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1540 I SÉRIE - NÚMERO 42

tugal não é um Estado confessional. E a ter presente as convicções cristãs há sempre lugar à tolerância do Novo Testamento, evidenciada no perdão a Maria Madalena.
A questão essencial estará, sim, em se considerar ou não como crime o recurso ao aborto, em determinadas circunstâncias.
Ora, é um facto que em Portugal, apesar de a criminalização do aborto estar prevista num artigo do actual Código Penal, coexistem, mais ou menos pacificamente, as mulheres que abortam e as que não abortam; o sentimento de reprovação social quanto à prática do aborto esbateu-se a tal ponto que a norma incriminadora do actual Código Penal entrou em situação de «anomia», ou seja, em desuso.
Assim, a norma do Código Penal, actualmente, tem apenas uma função, a de descriminar as que podem abortar em boas condições e as que têm de abortar nas condições conhecidas do «aborto clandestino», ofendendo desse modo o princípio da igualdade de oportunidades das pessoas.
Por outro lado, as normas do Código Penal não traduzem a proibição de tal ou tal conduta, aferida pela consciência individual, confessional ou não, de quem quer que seja, mas, sim e apenas, aferida pela consciência social. E, efectivamente, a opção pela interrupção voluntária de gravidez diz respeito à consciência de cada mulher, em cada situação.
A realidade, ao que parece, é que se fazem, em Portugal, cerca de 20 000 abortos clandestinos por ano. Em condições muitas vezes degradantes.
Ao debater e votar estes projectos de lei, há, pois, que ter em consideração uma questão de saúde pública. Despenalizar não é incitar ao aborto; é somente permitir que quem opte pela interrupção voluntária de gravidez o possa fazer com dignidade e em condições de higiene e segurança.
A este nível se coloca também, em meu entender, a criação de centros de aconselhamento familiar (CAF), em cada distrito, como consta do projecto de lei n.º 236/VII, o que constitui uma novidade.
Por tudo isto, votei favoravelmente os projectos de lei n.º 235/VII, de que é primeiro subscritor o Deputado Manuel Strecht Monteiro, e o projecto de lei n.º 236/VII, 'de que é primeiro subscritor o Deputado Sérgio Sousa Pinto. Abstive-me na votação do projecto de lei n.º 177/VII, de que é primeira subscritora a Deputada Maria Odete Santos, porque considero exagerada a amplitude do artigo 1.º, pois não coloca nenhuma condição. Mas também porque o PCP optou por fazer de uma matéria tão sensível como é esta um pretexto para simples luta política, o que rejeito.

O Deputado do PS, António Martinho.

Votei favoravelmente, na generalidade, os projectos de lei n.ºs 235, 236 e 177/VII, pelas razões abaixo indicadas:
O projecto de lei n.º 235/VII (altera os prazos da exclusão de ilicitude nos casos de interrupção voluntária da gravidez), dado que o seu conteúdo essencial, ainda que de alcance limitado e circunscrito à regulação dos prazos da IVG nos limites do actual regime da ilicitude, alarga positivamente as possibilidades de decisão fundamentada da mulher quanto à interrupção ou não da gravidez, em termos que só podem favorecer os imperativos de uma maternidade conscientemente assumida,

O projecto de lei n.º 236/VII (interrupção voluntária da gravidez), em consideração pelo facto de a sua proposta essencial - despenalização parcial da IVG nas primeiras 12 semanas - considerar a relevância da protecção jurídica do primado da decisão da mulher fundada na preservação de valores de dignidade moral e social, bem como na exigência ética de uma maternidade e paternidade conscientes.
O projecto de lei promove, por outro lado, a superação de opções que, na actual política criminal, representam ainda uma desproporcionada imposição autoritária de valores, todavia longe de merecerem suficiente consenso ético jurídico na comunidade. O projecto de lei, ao optar em benefício de um quadro jurídico com tutela efectiva da autonomia do indivíduo mas no equilíbrio dos bens jurídicos carecidos de preservação - a dignidade da mulher e a gestação intra-uterina no processo de formação da pessoa humana - promove, a meu ver, adequadamente, à luz da experiência derivada da deficiente aplicação da Lei n.º 6/84, o recuo da reacção criminal para limites mais compatíveis com a vivência de uma sociedade tolerante. O valor da tolerância implica, necessariamente, a consideração pelo valor da vida.
Há, no entanto, que ter sempre em consideração que os direitos fundamentais de natureza pessoal - como o direito fundamental à vida - são isso mesmo, direitos da pessoa, sujeito com autonomia, dotado de identidade e de consciência e, como tal, com uma dignidade juridicamente protegida. Por isso, na compatibilização de valores, os que se incorporam nos direitos pessoais fundamentais não devem ser desproporcionalmente afectados ou diminuídos.
Considero ainda que as disposições constantes do projecto de lei n.º 236/VII poderão contrariar de modo mais eficaz os factores que incrementam o aborto clandestino. Assim se poderá qualificar melhor uma correcta política de saúde e de planeamento familiar.
O projecto de lei n.º 177/VII (altera os prazos de exclusão de ilicitude nos casos de interrupção voluntária da gravidez), tendo, no entanto, em consideração que várias das opções legislativas propostas parecem regular de modo menos harmonioso o equilíbrio de valores suscitado entre o respeito devido à autonomia de decisão por parte da mulher e a protecção do bem jurídico que representa a gestação in útero.
Tais opções sempre carecerão de exigente reavaliação em sede de especialidade e na perspectiva de uma votação final que desejavelmente possa garantir, no plano do direito, um adequado equilíbrio na ponderação dos valores carecidos de protecção.
No entanto, e na perspectiva de uma decisão favorável ao referendo, tomando por base as iniciativas acolhidas pela Assembleia da República, afigura-se-me que o conjunto das opções legislativas que suscitam a despenalização da IVG, ainda que com soluções não inteiramente coincidentes, deveriam poder merecer deliberação positiva por parte dos Deputados que, em sua consciência, em homenagem à dignidade da mulher, considerem aconselhável a revisão do actual regime de ilicitude.

O Deputado do PS, Jorge Lacão.

Entendo, pessoalmente, não ter mandato dos cidadãos do meu círculo eleitoral - perante quem respondo - para, neste momento, tomar decisões de opção ou rejeição de qualquer dos projectos de lei em apreciação.

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