultantes de mais liberalização, e regiões beneficiadas pelos resultados positivos das .exportações. Sempre tivemos bem presente esta diferença, mas o Governo continua adormecido em relação a estas realidades.
Há empregos em risco com a liberalização que ora se anuncia, devendo somar-se a crescente e previsível abertura comunitária aos países da Europa Central e Oriental.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não negamos hoje o que defendemos ontem sobre esta matéria. Considerámos ontem que o acordo que criou a OMC e a Acta final que consagrou os resultados do Uruguay Round são globalmente favoráveis para o desenvolvimento do comércio mundial. Mas este acordo é também um teste aos governos e às suas fragilidades, sobretudo quando não têm políticas económicas sectoriais bem definidas que atendam às necessidades dos empresários e dos trabalhadores. E a pergunta que se pode fazer é a seguinte: onde estão as políticas para os sectores e subsectores industriais? Onde está a atenção redobrada ao impacto de transformações como

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as que os têxteis vão sofrer? Deste Governo, a única política que se conhece é a da manutenção dos objectivos de convergência. Com ela esgota-se a sua ambição, afinal sustentada na condução económica do País de 1985 a 1994. Para atingir este objectivo, a tendencial descida das taxas de juro será condição quase suficiente, mas a convergência real da economia, a manutenção de uma indústria competitiva não encontra no Governo as respostas exigidas pelas empresas.
Por que razão o investimento está parado, o emprego não cresce e o consumo estagnou? A razão, a nosso ver, é simples: este Governo, com falta de coordenação de políticas económicas, com iniciativas desgarradas entre ministérios, envolvidas em roupagem de recuperação empresarial mas dirigidas apenas à cobrança de impostos, não oferece condições à criação de confiança no mundo empresarial, nos trabalhadores e nos consumidores.
Anão existência de confiança dos portugueses para aumentar a iniciativa empresarial, criar emprego e aumentar a riqueza nunca foi culpa dos cidadãos, trata-se apenas do julgamento negativo que fazem acercado Governo e da forma como se governa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As perspectivas que se abrem com o aumento das importações de têxteis, no quadro desta liberalização antecipada, vão ser muito negativas para certas zonas do País.
O desemprego maciço em importantes zonas e sectores levará a custos sociais, que importa prever e atacar nas suas consequências mais gravosas. O Governo, nesta como noutras questões, demonstra que está adormecido, contemplando os resultados das negociações, sem actuar politicamente em Bruxelas de forma adequada e sem prevenir atempadamente os efeitos internos decorrentes das decisões.
Os nossos exportadores ficam mais uma vez a saber que este Governo acaba de falhar na defesa dos interesses nacionais em Bruxelas, demonstrando que não sabe exercer a acção mais adequada, tendo em conta que hoje é através da Comissão europeia que passa boa parte da nossa acção em prol dos interesses nacionais, visto que a política comercial externa está comunitarizada.
Mas este Governo falha também quando não apresenta uma única iniciativa para atenuar os efeitos internos das decisões de Bruxelas.
Que propõe o Governo para as regiões têxteis e outras especializadas em indústrias tradicionais, a necessitarem de decisões urgentes? Que medidas para proteger os cerca de 20 000 empregos em redor da Serra da Estrela e no distrito do Porto?
Sabemos que o Sr. Ministro da Indústria declarou que está razoavelmente satisfeito com a solução de Bruxelas, pelo que não se esperarão grandes propostas, considerando o conformismo revelado. Mas a verdade é que não podemos ficar a assistir à ruína da indústria nacional e à perda de emprego derivada de decisões políticas comunitárias inadequadas à realidade portuguesa.
O PSD considera urgente que se adoptem medidas excepcionais para os têxteis portugueses e para as empresas que procuram sobreviver e modernizar-se.
A contratualização, entre empresários, sindicatos e Governo, de medidas que abranjam a redução de custos sociais das empresas contra a garantia de manutenção do emprego e de um esforço de criação de emprego para jovens é uma proposta que aqui queremos deixar. Torna-se urgente esta medida excepcional que permita salvaguardar o emprego, através da redução de custos fixos que penalizam e desequilibram as empresas.

Convém recordar que a malha de empresas do sector têxtil é sobretudo formada por unidades com menos de 50 trabalhadores e a redução, nestes casos, pode ter um significado, na manutenção do emprego, que merece ser devidamente ponderado. Aliás, assistimos a desigualdades dentro da União Europeia, nesta matéria, a que é preciso dar resposta, sob pena de as nossas empresas perderem na concorrência com as suas congéneres europeias.
O Governo e o Sr. Ministro da Economia dedicam todo o seu tempo ao plano de recuperação de dívidas, esquecendo a realidade trazida hoje a debate. Mas esta é a economia real; a outra, a do Governo, é a economia de laboratório, experimental, a recreação dos contratos de viabilização dos anos 80, o que revela a insuficiência de respostas adequadas e criativas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela nossa parte, reafirmamos que não abandonaremos a defesa dos interesses nacionais, mesmo no quadro de responsabilidades comunitárias complexas e difíceis.
O debate sobre o sector têxtil é um bom exemplo , e estamos à-vontade para o dizer. Deparámos, em 1985, com o sector têxtil obrigado a competir na Comunidade sem cláusulas de salvaguarda, as quais foram negligenciadas na pré-adesão. Soubemos harmonizar a adaptação a novo quadro concorrencial na Europa, ganhando, inclusive, mercados inesperados, como a Espanha, por negociações adequadamente conduzidas. Conseguimos apoios significativos nos Pacotes Delors I e II e ajudas suplementares no quadro. da negociação e conclusão do Uruguay Round, que constituem hoje a base da Iniciativa de Modernização da Indústria Têxtil, que este Governo deixou atrasar na sua execução.
Estamos, por isso, decididos a não permitir que se perca, por falta de visão estratégica da indústria. nacional e de defesa de regiões desfavorecidas onde se localizam subsectores de grande importância local, o que se conseguiu alcançar nos últimos anos.
É por isso também que, hoje, não podemos deixar de criticar o Governo por estar a assistir passivamente à situação decorrente das decisões de Bruxelas que penalizam os têxteis portugueses.
A conclusão final de mais este insucesso do Governo no plano comunitário e, sobretudo, a não prevenção das suas consequências no plano interno só pode significar a desaprovação clara que hoje percorri os agentes económicos.
O descrédito deste Governo ameaça conduzir o País para uma crise de que se podem ler sinais bem evidentes. Parece que só o Governo não os reconhece.
Há uma crise de confiança, porque os cidadãos consideram anormal a distância entre as promessas do Primeiro-Ministro e a realidade que o País vive.
Há uma crise de confiança, porque o País não compreende os ataques públicos entre o Ministro e o Provedor de Justiça, entre os Comandantes das Forças de Segurança e o Ministro do sector.
Há uma crise de confiança, porque é evidente a falta de coordenação no Governo e as demarcações entre Ministros do mesmo Governo. «É por estas e por outras que o Governo chegou a este estado» - escreveu, em bilhetinho discreto para o Primeiro-Ministro, o Ministro Jaime Gama. É caso para dizer «cá se fazem, cá se pagam».
Há também uma crise de confiança, porque o País não compreende que o Primeiro-Ministro, que tanto fala de diálogo, não seja capaz de obter a concertação estratégica. com os parceiros sociais para assegurar metas objectivas para o futuro.

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O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Está mal informado!

O Orador: - Em resumo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, após um ano de Governo, este não soube gerar confiança na sua acção.
O PSI) saberá, com oposição tranquila, construtiva mas firme, fazer com que os portugueses acreditem novamente que é possível governar melhor, construindo a alternativa de que o País necessita.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lavrador.

O Sr. Carlos Lavrador (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Pinto, covilhanense como o senhor, acredito e comungo das mesmas preocupações, que julgo serem sinceras, relativamente à situação dos têxteis da região, do distrito e, particularmente, do nosso concelho. Acredito, mas confesso que estou espantado, porque todos temos memória de que, durante anos a fio, V. Ex.ª foi o Presidente da Câmara da Covilhã,...

O Sr. José Magalhães (PS): - É verdade!

O Orador: - ... foi Deputado pelo círculo de Castelo Branco e navegou no melhor dos mundos, no oásis de Cavaco Silva, no silêncio cúmplice e no aplauso entusiástico, quando a indústria da nossa região definhava, num estertor a que era indiferente o seu governo.

Vozes do PS: - Bem lembrado!

O Orador: - Lembro-lhe as dezenas de empresas que, sucessivamente, foram à falência e desapareceram, provocando o alastrar da chaga social do desemprego, sem que, da parte do governo, houvesse qualquer intervenção quer de índole social, quer de índole estrutural.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O que conhecemos desse período, que queremos esquecer, são intervenções casuísticas, perfeitamente ocas e isentas de critérios de objectividade è justiça, favorecendo empresas inviáveis e deixando outras viáveis por apoiar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O que vimos foi um escudo brutalmente caro,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... que atirou as empresas para o fundo, tornando impossível a sua competição nos mercados externos.

Vozes do PS: - Bem lembrado!

O Orador: - O que vimos foi um crédito caro, inacessível às diferentes empresas.
Sr. Deputado, foi esta a ajuda e o contributo que o seu governo deu para a solução de uma crise que agora o assusta e que se nos deixa preocupados e simultaneamente esperançados, porque confiamos que este Governo nos defenderá o melhor que souber e puder, dentro dos constrangimentos que resultam de uma negociação em que nem tudo é receber. Estamos cientes, sobretudo depois da intervenção e esclarecimento do Sr. Secretário de Estado, de que o prejuízo será anulado ou, quando muito, reduzido ao mínimo. E não seremos indiferentes, como já não 0 somos neste momento, ao aspecto social e também a um apoio efectivo, claro e bem estruturado, como o que encerra o Plano Mateus.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - O Plano Mateus ainda existe?!

O Orador: - Fazêmo-lo não de uma forma casuística mas sistematizada, que procura objectivamente fazer justiça.
Por isso, Sr. Deputado, a questão que coloco é a seguinte: não considera insólito, não considera deslocado que, perante a sua intervenção ao longo de todos estes anos, venha agora invocar fantasmas que não existem?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Pinto, como tem apenas 0.4 minutos para responder, a Mesa concede-lhe 2 minutos.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Sr. Presidente, quero, em primeiro lugar, saudar também o Sr. Deputado José Carlos Lavrador, com quem tive o privilégio de conviver noutras instâncias locais, e dizer-lhe que quase me retirava o direito de falar...

O Sr. José Magalhães (PS): - O direito não, a legitimidade!

O Orador: - ... sobre os problemas que aqui trouxe, no âmbito deste debate, porque invocou responsabilidades das quais me orgulho. Só quem esteve distraído neste país, designadamente V. Ex.ª, localmente, é que esquece coisas simples que se passaram nos últimos 10 anos.
Sr. Deputado, em 1985, quando o PSD assumiu responsabilidades, as taxas de juro para os industriais da Covilhã era de 30 %, com juros à cabeça que atingiam os 40 %.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - E a taxa de câmbio qual era?!...

O Orador: - Sabe que essa era uma herança do bloco central...

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Peço que façam silêncio, Srs. Deputados.

O Orador: - O Partido Socialista, Sr. Presidente, não se habitua a que os portugueses julguem os políticos em eleições e, portanto, entende que não fomos julgados e que eles não o serão proximamente.
Srs. Deputados, fomos julgados em 1995 sobre o que fizemos de bom e :mau e os senhores serão julgados proximamente!
Quero recordar à bancada do Partido Socialista a seguinte circunstância clara: efectivamente, os sectores ex-

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portadores portugueses dos têxteis multiplicaram os números por 20, desde 1985 até hoje.

O Sr. Joel liasse Ferreira (PS): - Quais números?!

O Orador: - E isso foi devido às circunstâncias envolventes criadas pelos governos do PSD, não só a nível macroeconómico.
Já falei das taxas de juro e poderia falar agora da taxa de inflação e de tantas coisas que sucederam e que permitiram baixar as taxas de juro, as quais eram fundamentais para o investimento, bem como do investimento na melhoria da qualidade e do design, da capacidade competitiva com os nossos principais concorrentes, etc.
Os Srs. Deputados estavam mais virados para as empresas públicas que davam milhões,...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Geridas pelo PSD!

O Orador:- ... porque a vossa, inspiração não era com a sociedade civil, não' era com o mundo empresarial que efectivamente mantém o emprego, porque o vosso conhecimento era o das empresas públicas, dos prejuízos. Esse é que era o vosso conhecimento e, portanto, os senhores desconhecem como é que o sector textilaneiro, curiosamente, produz mais em 1996, em metros fabricados, do que produzia em 1980.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Então o que é que esteve a dizer na tribuna?!

O Orador: - Sabe qual é o perigo das decisões do Governo de hoje? É que há 2 anos os industriais receberam orientações no sentido de que a Organização Mundial do Comércio e a liberalização estariam defendidas até ao ano de 2005.
Por seu lado, o Sr. Secretário de Estado interpreta mal ou tem informações incorrectas quando diz que a maior parte dos tecidos, na nossa zona, na zona dos 20 000 trabalhadores, até nem vai ser tocada, porque as misturas até nem vão ser consideradas como tecidos de lã mas, sim, como tecidos sintéticos. Está enganado, Sr. Secretário de Estado, e o problema é que o investimento feito em muitas empresas, que se modernizaram, que aumentaram o emprego, pode ser prejudicado por esta decisão não dialogada com o Governo.
O Sr. Secretário de Estado diz que tem ao seu lado os empresários, mas peço-lhe que leia as declarações do Presidente da Associação Nacional dos Industriais de Lanifícios e saberá que ele está absolutamente estupefacto com a incapacidade de não transferirmos para os produtos que foram aqui referidos pelo Sr. Deputado do PCP, designadamente aqueles que não são produzidos no nosso país e que, obviamente, permitiriam uma moeda de troca no quadro de negociação multilateral em que a Comunidade tem de actuar.
É por essa incapacidade e por os senhores não reconhecerem o que está em jogo, designadamente a nível local, por não questionarem sequer a proposta que ali deixei e que vem na sequência daquilo de que- ainda há tempos falávamos, ou seja, só se pode incentivar e precaver algumas consequências negativas no nosso tecido microempresarial se efectivamente reduzirmos os custos fixos, os quais passam pela redução dos custos sociais,, que os senhores, continuam a fazer «orelhas moucas» em relação a isto.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: É um lugar comum falar da importância do sector têxtil e de vestuário para a nossa economia - cerca de 300 000 postos de trabalho, mais de 800 milhões de contos de exportação. Quer dizer que ninguém, com bom senso, pode ignorar o que este sector de actividade representa para Portugal e para os portugueses.
Mas, dito isto, também não podemos ignorar que, por um lado, o sector tem continuado a crescer em produção e vendas e, por outro, que o padrão de especialização da nossa indústria não pode continuar a basear-se essencialmente no trabalho intensivo existente no sector, assente em baixos salários.
Acresce que também não podemos desconhecer o que se passa no mundo e as tendências económicas dominantes, nomeadamente depois dos acordos do Uruguay Round, ou desconhecer os seus efeitos positivos no comércio internacional e na dinamização das economias, incluindo as economias dos países menos desenvolvidos.
Ou seja, Portugal, país universalista e aberto, não pode deixar de considerar este aspecto e querer ter sempre o «sol na eira e a chuva no nabal», como o PCP consistentemente quer fazer acreditar ao povo português...

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Bem lembrado!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Só temos é chuva!

O Orador: - É isto que o PCP faz, de forma continuada, e, de uma vez por todas, deveria explicar ao País como é possível promover o nosso desenvolvimento económico, reduzir o desemprego e melhorar o nível de vida dos portugueses ao arrepio das tendências económicas dominantes e da relação de forças existentes no mundo actual,...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E o que fica para nós?

O Orador: - ...isto é, em isolamento político e económico, relativamente à maioria dos povos do mundo, nomeadamente dos povos com quem temos as mais fortes relações de proximidade e de histórica comum: os povos europeus.
O PCP deverá explicar, com rigor, aos portugueses quais, na opinião do partido, devem ser os nossos parceiros e mercados essenciais e prioritários. Serão os mercados de Cuba e da Coreia do Norte?

O Sr. João Amaral (PCP): - Isso são frases não compatíveis com a função de Deputado!

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Que tristeza!

O Orador: - Parece-me, pois, evidente que, embora respeitando algumas das preocupações do PCP, muitas das quais são também preocupações nossas, não há dúvida de que a postura política do PCP não tem a ver com as verdadeiras soluções para o sector têxtil, as quais passam pela melhoria da competitividade e maior diversificação da nossa indústria no mercado mundial.

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Num aspecto concordamos, todavia, com o PCP, é com a absoluta necessidade de a indústria têxtil e o vestuário português terem tempo para se adaptarem às novas condições de mercado, nomeadamente no respeito pelos acordos internacionais estabelecidos. E que não é aceitável sermos confrontados com factos consumados decididos por países que não têm as mesmas preocupações neste sector de actividade. Mas é isso que o Governo do Partido Socialista tem combatido relativamente à 2.ª fase de transição. Foi essa a razão por que Portugal contestou propostas da Comissão junto do Tribunal Europeu e está a contestar os limites do mandato da Comissão para negociar futuros acordos bilaterais ou novos avanços na política de liberalização, sem o acordo do nosso país.
Aliás, este Governo iniciou claramente uma nova prática política relativamente à União Europeia, onde deixámos de ser os bons alunos da Comissão que fomos no passado, nova política que não é isenta de atritos e de dificuldades e que esperamos, sinceramente, possa ser sempre apoiada nesta Câmara, porque é do interesse nacional que estamos a tratar.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Entretanto, como todos sabemos, o futuro da indústria têxtil e de vestuário passa por reformas profundas no sector, muitas das quais dependem de reformas em curso na nossa sociedade, nomeadamente no ensino, na formação profissional, na internacionalização das empresas portuguesas, no desenvolvimento de novas tecnologias e da inovação nos produtos, nos métodos de comercialização, de distribuição e de transporte.
E sobre isto gostaria aqui de contar uma história aos Srs. Deputados. Um cidadão francês, ou sueco, que queira comprar um bom fato, de que precisa com alguma urgência, dirige-se a uma cadeia de lojas chamada "Taylor", onde o espera uma máquina em que as formas e as dimensões exactas do seu corpo são registadas tridimensionalmente. No monitor da máquina, o cliente vê, depois, simular diferentes modelos de fatos e diversos tipos de fazendas, até se decidir sobre o que pretende.
Minutos mais tarde, a informação assim registada na referida máquina chega, por via digital, à fábrica de confecção localizada no Vale do Ave e, pouco depois, uma outra máquina pode cortar o tecido escolhido pelo cliente, com um rigor inimaginável para qualquer alfaiate humano.
Segue-se a confecção propriamente dita e, ao fim do dia, o fato está pronto para ser enviado por uma das várias empresas de entregas rápidas que operam no mercado e o cliente recebe o fato no dia seguinte.

O Sr. João Amaral (PCP): - E quanto é que ele paga pelo fato?

O Orador: - Da próxima vez que o mesmo cliente necessitar de um outro fato, já não precisará de sair de casa. Bastará telefonar ou escolher o que pretende no terminal do seu computador.
Sr.as e Srs. Deputados, sei que esta é apenas uma história, mas uma história séria, porque é um desafio real à nossa capacidade nacional de afrontar os verdadeiros problemas do nosso desenvolvimento, que não se compadece com boas intenções e que passa por desafiar o futuro.
Felizmente, existe uma consciência clara de tudo isto no Partido Socialista, que teve a iniciativa de criar o Ministério da Ciência e Tecnologia, cujo trabalho e determinação neste domínio pode ainda não estar a ser visto pela apressada volúpia dos factos políticos mas já existe, é válido e a seu tempo terá os seus efeitos positivos na nossa competitividade. Porque, possibilidades como a da história que vos contei são, por exemplo, pela primeira vez,, projectos na agenda de trabalho da Agência de Inovação, que procura dotar de sentido e incentivar a criatividade e a inovação das instituições dedicadas à investigação e motivar a inovação nas nossas empresas.
Sr.as e Srs. Deputados, temos consciência das dificuldades e dos desafios por que passa o nosso sector têxtil e de vestuário e estamos disponíveis para, com todos os partidos, encontrar e reforçar formas de defesa, do emprego e da estabilidade do sector. Só não acreditamos que isso possa ser conseguido, no nosso tempo, com meras panaceias defensivas ou com proteccionismos inconsequentes e, na prática, irrealistas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Moura e Silva.

O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do. Governo, Srs. Deputados: O debate sobre as ameaças para Portugal resultantes da 2.ª fase da integração dos produtos têxteis e vestuário nas regras da Organização Mundial de Comércio, que hoje aqui fazemos, surge numa altura em que a União Europeia não consegue dar satisfação à sua primeira preocupação, construir uma Europa mais forte e mais competitiva economicamente, mais solidária e, desde logo, encontrar solução para o flagelo que é o desemprego.
Quando se admitia, porque se justificava, que a União Europeia moderasse a sua vocação excessivamente liberalizante, a Comissão Europeia, apresentou, no passado dia 2 de Outubro, aos 15 Estados membros, uma proposta de abertura parcial do mercado comunitário a alguns produtos têxteis. A ser aprovada pelos Estados membros, esta proposta constituirá uma violação aos compromissos assumidos no quadro do Uruguay Round, que prevê um período de 10 anos (1995-2005) para a indústria têxtil europeia preparar a sua adaptação às regras do livre mercado e constitui uma violação porque a percentagem para a 2.ª fase (1998-2002), que agora se discute, era de uma taxa de liberalização de 17 % e não de 17,84 %, como a Comissão propõe.
A manter-se as taxas de liberalização aprovadas, ou seja, as quatro fases até ao ano 2005, ficou, contudo, da responsabilidade da União Europeia definir em cada fase o conjunto de produtos a liberalizar, apenas tendo que notificar a Organização Mundial do Comércio da sua decisão.
Percebemos o argumento do comissário português para não apoiar a proposta, o que estranhamos é o silêncio do Governo português. A crise e a vaga de desemprego que vivemos impõem uma postura de maior firmeza e determinação nos interesses de Portugal e dos portugueses.
Recordo que, nos últimos cinco anos, no sector das indústrias têxteis e de vestuário, a Europa perdeu 600 000 postos de trabalho e os portugueses perdem aproximadamente 75 000 empregos.
A Comissão Europeia consagra, na presente proposta, que a 2.ª fase de liberalização do comércio mundial dos têxteis abranja 24 categorias de produtos, dois dos quais (tecidos de lã e cordas e fios sintéticos) são sensíveis para o nosso país. Só estas categorias de tecidos de lã e cordas e fios sintéticos são sectores que representam, respectivamente, seis e 11 milhões de contos para os exportadores

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nacionais do sector têxtil e vestuário. Só no sector das cordas e fios sintéticos estão em causa cerca de 5000 postos de trabalho, concentrados, maioritariamente, nas zonas de Vila Nova de Gaia e Póvoa de Varzim.
Esperamos que o Governo português não dê o seu acordo quanto ao «cabaz» de produtos a serem liberalizados. Consideramos importante que o Governo português tenha a sua própria proposta e que encontre consenso para ela. O êxito da sua proposta depende da abrangência do apoio político.
Segundo Leon Brittan, o comissário responsável pelas relações com a OMC, Portugal não tem razões para se queixar. Segundo ele, para a maioria dos artigos incluídos na lista, a quota de mercado que Portugal detém na UE oscila entre 1 e 5 %. Ou se trata de uma ingenuidade saloia, que não acredito, ou de uma esperteza patética...
Num mercado aberto como o da UE, não está em causa para Portugal apenas o mercado para as nossas exportações, está também em causa o nosso próprio mercado interno, onde esses produtos passam a estar disponíveis.
Sem pretendermos ser alarmistas, tememos que, a ser aprovado este «cabaz», estejam em causa em Portugal mais de 50 000 postos de trabalho.
Interrogamos: a quem interessa a tentativa de liberalização, feita de forma acéfala e apressada, de 'que. deverá resultar ó aparecimento da era do comércio mundial de novos países, em que os baixos custos salariais constituirão o principal factor de competitividade? A Portugal de certeza que não!
Para o Partido Popular, há duas fortes razões que justificam o procedimento da Comissão.
Primeiro, todos sabemos que as indústrias têxteis e de vestuário são normalmente importantes para qualquer país em vias de desenvolvimento e a Comissão Europeia, influenciada pelos países fortes da Comunidade; tem utilizado este importante sector como moeda de troca, quando quer negociar e exportar, para esses países, produtos como telecomunicações, frigoríficos, automóveis e outros, ou quando quer, generosamente, prestar solidariedade política. O melhor exemplo é o da abertura à importação de têxteis é vestuário do Leste Europeu, que brevemente passará a ser livre.
Segundo, o constatado interesse das grandes empresas multinacionais, que deslocalizam a sua produção para esses países, sujeitando trabalhadores e crianças a elevados níveis de exploração. Os empresários são os mesmos, os países e os trabalhadores é que são outros, e, neste último caso, mais desprotegidos.
Este fenómeno surge quando se constata a inferioridade da competitividade externa da economia portuguesa, por uma condução inadequada da política económica portuguesa dos últimos anos.
Este Governo não tem dado sinais de inversão de uma política que já demonstrou toda a sua ineficácia. Este Governo não pode continuar com uma postura de timidez e subserviência aos interesses e às orientações emanadas da Comunidade.
A política da «mão estendida e da coluna vertebral de borracha flexível» são factores que têm contribuído para o aumento do desemprego, que resulta, em grande medida, pela abertura das fronteiras comerciais a países com
reduzidas obrigações sociais.
Não é possível, nem desejável, continuar a assistir à abertura das nossas fronteiras ao comércio internacional sem que, como condição obrigatória, se estabeleça, para os países envolvidos, regimes mínimos de justiça social.

Não entendemos que se condene - e bem, no nosso entender - o trabalho infantil em Portugal quando se subscrevem acordos com países terceiros em que a exploração infantil é uma realidade. Estamos a abrir as portas ao inimigo. A Europa está a ser destruída pelos grupos de interesse europeu.
Para o Partido Popular, Portugal tem de se afirmar por princípios, por valores e por regras. Esta tem de ser a sua postura na Comunidade. Deste modo,, o Partido Popular vem alertar e exigir que o Governo português se bata nos diversos fóruns de negociação europeia pela consagração: do respeito pelos acordos realizados no âmbito do GATT, cumprindo-se o período de transição de 10 anos; do respeito pelo princípio de reciprocidade em todas as negociações bilaterais com países terceiros, do reforço do combate à- fraude, aos desvios, ao tráfico, ao dumping em todas as suas vertentes, económica, social, ambiental e de mais práticas distorcidas da concorrência e a implementação de medidas que possam ser accionadas de forma rápida e eficaz; da criação de programas destinados a apoiar as empresas, auxiliando a sua adaptação às exigências no domínio do ambiente, apoiando a investigação e o desenvolvimento de novas tecnologias; promovendo a imagem e os produtos europeus nos mercados externos; e do reforço dos programas de formação e reconversão profissional, destinados aos trabalhadores no activo e àqueles que estão em vias de perder ou já perderem o seu emprego.
Para o Partido Popular, as associações patronais não podem ficar numa posição de expectativa e inércia que permita à Comissão Europeia aprovar este «cabaz» e, de seguida, virem colocar os trabalhadores perante a chantagem de que a concorrência acrescida aos nossos produtos exige a manutenção de baixos salários e elevados horários de trabalho.
Para concluir, diria que o Partido Popular têm-se batido pela defesa constante. do sector têxtil nacional, mediante a manifesta oposição aos recentes acordos que a UE tem vindo a celebrar com países terceiros, que abrem as portas do nosso mercado, sem qualquer controlo prévio ou de fiscalização, a produtos que são fabricados nas condições por nós conhecidas de total ausência de regras laborais e sujeitos às práticas de dumping de natureza económica, social e ambiental, que mais não fazem do que contradizer as normas internacionais estabelecidas nas negociações do GATT e da OMC.
Não podemos exigir às nossas empresas a capacidade de competir num ambiente hostil, não sujeito às mais elementares regras de concorrência leal, sem lhes darmos as condições necessárias à sua adaptação à globalização crescente da economia.
Exige-se o cumprimento do acordado em 1994, no Uruguay Round, em matéria do período de transição de 10 anos, indispensável à restruturação das nossas empresas e à capacidade produtiva. Aos nossos empresários é de todo impossível competir se o preço da energia para a indústria não for claramente reduzido.
O Partido Popular propõe que se prevejam, com a maior brevidade possível, linhas de financiamento, sempre reembolsáveis, com taxas de juro miais baixas quanto mais rápido for o reembolso, e que, no domínio fiscal, as acções de formação, quer com empresários quer com trabalhadores, bem como as operações de reconversão da actividade e de transferência de parques de máquinas e ainda acções de marketing, sejam consideradas como custo na definição dos impostos.

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Por último, podemos dizer que de nada serve falar da indústria se não começamos por incentivar o País a consumir os nossos produtos. É urgente promover, cá dentro, uma campanha de preferência pelos produtos nacionais. A não serem tomadas estas medidas, tememos que o País caminhe para um total descalabro e que surjam, com mais intensidade, acções de protesto e uma maior acutilância de convulsões sociais.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Saraiva.

O Sr. José Saraiva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O neoliberalismo não é a melhor das soluções para os problemas do nosso tempo. É verdade que vivemos um tempo de novas desigualdades, mas não é com atitudes de cegueira proteccionista que ultrapassaremos as dificuldades.
E a que hoje aqui debatemos é uma dificuldade que obriga a todos os que aceitam as regras do jogo europeu a tentar percebê-la e tudo fazer para a superar. Teremos feito tudo? Estaremos a fazer tudo? Se considerarmos, como já aqui foi acentuado, a perda de quase um milhão de postos de trabalho na indústria têxtil, nos últimos 10 anos, 600 000 dos quais nos últimos cinco anos, compreenderemos todos a extensão desta dificuldade.
Se aceitarmos, como parece ser inevitável, a tendência para o definhamento, declínio e marginalização da indústria têxtil e de vestuário, estaremos, pois, em melhores condições para enfrentar o problema.
Não obstante os esforços que, nos últimos 10 anos, o sector têxtil e do vestuário fez em especializar-se em segmentos de procura do mercado mundial, importa registar que o défice comercial da UE - a UE é o primeiro exportador e simultaneamente o primeiro importador de produtos têxteis - se traduz em 13 500 milhões de ECUS.
Assim se fica com uma ideia, aproximada talvez, da crua realidade. Uma realidade da UE que não exclui ninguém e que, bem pelo contrário, nos atinge. Será fastidioso repetir o que significa para a nossa economia e para o emprego o sector têxtil português. Ciclicamente, estamos por isso confrontados com situações como a que, hoje, nesta Câmara, debatemos. Algum dia terminará? Temo que não vai acabar. Os problemas sucedem-se aos problemas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal está na UE para o que der e vier.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mais para o que der do que para o que vier!

O Orador: - Depois de uma década, que foi a da oportunidade perdida, o sector têxtil português está confrontado com a realidade da liberalização acelerada. Em princípio, o «escancarar» do comércio será apenas em 2005. Já se percebeu, porém, o que os Estados membros mais tendentes ao neo-liberalismo desejam e todos os esforços fazem para acelerar o tempo. Tanto mais que a UE vai celebrando acordos sobre acordos, ora com o Paquistão, ora com a índia, ora com a Turquia, ora com os PECO, e as dificuldades vão sucessivamente aumentando.
Só há uma resposta, Sr.as e Srs. Deputados, a de, avisadamente, interiorizarmos as regras do jogo e reclamarmos um novo esforço de ajustamento estrutural da indústria têxtil. Se assim não vier a suceder, os 2,3 milhões de empregos no sector, no espaço comunitário, viverão dias de angústia.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, é essa angústia que paira, também agora, na coroa da Área Metropolitana do Porto e nas terras laneiras da Beira Alta e da Beira Interior.
Os subsectores ou categorias afectadas pela proposta da Comissão Europeia traduzem uma ameaça, havendo até já indícios de empresários que se dispõem a deslocalizar as suas unidades para outros continentes,...

O Sr. Carlos Pinto (PSD): - É uma crítica ao Governo!

O Orador: - ... e não nas cordas, nos fios sintéticos ou só nas lãs.
Do ponto de vista dos valores em causa, dir-se-á que rondam os 15 a 20 milhões de contos,...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Afinal, são 15 a 20 milhões de contos!

O Orador: - ... e constituem, repito, uma ameaça para os 15 á 20 000 trabalhadores. Do mal, o menos, suspiraram os empresários, que viveram horas e dias de pânico quando souberam das intenções da Comissão. Seria o «golpe» que feriria de morte o sector têxtil e do vestuário português.
O que é um facto é que não há possibilidade de tentarmos travar a marcha acelerada para a liberalização do comércio mundial. Não se pára o vento com as mãos e é justo sublinhar que o Governo, desde o primeiro momento, desde a Primavera e mais acentuadamente desde este Verão, protestou e batalhou, nas diversas instâncias, para reduzir ao mínimo os custos. A verdade, Sr.as e Srs. Deputados, é que conseguiu!
O esforço de negociação do Governo, dos sindicatos, dos empresários, dos Deputados socialistas no Parlamento Europeu e também dos comunistas teve algum sucesso. Mas, não nos iludamos, é uma vitória a prazo!
Se os empresários não compreenderem e os sindicatos não se esforçarem por entender, poderemos estar na antecâmara de um desastre sobre a indústria têxtil.

O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Disse bem, desastre!

O Orador: - Cabe, consequentemente, ao Governo fazer tudo, como tem feito e como certamente fará, para impedir que tal aconteça, «porque na UE perde-se e ganha-se.
Nós, socialistas, estamos convictos de que se ganha mais. Por isso, todo o esforço será feito para que Portugal esteja na mesa das decisões ao integrar o grupo de Estados que irá aderir à moeda única. Isso não impede, porém, que o Governo deva desenhar já um eventual novo plano de acção - envolvendo empresas, parceiros sociais e autarquias, uma nova atitude das acções do ICEP -, com vista a superar os embates próximos futuros.
E deve o Governo - VV. Exas., Srs. Secretários de Estado - fazer ver constantemente que o encurtamento do calendário do GATT é uma «corda ao pescoço» de um sector-chave da nossa indústria transformadora, o que não é aceitável porque as condições de concorrência do comércio internacional não estão a ser verificáveis e é preciso consolidar rigorosamente os resultados de Maraquexe.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Verificar a solidez do sistema multilateral e avaliar os resultados do Uruguay Round é um imperativo.

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Finalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Governo de Portugal tem de continuar a ser suficientemente persuasivo - como tem sido! - para que a Comissão Europeia avalie a extensão desta enorme dificuldade para o têxtil/vestuário, que se ampliará com a entrada da China e da Rússia na OMC.
Estou certo - nós, socialistas, estamos certos - de que, em Singapura, na Conferência Interministerial, o Sr. Primeiro-Ministro não deixará que os dogmas neoliberais lhe passem indiferentes. Bater-se-á, como ainda recentemente o deixou perceber ao intervir em Nova Iorque, na Cimeira da Internacional Socialista, para que ao comércio livre se agregue o comércio justo. E isto que se diz tem de ser exercido!
O Primeiro-Ministro sabe - e nós confiamos - que a natureza das coisas pode ser superada pela vontade dos homens. Por isso, confiamos no Governo, por isso, confiamos no Primeiro-Ministro!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos quase no final do debate. O Sr. Secretário de Estado procurou vir descansar esta Assembleia, minimizando os efeitos gravosos para a indústria têxtil da antecipação da aplicação das regras do GATT no sector, porque é isso que está em causa. Infelizmente, é o mesmo discurso que já ouvimos noutras ocasiões, designadamente quando das negociações do GATT ou quando dos acordos coma índia e o Paquistão, discursos que, como sabemos, Sr. Secretário de Estado, se têm revelado, na maioria das vezes, ilusórios.
Aliás, hoje ouvimos aqui ó Sr. Secretário de Estado queixar-se e criticar as lacunas dos acordos do GATT, que permitem que esta liberalização do comércio mundial se esteja afazer em prejuízo de economias como a nossa. Mas eu recordo, Sr. Secretário de Estado, que, em 1994, quando procedemos aqui à ratificação dos acordos dó GATT, em que criticámos as suas lacunas e esses elementos nefastos, o PS aplaudiu-o e votou-o favoravelmente, como um novo paraíso comercial que vinha para o País.
Felizmente, agora já o criticam - embora seja tarde de mais, ainda bem, porque mais vale tarde do que nunca por reconhecerem as dificuldades, as lacunas e os perigos dos acordos do GATT para a economia portuguesa.
Quando foi do acordo têxtil com a Índia e o Paquistão também vieram aqui dizer que os nossos interesses estavam defendidos, mas depois viram-se forçados a recorrer ao Tribunal de Justiça da União Europeia. Dentro de algum tempo, de certo, teremos aqui o Governo outra vez, infelizmente, a lamentar os resultados que hoje veio aqui minimizar quanto a esta integração antecipada dos têxteis na segunda fase dos acordos do GATT, porque, Sr. Secretário de Estado, para lá das listas de produtos incorporados que nos afecta e afecta o emprego; está aberto o caminho, está aberto o precedente para a antecipação da liberalização do mercado têxtil, para a antecipação da aplicação dos próprios acordos do GATT, que tem vindo a acontecer, aliás, através do estratagema de inúmeros acordos bilaterais. Essa é uma questão central em todo este processo.
O Sr. Secretário de Estado reconheceu que as pressões que exercemos - e congratulamo-nos por nelas termos participado empenhadamente - podem ter conseguido surtir algum efeito. Eu diria que muito mais se poderia conseguir se o Governo tivesse envolvido a Assembleia da República e o Pais nos debates e no processo negociai da Comunidade, aliás, cumprindo as promessas que fez no inicio da legislatura de vir aqui à Assembleia discutir connosco as questões importantes em véspera dos conselhos, por sua iniciativa, quando estejam em causa problemas importantes do País.
Mas, Sr. Secretário de Estado, não embarque em novos enganos e em novas ilusões porque os produtos que restam na lista. são muito mais gravosos do que o Sr. Secretário de Estado veio aqui dizer: são gravosos para a zona da Covilhã, são gravosos para o sector das cordas e cordames e, como recordou aqui, agora mesmo, o Sr. Deputado José Saraiva, correspondem ainda a cerca de 20 000 empregos. Sr. Secretário de Estado, 20 000 empregos é algo que não deve ser minimizado, é algo que deveria preocupar-nos a todos!
Por isso, nesta fase final do debate, eu gostava de recordar os dois desafios que lancei inicialmente: um é que o Governo não aceite a integração de nenhum produto sensível na segunda fase da integração dos têxteis, nenhum, Sr. Secretário de Estado! O segundo é que o Governo abra um debate sério sobre os termos em que se está a processar esta antecipação da integração, sobre as condições em que se estão a processar as negociações para a nova fase dos acordos do GATT que vão começar em Singapura, para que estas pequenas vitórias que o Governo de vez em quando anuncia não sejam, como disse e bem o Sr. Deputado José Saraiva, vitórias de Pirro em relação ao futuro da indústria portuguesa.
Pela nossa parte, reafirmamos o que já dissemos, Sr. Presidente, estamos disponíveis e continuamos disponíveis, como sempre o fizemos neste processo, para participar construtivamente em todas as iniciativas que permitam defender os interesses portugueses. Esperemos que, no mínimo, o Governo, Sr. Secretário de Estado, tenha melhor bom senso do que o Sr. Deputado Henrique Neto porque, a seguir-se as teorias ultraliberais do Ministro-sombra da Economia do PS, chegávamos àquele resultado de que «o último a sair, apagava a luz e fechava a porta».
Seguramente, o Sr. Secretário de Estado não está de acordo com as teorias ultraliberais do Sr. Deputado Henrique Neto porque nem a tridimensional idade imaginosa do alfaiate que o Sr. Deputado aqui trouxe salvaria a economia portuguesa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de forma breve, ao encerrar este debate em nome da bancada Socialista, não posso deixar de sublinhar as preocupações sociais legítimas subjacentes à interpelação do PCP. Felicito mesmo o PCP por ter juntado a sua voz e o empenho da sua bancada ao esforço intenso do Governo e do PS para minimizar os impactos sociais dos processos de globalização económica.
Lamento, por isso, Sr. Deputado Lino de Carvalho, que não tenha tido a ousadia e a lucidez de reconhecer que, por mérito da capacidade negociai do Governo e, sobretudo, por mérito de uma nova atitude política nas negociações europeias, a evolução recente da lista de produtos a liberalizar tem favorecido os interesses da indústria portuguesa.

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É que, Sr. Deputado Lino de Carvalho, ao contrário da estratégia que nos sugeriu, nós apresentamos resultados não fazemos agitação e propaganda.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador: - Muitos acusam o Governo do PS de não governar. Pelo contrário, a nossa atitude demonstra que não prescindimos de governar. Neste domínio, como em muitos outros, quem não governou, foi o PSD, que esbanjou milhões de contos sem alterar a nossa estrutura produtiva. E é preciso dizer, Sr. Deputado, que esta atitude teve no PCP um apoio, porque estão sempre ciosos de, que nada mude e prontos a cavalgar as inevitáveis resistências à mudança.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Deixe-se de cassettes!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, existem três grandes caminhos alternativos para gerir a evolução da nossa indústria têxtil e do vestuário. A primeira alternativa, seguida à risca pelos governos do PSD, foi aceitar passivamente as imposições externas e vender o silêncio por alguns milhões de contos avulso. A segunda opção foi aqui bem delineada pela sua bancada e consta do fechamento de Portugal sobre si mesmo, mais ou menos maquilhado por propostas irrealizáveis. A terceira opção é a do Governo e a do PS: negociação activa que permita modernizar a nossa indústria, sustentando simultaneamente a criação de emprego, com coragem política. É esta a via que continuaremos a trilhar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado para a Competitividade e a Internacionalização.

O Sr. Secretário de Estado para a Competitividade e a Internacionalização (Fernando Freire de Sousa): Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostaria de começar esta minha intervenção com um agradecimento ao Partido Ecologista Os Verdes por nos ter cedido algum tempo adicional para prestarmos alguns esclarecimentos em relação a esta questão importante que foi levantada pelo PCP, relativa aos acordos da indústria têxtil e do vestuário.
Gostaria de dividir a minha intervenção em três pontos, o primeiro dos quais parte da seguinte ideia: sou dos que pensam e dos que acreditam - tal como, estou convicto, a totalidade dos membros desta Câmara - nas virtualidades da luta política; porém, penso que as virtualidades da luta política democrática são para ser jogadas com regras e creio que essas regras e esses pressupostos devem estar presentes em todos os momentos de debate a que aqui se procedem.
No caso vertente, os pressupostos são, pelo menos, dois: primeiro, temos de saber aquilo de que estamos a falar; segundo, temos de falar no momento certo e não antes do tempo.
Este debate, levantado pelo PCP e de grande utilidade, como aqui foi, várias vezes, reafirmado, é um debate importante mas enferma dos dois pontos que referi anteriormente: falou-se aqui acerca de coisas que não se conhecem, disse-se coisas que não são correctas e falou-se antes do tempo.

Portanto, em suma e usando terminologias que foram empregues por vários Deputados neste debate, houve aqui várias mistificações, várias confusões e várias incorrecções. É importante que saibamos as regras do jogo que estamos a jogar e aquilo de que estamos a falar.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Dando dois ou três exemplos direi que houve mistificações quando se tentou fazer esconder que, entre o momento em que este debate foi solicitado e o momento de hoje, havia uma diferença qualitativa enorme nos pontos de partida que estavam subjacentes à discussão. Mesmo hoje, tentou-se chamar a atenção para a chamada cláusula 4 no desconhecimento de que ela já não existia e que, portanto, já era real.
Portanto, isto significa que estamos a raciocinar na base de pressupostos que são completamente diferenciados. É preciso saber do que é que estamos a falar, quando falamos de produtos sensíveis. É preciso saber que o Governo, em Março último, estabilizou, em articulação com as associações empresariais todas do sector, uma lista global, que assumiu como a sua lista, a qual apresentou à Comissão das Comunidades, lista global essa que é o ponto de partida que guia e orienta a nossa acção desde Março e que é também assumida globalmente pela larga maioria dos agentes económicos do sector.
Esta lista existe, é um ponto de partida e, salvo melhor opinião, define melhor o que são os produtos sensíveis do que qualquer opinião de qualquer individualidade, por muito iluminada que seja.
Por outro lado, quanto aos impactos de que estamos a falar, é importante que se diga que estamos a referir o caso concreto das duas categorias sobrantes - e são só duas em relação aos produtos sensíveis. Construiu-se uma lista que tinha 80 % das exportações portuguesas, como considerados produtos sensíveis; desses 80 % das exportações portuguesas estamos agora a falar apenas de dois produtos, de duas categorias de produtos, as lãs e as cordas, globalmente falando, as quais representam, de facto, 15 000 trabalhadores, na sua globalidade.
Porém, não esqueçamos nem façamos confusão quando dizemos que estamos a falar de 15 000 trabalhadores que, globalmente, trabalham no sector, pois estamos a falar de 15 000 trabalhadores que serão afectados pela ruína da abertura dos mercados. Assim, lutaremos até ao último minuto pela retirada dessas duas categorias da lista de produtos, mas também é preciso dizer que, mantendo-se essas duas categorias como resultado da negociação, não estão em causa, de um dia para o outro ou da noite para o dia, 15 000 trabalhadores que vão perder os seus postos de trabalho repentinamente.
Nesta primeira parte da intervenção, e mais importante, gostaria ainda de chamar a atenção para o facto de não estar em causa, como também aqui foi dito por duas vezes, qualquer coisa que tenha a ver com antecipar a aplicação dos acordos do GATT. Ninguém está a antecipar acordos nenhuns, eles foram assinados em 1994 e o que estamos a fazer é cumpri-los escrupulosamente, como é do direito internacional e como faz parte das nossas obrigações.
Portanto, não há antecipação alguma, há o respeito por um compromisso global e o que se está a negociar é uma lista que não está estabilizada, é uma lista que está a ser definida depois de o Colégio de Comissários se ter pronunciado e que está a ser articulada para ser aprovada em

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conselho, que se pronunciará em última instância. É disso que estamos a falar e é nesse estrito ponto que nos situamos.
Por último, não estamos a referir qualquer coisa que tenha a ver com o apresentar à Organização Mundial do Comércio, em Singapura, para negociação, uma lista. Uma coisa é Singapura, que é uma conferência ministerial que vai debater questões ligadas à evolução da OCM nos últimos dois anos, e outra questão são os compromissos dos acordos têxteis que foram obtidos em 1994 e de que faz parte apresentar uma lista até ao fim deste ano em sede de OCM. São duas coisas diferentes, é preciso que nos entendamos.
Um segundo ponto é o seguinte: os acontecimentos falam por si e já referi a lista que o Governo promoveu junto das associações e junto dos agentes económicos, no sentido de ela ser constituída da forma mais consensual possível. Também já falei da metodologia que foi adoptada para a constituição dessa lista e já foi, de algum modo, abordada, pelo meu colega Seixas da Costa, a postura do Governo, que nada tem a ver, como dizia o Sr. Deputado Francisco Torres, com dar-se bem ou' dar-se mal com a Comissão ou com qualquer mudança dê atitude mias com o respeitar a função da Comissão, no quadro das suas responsabilidades e das suas capacidades, e com o respeitar e, sobretudo, privilegiar os interesses nacionais nessa matéria, dando um murro na mesa quando é preciso. Isso é o que o Governo português tem procurado fazer.
O processo que está em curso é de discussão da lista, é um processo de luta permanente em relação à reciprocidade na abertura dos mercados, em que não cessaremos de procurar, de uma forma muito objectiva, ir ao encontro da necessidade, por parte dos empresários e dos trabalhadores da indústria têxtil e do vestuário, de respeitar o mais possível os compromissos que assumimos enquanto país há dois anos, em 1994, no encerramento do Uruguay Round.
No terceiro e último ponto da minha intervenção apenas uma pequena palavra - porque foi citado o Ministro da Economia, em várias sedes e de várias maneiras, nem sempre das melhores, pelo menos nem sempre das mais fidedignas - para dizer que o Ministério da Economia tem uma estratégia económica para o País e tem o desígnio de procurar, nestes próximos anos, proceder a um ajustamento estrutural da economia portuguesa e ajudar a que ele se faça, o qual passa por muitas dimensões, tendo algumas delas sido aqui tocadas. São dimensões que têm a ver com a aceleração da capacidade competitiva das nossas empresas, com a tecnologia, pondo fim à grande confusão que reina em toda a área tecnológica nacional, com a qualidade, reforçando, integrando e incrementando essa componente fundamental da competitividade e da internacionalização da nossa economia nos seus vários planos.
Já aqui foi dito várias vezes pelo Ministro da Economia que, em termos de um programa de internacionalização, estão em vias de serem lançados à opinião pública alguns desses planos e de serem concretizados uma série de projectos de investimento estrangeiro, existindo, neste momento, em fase adiantada de gizamento pontos fundamentais do que é a nossa estratégia de ajustamento estrutural.
É evidente que estamos a trabalhar de forma tranquila; temos a nossa estratégia, esperamos que ela resulte, a bem do país, e esperamos que nessa estratégia o sector têxtil e do vestuário, como sector fundamental da nossa economia e da nossa indústria, tenha um lugar de parte inteira, tenha um lugar fundamental.

Estamos convictos que tudo aquilo que este Governo tem vindo a fazer nessa matéria é, sobretudo, a defesa desse sector e um contributo para que ele seja efectivamente, no futuro, um sector importante da nossa economia e que tenha uma capacidade concorrencial que nos últimos anos (não vou aqui fazer processos de intenções) nenhum governo foi capaz de lhe conceder. Assim, esperamos desenvolver esses planos mas nos nossos timing, dentro da nossa lógica e da nossa estratégia.
Neste contexto, a capacidade negociai do Governo português em sede de União Europeia é uma componente muito importante. Gostaria de' registar com agrado que a intervenção, nomeadamente, do Secretário de Estado Seixas da Costa é, nessa matéria, um ponto fulcral da nossa presença na União Europeia, é uma componente fundamental da estratégia do Governo, do Ministério da Economia, que é uma estratégia integrada, sendo também uma questão nova deste Governo, que funciona em equipa e em equipa vai continuar a funcionar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para defender a honra da sua bancada, a palavra ao Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, fomos, surpreendidos pelo tom agressivo do Sr. Secretário de Estado para a Competitividade e a Internacionalização, que nos acusou de mistificar o debate e de o fazermos antes de tempo.
Sr. Secretário de Estado, creio que a primeira condição é o senhor habituar-se às regras do funcionamento democrático da Assembleia da República. Quem escolhe o momento dos debates somos nós, não é o Governo! Quem escolhe os argumentos que aqui trazemos somos nós, não é o Governo!

Vozes do PSD e do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à mistificação, Sr. Secretário de Estado, se mistificação há, é do Governo, que procura vir aqui minimizar um assunto particularmente sensível para a indústria têxtil portuguesa, contrariando, aliás, as preocupações expressas pelo próprio Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, porque há produtos que vão afectar sectores importantes regionalmente e subsectores da indústria têxtil.
O Sr. Secretário de Estado sabe que a Comissão Europeia continua a ter a possibilidade de alterar a lista de produtos sensíveis no decurso de processo negociai para a segunda fase da integração e isso é grave, Sr. Secretário de Estado, porque essa possibilidade que a Comissão Europeia tem pode permitir que, rio quadro de *um processo negociai, outros produtos sensíveis voltem a reentrar na lista e venham a prejudicar os interesses portugueses, como, aliás, o Sr. Secretário de Estado ao seu lado confirma por gestos.
Portanto, não estamos a mistificar, quem está a fazê-lo é o Sr. Secretário de Estado, ao querer, irresponsavelmente, minimizar uma questão para a qual, ao contrário, delia procurar mobilizar o País, a Assembleia da República, os trabalhadores e os empresários, no sentido de reforçar a posição negocial.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Secretário de Estado vem aqui dizer que o debate é importante mas que nos devíamos ter

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calado para só abrirmos a boca, se calhar, no final, quando os factos estivessem consumados.
O Sr. Secretário de Estado vem aqui dizer que não há nenhum problema com a reciprocidade, que os acordos do GATT estão a ser cumpridos. Porém, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, aí ao seu lado, ainda recentemente escreveu uma carta ao Comissário Leon Brittan .em que critica a Comissão porque o artigo 7.º do Acordo Têxtil, o da reciprocidade, não está a ser aplicado. Em que, é que ficamos, Sr. Secretário de Estado? Os acordos assinados estão a ser aplicados ou não? Os acordos assinados estão ou não a servir a indústria têxtil portuguesa e o emprego?
Sr. Secretário de Estado, pensamos que não estão a servir a indústria têxtil portuguesa e o emprego, mas o grave é que os senhores, procuram escamotear questões importantes.
O senhor procura escamotear que todo este processo de debate sobre os têxteis se integra na antecipação às regras de liberalização e no processo que terá como recta final o ano 2005 e que, de acordo com os últimos estudos da Comunidade Europeia, se traduzirá numa quebra de emprego de mais 40 % no sector têxtil e de mais 33 % no sector do vestuário. Sr. Secretário de Estado, como é que isto se repercute no emprego em Portugal? Como é que isto se repercute na internacionalização da economia portuguesa? Como é que isto poderá ser superado se não for desde já, nesta fase, conseguida a convergência de todos na defesa dos interesses nacionais?
Parece que o Governo está incomodado por haver partidos da oposição que levantam a voz contra acordos que são gravosos para o País! Parece que o Governo está incomodado por o PCP vir aqui à Assembleia da República dizer que podem contar connosco, se for caso disso, para a defesa dos interesses portugueses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Secretário de Estado, não nos calamos perante as negociações que, em Bruxelas, em qualquer momento, o Governo português possa levar a cabo, prejudicando os interesses nacionais.

Aplausos do PCP

O Sr. Presidente: - Apalavra ao Sr. Secretário de Estado para a Competitividade e Internacionalização, para dar explicações, querendo.

O Sr. Secretário de Estado para a Competitividade e Internacionalização: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, em relação à sua última intervenção, gostaria de afirmar que há um ponto em que estou de acordo consigo. Na verdade, é muito importante que todos possamos convergir (citando as suas palavras) na defesa do interesse nacional e é isso que nós, no Governo, estamos a fazer e é por isso que considero este debate importante. Aliás, é assim que interpreto este pedido de debate por parte do Partido Comunista Português.
Mas este é um ponto fundamental que convém arrumar, para podermos ir ao outro. Quem aqui abriu este debate, falando de mistificações, foi o Sr. Deputado relativamente a nós.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Onde é que isso está?!

O Orador: - Mistificações não é aquilo que o Governo português tem vindo a fazer nesta matéria. Não fiz na minha intervenção qualquer tentativa de minimizar a questão dos têxteis ou de referir, como também disse, que não há qualquer problema com a reciprocidade. Também não tive qualquer propósito, longe de mim, de questionar quem escolhe o momento destes debates. Obviamente que o debate é importante e que o momento do debate é escolhido pelos Srs. Deputados e pelos grupos parlamentares que os representam.
Gostaria, no entanto, de chamar a atenção sobre dois pontos nucleares. Não houve da minha parte qualquer preocupação de minimização de riscos, houve apenas uma tentativa de ser realista e, sobretudo, de chamar a atenção para uma evolução positiva que tem vindo a acontecer nos últimos meses e relativamente à qual nos honramos de ser parte fundamental, no sentido de uma coisa que começou por ser dita pelo Partido Comunista Português, ou seja, que estavam em risco 25 % das exportações portuguesas. Porém, hoje estamos a falar de qualquer coisa menos do que 8 % das nossas exportações. É disso que estou a falar!
É evidente que, do ponto de vista do interesse nacional que todos queremos, respeitar, provavelmente, o ideal seria que não houvesse acordo têxtil nenhum; só que não é, infelizmente, esse o quadro em que estamos a funcionar. Temos um acordo têxtil para respeitar, nesse quadro, respeitá-lo-emos e ele obriga a União Europeia a abrir o seu mercado em 17 % na 2.ª fase a partir de 98.
Portugal apresentou a sua lista, onde defenderá, até ao último minuto, a não existência de produtos sensíveis, mas temos de ter consciência que este é um processo negocial e que, embora haja riscos relativamente a alguns sectores, envolvendo os tais 15 000 trabalhadores - que, no entanto, não vão todos para a rua de um dia para o outro -, esses riscos são bem menores do que eram os 25 % da primeira lista e são bem menores do que eram os riscos agitados com um grau de veemência talvez excessiva numa primeira fase, aliás, aquilo que suscitou este debate.
Assim, gostaria de dizer que não esteve nunca em causa qualquer desrespeito para com esta Câmara e muito menos para com o Grupo Parlamentar do PCP, que aqui levantou este debate, que foi, provavelmente, esclarecedor. Porém, julgo que é importante sabermos sempre - e repito aquilo que disse no início da minha intervenção do que estamos a falar, escolhermos os momentos e adaptarmos o nosso discurso à fase em que as coisas estão e não àquilo que estava em cima da mesa há dois ou três meses atrás.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 18 horas e 20 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder às votações agendadas.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 208/VII - Criação de vagas adicionais no ensino superior, reposição de justiça no acesso ao ensino superior (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PS.

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Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 209/VII - Cria vagas adicionais para os estudantes que realizaram a 2.ª fase dos exames nacionais (CDS-PP).

Submetido à votarão, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PS.

Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 215/VII - Criação de vagas adicionais no acesso ao ensino superior (PCP).

Submetido à votação; foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos centra do PS.

Srs. Deputados, estes projectos ,de lei baixam à 6.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 27/VII - Estabelece os princípios a que deve obedecer o regime de recrutamento, e selecção de directores de serviço e chefes de divisão para os quadros da Administração
Pública.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PCP, e de Os Verdes e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, este diploma baixa à 1.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 115/VII - Alteração do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, que revê o Estatuto do Pessoal Dirigente da Função Pública (CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e com a abstenção do PS.

Srs. Deputados, este diploma baixa também à 1.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 158/VII - Altera o Estatuto do Pessoal Dirigente (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes, e com a abstenção do PS.

Srs. Deputados, este diploma também baixa à 1.ª Comissão.
O Sr. Deputado Carlos Coelho pede a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, acabámos de votar, na generalidade, seis iniciativas, em dois pacotes diferentes, como V. Ex.ª bem sabe. Um primeiro
pacote tem a ver com as vagas loucas

Risos do PS, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes.

Aplausos do PS.

São loucas, Sr. Presidente, porque perturbam muito a bancada socialista.

Risos gerais.

Mas a loucura da Assembleia da República não pode significar, para alguns grupos parlamentares, eternizar o problema que foi iniciado com a incapacidade de o Governo dar resposta a recomendações da Comissão Permanente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, qual a figura regimental que está a usar?

O Orador: - Uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor. É que não parecia...

Risos gerais.

O Orador: - Nesse quadro, Sr. Presidente, parecer-nos-ia razoável que, no âmbito dos poderes que cabem ao Presidente da Assembleia da República, determinasse um prazo curto para que, no primeiro caso, a Comissão de Educação, Ciência e Cultura proceda à apreciação, na especialidade, dos três projectos de lei referidos, e, no segundo caso, para que o pacote que tem a ver com os concursos para dirigentes na Função Pública - que, como V. Ex.ª sabe, foi discutido neste Plenário há vários meses e esteve à espera de um processo de audição de entidades representativas idos trabalhadores, que já terminou, na 1.ª Comissão, tendo subido agora, passados quatro ou cinco meses, a votação na generalidade - não tivesse de esperar outros quatro ou cinco meses paia votação final global em Plenário da Assembleia da República.
Nesses termos, pedimos à Mesa e em particular ao Sr. Presidente da Assembleia da República que determine um prazo curto para a Comissão de Educação, Ciência e Cultura, no primeiro caso, e a Comissão Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, no segundo caso, procederem à sua discussão e apreciação na especialidade, deforma a que, rapidamente, o Plenário possa fazer a votação final global respectiva.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado; vou tomar em conta a sua preocupação.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura e votação de três pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - De acordo com o solicitado no oficio n.º 1204, de 96.09.19, do Tribunal Judicial da Comarca de Tomar, enviado à Assembleia da República, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Miguel Ferrando Cassola de Miranda Relvas a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência, em audiência de julgamento marcada para o próximo dia 16 de Outubro de 1996, pelas 14 horas.

Ó Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - De acordo com o solicitado no ofício n.º 1043, de 96.09.26, do Tribunal de Círculo de Penafiel, enviado à Assembleia da República, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Francisco José Pereira de Assis Miranda a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência, em audiência de julgamento marcada para o próximo dia 16 de Outubro de 1996, pelas 9 horas e 30 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): De acordo com o solicitado no ofício nº 6850, de 96.09.18, do Tribunal Criminal da Comarca do Porto, enviado à Assembleia da República, tenho a honra de comunicar a Vossa Excelência que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de: autorizar o Sr. Deputado Fernando Manuel de Jesus a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência, em audiência de julgamento marcada para o próximo dia 18 de Outubro de 1996, pelas 9 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tal como consta do guião, estão em aprovação os n.- 97 a 191 do Diário, respeitantes às reuniões da Comissão Permanente de 18 de Julho, 5, 12 e 19 de Setembro, p.p.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
Passaremos agora à discussão, do inquérito parlamentar n.º 5/VII - Ao acordo estabelecido entre o Estado e o Sr. António Champalimaud (PCP).
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP submete hoje à apreciação do Plenário um requerimento de inquérito parlamentar que tem um duplo objecto: por um lado, esclarecer todo o processo e conteúdo relativos ao acordo estabelecido, em 1992, entre o governo e o Sr. António Champalimaud, pelo qual o Estado ofertou àquele banqueiro cerca de 17 milhões de contos, desistindo, simultaneamente, dos processos judiciais que sobre ele pendiam e que haviam sido interpostos pelo próprio Estado; por outro lado, esclarecer se o dossier relativo a esse acordo transitou ou não para o actual Governo, já que o Ministério das Finanças tem feito declarações e dado respostas a essa questão que se contradizem plenamente.
Isto é, o inquérito parlamentar visa, exactamente, apreciar os actos do anterior governo do PSD e do actual Governo do PS; apreciar actos praticados pelo anterior governo, apreciar omissões ou eventuais actos de ocultação do actual Governo.
A existência de acordos de António Champalimaud com o Estado, através do Banco Pinto & Sotto Mayor e da Cimpor, não é nem nunca foi negada por ninguém. Mas, através do recurso ao pretexto do segredo empresarial, até hoje sempre foi recusado o conhecimento do seu conteúdo.
Não é aceitável que esta situação secretista se prolongue indefinidamente, pelos resultados concretos que desses acordos decorreram, concretamente a transferência de quase 17 milhões de contos dos cofres de duas empresas públicas para os bolsos do Sr. Champalimaud, com os quais este senhor pôde, passados dois dias após os referidos acordos, adquirir o controlo da Mundial-Confiança,...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - .. empresa a partir da qual pôde constituir um dos maiores grupos financeiros do País em apenas três anos e, praticamente, sem ter de desembolsar um único escudo próprio. Isto é, de facto, ser esperto, isto é, de facto, ter capacidade empresarial, isto é, de facto, ser um self made man, à custa do património do Estado, através da acção de um governo!

O Sr. João Amaral (PCP): - Ora aí está!

O Orador: - Quanto a um acordo directo entre o governo e o Sr. Champalimaud, tem vindo a ser negada a sua existência por vários membros do governo, ao longo dos anos, e exige-se que esta questão seja total e definitivamente dilucidada, porque existem razões para acreditar que tal acordo existe de facto. Desde logo, porque, na altura da sua eventual assinatura, vários órgãos da comunicação social a ele se referiram e, como sói dizer-se, "não há fumo sem fogo", mas, fundamentalmente, por outras duas razões.
A primeira razão tem a ver com o facto de no dia 26 de Junho de 1992, neste Plenário da Assembleia da República, respondendo a uma questão que eu próprio lhe coloquei, o então Secretário de Estado das Finanças, Dr. Elias da Costa, ter declarado: «Sr. Deputado, terei o gosto de, em sede de Plenário ou de Comissão de Economia, Finanças e Plano, prestar todos os esclarecimentos que desejar e poderei fornecer todos os documentos relativos ao acordo celebrado com o Sr. António Champalimaud, para que não restem dúvidas aos Srs. Deputados».
A verdade é que nem naquela reunião plenária nem em qualquer outra nem na Comissão, o Secretário de Estado ou qualquer outro membro do Governo forneceu os tais elementos. Por isso, continuam a restar todas as dúvidas aos Deputados do PCP e, estou em crer, a todos os Srs. Deputados.
Mas, Srs. Deputados, há uma segunda e mais recente razão para sermos levados a crer que esse acordo existe. Em entrevista publicada no Diário Económico, de 1 de Agosto, o Sr. António Champalimaud confirmou a existência do acordo, dizendo mesmo que «em vez de acordo, eu chamar-lhe-ia uma contrato para acabar com divergências entre mim e o Estado».
E foi mais longe, agora sobre o conteúdo desse «contrato» com o Governo: é que, para além do dinheiro que recebeu e da desistência dos processos, o Sr. Champalimaud «obtinha em bloco as privatizações dos cimentos, da Siderurgia e do Banco Pinto & Sotto Mayor, deixando apenas de fora a privatização da Mundial-Confiança, cujo dossier já se encontrava em adiantado estado de processamento». E a verdade é que o Sr. Champalimaud já «obteve» a Mundial-Confiança e o BPSM e os processos dos cimentos e da Siderurgia estão em curso.
É certo que também já obteve o BTA, que, segundo ele, não constava do rol do contrato assinado com o Estado, mas também é certo que, nessa altura, o BTA parava nas mãos do Banesto ...
Convenhamos, Srs. Deputados, que, se tal acordo ou contrato existiu, é extremamente grave, diria mais, é um escândalo, qualquer que seja a óptica sob a qual o analisemos. É imperioso que esta questão seja clarificada em todas as suas vertentes e quero estar convicto que todos os Srs. Deputados, independentemente do grupo parlamentar em que se incluem, estarão de acordo com a necessidade dessa cabal clarificação.

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Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - No que concerne ao objecto do inquérito parlamentar relacionado com a acção do actual Governo, ele explica-se por si mesmo.
A ter conhecimento de tão escandaloso acordo, a obrigação única do Governo é torná-lo público, dele se demarcando de forma insofismável, denunciando-o e criticando-o e nunca assumir posições que, de algum modo, possam indiciar qualquer coluio ou cobertura do Governo do PS a tal contrato.
Urge, pois, clarificar as razões das contradições em que o Ministério das Finanças, ao menos aparentemente, se tem enredado nesta matéria. O Sr. Primeiro-Ministro, para já não falar nos Srs. Ministros da Justiça e da Solidariedade Social, que, enquanto Deputados se bateram pela clarificação desta situação, certamente que nos agradecerá a iniciativa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Estou convicto de que os Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista serão os primeiros a tudo querer fazer para arredar quaisquer dúvidas que possam pairar na opinião pública sobre a actuação do Governo do PS nesta matéria.
Em suma, Sr. Presidente e Srs. Deputados, eis um inquérito parlamentar que, objectiva e subjectivamente, deve suscitar o apoio e o empenhamento de todos os grupos parlamentares.
Contamos com isso, quando da votação, para a sua aprovação, tal como esperamos o seu empenhamento para a realização do inquérito parlamentar e para a sua celeridade. Por isso, propomos um prazo curto, de apenas 45 dias, para a sua conclusão. É tempo suficiente para tornar claro o que sempre claro deveria ter sido.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, penso que V. Ex.ª só por figura de retórica poderia colocar algumas das questões que colocou, pois seguramente sabia, antes de as ter colocado, que o Grupo Parlamentar do PS, em coerência com a postura que assumiu em debates semelhantes àquele, que V. Ex.ª acabou de introduzir, viabilizou sempre esse tipo de inquéritos. Aliás, nós dois somos parceiros de urna luta terrível nesta Assembleia, que felizmente ganhámos através da utilização do mecanismo das assinaturas, e que levou a maioria de então a aceitar um inquérito muito semelhante ao que VV. Exas. vêm propor. Portanto, julgo que não deveria pairar no seu espírito qualquer espécie de dúvida acerca da posição que o Grupo Parlamentando PS tomará relativamente à viabilização do inquérito que os Deputados do PCP aqui nos trazem pela sua voz.
Mas, Sr. Deputado Octávio Teixeira, entendamo-nos: há inquéritos e inquéritos, V. Ex.ª quer fazer um inquérito, nós também queremos fazer um inquérito. E escusa de estar preocupado com algo que disse sobre a possibilidade de eventualmente o Governo estar a facilitar este conluio ou que esta obstaculização de informação permaneça no tempo. Quanto a isso não tenha qualquer receio. Agora, não podemos é aceitar - e de algum modo o fundamento do
seu pedido de inquérito aponta um pouco nesse sentido, o que é preocupante - que o Sr. Deputado Octávio Teixeira e o seu grupo parlamentar transformem este inquérito num julgamento do processo de privatizações, tal qual está a ser gerido e desenvolvido pelo Governo da nova maioria, da responsabilidade do PS. As regras são claras. V. Ex.ª sabe o que nós pensamos sobre isso, sabe que as divergências entre nós são mais do que muitas e que dificilmente encontraremos muitos, pontos de contacto entre o que pensa a minha bancada e o que pensa a sua.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Já pensou de maneira diferente, Sr. Deputado!

O Orador: - Pensei sempre assim, Sr. Deputado, e exactamente porque está escrito é que posso afirmar peremptoriamente o que estou a dizer.
Mas, como estava dizer, Sr. Deputado Octávio Teixeira, seguramente encontrará sempre no Governo a definição de uma, estratégia de privatização, a definição de regras claras e transparentes de cada uma das privatizações. Não necessariamente a utilização de um mecanismo de mero encaixe como critério essencial para as reprivatizações, mas a tomada em consideração de outro tipo de interesses, nomeadamente o ordenamento do tecido empresarial, do tecido produtivo e a defesa do interesse nacional. Estou convicto que o Sr. Deputado encontrará sempre todas essas regras na acção do Governo e naquela que for a nossa acção fiscalizadora.
A minha questão é, no fundo; um comentário e traduz-se tão-só em saber se o Sr. Deputado quer fazer, um inquérito a uma situação que V. Ex.ª considera não estar devidamente esclarecida - e acho que tem alguma razão nisso -, caso em que não inviabilizaremos essa proposta do PCP e votaremos de forma adequada a que essa viabilização seja conseguida, ou se quer transformar este inquérito num novo debate sobre as reprivatizações e, sobretudo, num julgamento daquela que foi a actividade nesta matéria por parte do Governo da nova maioria, caso em que encontrará obviamente o nosso obstáculo e á nossa oposição.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Da nova maioria; não! Da nova minoria!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, continuo a referir aquilo que referi è continuo a saber aquilo que sabia: se a questão do Sr. Deputado Manuel dos Santos é a de que, eventualmente, o Grupo Parlamentar do PCP sabe qual será a votação do Grupo Parlamentar do PS sobre a matéria, posso dizer-lhe que continuo como estava há pouco - não sei.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Já falta pouco tempo para saber!

O Orador: - Exactamente. Mas foi o Sr. Deputado Manuel dos Santos que me veio acusar, dizendo que fiz afirmações que davam a entender que eu não sabia qual a posição do PS.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - E foi exactamente isso!

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O Orador: - Agora, repare: o Sr. Deputado Manuel dos Santos referiu uma ou duas vezes que essa posição será no sentido da viabilização do inquérito, mas, na parte final, referiu que seria uma posição de não inviabilização do inquérito.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Não, não!

O Orador: - Ora, há aqui nuances.
Em termos do conteúdo do inquérito, o Sr. Deputado sabe perfeitamente que nós, para contestarmos o processo das privatizações, não precisamos de nos socorrer de outros pretextos. É evidente que, como sempre temos denunciado, o processo das privatizações tem sido negativo e, para além dos aspectos negativos do ponto de vista económico, social, etc., da própria situação da economia portuguesa em relação às economias externas, nele tem havido situações profundamente escuras e eventualmente escandalosas. Por isso, não precisamos de misturar as questões e não necessitamos de um pretexto.
O nosso requerimento de inquérito parlamentar refere claramente qual é o objecto do inquérito - está plenamente definido -, que é apenas aquele que referenciei e não incluiu o processos das privatizações. Assim sendo, se o receio do PS é o da abertura de um debate, de uma discussão ou de um inquérito - e é estranho terem receio disso - ao processo de privatizações, e se querem a clarificação desta matéria, não têm qualquer razão para manifestar outro voto que não seja o voto favorável ao inquérito parlamentar. É com esta curiosidade que ficarei até à altura da votação.
Já agora, se o Sr. Presidente autorizar e os grupos parlamentares estiverem de acordo; pela nossa parte, não há inconveniente em que a votação se possa fazer mesmo hoje.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Galvão Lucas.

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O inquérito parlamentar n.º5/VII, objecto de requerimento do PCP ao acordo estabelecido entre o Estado e o Sr. António Champalimaud, independentemente da sua fundamentação e da sua forma, que, na nossa opinião, poderão não ser as mais adequadas, ou mesmo de alguma carga ideológica nele contida, com a qual, naturalmente, não nos identificamos, insere-se, no entanto, num quadro de intervenção em relação ao qual o Partido Popular tem uma posição de princípio, clara e inequívoca, que pretendemos hoje, mais uma vez, transmitir a esta Câmara.
Decisões governamentais envolvendo dinheiros públicos deverão, em todas as circunstâncias, ser claras e transparentes para salvaguarda de todos, dos envolvidos directa ou indirectamente e, em última análise, do povo português.
Processos em que subsistam dúvidas, que venham a verificar-se justificadas ou não - e isso não é relevante, neste momento -, devem ser esclarecidos, quer estejam em causa decisões de empresas públicas ou de capital parcial ou totalmente público, concursos levados a cabo por empresas públicas ou de capital parcial ou totalmente público, indemnizações, processos de privatização ou acordos que envolvam dinheiros públicos.

Nunca, por princípio, suspeitamos da legalidade e transparência das decisões governamentais, mesmo quando delas discordamos. Mas processos que venham a revelar-se menos claros não podem deixar de ser objecto do necessário e devido esclarecimento. Nesta linha, o Partido Popular tem actuado de uma forma coerente, e assim continuará.
No caso em apreço, ninguém tenha dúvidas, não está em causa o nosso claro e inequívoco apoio à iniciativa privada, aos empresários e grupos empresariais, e não só aos portugueses, mas a dúvida e a suspeição a ninguém aproveitam e só desacreditam, em última análise, o País.
E mesmo importante dizer que empresários como o Sr. António Champalimaud têm obra feita ao longo de várias décadas, e, se mais razões não houvesse, essa bastaria para existir um esclarecimento no que se refere a aspectos relacionados com parte da evolução recente deste sem dúvida importante grupo empresarial português.
O pedido de inquérito parlamentar do PCP, para além do já referido no início da minha intervenção, pode não identificar com precisão, mesmo que em linhas gerais, todos os pontos a clarificar nem a real origem e a sequência dos factos e decisões a averiguar. Mas isso não impedirá que o Partido Popular tome uma posição clara e coerente no momento da votação. É que estão em causa princípios, e, em última análise, interesses, que temos a obrigação de acautelar.
Assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do Partido Popular votará favoravelmente o pedido de inquérito n.º 5/VII, apresentado pelo Partido Comunista Português, só lamentando que a governação deste país tenha nos últimos anos conduzido a tantas situações menos claras, aliás, muitas delas decorrentes das nacionalizações, das quais o PCP e o próprio PS foram inspiradores em 1975.
Os desejos e os princípios da esmagadora maioria dos portugueses vão no sentido de uma cada vez mais transparente e profissional actuação a todos os níveis da Administração Pública. É nossa vontade e nosso imperativo consegui-]o, e julgo que se, nesta Câmara, não nos unirmos nesse esforço, estaremos a prestar um péssimo. serviço ao .País e a desacreditar, talvez de uma forma irreparável, a nossa classe política.
Para terminar, direi que vamos votar a favor deste pedido de inquérito pelas boas razões, enquanto que o PCP o fará, eventualmente, pelas más.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, gostaria de abordar uma questão preliminar. No fundo, a razão subjacente ao pedido de inquérito parlamentar formulado pelo PCP é análoga à apresentada para justificar outros pedidos, no passado, e devo dizer que manifestamos compreensão por esta iniciativa. Em 1975, o PCP deu um estimável contributo para as nacionalizações e estranho seria que estivesse de acordo com o processo de privatizações. Impedido de obstaculizar, por não. deter poder para isso, o processo de privatizações, frequentemente o PCP recorre ao manto da suspeita quanto à transparência desse processo.
A este respeito, temos uma posição de princípio muito simples: reconhecemos toda a legitimidade a um grupo de Srs. Deputados que acerca de uma qualquer matéria possa ter dúvidas. Se a elucidação dessas dúvidas tiver de ocor-

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rer em sede de inquérito parlamentar, não será o Grupo Parlamentar do PSI) que impedirá a tramitação do inquérito parlamentar até às suas conclusões.
Quanto a este caso em concreto, temos uma posição diametralmente oposta à do PCP, que, de alguma forma, insinua que o Sr. António Champalimaud beneficiou de um favor. Ora, nós pensamos que, muito pelo contrário, o Estado acabou por beneficiar em muito com a conclusão a que neste processo se chegou.
Atribuo esta nossa divergência de posições ao desconhecimento ou à omissão do PCP de uma questão. essencial, que não consta do texto do pedido de inquérito parlamentar.
O Sr. António Champalimaud - e está é a verdade - interpôs várias acções contra o Estado português, pedindo ou reclamando aquilo que ele entendia ser o justo valor pelas acções que detinha nas empresas de que foi esbulhado através do processo de nacionalizações. E, em todas as instâncias em que essas acções transitaram, o Sr. António Champalimaud teve vencimento de causa.
Porque chamo esta questão ao Parlamento? Por esta razão bem simples: existia toda a probabilidade de o Sr. António Champalimaud vir a receber a preço que pedia - cerca de 80 milhões de contos - ou uma quantia muito próxima. Haveria de ser aquela que o tribunal, em último caso, arbitraria. Mas tudo leva a crer que a sentença era favorável ao Sr. António Champalimaud e condenatória para o Estado português.
Como disse, este aspecto é omitido no pedido de inquérito parlamentar apresentado pelo PCP, embora seja referido que o Sr. António Champalimaud tinha interposto acções contra o Estado.
Resumindo, reitero que vamos contribuir para a viabilização da constituição desta comissão de inquérito. Não quero deixar de dizer que, embora esteja em causa um Governo que apoiávamos, fosse qual fosse nesse momento e sabendo nós que tudo se passou exactamente como acabo de relatar, concluiríamos sempre que se teria tratado de um Governo lúcido, que tinha defendido o interesse do Estado, por uma razão muito simples: porque em vez da teimosia tinha encontrado uma solução mais benéfica para o País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vieira de Castro, não quero entrar, neste momento, em debate da matéria de facto. Essa fica para a comissão de inquérito.
Começou por dizer que eu teria - o Sr. Deputado não utilizou esta palavra, mas deixe-me utilizá-la a mim - escamoteado, o facto de existirem processos do Sr. António Champalimaud contra o Estado. De facto, está lá, mas também não aprofundei a razão dos processos do Estado contra o Sr. António Champalimaud. Estão ao mesmo nível, no pedido de inquérito.
Mas o Sr. Deputado utilizou a palavra - e não vou entrar na discussão de facto - «esbulhado»: disse que o Sr. António Champalimaud foi esbulhado dos seus bens, que pediu uma indemnização e tudo levaria a crer, em sua opinião, que a obteria.
A questão que coloco, utilizando a sua expressão, é esta: se isso pudesse ser uma razão para o que foi feito, se o Sr. António Champalimaud foi esbulhado, o Sr. Jorge de Mello, o Sr. José Manuel de Mello, etc., também não foram esbulhados? Também não teriam direito a receber?!

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Também teriam!

O Orador: - Não teriam também direito a receber?! Então, por que é que foi feito só para um e não para todos?!

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - E os pequenos accionistas também!

O Orador: - Era esta a única questão que gostaria de lhe colocar, Sr. Deputado, porque a matéria de facto e alguns aspectos que referenciou serão discutidos na comissão de inquérito. Aliás, alguma da documentação que consideramos básica já consta do requerimento de inquérito, mas há outra que mostrará, em nossa opinião, qual será a verdade dos factos.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado beneficiou de 2 minutos que lhe foram concedidos pela Mesa, à semelhança do que foi feito em relação a outros Srs. Deputados.
Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, gostaria de encontrar uma expressão que fosse do seu maior agrado, mas não tenho outra que não a de considerar que, para mim, o que aconteceu no processo das nacionalizações, em 1975, foi rigorosamente um esbulho para todos os detentores das empresas que foram nacionalizadas.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Então, e os outros?! Só se paga a um?!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Faço está intervenção para me congratular, em nome da bancada do Partido Socialista, com a clara mudança de atitude do PSD em relação a inquéritos parlamentares, a qual ficou aqui muito bem revelada pelas palavras do Sr. Deputado Vieira de Castro, que disse expressamente que, a partir do momento em que um grupo parlamentar tem dúvidas sobre a forma como qualquer processo ocorre, é legítimo recorrer à figura do inquérito parlamentar.
Nós também pensamos assim, só que não é apenas de hoje, já pensávamos assim no passado. A, este propósito, gostaria de recordar os sucessivos inquéritos parlamentares inviabilizados pela maioria absoluta do PSD no passado, nomeadamente o relativo ao modo como decorreu o processo de privatização do Banco Totta & Açores, tendo os Deputados do PS sido obrigados a gastar as suas assinaturas num requerimento de inquérito parlamentar potestativo, dada a atitude de obstrução que a maioria do PSD de então tomou.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Lembro também tudo o que se passou na comissão de inquérito, inclusive tendo os Deputados do

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PS sido obrigados a abandona-la, nomeadamente no que respeita à forma como o relatório dessa comissão foi feito, de modo que pode constituir, e constitui de facto, um abuso de direito da maioria de manipular as conclusões de uma comissão de inquérito.
Portanto, reafirmando as palavras de há pouco do meu colega e camarada Manuel dos Santos, quero dizer que o PS não só viabilizará este inquérito, porque entende que a figura do inquérito parlamentar, desde que não seja banalizada, só dignifica a Assembleia da República, como também terá nessa comissão, se ela vier a formar-se, uma atitude construtiva para que se apure toda a verdade dos factos que se pretenda apurar.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não tomaremos, em sede de comissão de inquérito, qualquer atitude de inviabilização, de boicote dos trabalhos, como aconteceu no passado, porque nós e o Governo formado pelo Partido Socialista e pela nova maioria não temos medo de qualquer comissão de inquérito nem que o povo português saiba a verdade do que se passa rio País.

Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra e consideração pessoal.

O Sr. Presidente: - Como chegámos ao fim do debate, dado não haver mais intervenções, tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Sr. Deputado João Carlos da Silva, presidi à Comissão de Inquérito para Apreciação do Processo de Privatização do Banco Totta & Açores, e juntamente com vários Deputados do seu grupo parlamentar, tal como dos restantes, que estão hoje aqui, tivemos um trabalho intensíssimo, abdicando de alguns períodos de férias, para escutarmos todos aqueles que os grupos parlamentares entenderam chamar a esta Casa. Ouvimos centenas de horas de audições, preenchemos milhares de páginas e, no final, chegámos a algumas conclusões, que resultaram daquilo que foi o equilíbrio, a síntese final, entre diversas audições realizadas com representantes quer de instituições privadas quer de instituições públicas, tendo o relatório sido apreciado, discutivo e votado neste Plenário.
Portanto, V. Ex.ª ofende-me e ofende todos os que trabalharam seriamente nessa comissão de inquérito, e que estão ao seu lado, ao dizer aqui que essa comissão foi manipulada. Essa comissão teve a oportunidade de procurar fazer um trabalho sério, independentemente dos antecedentes da sua constituição.
O que eu esperava de V. Ex.ª era que não fizesse juízos de valor sobre coisas onde não participou, sobre ciência feita a partir de notícias, de jornais e de testemunhos que, obviamente, são distorcidos.
É nesse sentido que entendo ás palavras de V. Ex.ª e considero que não são de má fé, porque, noutro plano, teria de as considerar como tal.
Repito, não houve manipulação, mas um trabalho sério, as conclusões foram vertidas no Diário da Assembleia da República e, pessoalmente, não me sinto envergonhado pelo, trabalho feito por essa comissão.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Muito bem!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carios Pinto, não era minha' intenção ofender pessoalmente V. Ex.ª, nomeadamente enquanto presidente e não como relator dessa comissão de inquérito, nem os Srs. Deputados do PSD.
Porém - e V. Ex.ª não infirmou isso -, a verdade é que, não obstante o trabalho da comissão, as conclusões retiradas e constantes do respectivo relatório - e tive o cuidado de o ler, bem como os debates que se realizaram no Plenário e as conclusões - são, única e exclusivamente, no interesse da bancada do PSD. Foi utilizada a maioria absoluta do PSD para condicionar essas conclusões contra aquilo que seria a imediata verdade do que está precisamente exposto no relatório antes dessas conclusões. Foi isso que quis dizer e foi isso que efectivamente se passou. E a leitura dos debates efectuados em Plenário, no momento da aprovação do relatório, confirma o que acabei de dizer.
Porém, Sr. Deputado Carlos Pinto, a honra do PSD foi lavada aqui hoje pelo Sr. Deputado Vieira de Castro, ao voltar atrás com tudo aquilo que foi a vossa prática no passado. De facto, o Sr. Deputado Vieira de Castro veio aqui dizer que, agora, o PSD é a favor de todos os inquéritos e mais alguns. Ou seja, o PSD teve um discurso enquanto era governo e uma maioria absoluta, mas agora, que é oposição, tem outro discurso completamente diferente.

Protestos do PSD.

Houve um inquérito ao abrigo do direito potestativo da oposição e, agora, os inquéritos são aprovados nesta Assembleia; sem que haja a força esmagadora da maioria absoluta do PSD, graças à derrota eleitoral que VV. Ex.ª sofreram em 1 de Outubro de 1995. É que se isso não tivesse acontecido, ainda hoje teríamos ter de recorrer a requerimentos potestativos para haver inquéritos parlamentares.

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Manuel dos Santos. (PS): - Sr. Presidente, o meu grupo parlamentar ainda dispõe de tempo para intervir. Porém, o Sr. Presidente Almeida Santos, seu antecessor na presidência, anunciou o encerramento do debate, pelo que, julgo, não seria muito curial nem, e sobretudo, muito ético inscrever-me para uma intervenção.
Assim, peço-lhe que me deixe fazer uma pequena interpelação, porque, de algum modo, fui citado na intervenção feita pelo Sr. Deputado Carlos Pinto, já que ele se referiu aos Deputados que...

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O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Pinto, julgo que nunca esteve em causa - e estou perfeitamente solidário com a intervenção feita pelo meu camarada João Carlos da Silva, com quem, aliás, tive oportunidade de conversar sobre o inquérito ao processo de privatização do Banco Totta & Açores - a sua intervenção nesse inquérito. Aliás, estou a citar de memória e a tentar lembrar-me e julgo que V. Ex.ª, em alguns momentos, foi até elogiado unanimemente pela forma como conduziu os trabalhos. Portanto, com franqueza, julgo que a sua intervenção foi despropositada, no sentido de que não foi o Sr. Deputado Carlos Pinto que esteve em causa.
O que esteve em causa, sim, foi o resultado político do inquérito. E aqui, meu caro amigo, estou inteiramente de acordo com o que o Deputado João Carlos da Silva acabou de dizer. Realmente, o resultado político do inquérito foi obviamente subvertido pelos interesses da maioria de então. E subvertido de uma maneira arrogante e impositiva, usando, aliás, a maioria que tinham, contra todas as bancadas e não só contra o PS.
Portanto, as conclusões serviram apenas os interesses do PSD, não tendo sido ouvidos os depoimentos que o PS e outros partidos - estou a recordar-me, por exemplo, do ex-Deputado Nogueira de Brito - julgavam essenciais. Quanto a isso, não tenhamos quaisquer dúvidas.
Uma última observação tem a ver com o seguinte: é evidente que o inquérito ao processo de privatização do Banco Totta & Açores só se fez porque nós e os Deputados do PCP utilizámos um mecanismo regimental à nossa disposição para .º impor. Os senhores tinham claramente uma política de obstaculização em relação a esses inquéritos. E se agora não a têm, é correcto o que disse o Sr. Deputado João Carlos da Silva: mudaram de opinião. Sobre isso não há duas interpretações possíveis, Srs. Deputados.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Faça favor, Sr. Deputado, mas seja breve.

O Sr. Carlos Pinto (PSD) - Sr. Presidente, julgo que devemos precisar esta matéria porque sou daqueles que atribuem às comissões de inquérito um carácter nobre na actividade parlamentar.
Sr. Deputado Manuel dos Santos, V. Ex.ª sabe que esta Casa se rege por um Regimento e, portanto, a vontade em cada momento expressa pela maioria desta Assembleia tem de ser respeitada. Foi-o no passado, como tem de ser hoje.
Portanto, se V. Ex.ª e está mais interessado em discutir a forma do que a substância, isso é com a bancada do PS.
Quero dizer-lhe o seguinte: VV. Ex.as, na época - isso tem de sublinhar-se e esta é a minha leitura -, distorceram o sentido dos inquéritos parlamentares, pois usaram-nos como arma de arremesso contra a maioria existente. Era isso que nós tínhamos a consciência de que estava a acontecer.

Protestos do Deputado do PS João Carlos da Silva

Ó Sr. Deputado João Carlos da Silva, se V. Ex.ª vivia longe da Assembleia da República, como pode estar a pronunciar-se sobre o que aqui se passou nos bastidores?

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sabe-se tudo!

O Orador:- - Aquilo que quero dizer, respondendo ao Sr. Deputado Manuel dos Santos, é que gostaria que todos pudéssemos reconduzir a figura dos inquéritos parlamentares à audição aberta, descomplexada e analítica sobre aquilo que se passa, passou e há-de passar, sem que, no final, aqueles que julgam que nas conclusões não são vertidas as suas ideias ou as suas perspectivas sintam que os outros manipularam, manobraram ou condicionaram. Porque há-de ser sempre assim! V. Ex.ª não espera que, sobre a matéria agora em discussão, haja unanimidade. Penso que não; não vão esperar isso. Agora, espero que VV. Ex.as reconheçam, tal como se fez então, aquando da discussão na Comissão de Inquérito para Apreciação do Processo de Privatização do Banco Totta & Açores, o esforço de audição do maior número de personalidades, que, em síntese, bom senso e equilíbrio de interesse para a Comissão, foram ouvidas. Evidentemente, V. Ex.ª queria ouvir o Primeiro-Ministro da época, queria ir até ao ministro das finanças não sei de onde, e aí havia opiniões diferentes.
Assim sendo, reportar-se, neste momento, a conclusões de uma comissão de inquérito, que trabalhou e fez o melhor que pôde, traz-me à ideia esta noção: a de que se continuam com o mesmo espírito relativamente àquela que estamos hoje a criar, duvido que se arrepie caminho justamente em relação àquilo que VV. Ex.as têm criticado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, o debate dos requerimentos de constituição de comissões de inquérito tem até uma formulação bastante circunscrita - é, de acordo com, o Regimento, uma intervenção por cada grupo parlamentar -, pelo que vamos concluí-lo. Aliás, como o debate já ía adiantado quando assumi á presidência, creio ter sido muito tolerante.
Assim, peço ao Sr. Deputado Manuel dos Santos a sua compreensão ...

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Vou demonstrar a minha compreensão, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Mas pede a palavra, para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma interpelação no sentido próprio, tem a palavra.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, acabou de ser dito pelo Sr. Deputado Carlos Pinto que requeri a presença do anterior Sr. Primeiro-Ministro para ser ouvido nessa comissão de inquérito. Ora, isso é falso e têm de ficar registado. Era isso o que queria dizer.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por concluído o debate so-

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bre o inquérito parlamentar n.º 5/VII - Ao acordo estabelecido entre o Estado e o Sr. António Champalimaud (PCP). A votação efectuar-se-á, nos termos regimentais, na próxima sessão em que houver votações.
Passamos, agora, à apreciação do Decreto-Lei n.º 63/96, de 28 de Maio - Aprova o processo de reprivatização do capital social da Tabaqueira-Empresa Industrial de Tabacos, S.A. (ratificação n.º 21/VII (PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: A ratificação n.º 21/VII, que hoje sobe a Plenário da Assembleia da República, sobre a privatização da Tabaqueira, é uma iniciativa do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português e tem em vista repor, mais uma vez, a verdade de que não se deve alienar o património do sector empresarial do Estado, que é um bem de todos nós, apenas para cumprir os compromissos eleitorais ou, o que é pior, para cumprir vontades de grupos, interessados em delapidar o património nacional.
Já aqui discutimos esta matéria, quando foi aprovada a não ratificação do Decreto-Lei n.º 167/95.
Os termos e as condições em que o processo de privatização é agora retomado contrariam frontalmente a vontade que a Assembleia da República expressou, quando recusou a ratificação do referido Decreto-Lei, que, tal como o actual, também se propunha alienar as acções daquela empresa, sendo certo, porém, que o Decreto-Lei n.º 63/96 abre a real perspectiva de o controlo da Tabaqueira poder passar para entidades estrangeiras, o que, de resto, já hoje se está a confirmar, conhecidos que são os candidatos à compra da mais apetecida empresa do sector empresarial do Estado.
Dissemo-lo ontem, aquando dá discussão desta matéria, e repetimo-lo hoje: a privatização da Tabaqueira não tem, em nosso entender, qualquer fundamento económico, dado tratar-se, como é sabido, de uma empresa sólida, com forte implantação no mercado nacional, sendo reconhecida, pela sua solidez financeira, como a «Jóia da Coroa» das indústrias pertencentes ao sector empresarial do Estado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Todos sabemos que uma empresa assim é demasiado apetecível, quer por capitais nacionais quer por capitais estrangeiros.
O sector do tabaco, desde a produção à comercialização, é um sector sensível, um segmento importante da nossa economia pelos lucros que gera e também por aquilo que ele representa por si mesmo.
Hoje, tal como ontem, privatizar a empresa Tabaqueira é um erro não só económico mas igualmente político, de profundas é lesivas consequências para o sector empresarial do Estado, com tudo o que representa o entregar-se de bandeja uma enorme fonte de receita, não- só directa mas indirecta, do Orçamento do Estado e uma empresa de um importante sector da economia.
De uma análise, embora sucinta, à situação financeira da empresa, ressaltam números, que, por si só, ilustram bem o que acabamos de afirmar, de uma empresa sólida financeiramente e com uma forte implantação no mercado nacional e com uma componente não menos interessante no sector dos tabacos, nas Repúblicas de Angola e Moçambique, que, como se sabe, não é de somenos importância. Quem ganhar este sector em Portugal tem o campo aberto na comercialização da tabacos em Angola e Moçambique, através das participações que a Tabaqueira detém em empresas desses países de língua portuguesa.
Mas, como mero exercício de reflexão, passemos aos números da Tabaqueira.
A empresa arrecadou e entregou ao Estado, de 1976 a 1991, impostos sobre o consumo de tabaco da ordem dos 503 milhões de contos, mas, só no ano de 1994, facturou cerca 145,3 milhões de contos, o que se traduziu num resultado líquido de cerca de 5,8 milhões de contos.
Foi o ano de ouro da Tabaqueira. A partir daqui foi aberto o caminho para a privatização, com a transformação da empresa pública em sociedade anónima e a consequente nomeação de novo Conselho de Administração, que tudo fez e faz para abrir as portas à privatização.
A empresa passou de 1600 trabalhadores para cerca de 750, actualmente.
Os resultados líquidos vêm decrescendo de ano para ano, passando dos 5,8 milhões de contos para os 2,3 milhões de contos em 94. O actual conselho de administração mais parece uma comissão liquidatária, interessada em deixar a empresa em condições de, a todo o momento, ser entregue ao capital privado.
É uma desculpa velha e demasiado conhecida, de que tudo o que está no sector público é mal gerido e os gastos exagerados.
E a pergunta que pode e deve fazer-se, neste momento, é que interesse tem para a economia nacional qualquer dos candidatos que se perfilam para a compra da Tabaqueira.
Que interesse tem para a economia nacional vender à Philip Morris americana, o gigante das empresas tabaqueiras, como é sobejamente conhecido, ou à Tabacalera espanhola, cujos interesses à escala da Europa se entrecuzam, sendo que a primeira detém na Tabacalera importantes interesses na comercialização do tabaco em Espanha e à segunda lhe interessa, como à primeira, ficar com o mercado português; por tudo aquilo que ele representa, mas também pela enorme possibilidade de penetração nos mercados de Angola e Moçambique, por força da participação que, como se disse, a Tabaqueira detém em empresas desses países, e também pela participação que a Tabaqueira tem no ramo agro-alimentar, através da Nutrinveste, e no ramo dos seguros?
Mas podemos igualmente colocar outras questões: está devidamente salvaguardada a produção nacional, ou a venda da Tabaqueira trará como consequência, a médio prazo, uma redução da nossa produção permitindo a penetração de tabaco americano ou mesmo espanhol?
E os interesses dos trabalhadores da Tabaqueira, estão devidamente salvaguardados?
Entendemos que não. E basta ver o que tem acontecido com outras empresas que foram privatizadas, para se verificar a diminuição de postos de trabalho, que, em muitos casos, levou à redução drástica e à falência dessas mesmas empresas.
E seja qual for o resultado a que se chegue, Philip Morris ou Tabacalera, o quadro está, desde já, traçado: os prejuízos são para um sector estratégico e fundamental, o sector empresarial do Estado, e, consequentemente, para a economia nacional.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: se, no passado, criticámos o PSD, por querer vender a Tabaqueira, não podemos, hoje, deixar de criticar a incoerência política com que o PS pretende fazê-lo, através deste decreto-lei.

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E dizemos incoerência política do Partido Socialista, porque votou neste Parlamento a não ,ratificação do Decreto-Lei n.º 167/95, da autoria do Governo do PSD, para, tempos depois, apresentar idêntica iniciativa, mas, desta
vez, ainda mais gravosa, como amplamente aqui ficou demonstrado.
Que pretendeu afinal o Governo do Partido Socialista, com tal adiamento?
Criar as condições para um melhor encaixe financeiro, ou criar as condições para a venda da Tabaqueira a uma empresa estrangeira?
É que é conhecida, desde sempre, a pretensão da Philip Morris pela Tabaqueira e, neste momento, ela é uma forte candidata.
Em qualquer das situações, os argumentos são demasiado frágeis, mas fortemente intencionais, e não servem o interesse nacional.
De tudo o que fica dito, conclui-se que, no caso da Tabaqueira, como em tantos outros, a privatização não tem como motivação qualquer projecto, qualquer ideia da racionalização ou melhoria do sistema económico; tem, sim, como única motivação, o encaixe para o Estado, à custa da entrega do sector público aos grandes interesses privados nacionais ou estrangeiros.
É nesta filosofia, que, no passado, gerou a destruição de importantes sectores produtivos do País e aumentou o desemprego, que hoje o Governo do Partido Socialista teima em prosseguir.
Pela nossa parte, reafirmamos o nosso desacordo com a política de privatizações traduzida neste caso exemplar, o nosso desacordo com a privatização da Tabaqueira, uma empresa onde nada justifica tal privatização.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Não havendo pedidos de esclarecimentos, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Galvão Lucas.

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente; Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O. Decreto-Lei n.º 63/96, publicado no Diário da República n.º 124, I Série-A - «Privatização da Tabaqueira Empresa Industrial de Tabacos, SA» -, de que o Grupo Parlamentar do Partido Comunista vem agora requerer a ratificação, merece, da parte do Grupo Parlamentar do Partido Popular, algumas reflexões que, necessariamente, estão em linha com o que aqui exprimimos, aquando da recusa da ratificação do Decreto-Lei n.º 167/95, sobre a mesma matéria.
Referimos, na altura, e mantemos agora, a necessidade de introduzir nos processos de reprivatização a máxima celeridade, compatível com uma correcta preparação e concretização de cada operação, mas, de qualquer forma, visando devolver rapidamente à iniciativa privada aquilo pelo qual ela pode e deve responsabilizar-se, além de que cada reprivatização é, na nossa opinião, uma reparação, ainda que eventualmente insuficiente e tardia na maior parte dos casos.
Analisámos, na altura, aspectos referentes às actividades diversificadas da Tabaqueira e à possível evolução do mercado do tabaco em Portugal, nomeadamente no que se refere às quotas que no mesmo eram e, previsivelmente, passariam a ser, com o decorrer dos tempos, detidas pelos vários intervenientes.
Não vamos voltar agora a esses aspectos, mas outros subsistem como de maior importância e para os quais é preciso claramente chamar a atenção desta Câmara.

Primeiro aspecto: a manutenção da actividade da Tabaqueira nos níveis actuais, com a consequência imprescindível da manutenção dos postos de trabalho. O Governo tem de pôr, em equação claramente a necessidade de, durante todo este processo, aliás já em curso, salvaguardar a manutenção em Portugal de uma unidade industrial com tradições, tecnicamente bem equipada e com dimensão, e não pode, em circunstância alguma, permitir que a alienação conduza a reduções de níveis de actividade ou fecho da unidade, sobretudo pela prioridade que, além do mais, tem de ser dada ao emprego.
Segundo aspecto: a empresa, uma vez privatizada, tem de prosseguir e, portanto, há que assegurar, até à decisão final, que a empresa continuará dotada dos meios, naturalmente que em parte com origem nos seus accionistas, para poder dar continuidade aos necessários investimentos de todo o tipo, por forma a operar com rentabilidade, em expansão, se possível, e garantindo emprego pelo menos aos níveis actuais.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Ganhe quem ganhar, há que assegurar, para além de tudo o resto, os aspectos que acabo de referir.
Significam estas palavras que, embora as razões invocadas pelo Partido Socialista para a não ratificação do Decreto-Lei n.º 167/95 não tenham, eventualmente, sido totalmente resolvidas com o decreto em apreço, tal não obsta a que o Partido Popular vote, no momento oportuno, no sentido da ratificação do mesmo.
É que, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, na altura dizia-se que 80 % era uma percentagem de capital social da empresa demasiado grande para ser vendida a um só comprador, designadamente no que se referia à «ampla participação dos cidadãos portugueses na titularidade do capital das empresas, através de uma adequada dispersão do capital, dando particular atenção aos trabalhadores das próprias empresas e aos pequenos subscritores», conforme refere a Lei-Quadro das Privatizações, no seu artigo 3.º, alínea f).
Agora, temos, numa 1.ª fase, a alienação de um bloco indivisível de 65 %. Parece-nos ter o Governo agora maior espaço de manobra para atender a tal objectivo, se é que já não o tinha anteriormente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - O segundo aspecto, na altura referido igualmente pelo Partido Socialista, tinha a ver com a possível mais-valia que o comprador faria de imediato com 29 % do capital social (80 % menos 51 %), que poderia vender em bolsa através de OPV. Está agora ultrapassado este aspecto, independentemente de julgarmos, tal como julgávamos em Dezembro de 1995, que nada de incorrecto ou ilegal continha a possibilidade teórica que se oferecia ao comprador.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quanto ao problema do controlo da Tabaqueira poder passar para mãos estrangeiras, levantado pelo Partido Comunista Português, é público que a participação portuguesa no capital social dos grupos concorrentes vai de 0 a 20 %, mas o que interessa verdadeiramente, para além de, eventualmente, não podermos obstar a que, de outra forma, esta e outras reprivatizações sejam concretizadas, é que a empresa continue em Portugal, pagando aqui impostos, dando aqui trabalho a cidadãos na sua quase totalidade portugueses.

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Julgo que já todos os portugueses perceberam que, sendo importante, mesmo um imperativo nacional, criar condições para que grandes grupos empresariais portugueses se consolidem ou criem, é sobretudo importante manter em Portugal um sector industrial competitivo e desenvolvê-lo o mais que for possível.
A titularidade do seu capital, ao seu último nível, não é - e volto a repetir -, independentemente de todas as considerações sobre as possibilidades de o evitar, condição minimamente relevante nem no mundo dos negócios em que nos movimentamos nem no espaço económico que integramos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: É, isso sim, da maior importância que o Governo, ao abrigo do artigo 2.º, alínea 3, do Decreto-Lei agora em apreço, verifique primeiro e vincule depois que quem quer que ganhe tenha um projecto estratégico para a empresa, que salvaguarde os interesses nacionais, à luz do que referi no início da minha intervenção.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Por iniciativa do Partido Comunista Português, está a Assembleia da República a apreciar o Decreto-Lei n.º 63/96, de 28 de Maio, que aprova a alienação faseada da totalidade das acções representativas do capital social da Tabaqueira.
Não estranhamos esta atitude do Partido Comunista, pois é coerente com a sua filosofia política e com o seu comportamento recente.
Em primeiro lugar, é coerente com a sua filosofia política porque o PCP defende uma forte intervenção do Estado na actividade económica, porque apoiou o processo de nacionalizações e sempre se opôs às reprivatizações que têm vindo a ocorrer na economia portuguesa.
Em segundo lugar, é coerente com o seu comportamento recente, pois, já na presente sessão legislativa, o Partido Comunista pediu a apreciação do Decreto-Lei n.º 167/95, que aprovava a reprivatização da Tabaqueira, de cuja discussão resultou a sua não ratificação, devido a uma conjugação de votos do PCP com os do Partido Socialista.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Maioria de esquerda!

O Orador: - O seu comportamento é, pois, coerente!
Estranho é, no entanto, o comportamento do Governo, que apresentou recentemente um decreto-lei análogo ao anterior, após o Partido Socialista, em Dezembro último, ter votado a não ratificação do decreto-lei que privatizava a Tabaqueira. Argumentou, na altura, o Partido Socialista e o Governo de que era necessário rever o modelo de privatização proposto, de modo a permitir a dispersão de parte do capital em Bolsa.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Esta foi a razão invocada pelo PS e pelo Governo, mas, analisando o Decreto-Lei n.º 63/96, não descortinamos que tenha sido esta sua a verdadeira intenção.
O PS não ratificou o decreto-lei do Governo anterior, por simples capricho, por desejo de estar contra tudo o que vinha do anterior Governo, sem analisar a bondade da iniciativa, pondo em causa um processo de privatização já em curso, dando um sinal político negativo para os, agentes económicos, acabando, na prática, por atrasar, em cerca de um ano, a privatização da Tabaqueira.
Este comportamento dos socialistas é facilmente identificável quando se analisa o que distingue os dois decretos-leis. A principal diferença está no facto de o actual Governo propor alienar por concurso público, num bloco indivisível, 65 % do capital social da empresa, ao invés dos 80 % anteriormente previstos.
Visto que ambos os modelos prevêem que 20 % do capital seja alienado numa fase posterior a trabalhadores, pequenos subscritores e emigrantes, a diferença do actual modelo reside no facto de 15 % do capital permanecer com um destino indefinido: ser alienado por oferta pública de venda ao público em geral ou, em alternativa, ser alienado ao vencedor do concurso público da primeira fase, ou seja, àquele que já tem 65 % do capital.
Srs. Deputados socialistas, na prática, aquilo que o Governo fez foi uma operação de cosmética e deixar o essencial do anterior decreto-lei, mas com custos para toda a economia.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não é verdade!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): É a mesma coisa!

O Orador: - Seguiu o essencial do anterior modelo, já que manteve a venda em bloco indivisível de mais de metade do capital social da empresa. Convenhamos que, para o controlo da Tabaqueira, 65 % ou 80 % do capital da sociedade é completamente indiferente.

O Sr. João Carlos Silva (PS):.- Não, não é!

O Orador: - Mas mais: na prática permite a possibilidade de o grupo que controla a empresa ficar com 80 % do capital, uma vez que apresenta como hipótese vender-lhe os restantes 15 %, que, entretanto, permanecerão nas mãos do Estado.
E, de duas, uma: ou o Governo mudou de opinião e já não defende a dispersão do capital em bolsa, e esta é uma simples tentativa de esconder o que está à vista de todos, ou, então, mantém a necessidade de dispersar o capital, situação em que o que é reservado pata o efeito não tem qualquer expressão.
A verdade é que; qualquer que seja a razão, o Governo manteve o geral do modelo anteriormente elaborado e o que conseguiu foi unicamente atrasar este processo em cerca de um ano, o que trouxe custos para toda a economia. Custos contabilizáveis no atraso da operação, na incerteza que acarreta a indefinição do destino de 15 % do capital, e na credibilidade do Estado.
O Partido Social Democrata, fiel aos seus princípios e à sua prática política, deseja sinceramente que este seja um caso isolado e que no programa de privatizações já apresentado não surjam avanços e recuos, comportamentos dilatórios ou estratégias pouco claras que ponham em causa o êxito de todo o processo e a dignidade do Estado português.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr: Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

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O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Encontra-se hoje em discussão nesta Assembleia o processo de privatização da Tabaqueira.
Obviamente que o Grupo Parlamentar do PS é favorável à privatização desta empresa, dentro da programação oportunamente apresentada e visando o reforço do funcionamento da economia de mercado também neste sector económico. Em qualquer caso e porque queremos um mercado efectivamente a funcionar, apoiámos, já em Dezembro último, a orientação governamentalmente expressa de dispersar parte do capital em bolsa.
Sr. Presidente, defendemos nós, na mesma altura, através da autorizada voz do meu camarada Crisóstomo Teixeira, que fosse dada a este Governo oportunidade de' definir um modelo de alienação das acções da Tabaqueira mais adequado à salvaguarda dos interesses nacionais.

O Sr. João Carlos. Silva (PS):- Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputado: Interessa, então, verificar se existem contradições entre a decisão tomada pela Assembleia da República quanto à irão ratificação do Decreto-Lei n.º 167/95 e uma eventual ratificação do decreto que hoje se encontra em apreciação. Depois das intervenções feitas, diria uma muito provável ratificação.
Ora, a nossa opinião, contrariamente a algumas outras, em nosso entender mal expressas, é que o conteúdo do Decreto-Lei n.º 63/96, de 28 de Maio, procura colmatar os aspectos essenciais então por nós criticados no esquema aprovado pelo anterior Governo.
O Decreto-Lei n.º 63/96, de 28 de Maio, adoptou, efectivamente, o princípio da privatização em três fases, conforme tinha sido sugerido, e permite ainda uma mais elevada dispersão do capital em bolsa.
Por outro lado, na 1.ª fase do concurso público não serão alienadas acções representativas de uma percentagem superior a 65 %, diminuindo-se, assim, o que nos parece extremamente positivo, o bloco de acções maioritário inicial. E não só do ponto de vista numérico como também do ponto de vista financeiro e até do ponto de vista de algumas consequências jurídicas estes dois números são claramente diferentes e ignora-lo é tentar baralhar os termos do debate.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Também é claro que, diminuindo-se esse bloco inicial maioritário de acções, ficam, eventualmente, mais acções, disponíveis quer para a oferta pública de venda, quer para trabalhadores, pequenos subscritores e emigrantes:
Parece-nos que, desta forma, garantindo a possibilidade de escolha de um grande accionista ou conjunto de accionistas associados com elevada capacidade estratégica, com know-how, com fortes capacidades financeiras e preferivelmente evidenciando uma associação em que seja patente a boa implantação em mercados internacionais, a perspectiva de aumentar as acções consignadas às 2.ª e 3.ª fases é muito positiva.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É bom que fique claro que convergimos circunstancial e conjunturalmente com o PCP na recusa do anterior esquema de privatização da Tabaqueira, sendo, no entanto, claro que as duas intenções eram diversas. Nós não concordávamos com alguns dos aspectos da privatização, como o anterior Governo a pretendia fazer, mas, corrigidos esses aspectos, o decreto em apreciação parece-nos um bom decreto. Julgamos que permitirá a necessária flexibilidade por nós preconizada e que defende bem os interesses do Estado e os interesses da empresa.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, e sabendo nós que é política deste Governo conjugar os critérios de apreciação financeira com os da capacidade estratégica e financeira dos concorrentes, esta privatização poderá - e eu digo deverá - ser feita a bem de um melhor funcionamento deste sector, da economia nacional e, obviamente, da redução da dívida e do aumento do encaixe financeiro do Estado.
Por julgarmos que é uma boa solução apoiamo-la e votaremos a ratificação deste decreto.
Apelamos, o que parece já estar á, ser ouvido, a que, com realismo económico e sentido de Estado, a maioria desta Assembleia também o faça.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Foi o que vos faltou da última vez!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças (Teixeira dos Santos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de dirigir uma breves palavras em relação ao decreto-lei aqui em discussão, gostaria de saudar esta Assembleia.
Começaria por agradecer ao PCP a oportunidade que dá. ao Governo de, mais uma vez, poder expor, perante esta Assembleia, as suas motivações e os seus objectivos com o programa de privatizações.
Não estranho que o PCP tenha pedido a ratificação deste decreto-lei e que, de alguma forma, tenha tomado a Tabaqueira como uma bandeira contra todo o processo de privatizações que tem vindo a ser conduzido neste país.
Na anterior ratificação, que foi discutida aqui, se bem me recordo, em Dezembro do ano passado, houve uma coincidência conjuntural tanto por parte do Partido Socialista como do Governo com o PCP no que se referia ao diploma que, na altura, estava a ser objecto de ratificação. E a razão pela qual não apoiámos a referida ratificação teve a ver, por um lado, com o interesse do Governo em enquadrar esse processo no programa global de privatizações que estava a ser preparado e, por outro, com o nosso entendimento de que haveria conveniência em podermos dispor de uma maior dispersão do capital da referida empresa em Bolsa. Parece-nos que esse objectivo é perfeitamente conseguido com o decreto-lei que hoje está a ser objecto de apreciação no âmbito deste pedido de ratificação do Partido Comunista Português.
Gostaria de referir, usando uma expressão popular, que o PCP foge do mercado como o diabo da cruz. Ora, este Governo não tem medo nem preconceitos quanto ao papel do mercado na nossa economia. Entendemos que o essencial da afectação dos recursos na nossa economia deve ser feito através do mercado. É o mercado que garante e garantirá as melhores condições de eficiência nesse processo de afectação e só assim será, de facto, possível gerar progresso, desenvolvimento e emprego na economia.

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Entendemos, no entanto, que é necessária uma intervenção correctora. Há áreas e aspectos da vida social e económica nas quais não há solução de mercado ou onde ele falha e aí o Governo intervirá. Essa é a nossa postura e, por isso, não temos qualquer problema em conduzir um programa de privatizações e, em particular, em privatizar a Tabaqueira.
Mais: a visão estatista da economia que o Partido Comunista tem levaria a que, se mantivéssemos a Tabaqueira na posse do Estado, ela se iria afundando e, no futuro, seria mais um problema para as finanças públicas, como tantos outros que são do conhecimento público, que teria de ser suportado pelos trabalhadores portugueses e pelo povo português. É preciso saber quem é que pagaria essa manutenção da Tabaqueira no âmbito da esfera estatal. Estamos convencidos de que, através da privatização, vamos conseguir melhorar as condições de funcionamento da Tabaqueira e contribuir para a sua modernização, para a sua competitividade e para a manutenção do emprego.
Gostaria de deixar claro aqui - e já está a decorrer o respectivo concurso no âmbito deste processo de privatização - que o Governo vai, de facto, procurar assegurar quatro objectivos fundamentais: em primeiro lugar, pretendemos desenvolver a actividade da empresa e assegurar a sua modernização e a sua competitividade, como já há pouco referi; em segundo lugar, vamos também procurar fazer com que seja possível desenvolver as áreas de negócios complementares; em terceiro lugar, pretendemos assegurar a manutenção da produção nacional do tabaco e a manutenção das marcas nacionais; e, em quarto lugar, pretendemos assegurar que serão escrupulosamente respeitados os compromissos e as obrigações fiscais desta empresa.
Portanto, não temos qualquer problema em proceder a esta privatização num novo enquadramento que nos parece dar melhores condições ao Estado de proceder à sua alienação.
Quanto a custos decorrentes do adiamento havido no processo, entendo que é fácil dizer que há custos, mas gostaria de os ver quantificados. De facto, duvido que tenham ocorrido custos elevados neste adiamento do processo de privatização.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, reconhecemos a essência do mercado e sabemos qual é seu o papel, o que não entendemos, o que não aceitamos, o que recusamos e rejeitamos é que o mercado seja o «senhor todo-poderoso de tudo», que se utilize sempre a tese do mercado, o pretexto do mercado...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - A cassette do mercado!

O Orador: - ... e, como diz, e muito bem, o meu camarada, a cassette do mercado para, ao fim e ao cabo, se pretender, pura e simplesmente, manter e reproduzir o poder económico de alguns.
O Sr. Secretário de Estado foi ainda mais longe. Para si privatizar é modernizar e dar condições de competitividade. É evidente que isto nada tem de sustentação do ponto de vista económico; poderá ter se o Sr. Secretário de Estado disser que qualquer empresa pública gerida por. este Governo é gerida por incompetentes e é tutelada por incompetentes. Então, sim, se é gerida e tutelada por incompetentes, para se modernizar e adquirir competitividade, terá de ser privatizada, mas a alternativa não é a privatização. A alternativa numa situação destas é substituir os incompetentes por competentes, capazes e eficazes.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Secretário de Estado vem ainda com a ideia de que sé a empresa ficasse nas mãos do Estado seria o descalabro. Mas explique porquê, não mande apenas «bocas», não faça afirmações peremptórias, que, ao fim e ao cabo, apenas servem para escamotear a falta de razões. Porquê? Para criar o descalabro? Os portugueses não querem e rejeitam as marcas de tabaco português? O tabaco é produzido em Portugal? Ou o futuro da empresa estará virado apenas para a hipótese de exportar tabaco para os Estados Unidos da América ou para os outros países europeus? Não! Neste caso concreto, e sem pôr em causa a possibilidade da internacionalização da empresa em termos de internacionalização activa, a empresa pode sobreviver, pode viver; como viveu durante muitas e muitas dezenas de anos, com o mercado interno e com lucros.
Por último, o Sr. Secretário de Estado diz: «vamos fortalecer e aumentar as áreas complementares da Tabaqueira». Mas, depois, vão fortalecer e aumentar a privatização? Foi nesta perspectiva que retiraram à Tabaqueira e privatizaram áreas complementares, como, por exemplo, a agro-alimentar? É esta a perspectiva que o Governo continua a manter? É a de destruir, e destruir cada vez mais, enquanto é público, e auxiliar e fortalecer depois de privatizar?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, fico satisfeito em ouvir a afirmação de que sabem qual é o papel do mercado, embora, depois de o ouvir, tenha ficado com dúvidas de que o saibam.
De facto, não partilho inteiramente da ideia de o mercado ser «o todo-poderoso em tudo», tal como a minha intervenção terá dado a entender. Acredito, de facto, na força do mercado, embora não tenha nela uma fé cega.
A alternativa que nos propõe é a de o Estado ser o «senhor poderoso». Francamente, devo dizer, tenho mais medo desse «senhor poderoso».
Quanto a isto ser a cassette do mercado, digo-lhe que não é. Nós já passamos a fase da cassette, agora usamos o CD ROM.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Agora os negócios são mais rápidos. Há a Internet!

O Orador: - Ora, nem mais! Fico grato e satisfeito em ver essa tónica de modernidade no Partido Comunista.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Relativamente à gestão das empresas públicas, a conclusão de que elas são geridas por incompetentes, francamente...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Foi o Sr. Secretário de Estado quem o disse!

O Orador: - Isso nunca foi dito! Quem o disse foi o PCP, aqui, o que é confundir a prática da gestão com um conjunto de condições e de incentivos que estão presentes à actividade de gestão. E o que está em causa não é a qualidade dos gestores mas, no fundo, isso sim, um contexto de incentivos que norteiam a gestão pública da actividade económica. E isto que está aqui em causa.

Aplausos do PS.

No que se refere à acusação de que, eu teria dito que a manutenção da Tabaqueira no Estado iria dar ao descalabro, não tenho dúvidas de que, por causa desse contexto de incentivos existente na gestão pública nestas áreas de negócios, viríamos, no futuro, a ter problemas com a Tabaqueira. Por estar sujeita a uma forte concorrência de outras entidades que competem no mercado dos tabacos na nossa economia, com a gestão pública a Tabaqueira não teria a vitalidade necessária para enfrentar essa concorrência.
Ora, mas se de facto critica a ideia de que a Tabaqueira seria o descalabro se continuasse na posse do Estado - não sei porquê, porque também é tirável da cartola como um coelho - porque é que, necessariamente, haverá um descalabro na iniciativa privada - foi, no fundo, o argumento que utilizaram?
Quanto às actividades complementares, não tenho dúvidas de que a solução que iremos encontrar no âmbito do concurso em curso irá permitir, obviamente, o reforço dessas actividades.

Aplausos do PS.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Se vender à empresa pública Tabacalera, depois vamos conversar!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, gostaria de colocar-lhe três pequenas questões.
Sr. Secretário de Estado, estamos de acordo com tudo aquilo que nos disse hoje aqui, mas pergunto-lhe: porquê ter demorado praticamente um ano a mudar o anterior modelo, chegando só agora à situação de privatizar a empresa? O PCP queria, pura e simplesmente, impedir a operação, mas dá-me a sensação de que o comportamento do PS foi simplesmente o de a atrasar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, gostaria que fosse aqui dado um esclarecimento para sabermos para quê e porquê este comportamento dilatório do PS.
Em segundo lugar, pergunto, muito concretamente, se 0 óbice que na altura o Governo e o Partido Socialista apresentaram, que tinha a ver com a pouca participação dos portugueses em geral, do público em geral, no capital social da empresa, se esse óbice está ultrapassado, reservando-lhes hipoteticamente 15 % do capital.
Terceira questão: porquê esperar dois anos para os trabalhadores poderem ser accionistas desta empresa?
A 3.ª fase só pode ocorrer após a 2.ª; a 2.ª fase só poderá ocorrer dois anos após o momento da tomada de decisão sobre com quem ficam estes 65 % do capital. Então, porquê esperar dois anos? É para o Estado poder continuar a nomear administradores durante mais algum tempo?

Aplausos da PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, embora já se tenha inscrito fora de prazo, tem a palavra o Sr. Deputado Macário Correia.

O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, a minha pergunta é bastante simples e espero que a resposta seja naturalmente clara.
O Sr. Secretário de Estado representa aqui o Governo e manifestou ter uma estratégia clara em relação aos objectivos da empresa. Falou de aspectos muito concretos que se prendem com o mercado, como a competitividade, a concorrência. Falou de um conjunto de aspectos como, e naturalmente que o é, um profundo conhecedor do mercado dos tabacos. Mas porque o Governo, através do Ministério da Saúde, publica estatísticas que referem a morte de aproximadamente 10 000 portugueses/ano, por consumo dessa droga, que é a nicotina, comercializada pela empresa de que estamos aqui a falar em privatizar, que detém ainda cerca de 80 % de quota do mercado em Portugal; porque admito que o Governo tem uma unidade de funcionamento e política em relação a estas questões e porque não sei se nos objectivos que anunciou terá, por lapso, omitido a estratégia do Governo em relação ao comércio dos tabacos em Portugal, mesmo nesta ideia de privatização, pergunto se teve em conta a sua articulação com a política de saúde ou se a Sr.ª Ministra da Saúde, que, apesar de não estar presente, estará em espírito com a unidade e a estratégia do Governo em relação à Tabaqueira, está de acordo com o que pensa sobre esta matéria e quais ás implicações disto, em termos de mercado, nas políticas de consumo e obviamente nas doenças e nas mortes que vai provocar.
,Gostaria de perceber se o comércio da nicotina, tão presente na sua estratégia, está articulado com a política de saúde. É esta a pergunta, Sr. Secretário de Estado, que queria fazer.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Pára responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Duarte Pacheco, conforme referi, quando, em Dezembro passado, foi apreciado o anterior pedido de ratificação, o Governo entendeu, porque estava na altura a elaborar o programa de privatizações para 1996/97, que não faria sentido avançar com a privatização da Tabaqueira desgarrada deste programa de privatizações e que teria de se instituir um modelo diferente de privatização. E, de facto, a conjugação deste factor que referi com a elaboração do referido programa de privatizações levou a que o Governo apoiasse a não ratificação do referido decreto.

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O Sr. Deputado pergunta-me porquê um ano. Bem, no contexto do programa de privatizações, entendemos que o timing adequado a esta privatização na respectiva sequência de privatizações deveria ser este, e este é uma decisão política. Portanto, penso que nada mais haverá a dizer quanto a isto, excepto que não creio que advenham daqui custos significativos neste processo.
Quanto à participação dos portugueses, devo dizer que o actual diploma permite que a participação dos portugueses possa ir até aos 35 %, enquanto o diploma anterior limitava essa participação a 20 %. Este diploma permite que a participação dos portugueses vá até aos 35 %. Assim, vende 65 % desse lote indivisível, 20 % são para os trabalhadores e 15 % poderá ser também objecto de uma OPV, permitindo a tal participação dos investidores nacionais e de se utilizar esta empresa para dinamizar o nosso mercado de capitais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Porquê dois anos? Por que é que os trabalhadores vão ter de esperar dois anos? Sé vamos entregar o controlo desta empresa a uma nova entidade, que obviamente vai ter de proceder a reestruturações, vai ter de redefinir a sua política estratégica, dentro dos parâmetros definidos no caderno de encargos, mas, de qualquer modo, haverá um novo dono da empresa, haverá um processo de reestruturação a incluir, é óbvio que é preciso dar um tempo para que se vejam os frutos desse processo de reestruturação, para que os trabalhadores possam, de facto, saber o que estão a adquirir. Portanto, penso que é importante haver este período de dois anos por forma a garantir que esta empresa e as suas actividades complementares dêem essa percepção e essa informação que nos parecem fundamentais.
Quanto à questão da saúde, entendemos que não temos de tomar uma atitude paternalista. Ou seja, há uma actividade económica, que é, neste caso, a produção do tabaco, que será, de alguma forma, quer estatal, quer privada, desenvolvida. Pensamos que competirá aos consumidores tomarem a decisão de fumar ou não.
Estou aqui a defender a privatização da Tabaqueira, mas eu próprio não sou um fumador e não tenho qualquer problema em conduzir este processo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente. (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, apenas para que fique registado, informo que, nesta resposta, o Governo utilizou tempo cedido pelo PS.
Srs. Deputados, visto não haver mais. inscrições, dou por encerrado o debate do Decreto-Lei n.º 63/96, de 28 de Maio - Aprova o processo de reprivatização do capital social da Tabaqueira-Empresa Industrial de Tabacos, S.A. (ratificação n.º 21/VII (PCP).
Informo, entretanto, a Câmara que deu entrada na Mesa um projecto de resolução, apresentado pelo PCP, de recusa de ratificação do Decreto-Lei n.º 63/96, de 28 de Maio, que, nos termos regimentais, será votado na próxima reunião em que houver lugar a votações.
Srs. Deputados, passamos à apreciação conjunta dos Decretos-Leis n.º5 74/96, de 18 de Junho - Cria a Lei Orgânica do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas (ratificação n.º 22/VII (PSD) e 75/96, de 18 de Junho - Fixa a lei quadro das direcções regionais de agricultura (ratificação n.º 23/VII (PSD).

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cruz Oliveira.

O Sr. Cruz Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em 18 de Junho passado, foi publicada a nova lei orgânica do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas juntamente com o quadro orgânico das direcções regionais. Geraram-se expectativas mas o sentimento final foi de frustração e de incomodidade. De frustração, desde logo, porque os técnicos das direcções regionais esperavam que uma modificação em tão curto prazo fosse de alguma forma ao encontro dos seus anseios, e de incomodidade, que resultou da fusão dos serviços florestais e da sua integração nas direcções regionais.
O Ministério da Agricultura demorou mais de seis meses a desenvolver, a criar e a publicar a nova lei orgânica. Agora, estamos à espera há já cinco meses das leis orgânicas das direcções regionais. Enquanto isto se passa não há directrizes, não se sabe quem manda, desconhece-se a hierarquia.
Surpreende-nos que; também nas novas leis orgânicas publicadas, a Direcção-Geral de Fiscalização e Controlo Alimentar não tenha competências para a fiscalização das trocas intercomunitárias e para o combate à repressão e à fraude. Discordamos ainda de que o planeamento florestal não esteja incluído no Gabinete de Planeamento e Política Agro-alimentar pois, enquanto grassava a perplexidade no interior dos serviços florestais, estes ganharam mal-estar público pela minimização das florestas.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, há mais de 100 anos que existem serviços florestais autónomos capazes e dinâmicos. Como e porquê se destrói isto tudo num ano? A responsabilidade terá de ser atribuída a alguém, a saber, ao Governo e ao Ministério da Agricultura.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A desmotivação actual dos serviços florestais terá graves consequências no trabalho desenvolvido e no apoio aos agricultores. Temos ainda algumas dúvidas para as quais não encontramos respostas esclarecedoras: como vai efectuar-se, à luz da actual legislação, a gestão das redes nacionais dos postos de vigia, das brigadas de investigação de causas de fogos florestais ou da rede nacional de radiocomunicações? É que a lei actual é omissa nestes aspectos.
Outra preocupação nossa é sobre quem exercerá o comando do corpo de guardas florestais. Vai ser cada director regional ou um director-geral criado para gerir este corpo de guardas florestais?
Outra dúvida, sentida com enorme preocupação, é relativa à gestão do património florestal sob responsabilidade do Estado. A presente lei orgânica é incoerente com a proposta de lei de bases da floresta apresentada pelo Governo à Assembleia da República. Vão ser as direcções regionais a gerir as matas públicas ou um organismo a criar para o efeito?
E, sobre as matas comunitárias que representam uma área de 430 000 ha dos quais 203 000 estão arborizados em que a actual lei é completamente omissa, que vai fazer o Ministério da Agricultura?
Outros aspectos que consideramos relevantes. A propósito dos médicos veterinários municipais sentimos enorme preocupação quanto à sua ligação às autoridades sanitárias concelhias, às direcções regionais e à própria autarquia.

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O que vai fazer-se neste caso? O que diz a lei? O que preconiza a nova lei se vier a ser publicada? Como se processa o seu relacionamento com as novas direcções regionais e com a nova legislação?
Tanta critica foi feita no passado ao Governo anterior pela não independência técnica e de investigação dos serviços pecuários. Afinal, ouviram-se os serviços pecuários e manteve-se iguala sua estrutura. As leis orgânicas publicam-se mantendo o que era criticado no passado.
Onde está o diálogo tão proclamado? Ouviram-se os médicos veterinários mas as medidas foram publicadas na mesma; ouviram-se os serviços florestais, sabia-se que eram discordantes quanto à sua integração mas os mesmos foram integrados nas direcções regionais.
Na sequência das nossas discordâncias, vimos aqui apresentar, em conjunto, propostas de alteração que consagram a resolução de alguns dos problemas que acabamos de referir. Em jeito de súmula, seja-nos permitido destacar aqueles que consideramos de vital importância, ou seja, a autonomia dos serviços florestais com responsabilidade na gestão das matas públicas e dos baldios florestais a essa mesma instituição; a independência técnica dos serviços dos serviços veterinários assim como o alargamento das competências da Direcção-Geral de Fiscalização e Controlo da Qualidade Alimentar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Santo.

A Sr.ª Helena Santo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Após anos de cerradas críticas a uma governação distante do mundo rural e próxima de critérios ditados por Bruxelas, as quais vinham das mais diferentes entidades, seria obrigação deste Governo dar uma clara prioridade ao apoio ao mundo rural e ao sector primário em geral através também da implementação de um processo administrativo mais expedito e acessível ao público.
Todos sabemos que aqueles que mais precisam de ajuda e de apoio no mundo rural ficam na sua grande maioria impedidos de o conseguir tal é a teia e a burocracia criada à volta do Ministério da Agricultura e dos organismos que dele dependem. Mas, ao invés do que era esperado e seria desejável, o Ministério da Agricultura apresenta uma lei orgânica em que se assiste a uma longa e penosa viragem do Ministério para dentro de si próprio, digladiando-se através de desgastantes processos de conquista de poderes pessoais e numa lógica inversa quanto ao caminho correcto a dar ao sector primário.
Assim, para o Partido Popular, os diplomas cuja ratificação foi pedida partem desde logo de pressupostos errados pelo que consideramos haver, em primeiro lugar, uma precipitação legislativa. Por um lado, esta lei orgânica surge sem que o Governo PS, uma vez mais dando continuidade à governação do PSD em matéria agrícola, que tanto criticou, defina primeiro quais os objectivos da política agrícola nacional; e, por outro, procura-se com esta lei orgânica, como se diz no seu preâmbulo, adequar a estrutura orgânica do Ministério da Agricultura «às necessidades eventuais da futura regionalização administrativa» que não existe e, ao que tudo indica, não virá a existir, isto é, a lei orgânica do Ministério da Agricultura surge à margem da realidade mas virada para situações futuras que não se verificaram ainda e que não virão a verificar-se.

Mas há ainda precipitação legislativa e, diríamos mesmo, falta de coerência entre o programa do Governo e a sua acção quando se pretende extinguir o Instituto Florestal e se integram os serviços florestais nas direcções regionais, uma vez que, como é público, todos os relatórios de especialistas aconselham a uma coordenação e concentração dos serviços públicos numa autoridade florestal nacional.
Afinal, foi precisamente o Governo socialista que considerou a fileira florestal como grande prioridade da política agrícola que tomou esta iniciativa. Imaginemos o que aconteceria com o sector florestal se assim o não tivesse entendido...
Em conclusão, só pode vir a ocorrer aumento da despesa pública traduzida por um aumento do pessoal e da ineficiência dos recursos disponíveis sendo, consequentemente, cada vez maior o caos do sector primário.
Em segundo lugar, estes decretos-leis estabelecem uma confusão burocrática. Simultaneamente, é criada a Direcção-Geral de Florestas - trata-se apenas de um exemplo - que responde directamente ao Ministro e a quem competirá emitir normas funcionais que irão ser aplicadas pela Direcção dos Serviços Florestais das Direcções Regionais de Agricultura, que, por sua vez, também respondem directamente ao Ministro, não havendo qualquer ligação entre estas entidades. Essa ligação, daquilo que resulta da lei orgânica, só pode ser feita pelo Sr. Ministro, qual «moço de recados» entre as direcções regionais e a Direcção-Geral de Florestas e não é esta a postura que pugnamos para um Ministro.
Em terceiro lugar, assiste-se com esta lei orgânica a uma estatização crescente da agricultura portuguesa. Quando se esperava que uma revisão da lei orgânica do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas viesse transferir competências do poder central para as organizações de produtores, assiste-se precisamente ao inverso. Alteram-se apenas as relações de força entre a estrutura do Ministério mas não se concretiza a tão proclamada transferência de competências. E, quando são' conhecidos os resultados de anteriores acções de Direcções Regionais de Agricultura e a tendência dos países da União Europeia no sentido da privatização dos serviços públicos e na redução da intervenção do Estado, estranha-se que se adopte exactamente o caminho oposto. Talvez até não seja tão estranho quando sabemos que somos governados por um partido de esquerda. Só é pena que o Sr. Ministro não seja coerente com o que afirma e depois se propõe fazer.
Com estas alterações mais não se fez do que mudar os nomes dos institutos públicos para direcções gerais desorganizadas e totalmente desarticuladas entre si, engordando a componente política do Ministério e emagrecendo a componente técnica.
Assim sendo, o Grupo Parlamentar do Partido Popular propõe a alteração do Decreto-Lei n.º 74/96, de 18 de Junho, designadamente do seu artigo 12.º, de modo a permitir que algumas das competências do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas possam ser gradualmente transferidas para as organizações de produtores.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

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O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Pela nossa parte, importa referir duas questões prévias a este debate sobre o pedido de ratificação da lei orgânica do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas. Em primeiro lugar, do ponto de vista político e substancial, o nosso critério de apreciação da reestruturação orgânica do Ministério é conduzido por estas perguntas: a reestruturação serve melhor ou pior a agricultura portuguesa? A reestruturação torna melhores ou piores os serviços do Ministério ao serviço dos agricultores portugueses? Do ponto de vista formal, consideramos, como já o dissemos na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, que, sem prejuízo da nossa apreciação de fundo sobre as matérias, esta é uma matéria da competência exclusiva do Governo. Para o bem ou para o mal, é o Governo que tem de assumir as responsabilidades da sua organização interna.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é o Governo, mas a Administração!

O Orador: - Ó Sr. Deputado, leia a Constituição!
Quanto aos aspectos substanciais sobre esta matéria, sabemos que a motivação para esta ratificação são as questões florestais, que o resto vem por acréscimo, mas é sobre elas que queremos debruçar-nos.
Diz o Governo que, subjacente ao princípio do desaparecimento do instituto florestal, da sua passagem a direcção-geral e da sua integração na lógica global do funcionamento do Ministério da Agricultura, está uma filosofia de integração das diversas componentes da sua actividade. Estamos de acordo com este princípio. Só que o mesmo, nos termos e condições em que está a processar-se essa integração, corre sérios riscos de não ter tradução prática face à precipitação, à incoerência e às contradições da forma como a reestruturação está a ser feita, designadamente, como disse, nesta componente florestal.
Houve precipitação porque, quando se integra. um serviço ou um instituto com uma cultura de autonomia de 100 anos de existência, que não pode dissociar-se da experiência, dos conhecimentos e do relacionamento com os produtores ao longo da sua existência, tal deve deve ser feito com base num diálogo sério com o sector e com os profissionais que nele trabalham no sentido de essa integração poder potenciar todos os conhecimentos adquiridos pelo sector e não ser um elemento de amputação, de condicionamento ou até de liquidação da experiência e das potencialidades que o instituto florestal ganhou ao longo destes anos.
Omissões e contradições existem, algumas das quais já foram aqui referidas. O Governo fala na filosofia de integração mas, depois, numa estrutura que é central no apoio à concepção da política global do Ministério, que é o Gabinete de Planeamento, falta exactamente a componente florestal. O Governo fala nessa filosofia de integração mas depois cria uma empresa pública, cuja base é muito discutível legal e constitucionalmente, para gerir as matas públicas e comunitárias do pais, no que está em contradição com o princípio geral da filosofia de integração e de uma gestão conjunta da floresta em Portugal. Acresce que essa empresa pública, como o Sr. Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, aqui presente, sabe, se propõe fazer a gestão não só das matas do Estado mas das matas comunitárias, o que é claramente inconstitucional.

Vejo que o Sr. Secretário de Estado abana a cabeça em sinal de desacordo mas certamente tem experiência de que, quando falo, faço-o com conhecimento de causa. Tenho à minha frente o texto do projecto de estatutos bem como 0 relatório respectivo, que passo a ler: «Envolvente jurídica - os baldios, que representam a fatia mais significativa do conjunto das áreas geridas pelo Estado, ...» (mentira, pois não são geridas pelo Estado mas pelos compartes, como o Sr. Secretário de Estado sabe), «...dispõem de legislação própria de enquadramento. A assunção por um novo modelo de gestão empresarial das actuais responsabilidades do Estado, nas condições e nos termos do que diz a lei, deverá ser objecto de apreciação jurídica no sentido de se obter parecer sobre a compatibilidade do actual enquadramento jurídico dos baldios com a criação da empresa». Ou seja, são os próprios serviços do Ministério que reconhecem haver uma incongruência de fundo nesta matéria. Portanto, Sr. Secretário de Estado, não abane mais a cabeça porque a questão está em cima da mesa.
Acresce que não temos dúvidas de que os baldios, que, de acordo com a Constituição, são bens comunitários possuídos e geridos pelas comunidades, pelas assembleias de compartes, não cabem no processo de gestão do Estado. Esta é uma luta antiga e, Sr. Secretário de Estado, não queira reactivá-la porque, se os baldios passarem a ser geridos por uma empresa pública, terá o Governo de fazer frente, de novo, à luta das populações, o que penso ser evitável.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas colocam-se outras questões, aliás, pelos altos funcionários do Ministério, que passo a referir, até para obter esclarecimentos do Sr. Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural. De onde serão recortados, perguntam os directores regionais da agricultura, os recursos humanos para o funcionamento da referida empresa? Será no quadro do ex-Instituto Florestal ou fora desta estrutura? Em qualquer dos casos, aquela não será a solução mais adequada porque, no caso de o recrutamento ser realizado no quadro do pessoal do ex-Instituto Florestal, as direcções regionais ficariam com acrescidas dificuldades de pessoal para intervirem na área que agora lhes é atribuída. Por outro lado, dizem que os técnicos que possam ser recrutados do exterior não têm qualquer experiência nem conhecimento do sector pelo que sucederá o mesmo que no exemplo infeliz da ENDAC.
Por outro lado, a duplicação no terreno dos quadros públicos e dos meios financeiros que depois ficam à disposição dos serviços florestais públicos do Estado para gerirem as matas públicas constituem um conjunto de questões contraditórias com todo o processo e filosofia do Governo subjacente à sua reestruturação orgânica.
Há contradição com a própria lei de bases, Sr. Secretário de Estado. Como sabe, a lei de bases cria uma autoridade florestal nacional que tem de ter uma estrutura vertical. Ora, como é que isso se compatibiliza com esta integração e direcção-geral que os senhores criaram?
Estas são algumas questões, entre outras, que, se tivéssemos mais tempo, poderíamos enunciar, e que nos levam a ter sérias reservas e dúvidas sobre as fórmulas práticas que o Governo está a encontrar para a reestruturação orgânica do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
Termino dizendo, tal como no início, que, sendo favoráveis ao princípio da integração, temos sérias reservas,

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dúvidas e críticas quanto à forma como a mesma está a ser feita. Contudo, esta é uma matéria da exclusiva responsabilidade do Governo pelo que, para o bem e para o mal, será o Governo que, na altura oportuna, terá de responder perante o Parlamento sobre as soluções que adoptou para melhorar ou piorar os serviços que lhe compete prestar à agricultura e aos agricultores portugueses e é neste quadro que iremos comportar-nos em sede de especialidade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gavino Paixão.

O Sr. Gavino Paixão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As matérias que constituem objecto dos pedidos de ratificação n.os m 22 e 23/VII, relativos à Lei Orgânica do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas e à lei-quadro das direcções regionais, respectivamente, são da competência e da responsabilidade do Governo. No entanto, contrariando práticas de legislaturas anteriores, o PSD requereu a apreciação pela Assembleia da República dos Decretos-Leis n.os 74 e 75/96.
Por muito que custe aos Srs. Deputados do PSD, o Partido Socialista e o Governo da nova maioria cumprem rigorosamente aquilo que prometeram aos cidadãos portugueses.

Aplausos do PS.

Vejamos: no programa eleitoral do Partido Socialista defendemos a valorização e desenvolvimento da fileira florestal como primeira prioridade da política agrícola.

Protestos do PSD.

Como medida de valorização e desenvolvimento da fileira florestal, entre outros, prevíamos a publicação de uma lei-quadro do desenvolvimento florestal,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... e como medida de reformulação do quadro institucional, ajustar a estrutura do Ministério da Agricultura em função dos novos objectivos da política agrícola nacional.
No Programa do Governo, pasme-se, defendemos as mesmas soluções e, cúmulo dos cúmulos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, ao arrepio das teses «alaranjadas», o Governo da nova maioria está a cumprir aquilo que prometeu aos portugueses!

Aplausos do PS.

Os argumentos invocados pelo PSD nos pedidos de ratificação consubstanciam e confirmam a falta de ideias e a pouca importância que os governos do PSD atribuíram à floresta portuguesa. Alegam VV. Exas. que a Lei Orgânica do Ministério da Agricultura «contraria as posições e conclusões resultantes de análises e estudos, designadamente das conclusões de um debate realizado em 1981».

Risos do PS.

E ainda que o diploma aprovado pelo Governo coloca em risco a necessidade de racionalizar a gestão dos meios técnicos, financeiros e humanos.

Quanto à lei-quadro das direcções regionais, VV. Exas. argumentam que a integração funcional e hierárquica, em matéria florestal, não é pacifica para a generalidade dos agentes económicos e especialistas. dedicados ao sector florestal nacional. Todavia, se dúvidas houvesse quanto ao acerto da estruturação dos serviços levado a efeito pelo Governo da nova maioria, a audição parlamentar iniciada em Setembro veio de forma concludente e séria comprovar a fragilidade dos argumentos do PSD e registar a validade das medidas desencadeadas pelo Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Tal audição veio, de forma praticamente unanime por parte dos seus intervenientes, sustentar o acerto da estruturação em causa, sendo lícito concluir-se, dos testemunhos então ouvidos, que as anteriores políticas não serviram a necessidade urgente em alterar o status quo, nem atenderam às expectativas legítimas criadas por essa lei orgânica, à importância da fusão dos serviços florestais nas regiões agrárias e ao empenho do Sr. Ministro e do Ministério perante as questões da floresta.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o PSD teima em não se ajustar à sua nova condição de partido minoritário.

Aplausos do PS.

O PSD dispôs de mais de uma década para imprimir à fileira florestal nacional, uma nova, necessária e indispensável política de desenvolvimento. Não o fez, ou porque não foi capaz, ou porque não quis, ou porque não pôde por motivos que só o PSD poderá aqui justificar!

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, felizmente, nem todos os partidos da oposição têm vindo a partilhar essa visão e postura do PSD,...

Vozes do PSD: - O PCP!

O Orador: -.. sublinhando-se com agrado as atitudes construtivas patenteadas, sobre essa matéria, por outras forças políticas.

Vozes do PSD: - Quais?

O Orador: - Assim, esperamos uma contribuição de todos aqueles que, de forma útil, procuram as melhores soluções para a floresta. A floresta agradece é nós também.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Duarte.

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Gavino Paixão, certamente por ter trazido 0 discurso já escrito, não teve oportunidade de equacionar as propostas de alteração do PSD, e do próprio Partido Popular, a estes decretos-leis. Foi, pois, um lapso não ter conseguido anexá-las.
Sobre a questão da competência da Assembleia da República, gostaria de dizer que todos os partidos políticos tiveram o direito de recorrer da admissibilidade pela Mesa desta nossa proposta de lei. Como não o fizeram na

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altura oportuna, não vamos aqui inventar outros mecanismos ou bloqueios regimentais e constitucionais que possam impedir que encontremos as soluções mais adequadas para que os agricultores e todos os produtores agrícolas nacionais possam ter, da parte do Estado, a melhor qualidade na prestação de serviços. É esse o nosso objectivo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Perguntava ainda ao Sr. Deputado Gavino Paixão se assistiu a uma reunião da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, realizada em Junho, com a presença do Sr. Ministro, onde foi equacionado, em termos de incompatibilidade, o facto de o planeamento florestal estar numa direcção-geral diferente daquela onde figurava a existência de um direito de planeamento e a política agro-alimentar. É que, perante isso, o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas disse tratar-se de um lapso, só detectado depois da publicação do decreto-lei.

Vozes do PSD: - Pasme-se!

O Orador: - Sr. Deputado, não quer ajudar o Governo a encontrar uma estrutura do Ministério que possa ir de encontro aos objectivos nacionais e do próprio Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas? Então, acompanhe-nos para que, em sede de Comissão, se possam equacionar as melhores soluções. É nesse sentido que compreendemos a eventual disponibilidade que, certamente, irá manifestar!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Gavino Paixão.

O Sr. Gavino Paixão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Duarte, quanto ao seu primeiro reparo, em relação ao meu discurso escrito, na próxima vez terei o cuidado de distribuir uma cópia antes de o proferir, para que o Sr. Deputado possa preparar, de forma mais cuidada, o seu pedido de esclarecimento!

Aplausos do PS.

Efectivamente, o Sr. Deputado não ouviu os argumentos e os contra-argumentos que aqui produzi.
Quanto a ser ou não escrito, apenas quero recordar que os senhores apresentaram um requerimento em Junho, sabendo perfeitamente que se iria realizar uma audição parlamentar sobre as florestas mas, ao contrário do que esperavam, todas as pessoas que participaram nessa audição não defenderam as vossas teses! E isso os senhores não sabiam em Junho!
Portanto, em Setembro provou-se que os argumentos que os senhores desfilaram não faziam sentido.

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr. Deputado, permite-me que o interrompa?

O Orador: - Mais tarde, Sr. Deputado.
Quanto a um eventual bloqueio por parte do Grupo Parlamentar do Partido Socialista em relação à lei orgânica, o Sr. Deputado Carlos Duarte, com certeza, não irá comparar os argumentos que aqui estamos a expor com as forças de bloqueio que os senhores utilizavam na anterior legislatura!

Vozes do PSD: - Outra vez as forças de bloqueio!

O Orador: - Quando tinham maioria absoluta os senhores nunca permitiram pedidos de ratificação!

Aplausos do PS.

Antes, os senhores nunca se lembraram de apresentar pedidos de ratificação, mas já se lembram de o fazer com o Governo da nova maioria!

Aplausos do PS.
Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural.

O Sr. Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural (Luís Capoulas Santos): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me que comece por saudá-los e, também, por justificar a ausência do Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas, que voa neste momento para Bruxelas e que pediu que transmitisse aqui que muito gostaria de participar neste debate. Quero, desde já, manifestar a minha satisfação por o poder fazer, porque lembro-me perfeitamente de, em 1993, aquando da aprovação de leis orgânicas do Ministério da Agricultura do então governo da maioria do PSD, termos tentado promover aqui um debate semelhante e, nessa altura, todos os Srs. Deputados - alguns dos quais tenho o prazer de rever agora aqui, noutra posição se bateram intransigentemente pela inconstitucionalidade de tal possibilidade ...

. O Sr. Gavino Paixão (PS): - Já esqueceram!

O Orador: - ... e inviabilizaram por completo a realização do debate, posição a que nós, na altura, acedemos de boa vontade.
Registo, por isso, com satisfação, essa mudança de opinião, que é a demonstração de que a cura de oposição faz mal, particularmente a quem, em determinadas circunstâncias, fez da arrogância a sua bandeira principal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas é sobre a orgânica do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas que vamos falar. Gostaria, por isso, de explicar-vos, porque me é dada oportunidade para isso, o que é que está, de facto, em causa com esta mudança profunda que estamos a levar a cabo no Ministério.
Sei que a mudança dói muito, dói mesmo muitíssimo, àqueles que muito gostariam que tudo ficasse na mesma.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Bem observado!

O Orador: - Pelo que me é dado ver, a partir da composição da bancada do PSD, este pedido de ratificação suscitou pouco entusiasmo, mas vou passar a explicar-vos o que está em causa.
Em primeiro lugar, retecnicizar e desburocratizar o Ministério. Para tanto, eliminámos as estruturas gigantescas, os mega-institutos que foram constituídos e criámos direcções-gerais técnicas, ágeis, simples e, repito, profun

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damente tecnicizadas. Ao mesmo tempo, estamos a preparar uma lei-quadro de transferência de funções para o movimento associativo dos agricultores, e levámos essa transferência tão longe - coisa que os senhores jamais poderiam ter imaginado! - que hoje aquilo que o movimento associativo faz, e fá-lo sem nenhum tipo de preconceitos, já é comum a todas as organizações e confederações, sem qualquer tipo de marginalização.
Em segundo lugar, somos coerentes com o nosso discurso da regionalização. Separámos funções, organismos de concepção de organismos de execução, e tivemos a coragem de pôr fim a 20 anos de situação anómala que se vivia na Direcção-Geral das Florestas e que os senhores jamais tiveram coragem de enfrentar! Vou dar-lhe dois ou três exemplos.

Aplausos do PS.

A Direcção-Geral das Florestas, o ex-Instituto Florestal tinha no seu seio os guardas florestais e estes não fiscalizavam a caça ao domingo. Sabem porquê, Srs. Deputados? Porque não tinham viaturas! Neste momento, e uma vez integrados nas direcções-regionais, ao domingo, quando estas estão fechadas, por cada guarda florestal há cinco ou seis viaturas disponíveis.

Aplausos do PS.

Com a Direcção-Geral das Florestas, os Srs. Deputados imaginam quantas centenas de funcionários da sede central estavam destacados anos a fio, a vencer ajudas de custo todos os meses, para fazerem aquilo que pode ser feito pelos técnicos das direcções regionais com muito menores custos para o Estado? Dezenas e dezenas de funcionários!
Os Srs. Deputados sabem quantas instalações existem em duplicado, em triplicado e em quadriplicado por esse país fora? Estive há poucos dias em Macedo de Cavaleiros, em quatro serviços distintos do Ministério da Agricultura, alguns deles pagando dezenas de contos de rendas por mês. Sabem quantos gabinetes estão vazios na zona agrária da Direcção Regional de Agricultura? Mais do 'que os suficientes para instalar o dobro dos serviços que estavam disseminados na mesma cidade. E isto acontece em Moura, em S. Pedro do Sul, em Cabeceiras de Basto.
Srs. Deputados do PSD, a situação com a qual coexistimos, sob vossa responsabilidade, durante mais de duas décadas, é completamente anómala e imoral e, finalmente, tivemos a coragem de lhe pôr cobro.
Mas vamos fazer mais, Srs. Deputados, vamos inovar: criámos uma Direcção-Geral de Fiscalização e Controlo, para fiscalizar as nossas estradas, já que não podemos fiscalizar as nossas fronteiras, e, dessa forma, defendermos os agricultores portugueses do modo que os senhores nunca tiveram coragem de fazer, lançando-os, por essa razão, numa situação muito difícil nos últimos anos.
Há agora uma Direcção-Geral de Fiscalização, existem direcções de serviços de fiscalização nas direcções regionais e, mais do que isso, regionalizámos ao ponto de extinguir 52 zonas agrárias para criar 305. Neste momento, vão passar a existir técnicos em todos os concelhos, com áreas geográficas definidas, para impedir o excesso de despesismo,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - porque, a partir de agora, cada agricultor terá o seu médico de família, cada agricultor terá um técnico com uma área restrita para o informar e apoiar, em detrimento das mega-estruturas intermédias que existiram nos últimos anos.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Mas vamos fazer muito mais, Srs. Deputados! Vamos intensificar a defesa da saúde pública, para o que já criámos uma Direcção-Geral de Veterinária - uma autoridade veterinária nacional -, estamos a criar um sistema e uma rede de laboratórios que os senhores deixaram chegar a situações inadmissíveis de infuncionalidade. A saúde pública, de que houve um triste exemplo há dois anos atrás, com o caso das vacas loucas, é mais uma situação que está, neste momento, a ser resolvida: temos um laboratório nacional, com um estatuto e subdirector-geral, ao qual vão ser acoplados todos os laboratórios regionais. Para além disso, criámos a Direcção-Geral de Protecção das Culturas, porque a sanidade vegetal também tem reflexos na saúde pública.
Mais ainda, Srs. Deputados: reduzimos as chefias das direcções centrais, nos lugares de topo, em cerca de 12 e vamos reduzir mais de 30 lugares de chefia nas direcções regionais.

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Trata-se de uma revolução tranquila pela qual o Ministério da Agricultura está a passar, para servir os agricultores, porque é para servir os agricultores que este Governo governa e não para servir cliques ou lobbies de interesses instalados há décadas no Ministério, e, que os senhores montaram e alimentaram.

Aplausos do PS.

Não pactuaremos com a alimentação dos lobbies e dos conjuntos de interesses que os senhores montaram e mantiveram e que agora não têm sequer coragem de denunciar, mesmo na oposição.

Vozes do PS: - Isto é muito grave!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Por tudo isto,, Srs. Deputados, agradeço que tenham permitido este debate, o Governo estará à disposição para debater esta matéria todas as vezes que VV. Exas. entenderem, em sede de Plenário ou de comissão, porque na agricultura - podem crer! - a mudança está a operar-se.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Estão inscritos, para pedirem esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, os Srs. Deputados Carlos Duarte e Gonçalo Ribeiro da Costa. Antes, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, para fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, estou surpreendido com a intervenção do Sr. Secretário de Estado...

Vozes do PSD: - Estamos todos!

O Orador: - ... e a minha interpelação é uma interpelação propriamente dita, porque, como dissemos ini-

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cialmente, independentemente das nossas críticas de fundo à matéria substancial das políticas, do ponto de vista formal e constitucional, esta matéria era da exclusiva competência do Governo. Nesse sentido, assim nos comportámos em Plenário e nos pretendíamos comportar em comissão.
Ora, na medida em que o Sr. Secretário de Estado veio aqui dizer que se congratula por este debate, que o Governo está de acordo com este debate e que tem interesse nele, então, Sr. Presidente, quero anunciar à Câmara, através do então, Presidente, que nos vemos confrontados com a necessidade de entregar as propostas de alteração que inicialmente tínhamos previsto.

Vozes do PCP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, as propostas serão aceites nos termos em que o foram as restantes.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Sr. Presidente, tive a felicidade de ouvir o início da intervenção do Sr. Secretário de Estado Capoulas Santos ainda no meu gabinete e creio que há aqui uma interpretação errónea - permita-me que o diga, Sr. Deputado Lino de Carvalho -, visto que o sentido desta questão é claro.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Olhe que não, Sr. Secretário de Estado!

O Orador: - Uma coisa é debatermos uma matéria, outra coisa é a posição que o Governo deixou clara, quer no momento em que foi pedida a ratificação, quer em sucessivas reuniões da conferência de líderes. E o Governo defendeu claramente que a matéria das leis orgânicas é da sua exclusiva competência e será inconstitucional qualquer iniciativa legislativa nesse domínio, aprovada pela Assembleia da República.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - A Lei Orgânica do Governo, e só a do Governo!

O Orador: - Sobre isso, não pode restar a menor das dúvidas.
De qualquer forma, naturalmente, o Governo não se furta ao debate político. Houve requerimentos sobre esta matéria a que o Governo respondeu e se tivesse havido sessões de perguntas ao Governo o Governo teria respondido nessa sede. Estamos hoje aqui apenas pelo respeito devido ao Sr. Presidente da Assembleia da República, que entendeu, no seu critério, que não é o nosso, que esta ratificação deveria ter sido admitida.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado, creio que o seu pensamento está percebido...

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Que não haja a menor das dúvidas - e creio que não se pode retirar essa ilação das palavras do Sr. Secretário de Estado Capoulas Santos - que o que quis foi sublinhar a contradição de quem tinha uma posição quando era maioria e agora dá o dito por não dito para fazer oposição a qualquer custo.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Que feio, Sr. Secretário de Estado!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para fazer uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, devo confessar que, se o Sr. Deputado Lino de Carvalho ficou surpreendido com a intervenção do Sr. Secretário de Estado Capoulas Santos, fiquei agora surpreendido com a intervenção do Sr. Secretário de Estado António Costa, pelo insólito da interpelação que dirigiu à Mesa.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Ainda bem que nos conseguimos surpreender uns aos outros!

O Orador: - Pelos vistos, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares não concorda com a interpretação, que me parece, aliás, bastante razoável - basta ver as actas e aquilo que o Sr. Secretário de Estado Capoulas Santos disse - e que justifica a inversão de posição do PCP.
Mas, enfim, esse é um problema para o PCP analisar, em função daquilo que entende que o Governo terá dito ou não; para nós, é claro aquilo que o Governo disse, pela voz do Sr. Secretário de Estado.
Relativamente às questões formais suscitadas pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, nem sequer vou discutir se há ou não uma grande confusão na cabeça do Sr. Secretário de Estado entre a Lei Orgânica do Governo - essa, sim, manifestamente da competência exclusiva do Governo - e as leis orgânicas dos serviços da Administração Pública, que são coisas diferentes, o que me parece é que se alguém, nesta Casa, tinha dúvidas sobre a legitimidade da aceitação a debate da ratificação que, em devido tempo, foi apresentada deveria ter recorrido da decisão de S. Ex.ª o Sr. Presidente da Assembleia da República.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como essa questão, em devido tempo, não foi suscitada por ninguém, julgo que está dirimida e não faz qualquer sentido tentar confundir o essencial desta discussão política com questões formais colocadas fora de tempo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - No mesmo espírito com que foram feitas as anteriores interpelações à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão, também para fazer uma interpelação.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço desculpa pela circunstância desta interpelação e faço-a apenas para que não fique convalidada pelo silêncio a interpretação feita pelo Sr. Deputado Carlos Coelho.
A circunstância de não ter sido interposto recurso do acto de admissão da iniciativa do PSD não significou que não tivéssemos considerado que essa iniciativa estava ferida de inconstitucionalidade, significou, isso sim, que não nos quisemos furtar também ao debate político...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Oh!...

O Orador: - ... e que, para além das razões de inconstitucionalidade, tínhamos todo o gosto em aprovei-

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tar a circunstância para fazer um debate de incidência política acerca de orientações na área do Ministério da Agricultura.

Risos do PSD.

Neste sentido, mantemos a nossa observação acerca da natureza inconstitucional da iniciativa do PSI) mas, acima disso e para além disso, temos todo o gosto em debater linhas de orientação política aqui trazidas pelo Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, agora vou ter todo o gosto em dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Duarte, que viu adiado por 10 minutos o seu direito de questionar o Sr. Secretário de Estado.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, não vou fazer perguntas num tom comicieiro, ao contrário do que fez V. Ex.ª, que falou aqui num tom exaltado, pensando que a forma poderia esconder a fragilidade dos argumentos e do conteúdo dessa lei.
Em primeiro lugar, o Sr. Secretário de Estado teve a ousadia de vir aqui falar nos lobbies de interesses e de acusar alguém de, no passado, ter compensado esses lobbies, quando, no dia 5 de Maio, nomeou o Sr. Presidente do Sindicato dos Médicos Veterinários uma pessoa sem qualquer ligação à Administração Pública -, à margem do Director-Geral de Veterinária, para representar Portugal na Organização Internacional de Epizootias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Qual a coerência desta posição, Sr. Secretário de Estado?!...

O Sr. Secretário de Estado veio aqui anunciar que cada agricultor irá ter um médico veterinário como médico de família?! Sr. Secretário de Estado, em Portugal, estão constituídos 150 agrupamentos de defesa sanitária, que fazem o tratamento e a erradicação de doenças em cerca de 1,3 milhões de animais e, se é verdade que, até agora, o Governo garantiu o financiamento desses agrupamentos, o certo é que o Governo de V. Ex.ª cortou, este ano, 3 milhões de contos de financiamento, colocando em ruptura financeira os agrupamentos de defesa sanitária e impedindo que se continue a trabalhar no sentido de que Portugal possa ser indemne à maior parte das doenças.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Com. que autoridade isto se faz?! Com que meios é que vem garantir a esta Assembleia, aqui e agora, que cada agricultor irá ter um médico veterinário para os seus animais?! Iremos ver, em sede de Orçamento do Estado, que meios financeiros, que logística irá existir para garantir essa promessa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Secretário de Estado falou na Direcção-Geral de Fiscalização.

Vozes do PSD: - Das estradas!...

O Orador: - Pergunto: sabe V. Ex.ª e que até final de Junho se fazia o controlo das fábricas de rações e de todos os tratamentos de subprodutos? Por que razão é que a partir do dia 30 de Junho não foi feita nenhuma inspecção? Porque não há lei orgânica da Direcção-Geral de Fiscalização. V. Ex.ª publicou a Lei-Quadro das Direcções Regionais no dia 18 de Junho e até hoje não apresentou qualquer proposta de lei orgânica interna, havendo um vazio de competências.
Por que é que a Direcção-Geral de Fiscalização enviou para às tribunais civis um conjunto de contra-ordenações e os tribunais as devolveram? Porque não há competências delegadas nessa direcção-geral.
Que eficácia da Administração é esta?! Que confusão e desorganização é esta?! Que inoperância é esta?!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em vez de emprestar tanto calor a este debate, Sr. Secretário de Estado, devia ter emprestado mais empenho à concretização das leis orgânicas, dando operacionalidade às acções de fiscalização e controlo dos produtos que entram em Portugal e substância ao seu discurso político.
Há dois meses atrás o Sr. Secretário de Estado também anunciou um Serviço Nacional de Caça e Pesca. No dia seguinte à saída dessa notícia no jornal, o Sr. Ministro da Agricultura esteve aqui e perguntámos-lhe sobre esse serviço, uma vez que não estava previsto na lei orgânica. A resposta do Sr. Ministro da Agricultura foi no seguinte sentido: essa afirmação não tem qualquer fundamento.

Protestos do PS.

Sr. Secretário de Estado, lamentamos que hoje não tenha estado cá o Sr. Ministro, para que, eventualmente, pudesse ser o interlocutor. Foi lamentável que o Sr. Ministro não o tivesse trazido a si à Assembleia da
República, quando se discutiu a lei orgânica, para. o Governo ter uma só voz.
Por outro lado, Sr. Secretário de Estado, não havendo até agora nenhuma lei orgânica de nenhuma direcção-geral, de nenhuma direcção regional, como é que V. Ex.ª nomeia directores de serviços para a Direcção Regional
do Ribatejo e Oeste, para a Direcção Regional de Trás-os-Montes ou do Alentejo e não nomeia as restantes chefias para as outras direcções regionais ou gerais e nomeia estas chefias sem base legal e sem lei orgânica?!
Sr. Secretário de Estado, desafio-o a dotar de imediato o serviço da Administração Pública da sua hierarquia normal e a pô-la a funcionar de forma a que os agricultores possam ter o benefício da acção do Governo. É muito mau
o que se está a passar a nível dos abates sanitários, pois o Sr. Secretário de Estado fez um despacho, que produz efeitos retroactivos a 9 de Maio e em que se diz que os agricultores vão ter uma indemnização actualizada do abate
sanitário para a brucelose. Mas até hoje os vários focos dessas doenças têm vindo a aumentar na Murtosa, em Trás-os-Montes e Entre Douro e Minho e os agricultores têm de esperar que os efeitos retroactivos do seu despacho de Maio se produzam.
Por favor, Sr. Secretário de Estado, clarifique essas situações de forma a que os agricultores não se sintam enganados, como acontece neste momento. E, perante Assembleia da República, disponibilize-se para, em sede de Comissão Parlamentar de Agricultura, Desenvolvimen-

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to Rural e Pescas, construirmos uma melhor orgânica, de forma a prestigiar a Assembleia da República e que a agricultura nacional possa ter uma administração pública eficaz.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, tive informação de que o Sr. Secretário de Estado responderá em conjunto a todos os pedidos de esclarecimento.
Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, o senhor anunciou aqui como uma grande medida a extinção dos mega-institutos e a criação das direcções-gerais mas quer-nos parecer que estamos apenas perante uma mudança de nome, uma mudança de terminologia. Senão, esclareça a Assembleia da República: o que vai fazer aos funcionários dos mega-institutos, vai despedi-los ou vai transferi-los para futuras mega-direcções-gerais? O que é que vai fazer aos edifícios, ao enorme parque automóvel, aos equipamentos, a tudo o que estava afecto aos mega-institutos? Diga-nos se os vai vender, se vai desonerar o Estado de todas essas despesas ou, se pelo contrário, vai ter de reforçar o já vasto parque automóvel do Ministério da Agricultura? Vai continuar a manter a política despesista do Ministério da Agricultura em equipamentos, em automóveis e em edifícios que, pelos vistos, passarão a ser inúteis?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural,

O Sr. Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero começar por esclarecer o Sr. Deputado Lino de Carvalho, concedendo-lhe o direito de interpretar as minhas intervenções da forma que muito bem lhe aprouver. Todavia, felizmente, as intervenções estão gravadas e, portanto, podem ser verificadas a posteriori.
Ora, comecei exactamente a minha intervenção, manifestando a minha surpresa pela incoerência do PSD, que reiterou «a pés juntos», há três anos atrás, que a discussão deste tipo de questões era inconstitucional, tendo, na altura, inviabilizado a discussão. Aliás, sendo intenção do PS requerer essa discussão, acatou de bom grado concordou com a então Mesa da Assembleia, considerando, depois de ter ponderado atentamente sobre o assunto, que era manifestamente inconstitucional a discussão desta matéria. Disse-o nessa altura, reiterei-o no inicio deste debate, confirmo-o agora, se bem que o Sr. Deputado possa fazer das minhas declarações a interpretação que muito bem entender.
Quanto às questões colocadas, de facto, fico perplexo quando oiço responsáveis do PSD, da área agrícola, que curiosamente estiveram calados durante um ano - é a primeira vez que os oiço -, levantar uma pequena voz relativamente a uma iniciativa do Ministério da Agricultura.

Vozes do PSD: - Isso é falso!

O Orador: - Até tenho lamentado não haver oposição - disse-o mesmo há poucos dias. Temos vindo a tratar, com melindre, com bisturi, um dos mais explosivos dossiers, que é a questão da caça. Fizemos uma lei nova, inteirinha, ninguém do PSD levantou uma palavra a contestar o que quer que fosse, é a primeira vez que se contesta uma posição do Ministério da Agricultura, e logo quanto à orgânica e quando se demonstra à saciedade que ela visa acabar com lugares de chefia, visa flexibilizar os serviços, generalizar o apoio ao agricultor, criando mais de 300 zonas agrárias em detrimento das 52, poupando despesas ao Estado, racionalizando meios. E vem agora o Sr. Deputado Carlos Duarte levantar a questão. Mas eu, no seu lugar, teria muito, cuidado ao abrir a boca sobre esta matéria, especialmente quando fala dos agrupamentos de defesa sanitária...

Protestos do PSD.

..., .pois sabe muito bem que foi numa situação quase de «beco sem saída» que colocou os produtores de carne deste país. O senhor sabe isso perfeitamente. Portanto, sobre esta matéria, gostaria de não ser obrigado a dar esclarecimentos muito pormenorizados sobre esta questão...

Vozes do PSD: - Faça, faça!

O Orador: - Os senhores têm o descaramento de dizer que há dois meses que este Governo não faz fiscalização sobre as rações quando, ao que se sabe, nunca isso tinha acontecido antes! Aliás, foi a primeira vez, em Julho deste ano, que foram divulgados, tornados públicos, resultados sobre a composição das rações de alimentos compostos para animais. Que se saiba, nunca antes alguém tinha tomado uma posição nesses termos.
Quando fala agora da forma como foram nomeados os directores de serviço das direcções regionais e não o foram os dos serviços centrais, essa é uma questão que demonstra, não direi só uma tamanha ignorância, mas, pura e simplesmente, que o senhor não leu as leis orgânicas.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Deputado Lino de Carvalho pediu a palavra...

O Sr. Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural: - Sr. Presidente, peço desculpa, mas ainda não respondi ao Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, pensei que tinha terminado.
Faça favor de continuar.

O Orador: - Não houve qualquer intenção da minha parte, Sr. Deputado, mas, como deve calcular, tenho uma fixação maior para a bancada do PSD.

Vozes do PSD: - Isso já se sabia!

O Orador: - Sr. Deputado do PSD, ainda agora, ao verificar uma nota de pé de página que tinha tomado - e ainda sobre os abates sanitários -,lembro-lhe, por exemplo, que, relativamente aos abates da BSE, com cujo atraso

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o senhor agora está tão preocupado, estamos a pagá-los no próprio dia, embora tenha encontrado casos pendentes do seu governo com três anos de atraso.
Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, aquilo que estamos a fazer é racionalizar os serviços do Ministério, reduzindo o número de chefias, tecnicizando os diversos departamentos, a partir naturalmente dos meios humanos que existem, criando incentivos para que estes meios humanos possam reforçar os serviços locais, quer nos serviços centrais das regiões quer, sobretudo, ao nível dos concelhos.
Estamos apenas aqui a discutir a lei-quadro do Ministério da Agricultura e das direcções regionais. As leis orgânicas de cada um destes departamentos estão, neste momento, em fase de ultimação e o senhor irá verificar que, de facto, elas traduzir-se-ão numa redução significativa da burocracia, num aumento da operacionalidade e ainda numa redução significativa de custos, que, repito, se traduz em menos 12 lugares de directores e subdirectores-gerais ao nível central e em cerca de 30 chefias ao nível de divisão e director de serviço nas direcções regionais. Fique atento, porque terá, com os diplomas orgânicos de cada um dos departamentos, a muito curto prazo, respostas que certamente o surpreenderão pela positiva.
Ainda relativamente ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, há pouco, não respondi à questão da alegada, da hipotética, empresa pública para gerir as matas nacionais, porque não é isso que está aqui hoje em discussão. Esse é apenas um projecto, uma intenção que está a ser estudada, porque o Ministério quer orientar os serviços do Estado para o apoio à floresta privada, que corresponde a 85 % da nossa área florestal, e quer gerir muito melhor do que o fez o antigo instituto florestal, no passado, os cerca de 70 000 ha das matas públicas e, obviamente, exercer alguma coordenação sem interferir na legislação própria sobre os baldios, pois temos muito respeito pelas comunidades que, de acordo com a lei, os regem o melhor possível, seguramente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - E mais, o Sr. Secretário de Estado teve a infelicidade de dizer à bancada do Partido Popular que tinha uma «fixação pela bancada do PSD». Faz mal, Sr. Secretário de Estado, porque ' o senhor devia estar aí em nome do Governo do País e não a atacar ninguém. Portanto, Sr. Secretário de Estado, se o Governo tem feito algum dia más figuras neste Hemiciclo, ó senhor deu-lhes um mau exemplo e esperemos que não repita em nome do prestígio desta Assembleia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural.

O Sr. Secretário de Estado da. Agricultura e do Desenvolvimento Rural: - Sr. Presidente, só gostaria de dizer à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite que por muito má figura e por muito má representação do Governo de Portugal que eu possa ter feito, aqui hoje, não chegarei certamente aos calcanhares da má figura que a senhora fez enquanto representante do Governo de Portugal quando foi Ministra da Educação.

Aplausos do PS.

Protestos dos Deputados do PSD, batendo com os punhos nas bancadas.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, o «material» tem sempre razão, portanto, não vale a pena estar a...

O Orador: - O que eu quis dizer ao Sr. Deputado do PSD, quando ele pós em causa o apoio deste Governo à política de sanidade animal, aos agrupamentos de defesa sanitária...

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - E o que é que isso tem a ver com o que eu disse?!

O Orador: - O que queria dizer, Sr.ª Deputada - e terei muito gosto em esclarecê-la -, é que este Governo e eu próprio verificámos que aquilo que sobre esta matéria estava transposto nas portarias, na legislação. portuguesa, muito pouco tinha a ver com o que os senhores negociaram em Bruxelas, e corremos o risco, não fôra a posição diplomática nos círculos comunitários, não fôra a atitude deste Governo, porventura, de que muitos milhões de contos, neste momento, tivessem de ser devolvidos pelos produtores às autoridades comunitárias..
Foi por isso que eu lhe disse que, sobre esta matéria, o PSD e os seus responsáveis não têm a mais pequena autoridade moral para levantar a voz, quanto mais para criticar quem está, e bem, a tentar resolver os problemas que os senhores criaram aos agricultores portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, pede a palavra para que efeito?

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, para defesa da honra da minha bancada, já que a minha honra pessoal é defendida pela minha actuação pessoal e não por palavras que alguém possa dirigir.

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O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, vamos reflectir um pouco sobre isto: a regra que existe não permite sucessivas defesas da honra da bancada. Compreendo, subjectivamente, a sua razão, mas peço-lhe que compreenda a minha necessidade de gerir a Assembleia porque, se isso fosse possível, um debate poderia nunca mais acabar. Portanto, peço a sua cooperação no sentido de ficarmos por aqui, neste ponto, e agradeço-lhe.
Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, há pouco, quando fiz uma interpelação, condicionei uma decisão da bancada às explicações do Governo e, por uma questão de lealdade, queria dar agora, sob a mesma figura da interpelação, uma informação sobre essa decisão.
Continuamos a considerar bastante desadequados e menos felizes os termos com que este debate foi introduzido pelo Sr. Secretário de Estado, tal como consideramos desadequada e inoportuna a forma como ele foi desenvolvido. Quando quisermos um debate sobre a política agrícola do Governo, faremos o respectivo requerimento, ao, abrigo do Regimento da Assembleia. Contudo, quero dizer que aceitamos as explicações do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares e não entregaremos as propostas de alterações, sem prejuízo, sublinho, da nossa posição profundamente crítica em relação aos termos em que esta restruturação está a ser feita.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Está dada a informação.
Srs. Deputados, creio que podemos concluir este debate. Foram apresentadas propostas de alteração, por parte da bancada do PSD e da bancada do CDS-PP. Não há lugar a qualquer votação neste momento e, assim, as propostas de alteração baixam à Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, para a devida consideração. Está encerrado este debate.

Passamos agora ao último ponto da ordem de trabalhos, a ratificação n.º 24/VII - Decreto-Lei n.º 84/96, de 29 de Junho, que define as condições legais aplicáveis à concessão de apoios por parte do Estado ao sector da comunicação social, bem como à coordenação e à distribuição da publicidade do Estado, em especial pelas regionais e pela imprensa regional (PCP).
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, efectivamente, a matéria que, neste momento, passamos a debater, tem a ver com o decreto-lei relativo às condições legais aplicáveis à concessão de apoios por parte do Estado ao sector da comunicação social bem como à coordenação e à distribuição da publicidade do Estado, em especial pelas rádios locais e regionais e pela imprensa regional.
Esta é uma matéria que reputamos de relevante e o facto de chamarmos este decreto-lei à ratificação não tem a ver com qualquer contestação ao apoio a conferir, por parte do Estado, aos órgãos de comunicação social em geral e muito menos à imprensa regional e às rádios locais, que pensamos serem, de facto, órgãos de comunicação social que devem merecer todo o apoio possível por parte do Estado, na medida em que são estruturas de grande importância social e economicamente com maiores debilidades. A questão não é essa.
A questão é que, durante muitos anos, tivemos oportunidade de criticar aqui os governos do PSD pelo facto de não existir legislação enquadradora dos apoios a conferir pelo Estado à comunicação social e esses apoios serem decididos através de portarias governamentais, pelo que o governo mantinha na sua discricionaridade a definição dos critérios de apoio à comunicação social, facto que sempre contestámos e que o PS também, enquanto não foi governo, sempre contestou.
Daí estranharmos que o Governo tenha vindo a aprovar um decreto-lei em que se limita a dizer que os apoios a conceder pelo Estado à comunicação social e a coordenação da distribuição da publicidade institucional pelas rádios locais e pela imprensa regional são definidos por portarias governamentais. Evidentemente que não podemos aceitar isso.
Naturalmente que não defendemos que seja outra entidade que não o Governo, através dos seus serviços, a decidir da atribuição em concreto dos apoios, mas pensamos que é importante que a definição dos critérios gerais seja feita por decreto-lei para que, se a Assembleia da República assim o entender (o que não quer dizer que o faça, mas se assim o entender), possa chamar aqui o debate sobre os critérios gerais a definir para o apoio do Estado à comunicação social. É apenas esta a questão que colocamos.
Assim, apresentámos propostas no sentido de as referências que este decreto-lei faz às portarias governamentais sejam transformadas em referências a decretos-leis, para que a Assembleia possa, se o entender, pronunciar-se sobre essa matéria.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social.

O Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social (Arons de Carvalho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, registo a intervenção do Sr. Deputado António Filipe e a explicação que foi dada para o pedido de ratificação deste decreto e queria esclarecer o seguinte: o Decreto-Lei n.º 84/96 foi publicado para suprir uma lacuna no nosso ordenamento jurídico. De facto, a portaria de apoios à comunicação social, n.º 169/94, reportava apenas à Constituição da República e não a qualquer decreto-lei.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Ora aí está uma boa observação!

O Orador: - Foi considerado, na altura, necessário alargar o sistema de porte pago a publicações para deficientes e às publicações de interesse cultural e, para não ser feita outra portaria sem cobertura jurídica, foi decidido elaborar este decreto-lei. Ultrapassada esta questão conjuntural, o Governo não tem qualquer objecção a que o sistema de incentivos do Estado à comunicação social regional seja publicado através de um decreto-lei e posso mesmo dizer que, dentro de algumas semanas, estará publicado o próximo sistema de incentivos à comunicação social, precisamente através de um decreto-lei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados, o

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Partido Popular entende que é de todo em todo benéfico que este tipo de apoios obedeça a critérios definidos por decreto-lei e não por portaria.
Recordo que o Sr. Secretário de Estado, porque aqui também se trata da distribuição de publicidade, no debate parlamentar sobre a proposta de lei n.º 45/VII, disse que não tinha dúvidas, e cito, que «não há qualquer possibilidade de distinguir um contrato de publicidade de um financiamento». Portanto, aquilo que inicialmente foi aprovado pelo Governo é a negação e uma forma de incoerência face àquilo que o Sr. Secretário de Estado, nesta mesma legislatura e há poucos meses, disse sobre uma situação semelhante.
Por isso, o PP compraz-se pela aceitação que o Sr. Secretário de Estado aqui anunciou de que esses critérios sejam definidos em decreto-lei, podendo ser, portanto, sujeitos à fiscalização desta Assembleia.
Porém, obviamente, não deixo de salientar que aquilo que o PCP hoje aqui vem reclamar é diferente daquilo que o PCP pratica nas câmaras municipais onde tem a maioria.

O Sr. António Filipe (PCP): - Essa agora!

O Orador: - Todos nós sabemos como é que são usados os dinheiros públicos nessas autarquias locais para financiar as rádios locais e os jornais locais, enfim, a comunicação social local.

O Sr. António Filipe (PCP): - Vai ter de explicar isso!

O Orador: - Mas compreendemos que o PCP, nalguns locais, sendo poder, se comporte como poder e; noutros, sendo oposição, sinta a necessidade de se comportar como oposição.
De qualquer forma, damos o nosso agréement às propostas que aqui foram anunciadas e que foram aceites por V. Ex.ª

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para defesa da consideração da bancada, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, completamente a despropósito, depois de ter dito que concordava com esta nossa iniciativa, veio fazer acusações ao PCP completamente destituídas de fundamento e de sentido.
Se o Sr. Deputado tem alguma acusação concreta a fazer, que a faça; senão tiver, tenha vergonha e não faça acusações dessa natureza.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): Sr. Presidente, todos nós sabemos que há financiamentos encapotados por parte das câmaras municipais onde o PCP é maioritário.

Vozes do PCP: - Diga quais! Quais? Não venha para aqui com insinuações!

O Orador: - Não vale a pena escamotear esta situação porque sabemos que isso corresponde à verdade e, obviamente, aos senhores, aqui, neste momento, apenas compete o papel de negar, embora negando a evidência.

Vozes do PCP: - Caluniadores!;

O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Deputado José Saraiva estava inscrito, mas informa-me de que prescinde do uso da palavra. Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados, muito brevemente, queria dizer o seguinte: este pedido de ratificação do PCP em relação ao Decreto-Lei n.º 84/96 funda-se - do meu ponto de vista, a título justo - na perplexidade política de quem acompanha estas matérias da comunicação social com algum interesse, sobre o bem fundado do teor deste decreto-lei.
Quem, ao longo dos últimos anos, ouviu aqui, na Assembleia da República, o PS, muitas vezes pela voz do Sr. Secretário de Estado, a insistir, a. clamar e a reclamar contra os anteriores governos pela necessidade premente de que estes, através de um decreto-lei, pudessem estabelecer os critérios que norteariam os apoios à comunicação social, não deixará certamente de manifestar uma grande perplexidade e uma grande estranheza pelo teor do decreto-lei que agora veio a ratificação, por iniciativa do PCP.
Queria dizer ao Sr. Secretário de Estado que essa questão do diploma habilitante para as portarias que haveriam de definir os critérios para esses apoios foi justamente aquela que sempre esteve em cima da mesa na discussão sobre esta matéria.
Portanto, essa desculpa, que serve para o recuo que o Sr. Secretário de Estado aqui veio fazer em relação a esta iniciativa legislativa que teve neste domínio, não é uma desculpa verdadeira, na justa medida em que, recordando as posições anteriores do PS sobre esta matéria, o PS está agora no Governo e só deveria fazer uma coisa: o decreto-lei com os critérios claramente definidos e, assim, cumprir os objectivos políticos que os senhores sempre reclamaram no passado em relação a esta matéria.
Os senhores diziam que um decreto-lei sobre esta matéria era fundamental por três aspectos importantes. Primeiro, só assim se garantia a transparência dos apoios. Ora aí está uma excelente oportunidade para os senhores plasmarem os critérios no decreto-lei e termos então acesso, com rigor, ao que deve ser a transparência do processo nestes tipos de apoios à comunicação social. Segundo, só um decreto-lei garantia as condições de igualdade para todos os interessados neste tipo de apoio. Terceiro, só com um decreto-lei é que a Assembleia da República podia, de forma capaz, exercer totalmente as suas condições de fiscalização a esta área política do governo.
Eram estes os três critérios e os três fundamentos que os senhores invocavam para exigir do anterior governo um decreto-lei sobre esta matéria, coisa que os senhores agora não fizeram.
Aliás, o que os senhores agora fizeram foi um decreto-lei perfeitamente genérico sobre esta matéria, meramente habilitante, do ponto de vista formal, para as portarias que se preparavam para emitir sobre esta matéria. Todavia, agora tiveram de vir aqui à Assembleia da República, devido a este pedido de ratificação apresentado pelo PCP, dizer que afinal actuaram assim só para uma questão conjuntural e que vão resolver este assunto como no passado tínhamos prometido.
Mas, Sr. Secretário de Estado, isto tem a validade que tem porque recordamos o que os senhores disseram anteriormente sobre Lei de Imprensa, apoios à RTP, apoios às

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rádios locais e outras matérias importantes que aqui sempre discutimos e, por isso, não podem pensar que passam uma esponja sobre esta matéria, como o Sr. Secretário dê Estado aqui veio fazer, dizendo: «Sim, senhor, fizemos esta coisa mas isto não era para valer, o que vai valer é o que vamos fazer a seguir».
Sr. Secretário de Estado, isto saiu em Diário da República, é um decreto-lei do Governo e, por isso, esta ratificação tem legitimidade política, embora os senhores tenham emendado a mão no início da sua discussão, - ainda bem e quero saudá-los por isso.
Porém, resta uma questão que quero aqui colocar. Sr. Secretário de Estado, enriqueça este debate e diga quantos apoios concedeu ao abrigo deste decreto-lei que, entretanto, está em vigor. Quantos foram, a quem foram concedidos e de que montante? Isso sim, enriquece o debate que aqui estamos a fazer.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Reis.

O Sr. António Reis (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que ficou bem claro na intervenção do Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social que esta iniciativa do Governo teve, no fundo, um único objectivo, o preenchimento de um vazio legal, de uma lacuna, para atalhar a uma situação de emergência conjuntural ditada também pela necessidade de tomada de uma decisão célere em matéria da portaria que já foi publicada.
Nesse sentido, a ratificação aqui pedida pelo Partido Comunista Português constituiu uma boa oportunidade paia chamar a atenção para a necessidade de elaboração de um enquadramento legislativo que defina, de facto, a política de fundo do Governo nessa matéria.
Por isso, o Partido Socialista, neste momento, só tem de se congratular com a disponibilidade manifestada pelo Governo para, rapidamente e em coerência com aquilo que sempre defendemos nesta Casa, elaborar um decreto-lei que regule o sistema de incentivos e de apoios do Estado aos órgãos de comunicação social, o que permitirá, sem dúvida, uma melhor fiscalização do Parlamento em relação a esta matéria, sem embargo de nós, socialistas, estarmos convictos de que a isenção e a lisura dos processos têm presidido e continuarão a presidir às decisões governamentais neste domínio.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social, para encerrar o debate.

O Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero sobretudo referir-me à intervenção do Sr. Deputado Miguel Macedo, em primeiro lugar, para constatar que o Sr. Deputado lê hoje com muito mais atenção o que o PS propunha no passado do que aquilo que o governo do seu partido fez. De facto, só tenho que me congratular com isso.
Em segundo lugar, queria dizer que não havia no tempo dos governos do PSD qualquer diploma habilitante,...

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Eu não disse que havia!

O Orador: - ... pelo que a portaria de incentivos do Estado à comunicação social, a de 1994 como algumas anteriores, tinham, digamos, uma legalidade um pouco duvidosa.

Em terceiro lugar, gostaria de dizer que foi, entretanto, atribuído o porte pago a cerca de uma dezena de publicações ligadas a associações de deficientes e de interesse cultural e, por outro lado, foi aumentada a publicidade institucional de 10 para 15 %; para as rádios locais e para a imprensa regional.
Em quarto lugar, direi ao Sr. Deputado Miguel Macedo que se pensa que este diploma que estamos agora a discutir é o sistema de incentivos que este Governo vai fazer publicar, engana-se redondamente e nessa matéria terá não sei se uma grata ou uma má surpresa, porque o sistema de incentivos a publicar ultrapassará em muito aquilo que os governos dó PSD fizeram, nomeadamente no apoio às rádios locais, e será, porventura, superior àquilo que o Partido Socialista, enquanto oposição, reclamou ao governo do PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social, não disse que este diploma não era o diploma habilitante e que, porventura, não era o primeiro sobre esta matéria, pois sei qual era a vossa argumentação no passado. Os senhores questionaram até a legalidade de algumas portarias e de algumas decisões que foram tomadas no governo anterior em relação a esta matéria justamente porque entendiam que devia haver um diploma habilitante, só que foram mais longe.
Sendo assim, não estou a questionar essa matéria, nem a questionei anteriormente, mas os senhores foram mais longe do que isso. Nessa altura, nesses debates, os senhores disseram - e foi esse o vosso compromisso político que critérios para a atribuição de apoios à comunicação social, tendo em conta a importância desses apoios, sobretudo para a salvaguarda de valores tão importantes como a independência da comunicação social, teriam de ser plasmados em decreto-lei, porque só assim o Parlamento ficaria habilitado a fazer a competente fiscalização, que lhe cabe nos termos constitucionais.
Portanto, a questão que se põe é a seguinte: V. Ex.ª teve de facto de fazer este diploma só para acudir a uma emergência, para apoiar os tais jornais de associações de deficientes - que é uma actividade muito prezável - ou tinha verdadeiramente a intenção política de ficar por aqui e de fazer tudo o resto em portaria? Essa foi a questão que levantei.
O que disse na, minha intervenção foi que os senhores se preparavam, se não fosse a atenção do Parlamento em relação a esta matéria, para fazer justamente o contrário daquilo que prometeram durante anos em relação a este domínio.

O Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social: - Está enganado!

O Orador: - No entanto, Sr. Secretário de Estado, ficamos satisfeitos por os senhores conseguirem mobilizar os meios financeiros que permitam, com critério, apoiar a imprensa regional, as rádios locais, o porte pago, enfim, tudo o que for preciso em relação a esta matéria e apoia-

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remos esse incremento. Todavia, não venha aqui levantar uma nuvem de poeira e tapar-nos os olhos com esta situação concreta, que é isso que está em discussão.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, o senhor anunciou aqui que iria fazer sair um diploma com o sistema de incentivos à comunicação social local e a minha pergunta é a seguinte: tenciona encontrar e estabelecer esquemas regulares de divulgação pública dos apoios e dos incentivos concedidos à comunicação social local, à imagem daquilo que o PS, enquanto oposição, vinha reclamando noutros sectores em matéria de incentivos e de apoios a organizações não governamentais, a entidades privadas?

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social.

O Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social: - Sr. Presidente, queria dizer, muito rapidamente, ao Sr. Deputado Miguel Macedo que não consegui perceber como é que o Sr. Deputado se lembra tanto do que o PS fez e disse e não se lembra daquilo que o governo do PSD fez e disse.
Seria mais importante que o Sr. Deputado dissesse aqui se mudou ou não de opinião, se acha que deveria ter saído ou não um decreto-lei ou uma lei sobre os apoios do Estado à comunicação social, se está ou não de acordo com aquilo que o governo do PSD fez no passado. Era isso que gostaríamos de ouvir aqui.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Não somos nós que estamos a ser interpelados!

O Orador: - Sr. Deputado, já esclarecia posição do Governo, pelo que resta agora esclarecer a posição do seu partido em relação a esta questão.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Na altura própria, tê-la-á!

O Orador: - O PSD, agora que está na oposição, mudou de opinião ou não? ? essa a questão.
Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, a questão que colocou faz parte de uma matéria que está em estudo, mas devo dizer-lhe que usaremos a máxima transparência possível na atribuição de subsídios e na sua divulgação.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, temos duas propostas de alteração, apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PCP; nos termos constitucionais e regimentais, não há lugar para a votação do decreto-lei, pelo que as propostas baixarão à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para debate e votação.
A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, pelas 10 horas, estando agendada a discussão conjunta das propostas de resolução n.os 10/VII, 11/VII e 12/VII e n.os 13/VII e 14/VII.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 21 horas e 20 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Cláudio Ramos Monteiro.
João Rui Gaspar de Almeida.
José Manuel Rosa do Egipto.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel António dos Santos.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.

Partido Social Democrata (PSD):

Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Santos Pereira.
Luís Carlos David Nobre.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Silvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

Maria Odete dos Santos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Alves Martinho.
António Jorge Mammerickx da Trindade.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Joel Maria da Silva Ferro.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.

Partido Social Democrata (PSD):

Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Bosco Soares Mota Amaral.
José Guilherme Reis Leite.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Rui Manuel Pereira Marques.

Partido Comunista Português (PCP):

Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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DIÁRIO da Assembleia da República

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