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0270 | I Série - Número 09 | 06 de Outubro de 2001

 

constava a recepção no Código Penal Português de todas as molduras penais previstas no Estatuto do Tribunal Penal Internacional. Seria, portanto, perfeitamente possível, com a aprovação deste projecto de lei, que todos esses crimes pudessem ser julgados em Portugal, caso os criminosos se encontrassem no nosso país. Todavia, seriam julgados não por molduras penais que nos procuram impor e que passam pela prisão perpétua mas pelas molduras penais vigentes em Portugal, que todos nós consideramos justas. O que é significativo é que os mesmos Srs. Deputados que aqui propõem a ratificação do Estatuto do Tribunal Penal Internacional nessas condições, tenham recusado o agendamento prévio deste projecto de lei, que seguramente resolveria este problema com respeito por valores fundamentais da Constituição actualmente vigente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.

O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nunca como hoje, para mim, foi tão verdadeira a afirmação de que, como diria Ortega y Gasset, «somos nós e as nossas circunstâncias».
Quando a questão da adesão ao Tribunal Penal Internacional foi suscitada, solicitei à direcção do meu partido, através da direcção do seu grupo parlamentar, a liberdade de voto nesta matéria por razões de consciência. Como já tive ocasião de referir pormenorizadamente numa das reuniões da Comissão Eventual de Revisão Constitucional, lamentei então que Portugal aceitasse incluir na Constituição da República Portuguesa uma disposição no sentido de readmitir a figura da prisão perpétua no ordenamento jurídico português (dele erradicada em 1911), mesmo que indirectamente, por referência a disposições de tratados internacionais de que Portugal seja parte e para um número bem definido de crimes.
Referi, então - no pedido que entendi dirigir ao Deputado António Capucho, então Presidente do meu grupo parlamentar, a quem aqui quero deixar uma palavra pública de elogio pelo espírito de abertura demonstrado -, as razões de tal atitude. Salientei, nessa altura, uma hipotética culpa do Governo, que, aquando da adesão de Portugal ao Estatuto de Roma, assinada no dia 7 de Outubro de 1998, destinado a implantar o Tribunal Penal Internacional, o fez sem qualquer declaração interpretativa, ao contrário de outros países, como a França, a Bélgica e a Nova Zelândia. Sublinhei a importância de não devermos responder com a permissividade e a lassidão aos princípios civilizacionais fundamentais. Relembrei o facto de Portugal ter mantido, desde sempre, nesta matéria, uma posição humanista avançada. Alertei para o facto de se poder considerar que a reintrodução da pena de prisão perpétua poderia traduzir um retrocesso em matéria de direitos humanos, um recuo que poderia abrir um perigoso precedente para uma qualquer futura tentativa de admissão da pena de morte que recuso em absoluto. Concluí afirmando, então sem dúvidas, ser contra uma revisão constitucional que admitisse, ainda que indirectamente, qualquer disposição que caminhasse nesse sentido.
Mas, Sr. Presidente, Srs. Deputados, quer queiramos ou não, o mundo mudou desde o dia 11 de Setembro de 2001. Como já referi nessa mesma intervenção em Comissão, depois do que aconteceu em Nova Iorque e Washington nesse fatídico dia, não quero ser confundido com os que falsificam a realidade, não quero caminhar ao lado dos que deturpam a verdade para a adequar aos seus ideais, não quero emparceirar com os que julgam poder justificar actos bárbaros num mundo livre e democrático.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não quero que alguém, num futuro mais ou menos longínquo, possa sequer admitir que, em algum momento, alinhei com os que julgam ter o terrorismo legitimidade para matar, cabendo às vítimas a responsabilidade pela sua própria morte.
E se estes crimes agora perpetrados revelam uma situação internacional tão grave que a sua resolução pela comunidade das nações passa pela introdução de mecanismos como o TPI e o mandado de captura europeu, então que assim seja.
Como em tudo, há que hierarquizar princípios. O mundo mudou! Mantenho as convicções, mas, tal como o mundo, também as circunstâncias que determinam o meu voto mudaram. E o meu voto, esse - por muito que custe a algumas pessoas -, será, hoje, obviamente, a favor da introdução dessas mesmas alterações no texto da Constituição da República Portuguesa.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, não escapará a ninguém que a maioria «revisional» que se formou nesta Assembleia está em grandes dificuldades. Há uma maioria esmagadora que permite fazer o que seja e, no entanto, são os mais extraordinários argumentos que aqui são vertidos no debate.
Um Sr. Deputado vem explicar-nos um novo sentido para a palavra «princípio», que passa a ser tudo o que é essencial até ter de ser abandonado. Um outro Sr. Deputado vem explicar-nos exactamente as razão pelas quais devemos rejeitar o actual Estatuto do TPI: porque ele não nos exclui de um mundo com dois pesos e duas medidas e porque na sua génese está a rejeição da classificação do terrorismo e do narcotráfico como crimes contra a humanidade. Ele não é universal nem eficiente e, desse ponto de vista, não defende os princípios da justiça.
Pior ainda: este artigo que agora estamos a discutir introduz, de facto - pesem embora as muitas consciências dilaceradas no silêncio da sua palavra -, a pena de prisão perpétua no sistema jurídico português. Basta que o Tribunal Penal Internacional possa invocar que o Estado português, onde corre um determinado processo, tem uma regra diferente da determinação da prescrição para que possa exigir que um cidadão português que aqui poderia ser julgado tenha de ser entregue para eventualmente cumprir uma pena de prisão perpétua. É por causa destas excepções tão graves que o Direito não se aplica, o que é suficiente e necessário a que seja indispensável pronunciarmo-nos claramente pela justiça, votando, portanto, contra este princípio.

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