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0686 | I Série - Número 018 | 07 de Junho de 2002

 

A ser assim, se continuássemos uma política orçamental e financeira estimuladora da despesa interna, qual seria o futuro da economia portuguesa? Sr. Presidente e Srs. Deputados, a resposta a esta questão não é difícil de adivinhar, basta conhecer as regras do jogo.
Quem acompanha, por exemplo, o mercado bancário sabe que, desde há mais de um ano, as condições de financiamento para as empresas se têm vindo a agravar significativamente (os spreads sobre as taxas de mercado são hoje duas a três vezes o que eram há cerca de 12 meses, para uma empresa de risco médio).
No quadro de análise em que nos situamos, esta restrição financeira tenderia a agravar-se gradualmente, num processo inexorável de asfixia do sector produtivo. Impossibilitados de expandir o crédito por indisponibilidade de recursos, os bancos teriam de o restringir gradualmente, começando (como já começaram) por subir o preço, agravando os spreads.
A restrição financeira assumiria também uma dimensão quantitativa, traduzida numa selectividade cada vez mais exigente, excluindo dezenas, centenas, talvez milhares de empresas, amanhã, do acesso ao crédito bancário.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na ausência de um ajustamento orçamental sério, seria este o mecanismo de ajustamento da economia portuguesa, de correcção dos seus desequilíbrios e do sobreendividamento em que caímos. Este processo traduzir-se-ia no encerramento sucessivo de empresas, com quebras de produção e aumento contínuo do desemprego. Este processo, aliás, já começou, como atesta o aumento significativo do desemprego iniciado em Dezembro e continuado nos meses seguintes (atente-se na última informação dos Indicadores de Conjuntura do Banco de Portugal, de Abril).
Em dois anos, o desemprego ultrapassaria, sem surpresa, a fasquia dos 10%. A recessão instalar-se-ia, só não se sabe por quantos anos (certamente por muitos!), a convergência com a Europa transformar-se-ia numa miragem; só os nossos credores não teriam problemas, porque iriam receber os seus créditos, em última análise, tendo por contrapartida activos muito depreciados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para se perceber que este seria o futuro da nossa economia, basta recordar uma passagem do já citado texto do Governador do Banco de Portugal, que dizia que, nos próximos anos, vai ser necessário reduzir o défice da balança de bens e serviços, acrescentando o seguinte: «Os limites ao défice e ao endividamento são introduzidos pelos próprios agentes privados ou pelos mercados que asseguram, assim, o funcionamento dos mecanismos de auto-correcção dos défices, mecanismos que são naturalmente de natureza restritiva. Quanto mais tarde começasse este processo de correcção, mais abrupta poderia ser a paragem e maiores os riscos recessivos.»
E acrescentava que «(…) o que tudo isto significa é que necessitamos de um outro padrão de crescimento, menos assente na procura interna e mais baseado em aumentos de produtividade (…)» e que «(…) a desaceleração da despesa interna não tem de se traduzir linearmente na redução do crescimento do produto, visto que há sempre a possibilidade de as empresas desviarem mais produção para a exportação.»
E referia ainda: «A questão mais séria e imediata é a situação das finanças públicas. (…) O que está em causa são os compromissos que assumimos sobre a evolução a médio prazo do défice orçamental. (…) Para reduzir o défice terão que ser tomadas algumas medidas difíceis no sentido da contenção das despesas (…). A situação poderá mesmo justificar um aumento de alguns impostos indirectos com efeitos mais imediatos na recuperação das receitas do Estado.»
Finalmente, dizia: «Todas estas medidas têm, no curto prazo, consequências restritivas que se torna imperioso compensar com um maior dinamismo das exportações (…). Para possibilitar esta evolução torna-se necessário inverter a tendência dos últimos anos de aumentos salariais superiores ao crescimento da produtividade. (…) Todos devem ter consciência de que, na situação actual, isso é uma condição para manter níveis elevados de emprego e evitar, assim, o agravamento de factores de exclusão e maior desigualdade na sociedade portuguesa.»
Direi que o Governador do Banco de Portugal não poderia ser mais claro!
Chegado a este ponto, apresentam-se-nos duas conclusões com grande evidência.
A primeira é a de que não existe alternativa para a principal prioridade da política económica assumida pelo Governo: a disciplina das finanças públicas e a contenção da despesa pública, tendo em vista conseguir uma significativa redução dos défices públicos, em 2003 e 2004. Esta nova política financeira e orçamental, suplementada por medidas estruturais e outras de estímulo à oferta de bens e serviços, é uma condição sine qua non para que a economia possa libertar-se do grave desequilíbrio em que se vem arrastando desde 1998 e se crie uma plataforma de sustentabilidade financeira, abrindo a possibilidade de uma retoma do crescimento a partir de 2004.
Numa união monetária e nas condições específicas em que nos encontramos, não existe alternativa para esta política. Alimentar ilusões a este respeito, como ainda há pouco ouvimos, lançar-nos-ia num processo de frustrações cada vez mais traumatizantes.
A segunda conclusão é a do absurdo do discurso em que alguns porta-vozes da oposição insistem, acusando a política de contenção orçamental de ser - ou poder vir a ser - causadora de uma crise económica em Portugal, com mais desemprego, encerramento de empresas, etc. A insistência neste discurso é um verdadeiro atentado à inteligência, tão viciados são os pressupostos em que assenta. Considerar uma ameaça para a economia portuguesa a única política que ainda nos pode salvar de uma longa e profunda recessão é, de facto, uma enorme barbaridade!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Tal discurso só pode ser explicado por absoluta má fé, por demagogia doentia ou por um insanável desconhecimento da realidade económica.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É tempo, é mais do que tempo, de se introduzir um mínimo de seriedade e de rigor na análise do problema económico e financeiro português.
Pela minha parte, nunca, mas nunca, desistirei de seguir essa via!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Ferreira, para o que dispõe de 3 minutos.

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