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1175 | I Série - Número 030 | 21 de Dezembro de 2001

 

para determinar o que é ou não perfeito, o que é ou não completo? Quem se reveste da arrogância, que seria quase ridícula, de querer ter razão contra todo o mundo? Há já mais de século e meio, Antonio Rosmini sublinhava que a pretensa perfeição dos instrumentos ou instituições políticas e jurídicas tem uma carga enorme de determinismo.
Ora, nós, no PSD, não aceitamos modelos predeterminados por ninguém, nem modelos definitivos e irreversíveis de instituições ou modelos sociais! Não há, para nós, objectivos finais perfeitos! Nenhuma geração os pode impor às seguintes, que terão, eventualmente, outras aspirações, outros critérios e outras possibilidades. Por isso, no plano nacional, o PSD sempre defendeu um reformismo humanista, que gradualmente pudesse melhorar a vida da comunidade, de acordo com a vontade da maioria.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Francisco Sá Carneiro fundamentou muitas vezes esta sua opção fundacional pelo reformismo, rejeitando o carácter absoluto da perfeição, e, por isso, estamos convictos, ainda hoje, de que, ao contrário do que sucedeu em séculos passados - não se assustem com o que vou dizer! -, ao contrário do que aconteceu com as Revoluções Inglesa, Francesa e Americana, entre outras, no século XX e ainda mais no século XXI, só o reformismo e não a revolução pode ser humanista, porque só o reformismo permite uma evolução segura e frutuosa assente na dignidade da pessoa, na aceitação progressiva e partilhada dos valores fundamentais para sociedades melhores.
Está provado que só o reformismo permite o respeito pela pessoa humana, ficando claro que quer o imobilismo quer as revoluções conduzidas por vanguardas auto-iluminadas desembocam inevitavelmente na tirania, nos campos de concentração, na supressão dos direitos fundamentais. A tentativa de imposição de perfeições sociais, de instituições perfeitas é, portanto, pré-totalitária e conduz ao totalitarismo.
Já disse nesta Assembleia que, se cada pessoa pode e deve, eventualmente, buscar a perfeição individual, nunca pode impor aos outros o seu próprio modelo, e muito menos o pode impor a todo o mundo. Seria, pois, bom que se reflectisse sobre mais este paradoxo. No mundo do futuro, só o reformismo humanista pode, de algum modo, ser revolucionário!

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É, pois, chegado o momento de transferir as virtudes do reformismo humanista do plano nacional para o nível mundial. Numa comunidade mundial globalizada, só ele pode ser o caminho para evitar o esmagamento das pessoas pelos mais fortes, sejam eles Estados, empresas, redes de comunicação global ou outras organizações, sem falar já na emergência dos poderes erráticos, os poderes da sombra, que por vezes fazem, como em 11 de Setembro passado, devastadoras afirmações do seu poder desumano.
Da mesma forma, não é sequer concebível fazer progredir toda a comunidade mundial, hoje globalizada, por rupturas revolucionárias que são impossíveis. Efectivamente, só o convencimento de que o reconhecimento do primado da pessoa humana para todos e dos seus direitos como limite a todo e qualquer poder pode permitir uma caminhada para uma comunidade assente em valores partilhados e que vise o bem de todas as pessoas, antes do poder dos Estados e de outras organizações que a ela devem servir.
É curioso que também neste caso os extremos se tocam. Incapazes das rupturas revolucionárias com que sonham, os que recusam o reformismo acabam por cair, na prática, próximo das posições imobilistas.
Escolhido o método - o reformismo -, passemos aos fundamentos. A ratificação do Estatuto que debatemos está alicerçada nos princípios fundamentais da filosofia e da ética políticas que há muito adoptámos. Qual é, para nós, o objectivo essencial da política? Acção, com vista a uma sociedade mais justa e mais livre, onde todas as pessoas possam ter uma vida boa, na qual seja promovido o bem comum de todos; o primado da pessoa humana, da sua dignidade e dos seus direitos, que deve ser a referência constante e permanente que ilumine toda a acção.
Também de entre os princípios fundamentais da ética destacam-se o princípio da beneficência (a obrigação de promover, sempre e por todo o lado, o bem), o princípio da não maleficência (a obrigação de não causar males a outrem), o princípio da justiça (a obrigação de dar a todos um acesso equitativo e justo, não só aos direitos, como também aos bens essenciais).
Ora, a globalização veio acentuar o facto de a identidade de origem e a comunidade de destino ter criado entre todos os seres humanos, sem qualquer excepção, laços indestrutíveis de natureza ontológica e ética. Uma vez feito o reconhecimento da universalidade do género humano, para o qual Portugal deu um contributo pioneiro, reconhecida no direito internacional a universalidade dos direitos humanos, que consagrámos já na nossa Constituição há bastante tempo, chegou a hora de levar por forma institucionalizada todos aqueles princípios a toda a comunidade humana. Para tanto, a dialéctica passada entre o Estado soberano e os cidadãos não chega. É certo que, como afirmou em 1999 Khofi Annan, tão justamente laureado agora com o Prémio Nobel da Paz, «A soberania dos Estados está em plena redefinição e não só por efeito das forças de globalização e de cooperação internacional. Os Estados são largamente considerados como instrumentos ao serviço dos seus povos e não o contrário. No nosso tempo, a soberania da pessoa é reforçada por uma consciência renovada e pela difusão dos direitos individuais. Uma nova e mais larga definição do interesse nacional impõe-se no século XXI. Ela vai incitar os Estados a uma maior unidade na prossecução dos objectivos comuns e de valores partilhados».
Novos actores surgem na cena internacional, mas a pessoa tem de dialogar com todos eles e tem de ser protegida de todos eles e não apenas do seu Estado nacional. De nada vale, nem é possível, negar esta globalização, querer ficar de fora ou ter medo dela. O que há é que evitar que ela se transforme numa selva, onde triunfe o poder dos mais fortes, os sucedâneos da velha realpolitik dos Estados agora adoptada por poderes minoritários, mas oligárquicos, sejam eles políticos, económicos, sociais, comunicacionais, ou outros, que pretendam concentrar mais e mais poder, riqueza e capacidade de manipulação das opiniões.
Ora, este Estatuto é uma peça da outra globalização, que nós queremos, que reconheça a unidade do género humano e a universalidade dos direitos humanos, que acompanhe a unificação do espaço e do tempo, aproximando progressivamente todos os que participam e beneficiam das vantagens da gestão comum dos grandes problemas

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