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Quinta-feira, 2 de Setembro de 1999 I Série - Número 105 3829

DIÁRIO
Da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1998-1999)

COMISSÃO PERMANENTE
REUNIÃO DE 1 DE SETEMBRO DE 1999

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretário: Ex.mos Sr. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Fernando José Antunes Gomes Pereira

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei n.os 287 e 288/VII, das apreciações parlamentares n.os 111 e ll2/VII e do projecto de resolução n.º 140/VII, de requerimentos e de respostas a alguns outros.
A Câmara aprovou dois pareceres da Comissão de Ética, um relativo à retoma de mandato de três Deputados do PS e à substituição de um Deputado do PSD e outro autorizando um Deputado do PS a depor em tribunal como testemunha.
Deu-se conta de uma mensagem do Sr. Presidente da República fundamentando o veto por inconstitucionalidade que exerceu e devolvendo para reapreciação o Decreto n.º 415/VII-Regula as técnicas de procriação medicamente assistida.
Foi ainda aprovado o voto n º 159/VII-De congratulação pela realização da consulta popular em Timor Leste (PAR), após o que a Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio em memória das vítimas do condito. Produziram intervenções, além do Sr. Presidente, os Srs. Deputados Carlos Luís (PS), Luís Marques Mendes (PSD), Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes).
O Sr. Deputado Luís Marques Mendes (PSD), a propósito da realização de touradas com touros de morte em Barrancos, responsabilizou o Governo pela violação da lei e pelo desrespeito de decisões judiciais, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Sílvio Rui Cervan (CDS-PP) e Lino de Carvalho (PCP).
0 Sr Deputado Acácio Barreiros (PS) referiu-se às medidas tomadas pelo Governo para fazer respeitar alei relativamente às touradas em Barrancos. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Manuel Alegre (PS), que também deu explicações a uma defesa da honra do Sr. Deputado Luís Marques Mendes (PSD).

Ordem do dia.- Foi apreciada uma convocatória extraordinária do Plenário para discussão e votação do projecto de resolução n.º 140/VII - Constituição de uma comissão eventual de inquérito parlamentar às viagens dos Deputados (PSD), que foi rejeitada. Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Luís Marques Guedes (PSD), José Magalhães (PS), João Amaral (PCP), Sílvio Rui Cervan (CDS-PP) e Isabel Castro (Os verdes).
A Câmara procedeu também à apreciação das notícias vindas a público sobre a situação financeira da TAP, requerida pelo CDS-PP. Intervieram, além do Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (João Cravinho), os Srs. Deputados Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP), José Junqueiro (PS) e Ferreira do Amaral (PSD).
Procedeu-se ainda ao debate, requerido pelo PCP, sobre a travessia ferroviária da Ponte 25 de Abril, tendo usado da palavra, além do Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, os Srs. Deputados Octávio Teixeira (PCP) e José Junqueiro (PS).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 18 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

' Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
José Adelino Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Manuel Santos de Magalhães.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.

Partido Social Democrata (PSD):

Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Luís Campos Vieira de Castro.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular(CDS-PP):

António Carlos Brochado de Sousa Pedras.
Fernando José de Moura e Silva.
Pedro José Del Negro Feist.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):.

Lino António Marques de Carvalho.
João António Gonçalves do Amaral.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas, dos requerimentos e das respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa e foram admitidos, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 287/VII - Direito de reunião (ALRM), quer baixou à 1.ª Comissão; proposta de lei n.º 288/VII - Tarifa de formação para estudantes do ensino superior da Região Autónoma da Madeira, (ALRM), que baixou à 6.1 Comissão; apreciação parlamentar n.º 111/VII - Decreto-Lei n.º 237/99, de 25 de Junho, que extingue a JAE e a JAE - Construção S.A. e cria em sua substituição o Instituto das Estradas de Portugal (IEP), o Instituto para a Construção Rodoviária (ICOR) e o Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Rodoviária (ICERR) (PCP); apreciação parlamentar n.º 112/VII - Decreto-Lei n.º 237/99, de 25 de Junho, que Extingue a JAE e a JAE Construção S.A., e cria em sua substituição o Instituto das Estradas de Portugal (IEP), o Instituto para a Construção Rodoviária (ICOR) e o Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Rodoviária (ICERR) (PSD); projecto de resolução n.º 140/VII - Constituição de uma comissão eventual de inquérito parlamentar às viagens dos Deputados (PSD).
Foram apresentados na Mesa, nos dias 9 e 12 de Julho, os seguintes requerimentos: aos Ministérios do Trabalho e da Solidariedade e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; aos Ministérios da Educação e da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.
Na Comissão Permanente de 14 de Julho: a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; a diversos Ministérios, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira; ao Ministério das Finanças e à Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, formulados pelos Sr. Deputado Jorge Ferreira.
No dia 22 de Julho: ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco; aos Ministérios do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e da Saúde, formulados pela Sr.ª Deputada Teresa patrício Gouveia; ao Ministério do Ambiente, formulado pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
No dia 27 de Julho: a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Roque Cunha; ao Sr. Primeiro-Ministro e a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Pimenta Dias; aos Ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Ambiente, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; à Direcção-Geral de Energia, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
No dia 28 de Julho: ao Ministério da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Roque Cunha; aos Ministérios do Ambiente, e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
No dia 19 de Agosto: ao Ministério do Ambiente, formulados pelo Sr. Deputado Aires de Carvalho; aos Ministérios do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Administração Interna, formulado pela Sr.ª Deputada Manuela Aguiar; ao Ministério tia Educação formulado pelo Sr. Deputado Moura e Silva.

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a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Luís Sá; a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Pimenta Dias; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: no dia 29 de Junho Luísa Mesquita, no dia 27 de Novembro; António Martinho, nas sessões de 18 de Fevereiro e 21 de Maio; Alexandrino Saldanha, na sessão de 30 de Março; Rodeia Machado, na sessão de 22 de Abril; António Rodrigues, na sessão de 16 de Junho.
No dia 1 de Julho: Manuela Aguiar, no dia -2 de Novembro e na sessão de 4 de Fevereiro; Alexandrino Saldanha, na sessão de 14 de Abril; Rodeia Machado, nas sessões de 22 de Abril e 7 de Maio; Pimenta Dias, na sessão de 6 de Maio; Aires de Carvalho, lia sessão de 25 de Maio.
No dia 5 de Julho: Luísa Mesquita, na sessão de 6 de Março; Castro Almeida, na sessão de 30 de Abril; José Junqueiro, na sessão de 4 de Junho; Jorge Roque Cunha, José Cesário, Roleira Marinho e Carmen Francisco, no dia 11 de Agosto, nas sessões de 18 de Novembro, 31 de Março, 7, 13 e 16 de Abril e 12 de Maio; Rui Pedrosa, no dia 13 de Outubro; Isabel Castro, na sessão de 21 e no dia 19 de Outubro, na sessão de 2 e no dia 4 de Dezembro; .Limo de Carvalho, na sessão de 9 de Dezembro; Fernando Pedro Moutinho, no dia 5 de Janeiro; Pimenta Dias, na sessão de 10 de Março; Jovita Ladeira, na sessão de 25 de Março; Bernardino Soares, nas sessões de 8, 21 e 23 de Abril; Rodeia Machado, na sessão de 22 de Abril; Alexandrino Saldanha, no dia 26 de Abril; Ricardo Castanheira, na sessão de 5 de Maio e no dia 2 de Junho; João Carlos Duarte, na sessão de 19 de Maio.
Nos dias 6 e 8 de Julho: Rodeia Machado, ria sessão de 21 de Janeiro; Carmen Francisco, no dia 9 de Março; Pimenta Dias, na sessão de 12 de Março; Ricardo Castanheira, no dia 23 de Março;. Rui Namorado, na sessão de 20 de Maio; Jovita Ladeira, na sessão de 24 de Junho.
No dia 13 de Julho: Alexandrino Saldanha, na sessão de 14 de Janeiro e no dia 2 de Junho; Luís António Veríssimo, na sessão de 6 de Março; António Rodrigues, na sessão de 21 de Maio; José Reis, na sessão de 26 de Maio; Isabel Castro, na sessão de 16 de Junho.
No dia 16 de Julho: Mota Amaral, na sessão de 12 de Março; António Barradas Leitão, nas sessões de 28 de Maio, 9 de Junho, 23 de Setembro e 1 de Outubro; Fernando Serrasqueiro, na sessão de 28 de Janeiro; Manuela Aguiar, na sessão de 5 de Fevereiro; Jovita Ladeira, na sessão de 10 de Fevereiro; Jorge Valente, na sessão de 18 de Fevereiro; José Cesário, na sessão de 25 de Fevereiro; Fernando Santos Pereira, na sessão de 26 de fevereiro; Ricardo Castanheira, na sessão de 4 de Março; Carmen Francisco, no dia 9 de Março; Carlos Alberto Santos e Pimenta Dias, nas sessões de 18 de Março é 23 de Junho; Alexandrino Saldanha e Bernardino Soares, nas sessões de 21 de Abril e 19 de Maio; Rodeia Machado, na sessão de 22 de Abril; Maria José Nogueira Pinto, na sessão de 28 de Abril; Roleira Marinho, na sessão de 12 de Maio.
Nos dias 19 e 29 de Julho: Rodeia Machado, na sessão de 4 de Março; Ricardo Castanheira, no dia 23 de Março; Jorge Roque Cunha, no dia 19 de Abril; Manuela Aguiar, na sessão de 12 de Maio; Alexandrino Saldanha, na sessão de 13 de Maio; Fernando Pereira, na sessão de 2 de Julho.
No dia 22 de Julho: Isabel Castro, nos dias 3 de Dezembro e 3 de Junho; Rodeia Machado, na sessão de 20 de Janeiro; Fernando Pedro Moutinho, na sessão de 18 de Fevereiro; Barbosa de Melo, na sessão de 24 de Fevereiro; Manuel Alves Oliveira, na sessão de 21 de Abril; Jorge Valente, Manuela Aguiar, Lino de Carvalho e Rui Namorado, nas sessões de 12, 13 e 20 de Maio; António Filipe, na sessão de 14 de Maio; Luísa Mesquita, na sessão de 19 de Maio; Jovita Ladeira, na sessão de 17 de Junho; Jorge Lacão, na sessão de 2 de Julho.
No dia 27 de Julho: Jorge Roque Cunha, na sessão de 17 de Fevereiro; Rodeia Machado, nas sessões de 4 e 10 de Março.
No dia 28 de Julho: Ana Catarina Mendonça e Antão Ramos, na sessão de 22 de Abril; Arménio Santos, na sessão de 13 de Maio; Alexandrino Saldanha, no dia 8 de Junho; Jorge Lacão, na sessão de 2 de Julho.
No dia 29 de Julho:- Pimenta Dias, na sessão de 15 de, Abril; António Filipe, na sessão de 19 de Maio; Fernando Pedro Moutinho, na sessão de 25 de Maio; Hermínio Loureiro, na sessão de 1 de Julho.
No dia 3 de Agosto: Hermínio Loureiro, na sessão de 4 de Março; Odete Santos, na sessão de 26 de Março; António Rodrigues, na sessão de 7 de Abril; Joaquim Sarmento, na sessão de 22 de Abril; José Reis, na sessão de 26 de Maio; Alexandrino Saldanha, na sessão de 30 de Junho; Manuel Alves Oliveira, na sessão de 1 de Julho; Lucília Ferra e Manuel Moreira, na sessão de 2 de Julho.
Nos dias 5, 6 e 13 de Agosto: Fernando Pedro Moutinho, na sessão de 26 de Maio; Jorge Roque Cunha, no dia 22 de Junho; José Junqueiro, na sessão de 23 de Junho; Correia de Jesus, na sessão de 2 de Julho.
No dia 18 de Agosto: Jovita Ladeira, na sessão de 8 de Janeiro; Jorge Roque Cunha, no dia 2 de Março e na sessão de 20 de Maio; Rodeia Machado, no dia 23 e na sessão de 24 de Março; Antão Ramos, nas sessões de 15 de Abril e 13 de Maio; Manuel Alves Oliveira e Paulo Arsênio, nas sessões de 21 de Abril e 1 de Julho; Isabel Castro, na sessão de 21 de Maio; António Filipe, no dia 2 de Junho; Afonso Lobão, na sessão de 23 de Junho; Lucília Ferra, na sessão de 2 de Julho; Heloísa Apolónia, na Comissão Permanente de 14 de Julho.
No dia 23 de Agosto: José Cesário, na sessão de 8 de Abril; Fernanda Mota Pinto, na sessão de 15 de Abril; Jorge Ferreira, nas sessões de 20 de Maio e 16 de Junho; Isabel Castro, na sessão de 17 de Junho; António Saleiro, na sessão de 30 de Junho; Heloísa Apolónia e Lino de Carvalho, na Comissão Permanente de 14 de Julho.
Srs. Deputados, vou ainda dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Ética, cuja reunião foi realizada no dia 1 de Setembro de 1999, pelas 11 horas, onde foram observadas as seguintes retomas de mandatos e substituição de Deputados.
Retomas de mandatos, nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2 do Estatuto dos Deputados, de Deputados do Partido Socialista: Antero Gaspar de Paiva Vieira, em 29 de Agosto passado, inclusive, cessando Aníbal Marcelino Gouveia; José de Sampaio Lopes, em 29 de Agosto passado, inclusive, cessando Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira; e Joaquim Américo Fialho Anastácio, em 29 de Agosto passado, inclusive, cessando. Filipe Mesquita Vital.
Substituição, nos termos da alínea h), do n.º 1 do artigo 20.º, do Estatuto dos Deputados, do Deputado do, PSD, Carlos Alberto Pinto por Maria de Lurdes Lara Teixeira, com início em 5 de Agosto passado.

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O parecer é o seguinte: As retomas de mandatos e a substituição em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão o parecer que acabou de ser lido.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, for aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de outro relatório e parecer da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa (Processo 447/99 - 4 º Juízo - 1 .ª Secção), a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Manuel Niza Antunes Mendes, a prestar depoimento, como testemunha, no âmbito dos autos em referência, em audiência marcada para o próximo dia 16 de Setembro corrente, pelas 10 horas e 30 minutos, no Tribunal em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar o referido parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados; o Sr. Secretário vai ainda ler uma comunicação do Sr. Presidente da República.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados o texto da comunicação é do seguinte teor "Ex.mo Sr. Presidente da República, tenho a honra de junto enviar a V. Ex.a, nos termos e para os efeitos do artigo 136.º, n.º 1, da Constituição da República, o autógrafo tia lei referente ao Decreto da Assembleia da República n.º 415/VII que regula as técnicas de procriação medicamente assistida.
Apresento a V. Ex.ª os meus respeitosos cumprimentos pessoais e de muita estima, Jorge Sampaio".

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o texto enviado à Assembleia foi distribuído por todos os grupos parlamentares e está já publicado, pelo que creio que é dispensável a sua leitura. Em todo o caso, se os Srs. Deputados quiserem, poder-se-á proceder á sua leitura, apesar de hoje, em Conferência de Representantes dos Grupos Parlamentares, ter sido entendido que este assunto deverá ser encarado na primeira Conferência de Representantes dos Grupos Parlamentares que reunir após as eleições legislativas.
Penso que esta é uma atitude sensata e que, na verdade, respeita o facto de então se constituir um novo universo parlamentar.
Srs. Deputados, quero dar-vos conta de um voto de congratulação que tomei a iniciativa de apresentar, com o consentimento de todos os grupos parlamentares, e relativamente ao qual recebi uma sugestão de um pequeno acrescento no fim.
É o seguinte: "Voto n.º 159/VII - De congratulação pela realização da consulta popular em Timor Leste
O povo de Timor, ao acorrer às urnas em percentagem de eleitores inscritos próxima dos 100%, para poder exercer o direito de autodeterminar o seu futuro, e ao tê-lo feito por forma extremamente ordeira, disciplinada e corajosa, superando intimidações, ameaças e até agressões, deu ao mundo livre um exemplo digno de registo, exaltação e apreço.
Após um quarto de século de heróica resistência ao invasor, de armas na mão ou em permanente protesto cívico, aproxima-se o momento histórico da conquista da independência e da liberdade. Timor será, em breve, por mais que o opressor ou os seus asseclas no terreno ainda tentem adiar ou mesmo evitar esse resultado, a Pátria livre de todos os timorenses. Está à crista, desejavelmente sem mais mortes e mais violência, a "Terra da Promissão" tão longamente desejada.
Portugal, que manteve com Timor uma plurissecular relação de convívio, sente-se particularmente feliz por ter podido contribuir, através de sucessivos actos de solidariedade, para a sua libertação, convicto como está de que o processo que conduz a ela é a partir de agora irreversível.
A Indonésia enfrenta, ela também, o processo da sua libertação, optando pela democratização do seu próprio regime. A emancipação de Timor é uma pedra fundamental desse processo e ficará a constituir o melhor certificado da sinceridade com que o encara.
Um próximo futuro de liberdade, democracia e progresso em Timor e na Indonésia com substituição do machado de guerra pelo cachimbo da paz, com Portugal a assumir as suas responsabilidades históricas para com o povo de Timor e com relações diplomáticas e de cooperação bilateral com a Indonésia, é um cenário que tem tanto de realista como sedutor. E que bem justifica a total renúncia à violência dos que ainda apostem nela para superar os seus recalques ou saciar os seus ódios.
Esta causa tem os seus mártires e os seus heróis. Mártires todos os que morreram por uma pátria livre, heróis o povo de Timor, todo ele, conduzido pelo seu líder histórico Xanana Gusmão, que sublimou o seu martírio em sabedoria, tolerância e espírito de concórdia. E também as grandes figuras de D. Ximenes Belo e do Dr. Ramos Horta, distinguidos, pela sua corajosa dedicação à causa de Timor, com o alto galardão do Prémio Nobel. Realce justifica ainda o papel da Igreja Católica e, sobretudo mais recentemente, a condenação pela consciência universal da ocupação de Timor pela Indonésia.
Neste momento de expectativa ansiosa pelo apuramento dos resultados da consulta popular, e não menos pelo grau de aceitação pacífica do seu significado histórico, a Comissão Permanente da Assembleia da República, na sua reunião de 1 de Setembro de 1999, congratula-se pelo resultado já alcançado e pelas expectativas que justifica e endereça ao povo de Timor a sua legítima esperança de um futuro de independência, liberdade, paz e progresso".
Foi-me sugerida a seguinte adenda: "A Comissão Permanente cometeu ainda o Presidente da Assembleia da República a incumbência de transmitir ao Sr. Secretário-Geral da ONU e ao Presidente da República da Indonésia a sua preocupação pelos novos surtos de violência exteriores ao acto de consulta e o seu empenhamento em que sejam de imediato tomadas as providências necessárias para assegurar a paz e a ordem no território de Timor."
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

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O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista associa-se ao voto que V. Ex.ª acabou de apresentar a esta Câmara e 'entende que o passado dia 30 de Agosto foi um dia histórico para o destino de Timor Leste.
Começamos, pois, por saudar o povo de Timor, pela coragem, pela determinação e pela forma cívica e corajosa como acorreu às urnas num ambiente pacífico e de determinação.
Recordamos aqui todos aqueles que lutaram para verem livre do jugo indonésio a pátria de Timor Leste, ao longo de 23 anos, nas montanhas, pegando em armas e com uma coragem bem determinada, e no exterior - e foram muitos -, percorrendo as diversas chancelarias do mundo para sensibilizar chefes de Estado, políticos, organismos internacionais e a opinião pública, em geral, pela causa de Timor Leste.
Penso que esse dia glorioso chegou e que aos timorenses, num acto de coragem e de determinação, no dia 30, foi possível escolher o seu próprio destino.
Também quero salientar aqui o papel extraordinário que as Nações Unidas, através da UNAMET, têm levado a cabo em situações bem desceis e com muitos contratempos de percurso.
Desta tribuna e em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, quero lembrar também as dezenas e dezenas de milhar de timorenses que caíram, que tombaram, que lutaram por um ideal, naquilo que foi, talvez, o maior genocídio, em termos relativos, deste século.
Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, quero manifestar ao povo timorense a nossa determinação, a nossa coragem e o nosso apoio para que o povo de Timor Leste possa crescer, desenvolver-se como Estado, um Estado independente, se essa tiver sido a sua escolha, em paz e em desenvolvimento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero dizer também duas palavras sobre o voto que foi apresentado e sobre' a questão geral, do processo em Timor Leste.
A primeira palavra é, evidentemente, de congratulação, tal como é proposto no voto, pela elevadíssima participação dos timorenses neste referendo, o que é factor de grande satisfação e significa, a nosso ver, como temos sublinhado e agora reafirmamos, que os timorenses, que lutaram durante mais de 20 anos pelo seu direito à autodeterminação, decidiram participar maciçamente neste referendo, querendo tomar nas suas mãos a decisão sobre o seu destino futuro, o que evidencia que o direito à autodeterminação é, de facto, um direito inalienável.
O povo timorense, que resistiu estóica e heroicamente, durante mais de duas décadas, a um conjunto de atrocidades do regime indonésio, demonstrou, com esta elevada participação, ser um povo adulto, responsável, com sentido do seu próprio destino, e nós, que ao longo dos anos temos sido solidários com o povo timorense, exprimimos também aqui, uma vez mais, a nossa congratulação por esta elevadíssima participação e por este exercício do seu direito à autodeterminação.
Uma segunda palavra é para deixar aqui também vincado - e o Parlamento deve ser muito claro relativamente a isso, numa mensagem a sair hoje daqui - que todos desejamos que, contados os votos, todas as partes envolvidas assumam o compromisso do respeito pela vontade popular, que foi exercida nas urnas nos últimos dias.
O referendo foi uma conquista importante e o resultado deve ser respeitado, em particular depois de tudo o que sucedeu e tendo em atenção esta elevadíssima participação dos timorenses na ida às urnas.
O Parlamento português, como uma parte empenhada, interessada e, ao longo dos anos, sempre solidária neste processo, deve deixar aqui essa mensagem muito clara e exprimi-la publicamente.
Uma terceira palavra, Sr. Presidente, é de preocupação. Tive a ocasião, no início desta sessão, de me dirigir a si, dizendo-lhe que me parecia bem o voto mas que ele deveria ser complementado com uma palavra de preocupação e com uma mensagem condizente essa preocupação.
Assim, parece-me bem o texto que o Sr. Presidente acabou de propor como aditamento, ou seja, neste momento, para além da congratulação, temos todos motivos de séria preocupação. Os dados, as informações, as notícias que chegam do território de Timor Leste apontam para uma tendência de agravamento do clima de tensão, para um agravamento da situação, para um clima de violência, de intimidação, de coacção, o que, obviamente, nos suscita novas, renovadas e reforçadas preocupações.
E é nessa linha que esta palavra de preocupação não deve ser meramente retórica. Seria importante, para além dos elogios, justos, já dispensados à comunidade internacional e em particular às Nações Unidas, que o Parlamento português, hoje reunido, exprimisse uma mensagem de preocupação ao Secretário-Geral das Nações Unidas e ao Presidente da Indonésia: às Nações Unidas na linha do seu papel mediador, de árbitro deste processo; ao Presidente da Indonésia porque não é admissível que um regime como o indonésio, com as instituições de que dispõe e a força que detém, não seja capaz de garantir a paz e a segurança naquele território.
Não pode haver duplicidade de comportamento, não pode haver um discurso público de respeito pelo resultado do referendo e pela garantia da segurança e, depois, não haver os actos e as acções condizentes com este discurso. Nós somos - pela coerência e não podemos aceitar duplicidade ou dualidade de comportamentos.
Seria bom, repito, que o Parlamento exprimisse esta mensagem ao Secretário-Geral das Nações Unidas e ao Presidente da Indonésia, com a firmeza dos nossos princípios e das nossas convicções.
Termino desejando que, com todas estas preocupações, o processo acabe bem. E neste momento é devida aqui, como também já foi referido, uma palavra de homenagem não só à resistência, que, de facto, é um exemplo a enaltecer, como à igreja católica, em particular à igreja católica de Timor Leste, formalizada na pessoa do Sr. Bispo D. Ximenes Belo, e ainda uma palavra a quem ainda não pôde usufruir do seu direito à liberdade, Xanana Gusmão, que é um símbolo e que devemos também, aqui e neste momento, homenagear e enaltecer. Ele foi um exemplo e é este exemplo de sentido de responsabilidade e de sentido de luta que nos leva, neste momento, a dizer que esperamos, aguardamos e, acima de tudo, ansiamos .que tudo corra bem, para que, neste final de século, o povo de Timor Leste tenha, finalmente, o direito à dignidade, à liberdade e ao seu próprio futuro.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados e Srs. Jornalistas, o som desta sala passou a ser também digital, o que significa que passa a ser também sensível aos telemóveis que estão ligados - e penso que alguns estarão, neste momento. Assim, peço a todos o favor de os desligarem, caso se tenham esquecido disso.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Silvio Rui Cervan.

O Sr. S7Nio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Partido Popular, quero associar-me também a este voto, que tem hoje, aqui, dois objectivos bem distintos. 0 primeiro é, efectivamente, de congratulação e, como voto de congratulação, lembro que ele só é possível hoje, dia 1 de Setembro de 1999, na Assembleia da República de Portugal, porque em Timor Leste houve quem resistisse. Portanto, é fundamental que possamos lembrar, com um sublinhado muito especial, todos os timorenses que compõem a resistência e a igreja católica timorense.

Vozes do CDS-PP: - muito bem!

O Orador: - Temos de ter plenamente a consciência de que sem a resistência em Timor Leste e sem a igreja católica timorense todo este trabalho não teria o desfecho que, neste momento, julgamos previsível e possível.
Quero deixar também uma palavra de preocupação. Desejamos que Timor Leste recupere a normalidade, mas a normalidade em Timor, hoje, dia 1 de Setembro de 1999, foram mais dois mortos da parta da manhã. E como não é esta a normalidade que desejamos para Timor, preocupação tem também de ser uma palavra cone um sublinhado. Morreram hoje, em Timor Leste - hoje, como ontem e como anteontem -, mais dois timorenses.
Se queremos ajudar Timor Leste - e queremos certamente, pois houve um amplo consenso na Comissão de Acompanhamento da Situação em Timor Leste, houve um amplo consenso em toda a Assembleia da República, houve um amplo consenso em toda a opinião pública portuguesa, houve um amplo consenso entre quase todos os portugueses à volta da questão de Timor -, hoje, isso significa duas palavras, que têm unta necessidade muito específica. São elas as palavras "reconstrução" e "reconciliação". Ora, reconstrução e reconciliação só são possíveis, hoje, em Timor Leste, se estiverem associadas a compreensão e a perdão em relação a um conjunto de coisas com as quais muitos de nós também não concordamos, também não compreendemos, também verberamos, mas que, a partir de hoje, e a confirmarem-se os resultados que temos a expectativa que venham a ser francamente favoráveis à independência do povo timorense, têm de ser palavras presentes em toda a actuação do Estado português, em toda a actuação dos órgãos de soberania portugueses e, portanto, em toda a actuação da Assembleia da República portuguesa.
Uma última nota, para que Portugal saiba assumir as suas responsabilidades. Ora, aqui, assumir responsabilidades representa, em relação a Timor Leste, corrigir erros graves que tivemos noutro tipo de processos, para com povos também amigos, também irmãos. Assumir as nossas responsabilidades em relação a Timor Leste é saber receber e é saber dar, é saber dar e é saber receber.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, também quero manifestar a nossa total adesão e concordância com o voto de congratulação, subscrito pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, pela grande vitória que os timorenses obtiveram pelo facto de terem conseguido fazer este referendo, a grande vitória que obtiveram por, depois de 24 anos de resistência e de luta, quer no interior, contra o invasor indonésio, quer no exterior, contra a incompreensão e os interesses da mais variada índole - interesses políticos, económicos, militares - que em boa parte do mundo se levantaram, durante muitos anos, contra a opinião e contra a vontade dos timorenses.
Foi também uma vitória porque os timorenses conseguiram ultrapassar essas incompreensões e esses interesses que, durante muito tempo, se levantaram contra os seus desejos e contra aquilo que eram as suas aspirações à manifestação da sua autodeterminação.
Foi ainda uma vitória porque estes quase 100% de votantes que se registaram no passado domingo significam também a vitória contra a intimidação que durante os últimos dois menos, pelo menos, se fez pesar sobre o povo timorense, tentando afastá-lo das urnas.
Mas como já aqui foi referido, Sr. Presidente e Srs. Deputados, também nós entendemos que os riscos e os perigos persistem. Todos os temos visto nos últimos dias e, nesse sentido, a par da congratulação, teremos também de suscitar, perante o povo português e perante a comunidade internacional, a necessidade de ninguém baixar os braços para que esses perigos e esses riscos possam, também agora, ser vencidos e para que, depois de serem ultrapassados, depois da declaração dos resultados - e julgo que todos nós esperamos que eles sejam no sentido da manifestação do desejo da independência de Timor Leste -, Portugal continue a assumir, se possível ainda de forma mais forte, as suas responsabilidades perante Timor Leste e os timorenses, responsabilidades a todos os níveis, em termos de apoio político, diplomático e técnico, em várias áreas, mas também com aquilo que muita falta fará para o inicio do novo destino do povo de Timor Leste, a sua independência, ou seja, o apoio económico e o apoio financeiro.
Portugal não pode, de forma alguma, recusar ou pôr em causa, minimamente, qualquer um desses tipos de apoio.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome de Os Verdes, quero exprimir todo o nosso apoio a este voto, que é sinónimo de algo que todos, nesta Câmara, partilhamos, como, seguramente, todos os portugueses partilham: a comoção de ter visto um povo, que durante anos e anos lutou, quase sem armas, isolado, ao fim de 24 anos, exprimir unia vontade da forma como o fez, com a emoção com que o fez, com a firmeza e o entusiasmo com que o fez. Julgo que, porventura, talvez nunca antes tenha sentido a importância e como pode ser belo o acto de um voto, um voto dando sinal de uma mudança, que, julgo eu, é muito importante compreender no seu exacto significado,

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depois de tantos e tantos obstáculos que, com tanta determinação, o povo de Timor Leste soube vencer.
Há, duas coisas que, neste momento, me parem ser de sublinhar: este acto é muito importante, tem um valor simbólico extremamente muito grande, vai ao encontro daquilo que nós desejámos, vai ao encontro daquilo que muitos, noutras latitudes, tentaram também que acontecesse e, portanto, penso que não podemos permitir que esta coisa tão bela que aconteceu possa perder-se. Ou seja, a comunidade internacional, para além de ter hoje uma grande responsabilidade, depois de anos em que muitas vezes foi cúmplice, pelo silêncio, da violência em Timor Leste, não pode fechar os olhos depois deste acto eleitoral àquilo que irá passar-se a seguir e tem também de assegurar condições de segurança para que, no território, este processo não seja perdido.
A última coisa que me parece importante que assumamos - e foram muitos os que em Portugal exprimiram, também nas ruas, o seu desejo de que um dia Timor Leste pudesse ser uma nação livre e independente - é que uma nação livre e independente precisa de apoio e esse apoio é algo que julgo que temos a responsabilidade de não negar, apelando aos outros para também, nesta hora, serem solidários.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, penso que seria difícil uma maior unanimidade, não apenas de expressões, mas de sentimentos, do que aquela que estamos a viver aqui. Creio que essa unanimidade, esse consenso, se pode estender, com raríssimas excepções, à opinião pública portuguesa e, portanto, temos de nos felicitar por termos conseguido todos esta vitória moral, que, mais do que política, é uma vitória dos direitos humanos, da liberdade e 'do princípio do direito à autodeterminação dos povos.
Creio que, nos últimos tempos, a coisa mais bonita que aconteceu no mundo foi o que aconteceu há dois dias em Timor Leste. Foi uma lição, foi um exemplo e, de facto, Portugal tem de estar à altura da suas responsabilidades históricas, o que creio que irá acontecer. Creio que estamos "prisioneiros" dessa responsabilidade e que, se algum governo pudesse admitir não estar à sua altura, o povo exigiria que estivesse, pelo que o problema não se põe.
Srs. Deputados, vou, então, mandar acrescentar aquela parte que li, mas à qual adicionei, em resultado de uma sugestão que também foi aqui dada, a seguinte parte:. "o empenhamento em que sejam de imediato tomadas todas as providências necessárias a assegurar a paz e a ordem no Território de Timor, e a imediata devolução à liberdade de Xanana Gusmão.".
Por outro lado, na parte em que se fala na consciência universal da ocupação de Timor Leste pela Indonésia, eu acrescentaria o seguinte: "que a ONU e o seu Secretário-Geral (...)", porque se esqueceu a referência ao Secretário-Geral da ONU, " (...) souberam interpretar de forma genuína e até agora eficaz.".
Srs. Deputados, se concordassem, procederíamos, então, à votação do voto n.º 159/VII - De congratulação pela realização da consulta popular em Timor Leste, com as alterações que acabei de vos referir.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Aplausos gerais, de pé.

Srs. Deputados, apesar da hora ser de alegria, creio que não deixará de fazer sentido guardarmos um minuto de silêncio por todos os mortos pela causa de Timor Leste.

A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.

Srs. Deputados, o voto será endereçado ao Secretário-Geral da ONU, ao Presidente da República da Indonésia, ao Presidente da República de Portugal e ao Primeiro-Ministro de Portugal, a D. Ximenes Belo e ao Dr. Ramos Horta. Penso que são as entidades a quem deve ser enviado.
Ainda antes de iniciarmos o período da ordem do dia, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra para uma fazer uma intervenção sobre os episódios lamentáveis dos últimos dias, que o País todo conheceu, a propósito do caso de Barrancos. Não é, porventura, sobre a situação de Barrancos que quero centrar a minha intervenção, mas é, em particular, sobre as consequências deste evento para o País inteiro, para a autoridade do Estado e para o exercício democrático.
Em primeiro lugar, tenho de expender uma ou duas palavras para enquadrar a questão. Neste caso que o País presenciou nos últimos dias pelos meios de comunicação social, uma lei da República foi violada e decisões dos tribunais foram totalmente desrespeitadas. O Governo, o verdadeiro responsável por esta situação, de uma penada, incorreu, de facto, nestas duas situações intoleráveis: permitiu que uma lei da República fosse violada e permitiu, o que ainda é mais grave, que uma decisão judicial actualizada, porque tomada pouco tempo antes da realização desta ocorrência, fosse totalmente desrespeitada.
A primeira questão que aqui se coloca é a seguinte: a lei pode estar, eventualmente, errada, a lei pode ser, eventualmente, injusta, mas, num Estado de direito, uma lei que se considera errada muda-se e uma lei que se considera injusta altera-se. O que não se pode é não alterar e não mudar a lei e fazer apenas e só com que ela seja violada e desrespeitada. Isto que aconteceu é o contrário do Estado de direito democrático.
Digo isto com o à vontade que está relacionado com o processo legislativo sobre esta matéria, não deixando de recordar aqui os factos porque eles doem a algumas das bancadas e a alguns dos Srs. Deputados aqui presentes.
Nos últimos meses, o Partido Socialista, acompanhado, depois, por projectos do PCP e do CDS-PP, tomou iniciativas legislativas no sentido de alterar esta lei, abrindo uma excepção para Barrancos. Digo-o com o à vontade de quem lidera uma bancada que decidiu votar contra qualquer um daqueles três projectos. Havia, todavia, nestes três partidos, uma maioria de quase dois terços que, se quisesse, alteraria a lei. O Partido Socialista, responsável por esta situação, fez exactamente o oposto, ou seja, apresentou uma proposta de lei e deixou-a cair, apresentou uma proposta de lei para fazer de conta que queria resolver a situação e, tendo maioria mais do que suficiente para a fazer aprovar, não o quis fazer. Esta é a hipocrisia primeira que aqui se verificou.
Se pensavam que a lei estava errada ou que era injusta, ,tiveram condições para a alterar e apresentaram mesmo iniciativas, mas, depois, deixaram cair tudo. Digo-o cole o à vontade de quem, como líder da bancada e a titulo pessoal, é contra a existência de touros de morte, mesmo com um regime de excepção. De qualquer modo, houve aqui uma maioria que, se quisesse, poderia ter feito esta alteração. Não quis e esta é a suprema

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hipocrisia e é uma cobardia política, ou seja, não só não alteraram a lei como, a seguir, não a souberam respeitar e fazer aplicar.

O Sr. Rui Namorado (PS): - Qual foi a sua heroicidade durante 10 anos de governo?!

O Orador: - Mas a segunda questão, que é ainda mais absurda e hipócrita, é a justificação dada pelo Governo nos últimos dias para a situação de desrespeito aos tribunais que aconteceu. A justificação dada foi a de que toda aquela omissão do Governo era para evitar um mal maior, mas esta alternativa apresentada pelo Governo é a chamada "esperteza saloia"! É um mero truque, é uma mera tentativa de chantagem, ainda por cima feita com muito pouca subtileza e com muito pouca inteligência! A questão não estava em incorrer num mal maior, já que nenhum português desejava isso nem era necessário que isso sucedesse. A questão estava apenas e só em fazer cumprir uma lei e, acima de tudo, uma decisão judicial, que foi completamente desrespeitada.
De quem é a responsabilidade de tudo isto? Há quem diga que é, sobretudo, do Ministro da Administração Interna. É, contudo, minha convicção que a responsabilidade de toda esta situação é apenas e só do Sr. Primeiro-Ministro. Digo isto porque o Ministro da Administração Interna executou uma decisão de não aplicar a lei e de não aplicar uma decisão judicial, mas essa decisão fora tomada ao mais alto nível pelo Sr. Primeiro-Ministro, porque foi colocada como questão política essencial. É certo que o Sr. Ministro da Administração . Interna, responsável pela aplicação desta omissão do Estado, se ridicularizou publicamente com as explicações que deu. É um Ministro que ficou completamente ridicularizado e o ridículo, também em política, mata!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Se fosse assim, V. Ex.ª já estava morto!

O Orador: - Mas a grande responsabilidade, a primeira responsabilidade, está no Sr. Primeiro-Ministro que, como ontem se viu publicamente, brinca com coisas sérias. Como ontem publicamente, perante o País e os órgãos de comunicação social, se viu, o Sr. Primeiro-Ministro brinca com coisas sérias, em particular com o exercício de autoridade do Estado e com decisões dos tribunais, brincando, finalmente, às leis da República.
O Sr. Primeiro-Ministro é o grande, o primeiro responsável por esta situação, que é grave, e, mais do que por aquele caso, pela imagem que tudo isto dá ao País. A partir de agora, qual passa 'a ser a imagem da GNR no País? A de uma GNR completamente desacreditada. Como é que, a partir de agora, é possível um cidadão ter respeito pela Guarda Nacional Republicana, instituição que devia merecer mais respeito ao Governo?
Quanto aos tribunais, fica a ideia, aos olhos de qualquer cidadão, de que uma decisão judicial vale o que vale. Afinal, parece que vale coisa nenhuma. Aquela decisão do tribunal valeu "zero" e valeu "zero" porque quem tinha o dever e a obrigação de a cumprir e de a acatar fez dela "tábua rasa". Fica, sobretudo, a imagem de um Estado que não tem autoridade, que coloca a autoridade pelas ruas da amargura, e de um Governo que não tem autoridade nem coragem para exercer aquilo que num Estado de direito é o mais elementar: a autoridade das leis, a autoridade das decisões judiciais.
Esta questão não é uma questão de direita, de centro ou de esquerda, é, sobretudo, uma questão de princípios num Estado de direito. Não há liberdade sem autoridade, não há democracia sem autoridade, não há um Estado de direito sem o respeito pelas leis e pelas decisões judiciais. Chegou-se, de facto, a esta situação absolutamente incrível.
De resto, se levássemos à letra a doutrina absurda, hipócrita e intolerável expressa publicamente pelo Sr. Primeiro-Ministro, tínhamos de chegar à conclusão que a GNR podia ser dissolvida, que a PSP podia ser dissolvida, que não era necessária a existência de forças de segurança, porque bastavam alguns oficiais de diligências e dessa maneira estavam cumpridas, segundo o Governo, a autoridade do Estado, as leis e as decisões judiciais.
É uma vergonha, é um absurdo, é, de facto, o exemplo mais gritante de como este Governo não sabe lidar com o exercício da autoridade, sobretudo na defesa da liberdade, da democracia e da pureza do Estado de direito.
A justiça, em Portugal, não está bem, tem estado bem doente, mas com estes exemplos o Governo coloca a justiça portuguesa ainda mais de rastos, ainda mais pelas ruas da amargura e qualquer cidadão de meridiano bom senso coloca a si próprio esta questão: o que valem as decisões judiciais? Para que servem, afinal, as forças de segurança? Que governo é este que tem esta actuação hipócrita, lamentável e intolerável?
Sr. Presidente, termino sublinhando o seguinte ponto: de há muitos anos a esta parte, é nítido que entre o PS e o PS13 há, desde logo, esta grande diferença: nós privilegiamos...

Vozes do PS: - A cacetada!

O Orador: - ... os princípios de um Estado de direito e o exercício da autoridade democrática do Estado como forma de o credibilizar e de garantir que os cidadãos acreditam nas suas instituições, enquanto o Governo socialista é uma vez mais o paradigma de quem coloca pelas ruas da amargura o Estado, as leis, os tribunais e a sua autoridade.
É tempo de alterar esta situação, é tempo de, em defesa da liberdade, em defesa da democracia, em defesa do Estado de direito, reconhecer, garantir e, acima de tudo, valorizar a autoridade democrática do Estado, aquela que é democrática porque emana das leis, emana da vontade popular.
Esta é a diferença e os portugueses cada vez mais se apercebem da necessidade, também aqui, de mudar o conceito de Estado ...

O Sr. José Magalhães (PS): - À traulitada!

O Orador: - ... que os socialistas têm e para isso não é preciso mudar o Estado, o importante, cada vez mais, é mudar o Governo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Silvio Rui Cervan (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Luís Marques Mendes mostrou-se aqui admirado pelo facto de o Governo do Partido Socialista não ter autoridade nem coragem e eu manifesto-

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me admirado pelo facto de o Sr. Deputado ainda ter alguma admiração pelo Governo do Partido Socialista não ter nem autoridade nem coragem!
E estou admirado com mais coisas, Sr. Deputado. Uma má lei nunca pode ser uma lei justa. Aprendemos isto nas primeiras aulas do 1.º ano do curso de Direito, ou seja, repito, que uma má lei nunca pode ser uma lei justa.
Mas, Sr. Deputado, digo-lhe também que o senhor tem uma tarefa mais fácil, porque o que o que o seu partido fez foi pôr o Presidente da Distrital de Beja, o seu colega Raul dos Santos, 15 dias antes, a dizer que o povo de Barrancos
não poderia ser oprimido, que tinha direito à sua tourada e que a tradição, de dezenas de anos, era secular e tinha de ser cumprida. Agora, o Sr. Deputado vem aqui dizer e com razão - que, efectivamente, foi desrespeitada uma lei e foi
desrespeitada uma decisão judicial. Onde é que o Sr. Deputado poderia ter corrigido a actuação do PSD? Só num pequeno ponto: era ter votado a favor do projecto de lei do minar.
CDS-PP, que, ao contrário do que o Sr. Deputado disse, não abria uma excepção apenas para Barrancos, abria uma excepção sempre que, num quadro legal, ela fosse justificada e nesse projecto de lei estava efectivamente discriminado
que isso era com base numa razão histórica e num conjunto de pressupostos que ele continha. Assim, este problema estaria completamente resolvido.
Sr. Deputado Luís Marques Mendes, quero dizer-lhe que durante a governação do Partido Socialista, tal como durante a governação do Partido Social Democrata, sempre existiu uma lei que foi desrespeitada e, portanto, nessa lógica, a autoridade e a coragem que faltaram, hoje, ao Partido Socialista - e faltou autoridade e coragem - também faltaram ao Partido Social Democrata quando este foi governo, pois também não teve a autoridade ou a coragem para fazer uma de duas coisas: mudar a lei ou autorizar a tourada.

O Sr. Deputado conseguiu encontrar uma grande diferença entre si e o Partido Socialista, mas, então, digo-lhe que entre o Sr. Deputado Luís Marques Mendes e a bancada do Partido Popular há uma grande diferença: é que a falta de autoridade e coragem do Partido Socialista, a mim, não me espanta porque já não é de hoje.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, acerca do Sr. Dr. José Raul dos Santos, a questão é simples: tem o direito de ter uma opinião diferente da minha, diferente da do PSD e do seu
grupo parlamentar relativamente àquela matéria. E digo com tanto à vontade quanto como é sabido, como foi público e foi notório, que o Sr. Dr. José Raul dos Santos, Presidente da Distrital de Beja do meu partido, esteve, há
uns meses, no Grupo Parlamentar do PSD tentando sensibilizar o meu grupo parlamentar a ter uma posição diferente daquela que acabou por ter. E com toda a naturalidade lhe transmiti, em nome do meu grupo parlamentar e depois
de ter tomado uma deliberação livre sobre essa matéria, que reconhecia que ele tem o direito a ter uma opinião diferente mas que o PSD assumiria um ponto de vista contrário, ou seja, não admitiria qualquer excepção à lei.
Portanto, digo isto com o à vontade de quem, há uns meses, perante um processo legislativo em concreto, assumiu com toda a naturalidade uma diferença. A opinião do partido é uma e é natural que uma ou outra pessoa
tenham opiniões diferentes.
Segundo ponto: quanto à questão dos últimos anos relativamente a Barrancos, Sr. Deputado, só nos últimos dois anos, 1998 e 1999, houve esta situação de decisões judiciais prévias, de providências cautelares, a determinar que o Estado, o Governo em particular, fizesse um conjunto de diligências para aplicar a lei. Ora, justamente nestes dois últimos anos, no ano passado e este ano, perante decisões judiciais, o Governo fez avista grossa" a esta situação.

Protestos do PS.

Terceira questão: Sr. Deputado, estando de acordo consigo em muitas coisas, não posso deixar de exprimir aqui esta divergência, com a clareza com que gosto de colocar as questões.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça o favor de ter-

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.

Sr. Deputado, eu e o meu grupo parlamentar pensámos, e pensamos, que aquela lei não deve ser alterada, nem com uma excepção para um caso; nem com outra excepção para outro caso, e, assim, assumimos isso com naturalidade. Porém, não tínhamos votos para impedir uma eventual alteração da lei e, Sr. Deputado, não posso deixar de lhe dizer o seguinte: o seu partido também teve um projecto de lei para alterar aquela lei, para criar determinadas excepções, mas não teve a coragem de o levar a votos e eu considero que isso também não é um grande exercício de pedagogia democrática.

O Sr. Presidente: - Para fazer um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na opinião do Grupo Parlamentar do PCP, resumimos o que se passou em Barrancos nos últimos dias numa frase: prevaleceu o bom senso. Prevaleceu o bom senso entre os vários valores que estavam em presença e, portanto, no respeito por uma tradição centenária, no respeito por uma tradição que se pratica desde o início do século e tendo em conta valores de equilíbrio e de proporcionalidade, pensamos que a actuação a que assistimos, neste caso concreto, por parte das forças de segurança respeitou este princípio da proporcionalidade e do bom senso.
Neste sentido, há uma coisa que o PSD e o Sr. Deputado Luís Marques Mendes não dizem, que se traduz nesta é uma pergunta concreta: o que é que o Sr. Deputado Luís Marques Mendes queriam que a GNR fizesse nestes dias em Barrancos?!

Vozes do PS: - Pois claro!

O Orador: - Como sabe, os intervenientes directos na tourada foram identificados e irão provavelmente a tribunal. O que é que o Sr. Deputado e o PSD queriam que se fizesse? Era que houvesse uma carga repressiva da GNR sobre as cerca de 20 000 pessoas que estavam em Barrancos?! Era isso? Então, qual era a solução alternativa, Sr. Deputado? Era proibir as festas? Era tirar os touros de todos os concelhos, como disse o juiz? Qual era a solução que o PSD queria?
Quanto à segunda questão, Sr. Deputado, sejamos sérios, pois este problema não é, na sua essência, do foro

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policial, é um problema de ordem sociológica e de ordem cultural. Não sou particular adepto das touradas e muito menos das touradas de morte, mas também não alinho em cruzadas fundamentalistas. Penso que o problema das touradas de morte e de outros espectáculos onde os animais são agredidos serão alterados em função de uma evolução geracional e em função das várias culturas que animam hoje as nossas tradições em vários domínios do País.
Esta é que é a questão que temos de abordar de forma responsável, encontrando, no plano jurídico, as soluções para, nem que seja transitoriamente, integrar uma tradição secular, que deve ser respeitada, de uma comunidade rural naquilo que é a ordem jurídica nacional.
Aliás, ao longo destes anos, nunca ninguém se lembrou de Barrancos, nunca ninguém se lembrou da falta de centros de saúde, da falta de médicos, da falta de estradas de ligação a Moura. Ninguém se lembrou de Barrancos e, de repente, por razões de cruzadas obscuras que têm muito pouco a ver com os direitos dos animais mas com outras cruzadas, toda a gente - e o PSD em particular - se levantou em torno das questões de Barrancos.
Mas, nesse aspecto, Sr. Deputado, volto a colocar duas questões que aqui estão em cima da mesa, sendo que a primeira já foi colocada mas vale a pena repeti-la: a lei existe desde 1928; o PSD esteve 13 anos no Ministério da Administração Interna e o actual Presidente do PSD foi Secretário de Estado da Administração Interna quando se realizaram múltiplas touradas em Barrancos. Não havia acórdãos dos tribunais, é certo, mas havia uma lei. Pergunto: por que é que o governo de então não a fez cumprir? Por que é que, neste momento, isto serve como arma de arremesso?
Por outro lado, Sr. Deputado, é evidente que os órgãos locais do partido podem ter a sua opinião, mas o PSD não pode jogar como lhe convém.

O Sr. Presidente:- Sr. Deputado, faça favor de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente!
Não pode, em Beja, fazer comunicados à população a dizer que é a favor das touradas e, em Lisboa, dizer que é contra as touradas!

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do PS: - É uma vergonha!

O Orador: - O PSD tem de ter uma posição sobre esta matéria e em vésperas de eleições não serve tudo como arma de arremesso. Há aqui um problema sério, um problema sociológico e cultural, um problema de respeito por uma tradição das comunidades rurais, e é nesse terreno que o problema deve ser analisado e não como arma de arremesso demagógico e hipócrita, como temos visto nos últimos tempos.

Aplausos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Mendes, tem a palavra para responder, concedendo-lhe a Mesa, para o efeito, dois minutos.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, relativamente ao PCP, compreendo toda a sua tese, pois é facílima de perceber. Para o PCP, o mais importante é o seguinte: o PCP está feliz da vida, não apenas por aquele caso mas, de facto, pela situação nacional. O PCP está feliz da vida porque foi criado um precedente e isso significa que encontrou aqui as condições óptimas e excelentes, que só o Partido Socialista não há meio de perceber, para ter toda a legitimidade para, mais tarde, poder também justificar e sustentar outras atitudes de violação da lei, como cortes de estradas ou - outras, de outra natureza.

Aplausos do PSD.

O PCP está feliz e, por isso mesmo, percebo a sua tese. O PCP nem sequer quer alterar a lei, até pode apresentar o projecto de lei mas levá-lo a votos, nem pensar! Prefere, obviamente, que tudo continue assim, pois o pior seria mudar a lei e o melhor é que a lei não seja cumprida, sendo violada e desrespeitada.
O grave, Sr. Deputado, não se passa cone o PCP. Isto não me surpreende! Se V. Ex.ª não dissesse coisa diferente é que eu ficava surpreendido! Assim, fiquei com a clara noção da gravidade daquilo que aconteceu, não apenas para o caso concreto em Barrancos, mas para o País em geral.
A sua intervenção aqui, hoje, é a prova provada do acerto das minhas palavras e da minha denúncia, é a prova provada de como, nesta matéria de autoridade do Estado, se o PCP estivesse de acordo com o PSD, eu devia estar errado nalguma coisa; estando o PCP em total desacordo, é a prova provada de que estou certo.
Mas o grave, grave, Sr. Deputado, - e é isto que o PS não há meio de perceber nem de entender e que confunde os cidadãos -, é que isto significa que as decisões judiciais ficam pelas ruas da amargura e que os cidadãos ficam sem confiança nas instituições, na Guarda Nacional Republicana, e, de hoje a amanhã, tudo está justificado, ou seja, a omissão do Estado e das forças de segurança está justificada.
A responsabilidade não é do PCP, é de um Governo socialista que não percebe o que é um Estado de direito, não percebe o que é a autoridade democrática do Estado,...

O Sr. Presidente: - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - ... põe a GNR e os tribunais a ridículo, desrespeitados, descredibilizados, completamente pelas ruas da amargura, ou seja, numa palavra, é um Governo sem perdão.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando vi o Sr. Deputado Luís Marques Mendes pedir a palavra, pensei que fosse acrescentar alguma coisa às palavras, com as quais estive absolutamente de acordo, que proferiu sobre a questão de Timor Leste. Pensei que, às palavras acerca da necessidade de uma unidade e solidariedade de todos os portugueses, tão necessária, para com o povo de Timor, quisesse acrescentar uma palavra de condenação da atitude absolutamente irresponsável de um alto dirigente do PSD, o Dr. Alberto João Jardim, que sobre esta matéria fez um apelo à ruptura dessa solidariedade com o povo de Timor Leste.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: -E já que veio aqui falar de autoridade, é bom que comece com a autoridade dentro de casa, se quer convencer alguém de que é capaz de a exercer no País.

Aplausos do PS.

É absolutamente inadmissível que, quando todos procuramos juntar os nossos esforços - e sabemos bem que qualquer brecha na opinião pública portuguesa pode ter consequências desastrosas para o povo de Timor Leste -, o responsável do Governo Regional da Madeira diga o que disse e o PSD não tenha uma palavra de condenação dessa atitude absolutamente irresponsável, absolutamente repreensível, absolutamente indigna do Presidente do Governo Regional da Madeira.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas veio o Sr. Deputado falar de Barrancos, acusar de hipocrisia e dizer que está nesta matéria absolutamente à vontade. É uma coisa verdadeiramente espantosa! O Sr. Deputado foi membro de um governo em cuja sua vigência foram mortos mais de 55 touros em Barrancos, ano após ano. Não fez rigorosamente nada, ignorou o problema e vem agora fazer exigências e dizer que é preciso tomar medidas. É notável como, ainda por cirna, vem acusar os outros de hipocrisia!
Mas, mais: o Sr. Deputado vem falar de autoridade, quando o líder da lista de candidatos pelo PSD por Beja não se limitou a dizer que era a favor das corridas de touros em Barrancos, apelou a que não se cumprisse a lei em Barrancos. E também sobre isso - é claro! -,tal como no caso do Dr. Alberto João Jardim, a Direcção do PSD nada tem a dizer.
Mas, Sr. Deputado, o essencial sobre esta questão de Barrancos é saber o que é que o PSD propõe e o que é que o PSD acha que devia ter sido feito.
Em primeiro lugar, é mentira, é falso, que nada se tenha feito em Barrancos!

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Fez-se a tourada!

O Orador: - O Governador Civil, o Governo e a Guarda Nacional Republicana tomaram todas as medidas que consideraram convenientes e ajustadas nas circunstâncias concretas em que decorreram os acontecimentos em Barrancos. Foi notificada a Câmara Municipal de Barrancos e a comissão organizadora e foi, inclusivamente, solicitado ao Tribunal Judicial de Moura que enviasse oficiais de diligências para que fossem encerrados os curros. Foi feita a identificação das pessoas encontradas a vender bilhetes, assim como de toda a comissão organizadora, de todos os responsáveis e dos próprios toureiros, a qual foi entregue, tal como já tinha sido feito no ano passado, ao Tribunal Judicial de Moura, porque, como é óbvio e natural, quem tem de fazer cumprir a lei são os tribunais e, portanto, compete a estes, e não à Guarda Nacional República ou ao Governo, julgar aqueles que infringiram a lei, porque dizemos com clareza que a lei é para ser cumprida e quem infringe a lei deve ser julgado.
Mas entenderá talvez o Sr. Deputado Luís Marques Mendes que isto não é suficiente e, portanto, seria bom que o PSD dissesse com muita clareza o que é que faria, para além destas medidas que foram tomadas pelo Governo, pelo Governador Civil de Beja e pela Guarda Nacional Republicana. Isto porque, de duas, uma: ou o PSD está a sugerir que se fizesse o que se fazia no seu tempo, que era fazer de conta que o problema não existia, ou, então, se calhar, está a sugerir que se tomassem medidas extremas, e hoje aqui, em vez de estarmos a discutir estas questões legais que o Sr. Deputado levantou ou a morte dos touros em Barrancos, se calhar, estaríamos a discutir algum voto de pesar pela morte de alguma criança, de alguma pessoa de idade ou de alguma senhora esmagada numa carga policial que se fizesse ali.
O senhor não sabe ou procura não saber o que seria uma carga policiai ou uma medida extrema nas condições concretas de Barrancos, com milhares de pessoas naquela praça! Portanto, foram tomadas as medidas adequadas que as circunstâncias aconselhavam.
Finalmente, diz o Sr. Deputado Luís Marques Mendes que há, nesta matéria - e isso é um facto que os portugueses puderam comprovar ao longo destes quatro anos, uma grande diferença entre o PS e o PSD. Há mesmo uma diferença essencial entre o PS e o PSD: é que o PSD tem da autoridade uma visão autoritária, uma visão de autoritarismo, e nós vemos a autoridade como uma autoridade democrática, que respeita as pessoas, que procura seguir um princípio de proporcionalidade, de forma a que a actuação da polícia não acabe por provocar maior danos do que aqueles que pretende prevenir.
E é em nome dessa autoridade democrática que foram entregues aos tribunais todas as participações que foram julgadas convenientes, que se tomaram, sem exageros, as medidas que foram consideradas convenientes, e estamos muito orgulhosos da forma como o Governo actuou, com respeito pelas pessoas, com respeito pelos barranquenhos, com respeito péla opinião pública e, sobretudo, com respeito pelos valores democráticos e de tolerância, que são a imagem de marca do PS, bem diferente da do PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Acácio Barreiros, suponho que V. Ex.ª não ouviu as declarações do Presidente do PSD a respeito deste caso. Ele disse, nomeadamente, que lhe dava muito gozo, como líder da oposição, ver o Governo a ser toureado em Barrancos.
Penso que estas declarações não são próprias nem são dignas de alguém que se apresenta como candidato a primeiro-ministro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Penso que a virtude do Governo foi que não se deixou tourear em Barrancos, não se deixou armadilhar em Barrancos.
Há muita gente que parece que quer sangue em Barrancos - não, evidentemente, o Sr. Deputado Luís Marques Mendes, que conheço muito bem -, e não o dos touros crias o sangue das pessoas, talvez por razões de espectáculo, na convicção ou na ilusão de que o espectáculo do sangue, sobretudo das pessoas, faz aumentar as audiências; outros porque supõem que a exploração deste caso traz dividendos eleitorais.

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Ora, penso que a virtude do Governo foi não se deixar armadilhar, não defender uma concepção abstracta e autoritária do Estado de direito contra as pessoas. Entre a morte dos touros e a vida das pessoas, creio que o Ministro Jorge Coelho demonstrou uma grande sensibilidade, muito bom senso e interpretou muito bem a concepção democrática que temos de Estado de direito.
Mas também estou de acordo com o que disse o Sr. Deputado Lino de Carvalho, ou seja, que este problema é cultural. Temos de respeitar também o direito à diferença, o direito do povo à tradição, à festa e à sua especificidade. Isso faz parte também da liberdade, isso faz parte também de uma concepção democrática do Estado de direito.
O que quero perguntar ao Sr. Deputado Acácio Barreiros é se não acha, de facto, muito chocantes estas declarações de um líder de um partido que se apresenta como candidato a primeiro-ministro, ao dizer que lhe dá muito gozo ver o Governo ser toureado em Barrancos. Não foi o Governo que foi toureado em Barrancos.

Aplausos do PS,

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Alegre, é apenas para dizer que partilho com V. Ex.ª a indignação que tão bem traduziu nas suas palavras.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Alegre, adorei ouvir V. Ex.a, porque me permite, de facto, mais duas ou três considerações, e é sempre muito interessante o debate com V. Ex.a, às vezes em consonância, mas desta vez em clara divergência.
Primeiro ponto: como é bom de ver - e o Sr. Deputado poderá rever as declarações -, o líder do meu partido não usou, nos termos que apontou, as expressões que referiu.

Vozes do PS: - Usou, usou!

O Orador: - Como é evidente, o líder do meu partido teve afirmações...

O Sr. José Magalhães (PS): - Estão gravadas!

O Orador: - Com certeza, estão todas gravadas! Não vamos litigar sobre isso!
É óbvio que o líder do meu partido não usou as expressões nos termos e, sobretudo, com a intenção e com 0 objectivo que o Sr. Deputado acabou de referir.
Segundo ponto: que o Sr. Deputado Manuel Alegre seja a favor de touradas com touros de morte, está no seu pleníssimo direito; que Sr. Deputado defenda o direito à tradição, também está no seu pleníssimo direito; agora, o que gostava era que o Sr. Deputado conseguisse explicar seriamente como é que se concilia o direito à tradição com o direito à lei, sobretudo se a lei diverge da tradição. Gostava que me explicasse!

O Sr. José Magalhães (PS): -É uma boa tese para doutoramento!

O Orador: - É que só há uma forma, Sr. Deputado, e gostava que V. Ex.ª tivesse a coragem de dizer que o seu grupo parlamentar cometeu a maior das hipocrisias, porque legitimamente apresentou um projecto de lei para fazer corresponder a lei à tradição e, depois, retirou o projecto de lei, porque não teve coragem de o levar a votos.
Terceiro ponto: o Sr. Deputado vai fazer o favor de me explicar, se tiver essa amabilidade, por que é que existiu uma diferença de comportamento entre a actuação deste Governo em Barrancos, no ano passado e este ano, e em
Ourique, há uns meses atrás, perante uma manifestação de agricultores, na iminência de um corte de estradas. Por que é que num caso de violação da lei as forças de segurança intervêm e por que é que noutro caso as forças de segurança e o Governo fazem "vista grossa"? Há leis de natureza diferente, Sr. Deputado?
Quarto ponto: riem o Sr. Deputado nem o Sr. Deputado Acácio Barreiros são juristas, mas, seguramente, há uma coisa que sabem. Uma decisão judicial de uma providência cautelar o que é que é? É, em função do cumprimento da lei e na perspectiva de ela ser violada, determinar um conjunto de diligências em concreto para serem observadas. O tribunal determinou o cumprimento de cinco diligências em concreto - repito, cinco diligências, já não é a lei 'em abstracto - que era preciso serem observadas, e essas cinco diligências foram todas elas violadas, porque o Governo fez "vista grossa" a esta situação.
Se o Sr. Deputado consegue explicar-me como é que se respeitam todos os princípios - e o senhor costuma ser uma pessoa de princípios - e, depois, não se respeitam as decisões judiciais, gostava que nos prestasse aqui essa ajuda, para todos conseguirmos perceber. Ou seja, Sr. Deputado, reconheço o direito a ter opiniões diferentes da minha sobre aquela questão em concreto, isto é, sobre os touros de morte; porém, não consigo perceber como é que urna pessoa responsável como V. Ex.ª advoga facilmente o incumprimento de decisões judiciais.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Mendes, em primeiro lugar, quero dizer-lhe que, por enquanto, ainda não estou surdo. Realmente, ouvi, e creio que ouvi correctamente, as declarações do líder do seu partido, e penso que elas foram aquelas que 'eu aqui disse.
Quanto à questão que me põe, que é uma questão interessante de direito, quero dizer-lhe que não sou pelo direito nem pela lei contra as pessoas, e penso que neste caso concreto, no caso de Barrancos, é preciso conciliar a lei e a tradição. Temos aqui um caso específico, um caso diferente; eles também têm um dialecto próprio e aquilo faz parte da sua identidade cultural. Penso, pois, que a lei não deve ser feita em abstracto, deve ter unta perspectiva histórica e sociológica, deve adaptar-se neste caso à tradição e deve abrir uma excepção para a tradição. É aquilo que penso.

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Quanto ao outro caso que o Sr. Deputado me colocou, não comparo casos que não são comparáveis, como o de Barrancos e Ourique, que nada têm a ver um com o outro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e SO minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, do primeiro ponto do período da ordem do dia consta a apreciação de uma convocação extraordinária do Plenário da Assembleia da República para discussão e votação do projecto de resolução n.º 140/VII - Sobre a constituição de una comissão eventual de inquérito parlamentar às viagens dos Deputados (PSD).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: São por demais conhecidas as razões que levaram o PSD a propor a constituição urgente de uma comissão parlamentar de inquérito às viagens dos Deputados. São posições claras, já mais de uma vez expressas publicamente por várias personalidades do PSD e que estão inscritas no próprio projecto de resolução apresentado pela minha bancada. Não vou, pois, repetir aqui todas as considerações já expendidas sobre este assunto. Quero, no entanto, reafirmar, nesta oportunidade, três aspectos, que me parecem ser os mais relevantes e devem ser tidos em conta na abordagem deste problema.
-Em primeiro lugar, todos sabem que a questão suscitada é má para a imagem do Parlamento e, sobretudo, desprestigiante para o seu próprio funcionamento, enquanto instituição democrática de primeira grandeza. As coisas são como são e, do nosso ponto de vista, essa imagem negativa só poda ser combatida com o esclarecimento, um esclarecimento que seja cabal e completo. Não entender isto ou, ainda pior, do nosso ponto de vista, optar pela via do silenciamento de toda a situação só serve para o avolumar do problema. O PSD. já o disse e reafirmo-o: não contem connosco para pactos de silêncio sobre esta matéria.
Em segundo lugar, o PSD sempre entendeu que há dois planos distintos neste problema: por um lado, o plano criminal, o problema na sua vertente criminal e, por outro, o problema na sua vertente ética. Só por reserva mental, para não dizer outra coisa, é que alguns podem continuar a querer iludir esta duplicidade de vertentes no problema e fingir que tudo pode ser esclarecido pelos tribunais. Esta questão é tão evidente que me escuso de tecer mais considerações sobre ela.
Em terceiro lugar, é preciso, do nosso ponto de vista, averiguar se a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito é ou não o meio ideal para atingir o cabal esclarecimento. O que está em causa, do nosso ponto de vista, é decidir se queremos pôr tudo cem pratos limpos" relativamente a este problema, com total transparência e apurando os factos publicamente, sem secretismos, subterfúgios, segredos de justiça ou critérios mal explicados e mal entendidos pela opinião pública. Não vale a pena andarmos aqui com ambiguidades e equívocos. Todos sabem que a verdade só pode vir totalmente a lume e só se pode pôr tudo "em pratos limpos" se houver uma averiguação feita pelo Parlamento - e é também para isso que, em última instância, existe no nosso ordenamento jurídico a figura das comissões parlamentares de inquérito.
No entanto, também não escondemos, desde o início deste processo, que, a nosso ver, pode, de facto, haver alguns inconvenientes na opção de criar de uma comissão parlamentar de inquérito. Mas o que importa perguntar a todos é qual é, então, a alternativa. Quem pensa que este não é o meio adequado para atingir o esclarecimento e procurar a verdade, então, sugira - e faça-o com coragem - um outro meio através do qual o Parlamento possa actuar para alcançar esse esclarecimento e não se esconda atrás das dificuldades que a comissão parlamentar de inquérito pode suscitar, efectivamente, também o reconhecemos. Haja coragem e apareça alguém a sugerir uma outra forma de clarificar e de o Parlamento ter uma actuação decidida para o esclarecimento cabal deste problema.
O PSD propõe a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito porque está consciente de que a realização de inquéritos parlamentares é um poder próprio da Assembleia da República e, do nosso ponto de vista, é sempre no uso dos seus poderes que a Assembleia da República terá de actuar.
O que é preciso, Srs. Deputados, é actuar! Do nosso ponto de vista, a atitude de olhar para o lado, de continuar a silenciar o problema quando o assunto é difícil ou incómodo, não é uma atitude aceitável.
Daqui faço uma crítica directa, a este propósito, ao Partido Socialista, que não me pareceu nada incomodado enquanto o problema apenas foi utilizado como arma de arremesso político contra pessoas e individualidades ligadas ao PSD. Mas assim que ficou claro que o problema também lhe tocava à porta, logo surgiu a protestar uma enorme indignação e a defender o rápido abafamento do problema. Foi isso, Srs. Deputados, o que verdadeiramente se passou e essa atitude é seguramente reprovável.
Para o PSD, quanto maior for o problema, maior terá de ser o seu cabal esclarecimento, em nome da transparência, da dignidade do próprio Parlamento e de todos aqueles cuja honorabilidade tem sido - e, do meu ponto de vista, injustamente - alvo de suspeições. E digo injustamente porque se trata de suspeições não esclarecidas, não comprovadas e não clarificadas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação à questão subjacente a esta iniciativa do PSD, a posição do Grupo Parlamentar do Partido Socialista é exactamente a mesma que levou o PS, nos idos de 1989, quando era oposição, a apoiar, genuinamente e com eficácia, um conjunto de medidas que alteraram profundamente todo o regime jurídico aplicável aos transportes nesta Casa e que foram acoplados de garantias, por um lado, de controlo e, por outro, de transparência. Votámos essas medidas, batemo-nos pela sua aplicação e é com esse espírito exacto que nos posicionamos face à questão que nos é hoje trazida a discussão.

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Um mau remédio, longe de curar o doente, mata-o! E a proposta do PSD é, consabidamente, um mau remédio, mal apresentado, com maus fundamentos e, devo dizê-lo, com escassa convicção.
Em relação aos factos ocorridos há cerca de 10 anos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, houve trabalhos aprofundados, realizados, em sede de auditoria, por entidades especializadas, que, sobre essa matéria, compilaram todos os documentos, tiveram acesso a tudo e tudo reuniam. Esses documentos estão, livremente consultáveis, no gabinete do Sr. Presidente da Assembleia da República - e, na verdade, têm sido intensamente consultados - e, sobre eles, pode ser feita toda a espécie de indagações e re-indagações. Não pode haver maior transparência!
Nesse quadro, falar de pacto de silêncio, pura e simplesmente, não faz qualquer sentido. Ninguém propôs tal pacto, nem ele seria possível em termos fácticos.
Em segundo lugar, sabemos todos, e sabemo-lo bem e até ao fundo, que há processos judiciais pendentes, processos a cargo de entidades independentes, entidades cujos poderes são constitucionalmente garantidos e serão respeitados - da nossa parte, seguramente, mas também seguramente da parte de todas as bancadas até ao extremo limite. A nossa posição sobre esse ponto é absolutamente inequívoca e, por isso, dispenso-me de reiterá-la pela enésima vez. As infracções criminais serão tratadas seguramente nos termos da Constituição, da lei processual e do Estatuto dos Deputados e, na altura própria, as decisões adequadas serão tomadas e nós assumiremos, sem qualquer tergiversação, as nossas próprias responsabilidades.
Em terceiro lugar, quanto à questão de eventuais melhorias do regime que rege os transportes dos Deputados, regime aprovado por unanimidade nesta Câmara, entendemos que as decisões a tomar, se melhorias há, devem sê-lo pela Assembleia da República a eleger pelos portugueses no próximo dia 10 de Outubro. Quem cumpre a lei em vigor rege-se pela ética que a República consagrou e impôs - não há outra a que se deva obediência nos termos estritos dos códigos políticos que nos regem. E nós saberemos, também nessa matéria, agir coerentemente, fora de qualquer clima de paixão política e longe das inquietações e dos pesadelos que, pelos vistos, povoam as noites de alguns políticos que desencadearam, ou quiseram desencadear, certos fogos.
Por último, Sr. Presidente e Srs. Deputados, especificamente em referência a esta iniciativa do PSD, gostaria de fazer uma observação e um apelo. Julgo que não é hora de inventar falsas clivagens do tipo "de um lado, os amigos da transparência; do outro, os inimigos jurados da transparência".
Ninguém porá em dúvida a nossa vontade de transparência, comprovada inequivocamente ao longo do processo, mas esta iniciativa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é quase .inconcebível. Em primeiro lugar, porque um auto-inquérito sempre foi rejeitado pela Câmara com um acto de sensatez, um auto-inquérito, num domínio destes, é extremamente desaconselhável Por isso, na altura própria, optámos por uma auditoria e por isso é que há também, nesta matéria, processos em relação às situações cuja gravidade o exige.

Protestos do Deputado do PSD Luís Marques Guedes.

Em segundo lugar, um inquérito parlamentar neste domínio arriscar-se-ia a ser a mera repetição de diligências de

auditoria, unia espécie de re-auditoria feita pelos Deputados a si próprios.
Em terceiro lugar, e sobretudo,...

Protestos do Deputado do PSD Luís Marques Guedes.

Sr. Deputado Luís Marques Guedes, há seguramente, no PSD, pessoas cuja mão treme e pensam duas vezes antes de embarcar nas iniciativas incendiárias e irresponsáveis que alguns de vós puseram a correr no mercado político!
Como dizia, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em relação a um inquérito deste tipo, o maior risco ainda seria o de ele poder ser interpretado como uma arma de arremesso e de ,vindicta contra os tribunais. E nós, numa arma de arremesso e de vindicta contra os tribunais, não embarcámos, não embarcamos neste momento e não embarcaremos! Por isso é que, Sr: Presidente, sem tremer, votaremos contra esta iniciativa inteiramente descabida.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Não havendo pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP considera que o essencial nestes processos das "viagens dos Deputados" é que todas as situações criminosas sejam identificadas, investigadas e julgadas, sem excepção e com toda a urgência.
A nossa posição é, portanto, a de reclamarmos a investigação de todas estas situações, e reclamarmos que o apuramento de responsabilidades seja feito sem demora, com toda a urgência.
É isso que se impõe, não só para que aqueles que cometeram crimes sejam efectivamente julgados e condenados mas também para que se acabe com a situação inaceitável, que hoje se verifica, de suspeita generalizada, suspeita que não só atinge o bom nome dos que se pautaram por princípios e pelo respeito das regras jurídicas aplicáveis como fere a própria credibilidade da política e dos políticos em geral.
De facto, esta situação, em que os que cometeram crimes não estão devidamente identificados e isolados e, pelo contrário, a suspeita, mesmo sem fundamento, recai sobre todos e cada um, é um < caldo de cultura" para sentimentos antidemocráticos e uma contribuição para o afastamento dos cidadãos da vida política.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Da nossa parte, PCP, não alimentamos esse "caldo de cultura", que inculca ideias que rejeitamos, do género " os políticos são todos iguais" e "andam todos ao mesmo", ideias que combatemos com uma prática de respeito pelas regras e de permanente e constante defesa da ideia de que a política é um serviço dos interesses do povo e do País e não um serviço de interesses próprios.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esta é a nossa posição ética, face ao exercício da política e face ao exercício do mandato conferido pelo voto popular. E é com a legitimidade que decorre das

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nossas concepções que, repito, reclamamos investigações totais e urgentes.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Essas investigações estão a ser feitas pela instituição competente no Estado de direito que somos, isto é, pela Procuradoria-Geral da República. E é aí que devem ser feitas e com toda a urgência.
A Assembleia da República não se pode pôr a reboque dos que tentam, com ataques à Procuradoria e Procurador-Geral, desviar a atenção sobre o fundo da questão, que é a responsabilidade criminal decorrente de actos que foram praticados.
Há, efectivamente, graves problemas com a justiça, em Portugal, e da nossa parte ainda há poucos meses fizemos aqui uma interpelação ao Governo sobre a matéria. Mas a forma de resolver esses problemas alão é fugir às responsabilidades individuais no plano criminal. Pelo contrário, como agentes que somos desta instituição política, cabe-nos reclamar que as investigações sejam feitas e não obscurecer o processo e as responsabilidades individuais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É neste quadro que o PSD propõe um inquérito parlamentar. Da nossa parte, declaro, desde já, que não inviabilizaremos o inquérito proposto, mas temos de fazer cinco observações à proposta apresentada.
A primeira é esta: o inquérito nunca poderá abranger a questão essencial, isto é, a das actividades criminosas, porque isso não é possível, dada a competência da Procuradoria-Geral da República e dado o facto de a própria "lei das comissões de inquérito" proibir que os inquéritos versem sobre matéria sobre a qual há acusações criminais.
A segunda observação tem a ver com o seguinte: estamos a 40 dias das eleições, numa campanha eleitoral. Um inquérito como este não só tem escassas possibilidades de ser realizado com rigor e profundidade neste tempo limitado como inevitavelmente será usado como permanente arma eleitoral, desviando-se, assim, da sua função e da seriedade de que se deveria revestir, contribuindo não para a clarificação mas para a degradação do debate político.
A terceira observação é a seguinte: algumas das matérias sobre as quais se propõe fazer o inquérito são da responsabilidade do poder judicial, designadamente os critérios de investigação e questões processuais. A Constituição da República prevê os inquéritos aos actos da administração e do governo e exclui os outros órgãos de soberania, designadamente os tribunais. Portanto, esses pontos terão de ser excluídos.
A quarta observação: há questões, no inquérito, cuja matéria é absolutamente clara. Por exemplo, quanto à legitimidade dos chamados "desdobramentos" feitos antes da Deliberação n.º 15-PL/89. Aproveito para dizer que não se trata de um despacho do Presidente da Assembleia da República mas, sim, de uma deliberação da Assembleia da República aprovada, por unanimidade, em 7 de Dezembro de 1989. Antes desta deliberação, que considerou legais os chamados "desdobramentos" em certas circunstâncias, toda a gente sabe que uma larga maioria da Assembleia, da qual penso que só o PCP se excluía, considerava que, mesmo não estando legalmente previstos, os desdobramentos eram possíveis. Se isto é sabido, o que pode fazer um inquérito parlamentar nesta matéria? Dizem que pode fazer um juízo ético, mas penso que os juízos éticos que seriam relevantes não são os feitos a posteriori, são os feitos antes dos actos praticados.
Agora, o que é que vai fazer o inquérito parlamentar? Um acto de contrição? Creio que esse não é o palco para a Assembleia da República! Como diz o ditado, "A César o que é de César"!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Já agora, quero dizer o seguinte: como é óbvio, na nossa opinião, as quantias remanescentes, sendo dinheiro do Estado, tinham sempre de lhe ser devolvidas. Também aqui, o que quer inquérito? Um acto de contrição? Creio que é tardio!
Quinta observação: sobre a utilidade do inquérito para definir novas regras, é importante recordar que, há um ano, foi aprovado, no Plenário, por unanimidade, o projecto de deliberação n.º 49/VII, proposto pelo Sr. Presidente da Assembleia, definindo regras mais apertadas para as viagens.
Levantam agora, alguns dos que votaram esse projecto de deliberação no ano passado, a questão de definir novamente regras. Se se trata de mais rigor, no PCP estaremos sempre disponíveis, mas é preciso perceber o que se pretende. Proibir os chamados "desdobramentos" mas permitir, em certas circunstâncias, viagens de acompanhantes parece querer dizer, ao fim e ao cabo, mais encargos financeiros para o Estado.
Não é na pressa de um inquérito em cima das eleições que questões como estas podem ser discutidas com a serenidade e sentido ético exigíveis.
No recomeço dos trabalhos parlamentares da nova legislatura, o PCP propõem que toda esta problemática seja discutida sem adiamentos, com toda a profundidade e com toda a transparência para defesa da dignidade da política, da vida democrática e do bom nome dos que exercem a função política como um serviço público e com base em princípios.
Termino, reafirmando o nosso empenho em que sejam feitas todas as investigações na Procuradoria-Geral da República com toda a urgência.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, sobre esta questão, que é necessariamente melindrosa e que tem sido, infelizmente, na óptica do Partido Popular, indevidamente utilizada como arma de arremesso político-partidário, queria dizer uma coisa muito simples: quem prevaricou deve ser punido!
Mas queria dizer uma coisa igualmente simples, contudo igualmente importante: para nós, todos são inocentes até que se prove judicialmente o contrário.
E inaceitável que se utilizem forte indícios, que se utilizem notícias de jornais, que se utilizem fugas seleccionadas - repito, "fugas seleccionadas" - de informação para fazer combate político-partidário e, em alguns casos, tentar manchar a imagem de políticos, de homens honestos, que, para nós, até sentença em contrário, se presumem inocentes.
Prejudicar um, dois ou dez é prejudicar toda a classe política, pelo que temos de ter este sentido de responsa-

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bilidade. Queremos também que se averigúe e que se condene quem prevaricou, mas que se absolva todos aqueles que injustamente viram o seu nome manchado.
Em relação a esta comissão de inquérito, queremos dizer que não a vamos inviabilizar, abster-nos-emos, mas parece-nos que, aos olhos da opinião pública, cai mal que os Deputados sejam juizes em causa própria.

Protestos do PSD.

Parece-nos que, na ânsia seguramente positiva e imbuído do melhor espírito, está a fazer-se pior com esta proposta do que em pedir à Procuradoria-Geral da República que investigue tudo, para todos, e rápido - repito, que investigue tudo, mas que investigue tudo para todos e rápido! -,...

O Sr. José Junqueiro (PS): - Com isenção!

O Orador: - ... com isenção, como me é soprado por um colega e adversário político, para que o poder judicial cumpra a sua função, porque é para isso que esse poder existe. A função desta Assembleia é a de colaborar, neste e noutros casos, com o poder judicial para que se averigúe a verdade. Julgo que não estaríamos a ajudar-nos nem a ajudar a democracia representativa se quiséssemos substituir o poder judicial ou se quiséssemos ser nós, Deputados, juízes em causa própria.
Termino, afirmando que, para nós, todos são inocentes até ser provado o contrário. Queria também dizer que continuamos muito preocupados com um conjunto de fugas de informações, não raras vezes seleccionadas, que acontecem periodicamente e em que nada ajudam a imagem quer da classe política, por um lado, quer das magistraturas judicial e do Ministério Público, por outro.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que estamos perante uma questão extremamente delicada e que exige toda a verdade, porque, se há muitas razões que têm contribuído para o desprestígio e o desinteresse dos cidadãos pela política, pelas instituições e pela sua participação na vida da comunidade, provavelmente, estas "histórias" têm dado um grande contributo para que isto aconteça. Sendo assim, parece-me que a Assembleia da República, os Deputados e os portugueses têm o dever de exigir que a justiça funcione com rapidez e celeridade.
É a Procuradoria-Geral da República que tem meios. Pois bem, nós entendemos que deverá ter meios para que rapidamente, preto no branco, não só torne claro quem são, e quem não são, aqueles que cometeram ilegalidades e infracções criminais e que têm de ser julgados mas também faça a separação daqueles que não têm quaisquer responsabilidades, os quais não têm de ficar pendentes de urna gestão de processos, que, por razões provavelmente alheias à própria Procuradoria-Geral, tem sido feita a conta-gotas, por, no fundo, serem obrigados a ter algo que me parece humilhante, que são "atestados de bom comportamento".
Julgo que todos aqueles que foram citados nos jornais, ou não, sentem o peso que recai sobre si pelo facto de serem Deputados, o que, do nosso ponto de vista, não é um pecado, é o cumprimento de um cargo que não deve envergonhar-nos e que, por isso também, exige que, com clareza, a investigação se faça com rapidez e seja célere.
Julgo que a discussão em torno desta matéria terá de ser feita, mas não por uma comissão de inquérito, que é juiz em causa própria e que, naturalmente, não o podia ser no momento em que os processos estão a decorrer. Parece-me que os próximos Deputados desta Câmara terão, seguramente, muito a fazer no sentido de rectificar o que haja a rectificar.
Em todo o caso, penso que poderia ser um contributo importante se a Assembleia da República, sempre que seja notificada para que um Deputado seja ouvido como declarante ou como arguido, pudesse agir e desenvolver os mecanismos com rapidez, fazendo, pelo menos nesta fase transitória, o que está ao seu alcance, a fim de que, rapidamente, o apuramento das responsabilidades seja feito e não mais estas "histórias" tenham cabimento e sejam o espaço privilegiado não do debate dos problemas do País mas, sim, do debate de algo que, seguramente, só contribui para desprestigiar e desinteressar os cidadãos da política.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Peço a palavra para uma segunda intervenção, pois pensava que, nas últimas semanas, já tinha ouvido as posições políticas dos vários partidos sobre esta matéria, mas há sempre, de facto, qualquer coisa de novo que é acrescentado, pelo que há algumas questões que é preciso clarificar.
Em primeiro lugar, quero referir que uma tecla que hoje foi bastante usada, penso que por todas as bancadas à excepção da do PSD, é esse falso argumento de que o Parlamento não pode ser juiz em causa própria, que não pode haver o autojulgamento destas matérias. Esta é uma das grandes falsidades com que se tem tentado iludir a opinião pública!
O Parlamento não é tribunal, não julga ninguém em circunstância alguma. Os inquéritos parlamentares não são feitos para julgar ninguém: nem para julgar os outros nem para os Deputados se julgarem a si próprios.
As competências das comissões parlamentares de inquérito e do Parlamento são competências de apreciação de factos, de fiscalização e têm por finalidade trazer ao conhecimento e ao esclarecimento públicos, através dos seus representantes nesta Casa, que somos todos nós, a verdade dos factos e apreciar o que foi feito ao nível da Administração ou ao nível do Estado lato sensu.
Portanto, é preciso desmistificar, desmentir com clareza este argumento do autojulgamento, o argumento de que o Parlamento não se pode julgar a si próprio, porque é um argumento não verdadeiro. O Parlamento nunca se julga, o Parlamento não é um tribunal, as comissões parlamentares de inquérito não julgam ninguém, apreciam factos, debatem-nos e trazem-nos ao conhecimento público. É isto que os senhores querem iludir e é isto que o PSD queria e quer que venha a acontecer!
Quero ainda dizer, com toda a clareza, que é evidente para todos que também é um falso problema tentar iludir a questão de que aos tribunais cabe investigar a matéria criminal mas que há matéria que os tribunais não investigam, pois há matéria que não cabe nessa investigação de natureza criminal.

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Posso citar vários exemplos: não está a ser investigado o problema dos remanescentes, que já aqui foram referidos; não está a ser investigado o problema dos casos que envolvem verbas inferiores a 350 contos; não está sequer a ser investigado o problema dos desdobramentos. Estas questões não devem ser investigadas, não devem ser clarificadas? Ninguém vai ficar esclarecido sobre estas questões?

Protestos do PS.

É que estas questões não constam das investigações. Isto é público e toda a gente sabe que estas questões que referi não constam das investigações!
Portanto, impedir que haja uma actuação do Parlamento no sentido de clarificar estas questões é continuar a encobrir, é continuar a branquear, é continuar a silenciar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Assim, aponto o dedo, com clareza, ao Partido Socialista e ao Partido Popular, a quem não ouvi fazer hoje, aqui, a defesa do total apuramento da verdade e o esclarecimento das questões. Foi feita uma intervenção por parte do Partido Comunista, dizendo que "sim, mas agora, não; faz-se depois", mas nem sequer isto ouvi quer da parte do Partido Socialista quer da do Partido Popular.

Protestos do Deputado do PS Rui Namorado.

É, pois, evidente que há aqui uma linha de clivagem entre os que querem continuar a iludir o problema, a manter a suspeição generalizada, o que é um libelo acusatório completamente injusto que afecta o bom nome do Parlamento e de todos os que são representantes do povo nesta Casa, os quais deveriam ter direito ao seu bom nome e à presunção da sua inocência até sentença judicial em contrário, o que constitui um direito essencial de qualquer cidadão.
O que os senhores querem fazer é manter uma suspeição generalizada, negando esse direito básico para qualquer cidadão e, mais grave ainda, para uma instituição democrática como é o Parlamento.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, só posso considerar como manifesto lapso da sua parte o facto de não ter estado com atenção ao que eu disse - e sei que, normalmente, o Sr. Deputado ouve com atenção tudo o que dizem todos os Srs. Deputados nesta Assembleia -, pelo que, como estou aqui para ajudá-lo, vou repetir rigorosamente o que disse na minha intervenção.
Ora, o que eu disse na minha intervenção foi que queria que se descobrisse toda a verdade - e repito "toda a verdade" - sobre todos os processos. Portanto, Sr. Deputado, em relação a esta matéria, ficamos absolutamente esclarecidos.
O Sr. Deputado pode encontrar muitas clivagens - e certamente encontrá-las-á -, mas não essa. Se esse é o seu espirito, devo dizer-lhe que, em relação a esta matéria, o Sr. Deputado não encontra qualquer clivagem.
Mas eu disse mais: disse que não aceitava afogas seleccionadas", disse que isto se aplicava a todos os casos e verberei "fugas seleccionadas". Mais ainda, Sr. Deputado: eu disse que não era sequer aceitável fazer perseguição política ou combate político e partidário através dessas "fugas seleccionadas".
Sr. Deputado, o que eu disse foi precisamente isto: o Ministério Público que investigue tudo sobre todos. O que queremos, repito, é que o Ministério Público investigue tudo sobre todos.
Ora, o que, infelizmente, acontece em Portugal, não raras vezes, é "deixar-se cair" uma, duas, três, quatro ou cinco notícias, atira-se a calúnia e, depois, pára-se e, assim, aos olhos da opinião pública, a dúvida persiste. Como tal, quem é honesto fica claramente prejudicado porque tinha direito a estar absolvido aos olhos da opinião pública e quem prevaricou fica em situação igual à de quem é honesto. Assim, ficando em situação igual quem cumpriu e quem prevaricou, subsiste em relação aos dois uma dúvida idêntica que, para nós, é inaceitável. Portanto, para nós, é muito claro: investigue-se tudo; absolva-se quem não prevaricou, condene-se quem prevaricou.
O que eu disse foi que a criação de uma comissão de inquérito agora, no final da legislatura, apareceria, aos olhos da opinião pública, como se a Assembleia da República quisesse ser juiz em causa própria. Foi isto que disse e reitero-o agora, Sr. Deputado. Portanto, não vamos inviabilizar uma comissão de inquérito, vamos abster-nos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, para responder.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, quando 0 ouvi pedir a palavra para me pedir esclarecimentos pensei por momentos, conhecendo-o como o conheço, que, eventualmente, teria havido algum mau entendimento da minha parte relativamente às suas palavras. Ora, Sr. Deputado, quero dizer-lhe com toda a franqueza que, depois de ter ouvido a questão que acaba de colocar-me, fico convencido de que, de facto, interpretei bem o que disse na sua intervenção.
Sr. Deputado, deixe-me ser muito claro no que vou dizer-lhe. É que de nada serve dizer-se que se quer descobrir toda a verdade - e acho até que é, rotundamente, uma falsa questão, frase que, de facto, o ouvi dizer na sua intervenção e que o Sr. Deputado repetiu agora, quando fez o seu pedido de esclarecimento. Repito que de nada serve dizer-se que se quer que seja descoberta toda a verdade para, depois, vir dizer-se que, em consequência, o que deve fazer-se é instar a Procuradoria-Geral da República a fazer todas as investigações, porque, Sr. Deputado, a Procuradoria-Geral da República tem competências próprias as quais têm limitações. Aliás, citei exemplos objectivos de situações que a Procuradoria-Geral da República não está a investigar, diria mesmo que não tem competências para investigar, nalguns casos.
Portanto, se a nossa solução fosse a de "atirar" tudo para as instâncias de investigação criminal, tal equivaleria a dizer que essas questões não vão ser esclarecidas, que vão continuar na penumbra, que vai continuar a existir a suspeição.
A este propósito, cito um exemplo concreto. Conforme noticiado em todos os órgãos de comunicação social, ontem mesmo, foi proferida uma sentença judicial relativamente

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ao caso pessoal do ex-Deputado Luís Filipe Menezes que, por razões da lei processual, viu o respectivo processo arquivado. No entanto, ele próprio continua sem ter a possibilidade de dar explicações e de lutar pela defesa do seu bom nome, da sua dignidade e da sua integridade. Assim, uma vez que não vai haver processo judicial e para que o seu bom nome possa ser defendido, ele próprio escreveu ao Presidente da Assembleia da República, disponibilizando-se para, através do estabelecimento de uma comissão de inquérito ou de qualquer outro meio que a Assembleia ponha em funcionamento para investigar estes factos, vir, publicamente, clarificar na totalidade a sua situação para com a Assembleia no que diz respeito às viagens que efectuou enquanto Deputado a fim de o seu bom nome poder ser resgatado contra a "lama" que lhe foi lançada junto da opinião pública. Eis, pois, um exemplo concreto de casos em relação aos quais, se forem deixados estritamente à competência dos meios de investigação, não serão atingidos os objectivos que o Sr. Deputado também diz defender, tal como bem o ouvi dizer.
Sr. Deputado, não vale a pena fazer discursos bonitos, querer atingir o Paraíso, se, depois, não se põem ao serviço meios para lá chegar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A pergunta que fica no ar é a seguinte: se não querem uma comissão de inquérito, então, qual a alternativa? É que a solução de "atirar" tudo para a investigação criminal - é certo e sabido e não vale a pena "atirar areia para os olhos" - não serve para a clarificação total do assunto, clarificação essa que é necessária. Proponham, então, uma alternativa!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, para defesa da honra.

O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, tive algum cuidado e algum pudor em não particularizar. Repito: tive algum cuidado, rigor e pudor em não particularizar.
O Sr. Deputado acaba de fazer-me o favor pessoal de trazer a esta sede a questão de um seu colega de partido, presumo que seu amigo,...

O "Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Meu amigo, sim!

O Orador: - ... meu antigo, sobre quem afirmei, tanto quando ele era cabeça-de-lista do seu partido pelo círculo eleitoral do Porto como após deixar de o ser, que, em meu entender, estava completamente inocente. Afirmei mesmo que exigia uma sentença judicial para que fosse possível conseguir-se provar o contrário do que era minha convicção. Repito, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, que fiz essas afirmações quando o seu colega era cabeça7de-lista do seu partido pelo círculo eleitoral do Porto, portanto, meu adversário, mas continuei a dizê-lo quando ele deixou de integrar as listas do PSD, ao contrário de outros, mas isso são problemas internos do Partido Social Democrata!...
Sr. Deputado Luís Marques Guedes, a única coisa que, sinceramente, não o autorizo a fazer é que insinue e desvirtue sistematicamente as minhas afirmações.
Sr. Deputado, eu disse que o meu partido não votaria no sentido de inviabilizar a constituição de uma comissão de inquérito, eu disse que o CDS-PP iria abster-se. Aliás, disse-lhe qual era a nossa dúvida em relação à constituição de uma comissão de inquérito. Portanto, as nossas dúvidas mantêm-se, mas não votaremos no sentido de inviabilizar uma tal comissão.
Mas há uma coisa que não deixamos ficar no ar, pelo menos, em relação a mim próprio e à minha bancada.
Efectivamente, o Sr. Deputado e o seu partido, só porque, hoje, vêm propor a realização de uma comissão de inquérito, afirmam que querem toda a verdade, enquanto, relativamente aos outros Srs. Deputados, porque têm reticências quanto à forma e ao método, os senhores dão ideia de que eles não querem o apuramento da verdade. Quanto a isso, Sr. Deputado, peço-lhe imensa desculpa, mas não posso aceitar, nem relativamente a mim próprio nem ao meu partido.
0 que eu disse da primeira vez que usei da palavra foi o que disse da segunda vez e, igualmente, o que digo agora, ao abrigo da figura regimental da defesa da honra. É este o espírito do Partido Popular.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, para dar explicações, se assim o desejar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Silvio Rui Cervan, serei breve até porque me parece que, em boa verdade, não protestou contra qualquer falta de consideração de que tenha sido objecto pela minha parte pois, de facto, não o foi.
Sr. Deputado, após ter voltado a ouvi-lo tentar dar explicações sobre esta matéria, apenas quero reafirmar o que já disse.
Do meu ponto de esta, o que é importante não é tanto protestar-se a inocência que cada um de nós acredita que outros Deputados possam ter relativamente a esta matéria mas, sim, permitir que todos eles, sem excepção, tenham a possibilidade prática de, eles próprios, defender o seu bom nome, a sua dignidade e demonstrar que estão perfeitamente inocentes perante cabalas que foram lançadas para manchar o seu bom nome. É isto que, quanto a mim, não está a acontecer.
Se, como fiz, citei o exemplo do também muito meu amigo, Luís Filipe Menezes, foi precisamente porque é público que ele próprio já tomou a iniciativa de dizer que quer ter a possibilidade de resgatar pessoalmente o bom nome e a dignidade a que tem direito.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, para uma intervenção.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aproximamo-nos do momento da votação e julgo que, agora, está inteiramente claro qual foi o objectivo desta iniciativa do PSD.
Na verdade, o PSD queria dizer à Câmara que tinha um suposto "elixir de salvação", mas foi incompreendido por todos, inclusive, seguramente, por vários membros da sua própria bancada. Os Deputados assinalaram, um a um, os defeitos, objectivos e não inventados, da iniciativa do PSD que, longe de ser um "elixir de salvação" poderia ser, talvez, uma espécie de "poção venenosa" que, aliás, acabaria por envenenar os próprios que a administrariam.
Por outro lado, face a estas críticas, não ouvimos qualquer réplica, a não ser a invocação daquele terrível e tene-

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broso argumento que fez escola neste país durante tantos decénios: "quem não é contra mim, mesmo nas minhas asneiras, é filho das trevas e, seguramente, está do lado da mentira e não da verdade". É algo que, neste caso, é puramente caricato porque os argumentos do PSD nesta matéria não têm relevo e, coisa que compreendo que irrita soberanamente o PSD, contrariam uma verdade de senso comum que os cidadãos sentem: Deputado não julga Deputado; a entidade mais inapropriada para esse efeito é o autojulgamento. Todas as pessoas compreendem isto. Portanto, o PSD pode "chorar", por mais esta mensagem não passar nos jornais, nos telejornais, no que quiser. Esta mensagem não passa porque colide com o bom senso, e os portugueses têm bom senso.
Mas há uma segunda, e última, questão, a que não aludi no início porque, nesta matéria, é nosso propósito manter uma atitude de grande e medida prudência, que, aliás, não quebrarei. Há um outro aspecto desta operação que merece ser assinalado dentro do espírito que citei.
Neste ponto o PSD colide com outra regra de bom senso a que, seguramente, os portugueses são sensíveis. Essa regra é: não se deve, não se pode misturar o trigo com o joio, Nestas últimas semanas viu-se um esforço notável, pela sua violência, reprovável, naturalmente, para misturar trigo e joio.
Gostaria de dizer que, tal como fez nestas semanas e fará na votação, o PS não só leão se confunde, como não se deixa confundir, como não ajuda à confusão e como impedirá que alguém traga para as instituições, poluindo-as, o espírito da mistura do inocente e do culpado. Connosco, aqui, isso não passará. É essa a garantia que damos aos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que dou por encerrada a discussão do primeiro ponto da ordem do dia, que iremos votar.
Apesar de os Srs. Deputados terem, de algum modo, extravasado o que estava rigorosamente em causa e o que vai ser objecto de votação, pronunciando-se sobre se eram ou não favoráveis á constituição de uma comissão parlamentar de inquérito requerida pelo PSD, o que vai ser posto à votação, porque é o único ponto que está em causa, é a convocatória extraordinária do Plenário da Assembleia da República, antes das eleições, para discussão e votação do projecto de resolução apresentado pelo PSD. É apenas isto que está em causa, porque o novo universo eleitoral que há-de sair das próximas eleições poderá ou não pronunciar-se sobre este pedido de inquérito, consoante ele seja ou não agendado na conferência de líderes.
Já sabemos, por antecipação, qual é a posição dos partidos políticos sobre o projecto de resolução, mas não é sobre isso que nos vamos pronunciar, nem é essa questão que vou pôr à, votação. O que vou pôr à votação, repito, é apenas se deve ou não fazer-se uma convocação extraordinária do Plenário da Assembleia da República antes das eleições, numa data a fixar posteriormente. Se forem contrários à convocação extraordinária, já não se põe o problema da data, mas se forem favoráveis temos de encontrar unia data em sede de conferência de lideres. Mas, repito, é só este ponto que posso pôr à votação.
Portanto, a votação de hoje não prejudica, em absoluto, a possibilidade de o novo universo que sair do próximo acto eleitoral vir a apreciar este pedido de inquérito parlamentar, se o mesmo vier a ser agendado em conferência de líderes.
Srs. Deputados, vamos votar apenas a convocatória extraordinária do Plenário da Assembleia da República para discussão e votação do projecto de resolução n.º 140/VII Constituição de uma comissão eventual de inquérito parlamentar às viagens dos Deputados, requerida pelo PSD.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, votos a favor do PSD e abstenções do CDS-PP, do PCP e de Os verdes.

Houve, pois, maioria no sentido de não se proceder a uma convocação extraordinária do Plenário da Assembleia da República para apreciar e votar o projecto de resolução n.º 140/VII, que constitui uma comissão eventual de inquérito parlamentar, formulado pelo PSD.
Srs. Deputados, vamos passar à apreciação das notícias vindas a público sobre a situação financeira da TAP, requerida pelo CDS-PP.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, é sintomático que, face ao nosso pedido, o Sr. Primeiro-Ministro tenha aqui deixado não digo sozinho, porque está bem acompanhado!, o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, mas que não tenha vindo prestar a solidariedade que o Sr. Ministro necessitava, seguramente, para nos dar respostas às perguntas que formularemos.
Efectivamente, solicitámos a presença do Sr. Primeiro-Ministro e, caso não fosse possível, também do Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.
Sr. Ministro João Cravinho, desde logo, gostava que nos respondesse a três perguntas muito simples, porque, se ficarmos satisfeitos com as respostas a estas perguntas, estamos absolutamente tranquilos em relação a esta matéria.
Segundo dados que o Sr. Ministro forneceu á Comissão em Abril ou Maio passado, a anterior administração da TAP teve aproximadamente, em dotações do PESEF, 50 milhões de contos em 1994, 50 milhões de contos em 1995, 40 milhões de contos em 1996 e 40 milhões de contos em 1997. Este conjunto de investimentos, de dotações que contribuíram para a reestruturação da Transportadora Aérea Portuguesa serviriam para viabilizar, modernizar a TAP, no fundo, para melhorar e tornar mais competitiva a nossa transportadora.
O conselho de administração mudou em Maio passado, tendo o anterior conselho de administração afirmado que a situação estava estabilizada e que, a partir de então, tínhamos condições para inverter o ciclo.
Sr. Ministro, a actual administração informou-nos, via comunicação social, que a situação era muito difícil, que os investimentos tinham sido insuficientes, bem como que, desde Outubro passado, a TAP vive uma situação muito difícil.
Sr. Ministro, quem mentiu? Mentiu o anterior conselho de administração? Mente o actual conselho de administração? Ou será que houve um erro de avaliação do anterior ou do actual conselho de administração?
Mas há uma segunda pergunta que gostávamos de ver respondida. Por avaliações de peritos, foi dito que a TAP

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valeria, aproximadamente, entre 80 e 100 milhões de contos, numa das avaliações, e entre 70 e 90 milhões de contos, numa outra. Portanto, há um ano e meio atrás era dito, de forma reiterada, que a TAP valia, aproximadamente, 100 milhões de contos. Mas há seis meses atrás começou a dizer-se que a TAP valia 60 milhões de contos e, hoje, a única coisa que se diz é que cada dia que passa ajuda a Swissair a comprar a TAP mais barata! Esta é hoje a única informação, repetida e reiterada, que temos.
Sr. Ministro, quanto vale hoje a TAP?
Sr. Ministro, sempre se disse que estrategicamente seria correcto e empresarialmente saudável que a TAP comprasse a Portugália e que a negociação fosse feita em bloco em relação à Swissair e aos demais membros do Qualiflyer Group. Mas, segundo notícias que vêm todos os dias a público, a Sw7ssair já comprou parte importante da Portugália - a TAP tê-lo-á feito noutra percentagem e, portanto, agora a negociação da TAP com a Swissair é autónoma, o que desvaloriza o valor da TAP. É verdade ou é mentira, Sr. Ministro?
A terceira pergunta prende-se com o seguinte: sabemos, porque o Sr. Ministro teve a amabilidade de o tornar público, conjuntamente com o Conselho da Administração da TAP, que foi feito um acordo com os pilotos e, ainda, um acordo complemento de reforma. Ora, queríamos saber quanto custa o acordo com os pilotos e quanto custa o complemento de reforma a ser dado, bem como se nas declarações feitas pelo actual Conselho de Administração já estava esta preocupação, ou ela ainda vai acrescer a muitas outras preocupações do actual Presidente do Conselho de Administração da TAP.
Sr. Ministro, se ter uma companhia de bandeira, que perde valor estratégico todos os dias e que, tendo em atenção as vozes diárias dos nossos emigrantes que entram e saem todos os dias em Julho, Agosto e Setembro, é cada vez menos útil, menos eficaz, serve apenas para ir ao bolso do contribuinte, então, para isso, não vale a pena ter companhia de bandeira. A companhia de bandeira valeria a pena se fosse economicamente viável, se fosse economicamente bem gerida e se, efectivamente, significasse um valor acrescentado para os portugueses, nomeadamente, para as inúmeras comunidades de portugueses espalhadas pelo mundo.
Se o Sr. Ministro tiver boas respostas para as perguntas que formulei, poderá sossegar não só a bancada do Partido Popular como toda a Assembleia da República e, seguramente, o Sr. Presidente do Conselho de Administração da TAP que, esse sim, além de estar alarmado, julgo ter alarmado todo o País com as últimas declarações.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, terra a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Tenho ideia de que o único interesse que este debate terá hoje não é o de repetirmos aquele que aqui teve lugar em Março e Abril mas, porventura, o de "fazer uma viagem" pelos recentes desenvolvimentos da empresa, designadamente no que se refere à substituição do conselho de administração, às novas declarações por ele proferidas e ao acordo que, entretanto, foi celebrado entre a TAP e os pilotos. Esses são os factos novos que, penso, vale a pena trazer à colação.
Em primeiro lugar, faço-o para sublinhar algum espanto, Sr. Ministro, pela contradição profunda entre o cenário "cor-de-rosa" que aqui nos foi exposto no Plenário da Assembleia da República em Abril deste ano e mesmo antes, na audição promovida pelo PCP, em relação à situação financeira da TAP e às virtualidades do acordo Qualiflyer, e as declarações que agora ouvimos do Presidente do Conselho de Administração da TAP, revelando uma situação negra da TAP e pondo em causa o acordo Qualiflyer.
Lembra-se, por exemplo, o Sr. Ministro, quando discutimos aqui os perigos que recaíam sobre a TAP ao fazer-se a transferência do sistema de reservas para uma empresa do grupo Swissair? O Sr. Ministro e o então presidente do conselho de administração da TAP disseram: "Não há perigo algum, isso está tudo garantido". Todavia, ouvimos agora o novo Presidente do Conselho de Administração da TAP declarar que houve uma migração para esse sistema - refere-se à transferência do sistema de reservas para a empresa do grupo Swissair - sem a necessária preparação, o que teve uma quota-parte na quebra de receitas, etc., etc.
Estas são algumas das declarações que hoje ouvimos sobre esta matéria, mas também poderíamos referir a análise sombria da situação económica da empresa e da sua performance que o novo Presidente do Conselho de Administração da TAP apresentou numa conferência de imprensa realizada a 7 de Outubro, em que afirma que, só até Maio, se verificou uma quebra enorme do resultado líquido da empresa, quando já registava um desvio negativo superior a 100% em relação ao orçamentado: com menos 7,1% em receitas de tráfego, com menos 7,9ºlo da remuneração do capital, com menos 8,9º/a na receita global face a idêntico período em 1998.
Sr. Ministro, este novo discurso do novo Presidente do Conselho de Administração da TAP desmente completamente o cenário "cor-de-rosa" que o Sr. Ministro e o anterior presidente do conselho de administração da TAP aqui tinham trazido em debates anteriores, designadamente na audição promovida pelo PCP.
A primeira pergunta é esta, Sr. Ministro: onde está a verdade? No cenário "cor-de-rosa" que o Sr. Ministro aqui trouxe? Nas virtualidades do acordo Qualiflyer, tendo até mostrado - recorda-se, com certeza - aquele "livrinho" com as fotografias da nova imagem da TAP pelos aeroportos fora? Quando nós defendíamos que o que estava em causa neste acordo com a Swissair era uma degradação da imagem, uma perca de rotas, unia transferência para um grupo de internacionais sem o controlo de elementos centrais do coração da empresa, como era o casting de reservas!
É verdade o que o Sr. Ministro dizia ontem ou é verdade o que diz hoje o Presidente do Conselho de Administração da TAP e que, no fundo, confirma as nossas preocupações e as preocupações e críticas dos trabalhadores? Esta é uma questão que gostava de ver esclarecida pelo Sr. Ministro.
A segunda questão, Sr. Ministro - espero que o reconheça -, refere-se ao acerto das nossas previsões quando, na altura, trouxemos esta questão ao debate. Entre outras, afirmámos que não víamos saída para aquele inenarrável acordo que a comissão arbitral tinha aprovado, a não ser pela abertura do capital aos pilotos. O Sr. Ministro não disse que não, mas recusou-se a dar uma resposta clara na altura. Ora, era evidente que esse era o único caminho, só que esse caminho é, como deve sa-

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ber, altamente perigoso, porque arrasta consigo muitos outros problemas.
O primeiro problema que arrasta é o da privatização da TAP, é o do desmembramento da TAP, a sua segmentação em três áreas aliás, já estão criadas três direcções-gerais. Com isto, o que se vai fazer é, por um lado, fragilizar a TAP. É que a TAP, apesar de tudo e com todas as dificuldades, é hoje uma empresa com uma determinada dimensão, com capacidade de negociar e de intervir no mercado, mas, ao ser segmentada 9 dividida em três pequenas empresas, com o objectivo da sua privatização em resultado do acordo com os pilotos, o que vai acontecer, Sr. Ministro, não é um acréscimo da capacidade dos níveis de produti-vidade e da capacidade concorrencial da Transportadora Aérea Portuguesa mas, sim, o seu desmembramento, a sua fragilização, a sua perca de quotas no mercado, enfim, a sua dependência em relação aos grandes operadores na Europa.
Portanto, Sr. Ministro, a questão é que nós também tínhamos razão e essa razão arrasta estes problemas que estão em cima da mesa. Já não falo, por exemplo, no facto de se ter de distribuir capital pelos restantes 7000 trabalhadores - e perguntava-lhe onde é que ficava capital para o resto -, não é isso, até porque os trabalhadores, e bem!, rejeitam essa outra solução, porque não estão de acordo com o processo de privatização da TAP, mas arrasta o problema que acabei de referir, o de uma empresa, que é hoje de capitais públicos, que serve os interesses nacionais, que serve os interesses da soberania nacional, que serve os interesses do Estado português, por causa deste acordo e dos novos modos de gestão que estão patentes, vir a ser transformada em várias empresas, vir a ser privatizada e, portanto, o País perder o controlo de uma empresa de transporte aéreo de capitais públicos, que tão necessária é, quase diria, para a nossa própria soberania.
A questão que coloco é a seguinte: face ao facto de o novo Presidente do Conselho de Administração da TAP, contrariando as declarações do Ministro da tutela e do anterior presidente, pôr em causa as virtualidades do acordo com a Swissair, em particular a questão Qualiflyer e o sistema de reservas, o Governo e a TAP vão rever o acordo com a Swissair7
Como o Sr. Ministro sabe, o PCP tem uma posição muito clara sobre esta questão: somos favoráveis a que a TAP faça acordos de parceria estratégica com outros operadores aéreos na Europa, mas já não somos favoráveis a que, na sequência desses acordos, a TAP perca a sua autonomia, perca a sua imagem, perca as suas rotas e o País perca uma transportadora com a importância e o significado que ela tem.
Vai o Governo dar instruções à TAP, ainda nesta fase, para rever o acordo com a Swissair7 Está o Governo de acordo em rever e, se for casa disso, suspender o caminho para o processo de privatizações e reequacionar toda esta questão no sentido de mantermos a TAP como uma empresa de capitais públicos?
Já agora, Sr. Ministro, depois explique ao PP - cujo Presidente fez hoje uma declaração no sentido de propor cortes sucessivos á TAP ou á CP para o aumento de pensões. Isto é, uma espécie de supermercado! Se não der a TAP, vai-se à CP ou vai-se à Caixa Geral Depósitos, tiram-se uns milhões e dão-se para as pensões!... Em véspera de eleições, parece que vale tudo... -, mas, repito, já agora, Sr. Ministro, explique ao PP que a TAP, neste momento, tanto quanto sabemos, mal ou bem - não estamos a discutir essa questão -, já não recebe apoios estatais, depois dos acordos feitos ao abrigo das normas comunitárias.
Vale a pena esclarecer esta matéria para pormos algum travão neste chorrilho de promessas que vai por esse país fora em véspera de eleições, em que tudo vale!
Sr. Ministro, fique com as nossas questões e as nossas preocupações e nós esperamos as suas respostas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação na TAP é do interesse de todos e a minha primeira observação é a de saber se, eventualmente, o debate que estamos a realizar hoje é um contributo positivo para o progresso e para a solvência da empresa, posto que ela tem um mercado concorrencial em que se insere, e o que importa reflectir é se esta é a melhor maneira de enquadrar o problema.
Em segundo lugar, entendemos que as parcerias estratégicas não devem ser postas em causa e, no mundo em que ovemos, hoje, não constitui dúvida para ninguém que, se a empresa tem futuro, deverá progredir em parceria com outras empresas estrategicamente situadas _ no mercado concorrencial.
Em terceiro lugar, a TAP tem uma perspectiva de futuro que envolve o seu enquadramento em três empresas distintas com a finalidade de a dotar de maior capacidade concorrencial. Penso que o caminho é este e que em cada momento será sempre feita uma avaliação de gestão da própria empresa, que é sempre susceptível de evolução em termos futuros. Aliás, é isso que qualquer empresa faz.
Em quarto lugar, é necessário reconquistar os mercados, sobretudo os que têm o seu início e fim no Porto, Faro, Madeira e Açores, o que nos parece um esforço quito positivo. A reanimação de canais e de estruturas de venda, em Portugal e no estrangeiro, é também um esforço positivo e o próprio relacionamento da TAP com outras companhias, nomeadamente com a Portugália, é, a nosso ver, também positivo.
De qualquer forma, a situação gera, eventualmente, alguma preocupação e sobre esta matéria nunca foi aqui traçado um cenário cor-de-rosa, pelo contrário. Vivemos nesta empresa momentos de grande instabilidade laborar, que são conhecidos de todos, e há alguns meses a esta parte, num dos últimos debates que fizemos sobre esta matéria, o Governo e também nós tivemos a preocupação de dizer: "Atenção, é fundamental corrigir o que está a acontecer, sob pena de a própria Companhia, eventualmente, retirar prejuízos desse tipo de comportamento".
Por outro lado, a avaliação da própria empresa deve ser objecto de alguma ponderação. Aliás, no ano passado, falava-se, mais ou menos por esta altura do ano, que, no primeiro semestre, existia um resultado negativo de cerca de 6,5 milhões de contos, mas a verdade é que, no final do ano, isso foi superado e o resultado foi positivo em cerca de 1,6 milhões de contos. Também é claro para todos que este ano esse défice assume uma proporção mais elevada, mas pensamos que a extrapolação e o resultado final poderão apenas ser vistos e analisados no final deste ano.
Para terminar, há que ponderar também as situações que decorrem de uma quebra de receitas que atinge a generalidade das companhias aéreas: os resultados operacionais

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da Lufthansa caíram cerca de 40% no primeiro semestre; a Austrian Airlines prevê uma quebra idêntica de 30 a 40% e as outras companhias, como a British Airways, a ICL,M, a Swissair e a Sabem têm resultados mais ou menos conformados a números que indicam, neste momento, um défice. .
Significa, portanto, que no mercado há uma concorrência feroz, há um esmagamento de preços e ë sobre este cenário, e relativamente a esta matéria, que há necessidade de repensar a estratégia da TAP, o que se está a fazer através de indicadores que referi inicialmente.
Por isso, relativamente à empresa, aos seus resultados e à sua situação actual, exprimimos, como é óbvio, a nossa observação interessada, alguma preocupação, mas penso que a melhor maneira de ajudar a empresa é não sermos nós próprios a pôr em causa publicamente a sua capacidade concorrencial.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tema palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (João Cravinho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começando por responder ao Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, gostaria de dizer que, segundo anota que recebemos, os esclarecimentos foram pedidos ao Ministro da tutela e não ao Sr. Primeiro-Ministro. De qualquer maneira, é natural que seja o Ministro da tutela a responder.
Relativamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, devo dizer que a TAP recebeu, entre 1994 e 1998, 180 milhões de contos, de acordo com o PESEF, fundamentalmente para absorver um passivo que, como sabe, ultrapassava a centena de milhar de contos. Neste momento, a TAP não recebe qualquer subsídio do Estado e é política fundamental do Governo fazer com que a TAP, ainda que com grande interesse público, seja tratada como uma empresa comercial.
Ninguém mente a propósito destas questões. O que sucede é que existe uma economia de mercado que, infelizmente, não se comporta como a economia soviética planificada que existiu há 20 anos e que, portanto, funciona como funciona.
Como os Srs. Deputados sabem, houve alterações de mercado que modificaram o valor, as situações patrimoniais e os resultados de exploração de todas as companhias aéreas - não foi só o caso da TAP -,situações que, em muitos casos, não se afastam do caso da TAP. Ainda há alguns dias, um jornal publicou a perda de património de fortunas bem conhecidas em Portugal, que atingiam nalguns casos mais de 100 milhões de contos em poucas semanas, e tenho a impressão de que a perda de 140 milhões de contos de uma dessas fortunas aconteceu a partir de Abril. Isto é o mercado. Portanto, ninguém mente. O que se pode dizer é que, infelizmente, não está no nosso poder forçar os mercados a ficarem imóveis durante anos e anos a fio...
Relativamente à avaliação da TAP, os esclarecimentos já foram prestados. A situação é perfeitamente clara, pelo que suponho não ser necessário repetir. No entanto, direi que os números iniciais eram da ordem dos 80 milhões de contos, como ponto médio, e na altura ficaram fixados em 60 milhões de contos. A correcção fundamental tem a ver com a avaliação da progressão do yeld que, na primeira versão, era excessivamente optimista, mas mandámos fazer uma reavaliação por parte de empresas internacionais especializadas e os números encontrados passaram para 60 milhões de contos.
A questão do yeld é fundamental. Presumia-se que o yeld ia subir seis pontos percentuais nos próximos quatro anos. Pois bem, nos primeiros seis meses deste ano o yeld caiu no caso da TAP, como no caso de quase todas as companhias europeias. A TAP está exactamente na média, que é 8%. Quando o yeld cai 8%, os resultados têm de ser negativos. É o caso da Lufthansa, da Swissair, da British Airways, da Austrian Airlines; todas as companhias europeias têm tido, em média, decréscimos de yeld de oito pontos, o que dá origem a decréscimos de lucros ou de resultados operacionais na ordem dos 30 a 40%.
Portanto, o problema é o de saber se a TAP tem alguma situação especial.
A TAP acompanha a situação geral, tem alguns aspectos um pouco mais delicados, porque é uma companhia frágil. A TAP esteve 23 anos a sofrer prejuízos e, ao fim desse tempo, teve, em 1997, um lucro de 1 milhão de contos e, em 1998, teve um lucro semelhante. É evidente que a TAP é uma companhia extremamente frágil, como todas as pessoas sabem, depois de 23 anos em que esteve no "vermelho", nalguns casos em dezenas de milhões de contos. Portanto, qual é o espanto!?
Quanto ao acordo com os pilotos, o mesmo custou 1,2 milhões de contos. Houve um acréscimo de despesas com os pilotos de 1988 para 1999 mas nesses 1,2 milhões de contos está incluído o aumento de 3% relativamente a 1998, um aumento de 3% relativamente a 1999, de forma que temos um acréscimo de cerca dé 500 000 contos acima do que resulta do puro alinhamento do acréscimo dos salários nas outras empresas.
Finalmente, o Sr. Deputado Lino de Carvalho pergunta onde está o "cenário cor-de-rosa". Devo dizer que os mercados, como já referi, infelizmente, não podem ser previstos de acordo com aquela velha maneira descrita nos manuais. Também os manuais falharam rotundamente quanto mais os mercados! Temos de ter consciência das realidades.
O que é que nós dissemos, aqui, em Março? Dissemos que o sistema de reservas mostrava uma recuperação e, de facto, a recuperação verificou-se no número passageiros, tendo havido um aumento de 5%. Simplesmente, devido à crise em África e à SATA, o número de passageiros por quilómetro decresceu 1,9%.
Finalmente, o yeld caiu 8% na média europeia e a TAP acompanhou rigorosamente o decréscimo e o resultado evidentemente tinha de ser negativo.
No entanto, a situação para o segundo semestre parece estar estabilizada do ponto de vista dos resultados operacionais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha apreciação da situação da TAP tem pouco a ver com a que foi feita pelo Governo.
Conheço bem o problema da TAP, conheço-o já há bastante tempo e julgo até ter alguma autoridade moral para poder falar neste problema. E que enfrentei, há um bom par de aios, uma das crises mais desceis que se passou em Portugal relativamente a qualquer empresa

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pública, que foi a crise da TAP, apanhada, por um lado, pela liberalização emergente na Europa e, por outro, pela sua muitíssimo lamentável situação financeira, que vinha do facto de ela ter perdido vocação. A TAP, como empresa de bandeira que fazia o transporte entre a metrópole e as colónias, tinha desaparecido, não tinha encontrado uma nova via e esta falta de vocação, adicionada ao facto de ter um ambiente concorrencial inteiramente distinto do que estava habituada, redundou numa das maiores crises de empresas públicas em Portugal. De tal forma foi que - e faço um apelo à memória dos Srs. Deputados - muitas pessoas, algumas delas estão presentes nesta sala, defenderam, na altura, pura e simplesmente, a extinção da TAP.
Considerava-se que a TAP custava demasiado dinheiro ao Estado português para poder sobreviver e, sobretudo, para as vantagens que lhe poderia trazer. Nunca tive essa opinião. Sempre acreditei que a TAP tinha feito o que era mais difícil de conseguir numa companhia aérea, que era ter firmado o seu nome na qualidade dos serviços que prestava e na confiança dos portugueses. Esse é um património, embora intangível, que não poderia ser desperdiçado e que nenhuma outra companhia o construiria exactamente nos mesmos moldes em que a TAP o tinha conseguido construir ao longo de décadas.
Defendi ardorosamente o futuro da TAP. Fi-lo, em alguns casos, contra ventos e marés, mas sempre com a consciência plena do que estava a fazer. A solução que foi encontrada não foi nada fácil, não tento agora sobrevalorizar o esforço que muita gente despendeu nessa altura, mas a realidade era essa. Não foi fácil! Primeiro, foi necessário encontrar os recursos suficientes para assumir a dívida que a TÀP tinha e que inviabilizava qualquer hipótese de reestruturação da empresa, dívida que, na verdade, já não era da própria TAP, era do Estado - o Estado "atravessava-se" nessa dívida -, e, na hipótese de desaparecimento da TAP, quem ficava devedor era imediatamente o Estado. Portanto, achou-se que a solução possível era o Estado assumir directamente essa dívida, para que dessa forma; pelo menos, assuas hipóteses de recuperação não pudessem ser comprometidas.
Esse esquema pôs-se em funcionamento e, depois, foi absolutamente imprescindível negociar com muitas entidades, desde logo com todos os sindicatos internos da TAP, alguns mais recalcitrantes que outros, mas em diálogo, que, embora sempre difícil, também foi sempre conclusivo, e, sobretudo, negociar com as autoridades da Comissão Europeia, que, nessa altura, defendiam uma política de mercado aberto na Europa relativamente ao transporte aéreo, algo a que a Europa não estava habituada, mas que justamente por isso e para vincar que era mesmo para vingar a Comissão Europeia procurava tornar mesmo verdadeiras essas regras.
Foi, portanto, destas múltiplas frentes que foi necessário conduzir este processo delicado, com alguns momentos de angústia, alguns momentos até de desânimo, mas sempre com um objectivo final. Felizmente, foi possível, insisto, com o esforço de muita gente - e algumas delas ficarão sempre anónimas -, conseguir o acordo da TAP. O que era o acordo da TAP? O acordo da TAP era um acordo aceitável para as autoridades da Comissão Europeia, como tinha de ser, um acordo aceitável para os próprios sindicatos, mas, sobretudo, um acordo que dava futuro á TAP, o qual tinha agregado um plano de reestruturação da TAP, porque todos sabíamos que se esta empresa continuasse carro anteriormente, em breve, voltaria ao estado em que estava. A situação era recorrente e não haveria segunda oportunidade para um segundo acordo.
Por isso, procurou agregar-se, logo na altura, aquilo era o futuro da TAP, um futuro, na altura, a médio prazo, estabelecido com metas anilais para serem atingidas e verificadas. Obviamente que esta era a única solução possível para uma empresa daquela envergadura e á qual, pessoalmente, devo atribuir uma enorme importância.
Fiquei satisfeito. Devo dizer que não fui o único, muita gente ficou satisfeita com o resultado alcançado. Eram, de facto, as metas possíveis que contribuíam, uma vez alcançadas, para um futuro seguro, estável e definitivo da TAP.
Nos primeiros anos, Srs. Deputados, esse acordo cumpriu-se; no primeiro ano, concretamente. Depois, mudou o Governo. E o Governo, como em muitas Outras matérias, e nesta especificamente e esta serve muito de exemplo, é paradigmática - teve a atitude comum. Isto é, entendeu este acordo, entendeu esta nova perspectiva para a empresa, esta estabilidade, pelo menos, aparente da empresa, não como um estímulo para prosseguir a necessidade de transformação que a empresa carecia mas, pelo contrário, como tempo de bonança, que podia ser aproveitado para nada fazer. E, na realidade, foi isso que sucedeu. Durante quatro anos nada se fez na TAP, não se prosseguiu o programa, as metas não foram alcançadas. Naturalmente, há o dia-a-dia da gestão, mas o esforço para alcançar a meta que tinha sido estabelecida foi abandonado.
Portanto, não é de espantar - esta é a verdade da situação - que, ao fim de quatro anos, se seja confrontado com uma situação em que a TAP corre o risco de ter voltado exactamente á mesma! Têm só uma solução política. Além do discurso - e o discurso funciona sempre -, há uma outra: substituir a administração, que foi a culpada. Foi a culpada de não se ter atingido as metas. Agora, temos uma situação, talvez até mais aflitiva e mais preocupante do que a que tínhamos há quatro anos, porque se ela, financeiramente, talvez esteja ligeiramente melhor, mas as tendências revelam que, afinal, caminha-se para uma situação pior, a verdade é que já não há margem de manobra para fazer um segundo acordo como foi feito o primeiro.
Esta situação releva exclusivamente desta atitude típica, que este Governo teve, de achar que "enquanto o pau vaie vem folgam as costas", mas o pior é que o "pau" já voltou. Passou o tempo e adora é confrontado com esta realidade. Qual é a solução? E dizer que a TAP está numa "manada" de más empresas, que estão todas a perder dinheiro; é dizer que o futuro vai ser brilhante; é dizer que a partir de agora é que se vai estruturar. Pois é, mas perderam-se quatro anos e, sobretudo, perdeu-se muita esperança nos trabalhadores da TAP!
Do meu ponto de vista, seria uma enorme pena que a TAP não vingasse e não pudesse seguir o seu caminho como uma empresa europeia de transporte aéreo que tem direito a ser. E digo isto por duas razões muito importantes: primeira, pelo esforço despendido por muita gente para que a TAP viesse a ter um futuro, esforço que, neste momento, está um pouco comprometido; segunda, porque é uma grande empresa, e nós não temos tão grandes empresas em Portugal que sejam tão queridas dos portugueses que possamos deitar fora, uma e, sobretudo, com o nome que a TAP tem.
Digo, aqui, publicamente, apenas aquilo que, provavelmente se não fossem estas vozes nesta Assembleia, nunca a opinião pública o saberia. A situação em que a TAP

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se encontra deve-se exclusivamente à convicção do Governo de que se conseguem atingir metas sem fazer esforço para isso.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervas.

O Sr. Silvio Rui Cervas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro João Cravinho, na minha primeira intervenção fiz três perguntas directas que gostava de ver respondidas.
Peço ao Sr. Ministro que me corrija se estou a interpretar mal as suas palavras. À primeira pergunta, que consistia em saber quem mente, se o primeiro conselho de administração se o segundo, com base nas declarações que foram feitas pelo primeiro e pelo segundo, o Sr. Ministro disse que ninguém mente. E passo a citar: "a TAP é uma companhia extremamente frágil e as leis do mercado, pelas quais a TAP se rege, fizeram com que, das afirmações do primeiro conselho de administração para as afirmações do segundo, a situação ficasse profundamente alterada". Daí a diferença de atitude do primeiro conselho de administração relativamente às declarações do segundo Conselho de Administração.
Quando lhe perguntei "quanto vale a TAP", o Sr. Ministro disse: "valia 80 milhões de contos, mas agora vale 60 milhões de contos".

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Para o mês que vem não se sabe!

O Orador: - Houve, pois, uma actualização.
Curiosamente, não me respondeu à pergunta que também fiz, no âmbito desta segunda, isto é, se era efectivamente verdade que hoje a TAP valia seguramente menos do que ontem e que amanhã valeria menos do que hoje, uma vez que cada dia que passa a TAP vale menos para a Swissair.
Mas à terceira pergunta o Sr. Ministro não respondeu de todo. Sr. Ministro, quanto custa o que falta fazer? E dentro do que falta fazer, quanto custam os complementos de reforma e quanto custa o acordo com os pilotos? O que falta fazer já está incluído na última análise que foi feita pelo actual Conselho de Administração ou teremos, dentro de umas semanas ou de um ou dois meses, uma afirmação igualmente preocupaste do actual Conselho de Administração, ou de outro, de que a situação ainda é mais grave do que a que temos agora?
Sr. Ministro, fiquei mais preocupado e triste ao ver que, em Julho e Agosto, a televisão anunciava, todos os dias, nos seus noticiários, que os voos estavam atrasados, que os passageiros não estavam satisfeitos, que a TAP não dava resposta e que aquele serviço, que transformou a TAP numa empresa sólida, boa e fiável, transformou hoje a TAP numa opção de segunda, de terceira ou de quarta escolha. Isso é que me deixa mais preocupado!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervas, vamos ver se não distorcemos as coisas que cada um diz.
Começando pela avaliação da TAP, o que eu disse e houve até uma sessão parlamentar em que se debateu longamente este assunto, portanto, é matéria que não deveria ser trazida de novo à colação, porque é matéria dada - foi que a TAP foi avaliada em 84 milhões de contos, com certas premissas, com um leque que oscilava entre qualquer coisa como sessenta e tal ou 70 milhões de contos a 104 milhões de contos. Neste momento não tenho de cabeça, mas o ponto médio era 84 milhões de contos, com determinadas premissas. Nós próprios verificámos, passado algum tempo, que essas premissas não tinham verosimilhança, a fundamental das quais dizia respeito a um parâmetro que é o yield e os 84 milhões de contos, ponto médio, partiam de um yield extremamente optimista, com uma progressão que, de facto, não se verificava em nenhuma companhia europeia. Nessa altura, as companhias europeias previam o crescimento do yeld em zero e nós tínhamos um crescimento absolutamente espantoso. Cada ponto de yield vale muito. Entretanto, pedimos à Mackenzie, empresa especializada, que fizesse uma revisão desse parâmetro. E a Mackenzie disse "é uma previsão de yield extremamente optimista, não é aceitável..." E, em função disso, houve novos cálculos, e esses cálculos deram, na época, em Julho do ano passado, 60 milhões de contos. Isto é muito simples! Quem tem experiência de avaliação de empresas sabe perfeitamente que isto nada tem de extraordinário, é perfeitamente curial e banal. Portanto, acabou!
Quanto é que vale agora a TAP? Não foi feita qualquer nova avaliação neste momento. E ponto final parágrafo! Eu não posso substituir-me a avaliadores e vir aqui, agora, de cabeça, dar um palpite. Não dou! Portanto, nesse ponto, estamos esclarecidos!
Quanto às fragilidades da TAP, devo dizer que uma empresa que, como a TAP, teve prejuízos durante 23 anos é evidente que tem fragilidades. Contudo, no meu entender, a TAP - e quero esclarecer isto para que fique bem claro - não é uma companhia frágil estruturalmente, do ponto de vista das perspectivas que efectivamente uma boa gestão da TAP podem alcançar no futuro. Tem, com certeza, pontos fracos, e estão a ser melhorados. A TAP tem precisamente um campo onde se verificou uma fragilidade que deu muito maus resultados e foi essa que precisamente o acordo com os pilotos corrigiu.
O Sr. Deputado sabe perfeitamente que a TAP perdeu uma boa parte do seu melhor mercado em certa fase, o mercado de negócios, exactamente porque tinha tuna irregularidade muito grande. Entre Abril e Junho, foram cancelados 189 voos. Portanto, tanto as agência de viagens como os particulares que pagam a tarifa por inteiro, cada vez menos recorriam à TAP. Instalou-se um clima que, do ponto de vista comercial, degradou a TAP. Porquê? Porque o conflito com os pilotos, o comportamento, as razões que lhe seguiram levaram a cancelamentos frequentíssimos.
Ora, a maior, valia do acordo que se fez foi precisamente a de eliminar essa incerteza e, deste modo, eliminar uma fonte de penalização comercial brutal que vale dezenas de milhões de contos. Esse acordo custou 1,2 milhões de contos... Eu respondi-lhe claramente: 1,2 milhões de contos face à não existência do acordo com 189 voos cancelados em três meses... É evidente que este acordo paga-se a si próprio amplamente, pelas razões que todos nós compreendemos.
Quantos cancelamentos é que houve a partir da assinatura do acordo em Julho? Zero! Está a ver como se passou de 189 para zero? E está a ver como isto faz a

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diferença abissal entre as receitas da empresa numa situação de conflito ou de instabilidade laborai e as receitas da empresa na nova situação? De facto, esta fragilidade foi corrigida - aliás, esta fragilidade não fui eu quem a inventou, vem de há muitos anos.
Finalmente, Sr. Deputado Ferreira do Amaral: excelente discurso! Magnífico discurso!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Acima de tudo, verdadeiro!

O Orador: - Verdadeiro discurso! Simplesmente, o Sr. Deputado esqueceu-se de explicar uma coisa muito simples, que é a base disto tudo: como é que em 1994, três anos depois de o senhor estar no governo, a TAP tinha 35 milhões de contos de prejuízo, quando o senhor sabe tão bem fazer estas coisas?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar ao último ponto da nossa ordem de trabalhos - vamos tomar o comboio... -, ou seja, ao debate, requerido pelo PCP, sobre a travessia ferroviária da Ponte 25 de Abril.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A construção de uma linha férrea que ligasse Lisboa ao Pinhal Novo, atravessando a Ponte 25 de Abril, visando dotar as populações abrangidas com mais um meio de transporte funcionando em alternativa aos existentes, é uma antiga aspiração e reivindicação - justa reivindicação - da população da Península de Setúbal.
Finalmente, no passado dia 29 de Julho, foi inaugurada, com grande aparato mediático, a travessia ferroviária até ao. Fogueteiro. Pese embora o facto de a ligação até ao Pinhal Novo não ter sido ainda concretizada, seria de supor que com aquela inauguração as aspirações e reivindicações das populações tivessem sido satisfeitas. Mas não é isso que se verifica! E não é isso que se verifica porque aquela reivindicação das populações abrangia, igual e naturalmente, que, do ponto de vista social, a travessia ferroviária fosse acompanhada de uma política tarifária que tivesse em conta basicamente que os potenciais utilizadores do transporte são trabalhadores que diariamente se deslocam entre as duas margens do Tejo e deslocam-se para trabalhar e não para fazer turismo, Essa vertente social está completamente ausente!
Mais do que isso: a campanha propagandística que o Governo fez durante os meses imediatamente anteriores à inauguração do comboio sobre a Ponte, indiciando a ideia que o Governo iria pôr à disposição das populações mais uma opção de transporte de alta qualidade e barata, foi um logro.
E política e socialmente inaceitável que a população da Península de Setúbal seja financeiramente penalizada relativamente às populações da margem norte do Tejo, em situações comparáveis.
Desde logo, os preços dos bilhetes do comboio da linha do Fogueteiro são muito mais caros, são quase o dobro dos preços praticados nas linhas ferroviárias de Cascais, de Sintra e da Azambuja. Por exemplo, tendo em conta distâncias equivalentes, um bilhete simples entre Oeiras e Lisboa custa 170$, enquanto o bilhete entre Pragal e Lisboa custa 260$; o percurso Cascais/Lisboa custa 200$ e o Azambuja/Lisboa 290$, ao passo que a viagem Fogueteiro/Lisboa custa 440$. Não há razões políticas e sociais que o justifiquem. Nem sequer há razões económicas, a não ser a "razão" de se pretender que este transporte ferroviário, porque explorado por um grupo económico privado, seja beneficiado com suculentas taxas de rentabilidade.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Por outro lado, o próprio sistema dos passes sociais inclui como que uma portagem implícita pela travessia da Ponte da ordem dos 90$ diários, o que, e para além do mais, significa uma portagem mais cara da que é paga por um carro ligeiro que transporte duas pessoas.
De novo exemplificando com situações equivalentes, os passes sociais L1 e L123 custam, respectivamente, 5050$ e 6870$, enquanto os equivalentes da Fertagus custam, respectivamente, mais 2650$ e 2830$ por mês, não incluindo aqui os 2800$ mensais pelo passe para os parques de estacionamento junto às estações do comboio.
Mas não é apenas (e já suficiente seria) pelos preços que a propaganda do Governo sobre um novo transporte alternativo é um logro. A verdade é que a possibilidade de uma nova escolha, afirmada pelo Governo, dada a manutenção, segundo o Governo dizia, das anteriores alternativas, acaba igualmente por não se verificar. E isto porque o Grupo Barraqueiro/Vivendi, que explora a travessia ferroviária, detém o prático monopólio dos transportes públicos colectivos na zona a sul do Tejo que fazem a ligação a Lisboa.
Perante a passividade do Governo, que legitimamente se pode considerar conivência, esse grupo económico tem ando a tomar decisões que reduzem as possibilidades de escolha aos cidadãos e os empurram para o comboio (mais caro). Designadamente, as carreiras rodoviárias para Lisboa, alheias às características do período balnear, sofreram já cortes de mais de 45% a 55% entre Almada, Amora e Cruz de Pau e a Praça de Espanha, e ainda agora a procissão vai no adro...
A própria margem de decisão das empresas públicas, nomeadamente da Trãnstejo; parece estar cada vez mais condicionada à estratégia de controlo monopolista dos transportes públicos de ligação a Lisboa por parte do grupo privado Barraqueiro/Vivendi.
Em suma, a estratégia montada por aquele grupo privado e pelo Governo, com a criação da Fertagus para explorar a travessia ferroviária da Ponte, não tem em conta os interesses dos utentes e das populações, nem os interesses dos trabalhadores daquele grupo privado, nem sequer o propagandeado objectivo de desanuviamento do tráfego rodoviário sobre a Ponte 25 de Abril. O principal, e quase exclusivo, interesse prosseguido é o do maior lucro possível.
Esta é uma situação inaceitável, que suscita a nossa inequívoca crítica política ao Governo e a exigência política e social de que seja rapidamente alterada e que o Governo tome as medidas concretas e adequadas para que esta situação seja profundamente alterada, não digo para beneficiar os utentes da margem sul do Tejo mas, pelo menos, para que os utentes da margem sul do Tejo sejam tratados em igual circunstâncias com os utentes da margem norte do Tejo.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Creio que este debate, requerido pelo PCP, não teria lugar hoje se não estivéssemos, por um lado, em véspera de campanha eleitoral e, por outro, se o Sr. Deputado Octávio Teixeira tivesse visto hoje na televisão a reportagem sobre o balanço do primeiro mês do transporte ferroviário na Ponte.
De facto, se assim tivesse sido, o Sr. Deputado teria dado conta de que se suplantaram todas as expectativas, de que as pessoas estão satisfeitas e de que esta iniciativa promove, de forma geral, a qualidade aos utentes da Ponte.
Por outro lado, o Sr. Deputado Octávio Teixeira falou em bilhetes simples, que, de qualquer forma, são mais baratos do que os de autocarro, mas iludiu deliberadamente a questão dos passes, não se referindo ao facto de haver tarifário diferenciado para os reformados, os pensionistas e as crianças.
A verdade é que, por exemplo, o passe combinado faz com que o preço da viagem não seja de 250$ ou 310$, como é no autocarro, mas, sim, de 114$; se pensarmos nos reformados e nos pensionistas, esse preço passa a ser de 85$ e se for para as crianças passa a ser de cerca de 57$.
É, de facto, minimamente risível aquilo que se pretende constituir aqui como crítica quando os dados são o que são, constituem factos e, portanto, não são susceptíveis de qualquer tipo de contestação.
Mais: os utentes dispõem ainda da rodovia e do transporte de barco para fazer este trajecto, mas aquilo que claramente se nota é uma procura progressiva cada vez mais intensa desta alternativa que foi proporcionada aos portugueses em geral, mas, sobretudo, àqueles que habitam, que residem e que trabalham nesta zona.
É, sem dúvida, uma obra notável, uma mais-valia notável que, de alguma forma, proporciona bem-estar a uma população que, eventualmente, o PCP julga que continuará eternamente como seu eleitorado privativo!
Assim, o PCP faz este tipo de crítica ou tem este tipo de estratégia não em nome da verdade mas apenas para tentar - e, penso, inutilmente - conseguir alguns, poucos, dividendos eleitorais. Aliás, o Sr. Provedor de Justiça, mediante uma exposição que lhe foi feita pelos utentes, deu razão ao Governo e considerou como ideais estas condições em que este transporte se processa.
Portanto, a ferrovia é uma nova opção. Há qualidade, há fiabilidade e há um tarifário que é singular, porque se preocupa com os pensionistas, com os reformados e com as crianças, havendo, de forma clara, uma vantagem para o público em geral.
Gostaria, ainda, de lembrar que há alguns esquecimentos da parte do PCP. Por exemplo, não lhe ficava mal, no meio desta crítica, dizer que o Governo, nesta legislatura, fez investimentos globais da ordem dos 453 milhões de contos na ferrovia, que aumentou em 60% esse mesmo investimento e que a média/ano desse investimento foi de 113 milhões de contos, tendo-se feito esse investimento em sectores com vantagens competitivas - e é evidente que a qualidade, a fiabilidade e o bem-estar não interessam neste contexto e são uma mera conjuntura -, tendo os serviços suburbanos das áreas metropolitanas recebido deste "bolo" um investimento de 215 milhões de contos, nesta legislatura, ou seja, mais 180%.
Ora, isto significa que o PCP, numa análise global que se pretendia séria sobre uma mais-valia e uma qualidade que é tributada aos utentes e às pessoas em geral, poderia, de uma forma mais séria, ter enquadrado e ter feito o enfoque deste problema.
Por isso, Sr. Ministro, no entender do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, este é um serviço que está a ser prestado com êxito e o Governo foi por bom caminho.
Mas, melhor do que as palavras, convido o Sr. Deputado Octávio Teixeira a, se, eventualmente, a televisão repetir logo a reportagem, ver a notícia e a tomar nota daquela que é a verdadeira opinião dos utentes da ferrovia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito em particular, Sr. Deputado Octávio Teixeira: Devo dizer que as suas observações não estão fundamentadas numa análise rigorosa do problema.
Em primeiro lugar, do ponto de vista meramente factual:- o preço dos bilhetes. O preço de um bilhete simples de comboio, que tem de ser comparado com o do meio alternativo actualmente existente - o autocarro -, custa do Pragal a Entrecampos, para um utente normal, 260$ e o de autocarro custa 310$; se se tratar de uma criança, de um reformado ou de um pensionista custa, de comboio, 130$, enquanto que de autocarro custa 310$; se for de Foros de Amora, um bilhete simples de comboio custa 380$ contra 410$ de autocarro para o utente normal e se for uma criança, um pensionista ou um reformado custa 190$ contra 410$.
Relativamente à assinatura, que é o que mais interessa, por exemplo, do Pragal a Entrecampos, o preço do comboio é de 4160$ e o de autocarro é de 4010$, pagando as crianças, os reformados ou os pensionistas 2080$ de comboio e 4010$ de autocarro; do Fogueteiro a Entrecampos, o utente normal paga 7040$ de comboio contra 7380$ de autocarro e as crianças, os pensionistas ou os reformados pagam 3520$ contra 7380$. E poderia continuar falando dos passes combinados, e por aí' fora.
Desde logo, com estes números, ficou claro que para serviços muito distintos, em que é inegável a excepcional qualidade do comboio comparado a quem faz, por exemplo, em hora de ponta, o percurso Fogueteiro! Entrecampos - e o Sr. Deputado sabe bem o que é esse pequeno martírio -, com assinatura, é mais barato ir de comboio. Além disso, este percurso faz-se em 27 minutos, com muito maior comodidade, e é mais barato do que ir de autocarro, onde se tem de pagar 7380$. Portanto, essa é que é a realidade.
Quanto ao facto de isto ter sido feito sem consciência social, os números são muito claros. Não há nenhum sistema de transportes ferroviários que dê os descontos que este dá a crianças, reformados e pensionistas, que chegam a atingir 50%.
Finalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para não me alongar muito, quero pedir que seja distribuído o parecer do Sr. Provedor de Justiça, não ao Sr. Deputado Octávio Teixeira mas a quem produziu exactamente os mesmos argumentos que Sr. Deputado Octávio Teixeira.

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Portanto, digamos que esta resposta do Sr. Provedor de Justiça vale para quem apresentou aqui o problema exactamente como o Sr. Deputado Octávio Teixeira apresentou. O parecer está aqui para ser entregue a todos os Srs. Deputados - não é preciso fotocopiar, basta autenticar, pois há o documento em número suficiente -, e eu limito-me a salientar os pontos n.os 2, 4, 12, 13, 17, 19, 20, 21 24 e 25 do parecer do Sr. Provedor de Justiça. E para prevenir a hipótese de haver algum orador que ainda não tenha revelado a sua intenção de trazer a sua sabedoria a esta Assembleia, em última instância, quando ninguém puder responder-lhe, passo a ler o ponto n.º 24, que aqui deixo por todos: "Não posso, por isso, deixar de dar razão ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, quando defende que as comparações com as linhas suburbanas da margem norte, não sendo as mais adequadas, são, para além do mais, distorcidas pelo facto de terem por base o bilhete simples, sem terem em conta que aos utentes do Eixo Ferroviário Norte/Sul são oferecidas opções que nem sequer existem nos serviços ferroviários da margem norte, como sejam (...)"
Quero ainda dizer que urna outra conclusão do parecer do Sr. Provedor de Justiça relativamente a este serviço é a de que ninguém é obrigado a andar nele. Ora, este serviço não prejudi8a ninguém pelo simples facto de que não retira nenhuma das possibilidades actuais. Portanto, quem está tão encantado cone o sistema actual ou a quem ele servir, legitimamente, que o use. Tem a sua base de escolha, seja ela qual for.
Só que este é, agora, um novo meio que o utente poderá escolher. Em muitos casos será mais favorável, mas em alguns casos e por força do percurso peculiar que o utente venha a fazer, o sistema actual poderá revelar-se mais favorável.
Portanto, digamos assim, este é um meio acrescido, extremamente poderoso, extremamente favorável, de grande qualidade e que, ainda por cima, pela primeira vez em Portugal - e este ponto é crucial -, está controlado diariamente quanto à fiabilidade e qualidade do serviço, mediante de indicadores precisos, que o Instituto Nacional Ferroviário fiscaliza diariamente. Aliás, já estão aqui indicações sobre o modo como a qualidade é cumprida, o que se faz pela primeira vez em Portugal e vai ser exemplo para tudo o resto.
Última e final observação: Sr. Deputado, a questão é muito simples. No primeiro mês, o de Agosto -que, como sabe, é um mês muito difícil e muito diferente, não é típico -, houve 750 000 votos a favor do sistema, ...

Risos do PCP.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): Conto?!

O Orador: - Sim, sim, votos, opções deliberadas! A previsão é que estes números vão crescendo e quando chegarem aos três ou quatro milhões, daqui a dois anos, haverá sempre uma alma iluminada que dirá: "mas eu venho aqui dizer, em nome não sei de quê, que quem escolhe livremente que é do seu interesse ir de comboio, não deve ir, porque o que dá agitação social é não ir no comboio."

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, para precaver já as manifestações sociais, recorda-se daquela sua célebre proposta, que conseguiu passar ao seu colega da Justiça, quanto ao corte de estradas: Pumba! É penalizá-lo!

O Sr. Ministro do Planeamento, do Equipamento e da Administração do Território: - Pumba?!

O Orador: - Possivelmente, o Ministro da Justiça foi .mais ponderado do que o Ministro João Cravinho.
Mas eu gostaria apenas de dizer duas coisas muito rápidas ao Sr. Deputado José Junqueiro, porque fez uma afirmação que não é correcta, que é falsa - e, por conseguinte, quero clarificá-la -, quando disse que eu só fiz a comparação dos bilhetes simples.
Primeira questão: não, eu fiz também a comparação entre o passe combinado e o passe social equivalente e mostrei as diferenças que existem, que são de 2600$ num caso e de 2800$ noutro caso.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Segunda questão: o Sr. Deputado diz que há uma mais-valia e que eu não a referi.
De facto, há unia mais-valia, o problema é que essa mais-valia está a ser canalizada exclusivamente para o grupo Barraqueiro. Não é para os utentes, é para o grupo Barraqueiro, e é necessário que isso não seja assim.
Mas, Sr. Ministro, vamos lá a ver: tenho a maior consideração pelo Sr. Provedor de Justiça. Não conheço o relatório do Sr. Provedor de Justiça e vou lê-lo. Porém, o facto de o Sr. Provedor de Justiça ter uma opinião não quer dizer que essa opinião seja justa e correcta. Claramente!
Aliás, se tem havido tantas sugestões do Provedor de Justiça que o Governo não cumpre é porque não as considera correctas, provavelmente. Ou, então, considera-as correctas e faz de conta que não as conhece.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Por isso, vamos ver.
Quanto a comparar o bilhete de ferrovia com o bilhete de rodovia, então, sugiro que façamos isso também na margem norte! Mas o Sr. Ministro quer comparar apenas na margem sul o bilhete rodoviário com o bilhete ferroviário!
Sr. Ministro,... eu ia a dizer "quando o seu Governo propôs a travessia ferroviária", mas a proposta foi anterior e, por conseguinte, não quero entrar nessa incorrecção. De qualquer modo, quando todos defenderam a travessia rodoviária, fizeram-no com duas perspectivas essenciais: uma delas era que o transporte colectivo ficasse mais barato, porque, por norma, o transporte ferroviário é mais barato do que o transporte rodoviário, e a outra era desentupir a ponte 25 de Abril.
Ora bem, em relação aos preços, o que temos de perguntar é o seguinte: por que é que o preço/km do transporte ferroviário na margem sul do Tejo é quase o dobro do preço praticado na margem norte do Tejo?

O Sr. Lino de. Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Se é o mesmo tipo de transporte, um transporte ferroviário, por que é que o preço é o dobro?

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Aliás, seria interessante saber com que bases foi feito o estudo da viabilidade económica da travessia ferroviária na ponte 25 de Abril. Com que base é que isto foi feito, em termos dos custos? Tanto quanto a memória me deixa recordar, ele terá Sido feito tendo como terno de comparação os custos e os preços da linha de Sintra. Então, por que é que agora, depois disso, se aumentam substancialmente esses preços?
Por outro lado, o Sr. Ministro referiu sempre, se ouvi bem, preços para crianças, reformados e pensionista, estando aí está a vertente social do Governo. Porém, esqueceu os outros!
Quem são os outros? São aqueles "desgraçados", os trabalhadores. Esses não têm nada que ser beneficiados, não têm nada que beneficiar de um transporte que seja, de facto, mais barato.
Aliás, no exemplo concreto do passe social e do passe combinado, que dá cerca de 90$/dia de portagem implícita, continuo a trazer o carro, venho com mais outra pessoa e a cada um a portagem custa apenas 75$, ou seja, é mais barata a portagem do carro do que a portagem que é paga no comboio.
Apesar da incorrecção com que o Sr. Ministro apresentou a questão dos argumentos, não vou agora referir-me a isso, não vou entrar em questões de formas. Quem arranjou os argumentos? Os argumentos são os do meu partido e não são de hoje. Por conseguinte, são argumentos meus, porque são do meu partido, e não foi apenas hoje que os apresentámos.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, Sr. Presidente, a última do Sr. Ministro, dita na sequência do relatório do Sr. Provedor de Justiça, foi que ninguém é obrigado a ir de comboio.
O problema não é esse, Sr. Ministro, mas, para além de o problema não ser esse, esse problema existe! E lembro que lhe referi os cortes de carreira que estão a ser feitos no transporte rodoviário ....

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que termine.

O Orador: - ... que não serve apenas para fazer a travessia propriamente dita. Lembro, por exemplo, os cortes que estão a ser feitos nas carreiras que conduzem as pessoas daquela zona aos barcos, e por isso eu falei na Transtejo. Essas carreiras estão a ser cortadas para as pessoas não poderem fazer a travessia por barco, porque lhes fica muito mais barato, ou terem nisso mais dificuldade, sendo obrigadas a vir no comboio.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serei muito rápido.
Unia vez que esta intervenção foi feita em vésperas da festa do Avante, quero aqui afirmar que é minha convicção que os militantes do PCP e demais pessoas que irão à festa do Avante utilizarão intensamente o comboio e vai ser, com certeza, necessário organizar algumas composições especiais. A minha única dúvida reside no facto de eu não saber se as pessoas o fazem para ir à festa do Avante ou se vão mesmo para experimentar andar de comboio.

Risos do PS.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Também quer uma EP9

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, de facto, era desejável para todos nós que, por exemplo, quando nos transportamos seja na ponte sobre o Tejo, seja na CP, seja num autocarro, seja na Carris ou no Metro, os bilhetes fossem mais baratos.
Portanto, ganha-se sempre, do ponto de vista de procurar sensibilizar pessoas mais emocionais, dizendo que tudo tem de ser mais barato.
Bom, já sabemos isto, mas a questão é esta: a provisão deste serviço tem custos e foram efectivamente negociados, em processo de concurso público internacional, ao qual concorreu quem tulha soluções, porque quem não as tinha ficou em casa e, portanto, não é para aqui chamado. Mas quem foi ao concurso apresentou, num caso, uma tarifa de cerca de 10$/km, que foi o máximo e foi eliminado; em negociação final, entraram dois consórcios, um com uma proposta à volta de 8$/km e o outro com uma proposta de 7$7/km. Ganhou o de 7$7! Não apareceu ninguém oferecendo menos.
Sei que, como dirá alguém, há soluções, mas o certo é que elas nunca aparecem! Publicam-se anúncios, convida-se, abre-se a porta toda, e aqueles que dizem que têm soluções nunca apresentam, no concreto, na negociação, num consórcio, num concurso público internacional, qualquer solução! Bom, isto assim não vale!
O que se fez foi dar a concessão à proposta com o menor preço, ou seja, à de 7$7/km. E agora pergunta-se: isto é muito, isto é caro?
Bom, não quero fazer comparações directas, porque, de facto, não é legítimo fazê-las, mas não quero deixar de relembrar que a tarifa do Metro é de 10$48 e que, por sua vez, a tarifa da Carris é de 10$92, é tanto o Metro como a Carris perdem enormes somas, porque os custos directos de provisão do serviço de transportes são muito superiores a 10$48 e muito superiores a 10$92. Esta tarifa é de

Protestos do Deputado do PCP Octávio Teixeira.

O Orador: - Sr. Deputado, isto é negociado, é do contrato e é fiscalizado!
O Sr. Deputado tem todo o dossier à sua disposição e eu sei que o Sr. Deputado é uma pessoa não só cuidadosa como extremamente competente e perante o dossier concreto poderá confirmar o que lhe referi. Julgo que muitas das opiniões que o Sr. Deputado hoje tem resultam de não ter tido a possibilidade de ter aceso à informação directa, pois, de outro modo, pela sua competência e pela sua seriedade, que eu reconheço e conheço de longa data, o Sr. Deputado não diria as coisas que disse, porque veria que não têm fundamento.
Finalmente, o caso dos autocarros. Não falei disso, mas o que se passou foi o seguinte: os Transportes Sul do Tejo fizeram em Agosto - é deste mês que estamos a falar -,

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aquilo que fazem todos os anos, ou seja, diminuíram as frequências de certos percursos.
Portanto, no mês de Agosto, a Transportes Sul do Tejo alterou, como altera todos os anos, os seus horários, reforçou os serviços de praia e mudou os suburbanos e neste momento, com as câmaras como, aliás, é habitual - está a ser fixado o novo esquema, a vigorar a partir de 15 de Setembro. A Direcção-Geral de Transportes Terrestres está a acompanhar essa questão cuidadosamente, as câmaras estão a acompanhar essa questão cuidadosamente e a negociação ou o estudo está em curso. Vamos ver como é que as coisas se vão passar!
Não deixo de reconhecer que é preciso ter atenção a esse aspecto, mas, neste momento, posso dizer-lhe que o cuidado que esse assunto nos suscita leva a que a Direcção-Geral dos Transportes Terrestres esteja a acompanhar o processo cuidadosamente e vamos ver como é que, de facto, as coisas irão passar-se. Pensamos que irão passar-se bem; caso se passem mal, cá está também a Direcção-
Geral de Transportes Terrestres para prevenir qualquer abuso eventual. Neste momento, não podemos falar de outro modo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos os nossos trabalhos. Devolvo-os ás vossas campanhas eleitorais e desejo a todos que tirem delas as satisfações que nelas depositam justificadamente.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e SS minutos.

Faltaram à reunido os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD):

João Bosco Soares Mota Amaral.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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