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Sexta-feira, 29 de Maio de 1998 2539

I Série - Número 74

VII LEGISLATURA

3.A SESSÃO LEGISLATIVA (1997-1998)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 28 DE MAIO DE 1998

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Corregedor da Fonseca
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos.

Antes de ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei n. os 178 e 179/VII, dos projectos de resolução n.os 89 e 91/VII, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
A Câmara prestou homenagem à memória do Prof.º Doutor Francisco Lucas Pires, Deputado à Assembleia da República e ao Parlamento Europeu. Usaram da palavra, além do Sr. Presidente - que leu à Câmara uma mensagem recebida dos Deputados portugueses ao Parlamento Europeu -, os Srs. Deputados Medeiros Ferreira (PS), Luís Queiró (CDS-PP), Barbosa de Melo (PSD), Luís Filipe Madeira (PS), João Amaral (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes). No fim, foi aprovado o voto n.º 120/VII - De pesar pela morte do Dr. Francisco Lucas Pires (Presidente da A. R.), após o que a Assembleia guardou um minuto de silêncio.
A Sr.ª Deputada Carmen Francisco (Os Verdes) criticou a estratégia de protecção do litoral levada a cabo pelo Governo.
Procedeu-se ao debate de urgência, da iniciativa do PSD, sobre o alegado projecto de Estado espanhol de vir a instalar um cemitério de resíduos nucleares em Aldeadávila de Ia Ribera. junto à fronteira portuguesa de Trás-os-Montes. Usaram da palavra, a diverso título, além da Sr.ª Ministra do Ambiente (Elisa Ferreira), os Srs. Deputados Artur Torres Pereira (PSD), Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), José Calçada (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Augusto Boucinha (CDS-PP) e Júlio Meirinhos (PS).
O Sr. Deputado João Carlos Duarte (PSD) solicitou ao Governo uma rápida divulgação dos estudos elaborados por este e urna decisão política sobre a localização do futuro aeroporto internacional.
Foi aprovado o voto n.º 121/VII - De saudação pela realização e objectivos da Marcha Global contra o Trabalho Infantil (PCP), tendo jeito intervenções os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Hermínia Loureiro (PSD), Ricardo Castanheira (PS), Isabel Castro (Os Verdes) e Moura e Silva (CDS-PP).
O voto n.º 122/VII - De congratulação pela deliberação do Conselho de Ministros da Cultura da União Europeia que confere ao Porto o titulo de Capital- Europeia da Cultura no ano 2001 (Presidente da AR, PS, PSD, CDS-PP e PCP) foi aprovado. Produziram intervenções os Srs. Deputados José Saraiva (PS), Pedro da Vinha Costa (PSD), João Amaral (PCP), Silvio Rui Cervan (CDS-PP) e Isabel Castro (Os Verdes).
O Sr. Deputado Manuel dos Santos (PS) interpelou a Mesa acerca de uma notícia veiculada pela comunicação social sobre uma carta que o Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos terá enviado ao Sr. Presidente, protestando pela recente aprovação pela Assembleia de uma disposição legal permitindo a inserção de pessoas sem qualificação como técnicos oficiais de contas.

Ordem do dia. - Foram aprovadas, na generalidade, as propostas de lei n.os ll3/VII - Estatuto do Ministério Público, 157/VII - Altera o Código de Processo Penal e 167/VII - Autoriza o Governo a alterar o regime de contra-ordenações em matéria de pesca marítima e culturas marinhas, constante do Decreto-Lei n. º 278/87, de 7 de Julho, com as alterações que lhe foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 218/91, de 17 de Junho, e, em votação global, as propostas de resolução n.os 90/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção estabelecida com base no artigo K3 do Tratado da União Europeia, relativa à Extradição entre os 'Estados membros da União Europeia e 99/VII - Aprova, para adesão, as emendas ao anexo à Convenção Internacional sobre Normas de Formação, de Certificação e de Serviço de Quartos para os Marítimos, 1978, e ao Código de Formação, de Certificação e de Serviço de Quartos para os Marítimos (STCW), adoptados nas conferências de Partes que teve lugar de 26 de Junho a 7 de Julho de 1995 em Londres.
A Câmara aprovou ainda um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando um Deputado do PSD a depor em tribunal como testemunha.
Finalmente, foi debatido o inquérito parlamentar n. º 8/VII - Apreciação de actos dos Governos do PS e do PSD envolvendo o Estado e grupos económicos (PCP), tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Octávio Teixeira (PCP), Luís Marques Guedes. (PSD), Manuel dos Santos (PS), Francisco Peixoto (CDS-PP), Luís Marques Mendes (PSD), Francisco de Assis (PS) e Luís Queiró (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 5 minutos.

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l SÉRIE — NÚMERO 74
O ST. Presidente: — Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 35 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes Dias.
António Manuel Carmo Saleiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Pedro da Silva Correia.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Rodrigues Costa de Brito.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria de Lurdes Ferreira da Silva Farinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Eduarda Bento Alves Ferronha.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Paulo Jorge Lúcio Arsénio.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheiro Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sônia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.
Partido Social Democrata (PSD):
Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairínhos.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.

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Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Comes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas
Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
Lucília' Maria Samoreno Ferra.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques. Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria de Lourdes Lara Teixeira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Almeida Figueiredo Barbosa Pombeiro.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Silvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Octávio Augusto Teixeira. .

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):

Carmen Isabel Amador Francisco.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Deputado Independente

José Mário de Lemos Damião.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas, requerimentos e respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: propostas de lei n.º5 178/VII Autoriza o Governo a legislar em matéria de benefícios fiscais à BRISA, Auto-Estradas de Portugal, S. A. - e 179/VII - Aprova o Estatuto do Jornalista, que baixa às 1.ª e 8.ª Comissões; projectos de resolução n.º5 89/VII - Referendo sobre a regionalização (PSD), que baixa às 1.ª e 4.ª Comissões - e 91/VII Referendo sobre a revisão do Tratado da União Europeia (PSD), que baixa às 1.ª e 9.ª Comissões.
Foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos:
Na reunião plenária de 13 de Maio de 1998: ao Ministério da Cultura, formulado pela Sr.ª Deputada Fernanda Costa; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Artur Torres Pereira; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Castro de Almeida;
Na reunião plenária de 14 de Maio de 1998: ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Hermínio Loureiro; aos Ministérios do Ambiente é da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e à Secretaria de Estado do Desporto, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Alves de Oliveira; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; ao Ministério do Ambiente, formulados pelo Sr. Deputado Rui Pedrosa de Moura; aos Ministérios da Cultura e da Administração Interna e ao IPPAR, formulados pelo Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; ao Ministério da Administração Interna e à Câmara Municipal de Évora, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita;

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Na reunião plenária de 15 de Maio de 1998: ao Ministério da Cultura, formulados pelos Srs. Deputados António Saleiro e Sílvio Rui Cervan; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelos Srs. Deputados Jovita Ladeira e José Cesário; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Rui Pedrosa de Moura;
Nas reuniões plenárias e 20 e 22 de Maio de 1998: ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Encarnação; ao Ministério da Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados Teresa Gil Narciso, Durão Barroso, Pedro Holstein Campilho e Manuela Aguiar; ao Ministério do Equipamento, Planeamento e da Administração do Território, formulados pelos Srs. Deputados Antão Ramos e Hermínio Loureiro; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Luís David Nobre; aos Ministérios da Administração Interna e da Justiça, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Roque Cunha; ao Governo- e ao Ministério da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; aos Ministérios da Saúde e da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Miguel Miranda Relvas; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado António Germano Sá e Abreu; aos Ministérios da Cultura e da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado António Rodrigues; ao Ministério do Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados Manuel Moreira e Isabel Castro; à Secretaria de Estado da Comunicação Social, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Governo, a diversos Ministérios e Secretarias de Estado, formulado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado; à Secretaria de Estado da Habitação, formulado pelo Sr. Deputado Antão Ramos; ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e ao Ministério das Finanças, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; e ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Rui Rio.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: .
No dia 19 de Maio de 1998: Luís Sá, Carvalho Martins, Fernando Pereira Marques, Ricardo Castanheira, José Reis, Arménio Santos, Duarte Pacheco, Jorge Ferreira, Artur Torres Pereira, Roleira Marinho, Gonçalo Ribeiro da Costa e Luís Queiró;
No dia 20 de Maio de 1998: Manuela Aguiar, Duarte Pacheco, Luísa Mesquita, Rodeia Machado, Artur Torres Pereira, Miguel Ginestal, Roleira Marinho, Cruz Oliveira, Castro Almeida e Carlos Encarnação;
No dia 21 de Maio de 1998: Luís Marques Mendes, Paulo Pereira Coelho, Manuel Alves de Oliveira, Rodeia Machado, Heloísa Apolónia e Luís Queiró;
No dia 26/05!98: Francisco Torres, Bernardino Soares, José Calçada e Jorge Ferreira;
No dia 27 de Maio de 1998: Manuela Aguiar, Heloísa Apolónia, Miguel Ginestal, Jorge Valente e Francisco Torres.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, então, dar início à sessão de homenagem à memória do Dr. Francisco Lucas Pires com uma saudação especial da Mesa às ilustres personalidades presentes.
Tem a palavra, em primeiro lugar, porque a solicitou, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, Presidente da Comissão de Assuntos Europeus.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, pedi o uso da palavra para assinalar que a Comissão de Assuntos Europeus, a que tenho a honra de presidir, na sua reunião desta semana aprovou um voto de pesar pela morte prematura do eurodeputado Francisco Lucas Pires, cuja redacção, da autoria do Sr. Deputado Francisco Torres, é a seguinte:
"Morreu um dos mais ilustres Deputados portugueses de sempre.
Francisco Lucas Pires foi um lutador incansável por uma verdadeira participação de Portugal no projecto europeu. Como poucos, preocupou-se e contribuiu para a construção de uma Europa dos cidadãos.
A Comissão de Assuntos Europeus não pode deixar de assinalar o empenho e a relevância dos contributos de Francisco Lucas Pires para o debate europeu e nacional, sobretudo no processo de integração europeia. Sempre disponível para participar nas reuniões da Comissão de Assuntos Europeus e em tantos outros encontros a propósito da Europa, Francisco Lucas Pires aproximou a Europa dos portugueses, aproximou o Parlamento Europeu à Assembleia da República, mostrou como era possível fazer política à escala europeia.
A Comissão de Assuntos Europeus lamenta profundamente a sua morte prematura e junta-se à sua família e amigos na dor da sua partida."
Se me permite, Sr. Presidente, muito rapidamente, gostaria de juntar só uma nota pessoal a este voto de pesar da Comissão de Assuntos Europeus, dizendo que, pessoalmente, foi para mim muito penoso, como para todos nós, tomar conhecimento desta notícia e que creio que a pressa, a disponibilidade, a grande generosidade da alma de Francisco Lucas Pires era realmente de alguém que sabia que a sua vida seria intensa, tensa e de certa maneira dramática.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado eu, Sr. Deputado. E porque se trata de uma verdadeira sessão de homenagem e não apenas da discussão e votação de um voto de pesar, o que, no fim, se fará, passamos, de momento, às intervenções dos representantes dos grupos parlamentares, começando pelo CDS-PP.
Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Francisco Lucas Pires foi Deputado do CDS nesta Assembleia de 1976 a 1985. Com excepção do período de 1981 a 1983, em que foi Ministro da Cultura no Governo da Aliança Democrática, a sua actividade política esteve associada a esse mandato, cujo exercício se revestiu sempre de um brilhantismo reconhecido por todos. Na Legislatura iniciada em 1983 chegou mesmo a assumir, por breve período, o cargo de líder parlamentar, apesar de acumulá-lo com as funções de Presidente do meu partido.
Foi indiscutivelmente uma das figuras mais marcantes da história deste Parlamento, pela profundidade do seu pensamento, pelo talento que emprestava à sua exposição e pelo empenho que colocava na defesa das suas convicções. Várias das suas contribuições para os debates parlamentares ficaram na memória daqueles que as presenciaram e aqui, nesta bancada que foi a sua, guardamos a memória de alguns momentos que para nós conservam um significado particular e que, estamos certos, são lembrados por muitos outros pelo profundo impacto que produziram.
Quem não recorda, com efeito, q discurso com que Lucas Pires encerrou a moção de censura de 1984 ao Governo do Bloco Central, em que o seu duelo com o Primeiro-Ministro Mário Soares pré-anunciava o fim político daquela solução governativa ou, no mesmo ano, a elevação e a inteligência com que defendeu o "Não" à despenalização do aborto?

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Quando Lucas Pires, nestas ocasiões, se perfilava pelas suas opções, fazia-o de um modo inequívoco, mas, para além disso, a complexidade e a intensidade da sua argumentação introduziam por regra no campo oposto a perplexidade e a vacilação. Era sem dúvida um caso raro no combate político e o Parlamento foi simultaneamente o cenário e a testemunha privilegiada de alguns dos seus melhores contributos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Francisco Lucas Pires foi Presidente do CDS durante dois anos e foi o seu rosto em três eleições de âmbito nacional: as legislativas de 1983 e de 1985 e as europeias de 1987. Essa época foi suficiente para gravar, no entendimento popular, uma imagem inapagável do político que ele foi, e, mais até do que isso, estou seguro de que aquela foi também a fase da sua vida em que ele mais sentiu o cunho pessoal a influir no destino da sua Pátria. Divergências conhecidas fizeram depois disso desencontrar os nossos caminhos, mas esse afastamento não nos fez esquecer o património que para nós passou a constituir a memória do seu empenhamento e a sinceridade do seu entusiasmo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como intelectual e como académico, Francisco Lucas Pires foi uma das personalidades mais admiradas da sua geração e, seguramente, a mais original e sedutora. O seu espírito orientou-se, desde os primeiros escritos, para os temas da teoria do Estado e do Direito Constitucional e aí permaneceu concentrado, como vocação exclusiva e irresistível, ao longo dos 30 anos da sua vida de universitário e pensador, com o único desvio imposto pela emergência das questões constitucionais da União Europeia. As suas dissertações e obras científicas mostram-no sempre no rasto das questões mais difíceis e complexas, as únicas que verdadeiramente o interessavam e mobilizavam a sua inteligência. Para as expor, serviu-se Lucas Pires de uma capacidade expressiva que se tornou lendária e que é verdadeiramente inseparável da substância do seu pensamento, como marca de um esforço, sempre insatisfeito e recomeçado, de ir mais longe na compreensão dos problemas e de chegar mais alto na formulação dos conceitos. Em Lucas Pires, o brilho literário não tomou o lugar das ideias, nem ofuscou o sentido ético fundamental das suas preocupações. Esse sentido ético está presente em toda a sua obra e é ele que decisivamente eleva e enobrece o legado científico que nos deixou.
Uma dimensão intelectual desta envergadura poderia, como tantas vezes sucede, produzir um temperamento fechado e até sobranceiro. Não foi assim com Lucas Pires. Com os seus colegas e amigos, com simples conhecidos, com quaisquer pessoas que dele se aproximassem no decorrer das suas múltiplas actividades, Lucas Pires foi sempre o mais disponível dos interlocutores e o mais informal e acessível dos homens públicos. Era possível conversar com ele sobre os assuntos mais triviais e até enfadonhos, até porque ele tinha o segredo de os tornar interessantes. Os limites da sua paciência só eram perceptíveis pela expressão absorta com que se refugiava por vezes nas suas próprias reflexões. Possuía, em alto grau, uma das qualidades humanas mais raras e preciosas, que é a preocupação de não ferir nem ofender os outros, o que lhe exigia, aliás, um cuidado atento para moderar a força mordaz da sua ironia. Como todas as almas sensíveis e generosas, apreciava os gestos de amizade sincera e retribuía-os com simplicidade e sem reservas. Não admira, pois, que tivesse tantos amigos e que seja tão grande e tão comovida a saudade com que eles o recordam hoje e recordarão, decerto, para sempre.
Em meu nome e no de todos os Deputados que constituem hoje a bancada do CDS-PP, quero aqui deixar o testemunho da nossa admiração e respeito pela singular figura do Amigo, do Político e do Professor Francisco Lucas Pires. As circunstâncias brutais e absurdas do seu prematuro desaparecimento provocaram em todos uma comoção particular, e esta bancada apresenta a toda a sua família e amigos a sua solidariedade e o seu sentido respeito perante a dor que os assalta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, em representação do PSD, o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uso a palavra para, em nome do Grupo Parlamentar do PSD e em meu nome próprio, participar na homenagem que a Assembleia da República hoje presta à excepcional figura humana, intelectual, universitária e política que é Francisco António Lucas Pires 3/4 em tempos, Presidente e Vice-Presidente do CDS, Deputado, Presidente e Vice-Presidente do Grupo Parlamentar do CDS, Ministro e Membro do Conselho de Estado, Coordenador da Aliança Democrática, Deputado ao Parlamento Europeu, Vice-Presidente da União Europeia das Democracias Cristãs, da União Democrática Internacional e do Parlamento Europeu, Membro da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa e Vice-Presidente do seu Grupo Parlamentar Democrata Cristão e, mais recentemente, filiado do PSD, Deputado e Vice-Presidente do Parlamento Europeu e Coordenador e Vice-Presidente do Grupo Paramentar do PPE. Colhido por morte temporã e imprevista, ele deixa nas muitas e diversas instituições por onde, com brevidade, perpassou as marcas de uma personalidade singularmente rica e original.
No mundo das ideias e da cultura, no campo largo e vasto do Direito e das Ciências Sociais, no permanente emaranhado da História e da política, Lucas Pires jamais perdeu o fio condutor da sua vocação prospectora e prospectiva dirigida à descoberta da verdade e à invenção da liberdade, inquieta e nunca instalada, alheia a recompensas, surda a lisonjas, desinibida e autêntica. A propósito do seu serviço à polis e à cidade, diria, em 1991, com lucidez e argúcia, "em política não há registo de patentes, nem se pagam direitos de autor", confessando ter procurado "ser fiel ao espírito de fronteira", para rasgar novos horizontes para a democracia portuguesa, com a convicção de que urgia "ultrapassar nominalismos que ficaram desde 1975, mas hoje parecem apontar mais a revoluções passadas do que a revoluções futuras e têm, por isso, cada vez menos lógica e sentido".
Em Janeiro de 1997, Lucas Pires, no acto público de adesão ao PSD, realizado em Arcos de Valdevez, afirmou textualmente: "quero morrer como alguém que ajudou a dar nobreza à política portuguesa". Consumada a sua carreira ou caminhada, todos nós, seus pares - e esta sessão de homenagem também é disso prova - e todos os seus correligionários, admiradores e amigos testemunham que ele cumpriu à risca esse seu primordial objectivo: ajudou a dar nobreza à política em Portugal. Mas fez mais, também ajudou a dar nobreza e brilho à ciência jurídica e à instituição universitária portuguesas, às quais ficará perenemente ligado.
Homem de rara inteligência, de fecunda imaginação, de riquíssima cultura, de notável generosidade e coragem, jamais descansou na sua luta por um mundo novo, vivo, desalienado e livre dos fantasmas do passado. Desse fulgor e generosidade guarda Coimbra a melhor lembrança: estudante, é líder incontestado da direita académica, na primeira metade da década de 60; jovem assistente, anima tertúlias e debates, dando a lume trabalhos académicos de fibra, onde deixou escalpelizada a perdição política do

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salazarismo crepuscular, tais como O Ultramar e a Revisão Constitucional (1971), O Estado Pós-Corporativo (1973) e Soberania e Autonomia (1974); investigador, produz obras que o inscrevem indubitavelmente na antologia da literatura jurídico-pública portuguesa deste período, tais como O problema da Constituição ( I 970) e A Teoria da Constituição de 1976 - a transição dualista (1988); professor, torna-se alvo da admiração e do carinho dos muitos milhares de estudantes que seguiram os seus cursos e dos colegas de escola que com ele conviveram. Deste espontâneo apreço pelo Mestre e companheiro falam os silêncios e as lágrimas que o Pátio da Universidade viu na sexta-feira e sábado passados.
Dos méritos da acção política de Lucas Pires no pós-25 de Abril 3/a desde as assembleias de unidade, de 1975, período em que cumpriu o serviço militar, até à actividade partidária, à Assembleia da República, ao Conselho da Europa e ao Parlamento Europeu 3/4 talvez deva ser destacado, aqui e agora, o seu constante empenho em promover a reconciliação da direita portuguesa com o 25 de Abril. Em 1991, escrevia ele, em jeito de quem saboreia o dever cumprido: "A direita democrática pode hoje reclamar-se, mesmo, da liderança do Regime 3/4 e não apenas do. Governo. (...) É visível que a direita se reconciliou (...) e abandonou a guerra de trincheiras. Prefere agora caminhar pelo interior [do Regime] e determinar o seu poder (...)".
Em Pascal está, julgo, uma chave feliz para se compreender o homem, o intelectual, o político e politólogo e o jurista que foi - e continuará a ser - Lucas Pires. Escreveu o autor de Pensées, cito, traduzindo: "Não se pode ser homem de academia sem abafar a natureza, não se pode ser dogmático sem renunciar à razão. A natureza confunde os académicos e a razão confunde os dogmáticos
Ora, Lucas Pires nem foi um académico, neste sentido, nem um dogmático, justamente porque prezou e honrou sempre, e no mais fundo de si próprio, a natureza do mundo e da vida e a razão do Homem e das coisas. Termino com palavras proferidas pelo Dr. Rui Marcos, Presidente em exercício da Conselho Directivo da Faculdade de Direito de Coimbra, nas exéquias do Dr. Francisco Lucas Pires: "dele fica para sempre impressa na nossa lembrança a memória do homem justo, do político saliente, do orador expressivo e de um universitário marcante".
O grupo parlamentar do PSD curva-se respeitosamente perante o homem e o cidadão Francisco António Lucas Pires, guarda com fidelidade e admiração a obra realizada por este português ilustre, e apresenta a seus pais, a sua esposa e a seus filhos a expressão do seu muito pesar. Que descanse em paz.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, em nome do Grupo Parlamentar do PS e em meu nome pessoal, queria também aqui prestar homenagem à figura de Francisco Lucas Pires.
Seja-me permitido evocar as relações pessoais, que muito prezava, e a forma como se iniciaram e se desenvolveram essas relações pessoais. Melhor do que considerações subjectivas, creio que factos serão mais ilustrativos .da personalidade e do carácter desse grande português que foi Francisco Lucas Pires.
Corria o ano de 1961, estavam agitadas as ondas políticas em Coimbra, eu era quartanista de Direito e pertencia a uma das mais ásperas e rudes casamatas da esquerda de Coimbra, que era a república chamada "dos Cágados". Fui um dia chamado a descer do meu assento etéreo para vir tratar praxisticamente de um famigerado dirigente da direita de Coimbra, que era caloiro - era o Francisco Lucas Pires. Desci cheio de afã revolucionário, travei conhecimento com o académico primeiranista e, ao fim de meia hora, estava vencido pela inteligência, pela sedução, pela generosidade e pela capacidade de encaixe de uma situação que nem todos suportavam de ânimo leve. Em vez do tenebroso "miguelista", encontrei um jovem inteligente, afável, com que, desde aí, estabeleci uma ligação de amizade profunda que durou até à prematura morte de Lucas Pires. De convidado ameaçado, passou a ser uma visita bem-vinda à minha república. Frequentemente lá foi, conviver connosco, almoçar ou jantar, ou apenas beber um copo, conversar e discutir política, fazendo-o sem medo e com coragem, e todos nós ganhámos um enorme respeito pelo estudante Francisco Lucas Pires.
Interrompida a relação académica, vim a reencontrá-lo em Lisboa, neste Parlamento - e não só. Francisco Lucas Pires frequentava também um templo do anarquismo democrático (suponho que é uma designação que não ofenderá ninguém) onde pontificava uma sacerdotisa que era a Natália Correia. Também eu frequentava esse templo e ali, em longas noites de tertúlia, as espadas se cruzavam entre a direita e a esquerda, e os revolucionários mas de um lado ou mais de outro. Também aí, Francisco Lucas Pires se impôs com a mesma generosidade, com o mesmo brilho, com o mesmo racionalismo bergsoniano, aceitando com uma abertura de espírito política que redimiu pecados reais ou supostos da direita tradicional. Lucas Pires foi, de facto, pela sua acção pedagógica e política, pelo seu exempto como personalidade marcante da vida portuguesa do pós 25 de Abril, sobretudo, um homem que contribuiu imenso para a reconciliação, para a convivência dialéctica das várias correntes ideológicas e políticas em Portugal.
Voltei a encontrar Lucas Pires e a fazer com ele longas discussões e longas caminhadas peripatéticas em Estrasburgo e em Bruxelas, no Parlamento Europeu. Sei como ele vivia apaixonadamente esta etapa da história da Europa e de Portugal, que é aventura europeia. Sei como ele se dedicou sem sectarismos partidários, que não os tinha, colaborando em tudo o que qualquer outro Deputado europeu propusesse e que fosse de interesse para uma integração harmoniosa e proveitosa para o nosso país. Sei também o brilho e o interesse que ele punha nas análises escritas que produziu, umas mais académicas, outras mais políticas distinguia-me com a oferta de uma generosa dedicatória em cada obra. Sei também - e invoco-o com muita comoção - o apego, o amor que ele tinha também à sua família. Sei como ele, lá longe, em Bruxelas ou em Estrasburgo, me dizia, muitas vezes: "Madeira, o que aqui aborrece, é estar longe da família! Às vezes, apetece-me beijar um filho e não posso! Mas não há bela sem senão..."
Ele aderiu apaixonadamente àquela missão, que alguns não _entendem completamente, mas que ele assumiu como uma faceta importante da sua missão política.
Viveu velozmente e gulosamente a vida. A morte apanhou-o em plena pujança. O País perdeu um grande homem. A política portuguesa e os políticos portugueses, hoje, aqui, ao exaltá-lo, cumprem o seu dever de lhe agradecer por ter vivido e ter repartido com todos nós a generosidade do seu carácter e da sua inteligência. Em nome da minha bancada, quero expressar à Família e aos grupos político a que ele deu a honra de participar o nosso profundo pesar e a já grande saudade de Francisco Lucas Pires.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

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O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tomo a palavra para manifestar o nosso grande pesar pelo falecimento de Francisco Lucas Pires, e igualmente para endereçar à família enlutada as nossas sentidas condolências. À Direcção do PSD, partido a que pertencia, apresentamos também a expressão do nosso pesar.
Nas intervenções que em nome do PSD e do CDS-PP aqui foram produzidas, ouvimos a evocação das qualidades públicas de Francisco Lucas Pires. As suas qualidades como homem da política, mas também as suas qualidades como cientista do Direito e como professor universitário. Dos muitos amigos que fez ao longo da sua vida, ouvimos a evocação das suas qualidades pessoais, em todos os campos em que a vida de um homem se projecta. Permito-me relevar neste momento doloroso as suas qualidades como pai atento e empenhado.
O enorme capital de experiência e dedicação à vida política e à ciência política que acumulou, foi ceifado brutalmente, de forma inesperada e injusta, por uma morte que levou consigo as certezas e as esperanças que companheiros e amigos nele tinham. Sentimos todos a profunda sinceridade que transparece das palavras dos seus amigos e companheiros. E essa é a homenagem maior que pode ser prestada neste momento e que mostra que Francisco Lucas Pires deixa um lugar insubstituível. Francisco Lucas Pires foi um cidadão do seu tempo, um tempo de controvérsia e luta, que ele assumiu desde muito jovem. Cumpriu o seu dever de cidadão, escolheu o seu campo, e serviu-o com dignidade e competência. Ocupou altos lugares no Estado, no Governo, na Assembleia da República, no Parlamento Europeu, e também altos cargos partidários, e em todas as situações deixou uma marca pessoal inconfundível, uma marca de seriedade e qualidade.
Dizer que muitas coisas nos dividiam é absolutamente inútil e redundante. Lucas Pires foi um cidadão do seu tempo, de corpo inteiro, e por isso mesmo teve companheiros e teve adversários. É assim que deve ser, é por isso também que neste momento a Assembleia da República o homenageia. Francisco Lucas Pires assumiu a vida política com o sentido de um percurso colectivo, grupal, mas a que ele quis juntar a sua vivência pessoal. Pertenceu aos que aderiram à política por exigência ideológica; aos que nela intervieram para afirmar conteúdos e modelos, aos que não se fixaram no que está adquirido e quiseram questionar o futuro. Escolheu o seu próprio percurso, um percurso certamente controverso, como deve ser toda a política. Fê-lo com a consciência de que a política, os órgãos de poder, os partidos, os grupos são feitos e constituídos por homens, por homens livres que assumem, devem assumir o encargo de juntarem, a uma causa comum, as suas próprias convicções e forças, a sua maneira própria de estar e pensar.
Francisco Lucas Pires viveu o seu último dia numa corrida, entre as exigências da política e da vida universitária. Uma corrida contra o tempo, que nos impusemos todos, uns aos outros. Este é um momento de reflexão sobre o homem que serviu a vida pública com as suas próprias convicções, mas também uma reflexão também sobre a política e a forma exigente como é feita.
Mais uma vez, a terminar, o nosso pesar, as nossas condolências, ao PSD, aos amigos de Francisco Lucas Pires e, muito especialmente, à família enlutada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Morreu Francisco Lucas Pires e quero, por isso, em nome do Partido Ecologista Os Verdes, exprimir o nosso mais vivo pesar.
As palavras que posso deixar-vos são, seguramente, muito singelas. Não poderiam deixar de sê-lo na medida em que a minha não vivência com Francisco Lucas Pires, o facto de nunca ter privado com ele me leva a não ter senão uma visão distanciada de quem não pôde directamente beneficiar daquilo que foram as suas qualidades humanas, de quem foi mero observador daquilo que ele escreveu, daquilo que ele, politicamente, fez na sua intervenção marcante, naquilo que caracterizou a sua vida. Mas essa visão distanciada não pode impedir-me de manifestar, como o faço, a nossa opinião e sentido de pesar por esta morte.
É uma morte que aconteceu de forma violenta e abrupta, e que veio interromper uma vida cheia, de alguém que optou, por abraçar uma causa e a ela inteiramente se dedicou. E a perda de alguém que esteve de acordo com as convicções profundas a que aderiu, no espaço certo e na forma como entendeu dever fazê-lo. É alguém que merece por isso, a qualquer um de nós, todo o respeito. E é com esse respeito pelo sentir que qualquer pessoa, na sua diversidade, tem o seu contributo pessoal, individual e próprio a dar ao seu país, por essa perda, por esse contributo que desaparece, por essa vida que finda, que quero, em nome de Os Verdes, apresentar à sua família, aos seus múltiplos amigos e ao partido em que milhava o nosso profundo pesar, as nossas condolências.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é o momento de ler e comunicar a todos os presentes uma mensagem recebida dos Deputados portugueses ao Parlamento Europeu, pedindo que a mesma seja lida neste preciso momento.
"Sr. Presidente da Assembleia da República, impossibilitados de estar presentes por motivo de sessão plenária em Bruxelas, vimos associar-nos muito sentidamente à homenagem promovida pela Assembleia da República ao nosso malogrado colega Francisco Lucas Pires, Vice-Presidente do Parlamento Europeu, que, no exercício das suas funções, muito honrou esta instituição e o nome de Portugal, contribuindo de forma marcante para a promoção do ideal europeu e para a construção de uma Europa democrática e solidária." Esta mensagem vem assinada por Luís Marinho, Vice-Presidente do Parlamento Europeu.
Srs. Deputados, é chegado o momento de eu próprio vos dizer que me identifico inteiramente e com igual sinceridade com as vossas palavras, os vossos sentimentos, a vossa mágoa e com a homenagem que aqui estamos a prestar ao Dr. Francisco Lucas Pires. Creio que o conheci bem porque, durante mais de duas décadas, mantivemos uma relação pessoal de grande amizade e, creio, de recíproca admiração. Quando digo creio, não é para duvidar da minha para com ele mas apenas para deduzir a dele das palavras amáveis que sempre pôs nos livros que me ofereceu e nas referências pessoais que me fez.
Ainda paira nesta Casa a frescura e a beleza do seu espírito. Lembro-me de, uma vez, ele ter feito uma daquelas belas intervenções que fazia, cheias de inteligência, de ironia e de graça; e de eu, na qualidade de representante do grupo parlamentar do PS, ter sentido a necessidade de diminuir um pouco o efeito corrosivo que, para nós tinha, a intervenção que ele acabara de fazer, e não encontrei mais nada para lhe dizer senão: "o senhor, que costuma fazer intervenções tão brilhantes, hoje limitou-se apenas a algumas antinomias verbais!" Ele respondeu-me de uma maneira terrível, que me deixou perfeitamente frustrado e, simultaneamente cativado, que era a maneira encantadora de ele fazer política; depois de responder ao resto, quando chegou a este ponto, disse: "quan

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to às antinomias verbais, aprendi consigo!" Ele tinha uma maneira lúdica, quase lúdica de fazer política, sem prejuízo da profundidade do seu pensamento e da riqueza das suas ideias.
Era um homem de profundas convicções, tinha um sentido ético da política que bem preciso, foi à política portuguesa e à política em geral nestes últimos anos. Estou de acordo com a citação aqui feita pelo Sr. Deputado Barbosa de Melo, quando disse que ele deu nobreza à política portuguesa. Bem precisávamos que ele a tivesse dado, bem nos ajudou a responder de forma positiva àqueles que procuram indignificar a classe política e o seu trabalho.
Quero dizer-vos, queridos amigos, só mais isto: não tenho qualquer dúvida em considerar que o Dr. Francisco Lucas Pires foi, nestas últimas décadas, uma referência cívica, política e humana para todos nós.
Endereço muito comovidamente os meus sentimentos de pesar à família enlutada, à Universidade de Coimbra, aos partidos de que foi membro, de um dos quais foi, inclusivamente, líder, e à Assembleia da República, de que ele ainda é Deputado eleito, tendo suspendido o seu mandato para o emprestarmos, por uma época, ao Parlamento Europeu.
Veneremos a sua memória, que bem merece ser venerada.
Srs. Deputados, vou passar à leitura do voto n.º 120/VII - De pesar pela morte do Dr. Francisco Lucas Pires, que é do seguinte teor:

Faleceu o Dr. Francisco Lucas Pires. O País, de que foi cidadão ilustre; a Universidade de Coimbra, de que foi académico distinto; o Parlamento Europeu, de que foi Deputado brilhante; esta Assembleia, onde ainda pairam a vivacidade e o encanto das suas intervenções, ficaram subitamente mais vazios.
Francisco Lucas Pires marcou o novo regime democrático com o fulgor da sua personalidade. Atravessou duas décadas de profundas transformações políticas e sociais, como Ministro, Deputado, líder partidário e referência intelectual sem deixar uma só recordação amarga. Cultivou um estilo simultaneamente leve e profundo de intervenção política, cativante e sedutor.
Europeu convicto, rejeitava uma visão estreita do Mundo e da Vida. Deixa-nos um legado de inteligência e lucidez que cumpre partilhar com generosidade igual à sua.
A Assembleia da República, profundamente contristada, na sua reunião plenária de vinte e oito de Maio de 1998, rende à memória do Dr. Francisco Lucas Pires uma sentida homenagem, e aprova um voto de profundo pesar pela sua morte, endereçando à família enlutada, à Universidade de Coimbra, ao Parlamento Europeu, à Assembleia da República e ao País as mais sinceras condolências.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação deste voto que, em minha opinião, não poderá ter outro resultado que não a aprovação por unanimidade.

Submetido à aprovação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos guardar um respeitoso minuto de silêncio.

A Câmara guardou de pé um minuto de silêncio.

Srs. Deputados, o voto será comunicado à família enlutada, à Universidade de Coimbra, aos dirigentes do CDS-PP e do PSD, aqui presentes.

Srs. Deputados, encontra-se a assistir à sessão um grupo de alunos da Universidade do Minho - Curso de Comunicação Social, do CEBI - Fundação para o Desenvolvimento Comunitário de Alverca, e da Escola Básica dos 2. e 3.º ciclos de Vale de Milhaços.
Para todos eles peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Srs. Deputados, para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carmen Francisco.

A Sr.ª Carmen Francisco (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Sendo esta a primeira vez que me dirijo à Ex.ma Câmara, gostaria de apresentar os meus cumprimentos a S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República e aos demais Deputados.
As afirmações de conhecimento da gravidade da situação em que se encontra grande parte do litoral português têm sido ouvidas, não poucas vezes, aos responsáveis pela pastado Ambiente no Governo.
No entanto, a estas afirmações não tem correspondido a prática de uma preocupação em encontrar soluções que resultem numa efectiva protecção da orla costeira, a pensar num futuro de fruição, por todos, daquele que é um património natural e um recurso económico importante do País.
Recentemente, o Governo apresentou aquilo a que chamou "Litoral/98: Uma estratégia - Um programa de acção". Parece-me um título demasiado pretensioso para aquilo que este programa de facto significa. Ainda mais quando se insistiu, na sua apresentação pública, em que é um instrumento para acabar de vez com uma gestão repartida e descoordenada do litoral.
Não é perceptível como poderá um programa de circunstância, destinado a anunciar obras até final da Legislatura, conseguir aquilo que sucessivos governos não conseguiram, isto é, ordenar as competências entre entidades envolvidas na gestão do litoral. Este objectivo, já enunciado pelo Governo mais do que uma vez, é para nós considerado como fundamental.
Mas, aparentemente, a única resposta do Ministério do Ambiente a esta questão reduz-se à breve referência a uma "recomendação", para a criação de um Conselho para a Qualificação do Litoral, ainda em "desenho", não sendo perceptível a quem se dirige esta recomendação. Parece pouco, nesta altura da Legislatura, para um Ministério que diz ter como uma das suas principais linhas de orientação para o litoral a gestão integrada e coordenada da orla costeira.
O Programa Litoral/98 nada mais é do que um documento de propaganda, com o objectivo de tornar visível o muito pouco que o Ministério do Ambiente tem vindo a fazer ou, nalguns casos, apenas a anunciar, por vezes, mais do que uma vez.
É o caso, por exemplo, das obras que, no "Programa de Qualificação do Litoral", anunciado em Janeiro de 1997, se chamavam "reconstrução dos esporões de Espinho e Paramos" e que, no Litoral/98, se chamam "reparação dos esporões de Espinho-Paramos"; ou a "reconstrução dos esporões de Esmoriz e Furadouro", de 1997, que passa, em '1998, a "reparação dos esporões entre Esmoriz e Furadouro"; ou ainda a "reconstrução dos esporões da Costa Nova e Sul da Vagueira", em 1997, e que, no Litoral/98, passa a "repararão de esporões da Costa Nova e a Sul da Vaqueira". E também o caso da "recarga do troço de costa entre a Praia da Rocha e do Vau", versão 1997, e o "enchimento artificial do troço entre a Praia do Vau e a Praia da Rocha", versão do Li

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foral/98. É ainda o caso da "recarga da Praia do Vale de Lobo e consolidação das falésias" versão 1997, que aparece em 1998 como "alimentação artificial em Vale de Lobo".
Em 1997, juntavam-se os valores gastos em 1996 com os previstos para 1997 e atirava-se com um número traduzido em milhões, em 1998, volta a atira-se com uma soma, onde existem parcelas já antes anunciadas. Para nós, o mais importante numa estratégia para o litoral não é o anunciar dos milhões investidos, ainda mais quando estes se repetem. O mais importante seria fazer aquilo que só se promete para 1999. Diz a estratégia do Governo que é nessa altura que se vai apresentar um plano para três anos porque, "cada vez mais se revela fundamental agir com base em quadros de planeamento integrado, e não através da realização de obras avulsas de emergência".
A declaração de intenções até é boa, mas não tem conseguido chegar à prática. Este programa, que pretende conter uma estratégia, nada mais representa do que a continuação de aplicação de medidas avulsas, medidas essas que, muitas vezes, significam a utilização de dinheiros públicos na defesa de interesses privados.
Sr. Presidente, Sr.º5 e Srs. Deputados: É o próprio Ministério do Ambiente que, neste mesmo documento, reconhece a "ausência de uma política para o litoral devidamente concertada e consequente". São estas as palavras que lá estão! Citando o Prof. Galopim de Carvalho, "as obras de engenharia a que frequentemente se recorre para remediar situações tantas vezes dramáticas a que se tem chamado, eufemisticamente, de `protecção do litoral', não passam de intervenções localizadas para defesa de bens aí instalados, alguns dos quais por incúria ou simples ignorância" Continuando a citar Galopim de Carvalho, "a construção de molhes, de esporões e de outros entroncamentos, como os que neste momento são causa de polémica na foz do Douro, procuram resolver situações locais, pontuais, mas criam outras, gerando o mesmo tipo de problemas, geralmente de forma agravada, para jusante (...). Não podemos é continuar a planear o litoral de costas viradas para o que a ciência nos está a oferecer. Não podemos - ou, pelo menos, não devemos - ir atrás de soluções imediatistas ou de interesses tantas vezes duvidosos."
Estas palavras coincidem com a posição de Os Verdes: continua a faltar uma estratégia, uma política de preservação deste recurso vital para o nosso país, que é o litoral, onde a erosão vai, pouco a pouco, levando parte do nosso território.
Até porque uma política para o litoral nunca se esgota em estratégias dirigidas especificamente para estas áreas, passando igualmente pela procura da diminuição da pressão sobre a orla costeira e uma política de redução das assimetrias entre o litoral e o interior, que leve à fixação das populações. Instrumento imprescindível para este objectivo será a regionalização.
Outros instrumentos que nos parecem poder vir a ser úteis, são os anunciados "Plano Nacional de Monitorização do Litoral" e a "Carta de Risco", desde que estes estudos não tenham o mesmo percurso, cujo fim ainda não se conhece, dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira. Após uma enorme pressão sobre as Comissões Técnicas de Acompanhamento dos cinco planos que avançaram mais cedo, para que, finda a consulta pública, os pareceres finais chegassem ao ICN e ao INAG, aguarda-se ainda a conclusão do processo, em que há questões extremamente importantes por definir. Por outro lado, desconhecem-se ainda as propostas iniciais para a quase totalidade da costa entre Ovar e o Sado, bem como parte importante do litoral algarvio.
É o próprio Governo que afirma que a falta de actuação imediata provocará danos irreversíveis. Mas é também o Governo que hesita, que atrasa, que tarda em aplicar os princípios que define.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar ao debate de urgência, requerido pelo PSD, sobre o alegado projecto do Estado espanhol de vir a instalar um cemitério de resíduos nucleares em Aldeadávila de Ia Ribera junto à fronteira portuguesa de Trás-os-Montes.
Pára abrir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em 1986, o Governo espanhol, através da ENRESA - Empresa Nacional de Resíduos Radioactivos - tentou impor, de surpresa e com total desconhecimento das populações, das instituições e das autarquias, portuguesas e espanholas, e do próprio Governo português, a construção de um cemitério de resíduos nucleares em Aldeadávila de Ia Ribera.
A firmeza da reacção por parte do Governo português de então, que teve como incontornável referência o então Secretário de Estado do Ambiente, Carlos Pimenta, bem como por parte das populações e das instituições portuguesas e espanholas, levaram o Governo espanhol de então a retirar tal projecto. Não fora essa reacção e quase seguramente hoje ali existiria um depósito recebendo os resíduos provenientes das centrais nucleares espanholas, com as consequências que todos podemos imaginar para o meio ambiente, para a economia e para a vida da região do vinho do Porto.
Volvidos 12 anos, Espanha tenta agora impor, através de lei e a partir do Senado espanhol, o que não logrou anteriormente obter pela via do facto consumado.
Esta realidade é bem demonstrativa da política de mentira que tem sido utilizada para com Portugal, nos últimos anos, no domínio dos resíduos nucleares e no da gestão dos recursos hídricos, a qual só pode merecer o repúdio político, a rejeição cívica, a firmeza diplomática e a denúncia internacional, que, infelizmente, não têm existido por parte do Governo português.
No tocante à gestão dos recursos hídricos, Espanha, ao mesmo tempo que vai conseguindo atrasar e adiar, desde finais de 1995, as negociações com Portugal, com vista à elaboração de um novo convénio luso-espanhol, vai, paulatina e sorrateiramente, aproveitando o tempo assim habilmente ganho para construir as dezenas de barragens e albufeiras que permitirão uma capacidade de regadio onze vezes superior .à gerada pela barragem do Alqueva em pleno funcionamento e para continuar as obras hidráulicas que permitem os transvases entre bacias hidrográficas, tudo isto à custa da redução para níveis alarmantes dos caudais do Tejo, do Douro e do Guadiana que entram em Portugal.
No que diz respeito ao nuclear, apesar de, em 1987, o Governo espanhol ter renunciado então ao projecto IPES Instalação Piloto Experimental Subterrânea -, a reserva mental das autoridades espanholas fica bem patente nesta nova tentativa, que obteve o mesmo firme e inequívoco repúdio das populações, das autarquias e das instituições, portuguesas e espanholas, infelizmente não acompanhadas pelo Governo português, que se limitou a pedir esclarecimentos ao Governo espanhol e a afirmar, uma vez aqueles obtidos, que se contentara com eles.
O Governo espanhol, inexplicavelmente sem contestação visível do lado português, limitou-se a dizer que a

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decisão quanto à localização do cemitério nuclear, afinal, já não será tomada agora, mas que fica adiada até 2010!...
Para o Governo português, já percebemos que adiar é resolver; para nós, adiar é adiar. E, neste caso, adiar não significa abandonar o projecto, significa apenas remeter para mais tarde a sua concretização - e isto é muito grave.
O Governo português, bacocamente, suspira de alívio com a informação e sustenta que «mobilizar forças quando o assunto não está na mesa. não parece ser o mais adequado», porventura a guardar-se para intervir, quando já não houver remédio e o cemitério for uma realidade...
Portugal tem de rejeitar liminarmente esta resposta espanhola, porque não nos tranquiliza a transformação de uma ameaça de curto prazo noutra de médio prazo; o que importa, isso sim, é acabar, de uma vez para sempre, com esta insuportável ameaça.
Tendo o nosso país, ao contrário de Espanha, feito, em 1984, uma inequívoca opção pela não utilização de energia nuclear, não poderá ficar sujeito, em momento algum, aos custos e às consequências dos problemas resultantes da opção espanhola.
Não aceitamos que o Governo português se contente com a mera informação de que a localização de um cemitério nuclear foi adiada. As populações, as autarquias e as instituições já não aceitam mais declarações de intenção e exigem o formal compromisso jurídico e diplomático por parte do Estado espanhol, de abandonar, inequívoca e definitivamente, o propósito de viabilizar qualquer projecto deste tipo em qualquer local junto da fronteira portuguesa e, em particular, nas bacias hidrográficas dos cursos de água luso-espanhóis.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Se tal não ocorrer, então, o Governo português, abandonando a postura tíbia e hesitante que o tem caracterizado, deve claramente interpretar tal decisão de Espanha como uma manifestação de hostilidade para com Portugal e assumi-la inequivocamente em todas as instâncias comunitárias como lesiva do interesse vital do Estado português.
O Governo não pode continuar a deixar pairar a ameaça, que constitui a diminuição radical dos caudais dos rios luso-espanhóis, nem deve aceitar tranquilamente que toda a vida económica, social e cultural de uma região do País continue a ser directamente ameaçada, ainda que a prazo, com a instalação de resíduos tóxicos radioactivos junto à sua fronteira.
Se o aceitasse ou sequer se o admitisse, estaria, ele próprio, pela sua inércia e pela sua irresponsabilidade, a condenar os jovens de hoje e as próximas gerações de portugueses a condições de vida deploráveis no futuro.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Estes problemas já não são locais ou regionais e nem sequer nacionais. Sendo eles hoje. inequívoca e assumidamente, internacionais, mal da humanidade se se distrair...
É por isso que é bom ir avisando, desde já, a Espanha e a União Europeia das consequências que poderão advir da concretização de tais ameaças.
É por isso que consideramos imprescindível derrubar o espesso e intransponível muro feito de silêncios, das omissões e das ambiguidades governamentais, no qual têm esbarrado as populações, as autarquias, as organizações ambientalistas e o próprio Parlamento, quando tentam obter respostas claras e inequívocas para as suas angústias e para as suas perplexidades.
Era bom que o Governo fosse ao Douro, não como até aqui em visitas que apenas têm visado o impacto mediático, mas para verdadeiramente ouvir e dialogar com as pessoas e com as instituições.
Se o fizesse, como nós o fizemos há dias, saberia que, nas pessoas de lá, há medo, indignação e uma enorme revolta.
E quando há membros do Governo que, olhando para o dedo quando se lhes aponta a lua, esquecem onde está o verdadeiro alvo, há que recordar-lhes que estes são temas nacionais que não podem ser objecto de reacções partidárias ou estados de alma politiqueiros.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece haver quem, no Governo, se esqueça que só falando a uma só voz, no Parlamento, no País ou até fora dele e que só mobilizando todas as vozes e vontades disponíveis conseguiremos ganho de causa para questões aparentemente tão simples, mas tão transcendentes para a nossa sobrevivência como nação e como Povo. como a água de que dispomos ou o ambiente em que vivemos.
Pela nossa parte, estamos e estaremos totalmente disponíveis para juntar a nossa voz à do Governo e à de todos os portugueses que queiram, firme e descomplexadamente, lutar para fazermos valer os nossos direitos mas, sobretudo, para fazermos valer o nosso futuro.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Artur Torres Pereira. V. Ex.ª traz-nos aqui uma preocupação importante e que é também do Partido Popular. Mas há uma questão, que, a priori, gostava de colocar a V. Ex.ª e a esta Câmara e que me preocupa sobremaneira.
Ontem, o Sr. Ministro Ferro Rodrigues, a propósito das reformas da segurança social, dizia que a situação não estava em ruptura nem em pré-ruptura, porque era um problema que apenas se poria entre 2010 a 2015.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - O Sr. Deputado está perdido ou precisa do mapa?

O Orador: - Hoje, a propósito de uma situação diametralmente diferente, temos lido na comunicação social que o problema também não é grave nem importante, porque estará resolvido até 2010.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Em 2010, até V. Ex.ª pode ir para o Governo!

O Orador: - O que significa que começámos a ouvir aqui falar reiteradamente num horizonte temporal, a partir do qual nos aparecerão catástrofes de toda a natureza.
Ora, V. Ex.ª permita-me que tenha um horizonte um pouco mais alargado e consiga estar preocupado para além de 2010, 2030 e 2050, porque esta Câmara tem responsabilidades bem mais graves e importantes do que o telejornal de logo à noite, o horizonte das próximas eleições autárquicas ou mesmo o fim do século e do milénio.

Vozes do PSD: - Em 2010 já não há socialistas!

O Orador: - Gostava de dizer que se Portugal optou - e bem! - por não ter qualquer dos benefícios da opção nuclear, não tem de pagar qualquer dos custos dessa opção. Se não temos os benefícios, não queremos os custos.

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E quando falamos da questão de Aldeadávila, estamos a falar não só da zona fronteiriça mas também de uma região que devia ser uma opção de turismo estratégica, estamos a falar de um dos emblemas de Portugal, como, por exemplo, o vinho do Porto, estamos a falar de um conjunto imenso de problemas em cascata, que se podem colocar através só da suspeita, Sr. Deputado.
Sr. Deputado, gostava de perguntar-lhe se tem conhecimento de algum compromisso diplomático por parte de Espanha, de que este é, com efeito, um problema completamente fechado e resolvido ou é apenas um problema adiado para 2010.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Essa é uma pergunta difícil!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, agradeço-lhe a sua pergunta. A resposta é muito simples e muito rápida.
Tal como o meu partido se tem permanentemente oposto à prática deste Governo de adiar todas as reformas estruturais em todos os sectores vitais para a sociedade portuguesa, seja na segurança social, seja na saúde, seja na Administração Pública, seja na justiça, seja em que sector for, naturalmente que também não deixará de se opor a que a resolução de alguns dos mais importantes problemas que se colocam à sociedade portuguesa seja adiada, quer para 2010 quer para qualquer outra data.
Neste problema concreto, aquilo que nos preocupa e continuará a preocupar é a tíbia e hesitante postura do Governo em, de uma forma inequívoca e firme, contribuir para fazer desaparecer, de vez, os fantasmas que pairam sobre a região nordestina: como se não bastasse a ameaça da deposição de um cemitério nuclear, prepara-se agora, porventura, para, a prazo, ver também atravessado e rasgado o Parque de Montesinho por uma nova via rápida.
São estes problemas que infelizmente preocupam as populações e que infelizmente também não vemos, parece, preocupar o Governo português.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente.

A Sr.ª Ministra do Ambiente (Elisa Ferreira): Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: É com muito interesse que venho ao Parlamento falar sobre Aldeadávila.
Esse interesse é especial pelo facto de me custar a crer, digo mais, de me recusar pessoalmente a acreditar que um assunto que, se tivesse algum fundamento,...

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Não tem?!

A Oradora: - ... deveria mobilizar todas as forças nacionais possa estar a ser utilizado para mera mediatização partidária e ocupação de tempos de antena.

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

A Oradora: - Porque me recuso, por princípio, a acreditar em hipóteses tão descredibilizadoras, prefiro começar por, claramente, fornecer a informação objectiva, que obviamente escasseia aos Srs. Deputados do PSD.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Muito bem!

A Oradora: - Há, no entanto, questões centrais, que precisam de ser esclarecidas: o que aconteceu, agora, sobre Aldeadávila que justifique todo o alarmismo que decidiram protagonizar?
Está Espanha a lançar alguma discussão interna ou externa sobre localização de depósitos de resíduos nucleares em profundidade? A resposta é: não!
Está Espanha a reforçar, de forma directa ou indirecta, a sua aposta na utilização de energia nuclear, com consequências para Portugal? A resposta é: não!
Relançou Espanha algum projecto específico sobre laboratórios, em Aldeadávila, ou iniciou algum procedimento para retomar 2 Central de Sayago? A resposta é: não!
Então, o que aconteceu? Espero sinceramente perceber durante o debate!
Entretanto, debrucemo-nos sobre os factos.
São factos indiscutíveis, em primeiro lugar, que, ao contrário de Portugal, Espanha optou por utilizar a energia nuclear, que criou, em 1984, a empresa ENRESA, de capitais públicos, para gerir os resíduos radioactivos, que os resíduos de baixa actividade estão a ser depositados em El Cabril, a norte de Córdova, no Guadalquivir, o qual tem capacidade estimada para mais 300 anos e que os resíduos de alta actividade têm normalmente três fases sucessivas de tratamento - numa primeira fase, são depositados em água junto das centrais que os produzem e podem estar entre 15 a 20 anos neste processo; de seguida, passam normalmente para a superfície e têm um depósito a seco e o destino final, normal e conhecido, partilhado por todos os países que produzem este tipo de resíduos, é o enterramento dos mesmos, a grandes profundidades.
Embora a tecnologia existente aponte como solução típica o armazenamento geológico profundo, está a ser estudada a transmutação nuclear, no sentido de permitir que esses resíduos, que, como destino último, têm normalmente essa deposição, sejam tratados e possam ter um destino final em instalações semelhantes às de El Cabril.
Segundo tipo de informação objectiva: a ENRESA elaborou um plano para gestão de resíduos, já na altura, ainda nos anos 80, e, sucessivamente, de três em três anos, tem feito a sua revisão, sendo o último plano o de 1984, que está disponível para quem o quiser consultar.
Nesse plano, o que estava previsto era que, em 1999, houvesse uma decisão sobre os locais mais viáveis para o armazenamento profundo destes resíduos de alta actividade.
De entre esses locais, seria seleccionado o local definitivo, processo que decorreria entre 2010 e 2015. Em 2020, iniciar-se-ia o armazenamento. Estou a falar do plano da ENRESA de 1994, onde não aparece qualquer referência a localizações concretas.
Sendo a questão reconhecidamente de grande sensibilidade política e tendo sido todos os prazos previstos totalmente inviabilizados, o Senado espanhol decidiu, no final de Outubro de 1996, constituir uma Comissão para estudar a questão dos resíduos.
Entretanto - e isto é importante -, ultrapassados todos os prazos previstos nesse plano de 1994, em 29 de Janeiro último, o Ministério da Indústria e Energia espanhol toma a decisão formal de proceder ao armazenamento dos resíduos de alta actividade, cujo período de armazenamento líquido se tinha esgotado, nas centrais nucleares, ao ar livre.
Última nota objectiva: relativamente a Aldeadávila, em 1986, o Governo espanhol lançou um projecto de laboratório para Aldeadávila, um projecto-piloto, a que se cha

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mou Instalação Piloto Experimental Subterrânea (IPES), para o estudo das rochas graníticas e do seu comportamento em contacto com material radioactivo. Em Setembro de 1986, este projecto é candidatado para financiamento de Bruxelas (DG XII), tendo esta Direcção-Geral dado conhecimento ao Governo português da existência do projecto.
O receio de Portugal não estava, como sabem, na existência, naquele instante, de uma proposta de central nuclear; traduzia-se, sim, numa posição de prudência relativamente à evolução possível do laboratório para fins de armazenamento definitivo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Este projecto foi rejeitado formalmente, em 1987 pela Comissão Europeia e o Governo espanhol desistiu dele, formalmente também, em Outubro de 1987.
Dado estes factos inquestionáveis, pergunta-se: o que despoletou o reavivar da questão?
Tal como disse, o Senado espanhol decidiu, no final de Outubro de 1996, constituir essa tal Comissão para estudar a questão.
Uma versão preliminar do documento desta Comissão - e ele também não fazia referência alguma a localizações -, a que teve acesso um conhecido ambientalista e professor de Salamanca, dirigente do Comité Anti-Nuclear Ecologista de Salamanca e grande protagonista da luta dos anos 80 contra o Laboratório IDES, originou um comunicado de crítica, feito por esse ambientalista, às conclusões propostas pela Comissão.
Passo a citar esse comunicado, que também está disponível: "Este comité, tal como a grande maioria do movimento ecologista espanhol, (...), opor-se-á activamente a qualquer tipo de cemitério nuclear ou armazenamento de resíduos radioactivos, enquanto não cesse a produção dos mesmos nas centrais nucleares espanholas. Do mesmo modo nos oporemos a qualquer possível plano da ENRESA de construir um Armazém Temporário à superfície Centralizado (...)".
Nem por um momento, este conhecido ambientalista de Salamanca pôs a hipótese de voltar a discutir Aldeadávila enquanto laboratório, muito menos como depósito dos resíduos ele que é de Salamanca e foi um grande protagonista, e continua a ser, na luta anti-nuclear!
Este comunicado está disponível e pode ser distribuído.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - É lê-lo!

A Oradora: - Mas, mesmo assim, bastou este comunicado para se reavivarem velhos fantasmas e correram dúvidas e rumores a nível local...
E o que é que o Governo fez?
Apesar de nada indiciar que estivesse em curso qualquer discussão, muito menos qualquer decisão, sobre localizações de depósitos radioactivos, para além das que eram, e foram sempre, do nosso conhecimento, o contacto foi feito com o Governo espanhol, pela via diplomática e formalmente, como não podia deixar de ser.
A resposta dada, pela mesma via, foi peremptória e veio em carta do Ministério dos Negócios Estrangeiros espanhol, datada de 23 de Abril último, isto é, bastante antes de toda esta publicidade e mediatização estarem ao rubro ou sequer iniciadas.
Nessa declaração formal, reconfirma-se que "não se autorizará qualquer armazenamento geológico profundo de resíduos radioactivos em Espanha e qualquer outra decisão ficará protelada até 2010", e que "(...) não pode falar-se da existência de nenhum projecto de armazenamento geológico de resíduos radioactivos de alta actividade em nenhuma localidade do território espanhol e, consequentemente, também não em Castilla-Léon".
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Pergunta-se como é possível que, tendo os Srs. Deputados do PSI) (enquanto foi governo) tido acesso aos relatórios trianuais da ENRESA - o último dos quais datado de 1994 e onde se previa a definição de locais para depósitos profundos de resíduos de alta radioactividade para o próximo ano sem que tal lhes tenha merecido qualquer tipo de iniciativa ou comentário?
Agora, quando a Espanha definitivamente opta por utilizar armazenamentos em superfícies próximas das centrais, ao mesmo tempo que busca uma solução alternativa à deposição de resíduos em profundidade, vêm os senhores clamar por "atitudes globais de exigência da protecção dos interesses portugueses..." cito as vossas frases - u...impostas preferencialmente à bruta' aos espanhóis"?

O Sr. José Magalhães (PS): - É uma posição bruta, Sr.ª Ministra!

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Parece uma Ministra espanhola a falar português!

A Oradora: - Os senhores têm uma ideia, mesmo que vaga citei declarações de um vosso Deputado à televisão - do que pretendem sugerir ou recomendar? E, se têm, porque não o fizeram quando os planos espanhóis eram muito mais preocupantes para Portugal?

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Fizemos, o problema é que a Sr.ª Ministra era Presidente da Comissão de Coordenação!

A Oradora: - Como é possível que, mais de um mês depois de o Governo português ter obtido a resposta formal do Governo espanhol pela via diplomática normal e dela ter sido dada a devida nota pública, o maior partido da oposição venha, mediaticamente, exigir que "se obtenha uma confirmação por escrito e se envolva neste acto o Ministério do Negócios Estrangeiros Português"?

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Se calhar é um escândalo!?

A Oradora: - Admitindo que os senhores estavam a mediatizar qualquer outro assunto na altura e que não deram conta, respondo-lhes no mesmo espírito de boa fé: Srs. Deputados o que "exigem" está feito, e de forma satisfatória, há mais de um mês!
Como é possível que o maior partido da oposição tenha tido de se deslocar, mediaticamente, e de helicóptero, ao Douro para "se informar do que lá se passava", no último dia 25 quando lhe bastaria ter contactado algumas das muitas pessoas que aí estiveram no dia 17, para saber que não se passava absolutamente nada?
Porque é que assustam e lançam a desconfiança e a dúvida sobre as pessoas do Douro, lançando a hipótese de um depósito de resíduos radioactivos em Aldeadávila, quando sabem que mesmo a hipótese de um laboratório foi - e bem! - abandonada por questões de precaução?
Mas, mais do que isso, não sabem os Srs. Deputados do PSD que qualquer central nuclear, qualquer depósito

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de resíduos radioactivos ou qualquer outra instalação nuclear em Aldeadávila exige, ao abrigo do Acordo Luso Espanhol sobre Cooperação em Matéria de Segurança das Instalações Nucleares de Fronteira um processo de co-licenciamento, em parceria, das autoridades portuguesas e espanholas, quer na fase de decisão sobre localização, quer na fase de obra, quer ainda na fase de licença de exploração? Os senhores não sabem isso?
Sr.ªs e Srs. Deputados do PSD, de todo o aparato mediático dessa famosa visita que, perante a majestática serenidade das arribas onde nada acontecia, deixava' os protagonistas completamente sem justificação para o que tinham ido lá fazer, permitam-me que lhes sugira uma saída meritória: os Srs. Deputados e os altos dirigentes do PSD foram ver o Parque Natural do Douro Internacional que este Governo, com todo o apoio da população local, criou e que, para além de tudo o que aqui pudéssemos evocar, constitui o garante máximo da preservação ambiental de um e de outro lado da fronteira!

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira para defesa da consideração da sua bancada.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr.ª Ministra do Ambiente, costuma dizer o nosso povo que "presunção e água benta, cada qual toma a que quer"...

Vozes do PS: - Os senhores já tomaram a vossa!

O Orador: - Devo dizer-lhe, francamente, que V. Ex.ª, hoje, ultrapassou todas as marcas. Faz lembrar aquela história do soldadinho que ia com o passo trocado, enquanto os outros apresentavam um passo diverso. Todos lhe apontavam tal facto, que só ele não queria ver, tal como acontece com V. Ex.ª. Isto é, perante as preocupações das populações, das autarquias e das instituições do Douro face a esta ameaça, só há mesmo uma pessoa que a não quer ver: V. Ex.ª!
Como é possível, numa situação como esta, que só V. Ex.ª esteja certa do que afirma? Como é possível que mais ninguém esteja certo disto?

O Sr. Manuel Varges (PS): - Nós também estamos!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - E os ambientalistas!

O Orador: - A Sr.ª tem a certeza absoluta? Pode, aqui, dar-nos a garantia clara, inequívoca e expressa de que esse projecto nunca mais vai ser implementado?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Já deu!

O Orador: - Se tem, diga-nos isso sem fugir à questão. Sabe porquê, Sr.ª Ministra? Porque esse senhor de Salamanca que há pouco citou mandou-me hoje um documento, que tenho aqui na minha posse, ...

O Sr. José Magalhães (PS): - Ah! Outra surpresa!

O Orador: - ...que inclui uma cópia do relatório do Senado espanhol, aprovado a 27 de Abril, onde está escrito... Sabe o quê Sr.ª Ministra?. Vou ler para a recordar a si e a outros, que em vez de ouvir fazem barulho.
Diz assim: "Na actualidade, o recurso ao armazenamento geológico profundo constitui a única opção sobre a qual existe um certo consenso, e esta alternativa seguirá sendo necessária mesmo no pressuposto desejável de que as actividades de investigação e experimentação permitam, se não suprimir, pelo menos reduzir a massa de resíduos nucleares". Sr.ª Ministra, este documento é do Senado espanhol!

O Sr. José Magalhães (PS): - E então?!

O Orador: - É um documento oficial que vem ao encontro das preocupações das populações, das autarquias.
Sr.ª Ministra, pare! Ponha a mão na sua consciência!

Vozes do PS: - Oh!

O Orador: - As populações do Douro querem que a Sr.ª Ministra fale! É que ou a Senhora não fala, ou, quando o faz, fala contra quem não deve, esquecendo-se que o adversário não está aqui, está lá fora. As populações do Douro querem que a senhora as ouça, e a senhora não as ouve; não vai lá, não conversa com elas! As populações do Douro querem que a Sr.ª Ministra veja onde estão os túneis em que toda a actividade espanhola coincidiu para instalar esse depósito, e a Sr.ª Ministra não quer ver.
Sr.ª Ministra, um membro do Governo que não fala quando deve, que quando fala não diz o que deve, que se recusa a ouvir as populações e que se recusa a ver aquilo que todos lhe mostram não é um membro de um Governo que tenha em conta as preocupações dos portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente.

A Sr.ª Ministra do Ambiente: - Sr. Deputado, sugiro-lhe moderação e respeito pelas pessoas do Douro.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É o que a senhora não tem!

A Oradora: - As pessoas do Douro não estão em risco. Os senhores é que precisavam de uma oportunidade de mediatização. Que isso fique aqui muito claro!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - É uma vergonha!

A Oradora: - É muito grave que os senhores estejam a lançar esse tipo de atoardas precisamente sobre Aldeadávila, onde, em função da legislação que está acordada entre Portugal e Espanha, nada pode ocorrer - nada! - em termos de depósitos nucleares profundos ou de reactivação da central nuclear que aí está construída e parada, sem autorização expressa do Governo português. Nesse sentido, e porque tenho comigo um documento igual ao que há pouco apresentou...

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Então não leu!

A Oradora: - O Sr. Deputado leu e não o entendeu. O que está a dizer é óbvio e consta do discurso que acabei de ler: é que, neste momento, a única tecnologia disponível controlada para os resíduos de alta actividade é o depósito profundo. Mas qual é a relação entre isso e

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Aldeadávila? Está provado que, tecnicamente, este local não serve para depósito nuclear profundo.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Onde, Sr.ª Ministra?

A Oradora: - Deixe-me continuar!
Em primeiro lugar, não serve geologicamente para depósito nuclear profundo; em segundo lugar, para que alguma coisa lá aconteça, nesses termos, o Governo de Portugal entra, segundo o Acordo Anti-Nuclear Luso-Espanhol, claramente e legalmente, na discussão da localização...

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - O mesmo Governo que se tem preocupado com os rios e as barragens...?

A Oradora: - Ó Sr. Deputado, é disso que estamos a falar e não pode mandar atoardas para o ar.
Dizia eu que, em primeiro lugar, aquele local não serve como depósito nuclear profundo; em segundo lugar, e de acordo com o tratado que existe entre Portugal e Espanha relativo à gestão de resíduos anti-nucleares, o nosso país tem de autorizar a localização de um eventual aterro, e essa autorização tem de constar do licenciamento da construção e do licenciamento da exploração.
Porque é que pensa que Sayago foi abandonado há tanto tempo? Porque essa legislação, que os senhores ignoram, foi claramente invocada!
Finalmente, direi que fizemos o maior "tampão" ambiental que se pode fazer em relação a projectos dessa natureza: criámos o Parque do Douro Internacional, e ninguém neste mundo, nem em Bruxelas, autorizaria uma central nuclear lá em frente.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Artur Torres Pereira pede a palavra para que efeito?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Para ver se é o último a falar!

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Para, se o Sr. Ministro Alberto Costa estiver um pouco mais calmo e me deixar falar, fazer uma interpelação à mesa.

Vozes do PS: Alberto Costa!?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Visto que a Sr.ª Ministra já está a acalmar o Sr. Ministro Alberto Costa, podemos prosseguir os trabalhos.

Vozes do PS e do PCP: - Alberto Costa!?

O Sr. Manuel Varges: - Está nervoso!

O Orador: - Queria dizer Ministro António Costa, peço desculpa.
Sr. Presidente, gostava de solicitar a V. Ex.ª, sem qualquer antinomia verbal, que explicasse à Sr.ª Ministra do Ambiente - ou, se me autorizar, fá-lo-ei eu - que ela não deu resposta à pergunta que há pouco coloquei no sentido de saber se pode garantir em absoluto à Assembleia da República Portuguesa e a Portugal que a instalação daquele projecto de cemitério nuclear foi abandonado.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - A Sr.ª Ministra já o fez por três vezes!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como sabe, só há o direito de obter resposta aos requerimentos escritos. Para os verbais, e infelizmente, a resposta é facultativa.
Mas, como vê, a Sr.ª Ministra quer responder, para o que lhe dou a palavra.

A Sr.ª Ministra do Ambiente: - Gostava de fazer uso da mesma figura que o Sr. Deputado acabou de utilizar, para lhe dizer que a sua surpresa por desconhecer legislação essencial em matéria de controlo anti-nuclear entre Portugal e Espanha, que nos dá poderes em relação a Aldeadávila, que eventualmente não teremos em relação a outras zonas de Espanha, porque ainda é território espanhol...

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Foi abandonado ou não foi, Sr.ª Ministra?

A Oradora: - Foi abandonado, sim, Sr. Deputado, e posso acrescentar que qualquer ideia de retomar o projecto de Sayago...

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Quem lhe deu essa garantia?

A Oradora: - Alei, Sr. Deputado.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Como?!...

A Oradora: - Ó Sr. Deputado, vamos ser francos! O Sr. Deputado ignora completamente o acordo anti-nuclear luso-espanhol, não ignora?

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Como é hoje comummente aceite, a energia nuclear não é apenas mais uma forma de energia mas uma forma de energia qualitativamente diferente.
Diferentemente de todas as restantes, a energia nuclear e a sua utilização colocam problemas à espécie humana, que não apenas ao indivíduo, à Humanidade, que não apenas a cada homem, e à Terra, que não apenas a uma região ou a um país.
A energia nuclear e a sua utilização colocam-nos, assim, perante problemas que extravasam o domínio meramente quantitativo e nos conduzem, naturalmente, à área mais nobre, ou mais perversa, do comportamento humano, à área das opções políticas e ético-políticas. De tal modo assim é que, a pretexto da sua utilização militar, a energia nuclear se transformou num palco privilegiado para a afirmação quer da consciência social e ético-política do cientista quer do carácter não neutral da própria investigação científica e tecnológica.
Hoje, a utilização pacífica da energia nuclear e, particularmente, a edificação de centrais para a produção de electricidade, com todas as questões que se levantam a

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jusante e a montante dessa edificação, têm vindo a contribuir para uma outra construção, a da consciência social cada vez mais ampla em torno da gravidade do problema.
Neste quadro, são exemplares as manifestações das populações e dos responsáveis autárquicos, de um e de outro lado da fronteira, contra a hipótese de instalação, pelo Governo espanhol, de um cemitério de detritos nucleares na zona de Aldeadávila de Ia Ribera, na bacia hidrográfica do Douro e próximo da fronteira portuguesa.
É preciso que se diga, claramente e de uma vez por todas, que, no presente estádio de desenvolvimento dos nossos conhecimentos científicos, tecnológicos e industriais, todos os cemitérios de resíduos nucleares são provisórios, isto é, envolvem um elevado risco potencial, pois a verdade é que, de forma definitiva e segura, ninguém sabe ainda o que fazer com esses resíduos. E que não estamos a falar de uma lixeira comum mas sim de resíduos que se mantêm perigosamente radioactivos por centenas ou mesmo por milhares de anos. Daí a elevadíssima responsabilidade técnica e política que se deve exigir a quem tenha de lidar com estas situações.
É fácil ceder a voluntarismos mediáticos, seja com o espectáculo do sobrevoo da região em helicóptero, seja com a sensata sugestão de que se impõe negociar com a Espanha "à bruta" - e estou a citar, a expressão não é minha -, como também é fácil, por outro lado, para esconder inoperâncias e incapacidades técnicas e diplomáticas, defender a tese de que o "segredo é a alma do negócio", ou a de que a questão está a ser excessivamente ampliada.
A questão é outra, e é séria e grave.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Independentemente de um ou outro recuo circunstancial, ditado pela própria sensibilidade política, social e diplomática do problema, a verdade é que, já com projecto formal ou ainda sem ele, existem vários documentos oficiais espanhóis que apresentam a zona de Aldeadávila como uma daquelas em que poderá vir a instalar-se um cemitério nuclear. Ninguém quer que as garrafas do nosso maravilhoso - e único - "vinho fino do Douro" se vejam um dia obrigadas a ostentar o aviso "Beber este vinho prejudica gravemente a saúde".
O Governo português não pode neste domínio de afirmação estratégica da independência nacional, manter-se numa atitude de "esperar para ver". Aqui, o segredo não é a alma do negócio, quer porque nenhum negócio é possível quer porque é fundamental o máximo de informação clara, rigorosa e mobilizadora, se for caso disso.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Não somos daqueles que subscrevem o adágio de que "de Espanha, nem bom vento nem bom casamento". Na luta comum contra os dois fascismos ibéricos, o desaparecimento do franquismo e o 25 de Abril constituem passos fundamentais propiciadores do reforço da amizade e da cooperação entre os povos de Espanha e o povo português.
As manifestações populares em torno da questão de Aldeadávila têm sido - lembro - transfronteiriças, e isso mostra bem como têm sabido separar o essencial do acessório.
O Governo português tem a mais estrita obrigação de demonstrar, pelo menos, igual capacidade, o que, de todo, até agora não mostrou. Não queremos que trate estas coisas com a Espanha "à bruta", queremos apenas que as trate, que as trate com seriedade e com transparência e que o faça em defesa dos interesses legítimos do povo português e - permita-se-me o excesso - dos povos de Espanha.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Passou um mês sobre a acção pública de protesto que juntou em Aldeadávila populações e eleitos locais de ambos os lados da fronteira. Este protesto fez-se contra a hipótese de instalação de um cemitério nuclear naquela localidade.
Passou um mês sobre a declaração política e a votação, nesta Câmara, de um voto, apresentado por Os Verdes, de condenação do projecto nuclear do Estado espanhol junto à fronteira portuguesa.
Passaram poucos dias sobre a concentração de 17 de Maio, que reuniu. por iniciativa da Associação de Municípios de Trás-os-Montes e Alto Douro, em Lagoaça, movimentos anti-nuclearistas, associações de ambiente, agricultores, autarcas e, aliás, alguns - bem escassos Deputados, entre os quais me incluía. Aliás, fiquei muito lisonjeada pelo facto de o Professor Marcelo Rebelo de Sousa ter seguido o nosso exemplo.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, poucos dias para que Aldeadávila regressasse de novo para debate. Este regresso de Aldeadávila ao espaço e debate públicos é, em nosso entendimento, perfeitamente justificável. E é bem vindo, tratando-se, como se trata, do nuclear, uma questão decisiva para o nosso futuro comum.
O nuclear na sua trágica adopção e herança, que vem impor à humanidade uma nova ética de responsabilidade.
A adopção do nuclear que vem confrontar a humanidade com um novo risco para a saúde, a vida e o equilíbrio ecológico do planeta.
A adopção do nuclear que vem introduzir uma ameaça de tipo novo à paz e à segurança colectivas, e questionar a nossa responsabilidade em relação às gerações futuras.
E é precisamente por isso importante relevar a posição assumida por este Parlamento na aprovação, por unanimidade e por proposta de Os Verdes, de um voto de condenação dos testes nucleares da índia, pelo que estes testes representam de ameaça para a vida e para a paz no planeta.
Por acrescidas razões, é importante que o Parlamento não tenha ficado indiferente perante o projecto retomado publicamente, l I anos depois, pelo Estado espanhol, de poder vir a instalar junto à fronteira portuguesa na bacia do rio Douro, um cemitério para armazenar os seus resíduos nucleares.
É importante que o nosso Parlamento se tenha feito eco das legítimas inquietações não só das gentes de Trás-os-Montes e Alto Douro como dos demais portugueses, perante o regresso das graves ameaças que podem pairar sobre a região do Douro e sobre o seu desenvolvimento.
É importante que a Assembleia da República tenha adoptado, por iniciativa de Os Verdes, um voto, e tenha deliberado "exprimir a sua viva oposição a qualquer projecto de instalação de um cemitério nuclear junto à fronteira portuguesa", bem como "apelar ao Governo português no sentido do seu empenhamento activo junto do Estado espanhol, para exigir informação", para condenar este projecto e para reclamar o seu abandono definitivo.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Portugal recusou, em devido tempo, e bem, felizmente, a opção nuclear.
Contudo, não basta isso para que possamos viver descansados.
A poluição não tem fronteiras e muito menos o nuclear.
Os perigos que do nuclear nos vêm são múltiplos, como de há muito vimos alertando. Portugal não pode, pois, continuar a ser mero - e mesmo assim mau - observa

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dor do que se passa à sua volta, nem permanecer alheio à defesa dos interesses nacionais.
Como tantas vezes já o dissemos - e recordo-o - "os ventos que da vizinha Espanha sopram (quer se fale de recursos hídricos quer do nuclear) de há muito exigem atenção e reclamam responsabilidade no acompanhamento destes dossiers, aconselhando uma atitude preventiva".
As razões estão à vista e Os Verdes são seguramente, na multiplicidade das suas iniciativas, o partido que, ao longo do tempo e para tal necessidade imperiosa, mais tem chamado à atenção e proposto medidas. Desde logo, para a criação de um organismo responsável - e único - pela coordenação em matéria de vigilância, protecção e segurança nuclear, que a extinção do Gabinete de Protecção e Segurança Nuclear pôs em causa.
Alertas vários, não só para a localização das centrais nucleares espanholas junto às bacias dos rios internacionais Douro, Tejo e Guadiana - como para a necessidade de um eficaz controle da poluição transfronteiriça.
Mas alertas também para a instalação, na proximidade das nossas fronteiras, pelo Estado espanhol, de um gigantesco complexo de enriquecimento de urânio em Saelices el Chico, naturalmente com as consequências daí resultantes.
Alertas para a tentativa de instalação de lixeiras nucleares, como em Sayago se tentou ensaiar.
Alertas agora, de novo, perante uma história que se repete, na hipótese retomada de construir, no futuro, um cemitério, eufemisticamente chamado de laboratório, na bacia do rio Douro, para armazenar os resíduos de alta actividade provenientes das centrais nucleares espanholas cuja capacidade de armazenamento está prestes a esgotar-se.
Um projecto que, a concretizar-se, faria da região do Douro, a prazo, uma região condenada à morte e hipotecaria o seu futuro.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Perante tudo isto o Estado português não pode ficar mudo e quedo, fugir às suas responsabilidades, nada dizer e nem sequer dar sequência à recente deliberação da Assembleia da República. Há que, recordo, exigir do Estado espanhol informação, condenar este projecto e exigir o seu abandono definitivo.
Perante isto, há que prestar contas a este Parlamento, às populações locais e a todos os portugueses. No fundo, perante isto, há que garantir, enquanto é tempo, que tendo Portugal para si recusado a opção nuclear, não irá herdar a opção de outros.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Portugal não fez a opção nuclear, não optou no seu plano energético pela utilização de energia proveniente da indústria nuclear.
Acontece que, não usufruindo dos benefícios económicos desta solução, se calhar, ainda seremos forçados a assumir todas as consequências, todos os riscos, de uma opção que claramente rejeitamos.
São inúmeros e gravíssimos os riscos que o desenvolvimento de um projecto como aquele planeado para Aldeadávila causaria na saúde pública, no meio ambiente e na economia do nosso país, dada a planeada localização do empreendimento à entrada do rio Douro.
O Partido Popular tudo fará para que o Estado português assuma uma opção política de fundo, consistente e duradoura, no sentido do repúdio da instalação desta ou de qualquer outra lixeira nuclear junto da nossa fronteira e que leve ao abandono definitivo, por parte de Espanha, deste tipo de opções e sistemáticas ameaças.
Aldeadávila não é o sítio com melhores condições geológicas, é, sim, o sítio que oferece a Espanha, por razões óbvias, menos custos políticos.
A avaliação e o controle dos efeitos da poluição transfronteiriça, a segurança nuclear e o programa nuclear espanhol não podem ser assuntos a que o Governo português sistematicamente responda com o silêncio e evasivas.
Lamentamos, assim, que as dezenas de requerimentos, votos, declarações, projectos e perguntas sobre o nuclear e a estratégia portuguesa para com ele lidar, dirigidos ao actual Governo do PS, tenham vindo a cair quase em "saco roto".
Neste, como noutros vectores, o silêncio é cúmplice, gera desconfianças e em nada contribui para o esclarecimento e informação das populações.
É de lamentar que, para que o Governo preste contas ao Parlamento e ao povo português do real estado da situação, seja necessário o agendamento de um debate de urgência! E este diálogo, este "diálogo de mudo" que criticamos, que não compreendemos e que não podemos aceitar.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O nuclear não tem fronteiras e o plano definido por Espanha para o armazenamento dos seus resíduos, designadamente dos resíduos de alta radioactividade, tem de ser acompanhado passo a passo e combatido sem tréguas.
Dizerem-nos que, até 2010, temos tempo para respirar de alívio não pode contentar-nos. A política do adiamento dos problemas a que o Governo do PS nos habituou, não é a nossa política! A segurança e a qualidade de vida dos portugueses não se compadece com moratórias!
Num momento em que é um objectivo nacional a valorização do Douro como grande via de comunicação, como grande circuito turístico e como vale cuja produção vinícola importa valorizar e desenvolver, é com a mais profunda das preocupações que temos assistido à possibilidade de instalação de um laboratório de resíduos nucleares em Aldeadávila.
Não podemos deixar de referir a importância que o mais saboroso produto daquela região, o vinho do Porto, tem na economia local, regional e nacional, e as incertezas e inquantificáveis repercussões que a decisão de implantar um cemitério nuclear provocará em tão importante e apreciado produto.
Com todo o respeito que o Estado espanhol nos merece, já é tempo de, peremptoriamente, afirmarmos que não podemos admitir que quem, por um lado, nos quer tirar a água, por outro, nos queira atirar "água suja" para cima. Se o Estado espanhol pretende construir um reservatório para os seus resíduos nucleares, que o faça no interior do seu enorme território, sem causar qualquer problema aos países vizinhos.
Por isso, o Partido Popular quer saber do Governo que medidas concretas está a tomar, que provas de empenhamento activo nos pode garantir, no sentido de exigir de Espanha a informação adequada, no sentido de condenar e de exigir o abandono, definitivo, deste e de qualquer projecto similar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Meirinhos.

O Sr. Júlio Meirinhos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Este debate, requerido pelo PSD, é um debate do "faz de conta". Faz de conta que o PSD ignora e desconhece os planos gerais de resíduos nucleares, publicados pelo Governo

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espanhol desde 1984, de três em três anos, faz de conta que o Governo espanhol já escolheu Aldeadávila para a construção deste chamado cemitério de resíduos nucleares e até faz de conta que decidiu, em alguma altura, que a questão estava de momento suspensa até 2010 e que, imediatamente a seguir a esse ano, iniciarse-iam as obras desse cemitério.
A verdade é que não há um único documento, um anteprojecto ou um projecto que refira qualquer hipótese ou indicação de construção deste empreendimento em Aldeadávila. Não há nenhum documento que, até hoje, tenha optado por qualquer tipo de selecção de solos, nem sequer por qualquer tipo de solução de armazenamento.
O que o Senado fez foi, tão-só, abrir um debate, reunir ideias, ouvir especialistas e recomendar que se reformulasse a legislação do nuclear, que se passasse para a lei-quadro, e dizer que só depois, com calma, recomendando às Cortes, se deveria falar do assunto, lá para depois do ano 2010.
É preciso clarificar que o Estado espanhol está, neste momento, perante a seguinte situação: dos resíduos de baixa e média actividade, está descansadíssimo - e a Sr.ª Ministra disse-o por centenas de anos, já que com Cabril, em Córdova, tem o assunto resolvido;...

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - A Sr.ª Ministra está descansada! As populações é que não estão!

O Orador: - Já lá iremos, Sr. Deputado.
... quanto aos resíduos em alta actividade, os documentos, assumidos pelas Cortes e pelo Senado, dizem que a aposta tem sido feita na construção e no alargamento das "piscinas" e no armazenamento em contentores, tal qual como hoje os Estados Unidos estão a fazer. E não dão mais nenhum passo, porque a verdade é esta: no mundo inteiro não existe ainda em funcionamento qualquer armazenamento geológico em profundidade. Até lá, muita coisa se irá fazer, ir-se-á ver a tecnologia nova que aparece, ir-se-á ainda ver as coisas que, por exemplo com a transmutação, possam aparecer e logo se verá.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Logo se verá!

O Orador: - Eu, que sou vizinho deste sítio, eu, que convivo com este cemitério em frente de minha casa e que ando nestas lutas há muitos anos, desde a finda década de 70 - recordo que na central nuclear de Sayago, que foi uma luta à imagem de David e Golias, conseguimos travar a obra que estava no terreno -, nunca vi ao meu lado, por solidariedade, o PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Manuel Varges (PS): - O Deputado Artur Torres Pereira não, ele nem conhecia Aldeadávila!

O Orador: - Mas para eu ter a certeza de que este cemitério não vai ser construído em Aldeadávila, que nunca ali aparecerá, nem sequer precisaria de me estribar numa carta que a ENRESA, uma empresa pública criada e fiscalizada pelo Parlamento espanhol, enviou ao Sr. Alcalde de Aldeadávila de Ia Ribera, que fez o favor de receber a vossa delegação no dia 20 de Abril, e que diz, textualmente, isto, meus senhores: "Reafirma (...)" o Governo espanhol e a ENRESA - "(...) a sua posição de excluir a construção de qualquer armazenamento geológico profundo em Aldeadávila".
Também não precisaria sequer de estribar-me neste documento para ficar descansado, porque a Lei n.º 8/91, da Cortes de Castela e Leão - não é uma simples região, tem poder político -, afasta a hipótese de vir a construir este empreendimento. De igual modo, numa decisão recente, o Ministério da Indústria espanhol diz que não autorizará qualquer armazenamento geológico profundo de resíduos radioactivos em Espanha e, por conseguinte, em Aldeadávila. Está claríssimo no comunicado que tenho aqui, que diz: "Esse assunto ficará para depois, para o Senado, com o acordo dos partidos políticos, em face da conjuntura actual e com a tecnologia mais conveniente".
Nem sequer me estribo, Srs. Deputados, na comunicação que o Governo espanhol fez por escrito ao Governo português fazendo aquilo que tanto o líder do PSD pediu, deixando preto no branco -, no dia 23 de Abril de 1998, onde diz, expressamente: "Não será autorizado nenhum armazenamento geológico profundo de resíduos radioactivos em Espanha e, consequentemente, em Aldeadávila".

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Agora! Fica para depois!

O Orador: - Eu diria que nem sequer precisaria de me estribar nestas questões, porque temos matéria dentro de casa e temos gente que tem trabalhado nesta matéria, e é bonito reconhecê-lo.
Foi por isso que este Governo teve a ousadia, o rasgo e a inteligência de fazer aprovar a lei sobre impactes ambientais transfronteiriços, que obrigará a ir ao relho, sempre e como bem disse a Sr.ª Ministra, nestas questões transfronteiriças, o vizinho Estado espanhol.
Mas há outra coisa a ter em consideração, e esta é que é nuclear: dos tempos em que presidi à Associação Ibérica Anti-nuclear e de reuniões que tivemos com esta empresa pública, a ENRESA, sabíamos que havia um truque, decorrente não desta empresa mas da lei espanhola, nomeadamente das Lei n.os 25/64, 15/80 e 1131/88, do Real Decreto n.º 1303 e do Tratado EURATOM, relacionado com o facto de, para se fixar o lugar ideal para um cemitério, ser preciso determinada pontuação. Esta pontuação é aferida aos valores de população, geologia, economia e um outro, que é fatal, que é a existência de um parque natural. Isto é, se na zona de intervenção ou onde se pretende localizar o cemitério existir um parque natural, o projecto desvaloriza a zero, o que quer dizer que não atinge a pontuação ideal prevista nesse diploma e fica completamente, vedada essa possibilidade.
Ora, nós lutámos durante longos anos por um parque natural, e ele foi conseguido efeito por este Governo, recentemente. Pequenino ainda, a dar os primeiros passos, ganhou o prémio Henry Ford, mas, coincidência das coincidências, Srs. Deputados, o PSD regional e local esteve sempre, desde a primeira hora, contra a criação deste parque.

Aplausos do PS.

E esta ida apressada do líder do PSD, muito a correr, esquecendo-se das últimas manifestações populares que ali existiram, ainda neste mês de Maio, como a Deputada Isabel Castro referiu, de helicóptero, sobrevoando e aterrando na área de intervenção do parque, nesta altura crítica da nidificação da cegonha negra e da águia real,...

Aplausos do PS.

... só veio trazer um clima de alarmismo que em nada ajuda a região, como também não ajuda a fixar as pessoas, os agentes económicos, e é difícil conseguir retê-los ali.

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Por isso, o que aconselhamos, nestas situações, tal como ontem, em Lamego, a Associação de Municípios de Trás-os-Montes e Alto Douro, e, lembro, são 36 grandes municípios...

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Foram só três!

O Orador: - Esta Associação, reunindo ontem, dizia que o PSD está a contribuir para fraccionar uma luta que se pretende comum. Mais, repudia a demagogia anti-espanhola, utilizada por Carlos Pimenta.
Ora, nestas situações é recomendável a serenidade e, para que estas questões de Estado sigam, que não nos mexamos muito, não tremamos muito, porque, se não, no retrato, podemos ficar tremidos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, - Sr. Deputado Júlio Meirinhos, em primeiro lugar, queria congratular-me com a sua esperança, com fé que manifesta neste Governo em relação a esta matéria, fé que não manifestou, naturalmente, quando teve de abandonar, por todas as condições que sabemos,...

Protestos do PS.

.., a gestão do programa PROCÔA, que também foi um sonho do Governo para uma região do País, foi ele próprio a dar a ideia da esperança que teve nesse projecto e, apesar disso, foi o primeiro a abandonar a gestão desse programa! Quando pensar no assunto que está em debate, verá que se passa exactamente o mesmo!
Sr. Deputado Júlio Meirinhos, não lhe fica bem citar a reunião de uma associação na qual só três presidentes de câmara, todos do seu partido, estiveram presentes, tendo sido divulgado um comunicado.

O Sr. António Martinho (PS): - Em Lamego?! Não!

p Orador: - Quero recordar-lhe que, em 1987, todos estivemos ao seu lado. Estive, na altura, como Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses, a organizar a Associação de Municípios Ibéricos, que deu força a essa causa, e só lamento que V. Ex.ª, a sua bancada parlamentar e o seu Governo, hoje, não façam o que fizemos então, ou seja, em vez de apontarem para nós, apontem para onde devem apontar, porque a ameaça não vem daqui, vem de outro lado, e mal será se o autismo político da sua bancada e do Governo não reconhecer onde está o perigo e não adoptar a melhor maneira de o combater.

Aplausos do PSD.

O Sr. Manuel Varges (PS): - Já adoptou!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Meirinhos.

O Sr. Júlio Meirinhos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Artur Torres Pereira, nesta questão, o PS está à vontade para dizer que desde a primeira hora, em tempos difíceis, nunca falhou. Esta bancada do PS e muitos Deputados, desde sempre, desde a primeira hora, estiveram solidários com estas grandes e longas questões. Às vezes, é quase de perguntar por que razão nestas manifestações, que são as difíceis mas que são ao lado do povo, nunca vimos um Deputado do PSD.
Quando tínhamos esse "papão" da central nuclear de Sayago em plena construção, eu era autarca e Presidente da Câmara Municipal de Miranda do Douro e levei à assembleia distrital uma moção suave, discreta, contra a central nuclear de Sayago, para ver se conseguíamos arranjar um caminho de consenso para que ela não se construísse. Essa moção foi votada e teve o meu voto favorável e o dos 35 autarcas do PSD, na altura. contra. Esta é a prova sintomática de que, quanto a nós, não haverá dúvidas de que o Governo nunca deixará cair esta bandeira, importantíssima, do anti-nuclear e dará passos consequentes.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim do debate de urgência, requerido pelo PSD, sobre o alegado projecto do Estado espanhol de vir a instalar um cemitério de resíduos nucleares em Aldeadávila de Ia Ribera, junto à fronteira portuguesa de Trás-os-Montes.
Vamos passar ao tratamento de assuntos de interesse político relevante.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos Duarte.

O Sr. João Carlos Duarte (PSD): = Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há histórias em Portugal que, de vez em quando, levantam voo não se sabe bem porquê.
A construção do novo aeroporto internacional algures na periferia de Lisboa é uma delas.
Só que o Governo socialista, para além de ameaças públicas e sucessivamente adiadas de avançar com a construção do novo aeroporto, quanto à sua localização, fez pior. Fez o que poderá ser considerado de mau prenúncio. Sem anúncio prévio, criou, para surpresa de muita gente, a empresa NAER, atribuindo-lhe a missão de elaborar um estudo para sabermos qual a melhor localização para esta infra-estrutura, aparentemente encalhada entre as soluções Ota e Rio Frio. Estudo este que deveria ser apresentado em Conselho de Ministros até ao final do primeiro semestre do ano de 1998, mas, segundo novas informações, a apresentação das suas conclusões foi adiada para o final do ano. Aguardamos, para ver se haverá mais adiamentos, como tem sido hábito, como pretexto de fugir a uma decisão difícil. Até porque uma das coisas mais estranhas deste projecto, e que torna incompreensível a estratégia nebulosa do Governo, é a falta de sustentação dos argumentos invocados para se construir um novo aeroporto, nomeadamente as dúvidas levantadas por vários especialistas acerca de questões técnicas básicas.
A necessidade de um novo aeroporto é equacionada desde tempos longínquos, mas mais importante do que isso é não se saber que estudos foram entretanto feitos para afastar dúvidas que subsistem há muito tempo, por muitos especialistas e cidadãos em geral.
Estão em causa cerca de 500 milhões de contos, segundo estimativas referidas. Este valor, por si só, justifica um amplo debate sobre a necessidade de um novo aeroporto internacional. Para além disso, é exigível que o local escolhido seja indiscutível, do ponto de vista técnico e estratégico. A não ser que a ideia se destine apenas a entreter a construção civil em anos de previsível secura de grandes obras, com o que não nos admiraríamos, pois esta é a forma de governar do Partido Socialista.
Se, em teoria, a Expo 98 serve para afirmar Portugal no Mundo, a construção de um novo aeroporto é uma forma de resolver um problema de médio e longo prazo
do País..

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A decisão de construção de um novo aeroporto não pode arrastar-se por muito mais tempo pelo poder político. E não pode estar-se à espera de prever todos os pormenores e problemas inerentes a este processo. Se todos os problemas fossem previsíveis, não seria necessário haver decisores, e muito menos decisores políticos!
Com efeito, não podemos passar a vida a fazer estudos, formar comissões, realizar reuniões e mais reuniões e grupos de reflexão. É tempo de agir! O tempo para estudos está a terminar. O tempo para decidir está a começar. Não podemos passar a vida a fazer estudos, sob pena de deixarmos fugir as oportunidades e questionarmos permanentemente os custos, em vez de pensarmos nos proveitos de decidir a tempo e horas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi aqui aprovada, na Assembleia da República, há cerca de dois meses, por unanimidade, uma proposta do PSD para a criação de uma Comissão Eventual para Análise e Acompanhamento da Localização e Construção do Futuro Aeroporto Internacional. Mas, para nosso grande espanto, até agora, não funcionou, porque o PS não indicou os seus Deputados.
É lamentável esta situação de impasse, da responsabilidade do PS. Verificamos, perante esta situação, que o PS não quer que esta Comissão parlamentar funcione, ou seja, apoiou e votou favoravelmente a sua criação, mas não quer que ela trabalhe, aliás, algo que os portugueses já sabem, porque os socialistas apoiam comissões e grupos de trabalho, pensam e preocupam-se muito, mas decisões políticas fundamentais para o futuro do País é que não têm coragem de tomar, adiando-as sistematicamente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista gosta de falar muito e decidir pouco sobre os assuntos importantes para o País. Toma atitudes e comportamentos muito ligeiros, utilizando a política do «deixa andar».
O Governo socialista não governa, mas anda em campanha eleitoral permanente; não dorme, mas descansa; não decide, mas adia; não soluciona, mas reflecte muito; não resolve os problemas dos portugueses, mas preocupa-se muito com o nada; não admite benesses, mas oferece-as; não decide, mas estuda lentamente. Enfim, é um Governo que tem dificuldade em lançar novas obras, mas adora as festas de inauguração das obras lançadas pelo anterior Governo.
Este Governo e este Ministro fazem lembrar os cucos: gostam de chocar os ovos dos outros, mas pôr ovos novos, nem pensar.
Por tudo isto, desejamos uma rápida divulgação dos estudos elaborados pelo Governo e uma decisão política sem hesitação sobre a localização do futuro aeroporto internacional.
O novo aeroporto é uma infra-estrutura que se considera como essencial para o desenvolvimento económico e social do nosso país.
Existem alguns estudos e consensos relativos à necessidade e às vantagens de construir o novo aeroporto, cujo princípio subjacente à decisão deve obedecer a uma lógica de descentralização dos investimentos (e. neste caso, já temos um aeroporto a Norte e outro a Sul), sendo de considerar decidir-se pelo Centro do País, nomeadamente pela Ota, solução, aliás, sugerida por alguns estudos já realizados. O novo aeroporto, ao ser instalado na Ota, permitirá servir de forma equidistante cerca de 7 milhões de portugueses, já para não referir o impulso que esta decisão irá dar ao desenvolvimento do turismo nacional e a outros sectores da actividade económica.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não podemos esperar mais! Estamos à espera de quê?! De que os espanhóis construam um aeroporto internacional junto à nossa fronteira, por exemplo em Badajoz ou na Galiza?
A decisão de construção do novo aeroporto cabe ao Governo e insere-se numa política de desenvolvimento do sector de transportes no nosso país.
Cabe ao Governo a capacidade técnica e política para demonstrar a necessidade da construção de um novo aeroporto para substituir o actual.
Pretende-se, assim, reforçar a importância da defesa da localização na Ota, o que parece óbvio, já que existe um conjunto de argumentos que permite afirmar tratar-se da melhor localização.
Esta argumentação baseia-se nos índices de desenvolvimento que esta região oferece em relação à zona da margem sul do Tejo.
O aeroporto não é apenas um factor estratégico de desenvolvimento, pelo que não faz sentido pensar que será apenas o aeroporto que irá ser a base desse desenvolvimento. Ou seja, o facto de a Ota possuir um conjunto de infra-estruturas já implantadas no terreno permite concluir que ficará com capacidade para receber o novo aeroporto, já que é uma infra-estrutura necessária ao País e não apenas necessária a uma região.
Em termos de impacte ambiental, a localização na Ota apresenta-se como mais favorável, uma vez que, a Sul, o aeroporto vai pôr em causa a Reserva Natural do Estuário do Tejo, nomeadamente através de dois factores: o ruído no ar e as rotas de aproximação à pista.
Não se defende a localização na Ota apenas pelos benefícios que este irá trazer para a. região mas também porque está em causa o estádio de desenvolvimento da Região Oeste, que é bastante mais favorável em relação ao Sul. Isto é, em 10 anos. não vai ser possível dotar a Região Sul com o mesmo nível de infra-estruturas que a Ota já apresenta actualmente.
Um dos factores decisivos para a escolha da Ota é, sem dúvida, o das acessibilidades. De facto, a Ota apresenta-se, à partida, com o melhor conjunto de soluções viárias e ferroviárias para servir o novo aeroporto.
A Ota apresenta-se ainda como a melhor localização geoestratégica. É indiscutível que o rio constitui uma barreira geográfica e. se pensarmos nos acontecimentos recentes vividos na Ponte 25 de Abril, percebemos que o aeroporto na margem sul ficará mais vulnerável em situações de crise, sejam elas sociais, políticas ou até resultantes de catástrofes naturais.
Em termos de investimento público, a Ota apresenta-se também como a localização que vai exigir menor investimento do Estado. É que, do ponto de vista da obra em si, o investimento será feito no sistema de project finance, suportado por privados, e neste contexto estão todos os custos inerentes à construção. Pelo conjunto de infra-estruturas que importa construir a Sul. o Estado terá de realizar investimentos suplementares de grande monta, os quais são fundamentais para dotar o novo aeroporto de condições necessárias de operacionalidade. Nesta perspectiva, o aeroporto torna-se mais caro. além de vir subverter o seu papel em termos de desenvolvimento. Ou seja, não deve desenvolver-se a partir do aeroporto mas, sim, construir o aeroporto numa zona já desenvolvida, como é o caso da Ota.
Ao nível de segurança, pode considerar-se que as condições são idênticas em ambas as localizações. Para o sector agrícola, a localização do novo aeroporto assume-se claramente como geradora de maiores vantagens competitivas para o País e a região.
De facto, na Estremadura e Oeste produzem-se cerca de 65% dos produtos hortícolas nacionais e a presença do aeroporto na Ota vai permitir encarar os mercados de exportação com outra perspectiva, sobretudo pela rapidez de escoamento, factor determinante para a frescura dos alimentos.

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O turismo também tem um papel fundamental na determinação das vantagens de localizar o novo aeroporto. É óbvio, mais uma vez, que o aeroporto é um factor de desenvolvimento do turismo. As condições existentes à sua volta vão permitir uma maior mobilização turística e, neste aspecto, o norte entre o Tejo e o Mondego (Região Centro) tem ainda muito para oferecer em termos turísticos. Depois, o conjunto dos acessos já existentes e a desenvolver na zona da Ota vai permitir não só um acesso fácil à cidade de Lisboa como também à margem sul do Tejo, sem ter de recorrer necessariamente à rede que serve a cidade de Lisboa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esperamos que os Deputados e autarcas socialistas da região estejam connosco nesta luta e que não aconteça o que aconteceu aquando da luta contra as portagens do Oeste, que foi uma vitória da população e da Comissão Antiportagens, mas poderia ter sido uma maior vitória se alguns autarcas e Deputados socialistas não tivessem «mandado às urtigas» os interesses da população, pois quem mais traiu a população vai corar de vergonha quando lhe recordarmos o que fizeram e disseram a favor das portagens, nos termos propostos. Foi surpreendente a forma como se comportaram poucos dirigentes de associações empresariais, que não resistiram às pressões do Sr. Governador Civil e do Ministro João Cravinho, manifestando a maior falta de solidariedade para com a população da região.
Aliás, todos sabemos das pressões dos grupos económicos interessados na «Brisa Oeste», «negócio da China», como lhe chamou um Deputado, aqui, na Assembleia da República.
A construção do novo aeroporto na Ota foi utilizada quase como moeda de troca para as portagens do Oeste pelo Governo. Seria uma dupla afronta às populações que o Ministro Cravinho e o Governo viessem a dar o dito por não dito. Então, numa reunião em Leiria, o Sr. Ministro João Cravinho ameaçou a população e os autarcas daquela região que se estes não se calassem não iria construir o aeroporto na Ota, reafirmando o mesmo, aqui, por duas vezes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Assistimos recentemente a um conjunto de iniciativas de Deputados e autarcas socialistas que visam, de forma hábil, colocar a questão para discussão pública. Apesar de termos como certo que esta encenação não passa de uma forma de os socialistas se redimirem do seu comportamento no processo das portagens e de outros, não podemos deixar de manifestar vivamente a nossa satisfação por este arrependimento.
Na verdade, embora a grande maioria esteja de acordo de que não há melhor solução do que a da Ota, não tenho a certeza de que o Governo e o seu «super» Ministro João Cravinho venha a fazer esta escolha. Mas faço votos para que os «novos» defensores do aeroporto na Ota não mudem de opinião por qualquer ameaça ou promessa que o Sr. Ministro João Cravinho venha a fazer para justificar a localização noutro local. Tal a acontecer seria não apenas uma dupla afronta mas uma verdadeira falta à verdade e à justiça. Que todos estejamos unidos!
Mas, atenção, todos sabemos das movimentações de conhecidos - e ultimamente muito badalados - grupos económicos para que Ota seja preterida a favor de Rio Frio. Todos temos conhecimento do que os move. E também sabemos que este Governo socialista não sofre qualquer tipo de pressões, influências e favorecimentos junto dos grandes grupos económicos. Pelo menos, é o que tem dito!...
Vamos esperar para ver, acreditar e confirmar, desejando que o Sr. Ministro João Cravinho não diga. em Leiria, que é a favor do aeroporto na Ota e, em Setúbal, incentive a defesa em Rio Frio. Espero que o novo aeroporto não seja um aeroporto de altos voos para grupos económicos. É que os interesses do País e dos portugueses estão acima disso.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa o voto n.º 121/VII - De saudação pela realização e objectivos da Marcha Global contra o Trabalho Infantil, subscrito pelo PCP, e o voto n.º 122/VII - De congratulação pela deliberação do Conselho de Ministros da União Europeia que confere ao Porto o título de Capital da Cultura no ano 2001, subscrito pelo PS.

O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, certamente por lapso, V. Ex.ª terá apenas reparado em algumas assinaturas, porque o voto de congratulação, tal como é dado saber, foi assinado por Deputados do círculo eleitoral do Porto de todas as bancadas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu tinha obrigação de ter concluído isso mesmo sem ter lido as assinaturas. Peço desculpa.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço também a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para dizer que nos congratulamos com o facto de o PS ter aderido à iniciativa, mas a iniciativa é subscrita por outros grupos parlamentares, nomeadamente o do PCP.

O Sr. Presidente: - Fica feito o esclarecimento. Peço desculpa.
Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do voto de saudação.

A Sr.ª Secretária (Rosa Albernaz): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto n.º 121/VII é do seguinte teor:
O trabalho infantil constitui, às portas do século XXI e numa época de gigantesco desenvolvimento tecnológico, uma grave realidade que exige de todos os Estados e de toda a sociedade um decidido combate pelos direitos dos «filhos dos homens que nunca foram meninos».
A UNICEF e a OIT estimam em 250 milhões o número de crianças que, em todo o mundo, estão sujeitas a diversas formas intoleráveis de trabalho e exploração infantil. Em Portugal, a mancha real deste fenómeno é também acentuada. Não existindo números fidedignos sabe-se, de acordo com a Comissão Nacional de Combate ao Trabalho Infantil, «que se torna cada vez mais preocupante o fenómeno do abandono escolar que é, muitas vezes, o primeiro passo para uma situação de trabalho ilegal».
Sendo um fenómeno com expressões e razões económicas, sociais e culturais diversas e complexas, o seu alastramento tem estado associado ao aumento do desemprego, da precariedade das relações laborais, do trabalho clandestino e das dificuldades de sobrevivência de inúmeras famílias.

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A Marcha Global contra o Trabalho Infantil pretende constituir um grito universal de alerta e de protesto a favor dos direitos das crianças. A 86.8 Sessão da Conferência Internacional do Trabalho, a realizar em Genebra, está também centrada no combate infantil.
Neste quadro, a Assembleia da República de Portugal:
Recorda a Convenção sobre os Direitos das Crianças, adoptada pela ONU em 20 de Novembro de 1989, em particular o seu artigo 32.º: "Os Estados reconhecem o direito da criança ser protegida contra a exploração económica e de não ser obrigada a nenhum trabalho comportando riscos ou ser susceptível de comprometer a sua educação, de ser prejudicial à sua saúde ou ao seu desenvolvimento tísico, mental, espiritual, moral ou social. Os Estados tomarão as medidas legislativas, administrativas, sociais e educativas que assegurem a aplicação do presente artigo";
Saúda a realização e os objectivos da Marcha Global contra o Trabalho Infantil;
Exorta os Estados a realizar uma avaliação do trabalho infantil e a tornar públicos os dados estatísticos, entidades e empresas que exploram a força de trabalho infantil;
Apela aos Governos para que travem a crescente desregulamentação das relações de trabalho e para que proíbam o trabalho clandestino;
Apela aos Governos para que adoptem medidas de eliminação da pobreza e de apoio ao rendimento das famílias mais carenciadas, bem como medidas activas de integração social;
Propõe o lançamento de uma campanha internacional de educação e sensibilização da opinião pública contra o trabalho infantil e em defesa dos direitos das crianças.
A Assembleia da República encarrega a delegação da Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, presente, em Genebra, na 86.º Sessão dá Conferência Internacional do Trabalho, a transmitir este voto à OIT e à Marcha Global contra o Trabalho Infantil.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A leitura do voto, feito pela Mesa, é só por si elucidativa e dispensa comentários. Contudo, importa sempre sublinhar que não nos pode ser indiferente a dimensão e a gravidade da exploração do trabalho infantil, designadamente quando, às portas do século XXI, numa era de enorme desenvolvimento tecnológico, verificamos como este desenvolvimento não se reparte de igual modo ou, diria até, se reparte cada vez mais de forma desigual no mundo e entre grupos sociais.
Basta dizer que no país que tomou esta iniciativa como sua, na índia, se calcula em 90 milhões o número de crianças que são exploradas nos vários tipos de actividades económicas. Mesmo em Portugal, ainda h5 poucos dias, num seminário em Braga, que sublinhou o início das actividades da rede europeia anti-pobreza, esta questão também foi acentuada. E sabendo como sabemos que o alastramento do trabalho infantil tem causas complexas, sendo que uma delas tem a ver com a extrema pobreza das famílias e com a precariedade das relações laborais, importa também recordar que, nesse mesmo seminário, foi divulgado que, em Portugal, um em cada cinco portugueses vive abaixo do limiar da pobreza e que mais de um terço das famílias nesta situação consome apenas uma refeição por dia.
É deste quadro que se alimenta o trabalho infantil e é este quadro que todos nós temos obrigação de ajudar a combater e de contribuir para que se resolva.
A Marcha Global contra o Trabalho Infantil, que vai terminar no dia 2 de Junho, em Genebra, pretende ser nesse terreno um grito de alerta internacional sobre esta matéria e a OIT dedicou a sua próxima conferência a este tema, como foi dito no voto, com a presença de uma delegação deste Parlamento.
Pensamos, Sr: Presidente, que só nos prestigia e prestigia Portugal que a nossa delegação seja portadora desse voto, tanto à Marcha Global contra o Trabalho Infantil como à própria Conferência da OIT.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Loureiro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Às portas do século XXI, infelizmente, o trabalho infantil constitui uma triste e grave realidade que exige de todos nós, sem excepção, uma profunda reflexão.
Este fenómeno torna-se cada vez mais preocupante. Para além do precoce abandono escolar, existem razões sócio-económicas que devem ser ponderadas e às quais se torna urgente colocar um ponto final. Mas o que aconteceu nesta matéria foi, infelizmente, igual ao que aconteceu em muitas outras, ou seja, a constituição de mais um grupo de trabalho para estudar o problema em Portugal. Foram dois anos e meio de muitas palavras e nenhuma acção.
Nós nunca esquecemos a problemática do trabalho infantil e todos os aspectos complexos que este flagelo envolve, infelizmente mais um entre os muitos capítulos em que o sonho da "governação rosa" se tornou num grande pesadelo. As rosas da campanha eleitoral rapidamente se tornaram em espinhos da governação.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Olhe a cassette!

O Orador: - Assim, é conveniente, uma vez mais, aqui relembrarmos a promessa do Programa Eleitoral do Partido Socialista: "erradicação do trabalho infantil e a criação de um sistema de cruzamento de informações entre escolas e a Inspecção-Geral do Trabalho, que permita o acompanhamento dos jovens que interromperam a escolaridade obrigatória".
Promessas! Repito, promessas!
Podem contar com a nossa total colaboração para, todos juntos, ajudarmos a resolver este grave flagelo que afecta a sociedade portuguesa. Nesta matéria como em muitos casos, torna-se urgente e prioritário passar da teoria à prática. Por isso mesmo, nos associamos a este voto, na esperança de que ele possa ser a mola que faça despertar o Governo da letargia de promessas demagógicas mas de nenhuma acção concreta contra o flagelo do trabalho infantil.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Castanheira.

O Sr. Ricardo Castanheira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O trabalho infantil é, de facto, um fenómeno mundial que não tem fronteiras, relativamente ao qual não há números certos, isto é, estimam-se em cerca de 250 milhões de crianças, uma em cada quatro, aquelas que trabalham sem terem, no entanto, idade para o fazer. Não é um fenómeno único e exclusivo dos países subdesenvolvidos e por isso mesmo é um fenómeno que tam

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bém se verifica em Portugal. Não é um fenómeno recente, é um fenómeno antigo, é um fenómeno que tem décadas.
No entanto, em Portugal, de acordo com a Organização Internacional de Trabalho, há, aproximadamente, 63 000 crianças a trabalhar entre os 10 e os 14 anos. Ainda que existisse apenas uma, era motivo para preocupação e era motivo para este voto, obviamente, ter oportunidade e dignidade para aqui ser apresentado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Julgo que - e esse é o entendimento do Grupo Parlamentar do Partido Socialista - é importante assumir este fenómeno como uma realidade no nosso país, porque é a única forma de encontrar soluções para o poder ultrapassar e para lhe fazer face.
E verdade que há causas sociais decorrentes de baixos rendimentos familiares; é verdade que há causas económicas, também fruto não só dos baixos rendimentos familiares mas também do baixo nível de escolaridade e ainda dos índices elevados de analfabetismo no nosso país; é verdade também que há causas culturais envolvendo este mesmo fenómeno. Isto é, há ainda no nosso país zonas geográficas onde se entende que uma criança a trabalhar aos 10 anos é fruto e sintomático de um desenvolvimento e de um crescimento mais próspero para essa mesma criança.
Ora, no Grupo Parlamentar do Partido Socialista, ternos o entendimento de que este é um fenómeno complexo e por ser complexo obriga a que todos nós, todos - e com isto significa uma frente comum de batalha a este mesmo fenómeno -, quer parlamentares, quer não parlamentares, lhes façamos face.
Ao contrário do que o Sr. Deputado do PSD fez referência, o actual Governo tem tido uma preocupação clara nesta matéria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, os últimos números da Inspecção-Geral do Trabalho demonstram um claro aumento em relação aos casos detectados e também uma focalização da mesma Inspecção-Geral do Trabalho para este fenómeno. Por outro lado, há preocupação em articular este fenómeno com o rendimento mínimo garantido e, obviamente, dar à escola um papel de prevenção, que, porventura, no passado, não teve e que, para o futuro, se espera venha a ter com maior incidência.
Quero dizer também que, habitualmente, há sempre a preocupação de analisar este fenómeno com números, uma perspectiva puramente aritmética. Ora, nós vamos muito mais longe: quando uma criança trabalha, está a violar-se. clara e peremptoriamente, direitos fundamentais dessa mesma criança a estar na escola, a sonhar, a brincar, a participar, no fundo, na construção de si própria para, mais tarde, poder participar na construção da sociedade onde está integrada. Estes são direitos, para nós, fundamentais, direitos plasmados não só na nossa Constituição como em convenções das Nações Unidas.
O simples facto de, hoje, o Sr. Presidente da Assembleia da República ter recebido um conjunto de crianças que, infelizmente, no passado, trabalharam em idade tenra e serem, ao mesmo tempo, responsáveis por esta Marcha Global julgo que a esta Câmara deve dignificar e que o voto do PCP, como disse - e torno a repetir -, é oportuno, pelo que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não pode deixar de se associar a ele.
Por último, quero dizer que a Marcha Global contra o Trabalho Infantil é apenas um passo, de entre outros que são importantes dar. Há passos a dar no sentido da denúncia. no sentido do alerta da opinião pública nacional e internacional, no sentido do agravamento das coimas e das contra-ordenações em relação aos empresários, no sentido do combate à pobreza e à exclusão social.
Quero anunciar, ainda, que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, em breve, apresentará também nesta Câmara uma iniciativa legislativa no sentido de criminalizar a conduta de todos aqueles que recorrem ao trabalho infantil.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Julgo que o voto em discussão reclama de nós uma responsabilidade muito grande. Mais do que a acusação e a identificação clara de um problema a nível planetário, este voto é a acusação clara de uma sociedade que, cruelmente, não foi capaz de dar aos seus meninos o tempo e o espaço de o serem.
Urge, pois, mais do que somar palavras, tomar medidas para agir contra esta realidade que tem múltiplas causas, não tem uma só, tem múltiplas causas, cuja soma importa analisar: é a pobreza que existe em Portugal, são os baixos rendimentos das famílias portuguesas, é a escola que não é capaz de satisfazer e de integrar as crianças, são múltiplos problemas, designadamente também problemas culturais que ainda se colocam perante esta realidade.
Mas se esta realidade implica respostas imediatas no sentido de a combater, implica também uma outra concepção, outros valores e outras valias na forma de organizar a sociedade para que, mais do que reagir a um problema, sejamos capazes de o prevenir, de o evitar. É disso que se trata.
É perante esta acusação que o voto tem claramente implícita, ou seja, perante a responsabilidade de o poder político ser capaz de encontrar formas de repartir, diferentemente, a sua riqueza, de, diferentemente, dar à sociedade possibilidades de acesso, de fruição do seu tempo, de direito à felicidade, é perante tudo isto que a Assembleia da República deve assumir este voto, não só como uma declaração formal de condenação do trabalho infantil mas, também, como uma responsabilidade colectiva de modificar radicalmente as razões que estão na origem da sua existência.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva.

O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também nós queremos deixar expressa a nossa crítica e a nossa condenação por este flagelo, que é a exploração da mão-de-obra infantil. Se é verdade que, em Portugal, o trabalho infantil constitui um cancro, que reconhecemos só ser possível combater com o empenhamento de toda a comunidade nacional,...

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - ... não ignoramos as responsabilidades dos pais dessas crianças, mas, como ninguém, por certo, quererá o pior para os seus filhos, há indubitavelmente que identificar e solucionar as fortes razões de natureza social e económica que obrigam estes pais a lançar prematuramente os seus filhos no mundo do trabalho.

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Também é verdade que o trabalho infantil constitui um egoísmo social de falsos e poucos escrupulosos empresários. Seria caso para perguntar o que é que o Governo tem feito para combater este flagelo. Eu diria que, infelizmente, muito pouco! A Inspecção-Geral do Trabalho actua de uma forma muito tímida e os efeitos têm sido muito poucos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Eu diria que as crianças de hoje não perdoarão amanhã aqueles que, uma vez no governo, governam de costas voltadas, cegos, surdos é mudos a este problema, que é o da exploração da mão-de-obra infantil.
Termino, dizendo que, enquanto houver neste país uma criança que abandone precocemente a escola para ir engrossar esse mundo do trabalho, sem qualidade e que é cada vez mais explorado, o PP não calará a sua voz, terá sempre uma voz interventora na defesa das crianças.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do voto n.º 121/VII - De saudação pela realização e objectivos da Marcha Global contra o Trabalho Infantil, apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o voto será transmitido ao Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade e entregue à Delegação da Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, que se deslocará a Genebra, para que o entregue à 86.º Sessão da Conferência Internacional do Trabalho e dele dê conhecimento à OIT e à Marcha Global contra o Trabalho Infantil.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai agora proceder à leitura do voto n.º 122/VII - De congratulação pela deliberação do Conselho de Ministros da Cultura da União Europeia que confere ao Porto o título de Capital Europeia da Cultura no ano 2001, apresentado pelo Presidente da AR, PS, PSD, CDS-PP e PCP.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto n.º 122/VII, é do seguinte teor: Dos tempos áureos do fim da Idade Média aos alvores do fim do século XVIII e durante todo o século XIX o Porto marcou a actividade política financeira e cultural de Portugal e já no século XX, após o centralismo autista que obrigou a "cidade e o seu termo" à travessia do deserto, tem vindo a recuperar o papel que por inteiro lhe cabe entre as cidades europeias.
A deliberação do Conselho de Ministros da Cultura da União Europeia que confere ao Porto o título de Capital Cultural no ano de 2001 vem confirmar essa recuperação do orgulho de ser portuense, mas vem também sustentar que Portugal está no bom caminho. Prova-o - é bom e justo acentuar - a execução do grande empreendimento nacional que é a Expo 98, no ano em que Portugal integra por mérito próprio o grupo fundador da UEM.
Em 1994, Lisboa foi Capital Europeia da Cultura e ao usufruir desse estatuto teve a possibilidade de promover não só eventos que se multiplicaram na atracção de natureza cultural, mas que deixaram um lastro na sociedade que os pode viver, e ao mesmo tempo foi uma grande oportunidade para requalificar espaços e áreas da bela capital de Portugal.
Agora é a vez do Porto, "donde nasceu Portugal".
Aí, então, se terá oportunidade de mostrar mais ao mundo a literatura de Agustina e de Eugénio de Andrade, o cinema de Manuel Oliveira, a pintura de Júlio Resende, a arquitectura de Álvaro Siza Vieira e de tantas outras personalidades da nossa cultura.
A candidatura teve um desfecho que deve ser partilhado por todos nós.
Nestes termos, a Assembleia da República congratula-se com o facto e felicita, particularmente, o Presidente da Câmara do Porto que já obteve da UNESCO a classificação do casco portuense como património mundial e os vereadores do município, os agentes culturais e a população do Porto, que tem fundadas razões para exultar com esta decisão que é também uma felicitação a Portugal.
Os portugueses merecem esta distinção. Os portuenses estão mais felizes. Todos nos devemos sentir orgulhosos de sermos Portugal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de prosseguirmos os nossos trabalhos, tendo em conta a dificuldade de alguns grupos parlamentares em aguardar pelo período regimental das votações se este ocorrer apenas no fim dos trabalhos, lembro que passaremos ao período regimental das votações imediatamente a seguir à votação do voto n.º 122/VII.
Assim, agradeço que cada grupo parlamentar avise os seus Deputados deste facto.
Voltando ao debate sobre o voto ora em discussão, tem a palavra o Sr. Deputado José Saraiva, para uma intervenção.

O Sr. José Saraiva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O voto de congratulação, que esta Câmara certamente irá aprovar, traduz o orgulho que os Deputados eleitos pelo círculo eleitoral do Porto, e os outros Deputados também, certamente todos, têm pela circunstância de o Conselho de Ministros da Cultura da União Europeia ter hoje concedido a possibilidade, de o próximo século começar para nós, portuenses, de uma forma que esperamos que seja grandiosa.
Ao ser atribuída a possibilidade de o Porto ser capital europeia da cultura em 2001 iniciamos hoje, todos nós, todos os portugueses certamente, uma odisseia que nos faz rememorar o orgulho, que temos vindo a recuperar nos últimos anos, que fez já com que o Porto fosse considerado pela UNESCO - o velho Porto, o de Garrett, cujo centenário comemoraremos no próximo ano - património mundial.
Agora, iremos partilhar com outra cidade, com a qual, no passado, tivemos fortes relações comerciais, a aventura de também qualificar alguns espaços, atrair alguns eventos de natureza cultural e propiciar a todos aqueles que demandarem ao Porto e aos portuenses também a possibilidade de fruírem de alguns eventos, que certamente acabarão por traduzir-se na melhoria das suas interpretações da vida.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como socialista, como Deputado do PS, não posso deixar aqui de relevar o importante papel que os autarcas tiveram nesta candidatura, muito trabalhosa, para a qual certamente o Presidente da Câmara Municipal, e meu particular amigo, Fernando Gomes trabalhou, mas não gostaria de deixar de referir o esforço diplomático dó Ministro da Cultura, Dr. Manuel Maria Carrilho, e a persuasão que teve para conseguir que todos os outros se colocassem de acordo com a nossa vontade. Este é um triunfo do Governo, antes de mais, mas será um triunfo do Porto, certamente, e de todos nós, no final.

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Também gostaria de agradecer aos Deputados dos outros partidos que muito amavelmente se associaram a este voto, porque este acontecimento neste ano, em que todos estamos felizes por acontecimentos que, de um modo ou de outro, vêm enriquecer o nosso património colectivo comum, vem marcar decisivamente - esperamos que sim e para nós, do Porto, certamente que sim - o início do novo século.
Creiam, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que este orgulho de ser portuense se traduz, muitas vezes, de formas nem sempre compreensíveis por todos. Neste momento, estou certo de que VV. Ex.as, os outros que não nasceram nem vivem no Porto, compreendem as fundadas razões que temos para o enaltecermos e vincarmos, e para que esta Assembleia da República assinale devidamente a possibilidade que nos foi conferida, depois de muito trabalho.
Uma palavra final para dizer que também gostaria de associar a esta congratulação a Vereadora da Cultura da Câmara Municipal do Porto, Dr.ª Manuela de Melo, e ó Professor Álvaro Domingos, que foi o encarregado do dossier que apresentámos ao Conselho de Ministros da Cultura da União Europeia e que acabou por merecer o apoio dos outros Estados membros.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro da Vinha Cosia:

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Peço a palavra para, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, em nome de todos os Deputados do PSD eleitos pelo círculo eleitoral do Porto e, obviamente, também em meu nome pessoal, nos associarmos a este voto de congratulação por este importante acontecimento, aliás, já esperado, mas digno do nosso reconhecimento e da nossa congratulação.
É de facto motivo de orgulho e de satisfação, pela cidade e pela sua história, pelo reconhecimento da importância da cidade do Porto e da sua história, aquilo que hoje teve lugar com esta decisão. Por isso, evidentemente, todos nós, Deputados nesta Câmara, e muito em particular os Deputados do Porto, estaremos com certeza orgulhosos e satisfeitos com essa decisão, até porque, para além da importância do reconhecimento do papel do Porto e da sua história, este acontecimento pode ser um importante motor de desenvolvimento para a cidade e para a Área Metropolitana do Porto. Esperamos sinceramente que assim seja, sob pena de estarmos a perder e a adiar mais uma oportunidade.
O PSD já hoje, pela voz do seu presidente, o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, teve ocasião de anunciar que está disponível para elencar uma série de necessidades que importa serem supridas, para as quais importa que o Governo encontre os meios de financiamento, e que irá, muito brevemente, apresentar este mesmo elenco de investimentos públicos que terão necessariamente de ser feitos na cidade do Porto e lia sua Área Metropolitana como única forma de conseguirmos potenciar esta importante decisão, que só terá de facto importância na vida das pessoas se se assumir como um motor de desenvolvimento, como catalisador do investimento que tanto tem fugido à cidade do Porto e à sua área metropolitana.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, permitam-me que, socorrendo-me aqui daquele ditado popular que diz que "gato escaldado de água fria tem medo", faça aqui um apelo no sentido de que se resista à tentação de pessoalizar este evento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se não se resistir a essa tentação, correremos o risco de que o Porto Capital da Cultura venha a ter o mesmo destino que teve o metropolitano da cidade do Porto. Isto é, que se façam duas ou três exposições de cartão, à porta de um qualquer edifício público, sem que, disso a cidade e as suas gentes venham a beneficiar coisíssima nenhuma.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, em primeiro lugar, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, quero saudar a população do Porto e as suas autoridades, desde logo, a sua Câmara e todos os autarcas, pelo facto de o Porto ser uma das capitais europeias da cultura no ano 2001.
Creio que isso é importante para o .Porto porque esta cidade está numa região que merece, de todos nós, um olhar mais atento do que aquele que lhe tem sido dado.
Sei que, para muitos que vivem na área de Lisboa, muitas vezes, parecem excessivas as afirmações que vêm do norte de que é discriminado. Porém, creio que é prudente compreender que o norte se pode sentir discriminado e é importante que a acção política geral promova outras regiões do país, incluindo o norte. É importante não só investir-se como também dar-se capacidade a essas outras regiões, incluindo o Porto, para se tornarem pólos de desenvolvimento do nosso país.
Como disse o Sr. Deputado José Saraiva, associámo-nos ao voto subscrito pelo Partido Socialista - o que num ou noutro ponto sé nota, pela sua redacção - porque este era o momento de expressarmos em conjunto a nossa satisfação.

A Sr.ª Maria Celeste Correia ( PS): - Muito bem!

O Orador: - Todavia, quando, como se faz no voto do Partido Socialista, se invocam alguns nomes, corre-se sempre o risco de esquecer outros. Quem invocar escritores como Agustina e Eugénio de Andrade pode esquecer, por exemplo, Mário Cláudio. Quem invoca um arquitecto como Sisa Vieira pode esquecer Alcino Soutinho ou Fernando Távora, que são grandes arquitectos também. Quem fala de Júlio Resende pode estar a esquecer José Rodrigues.

O Sr. José Magalhães. - E muitos outros!

O Orador: - Quem fala de muitas artes, pode esquecer, por exemplo, a música e um intérprete como Burmester ou um criador e intérprete - por que não dizê-lo aqui - como o Pedro Abrunhosa, que tão bem caracteriza as gentes do norte.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Porto da cultura não há de ser só 0 Porto de uma forma de cultura, tem de ser também a afirmação da cultura popular, em todas as suas vertentes. Por isso, à gente e à Câmara do Porto, desejo que a realização de 2001 seja devidamente apoiada, nomeadamente em termos financeiros, para que possa ser uma grande expres

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são cultural não só do norte mas do país que somos, na expressão nortenha.

Aplausos do PCP e de alguns Deputados do PS.

O Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tomando um bocadinho a linha do Sr. Deputado João Amaral, gostaria de dizer que, talvez, enquanto Deputados eleitos pelo círculo eleitoral do Porto, estejamos aqui a fazer, agora, não só um mero voto de congratulação, mas um voto de congratulação a um Porto que sentimos não contra o resto do país, nunca contra o resto do país, como poderiam fazer lembrar declarações recentes de pessoas com muita responsabilidade no poder político da cidade do Porto.
Queremos que esta vitória da cidade do Porto seja uma vitória de Portugal, o que só poderá acontecer se ela for acompanhada da mesma solidariedade com que todo o País interpretou a Expo 98, em Lisboa, ou seja, como uma vitória de Portugal.
Se, efectivamente, durante 5 anos, este país teve orçamentos generosos, bons, justos,...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Tão bons que vocês deixaram passar alguns!

O Orador: - ... para Lisboa e Vale do Tejo, Srs. Deputados, está agora na altura de VV. Ex.as, do vosso Governo e da vossa bancada mostrarem que é preciso também essa discriminação solidária, positiva, porque o Porto, em 2001, vai ter de mostrar, não só à sua região mas ao País e à Europa, que é também capaz de fazer um grande evento.
E queria dizer mais, Srs. Deputados: não tentem - porque seria condená-la ao fracasso e ao insucesso - transformar esta vitória, que é de uma cidade, de uma região e de um país, na vã glória pessoal de alguém, porque senão, infelizmente, pela grande vaidade de um só, pode condenar-se ao degredo a justa aspiração de muitos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não sendo eleita pelo distrito do Porto como os outros Deputados que falaram, sou eleita pela Nação...

O Sr. Silvio Rui Cervan ( CDS/PP): - Muito bem!

A Oradora: e o Porto é seguramente um património nacional.

Vozes do PSD: - Muito bem! Nós também somos eleitos pela Nação!

A Oradora: - Por isso, Srs. Deputados, penso que ninguém pode ficar indiferente àquilo que é a importância e a honra de sabermos que a segunda cidade deste país, a mais importante cidade do norte do país, vai ter a grande oportunidade de ter uma realização cultural que promova, do ponto de vista nacional e internacional, aquele que é o grande e diverso património cultural que em si em seu torno se gera constantemente. Julgo que é esse facto que nos deve, hoje, unir e fazer congratularmo-nos
Não se trata, seguramente, só de uma vitória, de uma alegria para os munícipes do Porto. É, sobretudo, o reconhecimento da importância do Porto, das suas gentes, da sua história. É isso que, em nosso entendimento, este voto significa. Este evento é importante, do ponto de vista da coesão nacional e da compreensão da riqueza e diversidade que o País encerra, pelo que julgo que importa associar a este evento os meios financeiros necessários para que ele tenha a importância e a expressão que, é nossa convicção, todos, de norte a sul do país, desejamos.

Vozes de Os Verdes, do PS e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como antigo Deputado durante dois mandatos pelo círculo do Porto e como admirador da cidade do Porto, também me congratulo pelos mesmos motivos realçados pelos Srs. Deputados.

Aplausos do PSD e do PCP.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação.

Submetido à votarão, foi aprovado por unanimidade.

Aplausos gerais.

O voto será transmitido, como é natural, ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, endereçado ao Sr. Ministro da Cultura, ao Sr. Presidente da Câmara Municipal do Porto, ao Sr. Presidente da Assembleia Municipal do Porto e ao Sr. Governador Civil do Distrito do Porto.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, na sequência desta minha interpelação, faço também uma pergunta e um pedido a V. Ex.ª.
Li ontem, na comunicação social, que o Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos dirigiu uma carta a V. Ex.ª produzindo um veemente protesto contra a aprovação recente pela Assembleia da República de uma disposição legal que permite a inscrição de pessoas sem qualificações como técnicos oficiais de contas.
A notícia foi feita num sentido que envolve toda a Câmara. Ora, há um grupo parlamentar e alguns Deputados que não estão, naturalmente, associados àquilo que eu, pessoalmente, considero uma monstruosidade. Portanto, pergunto a V. Ex.ª se recebeu essa carta e, no caso de a ter recebido, pedia-lhe o favor de me dar cópia - independentemente de outro destino que deseje dar a essa missiva -, uma vez que eu próprio pretendo tomar uma posição em relação ao assunto.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Vou começar a fazer interpelações diárias sobre a correspondência do Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não costumo fazer segredo das coisas que recebo. Receberá, com certeza, cópia dessa carta, logo que eu tenha conhecimento dela, como é evidente.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia, pelo que vamos entrar no período da ordem do dia.

Eram 18 horas e 40 minutos.

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ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder às votações regimentais, começando por votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 113/VII - Estatuto do Ministério Público.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Esta proposta de lei baixa à 1 .ª Comissão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, quero informar a Mesa de que o CDS-PP apresentará uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado. Passamos à proposta de lei n.º 157/VII - Altera o Código do Processo Penal.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Esta proposta de lei baixa também à 1.ª Comissão.
O Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan informa a Mesa de que irá igualmente entregar declaração de voto.
Srs. Deputados, vamos agora votar um requerimento, apresentado pelo PSD e CDS-PP, no sentido de que se libere a baixa à 10.º Comissão, sem votação, da proposta de lei n.º 167/VII - Autoriza o Governo a alterar o regime de contra-ordenações em matéria de pesca marítima e culturas marinhas, constante do Decreto-Lei n.º 278/87, de 7 de Julho, com as alterações que lhe foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 218/91, de 17 de Junho.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação deste requerimento.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Assim sendo, vamos proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 167/VII.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan informa a Mesa de que irá entregar igualmente uma declaração de voto.
Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento, subscrito por Deputados do PS, solicitando que, nos termos legais e regimentais, a proposta de lei n.º 167/VII baixe à Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas. Como sabem, não é normal que os pedidos de autorização legislativa baixem às comissões, mas, excepcionalmente e quando tal se justifique, podem baixar, pelo que vamos votar este requerimento.
Vamos proceder à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Esta proposta de lei baixa assim à 10.º Comissão.
Srs. Deputados, vamos passar agora à votação global de uma proposta de resolução, com o n.º 90/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção estabelecida com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativa à Extradição entre os Estados membros da União Europeia. Vamos proceder à votação.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos agora, também em votação global, votar a proposta de resolução n.º 99/VII - Aprova, para adesão, as emendas ao anexo à Convenção Internacional sobre Normas de Formação, de Certificação e de Serviço de Quartos para os Marítimos, 1978, e ao Código de Formação, de Certificação e de Serviço de Quartos para os Marítimos (STCW), adoptados nas conferências de Partes que teve lugar de 26 de Junho a 7 de Julho de 1995 em Londres.
Vamos, proceder à votação.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, temos agora dois relatórios e pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, a cuja leitura o Sr. Secretário da Mesa vai proceder.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Fafe, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer com o seguinte teor: "face ao exposto e perante a inequívoca disponibilidade manifestada pelo Sr. Deputado Laurentino José Monteiro Castro Dias, deverá a Assembleia da República levantar a sua imunidade parlamentar a fim de prosseguir a audiência de discussão e julgamento no âmbito do processo em que é arguido e que corre os seus termos no 2 º Juízo do Tribunal Judicial de Fafe".

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está à discussão. Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, solicito apenas um pequeno compasso de espera; não tínhamos conhecimento de que esta solicitação tivesse passado pela Comissão, pelo que estamos a ponderar.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, o pedido do tribunal foi apreciado na Comissão e o Sr. Deputado em causa foi ouvido. A matéria foi discutida na Comissão, a qual se inclinou no sentido que foi lido pelo Sr. Secretário da Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente, gostaria de propor a V. Ex.ª, nos termos regimentais, que a votação desta questão passasse para a próxima semana, a fim de podermos analisar mais profundamente esta caso.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem! Muito avisado!

O Sr. Presidente: - Se houver consenso nesse sentido, assim se fará.

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Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, queria interpelar a Mesa no sentido de solicitar ao Sr. Presidente que nos informasse, caso seja possível, sobre qual a inclinação da 1.ª Comissão, porque gostaríamos de saber se houve votação ou não e qual foi o resultado da votação deste parecer.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o resultado da votação deste parecer é aquele que consta do próprio parecer: no sentido de que deve ser levantada a imunidade parlamentar, com a concordância do próprio Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, de uma forma muito breve, gostaria de dizer apenas que é ao Plenário, como é óbvio e regimental, que incumbe tomar a decisão; a mim, incumbiu-me, naquilo a que o meu sentir pessoal obrigava e exigia, declarar, de forma muito clara, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias que a minha vontade inequívoca, como foi dito pelo Sr. Secretário da Mesa, é aceder à solicitação que foi feita, por ofício, à Assembleia da República. Foi isso que eu disse, pessoalmente. Agora, incumbirá ao Plenário tomar essa decisão.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Acácio Barreiros informa a Mesa de que mantém a sua proposta no sentido de que esta votação seja adiada para a próxima reunião. Dado que ninguém se opõe, assim será feito.
Tem a palavra o Sr. Secretário da Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal do Trabalho de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Cabrita Neto (PSD) a prestar depoimento, por escrito, querendo, na qualidade de testemunha, em processo que se encontra pendente naquele tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Dado que não há inscrições, vamos proceder à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos dar início ao debate relativo ao inquérito parlamentar n.º 8/VII - Apreciação de actos dos governos do PS e do PSI) envolvendo o Estado e grupos económicos (PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

Pausa.

Srs. Deputados, agradeço que façam o silêncio necessário para que o Sr. Deputado Octávio Teixeira possa falar e ser ouvido. Agradeço igualmente que as migrações se façam um pouco mais depressa.

Risos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o projecto de inquérito parlamentar apresentado pelo grupo parlamentar do PCP insere-se na posição coerente - que, desde sempre, assumimos - de defesa da subordinação do poder económico ao poder político, da exigência de total transparência nas relações entre o Estado e o poder económico e de repúdio de qualquer promiscuidade entre a governação do País e os interesses particulares de quaisquer grupos económicos.
Assumimos essa postura durante os governos do PSD, nomeadamente no que respeita à condução do processo de privatizações, fazemo-lo com o actual Governo do PS, como o faremos com qualquer outro governo no futuro, porque o que nos motiva são os princípios e não os nomes dos grupos económicos ou a coloração política dos governos.
Não usamos tácticas "camaleónicas" de mudança de posição face às conjunturas governativas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A seriedade e transparência de processos é exigível a todos, principalmente quando estão em causa negócios.
Somos claramente contrários aos favorecimentos ilegítimos a grupos económicos, aos apoios encobertos ou dissimulados e a quaisquer actos ou omissões discricionários que visem beneficiar A, B ou C.
Um ditado popular diz que "ou comem todos, ou não come nenhum". Para nós, e no âmbito da eventual imoralidade nos negócios entre o Estado e os grupos económicos, não há alternativa, pura e simplesmente, nenhum deve comer!
Surgiram recentemente casos de decisões e colaborações, envolvendo o Governo, empresas de capitais públicos e grupos económicos, que suscitam dúvidas do ponto de vista da sua transparência e moralidade.
Pela parte do PCP, não há a mínima hesitação: as dúvidas são legítimas, a Assembleia da República deve exercer o seu dever de fiscalização política.
Mas, repito: a moralidade e a transparência são exigíveis a todos os governos.
Por isso, o Grupo Parlamentar do PCP entende que o inquérito parlamentar deve ser alargado a casos semelhantes ocorridos durante os governos do PSD.
Para repartir as culpas entre o PS e o PSD? Não! O que entendemos, mais uma vez em respeito dos princípios que defendemos, é que deveria ter sido feita a idêntica fiscalização na altura dos governos do PSD, tal como, por mais de uma vez, o PCP o propôs, mas que sempre o PSD, dispondo da maioria absoluta nesta Câmara, o impediu. Impedimento pela força numérica, que o PS não se dispôs, então, a ultrapassar, juntando às nossas a5 suas assinaturas para impormos um inquérito parlamentar potestativo.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Ora, agora, e só agora, parecem estar criadas as condições para que esses pedidos de inquérito parlamentar possam ser viabilizados. E as, razões que antes fundamentaram a sua apresentação, porque assentes em princípios, não caducaram; por isso, esta iniciativa do PCP.
No que se refere ao âmbito dos factos ocorridos durante os governos do PSD, que, do nosso ponto de vista, suscitam fundadas dúvidas quanto à concessão de benesses a grupos económicos, e por isso justificariam a fiscalização política por parte da Assembleia, fomos obrigados a fazer uma selecção, porque fiscalizar todos os casos seria prolongar excessivamente o tempo necessário para a comissão de inquérito levar até ao fim o seu mandato.
Optámos por usar critérios objectivos para essa selecção. Por um lado, tivemos em consideração que o Presi

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dente do Grupo SONAE, em "comunicado pessoal", garantiu que, quanto a prestar declarações na comissão de inquérito, "será com todo o gosto que o farei em geral e com particular deleite se quisermos comparar os vários negócios ou negociatas de tal período, e também o comportamento dos vários actores nas privatizações do Totta, JN/DN, Espírito Santo, OPA BCP/BPA (...)". Muito bem! São casos paradigmáticos e têm a vantagem de, à partida, haver quem, conhecedor directo dos meandros dos mesmos, se proponha cooperar empenhadamente com a comissão de inquérito.
E acrescentámos os casos da Tranquilidade e da Mundial-Confiança, porque, na altura da sua privatização, os próprios beneficiados fizeram declarações sobre a sub-avaliação efectiva dos respectivos preços de venda. Se foram os próprios interessados a declará-lo, também aqui poderão estar facilitados os trabalhos da comissão de inquérito.
É evidente que, pela nossa parte, não haverá oposição a que algum Sr. Deputado, do PP, do PS ou do PSD, que queira acrescentar mais algum caso a esta lista que propomos o possa fazer, sendo, de facto, um caso que suscite dúvidas, e teremos todo o gosto em aprovar também esses aditamentos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A proposta é para todos os grupos parlamentares que a queiram utilizar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Resta uma questão de natureza processual e de eficiência, que pode ser suscitada.
Porque o PSD não concordou em que os dois pedidos de inquérito parlamentar fossem fundidos num só, haveria vantagem em que não houvesse a funcionar em simultâneo duas comissões de inquérito com sobreposição parcial de mandato.
Pela parte do PCP, estamos disponíveis para encontrar, agora, uma solução que o evite.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E colocamos, desde já, uma hipótese viável: que a comissão criada para apreciar o inquérito apresentado pelo PSD seja, ela mesma, mandatada para realizar, igual e simultaneamente, o inquérito parlamentar requerido pelo PCP.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em última análise, se houver grandes objecções a esta via, que nos parece a mais natural, é evidente que poderemos considerar a hipótese de a comissão para este pedido de inquérito parlamentar apresentado pelo PCP poder ser constituída pelos mesmos Deputados que constituem a outra comissão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Naturalmente que não nos passa pela cabeça a hipótese de o PSD e o PS poderem, pelos seus votos, rejeitar este inquérito parlamentar. A eles, como a nós, certamente que a única razão que os move nesta matéria é fiscalizar tudo o que houver para ser clarificado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para ume intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A posição do PSD relativamente à exigência de transparência nas relações entre o Estado e os interesses privados é por todos conhecida. Nós - e desde já deixava ficar aqui claro, até para sossegar, eventualmente, o espírito do Sr. Deputado Octávio Teixeira estamos, obviamente, de acordo com qualquer interesse em realizar um inquérito às relações do Estado com interesses privados, no presente ou no passado. Não haja dúvidas sobre isso! Portanto, desde já, o Sr. Deputado pode afastar os seus receios relativamente a uma eventual oposição do PSD ao pedido de inquérito.
Quero, no entanto, assinalar aqui, nesta minha intervenção, que, em qualquer circunstância, é curioso que só depois de o PSD ter fundadamente suscitado, perante o País, dúvidas e legítimas suspeitas sobre as estranhas parcerias e cumplicidades a que hoje assistimos entre o actual Governo e interesses privados é que surge esta iniciativa.
Aliás, para nós, é também curioso que esta iniciativa não tenha partido directamente do PS mas, sim, de uma outra bancada e, ainda por cima, que esta iniciativa não contenha nenhuma questão nova relativamente àquelas que são as relações duvidosas e as parcerias estranhas entre o actual Governo e os interesses privados. Cada um que tire as conclusões, mas, para nós, é curioso! Cada um tirará as suas conclusões!... Digamos que são coincidências, que registamos!
Quanto ao inquérito em si, reafirmo aquilo por onde comecei: a nossa total abertura ao interesse em investigar dúvidas que possam existir no espírito de alguns Srs. Deputados relativamente a relações entre o Estado e o poder económico, entre o Estado e interesses privados.
Colocada esta questão, a que chamaria a questão política, passaria a uma questão de natureza jurídica mas que é fundamental, para a qual, de resto, chamava a atenção e fazia um apelo ao próprio Sr. Presidente da Assembleia da República, porque é evidente que é ilegal parte daquilo que o PCP está a propor neste seu inquérito parlamentar, uma vez que existe no Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares uma norma expressa contra a repetição do objecto dos inquéritos parlamentares.
Ao olharmos para esta iniciativa parlamentar do PCP, constatamos que, se ela contém sete pontos para o inquérito, cinco deles são a cópia fiel daquilo que já foi aprovado nesta Câmara para o inquérito parlamentar a realizar por iniciativa do PSD.

Vozes do PS: - Aprovado nesta Câmara?!

O Orador: - Aprovado nesta Câmara, sim, Srs. Deputados, porque, como sabem, é um direito potestativo que o Grupo Parlamentar do PSD tem, e, que eu saiba, o Grupo Parlamentar do PSD faz parte desta Câmara! Portanto, se é um direito potestativo, é algo que o Parlamento tem de realizar.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - A expressão não foi feliz!

O Orador: - Os Srs. Deputados não gostam do termo "aprovado", mas o inquérito vai ter lugar, está assumido por esta Câmara, nesta sessão legislativa e a repetição do objecto é expressamente vedada pela lei. Assim, e apenas por essa razão, chamava a atenção do PCP e do Sr. Presidente de que este pedido de inquérito tem de ser revisto no seu objecto, passando a comissão de inquérito a ser exclusivamente aos processos de privatização ocorridos durante os governos do PSD.

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É a tal coincidência de que eu falava há pouco. Porém, desde já, deixamos claro que não temos quaisquer problemas e daremos o nosso aval, não nos oporemos minimamente, como o Sr. Deputado disse, ao inquérito a essas privatizações realizadas durante o governo do PSD, que o PCP quis, desde já, colocar no seu projecto de resolução, como a eventuais outras privatizações ocorridas nessa altura e que, durante esse debate, respondendo ao apelo que o Sr. Deputado Octávio .Teixeira fez, qualquer outra bancada venha a colocar.
Não colocaremos qualquer obstáculo e estaremos de acordo, mas chamava apenas a atenção da Mesa de que esta comissão de inquérito será para apreciação de actos do governo do PSD envolvendo o Estado e grupos económicos em processos de privatização.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, é tarde para o Presidente da Mesa não aceitar o processo de inquérito, porque já o aceitou.

O Sr. Luís Marques. Guedes (PSD): - Tem é de ser corrigido!

O Sr. Presidente: - Mas devo dizer-lhe que noutros casos anteriores, envolvendo, inclusivamente, interesses paralelos do seu partido, me pronunciei no sentido de que, desde que não haja coincidência integral entre os objectos dos dois inquéritos, são possíveis os dois. Esse entendimento foi tido por mim num caso que, digamos, nesse momento, era favorável ao PSD; por isso, pensei que também neste caso não poderia deixar de tomar a mesma atitude e, portanto, admiti-o.
Evidentemente, que a comissão pode fazer o que entender. Pode limitar o objecto, até porque ele é comum, e, portanto, se aceitarem o ponto de vista do Sr. Deputado Octávio Teixeira de que seja a mesma comissão a acumular os dois objectos - parte comum e parte não comum - ou que sejam os mesmos Deputados em duas comissões, penso que o problema poderá ser ultrapassado.
Eu é que já não posso fazer mais nada, como calcula, porque já o admiti!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, longe de mim pensar fazer uma crítica ao Sr. Presidente por o ter admitido!

O Sr. Presidente: - Tem todo o direito de a fazer! Não me susceptibilizo nada com isso!

O Orador: - Mas quero dizer-lhe que longe de mim estar a fazer uma crítica ao Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Muito obrigado!

O Orador: - Apelei apenas à atenção da Câmara, e também do Sr. Presidente, para o tacto de que, como o Sr. Presidente sabe, diferentemente do que ocorreu na questão dó inquérito suscitado pelo PSD, aí estávamos perante um direito potestativo e, portanto, não restava 'outra, posição legal e regimental à Câmara; neste caso estamos perante uma questão, que o Sr. Presidente admitiu, perfeitamente dentro das suas competências. No entanto, chamo a atenção de que a Câmara não o pode aprovar, porque a lei diz expressamente que "durante o período de cada sessão legislativa não é permitida a constituição de novas comissões de inquérito que tenham o mesmo objecto que dera lugar à constituição de outra comissão (...)".
Por outro lado, permitia-me também referir que, nesta proposta que estamos agora a analisar, o PCP diz expressamente, na página 4, "que integra no seu objecto as situações e casos que o PSD pretende ver clarificados". Portanto, há objectivamente, diria até assumidamente pelos próprios autores, uma identidade de objectos, identidade essa que é expressamente proibida pela lei. Por isso, nessa parte, a Assembleia, do nosso ponto de vista, não pode minimamente aprovar a constituição da comissão de inquérito. Poderá aprovar a constituição da comissão de inquérito relativamente a todas as matérias que têm a ver com as privatizações ocorridas durante os governos do PSD, ou seja, aquelas que estão para além do objecto da comissão de inquérito j5 constituída por iniciativa do PSD, porque é isso que a lei diz.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é um problema de interpretação da lei, não vamos agora debater isto. Este assunto vai estar em sede de Comissão, se o inquérito for aprovado, como, provavelmente, será... É um problema de interpretação, porque, quando diz "o mesmo objecto", resta saber se é o mesmo na totalidade ou o mesmo em parte. Estamos perante uma divergência, se o problema é esse!
Se a simultaneidade é apenas parcial... Suponhamos que era uma palavra ou uma vírgula, não chegava, com certeza; se fosse apenas uma alínea, talvez também não chegasse; aqui é mais do que uma alínea, são muitas alíneas. Chegará!? O problema é sempre do todo ou da parte, é um, problema de interpretação.
E um assunto que está nas vossas mãos, porque cada um votará ou não o inquérito tomando também em conta a forma como ele vem formulado, como óbvio. Uma das maneiras de impedir isso que o Sr. Deputado receia é votarem contra o inquérito e não haver este inquérito. Se ele for votado favoravelmente, só em sede de Comissão é que o problema pode ser elucidado, interpretando o que é que a lei quer dizer: se é coincidência no todo ou em parte, se é totalmente o mesmo ou em parte e em que parte. Bastará haver uma qualquer parte comum para o inviabilizar? Será necessária uma coincidência quase total para o inviabilizar? É um problema de interpretação. O todo ou a parte é que é a questão. Mas quando em sede de Comissão, ela fará como entender! Eu é que já não posso fazer nada, embora seja sensível aos seus argumentos, como é óbvio!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente. Sr. Deputado Luís Marques Guedes, quanto à curiosidade de só depois de o PSD ter anunciado o seu projecto de inquérito é que o PCP apresentou o seu, devo dizer que não há que ter curiosidade - já expliquei isso várias vezes e ainda Irá pouco o fiz -, pois só nessa altura, quando 0 PSD se mostrou disposto e disponível a fazer inquéritos parlamentares sobre a transparência nos negócios entre o Estado e os grupos económicos, é que vi que, afinal, havia uma nova. posição do PSD e, por isso, estavam cria

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das as condições para podermos avançar com um inquérito parlamentar, que, antes, sempre foi recusado pelo PSD. Não há qualquer curiosidade, a não ser isto, trata-se de uma situação factual.
Sobre a questão de não apresentarmos novas propostas para casos que suscitem dúvidas respeitantes ao Governo do PS, assumimos expressamente as questões suscitadas pelo PSD porque a nossa ideia, como ainda há pouco referi, era poder juntar os dois pedidos de inquérito para serem abrangidas todas as situações que se colocam nesta matéria. O PSD não o quis e foi essa a razão por que o apresentámos deste modo. Mas, peia nossa parte, estaremos disponíveis e se VV. Ex.as quiserem acrescentar outras situações na primeira parte do nosso pedido de inquérito, apresentem-nas" para que as possamos incluir, desde que haja dúvidas fundadas. E o mesmo se diga em relação à questão das privatizações, quer na altura do governo do PSD, quer na altura do Governo do PS.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Se o PSD quiser propor que no nosso inquérito fiquem mais processos de privatização, quer na altura em que os senhores eram governo, quer na altura em que o PS é Governo, pela nossa parte estamos disponíveis para isso.
A última questão, Sr. Presidente, tem a ver com o problema que eu próprio suscitei e que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes agora colocou. Referi que poderia haver algum problema processual ou de eficiência na realização dos trabalhos da comissão ou comissões de inquérito. Não me parece é que a argumentação aduzida pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes, pelo PSD, seja sustentável, na medida em que o projecto de inquérito parlamentar apresentado pelo PCP não se identifica com o do PSD, embora integre as quatro ou cinco questões que o PSD colocou no seu inquérito parlamentar.
Mas, por outro lado, também lhe digo, Sr. Deputado Luís Marques Guedes: se o PSD quer questionar a admissibilidade deste requerimento de inquérito parlamentar, aqui a curiosidade será minha, porque só passados cerca de 15 ou 16 dias é que o PSD se lembrou disso, não o tendo feito em tempo oportuno para impugnar a admissibilidade pela Mesa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, quanto à questão da minha curiosidade, o Sr. Deputado não leve a mal, mas, de facto, fiquei curioso porque achei, e continuo a achar, que é uma coincidência assaz curiosa e até queria lembrar-lhe o seguinte: não sabia tão-pouco que o PCP - e, agora, a minha curiosidade aumentou pautava as suas actuações por aquele que era o entendimento do PSD relativamente a quaisquer assuntos.
O que eu sei é que, desde o início desta Legislatura, tendo o PSD perdido a maioria nas últimas eleições, o PCP tinha objectivamente condições de maioria para aprovar os inquéritos que quisesse e nunca o fez; foi só depois de o PSD tomar a iniciativa que se lembrou de o fazer.
Quanto à questão essencial, a segunda questão que me colocou, de o Sr. Deputado não estar convencido de que pode haver um problema processual ou de eficiência, ó Sr. Deputado, com toda a franqueza, é uma questão de legalidade! Eu li a lei... e o Sr. Deputado também sabe ler!... E a lei é clarinha como água: "Durante o período de cada sessão legislativa não é permitida a constituição de novas comissões de inquérito que tenham o mesmo objecto (...)n - é tão simples como isto! E o PSD, ao abrigo de um direito que lhe assiste regimentalmente, já constituiu uma comissão de inquérito que tem por objecto a actuação do Governo nos seguintes casos: a Torralta, a participação do IPE no capital da Companhia Real de Distribuição, a atribuição da terceira rede de telemóveis, a questão do autódromo do Estoril e a questão da nomeação inopinada de gestores e as suas substituições em empresas públicas, como a EDP, a Transgás e a Portucel. Entretanto, o PCP propõe, no mesmo sentido: a Torralta, a participação do IPE no capital da Companhia Real de Distribuição, a atribuição da terceira rede de telemóveis, a dação em pagamento das dívidas da Grã-Pará ao Estado e a substituição de gestores das empresas públicas EDP, Transgás e Portucel.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - E mais?!...

O Orador: - Se isto não é um problema de legalidade...! Ó Sr. Deputado, com toda a franqueza, é evidente que é ilegal constituir-se, hoje aqui, uma comissão de inquérito com esta parte do objecto. Esta parte do objecto é, pura e simplesmente, ilegal para a comissão de inquérito.
E quer saber por que não impugnámos a admissibilidade? Porque nós não estamos contra a constituição da comissão de inquérito; só que esta comissão de inquérito que hoje vamos aqui constituir é uma comissão de inquérito virada para os processos de privatização realizados pelos governos do PSD - os senhores não querem assumi-lo, mas é! E nós não estamos contra isso, não temos quaisquer problemas em que se constitua essa comissão de inquérito. Haverá uma comissão de inquérito, constituída por iniciativa do PSD, para investigar as cumplicidades e as parcerias do actual Governo com os interesses privados e haverá outra comissão de inquérito, que sairá deste Plenário no dia da votação, constituída por iniciativa do PCP, sobre os processos de privatização ocorridos durante os governos do PSD.
É essa a coincidência e dela resulta a curiosidade que há pouco referi e que - e o Sr. Deputado não me vai levar a mal - mantenho, porque continuo a não perceber por que foi preciso o PSD levantar suspeições sobre as relações do actual Governo com interesses privados para o PCP se ter lembrado, não sei "por que carga de água", de ir investigar os processos de privatização do passado. Mas por nós, tudo bem, venha a comissão de inquérito, não temos quaisquer problemas relativamente a estes ou a todos os outros processos de privatização ocorridos durante os governos do PSD.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por saudar a nova postura do PSD relativamente aos inquéritos. É que todos sabemos que o PSD, enquanto teve maioria, sempre inviabilizou nesta Assembleia todos os inquéritos parlamentares que aqui foram apresentados pelos partidos da oposição.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Foi, aliás, por isso que se fizeram poucos inquéritos parlamentares. Sempre os inviabilizou, usan

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do legitimamente - não me custa reconhece-lo - a força dos seus votos.
O Sr. Deputado Luís Marques Guedes, presumo que representando o sentir colectivo do seu grupo parlamentar, acaba de anunciar, na primeira intervenção que aqui fez, que, a partir de agora, viabilizará todos os inquéritos. Bem-vindo à razão, Sr. Deputado Luís Marques Guedes!

O Sr. José Magalhães (PS): - Durante algum tempo!

O Orador: - Mas fica-me a dúvida - e não quero refugiar-me em meras questões processuais, porque este é um debate eminentemente político - sobre aquilo que V. Ex.ª verdadeiramente pretende. E o embate processual em que se envolveu com o Sr. Deputado Octávio Teixeira acentuou a minha dúvida. Não sei se V. Ex.ª pretende, dando a entender que viabiliza todos os inquéritos, realmente inviabilizar o segundo inquérito ou, então, conduzir ao ridículo a Assembleia da República - porque será ridículo a Assembleia da República apreciar os mesmos e exactos factos,...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É ilegal!

O Orador: - ... com as mesmas e exactas, arguições, com as mesmas e exactas pessoas, com o dobro das despesas, Sr. Deputado,...

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto! Bem lembrado!

O Orador: - ... e provavelmente no dobro do tempo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É ilegal!

O Orador: - Já lá vou a esse ponto, Sr. Deputado!
Em meu entender, será ridículo que esse procedimento ocorra. Portanto, uma boa explicação para a abertura de espírito de V. Ex.ª e do seu grupo parlamentar pode ser essa.
Mas há outra: é que se o inquérito proposto pelo PCP for aprovado - e nós naturalmente não o inviabilizaremos, aliás em coerência com o que sempre fizemos na oposição e no Governo -,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... evidentemente vai existir uma clivagem muito interessante de verificar e analisar entre VV. Ex.as. E será - ou estou apenas a sonhar ou apenas a imaginar - que há pessoas, actualmente na direcção do seu partido e do seu grupo parlamentar, que estão interessadas em "ajustar contas" com os responsáveis da anterior direcção do seu partido e do seu grupo parlamentar?

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - É que realmente o que se vai analisar, Sr. Deputado, o que o inquérito do PCP propõe nas duas alíneas novas é verdadeiramente a autópsia de um cadáver.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Salvo seja!

O Orador: - O cadáver chama-se "cavaquismo" e é a autópsia do cavaquismo que VV. Ex.as estão a viabilizar.
Outra explicação poderá ser, portanto, a necessidade de "ajuste de contas" que VV. Ex.a` têm de fazer entre vós.
Mas dizia eu que este é um debate eminentemente político e não podemos deixar de situá-lo na sua validade política. Numa coisa o Sr. Deputado Luís Marques Guedes
tem razão: efectivamente, é na sequência de um processo "brutal", provavelmente sem algo de parecido ao longo dos debates parlamentares que aqui se realizaram, portanto, de uma estratégia elaborada pela direcção do seu partido, assente na calúnia, na insídia e nas acusações não provadas, que surge o vosso inquérito. E realmente é surpreendente que o PCP só reaja ao vosso inquérito, porque antes de os senhores lançarem essa campanha efectivamente. V. Ex.ª tem razão - o PCP "guardou de Conrado o prudente silêncio".
Ora bem, o que é que haverá aqui de objectivamente estranho neste tipo de comportamento? Que coincidência estratégica é esta, Srs. Deputados Luís Marques Guedes e Octávio Teixeira? Provavelmente, apenas elaborei uma hipótese teórica e as minhas considerações não têm razão... No entanto, não gostaria de deixar de colocá-las aqui, porque realmente, para coincidência, parece-me demasiado.
Sr. Deputado Luís Marques Guedes, é verdadeiramente sustentável, a meu ver - não sendo eu jurista, pois jurista é V. Ex.ª e qualificado, reconheço-o -, que estamos perante dois inquéritos diferentes, mas que esses inquéritos têm uma zona de confluência e de coincidência muito grande. E nesse sentido, a pergunta a que V. Ex.ª tem, desde já, de responder é esta: independentemente da sorte do segundo inquérito, uma vez que o primeiro, não tendo sido aprovado na Assembleia da República, foi naturalmente assumido, face aos direitos que VV. Ex.as, têm, pela Assembleia da República, V. Ex.ª quer multiplicar o despesismo a que há pouco me referia, quer reduzir a Assembleia da República e as comissões à situação ridícula de fazerem as mesmas perguntas às mesmas pessoas em dois tempos diferentes, ou está efectivamente disposto a aceitar que, independentemente de se tratar de dois inquéritos diferentes, a mesma comissão faça obviamente as duas investigações e naturalmente na investigação comum faça apenas uma única investigação e uma única arguição?

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - Esse é um elemento fundamental e essencial. E é-o porque, repito, é perfeitamente sustentável - aliás, o simples facto de o Sr. Presidente da Assembleia da República ter procedido à admissão do pedido de inquérito dá força a esta minha constatação - estarmos perante dois inquéritos diferentes, com uma significativa área de confluência e de acção. Portanto, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, gostaria que V. Ex.ª pudesse também responder a esta questão.
Mas, repito, a questão essencial é política e tem de ficar claramente esclarecida. O PS, enquanto oposição, trouxe a esta Câmara, com autoridade, normalidade e alguma discrição, um conjunto de iniciativas de inquérito que VV. Ex as chumbaram. O PCP, aliás, acusou-nos de não termos cedido as nossas assinaturas, nessas circunstâncias, para viabilizar projectos do. PCP, o que não é inteiramente certo. O Sr. Deputado Octávio Teixeira sabe perfeitamente que, pelo menos num caso, foi a confluência das assinaturas do PS e do PCP que permitiu, pela utilização do mecanismo potestativo, a realização de um determinado inquérito. Agora, o que o Sr. Deputado Octávio Teixeira não poderia esperar era que a agenda política do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, então na oposição, tosse a agenda política do PCP, então e agora na oposição, e, portanto, que nós devesse-mos ceder, em todas as circunstâncias, em todos os momentos e por todos modos, as nossas assinaturas para viabilizar os inquéritos do PCP.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - É um problema de agenda!

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O Orador: - Portanto, esta questão é também uma questão política e é essencial.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - É um problema de agenda!

O Orador: - Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, o senhor ainda é muito novo, daqui a algum tempo é capaz de perceber algumas coisas, pelo que lhe aconselho a ter calma.

Protestos do CDS-PP.

Finalmente, Srs. Deputados, há ainda uma última nota, que não quero deixar de registar. Já afirmei que o PS não faz ajuste de contas com a História. A sanção política, essa sim verdadeira promiscuidade existente entre o cavaquismo, os grupos económicos e interesses menos legítimos desses mesmos grupos económicos, foi claramente dada pelo eleitorado nas eleições de 1995.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Foi por isso e por outras coisas que os senhores perderam as eleições. E é por isso e por outras coisas que os senhores vão perder as próximas eleições.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Esse ajuste de contas está feito, Srs. Deputados, e nós não tomamos a iniciativa de reanimá-lo, de trazê-lo aqui. Mas há algo que tem de ficar muito claro, estando nós numa postura, repito, de viabilização do inquérito: é que nós queremos ser julgados, inquiridos, na matéria que VV. Ex.as propuseram e não queremos que, em circunstância alguma, se diga - o Sr. Deputado Octávio Teixeira, aliás, disse-o e quero que se lembre dessas palavras, porque, sendo um homem que honra a sua palavra, seguramente di-lo-á no futuro - que são todos iguais e que os comportamentos de uns são os comportamentos dos outros. Não acredito que o Sr. Deputado Octávio Teixeira e o PCP, ao tomarem esta iniciativa, tenham, algum dia, tido isto no seu espírito - aliás, repito-o, o Sr. Deputado Octávio Teixeira referiu-o, dizendo exactamente o contrário, isto é, dizendo que não considerava que os comportamentos fossem totalmente iguais. Portanto, essa rejeição tem de ser feita de uma forma categórica.
VV. Ex.as, Srs. Deputados do PSI) - e, já agora, Srs. Deputados do PP, como uma extensão -, tiveram à vossa disposição imensos dispositivos regimentais e políticos. VV. Ex.as podiam recorrer aos tribunais, até porque fizeram acusações cuja resolução requeria sede diferente da Assembleia da República; VV. Ex.as podiam promover um inquérito, e essa foi a única coisa que fizeram; VV. Ex.as podiam ter optado por uma iniciativa mais forte, que se justificaria caso as vossas afirmações fossem verdadeiras, e não foram capazes de torná-la; VV. Ex.as deviam ter apresentado uma moção de censura ao Governo, porque era aí que se verificava se estavam a falar verdade, se sabiam o que queriam...

Aplausos do PS.

... ou se pretendiam fazer - e é nisso que eu acredito - uma manobra de chicana política, que às vezes até é "justificável", mas que neste caso, em que se põe em causa a honorabilidade e a honra das pessoas, não é manifestamente tolerável.

Aplausos do PS.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Grande exercício, Sr. Deputado! Conseguiu gastar o tempo todo do PS!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Octávio Teixeira pede a palavra para que efeito?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Presidente: - Dispõe de dois minutos, que lhe foram concedidos pelo Partido Socialista.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado Manuel dos Santos, mais uma vez a questão da curiosidade veio à colação em relação ao PCP, agora por parte do Partido .Socialista.
Eu já expliquei, em relação ao PSD, que não tem de haver curiosidade, e a explicação é a mesma para o Partido Socialista.
Porquê só depois? Porque o PS, antes de o PSD estar disponível para avançar em inquéritos parlamentares nessas matérias, não nos dava garantias disso. Relativamente a este projecto, que apresentámos antes do PSD ter dado entrada do seu projecto, o PS votaria contra, em coerência com aquilo que fez durante os governos do PSD, quando impediu que o processo das privatizações fosse devidamente fiscalizado pela Assembleia da República em sede de comissões de inquérito. Apenas num caso último, o do Banco Totta & Açores - e assim mesmo já no final esteve de acordo em juntar as assinaturas necessárias para impor o inquérito potestativo.
E a grande questão é esta, Sr. Deputado Manuel dos Santos: nessa altura, V. Ex.ª disse que a agenda política do PS não era a mesma do PCP. É que nós, nesta matéria - e repito o que disse há pouco - movemo-nos por princípios...

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - O Sr. Deputado Manuel dos Santos é muito novo...!

O Orador: e não por agendas políticas! O que está em causa são os princípios,...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ... é a promiscuidade entre o Estado, os governos e o poder económico.
Não é um ajuste de contas o que nós queremos fazer com a História ou com os governos do PSD; o que nós queremos é, com base nos princípios que defendemos, clarificar também aquelas situações.
Esta é a razão de fundo, esta é a questão que nos separa, e isto, como pode verificar se quiser pensar, seriamente nada tem a ver com problemas de curiosidade ou de não curiosidade.
última nota: ó Sr. Deputado Manuel dos Santos, eu tenho a minha intervenção escrita. Eu não disse que os casos do PSD são diferentes dos casos do PS - isso veremos depois dos inquéritos!.. O que eu disse, e repito, foi que a apresentação deste projecto de inquérito "não foi para repartir as culpas entre o PSD e o PS". É que, depois da realização de inquéritos, as culpas, se as houver, são dos dois, não são culpas para serem repartidas!...

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel dos Santos, como não tem tempo para responder, a Mesa dá-lhe dois minutos.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, muito obrigado pela sua benevolência. Aliás, penso que dois minutos me chegam, porque a primeira questão, a essencial que o Sr. Deputado Octávio Teixeira colocou - que, aliás, é surpreendente é de fácil resposta.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira fez aqui uma afirmação em relação a um comportamento previsível do PS!... Ora como a questão nunca se colocou, ele não pode aqui afirmar que o PS não viabilizaria o inquérito. Eventualmente abstinha-se e, uma vez que o PSI) agora está fúria inquisitorial, provavelmente até o viabilizaria.
Portanto, não entendo no que é que ele baseia a sua preocupação de não existir inquérito no caso de ele ser anunciado.
Eu era capaz - e digo-lhe isto com alguma sinceridade - de sugerir ao Sr. Deputado Octávio Teixeira e ao PCP, porque isso a nós nada nos afecta - espero que também não afecte o PCP -, que converse um pouco mais connosco e um bocadinho menos com o PSD. Se conversarem um pouco mais connosco talvez possamos forma de viabilizar alguns inquéritos de VV. Ex.as! É tudo uma questão de conversa, Sr. Deputado!... É tudo uma questão de conversa e de escolha dos interlocutores.
Ó Sr. Deputado, é evidente que quando referi o termo "agenda política" não estava a esquecer a questão dos princípios e dos valores, porque, como é evidente, o que eu quis dizer foi exactamente isso. Se a expressão "agenda política" não é a expressão perfeitamente adequada e a que satisfaz as preocupações de V. Ex.ª eu substituo a expressão "agenda política" por "conjunto de valores e de princípios".

Aplausos do PS.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra e consideração da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Manuel dos Santos: Pedi para exercer o direito de defesa da honra e consideração da minha bancada em virtude da insinuação que V. Ex.ª pareceu imprimir às palavras quando disse que devemos conversar menos com o PSD e mais com o PS.
A insinuação poderá passar por aí, na medida em que nós falamos com quem quisermos, quando quisermos e o tempo que quisermos. Agora o que é inaceitável, do nosso ponto de vista - e isso ofende a minha bancada -, é que pretenda fazer insinuações políticas por trás disso, quando V. Ex.ª tem a sua bancada sempre, sempre, sempre, não a conversar mas a negociar com a bancada do PSD: são as revisões constitucionais, são os referendos para a regionalização, é a questão do referendo para o aborto. É tudo!... Isso é que são entendimentos... e entre o PSD e o PS! E V. Ex.ª tem coragem política para vir aqui suscitar a questão que suscitou sobre o PCP?
Ó Sr. Deputado Manuel dos Santos, haja um mínimo de senso e de pudor!...

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, quero dizer, muito rapidamente, que verifiquei, com agrado político, que o Sr. Deputado Octávio Teixeira, líder do Grupo Parlamentar do PCP, se doeu, o que significa que lhe toquei num ponto extremamente sensível.
Reafirmo que o Sr. Deputado do PCP tem todo o direito de talar com quem entender, que o PCP tem todo 0 direito conversar e de fazer acordos com quem muito bem entender, mas reafirmo também que nos últimos tempos tem falado e tem convergido demasiado com o PSD, pelo menos para o meu gosto. Mas eu não tenho nada com isso e nesse aspecto ele tem alguma razão.

Risos do PS.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Em relação ao seu gosto, estou-me perfeitamente "nas tintas".

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Peixoto.

O Sr. Francisco Peixoto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero só reiterar, mais uma vez, a posição do nosso partido relativamente a esta questão.
Obviamente e de uma forma insuspeita, somos a favor da total transparência das relações entre o Estado e os agentes económicos - ninguém pode disso suspeitar nesta Casa - e foi por isso que, de uma forma que pretendemos mais eficaz e mais célere, no dia 30 de Abril solicitámos a V. Ex.ª que requeresse ao Governo um conjunto de documentação que pudesse trazer a esta Câmara, com a maior brevidade possível, um conjunto de informação, mas, sobretudo, que pudesse permitir a nós, Deputados, uma maior apreciação, mais consentânea, mais fundamentada, porventura susceptível de esclarecer rapidamente o que efectivamente se passa.
Para além desta questão existe uma outra de fundo e nós não vamos, seguramente, inviabilizar este projecto de pedido de inquérito do Partido Comunista Português, pese embora a diferença incontornável que haja nas motivações.
Pelo texto que o Sr. Deputado Octávio Teixeira acabou de ler, com que fundamentou o seu projecto, pareceu-nos ver alguma acrimónia relativamente à iniciativa privada e, sobretudo, ao processo das privatizações em si mesmo, independentemente da questão e do modo como foi conduzido.
A nossa motivação é exclusivamente esta: restaurar a excelência das relações entre o Estado e os agentes económicos e, no fundo, pacificar a relação entre o Estado e os cidadãos, porque não nos é possível concordar com esta situação de constante suspeição que há entre o Estado e os agentes económicas, já que prejudica a actividade económica do País e o esforço comum que o País deve fazer.
Trata-se de uma questão que deve cessar, que deve ser clarificada tão depressa quanto possível. E à colação diria que há aqui duas responsabilidades distintas: por um lado, do Governo, que deveria clarificar, de forma adequada e rápida - tão depressa quanto possível - tudo o que lhe foi solicitado, já que a resposta que tivemos foi zero, o Governo disse rigorosamente nada; por outro lado, independentemente das autópsias e dos exercícios que queiram fazer entre cadáveres, pensamos que quem acusa deve ter sempre o sagrado dever de fundamentar e de elucidar com suficiência, porque este clima de suspeição é intolerável.
Assim, esperamos que este inquérito, como qualquer outro, seja clarificador e suficiente para esta pacificação que, acima de tudo, desejamos.

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Resolvi intervir para fazer três ou quatro breves considerações depois de ouvir algumas que foram produzidas, há instantes, nesta Câmara.
De facto, numa coisa penso que estaremos todos de acordo: esta questão ê sobretudo política e não tanto de legalidade, embora também tenha, como o meu colega Luís Marques Guedes já disse, aspectos de legalidade. E do ponto de vista político, a forma como este pedido de inquérito foi apresentado é tudo menos inocente.

O Sr. José Magalhães (PS): - Era só o que faltava!

O' Orador: - Nisso eu cumprimento os seus autores.
E tudo menos inocente também para quem, nessa bancada, acha muito interessante a formulação deste pedido de inquérito. Coincidência ou curiosidade é o que o Sr. Deputado Octávio Teixeira depois esclarecerá, nos dias subsequentes. Não é isso o importante.
O importante, sobretudo para a bancada do Partido Socialista é, no fundo, tentar apresentar à Câmara e ao País, de hoje para amanhã, uma moeda de troca: nós investigamos casos vossos, vocês investigam casos nossos e, assim, fica tudo misturado.
Ora, politicamente, esta situação não vai suceder. Ela pode suceder legalmente, porque votos são votos - a maioria...

O Sr. José Magalhães (PS): - Ah!... Ainda bem que o reconhece!

O Orador:.- ... pode impor esta função, proposta pelo PCP -, mas politicamente isto nunca vai suceder.
E, desde logo, isto evidencia não só uma prova de fraqueza mas também preocupação e nervosismo. Qual era o problema de analisar separadamente, em duas comissões de inquérito, situações que são radicalmente distintas? E se são radicalmente distintas não é por se tratar de situações ocorridas em Governos diferentes - aí a distinção não importava -, é porque, por exemplo, basta ver o objecto do inquérito, as situações que se pretendem analisar relativamente a governos anteriores - e bera, analisem-se - para constatar que são processos, todos, de privatizações, enquanto nenhum dos casos suscitados pelo PSD tem a ver com processos de privatizações. Portanto, são realidades de actos completamente diferentes da parte dó Estado.
Que possam existir dúvidas num caso e no outro, é legítimo, agora que eles sejam iguais em termos de objecto para serem misturados no mesmo inquérito só é possível porque se pretende aqui uma espécie de moeda de troca, se pretende aqui, porventura, pensar que assim se diluem as questões.
E gostaria a esse respeito, por isso mesmo, de sublinhar que do ponto de vista da maioria dos votos até pode suceder isto. Todavia, o PSD não vai abdicar do objecto do seu inquérito nem prescindir do inquérito tal como foi formulado - de maneira nenhuma! -, como não vai misturar situações que são distintas. E não ternos aqui, por isso mesmo, a prova de fraqueza do Partido Socialista. Nós dizemos: analisem os casos do passado. Têm dúvidas? Analisem.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar. Já utilizou mais dois minutos do que aqueles de que dispunha.

O Orador: - Sr. Presidente, peço um pouco da sua tolerância.

O Sr. Presidente: - Já a teve, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, peço-lhe mais um minuto de tolerância.
E esta preocupação do Partido Socialista tem a ver também com o que tem sucedido nas últimas semanas, ou seja, a tentativa de tudo fazer para que esta comissão de inquérito vá por diante, chegando ao ponto de ameaçar com processos judiciais, uma atitude inqualificável e verdadeiramente inadmissível. De qualquer modo, nem sequer têm coragem de cumprir a ameaça que fazem.
Sr. Presidente, termino dizendo que nada, mas nada, irá inibir-nos neste processo e deixando este aviso: se pensam - e quero agradecer, entretanto, uma cedência de tempo que me permite explicar o meu ponto de vista que esta situação, a dos casos que apontámos, que são casos de natureza jurídica, sobretudo nesta fase, enganam-se. São questões que queremos analisar para saber se houve ou não clareza, se houve ou não favorecimento. Em relação a estas situações, dizemos ao mesmo tempo, de uma forma clara: é bom que pensem claramente que não se faz determinado tipo de perguntas às quais não é possível responder sem ter um mínimo de dados para levar a análise e a investigação até ao fim.

O Sr. José Magalhães (PS): - É uma ameaçazinha?!

O Orador: - É uma ameaça e, se quiser, instaure-me um processo crime ou peça ao Ministro Pina Moura para o fazer. O problema é seu!

Risos do PSD.

Faço as considerações que entender e nada me vai inibir. Não tenho medo de coisa alguma,...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Já se viu!

O Orador: - ... até tenho uma pena imensa que, quanto aos processos de privatização, o único que conduzi, nos 10 anos em que tive a honra de pertencer ao Governo, não conste deste pedido de inquérito. É uma pena que assim seja e gostaria até que isso tivesse acontecido.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Agora, o que digo é o seguinte: resolvam como entenderem a questão do objecto, do ponto de vista jurídico e político. No entanto, uma coisa é certa: podem confundir as situações, mas há algo a que os senhores não vão fugir, de maneira alguma, que é à análise dos casos que evidenciámos. Creio que seria bom que começassem a preparar-se para darem respostas concludentes, pois elas não foram dadas até ao momento. Não vale a pena vir, da parte do Governo, com mais ameaças, intimidações ou inibições. O assunto vai até ao fim e veremos, no final, que o último a rir é, porventura, o que ri melhor.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, as afirmações agora feitas pelo Sr. Depu-

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fado Luís Marques Mendes não resistem à constatação de um simples facto: não foi o PS que apresentou nesta Câmara o pedido de realização de um inquérito- sobre actos ocorridos aquando da governação do Professor Cavaco Silva.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Está a baralhar as coisas!

Protestos do PSD.

O Orador: - Não foi o PS que apresentou esse pedido. Esta é a demonstração inequívoca de que o Grupo Parlamentar do PS não está empenhado em qualquer iniciativa com o intuito de relativizar as acusações graves, infamantes, caluniosas, que impendem neste momento sobre o Governo e são da autoria do PSD, do Grupo Parlamentar do PSD e da Direcção Nacional do PSD.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Poderia o PSD ter razão na sua argumentação se ela se sustentasse no facto de nós próprios termos apresentado, aqui, na Assembleia, um pedido de realização de inquérito relativo a factos atinentes às governações anteriores. Se porventura fôssemos nós a apresentar esse pedido, seria legítimo ao PSD inferir daí uma vontade, da parte do Grupo Parlamentar do PS, de tentar relativizar as acusações. Mas nós não queremos isso e o Governo também não o quer. Inclusive, o Governo já o demonstrou claramente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma coincidência!

O Orador: - Justamente por não querer isso, e por estar disposto, interessado e empenhado em que se faça uma clarificação integral da natureza das acusações feitas pelo Grupo Parlamentar do PSD, é que já solicitou à Procuradoria-Geral da República a promoção de um inquérito para averiguar da veracidade ou da falsidade dessas mesmas acusações, que são injuriosas. A verdade é que o PSD, até aqui, não se limitou a enunciar dúvidas, a pôr a questão no plano dubitativo, sobre se o Governo favoreceu ou não ilegitimamente grupos económicos privados. O que o PSD até aqui fez foi acusações soezes, acusações vis, acusações sob forma claramente injuriosa, dizendo que...

Aplausos do PS.

... este Governo tinha favorecido ilegitimamente alguns interesses privados! Nós, de resto - e aproveito para anunciar a nossa posição de voto em relação ao pedido do Grupo Parlamentar do PCP -, por princípio, não concorremos para a inviabilização de inquéritos parlamentares. Nem agora nem quando estávamos na oposição. Por uma razão muito simples: contrariamente ao PSD, para nós, as pautas morais e éticas não se alteram em razão do número de assentos parlamentares que possuímos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Para nós, a ética e a moral são referências absolutas,...

Protestos do PSD.

... não são relativizadas em função da situação parlamentar em que nos encontramos, do ponto de vista numérico. Mas também entendemos que é necessário que este grupo parlamentar dê um claro sinal ao País de que não está minimamente interessado em concorrer, de forma activa, para a relativização dos ataques feitos ao Governo. Nessa perspectiva, o Grupo Parlamentar do PS vai abster-se na votação deste pedido apresentado pelo PCP. Creio que esta resposta constitui a clara desautorização de todas as considerações indevidas, e elas próprias infamantes, feitas pelo líder do- Grupo Parlamentar do PSD, há pouco.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Queiró inscreveu-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Francisco de Assis, mas este não dispõe de tempo para responder. Assim, solicito ao Sr. Deputado Luís Queiró que, se puder, no fim, ceda ao Sr. Deputado Francisco de Assis o tempo que lhe sobrar.
Sr. Deputada Luís Queiró, tem a palavra.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, não querendo, de modo algum, dar sugestões - quem sou eu!... -,faça o que às vezes faz, dando ao Sr. Deputado Francisco de Assis 1 minuto para responder.

O Sr. Presidente: - Quando não há quem dê esse minuto, faço-o, mas quando há, não dou eu, e esse tempo fica sempre de reserva.

O Orador: - Então, veremos até onde pode ir a minha generosidade.
Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, não queria, digamos assim, meter-me muito na conversa e nas questões que VV. Ex.as têm tratado directamente com o PSD, mas há algo que quero dizer: V. Ex.ª disse, e já repetiu várias vezes - não só V. Ex.ª mas também o seu Governo -, que as acusações de que foram alvo foram vis, foram soezes,...

Vozes do PS: - E foram!

O Orador: - ... foram de toda a natureza, foram do pior que pode acontecer. Sr. Deputado Francisco de Assis, tem V. Ex.ª todo o direito de se indignar... Aliás, eu sempre disse aqui que, à responsabilidade de quem tem o dever de esclarecer, corresponde a responsabilidade de quem acusa. É indiscutível, não digo o contrário!

O Sr. José Magalhães (PS): - É claro!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado Francisco de Assis, a questão é esta: por que razão VV. Ex.as não esclarecem? Por que razão VV. Ex.as-...

O Sr. José Magalhães (PS): - Quer mais?!

O Orador: - Quero mais, sim!

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço que façam silêncio. Assim não é maneira de discutirem.

O Orador: - Sr. Deputado José Magalhães, a pergunta não é para si, é para o Sr. Deputado Francisco de Assis.
Sr. Deputado Francisco de Assis, repito aqui que nós, no dia 30 de Abril, numa sessão plenária, na presença do Sr. Ministro Jaime Gama, fizemos um requerimento for-

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mal onde solicitámos um conjunto de documentação vasto, toda a documentação associada aos actos que foram colocados sob suspeita. A verdade é que o Governo não nos disse nada ... Por que razão o PS e o Governo não fazem aquilo que em Direito se chama "a prova dos factos"? Por que é que não trazem aqui a prova dos factos?! Por que razão não nos apresentam toda a documentação, todos os estudos, todos os despachos, todas as orientações, todas as decisões, tudo o que está associado a todos os casos colocados sob suspeita?!

Protestos do PS.

Por que é que até ao momento não o fizeram?! Inclusive, poderiam tê-lo feito em suporte magnético, como, de resto, o Sr. Deputado José Magalhães um dia me sugeriu?! Por que razão esse requerimento não teve resposta satisfatória e os senhores se limitam a recorrer à Procuradoria-Geral da República,...

Protestos do PS.

... aliás, intenção manifestada em intervenção do Sr. Ministro, muito infeliz para esta Assembleia, como já tive oportunidade de salientar, e a qualificar as insinuações disto e daquilo, ao passo que o esclarecimento concreto, documental, todo, não está aqui?! Por quê, Sr. Deputado?!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis. Dispõe de 2 minutos, cedidos pelo Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, não deixa de ser curioso que nesta nova ordem política na direita portuguesa a V. Ex.ª esteja remetido o papel de uma espécie de porta-voz secundário das preocupações do PSD.

Aplausos do PS.

No que toca a esta questão, a demonstração indiscutível de que o Governo está empenhado em clarificar esta situação consiste na circunstância de ter sido solicitada à Procuradoria-Geral da República a promoção de um inquérito...

Risos do PSD.

... exaustivo e rigoroso para averiguar da veracidade ou da falsidade das acusações feitas.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

De mais a mais, estando já estabelecido - e sendo do conhecimento público e, naturalmente, em particular, desta Câmara -, desde o momento que o Sr. Deputado referiu, que iria ser promovido um inquérito parlamentar por iniciativa do PSD, serão prestados todos os esclarecimentos...

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Onde?! Desmente o Sr. Ministro!

O Orador: ... no momento de realização desse inquérito parlamentar,

O Sr. José Magalhães (PS): - Na comissão!

O Orador: - ... na comissão que virá a ser constituída para esse efeito. Isso é absolutamente evidente, não parece que possa suscitar qualquer dúvida.
O que importa aqui salientar, de facto, e ainda bem que chamou a atenção para essa situação, é a diferença de posições. O anterior Governo, quando era confrontado com acusações, com a afirmação pública de algumas dúvidas sobre questões de transparência no seu comportamento, tinha, normalmente, uma reacção no sentido do impedimento da realização de inquéritos parlamentares.

Vozes do PS: - É verdade!

O Orador: - Agora, há a preocupação de não inviabilizar a realização de qualquer tipo de inquérito parlamentar, não concorrendo, assim, activamente, nesse sentido, e há, da parte deste Governo, uma preocupação acrescida de averiguação da falsidade ou da veracidade das acusações que sobre ele impendem, que se manifesta, em concreto, no pedido enviado à Procuradoria-Geral da República.
É esta a diferença e o Sr. Deputado faria bem melhor se salientasse essa diferença de comportamentos entre duas maiorias,...

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - O Sr. Deputado quer lá saber disso!

O Orador: - ... uma, que nos governou em época bem recente, e esta maioria relativa, actual, que tem por referência pautas morais e de exigência no que concerne à transparência das funções do Estado muito diferentes, manifestando-se, claramente, neste tipo de comportamento.
De resto, nós também ficamos satisfeitos com esta mudança de posição do PSD, que se materializa até no próprio líder parlamentar do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar. Esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Não deixa de nos suscitar algum agrado ver o líder parlamentar, Luís Marques Mendes, a renegar constantemente o Ministro Luís Marques Mendes. E a demonstração, no plano material, mais concreto e simbólico, desta alteração!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental de defesa da consideração da bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, não gosto muito de recorrer a esta Figura, mas V. Ex.ª, à falta de outros, utilizou o argumento de que eu era apenas um porta-voz secundário do PSD.

Protestos do PS.

Aliás, há pouco, o seu colega de bancada Deputado Manuel dos Santos já tinha dito também que eu era uma mera extensão da bancada do PSD.
Ora, a propósito de extensão, eu estava era preocupado com a extensão da sua intervenção, que nunca mais acabava!

O Sr. José Magalhães (PS): - E foi pequena!

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O Orador: - VV. Ex.ªs, que se queixam de serem vítimas de insinuações, de ataques de toda a natureza, afinal respondem na mesma moeda, mas esse não é argumento que valha. O senhor acabou de fazer uma insinuação que sabe não ser verdade mas que julga ser um truque político eficaz. Está mais do que desmentido e desmontado, mas V. Ex.ª insiste nele e tenho de concluir que o faz por não ter outro tipo de argumentação. Sobretudo, Sr. Deputado, recorre a ele porque o Sr. Ministro Jaime Gama, no dia 30 de Abril, prometeu aqui que entregava essa documentação e esse relatório circunstanciado e não o fez até agora!

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Já respondeu!

O Orador: - Extensão do Governo revelam ser os senhores, com o desconforto de alguns Deputados da vossa bancada! Extensão são os senhores e, muitas vezes, apenas uma extensão acrílica do vosso Governo!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Não sei o que o senhor quer!

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Consideração!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, francamente, não vejo em que é que a honra do Sr. Deputado Luís Queiró ou do seu grupo parlamentar foi minimamente beliscada com a minha intervenção. Não penso que o Sr. Deputado fez a demonstração de que essa honra foi posta em causa. Fiz uma consideração de natureza política, que, como é evidente, não comporta qualquer juízo de valor acerca das qualidades pessoais do Sr. Deputado Luís Queiró. São considerações de natureza política. Na verdade, é hoje visível, com agrado por alguns sectores do PP, com mais agrado por outros do PSD, com evidente desagrado para outros do PP. que há uma espécie de nova ordem política no âmbito da direita portuguesa, há um novo quadro de distribuição de trabalho e de distribuição de funções e é natural que ao PP seja cometida uma função relativamente menor nesse processo.
Não vejo em que é que as minhas considerações possam ser entendidas como ofensivas da dignidade ou da honra seja de quem for, tão objectivos, nítidos, evidentes e públicos são os factos que dão origem a esta minha constatação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira. Dispõe, para o efeito, de 2 minutos que lhe foram cedidos pelo Partido Ecologista Os Verdes.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, suscitou-se a necessidade, do nosso ponto de vista, de uma nova intervenção porque o PSD trouxe agora à discussão uma nova questão, que poderá levantar dúvidas ou algumas reservas, pelo menos, por parte do PSD: a hipótese de se juntar ao conjunto de casos que colocámos no nosso pedido de inquérito... Poderia haver aqui alguma ideia de moeda de troca. Gostaria de dizer, perante a Câmara e à Câmara, que não há essa possibilidade, mínima, de haver moeda de troca, porque, no mínimo dos mínimos, estará sempre o PCP na comissão, para impedir que haja moeda de troca. E se não o conseguir impedir, sempre estará para o denunciar. Por isso, não há possibilidade alguma de se vir a levantar a questão da moeda de troca! Se o problema é esse, está resolvido à partida. Não há aqui problemas de moeda de troca!
Chamo também a atenção dos Srs. Deputados do PSD, designadamente do Sr. Deputado Luís Marques Mendes, para o facto de que basta ter assistido ao debate durante esta tarde para ver que as intervenções do PS, nesta matéria, não foram feitas com qualquer paixão de que o inquérito parlamentar apresentado pelo PCP se realize. Não há paixão. Há, de facto, uma situação complicada para o PS, pura e simplesmente! Por conseguinte, há também dificuldade de se manobrar na situação que está criada. Quero com isto dizer que não pode o PSD pretender indiciar qualquer ideia de que teria havido um acordo entre o PS e o PCP para que o PCP apresentasse este pedido de inquérito.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É o que parece!

O Orador: - Não! Afirmo-o, porque estão os dois preocupados!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nós não estamos!

O Orador: - Logo, estando os dois preocupados, essa é a prova provada de que não...Nós podemos ser, às vezes, maléficos ao ponto de falar com uns e falar com outros. Mas, depois, queimar os dois.... tanto não! Que não haja dificuldades dessas! E mais do que isso, repare, ainda há pouco ouvimos aqui uma intervenção por parte da minha bancada,...

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.

... que mostra claramente que o problema da fiscalização de processos relacionados com as privatizações não é uma dificuldade do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apenas agora, já o foi no passado quando não quis dar as assinaturas.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Há sempre hipóteses que se podem colocar nessas matérias. Porquê? Porque nem antes, quando o governo era do PSD... Alguém pode garantir, neste momento, que se aprofundarmos essa fiscalização, não possam aparecer alguns casos de ramificações no PS?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Vou dar a palavra ao Sr. Deputado Luís Marques Mendes, por 1 minuto, cedido pelo CDS-PP.
Peço-lhe que utilize apenas 1 minuto, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais, agradeço ao CDS-PP o tempo cedido.
As intervenções aqui feitas, em particular a que foi produzida pelo Deputado Francisco de Assis, colocaram, de facto, a nu o essencial. E o essencial, telegraficamente, é isto: os senhores querem estar já, antecipadamente, a tirar conclusões,...

Protestos do PS.

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2576 I SÉRIE-NÚMERO 74

... mas eu recomendaria que fossem transparentes até ao fim e deixassem que a comissão concluísse os seus trabalhos.
Em segundo lugar, foi aqui dita uma coisa importante. É que ninguém consegue, com paixão, rebater o argumento que apontei há pouco: de um lado estão processos de privatização - temos a consciência tranquila, mas se há dúvidas, investiguem; até acrescentei um caso, que é da minha responsabilidade; peçam também a inquirição desse. Do outro lado, estão outros actos. Se os senhores tivessem a mesma consciência tranquila quanto a esses actos, eram os primeiros a dizer "faça-se uma comissão de inquérito em separado".

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Significa que as privatizações que fizemos estão bem .feitas!

O Orador: - O Sr. Deputado Francisco Assis coloca-se na postura irresponsável, ligeira e até de alguma leviandade política, como o seu Ministro Pina Moura, de dizer: "São calúnias! São calúnias!". No final, vamos ver se são calúnias e, depois de investigar, vamos ver quem tinha ou não razão. A sua postura é irresponsável, leviana e ligeira, como a do Ministro Pina Moura,!

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado

O Orador: - Sr. Presidente, peço-lhe só mais 15 segundos.

O Sr. Presidente: - Espero que sejam mesmo 15 segundos, Sr. Deputado.

O Orador: - Até diria mais, como já tive ocasião de dizer ao Sr. Deputado Francisco de Assis: duas comissões de inquérito a funcionar era o correcto.
E mais: relativamente a actos do passado, a presidência deveria pertencer a um partido que não estava na altura no governo e, relativamente a actos deste Governo, a presidência não deveria pertencer ao partido que o apoia. Era transparência até ao fim! É o desafio que aqui deixo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Francisco de Assis pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, para usar o direito regimental de defesa da honra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não pode abusar dessa figura. Desculpe, mas peço-o a todos os Deputados, não só a si.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, é para defesa da honra da bancada.

O Sr. Presidente: - Peço-lhe que se cinja à figura o mais possível. Faça favor. Sr. Deputado.

O Sr. Francisco Assis (PS): - Sr. Presidente, muito obrigado. Serei muito breve.
Também não resisto às considerações do Sr. Deputado Luís Marques Mendes. Há pouco, não resistiu a uma análise factual, agora não resiste a uma análise lógica, porque do que o Sr. Deputado me acusa é de ser irresponsável pela simples razão de que estarei, na sua óptica, a antecipar as conclusões do inquérito, por considerar que são calúnias as acusações graves feitas pelo PSD.
Ora, desta forma, o Sr. Deputado Luís Marques Mendes está a colocar-se exactamente na posição simétrica, que é a de dizer, de antemão, que não são calúnias :as graves acusações feitas por eles.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Essas acusações só não eram calúnias se, efectivamente, correspondessem à realidade. Como tal, ele está já a antecipar claramente as conclusões do inquérito.

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro. Ou a lógica é uma batata!

O Orador: - É evidente que essas considerações não resistem a uma análise lógica.

Aplausos do PS.

Mas a questão de fundo é esta: o PSI) não enunciou dúvidas, não manifestou preocupações acerca de eventuais ilegalidades, acerca de eventuais favorecimentos ilegítimos de grupos empresariais privados por parte do Estado; o PSI) fez graves acusações, algumas directas e outras, até as mais graves, sob a forma de insinuações ofensivas, ainda mais inflamantes justamente por serem feitas sob a forma da insinuação, sem ter a coragem e a possibilidade sequer de fazer a sua acusação de forma clara e devidamente fundamentada.
Sr. Presidente, a nossa posição nesta matéria é a que sempre tivemos: não concorreremos para- pôr em causa a realização de um inquérito. Participaremos activa, tranquila e serenamente nos trabalhos da comissão agora a criar. Deixámos clara qual a nossa posição: vemos vantagens na criação de uma única comissão. Alguns espectros, algumas dúvidas; algumas suspeições aqui enunciadas pelo Sr. Deputado Luís Marques Mendes foram claramente desmentidas, até pela circunstância de nós termos a orientação de voto que temos, que é uma opção pela abstenção. E, como tal, não vemos qualquer razão para que, tranquilamente, se não possa levar a cabo um trabalho sério no âmbito de uma única comissão, que tenha por incumbência fazer a análise das várias propostas entretanto apresentadas.
Esta é a nossa posição, sejamos nós partido do Governo, sejamos nós partido de oposição, porque para nós a ética e a moral não são umas quando estamos no Governo, não são outras completamente diferentes quando estamos na oposição. Isso também nos diferencia - e ainda bem que nos diferencia! - do PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem á palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, a primeira explicação é uma constatação interessante: é que, agora, no final, fugiu a boca para a verdade ao Sr. Deputado Francisco Assis. O que o Sr. Deputado disse há pouco era aquilo que o senhor queria, que existisse uma única comissão para tratar de forma igual casos que são radicalmente diferentes, para misturar tudo, para que pudesse existir a tal moeda de troca.

Protestos do PS.

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29 DE MAIO DE 1998 2577

Em segundo lugar, fugindo-lhe a boca para a verdade, só tem uma atenuante: é que foi uma confissão espontânea, no calor que é próprio das suas intervenções. Foi tão espontânea, foi genuína, portanto, é uma grande atenuante. Como jurista, lhe digo: no Direito, é uma atenuante. Mas nesta questão política é pequena; no Direito, é maior.
Sr. Deputado, a questão é que o senhor costuma ter esta arte interessante: no turbilhão de palavras que o caracterizam, costuma contundir factos com insinuações. É que ao longo dos debates que houve neste Parlamento e fora dele, relativamente a várias situações que referimos, nós apontámos factos. E relativamente aos factos, o senhor disse zero! E os membros do Governo disseram zero!
E sabe qual é a diferença? A diferença é que, perante estas dúvidas que temos,...

O Sr. Rui Namorado (PS): - Dúvidas ou factos?

O Orador: - ... perante estes exemplos que apontámos, nós dizemos: vamos inquirir! E os Srs. Deputados dizem: "não..., um processo em tribunal, uma queixa à Procuradoria Geral da República"! Isso é leviano, é irresponsável!
E digo-lhe mais: o senhor devia ter autoridade de criticar um ministro do seu governo que ameaça calar a voz de alguém, através de um processo judicial, e, ainda por cima, depois, "mete a viola ao saco", "entra de leão". "sai de sendeiro" e nem sequer tem a hombridade de pedir desculpa pela irresponsabilidade daquilo que cometeu. Isso é de uma leviandade total!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E a diferença, justamente, é esta: perante factos concretos, os senhores ameaçam, querem calar a voz.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço que façam silêncio!

O Orador: - E nós dizemos: não, investiguem! Porque os senhores querem analisar situações do passado, e nós dizemos de consciência tranquila: analisem! Analisem à vontade!
Sr. Deputado Francisco de Assis, explique por que é que não têm a mesma postura transparente que estou a apontar, para dizer "tenho a consciência tranquila!" - é uma coisa que adoraria ouvir! - e para dizer "analisem autonomamente, sem problema, dêem a presidência da comissão a outro partido para que seja tudo claro e transparente, vamos até ao Fim"!
Por que é que o senhor não tem a mesma postura, a mesma clareza, a mesma transparência? Por que é que o senhor, em vez de seguir este exemplo de clareza, segue o exemplo menor, baixo e leviano...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem mesmo de terminar.

O Orador: - Esta é que é a questão! Isto fica para o Sr. Deputado pensar!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não me levem a mal que lhes faça o seguinte reparo: não é possível fazermos um Regimento consoante o grau de excitação em que se encontram, pondo de lado o grau da susceptibilidade moral que efectivamente têm. Não houve aqui, hoje, em meu entender - não se ofendam por eu dizer isto -, uma só defesa da honra que coubesse dentro da vivacidade do debate parlamentar. Temos de chamar a nós - e peço aos Srs. Deputados que chamem a si próprios - a preocupação de, no futuro, não abusarem tanto quanto hoje se abusou da figura da defesa da honra.
Defesa da honra é uma coisa, contra-argumentação é outra. Hoje contra-argumentou-se com vivacidade. Sinceramente, não vi ninguém ofendido; se houve ofensa foi num caso ou noutro, mas nada que se pareça com o número de defesas da honra que hoje teve lugar. Não podemos manter este regime para a eternidade, senão, qualquer dia, quando não houver mais nenhuma figura, invoca-se a honra e nega-se a honra na medida em que se invoca em vão. É como o nome de Deus. Quando se invoca o nome de Deus em vão, é mau; quando se invoca a honra, é bom. Se calhar, também a colocamos em dúvida...

Risos.

Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos. A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, pelas 10 horas, com uma sessão de perguntas ao Governo.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 5 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa à votação das propostas de lei n.os 113/VII e 157/VII

O Partido Popular votou desfavoravelmente as propostas de lei de Revisão do Código do Processo Penal e da Orgânica do Ministério Público em coerência com as intervenções feitas em Plenário, por entender que tais propostas enfernam de vícios bem evitáveis e suscitam clivagens desastrosas que importa impedir. Como se refere no programa eleitoral de 1995, o Partido Popular preconiza igualmente a reorganização do Ministério Público e a revisão da legislação processual penal, embora com recurso a soluções distintas das que neste debate foram propostas e o Governo pretende.
Cientes como estamos da gravidade da crise que a justiça portuguesa atravessa, manifestamos uma vez mais a nossa disponibilidade para colaborarmos, em sede de especialidade, na redacção de alternativas legislativas tão consensuais como tais reformas devem necessariamente ser, e votá-las em conformidade. Só desta forma os portugueses poderão, genuinamente, ter mais e melhor justiça.

O Deputado do CDS-PP, Francisco Peixoto.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Manuel Alegre de Melo Duarte.

Partido Social Democrata (PSD):

Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Gama.

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2578 I SÉRIE - NÚMERO 74

Luís Carlos David Nobre.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido Comunista Português (PCP):

Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Bento da Silva Galamba.
João Rui Gaspar de Almeida.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.

Partido Social Democrata (PSD):

António Manuel Taveira da Silva.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Manuel Durão Barroso.
José Mendes Bota.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Pedro José Del Negro Feist.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

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