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Sexta-feira, 18 de Julho de 1997 I Série - Número 96

DIÁRIO da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 17 DE JULHO DE 1997

Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos
Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Maria Luísa Lourenço Ferreira
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 397/VII, da ratificação n.º 37/VII e de requerimentos.
Em declaração política, o Sr. Deputado Carlos Encarnação (PSD) falou sobre questões relativas à segurança e à droga, respondendo, no fim, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Manuel dos Santos e José Niza (PS).
O Sr. Deputado Rui Solheiro (PS) trouxe à colação problemas que afectam o distrito de Viana do Castelo e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Roleira Marinho e Antonino Antunes (PSD) e Augusto Boucinha e Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), tendo ainda dado explicações ao Sr. Deputado Carvalho Martins (PSD), que usara do direito de defesa da honra.
Foi aprovado o voto n.º 75/VII - De solidariedade para com os comerciantes, trabalhadores do comércio e Associação Naval 1.º de Maio atingidos pelo incêndio, ocorrido no dia 4 de Julho, na Figueira da Foz (PS, PSD, CDS-PP e PCP).
Ordem do dia. - Prosseguiu o debate da revisão constitucional (artigos 27.º, 51.º e 52.º, 54.º a 61.º e 63.º a 66.º).
Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Teresa Patrício Gouveia (PSD), Helena Santo (CDS-PP), Jorge Loção (PS), Luís Sá (PCP), Alberto Martins (PS), Calvão da Silva (PSD). João Corregedor da Fonseca (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Ferreira Ramos (CDS-PP), Barbosa de Melo e Francisco José Martins (PSD), Odete Santos (PCP), Barbosa de Oliveira (PS), Miguel Macedo (PSD), Moura e Silva (CDS-PP), José Magalhães e Strecht Ribeiro (PS), Pedro da Vinha Costa (PSD), Elisa Damião (PS). António Rodrigues e Antonino Antunes (PSD), Rui Namorado (PS), Lino de Carvalho (PCP), Filomena Bordalo (PSD), Nuno Correia da Silva e Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), João Rui de Almeida (PS), Jorge Roque Cunha (PSD), Alberto Marques (PS), Bernardino Soares (PCP), José Barradas (PS), Paulo Mendo, Lucília Ferra, Calvão da Silva e Francisco Torres (PSD).
Entretanto, a Câmara aprovara, na generalidade, na especialidade e em votação final global, as propostas de lei n.ºs 110/VII - Autoriza o Governo a proceder à revisão do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio - e 123/VII - Determina a aplicação da taxa reduzida do IVA a certas prestações de serviços relacionados com os resíduos sólidos urbanos e da taxa intermédia aos refrigerantes, sumos e néctares de frutos ou de produtos hortícolas. Após a aprovação do requerimento de avocação pelo Plenário, apresentado pelo PCP, da votação na especialidade do artigo 6.º do texto de substituição da proposta de lei n.º 92/VII (Estabelece o regime jurídico da concessão de garantias pessoais pelo Estado ou por outras pessoas colectivas de direito público), elaborado pela Comissão de Economia, Finanças e Plano - que foi aprovado -, a Câmara aprovou também, em votação final global, a proposta de lei referida.
Foram igualmente aprovados cinco pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, autorizando igual número de Deputados a deporem como testemunha, em tribunal.
No âmbito da revisão constitucional, foram votadas alterações relativas aos artigos 27.º, 51.º e 52.º e 54.º a 56.º.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 0 horas e 30 minutos do dia seguinte.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António Rui Esteves Solheiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobao.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Areias Fontes.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.

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António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Eugênio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugênio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Herminio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira. José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luisa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luisa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos. Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados; o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas, dos requerimentos e das respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projecto de lei n.º 397/VII - Revoga o Decreto-Lei n.º 257-A/96, de 31 de Dezembro (CDS-PP), que baixou à 5.ª Comissão, e a ratificação n.º 37/VII - Decreto-Lei n.º 160/97, de 25 de Junho (Aprova a orgânica do Centro Português de Fotografia, do Ministério da Cultura) (PCP).

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Foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: na reunião plenária de 9 de Julho p.p., ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e à Secretaria de Estado da Administração Pública, formulados pelo Sr. Deputado Barbosa de Oliveira; ao Ministério do Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados Ricardo Castanheira e José Calçada; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Costa Pereira; ao Ministério da Economia, formulados pelos Srs. Deputados Manuel Alves Oliveira e António Filipe; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pela Sr
Deputada Manuela Aguiar; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado.
Nas reuniões plenárias de 10 e 11 de Julho p.p., ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelos Srs. Deputados Soares Gomes, Hermínio Loureiro e António Filipe; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Castro de Almeida; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Paulo Pereira Coelho; ao Ministério do Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados Cruz Oliveira e Isabel Castro; ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Rodeia Machado; ao Sr. Ministro Adjunto, formulado pelo Sr. Deputado António Rodrigues.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, lembro que o período de antes da ordem do dia de hoje tem a duração rigorosa de uma hora.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Descansem, porque não vou. falar hoje da colecta mínima, não vou falar hoje do «totonegócio», não vou falar hoje do Plano Mateus, não vou falar hoje do «autonegócio», não vou falar hoje de Vizela. Não vou repetir, hoje e aqui, que o Governo não governa, que o Governo quer aumentar os impostos, que passa uma esponja sobre as grandes dívidas. Sobre isto estão todos já suficientemente informados.

Protestos do PS.

Vou evitar falar hoje dos erros e das tentativas do Governo.
É certo que o Sr. Primeiro-Ministro periodicamente surpreende os portugueses com as suas confissões amargas e os seus golpes de arrependimento.
Há, aliás, três tempos crónicos nos tempos de decisão do Sr. Primeiro-Ministro: o da promessa, o da tentativa, o do erro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Entretanto, e enquanto em relação a qualquer assunto a conclusão não chega, o País será, na versão defendida por S. Ex.ª, um campo de manobras.

As medidas governativas são servidas para degustação do povo. O povo reproduz no laboratório das sondagens as suas preferências.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ah, filósofo!

O Orador: - A acção do Governo é, na versão ideal do Sr. Primeiro-Ministro, uma sucessão de exercícios experimentais. .
Os portugueses, atentos, esperam. E, como num jogo de sombras, o Sr. Primeiro-Ministro parece querer surpreendê-los tanto quanto estes querem ser surpreendidos.
Tudo se passa entre o perdão (das dívidas, entenda-se) e as desculpas (dos enganos).
O «totonegócio» não estava «maduro»; procura-se o cidadão ou o computador maldito que enviou as cartas da colecta mínima;...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... põem-se alvíssaras para encontrar as empresas recuperadas à la Mateus; o negócio corri a Grão Pará é ainda, apenas e só, um guião.
Os portugueses começam a ansiar pelo momento em que o Sr. Primeiro-Ministro não erre. Nunca terão um momento igual na vida. Mesmo que seja breve, singular e único, é uma vitória sobre o impossível.
Seguro das suas incertezas, o Sr. Eng.º António Guterres anunciou há alguns anos, aos portugueses, um tempo novo.
A segurança, dizia, é a primeira preocupação. A droga, um combate total.
Foi acreditado. Sempre que falava nestes temas, o Sr. Primeiro-Ministro adoptava uma postura ascética: os olhos em alvo, um rictus dramático na expressão, a gravidade na voz.
Pelo seu discurso passavam as experiências amargas da família apanhada pelo esticão, dos vizinhos temerosos, dos confidentes inseguros. Pelos seus olhos e pelos de quem ouvia perpassavam as visões dos toxicodependentes alienados, das famílias destruídas, dos lares desfeitos.
Conseguiu o Sr. Primeiro-Ministro que muitos dos portugueses acreditassem que o mundo novo estava ali ao virar da esquina, na terra do socialismo atingido.
Bandos de polícias invadiriam alegremente as ruas, confraternizando com a população e os criminosos, milhares de casas nasceriam dos escombros, gente sem vício e povo sem crime repovoariam o País. Portugal seria, de um momento para o outro, uma terra diferente. A criminalidade diminuiria, porque o Governo era virtuoso e bom. A droga desistia, porque o Governo era atento. Uma solução fácil, mais dinheiro. Uma solução irrecusável, mais gente.
Da cartola, pensava-se, não parariam de sair os, coelhos.
Mas, entretanto,...
É certo que as prisões estavam cheias. E estão! Onde param as novas prisões? Onde param as separações dos tipos de criminosos ou dos detidos preventivamente dos demais? Porque será que todos descobriram que se pretendia esvazia-las primeiro e repensa-las depois?
Os tribunais e a justiça eram lentos. E são! Onde se criaram mais? Como se acelerou o processo penal? Que formalidades se pouparam?
Os polícias eram poucos. E continuam! O que foi feito para acabar com a sobrecarga administrativa em que se ocupam? Só nos cinco primeiros meses deste ano, e apenas em relação à PSP, 4073 agentes perdidos em actos

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processuais. O que foi conseguido em eficiência? O que se reorganizou? Por que se não aprova o diploma sobre os serviços aos tribunais que o PSD há cerca de um ano aqui apresentou?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Os níveis de criminalidade eram preocupantes, mas desciam. E hoje? A polícia e sobretudo os criminosos não prestaram atenção ao Sr. Primeiro-Ministro e aos seus desejos. A lâmpada de Aladino não funcionou. A criminalidade grave aumentou, tal como nós víamos e prevíamos, como os Srs. Ministros calavam e negavam. Paradoxo dos paradoxos. Há mais polícias nas ruas? Mas onde?! O furto ou o roubo por esticão subiu 62%!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Uma vergonha!

O Orador: - Os ladrões serão mais espertos, mais organizados, vigiam o movimento dos polícias, actuam quando eles estão de costas ou nas reuniões para o sindicato?
E os crimes violentos, porque aumentam também? S ó todos crimes passionais e sempre ocasionais? Ou é assim porque a paixão ser tornou moda? E os gangs organizados existem em número e importância maior só porque a lei lhes dá maior atenção?
Os bairros degradados são uma das principais fontes de crime. Estão identificados e inventariados. Mas não conseguiram ainda o Sr. Primeiro-Ministro e este Governo, depois de tanto tempo, encontrar um modelo que o evitasse e o combatesse. O que espera o Sr. Primeiro-Ministro para destacar a polícia de intervenção para lá, em permanência?
É que, neste universo, os cidadãos honestos vivem em permanente sobressalto; não funcionam as notificações; não há prova testemunhal, por medo; não há queixa, com receio de retaliação; não há tribunais, porque não se cumprem as sentenças; há armas, porque não há segurança, e a pena de Talião é a lei.

Aplausos do PSD.

Há, ali, Sr. Presidente e Srs. Deputados, um simulacro de Estado de direito.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não são nada boas as notícias sobre a evolução da criminalidade.
Todos os que acreditavam dormir mais descansados, passear nas ruas mais à vontade, ignorar os assaltantes, encontrar o carro quando saíam de casa, sentem-se frustrados e iludidos.
Pelos vistos, também aqui, a constatação é a mesma: alguém lhes prometeu o que não podia dar.
Mas o Sr. Primeiro-Ministro ainda fez sua primeira prioridade a luta contra a droga. Encheu páginas e páginas de medidas que ou já se praticavam ou eram a continuação óbvia de outras. Desenhou uma grande campanha promocional que se esgotou num só dia. Todavia, a criminalidade ligada à droga aumentou, no último ano, 33%. Todavia, o número de mortes por overdose aumentou, também, 35%. Todavia, a droga expandiu-se por todo o território nacional a uma enorme velocidade.
Ao mesmo tempo, no Observatório Vida, sucedem-se as demissões por alegada falta de condições de trabalho. Os dados do Projecto Vida são um panorama negro. O coordenador nacional pré-anuncia a sua saída.

A opinião pública continua, entretanto, cada vez mais confusa e baralhada. Uns defendem a despenalização total; outros, a parcial; outros, a administração oficial da droga; outros ainda, a substituição por sucedâneos. Mas a maioria dos portugueses sente que a luta contra o tráfico e a prevenção e evicção do consumo não podem parar, sob pena de capitulação e entrega.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Estamos, de facto, num impasse.
Sentimos que o Governo perdeu o discurso e se abandona à controvérsia. Num acto de fraqueza sobranceira, o partido que o apoia recusa as iniciativas legislativas que o PSD apresenta. O Governo promete e não cumpre as alternativas que anuncia. As lanchas rápidas e os novos postos de fiscalização da costa continuam à espera de vez. As estruturas que propusemos para a recuperação dos toxicodependentes nas cadeias foram substituídas por um mero despacho que prevê a colaboração de circunstância.
Assim, não! É urgente que o Governo nos diga se, no seu entender, o problema passa por soluções legislativas ou por soluções administrativas. '
No primeiro caso, continuamos dispostos a colaborar, mas é conveniente que o partido apoiante do Governo aprove e não impeça as nossas iniciativas.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - No segundo, tratando-se de competências próprias do Governo, é urgente saber se é necessário mais recursos ou se é preciso distribuir de maneira diferente e gerir melhor os existentes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Queremos que não fique sombra de dúvida que consideramos o flagelo da droga como uma grande preocupação nacional, um grande combate que nos deve unir a todos.
Esperamos que o Governo nos diga, com antecedência bastante, o que pretende para o próximo Orçamento. Em função daquela preocupação e do seu significado, estamos dispostos a formular propostas, a debatê-las em conjunto com o Governo, eventualmente a apoiar outras mais.
Para que fique bem claro, estamos disponíveis porque o País precisa e é nosso dever moral. Não se queira transformar esta matéria em campo de batalha ou em espectáculo mediatizado. Ninguém pode brincar com a tranquilidade dos portugueses ou com o seu futuro.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Manuel dos Santos e José Niza.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, não vou cometer a maldade de dizer, tal como alguns colegas 'meus de bancada afirmavam aqui em voz off, que, normalmente, quando o PSD nada tem para dizer, encarrega V: Ex.ª de subir à tribuna para fazer um discurso.

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Aliás, foi com grande expectativa que acorri ao Plenário, quando ouvi o Sr. Deputado referir vários temas dizendo, curiosamente, que não ia falar deles. Dizer que não se fala das coisas é uma forma nova, redundante, de falar delas.
Como acabou por perder pouco tempo com coisas importantes e que, de algum modo, correspondiam ao desafio que há uns dias lancei à sua bancada para discutirmos a situação económica do País e a verdadeira reforma fiscal, e não coisas perfeitamente secundárias relativas tanto a uma como a outra, aproveito esta oportunidade para o estimular, embora o tempo seja muito pouco, a dizer-nos algo mais.
Caso contrário, terei de concluir que a sua referência, pela não referência, à situação económica convalida exactamente a bondade dessa situação económica, tal como é apreciada, por exemplo, pelo Banco de Portugal, que, como sabe, tem à frente um governador da família ideológica a que o Sr. Deputado pertence. Terei de concluir que V. Ex.ª manifesta o seu agrado e a sua satisfação, por exemplo, por mais uma vez ter sido batido o nível histórico da inflação, pois todos os meses o vamos batendo sucessivamente. Terei de concluir que V. Ex.ª está muito agradado com o facto de, finalmente, nos últimos dois anos, o crescimento da economia portuguesa ser manifestamente superior ao crescimento médio da Europa. Terei de concluir que V. Ex.ª está muito satisfeito, convalida e verifica que a promessa feita pelo Governo, nomeadamente pelo Primeiro-Ministro, de não aumentar os impostos aí está concretizada e assimilada. Terei de concluir que V. Ex.ª se vangloria e satisfaz com o facto de haver sinais de diminuição do desemprego. Terei de concluir, finalmente, que V. Ex.ª está, na realidade, satisfeito face à posição que Portugal tem no contexto europeu, onde é, como sabe, um dos países que mais facilmente vai cumprir os critérios de convergência nominal, sem qualquer engenharia financeira, sem despedimentos nem diminuição de salários na função pública, sem qualquer dessas técnicas que foram utilizadas em países mais desenvolvidos.
Se assim for, e assim é, seguramente, o Sr. Deputado não vai com certeza desmentir tudo aquilo que referi, aliás, na linha do discurso que fez, pelo que bem-vinda é a sua observação e não posso, se for assim, repito, concordar corri os camaradas que me dizem que, quando nada há para dizer, é V. Ex.ª quem sobre à tribuna.
Se foi para dizer isto, ainda que na forma enfática de não o dizer, realmente, os meus camaradas não tinham razão. Se assim não é, os meus camaradas tinham toda a razão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo ainda outro orador inscrito para pedir esclarecimentos, deseja responder já ou no fim?

O Sr. Carlos Encarnação (PSD):Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): .- Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, vou responder-lhe imediatamente porque, de facto, precisa de uma resposta urgente.

Tenho apenas de lamentar o período, embora breve, em que o Sr. Deputado Manuel dos Santos não esteve na Assembleia e esteve no Governo, porque nos privou das suas intervenções.

Risos do PSD.

Mas eu sabia que V. Ex.ª voltaria, e rapidamente, como o filho pródigo voltou à casa paterna. Está aí, e muito bem, e não quero tirar-lhe o lugar, não o pense.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Não consegue!

O Orador: - Se é para nada dizer, basta V. Ex.ª, não preciso de falar.

Aplausos do PSD.

Porque, em boa verdade, sobre o tema essencial da minha intervenção - a segurança e a droga, um tema sério, profundo e importante para o País -, V. Ex.ª respondeu com índices macro-económicos. Ora, eu esperava que V. Ex.ª aceitasse o meu convite, que, ao mesmo tempo, era um desafio sério em relação a esta matéria. Mas já vi que o desafio sério deve ser aceite pelo meu querido amigo que está ao seu lado, o Deputado José Niza, enquanto que a parte não séria da intervenção da sua bancada lhe pertenceu.
Então, o Sr. Deputado entende que este dois anos, durante os quais, diz o senhor, esses índices foram extraordinários, dependem só desses dois anos?!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Fundamentalmente desses dois anos!

O Orador: - O senhor, que acabou de citar o relatório do Banco de Portugal, ignorou a sua parte mais importante, que diz que de 1985 a 1995 foi o período de ouro da economia portuguesa, só comparável aos períodos dos anos 60?! Sr. Deputado, é o Banco de Portugal que diz isto, não é o senhor. Também não esperava que fosse o senhor a dizê-lo, como é evidente, mas, ao menos, poderia ter feito uma breve referência, dizendo assim: «de facto, em relação à segurança e à droga, isto está uma vergonha, é verdade.» O senhor dizia isto, e ficava-lhe bem, porque reconhecia o que está a acontecer. Dizia: «é verdade, em relação a isso, apoio o que o senhor acabou de nos dizer, vamos fazer aqui um esforço conjunto, vamos fazer disto uma grande tarefa nacional»! O Sr. Deputado concordava comigo e, depois, falava então sobre a economia e dizia assim: «De facto, a economia não vai mal!...

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - ... Mas, com mil diabos, tivemos uma herança importantíssima. Os senhores trabalharam bastante para que a economia estivesse como está. Nós, sem os vossos governos, nunca cumpriríamos as metas de convergência,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... nós, sem os vossos governos, nunca estaríamos na situação em estamos».

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Contrarie os meus argumentos! Deixe-se de retórica!

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O Orador: - Isto até lhe ficava bem! Porque, se não, o Sr. Deputado parecia um homem «descorrente» que só agora, nestes dois últimos anos, se lembrou que existe vida, que existe Portugal, que existe economia e que existe progresso. Ficava-lhe bem e, assim, a sua intervenção ficou-lhe muito mal!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Niza.

O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, quero dizer ao meu querido amigo e Deputado Carlos Encarnação que não se deve «brincar» com coisas sérias. A questão da droga é uma coisa demasiado séria para ser utilizada, digamos, como arma de arremesso.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

.O Orador: - Há, na Assembleia, pessoas que se preocupam com isso, a começar pelo seu Presidente, e também o Sr. Presidente da República, Dr. Jorge Sampaio, tem tomado iniciativas muito louváveis e muito sensatas nessa matéria. Penso que esta deve ser uma matéria pacífica, para que os Deputados de todas as bancadas possam contribuir, em conjunto, para melhores soluções.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Agora, quero dizer-lhe ó seguinte: o Sr. Deputado fez aqui um discurso boomerang e se continua a fazer discursos desses tem de arranjar um escudo protector, até porque, com certeza, sabe onde é que eles se encontram no Ministério da Administração Interna.
O Sr. Deputado citou aqui números de um relatório, que foi ontem divulgado e que já li, referentes a 1995. Sublinho, para toda a gente, inclusivamente para os senhores jornalistas, que os dados desse relatório são referentes a 1995 e recordo-me disso porque até às eleições de 1995 fui funcionário do Gabinete de Combate à Droga, o Sr. Deputado foi Secretário de Estado da Administração Interna e à sua direita está aquele que foi ministro da tutela de toda essa área, que é hoje tutelada pelo Sr. Dr. Jorge Coelho.
Portanto, os números que o Sr. Deputado aqui trouxe são, digamos, 10 duodécimos da vossa responsabilidade, porque eu só fui eleito em 5 de Outubro, só passei a ser Deputado em 27 de Outubro e o Governo, que eu saiba, tomou posse logo a seguir. Por isso a vossa responsabilidade nessa matéria é de 10 ou 11 duodécimos.
A cada um aquilo que merece e, logicamente, não há varinhas mágicas, infelizmente, pelo que nem o vosso governo, anterior, nem o nosso, actual, têm uma solução imediata e definitiva para o problema da droga.
Portanto, Sr. Deputado, para aqueles que não conhecem o relatório que ontem foi divulgado e, sobretudo, o ano a que se refere, aqui fica sublinhado, com muita veemência, se se querem imputar responsabilidades políticas, que esses dados são do governo do PSD e não do nosso.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Niza, é verdade que tive a honra e o privilégio de colaborar com V. Ex.ª nas suas anteriores funções no combate à droga, que sempre troquei consigo várias impressões sobre estas matérias e que sempre estivemos de acordo em várias coisas. Só estranhei que V. Ex.ª, estando de acordo comigo em relação a uma medida que propusemos quanto à droga nas cadeias, acabasse por lutar contra ela, porque aí está a contradição entre aquilo que V. Ex.ª afirma e aquilo que V. Ex.ª faz.
Nunca deixámos de estar abertos às iniciativas de todos em relação ao combate à droga. Entendemos sempre que o combate à droga é um combate nacional, não é um combate de um partido, não é um combate de um governo, não pode ser utilizado como arma eleitoral. É esta a nossa diferença! Quando estamos na oposição ou no governo, assumimos a responsabilidade de colaborar nisto.
Se trouxemos aqui estes dados, Sr. Deputado, foi para todos os portugueses terem consciência de que tudo vai muito mal no combate à droga, de que tudo vai cada vez pior.
O que o Sr. Deputado tem hoje, aqui, perante si são as demissões em série no Observatório Vida e as que se anunciam no Projecto Vida. Isto significa, Sr: Deputado, que as coisas não vão bem, que as coisas não estão melhor, que não há soluções, que apenas há discussões teóricas sobre o problema e nós queremos medidas práticas.
Digam-nos o que precisam! Se querem novas leis, estamos aqui para colaborar convosco para as formular e para as aprovar! Não desprezem aquelas que são as nossas iniciativas! Se querem soluções administrativas e se compete ao Governo tomá-las, contem como o nosso apoio! É assim que fazemos política, Sr. Deputado. e não de outra maneira!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para tratar de assuntos de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Solheiro.

O Sr. Rui Solheiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O distrito de Viana do Castelo tem no seu património natural, cultural e humano as suas principais potencial idades.
É confrangedor verificar que uma região com tantos potenciais se encontra entre uma das menos desenvolvidas do País e a menos desenvolvida do litoral português.
Foi esta a herança de 10 anos de poder absoluto do PSD, que, apesar de dispor de meios excepcionais - QCA I e parte do QCA II -, abandonou o Alto Minho, deixando-o na cauda das regiões da Europa.
A constatação deste atraso em relação às outras regiões impõe a tomada de medidas de excepção que permitam recuperar o tempo e as oportunidades perdidas.
Na minha modesta opinião, o Governo deve considerar o distrito de Viana do Castelo como área de intervenção especial.
Na ausência das regiões administrativas, deve ser o Governo, em diálogo com as associações de municípios, a definir três ou quatro áreas de intervenção prioritária, procurando eliminar estrangulamentos é tirar o maior valor acrescentado das potencialidades locais.
Permitam-me indicar quatro sectores que me parecem justificar uma acção concertada entre poder central e local e outros actores públicos ou privados, visando uma

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intervenção imediata: acessibilidades, educação, ambiente e saúde.
A região do Alto Minho só pode aspirar ao desenvolvimento e ao progresso se, a curto prazo, conseguir uma rede de acessos indispensável à valorização da região que, por sua vez, crie condições que possibilitem na captação de investimentos e, ao criarem riqueza, ajudem a fixar a população, procurando inverter a actual regressão demográfica.

Importa referir o esforço que o actual Governo está a fazer para tentar recuperar os 10 anos perdidos de governação PSD.

A auto-estrada Braga/Valença está em construção e em grande ritmo de execução. No final do corrente mês de Julho será aberto um troço até Anais, em Novembro, até Ponte de Lima e, em meados de 1998, estará concluída até Valença.

É uma via estruturante fundamental, que vai possibilitar um aprofundamento das relações económicas, sociais e culturais com a Galiza, indispensável ao desenvolvimento da grande Região Transfronteiriça Norte de Portugal/ Galiza, com as inerentes consequências positivas que daí advirão para a nossa sub-região.

Quanto à IC1 Porto/Viana do Castelo, já com vários troços abertos ao trânsito e a totalidade da obra em curso, prevê-se a sua conclusão para finais de 1998. Trata-se de uma obra importante para o distrito e vital para Viana do Castelo.

As pontes internacionais Peso/Arbo, em Melgaço, já iniciada, e Vila Nova de Cerveira/Goyan, aprovada na Comissão Internacional de Limites, são mais dois bons exemplos de como o actual Governo está a olhar para o Alto Minho com mais e melhor atenção.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No entanto, situação de atraso que herdámos obriga a um esforço ainda maior, por parte da administração central e, por conseguinte, não posso deixar de chamar a atenção para a importância do avanço urgente de alguns investimentos, sob pena de se comprometer o desenvolvimento harmonioso do nosso distrito.

O IP9 terá de avançar a curto prazo ou correr-se-á o risco de Viana do Castelo perder margem de manobra em relação a Braga, mercê do traçado, de auto-estrada, assistindo-se, em consequência, à desestruturação interna do próprio distrito.

E urgente, ainda, o avanço do IC1 até Vila Praia de Âncora, fundamental para o atravessamento de Viana do Castelo e vital para o desenvolvimento do litoral do Vale do Minho.

Importa também sublinhar a importância da melhoria do eixo ferroviário Porto/Viana/Valença/Vigo, que, servindo para aumentar a atractividade das zonas de implantação industrial do Vale do Minho e do Vale do Lima, permitirá um melhor aproveitamento do porto de Viana do Castelo.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A educação e formação, como aposta na qualificação pessoal e profissional das pessoas, é o melhor investimento no futuro. Por isso, entendo que o Alto Minho, neste processo de desenvolvimento, tem de apostar mais forte na educação e na formação e, dentro deste âmbito, deve dar uma atenção especial à formação profissional e ao ensino superior.

Na formação profissional deve considerar-se primeira prioridade a consolidação das escolas profissionais existentes, apoiando a criação de infra-estruturas, por forma a torná-las instrumento sólido de formação da nossa juventude em áreas com saída profissional na região.
A descentralização do ensino superior pode ser uma das molas mais importantes para alterar este modelo de desenvolvimento desequilibrado que o nosso país tem seguido. Por isso, entendo que o distrito de Viana do Castelo deve ser das regiões do País que mais necessita de apostar no reforço do ensino superior.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Existem, hoje, condições para avançar
com duas escolas superiores no Alto Minho: uma no Vale do Lima e outra no Vale do Minho. O Ministério da Educação já manifestou abertura para esta questão, impondo-se agora avançar com soluções concretas, no que respeita à localização e cursos a ministrar.
A deslocação do ensino superior para as regiões mais periféricas permitirá dar um novo dinamismo cultural, social e económico às regiões mais desfavorecidas.


Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O distrito de
Viana do Castelo tem na qualidade ambiental uma das suas principais riquezas que urge preservar. Apraz-me registar o esforço que este Governo está a fazer no sentido da defesa do ambiente na nossa região. Dou dois exemplos que me parecem ser suficientemente ilustrativos: a recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos e o Parque Nacional da Peneda-Gerês. Como é do conhecimento público, as Associações de Municípios dos Vales do Minho e Lima tinham projectos para a construção de aterros sanitários para cobrir toda a área do Alto Minho: contudo, o governo PSD nunca
viabilizou o financiamento destes investimentos. 

O Governo PS assumiu o financiamento dos dois aterros, com 7,5 milhões de contos, garantindo o
encerramento e recuperação de todas as lixeiras existentes no distrito de Viana do Castelo.
No ano corrente, foi assinado um protocolo envolvendo as câmaras municipais da área do Parque, o próprio Parque Nacional de Peneda-Gerês e o Instituto de Conservação
da Natureza (ICN), no montante de 2,5 milhões de contos, o que possibilitou o avanço de obras que estão a decorrer visando a preservação ambiental e a melhoria da qualidade de vida da população da área do único parque nacional existente em Portugal.
Também nesta temática ambiental não posso deixar de fazer um alerta. Refiro-me à hipotética construção da barragem de Sela, no rio Minho. A este propósito, existe um grande consenso entre as instituições das duas margens do rio - autarquias, associações profissionais e ambientalistas - na oposição à construção da barragem.
Há o reconhecimento unânime de que a construção da barragem destruirá a fauna e a flora do rio, submergindo um grande património cultural e prejudicando a qualidade do vinho, essencialmente o vinho alvarinho, pondo em causa as águas minerais de Peso, Melgaço, Valadares e Monção. Enfim, o impacte ambiental é a tantos níveis negativo que ninguém entenderia que se insistisse na sua
construção.
Na minha opinião, é paradoxal que o Governo proponha o rio Minho à União Europeia para integrar a Rede Natura 2000 e, paralelamente, avance com um processo que leva à construção de uma barragem no seu troço internacional.
Para todo este processo, só vejo uma saída coerente: renegociar o acordo com Espanha e pôr definitivamente de parte a hipótese de construção da barragem de Sela,

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defendendo, assim, uma das nossas principais riquezas naturais, o rio Minho.
Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: Tem o distrito de Viana do Castelo enormes problemas nos diversos sectores, como tenho vindo a referir, mas, neste momento, o sector de maior debilidade e que mais preocupa a população é, indiscutivelmente, a saúde.
Reconhecendo embora o que está a ser feito neste domínio, como a construção de novos centros de saúde em Caminha e Paredes de Coura, o alargamento do período de consultas nos centros de saúde concelhios, o reforço do equipamento dos centros de saúde e a melhor articulação entre os hospitais da sub-região e os centros de saúde concelhios, o aumento de procura de serviços de saúde e a diminuição de pessoal médico levou algumas unidades do distrito à situação de total ruptura. Impõe-se por isso, com urgência, tomar medidas.
O Hospital Distrital de Viana do Castelo, que viu recentemente satisfeita uma velha aspiração de longos anos - a aprovação do seu quadro de pessoal -, exige agora a abertura de concursos para preenchimento desse quadro, de modo a possibilitar o funcionamento das diversas valências.
Ainda neste hospital distrital, torna-se urgente alargar e melhorar os serviços de urgência, pois, dispondo apenas de uma OBS com 9 camas, necessita de mais uma OBS e também de um bloco operatório, para que as urgências tenham a operacionalidade desejada.
No que respeita aos centros de saúde concelhios, o funcionamento dos SAP atinge proporções verdadeiramente alarmantes.
Vou dar o exemplo de três centros de saúde concelhios que constituem os casos mais paradigmáticos: Melgaço, Monção e Paredes de Coara.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em Melgaço, num, quadro de 13 médicos, apenas 4 lugares estão preenchidos, 30,8% da sua capacidade; em Monção, num quadro de 16 médicos, apenas 9 lugares estão preenchidos, numa percentagem de 56,3%; em Paredes de Coura, num quadro de 12 médicos, apenas 5 lugares estão preenchidos, o que corresponde a 41,7% da sua capacidade.
Esta situação leva a que os serviços de atendimento permanente não possam funcionar nem todos os dias nem 24 horas por dia, com o agravamento de o período de férias dos médicos coincidir com o aumento de população e a consequente maior procura dos serviços de saúde, provocando situações verdadeiramente dramáticas e geradoras de graves conflitos.
Compreendendo que esta situação resulta de erros acumulados ao longo dos anos e que medidas estruturais para alterar este estado de coisas só darão resultados a prazo, nomeadamente a alteração de numeras clausus e os incentivos à deslocação dos médicos para a periferia, não tenho dúvidas de que a população desta região não pode continuar a aguardar, por um longo período de tempo, que estas e outras medidas dêem resultados. É urgente tomar medidas com efeitos imediatos.
Sabemos que os concursos nacionais para preenchimento dos lugares de quadros de alguns centros de saúde do Alto Minho ficam desertos.
Estamos situados numa região com 100 km de fronteira com a Galiza, onde existem aglomerados populacionais lembro que existe mais população nestes 100 km do que nos restantes 800 km de fronteira de Portugal com a Espanha -, facilitando a comunicação em termos sociais, culturais e económicos entre as populações dos dois países.

Ora, existindo desemprego na classe médica em Espanha e não havendo praticamente qualquer problema de comunicação linguística com os médicos-espanhóis, nem existindo nenhum problema de comunicação com os médicos galegos, que em medicina privada são já um recurso para a nossa população, considero necessário e urgente que o Ministério da Saúde abra as portas aos médicos espanhóis para preenchimento das vagas que Ficam desertas nos concursos nacionais.
Julgo ser esta a única solução para pôr cobro à situação de desespero em que se encontram as populações daqueles concelhos do Alto Minho.
Aproveito esta oportunidade para, em total respeito pelo reforço do ensino superior na nossa região e apostando na formação em áreas que vão de encontro às necessidades da sociedade, propor a abertura de um curso de medicina em Viana do Castelo.

O Sr. Presidente: - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Procurei trazer ao vosso conhecimento algumas das principais preocupações das populações do Alto Minho.
Sinceramente espero que a solidariedade nacional seja um facto e que os problemas mais gritantes do distrito de Viana do Castelo contem com o vosso apoio para a sua resolução.
Temos grandes estrangulamentos mas também enormes potencialidades. Acredito num futuro melhor para o Alto Minho.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra a quem ma solicita para pedir esclarecimentos, quero informar que se encontram a assistir à sessão, mais uma vez, um grupo de cidadãos surdos-mudos e um numeroso grupo de autarcas e cidadãos do concelho de Fafe. Para eles peço uma saudação muito calorosa.

Aplausos gerais, de pé.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Roleira Marinho.

O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ruí Solheiro, de novo V. Ex.ª nos traz aqui a herança pesada do cavaquismo, esquecendo a mudança radical que se operou no distrito de Viana do Castelo quanto a escolas, centros de saúde e estradas, embora falte a conclusão do IC1, que o actual Governo, apesar de inaugurar pequenos troços, passo a passo, vai continuando a fazer deslizar.
Quanto à auto-estrada, Sr. Deputado, são milhões com que os senhores vêm sucessivamente abanando, vêm vendendo demagogia. Mas não esqueça, Sr. Deputado, que essa auto-estrada foi completamente lançada pelo governo do PSD e os prazos para a sua conclusão não foram alterados com o Governo socialista. As pontes fundamentais estavam construídas e as duas de que V. Ex.ª e fala foram resultado de negociações penosas e longas com o governo de Espanha e foi o governo do PSD que deixou essas bases para que hoje tal seja possível.
No que toca à saúde, Sr. Deputado, para além do diálogo permanente de que os senhores vêm falando, nada

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de substancial está alterado e a falta de médicos continua a ser uma praga no distrito de Viana do Castelo.
No que diz respeito ao resto, estamos consigo. Vamos concluir o IC1; vamos concluir a auto-estrada; vamos apostar na educação e na formação. Mas, então, Sr. Deputado, para quando o pleno funcionamento do centro de formação profissional, que também ficou ao dispor da população do distrito e que hoje continua «às moscas»?
O ensino superior politécnico deve merecer o seu aprofundamento, mas foi o PSD, foram os governos do PSD que levaram o ensino superior a Viana do Castelo. Vamos continuar a apostar no Instituto Politécnico de Viana do Castelo, mas agora vamos exigir do novo Governo um outro patamar do ensino superior, o ensino universitário, no distrito de Viana do Castelo. Para quando? Vamos dialogar. Não estamos aqui a exigir mas a dizer que é necessário, que contem connosco para esta caminhada conjunta.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, faz agora um ano que o senhor deixou aqui um alerta, um clamor profundo sobre o reforço do PIDDAC para 1997 destinado ao distrito de Viana do Castelo, que passou a ser metade daquilo que era anteriormente. Sr. Deputado Rui Solheiro, espero que o alerta que aqui deixou, que é também o de todos os Deputados desta Câmara, seja hoje ouvido pelo Partido Socialista e pelo Governo, no sentido de o PIDDAC para 1998 destinado ao distrito de Viana do Castelo ser reforçado.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rui Solheiro, tem ainda mais três Deputados inscritos para pedir esclarecimentos. Como o tempo já escasseia, permito-me sugerir que responda dois a dois.

O Sr. Rui Solheiro (PS): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado.
Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Antonino Antunes.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Solheiro, mais uma vez o ouvi com muito agrado, e é a segunda vez que o ouço falar nesta Câmara.
Recordo que há um ano V. Ex.ª disse sensivelmente o mesmo que hoje aqui reproduziu. Não vou repetir o que, com muita pertinência, foi já dito pelo meu ilustre colega Deputado Roleira Marinho. De qualquer forma apenas quero fazer-lhe uma observação e uma pergunta.
O Sr. Deputado referiu que a região do Alto Minho é uma das mais pobres ou a mais pobre do litoral português. É uma afirmação que aqui temos reproduzido por várias vezes. Mas V. Ex.ª, mais uma vez, veio fazer alusão aos 10 anos de governo do PSD.
Sr. Deputado, faço-lhe apenas esta pergunta: onde é que esteve o PS do distrito de Viana do Castelo durante esses 10 anos? O que fez o PS do distrito de Viana do Castelo durante esses anos? Mas, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que teria sido bom que nestes dois anos o Governo do PS tivesse feito pelo distrito de Viana do Castelo ao menos aquilo, que não foi pouco, que durante o período dos governos de Cavaco Silva foi feito, durante o qual V. Ex.ª e todos os alto-minhotos, com certeza, ficaram, apesar de tudo, mal habituados.
Pergunto-lhe também, Sr. Deputado: onde é que está o PS do distrito de Viana do Castelo? Que críticas tem feito esse PS neste dois anos de governação, durante os quais o distrito de Viana do Castelo, a região do Alto Minho, tem, na realidade, ficado sucessivamente para trás? Não vou aqui falar de novo no RIME, no PIDDAC, porque tudo isto é sobejamente conhecido.
Tenho efectivamente pena, Sr. Deputado, que, na realidade, V. Ex.ª venha aqui de ano a ano, no curto período que temos o prazer de o ver nesta Assembleia. repetir este discurso e que o Governo o não ouça. Mas espero firmemente que durante os 10 meses que passa na região do Alto Minho V. Ex.ª se lembre de fazer com que o PS, em conjugação connosco, Deputados na Assembleia. «puxe esta carruagem para a frente», por forma a fazer-se realmente algo mais por Viana do Castelo.
Sr. Deputado, por que é que V. Ex.ª, tendo-se referido às infra-estruturas viárias, não falou na suspensão do ICl entre Vila Praia de Âncora e Valença? Acredito que este troço não o afecte muito, mas afecta consideravelmente o distrito de Viana do Castelo, nomeadamente Caminha e Vila Nova de Cerveira, acima de tudo. Não me admiro que V. Ex.ª ainda se sirva da tão famosa estrada que o seu Governo não teria feito mas que ficou feita, a que liga Monção a Melgaço, e acredito que V. Ex.ª, para chegar a Melgaço, não vá por Viana do Castelo mas use o trajecto Braga/Ponte de Lima, razão por que V. Ex.ª está tão preocupado com a conclusão da Ale não manifesta assim tanta preocupação com a conclusão do IC1 a norte de Viana do Castelo.

(O Orador reviu.)

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Solheiro.

O Sr. Rui Solheiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados Roleira Marinho e Antonino Antunes, pensei, sinceramente, que hoje ia ouvi-los, pelo menos, reconhecer que são os grandes responsáveis - grandes como pertencendo ao partido que governou este país durante 10 anos com maioria absoluta - pelo estado em que se encontra o distrito de Viana do Castelo. É urna questão de seriedade política, cujo bom exemplo foi, aliás, dado pelo vosso líder da altura e Primeiro-Ministro durante 10 anos - relembro-o hoje outra vez -, num comício em Viana do Castelo, quando, em campanha para as eleições presidenciais, pediu desculpa à população da região do Alto Minho...

O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Isso é humildade, Sr. Deputado!

O Orador: pelo atraso em que deixou aquela
região.
Era o que mais faltava, Srs. Deputados, que vocês, que de verdadeiramente estruturante nada fizeram durante 10 anos, durante 120 meses, de poder absoluto, quisessem que este Governo, em 20 meses, recuperasse todo esse tempo perdido!

Protestos do PSD.

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Srs. Deputados, é melhor terem calma! As coisas discutem-se com serenidade. A razão não é de quem faz mais barulho mas de quem tem melhores argumentos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado referiu, mais uma vez, o «estafado» PIDDAC. Como sabe, há outros instrumentos de investimento e recordo-lhe que este ano estão a ser investidos no distrito de Viana do Castelo, embora para nós continue a ser insuficiente - não somos subservientes em relação à administração central como vocês foram nos 10 anos de governo do PSD -, mais de 50 milhões de contos.

O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Não constavam, Sr. Deputado.

O Orador: - Investiu-se na auto-estrada cerca de 32 milhões de contos; no ambiente, onde vocês negaram alguns apoios importantes e que já referi na minha intervenção, 10 milhões de contos; nos dois aterros sanitários, 7,5 milhões de contos; no Parque Nacional da Peneda-Gerês, 2,5 milhões de contos, e na IC1 e em outras obras pequenas de concelho a concelho, que, afinal, é a listagem que vocês vão apresentando, estão a ser feitos investimentos. Há mais de 50 milhões de contos em investimentos!
Quando VV. Ex.as referem a situação da saúde naquele distrito esquecem-se de que foram os grandes responsáveis pelo estado a que a saúde chegou. VV. Ex.as cruzavam os braços, dizendo apenas «Não. há médicos. Abrem-se concursos, mas ficam desertos». Nós não queremos cruzar os braços, queremos arranjar soluções para resolver os problemas daquelas populações.
Portanto, Srs. Deputados, era bom que VV. Ex.as procurassem, pelo menos, convencer-nos - o que não será fácil - de que é preciso esquecer o passado, o vosso triste passado em relação ao distrito de Viana do Castelo, e estarmos todos juntos - repito, todos juntos - a lutar pelo desenvolvimento futuro da nossa região.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Solheiro, confesso-lhe que já estamos a ficar levemente cansados dos argumentos usados reciprocamente, porque se de um lado referem os 10 anos - e efectivamente 10 anos é muito tempo, como diz a canção - do outro lado são as promessas.
São decorridos quase dois anos, tenho tido oportunidade de visitar o distrito de Viana do Castelo e, confesso, durante este tempo também pouco de novo tenho visto naquele distrito. Mas, Sr. Deputado, digo-lhe que tem uma excelente oportunidade, visto pertencer à bancada que apoia o Governo e ter, presumo, as portas levemente abertas - razão por que lhe faço este pedido -, para utilizar esses argumentos a bem das populações do distrito de Viana do Castelo e fazerem obras. Ou seja, dizerem menos palavras e fazerem mais obras.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Solheiro, apenas quero fazer uma pergunta.
Pareceu-me ouvir V. Ex.ª defender a abertura do quadro dos hospitais portugueses aos médicos espanhóis. Pergunto-lhe, e é com muita curiosidade que o faço: sendo V. Ex.ª membro do partido que apoia o Governo, não seria, antes, de pedir ao Governo que usasse dos seus poderes para conseguir uma correcta distribuição dos médicos, porque, como sabe, à excepção de clínica geral, anestesia e pouco mais, não há insuficiência de médicos, apenas estão mal distribuídos?!
Assentando o sistema de saúde português praticamente no Serviço Nacional de Saúde e não esquecendo que o Serviço Nacional de Saúde é o principal empregador dos médicos portugueses, o que, do meu ponto de vista, está errado, mas é assim, gostava de saber se V. Ex.ª concorda em que o Governo possa demitir-se da função de distribuir os médicos, deixando-os concentrar-se, como estão, nos grandes hospitais e nos grandes centros urbanos, com prejuízo até para a sua própria formação contínua, entendendo-se assim abrir as portas aos médicos espanhóis, não por não termos médicos, porque essa poderia ser outra situação, mas por os nossos estarem todos' em Lisboa e no Porto? Pelo que me pareceu entender das suas palavras, o Governo, aparentemente, aos costumes diz nada, deixando-os estar todos em Lisboa e no Porto, por acaso em hospitais públicos, como sabe.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Solheiro.

O Sr. Rui Solheiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados do CDS-PP, é evidente que não estamos satisfeitos e se estiveram com atenção à minha intervenção verificaram que, em todos os sectores que referi, pus o acento tónico no que é mais necessário fazer, no terreno perdido que é preciso recuperar, que durante muitos anos se perdeu, com maior incidência nos últimos 10 anos, em que houve mais meios à disposição para investir.
Aliás, Sr. Deputado Augusto Boucinha, só compreendo que não tenha notado algumas alterações, no que respeita principalmente à rede viária, porque, com certeza, as suas visitas ao distrito já não são feitas há alguns meses. Se hoje fizer o percurso Porto/Viana do Castelo verá que abriram alguns troços da IC1. É largamente insuficiente, mas melhorou.
No final deste mês de Julho vai ser aberto o troço da auto-estrada até Anais, no concelho de Ponte de Lima, portanto daqui a uns dias. Até Novembro vai ser aberto o troço até Ponte de Lima e em meados do próximo ano até Valença. É uma via estruturante que se está a fazer, fundamental para aquela região, investindo-se no terreno. É verdade que é insuficiente, digo e repito, e por isso entendo que devemos estar todos unidos para fazermos ouvir as nossas vozes neste processo de recuperar o tempo, perdido.
A Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto referiu-se às questões da saúde e, ao reconhecer que não há clínicos gerais em quantidade suficiente, está a ir de encontro às minhas principais preocupações. É que o grande problema

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nos centros de saúde que referi - há mais, mas os que apontei são os casos mais agudos - é o do não funcionamento dos serviços de atendimento permanente que, como sabe, são assegurados pelos clínicos gerais.
Ao longo dos anos, vão sendo sucessivamente lançados concursos e ficam desertos, pelo que as populações não podem contar com os serviços. Se há um acidente, seja a que hora for, as pessoas deslocam-se ao centro de saúde e não há um médico de serviço. Por exemplo, isto acontece em Melgaço e as pessoas correm para o centro de saúde de Monção, mas aí também não há médicos e têm de ir até Viana do Castelo. Isto acontece e é dramático. As populações recorrem, então, aos médicos privados espanhóis, tendo de gastar autênticas fortunas, mas têm de atravessar a fronteira para poderem aceder a um médico.
Perante isto, dizemos que não há soluções imediatas mas há certamente que mexer em profundidade no sistema de saúde - a questão do nunterus clausus, o apoio aos médicos para deslocação para a periferia, a distribuição dos médicos a nível nacional, etc. Enfim, tudo isto são medidas que o Ministério da Saúde certamente está a equacionar mas que só terão efeitos a prazo. No entanto, aquela população é que não pode continuar eternamente à espera sem ter um mínimo de assistência em termos de saúde.
Entretanto, sabemos que há pedidos de médicos espanhóis, especialmente galegos, que querem trabalhar no nosso País. Ora, não há problemas a nível de reconhecimento dos respectivos cursos, não há problemas de comunicação em termos de língua, principalmente no caso da língua galega, como muito bem sabe. Assim, uma vez que os concursos ficam desertos, não vejo qual possa ser o impedimento em recorrer ao mercado espanhol a fim de se conseguir dar assistência àquela gente, principalmente no caso desta Europa sem fronteiras que todos defendemos.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carvalho Martins tinha pedido a palavra para defesa da sua honra pessoal. É chegado o momento de o fazer, mas agradeço-lhe que caracterize objectivamente a ofensa porque não dei fé de que tenha sido ofendido.

O Sr. Carvalho Martins (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para defesa não só da minha honra mas também da dos Deputados eleitos pelo círculo eleitoral de Viana do Castelo, um dos quais está presente.
O Sr. Deputado disse que deveríamos ter vergonha do que se fez em 10 anos. Ora, quero dizer-lhe frontalmente que tenho orgulho do que se fez em 10 anos no distrito de Viana do Castelo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mais uma vez, lanço-lhe um desafio: seja o Partido Socialista capaz de, em quatro anos, fazer o que nós fizemos nos últimos quatro anos de governo PSD.
Lanço-lhe este desafio por uma razão muito simples que V. Ex.ª conhece tão bem quanto eu próprio: os números são realidades objectivas. Vocês podem brincar com as palavras, aliás, têm essa vantagem em relação a nós próprios, conseguem brincar com as palavras,...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... mas com os números não há brincadeiras, meus senhores! Os números são clarinhos e dizem que, em 1995, se investiu 11 milhões de contos no distrito de Viana do Castelo e que, em 1997, a previsão de investimentos não chega a 6 milhões de contos. E não chega, meus senhores!
Sr. Deputado, não é sério V. Ex.ª vir novamente falar na auto-estrada. Repito: a auto-estrada não é obra vossa, é obra do governo anterior. Vocês limitam-se a pagar. Se tivessem de lançar a obra, os vianenses ainda hoje estariam à espera dela e você sabe bem disso!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se falássemos no IC1, seria exactamente a mesma coisa: se vocês tivessem de lançar a obra, ainda hoje Viana do Castelo estaria à espera dela!
O desafio que lhe lanço mais uma vez - porque aí, sim, será mérito vosso e podem ter a certeza que os Deputados do PSD louvar-vos-ão se conseguirem - é o de serem capazes de continuar a construção do IC1, de Viana de Castelo até Vila Praia de Âncora, de serem capazes de construir o IC28, de construírem uma via rápida até Paredes de Coura e de resolverem o problema do RIME (Regime de Incentivos às Microempresas), do qual vocês falam mas que só foi resolvido porque nós «fizemos barulho» enquanto vocês estiverem calados. Aliás, vocês só «fizeram barulho» depois de nós termos falado.
Daqui a quatro anos, Sr. Deputado, pode ter a certeza que serei eu próprio a dizer-lhe.«tenha vergonha»! Mas vou dizer-lho com base em números, coisa que o senhor não pode fazer agora em relação a mim.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Solheiro, para dar explicações, querendo.

O Sr. Rui Solheiro (PS): -

Sr. Presidente, o Sr.

Deputado Carvalho Martins, meu caro amigo, não tem recuperação possível neste domínio!
Veio novamente falar no PIDDAC, a única linguagem que, pelos vistos, conhece em termos de investimento de Estado. Mas eu não acredito que assim seja, até porque é economista.
Porém, confunde outra questão importante e diz que investiram x milhões de contos no ano tal, baseando-se apenas no que estava inscrito no PIDDAC. Ora, é preciso ver o que se realizou de facto.
Já agora, por falar em pagar, é bom que o Sr. Deputado saiba - e sabe com certeza, pelo que apenas lho recordo - que quem está a pagar uma boa parte das pequenas obras que vocês fizeram mas não pagaram é este Governo. Vou dar-lhe um exemplo concreto para ver que é verdade o que digo e desminta-me se for capaz.
Ainda hoje - e a obra foi inaugurada há já dois anos, uns dias antes do início da última campanha eleitoral -, a obra da estrada Monção-Melgaço está a ser paga no INTERREG II. Quanto aos acessos à ponte de Valença, que vocês referiam como os 5 km de auto-estrada existentes no distrito - até parecia que queriam fazer uma ponte pendurada sem acessos -, ainda hoje estão a ser pagos por este Governo. São as vossas facturas, por terem corrido apressadamente em 1995. para tentarem desesperadamente inverter a tendência eleitoral que se confirmou.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, o Sr. Deputado Carvalho Martins até é de Ponte de Lima e certamente não negará que vai abrir mais um troço de auto-estrada no seu concelho e que, em Novembro, a mesma estará concluída até à sede do seu concelho. Também não negará que, em Maio ou Junho do próximo ano, estará concluída a auto-estrada até Valença. É só ir lá ver e o senhor passa lá todas as semanas!
Nega a importância deste investimento? Nega este esforço financeiro que o Estado português está a fazer bem como a importância que tem para o distrito? É preciso ser se sério, Sr. Deputado! Ser-se sério sempre, todos os dias!
O que nós dizemos é que isto é insuficiente porque, infelizmente, estávamos demasiado atrasados.
Vocês começam sempre as vossas intervenções sobre o estado do distrito de Viana do Castelo reconhecendo a sua situação de atraso em relação às outras regiões do País.
Ora, se vocês são os primeiros a reconhecer isto, como é que querem dizer, por outro lado, que têm orgulho na obra que lá têm feita? E orgulho na situação miserável em que deixaram aquele distrito nos mais diversos sectores? São, de facto, conceitos de orgulho que nós não partilhamos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou pôr à votação, precedida de discussão, se fizerem questão nisso - mas era bom que não discutissem, na medida em que estamos com o tempo muito contado -, o voto n.º 75/VII - De solidariedade para com os comerciantes, trabalhadores do comércio e Associação Naval I.º de Maio atingidos pelo incêndio ocorrido no dia 4 de Julho, na Figueira da Foz, apresentado pelo PS, PSD, CDS-PP e PCP.
É do seguinte teor: Na. passada sexta-Feira, dia 4 de Julho de 1997, um incêndio de grandes proporções destruiu um edifício histórico da cidade da Figueira da Foz. Em poucas horas, e não obstante o abnegado esforço das corporações de bombeiros, o fogo destruiu a sede e o espólio da Associação Naval 1.º de Maio, bem assim como algumas casas comerciais situadas no quarteirão atingido.
Um importante acervo histórico da cidade da Figueira da Foz e do País de que se destacavam a Biblioteca Carlos Sombrio, inúmeras taças e trofeus, bens materiais e documentos que retratavam 104 anos de história, foram totalmente destruídos.
No momento em que a Associação Naval I.º de Maio, uma das mais antigas e prestigiadas colectividades do País, se debate com as dificuldades inerentes a quem viu desfeito o seu passado e o seu presente desportivo, cultural e social, os Deputados abaixo assinados propõem ao Plenário da Assembleia da República a aprovação de um voto de solidariedade aos comerciantes e trabalhadores do comércio atingidos, à Associação Naval 1.º de Maio e à cidade da Figueira da Foz.
Não há inscrições, portanto, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, este voto vai ser transmitido ao Presidente da Associação Naval 1.º Maio, da Figueira da Foz.
Está encerrado o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 43 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos continuar a discussão das propostas de alteração da Constituição.

Na última reunião, tínhamos terminado o artigo 50 º, pelo que, agora, passamos ao artigo 51.º.

Está em discussão.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos passar ao artigo 52.º.

Pausa.

Não há pedidos de palavra pelo que passamos ao artigo 54.º, uma vez que, em relação ao artigo 53.º, não foi apresentada qualquer proposta de alteração.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, não pode ser! Há engano! Ainda faltam os artigos 51.º e 52.º.

O Sr. Presidente: - Quer que voltemos atrás, ao artigo 52.º.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): ao artigo 51.º.

- Não, Sr. Presidente,

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, em relação ao artigo 51.º, perguntei se havia inscrições e ninguém pediu a palavra. Mas não há problema nenhum.
Qual é o artigo que querem discutir?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço imensa desculpa, Sr. Presidente. Foi lapso nosso.

O Sr. Presidente: - Não há problema Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia pretende intervir sobre o artigo 51.º.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): - Sr. Presidente, penso que as alterações introduzidas neste artigo correspondem a um desejo de valorização do sistema partidário. Visam um aprofundamento do sistema democrático, da própria organização do Estado, no sentido de que um sistema partidário é uma base de sustentação fundamental.
Os partidos são, de facto, associações privadas mas, pelo destaque que têm na vida política e na vida da sociedade, têm relevo constitucional e, por isso, é significativo que tenham sido introduzidas estas alterações nesta revisão da Constituição.
Sabemos que o sistema partidário necessita de reformas que aproximem os partidos da sociedade, que contribuam para diminuir o alheamento dos cidadãos das formas tradicionais de participação política.
Pensò que os aditamentos feitos nesta revisão dão sinais de revitalização dos partidos políticos, sobretudo se a mesma for feita através do exercício inferno de modernização e de transparência dos próprios procedimentos internos dos partidos.
Em sintonia com aquela necessidade, o Partido Social Democrata tez ele próprio aquele exercício de

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transparência, de modernização, e fê-lo com empenho, assumindo todas as consequências. Pensamos que esse exercício, feito com visibilidade, foi um sinal de moralização da vida política e creio que poderá contribuir para a percepção que os cidadãos têm do sistema político, conferindo-lhe maior credibilidade e, também, uma possibilidade de se identificarem melhor, de se aproximarem da vida política e de nela participarem.
Sr. Presidente, para terminar, gostaria de manifestar a minha satisfação pelo consenso encontrado nesta Assembleia e que perpassa todos os partidos políticos relativamente à constitucionalização destas normas que correspondem, de facto, a um consenso das organizações partidárias no sentido da sua responsabilização pública, de uma maior participação da sociedade e do aprofundamento da democracia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Santo.

A Sr.ª Helena Santo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Obviamente, o Partido Popular entende que os partidos políticos devem reger-se por princípios de transparência e que deve haver um incentivo ao direito de participação de todos os cidadãos na vida dos partidos políticos. Por isso mesmo, o Partido Popular apresentou algumas propostas no sentido da alteração da lei do financiamento dos partidos políticos, alterações essas que visam precisamente incentivar a participação dos cidadãos na vida dos próprios partidos.
Consubstanciando e continuando a defender o primado do financiamento público, entendemos, por exemplo, que os cidadãos devem participar cada vez mais na vida dos partidos políticos através de donativos que possam ser considerados como custos para efeitos de IRS e de IRC, pois esta é uma forma de participação na vida daqueles.
Entendemos também que outras regras e outros conceitos é preciso alterar para devolver a maior transparência aos partidos políticos. No entanto, face ao estado actual da democracia portuguesa, quanto a nós, não faz sentido esta consagração constitucional. Entendemos que esta transparência deve advir da lei ordinária, da prática partidária. Pensamos que só quem duvida, só quem põe em causa a própria democracia defende agora a consagração constitucional destes princípios.
Em suma, entendemos que estes princípios não devem merecer acolhimento na Constituição, exactamente pelas razões que aduzi.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, também nós queremos congratular-nos vivamente pela inovação constitucional que agora se torna possível no que aos partidos políticos diz respeito, ao consagrar-se constitucionalmente de forma expressa o princípio da transparência, o princípio da organização democrática dos partidos, bem como a cominação constitucional para a definição de regras de financiamento e de expressão das respectivas contas, também de acordo com o princípio da transparência. 
Se tivermos em linha de conta que já hoje é uma competência do Tribunal Constitucional a verificação da legalidade da constituição dos partidos. não poderemos deixar de reconhecer como será importante a articulação destas novas prescrições constitucionais no que diz respeito à consagração dos princípios da transparência e da democraticidade interna na vida dos partidos políticos.
Os partidos concorrem para a existência de uma sociedade pluralista e nada melhor do que garantir na Constituição regras de democraticidade e de transparência quanto ao seu funcionamento interno. Esta é, aliás, uma matéria há muito tempo discutida em termos doutrinários na sociedade portuguesa. A boa doutrina passa agora a ter acolhimento em sede constitucional e tal deve-se, e muito, ao impulso do projecto inicial de revisão constitucional apresentado pelo Partido Socialista.
Renovo, por isso, a satisfação de podermos aqui aprovar as formulações agora apresentadas ao Plenário.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sabemos que estamos num Estado de partidos e que a estes cabe um papel de particular importância na construção do Estado de direito democrático da democracia representativa.
Nesse sentido, tem importância consagrar regras como a da transparência ou a da organização democrática, bem como o direito de participação de todos os membros dos partidos na vida destes. Mas se é verdade que as regras jurídicas são importantes, também convém relativizá-las para termos uma noção exacta da sua importância.
A este propósito, recordo uma tese de doutoramento onde se afirma, e muito bem, que os estatutos dos partidos políticos, na parte em que consagram a disciplina dos Deputados, são inconstitucionais. Portanto, a sua conclusão é que o mandato imperativo do partido contraria a Constituição. Esta tese de doutoramento, como é sabido, é do Professor Marcelo Rebelo de Sousa, mas este tacto não impediu que, antes e durante a liderança deste, Deputados do PSD fossem alvo de medidas disciplinares, tal como, eventualmente, Deputados de outras bancadas podem ser alvo de medidas disciplinares devido ao seu sentido de voto.
Assim, apesar da importância destas regras, entendo que é essencial que cada partido, em particular os representados na Assembleia da República, façam o seu próprio percurso no sentido de respeitarem, cada vez mais, regras que são fundamentais na vida democrática.
Quanto às regras de financiamento, consideramos importante a fixação destes princípios, mas é pena que não tenha ficado consagrado o princípio de que o financiamento por entidades privadas se deve resumir às pessoas individuais. 
Na verdade, continuamos a pensar que o financiamento por empresas pode ser um caminho para a dependência dos partidos políticos perante o poder económico e se este financiamento fosse acompanhado do desconto em IRC dos respectivos financiamentos, é claro que esta dependência face ao poder económico seria ainda maior!
Posto isto, vamos votar favoravelmente a consagração de regras sobre o financiamento dos partidos mas julgamos que elas são insuficientes ao que se imporia num Estado que pretendesse assegurar a independência dos partidos políticos face ao poder económico.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Queria identificar-me com as considerações já tecidas sobre as alterações a este artigo 51.º e, nomeadamente, vincar a ideia da organização e da gestão democrática dos partidos políticos no sentido de que é tempo de, em matéria respeitante às associações políticas e aos partidos políticos, «fazermos entrar» a Constituição na vida interna dos partidos e, sobretudo, erradicarmos dessa vida interna alguns factos da história recente, mas passada, que tem a ver com o «delito de opinião» no seio dos partidos políticos.
Evidentemente, como já foi salientado pelo Sr. Deputado Luís Sá, quando há um conflito entre a legitimidade democrática electiva, soberana, e a legitimidade da vontade partidária, a vontade do soberano, que é o povo, em nome da República, impõem-se, inevitavelmente, à vontade do «príncipe», isto é, à vontade do partido.
Trata-se, pois, de um adquirido constitucional com grande significado que queremos relevar.

O Sr. Presidente: - Terminada a discussão do artigo 51.º, vamos passar ao artigo 52.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O artigo que agora tratamos tem por epígrafe o direito de petição e o direito de acção popular. Bem sabemos que as sociedades modernas em que vivemos são complexas, mesmo muito complexas, e plurais. É, portanto, possível que na sua textura surjam conflitualidades.
Também é sabido que as sociedades modernas democráticas ainda repousam, essencialmente, na soberania representativa e esta encontra-se num certo estado de crise, pelo menos latente. Assim, tudo o que seja para aperfeiçoar a representatividade é contribuir para o reforço da soberania popular: o povo é quem manda, o povo mandata os seus representantes e é bom que estes encontrem melhores válvulas de comunicação com os representados.
Nesse sentido, tudo o que seja permitir a «respiração» dos representados pelos canais através dos quais os representantes devem sentir o pulsar dos representados, será reforçar a soberania popular. A democracia quer-se cada vez mais aberta e participativa para que, justamente, a essência representativa da verdadeira democracia possa continuar e ser solidificada.
Daí que, nesta galeria do reforço da democracia representativa, direitos como estes, quer o de petição quer o de acção popular, sejam verdadeiros direitos populares. A Constituição já os consagra na actual redacção e, por isso, o que agora se pretende é aperfeiçoar esses mecanismos e estender ainda mais os seus campos de acção.
Em primeiro lugar, no que diz respeito ao direito de petição, mais do que o direito, propriamente dito, que todos os cidadãos portugueses têm de apresentar petições, representações ou queixas aos órgãos de soberania ou outras autoridades para assim defenderem os seus direitos, as leis ou a Constituição, a nova redacção acrescenta o direito a uma resposta rápida, em tempo razoável, bem como o direito de ser informado sobre o resultado das petições apresentadas.

Obviamente, não era preciso escrevê-lo, pois decorre da história desta magna carta democrática que toda a petição deve ter uma resposta. Mas, ainda assim, entenderam os partidos que deveria ser constitucionalizado esse direito de resposta, bem como o de o cidadão ser informado sobre o resultado das petições apresentadas. Trata-se, nessa medida, apenas de um reforço daquilo que é a história da democracia recente em Portugal.
Em segundo lugar, o direito de acção popular, que já era consagrado em grande latitude, é agora alargado a outros níveis. Todos, quer pessoal quer colectivamente, em associações de defesa de interesses colectivos e de interesses difusos, podem apresentar acções com vista a promover a prevenção da saúde pública, os direitos dos consumidores - um ramo novo que surgiu quando John Kennedy fez o grande discurso de todos conhecido bem como a preservação do ambiente (um outro domínio novo, verdadeiramente ímpar, que está aí erguido aos grandes parâmetros do direito, em geral, e da vida, em particular) e a defesa dos bens do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais. Todos eles são domínios novos que enriquecem o perímetro de aplicação deste direito de acção popular do artigo 52.º da Constituição.
Trata-se de uma concretização da passagem do Estado de direito liberal ao Estado de direito social: de um Estado de direito liberal onde a legitimidade processual era, sobretudo e quase exclusivamente, individual, em que cada um defendia o seu direito e só o seu direito podia defender, para uma espécie de acções colectivas, acções de classe, em que estão em causa certos interesses colectivos ou comuns que a todos pertencem mas não são de ninguém, individualmente, ou seja, cada um quase não sente os prejuízos graves que, colectivamente, são sofridos por muitos.
Estes interesses, do ponto de vista de um direito liberal, acabavam por ficar sem satisfação ou protecção. Ora, o que aqui sé pretende é uma «socialização», no bom sentido, do direito liberal, enriquecendo-se, assim, o Estado de direito liberal, que é agora superado por um Estado de direito social.
É neste contexto que o PSD tem uma palavra de louvor para o enriquecimento e aprofundamento do artigo 52.º da Constituição, na certeza de que, assim, a democracia representativa sai reforçada e aperfeiçoada.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a, palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deseja-se que a democracia participativa seja, cada vez mais, aprofundada e reforçada. Para tal, a nossa democracia conta com um dos instrumentos mais relevantes, consagrado já na nossa Constituição. Trata-se do direito de petição, que possibilita a participação directa e activa dos cidadãos na vida política e concorre para a consolidação e aperfeiçoamento do regime democrático. Nesse aspecto, podemos considerar que a Constituição da República Portuguesa é, sem dúvida, das mais avançadas. Todos nos devemos congratular por isso.
Esta é, sem dúvida, uma das mais sérias normas constitucionais que consagra ao cidadão, individualmente, ou a grupos de cidadãos o direito de apresentarem aos órgãos de soberania ou a outras autoridades petições em

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defesa, nomeadamente, de interesses e direitos da própria Constituição.
Julgou-se igualmente importante garantir - tal como o Sr. Deputado Calvão da Silva referiu - aos autores das petições que estes tomem conhecimento atempado e por escrito do despacho que sobre elas recair. Na proposta que apresentei constava essa norma, por isso vejo com satisfação a sua consagração.
Deste modo, completa-se um quadro essencial do nosso sistema democrático, dinamizando-se a iniciativa e a participação activa dos cidadãos.
Sobre a acção popular, outra das boas normas constitucionais, reforça-se e alarga-se este direito quando estejam em causa direitos dos trabalhadores ou outros direitos fundamentais constitucionalmente previstos - na proposta que apresentei, que não retirei e desejo ver votada, consta, realmente, uma norma que prevê esse direito quando estão em causa, sobretudo, direitos dos trabalhadores ou outros direitos fundamentais constitucionalmente previstos.

Supre-se, assim, na nossa opinião, uma lacuna, tanto mais que exemplos de violação dos direitos dos trabalhadores não faltam, o que por si só justifica melhoria que se propõe e que vai, certamente, reformar a democracia participativa a que já me referi.

Julgamos que desta forma contribuiremos para uma melhor constituição no que a este capítulo concerne.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Congratulamo-nos com o facto de termos visto reconhecida a razão de ser de algumas das propostas fundamentais que adiantávamos paia este artigo, designadamente a de que deve haver uma resposta, em tempo útil, ao cidadão que se dirige à Administração.
É evidente que estamos de acordo em que os princípios gerais apontam já para a obrigação desta resposta em prazo razoável ou em tempo útil, para usar a expressão que utilizámos, mas também entendemos que uma revisão constitucional deve verificar os incumprimentos que ocorrem na sociedade e agir em conformidade, de modo a que, no futuro, este tipo de instituições tenha maior dignidade do que tem hoje. Nesse sentido, esta alteração é bem-vinda.
De resto, entendemos que o direito de petição deveria ser objecto de um tratamento, inclusive por parte da Assembleia da República, que conduzisse à sua dignificação efectiva aos olhos dos cidadãos e a uma utilização cada vez mais intensa.
Por outro lado, congratulamo-nos também com o facto de, correspondendo a uma proposta do PCP, ter sido alargado o reconhecimento explícito do direito de acção popular, designadamente ao caso dos direitos dos consumidores e à protecção do domínio público. E é bom ver o PSD, que particularmente em relação à protecção do património público hesitou muito na primeira leitura, neste momento, não apenas a votar favoravelmente mas a congratular-se enfaticamente com a consagração desta norma.
Entretanto, entendemos que é pena que não tenha sido reconhecido explicitamente nesta disposição legal o direito de associações de defesa dos interesses em causa poderem actuar no sentido da defesa dos direitos fundamentais dos
trabalhadores. Este aspecto foi por nós proposto, inclusive pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, como acaba de referir, e infelizmente não foi reconhecido, mas julgamos que os termos do reconhecimento deste direito devem apontar para uma interpretação na qual caiba a capacidade de associações, como comissões de trabalhadores ou associações sindicais, actuarem, efectivamente, em defesa dos respectivos interessados, tendo, para o efeito, legitimidade processual.
É pena que tal não tenha ficado já expressamente
garantido, continuamos a entender que não há direitos fundamentais de primeira e de segunda e que os direitos fundamentais dos trabalhadores não são direitos de segunda. Em todo o caso, julgamos que a interpretação futura poderá caminhar no sentido que preconizamos; caso assim não suceda, continuaremos a lutar para que tal venha a ser explicitamente reconhecido.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a  palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas dizer, de forma muito breve, que registamos positivamente o facto de o artigo 52.º ter acolhido algumas das preocupações que também constavam do nosso texto constitucional.
Nem sempre o acolhimento das propostas é imediato, mas o tempo de reflexão ajuda e ajudou também aqui a que as resistências que pareciam existir se desvanecessem e se introduzisse uma forma de responsabilização do Estado e dos órgãos de soberania, em termos de garantir e favorecer o maior recurso dos cidadãos ao direito de petição, favorecendo desse modo o interesse dos cidadãos na participação cívica e política.
No entanto, julgo que há outro aspecto importante cujo caminho terá de vir, gradualmente, a ser percorrido e enraizado, que é o da responsabilização do Estado e da Administração perante os cidadãos, pois trata-se também de uma lacuna naquela que é a nossa experiência de vida colectiva.
Por isso, parece-nos que o garantir não só o direito dos cidadãos mas também o dever de resposta perante os cidadãos é um aspecto que tem sido muitas vezes ignorado' e relativamente ao qual, de algum modo, a proposta, nos termos em que é feita, começa a fazer o seu percurso.
Por isso, saudamos esta alteração ao texto constitucional, que, no nosso entendimento, não foi tão longe quanto deveria e poderia ter ido mas é, talvez, um indício do início de um percurso que gostaríamos de ver aprofundado no futuro.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado
Ferreira Ramos.

O Sr. Ferreira Ramos (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, também muito brevemente, quero manifestar a posição do Partido Popular em relação às alterações introduzidas no artigo 52.º, que é de concordância e, ao fim e ao cabo, de satisfação, por considerar que, na verdade, há um alargamento quer do direito de petição, quer do direito de acção popular, o que corresponde também a um alargamento da possibilidade de participação dos cidadãos. Mas, sendo um direito, é

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também uma co-responsabilização, nomeadamente quando se atribui aos cidadãos portugueses a possibilidade de exercerem, quer individual, quer colectivamente, a sua participação social na defesa dos direitos dos consumidores e na preservação dos bens das autarquias locais, o que, para nós, tem bastante relevo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O instituto do direito de acção popular representa, seguramente, no quadro da democracia participativa, um dos aspectos mais relevantes da possibilidade de participação cívica dos cidadãos na vida pública, aos mais diversos níveis. Por isso nos congratulamos, particularmente por ter sido possível, nesta revisão constitucional, encontrar um espectro de largo consenso que permitiu ampliar as matérias que se tornam objecto da possibilidade de iniciativa popular. Assim é para os direitos dos consumidores, assim é para a defesa dos bens do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais, o que confere também, de alguma modo, aos cidadãos em geral uma espécie de dever implícito de boa vigilância em torno da defesa do património público, enquanto património comum. O direito de acção popular, como alargamento da possibilidade de iniciativa popular, é, assim, a expressão simultânea de um direito e de um dever cívicos.
Gostaria também de sublinhar que, ao permitirmos consagrar, no domínio da petição, o direito não apenas à sua apresentação mas também o de os cidadãos peticionários serem informados, em prazo razoável, sobre o resultado da respectiva apreciação, se consubstancia em termos mais exequíveis e credíveis aquilo que deve ser não apenas a possibilidade de iniciativa popular mas a resposta, por parte de entidades públicas, administrativas e, inclusive, políticas, a essa mesma iniciativa.
Por outro lado, Srs. Deputados, gostaria de me congratular com outras articulações, com enormes virtualidades, neste trabalho de revisão constitucional.
Ao consagrarmos os direitos dos consumidores como matéria que permitirá, no futuro, o exercício da acção popular, fomos mais longe do que aquando, da consagração que ainda teremos ocasião de debater e apreciar em sede do artigo 60.º, ao permitir que as associações de consumidores e as cooperativas de consumo possam ter legitimidade processual para a defesa dos seus associados e dos interesses colectivos ou difusos. As class action, como tradicionalmente são conhecidas, têm também, de forma inovadora, um acolhimento na Constituição.
Já agora, permitam-me que sublinhe que também no mesmo sentido e com o mesmo impulso, votámos favoravelmente uma solução para que fosse possível cometer às organizações de trabalhadores idêntica legitimidade processual na defesa dos interesses colectivos dos seus associados, sempre que estejam em apreciação judicial.
Esta é a última das matérias que não teve ainda, no quadro do artigo 56.º, a possibilidade de obter maioria suficiente de 2/3, dadas as hesitações que o PSD revelou, até ao momento, neste particular. E se agora, a propósito do artigo 52.º, já a invoco, é para que o PSD tenha ocasião de fazer sobre ela a melhor reflexão, de modo a que possa superar as hesitações reveladas na CERC e a que possamos aqui, ,em momento oportuno, alargar o âmbito da legitimidade das organizações de trabalhadores na representação judicial dos seus associados.
Como quer que seja, Sr. Presidente, que tanto relevo teve em tantas matérias e nesta em particular, ao ajudar, em sede de legislação ordinária, a definir o instituto da acção popular, é uma boa notícia que lhe trazemos, ao apresentarmos aqui um alargamento das possibilidades de acção popular, traduzido justamente no aumento e na dilatação do âmbito material em que ela será possível.
Todos os Srs. Deputados que se pronunciaram se congratularam com a inovação e, pela minha parte, faço coro com essa posição de satisfação geral.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de fazer aqui uma breve referência ao lastro histórico-cultural que está por detrás da ideia que fica hoje consagrada na Constituição, mas que é tradicional no. nosso direito, de que o povo, um qualquer do povo, pode, por si, litigar nos tribunais comuns para recuperar bens que sejam de uma autarquia, nomeadamente de um município, e que os gestores do município,' descuidadamente, deixaram fugir. Esta é uma tradição dos Fueros de Leão, é uma tradição do direito administrativo português e que vem do fundo das idades.
Nesta parte, quando estabelecemos na Constituição este direito de acção popular para a reivindicação de bens que são das comunidades locais e que foram mal perdidos por quem as gere, não estamos senão a pôr a Constituição de acordo com uma tradição cultural portuguesa.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Queria deixar isto aqui dito, não vá dar-se o caso de estarmos todos a pensar que descobrimos a «pólvora», quando, afinal, a pólvora já foi descoberta há muito tempo.

Aplausos do Deputado do PSD Luís Marques Guedes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos à apreciação e discussão do artigo 54.º da Constituição da República Portuguesa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, uma nota prévia para referir e dar relevo ao facto de este artigo 54.º ter merecido, em sede de Comissão Eventual, e em face das propostas formuladas nos diversos projectos de revisão constitucional em apreciação, um amplo debate, onde estiveram em discussão filosofias diferentes de encarar o exercício dos direitos de participação dos trabalhadores no âmbito da empresa.
Quanto' às duas propostas de alteração que hoje apreciamos, relativas aos n.º` 2 e 5, alínea c), deste artigo, elas consubstanciam uma melhoria no texto constitucional; no que respeita aos direitos das comissões de trabalhadores.
Senão, vejamos: a primeira proposta de alteração tem a ver com o n.º 2 deste artigo e sugere a substituição da expressão «plenários dé trabalhadores» por «trabalhadores». Tal alteração encontra o seu fundamento na consagração de uma expressão que, sendo menos restritiva, permite aos trabalhadores deliberai a constituição, aprovar os estatutos

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e eleger os membros dessas comissões de trabalhadores de forma livre e soberana, pelos meios que julgarem mais adequados à sua efectiva participação no processo. Trata-se de encontrar, e foi encontrada, uma solução mais abrangente, que está de acordo com os interesses dos trabalhadores no que respeita à sua participação neste processo.
Relativamente à segunda proposta de alteração, reporta-se aos direitos constitucionais das comissões de trabalhadores e intenta a consagração de novos direitos de participação no âmbito da empresa. Concretamente, a proposta vem estabelecer o direito de a comissão de trabalhadores participar nos processos de reestruturação de empresa, especialmente no tocante a acções de formação ou quando ocorram alterações às condições de trabalho. Trata-se, assim, de uma proposta que promove uma maior participação das comissões de trabalhadores na discussão dos problemas da empresa, de uma proposta que privilegia o diálogo social na empresa, à luz dos direitos de informação e consulta, e que, por conseguinte, merece todo o apoio do PSD.
Nestas condições e quanto a estas duas propostas, o PSD apoia-as e, por isso, vai votá-las favoravelmente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tanto em relação ao n.º 2 do artigo 54.º como à alínea c) do n.º 5, creio que é de muita utilidade reler o debate que se travou em 1989, porque a aspiração da supressão da palavra «plenário» já vem de longe, assim como a da palavra «participação» num determinado sentido, que o PSD também quis introduzir há muito tempo na Constituição laboral em vez da palavra «intervenção», fazendo até a graduação de que uma coisa seria intervenção e outra participação, que estaria num patamar inferior e pronunciando-se sobre outro patamar inferior.
O PSD conseguiu, desta vez, umas «dentadinhas» na Constituição laboral e introduziu aqui a palavra «participação». Ao contrário do que o Sr. Deputado Francisco José Martins disse, não é verdade que saiam reforçados os direitos das comissões de trabalhadores, mas entendo que também não saem prejudicados, porque continua a existir, expresso na Constituição, o direito ao controlo de gestão e é isso o que faz verdadeiramente a «barragem» à interpretação que a direita pode fazer da introdução da palavra «participação» neste contexto.
De facto, «intervenção» é uma palavra mais forte, com um sentido diferente, ao qual será reconduzido a palavra «participação» por força de uma outra alínea, a do controlo de gestão.
De igual modo, em relação à palavra «plenário», não é verdade que a expressão «os trabalhadores» seja mais abrangente do que «plenário dos trabalhadores». Plenário é o pleno dos trabalhadores. Mas eu entendo que foi um vezo ideológico por repúdio em relação àquilo que é colectivo que levou a atacar a palavra «plenário», como levou, noutros artigos, a atacar a palavra «povo», que Fernão Lopes tanto usou e elogiou e que agora, da parte de algumas pessoas, merece a reprovação, por ser muito revolucionário usar a palavra «povo», tal como é revolucionário usar a palavra «plenário».
Aquilo que os senhores conseguiram incluir na Constituição laboral não terá a aprovação do PCP mas também não terá o sentido que os senhores lhe querem dar, por força da manutenção de esteios na Constituição laboral.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, não queríamos deixar passar este momento sem sublinhar esta proposta de substituição da alínea c) do artigo 54.º, que vem alargar e, sobretudo, consolidar de uma forma iniludível, os direitos dos trabalhadores no que respeita quer à participação nos processos de restruturação da empresa quer, e muito especialmente, nas acções de formação que ocorrerem a propósito desses processos.
Esta é, sem dúvida, uma inovação no que diz respeito à consolidação dos direitos de participação dos trabalhadores na Constituição da República Portuguesa. Sem dúvida, é uma melhoria que queríamos sublinhar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, muito rapidamente, queria dizer o seguinte: comecei a minha intervenção por referir o quanto foi rico o debate em sede de comissão eventual, no que concerne a este preceito. Daí as diferenças que, de resto, ficaram marcadas pela Sr.ª Deputada Odete Santos quanto a esta matéria.
Considerámos Q mantemos a nossa posição de que alterações propostas consubstanciam uma mais-valia naquilo que são os direitos das comissões de trabalhadores e dos seus representantes. Entendemos e continuamos a dizê-lo e a defender que a expressão «trabalhadores», o universo trabalhadores, é mais abrangente do que a expressão «plenário»; os trabalhadores deverão ter legitimidade para constituir e votar os seus representantes da forma que eles muito bem entenderem, quer em plenários quer em assembleias ou da forma que entenderem, mas cabe-lhes, a eles, toda essa legitimidade.
Quanto à questão dos direitos de participação, percebo que haja divergência. Entendemos que o preceito amplia a âmbito de intervenção dos membros de comissões de trabalhadores e defendemos uma forma de estar em termos de relações de trabalho e em termos daquilo que é o papel interveniente dos representantes dos trabalhadores no âmbito dá empresa de uma forma diversa. Privilegiamos, e volto a dizê-lo, aquilo que é o diálogo social, o direito à informação, a concertação e, por conseguinte, esta nossa proposta vai ao encontro desses princípios que defendemos.
Repito, entendemos que esta é uma mais-valia que trazemos ao texto constitucional.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é chegado o momento de retomarmos a discussão, que ficou suspensa, da alínea h) do artigo 27.º. Se não houver objecção de ninguém, é bom recuperar o caminho que ficou perdido, retomando a discussão da proposta de substituição, apresentada por vários Deputados, que refere «internamento de portador de anomalia psíquica em estabelecimento terapêutico adequado, decretado ou confirmado por autoridade judicial competente». Esta é a proposta 52-P e foi distribuída a todas as bancadas.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

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A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, esta alínea aparece no Plenário já substancialmente melhorada em relação à formulação inicial apresentada na primeira leitura, que era francamente má e deixava uma área muito grande de preocupações em relação a internamentos compulsivos para efeitos que não estavam muito claros na primeira formulação. 
De qualquer forma, esta alínea continua ainda a ser alvo, por parte de entidades que também ouvimos muito recentemente, de algumas críticas e uma que nos chegou há pouco tempo seria a de que, a seguir à palavra «internamento», se deveria incluir a palavra «compulsivo», passando a constar «o internamento compulsivo de portador de anomalia psíquica», etc.
O texto está melhorado mas creio que esta matéria, se a revisão constitucional se tivesse processado em termos normais e não assim, a «mata cavalos», deveria ter merecido um debate muito mais amplo, na medida em que propostas deste género serviram noutros países, em que não há realização de direitos sociais, para a desistência dos próprios médicos de intervir, mandando as pessoas para os tribunais primeiro e só depois lhes dando assistência.
A proposta foi melhorada, uma vez que se acrescentou a palavra «confirmado», o que quer dizer que os médicos podem iniciar o tratamento pedindo depois a confirmação ao tribunal. Se assim não fosse, estaria aqui a porta aberta para ninguém mais dar assistência a ninguém sem que houvesse uma intervenção judicial. Não obstante, se se mantiver exactamente assim a redacção, porque, na dúvida, acolhemos a proposta que nos surge de que se adite a palavra «compulsivo» a seguir a «internamento», nós abster-nos-emos, embora fique claro desta maneira, com a palavra «terapêutico», que é para tratamento e que não pode ser qualquer pessoa, só porque se pensa que pode vir a cometer um crime, que pode ser internada em qualquer parte e de qualquer maneira, numa outra medida de segurança a acrescer à que já existe no Código Penal.
Porém, porque as dúvidas ainda permanecem nesta forma, iremos abster-nos se, conforme eu disse, não houver o tal aditamento para contemplar os protestos da classe médica, do próprio colégio da Ordem dos Médicos, da especialidade.

O Sr. Presidente.: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, duas ou três considerações a propósito desta proposta de alteração à alínea h) do artigo 27.º da Constituição, que, como se recordam, a pedido do PCP, ficou para discussão, o que agora se verifica.
O PSD, o PS e, aliás, o PCP, que teve conhecimento antecipado da proposta, procuraram aqui corresponder a algumas dúvidas que, em rigor, se poderiam colocar. Porém, entendo que se poderiam colocar numa interpretação um pouco forçada daquilo que era a proposta que vinha da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. Seja como for, tendo em atenção a pertinência das dúvidas então colocadas por um conjunto de médicos ligados à psiquiatria terapêutica e tendo em atenção que esta proposta acresce no texto constitucional garantias e direitos para um conjunto de cidadãos que estão, pelas circunstâncias médicas em que se encontram, particularmente desprotegidos, não nos custou subscrever o aditamento que agora consta desta alínea h) do artigo 27.º e que, justamente, sem margem para dúvidas, estabelece que este internamento é para «os portadores de anomalia psíquica em estabelecimento terapêutico adequado», o que significa que estamos aqui no âmbito do tratamento psiquiátrico, do tratamento médico destes doentes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, em relação à proposta agora avançada pela Sr.ª Deputada Odete Santos, queria sublinhar que julgo que esta discussão, em torno desta alínea, está um pouco inquinada pela proposta de lei que aí vem, sobre o internamento compulsivo. Creio que não é este nem o momento nem a hora de fazermos uma discussão que cabe na altura em que tivermos de nos pronunciar sobre a proposta de lei em causa; o que interessa aqui é adoptar na Constituição um conjunto de procedimentos que garantam a estes cidadãos direitos e a sua efectivação, não os deixando tão desamparados como, porventura, estiveram até hoje.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, independentemente da posição final que quisermos adoptar, penso que todos concordaremos que este é um bom avanço da nossa Constituição e que, sem margem para dúvidas, seja qual for a posição que cada um de nós adopte em relação à maior ou menor judicialização deste tipo de procedimentos, o que é verdade é que, com esta alínea; com este preceito, com esta alteração constitucional, demos um passo em frente no reconhecimento e na efectivação dos direitos destes cidadãos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva.

O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, também de uma forma muito breve, queria dizer o seguinte: ainda bem que esta questão ficou adiada porque permitiu ouvirem-se algumas organizações, algumas opiniões e acabou por se encontrar uma redacção que, no mínimo, nos parece mais adequada. Confirmo também que alguns especialistas eram de opinião que isto não devia sequer constar e que, de certa forma, a introdução desta alínea procura constitucionalizar uma lei que aí vem. Da nossa parte, com esta alteração, não vemos qualquer objecção.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que a introdução da palavra «compulsivo» teria vantagem. De qualquer modo, creio que quem sugere esta palavra, que propomos verbalmente, tem a preocupação que a classe médica não se possa desresponsabilizar perante o tratamento de um portador de anomalia psíquica.
Estando lá a palavra «compulsivo», se o portador de anomalia psíquica quiser ser tratado ou internado, é evidente, que o terá de ser. Isso decorre dessa alínea mas fica mais claro que a classe médica, perante um doente que aceita ser internado, não pode desresponsabilizar-se e dizer: porque é portador de anomalia psíquica vá ào tribunal primeiro e depois internamos. Creio que a preocupação é esta, porque há exemplos de outros países onde essa desresponsabilização se verificou em nome do direito à liberdade e à segurança.

O Sr. Presidente: - A palavra ao Sr. Deputado José Magalhães.

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O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na discussão feita na CERC sobre este artigo, na primeira leitura, tivemos ocasião de aprofundar aquilo que era desejado com a proposta do PS que deu origem a este debate. Ouvimos diversas entidades e está registada em acta a sua contribuição, que foi preciosa e positiva, ou seja, o assunto chega ao Plenário já discutido de forma inequívoca e ontem teve mais uma contribuição dada ainda em tempo útil por um conjunto de especialistas da classe médica, os quais, tendo tomado conhecimento na altura em que puderam e desejaram deste texto aventaram interrogações às quais procurámos responder.
Primeiro, quanto a este ponto, nenhuma dúvida se suscita no sentido de se tratar de garantir mais direitos, liberdades e garantias para pessoas em situação vulnerável, como as que são portadoras de anomalia psíquica. Mais liberdade e mais garantias contra situações que hoje não estão reguladas devidamente no direito ordinário e colocam dificuldades às autoridades policiais e à classe médica. O silêncio da Constituição da República Portuguesa ou a dúvida sobre o seu sentido, prejudica, não auxilia, pelo que há que o colmatar.
Em segundo lugar, esta norma não enferma nem é tributária de nenhuma concepção de Estado sobre os internamentos, as práticas médicas, os códigos médicos, as éticas médicas, não define uma doutrina médica sobre os internamentos; a doutrina médica é própria das legis artis e será aplicada pelos médicos, eles próprios, segundo o seu código, mas sujeita a controlo judicial. É esse o sentido desta norma, isto é, permitir formas de controlo judicial em relação a determinado tipo de internamento que é tipificado nos termos da lei e houve o premeditado cuidado de ter em conta a lição de direito comparado e não definir o modelo de controlo judicial.
Ninguém encontra aqui, nesta norma, um modelo que diga que controlo judicial é da competência exclusiva dos tribunais de execução de penas ou que tem de haver a mediação da entidade a, b, c ou d. Não o quisemos fazer pois esse modelo deve ser definido pela legislação ordinária.
Em terceiro lugar, não se configura o sistema de peritagem técnica necessário para o internamento, o qual só deve ser feito em circunstâncias de necessidade, de adequação à situação do doente e para Fins terapêuticos, muito obviamente. Aliás, o fantasma do Gulag não está nesta Assembleia, os internamentos por razões punitivas de carácter político nunca estiveram nesta Assembleia pela pena de ninguém e seguramente que nunca pela pena do Partido Socialista.
Congratulamo-nos, Sr. Presidente, porque tudo indica que vai ser possível atingir um consenso unânime, ou seja, não temos nenhuma objecção a que se fale no internamento compulsivo porque o auto-internamento ou o internamento «pelo próprio pé» não é privação da liberdade neste sentido. Não temos nenhuma objecção a que se sublinhe que é para fins terapêuticos porque, obviamente, só pode ser para fins terapêuticos; para fins retaliativos ou punitivos isso não é possível nestes termos. Mas, já agora, escreve-se para que não fique dúvida no mais duvidoso dos intérpretes.
Finalmente, há uma garantia de controlo judicial a definir nos termos da lei ordinária dentro do quadro constitucional. É uma solução francamente excelente e positiva e congratulamo-nos com o fim das dúvidas de quem quer que seja.

O Sr. Presidente: - A palavra, para uma intervenção, ao Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devo confessar que me parece que a proposta da Sr.ª Deputada Odete Santos de aditar «compulsivo» a seguir a internamento vem complicar mais do que aquilo que supostamente se propõe esclarecer. Julgo, aliás, como a Sr.ª Deputada Odete Santos bem referiu, que não há nesta proposta margem para dúvidas em relação à finalidade do internamento, não há também margem para dúvidas relativamente aos procedimentos que têm de ser adoptados em relação a esta matéria, como também não há margem para dúvidas de que, com esta proposta, acrescemos em direitos para cidadãos especialmente vulneráveis.
Todavia, a questão aqui colocada, Sr.ª Deputada Odete Santos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se formos ao fundo do problema, tem difícil tradução no texto constitucional e, porventura, podemos, se quisermos especificar demasiado, estar a fazer asneira, porque é bom não esquecer que os cidadãos, sejam eles quais forem, têm direito ao tratamento mas também têm o direito ao não tratamento.
Assim, do que se trata aqui verdadeiramente é de,
relativamente àqueles cidadãos que não tendo consciência da deficiência de que são portadores ou que podem ter uma deficiência não facilmente perceptível pelo comum dos outros cidadãos, a sociedade ter de reagir em relação a essa situação, no sentido de os tratar, na medida em que a sua
situação, no caso de anomalia psíquica, possa traduzir um perigo quer para o próprio cidadão quer para a sociedade que o rodeia. 

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É disto, e só disto que se trata. O que está aqui em causa é internamento para tratamento. Não podemos ofender este direito do não tratamento desse cidadão mas temos de reconhecer que, na sua própria defesa e na defesa da sociedade que o rodeia, obviamente, tem de haver, nestas circunstâncias, a possibilidade constitucional de salvaguardar este tipo de situações.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Ninguém pôs isso em causa!

O Orador: - É só desta situação, que é importante e que, tem alguma gravidade em termos sociais, que temos de tratar no texto constitucional e nada mais. Mais nenhum fantasma pode estar subjacente à apreciação desta proposta porque, Sr. Presidente, Srs. Deputados, a ninguém resta dúvidas de que não queremos construir uma sociedade onde existam hospitais psiquiátricos de má memória e não queremos que estes cidadãos, para além da sua vulnerabilidade psíquica, estejam mais vulneráveis do que aquilo que decorre dessa situação de doença.
Em suma, o que fazemos é acrescer direitos e garantias a cidadãos que merecem esse apoio e essa consideração por parte do Estado e da lei.

O Sr. Presidente: - A palavra ao Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A norma inicial da alínea h) do artigo 27.º, para nós, mesmo na formulação inicial, já tinha uma

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significação precisa, tal como continua a tê-la com a inclusão da ideia do internamento em estabelecimento terapêutico e até a ideia acrescida do internamento compulsivo.
Damos a esta proposta um sentido interpretativo, que decorre já de uma norma que é vigente no nosso direito interno com valor supralegislativo, a respeitante ao artigo 5.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, a qual diz muito claramente que ninguém pode ser privado da sua liberdade, salvo se se tratar de detenção legal de uma pessoa susceptível de propagar uma doença contagiosa, de um alienado mental, de um alcoólico, etc.
Portanto, a Convenção já diz isto e o objectivo desta disposição, que é similar ao da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, é, naturalmente, uma detenção para responder à protecção da pessoa, face a certas categorias de pessoas que representam um perigo para a sociedade ou até um perigo para elas próprias. Por isto e neste sentido, esta detenção deve decorrer de uma peritagem médica, deve ter um carácter e um âmbito que justifiquem esse internamento e não se pode prolongar para além da necessidade desse internamento.
Por conseguinte, o internamento é o necessário, é o proporcionado e é normalmente, como diz a Convenção em relação a vários casos concretos, um internamento em hospital, em clínica ou em estabelecimento similar. Se houvesse dúvidas na interpretação em termos de lei ordinária, a Convenção responderia a estas dúvidas, mas com este acrescento e o sentido que já foi dado e explicitado pelo meu colega José Magalhães e pelos outros Srs. Deputados, afasta-se em absoluto outra ideia dos objectivos deste internamento. Os seus objectivos são muito claros: proteger certas categorias de pessoas ou elas próprias perante elas próprias.

O Sr. Presidente: - A palavra, para um pedido de esclarecimento, ao Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, ouvi-o com muito interesse e sei que é um reputado especialista do direito em formação no Conselho da Europa. Não estamos a tocar num problema de somenos, como resulta das intervenções feitas até agora, estamos a tratar de uma questão que tem a ver com a dignidade humana e pergunto: até onde é que nos é legítimo privar alguém de liberdade internando-o por ser portador aparente de uma anomalia psíquica? Este é um problema mas um problema ainda mais grave que este é saber se o podemos sujeitar compulsivamente a tratamento.
Sabendo eu da experiência cultural de V. Ex.ª e do seu contributo, sempre precioso, no desenvolvimento deste trabalho do Conselho da Europa, pedia-lhe que esclarecesse a Câmara sobre qual é o sentido que aí, na prática do Conselho da Europa, vem a ser dado ao tratamento compulsivo. Lembro, nomeadamente, o que diz a última Convenção que a Sr.ª Ministra da Saúde foi assinar a Oviedo não há muito tempo, a chamada Convenção sobre Bioética, onde a um doente mental também é pedido consentimento para ser tratado e isto em nome do respeito pela dignidade humana.
Ouvi aqui misturas entre internamento e tratamento compulsivo que manifestamente me alarmaram e, por isso, gostava de ouvir um esclarecimento de V. Ex.ª.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A palavra, para responder, ao Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Barbosa de Melo, as questões que coloca preocupam-nos e essa preocupação identifica-nos na ideia central a que aludiu, a defesa da dignidade humana.
A questão que coloca tem uma pertinência muito concretizável e aquilo a que posso aludir é a um ou outro caso que possa ter, seleccionado nos casos que pude compulsar e nos textos respectivos.
A ideia vincada da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem é no sentido de que pode haver uma detenção independentemente de ter havido qualquer infracção penal. E a detenção não pressupõe sequer o processo penal ou civil mas pressupõe alguns casos e há casos concretos em que o tribunal decidiu nessa medida e de acordo até com o Regulamento Sanitário Internacional, que invocou para proteger os cidadãos e até as próprias pessoas no que respeita ao tratamento de algumas doenças consideradas altamente perigosas e contagiosas, como é o caso da peste, da cólera e da febre amarela ou de doenças eminentemente contagiosas. .
O caso de doenças contagiosas está incorporado na mesma alínea da disposição do Conselho da Europa.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Estamos a falar de
anomalia psíquica.

O Orador: - No caso de anomalia psíquica, a que queria chegar, a situação permitida é possibilitar a detenção de um alienado para tratamento mas de acordo com uma peritagem médica e em caso de urgência. Nesse sentido, a própria decisão de detenção deve ser proporcionada, deve definir um tempo, deve definir regras de proporcionalidade relativamente ao tratamento.
A doutrina e as decisões do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem referem que se trata de decisões necessárias, de carácter urgente, proporcionadas e não devem manter-se se não persistir a alienação e o internamento deve ser em hospital, clínica ou estabelecimento adequado.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de fazer uma pequena observação, se me permitem, pois temos de ver que a alínea não fala de um qualquer internamento; fala, sim, de internamento de alguém portador de anomalia psíquica e, leia-se, «decretado ou confirmado por autoridade judicial competente».
Não se trata, pois, de um qualquer internamento, é um internamento que tem esta especificidade, ou seja, só se for decretado ou confirmado pelo tribunal, que é a autoridade judicial competente. Por isso, nunca é a pedido. É justificado de tal maneira que o tribunal tem de decretado ou confirmá-lo, no mínimo. Sendo assim, para quê outro adjectivo a seguir a internamento, mesmo que o compulsivo?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

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A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando ouvi o pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Barbosa de Melo pensei que ele estava contra a alínea, mesmo com a redacção que agora tem, porque, é evidente, a actual redacção é para tratamento compulsivo, disso não tenhamos dúvidas!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, não!

A Oradora: - É, é! Então para que é? Então é mais grave!... Se o Sr. Deputado Luís Marques Guedes me diz que não é para tratamento, então, para que é? O portador de anomalia psíquica vai para um estabelecimento terapêutico fazer o quê? Então, os senhores têm de explicar o que é que querem com essa alínea, porque isso pode ser mais grave do que aquilo que eu pensava.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Mas o internamento tem de ser consentido!

A Oradora: - Srs. Deputados, quando se propõe, e parece-me que está certo, incluir a palavra «compulsivo» a seguir a internamento, a preocupação dessa inclusão vai no sentido de procurar impedir que os médicos, perante uma alínea destas, digam, quando lá vai um doente que até quer ser internado: «não senhor! Vá para o tribunal, porque o senhor é portador de anomalia psíquica»... E os Srs. Deputados, que conhecem até melhor do que eu o direito comparado e jurisprudência de outros países, sabem que há situações em que as pessoas querem ser sujeitas a determinados tratamentos e os médicos mandam-nas para os tribunais.
Portanto, a inclusão da palavra «compulsivo» tinha esse sentido, ou seja, nenhum médico podia dizer a um doente o seguinte: «pelo facto de ser portador de anomalia psíquica não o trato, vá para o tribunal». É esse o significado da proposta.

O Sr.ª Barbosa de Melo (PSD): - Mas o internamento tem de ser consentido!

A Oradora: - Mas se não é para tratamento, então é por medidas de segurança!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão do artigo 55.º
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sobre a proposta de alteração ao n.º 6 deste artigo, que consideramos de referência dos direitos colectivos dos trabalhadores na.Constituição da República Portuguesa, gostaria de tecer algumas breves considerações.
Em nosso entender, a proposta que se encontra em discussão responde a uma lacuna no núcleo dos direitos estabelecidos, quer na Constituição, quer na lei ordinária, para os representantes eleitos dos trabalhadores na sua actividade sindical e significa um efectivo reforço desses mesmos direitos.
Em boa verdade, com a aprovação desta proposta, os representantes eleitos dos trabalhadores passam a ver consagrado na Lei Fundamental o direito à informação e à consulta, o que constitui uma inovação e, na óptica do PSD, um suporte adequado a uma participação mais eficaz na defesa dos interesses dos trabalhadores a nível sindical.
Assim sendo, e porque esta proposta merece a nossa concordância, iremos votá-la favoravelmente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação a esta alteração, diremos que ela tem o significado e a importância de ser um complemento importantíssimo daquilo que foi à instantes discutido em relação à alínea c) do artigo 54 º. Aliás, sem esta alteração, a alínea c) do artigo 54.º teria pouca importância e pouco valor.
Portanto, esta alteração é complemento da outra, ou seja, as duas são inteiramente integrantes e complementam-se, tratando-se, como disse, de um avanço substancial na consagração dos direito dos trabalhadores.
De resto, até agora, era um direito que não estava totalmente claro e muito menos consagrado desta forma expressa. Daí a nossa satisfação por esta alteração que agora se verifica e para a qual contribuiremos com o nosso voto a favor.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva.

O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De forma breve, gostaria de dizer que nos parece que o artigo 54,.º acaba por Ficar melhorado com as alterações agora introduzidas.
Assim, e porque este artigo fica melhorado, esta proposta merece o nosso assentimento.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em boa verdade, o que ficará na Constituição já decorria do artigo 55.º, alínea d), em relação ao exercício da actividade sindical na empresa, pois tem-se entendido que também quer dizer direito a obter esclarecimentos de carácter económico-social.
Há também direitos de controlo de execução dos planos, de participação na própria elaboração dos planos, no Conselho Económico e Social, e, portanto, vamos reduzir a proposta ao significado que ela tem, não a empolando exageradamente, uma vez que o seu conteúdo já decorria de outros preceitos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão do artigo 56.º.
Tem a palavra o Sr. Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As propostas de alteração aos direitos das associações sindicais, previstas no n.º 2 do, artigo 56.º, merecem apoio do PSD. De resto, emergem do próprio acordo de revisão entre o PSD e o PS.
Relativamente à questão dos planos económicos e sociais, esta alteração vem consagrar o direito de as associações, para além do direito que a lei em vigor já estabelece no que concerne ao acompanhamento da sua execução, se manifestarem sobre esses mesmos planos. É, pois, o alargamento deste direito, que apoiamos.

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Mas, neste contexto dos direitos, das associações sindicais, esses direitos são ainda reforçados pela inclusão no texto constitucional da sua participação dos processos de reestruturação de empresas, especialmente no que concerne às acções de formação ou quando ocorra alteração das condições de trabalho.
É também uma inovação e trata-se, ao fim e ao cabo, de consagrar no texto constitucional um direito análogo ao que se propõe em alteração formulada ao artigo 54.º, que há pouco referimos, para as comissões de trabalhadores, o qual merece total concordância do PSD por consubstanciar e promover, no âmbito das relações de trabalho, uma aposta nos direitos de participação dos trabalhadores assentes num verdadeiro, eficaz e desejado diálogo social. Vamos, por conseguinte, votar favoravelmente estas alterações.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostava de salientar que foi proposto, mas por uma maioria não qualificada de dois terços, um n.º 5, que decorre de uma proposta do PCP, e entendemos que, essa sim, era uma proposta extraordinariamente importante para os trabalhadores e para as associações sindicais.
Assim, lamentamos e surpreendemo-nos pelo facto de o PSD, que nas intervenções que fez tanto tem falado nos trabalhadores e nos dirigentes sindicais, agora, não aprovar uma proposta tão importante como a que prevê a legitimidade processual das organizações dos trabalhadores em defesa do interesse colectivo da categoria que está em causa no processo, nos casos previstos na lei.
De facto, tem de salientar-se que, em contraponto às intervenções que o Sr. Deputado Francisco José Martins aqui veio fazer sobre propostas de conteúdo negativo, algumas, e inócuas, outras, o PSD rejeite uma proposta de tamanho interesse para as comissões de trabalhadores e para as associações sindicais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Em segundo lugar, queria referir-me à alínea e), que é idêntica à que discutimos, e à alínea c), salientando que o PSD conseguiu fazer o seguinte: onde estava a palavra «intervir» substituiu-a por «participar», isto lá para trás, e aqui, onde a Constituição consagrava «participar», substituiu essa palavra por «pronunciar».
Ora, quem ler as intervenções na revisão constitucional de 1989, na CERC, verá qual o entendimento que o PSD dá a estas três palavras, ou seja, um entendimento negativo para os trabalhadores. Porém, mas não é esse o entendimento que, apesar do PSD, sairá do texto constitucional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Strecht Ribeiro.

O Sr. Strecht Ribeiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de salientar a questão que foi levantada pela Sr.ª Deputada Odete Santos e estranhar a posição do PSD nesta questão.

De facto, não se entende que o PSD não reconheça às organizações dos trabalhadores o que acaba por reconhecer às associações de consumidores.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não se percebe que o PSD, sabendo de antemão que não são maiores as ilegalidades cometidas no mundo laboral do que as que se cometem a nível dos direitos dos consumidores, aceite no artigo 60.º o que recusa no artigo 56.º.
O PSD sabe, e tem obrigação disso, o alcance prático - não doutrinário nem ideológico - desta disposição e sabe que se não forem facultados aos sindicatos meios claros de actuação na defesa da legalidade laboral não haverá legalidade laboral.
Mais: o PSD sabe que a única forma de combater a ilegalidade na aplicação da lei nas empresas será um acréscimo absurdo da Inspecção-Geral de Trabalho e sabe que está a fazer um apelo à via repressiva e ao acréscimo do Estado neste domínio concreto.
Assim, não se percebe, porque não o esclareceu, apesar de inicialmente ter mostrado alguma reserva, por que razão, na prática, o PSD não quer conceder esse direito, embora haja Deputados do PSD que propuseram esta alteração ao artigo 56.º.
Gostaríamos de ver, da parte do PSD, um desejo sincero em colaborar na efectiva legalidade democrática no seio das empresas e gostaríamos de o ver, sinceramente, votar a consagração de um direito elementar de capacidade judiciária activa das organizações sindicais, no que toca às questões da legalidade laborai. 

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ainda antes de darmos início às votações, vamos discutir o artigo 57.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta de aditamento de um novo n.º 3 ao artigo 57.º da Constituição representa a possibilidade da salvaguarda constitucional do direito à greve.
Foi preciso correr muito sangue para que as sociedades em geral reconhecessem o direito à greve. Também em Portugal foi assim. Abril abriu-nos as portas para que tal reconhecimento fosse efectivo e o texto constitucional que se seguiu consagrou, como não podia deixar de ser, o direito à greve.
Desta forma, ao consagrar constitucionalmente este direito, estava o legislador constituinte a traduzir o reconhecimento do direito à greve como um importante e fundamental direito social, económico e político.
Mas o legislador estava também, desse modo, a prestar justa homenagem a todos quantos, e foram muitos, ao longo de anos e anos, com a sua luta e a sua perseverança, possibilitaram a aceitação e o reconhecimento da imprescindibilidade do direito à greve.
Mais tarde, a lei ordinária veio definir os contornos dentro dos quais o exercício do direito à greve poderia ter lugar.
Todos reconhecem hoje, alguns seguramente com mais convicção e menos hesitações do que nó passado, que o exercício do direito à greve nunca pode deixar de ter

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presente a necessidade de salvaguardar determinados serviços.
Se assim não for, estará eventualmente a ser respeitado o direito à greve mas poderão estar a ser postos em causa outros direitos, que em circunstância alguma o podem ser, sob pena de estarmos a subverter por completo a hierarquia de valores que tem de presidir a qualquer sociedade moderna.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Contudo, tratando-se do exercício de um direito com consagração e reconhecimento constitucional, o direito à greve, e da eventual colisão de tal exercício com outros direitos, importa encontrar o equilíbrio necessário para garantir que o exercício de um direito não põe em causa outros que têm de ser respeitados. Se olharmos para trás, facilmente concluiremos que este equilíbrio nem sempre foi fácil e raras vezes foi pacífico.
Assim, apesar da consagração legal dos serviços mínimos a garantir em caso de exercício do direito à greve, apesar de tal consagração legal, repito, muitos são os exemplos de situações em que alguns quiseram pôr em causa a necessidade de encontrar tais equilíbrios.
Quem não se lembra do esforço imaginativo que sempre vem ao de cima em situações de conflitualidade social que conduzem ao exercício do direito à greve, no sentido de justificar a não obrigatoriedade de garantir os serviços mínimos necessários à preservação e salvaguarda de outros direitos constitucionalmente consagrados?
O ponto comum desse esforço imaginativo tem sido sempre um: o direito à greve está constitucionalmente consagrado, pelo que seria ilegítima a limitação de tal direito, por lei ordinária, mesmo que destinando-se tal limitação a salvaguardar direitos também eles com consagração constitucional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pois bem, Sr. Presidente e Srs. Deputados, temos agora a possibilidade de ultrapassar, pelo menos, este argumento. De facto, se a Constituição, no mesmo artigo em que consagra o direito à greve, reconhecer a necessidade de os serviços mínimos indispensáveis serem assegurados em caso de exercício deste direito, pelo menos cai o argumento de que um aspecto, o do direito à greve, tem o valor que decorre da sua consagração constitucional enquanto que o outro aspecto, o da necessidade de assegurar os serviços mínimos indispensáveis, deve claudicar perante aquele, por não estar consagrado constitucionalmente.
Ao menos, esta discussão terminará com a aprovação deste n.º 3.
Depois, o bom senso, sempre o bom senso, que deve presidir à elaboração de qualquer diploma legal e, por maioria de razão, à da lei que regulamente o exercício do direito à greve, há-de permitir encontrar o tão almejado equilíbrio a que tenho vindo a referir-me.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, as sociedades evoluem. E, com elas, evoluem os homens e as mulheres que as constituem. Por isso, não olhamos sempre da mesma forma para os fenómenos sociais, por mais parecidos que eles se nos apresentem.
Foi esta evolução que, como há pouco referi, permitiu que o direito à greve fosse primeiro interiorizado e depois reconhecido constitucionalmente.

As relações sociais evoluem e transformam-se. Importa que a lei tenha presente tal evolução e tais transformações. Daí a sua temporalidade.
Talvez nenhum outro partido português se tenha batido como o PSD pela necessidade de modernização da legislação laboral. Às vezes, enfrentando por isso a calúnia e a difamação, mas com a certeza de que a evolução das relações sociais impunha, como impõe, a necessidade de modernização do normativo legal.
Daí que seja com muita satisfação que vemos neste novo n.º 3 do artigo 57.º a consagração constitucional de que o direito à greve será exercido no respeito por um quadro legal que definirá a necessidade de assegurar serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, para usar os termos da proposta, mas também a necessidade de ser assegurada a segurança e manutenção de equipamentos e instalações.
Quantas vezes, um conflito social extremado até uma situação de greve pôs em causa a segurança de equipamentos e instalações?
Trata-se pois, Sr. Presidente e Srs. Deputados, de reconhecer constitucionalmente uma preocupação que a todos deve tocar: que a radicalização de posições que conduz à greve hão possa pôr em causa, no limite, os próprios postos de trabalho e, assim, pôr em causa o próprio direito à greve.
Por isso dizia, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que se trata da, oportunidade de salvaguardarmos constitucionalmente o próprio direito à greve.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao ouvir a intervenção do Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa, eu, que não estive na Assembleia Constituinte, pensei: estou a ouvir um discurso da Assembleia Constituinte, aquando da consagração do direito à greve. É que V. Ex.ª começou a falar no direito à greve tal como hoje consta da Constituição, para disfarçar, talvez, o que diria a seguir.
No entanto, a sua intervenção não faz esquecer factos bem mais recentes da história da lei da greve, passados em 1992, quando, pelas mãos do PSD, foi discutido, nesta Assembleia, um projecto de lei que introduzia restrições no exercício do direito à greve. Esse projecto de lei foi lei e foi objecto, em sede de Tribunal Constitucional, da decisão que todos conhecemos, foi declarado inconstitucional, não por motivos materiais, mas por causa da votação, pois os senhores estavam tão distraídos e «contentinhos« com aquilo que julgavam que iam ter que perderam a atenção. De facto, quando se tem a posição do triunfador que julga ter tudo nas mãos, acontecem alguns percalços.
Também agora não será caso para cantar vitória, apesar de tudo, com o que senhores, apesar de tudo também, vão conseguir introduzir na Constituição.
Na verdade, o que o PSD queria era consagrar restrições ao direito à greve, porque não se esquece das grandes greves dos transportes públicos que abalaram o seu governo e é essa a «pedra que tem no sapato». Trata-se, de facto, de um vezo contra um direito que é um esteio da Constituição laboral, o direito à greve, tal como está consagrado na Constituição da República.

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Apresentam-nos esta proposta e, lá pelo meio, o PSD veio reconhecer que, afinal, era pouco - percebeu-se isso na intervenção do Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa -, porque o que esta lei dos serviços mínimos terá de ter não são restrições ao direito à greve, que não pode ter, mas, sim, a descoberta de limites imanentes naquilo em que há colisão com outros direitos. E descobriu-se, na intervenção feita, uma pontinha de desgosto, que não pôde exprimir-se de outra maneira, com muito mais tónica.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, retomaria aqui uma expressão, que, creio, até foi do Sr. Presidente em relação a outras matérias na revisão constitucional de 1989: aqui, o que se quer ou tem alto significado ou não tem qualquer significado. Tendo alto significado, mereceria a nossa mais viva rejeição. Não tendo qualquer significado, também não é preciso para nada.
Não obstante, está aberta a porta para uma regulamentação excessiva, que seguramente seria declarada inconstitucional numa lei do direito à greve. Esta porta foi aberta, e foi-o com a ajuda do PS, precisamente num dos direitos mais importantes dos trabalhadores, no direito que corresponde ao exercício da própria democracia participativa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há já mais duas inscrições e é de presumir que venha a haver outras mais. Por isso, vamos interromper a discussão deste artigo e retomá-la-emos depois das votações.
Vamos começar por proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 110/VII - Autoriza o Governo a proceder à revisão do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos agora votá-la na especialidade. Se não houver objecções, votaremos toda a proposta em bloco. .

Pausa.

Parece haver consenso, pelo que passamos à votação.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos proceder à votação final global da mesma proposta de lei.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Passamos à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 123/VII - Determina a aplicação da taxa reduzida do IVA a certas prestações de serviços relacionados com os resíduos sólidos urbanos e da taxa intermédia aos refrigerantes, sumos e néctares de frutos ou produtos hortícolas.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos votá-la agora na especialidade. Pergunto se, neste caso, também podemos fazer a votação em bloco.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos fazer a votação Final global da mesma proposta de lei.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Há também consenso no sentido de se votar a proposta de lei n.º 92/VII - Estabelece o regime jurídico da concessão de garantias pessoais pelo Estado ou por outras pessoas colectivas de direito público. Foi feita a votação em sede de comissão, mas há uma proposta de substituição de um artigo, com um requerimento de avocação. Creio não ser necessário votarmos a avocação.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, em minha opinião, é melhor votarmos primeiro o requerimento de avocação.

O Sr. Presidente: - Então, se assim é, Srs. Deputados, vamos votar o requerimento de avocação, apresentado pelo PCP. ,

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos agora votar, na especialidade, a proposta de substituição do artigo 6.º - com a epígrafe «Operações a garantir» , apresentada pelo PCP, com o seguinte teor: «As garantias pessoais destinam-se a assegurar a realização de operações de crédito e de outras operações financeiras, nacionais ou internacionais, de que sejam beneficiárias entidades públicas ou empresas nacionais».
Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, queremos sugerir ao partido proponente que acrescente a expressão «ou comunitárias».

O Sr. Presidente: - Pergunto ao partido proponente se concorda com esta sugestão.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, embora consideremos que seria desnecessário incluir isto na lei, na medida em que existe em todas as directivas sobre a matéria a questão do livre estabelecimento e do tratamento não discriminatório das empresas da Europa comunitária, não faremos qualquer objecção de fundo a que isso possa ser incluído, se for esse o consenso.

O Sr. Presidente: - Então, se todos estão de acordo...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, pela nossa parte entendemos que isso não só não é necessário como pode ser prejudicial. Vou tentar explicar rapidamente porquê.
Não é necessário, ao abrigo do Tratado de Roma, devido ao direito de estabelecimento. Ou seja, se essas empresas comunitárias se estabelecerem em Portugal ao abrigo do direito de estabelecimento é evidente que passarão - e isso tem efeitos imediatos na ordem jurídica, como todos sabemos - a beneficiar de todos os benefícios (passe o pleonasmo) em situação de igualdade com as empresas nacionais e, portanto, nesse sentido, é inútil.

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Mas pode ter um efeito perverso falar-se apenas em empresas comunitárias, porque se essas empresas não estiverem sediadas ou estabelecidas em Portugal de acordo com o Tratado de Roma e com a lei portuguesa, então, está bem de ver, os avales não devem ter lugar.
Portanto, parece-nos preferível manter apenas a expressão «empresas nacionais», sendo certo que, quando empresas comunitárias, ao abrigo do direito de estabelecimento, se estabelecerem no território nacional, passarão automaticamente a ter, para efeitos da legislação interna nacional, os mesmos benefícios das empresas nacionais e, por essa razão, cairão na alçada desta norma.
Achamos, portanto, que a norma não é estritamente necessária e pode ter um efeito perverso, pode ter uma leitura incorrecta, que não desejaríamos que tivesse. Aquilo que o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira pretende alcançar já está salvaguardado, através deste mecanismo jurídico, pela redacção que está em discussão.
Espero que o Sr. Deputado tenha percebido o efeito potencialmente perverso que essa alteração, não acrescentando nada ao que já lá está, pode introduzir, e que, seguramente, V. Ex.ª não deseja. O Sr. Deputado não deseja, seguramente, que uma qualquer empresa de um país de União Europeia que não esteja sediada nem estabelecida em Portugal, possa ter direito a requerer um aval ao Estado português, porque não é essa a intenção.
Portanto, para evitar esse efeito perverso, preferiríamos deixar a sua redacção com está.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, desejava. intervir sobre a proposta que foi apresentada, aproveitando a intervenção do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, com cuja primeira parte não estou substancialmente em desacordo, embora em relação à segunda tenha algumas dúvidas.
Penso que, mesmo que não esteja neste artigo 6.º a expressão «ou comunitárias», fica perfeitamente assegurado, como ele diz - e muito bem -, que, nas situações descritas, é aplicável a lei, mas não vejo, realmente, o efeito perverso, até porque, como sabe muito bem, não é apenas pela via do artigo 6.º que se define a elegibilidade das empresas ou entidades que são susceptíveis de serem apoiadas por esse tipo de garantias ou de apoios.
Como sabe, logo nos artigos iniciais define-se em que circunstâncias é que esses apoios podem ser dados, nomeadamente quando se verificar relevante interesse nacional ou interesse para a economia nacional. Portanto, é óbvio que a aplicação a cada situação em concreto tem de estar subordinada a esse interesse nacional e a esse interesse relevante.
Mas basicamente o que quero dizer, independentemente dessa questão que - reconheço -, não estando, também não altera substancialmente a filosofia do diploma e da ideia de que introduz uma perversidade, que não aceito, porque não será exactamente assim, é o seguinte: a Comissão de Economia, Finanças e Plano chegou a uma votação maioritária em relação ao artigo 6.º - o PCP não o votou tal como aparece no Plenário -, mas, curiosamente, a formulação que a Comissão aprovou foi a formulação do PSD. O artigo 6.º aparece aqui no Plenário exactamente com a formulação do PSD, não é a formulação do Governo.

Portanto, é, realmente, surpreendente que o PSD agora queira alterar a sua própria formulação. Não quero entrar por outros caminhos, mas, efectivamente, é, no mínimo, curioso, e isto tem de ficar publicamente esclarecido. Efectivamente, houve uma proposta do PSD na Comissão, que a maioria aceitou, exceptuando o PCP, e, agora, até essa proposta que foi aprovada na Comissão é alterada aqui.
Julgo que o PCP tem toda a justificação para fazer a avocação, uma vez que, na Comissão, não esteve de acordo com este artigo 6.º, no entanto, já me parece surpreendente a posição do PSD.
Portanto, independentemente do desfecho, antecipo já a nossa posição, que será de abstenção, porque, efectivamente, a formulação que tinha saído da Comissão, sendo já mais infeliz ou menos feliz do que a formulação do Governo, era, apesar de tudo, bastante mais feliz do que a formulação a que, eventualmente, se chegará com a proposta do Sr. Deputado Octávio Teixeira.
Por isso, a nossa abstenção tem de ser entendida nesse sentido, e basicamente tem de ser entendida no sentido de que não aceitamos interpretar a norma que Ficar, mesmo com a alteração que lhe introduz. o Sr. Deputado Octávio Teixeira, num sentido mais restritivo do aquele que resultaria da própria norma aprovada na Comissão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente. 

Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, se me permitir, é para tentar pôr um fim nesta polémica, que me parece que não se justifica.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, utilize a figura do pedido de esclarecimento.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, é para dizer que, com a minha intervenção anterior, como o Sr. Deputado também reconheceu, apenas tentei contribuir para evitar algum efeito perverso.
Concordo genericamente também com aquilo que o Sr. Deputado disse sobre esta matéria e, por isso, quero deixar claro que, se é esse o problema e esclarecido como ficou que esse efeito perverso não deve nem pode ser o desejo do legislador, o PSD não vê objecção a que se acrescente a expressão « ou comunitárias». Portanto, penso que, para superar eventuais dificuldades nesta votação, podemos votar a proposta inicial com a proposta do Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, acrescentando «entidades públicas ou empresas nacionais ou comunitárias». Pela parte do PSD, feito este esclarecimento, não vemos objecção e pensamos, que não vale a pena continuar esta polémica, que é um pouco artificial.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Sr. Presidente,, é

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apenas para sublinhar o seguinte: o que o Governo considera essencial relativamente a esta proposta de lei é que ela seja viabilizada, não fazendo questão quanto à redacção do artigo 6.º, com o qual se conforma, com o consenso que foi evoluindo.
Quando pedia palavra, tinha em vista fazer uma sugestão que podia ir de encontro à intervenção do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, no sentido de dizer que, então, em vez de explicitar "ou comunitárias" poderíamos talvez chegar ao mesmo local dizendo "empresas nacionais ou outras que gozem de igualdade de tratamento". Porém, depois da última intervenção do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, a questão está prejudicada, visto ter-se estabelecido o consenso com o acrescento da expressão "ou comunitárias". Portanto, não vale a pena dizer mais nada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, eu tinha pedido a palavra exactamente para levantar a questão que, antes de mim, foi levantada pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes; por isso não vale a pena acrescentar algo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Portanto, se bem entendi, ficaria "(...) empresas públicas ou empresas nacionais e comunitárias".

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - "(...) empresas públicas ou empresas nacionais ou comunitárias".

O Sr. Presidente: - "(...) ou empresas nacionais ou comunitárias"? Meu Deus! É que "empresas" é o substantivo e os qualificativos...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, face às várias questões que foram suscitadas sobre este aditamento, designadamente as considerações que foram feitas pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes, poria a questão de se não seria aceitável, neste caso concreto por parte do PS, a sugestão que foi feita pelo Sr. Secretário de Estado que seria acrescentar na parte final esta expressão: "ou empresas a estas legalmente equiparadas".

O Sr. Presidente: - Isso, do ponto de vista legal, é de uma imprecisão técnica terrível!

O Orador: - Talvez, depois, em termos de redacção final, se possa resolver o problema. Mas retiraríamos daqui...

O Sr. Presidente: - Equiparável a uma empresa nacional!?

O Orador: - ... aquele risco possível que foi suscitado pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes!

O Sr. Presidente: - Portanto, ficaria " (...) que justifiquem a identidade de tratamento"?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: Sr. Presidente, estamos aqui numa situação um bocado delicada, visto que eu julgava que à minha intervenção estava prejudicada mas, depois, percebi, pelo assentimento do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, do Sr. Deputado Octávio Teixeira e, creio, do Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, que aceitavam a redacção que eu tinha sugerido, que era "(...) empresas nacionais ou outras que gozem de igualdade de tratamento".

O Sr. Presidente: - Que gozem:.. Se não for alei a dar-lha!... Ou a lei lhe dá igualdade de tratamento ou não gozam! Ou, então, já antes gozavam!

Risos.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS):.- Sr. Presidente, neste caso, pressupõe-se que, por lei, gozem. de igualdade de tratamento! Louvo-me aqui na argumentação do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, embora pense que a formulação que sugerimos inicialmente era boa...

O Sr. Presidente: - Gozem de igualdade de tratamento por outra lei que não por esta!

O Orador: - Colocar aí a palavra "outra" talvez seja excessivo, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Se não é por outra, tem de ser por esta!

O Orador: - A formulação do Sr. Secretário de Estado " (...) gozem de igualdade de tratamento" parecia-me bem, mas enfim!

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados é que mandam!

O Orador: - Legalmente gozem... Não sei, mas V. Ex.ª é que é um insigne jurista! Eu não sou!

O Sr. Presidente: - Mas não tenho de me meter nisto, nem quero!
Portanto, a redacção seria "(...) ou empresas nacionais ou outras que justifiquem igualdade de tratamento". Acho que tem conteúdo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não,. Sr. Presidente, "(...) que gozem de igualdade de tratamento".

O Sr. Presidente: - Então, ficará "(...) ou empresas nacionais ou outras que gozem de igualdade de tratamento". Muito bem!

 

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, julgo que o consenso possível a que chegámos neste momento era que ficaria: «(...) empresas nacionais ou outras que legalmente gozem de igualdade de tratamento». Legalmente pode ser por lei ou pode ser por...

O Sr. Presidente: - Por outra coisa que não seja legal!

O Orador: - ... por regulamentos, directivas, etc.

Vozes do PS: - Exactamente!

O Sr. Presidente: - Fica assim, e eu remeto para a redacção final: «(...) que legalmente gozem de igualdade de tratamento»!

Vozes do PS: - Ora, exactamente! Ficou registado na acta!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar, na especialidade, este artigo 6.º, na formulação que acabámos de ler.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS.

É o seguinte:

Artigo 6.º Operações a garantir

As garantias pessoais destinam-se a assegurar a realização de operações de crédito e de outras operações financeiras, nacionais ou internacionais, de que sejam beneficiárias entidades públicas ou empresas nacionais ou outras que legalmente gozem de igualdade de tratamento.

Srs. Deputados, vamos votar, em votação final global, a proposta de lei n.º 92/VII, com a incorporação da nova redacção do artigo 6.º que acabámos de aprovar.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes e com votos contra do CDS-PP.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de diversos pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Serviços do Ministério Público da Comarca da Guarda - 2.º Delegação, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Soares Gomes (PSD) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo n.º 434/96-CP, que se encontra pendente naquela delegação.

Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Junqueira (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo n.º 639/96-CS, que se encontra pendente naquele tribunal, em audiência marcada para o dia 31 de Outubro de 1997, pelas 9 horas e 30 minutos

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 1.ª Secção do 3.º Juízo do Tribunal Criminal do Porto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Saraiva (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo n.º 550/95, que se encontra pendente naquele tribunal, em audiência marcada para o dia 13 de Novembro de 1997, pelas 9 horas e 30 minutos

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 4.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Loulé, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo n.º 146/97-CP, que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Inspecção de Braga da Polícia Judiciária, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Martinho Gonçalves (PS) a prestar depoimento, por escrito, na qualidade de testemunha, no processo de Inquérito n.º 887/96, que se encontra pendente naquela inspecção.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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Srs. Deputados, vamos iniciar as votações relativas à revisão constitucional.

Vamos começar por votar a proposta 52-P, de aditamento de uma alínea h) ao n.º 3 do artigo 27.º, apresentada pelo PS e PSD. Lembro que, se esta proposta for aprovada, fica prejudicada a votação da redacção proveniente da CERC.

Passamos, então, a votá-la.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP e de Os Verdes.

É a seguinte:

h) Internamento de portador de anomalia psíquica em estabelecimento terapêutico adequado, decretado ou confirmado por autoridade judicial competente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto ter sido aprovada, fica prejudicada a redacção da CERC.

Vamos passar à votação da proposta de aditamento de um n.º 5 ao artigo 51.º, apresentada pelo PS e proveniente da CERC.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

É a seguinte:

5 - Os partidos políticos devem reger-se pelos princípios da transparência, da organização e da gestão democráticas, com o direito de participação de todos os seus membros.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta de aditamento de um n.º 6 ao artigo 51.º, apresentada pelo PS e PSD e proveniente da CERC.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

É a seguinte:

6 - A lei estabelece as regras de financiamento dos partidos políticos, nomeadamente quanto aos requisitos e limites do financiamento público, bem como às exigências de publicidade do seu património e das suas contas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar a proposta de substituição do n.º 1 do artigo 52.º, apresentada pelo PS e PSD e proveniente da CERC.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo sido aprovada por unanimidade.

É a seguinte:

1 - Todos os cidadãos têm o direito de apresentar, individual ou colectivamente, aos órgãos de soberania ou a quaisquer autoridades petições, representações, reclamações ou queixas para defesa dos seus direitos, da Constituição, das leis ou do interesse geral e bem assim o direito de serem informados, em prazo razoável, sobre o resultado da respectiva apreciação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta de substituição do n.º 3 do artigo 52.º, apresentada pelo PS e PSD e proveniente da CERC.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo sido aprovada por unanimidade.

É a seguinte:

3 - É conferido a todos, pessoalmente ou através de associações de defesa dos interesses em causa, o direito de acção popular nos casos e termos previstos na lei, nomeadamente para promover a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial das infracções contra a saúde pública, os direitos dos consumidores, a qualidade de vida, a preservação do ambiente e do património cultural, ou para assegurar a defesa dos bens do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais, bem como de requerer para o lesado ou lesados a correspondente indemnização.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta 28-P, apresentada pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, de alteração do n.º 3 do artigo 52.º.

Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS.

Era a seguinte:

3 - É conferido a todos os cidadãos, pessoalmente ou através de associações de defesa dos interesses em causa, o direito de acção popular nos casos e termos previstos por lei, nomeadamente o direito de promover a prevenção, a cessação, ou a perseguição judicial das infracções contra a saúde pública, a degradação do ambiente e da qualidade de vida, a degradação do património cultural, os direitos dos trabalhadores ou outros direitos fundamentais constitucional mente previstos, bem como de requerer para o lesado ou lesados a correspondente indemnização.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar a proposta de substituição do n.º 2 do artigo 54.º, apresentada pelo PS e PSD e proveniente da CERC.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP e de Os Verdes.

É a seguinte:

2 - Os trabalhadores deliberam a constituição, aprovam os estatutos e elegem, por voto directo e secreto, os membros das comissões de trabalhadores.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta de substituição da alínea c) do n.º 5 do artigo 54.º, apresentada pelo PS e PSD e proveniente da CERC.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS e do PSD, votos contra do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

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É a seguinte:

c) Participar nos processos de reestruturação da empresa, especialmente no tocante a acções de formação ou quando ocorra alteração das condições de trabalho;

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta de substituição do n.º 6 do artigo 55.º, apresentada pelo PS e PSD e proveniente da CERC.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

É a seguinte:

6 - Os representantes eleitos dos trabalhadores gozam do direito à informação e consulta, bem como à protecção legal adequada contra quaisquer formas de condicionamento, constrangimento ou limitação do exercício legítimo das suas funções.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar a proposta de substituição da alínea c) do n.º 2 do artigo 56.º, apresentada pelo PS e PSD e proveniente da CERC.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS e do PSD, votos contra do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

É a seguinte:

c) Pronunciar-se sobre os planos económico-sociais e acompanhar a sua execução;

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a proposta 29-P, apresentada pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, relativa à alínea c) do n.º 2 do artigo 56.º, foi retirada, mas, a meu ver, estaria prejudicada.
Assim, vamos passar à votação da proposta de aditamento de uma alínea e) ao n.º 2 do artigo 56.º, apresentada pelo PS e PSD e proveniente da CERC.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS e do PSD e abstenções do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes.

E a seguinte:

e} Participar nos processos de reestruturação da empresa, especialmente no tocante a acções de formação ou quando ocorra alteração das condições de trabalho.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta 46-P, apresentada pelo PCP, de alteração do n.º 4 do artigo 56.º.

Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos contra do PSD. votos a favor do PCP e de Os Verdes e abstenções do PS f do CDS-PP.

Era a seguinte:

4 - A lei estabelece as regras respeitantes à legitimidade para a celebração das convenções colectivas de trabalho, bem como à eficácia das respectivas normas, não podendo excepcionar desta os casos de cessão total ou parcial de uma empresa ou estabelecimento.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar a proposta de aditamento de um n.º 5 ao artigo 56.º, apresentada pelo PS e PSD, que, na CERC, foi aprovada por maioria simples.

Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos contra do PSD, votos a favor do PS, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

Era a seguinte:

5 - As organizações de trabalhadores têm legitimidade processual em defesa do interesse colectivo da categoria, independentemente do exercício do direito de acção pelo trabalhador, nos casos e nos termos previstos na lei.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminado o período regimental de votações, vamos retomar a discussão das alterações relativas ao artigo 57.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta alteração é a que flui do acordo político de revisão constitucional e foi longamente discutida na CERC. Por isso mesmo, Sr. Presidente, é que importa sublinhar que é uma solução que se distingue, e se distingue em muito, das soluções propostas tanto pelo PP como pelo PSD.
Nesta matéria, Sr. Presidente, o PSD teve, ao longo da história, posições públicas que contribuíram sucessivamente não para facilitar mas para inquinar e causar sérias dificuldades à modernização da legislação laborai e à discussão daquilo que deve ser uma real modernização, que não tem confusão possível, ou não deve ter, com a redução dos direitos dos trabalhadores, a instituição, pela força bruta da lei, de uma supremacia patronal à custa de garantias fundamentais das organizações de trabalhadores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Essa contribuição do PSD, negativa, teve projecção em diversas revisões constitucionais. Felizmente, sempre com o mesmo resultado: nada, rejeição! Teve projecção em tentativas de alterar a Lei n.º 65/77: nada, rejeição, dado o funcionamento normal dos órgãos de controlo da constitucionalidade e a luta daqueles que se opuseram a essas iniciativas extremamente negativas, que marcaram a imagem pública do PSD e seguramente não marcaram bem, pelo que o PSD foi punido por isso. Aprendeu pouco, manifestamente.
Mas o debate constitucional, nesta parte, foi extremamente positivo. Desde logo, foi rejeitada a proposta do PP sobre esta* matéria. A proposta do PP suprimia a proibição constitucional do lock-out e permitia ao legislador ordinário regular, em termos altamente restritivos, o direito à greve. Essa proposta foi, pura e simplesmente, inviabilizada e rejeitada, tal como foi rejeitada a alteração proposta pelo PSD. em qualquer das modalidades e em qualquer dos sabores que projectaram a sua influência na CERC.
O que foi consagrado, Srs. Deputados, e nos é trazido aqui, é, pura e simplesmente, a transposição para o. texto

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da Constituição da interpretação constante da Lei n.º 65/77, segundo a qual não se confunde com o exercício de direito à greve o cumprimento de obrigações que o legislador preveja para acautelar eminentes valores tão relevantes como a greve, ela própria, e dentro de determinados limites. Ou seja, consagrámos nesta redacção, que é cuidadosa e que foi feita tendo à nossa frente a Lei n.º 65/77, aquilo que a doutrina portuguesa, sem excepções, considera poderem ser limites imanentes e adequações do exercício do direito à greve a uma sociedade democrática, onde há outros valores imperativos a- manifestar e a proteger.
Tem portanto, um significado esta alteração, mas é francamente um significado positivo. Primeiro, porque só por lei podem ser estabelecidas estas regras, e essa lei é lei da Assembleia da República, sujeita a debate prévio, com participação das organizações de trabalhadores, sujeita a controlo de constitucionalidade preventivo ou sucessivo, sujeita a veto do Sr. Presidente da República.
Por outro lado, não se pode impor, de forma atrabiliária, aquilo que este artigo refere.
Primeiro, só se admite esta intervenção legal fixando obrigações para a manutenção de equipamentos e instalações. E isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, é do interesse vital dos trabalhadores, é fundamental à luz de uma estratégia de defesa dos seus interesses justos e de não perturbação de outros valores relevantes.
Em segundo lugar, a obrigação de prestação de serviços mínimos não pode ser imposta a todas as empresas e estabelecimentos - esta redacção está feita ao milímetro para garantir isso -, só pode ser imposta a estabelecimentos e a empresas cuja actividade e cujo escopo se relacionem com a satisfação de necessidades sociais impreteríveis.
Por outro lado, mesmo em relação àquelas, serviço mínimo não é o que quer que seja. O serviço mínimo é mínimo, não visa o funcionamento normal, visa a satisfação de necessidades sociais impreteríveis aferidas em concreto, aferidas de forma adequada e a serem determinadas em condições que o próprio legislador há-de estabelecer consoante referi.
Em suma, Sr. Presidente, aos que vêem nesta norma um «adamastor» só pergunto: o artigo 8.º da actual lei da greve é inconstitucional? Há alguém nesta Sala que considere que o artigo 8.º da Lei n.º 65/77 é inconstitucional? Ninguém - e, aliás, até as conversas se interromperam!
É manifesto, Sr. Presidente, que o artigo 8.º não é inconstitucional.
Aquilo que a Constituição vai passar a dizer recobre exactamente esse âmbito é só esse e quanto a regulamentações excessivas, seriam excessivas, logo, inconstitucionais, como diria La Palice.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Exactamente!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pensei que esta questão seria um pouco mais pacífica...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Então, não é pacífica?!

O Sr. José Magalhães (PS): - É pacífica, mas nós não aceitamos a vossa proposta!

O Orador: - Sr. Presidente, peço desculpa, mas deve haver alguma confusão. É que eu pedi a palavra para falar sobre o artigo 57.º, n.º 3, e presumo que o Sr. Deputado José Magalhães tenha intervindo igualmente sobre a mesma matéria, ainda que me fiquem algumas dúvidas porque o Sr. Deputado referiu-se a uma proposta do PSD a esse respeito, mas a verdade é que o PSD não apresentou qualquer proposta sobre esta matéria.

O Sr. José Magalhães (PS): - Houve! Foi derrotada!

O Orador: - Sr. Deputado, se V. Ex.ª quiser falar das muitas propostas que apresentou nesta Câmara ao longo dos anos e que, hoje, já não defende...

O Sr. José Magalhães (PS): - Vamos falar!

O Orador: - Por amor de Deus, Sr. Deputado! A ser assim, a revisão constitucional não estará pronta nem lá para o Natal!

Aplausos do Deputado do PSD Calvão da Silva.

Continuando, apenas quero acrescentar mais uma coisa.
No que diz respeito a esta «corrida», que parece que o Sr. Deputado José Magalhães quis aqui introduzir para ver quem defende mais e melhor a modernização da legislação laborai, quero dizer ao Sr. Deputado que percebo o seu afã e a sua preocupação em mostrar-se interventivo nessa «corrida» porque chegou lá tarde, pois, durante muitos anos, não só não defendeu a modernização da legislação laboral como se lhe opôs e, graças ao brilhantismo que o caracteriza, opôs-se-lhe com algum sucesso, reconheça-se. Mas, agora que pretende apresentar-se como um grande defensor dessa modernização, obviamente, tem de fazê-lo mais alto e mais depressa do que aqueles que, há muitos anos, têm vindo a bater-se por ela. É óbvio que, sendo este o caso do PSD, quero dizer-lhe, Sr. Deputado que, pela nossa parte, não entramos nessa «corrida».

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostaria de não deixar sem resposta este comentário do Sr. Deputado...

O Sr. Presidente: - A que título pede a palavra, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é para uma curta intervenção.

O Sr. Presidente: - Então, se não se importa, fará a sua intervenção após a da Sr.ª Deputada Elisa Damião, a quem eu já tinha dado a palavra, a menos que troquem...

O Sr. José Magalhães (PS): - Nós trocámos, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Então, faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr.ª Deputada Elisa Damião, muito obrigado pela sua cedência.

Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa, não vamos fazer aqui uma espécie de «fotobiografia» comparada em que V. Ex.ª se estende ao meu lado para ambos sermos fotografados e medirmos os cadastros políticos...

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Não entendo!

O Orador: - Não vale a pena. O que está em discussão é o artigo 57.º da Constituição e, por mim. assumo tudo isso calmamente pelas razões que explicitei.
Quanto a este artigo, o Sr. Deputado é infelicíssimo ao trazer para aqui essa conversa porque a verdade é que o artigo 57.º, na formulação que o PSD previa, implicava devolver ao legislador ordinário poderes regulamentares que não tem e não terá.
No n.º 2 proposto pelo PSD - V. Ex.ª não estava na CERC, não passou por lá, mas está a tempo pois é aqui que se decidem as coisas; consulte a página 171 da «antologia» dos vários projectos de revisão constitucional que foram apresentados -, o partido devolvia ao legislador a capacidade de definir os moldes do exercício do direito à greve. E nós dissemos «Não. Não haverá nenhuma alteração neste ponto!», tal como dissemos «não» à proposta do CDS-PP no sentido da supressão da proibição constitucional do lock-out.
Em terceiro lugar, dissemos «sim» à definição do regime de serviços mínimos, no estrito acatamento da interpretação unânime da doutrina quanto ao que possam ser as possibilidades de o legislador ordinário impor esses limites mínimos. Congratulamo-nos com essa solução e todas as interpretações abusivas da solução constitucional são, obviamente, isso mesmo - abusivas -, não as contestaremos e lamentamos que quem quer que seja o faça.
O resto, Sr. Deputado, é outra conversa, outro debate. Está V. Ex.ª convidado para travá-lo comigo, aqui ou onde quiser, mas a esta hora, não!

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A discussão deste artigo, porque é paradigmático, é a sede adequada para fazer uma declaração e uma congratulação em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista no que diz respeito a um conjunto de propostas a cujo consenso foi possível chegar no sentido de melhorar a Constituição laboral.
Houve um profundo respeito por estes aspectos da Constituição cuja sensibilidade é inegável e que têm desempenhado um papel fundamental na vida social portuguesa.
Quando o Sr. Deputado do PSD, Pedro da Vinha Costa, se refere ao afã do PSD na modernização da Constituição, ficamos sem perceber o que é este conceito no plano filosófico, social e mesmo sociológico. Perguntamos se se pretende transformar a Constituição numa moda ou se o termo «modernização» significa inovação no sentido do progresso social.
Ora, como todos estes aspectos têm uma carga ideológica, diremos que V. Ex.ª usa a expressão «modernização da Constituição» para mistificar a intenção contrária, que é a de tornar a Constituição mais redutora, menos adequada às necessidades das sociedades modernas.
O n.º 3 deste artigo, que, no fundo, é a constitucionalização de um preceito já existente na sociedade portuguesa visando garantir a ordem e o respeito por outros valores igualmente constitucionalizados, é o que nós entendemos que é revelador do equilíbrio que o PS imprimiu à revisão constitucional nesta matéria. Está aqui o que nós quisemos que estivesse - e vamos encontrar muitos benefícios, mesmo nos artigos subsequentes - e não está aqui o que não quisemos que estivesse, tendo nós esgrimido, durante dias e semanas, nomeadamente contra os senhores, para que aqui não esteja o que os senhores queriam.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é má consciência!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vale a pena zangarem-se! Então, chegaram a um acordo e, agora, estão zangados? Ou será que há necessidade de dizer cenas coisas para mostrar lá para fora que estão em desacordo?

Risos do PCP.

Fiquei na dúvida sobre se teriam sido ditas algumas coisas, pelo que apenas quero fazer uma observação.
A alteração deste artigo não é nenhuma modernização da Constituição,...

O Sr. Luís Sá (PCP): - Bem dito!

A Oradora: - ... não tem o sentido que o PS gostaria que tivesse e já disse isto mesmo na minha outra intervenção. É que o que aí vem expresso não era necessário lá estar e é perigoso, já que, no futuro, perguntar-se-á «por que é que consagram isso se é verdade que o direito à greve conhece limites quando há colisão com outros direitos?».
Mas esta alteração também não tem o significado que o PSD pode querer dar-lhe de acordo com uma proposta que fez. Aliás, essa proposta só é aqui chamada à colação porque o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa começou a sua intervenção com um grande panegírico em relação ao direito à greve e é por isso que foi preciso recordar, e bem, qual tinha sido a proposta do PSD, nesta revisão constitucional e em anteriores revisões, que era no sentido de haver restrições ao direito à greve.
Como dizia, de facto, isto não é modernização absolutamente nenhuma. Aliás, os trabalhadores sempre souberam definir eles mesmos quais eram os serviços mínimos, o que era necessário ser feito para dar satisfação a outros direitos. Ora, em muitas situações, foram impedidos de prestar esses serviços mínimos e, noutras ainda, bem conhecidas do PSD, os serviços mínimos transformaram-se em «serviços máximos» e o que se fez foi impedir o exercício do direito à greve. É esta modernização que os senhores de facto defendem.

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Se vamos falar em modernização da legislação laboral, de que, agora, "encheram a boca", então, falemos dos jovens à procura do primeiro emprego que são contratados a prazo mesmo que exerçam um trabalho efectivo, falemos nos poderes que retiraram ao então Ministério do Emprego para proibir despedimentos colectivos ilícitos, falemos nas graves consequências para os trabalhadores em face dessa alteração que fizeram, falemos nos despedimentos por inadaptação, falemos no pacote laboral que, várias vezes, os senhores quiseram fazer aprovar aqui e que foi rejeitado outras tantas. O que os senhores propõem é que é modernização? Isso é velho, velho como a História, mas isso já os trabalhadores ultrapassaram porque sempre lutaram contra isso e conhecem essas propostas de há muitos e muitos anos!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs, Deputados, terminada a discussão das alterações relativas ao artigo 57.º, passamos à discussão das alterações relativas ao artigo 58.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou fazer uma intervenção muito breve.
O PSD tinha uma proposta relativamente ao n.º 2 do artigo 58.º para a qual esperamos que ainda seja possível obter a concordância do Partido Socialista de forma a permitir a viabilização da eliminação deste número, tão somente por duas razões que vou apontar.
Em primeiro lugar, este n.º 2 refere-se ao dever de trabalhar no contexto de um artigo cuja epígrafe "Direito ao trabalho". Portanto, há aqui quase uma contradição.
Mas a razão principal é a de que a parte final deste n.º 2 do artigo 58.º, ao excluir desse dever de trabalhar e do direito de trabalhar os cidadãos que sofram de diminuição de capacidade por razões de idade, doença ou invalidez, está a estabelecer uma diferenciação negativa que parece altamente imerecida para muitos cidadãos deste país. Na verdade, cidadãos portadores de deficiência são cidadãos que podem sofrer de uma diminuição de capacidade mas nem por isso têm menos direito ao trabalho ou menos dever de trabalhar, se este for reconhecido, do que qualquer outro cidadão que não seja portador de um qualquer tipo de deficiência e que, como tal, não tenha uma diminuição de capacidade.
Portanto, faço um apelo ao Partido Socialista no sentido de ter em conta o que acabei de dizer, dado que se trata de uma diferenciação negativa que não faz qualquer sentido.
No que diz respeito à proposta que ó PSD apresentou quanto à alínea c) do n.º 3 do artigo 58.º, para a qual também se espera que seja possível obter o consenso do Partido Socialista, trata-se, tão-somente, de chamar a atenção para um ponto que me parece importante que venha a obter consagração constitucional. Refiro-me à ideia de valorização profissional, de que se deve incumbir o Estado.
O conceito de valorização profissional é, substancialmente, mais amplo, porque mais rico, do que o simples conceito de formação profissional. Pensamos, por isso, que o primeiro não deixará de obter ó consenso do Partido Socialista.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de palavra; vamos passar à discussão das alterações relativas ao artigo 59.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Rodrigues.

O Sr. António Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgamos que as alterações que se pretende introduzir no artigo 59.º vêm melhorar o que está estabelecido em matéria de direitos dos trabalhadores.
O disposto nas alíneas b) e c) do n.º 1 deste artigo tem a ver com o reconhecimento que aos trabalhadores é dado em função da sua prestação de trabalho. Mas, como não é apenas isso que importa na vida das pessoas, há que promover e criar condições para conciliar a vida profissional com a vida familiar.
Já a alteração à alínea c) vem na decorrência natural do que a Constituição já prescrevia em matéria de condições de higiene e segurança na prestação de trabalho, acrescentando-se agora a questão da saúde.
Julgamos igualmente importante a proposta de aditamento de uma nova alínea - a alínea f) do n.º 1 que introduz e dá dignidade constitucional à matéria de acidentes de trabalho, o que também contribui para melhorar o estatuto dos próprios trabalhadores em termos da definição de direitos.
Relativamente ao n.º 2 do referido artigo 59.º, gostaríamos de deixar claro que o PSD apoia a proposta de integração da matéria relativa aos trabalhadores-estudantes no texto constitucional. Parece-nos, inclusive, que na matéria da valorização profissional dos trabalhadores, discussão já feita no âmbito do artigo 58.º, deve ser dado um espaço importante aos trabalhadores-estudantes. No entanto, temos algumas dúvidas quanto à formulação da proposta de alteração que chegou a Plenário.
Gostaria, por isso, de sugerir aos seus proponentes que eliminassem a parte final da alínea f), porque entendemos que há aqui um excesso de resguardo constitucional relativamente a esta matéria. Ou seja, a alínea f) do n.º 2 deveria conter apenas a formulação relativa à protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes e deixar de lado a restante matéria, pois parece-nos excessivo que o Estado esteja aqui a referir a garantia da sua formação.
Nesse sentido, e para que o PSD desse o seu voto favorável a esta proposta de aditamento, solicitava que os respectivos proponentes ponderassem a eventual retirada da parte final da alínea f) do n.º 2.
Relativamente ao n.º 3, estamos de acordo com a proposta de aditamento. pelo que votaremos a favor.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou fazer uma breve intervenção sobre a proposta de aditamento da alínea f) do n.º 2, relativa à protecção dos trabalhadores-estudantes, desde logo para dizer quão importante considero esta matéria, até pela circunstância de, por um lado, ter subscrito um projecto de revisão, conjuntamente com quatro colegas de bancada, onde esta proposta foi formulada, o que permitiu, logo na primeira leitura da revisão constitucional, em sede de Comissão, discutir profundamente esta temática, e, por outro, lado, ser subscritor da proposta de alteração que subiu a Plenário, aprovada com maioria simples.

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Quero igualmente afirmar, de uma forma muito clara, que estou totalmente receptivo à proposta agora apresentada pelo meu colega António Rodrigues, no sentido de consagrar no texto constitucional apenas a protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes, sem mais, reformulando, portanto, a proposta que, conjuntamente com Deputados do PS, subscrevi. Penso que, mesmo assim, os objectivos subjacentes à proposta estão atingidos.
Trata-se, de facto, de uma inovação no texto constitucional que merece relevância e fica, naturalmente, o convite ao Partido Socialista, também subscritor desta proposta, para repensar e, se possível, aceitar esta alteração à proposta inicial.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Trata-se de uma brevíssima intervenção para dizer que nos congratulamos com o facto de ficar consagrado na Constituição o direito dos trabalhadores à "assistência e justa reparação, quando vítimas de acidentes de trabalho ou de doença profissional", tanto mais que esta ideia saiu de uma proposta do PCP para o n.º 3 do artigo 59.º.
Também nos congratulamos pela consagração de garantias especiais para os salários, tanto mais que esta disposição nasceu de um artigo novo que o PCP havia proposto no seu projecto de revisão constitucional - o artigo 59.º-A.
Por outro lado, apesar de irmos votar a favor a proposta de alteração da alínea b) do n.º 1 do artigo 59.º, que consagra a possibilidade de conciliação da actividade profissional com a vida familiar, entendemos que esta alteração é redutora em relação à proposta originária, uma proposta do PCP sobre o horário de trabalho, em que se previa que este seria organizado através da estabilidade da organização do horário. Com esta proposta, pretendíamos que na Constituição ficasse consagrada a impossibilidade de se fixarem horários de trabalho por ciclos de 4 ou 12 meses ou de 2 anos, isto é, a Constituição deveria impedir a tristemente famosa flexibilidade que está introduzida na lei ordinária.
Também lamentamos que não tenha merecido a aprovação de outros grupos parlamentares uma proposta que reapresentámos e que diz respeito à valorização em termos reais do salário mínimo nacional.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se é verdade que há modernização no sentido da inovação, tal verifica-se, exactamente, neste artigo. E congratulamo-nos com estes contributos, sejam eles oriundos do PCP ou de qualquer outro partido, incluindo o PS.
Desde logo, queremos sublinhar, até porque se trata de uma proposta originária do Grupo Parlamentar do PS, uma importante inovação, que é a previsão da conciliação da vida activa com a vida familiar. Não se trata de uma inovação de somenos importância num momento em que a sociedade se desagrega e em que os trabalhadores enfrentam as maiores dificuldades em dar assistências aos filhos menores e aos idosos.
Também nos congratulamos pelo facto de o normativo constitucional poder vir a consagrar os direitos das vítimas de acidentes de trabalho e de doença profissional, bem como pela possibilidade de os salários virem a beneficiar de protecção especial na lei e de gozarem de especiais garantias.
Consideramos uma inovação bastante significativa aquela que, lamentavelmente, o PCP não aceita, mas que pode vir a melhorar as causas da igualdade. No actual normativo constitucional, o princípio de que para trabalho igual salário igual não está suficientemente claro, pelo que é preciso valorizar, igualmente, profissões e funções que hoje estão subvalorizadas. De facto, é importante modificar esta norma.
Quanto à proposta do PSD, para dar uma maioria qualificada à protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes relativa à proposta de aditamento da alínea f) do n.º 2 do artigo 59.º -, aceitamos a sua reformulação, porque consideramos que, mesmo que essa fórmula não corresponda inteiramente ao que seria a nossa pretensão, é já um avanço significativo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, há pouco não me referi à proposta de alteração da expressão "trabalho igual salário igual", e não vou poder dedicar-me a ela durante muito tempo, mas gostaria de dizer que o PCP irá votar contra essa alteração, porque considera que, de facto, a expressão que pretendem introduzir é pior e conduz menos à igualdade do que a já hoje consagrada na Constituição.
Nesse sentido, penso que a expressão "valor igual salário igual" poderá ter reflexos em, certas categorias profissionais - as categorias de licenciados e quadros técnicos -; hoje muito afectadas, mas a sua repercussão noutras categorias profissionais mais baixas não seria a que hoje tem a expressão "trabalho igual salário igual", que me parece garantir mais o direito à igualdade salarial.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminada a discussão das alterações relativas ao artigo 59.º, informo que acaba de dar entrada na Mesa uma proposta de aditamento da alínea f) do n.º 2 do artigo 59.º, do seguinte teor: "A protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes". Esta proposta é subscrita pelos Srs. Deputados Francisco José Martins, José Magalhães e outros.
Srs. Deputados, vamos então passar à discussão das alterações relativas ao artigo 60.º
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O artigo que agora passamos a discutir, o artigo 60.º, refere-se aos direitos dos consumidores. Falar de direitos dos consumidores ou, então, do direito do consumo seria erguer aqui um dos modernos ramos do direito, cuja autonomia ou autonomização - em construção - é hoje por muitos reivindicada. Não vou, no entanto, falar disso e limitar-me-ei a focar a utilidade daquilo que agora vai ser alterado, para melhor, na

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Constituição, bem como a reiterar um ou outro ponto que não deve ser perdido de vista como pano de fundo.
Em primeiro lugar, longe vão os tempos,, felizmente, em que se pensava que o mercado se regia pela tal "mão invisível" que fazia justiça a todos e a cada um. Provou-se que isso era falso e que, afinal, o mercado, não sendo fonte de justiça para todos, pelo contrário, muitas vezes gerava injustiças.
Gerou-se, assim, um. sentimento de necessidade de contrapeso social e o Estado viu-se obrigado, até pelos movimentos sociais que então surgiram, a corrigir essas injustiças. Daí que tenha surgido um Estado corrector, um Estado que, de algum modo, viesse legislar por forma a ir ao encontro de uma grande figura jurídica, como era Lacordaire, que dizia, lapidarmente: "Entre o forte e o fraco, é a lei que liberta e a liberdade que oprime".

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E assim foi em muitas circunstâncias, e ainda é hoje em muitas circunstâncias.
Por isso, John Kennedy dedicou integralmente aos direitos dos consumidores um grande discurso, que foi a pedra de toque e que ainda hoje é obrigatoriamente citado como ponto de partida deste novo direito em construção, o direito do consumo, dizendo que todos e cada um de nós somos consumidores, todos e, portanto, cada um de nós merecemos a protecção adequada, nas tais circunstâncias de desequilíbrio de poderes entre o forte e o fraco.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O mercado não pode ser uma ditadura, a "mão invisível" também não pode continuar a ser invisível para fugir à responsabilidade da justiça social. A Constituição portuguesa tem sido, desde sempre, das mais avançadas do mundo, ao consagrar os direitos dos consumidores, e orgulhamo-nos também por isso, por sermos dos melhores e dos mais progressistas no plano da justiça social.
A questão que está hoje aqui em causa, na alteração do n.º 3 do artigo 60.º, é apenas a de constitucionalizar a legitimidade processual das associações de defesa dos consumidores relativamente aos interesses ditos colectivos ou difusos. E digo apenas constitucionalizar, porque já é direito ordinário em Portugal. Já o é desde a lei de defesa do consumidor de 1981, continuou a sê-lo na lei actual de defesa do consumidor e, por isso, a Constituição apenas vem plasmar no seu próprio seio aquilo que as leis ordinárias há muito consagram. Não se trata de uma inovação, trata-se apenas de uma garantia constitucional para que, no futuro, não haja quaisquer veleidades ou retrocessos na matéria.
Por tudo isto, o PSD congratula-se também com este passo significativo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de assinalar que o Partido Socialista teve a iniciativa da norma que está em discussão e, quanto ao mais, este artigo incorpora os resultados de boa reflexão
constitucional, tanto do texto originário da Constituição como das sucessivas revisões; em que o articulado foi sendo reforçado.
Na Constituição, o consumidor não é visto em abstracto, a boa doutrina e as soluções constitucionais protegem os trabalhadores e os cidadãos em geral e a Constituição tem uma particular cautela com o novo direito do consumo em três números cujo conteúdo só precisa de ser melhorado num ponto. Era desse ponto que a proposta do PS tratava, pelo que nos congratulamos com o facto de ter sido contemplada na CERC com uma redacção aperfeiçoada. Trata-se de quê? Trata-se de reconhecer às associações de defesa dos consumidores e às cooperativas de consumo novas possibilidades de intervenção processual.
Não há, em bom rigor, uma sobreposição de 100% entre esta norma e a norma do artigo 52.º, que consagra o direito de acção popular. Porquê? Porque, como muito bem têm vindo a reflectir as associações de consumidores portuguesas, há necessidade de mais imaginação processual em Portugal, há necessidade de inventar figuras semelhantes às class actions, do direito anglo-saxónico, que permitam resolver, em grupo, questões que atingem uma multiplicidade de interlocutores. E isso distingue-se também daquele que é o âmbito próprio da acção popular, tal qual está configurada no artigo 52.º da Constituição.
Verifica-se, portanto, um casamento de tradições, a nossa, a típica, a habitual, e de experiências, como a norte-americana e a britânica, em que o uso de acções deste tipo permite, de uma assentada, resolver de forma eficaz questões que tocam uma maioria de interlocutores, que é precisamente aquilo que se deseja que passe a suceder na ordem jurídica portuguesa. Há, obviamente, uma zona de sobreposição com o artigo 52.º estamos conscientes disso -, foi alguma coisa que quisemos para assinalar a muita importância que têm as associações de consumidores e as cooperativas de consumo na defesa processual de interesses ligados ao consumo:
Trata-se, pois, de um bom resultado, por que nos felicitamos, assim como felicitamos todos aqueles que ajudaram a que ele pudesse ser alcançado, designadamente as associações que intervieram no debate e todos aqueles que nos trouxeram contribuições.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, muito rapidamente, quero dizer que a Constituição consagra e bem, integrado no título que trata. especificamente dos direitos e deveres económicos, sociais e culturais, um artigo que abrange os direitos dos consumidores e das respectivas associações, a quem se alarga a possibilidade de, independentemente de serem ouvidos sobre questões relativas à defesa dos consumidores, poderem, realmente, intervir em várias instâncias.
Apresentei uma proposta na qual pretendi inovar com a figura do provedor do consumidor, alargando-se, na vertente institucional, o conteúdo deste título da Constituição. Se se criasse o provedor do consumidor, dar-se-ia, pensava eu, uma maior eficácia aos cidadãos consumidores para recorrerem àquele órgão independente.
No entanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, considerando o debate na CERC, considerando a melhoria do n.º 3 do artigo 60.º. reconheço que, neste momento, a figura do provedor do consumidor não é relevante.

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Espero que, realmente, os direitos dos consumidores, como faz crer este reforço do n.º 3 do artigo 60.º, venham a ser devidamente ponderados e retiro a proposta 41-P que apresentei atempadamente a Plenário.

(O Orador reviu.)

Vozes do PSD e do Deputado do PS José Magalhães: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito brevemente, parece-nos que este artigo é de particular importância no texto constitucional.
Lamentamos o facto de algumas das propostas que fizemos, e que não colheram suporte de outros grupos parlamentares, não tenham transitado. Houve problemas em termos da sua formulação, que provavelmente as fragilizaram, mas, independentemente da maior ou menor fragilidade que pudessem conter, chamavam a atenção para aspectos que, de algum modo, julgamos que tinham e têm relevância e continuarão a tê-la. Porventura, no futuro, em lei ordinária ou em sede de revisão constitucional acabarão por ter de ser equacionados. Refiro-me, em concreto, a aspectos que dizem respeito à publicidade enganosa e oculta e à forma como esse tipo de publicidade induz, incorrectamente, os cidadãos ao consumo. Trata-se de uma questão que, aliás, está intimamente ligada à forma como a sociedade se organiza, aos valores, aos padrões culturais e aos padrões dominantes, os quais têm implícito outro aspecto para o qual chamávamos a atenção e que tem a ver com algo que pode ser um terreno delicado, que é a disciplina desta área, na medida em que tentar disciplinar nesta área pode ser entendido ou pode confundir-se com uma interferência na liberdade.
O que é facto é que julgamos que, para além do manifesto mau gosto em que se traduz a utilização abusiva das imagens da criança e da mulher na publicidade, nos moldes em que é feita, e independentemente de a disciplina nesta área ter de ser realizada de modo cauteloso, para não interferir com a liberdade, é seguramente uma questão em aberto e que, do nosso ponto de vista, terá de ser enquadrada, com razoabilidade, por via de um texto constitucional ou por via da lei ordinária, por normas de bom senso que permitam pautar a publicidade e o modo como chega aos destinatários, isto é, a todos nós. Aliás, julgo que esta questão é indissociável de uma outra que se traduz em ter em conta no texto constitucional a não discriminação em função do sexo. E utilizar a imagem da mulher, mais até do que a do homem, de uma forma degradante é, seguramente, atentatório do direito à igualdade e à não discriminação que está consagrado noutros artigos do texto constitucional.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão das alterações relativas ao artigo 61.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Antonino Antunes.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na economia do artigo 6l .º da Constituição actual, encontramos quatro números, o primeiro dos quais se refere à iniciativa privada, o segundo e o terceiro à iniciativa cooperativa e o quarto à iniciativa autogestionária.
A proposta que se faz vai no sentido da manutenção do actual n.º 1, que fica, portanto, intocável; quanto ao n.º 2, penso que será oportuno referir-se que houve quem quisesse inserir aqui a alusão expressa aos princípios da Aliança Cooperativa Internacional, porque, no fundo, tem sido unanimemente aceite que a Constituição, embora não o especificando, ao consagrar a necessidade de observação desses princípios está a reportar-se a um conceito que se densifica através da referência àqueles que foram e são formulados pela Aliança Cooperativa Internacional.
De resto, já nesta Legislatura, esta Assembleia aprovou, e foi publicado, o novo Código Cooperativo, a nova versão do Código Cooperativo, que resultou de uma actuação conjugada, sobretudo dos projectos do PSD e do PS. E houve o cuidado de, de certa forma mostrando o seu avanço e a sua actualização, se referir logo no artigo 3.º que as cooperativas, na sua constituição e funcionamento, obedecem aos princípios cooperativos que integram a Declaração sobre a Identidade Cooperativa adoptada pela Aliança Cooperativa Internacional, que são, como todos sabemos, aqueles que coincidem com a versão mais actualizada do Congresso de Manchester, de 1995, nomeadamente os da gestão democrática pelos membros, da participação económica dos membros, da adesão voluntária e livre - por onde devia ter começado -, da autonomia e independência, da educação, formação e informação, da intercooperação e do interesse pela comunidade.
Prevaleceu, no entanto, o entendimento de que basta garantir a consagração dos princípios cooperativos como o mínimo útil constitucionalmente relevante. Sobressai, naturalmente, o corolário de que, não sendo respeitados esses princípios, não se está em presença de autênticas cooperativas, não podendo aplicar-se os respectivos benefícios.
Temos agora uma proposta de aditamento de um n.º 3 e uma proposta de inserção de um n.º 4, que tomará a vez do actual n.º 4, o qual, como referirei a seguir, passará a constituir o n.º 5. Referem-se os n.ºs 3 e 4 especificamente a alguns chamados direitos cooperativos garantidos constitucionalmente, que são, como todos sabemos, o direito de todas as pessoas se constituírem em cooperativa - aliás, consagrado no n.º 2, que já referi - o direito de as cooperativas desenvolverem livremente a sua actividade (que já estava inserido no n.º 3, mas na sua primeira parte) e o direito de livre associação. No fundo, do que se trata é da definição de direitos e deveres económicos, como uma incidência particular no direito fundamental da liberdade de associação previsto no artigo 46.º da Constituição, e que já foi aqui objecto de discussão, nomeadamente na medida em que se refere que, aos cidadãos, é garantida a liberdade de constituição de cooperativas, sem necessidade de autorização prévia - daí que, designadamente, elas não possam ser dissolvidas por via administrativa, como todos sabemos -, do mesmo modo que é garantido o livre exercício das suas actividades, incluindo o poder de se agregarem. E é aqui, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que chega o ponto mais alto desta intervenção. Não digo da minha, porque, naturalmente, não quero referir-me a ela, mas desta intervenção legislativa. É que a dinâmica da vida actual impõe que, para além das tradicionais formas de cooperação - as uniões, as federações e as confederações -, sejam constitucionalmente consagradas outras formas de cooperação. Há, pois, que actualizar, há que flexibilizar, como já se disse, o n.º 3 do artigo 61.º para permitir outras

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formas mais competitivas mas também mais complexas de organização sem que isso viole o quadro constitucional. Também nesta medida, o Código Cooperativo, na sua versão aprovada nesta legislatura, prevê já, no seu artigo 6.º, as chamadas regiecooperativas, dizendo que é permitida a constituição, nos termos da respectiva legislação especial, de regiecooperativas ou cooperativas de interesse público caracterizadas pela participação do Estado ou de outras pessoas colectivas de direito público, bem como, conjunta ou separadamente, de cooperativas de utentes è de utentes dos bens e serviços produzidos. No fundo, há que garantir - e é isso o que nos preocupa que elas se mantenham (sem fazer, obviamente, alusão expressa às regiecooperativas) dentro do âmbito do sector cooperativo.
Por outro lado, Sr. Presidente, Srs. Deputados, há que acautelar que a lei ordinária que regular essas outras formas de intervenção não vá postergar nenhum dos princípios cooperativos. Sei que isto é uma preocupação do nosso partido, que entendemos que já está suficientemente consagrada na versão da proposta do artigo 61.º. No entanto, tomámos conhecimento de que o PS fez uma proposta de aditamento, não propriamente a este artigo mas - atendendo a uma melhor ordem sistemática - ao n.º 4, alínea a), do artigo 82.º, no sentido de fazer acrescentar a essa disposição, que diz: "os meios de produção possuídos e geridos por cooperativas, em obediência aos princípios cooperativos", a seguinte expressão: "sem prejuízo das especificidades estabelecidas na lei para as cooperativas de comparticipação pública, justificadas pela sua especial natureza". Como a seu tempo será dito, na altura da discussão dessa alteração ao artigo 82.º, nós não podemos deixar de reconhecer que se trata de uma maior explicitação daquilo que já mereceu o nosso acordo.
Para finalizar, Sr. Presidente, Srs. Deputados, como referi inicialmente, mantém-se o antigo n.º 4 que agora passa a ser n.º 5 e que se refere à iniciativa autogestionária, sob reserva da lei, evidentemente. Fez vencimento, portanto, a posição concertada do PS e do PCP no sentido de que continua esse direito a merecer consagração constitucional. Não teremos, neste momento, mais nada a objectar a isto do que aquilo que já foi dito, designadamente em sede de comissão; no entanto, não deixaremos de referir que, também no seio do PS, houve Deputados que acabaram por - referindo-se à nossa proposta de eliminação deste n.º 4 - reconhecer que não existem experiências válidas de autogestão que mereçam a tutela constitucional. Também no seio do PCP houve quem referisse com alguma pertinência que "a prática deste direito não tem a mesma incidência de outra época": referiu-o expressamente o Sr. Deputado Luís Sá, talvez com um certo saudosismo daquilo que, noutras épocas, se passou. Não vale a pena, Sr. Presidente e Srs. Deputados, "chorar sobre leite derramado". De qualquer modo, sempre é oportuno lembrar que não é o PSD responsável pela manutenção da consagração constitucional de uma realidade que não disse bem de si, que não deu boas provas de si mesma e que o tempo se encarregou de mostrar que está morta.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Perdeu-se a oportunidade de introduzir na lei fundamental esta benfeitoria actualizante. Não obstante e à guisa de conclusão, não podemos deixar de referir que as alterações que resultam do acordo do PS com o PSD para este artigo lhe introduzem uma benfeitoria considerável e que só por isso valeu, efectivamente, a pena, também no que diz respeito a este artigo, ter-se procedido a esta revisão constitucional.

(O Orador reviu.)

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Namorado.

O Sr. Rui Namorado (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, vou fazer uma breve intervenção que abrange não só este artigo mas, ao fim e ao cabo, todos os pontos em que haja alteração no campo cooperativo, que, aliás, são poucos.
A nossa Constituição, desde 1976, consagra um lugar próprio para as cooperativas portuguesas e, desde 1989, valoriza e exprime a articulação das cooperativas com outras formas de organização, também dinamizadas por objectivos que não são lucro, no seio de um sector cooperativo e social. Trata-se de uma marca específica do nosso texto constitucional, mas trata-se também de uma área onde existe um amplo consenso, que, aliás, tem sido duradouro.
Apesar do lugar de relevo atribuído pela Constituição às cooperativas, é, no entanto, possível proceder a alguns ajustamentos nesta revisão que beneficiam a coerência do dispositivo constitucional em matéria cooperativa. Embora tenha sido o PS a dar o impulso inicial conducente a esses ajustamentos, o resultado normativo alcançado contou com contributos de outras forças políticas, e em especial do PSD.
Quatro possíveis alterações estiveram em equação. Uma delas foi, logo na primeira leitura, considerada supérflua, já que se entendeu ser de tal forma inequívoco que os princípios cooperativos, cujo respeito é exigido pelo texto constitucional, são os consagrados pela Aliança Cooperativa Internacional que era inútil estar a dizê-lo na Constituição. Fica, portanto, mais uma vez sublinhado, aliás, em concordância com a doutrina larguissimamente dominante, pelo legislador constitucional. que os princípios cooperativos a que se refere a Constituição da República Portuguesa são os que a Aliança Cooperativa Internacional consagra.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Três outras possíveis alterações estavam em causa na área cooperativa.
A primeira destas alterações traduziu-se num aditamento ao n.º 3 do artigo 61.º, de modo a que agora se tornasse possível que a lei consagre tipos cooperativos de graus superior, para além das federações, das uniões e das ,confederações. Trata-se de uma modificação que projecta o princípio da liberdade cooperativa e afasta um bloqueamento a iniciativas que já se desenham no horizonte.
A segunda destas alterações consubstancia-se na conjugação do novo n.º 4 do artigo 61.º com um aditamento à alínea a) do n.º 4 do artigo 82.º que foi apresentado e mereceu o consenso do PSD, como já foi aqui dito. Através do primeiro destes preceitos, destaca-se a especificidade das cooperativas com comparticipação

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pública, conjunto. dentro do qual hoje se situam as cooperativas de interesse público ou regiecooperativas. O aditamento introduzido ao artigo 82.º admite como elementos do sector cooperativo e social quaisquer cooperativas com comparticipação pública, mesmo que o seu regime legal não obedeça por completo aos princípios cooperativos desde que essa não obediência se justifique pelo carácter público de uma parte dos elementos que integram a cooperativa e não vá além disso, não exceda essa motivação.
Põe-se, assim, termo a um anacronismo que já podia ter sido resolvido em 1989 e que se traduz no facto de as cooperativas de interesse público actualmente existentes pertencerem ao sector privado, embora a sua génese, a sua lógica e a sua tradição internacional, para já não referir a sua denominação, as ligarem ao sector cooperativo.
A terceira alteração alarga o sector cooperativo e social às entidades não lucrativas vocacionadas para a solidariedade social, com especial relevo para as de natureza mutualista. Prossegue-se assim um caminho iniciado em 1989, quando se transformou o sector cooperativo no actual sector cooperativo e social que resulta da junção ao n.º 1 das entidades que antes disso pertenciam ao sector público comunitário e ao sector público autogestionário.
Com esta alteração, vem agora estimular-se uma actividade meritória de muitas organizações sem fins lucrativos e dar-lhes um lugar constitucional que correspondesse à sua génese, estrutura e objectivos. Reflecte-se uma dinâmica social que não está circunscrita ao nosso país. Todavia, hoje, é já claro que há especificidades nacionais nesta área que não podem meter-se à força em conceitos com géneses em conjunturas diferentes, que se revelaram demasiado fluidos e instáveis para poderem alicerçar construções jurídicas. Hoje, é claro que esta noção bipolar, consagrada na Constituição, de um conjunto complexo em que se especifica o que é cooperativo e o que é social se adequa melhor à realidade actual e ao seu horizonte do que os outros conceitos como sejam o de economia social ou de terceiro sector. Estes podem ser focos legítimos de colaboração prática ou objectos de investigação, não devem ser pontos de partida para estratégias políticas ou para elaboração de normas jurídicas.
Estamos, pois, perante um passo positivo e rigoroso de um ponto de vista doutrinário, adequado do ponto de vista do que é a realidade social e que se espera que venha a ser fecundo na prática.
As cooperativas portuguesas podem, pois, rever-se nesta revisão constitucional. Podem continuar a sentir na Constituição um poderoso esteio e um factor positivo para o seu desenvolvimento:

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lano de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, é uma verdade, como acabou de dizer o Sr. Deputado Rui Namorado, que a Constituição da República Portuguesa desde sempre tem, e bem, consagrado garantia s constitucionais - passe o pleonasmo - ao sector cooperativo, designadamente pela dignidade que lhe dá enquanto sector específico de propriedade dos meios de produção e, por outro. lado, em relação aos outros normativos constitucionais, que lhe asseguram garantias e apoios especiais em função da sua própria actividade social, que as cooperativas e o sector cooperativo desempenham na sociedade portuguesa.
É certo que nem sempre ao normativo constitucional tem correspondido, como seria desejável, legislação ordinária e muito menos políticas concretas que traduzam na vida e na realidade aquilo que são a consagração constitucional do apoio ao sector cooperativo. Mas é bom que o sector cooperativo se mantenha na Constituição com o privilégio; com os apoios e com as garantias que os comandos constitucionais definem.
Estas actualizações que hoje são propostas não. têm, para nós, nenhuma especial reflexão a não ser aquela que já foi patente nas intervenções anteriores, de que os acréscimos que são propostos em relação ao sector cooperativo devem sempre e sempre ser lidos no quadro do respeito pelos princípios cooperativos, ou seja, no quadro do respeito pelos princípios da Aliança Cooperativa Internacional, recentemente actualizados no Congresso de Manchester. Esse é o quadro enquadrador para onde a Constituição reporta quando fala na defesa dos princípios cooperativos.
Quanto ao princípio autogestionário que o Sr. Deputado Antonino Antunes e o PSD entendiam retirar da Constituição, só duas notas: a primeira é que o facto de, na prática da vida económica e da vida social, as unidades autogestionárias, em virtude das políticas destrutivas e da ausência de apoios que tiveram. não tenham tido o sucesso que era desejável que tivessem e que, potencialmente, tinham condições para ter, isso não quer dizer que a Constituição não mantenha consagrado constitucionalmente o seu reconhecimento e o reconhecimento do direito da autogestão. É um princípio que está na Constituição, como outros princípios estão, infelizmente independente, muitas vezes, da sua realização na prática. Mas é preciso que se diga que o facto de o direito à autogestão e o princípio autogestionário terem hoje as limitações que têm, na realidade, se deve não ao princípio em si mesmo mas, obviamente, às políticas condicionadoras e à ausência de apoios que, ao longo de anos, vários Governos do PSD consagraram-na sua prática política e que condicionaram, limitaram, amputaram e quase liquidaram o sector autogestionário em Portugal.
Aliás, Sr. Deputado Antonino Antunes, passam os tempos e passam as vontades, porque quem ler o Programa do PSD verificará que o princípio autogestionário era uma das grandes bandeiras dos programas do PPD, aliás. como contraponto, na altura, às empresas públicas. O PSD procurou liquidar as empresas públicas, procura liquidar os princípios autogestionários, procura, sempre que possível, limitar e condicionar os princípios cooperativos e a economia social e por essa linha, obviamente, reduziria a Constituição da República Portuguesa a um exclusivo apoio ao sector privado.
Felizmente que ainda não conseguiu essa maioria na Assembleia da República e felizmente que o direito de autogestão se mantém consagrado na Constituição da República Portuguesa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão das alterações relativas ao artigo 63.º.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Filomena Bordalo.

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A Sr.ª Filomena Bordalo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Partindo do reconhecimento do direito de todos à segurança social, as alterações propostas ao artigo 63.º vêm, de uma forma muito ciara, actualizar e reforçar o papel do Estado e da sociedade no respeito, no exercício e no acesso àquele direito.
A consagração, em sede constitucional, da função do Estado versus solidariedade é um compromisso muito significativo. Mas importa referir aqui que o papel do Estado não é apenas no reconhecimento do direito de constituição de instituições particulares de solidariedade social mas, essencialmente, no apoio ao seu funcionamento. O Estado, porque reconhece, apoia, e, porque apoia, fiscaliza.
A opção de princípio seria, no nosso ponto de vista, um artigo autónomo, face ao significado e à marca identificadora que tal função do Estado imprime ao sistema de segurança social.
Perante as instituições particularidades de solidariedade social, o Estado reconhece a sua natureza jurídica, a complementaridade das funções que exercem, apoia e fiscaliza as suas actividades. No entanto, o essencial conseguiu-se, e importa realçar a alteração proposta para a epígrafe do artigo 63.º. Não é por acaso que o artigo 63.º se passa a referir à segurança social e solidariedade.
As instituições particulares de solidariedade social não são entidades meramente toleradas, são entidades consagradas em sede constitucional, são entidades indispensáveis no sistema de segurança social e, mais amplamente, no sistema de protecção social.
As alterações das estruturas e das relações familiares, as consequências da participação política, social, cívica e económica da Mulher, a profunda alteração do significado do trabalho, enquanto valor individual e social, provocam profundas transformações sociais.
Cada vez mais, e face às alterações sociais, demográficas e económicas, se alargam os objectivos das instituições particulares de solidariedade social, se diversificam os seus campos de actuação, cada vez mais têm de dizer, e dizem, presente, lá onde a pessoa humana e a família o exigem. Assim o exige o respeito do direito à dignidade pessoal, do direito à cidadania e do direito ao desenvolvimento da personalidade
A não explicitação das Misericórdias neste artigo é, apesar de tudo, um facto que não se pode deixar de lamentar. As Misericórdias são também instituições particulares de solidariedade social, mas têm, no entanto, que merecer da parte de todos nós um reconhecimento específico. Elas fazem parte integrante da nossa história, do nosso património cultural e social. Elas foram a semente visível da solidariedade. A sua obra e exemplo não podem deixar de ser transmitidos às gerações vindouras.
Não podemos permitir que caia no esquecimento a obra de mais de cinco séculos que as Misericórdias têm desenvolvido. As Misericórdias mereciam, quando se fala em solidariedade, uma referência própria no nosso texto constitucional.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: As alterações propostas ao artigo 63.º não foram tão longe quanto se justificaria no campo dos princípios do sistema de segurança social. Mantém expressos os princípios ,da universalidade, da unidade e da descentralização, da participação e da solidariedade, mas não avança na Consagração de princípios tão fundamentais como o da equidade e o da justiça social.
O princípio da equidade enquanto fundamento ontológico, corrector da deficiência da lei em resultado da sua generalidade, entendido como adequação da justiça às particularidades de cada situação.
O princípio da justiça social em que, simultaneamente, se acentue a responsabilidade conjunta dos indivíduos, da sociedade e do Estado, na formação do bem comum e na justa medida no benefício de cada pessoa.
Não se foi tão longe como seria necessário na abertura do caminho à reforma da segurança social. Reforma e não revolução. Reforma em que o Estado-Providência, embora não se substituindo aos princípios da solidariedade e da responsabilidade individual, seja sempre o garante de um compromisso entre a sociedade e a democracia. Reforma em que, sem alarmismo, com perspectiva de futuro e com sentido de responsabilidade, se construa progressiva e solidamente uma sociedade-providência. Reforma em que se conciliem direitos individuais com deveres sociais. Em suma, uma reforma da segurança social justa e solidária. Reforma que urge e a que o País não se poderá furtar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Popular apresenta uma proposta de alteração que, pensamos, deve merecer a melhor atenção, uma reflexão política e também alguma precisão técnica daquilo que resultou da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.
Em primeiro lugar, e começando pela epígrafe, resulta da proposta apresentada pela CERC que a anterior epígrafe "Segurança social" passe a ser "Segurança social e solidariedade". Esse é um erro grosseiro, do ponto de vista técnico.
Reportemo-nos à história. A segurança social nasceu e teve a sua génese nos seguros sociais obrigatórios e foi no período após a II Guerra Mundial, nomeadamente, com o relatório Beveridge, que se entende que os seguros sociais não cobrem todas as realidades e todas as eventualidades que põem em causa as condições económicas e as condições de subsistência das pessoas, das famílias. É então introduzido o princípio universalista e os cidadãos passam a ser portadores de direitos sociais, independentemente da sua capacidade contributiva para o sistema de protecção social. É daqui que resulta a concepção e o conceito de segurança social. Ou seja, segurança social em si mesmo integra as justiças distributiva e comutativa, e a justiça distributiva é o fundamento da solidariedade. Aquilo que temos aqui, permitam-me a expressão, Srs. Deputados, é uma aberração jurídica.
Senão, vejamos: temos na epígrafe "Segurança social e solidariedade". Portanto, partimos do princípio de que solidariedade não está integrada no conceito de segurança social, mas depois, no n.º 1, temos "Todos têm direito à segurança social". O que quer dizer que nem todos têm direito à solidariedade!... Parece-me, objectivamente, que isto é uma aberração e não corresponde, seguramente, ao espírito que presidiu à introdução na nova epígrafe.
Portanto, a proposta que o Partido Popular apresenta é a de que a epígrafe continue como está, que estava muito bem, pois o conceito de segurança social contempla a justiça distributiva, que se espelha na solidariedade, e a justiça comutativa.

 

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Em segundo lugar, no texto apresentado, que, aliás, vem no seguimento do actual n.º 2 do artigo 63.º, fala-se num sistema de segurança social unificado. Bom, não sei o que é um sistema unificado. Por definição, um sistema contém vários subsistemas e é precisamente pela articulação e pela coordenação desses subsistemas que encontramos o próprio sistema. Mas aquilo que sempre foi interpretação comum é a de que, ao falar o texto constitucional de um sistema unificado, se estaria a reportar a um regime unificado de segurança social. Tinha como pretensão o legislador constitucional que, no futuro, o regime fosse único. Hoje, verificamos que, ao contrário do que acontecia no passado, não é isso que a sociedade precisa, não é isso, seguramente, que a segurança social deve oferecer aos portugueses. E a questão é muito clara, Srs. Deputados. Nós hoje, perante o texto constitucional, teríamos vários regimes inconstitucionais, entre os quais o regime específico dos trabalhadores da função pública. Querem acabar com o regime especial da função pública? Então, assumam-no! Querem acabar com o regime especial dos trabalhadores da banca e seguros? Então, assumam-no! Querem acabar com o regime especial dos advogados? Então, assumam-no! E criemos só um regime. É que, se mantivermos no texto constitucional um sistema unificado, quer dizer que o regime será um e um só e que o sistema de segurança social começa e acaba num só regime de protecção social.
Para o n.º 3, julgamos que é fundamental que o texto constitucional abra as portas, em vez de fechar. Houve uma tentação, que é sempre perigosa, de fazer elencagem daquilo que seriam as eventualidades e os riscos sociais garantidos pelo sistema de protecção social público. Fala-se na doença, velhice, invalidez, viuvez, orfandade, bem como no desemprego, mas a verdade é que, à medida que vamos especificando, vamos fechando as portas. As eventualidades que, hoje, queremos proteger poderão não corresponder às eventualidades que, amanhã, temos o dever de proteger e o texto constitucional deve abrir essas portas. Por isso, entendemos que, em nome da filosofia que prevaleceu a todo o projecto apresentado pelo Partido Popular, a Constituição da República Portuguesa deve verter princípios. E o princípio fundamental para nós é o de que o sistema de segurança social proteja os cidadãos contra todos os riscos sociais e eventualidades que provoquem a diminuição de rendimentos ou de capacidade para o trabalho, bem como em todas as outras situações de falta de meios de subsistência.
Por sua vez, introduzimos também um princípio, que julgamos fundamental, que é verter no texto constitucional que o sistema de segurança social se funda em princípios de justiça distributiva e comutativa. A justiça distributiva reflecte, como disse há pouco, os princípios de solidariedade; a justiça comutativa reflecte aquilo que decorre dos seguros sociais que estiveram na génese da segurança social.
Por último e para o n.º 5, entendemos que a redacção proposta, embora seja de menor importância, não é despicienda. Fala-se naquilo que deverão ser os objectivos das instituições particulares de solidariedade social, mas, em bom rigor, a solidariedade não é apenas exercida pelas instituições particulares de solidariedade social. Estas exercem uma forma específica de solidariedade, que é a acção social. E por que é que ela é diferente de outras formas de solidariedade? Porque solidariedade são os regimes não contributivos, pessoas que recebem pensões, é a pensão social, pessoas que não contribuíram para o sistema, mas que nós reconhecemos que têm direito a uma pensão. Isto é solidariedade e não são as instituições particulares de solidariedade social que devem exercer esta obrigação. A acção social tem uma característica muito específica e por isso deve, de facto, ser exercida por estas instituições, através de um serviço personalizado, serviço, esse, que deve tratar cada pessoa e olhar para a situação de cada pessoa, porque o Governo e o Estado não o podem fazer. É por isso que penso que a redacção ganharia se identificássemos claramente como objectivos primeiros das instituições particulares de solidariedade social prosseguir objectivos de acção social.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: É esta a justificação da proposta do Partido Popular.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, pelo número de inscrições que a Mesa registou para pedidos de esclarecimentos, verifico que este artigo vai demorar muito tempo. Como o jantar também é uma exigência de todos nós, vou dar a palavra à Sr.ª Deputada Filomena Bordalo para formular o seu pedido de esclarecimento e depois ao Sr. Deputado Nuno Correia da Silva para responder, deixando o resto da discussão deste artigo para depois do jantar.
Tem, pois, a palavra a Sr.ª Deputada Filomena Bordalo.

A Sr.ª Filomena Bordalo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, gostaria de expressar a si e ao seu grupo parlamentar que, relativamente ao n.º 2 do artigo 63.º, apoiamos o sentido, o fundamento e o espírito da proposta que apresentaram, até porque ela vem exactamente na linha de uma proposta que foi apresentada pelos Deputados do PSD na CERC, em que se dizia «(...) a que todos os cidadãos tenham acesso segundo as exigências de justiça social».
Assim, e porque se trata de um pedido de esclarecimento, gostaria de saber se, quando fala nos princípios de justiça distributiva e comutativa, quer falar de justiça social.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Filomena Bordalo, agradeço a questão que colocou. Efectivamente, a justiça comutativa impõe que a prestação recebida por cada um seja em conformidade com aquilo que foi o seu esforço contributivo, sendo a justiça distributiva, como é comummente definida - e, aliás, é um conceito que não é objecto de grande controvérsia -, tratar de forma igual o que é igual e de forma diferente o que é diferente.
Entendemos que é isto que deve ser um sistema de segurança social e um sistema de protecção social. É aqui que se funda a justiça social que protagonizamos e que gostávamos de ver vertida no texto constitucional.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Apoiado!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ficam, então, inscritos, para depois de jantar, os Srs. Deputados José Calçada, Elisa Damião, Barbosa de Melo e Jorge Lacão.

Está interrompida a sessão.
Eram 20 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 21 horas e 45 minutos.

Srs. Deputados, uma vez que ainda não se encontram na Sala os Deputados José Calçada e Elisa Damião, dou a palavra ao Sr. Deputado Barbosa de Melo para uma intervenção.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vou dizer coisas muito diferentes das que foram ditas pela Sr.ª Deputada Filomena Bordalo, mas gostaria que ficasse registada a proposta que o PSD fez, e que a Sr.ª Deputada trouxe a Plenário, de neste artigo se fazer uma referência às misericórdias.
A razão pela qual o PSD insistiu longamente na CERC nesta matéria prende-se com duas ordens de considerações, sendo a primeira a seguinte: diz o historiador Charles Boxer, especialista da expansão portuguesa do mundo, inglês de nacionalidade e de cultura, que os portugueses por onde passaram deixaram sempre duas instituições, sendo uma delas as câmaras municipais e a outra as misericórdias.
Já agora, relembro que a primeira misericórdia foi criada em Portugal na data em que Vasco da Gama chegou à índia e por uma mulher, dai o facto de ter sido uma mulher que falou por parte do PSD nesta matéria.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Para além disso, faz no próximo ano 500 anos que essa instituição apareceu e que marcou a presença de Portugal no mundo.
Assim, o PSD, ao contrário da argumentação, que segui atentamente, aqui produzida pelo CDS-PP, julga que a segurança social e a solidariedade estão juntas, como disse, aliás, de uma forma feliz, a Deputada Filomela Bordalo, referindo que há o Estado-providência e há a sociedade-providência e este artigo casa as duas coisas.
Nós, aqui, ao fazermos referência, e bem, a que o Estado apoia as instituições de solidariedade social estamos já a fazer isso, ou seja, são instituições privadas, particulares de solidariedade social e o Estado apoia-as, havendo uma intercepção, uma interconexão, entre a obrigação do Estado e a acção própria da sociedade, sendo este um artigo importante na lógica constitucional portuguesa.
Faça-nos a tristeza de não percebemos inteiramente por que é que num artigo que, do ponto de vista redaccional, está prolixo, cheio de referências inúteis em muitas coisas, não se frise «nomeadamente as misericórdias» ao fazer referência às instituições de solidariedade social.
Isto era um cumprimento que dirigíamos à nossa História e às mulheres portuguesas porque, como diria aqui um Deputado que nos antecedeu, o Professor Adriano Moreira, as misericórdias eram obra «das viúvas de vivos» que ficavam enquanto os nossos homens iam por esse mundo fora...
Então, por que é que nós, num momento em que estamos a rever a Constituição, a um ano dos 500 anos de comemoração do início das misericórdias e da chegada à índia de Vasco da Gama, não temos a coragem de mencionar expressis verbis na Constituição a palavra misericórdia?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A segurança social é hoje um tema não só da sociedade portuguesa mas também das sociedades europeias e do mundo desenvolvido.
Assim, qualquer alteração à Constituição, que permitiu a criação deste sistema, infelizmente, entre nós, ainda recente, incipiente, jovem mas sólido na sua concepção filosófica e jurídica, é prejudicial pelo clima que se gerou e que alguns geraram com interesses vários, daí que entendemos que a Constituição tem uma formulação absolutamente ajustada àquilo que se exige de uma segurança social moderna.
E mais, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva: o acréscimo de solidariedade pode ser, sob o ponto de vista conceptual, um exagero, porque o sistema de segurança social, enquanto visão sistémica, é eminentemente solidário, mesmo quando se trata de um seguro social e quando, como o Sr. Deputado pretende, tenha duas perspectivas: a de seguro social e a distinta da acção social.
Porém, não é esse o nosso entendimento. A nossa visão da segurança social é a de um sistema que tem várias valências e a solidariedade não se esgota no sistema de segurança social. Mais: a solidariedade pode e deve ser financiada pelas mais variadas fontes, nomeadamente pelo Orçamento do Estado, ou pelo recurso a outro tipo de financiamentos que se entendam ser úteis, daí que a formulação constitucional é, em nosso entender, a mais adequada.
Ainda que o acréscimo da solidariedade não acrescente, no essencial, nada ele faz lembrar que há uma parte da solidariedade, como seja a do financiamento do rendimento mínimo, e o financiamento de alguns aspectos da própria segurança social que, nos termos da lei, tem de ser oriunda de outras contribuições.
Para nós, que defendemos um sistema universal, a formulação que o PSD inicialmente tentou e que o Sr. Deputado de forma mais sofisticada e mais subtil também ensaiou, é inaceitável. Em todo o caso, a proposta do CDS-PP contém algumas virtualidades e pode, inclusivamente, resolver alguns aspectos, como sejam o da consagração do rendimento mínimo, que nem os senhores nem o PSD aceitaram ver consagrado na Constituição.

Vozes do PSD: - Não aceitámos, mas pagámos! E pagámos caro!

A Oradora: - Os senhores vão pagar bem caro o rendimento mínimo?!...

Vozes do PSD: - Vamos pagar bem caro!...

A Oradora: - O Srs. Deputados, antes pagar o rendimento mínimo que os buracos que os senhores deixaram no orçamento da segurança social...!

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Era bom que os senhores tivessem reposto o dinheiro que usaram indevidamente da segurança social...

Protestos do PSD.

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... pois, provavelmente, não pairavam sobre esta Câmara as dúvidas que pairam hoje sobre o sistema e que, de algum modo, parecem legitimar uma concepção da segurança social que não tem a ver com a nossa.
Por isso, os vossos apartes legitimam que o PS seja firme e não abra mão da concepção universal da segurança social.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria apenas de dizer ao Sr. Deputado Barbosa de Melo que apreciei muito a sua intervenção, ato porque, como sabe, trabalhei na Misericórdia de Lisboa, mas penso que este artigo, na sua arquitectura, poderia dispensar essa referência, embora ela seja justíssima.
Contudo, creio que não se presta uma homenagem às misericórdias nem a quem as criou nem a quem as manteve, não apenas em Portugal como no resto do mundo, como sabe, alterando um artigo da Constituição. Confesso que isso não entendo!
Penso que o papel das misericórdias é muitíssimo importante, mas não me parece que tenha de ficar consagrado que elas façam parte, especialmente elas, por uma especial deferência a essas grandes obras, como arquitectura da Constituição, Isso, confesso, não entendo!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na linha do que já foi dito pela Sr.ª Deputada Elisa Damião, queremos salientar o quanto nos apraz registar o contributo que consideramos positivo na proposta que a CERC apresenta a Plenário em matéria de segurança social e também, desde logo, na proposta de epígrafe.
Esta articulação entre a segurança social e a solidariedade parece-nos ser uma referência positiva cuja consagração constitucional deve ser relevada tanto mais que o Estado passará a assumir não apenas o reconhecimento, como actualmente, do direito à constituição de instituições particulares de solidariedade social, como também deve, desde logo, assumir em sede constitucional o dever de apoiar a actividade e o funcionamento dessas instituições, bem como outras de reconhecido interesse público sem carácter lucrativo, que prossigam objectivos constitucionais de solidariedade social.
Ou seja, por um lado o Estado reafirma e não se demite de assumir perante os cidadãos o essencial da sua missão de Estado social no domínio da segurança social e, por outro lado, o Estado reconhece, e assume-o com dignidade constitucional, que a solidariedade não é exclusiva do Estado, que compete à sociedade no seu conjunto, às iniciativas de solidariedade social e que o Estado, aí subsidiariamente, deve assumir um papel de apoio a essa actividade estimulando-a para que o objectivo da solidariedade seja partilhado na sociedade civil e não seja apenas uma incumbência oficial dos poderes públicos.
É a virtualidade desta articulação que nos apraz salientar nesta proposta. Mas esta não é a única proposta que está agora em apreciação, pois para além da proposta da CERC, naquilo que ela teve de maioria qualificada indiciária, há outras matérias que compete aqui lembrar.
Estranho é, Srs. Deputados, e dirijo-me em particular à bancada do PSD, que, tendo nós tido ocasião de discutir largamente princípios como, por exemplo, o da equidade ao nível da segurança social, e tendo os Srs. Deputados do PSD considerado que este seria, porventura em termos teóricos, um princípio a consagrar em sede constitucional - com a reserva do PS, devo admiti-lo, desde já - na concretização do princípio da equidade, onde ele mais se faz sentir com pertinência na sociedade portuguesa, que é ao nível daqueles que não têm rendimento mínimo suficiente, o PSD se recuse a consagrar o princípio constitucional de um rendimento mínimo garantido aos cidadãos e às famílias dele carecidos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ou seja, ao nível teórico um discurso razoavelmente interessante, mas ao nível da concretização constitucional efectiva uma manifestação de insensibilidade social que, naturalmente, não podemos, deixar de lamentar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, Srs. Deputados, nos bateremos até ao fim, pela possibilidade da constitucionalização da salvaguarda de uma, referência aos objectivos do rendimento mínimo para os cidadãos e famílias dele carenciados.
Gostaria também de aproveitar a oportunidade para abordar um outro ângulo do problema que aqui nos foi trazido na proposta do CDS-PP. Este partido entende que o sistema que deve organizar a nossa segurança social deveria deixar cair a referência constitucional ao princípio desse sistema como sendo um sistema unificado.
Não concordamos com a posição do CDS-PP - e quero aqui registá-lo abertamente - porque consideramos que o direito às prestações sociais é um direito de cidadania que deve merecer do Estado um tratamento unificado de todos os cidadãos em função das condições sociais que eles revelem ter na sociedade. Por isso, a melhor forma de garantir este direito social, que tem a natureza de direito fundamental, é através de um sistema unificado que, por isso mesmo, trate todos os cidadãos portugueses em função da sua situação social concreta sem discriminar negativamente ninguém em função de outro tipo de interesses de natureza económica, designadamente, que prevaleçam ou possam prejudicar os objectivos fundamentais da justiça e da solidariedade.
Chegado a este ponto quero anotar o seguinte: o CDS-PP propõe que se consagre constitucionalmente a relevância do princípio da justiça distributiva e cumutativa.
Ora, o CDS-PP faz aqui, naturalmente, uma tentativa de consagração constitucional daquilo que é a concepção clássica entre justiça formal e justiça material. Mas, Srs. Deputados, porventura mais relevante do que isso era podermos consagrar nesta oportunidade referências àqueles princípios fundamentais que já a nossa própria Constituição consagra e tão expressivamente que logo a eles faz referência no artigo 1.º em sede de princípios fundamentais. Aí se diz que a sociedade portuguesa deve ser livre, justa e solidária. Por isso, pergunto a todos os Srs. Deputados que melhor sentido teria fazer uma referência à concretização de princípios, neste caso, da justiça e da solidariedade, se não exactamente no domínio da segurança social.

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Por isso vos propomos a possibilidade de uma nova redacção para o n.º 4 do artigo 63.º, em que, justamente, se faça a consagração dos princípios da justiça e da solidariedade, procurando um trabalho de consenso com o que nos parece o contributo útil da proposta do CDS-PP, uma referência aos objectivos do rendimento mínimo, a consagrar constitucionalmente, bem como a protecção do Estado nos casos em que os cidadãos não revelem capacidade efectiva para o trabalho. Da nossa parte, é uma disponibilidade para irmos ao encontro de um caminho de consenso.
A proposta que vos apresentamos é - reconheço-o já, à cabeça, pois alguém pode vir a referi-lo - tecnicamente menos correcta e precisaria de ser melhor elaborada. Já detectámos onde ela necessita de correcção e estamos disponíveis para o fazer. Mas a questão essencial, em relação à qual gostaria de obter a opinião do CDS-PP, do PCP e, obviamente, do PSD, é a de saber se estão ou não disponíveis para consagrar aqui a concretização dos princípios da justiça e da solidariedade, a referência ao rendimento mínimo e às situações de incapacidade para o trabalho, nos objectivos em que o sistema de segurança social deve proteger os cidadãos.
Srs. Deputados, estamos a tentar encontrar o consenso possível e ele será ou não alcançado em função do acolhimento que esta proposta vier a obter da vossa parte.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, penso ser grande empenhamento do PS a consagração constitucional do rendimento mínimo garantido, com o que não concordo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Concordo com o rendimento mínimo garantido enquanto medida conjuntural, mas, do meu ponto de vista, nunca deveria ser constitucionalizada.
Sr. Deputado, está aqui prevista a protecção no caso de falta de meios de subsistência. Ora, o rendimento mínimo garantido visa colmatar uma situação, já não digo de diminuição, de falta de meios de subsistência. Portanto, do meu ponto de vista, esta situação está coberta.
Quero deixar claro o seguinte: a pobreza não nasceu com o rendimento mínimo garantido, ou seja, estas preocupações são anteriores ao rendimento mínimo garantido. E vejo o PS e o Sr. Primeiro-Ministro falarem sistematicamente nesta medida como se ela fosse uma panaceia para todos os males.
Em Portugal existem 1,7 milhões de pessoas que se inserem no conceito técnico de pobreza, que é um bocado mais restritivo, porque, se não, estaríamos todos a chorar. E pergunto ao Sr. Deputado Jorge Lacão duas coisas. A primeira é se está ou não de acordo comigo em que esta medida é conjuntural e temos todos esperanças que medidas estruturais possam permitir não apenas resolver progressivamente situações de pobreza como também começar a atacar as causas que vão gerando a pobreza.
Em minha opinião, este é, politicamente, o quadro para o qual temos de caminhar. Mas se assim não for, e conseguir atacar apenas as causas, vai dar um rendimento
mínimo garantido a 1,7 milhões de pessoas? Não sei se o Sr. Deputado já fez as contas. E não podendo fazê-lo não as contas mas, sim, dar esse rendimento mínimo garantido -,creio que seria mais razoável, mais prudente, mais correcto e, apesar de menos entusiasmante, mais pragmático pensar que, não obstante eu saber que estes combates contra a pobreza são muito duros, porque quando se começa o combate de um lado ela aparece de outro, a consagração constitucional do rendimento mínimo garantido é uma intenção que não vai ser cumprida, porque não vai ser possível dar um rendimento mínimo garantido a todos os pobres ou a todas as famílias pobres, mesmo compondo agregado de três ou quatro pessoas.
Por outro lado, vamos consagrar uma medida que é conjuntural, que vale o que vale - vale muito e defendia aqui porque penso que ela vale muito nesta conjuntura -, mas não é suficiente nem é em si mesma resposta ideal. Portanto, vamos consagrar algo que não é um remédio nem uma solução, é um instrumento e não um princípio, e vamos consagrá-lo sabendo desde já que não o podemos dar a todos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, é evidente para todos nós que a pobreza não nasceu com o rendimento mínimo...

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Nem acabou!

O Orador: - ... e que, felizmente, foi ao contrário, ou seja, o rendimento mínimo é que teve de aparecer por causa da pobreza.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Que a pobreza não tem uma definição exclusivamente económica, estaremos todos de acordo com isso; que a pobreza revela-se em múltiplos factores de exclusão, designadamente de natureza cultural, social e política, estaremos todos de acordo com isso; que não temos, a presunção de que as soluções constitucionais têm valores demiúrgicos, estaremos todos de acordo com isso; agora, onde talvez já não estejamos de acordo é quando nos demitimos de assumir os deveres de solidariedade que o Estado social deve ter na sociedade envolvente. E aqui é que se levanta a questão fundamental.
Tendo em conta esta questão fundamental, Sr.ª Deputada, congratulei-me em ver, na vossa proposta, algo escrito de maneira permita-me dizê-lo - demasiado eufemística, mas que não me passou despercebida. A proposta do CDS-PP, no seu n.º 3, dizia: "O sistema de segurança social protegerá os cidadãos contra os riscos sociais e eventualidades, que provoquem a diminuição de rendimentos(...)". Sr.ª Deputada, esta é a maneira inconfessada de o CDS-PP admitir a existência constitucional do rendimento mínimo.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É verdade!

O Orador: - Agora, se me quer dizer que já estamos apenas a discutir na base da divergência semântica,...

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O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Não é semântica!

O Orador: - ... então, não discutamos por causa disso, porque o que interesse é saber se temos ou não disponibilidade para consagrar um objectivo relevante a prosseguir pela segurança social.
Por outro lado, a Sr.ª Deputada diz-me: não caiamos na tentação de constitucionalizar um objectivo que pode ser meramente conjuntural. Quem me desse que fosse meramente conjuntural!

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Ah! Não acreditam nisso!

O Orador: - Calma, Sr. Deputado. Quando vos estamos a propor que o Estado assuma, no quadro da segurança social, a protecção dos cidadãos com falta de um rendimento mínimo, isso só acontecerá enquanto os cidadãos revelarem essa falta, o que quer dizer que a medida, pela sua natureza, é conjuntural em relação aos cidadãos a quem se aplique. No entanto, trata-se de um objectivo permanente do Estado social de direito.
A questão fundamental é saber se os senhores aceitam que o rendimento mínimo, que conjunturalmente se aplicará a pessoas concretas, deva ser um objectivo permanente, constitucionalmente validado no nosso Estado social. Foi este o desafio político que vos fiz. E é acerca dele - perdoem-me que vos diga - que, apesar de tudo, me congratulo em estar a debater com a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto. Não deixo de estranhar o silêncio da bancada do PSD,...

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Isso é habitual!

O Orador: - ... que tem nesta área, também, um contributo relevante a dar. Seria interessante conhecê-lo, porque poderia validar aqui uma solução de maioria qualificada de dois terços.
Por isso, permanece o meu convite. Se formos capazes de nos colocar de acordo quanto ao essencial, resolveremos as questões de redacção rapidamente. O problema está em saber se, politicamente, sabemos o que queremos e assumimos com frontalidade aquilo que queremos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de assinalar, em primeiro lugar, que o que estamos a discutir é um direito fundamental e vai continuar a sê-lo. Não entendemos que as alterações que estão a ser propostas, desde logo a própria alteração da epígrafe, acrescentando à expressão "solidariedade", apaguem esta dimensão que é a de tratar este problema como um direito fundamental. Foi assim que foi consagrado na Constituição e é assim que vai continuar a ser.
É particularmente importante sublinhar este aspecto, porque entendemos que é muito respeitável, do ponto de vista ético, a atitude dos que dão esmola, de todos aqueles que reagem de uma forma solidária perante a pobreza, a doença, os idosos, os inválidos, os órfãos, o desemprego, os acidentados no trabalho. A justa atitude neste plano é, naturalmente, a de solidariedade, de ajudar quem pode ser ajudado, e, acima de tudo, a de lutar para que sejam reconhecidos os direitos e a dignidade. Mais importante do que dar esmola é lutar para que não seja preciso dar esmola.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Isto para dizer o seguinte: a caridade e a solidariedade são muito respeitáveis, mas não substituem os direitos, desde logo, o direito à dignidade. Do mesmo modo, entendemos que o papel das instituições particulares de solidariedade social e de toda uma série de outras instituições que têm o seu papel reconhecido na Constituição e o deveriam ter devidamente sublinhado, não apaga, de forma alguma, um aspecto da maior importância, que é a ideia da responsabilidade do Estado, da inapagável responsabilidade do Estado, e das entidades públicas perante a pobreza, a injustiça, a invalidez, a orfandade, a terceira idade, os acidentados no trabalho e todos os que precisam, no fim de contas, de maior apoio e maior auxílio.
É preciso não esquecer que estamos no país que tem mais pobres por habitante na Comunidade Europeia; estamos no país em que os índices de desigualdade são maiores; estamos num país em que as pensões de reforma são, em si mesmas, uma causa de pobreza, os subsídios de desemprego são muito baixos e muitas vezes até não existem. Daí que seja particularmente importante sublinhar que nenhum destes problemas pode ser apagado ou pode ficar em segundo plano com um discurso acerca do papel dá sociedade civil, da caridade e da solidariedade. Tudo isso tem um papel, mas não pode levar a pôr em segundo plano o papel do Estado, designadamente o papel indispensável do reconhecimento de direitos a todos os que têm menos direitos nas sociedades em que vivemos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Daí que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, perante as alterações propostas, sintamos a necessidade de enfrentar qualquer entendimento perverso do sublinhado maior que vai ser feito do papel de algumas instituições, desde logo das instituições particulares de solidariedade social.
Combateremos qualquer entendimento que conduza à ideia de que o direito à segurança social ficou diminuído ou de que a responsabilidade: do Estado e demais entidades públicas, perante a garantia deste direito, ficou diminuída, em favor da caridade ou de um qualquer novo nome da caridade, como o nome respeitável da solidariedade.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Quanto à questão do rendimento mínimo garantido, gostaria de lembrar que apresentámos uma proposta no sentido de ele ser expressamente consagrado na Constituição. É evidente que todos nós entendemos que seria bom que não fosse preciso assegurar na Constituição o rendimento mínimo garantido, creio, porém, que as perspectivas que se desenham para os próximos anos, pelo menos até à próxima revisão constitucional, são no sentido de ter pleno cabimento assegurar a consagração constitucional do rendimento mínimo garantido.
Quero dizer que o PCP foi o primeiro partido em Portugal que adiantou uma proposta de criação do

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rendimento mínimo garantido. Nós adiantámo-la e, felizmente, ela foi seguida pelo PS, contudo fomos críticos quanto ao grau de rapidez, quanto à extensão e, designadamente, quanto ao facto de, até ao momento, não ter sido devidamente cuidada uma dimensão mínima que este programa deveria ter, que era não apenas garantir o rendimento mas também promover a reinserção daqueles que precisam de apoio.
Agora, creio que também é importante sublinhar, para quem precisa de argumentos nesta matéria, que o rendimento mínimo garantido está assegurado na generalidade dos países, por exemplo da Europa comunitária. As excepções são muito poucas e abrangem apenas os países mais atrasados, como é o caso da Grécia.
É exactamente por causa disso que nós, em plena coerência com a nossa proposta de aditar um n.º 7 a este artigo respeitante ao rendimento mínimo garantido, apoiaremos a proposta que aqui nos é apresentada pelo PS, que, aliás, vem na linha da proposta que, tal como nós, tinha apresentado na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.
Entendemos, no entanto, que a redacção que é proposta pelo PS não é a mais feliz, não está, efectivamente, trabalhada. Nesse sentido, onde se diz "nomeadamente", seria bom que dissesse "bem como" e que se riscasse o "bem como" que está na linha seguinte. Ficaria uma redacção bem mais escorreita e bem mais compreensível, e certamente que, em relação a este ou a outros aperfeiçoamentos, o PS terá a abertura no sentido de que a proposta fique com a melhor redacção possível.
Naturalmente que aqueles que preferirem rejeitar esta proposta assumirão a sua responsabilidade. Pela nossa parte, continuaremos a lutar, nesta e noutras matérias, para que os direitos daqueles que menos têm sejam amplamente reconhecidos, não apenas na Constituição mas também na prática diária dos governos, o que aponta para soluções em que o rendimento mínimo garantido não seja propriamente uma flor de esquerda em políticas de direita, mas, pelo contrário, seja uma parte de políticas de esquerda coerentemente assumidas no conjunto da actividade governativa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá. quero começar por dizer que concordo com muito do que V. Ex.ª disse. Em primeiro lugar, porque o Sr. Deputado fez aqui uma distinção, que era urgente fazer, que foi a distinção entre a caridade e a segurança social.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - E esta distinção é fundamental!
Estou 100% de acordo consigo de que as IPSS e as misericórdias constituíram-se exactamente para praticar a caridade. As misericórdias constituíram-se para praticar as obras de misericórdia e as IPSS têm como base praticar a caridade, até porque muitas delas têm uma raiz cristã. E também estou 100% de acordo consigo de que é um grande risco confundirmos estas duas realidades, porque elas são diferentes.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): Exactamente!

A Oradora: - Com todo o respeito que tenha pelas misericórdias e pelas IPSS, quando há bocado, talvez de forma não muito clara, me exprimi em relação ao que disse o Sr. Deputado Barbosa de Melo era exactamente neste sentido: é que não posso trazer as misericórdias expressamente para este contexto, a menos que elas se integrem naquilo que o Estado entende ser o seu sistema se segurança social e aí assumam também os ónus e as contrapartidas desse contrato, se assim lhe podemos. chamar. Por isso mesmo é que lhe pergunto se não gosta da nossa redacção.
Diz-se aqui que "O Estado apoia e fiscaliza (...), com vista à prossecução de objectivos de acção social consignados, neste artigo (...)", ou seja, o Estado só tem obrigação de, apoiar as IPSS que com ele compartem tarefas concretas, que ele próprio decide quais são. O Estado não tem qualquer obrigação de apoiar IPSS e misericórdias só porque o são. E eu alertava aqui para esta situação que me preocupa, que é a ideia que se gerou de que toda a IPSS se constitui para ser apoiada pelo Estado.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): Exactamente!

A Oradora: - Julgo que isso não faz qualquer sentido! Então constitui-se uma para ir, no dia seguinte, buscar um subsídio,...

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - ... sem que haja sequer um juízo de valor de cada governo sobre a validade ou não validade, inclusivamente social e política, da acção que essas instituições prosseguem!?
Tivemos o cuidado de distinguir isso, até para não matar a caridade, Sr. Deputado Luís Sá! Porque, se não, vamos matar a caridade, que faz imensa falta nas sociedades justas e nas sociedades modernas! Ora, para não matar a caridade e distinguir tudo muito bem, fazemos essa distinção no n.º 5.
Depois, perguntava-lhe se pensa que, quando no n.º 3 dizemos " (...) contra os riscos sociais e eventualidades que provoquem a diminuição de rendimentos ou de capacidade para o trabalho (...), bem como em todas as outras situações de falta de meios de subsistência", estamos ou não a considerar, permanentes ou, pelo menos, durante muito tempo, situações de falta de meios de subsistência, relativamente às quais o sistema de segurança social tem de ter uma resposta concreta. Hoje pode chamar-se rendimento mínimo garantido e amanhã chamar-se qualquer outra coisa, o que não é certamente é uma resposta dada pela caridade nem pelas IPSS.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, agradeço a questão que me coloca.
Naturalmente que, como calculará, algumas das questões que V. Ex.ª levanta vão, como sublinhou, ao encontro de

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alguns dos problemas que levantei. É verdade. Simplesmente há aqui um ponto que, para nós, é fundamental, que é a responsabilidade do Estado e das entidades públicas perante todo o conjunto de fenómenos - doença, velhice, invalidez, viuvez, orfandade, desemprego e acidentes de trabalho - que têm de ter efectivamente um apoio.
Há uma ideia de não demissionismo do Estado e, simultaneamente, de colaboração com instituições particulares de solidariedade social e outras. E sublinhava bem "outras", porque, por vezes, há uma tendência de, referir as primeiras e de esquecer todas as outras ou secundarizá-las. Parece-me que é um aspecto muito importante de ser sublinhado, porque também aqui, perante estas instituições, há um papel regulador que o Estado deve assumir, há um papel naturalmente selectivo, estamos de acordo nesse ponto, mas não pode também haver um papel demissionista. Portanto, quer numa matéria, quer noutra, a nossa perspectiva é claramente de assunção plena de responsabilidades por parte de quem as deve assumir

O Sr. Octávio Teixeira (PC): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como já vem sendo hábito, encontra-se a assistir aos nossos trabalhos mais um grupo de cidadãos surdos-mudos, que está a compreender o que estamos a dizer através da linguagem gestual que lhes está a ser transmitida. Saudemo-los com muito carinho.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta que o PP apresenta é muito mais ambiciosa, vai muito mais além, do que a redacção que estava vertida no artigo 63.º e daquela que é proposta pela Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.
É curioso que o PS venha aqui dizer que não abdica do princípio da universalidade, mas a proposta que aqui nos traz diz-nos que, para o PS, segurança social e solidariedade são coisas diferentes. E curiosamente, no n.º 1, diz-se: "Todos têm direito à segurança social", mas em lado nenhum vejo que todos têm direito à solidariedade.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Só alguns!

O Orador: - É, no mínimo, curioso, Srs. Deputados do PS! Os Srs. Deputados recuaram 100 anos na História; recuaram até ao seguro social do Chanceler Bismarck em 1883! Ó Srs. Deputados, aprendam! Os livros e os compêndios não mentem! Não mentem! O conceito de segurança social não nasce por acaso! O conceito de segurança social nasce a partir do momento em que são reconhecidos direitos sociais a todo e qualquer cidadão, porque, enquanto cidadão, tem direito à protecção do Estado! São direitos de cidadania! E a segurança social espelha tudo isso que os senhores agora lhe querem subtrair! A vossa proposta é que é redutora, e não a nossa, seguramente!
Depois o Sr. Deputado Jorge Lacão disse que, quando falamos de justiça distributiva e comutativa, estamos, eventualmente, a tentar, de alguma forma ou de uma forma indirecta, dar abrigo ao rendimento mínimo garantido. Não estamos de uma forma indirecta ou de uma forma escamoteada, estamos a consagrar um princípio que permite, entre outras formas de protecção social, o rendimento mínimo garantido.
Agora, Sr. Deputado Jorge Lacão, mal vai este país, mal irão aqueles que precisam de ajuda, se nos limitarmos a passar um cheque, porque não é apenas de um cheque que eles precisam! Não é, seguramente, Sr. Deputado! A segurança social deve estar para a sociedade como a rede está para o trapezista! Disse-o uma vez, e volto a repeti-lo, porque penso que clarifica bem aquele que é o entendimento do PP sobre esta matéria.
A segurança social é muito mais do que as prestações pecuniárias! É muito mais! A segurança social tem esse dever, como dizia o Sr. Deputado, porque a exclusão social não é uma exclusão apenas financeira, decorre de razões sociais, de razões culturais e de razões políticas, são múltiplas as causas. E, se são múltiplas as causas, como é que pode haver uma única resposta, Sr. Deputado? Têm de haver múltiplas respostas. E isso que consignamos! É isso que propomos!
O que dizemos, Sr. Deputado, é que a segurança social garante a protecção pública, perante toda e qualquer situação em que qualquer cidadão não tenha capacidade de obter rendimentos ou que não tenha rendimentos para fazer face às suas necessidades básicas.
Sr. Deputado, mais abrangente do que isto e ir mais além do que isto não será, seguramente, possível e, portanto, aquilo que o PS vem propor é menos, não é mais.
Quanto ao sistema unificado, devo dizer que nunca ouvi falar nele. É um conceito novo.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Novo?!

O Orador: - Mas todos temos direito a inovar!
Mas, sendo um sistema, parte-se do princípio de que tem partes, partes interligadas, que concorrem para o mesmo objectivo, etc., etc. Um sistema unificado.
Gostava que o PS esclarecesse isto, porque, hoje, o nosso sistema de segurança social não tem um único regime, tem vários regimes - o regime dos trabalhadores da função pública, o regime dos profissionais da banca, o regime dos advogados, etc., etc.
O PS pretende um único regime igual para todos, então assumam-no e sejam consequentes. Proponham que o regime de que hoje, se calhar, de uma forma injustificada, beneficiam os trabalhadores da função pública deve acabar e eles devem passar para o regime geral. Assumam isso, Sr. Deputado! Agora, não sejamos hipócritas no texto constitucional, dizendo que o sistema é unificado, para, depois, permitirmos uma quantidade de sub-regimes. Isto é falta de verdade! Isto é falta de rigor! E falta de honestidade política! E nisto o Partido Popular não alinha.
Entendemos que a segurança social deve contemplar uma multiplicidade de respostas, porque cada vez mais são diferentes as situações, nomeadamente as situações profissionais dos cidadãos, cada vez mais são diferenciadas as actividades profissionais. E a segurança social nasceu, em grande parte, para dar resposta ao trabalho dependente.
Não vou fazer aqui considerações à História, mas todos nós sabemos que foi com a revolução industrial, com a dependência directa dos meios de subsistência e do salário, que houve necessidade de instituir a protecção social pública, de instituir os seguros sociais obrigatórios. Hoje, á realidade é diferente; hoje, as necessidades são outras e,

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se continuarmos a dar as mesmas respostas, estaremos, naturalmente, muito além daquilo que a sociedade espera de nós, daquilo que deve ser a obrigação da segurança social.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Filomena Bordalo.

A Sr.ª Filomena Bordalo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É evidente que a bancada do PSD não poderia ficar silenciosa, apesar do que foi dito anteriormente. Mas a democracia tem regras e só poderíamos falar quando chegasse a nossa altura.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Estamos a discutir, entre outras coisas, a inclusão ou não no texto constitucional do rendimento mínimo garantido, no sentido de ser uma forma da concretização dos princípios da justiça e da solidariedade, se bem entendi. O rendimento mínimo garantido é, a par de outros, um instrumento, o que também já aqui foi dito, na luta contra a pobreza. Parece-me redutor integrar no texto fundamental instrumentos, porque possivelmente outros instrumentos podem vir a justificar-se face à complexidade dos problemas sociais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Estamos a falar de rendimento mínimo garantido quando, em outros países europeus, já se fala em rendimento mínimo de inserção, mas não vou discutir conceitos. De qualquer forma, gostava de lembrar que não foi preciso alterar o texto constitucional para se aplicar, no terreno, este instrumento. A Constituição já consagra este direito ao dizer que "o sistema de segurança social protegerá os cidadãos (...) em todas as outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência (...)". Portanto, do nosso ponto de vista, não é preciso integrar no texto constitucional esta matéria.

Vozes do PSD: - Claro!

A Oradora: - Queria, no entanto, recordar que foi no Governo de Sá Carneiro, em 1979/80, se não estou em erro, que foi consagrada, pela primeira vez num diploma legal, a definição de um sistema com um esquema mínimo de subsistência para os cidadãos portugueses. Não é uma "flor" de esquerda numa política de direita, é uma "flor" que merecem os cidadãos portugueses que não tenham meios de subsistência. Não é bandeira de bancada alguma, é a bandeira do país. É uma responsabilidade que o Estado tem de exercer, não faz mais do que a sua obrigação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, não deixa de ser curioso que V. Ex.ª queira dar a esta bancada lições do que é uma definição de um sistema de segurança social e de solidariedade, como também não deixa de ser curioso que V. Ex.ª invoque as lutas sociais ao longo de 100 anos. Provavelmente, esqueceu-se de outros 100!
O Sr. Deputado devia de ter falado do Contrato Social de Rousseau, mas esse V. Ex.ª não conhece. Devia ter falado...

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Mas vamos falar disso!

A Oradora: - Sr. Deputado, vamos mais atrás! V. Ex.ª devia ter falado de um Sérgio, de um Gide,...

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Vamos falar!

A Oradora: - V. Ex.ª não disse que a actual lei da segurança social decorre exactamente desta norma constitucional, para a qual o seu partido em nada contribuiu.
V. Ex.ª confunde uma outra questão, que um sistema universal, unificado, numa visão sistémica, que é exactamente a antítese daquilo que a sua líder parlamentar disse. Nós não queremos a caridade, não gostamos da caridade. Nós não queremos consagrar a assistência.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Mas nós também não!

A Oradora: - Nós queremos que todos tenham direito a uma dignidade mínima à cidadania, o que não é um acto de caridade de Estado mas, sim, um direito. E é isto que o senhor nega ou é isto que o senhor pretende negar.
Sr.ª Deputada Filomena Bordalo, VV. Ex.as falam muito das misericórdias, como se d;.1as tivessem algum aval para aqui defender a sua acção.
Ora, em primeiro lugar, não o têm; e, em segundo lugar, as misericórdias têm um papel, antigo, respeitável, tradicional, fazem parte da nossa cultura, tal como da cultura da República. E, como já o disse, a minha memória é muito mais republicana, dela fazem parte as mutualidades, as instituições privadas de solidariedade social, nem todas de origem confessional.
Portanto, Sr.ª Deputada, é nesta diversidade - nesta diversidade de que o senhor fala, mas que depois se contradiz que o sistema tem a ver com todos, com todo o homem e o homem todo, como diz a encíclica papal. É exactamente com esta diversidade que o sistema de segurança social deve ser constituído, incluindo, além do mais, a solidariedade, que deve ser feita com a contribuição de toda a sociedade, inclusivamente do Orçamento do Estado.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Por isso, Sr. Deputado, não venha dar lições sobre o sistema de segurança social, porque os compêndios que escreveu só foram possíveis por existirem socialistas em Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Elisa Damião, se me permite, gostaria de ver alguns pontos esclarecidos.

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A Sr.ª Deputada falou no Contrato Social de Rousseau. Não sei se se estava a referir àquilo que era a interpretação dada por Rousseau àquilo que devia ser a interpretação da vontade geral. Conhece isto, pois leu provavelmente o Contrato Social de Rousseau,...

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Aos 15 anos!

O Orador: - ... logo sabe a diferença entre o contrato social e o pacto social.
Assim, pergunto-lhe, Sr.ª Deputada: concorda com a interpretação dada por Rousseau àquilo que deve ser a interpretação da vontade geral?

Protestos da Deputada do PS Elisa Damião.

Gostaria que me respondesse, Sr.ª Deputada, mas vamos ficar por aqui, porque não estou para discutir Rousseau. Podemos falar disso lá fora.
Por outro lado, não me parece que a Sr.ª Deputada tenha lido as encíclicas que fundamentaram a democracia-cristã,...

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Está enganado!

O Orador: - ... porque, se tivesse lido, não teria, com certeza, dito, com a ligeireza com que disse, que o meu partido, democrata-cristão, ideologicamente assumido, não tem autoridade para falar do passado sobre a segurança social.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Nesta matéria não tem!

O Orador: - Porque, se houve alguém que disse que os direitos sociais eram direitos de cidadania e que todos deveriam ter direito à protecção social, foram, seguramente, as encíclicas dá Igreja e as encíclicas que inspiraram os sistemas de protecção social.
Portanto, do ponto de vista ideológico, estamos a agir em perfeita coerência, Sr.ª Deputada - repito, em perfeita coerência!
Em relação ao passado, estamos esclarecidos, no que toca ao futuro os senhores continuam agarrados às ideias do passado.
A segurança social não pode continuar a ser um sistema fechado, com as mesmas respostas, quando há necessidades diferentes e estas são dinâmicas, não são estáticas. As necessidades de ontem não são as mesmas de hoje. Os senhores continuam a querer dar o peixe, em vez de ensinar a pescar! E é isto que os senhores não querem assumir. É mais fácil a política de "passar o cheque" do que garantir às pessoas capacidade e condições para se reintegrarem na sociedade. Esse desafio é seguramente muito mais ambicioso e esse desafio os senhores não querem assumir!
Agora, Sr.ª Deputada, para a História fica que o PS entende que solidariedade não está contida na segurança social. Isso ficará, com certeza, e por ela os senhores terão de responder.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto.(CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou ser muito breve, apenas para dizer o que realmente se está a passar neste momento em relação à segurança social e tentar, ao fazer uma síntese, não ser injusta.
Percebo a posição do PCP. O PCP considera que tudo aquilo que o Estado passa, ainda que dentro do mesmo sistema e sob contrato, para uma entidade privada, é qualquer coisa de que o Estado se pode vir a desobrigar. Essa é uma posição com a qual não estou de acordo, mas que compreendo. Compreendo esse receio à partida e uma coerência que depois se segue, porque é uma coerência cautelar em relação a esse receio.
O PS não pode sustentar esta mesma posição sob pena de negar em absoluto o Programa do seu próprio Governo. Logo, o PS tem, em relação a esta matéria, uma posição diferente da do PCP, ou pelo menos o Governo do PS tem uma posição diferente da do PCP. Já ouvi e li isto e têm-me dito, mas pode ser que eu esteja enganada.
O que eu quero deixar aqui claro é o seguinte: não faz sentido que hoje, em 1997, o PCP se agarre àquilo que eu chamaria de complexo de culpa, de ter de alienar coisas que não são essenciais, que não .são princípios. Porque, Sr.ª Deputada Elisa Damião, não são princípios mas instrumentos que historicamente se vão utilizando, instrumentos que num dado momento são adequados e que, depois, deixam de o ser, até porque, como bem disse o meu colega, as necessidades aumentam, modificam-se. E o que está a acontecer é que o PS está a inviabilizar uma reforma por questões históricas, o que é, do meu ponto de vista, um profundo egoísmo em relação às gerações futuras.
Sr.ª Deputada Elisa Damião, mais do que discutir quem fez ou não fez, quem esteve ou não na origem dos sistemas de segurança social, porque muitas foram as origens, o que sobretudo interessa é a origem da consciência da sua necessidade. Digo-lhe, Sr.ª Deputada, embora saiba tão bem como eu que é assim, que as condições, nomeadamente as macroeconómicas, foram alteradas. A Sr.ª Deputada sabe que não vai voltar a ter pleno emprego, possivelmente na maioria dos países da Europa, que não vai ter um grande crescimento económico, que não vai ter estabilidade no emprego, que o endividamento do Estado não vai poder crescer, que a carga fiscal já é muito grande. Logo, todos os pressupostos que foram a base dos sistemas sociais, infelizmente, Sr.ª Deputada, com muita pena minha, também o digo, já cá não estão. E o que é pedido hoje a esta Câmara, como foi pedido em todos os países a quem tinha responsabilidades políticas, é que se seja capaz de salvar o essencial e o mais importante de cada sistema social para o poder devolver intacto na sua essencialidade às gerações futuras.
Quero deixar isto aqui bem claro, porque à roda desta questão não há direita nem esquerda. Os senhores vêm com a direita porque isso é o analgésico que os senhores vão tomar hoje à noite, mas rios não servimos de analgésico, Sr.ª Deputada.
A senhora sabe perfeitamente que tenho razão. Sabe perfeitamente que, se nada se fizer, daqui a 15 anos a situação é muitíssimo pior e que de nada serviu a senhora dizer que foi a direita ou a esquerda. Isto vai ser inexoravelmente assim.
Portanto, o desafio que deixo ao PS é o seguinte: não impeça esta reforma em nome de princípios que não são os seus e agarrando-se a questões que são meramente acessórias. Este é que me parece ser o resultado final, triste, desta discussão.

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminada a discussão do artigo 63.º, vamos dar início ao debate do artigo 64.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS quer aqui deixar hoje uma posição muito clara sobre o artigo 64.º, que trata dos assuntos relacionados com a saúde, aliás como também deixou quando foi discutido em sede de Comissão.
A nossa posição clara é esta: continuamos a defender a existência de um serviço nacional de saúde como a espinha dorsal do nosso modelo de sistema nacional de saúde.
Fizemos uma opção política central. Aliás, as propostas apresentadas por outros partidos também encerravam uma opção política central. A do PS foi a de manter, reforçar mesmo o serviço nacional de saúde. A opção central do PSD, contida nas propostas que apresentou, já não é idêntica à do PS pois aquele partido atenua a participação do serviço nacional de saúde. A proposta do CDS-PP, também não igual à do PS, chega mesmo a propor o desmantelamento do que é actualmente o serviço nacional de saúde. Quanto ao PCP - e falaremos sobre isso na devida altura, se tivermos oportunidade -, apresentou uma proposta mais no campo da irrealidade, do virtual.
Para que não subsistam dúvidas, o PS pretende esclarecer um assunto que tem andado a confundir os nossos parlamentares: uma coisa é um sistema nacional de saúde e outra coisa é um serviço nacional de saúde.
Um serviço nacional de saúde, para poder ser assim denominado, tem de encerrar três conceitos fundamentais: é universal, isto é, dirige-se a toda a população; é geral, isto é, presta todo o tipo de cuidados; é financiado pelo Orçamento do Estado.
Ora, para nós, PS, um sistema nacional de saúde encerra a espinha dorsal da prestação de cuidados que é atribuída ao serviço nacional de saúde mas, visto que este último coexiste com outras formas de prestação de cuidados o privado, o mutualismo, os subsistemas -, chama-se sistema nacional de saúde, o que é completamente diferente de um serviço nacional de saúde.
Por isso, o PS pretende deixar muito clara a sua posição: não contem com o PS para acabar com o serviço nacional de saúde.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Podem, sim, contar com o PS para melhorar o serviço nacional de saúde: melhor gestão, prestação de cuidados mais humanizada, maior eficácia, maior descentralização, maior autonomia mas também maior responsabilidade na gestão.
Srs. Deputados dos diversos grupos parlamentares, quer queiram quer não, está hoje provado que os modelos baseados nos serviços nacionais de saúde são os mais eficazes e os menos dispendiosos.
Se atendermos à realidade, ao que tem sido a história da prestação de cuidados neste país, reforça-se a ideia de que, em Portugal, deve continuar a existir um modelo de saúde cuja espinha dorsal fundamental que garanta a prestação de cuidados seja o serviço nacional de saúde. Aliás, no fórum que a Comissão de Saúde teve oportunidade de realizar há cerca de um ano e meio, aquele conceito ressaltou na opinião generalizada dos participantes. Nós, os membros da Comissão de Saúde, tivemos o cuidado de não tirar conclusões, mas pode dizer-se, pelo menos, que a mais consensualmente aceite foi a de que deve haver um modelo que assente na prestação de cuidados através de um serviço nacional de saúde.
Srs. Deputados, permitam-me que, com amizade, me dirija, ainda que de forma sucinta, aos outros partidos que apresentaram propostas nesta matéria.
Começo por dirigir-me ao PPD/PSD, que sempre olhou de lado para o serviço nacional de saúde. Os Srs. Deputados nunca gostaram muito do que é o serviço nacional de saúde, nunca acreditaram muito nele. Aliás, isto verifica-se na vossa proposta quando, no n.º 2, alínea a), não se esquecem de dizer que a protecção da saúde é realizada "através de um sistema de saúde que compreende (...)" - isto é, que aceita - "(...) um serviço nacional de saúde universal e geral, (...)". Ora, a nossa perspectiva - e não é uma crítica mas, sim, a nossa perspectiva - é a de que este sistema de saúde deve estar centrado na tal espinha dorsal e não, como os senhores aqui dizem, que "compreende o serviço nacional de saúde". Por isso, os senhores, que nunca gostaram muito do serviço nacional de saúde, nunca lhe deram a atenção. devida, daí que o tenham 'gerido mal, tentando sempre provar que a sua realização não era viável economicamente.
A este propósito, ocorrem-me várias realidades ao pensar no que foi feito no domínio da política do subsídio às instituições, atribuído sem critérios de exigência para com a sua participação, nos centros de saúde que vemos dotados de equipamentos de medicina dentária, de equipamentos laboratoriais ou de raios X mas completamente abandonados.
Mais tarde terei oportunidade de pronunciar-me sobre a proposta de substituição apresentada pelo CDS-PP mas, ainda em relação à primeira proposta apresentada por este partido na CERC, devo dizer que, de facto, o PP não esconde a sua intenção de acabar com o serviço nacional de saúde. Propõe um modelo na base, ao fim e ao cabo, do que é o conceito do seguro de saúde. É uma opção, mas a nossa não passa por aí. A proposta do PP encerra um modelo mais caro e menos eficaz e, acima de tudo, é uma proposta que não se adapta à realidade social deste país.
Quanto ao PCP, não posso deixar de dizer que a sua é a tal proposta virtual, diria mesmo irreal. Na verdade, quando a proposta do PCP diz "Através de um serviço nacional de saúde, universal, geral e gratuito (...)" é completamente irreal, é impensável. Aliás, penso que esta proposta só pode vir de um grupo parlamentar que não tem a responsabilidade de governar e gerir os dinheiros públicos e, talvez mais grave ainda, nem pensa vir a ter essa responsabilidade.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Pensa, pensa!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É gravíssimo dizer isso!

O Orador: - De facto, hoje em dia é completamente irrealizável, irreal esta posição de gratuitidade do serviço nacional de saúde.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.

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O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na discussão, realizada na Comissão para a Revisão Constitucional, do artigo 64.º sobre a saúde, o Partido Socialista manteve uma atitude fechada e minimalista, aliás consequente com a circunstância de não apresentar no seu projecto de revisão qualquer proposta de alteração para este artigo.
Mantendo os traços estatizantes que, nas sucessivas revisões da Constituição de 1976, não foi possível adequar à realidade, neste artigo vemos, de facto, os Srs. Deputados do Partido Comunista com alegria estampada no rosto.
Perdeu-se, assim, mais uma oportunidade para, na revisão da Constituição, adequar a área da saúde à segunda década da democracia em que, para responder às necessidades dos cidadãos, temos como certo ser necessária maior flexibilidade.
Mas atenção, Srs. Deputados do Partido Socialista: com esta atitude deixarão de poder utilizar o alibi da Constituição para a inércia que têm revelado na reforma do sistema de saúde.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na sua proposta de revisão constitucional, o PSD pretendeu consagrar a liberdade de acesso e de escolha dos cidadãos aos cuidados de saúde - quando quisessem escolher o serviço nacional de saúde, escolheriam, quando tivessem alternativas melhores, também poderiam escolhê-las -, ao clarificar o entendimento do "sistema de saúde" que integra as entidades públicas e privadas, introduzindo, ainda, uma referência expressa às instituições de solidariedade social como peças fundamentais na prestação de cuidados. Ao invés da formulação actual estatizante, que se mantém na Constituição, ao afirmar que o direito à protecção da saúde é feito exclusivamente através do serviço nacional de saúde, esquecendo o papel dos subsistemas, dos seguros de saúde e das instituições privadas de solidariedade social.
Na nossa proposta mantinha-se o serviço nacional de saúde como peça central fundamental da prestação de cuidados de saúde em que as regras de utilização teriam em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos. Dizermos isto, Sr. Deputado João Rui de Almeida, é um pouco diferente de dizer que estamos completamente satisfeitos com a qualidade do actual serviço nacional de saúde e que este, só por si, deu resposta a todos os problemas de saúde no nosso país. É esta a grande diferença que estamos a analisar aqui hoje. Pretendíamos também terminar com a miragem de que a saúde é tendencialmente gratuita.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Prevíamos ainda que se desse enquadramento a uma garantia de que as famílias de menores recursos vissem a sua saúde mais apoiada, tivessem uma maior comparticipação nas suas despesas com a saúde.
Criava-se também a possibilidade de se alterar a situação actual em que o financiamento não seria canalizado para as instituições mas, sim, para os cidadãos, criando condições mais objectivas para atingir o objectivo profusamente proclamado no discurso governamental, de condições para o sector privado lucrativo ou não lucrativo poder desenvolver-se.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pretendíamos também, em termos constitucionais, não cingir ao privado a necessidade de controle e fiscalização.
Pretendíamos, ainda, fazer uma adequação terminológica aos novos conceitos da saúde, como a promoção de saúde, o direito à informação, as práticas saudáveis e retirar a consagração constitucional 'de expressões como, por exemplo, "socialização dos custos dos cuidados médicos e medicamentosos" e "educação sanitária do povo".
Valha a verdade dizer que, depois de grande discussão, conseguiu-se estender a fiscalização e a disciplina também ao sector público e não exclusivamente ao privado. Conseguiu-se, ainda, a obrigatoriedade de estabelecimento de uma política de prevenção e tratamento de toxicodependentes.
Mas, Srs. Deputados, o Partido Socialista deixa de poder queixar-se pelo facto de ser difícil ao sistema nacional de saúde cobrar o que é devido pelos subsistemas e responsabilizar esse facto pelo descontrole financeiro do sistema de saúde.
O PS e o Governo terão muita dificuldade em alterar o financiamento do sistema de saúde que todos os dias dá sinais de descontrole, mas não poderá utilizar o argumento constitucional para a falta de iniciativa que também tem tido nesta área.
O PS e o Governo terão muito maior dificuldade em dar credibilidade ao seu discurso quando falar da importância das instituições privadas' de solidariedade social, da sociedade civil, do mercado na saúde já que não teve consagração constitucional.
O PS e o Governo terão também muita dificuldade em fazer o discurso de delegar nos cidadãos o que são as responsabilidades da Administração, já que continua a ser o Estado todo poderoso a financiar, a prestar, a avaliar e a garantir a qualidade dos cuidados de saúde.
Termino, repetindo, pois, que o Partido Socialista não vai poder usar o alibi da inadequação do texto constitucional aos ventos da reforma da política de saúde. Pensamos que os cidadãos, com o artigo 64.º, perdem com esta atitude do PS, nomeadamente quanto ao seu direito e liberdade de escolha que, nesta matéria, não pode deixar de caber-lhes. E é pena, num acordo que, em termos globais, é positivo para o país, que, neste artigo, tenhamos de aguardar mais alguns anos para que o Partido Socialista se encontre com a realidade.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Marques.

O Sr. Alberto Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discutirmos a revisão do artigo 64.º da nossa Constituição é uma grande responsabilidade para todos nós. É que se há bem que todos preservamos é a saúde e se há problema que desperta a mobilização de todos os cidadãos é, efectivamente, a saúde.
Começo a minha intervenção justamente perguntando qual o conceito de saúde que Portugal defende com o artigo 64.º tal qual ele existe na nossa Constituição. É um conceito de saúde que tem a ver com a ausência de doença ou é um conceito de saúde que tem a ver com o bem-estar físico, psíquico e social de cada cidadão?

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É pela segunda definição que o Partido Socialista assume a sua posição política. Por isso mesmo, como já aqui foi referido pelo meu camarada João Rui de Almeida, o Partido Socialista considera o serviço nacional de saúde como a trave mestra que possibilita proporcionar aos cidadãos portugueses a saúde que corresponde ao conceito lato que referi como sendo a nossa posição política.
Mas o artigo 64.º, logo no seu primeiro número, faz referência a dois aspectos fundamentais. Por um lado, refere o direito à saúde, à protecção na saúde que contempla todos os cidadãos portugueses mas, por outro lado, infelizmente, muito poucas vezes aqui claramente assumido, refere o dever que cada cidadão tem de defender e promover a sua saúde.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Donde, para nós, Partido Socialista, a posição quanto à questão do artigo 64.º é muito clara: só é possível garantir o direito à protecção da saúde de cada português e proporcionar a cada português o cumprimento do dever de defender e promover a sua saúde se o serviço nacional de saúde for geral, universal e proporcionar a tendência da gratuitidade relativamente a todos os serviços que presta aos cidadãos. De uma forma muito clara, esta é a nossa posição e a razão de ser da manutenção deste texto tal qual existe neste momento.
Em sede de revisão constitucional, e no que toca, especificamente, ao Serviço Nacional de Saúde, são claras duas atitudes.
Por um lado, temos a atitude do PSD, que teve responsabilidade governativa durante quase 10 anos e que, com esta Constituição e as obrigações do enquadramento legal que definem as responsabilidades governativas quanto ao funcionamento do serviço nacional de saúde, não foi capaz de o modernizar e adaptar às necessidades, em dinâmica e em mutação, da população portuguesa, mantendo-o estático. E agora...

Vozes do PSD: - Está pior!

O Orador: - ... apresenta propostas que, em vez de tentarem corrigir e proporcionar um adequado funcionamento do serviço nacional de saúde, optam, claramente, por tentar "liquidar" a Constituição no que toca à defesa do direito à protecção da saúde e o dever de a promover.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - A atitude do Partido Socialista, ao invés, é a de considerar totalmente satisfatório os limites enquadrados na Constituição e optar, isso sim, pela reforma consensual, em diálogo com todos os parceiros sociais relacionados com o sector da saúde, de modernização do serviço nacional de saúde, de rentabilização das estruturas que lhe estão afectas, de permitir que os serviços privados de saúde, que têm um espaço perfeitamente definido na Lei de Bases de Saúde, possam, eles próprios, constituir um meio fundamental de complementaridade ao serviço nacional de saúde do Estado.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a nossa posição é clara. Há, repito, duas atitudes em jogo quanto ao artigo 64.º: a do Partido Socialista, que opta pela manutenção do actual texto, modernizando o seu sentido e, até, o seu texto, mas não abdicando da preservação daquilo que são os direitos consignados, e a do Partido Social Democrata, que, ao invés, opta por alterar a Constituição e por fazer esquecer ou pretender fazer esquecer que não foi capaz de aplicar, com efectividade, o serviço nacional de saúde enquanto teve responsabilidades governativas em Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresentámos uma proposta de alteração minimalista como último esforço para tentar centrar o debate naquilo que é essencial. Não vale mais a pena estarmos todos a repetir que queremos saúde para os portugueses, porque isso já nós sabemos! Hoje, a grande questão que se coloca é a de saber como é que isso se faz.
Recordo que, há cerca de 4 anos, num debate que travei com o Sr. Deputado João Rui Almeida, este me dizia que "jamais privatizar a gestão de um hospital público!", e agora o Sr. Deputado apoia um Governo que anuncia que prosseguirá nessa senda, sem qualquer dúvida! Ou seja, neste momento, a propósito da alteração ao artigo 64.º - e esta é, talvez, a última oportunidade de nele
consagrarmos algo de concreto -, penso que não vale a pena estarmos a discutir quem é que gosta mais da saúde dos portugueses! Aliás, interrogo-me sobre o que quererá dizer o Sr. Deputado Alberto Marques quando fala em "proporcionar a tendência da gratuitidade". O que é "proporcionar a tendência da gratuitidade", Sr. Deputado?
É nada!
Ora bem, a alteração minimalista que propomos tem dois objectivos, que passo a explicar.
O primeiro é o da utilização da palavra "sistema" em vez de "serviço", porque o que existe hoje, em Portugal, é um sistem9 e não um serviço nacional de saúde, ou seja, há um serviço nacional de saúde incluído num sistema nacional de saúde, porque nem de outra forma seria possível ter subsistemas - a ADSE, o SAMS, os subsistemas dos transportes, das telecomunicações, etc.
Portanto, neste momento, aquilo que temos em Portugal é um sistema nacional de saúde, que tem como pivot fundamental o serviço nacional de saúde, mas este coexiste com outros subsistemas.
Ora, não se colocar na Constituição a palavra "sistema", mantendo a palavra "serviço", significa tornar inexistente, para todos os efeitos, os subsistemas. Além do mais, o Sr. Deputado sabe perfeitamente que há grande dificuldade em
cobrar aos subsistemas os serviços que são prestados pelos hospitais públicos, bem como que, aquando da discussão do último Orçamento, o Sr. Secretário de Estado, num rasgo de optimismo, até fez crescer as previsíveis receitas,
exactamente na expectativa dessa cobrança. E uma das razões por que essa cobrança não é possível tem a ver com o facto de este artigo não ser modificado! Portanto, a não modificação deste artigo tem, como resultado prático,
sentido pelo Governo do Partido Socialista, a "parasitagem" dos subsistemas sobre o serviço nacional de saúde.
Em última análise, os senhores estão a consagrar um serviço nacional de saúde que não pode relacionar-se com os subsistemas que existem - um deles é público - e, por conseguinte, não tem possibilidade de fazer valer,

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nomeadamente, a prestação dos seus serviços. Em suma, a inclusão da fórmula " sistema nacional de saúde" é da maior importância.
Já a expressão "tendencialmente gratuito" é para deixar cair, porque ela só serve para o Sr. Deputado Alberto Marques falar em "proporcionar a tendência da gratuitidade", porque não tem qualquer efeito prático. Nem sintáctico, quanto mais prático!
Trata-se, portanto, de algo que gera confusão e engana os cidadãos, porque não corresponde à realidade. Aliás, o Sr. Deputado Alberto Marques acabou de dizer, virando-se para a bancada do PCP, que a gratuitidade é algo que já não podemos conceber, não é verdade! E podemos concebê-la, tendencialmente, quando já não a concebemos neste momento?! Deixar cair esta fórmula é um acto de seriedade, quanto mais não seja intelectual.
Finalmente, na ideia de sistema nacional de saúde, como é óbvio, convivem realidades públicas e privadas, porque ao contrário do que o Sr. Deputado João Rui Almeida pretende, não pode ser o senhor a definir o nosso modelo! O Sr. Deputado fez apenas uma interpretação, quiçá errada, desse modelo, porque quem define o nosso modelo ainda somos nós!
Além do mais, se o Sr. Deputado João Rui de Almeida estivesse mais informado, saberia que o nosso modelo não é outra coisa senão aquilo a que se chama um sistema misto, na constatação do que já existe e está a ser mal feito. A saber: parte da prestação já não é pública e algum financiamento também já não vem do Orçamento do Estado.
Defendemos, portanto, um sistema misto, com modelos de financiamento alternativos e com prestadores privados. É o que já acontece na prática, só que, como não existe uma organização sistémica, acontece da pior maneira. Ora, o que propomos é que o que já acontece neste momento aconteça de uma forma sistémica, isto é, de uma forma organizada, que permita o reforço, a sustentabilidade e. ganhos de saúde ao Serviço Nacional de Saúde, porque ele está muito doente.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Alberto Marques, João Rui de Almeida e João Corregedor da Fonseca.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Marques.

O Sr. Alberto Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, é muito positivo que na sua intervenção tenha dado especial ênfase à questão da tendência para a gratuitidade e, também, que tenha tomado nota de um termo que já tem sido usado, muitas vezes, como mote para algumas discussões, em sede de comissão. Refiro-me à eventual promiscuidade entre o sector privado e o sector público.
Quanto à primeira questão, a da tendência para a gratuitidade, lembro à Sr.ª Deputada que se os cuidados de saúde, porque não podem ser gratuitos, não fossem tendencialmente gratuitos, muitos dos cidadãos, cujos rendimentos e cujo nível cultural e de aptidão para a educação e para saúde são baixíssimos, não veriam assegurado o direito à protecção da saúde e o dever de a defender e promover. O objectivo do artigo 64.º é promover a protecção da saúde a todos os cidadãos portugueses, portanto se não existisse essa tendência da gratuitidade o risco dessa possibilidade seria muito grande no caso específico desse tipo de cidadãos. Mais, mesmo os cidadãos com altos rendimentos ou, pelo menos, com rendimentos muito favoráveis podem não ter, infelizmente, um nível adequado de esclarecimento sobre a sua responsabilidade na promoção da saúde.
Quanto à questão da promiscuidade entre os sectores público e privado, o Partido Socialista defende, através do seu Governo, a implementação da função de agência. Sabe a Sr.ª Deputada que esta é a prova provada de que a separação entre a função financiadora e a prestadora pode desenvolver-se, perfeitamente, sem que a Constituição tenha a ver com esse tipo de técnica e de desenvolvimento político.
Portanto, a sua preocupação é corroborada por nós, mas as suas premissas não correspondem às nossas. Somos capazes de resolver o problema através da introdução de medidas políticas concretas e isso nada tem a ver com a Constituição.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Marques, V. Ex.ª confundiu aqui duas situações, a de carência económica e a de risco. Elas não são a mesma coisa nem são tratadas da mesma maneira.
Em relação às situações de carência económica,, a Constituição, ao prever o direito à saúde, consagra um direito de acesso aos cuidados de saúde e faz recair sobre o Estado, obviamente, a obrigação de financiar quem não pode autofinanciar-se. Não é por se escrever na Constituição que o direito à protecção da saúde é "tendencialmente gratuito" - já foi gratuito, mas daqui a 5 anos cai! - que essa obrigação impende sobre o Estado; essa, obrigação impende sobre o Estado, sim, pelo entendimento que esta Constituição dá a estes direitos sociais. E o Sr. Deputado não acredita nisso, não acredita na Constituição!
O Sr. Deputado Alberto Marques acredita que esse direito vale porque tendencialmente gratuito, enquanto eu acredito que, ele vale porque está constitucionalmente consagrado. E esta a grande diferença. Nesse sentido, não me incomoda que se retire a expressão "tendencialmente gratuito", porque sei que, constitucionalmente, impende sobre o Estado português a obrigação de financiar quem não se pode autofinanciar no acesso aos cuidados de saúde. Para mim, isto é claro, o que prova que confio mais na Constituição do que V. Ex.ª.
Por outro lado, quero ainda dizer-lhe que essa figura da agência é uma invenção - Sr. Deputado, não se entusiasme! - copiada dos Estados Unidos, onde o sistema de saúde é um descalabro. e importada para Portugal, onde, felizmente. apesar de tudo, graças ao serviço nacional de saúde...

O Sr. Alberto Marques (PS): - Vamos ver!

A Oradora: - Não vamos ver, Sr. Deputado, porque estamos para ver imensas coisas e essa não vamos ver, de certeza!
A agência é uma realidade sofisticada e, aliás, a tradução é infelicíssima, porque aqui só conhecemos agências de viagens e agências funerárias...

Risos do CDS-PP.

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E a agência americana é outra coisa! Na prática, ela traduz-se nesta coisa triste: tirar o dinheiro do instituto de gestão financeira, onde, apesar de tudo, havia alguém que olhava para ele de uma forma pouco imaginativa mas conscienciosa, para o pôr nas mãos de uma ARS, que é um poder intermédio que o vai distribuir, como "bodo aos pobres", aos hospitais mal geridos, que a Sr.ª Ministra da Saúde não consegue organizar!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, V. Ex.ª começou por dizer que a proposta do PP é minimalista, mas não é tão minimalista como isso, Sr.ª Deputada. Senão vejamos: ela é contra o serviço nacional de saúde, é contra a fórmula "tendencialmente gratuito" e é contra o papel do Estado no sector da saúde. Pergunto, então, se o que a Sr.ª Deputada pretende é a liberalização total do sector da saúde. Aliás, que conceito de saúde tem o CDS-PP, porque nunca o ouvi nem percebi bem?
Finalmente, como prevê a promoção de saúde no país? É que, sobre essa matéria, o CDS-PP pouco ou nada, rigorosamente nada, se preocupa com os direitos sociais do povo português, onde o sector da saúde tem um papel essencial a desempenhar.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, tranquilize-se, porque o CDS-PP não quer a privatização do sistema 'de saúde. Acabei de dizer, há bem pouco tempo, que o único sistema que conheço mais privado do que misto é o americano, e não funciona. E o Sr. Deputado sabe tão bem como eu que não funciona.
Portanto, o que queremos é aquilo que aconteceu em todos os outros países, que foram "pais e mães" dos serviços nacionais de saúde. Não fomos nós, foi a Inglaterra! E o que é que está a acontecer em Inglaterra? Sei que o senhor sabe e, por isso, recomendo-lhe que vá ver, porque é isso mesmo que queremos. É tão fácil quanto isso!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, peço desculpa, mas, sinceramente, não entendi se a Sr.ª Deputada estava a fazer uma intervenção em defesa da proposta de substituição que apresentaram ou se ainda vão fazer uma intervenção sobre essa proposta de substituição.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não! Foi sobre essa!

O Orador: - Então, vai desculpar-me, mas tem de dizer mais umas coisinhas.
Em primeiro lugar, em relação a uma afirmação que me atribuiu sobre a privatização do hospital público, Sr.ª Deputada, é verdade! O actual Governo e o Partido Socialista são contra - não tenha dúvida! - a privatização dos hospitais públicos.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Da gestão!

O Orador: - Mas eu não falei da gestão!
E estará, certamente, registado aqui, quanto a uma questão suscitada pelo PCP sobre o Hospital Amadora/Sintra que disse mesmo que o PS está atento a essa experiência.
Quanto ao facto de á cobrança não ter sido possível por causa da constituição, isso é que ainda não tinha ouvido.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - É verdade!

O Orador: - Mas, Sr.ª Deputada, em relação a esta proposta de substituição, vai perdoar-me que lhe diga uma coisa, ainda que de forma sintética, porque os meus camaradas estão à fazer-me sinal para me apressar, mas não posso resistir, por respeito...

Risos do CDS-PP.

... por respeito em relação à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto e ao CDS-PP, nas propostas e nas posturas que tem assumido na Comissão de Saúde.
Sr.ª Deputada, ou nós não entendemos bem o que aqui está ou, então, vai desculpar-me, mas o que aqui está resultou numa mistura explosiva, que pode ser fruto da pressa ou do frenesim para fazer qualquer proposta. Aliás, o que aqui está, ao fim e ao cabo, não é uma explosão mas uma implosão para dentro do CDS-PP. Quem ler esta proposta de substituição com algum cuidado vê que foi feita, seguramente, no joelho e apresentada à pressa e que é um verdadeiro tratado de confusão.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Explique lá!

O Orador: - Vou já dizer-lhe, Sr.ª Deputada! Aliás, digo mesmo que é um disparate não pessoal mas político!
Veja só o último ponto que os senhores propõem: o sistema nacional de saúde, tem gestão descentralizada. O sistema?!

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sim, sim!

O Orador: - Onde estão incluídos os privados?! Tem gestão descentralizada e participada?! Isso é o serviço nacional de saúde, porque a gestão é do Estado e, portanto. é descentralizada e participada! Desculpe que lhe diga, mas isto reflecte a tal grande confusão de que falei no início.
Então, a Sr.ª Deputada quer ver um sistema, onde está englobado o serviço nacional de saúde, onde estão englobados os privados... Desculpe que lhe diga, mas está aqui escrito que o sistema nacional de saúde tem gestão descentralizada e participada.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, o seu tempo terminou.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.

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Peço o favor de que isso não fique registado, porque é, certamente, um descuido! Sinceramente, penso que isto foi, de facto, feito à pressa!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - É um erro, Sr.ª Deputada!

O Orador: - Mas quero dizer-lhe outra coisa...,

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, lamento mas não lhe posso dar mais tempo.

O Orador: - Não pode? Só mais um bocadinho...

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Não pode ser, Sr. Deputado.
Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Rui de Almeida, hoje está muito catastrofista: no início disse que desmantelei o sistema, agora mostra-se muito triste com a proposta.
Sr. Deputado, a proposta é perfeitamente inofensiva. Trata-se apenas da alteração das alíneas a) e d) da versão da CERC e, obviamente, do n.º 4.
Todo o seu espanto incidiu sobre o facto de o sistema nacional de saúde ter gestão descentralizada e participada. Por que é que não pode ser assim?! O senhor não está a perceber nem o que é sistema, nem o que é nacional, nem o que é saúde, nem o que é gestão, nem o que é descentralização e participação! Assim, não posso fazer nada!
Agora, pergunto-lhe o seguinte: a ADSE não pode ter uma gestão descentralizada e participada? Pode! O SAMS não pode ter uma gestão descentralizada e participada? Pode!
O sistema nacional de saúde tem, obviamente,...

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Então, e os consultórios privados podem ter uma gestão descentralizada e participada?

A Oradora: - Ó Sr. Deputado, onde é que o senhor leu "consultórios privados"?

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Estão aqui! Fazem parte do sistema!

A Oradora: - Estou a falar-lhe de subsistemas e o senhor responde-me com consultórios?!

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Não, não!

A Oradora: - Não, não? Onde é que ,estão os consultórios, Sr. Deputado?

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - O sistema nacional de saúde engloba tudo!

A Oradora: - Engloba tudo, não!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, não podem dialogar!
Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, faça o favor de responder directamente, sem estabelecer diálogo, porque temos de respeitar as regras do Regimento.

A Oradora: - Vou responder, Sr. Presidente.
O sistema nacional de saúde é constituído pelo seguinte: pelo serviço nacional de saúde, pelos subsistemas e, para já, que eu saiba, por mais nada. Se o sistema nacional de saúde tiver de ser constituído por mais qualquer coisa, a entrada dessa mais qualquer coisa no sistema far-se-á de acordo com regras muito claras, ditadas pelo Estado, que é quem gere o sistema. Não sei se me expliquei!
Onde estão os consultórios privados?! Então, o Sr. Deputado, Presidente da Comissão de Saúde, analisa a saúde através dos consultórios privados?! Ó Sr. Deputado, estou a falar de subsistemas, de milhões de utentes e de milhões de contos!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para intervir no debate, tem agora a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, o PCP propõe para este artigo que se retome a formulação inicial e se consagre um sistema nacional de saúde universal, geral e gratuito. É verdade!
Consideramos que este serviço nacional de saúde tem de ser universal, porque todos têm de ter acesso ao serviço nacional de saúde, ninguém pode ser excluído do acesso ao serviço nacional de saúde, nenhum cidadão ou grupo de cidadãos podem ser excluídos, por qualquer razão, do acesso ao serviço nacional de saúde.
Mas este serviço nacional de saúde também tem de ser geral, porque tem de dar possibilidades de acesso a todos os cidadãos, nas suas diversas carências em matéria de saúde.
Em terceiro lugar, e é aqui que se assinala a estranheza de vários Srs. Deputados em relação à peregrina proposta do PCP nesta matéria, existe muita vantagem em que seja um serviço nacional de saúde gratuito. E porquê? É que o reforço do serviço nacional de saúde não se faz apenas com palavras ou com declarações de intenções, faz-se garantindo aos cidadãos um melhor serviço, um melhor acesso democrático à saúde. E, nesse sentido, a espinha dorsal da consagração do direito dos cidadãos à saúde no nosso país é exercida pelo serviço nacional de saúde, que concretizará melhor esta sua função, se for gratuito. E porquê? Porque a gratuitidade, ao contrário do que, por vezes, se tenta fazer crer, é uma vantagem, especialmente para aqueles que são mais carenciados. A tendencial gratuitidade que é tão defendida, nomeadamente pelos Srs. Deputados do Partido Socialista, tem como consequência prática que os principais prejudicados, os principais afectados sejam aqueles que, afinal, têm menos recursos económicos, sejam as classes mais desfavorecidas, sejam aqueles que mais dificuldades têm no acesso à saúde. Esta é que é a realidade! E é por isso que a proposta no sentido de que o serviço nacional de saúde volte a ser tão-só gratuito e não tendencialmente gratuito se assume como uma proposta de justiça social e de consagração plena daquele que é o direito estipulado no n.º 1 do artigo 64.º, ou seja, o direito de acesso à saúde.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, em relação às outras propostas, quero dizer que o PSD falou bastante da questão da liberdade de acesso, parecendo até que, com a Constituição que hoje temos, e que, provavelmente, no fundamental, vamos continuar a ter, não há liberdade de

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acesso dos cidadãos aos diversos cuidados de saúde, públicos e privados, assim o queiram.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Dificulta!

O Orador: - O que não haveria, se se consagrassem as propostas do PSD, era a plena liberdade de acesso aos cuidados de saúde daqueles que têm mais dificuldades, das classes mais desfavorecidas, pura e simplesmente porque a garantia do serviço nacional de saúde ficaria diminuída.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só faltava essa!

O Orador: - A proposta do Partido Popular não é uma proposta minimalista mas, sim, uma proposta que visa minimizar a protecção dos cidadãos no acesso à saúde.
Termino, dizendo que a saúde é um direito humano, um direito fundamental e, especialmente, um fundamental dever do Estado, no sentido de garantir aos cidadãos um acesso condigno, pleno e total aos cuidados de saúde.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Barradas.

O Sr. José Barradas (PS): - Sr. Presidente, vou ser muito sintético, fazendo quase uma intervenção cirúrgica, como o tempo determina.

Risos.

Sr. Deputado Bernardino Soares, parece-me interessantíssima a forma como abordou este terna, concordo com muitas coisas que disse e se tivesse de sintetizar aquilo que se pretende com um sistema universal, geral e gratuito diria o seguinte: todos doentes, todos iguais, segundo V. Ex.ª.
A Constituição da República tem de reflectir a realidade do país e não pode conter preceitos impossíveis de levar a cabo. E corremos um risco, ao retomar propostas de experiências que se mostraram incapazes de apresentar bons resultados em épocas e países com outras realidades sócio-políticas que não a nossa, que é o de embarcar num sonho ou numa utopia que nos afastará definitivamente da oportunidade de adequar os nossos desejos às nossas realidades.
Ao mantermos o sistema tendencialmente gratuito, entendemos que não devemos expurgar da Constituição expressões que reflictam sentimentos e vontades de ontem e de hoje, que, embora consideradas, por uns, utópicas e desajustadas no tempo, não deixam de constituir, para outros, janelas de esperança para o futuro.
Não desistimos de restituir às organizações que servem as pessoas valores e princípios que. por serem humanos, as humanizem: solidariedade, equidade e, neste caso, acessibilidade. Valores e princípios esses que se mantêm subjacentes nos preceitos constitucionais que vamos aprovar em breve.
Por isso, cumprimentamos todos aqueles que, connosco, conseguiram assumir estes valores essenciais, viabilizando o texto.
Termino, dizendo-vos o seguinte: ao deixarmos a expressão "tendencialmente gratuito" mantemos intacto o nosso direito à utopia, sem pormos em causa a nossa realidade. Somos um país pequeno, com uma economia aberta e concorrencial e um pequeno orçamento, em face do tamanho das nossas ambições e dos nossos desejos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Mendo.

O Sr. Paulo Mendo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Naturalmente, sou obrigado a iniciar a minha intervenção, dizendo que a não modificação do texto constitucional, o não aproveitamento desta revisão constitucional para o modificar, se quiserem apenas até no sentido de o modernizar e de o flexibilizar, foi, para mim, uma desilusão.
O Partido Socialista assume a responsabilidade integral da manutenção do texto constitucional em vigor, mas gostava de fazer algumas considerações sobre o que foi dito, definindo também a posição do nosso partido.
Pela minha parte, e julgo que nisto estou acompanhado por toda a bancada e por toda aquela que tem sido a história do PSD, sempre defendemos o serviço nacional de saúde.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sempre o serviço nacional de saúde foi, para nós, a peça básica e fundamental do nosso sistema de saúde num sentido mais lato.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Assim é que devia ser!

O Orador: - O serviço nacional de saúde foi, quanto a nós, politicamente, escolhido numa época já tardia. Foi aquilo que digo que teve o pecado inicial de ser serôdio! O serviço nacional de saúde foi uma imensa conquista da sociedade, do Estado-Providência europeu, iniciou-se na Inglaterra, quase como um símbolo do que é um serviço público de solidariedade social, e, na altura em que foi criado, teve à sua frente 30 anos de crescimento económico constante, como sabem a um ritmo inclusivamente superior a 4,5%, o que significa que todos os anos o serviço nacional de saúde teve a possibilidade de se ir municiando, de ir sendo financiado cada vez core o quantitativo necessário aos novos desafios e compromissos que ia assumindo.
Fizemos este serviço nacional de saúde em 1975, o que significa que tinham acabado os 30 magníficos anos de Forrestier e estávamos a entrar num período de contenção económica. Por isso, porque o serviço nacional de saúde, tal como o tínhamos previsto, era um serviço universal, geral e gratuito - o que significa, com toda a coerência (como diz o PCP), que é pago integralmente pelo Orçamento do Estado -, desde aí, este serviço nacional de saúde começou a ser subfinanciado, na mesma altura, reparem, em que o serviço nacional de saúde inglês começou a sentir os mesmos problemas.
Junta-se a isto, a partir de 1982, a entrada num período espantoso de reformas tecnológicas na saúde e aquilo que considerávamos ser um serviço possível de prestar a todos nós, que era os cuidados médicos que consistiam em médico e receitas, passou a ser de uma enorme complexidade e de uma enorme carestia, o que significa que este modelo teve de começar a ser aberto. E não só a Inglaterra começou a estudar, como sabem, a modificação

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necessária pára a sua modernização, como todos os sistemas europeus começaram a fazer o mesmo estudo.
Ainda há menos de oito dias, na Fundação Gulbenkian, onde está a decorrer um ciclo sobre os serviços de saúde, quem lá esteve, ouviu um grande perito inglês em sistemas de saúde dizer que todos os sistemas de saúde estão em crise e que é necessário ter o pragmatismo suficiente para constantemente estar a adaptar as necessidades às possibilidades. Quando isto sucede nos outros países, muito mais sucede em Portugal onde, por sistema, temos um tipo de política - ainda não conseguimos mudar! - que é um tipo de política ao contrário do que devia ser. Isto é, devo definir os objectivos que quero atingir na política de saúde e arranjar o financiamento para suportar esses objectivos. Em vez disso, não podemos ainda ter este tipo de política e temos a política contrária, que é a de "tenho este bolo financeiro, arranja-te com ele"!
Ora,, perante isto, sucede uma coisa que me parece perfeitamente fundamental: temos de, obrigatoriamente, não arremessarmos ideologias uns aos outros. vermos o que é que podemos fazer e tentarmos viver num sistema jurídico que nos permita, o mais possível, aproveitar todos os recursos do país, o que significa que temos de ter um sistema de saúde no qual o serviço nacional de saúde seja fundamental. Admito, e talvez defenda, que seja fundamentalmente orçamentado pelo Orçamento do Estado, como o é em Inglaterra, mas temos de descobrir novas formas de financiamento, temos de descobrir novas formas de relacionamento com o sector privado, temos de descobrir a maneira de integração dos vários pilares num sistema que nos sirva a todos, temos, enfim, de fazer um tipo de sistema em relação ao qual não andemos a atirar boomerangs políticos uns aos outros, mas sejamos capazes de admitir um modelo.
Lembro que a Inglaterra tem um modelo socialista, que o Partido Conservador apoia, e lembro que, em França, temos um modelo completamente liberal, que o Partido Comunista francês também apoia. Só nós, aqui, é que temos a mania de nos atirarmos, como se fosse uma ideologia política, às limitações ou às posições de cada um de nós em relação a este sistema. Felizmente - e posso dizê-lo aqui, publicamente -, o ambiente que temos na Comissão de Saúde não é, de modo nenhum; um ambiente de querela política; pelo contrário, somos aí, muitas vezes, capazes de ver e estudar os problemas como deve ser.
Mas, face a isto, o Partido Socialista disse: não, senhor! Quero a Constituição que está! Não a abriu, não 'entrou neste' movimento, que é um movimento universal de modificação dos sistemas, e disse: quero tudo como está! Portanto, o PS é assim o responsável pela manutenção na nossa Lei Fundamental de princípios regulamentadores e orientadores de uma acção monopolista de Estado, na área da prestação dos serviços de saúde, em vez de, como seria importante, passarem a estar expressos na Constituição as garantias e os direitos que terá o cidadão no campo da saúde bem como os seus inseparáveis deveres.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Partido Socialista mantém, em relação a este importantíssimo artigo constitucional, uma posição conservadora, de reafirmação de princípios e estratégias que o seu próprio manifesto eleitoral - para não falar já nos seus Estados Gerais - põe em causa e abandona. Tal como estávamos a prever, o PS não está interessado em defender e realizar uma política de saúde baseada em objectivos concretos que traduzam mais segurança, mais conforto, mais benefícios para o cidadão, a não ser que essa. política seja realizada segundo os princípios ideológicos que o PS considera essenciais e prioritários, mesmo face aos interesses dos cidadãos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A separação das entidades prestadoras das entidades pagadoras, o dinheiro seguindo os doentes, a competição entre prestadores, o Estado mais garante e menos prestador, o aumento da liberdade de escolha, a saúde garantida num sistema em que o serviço nacional de saúde é o seu pilar essencial mas em que o sector privado é um indispensável associado - tudo isto são princípios gerais que o PS adoptou nos seus próprios Estados Gerais, que o seu Ministério continua a afirmar, mas que, agora, não recebem a mínima consagração constitucional, que se vai manter tristemente burocrática e limitativa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Não apoiado!

O Orador: - De tudo isto, concluímos, como também já foi dito pela minha bancada, que a partir de agora não pode o PS e o seu Governo apontar limitações constitucionais para justificar nem a ausência total de reformas ou de propostas de novas formas de financiamento do actual Governo, nem a impossibilidade de futuras reformas do sector. A partir de agora, tem o PS de saber e de assumir que esta formulação constitucional é sua e que cessam todos os alibis constitucionais para que não se realizem as reformas necessárias na política e no Financiamento que, até agora, nem sequer esboçadas foram pelo actual Ministério.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Mendo, houve uma parte dá sua intervenção em que fiquei sem saber se o Sr. Deputado colaborou na elaboração da proposta que o PSD fez. Pelos vistos, dá a impressão que sim, mas, por aquilo que ouvi, é um pouco contraditório do que aqui está. Registo, e o PS regista, não pode deixar de registar, que o Sr. Deputado Paulo Mendo tem simpatia pelo conceito do que é o serviço nacional de saúde - já o sabíamos, mas foi reforçado aqui, o que é importante.
Sr. Deputado Paulo Mendo, deixe-me dizer-lhe uma coisa: entre o médico e o doente - há uns anos atrás esta ligação era directa - intrometeu-se (passe o termo) o serviço nacional de saúde. E aquilo que os senhores fizeram, nesta área, neste serviço que está entre o médico e o doente, foi uma política do subsídio - o subsídio às instituições, aos hospitais, etc. Ou seja, o que é que isto quer dizer? Por exemplo, não sei se a maior parte dos Srs. Deputados sabe que a forma de subsidiar os hospitais em Portugal, de um ano para o outro ano, era, como chamávamos, "a olhómetro"! Sem critério nenhum! E aquilo que neste momento queremos fazer não é uma política de subsídio mas sim uma política de

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contratualização, ou seja, um financiamento mas com responsabilização, ao fim do ano, de acordo com critérios de exigência, que é aquilo que não foi feito em anos anteriores. Houve uma desresponsabilização porque os senhores optaram sempre pela tal política, mais fácil, ao fim e ao cabo, que era a de subsídio para as instituições sem nunca lhes ser pedido nem nunca ter sido desenvolvido o conceito, que é mais sério, da contratualização. Há um subsídio, sim, mas com regras, e com a exigência de responsabilização, de resposta perante o que foi gasto - isso é que é importante e nunca foi feito.
A intenção agora, porque nós - e desculpe o termo - amamos mais o serviço nacional de saúde, porque gostamos mais dele, porque não queremos deixa-lo morrer, nós - o Partido Socialista e o Governo - vamos querer que este dinheiro, que é ,de todos, seja aplicado com mais rigor para a resposta. Daí a permanente frase de que o doente deve estar no centro do serviço nacional de saúde.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por falta de tempo, fico por aqui. Mas quero ainda dizer que, em relação à área importante dos cuidados primários, nunca também desenvolveram a sua intervenção e as suas capacidades, que estão um tanto ou quanto adormecidas na situação actual.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Mendo.

O Sr. Paulo Mendo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Rui de Almeida, em primeiro lugar, queria dizer-lhe uma coisa: desconfio que alguém ame mais o serviço nacional de saúde português do que eu, até porque sinto que, em grande parte, não digo que seja obra minha, mas dei uma contribuição que qualquer médico do meu país não deu igual à minha - não tenho dúvida nenhuma em relação a isso.
E quando todos os médicos estiverem no privado, provavelmente continuará a haver um funcionário público, que sou eu! Trabalho em tempo exclusivo em hospital público, sempre me bati pelo hospital público, criei o meu serviço, criei uma nova especialidade, não tenho nenhum problema para dizer que me bati largamente por tudo o que é um serviço nacional de saúde, que defendo e, provavelmente, não haverá quem o defenda mais do que eu.
Por isso mesmo, sinto que a falta de contratualização se deve, por exemplo, a que, precisamente, temos um aparelho de Estado, temos uma função pública, temos uma forma de funcionamento no Estado que nos impede completamente disso. São, pois, necessários outros modelos, outras experiências, de tal modo que seja possível compararmos métodos e utilizarmos os métodos melhores e mais modernos, não fechando-nos aos serviços privados, criticando, como os senhores criticaram - provavelmente não o irão fazer - duas coisas que nós fizemos e que. nos parecem perfeitamente fundamentais: integração no serviço nacional de saúde de um hospital de uma misericórdia, entrega de um hospital público a uma gestão privada. São dois pontos de comparação: o ponto de comparação do primeiro, que é o Hospital da Prelada, é feito sob a forma de contratualização - tiramos daí
exemplos de que isto é muito mais eficaz; simplesmente, Sr. Deputado, fica mais caro! O problema, como viram na auditoria realizada pelo Tribunal de Contas aos hospitais, foi o de dizer que não é possível continuar a financiar hospitais com orçamentos financeiros que não têm nada a ver com orçamentos económicos! Fui director de hospital durante anos e anos, sempre fiz orçamentos económicos a dizer "quero fazer isto, vou fazer isto, preciso disto" e a resposta era "muito bem, precisas de 17 milhões, pega lá 14 milhões"! Esta forma de funcionamento de um serviço público não é possível manter-se muito mais tempo sob pena de o nosso subfinanciamento se traduzir - e vai-se traduzir rapidamente se por acaso não atalharmos - numa diminuição dos direitos dos cidadãos.
Portanto, temos como problema fundamental saber que financiamento e, segundo, que responsabilidade as instituições têm que ter. E aí estou inteiramente de acordo, todos temos que estar de acordo, que é evidente a responsabilidade autónoma de cada uma das instituições.
Sr. Presidente, eram estas as considerações que entendi proferir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, passamos ao artigo 65.º.
Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Lucília Ferra.

A Sr.ª Lucilia Ferra (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito sucintamente quero manifestar, em nome da bancada do PSD, a nossa satisfação por algumas das alterações introduzidas a este artigo e, sobretudo, pela abertura que houve em conferir dignidade constitucional a alguns aspectos da habitação e do urbanismo.
Assim, especificaria apenas alguns dos aspectos, começando pela própria epígrafe do artigo, em que foi incluído, a par da habitação, o urbanismo. Parece-nos importante esta inclusão na epígrafe porque desta forma salienta-se a importância que foi dada a um tratamento autónomo do urbanismo, urbanismo esse que assume toda a pertinência, sobretudo nas sociedades modernas, em que se manifesta de tão grande importância.
Salientaria igualmente na alínea b) do n.º 2 do mesmo artigo a preocupação que o legislador constitucional teve de incluir numa das incumbências do Estado a promoção, em colaboração com as autarquias locais, da construção de habitações económicas e sociais. O Partido Social Democrata sempre manifestou grandes preocupações nesta área e gostaria de recordar que o Programa de Erradicação das Barracas (PER) foi um dos programas lançados pelo PSD e, portanto, é com toda a satisfação que vimos incluir no texto constitucional esta preocupação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, na alínea c) do n.º 2 do mesmo artigo também entendemos ser de todo importante a circunstância de o legislador ter aí incluído, a par de estimular a construção privada com subordinação ao interesse geral, o acesso à habitação própria e arrendada. Também nos parece muito importante esta importância dada à habitação arrendada sobretudo se atendermos que, no âmbito dos governos do Partido Social Democrata, foi dada relevância a esta preocupação, nomeadamente através

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da legislação que foi então criada de apoio ao arrendamento jovem.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Quanto ao n.º 5 deste artigo, em sede de CERC, o Partido Social Democrata absteve-se não por discordar do princípio, pelo contrário concordamos em absoluto com o princípio da participação dos interessados, mas suscitaram-se, à data, algumas dúvidas se haveria necessidade de incluir no texto constitucional e nesta área do urbanismo, mais uma vez, a garantia da participação dos interessados na elaboração de .instrumentos de planeamento urbanístico e de quaisquer outros instrumentos de planeamento físico do território. De facto, entendíamos que a participação dos cidadãos estava garantida através de diversas disposições, algumas constitucionais e outras a nível de legislação ordinária, e tínhamos, à data, alguma dúvida sobre a necessidade de incluir esta preocupação de participação aqui no texto constitucional.
Todavia, reflectimos e, dado entendermos que as questões do urbanismo assumem uma relevância tão importante nas sociedades modernas, o nosso sentido de voto vai ser pela aprovação deste n.º 5 do artigo em apreciação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O conjunto de alterações que estão indiciadas neste artigo tem um sentido contraditório. Há alterações que entendemos positivas, designadamente o tratamento mais digno e mais profundo dado à temática do urbanismo, aliás, já encontrávamos alguns afloramentos dela na Constituição da República Portuguesa, quer neste artigo quer no artigo sobre direito ao ambiente que discutiremos de seguida. Em todo o caso, sem dúvida nenhuma que haverá um tratamento mais sistemático e aprofundado.
Congratulamo-nos com o facto de o PSD ter revisto a sua posição a respeito do n.º 5 porque sabemos que o princípio da democracia participativa está amplamente consagrado na Constituição da República Portuguesa e desde logo no artigo 2.º, mas isto não impede que esteja também consagrado num conjunto de outras disposições sobretudo quando é particularmente importante a participação. Entendemos que a gestão urbanística é uma daquelas áreas de intervenção da Administração Pública em que essa intervenção é efectivamente fundamental.
Quero também sublinhar o facto de as alterações positivas não estarem apenas consagradas neste artigo, designadamente a consagração do direito à habitação dos jovens tem uma consagração específica no artigo 70.º, que discutiremos de seguida.
Criticamos o facto de ter sido consagrada uma disposição em termos equívocos, a alínea b) do n.º 2, que aponta para um papel das autarquias locais que pode ser interpretado como de desresponsabilização do Estado e de imposição de encargos às autarquias sem meios. De resto, o exemplo dado pela Sr.ª Deputada que acaba de intervir é particularmente significativo porque o PER é um programa que significa um grande e desmedido esforço financeiro para autarquias locais e para muitas delas um compromisso muito profundo em relação ao futuro, um compromisso de muitas dezenas e até centenas de milhões de contos que, de todo em todo, não é acompanhado de apoios financeiros e qualquer eleito autarca, incluindo do PSD, confirma isto que estou a dizer, que, aliás, foi a posição tomada, por unanimidade, pela Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Nesse sentido, esta proposta parece-nos perversa, o que não significa de forma nenhuma que vai tornar legítima uma actuação do tipo daquela que foi tentada no passado e que vai eventualmente ser tentada de novo no futuro que é a ideia de desresponsabilizar o Estado e comprometer as autarquias muito para além da sua capacidade financeira.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é um fantasma!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero exprimir a congratulação do Grupo Parlamentar do PS por várias coisas. Primeiro, porque este artigo vê o seu âmbito alargado. Regulava habitação, passa a regular inequivocamente o urbanismo e o tratamento constitucional do urbanismo deixa de .estar ligado exclusivamente a uma perspectiva dominantemente ambiental deslocando-se o tratamento do artigo 66.º, onde hoje perpassa, para o artigo 65.º nos termos que resultam da proposta que se auto-explica.
Gostaria de saudar a redacção do n.º 4 que passa a ser uma verdadeira matriz do planeamento urbanístico em termos modernos, que, suponho, são consensuais mas comportam uma óptica extremamente positiva de ordenamento do território e de garantia de que não mais haja a proliferação de actos abusivos de ocupação ou de transformação em solos urbanos que tanto têm desfigurado o território nacional.
Em segundo lugar, a norma que foi incluída no sentido de prever um grau de participação das autarquias em matéria de promoção da construção de habitações económicas e sociais - sublinhe-se "habitações económicas e sociais" - não só não está desinserida daquilo que é a feição própria do poder local como nos termos em que está encarada não acarreta de per si nenhum ónus nem a possibilidade de transferência ou sobrecarga orçamental com uma missão que, por definição, tem de ser articulada. O preceito mantém a responsabilidade estadual nestes domínios e apenas alude a uma colaboração, a qual, como se sabe, é adjuvante e tem que se fazer de forma adequada, necessária e proporcionada e em função de possibilidades que hão-de ser determinadas anualmente em função das necessidades do Orçamento do Estado e das capacidades das autarquias locais.
Por último, gostaria de me congratular muito com a intervenção da Sr.ª Deputada Lucília Ferra que deu a aquiescência do PSD, se bem entendi, à consagração de uma norma específica sobre participação dos interessados na elaboração de instrumentos de planeamento urbanístico. Essa norma não tinha tido maioria de dois terços na CERC, lamentámos isso na circunstância, congratulamo-nos muito por o PSD ter aderido à ideia de que se justifica uma norma específica sobre participação num domínio em que a falta dela tem consequências tão graves.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, terminado o artigo 65.º, passamos ao artigo 66.º.

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Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O artigo 66.º é também um dos grandes artigos da Constituição da República Portuguesa dedicado ao ambiente e qualidade de vida. De novo aqui trata-se apenas de melhorar a Constituição da República Portuguesa porque também a Lei Fundamental vem já de longe a dedicar a esta matéria nova o artigo conveniente. É apenas um aprofundamento e uma melhoria que, todavia, merece ser destacado em vários aspectos.
Em primeiro lugar, uma nova filosofia de fundo no que toca ao papel do Estado. Se bem repararmos na actual redacção do n.º 2 do artigo em causa, a filosofia que nele está contida é a de incumbir ao Estado a tarefa de protecção do ambiente fazendo do Estado, mais uma vez, um Estado muito interventor p acima de tudo um Estado quase totalitário nesta gigantesca tarefa. O que se pretende agora, e com a nova redacção assim se vai ao encontro, é uma filosofia diferente, uma filosofia em que se faça sentir que o ambiente e a qualidade de vida são, acima de tudo e em primeiro lugar, uma tarefa da sociedade, de cada um dos cidadãos que integram a sociedade e, ao mesmo tempo, fazer incumbir ao Estado, em colaboração e envolvimento total da sociedade e dos cidadãos, a tarefa de, da melhor maneira possível, assegurar esse direito ao ambiente de todos os cidadãos.
Merece, por isso, ser sublinhada esta nova filosofia de fundo em que o Estado e a sociedade estão mais imbricados, estão mais ligados nesta tarefa, hercúlea, diremos mesmo, e propor assim, em consequência, alterações que, designadamente, levam à explicitação e consagração da ideia de educação para os valores ambientais e da ideia do respeito pelos valores ambientais como se prevê na nova alínea g).
Em segundo lugar, faz sentir que o ambiente é um problema de hoje com o sentido do amanhã; um problema onde a solidariedade geracional ou intergeracional, mais do que em muitos outros aspectos, está presente e, por isso, também uma nova alínea mostra que tudo deve ser feito no aproveitamento dos recursos naturais e na renovação e estabilidade ecológica com o devido respeito pela solidariedade entre gerações, como se propõe na nova redacção da alínea d).
E sendo este o pano de fundo da tarefa da sociedade e do Estado, educação e mentalidade social para estas novas vertentes e de solidariedade entre gerações, então, sim, compreendem-se algumas outras melhorias.
Duas vertentes o PSD propôs, que aqui são. plasmadas nas novas redacções. Em primeiro lugar, a vertente mais clássica da natureza humana e sobretudo da natureza e da paisagem. É bom que se consagre, como se faz na alínea b), a ideia da valorização da paisagem pois sabemos todos quão bom gosto temos em apreciar os melhores recantos de Portugal, desconhecido aqui e além, quantos turistas vão por Portugal inteiro à espera de encontrarem ainda hoje os mais recônditos lugares por aí espalhados de norte a sul e do interior ao litoral. É que a paisagem tem esse valor de ser um espelho do bem-estar, de ser um lugar aprazível e a valorização estética e mesmo cénica da paisagem é a vertente que o PSD quis introduzir neste artigo e que nos aparece na alínea b). Aliás, se é fonte de bem-estar, também é bom que seja um espelho da qualidade de vida de cada um que tenha bom gosto e se sinta agradado ao olhar para a paisagem.
Por último, uma nova vertente, a da qualidade de vida urbana. Todos nós sabemos que o país tem vindo a urbanizar-se em grande extensão, que o país rural que fomos, e ainda continuamos a ser em grande matriz, tende a dar lugar a um país cada vez mais urbano e também todos nós sabemos das chagas sociais que significam sobretudo os espaços suburbanos. Por conseguinte, é bom associar o ambiente e a qualidade de vida à promoção da qualidade ambiental das povoações, da vida urbana, no plano arquitectónico e urbanístico designadamente, e da protecção das zonas históricas.
De novo aqui o PSD pretende uma renovação no velho conceito usado por um grande autor, eterno, como é Torga, aquilo a que ele chama a renovação histórica. E nós queremos com isto uma renovação para a modernidade sem prejudicar o grande valor da identidade histórica do país com a salvaguarda dos traços, das matrizes, de cada uma das povoações e da sua vida urbana.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas esta vertente nova que o ambiente e a qualidade de vida pressupõem, para evitar ghettos sociais, com o que isso significa de fonte de anomias graves, de verdadeiras esquizofrenias, de verdadeiros factores de indução ao crime, tudo isso o PSD pretende evitar e para isso plasma a orientação que está na nova alínea. e) introduzida por proposta do PSD.
Por último, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o reconhecimento de que o direito ao ambiente é um direito horizontal que não é, propriamente, o direito a uma pasta qualquer do Estado, e que é um direito que deve perpassar nas várias políticas de âmbitos sectoriais. Essa horizontalidade fica agora aqui plasmada na nova alínea f) para que não haja dúvidas neste carácter horizontal e não vertical deste novo ramo do Direito.
Quanto a uma possível alínea h) no sentido de promover a diminuição dos desperdícios. e garantir o aumento de recuperação, reutilização e de reciclagem só não a aprovamos porque não é de dignidade constitucional.
Estamos de acordo com ela, é assim nas leis ordinárias, terá de ser assim, foi assim com os Governos do PSD, continua a ser assim com este Governo, assim esperamos, todavia apenas porque é um sector e não envolve outros sectores, que seriam tão dignos como este, designadamente os da luz, do ar, da água, do solo, do subsolo, etc., obviamente, não partilhamos da necessidade da sua constitucionalização.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Nada mais terei a acrescentar, Sr. Presidente, e muito obrigado por me ter dado a palavra.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos, de facto, em sede daquilo que é uma das áreas mais importantes do texto constitucional. Estamos a falar de ambiente e de qualidade de vida, de novos desafios e de novos paradigmas que se colocam à humanidade.
Não são questões menores, não são questões secundárias, não são questões marginais, são, isso sim,

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questões que não só passaram a estar na agenda política como são questões das quais depende, efectivamente, a segurança, num novo conceito que os problemas ambientais vieram trazer e numa redefinição do próprio conceito de segurança.
Estamos a falar de questões que têm a ver com saúde pública, com o equilíbrio ecológico e que envolvem uma outra abordagem, ou seja, uma abordagem sistémica, de longo prazo, nomeadamente uma diferente forma de conceber valores e valias que não são passíveis de troca.
As questões do direito ao ambiente e à qualidade de vida, como foi referido, tinham já, de algum modo, de forma antecipativa e inovadora no texto constitucional, uma expressão extremamente forte. Contudo, saudámos a unanimidade colhida para, em sede do artigo 9.º, autonomizar os direitos ambientais e também aqui, do nosso ponto de vista, recolhendo um conjunto de benfeitorias e mais-valias que Os Verdes tinham proposto ao longo do debate e que as organizações não governamentais, que, posteriormente, vieram a dirigir-se à Assembleia, também referiram nas suas propostas e que, de um modo geral, vieram a ser acolhidas.-
Em concreto, gostaria de sublinhar alguns aspectos que nos parecem importantes e que o texto constitucional veio acolher por proposta de Os Verdes com o acolhimento do PS e do PSD, designadamente uma evolução em termos dos conceitos de ambiente, considerando aquilo que, decorrente da Conferência do Rio, é hoje a caracterização e a definição do ambiente num conceito novo: o do desenvolvimento sustentável.
Mais do que a definição e um chavão há, ao longo do texto e do articulado que é proposto, uma densificação que dá corpo e sentido ao próprio conceito de desenvolvimento sustentado sem o qual ele ficaria, do nosso ponto de vista, extremamente empobrecido.
Gostaria de dizer, ainda, que nos parece extremamente importante no texto constitucional, ultrapassando reservas iniciais que tinham surgido, uma questão que é fundamental quando se fala de desenvolvimento sustentado.
Estamos a falar de uma rediscussão, de uma redefinição da própria democracia, de diferentes modos de viver, de consumir e de produzir e estamos a falar de modificações que têm uma perspectiva e que implicam alterações do ponto de vista político e ambiental e também na óptica cultural, estando implícita a participação dos cidadãos, donde o acrescento que é feito no n.º 2, sobre o envolvimento e participação dos cidadãos, nos parecer fundamental e um enriquecimento sem o qual a política de ambiente não será, de todo em todo, passível de ter a dimensão e o objectivo que se pretende.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há um conjunto de propostas que também são extremamente importantes e que estão intimamente ligadas ao desafio ecológico, ou seja, a uma diferente perspectiva de solidariedade, que é a de ter em conta uma utilização racional dos recursos e uma partilha socialmente justa desses recursos numa óptica que deixou de ser estritamente imediatista mas que tem em conta uma visão de longo prazo.
Portanto, nessa perspectiva, a solidariedade para com as gerações vindouras é uma alteração que nós defendíamos, de forma muito forte, e que veio a ter numa segunda fase da discussão acolhimento positivo pelos demais partidos.
Há aspectos pontuais, que são colocados por outros grupos parlamentares, que têm a ver com as questões com que se confronta a sociedade aquando de modificações
profundas na forma de viver. Quando se fala de alterações de padrões de consumo, de padrões culturais, obviamente temos de falar da pedagogia, da educação e do respeito para com os valores ambientais, tendo sido esta também uma proposta que acolhemos positivamente.
Em todo o caso, gostaria de sublinhar e chamar a atenção para dois aspectos que não vimos suficientemente aprofundados nas propostas de alteração ao texto constitucional, nomeadamente a de uma nova alínea e), que não colheu maioria qualificada e que teve grande resistência por parte do grupo parlamentar do PSD e para a qual voltaria a chamar a vossa atenção.
Estamos a falar de uma sociedade com determinados valores onde a imposição dos valores do "ter" se sobrepõem aos valores do "ser". Estamos, portanto, a falar de uma sociedade virada para o consumismo e para o produtivismo onde a questão da produção de lixos, por exemplo, ou a utilização irracional da energia colocam desafios importantes.
Assim, insistimos na importância de introduzir uma alínea nova que fale da diminuição de desperdício e da garantia do aumento da redução, reutilização e reciclagem - aliás, chamo a atenção para o facto de haver uma gralha na proposta que foi distribuída - e faria um último apelo à bancada do PSD para que reflectisse sobre a importância daquilo que está em jogo.
De facto, estamos a falar da necessidade da utilização racional de recursos, da necessidade de ter em conta aquilo que noutras alíneas, como princípios orientadores que devem pautar a política de ambiente e de qualidade de vida, foi contemplado, ou seja, uma visão de longo prazo, uma utilização sustentada dos recursos, tendo em conta o seu carácter finito.
Por isso, parece-nos que, em coerência com aquilo que se assumiu como princípios em alíneas anteriores, esta nova alínea e), que visa fazer reflectir o princípio do longo prazo da utilização racional com a promoção e diminuição do desperdício e o aumento da redução, reutilização e reciclagem, devia ser ponderada.
Gostaria, ainda, de pronunciar-me sobre uma proposta apresentada pelo Sr. Deputado Francisco Torres e que vem ao encontro de uma coisa que Os Verdes têm dito. Obviamente, que a política fiscal deve, do nosso ponto de vista, visar, dar corpo e garantir o exercício de direitos sociais, culturais, económicos ou ambientais e estes passaram a ser, na proposta que Os Verdes fizeram e que todos os grupos parlamentares aceitaram, direitos autonomizados no texto constitucional. Parece-me, pois, que isso é um património adquirido, que é extremamente importante sublinhar, pelo que julgamos que as políticas fiscais devem também elas servir o objectivo do equilíbrio do ambiente e da qualidade de vida na perspectiva que é proposta, ou seja, a do desenvolvimento e da qualidade de vida.
Esta é uma óptica que deve ser considerada não só na perspectiva da utilização racional da energia, quando, por exemplo, temos que lidar com problemas como o dó lixo, mas também quando sabemos que é necessário favorecer a reutilização - e essa não se faz por decreto encontrando mecanismos que favoreçam e ajudem a que os comportamentos das pessoas, dos consumidores, dos comerciantes e dos produtores se possam modificar.
É, pois, nesse sentido que temos defendido que as políticas fiscais podem ser instrumentos que, não resolvendo a questão, em articulação com outros, podem ajudar a modificar grandemente as políticas ambientais.

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Foi, pois, nessa perspectiva que subscrevemos a proposta apresentada pelo Deputado Francisco Torres que, a ser aprovada, trará uma densificação no texto constitucional daquilo que é o artigo 66.º, correspondente ao ambiente e à qualidade de vida.
Na verdade, parece-nos que esta alteração deveria ser introduzida e aprovada por unanimidade, porque, do nosso ponto de vista, dela resulta a densificação na perspectiva de que temos de um texto constitucional dinâmico e capaz de responder aos novos desafios e não um texto cristalizado e fechado. Ou seja, numa perspectiva evolutiva de novos direitos, de novas gerações de direitos e do acompanhamento e do responder através da lei àquilo que a vida impõe.
Direi, por último, e comentando uma afirmação do Sr. Deputado do PSD que me antecedeu, que julgo, ao contrário do que foi dito, pois partimos de diferentes premissas, que não me parece que o texto constitucional em sede do direito ao ambiente, com o que ele significa, seja excessivo no papel do Estado. Aliás, julgo que se há áreas em relação às quais o Estado, enquanto garante do interesse público e do interesse da comunidade, não se pode furtar àquilo que é a sua responsabilidade essa área é, claramente, a do ambiente.
O ambiente em qualquer país, qualquer que seja a concepção que se tenha no plano económico, pela sua natureza, implica sempre a não desresponsabilização do Estado, pois o mercado só por si não é panaceia para todos os males e não pode ser, em exclusivo, deixado ao mercado o gerir e lidar com valores que, uma vez destruídos, não são passíveis de troca.
Portanto, julgo que nesta matéria não só o texto constitucional foi sensato, equilibrado e ele próprio sustentado no passado como as propostas que agora estão em discussão e que nós saudamos positivamente têm largo consenso, pelo que me parece que essa sensatez, esse equilíbrio e essa visão alongada existe.
Em conclusão. quero dizer que Os Verdes vêem como extremamente positiva a forma como se evoluiu em termos da discussão em sede de Comissão das propostas de partida e de outras que chegaram relativas a este artigo.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos, em Portugal, uma situação que podemos dizer que é, de algum modo, paradoxal, pois fomos das primeiras Constituições a consagrar o direito ao ambiente, em termos bastante amplos e avançados para a época, no entanto, na prática, a realidade ficou muito aquém da consagração legal. De resto, grande parte das normas ambientais são uma mera transposição para Portugal de directivas comunitárias e, frequentemente, a transposição para o papel, para diplomas legais, não significou a transposição para a realidade.
Daí que tenha um significado que, depois de termos sido quase pioneiros da consagração do direito ao ambiente, todos os partidos políticos, sem excepção, tenham apresentado propostas de alteração, no sentido de enriquecer e aprofundar a consagração do direito ao ambiente no artigo 66.º. Julgamos que o sentido geral das alterações previstas é positivo. Há, no entanto, alguns aspectos para os quais gostaria de chamar a atenção.
O primeiro é o seguinte: tem interesse e importância haver uma consagração explícita do envolvimento e da participação dos cidadãos nesta matéria, embora, como é sabido; exista a referida consagração - ainda há pouco aludi a ela - da democracia participativa no conjunto da Constituição. Em nossa opinião, justificar-se-ia, e tínhamos apresentado uma proposta nesse sentido, que esta participação fosse densificada através de uma consagração específica das organizações não governamentais das associações de defesa do ambiente. É conhecida a importância que elas têm nesta luta, que é local, nacional e, simultaneamente, universal, como aconteceu, por exemplo, na própria Conferência do Rio, onde tiveram uma consagração e um papel específicos. Como é natural, lamentamos que este aspecto não tenha sido reconhecido pelos outros partidos, mas o princípio da participação contempla o papel que as organizações não governamentais não podem deixar de assumir.
Outro aspecto que gostaria de referir é a consagração do princípio da solidariedade entre gerações. Julgamos que este princípio está consagrado em termos equilibrados, não acompanhamos os adeptos da chamada ecologia profunda, do fundamentalismo ecológico, que esquecem, no fim de contas, as gerações actuais,...

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ... em nome de supostos interesses de supostas gerações futuras.
Queremos referir também o facto de um princípio que propusemos - e não fomos os únicos a fazê-lo -, o princípio do desenvolvimento sustentável, ter encontrado consagração também neste artigo.
De igual modo, julgamos importante - a proposta não foi nossa, mas apoiámo-la e entendemos ser oportuna a ideia da consagração da qualidade ambiental das povoações e da vida urbana, por razões que, aliás, já aqui foram sublinhadas.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Também o princípio, que adiantámos, da consagração explícita da educação ambiental tem uma importância que gostaria de sublinhar. A integração de objectivos ambientais nas várias políticas, que consta da alínea J), parece-nos importante e julgamos mesmo que esta integração de objectivos nas políticas sectoriais compreenderia a integração na política fiscal. Entretanto, houve uma iniciativa, apresentada pelo Sr. Deputado Francisco Torres, que subscrevemos e vamos apoiar, no sentido da sua consagração explícita, porque a política fiscal é um dos instrumentos importantes da política ambiental.
Finalmente, quero fazer meu, e da bancada do PCP, o apelo aqui feito à bancada do PSD, em particular, no sentido de rever a sua posição a respeito da questão dos resíduos, designadamente da política de redução, reutilização e reciclagem de resíduos sólidos. Quem quer que tenha lido avaliações do problema ambiental à escala universal e até nacional, quem quer que conheça, minimamente, literatura sobre esta matéria, inclusive instrumentos de Direito internacional ou de Direito Comunitário sobre este problema, sabe que este é um dos problemas-chave em matéria ambiental para agora e para o futuro.
Assim, seria importante que fosse completado um conjunto de alterações positivas que estão desenhadas nesta

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matéria com a consagração desta política na nossa Constituição. Independentemente disso, ela está consagrada no Direito Comunitário e em outros instrumentos de Direito Internacional. Se o PSD entender não a consagrar na Constituição, não será por causa disso que acabará a luta para que seja consagrada na prática.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, gostaria de saudar estas alterações, todas elas. Algumas delas resultam, de resto, do projecto de revisão constitucional que o PS apresentou em Março de 1996 e são ideias que fazem o seu caminho nas instituições e que chegaram agora ao reforço constitucional. Porque é disso que se trata, de reforço constitucional.
A Constituição ambiental é vasta e densa, desde 1976, foi alargada em todas as revisões constitucionais, sê-lo-á de novo agora e em três sentidos muito importantes, mas não no sentido de tornar a Constituição num código substituto da lei ordinária ou de obrigar a fazer aquilo que cabe às directivas e outros instrumentos, inclusive regulamentos comunitários. Por isso é que o grau de pormenorização de determinadas políticas foi excluído na CERC, com os fundamentos que discutimos durante horas e que aqui não reproduzo. Por isso também é que aí se sublinhou que tudo o que diz respeito à reutilização, à reciclagem e a outros aspectos relacionados com este domínio fluem hoje, já, obrigatoriamente, da alínea d) do n.º 2 do artigo 66.º, que alude à obrigação de "Promover o aproveitamento racional dos recursos naturais (...)", que comporta, nas suas subdimensões, precisamente tudo o que se refere na proposta de Os Verdes, que densificaria e hiperparticularizaria aquilo que já flui da Constituição. Deste modo, a não aprovação da proposta não representa défice de protecção constitucional mas, sim, quanto muito, défice de particularização e, em certos casos, de hiperparticularização constitucional.
Para terminar, congratulo-me com três aspectos. O primeiro é o facto de a estratégia constitucional de desenvolvimento passar a ser obrigatoriamente uma estratégia de desenvolvimento sustentável: Isto constava do projecto de revisão do PS e é muito desenvolvido no artigo 81.º, que adiante vamos discutir.
Por outro lado, sublinha-se e consagra-se o princípio do carácter transversal da política de ambiente em relação a todas as políticas sectoriais, ou seja, a óptica ecológica e ambiental tem de estar presente em todas as políticas onde tenha cabimento, como é natural.
Em terceiro lugar, reforça-se a dimensão participativa e, finalmente, dá-se ênfase à importância da educação ambiental, que tanto tem faltado em tantos domínios, apesar dos esforços e, seguramente, não por culpa da Constituição.
Por último, vamos apoiar - e subscrevemo-la - a proposta que o Sr. Deputado Francisco Torres e outros Srs. Deputados entenderam, em boa hora, trazer à Assembleia da República, e que prevê outra dimensão transversal: a política fiscal deve, ela própria, ter uma dimensão ecológica, o Estado deve assegurar a compatibilização de todos os objectivos, que são próprios, da política fiscal entendida na óptica do desenvolvimento com objectivos de protecção do ambiente e da qualidade de vida. É um passo positivo e prova que o debate em Plenário pode ainda trazer novidades, e boas novidades, pelo que, nesse sentido, é duplamente louvável.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que se está a gerar o consenso - aliás, era de esperar - em matéria de consagração constitucional do ambiente e da qualidade de vida. De facto, esta autonomização faz sentido nos dias que correm, desde logo no novo n.º 1 do artigo 66.º, quanto ao "direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado" e ao dever de o defender.
Todas as propostas já aqui sublinhadas pelos vários intervenientes, em particular pelo meu colega Calvão da Silva, que interveio, em nome do PSD, em primeiro lugar, traduzem tanto o consenso que se foi verificando na CERC e aqui, no Plenário, como a vontade do PSD em avançar com estas questões, para salvaguardar o verdadeiro direito ao ambiente das populações.
Nesse sentido, são enumeradas no n.º 2 várias alíneas que vêm ao encontro deste desiderato, como foi sublinhado pelos Srs. Deputados em todas as suas intervenções.
Para poupar tempo, faço um breve comentário sobre a alínea h), a que aludiram os Srs. Deputados Isabel Castro, Luís Sá e Calvão da Silva. Concordamos com o objectivo que se pretende atingir. É óbvio que é necessário recuperar, reutilizar, reciclar e evitar o desperdício. Entendemos, no entanto, que, havendo outras matérias de igual importância, como a política de recursos hídricos, dos solos, etc., não será necessário que conste da Constituição, como consta, por exemplo, a educação e o respeito pelos valores ambientais,, a garantia da qualidade ambiental das populações e tudo mais, que se autonomizam claramente em alíneas, neste n.º 2. Não obstante, podem os Srs. Deputados estar descansados, é vontade do PSD, com políticas que não estão consagradas directa e explicitamente na Lei Fundamental, promover a diminuição do desperdício, a recuperação, a reutilização e a reciclagem.
Gostaria de apresentar também a já citada proposta de aditamento de uma outra alínea, a inserir entre as novas alíneas e) e f), que diz o seguinte: "assegurar que a política fiscal compatibilize os objectivos do desenvolvimento com a protecção do ambiente e da qualidade de vida". Por que razão a política fiscal é trazida para aqui - e alguns dos Srs. Deputados já salientaram o seu apoio a esta novidade -,para o artigo 66.º, sobre ambiente e qualidade de vida, e não fica na parte fiscal da Constituição, onde sé trata dos impostos? E que a política fiscal, o sistema fiscal, é um instrumento fundamental para compatibilizar desenvolvimento e, diria mais, emprego com ambiente e qualidade de vida. Esse instrumento fundamental, que é, por maioria de razão, um dos que mais merece atenção na Constituição da República, pode dar os incentivos correctos para a utilização ou não de determinados produtos ou produções, para a correcção de determinadas instruções em matéria de ambiente e qualidade de vida e

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pode dar incentivos de valorização de um desenvolvimento que aposte no ambiente e na qualidade de vida.
Todos sabemos que se foi criando também nesta Câmara, entre os vários partidos, o consenso necessário para criarmos emprego de qualidade, apostando num desenvolvimento equilibrado, ao serviço da pessoa humana, como fim de realização de todos nós. Ora bem, o instrumento fiscal pode ser de grande ajuda. Em linguagem económica falamos de incentivos, mas eles não são necessariamente subsídios, podem ser incentivos negativos ou positivos, como, por exemplo, tributar os recursos não renováveis, os que são escassos, ou os recursos poluidores, ou aligeirar a carga fiscal sobre o trabalho, de modo a criar emprego, mas emprego de qualidade, que realize os trabalhadores e os consumidores e que venha a gerar desenvolvimento equilibrado. É nesse sentido que introduzimos esta proposta, que, vejo, está aqui a recolher consenso na Câmara. Espero bem que tanto esta proposta como todas as relativas ao artigo 66.º sejam aprovadas por unanimidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O, Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Torres, se a redacção proposta nesta última versão que apresentou pudesse ser mais "enxuta", o texto final nada perderia. Pergunto-lhe se pode ponderar esta alternativa de redacção: "adoptar uma política fiscal que compatibilize desenvolvimento e qualidade ambiental".

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Calvão da Silva, de início, eu próprio tinha uma proposta ligeiramente diferente, que pedi para ser subscrita pelos Srs. Deputados. Depois, foi alterada com os contributos vários de algumas bancadas.
Devo dizer que "adoptar uma política fiscal que compatibilize desenvolvimento e qualidade ambiental" não me parece diferente de "assegurar que a política fiscal compatibilize os objectivos de desenvolvimento com a protecção do ambiente e da qualidade de vida". Portanto, sendo uma redacção diferente, o espírito é o mesmo.
Julgo que o que interessa é que saia daqui uma formulação com o espírito desta proposta, que é, no fundo, compatibilizar o desenvolvimento com o ambiente e a qualidade de vida ou com a qualidade ambiental.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Obviamente que estou a falar por mim, como primeiro subscritor, mas se os outros subscritores não se opuserem, pelo menos os que estão presentes, começando aqui pelo Sr. Deputado Barbosa de Melo, passando pelo Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, pela Sr.ª Deputada Isabel Castro e terminando no Sr. Deputado Luís Sá, para ir no sentido dos ponteiros do relógio ou ao contrário - já não sei, a esta hora da noite, em que sentido é que estamos -, pois julgo que o que interessa é consagrar o espírito desta proposta, nada tenho a opor à sua sugestão.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, vamos passar à discussão do artigo 66.º-A.
Como não existem oradores inscritos para este artigo, dou por encerrados os nossos trabalhos de hoje.
Srs. Deputados, reuniremos de novo amanhã, sexta-feira, pelas 10 horas. A essa hora terá lugar uma sessão solene evocativa da figura do Padre António Vieira, com a presença do Sr. Presidente da República.
Está encerrada a sessão.

Eram 0 horas e 30 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD ):

José Augusto Santos da Silva Marques.

Partido Comunista Português (PCP):

João António Gonçalves do Amaral.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

José Manuel de Medeiros Ferreira.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Raul d' Assunção Pimenta Rego.

Partido Social Democrata (PSD):

Carlos Alberto Pinto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Mário de Lemos Damião.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Silvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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DIÁRIO da Assembleia da República
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