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21 DE FEVEREIRO DE 1997 1491

O Orador: - E estou também revoltado, Sr. Deputado, porque esta discussão revela, em muitas intervenções, uma brutal insensibilidade àquilo que é a realidade, a qual, admito-o, só as mulheres, e só as que praticaram um aborto, podem reconhecer e conhecer na sua totalidade. Todos nós temos a obrigação de reconhecer esse sofrimento e de reconhecer que ignorá-lo é uma insensibilidade monstruosa.
Devo dizer-lhe mais, Sr. Deputado: fico também revoltado quando intervenções nesta Casa sobre este problema descuram a realidade - e gostaria de perguntar-lhe se está também atento a ela das jovens mulheres, que também fazem abortos, que também recorrem ao aborto clandestino, que também são obrigadas, em virtude da lei penal que temos, repressiva, inútil e ineficaz, a recorrer ao aborto clandestino.
Quero perguntar-lhe se não pensa ter havido muitas vezes uma grande desatenção por parte dos que tão duramente recorreram a argumentos demagógicos e falsos.
Espero, Sr. Deputado - e quero saber se também é esta a sua posição -, não ter de voltar a discutir esta matéria na Assembleia da República, espero que fique, hoje e aqui, resolvido o problema do aborto clandestino.

Aplausos do PCP, de Os Verdes e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, o mais que posso dizer-lhe, face à sua intervenção inteiramente concordante com as minhas posições, é que partilho das suas preocupações e estou inteiramente solidário com as posições que aqui vem assumindo.
Agora, gostaria de frisar o seguinte: é certo que, em 1984, houve um impulso legislativo, no sentido de se alterar a situação. Hoje, que podemos avaliar a experiência de 13 anos de vigência da Lei n.º 6/84, de 11 de Maio, fazemos uma apreciação negativa, pois, em nosso entender, ela deixou patente a sua insuficiência para resolver problemas sociais graves de saúde pública. Foi por isso que, à luz de uma interpretação, que julguei correcta, das minhas responsabilidades decorrentes do mandato parlamentar que detenho e enquanto Deputado do PS, eu próprio, como primeiro subscritor, entendi apresentar este projecto de lei.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quatro palavras gostaria de trazer aqui e neste momento.
A primeira sobre a natureza deste debate. Este não é um debate da nossa responsabilidade. Mais do que isso, este é um debate que, nos moldes em que é feito, consideramos intempestivo e inoportuno.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nenhuma força política questionou na sociedade, no tempo próprio e com a clareza indispensável, o quadro legal existente sobre a interrupção voluntária da gravidez. Mais: ninguém introduziu no País a abordagem desta questão ou propostas para a resolver no tempo político em que os eleitores escolhem os seus Deputados, lhes delegam um mandato e lhes atribuem a sua representação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso este debate é mais imposto que sentido, feito de cima para baixo, sem que o País nele tivesse participado e com isso acentuando, numa matéria particularmente sensível e delicada, clivagens desnecessárias e divisões negativas entre portugueses.
Por isso este debate, nascendo enviesado, continua e terminará enviesado. Dificilmente, de resto, escapará já à leitura e à conclusão de que o aborto é o pretexto - e só um pretexto - e que o objectivo e as motivações são outras, eminentemente políticas e bem diferentes da questão séria e delicada que é a interrupção voluntária da gravidez.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A segunda palavra é sobre o objectivo essencial deste debate: a liberalização do aborto.

O Sr. António Filipe (PCP): - É falso!

O Orador: - O mais grave na discussão de hoje não é o querer alterar o quadro legal existente. O mais grave é pretender-se mudar radicalmente de filosofia, de política e de orientação em matéria de liberalização do aborto.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não se pretende alterar a lei; pretende-se é mudar de lei. Ou seja, o que se propõe é que, de uma penada, sem que o País se tenha pronunciado, sem que os portugueses tenham sido ouvidos, se passe de um regime em que a liberalização não é possível para um regime - em tudo oposto - em que a liberalização passe a ser permitida e a assumir-se como regra e valor.

Aplausos do PSD.

É uma alteração radical de política. Pretende-se que o Parlamento se substitua ao País, quando o Parlamento deve ser a representação da vontade do País. Pretende-se que o Parlamento imponha ao País uma outra política, quando deve ser primeiro o País a discutir e a decidir se quer, ou não quer, mudar de política.

Aplausos do PSD.

Importa, de resto, questionar: quando é que o País debateu esta questão? Nunca, nos últimos 13 anos. Quando é que o País legitimou esta mudança radical e profunda de política? Nunca, nos últimos 13 anos. Quando é que o País mandatou os seus representantes para esta inversão completa de política? Nunca, como se sabe. A única coisa que se sabe, se prova e se conhece é que, na última vez, há 13 anos, que se discutiu esta matéria, o País expressamente rejeitou o que, hoje, alguns pretendem consagrar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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