O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1865

Sexta-feira, 21 de Março de 1997 I Série - Número 54

DIÁRIO da Assembleia da República

VII LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 20 DE MARÇO DE 1997

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Carlos Manuel Duarte de Oliveira
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 290/VII, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Francisco de Assis (PS), a propósito da sua eleição como Presidente do Grupo Parlamentar do PS, enunciou um conjunto de propósitos e princípios que estruturam a actividade, comportamento e postura deste grupo parlamentar. No fim respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Marques Mendes (PSD), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Arménio Santos (PSD) referiu-se ao incumprimento do Acordo de Concertação Estratégica e criticou a política laboral do Governo. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Barbosa de Oliveira e Strecht Ribeiro (PS), Lino de Carvalho (PCP) e António Galvão Lucas (CDS-PP).
Ainda em declaração política, a Sr.ª Deputada Isabel Castro (Os Verdes), além de assinalar a passagem do Dia Mundial da Floresta, contestou o acordo de revisão constitucional celebrado pelo PS e pelo PSD.
Ao abrigo do artigo 81.º, n.º 2, do Regimento, o Sr. Deputado Mota Amaral (PSD) chamou a atenção da Câmara para a questão dos cidadãos portugueses deportados dos Estados Unidos da América e do Canadá e exigiu mais determinação do Governo da República na abordagem política do problema, que assume particular gravidade na Região Autónoma dos Açores. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Teixeira Dias (PS), António Filipe (PCP) e Luís Queiró (CDS-PP).
Ordem do dia. - Foi aprovado um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias sobre o pedido de urgência, solicitado pelo Governo, para apreciação da proposta de lei n.º 75/VII - Autoriza o Governo a transferir para os municípios competências relativas à actividade de transportes de aluguer em veículos ligeiros de passageiros e a criar regras específicas sobre o acesso à profissão de motorista de táxis (Revoga o Decreto-Lei n.º 319/95, de 28 de Novembro), tendo-se pronunciado os Srs. Deputados Miguel Macedo (PSD), Lino de Carvalho (PCP) e Osvaldo Castro (PS).
Procedeu-se à discussão, na generalidade do projecto de lei n.º 278/VII - Cria o Sistema de Informação para a Transparência dos Actos da Administração Pública (SITAAP) e reforça os mecanismos da transparência previstos na Lei n.º 26/94, de 19 de Agosto (PS), que foi aprovado na generalidade. Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados José Magalhães (PS), António Filipe (PCP), Jorge Ferreira (CDS-PP), Calvão da Silva (PSD) e Isabel Castro (Os Verdes).
Foram aprovados, na generalidade, os projectos de lei n.º 169/VII - Acompanhamento familiar de deficientes hospitalizados (Os Verdes) e 171/VII - Altera a Lei n.º 4/84, de 5 de Abril (Protecção da maternidade e da paternidade) (CDS-PP), que baixaram à 12.ª Comissão.
Relativamente ao projecto de lei n.º 252/VII - Cria a Fundação Democracia e Liberdade (PSD), foi aprovado um requerimento, subscrito pelo PSD, no sentido de que o referido diploma baixasse à 2.ª Comissão, sem votação, para reapreciação, e relativamente ao projecto de lei n.º 289/VII - Participação da Assembleia da República na cooperação com países africanos de língua portuguesa (PS) foi igualmente aprovado um requerimento, subscrito pelo PS, do mesmo teor.
Em votação global, foram aprovadas as propostas de resolução n.os 9/VII - Aprova, para ratificação, o Acordo-Quadro Inter-Regional de Cooperação entre a Comunidade Europeia e os seus Estados membros, por um lado, e o Mercado Comum do Sul e os seus Estados-partes, por outro 37/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção para a Cooperação no âmbito da Conferência Íbero-Americana, assinada em S. Carlos de Bariloche, Argentina, em 15 de Outubro de 1995, e 35/VII - Aprova, para ratificação, o Acordo entre a República Portuguesa e a República da Croácia sobre a Promoção e

Página 1866

1866 I SÉRIE - NÚMERO 54

a Protecção Recíproca de Investimentos e respectivo Protocolo, assinado em Lisboa, em 10 de Maio de 1995.
O projecto de deliberação n.º37/VII - Concessão de prazo adicional à Comissão Parlamentar de Inquérito para averiguar os pedidos pendentes no Ministério da Educação ou objecto de decisão nos últimos 12 meses para reconhecimento ou autorização de funcionamento de instituições nos cursos do ensino superior particular ou cooperativo (Presidente da AR) foi aprovado.
Em votação final global, foi ainda aprovado o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 27/VII - Estabelece os princípios a que deve obedecer o regime de recrutamento e selecção de directores de serviço e chefes de divisão para os quadros da Administração Pública, e aos projectos de lei n.os 115/VII - Alteração ao Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro (CDS-PP) e 158/VII - Altera o Estatuto do Pessoal Dirigente (PSD), tendo proferido declaração de voto dos Srs. Deputados Guilherme Silva (PSD) e José Magalhães (PS).
Foi apreciado, na generalidade, o projecto de lei n.º 70/VII (PP) - Cheque de ensino -, tendo intervindo, a diverso título, os Srs. Deputados Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Afonso Cardal (PS), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Castro de Almeida (PSD), Maria Celeste Correia e António Braga (PS), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP) e Luísa Mesquita (PCP).
Entretanto, haviam sido aprovados dois pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando Deputados do PSD e do CDS-PP a deporem em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 45 minutas.

Página 1867

21 DE MARÇO DE 1997 1867

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.

Página 1868

1868 I SÉRIE - NÚMERO 54

Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Carlos Pires Póvoas.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Mário de Lemos Damião.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social: - Partido Popular (CDS-PP):.

António Afonso de Pinto Gaivão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
Bernardino José Torrão Soares.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Limo António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do expediente que deu entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa e foi aceite o projecto de lei n.º 290/VII, sobre as bases da família (CDS-PP), que baixou à 1.ª e 12.ª Comissões.
Na reunião plenária de 26 de Fevereiro de 1997 foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: ao Ministério das Finanças, pelo Sr. Deputado Francisco Fonenga; ao Secretário de Estado Adjunto do Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e ao Ministério da Educação, pelos Srs. Deputados Afonso Candal e Roleira Marinho; à Secretaria de Estado do Ensino Superior, pelo Sr. Deputado Nuno Correia da Silva; ao Ministério da Administração Interna, pelo Sr. Deputado José Calçada; ao Ministério da Economia, pelo Sr. Deputado Rodeia Machado; a diversos ministérios, pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, pelo Sr. Deputado João Amaral; ao Governo, pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Na reunião plenária de 13 de Março de 1997 foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: ao Ministério para a Qualificação e o Emprego, pelo Sr. Deputado Victor Moura; ao Governo, pelo Sr. Deputado Antonino Antunes; Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; ao Ministério da Justiça, pelo Sr. Deputado Miguel Macedo; ao Ministério da, Educação, pelos Srs. Deputados José Cesário e Bernardino Soares; aos Ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, da Saúde e da Economia, pelos Srs. Deputados Lino de Carvalho, Rodeia Machado e Jorge Ferreira; a diversos ministérios, pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Na reunião plenária de 14 de Março de 1997 foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: ao Governo, pelo Sr. Deputado Mota Amaral; ao Ministro Adjunto, pelo Sr. Deputado Manuel Alves de Oliveira; ao Ministério da Saúde, pelos Srs. Deputados Roleira Marinho e José Cesário.
Entretanto, o Governo, no dia 13 de Março, respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Manuel Alves de Oliveira, na sessão de 25 de Novembro; Luís Nobre, na sessão de 28 de Novembro; Isabel Castro, na sessão de 20 de Dezembro e Fernando Pedro Moutinho, na sessão de 23 de Janeiro.
O Governo respondeu, no dia 14 de Março, aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: António José Dias, na sessão de 26 de Abril; Roleira Marinho, na sessão de 21 de Junho; Manuel Alves de Oliveira, na Comissão Permanente de 18 de Julho; Elisa

Página 1869

21 DE MARÇO DE 1997 1869

Damião, na sessão de 14 de Novembro; Jorge Ferreira, Isabel Castro e Mendes Bota, no dia 18 de Novembro e nas sessões de 20 de Dezembro e 8 de Janeiro; Maria da Luz Rosinha, no dia 26 de Novembro; António Filipe, na sessão de 5 de Dezembro; Moura e Silva, na sessão de 10 de Dezembro; António Reis, na sessão de 11 de Dezembro; Jovita Matias, no dia 17 de Dezembro; Heloísa Apolónia e Luísa Mesquita, na sessão de 18 de Dezembro; Bernardino Soares, na sessão de 9 de Janeiro; Alberto Marques e Maria José Nogueira Pinto, na sessão de 23 de Janeiro; Fernando Pedro Moutinho, na sessão de 24 de Janeiro; Castro de Almeida, na dia 28 de Janeiro.
O Governo respondeu, no dia 17 de Março, aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Ismael Pimentel, na sessão 7 de Novembro; Soares Gomes, na sessão de 19 de Dezembro; e Sílvio Rui Cervan, na sessão de 5 de Fevereiro.
O Governo respondeu, no dia 18 de Março, aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Luísa Mesquita, na sessão de 10 de Maio; Sílvio Rui Cervan, no dia 28 de Maio; Isabel Castro, nas sessões de 23 de Outubro e 6 de Novembro; Antão Ramos, na sessão de 24 de Outubro; Sérgio Vieira, no dia 5 de Novembro; Soares Gomes, na sessão de 7 de Novembro; Macário Correia, na sessão de 13 de Novembro; Manuel Moreira, no dia 25 de Novembro; António Filipe e Jorge Ferreira, na sessão de 5 e no dia 17 de Dezembro e nas sessões de 31 de Janeiro e 19 de Fevereiro; Heloísa Apolónia, na sessão de 18 de Dezembro; Carlos Marta, na sessão de 16 de Janeiro; e Afonso Candal, na sessão de 29 de Janeiro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início às declarações políticas, para as quais estão inscritos três Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No início da primeira intervenção que profiro nesta tribuna após a eleição para a liderança da bancada parlamentar do PS, permita-me V. Ex.ª, Sr. Presidente da Assembleia da República, que lhe dirija uma saudação particularmente efusiva, reveladora da enorme admiração que lhe tributo e indiciadora da inolvidável honra que para mim constitui exercer funções parlamentares numa altura em que esta Assembleia é presidida por uma personalidade de tão densa envergadura cultural e tão elevada dimensão política.
Permita-me ainda, Sr. Presidente, que aluda à diferença das nossas idades para salientar o quanto as novas gerações de portugueses, que fizeram a sua maturação cívica e intelectual em democracia, devem ao senhor e a tantos outros homens e mulheres da geração a que pertence, que lutaram, na adversidade e no perigo extremos, pela instauração de um regime democrático pluralista em Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quero, por isso, ainda que com a devida singeleza, prestar a minha homenagem aos verdadeiros pais fundadores da democracia portuguesa na pessoa de um dos seus mais brilhantes e generosos representantes, que agora nos cumula com a honra de nos dirigir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mesmo para aqueles que nunca se viram privados delas, a liberdade, a tolerância e a democracia têm uma memória, traçada num lastro de intrépida luta pela sua afirmação, que importa sobrepor sempre a incautos esquecimentos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quero também dirigir uma saudação sincera ao Sr. Deputado Jorge Lacão, que me antecedeu no desempenho das funções que agora me estão cometidas. O convívio próximo que com ele mantive no último ano e meio permitiu aprofundar uma relação de intenso companheirismo e alargar a admiração e o respeito que já antes a sua pessoa me suscitava.
Alicerçado nos seus naturais dotes de inteligência e agindo sempre com grande seriedade, o Sr. Deputado Jorge Lacão conduziu a bancada do PS com assinalável acerto num momento particularmente importante, em que abandonávamos a oposição e ascendíamos ao exercício do poder. Quiseram as circunstâncias que me fosse incumbida a tarefa de o substituir nessas funções, o que muito me honra e acrescidamente me responsabiliza.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Continuamos todos a contar com o precioso contributo da inteligência e da experiência do Sr. Deputado Jorge Lacão e eu, em particular, conto com o seu prestimoso auxílio no desempenho da tarefa que agora me cabe realizar.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Julgo conveniente aproveitar este momento para enunciar, sem ambiguidades, um conjunto de propósitos e princípios que estruturam e estruturarão a actividade, o comportamento e a postura do Grupo Parlamentar do PS - perante esta Câmara, os outros grupos parlamentares, o Governo e o País. Não o fazemos com o intuito de anunciar rupturas radicais, que na verdade se não colocam no horizonte, mas antes porque, tendo havido alterações na direcção da bancada, se afigura adequado clarificar a situação. Dediquemo-nos, pois, a esse exercício.
Atravessamos, de há alguns anos a esta parte, uma época em que o discurso político cede, com demasiada frequência, aos apelos do imediatismo e do sensacionalismo,..

O Sr. José Junqueiro (PS): - Exactamente!

O Orador: - ... e não é raro observarmos situações em que a estrutura e natureza desse discurso obedecem mais às regras da publicidade do que ao rigor de um pensamento solidamente elaborado. Não nos movendo a pretensão de fustigar o nosso próprio tempo e tendo até a preocupação de não cair num pessimismo atrofiante, não podemos deixar de referir este perigo que a todos, de forma mais ou menos intensa, vai envolvendo e que, a não ser devidamente contrariado, poderá pôr em causa os alicerces em que assenta a cultura cívica democrática.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Parece-nos, por isso, útil dizer que, em nosso entendimento, o Parlamento, sede da representação nacional, se deve inequivocamente afirmar como um lugar de resistência aos populismos demagógicos e de per-

Página 1870

1870 I SÉRIE - NÚMERO 54

manente exaltação da discussão racional e crítica. Afigura-se-nos mesmo que o Parlamento só se prestigiará perante o País se ousarmos seguir por este caminho de exigência, se não cedermos a facilidades momentâneas, se conseguirmos ser, como temos todos as condições para ser, muito mais do que o circo retórico a que alguns nos pretendem circunscrever, se nos recusarmos sempre a ser apenas a matéria-prima do enredo intriguista a que outros nos querem reduzir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Cientes da importância deste combate, da necessidade de conferir prestígio e importância ao Parlamento no contexto de uma sociedade cada vez mais complexa e segmentada, nós, parlamentares socialistas, estamos empenhados em assumir as nossas particulares responsabilidades numa tarefa que é de todos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Temos mesmo a convicção de que ao nosso grupo parlamentar compete demonstrar o mérito da conciliação da liberdade com a responsabilidade, do debate com a estabilidade e do pluralismo com a coesão. Estamos certos de corresponder deste modo às expectativas eleitorais em nós concentradas. Os portugueses apostaram no PS não apenas porque nele anteviram uma governação orientada em prol da melhoria do seu bem-estar material mas também porque lhe adivinharam outra postura e uma diferente forma de conceber o exercício do poder.

O Sr. António Braga (PS): - Muito bem!

O Orador: - Os portugueses não confiaram em nós para sermos a repetição serôdia de outras maiorias, copiando-lhe comportamentos e atitudes.
Fala-se, aliás, hoje, com uma excessiva ligeireza numa hipotética cultura de poder, a contrapor logicamente a uma suposta cultura de oposição, como se, uma vez alcançado o primeiro, o destino dos partidos fosse a auto-dissolução e absorção pelo aparelho de Estado e a discussão devesse ser anulada ou até mesmo proibida. Recusamos esta dicotomia, que ofende princípios fundamentais, já que para nós, no poder ou na oposição, consoante as circunstâncias, só vigora uma cultura democrática, tolerante e profundamente cívica.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso mesmo, no relacionamento com as outras forças políticas, continuaremos a adoptar uma postura aberta ao diálogo, disponível para a consumação dos entendimentos necessários, empenhada na concretização dos consensos que o interesse do País aconselhe. De resto, quando damos o nosso assentimento à celebração de entendimentos nacionais, fazêmo-lo sem cultivarmos uma obsessiva preocupação com a contabilização dos ganhos e perdas partidários, divergindo assim de outros que, infelizmente, se parecem extasiar com sucessivas vitórias virtuais, que, numa perspectiva benigna, poderão ter apenas o efeito de permitir atenuar a frustração das efectivas derrotas reais.
Se não nos é lícito, porque não seria sério, incitar a oposição, na pluralidade das suas manifestações, a aquiescer a tudo quanto o Governo proclama e decide, já é correcto e justo solicitar-lhe abertura e disponibilidade para um diálogo constante de que resultarão, com certeza, vantagens para o País.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não visamos com isto alienar as responsabilidades que nos estão cometidas. ou iludir obrigações que arcam sobre os nossos ombros. A disponibilidade para o consenso não significa a renúncia às convicções. Compete-nos assegurar a sustentação parlamentar do actual Governo, tarefa que desempenhamos com o acrescido gosto que decorre da constatação dos méritos inerentes à acção por ele desenvolvida.
Correspondendo às expectativas eleitorais, o Governo do PS tem vindo a garantir o progressivo cumprimento dos compromissos constantes do seu programa, promovendo desta forma a modernização e o desenvolvimento de Portugal.
Contrariando em absoluto as previsões apocalípticas de alguns, o Governo tem levado a cabo uma política económica de inegáveis rigor e qualidade, com resultados absolutamente notáveis, que se consubstanciam no elevado ritmo de crescimento económico, no controlo do défice orçamental, na diminuição da inflação, no abaixamento das taxas de juro, no incremento do investimento público e na contenção do desemprego.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Cumpre-se, assim, um desígnio enunciado no Programa de Governo, o da associação da convergência nominal com a convergência real. Ao mesmo tempo que reforça as possibilidades de participação no núcleo duro do processo de construção europeia, Portugal aproxima-se, ainda que lentamente, dos padrões europeus.
Cabe-nos igualmente registar que, a par desta brilhante prestação no domínio económico, de uma importância nuclear que ninguém de bom senso se atreverá a pôr em causa, se tem este Governo destacado pela actuação no plano social, permanecendo assim fiel a ideais de solidariedade constitutivos da sua matriz fundamental. Em áreas cruciais, como a educação e a formação profissional, constatamos também, com agrado, a adopção de medidas que contribuirão decisivamente para a qualificação dos recursos humanos nacionais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em suma, o Governo tem vindo, paulatinamente, a cumprir o seu programa, resolvendo problemas e abrindo novas perspectivas de desenvolvimento a Portugal e aos portugueses.
O Grupo Parlamentar do PS quer contribuir para a plena concretização deste projecto e reitera a firme disposição de promover a realização de importantes reformas institucionais, de entre as quais avulta, pela sua importância, a descentralização político-administrativa do País.

Aplausos do PS.

Contrariamente ao que foi afirmado por alguns sectores, nunca esteve em causa a nossa fidelidade a este objectivo, nem tão-pouco alguma vez esmoreceu o nosso entusiasmo em seu torno. O processo nunca foi interrom-

Página 1871

21 DE MARÇO DE 1997 1871

pido, mas é agora chegada a altura de relançar este debate, no Parlamento e no País, em ordem à consumação de tão importante e decisiva reforma do Estado e da Administração Pública e por isso mesmo consideramos importante desfazer equívocos. O PS tem o inegável mérito de ter uma posição clara onde outros cultivam a ambiguidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Somos convictamente a favor da regionalização, lutaremos empenhadamente pela sua efectivação.

Aplausos do PS.

Mas não temos a pretensão de deter o monopólio desta causa, nem queremos fazer desta questão um tema de debate político ordinário. O que está em causa é uma grande reforma nacional, que extravasa em muito as fronteiras partidárias. Vamos entrar no momento crucial do debate, que oporá os que legitimamente apoiam esta reforma aos que, com igual legitimidade, a pretendem contrariar. O tempo não é, pois, de inibições, de recusas, de silêncios.
Em nome de um grande debate democrático, exortamos todos quantos se reconhecem genuinamente na corrente descentralizadora a darem o seu contributo para o sucesso desta causa, independentemente das suas opções partidárias e proveniências ideológicas. Este combate, pela sua importância, não pode comportar exclusões ou desistências.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Reafirmamos a nossa absoluta determinação em lutar pelo sucesso da regionalização mas rejeitamos qualquer intenção de confiscar esta vitória. O êxito ou o fracasso terão de ser compartilhados por todos os defensores da descentralização.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E é, pois, Sr. Presidente e Srs. Deputados, com esta exortação e este apelo que termino, em nome de uma convicção, de um projecto e de uma esperança, que é, certamente, comum a muitos portugueses.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Francisco de Assis, quero agradecer a sua saudação tão calorosa no início da sua intervenção, para a qual só encontro explicação na sua generosidade.
Se bem está recordado, era ainda o senhor um jovem estudante de filosofia quando lhe vaticinei uma brilhante carreira política. Aí está ela! Não apenas brilhante mas vertiginosa. Desejo-lhe as maiores felicidades no exercício do seu novo cargo.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Francisco de Assis: Quero, em nome pessoal e em nome da minha bancada, começar por felicitá-lo. Tal como já o fiz pessoalmente, após a sua eleição e a da direcção a que preside, gostaria de lhe desejar, a si e à sua direcção, as maiores felicidades no exercício das suas funções e oferecer-lhe, como também já tive ocasião de lhe transmitir, por carta, a disponibilidade da nossa cooperação em tudo o que tenha a ver com a função institucional, para além daquilo que, saudavelmente, nos divide em termos políticos e partidários.
Permita-me também, comungando, de resto, daquilo que disse daquela tribuna, uma palavra de saudação ao seu antecessor, Deputado Jorge Lacão, com quem inúmeras vezes tive confrontos bem difíceis, bem exigentes, estando, a maior parte das vezes, em divergência de posições, mas também acentuando que sempre encontrei nele uma pessoa de palavra, de lealdade, de disponibilidade, de trabalho e de cooperação.
Digo estas palavras, em nome pessoal e em nome da minha bancada, com total sinceridade e com uma grande convicção.
Aproveitando agora o ensejo de estar no uso da palavra, permita-me duas ou três considerações mais de natureza política, que submeto, também aqui, à sua palavra.
Somos adversários políticos.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Não parece!

O Orador: - O senhor defende o Governo e está à frente da bancada que suporta politicamente o Governo. Nós somos adversários do Governo. Por isso, seguramente, ao longo dos tempos, serão muito mais os pontos de controvérsia política (natural, saudável e desejável) do que propriamente os momentos de convergência. Mas há também momentos de convergência, como, de resto, apontou dali, daquela tribuna, que são aquelas questões que estão para além da dimensão partidária e que se colocam no plano do regime ou no plano das questões de Estado.
É aqui que se colocam duas ou três questões. Quanto à regionalização, que não considero verdadeiramente no plano das questões de regime a não ser naquilo que vou dizer, admito que o PS tenha uma grande convicção em torno da regionalização.
No PSD, as questões colocam-se nestes termos: o PSD, tal como o País, tem pessoas que são a favor e outras que são contra a regionalização. Somos um pouco o espelho do País. Mas uma coisa defendemos por convicção, e sobre isso também gostaria de ouvir a sua palavra convicta: é que todos somos a favor de que o povo português, através de referendo, diga verdadeiramente se quer ou não fazer a regionalização. Essa é a tarefa prioritária, que tem a ver, Sr. Deputado, com a revisão constitucional.
Os dois partidos celebraram um acordo político, que tem a ver com o facto de os portugueses terem dado aos nossos dois partidos a única maioria que permite viabilizar uma revisão constitucional. Não se fez, portanto, uma engenharia política nem eleitoral, foi o povo quem determinou que assim fosse. E, Sr. Deputado, não pode haver, eventualmente, regionalização, porque essa está dependente da vontade popular através do referendo, se a revisão constitucional. não se fizer, se o acordo político não se viabilizar, se a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional não entrar, rapidamente, em funcionamento.
Por isso - e mais do que uma pergunta isto é um desejo - quero dizer aqui o seguinte: gostaríamos que a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional começasse rapidamente a funcionar, passando à discussão e

Página 1872

1872 I SÉRIE - NÚMERO 54

provação do articulado final. Assim, naturalmente, gostaríamos de ouvir da sua boca uma palavra de empenhamento nesse sentido, para não darmos de nós um mau aspecto ao País.
Ao mesmo tempo, quero deixar também uma palavra de apoio e de empenhamento da nossa parte quanto ao compromisso de levarmos por diante, tão rápido quanto possível, a concretização, em articulado, daqueles que foram os nossos objectivos políticos de revisão constitucional.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - E uma última nota, Sr. Deputado, para dizer que outra questão de regime, para além da revisão constitucional, são as questões europeias. Ontem, o PSD ficou preocupado, pois o Sr. Ministro das Finanças, questionado umas três vezes sobre a realização de um referendo europeu na sequência da revisão do Tratado da União Europeia, teve como resposta a omissão e o silêncio.
Gostávamos de saber, Sr. Deputado, a opinião do Partido Socialista sobre esta questão, dizendo desde já que a nossa posição é esta: referendo sobre a moeda única, não; referendo sobre o passado, não; referendo sobre a revisão do Tratado da União Europeia, sim, durante o primeiro semestre de 1998.
Sobre isto gostaria de ouvir a palavra do Sr. Deputado, da sua bancada, do partido que apoia o Governo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Mendes: Quero começar por retribuir os cumprimentos que generosamente me dirigiu e manifestar-lhe, em nome da minha bancada, toda a disponibilidade para prosseguir um debate, que há-de comportar momentos de dissensão e momentos de consenso, mas, quer nuns momentos quer noutros, o fundamental é que tenhamos sempre como horizonte de referência os grandes princípios inspiradores da democracia e aquilo que nas nossas interpretações corresponde ao verdadeiro interesse nacional.
Nessa perspectiva, estamos tão disponíveis para conflituar como para concertar e já demos prova disso mesmo, no passado, em relação aos diferentes grupos parlamentares com representação nesta Assembleia.
Não abdicaremos de defender as convicções que prosseguimos, mas, em nome dessas mesmas convicções, estaremos, naturalmente - em muitas circunstâncias e, sobretudo, em matérias que tenham que ver com questões mais estruturantes do regime democrático -, disponíveis para a celebração de grandes entendimentos nacionais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em relação às questões que me colocou, e começando pela primeira, a da regionalização, quero dizer-lhe muito claramente, Sr. Deputado Luís Marques Mendes, que não compreendo a posição do PSD.
Admito que no PSD coexistam pessoas com opiniões diferentes sobre essa matéria, mas não concebo como possa ser possível que o maior partido da oposição se abstenha de ter uma posição politicamente clara em relação a uma reforma fundamental do Estado e da Administração Pública portuguesa.
Se o princípio da coexistência de orientações políticas distintas no interior do mesmo agrupamento partidário servisse para sustentar a tese que V. Ex.ª aqui defendeu, nunca nenhum partido teria posição sobre coisa alguma, porque, certamente, no interior dos partidos democráticos há divergências em relação a todas as matéria. É para isso que há momentos de discussão interna e é para isso que há, depois, momentos de decisão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, quero dizer-lhe, Sr. Deputado Luís Marques Mendes, que, em relação à forma como o seu partido e o seu grupo parlamentar abordam a questão do referendo, permanecerá sempre a seguinte dúvida: serão pelo referendo por convicção genuína ou serão pelo referendo para esconderem a vossa falta de posição em relação a questões substanciais que se colocam na sociedade portuguesa?

Aplausos do PS.

Não estamos contra o referendo e a nossa posição é clara: estamos disponíveis para conduzir um processo legislativo que há-de levar a que os portugueses, em determinada altura e no momento adequado, possam pronunciar-se pelo referendo sobre os méritos ou deméritos da proposta que lhes vamos apresentar.
Nós, nesse aspecto, convergimos, mas gostaríamos, de facto, que, em nome da clarificação do debate político numa matéria tão crucial, o PSD emitisse uma opinião muito clara e dissesse o que pensa sobre esta questão ao País.
Como é que um partido pode pretender constituir-se como alternativa se acha que não deve ter posição sobre se o país que pretende governar deve ser governado de uma forma mais centralizada ou mais descentralizada, se devem existir ou não regiões administrativas? A posição em que os senhores subsistem é verdadeiramente escandalosa e subsistem nela apenas porque, ao que parece, a vossa liderança política não tem a coragem suficiente para resolver politicamente as dissensões que atravessam o PSD.

Aplausos do PS.

Em relação à questão da revisão constitucional, também é bom que fique claro que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, não abdicando de discutir essas questões, assume, como sempre assumiu, o compromisso de dar concretização, no plano legislativo, aos compromissos assumidos pelo partido em sede própria. Isso é indiscutível!
Agora, do que não abdicamos é de discutir internamente, do que nós não abdicamos é de divergir, porque isso é a prova clara de que somos um partido profundamente democrático, profundamente transparente, que não receia discutir perante os portugueses, porque está tão confiante da sua unidade em torno das questões essenciais que não tem qualquer receio de deixar transparecer as várias divergências que o vão percorrendo, neste ou naquele momento, em torno desta ou daquela questão.

Aplausos do PS.

Página 1873

21 DE MARÇO DE 1997 1873

Compreendo que não estando VV. Ex.as habituados a usar estas categorias mentais, elas vos causem algum espanto, mas este é o nosso comportamento e não deixaremos nunca colonizar-nos por categorias mentais que não são nossas, são vossas.
Os portugueses não votaram em nós para termos comportamento igual ao que os senhores tiveram noutras circunstâncias e noutros momentos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Assis, quero dizer apenas algumas palavras, sendo as, primeiras para o felicitar publicamente, no Hemiciclo, como já o fiz pessoalmente, desejando-lhe todas as felicidades no exercício do seu cargo.
Quero também dizer-lhe que estamos aqui para colaborar sempre, enquanto estiver em cima da mesa quer o interesse nacional quer o interesse dos portugueses e sabemos que são muitos ainda - e felizmente - os momentos em que isso acontece, não obstante tudo o que nos separa.
Deixo também uma palavra pessoal ao Sr. Deputado Jorge Lacão, já que foi ele, então líder da bancada do Partido Socialista, que teve a amabilidade de me ajudar quando dei os primeiros e muito inexperientes passos na liderança desta bancada. São laços de solidariedade institucional mas também pessoal, que não esquecemos nunca.
Sr. Deputado Francisco de Assis, depois do seu discurso, o pior que podia acontecer-lhe era um diálogo estreito com a bancada do Partido Social Democrata, porque o Sr. Deputado foi à tribuna dizer meia dúzia de coisas que considero importantes e se eu não me levantasse, apesar do meu acto ser modesto e circunscrito às minhas possibilidade, ficava nesse diálogo estreito, que é o pior que pode acontecer a este Parlamento e, neste momento, à vida política portuguesa.
Se o Sr. Deputado afirmou da tribuna - e eu julgo que isto é muito importante - que temos de combater a tentação do imediatismo e do sensacionalismo político (que, penso eu, é um dos males que está a atingir profundamente a democracia portuguesa), se o senhor traz - e acredito que sim - uma visão mais humanista, até pela sua formação, e de contraponto a uma «cultura política de caldo bacteriano», se o Sr. Deputado quer prestigiar esta Assembleia, acho que de certo vai ponderar sobre um processo que, realmente, constituiu um desrespeito por esta Câmara, pelos partidos que nela têm assento e pelos cidadãos portugueses.
Portanto, entre outras coisas, levantei-me também para cortar esse diálogo estreito, porque acho que ele deve ser transformado rapidamente num diálogo alargado, porque todos nós, certamente, temos um contributo para dar à revisão constitucional e nenhum de nós quer que lhe peçam contas, nesse momento, de não o ter pedido ou de o não ter dado.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, quero também retribuir, naturalmente com toda a simpatia, os generosos cumprimentos que me dirigiu e reiterar a nossa disponibilidade para o diálogo e para o debate, que há-de ser tanto mais rico quanto mais participado for.
Contudo, não quero deixar de lhe dizer que, no âmbito desse debate, também podemos enunciar, com toda a clareza e frontalidade, as nossas divergências. E, em relação ao último aspecto da sua intervenção, tenho de assumir claramente uma divergência frontal em relação à sua posição, já que não creio que o acordo celebrado entre o PS e o PSD corresponda, em nada, a um ultraje a esta Câmara.
Sr.ª Deputada, estamos sempre disponíveis para dialogar com todos os grupos parlamentares, mas também não temos qualquer complexo em afirmar que, em determinados momentos, temos de procurar estabelecer os necessários consensos com aqueles que nos permitam obter as maiorias de 2/3 necessárias para a promoção das reformas institucionais num quadro de coerência devido. E é nesse sentido e nessa perspectiva que quero dizer, muito claramente, que entendo que o acto que aqui foi realizado há duas semanas não configura, sob qualquer ponto de vista, um ultraje à democracia ou ao Parlamento.
Um ultraje a esta Câmara seria não sermos capazes de provocar entendimentos, um ultraje ao Parlamento seria não sermos capazes de estabelecer acordos que fossem a base de sustentação de uma revisão constitucional verdadeiramente coerente. Por isso, não vamos confundir as coisas: não é por aí que podemos aferir do nosso respeito ou desrespeito pela instituição parlamentar.
De resto, este acordo vai ser agora objecto de apreciação e de ratificação na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional e, mais tarde, no Plenário, pelo que todos os Srs. Deputados, se quiserem, terão a oportunidade de se pronunciar sobre essa questão no momento apropriado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, nada foi feito contra o Parlamento, nada será feito nas costas do Parlamento e tudo o que fizermos será, seguramente, pelo Parlamento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, quero dizer-lhes que continua a repetir-se o fenómeno exaltante de sermos acompanhados nos nossos trabalhos pela juventude escolar do nosso país.
Temos hoje connosco perto de 300 estudantes e aguardamos a chegada de mais 132. Estão já nas galerias um grupo de 50 alunos da Escola CEBI, de Alverca, um grupo de 50 alunos da Escola Secundária de Clara de Resende, do Porto, um grupo de 95 alunos da Escola do Ensino Básico, 2.º e 3.º ciclos, de Maceira, um grupo de 45 alunos da Escola Secundária do Bombarral, um grupo de 41 alunos da Escola Secundária de Peniche, um grupo de 12 alunos da Escola Secundária António Gedeão, do Laranjeiro, e aguardamos um grupo de 9 alunos da Cooperativa de Ensino de Coimbra, um grupo de 30 alunos da Escola Secundária de Mirandela e um grupo de 100 alunos da Escola da Escola Secundária da Batalha.
Testemunhemo-lhes o nosso apreço, da maneira mais calorosa possível.

Página 1874

1874 I SÉRIE - NÚMERO 54

Aplausos gerais, de pé.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, gostaria de começar por saudá-lo, a si pessoalmente, enquanto novo Presidente do
Grupo Parlamentar, mas também toda a nova direcção do Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Simultaneamente, se me permite, quero igualmente saudar - aliás tive a oportunidade de fazê-lo pessoalmente - o Sr. Deputado Jorge Lacão, com quem tivemos a oportunidade de, ao longo deste ano e meio, ter relações umas vezes mais pacíficas e outras vezes menos pacíficas, do ponto de vista político, naturalmente.
Para além disto, gostaria de dizer, Sr. Deputado Francisco de Assis - e não vou referir-me a toda a sua intervenção, designadamente à parte em que fez a apologia do cumprimento, pelo Governo, do seu programa, pois deixaremos isso para outras oportunidades - que estou de acordo consigo sobre a necessidade de prestigiarmos o Parlamento. Convém que o prestigiemos como fonte e como local próprio e insubstituível de aprofundamento da democracia no nosso país mas também convinha que o fizéssemos sempre e, como sabe, do nosso ponto de vista,
recentemente ele não foi tão prestigiado como isso.
Não será este o momento de voltar a esse tema nessa perspectiva, mas, de qualquer modo, gostaria de colocar-lhe uma questão sobre o problema da revisão constitucional, mais concretamente e dentro da perspectiva do prestígio da Assembleia, sobre o funcionamento da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.
Há 100 dias que a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional não reúne e parece que não há perspectivas de, a curto prazo, pelo menos não conhecemos iniciativas nesse sentido, reiniciar os seus trabalhos. Não sei quais serão as razões de fundo para que tal aconteça. Tivemos conhecimento do texto do acordo assinado entre o Grupo Parlamentar do PS e o Grupo Parlamentar do PSD e como não sei o que entrava a reunião da CERC faço esta pergunta.
Este processo de não funcionamento da CERC, agora, está dependente não do acordo que já está feito mas do articulado que ainda não está completo?

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Também já está!

O Orador: - Para além domais, parece que não se trata apenas do acordo e, por isso, a questão do prestígio da Assembleia da República coloca-se de uma forma mais grave, pois trata-se também da questão do articulado.
Acreditando numa informação de um jornal de hoje, posso saber já qual é o artigo 152.º que vai resultar da revisão constitucional!
Ora bem, se a questão do acordo poderia ser dirimida entre os dois grupos parlamentares que perfazemos 2/3 na CERC, é evidente que a elaboração dos artigos concretos ser também retirada da CERC não conduz de forma alguma, Sr. Deputado Francisco de Assis, ao prestígio da Assembleia da República, antes ao seu desprestígio.
A segunda questão tem a ver com aquilo que o Sr. Deputado referiu como sendo o desfazer de equívocos sobre a regionalização. Tomei nota do empenhamento
declarado do Grupo Parlamentar do PS para avançar com o processo de regionalização e a questão que lhe coloco é a seguinte: esse empenhamento vai ser mais forte ou idêntico ao que tem havido até agora? Esse empenhamento será o mesmo que conduziu a que, 10,5 meses depois da aprovação, na generalidade, dos projectos de lei sobre lei de criação das regiões, ainda estejamos numa situação de não haver nada? Ou vai, de facto, acelerar o processo de forma a que, independentemente do processo de revisão constitucional, a regionalização avance, de facto, em termos da comissão, em termos da Assembleia da República, em termos da lei de criação das regiões?

O Sr. Presidente: - A palavra, para responder, ao Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, agradeço e retribuo os cumprimentos que me dirigiu e estou certo que, no futuro, em muitos momentos, teremos oportunidade de prosseguir as divergências que mantinha com o Deputado Jorge Lacão, mas também estou disponível para as convergências que fomos capazes de estabelecer no passado, pois é essa a dialéctica da democracia.
Também registo com agrado a sua preocupação em contribuir para o prestígio da instituição parlamentar. Esse é um ponto que temos em comum.
Em relação às suas questões, respondo-lhe muito objectivamente. No que se refere à primeira, à questão do funcionamento da CERC, devo dizer que ainda esta semana a nossa bancada indicará o nome do Deputado que irá presidir à Comissão Eventual para a Revisão Constitucional e, a partir daí, estão, ao que creio, criadas todas as condições para que esta, imediatamente, retome as suas funções e o processo avance com a celeridade necessária. Como tal, o problema está resolvido e não faz qualquer sentido estar a inventariar supostas razões para justificar um problema que verdadeiramente está em vias de resolução.
A única razão por que esta resposta não foi dada e isso conduziu à paralisação da CERC, foi a substituição da liderança da nossa bancada parlamentar, que é um procedimento absolutamente normal.
Em relação à questão da regionalização, tenho a convicção firme e absoluta de que o Partido Socialista sempre se manteve absolutamente empenhado na consumação de uma reforma a que atribuímos uma elevadíssima importância e prioridade. Simplesmente, temos que respeitar a morosidade dos próprios processos e, nesse sentido, é natural que haja momentos em que essa vontade se manifeste de uma maneira mais incisiva e outros em que a opinião pública se não possa aperceber com tanta evidência da intensidade dessa mesma vontade.
Mas eu, que conheço bem o meu partido, tenho a noção clara que nunca esmorecemos na vontade de avançar com esta reforma, que consideramos importantíssima para o futuro do País e, por isso, causa-nos espanto que o principal partido da oposição não assuma uma posição clara em relação a esta matéria. Nós têmo-la e temo-nos mantido fiéis a essa orientação! Aliás, advogávamos uma posição quando estávamos na oposição, advogamos a mesma posição agora que estamos no poder e estamos absolutamente empenhados em contribuir, de uma forma que há-de ser sempre decisiva, para a plena consumação

Página 1875

21 DE MARÇO DE 1997 1875

de uma reforma que valoramos de uma forma muito positiva. E aí contamos, naturalmente, com o contributo empenhado do vosso grupo parlamentar.
Mas tive também o cuidado de dizer na minha intervenção inicial que esta era uma reforma verdadeiramente nacional. E, sendo uma reforma verdadeiramente nacional, ninguém pode invocar motivos de natureza partidária para deixar de dar o seu contributo para o seu sucesso desde que genuinamente se reconheça nos méritos desta mesma reforma. Por isso, a consequência que gostaria que o meu apelo tivesse seria a de garantir uma maior participação de todos os verdadeiros regionalistas, de todos os verdadeiros defensores da descentralização político-administrativa, no grande debate que haveremos de levar a cabo aqui, no Parlamento, mas que é desejável que tenha uma ampla repercussão nacional.
E aí, para terminar, Sr. Deputado Octávio Teixeira, para além dos muitos momentos em que as nossas divergências claras se afirmarão, vamos ter a oportunidade histórica de assumir e manifestar publicamente uma clara convergência em prol do objectivo da descentralização político-administrativa do País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - A palavra, para um pedido de esclarecimento, à Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, em primeiro lugar, quero saudá-lo no exercício das suas novas funções, bem como a todos os seus colegas que partilham actualmente a responsabilidade de liderar a bancada do Partido Socialista, aproveitando também para saudar quem dela sai e todos os Deputados que connosco, ao longo deste tempo, cooperaram e trabalharam.
Sr. Deputado, no entendimento de Os Verdes, a única coisa que, hoje, faz sentido dizer, com frontalidade, é que tomámos as suas palavras não como uma figura de retórica, não como uma vaga promessa de intenções mas como um código de conduta. E como é um código de conduta que, em seu entendimento, deve prestigiar o Parlamento, daqui a alguns meses espero poder saudá-lo por ter conseguido acabar com os vetos de gaveta, por ter conseguido conviver bem com os demais partidos, qualquer que seja a sua dimensão, por ter conseguido fazer do prestígio deste Parlamento não a facilidade das convergências, quando elas - são fáceis, mas a dificuldade do respeito pela diferença, porque a riqueza do Parlamento reside também nessa diferença e no convívio com ela.
É isso que espero e aquilo que vivamente desejo é, daqui a alguns meses, poder saudá-lo por ter cumprido as suas palavras.

Vozes de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A palavra, para responder, ao Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, mais uma vez agradeço e retribuo os seus cumprimentos, dizendo, Sr.ª Deputada, que teve o mérito de entender as minhas palavras no exacto sentido que lhe atribuí e que é justamente o de contribuir, na medida do possível e com a colaboração dos demais grupos parlamentares, para a dignificação do nosso Parlamento.
É evidente que a democracia é, por definição, o regime da experimentação permanente e nada há como dar tempo ao tempo para verificar, observar e depois constatar se estas palavras foram, como a Sr.ª Deputada admitiu, meras figuras de retórica ou se corresponderam exactamente a uma posição de fundo sobre o que deve ser o comportamento da bancada do Partido Socialista.
Mas, quanto a esta matéria, devo dizer que não pretendo introduzir nenhuma modificação substancial em relação à forma como nos temos comportado no passado. Creio que a bancada do Partido Socialista, sob as várias lideranças e nos diversos momentos históricos, sempre deu provas de grande respeito pelos princípios essenciais da democracia, sempre deu provas de grande respeito pelos princípios da tolerância e sempre deu provas, naturalmente, de valorizar a contribuição de todos os grupos parlamentares, independentemente da sua dimensão. Mas, de facto, o tempo se encarregará de resolver e, de uma forma definitiva, dilucidar verdadeiramente essa sua inquietação.
Por agora, o que lhe posso dizer é que o seu entendimento corresponde exactamente ao sentido que pretendi atribuir à declaração que fiz no início da minha intervenção.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - A palavra, para uma intervenção política, ao Sr. Deputado Arménio Santos.

O Sr. Arménio Santos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Faz hoje 90 dias que foi assinado o Acordo de Concertação Estratégica entre, o Governo e quatro dos cinco parceiros sociais.
O PSD acompanhou com interesse a negociação desse acordo, o Presidente do meu partido, Professor Marcelo Rebelo de Sousa, congratulou-se publicamente com a sua assinatura, mas estamos preocupados porque o Governo não o está a cumprir.
Sempre entendemos os mecanismos do diálogo e da concertarão social como um meio importante para potenciar a evolução das relações laborais e para mobilizar energias em torno de políticas essenciais ao desenvolvimento do País. A nossa atitude nesta matéria é de seriedade e de sentido de responsabilidade, que contrasta com a postura demagógica do PS e do Engenheiro Guterres quando estavam na oposição.
De facto, todos nos lembramos das manobras do secretário-geral socialista sobre os parceiros sociais para não assinarem qualquer acordo social, tal como nos recordamos que não houve um único acordo social celebrado pelo anterior governo que não tivesse de vencer a resistência e as várias formas de oposição do Partido Socialista.
Se aqui invocamos estes factos é para tornarmos claro que o actual Governo socialista beneficia de condições como nenhum outro para ser bem sucedido na concertação social e que nós temos toda a autoridade moral e política para lhe exigir que honre os compromissos assumidos nesse domínio.
Mas não é isso que está a suceder.
Em termos de balanço destes primeiros 90 dias, vejamos apenas três exemplos de como o Governo já não está a cumprir o Acordo de Concertação Estratégica.

Página 1876

1876 I SÉRIE - NÚMERO 54

Primeiro exemplo: emprego. Neste acordo foi estabelecido como meta a criação líquida de 100 a 120 000 postos de trabalho em três anos, a uma média anual de 40 000 novos empregos. Mas ao fim do primeiro trimestre de vigência do acordo, aquele objectivo conheça a falhar. O desemprego continua a subir e não existem políticas concretas para inverter esta tendência e o que é chocante é que, apesar desta realidade angustiar cerca de 500 000 portugueses desempregados e suas famílias, o discurso oficial pretende fazer crer ao País que o desemprego está controlado e a baixar.
Sentimo-nos indignados com a tentativa do Governo de branquear e de esconder a real dimensão do desemprego no nosso país. Por isso, pedimos ao Sr. Primeiro-Ministro que poupe mais nas palavras e no marketing e gaste mais tempo a governar - se possível bem - e que pense nos milhares de jovens sem emprego e na crescente legião de desempregados de longa duração, porque uma sociedade sem empregos é uma sociedade sem esperança e sem futuro.
Segundo exemplo: formação Profissional. Depois de o Governo ter alterado, no ano passado, as regras que disciplinavam os processos de formação profissional, esperava-se que esta área pudesse adquirir maior dinamismo e eficiência, em benefício do emprego de qualidade e da competitividade das empresas. Para isso foram destinados 140 milhões de contos à política de formação. No emanta, as queixas surgem de todos os lados, dos empresários e dos sindicatos, porque os processos de candidatura arrastam-se e não são despachados.
Receia-se que estes atrasos na formação profissional visem concentrar as suas acções no segundo semestre do ano, para fazer coincidir os seus efeitos positivos com as eleições autárquicas. Se isso se confirmar, desde já avisamos o Governo que não, pactuamos com esse grave desvirtuamento da formação e denunciá-lo-emos com coragem e por todos os meios ao nosso alcance.
Terceiro exemplo; combate ao trabalho ilegal. O combate ao trabalho ilegal foi um dos pontos que reputámos de maior importância no Acordo de Concertação Estratégica. Persistem fenómenos como o trabalho infantil, o falso trabalho independente, o trabalho suplementar abusivo e muitas vezes não remunerado e o trabalho clandestino, que implicam grave desprotecção social e autênticos atentados à concorrência.
A dimensão do trabalho ilegal e a precarização do emprego no nosso País foi recentemente divulgada por uma equipa de sociólogos do Ministério para a Qualificação e o Emprego e atinge quase metade da nossa população activa.
Para responder a esses problemas, o Governo comprometeu-se a apresentar anteprojectos, aos parceiros sociais, nos primeiros 90 dias de vigência do Acordo, mas até hoje nada!
Com igual objectivo, o Governo ficou de apresentar projectos para rever o sistema das sanções laborais, diferenciação das coimas e multas com base na dimensão das empresas e novas condições de funcionamento da Inspecção-Geral do Trabalho. Só que, também aqui, o Governo revela a sua incompetência e esqueceu-se de cumprir.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É estranho que a aplicação de um acordo de médio prazo e com uma dimensão estruturante, esteja a passar despercebido. Nós recusamos a ideia que se pretende fazer passar de que a única dificuldade laborai é a questão das 40 horas semanais.
Hoje, os trabalhadores portugueses confrontam-se com mais problemas e mais graves do que há um ano. Por isso mesmo, exigimos do Governo que promova as iniciativas políticas ajustadas ao cumprimento dos prazos e das metas a que se obrigou no Acordo de Médio Prazo, sob pena de vir a ser responsabilizado pelo seu desvirtuamento e descrédito.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Lei n.º 21/96, de 23 de Julho, veio regular a diminuição gradual da duração semanal para um máximo de 40 horas semanais. Este objectivo era há largos anos reivindicado pelos trabalhadores portugueses e objecto de negociação entre os parceiros sociais e o Governo, constando já do Acordo Económico e Social de 1990 o princípio da redução progressiva do tempo de trabalho, para alcançar as 40 horas pela via da negociação colectiva.
Ao contrário da expectativa criada, a referida lei introduziu a instabilidade nas relações de trabalho, prejudicando a negociação colectiva e o normal funcionamento das em tesas.
hoje conhecida a polémica que se gerou na interpretação e aplicação da lei. Em muitas situações, de norte a sul do Pais, os direitos e expectativas dos trabalhadores estão a ser lesados.
O Governo, autor do projecto de diploma e com a legitimidade política que tem, podia e devia, logo no início, clarificar a questão que estava na base da controvérsia, o n.º 3 do artigo 1.º da lei, e a criação do novo conceito de trabalho efectivo. Mas recusou assumir as suas responsabilidades políticas e preferiu proteger-se por detrás do Parecer da Comissão de Acompanhamento do Acordo de Curto Prazo.
Finalmente, face à pressão dos trabalhadores, o Governo acabou por dar um passo, ainda que tardio e tímido, ao emitir agora um despacho interpretativo do n.º 3 do artigo 1.º da lei referida. Em bom rigor, tal despacho só enquadra no conceito de trabalho efectivo as pequenas pausas fundadas em contrato ou na lei e quando não há paragem dos equipamentos. Todas as outras situações, mesmo as fundadas em contrato e aquelas que resultam dos usos e costumes da empresa, são excluídas da qualificação de trabalho efectivo, se houver paragem dos equipamentos.
É pena que o Governo não tenha tido coragem para ir mais longe e qualificado todas as pequenas pausas no conceito de trabalho efectivo, excepcionando o intervalo da refeição. Seria uma interpretação equilibrada e justa e mesmo aqueles que eventualmente pretendessem infernizar a situação não teriam seguramente seguidores. A fraqueza e ambiguidade do Governo estão a defraudar os trabalhadores e a transportar a instabilidade para o seio das empresas.
É público o nosso esforço de diálogo e sensibilização junto dos parceiros sociais, do Governo, do Provedor de Justiça e de S. Ex.ª o Presidente da República. Lembramos, a este propósito, que o Sr. Presidente da República durante o seu mandato apenas dirigiu uma mensagem a esta Assembleia, que incidiu exactamente sobre a Lei n.º 21/96. É certo que o centro das preocupações dessa mensagem não assenta no ponto objecto desta controvérsia, mas nem por isso deixa de ser politicamente relevante e singular.
Já ontem, aquando da audiência que nos concedeu, tivemos ocasião de lhe expressar a nossa preocupação com todo este processo e solicitar-lhe a sua influência junto das entidades competentes.

Página 1877

21 DE MARÇO DE 1997 1877

Defendemos uma solução equilibrada e justa, que acautele os interesses das nossas empresas, mas que respeite também as expectativas e os direitos dos trabalhadores portugueses
É neste quadro, e desta Tribuna, que apelo ao Sr. Presidente da República para que, no uso do seu alto sentido de moderação e de justiça, exerça a sua influência junto do Sr. Primeiro-Ministro, para que a questão das 40 horas seja final e definitivamente resolvida.
É o interesse dos trabalhadores, das nossas empresas e do País que o reclamam.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Barbosa de Oliveira, Strecht Ribeiro, Lino de Carvalho e António Galvão Lucas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Deputado Arménio Santos, gostaria de começar por dizer-lhe que, ao ouvir a sua intervenção, fiquei sem perceber - e a dificuldade é capaz de ser minha - o que é que o Sr. Deputado quer.
Primeiro: o Sr. Deputado, aqui, na Assembleia da República, votou contra a lei e agora tem um problema com a sua aplicação, ou seja, o seu discurso é, ipsis verbis, o mesmo da Intersindical. Exactamente o mesmo! Ou seja, o Sr. Deputado procura, através da figura da aplicação da lei, reivindicar o que não está na lei.
Ora, se se trata de uma reivindicação, então dir-lhe-ei que, quando os parceiros sociais começaram por discutir a questão das 40 horas - já agora lembro-lhe que vem do acordo de 1990 -, com um governo que o senhor pressurosa e deliciosamente apoiava (e, nessa altura, não tinha questões a colocar), o governo era parceiro de um acordo que se comprometia a reduzir o horário de trabalho para as 40 horas.
Porém, durante alguns anos, aconteceu que os sindicatos, na contratação colectiva, procuraram reduzir o horário de trabalho. A contratação colectiva bloqueou e o senhor agora diz que a Lei n.º 21/96 vem prejudicar a contratação colectiva? Ora, é isto que eu não consigo perceber!
Aquilo que a contratação colectiva não conseguiu fazer, a lei procurou fazê-lo, e digo procurou fazê-lo porque quando a UGT - central sindical que o senhor conhece muito bem e tem obrigação de conhecer - quis a redução do tempo normal de trabalho para as 40 horas, em sede de concertação social, não alcançou esse desiderato, porque do que se tratou foi de fazer uma negociação macro em termos de concertação social, que deu apenas a redução em termos de trabalho efectivo.
Ora, aquilo que consta da lei é trabalho efectivo, porque em sede de acordo não foi possível chegar à redução do tempo normal de trabalho e aquilo com que a Assembleia se confrontou foi com uma proposta de lei nascida desse acordo de concertação social.
Aliás, lembro-lhe que, ao tempo, a Assembleia, excepto coerentemente a bancada do PCP,...

O Sr. José Calçada (PCP): - Vá lá, vá lá!...

O Orador: - ... se congratulou com a concertação social, com doutos louvores e esses também tiveram o seu voto.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Quer o Sr. Deputado acabar com a concertação social? Quer o Sr. Deputado pôr em crise a concertação social ou quer o Sr. Deputado respeitá-la?

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Porque a Assembleia só tem de enobrecer-se por aprovar leis que, de alguma forma, tenham consenso na sociedade portuguesa e o senhor sabe as dificuldades da economia portuguesa e sabe que sem empresas não há emprego.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - A propósito do emprego quero lembrar-lhe que o emprego baixou, uma vez mais, no mês de Fevereiro...

O Sr. José Calçada (PCP): - Baixou, baixou! O emprego baixou!

O Orador: - O que o senhor aqui fez foi uma simples mistificação...

O Sr. José Calçada (PCP): - Pois, o emprego baixou!

O Orador: - O que eu quis dizer foi desemprego, Sr. Deputado. O desemprego baixou uma vez mais em Fevereiro. Não baixou o que seria desejável mas baixou!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Arménio Santos, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Arménio Santos (PSD): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Strecht Ribeiro.

O Sr. Strecht Ribeiro (PS): - Sr. Deputado Arménio Santos, o senhor fez uma intervenção genérica sobre as condições em que se exerce o trabalho em Portugal e esqueceu, propositadamente, dois diplomas que combatem uma coisa que é muito mais nuclear que as 40 horas e que é a precaridade do trabalho.
O Sr. Deputado sabe que herdámos uma situação de «clandestinização» real do trabalho e sabe quais são as implicações gravosas que isso traz não só às condições de vida dos trabalhadores, à angústia que dita uma situação precária, como sabe que isso pode ter reflexos gravíssimos na questão da própria receita da segurança social.
Pois bem, o senhor não ignora que os diplomas respeitantes, por um lado, aos recibos verdes e, por outro, ao «aperto», se assim quiser chamar, da forma como se pode contratar a termo são dois diplomas vitais para o combate àquilo que é a situação mais incómoda do mundo laborai: a precaridade do trabalho.
Portanto, gostaria de lhe perguntar se se lembra ou se conhece os respectivos diplomas e se está ou não de acordo com eles, se os aplaude ou não.

Página 1878

1878 I SÉRIE - NÚMERO 54

Quanto à questão das 40 horas, o senhor não ignora que em cinco anos do seu governo nada se conseguiu. Mas com esta lei - e não vou aqui perder muito tempo a discuti-la agora - o senhor tem já um milhão de beneficiários da redução do horário para as 40 horas, independentemente da conflitualidade do Vale do Ave, que, como sabe, é fruto de uma tensão inevitável entre o patronato e os trabalhadores.
O senhor também sabe que esta Assembleia não teve qualquer responsabilidade, uma vez que a sua posição é clara. Portanto, a intervenção do Governo teve de levar em conta o tempo necessário de aplicação da lei para saber como actuar cirurgicamente se, porventura, a conflitualidade se prolongasse, como se prolongou.
Na verdade, o senhor pode concordar ou discordar dos prazos de actuação, mas o facto é que não pode ignorar que houve uma actuação recente, com o despacho do Sr: Secretário de Estado, para clarificar - e bem, do meu ponto de vista - aquilo que era a nebulosa do n.º 3 do artigo 1.º
O senhor sabe que o despacho diz, e bem, repito, que se o trabalhador mostra disponibilidade - e isso é do exclusivo direito do trabalhador - isso é trabalho; se o trabalhador entender que não quer, que está indisponível, então esse tempo não se poderá considerar como trabalho.
Portanto, do meu ponto de vista, a intervenção do Governo, neste momento, clarifica o problema e resolve a questão que levantou.
Por último, devo dizer que acho espantoso que, relativamente a uma lei pela qual o senhor nada fez V. Ex.ª, passe agora a ser um guardião exemplar dela, enquanto nós, que nos batemos por ela, que a emendámos, na medida do possível, e a quisemos e desejámos, pelos vistos, não somos beneficiários de um resultado que só nós produzimos.
Gostaria, pois, de lhe perguntar se isto é ou não assim.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Deputado Arménio Santos, o PSD e em particular os TSD têm demonstrado recentemente uma jovem agitação em torno dos problemas laborais e da defesa dos direitos dos trabalhadores.
Estaria disponível para dizer ao Sr. Deputado: «bem-vindos aqueles que, desde sempre, coerentemente, têm estado na batalha pela defesa dos trabalhadores». Diria até, porque desconfio, que essa vossa chegada tardia a este combate não é uma chegada totalmente sincera...

O Sr. José Calçada (PCP): - Isso é capaz de ser verdade!

O Orador: - Aliás, Sr. Deputado, quando digo isto recordo-me de quando o PSD estava no Governo e os senhores votaram contra a lei das 40 horas de trabalho. Agora o PSD está na oposição e é favorável à lei!... Passa-se exactamente o inverso com o PS que, quando esteve na oposição, votou a favor de uma lei de redução do tempo de trabalho para 40 horas de trabalho normal nunca se falou em trabalho efectivo -, mas agora que chegou ao Governo já alterou completamente a sua posição, encontrou novos argumentos e novas definições para, na prática, transformar o que deveria ser uma necessária lei de redução do trabalho para 40 horas de trabalho normal numa mistificação para não dizer, como dizem os trabalhadores, numa vigarice.
Estou de acordo com o Sr. Deputado quando afirma que é preciso resolver e clarificar esta questão e transformar esta lei, que o PCP desde sempre criticou por várias razões, uma das quais pelo facto de ela estar a ser contestada nas ruas, numa verdadeira lei de redução das 40 horas de trabalho normal.
A minha pergunta é esta: há um mecanismo para resolver esta questão e ele não é, seguramente, o despacho do Sr. Secretário de Estado a que o senhor se referiu, porque ele, constituindo, em parte, um recuo do Governo em relação às teses que vinha defendendo, a verdade é que está muito longe de corresponder às necessidades. Primeiro, a filosofia do despacho continua a inserir-se numa linha interpretativa de redução do tempo de trabalho efectivo e não na redução do período normal de trabalho; segundo, o despacho omite inexplicavelmente, por exemplo, os casos e situações em que mesmo havendo paragem de equipamento tais interrupções são consideradas como integrando o período normal de trabalho, nos usos e costumes dos contratos de trabalho, referindo só o trabalho por turnos e tratando desigualmente os trabalhadores que não estão nas empresas e que trabalham por turnos.
Portanto, esta questão não fica resolvida por este despacho nem é resolvida em «reuniões em família» do Conselho Permanente de Concertação Social. Há um instrumento que pode resolver esta questão, que é o projecto de lei que entregámos na Mesa sobre a clarificação de conceitos.
A minha questão é, pois, esta, Sr. Deputado: se a vossa «chegada» à luta pelas 40 horas é sincera, está o PSD - não o senhor, pessoalmente - disponível para votar este nosso projecto de lei? É esta a nossa questão, este é o desafio que lhe deixo!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Galvão Lucas.

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Sr. Deputado, não tenho nenhum mandato dos trabalhadores, como é sabido não sou dirigente sindical, mas gostaria, apesar de tudo, de deixar aqui clara a minha posição em relação a esta matéria.
Entendo que é injusta para os trabalhadores esta situação de indefinição que actualmente se vive e que é absolutamente necessário que se clarifique, na linha daquilo que o senhor acabou de referir, de uma vez por todas, o que é trabalho efectivo e aquilo que não é trabalho efectivo.
A minha interpretação, que aplico a mais de 1500 trabalhadores e que tem resultado, é a de que, de facto, retirando ao conceito de «trabalho efectivo» o tempo que é dispendido quando as refeições são tomadas não junto dos equipamentos produtivos, deve ser considerado como tempo efectivo, resulte isso da prática da empresa ou da contratação colectiva.
É isso que tenho praticado e tenho obtido resultados que são os únicos desejáveis neste momento, que é a motivação para todos os trabalhadores deste país «arregaçarem as mangas» e trabalharem para que a nossa economia subsista contra toda a adversidade que resulta do quadro

Página 1879

21 DE MARÇO DE 1997 1879

económico para onde fomos empurrados por toda a governação, seja do Governo anterior seja do presente.
Portanto, estaremos disponíveis, independentemente de o nosso grupo parlamentar poder vir a tomar uma posição diferente, para analisar com toda a frontalidade esta situação e clarificar esta questão. Quarenta horas são 40 horas e os trabalhadores portugueses não entendem que, uma vez aprovada uma legislação que não permite que se trabalhe mais de 40 horas, se mistifiquem essas situações e não se clarifique, em definitivo, que 40 horas de trabalho efectivo são 40 horas de trabalho efectivo!
E não procuremos distinguir o que é trabalho efectivo... As pessoas já conseguiram um determinado número de direitos no âmbito da prática da empresa, bem como no âmbito da contratação colectiva, que não se lhes pode retirar, e não são essas meias horas que vão resolver o problema da indústria portuguesa ou das empresas portuguesas! O que vai resolver esses problemas é a motivação dos trabalhadores, é o readquirir da confiança dos trabalhadores nos seus dirigentes, sejam eles sindicais, que são quem os defende, mas também dos seus dirigentes dentro das empresas. É isso que trará saúde às empresas e à classe que, cada vez mais, está unida - a dos trabalhadores, a todos os níveis, nas empresas deste país. Só assim é que poderemos, de alguma forma, pensar em poder sobreviver face ao quadro económico em que nos movimentamos.
De facto, não é uma pergunta que lhe desejo formular, mas sim, de certa forma, deixar uma manifestação clara de alguém que, não tendo nenhum mandato, não sendo dirigente sindical, quer deixar muito claro qual é o entendimento que um bom número de empresários deste país tem deste problema.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Arménio Santos.

O Sr. Arménio Santos (PSD): - Sr. Presidente, começo por pedir ao Sr. Deputado Barbosa de Oliveira que ponha os olhos no Sr. Deputado do Partido Popular: um empresário, uma pessoa que, política e ideologicamente, situar-se-á mais à direita do que V. Ex.ª e que deu um exemplo de equilíbrio, de bom-senso, de sentido de responsabilidade e de abertura para tratar com elevação um problema que é muito sério. Porque não se trata de querer, como o Sr. Deputado aqui referiu, colocar-me em paralelo com uma confederação sindical ou com um partido qualquer, que resolve o problema - isso é demagogia! E este problema não pode ser tratado levianamente e de forma demagógica!
A nossa posição é a de ajudar a superar uma dificuldade mas, pelos vistos, o Sr. Deputado anda distraído ao ponto de não ver a sua dimensão e a perturbação que está a criar na área social e na área empresarial. Aliás, eu diria que V. Ex.ª trouxe aqui uma posição, talvez não da bancada do PS, mas de alguém que está com uma missão muito específica de defesa da equipa do Ministério do Trabalho ou, também poderia dizer, de uma confederação patronal. Quero dizer-lhe que a nossa posição, nesta questão, não é a de criar embaraços à concertação social. Nós pensamos que a concertação social só pode ser prestigiada e ter credibilidade se os seus objectivos forem escrupulosamente respeitados, para ambos os lados, no sentido de todas as partes assumirem o resultados e aquilo que é assinado. E aquilo que foi prometido aos trabalhadores foram 40 horas de trabalho, não foram prometidas 41, 42 ou 43 horas, a que a engenharia de alguns membros do Governo e algumas interpretações da Inspecção-Geral do Trabalho permitem que se chegue.
Acerca do desemprego, Sr. Deputado, o problema é que o PS, desde que é Governo, anda sempre a dizer que o desemprego cresceu. Só que - é espantoso! - quando o PS era oposição, dessa bancada e daquela tribuna muitas vezes os Deputados do PS acusavam o Governo anterior de receber um milhão de contos por dia dos fundos comunitários e de não conseguir resolver o problema do desemprego. E o desemprego, nessa altura, como sabe, era muito mais baixo do que agora.
Curiosamente, no dia 11 de Julho do ano passado, o Sr. Primeiro-Ministro, Engenheiro António Guterres, disse aqui que o Governo português estava a aproveitar 75 milhões de contos por mês - uma média de 2,5 milhões de contos por dia - da União Europeia. Então, pergunto: se os senhores, na altura, com um milhão de contos de apoio comunitário, exigiam que o desemprego descesse e, então, era muito inferior ao que hoje se verifica - como é que os senhores hoje, recebendo mais do dobro do que na altura se recebia, não resolvem o problema do desemprego? Pelo contrário, ele agrava-se e atinge cerca de meio milhão de portugueses. Mas os senhores, pelos vistos, não o sentem porque não estão desempregados!
Sr. Deputado Strecht Ribeiro, quanto aos diplomas de combate ao trabalho precário, lembro-lhe que do acordo de concertação estratégica faz parte um compromisso! E o Governo ainda não apresentou! Foi a essa situação que me referi. Pensamos que é necessário mexer, e com coragem, nesses domínios para combater essa chaga do trabalho ilegal. Há situações perfeitamente escandalosas: há, por exemplo, dezenas de milhar de horas extraordinárias que se realizam todos os dias no sector bancário - e não é um sector pobre - sem serem pagas! Isto é um escândalo! É preciso pôr cobro a isto! E esta não é uma questão do PSD nem do Governo, é de todos nós, Sr. Deputado. Portanto, o que queremos é que o Governo assuma plenamente as suas responsabilidades nesse domínio que, no que toca aos prazos estabelecidos no acordo de concertação estratégica, está a desrespeitar.
Quanto ao despacho, a interpretação que dei - não tem outra interpretação! - é a de procurar clarificar uma migalha do conjunto de trabalhadores que estão envolvidos com esta polémica do n.º 3 do artigo 1 º da Lei n.º 21/96. Por isso, não é uma resposta nem uma solução para o problema. Por isso, esperávamos que o Governo, já que, pela primeira vez, ousou mexer nessa questão, tivesse tratado o problema com a profundidade que ele requeria para, definitivamente, o resolver.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que termine.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, o PCP tem posições correctas e posições incorrectas.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Vá lá, vá lá!

O Orador: - E uma das posições incorrectas que o PCP tem é a de sistematicamente reclamar para si o monopólio da expressão social e da vontade dos trabalhadores deste país. Estou, naturalmente, em desacordo com muitas posições do PCP, mas os senhores têm de se ca-

Página 1880

1880 I SÉRIE - NÚMERO 54

pacitar de que se representassem os trabalhadores portugueses, como se reclamam, nem a bancada do PS era majoritária nem a do PSD era a segunda mais votada! E os senhores têm a votação que têm exactamente porque a esmagadora maioria dos trabalhadores portugueses não confia nos senhores, não se revêem no vosso projecto de sociedade, pelo que não vos dão o seu voto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem mesmo de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
E termino com uma palavra muito simples para o Sr. Deputado António Galvão Lucas: Sr. Deputado, subscrevo as suas preocupações,- até porque suponho que a sua intervenção foi ao encontro das preocupações que expressei na minha intervenção.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Arménio Santos não respondeu à única questão que coloquei, a de saber se o PSD votava favoravelmente o nosso projecto de lei de clarificação dos conceitos de tempo de trabalho, que é o instrumento necessário, em nossa opinião, para resolver este problema.

O Sr. Presidente: - Essa é uma velha questão, Sr. Deputado. Sabe que há a faculdade de responder mas não o direito de responder.
Tem a palavra o Sr. Deputado Arménio Santos, desde que não seja para responder...

O Sr. Arménio Santos (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para pedir desculpa ao Sr. Deputado Lino de Carvalho por não ter respondido a essa questão, mas devo dizer que o fiz involuntariamente.
Dir-lhe-ei, no entanto, que, na altura, o PSD ponderará os projectos que aqui forem apresentados e decidirá em consciência.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas só há um projecto!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Assinala-se amanhã o Dia Mundial da Floresta. Não faltarão certamente iniciativas que, um pouco por toda a parte, levarão jovens, rompendo com a usual clausura a que estão condenados, a, neste início de Primavera, lembrar, em contacto com a natureza, o que dela não deve ser esquecido: que a floresta é um bem precioso, que esse bem está ameaçado, que, esse bem carece ser protegido na sua diversidade.
Não faltarão certamente, a propósito, outras múltiplas iniciativas de convertidos jardineiros de ocasião que, dando tréguas à fúria do betão, se encarregarão de plantar umas árvores. Não faltarão tão-pouco, certamente, os discursos de ilustres governantes que não deixarão de aproveitar o dia para descobrir com espanto o que toda a gente já descobriu e prometer, com ar de novidade, uma daquelas medidas pela enésima vez anunciadas mas que, já ninguém duvida, nos restantes dias do ano em absoluto serão ignoradas.
Iniciativas, pois, de diferente tipo num ritual que se cumpre e que - pese embora a relativa importância que ao simbólico há que reconhecer - não nos faz sentir hoje obrigadas, nesta instituição, a celebrar, habituadas que estamos a falar quotidianamente da floresta sem dia e hora marcada, do ambiente, do desenvolvimento como parte integrante da nossa intervenção, seja quando se trata de caracterizar os seus problemas e identificar as suas causas, seja quando se trata de apresentar propostas para os prevenir e vias alternativas para os solucionar.
Iniciativas neste dia, afinal, Srs. Deputados, que nos conduzem, curiosamente, a uma outra reflexão, sobre uma outra realidade, também ela em perigo, também ela ameaçada, também ela em risco de perda da sua diversidade. Uma realidade que, só por puro equívoco, se poderia considerar um domínio exclusivo do ambiente. Uma realidade que, em tudo, tem contudo a ver com outra aquela que a revisão constitucional veio, no escandaloso negócio, na sombra dos bastidores, entre PS e PSD acordado, fazer despertar! Afinal realidades aparentemente tão distantes e tão próximas, tão diversas e tão similares, na idêntica visão cultural e política que a ambas caracteriza, na marca unificadora que as aproxima, no mesmo olhar que têm implícito. Aquele que, num e noutro caso, é incapaz, não sabe e recusa saber que, tal como num ecossistema, é na diversidade que o seu equilíbrio se mantém e a riqueza reside, e que também só na diversidade, na pluralidade e no confronto de opiniões, qualquer sistema político efectivamente democrático pode sobreviver, gerar confiança, enraizar-se.
Uma compreensão lamentavelmente ausente na preocupante insistência em velhas práticas políticas por demais descredibilizadas junto dos cidadãos, mas também no conjunto de afinidades, concepções, valores que, neste escandaloso negócio, PS e PSD, de modo tão indesejável, evidenciaram saber partilhar. Um negócio feito em nome da participação, disse-se! Da proximidade entre eleitores e eleitos, proclamou-se! Da credibilização das instituições e dos políticos, afirmou-se! Com o mesmo despudor com que, gastando-se precioso papel (para o qual decerto não terão sido poucas as arvores sacrificadas!), se afirmou, num inútil amontoado de palavras e num inexcedível exercício de hipocrisia a dois, tudo aquilo que o conteúdo, a prática, neste episódio, exemplarmente se encarregou de negar.
Um acordo vergonhoso que, nos seus contornos já conhecidos, traduz de modo inquietante alterações a princípios cuja aplicação poderá determinar e condicionar, forte e irreversivelmente, a sociedade portuguesa já que interfere com questões como a paz, a participação, o sistema eleitoral, a descentralização, o regime de representação dos cidadãos e dos partidos. Princípios que vêm claramente, no atentado ao património constitucional existente, limitá-lo, na sua riqueza, anulá-lo, na sua diversidade, cerceá-lo, na visão monolítica implícita e que, pese embora uma ou outra árvore aqui e além deixadas para embelezar o ramalhete, não escondem da floresta a sua essência empobrecedora. Uma floresta do pensamento cada vez mais único, normalizado, limitado nas suas livres escolhas nas alterações indiciadas, quer se trate do sistema eleitoral, da redução do número de Deputados, da abertura à extradição, do crescente envolvimento militar do nosso país.

Página 1881

21 DE MARÇO DE 1997 1881

Um acordo que, ao invés de reforçar meios de credibilizar as instituições, torná-las mais céleres e eficazes no exercício dos direitos dos cidadãos, ao invés de favorecer a expressão da multiplicidade de correntes de opinião de que a sociedade, na sua complexa teia, é feita, mais não faz, ao optar pela redução do número de Deputados e pela alteração do sistema eleitoral, do que afunilá-la, domesticar a diferença, desvirtuar o voto, anular a diversidade, comprometer a proporcionalidade anulando por antecipação o contraditório e o confronto de ideias essenciais num Parlamento, a prazo transformado não num espaço vivo e dinâmico de representação da sociedade mas numa monótona e acrítica caixa de ressonância de poderes cada vez mais semelhantes entre si.
Um acordo que, ao invés de reforçar as garantias de não extradição de cidadãos estrangeiros na presunção de que eles possam ser alvo de tortura, facilita a sua entrega, em clara violação com as convenções internacionais em vigor e num admissível recuo que a própria Amnistia Internacional não deixa de sublinhar.
Um acordo que, ao invés de caminhar para a gradual desmilitarização da sociedade, como a desconstitucionalização do Serviço Militar Obrigatório poderia ingenuamente fazer crer, mais não indicia, ao contrário, do que a profissionalização do Exército, o reforço do envolvimento e da participação do nosso país em aventuras belicistas, numa persistência e teimoso aprofundamento de caducas concepções militaristas e conceitos de segurança que, há muito, julgávamos ultrapassados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, os exemplos que demos são escassos e mais não são, seguramente, do que a ponta do iceberg, daquilo que este obscuro processo permite descortinar. Um processo, aliás, que, se porventura alguém, num acesso de distracção, julgasse ter-se tratado de uma bem intencionada tentativa de estimular o interesse pela vida pública, favorecer a transparência, credibilizar as instituições, promover a participação, não teria hoje qualquer sombra de dúvida em classificar como exemplo paradigmático da política do «faz de conta», da política de bastidores, da política espectáculo de que, manifestamente, os portugueses começam a estar fartos, e os jovens em particular. Um cansaço que também a floresta, nos seus sinais de disfunção, já mostrou evidenciar.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Amanhã é Dia Mundial da Floresta. A floresta, é bem verdade, está ameaçada. Mas previnam-se, Srs. Deputados, porque o sistema também está!

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há ainda três inscrições no período de antes do dia: do Sr. Deputado Mota Amaral, ao abrigo do artigo 81.º, n.º 2, que já foi deferida, e ainda dos Srs. Deputados Moura e Silva e Eurico de Figueiredo.
Como já ultrapassámos em 45 minutos o tempo destinado ao período antes da ordem do dia, darei apenas a palavra ao Sr. Deputado Mota Amaral e solicito aos Srs. Deputados Moura e Silva e Eurico de Figueiredo o favor de compreenderem a situação, ficando inscritos para o próximo período de antes da ordem do dia.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Amaral.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: A Assembleia da República não pode manter-se por mais tempo alheada do problema dos cidadãos portugueses deportados dos Estados Unidos da América e do Canadá. A questão verifica-se um pouco por todo o nosso país, mas assume particular gravidade na Região Autónoma dos Açores.
Desde há alguns anos para cá, em número crescente, desembarcam nas ilhas, vindos do continente americano, homens acabados de sair da prisão, quase todos jovens, expulsos, como indesejáveis, do país que em tempos os acolheu. Residiam nos Estados Unidos ou no Canadá, em geral há muitos anos, como emigrantes em situação regular. Por qualquer motivo, porém, não chegaram a naturalizar-se. Agora, que prevaricaram, são deportados sem piedade. Conheço alguns desses casos, directamente. Sei que são pessoas difíceis e muitos deles nem procuram sequer parecer boas companhias. Sei também que não merecem apenas compaixão mas ainda respeito pelos seus direitos e pela sua dignidade como seres humanos.
Mesmo ao mais cruel criminoso deve ser aberta uma via de redenção. E a maior parte dos jovens repatriados dos Açores são, afinal, vítimas, directas ou indirectas, do temível flagelo da droga, que por toda a parte alastra e não poupa ninguém.
Todos eles deixaram as ilhas sendo crianças, muitos ainda ao colo dos seus progenitores. Emigrantes legais nesses grandes países do Novo Mundo, acabaram triturados nas engrenagens da marginalização e do crime.
A deportação funciona para eles como a pior das penas. Na maioria dos casos, já nem memória guardam das ilhas onde nasceram, não dominam a língua, não têm familiares que lhes dêem agasalho e os ajudem a inserir-se.
O Governo da Região Autónoma dos Açores, com o apoio de organizações não governamentais, está a aplicar programas de acolhimento, com objectivos limitados e resultados nem sempre encorajadores.
Para os mais pessimistas, desenha-se já mesmo no horizonte o risco e a ameaça de um forte núcleo de marginalidade violenta, capaz de perturbar o equilíbrio das pequenas sociedades insulares do arquipélago, pelo seu tamanho exíguo sempre tão vulneráveis à desestabilização.
O Governo da República tem de evidenciar mais determinação na abordagem política do problema.
Trata-se de uma questão melindrosa e é duro levantar a voz em favor de pessoas que, face aos padrões comuns, muitos consideram, talvez com superficialidade, indesejáveis.
Por outro lado, o Estado português tem de manter intacta a sua autoridade para expulsar do território nacional qualquer estrangeiro que se comporte como persona non grata.
Tal poder, genericamente reconhecido nos usos e até nos tratados internacionais, não é, porém, omnímodo e ilimitado: deve ter como balizas os direitos fundamentais da pessoa humana.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Tribunal Constitucional, em recente e notável acórdão, do qual foi relator o Conselheiro Luís Nunes de Almeida, considerou contrária às garantias da nossa lei fundamental a expulsão de um cidadão estrangeiro com filhos menores de nacionalidade portuguesa, com ele residentes em território nacional. E isto em nome do direito à vida familiar e da unidade da própria família bem como da proibição de expulsar portugueses de Portugal, entendendo-se que a expulsão, no caso concreto da

Página 1882

1882 I SÉRIE - NÚMERO 54

mãe, equivaleria, por arrastamento, à própria expulsão dos filhos.
Em sentido idêntico se pronunciou já também o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, aplicando o artigo 8.º da Convenção que lhe incumbe salvaguardar.
A jurisprudência agora entre nós inaugurada. coloca Portugal na linha da frente da luta, tão necessária na Europa e em todo o Mundo, pela adopção de medidas de combate à xenofobia e ao racismo.
Uma vez mais afloram os grandes princípios enformadores da identidade nacional, nomeadamente o papel e a dignidade da instituição familiar, cujo enfraquecimento, em nome de uma mal-entendida modernidade, só tem tido resultados desastrosos.
Fica assim o Estado português com a autoridade moral indispensável para fazer do caso dos repatriados dos Açores um problema sério nas relações luso-americanas e luso-canadianas, e tanto mais grave quanto se trata, com toda a propriedade, de um problema de direitos humanos.
O que mais desespera esses jovens infelizes - e torna mais difícil e incerta a sua recuperação e reinserção social - é terem sido privados, por efeito da deportação, do convívio das respectivas famílias.
Com efeito, muitos deles deixaram na América e no Canadá, para além dos pais e irmãos, também mulher e filhos, nascidos no território desses países e, portanto, nos termos das suas próprias leis, titulares de nacionalidade americana e canadiana.
O Governo da República e o Governo da Região Autónoma dos Açores não podem limitar-se a uma atitude resignada, como se nada mais houvesse a fazer para além de tomar boa nota do nome e data de desembarque dos futuros repatriados. É preciso estimular os líderes das nossas comunidades nos Estados Unidos e no Canadá, para que o problema seja passado às instâncias judiciais desses países, na mira de se obter jurisprudência favorável, sintonizada com a que vai agora abrindo caminho entre nós.
Nos contactos oficiais com os responsáveis políticos desses mesmos países a questão tem de ser também apresentada de modo enérgico. Procurei fazê-lo assim nos últimos anos das minhas responsabilidades governativas nos Açores, quando este problema começou a surgir. Infelizmente, não encontrei então, da parte portuguesa, quem me desse o apoio necessário.
Será que os americanos e os canadianos, que tanto prezam a família e os seus valores, hão-de permanecer indiferentes face a medidas que se traduzem na prática em divórcios, impostos por via autoritária, contra a vontade dos cônjuges? E poderão, porventura, assistir impávidos à expulsão, por arrastamento, de concidadãos seus, mulheres e sobretudo crianças?
Convém que fique bem claro: esta grave questão não é apenas um problema de boas maneiras nas relações entre países aliados e até amigos - e já - seria muito, pois há coisas que não se fazem aos amigos e quando porventura acontecem doem mais!...
Com toda a crueza, o problema dos repatriados dos Açores tem de ser apresentado como uma questão de direitos humanos, violados no presente, a merecerem pronta reparação e maior respeito no futuro.
Gostaria de poder exprimir o sentir unânime da Assembleia da República ao apelar ao Sr. Primeiro-Ministro para que faça incluir, com o devido destaque, a questão dos repatriados dos Açores na agenda das conversações programadas para a visita oficial de trabalho, a realizar na semana da Páscoa, aos Estados Unidos da América.
E basta de fingir que não há problemas de tipo bilateral entre os dois países! Não serão certamente divergências estratégicas fundamentais nem conflitos de interesses insanáveis. Mas para além da questão dos vistos - inaceitável mais ainda desde que somos membros da União Europeia - existe agora o problema dos repatriados dos Açores.
Ora, há mais de 200 anos que existe emigração do arquipélago para a América, mesmo antes, portanto, da independência dos Estados Unidos, daí resultando laços afectivos muito especiais, verdadeiros laços de sangue. Para o Canadá, a emigração açoreana iniciou-se no começo da década de 50, dando origem a comunidades fortes e respeitadas, que se estendem de mar a mar.
Por outro lado, e desde há mais de meio século, é precisamente nos Açores que Portugal hospeda uma importantíssima base militar dos Estados Unidos. A população local acolhe, de coração aberto, como se fossem pessoas de família, primos da América, os cidadãos americanos que nela prestam serviço, em geral acompanhados das suas mulheres e filhos.
É por tudo isso que o problema dos repatriados dos Açores magoa tanto: é como um espinho cravado na carne!

Aplausos do PSD e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Teixeira Dias e António Filipe. Nada vejo contra isso no Regimento, desde que o tempo do pedido de esclarecimento e da resposta se desconte no tempo atribuído aos respectivos partidos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Teixeira Dias.

O Sr. Teixeira Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Mota Amaral, ouvi com atenção as suas preocupações e não deixo de reclamar que também são nossas, neste momento.
No entanto, peço-lhe um esclarecimento: quando é que, realmente, chegaram ao conhecimento do Sr. Deputado esses problemas? Quando foi Presidente do Governo Regional dos Açores, o que fez concretamente para esse objectivo?
Tenho muito gosto em informá-lo de que o Governo Regional dos Açores, do PS, está neste momento a desenvolver diversas actividades, que incluem não só o acompanhamento dos repatriados nos Açores mas inclusive a preparação de várias medidas tendentes a ocupar, desde os próprios Estados Unidos e Canadá, esses mesmos repatriados. Esperemos que o que o Sr. Deputado aqui afirma seja realmente um acompanhamento e um apoio incondicional ao que estamos a fazer pelos repatriados.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, deseja responder já ou no fim?

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Teixeira Dias, este problema, conforme mencionei,

Página 1883

21 DE MARÇO DE 1997 1883

surgiu nos últimos anos das minhas funções enquanto Presidente do Governo Regional dos Açores. Sei que o Governo em funções continua a manter os programas estabelecidos nos anos da minha governação - com isso me congratulo - e tem apresentado novas iniciativas. É evidente que teria de as apresentar porque o problema tem atingido, com o decorrer do tempo, maior gravidade. Estou certo de que essas diligências, que têm como indiquei objectivos limitados, devido às condições próprias da nossa região autónoma e às dificuldades de emprego que nela neste momento se verificam, terão o maior sucesso.
Entendo de igual modo que esse problema não pode ser visto apenas como o acolhimento dos repatriados nos Açores tem de ser visto na perspectiva das relações entre Portugal e os Estados Unidos da América. na defesa dos direitos humanos que estão postos em causa, quando, através da medida da deportação. se tem verificado a verdadeira divisão de famílias, separando-se pais para um lado mulheres e filhos para outros.
É contra esta situação que me insurjo e é contra ela que invoco a jurisprudência inovadora do Tribunal Constitucional português. Assim pudesse o Supremo Tribunal dos Estados Unidos invocando preceitos paralelos, que com certeza existem na Declaração de Direitos dos Cidadãos Americanos. defender as mesmas posições que o nosso Tribunal Constitucional. abrindo caminho defendeu!

aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Mota Amaral, através da figura do pedido de esclarecimento. quero antes de mais saudar o facto de o Sr. Deputado ter trazido aqui esta questão, que tem. de facto. grande importância.
Gostaria de me congratular com a solução que até agora teve a situação mais conhecida do cidadão de nacionalidade portuguesa que esteve prestes a ser repatriado para Portugal, numa situação dramática que foi do conhecimento da opinião pública.
A actual situação está como está não por qualquer vitória da diplomacia portuguesa como o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas a determinada altura disse, mas sobretudo por uma vitória importante da movimentação da comunidade portuguesa no Canadá e da opinião pública nesse país. que foi sensível a esta questão de direitos humanos. Portanto foi sobretudo uma vitória dos direitos humanos.
Mas isso não pode fazer com que esqueçamos que muitos cidadãos estão em Portugal, particularmente nos Açores, como é do conhecimento geral, em situações de expulsão consumada absolutamente dramáticas, como ainda não há muito tempo reportagens designadamente de televisões, deram a conhecer à opinião pública de todo o país, tendo noticiado situações dramáticas de violação dos direitos humanos da responsabilidade dos Estados Unidos da América e do Canadá, que procederam à expulsão desses cidadãos para Portugal país com o qual embora tenham um vínculo de nacionalidade. não têm, de facto, qualquer relação de parentesco, de amizade ou de inserção social.
A segunda questão que gostaria de abordar, a propósito ainda da intervenção do Sr. Deputado Mota Amaral, diz respeito ao exemplo que Portugal tem de dar nesta matéria, e que muito justamente referiu.
Não seria inédito que, por força da aplicação da pena acessória de expulsão, prevista na legislação portuguesa, cidadãos, designadamente de países africanos de língua oficial portuguesa, fossem repatriados para os seus países de origem após o cumprimento das penas de prisão. Isso já se verificou e, inclusive, foi apresentado à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias um pedido de audiência de uma associação de residentes angolanos em Portugal. que nos vem alertar precisamente para o facto de ter havido cidadãos angolanos que, após o cumprimento de penas de prisão, foram automaticamente expulsos. apesar de deixarem em Portugal todo o seu agregado familiar e de cá residirem há muitos anos.
Estas situações, agora, começam a ser contrariadas por força de decisões dos tribunais superiores, tal como o Sr. Deputado referiu. Os votos que fazemos são para que não aconteça em Portugal. em relação a povos de outros países, situações dramáticas como as que se verificam quanto a cidadãos portugueses que residem nos Estados Unidos e no Canadá.
Por isso, mais uma vez saúdo a importância da intervenção proferida hoje, nesta Câmara pelo Sr. Deputado Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Amaral.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe. não creio que me tenha feito um pedido de esclarecimento: mas agradeço imenso a sua intervenção por vir corroborar as minhas afirmações.
Creio que no domínio da defesa dos direitos humanos não podemos reclamar para os nossos cidadãos o que não estamos dispostos a aplicar aos outros. Esses princípios, que são comuns, de respeito pelos direitos humanos, devem ter consagração nas nossas próprias leis e na nossa própria prática.
E por isso que na minha intervenção, para além de fazer um apelo dirigido ao Sr. Primeiro-Ministro para que ponha esse assunto em cima da mesa das negociações que vão ter lugar na próxima semana da Páscoa em Washington quis também louvar a jurisprudência do Tribunal Constitucional e apresenta-la como um exemplo inovador neste domínio numa altura em que todos temos de dar as mãos para combater quaisquer sinais de xenofobia e de racismo. Esta luta é necessária por toda a Europa e por todo o mundo.

O Sr. Presidente: - Para um último pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró, que entretanto se inscreveu.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Mota Amaral. do nosso ponto de vista, para além dos casos humanos que aqui foram relatados e que merecem a total compreensão do nosso grupo parlamentar, e pessoal também, temos de ter em atenção que estamos em presença de pessoas normalmente condenadas e sujeitas à pena de expulsão prevista nos ordenamentos jurídicos dos países em causa.
Já aqui foi referido que o nosso ordenamento jurídico também inclui essa pena acessória e que também já a praticámos. No entanto, quero dizer ao Sr. Deputado Mota Amaral que somos particularmente sensíveis à situação que

Página 1884

1884 I SÉRIE - NÚMERO 54

foi aqui relatada, que se traduz nos casos em que, por virtude de uma medida deste tipo, de expulsão ou deportação de um país, se divide uma família. Nesse caso, se bem que entendamos que à prática de um crime tem de corresponder uma sanção por parte da sociedade, e se o ordenamento jurídico desse país também prevê essa pena - sem que isto signifique, da nossa parte, qualquer desculpabilização ou desresponsabilização quanto aos crimes praticados -, cremos que deve ser dada uma particular atenção, no domínio da defesa dos direitos humanos, às situações em que estão envolvidas famílias que, por esta via, podem ser divididas ou, então, obrigadas a ser deportadas, sem terem a menor responsabilidade na prática do crime em que determinado indivíduo é condenado.
Para esses casos, nada mal ficaria às jurisprudências supremas fazerem jurisprudência num sentido mais conforme aos direitos humanos das pessoas envolvidas.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Amaral.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, agradeço-lhe a sua intervenção, que vem na linha das minhas afirmações. Congratulo-me, pois, por verificar que sobre esta matéria existe um forte consenso no Parlamento na defesa dos Direitos do Homem. Nem outra coisa seria de esperar num país como o nosso, que, nesta matéria, tem os seus pergaminhos a defender. E, tal como no século passado os defendeu, abrindo o caminho à abolição da pena de morte, agora, deve defendê-los nestes domínios tão delicados do combate à xenofobia e ao racismo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 15 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar o período da ordem do dia comum pedido de urgência do Governo para a discussão da proposta de lei n.º 75/VII Autoriza o Governo a transferir para os municípios competências relativas à actividade de transportes de aluguer em veículos ligeiros de passageiros e a criar regras específicas sobre o acesso à profissão de motorista de táxis (revoga o Decreto-Lei n.º 319/95, de 28 de Novembro).
A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias deliberou sugerir à Mesa, dado o carácter prioritário e urgente que decorre do próprio pedido do Governo, que seja submetido já hoje ao Plenário, nos termos do n.º 3 do artigo 286.º do Regimento da Assembleia da República.
Assegurei-me de que há consenso nesse sentido. Temos, portanto, na Mesa o parecer da Comissão, que é o seguinte: «apreciar favoravelmente o pedido de urgência requerido; reduzir para 15 dias o prazo para apreciação em comissão desta proposta de lei; reduzir para dois dias o prazo para a redacção final; remeter para a Conferência, nos termos do n.º 3 do artigo 286.º, a fixação do tempo global destinado ao debate.».
Não sei se os Srs. Deputados querem usar da palavra, apesar de já todos necessariamente o terem feito na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Vou, então, dar a palavra ao Sr. Deputado Miguel Macedo, na sua qualidade de relator, e depois, concederei 3 minutos a cada um dos grupos parlamentares para igualmente se pronunciarem.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero somente tecer duas breves considerações em torno do parecer aprovado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, em respeito, aliás, ao despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República, para dizer o seguinte: no entendimento do relator, que foi, depois, o entendimento da Comissão, por unanimidade dos presentes, nesta proposta de lei reconhece-se a prioridade e urgência solicitadas pelo Governo e propõe-se, tal como foi mencionado pela Mesa, o procedimento referido para o desenvolvimento deste processo legislativo.
Quero, no entanto, chamar a atenção da Assembleia da República, sobretudo para evitar que deste parecer da Comissão resulte algum tipo de precedente, que, do nosso ponto de vista, é indesejável, para o seguinte: primeiro, o reconhecimento que se faz da urgência - e isso fica claro no parecer - resulta dos dois últimos artigos desta proposta de lei, a saber, os artigos 4.º e 5.º, relativos, respectivamente, à revogação do Decreto-Lei n.º 319/95, de 28 de Novembro, e à repristinação das normas anteriores; em relação aos três primeiros artigos da proposta de lei, que, em concreto, se referem à proposta de autorização legislativa, não entendemos que seja justificado o pedido de urgência requerido, a não ser por mero efeito de simpatia, na medida em que a proposta de autorização legislativa está conjuntamente incluída na proposta de lei que tem as duas normas materiais, a que fiz referência há pouco.
E, nesta medida, não pondo em causa a apreciação de constitucionalidade do procedimento do Governo, quero, no entanto, chamar a atenção para alguns efeitos, que me parecem ser de evitar no futuro, em relação a matérias deste género.
O primeiro efeito nesta matéria, na materialidade dos factos, é o seguinte: o Governo, através desta proposta de lei, vai querer conceder às câmaras municipais um poder que já lhes está outorgado por via da proposta de lei de Orçamento do Estado para 1995, que já concedia ao Governo uma autorização legislativa, ao abrigo da qual ele elaborou o Decreto-Lei n.º 319/95, de 28 de Novembro. Isto parece-me manifestamente desadequado, em relação aos poderes da Assembleia da República e aos poderes legislativos do Governo.
Julgo até que, em bom rigor, este tipo de procedimento do Governo devia vir acompanhado do parecer da Associação Nacional de Municípios Portugueses, verificando-se o seguinte: o Governo devia, primeiro, proceder à a revogação do decreto-lei, fazendo-o acompanhar de um parecer da Associação Nacional de Municípios Portugueses, e, só então, depois, elaborar a proposta de autorização legislativa que vem contida nesta proposta de lei.

Página 1885

21 DE MARÇO DE 1997 1885

A ser assim, como o Governo fez, julgo que estamos a adoptar um processo que só por um lapso, que me parece evidente, mas deve ser evitado no futuro, a Comissão e, porventura, a presidência da Assembleia deixaram passar.
Porém, quero registar isto: que não sirva de precedente, do nosso ponto de vista - e estou a falar em nome Grupo Parlamentar do PSD -, este comportamento do Governo, que não me parece o mais adequado em relação ao normal desenvolvimento deste tipo de processos legislativos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, deixei passar, como sempre, mas com reservas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Regular o acesso à profissão de motorista de táxis e mesmo à propriedade de táxis de praça é uma velha reivindicação do sector e dos profissionais do sector. Essa regulação é necessária para clarificar a actividade de táxis, para dar garantias aos verdadeiros profissionais e para separar as águas na confusão hoje existente entre os verdadeiros profissionais e aquilo que são taxistas, profissionais de táxis ou proprietários de táxis, que não reúnem as condições necessárias para a profissão, traduzindo-se depois tudo isto, para os utentes dos táxis, em menor segurança e numa relação menos própria para aquele tipo de actividade.
A exigência de regular toda esta actividade é, portanto, uma velha aspiração do sector. Infelizmente, o Governo atrasou-se muito tempo nesta definição do quadro legal, apesar de há muito vir a discutir esta questão com as associações do sector.
Este é um pedido de urgência - até feito nas condições aqui já referidas pelo Sr. Deputado Miguel Macedo - que percebemos, porque o Governo se atrasou no processo legislativo, mas que junta, como aliás, o Sr. Presidente referiu, e bem, no seu despacho, um pedido de urgência para uma autorização legislativa e, na mesma proposta, matéria substantiva. Ora, isto não pode ser, não é um processo curial.
Coloca ainda aqui uma outra questão, para a qual chamo a atenção do Sr. Presidente: é que, havendo nesta mesma proposta do Governo duas partes distintas, a autorização e matéria substancial, põe-se a questão de outros grupos parlamentares poderem também querer apresentar projectos de lei nesse sentido. E quero desde já aqui dizer que essa é uma das intenções do meu partido.
Nesse sentido, Sr. Presidente, damos o nosso acordo ao processo de urgência pedido pelo Governo, mas com esta nota que aqui fazemos, que deixamos ao Sr. Presidente e seguramente levaremos à Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares: com a perspectiva de este processo de urgência não inviabilizar, tendo até em conta o tipo de pedido de autorização legislativa que é feito, que na sua discussão sejam incluídos, se for caso disso, projectos de lei que outros partidos, em tempo oportuno, venham a apresentar sobre esta matéria.
É neste quadro que damos o nosso voto favorável ao pedido de urgência.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem lógica. Discutiremos isso na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.
Tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo Castro.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou-me confinar tão-só à questão da urgência. Estamos de acordo no essencial com os termos do relatório, que, aliás, aprovámos na Comissão, apresentado pelo Sr. Deputado Miguel Macedo. Mas tão-só e nessa medida estrita, pois quanto a trazer aqui já a discussão da proposta de lei, a urgência existe, mas não é tanta.
Assim, concordamos que será de ter em conta as recomendações feitas no parecer, bem como, aliás, as que o Sr. Presidente da Assembleia da República fez, logo em sede de despacho de admissão, e pensamos que realmente há que conceder prioridade e urgência, pelas razões já referidas, a esta proposta de lei.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Não havendo mais pedidos de palavra, vamos votar o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o pedido de urgência da proposta de lei n.º 75/VII - Autoriza o Governo a transferir para os municípios competências relativas à actividade de transportes de aluguer em veículos ligeiros de passageiros e a criar regras específicas sobre o acesso à profissão de motorista de táxis (revoga o Decreto-Lei n.º 319/95, de 28 de Novembro).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 278/VII - Cria o Sistema de Informação para a Transparência dos Actos da Administração Pública (SITAAP) e reforça os mecanismos da transparência previstos na Lei n.º 26/94, de 19 de Agosto (PS).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cumpre-me, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apresentar o projecto de lei n.º 278/VII, através do qual se visam duas inovações legislativas. Trata-se, basicamente, de criar um sistema, um sistema novo - e novo para dar mais transparência à divulgação de subsídios, subvenções e outros benefícios, que o Estado atribui a entidades de diversa natureza no nosso sistema -, e trata-se, por outro lado, de alterar esse regime de transparência, no sentido de alcançar objectivos que nos parecem desejáveis - mais certeza, melhor conhecimento de quem subscreve projectos e melhor divulgação junto das populações daquilo que verdadeiramente ocorre na relação entre a Administração e os cidadãos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Diga-se, à cabeça, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que se trata aqui de honrar compromissos que assumimos e que, de resto, na legislatura anterior, tiveram aqui no Plenário uma marcada e muito interessante discussão. Os Deputados do PS, na legislatura anterior, apresentaram precisamente um projecto com a mesma denominação «Sistema de Informação para a Transparên-

Página 1886

1886 I SÉRIE - NÚMERO 54

cia dos Actos Administrativos», projecto esse que colheu generalizada simpatia. Foi esse corpo de ideias que fizemos transportar para aquilo que é hoje o Programa do Governo e trata-se hoje aqui de concretizar esse compromisso.
Permitam-me que sublinhe, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que há de relevante neste projecto de lei. O SITAAP é verdadeiramente interessante porque coloca novas tecnologias ao serviço daquilo que a lei já prevê que seja transmitido aos cidadãos como informação pública. Em Portugal, temos um somatório de leis, de disposições - aliás, não apenas emanadas da República como das assembleias legislativas regionais -, que garantem a divulgação de subsídios, subvenções, benefícios e outras prestações públicas, para que todos - mas todos! - possamos avaliar se o Estado cumpre bem os seus deveres, enquanto Administração de prestação, e quem são os cidadãos e empresas que beneficiam dessa actividade. É um princípio republicano de transparência e também a instituição de mecanismos que dizem que o controle da aplicação das leis não é monopólio do Estado e dos seus órgãos, mas deve ser também tarefa dos cidadãos e das organizações sociais - é uma questão de todos, porque de dinheiro de todos, no fundo, se trata.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É este princípio saudável que, em democracias como a nossa, consta de Constituições, de leis fundamentais, de códigos administrativos, de legislação avulsa, que é preciso, hoje, armar com a força das novas tecnologias de comunicação e informação.
Alguns poderão perguntar se há algo de novo nisso e creio que é uma pergunta interessante. Entre nós, desde há alguns anos - e algum mérito o Partido Socialista também terá tido nisso -, é obrigatório fazer a divulgação pública de subsídios, subvenções e outras prestações.
A publicação faz-se no Diário da República e dá origem a volumosos exemplares, nos quais qualquer pessoa pode ler, desde que a eles aceda, naturalmente, nomes, tipos de prestações e outras informações relevantes. Mas convenhamos, Sr.as e Srs. Deputados, que se trata de um instrumento hoje insuficiente e, em muitos aspectos, inadequado.
Uma listagem de milhares de nomes, com milhares de verbas, atribuídas a dezenas de títulos, é uma infernal tarefa para fiscalização por parte dos cidadãos, mas é a coisa mais fácil do mundo para fiscalização por uma máquina computacional, à qual podemos perguntar, com carácter certeiro, quantos cidadãos é que recebem verba superior ao montante tal ou tal; quantos residentes em Sousel receberam prestações de carácter pecuniário por parte dos Ministérios da Agricultura e Pescas, das Finanças ou de outro qualquer;...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muitos, muitos!

O Orador: - ...quantos habitantes da Região Autónoma dos Açores é que foram contemplados com esta ou aquela verba; quantos é que, na Região Autónoma da Madeira, acederam veste ao àquele benefício; e quais são as regiões do país catalogadas e quantificadamente descritas que obtiveram fundos, quem ficou dentro; porque isso nos diz quase automaticamente quem ficou de fora. E isso é bom para todo o cidadão, porque todos nós podemos ser fiscais do cumprimento de importantes princípios, a saber: o princípio da imparcialidade da Administração, o princípio da igualdade e outros igualmente relevantes, para que, na nossa República, não haja senão virtude republicana na Administração e no uso dos dinheiros públicos.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - É isso que as novas tecnologias, Srs. Deputados, nos podem trazer a todos nós.
Refira-se também uma segunda diferença entre este debate e o que fizemos na legislatura pretérita. Muitas destas matérias ainda são discutidas entre nós como se de utopia se tratasse, como se falássemos de um mundo admirável, novíssimo, situado já noutros sítios do mundo, em condições favoráveis, mas inexistente em Portugal. Não é assim, Srs. Deputados! E felizmente que não é assim!
Foi com enorme prazer que, folheando o debate pretérito, me pude aperceber dos passos que já demos neste domínio nestes meses que nos separam do fim do anterior ciclo político e do ciclo que hoje estamos a percorrer. Nesses tempos, nós, na bancada socialista, propúnhamos iniciativas como a criação do Diário da República electrónico, o melhor acesso aos dados da Assembleia da República, medidas para divulgar a jurisprudência e medidas para divulgar as estatísticas nacionais; hoje é com prazer que todos podemos, a partir da Assembleia da República - e pode qualquer cidadão português, em qualquer ponto do mundo, resida em território nacional ou no estrangeiro -, aceder, por exemplo, ao arquivo digital da Assembleia da República e aí consultar, a título gratuito, os debates parlamentares e os textos dos projectos de revisão constitucional e das iniciativas legislativas de cada partido, podendo copiá-los livremente, transcrevê-los, usar o correio electrónico e outros meios para os transmitir, sem qualquer limitação e com facilidade.
A Administração Pública portuguesa e o Parlamento ele próprio também com a sua feição específica - estão a dar passos significativos na utilização destas novas tecnologias. E permitam-me, Srs. Deputados, que deixe aqui e nesta ocasião uma palavra de apreço em relação ao Sr. Presidente da Assembleia da República, na parte que diz respeito ao Parlamento, pelas medidas adoptadas no ano passado que conduziram à abertura deste arquivo que referi e que têm conduzido ao seu aperfeiçoamento sucessivo. Temos muito a fazer, mas a verdade é que os primeiros passos foram dados e aquilo que era sonho no passado é hoje uma realidade.
O que propomos, Srs. Deputados, é, pois, muito simples: é que, como é possível, hoje, qualquer cidadão saber que projectos de lei é que cada Deputado apresentou à Assembleia da República, qual é o seu texto, quem são os seus subscritores, em que estado é que estão, se, já foram aprovados e se estão em Comissão, assim seja possível criar, de forma não burocratizada, um sistema articulado de bases de dados, nas quais sejam colocadas informações sobre actos administrativos.
E, assim, se alguém quiser saber que actos é que foram praticados de adjudicação de empreitadas, de fornecimentos de serviços e de bens, de concessão de obras ou de serviços públicos ou que actos de atribuição de subsídios, de subvenções, de ajudas, de incentivos, de doações, de bonificações e de isenções, há-de ser possível fazer a pergunta e obter listagens que, de imediato, nos informem sobre quem recebeu, quanto recebeu, em que condições e

Página 1887

21 DE MARÇO DE 1997 1887

quando, e isso permitirá muito aos cidadãos, Srs. Deputados.
Nessa matéria, permitam-me que vos diga que creio que não temos imaginação que chegue para conceber aquilo que pode acontecer quando pomos ao alcance dos cidadãos ferramentas e armas do tipo daquelas que vos estou a referir.
Se, como propomos, e com as contribuições que as Sr.as e os Srs. Deputados venham a dar a esta iniciativa, forem criadas, como desejamos, bases de dados de diversos tipos - a tecnologia permite soluções flexíveis de custos diversificados e com grandes potencialidades - que contenham dados como aqueles que estou a referir, então, qualquer cidadão, qualquer grupo de cidadãos, de qualquer faixa etária - na própria população escolar isto vai ser possível, porque, a partir de Maio, haverá acesso às redes internacionais nas escolas portuguesas, através do Ministério da Ciência e Tecnologia e através da Rede de Ciência e Técnica, que colocará computadores multimédia em todas as escolas do ensino básico e secundário -, que faça perguntas nesses sistemas sobre subsídios, subvenções e actos deste tipo pode obter respostas e pode fazer trabalhos de análise, petições, artigos críticos ou de aplauso e requerimentos à Administração Pública.
Ou seja: com estas ferramentas, colocamos ao alcance do cidadão comum e das suas organizações, dos partidos políticos, das organizações sociais e das entidades empresariais instrumentos preciosos para exercerem os seus direitos. Com isso ganhará, desde logo - vejam lá, Srs. Deputados! -, a própria concorrência leal. As empresas saberão quem recebe e quem não recebe e, se articularem essa informação com a informação contida no Diário da República electrónico, poderão verificar se as prestações são legais e ao abrigo de que normas é que elas são feitas. Tudo isso instantaneamente!
É o nosso projecto de lei perfeito? A pergunta é retórica porque, manifestamente, não o é.
O Sr. Deputado Calvão da Silva, ilustre relator da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para este projecto de lei, teve ocasião de, além de observações descritivas e, creio, razoavelmente simpáticas sobre ele, anotar, a certa altura do seu texto, o seguinte, que cito integralmente: «Sendo claro o escopo do projecto, conquanto tímido no desenvolvimento ou fixação das suas bases, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é do seguinte parecer: o projecto de lei n.º 278/VII reúne os requisitos legais e regimentais bastantes para ser discutido em Plenário da Assembleia da República».

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Retenho a expressão «tímido no desenvolvimento ou fixação das suas bases». Tem razão o Sr. Deputado Calvão da Silva ou não? Vamos discutir este tema, naturalmente, Srs. Deputados, é mesmo a coisa interessante deste debate, mas, francamente, creio que não tem razão.
O projecto de lei não é tímido mas, sim, prudente. Porquê? Em primeiro lugar, porque estamos a lidar com dados que são objectivos. Não queremos bases de dados próprias de um Estado policial. Queremos bases de dados sem opiniões e só com factos.
Em segundo lugar, queremos bases de dados controladas estritamente pela Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados. Não há bases de dados sem controlo e estas devem ser rigorosamente controladas pela Comissão.
Em terceiro lugar, não podem ter determinados tipos de dados, só podem ter aqueles que constam dos diplomas que obrigam à publicação deste tipo de informações.
É com estas cautelas, que são muitas, que avançamos neste terreno. Por isso, devo dizer que, na Comissão, saudei, com simpatia, o facto de isto ter sido percebido pelo relator, porque a isso não se chama - repito - timidez, a isso chama-se cautela, e a cautela é necessária nesta matéria.
Uma última palavra, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é devida ao facto de, neste projecto de lei, ampliarmos, também ligeiramente, a legislação sobre transparência. E ampliamo-la em duas áreas. A primeira é em relação ao conhecimento público de quem são os responsáveis pelos projectos candidatos a financiamento. Todos nos lembramos, uma vez que este tema foi discutido entre nós, como é ou pode ser importante em muitos sectores, designadamente na área agrícola, conseguir sempre dizer, em relação a cada projecto, quem é o responsável, o autor técnico da candidatura, para que tudo seja inteiramente claro e tão haja qualquer possibilidade de obscuridade neste domínio.
A segunda ideia contida neste projecto de lei, que nos parece interessante e que alarga as fronteiras do segredo e da transparência, é aquela solução que visa envolver mais os municípios na divulgação dos benefícios concedidos aos cidadãos. Emana disto uma ideia saudável, que é a de que os computadores não fazem tudo. Farão muitas coisas nuns casos gostaremos muito noutros não -, mas não substituem, seguramente, as pessoas nem o contacto de proximidade que é necessário ter. Ora, os municípios têm aí um papel crucial. A lei já lhes atribui um papel muito relevante na divulgação de certos benefícios - eles próprios são, aliás, obrigados a divulgar certos actos que pratiquem neste domínio -, mas aquilo que propomos é diferente. Propomos que o Governo, na legislação regulamentar deste diploma, fixe com precisão formas de associar os municípios à divulgação de quem recebe e o quê, na agricultura, na indústria, nas regiões contempladas pela actividade municipal. Associar os municípios a isso é nobre, é positivo e, sobretudo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, pode ser extremamente eficaz.
Ouviremos a Associação Nacional de Municípios Portugueses, naturalmente, e é do nosso máximo interesse que os municípios participem, de raiz, na concepção desta medida.
Mas, se me é permitida, uma última palavra e um último voto, este seria, Srs. Deputados, o de que concedamos «via verde» para a aprovação desta iniciativa.
Temos na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias muitos temas. Pela nossa parte, demos ontem aos Srs. Deputados do PP, do PCP e do PSD a garantia solene de que queremos aprovar os diplomas pendentes no mais curto prazo e estamos disponíveis para, sem limite, fazer as reuniões extraordinárias que sejam necessárias, para que não fique pendente um só diploma nessa Comissão e possamos todos concluir os processos legislativos.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não é fácil!

Página 1888

1888 I SÉRIE - NÚMERO 54

O Orador: - Temos consciência de que estão pendentes na 1 e Comissão diplomas tão importantes como a legislação sobre o Tribunal de Contas, sobre o porte de arma, sobre a interrupção voluntária de gravidez, sobre direitos de oposição e sobre inquéritos parlamentares.
Tenham a certeza, Srs. Deputados, de que daremos a máxima prioridade à conclusão, ainda durante o mês de Abril, da apreciação de todos esses diplomas. Repito: de todos esses diplomas.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas pedimo-vos também, Sr.as e Srs.
Deputados, o vosso consenso para que um diploma tão razoável como este, que vai implicar ainda muito trabalho de arquitectura, muito financiamento, muita preparação, para evitar burocracia, ineficácia e custos inúteis, possa ter
aprovação no mais curto prazo possível após a sua aprovação na generalidade.
Termino, pois, apelando, Sr.as e Srs. Deputados, para que votem este projecto de lei, porque ele que pode trazer mais transparência à democracia portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que se encontra a assistir aos nossos trabalhos um grupo de 100 alunos da Escola Secundária da Batalha, cuja visita estava marcada para as 17 horas, para quem peço uma calorosa ovação.

Aplausos gerais, de pé.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, congratulamo-nos com a reapresentação desta iniciativa - aliás, já a votámos favoravelmente, tal como todos os Deputados desta Câmara, na VI Legislatura -, bem como com algumas notícias dadas pelo Sr. Deputado na sua intervenção, como a de que em Maio todas as nossas escolas estarão ligadas às mais modernas bases de dados. Salve-se alguma coisa, porque com o diagnóstico que ainda ontem o Ministério da Educação divulgou sobre o estado do nosso ensino secundário e como o Governo não apresentou outras medidas para resolver o problema, ao menos, em Maio, poderemos dizer:« não há mais nada, mas há, ao menos, umas ligações a umas bases de dados!». Aliás, estou já a ver que esse elemento constará talvez como o único ponto positivo do diagnóstico que o próximo Ministro da Educação irá fazer! Mas não é esta a questão fundamental, coloco-a en passant.
A questão fundamental da minha pergunta é a seguinte: o Sr. Deputado não referiu a única grande diferença que há entre o projecto de lei da VI Legislatura e este.
Não a referiu e eu estava à espera que na sua intervenção fosse explicado alguma coisa sobre isto. É que os senhores, na legislatura passada - e todos nós aprovámos o diploma na generalidade -, propuseram que esta base de dados funcionasse na Procuradoria-Geral da República (PGR), ao que ninguém se opôs. Agora, propõem que seja no Governo ou que seja o Governo a regulamentar... Quer dizer, já não é a Procuradoria-Geral da República, deslocou-se para o Governo. Ora, eu esperava que isso fosse explicado. O Sr. Deputado José Magalhães disse: «Bem, há aqui umas diferenças em relação ao anterior...», mas, curiosamente, esqueceu-se desta! Gostaria de saber não por que é que se esqueceu mas por que razão esta opção. Terá sido porque os senhores reflectiram e entenderam que não seria muito compatível com o estatuto da Procuradoria-Geral da República? Que haveria uma solução mais adequada, que era a de colocar esta base de dados na órbita governamental? Ou, pelo contrário, pensaram: «Bem, nós, da outra vez, não confiávamos no Governo por ser do PSD, mas agora confiamos no actual Governo do PS»?

Risos do PCP e do PSD.

E se o PS sair do Governo tencionam apresentar outro projecto de lei, passando, de novo, a base de dados para a Procuradoria-Geral da República? Isto é, não sei o que é que os senhores pensaram, mas gostaria de saber.

O Sr. José Calçada (PCP): - Eles também não sabem!

O Orador: - Por isso é que aguardei pela intervenção de apresentação do projecto de lei, pois pensei que nela nos fosse explicado, mas como não foi faço este pedido de esclarecimento, para, depois, face à resposta de V. Ex.ª, poder pronunciar-me sobre as razões que vos levaram a mudar de opinião.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, respondo gostosamente, pois é mesmo uma pergunta que, confesso, quis ter o prazer de deixar ao Sr. Deputado António Filipe,...

Risos do PS.

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito obrigado.

O Orador: - ... dentro daquele famoso jogo «Descubra as sete diferenças». Essa é, no entanto, inteiramente evidente e, portanto, não poderia ser nossa intenção ocultar ou subavaliar essa diferença. Agora, essa diferença, Sr. Deputado, não foi valorizada por mim, porque é totalmente irrelevante, e explico-lhe porquê, com muito prazer.
O que propomos distingue-se em muito de um sistema centralizado - uma espécie de grande computador, colocado num sítio fixo, ligado a todo o mundo por cabos, etc. -, porque, felizmente, os saltos tecnológicos que se têm vindo a registar nesta matéria permitem a colocação de sistemas flexíveis, conjuntos articulados de bases de dados, pelo que é perfeitamente possível ter uma base de dados - imaginemos - sobre loteamentos urbanos, situada no Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território; outra, sobre subvenções e subsídios, situada no Ministério das Finanças; outra, sobre subsídios na área agrícola, situada no Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas; outra, sobre a indústria, situada na Secretária de Estado da Indústria e Energia; outra, sobre os subsídios à educação, situada no Ministério da Educação; outra, onde o Sr. Deputado quiser. Podemos ter este conjunto de bases distribu-

Página 1889

21 DE MARÇO DE 1997 1889

ídas e acessíveis de forma invisível para o utente. De resto, é irrelevante para mim ou para si, como utilizador, se a base de dados está no Ministério A, B, C ou D, e suponho que tem essa experiência, que é uma experiência positiva. O sítio onde elas se encontram fisicamente é indiferente,...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Claro!

O Orador: - ... o seu acesso, esse sim, não é indiferente e a sua sabedoria, que é seguramente infinita, aumenta com isso, independentemente do sítio onde está a informação:
Foi por isto que passámos a falar de um sistema distribuído de base de dados, que podem estar nos mais diversos sítios hoje em dia.
Sr. Deputado, imagina quanto custou fazer a base que está na Assembleia da República e que funciona razoavelmente bem? Custou inacreditavelmente pouco. O Diário de Assembleia da República custa-nos 100 000 contos/ano, essa base de dados custou-nos seguramente 500 contos, no máximo. E a que construímos no Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que funciona em articulação com essa, custou-nos, a nós, 50 contos, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Grandes descontos!

O Orador: - E é uma base honesta e decente, que o Sr. Deputado, aliás, pode usar contra nós, livremente. Nessa base de dados pode encontrar a versão anterior do projecto de lei e tê-la integralmente ao seu acesso. Não temos medo algum disto.
Portanto, a resposta, Sr. Deputado, é: a diferença é irrelevante, a base de dados não é concebida só na óptica da prevenção e repressão criminal mas também na óptica da concorrência económica e do uso pelos cidadãos para o que quiserem, literalmente.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É a transparência!

O Orador: - Podem-na usar para o que quiserem, Sr. Deputado.
Se a Procuradoria-Geral da República quiser aceder a este sistema, meu caro Sr. Deputado António Filipe, pode e deve fazê-lo com o custo de uma ligação normalíssima à Internet, que, aliás, a PGR já tem. E esta também é uma novidade. A PGR não tinha qualquer acesso e hoje em dia tem um acesso, como todos os partidos.
Assim, deste ponto de vista, avançámos muito e a nossa ideia é esta e simples, e suponho que não choca o Sr. Deputado: vamos tirar partido da inovação tecnológica! É isto, Sr. Deputado.
Quanto à observação que fez sobre a Internet nas escolas, Sr. Deputado, «o último a rir é o que ri melhor» e eu, por mim, estou sentado calmamente e, seguramente, não estou com um ar sisudo. Se olhar para os meus lábios, verifica que estou a sorrir, o que não significa que não conte consigo para a tarefa de divulgar o uso da Internet nas escolas e evitar que os professores nessa matéria tenham uma posição de estarem mais distantes do uso destas técnicas do que os jovens alunos, que, aliás, têm muito a ensinar-lhes - esta é para o Sr. Deputado José Calçada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem á palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS/PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que a iniciativa legislativa do Partido Socialista que estamos agora a discutir é seguramente uma daquelas que não tem grandes dificuldades em recolher o consenso generalizado das bancadas, tendo em conta as finalidades que proclama e as utilidades que pretende fornecer aos cidadãos em matéria de acesso à informação que resulta da actividade da Administração Pública e, consequentemente, em dota-la de mais transparência, para que seja também mais facilmente sindicável por qualquer cidadão. É por isso, obviamente, que esta finalidade e utilidade não são, penso eu, contestadas por ninguém, até porque vivemos num país onde, em boa verdade, o sistema de informação estatística geral da própria Administração Pública verifica muitos atrasos, que em muitos casos tornam difícil e deficiente a própria governação.
Todos sabemos que há grandes dificuldades em ter acesso, em momento oportuno, à realidade do País em que vivemos, porque, como todos sabemos, o sistema nacional de estatística que vigora não é, infelizmente, suficientemente rápido e oportuno em muitas áreas onde seria importante para todos, para o Estado, para a Administração; para os agentes económicos, terem acesso à informação em tempo útil. Ora, isso tem claramente um custo para todos nós, não apenas do ponto de vista do acesso à informação mas também do ponto de vista de quem tem de produzir riqueza, de quem tem de tomar decisões, e aqui falamos de entidades públicas e de entidades privadas, indiscriminadamente.
Este é o primeiro ponto, que, em minha opinião, é o pressuposto de qualquer sistema de acesso dos cidadãos à informação. Penso que é um pressuposto no qual também, talvez sem dificuldade, todos os grupos parlamentares possam ajudar o Governo a tentar actualizar e operacionalizar um sistema adequado de produção de informação sobre a realidade do País que somos, porque, de facto, sem ter essa informação é muito difícil tomar decisões, sejam elas políticas, de investimento económico ou de qualquer outra natureza.
Quanto a este diploma em concreto, é óbvio que merece aplauso a sua finalidade, aliás, penso que ela já o mereceu na anterior legislatura, e que há algumas diferenças de pormenor em relação à iniciativa anterior, às quais o Sr. Deputado José Magalhães já se referiu, fazendo quase como que um desafio em termos de «descubra as diferenças». Mas eu diria que, vindo da parte de quem vem, é difícil não atribuir algum significado político a esta diferença, por exemplo, entre a Procuradoria-Geral da República e o Governo. Faço-lhe essa justiça.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Essa injustiça!

O Orador: - Da mesma forma, também penso que a prudência a que se referiu, relativamente ao relatório elaborado pelo Sr. Deputado Calvão da Silva, é, em meu entender, uma tentativa inteligente de tentar «dar a volta» ao verdadeiro significado, pelo menos àquele que eu percebi, da utilização dessa palavra pelo ilustre relator da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Porque, de facto, Sr. Deputado José Magalhães, a meu ver, quando o Sr. Deputado Calvão da Silva referiu no relatório a prudência, queria referir-se, se calhar, a alguma desilusão que teve quando leu este projec-

Página 1890

1890 I SÉRIE - NÚMERO 54

to de lei, porque vindo de quem vem talvez esperasse mais ousadia, por estar em posição de mais obrigações sobre o Governo para operacionalizar rapidamente tudo aquilo que aqui se prevê, como, por exemplo, o estabelecimento de prazos concretos para o Governo fazer tudo isto, etc. Imagino eu que ele estaria a pensar naquilo que V. Ex.ª exigiria ao Governo nesta matéria, se este fosse do PSD ...

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Exactamente!

O Orador: - ... e não apenas do PS.

Vozes do PSD: - Ora, aí é que está a questão!

O Orador: - E, portanto, interpretei a qualificação de prudente atribuída pelo Sr. Deputado Calvão da Silva ao projecto de lei mais neste sentido e não tanto naquele que V. Ex.ª tentou aproveitar, a benefício do seu próprio projecto de lei, o que é compreensível e legítimo e só lhe fica bem fazer.
Em todo o caso, gostaria de dizer-lhe que, do ponto de vista da finalidade e utilidade deste projecto de lei, obviamente, o Partido Popular comunga desta preocupação de permitir um cada vez maior acesso dos cidadãos a cada vez mais informação produzida por todos os órgãos da Administração Pública, porque pensamos que isso é importante, não apenas para a transparência da actuação dos decisores públicos mas também para múltiplas decisões concretas e quotidianas da economia, da sociedade. Todos os agentes sociais e económicos do País precisam de informação para poderem tomar decisões correctas, que, no fundo, revertem, ou não, a benefício do desenvolvimento geral do País.
Exactamente por isso estamos absolutamente de acordo com a finalidade e utilidade desta iniciativa, apesar de pensar que ela poderá ser melhorada, aperfeiçoada, e, se calhar, para isso até bastará recorrer à idêntica iniciativa legislativa do PS apresentada na passada legislatura, mas nesta matéria, não vou, obviamente, competir com V. Ex.ª. No entanto, estou descansado porque certamente, com a rapidez com que V. Ex.ª quer finalmente dar um contributo para pôr a 1.ª Comissão a funcionar e a votar na especialidade todos os diplomas que lá se encontram amontoados, será o primeiro a ajudar os outros grupos parlamentares a aperfeiçoarem, com o seu projecto de lei apresentado na anterior legislatura, aquele que agora aqui nos apresenta e que merece o nosso acordo de princípio.
Assim, limito-me a dar um pequeno contributo, Sr. Deputado, muito modesto: não se esqueça de estipular um prazo no artigo 7.º, porque normalmente com governos socialistas é prudente -...

Risos do PSD.

... aqui, sim, prudente - dar-se-lhes um prazo para fazerem as coisas, que é para depois não estarmos, na próxima legislatura, a contrastar o seu eventual futuro projecto de lei com este, para descobrir já não sete diferenças mas, porventura, 14.

Risos do PSD.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero agradecer ao Sr. Deputado José Magalhães o esforço que fez para ver se conseguia gastar algum do muito tempo que dispunha para falar a apresentar o seu projecto.

Risos do PSD.

Assistimos daqui, com agrado, a esse esforço e devo dizer que lhe tiro, com a devida vénia, o meu chapéu.
De facto, o projecto não tem muito que se diga, e o que eu disse em duas frases, e teve a bondade de me citar como relator, diz tudo. Em duas frases: o escopo é claro e é de aplaudir; a timidez e a prudência são de salientar. Foi só isto o que eu disse, pelo que, mais uma vez, lhe reitero o agradecimento por, do alto da tribuna, me ter citado.
Tenho uma interpretação deste projecto e, em nome da minha bancada, sossego o seu espírito inquieto: compartilhando deste objectivo, estaremos do mesmo lado nesta votação.
Mas é evidente que também compreenderá que chamemos a atenção para que tantos artigos digam tão pouco. Podemos até concluir que podiam concentrar-se num só, que seria do seguinte teor: « 1. É criado o Sistema de Informação para a Transparência dos Actos da Administração Pública; 2. O Governo regulará tudo isto como bem entender». Ou seja, dava-se uma ordem ao Governo: «Faça!», mas fica livre de o fazer como bem entender. Quer isto dizer, Sr. Deputado José Magalhães, que este diploma não chega a ser um projecto de lei de bases gerais nem um projecto de lei-quadro. Na verdade, não chega a ser nada... É um projecto de lei que, tendo um válido objectivo, contém vacuidades, grandes imprecisões, e que, pelas vacuidades e imprecisões, não merece ser aplaudido.
Em primeiro lugar, o que leva a ter de criar um sistema de informação? Devo dizer-lhe que, neste aspecto, sou um leigo ao seu lado e que, em «internetês», o senhor é catedrático - nem falo latim, hoje, porque não sei muito de «internetês». Nessa medida, Sr. Deputado, como leigo, pergunto se tudo aquilo que aqui quis explicitar, e bem, não é possível pelas actuais redes informáticas, designadamente, como disse, «introduzindo o Diário da República e todo um conjunto de dados nas redes informáticas já existentes». Será estritamente necessário criar um sistema destes? Teve o cuidado de dizer que quer desburocratizar (eu receio que vá burocratizar ainda mais) mas não o quero discutir consigo porque não sei, é apenas uma legítima dúvida que exige, com certeza, alguma resposta para mim próprio.
Em segundo lugar, ao dizer que o Governo regulará tudo como bem entender, é reconhecer-lhe uma competência normativa conformadora extremamente ampla, terá de reconhecê-lo. Obviamente, o Governo, nos termos do artigo 7.º, não tem prazo algum para o fazer, pois regulará as condições de aplicação do diploma quando e se quiser, desobedecendo a esta ordem que lhe quer dar. Não seria bom, Sr. Deputado, que pelo menos concedêssemos um prazo razoável ao Governo para ter de actuar?
Em terceiro lugar, quem são as tais entidades legalmente previstas a que se refere o artigo 1.º, n.º 2? Onde estão previstas? Será, com certeza, o Governo a prevê-las, penso eu. Mas não é correcto falar em entidades legalmente previstas, porque não sabemos identificá-las.

Página 1891

21 DE MARÇO DE 1997 1891

Em quarto lugar, quanto aos objectivos constantes do artigo 2.º, é evidente que pensou um bocado e elencou alguns dos actos administrativos. Convenhamos que, pela mesma razão, ficam de fora muitos outros. Também aí a timidez é grande. Fala-se em actos de doações de bens do Estado. E se for de empresas públicas ou de institutos públicos? E o que dizer quanto a problemas de alienações e de aquisições onerosas? Então, se o Estado comprar, por 100 000 contos, um bem que valia 10 000, não deve ser também sindicado nesta base de dados? E se uma câmara ou um qualquer instituto público venderem por 100 000 contos um bem que valha 1 milhão de contos, também não merece igual sindicância de quem quer ficar a saber como é que as coisas se passaram? O mesmo vale quanto a concessões ou a licenças de utilização do sector público.
Serve isto para afirmar que o artigo 2.º elenca alguns mas poderá elencar muitos mais actos - reconheço, como disse do alto da tribuna, que há muito trabalho a fazer.
Em quinto lugar, no tocante a garantias de fiscalização, remete-se para as leis existentes e obviamente que teria de ser assim.
Em sexto lugar, dizer que a base de dados tem de ser acessível constitui bom propósito, que aplaudimos. De outro modo, não se popularizaria a informação pretendida.
Em sétimo lugar, quanto ao reforço dos deveres de transparência constante do artigo 6.º, é dito que os benefícios concedidos pela Administração Pública a particulares devem ser comunicados de futuro aos municípios para divulgação em locais acessíveis à consulta pública. Não será bom estender esse procedimento também às freguesias? Já reparou o que significa não ter no município de Lisboa ou do Porto essa possibilidade de o fazer em relação às freguesias, que estão muito mais próximas dos cidadãos? Trata-se, porventura, de outra melhoria a introduzir.
Por que é que eu lhe disse, então, que o projecto era tímido? Alguns aspectos deverão ser analisados na especialidade, mas fiz esta advertência com um determinado objectivo (e, agora, situo-me num contexto global): no fundo, este é um projecto de lei virtual remetendo para um Governo que também pode ser virtual, como o tem sido em muitos aspectos. Um Governo virtual significará, até porque não tem prazo para regular as suas condições de aplicação, que esta lei nunca deixará de ser virtual para passar a ser real. É esta a filosofia subjacente, porque não houve coragem de dizer ao Governo «tem x tempo para o fazer» - e devemos ter essa coragem. Se entendemos que o objectivo é válido, não nos fiquemos por um projecto de lei virtual!
Devo chamar a atenção para um problema mais geral. Tudo se enquadra numa filosofia que é particularmente gostosa de V. Ex.ª, e com razão: a da sociedade dá comunicação e da informação. Temo que esta sociedade da comunicação não tenha conteúdo e que andemos a comunicar - falando - sem substância nem tendo o que quer que seja, em concreto, para dizer. O objectivo final destas coisas é, normalmente, a tirania da imagem, em que o importante é que hoje ainda possa haver um minuto de televisão no qual seja dito que o PS tomou uma grande iniciativa legislativa, quando se trata de iniciativa meramente virtual, que não vai dar resultados num, dois, três ou quatro anos, e, se calhar, nunca vai dar...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Mas vai votar a favor!

O Orador: - Vou votar a favor pelo objectivo.
É, portanto, a ideia dessa tirania da imagem de quem quer uma certa publicidade, um certo mediatismo e que pensa que a agenda política é a agenda mediática que também está por detrás do projecto do Partido Socialista.
No fundo, a sociedade da comunicação, sendo do mundo virtual, é uma sociedade de actores, na qual conta mais o mundo da ima em do que as verdadeiras e reais imagens do mundo. contra essa filosofia subjacente ao projecto de lei que também estou.
Nessa medida, preferia que, mais do que um actor está a sê-lo com este projecto de lei virtual, fosse um verdadeiro autor e apresentasse um projecto muito mais desenvolvido, com bases gerais. Sendo autor, teria maior autoridade para dizer-nos que estávamos aqui com um propósito firme de atingir determinado objectivo em tempo útil e não de mero consumo mediático.
Ainda hoje o novo líder da sua bancada aqui fez uma reflexão, que eu saúdo, quando entendeu que também esta Casa, centro nervoso da democracia, não deve entrar no jogo de meros actores. Recuso-me a ver a política como um mero palco de teatro onde há actores e «pontos», leia-se, os bastidores, que tudo resolvem, enquanto aqueles os actores - não têm interior, não têm valores nem causas próprias para decidirem por si, e a melhor coisa, então, é dialogar para adiar e não decidir. Como recuso esta ideia, Sr. Deputado, aqui lhe digo: preferia que a mensagem contida no diploma fosse maior e que não se ficasse por um acto de mera projecção mediática. É que o pior dos populismos da democracia moderna é exactamente esse dos «directos» para a comunicação social e, sobretudo, programados para as televisões; é essa concepção dos media cada vez mais como fins em si mesmos e não meios para passarem mensagens, como deve ser, que fragiliza a democracia. Por essa razão, também não devemos partilhar a filosofia subjacente a este projecto de lei virtual.
Termino, Sr. Deputado José Magalhães, dizendo que recuso a era do virtual, a era do vazio. Preferia que este projecto de lei fosse mais concreto e contivesse verdadeiras bases gerais. Temo que, passando para um Governo virtual, que, como sabe, tem andado a adiar, dialogando e não decidindo, dele faça, de novo, um projecto de lei adiado.

(O Orador reviu.)

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Calvão da Silva, gostava de agradecer as palavras simpáticas que dirigiu ao Presidente do Grupo Parlamentar e à direcção da bancada e dizer que não actuamos sob a tirania de qualquer vontade de imagem.
Ontem, tive ocasião de, em nome da minha bancada, numa pequena conferência de imprensa e em resposta a uma conferência de imprensa do PSD em que este partido tinha colocado questões sobre adopção, dizer que não faremos qualquer guerra em torno da questão da adopção de crianças, por mais efeitos mediáticos que isso possa acarretar. Não faremos essa guerra nem a queremos fazer; trata-se de uma questão nacional, de todos, pelo que não deve ser motivo de divisão. Portanto, Sr. Deputado, não nos acuse de termos preocupação, nesta matéria ou noutra qualquer, de tirania de audiências.

Página 1892

1892 I SÉRIE - NÚMERO 54

A preocupação que temos é a que decorreu da iniciativa que já tivemos na legislatura passada e que, aliás, conduziu, em 1994, por consenso que me apraz sublinhar e que foi possível registar numa Assembleia com maioria absoluta do PSD, à obrigação de serem publicitados os benefícios concedidos pela Administração Pública a particulares, em termos modestos mas que estão em vigor. Conseguimos fazê-lo, o que foi positivo. Não se tratou de um jogo para efeitos virtuais, foi real. Porquê? Porque houve votos para isso.
Apelamos, neste momento, Srs. Deputados - a todas as bancadas, aliás -, para que juntem a vossa à nossa votação para conseguirmos fazer uma lei. E, Sr. Deputado, no momento em que for publicada no Diário da República, promulgada pelo Sr. Presidente da República, se assim o entender, passará a ser lei da República e é para aplicar. É esta a regra que vigora entre nós e é bom que seja assim.
O Sr. Deputado fez quatro observações que gostava que pudesse concretizar. Primeira, disse que este projecto de lei podia resumir-se a um artigo único. Mesmo que fosse um artigo único era melhor do que aquilo que aconteceu na legislatura passada, em que o diploma, tendo sido aprovado, na generalidade, ficou numa gaveta da Comissão. Isto passou-se nos tempos em que havia simpatia virtual mas nenhum resultado real. Fazemos votos para que, agora, não seja assim e estamos empenhados em que não será assim.
Em segundo lugar, disse que é vago. Ó Sr. Deputado, verdadeiramente, o que é bom nesta fase é que já não há catedráticos de tecnologias de informação, de bata branca, a obrigarem-nos a aceitar, de cerviz baixa, o seu saber. Todos nos vamos adaptando a isto, todos nos estamos a habituar a utilizar e o que é bom é que os cidadãos se sintam desinibidos e não aceitem autoridades ex: cathedra nesta matéria. O Professor Barbosa de Melo, tal como eu, habituou-se a ler a edição londrina do Times, todos os dias, na Internet. É bom para ele, tornar-se-á, provavelmente, banal mas é agradável e possível. Somos nós juristas, imagine lá, capazes disso, esse é para mim um sinal.
Sr. Deputado, vamos criar o que não está criado. Mas o que estiver criado, em termos de bases de dados, deve ser integrado, aproveitado, reformatado, como o foi nesta Casa, e bem, num projecto que foi barato. É isso que queremos.
Em terceiro lugar, o Sr. Deputado diz «mas não são precisos». Nós não devemos, enquanto Assembleia da República, dizer aos engenheiros informáticos como é que se faz uma boa base de dados. Isso é com eles! Mas, como sabemos o que queremos, temos de dizer que actos nela queremos recenseados.
O Sr. Deputado diz-nos: «queremos mais do que aqueles que o PS propôs». Nós dizemos: «excelente, vamos a isso», porque se os que estão previstos na Lei n.º 26/94, de 19 de Agosto, são poucos é porque o PSD quis que não fossem mais. Se, agora, o PSD quer que sejam mais, excelente, seja bem-vindo à Casa da transparência alargada!
A última observação diz respeito ao prazo, que, Sr. Deputado, constitui a nossa diferença. É que, no passado, quando eu quis um prazo, os que se sentavam nessa bancada disseram «nem pense nisso». No presente, quando o Sr. Deputado diz que é preciso um prazo, a resposta que lhe dou é a seguinte: sim, Sr. Deputado Calvão e Silva, vamos fixar um prazo. Esta é a diferença e acho que é boa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, muito obrigado pelas suas considerações e pela gentileza que teve em colocar-me algumas perguntas.
Devo confessar que pouco tenho a dizer-lhe senão que fico muito contente por o Sr. Deputado entender que pode haver mais actos administrativos e que ainda fico mais satisfeito por reconhecer que tem de haver um prazo. Portanto, como vê, já valeu a pena dialogarmos e, nesse sentido, obviamente que o acordo começa a ser maior.
Porém, tenho receio de que o Sr. Deputado esteja convencido - terá sido por essa razão que não quis fixar um prazo e só agora teve de consentir nele - de que, depois, o Governo não vai cumprir. Mas não posso tirar essa desconfiança do seu espírito. É que, com a lei do consumidor, que o senhor e eu trabalhámos bastante, já lá vão prazos vários que não estão a ser cumpridos, Sr. Deputado. O Governo não cumpre.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não. Cumpre!

O Orador: - O senhor sabe disso. Quer que lhe dê mais exemplos? Então, se concede, está tudo dito!

(O Orador reviu.)

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a fim de procedermos à sua votação ainda hoje, proponho que terminemos a discussão deste projecto de lei, ainda que as votações não se realizem à hora regimental.
Não havendo oposição, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tal como foi dito, o projecto de lei n.º 278/VII é, basicamente, a reapresentação de uma iniciativa legislativa que mereceu o apoio unânime, na generalidade, aquando da VI Legislatura. Lamentavelmente, esse processo legislativo não chegou a ser concluído e, uma vez que não se tratava de uma iniciativa legislativa de grande extensão, tal não foi possível por não ter havido grande vontade política para o fazer.
Quanto à questão de princípio, mantemos a posição que exprimimos na VI Legislatura, isto é, trata-se de uma iniciativa que, a ser concretizada, contribuirá para reforçar os mecanismos que asseguram a transparência da actividade administrativa e, sobretudo, garantir o direito fundamental dos cidadãos a serem informados sobre essa actividade, com o interesse acrescido de permitir que esse direito à informação seja exercido de uma forma mais simplificada e acessível aos cidadãos.
Nesse sentido, esta iniciativa merece a nossa concordância, na generalidade, tal como aconteceu na legislatura passada.
Adianto também que merece a nossa concordância, na generalidade, não só a criação do chamado SITAAP (Sistema de Informação para a Transparência dos Actos da Administração Pública) mas também o artigo 6.º, que engloba regras de reforço de deveres de transparência a nível da Administração Pública. Enfim, dir-se-á que seria preferível que este artigo integrasse uma iniciativa legislativa à margem. Em todo o caso, não é esse o proble-

Página 1893

21 DE MARÇO DE 1997 1893

ma e, portanto, em termos substanciais, concordamos com o proposto, ou seja, não é por vir integrado no projecto de lei matéria conexa que virá mal ao mundo! Por isso, também não temos qualquer objecção a formular relativamente a este ponto.
Contudo, de entre os aspectos deste projecto de lei que terão de ser bem discutidos em sede de especialidade, não queria deixar de salientar um que, como há pouco referi, constitui uma diferença que não nos parece tão irrelevante como isso. Refiro-me à transferência da responsabilidade deste sistema da Procuradoria-Geral da República, como era proposto na VI Legislatura, para a órbita governamental.
Dizia o Sr. Deputado José Magalhães que essa transferência era uma irrelevância, mas sempre direi que, no entender do Partido Socialista, essa é uma irrelevância que mereceu a pena propor! Ora, como os senhores consideraram que valia a pena fazê-lo, também creio que vale a pena reflectir um pouco que seja sobre o assunto.
Assim, se é óbvio que, do ponto de vista da acessibilidade dos cidadãos - e é isso que é preciso assegurar, fundamentalmente -, há alguma irrelevância quanto à inserção desta base de dados, ou seja, esta base de dados existe e, portanto, o fundamental é assegurar que os cidadãos tenham acesso a ela, pelo que será irrelevante saber onde funciona, o que importa é estar acessível, já não é irrelevante que os poderes de regulamentação propostos nesta iniciativa sejam atribuídos ao Governo.
Isto é, de acordo com o proposto na VI Legislatura, a Procuradoria-Geral da República funcionaria como uma espécie de gestor deste sistema, que ficaria sob a sua responsabilidade. Teria, portanto, de verificar quais as entidades que, estando obrigadas a inserir dados na base de dados, não o faziam, ou seja, estaria assegurada uma fiscalização quanto à regularidade desta base de dados e quanto à existência dos dados a consultar pelos cidadãos.
Ora bem, o que os senhores agora propõem é que seja o Governo a definir «as prioridades na criação das bases de dados distribuídas que integram o SITAAP, bem como a respectiva inserção orgânica e os meios técnicos e financeiros necessários à sua entrada em funcionamento». Isto é, o Governo, que é uma entidade que está vinculada ao cumprimento do disposto nesta lei, no sentido de que também está obrigado, no que diz respeito à Administração Pública central, a assegurar que determinados actos estejam disponíveis nesta base de dados, passa a ter também o poder de ser ele próprio a definir quais as prioridades na implementação deste sistema. E isso é que nos parece particularmente grave!
No fundo, quais são os critérios que o Governo vai seguir na definição das prioridades para a criação das bases de dados? Por exemplo, o Governo vai decidir que, em primeiro lugar, serão as câmaras municipais a criar essas bases, deixando para um segundo momento a sua criação na Administração Pública central? Ou será que vai decidir que as câmaras municipais A, B ou C têm de, prioritariamente, criar as suas bases de dados e que as câmaras municipais X, Y e Z fá-lo-ão mais tarde?
Atribuir aqui poderes de regulamentação ao Governo parece-nos, de facto, uma solução inadequada, na medida em que o Governo está sujeito a deveres decorrentes desta lei. Portanto, não pode ficar na sua discricionaridade a definição daquilo que é ou não prioritário!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Com isto, o que quero dizer é que, em sede de especialidade, deveríamos encontrar uma forma de sermos mais precisos na regulamentação deste regime, inclusivamente em termos de calendarização e da afectação dos meios necessários, para evitar situações que possam conduzir a disparidades. Isto porque pode acontecer, por exemplo, os dados relativos à administração local estarem disponíveis e os da administração central não, ou os do ministério A estarem acessíveis e os do ministério B estarem acessíveis só a partir do ano 2000, ou, situações mais graves, entre entidades da mesma natureza, umas terem dados disponíveis e outras não. Era, pois, necessário que este ponto fosse clarificado.
O Sr. Deputado José Magalhães falou no esforço de arquitectura que será necessário empreender no debate em sede de especialidade. Neste ponto estamos de acordo, porque é necessário fazer-se um esforço para que estes termos fiquem mais precisos, em nome da eficácia deste sistema.
Com efeito, não podemos fazer uma lei e sujeitarmo-nos a que, daqui a alguns meses, todas as entidades venham pedir à Assembleia da República para clarificar isto ou aquilo, porque não sabem como se aplica! Tal situação em nada contribui para o prestígio desta Assembleia nem para a eficácia das leis, uma vez que estamos a aprovar um diploma que depois, na prática, não funciona, o que só nos desacredita e prejudica o direito dos cidadãos de acesso à informação da actividade administrativa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradecia que não esgotasse o tempo de que dispõe, porque tem um orador inscrito para pedir esclarecimentos.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente. Creio que o essencial está dito e, portanto reservarei algum tempo para responder aos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, o pedido de esclarecimento é a forma regimentalmente adequada de corresponder às interrogações feitas pelo Sr. Deputado António Filipe e, simultaneamente, convidá-lo a participar no esforço de reflexão para responder a algumas das perguntas que ele próprio deixou no ar.
Ou seja, se o legislador tentasse, numa lei como esta que temos hoje entre mãos, definir como é que muitos ministérios devem avançar para criar fontes de informação como estas que aqui estamos a discutir, ministérios esses que têm sistemas muitíssimo diferentes, com temperaturas tecnológicas muitíssimo distintas, alguns avançadíssimos... Por exemplo, o Instituto Nacional de Estatística coloca hoje à nossa disposição - aliás, todos os Deputados da Assembleia da República podem ter acesso a esses elementos, a título gratuito, de resto - os cadernos com as estatísticas económicas, demográficas, turísticas, todas elas desagregadas ao nível do concelho, imediatamente copiáveis e susceptíveis de serem transcritas.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É verdade!

O Orador: - É um esforço excelente conseguido pela Direcção Regional do Norte do INE, mas que serve todo

Página 1894

1894 I SÉRIE - NÚMERO 54

o Instituto e está ao alcance dos cidadãos desde há muito pouco tempo. Mas este é, de facto, um excelente serviço.
Sr. Deputado, não tratámos de gizar esse serviço dentro dos limites de uma lei, porque isso é extremamente difícil de conseguir - e aplicá-lo às autarquias locais é ainda muitíssimo mais difícil! Algumas têm sofisticadíssimos sistemas, que, aliás, servem os cidadãos, e até estão a prever a criação de redes inteiras à volta das cidades para facultarem formas de democracia participativa mais avançada, formação na hora, etc., etc.
De facto, é um processo negocial complexíssimo impor ritmos e calendários que, ainda por cima, têm de ser acompanhados de meios, uma vez que não podemos sobrecarregar essas entidades, impondo-lhes tarefas para as quais não haja meios financeiros adequados. Foi tudo isso que nos levou, Sr. Deputado António Filipe - confesso-lha, sinceramente -, a ter muito cuidado no adiantar de soluções que implicam negociações que o Parlamento não pode fazer.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Parlamento não pode fazer directamente esses processos negociais e aí há alguma coisa a que temos de chamar função governativa, função essa que pode ser balizada por nós, por um lado, mas também, seguramente, fiscalizada por nós! É essa á nossa segunda competência, que não se esgota, seguramente, apenas na elaboração de leis.
Sr. Deputado António Filipe, gostava que pudesse pormenorizar um pouco que soluções é que imagina que poderão apertar a «malha» sem entrar no tal domínio técnico, da ingerência na vida das autarquias e na organização interna da Administração, mas digo-lhe que estamos abertos a soluções que afinem este sistema, sem violação do princípio da separação de poderes e que o contributo de todos é, desse ponto de vista, muitíssimo bem-vindo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, creio que há uma convergência de opiniões entre nós, no seguinte aspecto: é de toda a conveniência que este sistema seja, de facto, eficaz e exista um esforço, da nossa parte, para procurar balizar, com toda a precisão possível, os contornos de um sistema que todos gostaríamos de ver a funcionar no mais breve prazo possível.
Naturalmente, há aspectos que, inevitavelmente, se prendem com a actividade governativa, pelo que remeter para o Governo a definição de alguns aspectos do sistema é uma solução possível. Mas creio que seria fundamental, para responder mais propriamente à questão que coloca, que encontrássemos uma forma de evitar soluções que pudessem conduzir a uma situação de desigualdade do acesso dos cidadãos à informação proveniente de entidades com idêntica natureza.
Por outro lado, e este aspecto faz apelo não tanto ao nosso trabalho de legisladores, em sede de especialidade, mas ao trabalho desta Assembleia enquanto órgão fiscalizador da actividade governativa, era importante que não se criassem, na prática, entraves burocráticos e administrativos para que este sistema comece a funcionar.
Creio que existem duas etapas fundamentais para pôr a funcionar este sistema. Em primeiro lugar, há que encontrar uma solução que funcione e seja adequada para que, depois, não venha alguém dizer que o sistema não funciona porque a lei está mal feita - deveríamos prevenir a ocorrência de situações como essa, que não seriam inéditas, em boa verdade! Em segundo lugar, é necessário que não venha qualquer ministério - entidades useiras e vezeiras neste tipo de coisas - invocar que, por dificuldades administrativas, burocráticas ou por falta de disponibilidades financeiras, esse sistema não pode estar ainda a funcionar como todos desejaríamos, mas esperando que antes das calendas gregas isso possa acontecer.
Agora, isto é algo que releva das competências deste órgão de soberania, enquanto fiscalizador da actividade governativa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 278/VII, hoje em discussão por iniciativa do Partido Socialista, que visa criar o Sistema de Informação para a Transparência dos Actos da Administração Pública, tal como já foi dito, repõe e transporta o fundamental dos objectivos do projecto já apresentado na anterior legislatura. Refiro-me à criação de condições de acessibilidade dos cidadãos a toda uma gama de informação de actos da Administração Pública que são fundamentais ao exercício da sua participação e importantes para a defesa dos seus direitos individuais e colectivos, o que, em nosso entender, favorece as condições de participação dos cidadãos na vida democrática do seu país.
Julgo que esta é, portanto, uma matéria totalmente pacífica nos objectivos propostos e, globalmente, nos meios para os atingir. A verdade é que também há pequenas diferenças, mas, porventura, não secundárias, no novo projecto apresentado e é óbvio que é precisamente sobre essa diferença, sobre essa nova definição de contornos que me parece que o trabalho terá de ser feito em sede de especialidade.
Não é indiferente para nós, Os Verdes, quem é guardião desta informação, não é indiferente para nós, Os Verdes, a proliferação ou não de informações e o modo como o seu não controle rigoroso se possa fazer pelos vários poderes, porque o que é facto é que os sistemas de informação são importantes mas também é importante que sejam definidos e precisados os contornos e os exactos territórios em que se movimentam. Trata-se de sistemas que têm de ser usados, e bem, através da lei criada, pelos vários poderes, quaisquer que eles sejam no tempo.
Portanto, a atitude de Os Verdes perante este projecto de lei é a de manter, como no passado, uma posição favorável, em termos globais, e a de tentar encontrar, em sede de especialidade, soluções que o não desvirtuem e que permitam que atinja os objectivos que julgo que lhe estão no espírito e que me parece também que, no essencial, a maioria dos partidos aqui representados querem ver consagrados.

Vozes de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim do debate do projecto de lei n.º 278/VII e estamos em condições de, na altura própria, proceder à sua votação.

Página 1895

21 DE MARÇO DE 1997 1895

Vamos, pois, dar início ao período de votações, começando com a votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 169/VII - Acompanhamento familiar de deficientes hospitalizados (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Este projecto de lei baixa à 12.ª Comissão.
Srs. Deputados, passamos à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 171/VII - Altera a Lei n.º 4/84, de 5 de Abril (Protecção da maternidade e paternidade) (CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O projecto de lei que acabámos de votar baixa, igualmente, à 12.ª Comissão.
Relativamente ao projecto de lei n.º 252/VII - Cria a Fundação Democracia e Liberdade (PSD), foi apresentado um requerimento, pelo partido proponente, ao abrigo do disposto no artigo 156.º do Regimento da Assembleia da República, no sentido de que o referido diploma baixe à 2.ª Comissão, sem votação, para reapreciação.
Importa, pois, antes de mais, votar o requerimento, e só então se verá se procedemos ou não à votação do projecto de lei.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, foi apresentado um requerimento do mesmo teor, por parte do Grupo Parlamentar do PS, no que diz respeito ao projecto de lei n.º 289/VII - Participação da Assembleia da República na cooperação com países africanos de língua portuguesa (PS).
Vamos votar o referido requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o projecto de lei que acabámos de votar baixa também à 1.ª Comissão.
Passamos agora à votação global da proposta de resolução n.º 9/VII - Aprova, para ratificação, o Acordo Quadro Inter-Regional de Cooperação entre a Comunidade Europeia e os seus Estados-membros, por um lado, e o Mercado Comum do Sul e os seus Estados-partes, por outro.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, e abstenções do CDS-PP, do PCP, e de Os Verdes.

Passamos à votação global da proposta de resolução n.º37/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção para a Cooperação no âmbito da Conferência Ibero-Americana, assinada em S. Carlos de Bariloche, Argentina, em 15 de Outubro de 1995.

Vamos ainda proceder à votação global da proposta de resolução n.º 35/VII - Aprova, para ratificação, o Acordo entre a República Portuguesa e a República da Croácia sobre a Promoção e a Protecção Recíproca de Investimentos e respectivo Protocolo, assinado em Lisboa, em 10 de Maio de 1995.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e do PSD e do CDS-PP, e de Os Verdes e a abstenção do PCP.

Vamos, agora, votar o projecto de deliberação n.º 37/VII - Concessão de prazo adicional à Comissão Parlamentar de Inquérito para averiguar os pedidos pendentes no Ministério da Educação ou objecto de decisão nos últimos 12 meses para reconhecimento ou autorização de funcionamento de instituições ou cursos do ensino superior particular ou cooperativo (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos à votação final global do texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 27/VII - Estabelece os princípios a que deve obedecer o regime de recrutamento e selecção de directores de serviço e chefes de divisão para os quadros da Administração Pública, e aos projectos de lei n.os 115/VII - Alteração ao Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro (CDS-PP) e 158/VII - Altera o Estatuto do Pessoal Dirigente (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Finalmente, vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 278/VII - Cria o Sistema de Informação para a Transparência dos Actos da Administração Pública (SITAAP) e reforça os mecanismos da transparência previstos na Lei n.º 26/94, de 19 de Agosto(PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais, quero confirmar se o projecto de lei que acabámos de votar baixa à 1.ª Comissão...

O Sr. Presidente: - Exactamente, Sr. Deputado. Peço desculpa por não ter feito essa referência.

O Orador: - Em segundo lugar, o Sr. Presidente anunciou que os projectos de lei n.os 252 e 289/VII, relativamente aos quais votámos há pouco dois requerimentos de baixa à comissão, sem votação, para reapreciação, baixaram à l.ª Comissão.
Ora, na verdade, um dos requerimentos refere expressamente que o projecto de lei correspondente baixa à 2.ª Comissão, e o Plenário aprovou-o, e parece-me que faz todo o sentido que o outro baixe igualmente à 2.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, Sr. Deputado. A velocidade adquirida, às vezes, dá estes resultados! Os projectos de lei n.os 252 e 289/VII baixarão à 2.ª Comissão, tal como foi requerido.
Para uma declaração de voto relativa à votação final global do texto de substituição da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

Página 1896

1896 I SÉRIE - NÚMERO 54

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, acabámos de votar o texto alternativo à proposta de lei n.º 27/VII e aos projectos de lei n.os 115 e 158/VII, que fixa a regra dos concursos públicos para os cargos dirigentes da Administração Pública, e sobre esta matéria quero, em nome do meu grupo parlamentar, fazer a seguinte declaração de voto: o Grupo Parlamentar do PSD congratula-se por ter sido possível, do trabalho de especialidade em Comissão, elaborar e fazer aprovar um texto de substituição, reunir o apoio conjunto dos partidos da oposição, que deixou isolado o Partido Socialista no apoio às propostas do Governo, uma redacção final que afaste os propósitos por nós denunciados de minar o espírito do serviço público na Administração e abrir caminho ao seu enxamear de cidadãos cuja única credencial fosse a sua militância na actual maioria.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Foi nesse sentido que não vingou a proposta de alargar o recrutamento para todos os cargos dirigentes a estranhos à Administração Pública, que não vingou a composição dos júris total ou maioritariamente estranha à Administração Pública e que não vingou o inconcebível critério de selecção que passava pela capacidade para garantir a execução das orientações superiormente fixadas, só para citar as propostas mais importantes.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não apoiado!

O Orador: - Por último, o Grupo Parlamentar do PSD não deixa também de constatar o claro abandono pelo Partido Socialista da sua promessa eleitoral, demagógica e irresponsável, de introduzir o método de concurso em todos os níveis de cargos públicos, bem como o carácter prioritário que inicialmente lhe deu e que, posteriormente, protelou, ganhando tempo para, escandalosamente, ir colocando os seus boys em cargos públicos.

Vozes do PS: - Isso não é verdade! É falso!

O Orador: - Em conclusão, o maquiavelismo do Partido Socialista chegou ao ponto de, a partir de agora, o País passar a dispor de uma lei de concursos públicos para os cargos dirigentes da Administração e, todavia, não haver cargos dirigentes para preencher, porque, entretanto, o Governo do Partido Socialista, por mera e discricionária nomeação, baseada quase sempre, se não sempre, em critérios partidários, já preencheu tudo quanto havia para preencher.

Vozes do PS: - Mentira!

O Orador: - Trata-se de um exemplo acabado de hipocrisia política!

Vozes do PS: - Ainda não chegámos à Madeira!

O Orador: - Assistimos às promessas eleitorais! Não havia comício em que o Engenheiro Guterres e os seus correligionários não apregoassem esta medida! Admitíamos todos que fosse a primeira a ser apresentada a esta Assembleia da República, mas tardou a ser apresentada e, além disso, foi sempre mantida na gaveta da 1.ª Comissão, e só por pressão dos partidos da oposição foi possível agora aprová-la.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Tarde, infelizmente! E é uma prática habitual do Partido Socialista: critica as regras do passado, mas, primeiro, utiliza-as e, depois, aprova outras para os Governos que hão-de vir, e que não hão-de ser os seus.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Votámos, e confesso que votámos gostosamente, este diploma, tanto pelo conteúdo como pelo método.

Vozes do PSD: - Tardiamente!

O Orador: - E assinalo os dois aspectos, o conteúdo e o método, porque o método, Sr. Presidente e Srs. Deputados, define também os partidos políticos, define os indivíduos, define o carácter e o timbre de quem aprova os diplomas. E, Sr. Presidente e Srs. Deputados, creio que esta bancada tem razões para estar orgulhosa do método.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O método traduziu-se, desde logo, numa capacidade infatigável e numa total recusa de intolerância e de intransigência.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Participámos provavelmente em, devo dizer, dezenas de contactos, fizemos, designadamente o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes - que não está presente por razões profissionais, mas que conduziu este processo em termos que me apraz sublinhar e assinalar neste momento -, contactos tendentes a apurar as consequências de cada solução alternativa que era aventada, a ter em conta o que havia sido dito no Conselho de Concertação Social, a ter em conta aquilo que havia sido discutido em momentos anteriores.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Entretanto, foram fazendo nomeações!

O Orador: - E se os resultados «falam» de modo gritante, este resultado unânime é a melhor prova de que o esforço foi bem conduzido e é positivo. Contra factos, não há argumentos!

Aplausos do PS.

O Orador: - Quem é que imaginaria, quando este processo legislativo teve início, com o PSD urrando vivamente, como estava, que culminaria num voto unânime, Srs. Deputados?! E por que razão é unânime?

O Sr. José Calçada (PCP): - Porque votaram todos!

Página 1897

21 DE MARÇO DE 1997 1897

Risos.

O Orador: - É unânime, porque, em relação às soluções que mereciam discordâncias de uns e de outros, todos contribuíram e a solução final provavelmente é o resultado desse «casamento» positivo.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - O que o Sr. Deputado José Magalhães quer dizer é que, se ainda houvesse lugares para preencher, votava contra!

Risos do PSD.

O Orador: - O Sr. Deputado Guilherme Silva, de cada vez que se inspira na experiência madeirense, fica com um sorriso, e sabe o que isso significa!

Aplausos do PS.

Mas não estava a falar disso, estava a falar do rincão nacional, estava a falar de tudo, estava a dizer, Sr. Deputado, e não era motivo para piada, porque se trata de uma questão séria, que fizemos um real e genuíno esforço de aproximação. E por isso lhe digo o seguinte: há, nesta lei, soluções com que o Sr. Deputado se identifica maximamente, e que nos pareciam menos desejáveis, mas aderimos às vossas sugestões, há outras que os Srs. Deputados abominavam e que acabaram por votar, aderindo às nossas. Não digo que extraímos a vossa cabeça e que conquistámos um trofeu, porque a vitória, desse ponto de vista, parece-me ser de todos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas há uma outra vitória, que é a vitória da palavra e da honra das pessoas.
O Engenheiro António Guterres, na campanha eleitoral, num debate célebre com o Sr. Dr. Fernando Nogueira, prometeu, em termos muito concretos, coisa que o PSD sempre tentou distorcer, exactamente aquilo que nós, agora, cumprimos.
E devo dizer-lhe que é com grande satisfação que cumprimos isso nos exactos termos que ele prometeu aos portugueses.

Vozes do PS: - Muito bem!

Risos do PSD.

O Orador: - Não naqueles que os senhores tinham imaginado, não nos termos da vossa caricatura.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
A última menção, Sr. Deputado Guilherme Silva e Srs. Deputados, é a seguinte: não aprovámos esta lei, hoje, por qualquer premeditada dilação mas porque os Srs. Deputados sabem, minuto a minuto, segundo a segundo, como eu, que tivemos de debater na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, durante estes meses, importantíssimas questões. O PSD propôs coisas que aceitámos, fizemos visitas, discutimos a lei do aborto, gastámos muitas dezenas de horas de actividades e todas elas louváveis.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - O meu requerimento é de Setembro!

O Orador: - Isto chega, pois, Sr. Deputado, na altura possível, a tempo. Nenhuma nomeação foi feita contra a Constituição e contra , a lei...

Risos do PSD.

... e, seguramente, nenhuma se compara aos milhares que os senhores fizeram em 10 anos de ciclo de «cavaquismo» e «laranjismo» na função pública.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura de dois pareceres da 1.ª Comissão.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o primeiro parecer é do seguinte teor: «De acordo com o solicitado pelos juízos Cíveis da Comarca de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Hugo Velosa a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo que corre os seus trâmites no referido tribunal, em audiência marcada para o próximo dia 28 de Maio de 1997, pelas 14 horas e 15 minutos».

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai proceder à leitura do segundo parecer.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o segundo relatório é do seguinte teor: «De acordo com o solicitado pelos Juízos Criminais da Comarca de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Ismael Pimentel a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo que corre os seus trâmites no referido tribunal».

O Sr. Presidente: - Vamos votar.

Submetido a votação,. foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão do projecto de lei n.º 70/VII, sobre o «cheque de ensino», da iniciativa do CDS-PP.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Silvio Rui Cervan.

O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate de hoje do projecto de lei n.º 70/VII, do Partido Popular, visa introduzir alguma justiça no sistema que vigora no ensino superior em Portugal.
Infelizmente, durante décadas, aos alunos candidatos ao ensino superior apenas era dada uma opção - o ensino superior público. Um ensino insuficiente, um ensino com poucas vagas, com numerus clausus complemente desajustado à realidade.

Página 1898

1898 I SÉRIE - NÚMERO 54

Como bem dizia, repetidamente, o Professor Adriano Moreira, «tratava-se de um problema de mesas e cadeiras, de um problema de salas, de um problema de espaço que não havia para albergar uma parte importante daquela que era e é a nossa excelência».
Não eram só os candidatos com aproveitamento que não tinham acesso ao ensino superior, eram alunos muito bons com médias altas (14,15 e 16 ), a quem o Estado não criava condições para uma formação superior. Como se de um país rico se tratasse, que transbordava em bons quadros superiores, bons técnicos, como se fosse um país educativamente desenvolvido.
O aparecimento do ensino superior privado, por muita hipocrisia que haja por parte de certos poderes, veio resolver um grave e sério problema ao ensino superior em Portugal.
Alguns erros - que também os houve - nascem não da necessidade da sua criação mas da forma como foi patrocinado algum do seu desenvolvimento. Alguns anátemas que sobre o ensino superior privado vêm sendo lançados nascem não de uma surpreendente qualidade do ensino superior público mas de uma total incapacidade fiscalizadora, quer ao nível do privado quer, também, ao nível do ensino superior público.
O ensino superior privado tem servido ao longo dos últimos anos para o poder político exibir algumas estatísticas, com percentagens de frequência e conclusão mais animadoras, mas não tem servido para criar reais condições de igualdade e justiça entre os dois subsistemas.
Infelizmente, hoje, o critério de acesso não é exclusivamente de natureza científica. Um aluno não tem, hoje, uma escolha verdadeiramente livre. A opção pelo ensino superior privado obriga-o a uma propina considerável, a opção pelo ensino superior público é o que se sabe. A opção pelo ensino superior privado não lhe confere uma acção social minimamente representativa, no ensino superior público, por muito que esta possa melhorar, existe acção social escolar.
Onde está a igualdade? Onde está a justiça?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Analisemos a frieza dos números. Um aluno custa, hoje, no ensino superior público quase 600 contos/ano ao Orçamento do Estado; um aluno que opta pelo ensino superior privado poupa, hoje, ao Estado mais de metade daquela verba. Qual a recompensa? Nenhuma.
Haja justiça, haja coragem!
U projecto de lei do Partido Popular promove a liberdade individual, aposta na valorização do aluno e na possibilidade da sua realização pessoal e profissional. O Estado, sob a forma do «cheque de ensino», tem a possibilidade de restituir às famílias verbas de uma competência que também é sua e da qual se alheou apenas por manifesta incapacidade.
O projecto de lei que o Partido Popular, hoje, aqui traz não é inovador: é o corolário de 13 anos de total insensibilidade face a este problema por parte dos sucessivos governos, quer do PS quer do PSD.
Em 1984, o Professor Adriano Moreira e outros trouxeram a esta Assembleia o projecto de lei n.º 405/III, reiterado em 1985 e 1987 com projectos idênticos 13 anos volvidos, PS e PSD continuam parados no tempo, conscientes do erro, mas incapazes de apresentar soluções.
O problema que, hoje, aqui se discute é também, e sobretudo, um problema político. Repito, o problema que, hoje, aqui se discute é um problema de uma opção política, que divide aqueles que, como nós, acreditam que o ensino superior privado deve ser concorrencial e alternativo àqueles que o querem subsidiário e complementar do ensino superior público e, já agora, de má qualidade para justificar tantos anos de falta de coragem política.
Quem, como nós, acreditar na primeira solução, venha connosco por uma simples e elementar questão de justiça.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para resumir o relatório de que é autor, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é o relatório que foi aprovado na Comissão de Economia, Finanças e Plano. Uma vez que o diploma em apreço também baixou à Comissão de Educação, entendeu-se na Comissão de Economia que o objectivo seria uma tentativa de ponderar os acréscimos de encargos para o Estado resultantes da eventual aprovação do mesmo.
Assim sendo, foram definidos alguns pressupostos e alguns esquemas que facilitassem os cálculos, até porque não há a pretensão, de que estes sejam absolutamente correctos, visto tal não ser possível, os critérios podem ser e são, com certeza, discutíveis. No entanto, este relatório foi aprovado por unanimidade na comissão, tendo sido calculados os valores para duas possibilidades: uma, minimalista e uma outra, limite, maximalista.
Resumindo, na hipótese de menores custos, isto acarretaria 32 milhões de contos de encargos para o Estado; na hipótese maximalista seria cerca de 60 milhões de contos, o que representaria um aumento de despesas com a educação na ordem dos 6%.

Vozes do PS: - Muito bem.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, gostaria de começar por dizer que a desigualdade de acesso e frequência ao ensino superior por razões de condição económica é, de facto, uma realidade.
Mas essa discriminação, essa realidade urge ser combatida. Os Verdes já se têm pronunciado neste Plenário por diversas vezes sobre esta matéria. Creio que a nossa posição é perfeitamente conhecida e passa - na nossa perspectiva, naturalmente - por combater esta realidade cumprindo primeiramente a Constituição da República Portuguesa: eliminando o numerus clausus, criando uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população e estabelecendo, progressivamente, a gratuitidade de todos os graus de ensino. Ao Estado, na nossa perspectiva e na da Constituição da República Portuguesa, compete garantir a educação para todos, com qualidade, superando as desigualdades económicas. Estes são princípios fundamentais para Os Verdes.
A opção dos sucessivos governos, contudo, tem sido diferente: tem sido antes a de uma aposta forte no ensino superior privado, não garantindo a qualidade; tem sido a da restrição de acesso ao ensino superior público, através do numerus clausus e, agora também, mais uma forma de restrição, a nota mínima; tem sido a da opção das propinas, transferindo os encargos com a educação, do Estado

Página 1899

21 DE MARÇO DE 1997 1899

para as famílias, o que, na perspectiva de Os Verdes, é inaceitável. Esta é também a lógica do Partido Popular.
Portanto, esta é uma diferença que nos separa fortemente na concepção de educação e na orientação para uma política de educação.
Dito isto, defendendo os princípios que defendemos, não podemos concordar com uma solução como a que o Partido Popular aponta neste projecto de lei - o cheque de ensino. O projecto de lei encerra a ideia da não gratuitidade do ensino superior, encerra a ideia da não aposta no ensino superior público. Discordando do princípio, abstemo-nos, naturalmente, de mais comentários sobre o conteúdo específico deste projecto de lei. Resta uma curiosidade - e era esta a questão concreta que eu gostaria de colocar ao Sr. Deputado: é que o projecto de lei não garante se quer a igualdade de oportunidades para todos. Porque é que só deveriam ter acesso ao cheque de ensino os menores de 25 anos? Então aqueles que, por exemplo, interrompem os seus estudos, ao retorná-los ultrapassando os 25 anos, não teriam a mesma oportunidade dos outros? Ou o Partido Popular vai apresentar, ou tem na manga, mais alguma proposta para garantir o pleno emprego para todos os cidadãos com mais de 25 anos?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan. V. Ex.ª afirmou na tribuna, e diz na «Nota justificativa» do seu projecto, que quer um ensino privado que seja concorrencial e alternativo ao ensino público, que não quer um ensino privado que seja subsidiário do ensino público - isso far-nos-ia pensar que, no seu projecto, iria atribuir um cheque de ensino ao jovem que estivesse habilitado a ingressar no ensino superior, deixando a esse jovem a opção pelo ensino público ou pelo privado. Era isto o que, aparentemente, faria sentido, dentro da nossa lógica. Contudo, o que vemos no articulado é que o cheque de ensino só seria atribuído aos estudantes que, por força do numerus clausus, não tivessem conseguido entrar no ensino público e lhes restasse apenas a alternativa do ensino privado - é isto que está inscrito no vosso artigo 6.º! Isto é absolutamente incompatível com o princípio do artigo 1.º, incompatível com a «Nota justificativa» que está no diploma e incompatível
com o discurso de V. Ex.ª nesta tribuna.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É contraditório, é!

O Orador: - Sr. Deputado, quero acreditar que V. Ex.ª deu a resposta quando disse que este diploma era de 1983, ou que tinha as suas raízes em 1983 num texto do Professor Adriano Moreira, então Deputado - assim, já se percebe porque, em 1983, quase não havia ensino privado!
E, nessa altura, os ricos iam para o ensino privado e os pobres iam para o ensino público.

O Sr. António Filipe (PCP): - Assim, ia dar o cheque aos ricos!

O Sr. José Calçada (PCP): - Isso era um xeque-mate aos pobres!

O Orador: - Mas a realidade hoje é outra, Sr. Deputado: hoje, pobres e ricos encontram-se tanto no ensino público como no privado. A tendência terá de ser a de considerar uns e outros por igual, e o Estado deve ajudar aqueles que precisem quer estejam no ensino público quer estejam no privado.
Gostava que o Sr. Deputado me esclarecesse qual é verdadeiramente o sentido deste diploma: é permitir a liberdade de escolha aos jovens entre o público e o privado? Ou é dar uma esmola àqueles que têm de se resignar com o ensino privado, como consta do vosso artigo 6.º?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Celeste Correia.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sílvio. Rui Cervan, o projecto ele lei do seu partido reconhece, na sua «Nota justificativa», entre outros aspectos, a existência de «um desajustamento preocupante entre as vocações naturais dos jovens e os cursos que eles se resignam a frequenta»; considera também que o Estado não tem nem deve ter a responsabilidade de garantir toda esta oferta; mas reconhece ainda que o sector privado não pode ambicionar à diversificação de áreas de que o País precisa e que corresponde também à diversidade de vocações dos jovens portugueses. No contexto de tal fundamentação e coerentemente, penso que seria de esperar que o projecto do seu partido propusesse medidas que pudessem contribuir para a diversificação com qualidade dessas mesmas ofertas; contraditoriamente, porém, apresenta um projecto de diploma que confessadamente não contribui para essa mesma diversificação. Gostaria que o Sr. Deputado me explicasse esta contradição.
Por último, Sr. Deputado, todo o enunciado do projecto pressupõe a aceitação do princípio do pagamento de propinas no ensino superior. Como devo presumir que nem o senhor nem o seu partido defendem a manutenção do actual montante das propinas, que é de 1973, devo inferir que o PP apoiará a revisão desta questão. Custaria que o Sr. Deputado comentasse esta minha afirmação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, tenho muito gosto em responder às perguntas que fez, com duas precisões prévias: primeira, quando o PP agendou este diploma, ainda não tinha sido...

O Sr. António Filipe (PCP): - Ainda não havia PP!?

O Orador: - Não! Registo com agrado o aparte do Sr. Deputado, mas devo dizer-lhe que a situação que deu origem ao primeiro diploma, de 1984, é uma situação que se mantém durante 13 anos - essa é que é a realidade!
Quanto àquilo que a Sr.ª Deputada me pergunta em relação à gratuitidade, queria dizer-lhe que não há

Página 1900

1900 I SÉRIE - NÚMERO 54

gratuitidade. A questão que aqui se coloca é diferente: é quem paga e como se paga. Porque não há gratuitidade quando sai do Orçamento do Estado - saindo do Orçamento do Estado, sai do bolso dos contribuintes, de todos os contribuintes portugueses. Temos essa filosofia diferente. Aqui, temos uma visão diametralmente oposta àquela que a Sr.ª Deputada tem - somos a favor da existência de uma propina e de uma propina substancial.
No entender do Partido Popular - e respondo também à parte final da pergunta da Sr.ª Deputada Celeste Correia -, no aluno que se forma no ensino superior há uma mais valia individual e uma mais-valia para a colectividade. Há, portanto, um custo que deve ser partilhado: uma parte pelo Estado - para essa mais-valia colectiva de ter mais um advogado, mais um médico ou mais um quadro superior -, e uma mais-valia individual porque um aluno do ensino superior que consegue aceder a um bacharelato ou a uma licenciatura aufere uma vantagem de natureza pessoal.
Este diploma não corrige necessariamente todas as injustiças; o que constata é uma situação que existe de facto e faz o diagnóstico. E é verdadeira a afirmação do Sr. Deputado Castro Almeida quando diz que a situação de hoje é substancialmente diferente da de 1984, mas, digo-lhe que é substancialmente mais grave porque os mesmos que não criam condições de igualdade entre o subsistema do público e o do privado são aqueles que, depois, à custa e sob a capa de não criarem essas condições de igualdade, dizem sistematicamente que o ensino superior privado é apenas residual e complementar. Todavia, nesta Câmara, bater-me-ei até ao limite para que o ensino superior privado não seja tratado como residual.
Aliás, quero deixar aqui o repto a todas as bancadas no sentido de permitirem que o diploma baixe à comissão respectiva, junto com o pacote sobre o financiamento do ensino superior que o Sr. Ministro da Educação se comprometeu a apresentar até ao final de Março, para discussão na especialidade.
Para mim há outros mecanismos, nomeadamente, a acção social escolar. Para nós é absolutamente crucial que a acção social escolar seja feita, duma vez por todas, tendo em atenção a pessoa e não em função do sitio onde a pessoa estuda.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Então e os 25 anos?!

O Sr. Presidente: - A palavra, para um intervenção, ao Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS-PP devolve-nos a uma discussão que permite marcar com total clareza uma distinção filosófica e programática sobre o valor social das políticas. Uma maior justiça social no apoio à frequência do ensino superior só será alcançada pela sobreposição do principio da selectividade ao da universalidade, enquanto o país não tiver os meios financeiros que lhe permitam tornar todo o sistema de ensino gratuito.
Mas, ao que parece, o PP tem evoluído: se analisarmos o seu programa eleitoral verificamos que nada consta relativamente à criação do cheque de ensino. Ao contrário, o que ali se previa era algo bem diferente. Defendia então o PP que «os estudantes não devem excluir-se do pagamento de um bem que os beneficia - o ensino superior». E dizia mais: «que ninguém deve ser excluído do acesso à universidade por falta de meios de pagamento. É para conciliar estes dois valores que o Partido Popular defende o empréstimo escolar. É um sistema em que o Estado abre linhas de crédito para os estudantes com menos recursos, fazendo um empréstimo que lhes permita tirar o curso. O direito a esse empréstimo depende do sucesso escolar do estudante, porque o Estado não deve financiar a preguiça nem subsidiar a inépcia».
Não sendo esta a nossa posição, porque defendemos um papel fundamental da acção social escolar nestes casos, noto contudo uma enorme contradição entre o programa eleitoral do CDS-PP que prometia empréstimos escolares anunciando um princípio de selectividade que só beneficiaria quem deles necessitasse. Mas será o mesmo PP que agora propõe a criação do cheque de ensino a todos os alunos desde que tenham as habilitações exigidas para o ingresso no ensino superior e não sejam, maiores de 25 anos, independentemente da sua situação económica? É o mesmo PP?
Mesmo assim, ao invés do que é defendido pelo PP, o Estado tem de facto a responsabilidade de garantir a oferta necessária para a satisfação da procura. Tal função não cabe ao ensino superior privado e cooperativo que tem apenas uma função de alternativa ou complementaridade. Aliás, a Constituição da República Portuguesa é muito clara e impõe ao Estado a criação de «(...) uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população», e que «O Estado reconhece e fiscaliza o ensino privado e cooperativo». Verifica-se, pois, que cabe ao Estado assegurar uma cobertura nacional ao nível do ensino, embora reconheça e valorize expressamente o ensino privado e cooperativo, nomeadamente, ao fiscalizá-lo a assumir a responsabilidade dessa fiscalização.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - A liberdade de escolha entre o ensino superior público e privado passa, pois, em nosso entender, pelo alargamento da oferta do ensino público e não o inverso. É ao Estado que compete assegurar, na justa medida das suas disponibilidades, a cobertura da oferta de acordo com as necessidades de procura, cabendo ao ensino privado e cooperativo uma função complementar ou alternativa.
Contrariando os protestos do PP, o reforço de igualdade de oportunidades constitui um dos pontos fundamentais da política educativa do Governo do Partido Socialista. Nesse sentido, inscrevemos no programa eleitoral a necessidade de «ampliar o esforço nacional no ensino superior de forma a responder às necessidades do País (...)» e a «expansão da capacidade do ensino superior, bem como a diversificação das opções e a diminuição progressiva do numeros clausus». Nesse sentido pretendemos «melhorar o acolhimento da rede pública, por forma a garantir a efectiva liberdade de escolha, esbatendo distorções existentes na procura dos cursos, face à disponibilidade da oferta do ensino superior público e privado, e ainda reformular o sistema de acesso ao ensino superior no sentido de uma maior democraticidade e flexibilidade»,

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Entre as medidas com vista à concretização destes objectivos destacam-se, no programa do Governo, o reforço da «acção social escolar e os apoi-

Página 1901

21 DE MARÇO DE 1997 1901

os educativos, com a criação de um sistema flexível de atribuição de bolsas de estudo, gerido de forma descentralizada» e ainda «um sistema de empréstimos com juros bonificados reembolsáveis após a integração do estudante no mercado de trabalho», mas com uma filosofia subjacente distinta que é em favor da autonomização do estudante, enquanto pessoa, do seu meio familiar e não enquanto titular dum direito qualquer pelo facto de ser também um contribuinte ou estar integrado num agregado que contribui.
Do mesmo modo, isso é retomado no Pacto Educativo para o Futuro,

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... quando propomos - e isso foi objecto de consenso - «alargar á oferta do ensino superior público, assegurando, desse modo, a liberdade de escolha entre o ensino público e o ensino privado e cooperativo», estabelecendo como acção prioritária «aumento progressivo do número de vagas oferecidas pelo ensino público, designadamente nos cursos da componente técnico-científica e tecnológica».
A nossa aposta é no sentido do alargamento da oferta pública e na concessão de apoios no âmbito da acção escolar, para gerar uma maior liberdade de escolha entre estabelecimentos de ensino públicos e privados, assim como uma maior igualdade de oportunidades no acesso e na frequência. Ora, o cheque de ensino afigura-se uma medida cega a princípios de justiça social e contraditória com o discurso da selectividade que o próprio PP vinha fazendo no que ao apoio social diz respeito.
O PP parece distraído e, talvez, por isso, afirme uma coisa na «Nota justificativa» e proponha outra no articulado. Diz na primeira que «O Estado (...) tem a obrigação de garantir os meios financeiros, necessários e suficientes, para que nenhum jovem português fique excluído da frequência do ensino superior apenas por razões económicas ou financeiras». Mas logo no primeiro artigo se desdiz ao excluir deste direito todos os alunos maiores de 25 anos e ao não fazer depender a eventual concessão desse beneficio das condições económicas e sociais dos estudantes. Isso, a ser praticado, agravaria as desigualdades já existentes.
Mas, mais grave ou se calhar não, a verdade está no artigo 9.º, que remete para o Governo a regulamentação da competência para a emissão do cheque de ensino, e prevê o seu envio directo - directo, se calhar por correio azul - aos estabelecimentos em função dos registos dos alunos que os frequentam.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isso é imprevidência!

O Orador: - E aqui ilumina-se a enunciação fatal: o PP quer nacionalizar as despesas das privadas, quer financiar totalmente com dinheiros públicos aqueles estabelecimentos de ensino superior.

O Sr. José Calçada(PCP): - Ah!!

O Orador: - Quer aplicar de 30 a 60 milhões de contos do Orçamento do Estado no financiamento ao ensino particular...

O Sr. José Calçada (PCP): - Malandros...

Risos.

O Orador: - ... e é isso justamente o sinal absolutamente evidente da nossa enorme e total divergência. É aqui que reside o essencial da proposta e por isso a nossa frontal divergência. Esse não é o nosso caminho. Sem complexos a Constituição da República é para ser cumprida.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Silvio Rui Cervan e Castro Almeida. Como o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan não tem tempo a Mesa concede-lhe um minuto.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Braga, estou quase esclarecido em relação a algumas questões e devo dizer que não gostei de ouvir, porque não concordei, mas gostei da coragem política do Sr. Deputado ao afirmar que o entendimento do Partido Socialista em relação ao ensino superior privado é que se trata de um ensino complementar do público. Para nós é concorrencial. Registo, sublinho e desde já agradeço o seu esclarecimento porque era um esclarecimento que procurava já há algum tempo.
Em relação à acção social escolar, quero que me dê uma pista no sentido de saber se vai ou não existir, no projecto de financiamento a propor pelo Sr. Ministro, uma equiparação total entre os alunos que estudam no ensino superior privado e os alunos que estudam no ensino superior público e saber se é aí - e quanto a nós bem - que quer fazer justiça social. Se quer utilizar mecanismo para fazer justiça social diga-me, Sr. Deputado, se o Partido Socialista vai efectivamente apresentar uma proposta em que trata em pé de igualdade - e não «tendencialmente para», nem «vamos fazer um esforço para» - os alunos que estudam no ensino superior privado e os alunos que estudam no ensino superior público.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Deputado António Braga, ano e meio passado sobre a tomada de posse do Governo, V. Ex.ª continua a falar da acção social escolar, por referência do programa do governo do PS, e era esperado que começasse a falar dos orçamentos do Governo do PS.
Na verdade, no programa do governo, o PS propõe-se reforçar e alargar a acção social escolar, mas se o senhor tivesse falado dos orçamentos - e o PS já apresentou dois dos quatro que tem para apresentar - chegaria à conclusão de que o valor reservado para investimentos na acção social escolar do ensino superior em 1997 é 1 % inferior ao valor previsto em 1995.
Ora, perante isto a minha pergunta é muito simples: até quando é que o PS vai falar do programa do Governo e quando é que começa a falar dos orçamentos do PS?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem! Isto é «passar da teoria à prática»!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga, a quem concedo mais um minuto, ficando com três minutos.

Página 1902

1902 I SÉRIE - NÚMERO 54

O Sr. António Braga (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente, pela sua bondade.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não chega a ser bondade. É tão curto o acrescento...

O Orador: - ): que eu com este elogio esperava mais um minutinho, Sr. Presidente...

Risos.

O Sr. Presidente: - Essa é a madeira abusiva como o senhor vai utilizar a bondade; vai até aos quatro minutos, mas isso já é à sua conta.
Tem, então, a palavra, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Deputado Silvio Rui Cervan, em primeiro lugar, devo dizer-lhe que não há qualquer novidade no discurso que fiz - aliás, podia citar-lhe ilustres constitucionalistas, referindo-lhe a interpretação que fazem do papel estratégico do Estado na necessidade de cobrir o País com oferta de ensino em todos os estabelecimentos.
Nós não temos qualquer complexo em olhar para o ensino privado e dizer que ele é importante, que existe e que deve servir de alternativa; não de alternativa ao Estado mas, sim, de alternativa ao aluno, porque o Estado tem a obrigação constitucional de garantir a oferta universal do ensino em todo o País.
Assim sendo, a alternativa a que o ensino privado deve servir é ao aluno e à escolha: o aluno pode escolher o privado para frequentar e não era por causa disso que nós defenderíamos uma política do cheque de ensino, bem pelo contrário. Aliás, já este ano - como o senhor sabe - os alunos do particular e do privado receberam o mesmo tratamento que é dado aos alunos do público em termos do acesso aos benefícios da acção social escolar.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Mesmo tratamento? Altamente residual!

O Orador: - Bom, não receberam inteiramente, mas,...

Vozes do PSD: - Ah!...

O Orador: - ... do ponto de vista da consagração da candidatura aos benefícios da acção social escolar, isso já foi possível este ano.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Podem candidatar-se, mas não têm é dinheiro!

O Orador: - E não é verdade que não se fala em orçamentos, porque sabe que este ano o orçamento da acção social escolar subiu exponencialmente...

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Subiu?!

O Orador: - Sim, exponencialmente - aliás, verificámos isso nos relatórios da Comissão de Educação, Ciência e Cultura.
Mas, mais do que isso, o que é importante - e talvez seja isso que o Sr. Deputado Castro de Almeida tenha dificuldade em entender - é que a definição destas políticas, nomeadamente de uma política de financiamento ao ensino superior, não se resolve numa penada, ou seja, não se resolve num gabinete qualquer confortável mas, sim, em diálogo com os agentes que têm a responsabilidade de participar.
Como sabe está, praticamente, concluído um processo negocia) que envolveu todos os parceiros, desde o Conselho de Reitores aos politécnicos, aos estudantes, etc., resultando daí uma proposta que enquadra e consagra tudo aquilo que disse e que tive oportunidade de vos lembrar, como sendo não só uma afirmação do programa do governo mas também uma promessa eleitoral dos socialistas feita em tempo oportuno.
Por isso, não temos qualquer complexo quer em referir-nos ao orçamento quer em referirmo-nos à ideia do ensino público como tendo, necessariamente, de cumprir essa oferta universal.
Para terminar, gostaria de dizer ao PP, com muita lealdade e frontalidade, que nesta matéria temos grandes diferenças, desde logo porque não temos uma visão, como a que o Deputado Sílvio Rui Cervan aqui nos explicitou, de fazer uma espécie de distribuição avulsa de subsídios sem curar de conhecer selectivamente quem deve recebê-los. Esse é o ponto fundamental com o qual não podíamos estar mais em desacordo.
Nós, enquanto o País não tiver condições de oferecer o ensino a todos nas mesmas circunstâncias de gratuitidade, temos, necessariamente, de fazer, num princípio de selectividade, a escolha por referência àqueles que têm menos poder económico e financeiro para podê-los apoiar.
Não é essa a proposta do PP, como bem sabe, pois o seu partido propõe-se distribuir a esmo cheques a todos os que frequentem o ensino. E mais: propõe-se fazer uma discriminação - e penso que isso será erro de redacção - dos alunos com 25 anos, que atingindo esta idade deixariam de receber. Imagine um aluno que chega à Universidade com 20 ou 21 anos, poderia correr o risco de ter de sair da universidade se essa vossa iniciativa tivesse a aprovação da Câmara.
Mas o fundamental, como há pouco referi e que é importante apontar, é que isso assinala o facto de o PP pretender fazer um financiamento directo do Estado ao ensino particular e cooperativo, sem mais, transferindo directamente do Orçamento do Estado esse montante em vez de dá-lo ao aluno. O nosso modelo é outro: é dar ao aluno que pagará no momento oportuno!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O discurso político do CDS-PP procura inculcar a ideia de que a solução designada «cheque de ensino» é a consequência lógica do princípio constitucional da liberdade de aprender e de ensinar.
Por outras palavras, o CDS-PP faz crer que quem não está a favor do cheque de ensino está, necessariamente, contra a liberdade de aprender e de ensinar. Nada mais falso! O cheque de ensino não é o instrumento de medida da liberdade de ensino e, tal como é apresentado no projecto do CDS-PP, é uma deficiente solução para um problema que realmente existe.
É verdade que há em Portugal um problema mal resolvido que tem a ver com o financiamento pelo Estado do ensino ministrado em estabelecimentos de educação privados ou cooperativos.

Página 1903

21 DE MARÇO DE 1997 1903

Queremos reconhecer antes de mais o nosso apreço por estes estabelecimentos de iniciativa privada e cooperativa. E reiteramos o nosso desacordo perante algumas vozes que pretenderam desqualificar todo o ensino superior privado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - As posições do PSD sempre foram claras e descomplexadas nesta matéria: defendemos o subsistema do ensino particular e cooperativo como parte integrante do sistema educativo, valorizamos a sua acção como parte essencial e não meramente supletiva da oferta educativa.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E não consentiremos em qualquer preconceito sobre a qualidade global do ensino público ou do privado. Não há qualidade global; há, sim, boas e más escolas públicas, da mesma forma que se passa nas escolas privadas.

O Sr. José Calçada (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Iludir esta realidade é desistir de combater pela qualidade da educação em Portugal.
Não custa ao PSD reconhecer que o financiamento das escolas privadas (ou dos estudantes que nelas aprendem) é sempre susceptível de merecer aperfeiçoamento. Mas já entendemos mal a prioridade que o CDS-PP atribui à discussão do seu projecto de lei sobre o cheque de ensino quando o mesmo partido tem pendente nesta Assembleia uma outra iniciativa, de maior fôlego, sobre todo o financiamento do ensino superior.
Curiosamente, o projecto do CDS-PP sobre o financiamento tem um artigo - um só artigo entre 29 - relativo ao «cheque de ensino».
Não se compreende, por isso, que o CDS-PP destaque do seu projecto de lei sobre financiamento do ensino superior o assunto «cheque de ensino», negligenciando tudo o que diz respeito a deduções fiscais, mecenato educativo, acção social, bolsas, empréstimos, alimentação e alojamento, propinas, auxílios de emergência, etc.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Lá iremos!

O Orador: - Está manifestamente desfocada a análise do CDS-PP. Está a usar uma lupa quando o instrumento adequado seria um telescópio que lhe permitisse ver longe e ver largo.

Risos do PSD.

Definitivamente, não faz sentido discutir e aprovar qualquer «cheque de ensino» de forma desenquadrada de todo o financiamento do ensino superior, seja ele público ou privado.
Mas também não faz sentido, Sr. Presidente e Srs. Deputados, defender uma solução para o financiamento dos estabelecimentos privados do ensino superior, desgarradamente do que se passa no ensino básico e, particularmente, no ensino secundário.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Também sob este ângulo, o projecto em análise peca por particularizar onde se justificaria uma visão integrada de todo o sistema educativo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Do nosso ponto de vista, é outro o caminho a percorrer e chama-se acção social escolar.
No que respeita ao ensino superior privado e mesmo em parte do ensino politécnico público, a acção social escolar é quase embrionária. Esta é que é a via adequada!
A proposta do CDS-PP acerca do «cheque de ensino», sendo generosa nos seus propósitos, corre o sério risco de tornar-se injusta por apoiar os que não precisem.
A aposta na acção social escolar é a via adequada para assegurar o principio, para nós fundamental, de que ninguém fique privado de aceder ao ensino superior por causa de carências económicas, seja no ensino superior público ou seja no privado.
Ninguém pode mais ter a ilusão de que os estudantes ricos vão para o ensino público e os pobres para o ensino privado.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Isso é verdade!

O Orador: - Em aplicação do principio de que o Estado deve apoiar os que precisam, cada vez mais se justifica equiparar o regime da acção social escolar no ensino público e no privado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Porque pobres e ricos há-os nos dois sistemas de ensino.

Aplausos do PSD.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Mas há-os de há 15 anos, não de agora!...

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal, que dispõe de um minuto e meio que lhe foi concedido pelo Grupo Parlamentar de Os Verdes.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr. Deputado Castro de Almeida, gostaria de colocar-lhe duas questões muito concretas, visto que, no fundo, foi durante os governos do PSD que houve uma abertura indiscriminada, por todo o lado, de estabelecimentos do ensino superior privado.
Assim, gostaria de saber se concorda com o PP quando ele afirma que o ensino superior privado constitui, no presente momento, uma saudável alternativa pela concorrência na qualidade, não fazendo aqui qualquer distinção entre os estabelecimentos de ensino privado.
Portanto, perguntar-lhe-ia se considera que todo o ensino privado é de qualidade e deve ou não ser apoiado, visto que, como já disse, a responsabilidade neste domínio é do PSD, que não definiu regras claras em termos da qualidade dos estabelecimentos.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Por isso é preciso fiscalizar!

O Orador: - Por outro lado, pergunto-lhe se, à luz do principio constitucional da responsabilidade do Estado face ao ensino superior, e na possibilidade de o Orçamen-

Página 1904

1904 I SÉRIE - NÚMERO 54

to do Estado dispor de uma verba de cerca de 30 a 60 milhões de contos, considera que esse dinheiro deve ser investido no ensino superior público ou no ensino superior privado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida, que dispõe de um minuto e meio.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Deputado, não houve uma abertura indiscriminada dos estabelecimentos do ensino superior privado...

O Sr. António Braga (PS): - Foi uma verdadeira invasão!

O Orador: - ... e eu gostava que os senhores fossem elencar as escolas que não deviam ter sido abertas e, então, tivessem a coragem de ir a essas escolas e dizer: «isto foi mal aberto, meus amigos. Vão para a rua que a escola vai ser fechada».
Isto deverá ser feito na sequência de um processo de avaliação cuja lei de enquadramento foi aprovada no tempo do anterior governo...

O Sr. António Braga (PS): - Mas nunca foi executada!

O Orador: - ... e era muito útil a qualidade do ensino que este Governo desse aplicação à lei de avaliação, aprovada em 1995.
Por outro lado, Sr. Deputado, no que respeita à aplicação dos recursos que o CDS-PP queria aplicar no «cheque de ensino», V. Ex.ª perguntou se as verbas deveriam ir para o sector público ou para o sector privado. Bom, eu digo-lhe que devem ir para os estudantes, estejam eles no sector público ou no privado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Uma coisa é o investimento que o Estado tem de fazer na instalação do ensino superior público, na contratação de docentes, nas garantias de qualidade do que lá se faz; questão diferente é a comparticipação das despesas que os estudantes e as suas famílias têm de ter no acesso à educação e essa tanto se faz no sector público como no privado, pois a acção social escolar deve, tendencialmente, abranger da mesma forma os alunos, quer sejam do público quer sejam do privado, com uma única condição: que sejam carenciados, coisa que o CDS-PP não acautela no projecto de lei que hoje nos apresentou.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, que dispõe de dois minutos, sendo um concedido pelo Grupo Parlamentar de Os Verdes e outro pela Mesa.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Muito obrigado Sr. Presidente e muito obrigado ao Grupo Parlamentar de Os Verdes por me ter concedido um minuto.
O Sr. Deputado Castro de Almeida disse que isto era uma solução para uma questão mal resolvida. Deixou-a o senhor mal resolvida, não se esqueça disso!... Mas o PS também ainda não a resolveu,...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Está na calha!

A Oradora: - ... daí a oportunidade de, mesmo sem qualquer espécie de eficácia, este assunto vir aqui.
Na verdade, este assunto vem à Assembleia da República porque nós estamos a viver entre questões mal resolvidas e questões por resolver, nomeadamente na área da saúde, da educação, da segurança social...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - A cassette!

A Oradora: - Por isso, traremos aqui todas as iniciativas que, pelo menos, levantem na consciência dos Srs. Deputados a necessidade de resolver o que uns não resolveram e acabar o que outros não acabaram.

O Sr. António Braga (PS): - Mas as iniciativas têm de ter mérito!

A Oradora: - Quero ainda dizer-lhe que acho lamentável que confunda acção social escolar com «cheque de ensino» e, finalmente, lembro-lhe uma coisa que creio que é fundamental: ou consagramos a liberdade de escolha ou a sua qualidade parcial, total ou global nunca vai existir.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - E uma fiscalização eficaz nos dois sistemas.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida, que dispõe de um minuto e meio.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, desta vez um minuto e meio é manifestamente insuficiente para responder a tão importantes questões como as colocadas pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

O Sr. Presidente: - Quer dizer que desta vez exagerei.

O Orador: - Sr.ª Deputada, não estávamos habituados a que viesse da sua bancada a referência às responsabilidades do PSD na situação do País, pois esse discurso é recorrente no PS.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Mas não disse que estava por resolver?!

O Orador: - Quero salientar que fui eu próprio quem disse que era um problema mal resolvido.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Ah!

O Orador: - Mas, Sr.ª Deputada, o que se passa é que o País não espera que o actual Governo resolva qualquer dos problemas que estão resolvidos. Só é necessário resolver problemas mal resolvidos ou não resolvidos!

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Daí o nosso contributo!

O Orador: - Ora, este é um problema mal resolvido, que compete ao actual Governo resolver,...

Página 1905

21 DE MARÇO DE 1997 1905

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Também não resolve!

O Orador: - ... tal como prometeu e se responsabilizou. Por isso, o debate não tem de ser feito à custa do que ficou ou por que ficou mal resolvido mas, sim, à custa da incapacidade que este Governo está a demonstrar para resolver o que ficou por resolver.

Vozes do PS: - Oh!

O Orador: - Por outro lado, Sr.ª Deputada, deixe-me dizer-lhe uma coisa, agora muito a sério.

Vozes do PS: - Até agora não era?!

O Orador: - Até agora, tratou-se de uma questão de polémica parlamentar recorrente. Agora, vou falar de um assunto importante, que é a questão da liberdade de aprender e de ensinar.
Hoje, ninguém vai para a escola pública ou privada por questões de liberdade. Não é em obediência ou por causa da liberdade...

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Há liberdade de escolha?!

O Orador: - ... que se escolhe entre ensino público e privado. Por isso, não se coloque a questão da liberdade como sendo um móbil da diferença entre o ensino público e o privado. Hoje, no ensino superior, infelizmente, vai-se para o ensino privado, via de regra, por não se conseguir entrar no público.

O Sr. José Calçada (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Estou espantado, pois não estou habituado a ouvir aplausos comunistas.

Risos.

Por isso, Sr.ª Deputada, insisto em que a solução passa por apoiar, através da acção social escolar, os estudantes carenciados, quer estejam no ensino público quer estejam no privado. Esta é que é a via. O seu cheque de ensino destina-se apenas aos estudantes do ensino privado. Ora, nós queremos uma solução para o problema, Sr.ª Deputada. Rejeitamos qualquer aumento de encargos do Estado dirigido apenas a uma fatia de estudantes em que o qualificativo seja estarem no ensino público ou no privado. Queremos que o qualificativo seja a necessidade do estudante, independentemente de estar no ensino público ou no privado.

Aplausos do Deputado do PSD Carlos Coelho.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 70/VII - Cheque de ensino -, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Popular, obtém espaço para discussão num quadro da política educativa para o ensino superior caracterizada pela confusão e determinada por valores meramente economicistas, na consecução de uma política neoliberal questionadora dos deveres do Estado e dos direitos dos cidadãos, em particular das famílias, sistematicamente penalizadas, e dos jovens, sistematicamente ignorados nas suas legítimas aspirações.
Observe-se o enquadramento legal desta iniciativa.
O artigo 74.º da Constituição da República Portuguesa estabelece o princípio da universalidade do direito ao ensino como garantia do direito de igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar e enuncia ainda a incumbência do Estado de, na realização da política de ensino, garantir a todos os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados de ensino e estabelecer progressivamente a respectiva gratuitidade.
Também a Lei de Bases do Sistema Educativo determina que «o Estado deve criar as condições que garantam aos cidadãos a possibilidade de frequentarem o ensino superior de forma a impedir os efeitos discriminatórios decorrentes das desigualdades económicas regionais ou desvantagens sociais prévias».
Finalmente, no, texto titulado Pacto Educativo para o Futuro, o actual Ministro da Educação considera que a promoção e o desenvolvimento equilibrado do ensino superior pressupõem, como primeira medida, «alargar a oferta de ensino superior público, assegurando, desse modo, a liberdade de escolha entre ensino público e ensino particular e cooperativo»...

O Sr. José Calçada (PCP): - Muito bem!

A Oradora: e refere como acção prioritária o «aumento progressivo do número de vagas oferecidas pelo ensino superior público, designadamente nos cursos de componente científico-tecnológica, assegurando, desse modo, a liberdade de escolha entre ensino público e ensino particular e cooperativo».
Perante este enquadramento legal, apesar do seu incumprimento, a velha iniciativa legislativa do CDS, retomada pelo PP, é claramente adunca, para além de se auto-destruir na conflitualidade intrínseca do seu próprio texto.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem dito!

A Oradora: - Se não, repare-se: sugere-se «que o Estado reconheça a sua incapacidade de resposta (...) e restitua às famílias, sob a forma de cheque de ensino, a contribuição recebida para um serviço que não fornece». Afirma-se ainda que esta desresponsabilização será uma medida de promoção para «a diversificação da oferta produzida pelo ensino superior privado em Portugal».
Ignorando o texto constitucional e a Lei de Bases do Sistema Educativo, afirma-se que «não é construindo mais estabelecimentos públicos que vencemos o défice da quantidade e da qualidade (...). Ao invés, (...) o ensino superior privado (...) poderá potenciar a dignificação do ensino em Portugal».
Mas, entretanto, fugindo o texto para a verdade, considera-se que «o sector privado, (...) orientado também por critérios de rentabilidade, não pode ambicionar à diversificação de áreas de que o país precisa (...)».
Depois deste conjunto de afirmações e contradições, poderíamos equacionar como válido o terminus da discussão do projecto de lei e retomarmos a discussão, agora, com a seriedade que a matéria exige.
De facto, o sistema de ensino superior, nos últimos anos, tem sido enquadrado por um conjunto de acções e

Página 1906

1906 I SÉRIE - NÚMERO 54

omissões que configura uma política cada vez mais explicitada de ataque ao ensino superior público e de favorecimento de interesses privados.
Nesta estratégia, tem-se efectivado progressivamente a desresponsabilização do Estado em relação ao financiamento do ensino superior público e o agravamento da já elevada participação dos alunos e das suas famílias nos custos da educação.
Nesta leitura neoliberal surgem diariamente tentativas de incumprimento dos diplomas legais que regem a política educativa.
Confundindo deveres do Estado e fontes de financiamento, propõem-se propicias e, simultaneamente, valores absurdos e incomportáveis para a grande maioria das famílias portuguesas, a quem já é pedida a cobertura total dos elevados custos de manutenção dos filhos que frequentam o ensino superior, especialmente os que o fazem deslocados da sua residência oficial. Ou então, ignorando o fim social da educação e a indispensável democratização do acesso na construção das condições de sucesso dos jovens estudantes, surge o inusitado sistema de empréstimos para pagar a gratuitidade que a Constituição prevê mas o Governo recusa.
Como serviço público essencial e de importância estratégica para o desenvolvimento, é na esfera do Orçamento do Estado e da política fiscal que suporta as suas receitas que se coloca a questão do financiamento do ensino superior.

O Sr. José Calçada (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Pelas mesmas razões, cabe ao Estado, através do Ministério da Educação, financiar adequadamente a acção social escolar para assim assegurar a igualdade de oportunidades.
Todavia, a acção social escolar não pode limitar-se a uma mera compensação económica, avaliada em função da insuficiência de rendimentos económicos de cada estudante ou respectiva família, devendo também ter-se em conta de forma equilibrada problemas que decorrem do retardamento da integração do jovem na vida profissional e até da muito mais rápida maturação das mais jovens gerações e das suas justas aspirações e necessidades.
A acção social escolar não pode ser confundida com caridade pública, e por isso tem de contar com verbas adequadas inscritas no Orçamento do Estado, no quadro das políticas de financiamento e de desenvolvimento do ensino superior.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Há ainda a considerar que o carácter restritivo do acesso ao ensino superior público tem conduzido à proliferação de estabelecimentos privados, que têm funcionado como última alternativa para os milhares de estudantes que em cada ano não obtêm colocação nos estabelecimentos públicos. Por isso mesmo, a acção social escolar deve contemplar também todos estes jovens que o sistema público excluiu por incapacidade de recebê-los.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Do que efectivamente se deve tratar, em matéria de ensino superior, é, em primeiro lugar, do urgente reconhecimento do seu papel estratégico, seja pelas funções complexas que desempenha no interior do sistema, seja pela resposta às necessidades quantitativas e qualitativas dos quadros necessários a um desenvolvimento económico, social e cultural integrado.
Do que efectivamente se deve tratar é de considerar o ensino superior público como um investimento social fundamental e não um espaço de mercantilização de saberes e interesses particulares.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Do que efectivamente se deve tratar é de exigir que o Estado assuma a plena responsabilidade pelo adequado financiamento do sistema de ensino superior público, concretizando a progressiva gratuitidade que a Constituição consagra, abrangendo a generalidade dos domínios do conhecimento, satisfazendo as necessidades sociais e as aspirações pessoais e cobrindo equilibradamente o território nacional.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, está encerrada a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 70/VII - Cheque de Ensino (CDS-PP).
A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, pelas 10 horas, com uma sessão de perguntas ao Governo.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 40 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados: -

Partido Socialista (PS):

António Bento da Silva Galamba.
Fernando Garcia dos Santos.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
Mário Manuel Videira Lopes.
Paulo Jorge dos Santos Neves.

Partido Social Democrata (PSD):

Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Santos Pereira.
João Álvaro Poças Santos.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Mendes Bota.
Luís Carlos David Nobre.
Manuel Castro de Almeida.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido Comunista Português (PCP):

António João Rodeia Machado.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.

Página 1907

21 DE MARÇO DE 1997 1907

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Joaquim Moreira Raposo.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Nelson Madeira Baltazar.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.

Partido Social Democrata (PSD):

Carlos Alberto Pinto.
João Carlos Barreiras Duarte.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Nuno Kruz Abecasis.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

Página 1908

1908 I SÉRIE - NÚMERO 54

DIÁRIO da Assembleia da República

1 - Preço de página para venda avulso, 9$50 (IVA incluído).

2-Para os novos assinantes do Diário da Assembleia da República, o período da assinatura será compreendido de Janeiro a Dezembro de cada ano. Os números publicados em Outubro, Novembro e Dezembro do ano anterior que completam a legislatura serão adquiridos ao preço de capa.

3-O texto final impresso deste Diário é da responsabilidade da Assembleia da República.

Depósito legal n 8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA. E. P PREÇO DESTE NÚMERO 418$00 (IVA INCLUÍDO 5%)

Toda a correspondência, quer oficial, quer relativa a anúncios e a assinaturas do «Diário da República» e do «Diário da Assembleia da República» deve ser dirigida à administração da Imprensa Nacional-Casa da Moeda, E.P. Rua de D. Francisco Manuel de Melo, 5-1099 Lisboa Codex

Páginas Relacionadas

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×