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2822 | I Série - Número 066 | 12 de Dezembro de 2002

 

Não podemos, no entanto, deixar de expressar, sendo essa a razão fundamental desta declaração de voto, a nossa insatisfação quanto à extensão das alterações introduzidas no Regimento.
Fala-se, há muito, da necessidade de uma reforma do sistema político que tem fundamentalmente a ver com uma imagem negativa dos políticos e em particular dos parlamentares, imagem essa em percentagem significativa artificialmente inoculada na opinião pública.
Na opinião pública portuguesa, muito mais do que preocupação ou condenação do actual sistema eleitoral ou da forma de financiamento dos partidos políticos, perpassa a imagem de que particularmente os Deputados trabalham pouco ou, pior do que isso, registam elevadas taxas de ausência naquilo que tem, até agora, sido a face visível para a referida opinião pública: as reuniões do Plenário da Assembleia da República.
Nós que estamos dentro da Câmara sabemos que a acusação é injusta. Os Deputados trabalham intensamente, na defesa dos interesses de quem os elegeu e acima de tudo de Portugal, auferindo por tão nobre missão o dobro do que aufere o presidente de uma junta de freguesia com mais de 20 000 eleitores.
Mas nós sabemos também, pelo menos é a nossa opinião, que a Câmara poderia funcionar melhor, isto é, mais rapidamente, mais eficazmente e sem que sobre os Deputados recaísse a injusta acusação de não estarem, muitas vezes injustificadamente, presentes nas reuniões plenárias, como irá continuar inexoravelmente a acontecer no futuro, apesar das alterações ora introduzidas no Regimento.
É precisamente no plano da superação dos aspectos negativos referidos no parágrafo anterior que consideramos muito curtas e conservadoras as alterações introduzidas no Regimento, configurando-se, assim, de certa forma, como uma oportunidade perdida.
Passamos, de imediato, a concretizar.
Tivemos ocasião ao longo do tempo, em particular dos dois anos da legislatura anterior, de examinar as matérias que, na forma de projectos de lei, de propostas de lei ou outras, foram levadas à discussão e votação em reunião do Plenário da Assembleia da República.
Pois bem, concluímos que porventura cerca de 70% a 80% de tais matérias não tinham, em nossa opinião, a dignidade necessária e suficiente para serem objecto de discussão e votação em Plenário da Câmara.
A título paradigmático, recordo projectos de diplomas sobre os tapetes de Arraiolos ou sobre a fauna e flora dos Açores.
Ora, não é nem humano nem racionalmente exigível impor ou pretender, a não ser como sacrifício para remição dos pecados dos Srs. Deputados, que estes estejam presentes, em número significativo, em discussões e votações tendo por objecto matérias que, fundamentalmente pela sua especialização, num mundo cada vez mais especializado, apenas e por natureza podem admitir a intervenção relevante de alguns poucos Deputados.
Em que pode, por exemplo, um Deputado advogado, Deputado pertencente à Comissão de Defesa, contribuir para uma discussão sobre tapetes de Arraiolos ou sobre a flora dos Açores? Obviamente que não pode contribuir com nada de útil.
A matéria em causa, apontada a título meramente exemplificativo, é altamente especializada e para ela só podem contribuir com relevância os Deputados da comissão especializada que a apreciaram e relataram e, eventualmente, excepcionalmente um ou outro Deputado que, por motivos particulares, tenha interesse no assunto ou conhecimentos sobre ele.
Ora, chegados a este ponto, entramos naquilo que julgamos que deveria ser um caminho que as alterações ao Regimento deveriam ter consagrado mas não consagraram, assim se perdendo, infelizmente, a oportunidade.
Qual, então, o caminho?
O caminho era o de reduzir drasticamente o número de reuniões plenárias da Assembleia da República, estripando delas as matérias que, pela sua especialização ou insuficiente dignidade, não devem ser discutidas em tal sede.
As reuniões plenárias ficariam afectas às grandes figuras regimentais: Grandes Opções do Plano e Orçamento do Estada, Conta Geral do Estado, Programa do Governo, Moção de Confiança e de Censura, etc.
Às comissões permanentes especializadas passaria a caber a discussão total, isto é, na generalidade e na especialidade, assim como a votação das aludidas restantes matérias.
No limite, acharíamos admissível retirar às comissões e levar ao Plenário apenas a votação dos projectos de diploma tendo por objecto as tais matérias.
Como V. Ex.ª, Sr. Presidente, deve calcular, limitamo-nos a apontar, nesta declaração de voto, apenas a linha essencial do trajecto que, penso, deveria ter sido traçado e traduzido nas correspondentes alterações ao Regimento.
O Parlamento funcionaria mais rapidamente, mais eficazmente e com maior dignidade quer para a Câmara como instituição quer, e fundamentalmente, para os Deputados, tantas vezes acusados de ausentes de discussões que, fundamentalmente pela sua especialidade, apenas justificam a presença daqueles que, por pertença à comissão ou por razões subjectivas, nelas têm de intervir ou querem intervir.
Apontamos, ainda, dois outros aspectos negativos que não são corrigidos com as alterações ao Regimento.
O primeiro aspecto consiste na continuação da consagração da possibilidade de se constituir um grupo parlamentar apenas com dois Deputados com todas as competências daí decorrentes em termos das prerrogativas regimentalmente consagradas, nomeadamente quanto ao tempo de intervenção. Trata-se de uma aberração, claramente antidemocrática, que leva a que o Partido Comunista usufrua da circunstância de ter dois grupos parlamentares na Assembleia da República: o próprio e outro que, sendo também próprio, tem outro nome - PEV.
O segundo aspecto consiste em não se terem introduzido as alterações necessárias a que, em muitas grelhas de uso de tempo, os pequenos ou pequeníssimos partidos tenham praticamente o mesmo tempo de intervenção dos maiores partidos.
Trata-se de outra aberração, igualmente antidemocrática, pois vem dar tempo de intervenção a minorias extremistas, pouco representadas na sociedade portuguesa, tempo esse inteiramente desproporcionado para mais, por comparação com aquele que em tais grelhas é concedido aos maiores partidos.

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