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Sábado, 28 de junho de 1997 I Série - Número 87

DIÁRIO da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 27 DE JUNHO DE 1997

Presidente: Ex.mo. Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 35 minutos.
Deu-se conta da apresentação da proposto de lei n.º 126/VII, dos projectos de lei n.ºs 390 e 391/VII e da interpelação n.º 10/VII.
Foram apreciadas a proposta de resolução n.º 51/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção fundamentada no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, Que Cria Um Serviço Europeu de Polícia (Convenção Europol), assinada em Bruxelas, era 26 de Julho de 1995, e o Protocolo estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, Relativo à Interpretação a Título Prejudicial pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias da Convenção Que Cria Um Serviço Europeu de Polícia, e a proposta de lei n.º 107/VII - Determina a entidade que exerce as funções de instância nacional de controlo e a forma de nomeação dos representantes do Estado português na Instância Comum de Controlo, previstas na Convenção, fundamentada no artigo K.3 do Tratado da União Europeia. Que Cria
Um Serviço Europeu de Polícia (Convenção Europol). Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estudo da Justiça (José Luís Lopes da Mota), os Srs. Deputados António Filipe (PCP), Raimundo Narciso (PS). Jorge Ferreira (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), Carlos Encarnação e Calvão da Silva (PSD) e Marques Júnior (PS).
A Câmara apreciou n relatório final e n projecto de resolução n.51/VII elaborados pela Comissão de Inquérito Parlamentar para Averiguar dos Pedidos Pendentes no Ministério da Educação nu objecto de decisão nos últimos 12 meses pura reconhecimento ou autorização de funcionamento de instituições ou cursos do ensino superior particular e cooperativo (inquérito parlamentar n.º 4/VII PSD). Usaram da palavra os Srs. Deputados Lucília Ferra (PSD), José Ribeira Mendes (PS)i Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP), Manuel Alves de Oliveira (PSD) e Carlos Lavrador (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 20 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pêlo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Domingos de Ascensão Cabeças.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheiro Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Carlos Eugênio Pereira de Brito.

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Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Pedro José Del Negro Feist.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: proposta de lei n.º 126/VII Autoriza o Governo a criar a Ordem dos Economistas; projectos de lei n.º 390/VII - Financiamento da actividade dos partidos políticos e das campanhas eleitorais (PCP), que baixou à 1.ª Comissão, e 39/VII - Prevê incentivos à colocação de médicos em hospitais situados fora das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto (CDS-PP), que baixou à 8.ª Comissão; e a interpelação n.º 10/VII (Os Verdes) - Política geral de ambiente centrada nas questões do ordenamento do território e dos resíduos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início à ordem do dia com a discussão conjunta da proposta de resolução n.º 51/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção, fundamentada no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, Que Cria Um Serviço Europeu de Polícia (Convenção Europol), assinada em Bruxelas, em 26 de Julho de 1995, e o Protocolo, estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, Relativo à Interpretação a Título Prejudicial pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias da Convenção Que Cria Um Serviço Europeu de Polícia, e da proposta de lei n.º 107/VII - Determina a entidade que exerce as funções de instância nacional de controlo e a forma de nomeação dos representantes do Estado português na Instância Comum de Controlo, previstas na Convenção, fundamentada no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, Que Cria Um Serviço Europeu de Polícia (Convenção Europol).
Dado que o único relator presente, Sr. Deputado Calvão da Silva, não deseja apresentar a síntese do relatório, tem

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a palavra, para introduzir o debate em nome do Governo, o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça (José Luís Lopes da Mota): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de resolução que tenho a honra de apresentar a VV. Ex.ª tem em vista a aprovação, para ratificação, da Convenção, fundamentada no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, que cria o Serviço Europeu de Polícia, conhecida por Convenção Europol, de 26 de Julho de 1995, e o Protocolo relativo à interpretação, a título prejudicial, pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias da mesma Convenção.
A Convenção tem por objecto a criação de um serviço' de polícia dotado de personalidade jurídica e da mais ampla capacidade reconhecida às pessoas colectivas pelo direito interno dos Estados-membros da União, com órgãos próprios, a funcionar em ligação aos Estados-membros através de unidades nacionais e de agentes de ligação designados de entre membros dessas unidades nacionais.
A Europol, cuja criação foi acordada no âmbito do artigo K.1 do Tratado da União Europeia, de 7 de Fevereiro de 1992, e que terá a sua sede na Haia, nos Países Baixos, por decisão do Conselho Europeu de 29 de Outubro de 1993, decorre da necessidade, comummente sentida, de reforçar a solidariedade e a cooperação entre os Estados da União, nomeadamente através da cooperação policial contra a criminalidade internacional grave, baseada essencialmente num intercâmbio constante, seguro e intenso de informações entre a Europol e as unidades nacionais dos Estados-membros.
A Europol tem, assim, por objectivo melhorar a eficácia dos serviços e entidades competentes dos Estados-membros da União, para a prevenção e combate à criminalidade, e a sua cooperação, no que diz respeito à prevenção e combate ao terrorismo, ao tráfico de estupefacientes e a outras formas de criminalidade internacional, quando haja indícios concretos da existência de uma estrutura ou organização criminosa e quando dois ou mais Estados-membros sejam afectados por essas formas de criminalidade, de tal modo que, pela amplitude, gravidade e consequências dos actos criminosos, seja necessária uma acção comum por parte destes Estados.
Com vista à realização deste objectivo, a Europol ocupar-se-á, numa primeira fase, da prevenção e luta contra formas especialmente graves de criminalidade no espaço comum europeu, como o tráfico de estupefacientes, a criminalidade ligada ao tráfico de material nuclear e radioactivo, as redes de imigração clandestina, o tráfico de seres humanos, nomeadamente com o objectivo da exploração da prostituição, da exploração e violências sexuais em relação a menores ou do comércio ligado ao abando no de crianças, e o tráfico de veículos roubados.
Num segundo momento e num período máximo de dois anos, se não for antecipado por decisão do Conselho, a Europol ocupar-se-á, igualmente, das infracções cometidas ou susceptíveis de serem cometidas no âmbito das actividades de terrorismo, que atentem contra vida, a integridade física, a liberdade das pessoas e os bens.
A Europol pode ainda ser encarregada pelo Conselho de outras formas de criminalidade constantes do anexo à Convenção, como o homicídio voluntário, as ofensas corporais graves, o tráfico de órgãos e tecidos humanos, o rapto, sequestro e tomada de reféns, o racismo e a xenofobia, o roubo organizado, o tráfico de bens culturais, incluindo antiguidade e obras de arte, a burla, a fraude, a extorsão de fundos, a contrafacção e piratagem de produtos, a falsificação e tráfico de documentos administrativos, a falsificação de moeda e meios de pagamento, a criminalidade informática, a corrupção, o tráfico de armas, munições e explosivos, o tráfico de espécies animais e vegetais ameaçados, os crimes contra o ambiente e o tráfico de substâncias hormonais e de crescimento.
A sua competência abrangerá sempre quer o branqueamento de capitais ligados a estas formas de criminalidade, quer os crimes conexos, destinados quer a obter os meios necessários a perpetração de tais crimes, quer a facilitar ou consumar a sua execução, quer a assegurar a impunidade dos seus agentes.
Para prossecução destes objectivos, a Convenção atribui à Europol um conjunto de funções tipicamente definidas.
São elas, em primeira linha, as de facilitar o intercâmbio de informações entre os Estados-membros, recolher, corrigir e analisar dados e informações, comunicar informações entre os serviços competentes dos Estados-membros, transmitir dados pertinentes para facilitar as investigações e manter colectâneas informatizadas de dados.
A Europol exerce ainda funções de aprofundamento de conhecimentos especializados e aconselhamento em matéria de investigação, de fornecimento de informações estratégicas para optimização de recursos e de apoio aos Estados-membros para formação de agentes de polícia, organização e equipamento de serviços, métodos de prevenção da criminalidade e métodos técnicos e científicos de polícia e de investigação.
A ligação entre a Europol e os serviços e entidades competentes, em cada um dos Estados-membros, rege-se pelo direito interno dos Estados-membros e é assegurada pelas unidades nacionais respectivas, que, não possuindo competência de investigação, têm funções de recolha, actualização, recepção e transmissão dos dados e informações necessários à actividade da Europol, em respeito pelo direito nacional.
Constituindo as informações relativas a dados pessoais, bem como o respectivo tratamento e análise, o objecto essencial da actividade da Europol, a Convenção regula esta matéria com particular cuidado, de forma restritiva, minuciosa e exigente.
Prevê-se, desde logo, nos artigos 7.º e 8.º, a criação e manutenção de um sistema de informações informatizado, directamente alimentado pelos Estados-membros, através das unidades nacionais e dos agentes de ligação, no respeito pelos procedimentos internos, no qual serão introduzidos dados relativos a pessoas que, nos termos do direito nacional, sejam suspeitas da autoria de infracções da competência da Europol ou que tenham sido condenadas por essas infracções, bem como relativamente a pessoas cm relação às quais certos factos graves justifiquem, também nos termos do direito interno, a presunção de que virão a cometer tais infracções.
As informações abrangem apenas os elementos essenciais relativos à identificação, às infracções e acusações, instrumentos do crime, suspeita de inclusão numa organização criminosa, condenações por infracções da

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competência da Europol e identificação do serviço que procede à investigação.
Admite-se igualmente a constituição de ficheiros de análise pela própria Europol, com base nas informações recebidas, relativas a suspeitos, testemunhas e vítimas, para efeitos de apoio à investigação criminal, sujeitos à expressa restrição de a legislação do Estado-membro autorizar o seu tratamento para idênticos fins e à necessidade de autorização do Estado que a transmite para efeitos de utilização por outro Estado-membro.
Com evidente preocupação de tutela e protecção dos direitos fundamentais, comprimidos pela utilização e tratamento de dados pessoais na investigação da criminalidade organizada transnacional, a Convenção estabelece uma regulamentação apertada em matéria de tratamento das informações, nomeadamente no que se refere ao dever de informação, ao nível de protecção de dados, à responsabilidade em matéria de protecção de dados, aos registos das consultas, às regras de utilização de dados, à transmissão de dados a instâncias de Estados terceiros, ao direito de acesso, rectificação e apagamento de dados, aos prazos de conservação, à conservação e rectificação de dados em dossiers, à segurança dos dados e ao regime de responsabilidade e protecção jurídica, reconhecendo, neste domínio, o papel regulador do direito interno dos Estados-membros.
Para o efeito, impõe aos Estados-membros a obrigação de designar uma instância nacional de controlo, encarregada de fiscalizar, com isenção e em conformidade com a legislação nacional, a legitimidade da introdução, da consulta ou de qualquer transmissão de dados pessoais à Europol efectuada por esse Estado-membro e de se assegurar que não há violação dos direitos das pessoas, conferindo-lhe o direito de acesso, junto das unidades nacionais ou dos agentes de ligação, aos dados introduzidos e arquivados no sistema de informações e aos gabinetes e documentação dos agentes de ligação, em conformidade com a lei nacional, bem como a competência para fiscalizar, por iniciativa própria ou a solicitação de qualquer pessoa, as actividades desenvolvidas pelas unidades nacionais e seus agentes de ligação, na medida do necessário à protecção dos dados pessoais.
Para além disso, prevê-se ainda a existência de uma Instância Comum de Controlo para fiscalizar a actividade da Europol, de modo a garantir a protecção dos direitos das pessoas, seja também por iniciativa própria ou a pedido de qualquer pessoa, relativamente a dados que lhe digam respeito.
Finalmente, em consonância com o disposto no n.º 2 do artigo K.3 do Tratado de 1992, a Convenção dispõe directamente sobre a resolução de diferendos entre os Estados-membros em matéria de interpretação ou aplicação das suas normas, estabelecendo a sua submissão ao Conselho, numa primeira fase, e remetendo para acordo entre os Estados-membros a forma de resolução de litígios não resolvidos por essa forma no prazo de seis meses.
Nesta conformidade, por declaração anexa à Convenção, acordaram os Estados-membros em submeter sistematicamente os diferendos em questão ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, circunstância que, nos termos do último parágrafo do artigo K.3 da Tratado, obrigou à celebração do Protocolo relativo à interpretação da Convenção, a título prejudicial, pelo Tribunal de Justiça das Comunidades, cuja aprovação é também agora submetida a esta Assembleia para ratificação.
Este Protocolo foi assinado um ano depois da aprovação da Convenção, em 24 de Julho de 1996, e constitui um instrumento necessário para atribuição da competência ao Tribunal de Justiça das Comunidades, uma vez que tal competência não resulta directamente quer do artigo L do Tratado de 1992, quer do artigo 177.º do Tratado de Roma.
Em conformidade com o disposto no artigo 2.º do Protocolo, por ocasião da sua assinatura, Portugal, tal como a generalidade dos países subscritores, produziu as declarações anexas, constantes do artigo 3.º da presente proposta de resolução, em termos que conferem aos tribunais portugueses a possibilidade de, em qualquer processo, solicitarem ao Tribunal de Justiça das Comunidades decisão prejudicial sobre interpretação da Convenção, se necessária ao julgamento da causa. Vai-se, porém, ainda mais longe, no sentido da garantia da unidade do direito e da tutela dos direitos fundamentais dos cidadãos, ao reservar-se o direito de dispor na legislação nacional a obrigatoriedade de recurso prejudicial, sempre que a decisão não seja susceptível de recurso nos termos do direito interno.
Tal como foi oportunamente reconhecido em parecer solicitado à Procuradoria-Geral da República, em vista da verificação da conformidade das normas da Convenção à nossa ordem jurídico-constitucional, não existe qualquer obstáculo à ratificação da Convenção, face, designadamente, ao disposto no artigo 35.º da Constituição.
Para além disso, o nosso país dispõe dos instrumentos jurídicos necessários à protecção de dados pessoais face à informática, nomeadamente quando a recolha e tratamento dos dados se destinem à investigação criminal, através da Lei n.º 10/91, de 29 de Abril, que garante a respectiva tutela e estabelece a regulamentação necessária à plena aplicação da Convenção.
Em cumprimento do disposto no artigo 23.º da Convenção, que obriga cada Estado-membro a designar uma instância nacional de controlo, encarregada de fiscalizar, com isenção, a legitimidade da introdução, consulta e transmissão de dados, e porque se trata de matéria da competência da Assembleia da República, o Governo apresenta a esta Assembleia uma proposta de lei nesse sentido.
Considerando as competências atribuídas à Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados pela Lei n.º 10/91 e que as funções da instância nacional de controlo se inserem no quadro das atribuições desta entidade, propõe-se que a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados seja designada instância nacional de controlo e que, em conformidade com o artigo 24.º da Convenção, seja da incumbência desta entidade a designação dos representantes na Instância Comum de Controlo, prevista no mesmo preceito.
Como expressamente se dispõe no artigo 44.º, a Convenção Europol não admite quaisquer reservas. Nem haveria fundamento para se excluir ou modificar qualquer das suas disposições, comprovada que se mostra a conformidade com o direito interno e pretendendo-se, como se pretende, uma maximização da eficácia de procedimentos no combate ao crime organizado nas condições previstas na Convenção.

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Assim sendo, afigura-se conveniente clarificar o sentido de algumas das suas disposições face ao direito interno, nomeadamente dos artigos 8.º, n.ºs 1, 2 e 5, l0.º, n.º 1, e 19.º, n.º 3.
Nesta conformidade, adita-se uma declaração quanto ao artigo 8.º, n.º 1, e 10.º, n.º1, clarificando a sua leitura face ao nosso sistema de processo penal, quer quanto ao regime da notícia do crime, que determina, necessariamente, a abertura de um processo, quer quanto ao regime das medidas de polícia previstas no artigo 250.º do Código de Processo Penal, que, podendo ser anteriores a abertura formal do inquérito, mas exigindo-o sempre, se justificam pela urgência, face ao perigo de demora e de perda ou prejuízo das fontes de prova, e pelo exercício das funções próprias dos órgãos de polícia criminal perante a notícia de facto criminalmente relevante.
Quanto aos artigos 8.º, n.º 5, e 10.º, n.º 1, produz-se uma declaração, no sentido de aquela primeira disposição ser aplicável aos dados respeitantes às pessoas referidas no n.º 1 do artigo 10.º. O princípio da conservação dos dados durante um período que não exceda o tempo necessário, tendo em conta os fins para que são registados, tem acolhimento generalizado em todos os textos normativos sobre a matéria de protecção de dados pessoais, em desenvolvimento do princípio da actualidade dos dados, corolário do princípio da necessidade, adequação e pertinência dos dados aos fins para que são recolhidos e tratados, princípios que têm impressivo acolhimento no âmbito da própria Convenção Europol, nomeadamente nos seus artigos 20.º e 22.º. E, se assim é, dificilmente se poderia aceitar que os dados referentes a pessoas não suspeitas se pudessem manter para além do arquivamento do processo ou da sentença de absolvição, pelo que a aplicação do artigo 8.º, n.º 5, aos dados das pessoas a que se refere o artigo 10.º, n.º 1, resulta, quanto a nós inequívoco, da própria interpretação sistemática do texto da Convenção.
Quanto ao artigo 19.º, n.º 3, produz-se uma declaração de interpretação conforme à Constituição, formulada com o sentido de a recusa de acesso aos dados apenas ser admissível nos termos consagrados na legislação nacional. O que significa que, conjugando a disposição da Convenção com o artigo 35.º, n.º 1, da Constituição, se garante o princípio do direito de acesso aos dados e que as situações de recusa, previstas na segunda parte do n.º 3 do artigo 19.º, apenas poderão justificar-se quando constituírem as excepções previstas na parte final daquele preceito constitucional. Isto é, a recusa de acesso por necessidade do correcto cumprimento das funções da Europol, da protecção da segurança do Estado ou da ordem pública ou do combate ao crime, bem como da protecção dos direitos e liberdade de terceiros, só será legítima quando a situação concreta estiver protegida por segredo de Estado ou por segredo de justiça, tal como são regulamentados na lei portuguesa, nomeadamente na lei processual penal.
Terminaria com uma breve nota sobre o processo de ratificação da Convenção e respectiva entrada em vigor.
Nos termos da declaração anexa ao Protocolo relativa à adopção simultânea da Convenção Europol e do Protocolo, assinada em 24 de Julho de 1996, os Estados-membros declararam-se prontos a tomar todas as medidas necessárias para que as formalidades nacionais de adopção de ambos os instrumentos sejam concluídas simultaneamente no prazo mais curto possível, o que se faz através da proposta de resolução apresentada a esta Assembleia.
Levando em atenção este compromisso, e constatada em devido tempo a impossibilidade de avançar com o processo de ratificação da Convenção sem a assinatura do Protocolo relativo à interpretação da Convenção, desencadeou-se, logo que possível, o processo legislativo necessário à ratificação, depois de obtido o parecer de conformidade constitucional e do seu reexame conjunto com o texto do Protocolo, tendo em vista, nomeadamente, a necessidade de elaboração da declaração apresentada em anexo.
Neste momento, podemos afirmar que o processo de ratificação da Convenção no nosso país é um dos mais avançados na Europa comunitária.
Os dados referentes ao dia 6 do corrente mês de Junho mostram-nos que a Convenção 'apenas foi ratificado pelo Reino Unido e que, nos demais países, à excepção da Espanha e da Dinamarca, cujos parlamentos aprovaram recentemente as leis de ratificação, o processo se encontra, na generalidade, em fases menos avançadas.
De qualquer forma, a entrada em actividade da Europol encontra-se dependente da aprovação de um conjunto de disposições relativas à fixação dos direitos e obrigações dos agentes de ligação, às regras de execução respeitantes a ficheiros, ao regulamento interno da Instância Comum de Controlo, ao estatuto de pessoal, à regulamentação do sigilo, ao regulamento financeiro, ao acordo de sede entre a Europol e os Países Baixos e ao protocolo e acordo relativos a privilégios e imunidades da Europol, dos membros dos seus órgãos, dos seus directores-adjuntos e funcionários, nos termos do artigo 45.º da Convenção.
Ao ratificar a Convenção Europol e o respectivo Protocolo de interpretação, estarão criadas as condições necessárias à efectiva participação no combate contra criminalidade grave e organizada no quadro da União Europeia, num espaço comum que, garantindo de forma reforçada os direitos das pessoas, assegure, de forma mais eficaz, como todos pretendemos, a cooperação, a solidariedade, a liberdade e a segurança.
É esse o sentido da nossa proposta e será esse, sem dúvida, o sentido da decisão desta Assembleia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Não havendo pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que está hoje em discussão é, para além dá aprovação, para ratificação, da Convenção que cria a Europol, a atribuição de competência ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias para decidir, a título prejudicial, sobre a interpretação da Convenção e ainda a definição da instância nacional de controlo para a protecção de dados pessoais.
Entendemos que, mais do que discutir os propósitos com que a Europol tem sido apresentada - todos subscrevem, sem dificuldade, esses propósitos -, importa,

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sobretudo, discutir o que significa, em concreto, a criação da Europol. Não é o facto de esta estrutura ser apresentada como uma indispensabilidade no combate à alta criminalidade, ao terrorismo, ao tráfico de droga e a outras formas inequivocamente graves de criminalidade organizada que nos deve impedir de reflectir serenamente sobre os reais propósitos e as reais consequências da criação desta unidade europeia de polícia.
É conhecido que o Tratado da União Europeia aponta para um sistema policial cada vez mais integrado. Contém um conjunto de dispositivos e de mecanismos no domínio da justiça e dos assuntos internos, conducentes à estruturação de um processo, que, materialmente, aponta para a existência de uma política comunitária de segurança interna e de imigração e para a criação dos respectivos instrumentos de nível supranacional.
A Europol não é seguramente um dos instrumentos menos importantes deste processo, a par de todo o sistema criado à volta dos acordos de Schengen.
O Tratado da União Europeia consubstancia, de facto, um processo em que são erigidas instituições supranacionais de natureza policial e de informações, ao mesmo tempo que várias componentes da política de segurança interna, judiciária e de imigração vão sendo progressivamente definidas e aplicadas pela regra da maioria qualificada.
Tal processo representa a perda de poderes soberanos num domínio sensível e essencial, tanto mais grave porquanto se trata de um domínio que contende com direitos, liberdades e garantias fundamentais e em que a inexistência de mecanismos de controle, quer judiciários quer parlamentares, torna este universo de medidas particularmente perigoso e antidemocrático.
Não está em causa - e importa que isto fique muito claro - o nosso apoio, por um lado, ao empenhamento do Estado português no combate à alta criminalidade, sob todas as suas formas, e, por outro, ao estabelecimento de formas de cooperação entre as forças policiais dos vários países no combate à criminalidade internacional.
Acontece que uma coisa é assegurar essa desejável e necessária cooperação, que, aliás, não deve confinar-se aos países da União Europeia, como se a criminalidade europeia tivesse uma identidade própria ou os problemas da criminalidade altamente organizada no plano internacional se confinassem ao espaço da União Europeia - é sabido que não é assim e que a cooperação internacional não deve restringir-se a este espaço no domínio do combate à criminalidade -, e outra, muito diferente, é criar, no âmbito do chamado III Pilar da União Europeia, uma estrutura policial supranacional, sobreposta às polícias nacionais ou, no mínimo, com tendência para se sobrepor às polícias nacionais, dotada de amplos poderes de actuação e de recolha de informações.
Não temos dúvidas de que o combate à criminalidade tem de ser reforçado e de recorrer a meios crescentemente sofisticados, que o tornem apto a responder aos meios de que dispõe a criminalidade organizada.
O que não podemos aceitar é que, com esse pretexto, se pretenda justificar a supranacionalização de estruturas policiais, invadindo a esfera própria da soberania de cada Estado, num domínio tão sensível e fundamental como a intervenção policial, a recolha de dados pessoais ou a investigação criminal.
Está em causa a garantia de direitos fundamentais dos cidadãos no seu reduto mais sensível; está em causa a aplicação da justiça, que constitui uma função de soberania que consideramos inalienável.
Não aceitamos, por isso, que, a pretexto da gravidade assumida pela criminalidade organizada, que é inquestionável, se procure impor a criação de uma polícia de âmbito supranacional, como parte integrante do processo de construção de uma Europa de natureza federal, ditada pelos interesses dos países mais poderosos.
A pretexto do combate à criminalidade, o que se pretende com a criação da Europol, bem como, aliás, com os acordos de Schengen e a respectiva Convenção de Aplicação, como com a Convenção de Dublin, como com todo o chamado BI Pilar do Tratado da União Europeia e com a crescente tendência para a comunitarização das questões relativas à justiça e à segurança, que, aliás, deu um passo muito significativo no texto recentemente assinado em Amsterdão, é, acima de tudo, impor uma Europa policiada, a partir dos seus reais centros de decisão, e criar os mecanismos policiais próprios da Europa-fortaleza, que os grandes interesses económicos supranacionais querem impor aos povos europeus.
Dirão os Srs. Deputados e os Membros do Governo que exageramos, que isto que acabo de referir não está consagrado no texto da Convenção Europol, mas não podemos perder de vista que o reforço de poderes desta unidade europeia de polícia é algo que está, desde há muito tempo, em cima da mesa. Já, em Março de 1996, o relatório da Comissão de Liberdades Públicas do Parlamento Europeu sobre a Europol previa precisamente que a Convenção fosse revista ulteriormente e, aliás, dizia-se mesmo, «no prazo máximo de dois anos, a fim de conferir à Europol competências próprias de inquérito», salientando, contudo, que tais poderes operacionais devem estar submetidos às instruções da Comissão, devendo o seu exercício ser submetido à fiscalização do Parlamento Europeu e dos parlamentos nacionais.
A criar-se um mecanismo dessa natureza, atribuindo poderes de inquérito próprios à Europol, pergunta-se o que ficaria, que pedra sobre pedra ficaria de todo o edifício garantístico constituído pelo Processo Penal e o que aconteceria efectivamente às entidades das quais depende funcionalmente a investigação criminal, que é, como sabe, o Ministério Público e a magistratura judicial.
Sr. Presidente. Srs. Deputados: É em nome do combate à criminalidade que se introduzem limitações do direito de asilo, que não respeitam garantias mínimas - aliás, saliento as preocupações que a Amnistia Internacional tem vindo a expressar relativamente ao que se tem vindo a verificar ao nível da União Europeia - de limitação de direitos fundamentais dos requerentes de asilo.
É a pretexto do combate à criminalidade que se pretende justificar um avanço no sentido da Europa das polícias, em que o Tratado de Amsterdão dá, aliás, enormes espaços, designadamente comunitarizando o chamado acervo de Schengen, o que faz com que a União Europeia se esteja a tornar cada vez mais um espaço de retrocesso em matéria de direitos fundamentais.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Não concordo com isso!

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O Orador: - É em nome deste combate à criminalidade que os Estados da União Europeia decidem considerar-se países seguros a si próprios, negando a apreciação de requerimentos de asilo, o que é profundamente condenável.
É também em nome deste combate à criminalidade que o acordo de revisão constitucional entre o PS e o PSD previa um retrocesso histórico de enormes proporções em matéria de extradição, admitindo a extradição de nacionais, o que, felizmente, ainda estamos a tempo de evitar, e vamos ver se o conseguimos fazer.
Há questões de controle democrático e de garantia de direitos fundamentais que não podem, em caso algum, ser esquecidos.
Direi ainda que a nomeação da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, como autoridade de controlo, em nosso entender, não representa uma garantia suficiente, dada a governamentalização da sua composição. Não está em causa qualquer mérito ou demérito das pessoas que a compõem, está em causa a forma de designação extremamente governamentalizada da maioria dos membros desta Comissão.
E fica por explicar como é que, em todo este processo se garante a direcção funcional da investigação criminal por parte do Ministério Público.
A invocação do combate à criminalidade, em nosso entender, não justifica tudo e não justifica sobretudo a criação de instituições como a Europol, que trazem consigo mais perigos para os cidadãos e para a soberania dos Estados do que reais vantagens no combate ao crime organizado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Não concordo com isso!

O Orador: - O combate ao crime não exige a criação da Europol, mas a garantia dos direitos fundamentais dos cidadãos e da soberania dos Estados, seguramente que a rejeitam. E é em nome desses direitos e dessa soberania que recusamos a aprovação, para ratificação, da Convenção Europol por parte do nosso País.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Par uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raimundo Narciso.

O Sr. Raimundo Narciso (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Convenção Europol, que o Governo submete à Assembleia da República para ratificação, é um instrumento de grande importância no processo de consolidação e aprofundamento da União Europeia.
Esta Convenção não deve ser vista apenas como um simples instrumento coordenador de acção policial para combate ao crime organizado, o que já é muito, mas também como um passo em frente, a que outros se devem seguir, no sentido da ampliação do espaço de liberdade do cidadão europeu.
Sendo um instrumento directamente interventor na área policial, a Europol visa aumentar a segurança e facilitar a administração da justiça. Por sua vez, a liberdade do cidadão está intimamente associada à segurança - depende dela - e está intrinsecamente ligada à justiça, não é sustentável na sua ausência. Por isso, e em última análise, a Convenção Europol está vocacionada para melhorar as condições do exercício da liberdade.
Para enfrentar e vencer o crime organizado, produto de associações cada vez mais poderosas e sofisticadas, os Estados e os cidadãos que se revêm nos valores europeus da democracia e dos direitos do homem têm na Europol a resposta comum, talvez ainda insuficiente, mas a que hoje é possível ter, contra um inimigo que com grande avanço se internacionalizou.
As organizações criminosas que se dedicam ao tráfico de estupefacientes, de armas, de material nuclear e radioactivo, ao tráfico de seres humanos, ao terrorismo e ao branqueamento de capitais reconheceram há muito as virtualidades do internacionalismo e praticam a cooperação transnacional para a execução dos seus crimes e desembaraçaram-se de barreiras fronteiriças ou nunca atenderam à sua existência para os seus negócios ilegais.
Imperdoável seria que os Estados, particularmente os que se empenham na edificação e aprofundamento da União Europeia, para atender razões de ultrapassado nacionalismo ou a falidas estratégias pseudo-revolucionárias, se atassem de pés e mãos e reerguessem, dificultando o combate ao crime, as barceiras fronteiriças que o crime internacional não respeita.
Há quem tente contrariar os esforços para a criação de instrumentos que possam estar à altura dos desafios colocados pelo crime organizado com o argumento de que este Serviço Europeu de Polícia visa não a segurança mas o cerceamento das liberdades dos cidadãos. Mas a realidade, indiferente aqui, como em relação a muitos outros humanos projectos, não lhes dá razão. A experiência comunitária tem revelado êxitos no combate ao crime e no consequente aumento da segurança.
A Convenção Europol é um serviço europeu de polícia, não é uma polícia comunitária. A Europol tem órgãos centrais de coordenação e centralização de informações e serviços e assenta a sua capacidade operativa em Unidades Nacionais, únicas para o efeito, que nomeiam os agentes de ligação com a Europol.
Estas Unidades Nacionais têm entre as suas funções a de facultar, por sua iniciativa, à Europol os dados e informações necessários às suas funções ou responder aos seus pedidos. No entanto, as Unidades Nacionais podem deixar de transmitir essas informações, se elas lesarem interesses fundamentais de segurança nacional ou comprometerem o êxito de investigações em curso ou a segurança de uma pessoa.
A proposta de resolução do Governo visa a ratificação da Convenção Europol, do Protocolo relativo ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e a Declaração no sentido da sua adopção simultânea.
Merece referência ainda o tacto de que Portugal formulou a este respeito duas declarações, pelas quais, na primeira, reconhece a competência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e, na segunda, reserva o direito de dispor na sua legislação nacional que, sempre que uma questão relativa à interpretação da Convenção Europol seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional, cujas decisões não sejam

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susceptíveis de recurso jurisdicional previsto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a questão ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias.
Os objectivos da Convenção Europol estão bem definidos e estão faseados no tempo. Numa primeira fase, a Europol terá na sua mira o tráfico de estupefacientes, o tráfico de material nuclear e radioactivo, as redes de emigração clandestina, o tráfico de seres humanos e de veículos roubados; numa segunda fase, até dois anos após o início da vigência da Europol, esta ocupar-se-5 do terrorismo que atente contra a vida, a integridade física e a liberdade das pessoas e bens.
Por decisão unânime do Conselho, a Europol pode ainda ocupar-se de outro tipo de crimes graves internacionais, como tráfico de órgãos e tecidos humanos, rapto, sequestro, racismo e xenofobia, tráfico de bens culturais, incluindo antiguidades e obras de arte, corrupção, etc.
Um factor chave em que assenta o edifício e a eficácia da Europol no combate ao crime internacional é o sistema de informações informatizado. No mundo de hoje - mundo da informação - esta é o factor decisivo para o êxito de qualquer política. O combate ao crime internacional organizado é, em primeiro lugar, a luta pela informação atempada.
Como todos temos presente, este é também um dos terrenos mais delicados da soberania das nações e da liberdade dos cidadãos. Por isso a Convenção Europol foi rodeada dos maiores cuidados e prevenções, para que os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos de cada país e a segurança nacional sejam salvaguardados ao longo de todo o processo de recolha, comunicação, processamento, acesso e uso de dados informatizados.
Além disso, os dados a recolher e a comunicar à Europol estão limitados pela estrita necessidade dos objectivos do sistema. Portugal e os outros Estados-membros atribuíram ao Tribunal de Justiça dos Comunidades Europeias, através de uma declaração, a resolução em última instância dos diferendos que surjam entre si sobre a interpretação ou aplicação desta Convenção.
Três dos sete títulos e vinte dos quarenta e sete artigos da Convenção são dedicados, pois, ao sistema de informações, às regras do seu uso, ao seu controlo e à responsabilização por eventuais desvios.
Cada Estado-membro designará uma instância nacional de controlo, encarregada de fiscalizar, com isenção e em conformidade com a legislação nacional, a legitimidade de introdução, consulta ou transmissão de dados pessoais à Europol e de se assegurar de que não há violação dos direitos das pessoas.
Na proposta de lei n.º 107/VII do Governo, que hoje aqui apreciamos e, seguramente, ratificaremos, designa-se como instância nacional de controlo, prevista na Convenção Europol, a Comissão Nacional para a Protecção de Dados Pessoais Informatizados e atribui-se-lhe a responsabilidade de nomear os dois representantes portugueses na Instancia Comum de Controlo.
A designação da Comissão Nacional para a Protecção de Dados Pessoais Informatizados, que funciona no âmbito da Assembleia da República, revela a preocupação do Governo em garantir a transparência de processos em terreno de grande melindre. O reconhecido prestígio e eficácia desta entidade é uma garantia para os cidadãos e para o Estado português.
A Comissão Nacional para a Protecção de Dados Pessoais Informatizados, cujo presidente e dois vogais são eleitos por esta Assembleia, tem uma experiência e prestígio firmados internacionalmente no âmbito das relações internacionais, nomeadamente no âmbito dos Acordos de Schengen, relativamente ao qual já funcionava como autoridade nacional de controlo da parte portuguesa do respectivo sistema de informações.
Sr Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Muitas das matérias do III Pilar pertencem ao núcleo da soberania nacional e por isso se compreende o melindre e, por vezes, a complexidade que representa a comunitarização ou tão-só a coordenação das políticas que a elas dizem respeito. Compreende-se, por isso, também a necessidade de dar apenas os passos seguros, evitando voluntarismos e pressas que, ao Fim e ao cabo, possam redundar em maiores atrasos.
Tendo em conta o aforismo que recomenda que se vá devagar porque se tem pressa, não devem, no entanto, os Governos e os cidadãos atrasar-se na necessidade de aprofundarem o acquis já obtido com a Convenção Europol.
Portugal é o segundo país a proceder à ratificação da Convenção Europol. Isso corrobora o seu empenhamento na luta contra o crime internacional e no fortalecimento dos instrumentos que a nível da União Europeia a possam prosseguir com maior êxito
É urgente ratificar a Convenção Europol. É urgente que todos os países membros que já manifestaram o seu acordo o façam rapidamente, antes do fim do ano, como o Conselho Europeu de Amsterdão recomenda.
O Conselho Europeu de Amsterdão confirmou, no texto do novo Tratado, a importância e o desejo de prosseguir o aprofundamento das políticas de defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, da não discriminação, da segurança e da justiça, em suma as matérias do III Pilar.
Como é sabido, o Governo português tem tido um desempenho e protagonismo nos Conselhos Europeus, no processo da Conferência Inter-Governamental e noutras instâncias comunitárias, que muito tem prestigiado Portugal. Não foi apenas ao levantar a bandeira em prol da luta contra o desemprego na cimeira de Madrid. O Governo português procurou também que se avançasse mais no âmbito do II Pilar, com a aproximação da UEO à União Europeia e teve um papel activo no reforço das políticas do âmbito do III Pilar.
No âmbito dos direitos do cidadão, relativos à liberdade, à segurança e v justiça, o tratado de Amsterdão materializou alguns progressos. Nele se inclui um protocolo que integra o acervo de Schengen no quadro da União Europeia, reformula vários artigos do Tratado de Maastricht no capítulo dos direitos fundamentais, segurança e justiça e inclui novos artigos que dizem respeito à Europol como é o caso do novo artigo K.1, no Título VI, onde se expressa ser objectivo da União Europeia facultar aos cidadãos um elevado nível de segurança dentro de um espaço de liberdade, segurança e justiça.
Neste novo artigo o ênfase é colocado na cooperação mais estreita entre forças policiais e autoridades judiciárias dos Estados-membros, tanto directamente como através da Europol.

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É introduzido um novo artigo K.7, através do qual passa a fazer parte do novo Tratado da União a essência do Protocolo, que hoje ratificaremos, relativamente à competência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias para decidir, a título prejudicial, sobre a interpretação da Convenção Europol.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo Português está empenhado na aplicação prática e eficaz da Convenção Europol. O Partido Socialista dará os seus votos para que a Assembleia da República ratifique hoje esta Convenção, assinada pelo Conselho em Julho de 1995, assim como o Protocolo, assinado em Setembro de 1996, que atribui ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias os poderes da sua interpretação.
Os Deputados socialistas apoiam a proposta do Governo que designa a Comissão Nacional para a Protecção de Dados Pessoais Informatizados como a instância nacional de controlo prevista na Convenção Europol.
A bancada socialista da Assembleia da República, em sintonia com o Governo, quer contribuir para a construção de uma União Europeia onde se preservem e ampliem os valores da liberdade, da segurança e da justiça.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Creio que ninguém de bom senso negará, hoje em dia, que uma acção eficaz dos vários Estados quanto aos fenómenos de criminalidade, sobretudo contra a criminalidade organizada à volta essencialmente do tráfico de droga, do terrorismo e de alguns outros fenómenos criminais que vão evoluindo com o tempo depende em muito de uma intensificação da cooperação internacional.
E essa cooperação internacional depende, e dependerá sempre, em nossa opinião, da vontade política efectiva que os vários Estados puserem na organização das formas de cooperação para combater essa criminalidade organizada.
No que diz respeito à União Europeia, ela poderia seguir um de dois caminhos: o caminho que muitos Deputados europeus têm apontado em resoluções que considero perigosas para a própria cooperação entre os Estados e que se baseiam essencialmente na ideia de formar uma polícia europeia, brigadas policiais europeias, e de substituir as polícias dos Estados-membros por uma polícia europeia que venha a representar, no futuro, a polícia de um eventual - esperamos que nunca ocorra - Estado unificado europeu ou o caminho da cooperação entre os Estados e que, respondendo ao desafio que hoje está colocado em matéria de combate à criminalidade organizada e que extravasa as fronteiras nacionais, respeite a soberania dos Estados e não ponha em causa as garantias essenciais dos cidadãos, se bem que preveja com suficiente operacionalidade métodos eficazes de combate a essa criminalidade organizada.
A Convenção Europol, que estamos a apreciar, optou pelo segundo caminho e, do nosso ponto de vista, optou bem. De facto, em nossa opinião, não se pode pôr em causa a soberania dos Estados e esta Convenção, cautelarmente e com bastante prudência, em quase todas as suas disposições, prevê que qualquer decisão, qualquer alteração ou qualquer evolução do serviço de polícia, e não da polícia, que é criado por esta Convenção depende sempre da unanimidade dos Estados.
É o método que o PP tem defendido relativamente ao funcionamento das instituições comunitárias e nesta matéria de combate à criminalidade, em que se lida com direitos e garantias fundamentais dos cidadãos, este método é especialmente aconselhável para encetar o caminho do combate organizado à criminalidade organizada. O que, em nossa opinião, não pode existir, como já refere noutro debate aqui realizado, são fórmulas de organização policial a funcionar neste momento na União Europeia à margem do Direito Comunitário ou, pelo menos, com o consentimento tácito ou com um fechar de olhos por parte dos Estados-membros, sem qualquer tipo de controlo e de informação. E esta ó, de facto, a situação que hoje existe relativamente à unidade antidroga, que, como todos sabemos, funciona na prática e no terreno sem cobertura, sem tutela jurídica, seja por parte do Direito Comunitário, seja indirectamente por qualquer expressão formal da vontade dos Estados. De facto, os fenómenos de criminalidade que hoje ocorrem interpelam, devem interpelar, todos os políticos responsáveis no sentido de se perceber que é a própria soberania dos Estados que está em causa, quando grandes associações criminosas operam indistintamente, no que toca aos vários países, sem considerarem fronteiras e nacionalidades. É, por exemplo, o caso da droga.
Penso que esta Convenção, organizada segundo os métodos da cooperação e do respeito permanente pelas decisões e vontade dos Estados expressa em unanimidade, poderá, no futuro, começar a ter alguma eficácia no sentido de permitir uma melhor actuação conjunta de todos os Estados e não daquilo que esperamos que nunca venha a existir, que é uma organização policial europeia única, substitutiva das polícias nacionais.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Era a polícia do «super-Costa»!

O Orador: - Nesta matéria, como em muitas outras, pensamos que um bom sistema de cooperação entre os Estados é a melhor forma de evitar a federalização de políticas que não se desejam federalizadas e cuja federalização o Partido Popular sempre contestará.

Agora, o que não se pode é defender uma cada vez maior cooperação internacional para combater a criminalidade organizada e impedir os rocios elementares mínimos para que essa cooperação internacional seja efectuada. Não se pode, em seminários e debates, dizer que o combate ao tráfico de droga depende essencialmente de uma actuação concertada entre os vários Estados e depois, quando se concretizam essas formas de cooperação, inviabilizá-las ou impedi-las.
Pela nossa parte, não hesitamos em considerar que no texto desta Convenção estão consagradas várias regras, pelas quais temos lutado, em matéria de funcionamento das instituições europeias e que, infelizmente, noutros campos da actuação comunitária, têm sido abandonadas. Está lá

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expressa a regra da unanimidade dos Estados, para tomar a esmagadora maioria das decisões; está lá expressa, entre outras, a regra de que as línguas de trabalho da Convenção coincidem com as línguas oficiais da União Europeia; estão lá expressos muitos princípios que hoje em dia corremos o risco de abandonar noutros domínios da actuação comunitárias, mas que nesta matéria acabam por, esperamos nós, vir a ser consagrados, se todos os Estados ratificarem esta Convenção. Se esta forma de cooperação entre os Estados da União Europeia relativamente ao combate à criminalidade funcionar e for eficaz, constituirá, no futuro, o melhor travão a qualquer tentativa de extinção das polícias nacionais e de criação de uma indesejável polícia europeia.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Agora é que está a ir por um bom caminho!

O Orador: - Penso que estou a agradar ao Sr. Deputado Carlos Encarnação,...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Está, sim senhor!

O Orador: - ... que, não obstante os seus esforços, não tem conseguido perturbar a minha intervenção e, tendo em conta que estou a terminar, aproveito para o cumprimentar especialmente, uma vez que me parece que o seu estado de espírito contrasta flagrantemente com o estado de espírito geral da Sala.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Muito obrigado!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Penso que o modo como o Governo e quem é partidário da ratificação e da criação da Convenção Europol fala reproduz aquilo que são os argumentos usuais.
A Europol, tal como Schengen, é apresentada como uma necessidade de segurança, como meio de garantir mais direitos dos cidadãos, em termos de defesa contra a criminalidade, o tráfico de droga e, hipoteticamente, contra a venda ilegal de armas. Enfim, estamos a talar de um conjunto de mecanismos que, supostamente, dão maior segurança mas têm como contrapartida a menor liberdade e o défice gradual dos direitos dos cidadãos. E penso que é nesta medida que a discussão deve ser feita, ou seja, saber em que medida é que se justifica, numa perspectiva de criação e de construção europeia, que se realize a livre circulação das pessoas, até hoje efectivamente não realizada, visto o preço a pagar por isso e o resultado directo disso ser a proliferação, a inalação de limitações extremamente desproporcionalizadas de direitos dos cidadãos. É evidente que, tanto em relação a esta Convenção como à Convenção de Schengen, do nosso ponto de vista, existe uma proliferação de polícias e sistemas de informação que paralelamente se vão criando, que vão fichando os cidadãos, que os vão controlando, que lhes vão restringindo a liberdade, e tudo isto vai proliferando como cogumelos com ligações directas a questões que nos parecem extremamente complicadas.
Além do mais, parece-nos extremamente complicado «meter no mesmo saco» - e é disso que se trata quando se legitima a criação da Europol, criminosos, terroristas, traficantes de droga, que, como é evidente, são uma preocupação para os cidadãos europeus, e trabalhadores ilegais, perseguidos políticos, refugiados, requerentes de asilo, porque estamos a falar de coisas totalmente diversas e que, manifestamente, se não podem confundir, como se faz nesta Convenção, que tem implicações directas - o que, a meu ver, é particularmente grave num país como o nosso - na concessão do direito de asilo, no acesso aos mercados de trabalho por parte dos imigrantes, no estatuto dos refugiados, na política de estrangeiros, ou seja, na política de concessão de vistos e na política de expulsão, disposições que tem a ver com o domicílio. Portanto, pensamos que esta cooperação, não assegurando, como não assegura claramente, mecanismos de controlo eficazes por parte dos cidadãos, o acesso rigoroso às fontes, constituídas por autênticas bases de dados sobre cidadãos europeus e à margem deles, o modo como tudo isto é pensado, o desigual peso que se atribui e a forma como se menorizam os direitos e liberdades dos cidadãos nesta concepção policial, é, claramente, para Os Verdes uma razão não para dizermos que, face a esta Convenção, temos dúvidas ou optamos por apresentar declarações de voto que justifiquem hipoteticamente a sua criação mas, sim, em face do que consideramos ser a desigualdade entre o que se garante e o que se retira, que ela não garante o que para nós é suposto garantir e, mais, secundariza e elimina completamente questões que não consideramos descartáveis, que são os direitos fundamentais dos cidadãos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, a minha interpelação é, muito breve e muito simples, na sequência daquilo que foi dito há pouco pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira.
Não quero que tique qualquer dúvida em relação ao meu interesse por estas matérias e muito menos em relação à natureza dos meus comentários e à perturbação eventual do Sr. Deputado Jorge Ferreira.
Eu sei que nem V. Ex.ª nem a Câmara notaram qualquer perturbação na brilhante intervenção do Sr. Deputado Jorge Ferreira, nenhum tremor na voz, nenhuma hesitação no raciocínio, pois os meus comentários não eram capazes de causar isso. Os meus comentários, e eu quero que fique no Diário expressamente dito, eram de incentivo e de apoio, porque o Sr. Deputado Jorge Ferreira ia, neste particular, no bom caminho.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Fica registado no Diário, Sr. Deputado Carlos Encarnação.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Calvão da Silva.

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O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, o PSD quer congratular-se com o processo de ratificação da Convenção Europol e do correspondente protocolo. É que o PSD, desde o início, lutou muito e ainda na presidência portuguesa da União Europeia empenhou-se profundamente para que a Convenção viesse a ser uma realidade. De algum modo, a unidade da droga funcionou em termos de facto, e foi o PSD que, na presidência, se empenhou para que uma convenção regulasse o quadro normativo do funcionamento não só desta unidade mas também de uma unidade de polícia europeia ou de um serviço europeu de polícia. Por isso, é que hoje aqui nos encontramos, não só por isso mas também devido a uma outra iniciativa do Grupo Parlamentar do PSD, apresentada já este ano, em Fevereiro, que é um projecto de resolução, que viria a ser aprovado por unanimidade da Câmara, no sentido de incentivar o Governo a apresentar a proposta de resolução. Também por isso, e de Fevereiro ao mês em que nos encontramos decorreu algum tempo. mas mesmo assim, nos congratulamos com o resultado a que hoje estamos a chegar. Naturalmente que, se tivéssemos andado mais depressa, hoje poderíamos dizer que seríamos o primeiro país a ratificar, mas, para desgraça do Sr. Deputado Carlos Encarnação, que tanto se empenhou, vamos ser o segundo. Ficar em segundo lugar não é desonroso, e o Deputado Carlos Encarnação sente-se, mesmo assim, feliz.
O pano de fundo, que nesta Convenção é dos mais interessantes, é um problema do coração do Estado. É um problema de espaço de liberdade, de segurança e de paz aquele que de algum modo forjou esta realidade em construção, que é a União Europeia. Desde o início que ela foi concebida como um grande espaço de liberdade, de segurança e de paz. Por isso, a grande autoridade, essa auctoritas, que vai de algum modo cimentar os fundadores e o seu pensamento está subjacente a esta Convenção e não vai no sentido da comunitarização, pelo que não vale a pena vermos fantasmas, como de algum modo o PCP está a ver. Não é urna polícia política, não é uma KGB, nem sequer uma PIDE; é de facto uma mera cooperação entre as polícias nacionais dos Estados membros da União Europeia. E é-o porque a realidade do crime assim o impõe. O crime hoje tem novas dinâmicas, a dinâmica do crime e da insegurança é outra, e tem também muito a ver com a mediatização do fenómeno, com a indução indirecta que isto também gera no sentimento de insegurança nas populações em geral, nos cidadãos em particular, e obviamente que se essa nova dinâmica do crime, essa nova dinâmica do medo e da insegurança, não for atalhada, cerce pode levar ao desenvolvimento de um caldo de cultura propício a novas ideologias totalitárias, mesmo que sob capas democráticas. É por isso que o PSD, que luta tenazmente contra o crime, que detende essa luta e que considera que ela está longe de estar ganha, não hesita em dizer que aprova completamente esta proposta de resolução apresentada pelo Governo.
Não queremos que se alimente o sentimento de insegurança, de vulnerabilidade dos cidadãos; queremos, pelo contrário, fortalecer o espaço de segurança, de liberdade e de paz na União Europeia em que nos encontramos.
Não querermos permitir alimentar esse circulus inextricabilis - mais crime, mais penas, mais polícias; mais crime, mais penas, mais polícias. Não é por aí que se vence a criminalidade organizada nem a alta criminalidade. Pelo contrário, o que pretendemos é melhores polícias, melhores forças de segurança e, para isso, temos de dotá-las dos instrumentos mais modernos que possam contrabalançar a organização do crime e dos criminosos. A um crime organizado à escala mundial, internacional e informatizada não podemos continuar a responder com polícias arcaicas, sem métodos eficazes, sem novas tecnológias de ponta para combater o crime organizado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Ora, é isso que nos assegura esta Convenção cuja ratificação o Governo agora nos propõe: uma melhor eficácia de cooperação policial entre as polícias nacionais dos Estados membros, um banco de dados e de informações posto ao serviço das polícias nacionais dos Estados membros para, assim, poderem prever, antever comportamentos desviantes e que, através da previsão, nos permita ter ciência e sabedoria na acção. Só com essa ciência e essa sabedoria, em virtude destes dados de antecipação das realidades, podemos prevenir o crime, combatê-lo eficazmente e, nesta medida, o PSD não hesita em aprovar a resolução.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não se trata, por isso, de uma polícia europeia: trata-se, sim, de um serviço de dados e de informações ao dispor das polícias nacionais dos Estados membros, um serviço com sede em Haia, que tem as suas unidades nacionais espalhadas por todos os Estados, que tem agentes de ligação entre a unidade central e as unidades nacionais e que, nessa medida, proporciona às polícias e às forças de segurança nacionais os meios para serem eficazes.
É, ainda, salvaguardada uma hipótese que nem o Partido Popular referiu mas que deveria ter feito. É que, quando se trate de questões de segurança interna e de ordem pública ou de segurança dos Estados, nem sequer há a obrigatoriedade de transmissão de dados para a unidade europeia de polícia. Ainda aqui, a nacionalidade, ainda aqui o serviço público de segurança de cada um dos Estados está salvaguardado, não havendo sequer comunitarização nem muito menos uma transferência de soberania na luta e no zelo pela ordem pública interna, pela segurança interna e pela segurança dos Estados.
Por isso, não podemos ter qualquer espécie de dúvida nem ver «fantasmas» de polícias europeias, de polícias políticas, que não se pretendem e que se querem sepultadas para sempre.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, julgo que podemos dizer que a liberdade dos cidadãos, sem fronteiras, que queremos salvaguardar, exige a eficácia no combate ao crime móvel para, assim, salvaguardar a mobilidade das pessoas, a sua liberdade, a sua segurança pessoal, a integridade física dos

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seus bens, da sua propriedade e, porque não?, da paz no círculo europeu em que nos encontramos e da paz no mundo.
Por isso, o PSD votará a favor desta proposta de resolução.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, para pedir esclarecimentos.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Calvão da Silva, sinto-me obrigado a pedir-lhe esclarecimentos na medida em que atribuiu ao PCP afirmações que não fiz. Disse que o PCP estava a ver «fantasmas», mas os únicos «fantasmas» são aqueles que o Sr. Deputado aqui agitou e que nada tiveram a ver com a intervenção que fiz, na qual fui mais rigoroso relativamente à matéria que estamos a discutir.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Os fantasmas não se agitam, são incorpóreos!

O Orador: - O Sr. Deputado diz que lançámos a acusação da criação de polícias políticas mas não falei disso. Quem falou de polícia política foi o Sr. Deputado e não eu. Portanto, rejeito essa imputação que nos fez.
Quanto às polícias europeias, o que estamos a discutir é uma Convenção relativa a uma unidade europeia de polícia, assim chamada, embora eu tenha tido oportunidade de referir o conteúdo concreto desta Convenção. No entanto, não deixei de referir intenções que existem, que estão escritas, designadamente no relatório do Parlamento Europeu sobre a Europol, em que se preconiza claramente a extensão do que actualmente está previsto na Convenção no sentido da atribuição de poderes directos de inquérito à Europol. Portanto, o que disse foi que essa questão está claramente posta em cima da mesa ao nível de vários órgãos da União Europeia.
Quanto à comunitarização das questões relativas à justiça e aos assuntos europeus e, designadamente, à cooperação policial, não fomos nós que inventámos esta matéria. Na verdade, a comunitarização destas questões está claramente colocada como objectivo, tanto, agora, após a Cimeira de Amsterdão como, aliás, já estava no Tratado da União Europeia, assinado em Maastricht. Portanto, não se trata de qualquer «fantasma», é um objectivo muito claro que é preconizado por muitos defensores de uma maior comunitarização de vários aspectos da vida social e também deste, o que, quanto a nós, é particularmente grave na medida em que contende com direitos fundamentais dos cidadãos. Repito que não se trata de fantasmas mas de realidades.
O Sr. Deputado, que, ainda recentemente, teve oportunidade de acompanhar a Comissão de Liberdades Públicas do Parlamento Europeu, sabe perfeitamente que a questão da comunitarização dos assuntos de justiça e dos assuntos internos está claramente na ordem do dia e que não estão a ser minimamente salvaguardados aspectos relacionados com a garantia de direitos dos cidadãos.
Aliás, a União Europeia tem uma grande tendência para a comunitarização de limitações aos direitos dos cidadãos e para a diminuição de garantias, mas é pena que não haja uma tendência para a comunitarização de direitos fundamentais. Isso é que era essencial, mas, aí, talvez os senhores tivessem uma atitude diferente da que têm.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, não é rigoroso dizer, como acabou de fazer, que está em cima da mesa o objectivo da comunitarização da Europol. Não estava no Tratado de Maastricht e, pelo que li, também não vi que esteja na nova versão, isto é, no tratado dito de Amsterdão.
Para confirmar o que digo basta ler o artigo K.1, n.º 9, para daí extrair a conclusão clara e inequívoca de que o que o Sr. Deputado disse não corresponde à verdade: «A cooperação policial (...)» parte «(...) à escala da União, de um sistema de intercâmbio de informações (...)». Portanto, nada tem a ver com comunitarização.
No artigo K.3, n.º 2, alínea c), em que se diz que se podem elaborar convenções, que é de onde resulta esta Convenção Europol que hoje discutimos, também não está mencionada a comunitarização, tal como não estará no próximo tratado em que apenas se fala no reforço da cooperação policial entre os Estados.
Assim, Sr. Deputado, se o que referiu não são fantasmas fico muito contente e ainda mais porque, ao responder-lhe, tive oportunidade de ler o que acabei de ler, em nome do rigor jurídico.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Gostaria de, neste momento, sublinhar que a ratificação desta Convenção significa a vontade que o Governo tem, e que nós subscrevemos, de, através da cooperação entre Estados membros, melhorar a eficácia dos seus serviços competentes no que se refere à prevenção e ao combate ao terrorismo, ao tráfico de estupefacientes e a outras formas graves de criminalidade internacional.
Como já foi afirmado, a supressão das fronteiras entre os Estados membros da União Europeia facilitou o terrorismo internacional, o tráfico de drogas e de armas de fogo, o furto de veículos, a fraude e o crime organizado, o que implica que se encontrem as formas mais eficientes de os combater. A criação da Europol, um serviço europeu de polícia, tem precisamente esse objectivo, que dependerá da intensa cooperação policial europeia.
São vários os instrumentos que os Estados têm utilizado com o objectivo da implantação da cooperação policial, como a Interpol, o Grupo de Trevi e o Acordo de Schengen, mas é na Cimeira de Maastricht, em Dezembro de 1991, que fica acordado estabelecer um gabinete europeu de informação policial designado Europol.

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Por seu lado, o Governo português inseriu no seu Programa de Governo o objectivo de, no quadro da União Europeia, defender um progressivo reforço no campo da justiça e dos assuntos internos, como forma de dar resposta organizada às questões que afectam a segurança dos cidadãos europeus, nomeadamente no tocante à criminalidade organizada, ao tráfico de drogas e ao terrorismo, designadamente através do eficaz funcionamento da Europol.
Estas matérias são igualmente destacadas no relatório de segurança interna do ano passado que refere a continuação das actividades de intercâmbio técnico entre forças e serviços de segurança nacionais e as forças e serviços congéneres de outros países, com destaque para os países da União Europeia, para além da intensificação da participação nas actividades no domínio do III Pilar do Tratado.
As funções atribuídas à Europol encontram-se reguladas e centram-se, essencialmente, no incremento do intercâmbio de informações entre os Estados membros, o que implicará, obviamente, recolha e análise de dados e informações, manutenção de colectâneas informatizadas de dados, entre outras. Este intercâmbio implica a criação e a manutenção de um sistema de informações informatizado que será alimentado pelos Estados membros representados pelas unidades nacionais e pelos agentes de ligação no respeito dos respectivos procedimentos internos, ficando o acesso a este sistema de informações reservado às unidades nacionais e a funcionários da Europol devidamente habilitados.
Sublinhe-se, no entanto, como já fez o Sr. Deputado Calvão da Silva, a não obrigatoriedade para as unidades nacionais da transmissão de dados e informações sempre que tal lese interesses fundamentais da segurança nacional, respeite à segurança do Estado, comprometa o êxito das investigações em curso ou a segurança de uma das pessoas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não se ignora a importância que implica a existência de um sistema de informações com estas características e, por isso, houve o cuidado de dotar este sistema de uma instância comum de controlo independente, integrada por membros das instâncias nacionais, para fiscalizar a legalidade da referida actividade ao nível da Europol.
No caso de Portugal, o Governo propõe que a instância nacional de controlo seja a Comissão para a Protecção de Dados Pessoais Informatizados e determina-se que seja esta a designar um representante do Estado na instância comum de controlo. Esta opção revela preocupação em garantir a transparência do controlo e do funcionamento do sistema através da função de fiscalização cometida a uma entidade que funciona no âmbito da Assembleia da República.
A este propósito, recorda-se que a primeira tentativa ensaiada para instituir o registo nacional de identificação foi através da Lei n.º 2/73, de 10 de Fevereiro, mas a consagração efectiva dos direitos pessoais face à informática veio, porém, a ocorrer, graças à sensibilidade do legislador constituinte, em 1976. A partir desta altura, Portugal pôde assumir-se como um dos pioneiros na defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, maxime no domínio da defesa do direito à privacidade perante cada vez maior generalização da informática.
A Constituição de 1976 foi a primeira a conferir dignidade constitucional à utilização da informática, inserindo-a no capítulo dos direitos, liberdades e garantias, assumindo-se, então, como a única no mundo a regular tal matéria.
Esta preocupação tem sido tal que à rápida evolução tecnológica têm correspondido os Deputados, em sede de revisão constitucional, à sua adaptação. É o caso que, neste momento, se verifica quando decorre o processo de revisão constitucional e a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional tem já votada a alteração ao artigo 35.º sobre a utilização da informática. Atendendo à sua importância e adequação à sensibilidade que decorre desta matéria, permito-me reproduzi-la:
«1 - Todos os cidadãos têm o direito de acesso aos dados informatizados que lhes digam respeito, podendo exigir a sua rectificação e actualização, e o direito de conhecer a finalidade a que se destinam, nos termos da lei.
2 - A lei define o conceito de dados pessoais, bem como as condições aplicáveis ao seu tratamento automatizado, conexão, transmissão e utilização, e garante a sua protecção designadamente através de entidade administrativa independente.
3 - A informática não pode ser utilizada para tratamento de dados referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada ou origem étnica, salvo mediante consentimento expresso do titular ou autorização legal com garantias de não discriminação ou para processamento de dados estatísticos não individualmente identificáveis.
4 - É proibido o acesso a dados pessoais de terceiros, salvo em casos excepcionais previstos na lei.
6 - A todos é garantido o livre acesso às redes informáticas de uso público, definindo a lei o regime aplicável aos fluxos de dados transfronteiras e as formas adequadas de protecção de dados pessoais e de outros cuja salvaguarda se justifica por razões de interesse nacional.
7 - Os dados pessoais constantes dos ficheiros manuais gozam de protecção idêntica à prevista nos manuais anteriores, nos termos da lei.»
O quadro jurídico referido dá garantias suficientes de defesa da privacidade dos cidadãos.
Por outro lado, e dado que o sistema de informações que a Convenção estabelece lida com dados pessoais e, em última instância, com direitos fundamentais, entenderam os Estados membros que seria necessário tornar a Europol refém de uma garantia de controlo jurisdicional.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos a falar de um serviço europeu de polícia, mas estamos igualmente a falar de um espaço de liberdade e de segurança, com o reforço de direitos dos cidadãos, sublinhados na última Cimeira de Amsterdão e constantes do Tratado da União Europeia.
O facto de Portugal ser dos primeiros países - é o segundo - a ratificar a Convenção Europol só pode significar o desejo de combater com eficácia o terrorismo e o crime organizado como forma de reforçar a segurança dos cidadãos, mas terá de significar também o retorço da garantia de defesa dos direitos fundamentais do cidadão,...

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Muito bem!

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O Orador: - ... que é a referência primeira, desde a fundação da Comunidade Económica Europeia, em benefício da qual todas as outras decisões se têm de subordinar, sob perigo de pôr em causa os fundamentos essenciais da construção europeia que terá de ser, sobretudo, um espaço de liberdade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais pedidos de palavra, dou por encerrado o debate desta matéria.
Srs. Deputados, segue-se a apreciação do relatório final e do projecto de resolução n.º 51/VII elaborados pela Comissão de inquérito parlamentar para averiguar dos pedidos pendentes no Ministério da Educação ou objecto de decisão nos últimos 12 meses para reconhecimento ou autorização de funcionamento de instituições ou cursos do ensino superior particular e cooperativo (inquérito parlamentar n.º 4/VII - PSD).
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Presidente da Comissão de Inquérito Lucília Ferra.

A Sr.ª Lucília Ferra (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Usando da palavra na qualidade de Presidente desta Comissão Parlamentar de Inquérito, irei, muito sucintamente, sumariar os trabalhos da mesma, reservando a apresentação do relatório final ao Sr. Deputado Relator, José Ribeiro Mendes.
A Comissão Parlamentar de Inquérito foi constituída para proceder à averiguação dos pedidos pendentes no Ministério da Educação ou objecto de decisão nos últimos 12 meses, período compreendido entre 12 de Julho de 1995 e 12 de Julho de 1996, para o reconhecimento ou autorização de funcionamento de instituições ou cursos de ensino superior particular e cooperativo.
Na sua génese encontra-se a Resolução n.º28, de 12 de Julho de 1996, publicada no Diário da Assembleia da República, II Série A - n.º 59, de 3 de Agosto, impulsionada pelo pedido de inquérito subscrito por quatro Deputados do Partido Social-Democrata. Pretendiam os Deputados subscritores esclarecer as razões que conduziram o Governo a reconhecer a Universidade Atlântica de entre um leque de solicitações que aguardavam resposta.
Por despacho de 18 de Setembro de 1996, veio o Sr. Presidente da Assembleia da República fixar o prazo de 180 dias para a realização deste inquérito parlamentar. Posteriormente, em 2 de Outubro de 1996, tomou posse a referida Comissão.
No início dos trabalhos, a Comissão elaborou o seu regimento interno, que veio a ser publicado no Diário da Assembleia da República, II Série - B - n.º 4, de 16 de Novembro de 1996, e procedeu à eleição do relator. Seguidamente, a Comissão elaborou um questionário indicativo, nos termos das disposições legais em vigor, solicitando informação e documentação ao Ministério da Educação e à Universidade Atlântica.
No decurso dos trabalhos, procedeu-se à audição das seguintes personalidades: Professor Doutor Eduardo Marçal Grilo, Ministro da Educação, em 26 de Fevereiro de 1997; Professor Doutor Alfredo Jorge Silva, Secretário de Estado do Ensino Superior, em 6 de Março de 1997; Professor Doutor Pedro Manuel Lourtie, Director do Departamento do Ensino Superior do Ministério da Educação, em 6 de Março de 1997; Professor Doutor Jorge Miranda, Presidente da Comissão de Especialistas, em 11 de Março de 1997; Professor Doutor Manuel Ferreira Patrício, ex-Director do Departamento do Ensino Superior do Ministério da Educação, em 12 de Março de 1997.
A Comissão deliberou igualmente efectuar uma visita às instalações da Universidade Atlântica, deslocação essa que veio a concretizar-se em 17 de Abril de 1997. Aí foi recebida pelo Sr. Professor Doutor João Pina Cabral, Reitor da mesma, que se fez acompanhar do respectivo secretário-geral, do director pedagógico, do director financeiro da EIA, de dois professores investigadores e de dois representantes dos principais sócios da universidade, a Caixa Geral de Depósitos e a Câmara Municipal de Oeiras.
Da análise exaustiva da documentação e da informação recolhida, veio a ser elaborado o relatório final, aprovado por unanimidade, em sede de Comissão, no passado dia 24 de Abril de 1997.
O referido relatório final e o projecto de resolução a apresentar a esta Câmara pelo Sr. Deputado Relator será hoje objecto de apreciação por esta Câmara.
Resta-me realçar o espírito de cooperação dos Srs. Deputados que compõem esta Comissão Eventual de Inquérito, bem como a colaboração empenhada dos funcionários que prestaram apoio à mesma.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para fazer um breve resumo do relatório da Comissão, tem a palavra o Sr. Deputado Relator, José Ribeiro Mendes.

O Sr. José Ribeiro Mendes (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório está organizado em quatro secções: a primeira trata o objecto e os motivos deste inquérito, a segunda as diligências efectuadas, a terceira as informações recolhidas e, finalmente, na quarta são tiradas as conclusões.
Quanto ao objecto do relatório, já a Sr.ª Presidente fez a sua exposição e, portanto, sobre esta secção, limitava-me a fazer uma breve referência aos Srs. Deputados que me coadjuvaram, porque, de facto, foram de uma dedicação e de uma disponibilidade fantástica. Refiro-me, em particular, aos Srs. Deputados José Cesário, Bernardino Soares e Sílvio Rui Cervan.
A Sr.ª Presidente também já se referiu às diligências efectuadas, pelo que permitia-me sintetizar, dizendo que foram feitos requerimentos, quer do PSD quer do PS, pedidas informações directamente à instituição e elaborado um questionário indicativo, para além de terem sido ouvidas as personalidades já referidas, designadamente o Sr. Ministro da Educação, o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, os Directores do Departamento do Ensino Superior do Ministério da Educação, o actual e o de então, bem como o Professor Doutor Jorge Miranda, que é o Presidente da Comissão de Especialistas.
Relativamente à terceira secção, a das informações recolhidas, a Comissão recebeu 29 dossiers em resposta às questões colocadas no questionário, das quais destacamos o facto de a Universidade Atlântica ter sido reconhecida no prazo de 2 anos, tendo o pedido de

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reconhecimento dado entrada em 6 de Junho de 1994 e o reconhecimento publicado em 31 de Julho de 1996.
Como resultado das diversas audições, destacava, em súmula, o seguinte: existia um elevado número de processos de reconhecimento pendentes no Ministério da Educação aquando da entrada em funções do Governo do PS e o Ministro da Educação não queria tomar decisões sem que antes se pudesse avaliar quer da situação do ensino particular e cooperativo, através do parecer de individualidades consideradas conhecedoras da matéria, quer da adequação do estatuto em vigor 1 realidade vigente, quer da preocupação em salvaguardar os interesses dos alunos e das respectivas famílias e, ainda, da necessidade de assegurar a qualidade de ensino.
Finalmente, as conclusões do inquérito referem que, à data da posse do Governo, encontravam-se no Ministério da Educação 62 pedidos de reconhecimento de instituições de ensino superior particular e cooperativo; que foram reconhecidos sete estabelecimentos, autorizado o funcionamento de um deles a título excepcional, arquivados dois pedidos e indeferidos onze; que, à data do relatório, encontravam-se pendentes 41 pedidos de reconhecimento. dos quais sete estão em fase de apreciação; que o prazo médio de tramitação dos processos era de 2 anos e os pedidos de reconhecimento e autorização de funcionamento das instituições foram deferidos com fundamentação nos pareceres favoráveis emitidos pela Comissão de Especialistas; que a Universidade Atlântica foi reconhecida no prazo de 2 anos e que o que fundamentou este reconhecimento foi o parecer favorável da Comissão de Especialistas.
A Comissão de Inquérito concluiu não ter havido relativamente à Universidade Atlântica qualquer medida de tratamento de favorecimento, já que a mesma foi reconhecida no prazo de 2 anos.
Da análise dos elementos recolhidos, a Comissão constatou que a Universidade Atlântica, acusada de promover publicidade enganosa, dado não ter inserido, nas menções publicitárias que fez, referência ao facto de o processo de reconhecimento de interesse público se encontrar em fase de aprovação, reconheceu tal situação, argumentando tratar-se de um lapso da firma de distribuição publicitária, tendo de imediato rectificado a situação, publicando uma nota de esclarecimento no jornal Correio da Manhã e enviando uma carta de esclarecimento ao Ministro da Educação e ao Secretário de Estado do Ensino Superior.
No que respeita aos aspectos pedagógicos, os mesmos são considerados, no parecer elaborado pela Comissão de Especialistas, «muito positivos e inovadores».
Da documentação recebida e dos depoimentos obtidos, a Comissão de Inquérito concluiu haver grande morosidade por parte do Ministério da Educação na instrução e decisão dos pedidos de reconhecimento apresentados, sendo muito elevado o número de processos pendentes, o que se atribui, por um lado, a alguma inépcia da «máquina administrativa» e, por outro, à morosidade das instituições em dar resposta às solicitações do Ministério da Educação.
Por último, no ponto n.º 13 deste relatório, apresentam-se as recomendações ao Governo, posteriormente traduzidas no projecto de resolução, que são do seguinte teor: «Que o Governo tome as providências e medidas que entender adequadas a uma maior celeridade dos processos pendentes de reconhecimento e autorização de funcionamento das instituições de ensino superior (...) e que defina, com carácter de urgência, um modelo de fiscalização do corpo decente (...)».
É tudo, Sr. Presidente.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, em primeiro lugar queria «corrigir» o Sr. Deputado Relator, porque o seu meritório trabalho é, efectivamente, um dado, mas não é extensivo ao representante do Partido popular, pelo que devolvo-lhe essa quota, agradecendo a gentileza.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Popular não pretende vir aqui, hoje, fazer mais do que uma análise política da forma como se processa o reconhecimento, ou autorização de funcionamento de instituições ou cursos de ensino superior.
Não estão em causa ilícitos, mas está seguramente em causa a análise da forma como é tramitado um qualquer pedido de reconhecimento quer na sua vertente temporal quer nas razões que sustentam a aprovação de novos cursos e de novos estabelecimentos.
De facto, ficou claro que o processo de reconhecimento da Universidade Atlântica, independentemente de juízos de valor que possamos ou não fazer da utilidade, da qualidade, da premência dos seus cursos, teve um tratamento se não de excepção pelo menos privilegiado face a outros cursos e outros estabelecimentos que, tendo entrado anteriormente, não foram despachados com a mesma celeridade.
Tenho, aliás, até hoje, dois requerimentos feitos à Secretaria de Estado do Ensino Superior sobre processos de publicidade enganosa, que não mereceram ainda resposta.
E é um facto, é um facto também indesmentível, que a Universidade Atlântica fez publicidade em alguns meios de comunicação social entre os dias 8 e 16 de Junho de 1996, quando, curiosamente, apenas um mês depois viria a ser reconhecida. A certeza do reconhecimento deveria ser tanta que, na publicidade, não constava, sequer, uma nota obrigatória, dizendo que se tratava de um processo que aguardava reconhecimento de interesse público.
Este comportamento seria menos gravoso ou, pelo menos, menos notado, se nos termos da sua estrutura societária de administração e ainda no seu corpo docente não figurassem membros e ex-membros do Governo, como, por exemplo, o Ministro Vera Jardim e a Secretária de Estado Ana Benavente.
Efectivamente, não me parece poder passar em branco que, como resposta ao requerimento n.º 1241/VII, da Sr.ª Deputada Isabel Castro, tenhamos sido informados de que o reconhecimento de interesse público da Universidade Atlântica pelo Decreto-Lei n.º 108/96, de 31 de Julho, foi precedido de uma análise técnica, na qual se faz uma expressa menção de que «o projecto tem aspectos muito positivos e inovadores a que não será estranha a colaboração nesse projecto de numerosas personalidades

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entre as quais se contam actuais e ex-membros do Governo deste País
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O hábito faz o monge!
Deixo hoje, aqui, apenas as dúvidas do Partido Popular quanto ao facto de constituir elemento determinante para o reconhecimento de uma universidade nova, com cursos novos, contar na sua administração e corpo docente com membros e ex-membros do Governo. Não estão em causa, seguramente, os méritos das pessoas em questão, não estão, seguramente, em causa as suas habilitações e capacidades, está em causa o inadmissível princípio de este facto constituir aspecto ponderado, importante, determinante ou decisivo.
Para nós, é inadmissível que tal ocorra; para nós, é claro que é hoje lícita a dúvida; para nós, é muito triste que, por um lado, se diga querer apoiar e incrementar uma maior autonomia universitária e, por outro, se assista ab initio, desde a sua formação, à promiscuidade entre o poder político e as nossas escolas de excelência, que são as universidades.
Oxalá a Universidade seja boa, oxalá esta dúvida se dissipe, porque, hoje e neste momento, tudo aquilo que podemos dizer é que esta «brisa atlântica» vem envolta em algum nevoeiro.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discutimos hoje, aqui, o resultado da Comissão de Inquérito que analisou os processos pendentes no Ministério da Educação, no que dizia respeito ao reconhecimento ou autorização de funcionamento de cursos ou estabelecimentos do ensino superior particular ou cooperativo.
Mas esta análise tem, seguramente, como pano de fundo, por um lado, a proliferação de instituições do ensino superior particular e cooperativo, que, nos últimos anos, tem sido prática no nosso país, por outro, a existência de diversas situações de funcionamento de instituições ou de cursos não autorizados mas cm que os alunos já participam e onde, inclusive, pagam as suas mensalidades.
De resto, no relatório, uma das coisas que está registada como tendo sido apurada pela Comissão é a existência de 7 pedidos, entre os 41 pedidos pendentes actualmente no Ministério da Educação, de instituições em actividade sem autorização.
Esta questão suscita um problema bastante complicado, que é o de saber como se resolve o seu problema, garantindo ou tentando garantir da melhor forma os interesses dos alunos que frequentam essas instituições.
O Governo comprometeu-se a resolver a situação da melhor forma, terá havido já algumas medidas de autorização de determinadas instituições em que se verificava esta situação e para outras ficou prometido um diploma - infelizmente, tanto quanto sabemos, ainda não existe - que permitiria levar a bom porto a regularização de todas as instituições ou das instituições que reunissem as condições e que tivessem o problema de já existirem alunos a frequentar os seus cursos.
Por outro lado, outra das questões que ficou claramente vista nos depoimentos e documentos que a Comissão recebeu é a da morosidade na análise dos processos, morosidade esta que não se deve apenas ao Ministério da Educação deve-se também, muitas vezes, à falta de requisitos, à falta de documentos das instituições que se candidatam a leccionar determinados cursos de ensino superior. Trata-se, enfim, de uma morosidade que, juntamente com a complexidade burocrática que existe nesta matéria e com a talvez pouca linearidade das regras instituídas, é inimiga da clareza e da transparência nesta matéria. Daí que uma das recomendações da Comissão, no relatório aprovado e que é hoje proposto ao Plenário, seja a de que a clareza e a diligência nesta matéria sejam um facto, de modo a que se possam avaliar as situações existentes.
Mas ficou também clara alguma inoperância da fiscalização por parte do Ministério da Educação junto das instituições de ensino superior particular e cooperativo, desde logo no início de funcionamento das instituições, pois algumas começam a funcionar sem autorização e não têm sobre si uma intervenção que permita acautelar situações que, depois, começam a ser complicadas e a tender para o facto consumado, mas também em situações tão importantes como, por exemplo, a do controle do tempo integral prestado pelos docentes nessas instituições, a do controle do número de instituições em que estes docentes participam, a da efectiva participação dos docentes enunciados nos processos apresentados ao Ministério da Educação, bem como a da sua efectiva participação nas actividades pedagógicas e nas actividades das escolas:
As conclusões que são propostas dirigem-se, portanto, fundamentalmente, ao Ministério da Educação, no sentido de suprir alguns destes problemas, e exigem, embora de forma indirecta - penso que podemos fazer esta leitura -, que esta matéria tenha, para além das intervenções concretas e no interesse do país, dos estudantes, dos alunos, das instituições, uma planificação, uma ideia do que se quer para o ensino superior particular e cooperativo, uma ideia de regulação de todo este fenómeno, sem dúvida completamente dependente do papel que se pretende, e que o Governo pretende, que o ensino superior particular e cooperativo tenha no âmbito mais geral do ensino superior.
Uma última palavra para subscrever o projecto de resolução apresentado e a intenção de tornar públicas todas as matérias, todos os documentos e depoimentos que a Comissão reuniu e que nos parecem poder ajudar ao esclarecimento de quem tenha interesse e do interesse que haja nos factos que estivemos a analisar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alves de Oliveira.

O Sr. Manuel Alves de Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Está hoje em apreciação o relatório final e projecto de resolução da comissão parlamentar de inquérito que se constituiu para averiguar dos pedidos pendentes no Ministério da Educação ou objecto de decisão nos doze meses compreendidos entre 12 de Julho de 1995 e 12 de Julho de 1996, como autorização

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de funcionamento de instituições ou cursos do ensino superior particular e cooperativo, das datas de entrada dos correspondentes pedidos e respectivo grau de instrução e das razões que fundamentaram a decisão do Governo, designadamente das razões que justificaram a autorização da denominada Universidade Atlântica.
A iniciativa da constituição da comissão de inquérito partiu do PSD, com o objectivo de esclarecer as razões que se prenderam com o reconhecimento da Universidade Atlântica, importando tornar claro e sem qualquer dúvida os fundamentos e razões que levaram o Governo a tomar tal deliberação, no quadro do elenco de pedidos que aguardavam respostas.
Em consequência da iniciativa, o Plenário da Assembleia da República deliberou constituir a comissão de inquérito, o que ocorreu por via da Resolução n.º 28, de 12 de Julho de 1996.
Depois de cuidadosamente compulsados os documentos recebidos e de analisados os esclarecimentos prestados pelas personalidades convidadas, não se consegue, positivamente, concluir que tenha havido critérios estritamente idênticos para as instituições a quem foi reconhecida a utilidade pública - exemplos da Escola Superior de Enfermagem Dr. J. T. Montalvão Machado, em Chaves, da Universidade Fernando Pessoa, da Universidade Atlântica e de outras que, aparentemente, estariam nas mesmas circunstâncias e a quem não foi concedido o referido estatuto. Nesta última situação retira-se, por exemplo, a Escola Superior de Línguas e Administração de S. João da Madeira.
Especificamente em relação à Universidade Atlântica, não discutimos o mérito do projecto. Realçamos que a comissão de inquérito, no seu todo, concluiu não ter havido medidas de favorecimento, já que a mesma foi reconhecida no prazo médio de instrução dos processos, ou seja, dois anos, e com base no parecer favorável da Comissão de Especialistas.
No entanto,...

O Sr. António Braga (PS): - No entanto?!...

O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - O Sr. Deputado António Braga vai acabar por dar lá aulas!...

O Orador: - No entanto, mereceu reparo e foi reconhecida, apesar de corrigida, a existência de publicidade a cursos a ministrar naquela instituição, antes da publicação da portaria autorizativa para o seu funcionamento.

O Sr. António Braga (PS): - Então, e as que funcionam com cursos que não estão homologados?!

O Orador: - No decurso da audição com o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, realizada em 6 de Março, foi afirmado que, para as instituições não reconhecidas mas com alunos no sistema, seria encontrada uma solução excepcional, prevendo-se a publicação dos normativos dentro de cerca de um mês a contar do referido dia 6 de Março.
Tal previsão só veio a ter consequência com a aprovação, em Conselho de Ministros do passado dia 5 de Junho, de um diploma cuja epígrafe é a «protecção aos estudantes de cursos superiores ilegais», que, tanto quanto se sabe, ainda não foi publicado.
Ficou patente que os processos de reconhecimento das instituições e a autorização de funcionamento dos respectivos cursos é um processo de longa maturação, o que provoca um elevado número de processos pendentes.
Sendo certo que perfilhamos que o princípio da qualidade deve privilegiar a concessão da utilidade pública, já não aceitamos que a inépcia da máquina administrativa do Estado seja obstáculo ao dever de resposta célere, que é exigível. Do mesmo modo, também não aceitamos alguma demora nas respostas das instituições às solicitações dos órgãos do Ministério da Educação durante a instrução dos processos. O que se deve sempre distinguir é a responsabilidade que em cada caso cabe a cada interveniente.
Por outro lado, foi reconhecido que a verificação do tempo integral/regime de exclusividade «é um problema gravíssimo». Esta verificação, como sabe, compete aos serviços do Ministério da Educação e à Inspecção-Geral do Ensino. Urge clarificar e verificar o tempo integral/regime de exclusividade, quer para prestígio das instituições quer para demonstrar a eficácia da administração. Só com mecanismos de fiscalização a funcionar em pleno é que valorizaremos a transparência dos actos públicos.
Ficámos esclarecidos quanto a estes processos e pensamos que contribuímos para o desfazer de equívocos em relação a instituições.
Finalmente, em sede de comissão, votámos favoravelmente o relatório, dentro de um espírito construtivo e responsável. Assim continuaremos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lavrador.

O Sr. Carlos Lavrador (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista revê-se nas conclusões do inquérito à Universidade Atlântica e a um conjunto de outras instituições, mas, fundamentalmente, à Universidade Atlântica, pelo que não pode deixar de manifestar o seu contentamento pelas conclusões de o referido inquérito apontarem, em substância, no sentido da transparência da correcção e da legalidade com que o processo foi conduzido, o que abona em função das entidades intervenientes e credibiliza a Universidade Atlântica, dando assim um contributo para a própria credibilização do ensino superior privado, que bem precisa de exemplos como este.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não podemos deixar de notar a incomodidade dos partidos da oposição, que transparece e é espelhada nas suas intervenções, quando, esquecendo a essência e o substancial da questão, que era uma suspeição de ilegalidades e, porventura, de favorecimentos, acabam por aparecer com meras argumentações de circunstância que, no essencial, nada dizem, remetendo-nos, digamos assim, para questões meramente de «mercearia». No essencial resulta, pois, que das suspeições levantadas não existia fundamento para tal.

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28 DE JUNHO DE 1997 3085

Como dissemos, isso contenta-nos, sobretudo porque reverte a favor do sistema do ensino superior, que necessita efectivamente de credibilização.
O Partido Socialista votará favoravelmente o projecto de resolução por entender que a actual tramitação, conducente ao reconhecimento de instituições do tipo da Universidade Atlântica, se processa com excessiva lentidão, dando azo, porventura, a situações de suspeição que não são de admitir.
Também é verdade que estamos de acordo com a implementação de um modelo eficaz de fiscalização do corpo docente para situações que sabemos existentes no presente e que não possam ter cabimento no futuro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, chegámos ao fim dos trabalhos de hoje.
A próxima reunião tem lugar dia 2 de Julho, quarta-feira, às 15 horas, com um período de antes da ordem do dia e um período da ordem do dia, no qual discutiremos, em conjunto, na generalidade, as propostas de lei n.ºs 111 e 115/VII.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 20 minutos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Agostinho Marques Moleiro.
António Alves Martinho.
António José Gavino Paixão.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Manuel Luís.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Porfírio Varges.
Maria da Luz Lameiro Beja Ferreira Rosinha.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.

Partido Social Democrata (PSD):

Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Domingos Dias Gomes.
Francisco Antunes da Silva.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Luís Carlos David Nobre.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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