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1821 | I Série - Número 45 | 03 de Fevereiro de 2001

 

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares para uma intervenção.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, devo assinalar que, na última reunião que tivemos na Comissão de Saúde e Toxicodependência, a Sr.ª Ministra prometeu-nos que viria a este debate, mas, infelizmente, não está cá hoje - não quero tirar daí qualquer conclusão!
Penso que é muito importante definirmos, neste debate, que objectivos deve ter uma política do medicamento. Ora, em primeiro lugar, a mesma deve ter o objectivo de assegurar aos utentes o acesso a cuidados tão importantes hoje em dia como são os cuidados medicamentosos.
De há algum tempo para cá, como houve uma «inundação» da despesa com medicamentos no orçamento para a saúde, fundamentalmente devido a terem aumentado as margens de lucro dos interesses económicos existentes neste sector e não por terem aumentado, pelo menos em paralelo com os aumentos de despesa, as vantagens para os utentes, também é preciso encontrar algumas medidas para diminuir os gastos desnecessários com medicamentos.
Portanto, é preciso enfrentar os interesses instalados, limitar as respectivas margens de lucro quando embolsam, por exemplo, os juros da dívida em atraso cujo montante continuamos a ignorar. Aliás, como a Sr.ª Ministra disse que nos daria essa informação, embora não esteja presente, tenho a certeza de que o Sr. Secretário de Estado vai dizer-nos quanto é que, no último ano, o Ministério da Saúde pagou de juros pela dívida na área do medicamento.
É preciso promover medidas que o Governo continua a não querer promover, como, por exemplo, a dispensa gratuita nos hospitais, na consulta externa e na urgência de, pelo menos, os medicamentos que, aí prescritos, possam ficar mais baratos para o Estado. É que se os medicamentos forem comprados em grande quantidade para serem distribuídos gratuitamente naqueles serviços, acabam por ficar mais baratos do que se o Estado tiver de arcar com a comparticipação que lhe cabe no caso de os medicamentos serem comprados mais tarde, em farmácia privada. Trata-se, pois, de uma medida absolutamente racional mas que o Ministério continua a não querer aplicar.
É preciso implementar medidas que permitam controlar os gastos e atacar o controlo que a indústria farmacêutica continua a exercer no domínio da prescrição de medicamentos. Aliás, facilmente se verifica a existência desse controlo perante o aumento exponencial da despesa com medicamentos nos hospitais, causado, evidentemente, por uma reorientação da estratégia da indústria que procurou recuperar as suas margens de lucro na área do consumo hospitalar de medicamentos, já que, durante alguns meses, tinha sido suspensa a aprovação de novos medicamentos, com tudo o que tal significou em matéria de lucros cessantes para a indústria que, portanto, teve de recuperá-los num outro domínio.
Ainda relativamente ao ataque que há que exercer sobre o controlo da indústria farmacêutica nesta matéria, é preciso atalhar e regulamentar melhor a questão dos ensaios clínicos. É que, hoje, sabe-se que muitos não são verdadeiros ensaios clínicos, são mecanismos utilizados para fomentar o consumo de determinados medicamentos, quer pela habituação do prescritor, o médico, quer, também, pela dependência em que acabam por ficar os doentes sujeitos a tratamentos deste tipo.
Por outro lado, é necessário tomar medidas ao nível da pressão da informação médica sobre os prescritores. Era fundamental que houvesse informação sobre os medicamentos que não fosse exclusivamente da responsabilidade de quem os produz. Ou seja, seria fundamental que houvesse uma intervenção do Ministério da Saúde, por forma a proporcionar a quem prescreve os medicamentos informação idónea e eficaz e a possibilidade de prescrição por princípio activo, não os deixando tão dependentes da pressão da informação da indústria.
Era, ainda, necessário que, finalmente, entrasse em funcionamento o laboratório do INFARMED, que tem vindo a ser adiado de seis em seis meses. Agora, segundo disse a Sr.ª Ministra na última reunião havida em sede de comissão, parece que esse laboratório entrará em funções no fim do ano, mas nada nos garante que assim seja, pois, como referi, trata-se de uma promessa que já foi feita repetidas vezes.
De igual modo, no que diz respeito à compra de medicamentos por parte dos hospitais, era preciso que o Governo esclarecesse por que razão a mesma é muitas vezes efectuada por ajuste directo e não através de um concurso público, verificando-se, assim, uma enorme disparidade entre os valores pagos por um hospital e um outro e, ainda, que esclarecesse qual o prejuízo que tal acarretou para o Serviço Nacional de Saúde.
Portanto, era preciso ter uma política mais corajosa no sentido de enfrentar todos estes interesses que continuam a manietar a implementação de uma verdadeira política de racionalização dos gastos com medicamentos.
Quanto à questão dos genéricos, é preciso dizer, em primeiro lugar, que, mesmo que aplicada em toda a sua profundidade, a sua introdução tem um efeito circunscrito. Digo isto porque parece-me que, por vezes, houve quem utilizasse uma estratégia que é a de sobrevalorizar o efeito de tal introdução para esconder a sua não vontade em aplicar outras medidas mais profundas, como, por exemplo, a da prescrição por princípio activo. Ora, a verdade é que a introdução de medidas que beneficiem a prescrição dos genéricos não pode constituir um alibi para a não tomada de outras medidas porventura mais importantes e mais decisivas nesta matéria.
Acresce que continuamos a ter essa invenção absolutamente extraordinária do Governo português que é a dos «genéricos de marca»! Ou seja, trata-se de medicamentos que, supostamente, se enquadram numa categoria em que são designados pelo nome genérico ou por denominação comum a nível internacional, mas que têm uma marca. É uma invenção extraordinária e que demonstra bem a capacidade inventiva nesta área do Governo do Partido Socialista.
Uma outra ideia, ainda em relação à introdução dos genéricos é a de que a mesma, ao contrário de outras medidas, não constituirá ganho profundo se não estiver associada ao princípio da prescrição por princípio activo. Esta é uma questão decisiva e o Governo continua a não querer trabalhar neste sentido e a não avançar nesta matéria.
Esta regulamentação que o Governo nos apresenta tem diversas curiosidades.
Em primeiro lugar, vai contra disposições de uma lei aprovada nesta Assembleia da República que resultou em boa parte, e quanto a essas disposições em concreto, de propostas apresentadas pelo Partido Socialista em sede de discussão na especialidade, na qual, aliás, teve um papel

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