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Quinta-feira, 21 de Fevereiro de 2002 I Série - Número 33

VIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2001-2002)

COMISSÃO PERMANENTE
REUNIÃO DE 20 DE FEVEREIRO DE 2002

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex. mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Manuel Maria Moreira

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 40 minutos.
Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da entrada na Mesa de requerimentos e da resposta a alguns outros.
O Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD) imputou responsabilidades ao Governo pela situação em que se encontram as Forças Armadas, tendo, de seguida, dado explicações ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães), que defendeu a honra da bancada do Governo, e respondido aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Medeiros Ferreira e Manuel Alegre (PS).
O Sr. Deputado Lino de Carvalho (PCP) insurgiu-se contra o incumprimento político e jurídico dos compromissos assumidos quanto à construção da nova fábrica de papel em Mourão, após o que respondeu aos pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado António Braga (PS).
A Sr.ª Deputada Isabel Castro (Os Verdes) criticou o Governo pelo incumprimento de leis da Assembleia relativas aos problemas de tratamento de resíduos industriais perigosos e à co-incineração. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento da Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça (PS).
O Sr. Deputado Francisco Louçã (BE) saudou os Deputados António Reis (PS) e João Amaral (PCP), que não integrarão as listas dos respectivos partidos, pelo contributo que deixaram na Assembleia nesta Legislatura, ao que se associou o Sr. Presidente, que lembrou também os Deputados Miguel Macedo (PSD) e Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), António Martinho, José Reis e Gil França (PS).
O Sr. Deputado Francisco de Assis (PS) teceu críticas à intervenção feita pelo Dr. Pacheco Pereira na Convenção do PSD, em que traçou o programa eleitoral do seu partido por contraposição à acção política do Governo, e referiu-se ainda à presença do Primeiro-Ministro espanhol Jose Maria Aznar. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento da Sr.ª Deputa Manuela Ferreira Leite (PSD).
Entretanto, a Câmara deu assentimento à viagem de carácter oficial do Sr. Presidente da República à Bósnia, de 3 a 5 de Março p.f.
Finalmente, foram aprovados quatro pareceres da Comissão de Ética autorizando, respectivamente, o Sr. Presidente, um Deputado do PS, um Deputado do PCP e uma Deputada do PSD a deporem, como testemunhas, em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 16 horas e 50 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a reunião.

Eram 15 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Sr. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Martinho
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Manuel Dias Baptista
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Fernando Pereira Serrasqueiro
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Gil Tristão Cardoso de Freitas França
Jamila Barbara Madeira e Madeira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Ernesto Figueira dos Reis
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro

Partido Social Democrata (PSD):
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
João Bosco Soares Mota Amaral
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José David Gomes Justino
José Manuel de Medeiros Ferreira
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Maria Moreira
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro

Partido Comunista Português (PCP):
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
João António Gonçalves do Amaral
Lino António Marques de Carvalho

Partido Popular (CDS-PP):
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos requerimentos e da resposta a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa, nos dias 5 e 6 de Fevereiro, os requerimentos seguintes: ao Ministério Educação, formulados pelos Srs. Deputados Bruno Dias e Miguel Anacoreta Correia.
Por sua vez, foi recebida resposta a requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.
No dia 8 de Fevereiro - Maria Manuela Aguiar, Isabel Castro, Vicente Merendas, Honório Novo, Margarida Botelho, Ricardo Fonseca de Almeida, Manuel Oliveira e Bruno Dias, Luís Fazenda, António Pinho, Natália Filipe e Heloísa Apolónia, Carlos Luís, Margarida Rocha Gariso, Machado Rodrigues, Mota Amaral, Carlos Martins; Rosado Fernandes, José Granja Fonseca, Rodeia Machado, Agostinho Lopes, Eugénio Marinho e Luísa Mesquita, Basílio Horta e Telmo Correia, Fernando Rosas e Odete Santos, e Miguel Capão Filipe.
Sr. Presidente, em matéria de expediente é tudo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se para intervir, no âmbito do tratamento de assuntos de interesse político relevante, os Srs. Deputados Guilherme Silva, Lino de Carvalho, Isabel Castro, Francisco Louçã e Francisco de Assis.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: Fomos todos, ao longo dos últimos seis anos, tendo a percepção dos graves erros e omissões, adiamentos e recuos, que constituíram o registo permanente do Governo socialista, agora em gestão.
Os portugueses apreenderam os graves custos que importava para o País esta forma de conduzir o poder em função dos lobbies e interesses, pressões da comunicação social e resultados de sondagens.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não houve sector da vida nacional que escapasse às hesitações e aos desperdícios do desgoverno socialista, sempre na perspectiva de que tudo quanto pudesse permitir a sua manutenção no poder, sem ondas ou aparentes perturbações, se resolvia pela via perdulária do esbanjamento de dinheiros públicos. Naturalmente que os reversos de todo este desregramento tinham de surgir, como vêm surgindo, das mais variadas formas.
Em todo o caso, o largo consenso que de uma forma geral se giza, mesmo no âmbito partidário, em matéria de defesa nacional e de Forças Armadas levou a admitir que ao menos estas, em nome dos mais elementares princípios da dignidade do Estado e da afirmação das soberania nacional, fossem poupadas ao descrédito a que os socialistas conduziram a coisa pública.
Inevitavelmente, o Governo socialista, mesmo em fase de estertor, não deixou de macular uma instituição que se confunde já com a própria História de Portugal e a quem o País deve o melhor do seu destino colectivo.

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A humilhação a que o Governo vem sujeitando os três ramos das Forças Armadas assume tal gravidade que a Historia jamais perdoará aos socialistas semelhante vexame.
Alertámos a tempo para a grave situação de carência de meios, para a renovação necessária e para os desperdícios que o adiamento das reformas, também no âmbito da defesa nacional, estava a causar, com detrimento da capacidade e da operacionalidade das Forças Armadas. Não esteve ausente tal preocupação quando votámos contra os Orçamentos do Estado e quando nos opusemos à versão da Lei de Programação Militar, que o Partido Socialista fez aprovar nesta Câmara com outras ajudas, que não a nossa.
Longe ainda de pensar caber-me fazer esta intervenção, escrevi isto, há poucos dias, num semanário: «Temos as Forças Armadas depauperadas e sem meios para cumprirem as suas elementares missões.
O Exército viu-se obrigado a contrair na banca empréstimos da ordem dos 9 milhões de contos para fazer face a despesas correntes, incluindo salários.
A Marinha, por falta de meios financeiros, foi obrigada a parar a frota, fazendo acostar os navios que deveriam estar a cumprir tarefas indispensáveis à nossa defesa e à protecção da nossa costa e vigilância da zona económica exclusiva.
É imperdoável que os desvarios da administração socialista façam a instituição militar passar por tamanha humilhação. É o prestígio de Portugal como Estado e Nação independente que está em causa! São os nossos compromissos internacionais, designadamente no âmbito da NATO, que são abalados.
É mais um enxovalho a que nos sujeitam.
Que prioridades são estas?
Qual o critério, na hierarquia dos interesses do Estado, que leva uma televisão pública a acumular, em cinco anos, o passivo de 200 milhões de contos e que levou a constituir uma dívida ao sector farmacêutico de mais de 80 milhões de contos e, ao mesmo tempo, sacrifica o orçamento da defesa ao ponto de obrigar a frota da Armada a parar?
É preciso, pois, mudar de rumo, de pessoas e de soluções e optar por quem mereça credibilidade e seja capaz de restaurar a confiança dos portugueses em si mesmos.»
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A História demonstra que é exactamente o sector das Forças Armadas, de entre todos os sectores da comunidade nacional, aquele que integra os cidadãos com a mais profunda consciência cívica.
Lembre-se a forma exemplar como as Forças Armadas fizeram a Revolução, que nos trouxe a democracia, e a elevação com que, passado o período transitório, regressaram aos quartéis e se confinaram, com tantas limitações e dificuldades, às mais nobres tarefas, interna e externamente, essenciais à nossa defesa e segurança, à nossa representação externa, à nossa soberania e à garantia da independência nacional.
Assim, se já é inadmissível fazer passar as Forças Armadas pela carência de meios indispensáveis ao desempenho mínimo das suas missões, injustiça maior é insinuar, ou mesmo afirmar, que aquela instituição e os seus superiores comandos põem em causa a sua subordinação ao poder político democrático.
A questão, infelizmente, é outra. É óbvio que as Forças Armadas e os respectivos Chefes de Estado-Maior não põem em causa, como nunca puseram, a subordinação da instituição militar ao poder político.
O que está em causa é que tanto as Forças Armadas como o poder político estão subordinados ao interesse nacional, e quando os governos não sabem ser os correctos intérpretes do interesse nacional, no que toca à quota-parte que cabe às Forças Armadas prosseguir, é legítimo que estas, em situações extremas, como as que se registaram, não possam ser coniventes com o Governo na ocultação ao País do descalabro financeiro e das mais elementares carências que as afectam, por razões a que são de todo alheias e para as quais foram alertando ao longo do tempo.
Não chega, pois, aos mais altos responsáveis políticos, tarde e mal, assumir posições do tipo «mandar calar a tropa». É que as Forças Armadas não só não o merecem como o enxovalho a que foram sujeitas poderia ter sido evitado e prevenido se, a tempo, se tivesse mandado o Governo governar!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Paradoxalmente, à medida que se foi tornando crescente, no contexto internacional e mundial em que nos inserimos e no quadro das alianças em que participamos, a necessidade de intervenção crescente das Forças Armadas, os governos socialistas permitiram-se, no tocante ao orçamento da defesa, à seguinte proeza: no ano de 2002, fixaram as despesas com a defesa em 1,4% do PIB. E fizeram esta degradação desde 1995: em 1995, 1,9%; em 1996, 1,8%; em 1997, 1,7%; em 1999, 1,6%; em 2001, 1,5% (na realidade, 1,4%, por força do Orçamento rectificativo).
Com o poder socialista, nos últimos três anos, o País conheceu quatro ministros da defesa, o que é bem elucidativo.
Enquanto isto, o Dr. Ferro Rodrigues, que todos estes anos foi conivente com este estado de coisas, veio agora dizer que, se ganhar as eleições legislativas, o poder político toma as decisões através da Assembleia da República e do Governo e as Forças Armadas cumprem. É espantosa semelhante declaração!
Quer o Dr. Ferro Rodrigues dizer que, com o Governo actual do Partido Socialista, tal subordinação não ocorre por falta de autoridade do poder político?
Quer o Dr. Ferro Rodrigues dizer que as Forças Armadas não conhecem e não cumprem a Constituição?
Trata-se de uma insinuação vil, que as Forças Armadas não merecem.
O que o Dr. Ferro Rodrigues continua a não dizer é se vai fazer a necessária reforma das Forças Armadas, permitindo economias e evitando desperdícios desnecessários; se vai dotá-las de meios modernos, adequados e bastantes para o cumprimento das suas missões e das novas solicitações e desafios a que são chamadas.
O que o Dr. Ferro Rodrigues não diz é se será capaz de criar um novo quadro de prioridades em termos de evitar o desperdício de centenas e centenas de milhões de contos nas empresas públicas e no clientelismo, afectando tais meios ao reequipamento e modernização das Forças Armadas, hoje dotadas de material obsoleto, muito dele imobilizado por falta de manutenção.

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Também pela degradação de uma instituição como as Forças Armadas, que o poder político tem obrigação de tratar com a maior dignidade, impõe-se a mudança.
Obviamente que tal não se faz com os «Ferro Rodrigues», ainda que «travestidos» de antiguterristas, de última hora.
A conivência e a intervenção activa que tiveram, e continuam a ter, em todo este processo de degradação dos meios humanos, financeiros e do equipamento das Forças Armadas leva a que não possam merecer a confiança dos portugueses.
Está em causa a credibilidade da própria República, e ninguém tenha dúvidas de que a dignificação das Forças Armadas passa, antes de mais, pela própria dignificação do poder político!
Cabe aos portugueses optar, no próximo dia 17 de Março, por essa dignificação!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Sílvio Rui Cervan, Medeiros Ferreira e Manuel Alegre.
No entanto, antes disso, vou dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares para defesa da honra da bancada do Governo.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães). - Sr. Presidente, Srs. Deputados, esta declaração política do Sr. Deputado Guilherme Silva pode ser tomada como banal ou como grave. Julgo que a devo tomar como grave, porque entendo que devemos poupar às Forças Armadas a degradação do debate político nacional sobre as questões de defesa.
A Assembleia da República dissolvida tem condições debilitadas para fazer esse debate; a Assembleia da República a eleger em 17 de Março e o governo que emergirá do voto dos portugueses terão condições plenas para o fazer, mas temos todo o dever de não degradar o estado actual desse debate.
Julgo que o Sr. Deputado Guilherme Silva fez uma intervenção que roça as fronteiras da apologia e do incitamento ao pronunciamento militar,…

O Sr. Ferreira do Amaral (PSD): - Essa é boa!

O Orador: - … e fá-lo em condições irresponsáveis e impensáveis!
O Sr. Deputado não é um perito em condições de Forças Armadas, o Sr. Deputado cumpre o seu papel de comissário político, mas julgo que o cumpre perdendo o sentido de Estado. Está fora de causa o exercício normal de direitos por parte das Forças Armadas, o que está absolutamente fora de causa é que alguém sustente o que o Sr. Deputado aqui acabou de sustentar!
Devo dizer que, perante isso, o Governo e as instituições têm agido com bom senso e com grande serenidade. Aliás, ontem mesmo, o Sr. Presidente da República, no cumprimento das suas funções, tomou medidas necessárias e apropriadas.
O Governo tem entre mãos a Lei de Programação Militar, que, com muito custo e trabalho, conseguiu pilotar nesta Assembleia da República sem contar, nem por um momento, com a colaboração do PSD, que sinalizou em direcções erradas, que nada propôs de concreto que fosse capaz de, realisticamente, dotar as Forças Armadas de meios, vindo hoje gabar-se precisamente do contrário.
A História julgará, naturalmente, aquilo que uns e outros fizeram, mas temos, desse ponto de vista, a consciência serena. E tanto mais serena quanto, no anunciado programa eleitoral do PSD, tomámos conhecimento de que este partido tem ideias que, a concretizar-se, mutilariam de meios as Forças Armadas, que contam com eles na Lei de Programação Militar que aqui foi aprovada.
É um rumo que nos parece completamente indesejável, mas é um rumo que define o rosto do PSD: tudo critica e tudo promete; inventa orçamentos completamente fantasiosos e faz acusações a todos sem nunca olhar para si próprio; acusa o Governo actual de défices e de não contribuições, quando governou durante um período longo e está na origem de algumas dessas situações, coisa de que, naturalmente, não se sente em absoluto responsável.
Confiamos no juízo dos portugueses, mas temos, desse ponto de vista, Sr. Deputado Guilherme Silva, não só a consciência tranquila como a consciência de que cumprimos minuto a minuto os nossos deveres com sentido elevado de Estado. O Sr. Deputado não pode gabar-se do mesmo!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva para dar explicações, querendo.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, registo a sua incomodidade em defender uma coisa difícil, ou seja, a honra deste Governo.
Limitei-me - e penso que o fiz em nome da História - a defender a honra das Forças Armadas. Agora percebo que a defesa da honra das Forças Armadas é, hoje, uma ofensa para este Governo!

Protestos do PS.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Não, não! A degradação é que é!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, a intervenção do Sr. Deputado Guilherme Silva, em representação do Partido Social Democrata, levanta-nos um problema, hoje e aqui, em primeiro lugar, grave e, em segundo lugar, sério.

Vozes do PSD: - Oh!

O Orador: - É grave e sério. E não é alternativa dizer-se que é ou grave ou sério, porque é, cumulativamente, grave e sério.
E, Sr. Membro do Governo, quero dizer-lhe que também confiámos no juízo dos portugueses, mas o problema que se colocou aqui foi o de saber se o Governo teve juízo no tratamento destas matérias. Muitas das críticas aqui feitas pelo Sr. Deputado Guilherme Silva têm razão de ser, mas o Sr. Deputado Guilherme Silva, que podia ter feito uma intervenção isenta de erros, não o fez, ao cometer um erro.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Qual seja…

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O Orador: - Qual seja, Sr. Deputado Guilherme Silva, o de, na panóplia de críticas justas que fez à política de defesa deste Governo, ou à ausência dela, e à falta de consideração - há que dizê-lo - que muitas vezes, durante os últimos seis anos e meio, foi mostrada por uma instituição com o prestígio das Forças Armadas, acusar quem tentou fazer, nomeadamente na Lei de Programação Militar, algo em sentido contrário, ou seja, quem, através da Lei de Programação Militar, tentou inverter o curso das coisas.
Sr. Deputado, é legítimo V. Ex.ª e o seu partido não concordarem com a lei, é legítimo V. Ex.ª e o seu partido fazerem críticas concretas a muitos aspectos da lei; porém, já não é legítimo - e esse erro tem de ser apontado, porque é a única crítica que o seu discurso merece da bancada à qual pertenço - dizer que quem, através dessa lei, tentou dignificar e inverter o curso, dando prestígio e meios às Forças Armadas, não contribuiu para dignificá-las.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Nesse ponto, apenas e só nesse ponto, o seu discurso peca por ser profundamente injusto!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, tem mais dois pedidos de esclarecimento, mas dispõe de pouco tempo. Concorda responder conjuntamente?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria de dizer que considero muito mau prenúncio chamar-se para o debate eleitoral a questão das Forças Armadas tal como tem vindo a ser trazida a público.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

O Orador: - Não queremos voltar aos tempos em que as Forças Armadas, mais do que divididas por ramos, estavam divididas por partidos. Não queremos voltar a esses tempos!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não queremos um ramo das Forças Armadas que dá uma indicação de voto por uma manobra perfeitamente facultativa e sem o sentido do tempo político que se desenrola no País.
Mas pior do que um movimento pouco cauteloso de um ramo das Forças Armadas é, no seguimento dessa posição crítica, o PSD vir agora, através da voz do Sr. Deputado Guilherme Silva, tentar fazer um aproveitamento directo, político, diria que quase sectário, da questão das Forças Armadas.
Se não há, neste momento, os meios de que as Forças Armadas necessitam…

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - De que o País precisa!

O Orador: - … (e o Partido Socialista encara para o próximo governo um aumento dos meios financeiros à disposição das Forças Armadas), o certo é que o atraso na aprovação da Lei de Programação Militar deveu-se a uma sistemática obstrução do Partido Social Democrata, deveu-se ao facto de o Partido Social Democrata, quando viu que a lei estava na iminência de ser aprovada, não ter recuado, no desprestígio da Assembleia da República, em desacreditar essa lei,…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … ou seja, em desacreditar o aproveitamento que as Forças Armadas podiam fazer, ainda a tempo, da execução da Lei de Programação Militar.
Portanto, Sr. Presidente, entendo que qualquer aproveitamento politiqueiro da situação das Forças Armadas é um mau serviço que se presta ao País, às Forças Armadas, à democracia e aos partidos políticos.
Gostaria, ainda, de reafirmar que, apesar de todas as dificuldades,…

O Sr. Presidente: - Terminou o tempo de que dispunha, Sr. Deputado.

O Orador: - … porque se trata de um período em que toda a gente fala de contenção da despesa, as nossas Forças Armadas têm desempenhado os seus compromissos internacionais por forma a que os nossos aliados tenham a maior confiança em nós.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, o meu camarada e amigo Medeiros Ferreira disse o essencial.
A questão das Forças Armadas é uma questão nacional. É uma questão que exige uma grande reflexão com sentido de Estado, com sentido de responsabilidade democrática e a busca de um consenso nacional. E não foi esse o sentido da intervenção do Sr. Deputado Guilherme Silva.
Sr. Deputado, a pior coisa que se pode fazer com este tema é transformá-lo num instrumento do confronto político-partidário, sobretudo num instrumento de caça ao voto. E parece-me que foi esse o sentido da sua intervenção.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É uma questão demasiado séria para descer a este nível de discussão.
Eu não vou lembrar, sequer, as responsabilidades anteriores do PSD, não vou acentuar muito a instrumentalização que os senhores quiseram fazer com a Lei de Programação Militar. Direi só que as Forças Armadas estão a cumprir com honra as suas missões em Timor, com grande esforço nacional, no Kosovo e na Bósnia e precisam - é verdade que precisam - que as forças políticas concorram não para que cada uma tenha, como disse o Deputado Medeiros Ferreira, um partido dentro das Forças Armadas mas, sim, para a definição de um novo conceito de defesa, de um novo conceito de estratégia e para a dignificação das nossas Forças Armadas - mas não para a sua instrumentalização baixa, rasteira, no sentido da caça ao voto.

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Penso também que o Sr. Deputado Guilherme Silva não necessitava de insultar o meu camarada Ferro Rodrigues, porque eu também não vou dizer que o Dr. Durão Barroso aparece agora «travestido», por ter sido ministro do governo de Cavaco Silva.
Em política, fazer parte de governos e deixar de fazer parte de governos são coisas naturais e, portanto, entendo que o respeito mútuo faz parte também da boa regra da convivência democrática.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputados Sílvio Cervan, em primeiro lugar, registo que V. Ex.ª está comigo em 90% ou 99% das críticas que fiz e que os 10% ou o 1% em que discordou têm a ver com a minha afirmação de que nos opusemos àquela lei - e tínhamos razões para a ela nos opormos - e que outros a viabilizaram. Percebi que V. Ex.ª ficou tocado com essa referência aos «outros», o que significa, naturalmente, que eu fui certeiro na minha observação.
Srs. Deputados Medeiros Ferreira e Manuel Alegre, é óbvio que esta é uma questão delicada, é uma questão de Estado. E é exactamente por ser uma questão delicada e uma questão de Estado que eu pergunto a VV. Ex.as se o País compreenderia que, face aos acontecimentos que ocorreram - e não fomos nós que os criámos - relativamente à questão de os navios terem sido chamados por haver falta de meios para cumprirem as suas missões, o maior partido da oposição, realizando-se uma Comissão Permanente, não levantasse esta questão da forma que levantou. E a maneira de a levantar tinha de ser, inevitavelmente, a de uma forma crítica ao Governo.
Tenho pena que VV. Ex.as estejam incomodados com isso, mas, para evitar esse incómodo, deveriam ter-se empenhado em evitar que o Governo deixasse as coisas chegarem ao estado a que chegou!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O que o País não compreenderia era que o maior partido da oposição deixasse passar em branco esta situação. E fiquem perfeitamente descansados que não é da parte do PSD que há preocupações eleitoralistas nesta matéria. E se ela foi tratada de forma incómoda para o Governo, de forma incómoda para VV. Ex.as, foi porque, em nome de uma questão de Estado como é esta, era preciso tratá-la desta maneira. Não era possível tratá-la de outra forma que não fosse a da denúncia, e estávamos à vontade para fazê-lo por termos chamado várias vezes a atenção para o facto de que se estava a conduzir as Forças Armadas para esta situação.
Portanto, temos toda a legitimidade para o fazer, e vamos fazê-lo, em nome da defesa das questões de Estado, como é a das Forças Armadas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E, se vamos falar em eleitoralismo, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, então, a promessa que agora faz, passados todos estes anos, de que está previsto no programa do Partido Socialista dar mais meios às Forças Armadas, se não é feita por eleitoralismo, não sei o que é eleitoralismo!…
Passando à forma como me referi ao Sr. Dr. Ferro Rodrigues. Disse o Sr. Deputado Manuel Alegre que fazer parte de governos são coisas normais em política. Lembre-se, Sr. Deputado Manuel Alegre, da forma digna como se bateu, em eleição, o Dr. Fernando Nogueira. Ninguém ouviu àquele homem uma palavra de crítica ao Professor Cavaco Silva, em nenhuma circunstância. E talvez até em algumas ele pudesse tê-lo feito! Foi essa dignidade que eu não registei no Sr. Dr. Ferro Rodrigues!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esperávamos ter hoje aqui o Governo para nos esclarecer, em resposta a um requerimento nosso, e, através de nós, ao País, das razões, das consequências e das medidas que o Governo entendia dever adoptar pelo facto de, em definitivo, não serem cumpridas as condições do diploma legal que regia a privatização do grupo Gescartão, onde se integra a Portucel Recicla, de Mourão, e que obrigava à construção, pela entidade adquirente, de uma fábrica de papel reciclado em Mourão, em substituição da unidade existente e em curso de desmantelamento porque a zona onde se situa será submergida pela albufeira de Alqueva. Obrigações contratuais, mas também compromisso político assumido pelo Governo e, pessoalmente, pelo Primeiro-Ministro.
O Ministro da Economia não está cá porque o Partido Socialista e o Governo a isso se opuseram, para fugirem a um debate insustentável.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Mas nós não deixamos de voltar a trazer este tema a este Hemiciclo, pela sua relevância e porque exigimos respostas claras.
A empresa adquirente, a Imocapital, pertencente ao universo Sonae, declarou já não querer cumprir o caderno de encargos e o Governo, de acordo com a nota do Gabinete do Sr. Ministro da Economia, que há pouco nos chegou à mão, demite-se de fazer cumprir a lei, porque não quer afrontar o Eng.º Belmiro de Azevedo, lava as mãos do processo e remete a responsabilidade da decisão do processo para os trabalhadores das autarquias, entidades que, além do mais, não têm qualquer capacidade jurídica para aceitar uma qualquer alteração ao caderno de encargos.
O Governo, na nota que nos envia, falta à verdade, para não dizer aquela expressão de que o Sr. Presidente não gosta que se diga. E eu digo porquê.
O Governo sabia que, mesmo antes do concurso de privatização, a Sonae levantava objecções à construção da fábrica. Mas o Governo - e bem! - incluiu no caderno de encargos a obrigação da sua construção.
O Governo foi deixando passar, sem intervir, os prazos a que a Sonae estava obrigada para colocar a nova fábrica em laboração: primeiro, Março de 2001; depois, Dezembro de 2001.
A Portucel SGPS deveria fazer relatórios mensais sobre a evolução da construção da nova fábrica, relatórios que

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ou nunca foram feitos ou que, se o foram, o Governo escondeu.
O Governo sabe - e esta é, Sr. Presidente, uma das coisas mais graves - que o grupo Gescartão, onde se inclui a Portucel Recicla, foi avaliado por cerca de 42,5 milhões de contos e foi vendido à Sonae somente por cerca de 20 milhões de contos. A diferença, de cerca de 22,5 milhões de contos - explicou-nos, então, o Governo -, correspondia ao investimento que ia ser feito na nova fábrica em Mourão. Agora, a Sonae promete, em alternativa, uma fábrica de móveis, cujo valor de investimento não chega aos 3 milhões de contos, mais um fundo de capital de risco de cerca de 1 milhão de contos. Só aqui a Sonae ganha cerca de 18,5 milhões de contos.
Chantageando as autarquias e os trabalhadores, a Sonae e o Governo deram agora um ultimato: ou aceitam isto ou não há nada para ninguém. Disse-o o Sr. Ministro da Economia a todas essas entidades, na reunião que teve.
O Governo sabe que está a cometer, e a deixar cometer, uma clara ilegalidade, que põe em causa dinheiros públicos e todo o processo de privatização.
O Governo sabe, por exemplo, que, no momento da apresentação das candidaturas dos interessados no processo de privatização, houve concorrentes que não se apresentaram ao concurso exactamente por discordarem da cláusula que obrigava à construção da nova fábrica. Agora, qualquer deles pode, obviamente, accionar um processo de anulação da privatização por não terem sido cumpridas as respectivas obrigações contratuais.
O Governo falta à verdade quando diz que se quisesse intervir agora teria de fazê-lo pela via judicial, o que levaria muito tempo. É mentira! Com esta afirmação procura fazer pressão sobre as autarquias e os trabalhadores, porque o Governo sabe que tem poderes para anular o concurso de privatização, através da publicação de um diploma legal com a mesma força de lei do decreto da privatização.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - O caderno de encargos não foi cumprido. O Governo tem de anular o processo de privatização, fazer retomar pelo Estado o capital da Gescartão e cumprir, ele próprio, as obrigações políticas e jurídicas a que se obrigou.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É inaceitável o comportamento do Governo, especialmente do Ministro da Economia e do Primeiro-Ministro, que inclusivamente, como sabem, colaborou numa encenação mediática de lançamento de uma primeira pedra que nunca existiu.
Está em causa um importante investimento numa zona que vai ficar submergida por albufeira - o concelho de Mourão fica amputado em cerca de 1/3 do seu território -, estão em causa o emprego e os salários de 105 trabalhadores, está em causa o Estado como pessoa de bem e, mais uma vez, se revela que o Governo, perante a força dos grandes interesses, verga e não faz cumprir a autoridade democrática do Estado.
O PCP tudo continuará a fazer para obrigar o Governo a cumprir e fazer cumprir as suas obrigações políticas e jurídicas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares pede a palavra para uma interpelação à Mesa. Agradecia que dissesse qual a matéria da ordem de trabalhos que está em causa.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, a matéria é a seguinte: o Governo, na sequência de uma iniciativa do Partido Comunista Português que a conferência não aceitou, preparou uma informação circunstanciada sobre o caso que o Sr. Deputado Lino de Carvalho aqui acaba de tratar.
Não vi, na intervenção do Sr. Deputado, reflectida essa informação…

O Sr. Presidente: - Sem alegações, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - … e gostaria, Sr. Presidente, que essa informação pudesse ser transmitida e distribuída aos grupos parlamentares, aqui mesmo, porque essa leitura resolverá as questões suscitadas.

O Sr. Presidente: - Será distribuída.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Qual é a matéria?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É exactamente por causa da nota que o Governo nos entregou.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, pede a divulgação de algum papel?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não, Sr. Presidente.
O Sr. Secretário de Estado esteve desatento porque a minha intervenção foi, exactamente, de resposta à nota do Sr. Ministro da Economia, que tenho aqui.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado tem o direito de pedir a distribuição de um papel. Tem algum papel para distribuir?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Tenho! Tenho aqui, se quiser, o projecto da fábrica de móveis; tenho aqui a acta do Sr. Ministro da Economia…

O Sr. Presidente: - Já se serviu dos seus argumentos, muito obrigado. A carta vai ser, então, distribuída.
Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Diga, então, qual é a matéria, Sr. Deputado.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, parece que só havia duas partes neste debate: o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português e o Governo, pois todos os outros não tinham conhecimento da carta, e foi dito ontem, em conferência de líderes,…

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que não alegue, porque ainda não lhe dei a palavra. Não faça insinuações desse género.
Se tem alguma interpelação a fazer, diga qual é a matéria, que tenho muito gosto em considerá-la.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, respeitosamente, penso que o debate não deve continuar enquanto os grupos parlamentares não possam ler a carta que foi dada como resposta do Governo à proposta do Partido Comunista.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O que sugere, Sr. Deputado? Uma suspensão dos trabalhos?

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, pelo menos, que a carta seja entregue aos grupos parlamentares - líamos a carta num minuto -, de forma a percebermos o que é que estamos a discutir.

O Sr. Presidente: - Vamos, então, suspender os trabalhos, por alguns segundos, por forma a que a carta seja distribuída e lida pelos Srs. Deputados.

Pausa.

Srs. Deputados, entretanto, vou dar-vos conta de uma mensagem de S. Ex.ª o Presidente da República, que é do seguinte teor: «Tencionando deslocar-me à Bósnia, para visitar as tropas portuguesas em Sarajevo, entre os dias 3 e 5 do próximo mês de Março, com passagem por Roma, venho requerer, nos termos dos artigos 129.º, n.º 1 e 179.º, alínea e) da Constituição, o necessário assentimento da Comissão Permanente da Assembleia da República.»
Srs. Deputados, recebi um ofício do Sr. Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, do seguinte teor: «Na impossibilidade de, no prazo previsto, reunir o plenário da Comissão - e sem prejuízo das dúvidas que ela própria já expressou sobre a legalidade da sua efectivação no actual período político -, desejo informar V. Ex.ª que contactei pessoalmente os Coordenadores dos vários partidos com assento nesta Comissão, os quais dão o seu total assentimento e parecer favorável à prevista deslocação de S. Ex.ª o Presidente da República.
Julgo, assim, nos termos requeridos, que pode considerar-se esta posição como equivalente ao parecer favorável da Comissão, por forma a habilitar a Comissão Permanente à competente decisão.»
Vamos, portanto, pronunciarmo-nos sobre o pedido de assentimento do Sr. Presidente da República.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de relatórios e pareceres da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial de Vinhais, Processo n.º 5/95, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de dar assentimento a S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, Dr. António de Almeida Santos, a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência, em audiência marcada para o próximo dia 5 de Março de 2002, pelas 14 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Procuradoria Geral da República, Processo n.º 110/2001, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Jorge Coelho (PS) a prestar depoimento, como testemunha, por escrito, no âmbito dos autos em referência (Inquérito n.º 216/00).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 2.º Juízo Criminal da Comarca do Porto, Processo n.º 268/99, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Agostinho Lopes (PCP), a prestar depoimento, como testemunha, no âmbito dos autos em referência, em audiência marcada para o próximo dia 25 de Fevereiro de 2002, pelas 9 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Direcção-Geral de Viação, Auto de contra-ordenação n.º 317115006, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, a prestar depoimento, como testemunha, por escrito, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, já podemos continuar os trabalhos?

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Para uma intervenção, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Acabou de intervir, Sr. Deputado!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas queria usar de 30 segundos de que ainda disponho para fechar este debate.

O Sr. Presidente: - Neste caso, para complementar a sua intervenção.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, julgava que iriam ser formulados pedidos de esclarecimento, o que não aconteceu, e assim requeiro que me inscreva para intervir ainda sobre este ponto do debate, uma vez que ainda disponho de algum tempo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Sílvio Rui Cervan e António Braga.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço desculpa, mas o Sr. Presidente não o tinha anunciado!

O Sr. Presidente: - Informam-me que o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan prescinde do uso da palavra, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, compreendemos que o PCP, nesta ocasião, leia a resposta do Governo num certo sentido, mas devo dizer-lhe que a solução do problema passava por dois aspectos relevantes: o de vincar o aspecto legal e, portanto, construir uma solução por via judicial ou, então, o de encontrar uma solução extrajudicial para o contrato a que os vencedores do concurso estão obrigados.
O Governo, em primeiro lugar, não aceitou que alguém não cumprisse o que estava contratado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Falso!

O Orador: - Não aceitou! E justamente por não aceitar acompanha o processo com estas duas vertentes. A via judicial pode trazer dificuldades acrescidas mas o Governo não descai dela; se for possível, optará pela via extrajudicial - aliás, os próprios trabalhadores, por maioria, já decidiram que estavam de acordo na procura de uma solução extrajudicial que salvaguarde fundamentalmente o emprego dos trabalhadores. Esta é a questão que está subjacente à informação do Governo.
Mais: mesmo que a solução extrajudicial não seja atingível no curto prazo, o Governo mantém a garantia absoluta de que fará vingar, nomeadamente, o direito dos trabalhadores ao emprego. Naturalmente, essa é a questão fundamental que nos preocupa e o Governo demonstrou-nos aqui que a está a acompanhar o problema pelas duas vias, adoptando a solução mais expedita - aquela a que os trabalhadores já aderiram -, que é a da negociação extrajudicial, se possível.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Braga, também nós lemos a informação do Governo, só que o Sr. Deputado leu-a e, naturalmente, acreditou nela enquanto que eu, para além de a ter lido, conheço os factos, estive nas reuniões com os membros do Governo e, enfim, conheço o que o Sr. Deputado não conhece.
O problema é muito simples, Sr. Deputado. Há um processo de privatização em que uma empresa ganhou o concurso de privatização com a condição - expressa no artigo 26 do caderno de encargos - de construir no mesmo local uma fábrica alternativa de papel reciclado. Houve concorrentes que não foram ao concurso por discordarem dessa cláusula. No fim, a construção foi adjudicada ao universo Sonae por menos 22 milhões de contos, porque esse montante significava o investimento na tal fábrica, e hoje esse universo Sonae, o grupo Imocapital, não constrói a fábrica, informa os trabalhadores que é melhor começarem a rescindir os seus contratos e oferece como alternativa uma hipotética fábrica de móveis, que se não se situar naquele local ficará em Linares, em Espanha.
Ora, perante esta situação, o Governo só tinha uma solução, que não era o recurso a via judicial alguma, era a de, pura e simplesmente, anular o concurso de privatização pela mesma via com que o fez, através de um diploma legal, de um decreto-lei, cumprindo ele as obrigações jurídicas e políticas a que o Estado se tinha obrigado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, Sr. Deputado, a realidade é esta: nada está cumprido, nem as obrigações políticas, nem as obrigações jurídicas, nem o futuro dos trabalhadores, nem os complementos para o concelho de Mourão a que o Governo se obrigou.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma vez mais, estamos perante algo que deixou de ser uma originalidade e, lamentavelmente, se tornou uma prática política. Refiro-me à troca de correspondência do Governo com o Parlamento, num momento em que, claramente - no caso concreto, esta não é uma situação nova -, um membro do Governo, o Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, se furta, como é seu hábito, ao confronto democrático e político com o Parlamento. E esta não é para nós uma questão menor, trata-se de uma lei da República (a partir do momento em que é aprovada por esta Assembleia deixa de ser uma proposta de Os Verdes e passa a ser uma lei da República) que está por cumprir e que tem a ver, concretamente, com a política para resíduos industriais no nosso país.
Pois é exactamente em relação a essa lei que está por cumprir que os portugueses são surpreendidos com o início de testes de co-incineração numa das cimenteiras que se situa precisamente no coração de um parque natural. E, sobre esta matéria, recusando deslocar-se ao Parlamento, o Sr. Ministro entendeu enviar uma missiva, que chegou hoje ao nosso poder, com 111 linhas, 17 pontos, dos quais um único se dedica a tratar dos resíduos industriais. Ou seja, todos os outros 16 pontos falam abundante e exclusivamente da co-incineração, o que constitui, como os Srs. Deputados sabem, menos de 5% do problema que esteve na origem da lei aprovada em 2000 por este Parlamento.

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Desde já, há que fazer a seguinte leitura política: não há por parte do Governo, e concretamente por parte do Ministro do Ambiente, respeito pela República; antes há, seguramente, uma atitude de quem parece estar refém de uma solução técnica que é discutível - mas não é essa que nos interessa de momento.
De facto, o que nos interessa, em concreto, é que a Assembleia da República obrigou o Governo, já que ele não estava a cumprir as suas funções como executivo, a apresentar um inventário sobre os resíduos industriais a que os industriais estão obrigados. Pois bem, o último inventário que existe revela menos de 5% da totalidade de resíduos produzidos. Portanto, tal significa que mais de 95% dos industriais portugueses não cumprem a lei, não apresentam registo e continuam, impávida e serenamente, a violar a leis.
Em segundo lugar, a Assembleia da República, preocupada com o ambiente e com a saúde, determinou que o Governo devia - o que, aliás, já devia ter feito - apresentar uma lista dos locais contaminados e tomar medidas de emergência para os identificar. Pois bem, o Governo não o fez e, mais, Sr. Presidente e Srs. Deputados, os aterros que o Governo devia ter construído não foram construídos.
Concluo dizendo que os testes que se vão iniciar vão sê-lo de forma ilegal: não houve licenciamento prévio por parte dos municípios nem foi criada uma monitorização nestes locais e, acima de tudo, os estudos epidemiológicos que deveriam ter sido feitos não se realizaram.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça inscreveu-se para pedir esclarecimentos, mas como a Sr.ª Deputada Isabel Castro não dispõe de tempo para responder, a Mesa concede-lhe 1 minuto para o efeito.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, não percebo quem é que não cumpre a lei. Começo por dizer-lhe que o PESGRI 2001 inclui uma listagem de resíduos de acordo com o respectivo código. Se calhar, a Sr.ª Deputada anda distraída ou não consultou as medidas já anunciadas e que estão disponíveis ao nível das novas tecnologias, designadamente através da Internet.
No fundo, gostaria de saber em que é que ficamos. A Sr.ª Deputada está ou não preocupada em que haja um esforço e uma política concertada e estratégica no que diz respeito ao tratamento dos resíduos industriais perigosos? A Sr.ª Deputada está ou não preocupada com a saúde pública das populações onde este processo da co-incineração vai ser feito?
Queria ainda recordar-lhe todo o processo que levou à elaboração e à adopção do tratamento dos resíduos industriais perigosos por via da co-incineração e também chamá-la à atenção que, quanto aos testes já realizados em Souselas, a Comissão Científica e Independente, que esta Assembleia da República aprovou e que considerou ser essencial para que se pudesse falar da co-incineração em Portugal, concluiu que esse ensaio permitiu confirmar a adequação da opção pela co-incineração em unidades cimenteiras.
Sr.ª Deputada, não sei quem é que não cumpre a lei e, sobretudo, quem é que não quer assumir aquilo que exigiu aqui em tempos… A bem da verdade, convém dizer que o Partido Ecologista Os Verdes requereu uma Comissão Científica Independente, a qual está a funcionar com a objectividade e com o rigor científico que todos desejamos.
Por isso mesmo, quanto ao «não cumprir a lei», não me parece que seja verdade!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada concluirá facilmente, se ler a lei aprovada pela Assembleia da República e o calendário proposto, quem é que não cumpre a lei.
Quem tem poder executivo e quem tem de decidir sobre política de resíduos industriais é o Governo. A Comissão Científica Independente tem um âmbito muito limitado, que é pronunciar-se sobre uma solução técnica e não mais do que isso.
A Sr. Deputada referiu Souselas. É um bom exemplo, porque só se pode dizer que não há risco acrescido quando se conhece o risco anterior. Ora, devo dizer-lhe que, relativamente aos acidentes ocorridos no ano passado em Souselas, a resposta do Governo foi que desconhecia qual a origem de emissões por não ter uma rede instalada. Nesse sentido, não posso dizer que não há mais ou menos risco porque não sei qual é o risco actualmente.
É a partir do vazio e do desconhecimento que vamos fazer das pessoas cobaias, uma vez que não há um estudo epidemiológico, o tal que a Comissão Científica e Independente disse que existia, e é também devido à ausência de medidas e de tomadas de decisão, que competem ao Executivo, que não temos, neste momento, nenhum dos muitos aterros necessários para instalar os resíduos industriais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, a próxima reunião da Assembleia da República terá, como é óbvio, uma composição muito diferente desta que agora termina e, por razões de amizade e de respeito, ficaria mal se não sublinhasse o contributo para esta Legislatura de alguns Deputados. Muitos não voltarão a ser eleitos pelo veredicto popular, mas gostaria de me referir em particular àqueles que não o serão por não terem sido incluídos nas listas partidárias pelas suas direcções políticas.
Não me referirei, naturalmente, às razões que determinaram essa escolha, mas quero, mais uma vez por razões de respeito e de amizade, sublinhar alguns casos, sem esquecer nenhum, em particular daqueles Deputados com os quais, ao longo deste Legislatura, houve uma convergência significativa em batalhas políticas que foram tão importantes para a intervenção do Bloco de Esquerda. Refiro-me, entre outros, a António Reis, vice-presidente da bancada socialista, e a João Amaral, Vice-Presidente da Assembleia da República, que não estarão na próxima Assembleia.
Queria dizer que os respeitei nos pontos de acordo, que foram muitos e alguns muito importantes: na luta pela reforma fiscal, por uma nova política sobre a toxicodependência, sobre políticas a respeito dos direitos sociais. Uns tiveram caminho na sociedade portuguesa,

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outros, como a reforma fiscal, vieram a ter o «beijo de Judas», como é bem conhecido.
Quero dizer, sobretudo, que os respeito e sublinho o contributo e a marca que deixaram nesta Assembleia, nomeadamente nos momentos em que com eles estive em desacordo.
Creio que é importante sublinhar que estes Deputados, trabalhadores dedicados, apresentaram claramente os pontos de vista dos seus partidos e contribuíram para aquilo que é o mais genuíno que tem de existir na esquerda: uma força plural e uma força de modernidade.
A esquerda, tal como a entendo e não penso estar enganado, pelo menos nessa matéria, deve ser fiel àquilo que sempre foi e, por isso mesmo, portadora de tempos novos. É por isso que nesses desacordos eu soube reconhecer e encontrar no António Reis ou no João Amaral figuras que se debateram, claramente, por uma transformação social que é tão importante.
Por isso, bem aventurado o Parlamento que merece este tipo de adversários e este tipo de confrontos políticos em que eles brilharam. Não queria deixar de o dizer aqui porque na próxima Assembleia eles já não estarão presentes, como, aliás, não estão hoje nesta Sala. Penso que é uma homenagem merecida e é uma homenagem necessária.
Sr. Presidente, quando está em vias de me retirar a palavra, certamente por obrigação regimental, o que faz pela última vez, não queria também deixar de dizer que me retirou a palavra tantas vezes quantas ma deu; por isso, ficámos quites e por isso lhe agradeço.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, deixe-me acompanhá-lo nas palavras elogiosas que proferiu em relação ao António Reis e ao João Amaral e, relativamente aos presentes, estendo-as ao Deputado Sílvio Rui Cervan também e a todos aqueles…
Mais quem?

Vozes do PSD: - Miguel Macedo!

O Sr. Presidente: - O Miguel Macedo penso que será por causa dos cabelos brancos…

Risos.

É capaz de ser essa a razão.
De qualquer modo, prestaram grandes serviços à democracia parlamentar, em especial ao Parlamento, e é sempre pena ver partir amigos e colegas com quem tivemos um contacto aturado durante anos, que nos levaram a admirá-los e a apreciá-los.
Queria, pois, secundar as suas palavras e render também a minha homenagem a estes quatro Deputados que foram aqui referidos e provavelmente a outros que mereciam continuar e por qualquer razão, que respeito, não podem continuar.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estados, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de começar a intervenção que aqui vou proferir, queria associar-me à saudação que o Deputado Francisco Louçã dirigiu a dois Deputados e alargá-la a outros, já aqui mencionados, que vão abandonar as funções parlamentares e que, ao longo destes anos, contribuíram para reforçar o prestígio da Assembleia da República.
Quero agradecer ao Deputado Francisco Louçã as considerações que fez acerca do Deputado António Reis, que foi vice-presidente da direcção desta bancada e que é fundador do Partido Socialista. Ele retira-se agora do Parlamento mas não da vida política portuguesa, onde vai continuar a dar um contributo muito importante para a renovação da própria esquerda, num diálogo fecundo que queremos manter com todos os seus representantes.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Dr. Pacheco Pereira enunciou, na Convenção do PSD realizada no passado fim-de-semana, aquele que será talvez o mais minimalista mas também o mais demagógico dos programas políticos concebíveis, considerando que, em relação ao que foi a governação do PS, o PSD se deveria limitar a fazer tudo ao contrário.
É evidente que a enunciação de um programa desta natureza tem de assentar numa prévia representação caricatural da realidade portuguesa, e é isso que, infelizmente, o PSD tem vindo a fazer. Toda a sua retórica política, todo o seu discurso assenta em dois princípios nucleares: em primeiro lugar, uma enunciação puramente caricatural, uma manipulação grosseira do que é hoje a realidade do País e, em segundo lugar, uma projecção de puro ilusionismo político, enunciando um programa que é mais um contraprograma, o qual, de resto, também vai sofrendo sucessivas alterações, de acordo com as reacções da opinião pública e de alguns sectores da sociedade portuguesa às propostas que vai apresentando.
Por isso, queremos dizer aqui, de uma forma muito clara, o seguinte: reconhecêmo-nos e temos orgulho na obra realizada ao longo destes seis anos, a qual não tem nada que ver com a representação caricatural que o PSD pretende fazer da mesma. Ao longo de seis anos, fomos capazes de introduzir uma nova cultura política no País, colocando a tolerância no lugar da arrogância, o diálogo no lugar do desrespeito pelas oposições. Independentemente dos resultados das próximas eleições legislativas, esperamos que isso fique instalado na sociedade portuguesa, sendo, em grande parte, o resultado da acção do Governo e em particular do Primeiro-Ministro António Guterres.
Por outro lado, temos orgulho no essencial da acção prosseguida mas nunca cometemos o erro do autismo e não ficámos prisioneiros da contemplação do trabalho já realizado. É por isso que estamos empenhados, com uma energia renovada, em responder hoje aos desafios que se colocam ao País, que são, seguramente, sob vários pontos de vista, distintos dos que se colocavam quando assumimos funções de responsabilidade governativa, há seis anos atrás. E, a isso, o que é o PSD contrapropõe?
Verdadeiramente, esta posição do PSD não nos surpreende. Este contraprograma que o PSD tem vindo a apresentar não é mais do que o corolário de seis anos em que o PSD optou pela maledicência e nunca pelo caminho de se constituir numa alternativa credível. Ao longo de seis anos, o PSD não apresentou, neste Parlamento, propostas políticas diferenciadoras que o credibilizassem como uma alternativa com uma orientação distinta, mas igualmente respeitável, em relação à acção do Governo.
O corolário de toda esta maledicência é agora a apresentação de um programa que mais não parece ser, como hoje referia um importante dirigente do PS, o

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Dr. António Costa, do que um programa de adiamentos e de suspensões, uma espécie de contraprograma, e um contraprograma que, de resto, vai sofrendo alterações.
Senão, vejamos: há dois meses atrás, anunciava-se como a prioridade no âmbito da política económica a privatização da Caixa Geral de Depósitos, mas, uma vez observadas algumas críticas, algumas das quais provenientes de alguns dos mais reputados economistas do próprio PSD, imediatamente recuaram, fazendo crer que tinha havido apenas um erro de interpretação em relação àquela que foi uma declaração clara e, cremos, um compromisso assumido pelo líder do partido.
Ainda na política económica, há a considerar a teoria do «choque fiscal», que, num primeiro momento, é apresentado de uma forma e, num segundo momento, vai sendo apresentado de forma muito mais titubeante, alteração essa que corresponde também à forma como tal iniciativa é recebida por alguns sectores da opinião pública portuguesa.
Na Convenção, entraram claramente na fase das suspensões e dos adiamentos, mas das suspensões e dos adiamentos estribados na mentira ou na mais absoluta demagogia. Na mentira quando dizem que vão suspender, procurando por essa via estabelecer um elemento de diferenciação, uma decisão que já ela própria foi objecto de decisão de suspensão por parte do actual Governo e que tem que ver com a terceira ponte sobre o Tejo. Já no que diz respeito ao aeroporto, usam-se os argumentos mais demagógicos, que ainda anteontem o Eng.º João Cravinho foi capaz de desmontar claramente, para justificar tal decisão.
Em relação à co-incineração, não se diz como é que se vai resolver o problema, mas apenas que não é esse o caminho que se vai seguir. Respeitamos todos aqueles que, neste Parlamento, ao longo dos anos, foram enunciando posições distintas das nossas - ainda há pouco tivemos um debate sobre o assunto -, mas quem tem a expectativa de governar Portugal tem a responsabilidade de dizer exactamente o que vai fazer, como e em que circunstâncias e não se pode limitar a dizer que não vai fazer com o intuito de arrecadar mais alguns apoios eleitorais conjunturais.
Em matéria de direitos sociais, depois de todo o discurso que foram proferindo nos últimos meses, em que demonizaram o rendimento mínimo garantido, considerando-o um incentivo à preguiça e um reconhecimento da vagabundagem, reconhecem agora não estar em condições de pôr em causa esse importante instrumento de combate à exclusão, à pobreza e à marginalidade sociais - não temos é a convicção de que o façam em obediência a um princípio político seguro, ou apenas por razões meramente eleitoralistas.
Em todo o caso, a verdade é que também nesta matéria mudaram de posição. Agora vêm recuar, dizendo que até vão defender a manutenção dos direitos sociais adquiridos, os mesmos que demonizaram no passado, aliás, os mesmos que puseram em causa quando tiveram funções de responsabilidade governativa em Portugal, nos últimos anos, pondo em risco a viabilidade financeira da segurança social pública ao não assegurarem o cumprimento da lei de bases e as obrigatórias transferências de verbas do Orçamento do Estado para o sistema de segurança social pública.
Tal demonstra que o PSD não tem convicções sérias sobre coisa nenhuma, não tem um projecto articulado, verdadeiramente pensado e que corresponda às necessidades reais do País, hoje. O PSD julga que está em condições de apenas se aproveitar daquelas que serão circunstâncias menos favoráveis para o PS, e que nós próprios reconhecemos, para tentar captar o apoio dos portugueses.
A isso contrapomos um projecto, que tem vindo a ser enunciado de forma muito clara, um projecto em que não renegamos a nossa tradição, em que não pomos em causa a nossa acção, em que não desdizemos hoje o que afirmámos ontem, mas em que, pelo contrário, procuramos compreender que hoje as questões são diferentes, que há muitos novos desafios, pelo que tem de haver novas respostas, e em que temos consciência de que, em relação a algumas áreas, a nossa acção ficou aquém do desejável e daquilo que nós próprios nos tínhamos proposto alcançar, mas estamos empenhados em redobrar as nossas energias no sentido de alcançarmos os objectivos que pretendemos atingir.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vou terminar a minha intervenção mas não sem antes referir também um dos mais curiosos fenómenos verificados na Convenção do PSD, que foi, sem sombra de dúvida, a presença do Primeiro-Ministro espanhol, o Sr. Aznar, a prescrever aquelas que devem ser as orientações de política económica de um hipotético futuro governo português liderado pelo Dr. Durão Barroso.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira concluir, porque esgotou o seu tempo.

O Orador: - É caso para perguntar se, porventura, a primeira decisão que um hipotético governo português tomaria, se o Dr. Durão Barroso fosse Primeiro-Ministro, não seria a de instalar uma linha directa entre a Residência de S. Bento e o Palácio da Moncloa para receber, todos os dias, algumas inspirações e recomendações!

Protestos do PSD.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nós seguiremos claramente pela via que temos prosseguido de enunciação clara dos projectos e de soluções, mesmo que suscitem momentaneamente alguns desagrados.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, dispondo para tal de um minuto cedido pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, começo por dizer que foi uma pena ter mandado calar o Sr. Deputado Francisco de Assis, já que ele estava tão embalado a desenvolver a importância da obra que levou o actual Primeiro-Ministro a ir-se embora.
O Sr. Deputado estava bastante embalado, aliás, fala sempre bastante bem, mas percebe-se que está verdadeiramente treinado e está apto a desempenhar a função que lhe estará destinada, que é a de estar na oposição.

Risos.

Penso que o discurso da oposição lhe assenta bem e, de resto, é uma tradição que julgo que o Partido Socialista verdadeiramente nunca perdeu.

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1259 | I Série - Número 033 | 21 de Fevereiro de 2002

 

O Sr. António Braga (PS): - É cedo para o dizer!

A Oradora: - Sr. Presidente, quero aproveitar estes últimos segundos para me associar ao Sr. Deputado Francisco Louçã quanto a manifestar toda a nossa solidariedade e homenagem aos nossos colegas Deputados que, hoje, por um motivo ou por outro, provavelmente é a última vez que se encontram neste Hemiciclo. Não quero deixar de dizer que me associo às palavras que já aqui foram proferidas, que serão poucas para prestar a homenagem devida a todos os colegas. Se me permitem, não posso deixar de fazer uma referência especial ao meu colega Miguel Macedo, não só porque ele é da nossa bancada mas porque prestou um trabalho inestimável ao Parlamento e à bancada do Partido Social Democrata.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Francisco de Assis, por um minuto, quero dizer que me penitencio por há pouco não ter referido entre os presentes que vão também deixar-nos os Deputados António Martinho, José Reis e Gil França. Só depois me apercebi desta falta, pelo que a corrijo desta maneira, porque tenho também muito pena de não contar com a vossa companhia, enquanto por aqui permanecer, o que já não será por muito tempo. Quando digo «aqui» não é na Presidência da Assembleia, porque quanto a isso ponho um ponto final, mas na qualidade de vosso colega de bancada, onde terei muito gosto em continuar por mais algum tempo.
Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. A resposta será muito breve, salientando que, com a elegância que a caracteriza e que tanto a habilita para estar na oposição como para estar no poder, a Deputada Manuela Ferreira Leite deixou transparecer subliminarmente uma mensagem de uma enorme arrogância, como se o lugar natural do PSD fosse o poder e o lugar natural do PS e das esquerdas fosse estar na oposição. É contra essa arrogância que nos batemos.
Foi precisamente porque nunca se deixou dominar por essa arrogância que o Eng.º António Guterres, malgrado valorar positivamente a acção desenvolvida ao longo dos últimos seis anos, entendeu que era altura de dar um contributo para superar uma situação de impasse que se vivia na vida política portuguesa e que tinha que ver, fundamentalmente, com a circunstância de haver um empate das representações parlamentares nesta Assembleia da República entre os 115 Deputados da maioria e os 115 Deputados das diversas oposições.
Mas ninguém sabe verdadeiramente o que é que vai acontecer a 17 de Março. Em nome dos nossos princípios, todos nos bateremos por alcançar um resultado que nos permita atingir o exercício do poder, mas de uma coisa a Sr.ª Deputada pode estar absolutamente certa: no poder ou na oposição, nunca estarei treinado. No poder ou na oposição, exercerei sempre, em toda a plenitude, os direitos que nos estão acometidos e lutarei sempre pelos princípios que são a razão de ser da minha acção política e que não têm nada que ver com a circunstância conjuntural de estar a apoiar o partido do poder ou de estar a combater outro partido que esteja no poder, em Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos. Resta-me despedir-me de vós, desejando a todos, mas a todos, sinceramente, uma boa campanha eleitoral e que o povo português premeie os melhores, como é natural que faça.
Boa campanha e até ao próximo universo parlamentar.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.

Eram 16 horas e 50 minutos.

Faltaram à reunião os seguintes Srs. Deputados:

Partido Popular (CDS-PP):
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da França
Narana Sinai Coissoró

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1260 | I Série - Número 033 | 21 de Fevereiro de 2002

 

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