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Sexta-feira, 27 de Junho de 1997 I Série - Número 86

VII LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997) REUNIÃO PLENÁRIA DE 26 DE JUNHO DE 1997

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

SUMÁRIO

O Sr Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos. Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 281/VII - Incentivo fiscal à criação de emprego poro jovens (PSD), que for aprovado e baixou à 11 ª Comissão, 282/VII Incentivos â criação de emprego paro jovens (PSD) e 297/VII Incentivos ao emprego nas instituições particulares de solidariedade social (PSD), que foram rejeitados. Intervieram no debate, a diverso título, os Srs. Deputados Hermínio Loureiro (PSD). Paulo Neves e Elisa Damião (PS), Nuno Abecasis (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP), Nuno Correia da Silvo (CDS-PP), Gonçalo Almeida Velho e Joel Hasse Ferreiro (PS), Jorge Moreira da Silva (PSD) e Afonso Candal (PS).
Sob a forma de interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Luís Sá (PCP) solicitou o empenho do Sr. Presidente na obtenção de resposta rápida a um requerimento que formulou no Governo relativo à participação deste ao Ministério Público do atraso da aprovação do orçamento e plano de actividades da Câmara Municipal da Amadora.
Foi debatida, na generalidade, a proposta de lei n.º 92/VII - Estabelece o regime jurídico da concessão de garantias pessoais pelo Estado ou por outras pessoas colectivas de direito público, que foi aprovado e baixou à 5.º Comissão. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro dos Finanças (Sousa Franco), os Srs. Deputados Luís Queiró (CDS-PP), Vieira de Castro (PSD), Joel Hasse Ferreira e Manuel dos Santos (PS) Octávio Teixeira (PCP), Jorge Ferreira (CDS-PP), Nuno Baltazar Mendes (PS) e Nuno Abecasis (CDS-PP).
Após o Sr. Deputado Nuno Abecasis ter lido uma comunicado emitido pela Comissão Eventual para Acompanhamento da Situação em Timor Leste, foi aprovado o voto n.º 72/VII - De protesto contra u actuação da Indonésia e de pesar pelo morte do comandante timorense David Alex (Presidente da AR), tendo a Câmara, no final, guardado um minuto de silêncio.
Foram rejeitados, na generalidade, os projectos de lei n.os 290/VII - Bases da Família (CDS-PP), 295/VII - Lei de bases da política de família (PSD), 338/VII - Alarga os direitos dos membros da família em união de facto (Os Verdes) e 384/VII - Estabelece protecção adequada às famílias em união de facto (PCP) e foi aprovado, também na generalidade, o projecto de lei n.º 340/VII - Garantia dos alimentos devidos a menores (PCP), que baixou à 12.ª Comissão.
Em votação final global, foram aprovados os textos finais apresentados pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativos aos projectos de lei n.os 257/VII - Altera a Lei dos Baldios (PSD) e 235/VII - Altera os prazos de exclusão da ilicitude nos casos de interrupção voluntária da gravidez (PS).
Após aprovação de um requerimento de avocação a Plenário apresentado pelo Sr. Deputado Luís Marques Mendes (PSD), dos artigos 38º, 46º n.º 2, 48.º e 114.º constantes do texto final elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à proposta de lei n.º 51/VII - Aprova a lei de bases do Tribunal de Contas, foram rejeitadas as propostas de alteração da autoria daquele partido. tendo usado da palavra os Srs. Deputados Luís Marques Guedes (PSD), António Filipe (PCP). José Magalhães (PS), Guilherme Silva (PSD) e Jorge Ferreira (CDS-PP). A Câmara aprovou, depois, em votação final global, o texto da Comissão, que também altera a designação da lei para «Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas».
Por Último, procedeu-se à discussão na generalidade, da proposta de lei n.º 102/VII - Autoriza o Governo a legislar sobre o regime de acesso e exercício da actividade seguradora, o regime de endividamento das empresas de seguros e resseguros e o regime sancionamento da actividade seguradora -, sobre n giras intervieram, a diverso título, além do Sr Ministro das Finanças (Sousa Franco), os Srs. Deputados António Galeão Lucas (CDS-PP), Duarte Pacheco (PSD), João Carlos da Silva (PS) e Lino de Carvalho (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 Horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Domingos de Ascensão Cabeças.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Lameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Jorge Lacão Costa. Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
José Carlos da Cruz Lavrador.

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António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Mário de Lemos Damião.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Cruz Abecasis.
Pedro José Dei Negro Feist.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, na ordem do dia de hoje, vamos proceder, em primeiro lugar, à discussão conjunta dos projectos de lei n.os 281/VII - Incentivo fiscal à criação de emprego para jovens (PSD), 282/VII - Incentivos à criação de emprego para jovens (PSD) e 297/VII - Incentivos ao emprego nas instituições particulares de solidariedade social (PSD).
Para uma intervenção, de apresentação dos referidos diplomas, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Loureiro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O desemprego dos jovens constitui, em Portugal, um dos mais graves e preocupantes problemas sociais.
O Partido Socialista sempre considerou o desemprego jovem como um flagelo, e o seu combate uma prioridade.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem.

O Orador: - As promessas foram muitas, mas, infelizmente para milhares de jovens, não passam de promessas que frustram as inúmeras expectativas criadas.

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A incapacidade do Governo socialista para resolver tão grave problema, infelizmente, é muito clara.
Infelizmente, o desencanto instalou-se nos milhares de jovens portugueses à procura do primeiro emprego e o Governo socialista não age nem sequer reage a este preocupante flagelo social.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O emprego é cada vez mais um meio de realização pessoal e de integração social, pelo que a sua promoção, enquanto condição de qualidade de vida, é fundamental.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não existe qualidade de vida sem emprego. E, hoje, são muitos, mesmo muitos, os jovens que não têm qualidade de vida, porque não têm emprego.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Bonitas eram as rosas da campanha eleitoral, mas rapidamente se transformaram em espinhos da governação socialista, que continua a governar de costas voltadas para a juventude portuguesa.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É bem verdade!

O Orador: - O País está a ser conduzido ao sabor da inércia, o que, como se sabe, nada é compatível com as exigências da vida actual...
Por isso mesmo, o desemprego dos jovens é cada vez mais angustiante e preocupante, a perspectiva de emprego é cada vez menor, os jovens, em geral, e os jovens licenciados, em particular, estão em número crescente no desemprego e os desempregados de longa duração não vêem uma luz ao fundo do túnel.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Sr.ª Ministra do Emprego já tomou uma medida, uma grande medida, uma medida de espantar e com efeitos concretos na análise da evolução desta preocupante situação: a limpeza de ficheiros que se tem estado a fazer.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A Sr.ª Ministra do Emprego transferiu, assim, o grave problema social para o problema estatístico e, deste modo, deu largas à teoria do primado dos números sobre as pessoas, posição claramente antagónica com o discurso político então praticado e tanto do agrado do Partido Socialista enquanto oposição.
Apresentou, há meses atrás, a Sr.ª Ministra do Emprego, com pompa e circunstância, à maneira de Edson Athaíde, uma grande medida: o Plano Nacional de Estágios. Quero aqui fazer votos para que este Plano não tenha o triste, o infeliz e o incompetente resultado do tão famigerado e também mediático Plano Mateus.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - De triste memória!

O Orador: - Assim, é fundamental criar oportunidades concretas para que os jovens participem na construção de um futuro mais promissor, que se incentive, de forma determinada, o seu espírito empreendedor e se reforce a sua reconhecida capacidade de iniciativa.
É fundamental que o Governo socialista se preocupe em criar oportunidades, com o objectivo de criar emprego e garantir aos milhares de jovens uma adequada inserção no mundo do trabalho.
O que os jovens portugueses querem é que a opção pela criatividade e pelo empreendimento seja assumida também por parte do Governo socialista.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não nos limitamos só a criticar: temos ideias e propostas alternativas - propostas concretas para problemas concretos, propostas ousadas e ambiciosas que representam o nosso contributo para o combate imediato ao desemprego jovem.
O plano de propostas de combate ao desemprego implica, fundamentalmente, a aprovação de um conjunto de medidas de capital importância: isenção de descontos para a segurança social durante os três primeiros anos de contrato; redução para 17,5% da taxa de desconto para a segurança social, durante os quarto e quinto anos de contrato; para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC), as remunerações correspondentes à criação líquida de postos de trabalho, admitidos por contrato sem termo, com idade não superior a 30 anos, são levados a custos em valor correspondente a 150%; para efeitos do disposto atrás referido, o limite do montante das remunerações por posto de trabalho e de 14 vezes o salário mínimo nacional, durante um período de cinco anos, a contar do início da criação do posto de trabalho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Esta medida visa, fundamentalmente, incentivar directamente a criação e a estabilidade de novos postos de trabalho, uma vez que daí resultam benefícios em IRC.
Desde já, convido o Partido Socialista a votar favoravelmente os projectos da JSD. É o vosso real e verdadeiro contributo para o combate a este flagelo social, pois o vosso silêncio, o silêncio dos membros do Governo, em particular do Sr. Secretário de Estado da Juventude,...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - É verdade! O Governo nem está presente!...

O Orador: - ... é muito preocupante, e o mínimo que se exige de VV. Ex.ª e que votem a favor destes projectos com o PSD.
Por este andar. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a Sr.ª Ministra do Emprego, Dr.ª Maria João Rodrigues, arrisca-se seriamente a ficar na História não por ser a Ministra do Emprego mas, sim, por, em Portugal, ser considerada a «Ministra do Desemprego».

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Hermínio Loureiro, os Srs. Deputados Paulo Neves, Bernardino Soares e Nuno Correia da Silva.
Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves.

O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Hermínio Loureiro, de facto, a frase «incapacidade de governar», pelo menos nesta matéria do desemprego juvenil, tem dois anos de atraso. E tem dois anos de atraso, porque foi este Governo que lançou o Programa de Acção Imediata para o Emprego, urgentíssimo, tendo em conta o estado calamitoso com que, em 1995, se deparavam os jovens, em Portugal, em matéria de desemprego, especialmente, como disse, os jovens licenciados. O Sr. Deputado não deve ler as estatísticas, fala de cor e continua com o mesmo discurso de há um ano atrás, altura em que, de facto, este Plano de Acção foi lançado.
Sr. Deputado, deve registar que, por exemplo, em relação ao silêncio que aqui referiu da Secretaria de Estado da Juventude, nos últimos quatro meses, só nos últimos quatro meses de aplicação do sistema de apoio aos jovens empresários, significou a criação de mais 300 postos de trabalho.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Trata-se de um investimento público de 2 milhões de contos a fundo perdido, para a criação, em parceria com os empresários, de mais iniciativas para o desenvolvimento e, nomeadamente, para a integração de jovens licenciados na vida activa.
Em dois anos de aplicação do Sistema de Incentivos aos Jovens Empresários - 1994 e 1995 -, durante o seu Governo, diga-me quantas dezenas de empregos foram criadas? Dezenas, digo eu, Sr. Deputado!

Vozes do PS: - Zero! Nada!

O Orador: - É que, neste momento, Sr. Deputado, em quatro meses, foram criados 400 novos postos de trabalho e só agora se iniciou a aplicação desse Sistema de Incentivos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em relação aos outros programas, quero só dar-lhe três exemplos.
No que diz respeito ao sistema de criação do próprio posto de trabalho, são 4000 iniciativas de jovens deste país que, nos últimos seis meses, foram aprovadas.
Relativamente ao regime de incentivos às micro-empresas, são mais 5000 postos de trabalho em Portugal, especialmente para os jovens que o Sr. Deputado aqui quis referir.
Sr. Deputado, afinal, incapacidade de governar conseguir fazer diminuir, do primeiro trimestre de 1995 para o primeiro trimestre de 1997, de 27% para 21 % o desemprego dos jovens em Portugal? Foi uma diminuição de G%, Sr. Deputado! No tempo do Governo do PSD, era de 27% o total de jovens desempregados em Portugal, hoje, é de 21 % sobre o total dos desempregados em Portugal.
Aumentámos as ofertas de emprego de 7000 para 11 000 novos postos de trabalho em 1996 e em 1997.
Diga-me. Sr. Deputado: quantos novos postos de trabalho foram criados durante o seu Governo? Rigorosamente, foram criados 6500 postos de trabalho, ou seja, metade dos actuais.
Diga-nos, Sr. Deputado: o que pensa, por exemplo, da medida de aprendizagem e das escolas-oficinas? São 11 000 jovens que safem do sistema oficial de ensino e que estão agora a ser rigorosamente integrados na vida activa através deste programa.
Diga-nos, Sr. Deputado!
O PSD, com estes diplomas, pretende apenas iniciativas soltas, uma acção sem reflexão, uma acção que é, afinal, de pura agitação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Loureiro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Neves, aprecio o seu esforço, aquilo que o senhor passou para conseguir dizer hoje, aqui, as poucas palavras que disse em relação à minha intervenção. Gostava, no entanto, que o Sr. Deputado dissesse isso aos milhares de jovens portugueses que não têm emprego,...

O Sr. Paulo Neves (PS): - São menos de 30 000!

O Orador: - ... aos milhares de jovens portugueses que saem da escola e que não têm oportunidades de emprego! Era isso que queria, Sr. Deputado!

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Vá dizer e explicar isso aos portugueses!
Sr. Deputado, tenha a coragem de enfrentar este problema e de dizer aos portugueses que não o consegue resolver!

O Sr. António Braga (PS): - Fale de números!

O Orador: - A vossa incapacidade é notória! E fiquei com essa certeza, depois de ouvir as suas palavras! Mas fico ainda mais preocupado, muito mais preocupado! Sabe, Sr. Deputado, é que o seu micro-universo, a sua análise relativamente a esta questão, resume-se, se calhar, ao grupo de amigos do Sr. Deputado, ao grupo de amigos da Juventude Socialista. E, esses, sei que não têm dificuldades de emprego, porque os senhores arranjam emprego para os vossos amigos!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

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Se há organização política de juventude que mais cumpriu à risca o job for the boys, foi, claramente, a Juventude Socialista. Aí, percebo que o Sr. Deputado não consiga encontrar jovens desempregados neste país!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Mas digo-lhe mais: as vossas grandes preocupações não são estas! Vocês têm-no demonstrado desde o início da sessão legislativa! Vocês preocupam-se muito pouco com o desemprego que aflige milhares de jovens, milhares de portugueses e milhares de famílias!

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - E sabe porquê, Sr. Deputado? Porque os senhores preocupam-se demais com as uniões de facto, os senhores preocupara-se demais com os homossexuais e não se preocupam com os problemas reais, com os problemas que afligem concretamente os jovens e as famílias portuguesas.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Era isso que gostaria de ouvir, da parte do Sr. Deputado!
Sr. Deputado Paulo Neves, não fale dos sonhos da Sr.ª Ministra do Emprego! É que o Sr. Deputado veio aqui reafirmar os sonhos pomposos da Sr.ª Ministra do Emprego quando vem à Assembleia! Fale do pesadelo dos jovens portugueses e das famílias portuguesas que não encontram emprego e oportunidades de emprego.

O Sr. Paulo Neves (PS): - São menos de 30 000 os jovens desempregados!

O Orador: - Era disso que gostava de o ouvir falar, mas, a isso, infelizmente, a Juventude Socialista e o Grupo Parlamentar do Partido Socialista têm dito zero, porque iniciativas neste âmbito têm sido muito poucas. Reconheça, Sr. Deputado, aquilo que ainda agora fizeram a propósito destes diplomas: agendamos esta matéria para discussão em Plenário e os senhores a isso, disseram zero, alterando, inclusive, a ordem de trabalhos e a sessão, porque a Sr. Ministra ainda não tinha encontrado o tal publicitário para lhe explicar como é que ela tinha de vir cá afirmar, prometer e enganar os portugueses!

Risos do PSD.

Protestos do PS.

Aquilo que lhe digo, Sr. Deputado, é que estamos a ficar cansados da vossa inactividade e, por isso, damos aqui o nosso contributo para que estas propostas obtenham o vosso apoio.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental de defesa da honra da sua bancada, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Hermínio Loureiro, hesitei durante alguns segundos em exercer este direito, mas decidi fazê-lo por razões meramente pedagógicas.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Apesar de o Sr. Deputado dificilmente interpretar aqui os problemas da juventude portuguesa e considero que tenho um espírito suficientemente jovem, ligado à vida e aberto às transformações da sociedade -, não consigo rever-me na sua juventude.

Risos do PS.

De facto, o anátema que o Sr. Deputado lançou sobre as pessoas que perfilham uma determinada atitude sexual, uma determinada postura na vida, é digna de que taça aqui uma chamada de atenção.
Efectivamente, o Sr. Deputado é discriminatório, pouco culto a vários níveis e não consegue, com essa sua atitude, desviar a nossa atenção,...

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - ... nem com a ajuda do PP,...

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Nós não temos nada a ver com isso!

A Oradora: - ... dos verdadeiros problemas da sociedade portuguesa.

Sr. Deputado, é ultrajante para esta bancada que o senhor não tenha respeito pela situação de todos os portugueses, sejam ou não homossexuais.
É ultrajante para o debate sobre o emprego que V. Ex.ª não tenha memória, que seja ofensivo e demagogo, que não tenha trazido uma radiografia do emprego jovem e dos problemas da juventude e, sobretudo, que V. Ex.ª não tenha dito aqui, nesta Câmara, que a herança que o vosso partido deixou, enquanto Governo, teria liquidado qualquer espécie de apoio à contratação, inclusivamente à acção do Instituto do Emprego, por irresponsabilidade eleitoral, por irresponsabilidade e falta de critérios de gestão no Fundo Social Europeu e no próprio Instituto do Emprego e Formação Profissional.
É ultrajante que V. Ex.ª venha aqui dizer que, de facto, nada se fez em matéria de contratação de jovens desempregados.
De facto, Sr. Deputado, o senhor não só não é jovem como também tem pouca memória e lê pouco!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Loureiro.

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O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, efectivamente, a Sr.ª Deputada hesitou em defender a honra, porque é uma situação difícil para a Sr.ª Deputada defender este problema.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E digo-lhe mais: a Sr.ª Deputada foi, no mínimo, deselegante.

Risos do PS.

A senhora falou de falta de cultura. Mas o que lhe digo é que tenho a mesma legitimidade que a Sr.ª Deputada para estar aqui, porque fui eleito pelos eleitores do meu círculo eleitoral, tal como a senhora foi eleita pelos eleitores do seu círculo eleitoral. Por isso, não é, de certeza, de si que recebo lições de moral sobre esta matéria.

Aplausos do PSD.

O embaraço é notório. Efectivamente, a minha intervenção atrapalhou - e de que maneira! - a bancada do Partido Socialista.

Vozes do PSD: - É verdade!

Risos do PS.

O Orador: - Sabe porquê, Sr.ª Deputada? Porque a Sr.ª Deputada está a tentar criar um incidente para fugir ao tema que nos traz hoje aqui.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - O que quero discutir é o desemprego dos jovens em Portugal, mas, se calhar, é isto que a ,dos Deputada não quer que se discuta aqui.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - A dificuldade da bancada do Partido Socialista nesta matéria é muito notória. A necessidade que encontraram para fugir ao tema ficou evidente.
Portanto, Sr.ª Deputada, não tenho mais explicações a dar-lhe.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a título de pausa refrescante, que começa a tornar-se necessária, vou anunciar que se encontram a assistir aos nossos trabalhos 60 alunos da Escola Primária n.º 2 de Guimarães; 28 alunos da Escola Portela Aboim de Amarante; e um grupo de 60 cidadãos idosos de Mortágua. A juventude e a terceira idade conjugam-se no interesse pelo Parlamento português. É comovedor. Saudêmo-los.

Aplausos gerais, de pé.

Para defesa da honra da sua bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Damião...

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Elisa!

O Orador: - Sr.ª Deputada Elisa Damião, não sei a que propósito é que citou o meu partido, mas quero dizer-lhe, com toda a frontalidade, que nunca ouviu desta bancada qualquer falta de respeito fosse por que cidadão português fosse. O que não entramos ó em confusões. Respeitamos as pessoas nas suas opções, respeitamo-las até nas suas limitações, mas o que não confundimos é uniões com casamentos. Isso já o dissemos e afirmamo-lo aqui claramente.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Não consentimos, de maneira nenhuma, que acuse a nossa bancada e o nosso partido de falta de respeito pelas pessoas. Sempre a tivemos - é, aliás, da nossa própria essência. Desmentir-nos-emos no dia em que falharmos nisso.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, quero agradecer esta oportunidade para lhe dizer que nutro por V. Ex.ª um profundo respeito, não obstante não saber o meu nome. Sou, aliás, uma admiradora da sua capacidade parlamentar.
Se V. Ex.ª tiver a amabilidade de perguntar ao Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, perceberá por que citei o seu partido. O Sr. Deputado Nuno Correia da Silva estava, em matéria de números e é uma perspectiva dele -, a apoiar a intervenção do Sr. Deputado do PSD. Tenho bom ouvido e sou suficientemente atenta.
No entanto, o que quero dizer-lhe, Sr. Deputado, é que o debate que aqui aconteceu não tem, pela atitude discriminatória do Sr. Deputado do PSD, nada a ver com o debate que estávamos a prosseguir.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - O PS é que não quer discutir o desemprego dos jovens!

A Oradora: - O Sr. Deputado é que introduziu, numa atitude ultramontana, essa questão. Portanto, não é ao Sr. Deputado que vou responder.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente Srs. Deputados, já suspeitava que este debate iria incidir muito pouco sobre o desemprego dos jovens, mas, de facto, a este ponto não estava nas minhas previsões.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Este é um debate requentado. E já se adivinhou, pelas intervenções que foram produzidas e pelas que virão a seguir, que o que vamos ter aqui é o costume: vamos ter o PSD a dizer que o Governo do Partido Socialista não governa e vamos ter o Partido Socialista a dizer que não governa devido à pesada herança que o PSD deixou. O que é mais engraçado é que ambas são verdade.
Portanto, o que temos que saber, agora, é que medidas concretas são hoje apresentadas e não, como provavelmente vai acontecer, e já aconteceu, o Sr. Deputado Hermínio Loureiro a dizer que o Sr. Secretário de Estado da Juventude não tem aparecido em público e o Sr. Deputado Paulo Neves a enumerar as medidas, os discursos, as propostas que o Governo e a Ministra para a Qualificação e o Emprego têm levado a cabo. Até desconfio que aquela voz que se ouve, na televisão, sobre o anúncio do Ministério para a Qualificação e o Emprego será, com certeza, a do Sr. Deputado Paulo Neves,...

Risos gerais.

... porque mais ninguém saberá enumerar tão bem todas as acções, a maioria das quais «de fachada», que têm sido produzidas nesta matéria.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Mas o problema destas questões e das posições destas duas bancadas é que não conseguem esconder aquilo que é verdadeiramente essencial. No que diz respeito ao desemprego e ao emprego dos jovens estão perfeitamente de acordo. Portanto, não é verdade que o Sr. Deputado Hermínio Loureiro tenha vindo aqui hoje apresentar as alternativas do PSD. As alternativas do PSD não são mais do que «maquilhagens» da legislação que o PS aprovou, que é uma «maquilhagem» da legislação que o governo do Professor Cavaco Silva aprovou e que serve, pura e simplesmente, para disfarçar a inoperância e a falta de vontade em contribuir para a resolução do problema do desemprego dos jovens.
Esta é que é a verdade!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Orador: - A minha pergunta, Sr. Deputado Hermínio Loureiro, é muito simples: assinou ou não, votou ou não a favor das resoluções da maioria do bloco central, nesta Câmara, que defenderam a marcha forçada para a Moeda única? É aqui que está o problema.
O Sr. Deputado não pode vir aqui apresentar essas medidas como panaceia para o problema do desemprego do jovem, sabendo que a principal causa deste problema é o facto de o seu partido e de o Partido Socialista caminharem de uma maneira inconsequente, irresponsável, para a Moeda única, sem ter em conta os direitos dos jovens e sem ter em conta os direitos dos jovens trabalhadores.
O que pergunto é se assinou ou não, se votou ou não a favor dessas resoluções. É porque se votou, Sr. Deputado, está aqui a padecer de uma grande incoerência!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a apalavra o Sr. Deputado Hermínio Loureiro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, é verdade - e reconheço-lhe aqui alguma coerência na sua intervenção - que a Juventude Comunista Portuguesa e o Grupo Parlamentar do PCP sempre se preocuparam com estes problemas. Nesse aspecto, reconheço coerência na sua intervenção.
No entanto, Sr. Deputado Bernardino Soares, o debate não é requentado, é um debate recorrente. O debate é feito porque o Governo do PS não governa;...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... o debate é feito porque o Governo do PS não consegue resolver o problema do desemprego dos jovens em Portugal. Como o Partido Socialista não cumpre as suas promessas eleitorais, temos de ser nós a chamar aqui a atenção do PS para a resolução deste problema.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Bernardino Soares, nós não vamos estar à espera, como o Sr. Deputado disse, do Sr. Secretário de Estado da Juventude nem da Sr.ª Ministra para a Qualificação e o Emprego, porque já estivemos dois anos à espera e nada foi feito. Há um velho ditado popular que diz: «quem espera, desespera». Fartos de esperar, estamos nós! Por isso, decidimos apresentar estes projectos de lei para forçar o PS e o Governo a resolverem este grande flagelo social.
É isto que queremos fazer. Queremos fazer com que - não por acção mas, se calhar, tem de ser mesmo por reacção - o Governo do PS assuma a resolução deste grave problema.

Aplausos do PSD.

Por outro lado, digo-lhe que aprovei convictamente aquilo que me perguntou. Votei convictamente a favor porque entendi que, para a economia crescer, para os jovens em Portugal terem futuro, era necessário votar a favor, mas também era necessário que tivéssemos um governo do PS que actuasse e que fosse de encontro á resolução dos problemas.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

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Porém, aquilo que acontece, Srs. Deputados do PS, é que os senhores não cumprem as suas promessas. E mais uma vez, nesta matéria, fica bem claro: VV. Ex.as fogem à responsabilidade, têm medo de enfrentar os problemas, fazem discursos demagógicos e apresentam planos demagógicos.

Protestos do PS.

Srs. Deputados, tenham paciência! Os senhores já estão habituados. Sinceramente, isto custa-vos: foi o Plano Mateus (de 2500 para duas empresas) e agora é o Plano Nacional de Estágios que vem resolver o problema todo... Sinceramente, não vejo luz no fundo do túnel para que os jovens portugueses possam encarar um futuro com melhores perspectivas!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Hermínio Loureiro, o senhor fala efectivamente com razão, mas penso que fala também com muita falta de autoridade. Com falta de autoridade, porque esta é uma questão velha, mas continua a ser um problema novo. Não é um complexo do Partido Popular, é um problema da juventude portuguesa; não é um problema de hoje, é um problema também de hoje, o que é uma questão diferente.
As soluções que temos de encontrar hoje passam também por avaliar as soluções que foram propostas no passado, para não repetirmos os mesmos erros que cometemos no passado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Aquilo que o PSD ou a Juventude Social-Democrata nos vem aqui propor é o mesmo, não traz qualquer novidade, Sr. Deputado.
Há pouco, o Deputado Bernardino Soares falava, com alguma oportunidade, na questão da Moeda única e da caminhada precipitada para a Moeda única. Não está em causa nem vou desviar o debate da questão fundamental, que é o emprego, mas, objectivamente, quando se discutiram aqui os prazos para a adesão à Moeda única, quando se discutiu nesta Câmara se devíamos optar por critérios de convergência, em função dos critérios nominais definidos no Tratado ou em função dos critérios da evolução real da nossa economia, aí, o PSD fez orelhas moucas ao que o PP disse, nomeadamente aos avisos que fez a esses critérios. O cumprimento desses critérios, nestes prazos, vão gerar desemprego, nomeadamente junto dos novos, dos mais jovens, das pessoas que estão à procura do primeiro emprego. A verdade e a história vieram ao de cima, à medida que o tempo passou.
Hoje, o que o PSD propõe é mesmo que está a propor a União Europeia: tentar remediar aquilo que foi claramente um erro e uma precipitação. Mas o remédio é claramente fraco, porque a doença é muito mais grave e tem uma latitude que está, claramente, a ser escamoteada com este folclore político que se está aqui a tentar criar, porque não estamos a tocar no fundo da questão.
Sr. Deputado, vamos saber quem são os desempregados, quem são os jovens desempregados neste país: não são só os militantes da Juventude Social-Democrata, nem os da Juventude Centrista ou os da Juventude Comunista Portuguesa: também há militantes da Juventude Socialista, porque não há lugares para todos, por enquanto; são, seguramente, jovens que aceitaram o desafio que lhes foi lançado de maior qualificação, que Fizeram um estorço para obter maior formação, que fizeram uru esforço para «apanhar o comboio», o desafio que lhes é lançado da competitividade e de uma economia cada vez mais global; são jovens que tiraram cursos superiores e que, depois, encontraram um mercado de trabalho completamente desajustado da formação que receberam.
A verdade, Sr. Deputado, é tão-só esta: nós, em Portugal, temos 800 licenciaturas diferentes, temos praticamente engenheiros «de parafuso» e doutores «dos botões». Enquanto isto for assim, Sr. Deputado, com mais ou menos diplomas, vamos ter desempregados! A questão é estrutural e não conjuntural. E aquilo que o Sr. Deputado nos propõe é uma aspirina para uma doença muito grave. Serve, eventualmente, para aliviar a dor, serve, eventualmente. para aliviar a sua consciência, Sr. Deputado, mas não serve, seguramente, para resolver os problemas efectivos do desemprego juvenil. Essa é a questão fundamental que temos de colocar aqui.

O Sr. João Carlos Silva (PS): - Isso é demagogia!

O Orador: - Demagogia é aquilo que os senhores têm feito! Sobre isso, já vamos falar daqui a pouco.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Loureiro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, mais uma vez, o PP vem com um discurso virado para o passado e não com a preocupação do futuro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, a Moeda única é um caminho que temos de percorrer para o futuro e para que os jovens portugueses tenham um futuro melhor.

Vozes do CDS-PP: - Temos de percorrer, não! Só temos se os portugueses quiserem!

O Orador: - E digo-lhe, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, que não é a Moeda Única que é responsável por esses problemas que o senhor acabou de apresentar. A responsabilidade desses problemas - que concordo que existem - é do Governo, que não governa. O Governo do PS não consegue resolver este problema e a Moeda

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Única tem servido, inclusivamente, para muita coisa. E, mais uma vez, vai servir e está a tentar servir para este problema.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Serve para o desemprego!

O Orador: - Não é verdade! Há países que, estando a percorrer o caminho para a Moeda única, não têm este problema do desemprego; há países em que isto não acontece. Sr. Deputado, o que falta aqui, em Portugal, são políticas de emprego credíveis, políticas de emprego que ajudem a resolver o problema e, neste caso, em particular o problema dos jovens.

O Sr. João Carlos Silva (PS): - E estas três folhas é que são a sua política de emprego?

O Orador: - E digo-lhe, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, a sua grande preocupação não tem de ser com esta bancada mas, sim, com a bancada do PS. O seu discurso tem de ser virado para aqueles senhores e para aquelas senhores, porque eles é que têm a responsabilidade, eles é que têm de resolver o problema.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não se vire contra o PSD! Vire-se contra a bancada do PS porque eles é que não resolvem o problema.

Vozes do CDS-PP: - Vocês são iguais!

O Orador: - Sr. Deputado, gostava que falasse de todos os jovens - de todos os jovens que têm, efectivamente, este grande problema - e que não se preocupasse só com os jovens licenciados. Preocupe-se com todos os jovens porque todos eles merecem uma oportunidade de emprego neste país.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o PSD apresenta hoje três projectos que, se tivessem sido apresentados há dois anos atrás, necessariamente por outra força política, teriam merecido, provavelmente, a frontal oposição do então partido majoritário. Mas hoje temos o PSD a defender estas medidas. Oposição, a quanto obrigas!...
O Partido Socialista - aliás «pê ésse» em linguagem moderna - disputa taco a taco com o PSD a liderança do aproveitamento demagógico da grave situação de desemprego jovem existente no nosso país, socorrendo-se de programas, discursos da Ministra do Emprego e anúncios na televisão para tentar fazer crer que está fortemente preocupado com o problema.
E o PCP? - perguntarão. O que faz o PCP? O PCP defende verdadeiramente o emprego e a dignidade dos trabalhadores jovens como valor primeiro da sua acção. E ataca, e contesta o fundo verdadeiro da questão do desemprego jovem, denunciando a euromania psicótica de marcha forçada para a Moeda única, que esmaga tudo e todos no seu caminho.
O PS e o PSD querem destas iniciativas o efeito de uma varinha de condão. Mas o milagre que procuram não é transformar o desemprego em emprego; esse é o que nos querem vender. O verdadeiro objectivo é transformar o completo desinteresse destas forças políticas pelos problemas do emprego jovem numa aparente vontade de combate ao desemprego que, na verdade, não existe.
Obviamente, os jovens portugueses não se deixam enganar por tais manobras de diversão à custa das suas dificuldades reais. E mesmo que quisessem acreditar nas lágrimas de crocodilo que, com tanta facilidade, PS e PSD derramam sempre que se fala do crescimento do desemprego, a realidade deitaria por terra tais ilusões, a realidade das dezenas de milhares de jovens desempregados e de bastantes mais com vínculo precário, a realidade de direitos negados e de salários baixos e degradados.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, em concreto, o PSD pouco propõe. Apresenta a receita de sempre: benefícios fiscais e isenções do pagamento das contribuições para a Segurança Social para as entidades empregadoras, para além de apoios financeiros. Aliás, os projectos de lei do PSD, em matérias de juventude, reduzem-se, depois de retirado o invólucro embelezador às mesmas propostas que hoje aqui aparecem repetidas, a benefícios fiscais e isenção de contribuições para a Segurança Social - nada mais. Nos casos concretos, junta-se ainda. no que diz respeito ao emprego em Instituições Particulares de Solidariedade Social, um apoio financeiro suplementar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, para nós, é inadmissível que se continue numa linha de criar dificuldades à Segurança Social e, portanto, rejeitamos liminarmente a existência de encargos para esta sem contrapartidas. Aliás, esta medida nem sequer é nova, já que está prevista no Decreto-Lei n.º 89/95, em que se prevê a possibilidade de dispensa de contribuições por 36 meses - o que parece ser idêntico aos três anos previstos no projecto de lei n.º 282/VII, no seu artigo 2.º! Provavelmente, a única inovação nesta matéria será a redução da taxa de desconto para 17,5% nos quarto e quinto anos de contrato.
No que diz respeito às propostas relativas ao emprego jovem nas Instituições Particulares de Solidariedade Social, há, desde logo, uma crítica a fazer: é que os conceitos aplicados deixam de fora muitas entidades que desenvolvem igualmente trabalho socialmente relevante e que não são abrangidas por estas propostas. É o caso, por exemplo, das associações de bombeiros e de algumas organizações de deficientes. Por outro lado as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) já estão abrangidas pela legislação vigente em relação aos incentivos ao emprego jovem, constituindo por isso esta alteração um acréscimo aos direitos já aí reconhecidos. De resto, a Constituição prevê já um dever de apoio mas também de fiscalização das IPSS.

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Quanto aos benefícios fiscais previstos no projecto de lei n.º 282/VII, é importante que se diga que se destinam à criação líquida de postos de trabalho, o que, a ser devidamente aplicado, permitirá obviar a que estes incentivos se traduzam na prática em substituição de trabalhadores não jovens por jovens. Aliás, nesta matéria, o PSD aprendeu algo com a experiência passada e com as críticas que foram feitas aos sistemas de incentivos que aplicou quando estava no Governo. Este projecto merecerá provavelmente, na especialidade, alguns aperfeiçoamentos, embora se admita que possa ser um ganho, relativo e limitado, no problema do desemprego jovem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, não se trata aqui, hoje, nesta discussão, de resolver o problema do desemprego jovem. Esse necessita de medidas muito mais profundas e que os proponentes não estão dispostos a aceitar. Pena é que assim seja e que as verdadeiras medidas de combate ao desemprego jovem sejam consecutivamente adiadas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves.

O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, sem prejuízo da discussão que se faça à volta deste tema fundamental na sociedade portuguesa e que nós assumimos, portanto sem prejuízo de continuarmos a discutir estes projectos de lei do PSD, tenho apenas duas perguntas para colocar-lhe directamente - o Sr. Deputado, se quiser, diz sim ou não em resposta a estas questões.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Posso dizer outras coisas?

O Orador: - O que quiser a mais, com certeza - o tempo é seu! Sr. Deputado, é óbvio que falou sobre o desemprego juvenil. Entendo que há uma grande preocupação da sociedade portuguesa neste momento, mas a primeira questão que lhe coloco é a seguinte: é verdade ou não que, entre Maio de 1996 e Maio de 1997, o desemprego juvenil diminuiu em 24 mil jovens em Portugal? É verdade ou é mentira? A segunda questão é sobre se, no mesmo período, entre Maio de 1996 e Maio de 1997, as ofertas de emprego das empresas, nos Centros de Emprego, aumentaram ou não de 7500 para 11 mil «novos postos de trabalho em Portugal?

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Ninguém acredita nisso!

O Orador: - São estas duas perguntas que quero colocar-lhe. E, se for verdade, entende ou não que, afinal, o programa de acção imediata para o emprego, que foi lançado pelo Governo, tem, de facto, situações muito positivas e que estão a dar resultado?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, agradeço ao Sr. Deputado Paulo Neves que me permita responder-lhe serra ser por «sim» ou «não». De facto, outra discussão teríamos de aqui ter, e já tivemos noutras alturas, entre esta bancada e, nomeadamente, o Governo em relação a estes dados que o Sr. Deputado Paulo Neves tão galhardamente invoca sempre que se fala desta questão. Queria lembrá-lo - aliás, como já uma vez o fiz, depois de uma brilhante exposição que o Sr. Deputado fez de todas as iniciativas do Governo nesta matéria - de que o próprio Governo, no relatório do Orçamento do Estado, prevê uma criação líquida de postos de trabalho para este ano, o ano que decorre, que é interior ao número de jovens que todos os anos entram no mercado de trabalho. Esta questão nunca foi respondida.

O Sr. Paulo Neves (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Não ó verdade? O Sr. Deputado está a desmentir o próprio relatório do Orçamento, apresentado pelo Governo.

O Sr. Paulo Neves (PS): - Leia o resto do relatório!

O Orador: - Queria dizer-lhe também que acho muito estranho que o Sr. Deputado venha aqui invocar como grande argumento para a bondade do trabalho e da política do Governo nesta matéria o facto de, nos Centros de Emprego, ter aumentado de 7500 para 11 mil a oferta de postos de trabalho; mas esqueceu-se de dizer quantos jovens estão inscritos nos Centros de Emprego à procura de trabalho! Esqueceu-se de dizer quantos jovens estão desempregados neste país, para podermos fazer a verdadeira comparação! Esqueceu-se de dizer quantos jovens, para além dos que estão desempregados, estão com vínculo precário e, a todo o momento, a correr o risco de ir para o desemprego! Esqueceu-se de tudo isso, Sr. Deputado!

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Ele não quer falar nisso! É tímido!

O Orador: - Portanto, mais do que responder «sim» ou «não», Sr. Deputado, a análise tem de ser feita de uma forma séria e tem de ser dito claramente - e, se quiser, até pode responder com «sim» ou «não» - se a caminhada para a Moeda única implica ou não custos ao nível do desemprego, nomeadamente do desemprego jovem. Sim, implica! E se o PS e o PSD apostam ou não, como primeira prioridade na sua política, nesta caminhada: «sim» ou «não»? Sim!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isso são perguntas

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Almeida Velho.

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O Sr. Gonçalo Almeida Velho (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, por iniciativa do Grupo Parlamentar do PSD debatem-se hoje três projectos de lei sobre incentivos à contratação de jovens desempregados e desempregados de longa duração. À semelhança do passado, o PSD continua, de forma simplista e pouco rigorosa, a apresentar iniciativas e medidas meramente parcelares, que não dão resposta, com a seriedade que a matéria exige, aos problemas do desemprego, em geral, e do desemprego dos jovens e dos desempregados de longa duração, em particular. Para nós, o combate ao desemprego e a criação de mais e melhor emprego constituiu, desde o primeiro momento, uma das prioridades do Governo da Nova Maioria. Nesse sentido, defendemos uma política e uma estratégia global e integrada de combate ao desemprego, ao invés do que sempre foi sustentado pelo PSD, que, apenas e só, se limita a apresentar iniciativas legislativas de carácter pontual, casuístico e cujo rigor e clareza estão sempre ausentes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, através do projecto de lei n.º 282/VII, pretende o PSD criar um sistema de incentivos à contratação de jovens, traduzindo-se em concreto num alargamento do sistema já vigente e introduzido pelo Decreto-Lei n.º 89/95. Numa atitude séria, deveria o PSD ponderar os custos/benefícios de uma tal medida. É que o tempo das medidas imponderadas e ao sabor do oportunismo político deixaram de ter lugar na sociedade portuguesa a partir do momento em que o Governo da Nova Maioria assumiu a condução dos destinos do País.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, foi com aquele objectivo que, no âmbito do Acordo de Concertação Estratégica. os parceiros sociais se comprometeram, no corrente ano, a desenvolver estudos de avaliação custo-eficácia e custo-benefício das medidas activas de emprego. Constitui um objectivo claro do Governo a revisão dos regimes de contribuições reduzidas, com base na avaliação dos resultados obtidos à luz de critérios rigorosos de eficiência, de eficácia e de compensação de financiamento, adequando-os aos objectivos da criação ou manutenção do emprego.
Não é por acaso que, numa recente comunicação, a Comissão Europeia refere que diversos Estados membros, que introduziram medidas para diminuir os custos salariais indirectos, vieram a constatar que tais medidas não tiveram efeitos significativos nos níveis globais de emprego, tendo desencadeado efeitos de substituições de mão-de-obra subvencionada e não subvencionada, com perdas consideráveis. E, nesse mesmo relatório, a Comissão Europeia deixa o seguinte alerta, Srs. Deputados: os efeitos positivos poderão ser maiores se as medidas forem cuidadosamente concebidas. Ora, Srs. Deputados do PSD, esta não é, seguramente, a vossa postura.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, do ponto de vista financeiro, constata-se que da aplicação desta medida resulta um agravamento anual suplementar para o orçamento da segurança social na ordem dos três milhões de contos. Actualmente, a isenção das contribuições para a segurança social, obtidas pelas entidades patronais, tendo como destinatários jovens com menos de 30 anos, representam custos suplementares anuais no orçamento da segurança social de quase 12 milhões de contos. Embora a segurança social receba anualmente transferencias do IEFP por via do Quadro Comunitário de Apoio, com vista ao ressarcimento de parte destes custos, aquelas transferências rondarão no corrente ano cerca de 700 mil contos, o que ficará muito aquém dos custos reais desta política. A redução da taxa de contribuição para a segurança social a vigorar nos quarto e quinto anos do contrato de trabalhe sem termo, como quer o PSD, representa um esforço orçamental, em mais de três milhões de contos. Acresce que, estando em curso a reforma do sistema da Segurança Social torna-se fundamental questionar o seu modelo de financiamento, nomeadamente a utilização da segurança social como amortecedor do desemprego.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Constata-se, ainda na iniciativa do PSD, uma completa ausência de regras que claramente definam as condições de acesso aos incentivos previstos. Também no que respeita à criação líquida de postos de trabalho, não é suficiente referi-lo em abstracto; importaria especificar as condições em que se processaria, sob pena de se tomar nubloso o sistema vigente e que o Governo, de forma responsável, veio clarificar. Por outro lado, o projecto não atribui qualquer relevância quanto à necessidade de as entidades empregadoras apresentarem viabilidade económica e financeira ou terem a sua situação regularizada perante a segurança social e o fisco. Para o PSD, numa atitude irresponsável e de puro Facilitismo, muitas vezes conducente e permissivo da fraude, qualquer entidade empregadora pode beneficiar de dispensa ou da redução das contribuições para a segurança social desde que declare ser entidade empregadora e demonstre vontade de criar postos de trabalho. Mas este é, uma vez mais, o modelo que o PSD quer e não seguramente o que o PS e os parceiros sociais defendem como melhor para os interesses do País.

O Sr. Paulo Neves (PS): - Ainda não aprenderam!

O Orador: - Por último, estamos convictos de que a aprovação deste projecto de diploma poderia suscitar dúvidas quanto à sua aplicação, designadamente na conjugação com o regime actualmente em vigor.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, quanto ao projecto de lei n.º 297/VII, o mesmo visa alargar a concessão de incentivos ao emprego de jovens desempregados e desempregados de longa duração às IPSS. A apresentação deste projecto de lei levaria os menos atentos a julgar que se trata de uma iniciativa inovadora.

O Sr. Paulo Neves (PS): - Não é inovadora! É uma iniciativa requentada!

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O Orador: - Todavia, esta não é a visão correcta, porquanto a legislação em vigor, no que concerne aos incentivos, quer financeiros quer ao nível da Segurança Social, diz que são aplicáveis a toda e qualquer entidade empregadora independentemente da sua qualificação jurídica. Em 1997, até Junho, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 34/96, foram já aprovadas 25 candidaturas de 25 IPSS, correspondentes à criação de 70 postos de trabalho. As IPSS, ao contrário do que o PSD pretende fazer parecer, não estão impedidas de aceder ao regime de incentivos à contratação, estando colocadas em pé de igualdade com as demais entidades empregadoras, beneficiando de um tratamento positivo noutros domínios. Por exemplo, no âmbito do Mercado Social de Emprego, está prevista a aplicação de apoios à contratação a entidades como sejam as IPSS.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, neste momento encontram-se já a receber formação profissional cerca de 500 desempregados que irão desenvolver a sua actividade em diversas áreas ocupacionais em 147 IPSS. Daqui se conclui que as IPSS gozam já de um acesso privilegiado aos apoios à contratação, não fazendo sentido, em paralelo, criar o sistema que o PSD pretende. É neste domínio que o PS e o Governo descriminam positivamente as IPSS, donde resulta que a medida agora apresentada pelo PSD já o PS a implementou e em melhores condições.
Por outro lado, ao prever a possibilidade da concessão de apoios financeiros às situações em que a contratação seja feita mediante contrato de trabalho a termo, o PSD opta claramente pelo facilitismo, sem ter em conta, face à escassez dos recursos financeiros do País, a necessidade de criação líquida de postos de trabalho. Este é o sistema que sempre combatemos e que pode gerar a fraude e o recurso à substituição fictícia de trabalhadores meramente com o intuito da obtenção de formas de emprego subvencionado. No que respeita às dispensas e reduções contributivas, as IPSS também delas beneficiam. Deste modo, não se entende bem qual o objectivo do PSD em consagrar um novo regime, quando o vigente já deu provas suficientes de responder de forma adequada às necessidades de contratação das entidades empregadoras, em geral, e das IPSS, em particular.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Este projecto de lei, para além de gerar a confusão, nenhuma mais-valia traz ao regime vigente e não resolve as dificuldades de contratação das IPSS. Aliás, a este respeito se diga que, quando o próprio Presidente da União das IPSS, numa entrevista dada há cerca de três dias a uma rádio, questiona o alcance das propostas do PSD, recusando-lhe qualquer espécie de apoio, pouco mais haverá a dizer a este respeito. Não é sério apresentar iniciativas legislativas apenas com o objectivo de preencher calendário político para tentar esconder os vossos problemas internos, quando os potenciais destinatários e beneficiários das mesmas, de forma clara. já as questionam, Srs. Deputados! Resta-nos concluir que o PSD terá preparado esta iniciativa sem sequer ponderar e auscultar os interesses das próprias IPSS. Por esta razão, não podemos apoiar as iniciativas do PSD que claramente se afastam da estratégia do Governo, plasmada no Plano Integrado de Combate ao Desemprego.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, aquilo que o PSD hoje pretendia era nada mais nada menos do que meter pela janela aquilo que não conseguiu meter pela porta, aquando da discussão da ratificação do Decreto-Lei n.º 34/ 96, há cerca de um ano. Srs. Deputados, não contem connosco, futuramente, para mais uma encenação como esta.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Gonçalo Almeida Velho - e Sr.ª Deputada Elisa Damião, que há pouco fez questão de me referir na sua intervenção -, respeito as opções individuais e, sobretudo, as opções que são absolutamente do toro íntimo de cada um e longe de mim fazer qualquer juízo de valor sobre essas mesmas opções. Porém, estava a comentar e seguramente que a Sr.ª Deputada não ouviu, que para mim não é insignificante que ontem tenha estado aqui o líder da Juventude Socialista quando foi para discutir as uniões de facto e hoje, para discutir o desemprego de jovens, não esteja presente na sua bancada.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Sr.ª Deputada, para mim isto não é inocente; para mim isto é revelador das prioridades da Juventude Socialista e revela-se na atitude do seu próprio líder.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Portanto, quanto a isso, estamos claramente esclarecidos. Quanto à busca de protagonismo estamos esclarecidos.
Quanto à preocupação, quanto à responsabilidade e quanto à honestidade política, também estou completamente esclarecido relativamente à bancada da Juventude Socialista!

Protestos do PS.

Mas gostava de dizer-lhe reais, Sr. Deputado: disse há pouco, referindo-me ao Deputado Hermínio Loureiro, do PSD, que o PSD tem razão mas tem falta de autoridade porque - como disse há pouco e volto a repetir - este

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problema é velho mas continua novo; é um problema que já vem de há muitos anos e ainda ninguém o soube resolver. O PSD tem razão mas não tem autoridade.
No entanto e duma vez por todas, não vamos desculpar as nossas incapacidades do presente, as incapacidades do Governo no presente, com os falhanços do PSD.
Sr. Deputado, faço um desafio à sua bancada, faço um desafio ao Partido Socialista, de uma vez por todas: a glória do Partido Socialista não está no fracasso passado do PSD; a glória do Partido Socialista estará naquilo que for capaz de fazer hoje, amanhã e depois. E, quanto a isso, os senhores, nesta Casa, nada dizem e estão sempre a desculpar-se com o triste passado que vos foi legado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, objectivamente, gostava que me respondesse às seguintes perguntas: onde está o programa de estágios prometido pelo Governo?

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Não está!

O Orador: - Está a bancada do Governo satisfeita com o resultado do Plano Mateus? Onde está a prometida reestruturação do ensino técnico? Responda, Sr. Deputado!
Por último, de uma forma muito objectiva e pode responder só «sim» ou «não», está o Sr. Deputado, está a sua bancada satisfeita com o desempenho da Sr.ª Ministra para a Qualificação e o Emprego? Aguardo a sua resposta, Sr. Deputado.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - A palavra ao Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, para defender a honra da bancada socialista.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós, às vezes, laboramos em equívocos com um ou outro Deputado do PP. Aqui há tempos foi a lamentável confusão entre «copos dei e opus leite» ou «opus dei copos de leite».

Risos do PS.

Hoje é a lamentável confusão entre o que é um elemento da direcção da bancada, que é também Secretário-Geral da Juventude Socialista, e o que é um colectivo partidário parlamentar que está aqui amplamente representado. Estão aqui vários elementos da Juventude Socialista que estão a intervir neste debate; estão aqui Deputados de outras gerações e, portanto, é preciso explicar com clareza. Nós não aceitamos qualquer ataque dessa natureza ao Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, que está neste momento noutras tarefas político-parlamentares partidárias, que tem dado o melhor contributo ao trabalho do Grupo Parlamentar do PS e à Juventude Socialista. E é com muito gosto que temos este debate, porque a Juventude Socialista não é uma organização com fhurer, é uma organização colectiva, com trabalho em condições, um excelente grupo de jovens, como nunca nenhum partido aqui teve desde o 25 de Abril.

Aplausos do PS.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, a palavra ao Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nono Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, não houve qualquer confusão. Para mim as coisas são muito claras: ontem o líder da Juventude Socialista e Deputado dessa bancada esteve presente no debate, fez questão de estar presente no debate. As conclusões políticas tiramo-las nós. Eu tiro as minhas!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Outra vez?!

O Orador: - Sr. Deputado, cada um tira, as conclusões que quiser. Quando foi para discutir as uniões de facto, o líder da Juventude Socialista estava aqui; porém, quando é para discutir o desemprego jovem, o líder da Juventude Socialista não está cá. Quanto a isto estamos esclarecidos e nada mais há a dizer.
Quanto a factos - não é a uniões de facto -, o facto é que o líder da Juventude Socialista está ausente num debate importante, penso eu, para os jovens portugueses.

Protestos do PS.

Aliás, respeito muito os Deputados da Juventude Socialista e para além de respeito também tenho alguma consideração por alguns Deputados, não digo por todos, da Juventude Socialista - e até nem compreendo por que é que teve de ser o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira a defender a honra da bancada e a honra da Juventude Socialista... .

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira pede a palavra para que efeito?

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Espero que seja, Sr. Deputado. Tem a palavra.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, a interpelação é só para lembrar que o critério da Mesa é que apenas os elementos da direcção da bancada podem defender a honra da bancada e que o único elemento da Juventude Socialista na direcção da bancada está exactamente neste momento, como disse,...

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O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Ausente!

O Orador: - ... noutra tarefa parlamentar e política e não está aqui.

O Sr. Presidente: - Está dado o esclarecimento.
A palavra ao Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva, para formular um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Gonçalo Almeida Velho.

O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Gonçalo Almeida Velho, admito que esteja numa situação incómoda e por isso começo por pedir-lhe desculpa por fazer-lhe esta pergunta a si e não ao líder de Juventude Socialista, que estará certamente em trabalhos parlamentares muito mais importantes do que discutir o emprego...
E, já agora, qual é o papel da Juventude Socialista? Tenho andado a pensar nisso, porque também vou pensando qual é o papel da Juventude Social-Democrata, e surge-me aqui uma dúvida: uma juventude partidária serve para, sendo autónoma do partido, ser a lente amplificadora dos jovens junto do partido, ajudando este a tomar boas decisões naquilo que é essencial para os jovens. Nesse âmbito, temos de falar de emprego, de educação, de droga, de segurança social. Ou uma juventude partidária deve evitar falar dessas matérias estando sempre ao lado do Governo no que é essencial fazendo uns «números» políticos, brincando para a bancada?
Confesso que ainda não percebi qual é o vosso papel porque ainda que o digam de forma contrária, na prática, fizeram sempre o que o Governo queria e no que não era essencial tentaram divergir do Partido Socialista! Recordo-lhe que nas vagas adicionais e nos exames nacionais do 12.º ano, estiveram ao lado do Governo e do PS; que nas propinas foram vocês a anunciar, em nome do Ministro da Educação, o valor da propina única e até disseram que gostavam que fosse um valor maior e falaram em 80 contos; que na área do emprego não apresentaram nada nesta Assembleia da República em dois anos!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Apresentaram um diploma relativo ao recenseamento dos jovens com 17 anos para votarem aos 18 anos, mas teve de ser a Juventude Social-Democrata a corrigi-lo para que os jovens com 18 anos também pudessem ser eleitos. E no resto fazem uns «números»!
Sr. Deputado, concorda com esta forma de fazer política brincando com coisas sérias, jogando para a bancada, ou acha que é da bancada que se deve fazer política lá para fora falando para 120 000 jovens desemproados, para 20 000 jovens licenciados desempregados em que o Estado investiu mais de 10 milhões de contos para que se licenciassem?! Acha bem que se nada faça quando há 26% dos empresários a dizer que vão contratar jovens no próximo ano e que só 4% dos empresários vão contratar jovens licenciados?! O que é que acha disso? É porque, numa altura em que o Governo nada faz nesta área, decorridos dois anos, ouvi a Juventude Socialista, numa altura em que a Juventude Social-Democrata com o Grupo Parlamentar do PSD apresentam aqui diplomas concretos para ajudar a resolver este problema, que não é um paraíso, quando - repito - o Governo nada faz nada, ouvi-o falar em números!
Não sei se participou na campanha eleitoral, deve ter participado porque foi eleito Deputado, mas era lá dito que as pessoas não são números. Estaremos a falar do mesmo partido?! Ou as pessoas que eram pessoas, agora transformaram-se em números?!...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Memória curta!

O Orador: - Em concreto: votam ou não a favor destes diplomas? Vão arranjar subterfúgios, vão encontrar alibis para fugir à resolução deste problema ou vão querer votar ao nosso lado esta matéria e a partir de agora começar a fazer oposição e ser alternativa a sério ao Governo?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - A palavra, para responder aos dois pedidos de esclarecimento, ao Sr. Deputado Gonçalo Almeida Velho.

O Sr. Gonçalo Almeida Velho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, olhe para trás e verá que o único Deputado da Juventude Centrista-Gerações Populares da sua bancada não está presente.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Estão cá todos, porque sou o único!!

O Orador: - Não tale do líder da minha organização de juventude porque estou tão ou mais habilitado para falar deste assunto como o senhor e seguramente que o líder da minha juventude está tão ou mais preocupado com este problema do que eu.

Vozes do PSD: - Não parece!

O Orador: - E quero dizer-lhe mais, a si e ao Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva: este problema, como há bem pouco disse nesta Casa, não é um problema com o qual, comigo, devam fazer qualquer tipo de chicana política. Fui ali acima ser sério e é isso que peço às Gerações Populares e à Juventude Social-Democrata.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O facto de o desemprego ter diminuído em 24 000 jovens é motivo da nossa satisfação, mas queira acreditar que não estamos contentes. Sé estaremos contentes quando o reduzirmos, se possível, a zero.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à pergunta concreta relativa ao trabalho da Sr.ª Ministra para a Qualificação e o Emprego

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quero dizer-lhe que estou satisfeito. Não me desiludiu, pois tem estado a fazer...

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Sr. Deputado, para nós, a política de emprego não é feita casuisticamente ou pontualmente, é integrada. Em Dezembro de 1995 o líder do meu partido, hoje Primeiro-Ministro deste país, no Conselho Europeu de Madrid, quando os senhores estavam a dormir, quer no PSD, quer no PP, quer no PCP, preocupou-se com a questão do emprego.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, é meritório que o último Conselho de Amsterdão tenha tido uma posição concreta sobre a resolução deste problema que não é fácil. Por isso apelo, como tenho feito várias vezes, a que as juventudes partidárias dêem as mãos para resolver este problema, que não é fácil e acerca do qual não basta recriminar, não basta apresentar medidas avulsas sem qualquer conteúdo e não ter uma posição concreta, concertada e eficaz.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva, frustrou-me, porque em relação a emprego disse zero, disse nada!

Aplausos do PS.

Só apontou medidas avulsas como quando estavam no poder - agora já não estão -, em que tomavam medidas pontuais que não resolviam, que atrapalhavam, confundiam e que, imagine, aumentavam o desemprego de jovens licenciados ou não.
Mas digo-lhe mais: não vai ouvir mais da minha boca o argumentário político de mais ou menos desemprego. Não estamos satisfeitos, mas estamos a trabalhar objectivamente para a resolução do mesmo.
Quanto aos assuntos que diz que o líder da minha juventude partidária pôs na ordem do dia, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que isso não nos cria quaisquer complicações porque não temos secretários-gerais a demitirem-se, não temos vice-presidentes a demitirem-se. Mais: nós não temos uma equipa de futebol, como os senhores, que queria ser de 11 elementos mas não tem dois vice-presidentes, não tem um secretário-geral! Cuidado porque a breve trecho não terão um líder do partido. Sr. Deputado, preocupe-se com o seu partido...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Preocupamo-nos com o trabalho dos jovens.

O Orador: - ... porque nós, juntamente com o Governo, estamos cá para resolver, para tentar atenuar um problema que atinge seguramente muitos dos jovens portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Nuno Abecasis inscreveu-se para defender a honra da bancada. Srs. Deputados, não me levem a mal se vos fizer o reparo de que hoje estão hipersensíveis.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, não estou hipersensível, nem sou hipersensível, mas não posso ouvir em silêncio dizer que o Deputado que representa a Juventude Centrista-Gerações Populares, que não ferir a dimensão do Grupo Parlamentar do PS, não está presente quando o Deputado Nuno Correia da Silva, que é o único Deputado eleito pela Juventude Centrista-Gerações Populares neste Parlamento, está cá, está activamente presente na altura em que se discute o problema do trabalho e do emprego dos jovens. Lamento que seja dito isto e que não sejam respondidas questões pertinentes que ele apresentou.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nuno Abecasis, tenho a honra da sua bancada por tão sólida que insisto em que há hipersensibilidade hoje.
A palavra, para dar explicações, ao Sr. Deputado Gonçalo Almeida Velho.

O Sr. Gonçalo Almeida Velho (PS): - Sr. Deputado Nuno Abecasis, tenho muita, sinceramente muita, consideração por si e não quis ofendê-lo. Não estou aqui para ofender ninguém, estou aqui para - aliás, creio que o senhor comunga desta minha forma de estar - tentar defender os problemas dos portugueses.
Mas, por mais que ponha ou tire os óculos, não vejo aí o líder do seu partido nem a líder da sua bancada...

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - E na sua?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Deu um tiro no pé! O seu líder também não está!

O Orador: - ... a discutir questões sérias, como são as que hoje discutimos. Em todo o caso, não vou passar qualquer atestado de menoridade, porque não cometeria essa indelicadeza, mas o debate é sério.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - O seu líder também não está!

O Orador: - Sr. Deputado Nuno Abecasis, não esperava, de modo algum, ouvir as opiniões extremistas que o PP imprime à construção europeu, porque o Conselho de Amsterdão soube criar e ter a sensibilidade para o problema do desemprego, mas, como estamos preocupados, o que eu gostava era de saber se a líder da sua bancada está preocupada ou não. Aliás, creio que o líder do seu partido estará, seguramente, tão preocupado como nós.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal para exercer a defesa da sua honra pessoal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr. Presidente, trata-se de uma dupla defesa da honra, ou seja, por um lado, é de carácter estritamente pessoal e, por outro, é em nome da Juventude Socialista, visto que há pouco apenas os elementos da direcção da bancada poderiam usar da palavra.
Trata-se de uma defesa da honra do ponto de vista pessoal porque aquilo que foi dito pelo Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva em relação ao projecto de lei apresentado pelo PS, do qual eu fui primeiro subscritor, relativamente ao recenseamento eleitoral de carácter provisório para jovens com menos de 18 anos, não corresponde à realidade, pois esse projecto de lei já incluía a capacidade de também ser eleito.
De qualquer forma, desculpo-lhe o engano, na medida em que não estava cá e, portanto, terá tido alguma dificuldade em acompanhar este processo. Seja como for, fica aqui a correcção.
Em relação à ausência do Secretário-Geral da Juventude Socialista, devo dizer que, com todas as acusações de protagonismo ou de excesso de protagonismo, o que é facto é que esse protagonismo existe na exacta medida do mérito que é reconhecido às posições e às iniciativas legislativas que ele e a JS tem tomado, pelo que há diversificadas solicitações em relação ao Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto.
Compreendo que alguns dos presentes não saibam o que são essas solicitações, porque também não sabem o que é esse protagonismo merecido. Às vezes fazem algumas tentativas, como aconteceu, por exemplo, com algumas das intervenções que ouvi aqui hoje, nomeadamente referenciando o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, mas esses apartes, no meu entender, só se justificam por dores articulares que a ortopedia não resolve.

Risos e aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva.

O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Sr. Deputado, mais uma vez, quero dizer-lhe que deve ser muito incómodo falar em nome de terceiros.
De qualquer forma, quero esclarecer que o senhor não desmentiu que o projecto de lei que vocês apresentaram relativo ao recenseamento eleitoral tivesse sido mal feito e que, inicialmente, tivesse apenas previsto a capacidade eleitoral passiva.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Não é verdade!

O Sr. Gonçalo Almeida Velho (PS): - Seja sério!

O Orador: - Se não fosse a contribuição de todas as bancadas nesta matéria... Também em relação à união de facto vocês apresentaram umas ideias, mas tiveram de ser o Os Verdes e o PCP a apresentar projectos de lei em concreto.
Relativamente ao que o senhor disse sobre o protagonismo, acho muito bem que a JS dê nas vistas! É mesmo importante que a JS dê nas vistas para a gente ter a noção de que existe, dado que não existe para aquilo que é essencial, como é o caso da educação e do emprego.
Srs. Deputados, não me obriguem a cair no exagero de fugir daquilo que é essencial na política! Nunca vou sair daquilo que é essencial na política...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ..., que são os jovens que têm uma educação que não serve e que não têm um emprego como gostariam.
Os senhores Falam de uniões de facto e de legalização de casamentos entre homossexuais e do concreto não falam, o que é uma pena.
Portanto, dores articulares eu não tenho! A prazo, veremos quem tem razão!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para interpelar a Mesa, os Srs. Deputado Nuno Abecasis, Afonso Candal e Luís Sá.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, quero interpelar a Mesa porque ouvi uma coisa que me deixou atónito. É que me foi perguntado onde estava a elite da minha bancada. Ora, eu conheço na minha bancada Deputados, não conheço elites. Não sei se isso será costume neste Parlamento ou noutras bancadas...

O Sr. Gonçalo Almeida Velho (PS): - Eu falei da líder, não da élite!

O Orador: - Por outro lado, neste momento, estão na minha bancada todos os elementos relevantes para este debate, ou seja, está .representada a juventude, estão representados os sindicatos e os dadores de trabalho, pelo que me parece que a nossa representação para este debate é a conveniente. São, pois, estes os Deputados que podem neste momento estar aqui, pelo que não aceito, de forma alguma, que se faça qualquer crítica à minha bancada sobre esse aspecto.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, á sua interpelação seria um protesto se não se tratasse de uma tomada de posição em relação à resposta a um pedido de esclarecimento. Fica registado o seu protesto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr. Presidente, uso da palavra apenas para saber se será possível à Mesa fazer distribuir os projectos de lei sobre o recenseamento, que foram apresentados por diversos partidos, a Deputados que não estavam cá na altura, tendo-lhes sido impossível, por

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esse motivo, acompanhar esse debate, continuando, mesmo depois de esclarecidos, a lavrar no mesmo erro.
Houve, de facto, um trabalho conjunto entre os diversos grupos parlamentares, sempre saudável em todas as matérias em que isso for possível, no entanto, aquilo que foi dito não corresponde à verdade pois o projecto de lei apresentado pelo PS já consagrava inicialmente a capacidade passiva conjuntamente com a capacidade activa.
Gostava que isso ficasse muito claro, não obstante o trabalho conjunto ter sido frutuoso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, esses projectos de lei foram não só distribuídos como publicados...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Basta ler no Diário da Assembleia da República!

O Orador: - ..., portanto a sua divulgação está assegurada. A Mesa não pode fazer mais nada!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Os jovens da JSD não sabem ler bem!

O Orador: - Srs. Deputados, acho pouco normal que os senhores discutam enquanto o Presidente da Mesa está a fazer uma comunicação que se dirige a quem está a discutir.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação não respeita às intervenções que acabaram de ser feitas mas, sim, a outra matéria que é de grande utilidade e que respeita ao seguinte: foi entregue ontem, pela minha bancada, na Mesa da Assembleia, um requerimento em relação ao qual pedíamos que o Sr. Presidente se empenhasse no sentido de obtermos uma resposta rápida por parte do Governo, pois trata-se de uma questão da maior urgência.
O problema é este: Foi participado pelo Governo ao Ministério Púbico, para efeitos de dissolução, o facto de ter havido atraso na aprovação do orçamento e plano de actividades da Câmara Municipal da Amadora. Acontece que há dezenas de municípios que aprovaram igualmente com atraso os planos de actividades e orçamentos, nomeadamente os de Sintra, Maia, Porto, Gondomar, Covilhã, Faro, entre muitos outros.
As questões que se colocam neste requerimento são as seguintes: quais os municípios que aprovaram planos de actividades e orçamentos com atrasos, na medida em que eu referi estes mas há outros; que critérios utilizou o Governo para proceder à participação ao Ministério Público do caso da Amadora e não de outros casos em que se verificou uma situação semelhante; e o que levou o Governo a participar agora, em véspera de eleições, uma situação que respeita aos anos de 1994 e 1995 quando estamos em meados de 1997.
Gostaria também de pedir a diligência pessoal do Sr. Presidente no sentido de ser respondido um outro requerimento que apresentei há três meses aos Srs. Ministros das Finanças e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e que respeita ao facto de as inspecções, os inquéritos e as sindicâncias a autarquias locais poderem estar a ser utilizadas como instrumento nas eleições autárquicas.
Nesse requerimento eu solicitava a lista de municípios em que estão a ser feitas essas inspecções e sindicâncias, pretendendo saber que medidas tenciona o Governo tomar para impedir a instrumentalização daquilo que tem vindo a acontecer, ou seja, a utilização política de resultados sem a resposta dada pelos municípios, e, em termos gerais, que critérios têm vindo a ser utilizados para estas inspecções e sindicâncias.
Para terminar, diria que aquilo que toda a gente diz, por exemplo no município da Amadora - e há unanimidade de todas as forças políticas representadas nos órgãos autárquicos da Amadora, que, aliás, aprovaram por unanimidade os planos e orçamentos e compreenderam por unanimidade por que razão houve atraso -, é que por detrás desta participação pode haver, pura e simplesmente, discriminação e tentativa de ganhar eleições na secretaria.
Trata-se, portanto, de uma questão política da maior gravidade e, nesse sentido, peço as boas diligências da Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, quanto ao requerimento apresentado ontem, encarreguei o Sr. Secretário da Mesa Artur Penedos de promover a urgência solicitada, e estou convencido que o fez. Aliás está presente o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, que deu conta do seu empenhamento numa resposta rápida a esse requerimento.
Quanto ao requerimento que fez há três meses e que se refere ao Ministério das Finanças, temos a sorte de ter connosco o Sr. Ministro das Finanças, pelo que espero que a sua preocupação encontre a resposta adequada.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar á Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, apenas para testemunhar que tomei devida nota das preocupações do Sr. Deputado Luís Sá, que não conhecia, e já agora aproveito para dizer que ontem o PCP apresentou aqui um requerimento, através do Sr. Deputado Lino de Carvalho, ao Ministro da Agricultura, o qual terá resposta hoje mesmo, pois o Sr. Ministro, que entretanto regressou do estrangeiro, fez questão em que a resposta chegasse hoje para que não restassem quaisquer dúvidas sobre as questões suscitadas.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Está a ver, Sr. Deputado Lino de Carvalho, isto é que é eficiência!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 92/VII

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- Estabelece o regime jurídico da concessão de garantias pessoais pelo Estado ou por outras pessoas colectivas de direito público.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças (Sousa Franco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho a honra de apresentar neste Parlamento a proposta de lei sobre o regime jurídico da concessão de garantias pessoais pelo Estado ou por outras pessoas colectivas de direito público.
Permito-me, em primeiro lugar, sublinhar que ela faz parte de uma reforma global importante, que é a reforma do crédito e da dívida pública, que o Governo inscreveu no seu Programa e tem entre mãos. Com frequência essa reforma é esquecida como área, entre muitas, na qual estão a introduzir-se alterações estruturais fundamentais.
Em 1996 foi criado, e já entrou em pleno funcionamento, o Instituto de Gestão de Crédito Público, precioso instrumento, desde já e para o futuro, para consolidar a política iniciada em 1996 de redução da dívida pública, cortando nos encargos financeiros que pesam sobre as gerações futuras.
Esta política tem todas as perspectivas de se consolidar em 1997 e nos anos seguintes, de acordo com o Programa de Convergência apresentado pelo Governo português e aprovado pelo Conselho da União Europeia.
Tem o Governo também em adiantada fase de preparação uma proposta de lei-quadro da dívida pública, que esperamos poder aprovar antes do início da próxima sessão legislativa para a apresentar a esta Assembleia, a qual substituirá a legislação ainda vigente, que, no essencial, é a legislação do Estado Novo com mais de 50 anos de atraso e óbvia inadequação ao regime constitucional.
A proposta de lei hoje em apreciação - e que esperamos mereça a vossa aprovação - introduz um novo regime da chamada dívida pública garantida, acessória ou de garantia, que substituirá a legislação vigente também ela da altura do Estado Novo.
Se a isto for acrescentada a dinamização do mercado interno de capitais e a preparação pari uma gestão da dívida pública integrada já no curo e na União Económica e Monetária, evidente, por exemplo, na recente autorização do Governo para a colocação de Obrigações do Tesouro em ouro, ver-se-á que esta proposta de lei constitui uma parte de uma reforma global da dívida pública e do crédito público que visa consolidar as nossas finanças, poupar encargos às gerações futuras e preparar, num sector que está ainda regido por legislação do Estado Novo, condições para passarmos às necessidades do mercado único, da economia global e de uma gestão moderna mais económica para o povo português da dívida e do crédito público.
É neste contexto, de uma forma - estrutural, que às vezes não é identificada como tale que já está muito perto da conclusão, se a Assembleia aprovar esta lei e a futura lei-quadro referente à dívida pública, que a proposta de lei n.º 92/VII tem sentido político global. Ela integra uma reforma, e não pequena, da dívida pública, que representava cerca de 11000 milhões de contos no final do ano passado, e, neste caso, da dívida acessória, que representava também no final do ano passado cerca de 1273 milhões de contos.
Esta proposta de lei, especificamente, com este sentido global de cumprimento do Programa do Governo, pode ser apresentada sob três planos: necessidade e oportunidade; fundamentação; e princípios e conteúdo.
Tratarei, em primeiro lugar, da necessidade e oportunidade do diploma em apreço.
A exposição de motivos da proposta de lei dá conta da evolução histórica do regime dos avales e, mais amplamente, das garantias financeiras pessoais do Estado e de outras entidades públicas.
Antes de 1961 vigorava o princípio, constante no artigo 29.º da Lei de Bases para a Reforma da Contabilidade Pública, de 20 de Março de 1907, de proibição da concessão de garantias financeiras do Estado a obrigações de terceiros.
As necessidades de desenvolvimento económico levaram, nos anos 60, a que, tanto em Portugal como nas colónias, viesse a ser permitida a garantia pública de operações de crédito externo. Essa permissão teve tradução, entre nós, primeiro, no Decreto-Lei n.º 43 710, de 24 de Maio de 1961, e, depois, na Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro, que melhorou o enquadramento jurídico do aval do Estado, permitindo a sua concessão às operações de crédito interno.
Logo após a aprovação desta lei, a Revolução de 25 de Abril de 1974 deu origem a uma profunda mutação da função e do entendimento do regime legal, a qual veio a perdurar até hoje, por vezes conflituando em larga medida, como é natural, com a ocasião histórica e o espírito da lei ainda em vigor e até com entendimentos mais restritos da sua letra. Pode falar-se, neste caso, de uma prática constante de aplicação analógica de muitos dos aspectos da Lei n.º 1/73.
Isto, que não é só um legado do período revolucionário, embora o seja também, mas uma prática constante da administração financeira portuguesa desde então até hoje, levou a que se fixasse uma interpretação uniforme da Lei n.º 1/73, alargando significativamente os quadros muito restritivos em que a sua ]eira foi concebida.
E alargou-os, em primeiro lugar, quanto ao número e à tipologia das entidades que podem ser beneficiárias de aval, que a lei restringia, para além da hipótese caduca das colónias, a empresas nacionais, discriminando as estrangeiras, e a institutos públicos, no sentido restrito e técnico da expressão. Encontramos nesta prática de 24 anos, quase um quarto de século, entre as entidades beneficiárias de aval, a mais diversa gama de beneficiários: comissões de trabalhadores, federações de grémios, organismos corporativos, comissões administrativas de empresa, autarquias locais e seus serviços, fundos financeiros que não são serviços públicos, organizações empresariais, associações patronais, directamente ou por interpostas formas associativas ou societárias, associações diversas universidades, cooperativas de diverso grau e regiões autónomas.
Quanto à natureza das operações susceptíveis de serem objecto de garantia, idêntica modificação interpretativa uniforme se operou. O Decreto-Lei de 1961 falava na «importância para a estabilidade e progresso económico do

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País» como requisito objectivo da concessão de garantia financeira. A Lei n.º 1/73 falava, e ainda fala, de empreendimentos ou projectos de manifesto interesse para a economia nacional».
Porém, a prática uniforme de 24 anos introduziu com largo predomínio, quanto aos montantes e aos tipos de operações, em relação aos que obedeciam à letra da lei, todo um conjunto de situações bem diferentes, que só formalmente podem considerar-se empreendimentos ou projectos: saneamento financeiro, manutenção de postos de trabalho, liquidação de dívidas, apoios de tesouraria, pagamento de salários, pagamento de salários em atraso, pagamento de dívidas fiscais e à segurança social, indemnizações a trabalhadores por cessação de contratos de trabalho, aquisição de matérias-primas e bens de equipamento, financiamento indispensável à continuidade da empresa ou à sua reconversão, amortização de dívidas e cobertura de prejuízos, pagamento de juros e amortizações, entre outros.
Quanto ao carácter nacional das entidades beneficiárias, exigido pela Lei n.º 1/73, também ocorreram numerosos desvios ou afastamentos. A concessão de aval a empresas estrangeiras é um caso bastante frequente e, como é evidente, hoje, a Lei n.º 1/73 está inadequada, por discriminar relativamente aos cidadãos comunitários, contrariando assim um princípio imperativo do Direito Comunitário.
Finalmente, o último dos requisitos objectivos da Lei n.º 1/73 - garantias de viabilidade financeira às entidades beneficiarias - também foi objecto de uma interpretação muito larga. Em vez de financiarem empreendimentos e projectos de entidades sólidas, de um ponto de vista financeiro claramente relacionado com o desenvolvimento da economia nacional, o aval do Estado passou a funcionar como uma forma de apoio a entidades em dificuldade financeira, às vezes até reconhecidamente inviáveis.
Esta situação, que, sublinho, não é apenas do período revolucionário mas nasce nessa época e prolonga-se até hoje, não deixou de ser apercebida, bastante cedo. Logo em 1976 tive a honra de ser, nesta Assembleia, o primeiro signatário e co-autor do projecto de lei n.º 31/I, apresentado por Deputados sociais-democratas, o qual, juntamente com a proposta de lei n.º 52/I, do I Governo Constitucional, presidido por Mário Soares, visava substituir a Lei n.º 1/73. Ambos foram rejeitados na generalidade nesta Câmara, por razões que se prendem mais com a conjuntura política do que com o seu conteúdo. O referido projecto de lei foi renovado em 1978, mas desta vez não chegou a ser apreciado.
Por outro lado, o 1 Governo Constitucional tomou ainda a iniciativa, através do Despacho Normativo n.º 19/77, do Ministro das Finanças Mediria Carreira, de tornar obrigatória a publicação de listas anuais das entidades beneficiarias. A essa iniciativa foi dado cumprimento de 1977 até 1979 e, depois deste ano, apenas em 1985, 1987 e 1990.
Na preocupação de disciplinar o aval do Estado, a revisão constitucional de 1982 previu que, segundo o actual artigo 164.º, alínea i), a Assembleia da República fixasse os limites máximos de avales a prestar pelo Estado.
Neste quadro, não posso deixar de sublinhar a Resolução do Tribunal de Contas de 22 de Janeiro de 1988, proferida num processo em que estava em causa a execução de um aval prestado a favor de uma empresa estrangeira (o Banco Nacional da República Democrática de S. Tomé e Príncipe).
Neste caso, a legislação, na sua letra, não permitia a concessão de avales do Estado a entidades estrangeiras. Mas o Tribunal concedeu-o, apontando, no final, que «As profundas alterações político-económicas que se produziram no País nos últimos anos é natural que aconselhem a modificação da legislação vigente em matéria de avales do Estado, mas essa é decisão que caberá ao Governo tomar quando e pela forma que entenda conveniente».
Esta resolução não teve, até hoje, qualquer seguimento. Só agora este Governo, ao abrigo dos seus compromissos, e fiel a eles, lhe dá cumprimento.
Sublinho que lhe dá cumprimento no contexto de uma prática de tornar mais rigorosa, embora colocando ao serviço da economia nacional, a concessão de avales. Desde a sua entrada em funções, foi suspensa a emissão de cartas de conforto, as quais foram progressivamente reconduzidas à legalidade.
Determinou-se também, logo após a entrada em funções deste Governo, que fosse estudada pelos serviços a preparação de uma lei que substituísse a Lei n.º 1/73. Perante a dificuldade de os serviços assegurarem essa tarefa, foi constituído, em 8 de Outubro de 1996, um grupo de trabalho, que apresentou em 27 de Março de 1997 um anteprojecto, que o Governo reviu politicamente e que serve de base a este texto que agora submetemos à Assembleia da República. Sublinho que o fazemos por opção democrática e respeito pelo Parlamento, porque se trata de matéria que, por não integrar a reserva de competência legislativa da Assembleia da República, poderia ter sido objecto de disciplina por decreto-lei do Governo.
Ao mesmo tempo, determinou-se uma redução dos avales, operada em 1995 e 1996 e esperamos que continue em 1997; a sistemática comunicação prévia à Comissão da União Europeia das operações de garantia que pudessem representar ajudas do Estado relevantes para efeitos do regime comunitário, diferentemente da prática anterior; e, por despacho meu de Abril passado, que a execução do limite máximo de avales tosse reduzida na ordem dos 20%a abaixo do limite máximo autorizado pela Assembleia da República.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - A razão histórica desta iniciativa, penso tê-lo demonstrado, veio ao encontro de uma política de disciplina, mantendo, no entanto, a justificação do aval.
O segundo ponto de que queria falar era a fundamentação desta iniciativa.
Não há dúvida de que o aval é, e as garantias do Estado em sentido amplo são-no, um instrumento importante de apoio económico quer a entidades públicas quer à iniciativa privada. Esse instrumento, que é mais económico do que a concessão de subsídios de despesa, não pode nem deve ser objecto de renúncia por parte do

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Estado. Mas deve ser disciplinado, e a incerteza que se estabeleceu na aplicação da Lei n.º 1/73, manifestamente chocante nos seus princípios com a prática posterior a 1974, é perigosa e inconveniente. É, pois, necessário, manter o princípio da garantia financeira do Estado como a forma mais económica de todas de apoio à iniciativa económica privada e a entidades sociais ou públicas. É necessário não só manter alguma flexibilidade nessa forma de apoio mas também reintroduzir uma disciplina e uma segurança que têm faltado.
É este o sentido da presente proposta, Sr. Presidente e Srs. Deputados. Em primeiro lugar, ela visa disciplinar com maior rigor a prática actual. Por outro lado, da relativa contradição entre a letra da Lei n.º 1/73 e a aplicação uniforme que lhe tem sido dada resulta uma incerteza evidente. Tomámos o partido de procurar ser rigorosos mas também maleáveis e dinamizadores da economia. Por outro lado ainda, pretendeu-se clarificar várias formas de disciplina financeira que decorrem da imposição da autorização parlamentar, a qual tem poucas consequências, visto que a Lei n.º 1/73, naturalmente, no âmbito de um regime autoritário, não a previa. E procurámos que a autorização parlamentar tivesse mecanismos de garantia e de acatamento não apenas pelo Governo como também pela Administração.
Pretendemos estabelecer um conjunto de princípios que se aplique a outras entidades, fundos e serviços autónomos que têm o poder de conceder garantias financeiras. E pretendemos também, transformando o conceito restrito de aval no conceito de garantia pessoal do Estado, abranger todas as formas - aval, Fiança, mesmo outras formas de garantia - que o Estado possa conceder a entidades públicas ou privadas, como forma de possibilitar o seu acesso ao crédito.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os princípios deste projecto de lei, a sua razão histórica e a sua fundamentação demonstram, parece-me, a coerência do Governo com o compromisso que tomou de disciplinar a actividade financeira, colocando-a ao serviço do desenvolvimento económico-social. Por um lado, clarificando o regime da dívida pública de garantia; por outro, permitindo a necessária maleabilidade da sua concessão, mas core disciplina e rigor quanto aos casos e às situações em que essa concessão deve ser autorizada.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, este é mais um caso em que nos empenhámos em dar cumprimento ao Programa do Governo e, ao mesmo tempo, em fazer uma reforma de fundo.
Esta proposta de lei, que esperamos mereça a vossa aprovação, é um pilar da reforma legislativa do crédito público, essencial para modernizar o nosso direito financeiro, num domínio em que as leis fundamentais ainda vêm do tempo do regime autoritário do Estado Novo. Ela é, simultaneamente, reais moderna, mais exigente, mas também mais aberta às necessidades de apoio ao desenvolvimento económico e social.
Julgamos que, ao cumprir o compromisso de fazer a reforma do crédito público nesta parte respeitante à dívida de garantia, o Governo honra a sua palavra e o seu Programa.
Julgamos que se a Assembleia quiser aprovar esta proposta de lei o país ficará dotado de uma lei, enfim moderna, que concilia o rigor e a disciplina financeira com o desenvolvimento económico e social.

Aplausos do PS.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, há pouco, o Sr. Deputado Luís Sá suscitou uma questão acerca de um requerimento que disse estar há seis meses sem resposta. Creio ter havido aqui um problema de memória, visto que esse requerimento, no que diz respeito ao Sr. Ministro das Finanças, já foi respondido e remetido por mim a V. Ex.ª faz amanhã precisamente um mês. Trata-se do requerimento n.º 820/VII, que foi admitido pela Mesa em 2 de Abril, respondido pelo Sr. Ministro das Finanças em 23 de Maio e remetido por mim a V. Ex.ª, via Secretária-Geral da Assembleia da República, em 27 de Maio. Está, efectivamente, ainda por responder um requerimento idêntico que formulou ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (MEPAT). Quanto ao dirigido ao Ministério das Finanças, está respondido e, pelos vistos, deve ter havido algum extravio. Se o Sr. Presidente não levar a mal, entregaria cópia directamente ao Sr. Deputado Luís Sá e, pelos menos quanto às finanças, ficaria com a sua curiosidade satisfeita.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, sob a forma de interpelação à Mesa, gostaria de dizer o seguinte: o requerimento era efectivamente dirigido a dois Ministérios e não foi por falha de memória, mas por talha dos serviços, que não conheci a resposta do Sr. Ministro das Finanças, que, obviamente, agradeço. Isto, sem prejuízo de referir o seguinte: é que a maior parte das inspecções, inquéritos e sindicâncias, designadamente aquelas que foram objecto de instrumentalização em órgãos de comunicação social, não são do Ministério das Finanças, mas do Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.
Naturalmente, tenho que pedir desculpas pela falha dos serviços, que vou averiguar em que consistiu, sem prejuízo de dizer que grande parte das questões colocadas dizem respeito a outro Ministério, pelo que continuarei à espera.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro das Finanças, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

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O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente. Sr. Ministro das Finanças, em primeiro lugar, quero cumprimentá-lo e dizer-lhe que a minha bancada e eu pessoalmente ouvimos com muita atenção a sua exposição sobre esta nova legislação.
Depois, gostaria de dizer-lhe, sem embargo do muito respeito intelectual e consideração pessoal que tenho por V. Ex.ª, que não podemos discutir esta proposta de lei do Governo sem a enquadrarmos naquilo que foi a pequena crise resultante do aval concedido à UGT há relativamente pouco tempo.
E digo isto porque V. Ex.ª classificou esta iniciativa legislativa como uma grande reforma, uma lei importante, no regime do crédito público e justificou-a pela necessidade de evolução, de alteração e de actualização da legislação em vigor.
Sr. Ministro, de facto, tal como V. Ex.ª salientou, os avales serviam, nos termos da lei em vigor, sobretudo para fomentar a economia nacional, a própria Base I da Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro, dizia-o. Este conceito foi sendo distorcido e havia, hoje, prestações de avales do Estado, «a torto e a direito» e para tudo e para nada. E a prova disso é que num quadro, aliás anexo a um despacho de V. Ex.ª, publicado no Diário da República, II Série, de 13 de Maio de 1997, entre 1990 e 1996 foram concedidos avales no valor global da ordem de I bilião e 270 milhões de contos.
Na realidade, também reconhecemos que estão prestados avales a muitas entidades que estão perto da insolvência. Como é que a CP, a TAP ou a RTP vão, algum dia, com os valores enormes de avales que aqui constam, conseguir sanear financeiramente na totalidade, para que não seja necessário o Estado intervir? E isto, já não sob a forma de aval mas de responsabilização directa pela dívida.
Ora, a minha primeira pergunta tem a ver com o seguinte: na verdade, estas responsabilidades financeiras não entram no chamado stock da dívida pública directa. que é aquela que conta para a apreciação do critério de convergência da dívida pública. Porém, pergunto-lhe: e no caso de o Governo ter de se responsabilizar pelo pagamento das dívidas não liquidadas, não amortizadas, pelas entidades avalizadas? Nessa altura, como é?
E, associada a esta questão, surge outra. A lei anterior previa um fundo de garantia, onde estariam as disponibilidades financeiras necessárias para liquidar esses avales em que o Estado tivesse de substituir-se ao devedor originário. Ora, na nova legislação não encontro esse fundo de garantia - o defeito, se calhar, é meu... Pergunto-lhe, então, como serão liquidados esses avales e de que meios financeiros o Governo vai socorrer-se para proceder a esse pagamento.
Uma terceira questão relaciona-se com o seguinte: na verdade, como V. Ex.ª disse, os avales prestaram-se para sanear financeiramente empresas, para pagar dívidas fiscais,...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que abrevie as suas conclusões.

O Orador: - Sr. Presidente, como nós não vamos fazer qualquer intervenção... De qualquer modo, termino já.
Como V. Ex.ª disse, Sr. Ministro, os avales prestaram-se para sanear financeiramente empresas, pagar dívidas fiscais e salários em atraso e cobrir prejuízos e foram também concedidos a entidades financeiramente inviáveis - e retirei todas estas expressões da sua exposição. Pergunto-lhe: então, V. Ex.ª reconhece, em relação à lei até hoje em vigor - má ou boa -,ter havido concessão de avales contra a lei ou para além dela? Faço-lhe esta pergunta devido à polémica gerada a propósito da concessão do aval à UGT, entidade que não cabe manifestamente nas que podiam socorrer-se do aval do Estado, pois essas, nos termos da Base I, eram apenas os institutos públicos e as empresas nacionais - públicas ou privadas, não está aqui dito. Ora, nem num conceito nem noutro a UGT cabe. E V. Ex.ª, nesse despacho. que, aliás, é muito curioso e polémico, classificou toda a crítica ou muita da crítica que se fez à volta dessa operação como «hipocrisia, ignorância, má fé». Porém, parece-me que, além disso, também houve menos cuidado na apreciação dos requisitos legais a que o Governo se poderia socorrer para avalizar aquele crédito de que a UGT necessitava.
Eram estas as questões: houve ou não ilegalidade, por um lado,... ,

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já gastou 5 minutos. .

O Orador: - ...e as outras que já coloquei.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, permito-me chamar a sua atenção para o facto de não ter dito que esta proposta de lei, só por si, era uma reforma de fundo, mas que ela, com a futura lei-quadro da dívida pública e com a reforma do Instituto de Gestão de Crédito Público, isso sim, constituem o quadro jurídico - é posto em prática com a nova gestão da dívida pública e com o funcionamento do Instituto de Gestão de Crédito Público - da mais importante reforma do crédito público, desde os anos 30, visto que a legislação hoje existente ainda é essa, a dos anos 30. Isso, sim, é uma reforma da dívida pública e do crédito público, que está em causa, e esta lei faz parte dela.
Em segundo lugar, quanto aos valores de 1990/96, eles são os que V. Ex.ª referiu, ou seja, um montante total de 1273 milhões de contos de dívida garantida. Mas já sublinhei aqui, numa outra oportunidade, que os encargos efectivos de execução de avales são bastante inferiores. Por exemplo, relativamente ao mesmo período de 1990/96, e comparando com todo esse capital, no ano passado, os encargos efectivos foram de 1,366 milhões de contos; em 1994, foram de 6 milhões de contos; em 1990, foram de 4 milhões de contos. Quer dizer: as execuções efectivas de aval são bastante baixas.

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E daqui avanço para o problema do fundo de garantia. Um fundo desses - e é essa a razão por que não se propõe - só tem sentido, se alcançar dimensão financeira significativa; se não a tiver, é melhor integrar as receitas de taxa de aval, que continua a prever-se que sejam quebradas, no Tesouro e ser ele a assumir essas responsabilidades, como, aliás, sempre tem acontecido. Portanto, a ideia de um fundo de garantia com uma redução insignificante é uma ideia financeiramente errada, salvo melhor opinião. E, volto a sublinhá-lo, não se trata de um montante enorme de despesas. Quando referi, há pouco, que um aval não é um subsídio, mas uma garantia, e que a garantia é condicionada à efectivação do incumprimento pelo devedor principal, sublinhava a razão por que é praticamente insignificante o montante dos pagamentos em execução de aval. O relatório do grupo de trabalho presidido pelo Dr. José Maria Calheiros, que serviu de base à elaboração de um anteprojecto, que o Governo reviu e fez seu, demonstra isso claramente. Trata-se de montantes muito reduzidos.
Quanto ao saneamento, Sr. Deputado, este instrumento deve ser disciplinado, mas não me parece que, em comparação, por exemplo, com subsídios, que representam 15% das despesas do Orçamento do Estado, seja prudente limitar excessivamente as garantias financeiras de tipo pessoal e aumentar necessariamente os subsídios. O contrário é que é prudente.
Esta forma de garantia financeira é muito melhor do que os subsídios e muito mais barata para as finanças públicas.
Finalmente, para concluir, Sr. Deputado Luís Queiró, não vou falar aqui - porque penso haver outras sedes para fazê-lo, mesmo no Parlamento - do caso do aval à UGT. Porém, sublinharia que, em minha opinião, ou o Sr. Deputado Luís Queiró diz que todas aquela situações que enunciei, no início, de aplicação prática, ao longo de 24 anos, da Lei n.º 1/73 são situações ilegais e muito poucos avales se salvarão, sendo quase todos ilegais, ou reconhece que a prática de aplicação levou, por interpretação extensiva ou analógica, a uma jurisprudência que durou um quarto de século, que tem razão de ser e que atribuiu um determinado sentido à lei dos avales. Essa é mais uma razão para este diploma e para a fazer mudar.
Não desconheço - e suponho que nenhum jurista desconhece - que é possível interpretar as leis em termos puramente históricos e que é possível interpretá-las à luz da sua aplicação e em termos actualistas. Lembro-me que o meu professor, Dr. Paulo Cunha, dizia que o contrato de transporte em grandes paquetes ou em aviões era regulado, no tempo do Código de Seabra, pelo regime do contrato de recovagem, barcagem e alquilaria.
Ora, não foi tanto isso, mas foi muito isso, o que se passou com a Lei n.º 1/73. Se quisermos pôr de fora a sua aplicação, vamos lê-la como se lia em 1973. Sé quisermos integrar a sua aplicação, então, Sr. Deputado, esse caso de que falou e muitos outros são, em minha opinião, claramente legais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei em discussão, ao estabelecer um novo regime jurídico da concessão de garantias pessoais pelo Estado ou por outras pessoas colectivas de direito público, ao invés de se limitar a rever e actualizar o regime jurídico do aval, que no essencial se mostra adequado, em função da nova ordem jurídica decorrente da Constituição de 1976 e da adesão de Portugal às Comunidades, acaba por se traduzir num instrumento que amplia de tal forma as hipóteses de financiamento que permite, arbitrariamente, a concessão de garantias do Estado a qualquer cidadão, à medida dos interesses políticos do Ministro das Finanças.
Na verdade, onde a lei actual tala em institutos públicos e em empresas nacionais, o novo regime vem agora permitir a concessão de garantias a qualquer sujeito de direito, o que acaba por abranger qualquer cidadão ou pessoa colectiva nacional ou estrangeira.
Nem se diga que tais garantias têm obrigatoriamente a finalidade de financiar empreendimentos, projectos ou operações de manifesto interesse para a economia nacional. É que a mesma proposta logo refere que pode haver um ou outro motivo especial da concessão do aval.
Esperava-se que a lei elencasse tais motivos especiais, em respeito do principio da legalidade.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas não! É o despacho de autorização do Ministro das Finanças que, em cada caso, fará lei, nos termos do n.º 2 do artigo 8.º da proposta de lei. Mas o Ministro das Finanças não tem, por si só, o poder de fazer lei em Portugal.
Por isso o Tribunal Constitucional não deixará, certamente, de declarar inconstitucional uma norma que viola claramente o disposto no n.º 5 do artigo 115.º da Constituição.
É que «Nenhuma lei pode (...) conferir a actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, (...) integrar (...) qualquer dos seus preceitos».
A ser aprovada esta proposta de lei, o aval do Estado, que, era uma operação excepcional, passa a ser uma operação trivial e sem qualquer controle.

Vozes do PS: - É falso!

O Orador: - Acontece que a génese da proposta de lei n.º 92/VII nada tem de louvável. De facto, a sua apresentação vem na sequência de um acto, ao que tudo indica ilegal, praticado pelo Sr. Ministro das Finanças.

Vozes do PS: - Também é falso!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Está a antecipar-se a uma decisão do tribunal!

O Orador: - Há uma infeliz semelhança entre esta proposta de lei e o chamado Plano Mateus.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Plano Mateus esteve para o totonegócio assim como esta proposta de lei está para a concessão do aval à UGT.

Vozes do PSD: - Exactamente!

Vozes do PS: - É uma vergonha!

O Orador: - A um erro político - o totonegócio - ou a um acto configurado como ilegal - a concessão do aval à UGT -, o Governo faz suceder duas precipitações.
No primeiro caso, o chamado Plano Mateus, e no segundo, a proposta de Lei n.º 92/VII.
Com a apresentação desta iniciativa legislativa, o Governo pretende imputar à Lei n.º 1173, de 2 de Janeiro, a «culpa» pela concessão do aval à UGT. Só que a «culpa», nunca é da lei, é sempre de quem a aplica.
O Governo pretende, como se tal fosse possível, branquear um acto previsivelmente ilegal cometido sob a assinatura do Sr. Ministro das Finanças.
Porém, esqueceu-se o Governo que mesmo alargando o âmbito da Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro, não fica legitimada a concessão de avales a centrais sindicais.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Porque a Constituição consagra o princípio da independência sindical perante o Estado e porque a lei sindical proíbe o financiamento pelo Estado das associações sindicais.
Se o Governo quiser dar o sentido que pretende à proposta de lei em discussão, então é necessário alterar a Constituição e a lei sindical. Veremos se o Governo e o Grupo Parlamentar do PS são capazes de ir tão longe.
Acerca da concessão do aval à UGT o menos que se pode dizer é que a confusão foi e continua a ser total.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Designadamente a sua!

O Orador: - Vale a pena ler ó Despacho n.º 310/97 (II Série). É um comunicado pessoal do Sr. Ministro das Finanças que, em vez de pagar a publicação de uma carta num jornal diário, optou, desta vez, pelo Diário da República.

Protestos do PS.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - É uma vergonha! É um disparate!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço silencio.

O Orador: - Mas a confusão não se cansa! Na semana passada, os Srs. Deputados do PS que integram a comissão de inquérito ao aval da UGT manifestaram-se solidários com a perturbação do Sr. Ministro das Finanças.
Na tentativa de poupá-lo, .ao que, por certo, só eles os Deputados do PS - consideram ser uma humilhação para o Sr. Ministro, propuseram a suspensão dos trabalhos da comissão de inquérito. Invocaram para tal o facto de o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República se haver pronunciado no sentido da ilegalidade do aval à UGT e de o Sr. Procurador-Geral ter solicitado ao Supremo Tribunal Administrativo a declaração de ilegalidade do despacho do Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Um escândalo!

O Orador: - Os Srs. Deputados do PS esqueceram-se que, de acordo com o Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares, a suspensão dos trabalhos das comissões de inquérito apenas podem ocorrer se sobre o respectivo, objecto se encontrar em curso um processo criminal, com despacho de pronúncia transitado em julgado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ora, não existindo quanto ao aval concedido à UGT um tal processo, das duas uma: ou os Srs. Deputados do PS não leram bem o Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares ou, o que seria muito grave, não querem que seja apurada toda a verdade quanto à concessão do aval à UGT e à inerente responsabilidade política do Sr. Ministro das Finanças e do Governo.

Aplausos do PSD.

Vozes do PS: - É falso!

O Orador: - O que o PS ousou propor é mesmo muito grave.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Isto é tudo ao contrário do que disse na Comissão!

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - O senhor é um homem de duas palavras! É mentiroso!

O Orador: - Passado o período inicial, em que o PS tinha muita pressa, em que reclamava a sua adesão ao inquérito parlamentar e ao apuramento da verdade, agora perdeu o verniz, deixou cair a máscara e mostra a sua verdadeira face - a face de um partido que, afinal, não quer inquérito parlamentar nenhum, tem medo da verdade, receio das consequências e pretende, à socapa, relegar para o fim da legislatura ou para as calendas o apuramento da verdade dos factos acerca da leviandade que foi a concessão do aval à UGT.

Aplausos do PSD.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - É mentiroso!

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Isto é uma canalhice!

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deixem de gritar, se fazem favor respeitem quem está no uso da palavra. O Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes acaba de se inscrever para usar da palavra e quer, com certeza, ser ouvido, tal como o Sr. Deputado que está a usar dela quer ser ouvido. Tenham paciência e um pouco mais de calma.

O Orador: - O PSD, por seu lado, quer ser muito claro. Se os Srs. Deputados do PS insistirem na proposta de suspensão dos trabalhos da comissão de inquérito, o Grupo Parlamentar do PSD exigirá que o assunto seja discutido em Plenário,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ...para que fique definitivamente esclarecido quem quer e quem não quer o apuramento da verdade.

Aplausos do PSD.

Quer os Srs. Deputados queiram quer não, quer os Srs. Deputados gostem quer não, o inquérito parlamentar vai mesmo por diante. Irá até ao fim e a verdade de tudo quanto se passou virá mesmo ao de cima. Disso nós não desistiremos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes pediu a palavra para defesa da sua honra pessoal, a qual lhe será dada, nos termos regimentais, no fim do debate.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, quero informar, como Presidente da comissão de inquérito que aqui foi referida, que esta comissão, face a posições diversas de vários Deputados, deliberou, na sua última reunião, enviar uma carta ao Sr. Procurador-Geral da República solicitando o esclarecimento sobre a sua actuação junto do Supremo Tribunal Administrativo. Essa deliberação, após discussão, foi tomada por consenso. Portanto, este assunto continuará a ser tratado na próxima reunião. É isto que quero deixar aqui esclarecido.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, fica registada a sua interpelação.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vieira de Castro, o cidadão José Luís Vieira de Castro, que conheço há muitos anos e me habituei a respeitar, seguramente que, passadas 24 horas após a infeliz intervenção que aqui fez, se envergonhará do que disse.
Se não for assim, terei de pensar que andei muitos anos enganado acerca do seu carácter e da sua personalidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O que o Sr. Deputado acaba de fazer daquela tribuna é indigno do seu passado nesta Assembleia da República.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Apoiado!

Aplausos do PS.

O Orador: - O Sr. Deputado veio fazer uma mistificação completa deste debate e, mais grave do que isso, como foi referido agora pelo Sr. Presidente da comissão eventual de inquérito, disse aqui exactamente o contrário do que defendeu e aceitou em sede de comissão parlamentar.

Vozes do PS: - É verdade!

O Orador: - Isso não é digno de um Deputado que tem os anos que V. Ex.ª tem neste Parlamento! Isso é pura chicana política! Isso tem de ser penalizado, quer no plano pessoal, quer no plano político, e. eu não podia deixar de o referir em relação a V. Ex.ª.
O Sr. Deputado Vieira de Castro fez-me lembrar, na parte em que eu podia pensar que, eventualmente, alguma coisa se podia salvar da sua intervenção, um Deputado digno da sua bancada, o Sr. Deputado Pedro Roseta, que muitas vezes aqui dizia, referindo-se a nós nessa altura: «os senhores fazem o mal e a caramunha». É exactamente este piropo que lhe devolvo: os senhores «fazem o mal e a caramunha» e estão sempre contra tudo.
Estiveram contra a aplicação da Lei n.º l/73 no caso concreto em apreciação e noutros casos e estão agora contra uma modificação substancial desta lei, que o Sr. Ministro das Finanças aqui traz, não a reboque de qualquer coisa, mas simplesmente num plano que está enquadrado no programa e no compromisso que o Governo tem com o eleitorado português e que, há muito tempo, vinha a ser preparado no Ministério das Finanças e no Governo.
O que V. Ex.ª poderia, eventualmente, ter aqui referido - e não teve coragem para o fazer - é que o tempo que decorreu desde a entrada em vigor da Lei n.º 1/73 até ao momento actual, ou seja, 24 anos, como o Sr. Ministro já referiu e como eu próprio referirei na minha intervenção, é demasiado para que ninguém, sobretudo os seus governos, se tenha lembrado de mudar este regime, que é um regime legal que - veja lá! - até considera as províncias ultramarinas como sujeitos passivos capazes de receberem os avales e as garantias pessoais estabelecidas pelo Estado.
Talvez sejam as saudades das províncias ultramarinas e do conceito que estava por detrás desta noção que levaram V. Ex.ª a dizer os dislates que disse da tribuna da Assembleia da República!

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Só que nós não estamos nessa cultura! A nossa cultura é completamente diferente da sua, é uma cultura democrática, e não baixamos a esse nível para fazer uma discussão exactamente desse ponto de vista e de observação política!
Mas há uma coisa grave que o Sr. Deputado ali disse. Referiu-se à liberalidade, digamos assim, que o regime que o Governo aqui hoje nos traz, não estando, aliás, obrigado a fazê-lo, e era bom que o Sr. Deputado tivesse uma palavra para o Sr. Ministro das Finanças, que tantas vezes é acusado de não respeitar a Assembleia da República, e para o Governo, que não tendo necessidade de trazer este assunto à discussão da Assembleia da República o fez exactamente porque respeita o Parlamento e os Deputados. E faz muito bem, mesmo quando alguns Deputados, como o Sr. Deputado Vieira de Castro, talvez não mereçam o respeito do Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Presidente: - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Dizia eu que V. Ex.ª se espanta com a liberalidade que este regime introduzirá. Dirá V. Ex.ª que, a partir de agora, podem ser concedidos avales a diversas entidades ou a mais entidades do que aquelas a quem, até agora, eles poderiam ser concedidos, ao abrigo do regime legal da Lei n.º 1/73! O Sr. Deputado não conhece o princípio da igualdade constitucionalmente consagrado? O Sr. Deputado não respeita o princípio da igualdade constitucionalmente consagrado? Queria V. Ex.ª que fizéssemos uma discriminação que não assentasse exclusivamente no manifesto interesse público?
Ó Sr. Deputado, tenha maneiras!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, muito obrigado pelo esclarecimento que fez o favor de me fazer.
Acerca do despacho do Sr. Ministro das Finanças de concessão do aval à UGT, o Sr. Deputado sabe - presumo - o mesmo que eu.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sabe que são legais! É o que o Deputado Manuel dos Santos sabe!

O Orador: - Sabe que, sobre o objecto do inquérito, não existe qualquer processo criminal, com despacho de pronúncia transitado em julgado. E o Sr. Deputado Manuel dos Santos sabe também que só nessa circunstância é que são suspensos os trabalhos das comissões de inquérito.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Ora, não existindo esse processo criminal, porque não existe, gostava que o Sr. Deputado
Manuel dos Santos afirmasse aqui perante a Câmara que, então, o Grupo Parlamentar, do PS quer prosseguir o inquérito parlamentar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Temos hoje presente uma proposta de lei do Governo visando estabelecer o regime jurídico da concessão de garantias pessoais pelo Estado ou por outras pessoas colectivas de direito público. É necessidade que há muito tempo se faz sentir, já que a lei base em vigor remonta a 1973 e se refere exclusivamente à figura do aval, que factos recentes vieram recolocar na ordem do dia.
Aliás, face a eventuais práticas de interpretação analógica da Lei n. 1/73, importa recordar, entre outros, o parecer n.º 2588, de 12 de Julho de 1990, da Procuradoria-Geral da República, promulgado pelo governo de então. Diz-se, nas conclusões, que «o aval do Estado constitui uma operação de garantia creditícia com finalidade financeira de natureza excepcional não permitindo, por conseguinte, a integração analógica nem legitimando, atenta a sua etiologia, a interpretação extensiva» e, na sequência disto, «o regime legal do aval do Estado consta basicamente da Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro, diploma que não contempla a concessão de garantias a entidades que não figurem no elenco da sua Base I, isto é, institutos públicos e empresas nacionais».
Voltando à proposta de lei que temos presente, julgamos dever relevar positivamente três aspectos: em primeiro lugar, a intenção de criar uma disciplina jurídica comum e uniforme para a concessão de garantias pessoais pelo Estado ou por outras pessoas colectivas de direito público; em segundo lugar, abranger não apenas a concessão do aval mas ainda da fiança e de todas as outras modalidades de garantia pessoal admitidas em direito; e, em terceiro lugar, a limitação de todas essas garantias a um limite máximo a fixar anualmente pela Assembleia da República, e não apenas, como actualmente sucede, os avales prestados directamente pelo Estado.
A proposta de lei insere, porém, orientações outras que nos suscitam grandes reservas e objecções.
Objecções e reservas que se fundam num princípio essencial, qual seja o de as garantias pessoais prestadas pelo Estado e outras pessoas colectivas de direito público deverem assumir sempre um carácter de excepcionalidade, porque a concessão de garantias e, em particular, a concessão de avales constitui uma operação de crédito que coloca o Estado numa posição de devedor acessório, que não subsidiário, de outra entidade. E se de uma operação de crédito se trata, lógico é que o Estado a não deva praticar como norma.
Daí que consideremos, desde logo, que o fundamento para a concessão de garantias pessoais não deve ser alargado de forma quase ilimitada, como o pretende a proposta de lei, com a sua fundamentação em todo e

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qualquer «motivo de interesse público constitucionalmente protegido».
Igualmente, e na decorrência da questão anterior, nos parece desadequado e excessivamente abrangente que da garantia do Estado possa ser beneficiário «qualquer sujeito de direito».
Por outro lado ainda, é para nós igualmente essencial que a lei que venha a regular a concessão de garantias pessoais explicite claramente, na linha, aliás, da legislação em vigor, que essa concessão se mostre absolutamente imprescindível para a realização do financiamento ou operação financeira, condicionalismo que a proposta de lei não consagra.
Aliás, da conjugação destes três aspectos seria fácil elencar enorme número de situações teoricamente passíveis de beneficiar de um aval do Estado, segundo a proposta de lei, mas que certamente a generalidade de nós recusa, à partida, conceber como teórica e praticamente admissível.
Em nosso entender, a lei não deve concretizar discriminadamente os casos concretos passíveis de beneficiar das garantias pessoais do Estado ou de outras pessoas colectivas de direito público. Mas igualmente consideramos não aceitável que a sua abstracção e generalidade vá tão longe que, ao fim e ao cabo, deixe na dependência de um ministro a concessão de garantias a qualquer pessoa e por quase qualquer motivo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em sede de generalidade, um outro aspecto nos merece referência. Tendo em conta a experiência de anos e o facto de a concessão de avales pelo Estado dar origem a dívida pública acessória, que, em qualquer momento, se pode transformar em dívida efectiva, parece-nos desejável que a lei consagre expressamente que a sua violação, por parte de membros do Governo, constitui crime de responsabilidade punível nos termos da legislação aplicável, assim exigindo e impondo um maior e mais cuidado rigor na sua aplicação.
Em suma, Sr. Presidente e Srs. Deputados, consideramos que a nova lei de concessão de garantias pessoais pelo Estado deve ter como objectivo o estabelecimento de um quadro mais adequado, mais rigoroso e mais exigente que o actualmente existente. Mas não pode servir para, de qualquer forma, eventualmente poder justificar e absolver quaisquer actos passados de concessão de garantias à margem da legislação em vigor.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Serão aqueles princípios e estes objectivos que enquadrarão o posicionamento e a intervenção do Grupo Parlamentar do PCP no processo de discussão e votação desta proposta de lei.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Visto não haver pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Começo por saudar o Sr. Ministro das Finanças, na linha, aliás, do que já fiz aquando da interpelação que acabei de proferir, pela afirmação clara que aqui fez e que a nós não nos surpreendeu e que consta do seu discurso, que foi exactamente, na proporção democrática e no respeito pelo Parlamento, embora se trate de matéria que não se integra na reserva de competência legislativa da Assembleia da República, a de o Governo resolver trazer este assunto à discussão dos Srs. Deputados. Se alguma prova fosse necessária do respeito que o Governo tem pelo Parlamento, o Governo em geral e o Sr. Ministro das Finanças em particular, aqui estava este acto, da maior importância democrática, para negar e contrariar todos aqueles que têm feito da chicana política contra o Sr. Ministro das Finanças o seu comportamento habitual na intervenção político-partidária.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao apresentar a presente proposta de leio Governo pretende rever, actualizar e aprofundar as disposições legais que regulam as garantias prestadas pelo Estado a operações de financiamento da economia que sejam qualificadas como importantes para a estabilidade e progresso económico do País.
O regime jurídico decorrente desta proposta reveste-se, contudo, como é normal numa economia que privilegia a eficiência do mercado, de carácter absolutamente excepcional e fundamenta-se em motivo de interesse público constitucionalmente protegido. Como é evidente, este regime excepcionai de apoio desenvolve-se num quadro de absoluto respeito pelas regras de concorrência nacionais e comunitárias e pela subordinação ao princípio constitucional da igualdade.
O envolvimento do Estado em operações de garantia é actualmente regulado pela Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro, e foi com base neste regime legal que o Estado procedeu desde 1974 (e em circunstâncias históricas diferenciadas, mas todas elas bem marcantes) a diversas e significativas operações de apoio ao financiamento a empresas nacionais ou equiparadas.
Note-se que, de harmonia com a letra da lei ainda em vigor, os beneficiários do apoio regulado só poderiam ser empresas nacionais, institutos públicos ou as províncias ultramarinas. Relativamente à justificação para o apoio, a Lei n.º 1/73, taxativamente, define três requisitos: o interesse nacional (manifesto interesse) dos projectos a financiar; a participação do Estado no empreendimento; a absoluta indispensabilidade do apoio/garantia para efectuar a operação de financiamento em causa.
O que é espantoso nesta situação é que, 23 anos depois da Revolução de Abril e 24 anos após a publicação da Lei n.º 1/73, não se tenha ainda procedido à requalificação e actualização da legislação aplicável a este regime.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - E a responsabilidade é seguramente maior para os governos depois de 1986, data da nossa

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entrada na então chamada Comunidade Económica Europeia, pois foi manifestamente a partir de então que Europeia, verificou uma ruptura entre o enquadramento legal de operações de garantia, protegido pela Lei n.º 1/73, e as nossas responsabilidades no quadro de construção do mercado interno e no respeito pelas regras de concorrência nacionais e comunitárias.
A explicação para esta apatia, de que é responsável sobretudo a governação do PSD, exercida até 1995,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... só é explicável pela opção política de manter em vigor um regime legal de responsabilização do Estado suficientemente vago para, a seu coberto, poderem ser desenvolvidas todas as operações que política ou partidariamente fossem consideradas convenientes. E foi exactamente isso o que sucedeu, de maneira acentuada, nos últimos anos de governação do PSD, quando os valores de garantias conhecidos atingiram níveis perfeitamente descontroladas c, sobretudo, quando se reconhece (como o pode fazer quem minimamente tiver uma prática empresarial regular) a abusiva e generalizada utilização de cartas de conforto, ou seja, de operações de garantia sem qualquer controlo ou de controlo escasso e naturalmente, por isso, sujeitas a uma fiscalização política mínima.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Isso é que era escandaloso!

O Orador: - Note-se que imediatamente após a entrada em funções do actual Governo - e já o lembrou aqui hoje o Sr. Ministro das Finanças - se suspendeu a prática ilegal de emitir cartas de conforto, reconduzindo esta actividade do Estado, na medida do possível, face ao enquadramento legal subsistente, a um quadro de total disciplina e moralização. E é exactamente por isto que se torna ainda mais chocante a utilização abusiva e partidária de certos actos administrativos do actual Governo, que, independentemente do juízo político que se formule sobre eles, sabendo-se quanto positivo é o nosso próprio juízo, constituem, eles sim, exemplos de coragem política, de transparência e de assumir de responsabilidades.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É também por isto, e não apenas pela simples necessidade de introduzir aperfeiçoamento técnico-jurídicos na Lei n.º 1/73, que o Governo apresenta a proposta de lei em apreciação.
Integrados numa economia substancialmente diferente da existente em 1973 ou mesmo no período compreendido entre 1974 e 1986, as normas actuais devem ser revistas, actualizadas e aprofundadas, ajustando-as, nomeadamente, às regras de concorrência prevalecentes no mercado, salvaguardando os actos administrativos do Estado nesta área de intervenção de eventuais imputações de violação do regime de proibição de ajudas estatais.
É neste contexto que se torna importante a requalificação legal dos critérios de autorização das garantias pessoais que compatibilizem com os referidos princípios de defesa da concorrência a igualdade de tratamento, constitucionalmente consagrada, de todos os agentes económicos, desde que salvaguardadas e identificadas as exigências de interesse público relevante e justificado que seja um tratamento de discriminação positiva.
Estamos, assim, perante um novo regime legal que assume, como seria normal, uma ruptura com as concepções prevalecentes na Lei n.º 1/73, não apenas em aspectos técnico jurídicos mas, sobretudo, no quadro da Filosofia económica que lhe é subjacente e da transparência na responsabilização política que lhe é inerente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Independentemente das eventuais querelas partidárias, estamos, com a presente proposta de lei, em presença de um novo regime de regulação da actividade do Estado no quadro das suas obrigações constitucionais no sentido de promover e defender a crescente eficiência dos mercados, que é da maior relevância e oportunidade, como se viu. Esta disciplina legal é exigida pelas profundas transformações existentes no sistema económico nacional, pelas obrigações decorrentes das, associações internacionais em que estamos envolvidos, pela dinamização de uma opção económica do actual Governo, no sentido de proceder à recuperação de uma parte significativa do tecido produtivo nacional e, sobretudo, pela necessidade de introduzir normalidade, transparência, disciplina e justiça na concessão destes apoios. Transparência, disciplina e justiça que, repito, nem sempre caracterizaram a actividade do Estado nestes domínios e cuja ausência se acentuou entre 1990 e 1995, em pleno consulado cavaquista.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, estamos hoje, felizmente, muito longe de um tempo e de um modo, provavelmente histórica e socialmente justificáveis, em que o recurso ao apoio indiscriminado do Estado era a regra prevalecente e o comportamento quotidiano, independentemente da utilidade económica e social e da probabilidade de recuperação dos apoios concedidos.
Quando não se verificou de imediato, os custos desses comportamentos de então foram assumidos e serão assumidos pelas gerações seguintes.
O Governo do PS fez um contrato claro e explícito com o mercado, que passa por respeitar todas as regras que não ponham em causa o seu funcionamento eficiente mas, de igual modo, pelo direito de intervenção justa e transparente, quando estejam em causa significativos valores sociais ou indispensáveis reestruturações produtivas. Deve ser esse, aliás, o papel do Estado numa economia moderna.
Árbitro quando tiver de o ser; regulador interessado e activo quando tal manifestamente se lhe imponha.
A recusa de aceitar uma generalizada e permanente cultura de subsídio-dependência é também uma linha de força da actual proposta legislativa. Não poderia, de resto, ser de outro modo, face ao compromisso do Governo socialista com o País.
Saudamos, pois, enquanto grupo parlamentar que apoia o Governo, esta iniciativa legislativa, que vem repor e

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normalizar uma situação jurídica manifestamente desenquadrada do funcionamento da nossa economia e das responsabilidades que assumimos num quadro supranacional.
Saudamos e apoiamos de igual modo o Sr. Ministro das Finanças por, num espaço de tempo reduzido, no seguimento de trabalho que ele próprio oportunamente desencadeou e no quadro do compromisso que assumiu com a Assembleia da República, na sequência de um mediático aval concedido ao abrigo da Lei n.º 1/73, ter apresentado a presente proposta de lei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Visto não haver pedidos de esclarecimento, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Tem estado aqui a ocorrer, a propósito do debate desta proposta de lei, em simultâneo, um ajuste de contas e um debate.
Relativamente ao ajuste de contas, o Partido Popular não é tido nem achado porque não tez parte do Governo anterior nem faz parte do actual e, por isso, do ajuste de contas não vamos curar neste debate.
Quanto ao debate, que tem obviamente a ver com a proposta de lei que nos é apresentada, não podemos deixar de manifestar desde já a nossa estupefacção pelo regime proposto à Assembleia sobre esta matéria.
Na nossa opinião, o problema dos avales do Estado e outras garantias tem de obedecer a três critérios, que, de resto, aqui já foram salientados: o rigor, a disciplina e a excepcionalidade deste tipo de operações do Estado perante os sujeitos de direito que delas podem usufruir. Ora, esta proposta de lei consagra, se a analisarmos com cuidado, exactamente o contrário destes três princípios e, como o Sr. Deputado Manuel dos Santos acabou de enfatizar que assegura o princípio da igualdade, podemos dizer que o princípio da igualdade, que. de tacto, vem escrito na proposta de lei, somado aos alçapões, que vêm espalhados por vários artigos adiante, transformam, como dizia há pouco um colega meu do lado, este diploma na proposta de lei do aval mínimo garantido. Não é definitivamente, penso, o que se pretende para o Estado nesta matéria.
Não queremos fazer desta matéria um regime jurídico que se transforme num cheque em branco ao Governo, qualquer que ele seja, para, através destes instrumentos, apoiar as várias entidades que dele possam beneficiar. Não pode voltar a ser possível - atribuir avales do Estado, como aconteceu em 1975, à Comissão de Trabalhadores da Tinturaria Cambournac, nessa altura sem protestos visíveis do Partido Comunista Português, nem como foram concedidos para a construção do Europarque-AIP, nessa altura sem protestos visíveis do Partido Social Democrata, por, porventura, estarem, nesse caso, partidariamente interessados nesses avales.
Agora, o que é um facto é que o interesse do Estado está acima disso, o interesse da economia está acima dos interesses partidários e, seja através de que partido for, incluindo agora, por via do PS, o aval à UGT, este tipo de operações tem de bastar-se em critérios objectivos, claros e precisos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que esta proposta de lei vem dizer é que se aplica a todos os sujeitos de direito. Ou seja, o «Sr. Francisco», que está a construir a sua casinha e que por esse facto contribui para o fomento da economia nacional, porque tem a ver com a indústria da construção civil, e é um sujeito de direito, pode vir a ter esperanças, se esta proposta de lei for aprovada, de vir a ter um aval do Estado. O problema é que, como cá está o princípio da igualdade, o aval do Estado ao «Sr. Francisco» vai transformar-se em milhões de avales, esperamos nós, para fomentar a indústria da construção civil e da aquisição de casa a todos os senhores e senhoras, a todos os nossos concidadãos que quiserem construir a sua casinha com o conforto de um aval do Estado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, isto é inaceitável!
Por outro lado, a proposta de lei, que pretende ser disciplinadora, como o Sr. Ministro das Finanças referiu aquando da apresentação, diz que estas operações só podem ter lugar para projectos ou operações de manifesto interesse para a economia nacional. O problema é que há o célebre n.º 2 do artigo 8.º, que diz que por motivos especiais o n.º 1 do mesmo artigo pode não aplicar-se. E qual é a única limitação ao «motivo especial»? Estar fundamentado no despacho. Ou seja, um cheque em branco para que se tornem especiais todos os motivos que os decisores políticos, sejam eles quem forem, entenderem na altura como tal. Ou seja, não há rigor nem disciplina, mas, mais uma vez, um cheque em branco.
Mas não é tudo: no artigo 9.º, referente às condições para a autorização das operações, alínea u) do n.º 1, está, meio escondido, uru critério, que é o do interesse do Estado no empreendimento. Ora bem, vamos lá, então, tentar tipificar aquilo que possa vir a ser «o interesse do Estado» num empreendimento que possa ser susceptível de uma operação desta natureza.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é difícil encontrar aqui uma lista, quase infinita, de possibilidades, de justificações e de argumentos para considerar de «interesse do Estado» as mais diversas operações.
Ou seja, esta proposta de lei vem, ao contrário do que tem sido dito pelos Srs. Deputados do Partido Socialista e do que esperançosamente começámos por ouvir na respectiva apresentação feita pelo Sr. Ministro das Finanças, transformar este regime proposto pelo Governo à Assembleia num cheque em branco.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Isto é inaceitável, tão inaceitável quanto é de considerar, como também já foi referido, a oportunidade política em que a proposta de lei é submetida à Assembleia da República. Até pelos precedentes mais próximos, está bom de ver que esta proposta de lei, além de inaceitável, é imprudente porque o pior que pode acontecer à economia nacional e ao Estado é que o debate profundo, quer sobre a estratégia da

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economia quer sobre o papel do Estado no financiamento da economia, se reduza àquilo a que se reduziu hoje, na primeira parte deste debate, que foi ao tal ajuste de contas e não propriamente ao debate que interessava fazer.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Não há inscrições para pedidos de esclarecimentos, portanto, é o momento de o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes exercer o direito de defesa da sua honra pessoal contra afirmações feitas pelo Sr. Deputado Vieira de Castro.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, face às afirmações graves que foram proferidas pelo Sr. Deputado Vieira de Castro relativamente aos factos ocorridos na última reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito para Apreciação da Conformidade. Constitucional e Legal do Aval do Estado à UGT, pretendo tecer algumas considerações.
Em face de uma decisão do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, que veio relatada nos jornais, em face, também, de uma eventual decisão, que teria sido tomada pelo Sr. Procurador-Geral da República, de remeter ao Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito de um processo próprio autónomo, a apreciação da legalidade do aval, tal qual foi prestado pelo Governo à UGT, e uma vez que a resolução da Assembleia da República, através da qual foi deliberada a constituição da referida Comissão Parlamentar de Inquérito, referia, no ponto 2, que a Comissão deveria verificar da legalidade do próprio aval, nomeadamente em relação à base I da Lei n.º 1/73 e deveria também verificar da sua legalidade face ao disposto no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 215-B/75, consideramos que, sendo os tribunais os órgãos próprios para aferir e apreciar da legalidade, nomeadamente deste acto, por uma questão de precaução e com vista a evitar situações que, possivelmente, poderiam ser muito delicadas e caso existisse este processo, deveríamos aguardar uma decisão do Supremo Tribunal Administrativo.
Esta questão foi debatida na Comissão Parlamentar de Inquérito e as diversas forças políticas acabaram por tomar uma posição consensual no sentido de aguardar a remessa de documentos que foram solicitados, nomeadamente à Procuradoria-Geral da República, para, então, se tomar uma decisão.
É completamente falso que o Partido Socialista tenha pretendido suspender, fosse por que meio fosse, os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito. É uma falsidade o que o Sr. Deputado Vieira de Castro referiu.
Para além disto, declarámo-nos completamente disponíveis para continuar os trabalhos da Comissão...

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Não foi isso que disseram!

O Orador: - ... no que respeita à apreciação de todos os outros pontos, se fosse decidido que havia um processo no Supremo Tribunal Administrativo para apreciar a mesma matéria que a Assembleia da República se propõe apreciar no que diz respeito à legalidade do aval.
Os tribunais têm uma função específica própria e têm atribuições que estão definidas na Constituição - o Sr. Deputado Vieira de Castro não podia ignorar isto - e foi nessa base que o Partido Socialista tomou aquela posição.
Desafio, ainda, o Sr. Deputado Vieira de Castro a mostrar-nos e a reproduzir, se assim o entender, a parte final da reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito, cuja gravação contém a posição assumida pelo Partido Socialista.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, o que critiquei foi a circunstância de ter sido sequer admitida a possibilidade de suspender os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito.

Protestos do PS.

Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, já na reunião da Comissão, centrou o objecto do inquérito apenas na avaliação da conformidade constitucional e legal da concessão do aval, mas o ponto 5 da resolução da Assembleia da República refere que a Comissão tem de avaliar politicamente o acto praticado pelo Sr. Ministro das Finanças.
Se, agora, o Sr. Deputado vem dizer que estão dispostos a prosseguir os trabalhos da Comissão, então, consegui o objectivo que pretendia.

Protestos do PS.

Vamos reunir amanhã, se quiserem!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dei a palavra ao Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes para defender a sua honra pessoal na convicção de que o debate tinha terminado, mas, entretanto, chegou-me o conhecimento de que o Sr. Ministro das Finanças pretendia usar da palavra para fazer uma segunda intervenção, para o que ainda dispõe de 4,2 minutos, atendendo ao tempo que lhe foi cedido pelo Partido Ecologista Os Verdes.
Assim, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é para perguntar se não vai haver agora uma interrupção

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do debate para procedermos às votações regimentais que estão agendadas.

O Sr. Presidente: - Há, sim, Sr. Deputado. Mas não se esqueça que, até este momento, têm estado a resolver-se problemas que condicionam alguns aspectos da votação, inclusive alguns colocados por mandantes do seu partido, nomeadamente um requerimento que acaba de ser entregue na Mesa.
Ora, tudo isto tem de ser tomado em conta e, até agora, ainda não estavam reunidas as condições para se efectuar a votação, mas começam a estar neste momento. Assim, dentro de minutos, iremos proceder às votações agendadas.
Sr. Ministro das Finanças, tem a palavra.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas algumas palavras muito simples de ordem política.
A primeira é a de que estamos a discutir uma proposta de lei e estamos a fazê-lo com o espírito com que o Governo sempre tem vindo a esta Assembleia: com abertura ao diálogo, com vontade de argumentar mas, sobretudo, com vontade de encontrar as melhores soluções para o interesse nacional. Isto significa que, pela nossa parte, estamos abertos a alterações - e, certamente, é também essa a posição da bancada do Partido Socialista - que venham melhorar a proposta que apresentámos.
Em segundo lugar, Sr. Presidente, Srs. Deputados, uma segunda palavra política.
Deixa-me alguma perplexidade que haja quem, sem fazer propostas alternativas, prefira que esta matéria, como a matéria do crédito público em geral, continue a ser regulada por leis do Estado Novo que não garantem o respeito pela primazia parlamentar, que não garantem o respeito democrático pelos dinheiros públicos.

Aplausos do PS.

É que, Sr. Presidente, Srs. Deputados, estando nós abertos, como estamos, a soluções inovadoras, a verdade é que esta proposta, que, como tudo, é certamente discutível, é uma proposta democrática que estabelece a responsabilidade financeira para os casos em que a autorização da Assembleia da República não seja respeitada, que tem em vista um ordenamento jurídico democrático e não o velho e caduco regime que, nesta matéria e na do crédito público em geral, vigora ainda hoje. São preferências às quais não quero atribuir grande significado, mas que me parecem de rejeitar.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma terceira palavra.
Este regime não tem nada a ver com nenhum caso concreto. Os casos concretos têm a sua sede própria para serem discutidos. O grupo de trabalho que preparou o anteprojecto desta proposta de lei, porque nós fazemos tudo de uma forma transparente, foi constituído por um despacho publicado em 8 de Outubro de 1996 e apresentou o anteprojecto em 27 de Março de 1997. O Governo transformou-o numa decisão política e o que aqui está é uma proposta geral.
Por meio desta proposta de lei, não queremos interferir, nem tal seria possível, em nenhum caso concreto, mas queremos que, de uma vez por todas, passe a haver um regime claro, democrático, um regime de acordo com a Constituição no domínio dos avales do Estado, no domínio das garantias pessoais do Estado e não a incerteza e o anacronismo autoritário que é a legislação hoje vigente.
O Governo do PSD nunca quis fazer nada neste domínio. Dava-lhe jeito. Mas nós o que queremos é que haja regras democráticas que nos esclareçam nos nossos critérios de decisão. Por isso, aqui vimos e esperamos a vossa anuência.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis, para um protesto contra declarações do Sr. Ministro.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, francamente, não esperava que viesse insinuar que quem não concorda com uma proposta de lei da sua iniciativa e apresenta os argumentos que demonstram a sua discordância está a pretender que continuem em vigor leis do Estado Novo.
Apenas recordarei ao Sr. Ministro que o que não falta neste País são leis do Estado Novo que têm sido aplicadas por todos os governos depois do 25 de Abril, quando muito bem lhes convém.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E quando aquelas não lhes convêm, então, dizem que se trata de leis de antes do 25 de Abril.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, nós não embarcamos nisso!
Não concordamos com a lei anterior, mas também não concordamos com esta e dissemos porquê. No entanto, estamos prontos a procurar encontrar consigo, se o Sr. Ministro assim o entender, uma lei conveniente em sede de comissão desta Assembleia. pois é para isso que esta existe.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para um contraprotesto, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças e dispõe de 2 minutos.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, não fiz nenhuma imputação, limitei-me a verificar um facto. Também não disse que tal tacto era imputável a esta ou àquela bancada.
Regozijo-me pelo facto de o PP querer trabalhar connosco com vista a uma lei melhor e parece-me que a introdução de mais disciplina e, ao mesmo tempo, a

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colocação das garantias pessoais do Estado ao serviço da iniciativa privada e a introdução de uma forma flexível e concorrencial de gerir a economia constituem um bom passo.
É, pois, um bom passo que, parece-me, elimina a malta de clareza dos regimes actuais, o dirigismo e a falta de respeito pela concorrência nos regimes actuais e, sobretudo, prepara o caminho para algo que também quereríamos submeter a esta Assembleia, ainda durante a presente legislatura. Refiro-me a uma lei geral sobre as subvenções e subsídios porque este é que é o problema. O problema das garantias é pequeno, o dos gastos com subsídios é grande.
Congratulo-me, Sr. Deputado, pela possibilidade de, todos juntos, buscarmos uma solução melhor para o País porque é o que também interessa ao Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para, a título verdadeiramente excepcional, ler um comunicado da Comissão Eventual para Acompanhamento da Situação em Timor Leste.

O Sr. Presidente: - Se não houver oposição dos grupos parlamentares, e vejo que não há, faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o comunicado emitido pela Comissão Eventual para Acompanhamento da Situação de Timor Leste é do seguinte teor: «A Indonésia ocupa, desde 7 de Dezembro de 1975, com violação dos mais elementares princípios do Direito Internacional e da Carta das Nações Unidas, o território não autónomo de Timor Leste. As violências sobre o povo timorense e as violações dos direitos do homem no território são prática constante das forças militares e policiais invasoras e causa das tragédias humanas inenarráveis sofridas dia-a-dia por este povo martirizado, ligado ao povo português por profundos laços históricos, culturais e humanos.
Hoje a humanidade pôde voltar a tomar consciência do drama do povo timorense. A prisão e a morte, com toda a probabilidade intencionalmente perpetrada, do Comandante David Alex, o número dois das forças que lutam pela autodeterminação, mostram, mais uma vez, a urgência de a Comunidade Internacional garantir efectivamente aos timorenses o exercício do seu inalienável direito à autodeterminação.
A tragédia do povo timorense não deixará de se agravar enquanto a Comunidade Internacional não cumprir as suas obrigações em Timor Leste.
A Assembleia da República, revoltada pela prisão e assassínio do Comandante David Alex, denuncia com veemência este gravíssimo atentado que roubou a vida a um insigne e heróico timorense e ofendeu, mais uma vez, a dignidade de todo o povo martirizado de Timor leste.
À família do Comandante David Alex e a todo o povo de Timor a Assembleia da República dirige o seu finais sentido pesar.
Sr. Presidente, li este comunicado em nome de todos os Deputados que integram a Comissão Eventual para Acompanhamento da Situação em Timor Leste.

O Sr. Presidente: - Suponho que o Sr. Deputado Nuno Abecasis acometeu ao Presidente da Mesa a formulação de um protesto que deverá ser votado, desde que todos os grupos parlamentares estejam de acordo.
Assim, se ninguém se opõe, passo a ler o voto n.º 72/VII - De protesto contra a actuação da Indonésia e de pesar pela morte do Comandante timorense David Alex, que iremos votar em seguida, sem que haja lugar à discussão.
«A Assembleia da República, na sua reunião de 26 de Junho de 1997, aprovou o seguinte voto de protesto e pesar:
Foi assassinado pelas forças militares da Indonésia, que com escândalo universal ocupam o território de Timor, o comandante David Alex, no decurso de mais um acto de genocídio, desta vez pontual. Quando pode, a Indonésia mata por atacado.
Morreu um herói timorense por amor da liberdade e da autodeterminação do seu povo.
Quando um herói é assassinado o seu exemplo multiplica-se em novos actos de heroísmo. A Indonésia fez assim um mau investimento.
Convicta de que a morte do herói não mata, antes reforça o heroísmo do povo de Timor, a Assembleia da República curva-se reverentemente perante a memória do herói comandante David Alex, protesta contra a ignominiosa actuação da Indonésia, seus governantes e militares no território mártir de Timor, exprime o seu pesar e reafirma a sua determinação de continuar a lutar pela autodeterminação do povo de Timor».
Srs. Deputados, vamos então passar à sua votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, seguindo a tradição, peço à Câmara que me acompanhe num minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.

Srs. Deputados, vamos agora passar às votações agendadas para hoje. Espero que já tenham em vosso poder um requerimento de avocação, apresentado pelo PSD, no sentido de serem votados na especialidade em Plenário os artigos 38.º, 46.º, n.º 2. 48.º e 114.º do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 51/VII - Aprova a lei de bases do Tribunal de Contas.
Parece haver consenso no sentido de que se vote hoje também a proposta de lei n.º 92/VII, que acaba de ser debatida, que estabelece o regime jurídico da concessão de garantias pessoais pelo Estado ou por outras pessoas colectivas de direito público.
Srs. Deputados, vamos começar por votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 290/VII - Bases da Família (CDS-PP).

Submetido à votação, foi. rejeitado, com votos contra do PS, do PCP e de Os Verdes e votos a favor do PSD, do CDS-PP e dos Deputados do PS Cláudio Monteiro e Maria do Rosário Carneiro.

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Passamos agora à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 295/VII - Lei de bases da política de família (PSD).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP e de Os Verdes e votos a favor do PSD, do CDS-PP e dos Deputados do PS Cláudio Monteiro e Maria do Rosário Carneiro.

Vamos votar, também na generalidade, o projecto de lei n.º 338/VII - Alarga os direitos dos membros da família em união de facto (Os Verdes).

Submetido à votação, foi rejeitado, cone votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS.

Srs. Deputados, passamos à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 340/VII - Garantia dos alimentos devidos a menores (PCP).

Submetido à votarão, foi aprovado por unanimidade.

O diploma agora aprovado baixa à 12.ª Comissão.
Segue-se a votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 384/VII - Estabelece protecção adequada às famílias em união de facto (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS-PP e dos Deputados do PS Cláudio Monteiro e Maria do Rosário Carneiro, votos a favor do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para informar que, em relação aos projectos de lei n.os 290, 295, 338 e 384/VII, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentará, na Mesa, uma declaração de voto escrita.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, peço também a palavra para informar que o Grupo Parlamentar do PCP irá entregar, na Mesa, uma declaração de voto escrita relativa aos projectos de lei votados até este momento.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Srs. Deputados. . Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 281/VII - Incentivo fiscal à criação de emprego para jovens (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor ido PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos; contra do PS.

O diploma agora aprovado baixará à 11.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 282/ VII - Incentivos à criação de emprego para jovens (PSD).

Submetido .à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP e de Os Verdes e votos a favor do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 297/VII - Incentivos ao emprego nas instituições particulares de solidariedade social (PSD).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Tal como anunciei há pouco, vamos ainda votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 92/VII - Estabelece o regime jurídico da concessão de garantias pessoais pelo Estado ou por outras pessoas colectivas de direito público.

Submetida à votação, foi aprovada, cora votos a favor do PS, votos contra do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP e de Os Verdes.

O diploma agora aprovado baixa à 5.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 257/VII - Altera a Lei dos Baldios (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, votos contra do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS.

Srs. Deputados, vamos agora votar, também em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo no projecto de lei n.º 235/VII - Altera os prazos de exclusão da ilicitude nos casos de interrupção voluntária da gravidez (PS).

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, dada a natureza da matéria e a circunstância de a mesma decorrer de opções de consciência individual, é provável que o sentido de voto desta proposta de lei não corresponda, necessariamente, a um alinhamento de bancadas. Pelo menos, será assim com o Grupo Parlamentar do PSD, como já aconteceu aquando da sua votação na generalidade.
Para que se possa aferir dos resultados nestes termos, pedia a V. Ex.ª que esta votação fosse feita por filas.

O Sr. Presidente: - Se ninguém se opõe, vamos então proceder à votação por filas.

Submetido à votação, foi aprovado, com 118 votos a favor do PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes, 36 votos contra de Deputados do PSD e do CDS-PP e 11 abstenções de Deputados do PS, do PSD e do CDS-PP.

Aplausos do PS e da Deputada do PCP Odeie Santos.

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Srs. Deputados, antes de procedermos à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 51/VII - Aprova alei de bases do Tribunal de Contas, vamos votar o requerimento de avocação, apresentado pelo PSD, no sentido de serem votados em Plenário os artigos 38.º, 46.º, n.º 2, 48.º e 114.º do referido texto final.
Para uma intervenção, tem u palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, queria justificar, sobretudo, a avocação das normas dos artigos 38.º e 48.º do texto final apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Em nome da minha bancada, gostaria de dizer a todos os Srs. Deputados o seguinte: nesta lei define-se, naturalmente, um conjunto de entidades que estão sujeitas a visto prévio do Tribunal de Contas. Até aí tudo bem! Mas, depois, há uma norma altamente estranha e contraditória, em que se permite que o Tribunal de Contas, na dependência de lei nenhuma, possa, ano a ano e caso a caso, por critérios que são subjectivos e não objectivos, dispensar certas entidades ou serviços do visto prévio que a lei impõe nos seus artigos iniciais.
Na nossa opinião, esta solução é inadmissível e muito grave a todos os títulos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Juridicamente, isto significa a violação do princípio da legalidade. E, num Estado de direito democrático, todas as entidades, todas as pessoas, incluindo os tribunais, estão sujeitos à lei!
Mas, do nosso ponto de vista, isto significa também a violação do princípio da separação de poderes, segundo o qual, aos órgãos legislativos - Assembleia da República e Governo - compete legislar e aos tribunais aplicar a lei.
Esta é, pois, uma solução ilegal.
Mas, mais do que isso, a questão é muito grave ainda noutro plano. Que princípios é que estão em causa? Na prática, num exemplo muito simples, pode dizer-se o seguinte: é o Tribunal de Contas, quando todas as autarquias do País, por exemplo, estão sujeitas a visto prévio, ano a ano e caso a caso, é o Tribunal de Contas, repito, que poderá dizer que a câmara A fica dispensada e a câmara B, ao lado, fica obrigada. Como é possível explicar isto objectivamente às pessoas? Parece-nos que isto significa a violação grave de um princípio. Parece que há «Estados» dentro do Estado e parece que há órgãos dentro do Estado que estão acima da lei.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E o Tribunal de Contas não pode, de forma nenhuma, ser um «Estado» dentro do Estado! Há que ter a coragem de o dizer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, ainda no plano dos princípios, no momento em que um tribunal, que não tem controlo democrático, pode dispensar ou, na prática, alterar e modificar a lei, todas as dúvidas passam a ser legítimas, todas as suspeitas passam a ser possíveis, todas as especulações passam a ser admissíveis. Como é que se explica a um cidadão, por mais séria que seja a decisão, que a câmara A fica obrigada a sujeitar tudo ao Tribunal de Contas e que a câmara B Fica dispensada? Julgo que a credibilidade do Estado e do próprio Tribunal implicariam que a lei não permitisse isto e que o próprio Tribunal de Contas não quisesse minimamente aceitar uma situação desta natureza.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, numa palavra e para concluir, consideramos que, juridicamente, há violação de princípios constitucionais básicos e, no plano dos princípios, o Estado permite que alguns órgãos dentro de si estejam acima da lei e, na prática, modifiquem a lei. Se houver uma entidade que os órgãos legítimos queiram dispensar do visto prévio do Tribunal de Contas, por exemplo, para maior celeridade em qualquer contrato, a Assembleia da República pode legislar e, nesse caso, é julgada e responsabilizada, porque tem um controlo político e democrático;...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... um tribunal não tem julgamento, um tribunal não é responsabilizado, porque não tem um controlo político e democrático.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quero, por isso, em conclusão, dizer que votaremos totalmente contra esta norma, se não for aceite a sua revogação, e, porque consideramos altamente grave o que vai ser feito, afirmar aqui, desde já, que solicitaremos ao Sr. Presidente da República que; antes de promulgar a lei, suscite a fiscalização prévia da sua constitucionalidade por parte do Tribunal Constitucional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Podemos ficar vencidos nos votos, mas não ficamos vencidos nos argumentos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, sendo assim, antes de mais, vamos votar o requerimento de avocação, apresentado pelo PSD, para votação na especialidade em Plenário dos artigos 38.º, 46.º, n.º 2, 48.º e 1l4.º do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos. Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 51/VII e depois se verá se se votam ou não os artigos cuja avocação é requerida.

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Vamos votar, Srs. Deputados.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos agora votar, na especialidade, os respectivos artigos em relação aos quais o PSD apresentou propostas de alteração.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, dá-me licença...

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, uma vez que o requerimento de avocação foi aprovado, quero apenas sugerir que acertemos uma grelha de tempos para a discussão na especialidade. O PSD não requer muito tempo mas uma grelha mínima, de 3 ou 4 minutos, mostra-se necessária.

O Sr. Presidente: - Para cada grupo parlamentar?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Se todos estiverem de acordo...

Pausa.

Uma vez que ninguém se opõe, fica, então, estabelecido que cada grupo parlamentar disporá de 4 minutos para a discussão na especialidade.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, inscrevi-me, mas confesso que esperava que os proponentes, dado que, inclusivamente, foram eles que pediram uma grelha de tempos, quisessem fundamentar a proposta e, nesse caso, usaria da palavra em momento posterior.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não sei se a intervenção do Sr. Deputado Marques Mendes consistiu ou não na justificação da proposta.
De qualquer modo, uma vez que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes também está inscrito, dar-lhe-ei a palavra em primeiro lugar, para poder formular a justificação da proposta, em nome do seu partido.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, como o Deputado Luís Marques Mendes acabou de referir, a questão fundamental que está aqui em causa é o mecanismo da selectividade que é integrado neste diploma, através do qual se chega ao ponto de normas que são aprovadas na lei do Orçamento do Estado, pura e simplesmente, poderem ser derrogadas pelo Tribunal de Contas, o Tribunal de Contas não aplicar aquilo que é decidido na Câmara, desrespeitar as leis da República e ter poderes para além da lei.
O que está aqui em causa são fundamentalmente dois artigos - e os Srs. Deputados já dispõem das propostas de substituição -, que são os artigos 38.º e 48.º. No que se refere aos outros dois artigos, as alterações que propomos são reflexas e prendem-se com as propostas de nova redacção que é dada a estes.
Assim, o que o PSD propõe é que se acabe com a possibilidade de o Tribunal de Contas, através de um programa de selectividade na sua acção, aprovado internamente pelo próprio Tribunal, poder pôr em causa aquilo que é democraticamente aprovado nas leis da República, fazer tábua rasa das leis da República e decidir quais as entidades e organismos que devem ser sujeitos a um determinado tipo de fiscalização e de controlo da legalidade nos seus actos financeiros, que envolvam dinheiros do erário público - controlo prévio de legalidade -, e quais os que, por merecerem, digamos, um juízo valorativo favorável, perfeitamente subjectivo, por parte do Tribunal, estão dispensados, têm o prémio de não terem de se sujeitar a essa fiscalização prévia da legalidade. Isto é perfeitamente inadmissível!
Como todos os Srs. Deputados sabem, a lei ou é igual para todos ou não é boa para ninguém - é um princípio fundamental que o PSD tem por base em qualquer Estado de direito - e, como é evidente, muito menos um Tribunal pode substituir-se ao legislador ordinário. Num Estado de direito quem faz as leis são os órgãos de soberania Assembleia da República e Governo, o tribunal cumpre a lei. Mal andará Portugal, mal andará o nosso Estado, se os tribunais se substituírem aos órgãos de soberania que têm capacidade legislativa e passarem a ser eles não só a alterar e a modificar como a fazer tábua rasa das leis da República.
As propostas do PSD têm, pois, esta explicação.
No artigo 38.º, mantém-se o programa anual do Tribunal de Contas, que é definido pelo Plenário da 1.ª Secção, mas é um programa que se subordina ao programa de acção trienal e nada mais, ou seja, não pode ser feito ao sabor do tal princípio da selectividade, que é totalmente inaceitável e que choca com os princípios básicos de um Estado de direito.
No artigo 48.º, pretende-se exactamente afirmar o primado das leis da República, neste caso da lei do Orçamento do Estado. São estas que fixam, anualmente, qual o valor abaixo do qual existe uma isenção automática de fiscalização prévia. Isto é que faz sentido, tem de ser a leia decidi-lo de uma forma genérica e igual para todos e essa lei não pode ser alterada por uma decisão do Tribunal, a qual será sempre, naturalmente, arbitrária ou, pelo menos, discricionária e pautada por critérios subjectivos e não objectivos, como tem de suceder com uma lei.
O PSD gostaria que todos os Srs. Deputados tivessem pelos valores do Estado de direito a mesma apreciação e cuidado, no sentido de repor a constitucionalidade e a legalidade nesta Câmara de um diploma estruturante, como o da organização e processo do Tribunal de Contas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

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O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, compreendemos a questão que está em discussão, a qual tem a ver com a programação selectiva das actividades do Tribunal relativamente ao controlo prévio, mas não fazemos o mesmo juízo que é feito pelo PSD, e que foi agora expresso pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes, aliás, já havia sido expresso pelo Sr. Deputado Marques Mendes, quanto às consequências da consagração do regime que é proposto, não fazemos, enfim, um juízo tão dramático sobre esta questão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O problema não é das consequências!

O Orador: - Esta proposta não é nossa, não fomos nós que a elaborámos e, portanto, não fazemos qualquer questão na consagração deste regime, mas consideramos que há, de facto, um objectivo compartilhado por todas as bancadas, que é o da substituição progressiva do controlo prévio, e admitimos que uma das formas de substituição do controlo prévio, para além daquelas que são estabelecidas taxativamente na lei - e são-no em várias disposições desta lei -, é a de admitir alguma flexibilização, designadamente através da programação selectiva das actividades do Tribunal. Isto é, pode ser dada alguma possibilidade ao Tribunal de Contas de, através dos seus mecanismos de fiscalização, designadamente de auditoria, poder considerar, ele próprio, alguma margem de flexibilização na programação das suas actividades, que não é discricionária, e, nessa medida, poder considerar alguma margem de selectividade.
Não se trata de uma discricionaridade, tal como disse, uma vez que, nos termos do artigo 38.º, os mecanismos de controlo estão estabelecidos, a selectividade na programação tem de ser feita nos termos da lei que aprovámos e não pode prejudicar aquilo que está determinado nesta lei e aquilo que seja determinado, em cada ano, na lei do Orçamento do Estado.
Mas também não se trata de subjectividade, na medida em que as competências que são atribuídas ao Tribunal de Contas têm de ser exercidas nos termos da lei e, como é evidente, com transparência, uma vez que a programação selectiva constará, de facto, dos programas a apresentar no âmbito do Tribunal de Contas.
Como disse no início, esta solução não nos agrada, aliás, não a votámos favoravelmente durante a votação na especialidade, como se pode ver no respectivo relatório, e iremos manter a posição que manifestámos em sede de Comissão, que foi a de abstenção, porque não vemos razão para a alterar.
Quero ainda dizer que houve Srs. Deputados que suscitaram dúvidas quanto à constitucionalidade deste regime, mas pensamos, com toda a naturalidade, que há forma de essas dúvidas serem dissipadas, há mecanismos de controlo da constitucionalidade, quer a nível preventivo, quer a nível sucessivo, pelo que, se essas dúvidas existem, haverá formas, previstas na Constituição e na lei, de as dissipar e encaramos isso com toda a naturalidade.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças, esta reivindicação do PSD, que se traduz numa rejeição de qualquer modalidade de programação selectiva, revela aquilo que parece ser uma característica doravante genética do PSD nas suas relações com o Tribunal de Contas.
O PSD tem uma suspeição funda e permanente em relação ao Tribunal de Contas e aquilo que possa parecer «amor» ao Tribunal de Contas não é «amor», é o seu reverso. Por isso, hoje, o PSD apresenta-se aqui não para nos falar mas, verdadeiramente, para exigir ao Sr. Presidente da República que exerça as suas competências num determinado sentido.
Portanto, o que assistimos, da parte dos Srs. Deputados Marques Mendes e Marques Guedes, não é aquilo que formal, jurídica e regimentalmente dizem ser, é, isso sim. uma pequena, diria uma modesta mas, apesar de tudo significativa tentativa de pressão sobre órgãos de soberania, na base de um caderno reivindicativo infundamentado. E era aqui que gostaria de chegar. Sr. Presidente.
A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, ao longo de muitos meses, fez um trabalho muito cuidadoso e, neste ponto, especialmente cuidadoso, de calibração e ponderação de soluções. A nossa estrela polar foi, e ainda bem que o foi, a de alterar o actual sistema, excessivamente assente na fiscalização prévia, por um novo sistema.
E o artigo 114.º desta proposta exprime, modelarmente, o espírito que presidiu a esta revisão da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas. É um artigo que, desde logo e desde já, liberta de fiscalização muitas e muitas centenas de actos - isto vai ser extremamente importante, não só para órgãos da administração central mas também para entidades da administração indirecta. para as autarquias locais, seguramente, que tivemos no nosso pensamento -, é, obviamente, tributária de uma filosofia que privilegia outras formas de controlo - não é arredia ao controlo, apenas prescinde do controlo prévio -, programa vagas sucessivas de supressão de obrigações de visto prévio, vagas calendarizadas com rigor na lei, e, além destas vagas, directamente determinadas pela lei, obriga o Orçamento do Estado, todos os anos, a levar mais longe esse esforço, rumo a um resultado final ainda melhor do que o ponto de partida.
Nesse sentido, Sr. Presidente, é uma grande vitória de uma concepção nova do que deve ser o Tribunal de Contas e uma concepção moderna do tipo de controlo que este deve exercer. Não fomos acompanhados nessa viagem pelo PSD, como desejaríamos ter sido, mas percebe-se porquê. O PSD foi guardião, manteve-se como uma espécie de guarda até à última hora da concepção, que manteve e impôs, a ferro e fogo, durante o ciclo político precedente, num vezo que teve dimensões persecutórias que jazem nas páginas da história desta Assembleia da República.
Prolonga agora, já em caricatura, esse esforço de limitação, mas não vai consegui-lo, Sr. Presidente, e congratulamo-nos com esse facto. Tudo indica que não vai consegui-lo, porque a fórmula a que chegámos na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias não é uma fórmula que isente de critérios a

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dispensa de fiscalização e que transforme a programação selectiva num acto de arbítrio.
O acto de programação selectiva é um acto legalmente enquadrado. Deve reger-se por padrões que garantam, entre outras coisas, a imparcialidade, a igualdade de tratamento, a não discriminação e, obviamente, nenhum desvio de poder nesse acto.
Em segundo lugar, «A dispensa de fiscalização prévia pode ser revogada a todo o tempo...»...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mais grave ainda!

O Orador: - ... - diz o n.º 2 do artigo 38.º - «(...) na falta de fiabilidade do sistema de decisão e controlo interno do serviço ou organismo constatada em auditorias realizadas pelo Tribunal». Não é uma isenção acompanhada de cegueira, é uma isenção medida, condicionada, aferida por critérios objectivamente comprováveis e susceptíveis de serem publicamente aferidos e avaliados.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Terminarei, Sr. Presidente.
Por isso, Sr. Presidente, não nos reconhecemos nas críticas feitas pelo PSD, não vislumbramos que haja, nesta matéria, desvio em relação a parâmetros constitucionais impositivos e desafiamos o PSD a exercer o seu direito de requerer ao Tribunal Constitucional a fiscalização sucessiva, abstracta deste diploma, cuja entrada em vigor rápida é muito importante. Lutámos, neste diploma - e já terei ocasião de explicá-lo -, por muitos objectivos que foram realizados. Queremos esses objectivos susceptíveis de serem realizados e desenvolvidos pelo Governo através de diplomas complementares, queremos que essa reforma não seja atrasada. Os senhores já delongaram muito, meteram-na na gaveta durante quase um decénio, não a meterão na gaveta muito mais. Fazemos votos, aqui e agora!

Aplausos do PS.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra da bancada, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Magalhães tem, como sempre, uma habilidade extraordinária para a caricatura. A caricatura foi, efectivamente, a sua intervenção.
O que V. Ex.ª devia falar aqui era do contributo que os vários partidos deram, em sede de discussão na especialidade, designadamente o PSD, para a melhoria desta lei. Felizmente, foi possível, em várias ocasiões, formar a maioria necessária para aperfeiçoar várias situações menos correctas que esta lei consagrava.
V. Ex.ª imputou ao PSD, no passado, desrespeito pelo Tribunal de Contas. Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que a consagração desta norma é o mais grave desrespeito pelo Tribunal de Contas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sem dúvida!

O Orador: - Consagrar uma norma destas a um tribunal, seja ele qual for, mas em particular a um tribunal com as responsabilidades que tem o Tribunal de Contas, é desrespeitar aquilo que deve ser o estatuto do Tribunal de Contas.

Protestos do PS.

Nós não nos opusemos em nada do que seja acertar critérios objectivos de, gradualmente, extinguir-se até, eventualmente, o visto prévio, mas em critérios objectivos fixados na lei do Orçamento do Estado, anualmente, para todos, não é deixar ao arbítrio do Tribunal de Contas fixar e seleccionar alguns - e penso que é o Tribunal que vai perceber o incómodo de ter um poder destes -, para subtraí-los à aplicação da lei, que prevê o visto prévio.
Esta situação não é dignificante para o Tribunal de Contas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É, pois, este desrespeito que não queremos que seja a Assembleia da República a consagrar numa lei.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quando V. Ex.ª revela receios sobre o pedido de apreciação da inconstitucionalidade é porque tem bem a noção da inconstitucionalidade desta norma. Basta ler o n.º 5 do artigo 115.º da Constituição da República Portuguesa, que diz muito claramente o seguinte: «Nenhuma lei pode criar outras categorias de actos legislativos ou conferir a actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos». É este poder que VV. Ex.as querem que o Tribunal de Contas tenha. Com isto não pactuamos, porque queremos dignificar a Assembleia da República e o Tribunal de Contas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, não há muito a explicar.

Vozes do PSD: - Pois não!

O Orador: - O Sr. Deputado Guilherme Silva tem, basicamente, má consciência.

Vozes do PSD: - Oh...!

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O Orador: - A história não se reescreve e o cadastro jurídico-constitucional do PSD, nesta matéria, está inscrito nas actas da Assembleia da República em iniciativas, algumas das quais, no mínimo, historicamente vergonhosas, as quais se dirigiam a uma tapitis deminutio de quem, na altura, era presidente do Tribunal,...

Protestos do PSD.

... traduzida na célebre teoria das forças de bloqueio, que ma, no mínimo controlo do Tribunal, uma terrível obstrução à realização dos imperativos supremos do cavaquismo.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, façam favor de fazer silêncio!

O Orador: - Sr. Deputado Guilherme Silva, não se gabe da contribuição dada pelo PSD para esta lei.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não se gabe, desde logo porque o PSD não ficará associado a algumas das melhores ideias constantes deste diploma, que agora aprovamos, e não ficará associado...

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Graças a Deus!

O Orador: - ... à verdadeira operação de desburocratização e simplificação da vida das entidades públicas, desde logo das autarquias locais que, aqui e agora, acabámos de operar e que nos comprometemos legalmente a continuar nos anos seguintes. Nunca esse compromisso foi assumido aquando do cavaquismo, nem ele era possível porque era completamente contrario à natureza controleirista desse sistema já perecido.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço desculpa, mas as minhas advertências são para todos, não são para alguns. Não posso continuar eternamente a recomendar que os Srs. Deputados cumpram o seu dever de ouvir, com respeito, os seus colegas. Tenham paciência!
Queira continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Em segundo lugar, Srs. Deputados e, em particular, Sr. Deputado Guilherme Silva, o alargamento de competências deste Tribunal é, só por si - e foi proposto pelo Governo e aprovado por nós conscientemente, com o vosso voto contra -, a prova suprema de que a nossa atitude em relação ao Tribunal é de mais controlo, mais e melhor fiscalização no quadro constitucional, para que o Tribunal seja rigorosamente aquilo que a Constituição quer que ele seja e não um órgão anquilosado que não tenha verdadeiramente capacidade para avaliar, não apenas o que a Administração Pública faz legalmente mas se faz eficazmente e gasta bem os dinheiros públicos. Não poupámos esforços por isso. Demorámos um ano a votar esta lei mas consultámos numerosas instâncias, ouvimos diversas entidades, ouvimos várias vezes o Sr. Presidente do Tribunal de Contas, contámos com a cooperação institucional do Governo sempre e em cada momento. Não nos faltou um elemento de informação, nenhuma contribuição necessária.
O que não contámos, Sr. Deputado, foi com a vossa colaboração para conseguirem desbastar na actividade do Tribunal o essencial e o secundário.
A programação selectiva não conta com o vosso voto, mas conta com o nosso voto, conta com uma maioria e não é contrária à Constituição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao vosso amor tardio pela separação de poderes...

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino, Sr. Presidente, precisamente com esta reflexão: o PSD, durante o tempo em que governou, teve da separação de poderes a ideia que a história regista. Converteu-se agora à separação de poderes, mas como todos os neófitos exagera e ainda não percebeu bem aquilo a que diz ter-se convertido. É um mau exemplo e não passará, Sr. Deputado!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando discutimos esta matéria na 1.ª Comissão, em sede de especialidade, tive ocasião, em nome do Partido Popular, de manifestar a minha total discordância face ao regime que, com o voto favorável do Partido Socialista e a viabilização abstencionista do PCP, acabou por ficar na versão do texto final.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Ouça, Sr. Deputado José Magalhães!

O Orador: - É a pior maneira de se fazer mal ao Tribunal de Contas. E se o Sr. Deputado José Magalhães tem presente aquilo a que chama «o cadastro político do PSD», em matéria do Tribunal de Contas, não queira V. Ex.ª começar a construir o seu, porque o pior que se pode fazer à credibilidade do Tribunal de Contas é imputar-lhe a responsabilidade política de decidir a quem aplica ou a quem não aplica a lei.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Exactamente!

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O Orador: - Isto não é de um Estado de direito, Sr. Deputado.
Desafio-o a defender em consequência e a avançar já a proposta nesse sentido, no sentido de dizer, por favor, quais são as câmaras que, no seu entendimento, para o próximo ano, devem ser alvo de fiscalização prévia do Tribunal e quais as que, no seu entendimento, não o devem ser. Isto chama-se violar o Estado de direito, violar os princípios gerais do Direito.
Nunca esperei, Sr. Deputado José Magalhães, que o seu excesso de zelo na defesa das piores soluções legislativas, venham elas de onde vierem, fosse ao ponto de ficar intelectualmente cego perante uma má solução técnica, legislativa e jurídica, que é a que estamos a discutir.
Mais: na sessão de hoje ouvimos o Sr. Deputado Luís Sá interpelar a Mesa para saber quais os critérios pelos quais o Governo entendeu que certas câmaras, com planos de actividade e orçamentos aprovados com atraso, mereceram uma acção inspectiva consequente, e por que razão outras, também com planos de actividade e orçamento em atraso, não mereceram idêntica atitude. Estaremos, se esta lei passar como está, para o ano, a discutir aqui - já não com o contributo do Sr. Deputado Luís Sá, porque se se vai abster nesta solução perderá toda a autoridade moral para criticar outros comportamentos idênticos da administração relativamente à direcção e selecção política da aplicação de qualquer lei, mas, porventura com o nosso, porque não subscrevemos essa solução, opomo-nos e votaremos contra ela - por que razão há uma câmara que é fiscalizada com visto prévio e outra não.
Se o Sr. Deputado quer acabar com a credibilidade do Tribunal de Contas não lhe cometa esta maldade. Os tribunais existem para aplicar leis, não para decidir a quem as aplicam. Os tribunais aplicam as leis a todos ou a nenhuns. Agora, o que não pode acontecer é um tribunal escolher a quem vai aplicar a lei.
O Sr. Deputado, normalmente, tem sempre um argumento à mão, quando não tem outros argumentos políticos para desfazer ideias dos adversários, que é a falta de consistência jurídica. Assim, tendo em conta o seu argumento, faço-lhe um apelo: tenha um momento de consciência e de lucidez e peça à sua bancada para rever a sua posição, porque até ao último momento, Sr. Deputado - e elevá-lo-ei por isso -, a bancada do PS pode reconhecer que esta solução é má para o Tribunal de Contas, é má para o Estado de direito e é má, obviamente, para todas as entidades que, a partir deste momento, não sabem em que ano é que serão visitadas pelo Tribunal de Contas, designadamente em fiscalização prévia. Em nome de todos estes interesses que me parecem suficientemente importantes, revejam a vossa posição, corrijam o erro, porque ainda vão a tempo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputado, vamos então passar à votação dos artigos, cuja avocação foi requerida.

Vamos começar por votar, na especialidade, a proposta de substituição do artigo 38.º da iniciativa do PSD.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Era a seguinte:

«Artigo 38.º

1 - O Plenário da 1.ª Sessão aprova até 15 de Dezembro de cada ano, com subordinação ao programa de acção trienal, o respectivo programa anual.
2 - A atribuição aos juízes da direcção das auditorias é feita por sorteio.»

Srs. Deputados, vamos passar à votação, também na especialidade, da proposta de substituição do n.º 2 do artigo 46.º...
O Sr. Deputado José Magalhães pediu a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, tendo submetido à votação esta proposta de, eliminação e estando nós a refazer a votação, sugiro que se vote o artigo 38.º na redacção que tínhamos examinado na Comissão ou, então que se assente que é dado por votado.

O Sr. Presidente: - É evidente que parto do princípio de que seria dado por votado, mas, se entenderem que se deve votar na redacção que constava no texto, fá-lo-emos. Mas parece-me que isso está implícito - ça va de soi.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta de substituição do n.º 2 do artigo 46.º

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, votos a favor do PSD e do CDS-PP, e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Era a seguinte:

«Artigo 46.º

2-A fiscalização prévia exerce-se através do visto ou da declaração de conformidade, sendo devidos emolumentos em ambos os casos.»

Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta de substituição do artigo 48.º

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, votos a favor do PSD e do CDS-PP, e abstenções do PCP e de Os Verdes.

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Era a seguinte:

«Artigo 48.º

Dispensa de fiscalização prévia

As leis do Orçamento do Estado disporão, em cada ano, sobre a actualização dos valores abaixo dos quais os actos e contratos ficam dispensados de Fiscalização prévia.»

Vamos passar agora ao artigo 114.º. Confesso que não percebo bem em que é que consiste a alteração, mas suponho que os Srs. Deputados sabem do que se trata...
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, trata se da eliminação de dois números que constam do texto aprovado pela Comissão.

O Sr. Presidente: - Embora não esteja tão claro quanto isso, agora está esclarecido. O artigo passa a ter apenas três números e não os cinco que constam da redacção inicial.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação desta proposta de eliminação de dois números do artigo 114.º

Submetida à votação, foi rejeitada, coar votos contra do PS, votos a favor do PSD e do CDS-PP, e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação final global do texto final aprovado na 1.ª Comissão, com a alteração da designação da lei, que passa a Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas.

Submetido à votação, foi aprovada, com votos u favor do PS, votos contra do PSD e do CDS-PP, e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, temos ainda dois relatórios para votar. Tem a palavra o Sr. Secretário da Mesa para proceder à respectiva apresentação.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Procuradoria-Geral da República, a Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Maria Manuela Dias Ferreira Leite a prestar declarações, por escrito, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Dado que não há pedidos de palavra, vamos proceder à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado no ofício n.º 344, de 11 de Março de 1997, da Procuradoria-Geral da República, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer sobre o processo n.º 68/97, relacionado com o Sr. Deputado José da Conceição Saraiva, que foi aprovado por maioria, com os votos favoráveis do PS, do PSD e do PCP, e a abstenção do CDS-PP, em reunião desta Comissão Parlamentar realizada em 25 de Junho de 1997.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está à discussão.
Dado que não há pedidos de palavra, vamos proceder à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos passar à discussão da proposta de lei n.º 102/VII - Autoriza o Governo a legislar sobre o regime de acesso e exercício da actividade seguradora, o regime de endividamento das empresas de seguros e resseguros e o regime sancionatório da actividade seguradora. Para dar início ao debate, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
Entretanto, peço ao Sr. Deputado Mota Amaral que me substitua na presidência da Mesa, dado que tenho de me ausentar para uma reunião da Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, tenho a honra dê apresentar hoje à Assembleia uma outra proposta de lei de autorização legislativa para regular duas matérias substancialmente distintas, embora interligadas: o regime sancionatório da actividade seguradora e o acesso à actividade seguradora e seu exercício. Trata-se no seu conjunto, de uma área importante e que carece de revisão legislativa.
Começando por falar do regime sancionatório da actividade seguradora, recordo que ele está hoje regulado pelo Decreto-Lei n.º 91/82, de 22 de Março, cujo contexto marca a sua evidente desactualização. A estrutura em que foi aprovado era marcada pelas nacionalizações próximas das empresas de seguros e pela proibição de acesso da iniciativa privada à actividade seguradora. O contexto em que se inseria era anterior à adesão de Portugal às Comunidades Europeias e anterior às iniciativas comunitárias tendentes a criar um .mercado único no sector segurador. Era ainda um contexto anterior às novas concepções de política criminal e sancionatória resultantes da aprovação e da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, que aprova o regime geral do ilícito de mera ordenação social. Além disso, ocorreu um movimento profundo de liberalização de movimentos de capitais nos espaços europeu e mundial.
Por isso tudo, a revisão deste diploma é urgente. A sua necessidade torna-se ainda mais evidente quando, num contexto de grande complexidade, como é aquele em que hoje se desenvolve a actividade seguradora, as infracções puníveis com multa, no Decreto-Lei n.º 91/82, eram apenas violação ou inobservância de disposições legais e regulamentares respeitantes ao acesso, exploração e exercício da actividade seguradora e resseguradora, não envio dentro dos prazos fixados ou recusa de envio de elementos ou

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documentos a entidades oficiais ou públicas e fornecimento de elementos ou documentos falsos ou incompletos a entidades oficiais ou públicas. É um conjunto de infracções penais pobre e inadequado à realidade actual. Por outro lado, as multas variavam entre um mínimo de 25 contos e um máximo de 10 mil contos, o que conduzia - e conduz ainda - a comentários como este: em Portugal, não existe verdadeiro regime sancionatório para a actividade seguradora, sobretudo tendo em conta que o capital social mínimo exigido para o acesso ao exercício da actividade seguradora varia entre os 500 mil contos e os três milhões de contos, o que demonstra a insignificância dos montantes sancionatórios vigentes.

O Sr. João Carlos Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Neste contexto, apresenta-se ao Parlamento uma profunda reformulação do regime sancionatório da actividade seguradora em autorização legislativa, dada a complexidade dessa regulamentação, a qual assenta nos seguintes princípios essenciais que inspiram a presente proposta de lei: primeiro, criminalização do exercício não autorizado de actos ou operações de seguros, resseguros ou gestão de fundos de pensões, a exemplo do que sucede noutros países comunitários, uma vez que estão em causa nestas actividades interesses fundamentais de protecção da poupança das famílias, garantia de riscos e protecção dos interesses dos segurados e dos terceiros. Pretende-se, assim, tornar eficazes objectivos de natureza preventiva, indispensáveis numa actividade como a seguradora e também a da gestão de fundos de pensões, que são marcadas ambas pela chamada inversão do ciclo de produção, em que o tomador paga primeiro e recebe depois. Por isso se prevê, pela primeira vez em Portugal, neste domínio, a punição da tentativa nos casos de ilícitos especialmente graves. Em segundo lugar, a adaptação dos tipos legais das infracções às inovações legislativas introduzidas neste sector da actividade financeira e às inovações que resultam do novo contexto de internacionalização, de criatividade de oferta, de sofisticação dos produtos e serviços prestados e de livre circulação de capitais. Em terceiro lugar, o ajustamento do quadro legal, tanto nos aspectos substantivos como nos processuais, ao regime geral dos ilícitos de mera ordenação social, e deste à especificidade das entidades e actividades do sector segurador. Em quarto lugar, a actualização e revisão dos montantes das sanções pecuniárias em função dos bens jurídicos protegidos, abandonando a situação actual que é de prática e ridícula impunidade, qualquer que seja a infracção cometida.
Desenvolvendo estes princípios, direi, pois, que o Governo se propõe, através da presente proposta de lei, tipificar como crime punível com prisão até três anos a prática de actos ou operações de seguros, resseguros ou gestão de fundos de pensões por entidades não autorizadas nos termos da legislação em vigor. As demais infracções à legislação reguladora são qualificadas como ilícitos de mera ordenação social. Quanto à moldura sancionatória e atendendo à crescente complexidade da actividade seguradora, procurou-se estruturá-la em três níveis, com o que se respeita o princípio da proporcionalidade: o dos ilícitos cujo desvalor não deve desencadear uma reacção sancionatória muito forte, o dos ilícitos graves e o dos ilícitos especialmente graves. No primeiro nível, a moldura sancionatória proposta varia entre limites mínimos e máximos para pessoas singulares, de 50 a 3000 contos, e para pessoas colectivas, de 150 a 15000 contos; no segundo, sobe significativamente, para pessoas singulares, de 150 a 10000 contos e, para pessoas colectivas, de 300 a 50000 contos; no terceiro nível, a moldura sancionatória varia entre os limites mínimos de 300 contos e o máximo de 30000 contos para pessoas singulares e de 600 e 150000 contos para pessoas colectivas - menos do que situações comparáveis do sistema bancário, mas seguramente algo que se justifica pela responsabilidade social assumida por estas empresas. Esta solução mereceu o acordo das associações representativas do sector, que foram ouvidas pelo Governo, e assenta no equilíbrio entre a justa aplicação de normas sancionatórias e a responsabilidade social da actividade desenvolvida.
Sublinho um segundo conjunto de matérias para cuja disciplina o Governo solicita a autorização legislativa. Está em causa, por um lado, criar condições para a transposição de directivas comunitárias no domínio do controlo dos detentores de participações em empresas de seguros; por outro lado, a revisão das disposições relativas ao saneamento financeiros de empresas de seguros, definindo, de forma mais completa e precisa, as providências de recuperação e saneamento; finalmente, pretende-se regular o regime do endividamento das empresas de seguros e resseguros, definindo, de harmonia com os ensinamentos da experiência nacional e estrangeira, as condições e limites que devem ser observados em tais operações para salvaguarda da solvência das empresas e dos direitos e interesses dos segurados e demais beneficiários das apólices.
Quanto ao primeiro domínio, o controlo dos detentores de participações, pretende-se definir que entidades que, de acordo com critérios objectivos, não tenham condições adequadas à garantia de uma gestão sã e prudente da empresa de seguros não podem possuir nelas participações qualificadas, instituindo-se um sistema de controlo iniciai e sucessivo dos detentores de participações e consagrando-se o, princípio do registo de acordos parassociais relativos aos exercício dos direitos de voto, a exemplo do regime geral das instituições de crédito e sociedades financeiras.
Quanto à revisão das disposições relativas ao saneamento financeiro das empresas de seguros, pretende-se rever as disposições relativas ao saneamento de empresas em situação financeira insuficiente, definindo de forma mais completa e precisa, aproveitando até lições de uma experiência recente infeliz, as providências de recuperação e saneamento que competem ao Estado ou, melhor, ao sector público, através do Instituto de Seguros de Portugal.
Finalmente, no que respeita ao regime do endividamento das empresas de seguros e resseguros, pretende-se definir, de harmonia com experiência nacional e estrangeira, condições e limites que devem ser observados. A regra tradicional era a da proibição de emissão de obrigações e aquisição de acções próprias ou operações sobre elas; a aprovação e entrada em vigor do Decreto-

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- Lei n.º 102/94, de 20 de Abril, suscitou dúvidas sobre a vigência daquelas normas, uma vez que o legislador, numa transposição cega das directivas comunitárias, veio prever que os empréstimos subordinados e os títulos de duração indeterminada passavam a integrar a margem de solvência das seguradoras. Importa clarificar o regime jurídico do endividamento das empresas de seguros, não apenas no plano da segurança jurídica das operações mas também no plano económico.

O Sr. João Carlos Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Pode perguntar-se se existe razão para que empresas que recebem adiantamentos dos seus clientes, por sistema, pela natureza da sua actividade, necessitem de recorrer ao endividamento para financiar a sua actividade. À primeira vista, sendo a resposta negativa, podem em todo o caso identificar-se duas motivações principais dos accionistas para recorrerem ao endividamento. A primeira passa pela utilização de dívida como meio de gerir um negócio com menor compromisso de capital próprio, ou por manifesta insuficiência de capital ou por menor predisposição dos accionistas para realizarem investimentos significativos numa actividade que em termos de rendibilidade comparada não aparenta ser tão apetecível como outras alternativas de negócio.
A segunda motivação para recorrer ao endividamento assenta na tentativa de utilizar o dinheiro dos segurados cromo uma almofada para, em proveito próprio, realizar operações que, mesmo caracterizadas com o máximo de brandura e compreensão, não poderão deixar de ser qualificadas como de mera especulação.
A solução para que apontámos teve em conta. pois, que o endividamento, sendo em princípio pouco justificável, deve em todo o caso. realisticamente, ser objecto de alguma compreensão. O endividamento das seguradoras não é proibido na maior parte dos países comunitários existindo, contudo, fortes restrições à emissão de dívida que nunca impediram nem o crescimento da actividade nem a consolidação do poderio financeiro das empresas de seguros, por exemplo, da Alemanha e não existe harmonização comunitária na matéria.
Tendo em conta a actual situação portuguesa, talvez demasiado permissiva e de certo pouco clarificada, foi necessário procurar um equilíbrio de soluções era diálogo com as associações representativas do sector, sendo que o equilíbrio a que chegámos consta da presente proposta de lei. Sublinhe-se que ela não tem efeitos retroactivos aos empréstimos já contraídos e aos títulos de dívida emitidos pelas empresas de seguros e resseguros os quais deverão ser reembolsados nos termos contratados embora não possam ser renovados.
Nesta conformidade diria que a solução para que aponta a proposta de lei vai no sentido de admitir o endividamento apenas como meio de financiamento para aquisição de imóveis e bens de equipamento que sejam indispensáveis para a sua instalação ou funcionamento ou para a prossecução do seu objecto social, ficando essa emissão dependente de autorização prévia do Instituto de Seguros de Portugal.
Para terminar, Sr. Presidente, quero referir que uma das conclusões expressas no Livro branco para a actividade seguradora considera justificado que a emissão de obrigações, logo de dívida, seja expressamente reconhecida na lei, embora apenas na medida em que o produto das obrigações a emitir se destine ao financiamento da aquisição de imóveis necessários às actividades normais das seguradoras. Admite-se ainda o endividamento de curto prazo não renovável e até 10% dos capitais próprios, em casos pontuais, designadamente, para cumprimento de obrigações contratuais directamente decorrentes da realização de seguros e de resseguros. Procura-se assim acautelar as responsabilidades das empresas seguradoras para com os credores específicos de seguros permitindo à autoridade de supervisão que vede a contracção de empréstimos e a emissão de dívida por essas empresas de seguros ou resseguros quando em situação financeira insuficiente e bem assim, no mesmo contexto, que vede a distribuição de dividendos ou reembolsos de suprimentos. Institui-se ainda como necessário complemento um sistema de informação pelas empresas de seguros e resseguros ao ISP sobre todos os empréstimos e respectivas condições que hajam contraído.
Penso que esta é uma solução equilibrada que pode permitir com o decurso do tempo maior confiança do público na actividade seguradora, maior solidez financeira das empresas, bem necessária para enfrentarem os desafios dos tempos que se avizinhara, e melhoria da supervisão do ISP responsabilidade pública não menos importante para os tempos que se avizinham.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Concluo dizendo que também neste domínio temos uma proposta global e estamos a cumpri-la. Além desta proposta de lei de autorização legislativa, o Governo está neste momento a apreciar e penso que o Conselho de Ministros poderá aprovar no próximo mês de Julho, um projecto de estatutos do ISP e julgo que será possível apresentar até ao início da próxima sessão legislativa iniciativas legislativas no domínio do regime do contrato de seguros. Reforço da supervisão, enquadramento mais moderno, exigente mas flexível, das empresas são os caminhos para que as empresas de seguros possam enfrentar a concorrência acrescida em livre circulação da capitais, moeda única e União Económica e Monetária.

Aplausos do PS.

Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amara.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Galvão Lucas.

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, duas questões que são suscitadas pelas explicações, que agradeço, e pela leitura da proposta de lei n.º 102/VII.
Quanto à supervisão, ainda recentemente numa reunião de acompanhamento da União Económica e Monetária, havida aqui, na Assembleia da República, tive oportu-

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nidade de colocar ao Sr. Governador do Banco de Portugal a ideia de que esta supervisão do sistema bancário que efeito? propriamente dito, do mercado de valores mobiliários e do mercado segurador, pudesse vir a ser feita de uma forma diferente daquela que é feita hoje, até porque estes sistemas cada vez estão mais integrados.
O Sr. Ministro sabe que hoje mais de 50% da actividade seguradora portuguesa está na mão de grupos financeiros ligados a bancos e talvez mais de 50% dos produtos das seguradoras são vendidos através desses
bancos.
Portanto, não sendo claro, nem decorre da proposta de lei, que o Sr. Ministro admita a possibilidade que essa supervisão venha a ser diferente no futuro e que fique exclusivamente entregue, parece ser isso que sugere o pedido de autorização legislativa, ao ISP coloco-lhe essa questão. Parece ser razoável que, havendo essa integração de sectores, houvesse uma integração da função supervisora, o que, aliás, não vai completamente contra o que a União Económica e Monetária está a preconizar e que, como sabe melhor do que eu, na Inglaterra virá eventual
mente a ser implementado.
A segunda questão, que penso ter a ver com a primeira porque aquilo que pretendem impedir com o que introduzem no pedido de autorização legislativa seria resolvido com, uma correcta supervisão, tem a ver com a limitação do endividamento das seguradoras impondo um limite de 10% de capitais próprios. Consideramos escasso, injustificado, pois há casos na actividade seguradora em que se justifica recorrer a fundos de montante muito elevado, independentemente de, a posteriori, as seguradoras poderem vir a concorrer com esses fundos, sendo limitativo numa fase de concorrência acrescida com empresas seguradoras estrangeiras.
São estas duas questões, sobre a supervisão e a limitação do endividamento, que aqui lhe deixo se bem que pense que com uma supervisão adequada o Governo atingiria o objectivo que pretende ao impor restrições ao endividamento das seguradoras.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, o Sr. Ministro utilizou tempo cedido pelo Partido Socialista para terminar a sua intervenção.
Sr. Deputado António Gaivão Lucas, o Governo não tem tempo para responder e o PS não está disposto a ceder tempo, portanto, temo que seja preciso que o PP ceda algum tempo para o Sr. Ministro das Finanças responder. O Sr. Deputado António Gaivão Lucas não está pronto para esse efeito?

Pausa.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, o Partido Comunista Português cede dois minutos.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Então, com a cedência de dois minutos por parte do Partido Comunista Português, o Sr. Ministro vai responder.

O Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira pede a palavra para

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, certamente por deficiência minha, que de V. Ex.ª seria impossível que fosse, houve aqui um equívoco ou um erro de comunicação. Já cedemos alguns minutos, temos uma intervenção de fundo para fazer e, na nossa opinião, para esclarecer as perguntas do PP, achamos lógico e nesse sentido até tinha contactado a Direcção do Grupo Parlamentar do PP, que fosse esse partido a ceder tempo. Mas estamos sempre disponíveis para ceder tempo ao Sr. Ministro.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, está esclarecido. Não ponho em causa que o PS não apoie o Governo, era só o que faltava!

O Sr. António Gaivão Lucas (CDS-PP): - Permita-me, Sr. Presidente, que lhe diga que o PP está disposto a ceder o tempo que o Sr. Ministro precisar para responder às minhas perguntas, independentemente de termos também uma intervenção de fundo para fazer.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças, para responder.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradeço o tempo cedido e vou tentar responder muito brevemente.
A segunda pergunta naturalmente teria, e tem, uma resposta de abertura em termos de especialidade, pois, mesmo tratando-se de uma proposta de autorização legislativa, existe a possibilidade de vincular a utilização. Nesse sentido gostaríamos de saber quais são as vossas propostas, mas sendo este um princípio geral, no caso concreto, a sua proposta deve ser, à partida, encarada com alguma relutância. Em princípio o regime do endividamento é um aspecto fundamental da solidez financeira das empresas seguradoras e temos necessidade de reforçar essa solidez. Nesse aspecto diria, repetindo as palavras da vossa bancada, que não é só o Estado que precisa de rigor, pois também muitas vezes outros sectores, nomeadamente os sectores financeiros, precisam de ser tratados com rigor para resistirem à concorrência acrescida que aí vem e às responsabilidades perante o público que têm de satisfazer.
Portanto, abertos, por princípio, à consideração de outras soluções, mas, à partida, com a convicção muito forte de que o regime do endividamento não pode ser alargado arbitrariamente. A nossa proposta foi aceite pela Associação Portuguesa de Seguros e é de algum modo por essa via uma proposta razoável, politicamente legitimada estaria de qualquer forma, no contacto com o sector. E não queremos, de maneira nenhuma, neste sector gigantes

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com pés de barro que coloquem em risco o dinheiro dos portugueses e a confiança no sistema.
Relativamente à supervisão, é uma condição essencial, tal como a solidez financeira com que se prende este problema do endividamento, para que em todos os sectores financeiros as nossas empresas resistam ao embate, positivo, que de todo o modo é o do mundo em que estamos e que não podemos ignorar ou deixar de viver, da globalização, da União Económica e Monetária e da moeda única.
Os sectores financeiros vão ser dos sectores em que a exigência de solidez, de capacidade, de critérios sólidos de actuação, é maior, senão mesmo o conjunto dos sectores em que essa exigência é maior. A supervisão é, pois, um requisito fundamental da sobrevivência das nossas instituições financeiras e da confiança que os mercados e o público em geral nelas possam ter, bem como do regular funcionamento dos mercados.
Não sou daqueles que partilham da ideia, por vezes expressa, de que a supervisão em Portugal não é satisfatória. A supervisão do Banco de Portugal, a supervisão da Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, a supervisão do Instituto de Seguros de Portugal são credíveis, mas é necessário, no entanto - e nós temos um contacto permanente com estas instituições -, melhorá-las e evitar situações que, por falta de estruturas de coordenação, de troca de informação, de diálogo permanente, haja empresas ou grupos financeiros e até financeiros com componente não financeira, que, possam criar zonas escuras em relação à supervisão porque, em rigor, nenhuma das entidades de supervisão tem capacidade para supervisar numa base consolidada. Esse é o problema fundamental, ou seja, articular as instituições de supervisão e teremos de fazê-lo, porventura. Estamos em diálogo com as três instituições neste momento e pensamos em fórmulas de articulação que têm de ser tratadas com elas.
Aliás, é importante essa experiência inglesa que exemplifica uma coisa que já tenho dito, que vou dizer aqui de novo e que espero não seja mal interpretada: é muito importante que a independência que temos de conceder por imposição do Tratado de Maastricht e das regras instituídas quanto ao sistema europeu de bancos centrais se estenda ao Banco de Portugal, apenas essa independência blindada como autoridade de política monetária, mas que não se estenda ao exercício das funções de supervisão. Isto significa que na qualidade de autoridade de supervisão, o Banco de Portugal está em pé de igualdade com as outras instituições de supervisão e deve, como a experiência inglesa demonstra, ser tratado, naturalmente com toda a autonomia que as instituições de supervisão carecera, em termos diferentes porque a supervisão é uma função em que a independência da autoridade supervisora e a sua competência são fundamentais mas a articulação e a coordenação em nome do bem público e do interesse públicos torna essa independência mais limitada do que a concebida para o Banco Central como tal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Galvão Lucas.

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados: A actividade seguradora assume. hoje em dia, face ao crescente desenvolvimento da actividade económica e financeira, bem como ao aumento dos produtos oferecidos pelas entidades seguradoras, uma importância que justifica, sem dúvida, uma intervenção legislativa no sentido de adequar a regulamentação desta actividade às necessidades quer das seguradoras e resseguradoras quer dos segurados.
Assim, a proposta de lei n.º 102/VII, embora apresentando alguns aspectos que carecem de clarificação e em relação a outros seja omissa, constitui, desde que devidamente ajustada, um documento de base susceptível de poder permitir que os objectivos a que o Governo e a actividade em causa se propõem.
Decorre do que fica dito que esta pequena intervenção terá necessariamente, tal como já procurei atingir com o pedido de esclarecimento que coloquei a V.Ex.ª, o objectivo de lançar as questões em que haverá que repensar para que da autorização legislativa decorra a legislação adequada que se deseja.
No que se refere ao regime sancionatório, encontramos hoje uma legislação obsoleta e fragmentada (Decreto-Lei n.º 91/82, de 22 de Março, que estabelece normas quanto à disciplina das sanções aplicáveis às companhias de seguros e seus gestores, e o Decreto-Lei n.º 107/88, de 31 de Março, que estabelece medidas tendentes a sancionar a prática ilegal de actos ou operações inerentes à actividade seguradora por entidades não autorizadas), pelo que não podemos deixar de concordar com uma adaptação e actualização do regime sancionatório à realidade. no qual não só sejam estabelecidos novos montantes para as coimas, como também definidos os princípios a que deve obedecer a aplicação das mesmas, o que permitirá reforçar a protecção dos interesses públicos.
Acresce que. obrigações em matéria de supervisão, resultantes de disposições legislativas, regulamentares ou administrativas com origem em directivas comunitárias datadas de (992, só poderão ser devidamente efectivadas mediante a definição de um novo quadro sancionatório.
No entanto, verifica-se que o principal vício de que enferma o regime actualmente em vigor não foi sanado. Isto é, tal como o Decreto-Lei n.º 91/82, de 22 de Março, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 133/86, de 12 de Junho, que estabelece normas quanto à disciplina das sanções aplicáveis às companhias de seguros e seus gestores, a proposta de lei não define o que são infracções simples, graves e muito graves, o que impede uma aplicação justa, uniforme e coerente das sanções.
Tal indefinição atinge a sua gravidade máxima no caso de aplicação da sanção de revogação da autorização para exercício da actividade. Portanto, torna-se necessário saber o que é uma infracção grave que, praticada com dolo, justifique essa sanção. Parece-nos, pois, imprescindível que o Governo esclareça e determine o que se entende por «infracção grave».

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Parece-nos, por outro lado, igualmente de louvar a introdução de sanções acessórias em conformidade com o regime geral do ilícito de mera ordenação social e correspondente definição dos princípios a que deve obedecer a sua aplicação, bem como as adaptações efectuadas aos procedimentos ilícitos de mera ordenação social, por forma a torná-lo mais célere e menos burocrático.
Quanto ao regime que o Governo pretende instituir no sentido de proceder a um controlo dos detentores de participações sociais nas empresas de seguros (sem prejuízo sermos favoráveis a essa forma de evitar que uma gestão inoportuna ponha em risco a actividade seguradora), coloca-se a questão de saber quem o irá por em prática. A entidade supervisora? Ou o Governo?
Gostaríamos igualmente de ver esclarecido como irá o Governo definir «participação qualificada» para efeitos da aferição da adequação dos respectivos detentores. Será o mero direito de voto? Será a integração de corpos sociais?
Saliente-se o tranco acréscimo de poderes conferidos, na actual versão, ao ISP, nomeadamente no que toca à aplicação e acompanhamento de medidas de recuperação e de saneamento de empresas de seguros em situação financeira insuficiente, bem como a possibilidade de revogar a autorização para o exercício da respectiva actividade, nos termos impostos peia Directiva n.º 92/96/CEE do Conselho. Porque razão não se aplicam tais disposições às empresas de resseguros? Será esta, a do ISP, a melhor solução para a entidade supervisora, como, aliás, decorre do meu pedido de esclarecimento?
Finalmente, e tal como também decorre do meu pedido de esclarecimento, quer a contracção de empréstimos quer a emissão de títulos de dívida por empresas de seguros ou resseguros estarão subordinados a uma autorização prévia do ISP, mas parece-nos ser discutível, pelo menos, o que da aplicação da alínea b) do artigo 7.º se refere ao limite dos 10% dos capitais próprios. Continuo a insistir neste aspecto, referindo que 10% de relação entre capitais próprios e capitais alheios, mesmo numa actividade do tipo segurador parece-me escasso face às razões que aduzi.
Tendo esse aspecto já sido coberto pelo pedido de esclarecimento, concluiria por um claro apelo ao Governo para que tome em consideração o que fica dito, para que não venha, mais uma vez, produzir legislação que, podendo não ser por nós votada favoravelmente - mas, infelizmente, isso não impedirá a sua aprovação -, não satisfaz, não é a mais adequada e, por consequência, não nos dignifica quanto à qualidade da nossa intervenção legislativa.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Na proposta de lei n.º 102/VII, que estamos a apreciar, o Governo solicita autorização à Assembleia da República para legislar, primeiro sobre o regime de acesso e exercício da actividade seguradora, segundo sobre o regime de endividamento das empresas de seguros é, finalmente, sobre o regime sancionatório da actividade seguradora.
Compreende-se a necessidade de aperfeiçoar os instrumentos legais em vigor nas áreas já mencionadas, face às alterações profundas que o sector segurador tem vivido nos últimos tempos, nomeadamente inerentes à liberalização e internacionalização da actividade seguradora e ao desenvolvimento tecnológico, que permitiu áreas de negócios anteriormente fora do âmbito desta actividade.
Face a todas estas mutações e, ainda, à criação do mercado único no sector segurador, tornou-se essencial criar condições para aprofundar a supervisão prudencial a qual passou no Mercado Europeu a ser feita com base no sistema do controlo pelo país de origem.
É este o âmbito da Directiva n.º 95/26/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho de 29 de Junho de 1995, a qual o Governo pretende transpor para o Direito português através da presente proposta de lei. No entanto, o Governo aproveita a oportunidade para solicitar à Assembleia da república autorização para legislar de uma forma mais profunda.
Se concordamos com o espírito geral da presente proposta de lei, nomeadamente a tipificação da prática não autorizada de actos ou operações de seguros, como crime punível até 3 anos de prisão, e a instituição de um regime sancionatório que reforce a protecção dos interesses públicos, em especial o da garantia da capacidade financeira das empresas de seguros para fazer face às obrigações contraídas perante os seus clientes, algumas das normas propostas levantam-nos as maiores dúvidas, das quais destaco algumas.
Primeiro, o Governo solicita autorização legislativa para estabelecer o limite das coimas a todos os prevaricadores, as quais podem atingir sanções pecuniárias de 150 000 contos no caso de «ilícitos graves» e «especialmente graves». O problema é que o critério para esta qualificação não está estabelecido.
Segundo, reforçando-se os poderes de supervisão do Instituto de Seguros de Portugal, atribui-se a este poderes que têm que ser questionados. Assim, estabelece-se que o Instituto de Seguros de Portugal terá competência para «proceder à apreensão de documentos e valores e proceder à selagem de objectos não apreendidos». Ora, como é possível que isto aconteça sem uma expressa determinação prévia nesse sentido de uma autoridade judicial competente? O mesmo se diga dos poderes deste Instituto, para «determinar (...) o encerramento e a selagem de estabelecimentos» sem, de igual modo, uma expressa determinação nesse sentido de uma autoridade judicial ou, ainda, dos poderes especiais que são reconhecidos aos administradores provisórios, designados pelo Instituto de Seguros de Portugal, que são claramente excessivos e, no mínimo, desproporcionados face ao valor que se pretende salvaguardar e os meios a que para tanto se recorre, nomeadamente «a sua designação determina a suspensão temporária da assembleia geral e dos demais órgãos sociais».
Terceiro, atribui-se ao Ministério das Finanças ou ao Instituto de Seguros de Portugal a possibilidade de intervir de modo arbitrário sobre a empresa a ou b, o que pode

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acarretar uma vantagem concorrencial ilícita para as restantes empresas do sector, o que não é aceitável.
Quarto, estabelece-se como competente para o recurso de impugnação e para execução no âmbito do processo de ilícito de mera ordenação social, o Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa. Mas porque apenas este?
Quinta, o Governo fica autorizado a estabelecer um regime relativo ao controlo dos detentores de participações sociais nas empresas de seguros, só que não define o que se deve entender por participações qualificadas. Corresponde a 10 ou a 20% do capital? Não se sabe! É algo em aberto que, tendo em conta que tem efeitos, por exemplo, na revogação da autorização concedida para o exercício da actividade seguradora, não pode ficar em branco.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: As questões que acabámos de colocar resultam de uma análise séria da proposta de lei apresentada pelo Governo, cuja oportunidade reconhecemos, mas cujo conteúdo, ao extravasar a simples transposição da Directiva, entra em áreas que necessitam, sem dúvida, de novas formulações, mas cujas alterações carecem de uma grande ponderação e, sobretudo, de grande clareza face à necessidade de estabelecer regras bem definidas para o funcionamento do sector segurador português neste mundo em mutação em que vivemos.
Não tendo o Governo tido este cuidado, estas são algumas das nossas preocupações, as quais esperamos que possam ter acolhimento por parte do Governo, de modo a que o sector possa beneficiar de uma legislação que verdadeiramente o potencie, salvaguardando-se o mais importante, ou seja, os interesses de toda a comunidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados, antes de mais uma pequena nota prévia: nos termos do Regimento, conforme consta da minha declaração de registo de interesses, exerço parcialmente a minha actividade profissional no sector segurador, mas tal facto não impede que a minha intervenção seja ditada, estritamente, pelo interesse público.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há que, em primeiro lugar, localizar a questão que estamos a discutir e, de certa forma, evidenciar a grande oportunidade desta medida legislativa e a sua premência, sobretudo tendo em conta certas situações práticas que se passaram no passado no sector segurador e também, por outro lado, a incapacidade do Governo e das autoridades administrativas da altura para tomarem medidas adequadas por falta de instrumentos legislativos, de vontade política e de força para estabelecer disciplina no sector segurador.
Recordaria aqui casos em que o presidente da autoridade de supervisão obrigou uma companhia de seguros a fazer um aumento de capital e essa companhia de seguros não o fez. Ora, perante uma norma com regime sancionatório perfeitamente ineficaz, subindo o problema ao Sr. Secretário de Estado da altura, este o que fez foi aplicar uma coima de 2500 contos, mas o interesse dos segurados continuou perfeitamente em risco.
Portanto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, não houve no passado coragem quer no piano administrativo quer no legislativo para assumir esta reforma essencial para o sector segurador.
Já agora, gostaria de comentar o que o Sr. Deputado Duarte Pacheco disse relativamente aos poderes que agora são dados, através desta autorização legislativa, aos administradores provisórios das companhias de seguros nomeados pela autoridade de supervisão em caso de a companhia entrar em risco financeiro, referindo que esses poderes são claramente excessivos.
Mas o que se passou foi o seguinte: os administradores nomeados pela entidade de supervisão, na altura em. que o PSD estava no Governo, foram colocados numa companhia de seguros sem poderes nenhuns e mais não serviram do que para sancionar as actividades, porventura ilícitas - ainda se há-de apurar -, que estavam a ser desempenhadas no conselho de administração dessa companhia.
Contudo, agora, V. Ex.ª o que está a sugerir - mas nós na especialidade teremos oportunidade para discutir isto - é que os administradores a nomear pelo Estado continuem com essa castração no domínio da actuação necessária para disciplinar qualquer companhia que entre em risco de quebra, porque as companhias de seguros têm uma função social de interesse público, nomeadamente ao nível dos acidentes de viação e de trabalho e não são apenas um negócio, por isso é que há fundos para garantia das indemnizações.
Portanto, quando as companhias de seguros quebrarem é o Estado que vai ter de pagar essas indemnizações, pois as companhias de seguros têm um papel a desempenhar como um novo pilar ao nível da segurança social e, portanto, cumpre ter a garantia de que essas empresas, que nascem da iniciativa individual mas que se tornam empresas de interesse público, sejam empresas que não ponham em risco a sua actividade pelos próprios actos da sua administração.
É claro que estamos abertos a analisar soluções que detalhem ainda mais ou melhor as propostas que estão na mesa, mas os princípios, como o Sr. Ministro das Finanças há pouco referiu, têm de manter-se. Esses princípios são: uma supervisão eficaz, dotada de um poder sancionatório também ele eficaz, que cumpra os objectivos de prevenção geral e especial e a segurança e a solvabilidade do sector.
No que respeita à segurança e à solvabilidade do sector - e o Sr. Deputado António Galvão Lucas, na sua intervenção, referiu que 10% de endividamento era extremamente reduzido para qualquer empresa -, diria que é preciso ver que as companhias de seguros não têm um ciclo de exploração como qualquer outra empresa. Aliás, o próprio Sr. Ministro das Finanças referiu que o ciclo de exploração nas companhias de seguros é um ciclo de exploração invertido.
Já agora, gostaria de referir o seguinte: as companhias de seguros são, fundamentalmente, instituições aplicadoras

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de fundos. Aliás, o prémio do seguro tem esse nome, porque vem de prima, ou seja, porque é entregue primeiro do que o pagamento que é feito. Na verdade, a companhia de seguros recebe o preço antes de prestar o serviço, por isso é que se chama prémio. Portanto, as companhias de seguros são, claramente, entidades de acumulação de cash e são, por definição, investidores institucionais aplicadores de fundos.
Tornar as companhias de seguros em entidades que se endividam é inverter claramente a lógica de exploração e, mais, é pôr em risco a sua solvabilidade. E explico porquê: porque a diferença entre o valor dos prémios e os sinistros que as companhias de seguros pagam é claramente deficitária, pelo que o sector segurador depende do rendimento financeiro para ter resultados positivos.
E digo-lhe que, em média, os rendimentos financeiros do sector pesam na conta de réditos das companhias de seguros em 15% dos prémios, enquanto que os resultados do sector não atingem 4% dos prémios. Ou seja, se não houvesse rendimentos financeiros, as companhias seguradoras, em média, no sector, davam prejuízo.
Portanto, se nós permitirmos um endividamento indiscriminado as empresas entram claramente no «vermelho» e o problema é este: é que o senhor pode dizer «mas não há nenhum empresário que queira a sua empresa a entrar no "vermelho"...», no entanto o problema surge quando as empresas seguradoras são utilizadas como uma «alavancagem» financeira de grupos económicos, em que, por vezes, a necessidade de cash não permite que o investidor mantenha a sua empresa a funcionar no «azul» e transfira fundos que são dos segurados para outro tipo de actividades que podem, essas sim, ser actividades extremamente deficitárias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para concluir, gostaria de dizer, em nome da bancada do PS, que me congratulo por mais esta reforma de fundo no sentido da clareza dos mercados, da solidez das instituições Financeiras e que vem associada a algumas medidas que já aqui foram hoje estudadas, elas também da iniciativa do Governo, como sejam a reforma do Tribunal de Contas, a reforma do regime jurídico das garantias pessoais do Estado, fazendo tudo isto parte de uma atitude corajosa, determinada e importante por parte do Governo da nova maioria que pretende, sobretudo no sector financeiro, no mercado de capitais e no mercado monetário, garantir a estabilidade e a segurança para todos aqueles que investem os seus fundos e as suas poupanças.
Esta proposta de lei, podendo ser ajustada em sede de especialidade, garante tudo aquilo que pretendemos em benefício dos segurados, dós trabalhadores, das vítimas de acidentes de viação e dos indivíduos que aplicam as suas poupanças nos regimes facultativos da segurança social.

Aplausos do PS.

O Sr. António Gaivão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir esclarecimentos.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, o PS não dispõe de tempo para responder.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar de Os Verdes cedeu-nos 2 minutos do tempo de que disponha, tal como a representante de Os Verdes informou o 1.º Secretário da Mesa antes de sair da Sala.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Então, tem a palavra o Sr. Deputado António Gaivão Lucas para formular um pedido de esclarecimento, beneficiando de uma cedência de tempo.

O Sr. António Gaivão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente, começo por agradecer ao PSD o tempo que também me cedeu.
Sr. Deputado João Carlos da Silva, no domínio dos princípios, disse coisas que poderão não ser muito discutíveis, mas há um ou dois aspectos de pormenor que gostaria de voltar a realçar.
O endividamento pode ser necessário em situações muito especiais, muito específicas, da actividade seguradora. Isso nada tem a ver com a existência das reservas, das provisões e da estrutura financeira adequadas para que as empresas desempenhem a sua actividade e os segurados não corram qualquer risco.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Então por que é que as compraram?!

O Orador: - Para isso existe supervisão. Agora, pode acontecer que em determinadas situações de sinistros que envolvam enormes montantes, antes de a resseguradora transferir os fundos para fazer face aos danos causados, a companhia seguradora tenha de recorrer ao crédito. É só para isso e não para que a companhia seguradora vá investir. É apenas para que essa relação - aliás, o que refere já não é de hoje, porque isso era verdade quando as taxas de juro eram outras e tudo isto decorre da evolução que houve em termos de taxas de juro - entre resultados da actividade e resultados financeiros se mantenha. É para que a actividade seguradora se faça, para que as empresas seguradoras portuguesas possam resistir à concorrência acrescida existente neste momento e para que, em última análise, os trabalhadores, os técnicos e os quadros que nelas trabalham, e que são bons, possam manter-se em funções, de modo a não assistirmos nesse sector, como já assistimos noutros, a empresas desaparecerem.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.

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O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Gaivão Lucas, agradeço a questão que colocou.
Compreendi perfeitamente a objecção que levanta. O que o Sr. Deputado diz é que, por razões derivadas do seu ciclo de exploração, ou seja, para pagar eventuais indemnizações avultadas que ocorram e provoquem crise de tesouraria, a empresa possa endividar-se.

O Sr. António Gaivão Lucas (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Portanto, estamos a falar em endividamento no âmbito estrito do seu ciclo de exploração.
Ora, a proposta de lei prevê precisamente esses 10% para endividamentos de curto prazo...

O Sr. António Gaivão Lucas (CDS-PP): - Não chega!

O Orador: - Diz V. Ex.ª que não chega. Nós estamos disponíveis para analisar soluções, dentro do estrito princípio de não sairmos do âmbito do ciclo de exploração das empresas, em que se possa criar mecanismos que, em situações excepcionais, proporcionem respostas excepcionais. Mas isso é algo que poderemos discutir aquando da discussão na especialidade.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Na especialidade?!

O Orador: - De qualquer das formas, a questão do pagamento da tesouraria não tem a ver propriamente com o endividamento da empresa mas, sim, com a liquidez dos seus activos. E as reservas das companhias, que são as indemnizações que terão de pagar aos associados, as reservas matemáticas, para sinistros, etc., têm de estar aplicadas em activos de maior liquidez e de alguma liquidez.

O Sr. António Gaivão Lucas (CDS-PP): - Com certeza!

O Orador: - Isso faz parte da própria gestão prudêncial e do controle que o Instituto de Seguros de Portugal terá de fazer sobre os rácios de aplicação das reservas das companhias. Ora, do que estamos a falar é de endividamento estrutural das empresas. É isso o que queremos impedir. Se V. Ex.ª fala de um endividamento temporário para ocorrer a um ciclo de exploração, estão previstos os tais 10% e também os empréstimos subordinados.
No que toca ao endividamento mais estrutural, estamos disponíveis para analisar soluções sem beliscar os princípios que foram enunciados.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Sr. Deputado João Carlos da Silva fez uma intervenção importante, tendo focalizado alguns pontos do actual desequilíbrio da actividade seguradora que sustentam ou justificam esta proposta de autorização legislativa. Só que se esqueceu de um aspecto, e teria sido muito importante referi-lo: esqueceu-se de dizer por que razão existe hoje este desequilíbrio, por que razão muitas empresas seguradoras, ou os grupos que as controlam, estão a incorrer em actividades que podem lesar a segurança dos utentes, dos consumidores, dos segurados. Se aprofundarmos essa matéria, poderemos encontrar a génese do problema quando se liquidaram as seguradoras nacionais e se entregou o sector financeiro à lógica do lucro privado, no processo de desmantelamento e privatização deste sector.
Valia a pena que a reflexão trazida aqui pelo Sr. Deputado João Carlos da Silva fosse feita à luz deste referencial e do percurso histórico deste sector.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A alteração do actual regime de acesso e exercício da actividade seguradora que nos é presente limita-se a propor, e em nossa opinião timidamente, alterações no domínio do regime sancionatório à prática de actos ilícitos no sector e à defesa das garantias financeiras e solvabilidade das empresas, designadamente face a uma prática que o processo de privatização do sector financeiro segurador veio suscitar e impulsionar, que é a de os grupos económicos que tomaram conta das empresas seguradoras terem vindo a servir-se destas, em muitos casos, como fonte de financiamento dos próprios grupos, «secando-as», promovendo o seu endividamento, em alguns casos descapitalizando-as, com todos os riscos inerentes à actividade e às garantias dos segurados. Aliás, como é sabido, já temos tido, nesta matéria, exemplos recentes no universo da actividade seguradora em Portugal.
Neste quadro, é nosso entendimento que o pedido de autorização legislativa avança, embora timidamente, alguns passos nesta questão. Mas avança de forma limitada, porque o valor das coimas, apesar de substancialmente elevado - e não temos qualquer dificuldade em, afirmá-lo -, é ainda pequeno face ao volume global de negócios do sector e ao seu volume de lucros.
Portanto, Sr. Deputado António Gaivão Lucas, não podemos estar a ver as coimas em função de uma actividade que não é idêntica às outras e gera uma dimensão de negócios financeiros e de rentabilidade bastante apreciável no sector.

O Sr. António Gaivão Lucas (CDS-PP): - Concorda com as coimas?!

O Orador: - Avança de forma limitada, em nossa opinião, porque, apesar de tudo, está desenquadrada de um verdadeiro controlo e fiscalização da actividade.
Assim, diria que, apesar de esta proposta de autorização legislativa ser oportuna nos aspectos limitados em que intervém, não deixa de se acomodar aos interesses das próprias empresas seguradoras, como, aliás, entrevistas recentes dos seus dirigentes vieram confirmar. Basta lê-tas.
Em nossa opinião, seria preciso ir mais além e aproveitar-se esta oportunidade para intervir em matérias que, quanto a nós, são verdadeiramente substanciais. Aliás,

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o Sr. Ministro das Finanças, na parte final da sua intervenção, talvez percebendo a ausência desse aspecto nesta proposta de lei, referiu que é uma intervenção legislativa em matéria de transparência e de disciplina dos contratos de seguros. Cremos que essa é uma das questões centrais que hoje atravessa a actividade seguradora em Portugal: a transparência e a disciplina em matéria de contratos de seguros. Poder-se-ia ter aproveitado para a legislar.
Sobre esta matéria gostaria de levantar várias questões. Por exemplo: por que não se aproveitou para legislar e reflectir sobre uma orientação para o seguro social de acidentes de trabalho? Como sabemos, Portugal, ao lado da Bélgica e da Finlândia - mas nestes países há soluções que, apesar de tudo, são diferentes -, e o único país onde este ramo dos seguros sociais e de trabalho está exclusivamente nas mãos e na dependência dos interesses privados das seguradoras, portanto, do interesse do máximo lucro, o que muitas vezes é incompatível com este tipo de seguro.
Por que não se aproveitou para estabelecer novas regras para o seguro obrigatório de automóvel? Como é sabido, as empresas seguradoras gerem o seguro obrigatório de automóvel como se fosse um seguro facultativo, a começar pelo valor dos prémios cobrados, pelos sucessivos aumentos, muito acima dos valores da inflação, pela recusa de aceitar a obrigatoriedade da redução automática dos prémios de seguro na proporção da desvalorização das viaturas, tese que, aliás, como sabemos, é defendida por outros membros do Governo ou tem vindo a público com reservas do Ministério das Finanças e das empresas seguradoras, mas é uma questão central neste processo, nomeadamente no que toca à defesa dos consumidores, dos segurados.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, trata-se de matérias que deveria ter-se aproveitado para legislar. O mesmo se passa, por exemplo, em sede de produtos de capitalização, que são verdadeiros produtos bancários que as companhias de seguro tratam - mal - como se fossem um seguro do ramo vida.
Não se impõe apenas legislar em matéria de coimas. Isso é importante, mas é pouco. Impõe-se ir mais longe nestes sectores, que, para nós, são fundamentais.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, queira terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente. Há pouco cedi 2 minutos ao Governo e, como se vê, «por bem Fazer, mal haver».

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Pode beneficiar de 2 minutos do tempo pertencente ao Grupo Parlamentar de «Os Verdes».

O Orador: - Obrigado, Sr. Presidente.
Esta é a nossa posição: seria útil aproveitar este processo para legislar esta matéria. Mas isso não foi feito porque legislar essa matéria é legislar um sector extremamente sensível para a actividade financeira das empresas seguradoras privadas, pois, como sabemos, o impropriamente chamado ramo vida representa mais de 70% dos prémios processados pelas empresas seguradoras. Possivelmente, é aí que elas vão buscar grande parte das suas taxas de rentabilidade...

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Não, não!

O Orador: - ... e é aí que os segurados e os cidadãos deste país mais sentem a tirania da actividade unilateral das empresas e dos contratos de seguros em Portugal.
Por isso. Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, pensamos que, nesta matéria, o que se legisla é importante, é limitado e é um pequeno passo em relação a matérias mais de fundo, sobre as quais é preciso o Governo ter a coragem - diria - para intervir, que são as da transparência e da disciplina dos contratos de seguro em Portugal.

Aplausos elo PCP.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para o efeito, tem a palavra.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, na minha intervenção cometi um ligeiro lapso. Quando disse «discussão na especialidade» estava a referir-me, com certeza, não à discussão na especialidade mas ao desenvolvimento da autorização legislativa pelo acto legislativo que se seguirá. Foi um lapso da minha parte.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados,, não havendo mais oradores inscritos, está encerrado o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 102/VII.
A próxima sessão plenária terá lugar amanhã, Sexta-feira, pelas 10 horas, com um período da ordem do dia em que discutiremos a proposta de resolução n.º 51/VII, a proposta de lei n.º 107/VII e apreciaremos o relatório final e projecto de resolução da Comissão de inquérito parlamentar para averiguar dos pedidos pendentes no Ministério da Educação ou objecto de decisão nos últimos doze meses para reconhecimento ou autorização de funcionamento de instituições ou cursos do ensino superior particular e cooperativo.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 15 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa à votação, na generalidade, dos projectos de lei n. os 290, 295, 338, 340 e 384/VII.

I - Uma concepção passadista da família

A apresentação dos projectos de lei de Os Verdes e do PCP sobre a protecção jurídica das famílias em união de facto e o seu agendamento para o dia 25 de Junho

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contribuiu para pôr em evidência a filosofia ultrapassada e retrógrada dos projectos de lei do CDS-PP e do PSD, mais evidenciada no projecto do PP.
São projectos de lei que propositadamente ignoram as transformações que sempre vão ocorrendo na organização familiar.
A conquista da igualdade entre os sexos, fruto de um sempre crescente aumento da taxa de actividade feminina, a constante luta pelos direitos fundamentais do ser humano, a própria existência de uniões de tacto (nascidas muitas vezes da contestação da acção opressora do Estado no seio da família), determinaram a inevitabilidade de transformações no quadro jurídico relativo à família.
Porque o quadro jurídico napoleónico nunca permitiu a realização do direito à felicidade dentro da família, nomeadamente por parte das mulheres e das crianças.
Com a Constituição da República e a reforma do Código Civil de 1977, a família deixou de ser uma entidade com relevância jurídica aos interesses da qual, e no altar da qual se deve sacrificar o direito à felicidade dos membros da família, inclusive através de restrições
dissolução do casamento.
O projecto de lei do CDS-PP ignora propositadamente as transformações sociais e as transformações jurídicas, voltando a um conceito passadista da família, transmissora de valores passadistas, chegando ao ponto de pretender criminalizar o aborto, nos casos em que já se encontra despenalizado.
O vezo retrógrado do projecto de diploma vai ao ponto de permitir a ingerência dos pais nos ensinamentos ministrados aos filhos ainda que de carácter científico.
Na verdade, ao propor que os pais se podem opor a que sejam ministrados aos filhos ensinamentos que vão contra as suas convicções éticas e religiosas, o CDS-PP não pretende abranger apenas a dispensa das aulas de religião e moral (sendo assim, o inciso teria um conteúdo progressista). O preceito tem um conteúdo mais amplo pois não se estabelece apenas o direito de os pais se oporem a que sejam ministrados conhecimentos religiosos contra as suas convicções éticas e religiosos, ruas o de se oporem a todos os ensinamentos, portanto também os científicos e técnicos que se oponham àquelas convicções. O que quer dizer que o CDS-PP sonha com uma família que transmita valores passadistas e que possa interferir na própria educação, vedando aos filhos a aquisição de conhecimentos científicos. Para além disso, o CDS-PP esquece-se de que nos termos do artigo 1.886.º do Código Civil os pais não podem interferir nas convicções religiosas dos filhos maiores de 16 anos. Na família defendida pelo CDS-PP os jovens não adquiriram ainda o estatuto de plena dignidade.
Tanto o projecto de lei do PSD como o do PP defendem uma política de família. O que não se coaduna com a realidade sociológica da família. Esta é objecto de várias políticas, nas várias áreas, dirigidas aos membros do agregado familiar, e não à família como eme jurídico que já não tem acolhimento no nosso direito.
Por estes motivos, o PCP votou contra os projectos de lei daqueles dois partidos.

II - As votações eufemísticas do Partido Socialista

O Parido Socialista esforçou-se por que os projectos de lei de Os Verdes e do PCP sobre uniões de facto baixassem à Comissão da especialidade sem votação.
O Partido Socialista sempre que quer impedir iniciativas legislativas, sem tomar o odioso de votar por forma a impedir as mesmas, ou sempre que quer evitar que se ponha em destaque alguma valia das mesmas (ainda que em sede de especialidade as mesmas possam ser melhoradas como o PCP sempre admite) opta por aquela atitude.
Quis que um dos projectos de lei do PCP - o da garantia de alimentos devidos a menores tivesse essa sorte por meras questões de pormenor a serem resolvidas na especialidade. Não o conseguiu, porque, apesar de sugestões para aperfeiçoamento do diploma, o mesmo teve adesão nas audições a que procedeu a Comissão da Paridade, nomeadamente por parte do Sr. Provedor de Justiça e da Dr.ª Joana Vidal do Tribunal Tutelar de Menores de Lisboa.
Mas este comportamento do PS já se verificou com o diploma do PCP suscitado pevas discriminações no BCP relativamente ao acesso de mulheres no emprego, diploma que mereceu o voto favorável do PS na anterior legislatura, e que por ter baixado à Comissão sem votação se encontra congelado há 1 ano, sem qualquer votação.
Votação eufemística foi também a relativa à reposição nos 62 anos da idade de reforma das mulheres. Aprovado na generalidade, com alguns votos contra dos Deputados da Juventude Socialista, o projecto viria a ser rejeitado na especialidade e em votação final global porque todo o Grupo Parlamentar do PS votou contra.
Votação eufemística foi a do PS no projecto de lei do PCP relativo às uniões de facto.
Goradas as tentativas desesperadas do Partido Socialista para que o projecto baixasse sem votação à espera de uma prometida iniciativa do PS durante toda a legislatura, o Partido Socialista votou contra o projecto usando a abstenção, pois sabia que a direita iria votar contra, como ficou claro.
O Partido Socialista sentiu-se defraudado por não ter tomado a dianteira relativamente à protecção jurídica das uniões de facto.
Mas este é um problema que o PCP vem estudando há muito. É um problema o das uniões de facto heterossexuais que já mereceu várias iniciativas legislativas do Partido Comunista.
Desde propostas apresentadas no âmbito da legislação sobre arrendamento em 1985, até às propostas no âmbito dos vários diplomas sobre acidentes de trabalho, até ao projecto de lei apresentado em 1988, até ao penúltimo apresentado na sequência do Decreto-Regulamentar n.º 1/94, foram vários os debates travados dentro do PCP sobre as uniões de facto heterossexuais.
A iniciativa legislativa que o PS acabou de rejeitar por puro sectarismo resultou das reflexões .anteriores. Não cuidámos nesta iniciativa das uniões homossexuais. Não foi objecto de debates, nem o pinha de ser, dado que a realidade destas é diferente da realidade das uniões de facto

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que são uma comunhão de vida entre homem e mulher, coabitando em circunstâncias análogas às dos cônjuges. Não foi objecto de debates nem está ainda a ser objecto de debate dentro do PCP ou do seu grupo parlamentar.
Sabe-se é que relativamente às uniões de facto heterossexuais a grande maioria da população portuguesa entende que estas uniões devem ter direitos iguais às das famílias baseadas no casamento.
Os argumentos do Partido Socialista, escondendo a verdadeira motivação do seu voto, escondem também um conservadorismo, disfarçado atrás de argumentos pseudo progressistas.
O primeiro argumento é o de que se deve respeitar a liberdade das pessoas que não quiseram sujeitar-se às regras do casamento.
É a tradução eufemística da célebre frase de Napoleão Bonaparte, responsável pelo Código Civil Bonapartista contra o qual duramente lutaram os movimentos femininos. E essa frase é: ales concubins se passent de la loi. La loi se désintéresse d'eux». Bela tradução da liberdade abandonando à sua sorte, em nome de um pseudo-moralismo, porque é disso de facto que acontece, os dependentes psicologicamente e os financeiramente mais fracos, normalmente as mulheres.
Liberdade não quer dizer irresponsabilidade. E a responsabilidade nas relações entre parceiros numa união de facto exige que o direito assegure, na efectivação dessa responsabilidade, as regras jurídicas que assegurem que a cooperação na união de facto não se transforme na exploração do trabalho de alguns (normalmente o trabalho das mulheres) em proveito de outros.
Se as uniões de facto rejeitam a formalização da sua relação, não podem viver fora das leis que têm de assegurar direitos individuais. E, paradoxalmente, as uniões de facto lutam pela efectivação desses direitos. A vastíssima jurisprudência que se conhece a nível internacional, onde os sistemas jurídicos permitem a utilização de normas relativas a outras realidades jurídicas, como as sociedades de facto, provam que as uniões de facto não se desinteressam da lei.
Mas onde o conservadorismo atinge o auge, não é nos direitos sociais, a cargo do Estado, ou que o Estado deve impor aos particulares como realização dos direitos individuais.
O conservadorismo a que não consegue fugir o Partido Socialista, surge quando se trata do regime de bens ou da equiparação da pessoa vivendo em união de facto ao cônjuge, ,para efeitos sucessórios, sempre que o autor da sucessão não tenha filhos de anterior casamento.
Sempre que se trata, pois, da herançazinha, ou da salvaguarda do património dos menos escrupulosos, que exploram o trabalho de outrem, nomeadamente o trabalho doméstico, surge a direita, acompanhada a uma distância julgada conveniente pelo PS, rejeitando a aproximação do regime das uniões de facto do regime do casamento, como propõe o PCP
O que está na base de tal atitude é a assimilação da ideologia do Código Civil que em nome de um pseudo moralismo considera ilícitas, com algumas restrições resultantes da reforma de 1977, as relações sexuais fora do casamento.
E, no entanto, foi a vida que, com as suas transformações, deu origem a que os laços de afectividade viessem a superar alguns laços de consanguinidade, no direito sucessório.
O cônjuge ultrapassou definitivamente os irmãos e sobrinhos na linha sucessória. Foi o triunfo da afectividade! Por que razão, salvaguardando-se o caso de o autor da sucessão ter filhos de anterior casamento, não deverá o companheiro da união de facto, ligado pelos mesmos laços de afectividade, entrar no direito sucessório?
A crítica a esta solução envolve um conservadorismo fácil de desmascarar.
O PCP, na própria definição de união de facto para efeito de concessão de direitos sociais, revela a compreensão exacta da evolução da realidade família. É que a globalização da economia, as migrações, o afastamento dos membros do agregado familiar determinados pela procura de emprego, o atraso na evolução do direito de família relativamente às causas de dissolução do casamento, determinam situações de uniões de facto entre pessoas que ainda não viram dissolvido o vínculo matrimonial. Estas situações não são situações imorais. Não são situações ilícitas. Devem merecer protecção na área dos direitos sociais.
Convirá ainda referir que o PCP rejeita qualquer registo das uniões de facto. Seja no registo civil, seja na segurança social, seja em que repartição for. Isso seria transformar a união de facto em casamento de 2.ª celebrado na bicha dos que apresentam os mapas de descontos nos centros regionais da segurança social.
Não há no projecto do PCP de onde decorra a necessidade desse registo.
E nem o projecto do PCP exige, obrigatoriamente a sentença judicial para declaração de ruptura da união de facto.
O que a esse respeito consta do diploma assinala, sins, que o acesso ao tribunal não é obrigatório. Apenas a ruptura terá de ser declarada judicialmente quando litigiosamente se pretendem exercer direitos. Assim não será quando houver completo acordo entre os companheiros.
Nada há no projecto de lei que determine a obrigatoriedade de aplicação das normas do projecto de lei guando haja um completo acordo noutro sentido.
E porque o pode haver, o projecto teve de preocupar-se, como o fez com as relações entre a união de facto e terceiros. Como o tem de fazer qualquer projecto de lei.
O voto reactivo do Partido Socialista impediu que se começasse desde já a elaborar na especialidade um diploma que respondesse às complexas questões jurídicas suscitadas pela união de facto.

A Deputada do PCP, Odete Santos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD):

João Calvão da Silva.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.

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Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Agostinho Marques Moleiro.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Carlos Manuel Luís.
Fernando Alberto Pereira Marques.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Porfírio Varges.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.

Partido Social Democrata (PSD):

António de Carvalho Martins.
Carlos Alberto Pinto.
Francisco Antunes da Silva.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Mendes Bota.
Luís Carlos David Nobre.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Maria José Pinto da Cunha.
Avilez Nogueira Pinto.

Partido Comunista Português (PCP):

João António Gonçalves do Amaral.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

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