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1502 I SÉRIE - NÚMERO 42

que, obviamente, ter um filho é um direito mas, do meu ponto de vista, a liberdade de escolha situa-se - e, hoje, a mulher tem essa possibilidade mas, como sabe, não a teve até há relativamente pouco tempo - a nível dos métodos anticonceptivos. Nem pode situar-se a outro nível. Sabe porquê? O senhor não é mulher mas eu sou e digo-lhe que é porque, a outro nível, essa liberdade de escolha já vem envenenada, já vem viciada. E as mulheres sabem-no perfeitamente. A liberdade de escolha é tomada no momento certo. Ora, se eu pensar que ela pode ser tomada noutro momento é passar às mulheres um atestado de irresponsabilidade, que eu não passo. E felizmente que o não faço.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Respondendo agora à Sr.ª Deputada Odete Santos, quero começar por dizer-lhe uma coisa, até porque já pensava que a Sr.ª Deputada iria «trazê-la à baila».
Quero dizer-lhe que não represento aqui a Igreja Católica. Não tenho nem mandato nem estatura para representar a Igreja Católica...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Tem, sim senhor!

A Oradora: - Eu sou uma humilde filha da Igreja Católica, tal como milhões de pessoas no mundo inteiro.
Quero dizer-lhe que o Evangelho é um grito contra a hipocrisia e é um grande apelo à misericórdia. Exactamente por isso assenta sobretudo na defesa da vida. E quanto a isto, Sr.ª Deputada, já verificámos que não estamos de acordo.
No entanto, quero esclarecer que a pergunta que fiz à Conferência Episcopal não era na qualidade de católica mas de cidadã. A pergunta era esta: não considerando a Igreja que deve haver um referendo, como é que considera que pode haver uma votação? Foi esta a pergunta e não a fiz como católica...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não, não! A Sr.ª Deputada perguntou o que é que a Igreja aconselha!

A Oradora: - Sr.ª Deputada, considera realmente que se eu tiver de falar com a Conferência Episcopal tenho de fazê-lo na Assembleia da República? Seria ridículo, Sr.ª Deputada!
Repito que a pergunta que fiz foi como Deputada. Estava a falar-se do referendo, aliás, como se falou em várias audições, e a pergunta que fiz foi a que eu disse...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Há-de vir escrito!

A Oradora: - A pergunta não tem nada de estranho. Fi-la para saber a posição da Igreja relativamente ao referendo e à votação.
Sr.ª Deputada, não entre pelo caminho da religião porque faz muito mal...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Quem entrou por aí foi a Sr.ª Deputada!

A Oradora: - Estamos em 1997, num país que é livre, num país que tem tradições fundas nessa matéria. Portanto, não entre por aí porque não tem qualquer razão para tal.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: São muitas, muitas mil. Ao certo, desconhece-se o seu número. São mulheres! Mulheres de que não falam as. estatísticas, feitas para ignorar, a sua realidade.
Mulheres, quase meninas algumas, a quem a escola encheu a cabeça de inúteis fórmulas químicas mas não cuidou de ensinar a lidar com o seu próprio corpo.
Mulheres menos jovens, outras, habituadas a ver o seu corpo usado, marcadas no rosto pela dureza da vida, pelos filhos, pela brutalidade do trabalho, resistindo, ainda assim, heroicamente, ao quotidiano com um sorriso alargado.
Mulheres empurradas por razões tão diferentes e paradoxalmente tão próximas, tantas quantas a diversidade de cada pessoa pode abarcar para a dolorosa decisão de interromper uma gravidez.
Uma decisão que não tomaram por gosto. Uma decisão que não tomaram por prazer. Uma decisão que não tomaram por livre opção. Mas uma decisão que tomaram precisamente por falta dela! Uma decisão dolorosa de que, certamente, quem a ela foi poupada dificilmente pode falar.
Mas uma dor que, porventura, poderemos imaginar se, tendo vivido a maravilhosa experiência de uma maternidade livremente escolhida, desejada, esperada e a imensa alegria que, nessas condições, ela comporta, pensarmos na dor das mulheres que, por falta de opções, num dado momento delas são privadas.
Uma realidade que nos leva hoje, Srs. Deputados, a interrogar: com que direito podem alguns falar de opção a mulheres a quem o patrão ameaça com despedimento, se porventura engravidarem?
Com que direito podem alguns falar de opção a mulheres cuja casa já não chega para os nascidos, muito menos para mais um?
Com que direito podem alguns falar de opção a uma família atingida subitamente pelo desemprego e que não pode permitir-se já o luxo de outra criança?
Com que direito podem alguns falar de opção a uma mulher quando o planeamento familiar nunca chegou ao seu bairro ou à sua terra, se não sabe o que isso é porque ninguém cuidou de lhe explicar?

Aplausos de Os Verdes, do PCP e de algumas Deputadas do PS.

Com que direito podem alguns falar de opção a jovens adolescentes que nunca tiveram acesso à educação sexual?
Com que direito podem alguns falar de opção a mulheres a quem interditos culturais e religiosos negam a sua sexualidade?
Com que direito podem alguns falar de opção a mulheres quando a estreiteza dos prazos hoje previstos na lei não permite a certeza de um diagnóstico seguro e o temor as leva a interromper a gravidez por mera precaução?

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

A Oradora: - Uma realidade que nos leva a questionar todos e cada um de vós em consciência. Com que legitimidade? Com que utilidade? Em ()me de quê? Para espiar que culpas, que pecados?
Com que direito, no fundo, pode um Estado, pode uma sociedade que não assegurou o seu papel social, persistir

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