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12 DE MARÇO DE 1998 1603

esta última corresponde às perturbações ou ameaças para bens jurídicos, nomeadamente referentes à ordem pública e à segurança, já em relação à hospitalização a pedido de terceiro o objectivo que se pretende atingir é a salvaguarda da saúde e do tratamento do doente, aceitando o primado da autoridade médica sem prejuízo da intervenção judicial a posteriori e, se necessário, correctiva.
A maior proximidade com a proposta apresentada existirá em relação à lei belga que aponta para uma via judicializadora, embora, mesmo assim, garanta a presença médica na audiência judicial, bem como uma maior intervenção do tribunal até na avaliação das condições em que se prestam os cuidados de saúde mental, o que não acontece na lei portuguesa.
A presente proposta de lei aponta para uma fortíssima judicialização da questão do internamento compulsivo em detrimento da participação e da autoridade médicas. Trata-se de uma solução que inverte as prioridades que deveriam presidir a esta questão, sobrevalorizando exclusivamente a intervenção judiciai.
Ao privilegiar uma perspectiva judicial neste processo, estamos, inevitavelmente, a descurar a perspectiva médico-assistencial da questão e, por consequência, a menorizar a prioridade ao tratamento e à cura do doente. Ou não será esse o fim a atingir?
Nada disto põe em causa a necessidade de intervenção nas situações em que o escopo é a questão da perigosidade social e da ameaça a determinados bens jurídicos. Mas a verdade é que estas não são a maioria das situações em que se verifica a necessidade de internamento compulsivo.
Nem se defende - Sr. Ministro, fique descansado! que tudo esteja nas mãos dos psiquiatras. Do que se trata é de dar prioridade às questões médicas, garantindo a intervenção das autoridades judiciais através da confirmação do internamento ou como instância de recurso.
Por outro lado, a proposta parte do princípio de que a garantia dos direitos de cidadania, o respeito pelo direito à liberdade e pelo carácter limitado das suas excepções são incompatíveis com a prioridade à protecção e tratamento médico com vista à cura do doente e com a participação determinante dos profissionais médicos. O que não é verdade!
É preciso, também, dizer que não se pode confundir a intervenção da autoridade judicial com a completa judicialização do processo que esta proposta prevê.
Analisando em concreto os dispositivos da proposta lei, comprovamos estarem presentes todos estes vectores.
Desde logo, encontramos nos princípios gerais a estipulação de que o internamento compulsivo deve ser proporcional ao grau de perigo e ao bem jurídico em causa, o que, sendo absolutamente adequado para as situações de internamento por perigosidade social, parece não ter grande preocupação pelas situações apenas do foro clínico.
As dúvidas que ainda existissem ficariam desfeitas pela análise do artigo 12º. Não se trata apenas da secundarização sistemática das situações em que se admite o internamento para evitar a deterioração do estado do doente. Trata-se, também, de concluir que a referência do n.º 1 aos bens jurídicos próprios ou alheios, pessoais ou patrimoniais, exclui do seu âmbito a saúde do próprio internado, relegada para o n.º 2.
A menorização deste aspecto é novamente visível na secção que se refere ao internamento de urgência, em que se excluem explicitamente as situações do n.º 2 do artigo 12º.

Quer isto dizer que, a serem aprovadas estas normas, nunca haveria lugar a internamento de urgência fora dos casos de perigosidade social?
Esta situação é agravada pelo facto de o procedimento normal introduzir um processo que, necessariamente, se traduzirá nalguma morosidade.
Toda esta situação deve ser analisada do ponto de vista da política de saúde mental. A realidade é que o nosso sistema de saúde mental tem grandes carências e necessita de forte investimento. E isto é claro no que diz respeito à melhoria dos serviços de psiquiatria das instituições de saúde e à necessidade de encontrar recursos humanos para esta área. Mas o que também é muito grave é existirem hoje medicamentos extremamente avançados para o tratamentos de diversas patologias específicas do foro psiquiátrico, em que se reduzem até os efeitos que, tradicionalmente, estes medicamentos produzem, e estes só serem comparticipados pelo escalão mínimo, para mais quando estão em causa preços bastante elevados.
Provavelmente, a secundarização e a menorização do internamento para defender a saúde mental e o não investimento para a melhoria das condições nos cuidados médicos e medicamentosos de saúde mental são as duas faces da mesma moeda.
É preciso que, á ser aprovada, esta proposta de lei sofra grandes alterações, na especialidade, que minimizem e eliminem as muitas soluções excessivas e erradas que contém.
Esta proposta de lei sobrepõe claramente a função de protecção pública do Estado à de responsabilidade pública pela saúde mental dos doentes.
A lógica de que o doente mental é um perigoso suspeito, susceptível de ameaçar a segurança pública, perpassa todo o texto, imbuído de uma perspectiva que ignora que o mais importante em relação aos doentes mentais é o seu tratamento.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedirem esclarecimentos, inscreveram-se o Sr. Deputado José Niza e o Sr. Ministro da Justiça.
No entanto, o Sr. Deputado Bernardino Soares já não tem tempo disponível para responder, pelo que pergunto ao Partido Socialista se está disposto a ceder algum do seu próprio tempo. Verifico que estão de acordo, pelo que o Sr. Deputado passa, então, a ter dois minutos para responder a cada um dos pedidos de esclarecimentos, o que totaliza quatro minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Niza.

O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, compreendo que o tema do internamento compulsivo domine este debate e também compreendo que, relativamente a esta questão, o Partido Comunista tenha especiais preocupações.
É que todos nós sabemos - felizmente, isso não se passou consigo, Sr. Deputado, pois já nasceu posteriormente - que muitos dos seus camaradas, tal como muitos dos meus, sofreram internamentos compulsivos em estabelecimentos que não eram propriamente destinados a tratamento psiquiátrico. Disso resultou um trauma, penso mesmo que até resultou um reflexo pavloviano a ponto de, quando ouvimos a expressão «internamento compulsivo, reagirmos de forma mais emocional, mais vivida e mais preocupada.

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