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Sábado, 14 de Junho de 1997 I Série - Número 81

DIÁRIO Da Assembleia da República

VII LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 6 DE MARÇO DE 1997

Presidente: Ex.mo Sr. Manuel Alegre de Melo Duarte

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Maria Luísa Lourenço Ferreira
João Cerveira Corregedor da Fonseca
José Ernesto Figueira dos Reis

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Deu-se conta da apresentação das propostas de lei n.os 119 e 120/VII e do projecto de resolução n.º 58/VII.
Após o Sr. Deputado Octávio Teixeira (PCP) ter interpelado a Mesa, o projecto de resolução n.º 58/VII, sobre a revisão do Tratado de Maastricht, foi incluído na ordem de trabalhos, tendo usado da palavra os Srs. Deputados António Braga (PS) e Carlos Coelho (PSD).
Procedeu-se à discussão conjunta dos projectos de resolução n.º 52/VII - Sobre a revisão do Tratado da União Europeia (CDS-PP), 54/VII - Aprofundamento da integração europeia de Portugal (PSD), 57/VII - Sobre o aprofundamento da União Europeia e n Conferência Intergovernamental (CIG) para a revisão do Tratado da União Europeia (PS) e 58/VII - Sobre a revisão do Tratado de Maastricht (PCP). Após a apresentação do relatório da Comissão de Assuntos Europeus feita pelo Sr. Deputado Medeiros Ferreira (PS), usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Primeiro-Ministro (António Guterres) e do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Jaime Gama), os Srs. Deputados Manuel Monteiro (CDS-PP), Carlos Encarnação (PSD), Carlos Zorrinho (PS), João Amaral (PCP), Rui Carreteiro, Acácio Barreiras e Joel Hasse Ferreira (PS), Luís Sá (PCP), Luís Queiró e Marra José Nogueira Pinto (CDS-PP), Francisco Torres (PSD), Ferreira Ramos (CDS-PP), Mota Amaral (PSD), Jorge Ferreira (CDS-PP), Maria Carrilho (PS) e Isabel Castro (Os Verdes). No final do debate, a Câmara aprovou os projectos de resolução n.os 54 e 57/VII e rejeitou os n.os 52 e 58/VII.
Foram ainda aprovados dois pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos. Liberdades e Garantias, concedendo autorização a um Deputado do PS para depor em tribunal e denegando-a a um outro do mesmo partido.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 35 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis Valente.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Domingos de Ascensão Cabeças.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Raimundo Pedro Narciso.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Roleira Marinho.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.

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Carlos Alberto Pinto.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto.
Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis. Pedro José Dei Negro Feist.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: propostas de lei n.os 119/VII Autoriza o Governo a alterar o Código do IRC no sentido de equiparar o Instituto de Gestão de Crédito Público a instituição de crédito residente, para efeitos de tratamento concedido aos instrumentos financeiros derivados no âmbito do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas e alterar o Estatuto dos Benefícios Fiscais, que baixou à 5.ª Comissão, e 120/VII - Autorização para contracção de empréstimos externos (ALRA), que baixou à 5.ª Comissão, e projecto de resolução n.º 58/VII - Sobre a revisão do Tratado de Maastricht (PCP), que baixou à 9.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Vamos dar início à discussão conjunta dos projectos de resolução n.os 52, 54 e 57/VII...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, ontem, na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, pusemos uma questão relacionada com o projecto de resolução que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou, que foi, aliás, agora anunciado pelo Sr. Secretário da Mesa, e que, como sabe, apenas o PS não deu consenso ao seu eventual agendamento. E evidente que está no seu legítimo direito, como qualquer outro grupo parlamentar, na medida em que não há a mínima dúvida

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de que apenas ontem foi apresentado o projecto de resolução. Todavia, a questão que colocámos ontem, e que voltamos a colocar hoje, não é no sentido de alterar os tempos que estão estabelecidos para os vários grupos parlamentares, em termos de intervenções, mas, como foi apenas o PS que, ontem, não deu consenso a que pudesse ser discutido e votado hoje esse projecto de resolução, de saber, por intermédio do Sr. Presidente, se o PS mantém ou altera a sua posição.

O Sr. Presidente: - Uma vez ouvida a interpelação do Sr. Deputado Octávio Teixeira, agradeço que o PS preste à Mesa o necessário esclarecimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, ontem, na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, não conhecíamos o projecto de resolução do PCP e por isso era nossa posição de princípio que, sem a conhecer, não daríamos obviamente consenso a que fosse agendado para hoje. Porém, agora, no conhecimento desse projecto, vamos dar consenso no sentido de que seja discutido nos mesmos termos dos outros projectos de resolução.

O Sr. Presidente: - Neste caso, suponho que se mantém o consenso que foi ontem manifestado pelos restantes grupos parlamentares.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, quero, em nome do PSD, dizer apenas que, embora discordando da substância do projecto de lei do PCP, não vemos razão para inviabilizar a sua discussão e votação na sessão de hoje. Pela nossa parte, há consenso para que o projecto de lei do PCP seja discutido juntamente com os outros.

O Sr. Presidente: - Havendo consenso, está, pois, preenchida a condição para poder ser incluído na ordem de trabalhos o projecto de resolução n.º 58/VII, do PCP, que foi anunciado há pouco.
Vamos, então, iniciar a discussão conjunta dos projectos de resolução n.os 52/VII - Sobre á revisão do Tratado da União Europeia (CDS-PP), 54/VII - Aprofundamento da integração europeia de Portugal (PSD), 57/VII - Sobre o aprofundamento da União Europeia e a Conferência Intergovernamental (CIG) para a revisão do Tratado da União Europeia (PS) e 58/VII - Sobre a revisão do Tratado de Maastricht (PCP).

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, antes da intervenção do primeiro orador, gostaria de usar da palavra, na qualidade de Presidente da Comissão de Assuntos Europeus, para resumir o relatório desta Comissão.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, tendo baixado à Comissão de Assuntos Europeus, no último fim-de-semana c no princípio desta, os projectos de resolução n.os 52, 54 e 57/VII, que vão ser hoje discutidos, a Comissão, ontem reunida, deliberou não poder pronunciar-se em profundidade sobre os mesmos, mas, mesmo assim, entendeu fazer chegar ao Plenário e à Mesa o relatório de que vou dar conta.
A Comissão de Assuntos Europeus tomou conhecimento da apresentação dos referidos projectos sobre a revisão do Tratado da União Europeia, mas, dado que eles deram entrada nesta Comissão a b (os n.os 52 e 54/VII) e 11 de Junho (o n.º 57/VII) de 1997 e que o seu debate em Plenário está agendado para o dia 12, a Comissão, na sua reunião de 11 de Junho, deliberou elaborar um relatório sucinto em virtude de estes prazos não serem consentâneos com uma análise aprofundada. que seria a mais desejável por parte desta Comissão.
A Comissão teve ainda conhecimento de que o Grupo Parlamentar do PCP teria elaborado um projecto de resolução cujo agendamento, por não existência de consenso, não terá sido aceite pela Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares para o debate do dia 12, lamentando o facto, já que desta forma se iria enriquecer esse mesmo debate. Neste momento, este ponto já está, obviamente, ultrapassado.
A Comissão protesta e lamenta ainda que sejam agendados para Plenário diplomas sobre questões europeias, alguns dos quais relativos a ratificações de Acordos, Convenções e Tratados, sem que os relatórios desta Comissão estejam formalmente aprovados.
No decurso do debate dessa reunião da Comissão, foi sublinhado que, cm termos de conteúdo, se verificava uma consonância de objectivos finais entre os projectos de resolução apresentados pelos Grupos Parlamentares do PS e do PSD e uma clara dissonância entre estes e o apresentado pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP. Foi ainda manifestado que os temas, objecto dos projectos, têm sido profundamente debatidos na Comissão de Assuntos Europeus, nomeadamente através do acompanhamento da Conferência Intergovernamental, no âmbito de reuniões com os Ministros dos Negócios Estrangeiros, da Justiça, da Administração Interna, da Defesa e, sobretudo, nas reuniões mensais e até semanais com o Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, representante pessoal de Portugal na Conferência Intergovernamental.
Tendo em conta tudo isto, a Comissão dá o seguinte parecer: nestes termos, a Comissão de Assuntos Europeus é de parecer que os três projectos de resolução podem subir a Plenário nos termos da Constituição, do Regimento e da Lei n.º 20/94, que regula o acompanhamento das questões europeias.

O Sr. Presidente: - Fica registado esse protesto, que tem a sua justificação. Como sabe, o agendamento por arrastamento tem inegáveis virtudes, mas tem também essas consequências negativas. Não podemos ter as virtudes sem suportar os defeitos. Em todo o caso, é necessário assegurar um certo distanciamento entre o projecto agendado por arrastamento c os outros já anteriormente agendados.
Para fazer a apresentação do projecto de resolução n.º 52/VII, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Uma vez mais, por iniciativa do Partido Popular, a Assembleia da República debate a construção europeia para analisar a próxima Conferência Intergovernamental, que tem por objectivo a revisão do Tratado de Maastricht.
Nessa revisão, as questões institucional e política não podem ser esquecidas, tal como querem os representantes desse novo bloco central europeu, de que são expoentes

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em Portugal o PS e, infelizmente, o PSD. Não debater a questão institucional é relegar o plano político da Europa para um patamar puramente secundário e é ainda afirmar o primado do monetarismo e dos índices macro-económicos sobre os valores e os ideais, sempre políticos, de qualquer causa. Há que denunciar que os adeptos do federalismo, na maior parte dos casos tímidos e sem coragem para defender as suas convicções, transformaram a moeda única em novo ópio das consciências populares e, ao erigi-la a desígnio, e ainda por cima nacional, estão não só a prestar um mau serviço ao País como à própria ideia europeia.
Estamos à vontade para o afirmar, porque defendemos a União Europeia, mas uma União que não confunde o livre pensamento com um pensamento único, próprio dos que consideram dogmas, valores que para se afirmarem devem poder sempre ser questionados. Não somos adeptos do pensamento único, qual nova espécie de comunismo branco que, sem apelar à revolta nem à luta de classes, pretende através da marcha monetária e económica condicionar a liberdade e modificar as instituições políticas dos Estados/Nação, que livremente aderiram à Comunidade Económica Europeia.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Os federalistas sabem que a opinião pública europeia não foi entusiasta de Maastricht, pelo que não querem discutir uma revisão política sem a garantia da tranquilidade financeira e económica, quer dos Estados quer, principalmente, dos eleitores. Mas o que é confrangedor é que o Governo português tenha alinhado nesta lógica, sabendo, salvo se já mudou de opinião, que no próximo ano se realizará, no nosso país, um amplo debate, seguido de um referendo sobre a questão europeia. Nada melhor, pois, para se ser ousado e propor, antes dos demais, um conjunto de propostas inovadoras e de futuro que permitam consagrar o nosso país como um dos pioneiros na construção dessa nova União Europeia.
Se a questão institucional não for desde já debatida ou, pelo menos, iniciada a sua discussão, ter-se-á perdido uma grande oportunidade de mobilizar a opinião pública para os problemas mais relevantes e mais essenciais da Europa. É nesse exacto sentido que surge a proposta de resolução que o Grupo Parlamentar do Partido Popular aqui hoje apresenta e submete a votação. Ela é também um testemunho de quem, acreditando na União Europeia, continua a acreditar numa forte componente intergovernamental, consciente de que se nova é a realidade novos são os desafios e que nada mudar significa, a prazo, a cumplicidade com um sistema que serve os interesses de um futuro governo europeu. E nós não queremos um governo europeu nem aceitamos que os governos nacionais se transformem, a prazo, numa espécie de governos regionais autónomos.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Decorre também este debate num momento em que alguns actos eleitorais se verificaram na Europa e com eles novas posturas quanto ao dito desígnio da moeda única se verificam. Referimos o Sr. Jospin, novo Primeiro-Ministro francês, que para ganhar as eleições foi mais sensível à real situação do emprego do que ao ditames do seu camarada Jacques Delors e às orientações do Partido Socialista europeu.

Risos do PS.

Infelizmente, nem assim o nosso Primeiro-Ministro e o nosso Governo param para reflectir aproveitando a boleia para ganhar mais tempo, o tempo que importa para que nos preocupemos com a convergência real e não sejamos cegos e mudos apenas perante a convergência nominal.
Curiosamente, ou talvez não, são os outros Estados que alertam e chamam a atenção para a necessidade de melhor reflectir. Apesar disso, o nosso Governo persiste teimosamente em tudo cumprir com a agravante de considerar a adesão à moeda única, já em 1999, como um desígnio nacional. Estranha vontade política que transforma em nosso desígnio aquilo que está dependente da vontade dos outros e cada vez mais dos outros; estranha vontade política que confunde meios com fins, objectivos com instrumentos, vontades colectivas ao nível europeu com afirmações próprias do interesse nacional.
Seria interessante, Sr. Presidente, que nesta Câmara se promovesse, e com alguma urgência, um debate sobre os desígnios nacionais do País, começando desde logo por esclarecer o que se entende por tal expressão e definindo depois quais são, afinal, os nossos objectivos enquanto povo e enquanto nação, quer no quadro europeu quer no quadro mundial. É que Portugal de há muito que perdeu um rumo, navega sem estratégia, é conduzido sem qualquer desígnio apenas em função dos ventos que por outros são soprados.
Tempos houve em que este País teve, de facto, desígnios nacionais, próprios, partilhados ou isolados, mas definidos, em primeira instância, em função dos seus interesses e das suas ambições.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - D. João I foi, sem dúvida...

Risos do PS.

Tenham calma, não se enervem! Eu sei que a verdade dói!
D. João I foi, sem dúvida, um marco desses desígnios e no período ditatorial, muitos, muitos anos depois, Salazar, símbolo dessa ditadura, tinha também um desígnio que considerava como único no quadro político em que se movia e permitia os outros moverem-se. O primeiro triunfou, o segundo falhou. Num caso e noutro, respeitando a História, sentimo-nos com isso felizes, porque, adeptos que somos da democracia e do sistema parlamentar, vemos na História e no percurso dos outros países democráticos desígnios próprios, partilhados - é certo -, comuns em muitos casos - é verdade -, mas nem por isso menos nacionais.

Aplausos do CDS-PP.

De então para cá que desígnios tivemos? Descolonizámos, aderimos à CEE e queremos agora entrar no chamado pelotão da frente da moeda única. Para nós, todos estes três passos são, sem dúvida, de alcance e importância política incomensurável, mas não só por nós considerados como desígnios nacionais.
A democracia merece e exige de nós muito mais e exige-nos a todos que saibamos, e com urgência, definir um verdadeiro desígnio nacional no seu sentido mais amplo, porque, ao fim de mais de 20 anos do 25 de Abril de 1974, não podemos aceitar continuar a viver num papel de tripulantes e não de condutores. A nossa dimensão

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atlântica não pode ser anulada pela nossa opção europeia, pelo que devemos considerar como objectivo estratégico e não apenas dialéctico a defesa da língua como grande desígnio nacional, talvez o primeiro digno desse nome após o derrube da ditadura, com a consciência de que a defesa e promoção da nossa língua além fronteiras nos abrirá portas para o desenvolvimento económico e para o progresso e o bem-estar das nossas populações. Tudo o resto são meios, são instrumentos e não entendê-lo é não aceitar, aí sim, as novas regras do presente e não atender, nem entender, as novas condicionantes do futuro.
Esta é, Sr. Presidente, Srs. Deputados, a grande diferença, a diferença entre os que se resignam a ser gestores ou administradores delegados em empresas de capital nominalmente anónimo mas com accionistas maioritários conhecidos e os que, querendo pertencer a uma empresa comum, sabem que lá estão porque também possuem capital próprio. É nessa perspectiva que nos encontramos e por ela caminharemos, com a consciência de quem, sendo livre e europeu, não esquece nunca a nação a que pertence.
Esperamos que essa seja sempre a postura de todos os nossos governantes, independentemente do partido a que pertençam, e que saibam que o seu poder, legítimo porque democrático, é sempre transitório e que essa transitoriedade não pode ser confundida com a perenidade das nações.

Aplausos do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente: - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, na oportunidade devida, o Sr. Deputado Rui Carreteiro.
Dou agora a palavra ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, para introduzir o debate, em representação do Governo.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Jaime Gama): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: Estamos numa encruzilhada decisiva da construção europeia - está Portugal e está a própria União Europeia - e é absolutamente necessário que o próximo Conselho Europeu de Amsterdão traga resultados positivos que clarifiquem de uma vez por todas a evolução do processo europeu, conferindo confiança aos cidadãos, às empresas e às instituições.
Queremos que do Conselho Europeu de Amsterdão saiam indicações claras de que a União Económica e Monetária é irreversível, de que a moeda única não sofrerá a menor alteração quanto ao calendário da sua institucionalização, de que o emprego e os problemas sociais tenham na União Europeia um tratamento que até aqui não tiveram e, naturalmente, de que a revisão do Tratado de Maastricht, nas suas grandes linhas, possa ser completada.
O Conselho Europeu de Amsterdão tem que dar sinais claros de que a moeda única não sofrerá alterações quanto ao calendário, nem quanto aos critérios para a alcançar, de que a União Europeia terá uma maior contemplação nas suas políticas em relação aos problemas sociais e do emprego e de que a revisão do Tratado de Maastricht será completada na data prevista.
Devo sublinhar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a revisão do Tratado de Maastricht está a ser feita de uma forma absolutamente diferente daquela que levou à sua realização, pois está a ser feita com participação dos parlamentos nacionais, dos agentes sociais, das opiniões públicas e por isso mesmo está a contribuir decisivamente, não só para a sua própria legitimidade mas também para a legitimidade que o Tratado de Maastricht não tinha conseguido alcançar durante o processo da sua elaboração precisamente em função da falta de transparência pública com que foi elaborado.
Consideramos que esta Conferência Intergovernamental, com a plena participação dos parlamentos nacionais, designadamente de VV. Ex.as em diálogo permanente com o Governo, através da Comissão dos Assuntos Europeus, está a contribuir para um aperfeiçoamento correcto e para uma relegitimação das instituições europeias, à luz das opiniões públicas. Os nossos objectivos, os objectivos nacionais portugueses, prefigurados pelo Governo, em diálogo permanente com VV. Ex.ª nesta Assembleia da República, objectivos moderados, objectivos realistas mas firmes, estão em vias de ser plenamente alcançados.
Pela primeira vez, estamos em condições de convalidar, na letra do Tratado, objectivos fundamentais em matéria social, em matéria de coordenação das políticas económicas, visando o investimento, e em matéria de emprego. Nunca isso tinha existido nos tratados constitutivos da União Europeia.
Pela primeira vez, estamos cm vias de dar passo decisivos no sentido de criar um verdadeiro espaço de liberdade, de segurança e de justiça na União Europeia e de, dessa forma. contribuir para aproximar a União Europeia das preocupações dos cidadãos, inscrevendo nos objectivos da União Europeia a luta contra a criminalidade organizada, contra o tráfico de droga, contra a insegurança dos cidadãos. Nunca isso tinha acontecido nos objectivos dos tratados que instituíam a União Europeia.
Estamos também em vias de criar os mecanismos adequados para que a União Europeia possa ter maior visibilidade na cena internacional, através do reforço da sua política externa. Isso é absolutamente indispensável para o reequilíbrio da situação internacional, isso é absolutamente indispensável para relançar em moldes adequados a cooperação com os países menos desenvolvidos e para reforçar o diálogo da Europa com a América latina, com África e com a Ásia. Nunca com tanta evidência esses passos tinham sido dados nos anteriores tratados constitutivos clã União Europeia.
Estamos também em vésperas de assegurar uma reforma racional das instituições europeias susceptível de conciliar uma maior eficiência no seu funcionamento com uma maior representatividade, uma maior democraticidade, uma maior transparência na coordenação e na actuação de todos os seus órgãos, assegurando presidências rotativas, uma composição equilibrada com representação nacional condigna na Comissão e a defesa da língua portuguesa enquanto língua e veículo da própria União Europeia. valorizando, assim, o próprio projecto europeu no relacionamento com outras áreas do mundo, designadamente a África, a América Latina e a Ásia.
A nosso ver, nesta revisão do Tratado de Maastricht, estão salvaguardadas condições essenciais para garantir um desenvolvimento coerente e equilibrado do processo europeu, assegurando não só o peso relativo dos países no processo decisório, designadamente na perspectiva do alargamento, mas também as condições indispensáveis para que todos os debates que vão ter lugar na agenda europeia após a Conferência Intergovernamental possam contemplar os interesses portugueses, nomeadamente em matéria de revisão das políticas de coesão, das políticas estruturais e da política agrícola comum. Estão asseguradas as condições

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para que o nosso país continue, de dia para dia, a ter cada vez mais influência nas instituições europeias.
Nesse sentido, procuramos conduzir as negociações, fazendo com que Portugal seja porta-voz de interesses não periféricos, limitados ou provincianos no debate europeu mas, sim, estruturantes do projecto europeu, porque é dessa forma que fazemos com que Portugal tenha credibilidade para negociar as agendas necessárias para o prosseguimento do desenvolvimento português.
Nessas negociações, o peso de Portugal - foi manifestamente consolidado pela circunstância feliz, positiva, desejável, de ser neste momento um dos países da União Europeia que satisfaz as condições para integrar o primeiro pelotão da moeda única. Essa circunstância deu-nos uma grande margem de liberdade nessas negociações, porque não tivemos a preocupação de agradar para obter o benefício da dúvida em relação à satisfação dos critérios de Maastricht. Antes pelo contrário, assumimos a liberdade de quem tinha essa condição preenchida, para contribuir com projectos próprios e autónomos para a redefinição das instituições europeias.
É esta a forma como entendemos o desafio permanente de modernização implícito na integração de Portugal na União Europeia. E o exemplo maior dessa atitude é aquela que tomamos em relação às cooperações reforçadas: não como o país que as olha com hesitação ou com a ideia implícita, secreta, de que jamais as poderá alcançar e integrar mas como o país que tem a certeza de, em todos os projectos de cooperação reforçada, ter estado na linha da frente, designadamente em matéria de política externa e de segurança comum, de União Europeia Ocidental, de União Económica e Monetária e de caminhada para a moeda única.

Aplausos do PS.

Ou seja, a nossa perspectiva sobre a hipótese das cooperações reforçadas é positiva e não isolacionista ou negativa.
Consideramos que, nesta renegociação do Tratado, matérias muito relevantes para os interesses e os valores portugueses foram, e estão a ser, acauteladas, em relação às regiões ultraperiféricas, às regiões insulares, ao lugar do Comité das Regiões na arquitectura europeia, à problemática da discriminação e igualdade das mulheres na sociedade e nas instituições políticas da Europa, aos direitos humanos e às sanções a aplicar aos Estados que violem - na política credível de direitos humanos, ao ambiente, à saúde pública. à defesa dos consumidores c até à protecção dos animais.
O nosso objectivo é manter Portugal no centro das decisões que constituem hoje a União Europeia: decisões sobre a União Económica e Monetária e sobre a união política. Para isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é necessário que, da próxima Cimeira de Amsterdão, saia um elevado grau de acordo sobre a União Económica e Monetária, o pacto social, a estabilidade, o calendário da moeda única e também uma reforma das instituições europeias que, mantendo o peso relativo de cada Estado-membro, assegure efectivamente uma contemplação nos objectivos da construção, na União Europeia, daquilo que são valores muito caros aos portugueses e a esta Assembleia.

Aplausos do PS.

É por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, sem directivas negociais restritivas, as quais não teriam cabimento constitucional, ainda para mais fundamentadas cm reservas mentais ditadas por pequenos pontos da agenda política interna, este Parlamento, neste momento, deve dar um sinal muito claro ao País de que está com o sentido genérico da participação reforçada de Portugal nas instituições europeias quando estas procuram consolidar um consenso absolutamente decisivo para fazer a Europa e os seus Estados-membros entrarem no século XXI.
Queremos que esse compromisso português seja suficientemente forte para que saia reforçado o poder negociai do Governo português na Conferência Intergovernamental. Fá-lo-emos com a convicção de que temos demonstrado, com a força legitimadora deste Parlamento e também com a certeza de ver hoje triunfar na Europa os valores de equilíbrio, liberdade e justiça social que têm pautado a actuação do Governo português. São esses valores que, agora, temos condições, com o vosso apoio, de transferir para a Europa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, tenho o prazer de anunciar que assistem à sessão plenária 80 membros da Associação Cultural, Desportiva e de Solidariedade da Freguesia de Vinha da Rainha, Soure, um grupo de 46 alunos da Escola de Serviços e Comércio do Oeste, Torres Vedras, e um grupo de 21 alunos do Colégio de Santa Clara da Casa Pia de Lisboa.
Como é nosso hábito, saudêmo-los.

Aplausos gerais, de pé.

Para fazer a apresentação do projecto de resolução n.º 54/VII, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A discussão da questão europeia tem envolvido dois temas principais: a Conferência Intergovernamental e o caminho para a moeda única.
No primeiro caso, as preocupações sobressaíam quanto à preparação para o alargamento, quanto a aperfeiçoamentos de participação institucional ou quanto à densificação das políticas.
No segundo caso, tratar-se-ia de saber como se cumpririam os critérios que o pacto implica, quem entra ou fica de fora, como será e se haverá período intermédio para quem espere por uma segunda volta.
A primeira questão que agitou a opinião pública foi a da aceitação do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Logo a seguir, tudo parecia resumir-se a uma corrida, na qual alguns ficariam voluntariamente de fora e em que muitos competiam pela entrada.
Foi o momento das dúvidas sucessivas e recíprocas. Os países do Norte e do Centro da Europa desconfiavam das performances e capacidades dos países do Sul. Os países do Sul dividiam-se entre os que entendiam possuir condições para entrar e o que fazia tudo por reuni-las.
Todos reconheciam, porém, a indispensabilidade de se encontrarem no primeiro grupo. Todos explicavam como seria particularmente dramático ficarem - excluídos.
A razão de ser das dúvidas correspondia a duas diversas tradições: à do grupo de países com uma tradição de

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disciplina orçamental, de controle do défice, de diminuição da dívida pública. de estabilidade económica, em suma; e à do grupo de países que, manifestamente, não tinha pergaminhos desta natureza e sofria da desconfiança da sustentabilidade dos resultados conseguidos.
O primeiro conjunto desconfiava do segundo, porque não queria uma moeda comum tornada fraca. O segundo conjunto desconfiava do primeiro, pela suspeita da intenção de exclusão.
Mas, mesmo nos países originariamente insuspeitos, começou a ganhar corpo alguma dúvida. Num momento, o recrudescer dos trabalhos da CIG e, sobretudo, o aproximar da reunião do Conselho Europeu fizeram incidir as atenções sobre. o tema da revisão do Tratado.
Todavia, foi «sol de pouca dura». Logo se sucederam os actos eleitorais e a instabilidade.
Em pouco tempo, três governos foram substituídos. Nos três actos eleitorais, houve um denominador comum: as oposições ganharam. Tal permitiu aos analistas mais atentos dizer que quem estivesse empenhado na realização da União Económica e Monetária perdia as eleições por desgaste ou afastamento do eleitorado.
Fossem os governos de esquerda ou de direita, não era apenas uma maldição, era uma fatalidade.
Daí as várias tentativas de explicação possível dos fenómenos. Daí as várias hipóteses de seriação divisionista e o apodo de fundamentalistas ou cépticos entre apoiantes e oposicionistas.
As políticas através das quais se realizava a União Económica e Monetária geravam, invariavelmente, afastamento e incompreensão. Mas os resultados, apesar de tudo, eram diferentes em cada país. O desemprego crescia em França ou na Alemanha, descia na Holanda, na Irlanda ou em Espanha. O crescimento variava de país para país, mas verificava-se.
A explicação à esquerda tendia a alinhar, no argumento tradicional: as políticas monetárias agravavam o desemprego, eram portadoras da insensibilidade social.
Só assim e nessa base foi possível que o actual Governo francês fizesse promessas eleitorais de criação de 700 000 novos postos de trabalho, da redução do horário de trabalho para 35 horas, da paragem das privatizações. Só assim e nessa base foi possível a Jospin recriar a miragem das políticas públicas de emprego. Só assim e nessa base foi possível, ao actual Governo francês, lançar a dúvida e criar a crise.
O que quer o Governo francês? Quer ele recusar a moeda única? Não! Quer ele repensar os critérios do pacto? Parece que não! O que Leonel Jospin pretende é, pura e simplesmente, tempo para pensar e adianta que, em todo o caso, a sua linha de vitória mínima consistirá em inserir no Tratado uma preocupação explícita com o emprego. Temos de convir que a posição francesa é diferente da de grande parte dos socialistas europeus. Não apenas pelo excesso mas também pela génese das posições do ponto de vista das propostas eleitorais.
Há autores particularmente atentos a estes pormenores. Que o diga o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, para cuja prosa, recém-publicada, chamo a atenção: «Quando o Presidente Chirac provocou eleições antecipadas, de supetão, nem sequer deu tempo ao PS de Jospin de apresentar um daqueles programas muito modernos e abertos à sociedade civil tidos por causadores das vitórias socialistas em Portugal, Grécia e Inglaterra. Desta vez mesmo um Partido Socialista clássico (republicano, laico e resistente) recebeu os favores do eleitorado só porque estava na oposição e tinha um líder mais sério que carismático».
Assim sendo, este seria um verdadeiro triunfo do socialismo à antiga, como tal saudado. Resta saber se este socialismo, no qual muitos ainda se revêm, tem alguma coisa que verdadeiramente o possa fazer distinguir e impor no novo ambiente económico da Europa.
Poderá ele confrontar-se com a evidência da necessidade de políticas de rigor ancoradas em economias de mercado? Poderá ele reconduzir-se a uma ideia de Europa na qual os compromissos eleitorais de um qualquer partido consigam impor-se aos demais países da União e fazer tábua rasa do esforço de tantos concidadãos europeus?
Por mais cumprimentado em público que seja, é óbvio que esse Governo socialista verá contestada, mesmo pelos demais governos da mesma matriz ideológica, qualquer exigência, de renegociação do Pacto de Estabilidade ou de adiamento, com real significado, dos prazos.
Sabem perfeitamente os governos envolvidos que o adiamento de uma decisão com este peso significaria pura e simplesmente a não realização do objectivo comum.
E sabem mais: sabem que a instabilidade que se lhe seguiria deixaria em grande dificuldade as economias mais frágeis. Tratar-se-ia de uma opção que, mesmo a curto prazo, causaria mais prejuízos do que benefícios.
É por isso que consideramos clara a consciência de ter chegado o caminho para a moeda única a um ponto de não retorno. O Governo português, temos a certeza, está ciente desta verdade.
Creio que também ressalta à evidência para todos que não tem o PSD dúvidas em apoiá-lo na realização do objectivo da União Económica e Monetária.
A distanciação que fazemos não está no objectivo. ela radica, sim, na nossa oposição a medidas que o Governo tem tomado, ou das quais se tem abstido de tomar. para lá chegar.
O Conselho dos Ministros de Economia e Finanças dos países da União Europeia (ECOFIN) acompanha-nos, aliás, na crítica que lhe dirigimos de dever conter o défice, através da contracção da despesa e não do aumento da receita. E os portugueses têm e terão razão em não compreender este procedimento do Governo.
Se não afirmássemos esta diferença, ficaríamos comprometidos para com todos aqueles que acreditam na Europa e se sentem injustamente penalizados. Por exemplo, por quantos não compreendem o gasto público desregrado e, ao mesmo tempo, o castigo do contribuinte, com antecipação de impostos, com métodos indiciários, com colectas mínimas.

Aplausos do PSD.

Mas não é apenas aqui que discordamos. Várias vezes reclamámos a necessidade de fazer, urgentemente. as reformas da saúde e da segurança social. E também sabemos que não estamos isolados na crítica formulada por tudo isto não estar a ser feito e não ser levado a cabo, em tempo oportuno.
Só a 9 de Setembro, se espera que a Comissão do Livro Branco da Segurança Social termine os seus trabalhos. Ignora-se ainda se há qualquer orientação estratégica do Governo nesta matéria, apesar de, uma vez mais, ECOFIN ter reclamado a urgência destas reformas.
O caminho para a moeda única continuará a ser seguido. Dele não abdicamos, c aqui acompanhamos a posição do Governo. O que nos penaliza é que ele seja feito à custa

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de mais impostos, mais gastos públicos e sem as reformas urgentes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Central é o tema da União Económica e Monetária e compreende-se que a subida de tom em relação à sua importância não tenha apenas a ver com o momento. Mas as conclusões da Conferência Intergovernamental são. elas próprias, igualmente matéria fundamental.
Sabemos, desde logo, que, nos tempos mais próximos, vai ser muito difícil, se não impossível, ter lugar uma nova revisão do Tratado.
Foi, ao longo de um tempo muito considerável, efectuado um importantíssimo trabalho, que visou criar entendimentos, plataformas de acordo e soluções.
O PSD tem razões para desejar que muitas das formulações que defendeu se encontrem, terminada a CIG, inseridas no Tratado. São soluções que, sendo boas para a União, são também boas para Portugal. Por isso, apresentámos a proposta de resolução hoje em debate, a qual representa apenas o enquadramento estratégico por nós proposto.
O aperfeiçoamento institucional da União e o aprofundamento da participação democrática deverão seguir a par com a inserção do conteúdo da declaração dos direitos fundamentais e com á afirmação da cidadania europeia.
O edifício institucional assenta no papel nuclear do Conselho Europeu, na eficácia da Comissão e na sua composição, com a presença de Comissários de todos os Estados-membros, no alargamento do âmbito de actuação dos tribunais, no controle do Parlamento Europeu sobre as instituições supranacionais, na participação reforçada dos parlamentos nacionais.
O processo decisional deve garantir a unanimidade para as questões de natureza constitucional e paraconstitucional e impedir o prejuízo dos pequenos e médios Estados na ponderação de votos, nos processos de votação por maioria qualificada.
Sempre defendemos a clarificação no domínio da política externa e de segurança comum, na certeza de possibilitar a praticabilidade de estratégias, acções e medidas comuns, com o eventual recurso à abstenção positiva.
Reconhecemos, como muito importante, a progressiva inserção na UEO na União Europeia, a integração do acquis de Schengen no Tratado, a comunitarização das políticas de asilo, imigração e passagem de fronteiras externas.
Entendemos essencial o reforço da cooperação na EUROPOL, na luta contra o crime e nas áreas judiciária e policial.
Estará, assim, concluídos estes trabalhos, aberto o caminho para o alargamento. E este será o próximo grande passo, cujo início formal se cumprirá a 16 de Junho. Nesse dia, a Comissão escolherá, porventura, que países vai convidar. Esses países não aderirão, certamente, antes de 2003, 2004 ou 2005.
Tratar-se-á de um alargamento mais lento, longo e restrito do que desejaríamos, por razões de solidariedade e de ideia de Europa. E à União Europeia caberá, então, definir as relações com todos os países que não conseguirão entrar, para que mantenham viva a esperança, estável a opção democrática, impossível a crise ou a guerra.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A União Europeia implica ainda a realização da Europa social. Jacques Delors, em intervenção recente, afirmava: «A ambição dos pais do Tratado era mais vasta: construir uma Europa dos povos baseada na partilha dos valores comuns fortes e que resistissem ao tempo.
A solidariedade era um dos valores que os pais da construção europeia tinham no coração. Uma solidariedade entre países, entre pessoas e também, esquecemo-lo muitas vezes, entre gerações.
Fiel a estas intenções, a Europa deve redinamizar a sua ambição e o seu dever de solidariedade.
Solidariedade em relação aos países que ela não pode apenas considerar como destinatários comerciais.
Solidariedade em relação às gerações futuras, sobre as quais temos tendência para reenviar os efeitos da crise das finanças públicas.
Trata-se de reencontrar um equilíbrio entre o realismo económico e a aplicação dos princípios que se encontram na base do modelo social europeu.
Para aí chegar, é preciso projectarmo-nos no futuro, lançando mão do nosso património histórico e preservando o equilíbrio entre sociedade e pessoa».

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Para a realização destes objectivos, é fundamental a permanência dos fundos de coesão e dos fundos estruturais.
Mesmo tomada a decisão de inclusão no núcleo de países da UEM, nada justifica o afastamento do fundo de coesão e tudo aconselha a manutenção do montante de verbas dos fundos estruturais previsto para 1999, a partir de 1 de Janeiro de 2000.
O Governo deve bater-se por estas garantias, da mesma maneira que deve ser assegurado que nenhuma área do País deixe de ter acesso àqueles fundos. É, neste capítulo, uma questão que temos por vital. Não sendo matéria intrínseca ao fecho da CIG, dificilmente dela e da evolução subsequente pode estar desligada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como a ultraperifericidade necessita de uma consagração explícita no Tratado.
São, uns e outros, ao fim e ao cabo, instrumentos de aproximação solidária.
São, uns e outros, instrumentos de combate, pelo desenvolvimento, contra a discriminação, a exclusão e o desemprego.
Deixámos claro que temos uma ideia forte e exigente da União Europeia, que não temos qualquer dúvida da nossa opção europeísta, que estamos comprometidos na construção da União Económica e Monetária e na revisão do Tratado.
Temos, portanto, uma perfeita consciência da responsabilidade.
Dissemos que queríamos uma «Europa das pessoas». Importa que a sua construção aprofundada se faça com elas.
Não ignoramos que, em alguns países, há um afastamento crítico.
Phillipe Séguin dizia, há dias, que os cidadãos tinham uma sensação de fome de participação democrática, porque

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não encontravam responsáveis imediatos para fenómenos que lhes condicionam a vida por efeito da globalização.
Por isso, queremos que o povo português seja mobilizado para participar na construção de ideais destes.
Por isso, entendemos essencial o esclarecimento público dos portugueses.
Está longe de ser suficientemente difundido o ideal europeu. A todos será mais difícil optar sem conhecer, decidir sem ser esclarecido.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O PSD mantém a exigência e o compromisso da realização do referendo nacional sobre as alterações ao Tratado de Maastricht. Referendo que, sendo o primeiro a realizar em Portugal, deve ser desligado de qualquer outro, porque deve ter o significado e a dignidade de uma consulta popular de inegável alcance político.

Aplausos do PSD.

Referendo que possibilitaria que uma grande maioria de portugueses se sentisse mais próxima e unida na realização de um ideal comum.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Ah, o Sr. Deputado já sabe qual é?!

O Orador: - Seria como que um símbolo de afirmação colectiva.
Esperamos que os demais partidos nos acompanhem nesta vontade política e na sua execução.

Risos do CDS-PP.

O aprofundamento da União Europeia exige muito marcadamente estabilidade política. O País deve encontrar-se intimamente ligado a esta opção.
Não faz, assim, qualquer sentido fazer oscilar a estabilidade governativa. A estabilidade governativa, que nos cumpre assegurar e, em primeiro lugar, ao Governo, é, neste contexto, uma pedra-de-toque do sentido de responsabilidade que o País de todos reclama.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O PSD está aqui sereno na oposição.
Em tempo oportuno, o Governo será julgado pelo que foi convencido a fazer e pelo que não fez.
Numa palavra final, desejamos reafirmar a clareza das nossas opções estratégicas em matérias estruturantes, como a chegada ao curo, a participação na primeira fase da moeda única ou a revisão do Tratado da União Europeia, e estamos com o Governo, na defesa do interesse nacional, na afirmação do que nos parece um importante desígnio colectivo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em muitas das políticas para alcançar tais objectivos, assumimos a frontalidade das divergências e não recusamos a distinção de pensarmos diferente e a vontade de agir de modo diferente.
Uma e outra - a consonância nos objectivos e a divergência nas políticas - assumimo-las, com a coragem e a responsabilidade de quem não troca convicções por conveniências,...

Vozes do CDS-PP: - Não! Lá agora!

O Orador: - ... de quem, também dessa forma, serve o interesse nacional e o interesse dos portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Não sei como o Sr. Deputado Carlos Encarnação conseguiu o prodígio tecnológico de despender tempo e, simultaneamente, evitar a contagem dele no painel. Como isso se verificou, espero que os serviços técnicos, em abono da verdade, façam a devida correcção.
Para fazer a apresentação do projecto de resolução n.º 57/VII, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Europa ou se moderniza ou morre. A agenda europeia com que nos confrontamos pode ser sintetizada, com rigor, nesta dicotomia radical, proposta por Tony Blair.
Mas a modernização de que a Europa carece não é apenas uma modernização institucional, é também uma modernização corajosa dos objectivos e do projecto partilhado que une, de forma directa ou ambicionada, os destinos de mais de duas dezenas de povos europeus.
Para os que acreditam firmemente no projecto europeu, Amsterdão não é um ponto de chegada mas um ponto de partida. O minimalismo assumido na reforma institucional da União só poderá ser compensado por uma visão ambiciosa da reforma social e económica, que sobre ela se construirá.
Unia visão de que o Governo português e, em particular, o seu Primeiro-Ministro foram percursores na Cimeira de Madrid, antevendo, com lucidez, as prioridades que os cidadãos da Europa têm vindo a valorizar inequivocamente em sucessivos actos eleitorais.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não é possível compreender os desafios que, hoje, se colocam aos múltiplos territórios geo-estratégicos, fora do contexto de globalização política e económica que caracteriza o mundo actual.
Na luta titânica interblocos económicos e políticos, a Europa joga a sobrevivência do seu modelo de tolerância e de bem-estar, fundado na competitividade, na protecção social e no emprego.
É em nome desse desafio de cidadania que urge mobilizar os europeus, as comunidades locais, as regiões e as nacionalidades. Só no quadro de um projecto europeu de afirmação de valores comuns se podem conquistar duradouramente os cidadãos para a concretização bem sucedida de instrumentos essenciais à consolidação do espaço europeu, de que a moeda única é o mais marcante exemplo.
A União Europeia carece de um novo impulso. A arquitectura dos pequenos interesses tem que ceder lugar à arquitectura dos grandes projectos.
A reforma do Tratado, que hoje aqui debatemos, tem de ser o alicerce de uma nova dinâmica de construção europeia, uma dinâmica que toque o coração e a razão de cada europeu.
Em nome da bancada do Partido Socialista, partido percursor da modernidade que hoje enforma a nova esquerda em que os europeus confiam, exorto o Governo português a prosseguir, na Cimeira de Amsterdão, a postura activa, criativa e liderante que lhe tem permitido marcar

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decisivamente o sentido da construção europeia, reforçando a matriz de cidadania, a defesa dos direitos sociais e a prioridade à coesão, como eixos fundamentais desse processo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portugal não está hoje na Europa com a atitude oportunista de trocar votos por pequenas compensações de curto prazo, tentando passar despercebido e minimizar a visibilidade das derrotas políticas. Temos uma visão da Europa, em defesa da qual nos empenhamos e na qual fundamentamos uma postura central no processo de construção europeia, em todas as suas dimensões.
Tudo o que fizermos, e muito temos feito, para revitalizar a União Europeia é também uma vitória do povo português, que nos credibiliza à escala mundial e abre novas oportunidades de relacionamento profícuo com outros espaços geo-económicos e políticos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Em 26 de Março de 1996, os Grupos Parlamentares do Partido Socialista, na Assembleia da República e no Parlamento Europeu, aprovaram o designado «Documento de Lisboa», que traça, com clareza, a visão europeia que prosseguimos e a expectativa legítima em relação aos contributos esperados da Conferência Intergovernamental para a sua concretização.
Para o Partido Socialista, a revisão em curso do Tratado de Maastricht deverá, e passo a citar o «Documento de Lisboa», «conduzir a uma consolidação da união política e social da Europa, com correcção dos excessos monetaristas, com preocupação sólida pelas políticas de emprego e de coesão social, afirmando uma vontade política de alargamento, consolidando uma política externa e de segurança comum, aprofundando o princípio de subsidiariedade e valorizando a competência da União Europeia em matéria de justiça e assuntos internos».
É com satisfação que verificamos, hoje, que a soberania popular expressa nas eleições, em diversos países europeus, torna possível reorientar a construção europeia para metas e objectivos, que nunca hesitámos em defender com convicção, mesmo estando em posição minoritária.
Temos absoluta consciência de que a revisão do Tratado da União Europeia é um processo negocial complexo, que conduzirá naturalmente a soluções de compromisso, nas quais algumas das prioridades enunciadas terão evoluções aquém do que consideramos desejável.
Será, contudo, relevante valorizar o sentido da evolução e o contributo que a estratégia negocial do Governo português deu para uma mais ousada abordagem da agenda social e económica subjacente à revisão do Tratado.
A estratégia assumida pelo Governo português, com a qual o Partido Socialista manifesta, desde já, a sua inteira concordância, assentou na definição da União como um espaço de afirmação de valores éticos, flexível, seguro e solidário.
Um espaço de afirmação de valores éticos, dos direitos fundamentais de cidadania e dos direitos humanos, como referência de modernidade e sentido solidário, num mundo que emerge do vazio provisório a que a queda do muro de Berlim o conduziu.
Um espaço flexível, capaz de ser competitivo e eficaz, num contexto de equilíbrio global e projecto partilhado, garantindo uma maior transparência de processos e a criação de uma arquitectura institucional compatível com o futuro alargamento aos novos países democráticos do espaço europeu.
Um espaço seguro, capaz de garantir a segurança económica e social dos seus cidadãos, combater a criminalidade, o tráfico e o terrorismo e dissuadir ameaças externas à sua integridade.
Um espaço solidário, prosseguindo um esforço consistente visando incrementar a coesão económica e social nos seus territórios, como factor de consolidação da identidade europeia e da cidadania e de fortalecimento da capacidade de afirmação da União no contexto global.
Como referi no início desta intervenção, o Tratado de Amsterdão não é um ponto de chegada mas, antes, um ponto de partida sobre o qual terá de construir-se a reforma social e económica da União Europeia.
É fundamental para Portugal e para os portugueses que o nosso país possa prosseguir com força acrescida o seu papel activo no desenho destas reformas fundamentais para o nosso futuro colectivo.
Este objectivo convoca-nos a todos para um grande sentido de Estado na apreciação das matérias europeias, sublinhando consensos e visões comuns e esbatendo, no plano externo, divergências frontalmente dirimidas na dimensão interna.
Não entendemos o projecto de resolução, que submetemos à apreciação desta Câmara, como um caderno reivindicativo, manietador da capacidade negocial do Governo português mas, antes, como um documento de apoio à visão de Europa e à estratégia negocial ofensiva que tem sido prosseguida.
Ao detalhar, no seu projecto de resolução, uma lista exaustiva de objectivos fundados numa egoísta visão do interesse nacional imediato, dissociados de uma visão dinâmica do processo negocial, o Partido Social Democrata parece mais interessado em identificar linhas potenciais de ataque ao Governo, no plano interno, do que em potenciar o sucesso do processo de construção europeia, a que o futuro do País está profundamente ligado.
Considerando, no entanto, o espírito subjacente ao projecto de resolução do PSD, preconizando um aprofundamento da participação portuguesa na União Europeia e salvaguardando os equilíbrios globais já atingidos, o Partido Socialista viabilizará a sua aprovação, entendendo-o, contudo, como um documento lato de orientação negocial.
Manifestamos, porém, a nossa frontal discordância, em relação ao referido no artigo 7.º do projecto de resolução, sobre a falta de esclarecimento, que se poderia aplicar ao comportamento do PSD durante a negociação do Tratado de Maastricht, mas não ao comportamento transparente do actual Governo neste processo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Consideramos, ainda, que a exaustiva referência ao importante temas dos fundos estruturais não pode ser mais do que um mero expediente de enviesamento da discussão, já que o seu debate não faz parte da agenda da Conferência Intergovernamental.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Permitam-me que termine com uma metáfora e uma manifestação de regozijo. Disputa-se, em Amsterdão, o apuramento para a fase final do «campeonato da construção europeia». Partamos para o desafio com a

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melhor selecção, para, depois, a seu tempo, nos digladiarmos saudavelmente nos «campeonatos» nacionais, regionais e concelhios. E regozigemo-nos pela circunstância feliz de vivermos, hoje, um novo fôlego da construção europeia, traçado à luz dos valores da solidariedade, da liberdade, da tolerância, da justiça e da confiança, princípios da nova vaga de pensamento de esquerda, cujo fulgor inundou a velha Europa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para fazer a apresentação do projecto de resolução n.º 58/VII, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral. Peço aos serviços técnicos que creditem ao Grupo Parlamentar do PCP o tempo correspondente, igual ao dos outros grupos parlamentares que apresentaram um projecto de resolução.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Recusamos este debate como um debate «faz-de-conta», uma encenação para o bloco central do PS/PSD dizer améns às opções estruturantes da construção europeia, tal como resultam do Tratado de Maastricht. Não estamos aqui para aceitar os espartilhos de uma discussão que querem centrada, essencialmente, no limitado campo de manobra imposto à revisão do Tratado pela Conferência Intergovernamental e para ignorar, ou passar ao de leve, pelo cerne dos problemas que afectam os países e os povos da Comunidade Europeia e que resultam da opção moeda única, dos critérios monetaristas impostos no Tratado de Maastricht (agravados com o Pacto de Estabilidade) e das políticas neoliberais que dominam a União Europeia e os governos dos Estados que a compõem.
Esta revisão do Tratado de Maastricht está inquinada, desde o começo. Ela está fundada num «pacto político de batota», no qual os governos e os dois partidos europeus mais largamente representados a nível governamental, o PSE e o PPE, se comprometeram a não tocar na União Económica e Monetária, isto é, precisamente na componente mais federalista do Tratado de Maastricht e na que contém as imposições monetaristas, que vêm espartilhando o desenvolvimento da Europa e causando o actual estado de alastramento do desemprego e da pobreza.

Aplausos do PCP.

Para os governos que, no ano passado, lançaram a Conferência Intergovernamental, a moeda única é uma espécie de «vaca sagrada». Dizem: «a moeda única não se pode discutir e ... "prontos"». É com esta profundidade e riqueza de argumentos que justificam este injustificável tabu.
Mas a vida e a vontade dos povos tiveram mais força do que os jogos das cúpulas partidárias que sustentam o Tratado de Maastricht.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Tiveram mais força que o black-out imposto aos meios de comunicação social em torno das questões económicas e sociais, decorrentes do Tratado de Maastricht. A Europa assistiu, nos últimos anos, a formidáveis movimentações sociais de protesto, que se espalharam pela França, Alemanha, Itália. Espanha, Grécia, Bélgica e Portugal. As opiniões públicas mais informadas, como a dinamarquesa ou a sueca, põem os respectivos governos a jogar à defesa, a procurar todos os meios para apagarem a imagem de fiéis cumpridores de Maastricht. E, onde há eleições, os governos são severamente julgados pela política que seguem, fundada na aceitação estrita dos critérios monetaristas de Maastricht, e são irremediavelmente corridos pelo voto popular.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Hoje, a Europa está assolada por uma tempestade política como há muito não se via. As movimentações sociais, greves e manifestações de protesto e os verdadeiros movimentos de revolta dos eleitores tiveram forçosamente consequências no plano político.
Há escassos dias, o Governo da Suécia decidiu não integrar o grupo de países fundadores do curo. Tudo foi feito para apagar este facto, apesar do enorme alcance político de que se reveste. Não houve nenhum título principal, nenhuma notícia de abertura. Os governos, onde foram obrigados a falar, fizeram comentários desvalorizadores, do género «isso são os suecos, já se sabe», um bocado como, nos anos 50 e 60, se lhes atribuía essa coisa esquisita que era o «amor livre».

Risos.

Mas, apesar das desvalorizações e dos silêncios, os suecos tomavam a decisão histórica de se juntar a outros países, para já a Dinamarca e o Reino Unido, que saltam do barco dos fundamentalistas da moeda única. Sr. Primeiro-Ministro, não teria sido boa ocasião para pensar seriamente sobre toda esta questão?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A sua resposta é teimosamente negativa, todos o sabem. O senhor não quer pensar sobre esta questão, prefere a «fuga para a frente», prefere ser o bom aluno, como já o fez seu antecessor Cavaco Silva.
Mas, por favor, Srs. Deputados do bloco da maioria de Maastricht, não venham com o « patati-patatá» sobre os que são contra a Europa. É fácil, assim, arrumar uma discussão e sossegar as consciências. Exige-se dos Srs. Deputados a honestidade intelectual de discutirem esta questão como os europeus e os portugueses o exigem.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não é a construção ou não da Europa que está sob fogo, é a forma de o fazer, é a questão central de saber que Europa se está a construir e quem paga a factura.

Aplausos do PCP.

Com as eleições em França e as posições assumidas pelo novo Governo francês a tempestade aumentou. O Governo francês veio dizer publicamente o que era evidente para quem não estivesse cego pela obediência aos critérios de Maastricht. Jospin veio dizer que, neste caminho para o curo, o emprego e as políticas sociais estavam a ser comprometidas e chamou particularmente para cima da mesa o pacto de estabilidade, instrumento essencial para o espartilho monetarista de Maastricht, através do qual os governos se obrigam, sob a ameaça de pesadas sanções financeiras. a manterem para o futuro, para

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além destes anos de 1997 e 1998 de julgamento das condições de acesso ao euro, o mesmo estrito cumprimento dos critérios de Maastricht. Jospin tem de responder a uma opinião pública que mostrou por todas as formas o seu descontentamento e se obteve o resultado eleitoral que teve não foi a dizer loas aos critérios de Maastricht, mas, pelo contrário, a criticá-los, juntamente com outras forças políticas, designadamente com os comunistas franceses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Agora que é a França a levantar interrogações, já não é possível, como com a Suécia, apagar os acontecimentos e os problemas. Agora todos já dizem que é necessário fazer alguma coisa pela vertente social da Europa, até a Alemanha, que foi apanhada na armadilha da rigidez dos critérios de Maastricht, que ela própria defendeu e impôs e que agora não consegue cumprir, vítima também ela da economia retraccionista que o monetarismo causou, e que, quando quis manipular o valor das reservas de ouro, foi apanhada pela armadilha do poder autocrático do banco central que ela própria defendeu e impôs também à Europa no Tratado de Maastricht.
Aqui, em Portugal, o Sr. Primeiro-Ministro quer trazer para si os louros de Jospin, dizendo: «eu sempre disse», «eu já lhes tinha dito», etc., etc.. Pois é! Talvez tenha dito em muitos sítios, mas, quando aqui se discutiu o pacto de estabilidade, o que ouvimos vindo do Governo foram elogios, foi a defesa integral do seu conteúdo, sem a mais pequena reserva. «Sem quaisquer reservas» foi exactamente a expressão usada no projecto de resolução que os Srs. Deputados do PS e do PSD subscreveram em conjunto e aqui votaram no passado dia 13 de Fevereiro.

Aplausos do PCP.

O grande problema da cruzada do Sr. Primeiro-Ministro sobre o emprego é que ela terá sido dita aqui, onde era ineficaz, nos discursos para os desempregados, por óbvios motivos políticos, mas nunca foi traduzida em actos, lá onde podia ser eficaz para a efectiva mudança das políticas que conduziram à actual situação.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Agora, que o capítulo sobre o emprego adquiriu o estatuto de questão prioritária, é bom que se diga que não basta fazer capítulos para resolver os problemas. A questão do emprego não se resolve enquanto não forem abandonados os critérios restritivos de Maastricht e as orientações neoliberais da política que lhe estão associadas. São aqueles critérios e estas orientações que tolhem o processo de desenvolvimento, que impedem o investimento público, que deixam a economia em estado inerte, que causam o desemprego, que acentuam as desigualdades nacionais, regionais e sociais e que fazem alastrar a pobreza e a exclusão.
Da nossa parte, se entendemos que é sempre tempo para mudar as orientações fundamentais da construção europeia, afirmamos que, com a revisão do Tratado em curso e com a crise social e política que a Europa atravessa, estamos no momento certo para ter a coragem de fazer agora essa mudança de orientação.

Aplausos do PCP.

É o momento certo para defender e conseguir que a revisão do Tratado de Maastricht coloque, como objectivos centrais, os objectivos da coesão económica e social, da afirmação das políticas social. de emprego e desenvolvimento e da igualização no progresso das condições de vida e de trabalho. Mas para que isso suceda é preciso questionar e reconsiderar todo o capítulo da União Económica e Monetária.
Não há ninguém exterior à própria vontade dos governos europeus a impor que a UEM e a moeda única não possam ser discutidas nesta revisão do Tratado.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Foi a própria vontade dos governos que impôs o tabu e é à vontade política de qualquer governo que incumbe o dever de o quebrar.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não há vontade exterior à vontade dos governos europeus que imponha o pacto de estabilidade, nem o carácter estruturalmente monetarista que o enforma, nem as inaceitáveis sanções que ele contém para os países que entendam necessário seguir com prioridade uma via de desenvolvimento, em vez da submissão às espartilhantes condições nele contidas.
O pacto de estabilidade não está firmado definitivamente, só o será - ou seria - em Amsterdão. É por isso a altura certa para o recusar.

Aplausos do PCP.

É um primeiro passo para inflectir as orientações de Maastricht. Sabemos que não estamos isolados nesta proposta política, não o estamos na Europa, onde há países que se insurgem contra estas orientações e onde ocorrem grandes movimentações sociais de contestação, nem o estamos no país, face a uma economia que, a acreditar no Ministro das Finanças, seria um retumbante sucesso, mas perante a qual os cidadãos se interrogam legitimamente sobre a parte que lhes cabe, porque não é a parte do sucesso é, sim, a dos pesados custos em matéria de desemprego, precaridade. baixas condições de trabalho e insegurança.
A par destas questões, Srs. Deputados, há os trabalhos da CIG, que estão presentes em fórmulas provisórias, inacabadas, sujeitas a golpes de última hora, que podem alterar significativamente o seu conteúdo. Os debates têm sido preocupantes.
A questão dos comissários, com o Governo português a chegar a admitir que Portugal pudesse perder o actual nível de representação na Comissão, mostra como estão em perigo alguns princípios fundamentais que marcam o espaço próprio das Nações no quadro da União e que são instrumentos essenciais de garantia da soberania e de defesa de interesses próprios. Para o PCP esses princípios de soberania são absolutamente inegociáveis.
Falando dos que têm sido mais referidos, consideramos inegociáveis princípios como o da presidência rotativa, o da presença nacional em todos os órgãos e instâncias, o do peso relativo de Portugal nas votações equivalente ao actual, o da manutenção do actual nível real de fundos comunitários e de coesão para Portugal no âmbito do próximo quadro comunitário de apoio, o do português como língua oficial e de trabalho, o 'do reforço da

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participação activa dos parlamentos nacionais na vida comunitária e o da imperiosidade de qualquer alteração dos tratados ser feita com o procedimento previsto nas constituições de cada país parra aprovação e ratificação do tratados.

Vozes do PCP.- - Muito bem!
Risos.

O Orador: - Apesar do carácter provisório dos textos de revisão do Tratado, é possível, desde já, concluir que as orientações que estão a presidir à sua elaboração, para além da muita demagogia em torno da participação dos cidadãos, representam um aprofundamento no sentido federalizador. Isto é particularmente visível no 3.º Pilar, com a comunitarização dos Acordos de Schengen, com o novo título que inclui as questões do asilo e da imigração e com o alargamento a esta área das competências do Tribunal de Justiça das Comunidades.
Mas essa via federalizadora está também presente com a previsão da intervenção permanente de um alto funcionário na PESC; com os avanços em relação à UEO; com a incorporação no Tratado das Missões Petersberg e a previsão de todos os Estados, incluindo os que não integram formalmente a UEO, poderem participar na execução dessas missões no quadro da UEO; com o alargamento dos processos de decisão maioritária; com atribuição da personalidade jurídica à União; com a introdução dos mecanismos de flexibilidade e desse mecanismo espantoso da «abstenção positiva».
Não há um único argumento válido para defender e propugnar por alterações ao Tratado que atingem a soberania portuguesa: que constróem uma Europa fortaleza; que levantam dificuldades acrescidas a uma política portuguesa autónoma, incluindo o relacionamento corri os países de língua portuguesa; que vão tornando a política externa portuguesa num apêndice das políticas externas das grandes potências europeias; e que paulatinamente vão dando passos na direcção da Europa potência militar.
É espantoso ouvir responsáveis, com experiência de análise estratégica, comprometerem, passo a passo, os atributos cia soberania de Portugal num espaço político e económico federalizado. onde o País acabaria forçosamente reduzido a uma condição de periferia economicamente débil e de escasso peso demográfico.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Seria essa a reflexão necessária a fazer, em vez de um blá-blá acrílico sobre o desígnio nacional. Mas se se fala de desígnio nacional, aqui digo também que nenhuma Nação pode ter como desígnio nacional a abdicação dos instrumentos essenciais para permanecer como Nação livre e independente.

Aplausos do PCP.

Da nossa parte recusamos esta orientação e as propostas que se inserem nela.
Mas não é nesse sentido que vão as propostas de resolução apresentadas pelo PS e pelo PSD. Apesar de, ao contrário do que sucedeu no debate, que já aqui referi, do passado dia 13 de Fevereiro sobre a moeda única e o pacto de estabilidade, o casamento PS/PSD não ter chegado
ao ponto da subscrição conjunta de uma proposta, os conteúdos das duas propostas são em substância coincidentes, quase complementares - socorro-me aqui, aliás, do Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Europeus, que o disse com clareza e oportunidade.
Ajustando-se às negociações em curso, os projectos de resolução, visam, no essencial, dar luz verde ao Governo e não verdadeiramente posicionar a Assembleia no debate dos conteúdos da revisão. Os projectos do PS e do PSD valem pelas coincidências e pela vontade política comum de que o Governo aprove o método seguido pela CIG de afastar a UEM e a moeda única dos temas em debate e os conteúdos de aprofundamento da vertente federal da União. Os projectos de resolução do PS e do PSD são a carimbadela que o bloco central «maastrichtiano» quer dar às orientações de Maastricht.
O PSD é tão denunciado neste objectivo federalista que já dá, escandalosamente. natureza constitucional c paraconstitucional às normas de natureza institucional do Tratado.
O próprio PP não se afasta desse esquema.
Não falo apenas, nem fundamentalmente, da natureza das propostas do PP. Propostas, como a da criação de um senado, eufemisticamcnte chamado pelo PP «Câmara das Nações Europeias», aponta, obviamente, no sentido federal e pressupõe o reforço dos poderes da estrutura parlamentar da União. Aliás, também a substituição dos actuais comissários por comissários com o estatuto de ministro nos governos nacionais dá a essa nova Comissão um peso muito maior do que tem a actual.
Mas mais importante do que esta novidade, que é o vezo federalista do PP, é a confirmação do que já se adivinhava quanto as orientações do PP sobre a União Económica e Monetária. O PP aceita implicitamente o curo e os critérios de Maastricht, já que apresenta uma resolução sobre a revisão do Tratado que deixa intocada a UEM. Não há uma palavra sobre o curo, nem uma palavra sobre a vertente social da construção europeia, nem uma palavra sobre a questão do emprego.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Já foi aprovada aqui!

O Orador: - Todos nós podemos perceber que uma resolução como a do PP, por causa dos compromissos firmados para Amsterdão, o PS e o PSD não a poderão apoiar. A via alternativa para o reforço federal da União que o PP propõe não está agora em condições de ser acolhida. Mas, confessem, Srs. Deputados do PS e do PSD: há ali ideias que gostariam de ter tido!

Risos.

Vai, assue, o Sr. Primeiro-Ministro e a sua comitiva para Amsterdão, com o conforto dos votos da maioria «maastrichtiana» - o bloco PS/PSD - e até com este beneplácito implícito do PP.

Vozes do CDS-PP: - Olhe que não!

O Orador: - Vá, portanto, com esse conforto de votos. mas digo-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, não acreditamos que vá sossegado com a sua consciência.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à fase dos pedidos de esclarecimento.
Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Manuel Monteiro, os Srs. Deputados Rui Carreteiro e Acácio Barreiros.
Para o efeito tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carreteiro.

O Sr. Rui Carreteiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Monteiro, o Partido Popular tem, como qualquer outro partido, o direito regimental de apresentar nesta Câmara um projecto de resolução sobre qualquer matéria que entender importante e na altura que considerar mais adequada.
Quanto à importância da CIG para o futuro da União Europeia e em consequência, para o futuro de Portugal, estamos todos de acordo. Mas no que não podemos deixar de divergir é quanto ao momento escolhido pelo PP para tomar esta iniciativa, sobretudo tendo cm conta os termos em que a faz.
Só a ânsia mediática do PP poderia levá-lo a apresentar, a poucos dias da conclusão da Conferência intergovernamental, uma série de propostas que vão completamente ao arrepio da posição histórica de Portugal face à construção europeia e de todos os temas e abordagens que têm estado, desde há largos meses, sobre a mesa das negociações.
Mas, Sr. Deputado Manuel Monteiro, se por total delírio surrealista desta Assembleia, este projecto de resolução fosse aprovado, tal decisão amarraria o Primeiro-Ministro de Portugal a posições na Cimeira de Amsterdão que o tornariam alvo da chacota de toda a União Europeia. E isso, Sr. Deputado, é de tal forma grave que a sua proposta não pode ser encarada de forma totalmente séria.
Se não, vejamos: o PP diz-se propor um novo ordenamento institucional para a União Europeia. Criando outros órgãos, que a racionalidade me impede de comentar, o que nos propõe o PP para a reforma dos três órgãos que mais indiscutivelmente têm beneficiado o nosso país?

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Não estava cá, não ouviu!

O Orador: - Quanto ao Parlamento Europeu, propõe que o mesmo se reduza à maior das insignificâncias numéricas e à mais insípida das competências; quanto ao Comité das Regiões, propõe que se extinga; quanto à Comissão Europeia, propõe que se liquide.
Sr. Deputado, este texto não é uma proposta de revisão. é uma proposta de execução sumária da União Europeia.
Portanto, tentemos olhar seriamente o futuro. Deixe-me chamar-lhe a atenção para um estudo feito recentemente pelo Observatório Permanente de Juventude sobre as atitudes dos jovens portugueses, face à integração europeia: cerca de 7 em cada dez jovens portugueses, entre os 15 e os 29 anos, é favorável à integração europeia e considera até que a Europa tem identidade própria; metade detende que Portugal deve privilegiar os seus laços com a Europa; que estariam dispostos a participar num exército europeu. face a uma ameaça externa à União Europeia, e escandalize-se, Sr. Deputado! - são favoráveis à existência de um governo europeu; e a grande maioria considera que o desporto e a cultura são muito mais importantes para a identidade nacional do que o ambiente, a política social ou - pasme-se! - a economia.
É por isso, em nome do futuro. que interpelamos a bancada do PP. O balão imediático do PP já encheu demais e pode estar prestes a rebentar. Passou o tempo das propostas radicais e sem arame. Um dia a História falará de figuras que souberam estar acima das conjunturas partidárias eleitorais e que se uniram em torno de um projecto comum, dando o seu contributo decisivo para a integração europeia do nosso país.
É um apelo de regresso ao futuro da História de Portugal que fazemos ao PP, de regresso ao lar constitucional, de que falava o Professor Adriano Moreira, que sempre cimentou partidariamente um enorme consenso na política externa portuguesa. a não ser que o PP guerra ficar na História ao lado do PCP, formando a parelha do novos «velhos do Restelo».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Manuel Monteiro deseja responder já ou no fim dos restantes pedidos de esclarecimento?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sn. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Monteiro, quero começar por lhe dizer, valha a verdade, que veio defender, tentar defender ou fundamentar as suas posições de uma forma frontal e, por isso, o cumprimento.
Mas o que decorre do seu discurso, que é, aliás, o fundo da posição do PP e também, em certa medida, o fundo da posição do PCP, é um complexo de inferioridade em relação à Europa, é urna leitura da nossa História, interpretando Portugal como um país dos pequeninos, um país pequenino, que não pode ambicionar a jogar na Europa um papel igual ao dos grandes países europeus. mas nem sequer igual ao de outros países com a mesma dimensão, como a Holanda, a Irlanda, a Áustria, a Dinamarca.
A Portugal está vedado jogar esse mesmo papel. Portugal tem de ter uma atitude de constante receio da Europa. De facto, isso, Sr. Deputado, letra alguma expressão na nossa sociedade e tem raízes numa atitude conservadora, tradicional na História portuguesa. de medo das novas ideias da Europa, que corresponde à s ideias da direita mais conservadora na História de Portugal.
O Sr. Deputado, na verdade, citou um mau exemplo para sustentar a sua tese, que for D. João I, porque exactamente o que este rei fez foi ter jogado, na História da Europa, um papel extremamente importante. Portugal. a partir do reinado de D. João I, jogou na História da Europa, aventurou-se e desenhou para a Europa um papel extremamente importante, que revolucionou não só a Europa como o próprio mundo.
Portanto, Sr. Deputado, o fundamento da posição do PCP é profundamente conservador e temeroso em relação... ,

Risos.

Vozes do CDS-PP: - Do PCP?!

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O Orador: - É a mesma coisa! E não foi gaffe! Reconheçamos que a posição do PCP e a do PP têm essa mesma base! É isso que nos distancia profundamente, sem a mania das grandezas, sem nos pormos em bicos do pés!
V. Ex.ª há-de reconhecer uma coisa, já que se debruçou sobre a História: chegámos ao séc. XX numa posição extremamente recuada em relação à Europa, podemos mesmo falar - e falava-se - que estávamos na cauda da Europa, mas vamos entrar no séc. XXI lado a lado com os mais avançados países europeus, trabalhando para uma Europa comum. E o verdadeiro desígnio nacional é esse, Sr. Deputado!

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Está mesmo convencido disso?!

O Orador: - Convença-se que é esse, Sr. Deputado!
O Sr. Deputado Manuel Monteiro disse que este é um debate profundo, mas eu digo-lhe que é mesmo o debate mais essencial para o futuro de Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Mais uma vez o painel electrónico entrou em colapso. Não sei se há telemóveis ligados na Sala, mas os serviços já se queixaram disso. Por isso chamo, mais uma vez, a atenção dos Srs. Deputados para esse facto.
Peço aos serviços que corrijam o erro do painel, que, pela segunda vez, se verifica, agora por excesso em vez de por defeito.
Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, embora não esteja cá o Sr. Professor Adriano Moreira, gostaria de lembrar uma frase que ele um dia aqui disse, dirigindo-se ao então Primeiro-Ministro Professor Cavaco Silva, quando curiosamente foi interpelado um pouco nas mesmas circunstâncias em que VV. Ex.as me interpelaram. Ele disse qualquer coisa como isto: «os filhos dos "Velhos do Restelo" são aqueles que apenas querem ficar na Europa, não aqueles que querem partir para além dela».

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Penso que respondi, quando pretendeu insinuar determinado tipo de comentários em relação ao Professor Adriano Moreira.
Em segundo lugar, quero dizer aos Srs. Deputados o seguinte: o Partido Popular propõe de facto a extinção do Comité das Regiões, irias também propõe a sua substituição por um comité do poder local. Portanto, é bom que por vezes leiamos o que é escrito, para, posteriormente, podermos fazer uma análise mais detalhada, e o PP fê-lo consciente de que a Europa em que acreditamos não é a Europa dos povos nem a das regiões, e nisto somos muito claros.
Não acreditamos nem na Europa dos povos nem na Europa, das regiões. Em essência, acreditamos na Europa dos Estados-Nação, na Europa das Pátrias, e há efectivamente nesta condição uma divergência, uma diferença de opinião e de substância profunda entre os senhores do PSD e do PS e o Partido Popular. Acreditamos na Europa, acreditamos numa União Europeia.
Mas gostaria de dizer-lhe o seguinte: há sondagens para todos os gostos e para todos os feitios e, se quiser, podemos trazer-lhe para a semana sondagens encomendadas pelo próprio Partido Popular que demonstram exactamente o contrário em relação ao exército único europeu, a um governo central europeu e, curiosamente, em relação à própria moeda única. Agora, Srs. Deputados, estamos permanentemente e este é que é ponto essencial, o que é de lamentar, a esquecer-nos de uma coisa: é que os senhores são menos europeus do que eu e do que muitas pessoas desta bancada. E vou explicar-lhes porquê.

Risos do PS.

Vou explicar-vos porquê. É que os senhores «vendem» a Europa como um alguidar de moedas. Os senhores não são capazes de discutir as questões políticas da Europa. Os senhores subverteram o primado político e dos valores da Europa à lógica monetária, à lógica financeira e à lógica económica.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Os senhores só avançam na construção europeia na medida em que os estômagos ou as carteiras dos cidadãos estejam mais ou menos cheias.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E entendamo-nos em relação a isto. Houve um arrepio, um grande susto para aqueles que acreditam, como vós, numa determinada Europa com o Tratado da União Europeia.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E é por isto que agora o não vão discutir. É por isto que agora não vão discutir o Tratado de Maastricht mas apenas querer concretizar a moeda única, porque, primeiro, adormeça-se o povo, dê-se-lhe dinheiro, dê-se-lhe subsídios...! E, meus caros amigos, cá estaremos - e queira Deus que eu e os meus colegas do PP nos enganemos! - para ver, se no dia em que acabar o dinheiro verdadeiramente, se as populações estarão ou não com as vossas opções e as vossas ideias. Porque defender Europa é dizer aos europeus que a Europa tem coisas boas e muitos sacrifícios, o que não fizeram, nem os senhores do PS, nem os senhores do PSD..
Os senhores são uns maus defensores da ideia europeia; os senhores são uns maus percursores da Europa.
Para concluir, Sr. Presidente, há um aspecto, em meu entender, fundamental: nós defendemos um outro modelo europeu. Somos contra o federalismo e por isso o propusemos, não porque o Sr. Deputado do PCP tenha vindo agora. com a graça que lhe é habitual e o brilhantismo que lhe é reconhecido, dizer que aderimos ou deixámos de aderir a todo o tipo de teses. Não vamos entrar por aí! Porém, Sr. Deputado, há uma coisa a que os senhores não são capazes de responder. É que o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros vêm aqui falar de emprego para trás, de emprego para a frente, de coesão social, de mais preocupação social... Mas os senhores não conseguem explicar a ninguém como é que estão preocupados com o emprego, com a protecção social dos trabalhadores na Europa, se os Deputados do PS, tal como os Deputados

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do PSD, no Parlamento Europeu, votaram ipsis verbis os acordos do GATT, que põem em causa esses direitos sociais dos trabalhadores europeus e as condições de emprego na Europa em função de uma concorrência que pode ser livre mas que é tudo menos justa.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Para terminar, não posso deixar de saudar V. Ex.ª pela acção que há largas décadas, no plano político, quer publicamente, quer de forma diplomática, tem desenvolvido no sentido do avanço da construção europeia e da empenhada participação de Portugal neste processo.

Aplausos do PS.

O Orador: - E há uma contradição total entre aquilo que os senhores apregoam «para português ver» e aquilo que os senhores fazem, votam e subscrevem no próprio Parlamento Europeu.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, inscreveram-se os Srs. Deputados Joel Hasse Ferreira, Luís Sá e Manuel Monteiro.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, começo por saudar os avanços recentes do processo de integração europeia que V. Ex.ª aqui descreveu sinteticamente.
Tendo em conta a situação actual com um peso claramente majoritário dos socialistas nos governos europeus, evidenciando-se assim uma maior atenção às questões do emprego e do desenvolvimento económico, penso que é justo lembrar que esta preocupação, esta particular atenção, vem na senda do que o Governo português tem defendido, e que foi evidenciado, nomeadamente, a partir do Conselho Europeu de Madrid pelo Engenheiro António Guterres.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Feita esta consideração, gostaria de fazer algumas perguntas, muito sinteticamente.
Em primeiro lugar, que impactos positivos pensa V. Ex.ª que terá para o desenvolvimento e o emprego no nosso país e na Europa a nova situação que se esboça, adoptando no plano europeu posições que visem conciliar de facto o equilíbrio financeiro e a consciência social?
A segunda questão prende-se com a primeira: que renovação pensa V. Ex.ª poder vir a gerar no conjunto das forças da esquerda europeia este novo quadro político europeu, levando mais longe o aprofundamento e a renovação que tem vindo a ser feita?
Terceira questão: que reforço do processo de integração europeia, em termos de cidadania e de inserção mais profunda no tecido social, pode representar esta evolução positiva no plano social, político e institucional? Será que o tal défice democrático de que se falava poderá vir a ser, para além de institucionalmente melhor resolvido, em boa parte preenchido pela satisfação social de camadas cada vez mais largas de cidadãos europeus?
Última questão: até onde V. Ex.ª pensa que se poderá
avançar no sentido da coordenação de políticas económicas, com governos diferenciados, de forma a concretizar no terreno as necessidades de resolução de problemas sociais e económicos que, sendo de toda a Europa, são de todos os cidadãos europeus?

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - São as perguntas

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, como é natural, a construção europeia não é monopólio exclusivo de nenhuma família política, é um compromisso entre várias famílias políticas no pós-guerra, entre socialistas democráticos e cristãos-democratas, entre ambos e liberais-democratas, e é isto que constituiu o cerne da matriz política de que a Europa hoje é o espelho. E bem podemos dizer que nas suas políticas concretas, específicas, ou no próprio desenvolvimento dos Tratados, essas várias matrizes têm o seu contributo indelével.
O que constatamos - e é para nós um motivo de grande satisfação - é que na actual situação europeia, caracterizando à parte todos os notáveis progressos em matéria económica pela persistência de inúmeros problemas de ordem social, tem sido a família política dos sociais-democratas, dos trabalhistas, dos socialistas democráticos, aquela que tem procurado introduzir, quer na agenda política europeia, quer na lógica e nos valores das instituições, com força, com significado, um determinado conjunto de valores. O Governo português inseriu-se nesta família, pugnou, como todos conhecem, por intermédio do Primeiro-Ministro, quer no âmbito da nossa família política, quer no conjunto das instituições europeias, por esses valores. E o que verificamos é que esses valores estão a fazer o seu caminho de uma forma consolidada, e a revisão do Tratado de Maastricht, contrariamente àquilo que foi a elaboração do Tratado de Maastricht, no final vai trazer de forma muito mais expressiva um conjunto significativo de valores dessa ordem e as políticas da União Europeia, designadamente através de uma valorização correcta da coordenação das políticas económicas. aliás, prevista pelo artigo 103.º do Tratado, passarão a ser uma realidade efectiva, o que seguramente beneficiará o nosso país.
Mas gostava de sublinhar que nesta matéria não estamos na posição de pedintes. Isto é, não aparecemos neste debate com a mão estendida para, depois de a União Europeia assumir estes valores e praticar estas políticas, podermos ser o destinatário final de uma lógica de subsidiação. Nós demos o nosso exemplo, com a coerência da nossa política no plano interno, e é por praticar uma política norteada por estes valores no plano interno que reforçamos a credibilidade para sustentar idêntico tipo de ideias no plano externo e na União Europeia e que agora vemos com satisfação, depois das mudanças políticas no Reino Unido e em França, que estas ideias podem e devem fazer o seu caminho.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

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O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, ao contrário do que aqui já foi dito, creio que este debate tem um mérito, o de pôr termo ao simulacro de crises e conflitos políticos artificiais. Está claro que por detrás de um conjunto de operações mediáticas o que verdadeiramente existe é uma concordância muito profunda em matéria de revisão constitucional do fundamentalismo em torno do euro, das opções fundamentais a respeito da Europa.
O Sr. Deputado Carlos Encarnação, na impossibilidade de criticar o Governo perante uma convergência profunda, optou por interpelar o governo francês; o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, implicitamente, parece que o interpelou também, porque, na verdade, vemos, da parte do governo francês, por exemplo, uma afirmação do Ministro da Economia e Finanças no sentido de pôr em causa o dogma dos 3%, vemos afirmações no sentido de pôr em causa o pacto de estabilidade, de parar para pensar. O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros parece responder a tudo isto com o fundamentalismo, com a fuga para a frente, com, no fim de contas, a reafirmação de prazos, de critérios, no momento exacto em que toda a Europa se agita, em que os governos que estão no poder caem e perdem eleições. Mas, independentemente da leitura deste facto, creio que este aspecto é, em grande medida, atribuível à opção feita nesta matéria, em que os povos se movimentam, em que se verifica que a própria Alemanha, em virtude da política económica adoptada para cumprir os critérios, está em risco de não os cumprir exactamente porque o abrandamento do crescimento, a baixa dos rendimentos, do crescimento do desemprego, pode levar a diminuir a colecta dos impostos. E sobre este aspecto há uma questão interessante, que, creio, seria curioso que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros comentasse.
Ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro, generosamente, aqui há tempos, admitir que a Alemanha pudesse aderir ao euro, mesmo não cumprindo integralmente os critérios de convergência. A Alemanha, naturalmente, ficou descansada perante esta generosidade. Porém, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros veio hoje aqui dizer que os critérios são para cumprir, inflexivelmente. Acaso foi desautorizado o Primeiro-Ministro? Mudou a posição do Governo? Creio que seria curioso que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros ilustrasse à Câmara.
Neste contexto, há um outro aspecto que gostaria de referir. Se o PS não deixa criar condições para «parar, escutar e olhar» no momento exacto em que toda a Europa se agita, a questão é: por que é que não deixa o povo português fazê-lo?
Já aqui se falou em referendo, mas há uma questão que é irrecusável. L que o grande problema que está colocado, aquele que se discute nas filiações por toda a Europa, aquele que se discute em todo o lado, é o do euro, o do caminho para lá chegar, o da União Económica e Monetária, o do pacto de estabilidade, o dos cortes de investimento público. Os problemas da Conferência Intergovernamental são extremamente importantes e têm de ser discutidos e examinados em profundidade, mas referir aqui um referendo sem referir a outra questão fundamental, a do direito do povo português se pronunciar sobre um aspecto fundamental do seu próprio destino, é naturalmente irrecusável.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois já ultrapassou o tempo regimental.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Quero apenas dizer o seguinte: nós defendemos a Europa da coesão, do ambiente, a Europa social e a Europa do desenvolvimento. Porém, não admitimos que se confunda este facto com a defesa da Europa dos banqueiros, da Europa da crueldade social, da Europa construída confidencial mente nas costas dos povos e que pretenda dizer-se que este é que é o europeísmo e que quem é europeu é obrigado a aderir a este projecto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, fui muito surpreendido com a intervenção do seu partido neste debate parlamentar de um agendamento potestativo do PP e, sobretudo, na anatomização do PP como partido federalista, com o remorso e a má consciência de, porventura, ter-se perdido uma frente comum antieuropeia neste Parlamento. Assim, para utilizar as palavras de inspiração sueca do Sr. Deputado João Amaral, resta ao Partido Comunista Português a frase «finalmente sós!».

Risos do PS.

De facto, o problema é de solipsismo, pelo que VV. Ex.as devem reflectir. Aliás, penso que já começaram a fazê-lo, aquando da reunião, em Portugal, de vários partidos comunistas sobre a moeda única, a moeda comum, não sei bem qual a diferença. Terão percebido que esse debate é muito interessante, sobretudo quando todo este processo vai ser ratificado por um governo que inclui comunistas, que é o Governo de França. Portanto. VV. Ex.a, terão aí uma margem para meditar sobre a extensão do «finalmente sós», em que as palavras doces e meigas do Sr. Deputado João Amaral querem fazer-vos beber.
Quanto ao problema do emprego, não foi agora que descobrimos a temática social e a temática do emprego. No início deste debate, tivemos o mérito de produzir, em nome do Governo, um documento muito claro sobre os nossos objectivos em matéria de Conferência Intergovernamental, dos quais fazem parte, à cabeça, os objectivos do emprego. Foram claramente assumidos por este Governo no início deste debate, quando ainda não estavam cenarizados quaisquer actos eleitorais e quando não estavam cenarizados os resultados eleitorais de França e do Reino Unido. Portanto, não estamos a fazer nenhuma espécie de reconversão em função dos dados eleitorais, estamos apenas a aproveitar uma nova conjuntura que criou as condições para fazermos prevalecer os nossos pontos de vista.
Também gostaria de dizer-vos que os critérios de Maastricht estão definidos no próprio Tratado e são rigorosos. O Tratado vincula os países e, portanto, é esse o nosso compromisso.
V. Ex.ª, Sr. Deputado Luís Sá, como um dos Deputados mais pró-europeístas da bancada comunista,...

Risos do PS.

... vem colocar o problema do debate popular na opinião pública. Pois bem, nós estamos sempre disponíveis para

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esse debate e, sobretudo, estivemo-lo, de forma muito explícita, nas últimas eleições. E as posições de VV. Ex.as sobre a Europa não foram sufragadas pelo eleitorado, pelo que penso que, um dia, serão VV. Ex.as a retirar alguma conclusão sobre a situação em que colocam a vossa força política em função das posições políticas que defendem, designadamente sobre a Europa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, em primeiro lugar, quero cumprimentar V. Ex.ª porque acredito que é o «tempero atlântico» dentro de um governo completamente europeu.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP):- Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, quero saudá-lo, a si e a todos os seus camaradas do Partido Socialista, pelo facto de ter aderido finalmente àqueles que preconizam e defendem a tese do referendo sobre a Europa. É que, embora não fosse Deputado na altura, recordo-me do que foi dito pelas bancadas do PSD e do Partido Socialista quando alguns tiveram a ousadia de propor um referendo sobre o Tratado de Maastricht. Só faltou que nos tivessem excomungado! Daqui a pouco, o meu colega de bancada Jorge Ferreira recordará as memórias mais esquecidas com citações e frases que, na altura, foram ditas pelos líderes dos dois partidos.

Aplausos do CDS-PP.

Posto isto, Sr. Ministro, quero fazer-lhe algumas perguntas muito objectivas.
Primeira pergunta: o que pensa V. Ex.ª da actuação do comissário europeu João de Deus Pinheiro? O meu partido, e eu próprio, é contra a existência da Comissão Europeia, tem um modelo alternativo, defende um Conselho de Ministros integrando ministros representantes dos governos nacionais que podem vir aos Parlamentos nacionais dar respostas. Ora, consta-me que o Sr. Comissário João de Deus Pinheiro não «dá cavaco» a ninguém. Penso, aliás, que já não «dava cavaco» ao Professor Cavaco...

Risos do CDS-PP.

Gostaria de saber se agora «dá cavaco» ao Engenheiro António Guterres e se, eventualmente, existe ou não alguma colaboração com a Comissão Europeia actual, nomeadamente por parte do Sr. Comissário Europeu. É que, apesar de ele lá estar e, segundo consta e está previsto no Tratado, não ter nenhuma obrigação de vir aqui prestar-nos contas, não deixa de ser um português e nós gostamos de saber se, sendo português, ele dá ou não conta do recado porque, também apesar de tudo, foi indicado para o cargo pelo Governo de Portugal. Assim, se o Governo de Portugal tem o respectivo mandato plenamente legitimado pelo Parlamento português, poderá existir uma relação, ainda que muito indirectamente. Ora, nunca ouvi um membro do Governo pronunciar-se, fazer sequer uma apreciação, que não tem de ser forçosamente crítica, sobre o comissário europeu João de Deus Pinheiro.
Segunda pergunta, muito simples: o Governo já pensou ou não na proposta de pergunta para o referendo europeu de 1998? Penso que esta é também uma matéria importante pois precisamos de começar desde já a pensar - nós próprios já estamos a fazê-lo - que pergunta vamos colocar ao povo português para que este se pronuncie sobre as questões europeias.
Terceira e última pergunta: se, por acaso, a moeda única não entrar em vigor em 1999, o que fará o Governo de Portugal? Recordo que a líder do meu grupo parlamentar fez um dia a seguinte pergunta: o Governo tem ou não um plano de contingência no caso de a moeda única não se concretizar? Ora, independentemente das nossas posições, penso que seria útil saber o que pensa o Governo no caso de não haver uma moeda única em 1999.
Por último, mais uma questão, que não sei se será para ser respondida por V. Ex.ª mas que aproveito para colocar por estar presente o Sr. Ministro da Economia.
O Governo diz que para entrar na moeda única tem de cumprir o défice. Para cumprir o défice, estou certo de que apresentará ao Parlamento uma proposta de lei de Orçamento que, de acordo com a opinião do Governo, cumpra aqueles mesmo critérios. Sr. Ministro, então, e se for aprovada uma lei das Finanças locais que não seja a que o Governo eventualmente deseja? O que irá acontecer em termos de cumprimento de critérios de convergência?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por fim, o Governo vai privilegiar a política nacional ou os critérios de convergência a nível europeu?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Monteiro, vou responder-lhe muito concisamente.
Já tive oportunidade de exprimir a minha opinião convicta mas gostava de reiterá-la aqui, nesta Assembleia.
Nós podemos discordar e criticar as posições que o PP apresentou em matéria europeia mas gostava de saudar o facto de o PP ter apresentado neste debate em matéria europeia um conjunto sistémico, articulado...

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - E federalista!

O Orador:-... e politicamente coerente sobre a reforma das instituições e do funcionamento da União Europeia, colocando-se numa plataforma europeia. Penso que houve aí um progresso nítido pois, durante muito tempo, o PP foi um partido que centrou a sua intervenção na exploração mediática de casos de conflito com o processo de integração europeia. Agora apresentou uma proposta sistémica com uma visão sobre a reforma das instituições europeias.
Não sei se a vossa proposta relativa à Comissão é muito feliz. A este propósito, o Secretário de Estado dos Assuntos Europeus dizia-nos há pouco que, ao propor comissários-ministros, a diferença da vossa proposta em relação à situação existente é a de que a actual Comissão é de ex-ministros e, com a proposta de VV. Ex.as, passaria a ser uma Comissão composta por ministros...

Risos.

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Essa é uma pequena diferença mas não é o que constitui o cerne do nosso debate.
Quanto ao comissário europeu João de Deus Pinheiro, como sabe, este Governo tem relações correctas com a Comissão e igualmente correctas com o comissário. Ele foi designado pelo anterior Governo e, contrariamente ao procedimento de outros governos europeus, consideramos que ele deve desempenhar a sua função até ao fim do mandato, sem oposição ou contestação por parte do actual Governo. A nossa política é a de estabelecer com ele, enquanto português, as mais correctas relações. Aliás, devo dizer que não seria curial que eu viesse «dar notas» ao comissário português na Comissão Europeia, o que, de certo modo, seria retroceder ao caminho do Professor Marcelo Rebelo de Sousa que, seguramente, alguma vez terá dado notas ao comissário João de Deus Pinheiro nas suas conhecidas «classificações de mérito» no Diário de Notícias.

Risos do PS e do CDS-PP.

Quanto à pergunta a fazer no caso de um eventual referendo europeu, será definida pelo Parlamento. Como sabe, a opinião do Governo é a de que essa matéria, para ser regulada, carece da revisão constitucional, por isso pomos tanto empenho na conclusão da mesma. A pergunta deve, pois, ser definida pelo Parlamento e o papel do Presidente da República, relativamente à convocação do referendo, é muitíssimo relevante.
O que nós dizemos é que, do nosso ponto de vista, uma pergunta neste campo não deve incidir sobre o Tratado de Maastricht em si mas, sim, sobre o sentido da integração europeia de Portugal e isso parece-nos absolutamente curial.
Perguntou-me depois se temos um cenário alternativo caso a moeda única não entre em vigor. V. Ex.ª, Sr. Deputado Manuel Monteiro, sabe que as políticas consignadas nos critérios de Maastricht são válidas não apenas em função da lógica europeia mas por si mesmas no plano da correcção das políticas orçamentais nacionais - a redução da dívida, a contenção do défice, a diminuição da inflação, permitindo a baixa das taxas de juro, a criação de riqueza, o investimento. Portanto, consideramos que aquelas políticas são válidas por si. Portugal estará perfeitamente habilitado para manejar qualquer cenário porque o que realizou até hoje e a situação em que se coloca é em si mesma extremamente vantajosa.
Quanto às consequências de uma lei de finanças locais taxista e despesista,...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - A frase é sua!

O Orador: - ... pois bem, neste domínio, a responsabilidade é basicamente da oposição e, como VV. Ex.as todos sabem, é em especial do Partido Social Democrata, partido que não só renova hoje a sua confiança no Tratado de Maastricht mas que aprovou aqui uma resolução a vincular-se expressamente ao cumprimento dos critérios do Tratado em matéria orçamentai.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para formularem pedidos de escurecimentos ao Sr. Deputado Carlos Encarnação, inscreveram-se o Sr. Deputado Luís Queiró e a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, inscrevi-me, talvez um pouco imprudentemente, para fazer-lhe uma pergunta, e falo em imprudência porque, na verdade, já não consigo, sequer, lembrar-me do que o Sr. Deputado disse, mas tomei algumas notas...
V. Ex ª, que até é um Deputado bem humorado e nos proporciona aqui bons momentos, fez um discurso, porventura, de humor em tom sério ou, então, adquiriu uma pose de Estado, dado que o assunto é importante, e fez aqui um discurso de grandes convicções europeístas, felizmente ainda em língua portuguesa... Enfim! De qualquer forma, tomei algumas notas curiosas, uma das quais a propósito da recente convicção de V. Ex.ª no referendo, que o Sr. Deputado, aliás, classificou como sendo um momento de grande mobilização europeísta, que é o que pretende.
De facto, quando estava a ouvir o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, em resposta à questão do Deputado Manuel Monteiro sobre qual a pergunta que deveria ser inserida na consulta referendária, vi logo qual era a pergunta que o Sr. Deputado Carlos Encarnação desejava quando quis fazer deste referendo um grande momento de mobilização europeísta: «Está o povo português muito entusiasmado ou apenas entusiasmado com a construção europeia?».

Risos do CDS-PP.

Talvez seja preciso prever outras possibilidades, talvez o povo português esteja cada vez mais descontente e descrente da construção europeia, em virtude de todos estes problemas relacionados com o emprego e a iniquidade social que está a verificar-se em diversas zonas, muito por culpa dos Governos do PS e do PSD.
Por outro lado, V. Ex.ª criticou, e bem, a solução socialista de Lionel Jospin relativamente ao emprego, isto é, a tese de que o emprego se cria, sobretudo, através do investimento público, o que, aliás, criará dificuldades graves ao cumprimento das promessas eleitorais do Partido Socialista francês agora no Governo. Além do mais, devo dizer que - esta frase não é minha, mas acho-a muito curiosa - os governantes de hoje são, sobretudo, políticos treinados para prometer e justificar o não cumprimento das promessas, porque essa é a realidade!
Pergunto-lhe então, Sr. Deputado Carlos Encarnação: qual é a solução do seu partido para a promoção do emprego neste quadro macro-económico, de cumprimento rigoroso dos critérios de convergência?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, vou tentar responder ao Sr. Deputado Luís Queiró, sendo certo que vou responder a uma grande dificuldade. Primeiro, a grande dificuldade de V. Ex.ª foi formular a pergunta, depois foi recordar-se do que eu tinha dito,...

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - A culpa é sua!

O Orador: - ... mas o seu grande problema foi prever o futuro e esquecer o passado próximo. De facto, V. Ex.ª não tem ideia da pergunta que vai formular e precisa de

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andar à volta de vários assuntos, durante uns bons 4 minutos, para tentar encontrar algo para perguntar. Ainda por cima, vira-se para mim quando queria virar-se para o Governo!
Com efeito, começou por dizer que eu tinha criticado o Governo socialista e depois estabeleceu um paralelo com os socialistas franceses, afirmando que, de facto, eu tinha razão ao criticar os socialistas franceses, porque eles são perdulários, esbanjadores e assim deram um mau exemplo do socialismo, ou seja, o Sr. Deputado disse, justamente, aquilo que eu pretendi dizer ao Sr. Primeiro-Ministro de Portugal. De facto, o Sr. Primeiro-Ministro de Portugal disse, e muito bem, que aquela história de acrescentar um capítulo sobre o emprego não dá um emprego a ninguém!
O Sr. Primeiro-Ministro de Portugal é mais lúcido do que o Sr. Primeiro-Ministro de França. O Sr. Primeiro-Ministro de Portugal tem a consciência nítida de que não pode responder a críticas daquelas nem fazer o que o Sr. Primeiro-Ministro francês ousou fazer.
É por isso que digo que o Sr. Deputado Luís Queiró estava ligeiramente desfasado na pergunta que formulou.
Quanto à questão do referendo, admito que tenha havido um entendimento um pouco diverso daquele que é a razão de ser da sua pergunta. A este propósito, muito clara e francamente, devo dizer-lhe o seguinte: para nós, a questão do referendo não tem qualquer problema. Desde as eleições de 1995, considerámos fundamental a feitura de um referendo sobre as questões essenciais de alteração do Tratado de Maastricht.

Risos do CDS-PP e do Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Sim, sim! Desde as eleições de 1995, por uma razão simples: porque havia um obstáculo constitucional que só poderá ser removido com esta revisão constitucional.
Vejo o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros muito hilariante em relação a esta matéria mas, na altura, a posição dele foi igual à nossa!

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Por isso é que, nesta altura, o Sr. Ministro se está a rir. Está a rir-se de si, não dele nem de mim, porque o Sr. Deputado não tinha compreendido o que eu lhe tinha dito.
Nesta matéria, a nossa posição é muito simples, mas se o Sr. Deputado Luís Queiró não compreendeu, vou explicar-lhe mais uma vez.
Em relação à União Económica e Monetária, estamos com o Governo, mas também temos algumas divergências, e eu expliquei quais eram essas divergências: há políticas que não seguiríamos, medidas que não aplicaríamos e outras que o Governo deveria aplicar e não aplica, do nosso ponto de vista mal; há reformas que deveria fazer e não faz! Portanto, a questão fundamental é só esta.
O Sr. Deputado Luís Queiró pergunta-me que medidas defendemos para criar emprego. Olhe, Sr. Deputado, são medidas que têm de ser pensadas e executadas no próprio país. Tal como disse na minha intervenção - e talvez valesse a pena recordá-lo -, existem países europeus com um bom percurso em relação à subida do emprego e à descida do desemprego que seguem as convicções e as aplicações da política da União Económica e Monetária, mas também encontramos outros países que apresentam resultados completamente diversos. Por isso é simples: cada país deve formular as suas políticas de emprego de acordo com os seus problemas próprios.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - E aos costumes disse nada, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, penso que é bom que este debate esteja agora mais animado, porque as intervenções iniciais foram muito bisonhas. Foram bisonhas tal como é bisonha a Europa para onde vamos entrar! Notei, aliás, o grande desalento dos oradores ao tentarem embrulhar esta matéria, mais uma vez, num bocadinho de papel de celofane cor-de-rosa.
Não tenho má memória, mas a verdade é que já me baralhei com as posições que o PSD tem adoptado, ao longo desta legislatura, em relação a esta matéria.

Vozes do CDS-PP: - O PSD também!

A Oradora: - Assim, para ficar esclarecida, gostava de colocar-lhe algumas questões. Se bem entendi, o Sr. Deputado Carlos Encarnação, que falou em representação da sua bancada e do seu partido, não tem qualquer divergência de fundo com o Governo em relação a esta matéria, mas tem divergências de método e, entre elas, citou, por exemplo, o caso das reformas sociais.
Ora, considerando que, eventualmente, essas reformas não vão ter lugar; considerando que existe degradação política e social em Portugal - presumo que é isso que os senhores pensam, uma vez que agendaram uma interpelação ao Governo, a realizar para a semana: considerando que o cenário europeu não ficou intocado e parado, como era desejo de alguns membros desta Câmara e de outros responsáveis portugueses... - aliás, penso que o problema da falta de informação não se põe apenas em relação aos cidadãos, mas em relação à classe política, que, naturalmente, lê jornais desportivos, jornais portugueses e vê telejornais, que também têm muito desporto, mas não pega numa revista que nos conta como está a Europa. Mas o Sr. Deputado Carlos Encarnação deve ler, com certeza!
Como dizia, partindo do princípio de que esse cenário exterior não só não permanece intocado como está a degradar-se, tal como a situação política - e social em Portugal, de tal forma que os senhores solicitaram um debate de urgência, e dado que as reformas sociais não vão ser feitas, pergunto se o PSD, enquanto partido da oposição, vai ou não aprovar o próximo Orçamento do Estado, tendo presente que esse é o orçamento da moeda única: pergunto ainda se vai continuar a fazer projectos de resolução a meias ou a terças com o Governo, fazendo algumas sugestões, ou se vai passar a ter o peso do maior partido da oposição nesta matéria.
As divergências de método podem ser dramáticas, não é verdade, Sr. Deputado Carlos Encarnação? De facto, o que o Sr. Deputado quis dizer na sua intervenção é que, por este caminho, vamos chegar à moeda única muito mal! Quero, pois, saber se o PSD subscreve uma chegada muito negativa para Portugal e para os portugueses a essa moeda única.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, na verdade, só me faltava que V. Ex.ª viesse agora tentar dizer-me o que havia de ler ou deixar de ler!

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Desejava que!

O Orador: - Tenho ouvido de tudo da bancada do PP mas, realmente, essa e a «última»!

Vozes do CDS-PP: - Queremos ajudar!

O Orador: - Realmente, penso que é mal dirigida, se é que V. Ex.ª queria - e não queria, de certeza! - dizer-me isso a mim! A Sr.ª Deputada queria dizer isso como uma boutade, como uma coisa engraçada, queria acabar com o aspecto bisonho desta discussão, queria, na verdade, tentar dar «uma mancha cor-de-rosa» à sua bancada - às vezes é dada também de ajuda a outras bancadas cor-de-rosa aqui nesta Assembleia - ...

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não se esteja a desviar!

O Orador: -... e queria fazer graça com isto. Bom, e tez bem, porque, de certa maneira, quebrou aqui o gelo!
O Sr. Deputado Luís Queiró estava também muito sério, tão sério que até se esqueceu do que queria perguntar V. Ex.ª agora é mais risonha, mais aberta e mais franca, mais jovial e mais prazenteira...

Risos do CDS-PP.

... a colocar-me alguns problemas.
Mas se a situação está tão má; se, por exemplo, o Plano Mateus Sr. Ministro da Economia, V. Ex.ª está aí e eu ainda não me tinha dado conta - é uma grande vergonha porque, na verdade, não tem qualquer viabilidade - parece que apenas três empresas responderam a ele: se o Governo faz uma série de asneiras e omissões que nós denunciamos, às vezes até o fazemos com antecedência, avisando que vai dar mau resultado... Mas isto é um papel activo e útil das oposições, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não foi isso que perguntei!

O Orador: - Queremos que o Governo governe bem e não mal! Não nos comprazemos com o facto de este Governo que aqui está esteja a governar mal! Queremos que ele governe bem, queremos que cumpra os objectivos que traçou, queremos que cumpra as suas promessas eleitorais, queremos que ele vá até ao fim! Está a ver como nós somos diferentes?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Mas vota ou não o Orçamento?

O Orador: - O problema é esse, Sr.ª Deputada!
Vamos lá a ver, quando falamos da moeda única, dos critérios de convergência, etc., qual é a nossa grande divergência? De tacto, temos objectivos que partilhamos com o Governo, e em relação aos quais todos nós fizemos muito. Até a Sr.ª Deputada. quando esteve num Governo em que eu estive, também deu a sua quota-parte em relação...

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Quando os senhores vêm com esse argumento é porque não têm mais nada a dizer!

O Orador: - ... aos objectivos que esse Governo prosseguiu!

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Estive a contribuir para reforçar a cultura portuguesa!

O Orador: - Não me consta que, nessa altura. V. Ex.ª estivesse em desacordo com este objectivo; se estava ninguém a ouviu. Falou muito baixinho.
Ora bem, nesta altura, o que dizemos com muita clareza é que estamos de acordo com estes objectivos, mas não com algumas políticas. Seja como for, a nossa posição é tão clara, tão frontal e tão límpida que temos a coragem de dizer aqui, a este Governo, que é o Governo de Portugal ....

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Mas vota ou não vota o Orçamento!

O Orador: - ... que o maior partido da oposição tem a responsabilidade suficiente para separar uma coisa da outra: dizer com franqueza e frontalidade aquilo com que não concordamos e dizer com igual franqueza e frontalidade aquilo em que estamos de acordo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Carlos Zorrinho, inscreveram-se os Srs. Deputados Francisco Torres, Luís Queiró e Luís Sá.
Como o Sr. Deputado Francisco Torres não se encontra na Sala, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, vou ser muito breve nas considerações e na pergunta que vou formular ao Sr. Deputado Carlos Zorrinho.
O Sr. Deputado reconhecerá, e julgo que o Governo também, que estamos, de facto, numa grande encruzilhada. situação que, aliás, também foi referida pelo Sr. Ministro Jaime Gama no seu discurso inicial.
Com efeito, a encruzilhada ou a grande questão não resolvida é a de saber como compatibilizar o objectivo do alargamento com o do aprofundamento. E como é que se faz isso? Creio que essa compatibilização pode ser leira de duas maneiras: por um lado, com flexibilização das instituições europeias, com alguma prevalência dos interesses nacionais e com afirmação do pendor intergovernamental, que era, por exemplo, o caminho que a Sr.ª Margaret Thatcher gostaria de ter preconizado, e que ainda hoje nós defendemos, sobretudo na perspectiva do alargamento da Europa aos países de Leste, decorrente da queda do Muro de Berlim.
Por outro lado, a outra questão que aqui se coloca ou o outro lado deste dilema é o de saber se, de facto, este alargamento se faz com o reforço das instituições europeias. É a visão de Delors, com o apoio de Kohl, e é aquela a que temos chegado até mora. São as com-

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petências reforçadas, são os directórios políticos da Comunidade, é a tentativa da eficácia e do aprofundamento do funcionamento das instituições europeias e o que é mais importante para mim é, na verdade, a primazia dos interesses comunitários em detrimento daquilo que se sabiam ser os interesses nacionais.
Por isso é que estas questões do emprego e das políticas nacionais, que não podem ser levadas avante em nome de um desígnio nacional irias comunitário, se colocam.
No entanto, os números são bons. O Governo responde-nos com números, com estatísticas, com milhões, com subsídios, com betão e tudo corre no melhor dos mundos. Mas, então, por que é que as pessoas descrêem? Por que é que a classe média está cada vez mais descrente e mais insegura relativamente ao seu emprego? Por que é que há zonas de verdadeira iniquidade social em volta de Lisboa, por exemplo, como ainda ontem foi aqui referido pelo Ministro João Cravinho? Por que é que o investimento privado desce no conjunto do investimento? Porquê? Por que é que as pessoas, por que é que as empresas, por que é que os agentes económicos não acreditam na economia, apesar de os números da convergência monetária serem números aparentemente optimistas? Como é que nos explica esta dicotomia entre a descrença das pessoas e o optimismo dos números?
A segunda questão que lhe quero colocar tem a ver com o seguinte: ao longo da minha vida, sempre ouvi que, em Portugal, o que vem de Paris é o que o mestre diz.

Risos.

O que quer isto dizer? Quer dizer que as eleições em França, que resultaram na escolha do Sr. Jospin, trouxeram, de facto, um problema acrescido para o discurso do Partido Socialista. E verdade!
Ouvi, há pouco, o Sr. Ministro Jaime Gama dizer que, desde sempre, o Partido Socialista e o Governo introduziram a temática do emprego no seu discurso europeu. Mas, Sr. Primeiro-Ministro e Sr. Ministro, também é verdade, e não tenho qualquer dúvida sobre isso, que os senhores iriam assinar em Amsterdão, como assinaram em Maastricht, o que fosse necessário, com políticas de emprego ou com menos políticas de emprego, porque o grande argumento que os senhores utilizam quando não têm mais nenhum é o da inevitabilidade da opção que fizemos.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Tal e qual!

O Orador: - Portanto, essa opção desenvolve-se com políticas de emprego ou sem políticas de emprego. Gostaria de ouvir um comentário do Sr. Deputado sobre esta questão.
Já agora, pergunto-lhe o seguinte: o que é que o Sr. Deputado Carlos Zorrinho pensa relativamente à questão de Portugal ter ou não, no futuro, um comissário? É que aquilo que os senhores conseguiram até agora foi apenas um adiamento dessa questão! Percebo que os senhores, relativamente ao actual comissário, até estivessem disponíveis para o dispensar, mas a questão não é essa, a questão é a de saber o que é que os senhores pensam relativamente a termos ou não um comissário em permanência.

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Zorrinho, aproveito para lhe fazer uma pergunta e também para situar a posição do Partido Social Democrata em matéria de crise internacional quanto à evolução do processo de integração europeia e de construção monetária.
O Partido Social Democrata está claramente no meio desta crise situado no conjunto daqueles que querem avançar mais rapidamente, sem parar o comboio, quer para a moeda única, quer para a aproximação das instituições dos cidadãos. Em suma, quer uma Europa mais transparente e mais democrática. Se quiser, e por nos reportarmos à França, o Partido Social Democrata não advoga as teses de Séguin nem de Jospin. Aliás, nós preferimos a dicotomia Blair - já que há pouco o líder da sua bancada me disse que era um «blairiano» - e, se quiser, do lado dos conservadores, preferimos o Sr. Kenneth Clark.
Ora, é importante saber o que é que entendem VV. Ex.ª da posição francesa relativamente ao emprego. É que ainda não percebi a necessidade de inscrever o problema do emprego no Tratado.
Obviamente, se todos estamos preocupados com o emprego, se foi feito um livro branco sobre a matéria e as receitas desse livro branco não foram implementadas nem na Europa nem em Portugal -, era necessário avançar com medidas estruturais, a nível micro-económico, para criar emprego de qualidade, isto é, emprego em indústrias não poluidoras, e emprego sustentado. É isso que nos interessa! A nossa preocupação não é a de criar emprego a qualquer preço, porque, senão, importávamos lixo nuclear de outros países europeus e estava resolvido o problema do emprego.
De qualquer forma, parece que o pacto de estabilidade vai ser aceite e, por isso, não houve aqui nenhuma paragem, como alguns grupos podiam fazer crer, porque afinal, o pacto de estabilidade vai mesmo ser aceite na Cimeira de Amsterdão e a CIG vai ser assinada.
Portanto, estamos menos preocupados, mas continuamos a não perceber esta necessidade de inscrever, com palavras, no Tratado, a política de emprego. É que o emprego já lá está e acreditamos que é essencial à coesão europeia porque acreditamos, em primeiro lugar, nas pessoas. Aliás, é por isso que queremos fazer a união monetária, para nos livrarmos dos empecilhos que têm impedido os governantes de olhar para as pessoas. Vivemos, há muitos anos a falar em taxas de juro, vivemos, há muitos anos, a falar em taxas de câmbio, vivemos, há muitos anos, escravos de uma política absurda de turismo do que quer que seja, com vista a satisfazer objectivos mercantilistas da balança de pagamentos, e temos de nos livrar desses empecilhos temos de ir às pessoas.
Sr. Deputado, lembro-lhe o programa do Partido Trabalhista inglês, de que o Sr. Deputado é, de facto, um grande admirador. E a educação, tal como era a paixão deste Governo e deste Primeiro-Ministro, é a única forma de nos tirar do subdesenvolvimento económico e social, é a única forma de preparar Portugal para os desafios da globalização e de uma Europa mais forte, de um Portugal mais coeso.
Por isso, não vejo nenhuma contradição entre avançar rapidamente, sem declarações ambíguas, sem perdas de tempo, contrariamente ao que sucedeu com esta intervenção, infeliz, meu ver, de um Governo socialista mais antiquado. Eventualmente, alguns sectores do seu partido partilharão dessa visão, mas parece-me que não é

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a melhor forma de defender nem os interesses das pessoas, nem os interesses daquilo que congrega as várias famílias europeias, e de que falou aqui o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Presidente: - Para um último pedido de esclarecimentos ao Sr. Deputado Carlos Zorrinho, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Zorrinho, a questão que lhe quero colocar tem a ver com o seguinte: há pouco tempo, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros fez uma afirmação que perfilho, a de que a Europa assenta num compromisso político, mas gostaria de acrescentar que este compromisso político é extremamente desigual. Por exemplo, quando nós falamos em coesão económica e social, em igualização no progresso das condições de vida e de trabalho - que constam dos tratados -, não encontramos listas de medidas, prazos, etc.; quando falamos de mercado interno, aparecem prazos e 300 medidas cuidadosamente listadas para serem adoptadas.
Neste momento, temos a promessa de um capítulo sobre emprego, bem como a promessa da inserção no Tratado do protocolo sobre a Europa social, mas temos a mesma perspectiva; ou seja, quando falamos de moeda única, estão cuidadosamente listadas as medidas, identificados os critérios de convergência, enfim, os prazos parece que são inflexíveis; quando falamos de emprego, de medidas sociais, da Europa social ou da Europa de outro tipo, esta questão não aparece nem é colocada nos mesmos ter-mos.
Ora, neste contexto, o problema que se coloca é exactamente o seguinte: falar em nova esquerda, como fez o Sr. Deputado, tem de significar, no fim de contas, abdicar daquilo que deveriam ser objectivos fundamentais da esquerda e que têm sido permanentemente secundarizados, no âmbito da construção europeia, o que está, mais uma vez, a acontecer.
O Sr. Deputado, com certeza, concordará que, mais uma vez, na revisão do Tratado e naquilo que se está a passar na Europa neste momento, há um compromisso desigual e é exactamente contra esse compromisso que os povos se estão a levantar, em vários movimentos, inclusive através do voto.
Outra questão que quero colocar-lhe, Sr. Deputado, é a seguinte: em grande medida, os critérios de convergência foram cumpridos, em Portugal, com receitas de privatizações. A própria Alemanha, neste momento, para além da tentativa de revalorizar as reservas de ouro, fala em procurar cumprir os critérios por via das privatizações, visto que falhou por outras vias.
A pergunta que lhe faço é a seguinte: depois das privatizações, Sr. Deputado, quais os caminhos que o Governo, que o PS, tenciona adoptar para cumprir os critérios?

O Sr. Primeiro-Ministro (António Guterres): Nacionalizações!...

O Orador: - Pretende aumentar os impostos, como já foi referido pelo Sr. Ministro das Finanças? Pretende cortar investimentos públicos muito mais abertamente? Esta é a questão que se coloca, é a pergunta que está neste momento no espírito de muitos portugueses e estará, com certeza, ainda mais no futuro.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder conjuntamente aos três pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, agradeço a sua pergunta, mas não tenho tempo disponível para o ajudar a resolver a encruzilhada em que o senhor se encontra e em que nós não nos encontramos.
No entanto. quero dizer-lhe que, em relação aos números, há uma imagem particularmente teliz: a economia é como a saúde, ou seja, sente-se quando funciona mal, não se sente quando funciona bem. E é claro que todos os indicadores mostram que a saúde económica no nosso país é extremamente positiva e que há uma sustentabilidade social acrescida em relação à Europa. o que decorre do facto de o Governo português ter começado a aplicar no plano interno o rigor com consciência social, conforme os povos europeus vêm agora exigir, em termos de aplicação, nos seus próprios países.
Por outro lado, quero dizer-lhe que a descrença do povo europeu pode também ser algum momento de encruzilhada mas tem, pelo menos, a vitalidade suficiente para apostar na mudança, o que é um excelente sinal de vitalidade.
Em relação ao comissário, é evidente que entendemos que Portugal deve continuar a ter um comissário, mas mais importante do que essa questão é a questão de garantir a igualdade de tratamento entre todos os Estados membros da União Europeia. É mais importante evitar directórios e, nesse contexto, conseguir ter também o nosso próprio comissário.
Sr. Deputado Francisco Torres, este é, talvez, o melhor momento para poder sublinhar aqui o sentido de responsabilidade com que o Sr. Deputado tem tratado a matéria europeia. O Sr. Deputado tem demonstrado grande coerência, grande convicção, grande coragem. Aliás, quero mesmo dizer-lhe que essa coragem se manifestou ainda recentemente, quando o seu partido, na Lei das Finanças Locais, tentou não cumprir o que hoje aqui defende e tentou criar um obstáculo para que Portugal consiga atingir os objectivos que, no fundo. nos unem e que nos vão levar a votar favoravelmente os projectos de resolução.
Mas o facto de salientar essa sua coerência não faz com que concorde consigo, pelo contrário, concordo muito mais com Jospin do que consigo, embora seja curioso verificar que todas as bancadas da oposição citaram Jospin, enquanto eu citei Blair no início da minha intervenção.
Sr. Deputado, eu, tal como Jospin, não acredito nas virtualidades absolutas do mercado. Acredito que a moeda tem de ser forte, mas não acredito que uma moeda forte gere automaticamente emprego e crescimento. Uma moeda forte é uma condição necessária mas não é uma condição suficiente para conseguir ter equidade, crescimento e emprego. Sabe, Sr. Deputado, foi isso que os europeus disseram, no último mês, em Inglaterra e em França e foi isso que nós percebemos antes de Outubro de 1995.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, Sr. Deputado Luís Sá, de facto, as questões que coloca são extremamente importantes: o capítulo social do emprego tem de ser traduzido em medidas, a discussão da coesão é fundamental para o País. Mas é exactamente porque

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queremos ajudar a traduzir essas opções fundamentais em medidas que agora nos esforçámos e pedimos sacrifícios aos portugueses para estarmos no centro da construção europeia; é exactamente para, nessa circunstância e nesse centro da construção europeia, conseguirmos traduzir essas nossas prioridades em medidas concretas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para a primeira de uma série de intervenções, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira Ramos.

O Sr. Ferreira Ramos (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Hoje, neste agendamento do PP, tivemos ocasião de ouvir o que todos já temíamos.
Assim, a Conferência Intergovernamental será minimalista. Não se dará um passo, um pequeno passo na construção da Europa, que terá obrigatoriamente de manter os parâmetros e vectores iniciais e em que a vontade e determinação dos cidadãos nessa construção é imprescindível. Essa postura, sendo certo que a Europa não é a originariamente pensada pelos seus mentores, essa construção assente na Europa das pátrias e no respeito pela soberania dos Estados e das Nações é a única forma, hoje como sempre, de evitar a repetição dos pesadelos que assolaram este continente.
Não ter enfrentado as questões que hoje se colocam, que hoje se podem já perspectivar; evitar discutir as alterações que o alargamento, unanimemente aceite, irá sem dúvida provocar; não abordar o défice democrático que perpassa toda a eurocracia vigente; não querer ver o crescente fosso entre a opinião pública e o processo de construção europeia, poderá ser para alguns, Burocratas convictos, sinónimo de ponderação, de perspicácia, indiciador de forte capacidade de separar o que é cirurgicamente urgente.
Para nós, para o Partido Popular, bem ao contrário, tal é sintoma de alguma falta de coragem, de algum receio em abordar aquilo que é, que vai ser - sabêmo-lo todos - essencial, determinante, fulcral e estruturante no futuro da Europa, que queremos construir e em que queremos participar.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Recusar liminarmente introduzir alterações que consubstanciem o reconhecimento da igualdade jurídica dos Estados membros, recusar o reforço da legitimidade democrática dos órgãos decisores, recusar a efectivação de mecanismos de controlo dos decisores é uma atitude que contribuirá para a descrença no processo europeu.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Apercebemo-nos, hoje, aqui, já da posição dos restantes partidos que, unanimemente, qualificam a nossa posição com variados, e sempre pouco lisonjeiros, adjectivos e epítetos. Não é, como se sabe, situação nova para nós nem preocupante. Porquê? Porque passado algum tempo, cada vez menos tempo, veremos quem hoje disse o que disse dizer coisa oposta e reconhecer a razão do Partido Popular.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Foi assim em relação ao referendo. Lembram-se, o PS e o PSD, do que disseram em relação a esta matéria? Bem vindos hoje a este desafio que foi lançado pelo Partido Popular.
Será assim, temos disso a certeza, em relação a esta proposta de reflexão acerca da matéria institucional que propomos, acerca da construção da Europa das pátrias e das nações que defendemos. Como também foi assim, interessa recordá-lo, em relação à moeda única, ao SME, aos critérios de convergência e ao Banco Central Europeu.
E aqui, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, interessa sublinhar a ironia de que a única matéria que tinha sido afastada da CIG, a única matéria em que presumivelmente se assistiria ao cumprir da mera formalidade ritual, ao desenrolar do calendário, a certeza indiscutível da moeda única, erigida em desígnio nacional, o milagre anunciado do SME, a inquestionabilidade dos critérios fixistas e irredutíveis, do Pacto de Convergência e Estabilidade transformado em bíblia pelos fervorosos e apressados «maastrichianos», é a única reforma sensível, importante, com relevo, que se pode, razoavelmente, esperar que ocorra neste final do processo CIG, pelo menos tendo em atenção aquilo que a opinião pública europeia espera e discute.
Tal representa pouco e representa muito. Representa pouco porque anuncia, é o prenúncio de várias outras CIG que, em formato mini ou maxi, se repetirão inexoravelmente nos próximos tempos; representa muito porque é um percalço assinalável para os que pretendiam atingir o federalismo político através do governo económico federal europeu.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O repensar da moeda única, dos seus critérios, do calendário, do seu impacto, das suas consequências danosas para o nosso país, recolherá, hoje, aqui, com mais ou menos hipocrisia, com mais ou menos reserva mental, suspeitos apoios.
Numa altura em que está bem presente o conflito entre o Governo alemão e o Bundesbank e a humilhação que o poder económico europeu desferiu ao poder político e à legitimidade democrática; numa altura em que países estão a reflectir (sendo de ponderar se a um país como Portugal seria concedido tal direito);...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP):- Muito bem!

O Orador: - ... num momento em que países da zona para a qual a União se irá alargar se excluem, por livre iniciativa, da moeda única é fácil, é extremamente fácil, usar a capacidade mimética dos partidos do centro esquerda para se aproximarem, com oportunismo, dos novos ventos europeus.
Tal soará sempre a falso. Soará sempre a falso, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, porque durante meses, durante debates consecutivos, o Partido Popular esteve nesta Câmara, sozinho, a .lutar contra a rigidez do processo da moeda única.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Deputados do Partido Popular referiram exaustivamente os custos, ao nível do emprego, do tecido produtivo; descreveram as consequências do cumprimento dos critérios num país com tempo escasso de participação na então Comunidade; apontaram, ponto por ponto, os dados e os números que consagravam que à convergência nominal correspondia uma cada vez mais acentuada divergência real.

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Onde estavam e o que diziam o PS e o PSD? Foi preciso um ministro de outro país dizer que os «critérios eram esquisitos»; foi preciso países num estádio de desenvolvimento maior assumirem a sua impossibilidade do cumprimento rigoroso dos critérios; foi necessário países corri uma participação na União temporalmente superior afirmarem a sua preocupação primordial com os seus cidadãos para os partidos do centro esquerda portuguesa ajustarem o seu discurso.
Não nos interessa, não nos preocupa, que esses partidos sejam mais sensíveis às opiniões, às atitudes de congéneres europeus do que às dos portugueses; o que nos interessa e o que nos preocupa é o que os portugueses sentem, sofrem e pensam. E acerca disso temos a certeza de que os representamos e de que eles - é a eles que nos dirigimos - compreenderão as propostas do Partido Popular e se revêem nas nossas posições.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Uma vez que não há pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Há mais de um ano que a agenda europeia está ocupada com a Conferência intergovernamental, cujos resultados parecem decisivos para o novo alargamento e para o aprofundamento da União Europeia. Entretanto, corre paralelamente o processo da passagem à moeda única e está entre parêntesis o quadro financeiro da Comunidade para depois de 1999. É, pois, mais do que tempo de terminar com a Conferência Intergovernamental e, assim, libertar governos, parlamentos e órgãos da Comunidade para os verdadeiros desafios que se avizinham.
O Partido Socialista foi, e é, o grande partido europeu em Portugal e, por isso, tem particulares responsabilidades no tempo e no modo da participação portuguesa na União Europeia.
Como diz a Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 7.º n.º 6: «Portugal pode, em condições de reciprocidade, com respeito pelo princípio da subsidiariedade e tendo em vista a realização da coesão económica e social, convencionar o exercício em comum dos poderes necessários à construção da união europeia».
A República Portuguesa está assim deveras comprometida com o processo de integração europeia desde que ele se destine à realização de certos objectivos como o da coesão económica e social e à defesa dos direitos humanos, desde os individuais aos sociais, assim como à defesa dos regimes democráticos.
Ora, desde que o muro de Berlim caiu e se decretou a extinção do conflito Leste/Oeste, muitos responsáveis europeus tornaram-se menos sensíveis aos princípios fundamentais consagrados na revolução americana de 1776, na revolução francesa de 1789 e depois, a nível internacional, na Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 e na Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais de Novembro de 1950. Em plena guerra fria e com o estabelecimento da política de blocos, essa defesa dos direitos fundamentais foi um baluarte dos regimes democráticos de tipo ocidental.
Já a Comunidade Europeia, fortificada por toda esta envolvente e então muito contida na sua dimensão política, apenas se refere no preâmbulo do Tratado de Roma à «defesa da paz e da liberdade» e apela aos outros povos da Europa «que partilhara dos seus ideais para que se associem aos seus esforços».
Torna-se. assim, imperioso introduzir novas cláusulas no Tratado da União Europeia sobre os direitos fundamentais, aliás, como consta das proposta inicial do Governo português, presidido por António Guterres.
Deste modo, o Partido Socialista recomenda empenhadamente ao Governo que, nesta fase final da CIG, tudo faça para que se altere o actual artigo F do Tratado da União Europeia, por forma a acentuar que a União Europeia se funda «nos princípios da liberdade, da democracia, do respeito pelos Direitos do Homem e pelas liberdades fundamentais. bem como do Estado de direito». Neste particular, a União Europeia deve recolher a sua inspiração no exemplo do Conselho da Europa.
Caso não seja o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos a instância mais querida pelos decisores da CIG. então deve alterar-se o artigo L do Tratado da União Europeia para permitir o controlo judicial do respeito pelos direitos fundamentais pelo Tribunal de Justiça da Comunidade. Só assim se poderá aprofundar a cooperação nos domínios da Justiça e cios Assuntos Internos, nomeadamente em matérias tão sensíveis como o asilo, a imigração e a cooperação policial.
Também devem ficar previstas no Tratado revisto quer a sanção política quer a sanção judicial para os casos de violação por um ou vários Estados membros, desses princípios fundamentais. Se a sanção política só pode ser aplicada pelo Conselho caso se venha a verificar «a existência de violação grave e persistente de um ou vários dos princípios enunciados», já quanto à sanção judicial ela dever-se-á basear apenas em actos. independentemente da persistência da violação. A entrada de matérias do III Pilar nas políticas comuns não pode fazer baixar o nível dos direitos, liberdades e garantias que se usufrui a nível nacional.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Deste modo. se a escolha dos decisores da CIG recair na atribuição de competências, neste particular, ao Tribunal de Justiça da Comunidade (embora preferíssemos o recurso ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, sediado em Estrasburgo), será então obrigatório alterar o artigo 173.º do Tribunal de Justiça do Luxemburgo. por forma a conferir aos cidadãos europeus. individualmente, o direito de interpor acções perante o Tribunal de Justiça.
O que se passa em variados países da União Europeia, e tendo em conta que o futuro estabelecimento cia moeda única pode implicar grandes deslocações de mão-de-obra, será avisado estender às disposições relativas à cooperação no domínio da Justiça e dos Assuntos Internos, à luta contra a discriminação, o racismo e os actos de xenofobia dentro do mais franco espírito de reciprocidade.
Sr. Primeiro-Ministro, calculo como serão difíceis e exigentes as negociações de última hora na CIG, dentro daquela metodologia que pode levar à assinatura de um documento menos bom para evitar os chamados fracassos de última hora, sobretudo, quando alguns dos temas mais importantes e delicados estão em aberto para decisão a nível do Primeiro-Ministro e Ministro dos Negócios Estrangeiros. Estou consciente da apertada margem de manobra que a metodologia implica.

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Deixe-me, porém, falar-lhe agora como Deputado socialista, eleito pelos Açores.
Para além da consagração jurídica das regiões insulares ultraperiféricas, que parece adquirida no n.º 2 do artigo 227.º, é da mais elementar justiça que os propósitos de desenvolvimento económico e social dessas regiões se venham a caracterizar por um mais eficaz instrumento financeiro. Qualquer protocolo que venha a ser anexado ao Tratado revisto só pode ter esta leitura, à qual a sua redacção deve corresponder. Não pretendemos uma mera satisfação formal e, neste caso como noutros, o que conta são os objectivos a atingir.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O que reclamam, então, os cidadãos europeus dos seus governos nacionais e das instituições comunitárias?
Mais transparência nas decisões e garantias quanto aos objectivos Finais da União Europeia. Queremos garantias quanto à defesa da democracia política e dos direitos fundamentais; queremos garantias quanto ao respeito por todos os Estados membros; queremos garantias quanto ao modelo social europeu e à aplicação da Carta Social Europeia; queremos garantias de igualdade entre homens e mulheres; queremos garantias quanto à coesão económica e social; queremos garantias quanto à manutenção do objectivo da moeda única a curto prazo; queremos garantias quanto à subordinação do poder económico ao poder político democrático a nível nacional e a nível da União Europeia; querermos garantias de que a União Europeia se rege pelos princípios análogos ao do Estado de direito democrático.
Daí, a importância que damos à próxima revisão do Tratado de Maastricht. Mais do que nunca, é preciso lutar pela União Europeia, fora da lógica dos Estados hegemónicos. Queremos, pois, mais transparência na tomada de decisões europeias.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Não havendo pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Mota Amaral.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros e Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Não podia ser mais oportuna a discussão, no Parlamento, das grandes questões europeias em véspera do Conselho Europeu, a realizar em Amsterdão na próxima semana, donde se esperam, com ansiedade, em todos os países membros, decisões deveras importantes.
Avulta em todas clãs a viabilização da moeda única, mediante a ratificação do pacto de estabilidade. Sobre este assunto já se falou aqui bastante. Quero, porém, solidarizar-me expressamente com as preocupações do Primeiro-Ministro de Portugal acerca do magno problema do desemprego e da necessidade de harmonizar o projecto estruturante do euro com uma resposta imediata aos milhões e milhões de cidadãos, homens e mulheres desempregados, em todos os países da União Europeia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O monetarismo e o poder do dinheiro, que através dele se exprime e fortalece, não podem vencer a visão personalista da política amplamente partilhada nesta Câmara, à qual os governantes devem subordinar a acção do Estado para a realização de um dos fins deste, que é a justiça social. Não consentiremos na derrota da pessoa humana, na sua instrumentalização e exploração. Como expressão da sua dignidade, o trabalho é um direito, um direito à afirmação das próprias capacidades, à realização pessoal, à felicidade, que não se satisfaz com subsídios de desemprego, por mais quantiosos que eles sejam. E a União Europeia não pode ficar cega, surda e muda perante a onda crescente de desemprego e de desespero, que está varrendo o nosso continente e que ameaça rebentar numa grave convulsão social.
Sr. Primeiro-Ministro, quando erguer a voz e exigir sobre esta matéria, à mesa da Cimeira de Amsterdão, caiba que tem a Assembleia da República e o próprio País a dar-lhe apoio.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: As conclusões da Conferência Intergovernamental são outro terna maior do Conselho Europeu na próxima semana. Na revisão do Tratado da União Europeia, Portugal tem, para além de muitos interesses de ordem geral, que, de resto, foram aqui mencionados na intervenção que fez o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, um interesse muito particular e próprio a defender. Refiro-me à introdução de um preceito novo e especificamente destinado a dar o necessário fundamento jurídico às regras definidoras do estatuto peculiar das regiões ultraperiféricas da União, propiciando a modelação das políticas comunitárias, em matérias para elas decisivas, como a agricultura, pescas, transportes, a energia, entre outras, e ainda a mobilização dos recursos financeiros adequados.
Fica aqui já o alerta a V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, e aos membros da delegação portuguesa à Cimeira de Amsterdão. Não basta. para responder aos problemas das nossas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, uma qualquer declaração anexa ao Tratado, menos ainda se for acompanhada de expressões restritivas quanto aos objectivos apontados.
O Tratado de Maastricht inclui já uma disposição deste género, contendo até o compromisso decisivo, de que importa não abdicar, sobre o envolvimento da União na garantia aos povos das regiões ultraperiféricas de condições de vida correspondentes às médias comunitárias.
Foi dado, assim, um passo em frente relativamente à participação dos Açores e da Madeira, bem como das outras regiões ultraperiféricas, as Canárias e os departamentos franceses do Ultramar (Guiana, Martinica, Guadalupe), no esforço colectivo de construção europeia. Desde o protocolo anexo ao Tratado de Lisboa, que consagrou a adesão de Portugal às Comunidades, destinado a afirmar a especificidade dos problemas dos arquipélagos portugueses do Atlântico até ao Tratado de Maastricht foi feito um longo caminho, desde logo, em ternos de consolidação com ajudas comunitárias do processo de desenvolvimento dos Açores e da Madeira, partindo de referências de atraso realmente vergonhosas. Mas também no que diz respeito a uma crescente consciencialização pan-insular no seio da Europa, que aproximou e levou ao diálogo e à colaboração regiões muito afastadas e diferentes entre si, porém, padecendo de problemas de natureza análoga.
No termo de um esforço de quase duas décadas, iniciado no seio do Conselho da Europa, com a realização das conferências das ilhas europeias, tendo em vista inscrever a questão do desenvolvimento das ilhas como uma questão de justiça na agenda política europeia, chega a hora da resposta decisiva por parte dos mais altos responsáveis da União.

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As limitações das regiões ultraperiféricas resultam da geografia e são, por isso mesmo. permanentes e estruturais. A solução dos problemas inerentes à consolidação nessas parcelas tão remotas de sociedades moldadas segundo os padrões europeus requer um quadro referencial de soluções estável. A União Europeia não pode olhar com displicência para as suas regiões mais remotas como se fossem, afinal, um peso implorável. Que fique bem claro - e falo como insular - que não nos consideramos agentes passivos da benemerência alheia mas cidadãos de parte inteira dos nossos próprios países e da nova Europa livre e democrática, culturalmente plural e na ponta do progresso, cujo poder, afinal, projectamos pelo mar adentro nas sete partidas da Terra.
Dificilmente, por isso, se compreende a atitude fechada dos governos de alguns Estados membros, nomeadamente a Alemanha e o Reino Unido, aos quais recentemente se somou o Luxemburgo, relativamente às justas reivindicações das regiões ultraperiféricas.
De resto, quero aqui assinalar também que sobre essa matéria, da parte do Governo português, as diligências têm sido constantes - aliás, no seguimento da linha de rumo seguida pelo anterior Governo - e só tenho palavras de louvor a apresentar aos responsáveis do Governo da República.
A experiência da aplicação do Tratado de Maastricht revelou a necessidade absoluta de dar outra força jurídica aos princípios já consagrados quanto à inserção das economias das regiões ultraperiféricas no grande mercado interior que caracteriza a União Europeia. A proposta de resolução apresentada neste debate pelo PSD formula este problema em termos precisos e bem merece por isso também a aprovação da Assembleia da República. O empenho do PSD nessas matérias vem já de há muito tempo e agora mesmo nas instâncias partidárias europeias em que participamos estamos a fazer tudo o que está ao nosso alcance por esse importante objectivo de interesse nacional e europeu.
O mesmo tem sido reclamado com persistência e unanimemente pela Conferência dos Presidentes das Regiões Ultraperiféricas da União Europeia, inclusivamente na sua última reunião, que teve lugar já depois das recentes eleições realizadas nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
Dá-me especial satisfação verificar que a doutrina para cuja elaboração dei o meu contributo mantém a sua validade e é reconhecida pelos governantes insulares europeus. Assim encontre ela, agora, o merecido eco em Amsterdão. Contamos para isso com o seu empenho, Sr. Primeiro-Ministro, e também do Ministro dos Negócios Estrangeiros, açoriano como eu e velho amigo. Boa sorte.

Aplausos do PSD e de Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma nova intervenção, a palavra ao Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Partido Popular apresenta hoje à Assembleia da República um conjunto de propostas, inovadoras, de alteração ao Tratado da União Europeia. Quando as anunciámos alguns políticos e comentadores e até hoje aqui alguns Deputados, fiéis aplicadores em Portugal do pensamento único produzido em Bruxelas, disseram que se tratava de ideias e de propostas sem futuro e votadas ao insucesso. Gente apressada. Gente demasiado apressada.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em 1992, o CDS propôs um referendo ao Tratado de Maastricht e convém talvez recordar aquilo que se disse na altura.
Começo pelo então Ministro dos Assuntos Parlamentares, Dr. Marques Mendes, que no Jornal de Notícias, de 8 de Maio de 1992, dizia: «(...) O referendo é um instrumento que deve ser usado com parcimónia e apenas para aquelas matérias em que seja legítimo ter dúvidas sobre o sentir da maioria dos portugueses. Ora acontece que, como é público e notório, e designadamente em matéria de representação parlamentar, existe uma esmagadora maioria de opiniões favoráveis à ratificação do Tratado de Maastricht, não se tratando, pois, de uma matéria polémica na sociedade portuguesa. Porque então polemizar o que não é polémico?» E acrescentava ser contra o referendo.
O Dr. Luís Filipe Menezes, na altura Secretário de Estado do Dr. Marques Mendes, no Público, de 13 de Junho de 1992, também dizia que era contra o referendo porque o «seu sentido útil» só se justificaria se «na sociedade portuguesa houvesse algum partido declaradamente antieuropeísta».
O Professor João de Deus Pinheiro, ainda hoje Comissário Europeu e na altura Ministro dos Negócios Estrangeiros, dizia ao Jornal de Notícias, de 8 de Maio de 1992: «Não se justifica o esforço para organizar um referendo» «(...) A maioria dos partidos concorda com Maastricht, o que torna excessivo pensar-se num referendo».
O Deputado António Guterres dizia, no Público, de 4 de Junho de 1992, que: «(...) O PS considera que o regime português não deve ser plebiscitário e que não deve haver referendos sobre matérias constitucionais ou sobre tratados internacionais estruturantes».

Risos do CDS-PP.

O Dr. Almeida Santos, então também Deputado do PS, no Expresso, de 30 de Maio. prudentemente, dizia: «(...). Ora nós somos um partido de poder e aceitando o referendo sobre Maastricht agora arriscamo-nos a semear dificuldades para um futuro governo PS». Enganou-se, Sr. Dr. Almeida Santos!

Risos do CDS-PP.

E, em O Jornal, acrescentava: «(...) Tratado vasto. Tratado complexo. Matéria para peritos, não para indiferentes ou sequer iniciados».
O Dr. José Lamego, então Deputado do PS, e actual Secretário de Estado do Ministro dos Negócios Estrangeiros, no Expresso, de 5 de Setembro de 1992, usava um argumento cavaquista: «(...) Defender um referendo em Portugal seria introduzir nas questões europeias uma dose de imprevisibilidade que não só diminuiria a capacidade de negociação do Estado português como traria consequências irremediáveis ao projecto de modernização do país».
Mas, pasme-se!, até o Dr. Octávio Teixeira, no Público, de 30 de Maio de 1992, dizia: « (...) Sempre fomos contra a realização dum referendo sobre Maastricht que continuamos a considerar inconstitucional(...)».

Risos do CDS-PP.

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O pior é que até a ala direita do PCP esteve presente. Dizia o Deputado Luís Sá, no Público, de 16 de Maio de 1992: «(...) Pronunciamo-nos contra qualquer alteração do estatuto constitucional do referendo que diminua as cautelas com que foi consagrado e contra precedentes que abram caminho à possibilidade da sua utilização contra a Constituição da República Portuguesa e o regime».

Risos do CDS-PP.

Convém também recordar que o PS, o PSD e o PCP, votaram todos contra uma alteração extraordinária da Constituição da República Portuguesa, proposta pelo CDS, para permitir esse referendo em 1992. Sr. Deputado Carlos Encarnação, o arrependimento não justifica a amnésia. Por isso é bom que critiquem as propostas do PP, é sinal que daqui a cinco anos estão connosco, como estão hoje. Essa foi a primeira batalha ideológica que ganhámos, foi a de tornar o referendo possível. Esperamos que o PS e o PSD se despachem na revisão constitucional para que ele, desta vez, seja mesmo possível.
Mas há outro problema na Europa neste momento. Esse problema é o do discurso duplo dos políticos. Um dos males que tem contribuído para a desconfiança dos cidadãos em relação a esta Europa é a linguagem dupla dos políticos em relação aos problemas sociais, económicos e políticos que a política bruxelense gerou. Também em Portugal há políticos com essa linguagem dupla.
Vejamos o que detende o Partido Popular Europeu para a Europa: «O Partido Popular Europeu é um partido federal e transnacional» - está escrito no seu manifesto para as eleições europeias de 1994. Defende «a elaboração de uma constituição europeia» e que «somente por uma estrutura federal a União Europeia pode garantir o respeito das identidades regionais». E nos seus Estatutos - os senhores do PSD devem tê-los lido antes de entrar - está escrito que o objectivo do PPE é (artigo 2.º) «prosseguir o processo de integração federal na Europa». Por outro lado, o PPE tem um projecto de constituição federal para a Europa que defende o seguinte: decisões por maioria qualificada em todas as matérias dos tratados; redução do número de comissários (como o Professor Marcelo Rebelo de Sousa sabe porque foi chamado a Bruxelas para lhe explicarem isso);...

Risos do CDS-PP.

Vozes do PSD: - Não, não!

O Orador: - ... investidura da Comissão pelo Parlamento Europeu; fazer da Comissão um governo europeu. E mais: o Partido Popular Europeu quer que «(...) a intervenção das forças de segurança europeias seja sujeita a decisão maioritária do Parlamento Europeu».
Ora isto é muito preocupante porque no Parlamento Europeu o PSD tem um Deputado, o Eng.º Carlos Pimenta; que, em O Primeiro de Janeiro, de 4 de Março de 1989, diz o seguinte: «comporto-me no Parlamento Europeu como um sócio da "Europa, S. A. R. L"»;

Risos do CDS-PP.

Srs. Deputados do PSD, é inadmissível que se firmem princípios em Portugal e nesta tribuna, completamente distintos daquilo que se aceita e se vota em Bruxelas! Lamentamos a adesão do PSD ao federalismo. Num momento em que por toda a Europa a opinião pública se manifesta cada vez mais favorável a uma união de Estados livres e soberanos e em que a abertura indiscriminada de fronteiras a todo o mundo prejudica países como o nosso, não entendemos como pode o PSD perder a sua firmeza e ceder à tentação de se aliar a quem não acredita na Europa das Nações. Afinal em que é que ficamos?!
O Sr. Deputado Carlos Encarnação esqueceu-se de dizer isto tudo e é por isso que me sinto na obrigação de explicar melhor qual é a política europeia do PSD neste momento. O que o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, vice-presidente do PPE, vice-presidente do Sr. Kohl, vice-presidente do federalismo europeu, quer é que as decisões sejam cada vez mais adoptadas por maioria no Conselho de Ministros, é que a Comissão Europeia tenha cada vez mais poderes e menos comissários, é que a política de defesa nacional passe para a esfera comunitária, como propõe o PPE! E que o Parlamento Europeu tenha ainda mais poderes do que aqueles que actualmente dispõe, como também propõe o PPE.
Vi o Sr. Deputado Carlos Coelho levantar o braço há pouco e faço um aviso que se estende também ao Sr. Deputado Carlos Encarnação: tenham cuidado com os pedidos de esclarecimento, pois podem ser chamados a Bruxelas para prestar contas do que agora me vão perguntar. E a viagem de avião é cara!

Aplausos e risos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Jorge Ferreira, os Srs. Deputados Luís Sá, Medeiros Ferreira e Carlos Encarnação. Mas, como o Sr. Deputado Jorge Ferreira não dispõe de tempo, será que os interpelantes lhe cedem tempo para as respostas?

Pausa.

Sendo assim, o Sr. Deputado Jorge Ferreira disporá de três minutos para responder.
A palavra ao Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, quero felicita-lo pelo momento de bom humor que aqui trouxe, que foi oportuno, mas a minha questão é a seguinte: não se deu ao trabalho - e por que é que não se deu - de juntar às citações que fez do Deputado Octávio Teixeira e minhas outras que, designadamente no âmbito da revisão extraordinária da Constituição da República Portuguesa de 1993, defenderam a viabilização de um referendo sobre a União Económica e Monetária. Acontece que em 1992, quando a questão foi colocada, não estava aberto o processo de revisão constitucional e é óbvio que se tinha que dizer que a questão era inconstitucional. Uma vez este processo aberto e desenhada uma vontade política para ratificar o Tratado, claro que a questão não se colocou nos mesmos termos. Por isso mesmo, creio que não houve propriamente uma incoerência, houve, sim, momentos políticos diferentes. Aliás, o Sr. Deputado bem conhece que nesta matéria, desde 1993, a defesa de um referendo sobre a moeda única por parte do meu partido e do seu grupo parlamentar tem sido constante.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - A palavra, para formular um pedido de esclarecimento, ao Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, fez o mesmo trabalho de casa para aquelas entidades que defenderam o referendo sobre a questão europeia antes de 1992 e depois de 1992?

O Sr. Presidente: - Apalavra, para formular um pedido de esclarecimento, ao Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, estou admirado com o trabalho enorme que V. Ex.ª teve e estou muito satisfeito pela alegria que lhe demos. V. Ex.ª teve a oportunidade de brilhar naquela tribuna fazendo essas citações todas, que foram muitas, que foram extensíssimas, devem ter dado um trabalhão doido para cotejar todos aqueles jornais, aquelas revistas, aquelas publicações! V. Ex.ª fez uma enorme intervenção «citativa», mas quero responder-lhe com três pequenas e brevíssimas observações. Primeira questão: aderimos ao PPE com uma ressalva explícita em relação à questão do federalismo que foi aceite pelo PPE e declarada por nós, que afirmámos que não aceitaríamos o federalismo tal como estava inscrito no PPE. E o PPE aceitou.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - São vice-presidentes!

O Orador: - E somos vice-presidentes.
Segunda questão: a do referendo. Simplicíssimo: o PSD, como o PS, aliás, foi contra o referendo e agora é a favor, mas isso devia ser motivo de júbilo para si.

Vozes do CDS-PP: - E é!

O Orador: - E cumprimentamo-lo por isso. O senhor satisfez o seu destino histórico, ganhou nessa batalha.

Aplausos do Sr. Deputado do CDS-PP Luís Queiró.

Mas esqueceu-se de uma pequena coisa que aí tem uma grande diferença em relação a nós: nós, desde 1992, somos a favor da moeda única. V. Ex.ª podia ter citado tanta coisa bonita acerca disso! Podia ter citado tanta coisa bonita da parte do seu partido contra, mas aí absteve-se. V. Ex.ª tem razão: somos a favor do referendo, queremos os portugueses a favor da moeda única, somos a favor da moeda única. Em relação ao PPE está esclarecidíssima a situação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Apalavra ao Sr. Deputado Jorge Ferreira, para responder aos três pedidos de esclarecimento.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, agradeço o tempo cedido pelos outros grupos parlamentares, quer para a intervenção quer para poder, rápida e brevemente, responder a estes pedidos de esclarecimentos.
Sr. Deputado Luís Sá, confirmo, tem razão, VV. Ex.as mudaram todos de opinião até o Dr. Álvaro Cunhal de quem também tenho algumas citações que neste momento julgo não ter interesse referir. Todavia, o ponto é que aquilo que os senhores, em 1992, votaram contra foi precisamente a abertura da possibilidade constitucional de se poder fazer o referendo. É isso mesmo. Também nisso mudaram. Parabéns, felicidades, sejam bem vindos, como de resto todos os outros partidos que mudaram nessa matéria. Por isso é que o PP ganhou essa batalha do referendo. É por isso que acho que tem que haver mais prudência da vossa parte quando hoje criticam propostas do PP.
Aliás, há um bonecos humorísticos num canal de televisão em que alguns ministros, há algum tempo, diziam para o Primeiro-Ministro: «Cuidado, nós há cinco anos, também éramos contra o referendo; veja lá o que vai dizer agora das propostas do Sr. Dr. Monteiro!»...

Risos do CDS-PP.

Sr. Deputado Medeiros Ferreira, é verdade que ainda não fiz todo o trabalho de casa mas como vai haver mais debates sobre a Europa. E no próximo V. Ex.ª terá oportunidade de ouvir o resto, pois, como compreenderá, não podemos «gastar os cartuchos» todos de uma só vez.

Risos do CDS-PP.

Sr. Deputado Carlos Encarnação, agora um pouco mais a sério porque parece que a amnésia nessa bancada é maior do que nas outras, solicito-lhe, de forma interessada do ponto de vista do estudo da ciência política, que me forneça a formalização dessa ressalva que diz, e eu acredito, que o seu partido obteve relativamente àquele partido europeu que adora a liberdade de pensamento, aceita a diversidade de opinião, não tem nada a mania de dar ordens a ninguém, não tem nada desses tiques!...

Risos do CDS-PP.

Acho interessante, do ponto de vista da ciência política, esse documento e, portanto, muito sinceramente, agradeço que me forneça um exemplar.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Mas com toda a certeza.

O Orador: - É que o meu pedido tem uma razão de ser e não é só para estudar do ponto de vista da ciência política. É que da próxima vez que o Dr. Marcelo for chamado a Bruxelas nós próprios prestaremos o serviço de lembrar ao PPE que eles assinaram uma ressalva convosco para vos permitir ter opinião, o que, como sabe não é muito vulgar naquele partido.

Risos do CDS-PP.

Quanto ao mais. Sr. Deputado, o problema é só um. VV. Ex.as, em 1992, enganaram-se todos. Paciência... Errar é humano. Hoje concordam connosco. Só quis dizer o seguinte: da próxima vez, poupem uns aninhos ao pai, porque não temos muito tempo, e concordem connosco mais cedo.

Aplausos e risos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Apalavra, para uma intervenção, à Sr.ª Deputada Maria Carrilho.

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A Sr.ª Maria Carrilho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Através da Conferência Intergovernamental, a União Europeia está a tentar dotar-se de instrumentos monetários, económicos e sociais, com tradução institucional - que são fundamentais para a sua coesão e para o êxito do seu futuro, na globalidade do sistema internacional. A União Europeia cresceu de 12 para 15 membros e prepara-se ainda para crescer, integrando novos países do centro-leste da Europa.
Acabam também de ser lançadas as bases para uma cooperação e segurança mútuas entre os que foram, até há poucos anos, dois blocos antagónicos.
No entanto, estamos na véspera de formalizações decisivas e todos aguardamos com alguma emoção o que vai exactamente acontecer nos próximos dias e semanas: o Conselho Europeu de Amsterdão e a cimeira da NATO em Madrid.
Os temas de alcance económico e social que hoje se encontram no centro das atenções foram já suficientemente abordados.
Cabe-me chamar a atenção para outros aspectos, menos urgentes mas igualmente fundamentais e decisivos: são os que têm a ver com a política exterior da União e a construção de um espaço geopolítico e geo-económico de segurança. São imprescindíveis para a projecção da Europa na globalidade mundial, mas também têm fortes reflexos no espaço intracomunitário de segurança interna.
Neste momento, mais do que nunca, convirá recordar que a esfera definida no Título V do Tratado da União Europeia, em 1992, como Política Exterior e de Segurança Comum tem sido das mais difíceis de concretizar ao longo da história da ideia europeia depois da Segunda Guerra Mundial, o que é, aparentemente, paradoxal, pois as questões de política externa e de segurança são as que mais directamente se ligam ao desígnio que impulsionou o início da construção europeia: nunca mais repetir a experiência de uma guerra entre os países europeus. Aliás, o caminho que garantiu a paz na Europa durante meio século não foi directo e linear mas, sim, cheio de curvas e desvios, como acontece quando é preciso chegar ao cimo de uma difícil montanha.
Convirá recordar, aos que gostariam de ver tudo e já e nos quais me incluiria, se fosse possível -, que tentativas precoces de acesso directo ao objectivo da coesão europeia, ou seja, da construção acelerada da confiança necessária à paz, fracassaram. Foi inicialmente, em 1948, o caso da União Europeia Ocidental.
Anos mais tarde, em 1954, a tentativa de construir uma Comunidade Europeia de Defesa falhou claramente, na sequência de uma votação no Parlamento francês.
A distância, é quase fácil dizer que os projectos, generosos mas voluntaristas, de criar uma estrutura europeia de defesa não podiam nessa época resultar, por duas ordens de razões.
Em primeiro lugar, não havia lugar para uma terceira força, não havia espaço geo-estratégico entre os dois grandes contendores da guerra fria.
Em segundo lugar, não havia, nessa altura, confiança entre os próprios países europeus ,interessados nos objectivos de paz e segurança na Europa.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Como se sabe, as feridas da guerra são de todas as mais difíceis, porque, para cicatrizar, não levam anos de uma vida, levam gerações.
Agora, começam a estar no poder, na Europa, as gerações que não passaram pela guerra e também as forças políticas que sempre compreenderam que a melhor forma de promover as capacidades nacionais não é através do nacionalismo mais ou menos fundamentalista mas, sim, da cooperação internacional, capaz de afastar os maus agouros dos que falam em «choques de civilizações».
A confiança entre os países europeus foi sendo construída ao longo de décadas. Desapareceu o inimigo ideologicamente traduzido a Leste, mas, perante uma situação do sistema internacional que um grande especialista norte-americano referiu recentemente como fluida, a Europa não pode descurar a esfera da política exterior e de segurança. Esta evidência tem vindo a ser objecto de várias acções e tentativas.
É o Tratado de Maastricht que, pela primeira vez, contém um título intitulado especificamente Política Externa e de Segurança Comum, que alguns consideraram até muito ousado.
O texto que resultou da discussão havida ao longo desta CIG não se afasta sensivelmente do espírito e da letra de Maastricht, nesta área.
Os princípios e a formulação final que o Governo português vai defender, e que o PS apoia com toda a sua força, encontram-se, aliás, delineados nas propostas inicialmente apresentadas aos portugueses e estão em consonância com a tendência que veio a afirmar-se no seio da União: o reforço realista da PESC.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Quer isto dizer que se parte implicitamente da reafirmação estratégica do papel da NATO enquanto estrutura euro-atlântica de segurança e que explicitamente se procura tirar partido de estruturas e mecanismos processuais já existentes.
Assim, a União Europeia deverá promover uma articulação institucional e política mais estreita com a UEO, no quadro da elaboração, em curso, da identidade europeia de defesa e segurança. Poderão, assim, ser potenciadas as capacidades operacionais da UEO no sentido da concretização das missões definidas em Petersberg - acções humanitárias, missões de manutenção e promoção da paz, gestão de crises -, de forma a conseguir uma resposta rápida a situações que dizem respeito, especificamente, aos países europeus.
Para essas missões, que podem apresentar aspectos militares, a NATO declarou-se disposta a cooperar com meios que lhe são próprios. De forma a tornar mais efectiva a capacidade de concertação europeia em termos de política internacional, está também previsto que a presidência seja assistida pelo Secretário-Geral do Conselho, que desempenhará a função de Alto Representante para a PESC.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, queira terminar.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Nesta área, muito mais haveria a dizer. Sublinhe-se, finalmente, que os pontos de vista de cada um, sejam eles forças políticas ou países, beneficiam, muitas vezes, da procura de objectivos comuns.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Caros Deputados: Hoje, voltam a ser pertinentes as palavras de um dos fundadores da Europa, Jean Monnet, com as quais termino a minha intervenção: «Os nossos

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povos devem aprender a viver juntos, com regras e instituições comuns, livremente consentidas, se quiserem conseguir as dimensões necessárias ao seu progresso e se quiserem ser donos do seu destino. As nações soberanas já não constituem o quadro privilegiado em que se podem resolver os problemas do presente(...)».

O Sr. Presidente: - Sr ª Deputada, queira terminar.

A Oradora: - Não corte a palavra a Jean Monnet, por favor.
«(...) E a Comunidade ela própria é uma etapa em direcção a formas de organização do mundo de amanhã onde não queremos coligar Estados mas unir as pessoas».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (António Guterres): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero começar a minha intervenção reafirmando a profunda convicção europeísta do Governo, o nosso claro empenhamento na unidade europeia e no destino europeu de Portugal. Esta convicção europeísta não é, no entanto, cega, pretendendo, antes, ser lúcida. E a lucidez obriga-nos a olhar hoje para a Europa e para os europeus, para as pessoas que constituem a Europa, e a reconhecer nelas dúvidas, preocupações e perplexidades.
Os cidadãos europeus interpelam-nos, hoje, sobretudo, a respeito de duas matérias e exigem da Europa uma resposta em dois domínios: no do emprego e no da segurança, tanto segurança física, contra o crime e o tráfico de droga, como segurança colectiva, na criação de condições para a paz e a estabilidade.
O que o Governo português vai procurar fazer em Amsterdão é contribuir para dar respostas concretas a estas duas inquietações e, ao mesmo tempo, afirmar Portugal no centro do processo de construção europeia, da sua transformação no sentido de uma Europa cada vez mais forte, mais unida e socialmente mais justa.
Quero afirmar-vos com clareza que considero a União Europeia um dado indispensável no actual processo de globalização dos mercados e das economias para a defesa do interesse nacional.
Há duas alternativas básicas de organização da Europa face a essa globalização dos mercados: a primeira, já hoje aqui citada pelo Deputado Luís Queiró, é a da Sr.ª Thatcher. Fundamentalmente, traduz-se na organização da Europa como uma zona de comércio livre com uma cooperação intergovernamental.
Sejamos claros: numa Europa organizada como zona de comércio livre e cooperação intergovernamental, os países com menores recursos, mais pobres ou periféricos, como o nosso, seriam inevitavelmente esmagados na lógica de uma globalização dos mercados internacionais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Podemos, muitas vezes, estar insatisfeitos com o grau de protecção que a construção política europeia até hoje nos tem dado em muitas matérias, mas só pelo caminho do fortalecimento das instituições europeias e da criação da Europa como um espaço de integração política, económica e social nos poderemos defender face a um mercado globalizado. A lógica do comércio livre e da cooperação intergovernamental seria uma lógica suicidária para Portugal, geradora de pobreza, de desemprego e de mal-estar social.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Apostura do Governo português em Amsterdão terá, naturalmente, a ver com a Conferência Intergovernamental para alteração do Tratado e também com a União Económica e Monetária.
Quero tornar muito claro que o Governo português não vai estar em Amsterdão na perspectiva sindical de quem tem uma leitura restrita do interesse nacional e se bate apenas pelos pontos concretos dessa leitura. O Governo português vai procurar, em Amsterdão, estar presente com a sua visão, que espero seja em grande parte a visão maioritária desta Câmara, sobre o futuro da Europa e o que queremos para a Europa, com a consciência de que a melhor maneira de defender o interesse nacional não é limitando-nos ao particularismo deste ou daquele tema que nos diz respeito mas, sim, integrando-o numa visão dinâmica, de construção da Europa, em que Portugal se possa afirmar de uma forma cada vez mais visível e com uma voz cada vez mais ouvida por todos.
Queremos defender o interesse nacional, mas entendemos que este passa por mais Europa e queremos que esse seja o resultado de Amsterdão.
Mais Europa, em primeiro lugar, nos domínios da justiça e dos assuntos internos. Isso tem a ver com o problema essencial da insegurança dos cidadãos em relação ao crime organizado internacionalmente, destacando-se o tráfico de droga, também ele organizado internacionalmente.
Desejamos que em Amsterdão se dê - e lamentamos que porventura não estejam ainda reunidas as condições para se ir suficientemente longe - um passo decisivo no sentido de integrar na competência europeia muito do que é hoje apenas competência nacional, ou, pelo menos, no sentido de criar mecanismos muito mais eficazes de cooperação intergovernamental no combate a estes flagelos das nossas sociedades.
Mais Europa contra o crime, porque este não é nacional mas, sim, internacional: mais Europa contra o tráfico de droga, porque ele não é nacional mas, sim, internacional;...

Aplausos do PS.

.., mais Europa na política externa e de segurança comum, porque temos de confessar que a Europa ainda hoje não é capaz de garantir a paz e a estabilidade, por si só, no interior do seu continente.
O exemplo da Bósnia foi disso claríssima prova. Só foi possível garantir na Bósnia condições de paz no momento em que ficou assegurado o envolvimento dos Estados Unidos da América. E esta é uma verdade indesmentível. Os Estados Unidos da América são hoje uma presença indispensável para assegurar a paz e a estabilidade no quadro europeu. Por isso, independentemente de vermos com agrado a comunidade atlântica e o seu desenvolvimento, é indiscutível que há um défice político europeu de afirmação na garantia da sua própria segurança, no quadro da evolução das relações internacionais.
Queremos mais Europa na política externa e de segurança comum e só ternos pena de que não estejam ainda criadas as condições para que seja possível ir tão longe quanto desejamos.

Aplausos do PS.

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Tive ocasião, recentemente, na Assembleia da União da Europa Ocidental, de exprimir o nosso figurino em relação às questões de segurança em que estamos inseridos. Ele passa pelo carácter desejável do reforço do pilar europeu da Aliança e da identidade europeia de defesa e de segurança, que em nosso entender deveria levar, desejavelmente, à integração a prazo da União da Europa Ocidental na União Europeia, o que reconhecemos não ser possível garantir neste momento. Esse pilar não deve destinar-se a substituir a NATO mas, sim, a reforçá-la como a Aliança que historicamente teve maior êxito na vida dos povos. Ou seja, uma Aliança que foi capaz de proteger a segurança dos países europeus sem disparar um tiro e que foi capaz não de derrotar os seus adversários mas de os levar a abdicar das suas posições e de os levar a transformar-se de adversários em parceiros, pela sua própria reforma interior. Foi uma Aliança que não venceu mas convenceu aqueles que constituíram o Pacto de Varsóvia e hoje pretendem aderir à própria NATO ou com ela relacionar-se.

Aplausos do PS.

Queremos que a NATO estabeleça uma relação com a Rússia e a Ucrânia que, desejavelmente - apesar de sabemos que isso não é possível a curto prazo -, deve evoluir para uma aliança e, finalmente, tudo isto deve ser integrado num anel de segurança que vá do Estreito de Bering ao Estreito de Bering, a que, felizmente, foi possível dar fundamento na recente reunião de Sintra, com o Conselho Euro-atlântico de Parceria que foi constituído.
Neste modelo, é vital dar força à união política europeia; neste modelo, é vital dar voz à capacidade de os europeus se exprimirem em conjunto.
Mais Europa também no plano social, fundamentalmente no que respeita ao emprego. É extremamente importante que um capítulo ou um título do emprego seja inscrito no Tratado, embora isso não chegue e esse título não seja, porventura, tão ousado com desejaríamos. De igual modo, é importante incorporar no Tratado aquilo que era apenas um protocolo em matéria de direitos sociais, o combate à exclusão social e a perspectiva dos direitos humanos e da sua salvaguarda.
Temos consciência de que o Tratado, só por si, não resolve as coisas. Disse-o uma vez e repito-o: não é um Tratado que cria postos de trabalho, mas é uma condição indispensável para permitir um progresso no sentido que considero essencial para a defesa do bem-estar dos cidadãos europeus.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É neste quadro que queremos também uma Europa que funcione, que não esteja e não viva paralisada.
Muitas vezes, discute-se a questão da soberania de uma for-ma que me parece profundamente enviesada. Permito-me dar um exemplo no que diz respeito às decisões por maioria qualificada. Muitos dos que mais se têm batido contra as decisões por maioria qualificada, vêm agora reclamar que, nas matérias que são do seu interesse, essas decisões assim sejam. Por exemplo, em matéria social, entende ou não o Partido Comunista que deve haver decisões por maioria qualificada? Por exemplo, em matéria ambiental, entende ou não o Partido Ecologista Os Verdes que deve haver decisões por maioria qualificada? Não teremos nós consciência de que, com mecanismos de decisão por unanimidade, será inviável qualquer evolução da Europa no plano social ou no plano ambiental? É isso o que desejamos para a Europa?

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Há uma reserva de soberania inalienável e um conjunto de matérias de que não podemos abdicar. Mas há, no mecanismo normal de funcionamento da União, necessidade de recorrer a formas de decisão que permitam que se avance, se progrida e que a Europa se afirme no todo mundial.
E não se tenha a ilusão de que um país ganha em poder vetar todas as decisões, porque na lógica da negociação permanente, que é a construção europeia, nenhum país pode permanentemente vetar todas as decisões. Aliás, a margem de manobra dos países, porventura, acresce pela capacidade de formar alianças, de fazer valer os seus pontos de vista, de mobilizar outros em torno das nossas ideias ou de constituir com eles as alianças indispensáveis para fazer vingar os nossos pontos de vista.
É neste quadro, de plena participação na construção europeia, que teremos autoridade para defender aquilo que são interesses fundamentais do nosso país: as regiões ultraperiféricas, a questão do equilíbrio institucional e da garantia de não subrepresentação de países mais pequenos nesse equilíbrio institucional a autoridade para negociar na altura própria a solidariedade europeia em matéria de fundos estruturais indispensáveis ao nosso desenvolvimento.
Desiludam-se os que pensam que a melhor maneira de defender estes pontos seria limitar a intervenção portuguesa à sua expressão. A melhor maneira de defender estes pontos é enquadrá-los numa vontade de discutir todos os problemas da Europa com todos os europeus e de dar a nossa visão global sobre a construção da Europa, nela inserindo os interesses vitais do povo português.

Aplausos do PS.

Conferência Intergovernamental mas também União Económica e Monetária. Utilizei uma vez uma imagem e repito-a aqui: uma união económica, geradora de desenvolvimento e emprego, e uma união monetária, indispensável para a estabilidade, deveriam ser dois gémeos. Infelizmente, não o são. Avançou a união monetária, mas não a união económica. E, de facto, verdade que a Europa ficou, no seu conjunto, em grande parte, insensível ao drama do desemprego.
Gostaria de recordar o que disse, nesta Câmara, aquando da ratificação do Tratado de Maastricht, em 1992: «A competição que estimula e que é, hoje, uma condição de progresso e a cooperação que é indispensável para o lançamento de uma iniciativa europeia de relançamento económico e de defesa do emprego é uma das necessidades mais evidentes dos tempos modernos». E, mais à frente, acrescentei: «Queremos, neste momento particular, insistir na necessidade de uma grande iniciativa europeia de relançamento económico a favor do emprego, como a recentemente proposta por Jacques Delors».
Avançou a união monetária - e ainda bem que assim aconteceu -, mas não, infelizmente, a união económica e as perspectivas de cooperação dos países europeus no domínio da criação de empregos e do desenvolvimento.
Qual deve ser a nossa estratégia neste momento em que o resultado recente das eleições britânicas e francesas cria

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uma oportunidade de fazer valer pontos de vista, que afirmei praticamente sozinho em Madrid e que tenho vindo a reiterar, embora com a frustração de verificar sempre sem seguimento no quadro dos conselhos europeus?
Qual é a oportunidade que nos está agora aberta? Não é a de destruir a união monetária; é, sim, a de manter e desenvolver a união monetária e de lhe acrescentar uma dimensão económica no plano do crescimento e do emprego.
E essencial que a moeda única prossiga e que isso aconteça nos calendários definidos. como factor de estabilidade e de confiança no quadro europeu. E não é verdade que os défices gerem postos de trabalho, mas é verdade que a inflação é um imposto e um dos impostos mais injustos que podem existir nas sociedades.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Se algum exemplo pode ser esclarecedor neste domínio, é o da Suécia, que, de 1990 a 1993, passou de um excedente de 4%, nas suas contas públicas, para um défice de 13% e teve um aumento de 8% de desemprego. Já a Dinamarca, no mesmo período, passou de um défice de 9% para um excedente de 3,5%, nas suas contas públicas, e viu o desemprego reduzido a metade.
Aqueles que pensam que a melhor maneira de criar empregos é gerar défices e é promover a inflação estão, hoje, profundamente errados em política económica.

Aplausos do PS.

A questão não está aí, mas em aproveitar esta oportunidade para criar um conjunto de mecanismos de cooperação entre os governos europeus, na definição de políticas de relançamento económico e de emprego e, desejavelmente - porventura, ainda não terei a esperança de o ver aprovado em Amsterdão -, repito-o, na adopção de programas europeus de emprego e reforço da competitividade, financiados directamente por obrigações contraídas pela própria União Europeia nos mercados financeiros, o que, penso, é hoje perfeitamente compatível com a estabilidade desses mesmos mercados e com o esforço de contenção orçamental feito pelos países.
Esta é uma oportunidade para avançarmos no sentido daquilo que sempre defendemos. Espero que essa oportunidade se concretize, a bem da Europa e de Portugal.
É que se, de alguma forma - e hoje a OCDE acaba de divulgá-lo -,conseguimos, em Portugal, compatibilizar estes dois objectivos, um objectivo de estabilidade e um objectivo de relançamento do nosso crescimento e de contenção do desemprego, se isso foi possível em Portugal, em 1996 e 1997, devemos ter consciência de que, se isso não ocorrer no quadro europeu globalmente, os nossos esforços correm o risco de não poder ser sustentados. Por isso, de alguma forma, a lógica de equilíbrio que houve nas políticas económicas em Portugal, deve ser a lógica de equilíbrio que deve subsistir nas políticas económicas no quadro europeu no seu conjunto.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Com moeda única, mas com união económica, estou certo de que poderemos dar aos cidadãos europeus uma resposta de confiança em matéria de emprego.
Vamos, porventura, para Amsterdão com a consciência de que nem tudo o que desejamos será alcançado, com a consciência de que os passos serão, porventura, pequenos no caminho que queremos percorrer. Mas com inteira sinceridade vos digo: creio que são passos no caminho certo, o caminho de mais Europa para termos mais Portugal.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Luís Sá e Isabel Castro.
O Sr. Primeiro-Ministro não terra tempo para responder, mas fui informado pelos grupos parlamentares de que lhe concedem, cada um, I minuto para esse efeito.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, verifico que terminou o tempo do debate entre virgens ofendidas, descompassados e mentirosos e que entrámos num período erra que a bancada do PSD, apesar de não ter aplaudido, frequentemente e durante quase toda a sua intervenção, foi dizendo «sim» com a cabeça, entusiasticamente, como agora mesmo o está a confirmar o Sr. Deputado Francisco Torres, sendo, creio, uma situação bastante generalizada.
Ora, por detrás disto, há uma questão: é que o Sr. Primeiro-Ministro começou por afirmar que tinha dúvidas, preocupações e perplexidades e, depois, bem pelo contrário, aquilo que esteve presente na sua intervenção foi uma completa inflexibilidade em relação aos problemas fundamentais, que, neste momento, colocam dúvidas profundas aos povos europeus. Pelos vistos, o Sr. Primeiro-Ministro, pelo menos nestas matérias, nunca tem dúvidas e nunca se engana.
Porém. Sr. Primeiro-Ministro, os problemas aí estão. O Sr. Primeiro-Ministro falou aqui, por exemplo, da Europa da justiça e dos assuntos internos, outros falarão da Europa das polícias, da Europa fortaleza, etc. E o problema que se coloca, um pouco por todo o lado - e não apenas no sector político a que pertence -, é o da protecção dos direitos, liberdades e garantias face a uma Europa que terá um papel acrescido neste domínio. Para além dos problemas de fundo, para além dos problemas do núcleo duro de soberania, que é atingido, por vezes sem justificação. há este ponto fundamental, sobre o qual não posso deixar de questionar V. Ex.ª.
A outra questão que quero colocar-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, tem a ver com o seguinte: como é sabido, Portugal, em matéria de pobreza - e há estudos internacionais que acabam de demonstrá-lo -, não está apenas no pelotão de trás da Comunidade Europeia, está mesmo em último lugar. E o problema que se põe é se este não deveria ser o verdadeiro pelotão da frente, para utilizar uma linguagem que se tornou muito querida ao Governo, o que deveria ter a prioridade, e não o tal pelotão da frente do euro, dos critérios de convergência e da inflexibilidade dos prazos, como problema fundamental do País.
A minha última questão, Sr. Primeiro-Ministro, prende-se com este ponto: como o Sr. Primeiro-Ministro e o Governo bem sabem, palavras são palavras. Incorporar no Tratado palavras. designadamente em matéria social e de emprego, pode, sem dúvida alguma, ter um papel importante, no sentido de constituir uma bandeira para os trabalhadores e para os povos, tal como a coesão

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económica e social, a equalização do progresso, das condições de vida e de trabalho, que, há tanto tempo, constam dos tratados. O que, entretanto, o Sr. Primeiro-Ministro não pode deixar de reconhecer é que, em matéria social e do emprego, nós temos palavras, enquanto, em matéria do mercado único, tivemos metas e prazos muito concretos.

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Da mesma forma que, em matéria do euro, temos critérios, prazos, tudo claramente definido, e, como sabe, não existe o mesmo critério para outro tipo de preocupações.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, deseja responder já ou no final dos restantes pedidos de esclarecimento?

O Sr. Primeiro-Ministro: - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, tenho muitas vezes dúvidas; procuro é responder-lhes e, às vezes, engano-me. E quando me engano, procuro corrigir os enganos. É um comportamento que recomendo à bancada comunista.

Aplausos do PS.

Após 20 anos de experiência, de convívio parlamentar com a bancada comunista, sou levado a recomendar-vos também este comportamento.
Sr. Deputado, a Europa da justiça e dos assuntos internos não será também a Europa das polícias? Claro que é! Sou dos que querem cooperação efectiva entre as polícias dos vários Estados membros para combater o crime organizado e o tráfico de droga, que são internacionais. E não tenho quaisquer dúvidas em dizê-lo! Nem isso põe em causa os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos...

Aplausos do PS.

... desde que se acrescente um conjunto de outros domínios, ao nível da afirmação desses direitos - e não é por acaso que nos batemos pela inscrição dos direitos humanos no Tratado e pelo recurso dos cidadãos ao tribunal, o que, porventura, ainda não passará desta vez, mas já passará, eventualmente, a possibilidade de sancionar os Estados membros que violem esses direitos. As duas coisas não são incompatíveis! Não temos de escolher entre direitos dos cidadãos com crime e violação dos direitos dos cidadãos sem crime. Temos de ter direitos dos cidadãos e combate ao crime e temos de prosseguir as duas políticas com o mesmo empenhamento e a mesma intensidade.

Aplausos do PS.

Pobreza? Com certeza! Se algum governo na Europa tem revelado preocupação com os problemas da exclusão social é este. Então, por que é que acabámos de criar o rendimento mínimo garantido para as famílias portuguesas? Então, por que é que. vamos diferenciar as prestações familiares? E porque temos uma preocupação séria! Não escondemos que há pobreza em Portugal; revelamo-la core o objectivo de a combater.
Mas também lhe digo, Sr. Deputado, que a razão fundamental da pobreza está, como sabe, no subdesenvolvimento e no desemprego, e a melhor maneira de combater o desemprego é investindo e só há duas formas de o fazer: pelo investimento público e pelo investimento privado.
O investimento público, este ano, aumenta 10% e o investimento privado exige relações de confiança, uma das quais, no essencial, tem a ver com a redução das taxas de juro, elemento fulcral da política económica que este Governo tem vindo a desenvolver, o que explica que também, segundo hoje foi publicado pela LUSA e pelo INE, todos os indicadores de confiança no sector privado, do comércio à indústria e a todos os outros sectores, se revelam em nítida ascensão. É investindo que se combate a pobreza!
Aqueles que procuraram combater a pobreza esquecendo que estas regras existem conduziram as suas sociedades a desastres históricos de empobrecimento colectivo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, julgo que a sua intervenção se pode caracterizar por uma profunda resignação e pelo aceitar como normal coisas que para nós, manifestamente, o não são.
O Sr. Primeiro-Ministro fala e passa pelas pessoas, fala e passa pela Europa, pelos mais de 20 milhões de desempregados, pelos 56 milhões de pobres, passa pelo facto de Portugal depender, do ponto de vista agro-alimentar - e este, a nosso ver, é um problema de segurança -, quase 75% do exterior, porque a nossa agricultura tem vindo a ser destruída, passa sobre todo este balanço e todo este período não tendo em conta que, se há pessoas que melhoraram o seu nível de vida, isso foi feito - e essa leitura caberia a um Governo do PS - num país onde um quarto da população vive no limiar da pobreza.
Por isso, parece-me que é com grande ligeireza e com grande resignação que detende esta Europa, mas nós não nos resignamos, não somos conformistas e não achamos normal que esta seja a Europa.
Julgo que toda a gente poderá estar de acordo que tem de haver mais Europa, agora a interrogação que se coloca e o debate que importa fazer, e importaria fazer na Cimeira, é saber o que ó que foi esta Europa, a que é que esta lógica conduziu a Europa e se ó isto que queremos.
O Sr. Primeiro-Ministro e o seu Governo acha que é isto que quer, mas nós achamos que não. Fala de mais Europa. Mas reais Europa em que sentido? Com que cooperação? Com que solidariedade, se as regras do jogo são as mesmas e se a única coisa que o Governo e quem quer, de forma fundamentalista, prosseguir este caminho suicidário acautelam é encontrar formas de melhor fechar a Europa ao exterior?
Como é que o Sr. Primeiro-Ministro quer mais equilíbrio e mais segurança se o único modo como entende

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isso é com mais armas, com a militarização e com a componente antiga de a Europa se armar e de partilhar, neste caso com a Nato, as formas de agir e de intervir no planeta na defesa dos seus direitos, se não quer discutir outras regras mais justas para o equilíbrio entre os povos e regiões, se não quer discutir outras regras para as trocas e se não quer alterar aquilo que são hoje as formas como a Europa se relaciona com o resto do mundo?
Em relação ao desemprego, a lógica que se mantém é a que fala da globalização e dos mercados como um valor absoluto, que não tem de ser colocado em função das pessoas e dos seus direitos, e que não fala da revolução técnica e científica como coisas que têm de ser ponderadas, no sentido de libertar as pessoas e de lhes dar mais direitos.
Esta não é a nossa Europa, porque a Europa, tal como a concebemos, é seguramente uma Europa que reconhece e respeita um património de gerações, acumulado durante anos e anos: é uma Europa que reconhece o direito ao asilo; é uma Europa que reconhece o direito à liberdade. E a liberdade não é um valor esvaziado de conteúdo, a liberdade é sinónimo de um conjunto de direitos, que não têm consagração, e, enquanto isso acontecer, esta será uma Europa de hipocrisia, do faz de conta e que, para alívio de consciência, falará de formas de minimizar a pobreza, mas não de a discutir como um problema sério que tem de ser alterado radicalmente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, no tempo de 2 minutos concedidos pela Mesa, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, este Governo não passa por vinte milhões de desempregados ou por 50 milhões de pobres, este Governo pára perante 20 milhões de desempregados e 50 milhões de pobres. Pára, pensa e age!

Aplausos do PS.

E é por isso que agimos! E digo-lhe mesmo mais: é, porventura, unicamente por isso que vale a pena ser Governo, porque para tudo o resto não me sentiria suficientemente estimulado! Mas para agir, no sentido de combater esses flagelos, vale a pena tentar acertar na forma de governar e na forma de construir também uma Europa, uma Europa que queremos diferente da que temos. Mas também lhe devo dizer que temos orgulho na Europa que já construímos até hoje ...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: - ... e que em muitos aspectos, tem um modelo social que é invejado em todas as outras partes do mundo e que, em relação às outras «Europas» que existiram, não pede meças!

Aplausos do PS.

Porque aqueles que fizeram a experiência de outras «Europas» hoje estão a bater à porta desta Europa para entrar, e isso também terra algum significado em relação ao futuro.

Aplausos do PS.

Quanto à Europa das armas, vai ficar inscrito no Tratado que a União Europeia assumirá as missões de Petersberg. Devo dizer que tenho o maior interesse e empenho nisso. E acho extremamente importante que a Europa possa pedir à UEO, através da União Europeia, missões dessa natureza e que os países ditos neutros possam nelas participar, porque é completamente diferente ter armas para combater inimigos ou ter armas para manter a paz na Bósnia e, graças a isso, haver homens e mulheres que não morrem, mulheres que não são violadas e crianças que não são destruídas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: - É completamente diferente ter armas e usá-las nesse contexto ou ter armas e usá-las num contexto de conflagração.

Aplausos do PS.

Por outro lado, tenho orgulho nas tropas portuguesas que, fora da Europa, em Angola, são um factor de paz para o seu povo ou das tropas portuguesas que, recentemente, em Brazaville, foram um factor de segurança para os portugueses que estão no Zaire.
Não queremos Forças Armadas que sejam forças armadas para combater inimigos. da mesma forma que não queremos uma Europa belicosa. Queremos uma Europa como espaço de segurança, para garantir a paz e a estabilidade. É nesse sentido que estamos a caminhar e é nesse sentido que Amsterdão vai representar um novo passo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do CDS-PP, no uso de um direito potestativo, requereu a votação do seu projecto de resolução no fim da discussão e julgo que também existe consenso no sentido de se votarem também hoje os restantes projectos de resolução que foram discutidos.
Nesse sentido, vamos passar à votação dos referidos projectos de resolução, começando pelo projecto de resolução n.º 52/VII - Sobre a revisão do Tratado da União Europeia (CDS-PP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes e votos a favor do CDS-PP.

Srs. Deputados, vamos agora votar o projecto de resolução n.º 54/VII - Aprofundamento da integração europeia de Portugal (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do PSD e votos contra do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 57/VII - Sobre o aprofundamento da União Europeia e a Conferência Intergovernamental (CIG) para a revisão do Tratado da União Europeia (PS).

Submetido à votação, foi aprovado. com votos a favor do PS e do PSD e votos contra do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes.

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Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 58/VII - Sobre a revisão do Tratado de Maastricht (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de dois pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 2.º Juízo do Tribunal da Comarca de Setúbal, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Manuel Jorge Goes a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo n.º 112/97-CP, em audiência marcada para o próximo dia 16 de Junho de 1997, pelas 16 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 1.ª Secção do 1.º Juízo do Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos. Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de não autorizar o Sr. Deputado José Egipto, nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo 140.º da Lei n.º 7/93, de I de Março, a prestar declarações como arguido no processo n.º 610/95, em sede de discussão e julgamento.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, a próxima sessão realizar-se-á na próxima quarta-feira, dia 18, às 15 horas, cuja ordem de trabalhos consta, para além de um agendamento potestativo do Grupo Parlamentar de Os Verdes, da discussão da proposta de lei n.º 81/VII.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 35 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Fernando Garcia dos Santos.

Partido Social Democrata (PSD):

António Manuel Taveira da Silva.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
José Manuel Costa Pereira.
Luís Carlos David Nobre.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Maria Helena Pereira Nogueira Santo.

Partido Comunista Português (PCP):

Maria Odete dos Santos.

Partido Ecologista Os Verdes.(PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Francisco José Pinto Camilo.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Mário Manuel Videira Lopes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.

Partido Social Democrata (PSD):

Álvaro dos Santos Amaro.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Hugo José Teixeira Velosa.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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DIÁRIO da Assembleia da República

Depósito legal n.º 8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

AVISO

1 - Nos termos do n.º 4 do artigo 122.º do Regimento da Assembleia da República, será distribuída gratuitamente com a 1.ª série do Diário da República uma série especial, de periodicidade quinzenal, para publicidade dos sumários da 1.ª série do Diário da Assembleia da República.

PREÇO DESTE NÚMERO 361$00 (IVA INCLUÍDO 5%)

Toda a correspondência, quer oficial, quer relativa a anúncios e a assinalaras do Diário da República, e do «Diário da Assembleia da República deve ser dirigida à administração da Imprensa Nacional-Casa da Moeda, E. P., Rua de D. Francisco Manuel de melo, 5 - 10099 Lisboa Codex

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