O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 85

Sábado, 23 de Setembro de 2000 I Série - Número 3

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 22 DE SETEMBRO DE 2000

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Manuel Alves de Oliveira
António João Rodeia Machado
José Ernesto Figueira dos Reis

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.
Deu-se conta da apresentação dos projectos de lei n.os 298 a 300/VIII, dos projectos de resolução n.os 73 a 75/VIII e da apreciação parlamentar n.º 24/VIII.
A Câmara apreciou a proposta de resolução n.º 31/VIII - Aprova, para ratificação, a Convenção estabelecida com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, o Protocolo estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativo à interpretação a título prejudicial pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, o Protocolo estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias e o Segundo Protocolo, estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativo à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias. Produziram intervenções o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus (Seixas da Costa) e os Srs. Deputados Honório Novo (PCP), Maria Ofélia Moleiro (PSD), Rosado Fernandes (CDS-PP) e Carlos Luís (PS).
De seguida, foi apreciada a proposta de resolução n.º 42/VIII - Aprova o Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federativa do Brasil, assinado em Porto Seguro, a 22 de Abril de 2000, tendo usado da palavra, além daquele membro do Governo, os Srs. Deputados Rodeia Machado (PCP), Álvaro Castello Branco (CDS-PP), Manuela Aguiar (PSD), Carlos Luís (PS), Pedro Roseta (PSD) e Rosado Fernandes (CDS-PP).
Foram ainda discutidas em conjunto as propostas de resolução n.os 9/VIII - Aprova, para ratificação, a Convenção entre a República Portuguesa e a República de Singapura para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada em Singapura em 6 de Setembro de 1999, 17/VIII - Aprova a Convenção Adicional que Altera a Convenção entre Portugal e a Bélgica para Evitar a Dupla Tributação e Regular Algumas Outras Questões em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e o Protocolo Final, assinada em Bruxelas em 6 de Março de 1995, 20/VIII - Aprova, para ratificação, a Convenção entre a República Portuguesa e os Estados Unidos Mexicanos para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e Protocolo Anexo, assinada na cidade do México em 11 de Novembro de 1999, e 32/VIII - Aprova, para ratificação, a Convenção entre a República Portuguesa e o Canadá para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e Respectivo Protocolo, assinados em Otava em 14 de Junho de 1999. Usaram da palavra, além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, os Srs. Deputados Matos Leitão (PS) e Rosado Fernandes (CDS-PP).
Foi também apreciada a petição n.º 16/VII (1.ª), apresentada por Lúcia Maria Garcia Mendes Ferreira e outros, solicitando a alteração do Regime do Arrendamento Urbano previsto no Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, tendo usado da palavra, além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães), os Srs. Deputados Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Helena Ribeiro (PS), Castro de Almeida (PSD) e Odete Santos (PCP).
Por fim, foi apreciada a petição n.º 56/VII (1.ª), apresentada pela Câmara Municipal do Montijo, pretendendo a manutenção do serviço de urgência do Hospital do Montijo. Intervieram os Srs. Deputados Rosado Fernandes (CDS-PP), Natália Filipe (PCP), Aires de Carvalho (PS), Lucília Ferra (PSD) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 15 minutos.

Página 86

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 10 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António de Almeida Santos
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos José Gonçalves Vieira de Matos
Carlos Manuel Luís
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Eduardo Ribeiro Pereira
Emanuel Silva Martins
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco D'Almeida
João Alberto Martins Sobral
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Rui Gaspar de Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rodrigues Pereira dos Penedos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel Maria Diogo
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custodia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Vítor Manuel Alves Peixoto
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António de Carvalho Martins
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Artur Ryder Torres Pereira
Carlos José das Neves Martins
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Manuel Marta Gonçalves
Domingos Duarte Lima
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Santos Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hugo José Teixeira Velosa
João Bosco Soares Mota Amaral
João José da Silva Maças
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José de Almeida Cesário
José Luís Campos Vieira de Castro
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Durão Barroso
José Manuel Macedo Abrantes
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira

Página 87

Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Manuel Cruz Roseta
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP):
Ana Margarida Lopes Botelho
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Natália Gomes Filipe
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas

Partido do Centro Democrático Social (CDS-PP):
Altino Bernardo Lemos Bessa
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello Branco
António Herculano Gonçalves
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
José Martins Pires da Silva
Luís Pedro Mota Soares
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Sacadura Cabral Portas
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai ler o expediente.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 298/VIII - Reforça os direitos das pessoas idosas (BE), que baixou às 1.ª e 13.ª Comissões, 299/VIII - Aprova o regime de requalificação pedagógica do 1.º ciclo do ensino básico (PSD) e 300/VIII - Apoio à expressão musical e dramática na educação pré-escolar e no 1.º ciclo do ensino básico (PSD), que baixaram à 7.ª Comissão; projectos de resolução n.os 73/VIII - Uma alternativa para a política de transportes (BE), 74/VIII - Sobre política educativa (PS) e 75/VIII - Promoção da utilização do transporte público (PS); apreciação parlamentar n.º 24/VIII - Decreto-Lei n.º 197/2000, de 24 de Agosto, que regulamenta a Lei n.º 43/99, de 11 de Junho (Prevê o direito à revisão da situação militar dos militares dos quadros permanentes que, em virtude da sua participação ou envolvimento no processo de transição para a democracia iniciado em 25 de Abril de 1974, viram as suas carreiras afectadas por esse evento) (PS, PSD, PCP, Os Verdes e BE).
Em matéria de expediente é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, vamos iniciar a ordem do dia com a apreciação da proposta de resolução n.º 31/VIII - Aprova, para ratificação, a Convenção estabelecida com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, o Protocolo estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativo à interpretação a título prejudicial pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, o Protocolo estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias e o Segundo Protocolo, estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativo à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus (Seixas da Costa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo traz hoje, a pé, a esta Assembleia, para ratificação, a Convenção estabelecida com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, assinada em Bruxelas, a 26 de Junho de 1995, bem como os seus protocolos anexos.
Referi a circunstância de ter sido trazida a pé para justificar um pouco a maneira como estou a ler a minha intervenção.

Risos.

Vozes do PSD: - Nós percebemos!

O Orador: - Trata-se de um conjunto de importantes instrumentos convencionais, todos eles animados do mesmo objectivo, que é o de combater a fraude face aos interesses financeiros das Comunidades, mormente a fraude perante o orçamento comunitário.
Na realidade, este tipo de fraude tem vindo a aumentar de uma forma preocupante nos últimos anos, defrontando-se os Estados-membros com dificuldades em combater um fenómeno que ultrapassa as fronteiras nacionais, assumindo crescentemente contornos transnacionais.
Este fenómeno surge de par com o desenvolvimento da delinquência financeira promovida através de organizações criminosas, que se têm mostrado hábeis na exploração dos pontos fracos dos diferentes sistemas jurídicos, assim como na repartição das suas actividades ilícitas pelos diversos espaços nacionais dentro e fora da União Europeia.

Página 88

Recorde-se que a protecção dos interesses financeiros das Comunidades é uma preocupação já antiga, que remonta aos anos 60, embora só tenha vindo a ganhar mais destaque a partir de meados dos anos 70.
Muitas iniciativas foram, entretanto, sendo desenvolvidas, avultando o tema nas conclusões de vários conselhos europeus, nomeadamente no Conselho Europeu de Copenhaga, de Junho de 1993. No entanto, esta questão só veio a encontrar consagração expressa, pela primeira vez, no Tratado de Maastricht, não só através de uma disposição nova a ela dedicada (o antigo artigo 209.º-A), como também através dos preceitos do Título VI, relativo à cooperação nos domínios da justiça e assuntos internos, o chamado terceiro pilar da União Europeia.
A convenção ora em apreciação surge na sequência desta nova dinâmica e destina-se a contribuir para que a luta contra a fraude aos interesses financeiros das Comunidades se torne mais eficaz e dissuasiva mediante a compatibilização das disposições penais nos Estados-membros, a criação de normas penais mínimas e o reforço da cooperação em matéria penal.
As acções de prevenção e repressão da fraude lesiva dos interesses financeiros das Comunidades e a recuperação de somas envolvidas constituem, assim, uma missão indeclinável por parte de todos os Estados-membros. Desde logo, por força do princípio da solidariedade, estabelecido no Tratado da Comunidade Europeia, de acordo com o qual os Estados-membros devem aplicar o direito comunitário e assegurar o cumprimento das obrigações dele emergentes.
Mas também por força do artigo 280.º, que impõe aos Estados-membros a adopção de medidas para combater as fraudes lesivas dos interesses financeiros das Comunidades análogas às adoptadas para combater a fraude aos interesses financeiros de natureza nacional.
Desta forma, ficou consagrado o chamado princípio da assimilação, já enunciado pelo Tribunal de Justiça num seu acórdão de 1988.
A mesma disposição estabelece ainda a coordenação das acções dos Estados-membros no sentido de defender os interesses financeiros da Comunidade contra a fraude mediante uma colaboração estreita e regular entre os serviços competentes das respectivas administrações.
É certo que nas ordens internas dos Estados-membros existem já, em numerosos domínios, disposições penais tendentes à protecção dos interesses financeiros das comunidades, mas é igualmente certo que entre elas continuam a verificar-se incompatibilidades e lacunas que se revelam prejudiciais à repressão da fraude e à cooperação judiciária penal.
Daí a justificação de um instrumento convencional como o presente, tendo por objectivo, dentro do actual sistema de repartição de competências entre os Estados-membros e as Comunidades, assegurar uma melhor compatibilidade entre os normativos penais nacionais, mediante a criação de normas penais mínimas, e alcançar níveis mais elevados de eficácia no combate à fraude e no reforço da cooperação judiciária em matéria penal entre os Estados-membros.
Finalmente, note-se que a entrada em vigor desta convenção se encontra dependente da conclusão dos processos nacionais de ratificação, pelo que se torna indispensável a sua aprovação por esta Assembleia.
Igualmente dependente de aprovação por esta Assembleia estão ainda três protocolos adicionais a esta convenção, que a desenvolvem e complementam. São os seguintes: o protocolo, estabelecido com base no artigo K.3, relativo à interpretação, a título prejudicial, pelo Tribunal de Justiça das Comunidades, da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, assinado em 29 de Novembro de 1996; o protocolo, estabelecido com base no artigo K.3, relativo à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, assinado em Dublin, em 27 de Fevereiro de 1996; e o segundo protocolo, estabelecido com base no artigo K.3, relativo à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, assinado em Bruxelas, em 19 de Junho de 1997. Se assim desejarem, poderão ser dados pormenores sobre estes três protocolos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que não sobram dúvidas sobre a utilidade e a necessidade destes instrumentos internacionais.
A União Europeia dedica, neste momento, uma particular atenção às acções tendentes à criação de um espaço de liberdade, segurança e justiça. Neste capítulo, avulta o combate à criminalidade organizada e transnacional, em particular à criminalidade económica grave, realçada nas conclusões do Conselho Europeu de Tampere, que teve lugar há cerca de um ano.
Trata-se de um objectivo que a todos mobiliza e ao qual Portugal se associa com empenho.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Secretário de Estado, peço-lhe que termine, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Assim, não podemos permitir que as diferenças entre os nossos ordenamentos jurídicos propiciem e compensem o engenho criminoso.
A aprovação desta Convenção constitui um passo importante neste sentido, que não devemos ignorar. Por isso, uma vez mais, em nome do Governo, solicito à Assembleia que se associe a esta luta e aprove, pela ratificação, os referidos instrumentos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de resolução n.º 31/VIII pretende suscitar a ratificação de uma Convenção destinada a proteger os interesses financeiros da Comunidade, estabelecida entre os Estados-membros com base nos tratados em vigor na União Europeia.
Pretende a mesma proposta de resolução suscitar também a ratificação de protocolos que a Convenção originou posteriormente à sua aprovação em Conselho de Ministros da Comunidade.
Deseja-se, com estes instrumentos, determinar a criação de um enquadramento legal destinado a penalizar o desvio de fundos e a utilização de documentos falsos, incompletos ou inexactos que, de forma fraudulenta, lesem, seja em matéria de despesas ou na diminuição ilegal de receitas, os interesses comunitários, financeiros e orçamentais.

Página 89

A partir da caracterização destes ilícitos, o PCP considera adequado e correcto que, na decorrência das bases intergovernamentais da Comunidade e da inexistência de uma política comum em matéria judicial, seja, no fundamental, mantida na legítima reserva das competências dos Estados-membros a definição das formas concretas e próprias de combater tais ilícitos.
Competirá, assim, aos Estados-membros a fixação de penas, sanções e o fundamental do restante enquadramento legal, tal como lhes fica cometida a explicitação de eventuais reservas que desejem adoptar, sendo mantido o dever de cooperação perante infracções que atinjam vários Estados- membros.
O PCP regista e realça também o facto de a Convenção explicitar que os Estados- membros devem, não só penalizar individualmente agentes de fraudes e o crime organizado, como também tomar medidas para responsabilizar penalmente, por exemplo, dirigentes empresariais sempre que subordinados seus pratiquem, em nome e por conta das empresas, eventuais actos fraudulentos.
Finalmente, o PCP considera profundamente negativo que convenções e protocolos com esta natureza, metodologia e objectivos, destinados a combater a fraude e a corrupção em todos e cada um dos Estados-membros, sejam subscritos entre Julho de 1995 e Junho de 1997, mas só agora, mais de cinco anos depois, sejam apreciados para a indispensável ratificação. Tanto mais que, como é normal, só entrarão em vigor 90 dias após terem sofrido igual processo de ratificação em todos e cada um dos Estados-membros.
Até parece que vieram a pé desde Bruxelas mas, em lugar de virem directamente para Lisboa, foram em sentido contrário e deram a volta à Terra.
Até parece, Sr. Secretário de Estado, que não há muito interesse e empenho em combater a fraude e a corrupção que a todos lesa mas que continua a beneficiar apenas alguns.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro.

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Saúdo em especial o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus pela sua chegada ao Parlamento a pé, em tão bom estado de saúde e com tanto vigor para tratar das questões europeias e portuguesas.
A Convenção em apreço, para além de tudo o que já foi referido pelo Sr. Secretário de Estado e pelo Sr. Deputado Honório Novo, alarga o conceito de fraude à óptica das receitas, protegendo os fluxos financeiros com origem na Comissão Europeia que entram no Orçamento do Estado e que se dirigem aos beneficiários promotores de projectos.
Os Estados-membros são notificados para indicar as sanções que vão aplicar no direito interno, sendo alargado o âmbito das sanções através desta Convenção, as quais se resumiam, sobretudo, a coimas, podendo, por força deste novo instrumento, culminar na privação do direito da liberdade dos infractores em qualquer país da União Europeia.
As fraudes lesam não só os interesses financeiros da Comunidade mas também os do nosso País, que participa no orçamento da Comunidade. Por outro lado, a fraude praticada num projecto significa uma deficiente aplicação dos fundos estruturais e da parte da comparticipação do Orçamento do Estado, estando a tirar oportunidades a outros projectos. Este facto retira a pretendida eficácia e eficiência na administração dos recursos comunitários e nacionais ao serviço do desenvolvimento económico e social e da coesão nacional e comunitária.
O PSD teve sempre uma grande preocupação na detecção e penalização de fraudes, pelo que, em nome da transparência e do rigor da administração dos recursos, congratula-se com a aprovação e aplicação desta Convenção e protocolos, que se pretende rápida, já que se encontra em início de execução o III Quadro Comunitário de Apoio, envolvendo uma verba de cerca de 10 000 milhões de contos.
Por outro lado, a longo prazo, será uma União Europeia muito mais exigente com a entrada prevista de novos Estados-membros.
Por tudo isto, o PSD vai votar favoravelmente, só lamentando que, em questão de contas, de rigor e de transparência, nas nossas contas internas não haja o mesmo tipo de sanções e a mesma preocupação de evitar a fraude.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Seixas da Costa, se fizesse um pouco de «passadeira» de manhã teria um pouco mais de fôlego, porque quem fuma… Não sei se fuma, mas a propósito de fumo gostava de dizer-lhe que é exactamente esse um dos principais objectos da fraude europeia organizada.
A fraude europeia é, no fundo, o sucedâneo da visão utópica maravilhosa do Sr. Delors de fazer uma Europa sem fronteiras. Eu gosto da Europa sem fronteiras, porque passo-as mais depressa, mas Europa sem controlo, naturalmente, dá vontade rir, é utopia! Ora, foi isso o que o Sr. Delors se entreteve a fazer, acreditando piamente no bom selvagem e que o civilizado é necessariamente bom se a sociedade boa for.
A verdade é que a criminalidade alterou-se. Neste momento, a criminalidade é elegante, andou connosco na universidade, namorou as mesmas meninas que nós namorámos, casa-se também em boas igrejas e come em bons restaurantes.
A criminalidade já não é o «dente de ouro» nem o «maneta»; a criminalidade é chique, é elegante! Aliás, ela está no próprio Estado, nos partidos, porque a verdade é que todos fazem dinheiro com a criminalidade e com a fraude. Dá imensa «massa», Sr. Secretário de Estado! Dá para os «sacos azuis» em toda a Europa! Naturalmente, quando fazem um ar compungido não acredito.
Há muito tempo que se sabia que com os países terceiros havia estações de controlo que não existiam, selos falsos que apareciam, nomes inventados que também não existiam. Vivia-se, portanto, numa criminalidade real, num controlo virtual. Mas isto para mim é, digamos, «canja», é coisa velha, há muitos anos que se passa.

Página 90

Um dia, eu disse ao comissário Monti: «a criminalidade organizada, Sr. Comissário, está, toda ela, agradecida à sua acção pouco eficaz no controlo da dita.»
E porquê? Controlos não faltam! Chateiam-nos se temos um metro quadrado a mais nas áreas que declaramos, chateiam-nos se temos mais cinco oliveiras ou mais uma vaca, no entanto, o verdadeiro controlo, o que pode ter um desfecho penal, esse não existe!
Portanto, o grande crime não é penalizado, no grande crime têm colaborado muitas vezes, fechando os olhos, alguns Estados e, naturalmente, convém que os abram, na medida em que os Estados europeus sempre consideraram que o dinheiro da Comunidade é deles, quando não é, pertence à Comunidade. E, naturalmente, é neste sentido do bolo comum que se tem perpetrado toda esta criminalidade.
A minha bancada aprova, pois, o que é proposto, queremos a ratificação da Convenção e queremos, sobretudo, que depois seja cumprida.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, através da proposta de resolução n.º 31/VIII, visa o Governo obter da Assembleia da República a aprovação, para ratificação, dos seguintes instrumentos internacionais: a Convenção estabelecida com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades, assinado em Bruxelas em 26 de Julho de 1995; o Protocolo, estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativo à interpretação, a titulo prejudicial, pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades, incluindo a declaração relativa à adopção simultânea da citada Convenção e Protocolo, assinado, este último em Bruxelas, a 29 de Novembro de 1996; o Protocolo, estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, assinado em Dublin, em 26 de Setembro de 1996; o segundo Protocolo, estabelecido com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, incluindo a Declaração assinada em Bruxelas, em 19 de Junho de 1997.
Partindo da constatação de que a fraude relativa aos interesses financeiros das Comunidades Europeias não se limita, em muitos casos, a um único país, sendo cometida, com frequência, por redes criminosas organizadas, as partes contratantes procuram, através da adopção da Convenção, adoptar procedimentos comuns contra comportamentos fraudulentos lesivos dos referidos interesses e que vão no sentido de qualificar tais comportamentos como infracções penais passíveis de sanções penais efectivas, proporcionais e dissuasoras, como sejam as de privação de liberdade que possam determinar a extradição, sem prejuízo da aplicação de outro tipo de sanções.
A Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias é composta por 13 artigos, que estabelecem as normas relativas à protecção dos interesses financeiros das Comunidades.
O segundo protocolo visa, em concreto, que os Estados-membros consagrem medidas no sentido de constituir o branqueamento de capitais como infracção penal e de estabelecer a responsabilidade das pessoas colectivas por actos de fraude, corrupção activa e branqueamento de capitais cometidos em seu benefício, adoptando sanções efectivas para tais comportamentos, incluindo multas ou coimas, e, eventualmente, a exclusão de benefícios, de vantagens ou de auxílios públicos, interdição temporária ou permanente do exercício da actividade comercial e colocação sob vigilância judicial de dissolução por via judicial.
Os Estados-membros devem ainda tomar as medidas necessárias para permitir a apreensão, a perda ou a privação de livre disposição dos instrumentos e produtos de fraude, de corrupção e de branqueamento de capitais ou dos bens cujo valor corresponda a esses produtos.
Por último, é de salientar que os Estados-membros não podem recusar a prestação de auxílio mútuo em caso de fraude, de corrupção ou de branqueamento de capitais, apenas com fundamento no facto de dizerem respeito a uma infracção fiscal ou aduaneira, ou de serem considerados como tal.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista vai votar favoravelmente a presente proposta de resolução.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, terminado o debate da proposta de resolução n.º 31/VIII, a sua votação far-se-á na devida oportunidade regimental.
Passamos à apreciação da proposta de resolução n.º 42/VIII - Aprova o Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federativa do Brasil, assinado em Porto Seguro, a 22 de Abril de 2000.
Para apresentar este diploma, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde o primeiro Tratado de Amizade e Aliança, concluído no Rio de Janeiro, em 29 de Agosto de 1825, entre o Rei de Portugal e dos Algarves e o Imperador do Brasil, foi sendo assinado entre os dois países um amplo conjunto de tratados, convenções, acordos e protocolos.
Convém notar que muitos dos referidos diplomas não chegaram a entrar em vigor, outros viram a sua vigência cessar pelo decurso do seu prazo de validade, por denúncia, por caducidade e até pela superveniência de instrumentos multilaterais subscritos, entretanto, pelas duas partes, que, ao menos parcialmente, ganharam prioridade na disciplina das relações bilaterais.
Tornou-se, assim - e torna-se ainda assim -, extremamente difícil identificar, em muitos casos, a disciplina que rege actualmente alguns aspectos das relações luso-brasileiras.
Para além das dificuldades que ficaram referidas, deve sublinhar-se que o conteúdo de alguns dos acordos que vigoram entre Portugal e o Brasil se mostra actualmente desajustado às coordenadas políticas e ao sistema de valores que hoje prevalecem nos dois países e determinam o seu mútuo posicionamento no plano internacional.

Página 91

Sublinhe-se, por outro lado, que o aparecimento de movimentos de integração regional na Europa e na América do Sul, a que um e outro dos Estados aderiram - Portugal, no que toca à União Europeia, e o Brasil, relativamente ao Mercosul - acabaram por ter um impacto directo na definição das relações bilaterais entre os dois Estados. Impacto que deverá vir a acentuar-se no futuro, à medida que se desenvolverem e aprofundarem esses mesmos movimentos de integração, a menos que a própria regulação da articulação entre os dois espaços venha trazer novos elementos que acabem por se repercutir sobre os Estados-membros que deles façam parte.
As circunstâncias apresentadas levaram o Governo português, em 16 de Abril de 1996, a apresentar ao Governo brasileiro a proposta de elaboração de um novo Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta, que fornecesse o quadro geral no qual deveriam desenvolver-se as relações entre os dois países.
Partiu-se da definição dos princípios fundamentais comuns aos dois Estados e às linhas que devem orientar, no plano político, o seu relacionamento, e fornecendo, por outro lado, os parâmetros a que devem obedecer os regimes próprios das várias áreas de natureza sectorial em que os dois países já hoje, activamente, contactam ou que de futuro podem vir a desenvolver relações.
Em Dezembro de 1996, a proposta do Ministério dos Negócios Estrangeiros português de rever o acervo constitucional que une os dois países foi aceite pelo Ministério das Relações Exteriores do Brasil.
Foi, então, decidido confiar a elaboração do projecto de Tratado a dois juristas, um designado pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal e outro escolhido pelo Ministro de Estado das Relações Exteriores do Brasil.
Pelo que toca a Portugal, em ordem à preparação do projecto em causa, foram consultados por escrito todos os Ministérios acerca das dificuldades ou interesses que deveriam ser tidos em conta em relação aos vários acordos que estavam em vigor, sobre as alternativas a propor e as novas matérias a incluir no futuro Tratado.
Encontros houve entre representantes do Ministério dos Negócios Estrangeiros e sectores da Administração Pública portuguesa, como a Administração Interna, as Finanças, a Economia, a Educação, a Cultura e a Ciência, com vista ao exame pormenorizado dessas dificuldades.
Também o problema do reconhecimento de títulos académicos e de especialização e as condições do acesso às profissões foi tido em consideração, em várias reuniões realizadas com diversas Ordens profissionais.
O projecto de resolução hoje apresentado começa por enunciar os princípios fundamentais que actualmente norteiam a sociedade e o Estado, em Portugal e no Brasil. Entre eles ressalta o empenhamento no desenvolvimento económico, social e cultural dos dois povos, alicerçado no respeito pelos direitos e liberdades fundamentais, enunciados na Declaração Universal dos Direitos do Homem, na organização democrática do Estado de direito e na busca de uma maior justiça social.
O novo Tratado toma também em linha de conta os desenvolvimentos recentes na comunidade internacional, capazes de influenciarem a definição de um quadro jurídico das relações bilaterais entre Portugal e o Brasil.
Entre essas desenvolvimentos destaca-se, naturalmente, a criação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, bem como a já referida integração de Portugal na União Europeia e do Brasil no Mercosul. Esta integração poderá fornecer aos dois países a oportunidade de contribuírem para uma maior aproximação entre a Europa e a América do Sul, num tempo em que as duas regiões procuram estabelecer uma nova parceria estratégica.
O novo Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre Portugal e o Brasil, depois de enunciar os fundamentos em que assenta e os objectivos que, através dele, as partes visam prosseguir, define, no seu Título II, o campo aberto à consulta e à cooperação entre os dois países e os mecanismos para tanto previstos.
O estatuto dos portugueses no Brasil e dos brasileiros em Portugal é objecto do Título III. Aí se reafirma o princípio da igualdade de direitos e deveres entre os nacionais dos dois países, na esteira do precedente Tratado de Amizade de 1955 e da Convenção de Brasília de 1971.
A condição de acesso à titularidade desse estatuto, bem como a definição do seu conteúdo, seguem, em geral, o disposto pela Convenção de Brasília.
Mas há que assinalar uma inovação importante: é diminuído, de cinco para três anos, o período de residência em Portugal ou no Brasil, até agora exigido aos nacionais das partes contratantes para o acesso aos direitos políticos relativamente aos nacionais do Estados de residência (artigo 17.º).
Nestas condições, a única limitação que se admite à total equiparação de direitos entre portugueses residentes no Brasil e brasileiros residentes em Portugal, em relação aos nacionais dos países de residência, é a que resulta dos preceitos constitucionais que num e noutro país expressamente reservam aos respectivos nacionais o exercício de certas funções ou cargos de natureza política.
Mas esse limite não pode ser ultrapassado por convenção internacional ou pelo legislador ordinário. Só a evolução das leis fundamentais em ambos os países poderá permitir eliminá-lo ou fazê-lo evoluir.
No título relativo à cooperação cultural, científica e tecnológica retomam-se e desenvolvem-se, actualizando-os à luz da recente evolução política ou dos progressos tecnológicos, muitas das disposições constantes do Acordo Cultural de 1966 e acordos complementares.
Assim, no quadro da defesa da língua portuguesa, toma-se em consideração a criação da CPLP, bem como a do Instituto Internacional de Língua Portuguesa.
Alargou-se a novos meios audiovisuais e electrónicos disposições que em acordos anteriores visavam essencialmente o livro e outras publicações que têm o papel como suporte.
Referem-se cinematecas e videotecas entre os centros e institutos a considerar no plano da cooperação cultural e incluem-se os escritores entre os beneficiários de bolsas de estudo a conceder neste plano.
Admite-se que, em termos a definir por acordo complementar, possam os estudantes portugueses ou brasileiros, inscritos numa universidade de qualquer das partes, ser admitidos a realizar uma parte do seu currículo académico numa universidade da outra parte contratante.
Mas é no capítulo do reconhecimento de graus e títulos académicos e de títulos de especialização e na definição do acesso a profissões e ao seu exercício que o novo Tratado, substituindo disposições do Acordo Cultural de 1966, apresenta inovações mais marcadas.
Como é sabido, algumas disposições do Acordo Cultural de 1966 tinham, neste domínio, gerado um contencioso

Página 92

prolongado entre as duas partes, nomeadamente no que respeita ao exercício de certas profissões em Portugal por parte de cidadãos brasileiros possuidores de determinados títulos profissionais.
O novo Tratado vem distinguir doravante entre a questão do reconhecimento dos graus e títulos académicos e de títulos de especialização e a questão das condições de acesso ao exercício profissional dependente desses graus.
Quanto ao primeiro problema, afirma-se expressamente a competência das universidades e demais instituições de ensino superior em Portugal e das universidades no Brasil para o reconhecimento de graus ou títulos académicos.
Mas esclarece-se agora que esse reconhecimento «(…) será sempre concedido, a menos que se demonstre fundamentadamente que há diferença substancial entre os conhecimentos e as aptidões atestados pelo grau ou título em questão, relativamente ao grau ou título correspondente no país em que o reconhecimento é requerido.»
Admite-se ainda, paralelamente, que podem as universidades e outras instituições de ensino superior em Portugal e as universidades no Brasil celebrar convénios «(…) tendentes a assegurar o reconhecimento automático dos graus e títulos académicos por eles emitidos em favor dos nacionais de uma e outra parte contratante.»
Um sistema semelhante ao que ficou descrito vale para o reconhecimento de títulos de especialização, admitindo-se ainda a celebração de convénios entre associações profissionais para tal legalmente habilitadas ou suas federações, tendentes a assegurar o reconhecimento dos títulos por elas emitidos, em favor de nacionais de uma ou outra parte contratante.
Quanto ao acesso a profissões e ao seu exercício, o novo Tratado estabelece que ele será garantido aos nacionais de uma das partes contratantes no território da outra parte contratante, em condições idênticas às dos nacionais desta última.
Se em Portugal ou no Brasil vigorarem disposições sobre o acesso a uma profissão ou ao seu exercício, resultantes de um processo de integração regional, aos brasileiros em Portugal e aos portugueses no Brasil serão aplicadas as disposições que em cada um desses Estados vigorarem para os nacionais dos países participantes no referido processo de integração regional.
No que respeita a direitos de autor e direitos afins, é garantido o reconhecimento e a protecção dos direitos dos nacionais de cada uma das partes contratantes no território da outra parte, em harmonia com os compromissos internacionais que vinculem cada um desses países, mas é também expressamente garantido o reconhecimento e protecção dos direitos sobre bens informáticos, uma vez verificada a reciprocidade.
As disposições no novo Tratado, no seu Título IV, sobre cooperação económica e financeira, retomam, actualizando-os, à luz dos novos compromissos internacionais assumidos pelas partes contratantes, em especial no quadro dos processos em curso de integração regional, os princípios básicos incorporados em acordos anteriores, nomeadamente no Acordo-Quadro de Cooperação, de 1991.
De notar, todavia, que, no artigo 50.º, se dispõe agora que «(…) as partes contratantes procurarão definir, relativamente aos diversos sectores de actividade, dispositivos legais que permitam o acesso das pessoas singulares e colectivas nacionais de cada uma delas a um tratamento tendencialmente unitário.»

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Secretário de Estado, queira terminar.

O Orador: - Concluirei rapidamente, Sr. Presidente.
Tratando-se, embora, de um preceito programático, importa sublinhar o seu alcance, na medida em que representa a semente de uma possível aproximação mais profunda entre as economias das duas partes contratantes.
Tendo em vista a natureza do novo Tratado-Quadro, a disciplina das relações entre os dois países, no âmbito comercial, financeiro e fiscal, ficará fundamentadamente remetida para acordos complementares respeitantes as várias áreas sectoriais, dada a especificidade técnica destas matérias.
Mas devem referir-se, entre outras, disposições gerais relativas aos investimentos de pessoas singulares e colectivas de uma parte contratante no território da outra parte contratante, à cooperação no domínio financeiro e fiscal, com referência à adopção de instrumentos adequados para evitar a dupla tributação e evasão fiscais.
Também no novo Tratado expressamente se estabelece o principio do reconhecimento e protecção, no território de cada parte contratante, dos direitos de propriedade industrial dos nacionais da outra parte, em harmonia com os compromissos a que cada uma dessas partes tenha aderido. A este reconhecimento e protecção acresce agora a garantia do recurso dessas pessoas aos meios de repressão da concorrência desleal.
No que toca à cooperação em outras áreas (Título V), o novo Tratado reporta-se em especial às acções previstas quanto ao meio ambiente e ao ordenamento do território, à segurança social, à saúde, à justiça, às Forças Armadas, à Administração Pública e à acção consular.
Em alguns desses sectores, trata-se de afirmar a continuidade e o desenvolvimento de acordos sectoriais já em vigor. Em alguns outros, como no da saúde ou no das Forças Armadas, especificam-se áreas em que a cooperação deverá alargar-se a novos domínios.
De destacar, no que se refere às Forças Armadas, a referência à cooperação militar nas operações de paz no quadro das Nações Unidas.
A natureza de Tratado-Quadro atribuída ao novo acordo e dos acordos que o precedem explica a disposição-chave contida no artigo 79.º: os acordos bilaterais anteriores que não tiverem sido expressamente revogados pelo novo Tratado permanecerão em vigor em tudo o que não for contrário a este instrumento.
Nisto se exprime, afinal, a síntese que o novo Tratado representa, entre a superação de anteriores regulamentações e a continuidade que ele expressamente assume em tudo - e muito é - do que o precede. Por isso, julgaram os governos de Portugal e do Brasil que a data de 22 de Abril do ano 2000, que assinala o cinquentenário do descobrimento do Brasil, seria uma data adequada para a assinatura do novo Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre os dois Estados.
Estou certo de que este novo Tratado, que surge no quadro de um relacionamento bilateral excelente, cria condições para desenvolver uma aproximação mais forte que terá reflexos importantes em todos os domínios por ele abrangidos.

Aplausos do PS.

Página 93

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Debatemos hoje, no Plenário da Assembleia da República, o Tratado de Amizade, Consulta e Cooperação entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federativa do Brasil, que foi assinado em Porto Seguro, no dia 22 de Abril, durante as comemorações dos 500 anos da descoberta do Brasil.
Se, por um lado, podemos afirmar que estamos, no fundamental, de acordo com o Tratado, não podemos deixar de afirmar que o mesmo não é mais do que o condensar de normativos dispersos, que anteriormente já estavam em vigor.
O Tratado incorpora e amplia o conteúdo desses tratados bilaterais que já existiam, que, na sua maioria, ficam expressamente revogados, pese embora lhe tenha sido dado um novo enquadramento doutrinal, sendo de registar que se fixam, de forma sistematizada, os mecanismos institucionais para persecução e acompanhamento das relações bilaterais.
Por outro lado, inova-se - e isto é certamente o mais importante - a redução, de cinco para três anos, do período mínimo de residência exigido para acesso ao estatuto de igualdade relativamente aos nacionais do Estado de residência.
A cooperação cultural, científica e tecnológica tem novas regras, como é o caso da regra da validação dos graus e títulos académicos, em que as universidades vêem reconhecida a sua competência nesta matéria.
Merecem ainda referência, embora pontual, a área da cooperação económica e financeira, em que se aperfeiçoaram os mecanismos e os dispositivos legais que podem e devem permitir um melhor tratamento a nível das pessoas singulares ou colectivas, visando uma eventual aproximação entre as economias portuguesa e brasileira.
O Tratado contém, ainda, dispositivos que abrangem as áreas do meio ambiente, da segurança social, da justiça e da administração pública e acção consular, que já constavam de anteriores tratados bilaterais avulsos.
Volta-se a realçar que a inovação mais significativa neste novo Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta é a redução de cinco para três anos do período mínimo de residência.
É evidente que, apesar do que fica dito, o Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta é extremamente importante para os portugueses que vivem no Brasil e para os brasileiros que vivem em Portugal.
A comunidade portuguesa residente no Brasil, fortemente constituída por portugueses que há muitos anos deixaram o quinhão pátrio, em procura de melhores condições de vida, e outros que ali se radicaram por questões políticas, têm todos eles também contribuído para que as relações entre os dois países possam e devam ser fortalecidas.
Os nossos emigrantes que escolheram o Brasil como país de acolhimento, fizeram-no, em primeiro lugar, pela questão da língua, e esta questão primeira que nos une, numa simbiose perfeita da cultura que soubemos dar, mas também da que soubemos receber, é um forte elo de ligação que pode e deve ser reforçado.
Os portugueses que ali estão, e são muitos, certamente que esperam mais de Portugal e do Governo português, nas questões que para eles são importantes, e este Tratado pode e deve ser um factor de desenvolvimento das relações luso-brasileiras.
A comunidade portuguesa que reside no Brasil tem contribuído para o desenvolvimento deste país e, por isso, é credora da nossa simpatia e da nossa solidariedade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sem sombra de dúvida, o acto que hoje praticamos de discussão do Tratado e, posteriormente, a votação, no Parlamento português, permitirá que o mesmo, depois de ratificado pelos dois parlamentos, constitua normativo legal que obriga os dois Estados.
Mas para o PCP mais importante que a sua ratificação é o imperativo de o levar à prática por parte do Governo português e do Governo brasileiro.
Podemos ter importantes documentos escritos, mas de nada servirão se não soubermos ou não quisermos pô-los em prática.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É por isso que, daqui, dizemos ao Governo que é necessário e fundamental que este Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta não seja apenas uma «letra morta», mas antes, pelo contrário, seja um instrumento vivo, na amizade entre a comunidade luso-brasileira, com vantagens e interesses recíprocos. Que a nível da cooperação se possa efectivamente levar ao expoente máximo para interesse e benefício das nossas duas nações e dos nossos dois povos. E, a nível da consulta, que ela também seja fruto de um entendimento e não de divergências que possam ensombrar as relações entre os dois países irmãos.
Vem tudo isto a propósito do Tratado que hoje debatemos, mas também da experiência que temos de um passado recente, em que alguns equívocos têm dado lugar a dúvidas, criando dificuldades entre os dois Estados, com prejuízos para os nossos dois povos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A experiência diz-nos que é necessário que o Governo português se empenhe numa verdadeira cooperação com o Brasil, para que o Tratado seja, efectivamente, um verdadeiro instrumento de trabalho ao serviço dos dois Estados e dos dois povos, ou seja, do povo português e do povo brasileiro.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Álvaro Castello Branco.

O Sr. Álvaro Castello Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de resolução n.º 42/VIII, que aprova para ratificação o Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federativa do Brasil, assinado em Porto Seguro, em 22 de Abril de 2000, merece da bancada do CDS/Partido Popular uma

Página 94

apreciação favorável. Apreciação esta assente nos particulares e fortes laços que unem os dois povos, o povo português e o povo brasileiro, fruto de uma história partilhada por mais de três séculos e que exprimem uma profunda comunidade de interesses morais, públicos, culturais, sociais e económicos.
Entre os objectivos mais relevantes deste Tratado destaco, pela sua importância, a intenção de compilar os mais importantes instrumentos jurídicos bilaterais em vigor entre os dois países, nomeadamente o Acordo entre Portugal e os Estados Unidos do Brasil para a supressão de vistos em passaportes diplomáticos e especiais, celebrado em Lisboa, aos 15 dias do mês de Outubro de 1951, por troca de notas, o Tratado de Amizade e Consulta entre Portugal e o Brasil, celebrado no Rio de Janeiro, aos 16 dias do mês de Novembro de 1953, o Acordo sobre vistos em passaportes comuns, concluído em Lisboa, por troca de notas, aos 9 dias do mês de Agosto de 1960. Este Tratado abrange, ainda, o Acordo Cultural entre Portugal e o Brasil, celebrado em Lisboa, em 7 de Setembro de 1966, o Protocolo Adicional ao Acordo Cultural de 7 de Setembro de 1996, celebrado em Lisboa, em 22 de Abril de 1971, a Convenção sobre Igualdade de Direitos e Deveres entre Portugueses e Brasileiros, celebrada em 7 de Setembro de 1971. Este Tratado reúne, também, o Acordo por troca de notas entre Portugal e o Brasil para a abolição do pagamento da taxa de residência pelos nacionais de cada um dos países residentes no território do outro, celebrado em Brasília, em 1979, e, finalmente, o Acordo entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federativa do Brasil relativo à isenção de vistos, celebrado em Brasília, em 1996.
É de salientar, neste Tratado que hoje aqui nos é submetido para aprovação, a matéria referente à entrada e permanência dos portugueses no Brasil e dos brasileiros em Portugal, nomeadamente o facto da passagem de cinco para três anos de residência para a aquisição do gozo de direitos políticos.
No que concerne à matéria de cooperação cultural, científica e tecnológica destaca-se a intenção de promover o património cultural através de livros, conferências, concertos e exposições, o que se nos afigura bastante positivo, sendo neste domínio também de realçar a importância da cooperação no domínio da língua portuguesa, de forma a potenciar e a enriquecer a difusão do português, em especial no quadro da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
Trata-se de uma matéria da maior importância e não quero deixar de alertar, uma vez mais, aproveitando esta ocasião, para a indispensável reforma da CPLP e a sua urgente revitalização, criando um espaço cultural e económico que fomente o desenvolvimento de todos os povos envolvidos e potencie a influência cultural, política e económica de Portugal dentro das comunidades de língua portuguesa.
Quero também salientar, na análise deste Tratado, na óptica da cooperação económica e financeira, a previsão de medidas tendentes à diversificação das relações económicas entre os dois países, cuja concretização passará pela consagração de regimes legais que possibilitem um tratamento unitário em diversos sectores de actividades. Para alcançar os objectivos propostos, são enunciadas uma série de medidas, entre as quais assume relevância a realização de projectos comuns de investimento, um intercâmbio de informações nos concursos públicos e a concertação das posições em instituições internacionais, nomeadamente no que respeita às matérias-primas e à estabilização dos preços.
Concluindo, o CDS-Partido Popular aprova o Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federativa do Brasil por entender que, para além de se tratar de um instrumento de trabalho unificador dos diplomas até agora dispersos, contribui para um aprofundamento significativo das relações entre estes dois países.
Por isso mesmo, por contribuir de uma forma significativa para as relações entre estes dois países, o CDS-PP estará vigilante relativamente à sua execução. Estamos perante uma base sólida de cooperação. Esperamos sinceramente a sua concretização prática. Não bastam lindas palavras e intenções, apenas os actos serão eficazes.
Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, desejamos que, no futuro, o Governo dê mais atenção aos actos, porque, no passado, tem dado mais atenção às palavras e a vários instrumentos que existem, mas que não são utilizados.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Aguiar.

A Sr.ª Manuela Aguiar (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É numa manhã parlamentar de sexta-feira que estamos a debater no Hemiciclo a resolução sobre o Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta com o Brasil, a meio de um rol de outras resoluções que, tendo o mesmo carácter jurídico e a sua importância definida em certas áreas, não assumem o significado histórico que deveria ser o de estoutra se, de forma criativa, traduzisse a mudança e o progresso vividos no quadro de relacionamento entre Portugal e Brasil num início de milénio que, previsível e desejavelmente, será o tempo de consolidação da Comunidade de Países de Língua Portuguesa.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Porém, o que parece desajustado, ou seja, o discutir tão sumária e discretamente um acordo celebrado com grande solenidade em 22 de Abril, em Porto Seguro, durante as comemorações oficiais do Achamento do Brasil pela expedição de Cabral, acaba sendo, de algum modo, menos criticável dada a natureza intrínseca e as limitações do instrumento jurídico em apreciação. De facto, ele não vai muito além de uma mera compilação de acordos bilaterais preexistentes, de um aproveitamento do património comum feito da vontade e da visão estratégica de muitos homens do passado, como o Embaixador António de Faria, aos quais os governantes do presente, neste lado do Atlântico, nada quiseram acrescentar.
Dir-se-á que, numa perspectiva estritamente técnica, se consegue por esta via a facilitação de acesso a vários textos dispersos. Convenhamos que sim, embora isso seja de menos no contexto de uma comemoração de tal magnitude.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

Página 95

A Oradora: - Ainda por cima, deixou-se perder toda a riqueza das considerações preambulares dos acordos originais, agora sintetizada em breves palavras e numa linguagem bem menos expressiva e ajustada à singularidade dos laços persistentes entre os nossos povos e Estados no espaço da comunidade luso-brasileira.
Permitam-me citar o Dr. António Gomes da Costa, Presidente do Gabinete de Leitura do Rio de Janeiro e da Federação de Associações Portuguesas e Luso-Brasileiras, que, referindo-se a este aspecto do Tratado, escreve: «fica-se com a impressão de que lhe falta um voo de asa, um pouco de utopia ou de sonho que nos faça ver mais longe do que o formato de um passaporte ou do princípio da não discriminação fiscal».
Antes de mais, é de facto essa ausência de rasgo e ímpeto de mudança que nos surpreende. As inovações são poucas e nem todas presumivelmente boas. Um exemplo: a consagrada desresponsabilização dos Estados, em matéria de concessão de equivalências académicas e profissionais, que passam a ser concedidas pelas instituições de ensino e por organizações profissionais. A nosso ver, o perigo de reacções e conflitos de tipo corporativo, como os que atingiram, não há muito, emigrantes brasileiros altamente qualificados, subsiste, porventura agravado pela expressa devolução das competências assim regulamentada.
Porém, o instrumento jurídico em análise desilude, sobretudo, por não se ter logrado, neste ano de 2000, qualquer avanço de um conceito comum de cidadania luso-brasileira, por se ter deixado no esquecimento a necessidade de ajustamento dos dispositivos constitucionais das partes, por se ter silenciado a chamada questão da reciprocidade.
Neste contexto, é pouco uma simples diminuição do prazo exigível para requerer o estatuto de igualdade de direitos políticos, que passa de cinco para três anos, sendo certo que o conjunto de direitos desse estatuto continua cerceado pela incapacidade portuguesa de assegurar constitucionalmente aos emigrantes brasileiros o que aos emigrantes portugueses foi reconhecido em Brasília: a possibilidade de ascender à titularidade dos mais altos cargos do Estado, do Governo, do Parlamento, da magistratura judicial.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - É certo que o Tratado de 2000 incorpora a Convenção de Igualdade de Direitos e Deveres entre Portugueses e Brasileiros e proclama, no artigo 14.º, um princípio geral de igualdade, exceptuando, todavia, da equiparação os direitos expressamente reservados pela Constituição de cada uma das partes contratantes. Fica assim naturalmente na estrita dependência das balizas constitucionais a latitude do estatuto de direitos dos emigrantes, que de emigrantes se trata, visto que a primeira exigência do estatuto de igualdade é a residência habitual no outro país. E nesta condicionante se encontra o pecado original do Tratado, que a Constituição brasileira transportaria, por si só, às alturas do progressismo máximo em Direito Comparado em fins do século XX, enquanto o ordenamento português o retém num nível alcançado há já quase 30 anos pela via convencional.
E nada justifica o regime restritivo do n.º 3 do artigo 15.º da nossa Constituição, pois o sentido das gentes é favorável à reciprocidade lata, como são figuras gradas da democracia no pós 25 de Abril, que, em voz alta, a têm defendido: o antigo Presidente Mário Soares, o Presidente Jorge Sampaio, ex-Presidentes desta Casa, como Victor Crespo e Barbosa de Melo, os líderes do meu e de outros partidos representados no Parlamento, salvo, pelos vistos, um, de que faz parte o Primeiro-Ministro do País.
É, de facto, insólito e incompreensível que, desde 1988, tenhamos atravessado três processos de revisão constitucional, dois dos quais chegaram ao seu termo, sem conseguir corresponder ao gesto admirável dos constituintes brasileiros, esse sim, digno da dimensão humana do acontecimento que celebramos neste ano de 2000.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Entre nós, registe-se a evolução positiva durante o período que vai da primeira proposta que encabecei, em 1989, e daquela outra que consta do projecto de revisão constitucional, apresentada pelo Deputado Pedro Roseta, em 1994, até à última que o Deputado Pedro Roseta e eu, conjuntamente com colegas dos vários grupos parlamentares, incluindo ilustres socialistas, apresentámos em Junho de 1997. Desde então todos os partidos - todos menos um, o PS - se manifestam incondicionalmente a favor da dação de plena reciprocidade às generosas disposições da Lei Fundamental do Brasil. É assim que o PS (embora não todos os socialistas…) se constitui no único obstáculo à reciprocidade. Até quando?
No entretanto, o Tratado de Amizade ver-se-á desprovido da componente essencial do aprofundamento da cidadania luso-brasileira e, consequentemente, esvaziado da sua mais alta dimensão simbólica de fraternalismo e da possibilidade de uma afirmação muito concreta do condicionalismo ideal para a integração de brasileiros e portugueses no espaço da comunidade a que pertencemos. Mas, nesta Câmara, podemos inverter o estado de coisas. É da nossa competência a iniciativa de uma revisão extraordinária da Constituição que faça justiça aos brasileiros e, através da reciprocidade assim garantida, aos portugueses do Brasil e que, do mesmo passo, através do artigo 14.º, que automaticamente recebe o estatuto de direitos redimensionado, insufle alma nova no tratado e com ela lhe dê a marca do espírito do nosso tempo.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Lembro o precedente de uma revisão extraordinária da Constituição para viabilizar uma das etapas do nosso processo de integração na Comunidade Europeia. A meu ver, merece procedimento semelhante a recriação de uma comunidade luso-brasileira fundada numa igualdade plena de direitos e deveres entre portugueses e brasileiros.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Nem a proposta de resolução agora em apreço, nem nenhum outro tratado, nem qualquer convenção conseguem traduzir as relações especiais entre dois povos, neste caso, entre Portugal e o Brasil.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

Página 96

O Orador: - É evidente que, nas relações bilaterais e multilaterais, os Estados regem-se por princípios e por tratados e convenções, mas, como já disse, os mesmos não conseguem traduzir a amizade, a solidariedade e a cooperação entre dois Estados. E estou convencido que, na comunidade internacional, não existem dois Estados cuja afectividade, ligação e cooperação tenham sido tão fortes como entre Portugal e o Brasil.
É certo que a Constituição brasileira é mais generosa em relação aos portugueses que trabalham e residem no Brasil, indo ao ponto de permitir que cidadãos apenas com a nacionalidade portuguesa exerçam altos cargos no Brasil, como é o caso, por exemplo, do Dr. Alcides Martins, que exerce as funções de delegado do Ministério Público do Estado Federal no Estado do Rio Janeiro, e também o do Dr. Artur Moreira, que, tendo só nacionalidade portuguesa, é o Director da Alfândega do aeroporto do Rio Janeiro.

A Sr.ª Manuela Aguiar (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Poderia citar, igualmente, os casos dos ex-presidentes das câmaras de Praia Grande e de São Vicente e de Deputados e Senadores que, tendo nacionalidade portuguesa, exercem altos cargos no Estado brasileiro.
Porém, o mesmo não se verifica em Portugal.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Por quê?!

O Orador: - Neste campo, a Constituição portuguesa limita o acesso a tais cargos e, como é óbvio, não é através de um tratado que esta matéria deve ser consubstanciada mas, sim, em sede da Constituição da República Portuguesa. Ora, tanto quanto sei, na última revisão constitucional, não foi apresentado qualquer projecto sobre esta matéria.

A Sr.ª Manuela Aguiar (PSD): - Foi, foi! Foi apresentado pelo PSD!

O Orador: - Refiro-me à revisão extraordinária da Constituição.

A Sr.ª Manuela Aguiar (PSD): - Exactamente, na revisão extraordinária!

O Orador: - No entanto, através de instrumentos por vezes muito simples, de relações bilaterais, quer a nível de Chefes de Estado, quer a nível de Chefes de Governo e, mesmo, a nível de Ministros dos Negócios Estrangeiros, é que foi possível ultrapassar, colmatar diferendos que, esses, sim, vinham a afectar as relações luso-brasileiras.
A este propósito, refiro um caso concreto, tão simples de resolver, bastando para tal haver vontade política, que não houve no passado, mas que agora, com este Governo, há: o caso dos dentistas brasileiros.
De facto, não havia português que chegasse ao Brasil que não fosse questionado de imediato por um brasileiro acerca do problema dos dentistas brasileiros em Portugal. Felizmente, soubemos encontrar uma solução justa e global para resolver este diferendo.
Portugal, pequeno país que é da União Europeia, soube também ser, hoje, o 5.º país com mais investimento no Brasil, ao contrário do que acontecia no passado.
Para além dos tratados, para além das convenções, dos protocolos, o que existe - isso, sim! - é uma profunda vontade política por parte deste Governo em encontrar soluções para os múltiplos problemas que vão surgindo entre as duas comunidades.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - No que diz respeito ao aprofundamento da cidadania, nós vamos mais longe quando, na II Cimeira da CPLP, que teve lugar na Cidade da Praia, lançámos, pela primeira vez, o conceito de cidadania lusófona, não relativamente a uma parte dos sete países-membros da CPLP mas no seu todo, conceito que agora foi aprofundado, na III Cimeira da CPLP, realizada em Maputo.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - O conceito de cidadania não pode ser residual, não pode aplicar-se apenas a uma parte de uma família que fala a mesma língua e tem partilhado traços culturais, profundos e estruturais, ao longo de cinco séculos de História.
É com esta visão histórica, de um espaço de família na CPLP, que queremos consubstanciar, plasmar - aí, sim! - a afectividade que une esta família composta por mais de 200 milhões de cidadãos espalhados pelo mundo.
Como dizia Amílcar Cabral, que, inclusivamente, sonhava com uma Constituição lusófona e um Parlamento lusófono com presidência rotativa, não queremos ser apenas residuais em relação Brasil mas, sim, integrados nessa vasta comunidade em que o Brasil é peça indispensável e até, porventura, motor para a constituição deste espaço lusófono, reforçando os direitos dos cidadãos em todo o espaço da lusofonia.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Encontrarão vontade política por parte desta bancada, obedecendo a um pragmatismo e a um realismo em relação a estas duas comunidades, sem embargo de querermos ser o motor que crie uma nova dinâmica consubstanciada na III Cimeira da CPLP, em Maputo.
Este conceito de cidadania deve ser alargado, não de forma residual ou aplicado especificamente aqui ou ali, mas no todo do espaço lusófono. Aí, sim, contem connosco.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta para uma intervenção.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Faço uma brevíssima intervenção para, além de corroborar integralmente as palavras da Sr.ª Deputada Manuela Aguiar, acrescentar uma informação, para que não restem dúvidas.
Alguns Deputados do PSD, com apoio de outros, para além de terem apresentado, aquando da última revisão ordinária da Constituição, propostas de disposições que consagravam a reciprocidade plena entre brasileiros e portugueses em termos semelhantes aos adoptados na

Página 97

Constituição brasileira, apresentaram também, em 1997, um projecto de revisão extraordinária da Constituição, o qual não teve seguimento. Tal deve constar dos documentos da Assembleia e a Mesa poderá certamente promover a respectiva distribuição aos Srs. Deputados que tenham dúvidas acerca deste facto indiscutível.
O segundo, e último, ponto que quero abordar diz respeito à cidadania lusófona em todo o espaço da lusofonia.
É certamente uma ideia importante mas, para nós, é um mínimo denominador comum. Entendemos que, sem prejuízo dessa cidadania lusófona, a cidadania luso-brasileira pode e deve ir mais longe do que aquela que venha a ser consagrada no espaço lusófono, dando resposta aos avanços inovadores do Brasil, ainda não aceite por outros países.
Como o povo diz: «água mole em pedra dura tanto dá até que fura», esperamos que, na próxima revisão constitucional, seja ela extraordinária, antecipada, como propôs a Sr.ª Deputada Manuela Aguiar, ou seja ela ordinária, se ponha cobro a esta discrepância que o povo brasileiro não merece e contra a qual não ouvimos qualquer argumento válido.

A Sr.ª Manuela Aguiar (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Houve algumas pessoas que levantaram fantasmas que, a nosso ver, não têm qualquer razão de ser.
Sem querer exagerar, não posso deixar de utilizar uma frase célebre: «A História, no novo milénio, vai, mais tarde ou mais cedo, dar-nos razão».

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, é só para dirigir-me ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus e comunicar-lhe a minha triste experiência enquanto, durante dois anos e meio, fui vice-presidente da delegação do Parlamento Europeu à América do Sul.
Se visse as ganas dos espanhóis, a sua presença contínua, a forma como intervinham, o contacto que estabeleciam com os embaixadores, e se visse a moleza flácida da delegação portuguesa, teria ficado surpreendido, como eu fiquei. E bem tentei incentivar para essa tarefa as pessoas que deveriam ter-me acompanhado. A verdade é que a nossa ausência - à excepção da minha presença que não era suficiente - se tornou notada.
Não há dúvida alguma que, por parte dos nossos irmãos, hay unas ganas que são reais: eles fazem! Pensava eu que os estremenhos e os castelhanos eram mandriões como nós! Mas não há dúvida alguma que eles continuam a ser os conquistadores que sempre foram.
Por outro lado, gostava de deixar mais uma pequena nota.
Tem sido timbre, desde a I República, resolver os problemas com os brasileiros através do acordo ortográfico. É o hífen, é o acento grave, é a acentuação dos advérbios de modo, é uma série de coisas que, a meu ver, são absolutamente inúteis e disse-o quando cá veio o Presidente do Congresso do Brasil. Aliás, ainda outro dia recebi uma carta do Brasil onde me diziam que, de facto, não é com acordos ortográficos que resolveremos a nossa acção junto dos 200 milhões de falantes que somos.
Sr. Secretário de Estado, veja se, no Parlamento Europeu, consegue animar os Deputados portugueses que integram a delegação à América do Sul, porque, pelo menos, faríamos melhor figura ao lado dos espanhóis.
Quanto ao acordo ortográfico, estamos falados. Os americanos e os ingleses nunca se preocuparam com tal, os franceses e os canadianos tão-pouco, e, de facto, há mais coisas «no Céu e na Terra» do que os hífens e os acentos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito brevemente, quero dizer que tomei nota de várias das intervenções que aqui foram feitas, nomeadamente da crítica que foi feita relativamente ao instrumento que, hoje, aqui está em apreciação. Tal crítica tem a ver, em certa medida, ao que fiquei ciente, com a ausência de alguns elementos de natureza declaratória que se encontravam noutros instrumentos e que, bilateralmente, no acordo que celebrámos com as autoridades brasileiras, entendemos poder fazer desaparecer deste texto ao qual se conferia um conteúdo mais prático, mais pragmático e mais operativo.
Penso que se há relação bilateral relativamente à qual as hipérboles retóricas já quase se esgotaram é a relação luso-brasileira. Em minha opinião, é bem mais útil que passemos a aspectos bastante mais concretos neste momento.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Muito bem!

O Orador: - Tenho consciência absoluta - e os Srs. Deputados têm-na, com certeza - de que, nos últimos cinco anos, nesta matéria, nomeadamente no tocante ao desenvolvimento das relações bilaterais no plano económico e financeiro, muito de substancial foi feito.
Este instrumento tem as suas limitações. Tem, em primeiro lugar, as limitações de ser um instrumento bilateral, isto é, um instrumento que não é português mas luso-brasileiro e, como tal, é produto de um acordo bilateral. Em segundo lugar, foi aqui citada hoje, recorrentemente, uma questão que tem a ver com elementos que se ligam à reforma constitucional portuguesa. Mas esta, também para citar um poeta, é uma questão que esta Assembleia tem «consigo mesma» e, neste sentido, é algo que tem de ser resolvido ao nível dos grupos parlamentares, porque é da competência deste Parlamento e, numa eventual revisão extraordinária da Constituição, o problema da reciprocidade pode colocar-se.
Nesta matéria, como compreenderão, o Governo nada mais pode fazer.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Informo que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus utilizou tempo

Página 98

que lhe foi cedido pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Srs. Deputados, terminada a lista de oradores, está concluído o debate sobre a proposta de resolução n.º 42/VIII.
O ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos respeita à discussão conjunta das propostas de resolução n.os 9/VIII - Aprova, para ratificação, a Convenção entre a República Portuguesa e a República de Singapura para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada em Singapura em 6 de Setembro de 1999, 17/VIII - Aprova a Convenção Adicional que Altera a Convenção entre Portugal e a Bélgica para Evitar a Dupla Tributação e Regular Algumas Outras Questões em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e Protocolo Final, assinada em Bruxelas em 6 de Março de 1995, 20/VIII - Aprova, para ratificação, a Convenção entre a República Portuguesa e os Estados Unidos Mexicanos para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e Protocolo Anexo, assinada na cidade do México em 11 de Novembro de 1999, e 32/VIII - Aprova, para ratificação, a Convenção entre a República Portuguesa e o Canadá para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e Respectivo Protocolo, assinados em Otava em 14 de Junho de 1999.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus: - Sr. Presidente, Sr. Deputados: Estava convicto de que, dado o carácter repetitivo deste tipo de instrumentos e o facto de, sistematicamente, aquando de anteriores vindas a esta Assembleia, todo o conjunto de argumentos que suportam estes instrumentos era do conhecimento desta Assembleia, o que faria com que a intervenção do Governo fosse, neste caso, dispensável.
De qualquer modo, muito brevemente, penso estar claro, até pelo próprio tipo de instrumentos e por aquilo que eles contêm, já que não se afastam do modelo tradicional de outros instrumentos bilaterais já assinados e ratificados neste âmbito, que constituem elementos facilitadores da acção externa dos agentes económicos portugueses e procuram estender um normativo harmonizado nas relações bilaterais de Portugal com os seus parceiros, por forma a garantir a acção dos agentes empresariais e uma maior justiça no trabalho das administrações nacionais no seu relacionamento com esses mesmos agentes.
Sendo, portanto, a meu ver, documentos relativamente consensuais, peço, naturalmente, a esta Assembleia a sua aprovação.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Matos Leitão.

O Sr. Matos Leitão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Programa do Governo, aprovado por este Parlamento, define como objectivo essencial o desenvolvimento da rede deste tipo de convenções que, à semelhança de muitas outras já aqui aprovadas, seguem o modelo recomendado pela OCDE, internacionalmente aceite e genericamente adoptado por Portugal e pela União Europeia.
A Convenção a celebrar entre Portugal e os Estados Unidos Mexicanos visa fomentar e incentivar o investimento económico, estabelecendo, para o efeito, regras de cooperação entre os Estados para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento.
Os fundamentos que justificam este tipo de convenções são conhecidos de todos nós e dispenso-me de os realçar mais uma vez.
Globalmente, esta Convenção segue o princípio da tributação na fonte, fixando a incidência fiscal no Estado onde os rendimentos são gerados. São estabelecidos métodos para eliminar a dupla tributação que se traduzem num sistema de deduções ao imposto das importâncias que o sujeito passivo tenha pago no outro Estado ao abrigo desta Convenção.
Esta Convenção abrange os rendimentos de bens imobiliários, os lucros das empresas, os lucros provenientes da exploração de navios ou aeronaves, os dividendos entre sociedades, os royalties, os rendimentos obtidos por profissionais independentes, os ganhos em mais-valias provenientes da alienação de alguns bens imobiliários ou mobiliários, as pensões e rendas, as remunerações públicas, entre muitos outros que o tempo de que disponho não permite discriminar.
Entre os Estados são estabelecidos princípios da não discriminação e da troca de informações e é fixado um procedimento amigável também para evitar a tributação não conforme a Convenção.
Para terminar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, apenas acrescento que o Grupo Parlamentar do PS votará favoravelmente a proposta de resolução n.º 20/VIII.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, de facto, hoje devia ter um pequeno aumento salarial, na medida em que já fiz tantas intervenções que até parece que estou num suet shop de Singapura!
De qualquer modo, mesmo sem esse acrescento salarial, de muito boa vontade informo que a bancada do CDS-PP vai votar favoravelmente estas disposições legais a respeito do México, do Canadá, de Singapura e da Bélgica, na medida em que, se queremos que os investidores portugueses invistam no exterior, também teremos de dar-lhes alguma garantia de que, ao contrário da «moda» portuguesa, eles não serão penalizados por causa disso. Tem havido sempre uma certa hostilidade para quem arrisca os bens e, enfim, o «cabedal» - e digo «cabedal» nos dois sentidos - no exterior, e, como é natural, se houver dupla tributação, as pessoas pensarão duas vezes antes de investirem.
Ora, se queremos «digitalizar», como estamos a fazer, a globalização - se estamos, de facto, a investir na Internet, se quase a inventámos!; se digitalizamos tudo com o meu amigo Mariano Gago -, também vale a pena digitalizar a questão dos impostos e da dupla tributação por forma a que quem queira investir num espaço mais vasto e arriscar o possa fazer. Digo «arriscar» porque com a Administração Pública portuguesa, que é a mais morosa que conheço, arrisca-se sempre a perder oportunidades, a perder o

Página 99

negócio, a perder uma quota, para o que nunca há desculpa por se decidir tarde mais!
Há quem perca quotas quando, na altura em que está a negociá-las, o burocrata descobre haver um pequeno problema e não o comunica imediatamente ao interessado; entretanto, quem vendia a quota perde-a no país de origem… Enfim, há várias coisas que, num mundo altamente burocratizado, se não houver de facto uma administração pública extremamente treinada e com boa vontade para quem investe, o investidor tem medo e não investe, como é evidente! E Portugal é um caso exemplar disto, porque, como sabem, tem existido alguns investimentos em certos países com resultados muito negativos, apesar de serem feitos por investidores extremamente competentes. Mas não vale a pena estarmos aqui a lembrar casos tristes, e conheço bem alguns deles.
Para concluir, devo dizer que a bancada do CDS-PP votará favoravelmente estas propostas de resolução, por se tratar de uma medida de bastante importância, embora pareça insignificante e seja aqui aprovada por poucos Deputados, que pode significar algo na globalização e na penetração da nossa economia, do nosso dinheiro, em mercados diferentes do nosso.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.as e Srs. Deputados, visto não haver mais oradores inscritos, dou por encerrado o debate das propostas de resolução n.os 9/VIII, 17/VIII, 20/VIII e 32/VIII, cuja votação será feita, nos termos regimentais, na primeira oportunidade.
Srs. Deputados, vamos passar à análise da petição n.º 16/VII (1.ª) - Solicita que a Assembleia da República altere o Regime do Arrendamento Urbano previsto no Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro (apresentada por Lúcia Maria Garcia Mendes Ferreira e outros), dispondo cada grupo parlamentar de 5 minutos para o efeito.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Esta petição enferma dos problemas genéricos das petições que são debatidas na Assembleia da República, pois é, também ela, uma petição já antiga e, como tal, espera-se que tenha chegado a esta Assembleia já com parte do seu objecto prejudicado.
Obtivemos nesta Assembleia, na última sessão legislativa, mais precisamente em Março, um compromisso por parte do Governo de que, no prazo de um ano, um conjunto de alterações profundas ao Regime de Arrendamento Urbano iriam ser introduzidas, até porque sabemos que o decreto-lei que deu origem ao Regime do Arrendamento Urbano é hoje, no nosso ordenamento jurídico, uma «manta de retalhos», já que tem um conjunto de normas que foram consideradas inconstitucionais, e foram-no não por causa do seu conteúdo, por ser pior ou melhor, mas, apenas e só, por significarem manifestos excessos em relação à autorização legislativa pedida pelo Governo, em 1999, para a elaboração deste diploma. Tal significa que, na altura, a Assembleia da República concedeu ao Governo uma autorização legislativa para que este pudesse legislar; só que esse decreto-lei violou, em muitos dos seus preceitos, a autorização legislativa que lhe tinha sido concedida. E essa inconstitucionalidade orgânica transformou, sucessivamente, a partir do terceiro acórdão de declaração de inconstitucionalidade, o nosso RAU numa «manta de retalhos». Aliás, quem se confronta diariamente com este diploma, encontra um conjunto de dificuldades que leva a que se cometam injustiças, porque a incerteza jurídica gera sempre injustiças.
Uma das primeiras e maiores injustiças, uma das mais acentuadas injustiças prende-se, necessariamente, com a dificuldade que os senhorios sentem, muitas vezes, até para conseguirem habitação para os seus próprios filhos - estou a falar de descendentes em linha directa -, uma vez que também esse preceito foi declarado inconstitucional por uma inconstitucionalidade orgânica.
O Governo comprometeu-se a corrigir um conjunto de situações; tomámos como bom esse compromisso; acreditámos nele, mas não podemos deixar de dizer que é absolutamente justo e crucial ver resolvida esta preocupação da cidadã Lúcia Maria Garcia Mendes Ferreira e outros. É decisivo legislar e acabar com esta «manta de retalhos» e esperamos que isto aconteça o mais rapidamente possível, porque cada mês, cada ano, que passa são milhares, milhares e milhares de pessoas que continuam a ser alvo de uma injustiça muito grande que é hoje o Regime do Arrendamento Urbano pelo qual se rege o nosso ordenamento jurídico.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Ribeiro.

A Sr.ª Helena Ribeiro (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição objecto da presente apreciação parlamentar, apresentada pela proprietária senhoria Lúcia Garcia Mendes Ferreira, integra um conjunto de preocupações da subscritora atinentes ao Regime do Arrendamento Urbano.
Na perspectiva da peticionante, a disciplina jurídica dos contratos de arrendamento urbano para habitação e para comércio ou indústria é inadequada a uma justa regulação da relação contratual locatícia que, segundo palavras suas, «mantém o senhorio amarrado ao pelourinho da propriedade arrendada».
Pretende a peticionante que o legislador introduza alterações substanciais no edifício jurídico do arrendamento urbano por forma a que o princípio da liberdade contratual seja a matriz estrutural das soluções a consagrar.
Para isso sugere um conjunto de alterações profundas a introduzir no nosso edifício jurídico, como: a revogação dos artigos 68.º a 73.º do Regime do Arrendamento Urbano e a sua substituição por um conjunto normativo que consagre a liberdade do senhorio para denunciar o contrato de arrendamento; a revogação das normas que consagram a transmissão do arrendamento por morte do inquilino a certos sucessores; o deferimento por um ano do prazo para desocupação e entrega das lojas comerciais em caso de denúncia dos contratos de arrendamento; e, por fim, a caducidade do contrato de arrendamento quando sejam inquilinas sociedades por quotas e tenha ocorrido uma cessão de quotas.
As soluções apontadas pela peticionante encerram uma concepção manifestamente liberal do direito ao arrendamento e a negação da natureza protectora dos direitos do inquilino, que se reconhece às normas que disciplinam este tipo de relação contratual.

Página 100

A experiência e a natureza dos interesses em presença diz-nos que, efectivamente, o exercício do direito à habitação pelo inquilino pode colidir, e colide muitas vezes, com o exercício do direito de propriedade de que é titular o senhorio e com o princípio da autonomia privada.
Mas as respostas que têm sido dadas, mesmo por referência ao Direito comparado, como forma de garantir a articulação e a harmonização dos valores representados pelos três direitos em confronto, assentam na aceitação de que o direito à habitação é, hierarquicamente, mais forte do que os direitos de propriedade e da autonomia privada.
Como muito bem nos ensina o insigne Professor Pereira Coelho, no Regime do Arrendamento Urbano são encontráveis especialidades legais, quer em face dos princípios dos negócios jurídicos, quer das regras gerais dos contratos e do direito comum sobre o cumprimento e não cumprimento das obrigações, das quais resulta uma forte limitação do princípio da liberdade contratual.
Os portugueses sabem que a nossa Constituição reconhece a todos os cidadãos o direito a uma habitação condigna para si e para o seu agregado familiar. Por isso, é dever indeclinável do Estado a função reguladora do mercado de arrendamento, em nome da garantia dos direitos de cidadania social. Obviamente que tal não significa que o Estado deva ignorar os legítimos interesses da parte contratual que figura como senhorio na relação locatícia. Sabemos que persistem situações de desajustamento contratual com repercussões negativas para os interesses do proprietário senhorio. Várias medidas têm sido implementadas no propósito de se avançar para o reequilíbrio contratual em matéria de arrendamento urbano que, mercê de uma política de congelamento de rendas seguida desde há várias décadas, apresenta distorções de todos conhecidas.
Não se contesta, nem é contestável que se prossiga este esforço de reequilíbrio contratual, de que é exemplo bem ilustrativo o ainda recente pacote legislativo da iniciativa legislativa do Governo aprovado por esta Câmara há bem pouco tempo. O que não se pode aceitar é o conjunto de inovações propostas pela peticionante que excederiam, a nosso ver, o quadro lógico da preservação/eliminação das regras socialmente úteis da posição vinculística do arrendatário.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, esta petição que hoje analisamos traduz uma visão absolutamente liberal do negócio do arrendamento para habitação.
Aceitar as teses desta petição seria regressar à visão do velho Código de Seabra, onde o senhorio tinha total liberdade de fazer cessar o contrato e havia liberdade de afixação do preço das rendas.
A verdade é que, depois dos excessos do Código de Seabra no sentido da total fixação das regras do arrendamento pela vontade do senhorio, seguiram-se outros excessos, depois de 1974. A um excesso seguiu-se outro excesso de sinal contrário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - De 1974 até 1986, o que passou a vigorar foi um regime em que os contratos de arrendamento eram sempre vitalícios e o valor das rendas fixadas era perpétuo. Só depois de 1986, com os governos do PSD, surgiu um conjunto de alterações para dar mais equilíbrio e razoabilidade a esta relação contratual do arrendamento. Foi, sucessivamente, em 1986, depois em 1990, em 1993 e em 1995 que surgiram alterações no sentido justo do equilíbrio da relação contratual das partes. Também é certo que, depois de 1995, depois dos governos do PSD, nada mais aconteceu nesta matéria.
Os governos do Partido Socialista, honra lhes seja feita, não mexeram mais nesta legislação, nem num sentido, nem noutro; ou seja, aparentemente, o Partido Socialista concorda completamente com aquilo que era a posição da legislação sobre arrendamento deixada pelo PSD, em 1995.
As alterações que foram introduzidas pelos governos do PSD foram no sentido de permitir, por um lado, que em alguns casos a duração limitada dos contratos não fosse imperativamente renovada e, por outro, actualizações controladas no valor das rendas. Tudo ajustamentos no sentido justo.
Desde a governação socialista não se verificou qualquer avanço, e, verdade seja dita, também qualquer recuo. O programa eleitoral do Partido Socialista prometia relançar o mercado de arrendamento, designadamente através da criação de linhas de financiamento para a promoção de arrendamento, mas nem uma acção se verificou. O Programa do Governo de 1999, esse nem uma palavra tem sobre as questões do arrendamento.
O Governo apresentou nesta Assembleia um pedido de alteração legislativa, que foi aprovado em Junho deste ano, mas, há que dizê-lo também, e contrariando a intervenção da Sr.ª Deputada do Partido Socialista, essa autorização legislativa em nada mexe com as questões que aqui estamos a tratar e que são objecto desta petição.
O anterior governo socialista criou uma comissão para acompanhamento do regime de arrendamento urbano, mas, como é próprio do Partido Socialista, deste Governo, daí não resultou qualquer acção concreta. Havia até calendários de acções, mas não há qualquer medida concreta tomada na sequência desse grupo de trabalho.
A verdade é que há algumas alterações que se impõe fazer, e quero destacar aqui uma que já foi referida pelo Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan. Desde o último regime de arrendamento urbano, aprovado no tempo do PSD, ficou estabelecida a possibilidade de o senhorio poder denunciar o contrato de arrendamento com fundamento na necessidade da habitação para os seus descendentes em primeiro grau. Entendeu-se que o direito à habitação para os filhos do proprietário era mais importante do que o direito de habitação de quem não tinha qualquer laço de sangue com o proprietário, desde que os filhos do proprietário carecessem de habitação.
Esta norma foi aprovada e esteve em vigor até ao momento em que o Tribunal Constitucional declarou a sua inconstitucionalidade com força obrigatória geral por razões orgânicas. Isto ocorreu em Fevereiro de 1999, já passou mais de um ano e meio sobre esta decisão do Tribunal Constitucional e, até agora, não houve qualquer acção por parte do Governo.

Página 101

Entendemos que se justifica fazer aqui esta alteração e que tem de se encontrar soluções equilibradas. Porém, rejeitamos o liberalismo desenfreado de quem quer ver o mercado a comandar o mundo. Quem quer fazer negócio numa área que «mexe» com a dignidade dos seres humanos tem de aceitar restrições à liberdade contratual e ao exclusivo da vontade das partes.
O caminho que defendemos é o da progressiva flexibilização da legislação sobre arrendamento urbano, sem ceder perante princípios e valores mais nobres, como seja o da dignidade da pessoa humana.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: A peticionante dava à Assembleia um tempo, que para ela era um tempo útil - não se percebe bem porquê! -, e exigia que se fizesse uma legislação no sentido que ela queria, cujo prazo se iniciaria no dia seguinte à aprovação do Orçamento do Estado para 1996 e que terminaria passado um ano. Esse resultado, portanto, já a peticionante não vai conseguir. E pela nossa parte também não o conseguiria em tempo algum, porque o que esta petição representa é uma exigência do tal liberalismo desenfreado de que o Sr. Deputado Castro de Almeida aqui falou.
Entretanto, há uma autorização legislativa que já contém algumas alterações - é muito recente, foi publicada em Agosto -, que não são alterações no total sentido do que a peticionante quer, mas, por exemplo, a questão da inconstitucionalidade dos descendentes em primeiro grau, que o Governo do PSD cometeu, já está reparada nessa autorização legislativa.
Creio que a autorização legislativa, contra a qual votámos, não satisfará a peticionante, porque ela até está contra o RECRIA. Quer é que as pessoas sejam postas na rua e não quer obras no prédio. Ora, o RECRIA, em muitos casos, impediu que a cidade de Lisboa se transformasse - vou usar uma das expressões da petição que me chocaram - «num coio de lazarentos acoitados em ruínas: os inquilinos». Esta é a óptica da peticionante acerca dos inquilinos.
Houve várias transformações na legislação do arrendamento urbano. O relatório da Sr.ª Deputada Helena Ribeiro, que considero que está muito bem feito e a quem cumprimento por isso…

Risos do PS.

É justo que eu o diga! Se não estivesse bem feito não o diria, mas quando tenho de fazer justiça faço!
O relatório dá-nos conta do enfraquecimento que tem havido na estabilidade do contrato de arrendamento ditada por questões de interesse público ao longo de muitos anos. Todavia, não foi só com o governo do PSD - e é justo que se diga, mas desta justiça o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira não gostará - que se enfraqueceu a estabilidade do contrato de arrendamento urbano, foi também com o governo do bloco central. A lei do aumento das rendas, de 1985, e, depois, os desenvolvimentos dessa lei foram da responsabilidade do governo do bloco central, era o actual Sr. Deputado Fernando Gomes Secretário de Estado da Habitação, que veio aqui defender uma legislação que já contém contratos a prazo para o arrendamento. Esta estabilidade existia igualmente - e também vou citar a peticionante - no tempo do Estado Novo, do qual ela salienta, parece que com apreço, «(…) a moral e o direito constantes da Constituição de 1933». Nessa altura foram congeladas rendas habitacionais, como toda a gente sabe.
Durante o debate da autorização legislativa, que não satisfará a peticionante, analisámos a manutenção da fórmula da taxa de esforço da lei de 1985, que, associada às propostas do Governo, elevaria para o dobro e até para muito mais as rendas vigentes. Vimos como até as próprias obras de conservação ordinária (a obra de pôr uma janela ou um telhado que está decrépito) vai dar origem a aumentos de rendas que são perpétuos: depois de paga a obra, vai continuar-se a pagar aquela janela e aquele telhado para todo o sempre. Esta é a «justiça» desta autorização legislativa, acumulando com isto o facto de a maior parte das pessoas ficarem excluídas do subsídio de renda como também demostrámos nessa altura.
Ora, o que a peticionante quer, para que tivesse sucesso, necessitaria de uma revisão constitucional. Para além das questões relativas aos arrendamentos comerciais, que teria uma trágica repercussão na vida das pequenas e médias empresas - e é isto que se deve salientar também -, há as questões do direito à habitação, a uma habitação adequada, em relação ao qual o Estado tem deveres. Isto é, o Estado tem o dever de adoptar uma política tendente a estabelecer um sistema de renda compatível com o rendimento familiar e de acesso à habitação própria.
Termino, dizendo que a pretensão da peticionante, que segundo o seu próprio limite e segundo os seus desejos, já caducou, para nós não tem qualquer viabilidade. Nem mesmo vi aqui, durante o debate, o PSD e creio que o PP advogarem um liberalismo desenfreado no arrendamento urbano, e isso era o que a peticionante queria.
Por esse motivo, não apresentamos qualquer iniciativa em relação a esta matéria, como ultimamente temos vindo a apresentar quando as petições nos parecem fundamentadas. Esta não tem qualquer fundamento e é anticonstitucional, contra uma Constituição que data de 1976.

Aplausos do PCP.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Faça favor, Sr. Secretário de Estado, mas peço-lhe que se cinja ao objecto das interpelações.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, pedi para usar da palavra sabendo que o Governo habitualmente não participa em debates sobre petições - regra que gostaria fosse analisada na sede própria, que é a Conferência de Representantes dos Grupos Parlamentares, pelo que não coloco aqui esta questão, naturalmente -, mas ficaria de mal com a minha consciência se não dissesse, para que fique registado em acta, se V. Ex.ª me permitir, que a

Página 102

autorização legislativa que regula a questão do arrendamento urbano está a ser executada e que foram já enviadas para o Conselho de Secretários de Estado todas as peças legislativas, tanto sobre a renda condicionada, como sobre o arrendamento urbano, como sobre o RECRIA. Isto significa que, dentro em breve, e no prazo próprio, poderemos dar satisfação ao que foi autorizado pela Assembleia da República.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado, considero que a norma regimental que diz que o Governo não intervém nestes debates tem uma ratio bem clara. Evidentemente, pode haver alterações, mas a petição é dirigida à Assembleia, assim como pode ser dirigida ao Governo e, naturalmente, o Governo não vai chamar os Deputados quando discute as petições que lhe são dirigidas!
Tenho, pois, dúvidas sobre se a solução que propõe é adequada, do ponto de vista regimental. Em todo o caso, como é óbvio, essa matéria será discutida em sede das normas de alteração ao Regimento.
Srs. Deputados, encerrámos a discussão da petição n.º 16/VII (1.ª), não havendo qualquer expediente relativamente à mesma. Como tal, a peticionante será notificada do teor deste debate, nos termos regimentais.
Vamos agora passar à apreciação da petição n.º 56/VII (1.ª), apresentada pela Câmara Municipal do Montijo, pretendendo a manutenção do serviço de urgência do hospital do Montijo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não perco uma sexta-feira de manhã por coisa alguma deste mundo!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe desculpa, mas vou ter de interromper a sua intervenção apenas para cumprirmos uma formalidade antes de começarmos este debate.
Desejo anunciar, antes que saiam, que temos entre nós um grupo de Srs. Deputados e Srs. Funcionários dos Parlamentos dos PALOP e ainda alguns representantes de Timor. Para eles, peço a vossa saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Mais uma vez pedindo-lhe desculpa, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, foi com o maior prazer que interrompi a minha intervenção - é não só um dever de hospitalidade como também um grande prazer para todos nós.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como dizia, não perco as sextas-feiras de manhã por coisa alguma deste mundo, nem mesmo vindo a pé, a cavalo ou de avião! E vou dizer porquê: em primeiro lugar, porque ouvi o Sr. Presidente dizer «a ratio», e é a primeira vez que ouço alguém falar do sexo real da ratio - é feminino, de facto! Ele aprendeu latim e, com isso, sinto uma comunhão imensa de simpatia com ele!

Risos.

Em segundo lugar, há aspectos caricatos. Quando vejo uma petição da Câmara Municipal do Montijo sobre um serviço de emergência - é emergente! - datada de 1996, que hei-de eu dizer?! Só gostaria de não ter estado lá!
Mas, pior do que isso, é que o abaixo-assinado começa da seguinte maneira: «Preocupados com as informações que circulam sobre o possível encerramento ou redução da capacidade de resposta da urgência do hospital do Montijo, os cidadãos abaixo assinados (…)» tomam a posição que passam a expor.
Quer dizer, por boatos, chegou ao Montijo a noção de que o serviço de urgência ia acabar. Houve protesto, houve marcha-atrás, e o serviço não acabou. Telefonei para lá ontem e continua a existir, não de boa saúde, porque os médicos saem para almoçar durante quatro horas e quem está numa situação de emergência sofre um pouco, numa maca, mas a verdade é que ele continua a existir.
Não será possível que se tenha uma forma menos caricata de fazer circular notícias? Não será possível que em vez daquele sigilo que a Administração Pública mantém sobre certos aspectos da vida nacional se comece a ter aquilo a que chamam de transparência, que me parece uma espécie de preservativo da honestidade (desculpem a imagem chocante)? Transparência é algo que me preocupa. Há seriedade? Há honestidade? De facto, não há seriedade naquilo que se faz.
É evidente que para mim é impensável que uma questão destas seja aqui discutida quatro anos depois, tratando-se de um serviço de saúde, tratando-se de um serviço de emergência. Naturalmente, isso choca-me e retira todo o caricato à questão. Em matérias sérias, o caricato é deslocado. Julgo que seria bom que houvesse um planeamento, que pode ser alterado, mas que pelo menos pudesse haver uma comunicação directa com as entidades locais para informar sobre aquilo que se pensa fazer relativamente a serviços de grande utilidade pública.

Aplausos do CDS-PP.

Neste momento, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Filipe.

A Sr.ª Natália Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em 1996, deu entrada nesta Assembleia a petição que está hoje aqui em debate. Efectivamente, discutir em Setembro do ano 2000 uma petição subscrita por 7192 cidadãos contra o encerramento do serviço de urgência do hospital distrital do Montijo, sem que tal, até ao momento, se tenha verificado, pode parecer extemporâneo ou completamente fora de actualidade.
Pela parte do PCP, esta petição mantém-se perfeitamente actual, importando realçar dois aspectos que nela são referidos. Por um lado, a população exigia ser ouvida em todo o eventual processo de encerramento ou reorganização dos serviços de saúde; por outro, reclamavam do Ministério a melhoria das condições de atendimento do hospital, nomeadamente a dotação de recursos humanos e materiais.

Página 103

Para o PCP, estas matérias não estão ultrapassadas e muito menos resolvidas. O PCP sempre denunciou a situação dos serviços de saúde na região, mas, com igual responsabilidade, temos apresentado nesta Assembleia propostas que visam a melhoria da rede de serviços de saúde ao nível local e em todo o País.
Em sede de discussão do Orçamento para 2000, o Grupo Parlamentar do PS, contrariando inclusive posições assumidas pelos seus eleitos autárquicos no distrito de Setúbal, votou contra todas as propostas do PCP.
Pergunto: quando vão avançar as obras de remodelação do hospital distrital do Montijo previstas no PIDDAC para 2000? Para quando o investimento em novas unidades de cuidados de saúde primários, tão necessárias nesta região, em franco crescimento populacional? Quando vai o Governo dotar os centros de saúde e os hospitais com os recursos humanos e as instalações necessárias à prestação de cuidados de saúde com qualidade e humanização? Quais as medidas de organização e funcionamento dos serviços de saúde que o Governo vai adoptar para criar as necessárias condições de atendimento às populações?
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Novamente em relação ao conteúdo da petição que estamos a discutir, importa reafirmar que o mesmo está efectivamente actualizado, apesar de terem passado mais de quatro anos.
Para gáudio de interesses privados que se movimentam na saúde, estamos a verificar a completa paralisia ao nível do funcionamento dos serviços de saúde públicos, ajudada pelo subfinanciamento sufocante que se está a verificar.
Criticamos vivamente o Governo pela ausência de aplicação de medidas de reorganização, modernização e humanização do Serviço Nacional de Saúde, ignorando por completo as medidas legislativas que estão em vigor. Disto é exemplo a criação do sistema local de Almada, Seixal e Sesimbra, que se encontrava a funcionar e que está completamente metido na gaveta. O Ministério da Saúde continuar sem dar resposta a um requerimento que apresentei nesta Assembleia sobre esta matéria.
Criticamos também o Governo e o Ministério da Saúde pelo completo autismo que se está a verificar, ao continuarem a ser ignoradas as populações nos processos de reorganização dos serviços de saúde. Por aqui passa também a não aplicação de medidas legislativas. Veja-se também o exemplo recente de uma audição que fizemos com o Sr. Presidente da ARS do Norte, que mostra como esta situação se verifica.
Criticamos o Governo pelo incumprimento de medidas legislativas propostas pelo PCP na Assembleia da República e que estão a ser completamente ignoradas.
Sem estar devidamente provada e comprovada a incapacidade de rentabilização da capacidade instalada no Serviço Nacional de Saúde, a pretexto da recuperação das listas de espera e em violação da lei aqui aprovada, o Governo prepara-se para realizar convenções com o sector privado.
Em Janeiro deste ano, aprovámos, nesta Assembleia, por unanimidade, uma resolução que visava o aumento de profissionais de saúde. Até hoje, continuamos a desconhecer o plano de acção urgente que o Governo vai desenvolver com vista ao aumento de formandos na área da saúde e a superar as necessidades do País em matéria de recursos humanos - e isto também concretamente no Montijo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Estas e outras são as preocupações do PCP.
A nossa postura é e será a de exigência de verdadeiras medidas de reforma e de defesa do Serviço Nacional de Saúde, onde também se incluem certamente o Montijo e todo o distrito de Setúbal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Aires de Carvalho.

O Sr. Aires de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Penso que, depois de ouvir a Sr.ª Deputada que me antecedeu, ficaram claras para o Sr. Deputado Rosado Fernandes as razões por que, por vezes, se apresentam petições com base em boatos. E, contrariamente à Sr.ª Deputada que me antecedeu, vou efectivamente falar da petição.
Saúdo naturalmente a subida a Plenário de mais esta petição. Aliás, não quero deixar de sublinhar a preocupação de Sua Excelência o Sr. Presidente desta Assembleia quando, no final da anterior sessão legislativa, fez distribuir por todas as Comissões uma nota estabelecendo prazo para entrega das petições pendentes.
Tenho a consciência do contributo que o instituto da petição representa como instrumento para dar voz aos cidadãos e os aproximar dos seus representantes. Só que, por vezes, nem todas as tentativas desenvolvidas pelos Deputados para satisfazer os diversos quesitos são coroadas de êxito.
A petição que agora sobe ao Plenário enquadra-se perfeitamente nestes pressupostos. Deu entrada em 23 de Julho de 1996 - friso, 1996! -, sendo subscrita por 7192 cidadãos que dão conta da necessidade de manter o serviço de urgências do hospital do Montijo.
Reclamam igualmente a melhoria das condições de atendimento do hospital, procedendo à dotação com meios humanos e materiais. Por fim, manifestam o apoio à administração do hospital, corpo técnico, administrativo e pessoal auxiliar.
Percebo, pois, quais terão sido as razões pelas quais esta petição acabou por ser redistribuída em 21 de Dezembro de 1999, até porque o actual Governo do PS, tal como o anterior, tem vindo a promover uma série de iniciativas com vista a satisfazer as preocupações constantes da presente petição, tendo em atenção que o objectivo fundamental da mesma nunca esteve em causa - o não encerramento do serviço de urgência -, como aliás, já foi questionado e respondido pelo Governo, em resposta a diversos requerimentos de vários Deputados.
Neste quadro, é de toda a justiça salientar os seguintes aspectos relativos ao hospital do Montijo: a abertura da unidade de cuidados intermédios do serviço de saúde; a abertura de um novo serviço farmacêutico: o novo serviço de consulta externa; a nova valência de cardiologia com prova de esforço; a nova valência de imuno-hemoterapia; a criação de uma nova unidade de recuperação pós-anestésica, bem como a actualização do quadro de pessoal.
Igualmente estão em curso um conjunto de profundas obras de beneficiação do serviço de urgência, estando, na presente data, todo o processo burocrático totalmente

Página 104

concluído, avaliado em 213 000 contos e que aguarda apenas o visto do Tribunal de Contas.
De salientar ainda é a conjugação de esforços tendentes à construção de um novo hospital de substituição - repito, de substituição -, para que possa servir as populações do Montijo e de Alcochete, fazendo face ao aumento populacional que se está a verificar resultante da construção e funcionamento da ponte Vasco da Gama.
Tanto mais que tal facto já conheceu, enquanto reivindicação, o apoio unânime da Assembleia Municipal e da Câmara Municipal do Montijo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lucília Ferra.

A Sr.ª Lucília Ferra (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a petição n.º 56/VII, pretendem os seus subscritores impedir o Governo de encerrar ou reduzir a capacidade de atendimento do serviço de urgências no hospital do Montijo, bem como implantar medidas que conduzam a uma melhoria das condições de prestações de cuidados de saúde nesta unidade hospitalar. Estando hoje a questão do serviço de urgências aparentemente ultrapassada, é da mais elementar justiça reconhecer que a indignação popular, consubstanciada nesta petição, teve o mérito de fazer recuar o Governo socialista nessa sua pretensão.
Mas a presente petição tem igualmente a virtualidade de permitir, uma vez mais, relançar o debate sobre as condições de saúde no concelho, permitindo invocar a necessidade, já defendida pelo Partido Social Democrata, da construção de um hospital de substituição no Montijo.
Após a construção da ponte Vasco da Gama, o conselho do Montijo e alguns conselhos limítrofes conheceram um aumento demográfico substancial, aumento esse de contornos ainda não totalmente definidos, sem que para o efeito o Governo do Partido Socialista tivesse dotado o município de infra-estruturas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de referir que não me parece justo afirmar que esta petição foi feita com base em boatos. Na verdade, a petição que aqui foi apresentada começa por referir que os cidadãos se sentem preocupados com as informações que circulam, não especificando, contudo, a forma como circulou essa informação. Mas não circulou num sítio qualquer, e tanto assim é que a primeira subscritora da petição era a então presidente da Câmara Municipal do Montijo, o segundo subscritor o presidente da Câmara Municipal de Alcochete, depois o representante dos utentes e o presidente do conselho geral, etc. É importante referir esta questão e creio que os peticionantes sabem que mais vale prevenir do que remediar, porque, na verdade, há mais de 10 anos foram surpreendidos, sem que primeiramente fossem informados, com o encerramento da maternidade do Montijo, já que esta maternidade encerrou portas sem dar contas disso. Assim, penso que o primeiro ponto referido na petição, isto é, chamar a população a participar e a pronunciar-se, é extremamente importante.
Por outro lado, o parecer da Comissão de Saúde e Toxicodependência refere que não está em causa o encerramento do serviço de urgência do hospital do Montijo, referindo, por isso, implicitamente, que o objecto desta petição está ultrapassado, que não é actual.
Gostaria de referir, como aliás já foi dito, que esta petição foi apresentada há quatro anos, e, nessa altura, o objectivo de encerramento do hospital era actual. Mas o relatório e parecer da Comissão de Saúde e Toxicodependência foram elaborados há três meses. Felizmente, pode ser que há três meses e que actualmente este objectivo não seja actual, graças às reivindicações e à pressão dos órgãos autárquicos e da população. Creio que isso é importante.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, a oradora tem o direito de se exprimir livremente.

A Oradora: - Aliás, quanto àquilo que o Governo do Partido Socialista pretendeu com o hospital de Alhos Vedros, as movimentações das populações foram um bom exemplo para calar o Governo e para fazer com que voltasse atrás nessa sua pretensão.
Por outro lado, o objecto da petição não está ultrapassado, porque a petição refere diversos pontos, sendo um deles a carência de meios humanos e técnicos dos serviços de urgência e a incapacidade de este serviço dar resposta às populações.
Conforme todas as intervenções feitas, à excepção, naturalmente, da do Sr. Deputado do Partido Socialista, que ainda se consegue iludir em relação a esta questão, não conhecendo a realidade do serviço de urgências do hospital do Montijo, esta carência é uma realidade neste hospital, sendo natural que o Governo do Partido Socialista tenha de dar resposta à questão, tenha de dar resposta às reivindicações da população do Montijo e de Alcochete sobre a construção de um novo hospital, dotando-as de mais e melhores condições.
Os Verdes estão solidários com as pretensões das populações do Montijo e de Alcochete. Vamos questionar concretamente o Governo, por via parlamentar, sobre os meios para ultrapassar as carências do hospital do Montijo e estaremos atentos, em sede da discussão do Orçamento do Estado, às propostas que vão ser apresentadas para dotar este hospital de mais e de melhores meios.

Aplausos do PSD e do PCP.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Para uma interpelação, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, qual é o tema da interpelação?

Página 105

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Gostaria que o Sr. Presidente transmitisse que uma afirmação minha foi mal interpretada pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia. Quando falei de informações que circulam, mesmo num dia em que se anda a pé, era para dizer que é triste que dois presidentes de câmara tenha informações que correm, que não tenham informações certas, que não tenham informações comunicadas pelos serviços centralizados a dizer-lhes o que na realidade se está a passar. Portanto, os próprios presidentes de câmara têm-se governado por boatos e têm de reagir, porque «gato escaldado de água fria tem medo».
Era esse esclarecimento que gostaria que a Mesa desse.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. as e Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos, chegámos ao fim do debate desta petição. Conforme dispõe o Regimento, dar-se-á conhecimento do teor do debate aos respectivos peticionários.
Antes de encerrar a sessão, gostaria de assinalar a presença na bancada do Governo do novo Secretário de Estados dos Assuntos Parlamentares, o nosso caro colega José Magalhães, a quem saúdo e desejo as maiores felicidades. Embora já o tivesse feito pessoalmente, quero agora fazê-lo, também no exercício de funções enquanto Presidente.

Aplausos gerais.

Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, só posso agradecer a imensa simpatia que decorre das suas palavras.
Da relação de conhecimento que nos une a todos, e que da minha parte é inteiramente expectável, porventura com a perda de alguns atributos que vos são familiares, mas, espero, que com o ganho de outros, espero estar à altura dessa confiança, para o que conto com a vossa ajuda.
Vamos ao trabalho e muitíssimo obrigado pela simpatia.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, a próxima sessão terá lugar na quarta-feira, dia 28, estando agendado, para o período de antes da ordem do dia, um debate de urgência, requerido pelo CDS-PP, sobre política de prevenção dos incêndios florestais. Da ordem do dia, constará a discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 261, 263, 264 e 265/VIII (PSD) e ainda a apreciação do projecto de resolução n.º 38/VII.
Está encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 15 minutos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
António Alves Martinho
António Bento da Silva Galamba
António Fernandes da Silva Braga
António José Gavino Paixão
Carlos Alberto Dias dos Santos
Dinis Manuel Prata Costa
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Cardona Gomes Cravinho
João Macedo Lourenço
João Pedro da Silva Correia
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Manuel de Medeiros Ferreira
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António dos Santos
Manuel Francisco dos Santos Valente
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino
Maria José Vidal do Rosário Campos
Maria Luísa Silva Vasconcelos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Vítor Manuel Caio Roque
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Martins Narciso
António D'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Paulo Martins Pereira Coelho
Bruno Jorge Viegas Vitorino
David Jorge Mascarenhas dos Santos
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Feliciano José Barreiras Duarte
Henrique José Monteiro Chaves
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Frederico de Lemos Salter Cid
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Mário Patinha Antão
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rui Fernando da Silva Rio
Sérgio André da Costa Vieira

Página 106

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
Cândido Capela Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas

Partido do Centro Democrático Social (CDS-PP):
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro

Bloco de Esquerda (BE):
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

Páginas Relacionadas
Página 0098:
que lhe foi cedido pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Srs. Deputados, terminada a
Página 0099:
negócio, a perder uma quota, para o que nunca há desculpa por se decidir tarde mais! Há quem

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×