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Sexta-feira, 15 de Novembro de 1996 I Série - Número 12

DIÁRIO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 14 DE NOVEMBRO DE 1996

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
João Cerveira Corregedor da Fonseca
José Ernesto Figueira dos Reis
Maria Luísa Lourenço Ferreira

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 25 minutos.
Foram aprovados os n.os 106 a 109 do Diário.
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando um Deputado a depor como testemunha em tribunal.
Prosseguiu o debate conjunto, na generalidade, das propostas de lei n.os 59/VII - Grandes Opções do Plano para 1997 e 60/VII - Orçamento do Estado para 1997. Intervieram, a diverso título, além dos Srs. Ministros do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (João Cravinho), da Solidariedade e Segurança Social (Ferro Rodrigues), da Justiça (José Vera Jardim) e da Educação (Marçal Grilo), os Srs. Deputados Helena Roseta (PS), Isabel Castro (Os Verdes), Octávio Teixeira (PCP), Manuela Ferreira Leite e Duarte Pacheco (PSD), José Junqueiro (PS), Lino de Carvalho (PCP), Álvaro Amaro (PSD), Nuno Abecasis (CDS-PP), Falcão e Cunha (PSD), Maria da Luz Rosinha (PS), Augusto Boucinha (CDS-PP), Henrique Neto (PS), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Alberto Marques (PS), Rui Rio (PSD), João Carlos da Silva e Elisa Damião (PS), Nuno Correia da Silva (CDS-PP), Pedro da Vinha Costa (PSD), Rodeia Machado (PCP), Barbosa de Oliveira (PS), Helena Santo (CDS-PP), Manuel dos Santos (PS), Vieira de Castro (PSD), Afonso Candal e Joaquim Sarmento (PS), Antonino Antunes (PSD), Luís Queiró (CDS-PP), Calvão da Silva (PSD), António Filipe (PCP), Moura e Silva (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP), Sérgio Vieira, Roleira Marinho e Pedro Passos Coelho (PSD), Jorge Lacão (PS), Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Castro de Almeida (PSD), Luísa Mesquita (PCP), José Cesário (PSD) e Fernando de Sousa (PS).
Entretanto, a propósito de uma referência feita pelo Sr. Deputado Vieira de Castro (PSD) quanto a declarações do Secretário-Geral do Partido Socialista e actual Primeiro-Ministro, durante a campanha eleitoral, sobre o aumento percentual do PIB para a área da saúde, usaram da palavra, a diverso título, além daquele orador, do Sr. Primeiro-Ministro (António Guterres) e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa), os Srs. Deputados Afonso Candal e Jorge Lacão (PS), Pedro Passos Coelho (PSD), Jorge Ferreira e Sílvio Rui Cervan (CDS-PP) e Luís Marques Mendes (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 55 minutos.

Renovação de assinaturas: ver informação na última página

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O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Agostinho Marques Moleiro.
Alberto de Sousa Martins.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Amândio.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pinto Camilo.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raimundo Pedro Narciso.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Teresa Maria Gonçalves Gil Oliveira Pereira Narciso.
Victor Brito de Moura.
Vital Martins Moreira.

Partido Social Democrata (PSD):

Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Francisco José Fernandes Martins.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
José Augusto Gama.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Póvoas.
José Gonçalves Sapinho.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
José Mário de Lemos Damião.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.

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Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.os 106 a 109 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 3, 9, 10 e 11 de Outubro.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de quatro pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal de Círculo de Abrantes, Processo n.º 7/95, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Nelson Baltazar (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência, em audiência de julgamento marcada para o dia 3 de Dezembro de 1996, pelas 14 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Processo n.º 68/95, 1.º Juízo Criminal, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Martim Gracias (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência, em audiência de julgamento marcada para o dia 5 de Fevereiro de 1997, pelas 10 horas.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Moncorvo, Processo n.º 21/96, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Gama(PSD) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência, em audiência de julgamento marcada para o dia 26 de Novembro de 1996, pelas 10 horas.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições; vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Por último, de acordo com o solicitado pela Polícia de Segurança Pública - Comando Metropolitano de Lisboa, Inquérito n.º 281/96 - GAB 5, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Cruz Oliveira (PSD) a prestar declarações, na qualidade de testemunha (por escrito, querendo), no âmbito do inquérito em referência.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos passar à discussão conjunta das propostas de lei n.os 59/VII - Grande Opções do Plano e 69/VII - Orçamento do Estado para 1997.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Tenho muita pena que não esteja presente a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite...

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Estou, sim!

A Oradora: - Ainda bem porque, ontem, fez-me um grande favor dizendo que eu não sabia Matemática nem fazer contas, talvez soubesse aritmética...

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Não disse isso.

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A Oradora: - A Sr.ª Deputada fez-me um grande favor porque me permite dizer hoje, desta tribuna, que não há dúvida alguma de que os debates nesta Casa estão desigualmente distribuídos. O Orçamento não é um assunto só para economistas, como poderá conceder, pois diz respeito a todos os cidadãos e nem todos nós temos a linguagem dos economistas, o que também não é obrigatório, nem tão-pouco a dos juristas, que é a que, com mais facilidade, se desenvolve nesta Casa.
Sou arquitecta, Sr.ª Deputada, de maneira que tenho o "vício" profissional de, quando estudo um assunto, procurar primeiro ver a imagem de conjunto e só depois o pormenor. Tenho a sensação de que, neste debate, que é suposto ser na generalidade, estão todos a ver o puxador da porta e o aro da janela e não querem apreciar a arquitectura do edifício. Mas é sobre a arquitectura do edifício que é o Orçamento do Estado, que quero falar e com linguagem de arquitecta.
Tenho muita pena de que este Parlamento, como quase todos os parlamentos do mundo, ainda esteja muito marcado por uma linguagem oral que vem do século XIX, pelo uso de expressões como "V. Ex.ª", de uma certa deferência e lentidão de expressão. Sonho com um Parlamento em que possamos mostrar gráficos, desenhos, quadros, música, som, "multimedia". Tenho muita pena de que este Parlamento seja sempre a preto e branco, ou talvez a cinzento, e que nem sequer uma fotocopiadora a cores exista nesta Casa, quando há milhares de fotocopiadoras em todos os corredores. Há um desfasamento de linguagem.
Serve isto para dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que fiz uma análise gráfica do Orçamento que, aliás, tenho muito prazer em distribuir a todos os Srs. Deputados e jornalistas.

Aplausos do PS.

Os meus colegas estão a bater palmas porque já a apreciaram e espero que os senhores, depois de verem esta espécie de "banda desenhada", percebam onde quero chegar.
Estamos perante um instrumento que não é neutro. Os orçamentos do Estado não são neutros. Enquadram os deveres do Estado e dos cidadãos, com base numa certa política económica.
O que pergunto é se este Orçamento é consistente com a política económica do Governo e se é credível e sustentável. Comecemos pela política económica. Os grandes objectivos que devemos prosseguir, julgo que estamos de acordo, deverão ser o crescimento, o emprego, a estabilidade dos preços e o equilíbrio orçamental. Ainda que com variantes - uns defenderão mais umas coisas e menos outras - andamos à volta disto e sobre estes objectivos haverá um certo consenso. O grande problema é que é muito difícil defender os quatro ao mesmo tempo.
Aqueles que se assumem como monetaristas, aqueles que privilegiam a convergência dita nominal, como é conhecida a expressão, aqueles que acham que, mais importante do que tudo, é controlar a estabilidade de preços e o equilíbrio das contas públicas (e até diminuir a despesa do Estado) - os que, no fundo, defendem o "Estado mínimo", que sustentam que o Estado não deve interferir porque, em termos de crescimento e de emprego, é a sociedade civil que se encarrega disso, que dizem mesmo que há uma "taxa natural de desemprego" que a sociedade se encarregará de encontrar - esses, em relação a este Orçamento, estarão naturalmente frustrados. Quereriam um Orçamento com menos despesa, um Orçamento mais pobrezinho, um Orçamento mais contido, um Orçamento menos ambicioso. De resto, este foi o discurso feito ontem, em parte, pela bancada do PSD.
Quando eu interrogava a bancada do PSD sobre as mudanças nos partidos, a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite respondeu que, quem mudou, fui eu. Pois mudei e por todas estas razões. Ainda hoje li nos jornais que o PSD se vai sentar, de armas e bagagens, na bancada dos Populares Europeus, o que também significa que está a tornar clara e transparente uma postura ideológica, que vinha de há uns anos a esta parte, que já não é sequer apenas de liberalismo mitigado, mas de liberalismo desenfreado. Como essa não é a nossa postura, não esperem, da nossa parte, um Orçamento sujeito às regras do liberalismo desenfreado e às teorias monetaristas.
Não queremos um Orçamento que dê prioridade à convergência nominal. Mas os Srs. Deputados do PP, que são contra a moeda única e passam a vida a dizer que se trata de uma imposição do exterior e de uma perda de soberania, estão sempre a afirmar que nem sequer valia a pena cumprir a convergência nominal. Só chamo a atenção para este raciocínio, que é elementar, Sr. Deputado Manuel Monteiro: o seu partido várias vezes tem defendido a ideia do referendo sobre a moeda única, e está no seu direito. Porém, se, neste Orçamento, o Governo não tivesse cumprido os critérios de convergência, o vosso referendo era inútil - porque ficávamos fora da moeda única, sem ninguém se ter pronunciado, por incapacidade da equipa governamental.

Aplausos do PS.

Ou seja, se o Governo consegue apresentar um instrumento que cumpre os critérios de convergência (mas que também quer outras coisas e não apenas essa), tal permite ao poder político democrático tomar soberanamente a decisão sobre entrar ou não na moeda única. Não vamos é trocar os planos das coisas, nem dizer que deveríamos fazer um Orçamento sem convergência nominal, porque ficávamos eliminados da corrida.
Agora, o ponto é este, Srs. Deputados do PP, que contestam a moeda única (os Srs. Deputados do Partido Comunista também a contestam): acho muito engraçado o vosso encarniçamento contra a moeda única, mas nunca vos vejo contestar o pensamento único. E o que é o pensamento único? É o que se está hoje a passar no mundo, depois da queda do muro, depois do colapso do bloco dos países de Leste e do pensamento comunista. Há hoje um pensamento dominante no mundo, que é o pensamento liberal, que domina os mercados financeiros, que dita as regras da mundialização, da globalização, de instituições como o Fundo Monetário Internacional, a que o Sr. Ministro das Finanças se opôs. Recordo o noticiado relatório "secreto" do FMI, antes da apresentação deste Orçamento do Estado, pondo em causa algumas das suas medidas, dizendo que não eram muito credíveis e que o Governo português não deveria enveredar pelo Rendimento Mínimo Garantido, nem pelo Plano Mateus...
Não ouvi os Srs. Deputados do PP, tão ciosos da soberania, apoiarem o nosso Ministro das Finanças, quando ele disse, com muita calma, "não aceitamos receitas de manual". Este não é um Orçamento de cartilha. Portanto, os senhores, que estão muito preocupados com a moeda única, continuam muito distraídos em relação ao pensamento único e nem sei mesmo se já estão todos colonizados por ele. Cuidem-se, porque é uma colonização que pode vir

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devagar mas que, quando vem, é difícil de evitar e contrariar.
Evidentemente que a questão da moeda única é importante, não para nos subordinarmos a imperativos alheios, mas para termos instrumentos económicos e financeiros que sejam sustentáveis.
Dirijo-me agora à bancada de Os Verdes, por causa desta questão da sustentabilidade, que penso que este Orçamento consegue cumprir, como tentarei demonstrar. E o que é o conceito de sustentabilidade? Basicamente, é um conceito que vem das ecologias e que tem um longo percurso desde os anos 70. O que é que retiramos de essencial do conceito de sustentável? Que, em primeiro lugar, no mundo complexo actual, as coisas interagem umas com as outras e todas elas podem gerar efeitos perversos entre si e, em segundo lugar, que não é legítimo atirar para as gerações seguintes com os resultados eventualmente negativos daquilo que estamos a fazer hoje.
Quando o Governo, obedecendo aos critérios da convergência nominal, consegue uma redução do défice para este ano e conter a dívida pública acumulada, o Governo está precisamente a tentar garantir um dos aspectos mais importantes da sustentabilidade orçamental, que é não estarmos a acumular dívida nem a atirar para o futuro com uma herança pesadíssima que, cada ano, cada Governo terá de ser capaz de pagar com todos os custos que isso tem.
Só para os Srs. Deputados que não lidam tanto com os números terem uma pequena ideia, lembrei-me que este ano vamos pagar (com juros favoráveis, porque também é verdade que, quando há credibilidade e estabilidade, as taxas de juro baixam e quando não há credibilidade nem estabilidade as taxas de juro sobem - e bastava este indicador indirecto para podermos dizer que há muita credibilidade na política económica que este Governo tem sustentado), mas apesar de ter havido baixa nas taxas de juro, como disse vamos pagar em juros da dívida acumulada, no ano de 1997, a módica quantia de 800 milhões de contos, quase tanto como todo o PIDDAC. É bom que os Srs. Deputados que se queixam de que o PIDDAC podia ter outros critérios, outras obras, outras prioridades, pensem que bom será quando conseguirmos termos umas finanças públicas mais equilibradas, capazes de libertar mais meios para investimento, em vez desta carga extraordinariamente pesada que vem do passado.
Quero porém continuar o meu raciocínio, voltando ao princípio da minha intervenção, recordo que uma política económica tem como objectivos o crescimento, o emprego, a estabilidade dos preços e o equilíbrio orçamental. Aqueles que defendem apenas a convergência nominal, do ponto de vista monetarista, só defendem a estabilidade dos preços e o equilíbrio orçamental. Os que, por outro lado, defendem uma convergência real, dão prioridade ao crescimento e ao emprego. Ora o que este Orçamento pretende - e este parece-me ser o ponto mais importante - é, simultaneamente, conseguir a convergência real e a convergência nominal, ou seja, conseguir atingir os quatro objectivos ao mesmo tempo.
Evidentemente, poderíamos fazer exercícios orçamentais que conseguissem atingir alguns destes objectivos melhor do que neste Orçamento. Poderíamos ter orçamentos que privilegiassem mais o crescimento, ou mais o emprego, ou mais o equilíbrio orçamental, ou mais a estabilidade de preços, apontando para taxas de inflação inferiores. Mas o problema não é esse. De facto, o problema é conseguir caminhar em todas as direcções ao mesmo tempo e tendo obtido sinais positivos, nos últimos dois anos, em todas esta direcções. Este é o ponto que o PSD não gosta de ouvir.
Se forem ver o exercício gráfico que fiz e olharem para todos os indicadores destes quatro objectivos, verificarão que houve sempre uma curva descendente na última legislatura em que Cavaco Silva governou e que a curva começa a ser ascendente em 1995, é fortemente ascendente em 1996 e prevê-se que continue a ser ascendente em 1997. A isto, os senhores responderão que é o ciclo económico. Mas não é só devido ao ciclo económico: é devido à capacidade do Governo, ao facto de o Governo ter um grande rigor e conseguir que as suas ideias sejam passadas à prática e concretizadas em actos.
Srs. Deputados, lembro-me que, em 1976, quando o Dr. Mário Soares era Primeiro-Ministro e anunciou que iria pedir a adesão de Portugal à Comunidade Europeia, houve muitas críticas. Levantaram-se então vozes muito parecidas com as que hoje criticam que Portugal vá entrar na moeda única. Houve muita gente, sobretudo dos lados da bancada do PCP, que dizia que ia ser um desastre para nós, que ia ser o caos, que a economia portuguesa não iria suportar o embate. Efectivamente, não foi isso que se passou. O que se passou foi que o processo de adesão à Comunidade Económica Europeia, se politicamente foi muito importante para o nosso país, do ponto de vista económico não foi um processo negativo, antes foi positivo, apesar dos riscos e de alguns erros. Mas foi um processo positivo. E tenho orgulho de, nessa altura, estando eu na bancada do PSD, ter apoiado a intenção do então Primeiro-Ministro em declarar o nosso pedido de adesão à Comunidade Económica Europeia.
Passaram estes anos e, hoje, vejo-me na circunstância de, estando na bancada do PS, poder apoiar um governo que vai pedir a entrada na moeda única. Tenho a consciência muito clara de que não se trata de nos sujeitarmos a qualquer espécie de ditadura financeira. A pior ditadura financeira, Srs. Deputados, não é a dos critérios de convergência; a pior ditadura financeira é a dos mercados financeiros mundiais, que impõem as suas taxas de juro, que os governos de modo nenhum podem alterar e todos se lhes sujeitam, quer governos, quer particulares. E para fazermos frente a esse tipo de ditadura financeira, para fazermos frente a essa desregulação mundial, temos de ter força política, força económica, capacidade que, como pequeno país isolado, dificilmente teríamos. É por isso que é importante entrarmos na moeda única.
Mas coloquemos a questão do ponto de vista do cidadão comum. O que vai o cidadão comum ganhar com isto? Podemos admitir que, em termos de desígnio nacional, é importante. Mas, repito, o que vai ganhar com isso o cidadão comum? É uma boa pergunta. E vamos discuti-la.
A questão é esta: Portugal pode não aderir. Portugal é soberano e ninguém nos obriga a entrar na moeda única. É uma decisão que tomamos como País, através dos nosso órgãos próprios. É uma decisão democrática. Não pode ser uma obrigação nem pode ser uma imposição. Poderíamos não entrar. Simplesmente, o que aconteceria? Peço-vos que acompanhem o meu raciocínio e, depois, nos pedidos de esclarecimentos, contestem, se quiserem.
Falando sem quaisquer conhecimentos económicos, mas como cidadã comum, posso imaginar que, se Portugal não entrasse na moeda única, ela não deixaria de existir. Não seria pelo facto de Portugal não entrar que deixaria de haver moeda única, o seu desígnio manter-se-ia. A moeda única constituir-se-ia à mesma, eventualmente com moedas europeias como o franco, o marco e outras, e nós fi-

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caríamos de fora, com o nosso escudo e a nossa economia.
O que pergunto é se as pessoas acham que, nessas condições, o nosso escudo iria valorizar-se ou iria perder força. É evidente que não estou a pensar nas desvalorizações competitivas, isto é, não estou a pensar na utilização de mecanismos de desvalorização do escudo para, matreiramente, ganharmos fatias de mercado através de mecanismos puramente monetários. Até porque não poderíamos fazê-lo e, simultaneamente, continuar a fazer parte do Sistema Monetário Europeu. Teríamos de sair de tudo, o que seria muito mais pesado. Mesmo sem entrarmos por aí, se o escudo ficar de fora da Moeda Única, é minha convicção - posso enganar-me - que, provavelmente, não iria ter muita força, até porque está suportado por uma economia, a nossa, que conhecemos e que tem as suas debilidades.
Penso que, naquelas circunstâncias, iríamos assistir, seguramente, a um aumento da inflação, a um aumento das dificuldades das pessoas que têm rendimentos fixos, à dificuldade de quem estivesse no governo em equilibrar as contas, a um aumento da dívida, a um aumento das taxas de juro, porque, a partir do momento em que não aderíssemos, a nossa economia geraria um certo grau de desconfiança. Ou seja, mesmo em termos económicos e em termos do quotidiano do cidadão, iríamos ficar pior com o escudo de fora da moeda única do que entrando no euro. Além disso, entrando no euro, beneficiamos de uma coisa simples. É que, no mundo actual, ninguém é indiferente às decisões que são tomadas - elas acabam por afectar directa ou indirectamente o nosso bolso, mesmo que não sejamos nós a tomá-las. Assim, prefiro ser eu própria a tomá-las. Prefiro ser eu própria a estar presente nas decisões que se tomam sobre o nosso futuro, do que estar de fora, a sofrer as consequências.
Mas há mais, Srs. Deputados.
Penso que o Governo de António Guterres não é o governo da "República dos Satisfeitos", de que falava Galbraith, não é o governo dos que acham que já fizeram tudo e que não há ninguém que seja capaz de fazer melhor. Nós - este Governo e esta bancada - somos, seguramente e permanentemente, insatisfeitos. Há muitas coisas que ainda não estão feitas. Apesar de este ser um Orçamento sustentável e de pretender, ao mesmo tempo, a convergência nominal e a real, apesar de os indicadores todos dizerem que vai consegui-lo e apesar de haver uma série de medidas que suportam uma visão social de todas estas questões, apesar disto tudo, não estamos satisfeitos.
Não estamos satisfeitos, nem em termos nacionais, nem em termos internacionais. E esta é mais uma razão para aderirmos à moeda única. É que podemos ter a certeza de que se houver mais vozes no núcleo duro da moeda única, a exigir que a orientação da política económica seja mais aberta e integre a vertente social, as coisas hão-de acabar por acontecer.
Sou dos que continuam a sonhar. Sou dos que continuam a pensar que, talvez um dia destes, o Tratado de Maastricht tenha de ser revisto e gostaria de participar nessa revisão. Sou dos que continuam a afirmar que era muito bom que dos critérios de convergência constasse o problema do emprego e do desemprego. Dirão que isso não nos afecta muito a nós, portugueses, que, em termos comparativos, até temos indicadores baixos nestes domínios, mas interessa-me em termos europeus e em termos mundiais. Sou dos que continuam a pensar que é um escândalo vivermos numa Europa tão rica e termos tantos milhões de desempregados. Sou dos que continuam a pensar que, efectivamente, temos de ter força política para inverter as coisas. Sou dos que continuam a pensar que um governo como o nosso, sendo tão estreita a sua margem de actuação, consegue fazer propostas que têm um inegável cunho social. Consegue levar para a frente o rendimento mínimo garantido - esta é uma das coisas que o FMI não queria.
Consegue também defender uma maior justiça fiscal, com a colecta mínima, por exemplo. Parece-me mesmo extraordinário os Srs. Deputados estarem todos muito preocupados com o problema da retroactividade da colecta mínima - e, certamente, vamos debruçar-nos sobre este problema em sede de especialidade - mas parece-me, dizia eu, extraordinário que comece a "gritaria" - "Assim, não! Assim, não!" - mal se aborda o conceito de colecta mínima. Num país em que os trabalhadores por conta de outrem pagam o "duro de toda a história", não será justo que o governo venha pedir que também participem na colecta aqueles que trabalham por conta própria? A colecta mínima, no máximo, significará, para os profissionais liberais, algo como uma contribuição de 9 a 16 contos por mês. Se isto já é tão difícil, então, não sei como poderá fazer-se uma reforma fiscal, pois vamos ter de apresentar propostas mais ambiciosas.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Até é pouco!

A Oradora: - É pouco? Óptimo! Se a Sr.ª Deputada acha pouco, faça propostas!
Faremos tudo o que pudermos fazer, em sede de Orçamento e em sede de reforma fiscal, para aumentar a justiça fiscal, a fim de que este país não fique dividido entre os que nunca pagam e nada lhes acontece e os outros, que cumprem sempre e suportam uma carga cada vez maior. Quanto a isso, pode ter a certeza que terá o nosso apoio.
Aliás, neste domínio, tenho de dar razão ao Sr. Deputado Lino de Carvalho quando, ontem, perguntava por que hão-de ser sempre os mesmos a pagar. Na verdade, não podem ser sempre os mesmos a pagar. É por isso que o Governo está a introduzir conceitos como este da colecta mínima e como, no ano passado, o dos métodos indiciários.
É natural que a bancada do PSD não goste, mas nós não fazemos parte dela. Efectivamente, há uma diferença entre esquerda e direita, há uma diferença entre socialismo e liberalismo, há uma diferença entre defender a coesão social e a convergência real ou defender apenas a convergência nominal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou terminar, citando um economista sueco G. Myrdal, porque identifico-me muito com o que ele diz. "O futuro não está nas mãos de um destino cego, mas podemos, ao contrário, construí-lo. Temos a faculdade de analisar os factos, de estabelecer racionalmente as implicações práticas dos nossos ideais. Temos a liberdade de adaptar a nossa política, temos a liberdade de inflectir e de mudar o curso natural dos acontecimentos."
Nós, que não acreditamos na "mão invisível" do mercado para resolver todas as coisas, nós, que não acreditamos que, sozinhos, os mercados se auto-regulem e atinjam os equilíbrios necessários, nós, que conhecemos as grandes devastações - ecológica, social e outras - que essa filosofia está a provocar, apoiamos com muito orgulho as propostas de lei do Orçamento do Estado e das Grandes Opções do Plano, apresentadas por um Governo

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que tem rigor, mas também consciência social, que pratica o diálogo, mas também é capaz de optar, que defende a moeda única mas que, acima de tudo, defende a soberania nacional.

(A oradora reviu.)

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedirem esclarecimentos, inscreveram-se a Sr.ª Deputada Isabel Castro, a quem o PS cedeu três minutos para o efeito, o Sr. Deputado Octávio Teixeira e a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Roseta, vou situar-me em relação a uma questão que colocou: sustentabilidade.
Não precisamos que nos seja explicado o que é a sustentabilidade pois, teoricamente, todos sabemos o que é: é prevenção, é longo prazo, é solidariedade com as gerações vindouras. Portanto, não é um conceito concretamente abstracto, é uma coisa feita de um conjunto de medidas muito precisas.
Se quisermos facilitar, poderemos dizer que esse conjunto de medidas muito precisas é constituído, muito claramente, pelo combate às assimetrias regionais, o combate aos desequilíbrios demográficos. Isto é particularmente evidente num país como o nosso, onde cerca de 60% da população está concentrada nas grandes áreas metropolitanas, existindo permanentemente um êxodo do interior, portanto, havendo desequilíbrios permanentes.
Perguntarão o que quero dizer com isto. Quero dizer que não há nenhuma sustentabilidade se não houver uma política muito clara de preservação do mundo rural, se não houver uma política muito clara para as cidades.
A política muito clara de que falo não é uma coisa abstracta. Como sabe, no nosso país, há um problema extremamente grave que é o da desertificação, o empobrecimento dos solos. O diagnóstico para a resolução do problema está feito e haveria que solucioná-lo, o que passa pela preservação da agricultura, pela preservação das culturas tradicionais, por uma política florestal considerada nessa óptica.
Sr.ª Deputada, sugiro-lhe que veja como está feito este Orçamento, não no que respeita às Grandes Opções do Plano mas ao modo como, no domínio dos fundos a distribuir e dos programas, dá ou não corpo - e não dá a esta preocupação, a este caminho que é sugerido. Portanto, não há nenhuma sustentabilidade, do ponto de vista da agricultura, do desenvolvimento regional, da preservação do mundo rural, que dê conteúdo ao que se afirma.
Passo à segunda questão, e podemos falar, por exemplo, de política das cidades.
Como é que a Sr.ª Deputada quer ter uma política de cidades, como é que quer ter uma melhoria da qualidade de vida das pessoas, como é que quer suster a acelerada degradação do ambiente urbano se não tem uma política energética, nem uma política de transportes, nem uma política fiscal, nem qualquer conjunto de medidas articuladas e que se conjuguem para esse fim? Sugiro-lhe um "roteiro": pegue em todas estas coisas para ver e concluir que, nesta matéria, não há nada.
Mas, mais, Sr.ª Deputada: não vai poder ter nenhuma perspectiva de preservação da nossa terra e dos nossos recursos se as coisas não tiverem alguma consistência entre si. Assim, pergunto-lhe: que consistência podem ter um Orçamento do Estado e umas Grandes Opções do Plano - e a Sr.ª Deputada tem todas as condições para saber como isto é grave - em que se consegue o "brilhantismo" de falar em ambiente sem mencionar o ordenamento do território e em que estes vivem completamente divorciados, conseguindo-se fazer um relatório sobre o estado do ambiente sem se escrever uma única linha sobre a questão dos solos?
Como é que a Sr.ª Deputada pode pensar que, em relação a questões tão complexas como a dos resíduos ou a da preservação da natureza, basta ter uma Rede Natura 2000 e continuar, diariamente, a violar a Reserva Ecológica Nacional? Como é que pode haver uma estratégia se não há, tão-pouco, a nível nacional, um elemento enquadrador de conservação da natureza?
Por último, como é que a questão dos resíduos pode ser tratada se os senhores se limitam a resolver, no imediato, o problema dos lixos sem se preocuparem em saber como alterar os padrões culturais e sem operar a grande mudança nos processos produtivos?

O Sr. Presidente (João Amaral): - Havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Roseta, não tenho tempo para discutir agora o que "aquela bancada" - julgo que estaria a referir-se à bancada do PCP - defendeu aquando da adesão de Portugal à CEE, mas sempre lhe direi que, de facto, agora temos mais estradas, menos agricultura, menos indústria, mais exclusão social e um maior afunilamento das relações económicas externas.
Mas, passando à frente, julgo que a Sr.ª Deputada Helena Roseta não vê bem a questão da "arquitectura" orçamental, porque fala de pormenores em relação a pontos que não são pormenores. Recordará, certamente, que o Orçamento é um instrumento regulador da conjuntura económica, é um instrumento de redistribuição de rendimento e é um instrumento aditador da afectação de recursos através do investimento. São estas as três funções essenciais do Orçamento.
Sobre a afectação de recursos através do investimento, pode dizer-se, por exemplo, que este Orçamento agrava as assimetrias regionais, o que é mau, como a Sr.ª Deputada concordará. Sobre o problema da redistribuição de rendimento, pareceu-me que a Sr.ª Deputada tratou a questão fiscal como um pormenor. Só que não é uma questão de pormenor mas, sim, de arquitectura, do tipo daqueles desenhos que a Sr.ª Deputada fez...

Risos da Deputada do PSD Manuela Ferreira Leite.

Talvez convenha fazer um com a parte fiscal!
Mas é como instrumento regulador da conjuntura económica que se põe a questão de fazer as duas convergências, a nominal e a real. Sobre esse assunto, a Sr.ª Deputada disse: "Não há milagres". Por conseguinte, é preciso que haja opções. Ora, o problema central é que, neste Orçamento, o Governo faz uma opção, aquela que a

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Sr.ª Deputada criticou, ou seja, a opção pelos critérios que privilegiam a convergência nominal.

Vozes do PS: - Não, não!

O Orador: - Isso está expresso, está escrito no Orçamento!

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Sr. Deputado, acalme-se um bocadinho e deixe-me falar com a Sr.ª Deputada Helena Roseta, até porque disponho de pouco tempo para o fazer!
Sr.ª Deputada, quando estou a discutir o Orçamento não posso referir-me ao Governo com base em declarações que, por exemplo, o Sr. Primeiro-Ministro faça na Internacional Socialista! Tenho de o fazer, sim, com base nas declarações feitas em sede de discussão do Orçamento, declarações essas que são completamente diferentes, como sabe.
Por outro lado, sobre a questão da moeda única, a Sr.ª Deputada referiu, na parte final da sua intervenção, que se ficássemos de fora, certamente, a nossa moeda não poderia fortalecer-se, não se tornaria uma moeda forte, até porque somos uma economia fraca. Ora, esse é precisamente um dos aspectos centrais que me leva a questionar o seguinte: como é que vamos ter uma moeda forte se continuaremos a ser uma economia fraca? Esse é o problema da contradição!
Por isso, temos como certo, não apenas do ponto de vista político mas também económico, que depois da integração na moeda única os problemas do País vão ser ainda mais graves, porque teremos a tal economia fraquinha com uma moeda forte. Por alguma razão Portugal, tal como outros países de moeda fraca, nunca aderiu à zona do marco nem à zona do dólar e, muito menos, substituiu o escudo pelo marco ou pelo dólar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito fraco!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, desde já queria dizer que não vou formular, propriamente, um pedido de esclarecimento à Sr.ª Deputada Helena Roseta.
Em primeiro lugar, queria esclarecer que ontem não disse que a Sr.ª Deputada Helena Roseta não sabia de aspectos matemáticos. Bem pelo contrário, o que referi foi que qualquer conhecimento elementar de aritmética daria para fazer determinada conta. Como é evidente, qualquer que fosse a sua formação, a Sr.ª Deputada saberia a aritmética suficiente para apurar como se faz uma diferença e como se encontra o resultado. Como tal, não vou colocar-lhe qualquer questão, mas simplesmente deixar esclarecido este ponto.
Em todo o caso, queria sugerir à Sr.ª Deputada que não se esquecesse de incluir, nesses seus gráficos, um sobre a evolução das despesas sociais desde 1985, pegando nos números contidos num livro publicado pelo Dr. Medira Carreira, no qual se faz essa análise.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É insuspeito!

A Orador: - Penso que esses números, como a Sr.ª Deputada calculará, são insuspeitos.
Depois agradecia que pegasse nesse gráfico, mesmo sem ser colorido - basta a preto e branco! -, e o mostrasse a esta Assembleia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, em nome da minha bancada, queria agradecer à Sr.ª Deputada Helena Roseta a profunda lição de economia que aqui deu a todos os Deputados. Penso mesmo que foi pena que as bancadas estivessem tão vazias no momento em que a Sr.ª Deputada falou, porque todos teríamos, com certeza, melhorado bastante com os profundos ensinamentos que aqui nos trouxe.
Devo dizer-lhe também, e para terminar, que o único ponto da sua intervenção em que estive receosa foi quando a Sr.ª Deputada falou sobre a forma de funcionamento desta Câmara. Sinceramente, receei que pudesse propor que passássemos a intervir cantando em vez de falar, porque nesse caso teria de pedir a suspensão do mandato!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, queria agradecer aos Srs. Deputados as perguntas que me formularam.
A Sr.ª Deputada Isabel Castro deu uma volta e falou de uma série de questões de fundo que, de facto, não podem ser resolvidas a nível de Orçamento do Estado. Por exemplo, não é o Orçamento do Estado que vai resolver o problema do ordenamento do território. Desculpe lá, mas está a fazer uma confusão muito grande!
A Sr.ª Deputada poder-me-á dizer que o PIDDAC, este plano de investimentos da administração central para 1997, não altera os desequilíbrios regionais existentes. Admito que isso seja verdade, mas o mesmo acontecia com o anterior e com os demais que o antecederam! O problema não é esse, mas o de saber quando é que vamos ter forças regionais que possam, elas sim, pela partilha de poderes, alterar a distribuição do "bolo" que nos permita modificar os investimentos.
Neste momento, estamos a seguir uma estratégia que, em termos de equilíbrios regionais, será sempre imperfeita, porque não temos o escalão regional político...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

A Oradora: - ... nem o escalão regional de planos de ordenamento. Portanto, faltando estes dois factores, é muito difícil que o Orçamento, através do PIDDAC, faça aquilo que os devidos instrumentos deverão fazer noutro nível de intervenção.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem lembrado!

A Oradora: - A propósito do ordenamento do território, a Sr.ª Deputada Isabel Castro disse, expressamente, que a REN não é respeitada e que não se sabe bem o que é a Rede Natura 2000. Adiantou ainda que não se percebe como é que pode haver um plano de estratégia para os

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lixos sem haver uma alteração dos processos produtivos. Ou seja, é o tal tipo de discurso em que se diz que tudo isto "é um problema mais geral que se insere num contexto mais vasto"... De facto, Sr.ª Deputada, todas as coisas são um problema mais geral que se insere num contexto mais vasto!
Ora, o que aqui está em causa é saber se as medidas concretas, designadamente propostas quer pelo Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, quer pelo Ministério do Ambiente, vão ou não ter efeitos positivos nestas precisas questões. Aliás, a Sr.ª Ministra do Ambiente já teve ocasião de esclarecer um ponto que me parece importante e que julgo que a Sr.ª Deputada ainda não percebeu. Refiro-me ao facto de o dinheiro que vai ser investido, concretamente, na alteração dos processos produtivos, não ser apenas dinheiro do Estado - ai de nós se o Estado, além de todas as responsabilidades sociais que já lhe cabem, ainda tivesse de gastar, ele próprio, todo o dinheiro necessário para mudar os processos produtivos! Nesse processo, o Estado é apenas incitador, através do PEDIP, de alterações de métodos de produção que vão, por sua vez, ter resultados numa mudança de cultura e de produção de resíduos. É isso que temos de perceber.
Portanto, não podemos pensar que estamos perante um Orçamento que concentra no Estado, em particular no instrumento financeiro "Orçamento de Estado", toda a capacidade de intervenção. Estão aqui alguns sinais, mecanismos e instrumentos, mas há muitos outros! E é da conjugação de todos esses instrumentos que podem resultar aspectos positivos.
Sr.ª Deputada, também lhe direi que em matéria de desequilíbrios regionais estou muito insatisfeita, não com este Orçamento, mas com os instrumentos de que dispomos, pois entendo que necessitamos de uma maior exigência e profundidade e, até, de conhecer melhor os problemas que estão a verificar-se em termos de desequilíbrios regionais no nosso país. Precisamos de ter, nomeadamente, mais conhecimentos de estatística, conhecimentos de índole social e cultural, para podermos fazer frente a um problema que é grave.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, desde já agradeço os esclarecimentos que me prestou, mas devo dizer-lhe que é inevitável lembrar-me de 1976, porque todo o discurso catastrofista feito pelos Deputados da bancada do PCP, a propósito da entrada de Portugal na CEE, está agora de volta. O Sr. Deputado, ao dizer que não pode aceitar ter uma moeda forte e uma economia fraca, significa que prefere ter tudo fraco!? Desculpe, Sr. Deputado, mas não vou por aí, porque entendo que a nossa economia se fortalece com a entrada na moeda única e...

Risos do Deputado do PCP Octávio Teixeira.

... ficaria enfraquecida caso não entrássemos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Essa é a parte em que a Sr.ª Deputada revela que não sabe economia!

A Oradora: - O Sr. Deputado diz que não sei de economia para poder fazer tal afirmação! No entanto, posso dar-lhe vários argumentos nesse sentido, e há pelo menos um que lhe dou já, à partida: é que se entrarmos na moeda única, teremos possibilidades de conseguir financiamentos a taxas de juro que muito nos convêm, libertando recursos para outros fins. Pelo contrário, se ficarmos do lado de fora, com uma economia fraca, não vamos conseguir essas taxas de juro.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, taxas de juro altas significam hipotecar o futuro, e não há sustentabilidade nesse caso. Portanto, o que lhe digo é que só esse benefício já era positivo, mas vamos ter muitos outros e é isso que o Sr. Deputado não quer ver.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - A Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite fica incomodada quando outras pessoas falam das suas matérias. Tenha paciência, mas tem de ouvir outras linguagens, outras formas de expressão, diferentes maneiras de abordar o problema!

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Não vim aqui dar uma aula, mas falar, como Deputada e cidadã, de um problema que me preocupa. Não estou nada interessada em estar aqui a falar ex cathedra. Aliás, nunca tive essa postura! As pessoas com quem a Sr.ª Deputada sempre se deu é que tiveram tal postura, mas essa não é a minha postura, nem a do actual Primeiro-Ministro.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, não venha com isso, porque não vale a pena!
A Sr.ª Deputada queria que eu fizesse os gráficos a partir de 1985, mas eu fi-los a partir de 1992 por uma razão muito simples: foi nessa altura que os senhores começaram a descarrilar! Aliás, por que é que não perderam as eleições de 1991 e perderam as seguintes? Se tudo fosse igual, então já teriam perdido as anteriores. É muito simples, Sr.ª Deputada: quando os resultados descarrilam, o eleitorado muda, e isso é fatal como o destino!
Portanto, fazer gráficos, para vos beneficiar, relativamente a um período em que o vosso mandato foi confirmado pelo eleitorado não interessa nada do meu ponto de vista, porque ele não altera a insustentabilidade das vossas políticas posteriores. O que estou a dizer é que este Governo tem uma política diferente da vossa e pretende seguir o ciclo virtuoso das políticas financeiras, sem cair no ciclo vicioso dos desequilíbrios sociais, que foi o que se passou com os senhores. Tentaram seguir políticas financeiras virtuosas, mas adoptaram políticas sociais desastrosas - e isso é socialmente insustentável.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - É isso que este Governo não aceita e é por essa razão que apoio este Orçamento do Estado.

(A Oradora reviu.)

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (João Cravinho): -

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Sr. Presidente, Srs. Deputados, devo começar por saudar todos os membros desta Assembleia e agradecer os relatos que me foram presentes no que diz respeito a matérias que relevam para o Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.
Se me permitem, aproveito para pôr em destaque, muito em especial, a qualidade de todos esses documentos, com grande e assinalável mérito para o relatório sobre as Grandes Opções do Plano. É um relatório que honra esta Casa...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... e que o Governo procurará seguir e acompanhar, a partir de Janeiro, mostrando-se, desde já, completamente disponível para prosseguir na linha que aí é avançada. Já tinha tomado idêntico compromisso com o Conselho Económico e Social e, por maioria de razão, apraz-me tomar também esse compromisso nesta Assembleia.
Quanto às matérias que hoje aqui me trazem, elas são vastas e procurarei concentrar-me em alguns aspectos, porventura menos debatidos, pedindo, desde já, a vossa benevolência para o facto de, no tempo disponível, não poder, necessariamente, abordar todas as questões. Falarei menos de coisas que já estão largamente esclarecidas, como, por exemplo, do financiamento das autarquias locais, com um aumento de 20%, sob a vigência deste Governo, num ano, quando a maior parte dos portugueses tiveram aumentos correspondentes de 4% e 5% nos seus salários, nos seus rendimentos, e de 51% para as freguesias, também legislado ou proposto no prazo de um ano, falarei um pouquinho menos do PIDDAC regional, porque espero discutir esse aspecto convosco, amplissimamente, em sede de especialidade, seleccionarei alguns aspectos quantitativos do PIDDAC e do Quadro Comunitário de Apoio e falarei sobretudo de políticas.
As propostas das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1997, bem como as medidas de política a que essas propostas dão suporte, constituem um bem decisivo para criar condições para uma economia competitiva, geradora de emprego, promovendo ao mesmo tempo uma sociedade solidária; para valorizar o território nacional no contexto europeu, superando também os dualismos cidade/campo e centro/periferia; para respeitar uma cultura de cidadania e reforçar a segurança dos cidadãos, promovendo igualmente a reforma do Estado, desenvolvendo simultaneamente os recursos humanos nacionais e estimulando a iniciativa individual e colectiva, de modo a afirmar uma presença europeia fiel à vocação universalista de Portugal.
Esses são os grandes objectivos nacionais que o Governo vem promovendo empenhadamente, no âmbito de um programa de legislatura, um programa de médio prazo para levantar Portugal e os portugueses à altura dos grandes desafios do século XXI.
Nessa caminhada de vários anos, as propostas do Governo para 1997 são o bem decisivo que nos cumpre realizar aqui e agora. Importa olhar para elas com os olhos postos no futuro de Portugal e dos portugueses, a partir da ponderação realista do melhor uso dos recursos que temos. O Governo estará atento a todas as sugestões que se situem nessa óptica, mas não poderá deixar de rejeitar, com toda a clareza, entorses aos grandes objectivos nacionais que, neste ano de 1997, se afirmam inequivocamente através da presente proposta de Orçamento do Estado.
Há quem queira avançar tais entorses, a coberto da excitação demagógica de expectativas desmesuradas, como se fosse possível realizar num só ano tudo quanto se prometeu mas não se foi capaz de fazer em 10 anos de governação passada.
Sejamos claros: quem agita essa imensa frustração acumulada ao longo de 10 anos de falsas promessas nem sequer percebeu ainda por que razão o passado governo perdeu as eleições, muito menos conseguirá perceber a razão pela qual a actual oposição se pulveriza à boca de qualquer sondagem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O povo português compreende perfeitamente que não é possível fazer neste Orçamento para 1997 tudo quanto se deixou de fazer ao longo de 10 anos.
Com o Orçamento do Estado para 1997, o Governo acelera ao máximo possível a transformação estrutural do País e a reparação das injustiças do passado. As nossas metas são ambiciosas mas não é possível fazer tudo já, como alguns advogados de interesses vários pretendem insinuar.
A esses advogados de interesses, que propõem mais projectos e mais despesa, há que perguntar se propõem também mais impostos ou mais défice para financiar os seus interesses.

O Sr. José Junqueira (PS): - Bem perguntado!

O Orador: - O País tem consciência de que este Governo recebeu uma herança carregada de enormes carências públicas e privadas. Exactamente porque existem essas enormes carências, em simultâneo com uma limitação rígida de recursos «clássicos» para lhes fazer face, é que se impõe uma estratégia selectiva e imaginativa,...

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - ... de modo a criar condições para que, em sucessivos orçamentos futuros, se consiga afectar verba significativa a políticas e projectos que hoje ainda não é possível financiar adequadamente.
É neste contexto de bom senso e realismo que se tem de avaliar o PIDDAC. Por exemplo, na proposta para 1997, o PIDDAC é um instrumento decisivo da política do Governo, visando, simultaneamente, a elevação qualitativa e quantitativa do emprego em Portugal e a aceleração da transformação estrutural do País, em todos os domínios. O PIDDAC de 1997 dá também resposta adequada a outras preocupações essenciais dos portugueses, nomeadamente no plano da justiça, da segurança dos cidadãos, da educação, da saúde, da habitação, do combate à exclusão social e do desenvolvimento científico.
Realço, em primeiro lugar, o papel do PIDDAC na criação de novas oportunidades de emprego, porque muitos ainda não entenderam o especial impulso que o PIDDAC dá à sustentação e elevação dos níveis e padrões de emprego nas mais diversas actividades.
No conjunto da economia nacional, há centenas de milhares de postos de trabalho que ficarão a dever a sua razão de ser a uma rigorosa política de aumento do investimento público numa conjuntura difícil. Mais do que isso, só em 1997, estima-se que o PIDDAC levará à criação de cerca de 20 000 novos empregos.

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O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Isto é, o PIDDAC de 1996 e o PIDDAC de 1997 criarão tantos empregos quantos aqueles que se perderam, sob o governo de Cavaco Silva, de 1993 a 1995.

Aplausos do PS.

Só o PIDDAC superará a perda de empregos de 1993 a 1995!

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - É o «milagre das rosas»!

O Orador: - Este impacto reforçado do investimento público é particularmente assinalável, em face das previsões que alguns fizeram, vaticinando a sua inevitável diminuição, tendo em atenção a redução do défice. Mais uma vez, foram frustrados esses vaticínios e esses vaticinadores, pois o PIDDAC, em 1997, aumentará cerca de 11%, apesar da redução do défice a 2,9% do PIB.
De facto, na presente conjuntura, a aposta que o Governo faz no notável aumento do investimento público é talvez o mais eficaz e importante sinal de uma política voluntarista de apoio à expansão do emprego. Com isto, não se minimiza a importância de outros dispositivos da política activa de emprego, o que se quer dizer é que, nas presentes condições da nossa economia, o reforço do investimento público em mais de 11% é o quadro decisivo que permitirá operacionalizar a maioria das outras medidas de apoio à criação de empregos de futuro e com futuro. Tanto mais que o PIDDAC é, ele mesmo, um poderoso veículo da acelerada modernização e transformação estrutural do País, nos mais diversos domínios.
Não se trata apenas de investimento material mas também de investimento essencial em funções de coesão nacional. O Governo orgulha-se de apresentar ao País um programa de investimentos públicos em que os sectores com maior crescimento de dotação são, precisamente, os que dizem respeito à justiça (+29%), à segurança (+54%), à educação (+11%), à saúde (+24%), ao desenvolvimento científico (+22%) e ao combate à exclusão social (+11,5%). Estas são as grandes prioridades da coesão nacional, a par da expansão do emprego melhor remunerado e do acesso de cada família a uma casa decente.
Em 1997, o PIDDAC atingirá cerca de 900 milhões de contos, ou seja, 5,5% do PIB, 20% da formação bruta de capital fixo, e contribuirá, só por si, com meio ponto percentual para o crescimento. Trata-se de somas enormes, mas nem tudo se faz a poder de dinheiro, muito há a fazer pelo empenhamento na melhoria da eficácia das políticas públicas, suprimindo a burocracia, adequando a legislação às realidades, mobilizando energias em todos os sectores da sociedade.
De um modo geral, todos sabemos que a rigidez da afectação orçamental do passado faz com que alterações imediatas das políticas públicas só sejam possíveis quando se injectam volumes muito consideráveis de recursos adicionais. Mas há campos em que é possível fazer muito mais e muito melhor, com alterações incisivas do quadro institucional e organizacional existente.
O Governo está particularmente atento a essas oportunidades e exemplifica com o que o se passa no campo da habitação. A situação herdada é conhecida: 70 000 agregados vivendo em barracas; 300 000 fogos em mau estado de conservação; 200 000 fogos em sobrelotação. As políticas que o Governo introduziu, quer melhorando e simplificando a legislação, quer solicitando as câmaras, as instituições de solidariedade social e as empresas para novas e mais imaginativas parcerias, já estão a dar muito bons resultados. Reduziu-se o juro bonificado a 3,6% ou a 2,5%, consoante os casos, publicaram-se alterações pontuais que eliminaram verdadeiros bloqueios que fizeram com que, no passado, não houvesse política de habitação no terreno,...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - ... criaram-se novos regimes de apoio à habitação de carácter social,...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - ... cuidando-se, sobretudo, da inserção das famílias em ambientes normais de convivência comunitária. Os resultados obtidos em 1996 são já muito encorajadores: os contratos de comparticipação em curso de execução entre o IGAPHE e as câmaras municipais, para realojamento de populações vivendo em condições degradadas, correspondem ao dobro das verbas relativas a 1995 ou a 1994, pois em cada um desses anos realizaram-se apenas 5 milhões de contos e em 1996 já se realizaram 10 milhões de contos; por outro lado, os contratos de financiamento no âmbito do PER, celebrados entre o INH e as câmaras municipais, atingiram, em 1995, 1560 fogos e, em 1996, os contratos de vária natureza, com essa finalidade, atingiram já 8200 fogos; em 1996 foram celebrados novos acordos de financiamento com câmaras municipais para construção ou aquisição de 8451 fogos para arrendamento público.
Há um novo dinamismo que faz com que só no terceiro trimestre, diria mesmo em 15 dias de 1996, isto é, na primeira quinzena de Outubro, se tivessem celebrado mais contratos, se tivesse promovido mais habitação do que em todos os anos de 1994 e 1995. Perguntar-me-ão: por que é que é no terceiro trimestre que surge esta expansão poderosa da habitação? Foi preciso corrigir inúmera legislação que, por pequenos ou grandes entorses, paralisava o investimento a favor da habitação, ou seja, as verbas estavam lá mas não era possível investir.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Foi isso que se fez e, portanto, não é apenas a poder de dinheiro que as coisas se fazem, é também a poder de simplificação e de rigor na adequação das políticas.
Gostaria, agora, de referir rapidamente a questão dos transportes. Trata-se de um sector muito importante, em cujos ramos se estão a operar grandes reformas de fundo. Este Governo enfrenta algumas reformas que já podiam e deviam ter sido feitas há quatro ou cinco anos, mas enfrenta-as com coragem e determinação. Nenhum dos sectores dos transportes ficará, em 1997, sem uma grande reforma de fundo. Trata-se de proceder à reestruturação institucional dos subsectores estratégicos, de os reenquadrar legislativamente, de reorientar o investimento, sob impulso do Estado, com abertura ao financiamento privado, de definir novos instrumentos de apoio à concretização de planos de acções.
O modelo de reestruturação institucional é o mesmo nos quatro sectores, com as adaptações necessárias: haverá um

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instituto responsável pela regulamentação do sector, empresa ou empresas responsáveis pela gestão das infra-estruturas e operadores sob regulamentação concorrencial, sejam eles públicos ou privados, que garantam os diversos serviços de transporte. Em todos os casos - transporte ferroviário, rodoviário, marítimo e serviços aeroportuários -, há grandes reformas de fundo que estão devidamente exemplificadas e explicitadas nas GOP. Não creio que se pudesse fazer mais, não creio que se pudesse ir mais fundo, porque, nos escassos meses que vão de Julho até ao presente, quase todas estas reformas estão prontas, muitas delas bloqueadas durante anos e anos de governos anteriores, e até ao primeiro semestre de 1997 terão os seus estatutos regulamentares todos em operação.

O Sr. José Junqueira (PS): - Muito bem!

O Orador: - O investimento sob tutela do MEPAT abrange, em 1997, mais de 700 milhões de contos, o que representa um acréscimo de 12% relativamente a 1996.
O investimento rodoviário será superior a 270 milhões de contos, o que representa, relativamente a 1996, um acréscimo de 27%. O investimento em ferrovia, que foi a grande prioridade de 1996, porque teve, nesse ano, um aumento de 52%, manter-se-á igualmente fortíssimo em 1997 e representará 240 milhões de contos do programado. Em portos, teremos 27 milhões de contos. É pouco, mas representa um aumento de 66% em 1997, relativamente a 1996, depois de um aumento de 26% em 1996 relativamente a 1995. Isto para dizer da indigência portuária que o anterior governo nos legou.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - E esta?!

O Orador: - Em habitação, será 32 milhões de contos, que será mais do triplo do investido em 1995. Isto só foi possível com novos métodos de financiamento, quer da ferrovia quer da rodovia. Assim, gostaria de assinalar à Câmara que, em 1997, serão iniciados os processos para a construção de estradas concessionadas em regime de portagem, no oeste e no norte. Esses investimentos representam cerca de 170 milhões de contos, que deverão ser realizados, em boa parte, até ao ano de 2000.
Também em 1997 será iniciado um processo para a construção de oito novas obras em regime de portagem virtual, das quais se espera que cheguem quatro à fase de obra ainda em 1997, sendo o investimento global, nessas quatro obras, de 72 milhões de contos.
Quanto à ferrovia, 1997 será um ano de avanço muito considerável no aperfeiçoamento dos sistemas suburbanos das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto. Em 1998, chegaremos ao fim do investimento da linha do norte ou ao fim do investimento principal, sendo possível realizar o percurso Porto-Lisboa - e reparem que não digo Lisboa-Porto, digo Porto-Lisboa - em 2 horas e 20 minutos.

O Sr. Afonso Candal (PS): - É a descer!

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - É mais fácil, é a descer!

O Orador: - Corresponde ao sentido da prioridade do investimento.

Quanto à regionalização, administração local e reforma da administração periférica, o avanço decisivo do processo de regionalização está sediado na Assembleia da República, mas o Governo está a preparar o apoio à concretização do processo de instituição das regiões administrativas, de modo a que elas possam entrar em funcionamento nas melhores condições logo após a decisão da Assembleia da República.
Para esse efeito, encaramos três tipos de acções: a reorganização da administração periférica do Estado; a instituição de medidas administrativas que permitam às autarquias regionais funcionar em pleno, tão breve quanto possível, com os recursos e o pessoal necessário, com os patrimónios transferidos em boa ordem; e o reforço das novas competências e dos recursos financeiros à disposição dos municípios.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - Temos produzido, nas próprias GOP, várias manifestações da nossa orientação quanto a essa matéria, pelo que ás dou aqui por subsumidas.
Finalmente, gostaria de falar do Quadro Comunitário de Apoio como grande criador de emprego, porque essa é também a nossa orientação. O Quadro Comunitário de Apoio tem um montante de investimentos programados da ordem dos 900 milhões de contos em 1997. Estamos, em 1996, a acelerar a execução do Quadro Comunitário de Apoio e, assim, posso dizer à Câmara que, neste momento, a aceleração da execução do QCA se traduz por uma execução financeira de 350 000 contos/dia, em acréscimo ao melhor que se fez em 1995.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - Cada dia, este Governo executa mais de 350 000 contos do Quadro Comunitário de Apoio do que se executou em 1995.
Estamos, portanto, a recuperar os atrasos e tudo indica que chegaremos a 1999 com a absorção plena dos fundos que foram postos à nossa disposição.
A maior parte destes investimentos são utilizados fora do quadro da Administração Pública central. Dos 900 milhões de contos, apenas 334 milhões de contos reforçarão o investimento público; os outros 565 milhões de contos irão para o sector privado, para o sector produtivo, para as autarquias, dispersar-se-ão por todo o País, esperando nós que a multiplicidade de agentes que é chamada a aplicar essas verbas as aplique bem.
Faremos a sua vigilância e confiamos no sentido cívico, na capacidade daqueles a quem esses fundos são dados; confiamos, mas reforçamos a vigilância. Por isso, confiamos!
Quanto ao emprego, por exemplo, os programas operacionais regionais, que são importantes por todo o País, têm um efeito multiplicador muito considerável no emprego, na medida em que muitos deles se dirigem a aplicações de construção. Ora, sustentam-se 300 postos de trabalho por cada milhão de contos investidos nesses domínios.
Por outro lado, reformámos o regime de incentivo às micro-empresas, do qual contamos obter, no fim do seu ano de vigência, em 1999, entre 25 000 a 30 000 novos postos de trabalho. Já foram criados, neste momento, cerca de 7500 postos de trabalho. Com a adição, que estará quase pronta a entrar, chegaremos a 10 000. Temos, portanto, 15 000 ou 20 000 novos postos de trabalho a haver.

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Além disso, se tudo correr bem, o QCA contribuirá também para o financiamento da barragem do Alqueva. Esse grande projecto criará, directamente, 1600 postos de trabalho durante a construção e 3000 postos de trabalho indirectos durante a mesma fase de construção, quase 5000 postos de trabalho até ao ano 2001, e o seu desenvolvimento do projecto permitir-nos-á chegar a 22 000 postos de trabalho. Se tudo correr bem, os fundos comunitários estarão nesse projecto; se não estiverem, está a garantia de que esse projecto é irreversível, é totalmente isento de qualquer bloqueio de Bruxelas. Suceda o que suceder, Portugal não é colónia de Bruxelas, Portugal fará o Alqueva.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos propostas orçamentais de grandes opções e medidas de política que sustentam o emprego, adicionam postos de trabalho, valorizam as nossas actividades, dão competitividade, dão bem-estar aos portugueses, dentro dos limites dos nossos recursos.

O Sr. José Junqueira (PS): - Muito bem!

O Orador: - É um Orçamento de grande transformação estrutural, é um Orçamento com os olhos postos no século XXI. Aqueles que governaram o País com os olhos postos nos anos 30, com a ajuda da solidariedade internacional dos anos 80 e 90, esses, não o compreenderão nunca!

Aplausos do PS, de pé.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Presidente em exercício Manuel Alegre.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Duarte Pacheco, José Junqueiro, Lino de Carvalho, Álvaro Amaro, Nuno Abecasis, Falcão e Cunha e Maria da Luz Rosinha.
Entretanto, informo que se encontram a assistir à reunião plenária 16 alunos da Escola do Professor Herculano Carvalho, dos Olivais; 49 alunos do Colégio S. João de Brito, de Lisboa, e 60 alunos da Escola D. Dinis, de Leiria, para os quais peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro João Cravinho, ao ouvir a sua intervenção, comecei a ter algumas dúvidas sobre qual era o orçamento que estávamos a discutir e a apreciar, porque o Sr. Ministro fez referência a ele como se fosse uma peça única.
Sr. Ministro, este é o segundo Orçamento de quatro que o Governo tem para apresentar a esta Casa, está, pois, a meio do seu trabalho. Logo, com este Orçamento, podemos já fazer um primeiro balanço da actividade governativa e perspectivar se muito daquilo que veio defendendo e apresentando poderá ou não ser uma realidade.
Aliás, nota-se já uma mudança de discurso. Como era tudo fácil, como se conseguia dizer sim a gregos e troianos e como hoje o discurso é diferente, apelando-se à seriedade e ao realismo!... É bem diferente quando se está na oposição e no governo, quando se é socialista na oposição e socialista no governo...
Quanto às Grandes Opções do Plano, Sr. Ministro, temos consciência da sua importância. Aliás, o relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano e o relatório do Conselho Económico e Social fazem uma reflexão profunda sobre a importância do documento em si, a motivação que ele gera na sociedade portuguesa e também aqui nesta Casa, para podermos, agora, também reflectirmos um pouco mais sobre isso, nomeadamente sobre o facto de as Grandes Opções do Plano terem uma duplicidade, sendo extremamente genéricas e, simultaneamente, um conjunto de medidas extremamente concretas, mas não apontando as linhas de rumo para a economia portuguesa como um todo, nem qual o modelo de desenvolvimento que está adjacente à economia portuguesa, o que faz com que, pelos parceiros sociais e pelos diversos partidos políticos, as Grandes Opções do Plano não estejam a ser apreciadas com a exaustão que deveriam.
De facto, Sr. Ministro, é necessário alterar a filosofia das GOP, colocando-se até a questão da sua existência como grandes opções anuais e, por que não, como grandes opções meramente de legislatura, ou seja, de médio prazo, nomeadamente quando estas aparecem com medidas extremamente concretas mas desvalorizando, por exemplo, a convergência real, visto que os grandes indicadores e a preocupação permanente nas diversas áreas é com a convergência nominal da economia portuguesa com a europeia.
A segunda questão tem a ver com o facto de estas grandes opções terem um orçamento ao lado, digamos, no qual se baseia o Orçamento, que aparece como um orçamento de rigor e de consciência social.
Sr. Ministro, o principal problema social é o do desemprego. Apesar de tudo aquilo que nos disse na sua intervenção, a verdade é que a expectativas dos empresários continuam negativas, face às perspectivas de investimento para o ano que aí vem. Logo, em termos do investimento privado per si, por iniciativa dos empresários, de acordo com as suas expectativas, não se vislumbram grandes melhorias. O senhor argumenta que será o investimento público mobilizador do investimento nacional e, automaticamente, o desemprego será combatido por essa área.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, ultrapassou o seu tempo. Faça favor de concluir.

O Orador: - Vou ser rápido, Sr. Presidente.

Mas quando olhamos para o Ministério para a Qualificação e o Emprego, o que se constata é uma diminuição real do seu orçamento e o Instituto do Emprego e Formação Profissional tem uma queda face à execução de 1996.
Por fim, Sr. Ministro, em relação às infra-estruturas rodoviárias, este Governo e o Partido Socialista diziam que este investimento era excessivo, no passado, e criticavam a política de betão; agora, ele passou a ser insuficiente, sendo necessário recorrer aos privados.
Assim, gostaria que dissesse, nesta Casa, como é que pode defender uma situação de privatização de troços rodoviários já hoje em funcionamento, pagos por dinheiros públicos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estou informado que o Sr. Ministro responderá de quatro em quatro pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

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O Sr. José Junqueira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, a proposta que o Sr. Ministro nos apresenta é, a todos os títulos, uma proposta credível, credibilidade essa que é fundamentada num nível de execução daquela que nos fez aqui anteriormente, que ultrapassava já, no mês anterior, penso eu, os 92%. Portanto, para aqueles que entenderam, nessa altura, que não seria possível cumprir aquilo que se anunciou como um plano apropriado e realista para o País, têm nesses números uma resposta clara e inequívoca.
Mas a sua intervenção e o seu discurso foram dirigidos para o futuro e a questão que quero colocar-lhe é uma questão do presente mas também dirigida ao futuro.
Vi que, nas opções políticas estratégicas de desenvolvimento que pensa e traça para o País, o seu Ministério e o Governo, na globalidade, têm uma concepção de desenvolvimento que assenta, essencialmente, num território equilibrado, numa regionalização que se impõe como urgente, na dignificação do poder local. Sr. Ministro, 1997 será, nesta matéria, um ano claramente decisivo. Para essa decisão, tem contribuído o trabalho da Comissão Eventual de Revisão Constitucional e tem contribuído o trabalho da Comissão do Poder Local.
O ano de 1997 será, de uma forma inequívoca, o ano em que a lei da criação das regiões administrativas será aprovada, o que corresponde, portanto, àquilo que se enuncia nas Grandes Opções do Plano e aquilo em que o Sr. Ministro põe tanto empenho. Mas 1997 será também, por parte desta Assembleia, o ano em que se concretizará, elaborará e aprovará a lei do referendo, lei essa que vai permitir concretizar esse mesmo referendo que, esperamos, viabiliza, ele próprio, este grande projecto do País e da sua reforma administrativa. Cumpre assim a Assembleia o seu papel e cumpre o PS, em particular, uma bandeira e um compromisso que assumiu perante o País.
Sr. Ministro, aquilo que eu gostava de saber, em concreto, é o seguinte: estará o Governo preparado para o enquadramento desta nova realidade regional? De que modo é que está preparado? Ao nível da regionalização dos serviços, ao nível dos quadros de pessoal e da transferência desse mesmo pessoal, ao nível da transferência do património? Sr. Ministro, o Governo estará apto para responder àquilo que, nesta Assembleia, será a realidade da regionalização?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, alguns aspectos abordarei na intervenção que vou fazer depois, pelo que procurarei não os repetir agora. Se o Sr. Ministro quiser, poderá interrogar-me depois sobre essa matéria, designadamente a articulação entre PIDDAC e ordenamento regional.
Neste momento, gostava de referir, em relação ao discurso que o Sr. Ministro fez, duas ou três questões: o Sr. Ministro privilegiou o discurso dos milhões - é natural - mas eu gostava de descer dos milhões ao concreto, a alguns problemas concretos que gostava de ver abordados pelo Sr. Ministro, quanto à qualidade desses milhões.
O Sr. Ministro começou por referir as GOP, elogiou a sua qualidade e sublinhou que o Governo irá tê-las em atenção; eu iria citar-lhe duas passagens, que estão no relatório da Comissão de Economia, uma da autoria do Sr. Deputado Henrique Neto e outra da nossa autoria, mas igualmente aprovadas, uma das quais diz o seguinte: «quando o instrumento de política sobrevive sem controvérsia e em clima de grande paz e alguma indiferença, é muito provável que não tenha grande utilidade» - é o que poderá acontecer com as Grandes Opções do Plano; a outra frase diz: «acresce que não existe tal correspondência entre as orientações apontadas nas GOP e as respectivas dotações orçamentais» - e esta é uma questão grossa, Sr. Ministro! É que uma coisa são as declarações de intenções, a que eu chamaria as piedosas declarações de intenções, o discurso a que costumo chamar de politicamente correcto, que está vertido nas GOP e outra coisa é a correspondência entre isso e as prioridades políticas e as respectivas dotações orçamentais, que estão, depois, transcritas no PIDDAC.
Portanto, estamos num quadro, que é este, Sr. Ministro: temos um Governo que faz umas Grandes Opções do Plano em que estabelece estratégias de desenvolvimento ou de crescimento que, nalguns casos, todos assinaríamos, porque são questões de bom-senso, mas depois pegamos naquilo e transplantamos para os respectivos instrumentos financeiros e verificamos que, no quadro dos instrumentos financeiros, não há instrumentos financeiros capazes de suportar aquelas estratégias.
O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Pode concretizar, Sr. Deputado?

O Sr. Afonso Candal (PS): - Isso é que vai ser mais difícil!

O Orador: - Sim, Sr. Ministro. Por exemplo, quanto ao ordenamento do território, no que toca ao PIDDAC (que não é o único instrumento de ordenamento do território, damos isso como adquirido), verificamos, na distribuição regional do investimento, que, por essa via, agravam-se as assimetrias regionais. Quanto à agricultura, fala-se em incremento da política florestal, em incremento da política de regadio, em apoio às associações de produtores e verificamos, quando vamos ver o investimento, que baixa o investimento. No que se refere ao turismo, fala-se no turismo como uma grande opção estratégica e verificamos, no Orçamento, que baixa o investimento. Posso dar-lhe mais exemplos, se o Sr. Ministro quiser!
Estamos perante umas GOP que são virtuais, porque não têm qualquer correspondência com a política orçamental do Sr. Ministro das Finanças e do Governo, no seu geral, que é transposta.

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Esta é uma contradição que o Sr. Ministro não aflorou mas era importante que o fizesse para vermos a contradição entre o que são as opções estratégicas, entre o que é um discurso politicamente correcto, e, depois, aquilo que não existe de verbas para suportar essas opções.

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, estamos num discurso do virtual!
Para terminar, Sr. Presidente, outra questão que o Sr. Ministro referiu foi que o PIDDAC, só por si, cria 20 000 empregos; o Orçamento, para além desses 20 000,

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fala em mais 10 000, ou seja, 30 000 empregos, mas, Sr. Ministro, não se esqueça que no mercado de trabalho entram 60 000 jovens à procura de emprego todos os anos, pelo que, mesmo contando com os que saem para a reforma, o resultado liquido é um aumento do desemprego.
Terceira e última questão, Sr. Presidente, para não estar só a criticar o Sr. Ministro, quero congratular-me pela reafirmação feita pelo Sr. Ministro em relação à construção do empreendimento do Alqueva.

O Sr. José Junqueira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Quero dizer que, pela nossa parte, rejeitamos completamente as pressões da Comunidade Europeia, bem como as pressões de alguns sectores, aqui, de Portugal, na Comunidade Europeia, para fazer com que o processo seja bloqueado. Acompanhamos o Governo na reivindicação de que a Comunidade tem de honrar os seus compromissos para que Alqueva se faça.

Aplausos do PS.

Há ainda uma questão a que o Sr. Ministro não respondeu na Comissão de Economia mas pode ser que responda agora, que é a seguinte: o Governo tem afirmado, e bem, que se Alqueva não for financiado pela Comunidade sê-lo-á pelo Orçamento do Estado. Sr. Ministro, se não for financiado pela Comunidade, no que toca aos cerca de 30 milhões de contos dê investimento que são precisos para o próximo ano, onde é que esse dinheiro está previsto no Orçamento para prevenir essa eventualidade?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Amaro.

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, quando estávamos a ouvir o seu discurso, lembrei-me de um passado ainda não muito distante e imaginei-o ali, naquela bancada, respondendo a um discurso do tipo daquele que produziu e dizendo que foi «de milhões, de percentagens» e perguntando: «então, e as pessoas...»

Risos do PS.

«... e as medidas para proporcionar às pessoas melhores níveis de vida?»

O Sr. Ministro, já no ano passado, numa sessão do mesmo tipo, de discussão do Orçamento do Estado de 1996, dizia, tal como o PS e o Governo, que agora é que era o arranque para a realização do muito que foi prometido e o País assistiu às suspensões, aos adiamentos, ainda que agora, para 1997, V. Ex.ª diga que agora sim, agora é que vai ser o ano cor-de-rosa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, eu até acho que vai ter, porventura, muita coisa cor-de-rosa; de resto, este Orçamento (e o Sr. Ministro disse-o bem na Comissão) não pode identificar muitas das medidas no que à sua responsabilidade diz respeito porque todos sabemos que 1997 é ano de eleições autárquicas.
Sr. Ministro, em termos de autarquias, pergunto-lhe o seguinte, e pedia-lhe que fizéssemos estas contas para depois discutirmos na especialidade: não há aumentos de 20% nas transferências para as autarquias ou para os municípios, em particular; não há pagamento daquilo que foi prometido às freguesias pelo Sr. Primeiro-Ministro, como disse a Associação Nacional das Freguesias.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É verdade!

O Orador: - Sr. Ministro, a continuar neste ritmo de crescimento das transferências para as freguesias, sabe quanto tempo é que um governo socialista precisava para satisfazer aquilo que o Secretário Geral do PS, então candidato a Primeiro-Ministro, Engenheiro António Guterres, disse que faria? Precisava de 13 anos e meio para satisfazer esse compromisso de duplicar as transferências para as freguesias, mantendo-se em 1997 o ritmo de transferência que aconteceu em 1996!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É verdade!

O Orador: - Sabe qual é já o montante da dívida aos municípios, em função dessa promessa? Neste momento, é já de cerca de 76 milhões de contos!
Sr. Ministro, quanto a Alqueva, há um ano, disse que resolvia tudo «em duas penadas». Criticou até o governo anterior pelo facto de ter decidido avançar com esta obra mesmo que a Comunidade não estivesse disposta a financiar o projecto na sua totalidade. Criticou o então governo por querer fazer isto! Nós reafirmámos que era um projecto sem bandeira, que era um projecto que ultrapassava até a importância estratégica para além das fronteiras da região do Alentejo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Ao mesmo tempo que hoje, aqui, o felicito por o ver chegado à boa causa de construir o Alqueva com Comunidade ou sem Comunidade, não posso, contudo, deixar de lamentar quanto nos atrasámos em relação a um ano.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem! Risos do PS.

O Orador: - Por último, Sr. Ministro, quão embaraçosa deve ter sido a questão do Sr. Deputado José Junqueira, porque, de regionalização, num discurso do Ministro do Planeamento, nem uma palavra! Assistiremos, com certeza, aos «últimos moicanos» do PS a acreditar naquilo que era também a reforma do século e que será mais uma adiada!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, começo por tranquilizar o Sr. Deputado Duarte Pacheco: este Governo não está a meio, pois tem apenas um ano! Se estivesse a meio, o Sr. Deputado Duarte Pacheco, nesta altura, V. Ex.ª defenderia eleições legislativas em 1997 e não sei se estaria cá para discutir o orçamento de 1998, pelas sondagens que temos...

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Tranquilize-se, Sr. Deputado, não estamos a meio, estamos a um quarto da nossa acção!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Mas já é o segundo orçamento!

O Orador: - Fizemos tanto que já lhe parece que estamos a meio!

Aplausos e risos do PS.

Dito isto, quanto às Grandes Opções do Plano e ao Orçamento do Estado, o que ouvi, foi uma crítica no sentido de que havia uma contradição em termos, ou seja, era genérico, era vago, não se percebia, era detalhado, era preciso... Tinha medidas concretas - horror dos horrores! - qualquer GOP apresentada pelo paradigma anterior? Este tem medidas concretas, Sr. Deputado, e pelas medidas concretas os conhecereis! Está lá delineado um modelo. Não é o seu modelo? Óptimo! Aliás, o Sr. Deputado Vieira de Castro diz que estamos a fazer exactamente o mesmo que o governo anterior fez.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Não!

O Orador: - O Sr. Deputado diz, que não, que não estamos a fazer nada e o Sr. Deputado Álvaro Amaro acha que perdemos o tempo, que perdemos um ano em relação a Alqueva, sendo certo e sabido que até 4 de Janeiro de 1996 não havia uma única decisão de Conselho de Ministros sobre o Alqueva, não havia nenhuma responsabilidade do governo, como colectivo, sobre o Alqueva! Fez-se uma inauguração, pretensa, simulada, de obras no Alqueva por 500 000 contos, mediante um simples despacho de Ministro, para uma obra que vai atingir 200 milhões de contos, que não tinha uma única resolução do Conselho de Ministros!
Sr. Deputado Álvaro Amaro, se só hoje ou amanhã adjudicaremos a obra, é porque os senhores só lançaram o concurso no dia 28 de Setembro de 1995, a três dias das eleições,...

Aplausos do PS.

... quando estiveram lá 10 anos! Sr. Deputado Álvaro Amaro, pode-se enganar muita gente durante algum tempo - 10 anos - mas basta!
Quanto às infra-estruturas ou betão, devo dizer o seguinte, com toda a franqueza: o nosso betão é diferente...

Risos do PSD.

Já sei que se riem, que estão humanizados...
Mas deixe-me explicar por que é que é diferente. É que era política oficial do anterior Governo fazer quilómetros de betão deixando uma cidade como Braga, a 6 km da auto-estrada, sem qualquer acesso à mesma. Fomos nós que o promovemos agora, depois de não sei quantos anos da inauguração que fizeram. O que vos interessava era a respectiva inauguração, sendo certo que se levava mais tempo - e leva hoje, qualquer Deputado de Braga o sabe -, em boa parte do ano, do centro de Braga aos 6 km a que fica a auto-estrada do que desta ao Porto.

Vozes do PS: - Exactamente!

Protestos do PSD.

O Orador: - Os senhores inauguraram o fácil, inauguraram aquilo que deu "fita" na televisão, mas não serviram a população de Braga como deveriam fazer.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Então, o melhor é fechar a auto-estrada.
O Orador: - Srs. Deputados de Leiria, há quantos anos, desde 91, que existe auto-estrada junto desta cidade, mas não há ligação entre Leiria e auto-estrada graças à tal política! A nossa política de betão foi a de fazer a ligação a Leiria.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Mas não há!

O Orador: - Sr. Deputado, vai-me permitir que lhe diga que as auto-estradas e os seus acessos não se compram na farmácia, é preciso construí-los pois são obras de 500 dias. Nós decidimos, pusemos a concurso e agora vem dizer--nos que já deveria estar pronto? Por amor de Deus!
Mas, já agora, queria explicar melhor a política do betão. Falei das variantes, falo agora da sinistralidade. No nosso novo Plano Rodoviário Nacional há um capítulo e um programa especial de sinistralidade, como há um capítulo de variantes, como há um capítulo de investimentos em vias de serviço e como há um capítulo de controlo, digamos assim, dos efeitos secundários das auto-estradas que se vão fazendo nos grandes centros urbanos. Nada disto consta do vosso programa, nada disto consta do vosso plano rodoviário. O nosso plano rodoviário parece igual ao vosso mas é totalmente diferente. Esta é uma política ao serviço da mobilidade das pessoas, a outra foi uma política de obra pública.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Por isso é que as pessoas não pagavam e agora vão ter de pagar.

O Orador: - É exactamente por isso.

Risos do PSD.

Deixe-me explicar. Vou-me rir muito quando as auto-estradas se inaugurarem e cada um dos senhores que lá passar com o seu automóvel for uma gargalhada sonora nas vossas afirmações. Eles é que vos vão dar a gargalhada, não sou eu. E veremos.
Sr. Deputado José Junqueiro, de facto o Governo tem...

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, já ultrapassou o seu tempo. Tem de ser mais rápido e concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, peço-lhe só mais 2 minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, já estou a ser tolerante.

O Orador: - Poderei utilizar qualquer figura regimental que me permita esclarecer a Câmara?

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, a Mesa tem usado de tolerância igual para todos. Peço-lhe, pois, que seja rápido.

O Orador: - Sr. Presidente serei rápido.

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Temos aqui um conjunto de doze medidas que vão desde o estatuto do pessoal das regiões administrativas, à Lei das Finanças Locais, à nova Lei de Bases do Ordenamento do Território, à nova lei de identificação, ao Código das Expropriações, que estruturarão o regime administrativo de funcionamento da autarquia regional e da autarquia municipal. Todos esses elementos ou serão promovidos pelo Governo quando for da sua competência ou ficarão à disposição da Assembleia da República.
Finalmente, Sr. Presidente, sobre o Alqueva, a realidade é a seguinte: já esclareci que não havia, de facto, financiamento assegurado, havia inauguração assegurada, o que é um bocado diferente, de umas obras, aliás, elementares. Sr. Deputado Lino de Carvalho, isso prova exactamente o contrário do que afirmou pois temos uma política de regadio, temos uma política agrícola, temos uma política regional. E, quando chegar à altura, gostarei de mostrar à Assembleia da República alguns números que comprovam que, no caso dos novos projectos PIDDAC lançados sob responsabilidade deste Governo, em 12 dos 18 distritos do país, efectivamente se corrigiram as assimetrias resultantes das obras feitas pelo anterior Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Álvaro Amaro pede a palavra para que efeito?

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, para uma interpelação à Mesa, na sequência da intervenção do Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, vou conceder-lhe a palavra, mas espero que seja uma verdadeira interpelação porque não tenho aberto excepções e não vou fazê-lo agora.

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, pretendia que, através da Mesa, a Assembleia da República registasse que o Sr. Ministro, apesar de ter franzido o sobrolho, quando lhe falei dos 3,5 anos para cumprir o prometido às autarquias não respondeu nada e para que fiquemos a saber das contradições que por cá reinam quando se tem a coragem de dizer que o Governo do PSD não decidiu nada em relação a Alqueva, quando, depois, o Sr. Ministro se queixa que houve atrasos quando o concurso foi lançado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não fez uma interpelação.
Srs. Deputados, não vou permitir a distorção da figura regimental da interpelação para se entrar em diálogo. O Sr. Ministro terá a possibilidade de responder em bloco no final.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis para um pedido de esclarecimento.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, falou com algum ênfase numa resposta que o seu PIDDAC daria a uma supressão de postos de trabalho verificada em Portugal. Quero lembrar-lhe, primeiro, a natureza dos postos de trabalho que se perderam em Portugal nos últimos anos, que são postos de trabalho com carácter de permanência e na indústria. Também lhe quero lembrar que só é legítimo falar na criação de postos de trabalho à custa do PIDDAC se nos estivermos a referir à diferença da incidência em termos de postos de trabalho entre o PIDDAC do ano passado e o deste ano. O Sr. Ministro não referiu isso e tenho muitas dúvidas que se tenham criado postos de trabalho suplementares.
Todavia, além de tudo, Sr. Ministro, o que V. Ex.ª disse à Assembleia da República não é só uma ilusão, é uma ilusão perigosa. O senhor não é o Ministro do Trabalho, não tem essa responsabilidade, portanto, também não estava obrigado a dizer isso e pode incorrer num pecado mortal se induzir esta Assembleia em erro. E num erro perigoso, porque estamos perante uma situação de emprego conjuntural gravíssima pois os últimos casos de desemprego em Portugal são de desemprego tecnológico que não é resolvido com uma política de betão armado mesmo que tenha alguma diferença da outra política, de betão armado. Mas já falaremos sobre isso.
Sendo assim, as minhas perguntas são as seguintes: ter-se-ão, de facto, criado mais postos de trabalho? A diferença entre os PIDDAC justifica esse seu optimismo? Qual é o grau de permanência dessa criação de postos de trabalho?
Em segundo lugar, o Sr. Ministro, ao referir-se à política portuária, mencionou 27 milhões de contos e perguntou se era muito ou pouco. Eu não sei responder, mas suponho que o senhor também não sabe. É que se há algum caso de infra-estruturas escandalosamente subtilizadas esse é o caso dos portos, e em zonas em que bem poderiam ser mais utilizadas pois estão a sofrer gravíssimas crises de desemprego.
Sr. Ministro, isto serve-me para referir um outro caso: este PIDDAC, como aliás todos os PIDDAC desde que me conheço, sofre de um mal crónico, que é o de não aproveitar a inter-relação industrial, não aproveitar todas as oportunidades...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo.

O Orador: - ... que cada infra-estrutura possibilita noutras áreas do desenvolvimento. Sr. Ministro, quando é que teremos um PIDDAC que encare globalmente a economia portuguesa e não um PIDDAC que seja uma adição de obras? Sem isso chego à conclusão que a diferença entre o PS e o PSD no Governo é como a diferença no betão: são alguns quilómetros de estradas..., não alteram a fisionomia do país.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Falcão e Cunha.

O Sr. Falcão e Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, se ouvi bem, o senhor disse-nos que os dois PIDDAC, o de 96 e o de 97, iam criar um volume de emprego equivalente aos empregos que teriam sido perdidos no período de 93/95. Ó Sr. Ministro, mas em 1996 o desemprego aumentou! Como é que me fala que é em 96 e 97?
Lembro-lhe os números que o Sr. Ministro das Finanças nos deu ontem: no Instituto de Emprego e Formação Profissional as inscrições de desempregados aumentaram 6% em 96; o relatório de conjuntura do Instituto Nacional de Estatística, que acaba de sair, diz: "a recuperação da actividade económica não foi suficiente para inverter a tendência do aumento do desemprego no terceiro trimestre de 1996, o número de novos desempregados voltou a aumentar"

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Então, Sr. Ministro, é em 97 que vai fazer a recuperação ou é em 96 e 97? Como disse que era em 96 e 97, a credibilidade da sua afirmação, convirá, fica afectada.
Vamos falar de acessibilidades. V. Ex.ª e o Governo mudaram a linguagem - o meu companheiro Álvaro Amaro já a isso se referiu. Quando se sentavam na bancada do PS era o ataque descabelado à política do betão e do asfalto, agora são as estradas humanas, referência feita por si com algum humor mas, convenhamos, sem nenhuma relação com a realidade. Aliás, em relação à política de acessibilidades, à tal política que o Sr. Ministro considerou uma questão de vida ou de morte para os portugueses, V. Ex.ª hoje disse muito pouco. O seu discurso passou esta matéria como gato sobre brasas. Sei porquê e vou-lhe fazer perguntas para que se veja que tenho razão.
O Sr. Ministro, em termos da Junta Autónoma das Estradas e da Brisa, vai continuar obras que já vinham do antecedente, mas provavelmente quererá abrir uma nova frente, que é a frente das portagens virtuais. Porém, esse também foi um tema pelo qual, na sua intervenção, passou como gato sobre brasas pois ainda não explicou aos portugueses o que é isso das portagens virtuais. O regime de portagens virtuais aplica-se a estradas que os privados vão construir e que o Sr. Ministro vai pagar durante um período de 20 a 25 anos - ainda não nos disse qual era esse período através de pagamentos que faz ao empreiteiro, normalmente em função do tráfego que passar nessas estradas.
Sr. Ministro isto é um pagamento diferido. Isto fica muito mais barato...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, ultrapassou o seu tempo.

O Orador: - Sr. Presidente, vou concluir.
Sr. Ministro, isto fica muito mais barato se fizer um empréstimo na Caixa Geral de Depósitos e construir a estrada! Sr. Ministro, o que o senhor está a fazer, já tive oportunidade de lhe dizer, é a desorçamentar, a não incluir no Orçamento do Estado investimentos que são da responsabilidade do Governo, que o Governo quer fazer, dos quais o Governo quer tirar dividendos, mas que não quer que figurem no Orçamento do Estado.
Sr. Ministro, é esta a questão que lhe coloco e agradecia que me esclarecesse de uma vez por todas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Deputado Nuno Abecasis, ouvi com muita atenção o que me disse e devo dizer-lhe o seguinte: referi o impacto do PIDDAC para 1997, tal como o de 1996, em termos de emprego. Se, por hipótese, o PIDDAC para 1998 caísse ou se o investimento agregado caísse em 1998 ou em 1999, sobretudo o investimento público, é evidente que os postos de trabalho não eram permanentes. Só que, Sr. Deputado, nós estamos aqui, agora, a responder pelo Orçamento do Estado para 1997, não estamos a discutir o orçamento para 1998 - nessa altura, pergunte-me se há continuidade ou não. Mas, pelo menos no que diz respeito a este Ministério, que vai manter o nível de investimento muito elevado, acima dos 700 milhões de contos até ao ano 2000, haverá continuidade. Portanto, por parte deste Ministério e atendendo ao peso que ele tem no investimento público, posso garantir-lhe que haverá continuidade.
Diz o Sr. Deputado, e bem, que do que se trata aqui é de um caso novo de desemprego e que isto não se resolve com betão, o que é verdade e não é, pois também se resolve com betão: resolve-se com casas, com investimento no aparelho produtivo e com incentivos à criação de novos postos de trabalho, resolve-se de muitas maneiras.
Mas quero dizer-lhe o seguinte: quando falamos de casas, como lhe disse, por cada milhão de contos, mantemos, pelo menos, 300 postos de trabalho; se adicionarmos um milhão de contos, criamos 300 novos postos de trabalho - é betão, é alvenaria, é actividade económica. Quando se faz uma fábrica criam-se postos de trabalho, como aconteceu no caso da fábrica da Siemens, em que se criaram 700 postos de trabalho altamente qualificados. E isto também vai ter acolhimento no Quadro Comunitário de Apoio. É essa a política que temos.
Quanto a portos, estamos empenhados, pela primeira vez desde há muitos anos neste país, em ter uma política portuária a sério. E o Sr. Deputado Nuno Abecasis reconhecê-lo-á porque conhece o sector.
Sr. Deputado Falcão e Cunha, relativamente ao emprego, falei nele e o Sr. Deputado não me contrariou. Se me tivesse contrariado, recomendava-lhe a leitura do relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano, onde está escrito, preto no branco, que, em 1993/1995, se perdeu 1% dos postos de trabalho, precisamente os que os PIDDAC para 1996 e para 1997 criaram. Isto é indesmentível. Eu falo-lhe no emprego e o Sr. Deputado não me diz nada sobre isso, portanto também não lhe respondo mais do que isto, porque nada me disse sobre as minhas palavras.
Quanto à questão das portagens virtuais, vou dar-lhe um conselho magnífico - e vejo ali o Sr. Deputado Cabrita Neto, que lhe vai "vender" a sua versão de que não se deve construir Lagos/Alcantarilha por esse malfadado sistema: o Sr. Deputado vá ao Algarve, a Vagos; a Gardete, a Abrantes, a Chaves e a Vila Real e, depois, se ainda vier de lá em boa forma física, agradeça a magnanimidade do bom povo português!
Relativamente ao facto de este Governo continuar apenas a obra anterior, devo dizer que, se assim fosse, não passaríamos, este ano, de um investimento de 200 para 270 milhões de contos e, porventura, para 300 milhões de contos no ano que vem - há-de admitir que é uma grande descontinuidade. E, se fosse assim, o Sr. Deputado, pelas ,suas próprias palavras, estaria a cair na maior das inconsequências: critica-me por fazer uma política que acha que não é boa e diz que estamos a fazer a mesma política que o PSD fez! A vossa política é que não era boa! Mas isso é outra coisa!
Finalmente, sobre a questão do preço final das estradas feitas por este novo regime, estão em causa dois factores, mas o Sr. Deputado só olha para um. Há o facto de a taxa de lucro ser maior do que a taxa de juro, factor que encarece, mas há também um factor que embaratece extraordinariamente: quando os privados se propõem defender a sua taxa de lucro fazem obras mais baratas do que o Estado, e o Sr. Deputado sabe muito bem que é assim ou não fora o facto de ter de pagar um milhão de contos pela portagem de Lisboa ou 900 000 contos pela do Freixo.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha.

A Sr.ª Maria da Luz Rosinha (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Governo, ao reconhecer, nas GOP para 1997, a família como elemento fundamental da sociedade e núcleo básico da solidariedade, está a assumir perante todos os portugueses o compromisso de, em áreas sectoriais como a da habitação, da educação, da saúde e do emprego, entre outras, ter presente esta nova maneira de estar na política, em que, tal como se dizia no programa eleitoral de 1995 e, posteriormente, no Programa do Governo, os socialistas consideram as pessoas em primeiro lugar, contrariamente ao que há pouco dizia o Sr. Deputado Álvaro Amaro.

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Quem?!

A Oradora: - O Sr. Ministro João Cravinho referiu na sua intervenção preocupações muito claras com a família na área da habitação. Noto, porém, que as necessidades de habitação vão muito para além das sentidas pelas famílias que vivem em barracas, a quem o PS se dirige. Elas são também sentidas pelas famílias que vivem em casas que já não reúnem condições - por exemplo, por falta de espaço, face à dimensão do agregado familiar e não têm possibilidades de encarar a mudança por falta de recursos económicos. Por isso, pergunto, com os olhos postos no século XXI, se existe da parte do Governo a disponibilidade para encarar o estudo de uma linha de benefícios que, a exemplo do que acontece para os jovens, venha a facilitar a aquisição de casa própria pelas famílias nas condições que referi.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro João Cravinho, já em sede própria lhe dirigi esta pergunta, mas, dado que a resposta que me deu não foi satisfatória, voltarei a questioná-lo - refiro-me ao Plano de Investimentos e de Despesa para o Desenvolvimento da Administração Central (PIDDAC). Depois de uma análise mais profunda, verifiquei que um terço dos investimentos previstos no PIDDAC se concentram na região de Lisboa e Vale do Tejo e que cerca de dois terços se localizam numa faixa litoral que vai de Setúbal até ao Porto.
Assim sendo, pergunto: e as gentes do interior? E pergunto ainda: é assim que se combatem as assimetrias? É assim que se combatem os desequilíbrios entre as grandes cidades e as cidades do interior, entre o litoral e o interior?
Mas, mais do que isso, a aplicação do PIDDAC localiza-se em zonas com maior densidade populacional e também mais desenvolvidas. Não se encerrará aí um pouco de eleitoralismo, dado que, no próximo ano, teremos eleições autárquicas?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Gostaria ainda de referir uma outra questão e de sublinhar o diferente tratamento que tiverem os dois acontecimentos ocorridos, um em Lisboa, na semana passada, com o incêndio na Câmara Municipal de Lisboa, que todos lamentamos, e aquele que aconteceu há uns tempos atrás no Porto: na Câmara Municipal de Lisboa, de imediato, variadíssimos ministros se prontificaram a comparticipar em metade da despesa; para o Coliseu do Porto ninguém levantou voz. É assim que se combatem as diferenças entre Lisboa e Porto?

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Parece o Manuel Serrão na Noite da Má Língua!
O Orador: - Sr. Ministro, isto não é aumentar o macrocefalismo de Lisboa? Gostaria que me respondesse.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, começaria por lhe agradecer as amáveis referências ao relatório sobre as Grandes Opções do Plano elaborado pela Comissão de Economia, Finanças e Plano. E agradeço-lho, tanto no plano pessoal como no plano político - penso que, no plano político essa referência foi importante porque a oposição, na discussão na Comissão, quis ver no relatório críticas ao Ministério de V. Ex.ª. Mas, ao pensarem em tal, revelam apenas que me conhecem mal e que conhecem mal a admiração e o respeito que, há muitos anos, tenho pelo intelectual e pelo cidadão que hoje é Ministro, bem como compreenderam mal que aquilo que eu pretendia era ter ideias alternativas e diferentes, propostas eventualmente contraditórias, inaceitáveis, mas propostas em qualquer dos casos.
Devo confessar que também na nossa própria bancada alguém terá ficado preocupado - é normal, é da vida! - com a reacção do Ministro. Neste caso, receio que não era a mim que conheciam mal, mas ao Ministro, porque, de facto - e essa é a importância política da referência que fez -, penso que este Parlamento e esta Câmara só teriam á ganhar no seu trabalho se fosse mais fácil debater ideias; se fosse mais fácil ter ideias alternativas, fazer propostas eventualmente diferentes, sem a preocupação de se estar ou não a fazer crítica.
Na realidade, a excessiva obsessão com a conformidade pode ser limitativa do trabalho dos Deputados e pode conduzir a uma menor qualidade. E cito um caso: por exemplo, na bancada do PSD tem vindo a dizer-se que o aumento da gasolina é um aumento de impostos. Aqui está o resultado de não se ter ideias, o resultado de não se ter propostas alternativas, de se ser conformista, o que, no fundo, resulta numa má qualidade.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Por outro lado, há muitos anos, que sou empresário, que trabalho a tentar mudar as coisas, mas tenho de reconhecer, por experiência própria, que é muito difícil mudar as coisas. O relatório das Grandes Opções do Plano contém ideias ou propostas para o futuro, mas reconheço a grande dificuldade de mudar, principalmente quando estão em causa estruturas humanas, quando estão em causa milhares de pessoas, nas organizações e, neste caso, no Ministério. É que não se muda essa organização, não se muda o Ministério, não se muda a Administração Pública num ano, nem em dois, muitas vezes nem numa

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geração. Por isso, tenho muito respeito pela dificuldade em mudar.
Em qualquer dos casos, pergunto ao Sr. Ministro se será possível evoluir o método de planeamento do Estado, em termos dos grandes planos de desenvolvimento regional, no sentido de poder haver mais criatividade das regiões quanto a fazerem propostas de programas de desenvolvimento e de que uma fatia substancial do investimento do Estado possa ser distribuída através da escolha entre projectos concorrentes apresentados.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha, a questão que me colocou é pertinente e muito importante. O Orçamento do Estado, na generalidade, faz um investimento da ordem dos 32/34 milhões de contos - depende do que se contabiliza exactamente - a favor da habitação dita social, investindo mais 40 milhões de contos em bonificação de juros e, por sua vez, dá isenções, as mais variadas, que correspondem a despesa fiscal.
Portanto, o Estado gasta pouco neste sector - na opinião do Governo deveria gastar, e preparamo-nos para que assim suceda -, mas é verdade que há, nesta opção, estratos que são iminentemente prejudicados, designadamente aqueles que não têm poder de compra solvente ao preço a que as rendas estão - as novas rendas. É absolutamente proibitivo para a grande maioria dos portugueses ter acesso a uma casa nova, digna e decente se não houver uma intervenção estadual, e essa intervenção tem de ser feita respeitando a dignidade das pessoas, o seu direito à inserção nos seus meios de preferência - é essa a política que fazemos. Para determinados estratos há, em todo o caso, uma política que tem de ser e está a ser concertada com o sector privado, com as empresas, no sentido de criar muitos mais fogos sob custos controlados - construção sob custos controlados. Toda a nossa política vai no sentido de, através da coerência da fiscalidade, da intervenção no mercado social e da incentivação à indústria de construção sã, dar muito mais habitação de custos controlados e trazer para o mercado uns 200 000 a 250 000 fogos, que hoje ninguém ocupa e que representam um enorme desperdício social, um enorme desperdício para a colectividade.
Quando a nossa política vai neste sentido, é atacada por aqueles que querem construção para os rendimentos altos. Sejamos claro, não há falta dessa construção. Pelo contrário, há excesso. Todos os anos, 25 000 fogos são desocupados e ficam, sem terem ninguém lá dentro, à espera ou da destruição, para se construírem oito andares, ou do filho que há-de casar daqui a 10 anos, ou da sogra que há-de morrer não se sabe quando. Isto é sabido. São 25 000 fogos/ano. É preciso atacar esta situação e dizer verdades que doem e muitas vezes são contraditórias com as que têm curso fácil.
Nós estamos a fazer, e demonstrei-o há pouco, um grande esforço na habitação. Construímos já para cima de 10 000 fogos num período muito curto de intervenção, de quatro ou cinco meses, enquanto que em 1994 e 1995 não se construíram mais de 2000. É um grande esforço, mas falta fazer muito mais.
Então, poderemos responder positivamente à sua pergunta. No entanto, não é apenas o Governo mas, sim, toda a Assembleia que tem de se co-responsabilizar e não deve sabotar e nem fazer tráfico de ideias e de inverdades.
Sr. Deputado Augusto Boucinha, sobre o Coliseu do Porto, poder-se-ia dizer que lhe encomendei a pergunta, a dois títulos...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Salvo seja!

O Orador: - Salvo seja.
Vou na segunda-feira assinar o contrato que dará 100 000 contos ao Coliseu do Porto. Mas porquê 100 000?

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Mas, espontaneamente, não o fez!

O Orador: - Espontaneamente! Estive lá no dia a seguir ao fogo e a minha primeira palavra foi de solidariedade. Perguntei qual era o valor dos prejuízos; disseram-me que era de cerca de 250 000 contos. Perguntei também quanto é que estava coberto pelo seguro; foi-me dito que só 150 000 contos. Têm 100 000 - disse.
Não podia dar mais!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O senhor talvez pudesse, com o seu dinheiro de bolso. Mas eu não, pois administro dinheiros do Estado.

Risos.

Veja como as coisas são! Dei ao Porto tudo quanto o Porto precisava.
Quanto ao incêndio na Câmara de Lisboa, estive lá no próprio dia, estava-se ainda no rescaldo, e não cheguei mais cedo porque tive uma visita de Estado e tinha obrigação de ser hospitaleiro. Mas esteve lá o Sr. Secretário de Estado da Administração Local desde o princípio e assim que pude, quando lá cheguei, perguntei: de quanto são os prejuízos? Responderam-me que eram de cerca 1,5 milhões de contos. Exactamente como fiz no Porto, perguntei quanto estava coberto pelo seguro. Responderam-me que só o recheio. O Estado não segura edifícios e lembro que o Coliseu do Porto não é do Estado. Então, têm metade, por solidariedade - disse.

De igual modo, terá sempre metade, pelo menos, qualquer catástrofe que ocorra neste País, seja ela qual for, porque o Governo é parte solidária da resolução de todos os problemas de sinistro neste País.

Aplausos do PS.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - E o PIDDAC?

O Orador: - Tenho a grata notícia a dar-lhe, bem como de demonstrar-lho, de que no PIDDAC, que vai deslizando com novos projectos, como já lhe disse, em 18 distritos, 12 melhoraram muito a sua posição relativa nos novos projectos e alguns perderam, como Lisboa e Setúbal, fundamentalmente, por razões óbvias - e quero realçar que nada tenho contra Lisboa e Setúbal, bem pelo contrário - e pelo facto de haver dois terços do PIDDAC no

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litoral, pois vive lá 75% da população. O Sr. Deputado não deu ainda por isso.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Já dei, já dei! E no interior não vive gente?

O Orador: - Quanto ao interior, lá vamos aos DBFO, às tais subestradas virtuais. A maior parte dos 150 milhões de contos mais concretamente 100 milhões de contos - em estradas virtuais é para que o interior, e precisamente o interior, tenha estradas até ao ano 2000, enquanto que, com o sistema que vinha de anteriormente, nem no ano 2010 isso aconteceria. Isto é que é solidariedade. Quem paga? Paga todo o País, através dos impostos. Paga todo o País. Isto é que é solidariedade. A resposta é esta. Estamos a fazer o que podemos para transferir investimentos a favor das populações do interior.
No que toca à política das cidades, vou a Coimbra e ao Porto na segunda-feira - já lhe disse, em parte, o que ia fazer -, para celebrar contratos com cerca de 10 câmaras municipais, ao abrigo do Programa PROSIURB.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, faça o favor de concluir.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Henrique Neto, nada é mais detestado pelos conservadores do que a mudança. Nada é mais difícil do que a mudança. Nada vale mais do que a mudança. Mas fá-la-emos. Estamos a fazê-la. Por isso é que somos atacados. Ai de nós se não formos atacados.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, a minha intervenção era dirigida à Sr.ª Ministra da Saúde, mas como ela saiu agora, dirigi-la-ei, então, ao Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (António Guterres): A Sr.ª Ministra da Saúde teve uma reunião com as ARS. Mas estará cá de tarde. Se quiser fazer a intervenção nessa altura...

A Oradora: - Seria preferível.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, a Sr.ª Ministra acaba de entrar na Sala.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Saúde: Peço desculpa por a ter obrigado a regressar ao Hemiciclo, mas penso que não faz sentido uma intervenção na área da saúde sem a sua presença.
Apresentou V. Ex.ª, em Fevereiro passado, a este Parlamento, um orçamento para 1996 que assentava em três pressupostos que não se verificaram. Era previsível que assim fosse e, oportunamente, nesta Câmara, dissemo-lo e explicámos porquê.
De facto, não era possível ao Ministério da Saúde, por uma simples declaração voluntarista, diminuir para menos de metade as despesas com medicamentos e meios de diagnóstico convencionados.
Na área do medicamento, eram várias as medidas a tomar e óbvio se tornava que não podiam, por extemporâneas, influenciar a execução orçamental de 1996.
O mesmo se diga da área dos convencionados, onde se impunham medidas de racionalização, que passavam por uma nova legislação sobre convenções e pelo levantamento e rentabilização da oferta existente.
Quanto ao aumento significativo de receitas próprias, por incremento de facturação e cobrança, todos sabíamos ser impossível sem o cartão do utente, que identificasse o financiador e desencorajasse ou impedisse um doente múltiplo, passeando sem proveito e com grande desperdício pelo sistema.
Sr.ª Ministra, é pois natural que vejamos com preocupação o orçamento apresentado por si para 1997.
O Serviço Nacional de Saúde continua um saco roto, onde tudo o que se acrescenta se perde. As unidades de saúde continuam organizadas e geridas de acordo com modelos e métodos obsoletos.
Onde estão, Sr.ª Ministra, os modelos estruturais e de gestão para os serviços de saúde e os mecanismos de competição gerida, contidos no Programa do Governo e nas GOP?
Onde está o sistema de informação económico-financeiro do Serviço Nacional de Saúde, sem o qual nem mesmo V. Ex.ª pode saber o que gasta e como gasta do Orçamento do Estado?
Onde está o cartão do utente, sem o qual nenhum ordenamento racional do sistema é possível?
Onde está a lei das convenções, que, dignificando e creditando os prestadores privados, termine com uma relação parasitária que a ninguém aproveita?
Onde está a carta de equipamentos de saúde, sem a qual não existe levantamento da oferta e sem a qual os investimentos na área da saúde são sempre deficientemente fundamentados?
Sr.ª Ministra, não obstante reconhecer os esforço de V. Ex.ª em áreas concretas, como a do medicamento, e, por isso, quanto mais não seja, louvar a sua determinação, tudo o que está por fazer, ainda que fosse passível de ser feito em 1997, não terá efeitos sensíveis no Orçamento que agora se discute. Ele está, assim, uma vez mais, desvirtuado, porque as intenções, como todos sabemos, não têm, por definição nem natureza, reflexo orçamental.
Sr.ª Ministra, ou se combatem as causas ou se financiam os efeitos. O ano de 1997, na área da saúde, será mais um ano de esforço inútil para o objectivo improdutivo de financiar os efeitos.
Mas, Sr.ª Ministra, acresce ainda que todos sabemos que qualquer reforma que vise destatizar tem de incluir medidas fiscais.
Todos sabemos que o Orçamento é também - tem de o ser - instrumento indispensável de reforma.
Face ao Orçamento de 1997, julgamos que V. Ex.ª deveria não apenas tentar cobrir a sua parte de despesa pública mas claramente instituí-lo como um auxiliar precioso no encorajamento de comportamentos reformadores.
As despesas fiscais, só na área da saúde, atingiram, em 1994, 40 milhões de contos. Ora, este número sugere de imediato que, sem acréscimo da despesa fiscal e através de medidas muito simples, se introduzam mecanismos de correcção básicos.
Em primeiro lugar, transformar as deduções à matéria colectável em deduções à colecta, criando mais equidade social e favorecendo cerca de 80% dos agregados com rendimentos mais baixos.

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Em segundo lugar, favorecer, através dos créditos fiscais, o opting out, tal como consta do Programa do Governo.
Em terceiro lugar, introduzir limites mínimos aos abatimentos para despesas com cuidados de saúde, de modo a evitar, o risco moral e o consumo imoderado.
Só assim se evitaria duplicar inutilmente despesas públicas com a saúde, as provenientes do financiamento dos benefícios fiscais e as decorrentes do financiamento directo do próprio sistema, beneficiando agregados com menores rendimentos e orientando comportamentos com vista à utilização racional dos recursos disponíveis. Estudos de grande qualidade demonstram esta evidência. São tão acessíveis para mim como, decerto, mais para V. Ex.ª. E aqui, Sr.ª Ministra, já nada há a reflectir, há simplesmente que actuar. Esperamos, sinceramente, que o faça.

Aplausos do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Marques.

O Sr. Alberto Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, ouvi-a com a maior atenção e, sabendo como sei que é uma pessoa extremamente interessada nas questões da saúde, naturalmente, o que disse tem ainda um maior significado. No entanto, permita-me que não concorde com uma grande parte do que disse.
Penso que a sua intervenção foi no sentido de negar - o que não corresponde à verdade - que não tenha sido, com determinação e clareza, introduzido um novo rumo na gestão da política de saúde em Portugal com o Governo da nova maioria.
Se não, vejamos: é ou não verdade que foi introduzida uma política nova de clara separação entre a componente financiadora e a prestadora de cuidados de saúde, que permitiu - e essa foi uma atitude corajosa - descentralizar competências para as administrações regionais de saúde, que agora podem, de facto, tomar medidas coerentes com as necessidades efectivas das populações, as quais são, obviamente, diferentes no norte ou no sul, no interior ou no litoral, sendo hoje possível, com as medidas introduzidas, fazer uma gestão dos interesses do cidadão sob o ponto de vista da saúde de acordo com as suas necessidades?
É ou não verdade que foram levadas a cabo experiências inovadoras no sentido de melhorar a acessibilidade, a qualidade e a humanização de atendimento na área de cuidados de saúde, nomeadamente nos cuidados de saúde primários, como é o caso do conhecido Projecto Alfa, que, naturalmente, está ainda a dar os primeiros passos?
É ou não verdade que há já no terreno uma clara preocupação de operacionalizar, ao nível local, os cuidados de saúde, nomeadamente através de medidas legislativas na área dos centros de saúde, que permitam, de facto, conseguir uma gestão competente nos centros de saúde, paralelamente à gestão profissionalizada e eficaz que já existe nos hospitais?
É ou não verdade, Sr.ª Deputada, que este Orçamento que agora discutimos, no que toca à saúde, vai pela primeira vez, em 1997, permitir um equilíbrio de crescimento entre a receita e a despesa, no que diz respeito ao Serviço Nacional de Saúde?
Penso que concordará connosco em que aquilo que dizíamos é verdade, isto é, estamos, de facto, num novo rumo.
Também é verdade que não foi possível fazer tudo o que, eventualmente, nós próprios reconhecemos como necessário e claramente determinamos no nosso Programa para a legislatura.
Concordamos em que ainda há muito a fazer, mas permita-me que discordemos de que, de alguma forma, tenha insinuado que ainda nada se fez. Não é verdade. Como sabe, e teve também oportunidade de o dizer, aquando do debate do Orçamento do Estado para 1996, não é possível num ano ou numa legislatura conseguir resolver o défice crónico, as deficiências de gestão crónicas de mais de 10 anos, na área da saúde. Faça-se-nos a justiça e reconheça-se que foi já possível, em pouco mais de um ano, se calhar, recuperar os erros de mais de dois ou de três anos.
Estamos convictos de que, a manter-se este rumo, esta clareza, esta transparência, esta determinação em fazer a reforma, e fazendo-a com segurança, ouvindo todos os parceiros, com a perspectiva de satisfazer as necessidades dos portugueses, certamente, será possível fazer mais e melhor pela saúde dos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Marques, julgo que não entendeu o que eu disse.
As coisas que me pergunta serem verdade, se estão ou não feitas, na realidade não estão feitas, e é melhor que o reconheçamos. O que não significa que não possam vir a ser feitas durante a legislatura. Mas estou a discutir o Orçamento do Estado e as Grandes Opções do Plano para 1997. O que digo agora, como disse no ano passado, é que os pressupostos não estão verificados. E, como não estão verificados, as coisas não vão acontecer. Diferente seria se a Sr.ª Ministra dissesse: "tenho um projecto ambicioso". Porque, repare, não houve qualquer alteração na gestão, houve, sim, na política. E isso nós reconhecemos desde o princípio. Houve alteração na política mas não na gestão.
Portanto, quanto a essas medidas políticas, compete ao Governo, nomeadamente à Sr.ª Ministra, dizer: "executam-se em quatro anos, em três, em dois, começa-se por estas, é necessário dar tempo, dar prazos...".
Ora, como isso não acontece, estamos agora a ouvir os mesmos pressupostos que ouvimos no ano passado. E continuam a não ser válidos. O Sr. Deputado não vai ter o cartão de utente de forma a influenciar a execução orçamental de 1997. E sabemos que não o vai ter. De igual modo, não vai ter o sistema de informação económico-financeiro do SNS. Não vai. O senhor não tem qualquer alteração da lei da gestão hospitalar em vista, excepto para eleger médicos e enfermeiros. Não tem qualquer modelo de gestão alternativo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Não separou o financiamento da prestação. O senhor descentralizou para as ARS, que são muito

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mais financiadoras e prestadoras, portanto, com muito maior confusão, do que quando estava no IGIF. O Sr. Deputado não tem nada disso.
Quando falamos de separação entre financiamento e prestação, em linguagem de saúde, todos sabemos o que estamos a dizer. Trata-se de uma entidade separada, eventualmente mesmo fora, do Ministério da Saúde, que possa comprar os serviços de acordo com as necessidades dos portugueses, negociando os preços prospectivamente. É disso que estamos a falar e não de outra coisa.
Portanto, quero dizer o seguinte: a Sr.ª Ministra apresentou um programa político que, penso, é importante para Portugal e para os portugueses; a Sr.ª Ministra apresentou prazos muitos optimistas; o Sr. Secretário de Estado, por duas vezes consecutivas, disse-nos: "Vamos diminuir a despesa e vamos aumentar a receita, assim, assim e assim". Ora, eu digo: "Assim, assim e assim, não vão!" Estou só a dizê-lo. Aliás, não temos cá o orçamento rectificativo, mas, quando tivermos, nessa altura, faça-me essas perguntas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Antes de propriamente iniciar a minha intervenção, gostaria de relembrar que já vamos a meio do debate sobre o Orçamento e continuamos sem conhecer a resposta do Sr. Primeiro-Ministro à seguinte pergunta política, há meses formulada: que faz o Governo se a proposta de lei sobre o Orçamento do Estado não passar nesta Câmara? Continuamos à espera dessa resposta por parte do Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Isso já é uma obsessão!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Faz agora precisamente um ano que, em linguagem própria de "mineiros e cavadores", alguns membros do Governo se esforçaram por anunciar que as contas públicas estariam repletas de "buracos".

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É bom lembrar!

O Orador: - Era com a verba de 600 milhões de contos que se pretendia atordoar a opinião pública e, assim, começar, logo à partida, a arranjar uma boa desculpa para todas as falhas governativas que, seguramente, iriam começar a surgir.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Mas não surgiram!

O Orador: - Passados que foram 12 meses sobre a "inventona dos buracos" e conhecidas que são a execução orçamental de 1995 e a sua projecção de 1996, eis-nos perante a fria realidade que comprova tudo o que o PSD disse há um ano atrás. A herança que este Governo recebeu não tinha os ditos "buracos"; tinha, sim, folgas que, em larga medida, serviram para cobrir os devaneios gastadores do Orçamento socialista do presente ano.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Está, hoje, claro, perante a opinião pública portuguesa que se interessa por estas matérias, que este Governo herdou um quadro macroeconómico estável e em completa consonância com os critérios de convergência nominal para a moeda única: o défice público em queda acentuada; a dívida pública no limiar da tendência decrescente, face à redução do défice e ao programa de privatizações; a inflação aos níveis mais baixos do pós 25 de Abril; as taxas de juro em queda acentuada e o escudo em plena estabilidade cambial no âmbito do Sistema Monetário Europeu.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A taxa de desemprego, se bem que um pouco acima daquilo que tinha sido a média dos anos anteriores, continuava a ser a mais baixa da Europa comunitária e o investimento, que fôra o verdadeiro motor da retoma, assegurava que bastaria não fazer asneiras para que a economia portuguesa pudesse continuar na senda da convergência real, que tinha sido conseguida durante o anterior ciclo económico.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Só que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, volvidos 12 meses de governação socialista, a boa herança não chegou para que a economia portuguesa pudesse reencontrar os melhores caminhos para o crescimento e o emprego.
E não podia chegar, porque efectivamente se acumularam erros e facilidades a mais, sem que, entretanto, se tenha tomado qualquer medida de fundo ou se tenha iniciado qualquer reforma.
Foi fácil acabar com as propinas! Foi fácil abolir portagens! Foi fácil acabar com a barragem de Foz Côa e seria, certamente, muito fácil, resolver dívidas fiscais com totonegócios ou qualquer outra habilidade do género.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Só que isso não é governar! Governar é olhar para o futuro e tomar medidas, sem atender aos índices de popularidade ou às manchettes da comunicação social.
E se, realmente, não foi complicado prometer mundos e fundos, enquanto oposição, ou anunciar meia dúzia de decisões "popularuchas", enquanto poder, as dificuldades, obviamente, aparecem, se se tentar governar e preparar o futuro de Portugal.
Ao cabo do primeiro ano de governação socialista não se assistiu ainda a uma única reforma de fundo.
O Partido Socialista continua a preferir o adiamento das questões, utilizando, para o efeito, um velho alibi, cada vez mais gasto: tudo o que está por fazer é porque o PSD não o fez no passado.
Tal argumentação conduz-nos, directamente, ao absurdo, ou seja, o PS nada precisa de fazer. Se o PSD fez, está feito. Se o PSD não fez, devia ter feito, pelo que a responsabilidade lhe cabe por inteiro.
É uma postura curiosa de quem manifestamente não se consegue adaptar às suas novas responsabilidades. É já claro que o PS não consegue governar e que apenas sabe ser oposição. O quotidiano deste Governo consiste basicamente em gerir a conjuntura, analisar os seus índices de popularidade, preocupar-se com a comunicação social e

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responsabilizar o anterior Governo por tudo aquilo que, ele próprio, não faz.

Aplausos do PSD.

É, realmente, uma postura curiosa, que a realidade não deixa ocultar e que acarreta óbvios custos para o desenvolvimento do País.
Apesar de tanto ter apelidado o sistema fiscal português de injusto, o PS ainda não foi capaz de iniciar a sua reestruturação. Preferiu optar por recorrer a medidas ainda mais injustas e perfeitamente ultrapassadas, essas, sim, geradoras das mais profundas arbitrariedades fiscais.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Apesar de, igualmente, tanto ter clamado por uma reforma da segurança social, não se vislumbra, neste Executivo, a coragem necessária para levar a cabo tão importante tarefa para o futuro de todos nós.
Apesar de tanto ter aproveitado as dificuldades do nosso sistema de saúde para fazer oposição ao anterior Governo, o PS é incapaz de dar um único passo para encetar a sua reforma. Aliás, ao contrário do que seria de esperar, opta por agravar ainda mais a situação, admitindo aumentos de preços nos medicamentos, que ninguém de bom senso pode e deve aceitar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Que injustiça!

Vozes do PS: - É falso!

O Orador: - Apesar de tanto ter reclamado a necessária reforma da Administração Pública, nada faz prever que esteja no horizonte deste Executivo tomar qualquer medida de fundo neste importante sector da economia nacional.
Apesar de tanto ter declarado a sua paixão pela educação, o Sr. Primeiro-Ministro ainda não conseguiu explicar aos portugueses qual a diferença de tratamento que dá a um sector, pelo qual se encontra apaixonado, face a um outro, pelo qual nada sente de especial.
Aliás, a outra grande paixão de António Guterres, a regionalização, também se encontra, de momento, na gaveta, à espera de melhores e bons dias.
Constata-se, assim, que, perante tais factos e no que concerne às anunciadas paixões do chefe do nosso Executivo, o País está, presentemente, perante um óbvio dilema: ou elas eram verdadeiras e, por falta de perícia governativa, sucumbiram logo às primeiras dificuldades, ou elas não eram sinceras e correspondiam, assim, apenas à superficialidade de um simples flirt, próprio de um Outono eleitoral.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas se há paixões que perturbam a acção deste Governo e que, por isso, estão frequentemente presentes no seu quotidiano, o dia de hoje é, nessa matéria, particularmente simbólico.
O dia de hoje assinala, por mais incrível que possa parecer, no curto espaço de um ano, o terceiro aumento do preço dos combustíveis, em Portugal.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É um escândalo!

O Orador: - Lembramo-nos bem do que foi a governação socialista no passado e a sua paixão pelos constantes aumentos do preço da gasolina. Por isso, não nos admiramos que, agora, o volte a fazer. Só que, desta vez, a desculpa é mais sofisticada. A desculpa consiste em tentar imputar a culpa do aumento ao PSD, porque ele é determinado com base num diploma elaborado pelo anterior Ministério da Indústria. Se assim é, se o diploma é assim tão mau, por que espera, então, o Governo para o alterar ?
Se esse maldito diploma dita agora tantos aumentos dos combustíveis, por que razão o actual Ministério da Economia não tratou já da sua alteração?

Aplausos do PSD.

É cómodo fazer o mal e tentar responsabilizar, ardilosamente, os outros; só que um dos papéis da oposição é precisamente o de alertar a opinião pública quando tal acontece. Por isso, temos de dizer claramente aos portugueses: se a gasolina já aumentou três vezes é apenas porque este Governo assim o quis. Tudo o mais não passam de meras desculpas que apenas visam enganar os consumidores.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: No início do presente ano, quando aqui discutimos o Orçamento do Estado para 1996, declarámos que, perante a fraca redução do défice prevista e os cortes no investimento público, três coisas tinham de acontecer.
O desemprego teria de aumentar, pois o Orçamento não era utilizado como um instrumento de combate a esse flagelo; os impostos teriam de aumentar, em 1997, e os aumentos salariais dos funcionários públicos, no próximo ano, seriam forçosamente muito baixos.
Não o dissemos porque nos tivéssemos deitado a adivinhar. Dissemo-lo porque, perante a política orçamental seguida, em que apenas se reduzia o défice pelo exacto montante da redução dos juros da dívida pública, estava-se a deixar para amanhã o que se podia fazer hoje. Em 1996, a redução do défice orçamental correspondeu, apenas, aos benefícios directamente importados da política monetária do anterior Executivo. Em 1996, a redução do défice deve-se, exclusivamente, à boa herança recebida.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não se fez, assim, no ano transacto, qualquer esforço real de contenção orçamental, pelo que era evidente que, em 1997, a redução do défice teria de rondar os 140 milhões de contos. Nada de mais certo, perante as opções do Orçamento de 1996.
E, como não podia deixar de ser, aqui temos nesta Assembleia da República uma proposta de Orçamento para 1997, que coincide integralmente com o que, na devida altura, prudentemente avisámos.
Passado um ano, o desemprego aumentou. Passado um ano, o Governo propõe aumentos de impostos. Passado um ano, os funcionários públicos que, perante as promessas socialistas, julgavam que iam ter bons aumentos salariais, estão, agora, na expectativa de terem aumentos reais inferiores aos do passado.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Você, desde que trabalha com o Marcelo, "estragou-se"! O Marcelo "estragou-o"!

O Orador: - Espero que esta agitação na bancada do Partido Socialista signifique que os aumentos para a função pública sejam superiores a 3%.
Mas os males da proposta de lei de Orçamento do Estado, que hoje aqui debatemos, não se confinam à herança difícil do ano transacto. Este documento tem, ele próprio, defeitos que, da nossa parte, não são aceitáveis e encerram opções erradas face às necessidades do País.
Desde logo, a política seguida para redução do défice e cumprimento do critério de convergência é, quanto a nós, completamente errada. O défice devia ser reduzido pela contenção da despesa e não pelo aumento da receita. A lógica gastadora, que imperou em 1996, continua em 1997.
A despesa total, sem juros, aumenta 7,6% e o seu peso no PIB continua a crescer.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A despesa corrente aumenta 7,2% e o seu peso na economia reforça-se mais uma vez.
É bom que se diga aos portugueses que, ao cabo de dois anos de política orçamental socialista, a despesa total, sem juros, cresce 1071 milhões de contos ao ano. Repito, Sr. Presidente: o Estado gasta, em apenas dois anos, por mais incrível que pareça, mais 1071 milhões de contos ao ano. Trata-se de um crescimento de 15,8% relativamente aos níveis de 1995.

Aplausos do PSD.

No que concerne à despesa corrente, o crescimento acumulado, nos dois primeiros anos de governação socialista, ascenderá a 865 milhões de contos, ou seja, precisamente mais 15,1% do que o montante correspondente ao último ano em que o PSD foi responsável pela elaboração do Orçamento do Estado.
É caso para nos interrogarmos em que nível estará a despesa pública quando terminarmos a presente legislatura. A continuar a este ritmo, não é difícil de prever como estarão as finanças públicas portuguesas, se a lógica gastadora da governação socialista continuar a prevalecer nos próximos Orçamentos.
Estarão, seguramente, a níveis incomportáveis para o desenvolvimento do País.
Se o combate à evasão e à fraude fiscal permitem aumentos de receita, esses aumentos deviam ser canalizado para baixar os impostos de quem paga e não para financiar o despesismo do Estado.
As receitas fiscais sobem, no presente Orçamento, 8,9%. Mas o que é mais dramático é que, se se analisar, também neste capítulo, a evolução acumulada ao fim de dois orçamentos socialistas, chega-se à conclusão de que, neste período cor-de-rosa, o Governo aumentou a receita fiscal anual em 630 milhões de contos, ou seja, mais 18,6%.
Em 1995, as receitas fiscais correspondiam a 21,8% do PIB. Em 1997, corresponderão a 22,8%. É o preço que os portugueses pagam pelo despesismo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Já ninguém acredita nisso!

O Orador: - É o preço da falta de rigor. Porque rigor não é só baixar o défice. Rigor é gastar e cobrar com moderação e equilíbrio. Não há rigor, quando, em apenas dois anos, se aumenta a receita fiscal em 18,6%, com o intuito de financiar um montante de despesa 15,8% superior ao herdado.
Se, no entanto, fizermos idêntica análise às verbas do investimento público, chegamos a conclusões diversas das anteriores. O PIDDAC nacional, que, em 1995, correspondeu a 2,43% do PIB, atingirá, em 1996, 2,25% e, em 1997, 2,35%. Torna-se, assim, claro que o Governo trata as despesas de investimento como uma rubrica menor da despesa pública. O Governo prefere gastar, a investir.
Não é este o caminho que assegura uma convivência saudável da nossa economia com a moeda única. Não basta chegar à moeda única, é preciso ter condições para lá poder permanecer. Constantes aumentos de despesa não asseguram, certamente, um futuro risonho para o Portugal do primeiro pelotão da União Económica e Monetária.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao cabo do segundo Orçamento socialista, tornou-se também claro que as principais promessas que o PS fez aos portugueses não são para cumprir.
Em dois anos, o peso da Educação no PIB subiu apenas 0,25%. É, pois, claro que a promessa de mais 1% em quatro anos não será já alcançada.
Em dois anos, o peso da Saúde no PIB subiu de 4,6% para 4,8%. É, pois, evidente que o desejo dos 6% jamais será cumprido.
Em dois anos, as verbas do Fundo de Equilíbrio Financeiro cresceram cerca de 14,2%, apenas 0,5% mais do que num só ano de 1995.
Parece, pois, evidente que a promessa de um crescimento de 100%, durante a legislatura, bem pode ser esquecida. O Sr. Primeiro-Ministro, pelos vistos, já não pensa o que pensava sobre esta matéria. Há pouco mais de um ano, dizia que um escudo gasto pelas autarquias era um escudo muito mais bem gasto do que pela administração central. Hoje, contenta-se em dar, em dois anos, aquilo que o PSD deu num só.

Risos do PS.

O problema também não é muito grave, porque, para os autarcas socialistas, em 1995, 13,7% de aumento foi ,pouco, mas, hoje, 5% já é o bastante.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Que dizer, também, da promessa de mais justiça fiscal? Mais justiça fiscal que, na óptica socialista, se consubstancia em tributar o contribuinte por métodos indiciários e decretar um imposto mínimo garantido, independentemente do rendimento real do cidadão.
Neste capitulo, também é curioso referir que, para o Governo, a eficácia da administração fiscal é boa ou má, consoante os objectivos que pretende prosseguir.
É má, quando se pretende justificar a introdução do imposto mínimo. É boa, quando se tenta explicar aos portugueses que o aumento da receita fiscal não se traduz em aumento de impostos mas, sim, em melhor eficácia dessa mesma administração fiscal.

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O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Ah! Já começou a perceber!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Esta proposta de Orçamento do Estado para 1997 é má. Peca, do lado da receita, e peca, do lado da despesa. Impõe-se, pois, que nela sejam introduzidas alterações, por forma a que o presente documento não se contente em ser apenas o Orçamento que permite, do ponto de vista das finanças públicas, a entrada de Portugal na moeda única.
Estamos certos de que os portugueses que em nós votaram exigem que sejamos mais ambiciosos e que obriguemos o Governo a aceitar que um Orçamento do Estado tem de ser sempre uma peça de política económica virada para o desenvolvimento futuro do País é não um mero exercício de equilíbrios.
Sabemos que é esse o nosso dever, pelo que não temos dúvidas de que essa será a nossa tarefa.

Aplausos do PSD.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não apoiado! O Marcelo "estragou-o" todo!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados João Carlos da Silva, Henrique Neto, José Junqueiro e Elisa Damião. Peço aos Srs. Deputados que se contenham no tempo regimental para podermos terminar os nossos trabalhos na parte da manhã.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, torna-se quase incompreensível a razão pela qual VV. Ex.as insistem sempre nesse discurso desgastado e descredibilizado. É que o Governo já tem curriculum, já demonstrou que é capaz de cumprir um Orçamento com credibilidade. VV. Ex.as também já têm curriculum a atacar os Orçamentos que este Governo apresenta.
Relembro as palavras do Sr. Deputado Rui Rio em entrevistas dadas à imprensa, em Fevereiro deste ano. Quando foi apresentado o Orçamento do Estado para 1996, V. Ex.ª disse, por exemplo: "Há um aumento da dívida pública escondido, que reside no facto de as receitas de privatização previstas não irem ser conseguidas. Acho que o nível de privatizações que a proposta de lei prevê não seria conseguido por Governo nenhum" - do PSD, diria eu.

Risos do PS.

"Nunca foram obtidas estas receitas e o Executivo só tem 10 meses para consegui-lo". Ao Semanário, seis dias antes, V. Ex.ª já tinha dito isto: "O PS, que nos acusou de tanto sermos fundamentalistas da convergência nominal, aparece, logo à partida, com a ideia de que o nível de crescimento do produto, na melhor das hipóteses, será na média comunitária, ou seja, não há convergência real".
Portanto, o curriculum de V. Ex.ª a criticar Orçamentos apresenta esta credibilidade. Desculpe que lho diga, Sr. Deputado, isto até nem condiz com a sua personalidade, mas é a realidade.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª fez, mais uma vez, o discurso desgastado dos aumentos dos impostos. Sr. Deputado, o senhor, no próximo ano, vai pagar mais impostos? Já fez as contas? A Sr.ª Deputada Manuel Ferreira Leite já tem aí as contas de ontem, que não apresentou?

Risos do PS.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Não, porque somos dos mais favorecidos!

O Orador: - Agradecia que mostrassem as contas para saber qual é o português que vai pagar mais impostos para o ano.

Aplausos do PS.

V. Ex.ª refere que o Governo governa por manchettes e à luz das sondagens. Gostava de saber por que é que o PSD faz oposição por referendos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Carlos Silva, começo por lhe dar os parabéns. V. Ex.ª fez aquilo que um Deputado deve fazer: antes de vir para este debate, foi ver o que os Deputados da oposição tinham dito há um ano, ponto por ponto, para tentar apanhar alguma falha.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só apanhou uma!

O Orador: - Dou-lhe os meus sinceros parabéns, porque é isso que um bom Deputado deve fazer - eu esforço-me por tentar fazer o mesmo -, e reconheço que V. Ex.ª apanhou uma única falha, que foi a que referiu aqui.
De facto, eu disse que seria muito difícil atingir a receita prevista para as privatizações e o Governo atingiu-a. Realmente, aquilo que eu pensava que não podia acontecer, aconteceu.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa):- Muito bem!

O Orador: - Só que, Sr. Deputado, refira agora todos os outros pontos que aí assinalei e em relação aos quais eu tinha razão. Refira, agora, que eu disse que o desemprego ia aumentar e aumentou, que eu disse que os impostos iam aumentar e aumentaram e que eu disse que os aumentos dos funcionários públicos iam ser minúsculos e vão sê-lo.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - E que ia haver despedimentos!

O Orador: - Por que é que não referiu tudo o mais que leu nas minhas intervenções?
Sr. Deputado, V. Ex.ª viu tudo à lupa e descobriu uma falha, que, reconheço, é verdadeira. Achava muito difícil - e era-o - o Governo conseguir obter essa determinada receita. Mas, agora, refira lá tudo o mais que eu disse

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- e falei muito tempo sobre o Orçamento do Estado e dei muitas entrevistas sobre esse assunto -, porque aí tive razão em tudo.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Não quis sacrificá-lo mais! Quis poupá-lo!

O Orador: - VV. Ex.as podem tentar explicar de todas as maneiras que não vai haver aumentos de impostos, no entanto, aquilo que eu disse é uma verdade. Este ano, vão cobrar mais 330 milhões de contos de receitas de impostos. Em dois anos, vão cobrar mais 630 milhões de contos do que aquilo que nós cobrámos. São os senhores que dizem que têm de impor um imposto mínimo garantido, como nós lhe chamamos, devido à ineficácia da administração fiscal. Portanto, se a administração fiscal é ineficaz ao ponto de terem de impor um imposto mínimo, explique-me lá como é que, com mais 330 milhões de contos num ano ou 630 milhões de contos em dois anos, os portugueses não vão pagar mais impostos. Quem vai pagar isto? São os espanhóis? Os franceses? Os chineses?! Não são os portugueses que vão pagar mais estes milhões de contos?

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - São aqueles a quem vocês não pagam!

O Orador: - Explique-me lá como não há aumento de impostos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, é sempre triste ver um bom profissional fazer um mau papel. A política justifica muita coisa, mas não tudo. Dizer que aumentar os impostos em valor absoluto é um aumento de impostos em termos relativos - e sabe que é em termos relativos que o problema se põe, porque, sendo economista e técnico, conhece isso tão bem ou provavelmente melhor do que eu - é fazer à política aquilo que ela não merece que se lhe faça.
Mas vamos a coisas mais concretas: o aumento do desemprego. Sr. Deputado, o aumento do desemprego, nos vossos últimos três anos de governação, aumentou 4% acima de 7% e agora tem estado nos 7,1%, 7,2%, 7,1%, seja o que for. Uma décima para cima ou para baixo, em termos orçamentais, não é crescimento, e o Sr. Deputado sabe isso. Mas se insiste faz à política aquilo que a política não merece, ou seja, faz uma política que é a do vosso partido, mas que, felizmente, não é a do Governo nem a da nossa bancada.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas, mais concretamente: V. Ex.ª falou da subida do preço dos medicamentos. Se fosse menos político e mais economista, mais técnico e estudasse melhor as questões, sabia que os preços dos medicamentos até 1000$ estava congelado - e ainda não se inventou, como V. Ex.ª devia saber, um sistema de economia que funcione com preços congelados, e eles estiveram congelados muito tempo - e que esses mesmos medicamentos contribuem apenas com 0,8% para as despesas do Estado neste sector. Além de que estes medicamentos evitam que sejam substituídos por outros que são bastante mais caros, ou seja, permitem uma economia ao Estado, o que V. Ex.ª devia saber se tivesse estudado a questão.
Mas mais grave: a questão da gasolina. Ó, Sr. Deputado, V. Ex.ª vem falar do maldito diploma do vosso Governo, dizendo que nós o devíamos alterar! O Sr. Deputado sabe perfeitamente que o diploma não é bom nem mau, é um diploma óbvio, fatal, que tem de existir em Portugal, como existe em todos os países. Ele foi já alterado duas vezes por este Governo, no sentido técnico de o flexibilizar às alterações de preços do crude na origem.
O que o Sr. Deputado devia explicar a esta Câmara era qual deveria ser a acção natural e responsável deste Governo - não uma resposta política do PSD de hoje - ou o que é que este Governo deveria fazer se o crude, desde Junho até hoje, subiu 37%.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Henrique Neto, quanto à questão do aumento de impostos, não quero repetir argumentos aqui estafados, mas aconselho V. Ex.ª a ler o relatório feito pelo Governo, onde se diz que o nível de fiscalidade aumenta.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Mas isso não é aumento de impostos!

O Orador: - É o Governo que o diz, não somos nós que o dizemos!
Em segundo lugar, Sr. Deputado, todos os indicadores...
Há pouco esqueci-me de outro argumento: a receita de impostos sobre o produto vem aumentando desde que este Governo tomou posse.
E só não haveria aumento, Sr. Deputado, se o acréscimo de receita que conseguem no combate à evasão fiscal servisse para baixar os impostos daqueles que suportam todo o sistema fiscal português. Aí não havia, mas assim há aumento da carga fiscal.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Mostre as contas!

O Orador: - Sr. Deputado, quanto à questão dos medicamentos, V. Ex.ª deu uma explicação para esse aumento muito comprida, que, francamente, não entendi, mas ela também não era para mim, era para os portugueses. Desde que os portugueses entendam essa explicação, está bem. Mas, para mim, e pegando no discurso que o Partido Socialista utilizava, foi uma resposta muito economicista e com pouca consciência social, como os senhores diziam que nós deveríamos ter.

Aplausos do PSD.

Porque a consciência social deste Governo, e para pegar em coisas que aconteceram nos últimos dias, é aumentar o preço da gasolina, é aumentar o preço do pão, é aumentar o preço do gás, é aumentar o preço dos telefones cá dentro - não aumentam lá para fora, talvez seja uma medida de protecção à emigração ou aos emigrantes...

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Foi o que os senhores fizeram!

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O Orador: - Ainda falta dizer essa! Mas é aumentar o preço dos telefones!
A consciência social deste Governo é, por exemplo, dizer que o imposto mínimo só se aplica aos médicos, aos engenheiros, aos arquitectos e esquecer que ele também se aplica a um canalizador, a um electricista ou a alguém que tem fracos rendimentos, que, eventualmente, até não teve clientes durante um dado ano, e a quem vai ser obrigatório pagar um imposto apenas porque existe o imposto mínimo garantido. É essa a vossa consciência social!

Vozes do PS: - Não senhor!

O Orador: - Para terminar, e pegando nos seus aumentos de medicamentos, deixe-me dizer-lhe que o melhor da consciência social é o Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social, de manhã, dar mais uns trocos para as pensões de reforma e a Sr.ª Ministra da Saúde, à tarde, tirar esse dinheiro para medicamentos!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, ouvi com atenção a sua intervenção e não posso deixar de lhe lembrar alguns números que aqui referiu, na medida em que uma mentira tantas vezes repetida passa às vezes como sendo verdade, e o Sr. Deputado é um especialista nessa matéria.
Referiu que o PIDDAC teve menos investimentos e comparou os dois últimos anos. Ora, o período de 1993/1995 teve 41 milhões de contos e o período de 1995/1997 tem mais 144 milhões de contos. Por outro lado, o Sr. Deputado não faz contas ao autofinanciamento de empresas como a CP, o Metro de Lisboa e da Transtejo, que são mais 109 milhões de contos, e nem sequer lhe interessa saber que o que estava programado no QCA, em média, nos dois últimos anos eram 500 milhões de contos e que, em 1996, foi de 860 milhões de contos e, em 1997, será de 901 milhões de contos.
Pergunto-lhe por isso, Sr. Deputado, se não é altura de, em vez de falar alto e tão aos gritos, descer mais à realidade e falar a linguagem da verdade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Depois falou no FEF. Reconheço que os senhores têm pouca autoridade política e até legitimidade moral para falar nesta matéria porque não cumpriram a Lei das Finanças Locais e porque , de 1993 a 1994, em matéria de FEF, tiveram um aumento de zero, e não conseguem perceber como é que, de 1995 a 1997, nós conseguimos um aumento muito superior àquele que VV. Ex.as estimavam, ou seja, mais 34 milhões de contos nas verbas do FEF puro e 45 milhões se considerarmos as outras contribuições, nomeadamente para os transportes escolares - que os senhores nunca consideraram -,que tiveram, no ano passado, 1,7 milhões de contos e, este ano, 2,7 milhões de contos, um aumento de 58%, e as transferências financeiras para as juntas de freguesia, que aumentam o FEF de 10 para 12,5% e, em 1988, de 10 para 15%. E por aí adiante!...
Uma outra questão que lhe quero colocar é esta: na sua intervenção, o Sr. Deputado referiu, mais uma vez, como já o tinha feito ontem o PSD e um outro partido - se não me engano Os Verdes -, nesta Assembleia, que tínhamos prometido a duplicação do FEF. Ora, foi explicado no ano passado e já foi dito este ano que o nosso compromisso foi o de fazer passar ou acompanhar as transferências financeiras das transferências de competências, ou seja, aquilo que os senhores não fizeram, que foi passar para as autarquias locais a questão dos transportes escolares, sem terem investido nisso um único tostão.
Portanto, também nesta matéria não têm, de facto, qualquer autoridade política para falar e, muito menos, criticar o Governo que, no que se refere a esta matéria e às juntas de freguesia em concreto, conseguiu aumentar as verbas em 51,5%.
Terminaria, perguntando: se estava, de facto, tudo tão bem a todos os níveis, como enunciou no princípio do seu discurso, como é que os senhores perderam as eleições e como é que o Professor Cavaco Silva se foi embora?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, V. Ex.ª não quer que eu fale alto, por isso vou falar muito baixinho.

Risos do PSD.

As verbas do PIDDAC sobre o produto estão este ano ao mesmo nível de 1995, quando toda a despesa está a níveis superiores. Logo, este Governo prefere gastar do que investir.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quanto à questão do Fundo de Equilíbrio Financeiro, este Governo prometeu duplicar em quatro anos; em dois anos deu 15%, faltam 85%. Quem fez a promessa não fomos nós, foram os senhores!

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - É mentira! É mentira!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, V. Ex.ª, é, há longos anos, Deputado nesta Câmara, por isso não tem a desculpa que alguns tecnocratas do seu partido poderão ter quanto à forma de fazer oposição, uma vez que nunca tiveram actividade política, foram meros tecnocratas no Governo, e estão agora, enquanto Deputados, a fazer aprendizagem, porventura dolorosa, de fazer oposição a um Governo que está a fazer uma governação de acordo com a sua experiência da oposição e com o conhecimento que tem das realidades do País, com humildade e sensibilidade.
Daí que V. Ex.ª tenha cometido um erro imperdoável, que foi o de abordar criticamente duas questões, ou seja a política deste Governo em matéria de segurança social e, a reforma da Administração Pública.
Sr. Deputado, em matéria de segurança social, os senhores ocuparam essa pasta durante 16 anos - foi a maior rotatividade governativa que se conhece - e nenhum dos secretários de estado ou ministros fez história nessa maté

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ria. O único que introduziu alguma legislação com o intuito de acelerar as cobranças - e está sentado ao seu lado - cedo foi demitido, seguramente por inoportuno.

Risos do PS.

Sr. Deputado Rui Rio, só em 1991/1993 os senhores não transferiram para a segurança social 400 milhões de contos e a dívida das transferências do Orçamento do Estado para cumprimento da Lei de Bases ascende a 1,2 mil milhões de contos.
Os senhores que fizeram do aumento das pensões mínimas uma batalha permanente eleitoral; os senhores que colocaram no mesmo nível os contribuintes com 40 anos de carreira contributiva e os contribuintes que praticamente não contribuíram, e para os quais o regime geral - e não o Estado - pagava a reforma; os senhores que colocaram a segurança social num estado calamitoso, invocam agora o escasso ano deste Governo, que já fez o diagnóstico, que já está a trabalhar, que já aprovou medidas de correcção dessas desigualdades, que, aliás, são do domínio público, nomeadamente, o combate à fraude. E devo dizer-lhe que o combate à fraude começou da melhor maneira, porque começou pela fraude que nada tem a ver com razões sociais ou com o colmatar de dificuldades sociais de certos sectores mas, sim, com uma fraude consentida por negligência das instituições.

Aplausos do PS.

O Governo de V. Ex.ª nunca teve o intuito de accionar os mecanismos de fiscalização!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, peço-lhe que termine.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Para terminar, pergunto-lhe o seguinte: sabe dizer-me quantos funcionários tem a Administração Pública? O seu Governo sabe quantos são?

Vozes do PSD: - O seu Governo!?

A Oradora: - O seu ex-Governo deixou-nos essa...

O Sr. Rui Rio (PSD): - Meu ex-Governo!?

A Oradora: - Sim, sim! O Sr. Deputado apoiou governos e, portanto, tem, com certeza, obrigação de dizer a esta Câmara quantos funcionários públicos deixou.

O Sr. Presidente (João Amaral): - E eu tenho obrigação de a advertir, Sr.ª Deputada, de que já terminou o seu tempo.

A Oradora: - O Sr. Deputado tem de dizer a esta Câmara quantos funcionários deixou em regime de recibo verde; tem obrigação de dizer a esta Câmara quantos funcionários foram contratados ilegalmente; tem obrigação de dizer a esta Câmara como distribuiu 80 milhões de contos no estatuto remuneratório e deixou as maiores injustiças na sociedade portuguesa; e tem de dizer a esta Câmara que, durante dois anos, os funcionários públicos não viram os seus salários aumentados.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, agradeço-lhe que conclua de imediato.

A Oradora: - Vou já concluir, apenas peço a sua benevolência.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, já leva 4.2 minutos...

A Oradora: - Sr. Presidente, já vi aqui alguns Srs. Deputados falarem 5 ou 6 minutos...

O Sr. Presidente (João Amaral): - Então, fale 5 ou 6 minutos, o tempo que quiser!

A Oradora: - Eu vou concluir, Sr. Presidente.
É evidente, é uma questão de igualdade, Sr. Presidente!
Concluiria dizendo o seguinte: os senhores, que, em matéria de desemprego, não fizeram as reestruturações e viveram da manipulação das estatísticas, têm a coragem de dizer que nada se está a fazer? Têm a coragem de dizer que o Governo não enfrentou a situação social em Portugal?
Sr. Deputado, gostaria que aprendesse rapidamente a fazer oposição, porventura melhor que o Sr. Deputado Pacheco Pereira a fazer manifestações, porque nessas também chumbou.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, no tempo que entender, como é óbvio, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Elisa Damião, relativamente à segurança social, há aqui um equivoco, que é o seguinte: o Partido Socialista considera que a reforma da segurança social está feita, porque cumpre a Lei de Bases da Segurança Social.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Não! O que é isso?!

O Orador: - Olhe, eu admito...

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - O senhor tem andado distraído!

O Orador: - Ouça, eu admito que, no passado, o montante de transferências previsto no Orçamento não tenha sido aquele que, numa leitura estrita da lei, podia ser o montante exacto. Mas isso é um problema menor, porque nenhuma reforma...

Risos do PS.

Ouçam. Também posso contar aqui uma charada, e rimo-nos todos! Estou a falar a sério, Srs. Deputados.
Este é um problema menor porque é um problema financeiro, compreende? O dinheiro apareceu e as reformas foram sempre pagas nos governos do PSD, aliás, a níveis muito superiores àqueles que tinham sido no passado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Também é verdade!

O Orador: - A questão não é dos fluxos financeiros. Não foi disso que falei da tribuna. Falo de um problema económico. O que quero saber é se, com a lei de bases como está, resolve o problema da evolução dos activos e

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inactivos, dos activos e pensionistas. O que quero saber é se, com a lei de bases como está, vão pagar as reformas daqui por 10 ou 20 anos. Resolve este problema? É disto que estou a falar!
Resolve o problema do desemprego quando a nossa economia tem de competir num mercado global com países que não têm qualquer assistência social? É disto que falo. Falo de um problema económico, não de um problema de fluxos financeiros. Falo de uma coisa mais séria e aí ainda não vi uma única medida. É isto que está em causa, Sr.ª Deputada.
Quanto à questão dos funcionários públicos, deixe-me que lhe diga, quem está no Governo não somos nós, é o Partido Socialista. Se quer saber quantos funcionários públicos há, pergunte ao Governo.

Protestos do PS.

Da nossa parte, há uma coisa que é certa, temos a certeza de uma coisa: após 12 meses, com os boys todos que entraram, o stock final é muito diferente do stock inicial!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, vamos interromper os nossos trabalhos e creio que será razoável recomeçá-los às 15 horas e 15 minutos.
Está interrompida a sessão.

Eram 13 horas e 30 minutos.

Após a interrupção, reassumiu a presidência o Sr. Presidente em exercício Manuel Alegre.

Srs. Deputados, declaro reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 45 minutos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Um dos problemas mais graves que se coloca ao País, a par do desemprego, é o do desequilíbrio do território, a ausência de políticas e de instrumentos que garantam o ordenamento desse mesmo território, que combatam o despovoamento e a desertificação do interior, impedindo o excesso de migração para o litoral e para as grandes áreas metropolitanas, onde se acumulam a pobreza, a exclusão social e a insegurança, e a necessidade de políticas de investimento público reforçadas e de condições para a mobilização do investimento privado nas zonas e regiões mais carenciadas.
Recentemente foi tornado público um relatório da União Europeia sobre a coesão económica e social, aí confirma-se o que há muito, em Portugal, o PCP vinha alertando. É que, ao contrário das promessas feitas e dos novos paraísos diariamente anunciados, tem-se agravado o fosso entre as regiões mais e menos desenvolvidas, têm crescido os desequilíbrios regionais. No nosso país isto é particularmente verdade para o Alentejo.
Nestas condições, o mínimo que se exigiria é que, no quadro de uma apregoada nova política, o Governo trabalhasse para inverter esta situação, através da reorientação dos programas e meios comunitários, da reorientação do investimento público ao nível do Orçamento do Estado, da criação de sistemas de incentivos novos destinados a mobilizar o investimento para as regiões mais dele necessitadas.
Sei que, em teoria, particularmente o Ministro João Cravinho, faz deste tema politicamente correcto o seu livro de cabeceira. Mas, infelizmente, não passa disso mesmo, de um livro de cabeceira para ajudar a adormecer consciências inquietas. Porque, na prática, os critérios e sistemas de incentivos atractivos do investimento não foram alterados e os sistemas de incentivos, seja à actividade produtiva, seja ao desenvolvimento regional, continuam a não estar adequados, nem às prioridades políticas, nem às necessidades do País, nem à estrutura social e empresarial, continuando a não haver qualquer coerência entre os sistemas de incentivos e as políticas de isenções ou estímulo fiscais e o próprio funcionamento do sistema bancário.
Por sua vez, os programas comunitários não foram reorientados, apesar das promessas mil vezes repetidas do Engenheiro António Guterres: Aliás, continuamos à espera que o Governo entregue o balanço da distribuição regional e sectorial dos programas comunitários, tal como o Sr. Ministro João Cravinho se comprometeu na Comissão de Economia, Finanças e Plano. Ainda não chegaram, Sr. Secretário de Estado.
Por isto tudo, não é de estranhar que o investimento produtivo no interior do País continue a ser residual e que, pelo contrário, continue a ser preferencialmente encaminhado para zonas já saturadas; que as pequenas e médias empresas, Sr. Dr. Henrique Neto, continuem em grande parte excluídas ou com enormes dificuldades de acesso a apoios ao investimento; que apenas menos de 10% dos agricultores portugueses continuem a beneficiar dos programas comunitários e nacionais, ou, dito de outra maneira, que só 5% dos agricultores portugueses têm acesso e esgotam 90% dos apoios para o sector agrícola.
Poder-se-ia esperar que o PIDDAC, como um dos instrumentos de intervenção do Governo, cuja importância não é pequena (representa 5,5% do PIB e 20% da FBCF total do País), contribuísse fortemente para corrigir os desequilíbrios regionais e constituísse uma alavanca para o investimento produtivo em sectores estratégicos ou fragilizados, como são, por exemplo, a agricultura, as pescas ou o turismo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Infelizmente, não é isso que acontece.
Do ponto de vista da distribuição regional - e refiro-me ao PIDDAC, porque, infelizmente, continuamos a não ter o balanço da distribuição regional dos programas sectoriais comunitários, pelo que o único instrumento de análise que temos é o PIDDAC, e é por ele que temos de nos aferir -, aos oito distritos do interior do País (Beja, Bragança, Castelo Branco, Évora, Guarda, Portalegre, Vila Real e Viseu) é afectado somente 8,8% do total nacional do investimento público, sendo que mesmo nos restantes distritos os grandes investimentos continuam a ser orientados sobretudo para o litoral, como é, por exemplo, o caso do Algarve ou de Coimbra.
Aos cinco distritos, Srs. Deputados, repito, aos cinco distritos a norte do Douro (Braga, Bragança, Porto, Vila Real e Viana do Castelo) é reservado um investimento público, que é inferior a 10% do total nacional.
Os três distritos do Alentejo têm afectado uma percentagem ridícula do investimento público, 2,4%, inferior mesmo ao último Orçamento apresentado pelo governo do

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PSD. Mas mais escandaloso é que, enquanto que para Beja, Évora e Portalegre a totalidade do investimento previsto é somente de 22 milhões de contos, o Governo disponibiliza 60 milhões de contos para meia dúzia de famílias de grandes agrários, de grandes proprietários fundiários alentejanos.
Onde está, nesta breve viagem que fizemos pelo PIDDAC, a consciência da necessidade de reduzir os desequilíbrios regionais, Sr. Ministro João Cravinho e Sr. Primeiro-Ministro? Onde está a consciência social, Sr. Engenheiro António Guterres?
Mas não menos significativo, Srs. Deputados, é a análise do tipo de projectos financiados em PIDDAC. O que se verifica é que, sobretudo (mas não só) nos distritos onde o PS tem a ambição de ganhar eleições autárquicas, há uma multiplicação como cogumelos de pequenas dotações de 1000, 2000 e 5000 contos espalhados por tudo quanto é concelho ou freguesia e alegadamente dirigidos a centros de dia, a lares para idosos, a escolas e parques, escolares, a centros de saúde ou a esquadras da PSP. Dois exemplos: no distrito de Setúbal, um quarto, 25%, dos projectos têm verbas que vão de 1000 a 5000 contos e no Alentejo essa percentagem é de um terço. Não é um programa de investimentos, Sr. Ministro, mas, sim, um programa de donativos para ano eleitoral. É que por coincidência - mas seguramente só por coincidência - 1997 é ano de eleições autárquicas. E este tipo de dotações é o ideal para permitir que governadores civis, secretários de Estado, ministros, candidatos a presidentes de câmara, vão esvoaçando de terra em terra a distribuir cheques para conforto das almas e descanso dos votos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Orçamento é também, e este é um outro problema grave, um orçamento de desaceleração do apoio a áreas económicas essenciais, sem qualquer correspondência, aliás em inúmeros casos, entre as dotações orçamentais e as piedosas declarações de intenções nas Grandes Opções do Plano, como, aliás, a própria Comissão de Economia, Finanças e Plano, com o voto favorável do PS, reconhece no seu relatório. Cito três áreas.
A primeira é a agricultura, onde o Governo defende uma ainda maior restrição no acesso da maioria dos agricultores aos sistemas de apoios existentes, o que significa, na prática, que o Governo pretende baixar ainda mais a já diminuta percentagem de 10% dos agricultores que têm acesso aos apoios. Aqui aproveito para lembrar ao Governo que continuo à espera que me seja fornecida a lista dos 100 maiores beneficiários dos apoios comunitários para a agricultura no nosso país.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não há!

O Orador: - Era importante que essa lista fosse entregue, Sr. Secretário de Estado.
Mas, mais, a agricultura familiar é, neste Orçamento, de novo secundarizada e as Grandes Opções do Plano defendem orientações, a que chama de essenciais, para o sector florestal, para a expansão e melhoria do regadio e para a comercialização, entre outras. Mas, no Orçamento, todos estes sectores vêem fortemente reduzidas as suas dotações. São reduzidas em 7%, em termos nominais, as ajudas nacionais pagas pelo INGA; desce o apoio financeiro às cooperativas; desce o apoio à "electricidade verde"; descem as ajudas às regiões desfavorecidas; descem os apoios relativos aos acidentes climatéricos; descem, em termos reais, os apoios aos produtos tradicionais; mas sobe o preço do gasóleo à agricultura; sobem os custos dos factores de produção; e, sobretudo, sobe o esforço financeiro que é exigido aos já muito debilitados agricultores portugueses.
É, como sabem, Srs. Deputados, um Orçamento que desce cerca de 15%, em termos reais, no sector agrícola, mas o Governo responde a essa descida exigindo um maior esforço financeiro aos agricultores portugueses. O aumento, entre 1996 e 1997, das receitas próprias do Ministério da Agricultura de 19,3% para 37% significa que são os agricultores portugueses que, através do pagamento de taxas, passam a financiar, em mais de um terço, o orçamento do Ministério da Agricultura, enquanto descem as transferências comunitárias e o esforço do Estado português em cerca de 20 pontos percentuais. É inaceitável, Srs. Deputados!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Nas pescas repete-se a quebra do investimento público, designadamente em programas enunciados também nas Grandes Opções do Plano como estratégicos, como as ajudas ao funcionamento das organizações de produtores, os apoios à constituição de sociedades mistas ou a transformação e comercialização dos produtos da pesca.
No turismo há também uma quebra geral das dotações orçamentais, desde a formação à promoção e ao funcionamento das instituições ligadas ao sector, apesar de também aqui as GOP sublinharem a importância da "natural vocação turística" do País.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Acredito que em 1997, ano de eleições autárquicas, o Governo tenha muitos pequenos cheques para distribuir pelo País. O que não acredito - e os senhores seguramente também não - é que este Orçamento desse novo deus que é a moeda única seja o Orçamento do desenvolvimento, do ordenamento do território, da correcção dos desequilíbrios regionais, do estímulo às actividades produtivas ou do emprego.
Ganhará, seguramente, o euro e o ego do Governo, mas perdem, seguramente, Portugal e os portugueses.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social.

O Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social (Ferro Rodrigues): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Governo assumiu uma preocupação fundamental com as políticas sociais. Essa opção, é necessário dizê-lo, acontece num contexto difícil, em que é necessário um claro empenhamento político na opção de conciliar o rigor orçamental, a promoção da competitividade e o aumento da coesão social. Uma boa parte dos nossos parceiros europeus não tiveram esta opção.
O Governo tem também um compromisso com a inovação nas políticas sociais. Estamos preocupados em garantir em simultâneo a sustentabilidade das políticas sociais a médio e a longo prazo e a melhoria dos níveis de cobertura social das populações mais carenciadas.
Este duplo objectivo só pode ser atingido com um conjunto de novas prioridades e metodologias de acção. O Orçamento de 1997 reflecte critérios de rigor, que já introduzimos no ano passado e que constituem rupturas relevantes com um passado recente, mas demasiado longo.

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É um ponto de honra o cumprimento da Lei de Bases da Segurança Social. Por dois anos consecutivos o Governo assume integralmente as responsabilidades do Orçamento do Estado perante o orçamento da segurança social. E aqueles que acham que isso é o normal esquecem que durante muitos anos o normal foi a anormalidade de uma política que não cumpria a lei. Esquecem? Não. Fingem que esquecem. Porque, se assumissem a memória, não poderiam atentar contra a inteligência dos cidadãos, dizendo que só vêem continuidades onde a esmagadora maioria dos portugueses vê mudança evidente, progresso, verdade, frontalidade. E vê, porque elas existem!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É necessário que se conheça com rigor o estado da segurança social. Pela primeira vez, trouxemos a este Parlamento um diagnóstico sério e profundo sobre a situação da segurança social e pedimos a este Parlamento os contributos e sugestões que considerasse pertinentes. Foi no dia 2 de Abril, há sete meses e meio.
É fundamental tornar a segurança social mais transparente para os contribuintes e é necessário criar uma cultura de cidadania na relação com os benefícios do nosso sistema de segurança social. A nossa acção é firme no combate às fraudes. Os contribuintes portugueses poupam, neste momento, mais de 2 milhões de contos/mês em resultado da radical redução no nível de fraude nas baixas por doença.
Urge melhorar a percepção dos cidadãos sobre quais os benefícios que derivam do esforço de solidariedade social e quais os que resultam do seu próprio esforço contributivo. O aumento do esforço de solidariedade social tem sido uma das nossas preocupações. Isso reflecte-se na dotação orçamental do PIDDAC para a acção social, reflecte-se na criação do rendimento mínimo garantido, mas não se reflecte apenas no aumento das verbas, verifica-se também no redireccionamento de programas para medidas mais activas, como nos casos dos Projectos de Luta contra a Pobreza, na reanimação do Subprograma INTEGRAR. A nova orientação não se reflecte apenas na acção do Governo, verifica-se na nova articulação com as instituições de solidariedade social que está já a dar frutos em parcerias mais activas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O ano de 1997 será marcado, na área da solidariedade e segurança social, por importantes desenvolvimentos do Programa do Governo para o sector. Foram definidos cinco grandes domínios de actuação prioritária.
Em primeiro lugar, pretendemos desenvolver o processo de reforma da segurança social.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Governo irá no próximo ano aprofundar significativamente o esforço de reforma da segurança social. Quando se vive intensamente, no dia-a-dia, o cumprimento rigoroso do Programa do Governo, fica-se perplexo perante as críticas de alegada lentidão na reforma, porque a reforma está em curso ao ritmo previsto no Programa do Governo, aprovado por este Parlamento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em Julho de 1997, a Comissão do Livro Branco apresentará o seu relatório ao Governo, cumprindo a sua função de identificação das principais alternativas que se abrem ao sistema. Os trabalhos desta Comissão irão possibilitar, como está já a acontecer, um profundo debate sobre esta reforma estratégica para a sociedade portuguesa.
Este debate, que, necessariamente, irá envolver os órgãos de soberania, os parceiros sociais e a generalidade da população portuguesa, será um momento de grande significado político nesta Legislatura e deverá habilitar o Governo a, em 1998, formular as medidas de política compatíveis com a reflexão produzida, o debate gerado e os objectivos políticos e sociais do seu Programa.
Em segundo lugar, iremos aplicar a todo o território nacional o rendimento mínimo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O ano de 1997 será marcado em termos da aplicação do rendimento mínimo por duas fases distintas: durante o primeiro semestre será concluído o período de projectos-piloto, avaliado o seu desenvolvimento e produzidas as alterações que essa experiência mostre necessárias; no segundo semestre de 1997 estará já em vigor a lei aprovada por esta Assembleia da República, que estabelece o rendimento mínimo, e, assim, esta medida estará em aplicação em todo o território nacional.

Aplausos do PS.

Sobre o rendimento mínimo, convirá recordar que esta medida tem estado a ser aplicada com determinação e com rigor.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A lei desta Assembleia da República entrou em vigor a 1 de Julho. Há quatro meses e meio, portanto. Recordo que nesse mesmo dia foi publicada a portaria que regulamenta os projectos-piloto. Ainda em Julho, foram assinados os despachos que criaram os primeiros 21 projectos-piloto, em todo o país, respondendo a uma excelente adesão da sociedade civil. Até hoje, já despachei 78 projectos-piloto, correspondendo a todas as candidaturas devidamente instruídas que me foram presentes. Já conseguimos uma cobertura bastante diversificada do território.
O desenvolvimento de novos projectos está condicionado pela existência de disponibilidade local e pela capacidade técnica já instalada na segurança social para acompanhar o fluxo de projectos. Como sabem, está em curso um processo de reapetrechamento de recursos humanos na segurança social, que ficou bastante debilitada por anos de gestão política com manifesto desinteresse por esta área.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - À política de desinvestimento em recursos humanos e irracionalidade nos recursos materiais, que foi dominante na segurança social, estamos a responder com a determinação de quem sabe que para o desenvolvimento de boas políticas sociais não bastam palavras, são

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necessários meios, acção, mobilização de vontades e de inconformismos.

Aplausos do PS.

No dia 31 de Outubro passado, mais de 3700 famílias já se haviam candidatado ao rendimento mínimo, o qual, neste momento, cobre, territorialmente, zonas onde habitam mais de 700 000 pessoas. Nessa mesma data 3500 pessoas já beneficiavam desta nova prestação.
O trabalho no terreno, por parte de todos os parceiros - departamentos governamentais, governos regionais, autarquias e instituições de solidariedade social - tem sido do maior empenhamento e competência. Há hoje um conjunto significativo de vontades que cooperam para que este projecto, de que alguns aqui descreram, se torne uma realidade. Uma realidade a tal ponto que; entre os que ontem diziam que esta medida era irrealizável, há hoje muitos defensores de que se avance muito mais depressa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O rendimento mínimo é também revelador das situações de carência da sociedade portuguesa. Perto de 40% das famílias que já beneficiam do rendimento mínimo são famílias monoparentais...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - São as que não pagaram o imposto!

O Orador: - ... e mais de 10% são pessoas isoladas. As pessoas que apresentam o requerimento, em nome de si próprias ou das suas famílias, são em dois terços dos casos mulheres e metade dos requerentes tem mais de 45 anos. As situações de desestruturação familiar parecem ser factores assinaláveis de vulnerabilidade social na sociedade portuguesa. A exclusão torna-se mais grave quando é também exclusão em relação aos laços sociais e familiares. Eis uma situação que a sociedade portuguesa já tinha e que só agora começa a ser enfrentada.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em terceiro lugar, continuaremos a desenvolver a rede de apoio social integrado em articulação com o Pacto de Solidariedade para a Cooperação. Esse Pacto irá estabilizar o quadro de relacionamento entre o Estado e as Instituições Particulares de Solidariedade Social e, desta forma, concretizar uma das linhas de força das GOP.
Este acordo, para além de prefigurar uma mais racional utilização dos recursos públicos no apoio às iniciativas de protecção social, vai favorecer o lançamento da Rede Social de Apoio Integrado, cuja consolidação está entre as opções prioritárias do Governo na área da solidariedade social.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em quarto lugar, continuaremos a desenvolver novas políticas sociais de combate à exclusão.
O desenvolvimento da nova geração de políticas sociais que faz parte do programa do Governo será aprofundado em 1997 através da convergência de diversas linhas de orientação política: reorientação das políticas e programas de combate à pobreza no sentido do reforço da sua eficácia, rigor e eficiência;...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador:- ... articulação intersectorial das políticas de protecção social, nomeadamente no que respeita à integração das políticas sociais das áreas da solidariedade, da saúde, da educação, da habitação e do emprego e formação; reorientação do investimento público na infraestruturação social no sentido de uma atenção prioritária aos sectores sociais mais fragilizados e com maiores dificuldades de integração social (idosos acamados, grandes dependentes e deficientes).
Finalmente, continuaremos o esforço de racionalização das despesas da segurança social. Este esforço, que tem de traduzir-se numa preocupação permanente, nomeadamente no que respeita ao combate às utilizações irregulares e fraudulentas das prestações sociais e também à fuga às contribuições, será aprofundado em 1997 quer no plano legislativo quer no plano das acções de fiscalização e controlo.
Desenvolvemos uma forte campanha de moralização das relações do cidadão com a Administração Pública, seja no plano contributivo, seja no plano das prestações.

Aplausos do PS.

O combate à evasão, à fraude e às irregularidades nas prestações é uma opção estruturante da nossa acção que já deu importantes frutos. Posso anunciar-vos em primeira mão que, em Outubro de 1996, o número de beneficiários com subsídio de doença diminuiu 18,5% em relação a Outubro de 1995 e que o número de dias subsidiados baixou 21 %, o que significa que diminuiu a violação da lei e não o número de doentes.

Aplausos do PS.

Os frutos do combate à fraude serão duradouros, não obstante as dúvidas legitimas que em alguns existem porque esse é também um combate para o qual estão solidários a imensa maioria dos portugueses e o conjunto dos parceiros sociais.
Mas, para além das grandes opções que têm marcado a actuação do Governo no domínio da solidariedade e segurança social, diversos pequenos passos têm vindo a ser dados no sentido de afirmar mais intensamente uma nova forma de governar no plano das políticas sociais.
Salientarei, pela sua relevância e simbolismo, o esforço que, de forma articulada com alguns Ministérios, temos vindo a fazer para responder de forma rápida e eficaz às necessidades de integração social dos refugiados timorenses ou, noutro plano, o esforço de desburocratização dos serviços significativamente marcado pela suspensão da chamada "prova de vida" dos pensionistas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Orçamento que o Governo propõe a esta Assembleia é um instrumento fundamental de desenvolvimento da nova visão das políticas de protecção social que temos vindo a cumprir mas é também um Orçamento tornado possível por uma evolução globalmente positiva nos resultados deste ano.
O orçamento da segurança social para 1997 é uma peça importante no conjunto do orçamento do sector público administrativo. As receitas da segurança social (incluindo as transferências de outros subsectores) correspondem a 23,5% das receitas totais do sector público administrativo.

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Para os objectivos de redução do défice do SPA para 2,9% do PIB em 1997 é fundamental que, a exemplo do previsto para 1996, haja uma boa execução do orçamento da segurança social em 1997.
No que respeita às receitas, há a salientar a importância das contribuições para a segurança social (1281,2 milhões de contos), que se espera possam crescer 5,2% em relação a 1996 em consonância com o crescimento de salários e rendimentos, o aumento do emprego, a melhoria da eficácia na cobrança e a recuperação de dívidas em resultado do Decreto-Lei n.º 124/96, de 10 de Agosto.
Do lado da despesa, as principais características do orçamento da segurança social de 1997 podem ser enunciadas nos seguintes vectores: estão criadas as condições financeiras para o alargamento do Rendimento Mínimo Garantido, a partir de Julho de 1997, a todo o país;...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... está garantido um importante esforço no combate à pobreza e a exclusão social e no apoio às crianças, idosos e deficientes, através de um reforço da capacidade de actuação numa lógica de desenvolvimento da iniciativa pública e de apoio racionalizado às iniciativas da sociedade civil; está orçamentado um significativo aumento do investimento em equipamentos sociais e na modernização dos serviços num quadro de contenção e rigor que é próprio deste orçamento; foram abertas as condições financeiras para melhoria das prestações sociais em termos reais e, portanto, para aumentos das pensões e prestações familiares ligeiramente acima da inflação prevista numa perspectiva de equidade e procurando agir no sentido da correcção das situações de mais profunda degradação.

Aplausos do PS.

É triste como a cegueira e o sectarismo levam alguns a desprezar um aumento de pensões que, em média, está 1,5% acima da inflação prevista e que permite a 40 000 pensionistas muito idosos e com muitos anos de contribuições viver com mais dignidade a partir de agora. São 40 000 portuguesas e portugueses que, para além do aumento anual, terão a partir de Dezembro aumentos mensais que, nalguns casos, podem atingir 6, 8 ou 10 000 escudos.
Foram garantidos os meios para a continuação do esforço de combate à fraude e obtenção abusiva de subsídios e assegurada uma aposta na modernização administrativa e na humanização dos serviços da segurança social. Para acrescer à transparência na gestão pública, as transferências do Orçamento do Estado para o orçamento da segurança social derivadas da lei estão, pela primeira vez, explicitadas de acordo, aliás, com a recomendação da Comissão do Livro Branco.
Para o cumprimento da Lei do Rendimento Mínimo Garantido é transferida verba suficiente (25,3 milhões de contos) perante a experiência já realizada com a fase inicial dos primeiros projectos-piloto.
O aumento do conjunto de verbas para a acção social (mais de 16%, para 112 milhões de contos) é bem ilustrativo da preocupação do Governo no combate à pobreza e à exclusão.
O PIDDAC, nas suas três componentes principais, atinge 13,5 milhões de contos, o que significa um aumento de 11 %.
As verbas previstas para as pensões quase atingem 1100 milhões de contos, o que implica um crescimento de 6,3% em relação à execução prevista para 1996.
Quanto às verbas inscritas para pagamento de subsídios de doença, correspondem a menos 6 milhões de contos do que a execução prevista para 1996, o que significa que estamos decididos, sem quebra de qualquer direito dos doentes, a que o bem sucedido esforço de combate à fraude se vá intensificar em 1997.

Aplausos do PS.

As verbas previstas para subsídio de desemprego (mais 4,5 milhões de contos do que em 1996) são compatíveis com a evolução previsível do emprego e com a necessidade de, por um lado, combater a fraude e, por outro, melhorar as condições para os desempregados de longa duração com mais idade e maiores carreiras contributivas. Também em primeira mão vos quero dizer que, apesar das melhorias no acesso ao subsídio social de desemprego, introduzidas por este Governo para os desempregados mais idosos, os dados de Outubro da segurança social mostram o número mais baixo dos últimos dois anos do conjunto de beneficiários dos dois subsídios (de desemprego e social de desemprego). Isto demonstra que a economia está muito melhor do que há meses se diria e que, também nesta área, o combate à fraude tem dado resultados.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Demonstra é que há mais desempregados que não têm subsídio!

O Orador: - Isto permite pensar em conjunto com os parceiros sociais - como estamos a fazer -, com a CGTP, com a UGT, com a CCP, com a CAP, em melhorias de apoio aos desempregados, nomeadamente aos desempregados de longa duração com largas carreiras contributivas.

Aplausos do PS.

Será através do aumento de meios humanos e, sobretudo, de produtividade que se atingirão os objectivos de humanização e modernização dos serviços, apesar da contenção dos custos de administração.
O orçamento da segurança social para 1997 será rigoroso, transparente, socialmente empenhado, modernizador, exigente.
As opções políticas do Governo para 1997 na área da solidariedade e segurança social, bem como o orçamento que as suporta - impossíveis sem o forte empenhamento do Primeiro-Ministro e o apoio, que quero aqui destacar, do Sr. Ministro das Finanças e da Sr.ª Secretária de Estado do Orçamento -, procuram combinar as duas tarefas prementes que defrontamos: gerir com rigor as necessidades de curto prazo e aprofundar as reformas estruturantes da protecção social no nossos país.

Aplausos do PS.

São, reconhecemos, duas tarefas de difícil e complexa compatibilização mas são imperiosas. Tempos houve em que mais facilmente se poderiam mobilizar os meios para conciliar estas tarefas. Infelizmente, perderam-se outras oportunidades e estamos a fazer tudo para não enjeitar as que nos couberam.
Não cederemos à tentação fácil de ampliar benefícios e prestações, que, mesmo que aparentemente viáveis no

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curtíssimo prazo, poderiam comprometer os equilíbrios do presente e do futuro. Queremos defender a viabilidade da segurança social pública, Srs. Deputados.
Os partidos è as organizações que se reivindicam dos trabalhadores só continuam a fazer dos aumentos das pensões e de outras prestações sociais arena de reivindicações (ao contrário do que acontece, por exemplo, na vizinha Espanha com as Comissiones Obreras), porque não fazem o exercício consequente de propor aumentos de impostos e contribuições, compatíveis com as reivindicações que apresentam, para os trabalhadores no activo.
Portugal continua a ter problemas sociais muito graves mas estamos a dar-lhes resposta. Não deixaremos de defender as responsabilidades do Estado na protecção social, especialmente as dos mais fracos e vulneráveis mas também não deixaremos de lutar pela modernização, pelo reforço de eficácia e pela flexibilização das políticas públicas de segurança e protecção social. Estamos confiantes que também aqui é possível conciliar competitividade e coesão social ao serviço do desenvolvimento de Portugal e do bem-estar dos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Nuno Correia da Silva, Pedro da Vinha Costa, Rodeia Machado e Barbosa de Oliveira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social, ouvimos ontem, na apresentação do Orçamento, o Sr. Ministro das Finanças classificá-lo como aquele que mais justiça social contém desde os anos 70, perfil que hoje foi reafirmado pela bancada do PS.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, também gostava que neste Orçamento estivessem já espelhadas as reformas da segurança social porque não é apenas com o aumento das dotações para a segurança social que se aumenta a justiça social, precisamente por aquilo que repetidamente tem dito no sentido de que a segurança social portuguesa, infelizmente, não é um instrumento de justiça social. Pelo contrário, o sistema de protecção social português confunde igualdade com equidade e equidade com solidariedade. É por isso que, aguardando com expectativa, vemos com agrado a elaboração de um livro branco que enuncie as efectivas reformas para que o sistema de segurança social seja um instrumento da justiça social. Mas, enquanto o sistema de segurança social não for um instrumento efectivo de justiça social, não é pelo facto de ter mais dinheiro que temos mais justiça social. Pelo contrário, Sr. Ministro! Nomeadamente no regime geral, enquanto que as prestações recebidas pelos beneficiários forem correspondentes àquilo que pagam com a remuneração mensal em vez de serem atribuídas em função das necessidades, este sistema não terá qualquer vertente de solidariedade nem sequer de equidade. Portanto, a justiça social que o Sr. Ministro apregoa por via de uma maior dotação orçamental não se alcança com o actual sistema de segurança social.
Foram eleitas - e muito bem - as instituições particulares de solidariedade social como parceiras activas da política social do Governo. Ainda bem que assim é e bem-vindas sejam a essa concepção da política social que seguramente é compartilhada pelo Partido Popular. Mas não basta dizê-lo, é preciso fazê-lo. Pergunto: apesar do Rendimento Mínimo Garantido, quantas instituições de solidariedade social continuam a sustentar tantas e tantas famílias deste país, comprando-lhes arroz e outros alimentos? Como pagam IVA sobre essas aquisições, que não podem ir buscar a outro lado, para quando a compensação do IVA para as instituições de solidariedade social?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou o tempo de que dispunha. Queira terminar.

O Orador: - Termino de seguida, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, não basta reconhecer a utilidade das instituições, é preciso dar-lhes acolhimento, o que devia ter sido feito no Orçamento do Estado.
Mas o Sr. Ministro também se referiu às Grandes Opções do Plano para 1997 e à diversificação das fontes de financiamento da segurança social. Não podemos estar mais de acordo com essa medida em virtude da excessiva tributação sobre a remuneração do trabalho.

O Sr. Presidente: - Queira concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Todos gostaríamos de ver reduzida a taxa social que prejudica a competitividade mas, curiosamente, não vislumbramos novas fontes de financiamento neste Orçamento proposto pelo Partido Socialista mas, sim, que o IVA social tem uma redução de cerca de 6,8% enquanto que as receitas globais de IVA têm um aumento de 5%. Portanto, Sr. Ministro, há aqui um paradoxo entre as Grandes Opções do Plano e o instrumento que lhes dá execução.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social, V. Ex.ª pintou de cor-de-rosa o cenário da segurança social, o que, sinceramente, já não nos surpreende porque de alguma forma começamos a estar habituados ao daltonismo de que os senhores parecem sofrer, vendo cor-de-rosa aquilo que, infelizmente, para quem não sofre desse mal, se aproxima muito mais do negro.
Surpreendidos podem ficar os portugueses ao constatarem que V. Ex.ª pinta de cor-de-rosa algo que eles não vêm nem sentem nesses termos. E, se eventualmente houver alguém que acredite naquilo que V. Ex.ª diz, não acha, Sr. Ministro, que quererá saber, se tudo é assim tão cor-de-rosa, porquê reformar a segurança social. Se tudo é tão cor-de-rosa, se tudo está a correr tão bem, se os objectivos estão a ser tão brilhantemente atingidos e ultrapassados, ao que V. Ex.ª diz, então, porquê reformar a segurança social?
Nós, Sr. Ministro, que sabemos que o cenário não é tão cor-de-rosa como o pinta e que é necessário reformar a segurança social, começamos a ficar preocupados, como já por diversas vezes tivemos ocasião de alertar V. Ex.ª, para o facto de sermos confrontados com medidas avulsas que tememos possam condicionar, e de que maneira, a reforma da segurança social que, repito, consideramos necessária.

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Gostaria, pois, que o Sr. Ministro pudesse dizer algo mais de concreto sobre a reforma e menos sobre as condicionantes da reforma que V. Ex.ª vai, dia-a-dia, impondo no terreno. Permita-me também que levante duas questões relacionadas com o problema do subsidio do desemprego.
Primeira, não resisto a constatar aquilo que me parece ser uma contradição entre o que V. Ex.ª diz e aquilo que afirmam outros colegas seus do Governo. Se o objectivo do Governo é diminuir o número de desempregados, por que razão foram aumentadas as verbas para o subsídio de desemprego, não estando previsto, ao que se saiba, nenhum aumento significativo do montante de cada um dos subsídios de desemprego que justifique esse aumento das verbas disponíveis para esse efeito, a não ser que, de facto, temam os senhores, temamos todos nós e principalmente temam os portugueses um aumento significativo do desemprego?
Segunda, se, eventualmente, o número de pessoas que recebe subsídio de desemprego diminui sem verificar-se um aumento do emprego, não fica V. Ex.ª preocupado com o que pode estar por detrás disto?

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social, referiu-se V. Ex.ª ao cumprimento da Lei de Bases da Segurança Social, voltando a reafirmar a sua importância. Também estamos convencidos disso mas é obrigação, deste e de qualquer Governo, cumprir essa lei e não viver à sua margem. Como o PSD não a cumpriu durante vários anos, foi penalizado nas eleições de Outubro e, em nosso entender, muito bem. Portanto, este Governo tem obrigação de cumprir a Lei de Bases da Segurança Social.
O Sr. Ministro disse-nos que procurou contributos da Assembleia. Nós já lhe demos alguns. Mas é preciso que, em sede de comissão, não haja um diálogo de surdos, não sejamos apenas nós a propor e o Governo a não ouvir. Aliás, tanto o Sr. Ministro como toda a Câmara sabem que foi assim em relação ao rendimento mínimo garantido. Isto é, combatemos desde sempre em favor dele mas, em nosso entender, as condições de atribuição desse mesmo rendimento são demasiado restritivas, as propostas que fizemos não tiveram acolhimento nesse sentido e, hoje, vê-se o que está a acontecer.
Coloco duas questões ao Sr. Ministro.
V. Ex.ª afirmou que há 3700 famílias candidatas à atribuição do rendimento mínimo e eu gostaria de saber qual é o ratio entre estas candidaturas e as que, depois, serão efectivamente aprovadas.
Por outro lado, referiu a questão do combate à fraude. Nós estamos de acordo com esse combate mas ele não pode incidir apenas nas baixas mas também nas dívidas dos contribuintes para a segurança social que não pagam as respectivas contribuições. Neste domínio, temos uma preocupação acrescida que é a de que, embora estando a ser feito o combate à fraude, já no que respeita às empresas que são devedoras entendemos que não está a ser feito. O Sr. Ministro diz que vai aprofundar este combate. Mas como? Criando mais brigadas de fiscalização para verificarem se as empresas são ou não contribuintes cumpridores? Como é que o Governo vai proceder?
Passo ao problema das pensões.
V. Ex.ª afirma que as pensões sofreram um aumento grande, significativo, superior à taxa de inflação. Em nosso entender, são aumentos diminutos. Todas as pensões estão degradadas e basta ver que há 1,650 milhões de pensionistas cuja pensão é inferior a 30 contos e se formos verificar os que têm uma pensão inferior a 50 contos, verificaremos que são cerca de 90%. Portanto, degradadas estão todas as pensões, pelo que o aumento que anunciou é pouco significativo. E há mais um "senão" que é o da atribuição só a partir dos 75 anos de idade com um período de maior contribuição.
O Sr. Ministro sabe tão bem quanto todos nós que se considerarmos os pensionistas com mais de 75 anos, reformados há 10 anos e que contribuíram durante pouco mais de 21 anos, veremos que eram poucos os que naquela altura eram abrangidos. Portanto, não aceitamos que o Sr. Ministro diga o que disse. Quanto a nós, o que é triste é chamar aumento de pensões a esta quantia irrisória.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, gostaria de começar por saudar a evidente melhoria das prestações e dos serviços da segurança social depois que V. Ex.ª tomou posse. Gostaria ainda de saudá-lo pelo rigor na fiscalização das baixas por doença e no combate à fraude a vários níveis no âmbito da segurança social.
Apesar de a sua intervenção ter sido suficientemente clara e exaustiva, há uma dúvida que me assalta e que gostaria que me explicasse, já que a dificuldade de compreensão deve ser minha.
Ultimamente, há quem defenda a diminuição das contribuições patronais para a segurança social e, simultaneamente, a melhoria substantiva das prestações aos beneficiários. São os mesmos que se afadigam a referir que o sistema está falido e não tem condições de solvabilidade. Por isso, como lhe digo, a dificuldade de compreensão é minha e gostaria que me explicasse como é possível diminuir as contribuições e aumentar o nível de prestações.
Por outro lado, as empresas que, por não cumprirem a lei, não pagam as contribuições para a segurança social estão privadas, entre outras coisas, de aceder a concursos públicos e outros trabalhos. Ora, gostaria de saber de que forma é que a segurança social pode contribuir para o combate ao trabalho clandestino.
Renovando as minhas saudações pelo seu trabalho, Sr. Ministro, são estas as minhas perguntas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social.

O Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social: Sr. Presidente, Srs. Deputados, peço desculpa por responder em conjunto mas tenho falta de tempo.
O Sr. Deputado Nuno Correia da Silva colocou um conjunto de questões que são importantes. Percebo que tenha alguma legitimidade para dizer que gostava que estivessem espelhadas as opções da reforma porque tem uma

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posição crítica em relação ao Programa de Governo que foi aprovado aqui, na Assembleia da República. Mas a verdade é que, neste caminho da reforma da segurança social, estamos a procurar seguir um traçado cuidadoso, rigoroso e participado. É que o pior que poderíamos fazer e a melhor maneira de não haver reforma nenhuma na segurança social em Portugal seria precipitarmo-nos nessa matéria.
Assim, algumas questões que já no ano passado foram levadas à prática e que estão também contidas na proposta de lei do Orçamento para este ano, como o cumprimento da lei de bases e a compatibilização entre universalidade e selectividade, que, como se viu, agora, neste aumento de pensões, constituem enormes passos em frente, não foram suficientemente salientadas por quem frequentemente os defendeu.
É óbvio que, do meu ponto de vista, o sistema público de segurança social, apesar de todos os problemas que tem, é um contributo para a justiça social. Não é essa a opinião do Sr. Deputado. Estou convencido que a destruição do sistema público destruiria os próprios fundamentos da solidariedade e da justiça social no nosso país. Hoje em dia, na Europa, ninguém defende isso, nem ao nível das confederações patronais nem ao nível dos principais partidos na União Europeia.
As instituições particulares de solidariedade social têm sido tratadas por este Governo como parceiros de corpo inteiro - e com toda a justiça -, não por qualquer "politiquice" mas por interesse social nessa parceria pois nada se faz sem cooperação com quem está no terreno e vamos continuar a proceder assim.
O rendimento mínimo é uma experiência concreta em que há uma presença total daquelas instituições, juntamente com as autarquias, no terreno e na Comissão Nacional do Rendimento Mínimo, em que toda a informação é disponibilizada, é totalmente transparente, e em que as correcções que seja necessário efectuar no terreno contam com a participação activa das instituições particulares de solidariedade social.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao problema do IVA, tal como o Sr. Ministro das Finanças tem dito muitas vezes, não é em sede de Orçamento do Estado que se faz uma reforma global de todas as injustiças que existem no domínio da fiscalidade em Portugal. Estou convicto de que, efectivamente, ainda há um caminho a trilhar. Mas posso dizer-lhe que, em matéria de economia social, não só com as instituições particulares mas com outras, como as mutualidades e as misericórdias, este Governo, num ano, com três Orçamentos sucessivos - um Orçamento do Estado rectificativo, o Orçamento do Estado para 1996 e o Orçamento do Estado para 1997 - deu passos de gigante como mais nenhum outro em apoio às instituições particulares de solidariedade social.
Quanto à diversificação das fontes de financiamento, já hoje existe. De facto, existe uma componente que provém do IVA social e uma outra que provém da taxa social única, com contribuições dos empregadores e dos empregados.
É necessário desenvolver essa diversificação, criando maior justiça no sistema e estou perfeitamente de acordo. Ora, isto tem de ser feito, preservando os equilíbrios fundamentais e sei que o Sr. Deputado também aposta no combate à inflação e no combate ao défice público.
Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa, achei muito interessante a sua intervenção, em primeiro lugar, devido à questão do "cenário cor-de-rosa".
O cenário na segurança social, infelizmente, ainda não é "cor-de-rosa", ainda está muito "alaranjado" para meu gosto porque continuamos a sentir a influência nefasta do que foram as políticas de sucessivas secretarias de Estado da segurança social, tuteladas pelo PSD, que iam destruindo o sistema público de segurança social em Portugal.

Aplausos do PS.

Aliás, quando vejo os Srs. Deputados do PSD já tão preocupados com a inexistência de uma reforma da segurança social, devo dizer que são uma oposição feroz, a posteriori, ao vosso próprio governo...

Protestos do Deputado do PSD Jorge Roque Cunha.

... porque tiveram 10 anos de governo de maioria absoluta e a reforma da segurança social é igual a zero.

Protestos do PSD.

Aplausos do PS.

Foram dados alguns passos importantes pelo então Secretário de Estado Vieira de Castro, que hoje está aqui na bancada do PSD e, possivelmente por isso e por outras coisas feitas de forma mais positiva, foi substituído. Em poucos meses, houve sucessivamente quatro Secretários de Estado da Segurança Social no antigo Ministério do Emprego. Por algum motivo assim terá sido, Srs. Deputados!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao aumento de verbas para o subsídio de desemprego, o Sr. Deputado diz que não entende por que é que crescem. Sabe que é possível aumentar as verbas para o subsídio de desemprego e diminuir o número de desempregados? É possível, desde que aconteça algo que pretendemos que é proteger mais e melhor os desempregados, nomeadamente os que têm mais de 45 ou de 50 anos, que têm desemprego de longa duração e que, neste momento, se vêem, de repente, numa situação extremamente difícil.
Sr. Deputado Rodeia Machado, fiquei muito satisfeito com as suas perguntas porque verifiquei que reconhece que este Governo cumpre a lei de bases enquanto o anterior não a cumpria. Reconhece ainda que este Governo está a levar à prática algo que o PCP sempre defendeu - o rendimento mínimo garantido - e reconhece que está a fazer-se um grande esforço de combate à fraude que deve ser intensificado. Ou seja, o Sr. Deputado reconhece que há uma mudança significativa na política que está a levar-se a cabo na área social e, nomeadamente, na segurança social.
Portanto, o Sr. Deputado reconhece que as políticas estão a mudar e que estamos a procurar mudar o País. Infelizmente, só a linguagem do PCP é que não está a mudar nestes últimos meses.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Barbosa de Oliveira, efectivamente, seria possível admitir simultaneamente alguma diminuição das contribuições da taxa social única e melhorias na protecção se, ao mesmo tempo, houvesse outras fontes de recei-

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tas públicas, o que teria de ser feito consequentemente por quem propõe essas medidas, propondo aumentos de impostos. Ora, até agora, que eu saiba, ainda nenhuma bancada da oposição apresentou qualquer proposta clara no sentido de aumento dos impostos para que aquele desiderato seja obtido.
Concluo, dizendo que o combate ao trabalho clandestino está a ser desenvolvido neste momento com uma articulação permanente entre a inspecção da segurança social e a inspecção do trabalho que, certamente, terá bons frutos a curto e a médio prazo.

Aplausos do PS.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - A solicitação do Sr. Presidente, cumpre-me anunciar que, nas galerias, se encontram a assistir à sessão um grupo de 10 pessoas da comissão concelhia do CDS-PP do Porto, 40 alunos da Escola Secundária Gama Barros, do Cacém, e 20 alunos da Escola Secundária Dr. Joaquim de Carvalho, da Figueira Foz.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, saudemo-los.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Santo.

A Sr.ª Helena Santo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Gostaria de dirigir-me ao Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, mas como não está presente, dirijo-me ao Sr. Secretário de Estado.
Na página 139 do Programa do XIII Governo Constitucional pode ler-se: " o Governo tem plena consciência da gravidade da situação em que se encontram a agricultura e o Mundo Rural Português" e, continuando a leitura, diz-se ainda que "esta situação de profundo desequilíbrio verificado no espaço agrícola e rural constitui para o Governo motivo de grande preocupação, e merece no seu Programa uma forte prioridade no conjunto das prioridades nacionais".
Apesar deste objectivo claramente enunciado no Programa do Governo, logo na proposta de Orçamento para 1996, a fatia atribuída ao Ministério da Agricultura foi bastante magra, conforme o Sr. Ministro também reconheceu ao tempo. Surpreendentemente, a proposta de orçamento agora em discussão apresenta uma quebra significativa, da ordem dos 12%, relativamente à proposta para 1996. No capítulo do investimento, este Ministério é um dos que tem uma maior quebra.
Ontem, a Sr.ª Secretária de Estado do Orçamento dizia a uma estação televisiva que este Orçamento obedece a uma lógica em que o Governo evidencia e estabelece as suas prioridades. Logo, podemos concluir que a agricultura para este Governo não foi nem é uma prioridade, contrariamente ao que afirmou, o que é grave.
Mas, a ser assim, que não se iludam mais os agricultores portugueses e haja coragem política para dizer-lhes que "arrumem as botas" e vão para casa ou, talvez, aos hipermercados comprar o que a Europa e o resto do mundo nos vendem, muitas vezes as sobras daquilo que não conseguem vender nos seus próprios mercados.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Todos sabemos que um dos maiores problemas com que se debatem muitos dos agricultores portugueses é o endividamento. Corremos o risco de as caixas agrícolas brevemente serem as proprietárias de grande parte das explorações agrícolas deste país.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - A pergunta que gostaria de fazer ao Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas, e que passo a formular mesmo não estando este presente, é muito simples: tem o Governo ideia do montante da dívida da agricultura e dos juros em dívida? Mas, quanto a endividamento, mais uma questão: na abertura da Feira Nacional da Agricultura, em Santarém, no passado dia 1 de Junho do corrente ano, o Sr. Ministro anunciou a criação de uma linha de crédito de 150 milhões de contos, a juros bonificados, para ajudar a regularizar o endividamento dos agricultores. Os agricultores aguardam essa linha de crédito com alguma ansiedade e com a esperança que lhes é devida. Pergunto, então, onde está traduzida, neste Orçamento, a promessa assumida em Santarém!
O Sr. Ministro disse, em sede de Comissão de Agricultura, que as promessas eleitorais nem sempre são para cumprir, e que nem sequer é socialista! Mas esta não foi apenas uma promessa dos socialistas, foi uma promessa do Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas de Portugal, a quem eu volto a perguntar se vai ou não assumir esse compromisso.
Por último, uma pergunta muito concreta, mas que é para nós extremamente importante: para onde vai a agricultura portuguesa? É que o Orçamento não é mais do que a tentativa de tradução quantitativa das opções qualitativas de um programa, neste caso das Grandes Opções. Ora, ao termos acesso ao texto das Grandes Opções do Plano para 1997, no capítulo respeitante à agricultura, não conseguimos perceber quais as orientações estratégicas deste Governo para o sector, quando é certo que um dos principais problemas do nosso sector agrícola é, precisamente, esta falta de rumo, esta falta de orientação estratégia, esta necessidade de sabermos o que devemos produzir e onde, porque produzimos bem.
Admito, no entanto, que esta falta de visão estratégica das Grandes Opções do Plano não constitua falta alguma, mas seja antes uma forma de o Governo dizer aos portugueses que o objectivo deste Ministério e deste Orçamento é continuar o funeral da agricultura portuguesa.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Mas, nesse caso, e se assim é, que o digam de uma vez por todas. Os portugueses merecem a verdade e precisam de saber com que contar.

Aplausos do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, quero apenas saber se a Mesa tem conhecimento do pa-

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radeiro do Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Está em Roma!

Risos.

O Orador: - A Mesa não tem conhecimento?

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Manuel Monteiro, não tenho conhecimento do seu paradeiro, mas admito que o Sr. Presidente em exercício tenha. De qualquer forma, creio que os Srs. Membros do Governo presentes poderão dar alguma informação!
Tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.

Vozes do PSD: - Não sabem dele!

O Sr. Ministro Adjunto (Jorge Coelho): - Sabemos, sabemos!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Ministro, peço-lhe que dê a informação suficiente, se é que entende fazê-lo.

O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, para responder ao Sr. Deputado Manuel Monteiro, informo que o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas encontra-se na Cimeira da FAO, em Roma, mas está aqui representado pelo Sr. Secretário de Estado da Produção Agro-Alimentar, que dará todas as informações necessárias para participar no debate que for possível.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Uma vez esclarecido o Sr. Deputado Manuel Monteiro, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando no início deste ano se discutiu e aprovou, neste Parlamento, o Orçamento do Estado para 1996, traçou-se em definitivo o resultado político da discussão relativa ao Orçamento do Estado para 1997.
Com efeito, com o Governo da nova maioria, então recentemente empossado, confrontado com a necessidade de controlar uma máquina potencialmente adversa e uma lógica de política orçamental com a qual haveria que fazer ruptura, o primeiro grande feito foi, desde logo, o de ter apresentado um Orçamento.
Inadaptado e desconfortado com a nova situação política, o principal partido da oposição foi incapaz de perceber o novo sinal dos tempos, abordando a discussão numa lógica de derrotismo e de confrontação gratuita, aqui e além pontuadas com afirmações arrogantes e autistas, de pretensa autoridade técnica e moral, que o bom senso aconselharia a não usar, tendo em conta as mais recentes realizações políticas, à época, dos respectivos protagonistas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Credibilidade foi a palavra chave do debate orçamental para 1996. Falta de credibilidade das projecções dos agregados fiscais, dos agregados macroeconómicos, dos propósitos da política, conforme apregoava a oposição; credibilidade da política orçamental proposta, como referia o Governo, ainda que reconhecida fosse a natureza última dessa mesma proposta, condicionada e reduzida à verdadeira dimensão de política intercalar. Todas as declarações estão registadas e acessíveis, portanto sobre isto não pode haver duas interpretações.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O que sucedeu entretanto, Srs. Deputados? Sucedeu que as previsões, todas as previsões do Governo se confirmaram, muitas delas em alta, os objectivos foram atingidos, a casa foi arrumada e tornou-se possível, então, lançar os alicerces de uma política orçamental diferente.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Todos sabemos que a questão das expectativas é algo de muito importante em política económica, mas também se sabe que as expectativas dos agentes económicos se encontram profundamente ligadas à estabilidade política e, sobretudo, à credibilidade.
Ora, credibilidade é o que não falta a esta equipa governamental. Credibilidade é, em contrapartida, o que não tem o principal partido da oposição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro das Finanças traçou-nos ontem um retrato fiel daquilo que é, objectiva e fundamentalmente, o Orçamento do Estado para 1997. Dar a Portugal o lugar que ambiciona no mundo é o primeiro dos desígnios.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - É, assim, errado reduzir a política proposta à questão da moeda única, sobretudo se a mesma é qualificada não como instrumento indispensável à integração da economia portuguesa na economia europeia mas antes como um mal necessário que é preciso acomodar mesmo que à custa de sacrifícios e iniquidades.
Portugal não está apenas confrontado com a Europa, eu diria que Portugal não está sobretudo confrontado com a Europa! No acelerado processo de globalização e internacionalização da economia mundial, Portugal está sobretudo confrontado, no plano externo, com a capacidade que os outros tiveram de se organizarem e integrarem - tornando-se, consequentemente, mais competitivos e, no plano interno, com a capacidade que tivermos nós próprios de proceder a diversas reformas estruturais, das quais destaco a reforma da Administração Pública e a reforma fiscal, absolutamente indispensáveis para assegurar a nossa própria competitividade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Está, assim, ilidida, a meu ver, uma crítica simplista que nos é dirigida e que, sistematicamente, nos pretende amarrar exclusivamente às condições de acesso à moeda única, sem curar de saber como seriam os cenários - os sacrifícios e as imposições - fora dela.
Apresentar uma política orçamental de estabilidade e consolidação é outro dos objectivos propostos.
O ano de 1996, como o referi, demonstrou que o Governo tem credibilidade para se louvar numa política pública onde os princípios ou as funções de afectação de

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recursos, distributiva e estabilizadora, sejam potenciadas. É o que faz o Orçamento do Estado para 1997, consolidando a despesa a um nível confortável, estruturando-a a um nível eficiente e aplicando-a ao serviço de prioridades sociais.
Não pode haver quanto a isto nenhuma espécie de dúvida ou hesitação. E é nesta linha que o Orçamento se apresenta como um factor essencial para a convergência real, pois contém um volume de investimentos muito razoável, define uma política de emprego de inversão de tendência, assume um crescimento real significativo e aposta numa aproximação clara com o nível médio da Europa dos quinze.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Tudo isto, assumindo sempre as preocupações sociais que constam do contrato que o Governo da nova maioria estabeleceu com o eleitorado e tem vindo a cumprir com coerência e honra.

Aplausos do PS.

Sabemos que os Srs. Deputados do PSD não gostam do rendimento mínimo garantido - está escrito em diversos locais e foi dito em diversas oportunidades; sabemos que os Srs. Deputados do PSD nunca se preocuparam com o cumprimento da Lei de Bases da Segurança Social, contemporizando com a acumulação de uma pressão financeira sobre o sistema que, a curto prazo, se revelaria insuportável. Mas, Srs. Deputados do PSD - é a vida -, essa não é a nossa política, estes foram os nossos compromissos, entre outros, e, quer os senhores gostem quer não, cumpri-los-emos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Repetindo a técnica do debate orçamental anterior, a oposição - alguma oposição - insiste na falta de realismo de algumas das projecções feitas: é um debate inacabado e inútil. É sempre possível afirmar que esta ou aquela proposta não é exequível ou realista e que, portanto, se não verificará. Mas o País não pode estar dependente destas considerações metafísicas ou desejos perversos mal disfarçados. E ao que se vê e se sabe, não o está!
Outra linha de ataque presente neste debate tem a ver com os impostos. Por um lado, posição comum ao PSD e ao PP, critica-se o Governo pela ausência de uma reforma fiscal. No que diz respeito ao PSD, esta crítica é caricata, pois até ainda há pouco tempo ouvimos dizer que a reforma fiscal tinha sido feita pelos seus governos.
Valha-nos, ao menos, a clarificação da situação. É verdade, Srs. Deputados, não foi feita uma adequada reforma fiscal e, sobretudo, o que não há é um sistema fiscal justo e equitativo. Isto mesmo foi, de resto, salientado, recentemente, pelo Sr. Professor Sousa Franco, quando qualificou o nosso sistema fiscal de vergonhoso e classificou a colecta mínima como uma questão de elementar justiça e de mera decência.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nestas afirmações, simples mas importantes, estão pois enunciadas as regras fundamentais da revisão do sistema fiscal: a decência, a justiça, a simplificação e a equidade.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - E foram dados os primeiros passos nesse sentido neste Orçamento, através de diversas disposições, precisamente justificadas à luz desses princípios e desses conceitos. Agora não esperem que a reforma fiscal se faça em sede de discussão do Orçamento do Estado.
Mas a questão mais mediática ligada aos impostos tem sido a afirmação reiterada e disparatada de que o Orçamento do Estado para 1997 consagra o seu aumento - dos impostos, claro.
O Governo comprometeu-se a não aumentar os impostos em 1996 e fê-lo! Comprometeu-se a não aumentar os impostos em 1997 e fá-lo-á, se a proposta orçamental for aprovada.

Aplausos do PS.

A reiterada afirmação de que em 1997 haverá aumento de impostos é uma mistificação e uma mentira, só justificável pela necessidade de manter artificialmente afirmações incorrectas anteriores.
É conhecido da vida comum que o grande problema de alguns mentirosos é que se enredam nas suas próprias mentiras e, em situações mais críticas, chegam mesmo a tomar a sua verdade pela verdade objectiva e pelos factos.
Desafiámos ontem o PSD a demonstrar, apresentando situações concretas, o agravamento fiscal para as famílias e as empresas. Reiteramos o desafio e, já agora, convidamos os Srs. Deputados a demonstrarem também o apregoado aumento de 0,9% dos impostos para 1997. Mas como ontem tive oportunidade de referir, não nos façam perder tempo e paciência com conceitos que não medem nem podem medir, em absoluto, a situação tributária dos contribuintes e, consequentemente, a sua real posição perante os impostos.
É, aliás, estranho que neste debate os Srs. Deputados da oposição nunca se tenham referido, por exemplo, à evolução do rendimento disponível das famílias!

O Sr. José Junqueiro (PS):- Exactamente!

O Orador: - Este sim, um indicador absolutamente indispensável para medir o progresso e o bem-estar dos cidadãos.

Aplausos do PS.

Por ser absolutamente inútil e desperdício de tempo, face à configuração do próprio Orçamento e, sobretudo, ao pulsar concerto da economia portuguesa, não abordo, em detalhe, as críticas de inércia, despesismo, facilitismo e alibi.
Vou, contudo, reportar-me a outros dois pontos de dúvida crítica: o do insuficiente aproveitamento da conjuntura e o da ausência das reformas estruturais.
Quanto ao primeiro, confesso que não atingi em todo o seu alcance a sugestão formulada. Se é certo e foi referido que o objectivo da redução do défice é fundamental (e independente da moeda única) e, ao que parece - palavras de Deputados do PSD -, podia e devia ser menor; se é certo que a compressão e consolidação das despesas se encontra já ao nível máximo comportável, para quem deseja prosseguir uma política de estabilidade social, onde é que vai o PSD encontrar margem de manobra?

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Redução da despesa corrente, dir-nos-ão! Mas onde? Podem os Srs. Deputados clarificar esta situação e, sobretudo, assumirem a responsabilidade de propostas concretas? Querem despedimentos na função pública? Querem bloqueamento do funcionamento normal dos serviços?

Vozes do PS: - Querem!

O Orador: - Querem incumprimento da Lei de Bases da Segurança Social?

Vozes do PS: - Querem!

O Orador: - Querem perpetuar a situação de discriminação em relação às regiões e às autarquias?

Vozes do PS: - Querem!

O Orador: - Ou vão repetir a proposta do ano passado, de eliminação do rendimento mínimo garantido!
Será que os Srs. Deputados do PSD, embalados na sua própria verdade, nos convidam, agora sim, a um inevitável aumento de impostos?
A segunda observação tem a ver com a acusação sobre a ausência de reformas estruturais, e mesmo que se dê de barato que os Srs. Deputados do PSD não exigem que ao articulado da proposta orçamental se juntem as disposições adequadas às reformas exigidas, interrogo-me, com sinceridade, sobre o que é que os Srs. Deputados do PSD têm andado a fazer. Não sabem que vai ser generalizado a todo o País o rendimento mínimo garantido? Não deram conta que foram tomadas recentemente medidas significativas no domínio da desburocratização e modernização de Estado? Nunca ouviram falar do Plano de Recuperação de Empresas? Ignoram o enorme esforço orçamental, de 1996 e 1997, canalizado para a educação?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi ontem uma Sr.ª Deputada, responsável de primeira linha da sua bancada, assumir que o desígnio nacional da passagem à terceira fase da União Económica e Monetária era compartilhado pelo seu próprio partido. Sem insistir em considerações já feitas sobre a verdadeira interpretação que damos a este desígnio nacional e que acentuaria, seguramente, a nossa divergência, é obvio que tenho de congratular-me com essa afirmação.
Só que a Sr.ª Deputada disse mais: disse que para atingir esse objectivo este - o nosso - não era o melhor caminho e, sobretudo, não era o seu caminho. Deve-nos, a todos, uma explicação Sr.ª Deputada: qual será afinal o seu caminho? Que medidas concretas tem para nos sugerir, sem tocar no que aparentemente nos une - a redução do défice e da dívida e o controlo da inflação - e sem nos obrigar ao incumprimento de compromissos programáticos e eleitorais (a estabilidade política, o esforço de investimento, a prioridade social)?
O PSD, como grande e indispensável partido da oposição que é, não pode passar de partido do sistema a partido do oculto e do esoterismo. Temo que tal suceda se continuar a expandir-se e consolidar-se no seu interior a tese da ocultação de que os Srs. Deputados aqui fizeram tão boa prova.
Segundo esta tese, e na impossibilidade de negar o óbvio, haveria sempre um caminho novo e diferente, um conjunto de medidas diferenciadas, um ramo de comportamentos políticos distintos e, sobretudo, um referendo à não, para decidir , não decidindo, baralhando de novo e mais uma vez.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que se espera deste debate orçamental é que ajude os portugueses a compreenderem os caminhos que lhes são propostos e os objectivos que lhes são essenciais. Isto impõe que o debate orçamental seja aberto, o que implica desde logo a eliminação da tese da ocultação, verdadeiro, o que pressupõe a boa fé, e digno o que exige a erradicação da chicana política.
O líder do PSD terá informado hoje que o seu grupo parlamentar nos reserva uma surpresa. Esperamos que assim seja e que, finalmente, o PSD se posicione como grande partido da oposição que é e ao qual não faltarão, seguramente, oportunidades democráticas no futuro, como partido que compartilha e prioriza a estabilidade política e social.
Em suma, que recupere plenamente o sentido da responsabilidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Afastado do poder durante 10 anos, o PS apostou tudo para ganhar as eleições legislativas de 1995. Conhecendo os constrangimentos orçamentais que marcariam o período da legislatura não se coibiu de se exceder em promessas. Promessas que de antemão sabia não poder cumprir.
Com a discussão do Orçamento do Estado para 1997, cujo período de vigência corresponde a metade do mandato do Governo, é já possível garantir que o PS não vai cumprir o que prometeu na campanha eleitoral.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Nota-se, nota-se!

O Orador: - As expectativas dos eleitores que votaram na mudança vão ser frustradas.
O PS prometeu que a despesa com a saúde atingiria 6% do PIB no final da legislatura.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Disse o contrário, disse que gostaria de lá chegar! Os senhores mentem, têm falta de carácter!

O Orador: - Para cumprir este objectivo, o acréscimo anual da respectiva dotação orçamental teria de ser superior a 102 milhões de contos.
Em 1996, a despesa com a saúde aumentou 53 milhões de contos e, em 1997, a previsão de aumento é de 86 milhões de contos. Temos, assim, que o défice da promessa é de 64 milhões de contos. Em 1998 e 1999, para que a promessa fosse cumprida, os acréscimos para as dotações com a saúde terão de totalizar 268 milhões de contos. Porque o critério do défice se mantém para aqueles anos, o Governo não vai poder cumprir o que o PS prometeu.
Em vez de criar uma ilusão, o Governo devia ter optado por prosseguir a reforma do sistema de saúde.
Não é de estranhar, porém, que o Governo tenha escolhido o caminho mais fácil. As reformas exigem coragem e o Governo está, sobretudo, preocupado com a sua imagem.

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A saúde não é uma prioridade para este Governo. Vejamos alguns exemplos: as transferências para a área dos cuidados de saúde primários têm um aumento de apenas 0,7% em relação à execução de 1996; o hospital Cascais/Sintra, cujo início da construção foi anunciado por mais de uma vez, tem, no PIDDAC, uma dotação de 5000 contos, repito, de 5000 contos! Outro exemplo: 70 projectos de centros de saúde e extensões têm uma dotação de 5000 contos, repito, de 5000 contos!
E o que se passou na área da toxicodependência?

E o que se passou na área da toxicodependência? Aí, o Governo falhou rotundamente. Dos 100 000 contos para o serviço de prevenção e tratamento de toxicodependentes, em 1996, vão ser executados 10 000 contos. A taxa de execução é de 10%. Convenhamos: trata-se de uma taxa de execução, já de si, irrisória e mais irrisória ainda quando o Governo elegeu a droga como o seu inimigo público número um.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Calunioso!

O Orador: - Mas há mais: o Governo anunciou um plano financeiro para eliminar o passivo do Serviço Nacional de Saúde. Do plano nada se sabe, mas sabe-se que o passivo continua a aumentar. E - pasme-se! -, em finais de 1997, o Ministério prevê que as dívidas do sistema nacional de saúde vão atingir 165,1 milhões de contos. Mais: em 1997, a saúde é desfavorecida na despesa do Estado. O seu peso era de 15,5% em 1996 e decresce para 14,9% em 1997.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo comprometeu-se a reformar o sistema de segurança social. Criou uma legítima expectativa ao nomear uma comissão para elaborar um livro branco. Enquanto a Comissão, com alguns acidentes de percurso, vai prosseguindo os seus trabalhos, o Governo vai tomando medidas avulsas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É bem verdade!

O Orador: - Sem estar concluída a avaliação sobre a situação financeira do sistema, o Governo vai assumindo novos compromissos sem medir as consequências futuras.
Não posso deixar de recordar um facto: aquando da discussão do Orçamento do Estado para 1995, o Sr. Deputado João Cravinho subscreveu uma proposta para que o Governo, então em funções, apresentasse, num prazo de 120 dias, as reformas necessárias à viabilização financeira da segurança social a médio prazo. Cabe perguntar o que pensa o Ministro João Cravinho da lentidão do Ministro Ferro Rodrigues...

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas, no relatório do Orçamento do Estado para 1997, o Governo reconhece; e passo a citar, que "O Orçamento da segurança social será, ainda, limitadamente influenciado pelas primeiras conclusões dos estudos para a reforma da segurança social". Ora, o Governo está a anunciar que a reforma fica adiada e está também a dizer que mais uma promessa não vai ser cumprida.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo tem reiterado, e acreditamos que com sinceridade, a sua preocupação quanto ao desemprego. Admito até que precisamente hoje o Governo esteja ainda mais preocupado do que ontem, porque soubemos que hoje, infelizmente, voltou a crescer o número de novos desempregados inscritos nos centros de emprego. Inexplicavelmente, porém, o Orçamento do Estado para 1997 não propõe nenhuma medida que promova o emprego e concorra para o combate ao desemprego. Sucede, inclusive, algo que o Governo deverá explicar: por que razão o orçamento do Ministério para a Qualificação e o Emprego tem um crescimento de apenas 1,8%? Custa-me a acreditar que a Sr.ª Ministra esteja satisfeita com o orçamento que lhe coube!...
Também era bom que o Governo explicasse por que razão o orçamento do Instituto do Emprego e Formação Profissional tem uma redução de 2,2% em relação a 1996?
O Governo deixa à conjuntura a criação de emprego e o combate ao desemprego. Se a conjuntura se apresenta favorável, com um crescimento do PIB na ordem dos 3%, mais uma razão para que sejam adoptadas medidas que potenciem os seus efeitos na criação de emprego. O Governo não tem desculpa se perder esta oportunidade.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas o Governo ainda está a tempo de suprir esta sua omissão, basta que se disponha a acolher as propostas que foram formuladas pelo PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho de falar da paixão do Sr. Primeiro-Ministro.
Durante a campanha eleitoral, o PS prometeu aumentar a despesa com a educação em 1 % do PIB, até ao fim da legislatura. Para cumprir este objectivo, o acréscimo anual da dotação deveria ser superior a 90 milhões de contos. Em 1996, a despesa com a educação aumentou 83 milhões de contos, a previsão de aumento para 1997 é de 72 milhões de contos. Temos, pois, que o défice da promessa já vai em 25 milhões de contos.
Para cumprir o prometido, os acréscimos das dotações para 1998 e 1999 teriam de totalizar 205 milhões de contos, o que corresponde a crescimentos anuais de 10%. O Governo sabe que não tem condições para cumprir esta promessa.
Sinceramente, Srs. Deputados do Partido Socialista e Srs. Membros do Governo, custa-me dizer-lhes o que vou dizer,...

Vozes do PS: - Diga lá!...

O Orador: - ... mas, porque é verdade, vou ter de o fazer. Decorrido um ano de mandato do Governo, não se descortina, na política da educação, um único aspecto positivo. Infelizmente, apenas se pode registar uma sucessão de erros graves que afectaram a credibilidade do Governo.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Limito-me a recordar tudo quanto se passou em relação aos exames de acesso ao ensino superior. Ninguém acredita, penso eu, que o Governo tenha condições para reformar o sistema.
A crescente contestação vem demonstrar que a paixão, afinal, foi fugaz e, ainda por cima, não é correspondida.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É muito mau sinal que o Governo falhe na sua maior aposta ou, por outras palavras, na paixão do Sr. Primeiro-Ministro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como ficou demonstrado, com o Orçamento do Estado para 1997, o Governo não cumpre as promessas eleitorais do PS, afinal, as promessas que lhe deram a vitória nas eleições.
Que os portugueses ajuízem quanto vale a palavra do PS.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ajuizarão!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Vieira de Castro, o Sr. Deputado Afonso Candal.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vieira de Castro, devo dizer-lhe que estava com alguma expectativa em relação à sua intervenção, mas, de facto, infelizmente, desiludiu-me. Sinceramente, não estava à espera de o ver nesse papel! Aliás, já hoje assistimos a um papel idêntico, desempenhado pelo Sr. Deputado Rui Rio, mas, de si, sinceramente, não esperava.
O Sr. Deputado fez uma intervenção sobre vários temas, toda ela assente em pressupostos errados e, mais grave, já várias vezes desmentidos, o que demonstra alguma má fé na discussão deste Orçamento e também que o PSD, ao longo deste debate, em nada tem contribuído para a clarificação das propostas do Governo. Mais grave ainda: o PSD ainda não demonstrou quais as suas propostas para a eventual alteração deste Orçamento.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Calma!

O Orador: - Concretamente em relação à saúde, o Sr. Deputado Vieira de Castro teceu toda a sua intervenção em torno de um alegado compromisso eleitoral que já foi várias vezes desmentido e que não foi, de facto, um compromisso.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - É preciso ir buscar o vídeo?!...

O Orador: - O que foi dito, na altura, foi que seria desejável que a despesa com a saúde atingisse os 6% do PIB, mas, infelizmente, isso não seria possível. E não seria possível devido a diversos constrangimentos por demais conhecidos.
Além disso, a avaliação do exercício deste Governo é feita constantemente ao nível da opinião pública e os resultados também são conhecidos. É claro que o PSD não lhes dá grande atenção, porque não lhe são favoráveis, mas eles existem e sobre isso também não há dúvidas.
De qualquer forma, houve, efectivamente, compromissos assumidos, grande parte deles já foram postos em prática, outros sê-lo-ão ainda nas próximas sessões legislativas, mas houve também intenções demonstradas, áreas prioritárias, e isso está bem claro, este Orçamento demonstra quais são essas áreas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - De boas intenções está o mundo cheio!

O Orador: - Por isso mesmo, ao Sr. Deputado e ao PSD, que falam num exagerado aumento da despesa, quando, de facto, a despesa foi fortemente contida onde podia ser contida, pergunto: onde é que defendem a redução da despesa? É nas funções sociais, como a educação, que subiu 11,1% (87 milhões de contos), a saúde, que subiu 5,8% (36 milhões de contos) ou a segurança social, que subiu 91,4% (157 milhões de contos)? Ou será, por outro lado, no investimento, onde há um grande esforço, nomeadamente nas áreas não elegíveis para financiamento comunitário, como a administração interna, que tem um aumento de 82,2% de investimento?
Já agora, a propósito da segurança, aproveito para referir que, ainda há pouco, o Sr. Deputado Lino de Carvalho desvalorizou a questão das esquadras da PSP e dos quartéis da GNR, mas é preciso clarificar se, de facto, é necessário haver ou não segurança. É que, para haver segurança, é preciso investir!
Será que pretendem reduzir a despesa na área da justiça, onde se registaram aumentos de 53,1%, em termos de esforço de investimento relacionado com a situação das cadeias em Portugal?
É importante que digam onde é que pretendem reduzir a despesa!
Será que é na Lei de Bases da Segurança Social? Será que é no cumprimento das transferências para as autarquias? Será que é no rendimento mínimo garantido, no âmbito do qual, curiosamente, no ano passado, apresentaram duas propostas de alteração na especialidade, uma no sentido da eliminação, outra no sentido do reforço da dotação?
Talvez seja essa a surpresa que já foi anunciada e que nos reservam: sobre qualquer tema, apresentam duas propostas contraditórias e terminamos a discussão do Orçamento sem nunca assumirem uma posição, dizendo quais são, de facto, as vossas propostas.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Tenham calma! Não sejam impacientes!

O Orador: - Srs. Deputados do PSD, é importante que clarifiquem as vossas posições!
Quanto ao Sr. Deputado Vieira de Castro, terá de provar as afirmações que fez e que lhe permitiram tecer toda a sua intervenção, porque, na verdade, são falsas e o Sr. Deputado não terá hipótese de fazer essa prova, como também não terão hipótese de provar o aumento dos impostos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Afonso Candal, regozijei-me com o facto de ter desiludido V. Ex.ª. Do meu ponto de vista, é bom sinal e, sinceramente, tomo-o como um elogio. Enfim, é a minha maneira de ver a sua alusão!...
Vamos ao problema dos 6%. Bem gostaria que isto ficasse hoje resolvido!

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Como o Sr. Deputado sabe, a questão dos 6% nasceu numa conjuntura, um pouco - como hei-de dizer? - atrapalhada.

Risos do PSD.

Ninguém é obrigado a fixar o valor do PIB, nem mesmo os candidatos a Primeiros-Ministros, e, portanto, não vou explorar esse aspecto, porque qualquer um de nós pode ter um lapso de memória. Eu seria incapaz de explorar uma falha que admito, e repito, qualquer um de nós pode ter. Porém, aconteceu assim e é verdade que quando essa situação ocorreu, houve uma alusão a 6% do PIB. Está gravado, não vale a pena desmentir!
Agora, Sr. Deputado Afonso Candal, eu não quero pensar - longe de mim essa ideia - que digam que, até às eleições, a alusão aos 6%, bem ou mal feita, como desejo ou como promessa, vai deixar-se ficar assim...

O Sr. Primeiro-Ministro: - Não fica não!

O Orador: - ... e que pós-eleições, digam que, afinal, já não foi isso que disseram. Eu não quero pensar isso, porque se há coisa que eu não acuso o Sr. Engenheiro António Guterres é de falta de honestidade política. Portanto, essa acusação eu não lhe faço!

Aplausos do PSD.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Exige a visualização das gravações!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra da bancada.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vieira de Castro, V. Ex.ª compreenderá, e todos nós compreenderemos, que é legítimo argumentar com divergência em torno de pontos de vista não coincidentes, é legítimo, mesmo, fazer interpretações de valor distintas sobre realidades, quaisquer que elas sejam. O que não é legítimo, Sr. Deputado Vieira de Castro, é deturpar manifestamente os factos para, em cima da deturpação, fazer acusações políticas.

Aplausos do PS.

O que o meu camarada de bancada lhe disse, Sr. Deputado Vieira de Castro, foi que a afirmação do então Secretário-Geral do PS, em período de campanha eleitoral - e volto a citar -,tinha sido a seguinte: "O que seria desejável era que as despesas com a saúde atingissem os 6% do PIB, mas, infelizmente, isso não vai ser possível".

Vozes do PS: - Ah!

O Orador: - Esta é a afirmação.
Sr. Deputado Vieira de Castro, de duas uma: ou, apresenta aqui uma gravação diferente daquilo que acabei de lhe referir ou pede desculpa ao Sr. Primeiro-Ministro e ao Partido Socialista por continuar a iludir os portugueses!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para dar explicações, nos termos regimentais, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão...

Protestos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, vamos ouvir as explicações do Sr. Deputado Vieira de Castro, nos termos normais de respeito nesta Câmara.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Faça favor, Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Lacão, quando ocorreu a situação a que há pouco aludi, houve ou não uma referência à despesa do PIB quantificada em 6%, como um desejo de que fosse atingido esse valor?

Protestos do PS.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Com certeza! É a média europeia!

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Lacão, acha ou não que, postas as coisas nestes termos e em plena campanha eleitoral, é legítimo que quem ouve possa assimilar a um compromisso político?!

Protestos do PS.

Terceira pergunta, Sr. Deputado Jorge Lacão: não foi ontem nem hoje que se falou nos 6% do PIB como despesa da saúde.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por que é que os senhores, quando da primeira vez que o problema se levantou, não tiveram coragem de desmentir?

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Deputado Jorge Lacão está a pedir a palavra, mas já exerceu o direito de defesa da honra da bancada...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Jorge Lacão, vai fazer o favor de cooperar connosco, fazendo a interpelação no sentido exacto da palavra.
Tem a palavra.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, neste acto de interpelação à Mesa, quero pedir a V. Ex.ª a oportunidade de a minha bancada, depois de inequivocamente esclarecido o teor das afirmações do então Secretário-Geral

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do Partido Socialista, em período de campanha eleitoral, dar ao Sr. Deputado Vieira de Castro o Programa Eleitoral do Governo do Partido Socialista ....

Protestos do PSD.

... e o Programa do XIII Governo Constitucional e voltar a pedir ao Sr. Deputado Vieira de Castro, porque é seguramente um homem de bem, que aproveite a oportunidade para pedir desculpas pelo lapso que cometeu.

Aplausos do PS.

Entretanto, o Deputado do PS Jorge Lacão fez chegar, pelas mãos do Deputado do PS José Magalhães, os documentos ao Deputado do PSD Vieira de Castro.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Se o Sr. Deputado José Magalhães tivesse esperado um pouco, eu tinha pedido a uma funcionária, auxiliar de sala, que fizesse a entrega dos documentos.

Risos.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, no sentido próprio, nos mesmos termos e com o mesmo respeito pelo Regimento da Assembleia da República, queira interpelar a Mesa.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Agradeço os documentos que o Sr. Deputado Jorge Lacão me deu, mas vai permitir-me que lhe diga que, para mim, eles não são uma bíblia. Nenhum programa de nenhum governo é, para mim, uma bíblia e - vai ainda permitir-me que lhe diga -, muito menos, os programas do Partido Socialista!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Partido Socialista não é um exemplo no cumprimento dos seus programas de Governo.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Vieira de Castro...

O Orador: - Sr. Presidente, vou já terminar, nos mesmos termos do Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Deputado Jorge Lacão parece que olhava mais para mim do que para...

Risos.

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Lacão, acredite que eu queria retribuir a sua amabilidade, mas não disponho da cassete vídeo onde estão essas declarações.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas devia dispor!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sendo assim, tendo havido já a troca de documentação possível, vamos prosseguir o debate das propostas de lei.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Boa ideia!

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, este debate já está circunscrito suficientemente, creio que já foi dito o suficiente, tendo sido utilizadas figuras regimentais que não têm este objecto. De maneira que peço ao Sr. Deputado que prescinda, voluntariamente, do uso da palavra e eu muito lhe agradeceria.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente,...

O Sr. José Magalhães (PS): - Tem a cassete em casa!

O Orador: - ... justamente, eu não ia pedir a palavra para interpelar a Mesa, nem para dar qualquer esclarecimento,...

O Sr. Presidente: - Muito bem!

O Orador: - ... mas, sim, para defender a consideração e honra da minha bancada...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Que ainda não foi feita!

O Orador: - ... que não foi feita, como o Sr. Presidente deve ter constatado.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, a situação que se criou foi a seguinte: o Sr. Deputado Jorge Lacão invocou a defesa da honra da bancada, e fê-la, e o Sr. Deputado Vieira de Castro deu explicações. Não vejo onde é que entra agora essa figura regimental que invoca. Ela já não tem cabimento da parte da bancada do PSD.

Vozes do PSD: - Tem, tem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Se a Mesa permite sucessivas defesas da honra da bancada, não há qualquer possibilidade de terminar o debate das propostas de lei em tempo útil.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, eu confio na interpretação que a Mesa fizer das normas regimentais, como julgo que o Sr. Presidente não colocará em questão que a minha bancada se sentiu ofendida, não apenas com alguns apartes audíveis do Sr. Primeiro-Ministro, pronunciados da bancada do Governo,...

O Sr. José Magalhães (PS): - Defesa por causa dos apartes?...

O Orador: - ... como também pelas considerações que o Sr. Deputado Jorge Lacão aqui fez.
Se o Sr. Presidente achar que existe, regimentalmente, cabimento a que eu possa defender a honra da minha bancada, eu ficarei naturalmente sensibilizado; se achar que ela não é possível, pois eu sentar-me-ei respeitosamente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, a Mesa não está aqui para impedir que o debate se realize mas para tentar regulá-lo. Creio que isto já pôs alguma

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água na fervura e suponho que a sua defesa da honra é em relação à interpelação feita pelo Sr. Deputado Jorge Lacão. Admitamos que é isso.
Se não houver objecção, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Pedro Passos Coelho para defender a honra da bancada do PSD.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Não há objecção mas há precedentes!

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, eu ia também fazer uma sugestão no sentido de me inscrever para uma intervenção,...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Isso era melhor!

O Orador: - ... uma vez que o PSD dispõe de tempo.
Porém, dado que me dá a palavra, gostaria de deixar claro, perante a Câmara, o seguinte: quando um candidato a Primeiro-Ministro vem dizer ao País que é seu desejo que o País, tão depressa quanto possível, atinja a média europeia de investimentos na saúde, não está, com certeza, a fazer desabafos numa mesa de café, está a falar para o País e a assumir compromissos políticos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não entendo afirmações destas de outro modo! O que tenho é dificuldade em compreender alguns comentários, como aqueles que aqui foram feitos, de que é preciso má fé ou falta de carácter para recordar aquilo que o Primeiro-Ministro afirmou perante o País.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

De duas uma: ou é dispensável que os desejos do Sr. Primeiro-Ministro tenham tradução pública e política e, então, todos ficaríamos agradecidos se ele não fizesse essas confidências ao País,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... ou, então, quando ele fala, tem de traduzir compromissos políticos.
O que o PSD afirmou da tribuna foi simplesmente isto, Sr. Presidente: está cada vez mais distante, pela política orçamental deste Governo, concretizar os desejos do Sr. Primeiro-Ministro, que são desejos políticos. Isso nem o Sr. Primeiro-Ministro nem o PS, que defendeu a honra do Sr. Primeiro-Ministro, aqui contrariaram. Foi isso que o PSD disse! Seria bom que o Primeiro-Ministro viesse, então, dizer que tinha perdido uma boa oportunidade para não ter confessado os seus íntimos desejos, porque eles não são válidos para terem tradução política no País.
Contudo, como eu acredito que o Primeiro-Ministro quis imprimir um desejo político para a sua acção, não levará a mal que o PSD lhe diga "Sr. Primeiro-Ministro, terá de fazer Orçamentos de outro modo, porque, como os faz, eles tornam muito difícil que o seu desejo político seja alcançado pelo seu Governo".

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, tenho ainda dois pedidos de palavra: para dar explicações, do Sr. Deputado Jorge Lacão, e para uma interpelação à Mesa, do Sr. Primeiro-Ministro.
Assim sendo, começo por dar a palavra ao Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, sobre matéria de facto, não há discussões. Fui acusado falsamente de ter proferido declarações com o sentido inverso daquele que me é atribuído.
Peço à Mesa que requeira aos órgãos de comunicação que gravaram as minhas declarações o favor de, caso ainda as tenham - e espero que algum possa tê-las conservado - as entregarem completamente à Mesa e de elas serem enviadas à bancada do PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Primeiro-Ministro, a sua interpelação suscita um problema à Mesa, que é o de requerer aos órgãos de comunicação social determinados elementos. Com o acordo de todos, creio, a Mesa providenciará, caso seja possível, no sentido de obter as gravações e registos que refere.
Para dar explicações, tem agora a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, afinal, do que se trata é de um Deputado da sua bancada ter subido à tribuna e ter denunciado a circunstância de a política deste Governo e este Orçamento traduzirem promessas não cumpridas. E, para fundamentar a acusação política de que estávamos perante promessas não cumpridas, foi dado o exemplo - como sendo um exemplo concludente - de que o Sr. Primeiro-Ministro teria garantido, em campanha eleitoral, a subida para 6% do PIB da despesa com a saúde.
Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, a democracia não é apenas uma técnica para a formação de maiorias e minorias; a democracia deve ser, acima de tudo, uma ética, uma ética de responsabilidade. E é em nome dela que volto a apelar à vossa responsabilidade e a sugerir que peçam desculpas a quem, legitimamente, é merecedor das vossas desculpas neste momento.

Protestos do PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, está encerrado o debate relativo a este ponto.
Vou dar a palavra ao Sr. Ministro da Justiça, para uma intervenção.

O Sr. Ministro da Justiça (José Vera Jardim): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Poucas questões há que hoje mais se discutam na generalidade dos países europeus e também entre nós do que as que dizem respeito à justiça e à segurança. Nesta Assembleia e desde há poucos meses, já várias vezes subiram a Plenário questões fundamentais que dizem respeito à segurança dos cidadãos e à organização da justiça. Já se discutiram problemas da justiça cível, da justiça administrativa, da justiça penal, o que dá bem a ideia de como esta Assembleia situa e compreende a importância destes sectores da vida nacional.
Por outro lado, nunca a justiça foi chamada tantas vezes à primeira página do jornais e às prime-time das televisões. São conhecidas as razões e estão identificados os

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problemas. O aumento exponencial da litigiosidade reflectindo, em muitos casos, situações de crise económica mas também e sobretudo o recurso crescente ao aparelho judiciário por parte dos cidadãos numa sociedade em que os conflitos são cada vez menos abafados para, rapidamente, virem à luz do dia; a crescente capacidade de contestação das pessoas e de movimentos sociais às decisões da Administração com recurso sistemático às jurisdições administrativas e fiscais; a situação geral da criminalidade, da pequena criminalidade à criminalidade organizada, e o surgimento de novas formas de criminalidade económico-financeira, corrupção, criminalidade informática, pondo em causa, quotidianamente, organizações das mais variadas nos seus próprios princípios de funcionamento.
Tudo isto tem levado a um crescente recorrer ao aparelho judiciário para decidir, arbitrar, mediar conflitos, definir situações jurídicas, sancionar o crime. Os tribunais vêem aumentar, sem cessar, o número de processos e crescentemente se espera que a resposta seja mais rápida, mais transparente e que o acesso à justiça seja mais fácil. E o que é certo é que a justiça estava mal preparada para lidar eficazmente com a "explosão judiciária".

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - A rigidez de normas processuais, excessiva burocracia, falta de agilidade dos sistemas de gestão, tradições pesadas difíceis de mudar, métodos de trabalhar muitas vezes arcaicos, têm criado ao aparelho judiciário dificuldades em se adaptar às exigências hoje postas pelas sociedades modernas, com crescentes solicitações e exigências dos cidadãos, e pelas necessidades de economias abertas e altamente competitivas. Face à incapacidade de, muitas vezes, lidar em tempo útil com o aumento da conflitualidade judiciária, os sinais de dúvida, de perda de confiança e mesmo de alguma contestação rodeiam, um pouco por toda a parte, as "casas da justiça".
A afirmação da independência dos tribunais e um conjunto de princípios constitucionais sobre o autogoverno das magistraturas vieram, sobretudo nos últimos decénios, também um pouco por toda a Europa a criar raízes profundas no pensamento e na vivência colectiva, libertando a justiça da interferência dos executivos e criando condições para constituir o aparelho judiciário e a organização judiciária, no seu conjunto, na sede de arbitragem por excelência da conflitualidade social.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - A independência das magistraturas é uma conquista irreversível das democracias modernas e o Governo quer deixar bem claro que assim o considera e que entende que sem magistraturas independentes do poder político e dos Executivos não há verdadeiro Estado de direito.

Aplausos do PS.

A questão do atraso da justiça e da incapacidade, em muitos casos, de julgar em tempo útil é hoje uma questão recorrente. Mas não tenhamos ilusões: o tempo da justiça tem que ser salvaguardado. Não é o tempo da sociedade mediática - a justiça rege-se por um conjunto de procedimentos que dão às partes, a todas as partes, tempo de resposta, tempo de maturação, tempo de preparação, tempo de recurso. Falar da justiça célere é importante, mas não é menos importante falar da justiça exercida em condições que dêem a todos o direito legítimo à defesa, à contestação, ao recurso. E não podemos esquecer que em todo o litígio há sempre uma parte que pretende celeridade e a outra cujo interesse reside muitas vezes em que a justiça ande devagar. Mas não há dúvida de que há um problema de morosidade da justiça, como há um problema de acesso à justiça, como há um problema genérico de condições de exercício da função judiciária.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A resolução dos problemas da justiça não passa unicamente por questões orçamentais; arriscarei até dizer que não passa, em muitos casos por questões orçamentais. Mas também passa pelo necessário esforço orçamental, quer no que diz respeito ao parque judiciário, quer no que diz respeito à necessária modernização de equipamentos, quer ainda no que diz respeito à exigência de melhor formação dos operadores. O esforço que está a ser feito e que está reflectido no Orçamento em relação a estas questões é importante para atribuir à justiça condições dignas de funcionamento, quer para os que nela trabalham quer para os que a ela recorrem.
O Orçamento do Estado traduz em compromissos do Governo a resposta necessária às necessidades actuais. Durante o ano de 1997, serão inaugurados os edifícios de 11 novos tribunais, alguns dos quais tribunais de grande impacto nas respectivas áreas.
Por outro lado, está-se a acudir com soluções expeditas à necessidade de alguns tribunais que acusavam situações especialmente carenciadas; muitas dessas situações têm que ver com Palácios da Justiça que solveram atrasos consideráveis por virtude de dificuldade dos respectivos empreiteiros. Noutras situações, estão a retirar-se dos antigos Palácios da Justiça serviços das conservatórias e notariado para permitir aos tribunais alargar as suas instalações em condições mínimas de dignidade. Noutros casos ainda, foi possível, em tempo recorde, criar e vir a instalar tribunais em zonas deles extremamente carenciadas. No que respeita à modernização de equipamento, estão todos os tribunais já em condições de proceder às gravações das audiências, meio indispensável para permitir um recurso fundamentado sobre a produção da prova na 1.ª instância.

O Sr. Osvaldo de Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Já este ano se procedeu a um passo em frente importante no que respeita à informatização do aparelho judiciário e o esforço será continuado no ano de 1997. Trata-se agora, num aspecto essencial para a modernização dos tribunais, de implantar programas modernos e de formar muitas centenas de funcionários para poderem tirar da informatização todas as potencialidades que ela oferece.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Neste particular, o atraso que temos é enorme. Continuamos, em muitas secretarias judiciais, a trabalhar com instrumentos e métodos de trabalho arcaicos, e não se pode exigir ao conjunto dos funcionários que façam face às crescentes solicitações com meios manifestamente desadequados. Não chegam reformas processuais se elas não tiverem ao nível da informatização um reflexo imediato, automatizando o que pode ser automatizado e

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tornando a informatização num verdadeiro instrumento de gestão dos tribunais, no seu conjunto e de cada um. Esforço necessário e decisivo terá de ser feito no acesso mais rápido e simplificado às bases de dados, que se têm mantido em linguagens e métodos de acesso demasiado complexos e, em muitos casos, ineficazes.
As reformas processuais e de orgânica judiciária assumem em relação à justiça uma importância decisiva. Terminada a primeira grande reforma do Processo Civil e completada pelo novo Código das Custas já aprovado pelo Governo, há agora que levar a cabo a reforma do Processo Penal e a revisão da Lei Orgânica dos Tribunais e da Lei Orgânica do Ministério Público. Até ao fim do corrente ano, estará pronto o projecto do Código de Processo Penal, instrumento decisivo para podermos ter uma justiça penal mais célere e eficaz, terminando com aquilo que tenho apelidado muitas vezes de verdadeiro "cancro" da justiça penal, os chamados adiamentos sistemáticos de julgamentos; revendo por completo os sistemas de recursos; criando processos para a pequena criminalidade, capazes de com ela lidar em condições de eficácia que, sem afectar as garantias de defesa do arguido, possam fazer justiça pronta nos casos mais simples e evidentes.
Esta última matéria trará, como, aliás, as restantes reformas do processo penal, um contributo importante para fazer baixar a enorme taxa de prisão preventiva que temos entre nós e que, a meu ver, encontra muitas das suas raízes num processo penal em alguns aspectos desadequado às condições de exercício exigidas para este tipo de processo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - As reformas da medicina legal e o reforço dos Laboratórios de Polícia Científica terão aqui que dar um contributo para que as perícias não signifiquem atrasos de meses e às vezes de anos no desenrolar normal do processo penal. Para dar um exemplo muito simples: a introdução de programas informáticos já em curso na Polícia Judiciária, no Laboratório de Polícia Científica, em matéria de alguns tipos de peritagem, vem fazer descer para cerca de metade o tempo de algumas dessas peritagens.
Mas também é urgente retirar dos tribunais tudo o que possa ser resolvido por métodos e sistemas não jurisdicionais - a arbitragem, a mediação informal são exemplos do que pretendemos incentivar - e também é um bom exemplo o artigo 51.º da proposta de lei do Orçamento do Estado, no que respeita aos meios alternativos de certificação de créditos incobráveis. Como sabem, Srs. Deputados, em algumas comarcas, sobretudo em Lisboa e no Porto, 60% das acções pendentes nos tribunais cíveis destinam-se a cobrar créditos que são, na maior parte dos casos, incobráveis e os tribunais estão a agir, praticamente, como certificadores de que não há bens para penhorar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é um facto!

O Orador: - Tenho aqui falado vários vezes, quer no Plenário, quer em Comissão, dos necessários instrumentos de reforço da luta contra a criminalidade. Eles continuam, paulatina mas seguramente, a ser postos no terreno para transformar a Polícia Judiciária numa polícia dotada de meios contra as formas mais modernas de criminalidade. Não se trata, em relação à Polícia Judiciária, tanto de aumentar efectivos - o que terá que suceder a um ritmo compatível com a sua formação e com a capacidade de absorção disponível - mas de proceder a revisões de implantação geográfica, já em curso, bem como a investimentos consideráveis que incidirão sobretudo no capítulo da informação processual da polícia. A atribuição a esta polícia de uma verba de investimento que, pela primeira vez, se aproxima de quase 1 milhão de contos demonstra bem o esforço que o Governo está a fazer e continuará a fazer para dotar a Polícia Judiciária de meios modernos de luta contra o crime.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em coerência e articulação com as opções na área da justiça e como uma das linhas características deste Orçamento, está também o reforço significativo das dotações previstas para o domínio da segurança em geral. Esse esforço visa assegurar a renovação, o reforço e a qualificação dos meios de policiamento - elemento não único mas imprescindível para a prevenção e a eficaz repressão do crime -, quer através da admissão de novos efectivos, quer através da modernização dos meios operacionais.
Este Orçamento permitirá, em consonância com os compromissos assumidos perante o eleitorado, prosseguir e alargar as entradas nas escolas das forças de segurança. Com este ritmo, conseguir-se-á que, nesta legislatura, se atinja um número de admissões de novos agentes de segurança superior ao de qualquer outra: 7000 novos elementos para as forças policiais. Este Orçamento permitirá ainda iniciar um novo ciclo de investimento no domínio dos meios materiais, fundamentais para desenvolver a operacionalidade e a eficácia das forças de segurança, onde se tem deparado, como é reconhecido, um panorama caracterizado por grandes carências. Esta viragem traduz-se num aumento de mais de 70% na área da segurança interna e numa valorização sem precedentes da área da justiça e da segurança, no conjunto do investimento público.
É conhecida a situação de profunda crise que atravessam os serviços prisionais. Pela sua enorme sobrelotação, pelas carências a todo o nível no que diz respeito à saúde, à formação, à cultura e ao desporto, à ocupação em geral dos reclusos e às condições de reclusão no interior da grande maioria dos nossos estabelecimentos prisionais. Neste particular, o esforço que vamos fazer e que já estamos a fazer para, simultaneamente, melhorar as condições de reclusão, aumentar a lotação e, em suma, fazer do sistema prisional português algo de que não tenhamos que nos envergonhar, como é o caso actualmente, em muitas situações, reflecte-se num aumento de 130% do PIDDAC, sendo que o aumento da participação no Orçamento do Estado é de 215%, passando de uma verba de 2 milhões de contos para uma verba superior a 6 milhões de contos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Será necessário recuar até à longínqua década de 40 para encontrar algo de parecido entre nós. Trata-se verdadeiramente de um novo sistema prisional que estamos a construir diariamente. E o mesmo se diga em relação ao Instituto de Reinserção Social, que vê aumentada a sua capacidade de investimento, sobretudo destinada aos institutos ou colégios de menores, em mais de 30%; permitindo também, em relação a este sistema tão impor-

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tante na prevenção da criminalidade, que possamos encarar o futuro com mais esperança.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é fácil nem é rápido o que temos pela frente. Muito ficou, aliás, por dizer da intervenção que o Governo tem em curso no sector da justiça.
Não quero cair na tentação fácil em que já outros caíram de tomar a ilusão, e porventura o sonho, pela realidade. Não quero fazer promessas que depois se confrontam com as duras condições da realidade. Também outros já as fizeram e elas foram rapidamente desmentidas. Mas há uma promessa que é já uma realidade: o Governo está a fazer, quer ao nível das reformas legislativas, quer ao nível da reforma dos procedimentos, quer ao nível dos investimentos um esforço que é novo entre nós em muitos dos seus aspectos, para que a justiça, nos seus múltiplos cambiantes, possa ser melhor, mais eficaz, mais acessível aos cidadãos.
Está a fazê-lo consciente de que sem justiça dignificada aos olhos dos cidadãos não estarão criadas as condições de confiança, que são elas também condição essencial de um Estado de direito. Sei que posso contar, que o Governo pode contar, que os cidadãos podem contar com a Assembleia da República e com os Srs. Deputados, no seu conjunto, para uma tarefa longa, complexa, mas inadiável: cumprir o Estado de direito, colocar a justiça no centro da vida democrática.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Joaquim Sarmento, Antonino Antunes, Calvão da Silva, Luís Queiró e António Filipe.
Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, na medida em que me coube o papel de relator do sector da justiça no âmbito da 1.ª Comissão, quero, nessa qualidade e na de socialista, expressar de uma forma inequívoca a total solidariedade dos socialistas na forma como V. Ex.ª tem gerido o Ministério da Justiça.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Numa fase de grande turbulência à volta da justiça, V. Ex.ª tem constituído um garante de serenidade e de lucidez à volta daqueles que querem controlar o poder jurisdicional.

Aplausos do PS.

O poder judicial não se controla, não se domestica. O poder judicial é a última trincheira na independência que pretendemos que ele assegure, é a última trincheira do Estado de direito na defesa dos cidadãos, na defesa do tecido democrático.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O sector da justiça expressado no Orçamento do Estado para 1997 dá uma importância considerável às despesas de investimento que representam já um esforço em relação ao Orçamento anterior, que já representou um esforço considerável em termos de despesas de investimento em relação aos Orçamentos anteriores.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É verdade!

O Orador: - Na despesa total consolidada é de 7 milhões de contos o seu acréscimo, o que representa bem o esforço que o Ministério da Justiça está a fazer no sentido de dar à justiça a importância que ela releva.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro da Justiça, quero também felicitá-lo pelo esforço do seu Ministério no sentido de aperfeiçoar e aprofundar novas tecnologias na informatização dos serviços judiciários, criminais, dos registos e notariado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro da Justiça, a sua intervenção foi profundamente exaustiva e apontou-nos pistas muito concretas no sentido da defesa deste sector nevrálgico da vida portuguesa. De qualquer forma, gostaria de lhe perguntar de que forma vai corporizar, nos próximos anos, o esforço que o Orçamento do Estado expressa no âmbito das política judiciária e criminal.
Numa leitura feita ao orçamento de funcionamento, a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais revela um acréscimo de 3,399 milhões de contos em relação ao orçamento anterior. Sendo assim, gostaria que frisasse mais concretamente o que representa este esforço financeiro, quais as medidas concretas que pretende implementar nos próximos anos.
Sr. Ministro da Justiça, estamos solidários com o seu esforço, estamos solidários com todos aqueles que respeitam integralmente a independência do poder judicial e contra aqueles que querem transformar a justiça numa arena da direita dos interesses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Antonino Antunes.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, ouvi atentamente a sua intervenção e registei quanto V. Ex.ª empolou, acentuou, os aumentos para o orçamento em curso. Porém, e é uma consideração prévia que faço à pergunta que vou formular, de que vale a pena apresentar esses aumentos se já em 1996 não foram executados e certamente veremos que em 1997 também não serão executados. Aliás, não importa tanto apresentar números bonitos porque o que o País quer e exige é seguramente que se façam obras e que efectivamente esses orçamentos sejam executados.
Mas vamos em frente: verificamos que, há pouco mais de seis meses atrás, quando estávamos aqui a discutir o Orçamento do Estado para 1996 na sua previsão plurianual, o Ministério da Justiça previa gastar em instalações dos serviços dos registos e notariado qualquer coisa como 1 489 147 contos mas agora prevê apenas 1 027 880 contos, ou seja, menos cerca de 470 000 contos; em instalações de tribunais previa gastar 10 384 080 contos, agora prevê gastar menos de metade!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Alguns já foram gastos!

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O Orador: - No sistema automatizado de gestão judiciária previa gastar cerca de 198 128 contos, agora prevê gastar menos de metade; na instalação de serviços da Polícia Judiciária previa gastar 891 000 contos, agora prevê gastar cerca de dois terços!
Ora bem, se verificarmos que o aumento em investimentos no sistema prisional só numa pequena parte compensa esta redução, pergunto: não será verdade que o Governo e o seu Ministério estão cegos para o aumento da criminalidade, estão surdos para as reclamações quanto à morosidade da Justiça e estão mudos quanto às reclamações acerca da falta de segurança dos cidadãos?
Em última análise, como é que pensa conciliar os tão anunciados combates à criminalidade e à morosidade da Justiça com esta acentuada redução das verbas inscritas em PIDDAC para o Orçamento do Estado de 1997?

(O Orador reviu.)

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, para respeitar o princípio da alternância, o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, ouvimos com muita atenção a sua intervenção e como desejo ser telegráfico pois estou a utilizar tempo cedido pelo PSD, a quem agradeço, quero apenas dizer-lhe o seguinte. Basta ler o enquadramento da situação da justiça em Portugal que é feito nas GOP para ver que este é um dos sectores em que o Estado mais devia investir com o fim de melhorar o nosso sistema judicial, dado ser uma zona da actividade do Estado que é típica dessa necessidade.
Todavia, querendo ser muito breve e muito concreto, deixo-lhe a seguinte observação. Há medidas que não custam dinheiro, como, por exemplo, a intervenção legislativa. Nesse sentido, quero lembrar-lhe que, na anterior sessão legislativa, se comprometeu a rever o regime da contumácia se não estivesse em condições de apresentar a reforma do Código de Processo Penal até ao fim dessa sessão legislativa. Contudo, o que aconteceu foi que essa reforma não apareceu e a revisão do regime da contumácia que aqui trouxemos sob a forma de projecto legislativo também não aconteceu. Sr. Ministro, porquê?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, V. Ex.ª fez duas afirmações com as quais gostaria de dizer publicamente que estou inteiramente de acordo: em primeiro lugar, que nunca a justiça foi chamada tantas vezes às primeiras páginas e, em segundo lugar, que o tempo da justiça não é o da comunicação social.
Sr. Ministro, queira saber que estou plenamente de acordo e, porque assim é, gostaria de recordar-lhe que quando há poucos meses, há menos de um ano, salvo erro em Maio, aqui tivemos um debate sobre a autoridade do Estado, o PSD, através de mim próprio, teve ocasião de, já então, dizer que estava iminente - e era já na altura muito visível com indícios fortes - a "guerra" no sector da justiça. Era uma tentativa de revisão da Lei Orgânica do Ministério Público, era um grande mal-estar entre o Ministério Público e a Polícia Judiciária e os juízes da magistratura propriamente dita.
Nessa altura, também recordei, e volto a fazê-lo agora, que governar é antecipar, sendo preciso ter capacidade para prever e prevenir as situações.
Sr. Ministro, também lhe disse na altura, como disse ao Sr. Primeiro-Ministro então ausente, que não se podiam desvalorizar guerras no coração do Estado. Efectivamente, a justiça é mesmo o coração do Estado de direito.
Porque assim foi, porque não soube o Governo prevenir, porque não soube nem teve capacidade para evitar esses conflitos, ecoou hoje com mais força aquilo que podia ter sido prevenido e evitado. É pena, Sr. Ministro, que só se venha com a tranca quando a porta já está roubada!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O segredo de justiça há muito tempo que se via que era um sector nevrálgico que devia ser reequacionado. O Sr. Ministro esperou tanto tempo que só depois de o problema ter caído na praça pública é que nos vem dizer que vai propor a mudança no sector que respeita ao segredo de justiça!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas isto é apenas um exemplo que serve para o Ministro da Justiça e para qualquer outro ministro e, mesmo, para o Sr. Primeiro-Ministro. Sr. Primeiro-Ministro, o diálogo é uma grande arma quando para decidir bem, não quando para adiar soluções. Aqui tem um exemplo de que quando se dialoga para não decidir mas para adiar os conflitos são maiores, as consequências para todos os portugueses são inevitáveis. E o sector da justiça ficou de algum modo abalado com tudo o que se está a passar, porque o Governo de agora, como porventura já o de outrora, não souberam actuar a tempo, porque não souberam prevenir, porque não souberam evitar problemas.
Arcana imperii, Sr. Ministro! Uma ideia de segredo no poder faz falta - é uma recomendação para quem tanto apregoa ao diálogo. Saiba entender este exemplo para o transpor para o Governo e verá como todos temos muito a ganhar. Algum segredo no poder é uma grande arma de todos os poderes, dos poderes democráticos necessariamente também.
Uma pergunta concreta para o Sr. Ministro da Justiça.
A liberdade condicional, em consequência de muitos factores, está a ser objecto de discussão. O PSD propôs algumas medidas, o PS viabilizou-as pela abstenção e o Sr. Ministro, com certeza, tem também ideias. Assim sendo, pergunto-lhe: vai equacionar o binómio da liberdade condicional com as medidas de segurança? Ou também vai ter medo de tomar medidas e só quando houver problemas mais graves, como agora, é que virá dizer que vai tomar medidas?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, de forma forçosamente telegráfi-

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ca, não vou pronunciar-me sobre as considerações extra-Orçamento do Estado que produziu, embora saliente que, pela nossa parte, compartilhamos algumas das suas observações, designadamente sobre a independência do poder judicial. No entanto, no que se refere concretamente à proposta do Orçamento do Estado, há um reparo que tem de ser feito.
O Sr. Ministro referiu vários aspectos que são muito preocupantes, dado o estado a que chegaram, designadamente, as prisões, o equipamento da Polícia Judiciária e o parque judiciário. Se o Sr. Ministro reconhece que, no caso do sistema prisional, dada a situação de crise profunda insustentável a que se chegou, há que admitir algum esforço de investimento a nível do PIDDAC, no que se refere à Polícia Judiciária e ao parque judiciário, a realidade não é a mesma, embora, pelo seu discurso, parecesse.
No que se refere à Polícia Judiciária, o Sr. Ministro reconhecerá que não há de facto a nível do PIDDAC um crescimento real significativo, face ao que se verificou em anos anteriores e particularmente no ano em curso, e, no caso do parque judiciário, é visível um retrocesso substancial. Efectivamente, a nível das instalações para tribunais, há um arrastamento visível de algumas obras e há, de facto, uma verba inferior àquela que foi orçamentada no PIDDAC para 1996. Este é um facto que o Governo não pode deixar de reconhecer.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, sem prejudicar as intervenções dos vários oradores, iria, segundo as minhas notas, começar pelo Sr. Deputado Antonino Antunes, que falou de orçamentos executados, de obra feita.
Sr. Deputado, ainda ontem, estive com V. Ex.ª em Ponte de Lima - estava à minha frente e tive ocasião de o cumprimentar -, onde assistiu comigo a um discurso que era assim: "Há 25 anos que estava prometido um tribunal, este Governo chegou cá e fê-lo num ano".

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quem é que lançou a obra?!

O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Estava tudo pronto! O Sr. Ministro só assinou!

O Orador: - A obra foi começada por este Governo, Sr. Deputado. A sua pergunta está respondida: "foi começada por este Governo!

Aplausos do PS.

O Sr. José Magalhães (PS): - Azar de pergunta!

O Orador: - Azar! Há dias infelizes!

Risos do PS.

Sr. Deputado Antonino Antunes, eu esperava que V. Ex.ª me interrogasse, ou melhor, me criticasse - é o seu papel - em tudo menos nisso, porque ainda ontem viemos de um sítio em que o Sr. Deputado ouviu um rol de lamentações das pessoas que tinham estado a ser enganadas durante 10 anos sobre a construção de um Palácio da Justiça. Este Governo começou a fazê-lo e terminou-o num ano. E o Sr. Deputado vem-me falar de execução de obras?!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, a única coisa que lhe diria é que mudo o Sr. Deputado não é; agora, cego e surdo começo a duvidar que não seja!

Risos e aplausos do PS.

Por outro lado, o Sr. Deputado leu uns números que eu, não conheço. Não terá V. Ex.ª lido os números do Gabinete de Gestão Financeira? Eu venho cá na próxima terça-feira discutir o Orçamento na especialidade e vou confrontar os meus números com os seus. É que somos capazes de estar a falar de coisas diferentes, porque nada daquilo que o Sr. Deputado referiu coincide com os números que tenho. Mas, enfim, para não estar agora aqui a discutir números, na próxima terça-feira, teremos ocasião de os discutir.
Sr. Deputado Luís Queiró, antes de mais, quero cumprimentá-lo por ainda se encontrar nesta Câmara. Da última vez que cá vim, V. Ex.ª lamentava-se que, naturalmente, teria de ir-se embora a breve trecho, mas verifico que ainda está!

Risos e aplausos do PS.

E mais: se o Sr. Deputado se mantiver mais umas semaninhas, terá ocasião de discutir o Código de Processo Penal! Mais umas semaninhas só, Sr. Deputado!

Risos do PS.

V. Ex.ª acusou-me de contumaz. Sr. Deputado, a contumácia não tem grandes efeitos entre nós, mas há uma coisa que lhe quero dizer e que já disse à bancada do PP: há um compromisso que tomei e que acabei por não cumprir.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Já disse isso da última vez!

O Orador: - Está certo, já o disse várias vezes neste Parlamento. Mas acabei por não o cumprir, porque mudei a meio do caminho e resolvi que vou fazer a reforma do Processo Penal, que não foi feita pelo anterior Governo.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Já tinha dito isso, Sr. Ministro!

O Orador: - Sr. Deputado, eu sei o que digo e também sei o que já disse! Há pessoas que sabem o que dizem, mas não sabem o que já disseram. Eu, por enquanto, ainda vou sabendo o que digo e o que já disse!...

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Calvão da Silva, é sempre com muito gosto que oiço as suas lições.

Risos do PS.

V. Ex.ª, que vem da Lusa Atenas, traz atrás de si um fundo teórico e doutrinário. E viu-se na sua intervenção, quando V. Ex.ª concordou comigo de que temos também

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de insistir que o tempo da justiça não é o tempo mediático. Não é! E, quando for, estamos mal! Porque o tempo mediático é o tempo da verdade rápida e a justiça, para chegar à verdade, demora o seu tempo. Mas estamos certamente de acordo que há morosidade.
Em relação ao segredo de justiça, vou dizer-lhe também alguma coisa. Como V. Ex.ª sabe, o segredo de justiça está no Código de Processo Penal e eu sempre ouvi VV. Ex.as criticarem, e bem, que reformas... - olhe, fazia uma da contumácia para o Sr. Dr. Queiró ficar satisfeito; fazia uma do segredo de justiça para V. Ex.ª ficar satisfeito e, ao fim de seis meses, tínhamos uma manta de retalhos! V. Ex.ª espere mais umas semaninhas que cá virá o segredo de justiça. Eu também fico à espera, porque nunca o vi propor nada sobre essa matéria. Talvez que, quando aqui vier a proposta do Governo sobre o segredo de justiça, V. Ex.ª tenha ocasião de apresentar alguma proposta. V. Ex.ª, que anda sempre tão à frente dos acontecimentos, nunca propôs nada sobre esta matéria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Agora, Sr. Deputado, sobre guerras nas magistraturas, só lhe peço uma coisa - e sei que vou poder contar consigo: não fale de guerras quando elas não existem, porque, muitas vezes, elas são criadas artificialmente. Há problemas, mas, muitas vezes, são levantados do exterior para o interior a fim de desestabilizar. É contra esses que temos de lutar!

Aplausos do PS.

A justiça precisa, sobretudo, de uma coisa - e sei que V. Ex.ª também dará a sua colaboração nesse sentido: serenidade! V. Ex.ª e a sua bancada também têm obrigação nesse sentido e estou certo de que vão dar a vossa colaboração.
Sr. Deputado António Filipe, não se pode acorrer a todas, mas penso que V. Ex.ª não tem razão. A Polícia Judiciária tem aumentado todos os anos a sua base de investimento - temos quase 1 milhão de contos para investir. V. Ex.ª diz-me que é pouco e ninguém mais do que o Ministro da Justiça o dirá também. Se eu tivesse dois, três ou vinte milhões de contos era melhor - nem tanto, porque, como sabe, estas coisas também têm de ser absorvidas! A nossa principal preocupação é esta: a Polícia Judiciária tem de ter um sistema de informação processual que funcione, que está a ser montado, está em prática, e o dinheiro vai chegando para absorver aquilo de que necessitamos.
Em relação a tribunais, não vou dar-lhe agora, aqui, a lista toda dos tribunais. Sabe, Sr. Deputado, deparei-me - e com isto vou terminar, depois de agradecer ao Sr. Deputado Joaquim Sarmento a sua intervenção, pois não vou ter tempo para lhe responder porque o tempo que tenho é já muito curto - com uma política que era seguinte: grandes Palácios da Justiça, mas, entretanto, há tribunais que estão a afundar-se, que estão numa situação dramática, e nada se faz. Tenho procurado acudir a várias situações pontuais, através do arrendamento e de outros esquemas. Temos de acrescentar àquilo que estamos a fazer em construção outras formas de fazer funcionar os tribunais. Isto já se passou em Matosinhos e na Maia e espero que se possa passar noutros sítios.
Sr. Deputado Joaquim Sarmento, agradeço-lhe muito a sua intervenção. Não vou ter tempo para dizer mais nada, mas, durante a discussão do Orçamento do Estado na especialidade, teremos ocasião de discutir mais sobre o Ministério da Justiça e sobre as questões da justiça. Nessa altura, espero retribuir-lhe a sua intervenção e dar-lhe os esclarecimentos adicionais que bem merece.

Aplausos do PS.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro reincide em considerar que os conflitos não existem internamente e vêm de fora, que têm sido mais provocados de fora para dentro.
Interpelo a Mesa, para que, através da mesma, seja esclarecido - eu, a Câmara e, porventura, o País - se os problemas da abertura do ano judicial foram também causados de fora para dentro ou se nasceram de dentro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Muito obrigado, Sr. Deputado. Como é óbvio, a Mesa vai averiguar detalhadamente esse facto e depois comunicar-lhe-á as suas conclusões.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva.

O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Temos dito e repetimos que muitos dos problemas com que se debatem os portugueses, particularmente do encerramento constante e progressivo do nosso tradicional sector produtivo, à redução dos níveis de protecção social e à contínua e progressiva degradação do poder de compra dos trabalhadores, resultam de uma confrangedora submissão à estratégia comunitária por parte dos nossos governos, em detrimento de Portugal e dos portugueses.
Seria legítimo esperar deste Governo a busca de resoluções que procurassem atenuar ou inverter o curso destes acontecimentos. Seria legítimo esperar deste Governo que, face à actual deterioração da economia nacional, reconhecesse os erros cometidos no passado, procedendo à sua correcção. Mas, ao invés, o Governo, ao apresentar este Orçamento para 1997, persiste na acção de uma política que já demonstrou toda a sua ineficiência.
Um Orçamento que se apresenta com um único objectivo: a todo o custo, mesmo que isso provoque o retornar ao passado de má memória do "apertar o cinto", cumprir as metas de convergência para a 3.º fase da moeda única.
Este Orçamento surpreende-me também pela negativa, ao contemplar o Ministério para a Qualificação e o Emprego, no conjunto dos Ministérios de cariz social, com o menor acréscimo de verbas para 1997. Um Ministério novo, feito à imagem e medida da Sr.ª Ministra, que provocou inicialmente algumas expectativas, mas que, infelizmente, após um ano de exercício, não passou da expectativa, diria mesmo de alguma decepção.
E não é pelo simples facto de a concertação estratégica, quer de curto prazo quer plurianual ou de legislatura, não ter mais fim. E, sobretudo, porque não foi capaz de introduzir um plano de formação profissional direccionado,

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para resolver os problemas que tem vindo a surgir com muita acutilância em algumas regiões deste país, nomeadamente em regiões da mono-indústria ou tradicionalmente rurais.
A Sr.ª Ministra tem repetidamente dito que o problema do desemprego é também e sobretudo de natureza estrutural. Estamos de acordo.
Tem dito, igualmente, que é preciso modernizar as nossas indústrias e torná-las competitivas e qualificar a mão-de-obra numa estratégia de interesse local. Também estamos de acordo.
Pergunto: de que forma vai a Sr.ª Ministra promover a concertação estratégica regional? Á imagem da concertação nacional, em comissão ad hoc, ou pretende regulamentar uma concertação envolvendo os parceiros sociais de interesse local?
Pergunto: o que é feito dos programas anuais e plurianuais de formação? O que é feito da gestão de mecanismos complementares de criação de emprego? O que é feito do rigor e controle da funcionalidade da formação profissional? Onde está a eficácia, o aproveitamento, no acesso ao mercado de trabalho pelos nossos jovens e na reinserção dos excluídos e dos desempregados de longa duração?
Sr.ª Ministra, não pode o seu Ministério limitar-se à feitura de estudos, projectos ou documentos sem exequibilidade prática, que nem os seus colegas de Governo lêem.
O melhor exemplo foi-nos dado ontem pelo Sr. Ministro das Finanças, quando, muito optimista, referia que no terceiro trimestre já se verificou uma diminuição do desemprego e que esta tendência ia continuar.
Se o Sr. Ministro tivesse lido o boletim estatístico do seu Ministério, teria visto que ele diz: "previsão a três meses: acréscimo da taxa de desemprego". E diz também: "previsão em Novembro de 1996: prevê-se que existiam 458 000 desempregados, o que significa um nível de desemprego superior ao registado actualmente (mais 16 500 desempregados). Ao longo do mês prevê-se que se inscrevam nos centros de emprego cerca de 33 000 pessoas."
Sr.ª Ministra, para que o seu Ministério não seja o da oportunidade perdida, recomendo-lhe, com todo o respeito, que imponha ao seu Governo uma taxa de desemprego como condição para a terceira fase da moeda única. Pergunto se considera esta medida como de importância vital para o seu Ministério.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ouvimos ontem o Sr. Ministro das Finanças dizer que este é um Orçamento fundamental para o Governo. É o Orçamento em que se assumem as verdadeiras prioridades do Partido Socialista e se relegam para segundo ou terceiro plano áreas de importância fundamental para os portugueses.
Repetem insistentemente a teoria do orçamento com consciência social, que não resiste a uma análise concreta dos factos e dos números apresentados.
Vejamos, por exemplo, a educação. Esta era uma das prioridades anunciadas pelo Governo, o que não impediu que a concretização prática deste discurso ficasse muito aquém das expectativas e necessidades do País. Denunciámos, no ano passado, a completa insuficiência do investimento em educação apresentado, que chegava em algumas áreas a decréscimos de mais de 30% da taxa de investimento.
Repare-se que a comparação estava, à partida, condicionada pelo facto de os números do PSD, no Orçamento do Estado para 1995, serem claramente insuficientes, como então denunciámos, tal como o fez o Partido Socialista.
Mas é o mesmo Partido Socialista que continua a não dar a áreas essenciais da educação a atenção de que necessitam.
Se não, vejamos alguns exemplos, como o crescimento nulo do investimento na educação especial; a exiguidade da verba para a construção de pavilhões escolares; ou o insignificante crescimento do investimento em acção social escolar.
Vejamos, em concreto, o que se passa com a acção social escolar. Parece inegável que esta é uma área em que, nomeadamente quanto ao ensino superior, há gritantes carências, em especial ao nível das infra-estruturas de apoio.

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Pois, face a isto, o Governo propõe um aumento do investimento de 1,8%. Se a isto juntarmos que no Orçamento anterior houve uma quebra de 37% no investimento nesta área, então concluímos que, a este ritmo, só daqui a 20 anos recuperaremos a quebra de 1996.
Falta apenas contabilizar o efeito desta política. Falta saber quantos estudantes não frequentarão o ensino superior porque não terão lugar em residências universitárias; quantos terão de arrendar quartos a preços proibitivos; quantos não terão cantinas de qualidade; enfim, quantos não terão as infra-estruturas necessárias para garantir a frequência do ensino superior.
Falemos agora da Saúde, sem esquecer a importância que este sector tem na vida de milhares de portugueses nem a crónica situação de subfinanciamento que, ao longo dos anos, o Serviço Nacional de Saúde tem vivido. Este é o panorama a que é preciso dar resposta.
Face a tudo isto, o que propõe o Governo?
Em relação ao Serviço Nacional de Saúde, propõe-se um aumento de 0,8%, o que na prática se traduz numa clara diminuição dos recursos postos à disposição do SNS.
Se tivermos em conta que a previsão para 1996 foi largamente ultrapassada pela despesa realizada, fica claro que isto se traduzirá em mais uma machadada na garantia do acesso aos cuidados de saúde e no Serviço Nacional de Saúde.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Pergunto ao Governo se já contabilizou em quanto vão aumentar as listas de espera, quantos equipamentos ficarão sem funcionar, quantas necessidades de pessoal ficarão por preencher.
No que toca à dívida acumulada pela área da saúde, a evolução é, no mínimo, desastrosa. Com a assunção de mais de 30 milhões de contos de dívida no Orçamento para 1996, o Governo e o Ministério da Saúde puderam começar o ano com 67 milhões de contos de dívida. No entanto, e apesar de tanto afirmarem a sua certeza de contenção das despesas, conseguem a proeza, digna de qualquer livro de recordes, de chegar ao final do ano com 130

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milhões de contos de dívida, isto é, de duplicar num ano a dívida pública nesta área.
Mais ainda, prevê-se, para 1997, um aumento para 165 milhões, continuando a evolução de 1996.
E que alternativas nos propõe o Governo? Começam a vislumbrar-se soluções pouco viradas para uma correcta política de saúde: pretende rever as comparticipações, indiciando um caminho no sentido da sua limitação, para poupar aí dinheiro; aposta, por outro lado, numa linha de progressiva exclusão de uma boa parte dos utentes do Serviço Nacional de Saúde, esquecendo que a Constituição prevê um SNS universal.
Em matéria de política de juventude, a mera análise do orçamento da Secretaria de Estado da Juventude não nos dá uma visão global da situação nesta área.
É, sem dúvida, inegável que a política global deste Governo tem consequências desastrosas para os jovens portugueses. O frenesim monetarista lança para o desemprego milhares de jovens, impede outros tantos de ingressarem no mercado de trabalho e deixa quase todos em situação laboral precária.
Quanto à Secretaria de Estado da Juventude, o PCP bateu-se sempre, nesta Assembleia, por uma questão fundamental: o apoio ao associativismo como principal prioridade do Governo nesta área.

O Partido Socialista, na oposição, sempre secundou esta perspectiva, embora no Governo não a tenha implantado. Aliás, comparando o Orçamento para 1996 com o proposto para 1997, chegamos à curiosa conclusão de que diminui a parcela do apoio ao associativismo.

O Sr. António Filipe (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Continua o peso predominante dos programas do IPJ em relação ao apoio ao associativismo, denunciando o desinteresse pelo estímulo à participação dos jovens na sociedade.
O que se continua a oferecer aos jovens é a crescente falta de perspectivas.
Se não, vejamos o que se passa, por exemplo, na área do combate à toxicodependência.
Nem vou falar na ridícula execução de 10% do já, de si exíguo PIDDAC para 1996 nesta matéria. Mas nesta proposta de lei de Orçamento do Estado para 1997 pouco se avança em necessidades prementes, como comunidades terapêuticas e unidades de desintoxicação, numa perspectiva de cobertura nacional.
Apesar de no seu Programa prever expressamente a gratuitidade do tratamento de toxicodependentes, a verdade é que o Governo, com este Orçamento, se alheia do cumprimento desse objectivo, investindo muito pouco na criação de unidades públicas destinadas à desintoxicação e obrigando a maioria dos toxicodependentes a recorrer, se puder, a instituições privadas com preços proibitivos, que não passam, em muitos casos, de autênticas fraudes.
Em suma, se dúvidas houvesse sobre as prioridades deste Governo, elas seriam dissipadas por este Orçamento. E se a tão falada consciência social fosse de facto uma consciência para o Governo, a sua voz gritaria protestos constantes aos ouvidos do Sr. Primeiro-Ministro.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E, para quem tanto fala na prova dos factos, os factos provam que este Governo não traz novidades nem mudança nas políticas sociais e que mantém, com nova cara, políticas velhas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Vieira.

O Sr. Sérgio Vieira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, o meu pedido de esclarecimento relaciona-se com o facto de V. Ex.ª ter falado, da tribuna, na questão da política de juventude deste Governo, nomeadamente no orçamento da Secretaria de Estado da Juventude. E referiu unicamente, como sua preocupação, o facto de o apoio ao associativismo ter decrescido em termos orçamentais.
Gostaria de saber, Sr. Deputado Bernardino Soares, se, entre muitas outras questões, as duas que vou referir merecem a sua preocupação e a do Partido Comunista Português.
A primeira questão tem a ver com a política de juventude. Nesta matéria, constata-se que a política deste Governo, ao contrário do que sempre existiu no passado, não é horizontal entre todos os ministérios, onde a Secretaria de Estado da Juventude deveria ter sempre uma participação, pois o que se verifica é que são tomadas medidas ou criados grupos de trabalho ou de estudo por causa do trabalho infantil e a Secretaria de Estado da Juventude não tem participação. De igual modo, é anunciado um pacote de cultura para a juventude portuguesa e o Sr. Secretário de Estado da Juventude não tem conhecimento do que vai acontecer ou não.
A segunda questão tem a ver com o desemprego dos jovens em Portugal. Não compete à Secretaria de Estado da Juventude combater e resolver, por si só, esta questão. Mas é inequívoco que a Secretaria de Estado da Juventude tem um papel importante a desempenhar. Tudo aquilo a que assistimos, durante este ano, foi, em primeiro lugar, ao facto de o Sr. Secretário de Estado da Juventude ter suspendido programas, que eram interessantes, de inserção de jovens na vida activa. Depois, disse que estava a estudar novos programas, tendo, há alguns meses, apresentado o Programa AGIR, que se destina só a 1200 jovens, mas no qual já se inscreveram perto de 6000 jovens. Afirmou ainda, já há largos meses, que andava em estudos e em conversações, com o Ministério para a Qualificação e o Emprego, para apresentar um grande programa, para a juventude portuguesa, de inserção de jovens desempregados ou recém-licenciados na vida activa.
O que quero perguntar ao Sr. Deputado é se está sensibilizado para estas questões e se elas merecem, da sua parte e da do Partido Comunista Português, uma preocupação muito especial.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sérgio Vieira, com muito prazer responderei às questões que colocou.
Em relação à questão do desemprego dos jovens, de facto, não cabe à Secretaria de Estado da Juventude, por si só, resolver este problema. Como disse na minha intervenção, a política global levada a cabo por este Governo e as suas orientações específicas, em matéria de política

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económica, aliás, semelhantes às que o PSD também aplicou quando esteve no Governo, penalizam claramente a vida dos jovens portugueses, nomeadamente no que diz respeito ao emprego, ao trabalho precário e à dificuldade no acesso ao mercado de trabalho e ao primeiro emprego.
Portanto, há aqui uma continuação da política que VV.Ex.as tão bem conhecem e tão bem levaram a cabo.
No que toca à política horizontal, como é evidente, é desejável que a Secretaria de Estado da Juventude intervenha nas várias áreas do Governo, quando as matérias dizem respeito a problemas da juventude, mas, tendo em conta a falta de preocupação de todo o Governo com esta matéria, de duas, uma: ou não há intervenção da Secretaria de Estado da Juventude ou ninguém liga nada ao que ela diz, porque não há reflexos práticos desta intervenção transversal na política governativa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Sr. Presidente, acabo de ser informado de que a VALIMA - Associação de Municípios do Vale do Lima -,constituída por presidentes de câmaras municipais do PS, do PSD e do PP, remeteu à Assembleia da República um documento protestando e reclamando quanto ao PIDDAC destinado a Viana do Castelo, por não estarem aí inscritos os investimentos anunciados pelo Sr. Primeiro-Ministro aquando da visita ao distrito, no seu "Governo em diálogo".
Pergunto à Mesa se já tomou conhecimento desse documento e, em caso afirmativo, se é possível distribuí-lo pelos grupos parlamentares, para que tomem conhecimento das alterações a proporem ao Orçamento do Estado.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não despertou entusiasmo!

O Orador: - Não é para despertar entusiasmo! É um facto!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Roleira Marinho, ainda não recebemos o documento, mas creio que ele passou a ser do conhecimento de todos. Não sei se vale a pena distribuí-lo agora, porque já deu conhecimento do seu conteúdo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O caso que há pouco aqui se passou, a propósito das despesas da saúde e da sua respectiva materialização, ou não, em sede de Orçamento do Estado é bem emblemático da situação, orçamento após orçamento, com que o Governo se tem defrontado.
No segundo ano de elaboração do Orçamento do Estado, o Primeiro-Ministro e o Partido Socialista revêem, em baixa significativa, as promessas, as expectativas e até os desejos, dos mais íntimos aos mais públicos, formulados perante o País e a opinião pública.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - De resto, aproveito, desde já, para retribuir, com um pouco mais de celeridade, ao Sr. Primeiro-Ministro a amabilidade, de há pouco, de nos fazer chegar justamente a gravação das suas declarações. Gostaria de ter tido o prazer mais cedo de lha fazer chegar e entregar, para que a memória se possa avivar. Tenho aqui justamente a cassete vídeo que lhe entregarei, mas adianto, desde já, que nela encontrará o seguinte registo...

O Sr. Primeiro-Ministro: - Na totalidade!

O Orador: - Na totalidade, Sr. Primeiro-Ministro.
Lá encontrará o registo, que reproduzo. O jornalista perguntou ao Sr. Primeiro-Ministro: "Quanto a mais é que vai ter o orçamento para a saúde?" A pergunta, naturalmente, era feita na suposição de que o Engenheiro António Guterres viesse a ser Primeiro-Ministro. E o Engenheiro António Guterres, que, de facto, é Primeiro-Ministro, respondeu: "Desejavelmente, nós deveríamos poder atingir, num prazo tão curto quanto possível, um nível da ordem dos 6% do produto em despesas de saúde".

Protestos do PS.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Desejavelmente!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Se isto não é uma promessa, o que é uma promessa?!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, creio que ninguém ganha nada com este incidente.
Faça o favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Significa, portanto, a avaliar pela reacção ruidosa do Partido Socialista - mas menos ruidosa do Governo -, que este tipo de declaração a pergunta tão expressa não tem naturalmente qualquer efeito político. Deve-se, pois, intuir que o Engenheiro António Guterres, quando responde a perguntas com esta clareza - e não leio o resto da peça, porque ela ainda está na memória de todos nós e não é relevante para o caso -, não tem intenção de assumir compromissos políticos.
Sr. Primeiro-Ministro, permita-me, se for possível, que o questione sobre o seguinte: se um jornalista vai ter com o Primeiro-Ministro ou com o candidato a tal e lhe faz uma pergunta - neste caso, na área da saúde, mas podia ter sido na da educação ou relativamente às autarquias locais - sobre quanto vai gastar, o Primeiro-Ministro, de facto, tem duas possibilidades: ou diz "olhe, vou pensar, não sei; sei que aposto muito nesta área, mas vou pensar" ou, então, diz "olhe, o que acho desejável e procurarei fazer, no mais curto prazo de tempo, é que o País venha a gastar 6% do produto em despesas de saúde". Julgo que foi isto que todo o País, a começar pelos senhores jornalistas e a acabar em quem ouviu a sua intervenção, deduziu.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não vejo que possa ser de outro modo.
Agora, Sr. Primeiro-Ministro, esta não é uma questão nem de honra nem, como dizia o Sr. Deputado Jorge Lacão, de ética da responsabilidade. Isto é um problema de credibilidade política!

Vozes do PSD: - Exactamente!

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O Orador: - Não é um problema nem de honra nem de ética!

Aplausos do PSD.

A verdade, Sr. Primeiro-Ministro, é que, Orçamento após Orçamento, é cada vez menor a credibilidade política de um Governo e de um Primeiro-Ministro que assumiu expectativas para com o País que está cada vez mais distante de cumprir.
Vejamos: 1 % da despesa para a educação. Estamos todos inteirados de que, no segundo Orçamento apresentado, teremos praticamente cumprido este objectivo. Não é assim, Sr. Ministro da Educação? Eu também acho que não.

Risos do PSD.

No que respeita ao FEF, todos sabemos que o Governo se comprometeu a duplicar essas transferências, no prazo da legislatura - aqui, houve mais prudência. E poderá, agora, o Sr. Deputado José Junqueiro vir dizer: "Não, não, os senhores estão a ser pouco rigorosos, porque, na verdade, quando dissemos isto, o que queríamos dizer era que transferiríamos dinheiro mas também funções". Dir-se-á agora: "Pois, mas como ainda não transferiram funções, também não transferem dinheiro". Não transferindo funções, demoraremos mais 13 anos e meio a cumprir aquilo que foi dito; transferindo competências, para quem sabe como estas transferências de competências são efectuadas, sabemos que, até ao fim da legislatura, não estarão em condições de transferir competências nem dinheiro.

Aplausos do PSD.

Ainda no que respeita a um problema de credibilidade política, quando o actual Sr. Primeiro-Ministro vem dizer como todos ouvimos, a certo tempo, que, legalmente, a regionalização se pode fazer em meio ano e as eleições regionais em simultâneo com as autárquicas, perante o País, esta impossibilidade já é tão evidente que o Sr. Primeiro-Ministro já veio confessar que até às eleições
autárquicas manifestamente não pode ser mas que, até ao fim da legislatura, a regionalização será completa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A ver vamos!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, quanto mais V. Ex.ª emenda a mão mais deixa a nu as insuficiências do seu Governo para satisfazer aquilo que apresentara ao eleitorado não apenas como desejável mas como possível e cumprível.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Desejavelmente!

O Orador: - E é isto, Sr. Primeiro-Ministro, que desejo acentuar nesta intervenção.
Bem sei que alguns Srs. Deputados do Partido Socialista gostariam que a discussão do Orçamento do Estado fosse, sobretudo, uma discussão de matéria financeira - era mais fácil. De resto, para o Governo, o Orçamento do Estado é um instrumento financeiro, quando dá jeito; quando não é vantajoso, não se deve recordar que ele é um instrumento de acção política. Mas, dado que o Orçamento é um instrumento de acção política, Sr. Primeiro-Ministro, aceite, muito cordialmente, a minha sugestão de não ceder tão rapidamente, Orçamento após Orçamento, ao realismo da governação, esquecendo-se daquilo com que presenteou o País, com uma mudança de política, com uma nova maioria, que, de facto, a cada ano que vai passando, vai demonstrando a falta de credibilidade política para concretizar aquilo a que se comprometeu.

Aplausos do PSD.
Neste momento, o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho fez entrega de uma cassette vídeo ao Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, gostaria de saber se a Mesa já está em condições de fazer distribuir à Câmara a gravação integral das declarações do Sr. Primeiro-Ministro, conforme o Sr. Primeiro-Ministro, há pouco, referiu.

Risos do PSD

Vozes do PSD: - Está aí! É essa!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado, a Mesa, neste momento, ainda não está em condições de o fazer, mas diligenciará nesse sentido.

Risos do PSD.

Srs. Deputados, a Mesa foi interpelada, há pouco, pelo Sr. Primeiro-Ministro, no sentido de obter determinados elementos e, agora, em resposta a essa interpelação, informa que ainda não tem em sua posse esses elementos.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, quero só dizer que o pedido dirigido há pouco pelo Governo à Mesa subsiste, pelo que aguardaremos calmamente que a Mesa esteja em condições de satisfazê-lo, distribuindo a gravação integral das declarações do actual Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado, naturalmente, a Mesa não suspendeu o pedido feito e dar-lhe-á o devido andamento.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente. Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, esta discussão tem de ter um sentido...

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - Ouçam, Srs. Deputados!

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E o sentido desta discussão tem a ver com a acusação, feita pelos senhores nesta Câmara, de que o Governo não cumpria as suas promessas eleitorais.

Protestos do PSD.

O Sr. Deputado Pedro Passos Coelho veio aqui dizer que o Governo não cumpria a sua promessa de fazer subir em um ponto percentual a percentagem do esforço financeiro no domínio da educação. Porém, sabe que esse é um compromisso para uma legislatura, sabe que estamos a tratar do segundo Orçamento do Estado e não pode ignorar que, em dois anos, já aumentou, pelo menos em 20%, o esforço real para a despesa educativa.
O Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, como é óbvio, não pode provar - e aí estão os livros que tive ocasião de distribuir à vossa bancada - que, alguma vez, tenha havido uma promessa do PS de aumentar para 6%, necessariamente, a despesa para a saúde, em termos de 6% sobre o PIB. Não o pode demonstrar e, como tal, fica de pé, plenamente, aquilo que dissemos acerca da ética de responsabilidade.
O Sr. Deputado Pedro Passos Coelho veio falar do aumento de verbas para as autarquias locais e esqueceu-se de referir que falámos de uma reforma estrutural, da regionalização, para os municípios e para as freguesias e que, no conjunto de uma reforma estrutural, admitimos, como objectivo final, a duplicação de verbas simultaneamente com o processo de transferência de competências.
Mas, mais, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, sempre dissemos que este era um objectivo terminal, na sequência de uma reforma de grande fôlego para a descentralização do Estado e da Administração Pública.
Depois, falou de regionalização e veio dizer que não seria cumprimento de uma promessa não fazer as regiões até às próximas eleições autárquicas. Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, em nenhum lado, essa promessa eleitoral está feita! Aquilo que é um compromisso político do PS é vencer a inércia, de 10 anos, da vossa parte,...

Aplausos do PS.

Protestos do PSD, batendo com as mãos nas bancadas.

... em que sobre descentralização do Estado nada fizeram, em que, sobre valorização das autarquias locais nada fizeram, em que relativamente à saúde, nos deixaram o sistema em crise e em que sobre a educação não foram capazes de a tomar como uma verdadeira prioridade nacional.
Srs. Deputados do PSD, é isto que vos dói e é por isso que os senhores não cumprem nem deixam de cumprir promessas. É que os senhores tinham perdido, pura e simplesmente, a ideia de um projecto mobilizador para Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, compreendo - de resto, nesta Câmara, praticamente todos compreendem - que para o Sr. Deputado a questão da regionalização é particularmente importante.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - É!

O Orador: - Nós sabemos! E também sabemos que, dentro do Partido Socialista, há mais quem tenha essa posição, nem sempre de encontro àquelas que vêm sendo manifestadas por alguns membros do Governo.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Explique-se lá!

O Orador: - Convenhamos, Sr. Deputado Jorge Lacão, que, quem afirmou prioridade à regionalização, não fomos nós mas, sim, o PS e o actual Primeiro-Ministro. Quem afirmou que, em meio ano, ela se faria e que haveríamos de ter eleições regionais, em 1997, não fomos nós.
Diz-me, agora, o Sr. Deputado Jorge Lacão que isso não vem escrito em lado algum...

Vozes do PSD: - Está gravado!

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Lacão, dá-me o senhor razão quando digo que este debate é emblemático. Para o PS há uma verdade formal e, depois, há uma verdade efectiva, que não deve ser discutida.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A verdade formal é a que vem nos textos. Nos textos vem alguma coisa? Alguém disse uma coisa que não está nos textos? Essa coisa não foi dita, não existiu! Ninguém fez esse compromisso!

Aplausos do PSD.

De resto, no futuro, por proposta do Partido Socialista, vai até deixar de se fazer campanha eleitoral. Apresenta-se um programa de governo e já não é preciso a campanha eleitoral, porque aquilo que se diz à frente dos portugueses não é relevante, não é, sobretudo, para ser lembrado depois.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, Sr. Deputado, a educação, em termos de despesa, variou qualquer coisa como 0,13% do produto de 1995 para 1996 e qualquer coisa como 0,138% neste segundo Orçamento. Acha o Sr. Deputado que o Governo está ainda em condições de obter, nos dois orçamentos que lhe faltam,1 % na educação? Aí, Sr. Deputado, talvez os senhores se vejam confrontados no final da legislatura, nessa altura sim, com um problema de ética da responsabilidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas o problema da ética da responsabilidade deriva da vossa inacção, do vosso desgosto por se verem confrontados com aquilo que disseram, prometeram, escreveram ou não escreveram.
Para terminar, Sr. Deputado Jorge Lacão, V. Ex.ª...

O Sr. Henrique Neto (PS): - Já chega!

O Orador: - Eu sei, Sr. Deputado Henrique Neto, que às vezes é desagradável ouvir, mas é um direito que tenho fazer-me ouvir nesta Câmara!

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Agora, Sr. Deputado...

O Sr. Henrique Neto (PS): - Um atentado à inteligência é sempre desagradável!

O Orador: - As referências à estupidez humana também seriam dispensáveis nesta Câmara, Sr. Deputado, porque nem sempre revertem em favor daqueles que mais merecem!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Lacão, garanto-lhe, como já pôde observar durante este último ano, que poderão VV. Ex.as desculpar-se sempre com os 10 anos negros que o País viveu, insultando, naturalmente, quantos portugueses deram duas maiorias absolutas ao PSD. VV. Ex.as, poderão fazê-lo repetidamente, mas, Sr. Deputado, nunca se engane numa coisa: sempre que o fizer, diminui o mérito da sua vitória eleitoral e garante ao País que os senhores só ganharam porque nós perdemos as eleições.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Essa é nova!

O Orador: - Mas sabe uma coisa, Sr. Deputado Jorge Lacão? Acho que o PSD perdeu as eleições mas acho também que um dia as vai ganhar, se tiver mérito para isso.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Se!...

O Orador: - Esperamos, Sr. Deputado, ter mais um bocadinho de mérito na oposição do que aquele que os senhores revelam em não aprender com os erros do passado que nós próprios cometemos!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, encontra-se inscrito, para uma interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Jorge Ferreira, mas como o Sr. Deputado Jorge Lacão pediu a palavra para defesa da consideração da sua bancada, essa figura tem precedência.
Para defesa da consideração da sua bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, V. Ex.ª procurou sugerir que haveria aquilo que designou por uma contradição entre a verdade formal e a verdade substantiva nas posições sustentadas peio Governo e pelo PS e, para o fazer, invocou o exemplo da regionalização. Vamos, pois, a ela, Sr. Deputado.
Em primeiro lugar, do ponto de vista daquilo que classificou de verdade formal, o Sr. Deputado sabe que a regionalização é um compromisso político constante do programa eleitoral do PS e é uma proposta de reforma constante do Programa do Governo. Ao contrário, portanto, das outras alusões sem consistência, nesta matéria, Sr. Deputado, há, de facto, um compromisso formal. O Partido Socialista disse aos eleitores que era sua convicção que uma profunda descentralização do Estado e da Administração Pública, pela reforma da regionalização, era importante para o País.
Vamos agora à verdade substantiva: o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho aludiu, sem, mais uma vez, o demonstrar - e é sempre esse o vosso problema -, que havia contradições de orientação entre a bancada do PS e membros do Governo.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Não sou eu que o digo!

O Orador: - Por isso, o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho também agora vai justificar essa afirmação e vai dizer-nos aqui onde, quando e como membros do Governo declararam estar contra o objectivo da regionalização como programa de descentralização do Estado e da Administração Pública.
Depois, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, acusou-nos de não cumprirmos um objectivo relativamente à meta das eleições autárquicas. Sabe, Sr. Deputado, aquilo que dissemos é que gostaríamos muito, era nosso propósito, por nós seria assim, que o processo da regionalização pudesse ser concretizado até ás próximas eleições autárquicas.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Só desejos!

O Orador: - Mas a questão política substantiva fundamental, Sr. Deputado - e sou eu que, neste momento, lhe falo -, é a seguinte: não foi o PS que se demitiu de apresentar um projecto para a regionalização, foi o PSD,...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É o PSD que tem culpa!

O Orador: - ... que, todavia, através do seu líder, veio dizer que era a favor da regionalização. Já lá vai mais de um ano e onde é que está o vosso projecto, Sr. Deputado? Até agora ninguém o conhece!

Aplausos do PS.

E depois, quando os senhores vinham falar de um referendo para a regionalização, queriam um referendo à cabeça, acerca de modelo nenhum, porque não tinham qualquer modelo para apresentar aos portugueses.

Vozes do PS: - Têm medo!

O Orador: - E o que é que nós dissemos? Referendo, com certeza, mas depois de ele ser suficientemente estruturado nos trabalhos de revisão constitucional e na sequência da aprovação de uma lei de criação das regiões.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, recorde-se que o seu partido bloqueou os trabalhos de revisão constitucional e impediu que se encontrasse aí uma solução para o referendo.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

E se hoje não há possibilidade de admitirmos que a regionalização se concretize a tempo das próximas eleições autárquicas é por uma razão muito simples: porque o PS não tem maioria absoluta na Câmara...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Graças a Deus!

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O Orador: - ... e o poder imobilista do PSD, com os paus que sucessivamente tem colocado na engrenagem, fez atrasar o processo.
Uma coisa é os senhores, com a vossa inércia e com o vosso imobilismo, fazerem travar certos processos ou dificultá-los e outra é evitarem o curso da história.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço que termine.

O Orador: - Isso, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, não acontecerá, porque, para a lógica de marcar passo, bastou a vossa década, e nós, pela nossa parte, tudo faremos, inclusivamente procurar convencer-vos a terem uma atitude positiva e construtiva, a bem do País.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, tem de terminar.

O Orador: - Vou terminar de imediato, Sr. Presidente.
Sabe, Sr. Deputado, relativamente ao Orçamento do Estado para 1996, os senhores votaram contra e estiveram de costas voltadas para os interesses nacionais; agora já perceberam que o País respondeu positivamente ao esforço do Orçamento para 1996 e há uma coisa que já todos sabemos: os senhores já não votam contra, porque estão a aprender com os vossos próprios erros.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, mais uma vez vem demonstrar que a regionalização é, de facto, uma coisa que o deixa perturbado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Respondo-lhe deste modo a duas das questões que o Sr. Deputado suscitou: primeiro, se não há contradição entre o Governo e o Partido Socialista, já deduzi que o Partido Socialista deu de barato que as novas regiões serão instâncias de auscultação e de concertação, mas de nenhuma decisão, o que, para quem defende a descentralização, é elucidativo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que ouvi, repetidas vezes - e julgo que o País também - o Sr. Primeiro-Ministro,...

Vozes do PSD: - Mais uma cassette!

O Orador: - ... em abono da regionalização, dizer: "nós não queremos transferir burocracias da administração central para uma administração regional. Não! O que queremos é que existam, nas futuras regiões, órgãos que sejam ouvidos, para que o Estado não decida ao arrepio daquilo que melhor pode conhecer e representar os cidadãos".
No mínimo, Sr. Deputado Jorge Lacão, há aqui uma contradição de conceitos, há uma contradição prática: é que se o Sr. Primeiro-Ministro admite que não pode fazer a regionalização se não até ao rim da legislatura, a contradição é evidente, Sr. Deputado. Pergunte ao Sr. Dr. Fernando Gomes por que razão clama ele por um referendo a 25 de Abril, que os senhores não permitem que se faça, porque não aceitaram o repto que nós próprios lançámos em sede de revisão constitucional de partir a revisão constitucional em duas partes para fazermos rapidamente o referendo para a regionalização.

Aplausos do PSD.

Só faltaria, Sr. Deputado, que viesse a responsabilizar o PSD por não se fazer a regionalização ou por não haver eleições regionais em 1997! Sei que não fará isso.
Mas o Sr. Deputado também disse, há pouco, que o compromisso de duplicar as verbas de transferência para as autarquias locais...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Objectivo final!

O Orador: - ... só valia - repare bem, isto é uma nova notícia - na decorrência da regionalização.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - Portanto, ficou hoje claro, mais uma vez - nós vamos tendo esta revisão em baixa às "pinguinhas" -, que só se cumprirá o compromisso de transferir para as autarquias locais o dobro daquilo que se transferia até 1995 se houver regionalização; se não houver, as câmaras municipais verão crescer os seus orçamentos ao ritmo normal.
Sr. Deputado Jorge Lacão,...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - O senhor sabe o que são regiões administrativas?! São autarquias!

O Orador: - Ah! Então, vejamos: agora é mais uma notícia...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Está, finalmente, a fazer-se luz no seu espírito!

O Orador: - Com certeza! Peço desculpa, Sr. Deputado!
O actual Primeiro-Ministro e o Partido Socialista quando falavam em duplicar o FEF para as autarquias nos próximos quatro anos, referiam-se, com certeza, às futuras autarquias regionais e não às câmaras municipais! Estamos inteirados!

Aplausos do PSD.

Ora, dado que duplicar transferências que não existiam para órgãos que não existiam é exactamente igual a multiplicar zero por zero, ficamos a saber que o actual Primeiro-Ministro não pensava transferir coisa alguma!

Risos do PSD.

Sr. Deputado, então, já reparou nas contradições?! Quer mais contradições!?

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente, dizendo o seguinte: o Sr. Deputado pode acusar o PSD de imobilismo

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e o País de ter sido seu cúmplice, mas eu não posso, de maneira alguma, subscrever aquilo que disse no fim. Disse o Sr. Deputado que "o País respondeu bem ao Orçamento para 1996" e eu digo-lhe, Sr. Deputado, que o Pais resistiu o melhor que pode a esse Orçamento. Veremos como resistirá ao próximo!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, acabámos de assistir a um facto que, na nossa opinião, é politicamente relevante, ou seja, ao facto de um grupo parlamentar desta Casa pôr em causa a palavra do Primeiro-Ministro numa matéria com relevância orçamental, que é, ao contrário do que por vezes parece, a razão pela qual estamos a desenvolver este debate.
O Governo, em reacção a esse facto, solicitou à Mesa que disponibilizasse uma gravação completa com as declarações do Sr. Primeiro-Ministro, que, invocadamente, não estão reflectidas na proposta de lei do Orçamento do Estado que vamos votar amanhã.
A minha interpelação à Mesa é no sentido de saber da viabilidade da Mesa em fazer distribuir a cassette que o Governo solicitou antes do início do encerramento do debate, porque quer-me parecer que, se o grupo parlamentar que invoca a falta de palavra do Primeiro-Ministro tiver razão, a vida útil da proposta de lei do Orçamento para 1997 terminará amanhã.

Risos do PS, do PSD e do PCP.

Esta é uma questão suficientemente grave para que não se possa permitir, numa matéria em que flagrantemente há uma contradição entre uma promessa eleitoral e uma proposta de lei de orçamento, que essa proposta de lei seja executada.
Assim, pergunto à Mesa se esta garante a todos os grupos parlamentares a disponibilização dessa gravação, se não já antes do início da sessão de encerramento, pelo menos antes da votação na generalidade da proposta de lei do Orçamento do Estado.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Jorge Ferreira, a Mesa não poupará esforços para que isso possa suceder nos termos pedidos.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Esperamos!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Pedro Passos Coelho,
V. Ex.ª fez uma intervenção, respondeu a uma pergunta e deu explicações. Agora, pretende usar da palavra para que efeito?

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado,...

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Garanto, Sr. Presidente, que não demorarei 10 segundos.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sendo ,assim, tem a palavra.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra apenas para dizer que, como as actas registarão, ao contrário do que disse o Sr. Deputado Jorge Ferreira, não pus em causa nem a palavra nem outras coisas do Sr. Primeiro-Ministro, apenas questionei a sua credibilidade política.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - Está na Acta!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Está esclarecido, Sr. Deputado.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação (Marçal Grilo): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Praticamente desde o momento em que este Governo tomou posse, ouvimos, do lado das oposições, com uma persistência indubitável, a acusação de que na área da educação não fomos suficientemente céleres, não operamos as mudanças prometidas e, ao fim de um ano, ainda não transformámos radicalmente a vida nas escolas, como se as alterações na educação pudessem fazer-se de supetão, por gesto de magia, ou como se falássemos de um país de robots, como se não fosse a própria sociedade a estar em causa.
O certo é que, se nas palavras muitos insistem na necessidade de convergências e na celebração de um pacto, persiste a tentação, irresistível, de avaliar o trabalho que vem sendo feito em função da sua teatralidade e mais pelo efeito fácil e imediatista do que pela substância e pelas suas repercussões nas gerações futuras.
Dissemos múltiplas vezes que recusamos esse método fácil. Preferimos a serenidade dos passos seguros e, não haja ilusões, sempre afirmámos que, em lugar das "reformas de sistema", iríamos privilegiar, como estamos a fazer, as mudanças graduais e o sentido demonstrativo das iniciativas positivas a partir da realidade e da sua complexidade. Assim, temos feito e, assim, continuaremos.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Ministro, peço desculpa por o interromper, não é muito usual da minha parte fazer isto, mas gostaria de pedir à Câmara que guardasse o silêncio necessário.
Faça favor de continuar, Sr. Ministro.

O Orador: - Neste contexto refira-se, antes de mais e a título de exemplo, o programa que lançámos de consolidação e expansão da educação pré-escolar, para dizer que ninguém fez, antes, em Portugal, uma afectação tão clara de recursos, envolvendo um planeamento de acções e de disposições tão meticulosamente preparado e negociado, tendo em vista o alargamento da efectivação da educação pré-escolar entre os 3 e os 5 anos de idade.
Neste plano, o Estado não se exime às suas responsabilidades e investe fortemente, enquanto as autarquias locais são chamadas a assumir significativas responsabilidades e as instituições particulares de solidariedade social,

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as mutualidades, as misericórdias e as iniciativas privadas e cooperativas são chamadas a unir e a congregar esforços, a fim de que a educação pré-escolar deixe de ser apenas uma boa proposta para ser, fundamentalmente, uma solução urgente, em nome da igualdade de oportunidades, da qualidade e da justiça, do combate à exclusão social e ao abandono escolar precoce.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Trata-se assim de encontrar, em nome da qualidade, as respostas que vão ao encontro das necessidades efectivas das crianças e das condições sócio-educativas das famílias.
Apostamos no efeito demonstrativo das medidas adequadas à realidade que partam das iniciativas ao nível da escola, devidamente apoiadas e avaliadas, e não esqueçam a sociedade e que façam convergir esforços e energias. Esse é o nosso método e dele não nos afastaremos seja por que razão for.
Permita-se-me que, a este propósito, refira o tema do diálogo.
Como é sabido, temos insistido na lógica de favorecer encontros e complementaridades entre os diversos protagonistas do processo educativo. Mas não se pense que política do diálogo é ausência de objectivos claros ou de vontade política determinada. Dialogar é abrir caminhos, mas não constitui um fim em si. Dialoga-se para melhor chegar à decisão e, sendo a política uma escolha permanente, torna-se necessário, depois de regularizadas as veredas, correr os riscos da decisão. O tempo, estamos seguros, virá, por certo, dar-nos razão, como, aliás, mostra já este processo lançado à volta do plano de expansão do pré-escolar.
Só as decisões participadas co-responsabilizam e implicam todos os que no dia-a-dia constróem a educação.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Assumir a prioridade da educação e da formação obriga-nos a pôr na ordem do dia as mudanças estruturais, uma vez que importa lançar as bases para as transformações que permitam responder aos desafios da formação, da mobilidade e do progresso científico e tecnológico, num mundo cada vez mais confrontado com a exigência na qualificação das pessoas, considerando que as novas formas de exclusão passam cada vez mais pelas carências no acesso ao conhecimento e à informação.
É neste sentido que privilegiamos os passos seguros na valorização dos educadores e das escolas, o que levou a empenharmo-nos na regulamentação de normas dos estatutos da carreira docente, que visam a valorização salarial em razão dos níveis de formação de professores, passo histórico que estamos a dar neste momento em concertação com as organizações sindicais e que aponta no sentido de uma carreira única.
Só assim valorizaremos, nomeadamente, o primeiro ciclo do ensino básico - momento chave para a formação de crianças e jovens -, garantindo que haja incentivos para que os professores possam fixar-se nesse grau de ensino com vencimentos adequados ao respectivo nível de formação. Importa pôr termo à hemorragia de professores do primeiro ciclo e incentivar uma melhor formação de base, a que deve acrescer um esforço redobrado e rigoroso na formação contínua.
E se falamos das pessoas e da função docente, importa recordar ainda a aposta em equipamentos estratégicos, merecendo especial destaque a cooperação estreita entre os Ministérios da Educação e da Cultura, no tocante ao programa das bibliotecas escolares, a ligação com as acções do Ministério da Ciência e Tecnologia, no respeitante à introdução de novas tecnologias de informação e comunicação nas escolas, e a concretização do programa Nónio-Século XXI, através do qual se pretende, de um modo sustentável, criar uma rede de expansão gradual, baseada na experiência e no incentivo à criação de pólos de desenvolvimento,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... envolvendo a formação continua de professores, a produção de software educativo e o aproveitamento das novas tecnologias e da inserção na Internar para a melhoria da qualidade da educação.

Vozes do PS: -- Muito bem!

O Orador: - Refira-se ainda, como área a que temos atribuído especial atenção, a formação profissional e as escolas profissionais, cujos estatutos e sistema de financiamento constituem uma prioridade que se insere na estruturação do ensino pós-obrigatório, que, como se sabe, é um sector de maior importância para a formação dos recursos humanos de qualificação intermédia.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Se iniciámos este ano lectivo sob a tripla invocação da exigência, da estabilidade e da segurança, fizemo-lo, contra toda a demagogia fácil, ciente de que necessitamos de agir em vários domínios em simultâneo, criando condições para a continuidade das políticas, para o seu acompanhamento e avaliação permanentes, para o combate às condições adversas nos domínios económico, social e cultural e para a preservação de condições de serenidade, únicas susceptíveis de favorecer a organização adequada de tarefas e responsabilidades no seio das comunidades educativas.
O desenvolvimento da experiência dos territórios educativos de intervenção prioritária, lançada este ano em 149 escolas, visa, no fundo, lançar um método diferenciado, mas dotado de coerência e baseado na complementaridade de esforços e iniciativas. Afinal, só em conjunto, envolvendo várias escolas, comunidades locais e famílias, será possível combater a exclusão e o insucesso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não podemos, pois, iludir as questões estratégicas. E é aqui que se exige uma participação activa da sociedade civil, para que os problemas sejam devidamente equacionados, para que a conflitualidade seja assumida e regulada, para que o pluralismo e a complexidade não sejam esquecidos nas decisões que forem adoptadas.
Não iludindo as questões de direcção, gestão e administração das escolas dos ensinos básico e secundário, vamos partir da experiência adquirida e recusar a adopção de modelos rígidos e fechados que não compreendam a diversidade das situações das escolas - não esquecendo, também aqui, o primeiro ciclo e a sua especificidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A administração educativa deverá ser, assim, encarada como um domínio percursor nas mudanças de hábitos e de métodos do Estado, no sentido da

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economia e da racionalidade. Importa, no fundo, caminhar no sentido de dar progressivamente mais peso e importância à melhoria da qualidade do ensino em detrimento da inércia burocrática e dos métodos incrementalistas de preparação e execução orçamental. E devemos registar resultados positivos numa linha de maior racionalidade quer na execução do Orçamento do Estado para 1996 quer na preparação do Orçamento do Estado para 1997.
No que se refere ao ensino superior, quero afirmar que mantemos, com grande rigor, a orientação do Programa do Governo, o que implica o Estado assumir as suas responsabilidades com o objectivo de construir um melhor ensino para o maior número.
Nesse sentido, para 1997, considerando os compromissos de revalorização salarial gradual, considerando a tendência iniciada no ano transacto da expansão dos lugares oferecidos pelo ensino superior público, considerando os compromissos assumidos com o ensino superior universitário e politécnico e tendo presente que queremos um grau de exigência realista mas gradualmente crescente, apresentamos um aumento das despesas públicas que, em média, é ligeiramente superior ao aumento registado nos níveis básico e secundário.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta orientação coerente com tudo o que temos feito envolve um esforço especial no que diz respeito ao ensino superior politécnico, cuja importância e dignidade devem ser realçadas e incentivadas.
Para termos um melhor ensino superior, carecemos de melhor ensino universitário, mas carecemos sobretudo de um ensino politécnico que se imponha pela sua qualidade e que constitua uma verdadeira alternativa ao ensino universitário sem, no entanto, este perder as suas características e especificidades próprias.

Aplausos do PS.

O Governo está disposto a assumir este combate, que é, afinal, o da qualidade e o da recusa intransigente de privilégios inaceitáveis numa sociedade democrática.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, necessitamos de mais coerência na formação de professores do ensino obrigatório, em termos que envolvam uma partilha efectiva de responsabilidades entre universidades e institutos superiores politécnicos. Assumimos, porém, esta exigência com muita serenidade e com a consciência de que ao Governo caberá salvaguardar o interesse nacional, recusando cultivar divergências, afastando discriminações e preservando a qualidade de que tanto carecemos. Este é o sentido da nossa determinação.

Aplausos do PS.

Temos demonstrado quanto prezamos a autonomia das instituições do ensino superior e quanto a respeitamos. Mas não basta prezar o que é um desígnio constitucional, é indispensável dar passos concretos no sentido de dar conteúdo concreto à autonomia, com consequente responsabilidade. É um trabalho permanente que deve ser prosseguido.
Mas há uma questão que tem a ver com a autonomia e que continua por resolver, uma vez que ainda não se operou a adequação entre a Lei de Bases do Sistema Educativo e a legislação sobre autonomia do ensino superior. Refiro-me ao tema do acesso, que é da maior importância e sensibilidade.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Não parece!

O Orador: - Não duvidamos, mas importa que a única instituição competente nessa matéria, que é a Assembleia da República, se pronuncie sobre a atribuição às instituições de ensino superior da capacidade para participarem na decisão sobre as candidaturas aos seus cursos. É esse o sistema adoptado na maior parte dos nossos parceiros europeus e foi esse o alcance da proposta que o Governo já apresentou a esta Câmara.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pelo que fica dito, parece-me ter ficado claro que a prioridade dada à educação e à formação não é uma questão de palavras mas de acções. Daí a importância das mudanças estratégicas e a necessidade de ir além do imediatismo ou de alterações pontuais e circunstanciais.
No início deste debate, um Sr. Deputado pôs em causa que estivesse a cumprir-se o compromisso deste Governo de aumentar até ao final da legislatura em mais 1% do PIB as despesas com a educação no Orçamento do Estado, tal como foi repetido há pouco. Permito-me referir o que o Sr. Ministro das Finanças já aqui afirmou ontem, ou seja, o objectivo está a ser cumprido e comparando realidades comparáveis, já chegámos a um crescimento de 0,4% do PIB.

Aplausos do PS, de pé.

Mas gostaria de dizer um pouco mais. Não podemos esquecer que este foi o único compromisso quantificado do programa eleitoral. O valor que sempre foi referido reportava-se a um aumento de 150 milhões de contos ou seja 1% a valores de 1995.

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - Ora, a verdade é que, tendo em conta a soma dos aumentos previstos para 1996 e 1997 e sem considerar o acréscimo salarial para o próximo ano, já ultrapassámos esse valor nominal, o que deve desde já ser referido.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Apenas fica demonstrado que estamos a cumprir com escrúpulo aquilo a que nos comprometemos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O caminho que iniciámos há um ano é exigente e obriga a uma grande determinação e à mobilização de energias e vontades de todos os protagonistas do processo educativo.
Termino, pois, com uma palavra de optimismo e de esperança.
Melhorar a educação e a formação das pessoas é um desafio que certamente nos poderá mobilizar a todos.
As novas gerações não nos perdoariam se não uníssemos vontades nesse sentido.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os seguintes Srs. Deputados: Síl-

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vio Rui Cervan, Castro de Almeida, Luísa Mesquita, José Cesário, Fernando de Sousa e Carlos Coelho.
Há um problema de falta de tempos mas, como esta foi a última intervenção, apenas peço aos Srs. Deputados que não abusem da boa vontade da Mesa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, terminou a sua intervenção com uma palavra optimista. Como gostávamos que a realidade fosse optimista!
Vamos aproveitar a ausência da Sr.ª Ministra Ana Benavente para conversarmos...

O Sr. José Magalhães (PS): - Está atrás de si, Sr. Deputado! Está sentada na tribuna dos Membros do Governo!

O Orador: - Sr. Deputado, aprenda com os clássicos: tem dois ouvidos e uma boca que é para ouvir o dobro do que fala! Ouça, Sr. Deputado! Ouça!
O Sr. Ministro, diz-nos, e bem, que não tem dinheiro, que não tem tanto dinheiro quanto queria. O Sr. Primeiro-Ministro diz-nos, e bem, que os recursos são escassos. O Sr. Ministro das Finanças diz-nos que não tem receita e eu digo-lhe que é porque a despesa é muita e é má.
Não falemos aqui nem da mediocridade da docência que se prevê para o 3.º ciclo, nem da nova lei de bases que parece uma " mousse Alsa" feita em 24 horas, nem das reformas adiadas dos programas, nem da avaliação ou da falta dela, nem da ausência de investimento. Guardamo-nos para a interpelação ao Governo que faremos no próximo dia 28. Falemos aqui daquilo que disse o Sr. Ministro em Novembro de 1995.
Veio V. Ex.ª a esta Assembleia dizer que se comprometia a "trazer ao Parlamento uma proposta de lei global sobre o financiamento do ensino superior, antes do final da sessão legislativa", ou seja, até ao passado mês de Junho.
Sr. Ministro, onde está a proposta? Sr. Ministro, em que serviços desta Casa deu ela entrada? Por lapso, certamente involuntário, no Partido Popular ainda dela não tivemos conhecimento. Será que para termos acesso a semelhante proposta teremos de ter amigos no meio académico onde a mesma já circula? Por que razão, Sr. Ministro, não cumpriu V. Ex.ª o calendário? Sr. Ministro, quanto é que isto vai custar ao País?
Repito, Sr. Ministro: não há ensino gratuito! O que há, e que cuidamos aqui de saber, é quem paga, quanto paga e como paga. V. Ex.ª, até hoje, não mexeu na lei de financiamento porque sabia, e sabe, que isso pode custar-lhe "dois comboios de protesto" vindos de Coimbra mais "três camionetas" do Porto. Sr. Ministro, hoje não temos essa boa lei de financiamento que prometeu e já temos o protesto em Coimbra e no Porto.
V. Ex.ª sabe que enquanto não houver lei de financiamento o que está em causa é que alguns continuam a estudar com o dinheiro de todos. Sr. Ministro, porque adia o inadiável?
Permita-me que faça uma comparação: a Sr.ª Deputada e ex-Ministra Manuela Ferreira Leite pode ter mostrado alguma inabilidade para lidar com a discência mas V. Ex.ª mostra incapacidade para lidar com a discência, com a docência, com os pais e com os funcionários.
Sr. Ministro, louvemos-lhe o ensino pré-escolar, porque é justo. Se cumprir os timings que prometeu, se cumprir o FEF prometido, louvemos-lhe essa acção.
Para terminar, pergunto ao Sr. Ministro se puniu quem não cumpriu, se castigou quem não respeitou a lei ou, pelo menos, se, por uma questão de justiça, devolveu o dinheiro a quem pagou.
Dir-me-ão que estou a falar de tostões num orçamento de milhões. Lembro-lhe que foi assim que me ensinaram: "casa que não poupa água nem lenha não poupa coisa que tenha".

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, entretanto, o Sr. Deputado Carlos Coelho informou a Mesa que prescinde do seu pedido de esclarecimento.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan acabou de dizer que a Sr.ª Ministra Manuela Ferreira Leite poderá ter usado de inabilidade no contacto com os estudantes. Digo mais, Sr. Presidente: estou consciente que muitos até a acusaram de altivez ou arrogância para com os estudantes mas nunca ninguém acusou a ex-Ministra Manuela Ferreira Leite de falta de coragem. Nunca fugiu ao contacto com os estudantes, nunca deixou de reunir com os estudantes, de os ouvir e de lhes falar, mesmo que ouvisse críticas.

Protestos do PS.

Quando foi Ministra, a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite esteve por várias vezes em sessões de abertura de anos académicos e em todas, sem excepção, ouviu críticas dos estudantes, mas nunca deixou de usar da palavra, apesar dessas mesmas críticas.
Sr. Ministro, o orçamento que nos traz consagra uma dotação de 6 milhões de contos por cada dia de funcionamento do sistema educativo. É quanto custa ao País cada dia de funcionamento das escolas: 6 milhões de contos por dia. Trata-se de uma verba importante, de muito dinheiro, e era útil que, em cada dia de escola, ela funcionasse.
Hoje em dia, não podemos passar ao lado de uma greve de estudantes que deixa sem aulas, que inutiliza centenas de milhar de contos, destes que agora estão a ser afectados no Orçamento. E porquê, Sr. Ministro? Porque os estudantes fazem uma reivindicação inaceitável para o Governo? Não! O que ouvimos os estudantes dizerem é que querem falar com o Sr. Ministro, querem que os ouça e que lhes explique o que pretende com a sua proposta de alteração à lei de bases.
Sr. Ministro, faço-lhe um apelo. Não custa muito, os estudantes não estão a pedir demais, pedem diálogo. Veja bem! Eu, Deputado do PSD, a sugerir ao Sr. Ministro Marçal Grilo que ouça os estudantes!
E faço-lhe um apelo suplementar:. não instale à porta do seu gabinete um "detector de capacidade científica", para ver quem pode ou não lá entrar para dialogar consigo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Diga lá isso sem se rir!

O Orador: - Os estudantes apenas querem diálogo. Dialogue com eles, mesmo reconhecendo que não dispõem da capacidade científica de V. Ex.ª, que é muita, sob pena de eu próprio não poder estar aqui a usar da palavra se fosse esse o critério, Sr. Ministro.

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O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Apoiado!

O Orador: - A minha modéstia é imensa!

Risos do PSD.

Sr. Ministro, referiu-se largamente à implementação do ensino pré-escolar, objectivo do Governo que é partilhado por toda a Câmara. Aliás, o Governo apresentou nesta Assembleia uma proposta de lei-quadro da educação pré-escolar, relativamente à qual entendemos - e já o dissemos - que, tal como estava formulada, não resolvia nenhum dos problemas da educação pré-escolar.
Para que essa proposta de lei seja operativa, é necessário que responda a algumas questões importantes.
O ensino pré-escolar é gratuito ou não?
Outro problema diz respeito à extensão dos horários da rede pública dos estabelecimentos de ensino pré-escolar. Sabemos que os horários actuais não satisfazem as necessidades das famílias, pelo que é necessário alargá-los.
É necessário assegurar aos educadores de infância que trabalham em instituições particulares de solidariedade social um mínimo de equiparação ao que é o estatuto dos que trabalham na Função Pública.
Ora, Sr. Ministro, nós temos a noção - somos realistas - de que não é possível fazer tudo isto num ano. Queremos assegurar a gratuitidade do ensino pré-escolar, queremos que o Estado assegure o alargamento de horário da rede pública do pré-escolar, queremos assegurar um estatuto equiparado aos educadores das IPSS, mas reconhecemos que é impossível fazê-lo num só ano, ou em dois ou, porventura, em três. Portanto, queremos estabelecer este objectivo, inscrevendo-o na lei, e começar a dar-lhe aplicação.
Assim, pergunto-lhe, Sr. Ministro: está ou não V. Ex.ª na disposição de, já na vigência do Orçamento para 1997, dar passos nos sentido da afirmação da gratuitidade do ensino pré-escolar, no sentido do alargamento e extensão dos horários e no da equiparação do estatuto dos educadores de infância?
Tenho ainda uma outra questão a colocar-lhe.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe que abrevie pois já ultrapassou o seu tempo.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente, mas se me permite, queria colocar esta última questão que tem a ver com o financiamento do ensino superior.
O Sr. Ministro disse que apresentaria uma lei de financiamento do ensino superior na anterior sessão legislativa. Não o fez. Terá as suas razões que haverá de explicar a seguir.
Pergunto-lhe: no orçamento do Ministério da Educação para 1997 está prevista receita de propinas para o início do ano lectivo 1997/1998? Vamos ter propinas neste ano lectivo? Estão ou não previstas no Orçamento? É que de acordo com a indicação que nos der, do ponto de vista do financiamento do ensino superior, ficaremos a saber se vai ou não adiar por mais um ano o cumprimento da sua promessa.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, começaria por evidenciar algo que, provavelmente, o Sr. Ministro sabe sobejamente. De facto, o seu discurso não esqueceu nenhuma área, nenhum subsistema e contemplou toda a comunidade educativa, mas o orçamento do seu Ministério, Sr. Ministro, esqueceu tudo ou quase tudo!

Vozes do PCP: - Exactamente!

A Oradora: - Mas vamos falar do discurso do Sr. Ministro, daquele que não esqueceu nada. E, desde já, falemos de diálogo.
A primeira questão que coloco é se o Sr. Ministro considera que a proposta de alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo, apresentada nesta Casa em Julho de 1996 - mas que, por razões óbvias, foi desagendada -, cujos pareceres negativos conhecidos são generalizados a todo o País, quer de docentes, quer de discentes, quer de toda a comunidade educativa, é o produto consumado da capacidade dialogante do Ministério da Educação.
Pergunto também se a Lei-quadro da Educação Pré-Escolar, desconhecida de muitos protagonistas do celebérrimo pacto educativo, que todos nós já esquecemos, é um produto acabado da capacidade dialogante do Sr. Ministro, ou se o anteprojecto divulgado pelos órgãos de comunicação social, mas que os Deputados não tiveram o privilégio de conhecer, embora estivessem a discutir, nesta Casa, a Lei-quadro da Educação Pré-Escolar, constitui, de facto, resultado da capacidade deveras dialogante do Sr. Ministro com as instituições!
Pergunto ainda se a atitude do Ministério da Educação e do seu Ministro face às vagas supletivas em termos de acesso ao ensino superior, decididas por vontade desta Casa, primeiramente de uma forma unânime e, num segundo momento, por maioria, é igualmente o protótipo da capacidade dialogante do Sr. Ministro.
Talvez o Sr. Ministro ainda não tivesse dado por isso, porque o seu discurso é um oásis... A paixão transformou-se em oásis! Será que o Sr. Ministro já se apercebeu que hoje as Universidades de Coimbra e dos Açores estão fechadas, também elas, provavelmente, produto da capacidade exímia de dialogar do Sr. Ministro da Educação? Talvez o Sr. Ministro ainda não tenha ouvido hoje a comunicação social, ou lido os jornais!
Sr. Ministro, falemos agora de números. É preciso esclarecer que só entenderemos os números previstos para 1997 se percebermos os decréscimos gritantes e calamitosos que o orçamento da educação para 1996 trouxe a esta Casa, para discussão. Dou-lhe apenas um exemplo, que o Sr. Ministro talvez considere de menor importância: o decréscimo em cerca de 40% da taxa de investimento na área da Acção Social Escolar em 1996: Provavelmente, o Sr. Ministro responder-me-á: "este ano o investimento subiu relativamente a 1996, porque o Governo propõe um aumento de 1,8% e, Sr.ª Deputada, estaremos 20 anos à espera para conseguir fazer a cobertura do decréscimo verificado no ano passado"!
Para terminar, o Sr. Ministro falou de qualidade, de formação de base. Provavelmente, em resultado da sua capacidade de dialogar, tal significa que formação de base, formação de qualidade, capacidade de ouvir os professores e os alunos é, efectivamente, reduzir a formação dos professores para dois anos e chamar-lhe um bacharelato, em nome da qualidade!

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Sr. Ministro, quem faz hoje greve nas Universidades de Coimbra e dos Açores está com a qualidade, com a formação de base, e os seus alunos lutam pela defesa destes princípios. De Norte a Sul do País, todos têm dito que o Sr. Ministro não é capaz de dialogar porque não tem premissas sérias de análise profunda do sistema educativo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.

O Sr. José Cesário (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, devo dizer-lhe que compreendo bem as suas dificuldades. Neste momento, o Sr. Ministro vive um drama: depois de um ano a discutir e a defender aqui o seu segundo orçamento, é já confrontado com greves, com manifestações, com os estudantes na rua! Com certeza, não era este o cenário que o Sr. Ministro esperava há exactamente um ano atrás.
Porém, quero garantir-lhe o seguinte: esteja certo que o comportamento do PSD perante estas manifestações não vai ser idêntico,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... nem sequer semelhante àquele que foi o comportamento do Partido Socialista no passado, perante situações idênticas, em que assumiu a demagogia mais pura, ou seja, onde se pedia dinheiro, dava-se dinheiro, onde se lutava pelo fim dos exames, prometia-se que este acabariam! Era um mundo de facilidades.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É por isso, Sr. Ministro, que hoje, tão cedo, começa já a provar as dificuldades de ser Ministro da Educação.
Deixe-me dizer-lhe, Sr. Ministro, que a política de educação do Governo, fundamentalmente o seu discurso, assenta em duas vertentes. A primeira é a do pré-escolar e, quanto a ela, estamos falados, pois o Sr. Deputado Castro de Almeida já enunciou muito bem quais são os propósitos do PSD e a vontade de colaborar em relação a este objectivo. A segunda é a da defesa do gradualismo - este é um princípio nobre, com que todos concordamos, nós sobretudo. Mas, francamente, penso que para o Governo, e para si em particular, Sr. Ministro, gradualismo significa fundamentalmente indefinição.
Com efeito, tarda a definição do Governo; do Ministério da Educação em relação a questões muito concretas, para as quais, aliás, temos vindo a chamar a sua atenção.
Em primeiro lugar, sobre a questão da gestão e administração escolar, o Sr. Ministro diz que recusa a existência de modelos rígidos, mas tem de dizer o que pensa do actual modelo, designadamente sobre a administração do pré-escolar e do 1.º ciclo do ensino básico, sobre conselhos directivos ou, porventura, a existência de directores executivos. Contudo, o Sr. Ministro nada diz, adia sistematicamente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, em matéria de avaliação de conhecimentos, assistimos, sobretudo pela parte da Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação... O Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan tratou-a por "Sr.ª Ministra", mas eu não diria tanto, porque Ministro é o Sr. Ministro Marçal Grilo. Ela, porventura, poderá querer ser Ministra, mas estou convencido de que não o será, pelo menos para já! Mas, dizia, assistimos, sistematicamente, a despacho sobre despacho, a correcção sobre correcção, à alterações permanentes do peso da avaliação, o que cria indefinição nas escolas.
De facto, os senhores não dizem o que querem, em concreto, quanto à avaliação de conhecimentos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, as escolas profissionais têm um papel determinante na inserção de milhares e milhares de jovens na vida activa e o Sr. Ministro, desde há alguns meses, iniciou uma estratégia que visa - e cito - ordenar, pôr ordem num subsistema. Contudo, a verdade dos factos é que, com toda essa indefinição, está a criar a mais profunda das incertezas em todas as escolas, sobretudo nos estudantes que as frequentam.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Termino, dizendo muito claramente o seguinte: o Sr. Ministro assumiu e assume hoje, perante esta Câmara, que considera o orçamento do Ministério da Educação razoável, um orçamento com um crescimento sólido e significativo, mas não se esqueça que no momento em que o diz está a aumentar as suas responsabilidades, porque as expectativas serão maiores e, sinceramente, tenho muitas dúvidas que o Sr. Ministro consiga corresponder a todas elas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, começaria por comentar as palavras do Sr. Deputado José Cesário e registar com agrado que quer o Sr. Deputado, quer o PSD começam agora a dar atenção a alguns aspectos que não os preocuparam nos últimos 10 anos em que foram Governo.

Aplausos do PS.

Em primeiro lugar, gostaria de lembrar-lhe, Sr. Deputado José Cesário, que se há facilidades em matéria de educação e de política educativa, essas facilidades foram, de facto, desenvolvidas pelo PSD nos anos em que esteve no Governo.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não fomos nós que acabámos com as provas globais, nem com as propinas!

O Orador: - Congratulamo-nos que se preocupe com o pré-escolar porque, finalmente, pela primeira vez, essa é uma preocupação do PSD. O mesmo vale para as escolas profissionais, porque o facto de terem deixado um défice de 50 milhões de contos nas escolas profissionais revela até que ponto os senhores estavam preocupados com esta matéria.
Sr. Ministro da Educação, em primeiro lugar gostaria de registar com agrado a intervenção que fez sobre a política educativa que está a ser desenvolvida pelo Governo. O PS

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congratula-se com o orçamento apresentado para a educação, uma vez que cresceu 7% em relação ao ano passado, bem como com a certeza de que o crescimento de 1% para a legislatura está a ser e será alcançado através dos próximos dois orçamentos.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro referiu ainda alguns problemas relacionados com o ensino superior, nomeadamente com a proposta de lei de alteração da Lei de Bases do Sistema Educativo. Ora, sobre essa matéria, gostaria de colocar uma questão que se prende com a polémica, muito debatida, quer pelos órgãos de comunicação social, quer pelas associações académicas, da formação dos professores do ensino básico, isto é, daqueles que se destinam ao 3.º ciclo.
Com efeito, o Governo defende um conjunto de requisitos a que as escolas superiores de educação devem obedecer para poderem ministrar os cursos de formação inicial dos professores do 3.º ciclo. Gostaria que o Sr. Ministro pudesse adiantar alguma coisa sobre esta matéria e nos falasse da grelha que tem prevista, grelha essa, julgo, de exigência e de rigor para resolver esta questão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No dia 28 do corrente mês está prevista uma interpelação, apresentada pelo Partido Popular, e nessa altura vamos, seguramente, ter ocasião de discutir a maior parte das questões que aqui foram levantadas pelos Srs. Deputados.
Todavia, há três ou quatro questões que não posso deixar passar. A primeira tem a ver com a importância que o Sr. Deputado Castro de Almeida hoje atribui ao pré-escolar. Quanto a isso, devo responder-lhe, com alguma sinceridade, o seguinte: penso que a vontade manifestada pelo PSD de colaborar na elaboração desta lei-quadro é de registar - saúdo-a com grande, satisfação - mas, com muito respeito pela sua opinião de hoje, tenho de dizer que em Abril de 1995, quando o PSD elaborou o Decreto-Lei n.º 173/95, estas não eram as suas preocupações.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Peço desculpa, mas tenho de o dizer, porque muito do que refere está contido no preâmbulo do decreto-lei, mas nele não é feita qualquer referência explícita, nem a horários, nem a estatuto de educadores, nem a gradualismo em termos de satisfação das mesmas regras para as IPSS e para...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não era uma lei-quadro!

O Orador: - Peço desculpa, era uma lei de aplicação! Os senhores adoptaram uma regra diferente...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Está a comparar coisas diferentes!

O Orador: - Peço desculpa, Sr. Deputado Carlos Coelho, mas o nosso decreto-lei de regulamentação da lei-quadro, e que está neste momento pronto, vai muitíssimo além de tudo aquilo que os senhores aqui levantaram, por uma razão simples: entendemos que o Estado não se exime das suas responsabilidades, que era o que decorria do Decreto-Lei n.º 173/95. Peço muita desculpa, mas um decreto-lei que, em concreto, apenas define que se pagam 280 000$ por sala, em 10 meses, aos concorrentes, é muito curto, em termos de concepção do que é uma rede pré-escolar e de quais são os seus objectivos. Por isso, peço desculpa, mas o Sr. Deputado Castro de Almeida não tem autoridade para vir criticar hoje aquilo que há um ano e meio atrás não foi capaz de fazer.

Aplausos do PS.

Em relação ao diálogo, permitam-me que diga o seguinte: sou sensível ao que disse sobre a capacidade científica. Aliás, certamente, isso veio a propósito de uma resposta que dei, porque não sou demagogo. Sr. Deputado, e sei com quem devo discutir cada uma das matérias. E não, é aceitável que me seja pedido para discutir os trâmites, a grelha e os requisitos científicos da formação dos professores com quem não tem capacidade científica. Ao contrário do que o Sr. Deputado disse, os estudantes sabem disto e fizeram-me saber que não tinham qualquer interesse em discutir aspectos de ordem científica.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Claro!

O Orador: - Nesta matéria, não farei aquilo que o seu Governo fez - não o Ministério da Dr.ª Manuela Ferreira Leite -, não cometerei a demagogia, como já disse aqui uma vez, de assinar com os estudantes um documento em que se analisem, nos currículos dos cursos do ensino superior, os numerus clausus e a avaliação do desempenho dos professores, conforme sucedeu no âmbito de um Governo do PSD, em que foi assinado por três ministros o chamado "Acordo social".

O Sr. Ricardo Castanheira (PS): - É verdade!

O Orador: - O Sr. Deputado sabe a gravidade de o Estado negociar com os estudantes o estatuto dos professores? É de uma gravidade inacreditável!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, não me peça uma coisa dessas, porque não sou demagogo e nunca farei um acordo destes, seja porque razão for!

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan colocou muitas questões e vamos, com certeza, debatê-las no dia 28. No entanto, deixe-me apenas dizer-lhe uma coisa que me parece importante: a alteração da Lei de Bases, ao contrário do que possa pensar, não foi feita em 24 horas. Em 1986, teve lugar, nesta Casa, um debate relativo à formação dos professores. V. Ex.ª não estava cá nessa altura, eu também não, mas assisti, acompanhei e até comentei, em artigos escritos, aquilo que foi aqui discutido. E trata-se de uma matéria séria! Por isso, aquilo que peço à Câmara, tal como sugeri aqui, aquando do debate do pacto educativo, é que o Parlamento discuta esta matéria a fun-

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do, para que o Sr. Deputado possa reflectir seriamente sobre ela, uma vez que nós também já o fizemos. Já falei com o Sr. Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, no sentido de podermos ir ao fundo desta matéria, pois trata-se de uma matéria muito séria. Mais uma vez, repito, no dia 28, certamente, terei ocasião de poder discutir consigo esta e outras questões.
O Sr. Deputado José Cesário colocou uma questão muito importante, que é a da gestão das escolas, referindo-se sobretudo ao l.º ciclo.
Sr. Deputado, quero dizer-lhe o seguinte: a gestão do 1.º ciclo é menos uma questão de legislação, em termos de quem é eleito, de quais são as responsabilidades do conselho directivo, do que é o conselho de escola ou as atribuições do secretário executivo, e muito mais uma questão de territorialização do ensino primário, do 1.º ciclo. E porquê? Porque, como o Sr. Deputado sabe, verdadeiramente, não temos escolas do 1.º ciclo, ou seja, as escolas do 1.º ciclo têm uma capacidade extremamente reduzida na sua própria gestão e autonomia. E, como disse há dias na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, ou nós somos capazes de fazer uma territorialização gradual do l.º ciclo ou nunca terá um sistema de gestão aceitável. Mas gradualismo não significa indefinição, Sr. Deputado. Se acompanhar bem o modo como se trabalha num país como os Estados Unidos, sobretudo ao nível dos Estados mais inovadores, verificará que se utiliza sempre o sentido gradualista e demonstrativo das soluções. Se conhecer o projecto mais interessante que conheço em matéria de inovação nas escolas, que é um projecto chamado The New Century Schools, e que foi iniciado no Minesota, verificará que, em todo o espaço americano, foram escolhidas apenas 220 escolas. Se algum Governo quiser manter uma estratégia de inovação ao nível de todo o espaço, nunca será verdadeiramente capaz de inovar. Projectos como o Nónio, o projecto das bibliotecas, o projecto dos territórios educativos de intervenção prioritária, têm de ter um sentido gradualista. E não se trata de não ser possível de outro modo, mas de não ser desejável que estes projectos tenham outras características.
Quanto à definição ou indefinição, permita-me que lhe diga o seguinte: não tem qualquer sentido pensar que a proposta que aqui fizemos em relação à Lei de Bases é pontual, pois trata-se de uma proposta de fundo, tocámos num dos aspectos mais estruturantes do sistema e os Srs. Deputados estão confrontados com uma matéria que é da maior importância para o futuro da educação. Estamos cientes disso e, como o Sr. Deputado sabe, estou disponível para podermos abordar esta questão na Comissão de Educação, com uma grande tranquilidade, longe do que são os lobbies, dos aspectos corporativos e daquilo que pode destruir uma ideia que é nobre.
A Sr.ª Deputada Luísa Mesquita colocou muitas questões, mas há uma a que tenho de responder, que se prende também com a pergunta formulada pelo Sr. Deputado Fernando de Sousa, e a que sou particularmente sensível. É que, a ser como V. Ex.ª disse, haveria, de facto, uma catástrofe no sistema. Aceito a crítica de que talvez o Ministério e o Ministro, em tempo próprio, devessem ter esclarecido, não negociado, a matéria dos bacharelatos de dois anos, mas vou dizer-lhe quais são os critérios que distribuímos ao conselho de reitores e ao conselho dos politécnicos, para poderem ser debatidos numa base de requisitos científicos para a formação. O primeiro critério é o de que os princípios se aplicam a todos os cursos, em todos os sistemas, isto é, no público, no privado, no universitário, no politécnico e na Universidade Católica. O segundo critério é o de que os cursos de formação serão sempre cursos de licenciatura. Aliás, é por isso que, na proposta de lei de bases, a questão do 3.º ciclo está acoplada à da institucionalização, à partida e de raiz, de licenciaturas no ensino politécnico. O terceiro critério é o de que a estrutura curricular geral é aplicável a todos os cursos e identifica a formação científica específica, a formação em ciências da educação, a formação prática e as ciências obrigatórias para a componente de formação em ciências da educação.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Ministro, peço desculpa, mas tenho de o interromper, pois preciso de pedir que seja desligado um telemóvel que está a fazer interferência no sistema de som e gravação.
Faça o favor de prosseguir a resposta. pelo tempo que entender necessário, Sr. Ministro.

O Orador: - Ainda em relação à parte da estrutura curricular, e continuo com a resposta ao Sr. Deputado Fernando de Sousa, há dois aspectos que são essenciais: as áreas científicas obrigatórias para a componente de formação científica específica identificam expressamente a natureza prática e a técnico-laboratorial, porque, como sabe, é uma das questões que se coloca muito nas áreas científicas específicas, que são a física, a química e a biologia, e a carga curricular mínima tem de ser medida em unidades de crédito para cada área científica obrigatória.
Quanto às características de um corpo docente de um curso que pretenda ser reconhecido, deve incluir um número de doutorados mínimo por número de estudantes na área científica específica e não apenas na área de ciências da educação. A regência das disciplinas incluídas no respectivo curriculum tem de ser assegurada pelos respectivos doutorados e não pelos assistentes, como tem acontecido.
Há ainda uma outra questão que tem a ver com instalações e equipamento, pois, como sabem, há escolas que, à partida, têm essas condições, mas há outras que não as têm.
Por último, julgamos que é altamente desejável que, para a formação dos professores do 3.º ciclo, o sistema universitário dialogue com o sistema politécnico. Faz pouco sentido manter em Portugal um sistema binário, que sempre defendi, um sistema com dois subsistemas de ensino superior e que vivam completamente separados. Há, hoje, no sistema português, muitos acordos, muitos protocolos e muitos entendimentos entre os dois subsistemas, mas penso que seria importante, a propósito desta matéria sensível da formação dos professores, motivarmos os departamentos do ensino universitário para estabelecerem acordos institucionais com estabelecimentos do ensino politécnico. E porquê esta lógica? É que a escolaridade obrigatória, em Portugal, foi expandida ao longo do tempo. A história é simples: nos anos 30, como sabem, a escolaridade obrigatória foi reduzida de 4 anos para 3 anos; mais tarde, foi expandida de 3 anos para 4 anos, apenas para o sexo masculino, e, mais tarde ainda, também para o sexo feminino; nos anos 60, foi expandida para 6 anos; na Lei de Bases de 1986, foi expandida para 9 anos; hoje, temos uma escolaridade obrigatória de 9 anos, mas, no fundo, com um ciclo de 4 anos, um ciclo de 2 anos e um ciclo de 3 anos. E importa dar aqui um clique! Há relativamente poucos dias alguém dizia que o 3.º ciclo da escolaridade obrigatória era uma espécie de pré-secundário,

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o que não é verdade, pois o terceiro ciclo do ensino obrigatório faz parte integrante dos 9 anos.
Por isso, a questão que temos de resolver é a seguinte: hoje, uma parte significativa da população entra para o sistema educativo com os olhos postos no ensino superior, faz do ensino secundário uma espécie de pré-universitário e do 3.º ciclo da escolaridade obrigatória uma espécie de pré-secundário. Mas, cuidado!... É que, com a abertura da escola a largas camadas da população, há muitos jovens que não têm os olhos postos no ensino superior, que não são cativados, que não são atraídos, que não são agarrados dentro da escola, tal como ela hoje se encontra. Em cada três crianças que entram na escola, no 1.º ano, uma não chega ao final da 9.º classe, ou seja, perdemos 17% nos primeiros seis anos e perdemos mais 19% nos 7.º, 8.º e 9.º anos. Ora, há que introduzir no sistema uma lógica de combate à exclusão escolar e importa introduzi-la não propriamente na área da formação científica mas na área da formação da educação. Necessitamos de professores que sejam educadores, necessitamos de professores que compreendam a questão das famílias e a situação económica dos jovens. Sou, hoje, extremamente sensível a esta realidade, pois visitei centenas de escolas no último ano e tenho a noção exacta de que se trata de um problema gravíssimo para o País. Não podemos continuar a ter situações como a que me foi dada a conhecer, há dias, numa escola, quando perguntei a uma professora qual era, verdadeiramente, o problema que tinha com as crianças. É que ela respondeu-me que o problema mais difícil que tinha era conseguir sentá-las numa cadeira e mantê-las atentas, durante uma hora, àquilo que se passava dentro da sala. Ora, este dramatismo em relação ao abandono escolar... Não escondamos os problemas, estes são os problemas que temos, são estes problemas que nos propomos resolver e são sobretudo estas questões que temos de entender num sentido estratégico. Se não pegarmos estrategicamente nesta matéria, arriscamo-nos a ficar por medidas pontuais ou meramente mediáticas ou teatrais, como referi na minha intervenção de base.
Pessoalmente, estou convencido de que o Parlamento é sensível a esta questão. Muitas vezes, a sensibilidade do Parlamento é diferente em Plenário e em comissão e é diferente em comissão consoante a reunião é ou não gravada. Os Srs. Deputados farão como quiserem na reunião da Comissão de Educação em que esta matéria for discutida: gravam ou não, abrem ou não aos meios de comunicação social. Agora, o que peço à Comissão de Educação é que abra um debate sobre esta matéria, porque é de interesse nacional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Vários Srs. Deputados pediram a palavra. Vou saber, em primeiro lugar, para que efeito a pediram.
Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, para que efeito pediu a palavra?

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Para defesa da honra pessoal, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Fernando de Sousa, para que efeito pediu a palavra?

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - E o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, para que efeito pediu a palavra?

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Também para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Da parte do PSD não há interpelações à Mesa...
Risos.

Então, vou fazer o seguinte: vou dar a palavra aos Srs. Deputados para interpelar a Mesa pela ordem das inscrições. Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, tenho pena, não lhe vou dar oportunidade de defender a honra ou a consideração pessoal, mas pode interpelar a Mesa. Depois dá-la-ei aos Srs. Deputados Fernando Sousa e Sílvio Rui Cervan.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, provavelmente, talvez seja mais correcto fazer a interpelação à Mesa.
O que pretendo é que a Mesa solicite ao Sr. Ministro que, em nome do diálogo e da tolerância demonstrada pelo Ministério da Educação, responda às questões colocadas pelo PCP. Se necessário for, voltarei a colocá-las, partindo do princípio que o Sr. Ministro não ouviu e talvez queira dialogar.

O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Ministro pretende também interpelar a Mesa, desde já?

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, transformando a interpelação à Mesa da Sr.ª Deputada, aproveitava para lhe responder a algumas das questões...

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - A todas!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Peço desculpa, Sr. Ministro, mas, nesse caso, daria em primeiro lugar a palavra aos Deputados inscritos para interpelar a Mesa, seguindo-se depois o Sr. Ministro.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, gostaria, através da Mesa, de pedir ao Sr. Ministro duas coisas.
Em primeiro lugar, se pode fazer o favor de voltar a indicar quais os requisitos que considera mínimos, uma vez que a Câmara não estava com a atenção necessária, pelo menos parte dos Deputados não ouviram.

Protestos do PSD e do PCP.

E também porque é uma questão que tem sido apresentada por numerosos Deputados.

Vozes do PS: - É verdade!

Protestos do PSD e do PCP.

Orador: - Em segundo lugar, Sr. Ministro, esse conjunto de requisitos já é do conhecimento dos intervenientes em todo este processo ou é a primeira vez que o está aqui a anunciar? Isto porque verificamos que, quer os órgãos de comunicação social quer os estudantes, têm-na questionado muito. É preciso saber quais são os requisitos. Por-

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tanto, o que pretendo saber é se já há publicidade relativamente a esses requisitos.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, para fazer uma real e verdadeira interpelação à Mesa e não para questionar o Sr. Ministro da Educação.
Por uma questão de respeito institucional por esta Casa, de profundo respeito pelo Parlamento e também pela instituição parlamentar, há cerca de uma hora, o líder da minha bancada perguntou aos membros da bancada do Governo se era possível facultar-nos uma cópia da cassette. E gostaríamos de saber se, de facto, é possível facultar-nos a cópia da cassette, porque ainda não obtivemos resposta.
Por último, gostávamos também de lembrar que ainda não tivemos oportunidade de cumprimentar aqueles que nos acompanham nas galerias.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, em relação à sua interpelação, a Mesa informa que, neste momento, não dispõe dessa cassette.
Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, em nome do esclarecimento das questões, o PSD não levantou qualquer objecção à generosidade com que o Sr. Ministro foi tratado pela Mesa na fase de respostas a esclarecimentos; o Sr. Ministro demorou mais tempo a responder do que propriamente na sua intervenção inicial. O Sr. Presidente não ouviu uma única palavra de protesto da bancada do PSD e, como sabe, também não ouvirá se conceder mais tempo ao Sr. Ministro para responder a perguntas que, pelos vistos, não foram respondidas, na sequência dos pedidos de esclarecimento formulados pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita. Agora, Sr. Presidente, dar tempo ao Sr. Ministro para repetir respostas que já deu à Câmara, como foi solicitado pelo Sr. Deputado Fernando de Sousa, peço desculpa, mas há limites para tudo nesta Câmara!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, vou dar a palavra ao Sr. Ministro, pedindo-lhe que seja muito directo e contido, para podermos concluir os trabalhos com relativo respeito pelo Regimento.
Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, a sua primeira afirmação foi que o meu discurso tinha lembrado tudo e que o Orçamento esquecia tudo. Foi sensivelmente este o trocadilho que fez.
Sr.ª Deputada, este Orçamento, tal como está e como o construímos, e, como tive ocasião de dizer na Comissão, onde aliás a Sr.ª Deputada não esteve, é extremamente equilibrado. Faz crescer o investimento em cerca de 10% - e digo cerca de 10% porque seria um pouco mais, se não tivéssemos feito, ainda em 1996, um reforço, em Junho passado, de cerca de 2,5 milhões de contos, que nos permitiu acelerar um conjunto significativo de obras na parte do Verão. Na parte relativa às despesas correntes é um orçamento que contempla a importância dos recursos humanos, da valorização salarial dos professores, de todos os compromissos assumidos que, como a Sr.ª Deputada sabe, são significativos. Têm a ver ainda com as sequelas do 8.º escalão e com aquilo que espero que seja um acordo de grande importância, acordo que estamos a fazer com os sindicatos, relativo à regulamentação dos artigos 54 º, 55.º, 56.º e 57 º.
Portanto, quando me diz que o Orçamento esqueceu tudo, nós vamos certamente, em sede de Comissões de Economia, Finanças e Plano e de Educação, analisar em detalhe e verá que este Orçamento é muito equilibrado, que permite fazer avançar decididamente a educação em, praticamente, todos os sectores.
Em relação ao diálogo sobre a lei de bases, penso que já lhe respondi. No entanto, digo-lhe que a lei de bases, como a Sr.ª Deputada sabe, é uma competência exclusiva e não delegável do Parlamento.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Ministro, peço-lhe que abrevie!

O Orador: - Isto é, não há possibilidade de se fazer uma autorização legislativa para o Governo legislar sobre esta matéria. Ora, não faria nenhum sentido, Sr.ª Deputada, que o Governo tivesse feito qualquer negociação formal com qualquer corpo da sociedade civil (Conselho de Reitores, Conselho de Politécnicos, faculdades, estudantes ou sindicatos) numa matéria que não é da nossa competência.
E vou explicar-lhe porquê.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Ministro, peço-lhe que termine!

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Quanto às vagas supletivas, tive oportunidade de, em duas ocasiões, dizer nesta Câmara, desta mesma bancada, que a questão das vagas estava, para nós, completamente ultrapassada e que devia ser colocada ao Parlamento pelos grupos parlamentares, tal como o fizeram. Aguardo, com enorme tranquilidade, que a lei seja publicada em Diário da República. Quando ela for publicada, nós, que somos um governo democrático, que dependemos da Assembleia da República, cumpriremos, se a lei for cumprível, aquilo que a lei disser, isto é, se tecnicamente, como eu aqui disse, a lei for exequível. VV. Ex.as saberão - eu também tenho a minha opinião -, mas na altura em que ela for publicada terei ocasião de referir isso.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, o debate está, nesta fase, mais do que esgotado.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Espero que seja mesmo uma interpelação, uma vez que eu ia terminar a reunião.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, verifiquei o seu sorriso, mas efectivamente vou fazer uma verdadeira interpelação sobre a condução dos trabalhos, partindo do pressuposto de que já acabámos este debate.

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O Sr. Presidente (João Amaral): - Sim, definitivamente!

O Orador: - Sr. Presidente, gostaria de saber, se possível, qual é o alinhamento das votações para amanhã, porque na última conferência de líderes tinha ficado assente, por consenso, que se faria um esforço para que a proposta de lei-quadro da educação pré-escolar, à qual o Governo atribui grande importância, fosse concluída, de forma a estar em condições para ser votada, amanhã, tendo em conta que só voltaríamos a ter votações daqui a um mês.
Aliás, pude testemunhar o empenho e a disponibilidade revelada por todos os grupos parlamentares - e aproveito, se o Sr. Presidente me permitir, para agradecer a disponibilidade que encontrei em, todos - para que esse esforço tivesse e fosse coroado de sucesso.
Neste momento, não disponho de qualquer informação, não sei se a Mesa dispõe, não sei, inclusive, se a Comissão de Educação já informou a Mesa, no sentido de saber se há ou não condições para, amanhã, se proceder à votação dessa proposta de lei, que o Governo reputa de essencial e estruturante para a reforma do sistema educativo que, como a oposição gosta de recordar, é a paixão deste Governo.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado, a Mesa informa que aguarda a entrega do texto para votação final global.
Entretanto, há alguns pedidos de palavra, que talvez digam respeito a esta matéria.
Sr. Deputado António Braga, é para dar uma informação sobre o trabalho da comissão?

O Sr. António Braga (PS): - Com certeza, Sr. Presidente. Creio que foi isso que foi solicitado.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, na qualidade de Vice-Presidente da Comissão de Educação e também por ter participado no grupo de trabalho, hoje, durante praticamente toda a tarde, devo informar a Câmara, uma vez que foi solicitado pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, o seguinte: estivemos debruçados sobre a proposta de lei, chegámos ao estudo do artigo 8.º, temos ainda algumas dúvidas sobre artigos anteriores, portanto, tanto quanto se afigura do que está construído até agora, não será possível concluir um texto final para votação final global amanhã.
Era esta a informação que tínhamos de dar à Câmara. Porém, o que quero sublinhar é que o empenho de todos os grupos parlamentares foi, justamente, no sentido de poder concluir um texto com esse objectivo, mas as dificuldades de construir o texto final em torno da discussão dos artigos em pormenor, levou-nos a ficar pelo artigo 8.º - recordo que a proposta de lei tem cerca de 23 artigos, portanto, fica praticamente impossível a condição de o ter pronto amanhã.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, creio que a questão está esclarecida.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, quero apenas, em alguns segundos, corroborar tudo quando foi dito por parte do PSD, sublinhando que a Assembleia da República teve, neste processo, um comportamento que considero não só acima de toda a suspeita mas sobretudo merecedor de todo o elogio. A Comissão Parlamentar de Educação desenvolveu um conjunto significativo de audições, coroou esse conjunto significativo de audições com um colóquio parlamentar que decorreu na Sala do Senado (que, aliás, foi aberto pelo Sr. Ministro da Educação), a relação entre o Governo e a Assembleia da República nesta matéria foi exemplar, o trabalho de relação com todas as instituições que, na área educativa, mais produzem, foi de relevo.
Esta é uma matéria relativamente à qual o trabalho enobreceu a Assembleia da República e no qual se destacaram todos os grupos parlamentares. Julgo que o desejo de todos era o de que fosse possível votar amanhã o texto final, mas o trabalho na especialidade não o permitiu, pelo que creio que agora haverá um segundo desafio: somos sensíveis à preocupação, que o Sr. Secretário de Estado enunciou, de não permitir que esta votação ocorra apenas daqui a cinco semanas. Creio que todos vamos encontrar a melhor boa-vontade para, em sede própria - que será a da Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares -, definir o momento para que o Plenário da Assembleia da República, com celeridade, possa proceder a essa votação final global.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma interpelação, também sobre esta matéria, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, quero apenas informar toda a Câmara que o PP junta os seus esforços ao esforço que acaba de ser manifestado por parte do Sr. Deputado Carlos Coelho por forma a que, com o máximo de brevidade, consigamos ter pronta essa lei que, para nós também, é de crucial importância.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Ainda sobre a mesma matéria, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, é-me difícil, como é evidente, acrescentar algo de muito mais significativo para além do que já foi dito nesta Câmara sobre esta matéria mas quero relevar particularmente o facto de que as dificuldades que encontrámos no sentido de levar a bom termo, em tempo útil, em termos de possibilidade de votação amanhã, a discussão desta proposta de lei, tiveram a ver, por um lado, com o pouco tempo de que dispusemos no sentido de, encontrar o máximo dos consensos possível e, por outro lado, com a própria complexidade da matéria que, ela mesma, penso ser digna de uma maior atenção para evitar conclusões excessivamente apressadas.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço desculpa, confesso, à partida, que é um abuso mas creio que é um bonito gesto

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(desculpem a imodéstia) que não podia deixar de fazer, depois das palavras que ouvi de todos os grupos parlamentares da oposição: em nome do Governo, quero manifestar o profundo reconhecimento que o Governo tem pelo empenhamento que todos revelaram em podermos obter uma boa Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar que a todos honraria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, perpassou, como todos temos disso plena consciência, por esta Câmara, dúvidas e, mais do que dúvidas, a infirmação expressa por parte da bancada do PSD, de alguns dos seus Srs. Deputados, relativamente a afirmações em período de campanha eleitoral feitas pelo candidato a Primeiro-Ministro, o Sr. Engenheiro António Guterres. O Sr. Primeiro-Ministro, neste Plenário, suscitou a possibilidade de que se obtivessem as declarações por ele então proferidas; uma estação de televisão, a SIC, no noticiário das 20 horas, acaba de pôr no ar essas declarações; por transcrição desse mesmo telejornal, essas declarações estão contidas nesta cassette.
Não nos foi possível fazer a transcrição absolutamente literal, ipsis verbis, das palavras do Sr. Primeiro-Ministro, mas, no essencial, foram as seguintes: na primeira fase da sua resposta, efectivamente, o Sr. Engenheiro António Guterres referiu que, desejavelmente deveríamos poder atingir, num prazo tão curto quanto possível, um nível de ordem dos 6% do PIB em despesas de saúde; depois, passado aquilo que não vale a pena ignorar como tendo sido uma gaffe na memória do Sr. Primeiro-Ministro relativamente às contas sobre o PIB, teve ocasião de voltar a dar o complemento político à sua resposta. Esse complemento foi do seguinte teor: "Também temos consciência de que não se podem fazer milagres e não posso dizer-vos que, daqui a um ano, ou dois, ou três anos, o número possa ser atingido. Seria, certamente, desejável mas há outras prioridades. Nenhuma promessa posso fazer".

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, creio que esta foi uma interpelação em forma de cassette!

Risos.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, julgo que o Sr. Deputado Jorge Lacão fez uma interpelação à Mesa e peço desculpa por não ter ouvido toda a sua interpelação mas penso que tem a ver com a questão da cassette, com o teor da cassette e tem a ver com o facto de uma estação de televisão, que gravou as declarações na altura proferidas pelo Sr. Primeiro-Ministro, concretamente a SIC, ter exibido há pouco - eu próprio tive ocasião de assistir - a parte final (chamemos-lhe assim) daquilo que o Sr. Primeiro-Ministro, eventualmente, teria dito...

Vozes do PS: - Eventualmente?! Disse!

O Orador: - Que disse - peço desculpa! Na sequência daquele excerto que, há pouco, aqui foi referido. A esse respeito gostava de dizer o seguinte: aquilo que os serviços do partido, hoje mesmo, na sequência da questão que aqui foi colocada, nos forneceram - a cassette do telejornal da altura em que passaram essas declarações - não coincide exactamente com aquilo que agora passou.

O Sr. José Magalhães (PS): - Eram os vossos telejornais!

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, nós ouvimos com atenção o Sr. Deputado Jorge Lacão, vamos ouvir agora o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Orador: - Peço imensa desculpa mas a cassette que entregámos ao Sr. Primeiro-Ministro, e que é a cassette que os serviços do partido nos entregaram, do telejornal, sem nenhum tipo de truncagem da nossa parte, apenas tem aquele excerto que aqui foi lido há pouco. Quero dizer, e julgo que o Sr. Primeiro-Ministro não me leva a mal, que, há pouco, numa conversa telefónica, o Sr. Primeiro-Ministro, a mim próprio, disse que tinha dito mais do que isso e eu tive ocasião de responder que, no telejornal e na cassette que tínhamos desse telejornal (era a minha convicção também na ocasião), apenas tinha saído a primeira parte. Julgo, mas não quero garantir - pediria mesmo ao órgão de informação em causa que o possa, de hoje para amanhã, comprovar - que no telejornal em causa só saiu o excerto que tivemos ocasião de aqui apresentar.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Isso foi a sua própria propaganda!

O Orador: - Numa estação privada de televisão, no caso concreto a SIC! A parte que hoje a SIC, para além dessa outra, acrescentou, julgo que, na altura, não foi para o ar.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, creio que será mais lesta a reunião se permitirem ao Sr. Deputado Marques Mendes concluir o seu raciocínio.
Sr. Deputado Marques Mendes, peço-lhe o favor de concluir.

O Orador: - Julgo que tenho sido, ao longo desta intervenção, correctíssimo a tentar repor os factos, incluindo pedir desculpas ao Sr. Primeiro-Ministro. Penso que não cometi nenhuma incorrecção ao contar uma conversa que tivemos há pouco mas fi-lo para tentar repor a situação. Ou seja, é uma questão factual que pode, perfeitamente, e deve, já que a questão chegou a este ponto, ser esclarecida. O que temos, sem nenhum tipo de truncagem da nossa parte, é um telejornal da SIC em que apenas foi passado o excerto que há pouco aqui foi lido; hoje, foi passado um excerto mais desenvolvido, que, do nosso ponto de vista, pelos dados que temos, não foi para o ar na altura própria, em Maio passado. Por isso é que nós dizemos que só assistimos, tal como os portugueses só assistiram, naturalmente, ao excerto que foi para o ar e que fala nos moldes que foram referidos.

O Sr. Ministro da Presidência (António Vitorino): - Isso não chega! Nós não somos mentirosos!

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O Orador: - Por isso, nós, no PSD, depois de confrontar a cassette em causa, voltamos a dizer, ipsis verbis, vírgula a vírgula, ponto a ponto, rigorosamente o mesmo que dissemos há pouco.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Um pouco mais de humildade não lhe fazia mal!

O Orador: - A nota final que peço ao Sr. Presidente é a seguinte...

O Sr. Ministro da Presidência: - Os senhores chamaram-nos mentirosos. Às vezes, é preciso pedir desculpa!

O Orador: - Já que esta questão se colocou, que é factual pelo que pode ser claramente esclarecida e clarificada, peço ao Sr. Presidente e à Mesa que, junto do órgão de informação em causa, clarifique se esta versão que aqui transmiti é verdadeira ou não é verdadeira - são os serviços do partido que nos dizem que é verdadeira mas gostaria da confirmação e acho que isso seria bom para todos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Marques Mendes, ouvi a sua interpelação, solicitando que a Mesa peça ao órgão de informação em causa que indique a parte da gravação que foi transmitida, creio que em Maio deste ano. A Mesa assim fará.
Entretanto, tenho também um pedido de interpelação do Sr. Primeiro-Ministro, a quem dou a palavra.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, todos, na vida, cometemos erros e eu, seguramente, tenho cometido muitos. Há uma coisa que, no entanto, tenho procurado fazer sempre na minha vida política: é pautá-la pelo amor à verdade. Devo dizer que o que me fere profundamente hoje não é o facto de se ter ou não apresentado uma versão truncada de uma cassette , mas o facto de, independentemente de qualquer cassette, tendo eu afirmado que tinha dito uma coisa, isso tivesse sido negado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - E mais: que tivesse havido a pressa de procurar humilhar-me em Plenário,...

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Credo!

O Orador: - ... com uma cassette truncada,...

Vozes do PSD: - Truncada?! Não foi truncada!

O Orador: - ... em que a totalidade das minhas afirmações não estavam contidas.
Não posso deixar de vos dizer que o que me fere não é a cassette ; o que me fere é o facto de, conhecendo-me como me conhecem, há tantos anos, e sabendo como sabem a forma como procuro fazer política, não acreditem naquilo que digo.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Luís Marques Mendes, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, também para uma interpelação, se me permite, e na mesma linha do Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Luís Marques Mendes, no quadro que está traçado evidentemente que, se me pede para usar da palavra, tenho que lha conceder.
Tem a palavra.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, julgo que é justo fazê-lo pelo que não invocarei a defesa da honra.
Sr. Primeiro-Ministro, permita-me que sublinhe três aspectos. O primeiro, só recordar aqui que foi o Sr. Primeiro-Ministro há pouco que, em jeito de interpelação à Mesa, requereu que fosse apresentada a cassette com as declarações em causa.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Integrais!

O Orador: - E o PSD foi junto dos seus serviços audiovisuais próprios, que são os que temos, e, na sua maior boa-fé,...

Voz do PS: - Não sejam aldrabões!

O Orador: - ... obtivemos a cassette do telejornal em causa. Fizemos dela entrega ao Sr. Primeiro-Ministro e disso aqui demos nota.
Primeira questão: Sr. Primeiro-Ministro, vai-me desculpar, pode V. Ex.ª estar irritado, perturbado com uma crítica que não foi pessoal mas política, mas quero dizer-lhe "cassette truncada não, Sr. Primeiro-Ministro!".

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A cassette não foi truncada.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Orador: - É o telejornal que temos. Não fizemos nenhuma truncagem e, por isso, não posso deixar passar em claro o que disse porque, como não questiono minimamente o seu carácter, a sua palavra e a sua seriedade, tenho o direito de exigir que o senhor não coloque minimamente em causa o meu carácter, a minha palavra e a minha seriedade.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Ministro da Presidência:.- Está a armar-se em vítima!

O Orador: - Segundo ponto: Sr. Primeiro-Ministro, permita-me que diga sobre esta questão só mais duas coisas. O Sr. Primeiro-Ministro pode e tem todo o direito de se armar em vítima.

Protestos do PS.

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15 DE NOVEMBRO DE 1996 453

O Sr. Ministro da Presidência: - Essa é demasiadamente forte!
Então, os senhores mentem?!...

O Orador: - É uma forma de o fazer,...

Protestos do PS.

... porque não há motivo para pedir desculpas face aos factos que apontei.
Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Ministro da Presidência, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, para o caso de ter ficado registado há pouco um aparte, que me pareceu ouvir da bancada, acerca de mentir e mentirosos, quero dizer, cara a cara, o seguinte: luta política é uma coisa, palavra é outra.

O Sr. Ministro da Presidência: - Está-se a fazer de vítima agora!

O Orador: - Nenhum de nós, deste lado, fala de falta de carácter, de falta de palavra ou de mentirosos relativamente a alguma pessoa desse lado...

Protestos do PS.

... mas não admitimos palavras como "mentir, mentirosos, falta de carácter" dirigidas a esta bancada.
Um pouco mais de bom-senso e equilíbrio valia a pena!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Em nota finalíssima, só para, em jeito político, dizer que o Sr. Primeiro-Ministro, naquilo que temos e que apresentámos, não definiu um prazo, demonstrou um desejo, o que no contexto político é claramente a evidência de um compromisso, pois em termos políticos tem esse valor; a verdade é que sem prazo mas falando em 6% tem o valor de um compromisso político. Permita-me que lhe diga, em jeito de leitura política, o seguinte: enquanto deu jeito até às eleições para conquistar votos não se desmentiu, a partir daí vem-se desmentir e agora fica muito incomodado com aquilo que é, aos olhos do povo português, um compromisso politicamente assumido perante o País!

Protestos do PS, batendo com os punhos nas bancadas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, apesar de tudo, há formas mais correntes de expressar satisfação ou indignação do que as que têm a ver directamente com o material.
Srs. Deputados, tenho um problema, talvez pudéssemos fazer um intervalo para jantar.

Risos.

Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, vejo o seu dedo - aliás, a coisa que mais vejo é o seu dedo, bem como outros.
Vou dar-lhe a palavra, suponho que para interpelar a Mesa, no sentido de encerrarmos os problemas.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, as minhas palavras são precisamente no sentido de interceder junto de V. Ex.ª para que pudéssemos parar os trabalhos de hoje porque creio que nos arriscamos todos a chegar a um ponto em que beliscaremos o saudável relacionamento pessoal entre todos e que entre adversários políticos deve subsistir.
O Sr. Presidente, tal como eu, era Deputado na anterior legislatura, o Dr. Luís Marques Mendes não foi. E na anterior legislatura houve um facto que me marcou profundamente (creio que marcou todos os Deputados nessa legislatura), que ainda há dois dias tive oportunidade de recordar ao Sr. Deputado Luís Queiró. Aquando dum debate com a presença do então Primeiro-Ministro o Sr. Deputado Manuel Queiró imputou ao Sr. Primeiro-Ministro uma frase que ele teria proferido. Gerou-se grande polémica nessa altura. No dia seguinte o Sr. Deputado Manuel Queiró deu a todos nós uma grande lição de lisura parlamentar e cívica quando nesta Câmara, em interpelação à Mesa, pediu desculpas pessoais e políticas ao então Primeiro-Ministro porque tinha elaborado num erro e tinha-lhe imputado um facto que tinha verificado não ser verdadeiro.
Ocorreu-me este facto porque me marcou e creio que nos marcou a todos nós.
Sr. Presidente, se fosse possível encerrar este debate era bom que fosse com saudade do carácter do Sr. Deputado Manuel Queiró.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado, quando houver uma vontade política bem definida encerro o debate.

Pausa.

Srs. Deputados, creio que estão reunidas as condições para o fazermos.
Na sessão de amanhã teremos as intervenções finais e seguidamente as votações nas quais incluiremos a votação de uma lei sobre infracções fiscais não aduaneiras.
A sessão de amanhã será às 10 horas e 30 minutos.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 55 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Albino Gonçalves da Costa.
António Bento da Silva Galamba.
António José Gavino Paixão.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Cláudio Ramos Monteiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Garcia dos Santos.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Joaquim Moreira Raposo.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José de Matos Leitão.

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454 I SÉRIE - NÚMERO 12

José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Moreira Barbosa de Melo.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madaíl.
João Álvaro Poças Santos.
João Calvão da Silva.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Macário Custódio Correia.
José Mendes Bota.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Popular - Partido Popular (CDS/PP):

Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António de Almeida Santos.
Carlos Manuel Luís.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raúl d' Assunção Pimenta Rêgo.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.

Partido Social Democrata (PSD):

António Paulo Martins Pereira Coelho.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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456 I SÉRIE - NÚMERO 12

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