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18 DE FEVEREIRO DE 1999 1819

A presente iniciativa do Governo, ainda que contemplando um aspecto circunscrito da resposta à criminalidade grave, ligado à protecção dos intervenientes no processo penal que possam dar um contributo relevante para a prova, reveste-se de uma especial importância, já que a ela está subjacente um necessário e imprescindível equilíbrio entre os direitos individuais do arguido e os interesses colectivos de segurança.
As soluções adoptadas na proposta de lei consagram medidas que têm vindo a ser recomendadas por organizações internacionais empenhadas na luta contra a criminalidade organizada, na protecção das testemunhas e das vítimas e na defesa do Estado de direito, como é o caso de diversas resoluções do Conselho da Europa e do Conselho da União Europeia. Do mesmo modo, pode-se garantir a sua compatibilização com o disposto na nossa Constituição, bem como com os textos internacionais a que Portugal está vinculado.
O instituto da protecção das testemunhas em processo penal, para além de querer, desde logo, significar um meio de prevenir pressões, ameaças e riscos de represálias, constitui também um importante meio de garantir a qualidade do processo. Com efeito, a obtenção de um depoimento testemunhal em condições de segurança e sem constrangimentos é a melhor forma de conseguir que a sua fiabilidade não seja objecto de suspeição.
É nossa convicção que as medidas ora propostas para a protecção das testemunhas em situação de risco, apesar do seu carácter manifestamente excepcional, não põem em causa a igualdade que sempre deverá caracterizar, no tribunal e no processo, a acusação e a defesa, a chamada «igualdade de armas». Refira-se, a este propósito, que nenhuma decisão condenatória poderá fundar-se exclusivamente ou de modo decisivo no depoimento ou nas declarações produzidas por uma ou mais testemunhas cuja identidade não foi revelada.
Quanto a esta questão, não podemos, entendemos nós, ter qualquer espécie de dúvida ou hesitação. É que convém assumir, nesta Câmara, de uma forma muito frontal e franca, uma realidade absolutamente clara: não haverá testemunhas, em alguns processos, se não tivermos assegurado a segurança absoluta das pessoas que vão depor, porque em muitos casos - e digo-o com alguma frontalidade e com a responsabilidade que se requer quando se produzem determinadas afirmações nesta Câmara -, se essa segurança não for assegurada, tal poderá acarretar a morte da própria testemunha ou de familiares seus. Nessas condições, nessas circunstâncias, ninguém estará em condições de prestar o seu depoimento.
Da mesma forma, permitimo-nos referir que é absolutamente importante garantir, quanto à execução técnica e tecnológica dos depoimentos, a salvaguarda do «bom segredo». Com isto queremos dizer, pese embora na proposta de lei ora em discussão esse aspecto não esteja suficientemente pormenorizado, que, para nós, também é absolutamente vital salvaguardar e assegurar o segredo, nomeadamente quando estamos perante o caso de ocultação da identidade das próprias testemunhas, em relação aos próprios técnicos e às pessoas que acompanham, por razão de ordem técnica, a prestação desse depoimento.
Entendemos que também relativamente a esses técnicos - e existem soluções técnicas e tecnológicas que poderão salvaguardar e garantir essa situação - o segredo deve ser absolutamente salvaguardado e garantido.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a criminalidade violenta e altamente organizada, para além de extremamente

eficaz, está a misturar-se com circuitos legais e a penetrar no tecido político e social do mundo, nomeadamente na Europa. Existem, hoje, sérios riscos de introdução de capitais criminosos nos circuitos legais, podendo mesmo dizer-se que se pode estar perante o risco de simbiose entre capitais legais e capitais criminosos.
Se é verdade que a luta contra o crime tem de ser travada também no combate às suas causas, temos de reconhecer que, quanto ao crime altamente organizado e violento, o Estado democrático não pode ter qualquer espécie de hesitação quanto à sua efectiva repressão, que tem de passar necessariamente pelo reforço da acção das polícias e das autoridades judiciais.
O combate eficaz ao crime organizado não é compatível, de modo algum, com situações que dificultam o trabalho às autoridades, enquanto os criminosos têm as mãos livres só porque actuam fora da lei.
Medidas como aquelas que, agora, são propostas pelo Governo são um instrumento importante, como também o são, ao nível do espaço europeu, o reforço da acção da nova Europol e o incremento da entreajuda judiciária para a troca de informações entre os diversos Estados.
O que está em causa no combate contra tal criminalidade é a defesa dos próprios cidadãos e dos valores civilizacionais que regem as nossas sociedades. A justiça deve ser reforçada enquanto há uma mão para a apoiar, como muito bem referiu, ainda há poucos dias, o Professor Jean Zigler, em Portugal.
Do mesmo modo, a opinião pública tem de ser sensibilizada de forma mais intensa para a realidade da criminalidade organizada e violenta. Existe, efectivamente, um problema de percepção quanto a esta espécie de criminalidade, que urge contrariar, sendo que a comunicação social deverá ter aí um papel decisivo.
Apoiamos, pois, a presente iniciativa do Governo, cujas medidas propostas são, em nosso entender, adequadas ao objectivo que visam atingir.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Subjacente à luta contra o crime organizado está a defesa da cultura europeia e dos valores humanistas que a regem. Combater a criminalidade altamente organizada e violenta é assegurar, também, a liberdade de cada um e de todos os cidadãos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O aperfeiçoamento da legislação de combate à corrupção e a adopção de medidas legislativas de protecção de testemunhas em processo penal são matérias que assumem uma importância e uma delicadeza indiscutíveis.
As duas iniciativas legislativas de que hoje nos ocupamos, tendo um fundo comum, que é o reforço dos mecanismos de combate à criminalidade organizada no domínio económico e financeiro, revestem-se de âmbito e natureza muito distinta e suscitam problemas muito diferentes, pelo que se exige uma abordagem distinta de cada uma delas.
A proposta de lei n.º 232/VII, relativa à alteração da legislação de combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira, surgiu, como ninguém ignora, na sequência da revelação de factos relacionados com a Jun-

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