O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1525

Sexta-feira, 19 de Janeiro de 2001 I Série - Número 38

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 18 DE JANEIRO DE 2001

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex. mos Srs. José Ernesto Figueira dos Reis
Manuel Alves de Oliveira
António João Rodeia Machado
António José Carlos Pinho

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da apresentação de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Isabel Castro (Os Verdes) insurgiu-se contra a passagem de um navio em águas da zona económica exclusiva portuguesa transportando plutónio e respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Natalina de Moura (PS) e José Eduardo Martins (PSD).
O Sr. Deputado António Nazaré Pereira (PSD) criticou o Governo por não ter apresentado em tempo útil as candidaturas à destilação voluntária do vinho, prejudicando, assim, os produtores de vinho portugueses por estes não poderem usufruir de ajudas comunitárias. Respondeu, depois, aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Rosado Fernandes (CDS-PP) e Miguel Ginestal (PS).
O Sr. Deputado Honório Novo (PCP) congratulou-se pela forma como decorreu a inauguração do Porto - Capital Europeia da Cultura 2001 e apresentou um projecto de resolução sobre a criação de medidas de apoio às empresas do comércio tradicional da Baixa do Porto. Respondeu, depois, aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), José Saraiva (PS) e Sérgio Vieira (PSD).
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 81.º do Regimento, o Sr. Deputado Cândido Capela (PCP) falou sobre a situação social no distrito de Braga.
Ao abrigo do artigo 83.º, n.º2, do Regimento, o Sr. Ministro da Justiça (António Costa) fez um balanço da actividade do seu ministério, tendo usado da palavra, além daquele membro do Governo, os Srs. Deputados Francisco Louçã (BE), Guilherme Silva (PSD), Basílio Horta (CDS-PP), Dias Baptista (PS), Odete Santos (PCP), António Montalvão Machado (PSD) e Nuno Teixeira de Melo e Narana Coissoró (CDS-PP).

Ordem do dia. - Foram discutidos, conjuntamente, na generalidade, os projectos de lei n.os 288/VIII - Altera o Decreto-Lei n.º 158/96, de 3 de Setembro, que define a Lei Orgânica do Ministério das Finanças, e o Decreto-Lei n.º 205/97, de 12 de Agosto, que regulamenta o estatuto legal do Defensor do Contribuinte (BE), 337/VIII - Legitimação democrática do Defensor do Contribuinte (PSD) e 341/VIII - Altera o Decreto-Lei n.º 158/96, de 3 de Setembro, que define a Lei Orgânica do Ministério das Finanças, e o Decreto-Lei n.º 205/97, de 12 de Agosto, que regulamenta o estatuto legal do Defensor do Contribuinte (CDS-PP). Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães), os Srs. Deputados Francisco Louçã (BE), Menezes Rodrigues (PS), Maria Celeste Cardona (CDS-PP), Rui Rio (PSD), Joel Hasse Ferreira (PS) e Octávio Teixeira (PCP).
Entretanto, na generalidade, a Câmara rejeitou, após se ter verificado um empate em duas votações sucessivas, conforme o artigo 107.º do Regimento, o projecto de lei n.º 257/VIII - Confere aos municípios o direito à detenção da maioria do capital social em empresas concessionárias da exploração e gestão de sistemas multimunicipais (PSD). Foi ainda rejeitado o projecto de lei n.º 316/VIII - Confirma o passe social intermodal como título nos transportes colectivos de passageiros e actualiza o âmbito geográfico das respectivas coroas (PCP).
Ainda na generalidade, as propostas de lei n.os 38/VIII - Estabelece o regime fiscal do património cultural e 39/VIII - Estabelece as bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural, mereceram aprovação.
A proposta de lei n.º 37/VIII - Autoriza o Governo a aprovar um regime jurídico para a concessão intermunicipal do serviço público de gestão urbana de uma área compreendida nos limites da Zona de Intervenção da Exposição Mundial de

Página 1526

Lisboa (EXPO 98), foi aprovada na generalidade, na especialidade e em votação final global.
Foi também aprovado, na especialidade e em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 226/VIII - Aprova a quinta revisão do Estatuto dos Deputados (PS).
A Câmara aprovou ainda, na generalidade, o projecto de lei n.º 228/VIII - Acompanhamento e apreciação pela Assembleia da
República da participação de Portugal no processo de construção da União Europeia (PS).
Os projectos de lei n.os 317/VIII - Altera o regime jurídico do contrato de trabalho a termo, combatendo a precaridade no emprego (PCP), 324/VIII - Alteração do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro (Contrato de trabalho a termo) (BE) e 342/VIII - Altera o regime jurídico do contrato de trabalho a termo (PS) baixaram à 9.ª Comissão sem votação na generalidade, a requerimento do PCP, PS e BE.
A Câmara aprovou, ainda, oito pareceres da Comissão de Ética, autorizando 7 Deputados (2 do PCP, 3 do PS e 2 do PSD) a deporem em tribunal como testemunha.
Por fim, foram discutidos os projectos de resolução n.os 86/VIII - Em defesa da Casa do Douro e da vitivinicultura duriense (PCP), 94/VIII - Situação actual na Região Demarcada do Douro (PS) e 96/VIII - Reequilíbrio financeiro da Casa do Douro e defesa da viticultura duriense (PSD). Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), António Martinho (PS), Melchior Moreira, António Nazaré Pereira e Luís Marques Guedes (PSD) e Rosado Fernandes (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 50 minutos.

Página 1527

1527 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Carlos Manuel Luís
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Dinis Manuel Prata Costa
Eduardo Ribeiro Pereira
Emanuel Silva Martins
Fernando Alberto Pereira Marques
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gil Tristão Cardoso de Freitas França
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco d'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Barbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rodrigues Pereira dos Penedos
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel António dos Santos
Manuel Francisco dos Santos Valente
Manuel Joaquim Barbosa Ribeiro
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria José Vidal do Rosário Campos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Vítor Manuel Alves Peixoto
Victor Manuel Caio Roque
Vítor Manuel Lontrão Carola
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António de Carvalho Martins
António d'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado

Página 1528

1528 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
António Paulo Martins Pereira Coelho
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Artur Ryder Torres Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Manuel Marta Gonçalves
Domingos Duarte Lima
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando José da Costa
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Santos Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Jaime Carlos Marta Soares
João Bosco Soares Mota Amaral
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José da Silva Maçãs
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Durão Barroso
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Manuel Cruz Roseta
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Comunista Português (PCP):
Alexandrino Augusto Saldanha
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Cândido Capela Dias
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello Branco
António de Magalhães Pires de Lima
António José Carlos Pinho
António Manuel Alves Pereira
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Mota Soares
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Sacadura Cabral Portas
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
Maria Helena Augusto das Neves Gorjão

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário da Mesa vai dar conta do expediente.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, nos dias 9 e 11 de Janeiro de 2001, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Mota Amaral; ao Ministério da Economia, formulado pela Sr.ª Deputada Helena Neves; ao Ministério do Equipamento Social, formulados pelo Sr. Deputado José Cesário.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados. No dia 11 de Janeiro de 2001: Francisco Louçã, na sessão de 16 de Junho; Hermínio Loureiro, na sessão de 18 de Outubro; João Rebelo, na sessão de 27 de Novembro.
No dia 12 de Janeiro de 2001: Luísa Mesquita, no dia 14 de Setembro; Carlos Martins, na sessão de 4 de Outubro; Luís Marques Mendes, na sessão de 12 de Outubro.
No dia 15 de Janeiro de 2001: Sílvio Rui Cervan, na sessão de 8 de Junho; Manuel Oliveira, no dia 31 de Julho; Maria do Carmo Sequeira e João Rebelo, no dia 30 de Agosto; Natália Filipe, na sessão de 27 de Setembro;

Página 1529

1529 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

Margarida Botelho, na sessão de 4 de Outubro; Vicente Merendas, na sessão de 19 de Outubro, Manuel Moreira, nas sessões de 20 de Outubro e de 8 de Novembro e no dia 10 de Novembro.
No dia 15 de Janeiro de 2001, foram respondidos os requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: José Eduardo Martins, na sessão de 8 de Novembro e Helena Neves, no dia 10 de Novembro.
Em matéria de expediente é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O perigo nuclear está de volta. Dentro dos próximos dias vai cruzar as águas portuguesas.
Plutónio, aquele que é indiscutivelmente o material radioactivo potencialmente mais destruidor do planeta.
Uma carga de plutónio e de urânio enriquecido, perante a irresponsabilidade de um Governo que consegue ter o seu Ministério do Ambiente, quando confrontado, a dizer: «não tenho nada a ver com isso!».
Uma carga de plutónio que bastaria um grama, um simples grama, sublinho, se derramado, para destruir o equilíbrio ecológico e afectar durante milhares e milhares de anos o nosso país.
Uma possibilidade, a de risco de acidente, que não pode ser excluída e que, a acontecer, provocaria danos irreparáveis e de dimensões incalculáveis na nossa vida e no nosso futuro, com consequências que estão muito para além daquilo que o conhecimento humano pode hoje, com rigor, prever.
Danos irreparáveis que significariam a destruição dos nossos ecossistemas, a contaminação de toda a cadeia alimentar, que afectariam, pelo seu elevado potencial cancerígeno, durante gerações e gerações, a saúde dos portugueses.
Perigos que, com estas passagens de plutónio na nossa zona económica exclusiva são inaceitáveis e também na perspectiva da salvaguarda das Regiões Autónomas. Regiões Autónomas, recorde-se, que, no caso da Região Autónoma dos Açores, viu no Verão de 1999 a passagem autorizada de toneladas de plutónio pelas suas águas e que, no caso da Região Autónoma da Madeira, se traduziu, há quatro anos, numa igual carga mortífera que penetrou 40 milhas nos nossos mares.
Riscos inaceitáveis resultantes da passagem de uma carga radioactiva no nosso país, passagem, essa, que envolve o maior perigo para os portugueses e que pode comprometer o nosso desenvolvimento, o equilíbrio, a vida, e sobre a qual não é aceitável o estranho e comprometedor silêncio do Governo do Partido Socialista.
Um transporte que não é singular, que tem ocorrido várias vezes por ano sem qualquer interdição por parte de Portugal. Plutónio e urânio enriquecido procedentes do Reino Unido e de França, com destino ao Japão, para satisfazer um programa nuclear que se prolongará, admite-se, no mínimo, por duas décadas, que envolve transporte marítimo e que, nas suas diferentes rotas, atinge invariavelmente Portugal.
Uma situação de risco nuclear que não é nova, como novo não tem sido o silêncio e a passividade do Governo perante este Parlamento e perante a opinião pública.
Factos para cuja gravidade Os Verdes sistematicamente têm alertado e aos quais se tem oposto, factos que mais recentemente justificaram, em Outubro, a apresentação e discussão nesta Câmara de um projecto de lei que visava precisamente a proibição da passagem destes navios contendo cargas radioactivas na nossa zona económica exclusiva, considerando nós então, como hoje, que a oposição firme do Estado português é indispensável nesta matéria.
Uma exigência política, em nosso entendimento, totalmente pertinente num país como o nosso, que recusou a opção nuclear e que tem o dever político mas também ético, até por solidariedade para com as gerações futuras, de salvaguardar bens patrimoniais que esta passagem de elevada perigosidade, se não impedida, põe irresponsavelmente em perigo.
Assim, Sr.as e Srs. Deputados, não abdicando da autonomia que como país entendemos ter de dever agir no interesse da manutenção da paz e segurança na zona económica exclusiva e da preservação do ambiente, dos seus recursos e ecossistemas costeiros e marinhos;
Face ao direito de Portugal, enquanto Estado costeiro, de se proteger contra potenciais, graves e irremediáveis danos à sua segurança, como objectivamente a passagem destas cargas radioactivas, se autorizada, representa;
Perante o direito que nos assiste como Estado de evocar o princípio da precaução, definido no direito internacional, uma vez que está em jogo, como é o caso, um risco socialmente inaceitável;
Perante o dever do Governo de informar, com transparência e verdade, este Parlamento e todos os portugueses, dever, esse, a que lamentavelmente, muito recentemente, se furtou em torno das questões do Kosovo,
Por tudo isto, Os Verdes sobem a esta tribuna para exigir que o Governo português se oponha à passagem desta carga nuclear na zona económica exclusiva portuguesa, para manifestar a sua oposição a esta passagem nas águas sob jurisdição portuguesa e para apelar a todos os países envolvidos, em nome do direito à vida e da paz, para que abandonem os seus mortíferos programas nucleares.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Isabel Castro, inscreveram-se os Srs. Deputados Natalina de Moura e José Eduardo Martins.

A Sr.ª Natalina de Moura (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Isabel Castro, nós poderíamos estar, e estaremos certamente, comungando sempre das mesmas preocupações quando se trata dos riscos que V. Ex.ª apontou na intervenção que fez da tribuna.
Porém, estamos em condições de a sossegar, porque acabámos de ouvir a informação, que talvez tenha alguma décalage em termos de tempo, de que nenhum navio com essas substâncias percorrerá qualquer dos caminhos que V. Ex.ª mencionou, nomeadamente a zona económica exclusiva portuguesa.
Queria perguntar à Sr.ª Deputada se V. Ex.ª acha que Portugal poderia algumas vezes impedir, em nome do direito internacional, todas as convenções que foram firmadas pelo Estado português e por outros, não acompanhando a passagem dos navios.

Página 1530

1530 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

A Sr.ª Deputada sabe tão bem quanto eu que há padrões que fazem com que essas passagens não sejam feitas a eito, sem desconhecimento e que não haja uma indicação prévia de que os navios vão ou não passar, porque têm de ostentar uma bandeira com esse indicativo e há um acompanhamento que é feito antes, durante e após a passagem.
Pergunto se acha que estamos em condições de quebrar compromissos internacionais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Natalina Moura, começo por agradecer a questão que me colocou.
Este carregamento com urânio enriquecido e plutónio está a sair da central nuclear de La Haag para Cherbourg e, proximamente, vai passar na nossa zona económica exclusiva.
Diz a Sr.ª Deputada que não vai passar na nossa zona económica exclusiva. A afirmação que retenho, porque a partir do momento em que faz esta afirmação está a assumi-la perante o povo português, é a de que este carregamento, que envolve enormes riscos, vai estar fora das 200 milhas. Esse é o registo que aqui fica e que, se se confirmar, entendemos como positivo.
Porém, digo-lhe que estranho, porque a informação que temos é a de que o Comando Naval do continente está a preparar-se para aguardar instruções, porque lamentavelmente o nosso país, que não tem nuclear, recebe instruções da NATO, não lhe é feito qualquer pedido de autorização, limita-se a ser notificado de que vai passar um navio.
Sobre o direito internacional, recordo que Portugal ratificou inúmeros documentos que consagram o direito de precaução e o recurso a aplicar este direito existe sempre que há um risco socialmente envolvido, com gravidade suficiente que o possa justificar.
Na opinião de Os Verdes, quando estamos perante uma carga que, durante milhares de anos, pode comprometer a saúde dos portugueses, quando estamos perante a possibilidade de a paz e o equilíbrio serem atingidos, como é o caso, não temos dúvida, Sr.ª Deputada, de que não temos obstáculos políticos para tomar esta decisão.
Aliás, se fosse certo o que a Sr.ª Deputada diz, muitos dos países que ratificaram, nomeadamente, a Convenção do Mar, nomeadamente o Brasil e a China - e eu sublinho que Portugal ratificou a Convenção com inúmeras adendas, que são suficientemente fortes para salvaguardar e contemplar esta nossa liberdade de poder impedir a passagem nas nossas águas -, não tinham obrigado a que estas cargas passassem fora das 200 milhas.
Portanto, de acordo com o próprio direito internacional, de acordo com o artigo 137.º da Convenção do Mar e com a obrigatoriedade de preservar o ambiente, os recursos e ecossistemas e a manutenção da segurança e da paz na ZEE, é precisamente invocando esses dois artigos da Convenção do Mar, que nós ratificámos, que há toda a possibilidade de agir.
Se o Governo não age é porque não quer.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, terminou o seu tempo. Agradeço que remate.

A Oradora: - Se o Governo garantiu, através da Sr.ª Deputada, que o navio vai passar fora das 200 milhas, então, cá estaremos para ver e, nesse caso, assinalar esse facto.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, como estará recordada, o PSD não pôde aderir à proposta que recentemente fizeram de proibir a passagem de navios com cargas perigosas na zona económica exclusiva não tanto pela discussão que se pode fazer, e que acabou de ser feita, sobre quais os imperativos aplicáveis do direito internacional público em relação às nossas obrigações face às convenções internacionais mas porque essa interpretação já foi feita de forma autêntica pela Assembleia da República em parecer da 1.ª Comissão e, portanto, não vivendo isolados no mundo, não podemos acompanhar essa proposta. No entanto, o que acompanhamos, com certeza, são as suas preocupações, porque elas, nesta matéria, são obviamente legítimas.
Porém, apesar do pouco interesse do Plenário, queria dizer-lhe que o princípio da preocupação não se assegura só pura e simplesmente proibindo a passagem de navios com cargas perigosas na nossa zona económica exclusiva.
O princípio da precaução também fica bem acautelado se tivermos uma vigilância efectiva da nossa costa e se o Governo, em vez de vir propor à Assembleia o aumento de coimas para as infracções que não fiscaliza, tiver um sistema eficaz de fiscalização. E esse sistema é conhecido. O sistema de monitorização computorizada de passagem de navios, o VTC (Vessel Traffic System), que o Governo já duas vezes anunciou ter vontade de implementar mas de que, até hoje, não há sinal.
Portanto, a minha pergunta é esta: no domínio do princípio da precaução e da vigilância que deve ser feita da nossa costa, que, como sabe, é enorme e está sujeita a vários perigos, conhece a Sr.ª Deputada alguma iniciativa do Governo, para além do aumento das coimas proposto em final da sessão legislativa passada? É que eu não conheço!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, consideramos da maior importância a existência de um VTS, razão pela qual, há vários anos, fazemos essa proposta em sede de Orçamento do Estado e também, há vários anos, temos coleccionado chumbos dessas propostas. Temos consciência de que ela é da máxima importância, em todo o caso, estamos a falar de patamares diferenciados.
A nossa argumentação, mesmo que se queira colocar estritamente no plano jurídico, vai no sentido de que o

Página 1531

1531 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

relatório feito pela 1.ª Comissão é discutível, porque permite fazer uma leitura segundo a qual não é passível de ser utilizado o princípio da precaução. Aliás, é uma leitura de tal modo restritiva que duvido que alguém alguma vez, de acordo com aquela leitura, possa vir em qualquer país, se aquilo for correcto, a utilizar o princípio da precaução.
Em todo o caso, chamaria a atenção para o facto de o Dr. Mário Soares, enquanto Presidente da Comissão Mundial Independente dos Oceanos, ter reflectido longamente sobre esta questão. Julgo que a leitura desse documento, associada à leitura atenta das possibilidades que a Convenção do Direito do Mar nos dá, permitiria uma intervenção política sustentada, que manifestamente não o é por razões de obediência a interesses nuclearistas, que não são os nossos.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Sr. José Barros Moura (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradecia que caracterizasse a matéria sobre a qual versa a interpelação.

O Sr. José Barros Moura (PS): - Sr. Presidente, foi feita pela minha colega de bancada, Natalina de Moura, uma afirmação segundo a qual tinha sido oficialmente comunicado que este carregamento não passaria da zona económica exclusiva portuguesa. Tenho informação de que uma nota do Ministério da Defesa e do Ministério do Ambiente se pronuncia claramente neste sentido.
Interpelo a Mesa apenas porque, para clarificação deste debate, será importante que esta informação seja transmitida à Câmara.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tem a possibilidade de obter cópia dessa informação ou documento comprovativo?

O Sr. José Barros Moura (PS): - Sr. Presidente, logo que possível, farei chegar à Mesa essa informação.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada? Não tem direito de resposta.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sob a forma de interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Desculpe, não é «sob a forma de interpelação». Isso pertence ao passado! Qual é a matéria da ordem de trabalhos que põe em causa?

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, julgo que a matéria não é passível de requerimento, porque todos sabemos que os requerimentos não dão, com urgência, satisfação a questões que são politicamente pertinentes como é esta. Parece-nos que toda a informação que o Governo dispõe sobre esta matéria não pode ser classificada, tem que vir rapidamente para este Parlamento, para todos os grupos parlamentares e para a opinião pública.

O Sr. Presidente: - O que é que a Sr.ª Deputada sugere que se faça? Isto porque «tem que vir» é um desejo e eu também o formulo.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, sugiro que a Mesa contacte o Governo e faça chegar ao Governo um pedido que, julgo, será subscrito por todos os partidos, sem excepção.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, não posso substituir-me à figura dos requerimentos ao Governo. Quando muito, posso recomendar urgência na resposta a um ou outro requerimento, mais urgência do que aquela que é exigível em todos os casos. No entanto, não me compete fazer requerimentos ao Governo. Contudo, se me fizer chegar um requerimento, imprimirei a urgência possível.
Srs. Deputados, vamos entrar no tratamento de assuntos de interesse político relevante.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Nazaré Pereira.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No âmbito da Organização de Comércio Mundial da vinha e do vinho, o Regulamento n.º 1493/99, aprovado em 17 de Maio, foram alteradas as regras de destilação voluntária do vinho.
De acordo com o artigo 29.º - Destilação do Uso de Boca (antigamente designada «destilação preventiva») -, a Comunidade Europeia pode apoiar a destilação de vinhos, sendo o preço médio para a campanha, nomeadamente a campanha que concluiu com a última vindima, de 2,5 euros por percentagem de volume hectolitro (cerca de 59$).
O prazo desta intervenção decorreu de 1 de Setembro a 31 de Dezembro, sendo o critério de aprovação a ordem de apresentação das candidaturas em Bruxelas.
Esta informação é certamente conhecida do Governo, que negociou o Regulamento e o tem vindo a apresentar aos portugueses como um documento favorável à viticultura e aos viticultores.
Para um total máximo de apoios concedidos pela União Europeia de 12 milhões de hectolitros nesta campanha, em 22 de Novembro, a Espanha já tinha apresentado candidaturas que totalizavam 4,5 milhões hectolitros e a Itália cerca de 4,7 milhões de hectolitros. Portugal, nessa data (22 de Novembro) tinha apresentado 0 hl de candidatura!

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - No dia 6 de Dezembro, os números presentes para o Comité de Gestão dos Vinhos da União Europeia eram de 7,26 milhões de hectolitros para Espanha e de 5 milhões de hectolitros para Itália. No total, estes e os restantes Estados-membros tinham apresentado candidaturas de cerca de 12,7 milhões de hectolitros, ultrapassando largamente o volume máximo estabelecido pela Comunidade.
Em Portugal, porém, o Ministério da Agricultura apenas em 11 de Dezembro deu a conhecer aos agentes económicos, através de uma circular, as condições e os impressos de candidatura e apenas a 12 de Dezembro submeteu a

Página 1532

1532 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

ajuda comunitária de destilação de boca de 445 000 hl. A proposta foi atrasada e é inferior ao nosso número histórico.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Assistimos, no final do mês de Dezembro, nesta Assembleia, a pedido do Sr. Ministro da Agricultura, no exercício do direito que legitimamente lhe assiste mas numa prova evidente de fraqueza política, a uma intervenção cínica de encanto.
Nessa altura, veio o Sr. Ministro a esta Assembleia elogiar-se pelo sucesso que obteve nas negociações com a União Europeia. Demonstrámos então ao Sr. Ministro quanto desajustada era a sua intervenção.

Vozes do PSD: - Uma vergonha!

O Orador: - Outras bancadas parlamentares, na altura, fizeram o mesmo. O Sr. Ministro vinha ao Parlamento vangloriar-se de ter afinal resolvido os problemas que ele próprio tinha criado e nada trazia de novo.
Porém, nessa altura devia o Sr. Ministro da Agricultura saber que, por sua incapacidade e incompetência política, Portugal e, em particular, os viticultores portugueses tinham perdido quase 3 milhões de contos de ajudas comunitárias. Não o disse! Não lhe interessava! Era um buraco negro (mais um) no ramalhete que tão ao seu jeito nos vinha tentar vender.
Portugal não apresentou em tempo útil candidaturas à destilação do uso de boca, antiga destilação voluntária. Nesse caso, os produtores poderiam inscrever 40% do total de vinho de mesa declarado da melhor das três últimas campanhas. Por incúria do Governo do Partido Socialista, inscreveram «zero».

Vozes do PSD: - É uma vergonha!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por ofício, em fins de Dezembro, o Sr. Ministro da Agricultura informou os agentes interessados da sua incompetência política.
Os agentes económicos foram informados que as candidaturas não foram aceites pela União Europeia porque teriam sido apresentadas apenas em Dezembro, enquanto que as de outros Estados-membros o haviam sido em Setembro, Outubro e Novembro, de acordo, aliás, com o Regulamento e as regras de atribuição das ajudas.
O Sr. Ministro afirmou que «Quando as candidaturas portuguesas foram apresentadas já os valores indicativos relativos à destilação voluntária tinham sido atingidos.»!
Esta intervenção está perdida, apesar de o Sr. Ministro da Agricultura, neste Plenário, interrogado sobre a questão, de passagem por um Sr. Deputado, ter dito que estava a tentar resolver o problema.
No momento em que se considera a hipótese de alargar o plafond de intervenção na União Europeia de 12 milhões para 15 milhões de contos, Portugal, não tendo apresentado candidatura a tempo este ano, corre o risco de perder o seu direito histórico de destilação, comprometendo o futuro do sector em Portugal.
Entretanto, o Governo tenta iludir os viticultores com um pedido de uma intervenção de destilação de crise. Anunciou que, em reunião do Comité de Gestão do Vinho da União, a especificidade da situação portuguesa tinha sido reconhecida. Evitou dizer que só em Fevereiro, na próxima reunião do Comité, se poderá tomar, eventualmente, alguma decisão e que, no caso, evidentemente utópico, de ser considerado todo o volume de candidatura, Portugal perderá, mesmo assim, 1,5 milhões de contos.
O sector vitícola português, por causa desta incapacidade governamental, confronta-se, hoje, com uma profunda crise. O que irão os produtores fazer com os vinhos destinados à destilação? Como colmatarão os produtores a falta de pagamentos pela queima destes vinhos de pior qualidade? Como vai o Governo ultrapassar esta situação de crise em que mergulhou o sector?
O Governo, numa atitude arrogante e inadmissível, informou recentemente os agricultores que não está disposto a cobrir a diferença entre o preço aproximado de 59$ por litro que a União Europeia paga por um preço da intervenção de crise.
O Governo sabe, mas não quer dizer e muito menos assumir responsabilidades, que o álcool vinícola proveniente da destilação de crise não pode ser utilizado no mesmo circuito comercial. Provavelmente, a maioria dele não terá mercado. O que é que os agricultores vão fazer com esse álcool?
Grande parte do vinho para destilação não será abrangido pela destilação de crise. O que é que os agricultores vão fazer com esse vinho? Vão inundar os circuitos comerciais com vinho de qualidade inferior, fazendo alastrar a crise e degradar a imagem de qualidade dos vinhos de Portugal junto dos consumidores?
Mais uma vez, o Governo do Partido Socialista não assume os seus erros. Mais uma vez, o Governo do Partido Socialista cria problemas pela sua governação incapaz. Depois, «assobia para o ar» e pretende que não é nada com ele.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Portugal e os produtores de vinho portugueses serão prejudicados entre 2 e 3 milhões de contos de ajudas comunitárias, porque o Governo não apresentou em tempo útil as candidaturas à destilação voluntária.
O Governo não é capaz de encontrar soluções para a situação que criou, estando a arrastar para uma profunda crise um sector importante da nossa economia. Há adegas cooperativas cuja viabilidade será posta em causa. Há agricultores que, mais uma vez, vão ser sacrificados no «altar do autismo» do Sr. Ministro da Agricultura. A Região do Oeste bem vai sentir essas dificuldades, bem as sente já neste momento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mais uma vez, Sr. Presidente e Srs. Deputados, os agricultores e os agentes económicos deste país ficam a saber da qualidade da governação de quem prometeu tudo e afinal é incapaz de fazer por Portugal e pelos portugueses o que quer que seja. Nem sequer, afinal, é capaz de gerir candidaturas na União Europeia de acordo com um regulamento que este Governo negociou.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Rosado Fernandes e Miguel Ginestal.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

Página 1533

1533 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nazaré Pereira, não posso estar mais de acordo consigo. Todavia, é evidente que tudo isto vem numa sequência de comportamentos interessantes. Começa na própria televisão. Deve ser a única televisão da Europa que, depois dos noticiários, não tem boletim meteorológico! É absolutamente assustador como é que as pessoas não se importam com o tempo que faz lá fora, embora gemam quando chove e quando faz frio! Temos de ir à Internet para sabermos qual é o tempo que vai fazer no dia seguinte. E Deus sabe a falta que faz para todas as actividades económicas. Este ano, por exemplo, mesmo para a construção das grandes obras públicas, isso tem criado atrasos que vão somar milhões de contos de prejuízos.
No que diz respeito ao vinho, porque razão não fazer um anúncio? O Presidente do Instituto da Vinha e do Vinho apresentou a sua demissão. Até se portou honestamente, o que até me surpreendeu, muito embora na pessoa dele não me tenha surpreendido, porque julgo que é uma pessoa séria. Escapou-lhes, porque estão habituados a nada anunciar! O secretismo costuma ser tão grande que até as coisas mais banais se escondem! Escondem-se a datas da prorrogação de determinado tipo de regulamentos. Nunca se sabe se os regulamento são ou não prorrogados. Os regulamentos saem atrasados e depois exigem que os agricultores façam as declarações a tempo e horas. Mandam reformular declarações e depois encurtam o tempo do último prazo.
Nesta confusão de falta de autoridade… Aliás, o problema não é do Ministro da Agricultura. O problema é geral! Falta quem mande e, não havendo quem mande, é uma espécie de albergue espanhol. E nem sequer álcool temos para nos embebedarmos à noite para esquecermos a desdita do dia!…

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Ginestal.

O Sr. Miguel Ginestal (PS): - Sr. Presidente, penso que seria importante informar a Câmara sobre a alteração que a última OCM do vinho impôs relativamente a este processo de destilação.
Como se sabe, a nova OCM do vinho, aprovada durante a Agenda 2000, determinou que, em vez de existir, como acontecia no quadro anterior, um plafond nacional e os países sabiam exactamente qual era a quantidade de hectolitros que tinham à sua disposição para procederem à destilação, não há um plafond nacional, passando a existir um plafond comunitário para a quantidade de 12,5 milhões de hectolitros.
Em Julho, saiu o regulamento desta OCM, que era de aplicação directa e imediata e impunha que os produtores de qualquer Estado comunitário informassem os organismos nacionais competentes, sendo que estes é que faziam chegar a este plafond comunitário as necessidades nacionais.
Dizem os produtores que o Instituto da Vinha e do Vinho não fez uma circular informando os produtores nacionais. Mas, meus amigos, sou capaz de fazer nossas as palavras do Sr. Deputado Rosado Fernandes e dizer que ninguém tem aqui qualquer responsabilidade! A responsabilidade é nacional, com certeza, mas é evidente que os produtores nacionais tinham também a responsabilidade, porque são eles a mola essencial para apresentar as suas candidaturas, e não podem invocar o desconhecimento dos regulamentos comunitários, tal como não podem invocar o desconhecimento da legislação nacional.
Sabendo deste prejuízo efectivo para a agricultura nacional - e sabemos como é fundamental, no nosso sector vitivinícola, que para vinhos de fraca qualidade se possa usar este mecanismo para os transformar em aguardente, sendo que, no caso português, a quantidade é de cerca de 450 000 hl -, consciente desta dificuldade e desta necessidade, o Governo, no Conselho de Ministros da Agricultura, em Dezembro, invocou a necessidade de se abrir também aqui uma excepção para o caso português. Já em Janeiro, como se sabe, esta necessidade foi considerada no Comité Técnico dos Vinhos e o processo negocial que está em curso…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o tempo de que dispunha. Faça favor de concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Como dizia, o processo negocial está em curso e, em Fevereiro, o Governo, junto das instituições europeias, saberá salvaguardar o interesse nacional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, os oradores seguintes são os Srs. Deputados António Martinho, que pediu a palavra para uma interpelação à Mesa, e António Nazaré Pereira, para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados pelos Srs. Deputados Rosado Fernandes e Miguel Ginestal.
Antes de lhes dar a palavra, dado que os jovens estudantes que estão a assistir aos nossos trabalhos já começaram a ausentar-se, e antes que outros o façam, informo que temos hoje connosco um grupo de 50 alunos da Escola Secundária de Alcácer do Sal, um grupo de 45 alunos da Escola Básica n.º 1 de Belas, um grupo de 108 alunos da Escola Secundária Virgílio Ferreira, de Lisboa, um grupo de 41 alunos da Escola Secundária David Mourão Ferreira, de Lisboa, e um numeroso grupo de cidadãos que querem também assistir aos nosso trabalhos.
Uma saudação calorosa para todos eles!

Aplausos gerais, de pé.

Para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados, tem a palavra o Sr. Deputado António Nazaré Pereira.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rosado Fernandes, V. Ex.ª referiu uma situação comum da agricultura e da sociedade portuguesas, mas o próprio Sr. Deputado Miguel Ginestal veio aqui mostrar de quem é a culpa! O Governo não tem culpa de nada, o Governo demite-se de todas as responsabilidades!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Miguel Ginestal (PS): - Está enganado!

Página 1534

1534 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Orador: - O Governo não sabe, não é nada com ele, assobia para o ar!

Vozes do PSD: - É o costume!

O Orador: - Neste caso em particular, a culpa é certamente dos agricultores! No caso do boletim meteorológico, a culpa será provavelmente de Nosso Senhor Jesus Cristo, e S. Pedro também deve ter uma parte da culpa!
De facto, Srs. Deputados Rosado Fernandes e Miguel Ginestal, Itália e Espanha também conheciam os regulamentos e os seus governos também acreditaram que as candidaturas chegariam a Bruxelas apenas por iniciativa dos agricultores. E, de facto, Itália e Espanha, que conhecem os seus agricultores, fizeram as respectivas comunicações e os respectivos impressos a tempo e fizeram chegar à União Europeia, ainda durante o mês de Novembro, uma quantidade tão elevada de candidaturas que põem em causa o futuro das nossas candidaturas nos próximos anos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Isto porque eles, só com as suas candidaturas, ultrapassaram os próprios limites de 12 milhões de hectolitros da União Europeia, sendo que Portugal, até agora, entregou, como disse, cerca de 450 000 hl. Esta candidatura foi entregue a 12 de Dezembro, quando o plafond já tinha sido ultrapassado em 700 000 hl. Srs. Deputados, esquece-se que, quando chegar a altura de invocar, junto da União Europeia, o direito histórico de Portugal, que era de 500 000 hl, verifica-se que nem esse foi comprovado!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas permitam que diga o seguinte: felizmente, os agricultores portugueses podem saber que o PSD não anda a «dormir na forma»!

Aplausos do PSD.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que especifique a decisão da Mesa ou a matéria da ordem de trabalhos que considera estar em causa.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, quero, na qualidade de Presidente da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, dar uma informação à Câmara sobre este assunto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, essa não é matéria de interpelação à Mesa. A simples informação de um presidente de uma comissão não faz parte da ordem de trabalhos.

O Sr. António Martinho (PS): - Mas é sobre o assunto em discussão, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Está bem, Sr. Deputado, mas a verdade é que não faz parte da ordem de trabalhos.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, tenho em meu poder dois pedidos de agendamento de reuniões com urgência e o Sr. Ministro já se disponibilizou a vir cá.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso faz parte da ordem de trabalhos da Comissão, não do Plenário! Por isso, não leve a mal, mas não lhe posso dar a palavra.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde o passado sábado, o Porto, capital do trabalho, passou também a ser capital da cultura.
Durante o ano 2001, o Porto vai centrar as atenções dos europeus, vai promover os valores universais da arte e da cultura, vai saber prestigiar o nome da região e do País perante quem o visitar, vai assegurar que criadores de todos os tempos, de muitas origens e lugares, possam viver e conviver com os seus públicos e para os seus públicos.
Mas o Projecto Porto 2001 não foi, nem é, apenas um vasto e diversificado conjunto de manifestações culturais. Não será apenas uma rica programação cultural, mesmo que sobre ela haja, eventualmente com razões, algumas críticas sobre omissões ou lacunas.
O Porto 2001 foi organizado visando associar à programação cultural a concretização de um vasto conjunto de investimentos que perdurassem bem para além do ano em que quase 500 iniciativas culturais vão ocorrer.
O Porto 2001 visou também captar investimentos para recuperar e construir equipamentos, para proceder a uma vasta operação de requalificação urbana, para concretizar, no futuro, uma profunda recuperação habitacional e uma extensa revitalização económica.
O Porto 2001 é, assim, um projecto complexo cujo desenrolar, até pelas características e objectivos pelos quais optou desde a génese, sofreu, e sofre ainda hoje, demasiados percalços, muitos deles certamente desnecessários e evitáveis.
Recorde-se a crise na liderança da sociedade Porto 2001, com a substituição inesperada e extemporânea do Dr. Santos Silva pela Dr.a Teresa Lago. Recordem-se as demissões de Álvaro Domingues e João Teixeira Lopes, que tiveram papel determinante na génese e no desenvolvimento do projecto.
Recorde-se - é bom não esquecer - o papel que alguns desempenharam mas que o PCP sempre cumpriu (por exemplo, no âmbito da sua participação activa na comissão parlamentar de acompanhamento) para que o projecto prosseguisse, para que a programação, então já delineada, pudesse ser preservada e para que questões orçamentais que a atingiam pudessem, como foram, ser minimamente superadas.
Hoje, o programa cultural está na rua e vai impor-se. Mas há questões que poderiam ter sido tratadas e resolvidas de forma bem diferente.
Não insistiremos com o facto de a sua imagem de marca - a Casa da Música - só vir a estar concluída em 2002. Mas direi, em nome do PCP, quanto é já grande a preocupação sobre o seu futuro modelo de gestão e financiamento.

Página 1535

1535 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Cumpre chamar também a atenção para o facto de o Auditório Nacional de Carlos Alberto e a futura Casa da Animação só «entrarem em cena» bem mais tarde do que o previsto - se calhar, também já não serão úteis durante 2001.
São factos como estes, que poderiam ter sido evitados, que podem vir a apoucar a imagem do Porto 2001 - Capital Europeia da Cultura.
Cumpre também tomar posição sobre as consequências que as obras de requalificação urbana estão a ter no tecido empresarial do pequeno comércio.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Porto 2001 - e os problemas que tem e certamente continuará a ter - não pode ser alvo de intervenções à moda do Velho do Restelo. Contra este tipo de considerações e de intervenções, a população reage, e bem, mesmo aqueles que se manifestam publicamente contra erros que os atingem profundamente.
Mas a honra e o prestígio do evento não admite que haja quem prefira meter a cabeça na areia para não ver as realidades.
O PCP continuará a manter a postura responsável que assumiu desde o lançamento do projecto. É essa postura responsável que faz com que o PCP, ao mesmo tempo que se congratula pela forma como decorreu a inauguração do Porto 2001 e aprecia a valia de uma programação cultural que já está no terreno, entrega hoje mesmo, agora, na Mesa da Assembleia da República, um projecto de resolução que visa contribuir para minorar as consequências negativas que as obras de requalificação urbana provocam na actividade empresarial das zonas intervencionadas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Sílvio Rui Cervan, José Saraiva e Sérgio Vieira, mas o Sr. Deputado Honório Novo não dispõe de tempo para responder a qualquer dos pedidos de esclarecimento.

Pausa.

Tenho a indicação de que o PSD cede ao Sr. Deputado Honório Novo 2 minutos, sendo que o PS e o CDS-PP lhe cedem 1 minuto cada.
Será então melhor serem formulados de seguida todos os pedidos de esclarecimento, respondendo depois o Sr. Deputado Honório Novo a todos conjuntamente.
Para pedir esclarecimentos, tem, então, a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, também para nós, Deputados do CDS-Partido Popular, a realização do Porto 2001, quer no plano cultural, quer no plano da requalificação urbana, quer no plano económico e financeiro de restabelecer e requalificar o tecido comercial do Porto, é muito importante.
Também nós, muito antes do início do Porto 2001, em período de pré-campanha eleitoral, onde seria mais fácil divergir, criar cisões, criticar, tivemos oportunidade de ter uma reunião com a administração e apoiar a iniciativa, os propósitos e os principais vectores que foram apresentados como sendo de promoção da cidade do Porto, da região Norte e do País, deste evento importante a nível europeu, que é o Porto 2001 - Capital Europeia da Cultura.
Também nós, no passado sábado, ficámos contentes com tudo o que correu bem; e também nós ficámos satisfeitos com o início de uma caminhada que esperamos seja frutuosa, não só ao nível da produção e da promoção culturais, mas também ao nível da criação de novos públicos e do incremento dos públicos culturais, cada vez menos elitistas e cada vez mais diversificados e transversais em toda a sociedade portuense.
Mas, Sr. Deputado Honório Novo, objectivamente, há um vector que não cumpre os desígnios iniciais do objectivo do Porto 2001. Esperemos que esse vector não ensombre todo o projecto, e queremos que assim seja, mas, objectivamente, desde o início, havia uma aposta clara, decisiva, na reabilitação do centro urbano. Aliás, foi explicado, tanto pela anterior como pela actual administração, o perímetro do que era entendido por «centro urbano», tendo sido dito que existiria um conjunto de incentivos, directos e indirectos, para que a requalificação urbana pudesse ajudar o tecido económico dessa zona da cidade do Porto. Ora, objectivamente, o que hoje temos, por parte de dezenas e dezenas de comerciantes, são situações muito difíceis, são situações económicas de pré-falência, e o facto de o Porto 2001…

O Sr. Presidente: - Já terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou já concluir, Sr. Presidente.
Como dizia, o facto de o Porto 2001 ser muito importante não nos pode nem deve fazer esquecer essas dificuldades; devemos, sim, actuar em conformidade para colmatar esses problemas.
Sobre isto, gostaria de ouvir a sua opinião, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Saraiva.

O Sr. José Saraiva (PS): - Sr. Presidente, certamente, era uma intervenção como esta que nos faltava a propósito do Porto - Capital Europeia da Cultura 2001. Isto porque o que o Sr. Deputado Honório Novo fez foi chamar a atenção, entregando na Mesa, um projecto de resolução, para ser apreciado por nós, sobre as dificuldades que alguns sectores estão a ter relacionadas com a requalificação urbana na Baixa portuense.
Sendo que nós também nos preocupamos com essas dificuldades, sendo que estamos atentos e procuramos escutar as preocupações dos sectores comerciais, gostaria de saber se o Sr. Deputado Honório Novo me poderá elucidar, assim como à Câmara, sobre a forma como está a ser desenvolvido o processo URBCOM, isto é, o processo de revitalização do comércio, que dispõe de uma fatia de 5 milhões de contos, a qual foi inicialmente subscrita pela Associação dos Comerciantes do Porto e pela Porto 2001, S.A.

Página 1536

1536 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

Já agora, gostaria de saber qual é a razão, porque sei que é uma pessoa informada, porque a Associação dos Comerciantes do Porto não aderiu a esse processo, que muito poderia facilitar a resolução de alguns problemas, que se mantêm.
Devo dizer que a iniciativa Porto - Capital Europeia da Cultura 2001 poderia ser um festival para o qual se dotaria uma verba e organizar-se-iam exposições, far-se-iam representações de teatro, audições musicais. Mas quis ir-se mais além, aproveitando a oportunidade para fazer a maior requalificação urbana de uma cidade há muito necessitada. Este processo baseou-se num esforço do Governo. Permita-me, aliás, salientar, por um lado, o papel desempenhado pelo então ministro da Cultura, Deputado Manuel Maria Carrilho, e pelo então presidente da Câmara, Fernando Gomes, que, com a ajuda de outros ministros (designadamente, o meu colega João Cravinho que, na altura, estava também no Governo), conseguiram carrear um conjunto de verbas que vão facilitar, já este ano, uma renovação esplêndida.
Certamente, o que preocupa o Sr. Deputado Honório Novo também nos preocupa, pelo que tudo faremos para minorar os efeitos visíveis, os quais reconhecemos que existem. Será através de um processo ou de outro? Estamos atentos para o procurar.

O Sr. Presidente: - Esgotou o tempo, Sr. Deputado. Tem de concluir.

O Orador: - Deixe-me, ainda, que lhe diga, Sr. Deputado, já que até não aproveitou a inauguração para se associar aos protestos, no dia da inauguração, como outros o fizeram despudoramente, quero perguntar se conhece a razão da teimosia que grassa…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça favor de concluir.

O Orador: - Terminei, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Vieira.

O Sr. Sérgio Vieira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, nestes últimos dias, a cidade do Porto tem vivido um clima de festa, que resulta da inauguração do evento Porto - Capital Europeia da Cultura 2001. A cidade do Porto teve muito orgulho por ter sido distinguida com a designação «Capital Europeia da Cultura» e, no último sábado, todos os portuenses demonstraram esse orgulho e deram a conhecer a importância que a cidade atribui à realização do evento.
Este acontecimento é determinante para a cidade, mas, Sr. Deputado Honório Novo, permita-me que lhe diga que tenho uma visão um pouco mais crítica da do Sr. Deputado sobre os aspectos negativos da preparação deste evento.
Em primeiro lugar, gostaria de saber se entende ou não que o projecto Porto - Capital Europeia da Cultura 2001 foi completamente desvirtuado ao longo deste último ano.
Há vectores essenciais para o sucesso da iniciativa, como a revitalização económica no comércio e nos serviços, a requalificação habitacional na Baixa do Porto, que ficaram pelo caminho, existindo somente na cidade a requalificação urbana, que não tem qualquer ligação à revitalização económica e social da Baixa do Porto.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Honório Novo, temos também de referir a irresponsabilidade dos dirigentes da Câmara Municipal do Porto e da Porto, 2001 S. A., que, ao longo deste ano, nos brindaram com zangas e desavenças, que levam a que algumas intervenções na cidade, nomeadamente as obras, sejam descoordenadas, não estejam planeadas e decorram a «passo de caracol».
Isto leva-nos, obviamente, a uma questão colocada pelo Sr. Deputado Honório Novo, no final da sua intervenção, questão que muito preocupa o PSD. A questão tem a ver com o estado caótico em que vive a cidade de Porto e a situação difícil, em alguns casos desesperada, em que vivem alguns comerciantes. Nem a Câmara Municipal do Porto nem Porto 2001, S. A. foram sensíveis a esta questão.
V. Ex.ª anunciou que o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentará uma iniciativa no sentido de ajudar a minorar os efeitos negativos que os comerciantes estão a viver na cidade e devo dizer que louvo essa iniciativa. O PSD também terá oportunidade de apresentar uma iniciativa no mesmo sentido, porque é a nós, infelizmente, que compete dar um passo, no Parlamento, para ajudar os comerciantes do Porto.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo para, em 5 minutos, responder conjuntamente aos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, começo por agradecer aos colegas pelo facto de terem cedido tempo para eu poder responder às amáveis perguntas que me colocaram.
O Projecto Porto - Capital Europeia da Cultura 2001 é, obviamente, desde a sua génese, um projecto complexo, diferente e diferenciado, o que se traduz no seu orçamento, sendo que a parte de programação cultural, que, aparentemente, é a que motiva a razão de ser do projecto, não ultrapassa os 12 ou 13% do orçamento global da iniciativa.
É, portanto, um projecto que visava aproveitar o momento para operar uma transformação na cidade, estabelecendo uma ponte para o futuro ou, se quiserem, várias pontes em termos de infra-estruturas e dos seus públicos.
Visava concretizar investimentos durante o ano em curso, inevitável e incontornavelmente, as obras dos equipamentos culturais novos e as obras de requalificação urbana, mas postergava toda a intervenção e todo o programa relativo à recuperação habitacional e à revitalização económica.
O projecto é uma ideia, é um programa, é um plano que necessariamente não se esgota em 2001.
Poderia, na parte em que deveria estar concretizado, ter corrido melhor? Sem dúvida! A posição do PCP foi, desde o início, uma posição de responsabilidade.

Página 1537

1537 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

Tomámos posições públicas. Apresentámos, no seio autárquico, mais de 15 recomendações: ao nível da segurança, da articulação, da coordenação e muitas delas foram rejeitadas municipalmente pelo PS… Mas essa é outra conversa, que não interessa referir hoje. Tivemos uma participação activa no âmbito da Comissão de Acompanhamento do Porto 2001 - Capital Europeia da Cultura.
Não estamos satisfeitos pelo facto de haver coisas que deveriam estar concluídas a curto prazo e não o vão estar, como já referi na minha intervenção, mas não quisemos, como alguns, que tudo estivesse pronto em 2001, porque desde o princípio isso não estava previsto. Isto não pode ser esquecido, esta informação não pode ser manipulada ao sabor de cada um, ao sabor das conveniências ou das tácticas pré-eleitorais.
Por isso, sendo responsáveis, criticando o que temos que criticar, não podemos, não queremos, nem iremos adoptar uma posição de Velhos do Restelo, aproveitando descontentamentos justos e legítimos, situações graves e preocupantes, para fazer baixa política.
A nossa preocupação é responsável e por isso não nos manifestamos apenas preocupados, porque nessas preocupação já todos nos encontramos.
O que importa é passar da preocupação ao acto, do discurso à acção, e foi isso que fizemos hoje.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Apresentamos um projecto de resolução, que convidamos à recolha do consenso desta Câmara, que visa resolver problemas, criar linhas de crédito de juros bonificados para os comerciantes e as empresas atingidas, convidar o Governo para tomar medidas que ajudem a resolver esta questão do ponto de vista económico e financeiro e, finalmente, Sr. Deputado José Saraiva, fazer com que o Governo, como parte interessada, intervenha no diálogo para resolver o problema do financiamento da URBCOM.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Ao abrigo do n.º 2 do artigo 81.º do Regimento, tem a palavra o Sr. Deputado Cândido Capela.

O Sr. Cândido Capela (PCP): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Desde há anos que de, Orçamento em Orçamento, milhões de contos são transferidos para o sector privado da economia como subsídios à revitalização da actividade industrial, através da criação, expansão ou modernização de empresas. Os programas sucessivos, apoiados em diagnósticos onde se identificam as áreas estratégicas, subsidiam investimentos corpóreos e incorpóreos considerados vitais para o aumento da produtividade, a eficiência energética, a gestão ambiental e qualificação dos recursos humanos e a competitividade.
A indústria têxtil é, e foi, uma das destinatárias e beneficiárias desse esforço colectivo de ultrapassar constrangimentos e evitar a morte prognosticada por tecnocratas apressados.
A prova de vida do sector têxtil e do vestuário está na balança comercial: a exportação de produtos têxteis continua a evidenciar um peso relativo que não pode ser ignorado. Não se confirmaram, portanto, os vaticínios mais pessimistas.
A reestruturação e modernização do sector é uma realidade, ainda que aquém do desejado. A confirmá-lo estão as restrições (alguns dirão penalizações) contidas no POE, nos sistemas de incentivos SIPIE e SIME, que, ao não majorar os projectos localizados no Vale do Ave, sub-região de quase monoindústria têxtil, indiciam da parte do Governo a intenção de ser mais exigente, mais selectivo, naturalmente por considerar que se atingiu um grau razoável de modernização.
Resta, para uma avaliação de alguns dos principais propósitos dos programas, apurar a evolução de outros indicadores, como a qualificação profissional, as condições de trabalho e a questão salarial. Porque, convém recordar, também foi no pressuposto de ganhos futuros que os trabalhadores aceitaram participar no esforço colectivo, primeiro na qualidade de assalariados das empresas envolvidas, depois como contribuintes.
Em resumo, pode dizer-se, sem receio de desmentido, que, face aos dados disponíveis, se cumpriu parte fundamental das metas previstas e nesta apreciação positiva convergem as opiniões mais variadas, desde associações empresariais a organizações de trabalhadores e ministérios. No que não haverá consenso é na repartição dos resultados.
A greve, a desencadear pelos trabalhadores têxteis e do vestuário, é antes de mais a expressão pública de um descontentamento e a revolta pela recusa de parte do patronato de minimizar os custos da operação de modernização.
A parte do patronato que aposta nos baixos salários, nos elevados ritmos de trabalho, como alternativa à introdução de novas tecnologias, faz prevalecer a sua lógica conservadora, a sua visão passadista, que sustenta a viabilidade das empresas na máxima exploração dos trabalhadores, enquanto no parque de estacionamento exibe as máquinas do último modelo.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Mas a greve é também um sinal de alarme para o Governo, pelos fundamentos da recusa das negociações directas. Se, depois de tanto subsídio, o sector não suporta um salário médio superior ao salário mínimo nacional, então, é caso para dizer que alguns dos objectivos propostos não foram alcançados, é sintoma de desvio entre o previsto e o realizado que tem de ser esclarecido devidamente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: É por estas atitudes, por estes comportamentos, que as populações do distrito de Braga andam desconfiadas e descontentes. Desconfiadas, porque fartas de promessas não honradas. Descontentes, porque a passividade é suspeita e beneficia o infractor.
A vida ensinou o povo a ser mais exigente e a não se conformar. Como o demonstra a luta dos trabalhadores da

Página 1538

1538 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

Grundig, que não se submetem às piruetas de um patronato habilidoso. Como a recusa das populações e autarcas da Apúlia em aceitar a exploração desenfreada do caulino e das areias. Ou os cidadãos e eleitos autárquicos de Barcelos, Famalicão, Braga e Guimarães, que rejeitam opções com impactes negativos na qualidade de vida. E também os populares da Morreira, de Trandeiras e de Celeirós, que se erguem em defesa dos seus centros cívicos.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sem esquecer os jovens, os estudantes, que, lado a lado com os professores e funcionários, exigem melhores condições nas escolas.
Perante a natureza e a profundidade do descontentamento, espera-se que o Governo não se ponha à margem. Perante a insatisfação das populações e dos autarcas fiéis ao povo, o Governo não pode ficar indiferente, esperando-se que, entre relatórios convenientes e as pessoas, fique do lado dos cidadãos. Perante a denúncia dos trabalhadores e dos empresários inconformados com opções ministeriais contraditórias, numa prática permissiva que potencia situações de concorrência desleal, exige-se do Governo que observe melhor antes de julgar, mas não fique imóvel.
Porque imóveis, Sr.as e Srs. Deputados, são as estátuas e todos sabemos o que as pombas lhes fazem.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Ao abrigo do artigo 83.º, n.º 2, do Regimento, o Governo fez inscrever uma participação do Sr. Ministro da Justiça.
Tem a palavra, Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça (António Costa): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há cerca de um ano, tive oportunidade de me dirigir à Assembleia da República, em duas ocasiões particularmente relevantes: aquando do debate do Programa do Governo e aquando da interpelação do CDS-PP sobre a «crise da justiça».
Pude então apresentar os objectivos estratégicos da nova agenda da justiça, enunciar as prioridades do Governo e explicitar o calendário de execução com que nos comprometíamos perante VV. Ex.as e o País.
Passo a passo, cumprimos todos os compromissos que assumimos para este primeiro ano: da entrada em vigor da nova lei tutelar educativa, à reorganização da estrutura de investigação criminal; da simplificação da vida dos cidadãos e das empresas, à garantia de igualdade de oportunidades no acesso ao direito e aos tribunais; do programa especial de recuperação de pendências, à reforma orgânica do Ministério; do reforço e modernização dos meios, à simplificação das leis processuais.
Não posso, aliás, deixar de saudar calorosamente a Assembleia da República, na pluralidade de todas as suas bancadas, pois muito do que foi feito não seria possível sem o seu contributo decisivo, legislando, autorizando o Governo a legislar, ou apreciando a actividade legislativa do Governo.
Impõe-se, obviamente, acompanhar e avaliar os efeitos deste conjunto de medidas, com espírito crítico e humildade, para podermos corrigir o que houver a corrigir e melhorar o que for possível melhorar. Neste sentido, contratámos com o Observatório Permanente da Justiça Portuguesa a monitorização dos primeiros meses de aplicação das recentes inovações processuais, cujos resultados serão conhecidos em Julho próximo e de que daremos conta, de imediato, à Assembleia da República.
Importa agora não ficar parado a contemplar o trabalho já realizado, porque ainda temos, todos, muito trabalho para realizar. Desde logo, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, e centrando-me, por limites de tempo, nas medidas legislativas que exigem a intervenção da Assembleia da República, o conjunto de medidas que há um ano vos anunciei como de médio prazo: a reforma do contencioso administrativo, do regime geral das contra-ordenações e a revisão do regime dos recursos e da acção executiva, que concluiremos este ano, conforme o previsto.
Permitam-me duas palavras sobre o contencioso administrativo e a acção executiva.
Está concluído o debate público dos ante-projectos da reforma do contencioso administrativo. Estão publicados os textos dos diversos colóquios realizados em todas as Faculdades de Direito, o relatório do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa sobre justiça administrativa e o estudo pioneiro da Andersen Consulting sobre a auditoria que efectuou aos tribunais administrativos.
Ontem mesmo, concluí o despacho que decide as diversas questões suscitadas no debate público, dando uma orientação política precisa ao Gabinete de Política Legislativa e Planeamento para a revisão dos ante-projectos, até final de Fevereiro, de modo a que as propostas de lei possam dar entrada na Assembleia da República durante o mês de Abril.
Trata-se de uma reforma integral do contencioso administrativo, que abrangerá também uma nova lei de responsabilidade civil extracontratual do Estado e da Administração. Mas trata-se, sobretudo, da ruptura radical com um modelo de privilégios da Administração na sua relação com os cidadãos.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - A Administração ficará também sujeita ao pagamento de custas, poderá ser condenada como litigante de má fé e condenada em sanções compulsórias que garantam a pronta execução das decisões judiciais favoráveis aos particulares.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Também na acção executiva é necessária uma ruptura com o modelo vigente, que se converteu, como todos sabemos, no maior bloqueio ao funcionamento do sistema judicial. E, por ironia, num benefício para o infractor.
Partimos de um princípio básico: aos tribunais deve estar reservada a resolução das questões jurisdicionais, as questões em que, para a resolução de um litígio, é necessário afirmar o Direito no caso concreto. Resolvido o litígio, esgota-se a função jurisdicional. O Direito está dito, cabendo à administração executar, sujeita, obviamente, ao controlo judicial.
Não faz sentido impor a um cidadão, que já obteve uma decisão judicial, que tenha de iniciar um novo processo,

Página 1539

1539 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

agora para executar aquela decisão. Assim como não faz sentido sujeitar o tribunal que já decidiu a decidir novamente, agora da execução da sua própria decisão. As decisões judiciais cíveis, tal como acontece com as penais, devem ser imediatamente exequíveis.
Por outro lado, devemos extrair todas as virtualidades da existência de outros títulos executivos para além das sentenças judiciais.
Proporemos, por isso, a exemplo do que acontece em França, que aos solicitadores sejam atribuídos os poderes próprios dos huissiers de justice, confiando-lhes o poder de executar os créditos titulados por outros títulos executivos, que não as sentenças, sem prejuízo, naturalmente, de os executados poderem fazer intervir o tribunal, se e quando os seus direitos estiverem a ser violados.
Esta estratégia de desjudicialização será prosseguida de modo sistemático, diversificando a capacidade de resposta do sistema de justiça às solicitações dos cidadãos que exigem - e têm de obter - uma resposta pronta: apostando na resolução alternativa de litígios, pela mediação, conciliação e arbitragem, que serão objecto de uma lei de bases a apresentar a esta Assembleia da República em Setembro próximo; apoiando, repito-o, o projecto de lei do Partido Comunista Português sobre a criação dos julgados de paz, que gostaríamos, ainda este ano, de poder começar a instalar em regime experimental; mas também reencaminhando para outros serviços do sistema de justiça - como o Notariado ou as Conservatórias - vários dos processos especiais, ou de jurisdição voluntária, que não pressupõem, necessariamente, a existência de um verdadeiro litígio, ou fazendo intervir o Ministério Público sempre que está tão-só em causa o suprimento de incapacidades ou a tutela de interesses de terceiros.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Apresentaremos, muito em breve, para discussão pública, uma proposta global de redistribuição de competências, de modo a permitir aos tribunais desempenhar eficaz e exclusivamente a função que lhes compete em exclusivo: a garantia dos direitos dos cidadãos.
Em duas outras áreas fundamentais suscitaremos a intervenção legislativa da Assembleia da República na presente sessão legislativa: na formação de magistrados e na reforma do modelo de financiamento do sistema de justiça.
Na formação de magistrados importa aproveitar os dois anos que medeiam entre a conclusão da licenciatura e a admissão ao curso de auditores para consagrar a função de assessor como um percurso vestibular do acesso à magistratura. Mas importa também não esgotar a atenção e o esforço do Centro de Estudos Judiciários na formação inicial, reorientando a sua acção para a formação contínua e especializada ao longo de toda a carreira dos magistrados.
No que respeita ao modelo de financiamento temos de extrair todas as consequências da jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e dos tribunais tributários, que condenaram, irreversivelmente, um modelo assente em receitas emolumentares desproporcionadas do custo do serviço e penalizadoras das condições de competitividade da nossa economia.
Por fim, apresentaremos à Assembleia da República um pacote de medidas que visam reforçar as condições de combate à criminalidade económica e financeira, designadamente medidas que agilizem o acesso à informação bancária e a prevenção e repressão do branqueamento de capitais.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Trata-se não só de reforçar a operacionalidade do combate à criminalidade económica e financeira…

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, terminou o seu tempo. No final do debate dispõe de mais 5 minutos.

O Orador: - Estou mesmo a terminar o meu discurso, se V. Ex.ª me permitir.

O Sr. Presidente: - Permito que remate, Sr. Ministro.

O Orador: - Mas trata-se, também, de um sinal político claro de que o Governo e a Assembleia da República não se conformam com a ideia de que há um certo tipo de criminalidade que se pode considerar impune em Portugal.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tal como há um ano, entendi ser meu dever informar lealmente a Assembleia da República do que, passo a passo, nos propomos fazer e comprometer-me publicamente com um calendário, de modo a que, como sempre, possa ser responsabilizado por VV. Ex.as.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Como sabem, Srs. Deputados, há uma grelha própria para estes debates ao abrigo do artigo 83.º, n.º 2, do Regimento.
Como o Sr. Ministro da Justiça já gastou os 10 minutos a que tem direito inicialmente, só pode dispor de mais 5 minutos no final.
Entretanto, inscreveram-se sete Srs. Deputados para intervir.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, ouvi com atenção a sua declaração. Esta Assembleia já foi várias vezes chamada a discutir iniciativas legislativas, ou do Governo ou de várias bancadas, do domínio que tratou nesta intervenção.
Terminou a sua intervenção - e acolho, naturalmente, com toda a atenção, esse alerta - dizendo-nos que se submetia à responsabilidade deste debate. Naturalmente assim deve ser. Quero, entretanto, colocar-lhe uma questão, que vem na esteira de debates que tivemos aqui na Assembleia, que tratou em intervenções anteriores, mas que, no entanto, não aparece nesta sua intervenção, nem sequer - a não ser, porventura, de uma forma indirecta -, no elencar das medidas que nos apresenta.
A Assembleia discutiu, em regime de debate de urgência, matérias que têm a ver com a prescrição de processos

Página 1540

1540 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

judiciais. Tivemos esta semana a confirmação (não a notícia) da prescrição de um dos mais importantes dos casos que a justiça portuguesa discutia, o caso Partex, em que estão envolvidas verbas astronómicas que têm a ver, precisamente, com má utilização de recursos do Fundo Social Europeu e de outras verbas públicas e de verbas comunitárias, para os quais não há culpa formada, não havendo, portanto, processo judiciário.
Ora, se nos diz, como disse, que em matérias como branqueamento de capitais, ou, em geral, crimes de «colarinho branco», é preciso uma outra atitude responsável, uma outra intervenção e uma capacidade de perseguir o crime e de levar a tribunal todos os casos fundamentais, estamos perante um paradoxo: é que a justiça portuguesa só obtém a credibilidade de que precisa se, em casos tão essenciais como estes - e aqui está uma oportunidade perdida -, for capaz de os levar a tribunal e de punir os responsáveis sempre que houver provas bastantes a este respeito.
É necessária uma nova atitude…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo. Agradeço que remate.

O Orador: - … e, naturalmente, medidas que, espero, possa anunciar a esta Câmara.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, quando V. Ex.ª aqui esteve, há um ano, eu disse-lhe que o carácter vago e impreciso do Programa do Governo na área da justiça e uma grande agitação, que se vinha desde logo fazendo nas pequenas medidas pontuais, levavam-nos a antever que o Governo e o PS queriam ficar pelos «remendos».

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E é exactamente isso que se vê ao longo do exercício do mandato de V. Ex.ª.
Também lhe lembrei que V. Ex.ª tinha uma herança, não do anterior ciclo político, mas uma herança do seu antecessor, que era a de a justiça ter, nesse mandato do Dr. Vera Jardim, descido o mais fundo possível como jamais tinha acontecido em Portugal.

Vozes do Sr. Ministro da Justiça e do PS: - Não apoiado!

O Orador: - Fomentando a conflitualidade entre os agentes judiciários, que teve aquele episódio conhecido da demissão do Director da Polícia Judiciária, instalou-se um clima de total descredibilidade da justiça.
E quando eu pensava que o Sr. Ministro vinha aqui convencer-nos do acerto das soluções que vem tomando, trazendo resultados a esta Assembleia, V. Ex.ª limitou-se a recapitular essas medidas, que nós sabemos que têm sido tomadas, e a anunciar aquelas que vai tomar. Ou seja, V. Ex.ª confirmou os «remendos» anteriores e veio dizer-nos que vai continuar a fazer os «remendos» seguintes.
Não há, da parte deste Governo, através de V. Ex.ª, em matéria de justiça, uma vontade de se fazer uma reforma de fundo na justiça. Esta é uma questão elementar.
Naturalmente que V. Ex.ª não nos traz os resultados porque não os tem. E nós queríamos saber o que é que resultou da medida tomada, em sede orçamental, de constituir isenções e reduções para se fomentar as transações judiciais.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Qual é o levantamento que V. Ex.ª faz disso? Queríamos saber qual é, efectivamente, a recuperação que há no âmbito do andamento dos processos. Queríamos saber se há, efectivamente, uma recuperação sensível. E V. Ex.ª nada nos disse sobre isso.
Falou na Lei Tutelar Educativa. Mas nós sabemos que V. Ex.ª não tomou a tempo as medidas com vista à criação das estruturas necessárias para dar resposta a esta matéria; tem o problema do apoio judiciário, que está a gerar um pandemónio relativamente à insuficiência da resposta da segurança social a esta solução;…

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Só se for na Madeira…

O Orador: - … aumentou as custas e criou um sistema de empréstimo forçado, em relação a preparos, que é o contrário do que V. Ex.ª diz. Nós queremos uma justiça para o cidadão, mas V. Ex.ª não está a fazer a justiça para o cidadão, que espera respostas concretas deste Governo e não as tem.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados, antes de mais, uma palavra para o Sr. Ministro da Justiça, dada a sua isolada ânsia reformadora, que o CDS-PP tem acompanhado de perto. Num Governo que reforma com dificuldade, que está preso a interesses muito claros, V. Ex.ª é uma excepção, embora nem sempre estejamos de acordo com as suas reformas. Mas tem um sentido reformista concreto e de dimensão, que é uma coisa importante e que não queríamos deixar de sublinhar.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Até reformou o Governo!

O Orador: - É verdade, até o próprio Governo conseguiu reformar - dizem-me, e com muita razão!
Só foi pena não ter ido mais longe!

Risos do CDS-PP.

Sr. Ministro, a questão que quero colocar-lhe é muito simples - tenho de ser breve: tem a ver com o Decreto-Lei n.º 320-B/2000, de 15 de Dezembro, relativo às custas e aos preparos. O que se passa é que V. Ex.ª alterou, não o montante dos preparos - foi hábil nesse domínio -, mas, sim, o valor da Unidade de Conta de 14 para 16. No

Página 1541

1541 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

entanto, o facto que mais se destaca é a alteração da fórmula do cálculo, porque, com estas alterações, há preparos iniciais cujos aumentos atingem os 600%!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Ou mais!

O Orador: - Mais, há preparos, recursos e providências cautelares cujos aumentos atingem cerca de 800%!
Ora, nós estamos de acordo com a simplificação da justiça e com o facto de os processos andarem mais depressa. Aliás, desta bancada, nomeadamente pela voz do meu colega Narana Coissoró, V. Ex.ª tem tido o apoio necessário para esse efeito. No entanto, uma coisa é ter em vista essa intenção louvável, outra é os processos que subsistem avançarem por deixar de haver processos, já que as pessoas não têm dinheiro para litigar. Isso é que é grave! O acesso à justiça para todos, particularmente aos de mais frágeis recursos - e, como V. Ex.ª deve saber, os procedimentos de auxílio judiciário estão empatados -, é que nos preocupa!
Sr. Ministro, o que é que se passa com isto? Isto é para levar até ao fim, ou V. Ex.ª pretende alterar com alguma brevidade este nefasto Decreto-Lei n.º 320-B/2000?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Dias Baptista.

O Sr. Dias Baptista (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, assistimos hoje a mais uma extremamente relevante comunicação do Sr. Ministro da Justiça, que o PS queria destacar e salientar. Queria fazê-lo porque ela vem na linha da sua actuação reformista, como aqui já foi dito, e que eu chamaria de reformadora.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Digo isto porque o Sr. Ministro tem posto em prática o compromisso assumido de mobilizar a justiça ao serviço da cidadania e do desenvolvimento. Manifestamente, o Sr. Ministro tem conseguido este desiderato, restando saber como e porquê. Está a consegui-lo porque está a tomar as medidas necessárias para que venhamos a ter uma justiça mais rápida e eficiente, mais próxima e acessível aos cidadãos.
Aliás, nesta área, gostava de destacar duas notas que são extremamente importantes e que demonstram uma nova forma de encarar a cidadania e o respeito que os cidadãos merecem na colaboração com a justiça. Esta é uma matéria que, normalmente, temos tendência para esquecer, mas que importa trazer à liça e à colação, exactamente para realçar a forma como o Sr. Ministro a está a tratar: muito bem! Refiro-me ao devido respeito que é dado às testemunhas que se predispõem a colaborar com a justiça. Esta é, normalmente, uma situação que temos tendência a postergar, a deixar cair, e à qual o Sr. Ministro, e muito bem, está a dar o devido destaque. Está o Sr. Ministro a fazê-lo de duas maneiras. Em primeiro lugar, através da alteração que introduziu na lei, que faz com que acabe aquele escândalo de obrigar as pessoas que querem que se faça justiça a serem prejudicadas na sua vida particular pela falta de qualquer outro interveniente, sendo depois obrigadas a voltar ao tribunal.

Protestos do Deputado do PSD António Montalvão Machado.

Tenha calma, Sr. Deputado!
Acontece que, com as alterações que o Sr. Ministro introduziu na lei, passa a ser possível que a testemunha não seja prejudicada pela ausência de um qualquer outro interveniente no processo, podendo, assim, colaborar com o desiderato fundamental, a efectivação da justiça.
A segunda forma, igualmente importante, através da qual o Sr. Ministro está a procurar alcançar este objectivo é a informatização do sistema judiciário. Este facto permite, por exemplo, através do sistema de videoconferência, já instalado em todos os tribunais do País, que as testemunhas possam mais facilmente prestar o seu depoimento, dando, de novo, primazia à importância da participação da cidadania no desenvolvimento e na aplicação da justiça.
V. Ex.ª não se ficou, no entanto, por aqui (e, se tivesse ficado, já não teria feito pouco). Algo mais tem vindo a ser feito para combater esse drama - porque é de um drama que se trata - do número terrível de pendências existentes. Nessa matéria, ao contrário do que o PSD fez, há que destacar uma questão importantíssima, que é o facto de, pela primeira vez em Portugal, ter sido preenchido o quadro de oficiais de justiça, ocupando-se mais de 1000 lugares. Tal aconteceu pela primeira vez em Portugal, o que é importantíssimo. Realço e destaco este facto porque é desta forma, criando meios humanos e materiais, que mais facilmente se pode e deve colaborar com a justiça.
Gostava, nesta linha de pensamento, de destacar uma nota que me parece importantíssima, dentro do que V. Ex.ª hoje comunicou a esta Câmara. Falo do combate à criminalidade económica e financeira, notícia que o PS registou com agrado, sobretudo porque, como todos sabemos, uma das coisas de que a justiça é normalmente acusada é a de deixar impune o crime de «colarinho branco». Como tal, ficamos a aguardar, já que o Sr. Ministro tem vindo a cumprir todos os compromissos por si assumidos, que venha a apresentar a esta Câmara uma medida que contribua para acrescentar mais justiça à cidadania e ao desenvolvimento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, devo confessar que, nos últimos dias, já trago em frente dos olhos balanças e mais balanças! Isto porque, quando me dirijo a uma caixa Multibanco, aparece-me o anúncio das medidas relativas à justiça e à qualidade da justiça! Quando vejo televisão, lá vem a justiça, que, dizem, agora será célere!

O Sr. Dias Baptista (PS): - Óptimo sinal!

Página 1542

1542 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

A Oradora: - Vou aos tribunais e vejo uns cartazes com umas pessoas sentadas, representando a justiça à moda antiga, quando se esperava muito tempo, com um ar muito chateado! Todavia, continuo a ver pessoas chateadas nos tribunais, apesar destas medidas, porque, agora, os juizes, mesmo que saibam que não podem fazer todos os julgamentos que estão marcados, não podem adiá-los. Vai daí, as pessoas estão até às 19 horas à espera que o Sr. Dr. Juiz comece aquele julgamento. As coisas não são assim tão maravilhosas como o Sr. Ministro da Justiça aqui veio dizer!
Por acaso, tenho alguma tendência para comparar o que se tem feito na área da justiça com uma intervenção que V. Ex.ª produziu no início do seu mandato, dizendo que já se tinham feito reformas suficientes e que era tempo de assentar e de pôr as reformas que estavam feitas a andar. Bom, creio que, de facto, se tem feito muita coisa, mas V. Ex.ª não honrou esse seu compromisso. O que me parece é que tem sido feita muita coisa, mas de uma forma desordenada e sem que se vislumbre nisto tudo um fio condutor.
Se o Sr. Ministro pensava fazer as mediações - e ainda bem que se fizeram -, por que motivo «disparou» noutro sentido, atirando para cima dos advogados as notificações, ou seja, funções do Estado e dos oficiais de justiça?!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É verdade! O Estado demite-se das suas funções!

A Oradora: - Se está preenchido o quadro dos oficiais de justiça, por que é que precisam dos advogados para desempenhar essas funções?!
Colocam-se ainda muitas outras questões, e é por isso que o questiono quanto ao que, no Processo Civil, está estatuído em relação às testemunhas. Isto porque, de facto, com o novo sistema, as pessoas, nomeadamente as pessoas carenciadas que não têm capacidade para suportar a deslocação de uma testemunha, vão estar sem testemunhas nos tribunais. Pergunto se é assim que se faz justiça.
Por fim, Sr. Ministro da Justiça, não tenho tempo para me referir às questões que já está a colocar a lei do apoio judiciário, nomeadamente na justiça do trabalho. Estas são questões graves e pergunto-lhe se pensa alterar isto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, antes de mais, queria dizer que partilho de algumas críticas e observações que aqui foram feitas a propósito deste incessante marketing político que tem sido feito às medidas tomadas. Queria referir-me a um em particular, que é falso. É falso dizer que as testemunhas não têm de se deslocar ao tribunal!
Sr. Ministro, ouvi com acostumado interesse a intervenção de V. Ex.ª e pouco ou nada divisei sobre o impacto, o efeito ou a repercussão nos tribunais da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto. Tal diploma tem como destinatários, entre outros, os advogados, e ao impor, a partir de 1 de Janeiro de 2001, que os advogados se notifiquem uns aos outros de tudo quanto requeiram, aleguem ou juntem aos processos, o Governo decidiu transferir para eles um enorme encargo, oneroso e complexo, que pertencia e devia continuar a pertencer ao Estado. O pior é que os principais prejudicados com tal originalidade não são apenas os advogados, mas, muito fundamentalmente, as partes e, portanto, os particulares, ou seja, os cidadãos.
As questões que coloco são as seguintes: o Sr. Ministro tem estado atento às reacções nacionais, distritais e locais que todos os advogados portugueses têm demonstrado e evidenciado em relação à entrada em vigor dessas normas? O Sr. Ministro tem estado atento às moções distritais, votadas por centenas e centenas de advogados portugueses, de completa rejeição, de total crítica e de absoluta censura a tais medidas normativas?
Admitindo que a resposta a estas questões é afirmativa, pergunto-lhe ainda, pedindo-lhe que não espere por Julho, que medidas de correcção tenciona tomar. Se algumas, diga quais. Se nenhumas, não poderemos deixar de constatar que V. Ex.ª é completamente insensível e manifestamente indiferente ao sentimento dos destinatários das normas, mesmo que os menospreze, os desmereça ou despreze.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, a quem o Partido Ecologista Os Verdes concedeu 2 minutos.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, faz todo o sentido que V. Ex.ª faça reformas, atento o estado da justiça em Portugal. O que não faz sentido é que procure promover essas reformas contra a vontade e o entendimento das profissões judiciárias, chegando mesmo a rejeitar a sua colaboração. O Sr. Dr. Montalvão Machado citou alguns exemplos e eu vou citar o último. O que se passa é que, pela primeira vez, uma organização corporativa tem uma reacção em bloco contra V. Ex.ª, ou seja, contra o Ministro da Justiça e contra estas reformas.

O Sr. Ministro da Justiça: - Organização corporativa?!

O Orador: - Chamo a sua atenção para uma petição que a Ordem dos Advogados está a promover e que termina dizendo o seguinte: «Mandaria a prudência que as sugestões e as críticas dos profissionais do sector fossem escutadas, tanto mais que não parece fácil nem razoável levar a efeito qualquer reforma contra a sua massiva opinião. Mas, porque ao contrário do que seria de esperar as modificações em causa desprezaram totalmente a comunidade jurídica e judiciária, é altura desta se fazer escutar pelos seus representantes.».
Esta petição tem como primeiro subscritor o Bastonário da Ordem dos Advogados, Sr. Ministro!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró, a quem o Partido Socialista cede 1 minuto.

Página 1543

1543 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, queria chamar a sua atenção para o facto de, talvez por distracção mas nunca por discriminação, V. Ex.ª ter deixado o Deputado Dias Baptista, do PS, falar durante 4 minutos e 19 segundos! Não vou pedir que me deixe falar durante tanto tempo, mas queria chamar a sua atenção para o facto de tal ter sucedido!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, dê-me licença que o interrompa antes de «embarcar» nesse seu reparo.
O que sucede é que o PS ainda dispõe de 2 minutos e 41 segundos para participar no debate, podendo administrá-los como quiser. Ora, os Srs. Deputados não têm estado a formular pedidos de esclarecimento, mas, sim, a participar num debate para o qual as bancadas dispunham do tempo que, inicialmente, estava indicado no painel. Não se trata, portanto, de pedidos de esclarecimento, nem eu alguma vez durante este debate falei nessa figura. Pelo contrário, dei sempre a palavra aos Srs. Deputados para participarem no debate, pelo que o seu reparo, neste caso - desculpe que lho diga -, não tem a menor justificação, embora todos sejamos susceptíveis de nos enganarmos, o que me tem acontecido algumas vezes.

O Orador: - Não tem importância, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Nenhuma, Sr. Deputado!

O Orador: - Sr. Ministro, queria fazer-lhe duas ou três perguntas. Em primeiro lugar, queria saber se V. Ex.ª não poderia, um dia destes, vir aqui à Assembleia para nos dar o quadro global das modificações que quer introduzir no Código de Processo Civil, em vez de anunciar hoje as modificações a introduzir num artigo, amanhã as que pretende introduzir noutro e depois de amanhã as que pretende introduzir em relação a outro. É que, assim, não sabemos o que é que, realmente, vai ser modificado ou se, em vez do actual Código, temos um Código novo. O estudo é atabalhoado e, portanto, não sabemos o que é que, amanhã, vem mais!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, gostaríamos de saber o que é isso da administrativização da acção executiva, porque V. Ex.ª sabe que, quando há oposição em relação a títulos de crédito, títulos executivos que não sejam sentenças, desenvolve-se uma autêntica acção declarativa. Uma autêntica acção declarativa, com o nome de processo executivo! V. Ex.ª sabe que é isso!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É a executiva!

O Orador: - Portanto, não pode vir dizer que há controlo judicial, porque não há! O controlo judicial tem de ser total, o juiz tem de intervir, como acontece na acção declarativa!
Quero, por isso, saber como é que V. Ex.ª transfere para os solicitadores ou para as autoridades administrativas o processo declarativo material que se desenvolve na acção executiva.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É o executivo!

O Orador: - Em terceiro lugar, gostava de saber o que é que V. Ex.ª, afinal, quer do Centro de Estudos Judiciários, porque ora o faz estimular, ora o dispensa totalmente para nomear os juízes chamados ad hoc, que, depois, podem ser tão bons, como eu já aqui disse, como os saídos do Centro de Estudos Judiciários.
E, amanhã, se se provar, como V. Ex.ª tem de provar, que, afinal, não foi erro seu, que os juízes recrutados sem curso do Centro de Estudos Judiciários são tão bons como aqueles que o têm, porque é que se vai manter esse Centro? Ou, então, há juízes de 1.ª e juízes de 2.ª, e os juízes que V. Ex.ª agora nomeou ad hoc são falsos juízes.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Quando é que abrem as vagas no CEJ?

O Sr. Ministro da Justiça: - Já abriram!

O Orador: - Em quarto lugar, se estes juízes julgam bem, porque é que é preciso o Centro de Estudos Judiciários? Porque não transferir para um curso de pós-graduação, através de um protocolo com universidades portuguesas de direito, este curso para formação de magistrados, em vez de o Estado gastar dinheiro no Centro de Estudos Judiciários, em relação ao qual já vimos que o próprio Ministro acha que deve intervir constantemente na sua modificação?

O Sr. Presidente: - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Em quinto lugar, gostava de saber se, para 2001, são estas as reformas que quer fazer ou se, nos próximos meses, vem aqui apresentar mais, para mostrar que o Ministro da Justiça está a trabalhar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, antes de mais, agradecer as intervenções e a atenção que a minha intervenção suscitou e manifestar, desde logo, alguma perplexidade por, um ano depois, ter ouvido duas críticas absolutamente contrárias a outras tantas que me fizeram exactamente há um ano. Uma foi dizer que fazemos demais e outra foi dizer que não ouvimos os interesses corporativos. Fico muito satisfeito com estas duas críticas, porque as que me incomodavam foram as que me fizeram há um ano, quando tinha iniciado funções, ou seja, de que eu andava a reboque de interesses corporativos…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Isso tinha a ver com a reforma de fundo!

O Orador: - … e de que nada fazia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Também era verdade!

Página 1544

1544 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Orador: - Fico satisfeito com as críticas de que fazemos e de que não andamos a reboque de interesses corporativos.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E não é verdade!?

O Orador: - Seria, aliás, um desperdício, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, que fosse eu a dar a voz aos interesses corporativos, quando, manifestamente, não faltam vozes para dar voz aos interesses corporativos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Queriam que eu viesse aqui falar e fazer o balanço do que fizemos. Eu disse, no início desta minha intervenção, que já contratámos com o Observatório Permanente da Justiça Portuguesa a monitorização das medidas que entraram em vigor no dia 1 de Janeiro. Mas eu sei, e os Srs. Deputados também, naturalmente melhor do que eu, que não é no dia 18 que se faz um balanço do resultado das medidas que entraram em vigor no dia 1 de Janeiro.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Era no dia 2!

O Orador: - E, assim que houver o balanço, fá-lo-ei, assim como estarei disponível para ir à Comissão, sempre que ela entender, explicar os problemas que existem e os que estão resolvidos.
A Sr.ª Deputada Odete Santos disse uma coisa que é totalmente verdade. Temos informação, através da Ordem dos Advogados, de que, na semana passada, houve, em algumas zonas do País, dificuldades no apoio judiciário, numa interpretação simplista, dizendo que, quem não pede a nomeação de patrono, também não tem de ter isenção de custas, porque, se tem dinheiro para advogado, também tem dinheiro para pagar as custas. Este é um assunto já resolvido, porque o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados informou-me, na segunda-feira passada, que o distrito onde o problema se colocou, que foi em Coimbra,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Agora já não é corporativo!

O Orador: - Não! Sabe qual é a diferença, Sr. Deputado Nuno de Melo? A diferença é esta: é a diferença de saber ouvir os outros, dar atenção aos problemas reais que os outros colocam…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - … e outra coisa é deixar de fazer, porque os outros, sem razão ou por razões estritamente do seu âmbito profissional, se opõem às mudanças que sejam feitas.

Aplausos do PS.

Porque, ao contrário do que diz o Sr. Deputado António Montalvão Machado - e é a grande divergência que tenho com ele -, os destinatários das normas da justiça não são os Srs. Advogados,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Destas são!

O Orador: - … não são os Srs. Juízes, não são os Srs. Magistrados do Ministério Público, os destinatários são os cidadãos, e é ao serviço dos cidadãos que a justiça tem de estar.

Aplausos do PS.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Eles é que vão sentir!

O Orador: - Os Srs. Deputados saberão que, em tempos, exerci a advocacia e, portanto, estou muito à vontade para dizer o que vou dizer novamente, isto é, repetir um apelo que aqui já fiz: peço aos Srs. Deputados que são advogados que ouçam os outros Deputados do seu próprio grupo parlamentar sobre o que eles pensam da justiça e o que pensam do funcionamento do sistema de justiça.
Nós, juristas, não podemos ter a presunção de que o sistema de justiça existe por nossa causa; nós, juristas, só existimos porque o sistema de justiça é indispensável aos cidadãos. E esse tem de ser o critério da nossa actuação.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Narana Coissoró disse: «Diga-nos lá tudo o que vai fazer». Sr. Deputado Narana Coissoró, lamento desiludi-lo sobre a sua própria memória. Eu hoje não dei qualquer novidade relativamente ao que disse à Assembleia da República no dia 3 de Fevereiro do ano passado, aquando da interpelação promovida pelo CDS-PP.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É verdade!

O Orador: - Vim aqui apenas recordar, porque temi - pelos vistos, com razão - que VV. Ex.as pudessem estar esquecidos dos compromissos que assumimos a médio prazo. Dissemos o que faríamos em 2000, e fizemo-lo; dizemos o que queremos fazer em 2001, e esperamos consegur fazê-lo. Sabemos que muito do que queremos fazer em 2001, tal como muito do que fizemos em 2000, depende do contributo decisivo da Assembleia da República. E tal como contámos com o contributo decisivo de todas as bancadas da Assembleia no ano passado, esperamos e desejamos contar com a colaboração activa de todas as bancadas da Assembleia, porque este não é um problema do Governo, este é um problema do País, é um problema dos cidadãos, que nos interpela a todos para todos darmos o nosso contributo.
Diz o Sr. Deputado Guilherme Silva que só queremos remendos. Sr. Deputado Guilherme Silva, não discuto avaliações subjectivas, mas fico antecipadamente satisfeito por saber que dará a máxima celeridade no tratamento a pequenas coisas, meros remendos, como a reforma do contencioso administrativo, a reforma da acção executiva, a reforma dos regimes de recurso, a reforma das contra-ordenações e do pacote da desjudicialização. Fico satisfeito, porque tenho a certeza de que, nessa altura, me dirá que não estamos a legislar à pressa, que não estamos a pressionar a Assembleia da República para que legisle à

Página 1545

1545 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

pressa, porque, no fundo, trata-se de meros remendos, e isto rapidamente se tratará por aqui entre o Governo e a Assembleia da República.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Bela ironia!

O Orador: - E esse conhecimento antecipado enche-me de satisfação
Sr. Deputado Francisco Louçã, para o combate à criminalidade económica e financeira e para dar um sinal político claro de quem detém o poder político, o Governo e a Assembleia da República são fundamentais. São fundamentais para quem exerce as funções de investigação criminal, para quem tem as funções…

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Ministro.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - As custas, Sr. Ministro!

O Orador: - Ó Sr. Presidente,…

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, não me peça tolerância, porque só antigamente isso acontecia!

O Orador: - Não, Sr. Presidente, não peço tolerância, peço apenas a V. Ex.ª…

O Sr. Presidente: - Mesmo que os Srs. Deputados estejam a fazer sinal de que posso dar-lhe um minuto, peço o favor de terminar o mais depressa possível.

O Orador: - Portanto, é necessário esse sinal, que passa, designadamente, por aperfeiçoar alguns instrumentos legislativos, mas não só, e a nova direcção da Polícia Judiciária, designadamente nesta área, creio que dá garantias ao País de uma grande determinação no combate a este tipo de criminalidade.
Não quero sair sem responder à questão das custas e sem deixar uma pequena nota às angústias do Sr. Deputado Guilherme Silva.
Quanto a custas, creio que tem havido vários equívocos. Um primeiro, explicitado, aliás, na intervenção do Sr. Deputado Basílio Horta, é que nós não aumentámos a unidade de conta.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Claro!

O Orador: - O Código das Custas prevê uma actualização automática de três em três anos.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Toda a gente sabe isso!

O Orador: - Passou o triénio e deu-se a actualização automática. Nada tem a ver com o novo regime de autoliquidação! Quanto ao novo regime de autoliquidação, ao contrário do que tem sido dito, não houve um aumento do montante global, há um montante a pagar no início, que, nuns casos, é menor e, noutros, é maior.

Protestos do CDS-PP.

Dou-lhes exemplos: se a acção tiver um valor até 3000 contos, antes pagava 18 000$ de preparo inicial e agora paga 16 000$; se acção tiver um valor até 10 000 contos, pagava 34 000$ e agora paga 32 000$; se a acção tiver um valor até 20 000 contos,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - As pequenas! As pequenas!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E os recursos!?

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, agradeço que termine o mais rapidamente possível.

O Orador: - Sr. Presidente, termino, dizendo o seguinte: existe diminuição nestas, mas há, de facto, um aumento do desembolso inicial para as acções de maior valor. As acções de menor valor…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Ó Sr. Presidente, não posso concluir, sendo sistematicamente interrompido.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, nada posso fazer contra isso!
Peço aos Srs. Deputados que facilitem as palavras finais da intervenção do Sr. Ministro.
Faça favor de continuar, Sr. Ministro.

O Orador: - As acções de menor valor baixaram todas; as outras, efectivamente, têm um aumento do desembolso inicial, mas que não é um aumento do valor global, porque esse não sofreu qualquer alteração.
Sr. Deputado Guilherme Silva, como o Sr. Presidente - e bem! - não manifestará tolerância para que responda à sua pergunta, deixo-lhe só duas notas. Quanto à medida fiscal a que fez referência - números do Tribunal de Pequena Instância Cível de Lisboa -, terminaram, por força do artigo 73.º da Lei do Orçamento do Estado para 2000, 54 000 processos,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Qual é o seu universo!?

O Orador: - … o que significa um número de processos equivalente ao trabalho de 10 magistrados do Tribunal de Pequena Instância Cível.
Finalmente, deixar-lhe-ei cópia da carta que foi endereçada ao Ministério da Justiça por um dos magistrados jubilados…

O Sr. Presidente: - Peço-lhe desculpa, Sr. Ministro, mas não pode continuar.

O Orador: - Então, deixo-lhe cópia da carta.

Aplausos do PS.

Vozes do CDS-PP: - E os outros!?

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Agradeço que identifique a matéria da ordem de trabalhos que está em causa.

Página 1546

1546 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, é apenas para comunicar a V. Ex.ª e à Câmara que vamos entregar ao Sr. Ministro um pequeno trabalho que fizemos sobre o valor de acções, de 4000 contos, 7000 contos, 12 000 contos e 18 000 contos - quer acções principais, quer recursos de apelação,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso não faz parte da ordem de trabalhos! Mas fica feito o anúncio!

O Orador: - … em que, realmente, se verifica que há uma divergência entre os valores antigos e os novos.

O Sr. Ministro da Justiça: - Peço também a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que me diga qual foi a decisão da Mesa que justifica a sua intervenção ou qual é a matéria da ordem de trabalhos que justifica o pedido de interpelação.

O Sr. Ministro da Justiça: - Foi a decisão do Sr. Presidente que deferiu a junção aos «autos» dos documentos apresentados pelo Sr. Deputado Basílio Horta.

Risos.

Para efeitos do «contraditório, tenho também um pequeno estudo, que, se o Sr. Presidente permitir, será também distribuído, que, creio, contrariará as conclusões do documento apresentado pelo Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Presidente: - O anúncio da entrega de papéis não faz parte da ordem de trabalhos!
Srs. Deputados, quero informar-vos de que deu entrada na Mesa um voto de protesto, que não poderá ser discutido nem votado hoje. Sê-lo-á no primeiro dia em que haja período de antes da ordem do dia.
Terminámos, assim, o período de antes da ordem do dia, não sem antes termos ultrapassado largamente o tempo a ele destinado.

Eram 17 horas e 15 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar o período da ordem do dia, com a discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 288/VIII - Altera o Decreto-Lei n.º 158/96, de 3 de Setembro, que define a Lei Orgânica do Ministério das Finanças, e o Decreto-Lei n.º 205/97, de 12 de Agosto, que regulamenta o estatuto legal do Defensor do Contribuinte (BE), 337/VIII - Legitimação democrática do Defensor do Contribuinte (PSD) e 341/VIII - Altera o Decreto-Lei n.º 158/96, de 3 de Setembro, que define a Lei Orgânica do Ministério das Finanças, e o Decreto-Lei n.º 205/97, de 12 de Agosto, que regulamenta o estatuto legal do Defensor do Contribuinte (CDS-PP).
Para introduzir o debate do projecto de lei apresentado pelo seu grupo parlamentar, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, vamos discutir três projectos de lei sobre a regulamentação e os poderes do defensor do contribuinte: o projecto de lei n.º 288/VIII, apresentado pelo Bloco de Esquerda, o projecto de lei n.º 337/VIII, do PSD, e o projecto de lei n.º 341/VIII, do CDS-PP. Esta matéria já foi várias vezes submetida a discussão na Assembleia da República, embora os projectos que são apresentados suscitem uma oportunidade, em nossa opinião, de correcção de um dos principais erros que foi cometido até agora.
Queria lembrar brevemente que o decreto-lei que aprovou a Lei Orgânica do Ministério das Finanças, em Setembro de 1996, introduzindo esta figura do Defensor do Contribuinte, o fazia de uma forma profundamente contraditória, porque, assim que dizia que se criava esta figura, que deve defender o contribuinte, e que, portanto, nos termos do próprio decreto lei, «deveria responder por liberdades e garantias de contribuintes e de outros cidadãos que invoquem direitos contra o Estado», também estabelecia que esta figura era nomeada por despacho conjunto do Primeiro-Ministro e do Ministro das Finanças. Portanto, estabelecia uma dependência do Governo daquela figura que deveria apoiar o contribuinte em actuações ou em pareceres que são potencialmente, se não sempre, contra o interesse do Estado e contra, pelo menos, a actuação do Ministério das Finanças, que era parte do despacho que deveria nomeá-lo.
Mais tarde, no Decreto-Lei n.º 205/97, em Agosto, regulamentando este estatuto legal do Defensor do Contribuinte, no preâmbulo reafirmava-se a total independência da acção e do julgamento e a perfeita neutralidade do Defensor do Contribuinte - mantínhamo-nos, ao estabelecer a figura do Defensor do Contribuinte ou ao regulamentar a sua actuação, no plano do perfeito paradoxo porque, naturalmente, não pode ter total independência, total autonomia e total neutralidade aquela figura que é nomeada pelo Ministério das Finanças, face ao qual deve actuar em regime de contraditório o Defensor do Contribuinte.
Depois disso, naturalmente em consequência desta contradição, quando foi chamado a apreciação parlamentar, em Janeiro de 1998, este decreto-lei regulamentar, o então Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Carlos dos Santos, dizia - e era puramente consequência desta concepção - que o Defensor do Contribuinte «é um órgão técnico de auto-controle da administração e que se traduzirá num Observatório», etc., etc. Era puramente a consequência deste ponto de vista e desta forma de regulamentação da Lei Orgânica do Ministério das Finanças considerar que o Defensor do Contribuinte seria um órgão coadjuvante que emitiria pareceres, relatórios, contributos para a actuação normal do Ministério das Finanças.
Mais tarde, o Decreto-lei n.º 21/99 introduziu, aquando da discussão do Orçamento do Estado para 1999, uma extensão destes poderes no sentido de tornar obrigatória a resposta, por órgãos do Estado, a pareceres que o Defensor do Contribuinte viesse a emitir. Parece-nos, portanto, que foi sensata a criação desta figura, mas que ela, desde o princípio, foi marcada por uma contradição que limitou e continuará a limitar a sua actuação.

Página 1547

1547 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

Aquilo que o projecto de lei do BE sugere é uma correcção desta contradição. E sugere-o propondo a todas as bancadas desta Assembleia da República a aprovação de duas alterações fundamentais: em primeiro lugar, que este Defensor do Contribuinte passe a ser eleito pela Assembleia da República, o que significará o corte desta relação de dependência hierárquica ou de subordinação funcional que, como a argumentação que o estabeleceu reconhece plenamente, é contraditória com o exercício destas funções; a segunda alteração que propomos - e verificamos que há alguma convergência com outra proposta que é aqui apresentada nesse âmbito - é no sentido de dotar o Defensor do Contribuinte da capacidade técnica ou dos meios instrumentais que lhe permitam exercer esta função. Interpretamos até a demora na nomeação do novo Defensor do Contribuinte (depois do falecimento do primeiro que foi nomeado, o Dr. Rodrigues Pardal) pelo facto simples de se verificar que a nomeação do actual Defensor só ocorre em Junho de 2000, é, em alguma medida, um reflexo desta contradição e destas dificuldades.
É para estas duas alterações que pedimos o voto das Sr.as Deputadas e dos Srs. Deputados desta Câmara, para que com esta transformação o Defensor do Contribuinte possa passar a actuar com a independência de que necessita, com a capacidade de acção que deve prestigiar este cargo.
Creio que se pode justificar em muito poucas palavras porque é que esta alteração ocorre. Aliás, quando o BE apresentou esta proposta, fê-lo no contexto da apresentação de um conjunto de propostas que procuravam iniciar uma reforma em matérias tão diversas como a dos impostos directos, dos impostos indirectos e também da incidência em algumas outras matérias como a sisa, a contribuição autárquica, o imposto sucessório e outras matérias que nos parece deverem fazer parte de um projecto de reforma global da tributação em Portugal. Nesse contexto, pareceu-nos essencial que fosse recuperada a experiência positiva que, em muitos países europeus e em outros, constituiu a consagração desta figura do Defensor do Contribuinte ou do Provedor do Contribuinte - os nomes são vários, em países distintos - porque, de uma forma diferenciada do que é a função do Provedor da Justiça, que trata, em geral, de todas as matérias do sistema judiciário e de todas as reclamações que os cidadãos nesse contexto apresentam, o Defensor do Contribuinte deve dar corpo, deve dar resposta, deve dar seguimento e deve dar a informação necessária a todos os contribuintes que, numa matéria tão sensível, procuram obter da necessária transparência do sistema fiscal, da necessária transparência das informações sobre o seu funcionamento, todas as formas de actuação pertinentes que lhes permitam defender e garantir os seus direitos.
Portanto, a especialização desta função merece, em nossa opinião, e seguindo exemplos consagrados noutros países, a existência desta figura. Mas, necessariamente, para que ela exista, tem de ter os meios e a capacidade, a autonomia, a independência e a garantia do seu estatuto jurídico e do seu estatuto político que lhe dê capacidade de actuação. É esse o sentido desta proposta e, por isso, a apresentamos, esperando ter o acolhimento de outras bancadas.
Queria, finalmente, referir-me à proposta apresentada pelo CDS-PP que é submetida a esta Câmara, para dizer que, se bem que concordemos com matérias importantes dessa proposta e que são comuns àquela que apresentamos, e à outra, que é igualmente submetida às Sr.as e aos Srs. Deputados, nomeadamente da forma de eleição pela Assembleia da República e da definição desse conteúdo político, estamos no entanto em desacordo com uma matéria essencial. Quero dizê-lo porque é da clareza do debate político que deve resultar esta votação.
Quando tratámos da reforma fiscal, foi apresentado, por proposta do Governo, e teve acolhimento desta Câmara, um acréscimo na alteração então sugerida à Lei Geral Tributária, no artigo 63.º-B, no que toca ao acesso a informações e documentos bancários. E esse acréscimo, que é actualmente o n.º 9 dessa proposta, estabelecia que, no âmbito da competência da administração tributária para o acesso directo à documentação bancária, todos os actos praticados por essa administração deveriam ser objecto de comunicação ao Defensor do Contribuinte. Houve acordo sobre esta medida - registo, aliás, que nem na Comissão nem no Plenário surgiram propostas de alteração a esta disposição, pelo que não considerámos então nenhuma outra medida neste âmbito preciso. Ora, parece-nos essencial manter exactamente como está esta medida da Lei Geral Tributária porque se trata das condições do n.º 1, em que a administração tributária acede directamente, por via administrativa, em situações de recusa de exibição de documentos pertinentes ou de autorização para a sua consulta, em duas circunstâncias bem delimitadas, que são as circunstâncias em que temos documentos de suporte de registo contabilístico ou quando o contribuinte usufrui de benefícios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados.
Nessas duas circunstâncias, que são aquelas em que é obrigatória a comunicação ao Defensor do Contribuinte, opomo-nos frontalmente a qualquer outra medida que pretenda introduzir uma dilação no tempo ou uma outra forma de procedimento que não o desta comunicação no âmbito do procedimento administrativo. Este pedido de parecer a que alude o artigo 5.º da proposta do CDS-PP pretende justamente, como é óbvio, introduzir o exercício do direito de audição prévia, o pedido de parecer e, portanto, uma forma de dilação temporária que nos parece profundamente contraditória com o sentido de busca da justiça tributária e da clareza da intervenção do sistema fiscal nestes dois casos, que são tão essenciais, como os de empresas ou entidades obrigadas a um registo contabilístico formalizado, organizado, e que, no entanto, contra a lei, não prestam as informações pertinentes, ou como aqueloutro de entidades sujeitas a benefícios ou regimes fiscais privilegiados, que também não o façam.
Portanto, opor-nos-emos, em consequência, a qualquer medida que pretenda subverter agora a decisão que foi tomada a seu tempo, no âmbito da reforma fiscal, porque nos parece que é errado, porque nos parece que é injusto e porque nos parece que é contraditório com o espírito de transparência e na luta contra a fraude e a evasão fiscal que se pretendeu introduzir com estas medidas. Desta forma, naturalmente, opor-nos-emos a essa medida essencial.

Página 1548

1548 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Francisco Louçã, os Srs. Deputados Menezes Rodrigues, Maria Celeste Cardona e Rui Rio.
Tem a palavra o Sr. Deputado Menezes Rodrigues.

O Sr. Menezes Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, naturalmente que a retoma do tema do Defensor do Contribuinte, em tempo de reforma fiscal, parece ter alguma pertinência. Mas é bom estarmos cientes de que o objectivo essencial é o de reforçar esta figura do Defensor do Contribuinte. Todavia, vale a pena pensar que existem equilíbrios neste processo que interessa preservar. Seguramente, não quereremos esvaziar, de algum modo, nem desresponsabilizar a administração fiscal; seguramente que deveremos obviar a algum conflito funcional ou institucional, tal como com o Provedor de Justiça, que é uma figura que se coloca num plano diferente.
Sendo certo que a proposta apresentada pelo Governo, e aprovada, de dar a esta figura do Defensor do Contribuinte, em primeiro lugar, a responsabilidade de pugnar pelos interesses e direitos dos contribuintes, mas também aí introduzindo uma medida que parece ser relevante - a da busca da eficácia da própria administração fiscal, colocada em pivot nesta figura do Defensor do Contribuinte -, como é que o Sr. Deputado conclui dos equilíbrios que são necessários neste processo e na proposta que coloca?
Relativamente à problemática judicial - se é que tem realmente notícia disso -, tendo entrado 400 processos no Defensor do Contribuinte desde a sua criação (com o anterior Provedor, o Conselheiro Rodrigues Pardal, já falecido, e com o actual) e sendo certo que, também na Provedoria de Justiça, os processos entrados, nos últimos três anos, são cerca de 600, tem notícia de se ter colocado algum problema do foro judicial?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Francisco Louçã, deseja responder já ou no fim?

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Respondo já, Sr. Presidente, porque se trata de questões muito precisas, que agradeço.
Sr. Deputado Menezes Rodrigues, quando preparei o projecto de lei, tentei informar-me sobre isso, sobre quais são as pendências judiciárias e qual era a intervenção do Defensor do Contribuinte. Devo dizer-lhe que telefonei para o Ministério das Finanças, donde nem sequer me souberam dizer qual era o número de telefone do Defensor do Contribuinte.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Se ele não depende do Ministro das Finanças!…

O Orador: - Pedi o relatório anual, a que ele é obrigado por lei e não consegui obtê-lo. Certamente, dou por segura a informação que nos dá sobre as actuações dos dois distintos juristas que ocuparam este cargo, mas o certo é que a dificuldade que tive para obter informação pertinente será muito maior para qualquer contribuinte. E é sobre isso que devemos interrogar-nos. O contribuinte normal tem de poder aceder a esta figura através de um caminho fácil para lhe pedir informações, para lhe fazer reclamações, para pedir a sua interferência e intervenção. E é nesse âmbito que darmos uma dignidade distinta a este cargo é certamente um progresso muito grande para a credibilidade e para a transparência do sistema fiscal.
É que a opção que se podia inferir da argumentação do anterior Secretário de Estado, António Carlos dos Santos, quando ele dizia que é um órgão técnico de autocontrolo da Administração, leva-nos por um caminho em que o Defensor do Contribuinte é entendido como uma espécie de «Inspecção Interna» do Ministério das Finanças e não deve ser isso. Creio que a opção é, sim, criar uma figura que publicamente reforça a garantia dos contribuintes e lhes dá tranquilidade, porque podem obter informação e alguém vai defendê-los, sempre que for necessário, contra o Estado, como refere o decreto-lei que altera a Lei Orgânica do Ministério das Finanças. Essa é a sua função, é desse lado da justiça que deve estar a sua actuação, sempre que entender.
Naturalmente, há outros órgãos, tal como o próprio Ministério das Finanças, que se defenderá segundo a sua própria interpretação dos interesses do Estado.
Agora, creio que este equilíbrio - e nisso dou-lhe razão - é justamente reforçado, se esta eleição for feita pela Assembleia da República, consagrando, portanto, esse estatuto de independência.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, quero agradecer-lhe a frontalidade e espero, aliás, que, na sequência da minha intervenção, me coloque as questões pertinentes. Mas já não tinha muitas dúvidas acerca da sua concepção quanto à natureza das normas. É que o dever de comunicação previsto no n.º 9 do artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária, tal qual está formulado, não serve para nada, Sr. Deputado. Comunicar para quê? Com que objectivo? Com que sentido?
Admito que o Sr. Deputado discorde do sentido que nós apresentamos no nosso projecto de lei e que, mais tarde, terei ocasião de referir. Mas há uma coisa que lhe garanto: ele é formulado para observar exactamente nos mesmos termos e nas mesmas condições que, hoje, a administração fiscal tem de notificar os contribuintes. O direito de audição prévia, Sr. Deputado Francisco Louçã, é um direito juridicamente consagrado e julgo que na sua bancada não há a ideia de o pôr em causa ou sequer de o revogar.
Feitos estes esclarecimentos, que espero, mais adiante, dilucidar melhor, também eu, relativamente ao projecto de lei apresentado pelo seu partido, gostaria de colocar uma questão, que resulta da análise e do estudo que dele fiz e de que resultou uma perplexidade e uma incapacidade da minha parte de ter resposta para a mesma.
De acordo com o vosso projecto de lei, entendem que o Defensor do Contribuinte deve intervir em processos

Página 1549

1549 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

judiciais quando justificado pela defesa dos direitos do contribuinte. É bonita esta norma, Sr. Deputado Francisco Louçã! É bonita! A defesa dos direitos do contribuinte é algo que, como sabe, me toca profundamente. Gostaria, pois, que me explicasse, porque disso depende a interpretação que vou fazer do vosso diploma, o que quer dizer com isto, na prática. Em que termos concebe esta intervenção? De que modo a concebe? E quais são os resultados práticos que, a seu ver, devem ou podem resultar desta intervenção judicial?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, muito brevemente (naturalmente, continuaremos esta discussão), devo dizer-lhe que não se trata de limitar qualquer direito de audição prévia. Os direitos gerais consagrados devem ser mantidos e são essenciais,…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Ainda bem!

O Orador: - … tanto em relação aos contribuintes como aos cidadãos.
O que está realmente em causa é saber se esse dever de comunicação, estabelecido por proposta do Governo - e não nossa - e sobre a qual não houve acréscimo de contrapropostas, nomeadamente da parte da sua bancada,…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - É agora!

O Orador: - … deve ou não ser intermediado por este pedido de parecer.
O dever de comunicação é uma coisa; o pedido de parecer, em consequência dessa comunicação, é uma coisa distinta.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Não é!

O Orador: - E aquilo a que nos opomos, como lhe disse, é a qualquer dilação temporal nestes casos, que estão suficientemente bem especificados. Por isso, opor-nos-emos a esta norma que sugere.
Quanto à forma de intervenção judiciária, naturalmente deixamos em aberto alguma especificação sobre isso. Parece-nos que há duas matérias essenciais. Em primeiro lugar, muitos contribuintes não têm recursos informativos nem capacidade para actuar, sem obterem a informação necessária, no que o Defensor do Contribuinte pode ser instrumental e essencial. Portanto, admitimos que para contribuintes que queiram actuar, no que presumem ser a melhor defesa dos seus interesses, junto dos tribunais - no âmbito daquilo que já está estabelecido na Lei Geral Tributária ou, mais tarde, daquilo que vier a ser o código sobre infracções tributárias - deve e pode haver uma actuação de apoio do Defensor do Contribuinte. Não pode ser de outra forma, se ele quiser ter uma actuação prática junto de pessoas que reclamam os seus direitos.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Não percebi!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, o meu pedido de esclarecimento está um pouco prejudicado pela pergunta da Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, porquanto ele ia no mesmo sentido. Não estão, no entanto, prejudicados os considerandos que vou fazer.
Assim, não quero deixar de saudar o Bloco de Esquerda pelo projecto de lei que aqui apresenta e que vai no mesmo sentido daquilo que é o projecto de lei do PSD de hoje e que foi em 1998.
A eleição do Defensor do Contribuinte, no fundo, prende-se com uma situação muito simples: ou o Defensor do Contribuinte existe ou não existe. Se se quer que ele exista, então, é óbvio que ele deve ter uma independência política face ao Governo. Não faz sentido - e imaginemos um jogo desportivo - que o árbitro seja nomeado por uma das partes. Evidentemente, isso não pode acontecer, mas é o que acontece neste momento. Portanto, ou é um defensor dos contribuintes ou não é um defensor dos contribuintes; ou existe ou não existe. A existir, então, é bom que ele tenha, face à administração fiscal, essa independência, que o actual não tem, pese embora seja uma pessoa competente e idónea - não é isso que está em causa, não é a figura da pessoa em si que está em causa, é o Defensor do Contribuinte.
Há um outro aspecto que também é importante. A discussão que estamos hoje a fazer aqui, no Parlamento, e de que a comunicação social fez eco, já é, em si, importante. É que, como questionou, quantos portugueses têm conhecimento da existência desta figura? Quantos? Muito poucos. Ora, esta discussão leva a que se tenha conhecimento de que a figura existe.
No momento em que o Defensor do Contribuinte, com a sua autonomia política, que, mais tarde, virá a ter, tiver duas ou três atitudes devidamente publicitadas, de defesa do contribuinte, naturalmente estão criadas condições para que as pessoas ainda conheçam mais e ainda possam recorrer mais. É que a sua existência só tem lógica, se isto acontecer.
A minha questão vai no mesmo sentido da colocada pela Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona. No que respeita à eleição, estamos com certeza em sintonia; no que respeita à intervenção em processos judiciais, se calhar, também estamos em sintonia, não sei. É que a proposta feita pelo Bloco de Esquerda é relativamente vaga. Se calhar, é propositadamente vaga, levando-nos a debater esta questão em sede de especialidade. Nesse caso, na especialidade, deveremos analisar esta questão da intervenção em processos judiciais. Não serei seguramente dos melhores Deputados para discutir este tema, pois ele é mais do foro jurídico, mas, de qualquer forma, se a ideia do Bloco de Esquerda é a de transferir a discussão desta matéria para a especialidade, estamos inteiramente de acordo. Porém, se o Bloco de Esquerda tem algo mais em mente, então, gostaria que isso fosse já explicitado aqui, na generalidade, aliás, nos termos em que a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona o solicitou.

Página 1550

1550 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, serei muito breve. Sr. Deputado Rui Rio, naturalmente a discussão continua sobre os méritos gerais dos projectos de lei. O tópico a que se refere é tratado, no nosso projecto de lei, no artigo 2.º, que altera o decreto-lei que regulamenta o Estatuto Legal do Defensor do Contribuinte, Decreto-Lei n.º 205/97, de 12 de Agosto, o qual, no n.º 5 do seu artigo 1.º, refere: «Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, o Defensor do Contribuinte poderá emitir pareceres e recomendações respeitantes a casos pendentes (…)». Ora, é neste âmbito que intervém nos processos judiciais. Portanto, deve ser uma figura presente nesses processos, na medida em que possa pronunciar-se a título destes pareceres, que podem ser essenciais para o apuramento de interpretações sobre o que está em causa em cada um deles.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando, em 1997, o Governo fez publicar o diploma que criou a figura do Defensor do Contribuinte, o Grupo Parlamentar do PSD, de imediato, pediu a sua apreciação parlamentar.
A grande alteração que propúnhamos prendia-se, já na altura, com a necessidade de lhe conferir um carácter mais independente face ao Governo.
Com efeito, não faz sentido que a individualidade que se pretende que defenda os contribuintes nos seus conflitos com a administração fiscal, seja, ela própria, nomeada pelo Ministro das Finanças, ou seja, pelo principal responsável por esses mesmos serviços.
Qual a lógica de ter, como defensor de uma parte, alguém nomeado pela parte antagónica?
Foram fortes as críticas que, por esta razão, na altura, tecemos, só que estas não colheram junto do, então, Ministro das Finanças.
O efeito foi o que já se esperava. Apesar de o cargo estar a ser desempenhado por uma individualidade idónea e competente, a verdade é que o contribuinte, em particular, e a sociedade em geral não acolheram a função com o entusiasmo que se poderia prever face aos múltiplos conflitos que continuam a opor os contribuintes e a pesada máquina burocrática do Estado. Os cidadãos acreditam pouco na eficácia de uma queixa a uma entidade que depende precisamente da parte com que estão em conflito. É um raciocínio mais do que lógico, que esta Assembleia tem a obrigação de não continuar a ignorar.
Se se pretende que os contribuintes tenham, realmente, confiança na capacidade do seu Defensor para defender os seus interesses, é evidente que temos de dotá-lo de uma legitimação independente, face à administração fiscal, única garantia credível de uma acção verdadeiramente autónoma, isenta e liberta de tutelas.
É, pois, no âmbito desta preocupação que o PSD propõe, mais uma vez, a sua eleição pelo Parlamento, com a exigência de uma maioria de dois terços.
Acresce que, se as razões então apontadas eram, por si só, já suficientes para justificar este carácter verdadeiramente independente do Defensor do Contribuinte, as recentes alterações aos Códigos do IRS e do IRC mais urgente e necessária tornam esta alteração.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Com efeito, o passo que a maioria de esquerda neste Parlamento entendeu dever dar, no sentido da quebra do sigilo bancário, da inversão do ónus da prova e da criação de um regime de tributação simplificada com aplicação subjectiva de métodos indiciários, mais justificam que o Defensor do Contribuinte seja liberto de qualquer dependência ou tutela do Ministério das Finanças.
Não estamos livres, Srs. Deputados, de que possa haver critérios políticos na gestão destes novos poderes da administração fiscal. A redução dos direitos dos contribuintes deve ter o máximo de contrapartidas, ao nível do reforço das garantias que se afigure sensato esta Câmara aprovar.
Por isso, e apesar de termos estado em pólos completamente opostos em sede de alterações fiscais, saudamos a iniciativa do Bloco de Esquerda, que, nesta matéria, aponta também no sentido do que sempre defendemos.
Sr. Presidente, não se pretende, com este projecto de lei, reduzir a esfera do Provedor de Justiça, que deve continuar a ter competência plena sobre todas as áreas de intervenção dos poderes públicos e, naturalmente, também sobre os poderes da administração fiscal.
O que se pretende, é que, num país em que a administração fiscal continua a funcionar de forma tão lenta e tão deficiente, possa - enquanto tal assim for - existir um entidade especializada, politicamente independente, que esteja apta a defender o contribuinte perante um monstro burocrático que, não raras vezes, o atropela nos seus mais elementares direitos.
É a ineficácia deste aparelho fiscal que nos leva a admitir uma instância especializada, sem prejuízo das superiores funções do cargo de Provedor de Justiça, que, felizmente, tem sido sempre desempenhado por relevantes e competentes individualidades a quem o País só tem a agradecer.
O mesmo acontece, aliás, com a personalidade que desempenha o cargo de Defensor do Contribuinte. O nosso projecto de lei não é, obviamente, contra ele, bem pelo contrário; o que queremos é precisamente dar-lhe outra legitimidade e, por essa via, outra força e outra capacidade interventiva.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Num País em que a receita fiscal tem subido todos os anos; num país em que a despesa pública corresponde a metade do seu PIB, ou seja, basicamente, a seis meses de trabalho dos portugueses, urge defender, com redobrado empenho, aqueles que pagam os seus impostos.
Na ânsia de cobrar muito, para conseguir fazer face a uma despesa pública galopante, a pressão sobre o fisco para atropelar regras é, logicamente, mais do que muita. Disso, julgo que estamos todos conscientes, porque directa ou indirectamente, já todos o sentimos na pele.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Muito bem.

O Orador: - Por isso, a medida que agora, mais uma vez, propomos afigura-se como um passo no sentido

Página 1551

1551 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

certo. Um passo no sentido de que os portugueses não só passarão a ter mais uma instância de recurso independente como poderão sentir que a Assembleia da República está preocupada com as arbitrariedades que vão acontecendo e que, acima de tudo, mais podem vir a acontecer em face das alterações introduzidas em sede de IRS e IRC.
Votando favoravelmente os projectos de lei que hoje apreciamos, seguramente que estamos a contribuir para que os contribuintes sintam uma maior confiança no seu Defensor e para que este seja mais forte e mais livre para continuar a sua missão.
Estou certo de que, desta vez, a maioria da Assembleia não voltará a negar este benefício aos que pagam os seus impostos e que com isso dão um exemplo ao País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver inscrições para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona para uma intervenção.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É com gosto que faço esta intervenção e que apresentamos este projecto de diploma que altera o actual Estatuto Legal do Defensor do Contribuinte.
Todos sabemos que cada vez mais se torna necessário reforçar as garantias dos contribuintes! Um dos meios possíveis, não sendo exclusivamente este, também pode ser este.
Pela parte do CDS-PP, julgo que ninguém tem dúvidas quanto às nossas posições nesta matéria: o reforço das garantias e dos direitos dos contribuintes deve ser prosseguido, nomeadamente através de um sistema fiscal justo, com taxas de imposto menos elevadas; de um melhor e mais racional funcionamento da máquina fiscal; de uma mais célere e eficaz actividade dos tribunais tributários.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Em todo o caso, o Defensor do Contribuinte pode revelar-se como mais um meio susceptível de colmatar algumas injustiças, de contribuir para melhorar o próprio sistema e de, sem custas para o cidadão, permitir que algumas das suas dificuldades possam obter ganho de causa. Assim o esperamos e é nesta convicção que apresentamos as nossas propostas.
Um dos aspectos que está consagrado neste projecto de lei (em identidade, aliás, com o que consta dos projectos de lei apresentados por outros partidos) é o que se refere à forma de nomeação do cargo de Defensor do Contribuinte.
Julgo, aliás, que nesta matéria parece ter sido alcançado o consenso, isto é, que todos estão de acordo quanto ao que agora vem designado por legitimação democrática do Defensor do Contribuinte. Também optámos por esta solução; trata-se de complementar a natureza de órgão independente, através de novas regras quanto à respectiva nomeação.
Parece-nos bem! Não vemos razão para não apoiar e até propor a mesma solução! Só esperamos que com estas novas regras não se venha a cair no mesmo que já aconteceu com a nomeação do Provedor de Justiça.
Talvez possamos ter esperança de que o anterior processo tenha servido para alguma coisa, quanto mais não seja para se fazer mais depressa, melhor e com menos custos, designadamente para o nome das pessoas envolvidas.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para além deste aspecto, que é importante, o CDS-PP procura, com a apresentação desta proposta, ir um pouco mais além do que a dita legitimação democrática.
Era o que faltava que não aproveitássemos esta oportunidade!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Ah!…

A Oradora: - Era o que faltava, Sr. Deputado, que não aproveitássemos esta oportunidade!

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Com certeza!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Era o que faltava que nós fossemos nisso!

A Oradora: - Sr. Deputado, cada um defende os seus interesses; da nossa parte defendemos os interesses dos contribuintes, que também são estes!

Aplausos do CDS-PP.

A Oradora: - Vejamos, dizia eu, em que se fundamentam e em que se baseiam as nossas propostas.
Em primeiro lugar, como todos sabemos, foram recentemente introduzidas novas regras em matéria de impostos sobre o rendimento, a que alguns, teimosamente, continuam a chamar reforma fiscal. Eles lá sabem…
De entre tais regras, e com o voto, expresso, contra do CDS-PP, foram modificadas algumas disposições inseridas na Lei Geral Tributária, no que se refere ao acesso à informação protegida pelo sigilo bancário.
Em termos sintéticos, o novo regime de acesso à informação bancária possibilita, em alguns casos, a interposição de recurso contra a decisão de acesso, com efeito suspensivo. Nestas situações, apesar de tudo, pode e deve admitir-se que os direitos dos contribuintes estejam acautelados. Assim a prática não venha a desmentir a teoria!
Em outras situações, como aquelas de que já hoje ouvimos falar e que constam no dito artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária, a administração fiscal pode, por decisão própria, aceder directamente à informação bancária que considere necessária.
Fomos e somos contra este sistema! Não fomos e somos contra este sistema, porque «sim»! Fomos e somos contra este método, porque ele se revela insusceptível de ser controlado por uma entidade independente!

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Exactamente!

A Oradora: - Sempre dissemos, e mantemos, que os contribuintes não cumpridores precisavam de ser fiscaliza

Página 1552

1552 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

dos e, se fosse caso disso, punidos! Mas sempre dissemos, e também mantemos, que a administração fiscal, até para se proteger, precisa de ser controlada. A melhor forma de alcançar este objectivo é garantir que os actos sobre esta matéria, praticados pelos serviços, devam ser previamente sindicados pelos tribunais.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Por mais que se diga que o actual sistema assim está bem e até, no dizer de alguns, que é insuficiente, apetece perguntar uma coisa muito simples: e se há engano? E se afinal de contas não se derem por verificados os pressupostos de que depende o acesso directo à informação bancária? Quem protege e garante os direitos dos contribuintes nestes casos?

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Que são direitos fundamentais!

A Oradora: - É que pode suceder que, quando o tribunal lhes vier a dar razão, já o mal esteja feito!

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Não é «pode suceder», sucede normalmente!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Devemos reconhecer, apesar de tudo, que o Governo acolheu algumas das nossas preocupações, de tal modo que inseriu a tal regra de comunicação ao Defensor do Contribuinte no n.º 9 do artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária. Ficou-se por aí, evidentemente! Mas nós não! Eis, pois, a razão de ser da apresentação das nossas propostas.
Como, aliás, se pode constatar no contexto da alteração à Lei Orgânica do Ministério das Finanças, bem como no âmbito das alterações propostas ao Estatuto Legal do Defensor do Contribuinte, encontrarão um conjunto de regras que têm por objectivo dar corpo e concretizar o dito princípio já consagrado no artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária.
Em primeiro lugar, consagra-se que o dever de comunicação deve ser concebido como um pedido de parecer, tal como resulta das nossas propostas. Este parecer deve ser pedido nos mesmos termos e prazos concedidos à administração fiscal para efeitos de notificação ao contribuinte do seu direito de audição prévia.
O defensor do contribuinte, de acordo com a nossa proposta formulada no n.º 2 do artigo 29.º, deve elaborar o seu parecer no prazo máximo de 10 dias.
Por outras palavras, a entidade fiscal só pode aceder à informação bancária após ter decorrido o prazo para o direito de audição prévia e ter sido proferido, no mesmo prazo e nos mesmos termos, o parecer do Defensor do Contribuinte.
Munida dos documentos integrantes deste procedimento, a entidade fiscal competente estará habilitada para actuar.
Estas propostas, deixem-me salientá-lo, devem ser conjugadas com o regime que já decorre da actual lei quanto aos juros compensatórios e moratórios, bem como quanto à publicidade dos relatórios a divulgar. Podemos considerar que, apesar de tudo, passará a haver alguma limitação na actuação da administração fiscal.
Em segundo lugar, também apresentamos propostas no sentido de reforçar os direitos dos contribuintes em matéria de prestação de garantias bancárias.
Como todos sabem, a um processo de liquidação de imposto está sempre associado um outro, o processo de execução. Isto é, continua a vigorar, na nossa ordem jurídico-fiscal, o velho princípio: primeiro paga-se e, depois, reclama-se ou impugna-se.
Nesta matéria, também no contexto deste Estatuto Legal do Defensor do Contribuinte, procuramos apresentar propostas no sentido de que, se o contribuinte não decair na sua pretensão, não deve, naturalmente, ser penalizado com quaisquer custas ou encargos, bem como com juros compensatórios ou moratórios.
Finalmente, propomos também, no artigo 37.º, o envio, à Assembleia da República, através da Comissão de Economia, Finanças e Plano, de um relatório analítico dos casos de acatamento, por parte das entidades fiscais competentes - e por quê?! -, das recomendações feitas pelo Defensor do Contribuinte em matéria de acesso directo à informação protegida pelo sigilo bancário.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não temos dúvidas de que as nossas propostas não esgotam e não completam todo o conjunto de regras que, porventura, seriam exigíveis para cumprir o objectivo que esteve presente na sua apresentação, que é, exclusivamente, o de reforço das garantias dos contribuintes.
Em todo o caso, esperamos que venham a ser aprovadas de modo a que, na especialidade, possam ser melhoradas e/ou até devidamente corrigidas.
A expectativa quanto à sua aprovação funda-se, para além de outros aspectos, nas próprias concepções assumidas pelo Governo no contexto das alterações sobre esta matéria assumidas em sede de Lei Geral Tributária, a que já fiz referência.
Admitimos que naquela fase o Governo não tenha tido tempo para ir mais longe. Faltava-lhe tempo! Nesta fase, acreditamos que tempo é coisa que não nos faltará.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos hoje a tratar de um importante assunto integrado na problemática da defesa dos contribuintes; concretamente o Estatuto, os poderes, os apoios de que deve gozar, as funções e o processo de eleição do Defensor do Contribuinte.
O anterior governo socialista produziu alguns textos legais extremamente importantes na área da defesa dos contribuintes, criando nomeadamente o Defensor do Contribuinte.
Quanto à própria Lei Geral Tributária, ela foi globalmente um modelo de equilíbrio entre as garantias dos contribuintes e os direitos da administração tributária, mas podendo, óbvia e gradualmente, ser aperfeiçoada, como temos procurado fazer com base no «saber de experiência feita».
Por outro lado, o já referido Estatuto Legal do Defensor do Contribuinte, apresentado por Sousa Franco, incluiu

Página 1553

1553 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

aspectos extremamente positivos, cujos objectivos ficaram claramente expressos, quer no texto legal quer em debate parlamentar.
Ora, que posição tomou então o PSD quanto a esse Estatuto? A de levantar algumas objecções, exprimindo, nomeadamente, uma discordância básica quanto ao processo de designação e sugerindo que se reforçassem eventualmente os poderes do Provedor de Justiça, ao invés de se criar um Defensor do Contribuinte.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, convirá que fique claro que somos completamente favoráveis à eleição do Defensor do Contribuinte pela Assembleia da República.
A Lei Orgânica do Ministério das Finanças (Decreto-Lei n.º 158/96) criou, em 1996, no seu artigo 27.º, o cargo de Defensor do Contribuinte.
Nessa altura, no n.º 2 desse artigo especificava-se que «O cargo de Defensor do Contribuinte será exercido, com estatuto de inteira independência de julgamento e acção, por um cidadão com comprovado mérito e competência, a designar por despacho conjunto do Primeiro-Ministro e do Ministro das Finanças para um mandato de sete anos, não renovável».
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Diremos que, hoje em dia, quanto à duração do mandato, somos claramente favoráveis à sua redução. Se será para quatro anos (um período normal de duração do mandato de órgãos como os das autarquias e da própria Assembleia da República) ou para um período mais longo, como o de cinco anos, a Assembleia decidirá. Nós, Deputados socialistas, estamos abertos a este debate, e da própria duração que se estabelecer dependerá, em boa parte, a aplicação eventual do princípio da não renovação.
O mandato de quatro anos obrigaria a que cada eventual conjugação de alargadas maiorias parlamentares formasse o arco político que elegesse, nas oportunidades que a lei venha a fixar, o Defensor do Contribuinte com o perfil e a competência mais adequados ao cargo. O mandato de cinco anos tornaria o período de exercício com uma maior autonomia temporal face à duração do mandato da Assembleia da República.
Por outro lado, convirá ainda clarificar o prazo em que entrarão em vigor, não só eventuais novas disposições que reforcem os poderes e a legitimidade democrática do Defensor do Contribuinte, como a própria data de entrada em vigor do novo processo de eleição.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em Agosto de 1997, abriu-se, então, caminho ao avanço deste processo, tendo sido publicado o Decreto-Lei n.º 205/97, que regulamentou o Estatuto Legal do Defensor do Contribuinte, onde se sublinha, no respectivo preâmbulo, que da acção do Defensor do Contribuinte se pretende que resulte: «Para além de um reforço de direitos e garantias dos contribuintes, uma acção importante em prol das alterações que se prefiguram no sentido da maior eficácia da administração tributária e da modernização do sistema tributário».
Essas alterações ao sistema fiscal e até na administração tributária têm vindo a ser feitas, quer ao longo da Legislatura anterior, após o necessário período de estudo e de reanálise das informações disponíveis e dos relatórios existentes, quer, obviamente, já nesta Legislatura.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem

O Orador: - Isso trouxe claramente para a ordem do dia, não só da Assembleia e da comunicação social mas também da opinião pública interessada, a necessidade de debater e de reequacionar a figura do Defensor do Contribuinte, os seus poderes e o seu processo de designação, por despacho governamental ou por eleição parlamentar. Já o dissemos, e repetimos, somos favoráveis, após o balanço da actual experiência, à designação parlamentar do Defensor do Contribuinte para lhe assegurar ainda maior representatividade e independência institucional, tendo até em conta a perspectiva de evoluções políticas que um dia poderão ocorrer.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em Janeiro de 1998, o mencionado Decreto-Lei n.º 205/97 foi sujeito a apreciação no Plenário da Assembleia da República e ratificado pela maioria que se formou, composta pelo PS e pelo CDS-PP. Apesar de ratificado por votação tal decreto-lei, tendo em conta o tipo e as orientações dos discursos produzidos pela generalidade dos tribunos da oposição que intervieram no debate, o PS teve alguma prudência na continuidade do processo, quer na esfera governamental, quer na instância parlamentar.
Assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, no Orçamento do Estado para 1999, introduziram-se alterações legais de forma a reforçar os poderes do Defensor do Contribuinte, mantendo-se ainda, todavia, o seu processo de designação. Essas alterações, aprovadas então em finais de 1998, passaram a ter força de lei, tendo o Decreto-Lei n.º 21/99, de 28 de Janeiro, redefinido a posição orgânica do Defensor do Contribuinte no Ministério das Finanças. Nesse mesmo mês de Janeiro foi nomeado o Sr. Conselheiro Rodrigues Pardal, entretanto falecido, tendo sido nomeado, em Junho último, o Dr. Armindo Ribeiro, actualmente em funções.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É, entretanto, chegada a altura de se fazer o balanço e a revisão do processo de designação para melhor se configurar a posição do próprio Defensor do Contribuinte.
No quadro da posição que defendemos, parece-nos importante que se proceda a uma clarificação no sentido de o relatório periódico do Defensor do Contribuinte ser apresentado directamente à Assembleia da República, o que se torna lógico no quadro do novo processo de designação, e tendo em conta o princípio, que apoiamos, de uma elevada existência de informações relevantes disponíveis para os Deputados.
Por outro lado, parece-nos importante a existência de um quadro de pessoal próprio, eventualmente preenchido, através da requisição ou destacamento, de competentes e experientes funcionários, estando nós disponíveis para ponderar, por exemplo, as soluções que, neste domínio, propõem sectores da oposição parlamentar, nomeadamente o Bloco de Esquerda. O que nos interessa, sim, é a eficácia do processo, a competência e a funcionalidade do serviço, uma justa e equilibrada defesa dos contribuintes, mas de todos eles.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Falemos das principais reservas quanto a alguns dos projectos de lei apresentados.

Página 1554

1554 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

É preciso que fique bem claro que o processo de audição do Defensor do Contribuinte não pode constituir um entrave quanto ao normal prosseguimento das acções que visam o combate à fraude e à evasão fiscal. O texto final do diploma que sair desta Assembleia, quando vier a incorporar válidos contributos do PP, não deverá ter qualquer ambiguidade, nomeadamente neste aspecto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa por o interromper, mas há um ruído de fundo na Sala perfeitamente inaceitável. Compreendo que os Srs. Deputados precisem de conversar uns com os outros, mas esta não é a oportunidade para isso.
Srs. Deputados, agradeço que façam silêncio e que tomem os seus lugares para, após a formulação do pedido de esclarecimento já solicitado, procedermos às votações regimentais.
Faça favor de prosseguir, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Orador: - É natural a ansiedade pelas votações, Sr. Presidente.
Por outro lado, propõe o BE um mandato de cinco anos, não renovável. É um aspecto a ter em conta na especialidade, como já referimos. O período de quatro anos seria também um prazo possível, coincidente com a duração normal, ou máxima, do mandato parlamentar.
Sr. Presidente, outro aspecto importante a clarificar no projecto de lei do Bloco de Esquerda é a forma de o Defensor do Contribuinte poder «intervir em processos judiciais», tema já hoje aqui abordado em diálogo com os proponentes. Terá o texto de ser preciso, especificando formas e condições de intervenção. Não gostaríamos que qualquer promiscuidade pudesse contaminar o texto do diploma que esta Assembleia deverá aprovar, em votação final global, provavelmente, daqui a algumas semanas.
A solução a que se chegue terá que ser moderna e europeia, adequada à situação portuguesa e aos novos desafios que a modernização da administração fiscal e a maior equidade do sistema tributário exigem.
Estamos disponíveis globalmente para estes avanços, para viabilizar, eventualmente de forma diferenciada, todos os projectos que vão no sentido de reforçar, de forma equilibrada, os poderes, a representatividade e a eficácia do Defensor do Contribuinte.
Em boa hora o anterior governo criou o Defensor do Contribuinte, em boa hora a Assembleia ratificou essa criação, em adequada oportunidade melhorou os contornos legais dessa nova figura. Em altura oportuna o Primeiro-Ministro António Guterres e os responsáveis governamentais das Finanças, Pina Moura e o então Secretário de Estado Sá Fernandes, preconizaram a sua eleição pela Assembleia, o que merece o nosso apoio.
O Grupo Parlamentar do PS, tendo feito o balanço de todo este positivo processo, acolhe favoravelmente as iniciativas que reforcem os poderes e a representatividade do Defensor do Contribuinte.
Salientamos, aliás, a nossa grande disponibilidade para, em sede de especialidade, se chegar a um texto escorreito e equilibrado. Com este debate a Assembleia prestigiar-se-á com o seu resultado final, os contribuintes serão, certamente, melhor defendidos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, começo por saudar a sua intervenção, que vai no sentido daquilo que sempre temos defendido sobre esta matéria.
V. Ex.ª reconfortou-me, porque, a dada altura, disse que vamos encontrar uma solução moderna e europeia. Portanto, se é moderna e europeia, vai ser boa, com certeza.

Risos do PS.

Sr. Deputado, a pergunta concreta que quero colocar-lhe tem a ver com o seguinte: um dos aspectos que ressaltou do debate - e da discussão nasce a luz, e penso que se fez luz sobre esta matéria - é o de que há, por parte dos contribuintes, um quase completo desconhecimento da existência da figura do Defensor do Contribuinte.
Não há em qualquer dos projectos de lei qualquer medida que, objectivamente, vise ultrapassar esta limitação. Assim, ocorreu ao PSD, há pouco, a hipótese de se poder fazer aprovar uma norma, na lei moderna e europeia que V. Ex.ª deseja, onde todas as repartições de finanças tivessem de afixar obrigatoriamente a informação sobre a existência do Defensor do Contribuinte e um modelo, aprovado por este mesmo Defensor, ao qual os contribuintes possam recorrer quando entendam recorrer a essa figura.
Pergunto a V. Ex.ª se, apesar de neste momento nos projectos de lei não constar esta norma, está na disposição de tentar aprovar, por consenso, uma norma destas na tal lei moderna e europeia que iremos ter.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, penso que a minha satisfação é quase visível.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - É por causa do Boavista!

O Orador: - Não é por causa do Boavista! Do Boavista será V. Ex.ª, eu sou do Sporting, tal como o nosso Presidente da República!
Estamos num raro momento em que temos uma oportunidade de votar favoravelmente um projecto de lei do PSD, daí a minha satisfação. Apareçam mais projectos que possamos votar favoravelmente, que assim faremos!
Sr. Deputado Rui Rio, a questão que levantou é importante, tem a ver com o aspecto da administração aberta e com a disposição de mecanismos para os cidadãos reclamarem. Somos, genericamente, favoráveis a que, de modo equilibrado, quer na lei, quer em outros dispositivos, os cidadãos sejam informados sobre a essência deste mecanismo.

Página 1555

1555 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

Portanto, se houver alguma disposição equilibrada que possa ser incluída na lei, estaremos abertos a conversar sobre ela.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Julgamos que isto vai no sentido de poderem existir - e existirão já - em muitos sítios disposições para os cidadãos poderem reclamar do funcionamento de serviços da administração pública. Mas penso ainda que, apesar de alguma desvalorização que periodicamente se procura fazer do Parlamento, o simples facto de o Defensor do Contribuinte passar a ser eleito pela Assembleia da República dar-lhe-á uma maior representatividade política e, a nós, uma grande tranquilidade, e não é porque se garanta mais isenção, porque as duas personalidades que exerceram as funções são extremamente isentas, mas nisto «há mar e mar, há ir e voltar», as maiorias parlamentares variam, e esta forma de eleição dá-nos uma garantia de grande isenção para o futuro.
Portanto, o simples facto de a eleição do Defensor do Contribuinte ser feita pela Assembleia, independentemente de eu estar de acordo com uma medida do tipo que foi sugerida pelo Sr. Deputado Rui Rio, chamará a atenção dos cidadãos, da comunicação social e dos contribuintes informados para o facto de terem à sua disposição este mecanismo.
Por outro lado, julgo que uma informação generalizada, a utilização, por exemplo, daquilo que deve ser, no seu verdadeiro sentido, o serviço público de televisão e da comunicação social em geral, a utilização das paredes das próprias repartições como um veículo de informação sobre o que é o Estatuto Legal do Defensor do Contribuinte, e o dar-se os meios adequados ao Defensor do Contribuinte, pode ser extremamente importante para que todos os cidadãos, e não só os contribuintes financeiramente mais poderosos, tenham acesso a este meio de defesa.
Portanto, somos favoráveis a tudo o que vai neste sentido, incluindo, obviamente, o que V. Ex.ª acaba de sugerir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos interromper aqui o debate que estamos a ter para procedermos às votações regimentais.
Assim, vamos começar pela votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 257/VIII - Confere aos municípios o direito à detenção da maioria do capital social em empresas concessionárias da exploração e gestão de sistemas multimunicipais (PSD).

Submetido à votação, verificou-se um empate, tendo votado a favor o PSD, o PCP, o CDS-PP, Os Verdes e o BE e contra o PS.

Srs. Deputados, dada a situação de empate, vamos repetir a votação.

Submetido à votação, verificou-se novo empate, tendo votado a favor o PSD, o PCP, o CDS-PP, Os Verdes e o BE e contra o PS.

Srs. Deputados, tendo-se registado novo empate, ao abrigo do artigo 107.º do Regimento, o projecto de lei foi rejeitado.
Vamos passar agora à votação, também na generalidade, do projecto de lei n.º 316/VIII - Confirma o passe social intermodal como título nos transportes colectivos de passageiros e actualiza o âmbito geográfico das respectivas coroas (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do PSD.

Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 38/VIII - Estabelece o regime fiscal do património cultural.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PCP e abstenções do PSD, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE.

Srs. Deputados, a proposta de lei n.º 38/VIII baixa à 7.ª Comissão.
Passamos à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 39/VIII - Estabelece as bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PCP e abstenções do PSD, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE.

Srs. Deputados, a proposta de lei n.º 39/VIII baixa também à 7.ª Comissão.
Vamos agora proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 37/VIII - Autoriza o Governo a aprovar um regime jurídico para a concessão intermunicipal do serviço público de gestão urbana de uma área compreendida nos limites da Zona de Intervenção da Exposição Mundial de Lisboa (EXPO 98).

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PSD, do CDS-PP e do BE e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, a proposta de lei n.º 37/VIII tem três artigos. Pretendem votá-los, na especialidade, uma a um ou em conjunto?

Pausa.

Visto não haver objecções, vamos votar a proposta de lei, no seu conjunto.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PSD, do CDS-PP e do BE e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global da proposta de lei n.º 37/VIII.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PSD, do CDS-PP e do BE e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Página 1556

1556 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

Srs. Deputados, temos para votar, na especialidade, o artigo 5.º e o n.º 5 do artigo 9.º do Estatuto dos Deputados que são alterados pelo artigo 1.º do texto final apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 226/VIII - Aprova a quinta revisão do Estatuto dos Deputados (PS).
Srs. Deputados, podemos votá-los em conjunto?

Pausa.

O Sr. António Filipe (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, em relação ao artigo 5.º, que tem vários números e alíneas, solicitamos a votação em separado da alínea d) do n.º 2 e os n.os 5 e 6.

O Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos, então, votar a alínea d) do n.º 2 do artigo 5.º.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP, de Os Verdes e do BE.

Srs. Deputados, a aprovação teve a maioria legal e constitucional exigível.
Em relação aos n.os 5 e 6 do artigo 5.º, o PCP também quer que a votação se proceda em separado, ou não?

O Sr. António Filipe (PCP): - Pode ser em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, vamos votá-los.

Submetidos à votação, foram aprovados, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do BE e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, esta aprovação também obteve a maioria legal e constitucional exigível.
Vamos passar à votação do n.º 5 do artigo 9.º.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, posso estar enganado, mas parece-me que os restantes números do artigo 5.º não chegaram a ser votados, ou seja, o n.o 1, as alíneas a) e c) do n.º 2 e o n.o 4.

O Sr. Presidente: - Tem razão, Sr. Deputado.
Vamos, então, votar.

Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.

Srs. Deputados, esta aprovação também obteve a maioria legal e constitucional exigível.
Vamos proceder à votação do n.º 5 do artigo 9.º.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação final global do texto final apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 226/VIII - Aprova a quinta revisão do Estatuto dos Deputados (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do CDS-PP e abstenções do PSD, do PCP, de Os Verdes, do BE e de 6 Deputados do PS.

A aprovação também obteve a maioria legal e constitucional exigida.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 228/VIII - Acompanhamento e apreciação pela Assembleia da República da participação de Portugal no processo de construção da União Europeia (PS).

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que, relativamente ao projecto de lei n.º 228/VIII, cuja votação o Sr. Presidente está a anunciar, temos a indicação de que há um requerimento de baixa à Comissão sem votação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, há realmente um requerimento de baixa à Comissão sem votação, mas relativo aos projectos de lei n.os 317/VIII, 324/VIII e 342/VIII e não a este que anunciei.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Se é para interpelar a Mesa, Sr. Deputado, tem a palavra.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sr. Presidente, é apenas para comunicar que irei entregar na Mesa uma declaração de voto relativa ao projecto de lei n.º 226/VIII, que acabámos de votar, em meu nome e em nome dos meus colegas que se abstiveram.

O Sr. Presidente: - Fica registada a sua declaração, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos, então, votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 228/VIII - Acompanhamento e apreciação pela Assembleia da República da participação de Portugal no processo de construção da União Europeia (PS), que discutimos ontem à tarde.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, votos contra do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP, de Os Verdes e do BE.

Página 1557

1557 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

Este projecto de lei baixa à 10.ª Comissão.
Srs. Deputados, relativamente aos projectos de lei n.os 317/VIII - Altera o regime jurídico do contrato de trabalho a termo, combatendo a precaridade no emprego (PCP), 324/VIII - Alteração do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro (Contrato de trabalho a termo) (BE) e 342/VIII - Altera o regime jurídico do contrato de trabalho a termo (PS), foi apresentado pelo PCP, PS e BE um requerimento de baixa à 9.ª Comissão, sem votação na generalidade, por um prazo de 30 dias.
Srs. Deputados, vamos votar este requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, tendo sido aprovado o requerimento de baixa à 9.ª Comissão sem votação, não se fará a votação dos referidos projectos de lei.
Terminadas as votações regimentais, o Sr. Secretário vai dar conta de alguns relatórios e pareceres da Comissão de Ética.

Neste momento, alguns Srs. Deputados começam a abandonar a Sala.

Srs. Deputados, peço-vos que não comecem a sair. O ligarem menos importância a este tipo de votação do que àquelas que acabámos de fazer é, a meu ver, um hábito reprovável que temos de corrigir. É um hábito, eu sei, porventura corresponde a algumas necessidades prementes,…

Risos.

… mas esperar mais um pouco mais não custa nada.
Faça favor, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do 4.º Juízo do Tribunal Criminal da Comarca de Lisboa - processo n.º 7547/94.4TD - 2.ª Secção - a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Odete Santos (PCP) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do 2.º Juízo Criminal do Tribunal da Comarca de Santarém, processo n.º 436/00, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Jorge Lacão (PS) a prestar depoimento, como testemunha, no âmbito dos autos em referência, em audiência marcada para o próximo dia 22 de Janeiro de 2001, pelas 10 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Visto não haver objecções, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Abrantes, processo n.º 292/00, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Jorge Lacão (PS) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do 2.º Juízo Criminal do Tribunal da Comarca de Santarém, processo n.º 436/00, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Manuel Alegre a prestar depoimento, como testemunha, por escrito, no âmbito dos autos em referência.

Página 1558

1558 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação de Varas de Competência Mista de Guimarães, processo n.º 173/00, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Cândido Capela Dias (PCP) a prestar depoimento, como testemunha, no âmbito dos autos em referência, em audiência marcada para o próximo dia 2 de Março de 2001, pelas 14 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Como não há objecções, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal de Instrução Criminal e Évora, processo n.º JIC 543/2000 - 1139/98 - 2, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Maria do Céu Ramos (PSD) a prestar depoimento, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, processo n.º 391/2000 - Acção Sumária, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Manuel Moreira (PSD) a prestar depoimento, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Como não há objecções, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do 2.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Espinho - Carta Precatória n.º 196/00 -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Rosa Maria Albernaz (PS) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Como não há objecções, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos, agora, prosseguir a discussão, conjunta, dos projectos de lei n.os 288, 337 e 341/VIII, que havíamos interrompido para proceder às votações regimentais.
Assim, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, os três projectos de lei que estão em apreciação suscitam cinco questões, do nosso ponto de vista.
Em relação à questão que parece ser a mais substantiva e aquela em que parece existir maior consenso, permito-me começar por recordar que, há exactamente três anos atrás, o CDS-PP se não tivesse enganado na sua votação não estaríamos aqui, hoje a discutir esta matéria.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Só o engano é que permitiu o consenso!

O Orador: - Certamente não seria o Defensor do Contribuinte! A questão de a defesa dos contribuintes ser feita por uma instituição com um responsável eleito directamente pela Assembleia da República estava resolvida com o problema do Provedor de Justiça.
Mas é evidente que a votação existiu tal como se concretizou, o Defensor do Contribuinte existe e não há que ter em atenção aquilo que, na altura, era nossa posição, como, aliás, a posição dos restantes grupos parlamentares da oposição, de que não deveria haver uma tentativa de, pelo menos, redução dos poderes do Provedor de Justiça. O assunto, como ia a dizer, está dirimido nesta perspectiva, existe o Defensor do Contribuinte, e, pela nossa parte, estamos de acordo - e esta é a primeira questão suscitada pelos projectos de leis - em que o Defensor do Contribuinte deixe de ser nomeado pelo Governo e passe a ser eleito pela Assembleia da República.
Mas eu gostaria de lembrar algo que foi referido hoje pelo Sr. Defensor do Contribuinte. Disse ele: «Haverá formalmente uma maior imagem de independência (…)», no entanto, e volto a citar «(…) de que serve a absoluta independência se continuar a depender da Administração Pública, sem orçamento próprio»?! Ora, esta é uma questão que não está em qualquer dos projectos de lei.
Por conseguinte, julgo que, em termos de discussão, de debate na generalidade, devemos clarificar entre todos os grupos parlamentares se, de facto, queremos dar, não apenas em termos meramente formais, maior independência ao Defensor do Contribuinte ou se não queremos. Se queremos dar maior independência - independência de facto - ao Defensor do Contribuinte, o que vem nos projectos de lei apresentados parece insuficiente face às questões que devem ser suscitadas.
A segunda questão que quero colocar é a da forma de eleição do Defensor do Contribuinte. E eu gostaria de dizer que em relação à eleição do Defensor do Contribuinte pela Assembleia da República por maioria de dois terços temos objecções, embora esta proposta seja comum aos três projectos de lei.
Sabendo que existem também alguns inconvenientes ou alguns riscos, se se quiser, se a eleição não for por maioria de dois terços, parece-nos que a própria experiência demonstra que é altura de acabar com aquilo a que está a pretender-se transformar num monopólio do PS/PSD, de designação de entidades que sejam nomeadas e eleitas pela Assembleia da República. Não só para acabar com esse monopólio mas também, como dizia há pouco, face à experiência passada, para evitar situações como aquela que tivemos para a eleição do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações de Segurança, do SIS. Durante cinco anos não tivemos esse Conselho de Fiscalização porque o PS e o PSD não se entendiam entre eles! Os restantes grupos parlamentares e o País estiveram cinco anos sem esse Conselho de Fiscalização! Em meu entender, isto não serve a própria democracia.
Aliás, há um outro exemplo recente que se verificou com o próprio Provedor de Justiça. A situação arrastou-se durante mais tempo do que seria aceitável, precisamente por não ter havido um acordo entre os dois grupos parlamentares.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas não foi essa a razão!

Página 1559

1559 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Orador: - Por conseguinte, fica a nossa objecção, desde já, a essa necessidade de dois terços, e espero que, em sede de especialidade, possa haver a abertura de, pelo menos, mais alguns grupos parlamentares para se alterar esta situação.
A terceira questão que quero colocar, apesar de já a ter referido há pouco, é a necessidade de acrescentar algo aos projectos de lei: a atribuição de capacidade efectiva ao Defensor do Contribuinte para que ele possa exercer cabalmente as suas funções.
Quanto à quarta questão, que é suscitada, se a memória não me trai, apenas pelo projecto de lei do Bloco de Esquerda, gostaria de deixar aqui algumas reservas, sem prejuízo de, em sede de especialidade, podermos analisar a questão com maior profundidade e cuidado. Mas, à partida, temos algumas dúvidas que a atribuição de poder de intervenção em processo judicial ao Defensor do Contribuinte seja uma via correcta e desejável para o papel que deve ter o Defensor do Contribuinte.
A quinta e última questão tem a ver com o projecto de lei do CDS-PP. Pela nossa parte, e para os tempos mais próximos, o problema do acesso da administração fiscal ao sigilo bancário está dirimido. É público e conhecido que consideramos que aquilo que foi aprovado, em sede da reforma fiscal relativa aos impostos sobre o rendimento, ficou aquém daquilo que seria desejável, mas durante algum tempo vamos manter a situação como está. A lei acabou de ser aprovada, há meia dúzia de dias, pelo que não faria qualquer sentido estarmos a propor de novo alguma alteração no âmbito de um maior alargamento da abertura do sigilo bancário para efeitos fiscais. O que nos conduz também a não embarcarmos - peço desculpa pela expressão, que não tem qualquer sentido pejorativo - no «engodo» que nos é lançado pelo projecto de lei do PP e vir, agora, criar ainda mais restrições à abertura do sigilo bancário para efeitos fiscais.
São estas as questões, Sr. Presidente, que se nos oferece dizer sobre esta matéria.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, uso da palavra, tão-só, para, como muitos Srs. Deputados já sabem, dar à Câmara uma explicação pelo facto do Sr. Ministro das Finanças não se encontrar hoje entre nós, como seria seu desejo, mas ele está numa reunião do ECOFIN a defender interesses nacionais e a cumprir um dos deveres que também tem.
Por outro lado, significou publicamente uma atitude de total aplauso do Governo ao sentido essencial da medida que hoje temos entre mãos e que a Câmara, pelos vistos, pretende aprovar por um consenso alargado no essencial.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E eu, tendo tomado boa nota das observações, das opiniões e, até, das reservas que aqui ficaram formuladas, tendo escutado atentamente todas essas intervenções, só diria uma coisa que senti, enquanto tudo ouvia: saboreemos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, este momento em que algo que dividiu fortemente a Câmara deixou de dividir. É preciso, em democracia, saborear os momentos em que as dificuldades são superadas e em que se consegue, por consenso alargado, obter soluções legais, que, como no caso concreto acontece, vão no sentido do reforço dos direitos dos cidadãos e de dissipar nuvens, interrogações e dúvidas - algumas legítimas, outras absolutamente despropositadas - sobre as intenções da administração fiscal e do Governo, no que diz respeito aos direitos dos cidadãos. As intenções são as que fluem da lei que concebe e consagra garantias; os meios são os previstos na lei, dentro dos seus limites; e a execução deve ser feita neste exacto quadro.
O que é o Defensor? O Defensor é uma garantia adicional, não substitui todas as outras. Não visa competir com o Provedor de Justiça, que tem um estatuto próprio, que, de resto, exerce de maneira activa, diligente. O Defensor não tem, de resto, poderes que o Provedor de Justiça tem, em vários domínios, mas tem outros. E, portanto, completam-se os dois sistemas.
Saboreemos, pois, o momento, porque, por vezes, em democracia há uma tendência pérfida para aquilo a que se pode chamar a «PGD», o salto para a próxima grande dificuldade. E eu vi a síndrome da «PGD» um pouco espalhado aqui e além também neste debate, e proponho, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não o adoptemos como lema da Câmara, porque essa dificuldade também é superável.
A eleição por maioria de dois terços tem uma característica, busca uma base de consenso alargada e visa um esforço de encontrar pessoas, o que, por vezes, tem dificuldades, mas tem, como contrapartida, uma legitimidade alargada e garantias que são relevantes em regime democrático. Por isso, a Constituição o escolheu para diversos cargos; por isso, ela pode ter um lugar nesta matéria e em relação a este cargo. O Sr. Ministro das Finanças teve ocasião de sublinhar isto, inequivocamente, há algumas horas e o Sr. Primeiro-Ministro, no quadro da discussão do que poderia ser a reforma do Ministério das Finanças, sublinhou a importância desta medida.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, este é um excelente momento e só posso dizer duas coisas, a terminar. Em primeiro lugar, o Sr. Ministro das Finanças estará evidentemente disponível para comparecer na comissão, para qualquer contribuição que os Srs. Deputados considerem que seja desejável para este efeito, designadamente, quanto ao perfil, aos meios e à estrutura. A imaginação dos nossos Deputados e do Governo será certamente útil para potenciar as formas de comunicação do Defensor do Contribuinte com os cidadãos. Nesta matéria, estão abertas, à nossa frente, fronteiras, caminhos e vias muito interessantes que, no passado, não existiam. Podemos, aliás, transcender, em muito, a simples afixação de cartazes nas repartições. Já há hoje meios formais e informais de levar aos contribuintes muita informação e de lhes permitir, interactivamente, comunicarem com a administração fiscal e esta já usa, de maneira significativa, esses meios e vai, certamente, usá-los mais. O Defensor do Contribuinte pode também recorrer a esses instrumentos.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, julgo que é um instante para felicitar a Câmara e para exprimir, em nome

Página 1560

1560 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

do Governo, uma profunda satisfação por este resultado estar ao alcance da nossa mão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, gostaria apenas de tomar nota de várias contribuições de Srs. Deputados, que sublinharam, numa espécie de antecipação do debate na especialidade, em que sentidos poderia caminhar esta convergência, a que agora o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares aludiu.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira levantou, entre outros, dois pontos que merecem consideração: um, sobre a importância do orçamento próprio como forma de consagração dos instrumentos de intervenção activa do Defensor do Contribuinte e, outro, sobre a consideração, em sede de especialidade, quanto ao modo de eleição, nomeadamente se deve ter os dois terços como requisito mínimo. São, certamente, pontos que merecem essa consideração atenta.
Outros Srs. Deputados sublinharam a questão da fixação do prazo, quatro ou cinco anos, e se, em função disso, deve ser ou não reconduzível por votação da Assembleia e a questão de precisar o conteúdo da intervenção em processos judiciais. Creio que todas estas matérias são importantes, porque tratam dos assuntos que vamos discutir em sede de especialidade.
Acerca do que importa fazer, opção no voto na Assembleia, é a continuação e a modificação de um curso e de um processo legislativo, que, até agora, esteve pouco definido ou, em muitos casos, mal definido. O primeiro texto de que parte esta definição de Defensor do Contribuinte conduz a uma função essencial, que é a da apresentação de propostas e recomendações ao Ministro e aos responsáveis do Ministério. É certo que, desde então, nomeadamente no Orçamento do Estado de 1999, foram feitas extensões destes poderes e desta responsabilidade.
Ao serem aprovados, se o forem, os vários projectos de lei, que apontam no sentido claro desta intervenção do Defensor do Contribuinte e na sua capacidade de prestação de informação e de intervenção junto da Administração Pública em defesa dos contribuintes, resultará uma alteração substancial à filosofia original do Defensor. Por isso, como outros, congratulo-me por essa alteração.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, também para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Sr. Presidente, a minha intervenção vai ser muito breve.
Em primeiro lugar, gostava de vos dar conta de um aspecto que, para mim, é importante. Devo confessar-vos, aqui, que me rendi à noção dos restantes colegas de independência. Considero que há órgãos independentes, mesmo no âmbito da Administração, que, apesar de tudo, são nomeados. Sou de um desses órgãos, do Centro de Estudos Fiscais, ao qual me orgulho de pertencer. É um órgão de investigação, é um órgão cientificamente independente, independente a todos os títulos, e, apesar, disso, por acaso, é por concurso que para lá vamos trabalhar. Mas devo confessar-vos que…

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Ainda é por concurso?

A Oradora: - É, ainda é!
Trabalhei com vários governos nessa qualidade e sempre, e em todas as ocasiões, exerci as minhas funções - aliás, a Dr.ª Manuela Ferreira Leite era, na altura, Secretária de Estado - com isenção e total independência.
No entanto, devo confessar que me rendo à vossa concepção de independência se essa significa legitimação democrática. Não me importo nada de também aderir a esses propósitos. Mas não gostaria de o fazer sem aqui deixar, pelo menos, notícia da minha experiência em matéria de isenção, de imparcialidade e de independência, mesmo trabalhando ao serviço do interesse público, que é aquilo que o Centro de Estudos Fiscais sempre fez e continua a fazer.
Em segundo lugar, queria registar, Sr. Deputado Octávio Teixeira, que concordo com a sua preocupação, que, aliás, nos disse que tinha sido traduzida pelo actual Sr. Defensor do Contribuinte. Relativamente ao orçamento próprio, julgo que devemos ponderar sobre isso e, caso as diversas propostas passem à especialidade, julgo seriamente que devemos trabalhar nessa matéria, porque esse sim - deixe-me confessar-lhe -, é um critério essencial do exercício independente das respectivas funções.
Queria, ainda, para finalizar, dizer ao Sr. Deputado Octávio Teixeira que não vou comentar o seu «engodo», porque ele não se me enfiou. E vou dizer-lhe porquê, Sr. Deputado. Em primeiro lugar, porque apresentei as minhas propostas, clara, frontal e para que toda a gente as visse. Portanto, não se trata de um engodo mas de uma convicção, de uma concepção e de outra coisa que o senhor vai ter de reconhecer: hoje, no nosso ordenamento jurídico-tributário, não há nenhuma decisão que possa legalmente ser tomada por quem tem competência no âmbito da administração fiscal para o fazer sem notificar o contribuinte para efeitos do exercício da audição prévia. Quer quando se trata de praticar um acto de liquidação, quer quando se trata de instaurar um processo de averiguações, quer quando se trata de decidir uma reclamação, em todas as fases lei consagra hoje, e bem, um direito fundamental do cidadão contribuinte, que é o direito de audição prévia. O prazo para que esse direito possa ser exercido é, em média, de 15 a 20 dias.
O que propomos, tão simplesmente, no nosso projecto de lei é que, no mesmo prazo, nas mesmas circunstâncias, de acordo com o mesmo procedimento, também o defensor do contribuinte possa pronunciar-se. Isto para atingir uma coisa muito simples, Sr. Deputado Octávio Teixeira - até porque não quero acreditar que o senhor queira leis para nada!: o nosso projecto pretende conferir razão de ser - e não estou a dizer que o que defendo como razão de ser é a razão de ser -, algum conteúdo útil ao n.º 9 do artigo 63.º.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, quer um dever de comunicar? Para quê? Para arquivar? Para registar? Para amontoar? É preciso dar-lhe um conteúdo útil!

Página 1561

1561 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

É por isso, Sr. Deputado Octávio Teixeira, que, a nosso ver, para reforço da defesa dos direitos dos contribuintes, nos mesmos prazos, da mesma forma, o contribuinte tem o direito de ver apreciada a pretensão da administração fiscal também pelo defensor do contribuinte. Se assim não for, o defensor do contribuinte é apenas para uns efeitos e não para outros.
É este o sentido do nosso projecto de lei. Julgamos, aliás, que temos razão quando preenchemos o que falta de uma norma que está em vigor neste momento. Naturalmente, não se trata de nenhum engodo, trata-se de uniformizar, de harmonizar as diversas regras existentes no nosso ordenamento jurídico-fiscal.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira para uma intervenção.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, é apenas para dizer duas coisas em relação à intervenção que acabámos de ouvir.
Em primeiro lugar, quanto à questão de o engodo ser ou não visível,…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - É o da pesca!

O Orador: - … digo-lhe que há um, muito popular, que é a cenoura,…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - E a minhoca?

O Orador: - … que é visível e até tem uma cor que salta à vista.
Devo dizer-lhe que falei em engodo, embora sem qualquer sentido pejorativo, precisamente porque há o problema do parecer. Isto é, o que os senhores propõem é que o defensor do contribuinte dê um parecer. Só que, na legislação sobre defesa do contribuinte, há vários artigos que determinam que a administração fiscal, pelo menos em princípio, deve seguir os pareceres e as recomendações do defensor do contribuinte.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Mas não são vinculativos!

O Orador: - Na prática, no entanto, já que desapareceu o juiz, mete-se aqui o defensor para servir de juiz. É por isso que não vamos nessa!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que está encerrado o debate conjunto, na generalidade, dos projectos de lei n.os 288, 337 e 341/VIII.
Passamos ao próximo ponto da ordem de trabalhos para hoje que consta da discussão conjunta dos projectos de resolução n.os 86/VIII - Em defesa da Casa do Douro e da vitivinicultura duriense (PCP), 94/VIII - Situação actual na Região Demarcada do Douro (PS) e 96/VIII - Reequilíbrio financeiro da Casa do Douro e defesa da viticultura duriense (PSD).
Para introduzir o debate relativamente ao projecto de resolução apresentado pelo seu grupo parlamentar, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 14 de Dezembro passado, no debate aqui realizado sobre a Casa do Douro e onde anunciámos e apresentámos o projecto de resolução que hoje debatemos, afirmou o Ministro da Agricultura que o PCP apresenta «algumas propostas concretas que, naturalmente, são bem acolhidas pelo Governo.»
Mas disse mais o Ministro: o PCP anunciou «um projecto de resolução com cinco pontos» que «está, antecipadamente, condenado ao sucesso…»
Pois bem, Srs. Deputados, depois desta declaração do Ministro da Agricultura, ainda não há um mês, bem se poderia dizer que o debate de hoje se resumiria quase à sua votação e aprovação formal. Temos, por isso, a expectativa de que o PS, ao contrário das declarações que foram sendo produzidas ao longo do dia de hoje, seja coerente com o que o seu Ministro da Agricultura aqui afirmou, há pouco mais de um mês. Será assim? Veremos!
A verdade é que, apesar das promessas do Governo, porventura pressionado pelos milhares de durienses que então vieram a Lisboa, até agora, nada foi concretizado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Não foi iniciado nenhum processo de negociação conducente à devolução à Casa do Douro dos poderes públicos e respectivas receitas que lhe foram retirados quando da criação da CIRDD, designadamente no que se refere aos poderes de controle da disciplina e de regulação de produção do vinho fino e, em especial, do cadastro, das contas-correntes, da recepção e controlo das declarações de produção-manifesto, do controlo das declarações de pagamento das compras do comércio à lavoura, da intervenção no escoamento dos vinhos não comercializados, da autorização de benefício.
Não foi aberta nenhuma perspectiva que permita resolver, de forma sustentada, as dificuldades financeiras da Casa do Douro, designadamente através da compensação pelo Estado dos prejuízos derivados de muitas receitas perdidas em resultado de decisões administrativas a que a Casa do Douro foi alheia. Pois bem, são estes, no fundamental, os pontos que queremos ver resolvidos e que, por isso, propomos no nosso projecto de resolução.
PSD e Partido Socialista decidiram, entretanto, apresentar também a debate dois projectos de resolução.
O do PSD, que, na quase totalidade, repete as preocupações e as propostas do PCP,…

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - É verdade, sim, Srs. Deputados! Não há mal nenhum nisso! O que é bom é para ser repetido e apoiado!
Como dizia, o projecto de resolução do PSD tem uma ausência notória. Devido, porventura, a problemas de má consciência, o PSD não propõe que se devolvam à Casa do Douro alguns dos poderes públicos que lhe foram usurpados, exactamente por iniciativa do seu governo.
Quanto ao do Partido Socialista, aplica-se-lhe aquela velha fórmula: «se bem não faz, mal também não traz». Isto é, o projecto de resolução do PS não vincula o Governo a nenhuma decisão concreta…

Página 1562

1562 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Nenhum projecto de resolução vincula! O do PCP também não!

O Orador: - … que permita abrir caminho a uma resolução sustentada dos problemas da Casa do Douro.
E, sobretudo, omite a porventura mais urgente e imediata questão: a da necessidade da injecção de meios financeiros na instituição duriense através da indemnização pelo Estado das dívidas deste devido às receitas que a Casa do Douro deixou de arrecadar em consequência das funções públicas que lhe foram retiradas e devido a muitas decisões do Estado que redundaram em prejuízo para a lavoura duriense.
Ora, o que interessa aqui, hoje, é que a Assembleia da República, dando corpo ao que, em palavras, é afirmado por todos como uma grande questão de consenso, afaste divergências e convirja no que é fundamental.
O que é fundamental, quanto a nós, é que, para além e por cima das naturais divergências entre as bancadas, se criem as condições para uma solução duradoura e estável para a Casa do Douro e para os vitivinicultores durienses. É neste sentido que aponta o projecto de resolução do PCP. Apelamos, por isso, à sua aprovação.
Mas se for caso disso, Srs. Deputados do Partido Socialista em especial, estamos disponíveis a contribuir para um consenso que permita, excepcionalmente, fazer baixar os três projectos de resolução à Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas de modo a que, aí, em tempo breve e útil, se tente elaborar um texto comum que responda ao essencial. E, como disse, o essencial é garantir a viabilidade e o futuro da Casa do Douro para que a produção e os produtores durienses não se vejam despojados da sua instituição.
O essencial, Srs. Deputados, é que passemos das palavras aos actos.

Aplausos do PCP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Narana Coissoró.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista demonstra, mais uma vez, estar interessado em ser parte, de forma activa, construtiva e realista, da solução de um problema. No caso vertente, dos problemas que se prendem com a situação actual da Região Demarcada do Douro.
O projecto de resolução n.° 94/VIII mostra que não ficámos indiferentes às razões que, há pouco mais de um mês, trouxeram muitos lavradores do Douro à Assembleia da República, todos eles, quero crer, imbuídos de boa fé e sinceramente esperançados em receber uma resposta positiva do Parlamento.
Na intervenção que, então, aqui produzi, expus - tentei, ao menos, fazê-lo - a minha interpretação dessa atitude dos durienses e que traduzi nas seguintes palavras: «Vieram lembrar que o Douro tem especificidades como nenhuma outra região demarcada e que os diplomas legais podem perfeitamente ter presente essa realidade; vieram dizer que o quadro jurídico-institucional pode ser melhorado, face à experiência dos últimos cinco anos; vieram pedir apoio para a sua Casa do Douro, instituição que os representa e que tem desempenhado e desempenha um importante papel na produção do vinho que ainda continua a ser o grande embaixador de Portugal - o Vinho do Porto (…)».
O nosso projecto de resolução, bem como a disponibilidade que o Governo então demonstrou, enquadra-se nesse espírito e procura dar-lhe corpo e expressão.
A «Exposição de motivos» é objectiva e clara quanto à real situação da Região Demarcada do Douro. O articulado sintetiza em três pontos, de forma realista, um quadro de soluções possíveis para um conjunto de questões que traduzem verdadeiros problemas com que a região se tem confrontado.
De entre eles, ressalta a necessidade de uma avaliação do actual quadro jurídico-institucional, criado em 1994-1995 e que tem mostrado debilidades e ineficiências, por um lado, e, por outro, manifesta existir algum desequilíbrio entre as profissões no próprio funcionamento do interprofissionalismo.
Propõe-se, assim, o «empenhamento do Governo na consensualização de um modelo interprofissional que tenha em vista o reforço da participação e um mais justo equilíbrio de atribuições entre os sectores da produção e do comércio.»
Não se questiona a coerência global do modelo, mas reconhece-se a necessidade de introduzir melhorias, inclusive na clarificação das competências dos organismos que intervêm na região ou que detêm tutela sobre a mesma.
É que uma certa sobreposição de competências em nada beneficia a região. Pelo contrário, tem criado situações de conflito. Por outro lado, impede mesmo o bom funcionamento da própria Administração e provocam confusão e desperdício de tempo a todos aqueles que têm de recorrer aos serviços que têm a ver com esta região demarcada.
É tendo presente esta realidade que se propõe que o Governo «avalie o actual quadro de competências das entidades com poderes de actuação na Região Demarcada do Douro». Não só no domínio da fiscalização, mas também nesse domínio, porque a garantia da manutenção do prestígio e da imagem de um produto de excelência como é o Vinho do Porto não permite contemplações com situações menos claras que não respeitem as exigências de qualidade, indispensáveis à manutenção do seu bom nome.
O reconhecimento da especificidade do Douro, a realidade socioeconómica da região, com uma profusão de pequenas parcelas e uma média de área de vinha por proprietário muito baixa exigem, da parte do Governo, uma atenção redobrada.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por isso se propõe que «o Governo reforce os mecanismos de audição e de participação das organizações representativas dos produtores, designadamente da Casa do Douro.»
Essa «audição e participação», para ser mais eficaz e produtiva, não deve restringir-se só aos aspectos que têm a ver com os instrumentos de política que se destinam ao investimento e à criação de melhores condições de produção.

Página 1563

1563 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não incluímos, no articulado do nosso projecto de resolução, nenhum ponto sobre a situação financeira da Casa do Douro.

O Sr. João Maçãs (PSD): - Lá isso é verdade!

O Orador: - O Grupo Parlamentar do Partido Socialista está sensibilizado para essa questão, no quadro do apoio que damos à solução global do problema.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Contudo, ainda há pouco tempo, dando cumprimento à Resolução do Conselho de Ministros n.° 24/97, foi assinado um protocolo entre a Casa do Douro e o XIII Governo Constitucional e, na sequência do mesmo, foi necessário desencadear um processo negocial que envolveu diversas outras entidades. Este acto releva, indiscutivelmente, o interesse do Governo e o apoio do PS à Casa do Douro.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem! Esse é que é o caminho!

O Orador: - Ora, na sequência do compromisso assumido pelo Sr. Ministro da Agricultura, no debate de urgência do dia 13 de Dezembro, está já marcada, para o próximo dia 23, uma reunião de trabalho entre ele próprio e a direcção da Casa do Douro para enfrentar também este problema.
Torna-se, pois, dispensável e desnecessário esse ponto na resolução. Mais: estou profundamente convencido de que a análise dessa situação numa mesa negocial pode ser bem mais eficaz e proveitosa para a própria instituição duriense do que a que nós possamos produzir aqui.
Além do mais, a resolução da vertente financeira só pode ser obtida através de actos administrativos. Ora, a introdução desse ponto no nosso projecto de resolução violaria o princípio da separação de poderes.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Essa agora!

O Orador: - Divergimos, por isso, do que é proposto, tanto no projecto de resolução do PCP como no do PSD.
O primeiro, o do PCP, propõe que o Governo assuma as dívidas da Casa do Douro. O que há de novo nesta proposta, Srs. Deputados? Que o Governo injecte milhões de contos na Casa do Douro?
É que «apoiar a resolução, de forma sustentada, da crise financeira da Casa do Douro», tal como consta do vosso projecto de resolução, Srs. Deputados do PCP, é o que o anterior e o actual Governo vêm fazendo. O protocolo que referi destinava-se a isso mesmo.
O PSD, por sua vez, propõe que «o Governo assuma (…) as contrapartidas financeiras devidas à Casa do Douro, resultantes da reforma institucional efectuada em 1995» - citei -, reforma, aliás, da responsabilidade do governo do PSD.
Por isso, é legítimo que pergunte: está prevista, na legislação de 1995, a assumpção dessas contrapartidas? Algum membro do governo de então assumiu, em público ou em privado, essa responsabilidade? Francamente, julgo que não.
O Grupo Parlamentar do PCP propõe, ainda, a «recuperação, por parte da Casa do Douro, de competências que detinha antes de 1995.»
Ora, todos sabemos que, de todo, não é possível voltar a fazer da Casa do Douro uma instituição corporativa ou uma entidade majestática que foi até 1990, mas que, hoje, não pode continuar a ser.
O PSD introduz, ainda, uma recomendação relativa aos trabalhadores da Casa do Douro que são funcionários públicos. Recomendação esta também desnecessária, pois o Governo já cumpriu mais este compromisso, tendo já enviado para publicação no Diário da República a respectiva portaria. Os trabalhadores da Casa do Douro nesta situação sabem reconhecer o esforço do Governo na resolução dos seus problemas. Aliás, também no próximo dia 23, a concretização do que está regulamentado constará da reunião de trabalho entre o Sr. Ministro da Agricultura e a direcção da Casa do Douro.
A exigência que consta do ponto 5 do projecto de resolução do PSD nem merece comentários. Rejeitamo-la liminarmente.
Nestes pontos, Srs. Deputados do PCP e do PSD, não vos acompanhamos, não podemos acompanhar-vos.
Mas os restantes pontos estão contidos, de uma ou outra forma, no articulado do nosso próprio projecto de resolução. Nele está plasmado o que é possível, razoável e racional fazer constar numa resolução, tendo presente a realidade actual, a situação actual da Região Demarcada do Douro.
Por tudo isso, pode merecer perfeitamente a vossa adesão ou aceitação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Lino de Carvalho e Melchior Moreira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, o Partido Socialista entendeu não abrir qualquer debate aquando da primeira intervenção do PCP, mas como não quero que o Partido Socialista fuja ao debate e às respostas concretas sobre alguns problemas, ficando-se pela retórica discursiva que foi feita da tribuna, gostaria de interpelar o Sr. Deputado António Martinho acerca de uma ou duas questões concretas.
Em primeiro lugar, queria dizer que o Partido Socialista, finalmente, reconhece a razão que nos assistia pelo menos num ponto: é necessário alterar a actual arquitectura institucional da Casa do Douro para reequilibrar o funcionamento da região e, porventura, restituir à Casa do Douro alguns poderes que lhe foram retirados. Já é um avanço!
Isto porque, em 1995, quando aqui colocámos exactamente essa questão no debate que então se fez, alertando para os perigos que vinham em termos de desequilíbrios na região e de agravamento da situação financeira pelo facto de terem sido retiradas à Casa do Douro determinadas funções públicas, o Partido Socialista ignorou a nossa crítica e, portanto, fez vingar, conjuntamente com o PSD,

Página 1564

1564 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

o projecto de lei da criação da CIRDD, nos exactos termos em que foi feito.
Hoje, o PS já reconhece que é preciso mudar algo. É um avanço, que saudamos.
Quanto à questão central - o problema financeiro -, recordo que, no memorando sobre a situação da Casa do Douro do então Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro, se referia, a certa altura, que o Governo se comprometia a elaborar uma estratégia de viabilização económica e financeira da Casa do Douro onde fossem ponderadas as receitas e outras fontes de rendimento da mesma, no quadro de um estudo que, na altura, foi elaborado por uma entidade independente e entregue ao Governo e no qual se concluía que haveria um valor de dívida do Estado à Casa do Douro de cerca de 11,5 milhões de contos, pelas razões várias que há pouco aqui citei.
A minha questão é esta: esse documento já não vale nada, Sr. Deputado? Essa ponderação que, na altura, o Governo entendia que deveria ser tida em conta já não vale nada? Então, porque é que o Governo a reconhecia? Porque é que o Sr. Ministro afirma que vai reunir com representantes da Casa do Douro no próximo dia 23 para discutir estes aspectos financeiros? Pelo menos, isso já é um avanço deste debate!
Quando os durienses vieram a Lisboa, o Sr. Ministro decidiu recebê-los, ir ao Douro, fazer promessas… Hoje, o facto de estarmos a travar este debate fez com que o Sr. Ministro da Agricultura decidisse marcar uma reunião com representantes da Casa do Douro, a fim de discutir estes problemas. Muito bem! Afirma-se aquela tese de que é preciso o País «mexer-se» para que o Governo faça algo e dê resposta às necessidades.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O Governo não age mas reage!

O Orador: - Mas se é assim, Sr. Deputado, se tudo está encaminhado, qual é a dificuldade de aprovarem hoje o nosso projecto de resolução e assumirem aqui o compromisso que o Sr. Deputado afirma que vai ser aberto nas negociações que o Governo tem previstas para o próximo dia 23?
Este é o desafio que lhe lançamos, Sr. Deputado, porque a nossa preocupação é só uma: a de criarmos as condições para salvaguardar o futuro da Casa do Douro enquanto instituição representante da lavoura e defensora dos produtores durienses.

Vozes do PCP e de alguns Deputados do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Como o Sr. Deputado António Martinho dispõe de pouco menos de 1 minuto para responder, presumo que o melhor será responder conjuntamente aos dois pedidos de esclarecimento.

O Sr. António Martinho (PS): - Sim, Sr. Presidente.

O Presidente (Narana Coissoró): - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Melchior Moreira.

O Sr. Melchior Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Martinho, vou ser muito breve, mas não posso deixar de colocar-lhe algumas questões, algumas delas já abordadas pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.
É lamentável e notório que, ultimamente, quer nesta matéria quer noutras, o Partido Socialista tem manifestado claramente uma crise de autismo, pois creio que as mobilizações dos agricultores do Douro aqui, na Assembleia da República, não fizeram qualquer eco na bancada do Partido Socialista. Aliás, era importante que o próprio Governo hoje estivesse presente - lamento a sua ausência, que me parece uma falta de respeito - num debate desta importância.
Ora, se é essa a vontade do Sr. Ministro da Agricultura - a de resolver o problema financeiro da Casa do Douro -, através da reunião anunciada pelo Sr. Deputado António Martinho, então por que é que não está aqui hoje, «a dar a cara», para resolver efectivamente esse problema financeiro que nos aflige a todos?

Aplausos do PSD.

Lamento profundamente essa postura do Sr. Ministro da Agricultura!

Vozes do PS: - Isso é demagogia!

O Orador: - Sr. Deputado, quero dizer-lhe que um projecto de resolução é uma iniciativa que deve apresentar pistas e soluções mas, lamentavelmente, o do PS é um projecto de indefinição; o projecto de resolução do PS não traz absolutamente nada, nem à viticultura duriense, nem aos agricultores, nem à associação representativa dos agricultores do Douro, que é a Casa do Douro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O seu projecto de resolução vale zero! De uma vez por todas, porque chega de andarmos a enganar as pessoas, era importante que o projecto de resolução do PS mostrasse um sinal claro em relação à situação financeira da Casa do Douro, mas o meu amigo limita-se apenas a anunciar uma determinada reunião… Sr. Deputado, não basta o Partido Socialista estar sensibilizado, é preciso apontar metas, é preciso agir, é preciso apontar soluções! E eu não as vejo.
Para terminar, Sr. Deputado, coloco-lhe as seguintes perguntas muito concretas: entende ou não que a Casa do Douro deve ter uma indemnização financeira pela perda de competências e naturais receitas? Entende, também, que o estudo económico que está na posse do Governo do Partido Socialista serve, ou será que não serve? E esse é um estudo com credibilidade para viabilizar a Casa do Douro? Se o estudo não serve, por que é que não avançamos com a realização de um novo estudo para resolver esses problemas da Casa do Douro?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Marinho, que dispõe de mais 2 minutos cedidos pela Mesa para o efeito.

Página 1565

1565 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, afinal, no projecto de resolução do Grupo Parlamentar do PS existe algo de concreto. Aliás, quero lembrar-lhe que, em 1994/1995, as nossas bancadas confluíram em vários aspectos, aceitando nós, naturalmente, o princípio do interprofissionalismo para a Região Demarcada do Douro. E a aceitação desse princípio levou-nos, num ou noutro aspecto, a que não votássemos no mesmo sentido os mesmos pontos. Mas a verdade é que muitos deles foram votados em conjunto.
O protocolo assinado entre a Casa do Douro e o Governo está em vigor, Sr. Deputado Lino de Carvalho. Aliás, na intervenção que proferi referi que, tal como consta da exposição de motivos do projecto de resolução do PS, é importante que o protocolo possa continuar o seu caminho, porque ele criou condições para que a Casa do Douro se visse liberta de dívidas ao fisco; se visse liberta de dívidas à Caixa Geral de Aposentações; se visse liberta de uma dívida a uma empresa privada por causa da aquisição dos 40% das acções da Real Companhia Velha.

Vozes do PS: - Bem lembrado!

O Orador: - No fundo, serviu para enquadrar um conjunto de medidas que fizeram com que a Casa do Douro deixasse de estar sob a ameaça constante de execuções judiciais e de hastas públicas. Ou seja, serviu para alguma coisa!
Nesse sentido, presto a minha homenagem aos dirigentes da Casa do Douro, na medida em que eles têm feito um grande esforço para cumprir a parte financeira que lhes diz respeito. É, pois, como Deputado eleito pelo distrito de Vila Real que lhes presto aqui a minha homenagem!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E peço ao Governo…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Ao Governo!

O Orador: - … que seja capaz de encontrar um quadro de solução para continuar a apoiar aquela situação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Naturalmente, foi com a autorização do Sr. Ministro da Agricultura que anunciei há pouco que, no próximo dia 23, irá iniciar-se um conjunto de reuniões para se encontrar um quadro de soluções.

Vozes do PSD: - É o costume: mais diálogo!

O Orador: - Srs. Deputados, penso que sou coerente com o que sempre defendi. E o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, ao anunciar, mais uma vez, o seu empenhamento na solução dos problemas, está a ser coerente com o que fez em 1996, 1997 e 1998, bem como com as posições que assumiu anteriormente.
Sr. Deputado Melchior Moreira, o estudo que foi feito a pedido da Casa do Douro, sob proposta do Governo, tem o seu valor e ajudou a enquadrar e a fundamentar este protocolo, estudo que já resultou de alguma filosofia que está subjacente ao protocolo. Além de que esse protocolo também cumpriu a sua missão.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Queira terminar, Sr. Deputado, uma vez que já ultrapassou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Agradeço-lhe muito a sua benevolência, Sr. Presidente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Nazaré Pereira.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estão hoje em discussão, nesta Assembleia, dois projectos de resolução: o projecto de resolução n.º 86/VIII, do Partido Comunista Português, em defesa da Casa do Douro e da viticultura duriense, e o projecto n.º 96/VIII, do Partido Social Democrata, que defende o reequilibro financeiro da Casa do Douro e defesa da viticultura duriense.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não me enganei, Sr. Presidente e Srs. Deputados, disse «dois projectos de resolução» porque, mais uma vez, o Partido Socialista se alheia da resolução dos actuais problemas que afectam a região do Douro, em grande parte - se não em exclusivo -, da sua inteira e completa responsabilidade,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - Isso é um absurdo!

O Orador: - … apresentando a esta Assembleia um documento que designa de «projecto de resolução» mas que de resolução não tem nada!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O projecto do Partido Socialista, politicamente e na realidade, não existe.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma fraude!

O Orador: - Não é nada, não propõe nada, recomenda zero e vale zero.

Aplausos do PSD.

É um zero à esquerda ou, se quisermos, uma esquerda a zero.

Protestos do PS.

O projecto de resolução do Partido Socialista entretém, adia, engana os viticultores durienses com mais empenhamento em diálogo, avaliação de quadro de competências, reforço urgente de mecanismos de audição, etc., etc., etc.

Página 1566

1566 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

Palavras vãs, vazias de conteúdo que, no fundo, mostram que o Partido Socialista e o Governo não têm projecto para o Douro, não têm capacidade para resolver os problemas que deixaram criar. Não sabem, afinal, governar.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

De uma vez por todas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Douro precisa de um Governo que governe; o Douro precisa de um Governo que resolva problemas;…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é só o Douro!

O Orador: - … o Douro precisa de um Governo que seja competente e não tente asfixiar economicamente a Casa do Douro, despojando-a de competências e de capacidades de intervenção.

Protestos do PS.

Os durienses criaram o Douro, fonte de riqueza e de orgulho deste País. Pelos vistos, o Partido Socialista está a precisar de conhecer a força e a coragem dos homens do Douro. Só então compreenderá que no Douro a palavra é só uma e a honra não tem preço.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, é conhecida a responsabilidade do Partido Social Democrata nas reformas institucionais introduzidas na região em 1995.

Vozes do PS: - Foram vocês que a fizeram!

O Orador: - Somos um partido reformista, capaz de provocar alterações, de conceber e implantar reformas estruturais que preparem o País para o futuro.

Vozes do PS: - Vê-se!

O Orador: - Um futuro mais próspero e melhor para todos os portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sabemos que as reformas são incómodas. Alteram o ritmo do dia-a-dia, mudam os hábitos e os costumes, modificam as relações de poder e as relações de interesses, alteram equilíbrios e exigem esforços de todos os agentes envolvidos para se adaptarem às mudanças. Mas as reformas trazem maior produtividade, mais rendimento e mais riqueza; preparam as regiões e o País para serem mais fortes na competição internacional; preparam os portugueses e Portugal para o futuro.
Em 1995, a reforma institucional que introduziu o modelo interprofissional na região do Douro teve inúmeros opositores. Provavelmente, na região, o PSD perdeu muitos votos por causa dessa sua ousadia. Mas tínhamos e temos a profunda convicção que foi uma reforma justa e necessária, uma reforma para bem de todos e, em particular, para bem do Douro e de Portugal.

O Sr. Miguel Ginestal (PS): - É a má consciência a falar!

O Orador: - É essa a nossa sina.
Srs. Deputados, ousamos vencer, ousamos ir mais além. Somos capazes de criar rupturas e reformas, porque sabemos que temos que vencer rapidamente um atraso estrutural.

O Sr. Miguel Ginestal (PS): - Só palavras!

O Orador: - E os problemas, Srs. Deputados do Partido Socialista, não se resolvem escondendo a cabeça na areia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Temos a honra de herdar a ousadia e o rasgo de Sá Carneiro. Somos capazes de separar as águas, somos como o homem do Douro que ousa transformar o xisto e o sol em vinho do Porto. Olhando para os montes e vales, ao principio ninguém acredita, depois é puro néctar.
Verificamos hoje, Srs. Deputados, que muitos dos que demagogicamente, em 1994 e 1995, eram contra o modelo interprofissional agora subscrevem projectos de resolução em que se considera o interprofissional necessário e vantajoso para a região. Evoluíram, mas escondem o que há poucos anos escreveram em artigos e que propalaram discursos contra essa reforma.
Temos esperança de que muitos que sinceramente eram e ainda hoje são contra o interprofissional no Douro venham a reconhecer que estavam e estão errados. Uns estão errados porque o modelo ideológico, político e económico que defendem é errado. Outros estão errados porque não vislumbram que os interesses pessoais e os interesses corporativos são antagónicos com o desenvolvimento da região e o bem-estar futuro dos durienses.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Só por isso - rigorosamente só por isso! - que fique bem claro que não podemos apoiar o projecto de resolução do Partido Comunista Português que, reconhecemos, tem um projecto para o Douro, mas que é, sem dúvida, Srs. Deputados, um projecto antiquado, que não corresponde às exigências da vida económica actual.
Parte dos problemas da região do Douro e da Casa do Douro resultam de o Governo do Partido Socialista ter sido incapaz de acompanhar a aplicação das reformas institucionais introduzidas em 1995.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Nesses decretos-leis previam-se períodos transitórios - e, pelos vistos, há Srs. Deputados que já não se lembram disso - para as transferências de competências entre instituições, como por exemplo a Casa do Douro e o Instituto do Vinho do Porto para a nova Comissão Interprofissional da Região Demarcada da Região do Douro (CIRDD).
A reforma de 1995 devia ter sido acompanhada pelo Governo como uma criança que se gere, que se alimenta,

Página 1567

1567 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

a quem se ensina os primeiros passos, a quem se instrui o a-bê-cê e se prepara para a vida.
E o que é que o Governo do Partido Socialista fez durante estes seis anos?

O Sr. António Martinho (PS): - Nomeou o Presidente da Comissão Instaladora!

O Orador: - Manteve sem instruções, durante anos, a direcção da CIRDD. Não acompanhou a transferência de competências da Casa do Douro para a CIRDD das correspondentes medidas económicas de compensação da Casa do Douro. Não recompensou a Casa do Douro pelas funções públicas que esta desempenhou durante décadas em nome do Estado. Empenhou-se no esvaziamento de competências da Casa do Douro, mas manteve inalteradas competências do Instituto do Vinho do Porto que, à luz da lei, também deviam ter passado para a CIRDD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queremos que todos os viticultores do Douro tenham condições de igualdade nos processos de legalização da vinha. Queremos que os órgãos representativos dos agricultores sejam respeitados. Queremos uma Casa do Douro com capacidade financeira para promover a evolução dos viticultores, dos técnicos e da região. Queremos que os problemas dos trabalhadores da Casa do Douro sejam resolvidos.
Queremos garantir o futuro da região do Douro e de Portugal. Estamos cansados de promessas, mais promessas e nada mais que promessas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para que feito, Sr. Deputado?

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Para defesa da consideração da bancada do Partido Socialista, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Qual foi a expressão que o chocou particularmente?

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Já vi que V. Ex.ª esteve desatento à primeira parte do discurso do Sr. Deputado Nazaré Pereira, Sr. Presidente. Toda a primeira parte do discurso é um ataque e um insulto à bancada do Partido Socialista. É essa a invocação que faço.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Não estive desatento, Sr. Deputado. Simplesmente não fiquei chocado.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

Risos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - V. Ex.ª não ficou chocado porque felizmente para si e para nós não faz parte da bancada do Partido Socialista.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Nazaré Pereira, V. Ex.ª elaborou aqui um discurso em duas partes. A segunda parte pode ser uma excelente tese de doutoramento, de mestrado ou de pós-graduação - fraca, aliás! -, mas tem pouco a ver com os problemas da Casa do Douro, pelo que nada tenho a comentar.
Relativamente à primeira parte, em que V. Ex.ª reconhecerá que desferiu violentos ataques à credibilidade e honorabilidade dos Deputados do Partido Socialista - aliás, há uma parte em que o Deputado Marques Guedes chama ao projecto de resolução do PS uma fraude,…

Vozes do PS: - Exactamente!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É verdade!

O Orador: - … como o Sr. Presidente estava distraído não ouviu -, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Nazaré Pereira que penso não haver qualquer razão (conheço-o suficientemente no plano pessoal para poder afirmar isto em relação a V. Ex.ª) que leve uma pessoa séria e honesta na sua vida normal a alterar o seu comportamento quando está na disputa partidária. Quero crer, portanto, que V. Ex.ª teve apenas um momento de infelicidade!
V. Ex.ª sabe perfeitamente que as soluções que aqui trouxeram, aliás pela via do PCP, são soluções de valor zero! O senhor sabe que, seja qual for o teor do projecto de resolução que, na próxima quinta-feira, for aprovado, não tem qualquer carácter vinculativo para o Governo. É isto que o senhor tem de explicar às pessoas que se encontram à assistir à sessão nas galerias!

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

Os problemas resolvem-se em diálogo com o Governo, não se resolvem aqui em projectos de resolução demagógicos, que visam apenas «jogar» com o sentimento das pessoas.

Protestos do PSD.

Isso não é legítimo, isso não é correcto. Repito, e falo sobretudo para as pessoas que se encontram nas galerias, qualquer que seja o projecto de resolução que seja aprovado aqui, ainda que fosse aprovado um projecto de resolução que recomendasse ao Governo resolver o problema financeiro, não tem qualquer vinculação para o Governo.

Protestos do PSD.

O Sr. Deputado Lino de Carvalho sabe isso muito bem e disse o contrário quando subiu à tribuna.
O que pode ser vinculativo para o Governo, Sr. Deputado Nazaré Pereira - e foi pena que não estivesse atento a isso -, é o teor da intervenção do Sr. Deputado António Martinho.

Protestos do PSD.

Página 1568

1568 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

Na intervenção do Sr. Deputado António Martinho há uma clara indicação do Grupo Parlamentar do Partido Socialista no sentido de ser também assumida a questão do protocolo financeiro. V. Ex.ª não foi sério, V. Ex.ª não foi correcto!

Protestos de público presente nas galerias.

Sei muito bem como é que se fazem essas manipulações e quem é que paga as deslocações das pessoas!...

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Tenham calma, Srs. Deputados.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Para fazer uma interpelação à Mesa sobre a sua condução dos trabalhos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, acabámos de assistir a uma coisa que foi tudo menos uma defesa de consideração da bancada! Foi um comício em que se fez um ataque à Assembleia da República, em que se disse que a Assembleia da República quando está a discutir projectos de resolução nada está a fazer. E a Mesa não interveio!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Protesto porque a Mesa deveria ter tirado a palavra ao Sr. Deputado Manuel dos Santos, que não estava a fazer qualquer defesa da honra e estava a ofender a honra desta Câmara.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Isso é mentira!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - O Sr. Deputado apenas quis falar, porque aquilo que o Sr. Deputado Manuel dos Santos disse é juridicamente certo. Politicamente, V. Ex.ª interpretará como melhor entender.
Teve o seu minuto de intervenção. Vamos continuar os trabalhos.
Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nazaré Pereira.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, a consideração pessoal que tenho por V. Ex.ª e por muitos dos Deputados do Partido Socialista em termos pessoais, como sabe, é elevada. Todavia, é evidente que tem toda a razão quando afirmou que se tratou de um ataque ao Partido Socialista. Um ataque pela sua inoperância, um ataque pela sua incapacidade para resolver um problema! Não se tratou de qualquer ofensa, e as palavras do Sr. Deputado bem provaram que não estava em causa qualquer honra.
O Sr. Deputado entendeu falar para a audiência que aqui está a acompanhar os trabalhos, V. Ex.ª quis fazer o favor de tentar explicar aqui o inexplicável. É o desconforto que V. Ex.ª e outros Deputados do Partido Socialista têm nesta Assembleia por aquilo que não pode, de modo algum, ser explicado, que é o autismo do Governo relativamente ao Douro!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados resistentes, que aguentaram até este momento, que pena me fez ter visto o bloco central, que tanto se amava, agora tão desavindo - que coisa tão triste!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta não terá sido a primeira vez na sua história que a região do Douro viu acirrados os ânimos dos seus viticultores, nem será certamente a última. E, pelos vistos, os ânimos vão mesmo acirrar-se! Não digo que sejam As Vinhas da Ira, mas andarão lá perto!
Num país que legifera e vocifera tantas vezes sem resultados palpáveis, é mais um facto a registar. Se não se tratasse da histórica região do Douro, se não se tratasse de um vinho de reputação mundial, se não se tratasse de um vinho por cujo número de garrafas bebidas se definiam num dia os homens na Inglaterra - one bottle man, two bottle man, three bottle man, four bottle man (William Pitt, o grande Primeiro-Ministro, era o four bottle man e dizem que, com o seu bafo de vinho do Porto, embebedava o escrivão que estava à sua frente!) -,…

Risos.

… se não fosse assim, não teriam aparecido hoje à discussão desta Câmara três projectos de resolução: do PS, do PSD e do PCP.
Limito-me, em nome da minha bancada, a comentá-los, sem ter a pretensão de ser o salvador do Douro, pois o Douro, para se salvar, precisa de mais Douro, de menos diálogo e de mais decisão - decisão sua, própria, e, bem entendido, governativa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não compete, por isso, a esta Assembleia, senão dentro da discrição aconselhável, decidir algumas medidas que poderão assegurar o futuro do Douro. Basta, pois, que aconselhe, como é seu dever, algumas tarefas a que urge lançar mão.
Em primeiro lugar, há que combater a desconexão patente entre as várias entidades em presença, desconexão acentuada pela fraqueza institucional da sexagenária Casa do Douro.

Página 1569

1569 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

E onde residem esses pontos de conflito? No IVV, para começar, devido à tradicional demora dos seus processos. No IVP, devido a ter um papel também não bem definido, o que o leva, não raro, a «meter o nariz onde não é chamado». Por outro lado, há que trabalhar com as associações de comerciantes, as quais, dotadas de poder económico assinalável, pretendem, talvez de uma forma exagerada (e digo «talvez» porque sem comércio nunca teria havido vinho do Porto), dominar por completo toda a região. Eu sei que é verdade, as queixas são verdadeiras, mas os comerciantes são necessários.
Por fim, na Casa do Douro, que, colocada numa situação financeira melindrosa devido a operações financeiras efectuadas no passado recente, como a aquisição forçada, nos anos 80, de excedentes vinícolas com benefício, a que se juntou depois a compra de uma posição a preço elevado na real companhia vinícola, mas também devido a ter perdido fundos que cobrava pelo exercício de funções transferidas para a comissão interprofissional da Região Demarcada do Douro, é agora deixada na dúbia posição de não saber se o Governo está ou não disposto a encarar de face a situação financeira em que se encontra e a assumir a sua quota parte de responsabilidade.
É verdade que a Resolução do Conselho de Ministros n.º 24/97, de 21 de Fevereiro, se assemelha aos vatícinios da Sibila de Cumas (uma bruxa da Antiguidade), que deixava sempre os que a consultavam com uma resposta que nitidamente podia ser interpretada em dois sentidos completamente antagónicos. Essa Resolução do Conselho de Ministros diz que o Governo não se considerou responsável por essa situação e rejeita qualquer hipótese de considerar a concessão de compensações indemnizatórias, para mais adiante resolver: «Apoiar, nos termos da presente resolução, a viabilização económico-financeira da Casa do Douro». Esta é a típica contradição nos termos, fórmula preferida de qualquer sofista.
Mas deixemo-nos de literatura e falemos do que se está a passar!
Na nossa opinião, o Governo deve viabilizar a Casa do Douro pagando parte da sua dívida. Seguidamente, deve definir as funções, em combinação com as instituições criadas, funções bem demarcadas, a desempenhar por cada uma.
Dentro deste quadro, deverá ser compreendido o âmbito das actividades a desempenhar pela Casa do Douro, tanto na esfera sócio-profissional como no campo sócio-económico, sem que, contudo, se volte, como é a pretensão da proposta do PCP, às antigas funções corporativas.
Com o saneamento financeiro da Casa do Douro e com a definição das suas funções, dar-se-lhe-ia uma estrutura que lhe permitiria falar de par a par, de cara a cara, com os comerciantes e as outras associações com que tem de conviver na comissão interprofissional. Esta é a forma - e vêmo-lo pela França e por todos os grandes países vinícolas - de, com mais conhecimento e eficácia, manter uma posição vantajosa no mercado e, se possível, conquistar mais espaço de exportação, o que - com grande prazer registo - tem vindo a acontecer.
Resta-nos falar de um problema importante - o da transferência de direitos de plantação para a zona do Douro.
A minha bancada está convencida de que, para fazer frente à competição movida pelas regiões concorrentes do vinho do Porto (Austrália, África do Sul, Califórnia), que até se permitem usurpar o seu nome, perante a passividade da Organização Mundial do Comércio, seria bom que a área plantada pudesse aumentar. Mas essa decisão deve ser confiada por inteiro ao critério dos produtores do Douro, porque a eles caberá a responsabilidade de, por uma boa ou má decisão - não pensem que os produtores só tomam boas decisões! -, virem a perder ou a ganhar lugares competitivos no já planetário mercado.
Por esse motivo, juntamo-nos ao PSD na afirmação de que o parecer dos produtores do Douro deve ser vinculativo no que respeita ao direito de transferência.
Para terminar, sem o saneamento financeiro da Casa do Douro não haverá Casa do Douro, o que não seria importante se isso não fosse afectar 35 000 agricultores dessa região, gente que trabalha e que arrisca num clima tão irregular como o nosso e que tem de se defrontar com adversários comerciais tão poderosos como aqueles que até têm como sócia a coroa real inglesa.
Esta é a realidade e, sem que os seus aspectos negativos sejam resolvidos, tudo aquilo que estivemos aqui a dizer não passará de vaga retórica.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa preocupação é dar um sentido útil a este debate e, para além da retórica parlamentar e das naturais divergências, encontrarmos um mínimo de consenso que permita que a Assembleia da República cumpra a sua função, que é a de dar resposta às promessas a que, repetidamente, são feitas aos cidadãos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Hoje, depois das eleições presidenciais, muitos preocupam-se com a abstenção, mas, a abstenção tem a ver, por exemplo, com o facto de, em Dezembro, o Sr. Ministro ter vindo aqui fazer propostas, promessas, que depois não foram concretizadas no terreno.

Aplausos do PCP.

É isto que leva os cidadãos a afastarem-se da vida política!
Esta é a nossa função, no respeito por nós e no respeito pelos cidadãos agricultores durienses, que, pela segunda vez, vêm assistir a este debate. E, neste contexto, Sr. Deputado Manuel dos Santos, penso ter sido de extremo mau gosto que se tenha virado para a galeria, onde estão os representantes da agricultura duriense, e lhes tenha dito que eles estavam aqui manipulados, seja por quem for!

Aplausos do PCP, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Manipulados por V. Ex.ª!

O Orador: - Como afirmava Miguel Torga, o Sr. Deputado tem a obrigação de conhecer os cidadãos

Página 1570

1570 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

durienses, que sabem muito bem o que querem para serem manipulados, seja por quem for.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Há cidadãos e cidadãos, Sr. Deputado!

O Orador: - Mais, Sr. Deputado, se o debate que estamos a ter ou os projectos de resolução que estamos a discutir e cuja aprovação constitui uma recomendação política a um Governo, o qual, se respeitar as instituições democráticas, não pode deixar de as cumprir, não valem nada, então por que é que o Partido Socialista apresentou um projecto de resolução?!

Aplausos do PCP.

Sr. Deputado António Martinho, não desvalorizamos o protocolo que foi realizado e no qual, como sabe, participámos de corpo inteiro, em intensas negociações para resolver algumas das questões pendentes. Mas há questões que ficaram por resolver, e o Partido Socialista conhece seguramente os valores que têm a ver com as compensações à Casa do Douro pelos poderes que lhe foram retirados ou por decisões a que ela foi alheia e das quais resultaram prejuízos que, como eu disse e o Sr. Deputado não desmentiu, estão orçados em 11,5 milhões de contos.
Pois bem, Sr. Deputado, o Partido Socialista elogiou aqui o esforço das direcções da Casa do Douro em cumprirem a sua parte nesse protocolo, acompanho-o neste elogio, mas já agora faço um desafio ao Governo: cumpra a sua parte, cumprindo totalmente os estudos que, na altura, foram feitos de forma a compensar a Casa do Douro dos meios financeiros que lhe foram retirados.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Quanto à parte do nosso projecto de resolução sobre a reorganização institucional da Casa do Douro, Srs. Deputados do PSD, não queremos voltar ao momento anterior, aceitamos o quadro institucional como está, e sempre o dissemos. Agora, o que queremos é que, dentro desse quadro institucional, a Casa do Douro mantenha poderes públicos na letra da lei, que não tem, deixando, por isso, de obter as correspondentes receitas. Aliás, a Casa do Douro exerce, hoje, a título delegado pela comissão interprofissional, alguns desses poderes; é porque se reconhece que ela é a entidade mais apropriada para o fazer. Então, nesse contexto, por que é que isso não passa para a letra da lei?
Sr. Deputado, se o nosso projecto de resolução é tão antiquado, por que razão é que aqui há uns tempos o Sr. Deputado Durão Barroso, quando foi ao Douro, fez uma conferência de imprensa onde criticava exactamente a comissão interprofissional e a necessidade de rever esta situação?!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Sr. Deputado, tem de terminar, porque o seu tempo esgotou.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, vou terminar como comecei, dizendo que queremos dar um sentido útil a este debate.
Como ainda temos uma semana para pensar no sentido de voto que iremos ter na votação que se irá fazer no próximo dia regimental de votações, espero que, até lá, o Partido Socialista pondere a sua posição e responda, pelo menos, ao nosso desafio. Se não quiserem aprovar os projectos de resolução, devemos, pelo menos, em sede de comissão, encontrar o mínimo denominador comum que permita fazer um texto consensual que responda, no fundamental, aos problemas dos durienses.
É este o nosso desafio, é esta a nossa disponibilidade que está aqui presente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por terminada a discussão dos projectos de resolução n.os 86, 94 e 96/VII, apresentados, respectivamente, pelo PCP, PS e PSD.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, a partir às 10 horas, e será uma sessão de perguntas ao Governo.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 50 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação,
relativa à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos,
Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 226/VIII - Aprova a quinta revisão do
Estatuto dos Deputados (PS)

Os Deputados abaixo-assinados declaram que se abstiveram na votação referente ao projecto de lei que define o Estatuto dos Deputados porque, não obstante concordarem com a generalidade do seu conteúdo, não subscrevem o ponto n.º 2 do artigo 4.º do seu articulado.
Entendem estes Deputados que a questão suscitada neste ponto específico deveria ser objecto de uma maior ponderação e debate no sentido de se obter um maior consenso nacional.

Os Deputados do PS, Miguel Coelho - João Benavente - Carla Gaspar - Custódia Fernandes - Emanuel Martins - Caio Roque.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
António Alves Martinho
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos José das Neves Martins
Henrique José Monteiro Chaves
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Mário Patinha Antão
Nuno Miguel Sancho Cruz Ramos

Partido Popular (CDS-PP):
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró

Página 1571

1571 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001

 

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Rui do Nascimento Rabaça Vieira

Partido Social Democrata (PSD):
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
José de Almeida Cesário
José Frederico de Lemos Salter Cid

Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

Páginas Relacionadas
Página 1556:
1556 | I Série - Número 38 | 19 de Janeiro de 2001   Srs. Deputados, temos pa

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×