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Sexta-feira, 7 de Fevereiro de 1997 1301

I Série - Número 36

DIÁRIO Da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997) .

REUNIÃO PLENÁRIA DE 6 DE FEVEREIRO DE 1997

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.
Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira (PCP) interpelou a Mesa no sentido de saber da existência ou não de alguma subcomissão da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 83.º do Regimento, o Sr. Ministro da Economia (Augusto Mateus) deu conta à Assembleia da forma como está, a desenrolar-se o chamado Plano Mateus. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Galvão Lucas (CDS-PP). Joel Hasse Ferreira (PS), Vieira de Castro (PSD), Lino de Carvalho (PCP) e Henrique Neto e Manuel dos Santos (PS).
Em declaração política, a Sr. Deputado Heloísa Apolónia (Os Verdes) criticou a estratégia do Governo relativamente à gestão e tratamento de resíduos e respondeu ao pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP).
O Sr. Deputado Calvão da Silva (PSD) trouxe à colação os principais problemas que afectam o distrito de Coimbra, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Carlos Beja (PS).
O Sr Deputado Pedro da Vinha Costa (PSD) teceu considerações acerca do que considerou ser a utilização indevida do aparelho do Estado por autarquias de maioria .socialista, no distrito do Porto. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP) e José Saraiva (PS).
O Sr. Deputado .José Junqueiro (PS) abordou questões relativas à distribuição de verbas pelas autarquias locais; respondendo, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Pedro da Vinha Costa (PSD), Luís Só (PCP) e Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP) - que também usou da palavra em defesa da honra e consideração da bancada.
Ordem do dia.- Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os l6/VII - Regime jurídico das comissões eventuais de inquérito (PS), 24/VII - Altera o regime jurídico dos inquéritos parlamentares (PSD) e 245/VII - Alteração do regime jurídico dos inquéritos parlamentares (PSD). Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados António Filipe (PCP), Guilherme Silva e Luís Marques Guedes (PSD), Jorge Ferreira (CDS-PP), Nuno Baltazar Mendes (PS) e Miguel Macedo (PSD).
Entretanto, foram rejeitados, na generalidade, os projectos de lei n.os195/VII - Lei-quadro de apoio ao associativismo (PCP), 260/VII. Reembolso dos montantes pagos a título de propinas de matrícula ou de inscrição (CDS-PP) e 271/VII - Reembolso de propinas do ensino superior pagas nos anos lectivos de 1992 a 1995 (PSD).
A Câmara aprovou também três pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando Deputados do PS e do PSD a deporem, como testemunha, em tribunal.
Foi ainda apreciado, na generalidade, o projecto de lei n.º 132/VII - Sobre extinção da enfiteuse ou aforamento (PS), tendo proferido intervenções os Srs. Deputados Arnaldo Homem Rebelo (PS). Antonino Antunes (PSD), Luísa Mesquita (PCP) e Luís Queiró (CDS-PP). No final, o projecto de lei foi aprovado por unanimidade e aclamação.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 30 minutos.

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Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Póvoas.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos requerimentos que deram entrada na Mesa, bem como das respostas recebidas.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa vários requerimentos. Na sessão plenária de 30 de Janeiro: ao Sr. Primeiro Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Pacheco Pereira; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Castro de Almeida; ao Ministro da Presidência, formulado pela Sr.ª Deputada Eduarda Azevedo; aos Ministérios para a Qualificação e o Emprego e do Equipamento, do
Planeamento e da Administração do Território, formula dos pelo Sr. Deputado Hermínio Loureiro; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira;
aos Ministérios do Ambiente e da Saúde, formulado pela Sr.ª Deputada Lucília Ferra; ao Ministério da Justiça e à Secretaria de Estado da Juventude, formulados pelo Sr. Deputado Soares Gomes; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; a diversos Ministérios, formulado pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto; ao Ministério da Defesa Nacional e à
Câmara Municipal de Alcobaça, formulados pelo Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa; ao Ministério do Ambiente, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro, e à Câmara Municipal de Setúbal, formulado pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
Na. sessão plenária de 31 de Janeiro: ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Mota Amaral; ao Ministério para a Qualificação e o Emprego, formulado pelo Sr. Deputado Soares Gomes; ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira; às Secretarias de Estado da Cultura e do Tesouro e das Finanças, formulados pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; à Presidên-

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cia do Conselho de Ministros e ao Ministério da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Luís Sá; aos Ministérios da Defesa Nacional e do Ambiente, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; ao Ministério da Cultura e à Junta de Freguesia do Ninho do Açor, formulados pelo Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados. No dia 31 de Janeiro: Jorge Ferreira, na sessão de 16 de Outubro; Costa Pereira, Fernando Pedro Moutinho, Francisco José Martins e Martinho Gonçalves, nas sessões de 30 de Outubro, 6 e 28 de Novembro e no dia 3 de Dezembro; Sérgio Vieira, no dia 5 de Novembro; Roleira Marinho, Miguel Ginestal e Manuel Alves Oliveira, na sessão de 7 de Novembro e no dia 25 de Novembro, 'e Macário Correia, na sessão de 13 de Novembro.
No dia 4 de Fevereiro: Luís Veríssimo, na sessão de 4 de Junho; Isabel Castro, na sessão de 6 de Novembro; Lino de Carvalho e Luís Nobre, no dia 19 e na sessão de 28 de Novembro; Gonçalo Ribeiro da Costa, no dia 25 de Novembro; Macário Correia, no dia 26 de Novembro; Sérgio Vieira, na sessão de 10 de Dezembro, e João Rui Almeida, na sessão de 12 de Dezembro.

O Sr. Presidente: - Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, a prática estabelecida até hoje, e que queremos manter, é a de que as intervenções do Governo, ao abrigo do artigo 83.º, n.º 2, do Regimento, só têm lugar no fim do período de antes da ordem do dia. Acontece que o Sr. Ministro da Economia tem de estar em Trás-os-Montes, às 17 horas e 30 minutos, pelo que pergunto se os líderes das bancadas dão assentimento a que, excepcionalmente e sem prejuízo da prática referida, o Sr. Ministro da Economia use da palavra, desde já, com precedência sobre todas as outras matérias do período de antes da ordem do dia. Seria, pois, uma intervenção a título excepcional, sem quebra da prática habitual. Pergunto-lhes, então, Srs. Deputados, se dão esse assentimento.

Pausa.

Muito bem, Srs. Deputados, vejo que não se opõem.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação vai no seguinte sentido: nos últimos dias, a comunicação social tem referenciado a existência de uma subcomissão da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, que seria constituída pelos Srs. Deputados José Magalhães e Luís Marques Guedes.

Risos do Deputado do PS Jorge Lacão.

O meu grupo parlamentar desconhece a existência de uma qualquer subcomissão da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. O que conhecemos e sabemos é que a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional tem vindo a reunir "em negócio" representantes de dois grupos parlamentares, concretamente do PS e do PSD.
Parece-me que o "negócio escrito" tem vindo a ser elaborado por esses Srs. Deputados, referenciados como pertencentes a uma subcomissão, do nosso ponto de vista, inexistente e tem havido também alguns jantares, em que, pelos vistos, se traçam as orientações para que os Deputados "escrivãos" - sem ofensa para qualquer desses Srs. Deputados - possam tomar nota dos resultados e dos consensos derivados das orientações dos dois líderes parlamentares.

Risos do PS e do PSD.

Nesse sentido, Sr. Presidente, solicito-lhe que esclareça a Câmara, a comunicação social e o País sobre se existe, ou não, alguma subcomissão da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. É que, se existir, nós teremos de desenvolver todos os procedimentos para saber como ela foi constituída sem o conhecimento do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, a subcomissão só poderia existir sendo autorizada pelo Presidente da Assembleia da República. Como não me foi solicitada tal autorização, não pude pronunciar-me sobre ela.
Srs. Deputados, vou, então, dar a palavra ao Sr. Ministro da Economia, como .disse, a título excepcional. Os tempos concedidos são os que constam do painel: o Sr. Ministro dispõe de 10 mais 5 minutos, respectivamente para uma intervenção inicial e para uma intervenção final, e os 20 minutos previstos pelo Regimento para o debate foram distribuídos já anteriormente, pelo que seguimos essa prática, de acordo com o que consta do painel.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia (Augusto Mateus): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, em primeiro lugar, quero agradecer a todos os grupos parlamentares a oportunidade que me deram de conciliar a importância do funcionamento desta Casa com o calendário relativamente apertado que tenho hoje.
A minha vinda hoje aqui tem basicamente a ver com um aspecto que considero fundamentalmente importante e com uma prática que julgo ser a adequada aos desafios existentes na nossa sociedade e na nossa economia e que consiste em valorizar sistematicamente o Parlamento, quando estão em causa aspectos fulcrais do desenvolvimento da nossa economia.
Como sabem, o Conselho de Ministros aprovou, em Maio do ano transacto, uma resolução que visava estabelecer um quadro de acção para a recuperação de empresas em situação financeira difícil, quadro esse que está a funcionar e que permitiu, no horizonte traçado para uma primeira fase da sua operacionalização em matéria de regularização de dívidas ao fisco e à segurança social, obter os resultados ontem divulgados, que podem sintetizar-se no seguinte: ultrapassada a fasquia dos 500 milhões de contos de dívidas ao fisco e à segurança social, com cerca de 185 000 pedidos de regularização, do ponto de vista das dívidas apuradas, capital mais juros, ficaremos entre os 520 e os 550 milhões de contos e, do ponto de vista das cobranças, entre os 430 e os 450 milhões de contos, uma vez que, ao nível dos juros, há todo um conjunto de

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correcções, feitas com a legislação produzida. Em termos de dívidas à segurança social, o valor situar-se-á entre 100 a 125 milhões de contos; em termos de impostos recuperados, o imposto dominante é o NA, com 52,5%, seguindo-se o IRC e o IRS, com cerca de 35%.
Mas o aspecto fundamental, que gostaria de salientar, em primeiro lugar, é o de que, ao contrário de perspectivas sempre pessimistas e sempre negativas em relação a aspectos fulcrais de recriação da confiança na economia portuguesa, foi possível obter um resultado que, falando por si - não vou falar sobre ele -, é suficientemente expressivo, do ponto de vista da sua objectividade. E tal resultado só foi possível, porque, pela primeira vez, se traçou um quadro contendo dois aspectos decisivos: em primeiro lugar, tratou-se de o Estado assumir simultaneamente a função de um credor que age em nome dos contribuintes cumpridores e que o faz com rigor e autoridade; depois, operou-se uma viragem fundamental na economia e na sociedade portuguesa, no sentido de pôr fim a uma situação de permissividade fiscal...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... e de inacção da máquina fiscal e de acabar com o flagelo da concorrência não leal na economia portuguesa. Um conjunto significativo de empresas entrou em dificuldades e, ao entrar em dificuldades, encontrou no não pagamento das suas obrigações fiscais uma tentativa artificial de sobreviver. Ora, isso acabou, em Portugal. E os dados que este plano obtém em matéria de regularização de dívidas são claros do ponto de vista daquilo que virou em Portugal.
Contudo, isto só foi possível, porque, pela primeira vez, o Estado português não se apresentou como um Estado que só pensa em arrecadar receitas. O Estado português apresentou-se, através da resolução aprovada pelo Conselho de Ministros, como um Estado que actua nos dois planos em que é necessário actuar: por um lado, com firmeza e autoridade, criando um quadro de responsabilidade na administração fiscal, e, por outro, dando condições efectivas aos contribuintes, sejam eles contribuintes individuais ou empresas, para fazerem do correcto e atempado cumprimento das obrigações fiscais o seu dia-a-dia.
É essa articulação entre recuperação de empresas, entre dinamização da economia portuguesa, e autoridade e rigor na administração fiscal que está longe de ser compreendida por alguns dos críticos desta acção do Governo, que, curiosamente, oscilam, de forma sistemática, entre a crítica à debilidade dos números de recuperação de dívidas ao fisco e à expressão deste quadro de acção em matéria de empresas.
Entendamo-nos: não teria sido possível chegar a esta situação, sem que, pela primeira vez, como disse, se pudessem articular rigorosamente estas duas vertentes.
Por outro lado, criou-se um sistema e não mais uma intervenção casuística, uma intervenção ao sabor de critérios muitas vezes duvidosos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E foi possível alcançar esta situação, porque o Governo actuou no seu conjunto, coordenadamente, criando formas de intervenção' decisivas do ponto de vista da coordenação interministerial, o que permitiu perceber que, para o conjunto da sociedade, as coisas iriam mudar - e mudaram.
Acentuaria aqui um aspecto fundamental, que é o de que, ficando fora de causa a dimensão daquilo que se obtém em termos de regularização de dívidas ao fisco e à segurança social - e, repito-o, em termos de pôr fim a uma situação de concorrência não leal, onde aquilo que acontece, como sabem, é os empregos em empresas artificialmente conservadas acabarem por afectar os empregos de empresas que tinham condições para funcionar adequadamente -, esta situação vai ser consolidada com o processo de recuperação de empresas. E, aqui, deixo uma pequena nota: com muita frequência, detectam-se na opinião pública algumas confusões entre o que é o processo de regularização de dívidas e o processo de recuperação de empresas. São dois processos, que, insisto, têm de estar articulados, mas que não se confundem. Ao contrário do que muitos tentaram afirmar, este quadro de acção não terminou em 31 de Janeiro; o que terminou em 31 de Janeiro foi uma oportunidade excepcional e inequivocamente não repetitível em matéria de moralizar a situação fiscal e regularizar dívidas.
Até ao final da legislatura e do II Quadro Comunitário de Apoio a Portugal, nós teremos um quadro de acção que vai permitir a recuperação de empresas pelos próprios gestores e proprietários das empresas, tenham ou não dívidas - e, ao contrário do que também se tentou fazer crer, este quadro de acção é, em' primeiro lugar, para as empresas sem dívidas ao fisco ou à segurança social e, de forma inovadora, com mudanças na propriedade e na gestão, seja através do acesso de quadros à função empresarial por meio dos MBO e dos MBI, no calão economista, seja através da aquisição de empresas em dificuldade por empresas dinâmicas e com oportunidades de crescimento.
Os casos aí estão para o demonstrar: em dois meses de trabalho, o Gabinete Coordenador de Recuperação de Empresas já organizou mais de duas centenas de processos, que 'envolvem mais de 30 000 postos de trabalho e empresas com vendas superiores a 150 milhões de contos, o que não se pode comparar, obviamente, com o mecanismo que estava e continua em funcionamento, que é a recuperação judicial de empresas, onde, por exemplo, ao longo do ano de 1996, entraram cerca de 189 casos. Ou seja, em dois meses fez-se cinco vezes mais do que acontecia em Portugal através do processo de recuperação judicial e, sobretudo, fez-se de uma forma muito mais atempada, muito mais no domínio da medicina preventiva dó que da curativa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Gostaria de salientar também que as interrogações permanentes sobre o número de empresas que aderiram ou não merecem duas respostas fundamentais.
Em primeiro lugar, as empresas não se inscrevem para serem recuperadas, não preenchem um formulário para serem recuperadas, a recuperação de empresas envolve uma articulação entre a propriedade, a gestão, o sistema financeiro e os credores, que tem de ser feita com extremo rigor e ao longo de um período que permita introduzir mudanças substanciais na propriedade, na gestão, nos mercados, na tecnologia e na dimensão do emprego, e esse processo envolve, obviamente, todo um conjunto de situações que não se compadecem com o preenchimento de um formulário.

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Em segundo lugar, convém ter a noção de que a própria economia portuguesa é dinâmica, e daria apenas um número para se entender que a dimensão das empresas em recuperação é variável ao longo do tempo. Se atendermos a que, no princípio deste ano, a indústria transformadora tinha uma tendência de crescimento que se avaliava emn 0.5% e que os dados do trimestre que termina em Novembro de 1996 revelam uma tendência de crescimento superior a 5% ou, se quiserem, que os sectores de actividades mais atingidos pela crise do princípio dos anos 90, sectores como o têxtil, a confecção, a madeira, a cortiça, entraram o ano com tendência de crescimento muitas vezes rondando os (-)10% e hoje estão todos com tendência de crescimento superiores a 10%, isso significa, obviamente, que a economia portuguesa tem uma clara recuperação da sua actividade económica, que é evidenciada por todos os indicadores e cria, por si só, um quadro completamente diferente para a recuperação de empresas.
Portanto, o Governo, com toda a serenidade, apresentará permanentemente ao Parlamento, aos agentes económicos e às associações empresariais os factores que aqui estão presentes.
Terminaria, dizendo que este quadro de acção para a recuperação de empresas envolve três objectivos fundamentais: aumento da capacidade empresarial; aumento da acção do Estado do ponto de vista da sua celeridade, da sua coordenação e da sua eficiência; e alteração do relacionamento entre a chamada economia real e o sistema financeiro.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, peço-lhe que termine, porque já ultrapassou o tempo.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Os instrumentos foram criados e são os seguintes: um novo sistema de garantia de empréstimos, com o Estado a assumir responsabilidades ao nível da assunção de riscos; um gabinete coordenador ,da recuperação de empresas, onde todos os ministérios com intervenção estão presentes; um novo conjunto de instrumentos ao serviço do reforço da capacidade empresarial. No essencial é disto que se trata.
A regularização de dívidas ao fisco e à segurança social criou para todos, objectivamente, um quadro novo na economia portuguesa, que é um quadro de confiança, de moralização, autoridade e respeito, que vai pôr fim à concorrência desleal e criar condições para consolidar o crescimento económico. Este é um dado fundamental.
O Governo continuará, com rigor, a criar um sistema e as condições para que, em Portugal, estas empresas possam ser recuperadas e possam articular-se com aquilo que é o tecido fundamental da nossa economia, que é um tecido que aumenta a competitividade e se internacionaliza, criando mais e melhores empregos na nossa economia e criando aquilo que a muitos dói, mas que é uma economia que cresce, que estabelece confiança e que tem efectivas condições de consolidar o que está a fazer no caminho da moeda única, para aproveitar para a Europa e para Portugal uma nova oportunidade de desenvolvimento e de pôr a economia ao serviço da população.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Galvão Lucas.

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, no curto espaço de tempo de que disponho, queria transmitir, desde já, ao Sr. Ministro que este plano, a que foi dado o seu nome, foi, desde o início, olhado pela nossa bancada e pelo nosso partido com algumas dúvidas. Desde logo, porque não era claro para nós que se conseguisse essa articulação entre uma simples recuperação de dívidas ao fisco e à segurança social e uma verdadeira política de recuperação de empresas em situação difícil, visando, nomeadamente, o seu reforço em termos financeiros, a manutenção dos postos de trabalho, enfim, a manutenção das empresas com um mínimo de saúde, que lhes permitisse sobreviver num quadro de acrescidas dificuldades.
A evolução havida, quer com a legislação que, entretanto, tem sido produzida, quer com aquilo a que fomos assistindo, não nos entusiasma, para dizer com toda a sinceridade, em demasia, porque, de facto, não é claro para nós que este instrumento não venha a ser uma repetição (e aí Deus queira que eu esteja enganado, que estas dúvidas não se confirmem) daquilo que, na altura, se considerou como sendo uma solução do mesmo tipo, a que se chamou Lei Catroga.
Toda e qualquer comparação em termos daquilo que já se cobrou em pagamentos a pronto ou que, efectivamente, se vai cobrar em prestações é uma comparação que não tem, necessariamente, de se fazer nem se deve fazer, até porque, em minha opinião e com todo o respeito que tenho por V. Ex.ª, não faz qualquer sentido dizer-se que, nos próximos 10 ou 12 anos, as empresas vão pagar 100; 120, 150, 200 ou 300 milhões de contos. Hoje em dia, 12 anos na vida de uma empresa ou de um projecto empresarial é uma eternidade e ninguém sabe o que é que vai acontecer ao futuro da nossa economia ou a essas empresas e, portanto, isso, que é demasiado fácil fazer 'em termos de previsão, é, provavelmente, de muito pouco interesse para os empresários, para os trabalhadores e para a economia portuguesa, que interessa salvaguardar e manter activa neste .momento.
Tínhamos também algumas dificuldades em aceitar um instrumento deste tipo, porque, de alguma forma, ele vem legitimar aquilo que vulgarmente se designa por "o crime compensa", uma vez que houve uma série de empresas que ao longo destes anos foram cumprindo com as suas obrigações, pagaram os seus impostos e as contribuições à segurança social e concorreram no mercado e que sofreriam a concorrência desleal por parte de empresas que não cumpriram com essas obrigações, alegando as mais variadas razões, em muitos casos justas ou aceitáveis.
Mas o que é facto é que, ao introduzir este tipo de legislação, ainda que com a promessa de que é a última vez, está-se, de alguma forma, a legitimar um comportamento que não foi correcto e não se está a compensar os empresários que cumpriram. Não se pede que haja compensação para isso, pois não se espera compensação quando se procede como deve ser, mas o que é facto é que, na realidade, quem não cumpriu com a lei incorreu claramente em crime e acaba por ver, mais uma vez, o seu problema resolvido ou, pelo menos, enquadrável numa solução.
Portanto, estes eram os aspectos que nos suscitavam algumas dúvidas e sobre os quais agradecíamos que pudesse acrescentar mais alguma coisa.
Nada disto resultará se a fiscalização não funcionar. Não funcionou no passado, continua a não funcionar e, se não

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funcionar no futuro, daqui a dois, três ou quatro anos, teremos o mesmo problema.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que sintetize a sua ideia, porque já gastou o seu tempo.

O Orador: - Sr. Ministro, já agora, pedia-lhe também um esclarecimento, porque já é o segundo dia consecutivo em que há notícias sobre isso. O que é que se passa, efectivamente, em relação àquilo que a União Europeia pretende fiscalizar? Pretende mesmo analisar cada caso em que os apoios sejam superiores a 20 000 contos, ou não?
este último entendimento que julgo ser o adequado e que deve prevalecer.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, queria começar por fizer uma saudação a V. Ex.ª e aos seus colegas do Governo não só pela apresentação mas também pela execução deste plano, nas fases que, até agora, se verificaram, e congratular-me pelos resultados já alcançados e pelos efeitos a prazo que julgo que estes resultados terão na própria reconversão do tecido empresarial.
Trata-se, efectivamente, como foi dito e tem sido visto, de um programa de recuperação das dívidas, o que implica e vai certamente contribuir para uma nova ética nas relações com o fisco, mas, em meu entender, também é importante termos consciência da necessidade de não só fazer a reforma fiscal como de modificar e aperfeiçoar a máquina fiscal.
Sr. Ministro da Economia, queria colocar-lhe duas questões.
Primeira, até que ponto é que o conjunto de mecanismos previstos no plano em relação às empresas que recorreram a instrumentos de apoio mais complexos e sofisticados pode vir a contribuir para a almejada renovação da classe empresarial, que, a meu ver, será um aspecto fundamental na reconversão do tecido económico português e na modernização global da nossa economia?
Segunda, até que ponto pensa V. Ex.ª que, não só na óptica da cobrança já verificada como na óptica da dinâmica que se terá criado, associando essa cobrança a um conjunto de mecanismos mais complexos que estavam ausentes de outros instrumentos anteriormente utilizados, a aplicação deste plano, não só o que já foi feito com o seu desenvolvimento, poderá vir a contribuir para, tendo libertado da perspectiva de sufoco e asfixia financeira pelos custos muito elevados do pagamento das dívidas, galvanizar um conjunto muito significativo de empresas que, não tendo recorrido aos instrumentos mais complexos, regularizaram a sua situação perante o fisco e a segurança social e poderão estar em melhores condições para contribuírem para a dinamização da economia nacional?
Eram estas as duas questões que gostaria de lhe colocar.
Queria felicitá-lo, mais uma vez, pela maneira como este plano está a correr.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, vou dizer-lhe, com toda a franqueza, que contava que V. Ex.ª nos fizesse aqui uma intervenção plena de entusiasmo e este meu raciocínio assentava no brilho dos holofotes da cerimónia que ontem decorreu no Ministério das Finanças. Acenderam-se as luzes no Ministério das Finanças, mas, francamente, aquilo que V. Ex.ª e, hoje, aqui nos veio trazer foi um coto de uma vela com um pavio mal aceso!

Risos do PSD.

O Sr. Ministro disse que os números falavam por si e eu estou em desacordo com V. Ex.ª Vou citar-lhe um exemplo: disse V. Ex.ª que as dívidas à segurança social que iriam ser objecto de acordo poderiam variar, se ouvi bem, entre 100 e 150 milhões de contos.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - 105 milhões de contos!

O Orador: - Sr. Ministro, peço desculpa, mas um intervalo com esta ordem de grandeza não se apresenta em lado algum.

Risos do PSD.

O Sr. Ministro começou a sua intervenção dando-nos a ideia de que, afinal, o mundo, em matéria fiscal, tinha começado hoje e que, no passado, nunca houve planos de recuperação de empresas nem sequer existia máquina fiscal.

Vozes do PS: - Apoiado! Apoiado!... Bem lembrado!

O Orador: - Pois bem, foi o Governo, a que o Sr. Ministro pertence, que reconheceu, no relatório do Orçamento do Estado para 1997, ter anulado as execuções fiscais em resultado das perspectivas que criou com o plano de recuperação de empresas, a que eu não junto o apelido de V. Ex.ª por pensar que não merece ser adicionado a um plano que é um fracasso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro, em Maio de 1996, V. Ex.ª disse que previsivelmente este plano iria ser aplicado a 2500 empresas, que empregavam 300 000 trabalhadores. Já não vou falar deste número, porque o Sr. Ministro fez uma revisão em baixa em Novembro de 1996, dizendo nessa altura serem 1500 empresas, às quais correspondiam 100 000 postos de trabalho. Hoje, o Sr. Ministro disse que o GACRE já recebeu candidaturas de duas centenas de empresa, ou à volta disso, mas, depois, deixou-nos na dúvida ao dizer que, em boa verdade pelo menos eu entendi assim -, nunca se poderia apurar esse número por a recuperação não se compadecer com o preenchimento de um formulário. O Governo não sabe quantas empresas vão recorrer ao plano de recuperação mas em contrapartida, e estranhamente, sabe que todos os clubes de futebol vão recorrer ao plano de regularização das suas dívidas.
O número de empresas a quem este plano será aplicado, para nós, é fundamental, Sr. Ministro, porque, de duas uma: ou são 2500 que representam 300 000 postos de trabalho e o País estava de facto numa situação muito má

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ou, então, esse número é escasso e o País não estava tão mau quanto o Governo o pintava.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS):.- Está um pouco confuso! Só o Deputado Carlos Coelho é que aplaude!

O Orador: - Sr. Ministro, para terminar, digo-lhe e é o que hoje, seguramente, vai sair deste debate - que o Governo fez três coisas bem feitas:...

Vozes do PS: - Apoiado!

O Orador: - ... uma operação de marketing em Maio, quando apresentou o plano; uma operação de marketing, bem feita, ontem, no Ministério das Finanças; e, hoje, a operação de marketing que o Sr. Ministro aqui tentou fazer já não foi assim tão bem sucedida! Seja como for, não é o marketing que salva as empresas e, Sr. Ministro, governar não é só fazer operações de marketing.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, a Mesa começou por nos informar que o Sr. Ministro estava com alguma pressa, porque tinha um compromisso em Bragança.

O Sr. Ministro da Economia: - Em Vila Real!

O Orador: - Sr. Ministro, permita-me, com toda a cordialidade, que lhe diga que talvez tivesse sido preferível ter viajado para Bragança...

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Para Vila Real!

O Orador: - ... para Vila Real, rectifico, e ter, desse modo, evitado este debate, porque a informação que o Sr. Ministro aqui traz é a mesma ou, porventura, menos do que a dada nas conferências de imprensa e nos telejornais, que todos ouvimos ontem. O que o Sr. Ministro vem aqui fazer é o rescaldo requentado da operação mediática que fez ontem ou anteontem, e isso é uma ausência de respeito para com a Assembleia da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro pode fazer as conferências que quiser, mas, pelo menos, venha primeiro informar a Assembleia da República daquilo que entende, através dela, informar o País, e só depois faça as conferências de imprensa que quiser. Inverter o processo é obviamente uma falta de respeito para com a Assembleia da República. E, por isso,- Sr. Ministro, é que eu digo que este debate está hoje requentado e ultrapassado. O Sr. Ministro poderia ter ido para Bragança à vontade,...

O Sr. Ministro da Economia: - Para Vila Real!

O Orador: porque o que tínhamos a ouvir e a dizer já ouvimos e dissemo-lo ontem à comunicação social, quando esta nos interpelou. Esta é uma questão de princípio e de cultura democrática, Sr. Ministro!
Quanto aos êxitos do Plano Mateus ou, como, aliás, ontem aqui disse muito bem o Sr. Deputado Manuel dos Santos, do impropriamente chamado Plano Mateus - e o Sr. Ministro sabe que somos favoráveis a processos de recuperação de empresas e de combate à fraude, expressámos essa nossa posição de princípio aqui aquando do debate da apresentação do impropriamente chamado Plano Mateus -, aquilo que hoje eu digo, Sr. Ministro, é que não deite foguetes antes da festa, como costuma dizer o nosso povo. O Sr. Ministro tem um conjunto de compromissos, alguns dos quais feitos por gestores de negócios, como é o caso dos clubes de futebol, e vamos ver até onde eles se traduzem em assumpção concreta de pagamentos de dívidas ao Estado.
Mas, mesmo nesse plano, o Sr. Ministro veio aqui acusar alguém, presumo que a oposição, de estar a confundir regularização de empresas com recuperação de dívidas ao Estado. Sr. Ministro, se alguém confundiu alguém, foi o Governo e o Partido Socialista, porque foram os senhores que começaram por fazer deste Plano um plano de recuperação de empresas. O debate de urgência solicitado pelo PS a propósito dos decretos-leis dizia "debate de urgência sobre recuperação de empresas em crise e emprego". É assim o título do documento saído do Ministério da Economia. O que acontece, Sr. Ministro, é que nesse contexto o Plano parece ser um fracasso, porque estamos não perante um plano de recuperação de empresas - e já não se fala nas 1500 nem nas 1000, parece que é um universo de 200 - mas de um plano de recuperação de dívidas ao Estado e à banca. É positivo que assim seja, mas, então, chamemos as coisas pelos seus nomes e não lhe dêmos a dimensão que não têm.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, peço-lhe que termine, pois já esgotou o seu tempo.

O Orador: - Portanto, Sr. Ministro, a questão que colocámos é esta: este Plano vai levar â recuperação de empresas, à recuperação de sectores económicos? Que tradução vai ter na defesa dos postos de trabalho? Como é que ele se articula com os compromissos públicos assumidos pelo Governo?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o maior partido da oposição, passado todo este tempo de debate sobre esta questão, continua a não compreender, a não perceber, a diferença entre recuperar dívidas e recuperar empresas, o que, decorrido todo este tempo, é espantoso.
Ó Srs. Deputados, recuperar dívidas foi aquilo que os senhores tentaram fazer sem grande sucesso durante anos, porque as dívidas foram-se acumulando ao longo do tempo.

Protestos do PSD.

Recuperar empresas, compreende-se que não saibam o que é, porque nunca o tentaram fazer!

Aplausos dos PS.

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Recuperar empresas não é uma coisa que se faça por decreto,...

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Mas é o que o Governo tem estado a fazer!

O Orador: nem é uma coisa que se faça em dois ou três meses.
Por outro lado, como o Sr. Ministro já aqui disse e os senhores são surdos ou não percebem de todo, o processo de recuperação de empresas não está fechado, só agora começou, como é óbvio.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É espantoso - e por isso não me espanta que o País tenha sido tão mal dirigido durante tanto tempo - que os senhores não compreendam a essência das questões.

Protestos do PSD.

Sr. Ministro, vou fazer-lhe a única pergunta que neste momento será realmente a pergunta difícil e que, em meu entender, seria a pergunta óbvia da oposição, aquela que ela deveria fazer, mas que aparentemente não sabe ou não quer fazer.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A pergunta é esta, apesar de neste momento poder ser de difícil resposta: tem o Ministério de V. Ex.ª ideia do universo de empresas industriais em dificuldade que não tenha entrado no processo de pagamento das dívidas ao fisco e à segurança social? É que aí é que poderá existir, eventualmente, o problema potencial, ou seja, o de saber o que vai acontecer a essas empresas.
Em minha opinião, seria esta a pergunta que a oposição deveria ter feito e que não sabe fazer.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - É muito difícil!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Economia: Respondendo directamente ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, lembro aos Srs. Deputados, não preciso de o fazer ao Sr. Ministro porque ele sabe isto perfeitamente, que o plano de recuperação de empresas é uma das promessas inscritas no Programa Eleitoral do PS e também no Programa do Governo, aprovado nesta Assembleia.
Portanto, um plano de recuperação é sempre um plano de Governo, um plano colectivo, um plano interministerial e, obviamente, só por uma questão de simplificação de linguagem, e, aliás, o Sr. Ministro da Economia já o referiu aqui uma vez, é que é qualificado e dirigido a uma única pessoa.
Mas a questão que me parece relevante acentuar neste momento tem a ver com aquilo que o Sr. Ministro aqui disse por ser extremamente significativo.
O Sr. Ministro disse aqui que este plano de recuperação de empresas, que é, aliás, como sabemos, um conjunto complexo de diplomas que integra várias vertentes, surge exactamente no momento em que se vive um quadro de confiança na economia portuguesa e introduz de uma forma inequívoca conceitos de moralidade e de respeito relativamente ao cumprimento das obrigações fiscais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta é a questão fundamental. Os socialistas sempre defenderam que o princípio da estabilidade entre o cidadão contribuinte ou a empresa contribuinte e a administração fiscal é um princípio sagrado, é um princípio intocável, que só pode ser alterado, modificado, à luz de um enquadramento do género daquele que o Governo fez, isto é, à luz de um plano de recuperação de empresas, e é isto que os Srs. Deputados do PSD ainda não perceberam. Não estamos perante um Plano Catroga revisitado mas, sim, perante uma entidade política jurídica substancialmente diferente, pelo que os julgamentos que agora possam ser feitos são prematuros. Aliás, nem me entusiasmo demasiado com os números que eventualmente possam ser divulgados porque só no futuro, como disse, e muito bem, o Deputado Henrique Neto, poderemos perceber se este Plano foi efectivamente eficaz em termos daquilo que é o seu objectivo essencial, que é a recuperação de empresas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Agora, o que ficou claro, penso eu, porque o Sr. Ministro da Economia foi muito contundente a esse propósito, é que esta é a última oportunidade para corrigir a bagunça fiscal que se viveu nos últimos anos e que foi permitida pelo anterior Governo por razões claramente de encaixes financeiros, exclusivamente de encaixe financeiro, e por outras que me dispenso de referir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, é exactamente neste quadro que esta situação tem de ser considerada.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel dos Santos, peço-lhe que termine, pois já esgotou o tempo.

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Exactamente para dar oportunidade ao Sr. Ministro da Economia de se referir a isto, apesar de ter seguramente outras oportunidades de o fazer na Assembleia, porque felizmente o Plano não acaba depois de amanhã...

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Pois não!

O Orador: - ... mas daqui a muito tempo - e há muitas empresas, para além das 208 que recorreram às repartições de finanças, que neste momento não podem ser contabilizadas -...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço-lhe que termine.

O Orador: - :.. gostaria que nos falasse de uma questão actual e que tem a ver com a eventual introdução ou não de desvios à concorrência, devida às ajudas do Estado ligadas ao Plano.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Não quis interromper o Sr. Deputado Manuel dos Santos quando estavam a sair alunos da Escola Primária n.º 1 de Loures, que se encontravam a assistir aos nossos trabalhos; mas anuncio que se encontra ainda a assistir à reunião plenária um grupo de 54 alunos da Escola Preparatória da Marquesa de Alorna, um grupo de 48 alunos da Casa Pia - Colégio Pina Manique, um grupo de 30 alunos da Escola Secundária da Quinta das Flores de Coimbra, um grupo de 50 alunos do Instituto Português de Administração e Marketing de Lisboa e, ainda, um grupo de 55 cidadãos de Salvaterra de Magos, acompanhados pelo Presidente da Câmara Municipal do concelho, para quem peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Presidente: - Para responder, por tempo não superior a cinco minutos, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, duas pequenas notas sobre aspectos secundários, antes de abordar as questões substanciais.
O respeito pela Assembleia da República está implícito na minha vinda a esta sede e na natureza da intervenção que fiz e, quanto ao marketing, não é essa a concepção que tinha da minha presença aqui.
Em primeiro lugar, interessa acentuar estarmos perante um processo que marca uma alteração substancial do funcionamento da economia portuguesa em matéria fiscal. As empresas e os cidadãos compreenderam que as coisas mudaram e dispenso-me de comentar números, pois a realidade na sociedade portuguesa á responde directamente à questão que o Sr. Deputado António Gaivão Lucas colocou. A ideia de que o crime podia compensar está afastada com aquilo que já se conseguiu fazer com este quadro de acção, que obviamente implica, do ponto de vista da fiscalização, do ponto de vista da eficiência da gestão da administração fiscal e da segurança social, um grande esforço de consolidação progressiva.
Agora, que há na sociedade portuguesa, com aquilo que aconteceu no desenvolvimento deste quadro de acção para a recuperação de empresas e regularização de dívidas, uma situação nova e que este quadro de acção serve, em primeiro lugar, para criar uma concorrência efectiva na economia portuguesa e acabar com a concorrência desleal é um dado fundamental, inovador e decisivo para o futuro desta economia. É por essa razão que, por exemplo, as relações do Estado português e do seu Governo com a Comissão se colocam neste terreno numa total frontalidade e abertura, o que, na segunda-feira, tive a oportunidade de esclarecer com o Comissário Van Miert. O respeito pelos artigos 92.º e 93 º do Tratado e por procedimentos que têm sido estabelecidos ente o Governo e a Comissão permitirão que este processo que tem a finalidade de acabar com práticas que desvirtuam a concorrência, possa ser levado, com toda a calma e serenidade, a bom porto no horizonte da legislatura que este Governo tem pela frente e da aplicação do II Quadro Comunitário de Apoio.
Contrariando aqueles que não percebem ou não querem perceber aquilo que está a ser feito, temos uma política para pôr esta economia a funcionar de outra maneira, que tem a ver com o programa de privatizações, com 'a internacionalização da nossa economia e com algo que é decisivo, ou seja, criar condições pára aproveitar a oportunidade da moeda única.
A moeda única é um instrumento para desenvolver a Europa e Portugal, exigindo, desde já, a criação de condições de consolidação, o que está a ser feito. E é o facto de os resultados estarem à vista que cria dificuldades.

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, e entendamo-nos: a recuperação de empresas vai ser feita ao longo deste período. Como é sabido, havia um mecanismo de recuperação judicial que não funcionava, já que as empresas entravam num processo onde faliam de forma vagarosa ou ficavam numa situação de penumbra desconhecendo se eram recuperadas ou se iam à falência, tornando-se necessário criar um quadro de intervenção expedita tornando-se economia portuguesa para acudir a empresas que sofreram condições de funcionamento completamente negativas por erros da política macroeconómica, pela concorrência desleal a que foram sujeitas, por legislações competitivas de outros países da União Europeia. Este plano de recuperação é para fazer face a essa situação, num horizonte e com instrumentos bem definidos.
É fundamental que a sociedade saiba (nisso importa valorizar o Parlamento e a questão do respeito tem a ver com isso) que a defesa dos postos de trabalho, a criação de condições em sectores como o do têxtil e da confecção ou o da madeira e da cortiça nas regiões de Lisboa, Setúbal, Aveiro, Porto e Braga, onde se concentra uma parte substancial da nossa indústria transformadora, bem como na Guarda, em Castelo Branco ou no interior do distrito de Leiria, por exemplo, onde há concentrações de lanifícios, para falar de exemplos de que todos conhecem; tem pela frente um sistema que permite, de forma inovadora, ir ao fundo do problema. É que o problema da recuperação de empresas não se resolve com dinheiro mas com a criação de condições de mudança na propriedade e gestão e de alternativas para que os quadros acedam à função empresarial e as empresas dinâmicas adquiram outras empresas em dificuldade, de forma a solver a situação pelo e no mercado, com o Estado a assumir a sua responsabilidade. É isso que este programa vai mostrar, paulatinamente, mês a mês.
A minha vinda aqui hoje significa, no essencial, que valorizo o Parlamento e a cooperação institucional que este país tem de desenvolver para fazer face a problemas de grande dimensão. No final deste ano bem como no final da legislatura, cá estarei para apresentar contas ao Parlamento sobre os mecanismos de recuperação de empresas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Para acabar com essa situação, fez-se um diagnóstico que identificou cerca de 2500 empresas com problemas por dívidas, pagamentos e muitos outros. Afirmei, e não revi em baixo, que, ao ritmo a que o GACRE está a trabalhar, em 1997, e não no final da legislatura, poderemos atingir qualquer coisa como 1000 empresas, representando cerca de 100 000 postos de trabalho. Cá estarei, no final deste ano, para prestar contas à Assembleia da República em relação a esse objectivo.
Claro que qualquer pessoa que saiba o que é uma economia dinâmica em mercados concorrenciais percebe que o melhor mecanismo para recuperar empresas é pôr essa economia a funcionar bem - com iniciativa, mais empregos e maior crescimento económico. É o que está a acontecer na economia portuguesa.

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Portanto, se conseguirmos recuperar algumas destas empresas sem recurso aos mecanismos do quadro de acção, estamos actuar bem porque as recuperámos pondo a economia portuguesa a crescer mais, criando mais empregos e reduzindo os prazos de recebimento das empresas. Essa articulação entre os Bois aspectos é absolutamente decisiva e foi dela que vim falar.
A recuperação de empresas não terminou em 31 de Janeiro. Nessa data terminaram, sim, as ilusões de que o crime compensava e de que se podia eternamente, em permissividade fiscal, resolver problemas. Verdadeiramente, o que acabou em 31 de Janeiro foi um sistema perverso de incentivos que vigorou desde 1992 e em que mais de 100 milhões de contos por ano foram dados para concorrência desleal e para que as empresas que actuavam como devia ser sofressem essas consequências. Isso acabou em ,31 de Janeiro.
Continua a recuperação de empresas com todos os mecanismos aqui mencionados, responsabilidade que cabe, em primeiro lugar, ao Governo mas também, porque envolve emprego, desenvolvimento regional e solidariedade entre os portugueses, a todos os partidos que têm aqui assento. Eu, como Ministro da Economia, espero ter da parte desses partidos toda a colaboração, o que é fundamental para a nossa economia e para a nossa sociedade.
Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, declaro encerrado o debate com intervenção do Governo, que teve lugar no período de antes da ordem do dia.
Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr Presidente, Srs Deputados: Se for classificado como um dos maiores dramas, não é exagerado uma vez que o problema dos resíduos constitui uma das maiores ameaças para a saúde pública e uma das maiores causas de contaminação dos solos, das águas e do ar.
Para enfrentar a resolução do problema não é correcto pôr a cabeça debaixo da areia, dizer que se compreende o drama ou proferir um conjunto de promessas no ar. É preciso agir determinantemente sobre ele!
Por essa razão, Os Verdes não compreenderam, quando analisaram o Programa deste Governo, por que nele não encontravam a palavra resíduo uma única vez, nem tão-pouco se percebe a estratégia deste Governo relativamente à gestão e tratamento de resíduos. Por exemplo, nos resíduos sólidos urbanos a prioridade é a de construir aterros, não importa onde; a estratégia é construí-los sem olhar a um princípio básico, o de que o ponto de partida para um bom aterro é a sua localização. Um aterro mal localizado, construído em cima de linhas de água ou próximo de zonas residenciais, constituirá mais um perigo de contaminação e de diminuição da qualidade de vida das populações. E o Governo tem ignorado as reacções legítimas das populações à localização de certas unidades de tratamento de resíduos, como as de Viana do Castelo, Souto Alto, Abrantes, Taveiro, etc., intitulando esta reacções de "empatas".
Mas não fica por aqui a confusão estratégica do Governo relativamente a este tipo de resíduos. No final do ano passado, o Governo surgiu com um Plano Estratégico de Resíduos Sólidos Urbanos, cuja função aparece viciada à partida porque, entretanto, já estavam definidas uma série de localizações de aterros pelo que está logo condicionado pelas acções avulsas e descoordenadas que o Governo já tomou. A lógica deveria ser a da elaboração de um plano que orientasse as acções concretas e não o contrário.
É que, depois, encontram-se coisas tão aberrantes como esta: o município de Setúbal, que se vangloria pelo facto de a Sr.ª Ministra do Ambiente ter afirmado que o sistema de tratamento de resíduos de Setúbal é exemplar, encontra agora, no plano estratégico, o pseudo-aterro classificado como vazadouro controlado porque, como Os Verdes têm denunciado, entrou em funcionamento sem estar vedado, para além de que os lixos não são diariamente cobertos. Construiu-se algo que era suposto ser um aterro e, agora, analisada as suas características pelo Governo, chega-se à conclusão de que não o é.
Isto serve para dar um exemplo da falta de definição de uma política estratégica e coordenada de resíduos por parte do Governo.
A situação dos resíduos é também calamitosa no que diz respeito aos lixos hospitalares. É de facto um contra-senso olhar para uma unidade de saúde com a função de prevenir e tratar doenças e, simultaneamente, vê-la como um veículo de contaminações por produzir resíduos perigosos em grande quantidade e não ter capacidade nem formas de tratamento desses resíduos.
Veja-se a situação em que se encontra actualmente o hospital do Barreiro. Depois de o presidente dos Serviços de Utilização Comum dos Hospitais vir a público afirmar que sabia, desde o início, que a central de incineração do hospital do Barreiro não estava em condições regulares de funcionamento, constituindo um perigo, foi preciso esperar por uma avaria para se concluir que aquele incinerador necessita de uma reparação. Entretanto, há quase dois meses que o lixo hospitalar vai-se amontoando no hospital do Barreiro sem as mínimas condições de segurança. E o mais caricato é que foi já este Governo a estabelecer quais as condições de acondicionamento do lixo hospitalar no Despacho n.º 242196, de 13 de Agosto, que não estão a ser cumpridas.
Este Governo só começou a falar de resíduos hospitalares depois do escândalo do Montijo, do qual todos se devem recordar, onde foram depositadas e queimadas clandestinamente toneladas e toneladas de resíduos hospitalares, alguns do grupo 3 e 4, portanto, contaminados, caso que Os Verdes trouxeram à Assembleia da República via audição parlamentar na 4.º Comissão, onde estiveram presentes os Srs. Secretários de Estado da Saúde e Adjunto da Ministra do Ambiente.
Não faltaram promessas nessa audição. Agora é que tudo ia resolver-se. A regulamentação do Decreto-Lei n.º 310/95, de 20 de Novembro, sobre gestão e valorização de resíduos estava para breve. Até hoje, a regulamentação desse decreto-lei, sem a qual este não tem eficácia prática, não se fez. Onde está a portaria de identificação de resíduos apontados no catálogo europeu de resíduos? Onde está a portaria que estipula a lista de resíduos perigosos? Onde está a portaria que estabelece o modelo de registo dos resíduos hospitalares produzidos? Onde está a portaria que estabelece as regras de instalação e funcionamento de unidades de tratamento de resíduos hospitalares? Onde está a portaria das regras de transporte de resíduos? E aquele conjunto de relatórios que os Srs. Secretários de Estado, nessa audição, diziam já terem na mão e prometiam enviar-nos em breve? Era um relatório da Inspecção

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Geral de Saúde, que concluía da necessidade de melhorar os sistemas de tratamento de resíduos hospitalares; era um relatório do Serviço de Utilização Comum dos Hospitais, que apresentava métodos de recuperação de instalações de tratamento de lixos hospitalares a curto prazo; era ainda um plano de gestão de resíduos hospitalares para médio e longo prazo que estava então a ser preparado. Já lá vão quase oito meses e nenhum destes documentos foi apresentado!
Também não foi lançado nos hospitais e clínicas um programa de redução, reutilização e reciclagem dos resíduos hospitalares passíveis desta política. E a situação mantém-se: os lixos hospitalares que não vão parar aos vazadouros municipais são queimados em fornalhas ou fornos obsoletos, que são um verdadeiro meio de poluição atmosférica.
Depois do escândalo do Montijo, o País não tem parado de assistir a verdadeiros atentados com resíduos hospitalares, que já antes aconteciam, apesar de o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra do Ambiente ter considerado que não. São inúmeros os exemplos: uma clínica particular do Porto teve amontoados, durante meses, resíduos hospitalares contaminados; em Viseu, perto de Mangualde, foram detectados resíduos hospitalares clandestinamente depositados; no Hospital dos Capuchos, as populações denunciaram a deposição de lixos hospitalares paredes-meias com as residências; foram detectados lixos hospitalares na lixeira de Coimbra e denunciados muitos exemplos de mau funcionamento de incineradores hospitalares por terem esgotado a capacidade de tratamento ou por terem infringido regularmente o cumprimento de normas ambientais, como no caso dos hospitais de Cascais, de Faro e de Abrantes, até que ó hospital do Barreiro veio concretizar todos os receios de mau funcionamento destas infra-estruturas com a acumulação, inclusivamente, de resíduos contaminados.
À incapacidade de estipular uma estratégia para o tratamento de resíduos hospitalares vem ainda juntar-se uma não obrigatoriedade, segundo o referido Despacho n.º 242/96, de 13 de Agosto, de um plano específico de emergência nos hospitais relativamente ao acondicionamento de resíduos. Caso este plano existisse obrigatoriamente, o processo não teria sido tão moroso e grave no caso do hospital do Barreiro.
E preciso ter em conta que esta é uma matéria de intervenção prioritária na área do ambiente. O Governo não entendeu assim e vai deixando arrastar a intervenção concreta para a resolução da situação caótica dos resíduos hospitalares.
Para terminar, não deixaremos de referir a continuação da inexistência de fiscalização nesta área, que cabe em primeira mão ao Ministério do Ambiente, de acordo com o Decreto-Lei n.º 310195, de 20 de Novembro, o qual tem lavado bem as mãos no caso do hospital do Barreiro, como noutros já denunciados e que aguardam provavelmente mais uma avaria, mais um amontoar de resíduos, mais uma dor de cabeça, mais um processo de provável e facilitada contaminação.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, mais uma vez, neste Plenário Os Verdes pretenderam dar conta da situação real que se vive em torno dos resíduos hospitalares, das inúmeras queixas que nos chegam a propósito destes problemas e que devem também chegar aos outros grupos parlamentares, que requerem uma intervenção urgente e efectiva por parte de quem tem responsabilidade na matéria - o Governo. É necessário que aquilo que foi prometido há oito meses atrás, a propósito do caso do Montijo, seja concretizado e que a fiscalização seja uma realidade para evitar a todo' o custo que o lixo seja um negócio rentável à conta das ilegalidades e da saúde pública porque, até à data, não tem passado de um verdadeiro negócio sujo.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, infelizmente, não ouvi a sua intervenção na totalidade mas, sim, o suficiente para fazer-lhe uma pergunta.
De acordo com o quadro que traçou, a Sr.ª Deputada julga que é preferível manter o sistema actual, embora cheio de deficiências, de incineradoras nos hospitais (nalguns hospitais recentes foram construídas unidades de incineração com capacidade para queimar lixo de Lisboa a Faro) ou defenderia, por exemplo, a existência de três unidades no País que pudessem fazer esse trabalho, obrigando, de qualquer forma, também à deslocação dos resíduos hospitalares?

O Sr. Presidente: - Pára responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, muito obrigada pela questão formulada.
Começo por dizer que não posso pronunciar-me sobre o método adequado para o tratamento dos resíduos sem conhecer previamente o que não se conhece em Portugal, ou seja, o tipo e a quantidade de resíduos produzidos em cada hospital. Portanto, é necessário, em primeiro lugar, saber o que vamos tratar porque, sem uma caracterização dos resíduos, é impossível passar para uma avaliação concreta do sistema de resíduos necessário em Portugal.
Ora, o que referi na minha intervenção, e que gostaria de reforçar, foi que é reconhecido que estas unidades de tratamento de resíduos hospitalares são perfeitamente obsoletas e constituem, de facto, um veículo e um meio de contaminação atmosférica, contribuindo, portanto, para um atentado à saúde pública das populações. Aliás, no nosso grupo parlamentar, presumo que à semelhança do que acontece com os outros, recebemos frequentemente de populações residentes perto dessas incineradoras dos hospitais queixas quanto às consequências do seu funcionamento.
Por fim, devo dizer que é fundamental que seja cumprido e concretizado o que está previsto no Decreto-Lei n.º 310195, isto é, que, de uma vez por todas, o Governo, que já o prometeu mas ainda não concretizou - e gostaria de saber quando pensa fazê-lo -, passe, de facto, à efectivação de um plano de gestão dos resíduos hospitalares. É que sem a planificação, sem o conhecimento do tipo, da quantidade, e das características dos resíduos de que falamos é, de facto, impossível passarmos à concretização em termos de tratamento dos mesmos, sendo impossível por outro lado manter a situação que actualmente existe.
Portanto, o que gostaríamos de deixar aqui bem claro é que é urgente que o Governo aja nesta matéria e não esteja à espera de mais um escândalo, como o do Montijo ou o do hospital do Barreiro, para passar à concretização daquilo a que obriga a própria lei.

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A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Muito bem!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar ao tratamento de assuntos de interesse político relevante.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nos termos da Constituição da República Portuguesa o Deputado representa a Nação, por isso cabe à Assembleia da República formular a vontade geral do povo que representa. Mesmo assim, no actual sistema, os Deputados não são eleitos em círculo nacional; os círculos são distritais, com vista a uma ligação mais estreita do Deputado aos eleitores.
No sentido de potenciar as virtualidades do sistema eleitoral, o Grupo Parlamentar do PSD deliberou fazer um programa de trabalho pelo País real, de forma sistemática, duas vezes por mês. Assim, conhecerá melhor os problemas e as necessidades dos portugueses e poderá ter iniciativas legislativas mais úteis, mais consentâneas com os anseios e aspirações das pessoas concretas, de carne e osso. É o nosso contributo para valorizar o Parlamento, centro nevrálgico da democracia, aproximando-o mais dos eleitores, através de leis que sirvam a vida viva e vivificadora dos seus destinatários, os cidadãos, e evitem a revolta dos factos contra o Direito.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A primeira visita de trabalho do Grupo Parlamentar do PSD foi no fim de semana passado ao distrito de Coimbra. Visitámos oito dos 17 concelhos. Tivemos reuniões de trabalho com pessoas e instituições representativas de vários sectores da sociedade, desde a agricultura à Universidade, passando pelas acessibilidades e instituições sociais várias, designadamente de apoio às crianças e associações de desenvolvimento. Ouvimos os seus problemas, os seus pontos de vista.
Como Deputado nacional eleito pelo círculo de Coimbra, subo a esta tribuna para dar a minha voz e a de todos os Deputados eleitos por Coimbra a essas pessoas e instituições. Menos como seu representante e mais como seu núncio, faço-me eco de alguns dos problemas que nos foram colocados.
Primeiro problema: a agricultura e os agricultores do Baixo Mondego.
Na reunião de trabalho realizada na Cooperativa Agrícola do Concelho de Montemor-o-Velho, foi patente o desânimo, senão mesmo o desespero, dos agricultores por duas grandes razões: a penalização do seu rendimento e a não consideração como prioritários dos seus investimentos na modernização das explorações agrícolas.
Na primeira razão os agricultores destacam vários aspectos:
Primeiro, o aumento dos custos de produção. Por exemplo, o preço do litro do gasóleo era de 73$, em Outubro de 1995, e de 83$, em Novembro de 1996. Consideram insuficiente a recente descida para 79$, mesmo assim como resultado da manifestação dos agricultores.
Segundo, a diminuição dos apoios aos rendimentos. Por um lado, decorrente das negociações em Bruxelas, houve redução de preços de garantia ao produtor em 15% sem a correspondente compensação ao rendimento. Deste modo, o actual Governo não conseguiu o que o anterior havia logrado em 1992 e o que o Conselho Jumbo de 1993 havia aprovado, com grave prejuízo para os agricultores. Por outro lado, por despacho de 13 de Fevereiro de 1996 do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, os agricultores de arroz, linho e girassol só têm direito a 50% do subsídio, quando, no tempo do anterior governo, recebiam 100%.
Na segunda razão do seu descontentamento, os agricultores pedem que sejam considerados prioritários os investimentos na modernização tecnológica das explorações agrícolas, porque só assim terão acesso aos apoios a fundo perdido que a União Europeia disponibiliza entre 40% a 60% do investimento realizado. Em 1996, por despacho de Abril, o Ministro da Agricultura não reconheceu essa prioridade e, por isso, todos os projectos foram rejeitados. Na manifestação que realizaram, o Sr. Ministro, nela presente em Montemor, aceitou essa prioridade, mas, dois fineses depois, nada fez. Os agricultores sentem-se enganados pelo Ministro.
É preciso que este Governo continue os investimentos em obras hidroagrícolas e operações de reestruturação fundiária no Baixo Mondego, acarinhado pelo governo do Bloco Central com Mário Soares e Mota Pinto e pelos governos de Cavaco Silva. O Baixo Mondego não pode parar. .
Pedem ainda os agricultores do Baixo Mondego ajustamentos na concessão do crédito de campanha, por forma a que coincida com o tempo da sementeira.
Por fim, recordam os agricultores a promessa do Sr. Primeiro-Ministro de abertura de uma linha de crédito de 150 milhões de contos, que nunca mais chega e que pedem que se concretize rapidamente.
Segundo grande problema detectado: a destruição da marginal da Figueira da Foz pelas marés vivas.
Não houve prevenção - a obra foi feita pela câmara municipal sem estudos rigorosos - e não está a verificar-se a reparação. Por que esperam, câmara municipal e mesmo o Governo, para começar as obras de reparação e reconstrução?
Terceiro grande problema: IP3 - troço Sta. Eulália-Trouxemil.
A obra está completamente parada. Porquê? Por que está em stand by o concurso aberto em 3 de Janeiro de 1996? Por que razão o acto público do concurso, adiado de 14 de Março de 1996 para 23 de Abril de 1996, não teve ainda lugar? Porquê ou por quem espera o Governo? Será que perspectiva a sua passagem a auto-estrada, a concluir no sistema de DBFO, com as famigeradas portagens virtuais? Mas alguém ainda acredita nisso?
As populações locais preferem o itinerário principal com o perfil do actual, rapidamente executado como estava previsto - não correm atrás do foguete ou nome de auto-estrada, não é por mudança de nome que se deixam enganar. E depois da generosa abolição de portagens, em estilo de "governo da Santa Casa", as populações não compreenderiam nem poderiam aceitar tamanhas discriminação e desigualdade.
O actual Governo está, assim, a prejudicar gravemente a ligação Coimbra-Figueira da Foz, remetendo este troço do IP3 para as "calendas gregas", com grande prejuízo para as pessoas.
Quarto grande problema: a Estrada da Beira, no troço de beneficiação Alto da Serra-Ponte da Murcela.
Concursada a obra há mais de um ano, porque não começa? Não serve a propalada e enganosa desculpa de que aguarda visto do Tribunal de Contas. Este deixou de ter as costas tão largas pois, agora, dispõe de um mês para

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responder. Então, porque não anda nem desanda esta obra? Também aqui se prejudica gravemente Coimbra, o seu distrito e as suas populações.
Quinto grande problema: o nó da Geria, na estrada da Cidreira que liga Coimbra a Montemor.
Há mais de um ano que as obras deveriam estar concluídas, mas estão paradas. É um espectáculo desolador. Para quando o fim desta obra? Será que, também aqui, se está à espera de um milagre?
Sexto grande problema que detectámos: o metropolitano de superfície entre Coimbra, Lousã e Mirandela do Corvo.
Lançado há mais de dois anos, não há sinais de que avance. A indefinição reina. Quererá este Governo pôr termo ao projecto? Também aqui, o Governo está a prejudicar gravemente Coimbra e os concelhos vizinhos.
Sétimo grande problema: a extinção da. CENEL Empresa de Energia Eléctrica do Centro.
O Sr. Secretário de Estado, por sinal, de Coimbra, admitiu já asna extinção -parece que poderá pretender criar uma empresa nacional. Quererá com isto o Governo regressar ao passado, à EDP majestática? Também aqui, se essa nova fórmula for avante, Coimbra será gravemente prejudicada tal como a Região Centro, regressando-se ao velho centralismo.
Oitavo grande problema: a Universidade.
O anterior Governo assumiu o compromisso da instalação no Pólo lII, em estreita colaboração com a Faculdade de Medicina e a Reitoria, de um centro de tecnologias nucleares aplicadas à saúde, na sequência da candidatura apresentada ao programa PRAXIS XXI (foram mesmo enviados estagiários para o estrangeiro), mas com o actual Governo o projecto encalhou - está a ser repensado, segundo se diz. Não obstante o empenho reiterado da Reitoria e da Faculdade de Medicina, a Ministra da Saúde e o Ministro da Ciência e Tecnologia não têm vontade de decidir. Será o Governo contra o projecto? E quanto à construção da futura faculdade de Medicina, no mesmo Pólo III, quando é que o Ministério define a sua calendarização? Aqui, de novo, o Governo prejudica gravemente Coimbra e a sua Universidade.
Nono problema: os estudantes timorenses.
Reunimos com Zito Soares, um dos estudantes do massacre de Santa Cruz que vive em Coimbra: andava no 3.º ano de Direito e... foi colocado no 1.º ano de Psicologia!...

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é apenas um exemplo do problema das equivalências de estudo dos timorenses. São tratados muito pior do que os estrangeiros em Portugal. Não pode ser!
O PSD assumiu o compromisso de apresentar uma iniciativa legislativa que rectifique a situação e vai cumpri-lo.
Para além deste, há problemas de integração e, sobretudo, de língua portuguesa relativamente aos quais tam
bém não se sente que haja grandes medidas para resolvê-los.
Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: O  Sr. Primeiro Ministro anunciou recentemente querer um Governo de
obra feita em 1997. É o reconhecimento de que, em 1996, fez uma governação virtual, a pensar em eleições antecipadas.

Risos do PSD

. Vai o Sr. Primeiro-Ministro, no fim do mês, realizar um «Governo em Diálogo» no distrito de Coimbra. Seja bem
vindo! Na intenção de que possa ser um Governo de trabalho, vou enviar ao Sr. Primeiro-Ministro esta intervenção para que, assim, possa anunciar e assumir a resolução destes nove problemas aqui levantados.

Risos do PSD

Mas outras grandes questões lhe sugerimos para a agenda de trabalho, promessas que, a serem assumidas para cumprir, serão bem-vindas e o Sr. Primeiro-Ministro poderá contar com o apoio do PSD.

Em primeiro lugar, temos a questão da ponte Europa, em Coimbra. É bom que acabe uma certa disputa entre o presidente da câmara e o governador civil: este último insinuando que a obra daquela ponte não consta do PIDDAC para este ano só porque a câmara municipal não fez o projecto. É bom que, agora, a obra possa ser anunciada. Seria bem-vinda a concretização dessa promessa.

Em segundo lugar, temos a obra da circular externa. Também seria bom que o Governo desse um grande impulso a esta obra, uma vez que a câmara tarda em fazê-lo há muitos anos.

Em terceiro lugar, o palácio dos congressos com. a reconversão do Convento de S. Francisco. Também neste caso seria bem-vinda essa promessa, desde que para cumprir.

Em quarto lugar, temos o Mosteiro de Santa Clara-aVelha, que precisa de ser recuperado. Esta recuperação é desejada, bem-vinda e por nós apoiada.

Em quinto lugar, o novo tribunal de Coimbra, há tantos anos prometido e que também está em stand by. Seria bom que fosse despoletado o cumprimento desta promessa.

Seja bem-vindo o «Governo em Diálogo». Esperemos que, finalmente, também seja um «Governo de trabalho, para proveito das pessoas de Coimbra, seu concelho e, seu distrito.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem, a palavra o Sr. Deputado Carlos Beja.

O Sr. Carlos Beja (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Calvão da Silva, em primeiro lugar, dado que também sou Deputado pelo círculo eleitoral de Coimbra, gostaria de saudá-lo pela sua intervenção. Saúdo-o ainda porque, ao fim de ano e meio, V. Ex.ª e «deu uma volta» por oito concelhos do distrito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ainda bem que V. Ex.ª saiu da Praça da República e percorreu o País real. Espero que V. Ex.ª passe mais vezes pelo distrito e o conheça melhor, não só o seu interior como o seu litoral e não se limite à Praça da República e aos «Gerais».

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - V. Ex.ª, equacionou 14 problemas nove e mais seis - isto é, 15 problemas...

Sendo formado em Direito não sou forte em Matemática,...

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... aliás, como V. Ex.ª!
Como dizia, há muito mais do que 15 problemas para resolver no nosso distrito, Sr. Deputado. Basta ler o manifesto eleitoral apresentado pelo Partido Socialista no distrito de Coimbra, por ocasião das eleições legislativas, para perceber o conjunto de promessas não cumpridas que VV. Ex.as fizeram nos governos anteriores, as quais nós vamos fazer todos os possíveis por cumprir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª falou nas obras do Baixo Mondego. Ora, eu falo nelas para recordar o Dr. Mário Soares, no I Primeiro Governo Constitucional, que foi quem impulsionou essas obras. De facto, devem-se ao 1 Governo Constitucional.
V. Ex.ª falou na marginal oceânica da Figueira da Foz. É verdade que há problemas com as intempéries que destruíram esta via, cujas obras foram comparticipadas por fundos comunitários, que teve o aval da CCR, que teve o aval da então Secretária de Estado Isabel Mota. Ora, Sr. Deputado, as responsabilidades podem ser da câmara mas não serão também do governo? São apenas da câmara?
Mas mais importante do que perspectivar agora o que se passou é encontrar uma solução técnica para essas questões. E estamos cientes de que o Sr. Primeiro-Ministro e os Ministros que se deslocarem ao distrito, num "Governo em Diálogo" e em trabalho, certamente saberão equacionar esses problemas. Quando os governantes do PS se deslocam aos vários distritos não o fazem para distribuir cheques às colectividades, Sr. Deputado,...

Protestos do PSD.

... vão para trabalhar com as comunidades e para resolver os problemas. Assim, pergunto-lhe, Sr. Deputado: face aos resultados eleitorais de 1 de Outubro, face à inversão do resultado eleitoral existente no distrito, em que o PSD passou de seis para quatro Deputados e o PS passou de quatro para seis Deputados, acha que o anterior governo do PSD desempenhava assim tão bem as suas funções?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Beja, vou responder-lhe como amigo e com a grande simpatia que por si nutro, dizendo-lhe, em primeiro lugar, que, de facto, não me conhece bem. E como não me conhece bem nem me acompanha não sabe que tenho andado frequentemente pelo distrito de Coimbra e pensa que foi esta a primeira vez. Está habituado a muito marketing - esteve no turismo e percebe disso, mas eu nunca estive, portanto, sei trabalhar melhor no terreno do que no marketing.
Em segundo lugar, Sr. Deputado, se não é forte em Matemática eu próprio também não sou, mas, se não compreendeu a minha intervenção, deixe-me dizer-lhe que ela teve uma linha de orientação: pegar nos muitos problemas suscitados naquela minha viagem e focar apenas os que, estando já assumidos e em curso no tempo do anterior governo, vieram a ser entretanto parados pelo actual Governo.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O problema é só este, Sr. Deputado, e foi por isso que foquei umas questões mais importantes e não todas. Mas o problema é grave porque, enquanto estava na oposição, o Partido Socialista criticou, e muito bem, a lentidão na resolução dos problemas de Coimbra e da sua região e agora, que está no Governo até os problemas que estavam a ser resolvidos estão a ser parados. Porquê, Sr. Deputado? É isto que não entendemos.

Aplausos do PSD.

Não me basta ler o manifesto eleitoral do Partido Socialista - palavras leva-as o vento! O que sei, perante a experiência do último ano de governação, é que este Governo está a prejudicar gravemente Coimbra e as suas gentes, parando projectos em curso que estavam em andamento em cumprimento da palavra de honra do anterior governo, e que agora, em nome de um repensar, em nome de um estudo para tudo adiar, estão parados não sabemos até quando, talvez - repito - para as "calendas gregas".
E só por isto, Sr. Deputado, que a marginal da Figueira da Foz é um problema grave. É que este é um problema que não vem do tempo do anterior governo. As marés vivas ocorreram agora. Por acaso, está no poder o actual Governo do Partido Socialista e é a este que compete resolver a situação. Interessa-me pouco a responsabilidade do passado, interessa-me é que quem deve resolver a situação é a câmara municipal e o actual Governo, a menos que queira demitir-se e permitir que vamos nós a tempo de resolvê-la.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado diz que este Governo não anda por aí a distribuir a cheques. E pena, porque os problemas concretos das instituições resolvem-se com distribuição de cheques e não com promessas!

Vozes do PS: - Viu-se!

O Orador: - Por último, Sr. Deputado, é certo que o PSD foi penalizado. Aceitamos humildemente esse facto e regressamos à oposição, mas por este andar, ao fim de um ano de Governo parado, virtual e não de trabalho, o Partido Socialista, mais cedo do que esperava, regressará aos quatro Deputados eleitos por Coimbra e nós voltaremos aos seis!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, ao abrigo do n.º 2 do artigo 81.º do Regimento, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Na passada segunda-feira, a Comissão Política Distrital do Porto do PSD procedeu à denúncia pública de grave e flagrante atropelo à legalidade e à transparência que deve nortear a acção do Governo e dos organismos da Administração Pública.
O PSD/Porto denunciou mais uma abusiva e escandalosa utilização do aparelho do Estado por parte do PS e do Governo.

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Na verdade, o Governo, apercebendo-se que as eleições autárquicas serão um momento de excelência para que o eleitorado mostre um enorme "cartão amarelo" à governação ou, melhor, à ausência de governação socialista, não tem hesitado em recorrer à utilização, necessariamente abusiva, do aparelho do Estado em proveito do partido que suporta o Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Nada de novo!

O Orador: - O Partido Socialista, sentindo que as próximas eleições autárquicas serão o julgamento da acção dos autarcas socialistas e a avaliação do cumprimento ou não das suas inúmeras promessas feitas às populações que deviam defender e representar, o PS, dizia eu, sentindo que, em muitos casos e inevitavelmente, o julgamento do eleitorado se traduzirá num definitivo "cartão vermelho" a muitos dos mais conhecidos autarcas socialistas, não tem hesitado em socorrer-se, em desespero de causa, da máquina e do aparelho do Estado para tentar, à última hora, tapar com a peneira o sol da incompetência de muitos dos autarcas que fez eleger.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No caso concreto do distrito do Porto, o PS sentiu e sente que não conseguirá por muito mais tempo manter na ilusão o eleitorado que se sente atraiçoado.
As eleições autárquicas deste ano apresentam-se assim, para o PS/Porto, com um espectro de derrota em muitos concelhos que têm sido baluartes socialistas. E, perante tal perspectiva, as populações assistem, atónitas e revoltadas, a um corrupio de visitas de membros do Governo a concelhos de maioria socialista, e só a concelhos de maioria socialista, em que se fazem e repetem até à exaustão promessas nas quais já ninguém acredita, em que se celebram protocolos já celebrados, em que se atribuem verbas já atribuídas.
De repente, para o Governo do PS, o distrito do Porto reduziu-se a alguns concelhos, todos eles, por coincidência, de maioria socialista.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E, no que toca a protocolos de apoio financeiro, então a situação começa a ultrapassar tudo e todos. Se os governantes parecem só conhecer os caminhos para os concelhos de maioria socialista, os factos demonstram que as suas canetas só têm tinta para assinar protocolos de apoio financeiro quando tais apoios se destinam a autarquias dominadas pelo PS.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Será, seguramente, incorrecção dos mapas e defeito das canetas!...
Mas, maior escândalo é o que se passa com o aproveitamento, a pressão e o controlo políticos que estão a ser exercidos sobre os mecanismos inspectivos da Administração Pública. Que fique bem claro, Sr. Presidente e Srs. Deputados: o PSD não teme a realização de inquéritos e inspecções às autarquias que dirige; e, em particular, o PSD/Porto não teme mesmo nada a verificação e a avaliação da legalidade dos actos praticados pelos seus autarcas. Muito pelo contrário: venham daí todas as investigações que quiserem!

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O que tememos, criticamos e denunciamos é, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a falta de rigor que pode resultar de pressões sobre quem tem a responsabilidade de, com isenção, investigar e aferir da legalidade da actuação dos autarcas.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O que tememos, criticamos e denunciamos é, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a realização de inspecções e investigações iniciadas em cima das eleições, propagandeadas até à exaustão, mas cujos resultados só se conhecem depois do acto eleitoral, isto é, depois de indevidamente potenciadas suspeições sem razão de ser; o que tememos, criticamos e denunciamos é, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o tratamento desigual a autarquias e autarcas consoante a cor política que representam; o que tememos, criticamos e denunciamos é, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a realização de inquéritos e investigações a autarquias de maioria PSD possa ser alibi para a não realização de idênticas acções inspectivas em autarquias de maioria PS.
Foram estas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, as denúncias que o PSD/Porto efectuou e, perante tão graves factos, assistimos surpresos e incrédulos a duas reacções: uma, do Sr. Ministro João Cravinho, remetendo para uma carta que terá enviado a V. Ex.ª, Sr. Presidente desta Assembleia, disponibilizando a IGAT para ser visitado por uma qualquer delegação parlamentar.
Que pena o Sr. Ministro João Cravinho, sempre tão claro e transparente, nada dizer sobre o ofício que, em 17 de Outubro de 1996, a sua chefe de gabinete enviou ao Inspector-Geral da IGAT, solicitando que este informasse com urgência - e passo a citar a informação n.º 409 oriunda da IGAT - "se os factos descritos na carta dos representantes do mencionado partido político tinham ou não sido objecto de inquérito".

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Escuso-me, obviamente, de informar a Câmara sobre qual é o partido em questão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E que pena o Sr. Ministro nada explicar quanto ao silêncio do seu gabinete a propósito do inquérito solicitado em Abril de 1995 pela Assembleia Municipal de Valongo, silêncio só interrompido pela sua chefe de gabinete poucos dias após o PS de Valongo ter ameaçado abandonar a assembleia municipal, em Setembro de 1996; e que pena, ainda, o Sr. Ministro nada dizer sobre o silêncio do seu gabinete a propósito da solicitação de investigação a determinados factos feita, em Março de 1996, por autarcas do PSD do município de Vila do Conde, sem que se conheça até hoje qualquer acção da IGAT nesse sentido.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Não convém!

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O Orador: - Teria sido muito proveitoso que o Sr. Ministro João Cravinho pudesse ter dito alguma coisa sobre estes e outros aspectos que, como compreendem, tanta curiosidade nos suscitam.
Mas as denúncias que o PSD/Porto efectuou não se confrontaram só com a ausência de resposta da parte do Sr. Ministro. O Presidente da Federação Distrital do Porto do PS, Sr. Narciso Miranda, veio não responder antes baixar ao ataque pessoal e ao insulto. Contudo, no meio desse arrazoado de impropérios, ainda conseguiu, o Sr. Narciso Miranda, atirar para o ar algumas mentiras sobre câmaras municipais de maioria do PSD e criticar o comportamento dos Governos do PSD em matéria de isenção.
Se sobre os insultos importa nada dizer, por resultarem de desnorte e desespero, se sobre as mentiras nos disponibilizamos para a sua correcção para reposição da verdade dos factos, já quanto às acusações de falta de isenção importa somente, e em definitivo, lembrar que quem as profere é a mesma pessoa, exactamente a mesma pessoa, que em Abril de 1993, enquanto Presidente da Câmara de Matosinhos, elogiava a acção e os apoios prestados pelos Governos do PSD, afirmando, ao mesmo tempo, que destes recebia apoios e obras, enquanto que dos governos socialistas tinha recebido "palmadinhas nas costas"...

Vozes do PSD: - É bom lembrar!

O Orador: - Mas isso era dantes!
Agora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em ano de eleições autárquicas, já o Sr. Presidente da Câmara de Matosinhos e outros autarcas socialistas do distrito do Porto se não podem queixar do tratamento dado aos seus concelhos, se comparado com concelhos vizinhos mas de maioria social-democrata.
Podiam e deviam ter-se queixado do vergonhoso e humilhante tratamento dispensado ao distrito do Porto no PIDDAC para o corrente ano. Mas aí foi o silêncio complacente porque talvez concordante.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa, estávamos convencidos de que o senhor vinha aqui descrever o último ano de governação socialista, mas afinal ficámos a saber que veio aqui descrever os últimos 11 anos de governação do País, onde, pelo o que aqui nos trouxe, nada mudou em matéria de utilização do aparelho do Estado para perseguir autarquias e autarcas que não alinham com os partidos que, em cada momento, estão no Governo.
Por este andar, afinal quem tem razão é o Partido Popular quando diz e rediz que o PSD e o PS são exactamente iguais. Pergunte aos autarcas de vários partidos quantas perseguições, quantas iniciativas de inquérito nos foram movidas com intuitos meramente eleitorais, em véspera de eleições autárquicas!

Vozes do PSD: - É falso!

O Orador: - E, a propósito de aproveitamento das estruturas do Estado para fins partidários,...

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço que deixem que o Sr. Deputado que está no uso da palavra se faça ouvir.

O Orador: - ... basta lembrarmo-nos daquele desabafo do ex-governador civil de Aveiro, a seguir às últimas eleições autárquicas, quando disse que, afinal, na sede de campanha do PSD tinha funcionado o governo civil de Aveiro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - É falso!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, começava por cumprimentar o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, porque a questão que coloca permite-me, desde já, juntar a minha palavra à do Sr. Deputado, que seguramente não concordará - e permito-me falar também em seu nome, porque estou certo disso - com processos de calúnia e de difamação como aqueles que alguns têm vindo a desencadear em período quase pré-eleitoral.
Exemplo disso é o vergonhoso comportamento de alguns responsáveis do seu partido, que avançaram com calúnias relativamente ao Presidente da Câmara de Paredes, sabendo-se - é público - que o mesmo apresentou já uma queixa-crime contra aqueles que, escondidos atrás do anonimato, têm avançado com calúnias e difamações idênticas àquelas que estão por trás de uma suposta participação á um qualquer órgão de fiscalização.
Estou certo de que o Sr. Deputado não concordará com isso, nem permitirá que o seu nome seja envolvido numa campanha caluniosa como essa. Foi, justamente, de factos como estes que quis falar, Sr. Deputado.
Obviamente, quando diz que nada mudou, provavelmente está a esquecer que um seu companheiro de partido, um autarca responsável de Lebução, em Valpaços, explicou que o acordo celebrado entre o PP e o PS tinha permitido que ele avançasse com um subsídio para uma corporação de bombeiros numa terra onde nem sequer existia corporação de bombeiros...

Aplausos do PSD.

Obviamente, Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, alguma coisa mudou ou, melhor, muita coisa mudou, nomeadamente os acordos celebrados no segredo dos gabinetes, que a comunicação social denunciou e os senhores desmentiram, mas que os factos vieram depois a provar, acordos esses feitos entre o seu partido e o partido que suporta o Governo e que se traduzem em coisas tão ridículas e mesquinhas como subsídios para corporações de bombeiros que não existem!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental de defesa da honra da bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, uma vez que a Mesa foi

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informada de que, na ausência da líder da bancada do PP, ficaria em sua substituição

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, intervenho para defender a honra da bancada do Partido Popular, porque o que o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa acabou de afirmar é uma evidente e caluniosa afirmação que nãd pode ser deixada em claro.
A propósito do Presidente da Câmara de Paredes, porventura o Sr. Deputado está a esquecer-se que, afinal, foi o próprio presidente da câmara que participou em acções de marketing de diversos empreendimentos imobiliários situados no concelho, quando lhe era exigida a maior isenção, uma vez que exerce as funções de presidente de câmara.
Quanto às difamações, calúnias e mentiras que alega em matéria de acordos celebrados entre o Partido Popular e o Partido Socialista, devo dizer-lhe que os mesmos são públicos...

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!.

O Orador: - ... e o seu objecto é por demais conhecido: teve a ver com a obtenção de benefícios fiscais, numa tentativa, felizmente bem sucedida, de reduzir a carga fiscal sobre os portugueses e as empresas portuguesas.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - E os bombeiros de Valpaços?!

O Orador: - Foi esse o acordo: é conhecido, é público e foi anunciado. Assim sendo, tudo o que o Sr. Deputado possa dizer para além disso é uma mera calúnia.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, V. Ex.ª tem toda a razão: os acordos que o Partido Popular celebrou com o Partido Socialista são públicos e conhecidos, mas são-no somente depois de proferidas as declarações do vereador do seu partido em Valpaços, que explicou, justamente, que o subsídio à corporação de bombeiros que não existia decorria do acordo que haviam celebrado.

O Sr. Luís Marques- Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Mas a câmara é do PSD!

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Mas o vereador é do PP!

O Orador. - Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, V. Ex.ª e referiu-se ao Presidente da Câmara de Paredes. Pode estar certo de que jamais utilizarei uma fotografia de V. Ex.ª com declarações que, porventura, profira a propósito da beleza de um qualquer concelho para fazer publicidade de um qualquer projecto imobiliário,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... mas não tenho a certeza de que V. Ex.ª possa estar certo de que todos procedam da mesma maneira!

Já agora, Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, permita-me que lhe pergunte o seguinte: já conhece V. Ex.ª o resultado do inquérito que a IGAT fez à Câmara Municipal de Vieira do Minho, onde foi candidato à assembleia municipal o seu líder partidário, cujos resultados estão conclusos há mais de um ano e ainda não foram divulgados?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não sei se V. Ex.ª está em condições de me adiantar alguma coisa sobre o assunto.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Saraiva.

O Sr. José Saraiva (PS): - Sr. Presidente, pela segunda vez, o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa subiu à tribuna desta Casa para invectivar o Partido Socialista, porém fê-lo hoje com uma deriva: pretendeu assacar responsabilidades, acusando o Ministro João Cravinho de estar a patrocinar inspecções, inquéritos, actos de fiscalização a câmaras lideradas pelo PSD em desfavor de autarquias do distrito do Porto que estão sob tutela do Partido Socialista. .
No fundo, reproduziu apenas uma crítica feita pelo Presidente do PSD, no Porto, na última segunda-feira, a que o Presidente do meu partido já respondeu, e bastante bem.
Todavia, Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa; o que importaria era questionar se fazer inquéritos ou inspecções é uma coisa boa ou má, se é legítimo ou ilegítimo ou se, pelo contrário, como sucedia no passado... Aliás, aqui o meu camarada Martim Gracias foi alvo de uma atitude inqualificável de divulgação de um inquérito na véspera das eleições, e isso é que é grave!
A este propósito, deixava-lhe a seguinte pergunta: em 17 anos que o PSD dirige a Câmara Municipal da Maia ou em 20 anos que o PSD dirige a dirige a Câmara Municipal de Ferreira, quantos inquéritos administrativos, quantas inspecções, quantos actos de averiguação oficial foram feitos a essas autarquias? Pelo contrário, as câmaras do Partido Socialista foram alvo de uma sanha persecutória do então Ministro Luís Valente de Oliveira. Por exemplo,, a Câmara Municipal do Porto, só nos últimos seis meses, antes do último acto eleitoral para as autarquias locais, foi alvo de três inquéritos ou inspecções administrativas, autorizadas e efectuadas, de resultado nulo e sem qualquer efeito, como sabe.
Ou seja, nesta matéria, este Governo procurou fazer a divulgação das investigações e inquéritos que, porventura, venham a ser conduzidos. Pelo contrário, no passado - dispenso-me de lembrar-lhe os números, porque certamente os possui -, o carácter persecutório, a campanha de intimidação constante, por vezes determinada cirurgicamente contra autarcas ou autarquias, deu no que deu! V. Ex.ª saberá, a tempo e horas, qual é o inquérito que está a ser realizado à Câmara Municipal de Valongo - e, já agora, peço-lhe vénia para lhe lembrar que o seu partido também o votou na assembleia municipal.

Protestos do PSD.

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O Sr. Deputado subiu à tribuna e pretendeu tirar lã, mas vai acabar por sair tosquiado, porque, na verdade, os factos são ilustrativos. Se me responder que, na Câmara Municipal da Maia, por exemplo, liderada por um senhor "vira-casacas",...

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Não baixe o nível da conversa! Há por aí tantos!

O Orador: - ... ou, na Câmara Municipal de Paços de Ferreira, houve inquéritos, dou-o de barato e comungo das suas dificuldades.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Saraiva, seguramente por lapso, V. Ex.ª confundiu o nome do Sr. Presidente da Câmara Municipal da Maia, que, como V. Ex.ª bem sabe, se chama Vieira de Carvalho. E fê-lo, seguramente, não motivado pela imagem do Sr. Presidente da Câmara Municipal da Maia mas, porventura, por alguma introspecção que tenha feito em questões de "virar-casacas"... V. Ex.ª confundiu e importa, pois, repor aqui o nome do Sr. Presidente da Câmara Municipal da Maia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, V. Ex.ª perguntou quantas inspecções foram feitas à Câmara Municipal da Maia e à Câmara Municipal de Paços de Ferreira. Sr. Deputado, tanto quanto sei, à Câmara Municipal da Maia foram feitas várias,...

O Sr. José Saraiva (PS): - Zero!

O Orador: - ... mas terei muito gosto em mostrar a V. Ex.ª, logo que me seja possível recolher esses elementos, as datas em que foram iniciadas e concluídas essas inspecções. De qualquer forma, V. Ex.ª, que tem o controlo da máquina do Estado, poderá, porventura, com mais facilidade e maior rapidez, obter as mesmas respostas. Em todo o caso, fica aqui o meu compromisso no sentido de que procurarei obter esses elementos.
Quanto à questão da inspecção à Câmara Municipal do Porto, deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado, que não sei se são ou não verdadeiras as suas afirmações. Aceito que sim, mas não abonam muito em favor de quem fez a inspecção,.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Já devia ter concluído, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, aceito que as suas afirmações sejam verdadeiras, mas não abonam muito em favor de quem fez a inspecção, porque se, porventura, a inspecção tivesse sido mais rigorosa, teria sido detectado a tempo e horas aquilo que mais tarde veio a ser detectado sobre as irregularidades nas obras da Feira Popular...

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - ... e, porventura, a vergonha que o seu partido passou...

O Sr. Presidente: - Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - ... com o empreendimento do Passeio da Boavista teria acontecido mais cedo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, usou 5,2 minutos. Tenha paciência, mas tem de aceitar as minhas injunções! Quando se vai um pouco além dos 3 minutos, compreendo; quando se excede o tempo regimental em 2,4 minutos, não se pode dizer. que se vai terminar e não terminar. Desculpe que lhe diga isto e não me leve a mal, Sr. Deputado.
O Sr. Deputado José Saraiva inscreveu-se para usar da palavra ao abrigo de que figura?

O Sr. José Saraiva (PS): - Sr. Presidente, é apenas para...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tenha paciência, mas tem de caracterizar a figura regimental ao abrigo da qual pretende usar da palavra.

O Sr. José Saraiva (PS): - Sr. Presidente, para um esclarecimento, para uma interpelação...

O Sr. Presidente: - Desculpe, Sr. Deputado, mas ou é uma coisa ou é outra...

O Sr. José Saraiva (PS): - Pretendo fazer uma interpelação, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Será mesmo uma interpelação?

O Sr. José Saraiva (PS): - É mesmo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - É que, se não for, interrompo-o, Sr. Deputado.

O Sr. José Saraiva (PS): - Sr. Presidente, pretendo que, através do Sr. Presidente ou da Mesa, seja dado conhecimento à Câmara...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa, mas tenho de interrompê-lo, porque há uma inscrição anterior, por parte do Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, para o mesmo efeito.
Tem a palavra, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, e espero que seja mesmo uma interpelação, porque, se não for, já sabe que estou autorizado pela conferência dos representantes dos grupos parlamentares a interrompê-lo.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, a minha interpelação à Mesa vai no sentido de explicar a esta Câmara, através de V. Ex.ª, o seguinte: foi dito aqui, e de forma incorrecta, pelo Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa, que o Partido Popular havia apresentado uma queixa à Procuradoria-Geral da República em relação à Câ-

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mara Municipal de Paredes. Isto não é rigoroso, porque aquilo que sucedeu foi que demos documentos à Procuradoria-Geral da República e pedimos ao Sr. Procurador-Geral para investigar a verdade. Não acusámos, pedimos para ser investigada a verdade!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não está a fazer uma interpelação.

O Orador: - É profundamente lamentável que Deputados responsáveis não queiram que seja descoberta a verdade de uma...

O Sr. Presidente: - Peço desculpa, mas tenho de interrompê-lo.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado podia ter pedido autorização à Mesa para dar um esclarecimento e eu dava-lhe essa autorização. Porque foi o que fez, não fez uma interpelação. Desculpe, mas tenho de ser rigoroso, porque, se não, nunca mais nos entendemos.
Sr. Deputado José Saraiva, vou dar-lhe a palavra e espero que seja mesmo uma interpelação, porque, se não, será também interrompido.

O Sr. José Saraiva (PS): - Com certeza, Sr. Presidente.

Aquando da leitura do expediente, o Sr. Secretário Artur Penedos deu conta de que foi apresentado à Mesa a que V. Ex.ª preside um pedido dirigido aos, Srs. Ministros do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e das Finanças, subscrito por todos os Deputados eleitos pelo Partido Socialista, no círculo do Porto, no sentido de nos serem facultados todos os dados referentes a averiguações, inquéritos e outros actos inspectivos a todas as câmaras municipais do distrito do Porto, no período compreendido entre 1986 e 1996.
Posto isto, agradeço, ao Sr. Presidente, se entender conveniente, que se proceda a uma fotocópia desse documento e que a mesma seja entregue ao Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa, porque nós, que sabemos o que queremos, que sabemos o que aconteceu,...

O Sr. Presidente: - Também não está a fazer uma interpelação, Sr. Deputado. Tem de terminar. Peço desculpa, mas tenho de ser muito rigoroso.

O Orador: - ...lamentamos que ele não o tenha feito, Sr. Presidente, e que tenha apenas atirado palavras ao vento.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi, com algum espanto, esta última intervenção relativa a uma pretensa falta de isenção e no que se refere às pseudo-pressões do Governo sobre as autoridades inspectivas.
Gostaria de dizer ao Sr. Presidente da Assembleia da República e aos Srs. Deputados que, ao tomar conhecimento das acusações concretas que foram feitas, o Partido Socialista dirigiu uma carta ao Presidente da Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente em que solicita uma reunião com a finalidade de se deliberar sobre uma visita à Inspecção-Geral da Administração do Território, para, in loco, apreciar todos os proced5mentos administrativos, e com o pedido expresso para que, nessa visita, exista um convidado especial, que é o Sr. Deputado Luís Filipe Menezes.
Não admitimos, em nenhuma circunstância, estas insinuações e acusações do PSD, na justa medida em que não nos confundimos com governantes anteriores, que passearam de câmara em câmara, em ano eleitoral, prometendo e dizendo que se edificavam equipamentos, nomeadamente as estradas ou outros, em virtude da personalidade do Sr. Presidente da câmara local. Esses equipamentos eram-lhes dedicados publicamente, equipamentos, esses, do Estado. Portanto, os senhores não têm moral, rigorosamente nenhuma, para falar nesta matéria, nem podem fazer uma única acusação a este Governo também a esse propósito.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: -- Mas gostaria ainda de lhes dizer o seguinte: em matéria de pressões sobre as autoridades inspectivas, há cartas de concelhias do PSD,...

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - E do PS!

O Orador: - ... e posso aqui mencionar algumas, que pedem directamente à Inspecção, durante o tempo do vosso Governo, para exercer pressões e para inspeccionar a câmara a e a câmara b do Partido Socialista.

O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - É ver quem fez pior!

O Orador: - Os senhores não têm legitimidade alguma - aliás, é uma grande falta de hombridade, virem aqui fazer este cerco e estas acusações.
Gostaria de lhes dizer mais uma coisa que considero essencial: é que relativamente à Assembleia Municipal de Valongo, de facto, foi feito um pedido de inquérito, mas foi feito por todos os partidos, inclusivamente pelo PSD, e foi aprovado por unanimidade. Não sei, por isso, qual a estranheza que os senhores querem trazer aqui ou infundir na opinião pública.
Mas vamos, então, às questões de isenção e aos "cheques na mão" e vamos ver como é que tudo correu em 1993 e em 1994, em matéria de autarquias e de contratos-programa.
Sucede que os senhores nas autarquias do norte, relativamente às autarquias do PSD, que representavam 40% da população, distribuíram 58% dos recursos financeiros, enquanto as autarquias socialistas, que representavam cerca de 60% dessa população, tiveram apenas 28% do total dos recursos financeiros.
Mais: nas autarquias do centro, onde o PSD representava 41 % da população, foram atribuídos 48% dos recursos financeiros; ao PS, que representava 49% dessa população, foram atribuídos 38% dos recursos financeiros; ao PP, que representava 10% dessa população, foi atribuído 1 % desses recursos.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Os mais prejudicados! Mas agora não vão dar-nos 0,5%, pois não?!...

O Orador: - Gostaria de perguntar-lhes, Srs. Deputados do PSD, onde está a isenção, onde está a autoridade

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política e a autoridade moral, para virem aqui, em termos nacionais, proferir críticas em relação a um Governo do PS, que, realmente, não adoptou, nem adoptará qualquer um destes procedimentos?
Em relação às autarquias do Vale do Tejo, o PSD, que representava 11% da população, teve 21% dos recursos financeiros; o PS, que representava 49% da população, teve 38% dos recursos; e a CDU, que representava 37% da população, teve 21 % dos recursos. Pergunto-lhes: onde é que está a isenção? Quem é que utilizou o Estado e os dinheiros do Estado para fazer propaganda político-partidária em ano de eleições autárquicas?

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Boa pergunta! 

O Orador: - Foram os senhores! Foi uma vergonha aquilo que fizeram! Delapidaram dinheiros públicos, utilizaram o dinheiro de todos nós para pagar a vossa campanha eleitoral, diga-se de passagem, com um claro insucesso!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nas autarquias do Alentejo, o PSD representava 11% da população e teve 52% dos recursos financeiros disponíveis, enquanto a CDU, que representava 68% da população, obteve apenas 48% desses recursos e o PS, com 21% da população, representada nas câmaras, teve zero. Não foi atribuído um único tostão às autarquias do PS!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Para terminar, gostaria também de informar a Câmara que, nas autarquias do Algarve, onde o PS representava, em matéria de autarquias, 72% da população, obteve 47% dos recursos financeiros, mas o PSD, que representava 11% da população, teve 53% dos recursos e a CDU teve zero.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - O PSD está em estado de choque!

O Orador: - Isto é uma vergonha...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... e espero que este momento sirva, de uma vez por todas, de lição ao PSD sobre o conjunto de calúnias e insinuações que tem tentado fazer em termos nacionais, pois não espelha mais do que a imoralidade de 10 anos de governação, de delapidação dos dinheiros públicos, de utilização dos dinheiros do Estado para campanhas políticas e partidárias.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Desculpem lá, mas os senhores puseram-se a jeito!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, quero colocar-lhe duas questões, mas, antes disso, vamos à questão de Valongo.
Começo por perguntar-lhe se V. Ex.ª considera que o processo em Valongo é claro e transparente. Vejamos: em Abril de 1995, a Assembleia Municipal de Valongo aprova, com os votos do PSD e do Partido Socialista, a solicitação' de uma inspecção à IGAT; posteriormente, a IGAT responde dizendo que não vale a pena dar cumprimento à solicitação porque, em breve, irá fazer uma inspecção ordinária. Em 1996, a IGAT diz que, afinal, não foi possível fazer a inspecção em 1995, mas vai fazê-la em 1996. De permeio, há um grupo de moradores, curiosamente liderado por camaradas seus, que solicita um inquérito à IGAT e ele é feito de imediato. As conclusões desse inquérito aparecem na comunicação social e nas mãos de "Deputados" municipais do Partido Socialista, sem que a Câmara Municipal de Valongo tenha conhecimento desses resultados. O inquérito que agora está a avançar ou que parece ir agora avançar é o tal inquérito que foi pedido em 1995 e relativamente ao qual foi dito, em 1995, que não valia a pena realizá-lo, porque iria ser feita uma inspecção ordinária e, em 1996, que iria ser feito nesse ano. Estamos em 1997, Sr. Deputado. Diga-me se considera que isto é correcto.
Mas vejamos uma outra questão: V. Ex.ª diz que o PSD distribuiu benesses em vésperas de eleições. Assim sendo, peco-lhe um comentário às palavras do seu camarada Narciso Miranda, que citei, há pouco, na tribuna, quando, em 1993, perante as câmaras de televisão, afirmou que, dos Governos do PSD recebia dinheiro e obras, enquanto dos governos do seu próprio partido tinha recebido, no passado, "palmadinhas nas costas". Isto foi dito, repito, pelo seu camarada Narciso Miranda perante as câmaras de televisão - aliás, tenho muito gosto em facultar-lhe cópia dessas declarações, se V. Ex.ª quiser.
Peço-lhe, por favor, Sr. Deputado, que me explique, então, quem é que está do lado da razão: se é V. Ex.ª se é o seu camarada Narciso Miranda.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa, devo dizer-lhe que os dinheiros recebidos pela autarquia de Matosinhos, eventualmente, contribuíram para o fraquíssimo número de 28% da distribuição dos recursos financeiros. Repito, Sr. Deputado, o PS, representando 60% da população local, obteve 28% dos recursos financeiros.
Relativamente à Câmara de Valongo, considero que o processo foi exemplar, aliás, para que não se esqueçam estas matérias.
Gostaria de terminar, porque não vale a pena estar a massacrá-lo mais, dizendo-lhe apenas o seguinte: no ano de 1996 houve, de facto, várias inspecções às câmaras municipais...

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - E os resultados dessas inspecções?

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O Orador: - Houve nove inspecções a câmaras da CDU; três, a câmaras do CDS-PP; 21, a câmaras do PSD e 29, a câmaras do PS.
O Sr. Deputado tem aqui o espelho de quem fala com legitimidade política e com autoridade moral, que os senhores não têm, porque as inspecções que "receitaram" durante o vosso tempo e o vosso mandato e que vos levaram à derrota, essas sim, eram político-partidárias, sem qualquer tipo de isenção.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, a primeira questão que quero notar é o facto de a bancada do PP não precisar de ser esclarecida, provavelmente, porque faz parte do acordo de não ser discriminada no futuro.

Risos do PCP.

Sem dúvida alguma, considero importante que o PS traga a esta Câmara um conjunto de números que provam que houve discriminação. No entanto, a grande questão que se coloca é a de saber em que medida é que o PS está disposto a 'alterar a legislação em vigor, de modo a não continuar a ser possível este tipo de actuação discricionária, arbitrária e antidemocrática.
A primeira Lei das Finanças Locais resultou de uma grande luta em todo o País, exactamente para acabar com o hábito passado, que era o dos subsídios e comparticipações. Hoje têm outro nome, mas a realidade política é fundamentalmente a mesma. E, nesta matéria, o que podemos dizer é que "a ocasião faz o ladrão".
Por isso, pergunto se o PS está ou não disposto a acabar com situações que permitem efectivamente actuações discricionárias, discriminatórias, favores e desfavores para o respectivo partido, para os aliados da ocasião ou sem ser da ocasião, como é o caso do PP; isto é, se está disposto ou não a criar, nesta matéria, uma estrutura democrática.
Por outro lado, em matéria de inquéritos e sindicâncias, sabemos que foram, no passado, instrumento de actuação eleitoral. A questão que colocamos - e, daqui a um ano, voltaremos a esta pergunta - é ver se, sim ou não, o PS está disposto, nesta matéria, a uma rectificação radical, que permita que esta situação não volte a acontecer, que não voltemos a ver situações em que; dadas as prioridades eleitorais, definidas pelo partido do poder, as autarquias e as câmaras inspeccionadas sejam exactamente as prioridades definidas, sabendo depois os resultados por fugas de informação, sistematicamente, através da comunicação social, utilizados como calúnias...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Isso era antes!

O Orador: - ... que, frequentemente, vêm a ser desmentidas. Sim ou não, nesta matéria, há disponibilidade para proceder de outra forma?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, agradeço as suas perguntas, porque elas ,permitem colocar o problema de uma forma serena e sensata, como, aliás, deve ser feito.
Creio que a veemência que utilizou na forma como questionou, apenas revela o interesse que tem, tal como nós, pela solução do conjunto de arbitrariedades do passado e do PSD. Devo dizer-lhe que, nessa matéria, deve estar perfeitamente tranquilo.
Em primeiro lugar, porque em matéria de inquéritos e sindicâncias, como ainda agora tive ocasião de exemplificar, não há, como havia no passado, qualquer preferência nem qualquer pressão sobre as entidades inspectivas, no sentido de, em ano de eleições ou fora dele, fazer qualquer tipo de pressão sobre essas mesmas autoridades com o objectivo de prejudicar ou beneficiar quem quer que seja.
Tem, da nossa parte, essa garantia: o PS fará, como tem feito até agora, uma política de total transparência, com grande serenidade, para que volte a confiança entre a política e os cidadãos, entre o Governo e os autarcas, para que seja relançado um ambiente de confiança que um passado de triste memória estragou.
A segunda questão, sobre a actuação discricionária e partidária, tem uma resposta muito simples: sabe o Sr. Deputado Luís Sá que o PS tem, praticamente, concretizada uma nova lei para as finanças locais?! Uma nova lei para as finanças locais que há-de ser discutida aqui, entre todos nós, nesta Assembleia, que é o garante mais sublime dessa isenção e do conjunto de critérios absolutamente justos, para que as autarquias locais possam ter uma vida e uma perspectiva de desenvolvimento em perfeito equilíbrio.
Tem também do PS a garantia, com toda a serenidade, de que o passado de triste memória do PSD não voltará a acontecer em Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para defesa da honra da sua bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, o senhor como bom leninista faz bom uso da técnica leninista, de que uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade. Cabe-me a mim, Sr. Deputado, desmentir, mais uma vez, e espero que a última, categoricamente, qualquer insinuação idêntica àquela que o senhor acabou de fazer a respeito do Partido Popular.
Que fique claro, de uma vez por todas, que esse tipo de afirmações só ficam mal a quem as profere, porque são inverdadeiras. Cá estaremos, Sr. Deputado, no final deste ano orçamental, para fazer contas e para lhe exigir a si e a todos os que tenham proferido esse tipo de afirmações que apresentem contas de qualquer tipo de benefício que tenha incidido sobre as câmaras do PP.
Que fique claro, também, Sr. Deputado, que se alguém tem razão de queixa nesta matéria é exactamente o PP. Tem razão de queixa no passado é espera não vir a ter razão de queixa no futuro. Se vier a ter razão de queixa, aqui estaremos também, com todo o vigor, para denunciar uma eventual futura discriminação das câmaras do PP.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Protestos do PCP.

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7 DE FEVEREIRO DE 1997 1323

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, há-de esclarecer-me, a mim e à Câmara, qual é o texto de Lenine em que se afirma que, "uma mentira repetida mil vezes se transforma verdade". Provavelmente, é capaz de haver um texto de algum autor de extrema direita, que o Sr. Deputado cultive, que refira que convém dizer que Lenine disse isso... Creio que não o disse, mas se o Sr. Deputado puder esclarecer, gostaria muito de aumentar a minha cultura através dessa informação.
Por outro lado, creio que está subjacente, de algum modo, na intervenção do Sr. Deputado a ideia de que espera, efectivamente, que o seu bom comportamento, em matéria de Orçamento do Estado, aderindo aliás ao esforço para atingir a moeda única, permita não ser discriminado. Mas o facto de o líder do seu partido, sistemática e ciclicamente, afirmar, em diferentes pontos do País, que tal ou tal situação se deve ao PP, creio que ilustra o facto de haver uma situação, já hoje aqui referida, de acordo, cujos contornos não se conhece exactamente, que pode, eventualmente, fazer compreender matérias deste tipo.
A intervenção do Sr. Deputado teve, pelo menos, um mérito: o de o PP não ter ficado calado nesta matéria. Não dirigiu nenhuma pergunta ao PS, parece que não tem nada a esclarecer, mas, pelo menos, falou e nós tivemos o gosto de o ouvir.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Cá estaremos no fim do ano para fazer contas!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Macário Correia pediu a palavra para uma verdadeira interpelação. Tem, pois, a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, perante esta interessante discussão e tendo aqui sido presente, pelo nosso colega Deputado José Junqueiro, um conjunto de documentos que são da maior relevância e interesse para todos os Deputados, pedia que à Mesa que, de algum modo, solicitasse - e esse é o objecto desta interpelação - esses documentos estatísticos sobre o número de inspecções e a sua distribuição pelas forças partidárias das diferentes autarquias.

O Sr. José Calçada (PCP): - A fotocópia!

O Orador: - Exactamente, a fotocópia desses documentos tem interesse! E ainda, se possível, a explicação, que o anexo não deixa de ter, com certeza, da razão pela qual, decorridos tantos meses, ainda não foi divulgado o relatório da inspecção à Câmara Municipal de Vieira do Minho, e se consta dessa documentação a explicação para essa tão longa ausência de resposta.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Junqueiro ouviu a interpelação, pelo que lhe agradeço que reaja em conformidade.
A Mesa gostaria de poder distribuir o texto que citou. Se o tiver organizado, pode enviá-lo noutro momento e far-se-á circular.
Srs. Deputados, terminou o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 40 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão conjunta dos projectos de lei n.os 16/VII Regime jurídico das comissões eventuais de inquérito (PS), 24/VII - Altera o regime jurídico dos inquéritos parlamentares (PCP) e 245/VII - Alteração do regime jurídico dos inquéritos parlamentares (PSD).
Entretanto, põe-se o seguinte problema: dois destes projectos de lei, o do PS e o do PCP, já foram discutidos neste Plenário, tendo baixado, sem votação, à comissão, para reapreciação, como diz o Regimento.
Não sei se a reapreciação que foi feita em sede de comissão justifica ou não que se rediscutam - isso pode acontecer - estes projectos aqui, pelo que deixo isso ao critério das bancadas titulares da iniciativa.
De qualquer modo, tenho ideia de que se já forma discutidos e se a reapreciação destes projectos na comissão não justificou uma rediscussão, nessa altura, talvez pudéssemos poupar algum tempo, centrando o debate na discussão do projecto de lei do PSD, embora sem prejuízo de sobre ele cada um proferir as declarações que entendesse.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, em jeito de interpelação, embora ligado ao que V. Ex.ª acabou dê dizer, aproveito para esclarecer que, em sede da 1.ª Comissão, não voltou a haver, quer da parte do PS quer da parte do PCP, nenhuma reapresentação para discussão dos respectivos diplomas, pelo menos que eu tenha conhecimento.
De facto, o que aconteceu há 15 meses foi que, face à forma como decorreu e pelas críticas que a oposição fez ao seu projecto o debate nesta Câmara, houve um requerimento, apresentado pelo PS, de baixa à comissão do diploma, sem votação, a fim de reponderar alguns dos aspectos que foram tão criticados nesse debate.
A minha interpelação é no sentido de saber se chegou à Mesa alguma proposta de alteração, apresentada pelo PS e referente ao seu projecto, uma vez que não teve lugar a tal discussão na 1.º Comissão. Daí que o meu grupo parlamentar parta do princípio de que terá havido, da parte do PS, uma proposta de alteração referente ao seu projecto.

O Sr. Presidente: - Sr. Presidente, é óbvio que se tivesse dado entrada na Mesa teria sido agendado, uma vez que, normalmente, sobem a Plenário todos os projectos relativos à mesma matéria.
Portanto, a direcção de cada bancada parlamentar dirá o que entender, tomando em conta que dois destes projectos já foram discutidos. Não vale a pena "malhar em ferro frio". Não quero cortar a liberdade a quem quer que seja de dizer o que entender sobre o projecto do PSD, nomeadamente, a propósito dele e dos outros dois, ou de o repetir, se for esse o caso. O Regimento não o proíbe, embora não tenha muita lógica. De qualquer modo, podem usar da palavra como entenderem.
Para interpelar a Mesa - e estas são verdadeiras interpelações -, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, já hoje fiz uma verdadeira interpelação, logo no início da sessão.

O Sr. Presidente: - Finalmente!

O Orador: - Sr. Presidente, julgo que cada bancada deverá intervir conforme entender, dentro do pressuposto, que é real, de que estão agendados três projectos, ó que, decididamente, foi feito por consenso.

O Sr. Presidente: - Foi isso o que eu disse. Só quis provocar alguma economia de tempo e mais nada. Não pretendi coarctar a liberdade de intervenção de cada grupo parlamentar.
Srs. Deputados, queria anunciar que temos o prazer da companhia de colegas da Assembleia Legislativa da Guiné Bissau, que estão entre nós para se familiarizarem com o nosso sistema de trabalho. Saudemo-los com toda a simpatia.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, naturalmente que já se colocou aqui a questão de termos três projectos de lei para discussão, dois dos quais já foram aqui debatidos. A Câmara necessita de um esclarecimento do PS no sentido de saber se esta oportunidade de segunda reflexão por parte da Câmara, bem como a própria posição do PS de o fazer baixar à Comissão sem votação, envolve uma reponderação com o fim de introduzir alterações que possam enriquecer uma reflexão conjunta. De contrário, estamos aqui num sistema que é regimentalmente absurdo, tipo "pescadinha de rabo na boca", que não dignifica a Assembleia nem o Plenário.

O Sr. Presidente: - Para dar o esclarecimento solicitado, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, efectivamente, foram agendados, por consenso, estes três projectos de lei e, como os Srs. Deputados do PSD sabem perfeitamente, não houve ainda possibilidade, no âmbito da 1 e Comissão, de discutir quer o projecto de lei do PCP quer o do PS . Portanto, não foi feita ainda essa discussão relativamente a esses projectos.
Assim, a nossa posição é, de alguma forma, no sentido do que o Sr. Presidente acabou de exprimir: se os Srs. Deputados de cada uma das bancadas entenderem pronunciar-se sobre os outros projectos de lei já discutidos nesta Câmara em Dezembro de 1995, fá-lo-ão, obviamente, nada havendo a obstar quanto a essa discussão e, depois, os trabalhos prosseguirão normalmente. É essa a nossa posição.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chamo a vossa atenção para o facto de não serem obrigados a interpelar a Mesa sobre esta matéria, que, aliás, me parece já estar esclarecida.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, queria dizer que eu nunca faço interpelações por obrigação e só pedi para a fazer depois de ouvir o Sr. Deputado Baltazar Mendes, como o Sr. Presidente teve ocasião de reparar. Já foram feitas várias .interpelações e eu mantive-me; silencioso mas esta última...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Já estávamos a estranhar!

O Orador: - Sei que o Sr. Deputado Carlos Coelho estranha sempre que não ouve o meu contributo, porque é muito importante para a sua própria reflexão, mas aqui estou eu, com todo o gosto, a dá-la.

Risos.

Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, disse uma coisa que não é totalmente verdadeira porque quando se discutiu aqui, no Plenário, um projecto de lei do PS e outro do PCP, em Novembro de 1995, na generalidade, tendo baixado os dois à Comissão sem votação, o meu grupo parlamentar apresento, no dia 30 de Janeiro (e tenho-os aqui, com despacho do Sr. Presidente, admitindo-os e ordenando a respectiva publicação e envio à l.ª Comissão), contributos para uma reflexão que foi o grupo parlamentar do PS que propôs a todos os grupos parlamentares, quando requereu a baixa do seu projecto de lei à Comissão sem votação.
Ora, acedendo com autenticidade a esse apelo, o meu grupo parlamentar apresentou várias propostas de alteração, tendo por base o projecto de lei do PS. Na 1.ª Comissão, por variadíssimas vezes - atrever-me-ia a dizer, pelo menos, uma dezena de vezes -, eu próprio tive oportunidade de alertar toda a Comissão para os dois projectos de lei, um do PS e outro do PCP, que aí jaziam, solicitando uma reflexão, uma reponderação e uma rediscussão na Comissão que nunca chegou a ocorrer, não por falta de aviso ou de lembrança mas porque a Comissão nunca chegou a decidir fazer essa reflexão.
Agora, o que não se pode dizer nem permitir que alguém o conclua, é que mais ninguém se lembrou desta matéria! A prova disso são as nossas propostas e os repetidos pedidos que eu próprio fiz à Comissão para proceder a essa reflexão. Gostaria que a Mesa tivesse presente que essa reflexão, se não foi feita, não foi seguramente por responsabilidade ou omissão do grupo parlamentar do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chamo a vossa atenção para o facto de que não vale a pena fazer a história do que se passou na Comissão porque todos, por consenso, concordaram com o reagendamento desta matéria. Talvez esses problemas devessem ser colocados na Conferência de Representantes dos Grupos Parlamentares, quando se pôs o problema de estes projectos de lei subirem todos, conjuntamente, a Plenário.
Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP):.- Sr. Presidente, há uma questão muito simples que está colocada e que é prévia ao debate, sendo por isso matéria de interpelação: há um ponto do projecto de lei do PS sobre o qual é entendimento geral que não tem qualquer sentido no quadro actual, a exigência de 213 para a votação dos inquéritos. O

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que se pergunta, para perceber como é que este debate decorre, dado o que se passou no primeiro debate, é se o PS formaliza ou não a retirada dessa norma.
Trata-se de uma pergunta concreta, que peço ao Sr. Presidente que enderece à bancada do PS, para sabermos em que quadro é que este debate decorre.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu entendo que, quando se concorda com o agendamento de um projecto sem apresentar nenhuma proposta de alteração, isto significa que não se quer alterar o projecto de lei na fase da sua introdução no Plenário. Porventura noutro momento será possível fazer alterações.
Srs. Deputados, vamos passar à discussão dos projectos. Para apresentar o respectivo projecto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o PCP tem vindo a expressar, desde há muito, a opinião de que importa proceder a uma revisão do regime jurídico dos inquéritos parlamentares, por forma a aumentar a respectiva eficácia e a impedir situações como as que marcaram as duas anteriores legislaturas, em que se verificaram diversas situações de bloqueamento de inquéritos sem que as comissões parlamentares dispusessem dos meios legais para as ultrapassar.
Por isso, logo no início da presente legislatura, o PCP apresentou o projecto de lei n.º 24/VII, de alteração do regime jurídico dos inquéritos parlamentares, que, embora tenha sido já objecto de debate na generalidade em Novembro de 1995, volta hoje a estar em apreciação, juntamente com outras propostas sobre a mesma matéria.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, das propostas apresentadas pelos vários grupos parlamentares ressaltam cinco questões concretas que importa analisar. Referir-me-ei de seguida a cada uma delas, apresentando as propostas do PCP e tecendo algumas considerações relativamente às propostas do PS e do PSD, sem esquecer que estamos neste momento a apreciar iniciativas legislativas na generalidade e que haverá seguramente oportunidade, na especialidade, para apreciar mais detalhadamente cada uma das questões em debate.
A primeira questão diz respeito à eventual suspensão dos inquéritos parlamentares quando esteja em curso algum processo-crime com objecto semelhante. Dispõe a lei actual, como se sabe, que, informada a Assembleia da República pelo Procurador-Geral da República de que sobre o objecto de inquérito parlamentar se encontra em curso processo criminal com despacho de pronúncia transitado em julgado, se suspende o processo de inquérito parlamentar até ao trânsito em julgado da correspondente sentença judicial. Propõe o PCP que esta suspensão deixe de ser automática e, que seja a Assembleia a deliberar se suspende ou não o inquérito parlamentar em causa. É que, de facto, não existe qualquer violação do princípio da separação de poderes pelo facto de, sobre uma qualquer matéria, poderem decorrer em simultâneo um processo criminal e um inquérito parlamentar, pelo simples facto de as funções do tribunal e as funções da Assembleia da República exercidas por via de uma comissão de inquérito serem absolutamente diferenciadas, quanto à sua natureza, quanto ao objectivo a atingir e quadro às consequências.
Como bem refere o Dr. Carlos Lopes do Rego, "a perspectiva que norteia a actuação das comissões de inquérito e o escopo da sua actuação são radicalmente diferentes dos que caracterizam a actividade dos tribunais que, eventualmente, se debrucem ou hajam debruçado sobre o mesmo material fáctico ou probatório. Não visam, na realidade, as comissões dirimir litígios ou reprimir violações da legalidade por parte de sujeitos determinados, mas avaliar globalmente situações, em face de parâmetros de natureza essencialmente política, com vista a habilitar o órgão máximo de representação democrática a adoptar as medidas adequadas, no âmbito da sua competência política ou legislativa. Os relatórios e, conclusões das comissões de inquérito não têm qualquer repercussão nos processos judiciais que hajam versado sobre os mesmos factos ou situações sobre que tenha incidido o inquérito parlamentar, assim se assegurando a plena independência dos tribunais no exercício da função jurisdicional".
A proposta do PSD sobre esta matéria, que vem basicamente no mesmo sentido da proposta do PCP, propondo embora que seja a própria comissão a deliberar sobre a suspensão do inquérito, representa - é bom salientar este facto - uma inversão total das posições que o PSD defendeu no passado. Mais: o PSD, na anterior legislatura, no cumprimento do papel que a si próprio se atribuiu de bloqueador de inquéritos parlamentares, impôs a esta Assembleia a regra da suspensão automática dos inquéritos sobre cuja matéria existisse processo criminal e usou inclusivamente essa norma para bloquear a realização de um inquérito parlamentar à aplicação das verbas do Fundo Social Europeu, visando ilibar os seus governos da responsabilidade política por uma situação de verdadeiro escândalo nacional.
A segunda questão diz respeito ao alargamento do, prazo para a realização dos inquéritos parlamentares. O PCP propõe que seja a própria resolução da Assembleia da República que decide da realização do inquérito a determinar o respectivo prazo, fixando-se, em caso de omissão, um prazo supletivo de um ano. Não há qualquer vantagem para a eficácia dos inquéritos parlamentares em estabelecer um prazo taxativo para a sua realização, pelo contrário. A fixação de um prazo improrrogável para a realização de diligências serviu ao PSD para impedir o aprofundamento de investigações parlamentares e para privar as comissões de inquérito da possibilidade de levar até ao fim as diligências necessárias ao cumprimento do seu objecto. Não tem este regime outra justificação que não seja essa e deve, por isso, ser alterado.
A terceira questão diz respeito à recusa de enviar documentos ou de prestar depoimentos perante comissões parlamentares de inquérito. Entende o PCP que essa possibilidade deve ser limitada ao mínimo, pelo que propomos que só exista possibilidade de recusar o envio de documentos ou a prestação de depoimentos nos mesmos casos em que tal recusa seja possível perante os tribunais. Não se trata de equiparar as comissões de inquérito aos tribunais, mas de resolver este problema com recurso a fórmulas provadas pela sua utilização em processo penal. As disposições do Código de Processo Penal relativas à invocação do segredo profissional (artigo 135.º), do segredo de funcionário (artigo 136 º) e do segredo de Estado (artigo 137.º) na prova testemunhal e na apresentação de documentos (artigo 182.º) fornecem uma base que, naturalmente com as adaptações devidas, permite encontrar uma solução adequada à natureza dos inquéritos parlamentares.
O que não nos parece aceitável é a proposta do PS que considera de admitir a recusa de depoimento de funcionários e agentes com fundamento em "interesse superior do

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Estado" justificado pelo Governo. É absolutamente inaceitável. Uma disposição desta natureza permitiria a qualquer governo ilibar-se de responsabilidades perante qualquer comissão de inquérito, justificando a recusa de depoimentos comprometedores com base no tal "interesse superior do Estado" que competiria ao governo aferir. Uma coisa é, nos termos da lei vigente, invocar o segredo de justiça ou o segredo de Estado, que são institutos juridicamente regulados, algo de muito diferente seria poder invocar um interesse governamental como "o interesse superior do Estado", sem controlo, por mera conveniência, colocando afinal no arbítrio do governo a viabilização dos inquéritos parlamentares. .
Quanto às questões suscitadas pelo projecto de lei do PSD relativamente à coadjuvação das. comissões de inquérito pelas autoridades judiciárias e ao acesso a matérias em segredo de justiça, entendemos. que estas justificam, na especialidade, uma cuidadosa ponderação, por forma a evitar que os valores que o segredo de justiça visa proteger sejam postos em causa e por forma a prevenir situações que se possam traduzir na violação de direitos fundamentais ou na impossibilitação do desempenho de funções constitucionalmente atribuídas aos tribunais.
A quarta questão diz respeito à publicidade dos trabalhos das comissões parlamentares de inquérito. Só quem tenha algo a esconder pode recear a publicidade dos inquéritos parlamentares e o acompanhamento dos seus trabalhos pela opinião pública. Entendemos que, também nesta matéria, o recurso às normas reguladoras do processo penal se afigura muito útil. Os trabalhos das comissões de inquérito devem ser públicos nos mesmos termos em que o são ás audiências de julgamento em processo criminal. Não é adequada a solução actual que faz depender de deliberação da comissão de inquérito a possibilidade de os trabalhos - e designadamente os depoimentos - serem públicos. Há toda a vantagem para a transparência no funcionamento dos inquéritos que esta margem de discricionariedade seja limitada e que só em casos em que manifestamente esteja em causa a dignidade das pessoas (para usar a expressão do artigo 87 º do Código de Processo Penal) possa a comissão funcionar à porta fechada.
A proposta do PS em matéria de publicidade dos trabalhos das comissões de inquérito é menos restritiva do que a lei vigente mas parece-nos, ainda assim, muito restritiva. É uma questão que, no entanto, poderemos discutir melhor na especialidade.
A quinta e última questão diz respeito à proposta do PS de que o relatório final das comissões de inquérito seja aprovado por maioria de 2/3. Aqui, estamos frontalmente em desacordo. Todos sabemos que o facto que mais contribuiu para o descrédito dos inquéritos parlamentares nas duas últimas legislaturas foi o de, dispondo o PSD de maioria absoluta, ter funcionado como um verdadeiro airbag das responsabilidades políticas do governo perante os inquéritos parlamentares, socorrendo-o prontamente em caso de qualquer acidente.
Por força da maioria, valia tudo: desde a inviabilização de inquéritos até à aprovação de relatórios sem correspondência com os factos apurados no decurso dos inquéritos. Mas este problema não se resolve por alteração das regras gerais de apuramento da vontade maioritária. Este problema é político e foi resolvido pelos eleitores, que retiraram a maioria absoluta ao PSD e não a deram ao PS.
Esta proposta do PS, se fosse aprovada, faria regressar a possibilidade, que o PSD tinha, de bloquear inquéritos, através da atribuição ao PS de um direito de veto sobre os relatórios finais das comissões de inquérito. Como sem os votos do PS não é possível formar uma maioria de 2/3, o PS disporia de um direito de veto em matéria de inquéritos parlamentares, a utilizar ao sabor das conveniências do Governo que apoia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, entendemos que é útil que todas as iniciativas legislativas hoje em discussão possam baixar à Comissão para apreciação ponderada na especialidade. Pensamos que é possível melhorar o regime jurídico dos inquéritos parlamentares, mas importa afirmar desde já que, em votação final global, não poderemos juntar o nosso voto a soluções como a que permitiria a recusa de prestar depoimentos invocando "interesses superiores do Estado" ou que faria depender de maiorias de 2/3 a aprovação dos relatórios das comissões de inquérito.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, são 18 horas, pelo que vamos proceder às votações que estão agendadas. Temos três votações na generalidade e a primeira refere-se ao projecto de lei n.º 195/VII - Lei-quadro de apoio ao associativismo (PCP).
Srs. Deputados, vamos proceder à respectiva votação.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP e de Os Verdes.

Vamos agora proceder à votação do projecto de lei n.º 260/VII - Reembolso dos montante pagos a título de propinas de matrícula ou de inscrição (CDS-PP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP e de Os Verdes e votos a favor do PSD e do CDS-PP.

Vamos votar agora o projecto n.º 271/VII - Reembolso de propinas do ensino superior pagas nos anos lectivos de 1992 a 1995 (PSD).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PCP, votos a favor do PSD e do CDS-PP e a abstenção de Os Verdes.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de três pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (João Corregedor da Fonseca): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias emitiu parecer no sentido de autorizar os Srs. Deputados José Gama e José Carlos Correia da Mota de Andrade a prestarem declarações, na qualidade de testemunhas, no âmbito do processo n.º 185/96 - 1.º Juízo, do Tribunal de Círculo e de Comarca de Bragança, em audiência de julgamento marcada para 11 de Março de 1997, pelas 10 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Vamos votar.

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário (João Corregedor da Fonseca): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias emitiu parecer no sentido de autorizar os Sr. Deputado Miguel Ginestal a prestar declarações, por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo n.º 1841/95 - 2.º Juízo, do Tribunal Judicial de Viseu.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário (João Corregedor da Fonseca): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira a prestar declarações, por escrito, querendo, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo n.º 767/95 - 17.º Juízo - 3.ª Secção, do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Vamos continuar os nossos trabalhos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva, para um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado António Filipe: V. Ex.ª disse, e bem, na sua intervenção, que estas iniciativas agora em causa, e particularmente a iniciativa do meu partido, visam melhorar o instituto do inquérito parlamentar, dignifica-lo, mas é bom que se tenha presente que há também, por arrastamento, uma iniciativa que já baixou à comissão sem votação e que consagra uma solução que não é em nada dignificadora do instituto do inquérito parlamentar, bem pelo contrário, é uma solução de veto da actual maioria relativamente aos inquéritos parlamentares.
É bom que fique claro que não se dignifica o instituto parlamentar por esta via e que não daremos, em nenhuma circunstância, anuência a semelhante solução.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Relativamente à sua intervenção e ao projecto de lei do seu partido desejava obter dois esclarecimentos. Em primeiro lugar, queria saber da abertura do PCP no sentido de, na especialidade, modificarmos a vossa proposta no que se refere aos prazos das comissões de inquérito parlamentar, pois parece-nos excessivo que, à partida, VV. Ex.as prevejam o prazo de um ano e ainda prorrogável. Parece-nos que essa dignificação do inquérito parlamentar deve passar também por uma aceleração do seu funcionamento e da sua conclusão.
Em segundo lugar, relativamente à solução proposta quanto ao sistema de publicidade das comissões parlamentares de inquérito, parece-nos que a solução actuai é equilibrada e que a solução proposta pelo PCP tem aqui um laivo de jurisdicionalização destas comissões, ao apelar para as soluções que o Código de Processo Penal tem para os casos de julgamento.
Por outro lado, não compreendo bem se o PCP entende que devia ser o presidente da comissão de inquérito parlamentar que funcionaria coiro juiz para decidir sobre a publicidade ou não das reuniões da comissão, tal qual acontece quanto aos julgamentos nos tribunais. Esta parece-nos não ser uma solução adequada, pois esta via de remissão para o processo penal tem vários inconvenientes, designadamente este.
Assim, queria saber da abertura do vosso grupo parlamentar para, em sede de especialidade, alterar esta vossa proposta inicial, designadamente e, quanto à minha segunda pergunta, aproximando-a ou mantendo o regime actual.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A palavra ao Sr. Deputado António Filipe, para responder.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, em primeiro lugar, agradeço as questões pertinentes e interessantes que colocou e a que procurarei dar resposta.
Começo, aliás, por dizer que tive oportunidade de manifestar a posição que temos relativamente à proposta que faria depender a aprovação dos relatórios finais das comissões de inquérito parlamentar de maiorias de 2/3 e expliquei a razão por que somos frontalmente contra essa possibilidade.
Relativamente à questão dos prazos para os inquéritos parlamentares, a proposta que fazemos assenta na base que deve ser a própria resolução da Assembleia da República a determinar um prazo para realização do inquérito parlamentar. Aliás, pode haver soluções muito diversas conforme o universo da matéria que esteja em apreciação no âmbito do inquérito parlamentar e, consequentemente, o Plenário, quando aprova a resolução, deve determinar e ,avaliar o tempo previsivelmente necessário para levar a cabo o inquérito parlamentar.
Todavia, fundamentalmente, o que pretendemos evitar é que se crie uma situação em que, por força de uma delimitação taxativa do tempo para a realização do inquérito parlamentar, possa abruptamente pôr-se termo ao inquérito deixando de fora a realização de diligências que, por hipótese, sejam consideradas por todos os grupos parlamentares como necessárias para que o inquérito parlamentar possa ser conclusivo.
Portanto, o que pretendemos é que o inquérito parlamentar possa ser levado a cabo sem protelamentos, não se criando uma situação em que, por força de uma "guilhotina" temporal que se estabelece na lei, o inquérito parlamentar deixe de poder realizar-se convenientemente.

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Essa é, para nós, a questão fundamental que importará discutirmos na especialidade.
Quanto à questão da publicidade das comissões de inquérito parlamentar, não há, do nosso ponto de vista, Sr. Deputado Guilherme Silva, qualquer ideia da sua judicialização. Nesse aspecto, o que nos parece é que devem ser rigorosamente delimitadas as situações e, de uma forma restritiva, as possibilidades de recusa à prestação de depoimentos perante as comissões de inquérito ou da facultação de documentos que sejam solicitados e que as normas restritivas existentes a nível de processo penal sobre esta matéria são uma boa base de trabalho. Mas, sendo uma boa base de trabalho, há adaptações que têm que ser feitas, designadamente a questão que referiu dos poderes do presidente da comissão de inquérito parlamentar.
De facto, não é nosso intuito presidencializar (permitam-me a expressão) as comissões parlamentares de inquérito porque a nossa ideia é que as deliberações tomadas para aplicação destas normas restritivas deverão sê-lo pela própria comissão.
No entanto, a ideia fundamental da nossa proposta e era essa que gostava de deixar claro - é limitar ao mínimo, como tive oportunidade de dizer, as possibilidades de recusa de prestação de depoimentos. Ou seja, não tornar essa opção de prestar ou não depoimentos perante a comissão de inquérito como algo de discricionário e que ficaria, por hipótese, na discricionariedade de qualquer entidade, designadamente do Governo, e pensamos que as normas existentes no Código de Processo Penal são uma boa base para a discussão na especialidade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A palavra ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes, para apresentar o projecto do PSD.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É por todos reconhecida a importância basilar aos próprios fundamentos do nosso Estado de direito que tem o instituto dos inquéritos parlamentares. Não vou, por isso, repisar uma matéria que é por todos conhecida nem tecer considerações, em termos de direito comparado, com aquilo que se passa em democracias que nos são afins e parceiras privilegiadas.
Um aspecto, tão só, me permito enfatizar. Não procedem nem podem proceder os argumentos dos que esgrimem o princípio sagrado da independência dos tribunais para pôr em causa a extensão e os limites dos poderes de investigação das comissões parlamentares de inquérito porque, Srs. Deputados, entendamo-nos numa coisa: a independência dos tribunais assenta no princípio da separação de poderes e esse princípio só é posto em causa quando alguma das partes invade competências que são próprias de outra, exorbitando dos seus poderes e desrespeitando a Constituição e a lei. Seria assim se a Assembleia da República procurasse julgar e condenar cidadãos ou entidades, como também o seria se assistíssemos a processos de fiscalização e julgamento político dos entes e instituições públicas por parte dos tribunais.
Coisa completamente diferente se passa no caso presente, dos inquéritos parlamentares, que constituem não só um direito como a expressão do dever da Assembleia da República em apreciar e exercer controlo democrático sobre os actos do Governo e da Administração.
Ora, o que, infelizmente, acontece - e o esforço parlamentar de inquérito ao caso Camarate é um bem elucidativo e triste exemplo -, é que a deficiente interpretação da lei e da Constituição sobre esta matéria tem, na prática, obstaculizado ao normal funcionamento e ao cabal apuramento da verdade em alguns inquéritos.
De facto, já na IV, depois na V e agora na VI Comissão de Inquérito ao Acidente de Camarate foram os trabalhos parlamentares prejudicados pela posição assumida por alguns órgãos jurisdicionais, situação intolerável e que urge, de uma vez por todas, remover.
Entendeu durante muito tempo o PSD que esta questão apenas se colocava no plano interpretativo e, logo, a seu tempo corrigível por si. Só. que a realidade demonstrou que, mesmo após um Acórdão do Tribunal Constitucional, que deu razão às posições defendidas pelas comissões de inquérito e por esta Assembleia, repetiu-se a lamentável situação de os trabalhos parlamentares serem mais uma vez postos em causa pela leitura restritiva que órgãos jurisdicionais teimam em fazer deste dispositivo constitucional.
Não sobram, pois, quaisquer dúvidas de que se impõe uma clarificação legal explícita que ponha termo a estes equívocos e restaure plenamente toda a dignidade e relevância institucional e política que as funções parlamentares de inquérito têm de ocupar no nosso Estado de direito.
É esta, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a motivação do projecto de lei aqui, hoje, agendado por iniciativa do Partido Social Democrata. O PSD propõe que a lei explicitamente diga, como a Constituição, que as comissões parlamentares de inquérito detêm todos os poderes de investigação em que estão investidas as autoridades judiciais e o sentido dessa norma não possa ser o de se admitir a recusa de fornecer ou permitir o acesso a documentos com base na invocação do segredo de justiça ou do segredo de Estado, mas antes que o eventual fornecimento ou acesso das comissões a essas matérias investe os Deputados seus membros no dever de confidencialidade e estrito sigilo a que também se encontram vinculados os agentes judiciários que o compartilham.
Propõe também o PSD que se devolva à própria Assembleia da República a apreciação soberana sobre a suspensão ou não dos seus trabalhos de inquérito, quando informada pelo Procurador-Geral da República da existência de um processo criminal em curso sobre o mesmo objecto.
Por último, aproveitamos ainda esta iniciativa para rever e flexibilizar a competência para prorrogação do prazo de realização de inquéritos parlamentares, sem perder de vista a preocupação de continuar a não permitir, em matérias com esta delicadeza, o arrastar indefinido dos processos de inquérito.
São estas, em suma, as motivações e as propostas do Partido Social Democrata a esta Câmara, com o intuito assumido de remover obstáculos que ainda permanecem no caminho que esta Assembleia legitimamente tem o direito, e o dever, de percorrer para contribuir ao apuramento da verdade sobre comportamentos e omissões que incompreensivelmente continuam a rodear o dramático caso de Camarate.
Queremos acreditar que em mais este esforço seremos acompanhados, responsavelmente, por todas as bancadas deste Hemiciclo.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: - A palavra ao Sr. Deputado Jorge ferreira, para um pedido de esclarecimento.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, ouvi com toda a atenção a sua intervenção e confesso que o meu primeiro impulso é saudá-lo e dar-lhe as boas vindas a uma ideia que já foi alvo de uma proposta do meu grupo parlamentar, em Janeiro do ano passado, e o meu segundo impulso, a que não resisto, é pôr-lhe a seguinte questão: como V. Ex.ª sabe, já as IV e V Comissões de Inquérito ao Acidente de Camarate se queixaram nos seus relatórios do comportamento, que V. Ex.ª acabou de descrever, por parte de algumas autoridades, inviabilizando, dificultando ou obstaculizando o pleno cumprimento do objecto dessas IV e V Comissões Parlamentares de Inquérito ao Acidente de Camarate.
Como V. Ex.ª se recorda, a lei dos inquéritos parlamentares em vigor, concretamente o seu artigo 5.º, que é o tal artigo que manda suspender e parar os inquéritos parlamentares que estejam a ocorrer sempre que o Procurador-Geral da República informe o Presidente da Assembleia da República de que está em curso investigação judicia], tem precisamente como fonte, origem e autor o Grupo Parlamentar do PSD que, no seu projecto de lei da VI Legislatura, propôs expressamente a introdução desta limitação ao livre curso dos inquéritos parlamentares em face desta comunicação do Sr. Procurador-Geral da República.
Considerando que apresentámos, como já disse, há um ano, esta proposta e que nos felicitamos por o PSD a ela agora ter aderido, o que lhe pergunto é o seguinte: este projecto de lei, geral e abstracto como tem de ser, do Grupo Parlamentar do PSD tem por exclusiva motivação o que aconteceu na Comissão de Inquérito ao Acidente de Camarate, que está suspensa, aliás, por deliberação do Plenário, ou corresponde a uma mudança de convicção profunda do Grupo Parlamentar do PSD sobre a natureza, o conteúdo e o papel dos inquéritos parlamentares puma democracia?
É que, Sr. Deputado, não resisto a lembrar-lhe que foi exactamente o seu partido que introduziu na lei a disposição que os senhores agora, por causa de Camarate, e ainda bem, querem alterar, porque é importante, politicamente, saber se o PSI) mudou a sua convicção sobre esta matéria ou se está apenas a utilizar um projecto de lei para resolver um louvável problema que tem de ser resolvido e que julgo que nos preocupa a todos, relacionado com o inquérito parlamentar em curso sobre Camarate, mas que, enfim, nesta segunda hipótese, terá para nós muito menos valor político do que se, como espero, V. Ex.ª me confirmar, ao responder-me, que os senhores reconhecem que, afinal, na anterior legislatura, erraram, tendo-se enganado.
Sr. Deputado, errar é humano, temos sempre é que ter a humildade de o reconhecer.

O Sr. Presidente: - A palavra ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes, para responder.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, agradeço-lhe a pergunta que me fez, até porque me dá a oportunidade de esclarecer alguma incorrecção nas suas palavras.
Em primeiro lugar, Sr. Deputado, quero lembrar-lhe que, independentemente de quem tenha sido à iniciativa, a lei em vigor foi aprovada nesta Câmara por unanimidade, ou seja, a sua bancada também se reviu no texto final dessa lei ou, pelo menos, assim o expressou no seu voto.
Para além disso, e em qualquer circunstância, recordo-lhe também que o que está em causa no actual artigo 5.º não tem nada a ver com o que aconteceu à VI Comissão de Camarate mas, sim, com a suspensão obrigatória ou não dos trabalhos de uma comissão de inquérito, caso esteja a decorrer um processo idêntico nas vias judiciais com despacho de pronúncia transitado em julgado.
Como o senhor se recordará, o problema que esteve na génese da suspensão dos trabalhos da VI Comissão de Camarate .teve a ver com a recusa de fornecimento de elementos por parte de um tribunal, com base no segredo de justiça. Portanto, não teve rigorosamente a ver uma coisa com a outra e aproveito para fazer esta precisão e dar este esclarecimento ao. Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quanto à motivação do PSD, posso dizer-lhe que ela tem a ver, em termos próximos, com os factos que levaram à suspensão, também ela decidida por unanimidade desta Câmara, da VI Comissão de Camarate. Aliás, a razão de ser dessa suspensão deu-se, como já tive oportunidade de referir ao Sr. Deputado, com a recusa por parte de um tribunal em fornecer elementos tidos por necessários ao andamento dos trabalhos da Comissão alegando o segredo de justiça.
Esta é, pois, uma das partes que o PSD pretende ver alterada no diploma agora apresentado para alteração da lei em vigor, esperando que, com as propostas que, em algumas matérias, são congéneres com as que o PP já apresentou e com muitas das que constam do projecto de lei do PCP, possamos encontrar, em sede de especialidade, uma solução que não só responda à motivação próxima do PSD, de ultrapassar os obstáculos que levaram à suspensão da VI Comissão de Camarate, mas também aproveite para, em alguns aspectos importantes, dignificar o instituto dos inquéritos parlamentares.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero começar esta intervenção pela referência ao programa eleitoral do PS e ao contrato de legislatura a propósito da revisão do Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares, e cito: "Urge pôr termo a uma situação em que os titulares de cargos políticos não vêm assumindo plenamente a responsabilidade pelos actos praticados no exercício dos seus cargos, quer por si ou pelos seus colaboradores, nomeadamente: deverão reformular-se as comissões de inquérito quanto à sua composição, regras de funcionamento e de deliberação e respeito das competências próprias dos tribunais".
Neste momento, e pese embora a presente iniciativa legislativa do Grupo Parlamentar do PSD, é importante lembrar a responsabilidade deste partido, nomeadamente quanto ao desprezo que sempre evidenciou pelo instituto dos inquéritos parlamentares, os quais não se compadeciam com a forma como exercia o poder, que se queria acima de qualquer critica, fiscalização ou contestação. O PSD agiu, então, com total arrogância procedendo à governamentalização da Assembleia da República.

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Vozes do PS : - Muito bem!

O Orador: - É conveniente lembrar que na legislatura anterior, em 23 inquéritos propostos, cinco foram aprovados, seis foram rejeitados, cinco não foram admitidos ou votados e sete foram propostos sob direito potestativo.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Todos os instrumentos vivificantes da democracia, fossem eles quais fossem, que pudessem perturbar minimamente o poder estabelecido, ou seja, o "Estado laranja", eram deliberadamente esmagados no rolo compressor da maioria existente. Eram os tempos das forças de bloqueio, da oposição destrutiva... Enfim, o tempo de quem não pensa como nós é, naturalmente, contra nós!...
Como decorre da lei, os inquéritos parlamentares têm por função vigiar o cumprimento da Constituição e das leis e apreciar os actos do Governo e da Administração. É nesta medida que continuamos a defender, como sempre o fizemos, que os inquéritos parlamentares têm, por natureza, carácter instrumental, pois a sua função não consiste em julgar mas, sim, em habilitar a Assembleia da República com os elementos e factos apurados, a fim de sobre eles se pronunciar, podendo, eventualmente, conduzir à adopção de medidas legislativas sobre o assunto inquirido.
Os inquéritos parlamentares são; assim, particularmente vocacionados, como instrumento de função de fiscalização política da Assembleia da República, para a apreciação dos actos do Governo e da Administração.

Vozes do PS : - Muito bem!

O Orador: - Todos temos consciência que os parlamentos estão, nas democracias modernas ocidentais, a jogar decisivamente o seu futuro. Defendemos hoje, que estamos no poder, aquilo que defendíamos na oposição: os parlamentos têm de colocar-se no sistema político como um epicentro do debate político nacional, do controlo democrático e da acção legislativa. Para o fazer têm de reforçar os meios de intervenção política, credibilizar os seus instrumentos de fiscalização e dar transparência plena aos seus actos e aos seus titulares.
As comissões de inquérito são um instrumento decisivo para a real credibilização dos instrumentos de fiscalização desta Assembleia. E a partir delas que o Parlamento obtém, ou deverá obter, os elementos e as informações necessárias a uma correcta avaliação dos assuntos que lhe estão confiados, sem esquecer a importância que têm para o exercício de um adequado controlo dos abusos e irregularidades do Governo e da Administração Pública.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se é verdade que não se pode subalternizar um inquérito efectuado no âmbito de uma comissão de inquérito da Assembleia a uma qualquer inquirição judicial, ou esta àquela, não é menos verdade que urge encontrar formas de compatibilização entre os interesses e objectivos prosseguidos por estes órgãos de soberania.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, continuamos a defender, em coerência com o que assumimos no passado, que é necessário aperfeiçoar e melhorar o regime jurídico das comissões de inquérito. Da mesma forma, entendemos que os relatórios das comissões de inquérito deverão reflectir a verdade dos factos que foi possível apurar e não apenas o mero predomínio de uma qualquer maioria parlamentar, seja ela qual for. A isto chama-se rigor!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - A prática política do PSD, no passado, foi sempre a de cercear o âmbito de inquirição das comissões de inquérito, com o objectivo de branquear as acções do seu governo e da Administração através do voto de força, com o objectivo de impedir a descoberta da verdade.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Lá isso é verdade!

O Orador:'- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é que o PSD não tenha o direito de mudar a sua prática, bem como os seus entendimentos, o que não aceitamos é que queira fazer tábua rasa do seu passado recente e se arrogue no direito de, agora na oposição, defender aquilo a que antes de opôs.
Aliás, a confusão e o desacerto no Grupo Parlamentar do PSD é de tal monta que chega ao ponto de propor soluções, como a que se prende com a eliminação do n.º 6 do artigo 13.º da Lei n.º 5/93, de 1 de Março, a propósito das condições em que pode haver recusa de depoimento fundamentado à comissão de inquérito, quando, ainda recentemente nesta Câmara, mais concretamente em Dezembro de 1995, criticou violentamente outros partidos que propuseram soluções idênticas ou análogas, invocando, então, o PSD que os fundamentos constantes da lei, o segredo de Estado e o segredo de justiça, eram fundamentos sérios, e cito: "é que não se pode deixar de atender na existência e na pendência de uma comissão de inquérito".
Srs. Deputados do PSD, a vossa incoerência é por demais evidente! A vossa acção política, por tão flutuante e errante, arrisca-se mesmo a já não poder ter como ponto de referência os próprios ventos!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS não quer para si próprio um regime jurídico das comissões eventuais de inquérito que permita à maioria que sustenta o Governo poder extrair conclusões de comissões de inquérito apenas por si própria. O que o PS deseja é que, nesta matéria, a lei seja tão prudente e tão cautelosa quanto necessário for,. razão pela qual não somos insensíveis à posição dos restantes grupos parlamentares no que respeita nomeadamente à maioria necessária para aprovação das conclusões de inquérito, pelo que, em sede de especialidade, estamos disponíveis, de forma franca e aberta o digo, a encontrar os necessários consensos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Até que enfim!

O Orador: - O regime das comissões de inquérito é daquelas matérias que deve servir para unir e não para dividir.
Em suma: as conclusões das comissões de inquérito parlamentar terão de ter credibilidade perante o País, credibilidade essa que o PSD pôs em causa no passado. O Grupo Parlamentar do PS reitera a sua disponibilidade para, em conjunto com os restantes grupos parlamentares, viabilizar um texto global, o qual será, com certeza, muito mais enriquecedor para o instituto em causa.

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Por último, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o PS afirma, desde já, a sua intenção de propor, na sede própria, a audição de diversas entidades, tais como a Procuradoria-Geral da República, Conselho Superior da Magistratura, Conselho Superior do Ministério Público e Ordem dos Advogados,...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Para quê?

O Orador: - ... com o objectivo de se encontrarem soluções adequadas, nomeadamente no que respeita ao disposto no artigo 13.º

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, creio que V. Ex.ª acabou de apresentar a nota justificativa do projecto de lei do PS, não apresentando, seguramente, o projecto de lei e o seu articulado, porque, de facto, tudo o que acabou de dizer existe na nota justificativa do vosso projecto de lei mas, depois, tudo é traído no articulado.
Sr. Deputado, então, agora que temos uma oportunidade parece-me que única - para ter um Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares a sério, que consiga fiscalizar com eficácia, com imparcialidade, com oportunidade, os actos do Governo e da Administração, com todos os requisitos que durante muitos anos o PS disse que queria para credibilizar este instituto, que também, na nossa opinião, é fundamental numa democracia moderna, então, agora, repito, o senhor não acha contraditório que, logo no articulado, o Grupo Parlamentar do PS não tenha encontrado melhor instrumento para atingir estes objectivos do que, na prática, auto-atribuir um direito de veto às deliberações das comissões de inquérito?

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Não ouviu o que eu disse!

O Orador: - Ouvi perfeitamente! Mas os senhores tiveram um ano para substituir isto e não o fizeram!... Também há um ano ouvi Deputados da sua bancada dizerem: os senhores não se preocupem, não é nada disso que estão a dizer, porque nós estamos dispostos a alterar isso... Mas passou um ano, Sr. Deputado, e não alteraram nada, podendo fazê-lo!...
Sr. Deputado, faço-lhe um desafio: faça favor, entregue na Mesa - pode fazê-lo -, em nome da sua bancada, um projecto de lei de alteração ao vosso projecto de lei no que respeita à maioria de 2/3, porque, pode ter uma certeza: nós não consentiremos como, aliás, já há um ano o meu colega de bancada Luís Queiró dizia - que os senhores tentem, ainda que seja ao de leve, obter por via legislativa o que não obtiveram por via eleitoral.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, para dar credibilidade à sua afirmação que não ponho em causa, mas falta o resto - Sr. Deputado, entregue já, por favor, na Mesa, uma alteração a esta disposição do vosso projecto de lei...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Vamos para a especialidade!

O Orador: - ... e o meu pedido de esclarecimento estaria, nessa circunstância, completamente retirado. Se V. Ex.ª não o fizer, tal como dissemos há um ano, pela nossa parte, terá de compreender que é em nome da coerência do seu partido que não poderemos viabilizar o vosso projecto de lei.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, deseja responder já ou no final dos restantes pedidos de esclarecimento?

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS) - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes; começo por assinalar que estou inteiramente solidário consigo. Há semanas assim!... V. Ex.ª está numa semana "não", teve alguns problemas em S. João de Brito, no âmbito de outras funções que exerce e hoje veio aqui fazer muito mais a apreciação daquilo que, no seu entendimento, foi o comportamento do Grupo Parlamentar do PSD na anterior legislatura em relação a esta matéria do que verdadeiramente defender as suas soluções, o que não deixa de ser extraordinário. É que quem estiver a ouvir este debate vai pensar que estamos a discutir o projecto de lei do Partido Socialista pela primeira vez. Ora, não há nada mais errado do que isso!... Nós, em Novembro de 1995, discutimos este mesmo projecto de lei! ...E em Novembro de 1995 assinalámos, justamente, que era para nós inaceitável, como continua hoje a ser, a regra de que uma maioria como a do Partido Socialista pode vetar a aprovação do relatório na comissão porque o Partido Socialista pretende inscrever no seu projecto de lei e pretende inscrever em lei a regra de dois terços como a maioria necessária para a aprovação do relatório de uma comissão de inquérito.
Como já dissemos, isto é inaceitável! Demos 15 meses ao Partido Socialista para reflectir sobre esta matéria, para dialogar connosco - nós estivemos sempre abertos ao diálogo nesta matéria -, e VV. Ex.as não quiseram dialogar, como pelos vistos não quiseram reflectir. Hoje VV. Ex.as querem fazer a rábula política ao dizerem de novo no Plenário: "nós apresentaremos, em sede de especialidade, a alteração, prova da nossa abertura em relação a esta matéria".
Nós não podemos aceitar isto, Sr. Deputado!...

O Sr Luís Marques Guedes (PSD): - É uma teimosia.

O Orador: - Estamos a fazer um debate recorrente em relação a esta questão, que para nós é uma questão de princípio. Que fique muito claro que o PSD não votará favoravelmente o projecto de lei do Partido Socialista se os senhores dele não retirarem a questão da aprovação do relatório por uma maioria de dois terços. Que isto fique muito claro para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista!

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Aliás, Sr. Deputado, V. Ex.ª fez um reparo que eu considero justo em relação à questão do segredo de justiça, que tem a explicação que foi dada antecipadamente, se V. Ex.ª bem ouviu, pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes, em relação às razões próximas que levaram a essa nossa preocupação. Mas não quero deixar de lhe devolver - e sei que V. Ex.ª vai aqui usar de grande honestidade intelectual - um outro reparo em relação ao vosso projecto de lei. É que, do nosso ponto de vista, no projecto de lei do Partido Socialista não basta invocar superiores interesses do Estado, fundamentados pelo Governo, para a recusa de depoimentos de funcionários porque há uma Lei do Segredo de Estado onde estão previstas as condições em que isso pode ser feito, a forma como deve ser feita a fundamentação e a invocação legal que é preciso fazer em relação a essas matérias. E os senhores retiram isso da lei!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Claro!

O Orador: - Ora, parece-me que se o empenhamento é de todos em relação à construção de um sistema legal que credibilize e responsabilize os Deputados individualmente nas comissões de inquérito, os senhores também não podem ceder em relação a essa matéria, têm de fazer essa alteração.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, quero registar com agrado a parte final da sua intervenção, em que o Sr. Deputado manifestou a abertura do Partido Socialista para rever a sua posição nesta matéria, que diz , respeito à maioria exigível para aprovação dos relatórios finais das comissões de inquérito. Aliás, não foi por acaso que, no início deste debate, o meu camarada João Amaral interpelou a Mesa no sentido de saber qual era a abertura do Partido Socialista para rever a posição que tinha nesta matéria, porque esta é uma questão decisiva no projecto de lei que apresenta.
Portanto, a afirmação que o Sr. Deputado fez, que entendemos como um sinal de grande abertura, para, em sede de comissão, poder encontrar-se uma solução mais adequada, que não atribua a nenhum partido o direito de veto sobre as conclusões das comissões parlamentares de inquérito, é um facto que registamos com agrado e, assim, parece-nos existirem melhores condições para que, em sede de comissão, se possam encontrar, de facto, soluções adequadas, que possam reunir o maior consenso possível nesta matéria, já que é isso que consideramos desejável.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, quero dizer-lhe que a posição do Partido Socialista nesta matéria é a da arrogância absoluta de uma maioria relativa. O seu partido vem aqui, pela segunda vez, convencer os grupos parlamentares a votarem favoravelmente a baixa deste diploma, sem votação, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. VV. Ex.as deixaram passar estes meses todos para trazerem de novo o diploma a Plenário e querem convencer-nos outra vez com as mesmas promessas que fizeram anteriormente, ou seja, que o diploma baixaria à Comissão e que aí o alterariam. Quer dizer, os senhores não tomam a iniciativa de apresentar na Mesa alterações concretas a estes pontos e vêm agora, de novo, dizer que estão abertos a rever .º projecto de lei?
Srs. Deputados, se estão de boa fé apresentem na Mesa as alterações concretas a estes pontos. Não se pode dignificar o instituto do inquérito parlamentar criando um sistema de veto da maioria relativa nesta Câmara. E não é possível dignificar introduzindo uma norma como esta, espantosa, que VV. Ex.as aqui propõem, a de que, ao abrigo de interesses superiores do Estado - não se sabe quais, são vagos e indefinidos -, a entidade fiscalizada - por norma, os inquéritos parlamentares fiscalizam o Governo, a Administração - seja juiz dessa situação e possa recusar que funcionários da Administração venham aqui depor por razões. de superior interesse do Estado.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - VV. Ex.as sempre fizeram isso!

O Orador: - O visado, que é o Governo, a Administração, é que decide e arbitra essa situação? Isto é dignificar o instituto dos inquéritos parlamentares, Srs. Deputados? Se querem, efectivamente, a cooperação dos demais grupos parlamentares no aproveitamento de um contributo vosso para a dignificação deste instituto, apresentem, até ao termo da sessão, alterações na Mesa da Assembleia, revelem a vossa boa fé e quebrem essa arrogância absoluta de maioria relativa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder a todos os pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes. Dispõe para o efeito, como sabe, de 5 minutos.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, naturalmente, o meu muito obrigado pelos pedidos de esclarecimento que me dirigiram.
Eu tenho uma vontade enorme...

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - De alterar isto?

O Orador: - Ó Sr. Deputado Miguel Macedo, tenho uma vontade enorme de ler as declarações que o Sr. Deputado proferiu neste Plenário, no dia 2 de Dezembro de 1995, a propósito das alterações sugeridas pelo Partida Comunista no artigo 13.º do projecto de lei que este partido então apresentou. E vou lê-las para que V. Ex.ª perceba a incoerência que grassa por essa bancada. É que o senhor está hoje a defender e a propor uma coisa radicalmente diferente daquela que na altura considerou estruturante do Estado de Direito. Dizia assim: "Sr. Deputado, o artigo 13.º da actual lei, a Lei n.º 5/93, fixa as condições em que pode haver recusa de depoimento fundamentado à comissão de inquérito. Essa recusa pode assentar em dois fundamentos: o segredo de Estado e o segredo de justiça, naturalmente nos termos da lei que regula estas matérias.

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Assim, Sr. Deputado, parece-me mal que o projecto de lei do Partido Comunista afaste qualquer um destes fundamentos sérios a que não se pode deixar de atender na existência e na pendência de uma comissão de inquérito.".

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Está a dar-me razão!...

O Orador: - Os senhores propõem a revogação do n .º 6 do artigo 13.º!...O senhor não deu uma cambalhota, deu sucessivas piruetas e ainda não se sabe onde é que vai acabar!...
Portanto, Srs. Deputados do PSD, sejam coerentes pelo menos uma vez.
Acabei de citar declarações do Sr. Deputado Miguel Macedo, que constam do Diário da Assembleia da República de 2 de Dezembro de 1995.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Não é nada disso! Está a dar-me razão!

O Orador: - E sabe o que é que o senhor ainda disse mais nessa altura? Disse: "Julgo que este tipo de comportamento por parte do Partido Comunista é muito mau porque me parece que continua a enfermar aqui de uma questão que é conceitual, que é ideológica, digamos assim. É que para o Partido Comunista a separação de poderes não é tão importante como o é, por exemplo, para o Partido Social Democrata e para os partidos que partilham a necessidade de haver uma separação entre o poder judicial, o poder legislativo e o poder executivo. Julgo decorrer daí a confusão das propostas que fazem no vosso projecto de lei."
Quid juris, Sr. Deputado Miguel Macedo! Vamos ser rigorosos, vamos ser sinceros!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Onde está isso?

O Orador: - Está na página 321, Sr. Deputado Miguel Macedo.
Quanto a esta matéria penso que estamos esclarecidos.
Relativamente ao que foi referido pelos Srs. Deputados Jorge Ferreira e António Filipe, quero dizer, muito sinceramente, o seguinte: a nossa posição é muito clara, foi afirmada com toda a responsabilidade do alto daquela tribuna e, portanto, significa que, naturalmente, o PS assumiu um compromisso claro, que reitera e, portanto, no âmbito da especialidade não deixará de ter em conta a posição dos restantes partidos relativamente a esta questão.
Sobre este assunto o PS tem uma posição muito clara: não quer, como é óbvio, criar qualquer situação de direito de veto, como não quer que se repitam situações como as que aconteceram no passado. Isso é que não queremos!
Sr. Deputado Jorge Ferreira, quanto ao que aconteceu no passado, tivemos já a oportunidade de referir da tribuna os números, e esses, para nós, é que são absolutamente inacreditáveis. Isso é que não pode voltar a acontecer nesta Casa. As comissões de inquérito devem funcionar sem estarem sujeitas a coletes de forças como os que tiveram na anterior legislatura.
Portanto, significa isto que a posição do PS, em sede de especialidade, é aquela que referi e V. Ex.ª não vai deixar de ter a oportunidade de, aí, não só verificar isto mesmo mas verificar também que a nossa disponibilidade
é total e real.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Ferreira pede a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Para uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Miguel Macedo pediu já o uso da palavra para defesa da honra e consideração, mas como não faz parte da direcção da bancada do Grupo Parlamentar do PSD dar-lha-ei logo que termine o debate, o que ocorrerá dentro de alguns minutos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Miguel Macedo faz parte da direcção da nossa bancada.

O Sr. Presidente: - Peço imensa desculpa, mas não tinha essa ideia.
Tem a palavra, Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, julgo ser a primeira vez que, na Assembleia da República, invoco esta figura para responder à intervenção de um Sr. Deputado que não correspondeu às minhas melhores expectativas no apelo que fiz ao seu rigor e à sua honestidade intelectual.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Isso é ofensivo.

O Orador: - Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, o que se passou não tem rigorosamente nada a ver com o que V. Ex.ª citou e que me quis imputar. Aquilo que o senhor disse em relação a essa matéria é verdade - aliás, eu reli, para este debate, essas minhas informações só que V. Ex.ª esqueceu-se de ler o projecto de lei do Partido Comunista que diz, no n .º 6, o seguinte: "No decorrer do inquérito. a recusa de apresentação de documentos ou de prestação de depoimentos só se terá por justificada nos termos da lei processual penal.".
Ora, como lhe disse há pouco - e foi esse, justamente, o fundamento da minha pergunta e da minha interrogação ao Partido Comunista -, eu concedo na questão do segredo de justiça, mas pedia-lhe a honestidade intelectual de conceder também que na matéria do segredo de Estado VV. Ex.as têm uma falha.. E só fiz a pergunta ao Partido Comunista por estar preocupado com o facto de numa legislação destas não vir expressa nem a questão do segredo de justiça nem, a do segredo de Estado.
Portanto, a ilação que V. Ex.ª quis tirar em relação a esta matéria é totalmente injusta em relação àquilo que pretendi com a pergunta que fiz ao Partido Comunista, não tem qualquer suporte em relação ao fundamento dessa pergunta e é totalmente desfasada do entendimento que tinha na altura - e que mantenho neste momento - em relação à necessidade de estar salvaguardada ,quer a questão do segredo de justiça quer a questão do segredo de Estado.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações,, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

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O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, das duas uma: ou o senhor não subscreve o projecto de lei que o PSD acaba de apresentar, e então o senhor tem razão naquilo que diz, ou o senhor subscreve o projecto de lei do PSD e não tem razão absolutamente nenhuma.
Sr. Deputado, a acusação de falta de honestidade intelectual devolvo-lha directamente e sem "apeadeiros"! Já! Entendamo-nos quanto a isso, Sr. Deputado. É que as suas declarações constam do Diário. Quem fala em segredo de justiça e em segredo de Estado é o Sr. Deputado.
Sr. Deputado Guilherme Silva, também posso citar-lhe assuas declarações, se quiser. É um esforço um pouco maior, mas também o posso fazer.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Olhe que iria valorizar a sua intervenção!

O Orador: - Até agora poupei-o, mas também o posso fazer. As suas declarações estão um pouco mais à frente. Tenha calma, não esteja com esse ar, porque não vale a pena.
Sr. Deputado Miguel Macedo, o senhor é que deve ser franco. Os senhores propõem a revogação pura e simples do n.º 6 do artigo 13.º. Significa isso que no vosso projecto de lei se deixa de falar em segredo de justiça e em segredo de Estado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Para outro efeito que não aquele!

O Orador: - Portanto, ou o vosso projecto de lei está mal escrito, ou o senhor enganou-se, ou a falta de honestidade intelectual é exclusivamente sua.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tema palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, a sua resposta ao meu pedido de esclarecimento obriga-me a aprofundar um pouco mais este assunto, e julgo que o merece, porque é aqui que está a verdadeira essência da dignidade e da credibilidade ou não dos inquéritos parlamentares.
Compreendo que o PS, quando o PSD tinha maioria absoluta, tivesse engendrado esta proposta da maioria de dois terços para aprovar as conclusões das comissões parlamentares de inquérito como instrumento para ter alguma voz, para lá chegar também, na deliberação sobre as conclusões.
Entretanto, os senhores ganharam umas eleições com maioria relativa e poder-se-ia ter dado o caso de dizermos assim: o PS esqueceu-se de que tinha ganho as eleições, de que já não é necessária essa maioria de dois terços para ter acesso, com a sua opinião, as suas convicções e as suas posições,. às conclusões das comissões parlamentares de inquérito, mas, entretanto, esqueceu-se de tirar do diploma a maioria de dois terços.
Poder-se-ia ter pensado isso. O problema, Sr. Deputado - e tenho muita pena que o Sr. Deputado José Magalhães aqui não esteja hoje -, é que chegámos à conclusão de que o PS não se esqueceu. Pelo contrário, acredita profundamente que as conclusões das comissões parlamentares de inquérito devem ser aprovadas por maioria de dois terços. E, Sr. Deputado, não resisto também a citar-lhe algumas afirmações de um colega seu de bancada. Dizia o Sr. Deputado José Magalhães há cerca de um ano: "Srs. Deputados, o nosso principio fundamental, o único que aqui nos move, é o de que - anunciei-o e repito-o nenhum inquérito parlamentar seja votado sem condições alargadas, direi mesmo à prova de bala (...)" - exijam a unanimidade, Srs. Deputados do PS, porque, à prova de bala, só com a unanimidade - "(...) e sem a máxima credibilidade (...). E é por ser pesado o peso do passado (...)" - onde ele aqui também se incluía, porque defendia a aprovação por maioria dê dois terços, na outra legislatura - "(...) que queremos um método pesado (...)", um método reforçado.
Tudo isto para lhe dizer, Sr. Deputado, que é muito importante aquilatar se o PS quer não apenas ter em conta e ouvir - porque isso está a fazê-lo, está a ouvir e a ter em conta, porque vai ter de nos responder - a nossa proposta sobre as deliberações serem tomadas por maioria simples mas também se quer modificar esse aspecto no seu projecto de lei. Até por uma razão simples, Sr. Deputado: por muito que lhe custe, os senhores terão mesmo de ter isso em conta, porque não têm a maioria absoluta para aprovar a lei.
Portanto, de duas, uma: ou seguem o método mais cómodo, fácil e eficaz, e convencem os outros grupos parlamentares que querem alterar esse artigo no vosso projecto de lei, e podem fazê-lo já, dando uma prova de boa vontade e de autenticidade, em que querem, de facto, credibilizar e dignificar o regime jurídico dos inquéritos parlamentares; ou, se não o fizerem, na votação, com certeza, o PS colherá os benefícios ou os malefícios da atitude que decidir ter sobre esta matéria.
Reafirmo-lhe, Sr. Deputado, que para nós esta questão é vital. Sempre recusámos um colete de forças para as conclusões das comissões parlamentares de inquérito, quando o PSD tinha a maioria absoluta, e continuamos a recusá-lo, muito mais agora, Sr. Deputado, que os senhores não têm a maioria absoluta. Repito, não queiram obter por via legislativa o que o eleitorado não vos deu.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Jorge Ferreira não quer ter em conta a nossa posição, que já aqui anunciámos, e está no seu direito. Por isso, não vou insistir quanto a essa matéria. A nossa posição é clara e inequívoca. Quanto aos fundamentos, deixe-me dizer-lhe uma coisa: o objectivo - e não está aqui o Sr. Deputado José Magalhães para se poder pronunciar sobre as declarações que ele próprio proferiu...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Está o Diário por ele!

O Orador: - O que é muito claro, tanto para o Sr. Deputado José Magalhães como para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, é que não foi nossa intenção e não temos o objectivo de entrar aqui, neste momento, na discussão na especialidade, que necessariamente tem de acontecer -, quando apresentámos aquela medida, que não tem o consenso da Câmara, e já se percebeu,...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Então, apresentem a alteração!

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O Orador: elaborar ou construir, ainda que de uma forma ínvia, qualquer direito de veto.
O que não queremos, e assumimo-lo, é aquilo que aqueles senhores, durante 10 anos, fizeram. Isso é que não queremos. Não queremos que um partido que disponha de uma maioria, como aquela de, que o PSD dispôs durante 10 anos, inviabilize, ponha em causa,...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Querem pior!

O Orador: - ... da forma escandalosa como pós, os resultados das comissões de inquérito. O senhor pode ter uma certeza: se isso é assim, nós somos umas pessoas abertas, um partido aberto, não somos dos que não têm dúvidas.
O Sr. Deputado não venha agora com uma postura de quem não tem dúvida alguma. Nós temos dúvidas, confessamo-las, não temos problemas nisso. Estamos num processo legislativo, pelo que é o momento certo para tomarmos as decisões que se impõem. A nossa postura, responsabilidade e disposição responde por nós, Sr. Deputado Jorge Ferreira.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, não tenho resposta a dar, porque não me foi feita qualquer pergunta. No entanto, agradeço a gentileza.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O argumento do Sc. Deputado Nuno Baltazar Mendes, quanto à alteração que vão pretender formular na especialidade a pontos essenciais no projecto de lei do PS, não tem qualquer sentido que seja apresentado nesta fase do debate. Esse argumento de que fica para a especialidade a discussão dessas matérias, que são, aliás, cruciais para a definição do nosso sentido de voto, faz sentido quando estamos a discutir uma matéria pela primeira vez. Ora, o projecto de lei apresentado pelo PS está em reapreciação no Plenário. Em Dezembro de 1995 foi aqui discutido, Sr. Deputado. Por isso, o que seria crível para nós que o PS aqui trouxesse hoje seria uma reponderação das soluções que propôs no seu projecto de lei. Pensávamos que, depois de terem tido a oportunidade de ouvir as críticas vindas de todas as outras bancadas em relação a algumas dessas soluções, hoje aqui chegasse e dissesse que, na ponderação e razoabilidade dessas críticas, tinha algumas alterações a fazer em relação ao seu projecto de lei, na especialidade. Julgo que isto seria sério, razoável e normal, nesta discussão.
Sr. Deputado, há pouco mantivemos uma pequena e, aliás, urbana altercação a propósito de anteriores declarações minhas. Quero apenas dizer-lhe que V. Ex.ª estava a falar de dois artigos diferentes: o artigo 13.º e o artigo 17.º da lei - um regula os poderes da comissão e o outro regula os depoimentos na comissão. São coisas distintas e com âmbitos diferentes, portanto, V. Ex.ª quis continuar no equívoco que presidiu à acusação que me fez, ilegítima e injustamente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais pedidos de palavra, está encerrada a discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 16/VII - Regime jurídico das comissões eventuais de inquérito (PS), 24/VII - Altera o regime jurídico dos inquéritos parlamentares (PCP), e 245/VII - Alteração do regime jurídico dos inquéritos parlamentares (PSD).
Passamos agora à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 132/VII - Sobre extinção da enfiteuse ou aforamento (PS).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Arnaldo Homem Rebelo.

O Sr. Arnaldo Homem Rebelo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tem o nome de emprazamento, aforamento ou enfiteuse o desmembramento do direito de propriedade em dois domínios, denominados directo e útil. O prédio sujeito ao regime da enfiteuse pode ser rústico ou urbano e tem o nome de prazo. Ao titular do domínio directo dá-se o nome de senhorio, ao titular do domínio útil, o de foreiro ou enfiteuta.
As situações de aforamento ou enfiteuse constituíam exemplos de propriedade fraccionada ou imperfeita, visto a propriedade dividir-se em dois domínios - o directo (o do senhorio) e o útil (o do foreiro) -, correspondendo a puras sequelas institucionais do modo de produção feudal.
Com efeito, em 1976 encontravam-se generalizados os foros, podendo referir-se que nessa altura só o Estado, segundo estimativas, era titular de domínios directos que atingiam cerca de 400 000. Uma política agrícola para apoio e valorização dos pequenos agricultores não pode deixar de integrar a liquidação radical de tais relações.
O presente projecto de lei visa extinguir situações de aforamento ou enfiteuse ainda hoje existentes, de forma a que se consolide a propriedade plena destes prédios nas mãos dos seus titulares do domínio útil, mediante a constituição da usucapião.
Todos os diversos projectos entrados na Assembleia da República sobre esta matéria tiveram sempre em linha de conta as reivindicações e as aspirações de um grupo de foreiros de Salvaterra de Magos, os quais eram, e ainda são, possuidores de terras sem terem legalmente esse título, que pretendiam, e pretendem ainda, ver regularizada a sua situação jurídica.
Nesse sentido, a legislação entretanto aprovada e em vigor procurou facilitar o seu acesso à titularidade, mediante o recurso a um processo judicial relativamente célere, que culminaria com a respectiva sentença, com a qual se fariam oficiosamente os registos de propriedade.
Mas tal implementação de medidas não foi suficiente, existindo ainda hoje casos em que a presunção de titularidade não foi passível de se consumar, em virtude de os requisitos legalmente exigíveis não terem tido em conta todos os aforamentos existentes.
Outra dificuldade acrescida tem consistido na prova do que se entende por terrenos incultos e quais poderão ser abrangidos por este regime.
O enquadramento legal da enfiteuse consta de diplomas que vieram substituir os artigos 1491.º a 1523.º do Código Civil, nomeadamente do Decreto-Lei n.º 195-A/70, de 16 de Março.
Este diploma veio adequar os encargos e obrigações que impendem sobre os "foreiros", tradicionalmente entendidos como pequenos agricultores, que mais não eram do

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que sequelas do processo feudal. Procedeu-se, então, à extinção da enfiteuse a que estavam sujeitos os prédios rústicos, transferindo-se o seu domínio directo para o titular do domínio útil.
A Lei n .º 22/87, de 24 de Junho, veio, por seu turno, uma vez que estes processos ainda não tinham terminado e verificando-se a necessidade de corrigir algumas lacunas, aditar alguns artigos ao referido Decreto-Lei.
Esta Lei resultou de um projecto de lei subscrito por Deputados de todos os grupos parlamentares representados na Assembleia da República, apresentado em 22 de Janeiro de 1987, que vinha permitir a inscrição oficiosa de todos os registos de inscrição de propriedade dos prédios rústicos ou parcelas a favor dos seus titulares do domínio útil.
Esta iniciativa teve o aval da então Comissão Parlamentar e foi discutida na generalidade em 13 de Março de 1987, tendo sido salientado pelo então Deputado do PS José Frazão que "Esta iniciativa legislativa, na base da qual, é justo dizê-lo, se encontra a tenaz persistência dos foreiros da Várzea Fresca e Califórnia, prédios situados na freguesia dos foros de Salvaterra de Magos, aplicados na luta pelo reconhecimento dos seus direitos e no esforço que desenvolveram para sensibilizar e convencer todas as forças políticas partidárias da justeza das suas reivindicações, tenacidade, porventura, igual à dos seus antepassados, manifestada na tarefa de arrotear as brenhas, plantar a árvore, levantar a casa e edificar os cómodos agrícolas. Apresente iniciativa reuniu o consenso unânime dos Deputados da Comissão de Agricultura e Mar, para poder ser a chave da abóbada do edifício legislativo que vai pôr termo em Portugal à milenar experiência da enfiteuse".
Foi este projecto de lei aprovado na especialidade e em votação final global, por unanimidade, a 28 de Abril de 1987, e deu lugar à já referida Lei n.º 22/87, de 24 de Junho.
Posteriormente, foi apresentado o projecto de lei n .º 559/VI - Sobre extinção da enfiteuse ou aforamento (PS).
A iniciativa surgiu na sequência da tomada de conhecimento de que o propósito, firmado com o Decreto-Lei n.º 195-A/76 e, depois, com a Lei n.º 22/87, de consolidar a propriedade dos prédios aforados nas mãos dos "foreiros" não viabilizou nem eliminou algumas dificuldades entretanto colocadas para que fosse reconhecida, nos termos da lei, essa qualidade aos titulares do domínio útil.
Verificou-se, pois, que, mesmo com as alterações introduzidas pela Lei n.º 22/87, a constituição da enfiteuse por usucapião, mediante a necessidade de ocorrência dos requisitos e condicionalismos previstos, impediu que muitos pequenos agricultores pudessem ficar abrangidos por este regime e não facilitou aos foreiros a prova dos seus direitos.
Daí a apresentação na Assembleia da República de diversas petições de vários foreiros, sobretudo do concelho de Salvaterra de Magos, que solicitavam a adopção de soluções legislativas mais equitativas para que pudessem fazer prova dos seus direitos.
As alterações propostas cingem-se à constituição da enfiteuse por usucapião.
Existindo, igualmente, alguma dificuldade no entendimento do que sejam os terrenos ou as parcelas em situação de incultas, procede-se à clarificação desta situação, para efeitos do disposto no Decreto-Lei n.º 547/74, de 22 de Outubro, o qual remete para o regime do arrendamento rural.
Este diploma não chegou a ser apreciado.
Daqui a razão do presente projecto de lei, apresentado pelo Partido Socialista, que constitui o retomar do anterior projecto de lei n .º 559/VI. Este diploma, tal como a Lei n.º 22/87, surge na sequência de diversas solicitações de foreiros do município de Salvaterra de Magos e do apoio e empenho que sempre foi demonstrado em todos os projectos de lei pelos Deputados Jorge Lacão e José Lameiro às justas reivindicações dos foreiros. Apesar do propósito legal de consolidação da propriedade dos prédios aforados nas mãos dos foreiros, é certo que, na prática, subsistem dificuldades a diversos grupos de foreiros espalhados pelo País, designadamente a do registo da enfiteuse.
Decorrendo esta situação em apreço da aplicação de legislação já com mais de 20 anos e constituindo os aforamentos ainda existentes uma excepção no quadro normativo, as medidas preconizadas nesta iniciativa legislativa são salutares, no sentido de, definitivamente, se eliminar todos os resquícios deste regime e atribuir direitos a todos os pequenos agricultores que toda a sua vida se dedicaram à terra e pela qual pagaram sempre "tributos", sem no entanto lhes ser reconhecida a sua titularidade de proprietários de igual forma meritório o presente projecto de lei em discussão, tal como o foram os anteriores, cuja intenção foi exactamente a mesma: a eliminação de situações de injustiça; a extinção de facto e de direito da enfiteuse ou aforamento; e a passagem do titular do domínio útil a titular do direito de propriedade plena. Ultrapassam-se, desde modo, as dificuldades de registo da enfiteuse e, assim, na prática, concretiza-se a vontade do legislador e resolve-se, em definitivo, a situação de diversos grupos de foreiros ainda existentes no País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Não havendo pedidos de esclarecimento, dou agora a palavra ao Sr. Deputado Antonino Antunes para, como relator e também em nome do Grupo Parlamentar do PSD, intervir.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos hoje aqui a discutir o projecto de lei n .º 132/VII, que se intitula "Sobre a extinção da enfiteuse e do aforamento". Na realidade - e como veremos, a seguir, na intervenção que vou fazer -, trata-se da discussão de um projecto de lei cujo conteúdo é mais vasto do que aquele que está enunciado no seu próprio título. De facto, para além da alteração a lei da extinção da enfiteuse e do aforamento, prevê-se também a alteração ao Decreto-Lei n.º 547/74, de 22 de Outubro, que tem a ver com questões relacionadas com o arrendamento de terrenos incultos ou em mato.
Este projecto de lei foi apreciado na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e foi objecto de parecer, no sentido de que não se encontram no texto quaisquer afrontamentos à lei fundamental, pelo que foi emitido o parecer de que o projecto estava em condições de subir, como já subiu, a este Plenário para apreciação e votação na generalidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em Abril de 1974, impendiam ainda sobre dezenas de milhares de pequenos agricultores portugueses obrigações e encargos, que não deixavam de ser uma sobrevivência endémica do modo de produção feudal.

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O Código Civil de 1966 não havia eliminado a enfiteuse, que continuou, então, a resistir como exemplo de propriedade fraccionada ou imperfeita: de um lado, o "domínio directo" e do outro o "domínio útil" do foreiro.
Essa situação manteve-se ainda durante dez anos, até que o Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de Março, aboliu a enfiteuse que incidia sobre os prédios rústicos, transferindo o domínio directo para o titular do domínio útil.
Assim se caminhou para a consolidação da propriedade plena dos prédios rústicos aforados na titularidade dos respectivos foreiros.
Esse diploma emergiu no contexto de "uma política agrária orientada para o apoio e libertação dos pequenos agricultores", visando a "liquidação radical de tais relações subsistentes no campo" - lê-se no respectivo preâmbulo.
Por outro lado, o Decreto-Lei n.º 233/76, de 2 de Abril (alterado pelos Decretos-Leis n.os 82/78, de 2 de Maio, 73(/79, de 3 de Abril e 226/80, de 15 de Julho), extinguiu a enfiteuse relativamente aos prédios urbanos.
Nesse mesmo ano de 1976, a Constituição da República Portuguesa conferiu dignidade constitucional à proibição dos regimes de aforamento.
Na prática, contudo, sentiram-se dificuldades no reconhecimento de jure da qualidade de foreiros dos prédios rústicos e na concretização das correspondentes operações de registo, não obstante estas deverem ser "oficiosamente efectuadas".
Foi nesse contexto, e visando a superação de tais dificuldades, que esta Assembleia da República aprovou a Lei n.º 22/87, de 24 de Junho.
Essa lei começou, com efeito, por dispor: "No caso de não haver registo anterior nem contrato escrito, o registo de enfiteuse poderá fazer-se com base em usucapião, reconhecida mediante justificação notarial ou judicial".
Aparentemente, estava apontado e desbravado o caminho; aparentemente, estavam arredados os obstáculos.
Só que essa lei adensou de tal modo os requisitos de que fez depender o reconhecimento da enfiteuse por usucapião que acabou por eliminar urna barreira mas cavar um enorme fosso, tantas vezes intransponível.
A lei teve, assim, um efeito perverso e inesperado que provocou o natural inconformismo de grupos de foreiros, alguns dos quais dirigiram a esta Assembleia várias petições que foram analisadas pela Comissão competente, tendo o respectivo relatório, com as conclusões, sido aprovado em 15 de Maio de 1991.
O projecto de lei que hoje discutimos em Plenário visa ultrapassar aquele fosso criado pelas diferenças que, tantas vezes, separam a teoria da prática.
Por um lado, torna-se agora menos densa a enumeração dos requisitos de constituição da enfiteuse por usucapião; por outro lado, cria-se todo um quadro de presunções legais que hão-de facilitar e viabilizar a prova o que hoje se justifica tanto mais quanto é certo que sobre a publicação daquele primeiro diploma já decorreram cerca de 20 anos.
Mas o projecto de lei em discussão contém ainda um terceiro e último artigo que aponta para a criação de uma presunção de arrendamento de terras no estado de incultas ou em mato, para efeitos do disposto no Decreto-Lei n.º 547/74, de 22 de Outubro.
Este diploma de 1974 partiu da constatação de que existiam (sobretudo, no Ribatejo e no Alentejo) situações em que a terra inculta havia sido aproveitada por famílias de agricultores, ao abrigo de contratos de arrendamento em regra sem suporte documental.
No entanto, a Lei do Arrendamento Rural não contemplou o caso específico de essas terras estarem incultas na altura em que foram confiadas aos rendeiros - o que, na prática, gerava injustiças sociais, quando os senhorios promoviam o despejo ou o aumento de rendas, tudo se passando, então, como se as benfeitorias e os investimentos concretizados pelos próprios rendeiros tivessem sido feitos pelos senhorios.
O Decreto-Lei n.º 547/74, de 22 de Outubro, encontra-se, em grande parte, revogado, mas mantêm-se em vigor alguns dos seus preceitos.
Também neste domínio se justifica a criação de uma presunção tantum juris, pelo facto de ser muito difícil fazer a prova daquilo que eram "terrenos incultos ou em mato", nos casos em que o conhecimento das características e natureza desses prédios rústicos, à data do início dos arrendamentos, excede a memória dos vivos.
A importância desta iniciativa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é atestada pelo elevado número de foreiros presentes nestas galerias. Esta iniciativa merece, pois, o apoio do Grupo Parlamentar do PSD.
E se algum outro comentário merece, é ó de que só peca por tardia.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Não havendo pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A enfiteuse, que, segundo alguns historiadores, remonta ao domínio dos romanos ou, segundo outros, à presença de colónias helénicas na Península, foi, ao longo dos séculos, objecto de políticas reformadoras e, simultaneamente, objecto de contestação por aqueles que, vivendo na dependência de relações sociais de subserviência medieval, se sentiam explorados.
Mas, só no século XIX, com a difusão das ideias liberais, a contestação assume, sem disfarces, o plano económico-social, denunciando-se, então, claras formas de opressão, presentes em inúmeras cláusulas do instituto jurídico da enfiteuse.
Começa-se por questionar os bens da coroa ou dela provenientes, seguidamente os bens das corporações religiosas e, em 22 de Junho de 1846, por Carta de Lei, eliminam-se todas as prestações estabelecidas por foral ou contrato enfitêutico sobre bens nacionais ou provenientes da coroa.
Relativamente aos emprazamentos particulares, só foram atingidos pelo Código Civil de 1867.
No entanto, a enfiteuse sobreviveu a toda a jurisprudência, a toda a doutrina ao longo dos tempos, e só em 1976 foi decretada a sua extinção.
Mas ficaram por resolver alguns contratos de aforamento, porque, sem títulos de posse, os foreiros, particularmente os do Vale do Tejo e do Alentejo, viam-se, e vêem-se, confrontados com inúmeras dificuldades, quando pretendiam, e pretendem, ver reconhecido o seu direito à terra, que trabalhavam e trabalham, e às benfeitorias que, entretanto, haviam realizado e realizam.

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A iniciativa legislativa hoje em discussão, o projecto de lei n.º 132/V1I, equaciona a hipótese de resolução desta matéria, que, poder-se-á afirmar, tem resistido às diversas soluções jurídicas, apesar da sua inadequação às relações sociais presentemente estabelecidas na sociedade portuguesa.
O Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de Março, que extinguiu a norma jurídica da enfiteuse, afirmava no seu preâmbulo que "têm continuado a impender sobre muitas dezenas de milhares de pequenos agricultores encargos e obrigações que correspondem a puras sequelas institucionais do modo de produção feudal. Com efeito, encontram-se ainda hoje extremamente generalizados os foros, podendo referir-se que só o Estado, segundo estimativas feitas pela Direcção-Geral da Fazenda Pública, é titular de domínios directos que atingem cerca de 400 000, ultrapassando o seu valor um milhão de contos".
Considerava ainda o legislador que "uma política agrária orientada para o apoio e a libertação dos pequenos agricultores não pode deixar de integrar a liquidação radical de tais relações subsistentes no campo".
Apesar de legislada a extinção, não foi possível, na prática, resolver todos os processos de aforamento existentes. E, concretamente, o processo de Foreiros da Várzea Fresca constitui um exemplo da incapacidade legislativa e administrativa nesta matéria.
Fazendo a via sacra das instituições governamentais, legislativas e judiciais, nunca obtiveram os interessados a resolução das indefinições jurídicas que todos reconheciam existir, mas que ninguém assumiu tornar definível.
Mais tarde, a Assembleia da República, através da Lei n.º 22/87, de 24 de Junho, decreta um enunciado de aditamento ao Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de Março, com o objectivo de encontrar o instrumento que permitisse enquadrar a questão.
E, nesse sentido, alargou-se o âmbito do artigo 1.º, ao qual se aditaram dois números. O n .º 4 estabelecia que "no caso de não haver registo anterior, nem contrato escrito, o registo da enfiteuse poderá fazer-se com base em usucapião reconhecido mediante justificação notarial ou judiciam, enquanto o n.º 5 enunciava quais os pressupostos imprescindíveis à constituição por usucapião e, consequentemente, a alegação provada da titularidade do domínio público.
Mas a verdade é que, apesar deste instrumento legislativo, os foreiros em causa e outros não obtiveram qualquer êxito na regularização dos seus legítimos desejos.
E, perante os obstáculos, em Maio de 1991, a Comissão de Petições aprecia a Petição n.º 199/V(4º), da iniciativa da Comissão de Foreiros da Várzea Fresca - Foros de Salvaterra, concelho de Salvaterra de Magos, Distrito de Santarém.
Solicitam, então, à Assembleia da República, os interessados o reconhecimento jurídico da qualidade de foreiros obtida como situação de facto. Enunciam os peticionantes que, concretamente, a sua situação decorre, temporalmente, da segunda metade do século XIX, quando o cidadão Porfírio das Neves doou verbalmente, sem qualquer escritura, em regime de aforamento, diversos terrenos por desbravar a um conjunto de famílias que aí se instalaram, com o objectivo de garantir os braços de trabalho necessários às propriedades que, no mesmo local, possuía.
Entretanto, essas famílias desbravaram as terras, tornaram-nas cultiváveis, instalaram nelas infra-estruturas de natureza privada e colectiva e, durante mais de 100 anos, pagaram o respectivo foro ao titular do domínio directo.
Considerou a Comissão de Petições, no seu parecer e perante a substância analisada, que "a dificuldade da prova da usucapião, exigida pela citada Lei n.º 22/87, quer em justificação notarial quer judicialmente, é que inviabiliza a louvável intenção desta referida lei". E mais adiante afirmava que só a Assembleia da República, através de uma iniciativa legislativa complementar, ou o Governo, com "a adopção de uma iniciativa legislativa susceptível de ultrapassar o esgotamento das possibilidades de resolução administrativa", poderiam solucionar o problema dos peticionários.
Hoje, decorridos praticamente seis anos, a iniciativa legislativa aqui apresentada diz pretender exactamente ultrapassar os obstáculos colocados ao registo de enfiteuse. E, com este objectivo, este projecto de lei aponta para um quadro de presunções legais que os proponentes consideram mais facilitadoras do já citado registo, concretamente, suprimindo alguns dos requisitos constantes da Lei n.º 22/87.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Herculano, considerando que o direito enfitêutico teria de ser simplificado e despido de todos os costumes e ideias bárbaras, afirmava que "o trabalho é a única base do direito de propriedade".

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Hoje, decorridos mais de 100 anos, esta Assembleia tem, tão-só, de reconhecer que esse trabalho tem sido realizado pelos foreiros ao longo dos séculos, desbravando matos, adubando, semeando, transformando matagais em pão, e daí lhes advém, naturalmente, a legitimidade de posse da terra.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas dizer duas palavras sobre esta matéria, já que a posição de princípio do meu partido é favorável às intenções que se anunciam para este projecto de lei.
A primeira palavra é para salientar um facto que, apesar de tudo, é raro, que é o de a Assembleia República, neste caso, estar a legislar na sequência de auscultação das pretensões de inúmeros foreiros do Ribatejo e Alentejo, a ela colocadas pelas vias adequadas, o que me parece ser sempre de salientar, em homenagem aos princípios do exercício autêntico da democracia e da proximidade entre eleitores e eleitos.
A segunda é para recordar, com brevidade, como disse, que, com a publicação do Decreto-Lei n.º 195-A/?6, de 16 de Março, se extinguiu o remanescente dos contratos de aforamento, que não haviam sido remidos pelos foreiros desde que a lei lhes deu essa possibilidade; primeiro, em 1911, pelo Decreto de 23 de Maio e, depois, em 1930, com a publicação do Decreto n.º 19 126, que introduziu a faculdade de remissão no Código Civil de 1867.
A extinção da enfiteuse ou aforamento deu-se, portanto, por força de lei, sem necessidade de qualquer processo, tendo, inclusivamente, o Decreto-Lei n.º 546/76, de 10 de Julho, determinado que as operações de registo predial

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correspondentes à extinção dos foros fossem feitas oficiosamente e sem encargos.
A situação, porém, que ficou por resolver foi a dos contratos de aforamento que não haviam sido reduzidos a escrito, o que impede os foreiros de registarem em seu nome as habitações, construções e demais benfeitorias que os mesmo fizeram, situação esta que lhes causa prejuízos económicos, porque se vêem impedidos de recorrer ao crédito para investimento e desvalorizado o seu direito, quando o pretendem alienar.
As soluções propostas na Lei n.º 22/87, de 24 de Junho, já aqui referida - pode ler-se na sua exposição de motivos -, não permitiram aos interessados obter o reconhecimento de jure do seu direito, na medida em que o n.º 5 aditado por aquela lei ao artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de Março, ao adensar as condições de aquisição por usucapião, veio a ter o efeito inverso ao fim para que foi pensado, que era o de facilitar aos foreiros a prova do seu direito.
O projecto de lei em apreço levanta contudo algumas dívidas, que quero aqui deixar expressas, apenas com a única finalidade de contribuir para o seu aperfeiçoamento em sede de discussão na especialidade.
A primeira dúvida prende-se com a exigência de um mínimo de 30 anos para a constituição da enfiteuse por usucapião, quando o Código Civil prevê que a usucapião, em geral, se dá, no máximo, ao fim de 20 anos, e isto se estivermos a falar do possuidor de má fé, quando não haja registo do título nem da mera posse. Porquê, então, esta dilação do prazo de 20 para 30 anos, mesmo relativamente ao diploma de 1987?
Já a segunda dúvida consiste em saber se os dois requisitos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 5 são cumulativos. É que, se são cumulativos, faz então algum sentido, que tenha relevo usucapível a realização de benfeitorias no prédio aforado após a data da extinção da enfiteuse por via legislativa, que, como se sabe, ocorreu a 16 de Março de 1976, por serem feitas por alguém - alínea b) - que, desde, pelo menos, 15 de Março de 1946, cultiva o prédio e paga a prestação anual. Se o não forem, isto é, se estivermos a considerar relevantes, para efeitos da usucapião, as benfeitorias realizadas após 16 de Março de 1976, data da extinção, por via legislativa, da enfiteuse, se calhar até apenas depois dessa data, sem a exigência do requisito do cultivo das terras desde, pelo menos, 15 de Março de 1946, com o respectivo pagamento anual do foro, então vai ser preciso dilucidar como é que estas duas realidades se compaginam.
Mas, como disse, esta iniciativa merece o apoio do Partido Popular, e a nossa disponibilidade. é total para, na especialidade, contribuir para o aperfeiçoamento de um diploma que apenas queremos que atinja os objectivos para que foi pensado.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por encerrado o debate do projecto de lei n.º 132/VII.
Normalmente, a votação na generalidade seria remetida para o dia e hora regimentalmente fixados, mas, havendo consenso de todas as bancadas, procederíamos desde já à votação do projecto de lei, tendo em atenção o facto de o debate estar a ser acompanhado pelos interessados.
Parece-me haver acordo de todos para que assim se proceda, pelo que vamos desde já votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 132/VII - Sobre extinção da enfiteuse ou aforamento, apresentado pelo PS, que acabámos de discutir.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Aplausos gerais, de pé.

Srs. Deputados, este diploma baixa às Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas para análise e votação na especialidade, e só depois é que subirá de novo a Plenário para votação final global.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Faça favor.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, não percebi a que comissão é que o diploma em causa irá baixar para efeitos de análise de especialidade.

O Sr: Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, há pareceres de duas Comissões, da 1.ª Comissão e da 10.ª Comissão. Porém, se houver uma sugestão concreta, por mim...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, sugeria que baixasse à l.ª Comissão, visto só poder baixar a uma para análise e votação na especialidade.

O Sr. Presidente (João Amaral): - A ser assim, se houver acordo, baixará à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para debate e votação na especialidade.
Parece-me haver consenso por parte de todas as bancadas, pelo que assim se fará.
Srs. Deputados, a nossa próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 10 horas, e terá como ordem do dia perguntas ao Governo.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados.

Partido Socialista (PS):

Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.

Partido Social Democrata (PSD):

Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Gilberto Parca Madaíl.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.

Página 1340

1340 I SÉRIE - NÚMERO 36

Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

Partido Social Democrata (PSD):

Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):,

Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Alberto de Sousa Martins.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Vital Martins Moreira.

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