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2493 | I Série - Número 63 | 23 De Março De 2001

revisões ditadas pelas circunstâncias ou por arranjos políticos conjunturais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Especialmente os processos de revisão extraordinária, que só deveriam ocorrer em casos de transcendente excepcionalidade, acabam por se tornar no expediente a utilizar sempre que algum governo decide assumir, no plano internacional, compromissos que não são admitidos pela nossa ordem constitucional.
Aconteceu assim com o Tratado da União Europeia, em 1992, e acontece agora com o Tribunal Penal Internacional. Em vez de suscitar atempadamente, em Portugal, o debate sobre as opções constitucionais que estão em causa na discussão dos tratados internacionais e decidi-las em sede constitucional antes de assumir qualquer vinculação internacional, os governos portugueses têm feito precisamente o contrário: assumem compromissos inconstitucionais e depois apresentam-nos como factos consumados, determinantes de revisões constitucionais. Isto é, os governos infringem princípios constitucionais e depois alteram esses princípios como forma de eliminação retroactiva da infracção.
O que se passou com o Estatuto do Tribunal Penal Internacional constitui um exemplo a todos os títulos lamentável. O Governo português participou, pelo menos desde 1996, nos trabalhos de elaboração desse estatuto e não podendo ignorar que estava em causa a adopção de um instrumento de direito internacional contendo normas, como a previsão da prisão perpétua, que não são consentidas pelo Constituição portuguesa, não fez aquilo a que estava estritamente obrigado, que era, no mínimo, suscitar um debate nacional sobre essas questões antes de assumir qualquer compromisso no plano internacional.
Em vez disso, o Governo assinou o Estatuto do TPI em 1998 e só agora vem reconhecer que, dada a inconstitucionalidade de algumas das suas disposições, não temos outro remédio senão rever a Constituição, ainda que isso represente «deitar pela borda fora» alguns dos princípios mais nobres e generosos do nosso património civilizacional, dos quais só temos que nos orgulhar.
Teremos oportunidade, quer no debate da revisão constitucional propriamente dita quer certamente no debate sobre a ratificação, de nos pronunciarmos detalhadamente sobre o Estatuto do TPI, não sendo ainda este o momento de o fazer.
Há, no entanto, alguns pontos que não queremos deixar de exprimir desde já.
A criação de uma instituição judiciária internacional destinada a julgar a prática de crimes contra a humanidade segundo critérios de justiça e imparcialidade é um propósito que acolhemos como muito meritório. Acabar com a impunidade dos autores de crimes que ofendem a consciência universal e consagrar instrumentos de aplicação do Direito internacional que escapem à lógica da «justiça» exercida pelos vencedores contra os vencidos, são propósitos em que nos revemos sem qualquer dúvida ou hesitação.
Acontece, porém, que as normas do Estatuto do Tribunal Penal Internacional, que apontam para alguma dependência da sua actuação em relação ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, representam preocupantes indícios de que este tribunal internacional corre o sério perigo de reflectir, no seu funcionamento, os critérios de escolha política que têm prevalecido na comunidade internacional.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Tendo em conta não apenas o texto do Tratado de Roma, mas sobretudo a evolução das negociações com vista à elaboração dos seus documentos complementares, temos muitas razões para recear que o TPI possa vir a ser não um instrumento para a aplicação justa e imparcial do direito internacional mas um meio judicial para a imposição e legitimação internacional da lei do mais forte.
Mas, independentemente deste problema, o que não oferece a mínima dúvida é que o TPI, ao prever a aplicação da pena de prisão perpétua, reintroduz na ordem jurídica portuguesa uma sanção penal que a Constituição inequivocamente proíbe e que se encontra banida, entre nós, desde os finais do século XIX.
E não se diga que não se trata de reintroduzir a prisão perpétua, porque é evidente que essa é precisamente uma das questões reconhecidamente determinantes da necessidade de ser aberto um processo extraordinário de revisão constitucional.
Um retrocesso dessa natureza na ordem jurídica portuguesa é algo que não podemos aceitar.
Todavia, compreendemos as apreensões de muita gente, que, com a justa preocupação de não deixar impune a prática de crimes contra a humanidade, se manifesta incomodada com a possibilidade de Portugal não ratificar o Estatuto do TPI e de podermos ser acusados de criar dentro das nossas fronteiras um indesejável e indesejado espaço de impunidade. Não falta mesmo quem, em nome dessa incomodidade, se disponha mesmo a abdicar da intangibilidade da proibição da prisão perpétua.
Do nosso ponto de vista, este problema pode ser ultrapassado sem violentar a consciência humanista que presidiu à elaboração da nossa legislação penal e sem impedir o julgamento e a punição dos autores de quaisquer crimes previstos e punidos no Estatuto do Tribunal Penal Internacional.
Para isso, é necessário que a lei penal portuguesa passe a prever e punir a prática dos crimes que, estando previstos no Estatuto do TPI, não o estejam ainda no nosso Código Penal,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … e é necessário ainda criar os mecanismos legais que permitam aos tribunais portugueses julgar, de acordo com a lei portuguesa, todos os indivíduos que se encontrem em Portugal e que sejam acusados da prática de qualquer um dos crimes previstos no Estatuto do Tribunal Penal Internacional.
É precisamente isto que o PCP hoje propõe. Nesse sentido, acabámos de entregar na Mesa da Assembleia da República um projecto de lei que propõe a alteração do Código Penal português, por forma a garantir o julgamento em Portugal dos autores de crimes graves que afectam a comunidade internacional no seu conjunto.

Vozes do PCP: - muito bem!

O Orador: - Segundo o nosso projecto, nenhum crime grave contra a Humanidade pode ficar sem julgamento por insuficiência da lei penal portuguesa.

Aplausos do PCP.

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