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Sexta-feira, 18 de Outubro de 2002 I Série - Número 50

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 17 DE OUTUBRO DE 2002

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
Ascenso Luís Seixas Simões
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em interpelação à Mesa, o Sr. Guilherme Silva (PSD) protestou pela forma como, na noite anterior, em Barcelos, o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues (PS) comentou uma iniciativa parlamentar da maioria, após o que usaram também da palavra os Srs. Deputados António Costa (PS), Francisco Louçã (BE) e Telmo Correia (CDS-PP) - que veio depois a prestar esclarecimentos a uma defesa da honra feita pelo Sr. Deputado António Costa (PS) - e Bernardino Soares (PCP).
Ainda em interpelação à Mesa, o Sr. Deputado José Magalhães (PS) solicitou ao Sr. Presidente uma reunião da Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares para apreciar da urgência de se realizar um debate com o Sr. Primeiro-Ministro a propósito do destino dado a 40 milhões de contos do Fundo de Garantia do Ministério da Justiça.
Em declaração política, o Sr. Deputado Francisco Louçã (BE) abordou a acção do Governo nos seis meses que tem de vigência e deu esclarecimentos aos Srs. Deputados Telmo Correia (CDS-PP) e Fernando Pedro Moutinho (PSD).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira (PS) fez um balanço dos primeiros seis meses de acção governativa, tendo respondido, depois, aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Nuno Teixeira de Melo e Narana Coissoró (CDS-PP).
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) deu conta do VI Congresso Regional do CDS-PP, realizado nos Açores, nos passados dias 11 e 12 de Outubro, e insurgiu-se contra a forma não só como o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues (PS) comentou uma iniciativa parlamentar da maioria mas também como o Sr. Deputado Eduardo Cabrita (PS) comentou declarações proferidas pela Sr.ª Ministra da Justiça na reunião da 1.ª Comissão. Respondeu, depois, aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Sócrates (PS) e Joaquim Ponte (PSD) e deu explicações ao Sr. Deputado Eduardo Cabrita (PS), que exerceu o direito de defesa da honra.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes) anunciou a intenção da Sr.ª Ministra da Justiça de pedir um debate de urgência sobre o Fundo de Garantia da Justiça.
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Bernardino Soares (PCP), referindo-se às greves da Administração Pública realizadas em 16 de Outubro p.p., criticou o Governo pelas suas políticas de educação, da saúde e social que afectam este sector.

Ordem do dia. - Foram aprovados os n.os 15 a 31 do Diário.
Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 9/IX - Iniciativa legislativa de cidadania (BE), 51/IX - Regula e garante o exercício do direito de iniciativa legislativa popular (PS), 68/IX - Iniciativa legislativa popular (PCP), 145/IX - Iniciativa da lei por grupos de cidadãos eleitores (PSD e CDS-PP). Após o Sr. Deputado António Filipe (PCP), na qualidade de relator, ter apresentado o relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias acerca dos diplomas em apreço, usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Francisco Louçã (BE), Vitalino Canas (PS), Assunção Esteves (PSD), Narana Coissoró (CDS-PP), António Filipe (PCP), Luís Montenegro e Rogério Marinho (PSD), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e José Magalhães (PS).

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Entretanto, a Câmara aprovou o voto n.º 24/IX - De protesto pelo ataque terrorista na ilha de Bali, na Indonésia (Presidente da AR).
Foi igualmente aprovado o voto n.º 25/IX - De pesar pelo falecimento de Mário Castrim (PCP), tendo usado da palavra o Sr. Deputado António Filipe (PCP). No final, a Câmara guardou 1 minuto de silêncio.
De seguida, mereceu aprovação, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º 22/IX - Autoriza o Governo a alterar o Decreto-Lei n.º 177/2001, de 4 de Junho, que alterou o Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, que estabeleceu o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação.
Foi rejeitado, na generalidade, o projecto de lei n.º 140/IX - Cria uma base de dados em que constam as informações a prestar pelas instituições de crédito mutuantes em relação a cada um dos contratos de empréstimo bonificado à habitação (PS).
Após ter sido rejeitado um requerimento, apresentado pela Sr.ª Deputada Cristina Granada (PS), de avocação pelo Plenário da discussão e votação, na especialidade, do artigo 26.º da proposta de lei n.º 17/IX - Aprova o estatuto do aluno do ensino não superior, foi aprovado, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo àquele diploma.
Em votação final global, mereceu aprovação o texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, relativo à proposta de lei n.º 20/IX - Aprova as bases gerais do sistema de segurança social, tendo o Sr. Deputado Luís Marques
Guedes (PSD) requerido a dispensa de baixa à respectiva comissão para redacção final, o que originou o uso da palavra por parte dos Srs. Deputados José Magalhães (PS), Lino de Carvalho (PCP), António Costa (PS), Bernardino Soares (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Luís Marques Guedes (PSD), Francisco Louçã (BE), Artur Penedos (PS) e Guilherme Silva (PSD). O Sr. Deputado José Magalhães (PS) interpôs recurso da decisão do Sr. Presidente sobre a admissibilidade daquele requerimento, que foi rejeitado, tendo usado da palavra os Srs. Deputados António Costa (PS), Guilherme Silva (PSD), Artur Penedos (PS), Bernardino Soares (PCP) e Narana Coissoró (CDS-PP), após o que o requerimento foi aprovado.
Em votação final global, foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo à proposta de lei n.º 12/IX - Aprova o regime jurídico do desenvolvimento e qualidade do ensino superior.
No fim, proferiram declarações de voto os Srs. Deputados Jamila Madeira (PS), sobre o projecto de lei n.º 140/IX (PS), Jerónimo de Sousa (PCP), relativamente ao texto final, apresentado pela Comissão do Trabalho e dos Assuntos Sociais, relativo à proposta de lei n.º 20/IX, Augusto Santos Silva (PS), sobre o texto final, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo à proposta de lei n.º 12/IX, e Ana Drago (BE), em relação ao texto final, apresentado pela Comissão do Trabalho e dos Assuntos Sociais, relativo à proposta de lei n.º 20/IX.
Procedeu-se, ainda, à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 69/IX - Altera o regime do exercício do direito de petição (PCP), 144/IX - Tendente a facilitar a entrega de petições dos cidadãos e a exercer controlo mais eficaz sobre a sua tramitação na era das redes electrónicas (PS) e 146/IX - Alteração do regime do exercício do direito de petição (PSD e CDS-PP). Intervieram os Srs. Deputados António Filipe (PCP), José Magalhães (PS), António Montalvão Machado (PSD), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), João Teixeira Lopes (BE) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo Alves de Sousa de Vasconcelos
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Gustavo de Sousa Duarte
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João António Pistacchini Calhau
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Ribeiro dos Santos
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba

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António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Sequeiros de Castro Pontes
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

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ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos requerimentos e das respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, Foram apresentados na Mesa os requerimentos seguintes:
Nas reuniões plenárias de 26 e 27 de Setembro - ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; ao Sr. Primeiro-Ministro e a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e à Câmara Municipal de Almada, formulados pelo Sr. Deputado Narana Coissoró; ao Ministério da Justiça, formulados pelo Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; aos Ministérios da Administração Interna, das Obras Públicas, Transportes e Habitação e da Justiça, formulados pelo Sr. Deputado José Junqueiro; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; ao Ministério da Ciência e do Ensino Superior, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
Nos dias 30 de Setembro e 1 de Outubro - ao Sr. Primeiro-Ministro, aos Ministros da Presidência e Adjunto do Primeiro-Ministro, a diversos Ministérios, à Ministra de Estado e das Finanças e à Câmara Municipal de Lisboa, formulado pelo Sr. Deputado António Galamba; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, dos Negócios Estrangeiros e da Saúde e à Câmara Municipal de Monção, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; ao Ministério da Segurança Social e do Trabalho, formulado pelo Sr. Deputado Artur Penedos.
Na reunião plenária de 2 de Outubro - aos Ministérios da Saúde e das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado António Braga; ao Sr. Primeiro-Ministro, ao Ministro dos Assuntos Parlamentares e a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Ascenso Simões; ao Sr. Primeiro-Ministro e ao Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado José Junqueiro; aos Ministérios das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, da Economia e da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado José Miguel Medeiros; ao Ministro da Presidência, formulado pela Sr.ª Deputada Maria do Carmo Romão; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado João Rebelo; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados Bernardino Soares e Isabel Castro; à Secretaria de Estado da Juventude e Desportos, formulado pelo Sr. Deputado Bruno Dias.
Nas reuniões plenárias de 3 e 4 de Outubro - ao Ministério da Ciência e Ensino Superior, formulado pelo Sr. Deputado José Junqueiro; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte; aos Ministérios da Segurança Social e do Trabalho e da Saúde, formulados pela Sr.ª Deputada Maria Do Carmo Romão; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Herculano Gonçalves e Luísa Mesquita; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; aos Ministérios da Educação e da Economia, formulado pelo Sr. Deputado João Teixeira Lopes; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Honório Novo; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Nos dias 7 e 8 de Outubro - aos Ministérios da Educação e dos Negócios Estrangeiros e à Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, formulados pela Sr.ª Deputada Maria Manuela Aguiar; à Secretaria de Estado da Administração Pública, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco; ao Ministro de Estado e da Defesa Nacional, à Ministra de Estado e das Finanças e à Caixa Geral de Aposentações, formulados pelo Sr. Deputado Francisco Louçã; ao Sr. Primeiro-Ministro, a diversos Ministérios e à Câmara Municipal de Silves, formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário; ao Ministério da Administração Interna e à Secretaria de Estado de Habitação, formulados pela Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.
Na reunião plenária de 9 de Outubro - ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado João Cravinho; ao Ministério da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Massano Cardoso; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelos Srs. Deputados Helder Amaral e Rodeia Machado; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Honório Novo; ao Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério das Finanças, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Por sua vez, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:
No dia 3 de Outubro - Fernando Pedro Moutinho, Eduardo Moreira, Ascenso Simões e Rodeia Machado, Sónia Fertuzinhos, António Galamba e Miguel Anacoreta Correia, Odete Santos, Daniel Rebelo, Manuel Oliveira, Maria Manuela Aguiar, José Apolinário, Bernardino Soares e Honório Novo, Heloísa Apolónia, Lino de Carvalho, Herculano Gonçalves e Carlos Luís.
No dia 8 de Outubro - Maria de Belém Roseira, Luísa Mesquita, Miranda Calha, José Apolinário, Rosa Maria Albernaz, João Teixeira Lopes, Fernando Pedro Moutinho, Honório Novo e Lino de Carvalho, António Galamba, João Pinho de Almeida, Acílio Gala e Francisco Louçã, João Carlos Barreiras Duarte, José Miguel Medeiros e Manuel Oliveira, Vitalino Canas e Álvaro Castello-Branco.
No dia 10 de Outubro - António Galamba, Luís Fagundes Duarte e António Costa.
Nos dias 14 e 15 de Outubro - José Saraiva e Fernando Pedro Moutinho, Alberto Antunes, Isabel Castro e António Galamba.
Foram respondidos os requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:
Nos dias 3, 7, 8 e 9 de Outubro - Isabel Castro, no dia 16 de Julho.
No dia 15 de Outubro - José Apolinário.

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O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Posso interpelar a Mesa, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Quer indicar o tema da sua interpelação, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, tem a ver com a Assembleia da República, com o seu prestígio e a sua dignidade.

O Sr. Presidente: - É vago, mas, em todo o caso, tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues, ontem à noite, em Barcelos, comentando uma iniciativa parlamentar da maioria, acabou a insultar Deputados desta Câmara, usando mesmo a expressão "palermas".

Risos do PS.

Sr. Presidente, trata-se de um grave insulto a Deputados e, portanto, também de um grave insulto a este Parlamento.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues tem o direito de discordar das iniciativas dos demais Deputados e dos demais grupos parlamentares, mas o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues, que infelizmente não se encontra presente, não tem o direito de insultar seja quem for.
Todos percebemos que o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues está desesperado, só que em democracia as regras são para todos. E a sua primeira regra elementar é a de nos respeitarmos, independentemente das divergência que, natural e saudavelmente, temos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O insulto não faz parte da democracia, o insulto não dignifica o Parlamento nem os Deputados.
Por isso, Sr. Presidente, em nome do PSD quero exercer aqui o direito de expressar um veemente protesto pelas declarações insultuosas, que a todos nós ofende, feitas pelo Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Pelo teor da intervenção do Sr. Deputado Guilherme Silva verifica-se que se tratou de um protesto legítimo da sua bancada, que não requer resposta por parte da Mesa.
De qualquer modo, a Mesa apela para que todas as Sr.as e Srs. Deputados mantenham o clima cordato que é próprio das democracias estabilizadas.
Sr. Deputado António Costa, pede a palavra para que efeito?

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra ao abrigo da figura regimental usada pelo Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Presidente: - E eu concedo-a nas mesmas condições.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Deputado Guilherme Silva, vejo que "enfiou uma carapuça".

Protestos do PSD.

E como dizia Vasco Santana, num conhecido filme português, "chapéus há muitos"!... E mais não digo, Sr. Deputado Guilherme Silva!!
Agora, o que as Sr.as Deputadas e os Srs. Deputados da maioria terão de compreender…

Vozes do PSD: - Ahhh!!

O Orador: - … é que a operação que lançaram para intimidar o Partido Socialista e desmotivá-lo da batalha que trava para manter elevados padrões éticos na vida pública não nos perturba,…

Aplausos do PS.

Risos do PSD e do CDS-PP.

… porque essa é uma batalha que prosseguiremos.

A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Os senhores sentem-se incomodados, e eu compreendo-os:...

Vozes do PSD: - Ah!...

O Orador: - ... é do convívio com um senhor que exerce funções de Ministro de Estado e da Defesa Nacional e que se recusou a vir à Assembleia da República prestar esclarecimentos!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem lembrado!…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - O vosso incómodo condu-los a quererem criar uma nuvem onde tudo caiba e onde todos pareçamos iguais. Mas, Sr. Deputado Guilherme Silva, nós somos diferentes, nós não nos confundimos, nós não somos iguais!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues disse: querem uma comissão de inquérito? Então, constitua-se uma comissão de inquérito que eu estou totalmente disponível para prestar todos os esclarecimentos que considerem necessários.
Sr. Deputado, que diferença há entre esta atitude e a cobardia que o Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional revelou perante as gravíssimas acusações constantes do relatório da Polícia Judiciária sobre o seu comportamento!…

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Protestos do PSD e do CDS-PP.

Que diferença há entre a sua atitude e a da Sr.ª Deputada Elisa Guimarães Ferreira, que já pediu para ir à Comissão de Execução Orçamental prestar todos os esclarecimentos, na sequência de uma cabala aqui montada pelo Sr. Ministro da Presidência!
Srs. Deputados, não invoco o meu próprio caso, mas percebo que VV. Ex.as, que apoiam um Governo que descredibiliza as instituições…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isto é uma interpelação, Sr. Presidente?!…

O Orador: - … mantendo o Dr. Paulo Portas no exercício das funções de Ministro de Estado e da Defesa Nacional, que impediram que esta Assembleia o ouvisse em explicações,…

O Sr. José Magalhães (PS): - É verdade!…

O Orador: - … quer dessa vez quer depois, quando, em público, ele denunciou que uma pretensa cabala de lobbies o condicionava no exercício da acção política, que apoiam um Governo que tem como Ministra da Justiça…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, olhe o tempo!…

O Orador: - … uma senhora que se permitiu vir à 1.ª Comissão, há dois dias, mentir, lançando acusações falsas… Sr. Deputado Guilherme Silva, eu percebo que, nestas condições tenha de enfiar uma carapuça, independentemente de ela lhe ser ou não dirigida.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Que fique muito claro: o PS não é um partido "chantageável", o PS não se intimida e prosseguirá no escrupuloso cumprimento do seu dever de partido da oposição. Metam a mão nas vossas consciências e arrepiem caminho, porque ainda estão a tempo e o prestígio das instituições democráticas bem precisa dessa vossa mudança de atitude.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Francisco Louçã, também pede a palavra para uma interpelação à Mesa?

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, é para uma "interpelação Guilherme Silva"...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esse tipo de interpelação não está previsto no Regimento.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, é exactamente ao mesmo título dos colegas que me antecederam.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado. Peço-lhe que seja breve.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, começo por declarar que o Bloco de Esquerda não se sente ofendido nem abrangido pela declaração que o Secretário-Geral do Partido Socialista ontem fez.
Aliás sabemos, como os Srs. Deputados sabem, que no debate político há vivacidade. Ainda há pouco tempo disso tivemos um exemplo nesta Assembleia, quando um Deputado da maioria, e não dos "menos representativos", entendeu definir a minha intervenção como "jesuítica".

Risos do BE, do PS e do PCP.

Essa expressão foi corrigida e passou para "mefistofélica",…

Risos do BE, do PS e do PCP.

… dois dias depois, o Ministro da Presidência, Morais Sarmento, veio explicar que era "evangélica" e eu tomei todos estes atributos e todos estes adjectivos a cargo da perturbação teológica da maioria…

Risos do BE, do PS e do PCP.

… e não tanto como tendo que ver com o debate político.

Aplausos do BE e do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, o debate é o que é e deve ser exercido com a dignidade política e com clarificação.
E é em nome da clarificação que quero dizer a este Parlamento que a minha bancada, no dia seguinte a uma greve que parou metade do País e de uma manifestação que demonstrou a indignidade de tantos homens e mulheres deste País, não contribuirá para qualquer fogo de artifício sobre as grandes questões acerca das quais há que enfrentar alternativas e acerca das quais o povo português tem de escolher as alternativas.
Assim faremos, assim fizemos e assim continuaremos a fazer!

Aplausos do BE e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é para uma interpelação à Mesa sobre um outro tema.

O Sr. Presidente: - É sobre a ordem dos trabalhos?

O Sr. José Magalhães (PS): - Pode implicar alguma ponderação da ordem de trabalhos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, dentro de segundos vou entregar na Mesa

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2006 | I Série - Número 050 | 18 de Outubro de 2002

 

um ofício da Direcção do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, propondo a V. Ex.ª que realizemos uma Conferência de Líderes na altura que entenda apropriada, para ponderar uma nossa proposta de realização de um debate de urgência sobre uma questão que foi suscitada na sequência das declarações feitas pela Sr.ª Ministra da Justiça na 1.ª Comissão, uma vez que, por um lado, essas declarações foram hoje desmentidas pelo Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça e, por outro lado - o primeiro caso já seria grave e o esclarecimento já se justificaria, uma vez que as acusações eram muitíssimo graves e totalmente descabidas -, há informações de que os 40 milhões de contos que estavam reservados no Instituto de Gestão Financeira e Patrimonial da Justiça estão a ser, agora sim, delapidados pela actual Ministra, em despesas correntes, designadamente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isto é uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente? Como é isto possível?!…

O Orador: - Ora, nós consideramos intolerável que tal aconteça e somos da opinião que a Assembleia da República, ainda antes da realização do debate orçamental, deve ter aqui o Governo para esclarecer cabalmente por que é que está a delapidar 40 milhões de contos e a caluniar aqueles que gastaram bem esse dinheiro,

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, ao contrário das anteriores interpelações, a sua tem uma resposta da Mesa, porque a ela se dirige. E a minha resposta é a de que aguardo a chegada do documento, o qual farei circular, de imediato, pelos membros da Conferência de Líderes, e que procurarei agendar uma reunião o mais depressa possível.
Sr. Deputado Telmo Correia, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, para interpelar a Mesa nos mesmos termos das interpelações feitas anteriormente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, começando pela interpelação do Sr. Deputado José Magalhães, quero dizer que, na minha opinião, o Partido Socialista, mais uma vez numa linguagem inaceitável, veio responder a uma acusação que não foi feita. O que a Sr.ª Ministra da Justiça disse foi que existiam sérias dúvidas sobre a circulação orçamental no Ministério da Justiça…

Vozes do PS e do PCP: - Não, não!… Não foi isso!…

O Orador: - … e que pediu uma auditoria sobre essa matéria. Portanto - é esse o nosso ponto de vista -, vamos esperar, para conhecer as conclusões dessa auditoria. E, se elas assim o indiciarem, estaremos dispostos a discutir convosco a situação orçamental e as responsabilidades políticas do Partido Socialista, enquanto Governo, no Ministério da Justiça.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Em segundo lugar, nós, CDS-PP, temos a maior dificuldade - confesso e assumo-o até pessoalmente - em entrar no tipo de discussão para a qual, sistematicamente, os senhores nos querem arrastar.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. António Costa (PS): - É preciso "lata"!…

O Orador: - E se querem comparações basta dizer que nós assistimos aos ataques pessoais que foram feitos ao Ministro da Segurança Social e do Trabalho, Dr. Bagão Felix, e às insinuações que fizeram - eram as seguradoras, era não sei mais o quê... -, às quais ele respondeu sempre com elevação e dignidade; nós assistimos aos ataques pessoais e às insinuações dirigidos à Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças e à elevação com que sempre respondeu a Dr.ª Manuela Ferreira Leite;…

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. António Costa (PS): - Não meta no mesmo saco a Dr.ª Manuela Ferreira Leite!… Não é a mesma coisa!…

O Orador: - … e, mais grave do que isso, nós assistimos a um Partido Socialista que é o que é, que tem a história que tem e que defendeu no passado os valores que defendeu. E eu assisti a algo que não imaginava possível presenciar na política portuguesa: até agora, o Partido Socialista não se retractou nem pediu desculpa - e não estou a falar das declarações de ontem - relativamente a um artigo vergonhoso, escrito pelo Dr. Manuel Maria Carrilho, atacando o Dr. Nuno Morais Sarmento.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Foi inqualificável!…

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Pessoal, baixo e inqualificável!…

Protestos do PS.

E agora chegámos ao limite:…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Telmo Correia, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - … é o Secretário-Geral do Partido Socialista quem se dirige a todos os Deputados que constituem a maioria, mas sobretudo ao Dr. Durão Barroso, como Presidente do PSD, e ao Dr. Paulo Portas, como Presidente do CDS-PP, numa linguagem que não vale a pena reproduzir.

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2007 | I Série - Número 050 | 18 de Outubro de 2002

 

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não era pensável, não era imaginável, não é normal!!
No entanto, ao contrário de muitos e se calhar também ao contrário do Dr. Guilherme Silva, que ouvi hoje falar sobre essa matéria, pessoalmente não fiquei chocado. E não fiquei chocado por uma razão simples: é porque se fosse o Eng.º António Guterres, que foi um mau governante e um péssimo primeiro-ministro, mas que é um homem que tem princípios e educado, a dizer o que disse, eu ficava chocado, mas vindo de quem vem não fiquei chocado nem surpreendido. É aquilo a que nos estão a habituar.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Telmo Correia, o seu tempo esgotou-se. Tem de concluir.

O Orador: - Para terminar, Sr. Presidente, quero dizer que não vão ter resposta no mesmo tom. Nós não viemos para a política para entrar nesse tipo de linguagem.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Vamos resistir a chegar a um limite em que somos não Deputados eleitos pelos cidadãos, não representantes da nação, mas um bando de rufias da rua a insultarem-se uns aos outros.
É para aí que os senhores vão! Nós não vamos nem nunca iremos para aí!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, a minha referência inicial à vantagem de mantermos a cordura que faz o Parlamento não foi ouvida, mas eu repito-a: não é, manifestamente, entrando numa escalada que fazemos com que a nossa Câmara funcione como deve ser!
De maneira que apelo, uma vez mais, para que as questões sejam debatidas com toda a abertura e toda a liberdade, obviamente, mas que ninguém procure subir acima do patamar anterior, porque aí entraremos, manifestamente, num caminho muito perigoso para o funcionamento do Parlamento e para a nossa democracia.
O Sr. Deputado António Costa pediu a palavra para defesa da honra da sua bancada, depois de ter havido já duas interpelações à Mesa da sua bancada que, no fundo, são declarações políticas. Temo que hoje não haja declarações políticas. Vamos ver…
Tem a palavra o Sr. Deputado António Costa, que dispõe de 3 minutos.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, registo que não teve necessidade de me perguntar qual foi a ofensa cometida pelo Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Devia ter perguntado!

O Sr. Presidente: - Assim como assim, não teria qualquer resposta muito clara. Passo adiante.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - Sr. Deputado Telmo Correia, registo que, no extenso rolo de agravos que citou, não referiu qualquer um respeitante ao Dr. Paulo Portas ou à Dr.ª Celeste Cardona.

O Sr. José Magalhães (PS): - Foi prudente!

O Orador: - Foi prudente. O que já me pareceu bastante imprudente da sua parte, para lhe ser sincero, foi o facto de se ter referido ao Secretário-Geral do Partido Socialista de uma forma que, sabemos, não é o seu estilo.
O Sr. Deputado Telmo Correia há-de perceber que, perante um comunicado (que não foi uma iniciativa parlamentar, mas um comunicado) que as direcções das bancadas do PSD e do CDS ontem fizeram - esse sim, cheio de inverdades - relativamente ao Dr. Ferro Rodrigues e depois da operação que, ao longo destas últimas semanas, têm procurado montar para ver se conseguem obscurecer o único caso real que existe, que é o do Dr. Paulo Portas,…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… alguém tem de ter um grito de alma!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sabe que os políticos são seres humanos e nas nossas veias não corre tinta-da-china, mas sangue. Às vezes, é preciso não esquecer que "quem não se sente não é filho de boa gente".

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

E aquilo que o Dr. Ferro Rodrigues ontem fez foi um grito de alma perante a forma como VV. Ex.as se têm comportado, porque abusam da maioria que aqui têm para ter uma atitude dúplice: quando estão em causa os membros do actual Governo, VV. Ex.as usam a maioria para impedir que eles prestem esclarecimentos; quando querem suscitar questões que dizem respeito aos membros do anterior governo, VV. Ex.as usam a maioria para impor que eles venham cá prestar esclarecimentos.
Poupem a maioria, porque, quanto a nós, não nos precisam de impor. Estamos de cabeça levantada e, cara a cara, vimos cá prestar esclarecimentos!

Aplausos do PS.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - "Cara a cara?... Onde é que está o Dr. Ferro Rodrigues?

O Orador: - … O Sr. Deputado bem pode, agora, querer recuar quanto à mentira que foi proferida pela Dr.ª Celeste Cardona, que eu não esqueço a mentira…

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Não foi mentira!

O Orador: - … e a verdade há-de ser apurada.
É por isso que queremos o debate de urgência e é por isso que os senhores têm medo do debate de urgência!
Desafio o Sr. Deputado a dizer, aqui e agora, se viabiliza, ou não, o debate de urgência.

Aplausos do PS.

Porque hoje ouvimos o Sr. Secretário de Estado Adjunto dizer que não só os 40 milhões de contos estavam lá, como está a gastar e a delapidar, gerando uma derrapagem na despesa superior a 20% do orçamento do Ministério da Justiça.
Os senhores não têm a noção do que falam, comportam-se de uma forma totalmente irresponsável. É uma vergonha que uma ministra venha a este Parlamento mentir e que os senhores queiram encobrir a sua mentira!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP..

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para dar explicações, o Sr. Deputado Telmo Correia, que também dispõe de 3 minutos.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Dr. António Costa, cara a cara, onde é que está o Dr. Ferro Rodrigues?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. António Costa (PS): - Não foi para a TVI!

O Orador: - Não o vejo e parece que isso é uma coisa que não acontece normalmente "cara a cara". Os vossos ataques, esse tipo de ataques nunca acontece "cara a cara"; acontecem numas reuniões vossas, quando os senhores não se dedicam a andar ao estalo uns com os outros...

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do PS.

Quando não se dedicam a isso, dedicam-se a insultar o parceiro. Nunca acontece cara a cara!
O Sr. Deputado levanta um problema de coerência ao qual quero responder. A Sr.ª Ministra das Finanças pediu uma auditoria. Vamos ver o resultado da auditoria e vamos discutir essa matéria.

O Sr. António Costa (PS): - Qual matéria?

O Orador: - Não sei qual é nem tenho de saber.
O Sr. Deputado diz que é uma questão de coerência, que nalguns casos queremos e noutros não queremos. Repito-lhe a nossa regra, que penso ser regra comum de toda a maioria e que é muito simples: entendemos que, sempre que existam suspeições sobre a actuação de um ministro enquanto ministro, ele virá ao Parlamento! Não nos oporemos e ele prestará todos os esclarecimentos!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

É assim connosco e é assim com os vossos ministros!
Sr. Deputado, aquilo que a maioria quer saber é o que é que aconteceu com decisões contraditórias e com um processo que não é só do passado, porque ainda hoje não sabemos como é que vamos sair dele!

O Sr. António Costa (PS): - Vamos esclarecer!

O Orador: - É o actual Governo que está confrontado com um problema que os senhores deixaram, que é o problema do túnel do Terreiro do Paço. Isso é responsabilidade política e é responsabilidade dos ministros.
O Sr. Ministro da Defesa, que foi tão atacado pelos senhores, disse que, como Ministro da Defesa, viria sempre ao Parlamento.

O Sr. António Costa (PS): - Então, venha!

O Orador: - A Sr.ª Ministra da Justiça disse que, como Ministra da Justiça, viria sempre ao Parlamento.

O Sr. António Costa (PS): - Venha!

O Orador: - Não tem a ver com factos pessoais.
E termino, Sr. Presidente, registando um aspecto curioso: os senhores não se coibiram de atacar, da forma que atacaram, o Dr. Paulo Portas por factos da sua actividade profissional e pessoal de há quatro anos atrás, com relatórios, como se o Sr. Deputado fosse o Ministério Público.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Exactamente!

O Sr. António Costa (PS): - Não!

O Orador: - E o Sr. Deputado leu na tribuna um relatório de polícia como se se substituísse ao Ministério Público.

O Sr. António Costa (PS): - Não é nada disso!

O Orador: - Não se coibiram, em relação a factos de há quatro anos atrás, com relatórios de há dois anos atrás.
Curiosamente, ontem mesmo, o Dr. Ferro Rodrigues, perante um facto actual, uma obra que não se consegue resolver agora, da sua responsabilidade enquanto ministro, usou o argumento: "como é que vão buscar coisas do passado?".
É extraordinário! Quando é do passado e vos convém que seja do passado é do passado; mas quando é de há quatro anos e os senhores pensam que podem fazer, aí já não querem saber disso!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Telmo Correia, o seu tempo esgotou-se. Tem de concluir.

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O Orador: - Dr. António Costa, o nosso estilo parlamentar é sabermos o que é responsabilidade política, o que são dinheiros públicos, o que são decisões sobre obras e sobre dinheiros públicos.

O Sr. António Costa (PS): - Então, devia pedir um debate de urgência!

O Orador: - Esse é o nosso estilo!
Nunca ouvirá um de nós proferir insultos, chamar nomes, descer ao nível da grosseria e ao nível de uma linguagem abaixo de carroceiro, que foi isso que ouvimos ontem.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Telmo Correia, permita-me que lhe chame a atenção, repetindo o que já disse há pouco. Entrar numa escalda não convém ao Parlamento e o qualificativo que aplicou, tanto na descrição que fez das reuniões de um partido político como das expressões utilizadas por um colega nosso, não são manifestamente parlamentares. Desculpe-me que lhe diga.

Aplausos do PS.

Tem a palavra, para uma interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, sem prejuízo da nossa disponibilidade para averiguarmos até ao fim todos os problemas que aqui estão colocados na Mesa, quero dizer que é visível a vontade da maioria de, esperneando em todas as direcções, encontrar factos de diversão sobre o que é fundamental nos dias que correm.

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - É evidente que a maioria quer que, no dia seguinte a uma grande acção de contestação dos trabalhadores portugueses, em relação às suas políticas…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O Bloco de Esquerda já lhe vendeu essa!

O Orador: - Não sei se o Sr. Deputado Luís Marques Guedes quer falar…

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, têm de fazer silêncio, para que o Sr. Deputado Bernardino Soares use da palavra.

O Orador: - É evidente que, no dia seguinte a uma acção fortíssima de contestação à política do Governo, a maioria quer que a notícia seja a linguagem e não o conteúdo do que está em causa. É essa a estratégia da maioria, Sr. Presidente.
Não aceitaremos isso! Não aceitaremos que, atrás desta manobras de diversão, se escondam os conteúdos das políticas de fundo e a contestação de que elas estão a ser alvo.
Também não aceitaremos que se escondam necessidades claras de esclarecimento da "ética republicana" (como alguém lhe chamou) de membros do Governo ou de quaisquer outros agentes políticos com disparos em todas as outras direcções, procurando que outros também tenham responsabilidades do mesmo tipo.
Isso não aceitaremos! O resto debateremos com toda a serenidade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Esta primeira parte dos nossos trabalhos de hoje, lembrou-me aquela iniciativa que, em tempos, se falou no sentido de haver interpelações à Câmara sobre questões especialmente urgentes. Mas essa figura não foi consagrada no nosso Regimento.
De qualquer modo, o efeito foi o mesmo, em termos de actualidade, e não perdemos por isto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã, para uma declaração política, em nome do seu grupo parlamentar, dispondo de 10 minutos para o efeito.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: "Cara a cara", como acabou de ser solicitado e como deve ser a prática parlamentar, queria discutir, através desta intervenção em nome do meu grupo parlamentar, dois factos marcantes que têm relevo na véspera do Orçamento do Estado e seis meses depois de se ter formado este Governo.
Ambos representam as tendências de fundo, as correntes fortes da sociedade portuguesa. O primeiro é a degradação extrema do debate político e o segundo é a indignação popular e a resposta democrática.
Referir-me-ei em detalhe a este aspecto da degradação da política portuguesa, porque importa considerar o significado do delírio populista, da incapacidade de gestão, mas sobretudo, porque é disso que vou falar, da utilização da mentira como uma forma de governo.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Começarei, no entanto, porque assim importa, por sublinhar o significado da resposta democrática a estes seis meses de governo.
O País esteve ontem parado na Administração Pública. Em função do que se consideram ser os ataques a direitos essenciais que configuram as relações que nascem do 25 de Abril de 1974, as centrais sindicais, os sindicatos e tantos cidadãos que não fazem parte da actividade sindical têm considerado a necessidade de uma resposta geral e de uma mobilização geral contra a política do Governo.
Assim tem acontecido porque os enfermeiros não aceitam que uma cadeia hierárquica seja imposta contra os bons princípios de uma gestão colectiva nos cuidados de saúde.
Assim tem acontecido e assim acontecerá porque os trabalhadores não podem aceitar o princípio da diferenciação salarial contra trabalho igual, ou porque não podem aceitar o fim do princípio estruturante do contrato colectivo ou porque os trabalhadores da Administração Pública não podem nem devem aceitar que os direitos de aposentação,

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escassas compensações para as suas condições de trabalho, ou a perseguição que este Governo ensaiou desde os primeiros dias, anunciando 50 000 despedimentos na função pública, se tornem uma regra.
Não pode quem trabalha aceitar o princípio da duplicidade extrema e, por isso mesmo, temos de olhar com toda a atenção e com toda a preocupação para esses pequenos factos indicativos do modo de governo.
Um Governo com um ministro na saúde que, não tendo sequer a precaução de se distanciar em actos de gestão quanto ao que interessa ao grupo empresarial de que é originário, resolve recusar o patrocínio jurídico aos ex-membros da Administração Regional de Saúde de Lisboa, quando estão em conflito com a gestão do Hospital Amadora-Sintra do Grupo Mello.
E este como outros factos simbólicos - no futebol, nos compromissos com a Madeira, em múltiplas actuações do Governo - têm suscitado, e bem, uma resposta social, que ontem se exprimiu nas ruas e na greve.
Talvez a razão mais importante para o significado democrático desta resposta seja a degradação do debate político e da decisão política em Portugal. O debate será o que for e os portugueses ajuizarão dos argumentos e das razões. Mas o que hoje está em causa, em Portugal, é saber se temos um Governo que tem a capacidade elementar de decência, de coerência e de rigor. E a resposta é que não temos!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Este Governo aceita colocar-se, dia após dia, na pendência das testemunhas e das eventuais decisões de um tribunal. Chega ao fim de cada dia constatando: "hoje, ainda nos safámos", sem saber o que vai acontecer amanhã. Porque, todos os dias, está dependente das decisões e questões que a justiça, naturalmente, deve esclarecer.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - E, em nome da cobertura ao "caso Moderna", aceita, promove e convive com toda a dissipação de múltiplas acusações sobre outras matérias.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ora, um governo sério, hoje, não pode aceitar este clima de suspeita, em particular sobre duas instituições. Um governo sério, decente, teria de ter uma palavra sobre elas.
Pode um governo sério aceitar que um seu ministro seja desautorizado pelo General Alvarenga Sousa Santos que descrê da capacidade de gestão do ministro e o declara falido politicamente?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pode um governo, nestas circunstâncias, nada ter a dizer e esperar que os dias passem para que outro eventual escândalo venha apagar este?

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Pode um governo nada ter a dizer quando o Coronel Alcino Roque, que foi um dos altos dirigentes da Polícia Judiciária Militar, vem dizer que o ministro tudo sabe mas nada investiga?
Pode um governo aceitar que a tutela que tem sobre as Forças Armadas seja orientada por este tipo de atitudes?
Em segundo lugar, pode um governo aceitar o que se passa nas universidades portuguesas? Pode um governo conviver com um escândalo na Lusófona, depois de um escândalo na Moderna, na expectativa vã de que um apague o outro, deixando sempre a suspeita sobre todas as universidades privadas em particular?
Em qualquer destes casos, Sr.as e Srs. Deputados, um governo sério teria de dizer "queremos uma auditoria imediata sobre todas as universidades privadas ou sobre todos os estabelecimentos de ensino porque estamos dispostos a dizer a verdade ao País. Queremos as decisões que façam com que o poder militar siga o poder eleito pelo País".
Não se pode admitir a continuação desta situação mas, sobretudo, não se pode admitir que o Governo queira prolongar esta situação em nome do obscurecimento das suas próprias responsabilidades.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Isto leva-me à mentira.
O Conselho de Ministros aprecia um decreto-lei que tem o registo n.º 188/2002, no livro de registo dos diplomas da Presidência de Conselho, com a data de 18 de Setembro de 2002, diploma este que institui o casino no Parque Mayer.
Sabe-se que o casino representa um valor extraordinário para o grupo que vai ser detentor deste novo estabelecimento. Até 2020, não pode haver outras zonas de jogo num raio de 300 km do Casino Estoril. Por isso mesmo, vale a pena ler este decreto-lei para saber as notícias do "pântano".
O n.º 2 do artigo 5.º deste decreto-lei estabelece que se, porventura, Stanley Ho vir diminuídos os seus lucros no Casino Estoril pela criação do casino no Parque Mayer, de Stanley Ho, será ressarcido dessas verbas, na totalidade, pela Câmara Municipal de Lisboa.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - É um escândalo!

O Orador: - Magnífico negócio! Está-se sempre a ganhar!
Os 100% de lucros do Casino Estoril estão sempre garantidos e se Stanley Ho fizer concorrência a Stanley Ho, então, naturalmente, a câmara municipal vai pagar a diferença.
Muito mais extraordinário é o que se escreve no artigo seguinte, o artigo 6.º deste decreto-lei.
A alínea e) do n.º 1 do artigo 6.º estabelece, como acontece já em relação a outros casinos - e, por aí, não viria grande mal ao mundo -, que 1% dos lucros totais são abatidos na contribuição para o erário público se forem gastos na promoção de espectáculos. Portanto, aos 50%, que é o tributo do jogo, abate-se aquela percentagem de 1% para promoção das actividades do próprio jogo.
As outras alíneas são, no entanto, muito mais espantosas.

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A alínea d) estabelece que o Estado português compromete-se a pagar em benefícios fiscais, ou seja, em custo fiscal, a totalidade da instalação de todas as máquinas de acesso ao casino - o sistema de emissão de cartões de acesso às salas de jogo, de controlo das respectivas receitas, a instalação de circuitos internos de televisão e outros dispositivos de segurança. O Estado pagará essa obras do casino.
Mas se nos debruçarmos sobre uma outra alínea a surpresa ainda pode ser maior: na alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º deste decreto-lei diz-se que todos os encargos com a aquisição, renovação e substituição de equipamentos de jogo, designadamente a aquisição, no mercado nacional ou estrangeiro, de máquinas electrónicas são pagos em 50% pelo Estado.
Ou seja, Sr.as e Srs. Deputados, o Primeiro-Ministro diz-nos que quem não paga impostos não é bom português. Os bons portugueses sabem que estão a pagar 50% de cada slot machine do Parque Mayer.
Extraordinário é que tudo isto se baseie numa mentira: a mentira que está no preâmbulo e na conclusão do texto, segundo o qual esta proposta resulta de uma iniciativa da Câmara Municipal de Lisboa.
Ora, a Assembleia Municipal de Lisboa e a vereação da Câmara Municipal de Lisboa nunca tomaram qualquer decisão. O Governo legisla na base de uma mentira, absolutamente mentira. Nunca a câmara se pronunciou, o Presidente, sim, o qual, aliás, nos diz hoje, no seu artigo publicado no Diário de Notícias, que quer reforçar a sua candidatura a uma outra presidência. Resta saber se, como diria um Sr. Deputado que me antecedeu, neste "Casino Portugal", não estamos perante uma política de rufias que acham que a mentira pode ser afirmada em qualquer circunstância e pode mesmo constar num diploma legislativo.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos inscreveram-se os Srs. Deputados Telmo Correia e Fernando Pedro Moutinho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, em primeiro lugar, cumprimento-o pela contundência que coloca nalgumas das suas afirmações, uma linguagem que é habitual no Bloco de Esquerda, mas, no entanto, V. Ex.ª consegue não descarrilar para o insulto, o que, nos dias que correm, é um elogio. Ainda bem que assim é, caso contrário, seria bastante pior e teríamos o mesmo a que temos assistido vindo de outras bancadas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A questão que quero colocar-lhe é a de que, um dia destes, embora não o tenha ouvido pessoalmente por não ter podido assistir a essa parte da sua intervenção, ouvi-o fazer uma descrição do branqueamento de dinheiro nos casinos, tendo dito que "vai-se lá, compram-se as fichas, volta-se não sei onde, faz-se não sei o quê…" Ouvi essa sua descrição com a maior das atenções e, na altura, verifiquei que o Sr. Primeiro-Ministro o desafiou a fazer uma denúncia, a dirigir-se a quem de direito para denunciar aquele esquema.
A pergunta que lhe faço, e que é óbvia, é no sentido de saber se o Sr. Deputado continua no mesmo registo ou se já fez aquela denúncia. É porque já tinha tido tempo de fazê-la.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A segunda pergunta relaciona-se com esta vossa "cruzada" anticasino.
É que também não percebi - e, noutro dia, fiz a pergunta ao seu colega de bancada João Teixeira Lopes - se os senhores entendem fechar todos os casinos. É que se os casinos são uma coisa assim tão complicada, se implicam tanto submundo, tanto tráfico, tanto branqueamento, etc., não acredito que seja bom no Estoril e seja mau em Lisboa. Não faz qualquer sentido!

Vozes do CDS-PP: - Claro!

O Orador: - Por que é que pode haver submundo, tráfico, etc., no Estoril e não pode haver em Lisboa, ou na Figueira da Foz, ou noutro sítio qualquer? Portanto, o Sr. Deputado terá de explicar que consequência tira dessa mesma matéria.
É que se se trata de uma questão de princípio, se é uma questão moral, se é uma questão do vosso novo moralismo, de o Bloco de Esquerda como defensor de um moralismo duro e acérrimo, então, vamos fechar todos os casinos porque não faz sentido que seja bom ali e mau acoli, sobretudo porque Lisboa é, indiscutivelmente, uma zona turística.
De resto, nesse tipo de afirmações, os senhores usam sistematicamente uma expressão, que não é insultuosa mas é muito "Bloco de Esquerda", aquela de "o País transformado em Las Vegas".
Sr. Deputado, não sou especialista em casinos e nem sequer gosto de jogar, mas já estive em suficientes capitais e cidades europeias para lembrar-lhe que muitas destas, não sei mesmo se a maioria, têm casinos. Há casino em Genève, em Londres, etc. Então, por que é que o senhor não fala em Londres ou em Genève mas fala em Las Vegas? Esta é que é a questão fundamental.
É que, Sr. Deputado, o que aqui está em causa é saber se deixamos morrer aquela zona do Parque Mayer ou se queremos um plano para a sua reabilitação. O casino é apenas um ponto nessa reabilitação. Ora, aquela zona sempre foi um espaço de lazer, sempre foi um espaço de diversão, sempre foi um espaço de cultura, nunca, nem no passado, se enquadrou nesse tom moralista nem se destinou a tele-evangelização do Bloco de Esquerda ou de seja quem for. É isso que está em causa e o Sr. Deputado sabe-o perfeitamente.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Francisco Louçã, responde já ou em conjunto?

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Respondo em conjunto, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho.

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, na sua intervenção, julguei ouvi-lo referir-se a um raio de 300 km para a instalação de casinos. Penso que deve ter sido um equívoco, mas o senhor certamente nos esclarecerá.
Mais importante é questioná-lo sobre alguns aspectos associados com a sua intervenção.
No fundo, pergunto-lhe se considera ou não legítimo que a cidade de Lisboa resolva o problema do Parque Mayer, mas que o faça reavivando aquela zona, dando novamente esperança àqueles que têm memória do Parque Mayer e, sobretudo, criando uma oportunidade para que o centro de Lisboa não continue a tornar-se num deserto.

Aplausos do CDS-PP.

É bom recordar que a anterior presidência da Câmara Municipal de Lisboa, com o então presidente João Soares, também defendeu o entendimento segundo o qual a abertura de um casino naquela zona de Lisboa poderia ser uma solução para a revitalização de todo o centro da cidade. Isso é importante, Sr. Deputado.
Não vale a pena fugirmos a estas questões, porque não há milagres. Provavelmente, a alternativa seria um empreendimento imobiliário que o senhor criticaria com mais veemência ainda.
Portanto, a solução que foi encontrada pelo actual Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, e que o Governo confirma, permite-nos dizer que, na Câmara Municipal de Lisboa, decide-se, actua-se; não se adia, faz-se! Isso é que é importante.

Aplausos do PSD.

Para além disto, quero perguntar-lhe se também não considera importante os rendimentos que o jogo dá ao Estado, os quais permitem ao Estado promover obra social.
É que o Sr. Deputado, com tanto discurso social e de esquerda, esquece muitas vezes que é importante redistribuir a riqueza mas, para isso, é preciso tê-la, ou seja, o Estado precisa de ter condições para exercer uma política social. Este é um aspecto relevante a que é necessário dar resposta e para isto o Sr. Deputado não tem qualquer resposta, apenas entra, por vezes, numa demagogia fácil.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Filipe (PCP): - É a roleta mínima garantida!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, terei muito gosto em entregar-lhe o texto do decreto-lei do Governo que, logo na primeira página, refere justamente o raio de 300 km de zona de protecção concorrencial em torno do local onde se situa o Casino Estoril e refere, ainda, os decretos-lei em que se baseia essa medida que é anterior a este Governo e que, naturalmente, está em vigor.
Sr. Deputado, entre várias coisas, disse-me, com a ênfase que seria de esperar, que, na Câmara de Lisboa decide-se. Sr. Deputado, na Câmara de Lisboa não se decide nada! A Câmara de Lisboa tem uma votação unânime da assembleia municipal pedindo ao presidente informação sobre as diligências que estava a determinar. A assembleia municipal nunca votou sobre isto e, Sr. Deputado, a vereação nunca votou sobre isto, nunca! Não há qualquer resolução da Câmara. A Câmara é um órgão colectivo, não é a ambição presidencial do Presidente Pedro Santana Lopes!

Aplausos do BE.

Não confunda, porque a democracia faz a diferença. E mal de nós se não sabemos a diferença entre uma coisa e outra.
A câmara tem de tomar uma decisão, decisão essa que nunca foi tomada. O presidente está a actuar em nome próprio e o Governo está a fingir que a Câmara Municipal de Lisboa tomou uma posição para tomar ele próprio uma posição em nome daquela outra que a câmara nunca tomou. Isto é uma mentira.
Sr. Deputado, o senhor pode não concordar comigo - e, naturalmente, não concorda -, mas com certeza não pode aceitar que a governação se baseie em mentiras. Com certeza que nós não aceitamos, com certeza que o Presidente da República não pode ser indiferente à mentira num decreto-lei do Governo e com certeza que o Governo não deveria fazê-lo.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Perguntou-nos o Sr. Deputado Telmo Correia, cuja diligência democrata-cristã na defesa do casino do Parque Mayer é sempre assinalável e sempre elogiável, se há uma questão moral.
Sr. Deputado, em política, há sempre questões morais, mas o que estamos a discutir é seriedade.
Sou a favor da existência legal do jogo. Acho que é dessa forma que se tem o melhor instrumento de controlo sobre uma actividade que existe em qualquer circunstância, mas isso não me permite aceitar que a construção de casinos seja a solução para um problema local, ou nacional, ou sectorial, de falta de financiamentos.
Há um casino no Estoril, tem dispositivos legais com os quais posso concordar ou discordar, deve continuar a existir. Não aceito que decorra das dificuldades da câmara a necessidade de construir um outro casino. Há, de facto, capitais europeias que os têm e outras que não os têm, mas essa é uma opção que tem de ser tomada em responsabilidade.
No entanto, aceito o seu desafio no sentido de que o debate é o de saber que alternativas existem a este casino e o Bloco de Esquerda propô-las: é possível criar alternativas de atracção de população, de criação de movimento numa zona que tem vindo a morrer e que criem mais-valias económicas. Não posso aceitar que o casino seja a forma de o fazer, não só pelos mecanismos que o casino representa,

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este como todos os outros, e que têm de ser controlados, e que um primeiro-ministro tinha obrigação de querer controlar, Sr. Deputado, mas, sobretudo, porque não posso aceitar - e diga-me agora, Sr. Deputado, se aceita - que sejam o seu imposto e o meu imposto e o imposto dos que nos ouvem que estejam a pagar metade das slot machines do Sr. Stanley Ho.
O senhor fica contente com essa decisão? O senhor aceita que 100% dos mecanismos de cartões de acesso, de controlo de vigilância, de câmaras, sejam pagos pelo Estado? O senhor aceita que se um casino do Sr. Stanley Ho tirar receitas ao outro casino do Sr. Stanley Ho é a câmara municipal que vai pagar?
Estamos perante a pouca vergonha absoluta e a pouca vergonha que se protege com a mentira quer proteger-se com a ignorância.
O decreto-lei está aqui, à minha frente. Posso dar-lho; tenho muito gosto nisso até porque todos devem conhecê-lo.
O grande problema é o de saber se isto é uma estratégia qualificante. O meu argumento é o de que é uma estratégia desqualificante e que não permite resolver problema algum.
O défice na Lei de Programação Militar vai ser resolvido com um casino?! As dificuldades orçamentais vão ser resolvidas com a criação de outros casinos?!
O conceito de "Casino Portugal", que é o conceito que combatemos, é o que permite toda a facilidade.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Está a transformar uma questão local numa questão nacional!

O Orador: - Percebo o seu incómodo, porque a maioria está envolvida, está imersa - e, pelos vistos, de vontade própria -, numa facilidade que é a pouca vergonha sem qualquer limite, passando até pela mentira.
E, sobre esse aspecto, quero sublinhar que não houve uma palavra da maioria. A maioria acha legítimo, pelo que me parece ser possível deduzir, que o Governo minta, que o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Santana Lopes, minta e que essa mentira seja o ponto de partida para um decreto-lei, que, sem ela, não tem qualquer justificação.

Protestos do PSD.

Não, Srs. Deputados! A Câmara Municipal de Lisboa nunca propôs ao Governo qualquer medida a este respeito, nunca! Que se levante o primeiro Deputado…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de concluir.

O Orador: - … que esteja em condições de dizer que isto não é a exacta verdade!

Aplausos do BE.

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - É Presidente da Câmara! Tem legitimidade para fazê-lo!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso, Sr. Presidente, que, pela força das coisas, iremos atingir, neste momento, uma espécie de anticlímax parlamentar,…

O Sr. Presidente: - Com a intervenção do Sr. Deputado, com certeza que não.

O Orador: - … com o que espero corresponder ao seu apelo do início.
Esta é a última semana da rentrée política, antes da discussão do Orçamento do Estado para 2003, que ocupará a cena até ao fim do Outono do nosso descontentamento. É, pois, o momento de julgar os primeiros seis meses do Governo da direita unida.
Em primeiro lugar, ressalta a óbvia impreparação da dupla PSD/PP para assumir as responsabilidades governamentais nesta fase da vida do País. O discurso eleitoral de Durão Barroso já o dava a entender. Prometeu, primeiro, a baixa dos impostos para acabar por agravá-los através, sobretudo, da subida do IVA. Criticou os projectos do aeroporto da OTA e do TGV, que sempre concentrariam a recolha de fundos comunitários, para acabar por recuperá-los, de uma forma mais ou menos envergonhada. Depois, empertigou-se com a tese fundamentalista do equilíbrio orçamental, que confundiu na Lei da Estabilidade Orçamental com o défice zero, precisamente na véspera de a Comissão Europeia ter adiado esse objectivo para as calendas de 2006 e de países como a França e a Alemanha flexibilizarem o seu entendimento sobre a matéria. Ou seja, o Governo revelou o seu desastrado entendimento europeu.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Governo promoveu, ainda, o descrédito do serviço público de televisão, no exacto momento em que na União Europeia e no Conselho da Europa crescem as preocupações com a deriva dos programas, a fiabilidade da informação, a concentração dos meios nas mãos de poucos empresários e o desprezo pela dimensão educativa dos media.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, a maioria de direita quer tomar o contrapé de todas as políticas governamentais anteriores, numa agitação destruidora de cariz sistemático, como se se vivesse em Portugal uma nova "viradeira" e se pretendesse inculcar uma cultura de contra-reforma.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pretende mesmo ameaçar quem se quer bater como o Partido Socialista pela ética republicana nos costumes políticos com retaliações, que só denunciam o seu receio da fiscalização parlamentar.

Aplausos do PS.

Em terceiro lugar, a maioria de direita partidariza a máquina do Estado. Nos primeiros seis meses, o Governo

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de direita procedeu já a mais de 2000 nomeações para os mais variados cargos. Das mais de 2000 nomeações, cerca de 1000 são para os gabinetes dos membros do Governo e aproximadamente 600 para altos cargos dirigentes da Administração. Não está em causa, como é evidente, a legitimidade do Governo para fazer nomeações, mas deve haver um ponto de equilíbrio a ter em conta na remoção das equipas que fazem o interface entre os objectivos políticos do Governo e a Administração.

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do Deputado do PSD Guilherme Silva.

O Orador: - O Sr. Deputado, depois, terá com certeza tempo para me interpelar.
A realidade mostra exactamente o contrário: as nomeações obedecem, na generalidade, à preocupação de garantir o controlo partidário do aparelho de Estado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A não ser assim, como se justificaria a substituição de todos os delegados distritais do Instituto de Segurança Social?
A limpeza foi total, de tal modo que até foram dispensadas pessoas que já ocupavam cargos no tempo dos governos de Cavaco Silva e que, bem ou mal - repito, bem ou mal -, foram mantidos neles durante os governos do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Se foi mal, então, devem ser substituídos!

O Orador: - Só a ânsia de ocupação do aparelho de Estado, numa lógica partidária, justifica ainda a razia que se está a verificar no Instituto do Emprego e Formação Profissional, em que já foram substituídos 29 dos 31 directores dos centros de formação, 42 dos 90 directores dos centros de emprego e todos os delegados regionais.
Em quarto lugar, a partidarização das relações institucionais é um caminho perigoso que, sobretudo, o PSD não se inibiu de encetar com a encenação fomentista da viagem de Durão Barroso à Madeira de Alberto João Jardim.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A Madeira não é de Alberto João Jardim, é dos madeirenses!

O Orador: - Este é um dos aspectos mais perigosos para a República deste Governo de direita.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Embora se tivesse assistido a uma espécie de "comédia de enganos" entre aqueles dois barões do PSD, foi lamentável a regressão operada nas relações entre a República e as regiões autónomas nesse passo atrás dado pelo Primeiro-Ministro. Para compensar a prepotência gratuita da sua Ministra das Finanças, com o estrangulamento do endividamento zero imposto aos governos regionais - uma medida tão absurda que acabará por ser ultrapassada -, Durão Barroso sujeitou-se a uma viagem de vassalagem a Alberto João Jardim.

Aplausos do PS.

As medidas que anunciou ao seu parceiro de coligação implícita estão já, na maioria, em andamento ou resultam de compromissos anteriores. Ao gesto de vassalagem, acrescentou-se, assim, um ilusório plano intercalar de fomento "para madeirense ver".

Risos do PS.

Em qualquer caso, o Governo do bloco de direita está a trilhar um caminho perigoso, ao partidarizar as relações entre a República e as regiões autónomas. A preferência laranja nas relações com os Açores e a Madeira é péssimo sintoma do eleitoralismo governamental que aí vem, com datas marcadas para 2004 e 2006.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Que outro critério existirá para adiar até à última data, de 2006, o esforço de reconstrução no Faial e no Pico, deixando, até lá, cerca de 1500 famílias em estado de necessidade?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Pensei que os socialistas tinham dado o dinheiro!…

O Orador: - Tenho a certeza de que o Sr. Deputado Guilherme Silva também irá fazer a sua intervenção a seguir.
O principal julgamento destes seis meses de Governo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, vem, no entanto, do estado da opinião pública, em Portugal.
Pedem-me, aliás, para trazer aqui o eco da angústia de muitas pessoas e famílias perante as notícias das novas leis laborais em gestação, que precarizam o emprego, propõem a alteração dos horários nocturnos até às 23 horas, expedicionam empregados para lugares distantes das suas residências habituais, retiram força à negociação colectiva e aos sindicatos, prendendo os trabalhadores a uma lógica de empresa à asiática.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Nem sequer é a indústria transformadora que o exige, é o grande comércio que comanda o ciclo.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Diga-nos a maioria de direita: em que momento os eleitores escolheram ficar sem protecção laboral, sem reformas pautadas por direitos adquiridos e expectativas consolidadas? Em que momento os eleitores leram nos lábios de Durão Barroso que baixar os impostos significava o contrário?

Aplausos do PS.

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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Seis meses do Governo do bloco de direita já deram para perceber que não é este o rumo político de que o País precisa. Não há política económica, não há política externa e a Defesa Nacional está paralisada pelos motivos conhecidos.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não há uma estratégia para o País, nas vésperas do novo alargamento europeu.
O presente é, pois, bem mais inquietante do que o passado.
Neste clima, a maioria de direita dá provas de desnorte e pretende amordarçar a oposição. Mas o Partido Socialista não se deixa intimidar nem aceita qualquer pacto de silêncio, no que diz respeito ao cumprimento da ética republicana.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não é um membro do Partido Socialista quem se recusa a prestar esclarecimentos na Assembleia, são os membros do Governo.

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do CDS-PP Narana Coissoró.

Também saúdo o Sr. Deputado Narana Coissoró e fico à espera das suas questões.
Somos favoráveis à transparência na vida política, não tememos qualquer comissão de inquérito, seis meses de oposição não nos cansaram.
Os portugueses podem contar connosco!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Nuno Teixeira de Melo e Narana Coissoró, a quem peço que sejam muito breves, porque o prolongamento do debate deixará alguns Srs. Deputados inscritos para intervir sem tempo para tal.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Serei brevíssimo, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Medeiros Ferreira, quero registar aqui o desconforto de V. Ex.ª e, mais do que isso, a circunstância de ter trazido à discussão a questão da reconstrução do Faial e do Pico. É que, se bem me lembro, estava previsto pelo governo do Partido Socialista e pelo governo regional essa reconstrução durar dois anos, mas ainda vai a meio, ainda não acabou, e, ao que parece, em 2005, não estará sequer terminada.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Pois é!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - E com o Orçamento do Estado do actual Governo, nem se sabe quando é!

O Orador: - E não se diga, Sr. Deputado, que isso foi por culpa do actual Governo. É que, como V. Ex.ª sabe, no Orçamento do Estado para 2002, o governo socialista do Eng.º António Guterres não inscreveu um tostão para a reconstrução do Faial e do Pico.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E, como V. Ex.ª também sabe, com uma habilidadezinha algures no mês de Março, o Eng.º António Guterres, através de um despacho, quis transferir 4 milhões de contos do Instituto Nacional de Habitação para esta reconstrução. Só que, como V. Ex.ª também sabe, esse despacho foi declarado ilegal.

Vozes do PS: - Não foi!

O Orador: - Conclusão, Sr. Deputado: para efeitos da reconstrução do Faial e do Pico, em 2002, o Eng.º António Guterres, o governo do partido de V. Ex.ª, deu "zero"! Foi este Governo de coligação, Sr. Deputado, que já inscreveu 3,5 milhões de contos (para falarmos em contos) para este efeito e que já garantiu que, até 2006, vai suportar 60% do custo da reconstrução do Faial e do Pico.
Melhor seria que V. Ex.ª, em homenagem e em abono dos habitantes destas duas ilhas, tivesse aqui uma palavra de apreço para o Governo da República, que conseguiu para as ilhas aquilo que o seu governo nunca deu.

Aplausos do CDS-PP e PSD.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Deputado Medeiros Ferreira que aceite responder em conjunto aos dois oradores inscritos para pedir esclarecimentos, ou seja, após o orador seguinte.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Responderei rapidamente ao Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, peço-lhe que seja breve, Sr. Deputado.
Tem a palavra.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Serei muito breve, Sr. Presidente.
Em primeiro lugar, gostaria de dizer que admiro que, no Grupo Parlamentar do Partido Popular, sempre que há uma tarefa mais difícil ou mais ingrata, se faça avançar a juventude.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - É o interesse das pessoas!

O Orador: - Isto no caso de haver alguma juventude de espírito, nessa bancada.
Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, há um pequeno vício de base nas questões que colocou. Vou explicar-lhe as fases da reconstrução, derivada da crise sísmica de 1998. A primeira fase foi de reconstrução das infra-estruturas e essas, nomeadamente as rodoviárias e as do saneamento básico, podiam ser subsidiadas pelos fundos comunitários. E, nessa altura, o governo do Eng.º António Guterres pôs

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à disposição do governo regional - sem se intrometer na gestão regional, o que é louvável - uma quantia cifrada em 9 milhões de contos.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Simplesmente,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - O "simplesmente" é que é pior!

O Orador: - … na fase que agora atravessamos, o que está em causa é a reconstrução do parque habitacional. Pelas regras comunitárias, não é possível drenar fundos comunitários para a reconstrução do parque habitacional, razão pela qual o governo regional necessita de um concurso superior da solidariedade nacional, o que, aliás, tenho a certeza, o Sr. Deputado é o primeiro a compreender. E é o primeiro a compreender, porque também tenho a certeza de que não lhe é indiferente a sorte de 1500 famílias que continuam a viver em pré-fabricados e em garagens, porque o Governo…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Regional!

O Orador: - … do PSD/CDS-PP, em vez de concentrar o esforço da República, nos próximos dois anos, como seria natural, quis estendê-los por quatro. E sabe porquê? Por causa das eleições legislativas que os senhores vão ter dificuldade em ganhar nos Açores.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró, a quem peço igualmente que seja breve.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, a pequena nota que vou fazer não é propriamente sobre a substância, sobre a coisa material, sobre os problemas dos Açores, porque não é esse o ponto da minha observação.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Mas isso é o que vem ao caso!

O Orador: - Mas apreciei a maneira como a ética republicana funciona, sob o ponto de vista do debate parlamentar. V. Ex.ª quis silenciar os apartes, dizendo "façam intervenções, não façam apartes". Ora, um debate parlamentar sem apartes…

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Eu adoro apartes!

O Orador: - Adora?! Mas todas as vezes que havia um aparte, V. Ex.ª dizia: "O Sr. Deputado Guilherme Silva, depois, terá oportunidade de fazer a sua intervenção" ou "O Sr. Deputado Narana Coissoró, depois, terá oportunidade de fazer a sua intervenção". Quer dizer, apartes não, intervenções, sim. Ora, isto é contra a ética republicana e contra a ética parlamentar.
O segundo ponto que quero sublinhar na sua intervenção foi o facto de o Sr. Deputado ter dito - e não foi um pequeno deslize, quero sublinhá-lo, e não vou deixar passar isso - que a maioria é o bloco de direita.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - É bem metido!

O Orador: - Ora, essa é a resposta inconsciente - ou consciente, porque, da sua parte, não há inconsciências - de que a esquerda, hoje, é hipnotizada pelo Bloco de Esquerda.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Essa é a confissão cabal do homem prestigiado nos jornais, entre os comentadores políticos, na bancada parlamentar e no mundo académico, de que este Parlamento se transformou em dois blocos: o Bloco de Esquerda, que comanda a esquerda, e o bloco de direita.

O Sr. José Magalhães (PS): - Que é comandado pelo PP!

Risos do PS.

O Orador: - E é bom que o País saiba pela sua boca que o PS é, hoje, parte do Bloco de Esquerda.
Em terceiro lugar, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, o que nós ouvimos são críticas legítimas da oposição. O único problema é que VV. Ex.as não podem esconder os vossos próprios defeitos estruturais, que talvez sejam defeitos estruturais da política portuguesa.
V. Ex.ª disse que há políticos que fogem a vir aqui, ao Parlamento,…

O Sr. José Lello (PS): - Os Ministros!

O Orador: - … repetindo a campanha…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Tem de concluir.

O Orador: - … de que se deve vir ao Parlamento dizer, justificar… Não quero retomar a discussão que antecedeu a sua intervenção, mas V. Ex.ª, como Deputado respeitado que é, deve dizer que o homem mais categorizado, partidariamente, na bancada do Partido Socialista, deu um péssimo exemplo quando disse que, quando o Parlamento pede contas, é palermice. V. Ex.ª tem de responder a isso.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, saúdo o Sr. Deputado Narana Coissoró e, em segundo lugar, quero dizer-lhe que, quando falo da ética republicana, falo de um assunto que, sei, nos é comum.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Eu sou republicano!

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O Orador: - Foi o que eu disse. Eu sei que é republicano. Sabe que eu não me enganei sobre si. Pode haver quem se tenha enganado, mas eu não!

Risos do PS.

Portanto, Sr. Deputado, quando citei os apartes foi para suscitar o debate. Gostei muito que se tivesse inscrito, ouvi-o com muita atenção e, em relação à matéria que me colocou, gostava de lhe dizer o seguinte: os dirigentes do Partido Socialista têm vindo a afirmar, com sistemática, que o Ministro de Estado e da Defesa Nacional, Paulo Portas, deve vir ao Parlamento esclarecer as dúvidas e não os factos passados, porque é disso que os Deputados do PSD e do CDS-PP gostam.
E, Sr. Deputado, deixe-me dizer o que penso sobre o fundo da matéria. O que eu gostava de referir é sobre uma questão quase de carácter, e digo "quase" porque é uma coisa um pouco diferente, não tem a ver com os factos do passado. O que me ocupa não é o relatório da Polícia Judiciária nem é o que vem nos jornais. O que me ocupa é saber se, perante tantas acusações, não teria sido uma prova de consideração e de coragem política o Ministro Paulo Portas, mesmo sem a minha bancada o ter pedido, dizer: "Venho ao Parlamento, a qualquer comissão, esclarecer que tudo o que tem vindo a ser dito sobre mim é mentira ou não toca na essência da minha personalidade política". Isso é que o Ministro Paulo Portas devia ter feito!

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Enquanto não o fizer, Sr. Deputado Narana Coissoró, digo-lhe com a maior frontalidade: ele pode não estar dependente do Parlamento, mas ficará dependente de um, dois, três, quatro generais, porque cinco já é demais para ele!

Risos do PS.

Parece-me que é essa situação do Ministro Paulo Portas que é lamentável, em termos de democracia política.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Penso que o Sr. Presidente me desculpará se eu tomar um pouco mais de tempo para responder a uma parte da pergunta feita pelo Deputado Nuno de Melo, a que há pouco não respondi, e que tem que ver com uma questão dos Açores…

O Sr. Presidente: - Com certeza. Dentro de certos limites.

O Orador: - Gostava de dizer que o despacho do ex-Primeiro-Ministro António Guterres não tem nada de ilegal, nem sequer foi impugnado como tal.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Onde é que está o dinheiro?!

O Orador: - O problema tem a ver com a execução desse despacho, o que é diferente. Mas repare que o governo de António Guterres…

Protestos do CDS-PP.

Sr. Presidente, quando os apartes terminarem, posso…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça favor de concluir.

O Orador: - O governo de António Guterres transferiu para os Açores cerca de 9 milhões de contos. O Governo de Durão Barroso ainda não transferiu nenhuma verba para a reconstrução.

Aplausos do PS.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, eu conheço o Regimento…

O Sr. Presidente: - Então, por favor, não insista.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Insisto, insisto, Sr. Presidente. É que as minhas palavras deram origem a que o Sr. Deputado Medeiros Ferreira falasse dos pecadilhos parlamentares, ou políticos, do Ministro Paulo Portas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esse assunto já foi tantas vezes debatido e o senhor também já se referiu a ele.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sinto-me responsável, pelo que gostaria de dizer, e não disse ainda ao Dr. Medeiros Ferreira, qual o motivo por que o Dr. Paulo Portas não é obrigado nem política, nem moral, nem eticamente, a vir ao Parlamento da maneira como o Partido Socialista o quer cá.
Sr. Presidente, está em jogo, por minha causa, o nome de Paulo Portas que, incessantemente, é invocado pelo líder do PS e eu não queria que fosse eu o causador das respostas que dizem respeito não às minhas perguntas mas ao Dr. Paulo Portas.
Portanto, tenho a obrigação moral e política de responder pelo Dr. Paulo Portas, porque foram as minhas palavras que provocaram a censura política do Sr. Deputado Medeiros Ferreira, pessoa que eu muito aprecio, e, pela consideração que lhe devo, é através de si, Sr. Deputado, que gostaria de dizer à sua bancada qual o motivo por que concordo que o Dr. Paulo Portas não venha a este Parlamento como o PS quer. Isto para que V. Ex.ª não julgue, daquilo que disse, que me deixei convencer ou que foi sua a última palavra.
O Sr. Presidente julgará como melhor entender.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nos passados dias

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11 e 12 de Outubro, realizou-se, nos Açores, o VI Congresso Regional do CDS-PP.

O Sr. António Costa (PS): - Nos Açores? Você?

O Orador: - Num Portugal democrático, a importância do evento que reconduziu, na liderança regional açoreana do Partido, a equipa presidida pelo Deputado regional Dr. Alvarino Pinheiro…

Vozes do PS: - Quem?!

O Orador: - … justificaria, só por si, a presente intervenção.
Mas mais se justifica na sequência dos inqualificáveis insultos feitos a Deputados da Assembleia da República, livremente eleitos pelo povo, e, por isso, à própria Assembleia da República, pelo líder do maior partido da oposição. Mas quanto a estes já lá vamos, com ou sem a presença do Dr. António Costa, que, pelo que aqui tem dito, também já não adiantaria muito à discussão.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O VI Congresso Regional do CDS-PP reflectiu, de forma evidente, o alto grau de maturidade da democracia portuguesa e a força que o CDS-PP já logrou alcançar no arquipélago.
Graças a uma grande seriedade e competência dos seus dirigentes, Deputados e autarcas, o CDS-PP tem vindo a obter gradualmente um reconhecimento crescente da sociedade açoreana, afirmando-se hoje como uma certeza inquestionável na cena política do arquipélago.
Nas últimas eleições legislativas regionais, o CDS-PP registou uma relevante subida, tendo alcançado a meta pré-definida dos dois dígitos e garantido a eleição de dois Deputados, isto, com uma particularidade de assinalar: após decisão do Tribunal Constitucional, que não relevou três votos obtidos nas Flores, o Partido ficou apenas a um voto da eleição de um Deputado por esta ilha. Por seu lado, apenas dois votos no Corvo, 70 votos em S. Jorge e cerca de 100 em S. Miguel teriam garantido a eleição de mais três Deputados.
Também nas eleições autárquicas, o esforço do Partido foi apreciável com as conquistas, desde logo, da Câmara Municipal do Corvo, de assembleias municipais e de juntas de freguesia por numerosos autarcas.
E daqui resulta uma certeza: tal como já sucedeu no continente, nos Açores, o CDS-PP também será parte determinante, num futuro próximo, da necessária mudança.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Seja num cenário de candidatura isolada, presente em todo o arquipélago, mas com particular relevo nas ilhas de São Miguel, Terceira, São Jorge, Flores e Corvo, seja numa lógica de convergência democrática assente num acordo pré-eleitoral que a excelente experiência nacional poderá estimular, o CDS-PP vai ser parte activa - podem crer - dessa mudança. Mudança que os açoreanos desejam e que o definhamento provocado pela governação regional socialista dos últimos anos impõe.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Partido Socialista já deixou de ser, nos Açores, solução governativa. Os sinais de má gestão são evidentes: a lógica clientelar impera; as finanças públicas regionais estão em profundo desequilíbrio; os planos de médio prazo não têm vindo a ser cumpridos; o grau de falta de execução é preocupante e dia após dia os primeiros e principais prejudicados vão sendo os açoreanos.
Numa palavra, tal como sucedeu no plano nacional, nos Açores, os socialistas também prometem muito com grande competência. Mas já na obra é o que se vê. Ou, melhor, o que não se vê.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E se tal já seria razão bastante para justificar a tão necessária mudança na governação do arquipélago, acresce uma outra, que se nos afigura particularmente perversa. É que, desde as eleições legislativas de 17 de Março último, por razões estritamente partidárias e com uma irresponsabilidade que o sentido de Estado não consente, os socialistas do Governo Regional dos Açores e da oposição no continente optaram por inventar conflitos sem sentido com o Governo da República, isto, com dois objectivos inconfessados: por um lado, o de disfarçarem a sua própria incompetência, que é manifesta; por outro, o de terem uma arma de arremesso político contra o Governo da República.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Mas sempre, Sr. Deputado Medeiros Ferreira - dirijo-me a V. Ex.ª em particular -, com um custo de oportunidade que é calculado: o do comprometimento do desenvolvimento do arquipélago e do bem-estar dos açoreanos em favor do interesse exclusivamente partidário do Partido Socialista, no ataque a este Governo de coligação que governa o País.
Sr. Deputado, tudo isto - e pena é que não esteja também presente o Sr. Deputado Ferro Rodrigues - com o alto patrocínio do seu Secretário-Geral, que, entre a falta de ideias e o recorrente mau gosto dos ataques pessoais, que já denotam, até, alguma falta de imaginação, decidiu optar agora, talvez por isso, por uma nova estratégia: a estratégia, já aqui falada, do insulto e da calúnia.
Demonstrando cada vez mais a crescente influência que sofre e a admiração que sente pela mais radical das esquerdas parlamentares, o Secretário-Geral do Partido Socialista decidiu reciclar velhos discursos enferrujados, certamente da sua experiência política dos anos 70, que agora conclui - e refina - com um ou outro insulto, um ou outro impropério dirigido contra os Deputados desta Assembleia, deste Parlamento, sem sentido e, portanto, pondo em causa o prestígio, o bom nome, a honra e a consideração desta Casa, que ele próprio, e também por isso, deveria ser o primeiro a respeitar e a proteger.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Devo dizer que considero relevantes os insultos feitos pelo Sr. Secretário-Geral do Partido Socialista no que toca

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à "palermice" de alguns Srs. Deputados. Não sei se, porventura, algum da bancada do Partido Socialista!? Não sei se se está a referir a eles ou não!?
Mas há outra expressão que, do meu ponto de vista, é particularmente grave, porventura, muito mais grave do que esse mero insulto e que teve que ver com esta expressão: "Os Srs. Deputados deste Parlamento…" - Srs. Deputados deste Parlamento, independentemente de quais sejam - "… usam métodos e mentiras semelhantes às da extrema-direita no regime anterior". Isto, Srs. Deputados, eu não posso deixar passar em claro, tanto mais que, até por razão da idade, como compreenderão, o regime anterior não me fará muito sentido, e muito menos hoje, no plano da discussão política.
Isto revela da parte do Sr. Secretário-Geral do Partido Socialista uma grande falta de sentido de Estado, já para não dizer uma tremenda falta de educação.
Falta de sentido de Estado e falta de educação, diga-se, que, infelizmente, parece também já estarem a fazer doutrina dentro do Partido Socialista, a avaliar pelas infelizes expressões do Sr. Deputado Eduardo Cabrita, que, referindo-se a uma Sr.ª Ministra, e senão pela circunstância de ser Ministra, pelo menos, pela circunstância de ser senhora, se é que isso para VV. Ex.as releva, tendo oportunidade de, no local próprio, quando a questão foi colocada na 1.ª Comissão, pedir explicações, dizer o que quisesse de sua justiça, ficou mudo, quedo e saiu calado. Amedrontadamente, teve de pedir autorização ao Sr. Dr. António Costa para depois, pelas costas…

O Sr. José Magalhães (PS): - Pelas costas?!

O Orador: - … e sem que a Sr.ª Ministra se pudesse pronunciar, como poderia tê-lo feito na 1.ª Comissão, a insultar, chamando-a de mentirosa. Mas, em devido tempo, as explicação serão dadas pela Sr.ª Ministra (e seja bem-vindo à Sala, Sr. Dr. António Costa). Ao que parece, é preciso dizer algumas verdades para V. Ex.ª aparecer!
Esta é a imagem que o Sr. Dr. Ferro Rodrigues, enquanto líder do maior partido da oposição, hoje, nos revela, essa é a postura de alguns Deputados do Partido Socialista na oposição, porque também já a secundam.
Imagine-se o que não diriam, o que não fariam estes responsáveis socialistas se os portugueses tivessem cometido a imprudência de lhes dar maioria bastante que lhes permitisse governar!?…
Srs. Deputados, "Métodos e mentiras semelhantes às da extrema-direita no regime anterior" e "palermas" são desculpas que nem com o esforço tido pelo Sr. Deputado António Costa, na intervenção anterior, justificam essas mesmas expressões.
Não há qualquer razão política, neste Parlamento, ou fora dele, que justifique que um Sr. Deputado, seja porque razão for, insulte outros Deputados desta Casa, eleitos por outros partidos, com este tipo de impropérios.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

É este o conceito de democracia do Dr. Ferro Rodrigues e do Partido Socialista, esta é a linguagem que querem introduzir no discurso parlamentar. O Dr. Ferro Rodrigues e o Partido Socialista não têm noção do dano que este tipo de linguagem de caserna causa ao prestígio, à imagem e à dignidade dos Deputados, todos eles, de todos os partidos, e por isso à imagem de todo o Parlamento e, no limite, do próprio regime que este Parlamento tem obrigação de salvaguardar!
Srs. Deputados, decorreram mais de 28 anos desde a instauração de um regime democrático e durante todo este tempo os responsáveis do meu partido, seja no poder, seja na oposição, procuraram sempre prestigiar todas as instituições democráticas com alto sentido de Estado, elevação, educação, discutindo ideias e projectos na oposição e, podendo, implementando essas ideias e projectos no poder.
Rejeitamos sempre a lógica dos ataques pessoais e do insulto. Habituámo-nos a ganhar e a perder, e não é a razão da derrota que nos faz mudar a postura.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É nesta base que temos garantido o relacionamento político com todos os partidos e é, também, nesta base que tencionamos continuar a manter o relacionamento com todos os partidos políticos, incluindo o Partido Socialista - se nos deixarem -, porque desta lógica não saímos.
Para terminar, deixamos aqui um recado muito directo ao Sr. Dr. Ferro Rodrigues e ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista (que espero lho transmita, devido à ausência dele), que é o seguinte: não tencionamos mudar, não faremos doutrina da nova postura e linguagem adoptada pelo Dr. Ferro Rodrigues e, ao que parece, por VV. Ex.as. A cada insulto responderemos sempre com serenidade e com elevação, a cada ameaça responderemos sempre com o exercício dos nossos mandatos, de forma livre e consciente, a cada "pedrada" que VV. Ex. as dêem na imagem e no bom nome de Deputados do Parlamento, livremente eleitos e no regime democrático, responderemos sempre com redobrada competência e sentido de Estado, numa certeza - e termino, Sr. Presidente, dispensando a advertência -, a de que continuaremos a garantir aos portugueses que tudo faremos para que vejam na Assembleia da República e nos seus Deputados a instituição-mãe de todas as democracias, com o prestígio e a dignidade que a sua importância merece. O Partido Socialista quer pô-la em crise, mas a defesa do regime impõe-nos que também a defendamos nesta sede.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Sócrates.

O Sr. José Sócrates (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Melo, a questão política essencial é a seguinte: os partidos da maioria que formam este Governo decidiram desencadear uma operação de retaliação que visava denegrir publicamente alguns dirigentes do Partido Socialista. Acontece que a operação vos correu mal, e correu-vos mal porque essa ideia de que todos são iguais não pega. É que não somos todos iguais!

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Quem esteva no anterior governo tem autoridade moral para reivindicar elevados padrões éticos e morais da democracia. E desse caminho não nos desviaremos.
A operação de intimidação junto do Partido Socialista não resulta, nem resultará. Os senhores vieram de uma operação da qual saíram tosquiados - não levaram lã, saíram tosquiados! E saíram tosquiados porque essa operação foi sustentada em acusações completamente infundadas.
Uma dessas acusações, a de que os anteriores responsáveis da justiça teriam tido comportamentos politicamente muito censuráveis na delapidação do orçamento do Ministério da Justiça, não corresponde à verdade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E de tal forma não corresponde à verdade que hoje, nesta sessão, ficou mais evidente que os senhores recuaram, já não querem falar no assunto e preferem debater outras matérias para fugir à questão!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Está enganado!

O Orador: - É que a Sr.ª Ministra da Justiça, ao dirigir-se ao Parlamento, não disse a verdade; pelo contrário, levou os Srs. Deputados ao engano. É por isso que o Sr. Deputado tem de responder.
É bom que os senhores tenham escutado, nesta sessão, uma mensagem muito clara: nós não nos deixamos intimidar.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Nós também não!

O Orador: - É bom que isso fique claro como água.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não nos afastaremos deste caminho! Nós não somos intimidáveis!
O anterior governo foi honesto e sempre teve no seu seio um comportamento exemplar, do ponto de vista da moral política,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Do "queijo Limiano"!

O Orador: - … e está, portanto, no direito de exigir o mesmo comportamento a quem exerce funções políticas, actualmente. Compete-nos, por isso, trilhar este caminho da responsabilização política, do qual não nos desviaremos.
O Sr. Deputado fica a saber que não nos intimida com essas operações de retaliação, operações que são, aliás, muito próprias de um certo estilo de lutador de rua…
Além do mais, Sr. Deputado, também fica a saber que não há prova mais evidente de uma certa impreparação e, até, de uma certa imaturidade para usar o poder do que comportarem-se desta forma, desencadeando operações com vista a produzir juízos completamente infundados sobre o anterior governo. Não há prova mais evidente da vossa imaturidade do que o comportamento de levantarem estas questões relativamente ao anterior governo, baseados em falsidades!

Aplausos do PS.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Para defesa da honra da bancada, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - E qual é o motivo do seu agravo, Sr. Deputado?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - A acusação de que nós estaríamos a desencadear uma operação de retaliação.

O Sr. Presidente: - Esse assunto já foi hoje esclarecido. Não posso dar-lhe a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Considera o Sr. Presidente que a acusação de que estaríamos a desencadear uma operação de retaliação é normal?

O Sr. Presidente: - Esse assunto já foi devidamente esclarecido hoje. Desculpe, Sr. Deputado, mas não posso dar-lhe a palavra.
Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Telmo Correia, tentarei fazer as suas vezes, muito embora sem dons premonitórios, porque desconheço o que V. Ex.ª iria fazer ou dizer, certamente em defesa da honra desta bancada, mas também eu me senti lesado pela intervenção do Sr. Deputado José Sócrates.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, por favor, responda ao pedido de esclarecimentos, porque foi isso que lhe foi pedido. Aliás, a sua atitude é extremamente incorrecta para com a Mesa e não aceitarei que a repita, de forma alguma. Mereceria que lhe retirasse a palavra.

Aplausos do PS, do PCP e do BE.

O Orador: - Sr. Presidente, como compreenderá - e, se me interpretou de outra forma, desde já, apresento as minhas desculpas -, de forma alguma quis ser incorrecto com a Mesa ou com V. Ex.ª, por quem tenho a maior estima e consideração pessoal. Releva, de resto, o aplauso do Partido Socialista.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Infantil!

O Orador: - De todo o modo, quis ser correcto e solidário com o líder da minha bancada, que aqui quis usar de um direito que lhe assiste e que não lhe foi permitido, no douto critério de V. Ex.ª.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

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O Orador: - Sr. Deputado José Sócrates, V. Ex.ª pode usar de todos os argumentos mas não encontrará um único argumento político, ou outro, que justifique que um Secretário-Geral de um partido político (até hoje, tido como um partido de referência da democracia nacional),…

O Sr. José Magalhães (PS): - E hoje deixou de o ser?!

O Orador: - … dirigindo-se a outros Deputados de forma genérica - fosse qual fosse o Deputado, eleito livremente pelo povo português -, lhes chame nomes, como "palermas"…

Risos da Deputada do PS Elisa Ferreira.

Sem graça, Sr.ª Deputada Elisa Ferreira, porque não tem graça nenhuma!
… ou dizendo que estes Deputados usam "métodos e mentiras semelhantes à da extrema-direita no regime anterior", e que causam hoje graça à Sr.ª Deputada Elisa Ferreira.

Vozes do PS: - E bem!

O Orador: - A nós, mesmo decorridos 28 anos, ainda não nos causam graça nenhuma!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Quanto ao mais, a propósito da Sr.ª Ministra da Justiça, Sr. Deputado José Sócrates, deixe-me que lhe diga o seguinte: a Sr.ª Ministra da Justiça é uma grande Ministra e é, com toda a certeza, uma grande senhora. Ao dizer o que entendia dizer, em sede da 1.ª Comissão, quando instada pelos Srs. Deputados, no exercício de um poder que lhes é conferido nos termos da Constituição e da lei, a Sr.ª Ministra poderia ter sido questionada e ter esclarecido tudo e mais alguma coisa.
Contudo, nessa circunstância, o Sr. Deputado Eduardo Cabrita calou e saiu. Amedrontadamente, pediu licença ao Mestre, Dr. António Costa, e optou, também ele, pelo insulto, chamando-lhe nomes, porque esclarecimentos não quis! Esclarecimentos esses que, sei, a Sr.ª Ministra dará em sede própria, porque a Sr.ª Ministra não deve, não teme,…

O Sr. José Magalhães (PS): - A Sr.ª Ministra que venha aqui!

O Orador: - … sabe o que disse, tem razão de ciência e poderá explicar tudo, Srs. Deputados, desde logo através de uma entidade que é idónea, isenta e competente e que, por isso, não pode ser acusada de instrumentalização partidária. Então, sim, como já referiu o líder da bancada do CDS-PP, Dr. Telmo Correia, também nós cá estaremos para sancionar, ou não, as conclusões dessa dita peritagem.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Ponte. Peço-lhe que seja breve.

O Sr. Joaquim Ponte (PSD): - Sr. Presidente, serei o mais breve possível.
O Sr. Deputado do Partido Popular, Nuno Melo, colocou uma questão que me parece importante no que diz respeito às regiões autónomas - de resto, tem a ver com uma questão já anteriormente colocada pelo Sr. Deputado Medeiros Ferreira - e que se prende com o relacionamento entre os órgãos de soberania do Estado e os órgãos de governo próprio das regiões autónomas.
Gostaria de perguntar se o Sr. Deputado Nuno Melo - e felicito-o, desde já, pela realização do congresso do CDS-PP - tem noção porque razão existe, neste momento, uma degradação dessas relações entre os órgãos de soberania e os órgãos de governo próprio da Região Autónoma dos Açores. Não sei se teve ocasião de se aperceber que, mesmo antes de se conhecerem as verbas que iam ser transferidas do Orçamento do Estado para a Região e as verbas que seriam transferidas por conta da Lei das Finanças das Regiões Autónomas, ou aquelas que estavam inscritas no PIDDAC/Açores, o Governo Regional dos Açores já tinha entregue na Assembleia Legislativa Regional uma proposta para cortar nos investimentos a realizar na Região - isto passou-se antes de se conhecer o dinheiro que ia ser transferido do Estado para a Região Autónoma dos Açores.
Já nessa altura, dizia o Governo Regional dos Açores que era por conta dos cortes da administração central que ele tinha de reduzir nos seus investimentos.
Contudo, ainda recentemente (e o Sr. Deputado Medeiros Ferreira colocou essa questão há pouco), por conta da visita do Primeiro-Ministro à Madeira, vieram os órgãos do Governo Regional dos Açores dizerem-se discriminados novamente, quando não existe discriminação absolutamente nenhuma, tal como aqui foi reconhecido pelo Sr. Deputado Medeiros Ferreira, ao afirmar que se tratavam de projectos que transitavam da administração anterior e, por conseguinte, não havia qualquer espécie de discriminação.
Perante esta situação, os órgãos de governo próprio da Região Autónoma dos Açores, em vez de terem uma postura idêntica àquela que teve a Madeira, vêm dizer que o Governo da República os discrimina e que o vão - imagine-se! - levar a tribunal, muito embora até desconheçam a que instância se devem dirigir (foi algo que ficou no ar, a esse respeito).
Relativamente à questão do sismo, Sr. Deputado, a reconstrução do Faial e do Pico estaria terminada em 2002, de acordo com as primeiras propostas do Partido Socialista. Ou seja, hoje, já não devíamos estar aqui a falar dela, porque se o Partido Socialista cumprisse o que disse, pura e simplesmente, a reconstrução do Faial e do Pico já estaria concluída. E não está!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Tem de concluir, por favor.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Agora, estão a atirar a conclusão dessa reconstrução para 2004, porque, como dizia o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, em 2004 há eleições!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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2022 | I Série - Número 050 | 18 de Outubro de 2002

 

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joaquim Ponte, agradeço a questão que me colocou e espero saber responder.
Parte da resposta foi dada há pouco, porventura, pelo Sr. Deputado José Sócrates, quando afirmou que o Partido Socialista governou bem os dinheiros públicos. Esse é um argumento político importante e que releva, mas é precisamente por isso que hoje queremos saber - e disso o Partido Socialista não se livra - por que é que alguém que governou tão bem os dinheiros públicos deixou as finanças públicas no estado em que elas se encontram!

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Tanto no continente como nas ilhas! E disso não se livram, como é evidente.
Também me parece manifesto, Sr. Deputado - estive nos Açores durante o fim-de-semana e, de resto, tive oportunidade de estar com o Sr. Deputado…

Protestos do PS.

Sr. Presidente, assim não é possível! Visto que os Srs. Deputados me interrompem constantemente, esperarei alguma tolerância da parte da Mesa, o que acontece em regra.
Como V. Ex.ª, Sr. Deputado, compreenderá, perante a ineficácia do governo regional socialista dos Açores, perante o definhamento e o atrofiamento a que tem trazido a região na cena nacional, perante esta manifesta demonstração da sua incompetência, é evidente que tem de haver um bode expiatório, tanto mais que até serve os interesses do Secretário-Geral e do Secretariado Nacional do Partido Socialista! Portanto, por um lado, disfarçam a sua incompetência, criando um conflito com o Governo da República e, por outro lado, os Drs. Ferro Rodrigues e António Costa e demais dirigentes do Partido Socialista podem usar essa circunstâncias que eles próprios criaram para atacarem o Governo da República. Sendo que, de todo o modo, há questões em que os números não deixam mentir.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Refiro-me, novamente, à questão do Faial e do Pico, que V. Ex.ª teve a curiosa iniciativa de trazer a debate. E, falando das doutíssimas diligências do Partido Socialista, a verdade é que, no Orçamento do Estado para 2002, inscreveram "zero" para efeitos da respectiva reconstrução!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Essa é que é a realidade!

O Orador: - Enquanto que este Governo de Portugal vai inscrever muitos milhões de contos, Sr. Deputado, tendo ainda garantido a comparticipação na reconstrução. Até 2006, a obra vai ser feita, e vai ser feita por este Governo, queiram ou não VV. Ex.as.
Portanto, Srs. Deputados, em matéria de gestão das contas públicas e dos dinheiros públicos, no final, VV. Ex.as tirarão a seguinte conclusão: o que o Sr. Deputado José Sócrates aqui disse hoje, afinal, não era verdade, porque não geriram bem os dinheiros públicos. E nós, porque gerimos bem os dinheiros públicos, vamos aplicá-los como deve ser também no arquipélago dos Açores e na Madeira.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir um esclarecimento à Mesa.

O Sr. Presidente: - À Mesa?

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Com certeza. Vamos ver se a Mesa sabe responder.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Tenho a certeza que sim, Sr. Presidente.
Tendo em conta a sua experiência como Presidente do Governo Regional dos Açores, gostaria que o Sr. Presidente ilustrasse os Srs. Deputados que acabam de tomar a palavra sobre as diferentes fases dos litígios entre a Região Autónoma dos Açores e a República. Quais foram as fases em que os litígios foram maiores e quais foram aqueles momentos mais pacíficos nas relações entre as regiões autónomas e a República.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Medeiros Ferreira dá-me um tema que adoraria poder expor, mas é óbvio que levaria tanto tempo que o Regimento não me consente fazer esta exposição. De qualquer modo, agradeço-lhe imenso a gentileza da sua referência. Sobre a matéria, o Sr. Deputado bem sabe o que penso.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares. Agradeço que seja breve, porque já excedemos muito o tempo de que dispúnhamos.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Tem toda a razão, Sr. Presidente. Serei breve e agradeço-lhe ter-me dado a palavra para esta brevíssima interpelação.
Sr. Presidente, hoje, ao princípio da tarde, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista anunciou aqui, publicamente, perante a Câmara, a intenção de pedir um debate de urgência sobre decisões, no âmbito do Ministério da Justiça, recentemente anunciadas (anteontem, mesmo) pela Sr.ª Ministra da Justiça.
A esse respeito, gostaria de transmitir ao Sr. Presidente e à Câmara que o Governo e em particular a Sr.ª Ministra da Justiça estão completamente disponíveis para a realização desse debate de urgência.

Aplausos do PSD, do CDS-PP e dos Deputados do PS António Costa e Elisa Ferreira.

Acrescentaria apenas, de uma forma breve, que a Sr.ª Ministra da Justiça já me transmitiu toda essa disponibilidade

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2023 | I Série - Número 050 | 18 de Outubro de 2002

 

- porque é uma pessoa com palavra e porque "quem não deve não teme" - para vir ao Parlamento falar dessa e de outras decisões de uma forma serena, democrática, com a linguagem apropriada, porque estamos a falar de importantes questões do Estado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Eduardo Cabrita pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Sr. Presidente, para defesa da minha honra pessoal.

O Sr. Presidente: - Muito bem, foi mencionado e dar-lhe-ei a palavra depois da intervenção do orador que está inscrito agora.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nenhum incidente, nenhuma manobra nos afastará do debate e da denúncia da gravidade das medidas do Governo e de trazê-los a esta Câmara.
Em vésperas de debate orçamental, aparece claro aos olhos de cada vez mais portugueses o verdadeiro carácter da política do Governo. Passaram os tempos da grande ilusão das promessas eleitorais, aqui e ali salpicadas de demagogia populista. Agora, no Governo, fazem-se promessas sempre com prazos bem dilatados, não vá alguém lembrar-se de pedir contas ainda nesta Legislatura.
Propõe-se o alargamento da escolaridade obrigatória para o 12.º ano de escolaridade, mas com a certeza de que a calendarização de tal objectivo, se for de facto sincero, só será conhecida algures nos próximos anos. Mas, entretanto, não se vislumbram os meios que permitem iniciar o caminho para aquela decisão.
Propõe-se a convergência das pensões com o salário mínimo nacional para daqui a 7 ou 8 anos, o que já estava, e melhor, consagrado na lei de bases em vigor, e entretanto não se vislumbra tal preocupação no Orçamento proposto para 2003.
O Governo e a maioria bem gostariam que na Assembleia da República não se discutissem as questões que mais afectam o País, que mais preocupam a população. Bem gostariam que a "cortina de fumo" da demagogia geral do seu discurso fosse suficiente para esconder a gravidade do caminho que querem impor ao País e aos portugueses. Mas não terão essa sorte!
O Governo invoca repetidamente a estafada justificação da pesada herança, aliás já utilizada no passado, mas não conseguirá esconder que ela é pesada mas para os portugueses e as portuguesas, e que com o actual Governo se produz um severo agravamento das dificuldades existentes.
O Governo dramatiza a situação do País no que respeita às contas públicas, apresentando-nos à beira de uma hecatombe orçamental, que nem por isso conseguirá esconder que os sacrifícios que pede à generalidade dos portugueses não se aplicam aos beneficiados de sempre.
O Governo repete a bafienta proclamação de que está cá não para dialogar mas para decidir, e nem assim esconderá a sua falta de flexibilidade democrática para discutir com os trabalhadores, os sindicatos, a sociedade, as suas políticas.
Diz o Primeiro-Ministro que o País não precisa de greves, mas de concertação; mas não há margem para concertação quando o objectivo de uma das partes é destruir o património fundamental da outra.
A resposta dada ontem pelos trabalhadores da Administração Pública à política que o Governo lhes propõe foi sem dúvida uma clara e inequívoca rejeição. O caso não é para menos! Está em marcha uma tentativa de destruição do vínculo de emprego público, dos direitos dos trabalhadores deste sector e da própria Administração Pública como garante de direitos dos cidadãos e do funcionamento do Estado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O Governo enfraquece o Estado quando atrofia os serviços, ao proibir as contratações ou renovações de contratos, criando reais dificuldades de funcionamento, nalguns casos tendo em vista facilitar operações de privatização. A isto se juntam os constrangimentos orçamentais que certamente criarão acrescidas dificuldades ao funcionamento aos mesmos serviços.
O Governo enfraquece o Estado e desrespeita os trabalhadores da Administração Pública quando os atira para um novo quadro de disponíveis, agora chamado de supranumerários, ofendendo a sua dignidade e os seus direitos fundamentais enquanto trabalhadores

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - O Governo enfraquece o Estado quando se prepara para destruir o vínculo de emprego público, empurrando os trabalhadores da Administração Pública para o contrato individual de trabalho, o que significará certamente em muitos sectores, como é o caso da saúde, a destruição ou minimização das carreiras.
O Governo enfraquece o Estado quando, apesar de os empurrar para a situação de disponíveis, nega a dezenas de milhar de trabalhadores os direitos e expectativas existentes em relação à sua aposentação, chegando ao cúmulo de o querer fazer de forma retroactiva.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - É escandaloso!

O Orador: - O Governo enfraquece o Estado quando, como discutiremos brevemente, pretende condenar mais um ano os trabalhadores da Administração Pública à diminuição real dos seus salários, com a agravante de querer fazer dos sindicatos os seus capatazes e de empurrar para eles a responsabilidade de repartir o que o Governo não quer dar.
O Governo usa da demagogia e da hipocrisia quando utiliza, de forma mais ou menos visível, a táctica da divisão dos trabalhadores. Quer dividir os trabalhadores do sector público e do privado, os desempregados e os empregados, os jovens e os menos jovens, os precários e os efectivos. Quer fazer crer que os trabalhadores da Administração Pública têm direitos a mais em relação aos do sector privado. Mas os trabalhadores sabem que a ofensiva

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contra os direitos de quem trabalha visa todos e que a diminuição dos direitos e dos salários dos trabalhadores da Administração Pública é sempre uma alavanca para uma maior exploração no sector privado, sabem que uma política de destruição e privatização dos serviços públicos é uma política que lesa todos os trabalhadores e toda a sociedade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas seria injusto não dizer que a contenção governamental em relação à Administração Pública tem excepções. É que sempre que se trata de inundar o aparelho de Estado com os seus rapazes, sejam do PSD ou do CDS-PP, não há restrições.
Veja-se o incrível caso dos 18 directores distritais da segurança social demitidos de uma vez só, veja-se quem são os seus substitutos, em geral com cartão do PSD e do CDS-PP, e que reúnem também requisitos adicionais, como já terem sido preteridos para outros cargos públicos, numa estranha lógica de compensação, ou como recompensa da disponibilidade para candidaturas autárquicas ou até para compensar solidariedades em questões partidárias internas. Um escândalo! E nem vale a pena vir invocar a prática anterior de governos socialistas, que igualmente criticámos, porque, e para utilizar linguagem bem compreendida por este sector do Governo, não se expia um pecado com outro de sentido contrário.
E há ainda mais excepções. É particularmente chocante que, ao mesmo tempo que o Governo exige sacrifícios salariais e de direitos aos trabalhadores da Administração Pública, tenha "metido na gaveta" a diminuição dos benefícios e regalias dos administradores e gestores públicos.
De facto, o Governo fez grande alarido da intenção de limitar esses benefícios, aprovando, na generalidade, em Conselho de Ministros, um decreto-lei sobre esta matéria, a 1 de Agosto. Pois bem, este diploma nunca foi sequer enviado às organizações sindicais para consulta, nem retomado no Conselho de Ministros. O Governo fez o número só para efeito público. Onde está a referido decreto-lei? Foi apenas uma encenação vergonhosa para tentar depois impor sacrifícios aos trabalhadores da Administração Pública.

Aplausos do PCP.

Nem conseguem já passar despercebidas outras utilizações do aparelho de Estado para fins partidários, como a escandalosa convocatória dirigida aos directores dos centros de saúde e seus colaboradores para estarem presentes numa iniciativa do PSD e do CDS-PP, no Porto, feita pela sub-região de saúde e pelo seu coordenador, que tanto quanto sabemos ainda está em funções.
Não menosprezamos os problemas da Administração Pública, mas não confundimos a necessária modernização com a sua anunciada liquidação. Neste momento, estão em causa importantes direitos dos trabalhadores, mas está também em causa a defesa do Estado e da Administração Pública como garante da soberania, da prestação de serviço público e do assegurar das funções que lhe estão atribuídas.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para defesa da honra, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Sr. Presidente, pedi a palavra para defesa da minha honra porque, tendo-me ausentado do Plenário por alguns minutos, enquanto o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo estava a fazer uma intervenção sobre o congresso do Partido Popular nos Açores, foi-me transmitido que, inesperada e surpreendentemente, na sequência dessa intervenção, o Sr. Deputado se terá referido a factos passados na Comissão Parlamentar onde esteve, esta semana, a Sr.ª Ministra da Justiça, Dr.ª Celeste Cardona. E disse isto numa espantosa manifestação, numa espantosa prova em tempo real e no dia em que esta questão foi colocada, do que é para o PP e para o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo falar olhos nos olhos!
Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, estive nessa Comissão Parlamentar desde o início e até ao final dos trabalhos, tendo o Sr. Deputado passado por lá.
Sr. Deputado, no exercício do meu mandato parlamentar, no que toca a chamar à atenção para aquilo que tem a ver com defesa da responsabilidade democrática e do sentido de Estado de Membros do Governo, designadamente da Dr.ª Celeste Cardona, por factos recentes relacionados com o processo de alteração dos responsáveis da Polícia Judiciária, nada tenho a esconder e já demonstrei suficientemente, olhos nos olhos, quanto sou capaz de exercer o mandato para o qual fui eleito.
Sr. Deputado, surpreendeu-me aqui esta manifestação em tempo real, na minha ausência, do que significa para si um debate de olhos nos olhos.
Cá estarei sempre, aqui, em Plenário ou na Comissão, com a Dr.ª Celeste Cardona ou com qualquer outro membro do Governo. A Dr.ª Celeste Cardona foi, hoje, desmentida pelo seu próprio Secretário de Estado Adjunto; no Parlamento, disse que tinha sido usada a reserva do fundo de garantia financeira, que a Dr.ª Celeste Cardona não constituiu e, hoje, o Sr. Secretário de Estado Adjunto pelo menos tranquilizou os portugueses dizendo que, ontem ainda, os 202 milhões de euros estavam na conta bancária do Ministério da Justiça; hoje não sabemos.
Sr. Deputado, o seu padrão ético foi mais uma vez aqui provado. Estarei aqui sempre e quando for necessário para confrontar a Dr.ª Celeste Cardona, e terei muito gosto também, quando o Dr. Paulo Portas deixar de estar escondido em S. Julião da Barra, em o confrontar com responsabilidades perante os portugueses, perante o Parlamento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, devo dizer-lhe, em jeito de introdução, que se V. Ex.ª se ausentou desta sala foi porque quis; se V. Ex.ª não me ouviu, disso não tenho culpa, tanto mais que se ausentou no momento em que iniciava a minha intervenção - de resto, como outros Srs. Deputados da sua bancada, mas isso não vem ao caso porque não estou aqui para sancionar quem está ou quem não está.

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Agora, Sr. Deputado, há uma coisa que sei: V. Ex.ª insultou a Sr.ª Ministra da Justiça.

Vozes do PS: - Não!

O Orador: - V. Ex.ª insultou a Sr.ª Ministra da Justiça. V. Ex.ª, e isto importa considerar, insultou quando poderia ter obtido na Comissão os esclarecimentos que supostamente pretendia, quando estava lá a Sr.ª Ministra. V. Ex.ª, na Comissão, com a Ministra à frente - lá está, olhos nos olhos -, ouviu e calou!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Oh, Sr. Deputado!...

O Orador: - Cá fora, algures acompanhado pelo Deputado António Costa, ouviu os insultos e depois reiterou esses mesmos insultos.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - A Sr.ª Ministra estava a responder-me. O senhor é que não estava lá!

O Orador: - Sr. Deputado, só para que conste e poderá verificar, na audição da Sr.ª Ministra estive na Comissão do primeiro ao último minuto - V. Ex.ª, certamente, não esteve atento a isso, como não esteve atento a muitas outras coisas - e, de resto, questionei a Sr.ª Ministra em numerosas ocasiões.
Sr. Deputado, tal como há pouco em relação aos insultos proferidos pelo Secretário-Geral do seu partido, também V. Ex.ª não tem nenhuma razão política ou outra que justifique o recurso ao ataque pessoal, que justifique o recurso ao insulto.

O Sr. António Costa (PS): - Insulto?! Insulto foi o que ela fez! Ela veio cá mentir!

O Orador: - V. Ex.ª pode divergir da política deste Governo para a área da justiça; V. Ex.ª pode até julgar que foi o melhor Secretário de Estado do mundo; V. Ex.ª pode até sentir alguma tristeza por ver, hoje, outros ocuparem o lugar que outrora foi seu, agora, Sr. Deputado, não há razão nenhuma para que o Sr. Deputado insulte uma Ministra do Governo da República…

Protestos do PS.

… como nunca nenhum Deputado desta bancada, em circunstância alguma, insultou um Sr. Ministro indicado pelo Partido Socialista para o Governo de Portugal.

O Sr. António Costa (PS): - Traga cá o Dr. Paulo Portas!

O Orador: - Nós discutimos ideias, discutimos projectos, não insultamos. Mas, tome nota, Sr. Deputado, também em circunstância alguma permitiremos que V. Ex.ª insulte; registaremos o facto…

O Sr. António Costa (PS): - É preciso ter lata! Devia ter vergonha!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Traga lá o Dr. Portas, que está escondido em S. Julião da Barra!

O Orador: - … e disso chamaremos a devida atenção, sempre com serenidade, sempre com educação, sempre com elevação.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, já ultrapassámos o tempo previsto pelo Regimento, pelo que os votos que estão pendentes serão votados na altura das votações.
Sr.as e Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 15 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, a primeira parte do período da ordem do dia refere-se à aprovação de Diários.
Estão, assim, em aprovação os n.os 15 a 31 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 29 a 31 de Maio, 5, 6, 12, 14, 19, 20, 21, 26, 27 e 28 de Junho e 3, 4, 5, 9 e 10 de Julho de 2002.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
O segundo ponto da ordem do dia é a discussão conjunta dos projectos de lei n.os 9/IX - Iniciativa legislativa da cidadania (BE), 51/IX - Regula e garante o exercício do direito de iniciativa legislativa popular (PS), 68/IX - Iniciativa legislativa popular (PCP) e 145/IX - Iniciativa da lei por grupos de cidadãos eleitores (PSD e CDS-PP).
Antes de dar a palavra ao primeiro orador inscrito, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, na qualidade de relator da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi sugerido na Comissão, aquando da discussão deste relatório, que, na qualidade de relator, eu pedisse a palavra aquando do início do debate em Plenário. Não é minha intenção, naturalmente, prejudicar nenhum dos Srs. Deputados que vai apresentar as respectivas iniciativas legislativas - eu próprio terei oportunidade de o fazer a propósito da iniciativa do PCP -, mas creio ser meu dever corresponder a essa sugestão que foi feita na Comissão Parlamentar.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serei muito sintético e apenas salientarei as conclusões fundamentais deste relatório, que discutimos e aprovámos por unanimidade na 1.ª Comissão, reconhecendo, desde logo, que vamos hoje discutir uma matéria que diz respeito a um direito dos cidadãos, que foi consagrado unanimemente na revisão constitucional de 1997 e relativamente ao qual esta Assembleia cumpre um elementar dever para com o País ao traduzi-lo em lei, ao proceder à sua regulamentação legal.

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Refiro o facto de haver um conjunto significativo de iniciativas legislativas - quatro iniciativas legislativas - sobre esta matéria, o que revela a importância que os grupos parlamentares lhe atribuem, sendo de salientar que em todas as iniciativas é destacada a importância da iniciativa legislativa de grupos de cidadãos enquanto mecanismo de aperfeiçoamento da democracia e de melhoramento do relacionamento desta Assembleia com os cidadãos.
Saliento ainda, como terceiro ponto, a existência de experiências noutros países em matéria de regulamentação da iniciativa legislativa popular, países esses que nos são próximos em termos de tradição jurídica, política e até cultural, pelo que é muito importante recolhê-las para podermos adoptar uma boa regulamentação no nosso país.
Por outro lado, saliento também que, nas duas legislaturas anteriores, foram apresentadas iniciativas legislativas sobre esta matéria por vários grupos parlamentares e todas elas foram aprovadas por unanimidade, na generalidade, mas, lamentavelmente, os processos legislativos, por várias razões, nunca se concluíram, sendo, portanto, esta a terceira vez que a Assembleia da República vai debater iniciativas sobre esta matéria. E permitam-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que expresse o voto de que, desta vez, os processos efectivamente se concluam.
Para concluir, refiro um último ponto, salientando o facto de haver um grau de consenso muito grande relativamente à maioria dos aspectos da regulamentação que é proposta pelos vários grupos parlamentares, havendo duas questões que são objecto de divergência: uma delas relativa ao âmbito material das iniciativas admissíveis e outra relativa ao número de assinaturas que é exigido para que uma iniciativa possa ser apresentada. Quanto ao resto, creio que há um grau de consenso assinalável, o que nos permitirá supor que, discutidas e dirimidas as poucas, mas relevantes, questões que dividem, se possa rapidamente dar sequência a este processo legislativo.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Para iniciar o debate e apresentar a iniciativa legislativa do seu grupo parlamentar, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do BE propôs ao Presidente da Assembleia, bem como à Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, e mereceu acolhimento, que fosse agendado, tão breve quanto possível, este debate. Houve unanimidade a esse respeito e isso traz-nos à consideração estas iniciativas legislativas - os projectos de lei n.os 9/IX, do BE, 51/IX, do PS, 68/IX, do PCP, e 145/IX, do PSD e do CDS-PP.
Como acabou de ser lembrado pelo relator da 1.ª Comissão, Deputado António Filipe, e como está aprovado no relatório que introduz este conjunto de iniciativas legislativas, elas resultam de uma larga unanimidade, consagrada na revisão constitucional de 1997 e depois reforçada na apreciação que a Assembleia da República fez de várias iniciativas, em várias oportunidades, para dar corpo ao artigo 167.º e autorizar grupos de cidadãos a apresentarem projectos de lei.
O mesmo relatório, aprovado na 1.ª Comissão, lembra que outros países - não muitos, mas alguns e significativos, como a Espanha, a Itália e o Brasil - já consagraram estas iniciativas, embora dando-lhe um âmbito de participação popular que é relativamente diferente.
Podemos, portanto, lamentar que, nas vicissitudes da interrupção da actividade legislativa, tenha de ter demorado cinco anos entre esta revisão constitucional e o momento em que reabrimos este processo, na esperança agora de o concluir. Mas este debate é, sem dúvida nenhuma, um progresso importante e um passo importante para a transformação, a abertura e a consolidação das regras democráticas no sistema político.
Em nome desta transparência e do contributo para este debate, afirmo que contribuiremos, como é natural, para a aprovação de todas as iniciativas, como aconteceu até hoje, para dar este sinal de confluência sobre as grandes matérias e as grandes escolhas de todos os projectos que estão em cima da mesa. Há um conjunto de matérias que vão ser discutidas na especialidade, que, aliás, estão identificadas no relatório que é muito detalhado a este respeito. Discutem-se os limites da iniciativa legislativa, sendo que o nosso entendimento é o de que os limites são os mesmos que obrigam a Assembleia da República - aplica-se a lei-travão em relação ao Orçamento e, naturalmente, a Constituição da República não pode ser modificada por legislação ordinária. E sendo a Assembleia da República a instância que toma a decisão sobre os projecto de lei de iniciativa popular, as limitações que nos obrigam devem ser as mesmas que restringem a acção dos cidadãos.
Dito isto, há um conjunto de outras matérias sobre as quais há opções diferentes nestes vários projectos. Partilhamos a opção corrente em todos os projectos, excepto no do PS, de que a promoção da iniciativa é de cidadãos eleitores - o PS sugere que sejam cidadãos portugueses; parece-nos mais adequado, como escolheram os outros três projectos, que qualquer cidadão com o poder de eleger em Portugal possa também contribuir para propor uma iniciativa legislativa.
No mesmo sentido, parece-nos muito excessivo que a identificação dos proponentes se faça por reconhecimento notarial, como propõe o PS; parece-nos mais adequado que as regras sejam as mesmas que permitem o controle rigoroso dos proponentes da candidatura do Presidente da República ou de referendos, que estão consagradas na legislação.
Acompanhamos a proposta do PCP, que não tínhamos considerado, sobre a ideia de que a forma da iniciativa pode ser relativamente mais aberta do que a formulação estrita, formalizada e finalizada de um projecto de lei, sendo que, no entanto, o conteúdo legislativo deve ficar claramente identificado e proposto. E aceitamos pontos de vista das propostas do PS, que não estão consagradas na nossa iniciativa, no sentido da publicação em Diário da República e do princípio importante do acompanhamento da execução da lei.
Todas as outras matérias parecem razoavelmente consensuais e pode-se ter uma convicção forte de que desta votação na generalidade resulta um trabalho célere da 1.ª Comissão e a aprovação, finalmente, desta medida constitucional a que a lei dará corpo.

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Para terminar, esta medida tem uma importância simbólica que vale a pena ressaltar: trata-se de um entendimento de que o campo da actividade política deve ser ampliado e não deve ser restrito, e que o caminho moderno na reforma do sistema político é o do alargamento da responsabilidade e, portanto, dos direitos dos cidadãos.
A política não pode nem deve ser entendida como um monopólio ou um exclusivo nem sequer dos representantes que, para a actividade legislativa, foram mandatados: 230 homens e mulheres com mandato de um legislatura não têm este privilégio, este monopólio da actividade legislativa, nos termos da Constituição - e a Constituição tem razão a este respeito. Têm uma responsabilidade bem definida pela Constituição, mas a qualidade da democracia depende também da sua abertura à proposta, à iniciativa e a um debate popular que seja consequente na assumpção de uma responsabilidade pelo facto de cidadãos se fazerem promotores de uma iniciativa, e esse é o sentido dos projectos de lei que temos aqui. Por isso os aprovaremos e por isso esperemos que eles dêem origem a uma lei desta Assembleia da República que seja tão significativa para o País e tão depressa quanto possível.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Também para apresentar o projecto de lei do seu partido, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 51/IX, do PS, visa honrar um compromisso há muito assumido por esta Câmara junto dos cidadãos, o de lhes dar poder de impulso legislativo através do instituto universalmente designado de iniciativa legislativa popular.
O recorte doutrinário e jurídico deste instituto permitem distingui-lo de outros instrumentos de democracia participativa, como são o direito de petição e a iniciativa popular do referendo, que a Constituição portuguesa também consagra, e de institutos da democracia directa, como a iniciativa popular para revisão da Constituição ou o referendo tal como previstos na Constituição suíça.
A iniciativa legislativa popular ocupa um lugar de honra na história e na formação do constitucionalismo democrático. Embora episódica, não deixou de ser significativa a sua primeira aparição no período da Revolução Francesa, pela mão de Condorcet, autor do projecto de Constituição que apresentou à Convenção de Fevereiro de 1793. Mais de um século após, na Constituição de Weimar, que neste, como noutros aspectos, foi pioneira, a iniciativa legislativa popular vai surgir com configuração e com intenções semelhantes às actuais.
Na verdade, em Weimar, a iniciativa legislativa popular era já um instrumento de incorporação efectiva dos cidadãos na vida política, não se perfilando como uma alternativa aos instrumentos da democracia representativa mas, sim, como um complemento da mesma de modo a garantir o desiderato - hoje, como então, dramaticamente actual - da aproximação entre governantes e eleitores.
Como é bem conhecido, a Constituição de Weimar é uma referência em muitos campos do direito constitucional e do ideário democrático, mas não teve um final feliz. Mas o que ela iniciou frutificou noutras latitudes.
Logo a Constituição austríaca de 1920 inaugurou o conceito e a fórmula de iniciativa legislativa popular que depois seriam adoptados por outras constituições. Alimentada pelo prestígio e pelo peso das concepções de Hans Kelsen, a iniciativa legislativa popular de lei ordinária ficou consagrada na Constituição austríaca como forma de participação dos cidadãos na formação da vontade estatal. Ela era vista como um contributo importante para a consolidação do parlamentarismo e da democracia representativa e não como sua alternativa.
Na Constituição austríaca de 1920, a iniciativa legislativa popular perdeu a natureza de instrumento de democracia directa, isto é, de instrumento ao dispor dos cidadãos para decidirem directamente sobre questões políticas, assumindo-se claramente como instrumento da democracia participativa. A iniciativa legislativa popular é, na Constituição austríaca, uma forma de os cidadãos desencadearem um processo legislativo, ficando porém os deputados com o poder de decidir, livremente e em definitivo, se a solução apresentada pelos cidadãos deve ou não ser transformada em lei.
Com essa configuração, a iniciativa legislativa popular reemerge na Constituição republicana espanhola de 1931; na Constituição italiana de 1947, notando-se aí o "dedo" qualificado de Constantino Mortati; e, outra vez, na Constituição espanhola actual, de 1978. Um pouco mais tarde e mais recentemente, foi consagrada na Constituição brasileira de 1988.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta viagem pela história deste instituto serve para mostrar que a iniciativa legislativa popular ostenta uma linhagem democrática brilhante. Não desonra, por isso a Constituição portuguesa de 1976 o facto de se ter querido juntar, a partir da revisão constitucional de 1997, na sequência de propostas do PS e do PCP, ao escol de textos constitucionais que a consagra. Mas, não obstante as suas sólidas raízes e embora a sua consagração constitucional não se esgote nos textos que citei, é ainda uma figura pouco familiar, pouco difundida. E mesmo nos sítios onde tem consagração constitucional e presença consolidada, o seu uso fica normalmente aquém daquilo que se poderia esperar.
O projecto de lei n.º 51/IX, do PS, está bem ciente da arqueologia deste instituto, dos seus pontos fortes mas também das suas fragilidades. Com esse projecto, queremos dar expressão a duas convicções: primeiro, a iniciativa legislativa popular é um poderoso instrumento de aproximação e de envolvimento dos cidadãos na política e nos circuitos do político; segundo, a iniciativa legislativa popular não é um instrumento alternativo aos instrumentos próprios da democracia representativa, é, sim, mais um instrumento que concorre para o aperfeiçoamento da representação política.
Estando o PS convicto sobre estes dois pressupostos, está também ciente de que a eficácia, a acessibilidade e o uso razoável do instituto da iniciativa legislativa popular requerem bom senso e equilíbrio na sua concretização legislativa.
A Constituição portuguesa não fixa o número de subscritores necessário para que a iniciativa possa ser admitida, ao contrário do que fazem as Constituições italiana, espanhola ou brasileira. Diferentemente da opção espanhola (artigo 87.º, n.º 3), não estabelece outros limites quanto às matérias que possam versar, para além dos genericamente previstos para toda e qualquer iniciativa, qualquer que seja

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a sua origem, como é o caso da chamada "lei-travão". Em contraste com a solução italiana, não exige que a iniciativa se concretize num projecto articulado.
O legislador ordinário português desfruta, assim, de maior liberdade de conformação do que os seus congéneres italianos, espanhóis ou brasileiros. Mas essa liberdade de conformação deve ser usada com parcimónia e sem perder de vista experiências e soluções estrangeiras.
Por isso, o Partido Socialista propõe um número de subscritores mínimo, que não é, em termos relativos, tão vultuoso como o que se exige em Espanha e no Brasil, mas também não é tão reduzido como o italiano - 0,3% do número de cidadãos portugueses inscritos no recenseamento em território nacional é um número intermédio, que corresponde, grosso modo, ao número de eleitores necessários para eleger um Deputado, se concentrados num único círculo eleitoral, adquirindo-se, por essa via, acesso indirecto à Assembleia da República.
Por isso, o PS procura elencar, com rigor, as matérias que devem estar subtraídas à iniciativa popular: todas as do artigo 164.º da Constituição, abrangidas pela reserva absoluta de competência legislativa, com excepção da alínea i); as que tenham conteúdo orçamental, tributário ou financeiro; as que sejam da exclusiva competência do Governo e, bem assim, todas cuja iniciativa esteja expressamente reservada a órgãos constitucionais.
O PS entende que a iniciativa legislativa deve assumir a forma de projecto de lei, devidamente articulado.
Essencial para a adesão a este instituto e para o seu crédito é que os cidadãos promotores tenham garantida a apreciação do projecto legislativo em tempo útil, se ele preencher os requisitos constitucionais e legais previstos. Aqui haverá que compatibilizar, com equilíbrio, o interesse da celeridade da tramitação da iniciativa legislativa com o interesse de uma decisão ponderada pelos Deputados.
Os prazos estabelecidos no projecto, nomeadamente o prazo de 30 dias para a produção de um relatório pela comissão competente, bem como o prazo de agendamento para uma das 10 reuniões plenárias subsequentes, cumprem esse desiderato.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como já aqui foi assinalado pelo Sr. Deputado relator do relatório da 1.ª Comissão, esta é a terceira tentativa que esta Câmara ensaia para dar plena execução à Constituição no que concerne à iniciativa legislativa popular. As anteriores depararam com dificuldades que impediram a sua concretização.
Desta vez temos todas as condições para ter sucesso. Se assim for, isso prestigiará esta Assembleia, consolidará o sistema democrático e constituirá um sinal de reforma que deve ser realçado.
O PS manifesta o seu total empenho no sentido de se concluir com rapidez este processo legislativo, havendo seguramente espaço para um grande consenso em torno destas iniciativas entre os vários partidos representados nesta Câmara.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): -Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Esteves.

A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Sr. Presidente, não é propriamente para pedir esclarecimentos, mas para chamar a atenção do Partido Socialista para um eventual lapso no projecto de lei que apresentou.
Segundo as intenções que o Sr. Deputado acaba de esclarecer, e que, curiosamente, são como tal referidas no relatório, as matérias objecto de iniciativa legislativa popular serão todas as da competência da Assembleia da República, concorrente e não concorrente com a do Governo, com excepção das matérias da reserva absoluta de competência, excluída a alínea relativa às bases do ensino. Mas não é isso que consta do artigo 6.º do projecto de lei. Este artigo, ao delimitar pela positiva a iniciativa legislativa popular às matérias previstas na alínea i) do artigo 164.º e no artigo 165.º da Constituição exclui claramente as matérias da competência concorrente da Assembleia com o Governo. Por isso, tenho a impressão de que a fórmula do artigo 6.º terá de ser alterada, sob pena de grande parte da competência legislativa da Assembleia da República estar a ser excluída deste enunciado.
Não sei se tenho razão, mas creio que os Srs. Deputados poderão confirmar, ou não, a minha observação. Portanto, repito: o facto de a competência estar delimitada deste modo exclui a competência concorrente da Assembleia e do Governo. Terei ou não razão, Srs. Deputados?

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para responder tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, seguramente, todos estes aspectos devem ser objecto de articulação ao nível da 1.ª Comissão. Não creio que seja difícil chegarmos, depois, a um consenso entre os vários projectos.
Em relação às questões ligadas à competência, teremos também depois de as apreciar com alguma atenção. Reconheço que o projecto do Partido Socialista é mais estrito na definição de matérias que estão excluídas da iniciativa legislativa popular do que o que sucede noutros ordenamentos constitucionais. Talvez seja um excesso de cautela, mas creio que será uma cautela necessária no momento em que nos apostamos em introduzir este instrumento da democracia participativa no nosso ordenamento.
Sr.ª Deputada, confirmo ser nossa intenção que as matérias do artigo 164.º da Constituição, com excepção da respectiva alínea i), sejam excluídas do objecto da iniciativa legislativa popular, como também é nossa intenção que não sejam excluídas do objecto da iniciativa legislativa popular todas as matérias do artigo 165.º da Constituição, que é, como sabe, uma lista longa, e também, por maioria de razão, não deverão ser excluídas as matérias de competência concorrencial.
Mas, Sr.ª Deputada, sei que este é um aspecto em relação ao qual o nosso projecto é mais restritivo do que os dos outros partidos aqui representados, pelo que poderemos, em sede de comissão, fazer uma análise de todas as questões que se suscitarem a propósito das competências que podem ser objecto de iniciativa legislativa popular.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró, a quem peço que seja o mais breve possível.

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O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vitalino Canas, a minha intervenção segue mais ou menos a mesma linha de pensamento da intervenção da Sr.ª Deputada Assunção Esteves, mas é mais material, não se tratando meramente da redacção do projecto de lei em discussão.
Gostaria de saber o seguinte: se o que compete aos eleitores é a iniciativa parlamentar e não o direito de legislar, se este direito de legislar é da Assembleia da República, ou seja, quem faz a lei é a Assembleia e os Deputados, que diferença faz que esta iniciativa parta de fora, uma vez que são os próprios Deputados que têm o direito de exercer a sua competência absoluta?
Quer dizer, as matérias elencadas na competência absoluta da Assembleia da República, no fundo, vão ser exercidas pelos Deputados da Assembleia da República. Pelo facto de a iniciativa não ter partido de um Deputado ou de um grupo parlamentar, mas de fora, colocar-se-á algum entrave aos Deputados no sentido de exercerem a sua própria competência absoluta para discutir e votar as leis?
Isto parece-me uma questão muito formal, porque efectivamente quem vai discutir, debater e votar são os Deputados, que vão exercer a competência que a Constituição lhes dá.
Por isso mesmo, é meramente artificial dizer que os próprios Deputados que vão debater e votar diplomas, exercendo a competência que a Constituição lhes atribui de legislarem sobre matérias da sua reserva absoluta, por a iniciativa ter vindo de fora, não poderão fazê-lo e que, por ter vindo um Deputado, poderão.
Além disso, o Sr. Deputado José Magalhães já defendeu o contrário. Há uma célebre passagem do discurso inflamado do Deputado José Magalhães sobre essa matéria, em que dizia que a criatividade de iniciativa popular não deve de forma nenhuma ficar restrita a qualquer constrangimento da Assembleia da República. "Querem mudança de regime matrimonial, votem! Se querem novos tribunais, proponham!" - dizia ele.
Posso ler as linhas que aqui tenho, mas isso era dar-lhe o benefício de ler a sua prosa…

O Sr. José Magalhães (PS): - Leia, leia!

O Orador: - Mas se quiser, depois da minha intervenção, posso dar-lhas.
Gostaria simplesmente de dizer que já defendeu aqui inflamadamente o contrário.

O Sr. José Magalhães (PS): - Leia, leia!

O Orador: - Não seria capaz de dar aquele tom que o meu amigo dá quando sobe à tribuna e "jorra" a sua prosa, mas posso dizer que já defendeu o contrário.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas, a quem agradeço que respeite o tempo disponível do seu partido, que são 59 segundos.

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, nesta fase final da sua intervenção fiquei sem saber se a sua pergunta me era endereçada ou ao Sr. Deputado José Magalhães. Mas, quanto à parte que me pareceu que me poderia ser endereçada, quero dizer-lhe que o projecto do Partido Socialista, na parte que referiu, ou seja, na introdução de um limite quanto à competência legislativa absoluta, procurou encontrar inspiração no artigo 115.º, n.º 4, alínea d), da Constituição, que diz respeito ao referendo. Também neste caso se impede que sobre essas matérias possam incidir referendos, que, como sabe, também podem ser da iniciativa popular.
Portanto, entendemos que deveríamos fazer aqui uma correspondência entre este preceito e o que cabe, ou caberá, aos cidadãos como iniciativa legislativa popular.
Mas, como disse já à Sr.ª Deputada Assunção Esteves, esta é uma matéria sobre a qual poderemos seguramente dialogar com os outros partidos e não será impossível atingir consensos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostaria de fazer uma interpelação a Mesa, porque embora julgue que as observações do Deputado Narana Coissoró não justificam o exercício do direito de defesa, uma vez que na verdade não fui "atacado", não gostaria que ficasse a constar da acta da Assembleia da República algo que julgo que resulta num equívoco.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, concedo-lhe 1 minuto para fazer o seu esclarecimento e podermos prosseguir o debate em condições normais.

O Sr. José Magalhães (PS): - Certamente, Sr. Presidente.
Julgo que o Sr. Deputado Narana Coissoró incorreu num equívoco, ou mesmo num lapso de leitura, porque a posição que sustentei nesta matéria é aquela que está expressa quer na versão anterior do projecto de lei do Partido Socialista sobre iniciativa legislativa popular, quer na presente versão. Isto resultou de uma reflexão que fizemos no quadro da chamada iniciativa Parlamento 2000, a qual foi editada em livro e que o Sr. Deputado Narana Coissoró capricha em citar - coisa que francamente muito me apraz, porque julgo tratar-se de uma boa leitura.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Por isso é que eu não citei, porque lhe apraz!

O Orador: - Nesse texto de reflexão, tivemos ocasião de sugerir que seria bom avançar com cuidado.
Se analisarmos o elenco das matérias referidas no artigo 165.º da Constituição veremos que eles incluem a possibilidade de iniciativas legislativas sobre matérias de carácter penal, sobre direitos, liberdades e garantias, que é em si mesmo um campo absolutamente gigantesco, sobre punição de infracções disciplinares, bases do sistema de

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segurança social, ambiente, protecção da natureza, arrendamento rural, criação de impostos, etc. Ou seja, são dezenas de matérias que permitem um amplíssimo campo.
Mas, evidentemente, como o Sr. Deputado Vitalino Canas teve ocasião de sublinhar, se no âmbito da comissão se decidir que este sistema - que é de facto inovador, implicando a inclusão na Assembleia da República de matérias que não podem ser controladas pelos partidos, e portanto são "válvulas de respiração" - deve ser ampliado, não será da parte do Partido Socialista que virá qualquer objecção determinante.
Era isto que eu gostava de dizer, para que não persista qualquer equívoco, Sr. Deputado Narana Coissóro.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, temos que prosseguir o debate, uma vez que estamos a aproximar-nos da hora regimental das votações. Pede a palavra para que efeito?

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Quero saber se à minha pergunta foram dadas duas respostas ou se o Sr. Deputado José Magalhães utilizou alguma figura regimental anómala, porque nesse caso também gostaria de ser anómalo.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, o Sr. Deputado José Magalhães usou a figura regimental, porventura um pouco desviante, da interpelação à Mesa, que a Mesa aceitou.
Mas se não há nenhum facto novo que permita novas formas de interpelação à Mesa, prosseguiremos o debate, nos termos em que estava agendado, caso o Sr. Deputado esteja de acordo.
Para apresentar a iniciativa legislativa do PCP e intervir no debate, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É a terceira vez que tenho o privilégio de apresentar o projecto de lei do PCP sobre a iniciativa legislativa popular. Espero, sinceramente, que seja a última vez que tenho de o fazer, porque é sinal de que, desta vez, vamos concluir o respectivo processo legislativo e vamos ter uma lei sobre a iniciativa legislativa popular.
Em termos constitucionais, a questão é claríssima, é pacífica. Não o foi em 1989, quando, pela primeira vez, em sede de revisão constitucional, propusemos a consagração desta figura, mas acabou por reunir consenso na revisão constitucional de 1997 e, desde essa data, está consagrada na Constituição.
Por duas vezes, nas VII e VIII Legislaturas, todos os projectos de lei relativos a esta matéria foram aprovados por unanimidade na generalidade. Todavia, os processos legislativos não foram concluídos porque ficaram dependentes de uma reforma mais vasta do Parlamento, que nunca chegámos a levar a cabo. Vamos ver se, desta vez, este processo legislativo se conclui. Embora existam algumas divergências - naturalmente, não estaremos todos de acordo em tudo -, julgo que, a breve prazo, será possível que este processo legislativo se conclua, desde que não fique dependente de outros. Daí a proposta que fazemos no sentido de que os projectos de lei sejam aprovados na generalidade - estamos convencidos de que o serão aprovados (pela nossa parte, sê-lo-ão, com certeza) - e que, a breve prazo, este processo seja concluído.
Relativamente ao conteúdo do nosso projecto de lei, e confrontando-o já com outras iniciativas em ppresença, abordarei, em primeiro lugar, a questão que mais nos divide, que diz respeito ao número de assinaturas necessário para que uma iniciativa legislativa popular possa dar entrada na Assembleia da República.
No que toca a este ponto, entendemos que não deve haver uma exigência que acabe por ser desproporcionada ou dissuasora, pelo que propomos o número de 5000 assinaturas, que cremos ser suficiente para apresentar uma iniciativa legislativa perante a Assembleia da República. Não nos parece que seja uma exigência de menos, se pensarmos que em Portugal, com 5000 assinaturas, se pode constituir um partido político. Além disso, o facto de os cidadãos apresentarem uma iniciativa legislativa não significa que sejam eles a decidir pela Assembleia da República, isto é, limitam-se a apresentar uma iniciativa, e é a Assembleia que, no uso dos seus poderes de órgão de soberania, vai decidir se aprova ou não uma lei no sentido que é proposto. Isto significa que a Assembleia da República não fica coagida na sua liberdade de decisão, dado que apenas terá de apreciar a iniciativa - a isso não poderá fugir -, sendo absolutamente livre e soberana quanto à decisão.
Não vemos, pois, razão para optar por soluções demasiado onerosas para os cidadãos e que, por essa razão, acabem por dissuadi-los. Nomeadamente, se exigirmos, como fazem o PSD ou o PS, números de 25 000 e 26 000 assinaturas para apresentar uma iniciativa legislativa, pergunto-me quais serão os cidadãos que vão dar-se a esse esforço, não tendo depois a mínima garantia de que essa iniciativa acabe por ser acolhida pela Assembleia da República. Do nosso ponto de vista, é desproporcionado fazer uma exigência de mais de 20 000 assinaturas, que ainda por cima, segundo o diploma do Partido Socialista, devem ser reconhecidas. Quanto a nós, trata-se de um esforço desproporcionado que é exigido aos cidadãos.
Dir-se-á que em Espanha se exige muito mais. É verdade que em Espanha se exige muito mais, mas aí tem outros contornos, porque em Espanha há duas fases: há uma primeira fase de admissibilidade da iniciativa e depois da iniciativa admitida é que os cidadãos são convidados a recolher assinaturas, beneficiando até de uma subvenção estatal para o fazer. Nós não propomos isso! Mas, para além desta diferença, acontece que não nos identificamos com o regime espanhol.
Há uns anos atrás, em Espanha, houve cidadãos que conseguiram recolher as 500 000 assinaturas exigidas para submeter ao Congresso dos Deputados uma iniciativa legislativa; depois, fez-se o debate e a maioria dos Deputados não esteve de acordo. Portanto, aqueles 500 000 cidadãos fizeram o esforço tremendo de se mobilizarem para uma iniciativa legislativa que acabou por não ter qualquer provimento.
Parece-nos que uma situação deste tipo é absolutamente dissuasora no que respeita à iniciativa e participação dos

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cidadãos. Por isso, entendemos que se deve optar por um número de assinaturas que seja razoável, em todo o caso um número razoável fixo!
Pensamos que a solução proposta pelo Partido Socialista, embora não seja inédita - no Brasil, por exemplo, é uma percentagem do eleitorado…

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Peço desculpa por interrompê-lo, Sr. Deputado.
Quero pedir aos Srs. Deputados que têm conversas a fazer fora do âmbito da discussão que as façam fora do Hemiciclo para que possamos ouvir o orador.
Pode prosseguir, Sr. Deputado.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, pensamos que deve ser exigível um número razoável de assinaturas. Consideramos que o número que propomos é razoável e julgamos que as propostas do PSD e do PS são desproporcionadas e dissuasoras, mas, em todo o caso, é nossa opinião que deve optar-se por um número fixo.
O número fixo é importante por várias razões, desde logo por razões de segurança. É importante que as pessoas saibam, à partida, quantas assinaturas é que têm de recolher, porque o recenseamento é permanente. Ora, sendo o recenseamento permanente, estaremos todos os meses a mudar o número exigível de assinaturas para apresentação de uma iniciativa legislativa popular, o que, de facto, não é bom para os cidadãos que vão apresentar a iniciativa, dado que pode suceder que numa semana o número de assinaturas seja suficiente, para depois, na semana seguinte, deixar de ser, se o número de eleitores aumentar.
Além disso, teria de definir-se qual o número relevante. É o das últimas eleições? É o das penúltimas? É o do mês passado? Há, pois, aqui um aspecto que complica as coisas e que é desnecessário, do nosso ponto de vista. Seria preferível optar-se por um número fixo!
Em segundo lugar, quanto à questão das matérias sobre as quais deve poder incidir a iniciativa legislativa popular, pensamos que se deve seguir o que dispõe a Constituição. Designadamente, há direitos de iniciativa que estão constitucionalmente reservados ao Governo, como é o caso da matéria que se refere à sua própria organização e funcionamento, bem como à proposta originária do Orçamento do Estado. Por outro lado, há direitos que são específicos dos Deputados, desde logo o direito de apresentar projectos de revisão constitucional. Há ainda direitos específicos das assembleias legislativas regionais, que é caso do estatuto político-administrativo das respectivas regiões. Porém, entendemos que não se deve ir além disso.
Nesse sentido, discordamos do projecto de lei apresentado do Partido Socialista, que propõe a exclusão das matérias da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia. Julgamos que esta proposta não faz grande sentido na medida em que é a Assembleia que vai decidir, e por isso não fica esbulhada dos seus poderes.
Por conseguinte, seja sobre matérias da sua reserva relativa, seja sobre matéria concorrencial, seja sobre matéria da sua reserva absoluta, é a Assembleia da República e mais ninguém que é chamada a legislar e, consequentemente, não vemos razão para que essa reserva seja feita.
Em terceiro lugar, pensamos que este direito não deve ser conferido apenas aos cidadãos portugueses mas também a todos os cidadãos recenseados em Portugal. Designadamente, se um cidadão estrangeiro está recenseado em Portugal e tem direito de voto, não vemos razão para que não possa subscrever uma iniciativa legislativa popular.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Em quarto lugar, gostaria de referir alguns princípios, que, pensamos, devem nortear este processo legislativo, desde logo o princípio de simplicidade. Cremos que não deve haver um rigor excessivo relativamente à formalização das iniciativas. Somos, aliás, da opinião que deve haver um princípio de colaboração da Assembleia da República e dos seus serviços no que toca às iniciativas que sejam apresentadas por cidadãos.
Naturalmente, poderá dizer-se que um grupo de cidadãos tão significativo conseguirá certamente arranjar juristas qualificados para articularem convenientemente a iniciativa. Contudo, parece-nos que este é um direito dos cidadãos e não necessariamente um direito dos juristas. Por isso, deve reconhecer-se aos cidadãos alguma liberdade relativamente à forma que adoptam na sua iniciativa, e também que a Assembleia possa ajudar a aperfeiçoar a iniciativa, se for caso disso.
Por outro lado, julgamos ser importante o princípio de participação e de informação permanente dos proponentes das iniciativas legislativas, que devem ser não apenas convidados, mas inclusive ter o direito de reunir com a Comissão competente da Assembleia para apresentarem as suas razões e dialogarem sobre a iniciativa que apresentam. Devem ainda ser atempadamente informados sobre todos os passos que a respectiva iniciativa dê na Assembleia da República.
Por fim, pensamos que devem ser estabelecidos prazos estritos para a apreciação das iniciativas.
Como teremos oportunidade de dizer daqui a pouco, a propósito do direito de petição, conferir aos cidadãos um direito a exercer perante a Assembleia da República e depois não estabelecer qualquer limite quanto aos prazos para apreciação dessas iniciativas não prestigia a Assembleia e não prestigia o exercício dos direitos de participação por parte dos cidadãos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Por conseguinte, quando alguém apresenta uma iniciativa legislativa perante a Assembleia, para a qual reúne o número de assinaturas (que não sabemos ainda qual será, mas que em todo o caso será um número significativo), não é concebível que os meses e os anos passem sem que a Assembleia se pronuncie efectivamente sobre essa iniciativa. Isso não pode acontecer de maneira nenhuma!
Por isso, é preciso que sejam estabelecidos prazos estritos, desde logo para a elaboração do relatório e, findo esse prazo, agendamento para Plenário, devendo também haver, em caso de aprovação na generalidade, um prazo para as votações na especialidade e final global. São estes os princípios pelos quais nos norteamos neste processo legislativo.
Termino, Sr. Presidente, deixando um apelo final, com o qual, aliás, dei início à minha intervenção, que é o de

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que façamos esta lei sem mais demoras. Estão reunidas todas as condições para que isso possa acontecer. Seria importante se, até ao fim do ano, ou pelo menos nos próximos meses, conseguíssemos, efectivamente, aprovar a lei da iniciativa legislativa popular, que já há vários anos poderia ter sido aprovada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Sr. Presidente, nas intervenções que foram já produzidas no âmbito deste debate, resultou clara a importância deste tipo de iniciativa e resultou claro o caminho no sentido de ser alcançado, no Parlamento, um consenso sobre esta matéria. É evidente que todos os projectos que aqui foram apresentados contêm disposições que não são bem iguais, são divergentes, e naturalmente que, em sede de especialidade, teremos oportunidade de escalpelizar essas questões e de, porventura, promover esse mesmo consenso.
No entanto, relativamente à intervenção do Sr. Deputado António Filipe, há um reparo que não posso deixar de fazer, que tem que ver com o número de assinaturas exigido, isto é, com o direito de titularidade da iniciativa legislativa popular.
No artigo 2.º do seu projecto de lei, o PCP propõe o número de 5000 assinaturas, fundamentando-o, no preâmbulo, com o facto de ser aquele o número necessário para a constituição de um partido político. Parece-me, no entanto, que esse fundamento não deve ser acolhido, até porque alguns partidos políticos, nomeadamente os que são constituídos mas que não têm assento parlamentar, não têm, eles próprios, legitimidade para poderem apresentar este tipo de iniciativa. Creio, pois, que fazer essa correlação não seja o fundamento mais correcto.
Por outro lado, o Sr. Deputado adiantou um outro argumento, que tem que ver com a possibilidade de a exigência de um número exagerado de assinaturas poder levar à dissuasão relativamente à apresentação deste tipo de iniciativas.
Devo lembrar que uma iniciativa legislativa deve, naturalmente, merecer ponderação, deve corresponder a uma vontade mais ou menos expressiva da sociedade portuguesa em relação a determinada matéria, e portanto, conforme disse o Sr. Deputado, há que alcançar um critério que seja mais ou menos razoável. Parece-me, todavia, que as 5000 assinaturas não correspondem a esse critério, porque há outros instrumentos, para questões que não tenham essa ponderação ou essa organização - nomeadamente a apresentação de uma petição que possa pedir que a Assembleia da República e os grupos parlamentares tomem determinada iniciativa legislativa num determinado sentido -, que poderão colmatar uma falha desse género.
Em face disto, gostaria que clarificasse o fundamento desta sua proposta, para que melhor se possa apreender o porquê de considerar as 5000 assinaturas um critério razoável.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, independentemente do número de 5000 assinaturas que propõe, a que me irei referir na minha intervenção, gostaria de colocar-lhe uma questão sobre o articulado.
O Partido Comunista dispensa o articulado para que este, depois, possa ser trabalhado aqui. Naturalmente que este privilégio não é dado a um Deputado, mesmo que não seja um especialista em articulados...
Pergunto-lhe, Sr. Deputado: em 5000 pessoas que subscrevam uma iniciativa legislativa não haverá umas 10 que saibam articular e apresentar um projecto como deve ser?!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, agradeço as questões colocadas, às quais responderei com brevidade, começando desde já por responder ao Sr. Deputado Luís Montenegro.
O Sr. Deputado critica o número de assinaturas proposto pelo PCP, argumentando que estabelecemos uma comparação com o número de assinaturas necessário para constituição de um partido.
Na verdade, entendemos não fazer muito sentido que com 5000 assinaturas se possa constituir um partido político e não se possa apresentar uma iniciativa legislativa popular! O Sr. Deputado vem dizer que esse argumento não colhe, porque há partidos que se constituem mas que, depois, não elegem Deputados, e que, portanto, nesse caso, não têm legitimidade para apresentar iniciativas legislativas populares. Sr. Deputado, esse argumento é perfeitamente reversível, porque se os cidadãos podem eleger Deputados então não precisam da iniciativa legislativa popular para nada, elegem os Deputados e os Deputados apresentam-nas.

Risos do PCP.

Portanto, esse tipo de argumentação vale o que vale.
O que importa, de facto, discutir é o número de assinaturas que pensamos ser razoável. E, devo dizer-lhe, parece-nos que o número de 5000 é razoável!
Não sei se o Sr. Deputado já teve a experiência de tentar recolher 5000 assinaturas. Nós temos essa experiência de há muitos anos, não propriamente de 5000 mas de 7500 assinaturas, quando há eleições presidenciais. E, como temos participado nesse trabalho, sabemos que não é fácil conseguir reunir um número significativo de assinaturas com o número de bilhete de identidade, com o número de eleitor... Não se trata apenas de recolher assinaturas numa estação de comboio, trata-se de encontrar 5000 cidadãos que se disponham a dar a cara, digamos assim, por uma iniciativa.
Parece-me, pois, que o número de 5000 assinaturas é razoável, porque é a Assembleia que vai decidir, não são os cidadãos. Portanto, é nesse sentido que entendemos que o número de assinaturas não deve ser dissuasor da participação mas, sim, incentivador à participação.
Sr. Deputado Narana Coissoró, é óbvio que, verificando as várias iniciativas legislativas…

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O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Cocluo de imediato, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Narana Coissoró, em nosso entender, esta deve ser uma iniciativa facultada aos cidadãos e não apenas, necessariamente, a juristas. Dir-me-á que, na sua esmagadora maioria, as iniciativas que fossem apresentadas viriam articuladas. Ainda bem que é assim! Mas, para nós, o fundamental é que os cidadãos indiquem exactamente as alterações que pretendem ver introduzidas na ordem jurídica. Portanto, isto não deveria depender da forma mas, sim, da validade quanto ao conteúdo. Para nós, é essencial que ninguém deixe de apresentar iniciativas pelo facto de não ter um jurista à sua disposição para as poder elaborar correctamente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Marinho.

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A iniciativa legislativa constitucionalmente consagrada esteve exclusivamente no domínio dos órgãos saídos da democracia representativa até à revisão constitucional de 1997. Pertencia em exclusivo aos Deputados, aos grupos parlamentares e ao Governo legislar sobre matérias da sua competência exclusiva ou de competência concorrente.
Quanto à competência legislativa de reserva absoluta da Assembleia da República, temos actualmente a matéria constante dos artigos 161.º e 164.º da Constituição.
Quanto à competência exclusiva do Governo, temos as matérias decorrentes do artigo 198.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2.
Por seu turno, o artigo 165.º da Constituição consagra as matérias de reserva relativa da Assembleia da República, o mesmo é dizer de competência concorrente entre o Governo e a Assembleia.
Foi assim que, até 1997, vigorou a iniciativa legislativa de base representativa. Porém, quis o legislador - entenda-se os Deputados da Assembleia da República, em momento em que esta assumiu poderes de revisão - ir mais além e alargar o âmbito da iniciativa legislativa.
O objectivo, se aparentemente simples, foi também generoso e grandioso: deixar para trás o momento em que apenas os representantes do povo podiam legislar para deixar o povo participar na actividade legislativa democrática e poder, por isso, apresentar as suas próprias iniciativas de lei.
É, pois, dado esse novo e importante passo de ampliar o âmbito da democracia participativa, já consagrada nos institutos da petição e do referendo, por forma a possibilitar a intervenção legislativa popular.
Assim, a quarta revisão constitucional dá origem à Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro, que consagra este novo instituto.
Pode não ter sido pacífica a discussão, pode não ter sido fácil alcançar o objectivo, mas o facto é que, no final, esta norma constitucional foi aprovada por unanimidade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Chegados aqui, isto é, modificado o texto constitucional, impunha-se o passo seguinte, que é o de dar concretização prática, por via de lei ordinária, à iniciativa legislativa popular. Impunha-se, tão-só, a sua regulamentação.
De 1997 até à presente data, vissicitudes várias, que não cumpre agora e aqui aflorar, motivaram que tal norma constitucional ainda hoje seja letra morta. Falta-lhe precisamente o que iremos, com toda a certeza, suprir. E é com satisfação e apreço que constatamos o empenho de todos os grupos parlamentares para se alcançar tal objectivo. No entanto, isto não quer significar, pelo contrário, que todos pensemos de igual forma e que bastaria um dos projectos de lei hoje em apreciação para solver o problema. De modo algum!
São quatro os projectos de lei em debate e, se todos possuem normas similares, também deles decorrem as naturais diferenças de pensamento quanto à concretização legal do instituto da iniciativa legislativa popular. E a verdade é que não são nem tão poucas nem tão insignificantes as diferenças.
Impõe-se, por isso, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, fazer, ainda que de forma sumária, uma análise àquelas que são as diferenças de substância dos diversos projectos de lei em apreciação.
Desde logo, e pela sua importância, ater-nos-emos no objecto.
O PSD e o CDS-PP, o PCP e o Bloco de Esquerda prevêem a amplitude máxima para as iniciativas legislativas populares, ainda que nos respectivos textos o digam de forma diferente.

Pausa.

Sr. Presidente, agradecia que se fizesse algum silêncio na Sala. Assim é praticamente impossível continuar a minha intervenção.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos que criem as condições para que o Sr. Deputado Eugénio Marinho possa ser ouvido.

O Orador: - Obrigado, Sr. Presidente.
Com efeito, estes grupos parlamentares consagram, nos seus respectivos projectos de lei, a possibilidade de os cidadãos apresentarem iniciativas legislativas em todas as matérias sobre as quais a Assembleia da República pode legislar, em exclusivo ou concorrentemente, nos termos dos artigos 161.º, 164.º e 165.º da Constituição, à excepção, como é evidente, das matérias que apenas pelos Deputados podem ser tratadas, como, por exemplo, de revisão constitucional, da competência exclusiva do Governo ou das regiões autónomas.
Se assim não fosse, as iniciativas legislativas populares iriam além das próprias possibilidades desta Assembleia, o que seria, necessariamente, inconstitucional.
Curioso, porém, é o texto do Partido Socialista, que é restritivo e muito aquém da transposição material do poder legislativo desta Assembleia para o alcance dos cidadãos.
Permitam-me uma nota para sublinhar que, de facto, o Sr. Deputado José Magalhães faltou à verdade, porque, em

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tempos, ele já defendeu posição diversa daquela que é hoje consagrada no texto do projecto de lei do Partido Socialista.

O Sr. José Magalhães (PS): - Como?!

O Orador: - Não se compreende o objectivo do Partido Socialista em pretender limitar a iniciativa legislativa popular às matérias da alínea i) do artigo 164.º e do artigo 165.º da Constituição.
Que receios subjacentes a tais medidas esconde o projecto de lei do Partido Socialista, quando a decisão última sobre quaisquer iniciativas legislativas populares cabe sempre a esta Assembleia? Se a Constituição não limita, por que razão deverá a lei ordinária limitar o âmbito material da iniciativa de lei popular?
Importa, necessariamente, que o PS clarifique e fundamente a sua posição.
Outra das questões a merecer controvérsia e, consequentemente, a ser plasmada nos textos dos diferentes projectos de lei com formulações diversas é a da titularidade do direito à iniciativa legislativa.
Permitam-me salientar a coerência e a consequência da posição assumida pelo PSD e pelo CDS-PP.
Com efeito, o projecto de lei n.º 145/IX, da iniciativa conjunta dos Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP, define como necessário para a abertura de processo legislativo de iniciativa popular que o mesmo seja resultado da vontade expressa por um número não inferior a 25 000 cidadãos. E este número, que não é aleatório, bem pelo contrário, surge em consequência de ser esse o número "redondo" para se fazer eleger um Deputado em Portugal.
Se a iniciativa legislativa, que se pretende abrir aos cidadãos, está hoje nas mãos dos Deputados ou do Governo, que, por sua vez, também têm origem nos resultados eleitorais, não faria qualquer sentido permitir que um número inferior a este pudesse ser suficiente para tomar iniciativas deste nível.
Aliás, da análise de outros sistemas onde a Constituição prevê a iniciativa legislativa popular, como sejam o da Espanha ou o da Itália, verifica-se até superior exigência. Em Espanha, para igual intervenção popular, são necessárias 500 000 assinaturas reconhecidas, enquanto que, em Itália, o número se queda pelas 50 000.
Sustentam o Partido Comunista Português e o Bloco de Esquerda, respectivamente, a necessidade de tais iniciativas legislativas serem subscritas apenas por 5000 ou 4000 cidadãos. Com o devido respeito, tal parece-nos completamente inaceitável. O argumento, a nosso ver errado, do PCP, de estabelecer o paralelismo com o número necessário de assinaturas para a constituição de um partido político não tem in casu qualquer correlação.
Quantos são os partidos que coexistem no nosso sistema político que lograram obter resultados eleitorais que lhes permitam ter voz nesta Assembleia e que, apesar de se submeterem a sufrágio, não conseguem reunir um número de votos necessário para poderem tomar aqui assento!
É, pois, óbvio que não podem proceder as pretensões do PCP e do BE, sob pena de podermos estar a transformar esta Assembleia num local de debate de iniciativas legislativas não sustentadas e até infundamentadas, banalizando a actividade parlamentar.
Numa última palavra, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, está prestes a concretizar-se mais uma conquista para a sociedade civil, fruto de uma atitude de abertura do poder político parlamentar. Esta e outras serão sempre as melhores respostas àqueles que todos os dias se preocupam em denegrir a instituição parlamentar e em fazer crer à população que esta Casa não serve o desígnio nacional para que está talhada. Mas, quer queiram quer não, esta é e será sempre a Casa da democracia, a Casa de todo o povo português.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, chegados à hora regimental das votações, vamos interromper o debate a que temos estado a proceder.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a sua interpelação tem a ver com algum assunto que não pode ficar para o final das votações?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, o assunto tem correlação directa com a intervenção que acabou de ser feita, mas pode esperar pelo final das votações. Mas o Sr. Presidente decidirá da sua oportunidade, pelo que qualquer decisão que tome será adequada.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, sendo assim, concedo-lhe a palavra para interpelar a Mesa a seguir ao período de votações.
Sr.as e Srs. Deputados, antes de darmos início às votações agendadas para hoje, quero apelar, uma vez mais, para que não utilizem telemóvel no Hemiciclo. É sabido que a utilização de telemóveis interfere com o sistema de som da Sala - as razões não as sei explicar, mas é o que acontece -, o que prejudica o funcionamento do Parlamento.
Aliás, está colocado, na porta de entrada da Sala das Sessões, um aviso nesse sentido, pelo que peço a compreensão de todos para que, de forma alguma, não utilizem telemóveis durante os nossos trabalhos.
Como já várias vezes tenho assinalado, temos, felizmente, enormes corredores e uns Passos Perdidos de grande beleza, onde se podem fazer conversas laterais e telefonemas.
Srs. Deputados, vamos, então, proceder às votações.
A Mesa, após contagem, verificou a presença na Sala de 97 Deputados do PSD, de 64 Deputados do PS, de 12 Deputados do CDS-PP, de 8 Deputados do PCP, de 3 Deputados do BE e de 2 Deputados de Os Verdes, o que dá um quórum mais do que suficiente para procedermos às votações agendadas para hoje.
Vamos, em primeiro lugar, proceder à votação do voto n.º 24/IX - De protesto pelo ataque terrorista na ilha de Bali, na Indonésia (Presidente da AR), para o qual não foi solicitado tempo de apreciação, pelo que, antecipando, de alguma forma, a orientação que o Regimento revisto propõe, vamos proceder imediatamente à sua votação.

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Voto n.º 24/IX
De protesto pelo ataque terrorista na ilha de Bali,
na Indonésia

No passado dia 12 de Outubro, em Bali, na Indonésia, o Mundo assistiu, horrorizado e atónito, uma vez mais, a um brutal e arrasador ataque terrorista.
Este acto criminoso provocou centenas de vítimas, entre mortos e feridos, quase todos turistas provenientes de países diversíssimos, e confirma a grande prioridade da luta antiterrorista na agenda internacional.
Sublinha-se, assim, a importância da cooperação entre todos os Estados na luta contra o terrorismo e na defesa dos Direitos Humanos.
A Assembleia da República manifesta o seu protesto veemente pela acção terrorista e pelo massacre que ocasionou, condenando firmemente os seus autores, que devem ser julgados por este crime hediondo.
A Assembleia da República manifesta o seu repúdio contra o fanatismo religioso que se exprime na exclusão ou aniquilação de outros seres humanos e condena veementemente o terrorismo e a luta pelo poder, que se afirma através do massacre de cidadãos inocentes.
A Assembleia da República manifesta o seu profundo pesar pelas vidas perdidas; exprime a sua simpatia às famílias das vítimas e, através do respectivo Parlamento, à Indonésia, que foi atingida por este atentado; e endereça a expressão da sua solidariedade às famílias portuguesas afectadas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, irei transmitir este voto, quanto antes, ao Presidente da Câmara dos Deputados da Indonésia.
De seguida, Srs. Deputados, passamos ao voto n.º 25/IX - De pesar pelo falecimento de Mário Castrim (PCP).
Para uma intervenção, em nome da bancada do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
Dispõe, para o efeito, de 3 minutos.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com enorme tristeza que encaramos o falecimento de Mário Castrim.
Mário Castrim era, como se sabe, membro do PCP há muitos anos e era um daqueles cidadãos de que qualquer partido se pode e deve orgulhar de contar entre os seus.
Mário Castrim era um homem de convicções, era um lutador pelas suas convicções em todas as esferas da vida.
Com o seu falecimento desaparece uma das mais marcantes referências intelectuais, culturais e cívicas de várias gerações de portugueses.
Foi na escrita que Mário Castrim mais se notabilizou, e notabilizou-se a tal ponto que o seu pseudónimo literário - Mário Castrim - se sobrepôs, até para os seus amigos mais próximos, ao seu nome civil, Manuel Nunes da Fonseca.
O maior tributo e as mais comovidas homenagens foram prestados a Mário Castrim, em inúmeros artigos dedicados ao seu falecimento, por muitos jornalistas, oficiais do seu ofício, particularmente os críticos de televisão, que, unanimemente, o reconhecem como o fundador da crítica de televisão em Portugal e como um dos mais exímios cultores desse género jornalístico ao longo de mais de 40 anos nas páginas do Diário de Lisboa e, mais recentemente, no semanário Tal & Qual.
Com o seu rigor, frontalidade, ironia, coragem, sensibilidade, talento e generosidade, Mário Castrim lutou incansavelmente pela dignificação da actividade televisiva em Portugal e pelo respeito para com os milhões de portugueses que vêem diariamente televisão.
Mário Castrim não se notabilizou apenas como crítico de televisão, mas também por uma obra literária de mérito e pela sua acção à frente do "Suplemento Juvenil" do Diário de Lisboa, a quem devemos a revelação de muitos jovens talentos que se viriam a tornar grandes nomes da literatura e do jornalismo.
O falecimento de Mário Castrim deixa um vazio no jornalismo, na literatura e na vida cívica do nosso país.
Em nome do Grupo Parlamentar do PCP, expressamos o nosso maior pesar pelo falecimento deste nosso amigo e camarada, enviamos um forte abraço de solidariedade à companheira da sua vida, Alice Vieira, e aos seus filhos André e Catarina Fonseca e agradecemos as condolências que têm sido apresentadas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 25/IX - De pesar pelo falecimento de Mário Castrim (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Voto n.º 25/IX
De pesar pelo falecimento de Mário Castrim

Com o falecimento de Mário Castrim, militante de muitas décadas do Partido Comunista Português, desaparece uma das mais marcantes referências intelectuais, culturais e cívicas de gerações de portugueses.
Poucas figuras haverá no nosso presente que com tanta discrição pessoal tenham exercido tão larga influência pública, pela coragem intelectual, pela sensibilidade, pela verticalidade de carácter, pela implacável independência crítica e pela generosidade.
Mário Castrim foi e será uma referência de uma forma exemplar de resistir, pelo simples rigor da inteligência, pelo combate diário contra a mediocridade e a ignorância, por uma cultura emancipadora.
Poeta, escritor, pedagogo, crítico, generoso inventor de espaços para jovens criadores literários, de Mário Castrim ficará muito mais do que a agudeza fulgurante com que analisou a "caixa que mudou o mundo", ficará o legado de um desses homens que, com a inteligência, a palavra e o sonho, mudam efectivamente o mundo.
Por isso, a Assembleia da República presta sentida homenagem à figura de Mário Castrim, exprime a sua profunda mágoa pelo seu desaparecimento e endereça a toda a família as sentidas condolências pela irreparável perda.

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O Sr. Presidente: - Conforme é usual, e em respeito para com o falecido e pela dignidade da própria morte, peço a todos que guardemos 1 minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 22/IX - Autoriza o Governo a alterar o Decreto-Lei n.º 177/2001, de 4 de Junho, que alterou o Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, que estabeleceu o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, como se trata de uma lei de autorização, temos de a votar também na especialidade e em votação final global, e, uma vez que existe consenso, vamos proceder a estas votações em conjunto.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 140/IX - Cria uma base de dados em que constam as informações a prestar pelas instituições de crédito mutuantes em relação a cada um dos contratos de empréstimo bonificado à habitação (PS).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Sr. Presidente, é para proferir uma declaração de voto, em nome da bancada do Partido Socialista, sobre a votação que acaba de ter lugar.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada embaraça-me, porque não me lembro se é ou não regimental a apresentação de uma declaração de voto imediatamente a seguir. Mas vou socorrer-me do parecer dos Srs. Secretários da Mesa.

Pausa.

Segundo me informam, a declaração de voto só poderá ser feita no final das outras votações.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é para me pronunciar sobre o que o Sr. Presidente acabou de referir à Câmara.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, com o devido respeito, nos termos do Regimento, só há direito a declarações de voto orais nas votações finais globais. Portanto, neste caso, qualquer Sr. Deputado que queira proferir uma declaração de voto terá de o fazer por escrito.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, de acordo com o n.º 3 do artigo 164.º do Regimento, parece-me que, em termos literais, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes tem razão: a declaração de voto oral está prevista no final da votação final global, o que não é o caso.
De todo o modo, o Sr. Deputado José Magalhães, que pediu a palavra, talvez tenha uma interpretação que possa ajudar a Mesa.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, julgo que V. Ex.ª fez a interpretação correcta quando previu que a palavra fosse concedida para uma declaração de voto no final das restantes votações. O que a reforma do Regimento da autoria do Deputado Silva Marques quis foi que houvesse uma conglobação das declarações de voto.
Quando uma iniciativa é rejeitada na generalidade, é evidente que nunca poderá haver, tecnicamente, uma votação final global. No entanto, terá de haver uma palavra final sobre o "óbito" dessa iniciativa, mas deve ter lugar no termo de todas as votações. Tem sido esta a interpretação do Regimento.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Naturalmente que a maioria PSD/CDS-PP pode inverter esta interpretação do Regimento. Mas, Sr. Presidente, parece-me que a outra interpretação era mais avisada.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, para já, reservo para o final do período de votações a questão da concessão da palavra para declaração de voto. Entretanto, enquanto procedemos às outras votações, vou pensar e verificar se há efectivamente precedência nesta matéria.
A interpretação literal do Regimento não deixa quaisquer dúvidas, mas admito que haja, Sr. Deputado José Magalhães, uma interpretação e uma praxe que vão no sentido das suas declarações.
Vamos, pois, passar à votação seguinte. Trata-se de um requerimento de avocação pelo Plenário, apresentado pelo PS, da discussão e votação, na especialidade, do artigo 26.º da proposta de lei n.º 17/IX - Aprova o estatuto do aluno do ensino não superior.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Granada para proceder à leitura do requerimento. Dispõe de 2 minutos.

A Sr.ª Cristina Granada (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Considerando que o artigo 26.º da proposta de lei n.º 17/IX, que aprova o estatuto do aluno do ensino não superior, define as medidas disciplinares preventivas e de integração e não contempla, relativamente à medida de "Advertência", a comunicação aos pais e encarregados de educação, de modo a permitir-lhes intervir,

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atempadamente, impedindo o agravamento da situação dos seus educandos;
Considerando que o incentivo a uma maior participação dos pais e dos encarregados de educação na vida escolar dos seus educandos, quer pessoalmente, quer pelas estruturas que os representam, não está suficientemente defendido, também pelo que se prevê nos artigos 41.º, 53.º e 54.º da mesma proposta de lei;
Considerando que a cooperação desejada entre a escola e a família passa, não só pelo acesso passivo dos pais e encarregados de educação à escola, quando solicitados, para conhecer e subscrever o regulamento a que estão sujeitos, mas também pela activa participação na construção do regulamento e do próprio processo educativo dos seus educandos;
Considerando que é necessário valorizar explicitamente a intervenção das famílias na vivência escolar dos seus educandos, quando se torna cada vez mais evidente o seu afastamento em relação ao processo educativo dos jovens, provocando assim uma lacuna socialmente gravosa no que concerne ao desenvolvimento integrado do indivíduo;
Os Deputados do Partido Socialista, vêm, nos termos do disposto no Regimento da Assembleia da República, requerer a avocação pelo Plenário da discussão e votação na especialidade do artigo 26.º da proposta de lei n.º 17/IX, que aprova o estatuto do aluno do ensino não superior.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar este requerimento.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos agora proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo à proposta de lei n.º 17/IX - Aprova o estatuto do aluno do ensino não superior.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PS.

A Sr.ª Ana Benavente (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Benavente (PS): - Sr. Presidente, é para comunicar que fizemos chegar à Mesa um requerimento no sentido de solicitar ao Sr. Presidente que, oficiosamente, nos termos da respectiva Lei de Bases, altere a designação deste diploma de "ensino não superior" para "educação básica e secundária".

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. ª Deputada, efectivamente recebi esse requerimento e estou a estudar a maneira de lhe dar andamento.
Seguidamente, vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, relativo à proposta de lei n.º 20/IX - Aprova as bases gerais do sistema de segurança social.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, é apenas para anunciar que, em meu nome próprio e no de um grupo de Deputados do Partido Socialista, apresentaremos uma declaração de voto por escrito sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - É regimental, fica registado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é para, em relação ao que acaba de ser aprovado, requerer a dispensa de redacção final, dada a urgência da publicação desta lei.

Protestos do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PSD): - Sr. Presidente, é, precisamente, para interpelar a Mesa no sentido de que se clarifique em que termos é que é apresentado este requerimento e com que fundamentos, uma vez que, sendo complexo…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Estão a brincar connosco!

O Sr. José Magalhães (PSD): - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, não se escandalize! Mil vezes eu tive ocasião de pedir a dispensa de redacção final, sempre por consenso, julgo eu - talvez tenha havido duas ou três excepções -, e sempre foi necessário fundamentar. Porquê? Em geral, por se tratar de casos muito simples.
Em diplomas de grande complexidade, como uma lei estruturante deste tipo, aconselha a prudência mínima que a Comissão tenha ocasião de reponderar e de rever, à vírgula, as soluções que foram aprovadas.

Vozes do PS: - Claro!

O Orador: - Ainda por cima, esta lei não teve um processo de votação especialmente tranquilo, nem especialmente sereno nem especialmente cuidados - que o digam os meus camaradas da bancada, como disseram.

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Protestos do PSD e do CDS-PP.

Portanto, devo dizer, Sr. Presidente, estamos aqui a agir em nome da República e não por qualquer interesse sectário!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Nem me passaria pela cabeça que houvesse outra preocupação da parte de qualquer Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa no mesmo sentido.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, também gostaríamos de ver mais fundamentada a razão deste pedido da bancada do PSD, tanto mais que a votação em comissão decorreu há largo tempo, teve múltiplas propostas de alterações em sede de especialidade,…

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

O Orador: - … havendo, seguramente, acertos de redacção final a fazer. Portanto, em nossa opinião, entendemos que este pedido de dispensa de redacção final não se adequa à necessidade de termos uma lei redigida em termos adequados e normais e não vemos qual é a urgência que está em causa.
Nesse sentido, era preciso que a bancada do PSD fundamentasse melhor este requerimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - As interpelações têm sido sobretudo dirigidas à bancada do PSD.
Pretende o PSD dar algum esclarecimento sobre o seu requerimento?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - O requerimento deve ser votado sem discussão, mas podia haver um esclarecimento.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Para invocar o Regimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, o artigo 165.º estabelece como regra que os diplomas estão sujeitos a redacção final. Já por diversas vezes o Plenário tem dispensado a redacção final, mas tem-no feito - e, provavelmente, neste caso, até o deve fazer - desde que sejam conhecidas razões fundamentadas para isso.
A única coisa que foi pedida ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes, que suscitou o problema, é que se digne explicar à Câmara quais os fundamentos que justificam a dispensa da redacção final. Provavelmente, nós até lhe daremos razão, mas o Sr. Deputado Luís Marques Guedes há-de compreender que esta não é propriamente uma "bancada de tabelião", que estamos aqui disponíveis para "cumprir o despacho de V. Ex.ª" que diz "faça-se" e nós fazemos...!

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Portanto, o Sr. Deputado tem de, simplesmente, dignar-se a explicar qual é a razão por que pede dispensa de redacção final!

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, apelo à sua devida mediação, porque é absurdo criarmos um incidente por simples birra do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, que entende que não tem de dar satisfações à Câmara e que a Câmara vota sem mais!
Só podemos saber se votamos a favor, contra ou nos abstemos se conhecermos as razões que fundamentam o pedido. Certamente serão razões atendíveis, senão o Sr. Deputado Luís Marques Guedes nunca o teria suscitado, mas o mínimo que pode fazer é dignar-se explicar quais são essas razões.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, qual é o objecto do seu pedido de intervenção?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É sobre a condução dos trabalhos e para invocar o Regimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, a leitura que fazemos do Regimento é que do processo legislativo consta uma das fases, que é a redacção final. No artigo 165.º, que é o que determina as condições em que se faz a redacção final, não está prevista a figura da dispensa.
Tem sido utilizada a dispensa de redacção final por acordo de todas as bancadas, afastando a aplicação desta norma regimental em cada caso concreto.
Ora, neste caso, é exactamente isto que tem de acontecer, Sr. Presidente. Ou seja, se não houver consenso de todas as bancadas para que não se aplique o que está previsto no Regimento, terá de aplicar-se o prazo previsto no Regimento, pelo menos o supletivo, para que a comissão respectiva faça a redacção final.

Vozes do PCP e do BE: - Muito bem!

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O Sr. António Filipe (PCP): - Não pode rever-se o Regimento por requerimento!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Bernardino Soares, devo dizer-lhe que aquilo que diz o artigo 165.º do Regimento é que "A redacção final efectua-se no prazo que a Assembleia ou o Presidente estabeleçam ou, na falta de fixação, no prazo de cinco dias.", o que significa que a Assembleia é soberana para marcar o prazo zero. Parece-me óbvio e decorrente do Regimento.
Para interpelar à Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Venda.

A Sr.ª Teresa Venda (PS): - Sr. Presidente, pedi a palavra para que ficasse registado que o meu sentido de voto, na votação final global da proposta de lei n.º 20/IX, foi o da abstenção e que vou entregar uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Muito bem, fica registado, Sr.ª Deputada. E, sendo assim, o resultado da votação da proposta de lei n.º 20/IX é o seguinte: votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção da Deputada do PS Teresa Venda.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Suponho que também seja para invocar o Regimento, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Não, Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, é somente para lembrar - salvo melhor memória - que a interpretação do Sr. Deputado Bernardino Soares não tem qualquer provimento.
O que é prática normal, perante um requerimento, que foi o que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes fez, é a decisão da Câmara ser maioritária.

Protestos do PS, do PCP e do BE.

Quanto à invocação da urgência, é evidente que ela só pode ser, na minha opinião (o Sr. Deputado Luís Marques Guedes o dirá), a urgência que a maioria e o Governo têm em implementar uma matéria que é fundamental para o País e é necessário que entre em vigor para permitir que a reforma se faça! Não vejo outra necessidade!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, permita-me discordar da interpretação que fez há pouco.
É verdade que a Assembleia pode, legitimamente, fixar qualquer prazo, mas, se não houver consenso, tem de proceder-se à redacção final, nem que seja aqui, já a seguir. Agora, Sr. Presidente, essa redacção final tem de ser feita, qualquer que seja o prazo estabelecido pela Assembleia.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Bernardino Soares, devo dizer-lhe, sem prejuízo do grande esforço da sua argumentação, que a mim não me convence, mas pode convencer a Câmara.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, de facto, muito gosta a oposição de discutir o sexo dos anjos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - O quê?!

O Orador: - Se fosse para decidir o prazo,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Então, vamos a isso!

O Orador: - … o Plenário poderia decidir, se seria de 30 minutos ou de 1 hora. Portanto, o ridículo da interpretação fica patente.

O Sr. António Costa (PS): - Qual é o fundamento?

O Orador: - Eu já o disse, Sr. Deputado António Costa, o senhor é que não me quis ouvir. Já o disse por duas vezes! O Sr. Presidente pediu-me para repetir o fundamento quando fiz o requerimento. Mas volto a repetir: é por razões de urgência na publicação.
Posso lembrar, de resto, que uma matéria desta mesma comissão, a lei de gestão hospitalar, depois de aprovada, nesta Câmara, em votação final global, esteve mais de 15 dias em comissão - oiça! - até ser enviada para promulgação para o Sr. Presidente da República.
As razões da urgência são as que invoquei, Sr. Presidente, e acrescento este exemplo.

Vozes do PS e do PCP: - Quais?

O Orador: - O Governo precisa que esta lei seja publicada rapidamente, e é por isso que pedimos a dispensa de redacção final.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, a minha interpelação é, mais uma vez, sobre o Regimento.
Creio que será consensual, e o Sr. Presidente certamente dar-me-á razão, que não estamos aqui, neste momento, a rever o Regimento.

Vozes do BE: - Claro!

Vozes do PCP: - Exactamente!

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2040 | I Série - Número 050 | 18 de Outubro de 2002

 

O Orador: - O Regimento não é "votável" em decisões avulsas, como aquela que consideramos, malgrado a sua importância.
O que o Regimento diz estritamente, e concordo com a interpretação que surgiu até agora, é que o prazo para a redacção final, se a Assembleia não fixar outro - n.º 3 do artigo 165.º - é de cinco dias (estamos a falar de segunda, terça, quarta-feiras, conforme contarmos os dias, é disto que estamos a falar) e que se entender fixar outro prazo inferior poderá fazê-lo. E, para o fazer, não basta que seja invocado o argumento da autoridade de quem tem força maioritária, porque é pouco avisado transformar um argumento sobre regras democráticas, que são as que têm de valer sempre, em qualquer circunstância, e são superiores ao casuísmo, numa verificação de um mandato de confiança da maioria.
Nesta matéria, não temos de votar se somos, ou não, seguidores do Deputado Luís Marques Guedes; o que estamos realmente a votar é se o Regimento é cumprido.
Sr. Presidente, quero pedir-lhe que contribua para que o Regimento seja superior a quezílias de interpretação ou partidárias, como as que ocorrem neste momento.
Por isso mesmo, parece-me que ou fica o prazo estabelecido, de cinco dias, ou a Assembleia fixa, nas condições em que sempre o tem feito, um outro prazo inferior, ponderada a argumentação a este respeito.

Vozes do PCP e do BE: - Exactamente!

O Sr. Artur Penedos (PS): - Peço a palavra para uma interpelação, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Artur Penedos, mas, depois, não a dou a mais ninguém, porque, a meu ver, este assunto está esclarecido, além de que não podemos ficar eternamente a discutir a questão do Regimento.
Tem a palavra, Sr. Deputado Artur Penedos.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes acaba de invocar, em favor da sua tese, o facto de a lei de gestão hospitalar ter demorado 15 dias ou três semanas na Comissão para ser publicada ou enviada para publicação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Foi mais tempo!

O Orador: - O Sr. Deputado Luís Marques Guedes esqueceu-se, deliberadamente, de dizer a esta Câmara as razões que levaram a que esse decreto saísse tão tarde da Assembleia da República, as quais se devem ao facto de o seu grupo parlamentar e de o Grupo Parlamentar do CDS-PP terem recusado uma proposta do PS,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isto tem a ver com o requerimento?

O Orador: - … subscrita e apoiada por todos os partidos da oposição, relativamente a uma norma revogatória, situação que só se resolveu mais tarde, a pedido do Governo, havendo assim um retardamento compulsivo.
Isto quer dizer que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes não tem o direito de imputar…

Protestos do Deputado do PSD Luís Marques Guedes.

… à Comissão do Trabalho e dos Assuntos Sociais a responsabilidade, que ela não tem, por um decreto ter demorado mais tempo do que deveria a ser publicado.
O que seria importante era que se tivesse em atenção que vale a pena fazer com que a redacção final desta lei de bases da segurança social passasse pela Comissão do Trabalho e dos Assuntos Sociais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, penso que a questão está sobejamente esclarecida, mas há aqui um novo problema - temos de respeitar o funcionamento da Câmara e as regras são para se cumprir.
Admito o requerimento, mas sou notificado pelo Sr. Deputado José Magalhães de que o Partido Socialista impugna o meu despacho de admissão do requerimento. Portanto, tenho de lhe dar a palavra para que apresente a sua impugnação e nós, depois, discutiremos essa questão.

Protestos do PSD.

Há uma impugnação, Srs. Deputados. Tenho pena, mas há uma impugnação.
Eu admito o requerimento, apresentado pelo PSD, de dispensa de redacção final para que seja votado, mas o Partido Socialista impugna o meu despacho de admissibilidade,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Com base em quê?!

O Sr. Presidente: - … e eu não posso deixar de dar a palavra para esse efeito.
Assim, darei a palavra ao Sr. Deputado José Magalhães e, depois, a um Deputado da maioria, e depois votaremos o recurso.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Recorre com base em quê?!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, temos de saber com que base é usada esta figura de impugnação do despacho de admissibilidade do requerimento!

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos manter todos a calma.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, temos de saber qual é a norma regimental que o Sr. Deputado José Magalhães invoca para impugnar a admissão do requerimento por parte de V. Ex.ª.

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2041 | I Série - Número 050 | 18 de Outubro de 2002

 

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, para saber isso tenho de dar a palavra ao Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Essa norma não existe, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, tem a palavra para justificar a sua impugnação.

O Sr. José Magalhães (PS). - Sr. Presidente, esta observação do Sr. Deputado Luís Marques Guedes é espantosa, porque os Deputados têm o direito de impugnar as decisões da Mesa.
A Mesa tomou uma deliberação nos termos que o Regimento autoriza, mas, cada vez que há uma deliberação, o Regimento autoriza a sua impugnação,…

Vozes do PSD: - Aonde?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não há norma!

O Orador: - … e esta regra, de resto, faz parte do código genético dos regimentos das assembleias parlamentares democráticas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ouvimos o fundamento do recurso apresentado pelo Sr. Deputado José Magalhães, em nome do Partido Socialista, e agora vamos votá-lo.

Vozes do PSD, do PS e do PCP: - Não! Não!

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, antes disso, tem de dar a palavra para a discussão!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não vou dar a palavra a ninguém, porque os requerimentos não se discutem, votam-se.

Protestos.

Srs. Deputados, não aceito mais inscrições para intervenções de qualidade nenhuma.
Vou passar imediatamente à votação do recurso do meu despacho de admissibilidade do requerimento apresentado pelo PSD.
Vamos votar.
Os Srs. Deputados que votam a favor do requerimento façam favor de se levantar…

Protestos do PS e do PCP.

Estou a pôr à votação o recurso apresentado pelo PS…

Protestos do PS.

Sr. Deputado António Costa, eu não posso perceber por gestos…

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra, para uma interpelação à Mesa

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, V. Ex.ª deu a palavra ao Sr. Deputado José Magalhães para ele interpor o recurso. Nesse momento, o Sr. Deputado Guilherme Silva e creio que também o Sr. Deputado Luís Marques Guedes insistiram para que ele esclarecesse ao abrigo de que norma é que queria usar da palavra.
Na sequência disso, o Sr. Deputado José Magalhães limitou-se, nessa primeira intervenção, a explicar por que razão tinha interposto o recurso, não chegou a expô-lo, e é isto que ele deve fazer antes de se proceder à votação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço que aguardem só 1 minuto, por favor.

Pausa.

Srs. Deputados, não há qualquer dúvida. De acordo com o artigo 90.º "Qualquer Deputado pode recorrer das decisões do Presidente ou da Mesa." e "O Deputado que tiver recorrido pode usar da palavra para fundamentar o recurso por tempo não superior a três minutos".

Vozes do PS: - É isso!

O Sr. Presidente: - Assim, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, ao abrigo do n.º 2 do artigo 90.º do Regimento, para fundamentar o seu recurso, dispondo, para o efeito, de 3 minutos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devo dizer que só um nervosismo incompreensível da maioria é que levou a que uma questão tão banal suscitasse esta perda de tempo à Câmara.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Grande lata!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, por favor, fundamente o seu recurso, e mais nada.

O Orador: - Fá-lo-ei, Sr. Presidente.
Julguei que a invocação do Regimento para este efeito era a coisa mais pacífica do mundo, só por razões conjunturais anómalas é que tal pode não ter acontecido.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, se se fizer aquilo que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes agora propôs que se fizesse, será aberto um precedente grave.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É tudo grave!

O Orador: - Aliás, esta semana está a ser assinalada por precedentes graves, do ponto de vista do funcionamento regular e democrático da Câmara.

Protestos do PSD e do CDS-PP e contraprotestos do PS.

Nesta semana, a maioria parlamentar abortou uma iniciativa da JS e do PS que visava trazer ao Plenário o

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debate sobre o crédito bonificado e, agora, pretende criar-se um outro precedente.
O instituto da redacção final é um instituto cautelar! O processo legislativo é complexo, os Deputados devem ter a possibilidade de, até ao último minuto, aperfeiçoarem tecnicamente a redacção das normas. A redacção final não serve para criar; serve, pura e simplesmente, para evitar lapsos, inexactidões e outros aspectos que possam viciar o processo legislativo.
Essa cautela, em processos legislativos simples, pode ser dispensada por unanimidade, e é assim que tem acontecido na prática desta Câmara.
Disse há bocado, e repito, que muitas vezes requeri, em nome do meu grupo parlamentar, então da maioria ou não, a dispensa de redacção final, e isto sempre aconteceu sem qualquer polémica, porque esse direito sempre foi exercido de forma criteriosa.
Interpretar a norma do Regimento como permitindo à maioria, em processos legislativos complexos, ou não, suprimir esta regra de consenso democrático para expedir para promulgação, sem esta mediação, um texto é uma atitude, por um lado, que viola o Regimento e, por outro, de grande imprudência! E devo dizer, Sr. Presidente, que é de uma imprudência tão grande que nos leva a dois avisos.
Primeiro: não julguem os Srs. Deputados da maioria que vão poder "agarrar" no diploma e, antes de enviá-lo para Belém, submetê-lo a uma revisão técnico-burocrática feita a latere da comissão parlamentar competente,…

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - … porque podem ter a certeza de que, se isso acontecer, impugnaremos o diploma por todos os meios e diremos que ele consubstancia uma fraude à Constituição e uma redacção apócrifa, feita à margem dos órgãos da Assembleia da República.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Segundo, Srs. Deputados, esta é uma questão séria e não julguem que podem compelir-nos a tomar parte naquilo que seria uma votação abusiva, contrária ao artigo 165.º do Regimento.
Portanto, os Srs. Deputados podem tentar abrir o precedente de forçar uma votação desta matéria por maioria, mas nós, garantimo-vos, não participaremos nessa votação que conduz a uma violação do Regimento, e é gravíssima!

Aplausos do PS.

Portanto, fica feita a advertência: não perpetrem esta violação da Constituição e do Regimento!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para intervir ao abrigo do artigo 90.º do Regimento, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, primeiro, quero dizer que o que aqui foi referido sobre a lei de gestão hospitalar não corresponde, efectivamente, ao que se passou. E o que está em causa é, realmente, ultrapassarmos esta técnica…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É a técnica do empata!

O Orador: -…da oposição, mas particularmente do Partido Socialista quer quando está na oposição quer quando está no governo, que é a do "arrasta, arrasta"!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Nós queremos dotar o País, rapidamente, de uma lei de bases da segurança social. E se outras razões não houvesse para pedirmos urgência e dispensa de redacção final, os senhores deram as razões todas, revelando que querem, a todo o custo, entravar a legislação e as reformas em Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, submeta à votação o recurso da sua decisão, submeta à votação o nosso requerimento e passemos às votações seguintes.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, é óbvio que estou interessadíssimo em conduzir os nossos trabalhos até ao final e, por isso, o meu desejo é o de que os incidentes procedimentais sejam reduzidos ao mínimo. Este é o meu desejo mas é evidente que sou confrontado com as iniciativas dos Srs. Deputados e não posso, de forma alguma, privá-los dessas iniciativas.
Portanto, ia agora dar a palavra ao Sr. Deputado Bernardino Soares, que também a pediu para intervir ao abrigo do que estabelece expressamente o Regimento, no n.º 5 do artigo 90.º, mas o Sr. Deputado Artur Penedos está de pé, a reclamar o uso da palavra e, por isso, tenho de saber para que efeito pretende usar dela.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, estou de pé, pela razão simples de que o Sr. Deputado Guilherme Silva acaba de dizer que é mentira aquilo que eu disse e eu não admito…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa mas, se bem ouvi, o Sr. Deputado Guilherme Silva não disse que era mentira o que o Sr. Deputado tinha dito.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Disse, disse! Disse que não era nada disso!
O Sr. Deputado Guilherme Silva mentiu a esta Câmara no momento em que produziu a afirmação que produziu e posso demonstrar por que é que…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Artur Penedos está, de alguma forma, a defender a sua honra pessoal e, por isso, não lhe posso tirar a palavra.
Peço o favor de guardarem silêncio, porque quanto mais nervosos estivermos menos facilmente chegamos ao fim dos nossos trabalhos.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, nem sequer é uma questão de honra pessoal, é uma questão de reposição da verdade.
É que a questão que se coloca, Sr. Presidente,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já ouvimos a sua explicação e parece-me que já não tem mais nada a acrescentar.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Não ouviu, não, Sr. Presidente! Não ouviu, porquanto…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, tenho o direito, como qualquer outro Sr. Deputado, de exprimir e fazer as correcções que entendo dever fazer. V. Ex.ª sabe disso perfeitamente e tem de me dar esse direito.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas não pode!

O Sr. Artur Penedos (PS): - Aquilo que lhe quero dizer, Sr. Presidente, e posso demonstrar, é que o Governo da República enviou um texto a esta Assembleia, pedindo que a lei de gestão hospitalar fosse corrigida nos aspectos que referenciei. O que isto significa e demonstra é que eu disse a verdade e o Sr. Deputado Guilherme Silva disse uma mentira!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares, ao abrigo da invocada disposição do Regimento, dispondo, para o efeito, de 3 minutos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, serei breve, pois quero apenas fazer duas observações, especialmente dirigidas, aliás, a V. Ex.ª.
A primeira observação é a de que, como todos, nesta Casa, sabemos, é raro o diploma que não necessita da redacção final para aperfeiçoamentos técnicos…

O Sr. José Magalhães (PS): - É claro!

O Orador: - … e para que o texto saia escorreito e sem nenhuma gralha.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Já vimos esse "filme"!

O Orador: - É evidente que é essa a prática e tem razão de ser. Aliás, por isso, existe, no Regimento, o artigo relativo à redacção final.
Ora, este diploma, que teve inúmeras alterações - mais de 90 propostas apresentadas pela maioria, em sede de especialidade -, sendo um diploma com uma extensão considerável, também terá, por maioria de razão, essa necessidade.
A segunda observação que quero fazer é a seguinte: não há muito tempo, vimos serem, publicamente, suscitadas dúvidas sobre uma votação efectuada nesta Casa, o que causou constrangimentos sérios ao Sr. Presidente da República em determinado momento.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - A que é que se está a referir?!

O Orador: - O que pergunto ao Sr. Presidente, através desta intervenção, é se não será avisado evitarmos qualquer tipo de incidente semelhante, com a mesma ou com outra razão, que suscite alguma fundada dúvida sobre a validade do texto que é efectivamente votado e o resultado concreto da votação que, eventualmente, viermos aqui a fazer.

O Sr. Presidente: - Ainda ao abrigo do mesmo preceito regimental, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró, dispondo igualmente de 3 minutos.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, estamos a assistir à forma mais anárquica de proceder a uma votação. V. Ex.ª há-de desculpar que diga isto, mas digo-o por várias razões.
Em primeiro lugar, não deveria haver uso de palavra por parte das várias bancadas, pelo seguinte: o Partido Socialista interpôs o recurso, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes disse que não havia lugar a recurso e V. Ex.ª, sem mais, admitiu-o. Aliás, não só o admitiu como também decidiu sobre ele e submeteu-o à votação.
O Partido Socialista desafiou a autoridade de V. Ex.ª…

O Sr. José Magalhães (PS): - De maneira nenhuma!

O Orador: - O Partido Socialista desafiou a autoridade de V. Ex.ª…

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço que façam silêncio, porque temos de ouvir o orador.

O Orador: - … quando V. Ex.ª solicitou que aqueles que votavam a favor do recurso se levantassem…

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Sr. José Magalhães (PS): - De maneira nenhuma!

O Orador: - Quando V. Ex.ª solicitou que aqueles que votavam a favor do recurso se levantassem, o Partido Socialista "fez orelhas moucas" e não se levantou, desafiando, repito, a autoridade de V. Ex.ª.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do PS.

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Há modus in rebus, há fundamentação de recurso para efeitos de tomada de decisão. Ouvem-se as alegações para tomar uma decisão, não há alegações depois da tomada de decisão! E V. Ex.ª já tinha tomado uma decisão, já tinha anunciado uma votação, razão pela qual o PS desafiou a autoridade de V. Ex.ª.
Em segundo lugar, não há qualquer entorse à lei pelo facto de não haver prazo para a revisão do texto. É que, quando não há prazo fixado, quando o prazo é absolutamente flexível, o texto pode ser votado e prescindir-se imediatamente do prazo. Quem pode o mais, pode o menos!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Há a velha máxima latina sine die debetur statim debetur, isto é, quando não há dia fixado, pode ser imediatamente exigido. É um princípio elementar de direito! Todos os juristas aqui presentes conhecem este princípio:…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Eles não o conhecem!

O Orador: - … quando não há prazo fixado, o acto pode ser imediatamente exigido. E nós, a maioria, exigimos que seja dispensado o prazo, porque o prazo é fixado no interesse do Parlamento e não de terceiros.

Vozes do PCP: - Exactamente! No interesse do Parlamento e não no da maioria!

O Orador: - E o Parlamento pode exercer o poder que tem de dispensar o prazo. Por isso, nós, a maioria, exigimos a dispensa do prazo, porque o mesmo é fixado no interesse do Parlamento e é do interesse do Parlamento que se proceda imediatamente à publicação, dispensando o prazo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, prossigamos, então, as votações.
Vamos votar, de imediato, o recurso interposto pelo Sr. Deputado José Magalhães, em nome do Partido Socialista, relativo à decisão de admissão do requerimento apresentado pelo PSD.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não dou a palavra a mais ninguém. Estamos em votações e não dou a palavra a mais ninguém! Desculpe! E não desafie a minha autoridade uma segunda vez, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP, tendo alguns Deputados do PSD aplaudido de pé.

Srs. Deputados, dispenso os aplausos, o que quero é que o Parlamento cumpra as suas obrigações.
Vamos votar, imediatamente, o requerimento apresentado pelo PSD para dispensa de redacção final em comissão.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, agora, vou ter de aplicar o Regimento! Tenho de o aplicar, porque, de acordo com ele, como todos os Deputados têm de votar, os que não votam contra nem a favor abstêm-se.
Assim sendo, o requerimento de dispensa de redacção final em comissão considera-se aprovado, com votos favoráveis do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É isso que refere, expressamente, o nosso Regimento, no artigo 102.º, n.º 2: "Nenhum Deputado presente pode deixar de votar, sem prejuízo do direito de abstenção".
Portanto, Srs. Deputados, como tenho de anunciar, do alto desta tribuna, o resultado da votação, a minha interpretação desse resultado é aquela que acabei de referir.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, para interpelar a Mesa, no sentido de ficar devidamente registada em Acta a posição do Partido Socialista quanto a esta votação.
Pedi a palavra ao Sr. Presidente antes da votação - o Sr. Presidente entendeu que não ma devia conceder e respeito-o -, porque pretendia informar V. Ex.ª e a Câmara de que, tratando-se de uma votação ilegal, por violação do Regimento, não participaríamos na mesma. E não participámos na votação!
Portanto, ao contrário da interpretação da Mesa, o nosso sentido de voto não foi o de abstenção. Nós não exercemos o direito de voto nesta votação!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por favor, façam silêncio, vamos tentar ouvir cada um por sua vez.
Sr. Deputado António Costa, está no uso da palavra, faça o favor de prosseguir.

O Orador: - O Regimento estabelece que os Deputados que estão na Sala não podem deixar de participar nas votações mas gostaria que ficasse claro, para o Sr. Presidente, que nós, estando presentes, não participámos nesta votação.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - É jurista e foi Ministro da Justiça!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, o assunto é demasiado sério para que lhe possa dizer mais do que isto: registo a sua declaração e ela consta da nossa Acta.
O Sr. Deputado Jerónimo de Sousa inscreveu-se para fazer uma declaração de voto mas há ainda uma votação final global, pelo que lhe darei a palavra no final das votações.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo à proposta de lei n.º 12/IX - Aprova o regime jurídico do desenvolvimento e qualidade do ensino superior.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Augusto Santos Silva (PS): - Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Augusto Santos Silva (PS): - Quero fazer uma declaração de voto, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - É em relação a este último diploma, Sr. Deputado?

O Sr. Augusto Santos Silva (PS): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado. Então, como há declarações de voto relativas a diplomas votados anteriormente, o Sr. Deputado, decerto, concordará que lhe dê a palavra depois de a dar aos outros Srs. Deputados inscritos…

O Sr. Augusto Santos Silva (PS): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que, em nome do Bloco de Esquerda, também vamos entregar uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, permite-me que faça uma interpelação à Mesa?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, já me havia inscrito há pouco, mas houve aqui alguma descoordenação, para dizer que também entendemos não expressar o nosso sentido de voto na votação anterior, porque não encontrámos norma regimental que fundamentasse a apresentação do requerimento.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado, fica registado em Acta.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se não se importa, vou dar a palavra, em primeiro lugar, aos Srs. Deputados que pretendem apresentar declarações de voto.

Pausa.

Visto não haver objecções, vou dar a palavra ao primeiro orador inscrito, que é a da Sr.ª Deputada Jamila Madeira, embora tenha algumas dúvidas sobre se a Sr.ª Deputada pode ou não produzir a declaração de voto, mas para ouvir a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativamente a esta matéria gastaríamos muito mais do que os 3 minutos que vou conceder, nos termos do Regimento.
Portanto, sem com isto pretender abrir um precedente na minha interpretação do Regimento, tem a palavra, para uma declaração de voto, a Sr.ª Deputada Jamila Madeira.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Sr. Presidente, vou proferir uma declaração de voto sobre a votação do projecto de lei n.º 140/IX.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, as alterações apresentadas pelo Governo de coligação PSD/PP em sede de Orçamento do Estado rectificativo de 2002 estão na base da proposta legislativa que sustenta esta declaração de voto.
Consideram os Deputados do PS Jamila Madeira, Jorge Coelho, Vitalino Canas, Afonso Candal, Ascenso Simões, Paulo Pedroso, José Magalhães, António Costa, Leonor Coutinho, Luísa Portugal, José Apolinário que o fim do crédito bonificado para aquisição de casa própria é um retrocesso brutal na construção de uma juventude portuguesa que se quer dinâmica, empreendedora e, sobretudo, independente. As propostas efectuadas visavam a sua reposição e a criação de mecanismos desincentivadores da fraude e seu eficaz combate, mas a maioria parlamentar afecta ao Governo impediu o agendamento do projecto de lei que repõe o crédito bonificado, invocando uma inconstitucionalidade, que nunca demonstrou.
Regista-se que os Deputados da maioria não hesitaram em impugnar uma decisão do Presidente da Assembleia da República, conduzindo a uma injustificada desautorização do mesmo. O Presidente da Assembleia da República já havia admitido o projecto de lei, não cabe à Assembleia da República, em sede de impugnação, substituir-se ao Tribunal Constitucional.
Depois de um momento triste, mas único, da democracia portuguesa, depois de nos depararmos com a forma bizarra como este Governo de direita lida com a oposição e a divergência de opiniões, depois de a maioria parlamentar

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tentar pôr uma rolha e calar a oposição, depois de estar provado, perante este Plenário, quem quer aumentar a justiça social no nosso país e está disponível para o discutir, depois de tudo isto, cabia saber quem, no mínimo, tinha como sua intenção um intenso e eficaz combate à fraude. Seria expectável, de uma maioria parlamentar responsável, a assunção das suas responsabilidades democráticas.
Os projectos de lei que entregámos assumidos sempre como instrumentos de política social, mas também como instrumentos de prova de responsabilidade e como um desafio que permitisse a avaliação de quem está empenhado na luta contra a fraude.
Combater a fraude é não só impedir erros e omissões relativamente a futuros contratos de crédito bonificado, se ele fosse reposto, mas também avaliar permanentemente as anteriores contratualizações no sentido de avaliar a sua veracidade. Fazer propostas concretas é a única forma de melhorar o sistema. É a diferença de quem corta de forma cega e só aumenta os impostos aos cumpridores e de quem, militante da justiça social, insiste em lutar para que a lei não beneficie o infractor.
Os Deputados do PS acima referenciados esperam que o Governo de direita volte atrás numa medida precipitada que tomou e para a qual não apresentou alternativas, penalizando, mais uma vez, milhares de jovens.
Os Deputados do PS acima referenciados propõem-se ser a voz de todos aqueles que em tão escasso tempo de governação já se sentem defraudados com este Governo.
Asseguraremos que o futuro dos nossos jovens e do nosso país esteja garantido com o devido respeito aos valores e princípios da honestidade democrática.
Por isso, os Deputados do PS acima referenciados assumem, perante esta Assembleia, a responsabilidade de propor em sede própria as medidas vertida nos projectos de lei n.os 139/IX, que repõe o crédito bonificado, e 140/IX, que visa as medidas de combate à fraude no crédito bonificado à habitação, com o objectivo explícito de garantir com clareza os níveis de justiça social no nosso país.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, dispondo, para o efeito, de 3 minutos.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do PCP votou contra a proposta de lei n.º 20/IX, que estabelece as bases gerais do sistema da segurança social. Fê-lo, em primeiro lugar, porque este diploma questiona e põe em causa o sistema público da Segurança Social enquanto sistema universal de solidariedade social, abrindo-o ao mercado de capitais, transformando-o num instrumento dos mercados bolsistas e dos negócios especulativos, colocando, no futuro, uma parte das pensões de reforma na dependência da instabilidade dos resultados das aplicações financeiras das entidades gestoras dos sistemas complementares privados.
Abre caminho à descapitalização do sistema público da segurança social e sua sustentabilidade financeira, não dá resposta à necessidade da melhoria das baixas pensões de reforma e de outras prestações sociais, nem à propalada e falsa promessa de convergência das pensões mínimas para o salário mínimo. Oculta que a lei de bases em vigor há menos de dois anos já consagra aquela progressão, assegurando, inclusivamente, aumentos superiores aos agora propostos.
Enfraquece ainda a capacidade redistributiva do sistema e as próprias quotizações passam a ter uma natureza regressiva, porque quanto mais elevada é a remuneração mais baixa é a taxa de contribuição efectiva para a segurança social.
Colide com normativos constitucionais, designadamente com o n.º 2 do artigo 63.º da Constituição, que concebe a segurança social como um sistema público unificado e descentralizado, enquanto que a proposta de lei integra no sistema da segurança social as componentes pública e privada. Colide também com o n.º 1 do mesmo artigo da Constituição da República Portuguesa, que estabelece que todos têm direito à segurança social, e com o n.º 4, que consagra que todo o tempo de trabalho contribuirá, nos termos da lei, para o cálculo das pensões, quando a lei agora aprovada permite e impõe que nem todos beneficiem de todas as eventualidades e consagra um limite máximo de remunerações que serão base de incidência contributiva.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o PSD e o CDS-PP serviram interesses de uns poucos, não serviram os interesses dos trabalhadores, dos reformados e, particularmente, das futuras gerações de trabalhadores.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Santos Silva.

O Sr. Augusto Santos Silva (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a declaração de voto que vou proferir explica o voto contra do PS na votação final global do texto final da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo à proposta de lei n.º 12/IX, que aprova o regime jurídico do desenvolvimento e qualidade do ensino superior.
O PS identificou oito graves erros na proposta de lei, apraz-nos registar que, no decurso da discussão em sede de especialidade, foi possível corrigir três destes erros, a saber: foi reposta a autonomia patrimonial e disciplinar das instituições; foi abandonada a inaceitável pretensão do Ministério da Ciência e do Ensino Superior de controlar o processo de avaliação, concedendo ao Ministro poderes de homologação dos seus resultados; e foi possível reduzir o artigo sobre o financiamento à reprodução do que o Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo hoje diz sobre as condições de apoio público ao ensino particular e cooperativo.
O PS congratula-se com estas correcções, que eliminam aspectos muito gravosos da proposta de lei.
O PS também acompanhou, com o seu voto favorável, vários elementos positivos constantes da proposta de lei, como, por exemplo, a consagração da igualdade de requisitos, a interdição dos estabelecimentos em regime de franquia, o não reconhecimento de graus conferidos em unidades ou cursos que não cumpram os requisitos devidos,

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o respeito pelos direitos do pessoal docente e pelas expectativas dos estudantes aquando da aplicação das medidas de racionalização, a valorização do acto de registo dos cursos, a intransmissibilidade do registo, a organização dos cursos em unidades curriculares e a extensão aos estudantes do ensino particular de todos os benefícios do sistema de acção social escolar.
Infelizmente, a votação, em sede de especialidade, manteve, por imposição da maioria, muitos dos aspectos mais negativos da proposta de lei. Mantém-se, assim: o peso da lógica mercantilista na indução do desenvolvimento do ensino superior, subordinando-a a avaliações, aliás, estáticas, do mercado de emprego; o hipercentralismo e a concentração excessiva de poderes na figura do Ministro; a indesejável intromissão do Ministério na autonomia científica e pedagógica das instituições, a qual vai ao ponto de prever a sua interferência nas áreas facultativas dos planos de estudos; a menorização do ensino politécnico, ao qual agora se retira a dimensão da formação científica e da investigação; o limiar de baixa exigência nos requisitos para criação e funcionamento de cursos e instituições; e a determinação de que o processo de avaliação termine numa só classificação de mérito.
Ocorreu, em sede de especialidade, um facto ainda mais negativo: foram introduzidas, pela maioria, alterações que distorcem a própria proposta de lei. Em primeiro lugar, modificou-se o texto do artigo 36.º, o que tem como consequência poder resultar da recusa de acreditação outra coisa que não o encerramento da respectiva instituição.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, pois já esgotou o tempo regimental.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Em segundo lugar, liberalizou-se ainda mais o regime de acumulação de funções dirigentes em diferentes estabelecimentos de ensino superior.
Por estas razões, o PS mantém o seu voto contra na votação final global.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, antes de iniciar a minha declaração de voto, relativamente à proposta de lei n.º 20/IX, quero apenas dizer que o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda declara que, para todos os efeitos presentes e futuros, considera a votação processual sobre a dispensa de redacção final como tendo sido ilegal.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, os Deputados do Bloco de Esquerda votaram contra o texto final relativo à proposta de lei que aprova as bases gerais do sistema de segurança social porque, a nosso ver, vem criar e implementar uma política que virá minar a sustentabilidade financeira do sistema de segurança social público e quebrar, de forma inaceitável, a componente de solidariedade inscrita neste sistema, que é também, na nossa opinião, uma peça fundamental na promoção da justiça e da coesão social na sociedade portuguesa.
Se a política que enforma a nova lei de bases do sistema da segurança social, esta tarde aprovada, for avante, e no passo estudado que a maioria governamental quer impor, não tenhamos quaisquer dúvidas de que gerará injustiças e terá profundos impactos sociais negativos, os quais, como sempre, serão mais gravosos para aqueles que são mais fracos e têm menos recursos. Não tenham os Srs. Deputados da maioria qualquer dúvida de que a responsabilidade destes impactos sociais negativos ser-vos-á imputada.
O Bloco de Esquerda, como, aliás, o País ontem o demonstrou, não deixará passar em silêncio esta política de desarticulação do Estado-providência em Portugal, política essa feita a pedido dos interesses das seguradoras e dos fundos de pensão privados, que, com esta nova lei de bases, ganham, assim, um mercado garantido pelo Estado.
É porque mantemos um compromisso com uma política de segurança social pública, solidária e financeiramente sustentável que reafirmamos que, assim que houver, nesta Câmara, uma vontade política diferente da actual, avançaremos com uma proposta de revogação desta nova lei de bases e entregaremos uma outra que faça a reposição das condições da sustentabilidade e da efectividade do princípio da solidariedade no sistema de segurança social público.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições para declarações de voto, tem a palavra, para interpelar a Mesa, o Sr. Deputado José Magalhães, a quem peço que seja breve, porque temos não só de terminar o debate que suspendemos para proceder às votações como ainda um outro.

O Sr. José Magalhães (PS): - Certamente, Sr. Presidente, aliás, como vou participar, juntamente com o Sr. Deputado Vitalino Canas, nesse debate, estou ciente da hora tardia.
Sr. Presidente, em relação à votação final global, que fizemos há pouco, do texto final, apresentado pela Comissão, relativo à proposta de lei n.º 20/IX, que aprova as bases gerais do sistema de segurança social, quero anunciar que o Grupo Parlamentar do PS não vai prescindir do exercício dos direitos previstos no artigo 166.º do Regimento. Como V. Ex.ª sabe, o artigo 166.º sujeita o texto agora votado em votação final global a reclamação de 10 Deputados até à terceira reunião plenária posterior ao dia da publicação do texto da redacção final no Diário. Por outro lado - e será a V. Ex.ª que caberá decidir essa reclamação feita nos termos do artigo 166.º -, o texto só se considerará definitivo nos termos do artigo 167.º do Regimento.
Significa isto, Sr. Presidente, que a violência usada há pouco é absolutamente inútil e que o diploma não pode seguir para Belém para promulgação, porque não reúne as condições previstas no Regimento.
Lamento, Sr. Presidente, que não tenhamos sido ouvidos, mas não podemos prescindir do exercício dos nossos direitos regimentais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é óbvio que o Presidente será a última pessoa a privar quem quer que seja do exercício dos seus direitos regimentais.

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No entanto, quero assegurar à Câmara que, atendendo às circunstâncias que envolveram esta aprovação final global, serei especialmente cauteloso na verificação da redacção do texto antes de proceder à sua assinatura.

O Sr. António Filipe (PCP): - Nem vale a pena rever o texto, pois não há votação final global!

O Sr. Presidente: - Evidentemente, procederemos, nesta matéria, como em todas as outras, de acordo com todos os requisitos estabelecidos no Regimento.
Srs. Deputados, antes de retomarmos os trabalhos, há um importante anúncio a fazer, pois diz respeito à ordem do dia da sessão de amanhã.
Os Srs. Deputados estão cientes de que o PS apresentou um requerimento a solicitar um debate de urgência sobre as questões que foram sobejamente discutidas no início da sessão de hoje. O Governo disponibilizou-se imediatamente para esse debate de urgência, pelo que, consultados os grupos parlamentares, ele ocorrerá amanhã, com a presença do Governo, obviamente, no final do debate temático sobre a família e a escola.
Portanto, este debate de urgência sobre a matéria suscitada na iniciativa do PS será acrescentado à nossa ordem de trabalhos de amanhã, por consenso - fico muito satisfeito por verificar que, depois de tanta controvérsia, ainda há pontos em que conseguimos alcançar o consenso -, e terá a grelha de tempos habituais, que, pela indicação que me dão, é a grelha E.
Srs. Deputados, vamos, então, retomar a discussão conjunta dos projectos de lei n.os 9, 51, 68 e 145/IX, relativos à iniciativa legislativa de cidadania, a partir do ponto em que a interrompemos, ou seja, no momento em que o Sr. Deputado José Magalhães pedia a palavra, no seguimento da intervenção feita pelo Sr. Deputado Eugénio Marinho.
Tem a palavra, Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Narana Coissoró acaba de me fazer uma sugestão, que me parece perfeitamente adequada, e que é a seguinte: uma vez que a matéria que levou à declaração do Sr. Deputado Eugénio Marinho, e que eu gostava de contestar, coincide com um projecto de declaração do mesmo teor do Sr. Deputado Narana Coissoró, e uma vez que o Sr. Deputado Narana Coissoró vai usar da palavra, o CDS-PP vai conceder-me tempo na altura própria para eu poder dizer o que iria dizer neste momento, e, assim, tendo em conta que o tempo atribuído ao meu grupo parlamentar já está um pouco "roído", poupamos todos tempo.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado, fico muito satisfeito com essa disponibilidade.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, estamos a apreciar hoje pela quarta vez,…

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Pela quarta vez?! Não, é pela terceira vez!

O Orador: - … como disse o Sr. Deputado António Filipe, o projecto de lei sobre a iniciativa legislativa popular.
Já ontem, em sede de Comissão, louvámos o relatório elaborado pelo Sr. Deputado António Filipe e é justo que, mais uma vez, agora no Plenário, este relatório seja elogiado, porque não só faz um bom resumo de todas as iniciativas parlamentares que foram apresentadas, o que facilita o debate, facilita a tomada de posição de vários Deputados sobre questões secundárias, como é um bom exemplo para, no futuro, pelo menos em relação aos diplomas importantes, os relatórios terem esta configuração.
É certo que não estamos perante um relatório erudito, na medida em que não traz grande contribuição relativamente ao direito comparado e à maneira como os problemas são resolvidos, pelo menos na maior parte dos países da União Europeia. Mas a verdade é que ele facilita o debate e uma das razões da elaboração dos relatórios é exactamente a de facilitar o debate, permitido que ele se torne mais vivo.
Por isso mesmo, vou usar esse relatório como guião para expressar os meus pontos de vista, mais exactamente os do partido que aqui represento.
Em primeiro lugar, a existência da iniciativa popular não retira quaisquer poderes à Assembleia da República para legislar sobre as matérias objecto de iniciativa popular, porque devolve aos Deputados o poder não só de escrutinar essas iniciativas como também o de aqui defender e votar essas mesmas iniciativas.
Simplesmente, um problema importante se coloca nesta matéria é o de saber se estas iniciativas, sendo elas populares, devem ter mais privilégios do que as apresentadas pelos Deputados; isto é, se uma iniciativa popular deve ter um regime que, muitas vezes, é negado às apresentadas pelos Deputados, ou que, pelo menos, não têm. Na minha opinião, não.
Em meu entender, as iniciativas dos Deputados, que são legitimamente eleitos, e são eleitos por um número considerável do mesmo eleitorado que apresenta as iniciativas populares, não devem ter menos direitos do que os concedidos à iniciativa popular. O que é que eu quero dizer com isto? Quero dizer que um projecto de lei apresentado por um Deputado não deve merecer menos atenção do que uma iniciativa popular, porque a tramitação da iniciativa popular é aqui reforçada em relação ao projecto de lei apresentado pelo Deputado.
Em segundo lugar, relativamente ao número de assinaturas existem vários critérios, já que cada partido apresenta o seu. E este número vai desde as 26 000 assinaturas, número não determinado mas indexado ao do eleitorado, até a um número que poderia pulverizar essas iniciativas legislativas, como faz o Bloco de Esquerda. Temos, portanto, uma gama de algarismos que terão de ser devidamente ponderados, de modo a que estas iniciativas tenham um peso próprio, para que o Parlamento não seja inundado de iniciativas populares por o número de assinaturas exigido ser relativamente fácil de obter e para que o número de assinaturas exigido não seja de tal modo excessivo ao ponto de representar um travão ou um impedimento à existência da iniciativa popular.
Assim, em sede de especialidade, temos não só de encontrar um número razoável como também de libertar os

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signatários dessas iniciativas de certos constrangimentos. Por exemplo, é preciso saber quem assina e por que é que assina e é também necessário encontrar forma de garantir a genuinidade da assinatura, para evitar que a mesma pessoa possa assinar 20, 30, 40 ou 50 vezes. Portanto, repito, tem de haver uma qualquer forma de garantir a autenticidade das assinaturas.
Por outro lado, terá de haver uma prova de que as pessoas assinaram aquilo que pretendiam. Como sabemos, muitas vezes o texto consta da primeira folha, quando muito da segunda, passando depois a circular, para assinatura, folhas em branco, que tanto podem servir para uma determinada iniciativa popular como para outra coisa qualquer. Consequentemente, é preciso acautelar que as pessoas assinam o texto a que aderem e não folhas em branco, que podem não corresponder à iniciativa a que diz respeito.
Em quarto lugar, precisamos de saber se esta iniciativa popular é apenas reservada a cidadãos nacionais ou se abrange também os não nacionais. Em nosso entendimento, no espaço da União Europeia os cidadãos devem ter o direito de assinatura de iniciativas populares no local onde residem e exercem os seus poderes e deveres, porque muitos dos assuntos podem dizer-lhes directamente respeito.
Em quinto lugar, temos o problema de saber se deve ou não haver reservas ou matérias vedadas à iniciativa popular. Em minha opinião, à iniciativa popular só devem ser vedadas as matérias que a própria Constituição prevê como tendo de ser originárias de determinados órgãos e não todas as outras, como, por exemplo, as que estão sob reserva absoluta da Assembleia da República.
E, para dar oportunidade ao meu amigo e Deputado José Magalhães de se pronunciar, li o que ele defendeu no calor da discussão da revisão Constitucional. E vou repetir textualmente o que o Sr. Deputado disse na altura, quando não previa que estes constrangimentos poderiam surgir um dia - e V. Ex.ª estava muito entusiasmado!… - e que consta precisamente do registo do n.º 101 do Diário, 1.ª Série, de 25 de Julho de 1997, exemplar que posso ceder-lhe quando quiser rebater esse ponto de vista.
Aí se pode ler o seguinte: "Creio que algumas das pessoas que discursam em termos muito genéricos sobre a bondade desta solução não têm em conta a profunda mudança que ela vai representar no funcionamento deste Parlamento, desde logo porque não se trata de um mero direito de petição, não é sequer um direito de petição qualificado, é mais do que isso.".
E vou saltar partes do texto, porque não tenho tempo para ler tudo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Que pena!…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - "(...) Por isso, creio que a grande novidade que daqui decorre é uma saudável emulação aberta, em relação aos Deputados, ao Governo e a outros titulares de direito de iniciativa (...)".
"Portanto, a generosidade desta solução, aprovada a Constituição e a lei de desenvolvimento, tem como consequência a abertura de um novo campo de competição e de criatividade legislativa, vinda de munícipes insatisfeitos ou com reivindicações de qualquer natureza, de cidadãos de diversos estratos (pescadores, agricultores, industriais, comerciantes), de vítimas de crimes, pais, mães, jovens de diversos estratos etários com pretensões e reivindicações. Propondo o quê? Propondo a criação ou a extinção de municípios, o reordenamento territorial, quaisquer regimes de garantia, pois não há nenhum limite desse ponto de vista, e isto significa, Sr. Presidente (e tive ocasião de anunciar isto no início dos debates), uma muito saudável libertação da Assembleia do 'politicamente correcto' (o 'PC'), da ideia de que há temas sérios e temas escabrosos, temas proibidos. O 'PC' é expurgado completamente, não há 'PC', não há 'politicamente correcto' nesta matéria.
Os cidadãos querem discutir o aborto? Propõem!...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se completamente

O Orador: - ... Querem discutir a eutanásia? Propõem! Querem discutir a homossexualidade? Propõem! Querem discutir a alteração do regime matrimonial? Propõem! Querem discutir penas ad terrorem? Propõem! É seu direito propor e talvez isto liberte a Assembleia de tensões de psicodrama cada vez que os chamados temas politicamente incorrectos são introduzidos, o que para nós é saudabilíssimo. (...)".

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem mesmo de terminar, senão sou obrigado a cortar-lhe a palavra.

O Orador: - Sr. Presidente, preciso só de terminar,…

O Sr. Presidente: - Então termine, por favor.

O Orador: - É porque estou a ver no quadro electrónico dos tempos que os meus Colegas também ultrapassam os seus tempos: o PSD em 28 segundos, o PS em 13 segundos e o PCP em 1 minuto e 7 segundos.

Risos.

O Sr. Presidente: - Mas o senhor já vai em 2 minutos e 43 segundos.

O Orador: - Talvez o Sr. Presidente julgue que eu não mereça...

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado merece isso e muito mais, mas acontece é que está a passar um pouco as marcas.

O Orador: - Concluo: portanto, a reserva absoluta sobre as penas ad terrorem podiam fazer parte de iniciativa legislativa. Era isto o que eu queria dizer.
Aliás, alguns dos nossos pontos de vista já foram manifestados aquando das perguntas que fiz ao Partido Comunista e ao Partido Socialista. Nós estamos de acordo com o teor geral de quase todos os projectos de lei, mas na especialidade teremos de trabalhá-los. Assim, faremos uma boa lei com o contributo de todos os partidos.

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Eugénio Marinho, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - Sr. Presidente, para interpelar a Mesa sobre os trabalhos. Embora o Sr. Presidente Mota Amaral esteja de saída, o senhor está agora a substituí-lo no cargo.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - Sr. Presidente, relativamente à condução dos trabalhos quero dizer que eu, para cumprir religiosamente o tempo que me era concedido, abdiquei de parte da minha intervenção - penso que disso toda a gente se apercebeu -, aliás, rodeado de um ruído absolutamente anormal.
Assim, não creio aceitável que eu tenha disso abdicado para cumprir religiosamente o tempo que me era concedido e que sistematicamente hoje, nesta Assembleia, se tenha violado todo o tipo de tempos. Com o devido respeito, isto não é admissível, porque esta situação vai facilitar que, na próxima vez, eu não me coíba de não respeitar o tempo, já que, em minha opinião, as pessoas não devem ser tratadas de modo diferente. Independentemente de se tratar do Deputado A, B, ou C; não é admissível que, do primeiro ao último minuto, se esteja sistematicamente a alterar os tempos, com prejuízo para as intervenções correctas de Deputados que nesta Legislatura têm pela primeira vez a oportunidade de intervir, como foi o meu caso.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, registo a sua interpelação, que, embora me pareça oportuna, diz respeito a todas as bancadas. Seguramente iremos procurar, dentro da flexibilidade que normalmente a Mesa tem nestas matérias, para não amputar o debate ou o pensamento de cada um dos Srs. Deputados, cumprir o Regimento o mais rigorosamente possível.
Sr. Deputado José Magalhães, pede a palavra para que efeito.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, julgo que seria esta a ocasião de, usando o bom senso que caracteriza a sua direcção dos trabalhos, me permitir dizer, em poucos segundos, o que se me oferece em relação a uma observação que foi feita pelo Sr. Deputado Eugénio Marinho - não o fiz na altura porque estávamos a entrar no período das votações - e a outra do Deputado Narana Coissoró…

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Mas qual é a figura regimental que o Sr. Deputado quer usar?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, quero prestar esclarecimentos…

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, desculpe-me, mas não há figura regimental. Acabámos de ouvir uma interpelação do Sr. Deputado Eugénio Marinho questionando os tempos excessivos utilizados pelos Srs. Deputados e se o Sr. Deputado José Magalhães quiser ajudar a Mesa peço-lhe que não insista, para prosseguirmos os trabalhos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, eu ajudo a Mesa, mas exercendo o direito regimental de defesa da honra que tenho e do qual não prescindo. Se assim entender, o Sr. Presidente dar-me-á a palavra no fim do debate, mas terá de dar-me a palavra.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, ao que percebi agora, pediu a palavra para exercer o direito de defesa da honra pessoal. Foi isso?

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Com base em quê?

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Ser-lhe-á então concedida a palavra no final do debate.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero começar a minha intervenção com um elogio ao relatório produzido pelo Sr. Deputado António Filipe, que demonstra a importância e a utilidade que os relatórios, quando bem produzidos, têm para a discussão.
A matéria que aqui está em discussão - a iniciativa legislativa popular -, consagrada na Constituição da República Portuguesa desde 1987, foi já discutida e aprovada, na generalidade, como aqui foi referido, no Plenário da Assembleia da República, em 1998 e em 2000. Nunca, porém, saiu da apreciação, na especialidade, em sede de comissão parlamentar especializada. Dizem as sábias vozes populares que "à terceira é de vez". Vamos ver se a Assembleia da República prova isso mesmo.
Ao contrário do que algumas vezes se tem afirmado, designadamente nos anteriores debates parlamentares, não creio que a iniciativa legislativa popular faça sentido em resposta ao fosso existente entre eleitos e eleitores. Por um lado, creio que o fosso eleito/eleitor se deve claramente a outras questões, nomeadamente à forma como as promessas eleitorais não são traduzidas em medidas concretas por parte de alguns partidos. Por outro lado, a iniciativa legislativa popular vale por si só; vale como uma forma de aprofundamento de participação democrática, onde os cidadãos têm necessariamente direito de proposta, direito de tomar a iniciativa de propor regras para a sociedade que integram e na qual devem agir de diferentes formas para construí-la.
Não se põe aqui em causa nem o órgão de soberania Assembleia da República, órgão legislativo por excelência, nem tão-pouco a imagem dos partidos políticos, nomeadamente aqueles com representação parlamentar, isto é, com Deputados eleitos à Assembleia da República, e a sua necessidade como base de um regime democrático.

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As diferentes formas de organização e de participação colectiva são, necessariamente, formas de exercício da democracia. Regulamentemos mais uma, consagrada na Constituição da República Portuguesa desde 1997: a iniciativa legislativa popular.
Os Verdes consideram muito meritória nos projectos de lei apresentados a possibilidade de os cidadãos tomarem a iniciativa por si só, responsabilizando-se nessa acção e não estando dependentes da vontade de um grupo parlamentar ou de um Deputado para a concretização da iniciativa das suas propostas. Alargam-se os mecanismos de participação entre todos os cidadãos e promove-se uma forma de igualizar essa participação entre todos os cidadãos.
No entanto, sobre as propostas constantes desses projectos de lei apresentados, gostava de realçar dois aspectos e sublinhar a nossa posição relativamente aos mesmos.
O primeiro tem que ver com o número necessário de subscritores que, na nossa perspectiva, não pode ser de tal modo elevado que acabe por inviabilizar a apresentação da proposta legislativa. Esta iniciativa legislativa popular destina-se a todos os cidadãos, pelo que, devendo estabelecer-se obrigatoriamente o número mínimo de subscritores, ele tem de ser realista, de modo a garantir que esta figura possa funcionar na prática.
Em jeito de resposta à intervenção do Sr. Deputado do PSD, gostava de referir expressamente que, através desta figura, se pretende dar voz na Assembleia da República não àqueles que aqui estão, porque esses já têm voz e possibilidade de iniciativa, mas àqueles estão lá fora.
Assim, tomando como referência o número necessário de subscritores para a constituição de um partido, ou para a apresentação de uma candidatura à Presidência da República, ou para o regime do direito de petição, cremos que o número não deverá variar muito destes valores, sob pena de se tornar inacessível a apresentação de iniciativas legislativas pelos cidadãos em geral, criando - repito - uma figura que, na prática, não poderá funcionar.
O segundo aspecto que queria realçar é o seguinte: é fundamental estabelecer prazos para que as iniciativas legislativas populares, uma vez admitidas, tenham sequência na Assembleia da República e para que não aconteça, de todo, aquilo que tem acontecido com as petições, que analisaremos no ponto seguinte da ordem do dia.
Todos os projectos de lei fazem referência a esta questão da tramitação. É um processo válido que requer eficácia de tratamento e, para além da definição dos prazos para a concretização das várias fases de tramitação do processo, requer um funcionamento adequado nesta Casa, no sentido de garantir as respostas, a análise e as decisões atempadas.
Para terminar, Os Verdes esperam que desta vez se concretize, de facto, a regulamentação da iniciativa legislativa popular, em Portugal. É, certamente, um passo que temos a possibilidade de dar para o aprofundamento do exercício da democracia em Portugal.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Terminaram as intervenções neste ponto da ordem do dia. Não há pedidos de esclarecimento.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, para defesa da honra pessoal.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostaria de mudar a figura ao abrigo da qual vou usar da palavra, uma vez que o Bloco de Esquerda me cedeu 3 minutos para este efeito. Julgo que se coaduna mais com o espírito daquilo que quero dizer.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Então, em tempo cedido pelo Bloco de Esquerda, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por um lado, congratulo-me com o facto de a Assembleia da República estar, agora, em condições de aprovar, na generalidade, na altura própria, uma iniciativa sobre este tema.
A batalha pela consagração constitucional do direito de iniciativa legislativa popular foi complexa. Passou, designadamente, pela celebração do acordo político de revisão constitucional, o qual permitiu um entendimento entre o PS e o PSD que conduziu aos dois terços que viabilizaram esta solução, que não tinha à partida "luz verde" nem qualquer viabilidade. Orgulho-me muito de ter procurado participar nesse esforço que culminou neste resultado positivo.
Quanto ao ponto que foi suscitado pelos Srs. Deputados Eugénio Marinho e Narana Coissoró, para ficar de bem com a consciência e para que o Diário diga com inteira verdade o que aconteceu neste debate, gostaria só de dizer o seguinte: o debate desta matéria na revisão constitucional culminou numa norma aberta. A norma constitucional do artigo 167.º remete para a lei a delimitação concreta das condições em que os grupos de cidadãos eleitores podem exercer o direito de iniciativa legislativa popular.
Foi por isso que, na revisão constitucional e no Diário que o Sr. Deputado Narana Coissoró citou, tive ocasião de assinalar que a solução constitucional era uma solução que permitia o mais e o menos: permitia uma solução de largo escopo, em que se admitisse que toda a área de competência da Assembleia pudesse vir a ser objecto de iniciativa parlamentar, ou outras soluções, eventualmente mais reduzidas, designadamente aquela que mais tarde o Grupo Parlamentar do Partido Socialista considerou que seria adequado propor e propôs no quadro da já referida iniciativa "Parlamento 2000".
Ou seja, não há, de facto, deste ponto de vista, contradição alguma. Durante o debate, apenas assinalei que a Assembleia não tinha querido fixar na Constituição que as iniciativas legislativas populares só poderiam versar sobre as matérias a, b, c ou d. E, francamente, penso que fizemos bem. Não fechámos ao legislador a possibilidade de ter aquilo que eu chamaria a "generosidade máxima", fazendo coincidir exactamente a competência dos actores populares com a competência dos Deputados em matéria de iniciativa. Permitiu graduações, designadamente que a Assembleia da República fizesse, como julgo que fará, a experiência de abrir a um núcleo importante e significativo de matérias a iniciativa legislativa popular e depois ponderar, em função da avaliação dessa lei, em que medida é que deve haver um alargamento e em que áreas é que esse alargamento deve ter lugar.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, esclarecido o equívoco, julgo que estão reunidas as condições para, na

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1.ª Comissão, podermos fazer um bom trabalho que delimite rigorosamente as condições, as exigências, designadamente as de carácter formal, e também esta importante questão do âmbito da iniciativa, porque podem gerar-se extraordinários conflitos institucionais se optarmos por uma má solução, designadamente por excesso,…

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - … e, por outro lado, sermos obrigados constitucionalmente a aprovar uma lei. Julgo que desta vez será "a vez", será a terceira e será, espero, a definitiva.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, não havendo mais ninguém inscrito, está encerrado o debate deste ponto da ordem de trabalhos. A votação das iniciativas legislativas correspondentes será feita no dia e na hora regimentais.
Passamos ao segundo ponto da ordem de trabalhos, que consta da discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 69/IX - Altera o regime do exercício do direito de petição (PCP), 144/IX - Tendente a facilitar a entrega de petições dos cidadãos e a exercer controlo mais eficaz sobre a sua tramitação na era das redes electrónicas (PS) e 146/IX - Alteração do regime do exercício do direito de petição (PSD e CDS-PP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos perante mais uma matéria, a par da iniciativa legislativa popular, sobre a qual a Assembleia da República já, de há muito, deveria e poderia ter legislado. Estamos a falar do exercício do direito de petição.
O PCP tem vindo, desde há vários anos, a insistir na necessidade de serem alteradas algumas das regras que regulam o exercício do direito de petição, designadamente perante a Assembleia da República, por forma a dignificar este modo de participação dos cidadãos na vida política e a dar um sentido efectivamente útil ao exercício deste direito.
Todos reconhecerão que a situação actual não é digna: não dignifica esta Assembleia, não dignifica o instituto do direito de petição. Há que reconhecer que a Assembleia da República, designadamente algumas das suas comissões, faz um esforço cíclico para regularizar a situação das petições. Assim, de quando em vez, são agendadas para Plenário discussões sobre petições pendentes nesta Assembleia, mas sempre que isso acontece somos confrontados com a realidade de petições que transitam de legislatura para legislatura, havendo petições ainda pendentes que remontam ao início dos anos 90.
Temos de reconhecer que a Assembleia da República, ao longo de várias legislaturas, não deu o tratamento que deveria ter dado a essas reclamações ou solicitações que são apresentadas por parte dos cidadãos. Nalguns casos por responsabilidade efectivamente directa da Assembleia da República, que não se organizou convenientemente para resolver esse problema; noutros casos por uma excessiva tolerância relativamente à falta de resposta por parte da Administração Pública, designadamente do Governo.
É sabido que muitas das petições que são feitas à Assembleia da República não solicitam qualquer intervenção legislativa. Trata-se, por vezes, de situações casuísticas cuja resolução deve ser tratada no âmbito da Administração Pública. A Assembleia da República muitas vezes solicita esclarecimentos a uma entidade administrativa que depois não presta esses esclarecimentos como devia, não resolve o problema apesar de ser solicitada a fazê-lo, o que leva a que não haja qualquer reacção institucional a essa falta de acção e a petição cai no esquecimento para ser, enfim, relembrada uns anos mais tarde, quando muitas vezes ou o problema já está resolvido ou já perdeu o objecto.
Portanto, esta é uma situação que nada nem ninguém dignifica e, por respeito elementar para com os cidadãos peticionantes, é necessário que a Assembleia da República altere algumas das regras que presidem à tramitação das petições.
Desde logo, relativamente à fixação de prazos, do nosso ponto de vista, é indispensável que, a partir do momento em que é admitida uma petição nesta Assembleia e que ela seja remetida para uma comissão parlamentar considerada competente em razão da matéria, seja fixado um prazo para que essa comissão elabore um relatório relativamente a essa petição. Entendemos que é razoável fixar um prazo de 60 dias. Após a elaboração desse relatório, deve existir um novo prazo para o agendamento da petição em Plenário, nos casos em que ela reúna os requisitos indispensáveis para que o debate tenha lugar, que deve ser de 30 dias entre o relatório e o agendamento.
O fundamental é que haja um prazo e que a Assembleia da República o cumpra, porque essa é a única forma de impedir que as petições transitem de legislatura para legislatura sem que seja dada qualquer satisfação aos peticionários.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Uma segunda questão que se nos afigura importante tem a ver com as consequências da discussão.
Quando há debate das petições em Plenário, temos verificado uma frustração por parte dos peticionários, relativamente à falta de consequências desse debate.
Por vezes, por imperativo legal, o debate é agendado, cada grupo parlamentar emite a sua opinião sobre a matéria e, depois, não há qualquer iniciativa concreta que a Assembleia da República discuta nesse momento que dê satisfação aos peticionários, mesmo em situações em que isso poderia ser feito. É de admitir que há situações em que a matéria não seja resolúvel por acto legislativo, mas há outras em que isso pode acontecer. Ora, do nosso ponto de vista, é preciso associar à discussão das petições as iniciativas concretas que lhes digam respeito.
Nesse sentido, consideramos que seria adequado que a própria comissão parlamentar competente possa apresentar à Assembleia da República projectos de resolução de acordo com o objecto da petição, que a deliberação possa ser feita no momento da discussão e que iniciativas de Deputados ou grupos parlamentares relacionadas com o objecto da petição em discussão possam ser agendadas para o mesmo momento em que aquela discussão tem lugar. Ou

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o contrário: isto é, havendo uma iniciativa legislativa que seja agendada e sobre cuja matéria exista alguma petição pendente para apreciação, propomos que essa petição seja também agendada "por arrastamento".
Pensamos que é fundamental que, havendo possibilidade de dar uma consequência prática, de tomar uma deliberação concreta relativamente ao objecto da petição, tal oportunidade não deve ser desperdiçada.
Finalmente, no nosso projecto de lei, entendemos propor uma redução do número de assinaturas necessárias para que o Plenário da Assembleia da República se pronuncie obrigatoriamente sobre as petições. Parece-nos que 4000 assinaturas é um número manifestamente exagerado e consideramos absolutamente razoável que 1000 assinaturas de cidadãos sejam suficientes para uma petição.
É preciso lembrar que a petição não tem de incidir sobre qualquer questão de relevância para todo o País ou para toda a população. Pode haver uma questão que diga respeito a um universo restrito de cidadãos e que tenha dignidade suficiente para ser objecto de uma petição. Daí parecer-nos que 1000 assinaturas de cidadãos deve ser número suficiente para que a petição seja obrigatoriamente discutida em Plenário.
Finalmente, no que diz respeito às outras iniciativas legislativas igualmente em discussão, quero dizer que não nos merecem objecções de fundo.
Parece-nos que as propostas relativas a esta matéria, contidas no projecto de lei apresentado pelo PSD e pelo CDS-PP, vão de encontro a algumas das preocupações que expressamos no nosso próprio projecto de diploma.
Relativamente ao projecto de lei apresentado pelo Partido Socialista, também nos parece muito pertinente a questão aí colocada no sentido de permitir que os cidadãos possam entregar petições por via electrónica. Hoje em dia, tal é tecnicamente possível e quer a Assembleia da República quer a Administração Pública devem, de facto, organizar-se para que os cidadãos possam proceder dessa forma.
Talvez haja um excesso de regulamentação. Penso que o Partido Socialista coloca no texto do seu projecto de lei algo que poderia constar das instruções dos próprios sites. Na verdade, só falta dizerem qual é o botão do rato em que as pessoas devem "clicar".
Talvez se possa ultrapassar isso, colocando na lei as questões essenciais, remetendo depois para as instruções do próprio site a forma prática de procedimento. Mas esta é uma questão secundária porque a ideia é, de facto, meritória e merece a nossa concordância.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para proceder à apresentação do projecto de lei n.º 144/IX, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que é positivo que a Assembleia da República debata iniciativas para eliminar entraves que vêm gerando uma diminuição do uso das petições pelos cidadãos.
Trata-se de alterar a lei geral das petições, não apenas o quadro legal aplicável à Assembleia da República mas o quadro aplicável a todas as petições a entidades que devam ser legal e constitucionalmente destinatárias de tal instrumento. Julgo que o facto de haver disponibilidade, que me parece generalizada, para ver em que pontos é que o quadro legal merece aperfeiçoamento é em si mesma um facto positivo. Apenas faço votos, em nome da bancada do PS, para que consigamos concluir esse trabalho até ao fim deste ano, o que seria um prazo razoável para começarmos o ano 2003 com um regime refrescado neste domínio.
No entanto, sucede que muitas das causas do declínio da figura das petições, uma vez que é de "declínio" que é preciso falar, dependem muitíssimo pouco de leis. Colocados, hoje, perante problemas aflitivos, os cidadãos perceberam muito bem a importância do terreno mediático, habituaram-se a buscar nos órgãos de comunicação social, e não nos órgãos de soberania, o lugar para fazer queixas e para obter audição para as suas representações e opiniões; sabem que, por essa via, podem ser ouvidos pela sociedade e até pressionar eficazmente os órgãos do Estado e instalou-se até uma ideia, que é perigosa, de que apresentar uma petição é accionar um instrumento que pode ficar secreto ou pode ficar na gaveta e, nesse caso, nem o Estado acorda nem a sociedade fica a saber.
De igual modo, sucede demasiadas vezes que, apreciada uma petição, mesmo que esta seja despachada favoravelmente, nada acontece e o parecer resultante da petição fica letra morta nos arquivos do órgão de poder que a recebeu. A repetição sistemática deste tipo de procedimentos gera não apenas o declínio da figura como, seguramente, descrédito da democracia numa das suas dimensões fundamentais: a dimensão participativa.
Por isso, estas iniciativas são importantes; por isso, a atenção da Assembleia da República ao revigoramento do instituto é em si mesma saudável.
Sucede que a experiência de outros países revela que é possível melhorar a capacidade de impacto das petições. Ou seja, nos regimes democráticos, não estamos condenados a uma espécie de declínio irreversível do instituto do direito de petição só porque a praça pública mediática é apetecível, é concorrente, aliás legítima, pode ser uma ampliação do espaço de respiração natural das sociedades.
Há experiências de outros Parlamentos que revelam que a alteração do regime legal pode levar a surtos de petições. Não por acaso, até à década de 80, as petições tiveram um declínio absolutamente clamoroso no Parlamento britânico - é um case study desta figura - e, depois, nos anos 80, aconteceu um revigoramento da figura. Hoje, na era das petições electrónicas, há um renascer da figura desde que, do nosso lado, órgãos de soberania, haja uma atitude positiva quanto a essas novas formas de expressão.
Portanto, não fazemos este debate sob o signo do fatalismo; há possibilidade de adoptar medidas.
No nosso projecto de lei, chamamos a atenção para um dos factores importantes neste domínio.
Na verdade, o novo ambiente propiciado pela explosão de redes electrónicas deve ser tido em conta, não para substituir o direito clássico à apresentação de petições em papel. Durante um longo período de transição histórica, haveremos de habituar-nos a viver em dois mundos e a co-existir razoavelmente nos dois suportes, nas duas formas de expressão. Nesta matéria, trata-se de ter em conta que há novas possibilidades que devem poder ser exploradas.

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Curiosamente, na década de 90, quando fizemos a Lei n.º 43/90, esta questão não deixou de ser considerada. É por isso que, no seu artigo 9.º, n.º 3, se teve o cuidado de dizer que "O direito de petição pode ser exercido por via postal ou através de telégrafo, telex,…" - onde é que isso já lá vai! - "… telefax…" e, reparem, "… e outros meios de telecomunicação". Era a era em que a Internet apenas despontava, não havia Internet service providers em Portugal, os acessos faziam-se através da rede científica e para um público muito limitado. No entanto, esta questão foi equacionada por nós. Só que esta alusão a "outros meios de telecomunicação", fórmula manifestamente de compromisso, foi encontrada para não fechar a lei a modalidades avançadas, mas nunca chegou a abrir-se plenamente a porta entreaberta. Isto mesmo quando a legislação portuguesa passou a consagrar a figura das assinaturas digitais.
Curiosamente, em 1999, quando foi apresentada, na Assembleia da República, uma petição electrónica, a primeira grande petição electrónica, a petição para a acessibilidade, subscrita por 9000 cidadãos e cidadãs, a 1.ª Comissão apreciou a questão e elaborou um parecer, aliás, muito bem redigido pelo então Deputado Cláudio Monteiro, no qual, por um lado, se sustentou a ideia de que a petição era admissível, uma vez que o que estava em causa era a autenticidade e, naquele caso, tínhamos indícios seguros de autenticidade das assinaturas e devia ser dado à petição um tratamento idêntico ao dos instrumentos apresentados em suporte clássico - esse foi um parecer pioneiro, aliás, aprovado por unanimidade na 1.ª Comissão.
Nessa altura, chamámos a atenção para a urgência de clarificar o regime legal de entrega de petições via Internet. Sucede, no entanto, que, desde então até agora, essa clarificação não ocorreu.
O presente projecto de lei, de que fui um dos subscritores, procura precisamente que essa questão seja discutida no Plenário e, depois, na comissão. No preâmbulo deste projecto, chamamos a atenção para que devemos olhar com cuidado as experiências de outros países e de outras instituições semelhantes à nossa, desde logo, o Parlamento Europeu.
O Parlamento Europeu, no seu site, tem um local específico para o depósito de petições e esse é um sistema que está configurado para que cada campo tenha de ser preenchido, e sem o preenchimento de campos fundamentais não é possível fazer a entrega.
Chamamos, também, a atenção para a experiência muito interessante do Parlamento escocês, sendo certo que, neste último, se está a utilizar uma espécie de pacto, ou contrato, ou protocolo de relacionamento com o International Teledemocracy Centre, igualmente situado na Escócia, que criou um sistema, o e-petitioner¸ através do qual é possível depositar assinaturas, recolher assinaturas e certificar que as mesmas são, de facto, de pessoas reais e que há uma vontade livre e esclarecida de subscrever a posição constante da petição. Julgo que é um exemplo muito interessante para nós.
A Assembleia da República tem um protocolo com a Universidade de Aveiro para a digitalização de conteúdos, que foi o que permitiu que, no nosso site, debates.parlamento.pt, tenhamos milhares e milhares de páginas digitalizadas. Ora, julgo que seria inteiramente normal o alargamento desse protocolo para compreender um estudo sobre as formas de depósito seguro e autêntico de petições electrónicas, designadamente através do webserver da Assembleia.
Diz o Sr. Deputado António Filipe que talvez não seja necessário que, no conteúdo da lei, definamos exactamente todas as modalidades. Estou de acordo. Foi por isso que, no nosso projecto, admitimos que a Comissão de Assuntos Constitucionais estude e, eventualmente, valide outras formas de entrega e chamamos, ainda, a atenção para o facto de, por exemplo, no n.º 10 de Downing Street, a residência oficial do Primeiro-Ministro britânico, existir um regulamento, no website respectivo, que sugere uma outra forma de fazer petições electrónicas que, de resto, são as aceites pelo Primeiro-Ministro britânico.
Qual é esse sistema? É um sistema através do qual os peticionários criam um website, um sítio, na Internet, em que instalam um sistema de recolha de assinaturas e de adesão dos cidadãos. Esse sítio é aberto e fechado na altura que se entenda encerrar as assinaturas; tem de ser validado e reconhecido como tal; está acessível 24 horas por dia, 7 dias por semana, na própria Internet; o postmaster do n.º 10 de Downing Street é notificado de que o site existe e está sujeito a inspecção; e tem-se a petição como aceite e válida para efeitos de resposta. Se forem ao site do Primeiro-Ministro britânico, encontrarão lá casos de petições já recebidas e já respondidas, isto é, encontra-se quer a petição quer, neste caso, a resposta do governo a essa concreta petição dos cidadãos, mas isso seria aplicável mutatis mutandis ao Parlamento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Segundo informação do Sr. Presidente da Assembleia, no próximo mês de Novembro, vamos ter participação provável na reunião anual da EPRI, associação de parlamentares que acompanha estas questões. Na última reunião da EPRI, estivemos representados por uma delegação da 1.ª Comissão, o que acontecerá também na próxima. Na agenda dessa reunião consta precisamente a discussão do tema e-petitioning, apresentação de petições electrónicas nos Parlamento membros da associação.
Penso que não enganarei os nossos colegas se lhes disser que, na Assembleia da República, existe disponibilidade para considerar a consagração de um regime que permita dar este passo, também em Portugal, em condições que têm de ser sujeitas a experiência, a aferição, e nós próprios seremos juízes da eficácia do sistema. Pela nossa parte, temos séria esperança de que o sistema funcione.
Uma nota brevíssima para aludir à segunda componente do nosso projecto de lei.
Na Intranet da Assembleia da República, há um sistema de controlo das petições. Na chamada PLC, há uma base de dados em que estão recolhidas algumas das petições pendentes na Assembleia da República. Pensamos que esse sistema deveria evoluir para uma base de dados acessível através da World Wide Web, na qual os cidadãos, quando entendessem, pudessem encontrar informação sobre que petições existem, quais são os relatores, como podem ser contactados, que diligências foram feitas, em que exacto momento do procedimento se encontram.
Criar um sistema desses a partir da base de dados instalada na Assembleia da República não reveste especial dificuldade. Colocá-lo em leitura pública, em

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www.parlamento.pt, é extremamente simples e não envolve qualquer dificuldade de carácter técnico.
Julgo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, se colocarmos ao serviço do direito de petição as novas tecnologias e as possibilidades dadas pelo novo ambiente digital em que estamos, o instituto não só permitirá revigorar as velhas formas de fazer petições como, provavelmente, dará origem àquilo que serão as petições do século XXI, esperemos que mais eficazes do que aquelas que existiram nos séculos precedentes da democracia parlamentar.
Assim seja! É o voto da bancada do PS.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Esperemos que sim, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Parlamento discute, hoje, três projectos de alteração à lei que regula o exercício do direito de petição: um, é apresentado pelo Partido Social Democrata e pelo Partido Popular; outro, pelo Partido Comunista Português; e outro, pelo Partido Socialista.
O instituto em apreço está regulado, há séculos, em diversos ordenamentos jurídicos, mas ele tem de representar, hoje, numa sociedade moderna e participada, um importante contributo para o aprofundamento e para o melhoramento da democracia.
Tem de ser, realmente, um factor de atenuação do ainda existente distanciamento entre a população e a Administração e, no caso concreto das petições dirigidas à Assembleia da República, tem de constituir um decisivo passo, conducente à intensificação dos contactos entre os cidadãos e o poder representativo.
A verdade é que a experiência até agora obtida (e vários Srs. Deputados já aludiram a isso), relativamente às petições dirigidas à Assembleia da República, não é satisfatória.
Ora porque se não decide, ora porque as petições se perpetuam nos meandros, nos trabalhos e mais trabalhos parlamentares, ora por quaisquer outros factores, o certo é que o resultado obtido não é, de facto, satisfatório.
E o que importa registar é que, na opinião de insuspeitos estudiosos, a lei que temos é das melhores que se conhecem, estando até tecnicamente muitíssimo bem feita.
Posto isto, importa reflectirmos sobre o que há-de fazer-se, então, para desenvolvermos com sucesso, na prática e com efectividade, o instituto do direito de petição, de forma a que ele constitua, realmente, uma expressão de cidadania activa no Estado democrático.
No caso concreto, e como se disse, foram apresentados três projectos de lei.
Registe-se, desde já, que, embora versando sobre o mesmo tema e sobre o mesmo diploma, as três propostas não são, em si mesmas, inconciliáveis.
Uma, é prática e eficaz, a do Partido Social Democrata e do Partido Popular.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Outra, para além da questão da não caducidade da petição, a que já aludiu o Sr. Deputado António Filipe, constitui um regresso ao diploma original, a propósito do número de subscritores necessário para que uma petição seja apreciada em Plenário e para que seja publicada no Diário da Assembleia da República. É a do Partido Comunista Português, registando-se, desde já, no entanto, que nem sempre um regresso ao passado, no domínio legislativo, representa um retrocesso e, por isso, não é inconciliável com a outra.
Outra, finalmente, é a do Partido Socialista, que versa sobre o método procedimental de envio das petições por via electrónica e pela necessidade de os destinatários de tais petições (órgãos de soberania e outros) terem organizados sistemas de controlo informático dessas petições e disponibilizados meios de divulgação na Internet das respectivas tramitações.
Comecemos pelo projecto de lei do Partido Social Democrata e do Partido Popular, que é claríssimo, ao tocar, entre outras coisas, em dois pontos essenciais. O primeiro ponto envolve uma diminuição e uma limitação do prazo de que passa a dispor a comissão parlamentar materialmente competente para a apreciação das petições. Em vez dos 60 dias, prorrogáveis sabe-se lá por quanto tempo, propõe-se que o prazo seja de 30 dias e que esse prazo seja improrrogável. A imposição normativa deste encurtamento e desta limitação do prazo é directamente proporcional à desejada eficácia da resposta política do Parlamento às pretensões formuladas pelos cidadãos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O segundo ponto não é menos fundamental: sempre que a petição seja subscrita por mais de 1000 cidadãos, passa a ser obrigatória a audição dos peticionantes, o que é mais do que relevante para acentuar uma comunicação mais estreita entre os Deputados da Assembleia da República e os seus eleitores.
Por sua vez, o projecto de lei do Partido Comunista Português, além da não caducidade já aqui referida, reconduz-nos à versão original do diploma, ao baixar para 1000 o número de subscritores necessário para que a petição seja apreciada em Plenário da Assembleia da República e para que seja publicada no respectivo Diário. Como se sabe, actualmente, o primeiro daqueles números é 4000 e o segundo é 2500.
Teoricamente, este projecto, já o referi, não é inconciliável com o anterior, podendo ambos ser objecto de análise e de melhoramentos, na especialidade, em sede da 1.ª Comissão.
O mesmo sucede com o projecto de lei do PS, que versa sobre o que já se disse que versa, pese embora haja a esse propósito que fazer algumas considerações. De facto, é preciso ver exactamente quais os meios disponíveis e os meios a disponibilizar, e até a dimensão financeira envolvida, para que os órgãos de soberania, de governo próprio das regiões autónomas e das autarquias locais, bem como os departamentos da Administração Pública, passem a dispor de sistemas de recepção electrónica das petições, bem como de divulgação das diversas fases das suas tramitações nos respectivos sítios na Internet. Uma proposta séria tem de ser responsável e a responsabilidade importa que se faça esse estudo.

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Por outro lado, a já obrigatoriedade da entrega electrónica das petições no Parlamento, em alguns casos impondo que as assinaturas digitais tenham de se mostrar certificadas por entidade legalmente autorizada ou indicar o número de depósito na Comissão Nacional de Protecção de Dados da base de dados com as assinaturas necessárias, neste momento, representa objectivamente um obstáculo ou, ao menos, uma dificuldade para que os nossos concidadãos exerçam, realmente, este nobre direito.
Será melhor, em tese - e já aqui percebi que é assim, embora no projecto de diploma não esteja -, que o envio electrónico das petições constitua, antes, uma faculdade.
Será melhor, sempre em tese, que qualquer inovação nesta área se submeta a um período experimental, como também aqui já foi dito.
Seja como for, o projecto de lei do Partido Socialista padece dos inúmeros erros e das inúmeras incorrecções habituais. Não são poucas as vezes em que se projecta alterar um diploma que nem sequer existe - a lei n.º 3/90, de 10 de Agosto. Pelo menos por três vezes, o Partido Socialista engana-se. Não é muito, vá lá… Repare: o diploma tem três páginas e só dá um erro por página. Podia ser pior…

Risos do PSD e do CDS-PP.

Por outro lado, o projecto socialista começa por alterar o artigo 9.º da lei; depois, altera o artigo 15.º; de seguida, volta para trás e altera o artigo 13.º; e, finalmente, volta para a frente, de novo, e altera, outra vez, o artigo 15.º. É espantoso!
A péssima técnica legislativa leva mesmo o PS a repetir, em dois artigos distintos, o mesmo, o que é, no mínimo, inédito.
Abandonaram várias coisas - uma vez, até abandonaram um governo… O que não abandonaram, infelizmente, foi este mau hábito que têm de legislar mal. Mas nós cá estamos para ajudar e para corrigir esses sistemáticos erros cometidos pelo Partido Socialista. Melhor fora que só fossem estes!…

O Sr. José Magalhães (PS): - Que bom! Já durmo descansado!

O Orador: - Não era a primeira vez! Nem a segunda… Mesmo quando estavam no governo!
Portanto, tudo se conjuga para que, em sede de comissão, se trabalhem estes projectos e se possa redigir um diploma capaz e coerente, que é o que todos queremos.

O Sr. António Filipe (PCP): - É por causa disso que tem de haver redacção final!

O Orador: - Ao dignificarmos o instituto do direito de petição, prestigiamos o Parlamento, respeitamos os cidadãos e enobrecemos a democracia participativa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não pode dispensar-se a redacção final!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O exercício do direito de petição, tal como o da iniciativa legislativa popular, também contribui para o melhoramento da democracia representativa, aberta e participativa.
Trata-se de matéria que também tem consagração na Constituição, no artigo 52.º, n.º 1. Este artigo foi alterado, na revisão constitucional de 1997, tendo sido acrescentado o inciso que consagra o direito a uma resposta rápida, em tempo razoável, bem como o direito de ser informado sobre o resultado das petições apresentadas.
Dir-se-á que as iniciativas legislativas do PCP e do PSD/CDS-PP visam dar cumprimento àquele comando constitucional, estabelecendo prazos não susceptíveis de prorrogação para a apreciação das petições nas respectivas comissões.
Ambos os referidos projectos de lei curam igualmente de reduzir a fasquia do número de subscritores necessários para que a mesma seja discutida no Plenário, baixando-a ambos de 4000 para 1000 subscritores. O projecto de lei do PCP vai mais além, propondo igualmente um prazo para o seu agendamento para apreciação no Plenário (30 dias), após a elaboração de relatório e parecer favorável a essa apreciação. O projecto de lei do PCP estabelece, igualmente, uma regra de não caducidade das petições que não sejam apreciadas na legislatura em que são apresentadas. Não se conhece, contudo, que seja esta a prática da Assembleia da República, sendo que, de todo o modo, também não é daí que viria censura particular ao diploma.
Já o projecto de lei do PS trata de matérias diferentes, já que visa estabelecer um regime de entrega electrónica das petições. Considera-se que este novo regime poderá, sendo objecto de ponderação, revelar alguma utilidade, devendo, contudo, minudências que apresenta ser deixadas para a especialidade.
As principais críticas dirigidas às petições, efectivamente, têm a ver com o longo espaço de tempo decorrido entre a apresentação de uma petição e a sua apreciação pela Assembleia da República. Mas não só: existe também uma grande sentimento de desânimo à volta da ineficácia que lhes está associada. Se é certo que a avaliação das consequências das petições levanta grandes dificuldades, não o é menos que, na grande maioria dos casos, os seus efeitos podem ser considerados mínimos.
Na verdade, o único efeito directo que pode seguir a apreciação de uma petição é uma possível recomendação da Assembleia da República. Também, embora já enquanto efeito indirecto, podem essas recomendações conduzir à apresentação de legislação nova ou de perguntas ao Governo.
Desde a revisão do regime das petições, em 1993, contudo, a recomendação parlamentar pode revestir a forma de diligência conciliadora, visando directamente a resolução de um problema sob mediação da Assembleia da República.
Acresce que a visibilidade que a discussão em Plenário proporciona pode resultar noutros efeitos indirectos que proporcionem alguma satisfação aos peticionantes. Não

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seria descabido, porém, rever o actual modelo de debate das petições, que peca por uma excessiva rigidez e falta de vivacidade.
Não serão estas razões suficientes para inverter o descrédito em que o direito de petição tem caído junto dos cidadãos, contribuindo, assim, para manter os cidadãos à margem da Assembleia da República, em vez de os aproximar.
Por último, há que referir que, além de darem cumprimento ao comando constitucional atrás referido, as iniciativas legislativas procuram igualmente dar resposta às preocupações suscitadas no relatório da actividade parlamentar da 4.ª Sessão Legislativa da VI Legislatura, no qual se advertia expressamente que "(…) na futura actividade da comissão de petições será importante progredir em duas áreas fundamentais: a celeridade na resposta da comissão de petições e o aumento da colaboração entre esta e as entidades competentes para a resolução das questões em razão da matéria".
Entretanto, o desaparecimento da comissão de petições e a consagração da distribuição destas pelas outras comissões pertinentes, em razão da matéria, retirou alguma actualidade àquela observação. Mas a questão da celeridade na resposta mantém plena actualidade, pelo que, curando as presentes iniciativas desse ponto, devem merecer, assim se espera, o voto favorável de todos os partidos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda contribuirá com o seu voto para a aprovação, assim o esperamos, destas propostas.
Pensamos que é fundamental que a democracia participativa não seja uma mera proclamação retórica e que, entre essa proclamação e a prática efectiva, não se aprofunde todo um abismo.
De facto, sabemos - e várias pessoas nos têm contactado a esse respeito - que há uma profunda descrença por parte dos nossos concidadãos no que diz respeito a este direito fundamental. Importa, por isso, dignificá-lo. E todas estas questões presentes nas várias propostas - a implantação de prazos, a obrigação de serem ouvidos os peticionantes, o facto de haver um agendamento obrigatório quer de comissão quer de Plenário e tirarem-se consequências efectivas do agendamento dessas petições - dignificarão, sem dúvida alguma, este instrumento.
Pior do que tudo é criar falsas expectativas, expectativas sociais que, depois, não são obviamente cumpridas. Isso, sim, descredibiliza; isso, sim, frustra; isso, sim, pode provocar regressões ao nível do comportamento político.
Por isso, pensamos que é fundamental que estas propostas sejam aprovadas e discutidas na especialidade e pensamos, também, que importa dar passos concretos no que diz respeito à própria utilização da via electrónica para este tipo de instrumentos.
Aliás, estamos à espera que o próprio Governo cumpra a sua promessa - e o prazo prometido foi de um ano - de o órgão da sociedade de informação dependente do Sr. Primeiro-Ministro, o e-government, o governo electrónico, estar disponível, no que diz respeito a todos os seus serviços.
Acho que a Assembleia deve dar aqui o exemplo, adoptando, sem delongas, a utilização dos meios electrónicos, para que haja uma proximidade cada vez maior face aos nossos eleitores.

Os Srs. Luís Marques Guedes (PSD) e António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Constituição da República Portuguesa refere expressamente que a informação, relativamente ao resultado da apreciação das petições, deve ser feita "em prazo razoável".
Entretanto, a Lei n.º 43/90, de 10 de Agosto, alterada pela Lei n.º 6/93, de 1 de Março, veio estabelecer o regime do exercício do direito de petição.
No entanto, como já aqui foi referido nas diversas intervenções produzidas, a prática é, de facto, diferente. As petições passam de legislatura para legislatura - às vezes, até mais do que uma legislatura -, pelo que os assuntos suscitados por via de uma petição, cujos objectos já estão completamente ultrapassados, fazem-nos discutir sobre aquilo que "era" (passado). Ora, isto tem descredibilizado necessariamente quer a Assembleia da República aos olhos dos peticionantes, quer a própria figura do direito de petição. Ele deve valer, na perspectiva de Os Verdes, para ter efeito, para ser eficaz, para apelar à acção, aos grupos parlamentares e aos Deputados. Mas, na maioria das vezes e ao longo dos tempos, não tem sido assim, fundamentalmente pelo facto de serem tardiamente discutidas e apreciadas essas petições.
O problema reside fundamentalmente no tempo de produção dos relatórios nas comissões - e relembro os Srs. Deputados dos inúmeros relatórios intercalares a solicitar informação a diferentes governos relativamente a matérias constantes das petições, estabelecendo-se um prazo de 20 dias para a resposta a esse relatório intercalar, que nunca me lembro de ter sido cumprido por parte de nenhum governo -, depois, a produção do relatório definitivo e, depois, o seu agendamento em Plenário, quando tem o número suficiente de assinaturas, prazo que normalmente arrasta bastante a discussão do objecto dessa petição.
Creio, também, que, nos últimos tempos, na Assembleia da República, se tem feito um esforço - é de reconhecer - para acelerar a discussão das petições, mas, de facto, esse esforço não tem sido suficiente.
Os Verdes crêem que, por todos estes motivos, está mais que justificada a necessidade de alteração do regime do exercício do direito de petição.
Gostava, ainda, de realçar que, de tudo aquilo que é proposto nos diferentes projectos de lei apresentados, aquilo a que atribuímos mais relevância é à definição do prazo de apreciação das petições, um prazo não prorrogável, de modo a que não se arraste eternamente a discussão dessas mesmas petições.

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Termino, referindo que a Assembleia da República deve ao País a dignificação do direito de petição.

Vozes do PSD, do PCP e do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por encerrada a discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 69/IX (PCP), 144/IX (PS) e 146/IX (PSD e CDS-PP).
A próxima reunião plenária realiza-se amanhã, sexta-feira, com início às 10 horas, e dela consta, em primeiro lugar, um debate de interesse relevante, ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento da Assembleia da República, sobre o tema "A família e a escola" e, em segundo lugar, um debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, sobre as dotações do Fundo de Garantia da Justiça. Informo, ainda, que os tempos estão distribuídos na folha avulsa que está na posse dos Srs. Deputados.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 25 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação,
relativa à votação, na generalidade, da proposta de lei
n.º 15/IX - Aprova o novo regime jurídico da
gestão hospitalar. a)

Seguindo a orientação de voto do meu grupo parlamentar, abstive-me na votação relativa à proposta de lei n.º 15/IX, sobre a gestão hospitalar.
Anunciei, então, que apresentaria uma declaração de voto, o que passo a fazer.
A proposta, pretendendo regular a rede nacional de prestação de cuidados de saúde, definida na Lei de Bases da Saúde, não respalda esta Lei nem a Constituição da República, no seu artigo 64.º.
Com efeito, coloca no mesmo plano a rede pública, a rede privada e a rede social, o que aqueles instrumentos legais não permitem.
Ao fazê-lo, pretende também aplicar os mesmos princípios de gestão às entidades dos três sectores, confundindo de forma grave o papel prestador e o papel regulador do Estado. Os cidadãos não necessitam que o Estado, ou melhor, o Ministro da Saúde, zele pela boa gestão financeira dos investimentos privados na saúde. Antes, requerem que ele seja o bom garante da correcta execução dos contratos que com eles celebrar, no que toca, sobretudo, à qualidade dos serviços prestados.
Por outro lado, no que se refere ao financiamento ou ao pagamento a realizar às entidades que integram a "rede nacional", também se parte do princípio de que público é igual a privado e social, esquecendo os ónus que implicam para o sector público, designadamente a formação e a investigação, bem como as reservas estratégicas ou a obrigação de garantir a prestação, mesmo quando a procura, pela sua estrutura, não garante "o lucro" da actividade.
No que se refere à natureza jurídica de que podem revestir os hospitais públicos, a previsão de "sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" é aparentemente desnecessária.
Ora, como não há coisas desnecessárias, terá de ter, pelo menos, um de dois objectivos, ou até ambos: o de desorçamentação - retirando os hospitais que revestirem essa natureza do sector público administrativo e, assim, facilitar o cumprimento dos critérios de convergência - ou o de facilitar a sua privatização total ou parcial, o que tem significado sempre a desnatação do sector público.
Por fim, e apesar de ter lavrado a minha discordância, considero que, tratando-se de instrumento que o Governo reputa de importante, é pouco profundo no traçado que define e no seu conteúdo, devendo ter merecido cuidado desenho, o que manifestamente não aconteceu.

A Deputada do PS, Maria de Belém Roseira.
a) (Por lapso, esta declaração de voto não foi incluída no Diário da Assembleia da República, I Série, n.º 33, de 12 de Julho de 2002)

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Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação,
relativa à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais,
referente à proposta de lei n.º 20/IX

Em nome dos princípios porque fui eleita e, tal como fiz com a anterior Lei de Bases (Lei n.º 17/2000 de 8 de Agosto) apresentada pelo Partido Socialista, abstive-me na votação da actual proposta de lei como uma forma de chamar a atenção para a necessidade de aprovar uma lei de bases consensual entre os maiores partidos, a qual se mantenha como referência para a programação do futuro de milhões de portugueses, direito inequívoco dos cidadãos que vivem hoje numa total incerteza no que respeita às suas reformas e pensões de sobrevivência.
Os partidos políticos devem esclarecer os cidadãos em todos os domínios e muito especialmente neste em que nos últimos 20 anos os direitos têm mudado com frequência. Quando a matéria em causa se baseia no cálculo actuarial, em tábuas de mortalidade, em previsões de evolução demográfica e de rendimentos só por excesso de politização se pode cair no debate ideológico e nas incertezas que ele provoca.
Esta é também uma ocasião para chamar a atenção para o desequilíbrio da Caixa Geral de Aposentações, o qual, segundo os especialistas, ameaça agravar-se nos próximos anos para limites intoleráveis e que representa uma clara injustiça social entre os funcionários do Estado e os beneficiários da segurança social.
A falta de clarificação sobre a situação da Caixa Geral de Aposentações só pode lançar os funcionários públicos numa crescente incerteza sobre o seu futuro.
É este o momento para ser apresentado à Assembleia da República um trabalho sério sobre a situação actual e futura da Caixa Geral de Aposentações, à semelhança do que foi feito para a segurança social pela respectiva Comissão do Livro Branco.
A abstenção pretende, ainda, chamar a atenção para outros problemas do sistema de segurança social:
1 - Considerar que a universalidade dos direitos, quando o Estado-Providência demonstra uma evidente incapacidade

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de recursos financeiros para acorrer às situações mais graves de forma humanamente aceitável, é inimiga da solidariedade.
As condições de recursos são em muitos casos a única forma de fazer mais e melhor justiça social e não se usem as deficiências do nosso sistema fiscal como desculpa para recusar as condições de recursos nas situações mais graves.
O caso dos grandes deficientes é um dos mais gritantes mas também a actualização das pensões mínimas está sujeita à mesma racionalidade.
2 - Ao considerar, embora gradualmente, toda a carreira contributiva para o cálculo da pensão de reforma e consequentemente das pensões de sobrevivência, há que ter a coragem de dizer aos portugueses que esse método de cálculo irá baixar significativamente o valor da pensão de reforma face ao último salário.
Dizem os actuários que o valor da pensão, sendo teoricamente um máximo de 80% do último salário (40 anos x 2%), não irá com a nova metodologia de cálculo ultrapassar os 50% a 55% do último salário, apesar das anunciadas correcções monetárias para compensar a inflação.
As estimativas sobre o futuro demonstram a necessidade de considerar toda a carreira contributiva, mas o que não é legítimo é que não se esclareçam os portugueses sobre as consequências do novo método de cálculo e que não se reforcem as condições fiscais para que os contribuintes possam fazer um esforço adicional de poupança para protegerem a sua velhice.
3 - A Lei de Bases da Segurança Social deve estabelecer o claro compromisso de os governos apresentarem no que respeita às leis dos Orçamentos isenções e benefícios fiscais que garantam igualdade de tratamento para todos os cidadãos.
O quadro actual é injusto. Os cidadãos menos protegidos são os mais penalizados sob o ponto de vista fiscal, no que respeita a esquemas complementares.
4 - No artigo 21.º fala-se na conservação dos direitos adquiridos e em formação. Esta é uma matéria que exige clarificação porque ao longo dos anos tem-se assistido à sistemática violação de direitos adquiridos. Os cidadãos precisam de saber sem margem para dúvidas o que se entende por este princípio que a Lei estabelece e que define de forma genérica no artigo 122.º.
5 - No artigo 23.º fala-se do princípio da informação. Esta é outra matéria fundamental que exige clarificação e garantia de correcta execução.

A Deputada do PS, Teresa Venda.

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A declaração de voto anunciada pelo Deputado do PS Paulo Pedroso, referente à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos
Assuntos Sociais, relativa à proposta de lei n.º 20/IX,
não foi enviada atempadamente para publicação.

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Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, referente
à proposta de lei n.º 12/IX

A proposta de lei n.º 12/IX, que aprova o Regime Jurídico do Desenvolvimento e Qualidade do Ensino Superior, foi apresentada pelo Governo e aprovada na generalidade, por voto da maioria, na Assembleia da República, sem que se procedesse a qualquer consulta ou audição dos parceiros relevantes. Talvez por isso enfermava de vários erros graves.
Para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, oito erros eram especialmente gravosos: a) o ataque à autonomia patrimonial e o cerceamento da autonomia científica e pedagógica das instituições do ensino superior; b) a menorização do ensino politécnico face ao ensino universitário, querendo, designadamente, retirar-lhe a condição de centro de cultura; c) o ataque à independência do sistema de avaliação, pela pretensão de conceder ao Ministro da Ciência e Ensino Superior o poder de homologação dos resultados dos processos de avaliação; d) a imposição de uma visão "comercialista" do ensino superior, querendo subordiná-lo a alegadas necessidades ou oportunidades do mercado de emprego; e) o abaixamento, face à lei vigente, do nível de exigência colocado às propostas de criação de estabelecimentos de ensino e de cursos, e considerado para efeito do seu funcionamento; f) a excessiva concentração no Ministro do poder de decisão sobre a fixação dos requisitos de qualidade, para autorização, registo ou funcionamento, assim como a sobrevalorização de critérios administrativos, tais como limites quantitativos de frequência de alunos, em detrimento de critérios científicos, pedagógicos e de relevância social; g) a revogação implícita da Lei de Bases do Financiamento e a extensão ao orçamento do funcionamento das instituições da lógica de contratualização anual, assim pondo em causa o princípio do financiamento por fórmula; h) a criação de um intitulado Conselho Nacional do Ensino Superior, estrutura governamentalizada que em grande parte esvazia o sentido e as competências do Conselho Nacional de Educação na mesma área.
No decurso da discussão e da votação na especialidade, foi possível corrigir três destes erros. Foi reposta a consagração da autonomia patrimonial e disciplinar das instituições. Foi abandonada a inaceitável pretensão de conceder ao Ministro o poder de homologar ou não os resultados dos processos de avaliação. E o artigo da proposta de lei sobre o financiamento foi reduzido à quase total reprodução do que diz hoje o Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo sobre as condições e formas de apoio financeiro público a este subsistema.
O Partido Socialista congratula-se com estas correcções, que eliminam aspectos muito gravosos da proposta de lei. O PS acompanhou também, com o seu voto favorável, vários elementos positivos constantes da proposta ou a ela acrescentados durante a discussão na especialidade. Tais são, entre outros elementos, a consagração da igualdade de requisitos, a interdição dos estabelecimentos em regime de franquia, o não reconhecimento de graus conferidos em unidades orgânicas ou extensões que não cumpram os requisitos devidos, o respeito pelos direitos do pessoal docente e não docente quando se trata de aplicar medidas de racionalização, a valorização do acto de registo dos cursos, a intransmissibilidade do registo, a organização dos cursos em

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unidades de crédito, a competência ministerial para a fixação de vagas, a extensão aos estudantes do ensino particular e cooperativo de todos os benefícios do sistema de acção social escolar, o dever de informação das instituições e a fiscalização pela Inspecção-Geral da Ciência e do Ensino Superior.
Infelizmente, a votação em sede de especialidade manteve, por imposição da maioria, muitos dos aspectos mais negativos da proposta de lei. Mantém-se o peso da lógica "comercialista" no controlo do desenvolvimento do ensino superior, subordinando-o a avaliações, aliás estáticas, do mercado de emprego. Mantém-se o hipercentralismo e a concentração de poderes na figura do Ministro. Mantém-se a indesejável intromissão do Ministério na autonomia científica e pedagógica das instituições, que vai ao ponto de prever a interferência nas áreas facultativas dos planos de estudos. Mantém-se a menorização do ensino politécnico, ao qual agora se retira a dimensão de formação científica e de investigação. Mantém-se o limiar de baixa exigência nos requisitos fixados para criação e funcionamento de cursos e instituições. Mantém-se a determinação de que o processo de avaliação se conclua pela atribuição de uma classificação de mérito, quando, do ponto de vista do PS, as classificações de mérito devem ser atribuídas nos múltiplos parâmetros que estruturam a avaliação. Mantém-se um pouco útil e demasiado governamentalizado o Conselho Consultivo do Ensino Superior.
Mas ocorreu, em sede de especialidade, um facto ainda mais negativo: é que foram introduzidas, pela maioria, alterações na proposta de lei que agravaram as suas disposições. Em primeiro lugar, modificou-se o texto do artigo 36.º, de forma a que da recusa de acreditação de um curso ou estabelecimento possa não resultar o seu encerramento. Em segundo lugar, liberalizou-se ainda mais o regime de acumulação de funções dirigentes em diferentes estabelecimentos de ensino. Em terceiro lugar, excluiu-se do sistema de ensino superior e do seu ordenamento instituições relevantes para a sua conformação, como é o caso da Universidade Católica.
Por isso, porque o texto final mantém ou introduz disposições prejudiciais para o desenvolvimento e a qualidade do ensino superior e porque o Governo e a maioria não quiseram aproveitar a oportunidade para conduzir um debate sério e elaborar uma lei estruturante para o sector, o PS mantém, na votação final global, o seu voto contra.

Os Deputados do PS, Augusto Santos Silva - Isabel Pires de Lima - Rosalina Martins - Cristina Granada - António Braga - Luiz Fagundes Duarte - Ana Benavente - Paulo Pedroso.

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O Bloco de Esquerda exprime pelo seu voto a firme recusa dos pressupostos contidos na proposta de lei n.º 12/IX, que aprova o Regime Jurídico do Desenvolvimento e Qualidade do Ensino Superior.
Entre outras, movem-nos as seguintes razões:
1 - A inadmissível confusão entre processos de avaliação e acreditação de cursos e estabelecimentos de ensino;
2 - A possibilidade de encerramento de estabelecimentos de ensino, no caso de avaliação negativa, sem se promover, previamente, um conjunto de incentivos que permitam a essas instituições corrigir e melhorar a sua situação;
3 - A redução objectiva do grau de autonomia dos estabelecimentos do ensino superior;
4 - A submissão estrita aos interesses económicos constitutivos do mercado de trabalho, nomeadamente ao condicionar, de forma subtil, a criação, expansão e encerramento de cursos e estabelecimentos de ensino superior, de acordo com o entendimento parcial e subjectivo do Ministério da Ciência e do Ensino Superior;
5 - A extensão das possibilidades de acumulação de funções docentes em estabelecimentos de ensino privado, potenciando situações de uma não desejada promiscuidade.

Os Deputados do BE, João Teixeira Lopes - Francisco Louçã - Ana Drago.

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Srs. Deputados que deram entrada durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Jorge Martins Pereira
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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