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1538 I SÉRIE - NÚMERO 42

É, pois, com inteira humildade democrática que legitima a minha convicção interior, que assumo esta postura, votando contra os projectos de lei em apreço.

O Deputado do PS, Joaquim Sarmento:

Dois dos projectos hoje em debate, do PCP e da Juventude Socialista, pretendem revolucionar as bases éticas em que a legislação em vigor, Lei n.º 6/84, se fundamenta. Esta procura gerir, em favor da mãe, alguns conflito de direitos entre a grávida e o feto. A lista poderia ser alongada. Mas os dois projectos propõem agora a liberalização indiscriminada da interrupção voluntária da gravidez, por decisão da mãe biológica, durante as 12 primeiras semanas.
O debate que precedeu o parlamentar teve o mérito de nos alertar para as dificuldades na aplicação da lei e, apesar das compreensivelmente poucas rigorosas certezas, para a suspeita da importância do aborto clandestino. O que, certamente, exige ponderação e tomada de medidas. O problema é saber quais.
Não se procurou, contudo, a perseverança cívica para que a Lei n.º 6/84 fosse criteriosamente aplicada. Não se procurou compreender o porquê das resistências que existem, no que respeita ao aborto, a nível da culpabilidade individual e da vergonha social. Não se fez a crítica à impotência dos serviços públicos nesta área. Não se tomaram iniciativas legislativas em áreas complementares, para melhoraras respostas ao já estipulado por lei e no Código Penal. Os proponentes dos referidos projectos optaram pela crença mágica na eficácia da proposta liberalizante...
Indo, todavia, à substância.
Pode parecer que, entre uma despenalização de facto da prática do aborto e uma liberalizarão de jure até às doze semanas, haja apenas uma diferença menor. Entre os que, aparentemente, sacrificando mães biológicas teimam em dar aos fetos o que parece serem obsoletos direitos a quem se encontra numa situação de radicalmente indefeso. Mas são garante da sobrevivência da espécie. E já representantes vivos dos interesses das gerações futuras. E os que liberalizando pretendem salvar vidas de mães biológicas ignorantes, desleixadas ou vítimas de falhas técnicas. Com o também propósito manifesto de criar as condições ideais para uma maternidade desejada e responsável.
É verdade que o dilema é delicado para quem compreende o drama feminino e as boa intenções da maternidade responsável. Mas, mesmo admitindo-se que a liberalizarão consiga vencer as resistências que referimos, e alcançar os objectivos desejados, evitar o aborto clandestino, o que está longe de estar provado, teimamos em continuar a dar valor e direitos aos que dentro de poucos meses serão recém-nascidos. Por razões civilizacionais de fundo. Reforçadas por razões conjunturais de natureza fundamentalmente política. Com a convicção que assim lidamos melhor com a actualidade numa perspectiva da eficácia. E respeitamos mais adequadamente os direitos das futuras gerações.
As referências culturais de fundo são as que questionam e rompem com o paradigma cultural que marcou o radicalismo do passado e julgava eu passado: a idealização do amanhã e diabolização do presente; a maximização da ruptura e minimização da reforma; a absolutização dos direitos e desvalorização da responsabilidade; a procura de vantagens, sem limites, para a actual geração, è o desprezo cínico pelos direitos das gerações futuras.
Mas além de razões de fundo, há também razões conjunturais que reforçam a nossa opinião.
Com o PS no Governo, estou ainda mais confiante nos que procuram no presente, aumentar a capacidade de reforma, a eficácia das leis e estimular o sentido de responsabilidade dos portugueses.
É por esse caminho que, no meu entender, devemos ir: procurar criar condições para que a actual legislação seja aplicada. Exigir do actual Governo respostas médicas adequadas de molde a que os serviços públicos de saúde viabilizem a actual legislação de interrupção voluntária da gravidez. Melhor planeamento familiar. Mais protecção do casal, da família e da maternidade. Educação sexual idónea para os jovens. Uma mais corajosa, e mais de acordo com o nosso tempo, atitude em relação à adopção. É de exigir uma reforma radical na prática da adopção onde os casais adoptantes são tratados, mais como criminosos do que heróis que são. Se necessário aperfeiçoando a própria lei. Por esta via salvaremos, creio eu, bem mais vidas do que liberalizando o aborto. Uma prática descomplexada da adopção resolveria também a maioria das situações de mal estar feminino a que os projectos do PCP e da Juventude Socialista procuram dar resposta. O PCP, afirma na nota justificativa, preconizar a despenalização do aborto até às 12 semanas, a pedido da grávida, «tendo por base causas económicas e sociais». A JS faz proposta semelhante também «a pedido da mulher, por motivos ligados à defesa da sua própria liberdade pessoal em matéria de maternidade ou em defesa da sua dignidade moral e social». Eu, por mim, sinceramente, prefiro fetos adaptados a fetos mortos!
Poder-me-ão dizer os signatários dos projectos em questão que também desejam o mesmo que nós, mais a referida liberalização nas 12 primeiras semanas...
Acontece que vias que aparentemente se completam na realidade se opõem. Desenvolver o sentido da responsabilidade parece-me ser, na actualidade, no campo da educação sexual, a via mais eficaz para salvar vidas.
O eventual manto diáfano que separa o dar-se direitos ao feto, apesar da despenalização de facto da prática do aborto, que não depende do legislador, e a liberalizarão do aborto, é a nosso ver, o da frágil delimitação da fronteira entre a barbárie e a civilização humana. Não acompanhamos os promotores de uma civilização que sinto como banalizando a morte. Mesmo quando procuramos compreender as suas pretensas boas intenções. Porque a atitude moral de Miguel Unamuno adapta-se a muitas circunstâncias. Viva a Vida.

O Deputado do PS, Eurico Figueiredo.

Não vou equacionar o momento a partir do qual considero existir vida. Admitamos que o feto já o é e que por isso é que existe legislação sobre o aborto. Entendo, assim, aquela legislação como forma de preservar um direito fundamental - o direito à vida. Caso contrário, não seria necessário legislação sobre esta matéria.
Está, pois, relativizado o direito à vida: numa hierarquia de conflitos, hoje, é legal abortar-se em determinados casos (perigo de vida ou lesão física ou psíquica para

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