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1314 | I Série - Número 032 | 12 de Julho de 2002

 

uma prévia separação dos sistemas de protecção fundamentalistas e dos sistemas de protecção sensatos e respeitadores da identidade cultural de cada país ou de alguma região de cada país.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Com efeito, não é possível ignorar que os movimentos radicais de protecção dos animais, por vezes autênticos demolidores de culturas, estão muitas vezes associados a forças políticas igualmente radicais que usam essa temática como uma via fácil para a obtenção de um sucesso político de doutrinas frequentemente desrespeitadoras do próprio Homem.
Ideologicamente, os movimentos protectores dos animais estão divididos em duas correntes: uma, radical, de «tudo ou nada», como ela própria se intitula, oriunda dos países anglo-saxónicos, e outra mais moderada, que tem vingado na legislação das «Nações civilizadas».
A primeira entende que, para que a legislação obtenha resultados eficazes, só a atribuição de direitos aos animais os protegeria convenientemente, sendo de condenar qualquer meio termo pelas excepções que tem vindo a permitir. Não se pode, contudo, ignorar que esta doutrina é oriunda de minorias de países anglo-saxónicos, cujos ordenamentos jurídicos são radicalmente diferentes do nosso em termos sistemáticos, e que nem nesses países esta doutrina foi acolhida.
Com efeito, a atribuição de direitos aos animais poria em causa toda a sistemática do direito português. Isto porque a figura do direito subjectivo, em qualquer ordenamento romano-germânico, está associado à autonomia privada e, como tal, à liberdade de o exercer ou não, estando a respectiva atribuição aos animais arredada, enquanto estes estiverem impedidos de comunicar racionalmente.
A segunda corrente ou doutrina, denominada welfarista ou da protecção do bem-estar dos animais, que o legislador acolheu na Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro, é a que tem sido acolhida pelas legislações das «Nações civilizadas» por ser mais consentânea e adaptável à realidade de cada país, pretendendo proibir apenas a violência gratuita e sádica para com os animais e, acima de tudo, harmonizar a protecção dos mesmos com o respeito de outros valores tutelados pelos ordenamentos jurídicos nacionais.
Esta corrente envereda, em suma, pela criação de deveres das pessoas para com os animais em detrimento da atribuição de direitos àqueles. Daqui se conclui que os animais não são titulares de direitos, nomeadamente do direito à vida e à integridade física, que, a serem considerados, nos conduziriam a realidades surrealistas, como a da imposição aos portugueses de que passassem a ser vegetarianos, sob pena de violarem permanentemente tais direitos.
Todavia, como se disse, se os animais não são titulares de direitos, os homens, esses, têm deveres para com eles. Só que a protecção dos animais constitui um valor a respeitar e o património cultural constitui outro valor a ter em conta. Acresce que, no plano jurídico, o segundo tem consagração constitucional, enquanto o primeiro não tem.
A caça, a pesca desportiva e as touradas são modalidades desportivas em que, eventualmente, são sacrificados animais. No essencial, as razões que podem justificar umas são idênticas às que podem justificar qualquer das outras: são actividades lúdicas e recreativas a que o homem se tem entregue ao longo dos tempos, por uma tradição que é cultural.
Não existem dúvidas de que a caça, a pesca desportiva e as touradas são consentidas por lei. Também não existem dúvidas de que em todas estas modalidades se pode, eventualmente, infligir a morte aos animais.
Como actividades lúdicas ou desportivas que são, tais actividades agradarão a uns e a outros não; serão por uns consideradas arte, por outros barbárie e por outros, ainda, simplesmente ignoradas.
Ninguém pode negar é que constituem parte integrante do património cultural de um país ou de regiões suas, neste caso de Portugal, para o qual concorrem factos históricos, tradição e enraizamentos nas populações que não é lícito, não é possível nem democrático eliminar.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com o presente projecto de lei, como se refere no preâmbulo, pretende-se ter em conta, excepcionalmente, circunstâncias em que os touros de morte integram as específicas tradições locais bem acolhidas pela sua população, porque se integraram nos seus costumes ancestrais.
Não se pretende pôr em causa a regra geral de proibição dos touros de morte, repito. O projecto de diploma é perfeitamente claro e inequívoco, restringindo as touradas com touros de morte aos casos em que sejam de atender tradições locais e ancestrais, nos dias em que o evento histórico se realize, como sucede na vila de Barrancos.
Embora a norma tenha carácter genérico, não conheço outro local ou região de Portugal onde ocorra, como em Barrancos, uma tradição ancestral de touradas com touros de morte. Mas constituirá esta realidade algum impedimento? Penso que não! A democracia, como regime aberto, plural e tolerante que é, exige bom senso, tolerância, compreensão pelas razões dos outros e da sua história, aceitação de culturas específicas e próprias, como é a do povo de Barrancos, que nunca regateou o seu portuguesismo. A democracia não pode ser a ditadura da maioria sobre minorias titulares de tradições ancestrais, tudo em nome do «politicamente correcto», num determinado momento.
No modelo de sociedade que defendo não cabe perseguir pessoas: ou porque são consideradas elitistas, ou porque se presumem selvagens, ou apenas porque têm gostos diferentes.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Não é aceitável que uma parte dos cidadãos se torne inquisidora e se julgue juiz do comportamento dos outros.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Há que conceder o direito à diferença.
Aqui, o direito à diferença consubstancia-se na liberdade de cultivar uma tradição ancestral, como sucede na vila de Barrancos.
Uma sociedade que não contemple tal abertura não é, pura e simplesmente, democrática.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Não se pretende que os que não gostem de touradas passem a gostar, mas tão-só que àqueles que gostam seja permitido o direito de continuar a gostar.
Estes, os que gostam de tauromaquia, são os primeiros a defender os toiros de lide e são a razão da sua existência. O toiro de lide é a figura central e ícone de uma identidade

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