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3396 I SÉRIE - NÚMERO 94

tos fundamentais e extraordinariamente pertinentes e profundos sobre esta afirmação de que a unidade e a igualdade se constróem na diferença.
Gostaria agora de referir outro ponto da proposta que temos perante nós: a necessidade de protecção legal contra quaisquer formas de discriminação.
Na verdade, quando se discrimina alguém está a atacar-se o seu direito ao livre desenvolvimento da personalidade. Creio que a parte final desta proposta de alteração ao n.º 1 do artigo 26.º é uma decorrência da afirmação do direito ao desenvolvimento livre da personalidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No que se refere ao n.º 3 proposto pelo PS e pelo PSD, sobre a protecção da chamada identidade genética, ele está relacionado com um longo trabalho em que participei, em vossa representação, aliás, com outros colegas, na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa. Este não é o momento certo para vos dar conta desse trabalho, mas prometo fazê-lo noutra ocasião, depois da revisão constitucional.
Ao longo de alguns anos, primeiro como membro da Assembleia, depois como Presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia daquela Assembleia Parlamentar, colaborei com o Comité Director para a Bioética, sob a superintendência do Comité de Ministros do Conselho da Europa. Do trabalho do Comité Director e dos sucessivos pareceres da Assembleia Parlamentar resultou um texto que foi aprovado pelo Comité de Ministros e aberto à assinatura dos Estados-Membros em 4 de Abril passado, em Oviedo, com a designação de Convenção sobre os Direitos do Homem e a Biomedicina.
Esta Convenção, e é isto que importa agora referir com brevidade, reconhece direitos essenciais da pessoa, novos direitos ou, se quiserem, ousaria dizer, novíssimos direitos. Entre eles, destaca-se a prevalência dos direitos da pessoa, do seu bem-estar e do seu interesse, sobre o interesse da sociedade e da ciência; o direito da pessoa humana à sua integridade, perante as aplicações da ciência biológica, medica ou qualquer outra; o princípio da não instrumentalização da pessoa; e a necessidade de um consentimento livre e esclarecido.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, é deste conjunto de princípios que resulta a protecção da pessoa e do genoma humano. Não vou abrir uma discussão sobre se é melhor ou pior referir a «identidade genética», como consta num projecto de Declaração Universal dos Direitos do Genoma Humano, que está a ser elaborado no âmbito da UNESCO, no qual, no seu artigo 1.º, se refere que o genoma humano é património comum da humanidade e, no artigo 2.º, se afirma que o genoma de cada indivíduo representa a sua identidade genética própria, acrescentando-se que cada pessoa tem direito ao respeito da sua dignidade e dos seus direitos, sejam quais forem as suas características genéticas.
O Conselho da Europa não adoptou aquela terminologia e o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida discordou no seu Parecer da utilização da expressão:«identidade genética».
Também tenho reservas em relação a ela. O que é importante é o princípio da protecção do genoma humano, da proibição de toda e qualquer discriminação em razão do património genético, da proibição de testes genéticos preditivos, com respeito pelo princípio de que as intervenções sobre o genoma humano só podem ser feitas por razões preventivas, de diagnóstico ou terapêuticas e sempre se não tiverem por objectivo a modificação do genoma da descendência, proibindo-se, sempre, como é óbvio, qualquer intervenção com outro fim, nomeadamente para a escolha do sexo. Tal intervenção seria extraordinariamente perigosa, arbitrária e discriminatória.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta matéria é vastíssima e representa, no fundo, o resumo de 10 anos de actividade de muitos intervenientes ao nível do Conselho da Europa. O que importa é que a nossa Constituição garanta a protecção das pessoas contra as discriminações, não apenas as clássicas, já contempladas no n.º 1 do artigo 26.º, mas também as baseadas na genética, no património genético e no conhecimento deste. Se fosse possível conhecer o património genético de cada cidadão - e sê-lo-á, um dia - e não fossem proibidas todas as discriminações, abrir-se-ia a porta a uma nova divisão, talvez muito mais grave do que a divisão em classes sociais, de que tanto se falou em tempos passados, que seria a divisão por características genéticas. Nesse caso em que as pessoas ficariam marcadas indelevelmente até à morte, diria mesmo até depois da morte, pelo seu património genético.
Entendo que toda e qualquer discriminação com base no património genético tem de ser totalmente proibida.
Além disso, a Constituição tem de conter um princípio que consagre a protecção, a garantia da pessoa perante a investigação científica e o desenvolvimento e utilização das tecnologias.
No fundo, é isto que se pretende com a nova Convenção que referi. Espero que Portugal, ao contrário do que tem acontecido com outras Convenções do Conselho da Europa, venha a ratificá-la rapidamente, pois o nosso país foi um dos primeiros a assiná-la, em Abril passado, facto com que me congratulo. Espero que seja possível ratificarmo-la, para consolidarmos e desenvolvermos o princípio fundamental que referi e que, estou certo, votaremos amanhã, por uma maioria certamente superior aos dois terços necessários.

(O Orador reviu.)

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Abordaremos o artigo 26.º em duas ópticas e em dois momentos separados: em primeiro lugar, a questão da consagração de um novo direito, o direito ao desenvolvimento da personalidade; em segundo lugar, as questões de bioética, genética e as demais, sobre as quais se pronunciará o Sr. Deputado Alberto Martins.
No que toca ao direito ao desenvolvimento da personalidade, gostaria de sublinhar que este novo direito tem, na nossa experiência constitucional, antecedentes, e interessantes antecedentes. Melhor do que ninguém, o Sr.Presidente sabe-o, uma vez que foi autor de propostas que procuraram fazer a primeira parte da caminhada neste sentido na revisão constitucional de 1989, sem êxito, nessa altura.
Esta norma, que tem origem, em parte, no projecto de revisão constitucional apresentado pelo Partido Socialista, é uma norma cujas fontes são públicas e confessas, e isso foi dito nas actas da CERC: por um lado, a Constituição espanhola de 1978, na parte em que protege a chamada «personalidade íntima»; por outro, a Lei Fundamental de Bona, na parte em que diz que todos têm direito ao livre desenvolvimento da sua personalidade, sempre que isso não lese os direitos dos demais e não atente contra a ordem constitucional ou contra a moral.

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