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1510 I SÉRIE - NÚMERO 42

Sr. Presidente, Srs. Deputados: É neste espírito que, opondo-me, como me oponho, aos três projectos de lei em apreciação, por convicção profunda e por razões que, antes de mais, dimanam da minha condição de homem, antes mesmo de implicarem convicções religiosas, nada me custa reconhecer a generosidade e a sincera compaixão humana que animaram os seus autores e subscritores.
Aí nos encontraremos, Srs. Deputados, na urgência que sentimos de descobrir e activar os meios eficazes para pôr termo a toda a injustiça, a toda a incompreensão e a todo o sofrimento que o aborto provoca entre nós.
Tenho para mim que a vida se inicia com a fecundação e que a totalidade da dignidade que nos foi concedida reside, desde logo, nessa maravilha que está na origem da perpetuação do género humano. Isto mesmo o vem demonstrando dia-a-dia, e cada vez mais, o desenvolvimento científico, ao conseguir provocar a fecundação do óvulo e o seu primeiro desenvolvimento fora do abrigo do corpo materno, ao detectar, sem margem para dúvida, o início da actividade cerebral bem próximo do início da fecundação, ao mostrar, com os novos recursos da imageologia, a própria forma humana, adquirida desde as primeiras semanas. Se isto é verdade no que diz respeito ao início da vida, não o é menos em relação à fase final da gestação, pois cada vez se pode garantir mais cedo e com maior segurança a manutenção da vida do feto fora do ventre materno. Igualmente o demonstra a marca genética individualizada do filho em relação aos seus pais, detectável desde o início da vida. Aliás, a própria ciência da fetologia, que tão rapidamente se está a desenvolver, com todas as perspectivas que abre de tratamento individualizado do feto, antes mesmo do nascimento, bem como todas as afirmações das mais diversas e prestigiadas instituições científicas são convergentes na afirmação da vida humana, autêntica e irrecusável desde o momento da fecundação.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe que tente abreviar a sua intervenção.

O Orador: - Tentarei, Sr. Presidente.
Certos, que estamos, da verdade do que estamos a afirmar, por razões exclusivamente científicas e não por preconceitos religiosos, não podemos, em caso algum, dar o nosso voto favorável à aprovação de leis que, ainda que animadas da melhor das intenções no seu desejo de minorar o sofrimento imerecido de tantas mães, começam por arrancar o próprio direito à vida, o mais elementar e sagrado de todos os direitos, ao filho que já existe e está para nascer.
Nesse sentido, Srs. Deputados, e nunca com o objectivo de atingir a dignidade ou de minimizar as intenções de qualquer um de vós, direi que estas leis são perversas, e perversas, enquanto escondem e desculpam as verdadeiras razões do sofrimento e desresponsabilizam todos os que devendo providenciar por um ordenamento justo da sociedade continuam a não o fazer.
Se é verdade, e penso que todos aceitamos que o é, que nenhuma mulher, ao sentir um filho dentro de si, é insensível ao apelo da maternidade e, pelo contrário, deseja praticar o aborto, sujeitando-se a toda a tragédia física psíquica e moral que implica, então, importa, antes de tudo, libertar a mulher de todo o cenário de incompreensão, de injustiça e de isolamento que a faz enfrentar a maternidade que se avizinha como se de um flagelo se tratasse.

Onde estão, então, as leis de protecção à família? Onde estão as leis laborais que tornam inviolável o posto de trabalho de uma mulher que necessita de recorrer a uma consulta de planeamento familiar? Onde estão os apoios sociais que lhe permitam usufruir dos medicamentos e instrumentos anticoncepcionais que a sua «magra» economia não consegue adquirir? Onde estão as leis que incentivam e facilitam a adopção de crianças por casais que o desejem fazer? Onde estão os infantários e os jardins infantis que darão um apoio adequado às famílias durante as horas de trabalho? Onde estão as instituições que permitem acolher, tratar e integrar tantas crianças deficientes que se tornam um peso incomportável para as famílias? Onde está a protecção às mães solteiras e o respeito pela sua dignidade?
A verdade, Srs. Deputados, é que o nosso país é escasso em todas estas instituições e não fossem aquelas que a igreja e os privados instituíram e sustentam bem pior seria o panorama social que enfrentaríamos. A verdade, Srs. Deputados, ainda há dias por mim comprovada no terreno, é que as consultas de planeamento familiar que v Estado deveria ter instituído cobrem, onde existem, e na melhor das hipóteses, escassos 30% das mulheres em idade fecunda. A verdade, Srs. Deputados, é que se tornou folclore, em Portugal, oferecer preservativos que são baratos, talvez para esconder a falta, que desde há quatro anos se verifica, nos centros de saúde, de pílulas contraceptivas.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Nuno Abecasis, peço-lhe que, efectivamente, abrevie.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
É por isso que afirmo, sem dúvida alguma do que estou a dizer, que estas leis são perversas nos efeitos que produzem.
Desejo sinceramente, Srs. Deputados, que a Assembleia da República não pactue com estas situações. Não é legalizando o roubo da vida de tantos que estão para nascer e que já hoje compartilham connosco da nossa dignidade humana que se defende a liberdade e a dignidade das mulheres que estão indefesas e desprotegidas face à vida.
Colmatemos todas as deficiências legislativas e todas as faltas de protecção às famílias, às mães solteiras, às crianças, aos deficientes. Construamos um Estado justo e solícito para com os que sofrem e são excluídos e eliminaremos a dor e o sofrimento que hoje existem e que, tão legitimamente, preocupam todos os Deputados desta Assembleia.
Este debate convocou a esta Assembleia o sofrimento humano e o direito à vida. Ambos constituem um apelo às nossas consciências e um desafio às nossas capacidades.
Desejo, sinceramente, que não nos falte a coragem para recusar os caminhos fáceis que, mais uma vez, nos impedirão de encontrar a justiça e afastar para sempre a dor humana. O que ó povo precisa e espera de nós, Srs. Deputados, é que legislemos de acordo com a justiça, que não legislemos em favor da morte!

Aplausos do CDS-PP, de pé, e do Deputado do PSD Carlos Coelho.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Nuno Abecasis, a aquiescência que obtive das outras bancadas permitiu-me ceder-lhe algum tempo para poder concluir a sua intervenção.

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