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1317 | I Série - Número 032 | 12 de Julho de 2002

 

Creio que a diversidade cultural de Barrancos é parte integrante do património cultural português. É, portanto, pelo respeito pelo povo de Barrancos que votar como sempre tenho defendido que se deveria votar.

Aplausos de alguns Deputados do PSD, do CDS-PP e do PS.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, invoca-se hoje aqui a tradição e práticas culturais para legalizar a festa dos touros com morte. A maioria traz-nos até uma versão alargada deste tema: invoca o multiculturalismo! Devo notar que as bancadas da maioria são, normalmente, muito avaras em reconhecer o multiculturalismo quando se trata de questões centrais do comportamento humano, como a sexualidade e outros, mas, neste caso, invocam com uma alargada generosidade o multiculturalismo.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Olha-se para aquilo que se quer, não se olha para aqui que se não quer!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Esta não é uma questão de sexualidade!

O Orador: - Mas, voltando à questão, temos para nós que esta prática cultural foi superada pelo tempo. A sociedade evoluiu, não há já o contexto económico e social em que esta tradição surgiu - e as tradições não têm, de facto, valor absoluto - e nem sequer podemos dizer hoje que, do ponto de vista da relação entre as pessoas, entre os seres humanos, práticas sacrificiais sejam aceitáveis do ponto de vista dos nossos valores. Não queremos impor os nossos valores, mas temos de dizer que, nos nossos valores, não é aceitável tal facto.
Isto porque a relação entre humanos não deve pressupor um espectáculo de violência, isto tem tudo a ver com as relações sociais e com a relação entre os seres humanos e, do nosso ponto de vista, é um retrocesso cultural face à evolução da nossa sociedade aceitar esse tipo de espectáculo com violência e com morte, já que ele é regressivo do ponto de vista da cultura humana.
Tudo aquilo que envolvia ou incorporava práticas sacrificiais ou tinha uma componente religiosa, que passou, ou tinha uma outra componente, que era a do domínio, a da celebração do domínio do homem sobre a natureza, simbolizada nessa prática sacrificial. Hoje, a sociedade emerge doutros valores: é a ciência, são os direitos positivos, é a tecnologia, são estas as formas de celebrar o seu domínio sobre a natureza.
Não nos assiste aqui nenhum fundamentalismo, nenhuma soberba cultural nem nenhuma ideia de que a cidade, ou certo tipo de cidade, tem de pretender impor a uma população rural os seus modelos culturais. Trata-se de uma questão muito simples: respeitamos em absoluto o povo de Barrancos, não temos qualquer noção de que as nossas ideias ou os nossos valores sejam «superiores», mas entendemos que há que escolher valores e, na escolha destes valores, sem qualquer suserania cultural - que, aliás, é indevida -, dizemos que optamos por estes valores e não entendemos que essa diversidade cultural seja mais aceitável - isto sem molestar o povo de Barrancos e sem ter qualquer tipo de atitude sobranceira sobre as práticas, a cultura ou as pessoas de Barrancos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos outras razões limite dos direitos humanos que não apenas a não violência, num espectáculo que é feito por seres humanos, temos outras razões para entender que é um péssimo precedente avançar com esta iniciativa legislativa, que não será local porque a mediatização vai ser nacional.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Exactamente!

O Orador: - Acerca disso, não há qualquer dúvida e é inútil e será até, de algum modo, cínico dizer que se está a preservar apenas uma iniciativa local. Aliás, quem o defendeu, do ponto de vista da diversidade cultural, defende-o de uma forma mais generalizada, e tem todo o direito de o fazer. Mas também penso que é uma verdadeira «caixinha de surpresas» o que vai suceder a seguir, porque veremos, mais cedo do que tarde, que outras localidades que têm práticas ancestrais, porventura não continuadas, irão tentar fazer a sua interpretação do que é que significa essa tradição, da injustiça relativa de ser atribuída a alguns essa possibilidade e de não lhes ser atribuída a eles. Não faltarão pessoas que venham testemunhar e abonar da ancestralidade de tais práticas, que sabemos que existem em algumas localidades continentais ou até insulares!
Muito para além disso, o sinal que nos é dado pela Secção Taurina da Associação Nacional de Municípios não deixa sobre isso a menor dúvida: interesses eleitoralistas e interesses económicos vão colocar-se aqui no caminho e não faltarão reivindicações. Apesar de não ter qualquer poder para adivinhar o futuro, como se calcula, deixem-me que vos diga que temo muito que alguns dos que hoje estão aqui tão enfaticamente a defender uma excepção para Barrancos venham dizer, futuramente, que a realidade da sociedade portuguesa evoluiu, que será necessário não haver um conjunto de discriminações, que são negativas, e teremos a legalização e a abertura de um processo muitíssimo mais vasto. Essa é a «caixinha das surpresas» que se esconde, mais cedo do que tarde, por trás desta lei.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr.as e Srs. Deputados, é por um imperativo de direitos humanos, sem qualquer manifestação de segregação de nenhuma comunidade nacional mas na ideia de que têm de se escolher valores, os valores que escolhemos são os da rejeição do touro de morte. E, Sr.as e Srs. Deputados, pensamos que, ao contrário do que aqui se disse, qualquer que seja o desfecho, isto não vai ficar por aqui.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, está terminado este debate. As votações serão feitas logo à tarde, à hora regimental.
A próxima sessão plenária realiza-se logo, pelas 15 horas, com a seguinte ordem do dia: discussão conjunta da proposta de lei n.º 20/IX e dos projectos de lei n.º 64/IX (PCP) e n.º 80/IX (BE), relativos ao sistema de segurança social.

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