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Quinta-feira, 9 de Janeiro de 2003 I Série - Número 71

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 8 DE JANEIRO DE 2003

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
Ascenso Luís Seixas Simões
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação dos projectos de lei n.os 187 a 189/IX, dos projectos de resolução n.os 75 a 78/IX, dos projectos de deliberação n.os 13 e 14/IX, das apreciações parlamentares n.os 12 a 42/IX, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Foram aprovados três pareceres da Comissão de Ética, um sobre a retoma de mandato de um Deputado do PSD, outro sobre a substituição de um Deputado do PS e outro ainda autorizando um Deputado do PS a depor em tribunal.
O Sr. Presidente manifestou o seu pesar pelo falecimento do Sr. Deputado Aires de Carvalho (PS), tendo sido aprovado o voto n.º 33/IX - De pesar pelo falecimento do Deputado do PS Aires de Carvalho (PS). No fim, a Câmara guardou 1 minuto de silêncio em sua homenagem, após o que o Sr. Deputado António Costa (PS) agradeceu a solidariedade manifestada pela Câmara ao seu Grupo Parlamentar.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Isabel Castro (Os Verdes) falou sobre as situações de emergência e de elevado risco, concretamente, das cheias e, no fim, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Manuel Alegre (PS).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Francisco Louçã (BE), a propósito das acusações que recaem sobre a Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras, insurgiu-se contra o facto de a mesma não se ter demitido assim que a investigação começou. Respondeu, depois, aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Costa (PS) e Narana Coissoró (CDS-PP).
O Sr. Deputado Miguel Coelho (PS) referiu-se às manifestações de protesto ocorridas na passada segunda-feira na CREL e condenou a medida tomada pelo Governo de reintrodução de pagamento de portagens na referida circular. Respondeu, depois, aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António da Silva Preto (PSD) - que deu também explicações a propósito do exercício da figura de defesa da consideração pela Sr.ª Deputada Edite Estrela (PS) - e António Filipe (PCP).

Ordem do dia. - Em debate mensal de interesse relevante (ao abrigo do artigo 76.º, n.º 2, do Regimento), sobre a revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento, usaram da palavra, a diverso título, além da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Manuela Ferreira Leite), os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Joel Hasse Ferreira (PS), Diogo Feio (CDS-PP), Jorge Neto (PSD), Francisco Louçã (BE), João Cravinho e Jamila Madeira (PS) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
A Câmara aprovou ainda um parecer da Comissão de Ética autorizando um Sr. Deputado do PS a depor em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Gustavo de Sousa Duarte
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Rodrigues Gomes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário Patinha Antão
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões

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Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Sequeiros de Castro Pontes
José António Fonseca Vieira da Silva
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Maria Abrunhosa Sousa
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas, dos requerimentos e das respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 187/IX - Segunda alteração à Lei n.º 91/95, de 2 de Setembro, sobre as Áreas Urbanas de Génese Ilegal (PSD), que baixa à 4.ª Comissão, 188/IX - Elevação de Vila Nova de Santo André a cidade (PSD), que baixa à 4.ª Comissão,

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189/IX - Assegura a defesa e a valorização da calçada de vidraço à portuguesa (PCP), que baixa à 5.ª Comissão; apreciações parlamentares n.os 12/IX - Do Decreto-Lei n.º 272/2002, de 9 de Dezembro, que "transforma o Hospital D. Pedro, em Aveiro, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP); 13/IX - Do Decreto-lei n.º 273/2002, de 9 de Dezembro, que "transforma o Centro Hospitalar de Vila Real/Peso da Régua em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 14/IX - Do Decreto-Lei n.º 274/2002, de 9 de Dezembro, que "transforma o Hospital de S. Gonçalo, de Amarante, pessoa colectiva de direito público, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 15/IX - Do Decreto-Lei n.º 275/2002, de 9 de Dezembro, que "transforma o Hospital José Joaquim Fernandes, Beja, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 16/IX - Do Decreto-Lei n.º 276/2002, de 9 de Dezembro, que "transforma o Instituto Português de Oncologia de Francisco Gentil, Centro Regional de Coimbra, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP); 17/IX - Do Decreto-Lei n.º 277/2002, de 9 de Dezembro, que "transforma o Hospital Distrital de Bragança em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 18/IX - Do Decreto-Lei n.º 278/2002, de 9 de Dezembro, que "transforma o Hospital de Egas Moniz, de Lisboa, pessoa colectiva de direito público, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 19/IX - Do Decreto-Lei n.º 279/2002, de 9 de Dezembro, que "transforma o Hospital S. Francisco Xavier, de Lisboa, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 20/IX - Do Decreto-Lei n.º 280/2002, de 9 de Dezembro, que "transforma o Hospital do Barlavento Algarvio, em Portimão, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 21/IX - Do Decreto-Lei n.º 281/2002, de 9 de Dezembro, que "transforma o Hospital Geral de Santo António, no Porto, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 22/IX - Do Decreto-Lei n.º 282/2002, de 10 de Dezembro, que "transforma o Instituto Português de Oncologia de Francisco Gentil, Centro Regional de Oncologia do Porto, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 23/IX - Do Decreto-Lei n.º 283/2002, de 10 de Dezembro, que "transforma a Unidade Local de Saúde, de Matosinhos, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 24/IX - Do Decreto-Lei n.º 284/2002, de 10 de Dezembro, que "transforma o Hospital de Padre Américo - Vale de Sousa, de Penafiel, pessoa colectiva de direito público, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 25/IX - Do Decreto-Lei n.º 285/2002, de 10 de Dezembro, que "transforma o Hospital da Senhora de Oliveira, de Guimarães, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 26/IX - Do Decreto-Lei n.º 286/2002, de 10 de Dezembro, que "transforma o Hospital Distrital da Figueira da Foz, pessoa colectiva de direito público, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 27/IX - Do Decreto-Lei n.º 287/2002, de 10 de Dezembro, que "transforma o Hospital de S. Teotónio, em Viseu, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 28/IX - Do Decreto-Lei n.º 288/2002, de 10 de Dezembro, que "transforma o Centro Hospitalar de Cova da Beira em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 29/IX - Do Decreto-Lei n.º 289/2002, de 10 de Dezembro, que "transforma o Instituto Português de Oncologia de Francisco Gentil, Centro Regional de Oncologia de Lisboa, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 30/IX - Do Decreto-Lei n.º 290/2002, de 10 de Dezembro, que "transforma o Hospital Pulido Valente, de Lisboa, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 31/IX - Do Decreto-Lei n.º 291/2002, de 10 de Dezembro, que "transforma o Hospital de Santa Cruz, de Lisboa, pessoa colectiva de direito público, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 32/IX - Do Decreto-Lei n.º 292/2002, de 10 de Dezembro, que "transforma o Hospital de Santa Marta, em Lisboa, pessoa colectiva de direito público, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 33/IX - Do Decreto-Lei n.º 293/2002, de 11 de Dezembro, que "transforma o Hospital de Santa Maria Maior, de Barcelos, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 34/IX - Do Decreto-Lei n.º 294/2002, de 11 de Dezembro, que "transforma o Hospital de S. João de Deus, de Vila Nova de Famalicão, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 35/IX - Do Decreto-Lei n.º 295/2002, de 11 de Dezembro, que "transforma o grupo dos hospitais do Alto Minho em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 36/IX - Do Decreto-Lei n.º 296/2002, de 11 de Dezembro, que "transforma o Hospital de S. Sebastião, em Santa Maria da Feira, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 37/IX - Do Decreto-Lei n.º 297/2002, de 11 de Dezembro, que "transforma o Hospital de Santo André - Leiria, pessoa colectiva de direito público, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 38/IX - Do Decreto-Lei n.º 298/2002, de 11 de Dezembro, que "transforma o Hospital de Garcia de Orta, de Almada, pessoa colectiva de direito público, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 39/IX - Do Decreto-Lei n.º 299/2002, de 11 de Dezembro, que "transforma o Hospital Nossa Senhora do Rosário, Barreiro, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 40/IX - Do Decreto-Lei n.º 300/2002, de 11 de Dezembro, que "transforma o Hospital de S. Bernardo, Setúbal, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 41/IX - Do Decreto-Lei n.º 301/2002, de 11 de Dezembro, que "transforma o Centro Hospitalar do Médio Tejo em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP), 42/IX - Do Decreto-Lei n.º 302/2002, de 11 de Dezembro, que "transforma o Hospital Distrital de Santarém em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos" (PCP); projectos de deliberação n.os 13/IX - Sobre o Pacto de Estabilidade e Crescimento e sobre o Programa de Estabilidade e Crescimento (2003-2006) (BE), 14/IX - Sobre a verificação das contas públicas que estão na base do Programa de Estabilidade e Crescimento (2003-2006) (BE); projectos de resolução n.os 75/IX - Atribui prioridade máxima à instalação de um sistema costeiro de vigilância marítima (VTS) (Os Verdes), 76/IX - Revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento para o período 2003-2006 (PSD e CDS-PP), 77/IX - Sobre o Programa de Estabilidade e Crescimento para o período 2003-2006 (PCP), 78/IX - Sobre o Programa de Estabilidade e Crescimento para o período de 2003/2006 (PS).
Foram apresentados na Mesa os requerimentos seguintes:
Nas reuniões plenárias de 11 e 12 de Dezembro de 2002: ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados Maria

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Santos e Manuel Cambra; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Carlos Luís; do Ministério da Segurança Social e do Trabalho, formulado pelo Sr. Deputado Jerónimo de Sousa; ao Governo e ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Luísa Mesquita, José Lello, José Apolinário e Bruno Dias; ao Ministério da Administração Interna, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação e da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Fernando Pedro Moutinho, José Junqueiro, Paula Cristina Duarte e Rodeia Machado; ao Ministério da Administração Interna e ao Director Nacional da PSP, formulados pelo Sr. Deputado José Saraiva; ao Sr. Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Honório Novo.
No dia 13 de Dezembro de 2002: à Secretaria de Estado da Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e à Câmara Municipal de Vila Pouca de Aguiar, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.
Nos dias 16 e 17 e na reunião plenária de 18 de Dezembro de 2002: ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pela Sr.ª Deputada Maria Manuela Aguiar; a diversos Ministérios, formulados pelos Srs. Deputados Luísa Mesquita, Isabel Castro, Bruno Vitorino e Lino de Carvalho; ao Governo, à Ministra de Estado e das Finanças e aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação e da Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados Afonso Candal e Fernando Cabral; ao Ministro da Presidência e aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação e da Cultura, formulados pelos Srs. Deputados José Saraiva e José Junqueiro; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; aos Ministérios da Ciência e do Ensino Superior e à Secretaria de Estado da Juventude e Desportos, formulado pelo Sr. Deputado Bruno Dias; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:
No dia 12 de Dezembro de 2002 - Maria Manuela Aguiar, nos dias 1 de Agosto e 12 de Setembro; Narana Coissoró, na sessão de 26 de Setembro; Bernardino Soares, na sessão de 22 de Outubro.
No dia 13 de Dezembro de 2002 - Judite Jorge, no dia 5 de Agosto; António Galamba, no dia 30 de Setembro; José Apolinário e Miranda Calha, na sessão de 16 de Outubro; Lino de Carvalho, na sessão de 17 de Outubro; António Filipe, na sessão de 23 de Outubro; Isabel Castro, no dia 28 de Outubro; Ascenso Simões, no dia 29 de Outubro; Heloísa Apolónia, no dia 30 de Outubro; José Junqueiro, no dia 6 de Novembro; Leonor Coutinho, no dia 7 de Novembro.
No dia 17 de Dezembro de 2002 - Fernando Pedro Moutinho, nas sessões de 7 de Maio e 20 de Junho; António Galamba, no dia 22 de Julho; Laurentino Dias, no dia 24 de Julho; Francisco Louçã, no dia 16 de Setembro; António Filipe, na sessão de 26 de Setembro; Isabel Castro, nas sessões de 3 e 4 de Outubro e nos dias 10 de Outubro e 8 de Novembro; João Rebelo, na sessão de 2 de Outubro; Maria Manuela Aguiar, no dia 7 de Outubro; Bruno Dias, na sessão de 10 de Outubro.
Nos dias 18 e 19 de Dezembro de 2002 - José Apolinário, na sessão de 26 de Setembro; Herculano Gonçalves, na sessão de 3 de Outubro; Fernando Serrasqueiro, na sessão de 3 de Dezembro; António Costa, na sessão de 11 de Dezembro.
No dia 17 de Dezembro de 2002, foi ainda dada resposta ao requerimento apresentado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro no dia 16 de Julho.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, após o período de interrupção dos trabalhos, na sequência do Natal, eis-nos regressados. A todos saúdo muito cordialmente, fazendo votos de que tenham tido boas férias em companhia das vossas famílias e desejando também cordialmente a todos as melhores venturas para o ano 2003.
Infelizmente, o nosso primeiro tema de hoje é um assunto penoso. Sr.as e Srs. Deputados, sofremos todos hoje a triste impressão de ter entre nós um lugar vazio. A morte levou o nosso Colega Aires de Carvalho, Deputado à Assembleia da República eleito pelo distrito de Setúbal nas listas do Partido Socialista. Noutras alturas, no meio de um conjunto tão numeroso de pessoas, talvez nem déssemos por ele; agora notamos-lhe a falta e sabemos que a sua ausência é definitiva e irremediável.
Fui surpreendido pela notícia da morte do Sr. Deputado Aires de Carvalho no Domingo passado, estando ainda em casa, nos Açores, de período natalício. Em representação de toda a Câmara acompanhei o seu funeral no dia seguinte, no Barreiro, e ajudei a estender sobre a urna que continha os seus restos mortais a bandeira nacional, em homenagem a quem foi em vida representante eleito do povo português.
Comovido, eu próprio pude comprovar a viva comoção de tantas e tantas pessoas - familiares, amigos, camaradas de partido e muito povo anónimo - que acompanharam o corpo de Aires de Carvalho até à sua última morada. Quem assim foi chorado e lamentado era, certamente, um homem bom, tinha, com certeza, um grande coração empenhado nos ideais que lhe nortearam o viver. Senti pena, então - e ainda sinto -, de o não ter conhecido melhor.
Em sinal de luto do Parlamento mandei descer a bandeira a meia haste na varanda do Palácio enquanto durar esta sessão plenária e sugeri ao Sr. Presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista que, por respeito para com o morto, não se preenchesse, de imediato, a sua vaga. Amanhã, dia em que haverá votações, verificaremos os poderes do seu substituto legal, mas hoje o seu lugar fica vazio.
Foram religiosos os ritos fúnebres do falecido Sr. Deputado Aires de Carvalho, conforme, certamente, as tradições da sua família e, presumo, as suas íntimas convicções. Isso me autoriza a concluir com o dito antigo, tão comum entre o nosso povo: "Tenha Deus a sua alma em bom lugar".
Srs. Deputados, vamos de imediato apreciar o voto n.º 33/IX - De pesar pelo falecimento do Deputado do PS Aires de Carvalho, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista e subscrito, conforme me comunicou o Sr. Deputado António Costa, pelos líderes de todos os grupos parlamentares.
Tem a palavra o Sr. Secretário para proceder à respectiva leitura.

O Sr. Secretário (Ascenso Simões): - O voto é o seguinte:
No passado dia 5 deixou o nosso convívio o Deputado eleito pelo círculo eleitoral de Setúbal, nas listas do Partido Socialista, Aires Manuel Jacinto de Carvalho.

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Técnico Tributário da Direcção-Geral de Contribuições e Impostos, filiou-se no Partido Socialista em 22 de Novembro de 1979.
Mas foi, sobretudo, na década de 80 que Aires de Carvalho assumiu um envolvimento partidário mais activo, percorrendo todos os degraus da responsabilidade partidária:
Membro da Comissão Política Concelhia do Barreiro e seu Presidente em vários mandatos;
Membro da Comissão Política do Secretariado da Federação de Setúbal do PS em vários mandatos e seu anterior Presidente;
Membro da Comissão Nacional do PS;
Vereador da Câmara Municipal do Barreiro eleito do PS nos mandatos de 93 a 97 e 97 a 2001;
Deputado eleito nas VII, VIII e IX Legislaturas.
Todos os que conheceram e conviveram com Aires de Carvalho reconheciam a sua firme determinação, a sua enorme coragem e extrema dedicação às causas em que acreditava e nos projectos em que se envolvia.
Era uma pessoa frontal, mas um companheiro leal e um homem extremamente solidário.
Aires de Carvalho nunca pensava em si, tendo sempre abraçado de forma apaixonada as causas em que acreditava.
Esta faceta da sua vida conduziu a que nem sequer se tivesse preocupado com os sintomas da doença que nos últimos tempos lhe bateu à porta.
E quando, finalmente, lha diagnosticaram, continuou a transmitir aos amigos e conhecidos uma mensagem de optimismo e esperança.
Em momento algum deu sinais de desalento ou desânimo.
A vida, para ele, era para ser vivida com a mesma intensidade até ao último momento.
É verdade que quando sentiu a terra fugir-lhe debaixo dos pés se agarrou à vida. Mas ao contrário do que diz Torga não perdeu o brio e enfrentou de cara levantada a fatalidade.
Quase não teve tempo de bater às portas da Ciência. Agarrou, com todas as forças, as asas da ilusão de que o poeta falava e continuou a dizer-nos, com a sua sensibilidade, que o sonho comanda a vida.
E que queria, sobretudo, para os seus semelhantes, mais dignidade e melhor cidadania.
Assim, propomos que a Assembleia da República manifeste à sua mãe, D. Mónica Jacinto, as mais sentidas condolências.
Exprima, num voto de pesar e no guardar de 1 minuto de silêncio, a sua admiração e o seu respeito.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto que acabámos ouvir ler.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, verifiquei a presença do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e quero agradecer, em nome da Assembleia da República, a solidariedade do Governo num momento de luto, que não é apenas do Partido Socialista - a quem, de qualquer modo, estendo os meus sentimentos -, mas também de todo o Parlamento.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, muito rapidamente, quero, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, agradecer a todas as bancadas, ao Sr. Presidente e ao Governo, na presença do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, pela forma como manifestaram a vossa solidariedade e pelas condolências que, desde domingo, transmitiram ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Em nome do meu grupo parlamentar, os meus agradecimentos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de vários relatórios e pareceres da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à retoma de mandato, nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Deputados, no Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata (PSD), de José de Matos Correia (Círculo Eleitoral de Lisboa), cessando Pistacchini Calhau, em 8 de Janeiro corrente, inclusive. O parecer é no sentido de que a retoma de mandato é de admitir.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição, nos termos do artigo 5.º, n.º 2, alínea d) do Estatuto dos Deputados, do Sr. Deputado Brandão Rodrigues (Círculo Eleitoral de Lisboa) pelo Sr. Deputado João Maria Abrunhosa de Sousa, com início em 1 de Janeiro de 2003, inclusive. Depois de observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis, o parecer é no sentido de admitir a substituição.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Os Srs. Deputados cujos poderes estão verificados podem, obviamente, tomar os seus lugares no Hemiciclo. Apresento-lhes as boas-vindas no seu ingresso e no seu regresso, como é o caso do Sr. Deputado José de Matos Correia.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 4.º Juízo do Tribunal Criminal de Lisboa, Processo n.º 3269/98.5TDLSB, 3.ª Secção, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Jorge Coelho (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

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A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A irresponsabilidade tem de ser combatida.
As situações de risco, como as cheias, têm de ser previstas e prevenidas.
Os cidadãos têm o direito de ser informados e de participar na organização da sua defesa.
É inaceitável que não haja uma pessoa ou entidade nacional com poder hierarquicamente atribuído e competência centralizada para responder, em tempo útil, nas situações de emergência e de elevado risco, como são as cheias, capaz de assegurar eficazmente toda a coordenação do processo e de deter o poder sobre as barragens. Uma entidade com capacidade de decidir sobre a gestão dos caudais; activar todo o sistema de segurança e de alerta; responder pela activação dos múltiplos meios de intervenção; desencadear a entrada em vigor dos planos de emergência; accionar os sistemas de informação aos cidadãos e garantir-lhes os respectivos meios de segurança e de apoio.
As incompetências verificadas nos últimos dias com as cheias nos rios Douro, Vouga, Mondego, Tejo, Zêzere e Alviela, que tão duramente inundaram a vida dos portugueses e se abateram com os seus prejuízos sobre as comunidades ribeirinhas que vivem nas suas margens, de que são exemplo os acidentes e repentinas subidas nos caudais das ribeiras do Porto e de Gaia, na Régua, em Amarante, em Águeda, em Mortágua, em Mira, em Constância, entre outros, não são uma fatalidade nem o resultado de caprichos dos rios; são, antes, o resultado de erros, que não podem continuar a ser tolerados!!
Neste país, a cultura de irresponsabilidade, irmã gémea do passa-culpas, tem sido, ao longo de anos, sinónimo da incapacidade de analisar fragilidades dos sistemas, da ausência de reflexão crítica sobre os erros e suas consequências, da inexistência de uma rotina de avaliação de métodos de cooperação e de trabalho.
Uma acusação incómoda e injusta, porventura julgarão alguns, mas que não resiste às interrogações que os cidadãos portugueses legitimamente a si próprios, durante os últimos dias, se colocam.
Pois é ou não verdade que não há uma correcta gestão dos caudais, concretamente no Douro e no Tejo?
É ou não verdade que tem sido a EDP a ditar as regras sobre a água que debita nas barragens e na definição da sua capacidade de encaixe?
É ou não verdade que a esmagadora maioria das barragens portuguesas não tem planos de emergência aprovados?
É ou não verdade que 37 barragens inspeccionadas estão em risco?
É ou não verdade que, não obstante há mais de um ano uma barragem ter sido considerada inaceitável em termos de segurança, nenhuma investigação foi feita aos responsáveis por aquela obra?
É ou não verdade que, uma vez mais, se registaram falhas no sistema de notificação e informação atempada aos cidadãos e populações em risco?
Perguntas a que se podem juntar outras num desastre que não é culpa da Natureza mas dos erros contra ela cometidos.
Pois é ou não verdade que algumas das consequências das cheias resultam de conhecidos erros e omissões graves em matéria de ocupação de solos, de ordenamento do território, de sistemático desprezo pelos valores ambientais?
É ou não verdade que esses erros são consentidos e responsabilidade directa ou por omissão das autarquias locais e da administração, de sucessivos governos, responsáveis nomeadamente pelo ordenamento do território, pela agricultura, pelo ambiente e pela floresta?
É obvio que sim!
Como é óbvio, também, que se continua a autorizar a construção em zonas ribeirinhas, a ocupação e a impermeabilização em leitos de cheia, que a falta de limpeza e desobstrução de linhas de água tem sido regra, que a alteração de usos dos solos tem sido feita ignorando a avaliação prévia de impactes, que a desflorestação das encostas, nomeadamente pela eucaliptização, são ainda hoje coisas vulgares.
Factos estes a que se têm somado outros mais recentes nesta incapacidade grave de prever e prevenir.
Pois é ou não verdade que as disfunções no nosso clima, concretamente resultantes da alteração do regime de pluviosidade, sua incidência, volume e precipitação, tão evidentes para todos, ainda não aconselharam a adopção por este Governo de novas medidas para tornar mais previsto o imprevisível, no tocante às cheias, medidas mais rigorosas de precaução, que passariam por uma nova e diferente avaliação de risco e reforço das margens de segurança nas barragens?
Em suma, Sr.as e Srs. Deputados, estas questões reclamam respostas consistentes e eficazes, que até agora o Governo no seu silêncio não foi capaz de dar, e não se compadecem com vagas excursões e declarações de ocasião para consumo mediático nem aceitam que nos limitemos a esperar com o aceno até à próxima cheia.
Implicam, sim e desde já, no entendimento de Os Verdes, um levantamento rigoroso de todos os prejuízos causados e das responsabilidades do Estado em função disso estimadas; uma análise que não dispensa a avaliação crítica e minuciosa de todos os factos ocorridos, a identificação clara das responsabilidades dos diferentes organismos e entidades envolvidos e a detecção de estrangulamentos e deficiências verificadas.
Propósito que não dispensa, antes impõe, que o Governo apresente rapidamente ao Parlamento um plano de acção com medidas que, para Os Verdes, passam: pela criação de uma entidade nacional que centralize todo o processo de intervenção na prevenção de cheias e na sua gestão, articulando estreitamente todas as entidades envolvidas no processo e garantindo a pilotagem dos meios disponíveis em todas as acções a desenvolver, e que tenha capacidade e autonomia política para definir a criação de um novo sistema de gestão dos caudais e da decisão, que não pode caber à EPAL nem à EDP, sobre as barragens em tempo de crise.
As medidas deste plano de acção passam ainda por contemplar um sistema de alerta e notificação imediata que ponha fim ao esquecimento dos cidadãos, que têm de ser envolvidos e avisados atempadamente e preparados para agir em caso de emergência e de acidente; pelo levantamento e definição de um plano de zonas de potencial risco com a definição de restrições nas emissões de licenças de construção em várzeas e leitos de rios e a imediata suspensão de projectos, escandalosamente hoje em curso, porque recentemente aprovados, como a mega urbanização licenciada em Loures numa zona de elevada perigosidade e que ainda está na memória das cheias no nosso país.
Por fim, um plano de acção que passa pela reanálise do risco e da sua gestão na Barragem de Castelo de Bode

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e pela definição de uma nova e mais apertada margem de segurança e de encaixe, tendo em conta a situação radicalmente nova criada com a ocupação territorial e localização de milhares e milhares de pessoas a jusante, ao longo dos anos verificada.
Um plano de acção que deve ter em conta a disponibilização de novos meios e não pode esquecer o apoio às populações afectadas e a ponderação de novas regras e cobertura de seguros em caso de cheias, hoje inexistentes, num domínio no nosso país ignorado.
É necessária uma nova atitude que não pode esquecer a operacionalização da Comissão Técnica prevista na Convenção para a Protecção das Bacias e dos Rios Internacionais, essencial para uma correcta gestão dos rios internacionais e das barragens e, desde 1999, parada.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estas são as propostas de Os Verdes, esta é uma exigência das populações e dos cidadãos afectados em nome de uma irresponsabilidade que não pode ser sentida, do risco que tem de ser prevenido, de uma informação aos cidadãos que não pode continuar a ser negada.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, estou praticamente de acordo com tudo aquilo que foi dito pela Sr.ª Deputada e queria aproveitar esta ocasião para dizer que se torna necessária uma reflexão sobre um problema que começa a ser um problema nacional.
Como disse o Sr. Presidente da República, é necessária uma cultura de segurança e prevenção. De facto, essa cultura não existe e tem de ser levada à prática. Ora, mais do que segurança isto exige uma reflexão sobre o passado, porque o que acontece é que cheias sempre houve, chover sempre choveu, mas, neste momento, chove um pouco e o País fica submerso pelas razões que muitas vezes têm sido ditas pelo Arq.º Gonçalo Ribeiro Telles, uma vez que o modelo de desenvolvimento está errado e esgotado: a impermeabilização dos solos urbanos, construir-se onde não se deve, etc., etc.
Portanto, os rios têm de correr para algum lado e quando já não têm por onde correr correm contra as coisas, contra as casas, contra os bens e contra as pessoas.
Srs. Deputados, isto exige uma grande reflexão dos partidos representados na Assembleia, da Assembleia da República no seu conjunto, do Governo, de todos os órgãos de soberania e numa acção conjugada com as autarquias locais que também têm as suas responsabilidades.
É necessário que haja um órgão nacional de coordenação da protecção civil, mas é preciso que as autarquias no plano local, e ao seu nível, assumam as suas responsabilidades. Portanto, parece-me que este começa a ser um problema nacional que se pode transformar numa grande tragédia nacional e que exige uma reflexão de todos para que em conjunto assumam as suas responsabilidades e para que haja, de facto, aquilo que disse o Presidente da República, isto é, uma cultura de segurança e de prevenção para que não se repitam tragédias como as de Entre-os-Rios e para que qualquer dia, quando se der por ela, não tenham desaparecido do mapa uma, duas ou três povoações porque os rios as "afogaram"!...

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Deputado Manuel Alegre, penso que as considerações que fez estão reflectidas na preocupação que tenho. É evidente que as cheias sempre existiram, a enorme diferença que separa a situação actual das do passado é que elas anteriormente eram contidas numa quase normalidade que, aliás, as tornava não só fecundas mas previsíveis e capazes de serem geridas pelas populações que viviam próximas delas.
Hoje a situação é radicalmente diferente, porque há um melhor conhecimento técnico dos problemas, o que torna mais injustificável estes factos, mas a verdade é que se cometem, num território particularmente como o nosso, erros gravíssimos na ocupação do território, continuam a consentir-se construções em leitos de cheia, a impermeabilizar solos a não limpar rios e a não prever e prevenir o risco, nomeadamente tendo em conta estudos científicos que permitem, ou que não tornam aceitável que se ignore aquilo que são hoje fenómenos novos como as disfunções no clima e os índices de pluviosidade totalmente desregulados.
É por isso que dizemos que esta responsabilidade deve ser partilhada por toda a Administração, desde logo directamente pelos autarcas que se queixam e muitas vezes são responsáveis, com os seus licenciamentos, por construções que são atentados à segurança.
Findas as catástrofes, os desastres e as promessas, os ministérios acabam por deixar sempre esquecidas nas gavetas as recomendações. Ora este conjunto de entidades e os cidadãos têm de perceber que o problema que têm pela frente é um problema nacional, é um problema que se paga com destruições e perda de haveres, com insegurança e, eventualmente, com perda de vidas. Portanto, esta foi a razão por que trouxemos este tema à discussão, uma vez que é importante que se tomem medidas, se acabe com a retórica e se façam coisas diferentes.
E fazer coisas diferentes é não aceitar que em Loures uma mega urbanização seja construída no leito de cheia conhecidos como são os erros brutais que resultam dessa construção. Não é aceitável que o Ministério do Ambiente, que tutela esta matéria, continue sem planos de emergência; não é aceitável que não haja normas restritivas de ocupação dos solos; não é aceitável, no fundo, que não se tomem medidas para gerir riscos, porque, presentemente, vivemos em sociedades de risco e a capacidade de prever, prevenir e avaliar o risco são responsabilidades de todos a que ninguém se pode furtar.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os portugueses entraram no ano 2003 com desgosto, com desilusão, com surpresa e, para muitos, com indignação.
Admita-se que esta indignação alimenta críticas às políticas, mas também críticas à política. Podemos, a esse respeito, não perceber, não ouvir, ou responder, corporativa ou tribalmente, que quem não é representante não deve intervir na política.
Venho dizer-vos, em contrapartida, Sr.as e Srs. Deputados, que a crítica é necessária. E é necessária porque se trata a cada momento de refundar as bases da democracia.

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Quem entende que a democracia convive com um País em que uns não têm nada, ou têm cada vez menos, e outros têm amigos milionários, boleias milionárias e ilhas milionárias, está enganado.
Quem entende que o País e a democracia convivem com uns que pagam impostos e outros que não pagam, com uns que estão no desemprego e outros que fazem falências fraudulentas, está enganado.
Por isso, a política deve ser criticada pelo que faz, mas a política, Sr.as e Srs. Deputados, também deve ser criticada pelo que é. A política só pode ser séria ou não merece respeito - e todos nós, homens e mulheres com defeitos, temos de defender uma política e regras que não tenham defeitos e que, em primeiro lugar, na transparência e na responsabilidade, estejam abertos a toda a crítica.
Por isso mesmo, aliás, combatemos a decapitação da unidade que fazia o combate à corrupção económica na Polícia Judiciária. Por isso mesmo, vale a pena lembrar as lições da operação "Mãos limpas" em Itália. Quando um obscuro funcionário socialista Mário Chiesa foi preso por, ilegalmente, transferir fundos a partir das obras para a construção de lares de idosos, abriu-se um processo que descortinou o que era a Tangentopolis, um processo de "mãos limpas", que levou à prisão, ou à destituição, de centenas de responsáveis políticos, de ministros, de senadores, de deputados, à prisão de um primeiro-ministro e à prisão ou à perseguição judicial de muitos empresários. O resultado foi uma política mais transparente nas suas regras e é por isso, talvez, que hoje, em Itália, as auto-estradas tenham um custo de construção reduzido em 20%.
Em Portugal, demo-nos conta que o triângulo entre câmaras municipais, futebol e empresas de construção civil se transformou num gigantesco "polvo" de que descobrimos alguns detalhes quando grandes construtores civis comunicam que não declaram o seu IRS ou quando nos apercebemos do caso do Vitória Sport Clube de Guimarães, ou quando ouvimos as declarações de Maria José Morgado ou do Procurador-Geral da República, Souto Moura.
Mas temos agora em apreciação um caso que representa o pior que este "polvo" tem, que é o caso da Câmara Municipal de Felgueiras, e, a partir deste caso, a partir de todos os casos, temos de estabelecer critérios.
Há três anos atrás, começou uma investigação sobre um alegado "saco azul" que teria financiado campanhas do Partido Socialista em Felgueiras e alegadamente alguns gastos pessoais da Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras. Um juiz de instrução criminal decretou, há dois dias, a suspensão do mandato da Presidente da Câmara e esta será acusada no âmbito do processo que está em preparação.
De tudo isso decidirá a justiça, mas aqui temos de julgar da bondade, ou da inaceitabilidade, do argumento de que a justiça impede a actuação política neste contexto. Temos de julgar aqui politicamente sobre se é ou não uma desculpa aceitável que nada se faça e se espere pela decisão do tribunal. E é isto que quero contestar.
Há três razões para que o julgamento político deste caso conclua pela necessidade de regras transparentes que não foram seguidas em Felgueiras: provou-se que o expediente não é um bom processo político - "quem vai por atalhos, mete-se em trabalhos". Pode ganhar-se uma câmara municipal e, em consequência, perderem-se as eleições. Fátima Felgueiras não se deu conta, porque assim não disse o voto popular, mas ela perdeu as eleições, assim como o seu partido foi arrastado para a derrota eleitoral, em Dezembro de 2001.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - E se essa é uma primeira conclusão, as duas outras são mais importantes.
O financiamento ilícito dos partidos foi regulado neste caso, ou é regulado por este caso, e o partido que recebeu esse financiamento ilícito deve explicações. Aliás, devo sublinhar, porque amanhã o discutiremos, que, se não houvesse sigilo bancário em Portugal, a conta n.º 27674009, do Banco Espírito Santo, de Felgueiras, teria sido investigada há muito mais tempo e não seria preciso que um vereador, com medo das consequências do seu envolvimento no caso do alegado "saco azul", viesse denunciá-lo à Polícia Judiciária, porque esses financiamentos não teriam justificação e chamariam a atenção do fisco. E é assim que se pode, no futuro, saber a verdade.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Mas a terceira razão fundamental é a de saber se, perante esta investigação, um presidente de câmara se deve demitir ou se se deve "agarrar" ao lugar.
A opinião do Bloco de Esquerda é a de que a Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras (e assim o dissemos na altura, como repetimos agora) se deveria ter demitido assim que a investigação começou. Por uma única razão que vale para ministros, como vale para presidentes de câmara: quem está no poder, não pode exercê-lo quando esse exercício condiciona as investigações sobre si próprio.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - A Presidente da Câmara, se fosse inocente, tinha de sair do cargo para provar a sua inocência, para garantir que não influenciava quem dela depende: autarcas, construtores, agentes económicos locais. Tinha, naturalmente, de sair se, porventura, fosse culpada.
A esse respeito, o critério que o Ministro António Vitorino estabeleceu é conclusivo: António Vitorino demitiu-se quando não havia acusação, quando nem sequer havia investigação, quando exclusivamente um jornal alegou que ele não tinha pago de sisa 300 contos. E demitiu-se para provar a sua inocência, o que fez conclusivamente, podendo, depois, assumir altos cargos de representação do País na União Europeia.
Se este critério serve e se ele é valorizado e elogiado, quem o defende não pode defender o comportamento de Fátima Felgueiras. E, em contrapartida, quem defende Fátima Felgueiras tem de dizer que António Vitorino não podia ter-se demitido. Mas demitiu-se e estabeleceu um padrão correcto do comportamento republicano nesta matéria.
É por isso que noutros casos, sendo o mais gritante o de Avelino Ferreira Torres, Presidente de câmara, do Partido Popular, em Marco de Canaveses, implicam o mesmo critério. Ou seja, Avelino Ferreira Torres, que pelo Tribunal da Relação foi confirmado que será julgado por crimes gravíssimos de peculato - nada menos do que peculato! -, deve demitir-se nas mesmas condições em que qualquer outro autarca deve fazê-lo. Não é a cor partidária, não é a cumplicidade política que estabelece diferenças, enquanto que a regra deve tornar todos iguais.

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Por isso, não digo ao PP, que, naturalmente, prefere ter um presidente de câmara, mas digo certamente ao PSD que, se toma posição sobre a Câmara de Felgueiras, não pode deixar de tomar a mesma posição sobre a Câmara de Marco de Canaveses.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - A este respeito, podemos ter a "política de avestruz", dizendo que tudo não passa de críticas à política vigente, ou, pelo contrário, assumir que as regras estão acima das pessoas, que nenhum acordo partidário pode inverter ou subverter as regras. Por isso, temos de ouvir o que diz a opinião pública. Para ter mãos limpas, Sr.as e Srs. Deputados, é preciso lavar as mãos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados António Costa e Narana Coissoró.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Costa, que dispõe de 3 minutos.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, em primeiro lugar, gostaria de dizer-lhe que, no que diz respeito a esta matéria, o Partido Socialista tem uma doutrina e a única diferença que estabelece relativamente aos seus próprios políticos é a de sermos mais exigentes connosco próprios do que entendemos dever ser com os outros.

O Sr. José Sócrates (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Partido Socialista tomou, ontem, uma posição oficial sobre esta questão através de um texto, que passo a ler: "O Partido Socialista entende que, depois dos acontecimentos de ontem e sem ser posta em causa a presunção de inocência dos cidadãos, não há condições para que a Dr.ª Fátima Felgueiras retome as funções de Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras até ao cabal esclarecimento dos factos sob investigação.
Tendo sido decretada a sua suspensão do cargo por decisão judicial, o PS entende que, se for deduzida acusação definitiva, deverá a Dr.ª Fátima Felgueiras demitir-se, como já se comprometeu a fazer, do mandato de Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras."

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta é, pois, a doutrina do Partido Socialista que aplicamos a nós próprios e gostamos de ver aplicada pelos outros. É um entendimento que assenta numa destrinça muito clara entre o que é a responsabilidade política e o que é a responsabilidade criminal.
Quanto à responsabilidade criminal, todos gozamos da presunção de inocência e só às autoridades judiciárias cabe fazer o julgamento de acordo com as regras. Podemos ter solidariedade pessoal para com as pessoas de quem somos amigos, mas ninguém está acima da lei, mesmo aqueles que estão entre nós. Assim, quanto a essa matéria, total e absoluta confiança na justiça portuguesa, nas autoridades judiciárias e na total isenção, imparcialidade e independência com que julgarão o que houver a julgar.
Matéria distinta, neste caso como em todos os outros, é a questão da responsabilidade política. O que se diz da mulher de César também vale para César: não basta sê-lo, é preciso parecê-lo. Em nosso entendimento, a defesa da dignidade das instituições exige sempre que sobre quem está a exercer um cargo público não possa pairar um grau de suspeição que afecta a credibilidade das próprias instituições.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Foi nesse sentido que, aquando das últimas eleições autárquicas, o apoio do PS à Dr.ª Fátima Felgueiras foi condicionado a um compromisso de que se demitiria se viesse a ser indiciada e esse indício viesse a traduzir-se numa acusação definitiva.
O tribunal entendeu suspendê-la de funções e pensamos que o tribunal julgou bem. Entendemos que não pode exercer as funções enquanto a questão não estiver esclarecida e que, se vier a ser acusada, deve demitir-se das mesmas. Nada disto tem a ver com qualquer juízo sobre a sua culpabilidade ou sobre a sua inocência. Nesta bancada, sentam-se muitas pessoas que são amigas da Dr.ª Fátima Felgueiras e, naturalmente, todos desejamos que esteja inocente.
Para nós, não é a questão da responsabilidade criminal que aqui está em causa, é a da responsabilidade política. Quanto a essa, temos sempre uma só posição, seja ou não um dos nossos que está em causa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Francisco Louçã informou a Mesa que responderá em conjunto aos pedidos de esclarecimento.
Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró, que dispõe igualmente de 3 minutos.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, o meu partido não tinha qualquer intenção de pedir esclarecimentos, nem sequer pela alusão displicente que fez a Avelino Ferreira Torres, tendo dito que o Partido Popular podia não responder porque este é um dos poucos ou talvez dos únicos presidentes de câmara que tem. Quer dizer, o critério é o da quantidade: quem tem maior quantidade de autarcas, tem de responder; quem tem poucos autarcas, está dispensado de o fazer - "compreende-se; tem de manter o que tem…" Não é esse o juízo político, muito menos o juízo de razoabilidade, menos ainda o juízo de honestidade. A honestidade está acima de tudo.
Intervenho na qualidade de jurista, jurista que preza inteiramente o que os tribunais fazem.
A Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras foi suspensa do exercício da sua função por uma razão extremamente simples: para que, com os respectivos actos, não pudesse dificultar a acção subsequente de investigação da justiça. Não há o mínimo critério de culpabilidade sobre ela, assim como sobre Avelino Ferreira Torres.
Enquanto a sentença não tiver transitado em julgado, e não transitou, Avelino Ferreira Torres goza da presunção de inocência. Aliás, há imensos casos em que os tribunais superiores julgam que o que foi decidido pelos tribunais das 1.ª e 2.ª instâncias não correspondeu inteiramente à

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verdade factual e, por isso mesmo, não deve haver condenação.
Servir-se da tribuna da Assembleia da República para exercer pressão sobre o juiz de instrução criminal, para arrebanhar - sublinho "arrebanhar" - a comunicação social contra os que estão a ser julgados não é o papel do Deputado, não é o papel de quem serve honestamente a colaboração e a distinção entre os poderes de soberania. Os tribunais não precisam das lições do Dr. Francisco Louçã!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O juiz do tribunal, qualquer que ele seja, mesmo da mais pequena instância, não precisa dos seus grandes conhecimentos, das suas informações internas, dos "sacos azuis" cuja existência o senhor diz conhecer.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - Então, vá à Polícia Judiciária, ofereça-se à acusação como testemunha e litigue contra estes dois autarcas que V. Ex.ª citou da tribuna. Não é da sua conta substituir-se aos juízes.
O linchamento popular compreendo-o; o linchamento parlamentar, feito da tribuna pelo Dr. Francisco Louçã, é condenável.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã, dispondo de um máximo de 5 minutos.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados Narana Coissoró e António Costa, o que estamos a discutir são critérios.
Se alguém, em particular o Sr. Deputado Narana Coissoró, ouviu a minha intervenção, terá percebido que nela se trata não de transformar a comunicação social num rebanho nem de influenciar os juízes, mas, simplesmente, de discutir perante o País, como temos de fazer, que critérios se adoptam, que critérios nos medem perante acusações, investigações, conduzam ou não as mesmas ao tribunal. Há vários padrões e temos de escolher o óptimo, porque nada menos do que o óptimo confere à política a seriedade de que esta precisa.
Se se utiliza o carácter incompleto do processo judiciário para fundamentar que qualquer político acusado se agarra ao poder com quantas forças tem, então, a partir daí, toda a lógica da presunção, da pressão, pode subsistir no terreno. É esse o problema dos presidentes de câmara.
Percebo a dificuldade do PP, que se refugia na banalidade, na trivialidade de que o tribunal tem de decidir. Mas os senhores é que têm de decidir se dão ou não confiança a um vosso correligionário para que continue como presidente de câmara enquanto é acusado de peculato…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Acusado! Não julgado!

O Orador: - … e, em função desse critério, falarão às restantes bancadas.
É isso que temos de dizer ao País: há critérios ou há cumplicidade; há rigor ou há facilidade; há amigos ou há seriedade. Essa é a diferença.
Quem diz a Fátima Felgueiras que deve sair da presidência da câmara, tem de dizê-lo a Avelino Ferreira Torres - e os senhores dizem a Fátima Felgueiras que ela deve sair!
Aliás, Srs. Deputados do PP, posso ler-lhe os vossos próprios comunicados sobre esta matéria.
O primeiro comunicado dizia que Fátima Felgueiras devia manter-se no seu cargo, que não se devia tirar ilações políticas relativas à legitimidade do mandato. O segundo comunicado diz que deve haver eleições. O Sr. Deputado vem agora dizer o contrário.
O critério usado em Felgueiras é bom em Marco de Canaveses, é bom em Lisboa, é bom em Sintra, é bom no País inteiro. Do que se trata é de seriedade dos critérios. É por isso que creio que o Deputado António Costa apresenta um certo critério dual.
Fátima Felgueiras respondeu-lhe hoje, no Jornal de Notícias, tendo dito que não vai demitir-se, mesmo quando haja acusação definitiva. Aliás, podemos discutir isto como se não soubéssemos os factos.
Mesmo assim, Sr. Deputado, o critério da acusação definitiva que é doutrina no Partido Socialista é o melhor? É o melhor para si? É o melhor para a direcção do Partido Socialista? É o melhor para o Partido Socialista? É o melhor para a política portuguesa? A sua resposta é "sim",…

O Sr. António Costa (PS): - Não, não!

O Orador: - … a minha é "não".
Quanto à presunção da inocência, valorizo-a da mesma forma que o fez, sobretudo em relação aos meus adversários políticos, como em relação a qualquer pessoa. Naturalmente, não pode ser posta em causa.
Não avaliamos a inocência da pessoa que está em causa - não nos compete, não nos atrevemos, não o faremos. O que discutimos é se um presidente de câmara, sob investigação de ter um "saco azul", deve continuar a exercer esse mesmo cargo durante o processo de investigação. A minha resposta é "não"…

O Sr. António Costa (PS): - Está suspensa!

O Orador: - Está suspensa pelo tribunal, agora! Não deveria ter sido candidata em Dezembro de 2001, quando esta investigação estava a desenvolver-se perante factos concretos. Os senhores podem defendê-la, e fizeram-no. Contudo, fizeram mal, pois viveram com dois critérios inconciliáveis.
É que, segundo esse critério, teriam de ter dito a António Vitorino que ficasse como ministro. Não havia acusação definitiva a António Vitorino. Ou havia? Não havia sequer acusação. Por que é que ele saiu? Por que é que ele é elogiado pela frontalidade e pela dignidade que manifestou? Tal dignidade foi o que faltou à Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras. Esta teria feito um serviço ao seu partido mas, sobretudo, ao municipalismo português, teria prestado um serviço à política portuguesa, se tivesse dito que "não interponho o meu poder até que as investigações permitam esclarecer tudo".

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Esta é a minha regra. Creio que é a regra que deve ser aplicada. É a regra para cuja discussão quero contribuir. Será esta ou será outra, mas a política portuguesa precisa de regras, precisa de transparência e precisa de responsabilidade. O caso de Felgueiras é um caso sem transparência, sem responsabilidade e sem regras. Digamos o que dissermos, todos sabemos que assim é. Cada um de nós sabe que assim é. Faltou seriedade, faltou transparência. Ora, é preciso que seja aplicado este tipo de critério para Felgueiras, ou para todas as câmaras municipais, ou para qualquer político, porque é o mesmo que exigimos aos ministros.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção sobre assunto de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: As manifestações de protesto ocorridas na passada segunda-feira, dia 6 de Janeiro, na CREL, junto às portagens no acesso ao IC19, constituem um sério sinal ao Governo no sentido da demonstração do descontentamento generalizado que esta injusta medida provocou junto das populações da Área Metropolitana de Lisboa.
Foram milhares de veículos que aderiram às propostas lançadas pelo Movimento dos Cidadãos pela Mobilidade que, ou buzinando, ou pagando com notas a respectiva portagem, ou manifestando a sua indignação de outro modo qualquer, quiseram manifestar ao País em geral e ao Governo em particular a sua profunda insatisfação por esta medida que, para além de agravar as economias das famílias, vem também criar uma situação de muito maior estrangulamento ao nível da circulação e da mobilidade no interior da Área Metropolitana.
Na realidade, esta autêntica "prenda de Natal" que o Governo decidiu oferecer às famílias que habitam na Área Metropolitana de Lisboa, famílias portuguesas, para além de representar um acréscimo significativo da despesa do seu orçamento familiar - por exemplo, quem utilizar a CREL, a partir de Alverca, terá uma despesa diária de 5 euros e o custo mensal do utilizador da CREL nunca será inferior a 30,80 euros -, representa também uma decisão injusta e errada.
É uma decisão injusta, porque não é oferecida ao utilizador da CREL nenhuma alternativa de circulação para quem não queira ou não possa pagar portagem. Afirmar-se, como já foi afirmado por responsáveis do Governo e do PSD, que as alternativas existem e que elas são o IC19 e a 2.ª Circular, só pode ter sido dito como brincadeira, de mau gosto, ou por total desconhecimento da realidade concreta das pessoas que diariamente já passam horas no trânsito supercongestionado destas vias. Quase que se é levado a pensar que quem afirmou este enorme disparate só passa no IC19 e na 2.ª Circular com batedores oficiais, motorizados, a abrirem-lhes o caminho.
Mas é também injusta, porque, deste modo, através desta medida avulsa, sem qualquer tipo de lógica ou coerência do ponto de vista nacional, visa apenas encontrar uma receita extraordinária para cobrir as contas, pelos vistos mal feitas no Orçamento rectificativo, para o défice deste ano. Trata-se de um imposto extraordinário, criado para os cidadãos de Lisboa (portanto, discriminatório), os quais, com os seus impostos, já contribuem para a manutenção e reforço do princípio da solidariedade e coesão nacionais, uma vez que outras regiões do País beneficiam - e muito bem - de auto-estradas sem portagens ou de outro tipo de equipamentos necessários para o bem-estar das suas populações.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para além de uma medida injusta, estamos também confrontados com uma medida profundamente errada, que prejudicará acentuadamente as condições de mobilidade e acessibilidades na Área Metropolitana de Lisboa, em particular, às populações que habitam na margem norte do Tejo.
Portajar a CREL, sem concluir as alternativas de circulação e mobilidade dos concelhos por ela servidos, trará como consequência que todos aqueles que optarem por não pagar portagens venham a sobrecarregar as vias já muito saturadas que são o IC19 e a 2.ª Circular, assim como também outras radiais ou vias de acesso a Lisboa, como serão os casos da Calçada de Carriche, da Avenida da Índia, da A5, da Auto-Estrada do Norte e da própria Marginal do Estoril. Isto é, o efeito dissuasor que uma circular deve ter, de desviar o trânsito rodoviário do centro de uma cidade, passará a ter, neste caso, um efeito contrário, isto é, provocará o atravessamento de Lisboa por muitos mais milhares de automóveis, com consequências graves ao nível da qualidade de vida ambiental. É obra, Srs. Deputados!
Em nenhuma grande capital ou grande cidade europeia se cobram portagens nas suas circulares envolventes, precisamente para incentivar o trânsito a desviar-se do seu centro, e acontece até que, em alguns casos, se cobram portagens nas radiais de acesso ao seu centro. Aqui, em Lisboa, cobram-se portagens em todo o lado.
Que moral tem este Governo para impor portagens na CREL sem primeiro construir o IC16, o IC30, concluir a CRIL e o Eixo Norte-Sul, sem ter terminado o alargamento do IC19 e da A5, isto é, sem ter criado as condições concretas para que as pessoas possam livremente optar?
Quando é que este Governo decide prolongar a linha do metropolitano de Odivelas (compromisso do Governo do PS, a inaugurar brevemente) até Loures?
Para quando a criação de grandes parques de estacionamento à entrada de Lisboa e respectiva implementação de corredores "BUS" para os transportes públicos, que permitam às pessoas ter acesso ao centro da cidade em 10 minutos?
Por que é que o Governo anulou os concurso para a construção do IC16 e do IC30 e também anulou o concurso para o fecho da CRIL, todos lançados pelo anterior governo?
Será para fazer show off, daqui a alguns anos, e dizer que foi apenas obra sua?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por nós, tudo bem, uma vez que a nossa única preocupação é a de que estas importantes infra-estruturas estejam concluídas rapidamente, o que certamente aconteceria se não tivessem agora anulado esses mesmos concursos.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como já tive oportunidade de o afirmar, estamos assim confrontados com um novo imposto extraordinário, arquitectado

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à custa de um negócio estabelecido com a empresa Brisa, onde, em troca da verba por esta paga ao Ministério das Finanças, o Governo oferece à Brisa, e por comparação com as taxas pagas na mesma via em 1995, aumentos, que, em alguns casos, são superiores a 100% e muito superiores à soma das taxas da inflação dos últimos sete anos. Por exemplo, um veículo da Classe 2 que entre na CREL em Belas, em 1995, pagava 0,60 euros e, agora, pagará 1,20 euros e, se o mesmo veículo entrar em Alverca, a diferença será de 2,10 para 4,40 euros.
Como autorizou o Governo a aplicação destes aumentos absurdos, violando os próprios termos dos contratos de concessão, que prevêem a actualização anual das portagens indexada à taxa de inflação?
Esteve a autorização destes aumentos incluída nestas negociações?
Infelizmente, ainda não podemos ter certezas sobre esta matéria, uma vez que o Governo ainda não forneceu a esta Assembleia da República os dados e os estudos técnicos que fundamentaram o acordo/negócio que estabeleceu com a Brisa.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Termino como comecei. Era bom para o País que o Governo olhasse para a realidade concreta, não fizesse como a avestruz e "enterrasse a cabeça debaixo da areia", isto é, que não ignorasse o profundo descontentamento que esta medida está a gerar na população metropolitana de Lisboa e que, provavelmente, irá continuar a manifestar-se.
As pessoas estão cansadas de promessas não cumpridas e de medidas contrárias ao prometido na campanha eleitoral. O PSD teve uma derrota eleitoral, nas eleições legislativas, no distrito de Lisboa, mas, durante a campanha e em plenos cenários catastrofistas por si anunciados, prometeu às pessoas uma diminuição dos impostos e, no que se refere à CREL, prometeu que tudo continuaria na mesma até à conclusão das outras infra-estruturas.
Não está a cumprir o que prometeu. Trouxe-lhes, agora, um novo imposto. As pessoas estão a começar a ficar cansadas e indignadas.
O PS, e em particular os socialistas da Área Metropolitana de Lisboa, compreendem esta irritação das pessoas, estão solidários com elas e apenas esperamos que o Governo e os partidos que os apoiam percebam que, em política, não vale tudo e que ainda estamos a tempo de, neste caso concreto, arrepiar caminho. Para bem das pessoas e para bem da Área Metropolitana de Lisboa.

Aplausos do PS e do Deputado do BE João Teixeira Lopes.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados António da Silva Preto e António Filipe.
Tem a palavra, por 3 minutos, o Sr. Deputado António da Silva Preto.

O Sr. António da Silva Preto (PSD): - Sr. Presidente, Colegas Deputados, neste tempo em que a questão das portagens tem sido aqui suscitada, aparece sempre o Deputado Miguel Coelho. É interessante notar que a Deputada Edite Estrela, que é a Presidente da FAUL, não aparece nestes momentos, como não aparece a falar das portagens na CREL. E nós percebemos porquê.
Mas ainda antes de referirmos porquê, queria deixar aqui uma palavra de esperança, que é também de certeza, para todos aqueles que vivem o drama diário do IC19 ao longo dos anos, há muitos anos, dizendo-lhes que o IC16, o IC30, o encerramento da CRIL, o fecho do Eixo Norte-Sul e o alargamento do IC19 vão estar concluídos entre 2005 e 2006 e que isto nada tem a ver com aquelas promessas feitas ao longo dos anos pelo Partido Socialista, a que eles se habituaram - e eles sabem-no. A demonstrá-lo está o nível de adesão àquele protesto na CREL: não foram os tais milhares de carros; foram uns 30, 40 ou 50 carros, que se viram na CREL. Uns 30 ou 40 carros que foram enchidos com gente de Lisboa, que se juntou na Trafaria, com autarcas do Partido Socialista.
E porquê, meus amigos? Porque querem escamotear uma responsabilidade que é toda do Partido Socialista. Em seis anos, não foram capazes de fazer qualquer destas obras, que eram a verdadeira alternativa, necessária para evitar o drama destas pessoas, este inferno em que se tornou o IC19.
Mais: é preciso que esta Câmara saiba, porque os portugueses lá fora já sabem e os munícipes de Sintra também - e daí a censura nas últimas autárquicas no concelho de Sintra - que 42% do que foi construído na área da Grande Lisboa foi-o no concelho de Sintra, sem se garantirem as contrapartidas necessárias, sem se garantirem as rodovias necessárias, para devolver a qualidade de vida àquelas pessoas.

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quero também dizer-vos que, quando vi as primeiras notícias nos jornais, quando ouvi o Dr. Miguel Coelho, nosso estimado Deputado, a falar, pensei, com alguma ingenuidade, que o que ele ia fazer era uma manifestação de protesto contra esta inoperância de seis anos, contra esta gestão socialista do município de Sintra - sempre pensei que fosse esse o protesto. Mas, quando percebi que não era e porque achava que esta era uma linha suicidária, que não era pensável num partido com as responsabilidades do Partido Socialista, fiz-lhe um apelo: que reconhecesse a culpa, que assumisse as suas responsabilidades e que ajudasse o PSD, o Governo e as populações de Sintra a resolver este problema, que nós vamos resolver e que eles não foram capazes de resolver.
Lembro, ainda, ao Sr. Deputado Miguel Coelho o seguinte: o Sr. Deputado já era presidente da concelhia de Lisboa, já tinha as responsabilidades…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado Miguel Coelho já tinha as responsabilidades que tinha como dirigente nacional do partido, era Deputado e, nesses seis anos, nunca o ouvimos falar uma única vez que fosse no interesse daquelas populações. É por isso que aquelas populações lhe deram, no passado dia 6, uma lição, mostrando-lhe que perceberam que o senhor nunca esteve interessado em resolver o problema deles, mas apenas em fazer chicana e esta política de protesto.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Miguel Coelho, há mais um orador inscrito para pedir esclarecimentos. Quer responder já ou no fim?

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O Sr. Miguel Coelho (PS): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra, por 3 minutos.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Preto, meu caro amigo, julguei que me viesse falar da carta que mandou aos eleitores do concelho de Sintra, prometendo tudo e mais alguma coisa - aliás, uma carta em papel luxuoso, que não há-de ter custado barato…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Olha quem!

O Orador: - Mas a verdade, Sr. Deputado, é que o senhor só veio aqui fazer promessas e o seu governo começou por anular tudo aquilo que estava a ser construído, precisamente os concursos para a continuação do alargamento do IC19, para o IC16, o IC30 e para o fecho da CRIL.

O Sr. António Costa (PS): - Essa é que é essa!

O Orador: - Isto é, o seu governo prefere empatar as obras, prefere prolongá-las, talvez para inaugurá-las em altura de eleições!…
O Sr. Deputado tem de discutir comigo estas coisas. Eu sou coordenador do Partido Socialista na Comissão Parlamentar de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, pelo que tem de discutir comigo estas coisas.
O senhor está muito preocupado com Sintra. Talvez venha a ser o próximo candidato do PSD à Câmara Municipal de Sintra, ou até talvez esteja disposto a afastar o actual presidente… É que tenho comigo uma moção, aprovada por unanimidade por toda a vereação da Câmara Municipal de Sintra e cujo primeiro subscritor é o Presidente da Câmara Municipal de Sintra, que diz: "Considerando que a decisão tomada é uma medida avulsa sem qualquer enquadramento numa política de acessibilidades na Área Metropolitana; considerando que a CREL…", e por aí fora. Como vê, até o seu correligionário, Presidente da Câmara Municipal de Sintra, está de acordo comigo e não com V. Ex.ª!
Mas quero lembrar-lhe, até porque é muito deselegante referirmo-nos a outras pessoas e à gestão de outras coisas que nada têm a ver com isto, que a Sr.ª Presidente da Câmara Municipal de Sintra, na altura, Dr.ª Edite Estrela, minha camarada e amiga, herdou todos os loteamentos que VV. Ex.as deixaram na anterior gestão e que os loteamentos aprovados na sua gestão foram todos aprovados por maioria e, inclusive, por unanimidade, contando, pois, com o voto dos vereadores do PSD da Câmara.
Portanto, é muito feio virmos falar de outras coisas, quando o que está aqui em discussão é a CREL, a CRIL, as portagens, e não o concelho de Sintra, em particular. Com certeza, haverá outros protagonistas para discutirem consigo, em particular, o concelho de Sintra.
Por outro lado, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que, de facto, nunca suscitei este problema antes, porque o governo que eu apoiava na altura, e muito bem, entendeu suspender as portagens na CREL até estarem concluídas todas as vias necessárias para que as mesmas pudessem justificar-se. Ora, VV. Ex.as anularam os concursos precisamente para os adiar. Portanto, estamos aqui perante uma manobra de política, uma manobra talvez de campanha eleitoral num futuro próximo, mas com prejuízo para as populações, que foi o que se veio a verificar.
Quanto aos tais 30 ou 40 carros que aderiram à tal manifestação, como diz V. Ex.ª, devo dizer-lhe que não fui o organizador do movimento, apesar de ter participado nele, mas, segundo a própria comunicação social, foram quilómetros de bichas…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Eh!…

O Orador: - … e foi uma aposta ganha pelos organizadores do movimento.
Portanto, deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado, que cada um interpreta como quiser, mas não vale a pena "enterrar a cabeça debaixo da areia" e não perceber os sinais que nos vêm lá de fora.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Coelho, quero saudar o facto de o Sr. Deputado se ter associado aos protestos dos utentes da CREL e dar-lhe as boas-vindas a esses protestos que, desde o início do ano, se têm vindo a fazer sentir em vários dias nesta Circular Regional Exterior de Lisboa. E saúdo a intervenção que o Sr. Deputado aqui fez, de cujos objectivos naturalmente compartilhamos.
Sr. Deputado, queremos salientar a nossa opinião - e ouvir também a sua - quanto à injustiça e ao carácter absurdo desta medida, que tem suscitado uma adesão muito significativa por parte dos utentes. Já alguém falou aí de 30 ou 40 carros que estariam no último protesto. Creio que 30 ou 40 carros seriam os da GNR que acompanharam o protesto à frente, atrás e no meio - aí acredito.

Risos do PCP.

Agora, dos utentes eram seguramente muitos mais do que essas dezenas de carros - pude testemunhá-lo. E creio que o Sr. Deputado Miguel Coelho também testemunhou que eram muitos mais os carros dos utentes que protestaram.
Mas a medida é injusta, desde logo, pelo encargo que representa para os agregados familiares dos utentes da CREL. É uma via que não tem alternativas; trata-se de uma cintura rodoviária que foi construída porque era fundamental construir uma via estruturante para desviar o trânsito do interior da cidade de Lisboa.
Essa via só tem lógica se for uma via sem portagens, para que possa ter esse efeito de desanuviamento do trânsito em Lisboa, e esta imposição de portagens, para além de ser completamente absurda do ponto de vista do ordenamento do trânsito, é injusta pelo encargo significativo que representa para um utente que tenha de utilizar a CREL no seu dia-a-dia, na deslocação de casa para o emprego e do emprego para casa. E são muitos milhares de utentes que estão nessas circunstâncias.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - A CREL não foi construída com o intuito de resolver os problemas do défice público; a CREL foi construída para resolver os problemas dos acessos à cidade de Lisboa…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … e não pode ser transformada num mero instrumento. Através da imposição de sacrifícios aos seus utentes, o Governo procura resolver problemas que são estritamente do foro financeiro, o Governo está a utilizar injustamente os utentes para resolver esse problema.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo também não explicou todos os contornos do negócio que fez com a Brisa, na medida em que ainda não demonstrou que não seja esta empresa a grande beneficiária deste negócio que acabou de celebrar com o Governo.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Finalmente, Sr. Deputado Miguel Coelho, queria colocar-lhe uma questão que se prende com o seguinte: foi noticiado pela comunicação social que o Governo, inquieto com os protestos dos utentes da CREL, teria posto o SIS no terreno.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se, queira concluir.

O Orador: - Vou concluir de imediato, Sr. Presidente.
Dirigimos um requerimento ao Governo sobre a matéria para apurar da veracidade dessa notícia, mas ainda não obtivemos qualquer resposta. Do nosso ponto de vista, se tal for verdade, estamos perante um gravíssimo atentado às funções legais e constitucionais desse serviço.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Porquê?!

O Orador: - Gostaria, pois, de conhecer a opinião do Sr. Deputado Miguel Coelho acerca desta matéria.

Aplausos do PCP.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho, que dispõe de 3 minutos.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, agradeço a pergunta e as reflexões que fez, reflexões essas que me suscitam o seguinte comentário, e isto, aliás, até tem a ver com uma crítica feita pelo Sr. Deputado António da Silva Preto: o sucesso de uma iniciativa desta natureza mede-se por quantos menos carros da organização participarem e por quantas mais pessoas de fora aderirem. Portanto, se tão poucos carros - como diz o Sr. Deputado António da Silva Preto - suscitaram uma adesão tão grande, é sinal de que o descontentamento é bem maior do que aquele que, de facto, eu próprio suponho ou os Deputados do PSD supõem que possa estar a acontecer.
Também gostava de dizer que a CREL tem dois objectivos fundamentais, em meu entender, sendo o primeiro desviar o trânsito do centro da cidade de Lisboa. Quem circula do norte do País, ou de Vila Franca, em direcção, por exemplo, à margem norte da Península de Setúbal, a Almada ou a toda aquela faixa litoral, não precisa de atravessar Lisboa, porque dispõe de uma via de acesso directo à Ponte 25 de Abril. Contudo, quem quiser fugir à portagem, vai mesmo atravessar Lisboa! E quando tivermos o célebre túnel das Amoreiras, que se preparam para construir em Lisboa - o que é, aliás, um grande disparate sob todos os pontos de vista -, as pessoas vão ter à sua disposição uma "auto-estrada", começando na 2.ª Circular, seguindo pelo Campo Grande, Avenida da República, Avenida Fontes Pereira de Melo, túnel das Amoreiras, Viaduto Duarte Pacheco e Ponte 25 de Abril! Teremos, portanto, milhares de carros a atravessar Lisboa, com todos os inconvenientes do ponto de vista do ordenamento do tráfego e do ponto de vista ambiental.
É, pois, lamentável que o Governo tenha tomado esta decisão, uma decisão avulsa, porque o objectivo das circulares exteriores às grandes cidades é o de desviar o trânsito do seu interior, contribuindo também para a sua distribuição em locais diversos, a fim de obter uma maior racionalização e aproveitamento das radiais. De facto, vamos ter aqui perspectivas muito sombrias nos tempos mais próximos em relação à capital, em termos de mobilidade das pessoas, daí que todas as pessoas se sintam indignadas com esta matéria, os utilizadores directos e as vítimas indirectas, que são os habitantes da cidade de Lisboa.
Quanto à questão concreta que me colocou sobre o SIS, devo dizer-lhe que quero acreditar que tal não seja verdade, Sr. Deputado, porque seria gravíssimo - tive oportunidade de o dizer na altura - que tal tivesse acontecido.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Gravíssimo?!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Gravíssimo, de facto!

O Orador: - Quero acreditar que tal não seja verdade, repito. No entanto, e digo-o com as devidas e honrosas excepções e ressalvas, para quem não tem uma cultura democrática tão arreigada, temo que algo possa acontecer… Enfim, Sr. Deputado, espero que esta notícia não se confirme.
Estou curioso em relação à resposta do requerimento que V. Ex.ª dirigiu ao Governo, porque se tal se vier a confirmar, todos nós teremos de manifestar a nossa indignação

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Todos?!

O Orador: - … e, evidentemente, tomar aqui as iniciativas políticas que se justificarem.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Edite Estrela pediu a palavra para que efeito?

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Para defesa da consideração, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Qual é o motivo da sua ofensa, Sr.ª Deputada?

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A Sr.ª Edite Estrela (PS): - As referências feitas pelo Sr. Deputado António da Silva Preto.

O Sr. Presidente: - Já não me recordo bem mas, na dúvida, dou-lhe a palavra, Sr. Deputada.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado António da Silva Preto afirmou que estranhava que não fosse a Deputada Edite Estrela a falar sobre esta matéria no Plenário, dizendo "ela lá saberá porquê".
Em nome da verdade, quero esclarecer o Sr. Deputado António da Silva Preto que, sobre esta matéria, já tive oportunidade de convocar uma conferência de imprensa, em Sintra; já tive oportunidade de falar na Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações da Assembleia da República, interpelando o Sr. Ministro das Obras Públicas, e já tive oportunidade, também neste Plenário, numa sessão de perguntas ao Governo, de interpelar o Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas.
Sr. Deputado António da Silva Preto, para além de lhe avivar a memória e de dizer que anda muito desatento, gostaria de esclarecer que o que referiu como crescimento do concelho de Sintra deve-se exclusivamente à gestão do PSD. Uma coisa, Sr. Deputado - devia sabê-lo -, é passar autorizações e licenças, outra coisa é aprovar construções.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Ora, o que o PSD fez foi aprovar loteamentos, constituir direitos que, naturalmente, a gestão seguinte teve de respeitar, passando as respectivas licenças. Para que conste - também porque a paciência tem limites -, enquanto a Câmara Municipal de Sintra teve na sua presidência uma pessoa do PS, eu concretamente, nenhum fogo foi aprovado exclusivamente pelo PS, implicou sempre os votos ou do PSD, ou do PCP, ou os votos do PS, do PSD e do PCP. Portanto, Sr. Deputado, não venha insinuar aquilo que não tem qualquer fundamento.
Já agora, também gostaria de acrescentar que a carta que dirigiu aos cidadãos de Sintra representa uma desautorização do actual presidente da câmara municipal.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Aquela que deve ser a figura-referência do PSD no concelho de Sinta foi desautorizada: tomou a posição correcta em relação à reintrodução de portagens na CREL e veio o líder da distrital desautorizá-lo, dizendo que o PSD tem outra posição. Aliás, há vários PSD… Há os que defendem uma coisa quando estão na oposição e outra coisa quando estão no poder.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Está escrito, está registado em acta que o PSD, quando estava na oposição, defendeu que não deveria haver portagens na CREL, nem no futuro IC16 e muito menos no IC30. Agora, no poder, não só reintroduziu as portagens na CREL como prevê, também, colocar portagens no IC16 e no IC30! Depois, há os vários PSD, aqueles que dizem uma coisa numa sede e coisa diferente noutra sede.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o tempo de que dispunha esgotou-se, peço-lhe para concluir.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Apenas quero dizer que, em nome da verdade, era bom que as pessoas tivessem conhecimento dos factos e não viessem aqui criar equívocos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado António da Silva Preto, também dispondo de 3 minutos.

O Sr. António da Silva Preto (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Edite Estrela, sinto um enorme embaraço. Tenho uma enorme simpatia por si (o embaraço também vem dessa simpatia) e, sinceramente, fico satisfeito por ver a responsável da FAUL aparecer neste debate, que tal como eu, enquanto presidente da distrital de Lisboa do meu partido, de alguma forma, tem responsabilidades iguais às minhas. Mas o embaraço ainda é maior porque o que vim aqui dizer, ou o que escrevi naquela carta que mencionou, foi o que os eleitores em Sintra já disseram em 2001, quando não a reelegeram, ou seja, também já mereceu a censura dos próprios eleitores em Sintra. Portanto, sinceramente não vejo que esteja aqui qualquer ataque à sua consideração.
Por outro lado, relativamente à atitude do Dr. Fernando Seara, dir-lhe-ei o seguinte: que bom teria sido para as populações de Sintra se a Dr.ª Edite Estrela, em vez de ter adoptado uma atitude conivente e cúmplice com o governo do Partido Socialista, tivesse tido a mesma atitude do Dr. Fernando Seara, de grande frontalidade, de exigência e que teve resultados: os eleitores do concelho de Sintra vão beneficiar do Eixo Norte/Sul, do alargamento do IC19, do acabamento da CRIL, do IC16 e do IC30. E muito se deve a esta atitude combativa do Sr. Presidente da Câmara de Sintra!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Tomáramos nós, tomaram os eleitores do concelho de Sintra que a Sr.ª Dr.ª Edite Estrela também tivesse tomado esta atitude! É que o problema não está apenas em deixar construir da forma desenfreada como deixou. A responsabilidade é do PSD?! Parece que não esteve lá 8 anos! O problema está em não ter encontrado vias alternativas para evitar o drama diário daquelas pessoas que, quando se deslocam para o trabalho ou regressam aos seus lares, têm de viver aquele inferno. O erro está nessa sua atitude!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas também não queria deixar passar em claro esta atitude de grande cumplicidade entre o Partido Socialista e o Partido Comunista Português. Refiro-me à pergunta do Sr. Deputado António Filipe, feita ao jeito do Sr. Deputado Miguel Coelho, relativa à "história do SIS".
Deviam ter aprendido, meus amigos, não só com o que diz o Dr. Vital Moreira, que já esteve convosco mas agora está do outro lado e que podia ser a tal "ponte" com que os senhores aprendiam… Mas não apenas isso, meus amigos! Deviam ter aprendido que esta lição do SIS, este fait divers para criar este ambiente… Deviam ter aprendido, em Lisboa, quando o Dr. Vasco Lourenço fez o número que fez! Não aprenderam com os resultados em Lisboa?! Por amor de Deus, aprendam!

Protestos do Deputado do PS, Osvaldo Castro.

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Digo-lhe mais: o Sr. Deputado Miguel Coelho, num debate na TSF, também suscitou esta questão, dizendo "Você até sabe que moro em Campo de Ourique e ando eu a fazer estas manifestações…". E foi o próprio que me disse, nesta Assembleia, que há um Deputado - o Deputado Alexandre Simões - que vive no mesmo prédio, e até disse: "Vou pô-lo como administrador do condomínio". Por amor de Deus! Haja aqui respeito, haja aqui decoro, haja limites!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se, tem de concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, termino já.
Sr. Deputado António Filipe, essa história do SIS… Meu Deus! Tenha dó de nós, tenha dó das pessoas que estão lá fora.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 35 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao debate mensal, ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, sobre a revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
O Sr. Deputado Francisco Louçã pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - O Sr. Presidente deverá estar lembrado que, no dia 19 de Dezembro, o Sr. Ministro Morais Sarmento deslocou-se a esta Assembleia para apresentar o novo projecto do Governo para a televisão. Nessa ocasião, fiz uma interpelação, que foi, aliás, rapidamente resolvida por uma informação do Governo, e da própria Mesa, assinalando que na documentação que nos tinha sido entregue era feita uma referência a um plano de anexos que incluía um relatório de serviço público, um relatório do Boston Consulting Group, um relatório do Media Parque, um relatório da regulação e estudos de preparação do novo operador, elementos esses que não nos tinham sido distribuídos.
Na altura, o Sr. Ministro Marques Mendes logo esclareceu que não o tinham sido por uma questão de rapidez, porque o volume de documentos era muito grande e, portanto, os mesmos não teriam sido logo entregues às bancadas parlamentares, mas encontravam-se na Mesa.
Ora, passaram-se três semanas e não temos essa documentação, que é muito importante para apreciar a fundamentação da proposta do Governo. Se a mesma chegou, agradecia que nos fosse distribuída; caso não tenha chegado e tal informação apenas tenha correspondido a uma manifestação de boa vontade natalícia do Governo, agradecia que agora fosse disponibilizada.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa tomou nota e vai providenciar.
Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Sr. Presidente, em termos muito breves, queria apenas dizer que deve ter havido qualquer problema de natureza logística, porque, de facto, foi entregue na Mesa, e com certeza será oportunamente distribuída às várias bancadas, a documentação a que se refere o Sr. Deputado Francisco Louçã. Nessa mesma ocasião, antes do Natal, foi entregue toda a documentação, que é, de facto, volumosa. Julgo que será uma questão de um ou dois dias.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Manuela Ferreira Leite): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: O Governo vem, hoje, à Assembleia da República apresentar o Programa de Estabilidade e Crescimento para o período de 2003-2006.
Estamos aqui não para cumprir quaisquer obrigações legais ou regimentais, mas para procurar um consenso alargado sobre uma matéria indiscutivelmente decisiva para o futuro do nosso país.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Estamos de boa fé e com espírito de abertura. De resto, não quero deixar de salientar o facto de estar presente neste debate o Sr. Primeiro-Ministro, o que é um sinal do empenho do Governo nesta matéria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Programa de Estabilidade e Crescimento trata-se de um programa plurianual, de médio prazo, o que implica uma linha de actuação duradoura e contínua que pode ultrapassar o período de vida de um governo.
Nessa medida, este programa não pode ser indiferente à oposição e muito menos aos que aspiram algum dia ser governo.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Trata-se de um programa cuja apresentação decorre de uma obrigatoriedade inerente à nossa participação na União Europeia. Nessa medida, esta discussão não pode ser indiferente à oposição e muito menos aos que partilham deste mesmo projecto. Ou seja, não se pode estar com o projecto europeu e estar genericamente contra este programa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Para além destas razões, saliento ainda o facto de as orientações subjacentes à elaboração do programa serem as resultantes da recomendação do Conselho da União Europeia sobre a situação de um défice excessivo em que Portugal está. Tratam-se, portanto, de orientações indiscutíveis.

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Elas apontam para que Portugal proceda a uma consolidação orçamental que se traduza numa redução média anual do défice estrutural de pelo menos 0,5 pontos percentuais do produto interno bruto, por ano, de forma a que resulte numa posição orçamental próxima do equilíbrio, em 2006.
É por isto que, independentemente da possível existência de pontos de vista diversos, quer quanto ao ponto de partida quer quanto a algumas das medidas concretas para atingir o objectivo final, há-de ser possível obter nesta Assembleia um consenso alargado, quer quanto ao ritmo de consolidação orçamental quer quanto ao ponto de chegada, já que estes dois aspectos são aspectos da orientação do Conselho da União Europeia e, portanto, quem está com este projecto não pode estar contra essas orientações.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nunca é demais salientar que finanças públicas sólidas e sustentáveis constituem - com ou sem União Económica e Monetária - uma das bases de sustentação da prosperidade económica e da justiça social.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Além disso, constituem o fulcro do enquadramento de política económica da União Económica e Monetária de que Portugal é parte integrante.
Por isso, o Governo seleccionou como sua primeira prioridade o saneamento das finanças públicas, designadamente corrigindo logo este ano a situação de défice excessivo com que o País se viu confrontado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Encontrava-se em causa a necessidade de uma rápida recuperação da credibilidade do País não só à luz do cumprimento dos seus compromissos internacionais mas, sobretudo, junto dos mercados financeiros internacionais.
Este aspecto da capacidade de cumprir os nossos compromissos internacionais é tanto mais relevante quanto, num contexto de um próximo e muito significativo alargamento da União Europeia, que decerto originará novos processos de decisão, se tornará absolutamente decisivo para um Estado-membro poder contar-se entre o grupo de países cumpridores e fiáveis.
O primeiro passo da estratégia de saneamento das finanças públicas está concretizado, com uma redução do défice para um valor claramente abaixo de 3%, em 2002. Portanto, vale agora a pena ocuparmo-nos da forma como o País poderá caminhar para o objectivo de alcançar uma posição orçamental próxima do equilíbrio ou excedentária.
O Programa de Estabilidade e Crescimento comporta dois objectivos de longo prazo. Em primeiro lugar, acelerar o processo de convergência real com a média da União Europeia; em segundo lugar, preparar a economia e, em particular, as contas públicas para as transformações demográficas de longo prazo.
O cenário macroeconómico utilizado é, para os anos de 2003 e 2004, um cenário muito próximo das previsões da Comissão Europeia para Portugal. Para 2005 e 2006, as previsões foram elaboradas partindo do princípio que Portugal retomará um crescimento do PIB próximo do potencial.
Nessa altura, já devem ser visíveis os efeitos das reformas estruturais, pelo que o aumento da competitividade do País permitirá um crescimento mais intenso das exportações e do investimento, ao mesmo tempo que o consumo privado iniciará uma fase de recuperação.
A aproximação ao equilíbrio nas contas públicas será realizada em simultâneo com a redução do défice nas contas externas, prevendo-se que o défice da balança corrente e de capital passe de 8,2% do PIB, em 2001, para uma situação próxima do equilíbrio, em 2006.
Para atingir os objectivos previstos no Programa de Estabilidade e Crescimento a despesa primária terá de se reduzir de 43,2% do PIB, em 2001, para 40,6%, em 2006, ou seja menos 2,6% do PIB.
Para que tal se consiga implica aplicar reformas estruturais que suportem uma mais eficiente afectação dos recursos públicos, sem prejudicar a quantidade e qualidade dos serviços públicos e promovendo em simultâneo a coesão social.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A estratégia seguida abrange, no essencial, as áreas da saúde, da educação, da Administração Pública e da segurança social e a promoção do crescimento económico e da produtividade.
Destacarei apenas os objectivos fundamentais que lhe estão subjacentes e a contribuição que delas se espera para o crescimento económico e para a consolidação das finanças públicas.
No sector da saúde, o objectivo central é aumentar a eficiência dos recursos públicos aplicados. A introdução do princípio da gestão empresarial no sistema de saúde é um dos instrumentos que será utilizado.
As poupanças que se espera obter, incluindo a aplicação da nova política do medicamento, permitirão conter as transferências do Estado para este sector numa taxa média de crescimento de 4% ao ano.
No sector da educação, a aposta do Governo é na melhoria da qualidade do ensino, visando diminuir a diferença que actualmente separa os resultados obtidos no sistema de ensino em Portugal e na União Europeia.
Esta política será desenvolvida num quadro de contenção de custos, tanto mais que a evolução demográfica dita a redução da procura de serviços de ensino.
As medidas a tomar incidem sobre a melhoria da gestão dos recursos humanos e físicos afectos ao sector, a introdução de um maior rigor na avaliação do desempenho das escolas e docentes e na reforma do currículo do ensino secundário.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Este conjunto de medidas permitirá aumentar a qualidade da prestação do ensino e conter os custos numa taxa de crescimento média de 1,6%, no período de 2004 a 2006.
Na Administração Pública, o objectivo final é o de racionalizar e simplificar as estruturas existentes através da redefinição das funções do Estado.
A reforma na Administração Pública deverá permitir baixar as despesas com pessoal de 15,1% do PIB, em 2002, para 13,9%, em 2006.

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Este resultado não será alcançado através de despedimentos, mas de uma forte moderação salarial e de uma contenção do número de admissões de funcionários, que permitirá reduzir o número de efectivos a uma taxa de 1,5% ao ano, entre 2004 e 2006.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto à segurança social, o Governo assumiu a necessidade de realizar a sua reforma, de forma a garantir a sua sustentabilidade e assegurar uma maior equidade e justiça social.
A prioridade que o Governo dá ao aumento da competitividade da economia ditou a redução progressiva da taxa de IRC até atingir 20%, em 2006, o que, conjuntamente com outras medidas previstas no Programa para a Produtividade e para o Crescimento da Economia, deverá permitir a retoma do investimento e o aumento significativo das exportações.
A perda de receita resultante da redução do IRC será compensada com o alargamento da base tributável e com a redução da fraude e evasão fiscais, de tal forma que receita fiscal, em 2006, terá aproximadamente o mesmo peso no PIB que em 2002, ou seja 24,2% do PIB.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Esta é, em traços gerais, a estratégia subjacente ao Programa de Estabilidade e Crescimento. Ela permitirá conduzir o País para uma situação de competitividade internacional e, em simultâneo, corrigir os desequilíbrios actuais das contas públicas e das contas externas.
Não duvido que, em face daquilo que está em jogo, esta Assembleia não deixará de manifestar um apoio às linhas de orientação gerais que o programa consubstancia.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Encontram-se nas nossas mãos o futuro de Portugal, a sua credibilidade, a sua capacidade competitiva, a possibilidade de retomar a convergência com a União Europeia e de continuar a assegurar maior prosperidade económica e justiça social aos seus cidadãos.
Estamos certos que todos temos a noção dessa responsabilidade e de que existe uma enorme margem de consenso, porque nesta matéria é muito mais o que nos une do que aquilo que nos possa dividir.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Deputados, Sr.ª Ministra, há uma afirmação da Sr.ª Ministra com a qual estamos de acordo: da nossa parte, não somos nada indiferentes a este programa, porque ele tem a ver com a vida dos portugueses nos próximos anos, com uma vida para a qual são anunciados novos sacrifícios e novas restrições.
Contudo, há duas afirmações, para já, que rejeitamos completamente. A primeira é a Sr.ª Ministra vir aqui anunciar que este programa assenta em orientações indiscutíveis. Ora, Sr.ª Ministra, até há pouco tempo também era indiscutível o défice zero, em 2004, e hoje, para 2004, já temos um défice proposto de 1,9%.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Sr.ª Ministra, em matéria de orientações indiscutíveis, a única coisa que pode dizer-se é que os arquivos estão cheios de orientações indiscutíveis.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A outra questão respeita à sua afirmação de que quem estiver contra este plano está contra o projecto europeu, contra a integração europeia. Isso não é verdade, Sr.ª Ministra.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é verdade?

O Orador: - Quem está contra este programa em concreto pode estar - e nós, da nossa parte, estamos - contra os critérios que estão subjacentes ao programa, que subordinam tudo à lógica do défice, à redução das despesas, designadamente à redução das despesas com pessoal, das despesas sociais e das despesas do investimento! Ou será, Sr.ª Ministra, que, por exemplo, o Sr. Presidente da Comissão Europeia, o Sr. Prodi, também é contra a integração europeia quando afirma que o Pacto de Estabilidade e Crescimento é estúpido, porque é completamente inflexível?!
Por outro lado, Sr.ª Ministra, estamos contra este programa. Mas por que é que estamos contra este programa? Entre outras razões, porque é particularmente chocante, Sr.ª Ministra, que, por exemplo, a reforma da Administração Pública, algo que é necessário, seja apresentada neste programa não visando a sua modernização, a sua eficiência, a melhoria da qualidade dos serviços prestados aos cidadãos, mas como uma necessidade de libertar recursos para o sector privado. É este o sentido que o Governo dá a esta reforma!
Isto é imposto pela União Europeia, Sr.ª Ministra, é imposto pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento ou é uma opção deliberada do Governo de alargar o processo de privatizações dos serviços da Administração Pública, a áreas que prestam serviços essenciais para os cidadãos?
Uma outra questão, Sr.ª Ministra, é que é incompreensível que o programa nada diga sobre a necessidade de se alargar a base tributária, de se aplicar o princípio de que todo o rendimento deve ser tributado, nada disponha sobre um efectivo combate à evasão e fraude fiscais e a única coisa que aponte seja para uma diminuição do imposto sobre os lucros enquanto mantém e reforça a tributação sobre os rendimentos de quem trabalha.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Estes são alguns dos aspectos, entre outros, pelos quais nos opomos a um programa que não apresenta nenhuma estratégia de desenvolvimento para o País, nenhuma esperança para o País, os quais desenvolveremos na nossa intervenção,
Mas há pelo menos uma pergunta que gostaria de colocar à Sr.ª Ministra, para terminar: no mínimo, Sr.ª Ministra, o seu Governo está disposto a empenhar-se junto da União Europeia na alteração dos princípios e dos critérios que presidem, hoje, à construção dos pactos de estabilidade e que são claramente restritivos e constrangedores do desenvolvimento económico e social dos vários países,

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porque não respeitam as suas especificidades e os diversos estádios de desenvolvimento? É o mínimo que o Governo deveria fazer!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, eu não tinha nenhuma dúvida de que a sua posição era contra a opção europeia e, portanto, as suas afirmações não me admiraram. Admirar-me-iam, sim, se o Sr. Deputado tivesse sido sempre um defensor do projecto europeu.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sei que esse não tem sido o vosso caso, por isso é evidente que não poderia esperar esse apoio.
O Sr. Deputado referiu que eu disse que havia orientações indiscutíveis e não quero deixar de especificar o que quero dizer com isso.
Quero dizer, muito simplesmente, que Portugal está perante um processo de défices excessivos e a Comissão Europeia foi clara ao definir quais os critérios a que tem de subordinar-se um país que está perante esse processo, caso não queira sofrer as sanções que daí decorrem.
Portanto, Sr. Deputado, podemos discutir à vontade e considerar que não devemos cumprir as regras que estão estabelecidas, isto é, não reduzir o défice estrutural meio ponto percentual/ano ou não apresentar nenhum programa que nos conduza a um défice próximo do zero, em 2006. Somos, efectivamente, livres de o fazer, mas também sabemos que ficamos sujeitos às sanções que daí decorrem, que são, como sabe, o não acesso aos fundos de coesão, problema que não se põe, por exemplo, em relação a uma França ou a uma Alemanha mas que se põe em relação a nós.
Portanto, quero dizer-lhe, muito claramente, que é opção deste Governo - uma opção política - evitar essa sanção para Portugal…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … e, como tal, faremos tudo para cumprir as regras a que estamos sujeitos, porque, como o senhor sabe, num acordo não é só um dos lados que tem de acordar: se queremos aquilo que nos dão, temos de fazer aquilo que nos pedem. É tão simples quanto isto!
Por conseguinte, Sr. Deputado, estas duas regras muito simples, a de reduzir o défice estrutural em meio ponto percentual e a de atingir um défice próximo do zero, em 2006, não são para discutir. Há uma coisa para discutir, isso sim, Sr. Deputado, que é o caminho que pode seguir-se para lá chegar.

O Sr. António Costa (PS): - Ora, muito bem!

A Oradora: - Isso pode discutir-se e é exactamente nesse ponto que podemos divergir. Mas há um ponto sobre o qual é difícil divergirmos, especialmente aqueles que têm um projecto europeu, que são as metas, os objectivos e os passos intermédios que têm obrigatoriamente de ser dados para lá chegarmos. Isso não vale a pena discutir, quanto a isso todos os que estão no projecto europeu têm de estar de acordo.
Sr. Deputado, é evidente que não esperava que o senhor viesse defender a redução do défice estrutural em meio ponto percentual e a existência de um défice próximo do zero, em 2006, porque defende teses e caminhos que, sabemos, não conduzem a isto.
Já não posso dizer o mesmo, por exemplo, em relação ao Partido Socialista, que sabe que para cumprir determinados objectivos não são possíveis todos os caminhos mas apenas dois ou três, todos eles muito semelhantes.

O Sr. António Costa (PS): - Olhe que não!

O Orador: - No entanto, é exactamente para isso, para discutir, que estamos aqui hoje.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, é claro, como se sabe, o nosso apoio ao Pacto de Estabilidade e Crescimento, o que não implica que não pretendamos a sua reavaliação, em termos europeus, devido ao interesse nacional e ao nosso empenhamento na construção europeia. Há todo um processo de alargamento em curso e circunstâncias novas que exigem essa reavaliação.
Mas temos, para além disso, várias divergências quanto aos caminhos que estão a ser propostos neste Programa de Estabilidade e Crescimento, porque, como V. Ex.ª disse, há vários caminhos.
Por outro lado, que fique claro que sempre demos o nosso acordo quanto à estrutura equilibrada das finanças públicas em 2006, mas é claro que a marcha proposta pode não nos conduzir à mesma.
O Sr. Comissário Pedro Solbes, em conferência de imprensa, realizada em 8 de Janeiro, hoje mesmo, disse: "Quisemos mostrar que há suficiente espaço de manobra para usar em diferentes circunstâncias económicas, tendo em conta a interpretação do objectivo próximo do equilíbrio. É preciso que esse espaço de manobra possa ser usado para reforçar as características essenciais do sistema e não para o minar.".
As manobras orçamentais de última hora, da 23.ª hora de 2002, não estarão em contradição com o que disse hoje Pedro Solbes, em conferência de imprensa?

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - E hoje mesmo foi difundido o relatório da Comissão sobre o programa italiano de estabilidade, em que é dito que o ajustamento foi conseguido, essencialmente, com medidas temporárias, que será necessário substituir ulteriormente por medidas com outra duração. V. Ex.ª, que adoptou medidas pontuais, não se sente abrangida nesta crítica estratégica da Comissão? Certamente que sim; o problema é se o confessa hoje, ou não.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, não considera perigoso o caminho que está a ser seguido, não considera preocupante que o cenário macroeconómico

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seja uma espécie de cenário deslizante, em que as previsões se mudam sucessivamente?
Por outro lado, parece-lhe ou não preocupante a redução no investimento?
Ontem, numa das respostas que deu, disse que havia uma mudança de critérios. Vamos lá clarificar qual é essa mudança de critérios. A nós, o que parece preocupante é que com qualquer critério haja uma perspectiva e uma prática de redução do investimento.
Não vemos também nenhuma perspectiva clara de transformação da Administração Pública e não queremos cortes cegos que afectem a qualidade dos serviços e apenas obedeçam a critérios contabilísticos.
Em resumo: estamos a favor da consolidação orçamental, mas não queremos cortes no investimento nem o agravamento do custo dos serviços na educação e na saúde, e também ainda não entendemos as novas taxas aplicáveis à agricultura, nem sei se V. Ex.ª já as entendeu.
Em suma, o equilíbrio nas finanças públicas tem de ser conseguido numa perspectiva de desenvolvimento económico e de solidariedade social. É isso que pretendemos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, começou por questionar-me sobre o possível apoio a uma revisão ou reavaliação do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Não queria deixar de relembrar-lhe que essa reavaliação, de alguma forma, já foi feita quando não se exigiu o valor zero para o défice orçamental, mas, sim, valores próximos de zero em 2006
Portanto, aqui já há alguma reavaliação e espero também que o Sr. Deputado faça a justiça de pensar que Portugal contribuiu decisivamente para isso.
Sr. Deputado, não posso deixar de recordar-me que fiz e faço parte de uma bancada que não hesitou, a despeito de estar absolutamente contra os caminhos que estavam a ser seguidos, em dar o seu apoio aos orçamentos e às medidas que tiveram de ser tomadas para que o País entrasse na moeda única.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Abstiveram-se!

O Orador: - Como não me esqueço disso (a deliberação que apoiou essa entrada é de 1997), recordo que não era possível ao PSD defender a integração de Portugal na União Económica e Monetária e estar, em simultâneo, genericamente contra essa entrada. Poderíamos discordar dos caminhos, mas estávamos de acordo com o objectivo,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … e foi com esse objectivo que não pudemos deixar de concordar.
Por isso, Sr. Deputado, não posso deixar de dizer-lhe, e essa é a questão fundamental, que o senhor ao falar, neste momento, em nome da bancada do Partido Socialista tem de definir claramente se está a favor ou contra. Não arranje pretextos para estar contra,…

Vozes do PSD: - Exactamente!

A Oradora: - … diga claramente se está ou não a favor. Isto porque, se o senhor está a favor, não deve arranjar pretextos sem dizer quais as alternativas. Isto é, os senhores não devem dizer: "Nós estamos a favor, mas discordamos completamente; não devem mexer na Administração Pública, não devem mexer na saúde, não devem mexer na educação, não devem mexer no investimento". Os senhores dizem rigorosamente que não devemos mexer em nada.

Vozes do PS: - Não, não!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Deve mexer-se, mas bem!

A Oradora: - O Sr. Deputado diz que deve mexer-se, mas bem. Aí está, Sr. Deputado, aquilo que espero da vossa colaboração!
Estamos aqui, já o disse, de boa fé, numa situação de abertura, não estamos aqui simplesmente para fazer figura de corpo presente, e ficamos à espera que nos digam quais são as propostas de alteração que pretendem introduzir no nosso programa, de forma a ultrapassar essas vossas questões tão decisivas, referindo que pode mexer-se na Administração Pública e na educação mas não da forma que nós propomos. De que forma, então? Como se mexe no investimento, como se mexe no consumo, como se mexe no pessoal?

O Sr. Presidente: - Sr.ª Ministra, o seu tempo esgotou-se.

A Oradora: - Portanto, Sr. Deputado, é exactamente isso que eu espero do si: é que, em nome da bancada do Partido Socialista, diga exactamente se está a favor ou contra e não arranje pretextos à parte, porque eles são temas que podemos discutir à parte mas não são chamados para a definição de um grande objectivo, de uma opção de fundo que o Partido Socialista terá de dizer se faz ou não.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Costa pediu a palavra para interpelar a Mesa.
Qual é o tema da sua interpelação, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, muito singelamente, para solicitar à Mesa que distribua ao Governo, que pelos vistos não os tem, os projectos de resolução que foram apresentados pelas diferentes bancadas, designadamente o do Partido Socialista, que tem oito páginas e contém precisamente um conjunto de sugestões de alteração ao programa aqui apresentado à apreciação pelo Governo,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Grandes sugestões!…

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O Orador: - … pois, pelos vistos, a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças ainda não o tem em seu dispor.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, julgo que esses documentos já foram circulados às bancadas, mas fá-los-emos chegar imediatamente à bancada do Governo.
Para um pedido esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, ouvi-a há pouco, com atenção, referir a importância da actualização do Programa de Estabilidade e Crescimento, fundamentalmente por uma questão de credibilidade externa, por definir claramente as orientações estratégicas no plano financeiro e por acentuar um compromisso muito importante com a União Europeia. Referiu até a necessidade, ou a existência, ou o facto de ser positivo um consenso alargado.
Aquilo que gostaria de começar por perguntar é o seguinte: qual é a expectativa que tem perante este debate, Sr.ª Ministra? E porque de expectativa se tem falado e escrito nos últimos tempos, quero dizer que li o seguinte: "(…) Aguarda-se com expectativa qual a amplitude do consenso político que deles possam resultar, a bem da credibilização da política financeira do Estado português, quer junto dos mercados, quer junto das instituições financeiras da zona euro". Escreveu estas palavras o penúltimo Ministro das Finanças do Partido Socialista, Dr. Pina Moura, quando se referia, precisamente, a esta matéria do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Mas há até quem, no PS, tenha ido mais longe. Por exemplo, também pude ler aquilo que foi dito pelo último Ministro das Finanças do Partido Socialista, o qual, fazendo uma distinção entre, por um lado, pactos de regime e, por outro, compromissos de regime, referia que esta é uma matéria em que claramente se deve optar pelos compromissos de regime.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E, Sr.ª Ministra, devo dizer-lhe que não consegui retirar conclusões definitivas daquela que é a resolução que o Partido Socialista aqui apresentou. Ainda por cima com uma intervenção que foi meramente crítica, não acentuando aquilo que é fundamental a nível de um compromisso importante para o Estado português.
Em face disto, Sr.ª Ministra, o que lhe pergunto é qual a importância que dá à existência desse mesmo compromisso. Parece-nos, claramente, que esse compromisso passa por uma divisão, uma divisão entre aqueles que acreditam numa economia aberta ou aqueles que nela não acreditam, aqueles que acreditam numa União Europeia com uma moeda única e aqueles que acreditam numa União Europeia com liberdade de pessoas e de capitais. Nós estamos, claramente, entre aqueles que defendem esta visão em relação à matéria em causa. Assim, Sr.ª Ministra, gostaria de perguntar se este não é um documento essencial nesse mesmo caminho.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Diogo Feio, a importância que o Governo dá a esta discussão na Assembleia e à obtenção de um consenso alargado por uma questão de credibilidade externa é efectivamente muito grande.
Em primeiro lugar, e como sabe, não era o Governo obrigado a trazer à Assembleia o Programa de Estabilidade e Crescimento. Mas fê-lo exactamente com o objectivo de envolver a Assembleia neste desígnio nacional.
Sabemos que temos maioria na Assembleia, portanto não estamos com dúvidas sobre o apoio que nos é dado pelos dois partidos que apoiam o Governo. Aquilo que quereríamos era ter um consenso mais alargado. Aquilo que consideramos importante em termos de credibilidade externa do País, e dada a enorme dificuldade subjacente a este Programa, é que estamos absolutamente convencidos de que este Programa é extremamente difícil de executar. Se fosse fácil, Sr. Deputado, se calhar estávamos todos muito à-vontade. Mas é muito difícil! Envolve muito empenho, determinação e vontade por parte de todo o povo português.
É esta ideia que deveria ficar bem subjacente no apoio de uma maioria alargada nesta Assembleia. Era a nota, o sinal, de que Portugal está, ele todo, na sua grande maioria, envolvido neste grande projecto nacional, que é conseguirmos levar o país à rota do desenvolvimento e da grande competitividade com os outros.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, em boa hora o Governo tomou a iniciativa de promover um amplo debate e discussão do Programa de Estabilidade e Crescimento 2003-2006, antes da sua aprovação em Conselho de Ministros e da sua apresentação em Bruxelas.
E em boa hora o fez, porque se trata de um documento vital, que define a estratégia prospectiva do país nos próximos quatro anos, num horizonte que ultrapassa mesmo, no limite, o horizonte do Governo. Por isso, justificava-se este debate alargado no sentido de recolher os contributos dos demais partidos políticos, com vista a introduzir as necessárias correcções e melhorias no documento.
Vimos mesmo, também em boa hora, o Sr. Presidente da República, na mensagem de Ano Novo, incitar os partidos políticos a convergirem quanto à revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Vimos também, há pouco, o antigo Ministro das Finanças, e hoje Deputado, Guilherme d'Oliveira Martins sublinhar, de forma enfática, clarividente e percuciente, a necessidade de o Partido Socialista dar o seu apoio, uma vez que se trata de uma matéria importante, qua tale a questão da União Europeia ou a questão do euro. Referiu o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins que são as tais matérias em que estão em causa questões nacionais e em que um compromisso de regime se justifica.

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Surpreendentemente, porém, há sinais recentes que apontam para alguma hesitação, alguma tibieza da parte do Partido Socialista relativamente à hipótese de sufragar a bondade deste Programa de Estabilidade e Crescimento.
E a questão que se coloca é esta: será que o Partido Socialista, nesta matéria, opta por se colar à esquerda radical, ao Bloco de Esquerda e ao Partido Comunista, afastando-se daquilo que é um apelo patriótico e nacional do Presidente da República, auto-excluindo-se daquilo que é uma matéria fundamental, uma matéria nacional, estratégica, que obviamente deveria importar ao Partido Socialista, posto que está também em causa o futuro colectivo de Portugal?
Posto isto, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, gostaria de colocar-lhe esta questão muito concreta: na sua óptica, dado que vimos de uma situação de incumprimento e de défice excessivo, que certamente nos penalizou aos olhos da União Europeia, seria ou não vital, para a credibilidade, para o prestígio e para a imagem de Portugal, que o Programa de Estabilidade e Crescimento tivesse um consenso de apoio mais alargado em termos parlamentares, para que junto de Bruxelas recebesse, da parte dos nossos parceiros da União Europeia, o necessário crédito e o necessário acolhimento, dado que se trata, efectivamente, de uma matéria fundamental para o prestígio e para o futuro do País?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada…

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Ainda não é!

O Sr. Presidente: - Mas foi, durante muito tempo, e com grande brilho!
Tem a palavra, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Muito obrigada, Sr. Presidente, não só por me ter concedido a palavra como por essa frase simpática.
Sr. Deputado Jorge Neto, quando me pergunta se era vital o apoio alargado desta Assembleia ao Programa de Estabilidade e Crescimento, quero dizer-lhe que não iria tão longe e não diria que era vital, mas que era muito importante. E diria que era muito importante porque estamos a tratar de um problema que não é nosso. Não é um problema do Governo, é um problema do País. Também não temos a ideia de que representamos sozinhos o país, representamos uma parte. A maioria do País, neste momento, revê-se no nosso Governo, mas admito que haja uma parte importante com voz neste País que também deveria estar envolvida neste projecto, que como disse não é do Governo, é do País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Além disso, daria também o sinal de que quando há dificuldades, há alguns que estão sempre presentes, e não que quando há dificuldades há alguns que nunca estão presentes, sinal esse que era extremamente importante.
Por conseguinte, nesse aspecto, era muito importante que, perante as instâncias internacionais e comunitárias, pudéssemos aparecer com um consenso alargado por parte do País, na medida em que, mais uma vez o refiro, o Programa é difícil, é complexo, pelo que interessaria ter um consenso alargado, tanto quanto possível.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, com um encanto que é só seu, a Sr.ª Ministra das Finanças, veio aqui, simultaneamente, fazer um julgamento sumário da oposição - condenada e executada a pena de imediato - e, ao mesmo tempo, um abrangente apelo ao consenso.
Quero responder ao apelo ao consenso.
Disse-nos, no entanto, que há uma identidade entre o projecto europeu e o programa que deriva do pacto de estabilidade: "Quem não está connosco, está contra nós".
A Sr.ª Ministra parece-me, a esse respeito, uma neófita, entusiasmada com a cruzada em que vai participar. E, como qualquer neófito, acredita nos chefes e acredita na palavra - a palavra é indiscutível. Mas, Sr.ª Ministra, lembro-lhe que foram os cruzados que saquearam Constantinopla. Por isso mesmo, talvez valha a pena pensar se esta palavra tem algum sentido.
Os republicanos americanos queriam tornar força da Constituição o equilíbrio das contas, o défice zero. George Bush, o vosso modelo político, está hoje a aprofundar um défice gigantesco. E o que hoje se discute na Europa é essa palavra! Tem sentido uma política económica que se baseie, perpetuum seculorum, no défice zero? Não! É impossível! 2004, 2003, 2002 provaram que é impossível, e é uma estupidez querer que isso seja possível!
A política orçamental tem de ter a capacidade de responder à conjuntura, de corrigir a economia, de dar sinais, de orientar. É por isso que o debate europeu, hoje, é sobre as melhores políticas orçamentais, e não sobre a palavra do dogma.
Por isso mesmo, Sr.ª Ministra, em duas matérias, devolvo-lhe o desafio. Nós estamos disponíveis, como sempre, para a consolidação orçamental, sempre que ela significa a transparência absoluta das contas públicas. Um orçamento de base zero é sempre o princípio de qualquer política que permita gastar o que é necessário gastar e evitar os gastos supérfluos. E gastar onde é preciso gastar.
Em segundo lugar, somos a favor de uma política de consolidação fiscal. Sei que o Governo "abre garrafas de champanhe" por ter recuperado 15% da dívida fiscal, e foi um grande progresso para o combate ao défice. Mas preferia que também enfrentasse os 100% da evasão e fraude fiscais, porque isso não é um problema de défice, é um problema de défice e de democracia política.
Por isso mesmo, como europeus que não querem uma Europa mesquinha, fechada, incapaz de responder aos problemas de desemprego e de crescimento, o nosso ponto de vista tem sido que este Pacto tem de ser corrigido. E tem de ser corrigido com um critério decisivo, que é valorizar o investimento que nos permita convergência.
E a Sr.ª Ministra sabe porquê. O mesmo se passa nas contas privadas ou nas contas públicas. Se o jacto do Sr. Pereira Coutinho meter gasolina para fazer uma viagem para o estrangeiro aumenta o consumo, e portanto aumenta o produto nacional. Mas não reproduz nada para o futuro. E o investimento, em contrapartida, reproduz para o futuro.

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E assim é nas contas públicas também: o gasto pode ser necessário, e muito gasto é necessário, mas é o investimento que qualifica, que projecta o país para o futuro. E, por isso, o esforço de investimento deve ser separado, apesar das dúvidas do Sr. Primeiro-Ministro, daquilo que é a qualificação do país.
Esse é o critério que deve ser tomado em conta na revisão do Pacto, isso é o que temos sentido até hoje, e esse é o desafio que temos presente.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, agradeço o seu esforço de consenso, mas devo dizer-lhe que não esperava tanto.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Mas pode sempre esperar.

A Oradora: - Porque, a despeito de o Sr. Deputado ter considerado que eu tinha um entusiasmo de neófita, também lhe devo dizer que se o senhor viesse para uma situação de consenso teria sido a maior das aquisições, porque não há nada de mais fanático do que os convertidos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Risos do Sr. Deputado do BE Francisco Louçã.

Ó Sr. Deputado, a verdade é que, por mais esforços que se façam, a política que tem de ser seguida não é muito diversa desta. Não há grandes espaços para outras fórmulas, para conduzir a situação orçamental e económica noutro sentido. Em relação a esta matéria, os espaços são muito reduzidos, a base de manobra é praticamente nula, e, como o Sr. Deputado sabe, essa é a opinião unânime de ilustres economistas de todos os quadrantes políticos e independentes. Os caminhos a seguir e os passos intermédios são poucos e a meta final é uma única.
Sr. Deputado, eu disse, e continuo a dizer, que, efectivamente, aquilo que nos une é bem mais do que aquilo que nos divide. Por isso, a despeito de o senhor considerar ser talvez uma obsessão demasiada, irei continuar a apostar no sentido e no espírito português para conseguirmos levar esta tarefa a bom termo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, sob a forma de interpelação à Mesa, desejo recordar que este debate resultou de uma sugestão do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e que ficou definido na Conferência de Líderes que, tratando-se de um debate sobre um documento da iniciativa do Governo, naturalmente condescendíamos que fosse aberto pelo Governo, mas que, a partir daí, deveríamos retomar a normalidade do Regimento, cabendo a segunda intervenção ao Partido Socialista.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tem toda a razão. Peço-lhe imensa desculpa e peço também desculpa ao Sr. Deputado Lino de Carvalho.
De facto, foi isso que ficou acordado em Conferência de Líderes, mas a lista de inscrições, elaborada por um Sr. Secretário que não esteve presente nessa Conferência, não o teve em conta, tendo o Sr. Deputado Lino de Carvalho sido o primeiro a inscrever-se.
Peço-lhe imensa desculpa e a sua compreensão, Sr. Deputado Lino de Carvalho, mas, conforme foi acordado, vou ter de dar a palavra, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Então, farei a minha intervenção a seguir, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Tem, pois, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O PS considera que a redução progressiva e sustentada do défice, de uma forma estrutural e consolidada, é um objectivo que deve mobilizar Portugal e os portugueses, mas não aceita que esse objectivo se dissolva num quadro sem sentido estratégico e improvisado para servir puros interesses partidários.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em oposição a essa degenerescência, pensamos que a redução do défice e a consolidação das finanças públicas têm de ser prosseguidas no âmbito de uma estratégia de médio e longo prazo ao serviço do futuro dos portugueses.
Reiteramos o apoio ao Pacto de Estabilidade e Crescimento, entendendo também que Portugal se deve empenhar na sua revisão, de modo a reforçar a sua contribuição para o crescimento e a coesão económica e social da União Europeia.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Penaliza os portugueses que o Governo se mantenha contrário a esse objectivo. Põe-se a questão: podem os portugueses passar a contar com o Governo? Sim ou não? Essa é a mais decisiva de todas as respostas que o Governo pode dar hoje a esta Assembleia.

Aplausos do PS.

Damos o nosso apoio ao objectivo de atingir, até 2006, uma estrutura equilibrada das finanças públicas, requalificando a despesa, garantindo a eficácia na arrecadação das receitas e controlando o défice de uma forma estrutural e consolidada, o que é bem diferente do que foi a desastrosa execução orçamental de 2002.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

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O Orador: - Defendemos que a consolidação das finanças públicas deve ser articulada com uma política económica e social que aumente a confiança, diminua a incerteza, garanta a estabilidade social e promova a actividade económica. O discurso do Governo tem ido em sentido contrário, sendo em grande parte responsável pela queda abrupta dos indicadores de confiança para os seus mais baixos níveis de sempre. Ora, sem confiança, não haverá investimento, não haverá retoma, cairá o emprego. Tudo será mais difícil, incluindo a consolidação das finanças públicas.
O Governo tem de inverter o seu discurso e a sua prática, de modo a criar condições favoráveis à retoma do investimento e da criação de emprego.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Estas três orientações podem e devem ser aceites pela maioria e pelo Governo em ordem à defesa do interesse nacional. Mas, para assegurar a sua aplicação frutuosa nos próximos anos, é necessário inserir o Programa de Estabilidade e Crescimento num quadro de verdade e credibilidade. Deste ponto de vista, é insofismável que as projecções macroeconómicas e das contas públicas que o Governo nos apresenta não são consistentes.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - A execução do Orçamento do Estado de 2002, tal como rectificado e votado no início desta governação, salda-se por um fracasso estrondoso. As receitas apresentam uma quebra extremamente significativa e quanto às despesas importa clarificar, nomeadamente, o seguinte: como se registou um significativo acréscimo de transferências da União Europeia, quando o investimento caiu também significativamente (segundo os dados do Governo)? Qual o impacto orçamental do Serviço Nacional de Saúde, dos Fundos e Serviços Autónomos, dos défices das empresas públicas e das contas das autarquias locais e regiões autónomas? Qual o impacto financeiro da dívida transitada para 2003 em diversas áreas da administração?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Boa pergunta!

O Orador: - Em relação a despesas muito importantes, como, por exemplo, as despesas do Serviço Nacional de Saúde, nem a Sr.ª Ministra faz ideia do seu impacto sobre o défice,…

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - … o que não a impede de anunciar resultados glorificados como definitivos.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Registamos com agrado que a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, em todo o caso, se comprometeu a esclarecer todas as operações, sem margem para qualquer sombra de dúvida - não pode ficar qualquer dúvida! Por isso, é necessário que o Governo assuma o compromisso da aferição das contas de forma análoga à adoptada para as de 2001.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Quanto a 2003, o cenário macroeconómico e as estimativas das contas públicas apresentadas pelo Governo retiram credibilidade ao Orçamento votado apenas seis semanas antes. Estarão recordados que a Câmara foi avisada disso, que a Sr.ª Ministra respondeu como respondeu, vindo hoje confessar que, de facto, tínhamos toda a razão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Este Governo, em seis meses, alterou quatro vezes as suas previsões, havendo já estimativas que colocam o crescimento em 2003 em cerca de metade daquilo que o Governo agora acaba de prever. Lá estaremos a caminho da quinta, e não vai demorar muito!
De qualquer maneira, as previsões do Governo não têm função útil na informação dos agentes económicos, são completamente dispensáveis, ninguém lhes dá importância.
As recentes e desesperadas operações extraordinárias, como a venda da rede fixa à PT, a antecipação das portagens da CREL e o inopinado perdão fiscal renderam muito mais de mil milhões de euros. Essas receitas extraordinárias têm servido para dar a ilusão de que se avançou enormemente na consolidação das finanças públicas. Pura ilusão propagandística!

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - O défice subjacente de 2002 será, provavelmente, próximo da mesma ordem de grandeza do nefando défice de 2001.

O Sr. António Costa (PS): - Essa é que é essa!

O Orador: - A camuflagem da má execução orçamental através de improvisadas e desesperadas arrecadações de receitas extraordinárias coloca o Governo português em conflito radical com a Comissão Europeia, que deseja, pura e simplesmente, proibir que esse tipo de manipulações do défice para avaliar o grau de consolidação das finanças públicas possa sequer continuar a ser apresentado.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Também coloca a Sr.ª Ministra em total oposição ao que pensam peritos responsáveis, dos quais cito apenas um, dos mais respeitados pela maioria, que diz taxativamente o seguinte: "Não se pode aceitar a venda de património, mesmo que essa opção seja correcta sob todos os pontos de vista, se a receita que daí advém se destinar ao pagamento de despesas correntes. Se o Governo o fizesse …" - diz esse perito - "… seria uma enorme irresponsabilidade, porque sabia que estava a obter receita que não mais se repetia para poder fazer despesas que se repetirão todos os anos." E diz ainda: "Com efeito, o que está por detrás dessas vendas é o único objectivo de obtenção de receita para ajudar a disfarçar o défice orçamental. Daí a pressa, a ausência de ponderação, a falta de racionalidade e a ânsia de fazer um negócio. Quando se necessita desesperadamente de dinheiro é meio caminho andado para vender mal. É o que está a acontecer ao Governo, que está a vender ao desbarato."
O respeitável perito que assim se opõe frontalmente à Sr.ª Ministra é nem mais nem menos do que a Dr.ª Manuela Ferreira Leite, em discurso proferido na Assembleia da

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República, em 4 de Outubro de 2000, registado no nosso Diário.

Aplausos do PS.

O mesmo perito, a Dr.ª Manuela Ferreira Leite, também se opôs nesta Assembleia à venda da rede fixa à PT e à concessão de perdões fiscais. O que ontem era irresponsável hoje é virtuoso! E continuará sendo, enquanto se dispuser de património ou não chegar o bom senso!
A propósito de quem se reconverte ou converte, haverá também quem se arrependa, com o mesmo sentido que há pouco foi atribuído a uma conversão.
O Governo precisa destes expedientes, em grande parte porque não combate adequadamente a fraude e a evasão fiscais. É preciso empenhamento nesse combate. São precisas medidas eficazes, entre as quais o PS propõe:
Acesso, pela administração tributária, aos documentos bancários do contribuinte, bem como à informação existente nos serviços e registos de notariado, quando usufrua ou pretenda usufruir de benefícios fiscais, de regimes fiscais privilegiados ou de auxílios do Estado e recuse a sua apresentação para verificação dos pressupostos de acesso àqueles apoios;
Recolha sistemática de informação sobre a situação tributária dos sujeitos passivos que utilizem bens pertencentes a sociedades registadas em zonas offshore, designadamente imóveis, viaturas e barcos de recreio;
Controlo dos pagamentos a entidades residentes em países com regime fiscal privilegiado;
Criação de uma conta corrente global, por sujeito passivo, que permita a compensação automática entre dados relativos a diversos impostos;
Estudo da exigência de declarações do património, exclusivamente para controlo da verdade das declarações em IRS, de acordo, aliás, com a prática vigente em países da União Europeia, e também apenas para contribuintes com patrimónios suficientemente elevados.
O PS também encara com preocupação a substituição de medidas eficazes de combate à fraude e evasão fiscais e de consolidação da despesa corrente primária por um aumento e criação arbitrários de novas taxas em sectores como a saúde, a educação e a agricultura.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Taxas, aliás, que a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças não conhece. Que credibilidade é que esta orientação do PEC nos pode merecer se a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças nos diz que isso são coisas do Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e que não sabe disso?!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não nos pede que votemos isso, com certeza!
E o PS julga ainda inaceitável a deterioração da qualidade de serviços públicos essenciais, afectados por cortes cegos, determinados sem estratégia precisa ou prioridades definidas.
A estratégia de médio prazo do PEC tem de integrar o combate ao desemprego e a defesa do investimento.
Para o Partido Socialista não é compreensível a actualização de um Programa de Estabilidade e Crescimento que ignore a evolução prevista para o emprego e do qual estejam ausentes políticas activas adequadas ao combate ao desemprego, particularmente na situação em que se vive.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Também não se considera aceitável que a perda de peso das despesas de capital no PIB caia sempre, todos os anos, de 2002 a 2006, com uma perda de quase mil milhões de euros em 2002.
É preciso racionalizar, controlar e melhorar a qualidade da despesa pública.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - O PS tem propostas concretas para esse efeito, que estão documentadas na nossa proposta de resolução, que têm estudos substantivos por detrás, os quais estão disponíveis no caso de haver uma negociação séria, e destas quero apenas destacar a necessidade de racionalizar e controlar as aquisições do Estado. Temos propostas nesse sentido, e pensamos que os ganhos poderão ser da ordem dos 40%, cumulados até 2006.
O PS pensa que é preciso reforçar a capacidade financeira da Caixa Geral de Aposentações e normalizar a segurança social dos novos ingressos no Estado. Propõe-se a constituição de um Fundo de Capitalização da Caixa Geral de Aposentações, alimentado, na sua grande parte, pelo produto das vendas de património, que deixaria de poder financiar despesa corrente e seria obrigatoriamente afectado a capitalização da segurança social, sem qualquer possibilidade de escape.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Considerando o que se vai gerando na sociedade portuguesa sobre a equidade dos regimes de segurança social, o PS tem propostas no sentido de se negociar com os sindicatos, em escrupuloso respeito pela lei, com o espírito aberto, essa normalização da segurança social dos futuros ingressos, fazendo-a acompanhar também de benefícios no plano da formação contínua, do enriquecimento das experiências de vida generalizáveis a toda a Administração Pública e capazes de serem consideradas pioneiras no nosso país.
Finalmente, no que se refere à qualidade, é preciso erguer a bandeira da qualidade, é preciso haver cartas de qualidade de serviço público, com obrigações precisas controláveis pelos cidadãos,…

A Sr.ª Elisa Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - … e é preciso fazer com que os serviços respondam a essas obrigações, sendo necessariamente certificados segundo as normas ISO, com a grande vantagem de a certificação ISO exigir a manutenção do padrão de qualidade e, portanto, dar uma garantia de continuidade, mas é preciso, sobretudo, que haja um governo que tenha uma política para o futuro, uma política estratégica de transformação da sociedade portuguesa, apoiada num Estado de qualidade. É a isso que convidamos o Governo.
Apresentámos as nossas propostas. Apoiamos o objectivo da consolidação das finanças públicas, de redução do défice, mas exprimimos o que pensamos sobre os caminhos que o Governo toma. Não se peça ao Partido Socialista

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que renuncie às suas responsabilidades, dando "cheques em branco", sem mais, às orientações do Governo.
Fomos claros sobre os princípios, sobre o que apoiamos, sobre o que nos dá preocupação, somos claros sobre o que propomos e estamos abertos a tudo debater, em coerência com essa posição. Que a maioria seja igualmente clara e que o Governo perceba finalmente que não é possível governar o País querendo dividi-lo contra si próprio, consoante as suas conveniências de hegemonia partidária.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Se assim for, haverá, de facto, estabilidade e crescimento, que brotará da cooperação institucional séria entre a Assembleia da República e o Governo. Se o Governo não quiser, o papel consente tudo quanto lá se põe. O resto ficará para a comprovação final.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Jorge Neto e Diogo Feio.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Cravinho, ouvi atentamente a sua intervenção e deixe-me dizer-lhe que fiquei atónito e perplexo com um certo despudor da sua exposição.
Desde logo, V. Ex.ª faz uma referência enfática à execução orçamental de 2002, apodando-a de "desastrosa". Pergunto-lhe: como é que qualifica a execução orçamental de 2001? Para além daquela referência que fez, muito residual e marginal, de pé de página, de "nefanda", como é que classifica a execução orçamental de 2001,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … que levou a um défice excessivo de 4,1%, fazendo com que Portugal fosse o primeiro país da União Europeia a entrar numa situação de défice excessivo?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Como é que qualifica essa execução orçamental? Será uma execução orçamental notável, sublime? É inqualificável, verdadeiramente inqualificável!
Em segundo lugar, V. Ex.ª, uma vez mais, repristina aqui um argumento já utilizado anteriormente na Comissão de Economia e Finanças, que é o argumento da demonização, das receitas extraordinárias. V. Ex.ª invoca mesmo jurisprudência desconhecida da Comissão Europeia relativamente a esta matéria…

O Sr. António Costa (PS): - É de hoje!

O Orador: - … que ostracizaria as receitas extraordinárias quando, efectivamente, não é ainda do domínio público qualquer notícia concreta sobre essa matéria.
Mas deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado: V. Ex.ª, que fez parte dos governos socialistas, que, de certa forma, contribuiu com a sua quota-parte também para o descalabro e para o desvario das finanças públicas, não quererá ter o condão de reconhecer, aqui e agora, que boa parte dessas receitas extraordinárias foram produzidas e foram necessárias devido, exactamente, ao despesismo…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … criado pelos governos de que V. Ex.ª fez parte? Não quererá ter o condão de reconhecer, aqui e agora, que foi exactamente esse descalabro que levou à necessidade imperiosa de realizar despesas extraordinárias para cumprir o objectivo do défice de 2002?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A terceira questão, Sr. Deputado João Cravinho - e deixe-me dizer-lhe isto com toda a frontalidade, com toda a abertura, porque é o que perpassa, de facto, pelo espírito de todos nós -, tem a ver com uma sensação incontida de que o que está por detrás do biombo desta sua excitação, deste seu pseudo-afrontamento, é a angústia, a amargura por ter sido cumprido o défice de 2002.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Essa é que é a realidade!
O que os portugueses, hoje, começam a verificar e a constatar com absoluta nitidez é que há uma insatisfação absolutamente incontornável do Partido Socialista relativamente ao cumprimento do objectivo do défice abaixo dos 3%, em 2002. E esse é o mérito da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.
V. Ex.ª não quererá também reconhecer que, efectivamente, é essa angústia que perpassa do tom agreste da sua intervenção?
Certamente, não esperaríamos uma palavra de felicitações da parte do Sr. Deputado João Cravinho, mas, no mínimo, valha-nos Deus!, uma palavra de satisfação por ter sido cumprido este desiderato nacional, que era cumprir o défice de 2002.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por último, Sr. Deputado João Cravinho, não será chegada a hora - a tal "hora" de que nos fala Fernando Pessoa - de o Partido Socialista ter um assombro de sensatez, de sentido de Estado e de dar um passo, dar um contributo, com os partidos da maioria, no sentido de apresentar um projecto de resolução que efectivamente transmita para o exterior o tal sinal de esperança e de confiança no futuro, um projecto de convergência relativamente ao apoio inequívoco ao Programa de Estabilidade e Crescimento? Não será chegada a hora de virar a página, de passar "além da Taprobana" e apoiar o Governo no Programa de Estabilidade e Crescimento?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Cravinho comunicou à Mesa que responderá aos dois pedidos de esclarecimento em conjunto.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Cravinho, começo por referir - não

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posso citar o facto de memória - o que foi dito por um conhecido especialista ligado ao Partido Socialista sobre aquela que foi a política de combate à fraude e evasão fiscais nos governos liderados pelo Eng.º António Guterres. Dizia esse conhecido especialista que faltou vontade política. Com certeza que se lembra que foi V. Ex.ª quem referiu isto numa entrevista ao Jornal de Leiria.
Começava por lhe pedir que comentasse esta sua mesma afirmação, agora, aqui, como Deputado nesta Assembleia.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A questão que mais directamente lhe quero colocar tem a ver com aquela que coloquei há pouco à Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: se há matéria que merece um compromisso alargado, pelos seus objectivos, pelos fins que visa alcançar e pelo modelo que claramente defende, é esta matéria da actualização do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Fiquei sem perceber, em relação a isso, qual é a posição, em concreto, que o Partido Socialista toma, porque ela é claramente dúbia, não se consegue compreender. E, Sr. Deputado João Cravinho, dou-lhe, por assim dizer, uma segunda oportunidade para que nos possa explicar qual é a sua posição…

O Sr. António Costa (PS): - Que generosidade!

O Orador: - Possivelmente, terá sido alguma dificuldade de compreensão minha e, se calhar, desta bancada e, se calhar, da que está ao lado… Mas, de facto, não entendemos qual é a posição que, perante esta matéria, o Partido Socialista pretende tomar de uma forma inequívoca.
Está em causa um modelo, apoiado por esta bancada, pelo PSD e que, pretensamente, tem sido apoiado pelo Partido Socialista. Infelizmente, neste momento, ficamos na dúvida.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho. Dispõe de um máximo de 5 minutos.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, não pensava dar de imediato uma resposta ao Sr. Deputado Diogo Feio, que não deve ter tido uma primeira oportunidade para ler o nosso projecto de resolução, porque ele é muito claro e muito preciso. Poderá ser discutível - é discutível, de certeza! -, poderá não estar de acordo, mas a nossa posição é clara e nada mais devo acrescentar.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - É aconselhável uma segunda leitura!

O Orador: - Em segundo lugar, devo dizer que estamos de acordo e apoiamos os objectivos, mas, como a Sr.ª Ministra disse, vamos ver quais são os caminhos. E aqui é que poderá haver, e há de facto, divergências profundas.
Portanto, este assunto está arrumado.
O segundo assunto tem a ver com o défice de 2001. Ó Sr. Deputado Jorge Neto, o senhor tem agora a segunda oportunidade de ler, com certeza pela primeira vez,…

Risos do PS.

Protestos do PSD.

… a pág. 8 do Programa de Estabilidade e Crescimento, onde se diz que a despesa corrente primária, em percentagem do PIB, é: em 2001 (o ano nefando, o ano horroroso), de 37%, em 2002, de 38% e,…

Vozes do PS: - Oh!…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - … em 2003, de 38,2%.

Risos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Pronto! O nefando, portanto, está aí! É o que eu digo: para o Governo o que, ontem, é nefando hoje virtuoso!

Protestos do PSD.

Depois, o Sr. Deputado diz que não há qualquer evidência das posições da Comissão Europeia contra as operações de receita extraordinária para camuflar as que…

Protestos do PSD.

Sr. Presidente, gostaria de oferecer ao Sr. Deputado Jorge Neto - e estou tentado a dizer que, frequentemente, isto me sucede - e aos diferentes grupos parlamentares a cópia da comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento, datada de 21 de Novembro de 2002, se não estou em erro, relativa à matéria sobre a qual o Sr. Deputado Jorge Neto diz não haver qualquer evidência. Este exemplar já está sublinhado por mim, é pena, mas, em todo o caso, ajuda a uma leitura rápida. Assim, gostaria que os serviços o entregassem ao Sr. Presidente para ser distribuído a todas as bancadas, inclusivamente ao Sr. Deputado Jorge Neto.
O Sr. Deputado Jorge Neto diz ainda: "Bom, mas qual é o problema das receitas extraordinárias?! O que os senhores têm é inveja!"

Protestos do Deputado do PSD Jorge Neto.

Peço desculpa, então retiro o termo. O que nós temos é alguma…

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Dor de cotovelo!

O Orador: - … dificuldade em aceitar o grande êxito que foi esta operação.
Sr. Deputado Jorge Neto, esta operação é tão boa, tão boa, que todos os comentadores, quase sem excepção, eu diria quase todos, dizem assim: bom, de facto, isto foi um expediente, é bom não repetir! E, de facto, isto não se pode repetir.
Bom, depois temos uma coisa muito simples: citei um perito que o Sr. Deputado diz ser desconhecido mas que, por acaso, dá pelo nome de Dr.ª Manuela Ferreira Leite,…

Risos do PS.

… que é completamente desconhecida em Portugal, e que, infelizmente, teve aquele deslize, aquele lapso, de estar

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em contradição com a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

Risos do PS.

Este é um problema, não sei se da Sr.ª Ministra das Finanças se da Dr.ª Manuel Ferreira Leite. Mas meu não é de certeza!

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do CDS-PP Diogo Feio.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas, uma vez que o Sr. Deputado Lino de Carvalho vai usar da palavra, gostaríamos de dizer que, como compensação pelo incidente de há pouco, cedemos 1 minuto ao Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Presidente: - Vá lá, são mesmo generosos!

Risos.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito obrigado, Sr. Deputado António Costa.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Comecemos por esclarecer uma questão, tendo em conta, mais a mais, a intervenção de há pouco da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.
O PCP é favorável à existência de um programa estratégico de consolidação das finanças públicas, mas um programa que se constitua como factor de crescimento e de desenvolvimento económico e social do País e do processo de convergência real com a União Europeia.
Mas a verdade é que o Pacto e o Programa ditos de Estabilidade e Crescimento que debatemos foram criados e são construídos partindo da consideração de que a disciplina e o equilíbrio das finanças públicas é um fim em si mesmo, e, para atingir isto, o défice, e o défice zero em particular, é eleito como o critério central e quase exclusivo, o que tem, aliás, contribuído não para a promoção do desenvolvimento económico e social mas para a sua própria travagem, designadamente, em períodos de abrandamento da economia.
Neste quadro, o que o Governo nos apresenta continua a ser um Programa excepcionalmente restritivo, que nem sequer se dá ao trabalho de questionar a própria metodologia do cálculo do défice, quando hoje já faz caminho a tese de que nele não devem ser incluídas as despesas de investimento. O Governo recusa-se, assim, a entrar no debate que já está em curso na própria União Europeia e que só nos favorece.
Mas a outra face da moeda tem a ver com a forma como se atingem os objectivos impostos para a redução do défice. Em Portugal, e neste Programa de Estabilidade e Crescimento para 2003-2006, em particular, a tónica é colocada no ataque às despesas com pessoal e às despesas sociais, elegendo-se os trabalhadores da administração pública, aos olhos do País, como os causadores de todos os males. No plano social, é intolerável, por exemplo, que o Programa, ao referir-se às políticas de educação e às medidas propostas, o faça com a alegação de que o seu objectivo é o de que tais medidas conduzem não a melhoria da eficiência do sistema de ensino mas "à realização de poupanças". Esta é a palavra-chave e é uma palavra que, aplicada à educação, é, no mínimo, inaceitável.
A educação é tratada não como um investimento para melhorar a qualificação dos recursos humanos do País mas como uma despesa corrente, onde se têm de realizar poupanças e, ainda por cima, em Portugal, onde é consabido, e o próprio Governo o tem afirmado, que tem o maior défice de qualificações de todos os Estados-membros.
Mas esta é também a linha de força que nos é apresentada para a saúde ou para a segurança social: aumentar as propinas; aumentar as taxas moderadoras; em outras áreas, criar novas taxas, designadamente no sector agrícola; diminuir os encargos com as políticas de solidariedade e segurança social; reduzir o papel das políticas públicas; e privilegiando as políticas de privatizações, que é o que o Governo quer dizer com a eufemística "redefinição das funções do Estado". Isto é particularmente chocante quando se afirma que a reforma da Administração Pública deve ser encarada não para melhorar a qualidade dos serviços prestados aos cidadãos e a qualificação e condições sociais dos seus trabalhadores mas para libertar recursos para o sector privado.
Em contrapartida, nada se vê quanto ao alargamento da base tributária, portanto, qualquer medida efectiva do lado da receita. A norma que o Governo prossegue não é a de que todo o rendimento deva ser tributado. Não, a norma é a de que aqueles que já pagam muito sejam mais penalizados e vejam a sua carga fiscal agravada. Para o justificar, o Governo acena-nos, por exemplo, com um quadro enganador, dizendo-nos que Portugal seria um dos países com maior taxa de imposto sobre os lucros. É preciso dizer que o Governo, ao escrever isto no Programa que nos apresenta, não está a falar verdade, porque, em primeiro lugar, a taxa efectiva de tributação em IRC, devido aos mecanismos que permitem múltiplas deduções aos lucros e benefícios fiscais, não passa, no máximo, dos 22,5 % e, como se sabe, há sectores, como a banca, onde não se vai além de 12% a 13%.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - É enorme e tem vindo a aumentar a diferença entre a taxa legal e a taxa efectiva.
Em segundo lugar, não está a falar verdade porque há múltiplos rendimentos de capital não sujeitos a tributação. Veja-se o que se passa com as mais-valias obtidas nas operações bolsistas ou nos capitais que circulam pelo offshore da Madeira. E, finalmente, porque a fuga (a fraude, a evasão fiscais) é gigantesca e o Governo não tem vontade política para as combater, a não ser através de periódicos perdões, os quais, podendo até traduzir-se, no imediato, em alguma arrecadação de receita - e, conforme revelou ontem a Sr.ª Ministra das Finanças, beneficiaram sobretudo muitas grandes empresas -, não deixam por isso de ser profundamente injustos para com todos aqueles que pagam os seus impostos pontualmente, correndo-se claramente o risco de serem incentivadores da consolidação de uma mentalidade de fuga ao fisco, na certeza de que um dia virá sempre mais um perdão.
Mas analisemos também a forma como o Governo, a todo o custo, pretende atingir o nível de défice que se propõe, a partir do que se passou em 2002 - e já o dissemos anteriormente.

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O Governo adoptou um conjunto de medidas extraordinárias para captar receitas extraordinárias, de forma avulsa e desgarrada, mas nada alterou quanto às condições estruturais das finanças públicas. A demonstração disto está no nível de receitas fiscais normais que vão ficar cerca de 1000 milhões de euros abaixo do previsto.
Ora, como as receitas extraordinárias a que o Governo deitou mão, penalizando em muitos casos o orçamento dos portugueses - em que a reintrodução das portagens na CREL é só a mais recente -, não se vão repetir, em grande parte, em 2003 ou nos anos seguintes e como não foram adoptadas medidas estruturantes, o que vamos ter nos próximos anos para cumprir o Programa que agora é apresentado são um conjunto de políticas de sacrifício para os portugueses, traduzidas em mais desemprego, aumentos de impostos e redução de salários. É simbólico que a medida mais visível e quantificada deste Programa seja a da redução do emprego na Administração Pública, à razão de cerca de 1,5%/ano, e uma forte contenção salarial, a que se junta uma redução das transferências do Orçamento do Estado para o Serviço Nacional de Saúde e, especialmente, para a educação.
Aqui, o anúncio de aumentos anuais de 1,6% na afectação de recursos públicos para o ensino não superior e a recusa de qualquer aumento nas transferências para o ensino superior significam a mais brutal diminuição do financiamento a que o Estado está obrigado com todas as consequências a prazo para a continuada desqualificação do ensino em Portugal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A isto, juntem-se os brutais aumentos das tabelas de preços dos bens e serviços públicos (electricidade, água, medicamentos, portagens, etc.) que o Governo anuncia no Programa de Estabilidade e Crescimento que irão prosseguir a valores superiores à taxa de inflação, e aí temos a receita para se atingirem, a todo o custo, as irracionais metas que são propostas.
Quando o Presidente da República, em Florença e agora na mensagem de Ano Novo, por um lado, se mostra preocupado com as consequências económicas e sociais do Pacto de Estabilidade e Crescimento e, por outro, apela a uma política de combate à fraude e à evasão fiscais tem neste Programa de Estabilidade e Crescimento para 2003-2006, condicionador da política orçamental nos próximos quatro anos, a expressão exactamente oposta do que defende, e, por isso, seguramente uma nova razão para juntar a sua voz à daqueles que entendem que é chegada a hora de uma outra racionalidade na definição e articulação dos programas de finanças públicas da zona euro, dando mais espaço às necessidades diferenciadas de cada Estado e conjugando-os com desenvolvimento e justiça social.
Acontece, por último, que as projecções que são apresentadas merecem muita pouca credibilidade. Ainda em Dezembro passado, o Governo obstinou-se a defender as projecções macroeconómicas que apresentou na proposta de Orçamento do Estado para 2003 contra a acusação que o PCP fez então, do seu irrealismo e manipulação. Pois bem, já nessa mesma altura o Governo tinha consciência de que os valores que apresentava nada tinham a ver com a realidade, porque já nessa altura estava a trabalhar nos dados que agora nos apresenta, aliás, de novo revistos em baixa.
Mas o que não deixa de ser estranho é que, baixando o Governo as previsões que tinha apresentado para o crescimento do Produto, não tenha praticamente, como teria de ser, alterado também as previsões de receitas fiscais. Regista-se, aliás, que os valores do crescimento do Produto, previstos no Programa de Estabilidade e Crescimento para 2003-2004, significam que Portugal continuará a crescer, pelo menos, para já nesses anos, a valores inferiores aos da União Europeia, tendo em conta as últimas projecções. Não exageraremos, aliás, face a isto tudo, se dissermos que, em boa verdade, este Programa de Estabilidade e Crescimento deveria ser acompanhado de um Orçamento rectificativo, porque o que esta Assembleia aprovou há pouco tempo nada tem já a ver com aquilo que agora é proposto.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é o Programa de Estabilidade e Crescimento que o Governo apresenta para 2003-2006 e, como demonstrámos, por este caminho não vamos longe, por isso apresentámos um projecto de resolução. Fazemo-lo porque não temos uma proposta que construa, como o Governo afirma, qualquer "futuro socialmente saudável" no âmbito do Programa de Estabilidade e Crescimento; pelo contrário, o que temos é um Programa de Estabilidade e Crescimento que não resolve qualquer problema de fundo nas finanças públicas, que vai criar ainda mais dificuldades ao relançamento da economia do País, que obriga os portugueses a apertar ainda mais o cinto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nesta hora em que se debate o Programa de Estabilidade e Crescimento 2003-2006, na Assembleia da República, a questão nodal que se coloca a todos nós é, efectivamente, uma só: vamos persistir nos erros crassos da política económica do passado, escudada sob o manto diáfano mas ilusório do pleno emprego, assente na despesa pública e privada e alavancada por um galopante endividamento, decorrente de um modelo económico esgotado e exangue, ou vamos dar a volta à situação, adoptando o passo estugado do ajustamento orçamental e do reequilíbrio das contas públicas, com vista a um desenvolvimento são e sustentado da nossa economia? Não há, não pode haver dúvidas algumas sobre o caminho a trilhar.
Urge disciplinar as finanças públicas, controlar e reduzir a despesa pública estrutural, estimular e incentivar a economia, combater, com eficácia, a fraude e a evasão fiscais.
Só com uma nova atitude na condução da política económica em Portugal será possível consagrar dois objectivos nucleares: a retoma da convergência real com os demais parceiros da União Europeia e a preparação das contas públicas para as transformações demográficas, a médio e longo prazo, decorrentes do envelhecimento da população.

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A retoma de convergência pressupõe, inexoravelmente, reformas estruturais que aumentem a produtividade e a competitividade da economia portuguesa. A interdependência da economia mundial exige uma particular e sagaz capacidade de adaptação e de ajustamento que favorece, conduz e exige mesmo essas reformas estruturais. Desde logo, na Administração Pública, libertando recursos para o sector privado, mas também na Educação, na Saúde e na Segurança Social, lobrigando inestimáveis ganhos de eficiência para enfrentar os desafios da mundialização. Mas não só!
A política económica terá também de ter em conta as consequências vindouras do envelhecimento da população, que só na União Europeia poderá vir a gerar, a partir de 2015, um forte aumento da despesa pública, na ordem dos 4% a 8% do produto interno bruto. É imperioso criar condições perenes que gerem excedentes significativos que financiem esse incontornável envelhecimento populacional e assegurem a sustentabilidade financeira da segurança social, para que esta não venha a constituir um factor de bloqueio do crescimento económico.
É já hoje um lugar comum dizer-se que só com finanças públicas sãs teremos desenvolvimento, prosperidade económica e maior justiça social. Mas há que reconhecer que o processo de ajustamento orçamental e de estabilização macroeconómica é um processo difícil, árduo e complexo e tem de ser debruado, nas suas linhas de força, por critérios de rigor e de justiça social.
A chave do problema e do despertar de uma nova era de esperança num futuro promissor passa, de modo irrefragável, por uma concertação de políticas públicas que, a um tempo, consolidem as finanças públicas e, a outro, privilegiem o crescimento económico e realizem as inadiáveis reformas estruturais.
O Programa de Estabilidade e Crescimento para 2003-2006 tem como condicionantes vinculativas as metas de obtenção de um défice orçamental próximo do equilíbrio em 2006, a par de uma redução anual do défice estrutural de 0,5 pontos percentuais. É a confirmação da bondade do postulado de que a consolidação e a disciplina orçamentais são vitais para assegurar a estabilidade macroeconómica, na senda da convergência da economia portuguesa com os melhores padrões da União Europeia.
A nossa economia - cumpre dizê-lo uma vez mais - apresenta graves desequilíbrios macroeconómicos, a nível interno e a nível externo.
A nível interno é manifesto que a nossa inflação, reiteradamente acima da média da União Económica e Monetária, determinou um agravamento dos custos dos factores de produção e uma perda de competitividade das empresas. Sem os instrumentos tradicionais da política monetária e cambial, de que hoje não dispomos, a manutenção deste status quo produziria inelutavelmente o encerramento das empresas e o desemprego. É isto que importa corrigir, fazendo apelo a uma lógica de moderação salarial, que não poderá deixar de levar em consideração a produtividade, na esteira do que sabiamente tem vindo a doutrinar, amiúde, o Banco de Portugal.
A nível externo é hoje também pacífico reconhecer-se que o período de 1998/2000 foi um período de irresponsável endividamento externo.
A euforia consumista pública e privada decorrente da baixa da taxa de juro subsequente à nossa entrada na zona euro, levou o País a níveis de endividamento anteriormente inimagináveis. Só no que concerne ao endividamento bancário - pasme-se! -, o mesmo ascendeu a 700 milhões de euros/mês, em 1999, e a 1100 milhões de euros/mês, em 2000 e 2001. Coeva e cúmplice da febre consumista que assolou o País, a política orçamental expansionista então adoptada ainda exacerbou mais esse desequilíbrio. Basta dizer que o défice estrutural permaneceu praticamente inalterado nos 3% entre 1998 e 2000.
Sejamos claros e frontais: o que a política orçamental originou nos últimos anos, não tendo realizado a consolidação quando ela teria sido mais fácil, foi o agravamento do desequilíbrio externo.
Daí que sejam necessárias políticas estruturais do lado da oferta e não da procura, que permitam uma melhor utilização de recursos e uma expansão da tendência de crescimento. É preciso actuar sobre os mercados de bens e sobre os mercados de trabalho. Não há alternativa, por mais fecunda que seja a fervilhante imaginação de alguns.
O Pacto de Estabilidade e Crescimento aponta, assim, o caminho único das reformas estruturais em vários domínios estratégicos da economia, "fundamentais para Portugal tirar partido da globalização e do alargamento da União Europeia e acelerar o processo de convergência".
Avulta, desde logo, pela sua relevância e dimensão, a reforma da Administração Pública, com o reequacionamento da sua missão e do seu modo de funcionamento ao serviço do cidadão, reduzindo, em proporção do PIB, a respectiva despesa corrente primária. Mas também a reforma da educação, com uma aposta na "educação moderna e com qualidade", com melhoria da organização e da gestão do sistema, a reforma da saúde, no sentido de reconfigurar o Serviço Nacional de Saúde como "uma fonte de valor para o cidadão" e a reforma da segurança social, "garantindo a sua sustentabilidade e assegurando maior equidade e justiça social".
A tudo isto acresce o conjunto das reformas económicas corporizado no Programa para a Produtividade e Crescimento da Economia (PPCE), visando "o aumento sustentado da produtividade e da competitividade da economia portuguesa". É neste quadro que se inserem as medidas que reforçam a concorrência, melhoram a regulação e fomentam o investimento produtivo e as exportações, sem esquecer, naturalmente, a promoção da competitividade fiscal das empresas e do País, com a projectada redução da taxa de IRC em 10 pontos percentuais, no período 2004/2006, associada ao alargamento da base tributável e ao objectivo da estabilidade orçamental.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pode discutir-se o mérito da estratégia de desenvolvimento do País implícito no Programa de Estabilidade e Crescimento e até se pode legitimamente discordar, uma vez que o que lhe subjaz são opções políticas bem definidas. O que não se pode dizer, a não ser com adâmica petulância e prosaica insolência, é que o mesmo não traça uma linha de rumo.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Traça e de forma clara, lúcida e desassombrada. É a via exigente do desenvolvimento sustentado da nossa economia, esconjurando a sociedade do jugo centralista, paternalista e quantas vezes decrépito do Estado,

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dando voz à sociedade civil, erigindo em batalhas cruciais da modernidade e do progresso os desafios da produtividade e da competitividade, cada vez mais exigentes e difíceis numa Europa alargada e num mundo mais aberto, convergindo em questões vitais de desenvolvimento estratégico do País, como ocorre com a presente revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Fazendo eco das avisadas palavras do Sr. Presidente da República na mensagem de Ano Novo, Portugal tem todas as condições para ultrapassar a adversidade. Fundamental é o esforço e a responsabilização de todos, sem excepção - "(…) Só com o trabalho e a determinação de todos podemos vencer as dificuldades. (…)". Haja esperança e confiança no futuro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Jamila Madeira.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada, dispondo de 3 minutos para o efeito.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Sr. Presidente, Caro Deputado Jorge Neto, falou-nos em consolidação e disciplina orçamental como sendo os grandes princípios, os grandes pressupostos deste Programa de Estabilidade e Crescimento, com vista a uma convergência, no meu entender cega e que esquece que é suposto um programa de estabilidade e crescimento promover a coesão social e não ser apenas um promotor tout court de uma perspectiva de "mangas de alpaca" de um qualquer governo que apenas pretende o equilíbrio rigoroso entre despesas e receitas.
Por isso, aquilo que se vê neste Programa é que os pontos de crise são a Administração Pública, a Educação, a Saúde e a Segurança Social; em suma, as funções sociais do Estado. Isto é claro e muito bem assumido em todos os discursos que foram aqui proferidos, concretamente no seu e no da Sr.ª Ministra das Finanças, num ataque direccionado às funções sociais do Estado.
Dir-me-á então: a Administração Interna não carece de reforma?! A Defesa Nacional não carece de reforma?! Os cidadãos não exigem a sua reforma?! Estamos para saber se a Defesa Nacional é, de facto, uma prioridade do nosso país, no sentido de o fazer convergir, em termos reais, em relação à União Europeia.
Efectivamente, o Programa do XV Governo diz que a qualificação dos portugueses é um objectivo absolutamente essencial para promover o desenvolvimento do País. Mas que objectivos se pretendem com estes cortes cegos?! É que, nas transferências para o ensino superior, temos uma variação zero de um crescimento zero, e isto sucede não durante um ou dois anos mas, sim, até 2006, porque estamos a falar de um programa com duração até 2006.
No ensino não superior, temos um crescimento nominal de 1,6%, abaixo da inflação prevista; logo, um decréscimo efectivo daquelas que serão as transferências para o ensino não superior.
É esta a convergência que se pretende para atingir a qualidade da investigação e do ensino?! Não deveremos também pactuar com uma alteração da visão do Pacto de Estabilidade e Crescimento para que possamos fomentar a noção do défice que, sendo positivo, promove o crescimento e a convergência real das economias?!
Por fim, depois de o ter ouvido citar o Sr. Presidente da República, será que também está disponível para concordar com ele quanto à alteração da visão ou do tipo de análise que é associado ao défice. Ou seja, pretende que os investimentos bons, os investimentos estruturantes para o País sejam também nele incluídos ou que sejam vistos e usados de uma forma diferente, na perspectiva da convergência real, esta, sim, importante, em termos de visão do nosso país?!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Jamila Madeira, agradeço as questões que me colocou.
Deixe-me dizer-lhe que enxerguei, na sua intervenção, que a base de sustentação ou fundamentação das questões que coloca assenta no postulado axiomático dos cortes cegos. É algo que já decorre da posição oficial expressa pelo Partido Socialista…

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - O crescimento zero não pode ser mais cego!

O Orador: - … sobre a revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento.
Mas, deixando de lado esses postulados axiomáticos e esses clichés, o que importa reter, na revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento, é que ela é, de facto, positiva, como, aliás, Deputados da sua bancada reconheceram - e estou a lembrar-me, porque o estou a ver, concretamente, do antigo Ministro das Finanças, que o reconheceu, por escrito, há dias, no Diário de Notícias -, porque tem uma linha de rumo estratégica de desenvolvimento do País.
Há, de facto, necessidade de acelerar a convergência do País com os demais parceiros da União Europeia, há necessidade de preparar a economia e as contas públicas para um problema grave que se vai colocar dentro de 10 ou 15 anos, que é o problema demográfico do envelhecimento da população, com o acréscimo que irá representar, a jusante, em matéria de produto interno bruto. E isto determina, necessariamente, reformas estruturais, quer no sector público, quer no sector privado da economia.
É exactamente esta linha de rumo, definindo, por um lado, as prioridades das reformas no sector público - na Administração Pública, na Saúde, na Educação, na Segurança Social - e, por outro, no domínio da economia, que subjaz, no essencial, ao que decorre deste Programa.
Quanto à questão da Administração Interna e da Defesa Nacional, quando este Programa aponta esta direcção no sentido das reformas estruturais, designadamente no que concerne à Administração Pública, o que está em causa, e que, naturalmente, terá efeitos transversais noutros domínios, nomeadamente nos da Administração Interna e da Defesa Nacional, é a introdução de ganhos de eficiência e de racionalidade na gestão dos recursos públicos, que, como sabe, são escassos. É exactamente neste domínio, no domínio dos recursos públicos escassos, que é, de facto, necessário introduzir os mecanismos de eficiência e de racionalidade que permitam a redução fundamental da despesa pública.
As reformas estruturais têm precisamente esse desiderato. Se estas reformas estruturais tivessem sido feitas no passado, porventura, não estaríamos a discutir aqui hoje a questão das receitas extraordinárias, que, há pouco, foi

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abordada pelo Deputado João Cravinho. É exactamente porque as reformas estruturais não foram implementadas em devido tempo, concretamente nos últimos anos, sob a égide dos governos socialistas, que foi necessário realizar receitas extraordinárias no final do ano transacto, para cumprir um desígnio patriótico, um compromisso europeu, que é o défice.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Para concluir, a Sr.ª Deputada fez ainda alusão a uma outra matéria, que é, enfim, uma questão recorrente na revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento e na pronúncia que, sobre essa matéria, têm tido várias entidades, designadamente o Sr. Presidente da República.
Nós temos um peso diminuto, temos um peso muito reduzido na União Europeia,…

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Mas fazemos parte dela!

O Orador: - … mas, naturalmente, não podemos ficar alheados desse debate e, como a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças já o disse, participaremos dele em pé de igualdade com os demais parceiros. Mas não vamos, obviamente, pôr-nos em bicos de pés, particularmente quando temos graves problemas macroeconómicos, a nível interno e externo, para resolver prioritariamente, em termos da nossa política económica.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Como é sabido, o actual Governo no seu Programa sublinhou dois objectivos fundamentais: sanear as finanças públicas e desenvolver a economia. Depois de ter começado a cumprir o primeiro desses fins, vem salientar a necessidade de iniciar decididamente a caminhada rumo ao segundo.
Neste sentido, a actualização proposta para o Programa de Estabilidade e Crescimento é um documento virado para o futuro. Hoje, já é possível assumir um discurso de confiança e de optimismo. Portugal está a tomar o balanço, mas para isso o caminho tem de ter as suas traves-mestras bem marcadas.
A primeira delas, é a do avançar para as reformas estruturais. Esta é a razão pela qual afirmamos que a questão central não pode colocar-se ao nível do equilíbrio orçamental. É muito mais séria do que isso. Há um problema de fundo a resolver.
Portugal tem de se assumir como um país de economia produtiva e competitiva, com profissionais de elevadas qualificações e uma Administração Pública eficiente. O crescimento económico não pode continuar a basear-se num Estado com peso excessivo que absorve enormes recursos sem retorno visível para os cidadãos. Menos Estado e melhor Estado terá de ser uma ideia fundamental.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - O "monstro obeso" do funcionalismo excessivo e deficiente tem de dar lugar àquilo que se pretende: uma administração simples, flexível e sobretudo de resultados satisfatórios.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Neste contexto, devem definir-se como objectivos centrais da orientação da política económica: primeiro, a retoma do processo de convergência; segundo, a preparação da economia e das finanças públicas para enfrentar com êxito as transformações que se desenham a médio e longo prazo; e, terceiro, a assunção de um conjunto de reformas na nossa Administração.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Programa de Estabilidade e Crescimento inscreve-se com coerência na linha do já preconizado pela Lei da Estabilidade Orçamental, aprovada nesta Assembleia, num clima, aí, de consenso alargado, que afirma o objectivo de assegurar um equilíbrio orçamental duradouro, e que torne possível manter os compromissos assumidos perante a União Europeia.
Quanto a estes compromissos deixo uma palavra: numa pequena economia aberta, como a portuguesa, a participação na união monetária é um factor inestimável para a estabilidade. Por outro lado, as exigências do Pacto de Estabilidade e Crescimento impõem uma trajectória sustentável para as finanças públicas. A ideia das meras aparências tem de ser definitivamente abandonada, tem de se lançar mão ao cimento que fará construir o edifício da nossa economia. Não se pode pretender manter em Portugal os centros de decisão e, simultaneamente, permitir ou contribuir para um elevado endividamento externo. O caminho não pode ser o desse desequilíbrio e da perda da competitividade da nossa economia; ou seja, tem de se reorientar o modelo.
Dúvidas não podem restar sobre a justeza deste caminho. Para isso, é necessário começar sem demoras a encetar um conjunto de políticas estruturantes que passam pela Educação, pela Saúde, pela Segurança Social e que não se traduzirão, por definição, de forma imediata, em termos de impacto na despesa. É assim, aliás, a natureza das coisas. Será preciso dar tempo para que os efeitos se possam fazer sentir. Será, então, num prazo mais alongado que se sentirá a verdadeira consolidação - aquela que se faz do lado da despesa pública.
A via escolhida é exigente, mas é a única que pode libertar a sociedade do peso paternalista do Estado…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … e que permite o crescimento da produtividade e da competitividade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É forçoso reconhecer que a economia ainda não tem a situação de que todos gostaríamos. Mas, numa perspectiva de futuro, tudo isto é preferível a continuarmos numa economia de ilusões. As dificuldades podem vir a ser o estímulo indispensável para a necessária mudança de certos comportamentos e atitudes que ainda impedem o crescimento. Devemos encarar o momento que passamos como tempos de desafios e também de enormes oportunidades.
É esta a altura para se lançarem as reformas necessárias, diria até que estamos numa situação de agora ou nunca, para intervir de uma forma estruturante, em primeiro

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lugar, na saúde, sector prioritário por tocar um elemento fundamental da vida dos cidadãos e, em simultâneo, ser excessivamente despesista e de grande desperdício, em segundo lugar, na educação, área que tem o maior impacto a longo prazo, e, em terceiro lugar, na Administração Pública em geral, onde não se pode continuar a viver na irrealidade, na confusão entre emprego e trabalho e no dogma de que a antiguidade deve servir como único critério para a promoção.
Este Programa de Estabilidade e Crescimento demonstra não só a vocação reformista do actual Governo como também a vontade de não desperdiçar oportunidades que não se repetem e ainda, por outro lado, lança elementos estruturantes que devem merecer um consenso alargado e responsável nesta Câmara. Essas linhas estratégicas conduzirão naturalmente a um aumento das exportações, à retoma do investimento e a uma situação financeira mais equilibrada.
No futuro, o centro da actividade governativa terá de estar dirigido para a actividade da economia; o objectivo deve ser, desde logo, o da diminuição dos custos de capital, associado à redução do IRC e à nova filosofia do Programa Operacional da Economia. Aliás, pode salientar-se como objectivos a promoção da concorrência saudável e do investimento produtivo, o fomento à inovação, investigação e desenvolvimento aplicado, o facilitar a criação, licenciamento, instalação e desenvolvimento das empresas, o incentivo ao comércio externo e ao turismo e, finalmente, mas muito importante, reduzir o peso do Estado na economia.
O caderno de encargos que nos é apresentado é exigente. Para todos nós, ultrapassa os limites temporais de uma legislatura, pelo que exige uma postura de responsabilidade por parte de todos os partidos aqui representados e, em especial, do maior partido da oposição. O CDS deixa aqui, de uma forma clara, o seu acordo e afirma convictamente a sua anuência em relação aos objectivos delineados e aos meios previstos para que os mesmos sejam alcançados.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Sr.ª Ministra das Finanças disse-me, há pouco, a mim que não sou um convertido e que estive toda a vida no mesmo campo, que os convertidos são os piores dos fanáticos - espero, Sr.ª Ministra, que não se estivesse a referir malevolamente ao homem que estava sentava ao seu lado nessa altura, o Dr. Durão Barroso.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Oh!…

O Orador: - Aliás, ofereço-me como testemunha abonatória, dizendo que o Primeiro-Ministro não é o pior dos fanáticos! Os piores dos fanáticos são aqueles que, depois do breve episódio da intervenção de Romano Prodi sobre a estupidez do Pacto de Estabilidade e Crescimento, quiseram voltar imediatamente ao silêncio e manter um novo manto de silêncio sobre esta matéria. É curioso que, a este respeito, Pascal Lamy, comissário europeu, comentando as declarações do Presidente da Comissão, tenha dito que mesmo um Presidente da Comissão (creio que estou a citá-lo exactamente) pode, em alguns momentos, dizer o que pensa.
Ora, nós temos a responsabilidade de dizer o que pensamos para contribuir para mudar aquilo que está errado na política orçamental instituída pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento.
A este respeito, aliás, confrontamo-nos com uma dificuldade particular, que já discutimos em sede de comissão - foi uma discussão técnica, particular, que não reproduzo aqui mas que tem uma incidência no debate - e que agora nos interessa, que são as perspectivas económicas em que o Governo assenta a política com a qual quer manter fidelidade a esse fanatismo monetarista do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
O Governo diz-nos, nas suas projecções, algo que é surpreendente e, aliás, bastante esdrúxulo: em 2002, o ano que acabou, o efeito do ciclo, no desvio em relação ao Produto potencial, foi de 0,1% do PIB, mas vai ser seis vezes maior em 2003, seis vezes maior em 2004 e quatro vezes maior em 2005. O erro está na metodologia que não conduz a nada, conduz ao erro, porque isto suscitaria um paradoxo. De duas, uma: ou o Produto potencial está a subir no mesmo momento em que o Produto real desacelera, e, então, teríamos no melhor ano um aumento do efeito do ciclo e no pior ano uma diminuição do efeito do ciclo, ou, então, o ciclo está a agravar-se, que é isto que nos dizem os números do Governo, ao mesmo tempo que argumenta que a recessão está a acabar. Além disso, as agências internacionais têm uma projecção económica para o crescimento muito diferente da do Governo. Por exemplo, o Economist sugere metade da taxa de crescimento para o ano de 2003, que é a base da política do Governo. Em qualquer caso, com 1,2% ou com 0,7%, que é o que diz o Economist, teremos a continuação da desaceleração, e, portanto, a continuação da divergência real.
Ora, o que, fundamentalmente, estamos aqui a discutir - e este é o desacordo que há entre a minha bancada e a do Governo - é se a política mais sensata é a de nos calarmos perante um debate que mal começou na União Europeia, aceitando uma solução que é pior para as contas portuguesas e para uma política orçamental a favor do crescimento e da convergência, ou se, pelo contrário, é a de aceitarmos o mais difícil, que é contribuir para este debate no mesmo momento em que a França garante não cumprir as metas do Pacto de Estabilidade e Crescimento, dando-lhe um novo contributo, uma convergência política, esta, sim, a favor de uma opção orçamental que construa o combate ao desemprego. E aí está, nas prioridades sociais, na forma como vemos o País e, portanto, na forma como nos vemos na Europa e por uma política europeia de crescimento e de emprego, toda a divergência entre o fanatismo dos monetaristas, daqueles que, mais tarde ou mais cedo, se converteram ao Pacto de Estabilidade e Crescimento, e aqueles que, em contrapartida, querem uma Europa aberta a uma política de pleno emprego.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, começo por agradecer ao PSD o tempo que me cedeu.

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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Programa de Estabilidade e Crescimento é baseado no Pacto de Estabilidade e Crescimento que o próprio Presidente da Comissão europeia classificou de estúpido.
O Pacto de Estabilidade e Crescimento traduz um modelo de construção europeia arredado das realidades concretas de cada país, dos diferentes níveis de desenvolvimento, das diferentes condições de vida das pessoas dos vários Estados-membros. Tomar tudo por igual é a base do princípio da desigualdade, que, na União Europeia, se insiste em intensificar. Este facto torna, de muito maior responsabilidade, o papel de cada Estado-membro na defesa dos seus interesses e das necessidades dos seus cidadãos. Ora, a submissão incondicional aos ditames da União Europeia não nos permite essa orientação, por isso, é legítimo concluir que, quando o Governo português não questiona e segue em absoluto e absurdamente o Pacto de Estabilidade e Crescimento, está a agir contra os interesses dos portugueses.
A leitura e a análise do Programa de Estabilidade e Crescimento para 2003-2006 permite-nos retirar várias conclusões das quais vou sublinhar algumas. Desde logo, a bandeira eleitoral do PSD, a descida dos impostos, nomeadamente do IRS, não será afinal concretizada - já não falam disto, nem agora, nem daqui a um ano, já deixou de ser intenção. Desenganem-se, portanto, aqueles que acreditaram!
Depois, é preciso mais receita, mas o alargamento da base tributária a todos os rendimentos não é proposta, nem tão-pouco um combate efectivo à fraude fiscal - vultuosos rendimentos continuam a não ser tributados e outros continuam a constituir receita não arrecadada. Opta-se, pois, por não mexer em interesses poderosos e por afectar sempre os mesmos: àqueles que vão contribuindo regularmente, de uma forma já pesada, para o erário público, pede-se mais e mais, aumentam-se os impostos, garantem-se baixos salários, retiram-se direitos aos trabalhadores, cria-se um quadro de supranumerários na função pública, gera-se insegurança no futuro com a privatização da segurança social, assume-se que quem quer saúde e educação paga-as, reduzem-se despesas de investimento, reduz-se o emprego, encarecem-se preços dos serviços públicos, e por aí fora. Ao mesmo tempo que se assiste a estas medidas insustentáveis, que deixam à vontade quem tem grandes rendimentos e penalizam quem contribui regularmente e de forma pesada, ouve-se dizer, por parte do Governo, que é preciso sacrificar agora para bem das pessoas no futuro. Nada menos verdadeiro, porque, o que o Governo está a fazer, com este Programa de Estabilidade e Crescimento e com as medidas tomadas e a tomar, é justamente a pôr em causa o futuro.
Peguemos só em duas áreas que nos demonstram isso mesmo: a educação e o ambiente.
Na área da educação, o Governo assume que é uma das prioritárias na poupança, promovendo o abandono escolar e a dificuldade de frequência do ensino para muitas crianças e jovens de inúmeras famílias. Disso servem de exemplo o encerramento das escolas, a redução do número de docentes e de apoio escolar, a generalização do ensino privado. Temos o maior nível de abandono escolar da Europa e temos o sistema de ensino mais caro para as famílias da Europa - uma coisa tem tudo a ver com a outra! Mas, para o Governo, a convergência europeia não passa por aqui. Olhando assim a educação, o Governo está a comprometer o futuro do País, dos seus quadro e do seu desenvolvimento e até a sua autonomia. Isto é que é proporcionar mais à vontade no futuro?!
Na área do ambiente, tudo o que o Governo hoje se recusa a fazer terá reflexos bem negativos no futuro do País, e tudo implicará, no futuro, despesa dobrada, ou triplicada, para concretizar o que é preciso fazer. Aqui, quem pagará essa maior despesa? O tratamento dos resíduos está adiado; o combate ao efeito de estufa está adiado; as acções sobre energias mais limpas estão adiadas; a privatização do sector da água é também uma intenção assumida neste Programa - modelo, aliás, negado na maior parte dos países europeus -, implicando mais sacrifícios para as populações no futuro, porque a água terá menos qualidade, haverá menor monitorização e fiscalização e as tarifas serão encarecidas. Portanto, mais encargos para as famílias no futuro! Acha o Governo que está a pedir sacrifícios hoje para aliviar no futuro?! Não! Está é a afunilar o País para um beco bem apertado de onde teremos depois muita dificuldade em sair.
Uma coisa fica clara: este "aperto" está prometido até 2006, provavelmente com uma ou outra medida eleitoralista para essa altura. Após cada medida que tem sido anunciada aos portugueses, estes só podem pensar no que virá a seguir.
Se o Pacto de Estabilidade e Crescimento, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é estúpido, como deveremos qualificar este programa?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, que beneficia igualmente de tempo cedido pelo PSD.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado, queremos reafirmar com toda a clareza o nosso apoio ao Programa de Estabilidade e Crescimento e a uma reavaliação que ultrapassa a mera calendarização como a que foi feita. Queria também expressar o nosso acordo com o objectivo de se atingir o equilíbrio das contas públicas, mas também manifestar e reforçar divergência quanto a diversos dos caminhos expressos no Programa de Estabilidade e Crescimento, estando obviamente disponíveis para os discutirmos.
Em síntese, queremos o equilíbrio das contas públicas, mas queremos também e concomitantemente que se desenvolva economicamente o País, que se promova o emprego; que se reforme a Administração Pública, mas numa perspectiva de ganhos de eficácia e de qualidade, tendo em conta a relação entre os custos e os benefícios oferecidos. Nesse sentido também, seria útil para nós que o Governo se pronunciasse sobre as posições de abertura aqui manifestadas porque é preciso dar, em nosso entender, à política das finanças públicas um enquadramento estratégico de médio prazo que assegure a maior justiça da carga fiscal, uma elevada qualidade e eficiência da despesa pública ao serviço do bem-estar dos portugueses, da promoção da actividade económica e de mais e melhor emprego.
Em suma, queremos um país melhor para os cidadãos e para as cidadãs, mais solidário e mais desenvolvido, num quadro europeu.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma última intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

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A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, penso que estamos a chegar ao fim do debate sobre o Programa de Estabilidade e Crescimento e não posso deixar de me congratular com o conteúdo do debate.
Estive ontem, durante a manhã, na Comissão de Economia e Finanças e hoje no Plenário, por isso congratulo-me com o facto de ter sido possível fazer um debate alargado nesta Assembleia sobre um tema que consideramos da maior importância para o desenvolvimento do País.
É natural, em discussões desta natureza, que haja partidos mais próximos e outros mais afastados das linhas gerais que estabelecemos para este Programa. Não deixaremos de estar atentos a algumas das recomendações que foram feitas e a algumas das preocupações que os partidos políticos mostram em relação às políticas a seguir nos caminhos que estão traçados para atingirmos determinadas metas. Não deixo também de dizer que muitas dessas preocupações são também as nossas preocupações; porém, admitimos tratar-se de temas que, nalguns casos, serão para tratar noutros momentos e não integrados no Programa de Estabilidade e Crescimento.
No entanto, mais uma vez reafirmo que seria importante para o País que houvesse um sinal de convergência em torno da meta final a que todos nos propomos. Seria bastante importante mostrarmos esse sinal perante a União Europeia, porque, julgo eu, apenas o País ganha com um sinal de unidade que era tão decisivo para a aceitação do nosso Programa de Estabilidade e Crescimento na União Europeia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais oradores inscritos, mas antes de encerrar o debate peço a atenção da Câmara, porque precisamos de votar ainda um parecer da Comissão de Ética relativo a uma diligência judicial que terá lugar depois de amanhã. Portanto, é urgente que o votemos hoje mesmo.
Tem a palavra, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Ascenso Simões): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 7.ª Vara Cível de Lisboa - 3.ª Secção - Processo n.º 2/2002, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado João Soares a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, a próxima reunião plenária terá lugar amanhã, pelas 15 horas, e terá como ordem do dia a discussão do projecto de lei n.º 124/IX - Altera as regras do sigilo bancário e garante a transparência fiscal, do BE, e do projecto de resolução n.º 70/IX - Criação de corredores ecológicos, de Os Verdes.
Este debate será precedido de um período de antes da ordem do dia e votaremos também amanhã, além de outros, os documentos que foram apresentados por diversos grupos parlamentares relativos ao debate desta tarde.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
José Agostinho Veloso da Silva
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Melchior Ribeiro Pereira Moreira

Partido Socialista (PS):
Francisco José Pereira de Assis Miranda
José Apolinário Nunes Portada

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
José Manuel Pereira da Costa
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta

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