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Sexta-feira, 17 de Janeiro de 2003 I Série - Número 75

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 16 DE JANEIRO DE 2003

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Ascenso Luís Seixas Simões
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação do projecto de resolução n.º 83/IX, do voto n.º 35/IX, de requerimentos e de resposta a alguns outros.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Ana Drago (BE), a propósito do anúncio do nascimento do primeiro ser humano clonado, lembrou os desafios éticos que a investigação e a manipulação do património genético colocam e solicitou à Câmara um debate sobre esta matéria com o objectivo de legislar sobre este campo de investigação e aplicação. Respondeu, no fim, ao pedido de esclarecimento da Sr. Deputada Maria de Belém Roseira (PS).
A Sr.ª Deputada Isabel Castro (Os Verdes), também em declaração política, falou do perigo que o litoral português corre, criticando a ausência de uma política integrada, e, a propósito do anúncio, por parte do Governo, de novas medidas de protecção do litoral, solicitou a presença do mesmo para prestar esclarecimentos.
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Bruno Dias (PCP), a propósito do encerramento da C & J Clark, em Castelo de Paiva, e da facilidade com que as empresas transnacionais transferem os seus negócios para outro país, exigiu ao Governo uma actuação firme e a tomada de medidas concretas sobre estes processos de deslocalização de empresas.
Ainda em declaração política, a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho (PS) referiu-se à questão da alienação do património do Estado.
Em declaração política, o Sr. Deputado Luís Montenegro (PSD) abordou também o encerramento da unidade fabril da multinacional inglesa C & J Clark, após o que respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Bruno Dias (PCP), Francisco Louçã (BE) e Victor Baptista (PS), bem como ao protesto formulado pelo Sr. Deputado Vítor Ramalho (PS).
Finalmente, em declaração política, o Sr. Deputado Miguel Paiva (CDS-PP) também falou do encerramento da Clark, em Castelo de Paiva, e deu conta da entrega na Mesa da Assembleia de um projecto de resolução, apelando ao Governo para que, entre outras medidas, elabore um plano global de intervenção.
O Sr. Deputado Antero Gaspar (PS) referiu-se igualmente ao encerramento da Clark, em Castelo de Paiva, e informou que irá entregar na Mesa da Assembleia, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, um projecto de resolução para responder não só à situação que se vive naquela zona mas também a situações idênticas noutras localidades do País igualmente afectadas por deslocalização de empresas. Respondeu, depois, ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado José Miguel Medeiros (PS).

Ordem do dia. - Procedeu-se ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 34/IX - Estabelece um regime específico de reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais, a qual baixou à Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, sem votação. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Juventude e dos Desportos (Hermínio Loureiro), os Srs. Deputados Laurentino Dias (PS), Pedro Alves (PSD), Luís Carito (PS), Ricardo Fonseca de Almeida (PSD), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Fernando Cabral (PS) e Bruno Dias (PCP).
A Câmara apreciou também, na generalidade, o projecto de lei n.º 50/IX - Regula a protecção dos direitos de autor dos jornalistas (PS), que foi aprovado, sobre o qual se pronunciaram, a diverso título, os Srs. Deputados Alberto Arons de Carvalho (PS),

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Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Maria Elisa Domingues (PSD), Francisco Louçã (BE) e António Filipe (PCP).
Foi rejeitado um recurso, interposto pelo BE e fundamentado pelo Sr. Deputado Francisco Louçã, da decisão do Sr. Presidente de a verificação de quórum de votação, através do voto electrónico, não ser feita por grupos parlamentares, tendo-se ainda pronunciado sobre o mesmo os Srs. Deputados Bernardino Soares (PCP), Isabel Castro (Os Verdes) e Manuel Alegre (PS).
Verificado o quórum de votação, o Sr. Deputado Bernardino Soares (PCP) fez um requerimento oral no sentido de a Mesa informar quantos Deputados estavam presentes em cada bancada, ao que o Sr. Presidente respondeu que tal pedido era contrário à orientação estabelecida no Regimento, tendo também usado da palavra o Sr. Deputado António Costa (PS).
De seguida, a Câmara, após leitura feita pela Sr.ª Deputada Edite Estrela (PS), aprovou o voto n.º 35/IX - De pesar pela morte do actor-pintor José Viana (PS), tendo, depois, guardado 1 minuto de silêncio.
Foram ainda aprovados, na generalidade, a proposta de lei n.º 29/IX - Aprova o Código do Trabalho e os projectos de lei n.os 48/IX - Previne e proíbe a discriminação com base na deficiência (PS), 160/IX - Proíbe as discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência ou na existência de risco agravado de saúde (Os Verdes), 162/IX - Proíbe as discrimina
ções no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência (BE), 166/IX - Define medidas de prevenção e combate à discriminação com base na deficiência (PCP) e 167/IX - Proíbe as discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência (CDS-PP).
Em votação conjunta, na generalidade, na especialidade e em votação final global, foi também aprovado o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 201/IX - Designação de titulares de cargos exteriores à Assembleia da República (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).
Finalmente, em votação final global, foi aprovada a proposta de lei n.º 99/VIII - Altera o Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, relativo ao regime jurídico dos terrenos do domínio público hídrico (ALRM), tendo produzido declarações de voto os Srs. Deputados Maximiano Martins (PS), Honório Novo (PCP), Isabel Castro (Os Verdes) e Guilherme Silva (PSD).
A Câmara aprovou ainda três pareceres da Comissão de Ética, um sobre a retoma de mandato de um Deputados do BE, outro autorizando um Deputado do PS a prestar depoimento, como testemunha, na Polícia Judiciária e o último autorizando um Deputado do PSD a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Gustavo de Sousa Duarte
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Agostinho Veloso da Silva
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Rodrigues Gomes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes

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Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Jorge Lacão Costa
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Sequeiros de Castro Pontes
José António Fonseca Vieira da Silva
José Augusto Clemente de Carvalho
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Maria Abrunhosa Sousa
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Francisco Anacleto Louçã

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, vamos dar início aos trabalhos. O Sr. Secretário da Mesa vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram aceites, as seguintes iniciativas legislativas: projecto de resolução n.º 83/IX - Encerramento da empresa C & J Clark - Fábrica de Calçado L.da, no concelho de Castelo de Paiva (PSD); e o voto n.º 35/IX - De pesar pela morte do actor-pintor José Viana (PS).
Foram apresentados na Mesa, nos dias 6 e 7 e na reunião plenária de 8 de Janeiro, os seguintes requerimentos: ao Governo e ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, formulados pela Sr.ª Deputada Maria Manuela Aguiar; ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Herculano Gonçalves; a diversos Ministérios e à Câmara Municipal da Covilhã, formulados pelo Sr. Deputado João Pinho de Almeida; aos Ministérios da Economia e Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelos Srs. Deputados Manuel Cambra, Honório Novo e Lino de Carvalho; aos Ministérios da Administração Interna e das Finanças, formulados pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Ministério da Defesa Nacional e à Secretaria de Estado da Juventude e Desportos, formulados pelo Sr. Deputado João Teixeira Lopes; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados José Apolinário, Almeida Henriques,

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Fernando Pedro Moutinho e Jerónimo de Sousa; ao Ministério da Segurança Social e do Trabalho, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves; e à Ministra de Estado e das Finanças, formulado pela Sr.ª Deputada Jamila Madeira.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.
No dia 8 de Janeiro: Maria Santos, Gonçalo Breda Marques, António Galamba, Honório Novo, Ana Manso, José Apolinário, Bruno Dias, Isabel Castro, Nelson Correia, Heloísa Apolónia, Francisco Louçã, António Filipe, Luísa Mesquita, Fernando Cabral e Carlos Carvalhas.
No dia 13 de Janeiro: Fernando Pedro Moutinho, António Galamba, Rosa Maria Albernaz, Heloísa Apolónia, Isabel Castro, Bernardino Soares, Odete Santos, José Miguel Medeiros, Leonor Coutinho, Helder Amaral, Ascenso Simões, José Apolinário, Jerónimo de Sousa, Lino de Carvalho, José Junqueiro, Bruno Dias, Luísa Mesquita, Miranda Calha e Paula Duarte.
No dia 15 de Janeiro: José Apolinário, Fernando Pedro Moutinho, Luís Fazenda, Herculano Gonçalves, Joaquim Ponte, Honório Novo, Carlos Luís, Ana Drago, João Rui de Almeida, José Junqueiro, Francisco Louçã e Luísa Mesquita.
Foi ainda respondido o requerimento apresentado no dia 13 de Janeiro pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos aqui com um pequeno embaraço, porque a primeira inscrição para uma declaração política é do Partido Ecologista "Os Verdes", que não se encontra representado, e a segunda inscrição é a do Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP, que também não está presente.
Assim, passo à terceira inscrição, que é do Bloco de Esquerda, e que está representado pela Sr.ª Deputada Ana Drago.
Tem a palavra, para uma declaração política, a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há cerca de duas semanas, uma seita religiosa, de traços, diríamos, bizarros, anunciou ao mundo que havia realizado com sucesso a técnica de clonagem reprodutiva em seres humanos e que, dessa experiência, havia nascido uma menina, com o nome simbólico de Eva, o primeiro ser humano clonado. Há apenas alguns anos atrás, um acontecimento deste tipo poderia bem fazer parte de um argumento de um filme de ficção científica, série B. Contudo, desde 1997, quando a clonagem de animais foi tornada possível e a famosa Dolly foi apresentada ao mundo, que sabíamos que, sem uma vontade política forte que respondesse aos receios e às questões éticas que estas inovações colocam, os perigos eram imensos.
Entrámos agora no século XXI, aquele que, como muitos prevêem, será o século da biotecnologia, o século em que as questões ligadas à informação e à manipulação dos resultados de investigação em genética humana se tornarão centrais nas escolhas valorativas das sociedades. E se é verdade que, nos últimos anos, governos e instituições internacionais deram os primeiros passos na regulamentação das práticas e técnicas de investigação e nos usos admissíveis a dar a estas novas possibilidades, é cada vez mais certo que temos ainda um longo debate e um longo caminho a percorrer. Sabemos que jogamos num cenário complexo, onde se cruzam imensos perigos evidentes, benefícios também eles inegáveis, mas, acima de tudo, vivemos num contexto de incerteza e de desconhecimento. E sabemos que, em contextos de incerteza, deve ser sempre seguido o princípio da precaução.
É, pois, nesta óptica de precaução e de dar resposta aos desafios éticos que a investigação e a manipulação do património genético colocam, que esta Câmara, honrando o seu papel de órgão de poder legislativo, tem de lançar um debate profundo sobre esta matéria, debate esse que seja capaz de dar origem a instrumentos legislativos que orientem o controlo e a regulação das práticas neste campo de investigação e de aplicação. Temos, assim, de discutir os critérios que definem as boas práticas na investigação, dos conhecimentos oriundos neste campo da genética humana; distinguir o que parece quase experiências de Frankenstein do que se afigura como um campo de possibilidades para o tratamento e a prevenção de doenças, para ajudar a reduzir o sofrimento humano. Temos, então, de discutir os critérios de propriedade e de patenteamento destes conhecimentos e destas técnicas, porque falamos de domínio público e de património comum da Humanidade. Temos, pois, de discutir para legislar sobre o uso da informação genética de cada cidadão.
Sobre esta última questão, o BE apresentou já na última Legislatura um projecto de lei sobre o uso e a protecção da informação genética, que define regras para o aconselhamento genético dos cidadãos e o recurso a testes genéticos, para que estes procedimentos sejam usados apenas quando existe um consentimento informado e se garanta a absoluta confidencialidade da informação, de modo a que esta não possa ser usada na segregação dos cidadãos no acesso ao emprego, ou a produtos das seguradoras, e também não possa servir para limitar o direito dos cidadãos. Esta matéria foi já retomada na actual Legislatura, enriquecida com as contribuições de vários organismos, entidades, especialistas e forças políticas, e é urgente que este processo se conclua.
Por outro lado, se o processo de clonagem reprodutiva foi já banido na União Europeia, seja pela Carta dos Direitos Fundamentais, seja pelo Protocolo Adicional à Convenção de Oviedo, do Conselho da Europa, é importante relembrar que as técnicas de clonagem terapêutica apresentam benefícios indiscutíveis na redução do sofrimento humano, nos casos de doenças tão dolorosas e traumáticas como a doença de Parkinson, a esclerose lateral amiotrófica, a diabetes, a leucemia e o cancro. É, pois, necessário, Srs. Deputados, discutir as regras que devem orientar e assegurar a qualidade destas terapêuticas e a sua positiva aplicação em matéria industrial. O que temos de fazer é um debate e uma reflexão importante. Esta tarefa exige-nos a progressão da busca do conhecimento: a proliferação das experiências demasiado perigosas de que tomamos hoje conhecimento e as potencialidades que estas experiências podem ter na melhoria das condições de vida de milhões de cidadãos. Como diria um ex-Deputado desta Câmara, o Dr. Jorge Moreira da Silva, chegou a hora do legislador.
É esta a nossa responsabilidade e, Srs. Deputados, é este o repto que vos deixo aqui.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

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A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, como sabe, esta questão tem sido objecto de intervenções a nível desta Câmara, uma vez que, conforme se analisou na Legislatura anterior, o anúncio mundial da descoberta do mapa do genoma humano significou um marco histórico que não pode deixar-nos indiferentes.
Há, no entanto, alguns aspectos que são fundamentais: um deles, desde logo, como é evidente, o do patenteamento, já está, de certa forma, resolvido através de documentos internacionais, do Direito Internacional, que já foram ratificados e aceites por este Parlamento; um outro aspecto importante e interessante é todo o campo que se abre a uma nova área da medicina, que, aliás, também de certa forma, aflorou na sua intervenção e que é a medicina regenerativa, que é algo que ainda não consta da maioria dos documentos sobre política de saúde na medida em que é um campo novo, cuja concretização não sabemos se será ou não demorada mas suscita esperanças relativamente ao tratamento de determinadas doenças hoje consideradas crónicas, ou mortais, ou fortemente limitadoras das nossas capacidades. Este campo, que se vai tornar um campo de exigência política dos cidadãos relativamente aos governos, abre novas frentes de pressão do ponto de vista do financiamento que poderão induzir a redesenhos dos sistemas de protecção social, que podem ser bem ou mal feitos - tudo depende da forma como se encarar este problema.
Mas há um outro campo, este sim, muito grave e que já temos pela frente, que é o da discriminação.
Na Legislatura passada, foram aprovadas resoluções, uma uniu todos os grupos parlamentares desta Câmara e uma específica sobre a discriminação do trabalho, apresentada pelo PSD. Nesta sequência, ficou decidido proceder-se à elaboração de um colóquio, que os Deputados da 1.ª Comissão estão a organizar.
Penso que, na sequência da sua intervenção, é importante, obviamente, sublinhar a importância desta matéria, a necessidade de procedermos à regulação e regulamentação urgente do que tiver de ser regulado e regulamentado e, sobretudo, o facto de nenhum de nós estar distraído relativamente ao impacto que todas estas matérias têm e à forma equilibrada e consensual pela qual devemos nortear-nos para garantir que os interesses graves e importantes que podem ser postos em causa sejam objecto da adequada previsão do legislador. Penso que a Sr.ª Deputada concordará com estas considerações.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago, dispondo, para o efeito, de 3 minutos.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, agradeço-lhe as questões que me colocou e o que relembrou nesta Câmara.
Quanto ao que eu penso, devo dizer-lhe que "sim", que concordo em absoluto com a leitura que a Sr.ª Deputada faz sobre estas matérias.
No entanto, gostava de dizer-lhe duas coisas. Penso que temos, todos nós, muito ainda para reflectir e para aprender sobre aquilo que actualmente se está a fazer nos programas de investigação sobre clonagem e genética humana, mas há, acima de tudo, coisas que percebemos, de senso comum, por muito que não conheçamos em detalhe os processos de investigação e a especificidade destas técnicas, que é a questão do domínio público e do domínio privado e do patenteamento daquilo que é património comum da Humanidade, como o genoma humano, que a Sr.ª Deputada referiu. É neste aspecto que, a meu ver, este Parlamento, mas também as instâncias internacionais, uma vez que Portugal tem alguma investigação neste domínio mas não uma investigação que possa ser imediatamente aplicada para fins comerciais, pode ser capaz de fazer a apologia e de advogar a percepção de que não podem ficar restritas à investigação privada coisas que, no domínio público, são consideradas como não aceitáveis em termos éticos. E quando falamos das empresas de biotecnologia americanas e do financiamento à investigação genética nos Estados Unidos da América, apercebemo-nos de que muitas das universidades públicas não têm permissão para fazer um conjunto de experiências ou de investigações, porque o Estado americano não as considera eticamente defensáveis, e de que essas investigações são depois feitas por investigadores ou empresas privadas, o que gera, sobre património comum e património que deve ser considerado público e tratado no espaço público, uma desvantagem para aquilo que é a investigação das universidades públicas. Penso que este é um aspecto fundamental para, no futuro, avaliarmos como devemos fazer a gestão deste género de investigações e estabelecer, portanto, aqui os tais critérios das boas práticas, e também percebermos até que ponto há aqui conhecimentos e aplicabilidades que devem pertencer ao domínio público e não ao domínio privado.
De qualquer modo, penso que todos os grupos parlamentares aqui presentes estão sensibilizados para este assunto. O debate que a Sr.ª Deputada referiu está, segundo penso, para acontecer em breve e, a partir dele, desse debate sobre informação genética, podemos colocar as outras questões e fazer o tal processo de reflexão, que considero ser nossa responsabilidade.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O litoral português corre perigo - e amanhã, a próxima reunião do Conselho de Ministros, poderá revelar-se o dia fatal para o seu assalto final. Assalto a um litoral cujo preocupante ritmo de ocupação, transformação e uso, com construções em zonas de risco, praias e dunas, sem qualquer respeito pelos valores ambientais, paisagísticos e de segurança, o deixaram numa situação caótica e de risco, como sublinhava a reflexão publicada em Maio de 2001 pelo Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável. Uma realidade que o próprio governo anterior reconhecia, num documento do Ministério do Ambiente, ao assinalar a "ausência de uma política integrada para o litoral devidamente concertada e consequente".
Um problema para o qual Os Verdes repetidamente alertaram, na crítica à inexistência de uma estratégia de gestão consistente na orla costeira, à persistência de medidas avulsas que muitas vezes significaram a utilização de dinheiros públicos na defesa de interesses privados - interesses, um pouco por todo o lado, de que seguramente nenhum de nós se esquece, como são os casos de Vale de Lobo, no Algarve, Esmoriz, na Costa Nova, na Vagueira e em Espinho.
Medidas avulsas, incapacidade na concretização de programas e falta de vontade política exploradas, quase sempre

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com êxito, pela ganância dos imobiliários, com a conivência de diversas entidades, designadamente da administração local, a cedência a grupos de pressão, facilidades traduzidas, e consentidas, em artifícios processuais para dispensa de estudos ou isenção de pareceres em benefício de interesses instalados ou que se foram instalando ao longo do tempo sem obstáculos, apropriando-se do espaço público e de um património que pertence a todos nós.
Uma realidade que nos levou a fazer a acusação, sem que nesta Câmara alguém ousasse contestar, de que o marasmo e o negócio estavam a dar cabo do litoral português. Um facto incontornável que se poderia ter evitado com vontade política e também previsto, desde que se tivesse considerado as consequências técnicas, mas, sobretudo, porque é do presente que importa falar, um facto que não é aceitável e que os partidos da maioria de direita, sempre tão críticos no passado, agora podem continuar a consentir. A consentir com a sistemática soma a recursos e simplificações processuais, a soluções imediatistas e a pretensas classificações de interesse público de outras coisas que não são interesses privados, a favor de projectos, de que é, porventura, por tão absurdo, paradigmático exemplo a construção de um campo de golfe numa duna, em Vale do Lobo, duna esta que, de tantas vezes paga a sua reposição pelos contribuintes portugueses, quase se poderia dizer que era tempo de ser nacionalizada.
Erros, alguns sem reparação, a que se juntam outros, cuja responsabilidade e factura pesada é tempo de quantificar: nas urbanizações, nos campos de golfe mal localizados, na praga de marinas e portos de recreio, nas construções em falésias, nas construções de hotéis em zonas de risco e inaceitáveis.
Uma situação escandalosa particularmente visível no Plano de Ordenamento da Orla Costeira, do Algarve - um Plano muitas vezes travado. Um Plano que, não obstante as críticas muitas vezes feitas nesta Câmara, nomeadamente pelo PSD, não veio para proteger a faixa do litoral inicialmente prevista, 280 m, mas a que agora, por força da pressão dos interesses locais, se fixou, pura e simplesmente, em metade. Um plano de ordenamento que, mantendo o regime de excepção, deixa de fora as administrações portuárias, permitindo que continuem a ser estados dentro do Estado. Um Plano que teima em erros antigos, admitindo - pasme-se! -, só numa escassa zona, como são a Ria Formosa e a Ilha de Faro, a construção de oito imensos esporões. No entendimento de Os Verdes, a prova que faltava, depois do estranho silêncio a que, durante meses, essa quota tinha sido remetida.
Um Ministério cujo titular, não obstante críticas passadas, continuou estranhamente, como se verificou ao longo destes tempos em relação à situação das cheias e ao Prestige, a viver na clandestinidade, precisamente ontem quebrada com o anúncio de novas medidas, ditas, de protecção do litoral, medidas de excepção. É precisamente este anúncio, nos contornos que assume, que não deixa de ser extremamente preocupante para Os Verdes.
Que sentido faz, há que perguntar, num país onde os solos são um recurso escasso - e no nosso país são-no -, tão críticos que fomos todos em relação às constantes desanexações de terrenos da Reserva Agrícola Nacional e da Reserva Ecológica Nacional, dizer-se e propor-se para o futuro regras excepcionais de expropriação precisamente para estes terrenos, para que se construa em áreas manifestamente erradas? Que sentido faz para esta direita, se se quer falar de ambiente e de desenvolvimento sustentado, autorizações especiais para desmatações e desarborizações? Que sentido fazem os regimes especiais de aprovação de planos de urbanização e planos de pormenor, se tudo aquilo para que se chama a atenção, designadamente os estudos técnicos das universidades, é para o excesso de construção, para as extracções ilegais e para uma actividade humana que, em 80% dos casos, é a principal causadora da erosão? Que sentido faz, ainda - há que perguntar -, a existência de regras especiais para licenciamento e autorizações urbanísticas, se é precisamente o excesso de autorizações especiais que têm justificado as aberrações paisagísticas e os atentados e crimes ambientais que pululam por toda a costa? Que sentido fazem as regras especiais para o processo de avaliação de impacte ambiental, uma avaliação que é para todos, não só para os construtores mas, lamentavelmente, assim se verifica a confirmarem-se os nossos temores, para o actual titular do Ministério, não um importante meio de diagnóstico e auxiliar técnico mas um estorvo que urge, pura e simplesmente, dispensar?
É por isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que é tempo de se falar claro. É tempo de ter aqui o Governo a explicar em nome de quem age: se é em nome dos construtores, se é em nome dos interesses especulativos e imobiliários, ou se é em nome de um litoral, cuja defesa tarda, cuja defesa tem sido esquecida e que tem sido atacado desta vez não por uma qualquer outra praga sem rosto mas pela betonização e pelos fundamentalistas que a têm defendido um pouco por todo o lado. É esta defesa e este esclarecimento que tardam, e importa saber de que lado é que o Governo afinal está.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para milhares de homens e mulheres deste País, os últimos tempos têm sido marcados pela revolta e angústia de quem é confrontado com a desumana perspectiva do desemprego.
Assim acontece na C & J Clark, em Castelo de Paiva, mas também noutras empresas, como a Rhode, a Ecco, a Gerry Weber, a Schuhunion, a Yazaki Saltano, a Horácio e Castro, a Gaspar Mota, a Eres, entre outras. Empresas transnacionais, pretendendo exibir um poder inaudito, actuando como que impunes e intocáveis, anunciam calmamente o fecho das suas portas e a transferência dos seus negócios para onde a exploração seja mais fácil. Atrás de si deixam a marca do desemprego, da falta de perspectivas para as populações locais, da ameaça sobre as empresas da região que abandonam, do aprofundar das desigualdades, do agravamento das assimetrias regionais.
Entretanto, a solução milagrosa que o Governo e a maioria despudoradamente advogam é ir ainda mais longe na perda de direitos. No acentuar da degradação das condições de vida e de trabalho, supostamente para que haja mais produtividade e rentabilidade das empresas.
O que a realidade implacavelmente vem demonstrar é que, na imensa maioria dos casos, não está em causa a produtividade, a eficiência, a viabilidade económica das empresas. Na maioria dos casos, não estão em causa sequer os lucros milionários destas multinacionais. Se dúvidas houver, atente-se no que se passa em Castelo de Paiva. Estivemos lá esta semana, lá estaremos amanhã, e deparámo-nos com esta chocante contradição.

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A unidade fabril de Castelo de Paiva era a mais rentável e a mais produtiva de todas as fábricas da empresa Clark. E a Clark, que encerra aquela fábrica e lança no desemprego 588 trabalhadores, é a mesma empresa que orgulhosamente exibe lucros que em 2001/2002 ascendem a mais de 285 milhões de contos!

O Sr. Honório Novo (PCP): - Uma vergonha!

O Orador: - Informações chegadas há momentos dão conta que, ao contrário do que inicialmente foi afirmado aos trabalhadores, de que teriam os seus postos de trabalho até Junho, afinal, só 50 dos 588 trabalhadores da empresa ficarão ao serviço até essa data. Afinal, para 538 trabalhadores, o desemprego aparece já no fim deste mês, o que só vem tornar mais premente e imediato o drama social que está diante de nós.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O que está em causa é a febril obsessão destas transnacionais em obter o máximo lucro, custe o que custar. Sustentadas pelas opções desregulamentadoras das políticas governamentais, aproveitando o terreno favorável da globalização capitalista e das facilidades que o desenvolvimento tecnológico lhes permite, estes grupos económicos beneficiam de apoios da União Europeia, do Estado português e do próprio poder local, encaixam milhões de euros de incentivos ao investimento, mobilizam em seu torno comunidades inteiras e sectores económicos regionais. E depois, à primeira oportunidade, levantam a tenda e transferem-se para outro país, onde a história se repete.
E sempre que aqui, em Portugal, a história se repete, o resultado tem sido o mesmo: acendem-se os holofotes, o País assiste ao dramático sofrimento de trabalhadores e suas famílias, aparecem os votos pios habituais, o poder político toma, ou não, medidas avulsas para alguns desses casos, e a raiz do problema continua!

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - O que só vem demonstrar que não estamos perante uma situação que pontualmente tenha "corrido mal". Pelo contrário, estes interesses antagónicos, esta exploração desenfreada, não serão resolvidos com estas opções políticas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É urgente e indispensável passar das palavras aos actos. Por diversas vezes o PCP tem trazido à Assembleia da República a denúncia e o alerta desta dramática situação, exigindo a actuação firme e a tomada de medidas concretas, apresentando e propondo iniciativas para disciplinar o investimento directo estrangeiro e os processos de deslocalização das empresas. Iniciativas como o projecto de resolução n.º 109/VII, que veio, aliás, a merecer a aprovação do Parlamento - com o voto favorável dos Deputados do PSD -, tendo sido publicado como Resolução da Assembleia da República n.º 25/99.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - Nessa resolução a Assembleia da República apela ao Governo para intervir activamente, no plano nacional mas também nas instâncias internacionais (na União Europeia, na OCDE, na OMC, na ONU), pela definição de regras efectivas e para todos, que disciplinem o investimento directo estrangeiro e os processos de deslocalização das empresas.
Com esta inequívoca tomada de posição do Parlamento, com o significativo voto favorável do PSD nessa Resolução, tem de haver memória, tem de haver coerência e seriedade política e têm de haver medidas concretas que traduzam as intenções declaradas.

Aplausos do PCP.

Por isso, é fundamental que o Governo informe o Parlamento e o País sobre as acções que têm sido (e as que serão) desenvolvidas, para concretizar e levar por diante a decisão desta Assembleia, que o seu próprio partido apoiou.
Permitam-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que invoque uma importante declaração que, a este propósito, se formulou no passado, aqui mesmo, neste Hemiciclo: "É bom dizermos todos ao Governo que o investimento directo estrangeiro não acaba no dia em que se inauguram novas fábricas. Não há pior investimento do que o que vem para criar expectativas e, logo a seguir, frustrá-las. Esse nós não queremos!". Esta afirmação, produzida a 10 de Março de 1999, pela voz autorizadíssima do então Sr. Deputado Vieira de Castro, agora membro deste Governo, vem colocar o PSD e a maioria perante esta urgente decisão: mudou de opinião desde aquele debate, ou, pelo contrário, reafirma esse entendimento e associa-se ao PCP na exigência de medidas concretas?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quando em Maio do ano passado o PCP levantou esta mesma questão, nada foi adiantado. Nem naquele momento, nem no momento presente, esse ensurdecedor silêncio é admissível!
Repito, porque é urgente passar das palavras aos actos, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou ao Governo, já no início desta semana, um requerimento no sentido de conhecer a tomada de medidas concretas para este caso concreto, da Clark em Castelo de Paiva.
Solicitámos, na Comissão Parlamentar de Economia e Finanças, a presença do Sr. Ministro da Economia para dar nota da intervenção do Governo nesta matéria e apresentaremos uma iniciativa na Assembleia da República na linha do que o Parlamento já defendeu e manifestou - o combate sério e efectivo à irresponsabilidade e à impunidade do comportamento parasitário de poderosíssimos grupos económicos transnacionais que assentam o seu lucro nestes desumanos modelos de investimento de beduíno.
Como desde sempre temos feito, continuaremos a intervir, de forma responsável e empenhada, na defesa dos direitos destes trabalhadores, destas comunidades, destas regiões. Estas empresas não podem comportar-se como sanguessugas. O País não o pode permitir! E o poder político, o Governo, tem de actuar com responsabilidade.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, ao reflectir e debater sobre estas situações, vale a pena reter esta ideia fundamental: perante o desemprego, perante a precariedade, perante o desrespeito de direitos fundamentais, só a luta, a unidade, a determinação de quem trabalha poderão motivar a resposta aos dramáticos problemas que afligem tantos seres humanos.
Por isso, saudamos a luta dos trabalhadores da Clark em Castelo de Paiva e em todas as empresas confrontadas

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com semelhante situação e manifestamos o que desde sempre manifestámos: poderão, obviamente, continuar a contar com a intervenção solidária do Partido Comunista Português.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.

A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: A alienação do património imobiliário do Estado é hoje tema do dia. Não será a primeira vez. Ainda na última Legislatura a actual Ministra de Estado e das Finanças, Dr.ª Manuela Ferreira Leite, na altura como Deputada, criticava as alienações feitas pelo Partido Socialista, levantando suspeições. Basta ler os jornais da época, os jornais de autarcas que sucedem a outros autarcas, para ver que esta matéria tem levantado sempre suspeições. E penso que é importante para os políticos que não existam suspeições. Portanto, sem ter a preocupação ou a veleidade de pensar que tudo vai ser completamente transparente, julgo ser importante que se contribua para que aqueles políticos que pretendem que tudo seja transparente tenham uma maneira de agir nesta matéria.
Pode parecer ridículo, mas a verdade é que não existem neste momento leis com menos de 60 anos que regulem esta matéria. As leis de 1942 e de 1944, que são aquelas que ainda regulam esta matéria, são de facto de um outro tempo, em que o que é regulado são essencialmente execuções fiscais em que o Estado toma posse de imóveis e depois os pretende alienar, num ambiente completamente diferente do actual, na medida em que na altura o Estado detinha o monopólio da urbanização de terrenos uma vez que a primeira lei de licenciamento que permite a privados transformar terrenos não urbanizáveis em urbanizáveis data de 1965, isto é, 20 anos depois da lei de alienação do património. Isto só para traduzir que as leis actualmente em vigor não têm qualquer aplicação.
Por isso, depois de a comunicação social levantar também suspeições no célebre caso da Lanalgo, foi então publicado um despacho normativo para as alienações do património do Estado em 2001 e depois outro em 2002, que, durante estes dois anos, supriram esta carência, aplicando-se apenas às alienações feitas pela Administração Central.
É, pois, indispensável que esta lacuna seja suprida. Aliás, todos reconhecem esta lacuna e a própria Ministra Manuela Ferreira Leite, quando interrogada por mim sobre esta matéria na discussão da proposta de lei do Orçamento, me desafiou a fazer esta proposta, uma vez que se trata de um verdadeiro escândalo que esta matéria não esteja regulada.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Só isto é que pode explicar, aliás, que a Dr.ª Maria José Nogueira Pinto, ainda ontem, na televisão, tenha estranhado que a Sr.ª Ministra das Finanças tenha aceitado vir à Assembleia da República dar explicações sobre um "pequeno" negócio que era uma mera questão de gestão e que implica, como todos sabem, valores na ordem das muitas dezenas de milhões de euros, quando qualquer alienação e qualquer adjudicação de mais de 1000 contos obriga a um concurso, sendo depois fiscalizada pelos tribunais.
É, pois, necessário que o Estado cumpra o seu papel regulador e que estas suspeições deixem de existir. É por isso necessário acautelar as circunstâncias e condições do negócio e regulamentar a utilização dos resultados pecuniários desse mesmo negócio de modo a que eles não sejam dispendidos em despesas correntes, mas, assim como nós propomos, em despesas de capital e, prioritariamente, na dotação de capital de fundos de pensões, que o próprio Tribunal de Contas releva que não estão suficientemente dotados, ou na manutenção e reabilitação do património, que é outra das carências existentes neste momento.
Também se pretende neste diploma salvaguardar qual o tipo de pessoas ou entidades que podem adquirir estes terrenos, impedindo, portanto, que entidades sediadas em offshore e que tenham dívidas ao Estado ou à segurança social possam adquirir estes terrenos, prevendo-se sempre a necessidade de publicitação das condições do negócio, a realização de contratos, os casos em que se pode fazer ajuste directo e aqueles onde é necessário concurso público e ainda que o diploma seja regulamentado num prazo razoável.
Outro aspecto que é importante avaliar, e é ele que é referido em todas as suspeições, tem a ver com a avaliação do património imobiliário, sempre que se trata de terrenos para construção. Toda a gente sabe que o preço dos terrenos depende do que neles pode ser construído, e a avaliação é feita com base em direitos de edificabilidade - x m2 de construção para habitação, para escritórios ou para serviços e depois um preço unitário. É necessário que sejam explicitados esses valores da avaliação, de modo a que, se o próprio Estado vier a alterar os direitos de edificabilidade e, portanto, aquilo que pode ser construído nos terrenos, esteja previsto sempre no contrato que o Estado seja ressarcido, pelo valor unitário que seja superior em 50% em relação ao valor unitário do contrato inicial, por todos os m2 de construção a mais que forem autorizados para esse terreno.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - É esse, aliás, o grande problema que é sempre enunciado por todos aqueles que põem em causa as condições em que são feitas estas alienações. É por isso que é necessário que estas matérias sejam claras e que o Estado adopte aquilo que os promotores imobiliários já adoptaram quando eles próprios fazem negócios, em que prevêem cláusulas em que o preço é ajustado se o valor construtivo dos terrenos for alterado posteriormente.
Penso, portanto, que este projecto de lei que vou hoje mesmo entregar aqui, na Assembleia da República, é um diploma que visa responder a todos os problemas que são postos sobre esta matéria e suprir uma lacuna que todos reconhecem.
Espero, por isso, a colaboração de todas as bancadas na sua redacção na especialidade, permitindo, depois, a regulamentação pelos órgãos previstos para o efeito, por forma a suprir uma lacuna que penso que, nos últimos tempos, muito tem contribuído para denegrir a classe política neste país, quer se trate do Estado quer das autarquias.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Senhores Deputados: Na passada sexta-feira, dia 10 de Janeiro, a administração da empresa multinacional C & J Clark, indústria de calçado, anunciou publicamente, de forma abrupta e com carácter irreversível, o encerramento da sua unidade fabril localizada em Castelo de Paiva.
O PSD lamenta, desde logo, esta decisão pelas suas consequências sócio-económicas, mas também e sobretudo porque dela decorre um drama social profundo para 588 trabalhadores que vêem perdidos os seus postos de trabalho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, os Deputados do Grupo Parlamentar do PSD reiteram aqui, hoje, depois de o terem feito pessoalmente nas próprias instalações da empresa, total solidariedade para com todos os trabalhadores e respectivas famílias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E fazemo-lo não apenas por palavras de circunstância mas reflectindo esse sentimento na nossa acção parlamentar. Daí termos apresentado ontem, na Mesa da Assembleia da República, um projecto de resolução cuja intenção é contribuir para solucionar o problema lançado pelo encerramento desta fábrica.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: São várias as razões que levaram a empresa C & J Clark a tomar esta lamentável decisão, desde aquelas que ela própria invoca a outras, mais estruturais, que esta situação veio pôr a nu.
De facto, cada vez mais se percebe que a política económica adoptada nos últimos anos, pautada por uma política orçamental incorrecta, despesista e desadequada e por um consumo interno excessivo, caracterizado por um recurso desmesurado ao crédito e assente num acentuado endividamento externo, para além de revelar ausência de rumo estratégico e coragem reformadora, enfraqueceu a nossa economia e não resolveu, antes agravou, os problemas de produtividade e competitividade das nossas empresas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Importa dizer que situações como a que se vive em Castelo de Paiva podiam e deviam ter sido acauteladas. E uma vez mais fica demonstrado que o caminho que o País seguiu nos últimos anos, errado e irresponsável, acarreta um custo pesado que temos de suportar nos dias de hoje.
Mas, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não pretendo agora, nem o PSD pretende - e estou certo mesmo de que o Governo também não pretende - vir aqui, perante o País, expor um mar de tristuras e lamúrias; antes quero daqui expressar uma firme convicção e uma fundada esperança.
Uma firme convicção de que as políticas e as reformas do actual Governo resultarão num consistente e sustentado desenvolvimento económico e social, capaz de evitar, no futuro, a repetição de fenómenos similares a este.
Uma fundada esperança de que as diligências concretas e imediatas do Presidente da Câmara Municipal de Castelo de Paiva, em articulação constante com o Ministério da Economia, com a Agência Portuguesa de Investimento, com o Ministério da Segurança Social e do Trabalho, a que se junta o empenho do Grupo Parlamentar do PSD, acompanhado também, estou certo, pelo interesse das bancadas da oposição, redundarão na obtenção de uma alternativa geradora de postos de trabalho para aqueles que repentinamente os perderam.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Neste contexto, o Parlamento, como expoente máximo da representatividade popular, não pode ficar indiferente e deve mobilizar-se para acelerar e concorrer na busca duma solução para o problema criado pelo encerramento da C & J Clark.
Por isso, o Grupo Parlamentar do PSD, através dos Deputados eleitos pelo Círculo Eleitoral de Aveiro, tomou a iniciativa de apresentar na Assembleia da República, um projecto de resolução cujo principal escopo é recomendar e apelar ao Governo a intensificação dos esforços, com vista a encontrar uma solução rápida para a questão, solução essa que deve passar, prioritariamente, pela captação de um novo investidor para o concelho, seja nacional ou estrangeiro. Corroboramos, confiamos e incentivamos o Governo e a Agência Portuguesa de Investimento a reforçarem o seu empenhamento nesta matéria.
No entanto, no caso de se mostrar insuficiente a concretização da solução proposta anteriormente, apela-se aos Ministérios da Economia e da Segurança Social e do Trabalho que, complementarmente, estudem e providenciem uma outra solução - esta de carácter institucional -, que pode passar, designadamente, pela criação e estabelecimento, nas instalações da empresa, do Centro de Apoio à Criação de Empresas e/ou de um Centro de Formação Profissional com vista, especialmente, à criação de novas actividades susceptíveis de ocuparem os trabalhadores agora empurrados para o desemprego.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD está, desde o primeiro momento, solidário com o sofrimento dos trabalhadores da empresa C & J Clark, de Castelo de Paiva, mas, acima de tudo, está empenhado em alcançar uma solução que ultrapasse o problema social e humano que, sem precedentes, se instalou nesse concelho.
Porém, queremos daqui dizer ao País que estes acontecimentos terríveis, estas situações difíceis, acentuam a nossa motivação para levarmos por diante o nosso projecto político. Nestas dificuldades bebemos mais inspiração para reformar Portugal, trilhando um caminho responsável e credível, seguindo uma estratégia de melhor afectação dos recursos públicos, de promoção de mais justiça social e de relançamento sustentado da nossa economia.
Esta é a nossa divisa, este é o nosso desafio. Com os paivenses e com os portugueses vamos vencê-lo!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Bruno Dias, Francisco Louçã e Victor Baptista.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, dispondo para o efeito de 3 minutos.

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O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, ouvi com atenção a sua intervenção e gostava de começar por transmitir esta ideia inicial: a expressão genérica da solidariedade para com os trabalhadores envolvidos neste autêntico drama social deve ir mais longe do que as palavras, deve traduzir-se em actos concretos e em medidas práticas, e, nesse sentido, é com alguma preocupação que registamos, de alguma forma, um recuo político na posição política do PSD entre o momento em que estava na oposição e o momento em que está em maioria.
Eu digo isto pelo seguinte: é que o actual Sr. Primeiro-Ministro, o Dr. Durão Barroso, quando era Deputado, votou favoravelmente, viabilizando-o dessa forma, um projecto de resolução apresentado pelo PCP que apontava para medidas de fundo que resolviam a raiz do problema, no sentido de moralizar e disciplinar este fenómeno desumano de deslocalização das empresas objecto de investimento directo estrangeiro.
Nesse sentido, aquilo que foi aprovado pelo actual Sr. Primeiro-Ministro foi uma resolução da Assembleia da República que se pronunciava pela necessidade de o governo suscitar nas instâncias internacionais adequadas - na União Europeia, na OCDE - o debate e a adopção de medidas visando disciplinar este investimento directo estrangeiro.
Portanto, a pergunta que é preciso fazer nesta fase, Sr. Deputado, é esta: vão ser necessárias 10 resoluções da Assembleia da República? 20 resoluções? Quantos projectos de resolução terão de ser apresentados e aprovados nesta Assembleia da República para que, efectivamente, se tomem medidas concretas? Porque é disso que se trata, Sr. Deputado!
Além do mais, a acção pontual sobre a empresa C & J Clark, em Castelo de Paiva, não pode ser vista como um facto isolado, como um acontecimento que correu mal. Há pouco, citei diversas empresas - e podia continuar a citar outras - que estão numa situação igualmente dramática, com centenas de trabalhadores perante a perspectiva negra do desemprego.
Aproveito também para perguntar-lhe se a tradução da expressão que nos veio trazer a este Hemiciclo se refere a um apoio do PSD à proposta do PCP de alteração ao Código do Trabalho que aumenta as indemnizações aos trabalhadores despedidos em circunstâncias como esta.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Esta é mais uma oportunidade soberana para se demonstrar que o interesse não é apenas a expressão de votos pios e de belas palavras mas, sim, a tradução no concreto e em medidas práticas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É porque, Sr. Deputado, corremos o risco de a expressão que V. Ex.ª utilizou de "reformar Portugal" não ser de reformar Portugal mas, sim, de mandá-lo para o desemprego.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Montenegro informou a Mesa de que responderá em conjunto aos três pedidos de esclarecimento.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, registei as suas palavras de solidariedade para com a C & J Clark, cuja autenticidade não vou, naturalmente, pôr em causa, mas também quero registar que se trata da segunda grande unidade da C & J Clark que vai ser fechada. Depois do que aconteceu em Arouca, agora é em Castelo de Paiva e talvez amanhã seja em Gaia.
Quero, no entanto, assinalar alguma surpresa pela forma como trata a bondade do seu Governo nesta matéria. Bem sei que, na argumentação política, se pode contrariar a estatística e a realidade dos factos,…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Fala o especialista…!

O Orador: - … mas não deixa de ser curioso verificar que nos venha dizer que agora, quando aumenta o desemprego, quando aumentam as falências fraudulentas, quando aumentam os despedimentos colectivos, como não conhecíamos desde o pior período dos governos cavaquistas, que a responsabilidade é de quem esteve antes no governo.
Sr. Deputado, o facto é que num ano de acção deste Governo, um pouco menos de um ano, temos um salto para mais de 7% de taxa efectiva de desemprego, tal como registada nas estatísticas, e talvez no segundo ano do Governo estejamos a aproximar-nos dos dois dígitos, se continuar esta tendência.
Mas isso confronta-nos sobretudo com uma responsabilidade - e aí estou de acordo consigo. Ao apresentar um projecto de resolução, o PSD aponta iniciativas - não sei se um centro de apoio à criação de emprego, com algumas dezenas ou alguns poucos funcionários, onde estavam 588 trabalhadores satisfaz aquelas famílias, mas sei que é preciso haver alternativas concretas… Por isso, Sr. Deputado, coloco-lhe três iniciativas, sobre as quais quero a opinião do seu grupo parlamentar e a sua própria.
Em primeiro lugar, isto é também um problema europeu. Parece-lhe bem ou não, Sr. Deputado, que haja iniciativas do Parlamento Europeu no plano internacional quanto à regulação das práticas destas entidades multinacionais?
Em segundo lugar, porque essa é a nossa responsabilidade, queria saber, Sr. Deputado - porque neste sentido o Bloco de Esquerda fará, nos próximos dias, um projecto que submeterá à sua consideração e à de todo o Parlamento -, se aceita que a contratualização do investimento estrangeiro seja subordinada, no que diz respeito a subsídios ou benefícios fiscais, à contrapartida de uma política de emprego e capacitação profissional, no incumprimento da qual os benefícios ou os subsídios tenham de ser devolvidos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Agradeço-lhe que conclua.

O Orador: - E concluo, Sr. Presidente, perguntando, finalmente, se o Sr. Deputado concorda, em terceiro lugar, com uma política de combate às falências fraudulentas que preveja a prioridade dos créditos dos trabalhadores,

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nomeadamente, na sua intervenção directa no arresto imediato dos bens de empresa, uma vez verificada a fraude.
Se estamos de acordo nestas medidas, já demos um passo em frente!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, ao ouvi-lo, já começa a ser um hábito nesta Assembleia: sempre que o Governo ou a maioria está em dificuldades, imputa rapidamente as responsabilidades ao governo anterior.

Vozes do PSD: - O que é que queria?!

O Orador: - Mas quero aqui dizer-lhe que nunca fecharam tantas empresas tão rapidamente, em Portugal, como encerraram durante estes últimos meses. A grande questão que se coloca é a de tentar compreender as causas desse encerramento e as responsabilidades nesse encerramento. É evidente que quando os altos responsáveis do País, nomeadamente, têm declarações que conduzem os investidores e o cidadão à perda de confiança no funcionamento da economia, outra coisa não poderá ser esperada que não seja, evidentemente, o caos económico que está a ser instalado no País.
Depois, eu esperava que o Sr. Deputado, ao abordar este tema, trouxesse ao Plenário alguma novidade em matéria de inverter a situação. Por exemplo, que nos dissesse que políticas, que estratégia tem o Governo para alterar esta situação.
Tem um desemprego que, para o ano de 2003, na proposta orçamental, estava estimado em 5,2%; no final do ano de 2002, já está na ordem dos 5,5%. Por este andar, nomeadamente, lá para Junho, será superior a 7%...

Vozes do PSD: - Se lá estivessem, já não existiríamos!

O Orador: - Depois, fala o Sr. Deputado em empresas que estão a encerrar em Castelo de Paiva. Mas não é só em Castelo de Paiva, é no distrito de Leiria, é no distrito de Coimbra. Dar-lhe-ia aqui facilmente exemplos de um conjunto de empresas que estão nessas dificuldades, em Arganil e em Coimbra, como a Bagir. Trata-se, enfim, de um conjunto delas que estão a passar por estas situações.
Portanto, a grande questão é a de que para o Governo o que anteriormente era irresponsabilidade, hoje, transformou-se em coisas virtuosas, nomeadamente, a questão financeira, a questão do défice orçamental. Ó Srs. Deputados, ainda estou a aguardar pelos resultados finais, mas se continuarem a fazer operações, como têm vindo a fazer, nomeadamente, a operação contabilista de maquilhagem do défice…

Protestos do PSD.

… que foi assumido agora com a tal Quinta da Falagueira, independentemente do negócio, a forma contabilística como arranjaram a receita, transferindo património da Direcção-Geral do Património para uma empresa que tem capital social 100% público...
De facto, Srs. Deputados, assim é fácil resolver, maquilhando o défice. Mas mais importante do que o défice é ter uma estratégia económica e uma estratégia de desenvolvimento para o País. Ora, aquilo que constato é que por este andar, sem estratégia, sem propostas concretas, no final do ano de 2003, a situação será ainda mais grave do que aquela que já é hoje, no tecido económico e, particularmente, nas empresas do País, estando a fechar, nomeadamente - e não é por acaso -, unidades do sector do calçado e o do têxtil. Isto deveria fazer o Governo repensar por que é que as empresas se estão a deslocar para países com mão-de-obra mais barata, onde há outras condições de produção, em vez de repensar o financiamento da segurança social, a base da segurança social, sobretudo, a base tributária que é a questão de fundo que distorce de tal forma a concorrência…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - … e leva à deslocação das empresas para outro lado.
Obrigado, Sr. Presidente, pela tolerância.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, começo, naturalmente, por agradecer todas as questões que foram suscitadas e relevar aqui alguns equívocos que resultaram da interpretação da minha intervenção.
Desde logo, e relativamente àquilo que disse o Sr. Deputado Bruno Dias, convém assinalar que tive a oportunidade de dizer que a solidariedade que o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata expressava aos trabalhadores envolvidos nesta situação concreta ia muito para além da circunstância de lhe dirigirmos algumas palavras e até algum conforto presencial que V. Ex.ª também pôde naturalmente dar, aquando da nossa deslocação a Castelo de Paiva, na passada segunda-feira.
Também disse, nomeadamente, que tomámos a iniciativa de apresentar um projecto de resolução, onde não só se volta a reiterar essa solidariedade mas onde se abrem caminhos para a solução concreta deste problema. Esses caminhos passam prioritariamente - é esta a nossa opção e, julgo, é a opção correcta - por encontrar novos investidores nacionais ou estrangeiros que possam absorver a mão-de-obra que foi nesta oportunidade para o desemprego.
Sabe também o Sr. Deputado, porque também teve a oportunidade de tomar conhecimento disso, que, na própria segunda-feira, o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Castelo de Paiva e alguns trabalhadores tiveram oportunidade de falar com a Agência Portuguesa de Investimento e, através dela, com o Ministério da Economia para procurar soluções concretas e rápidas para este problema.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas V. Ex.ª faz também uma alusão a uma resolução apresentada pelo Partido Comunista e que obteve a concordância do Partido Social-Democrata. A esse respeito, gostava de dizer-lhe o seguinte: nessa resolução, que V. Ex.ª relembrou e eu tenho aqui, é suscitada a questão

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da necessidade de, junto das instâncias internacionais, nomeadamente, dos órgãos da União Europeia, se tomarem medidas tendentes a evitar que possam ocorrer casos com estes.
V. Ex.ª tem, por certo, conhecimento de que, no âmbito da articulação interna do Partido Social-Democrata, os nossos Deputados no Parlamento Europeu apresentaram já esta semana perguntas concretas à Comissão que visam efectivamente fazer aquilo que nesta resolução já se pretendia.

O Sr. José Magalhães (PS): - É fantástico! Notável!

O Orador: - Como é evidente, convém recordar que este mecanismo também está à disposição de outros grupos parlamentares que também dispõem de Deputados no Parlamento Europeu,…

Vozes do PSD: - Bem lembrado! Apoiado!

Protestos do Deputado do PCP Carlos Carvalhas.

O Orador: - … nomeadamente, aqueles que fazem parte do Grupo Parlamentar do Partido Comunista, no Parlamento Europeu, e do Partido Socialista.

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, em relação a essa matéria mantemos, em coerência, a nossa posição e agimos em conformidade com ela.
Nessa resolução também se faz uma alusão à necessidade de, junto das autarquias locais vítimas dos prejuízos decorrentes de situações como esta, se criarem programas que possam minorar os seus efeitos. Pois é efectivamente isso que o Governo, através do Ministério da Economia e do Ministério da Segurança Social e do Trabalho, está a fazer relativamente a esta questão de Castelo de Paiva.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao Sr. Deputado Francisco Louçã, começava por dizer-lhe que V. Ex.ª abusa da capacidade de interpretação quando refere que eu próprio, na minha intervenção, teria tido a bondade de expressar solidariedade para com a Clark.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Eu não disse isso!

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Eu disse, reiterei e torno a reiterar, nesta oportunidade, que o Partido Social-Democrata está solidário com os trabalhadores da empresa C & J Clark em Castelo de Paiva.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem, mas precisará de actas!

O Orador: - … e devo dizer-lhe que tive a oportunidade de o dizer e de o fazer presencialmente em Castelo de Paiva.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª, porventura, preferirá outro tipo de expedição mais a norte, talvez na Galiza…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - É de mau gosto!

O Orador: - Mas eu estive lá, falei com as pessoas e tive a oportunidade de presencialmente lhes demonstrar toda a minha solidariedade pessoal e política.
Relativamente à intervenção do Sr. Deputado Victor Baptista, julgo que o tempo está a terminar, mas…

O Sr. Presidente: - Sim, o seu tempo terminou, Sr. Deputado. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, mas eu não queria deixar de fazer uma referência breve àquilo que foi afirmado pelo Sr. Deputado Victor Baptista, que vem aqui invocar uma "teoria do caos", vem aqui dizer que tudo isto acontece porque o actual Governo criou medo nos mercados, criou medo aos agentes económicos; e diz que, nos últimos meses, se avolumaram situações de despedimento como aquela que ocorreu agora.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Sr. José Magalhães (PS): - É inegável!

O Orador: - V. Ex.ª, num exercício de honestidade política, deve convir que aquilo que se passou não foi um governo tomar posse hoje e imediatamente amanhã começar a haver despedimentos, por responsabilidade desse mesmo governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Começou a gritar que o País estava "de tanga"!

O Orador: - V. Ex.ª não convence ninguém, com esse argumento!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Aquilo que aconteceu nestes meses é, naturalmente, fruto daquilo que foi o trabalho político e o desgoverno do Partido Socialista, enquanto governou Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - "Tem as costas largas"!

O Sr. Presidente: - Para formular um protesto, face à intervenção do Sr. Deputado Luís Montenegro, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ramalho. Dispõe, no máximo, de 3 minutos.

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O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, todos nós, povo português, sentimos uma grande solidariedade com todos os habitantes de Castelo de Paiva e, naturalmente, embora não fosse minha intenção abordar este tema, agora, não posso deixar de o fazer, porque me coube, enquanto membro do anterior governo, com enorme solidariedade, acompanhar todas as empresas em recuperação, em dificuldade.
Isto, a partir de uma altura, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em que, em 1995, quando o governo tomou posse, a situação dos salários em atraso era exactamente equivalente àquela que ocorria em 1983, ou seja, 600 empresas com salários em atraso e com endividamento ao fisco e à segurança social verdadeiramente imparável.
A situação que foi deixada não é essa. E não é essa porque me coube, com orgulho, acompanhar - uma a uma! - as empresas que estavam em situação de viabilidade duvidosa, não porque devessem deitar as mãos, gratuitamente, mas porque sei que, neste País débil e economicamente dependente, é absolutamente fundamental nas zonas do interior salvaguardarem-se empresas, porque elas são um factor de estabilidade…

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - … e porque com essa estabilidade se assegura o investimento privado e público.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Muito bem!

O Orador: - E por essa razão, Sr. Presidente - e esta Câmara sabe-o -, foram viabilizadas 50 empresas!
Conheci directamente as comissões de trabalhadores, falei com todas as administrações, falei e viabilizei, em processos extremamente morosos, cerca de 50 empresas, não apenas as grandes empresas, como a Lisnave, estão a atestá-lo, mas também a Casa do Douro, mas também a Beiralã - Lanifícios S. A., mas também a MELIX, mas também a Sampaio e Ferreira, mas também todas as empresas da Marinha Grande, mas também todas as empresas de Castanheira de Pêra - e eu poderia aqui apresentar uma lista infindável.
É, de facto, verdadeiramente inusitado que se venham invocar as responsabilidades do Partido Socialista nesta matéria. O que está a suceder, pura e simplesmente, é que os instrumentos que foram criados no Ministério da Economia, nomadamente, sistema de incentivos à revitalização e à modernização económica, foram completamente abandonados e o mais, que é a verdade, é que a Auditre (Unidade de auditoria para a reestruturação empresarial do Ministério da Economia), que consensualizava os cinco Ministérios que intervinham directamente nessas matérias, foi completamente abandonada.
A Clark, Sr. Deputado Luís Montenegro, conheço-a, sabe, mas não a conheço agora, como conheço todas essas empresas e asseguro-lhe, Sr. Deputado, para bem deste país, que se as empresas não tiverem um acompanhamento semelhante ao que eu lhes dei na altura em que estive no governo, com responsabilidade solidária, não vai ser só a Clark, tenho a certeza, irá ser um conjunto infindável delas. E, com certeza, o Sr. Deputado sabe quais são. Eu podia enumerá-las uma a uma, se quiser da sua região, se quiser da Covilhã, se quiser da Guarda, se quiser de Castanheira de Pêra e se quiser da Marinha Grande. Porquê? Porque o Sr. Deputado não sabe, mas, até hoje, ninguém da equipa governativa do Ministério da Economia, desde o Ministro aos Srs. Secretários de Estado, recebeu a administração de nenhuma dessas empresas. De nenhuma, Sr. Deputado! Nem nenhum sindicato. Não sei se sabe disso.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Peço-lhe para concluir.

O Orador: - Sabe quantas reuniões eu tive para viabilizar essas empresas? O senhor pode não acreditar, mas eu tive 520 reuniões em quatro anos. Se tem dúvidas, pergunte aos trabalhadores e às empresas.
Por isso este protesto é veemente, alertando para o que aí vem.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para um contraprotesto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro. Nos termos do Regimento, dispõe de 2 minutos.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Sr. Presidente, serei breve.
Quero apenas dizer ao Sr. Deputado Vítor Ramalho o seguinte: louvo as suas intenções…

O Sr. José Magalhães (PS): - Faz bem!

O Orador: - … enquanto membro de governo. Não tenho dúvidas de que V. Ex.ª tentou fazer o melhor que pôde e o melhor que soube. O que eu lamento é que essa acção tenha resultado infrutífera.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, V. Ex.ª avançou aqui um caso concreto, elucidativo a esse respeito, e que tem que ver com o mesmo grupo económico, a C & J Clark: o encerramento da sua unidade fabril em Arouca.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - No tempo em que V. Ex.ª desempenhou funções governativas, isso aconteceu!

Vozes do PSD: - É verdade!

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Por outro lado, deixe-me também dizer-lhe que a responsabilidade do anterior governo é muito mais vasta do que aquela que decorre de programas avulsos de viabilização de empresas. Eu tive oportunidade de dizer na intervenção que fiz que ela decorre essencialmente de um problema estrutural - o País encontrou-se com problemas delicados nas finanças públicas, reiteradas vezes lembrados nesta Câmara; o País encontrou-se com problemas de endividamento excessivo; o País encontrou-se com uma política económica sem um rumo estratégico definido…

Protestos do PS.

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… e são por essas razões que não nos cansaremos de lembrar ao País de quem é a responsabilidade e quem por ela tem de responder.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Castelo de Paiva, no distrito de Aveiro, é um concelho onde, como tantos outros, as dificuldades superam os recursos, as carências excedem os meios e as insuficiências não se bastam com as condições existentes para as satisfazer.
Como em tantos outros concelhos mais interiorizados, durante anos consecutivos Castelo de Paiva não teve, da parte do poder central, a atenção e o acolhimento que, sendo devidos, eram absolutamente justos e necessários. Só o esforço e a imaginação das próprias populações e dos seus representantes legais foram possibilitando atenuar tais dificuldades. Exíguos e insuficientes, ainda assim.
Ora, é numa destas situações de desvantagem e fragilidade que surge o caso Clark. E aqui convém analisar o problema com objectividade e isenção, mas com total frontalidade.
Neste contexto, cabe começar por constatar que, na génese de toda esta situação, estão deficiências de concepção e de procedimento, designadamente porquanto a atribuição de incentivos se fez de acordo com regras e mecanismos excessivamente benévolos. Mas, mais do que isso, pela total inexistência de acompanhamento do investimento efectuado, neste caso investimento estrangeiro.
É, de facto, importante criar condições que estimulem os investidores e promovam o País como destino de investimento, sobretudo daquele investimento que se integre em desígnios estratégicos previamente definidos. Mas é, igualmente, necessário que esses investimentos sejam devidamente acompanhados ao longo do seu percurso e que, desse modo, se propicie o crescimento das respectivas unidades e, por outro lado, se acautele, atempadamente, eventuais percalços ou dificuldades.
Ainda bem que a situação, também neste domínio, já não é a mesma.
A pertinência da Agência Portuguesa para o Investimento é, neste contexto, perfeitamente justificada. Aliás, segundo informação do Gabinete do Sr. Ministro da Economia, a Agência está já a acompanhar a situação da Clark e a procurar soluções para o problema. Ainda bem que, em termos de intervenção governativa, os tempos são agora outros!

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A verdade, porém, é que a decisão de encerramento da empresa não tem justificação lógica e razoável: a unidade da Clark, em Castelo de Paiva, executa trabalho qualificado e com excelentes índices de produtividade; não há falta de encomendas; apresenta elevados índices de rentabilidade (fala-se num custo médio de produção de 15€ por unidade para um preço de venda, em mercado próximo, o de Espanha, a 150€.
O encerramento da empresa não tem, pois, sustentabilidade racional.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Terá, no entanto, nefastas consequências económicas e sociais para o concelho de Castelo de Paiva e para a região onde se insere.
Serão quase 600 trabalhadores afectados, onde se incluem mais de duas dezenas de casais, que representam perto de um terço do emprego industrial do concelho e asseguram o sustento de cerca de 2000 pessoas.
O tecido empresarial da região não garante a absorção desta mão-de-obra, até por dificuldades várias de locomoção para outros locais potencialmente alternativos, como a zona industrial das Lavagueiras.
Sr. Presidente, Sr.as e Sr. Deputados, depois do encerramento das minas do Pejão, depois de tragédia, ainda relativamente recente, da ponte sobre o rio Douro, Castelo de Paiva é novamente fustigado por uma situação de crise grave, desde logo pela sua amplitude e consequências para centenas de famílias e para o concelho.
Ante tão difícil situação, o Grupo Parlamentar do CDS-PP saúda os trabalhadores da Clark, em Castelo de Paiva, expressando-lhes total solidariedade.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O CDS-PP louva o brio profissional e a dedicação desses trabalhadores, relevando o seu contributo para o desenvolvimento do País e para o prestígio da mão-de-obra nacional.
A verdade, porém, é que afecto e simpatia não bastam, não resolvem as dificuldades dos trabalhadores nem satisfazem as carências das suas famílias. Daí que seja necessário encontrar soluções.
Com esse intuito, os Deputados do CDS-PP eleitos pelo círculo eleitoral de Aveiro entregaram na Mesa da Assembleia um projecto de resolução, apelando ao Governo para que, entre outras medidas, elabore um plano global de intervenção.
De facto, na nossa opinião, as soluções terão de ser, muito provavelmente, de natureza vária e de diversa amplitude. Soluções que passam, desde logo, por medidas activas para trabalhadores e para investidores, mas que passam, igualmente, por mecanismos sancionatórios, se para tal houver suporte legal bastante.
Neste particular, o objectivo primeiro terá de ser, forçosamente, o de assegurar a continuidade da laboração da empresa e a manutenção dos seus postos de trabalho, eventualmente, com recurso a outros investidores ou, até, à segmentação da empresa e diversificação da respectiva actividade.
Gorada que seja tal tentativa - mas só mesmo ante a impossibilidade absoluta de tal solução -, o Instituto de Emprego tem de intervir em diversas vertentes: colocando trabalhadores nos seus programas de oferta de emprego; realizando acções de formação profissional; dando apoios vários, designadamente à criação do próprio posto de trabalho.
A seu lado, a atracção de investidores para a região - e aqui já não propriamente para a Clark -, em especial, no caso dos denominados "investimentos estruturantes", os quais, não obstante, devem ser avaliados na sua génese e nos seus efeitos reprodutivos, mas que têm, igualmente, de

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ser acompanhados na sua execução, a fim de evitar situações como a da Clark e tantas outras.
Esta tarefa, aliás, está cometida à Agência Portuguesa para o Investimento, pela alínea e) do artigo 6.° do Decreto-Lei n.º 225/2002, de 30 de Outubro. A pertinência do diploma está, infelizmente, comprovada pela realidade de Castelo de Paiva.
Paralelamente também, a aplicação de mecanismos sancionatórios deve ser equacionada, quer em termos nacionais quer em termos comunitários. Mecanismos sancionatórios decorrentes não propriamente do Contrato de Investimento celebrado em 1989, que estará cumprido e, desse ponto de vista, extinto, mas, porventura, do incumprimento contratual de outra ordem - e aqui, concretamente, com a Câmara Municipal - e, porque não?, de adulteração ou desvio de fins à data tidos em vista e que foram essenciais à decisão de contratar.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Concluindo, direi que os trabalhadores da Clark deram boa conta das suas atribuições profissionais. Estão agora ante uma perspectiva difícil, apreensivos quanto ao seu futuro, preocupados com a sobrevivência da família tal como a estruturaram, com o crescimento e educação dos filhos.
Usando esta prerrogativa regimental, viemos dizer-lhes que não estão sozinhos, que não somos indiferentes às suas preocupações e ao seu sofrimento.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Estamos a trabalhar, dando o nosso contributo para uma solução a contento para este caso concreto. Mas queremos também que daqui se tirem ilações a fim de evitar, tanto quanto possível, situações destas, quer em Castelo de Paiva, quer em Arouca, quer em Vila Nova de Gaia ou noutro qualquer ponto do País.
É esta a nossa preocupação, é este o nosso propósito. Será nesse sentido, portanto, o nosso esforço.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado Antero Gaspar.

O Sr. Antero Gaspar (PS): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: No fim da década de 80, a C & J Clark, empresa inglesa de relevo na indústria mundial do calçado, instalou-se em Castelo de Paiva. Era de bom augúrio uma unidade fabril desta envergadura sediar-se em concelho do interior. Desde logo, por garantir centenas de postos de trabalho no sector industrial, incipiente num município marcadamente rural e ao longo de décadas limitado à extracção mineira com a Empresa Carbonífera do Douro - Minas do Pejão.
A C & J Clark não aparece por acaso, nem no tempo nem no espaço. Foram custosas e estimulantes negociações da Câmara de Castelo de Paiva - e estou à-vontade para o dizer, porque era, ao tempo, o presidente da Câmara -, com apoios da autarquia, do governo e de fundos comunitários. Tudo somado, e ao longo destes 15 anos de laboração, dir-se-á que as ajudas terão ultrapassado, a valores da época, 2,5 milhões de euros.
Não foi preciso muito tempo para, após a instalação, se concluir e afirmar que esta nova unidade passava a ocupar no Grupo Clark uma posição invejável, com altos níveis de produtividade, graças à capacidade de trabalho dos jovens, manifestada no alto nível profissional e no gosto pela inovação e pela tecnologia.
O impacto da nova indústria e o trabalho garantido a cerca de 1000 paivenses gerou, desde logo, no tecido social e económico, novas perspectivas de desenvolvimento e de qualidade de vida, bem visíveis até hoje. E num concelho com uma população de 17 000 habitantes dir-se-á que a Clark tinha directamente a ver com quase todos os agregados familiares. Hoje, se afirmará que, para o bem e para o mal, a C & J Clark tem indiscutíveis obrigações sociais em Castelo de Paiva.
Infelizmente, tudo se precipitou nos últimos dias em desilusão, desencanto e amargo sabor a injustiça social.
Sabe-se que a lógica economicista das multinacionais, aqui e além, muda de estratégia da noite para o dia, invocando falta de encomendas e altos custos de produção para justificar a procura de novos paraísos à custa de trabalho escravo.
E é tanto mais inesperado quanto a própria empresa classificou a unidade de Castelo de Paiva como uma das mais produtivas e competitivas; é tanto mais inesperado quando, em 19 de Novembro de 2002, eu próprio, com outros Deputados do Grupo Parlamentar do PS, em visita ao concelho, reunimos na empresa e fomos informados pela administração de que não era previsível, a médio prazo, o encerramento da unidade, ainda que a C & J Clark, em Castelo de Paiva, estivesse em fase de reestruturação, de alteração de processos de trabalho.
O fantasma do encerramento, à semelhança do acontecido na unidade de Arouca, pareceu-nos virtual. Foi-nos confirmado que não se perspectivavam medidas idênticas, até por se tratar de uma unidade de raiz, sólida e bem estruturada.
Sobre nós, sobre Castelo de Paiva, um concelho do interior, caiu a tragédia social. Todo o discurso ruiu, ficando o desemprego, o drama de centenas de trabalhadores, problemas de jovens casais com compromissos assumidos, a depressão psíquica e económica.
Alguém trocou as voltas à dignidade das pessoas, preferindo o lucro a tudo o mais.
Os paivenses, uma vez mais, não merecem isto. Não é hora para recordar as angústias recentes, mas é tempo de querermos que, a nível do Governo, a nível da Comunidade Europeia, se olhe de frente para a impunidade de uns e a penalização dos mais pobres.
O Governo tem que agir e reagir, isto é, tem de saber e questionar se o que a C & J Clark acaba de fazer tem enquadramento legal e jurídico, nacional e comunitário, tem de accionar os mecanismos que evitem o encerramento selvagem, até para que não sejamos levados a pensar que, no actual contexto político e com as previsíveis e discutíveis alterações às leis laborais, estão criadas as condições ideais para que estas situações se multipliquem indiscriminadamente.
Se nada se fizer rápida e eficazmente, ficará a nota da ligeireza deste Governo numa questão nuclear - o direito ao trabalho é sagrado. Mas que sejam actos efectivos e não simulacros, que haja solidariedade e não hipocrisia.
Quanto às acusações que o Sr. Deputado Luís Montenegro fez, quero aqui tecer um breve comentário: como paivense e por respeito aos paivenses, meus conterrâneos, ao seu sofrimento, à angústia e à ansiedade das famílias paivenses, prefiro evitar o confronto e, ao

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contrário, apelar a todos, grupos parlamentares e Deputados, no sentido dos necessários consensos.

Vozes do PS e de Deputados do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, faço um apelo, enquanto Deputado e paivense, e também em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, para que, no caso da irreversibilidade do encerramento da unidade fabril, o Governo da Nação preste particular atenção a este caso, a este concelho, a estes trabalhadores, a estas pessoas, com acções de requalificação, com programas de atracção de investimentos e, sobretudo, com a garantia do aproveitamento das instalações fabris a favor de novos projectos.
Exige-se que o Governo, junto da Agência Portuguesa para o Investimento, considere prioritária esta intervenção em Castelo de Paiva. Não pedimos tratamento de excepção, pedimos que considerem uma excepção este caso de infortúnio e, como tal, não pedimos boas palavras mas acções objectivas nesta região tão desfavorecida.
Nesse sentido, apresento à Mesa da Assembleia, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, um projecto de resolução para responder a esta situação de grande dramatismo social que se vive em Castelo de Paiva e que tem merecido a solidariedade de todo o País, mas também para responder a situações idênticas, em outras localidades deste país igualmente afectadas por deslocalização de empresas.

Aplausos do PS e de Deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Medeiros.

O Sr. José Miguel Medeiros (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Antero Gaspar, quero, rapidamente, saudar a sua intervenção e dizer-lhe que registo, em nome dos Deputados do Partido Socialista do distrito de Leiria, a solidariedade do projecto de resolução que subscreveu e que apresentou em nome do Grupo Parlamentar do PS, no sentido de que o caso de Castelo de Paiva seja, naturalmente, um exemplo que traduz uma situação de infelicidade local e extensiva a todo o País.
Mas quero também, sobretudo, chamar a atenção, designadamente das bancadas da maioria, que foram muito lestas a ser solidárias com Castelo de Paiva mas esqueceram-se de que, neste país, existem outras situações semelhantes, como sucede em Figueiró dos Vinhos, com a empresa Gerry Weber, sobre a qual apresentei um requerimento, nesta Casa, há oito dias e ainda não obtive resposta, sendo certo que o Governo não foi a correr manifestar a sua solidariedade ao Sr. Presidente da Câmara de Figueiró dos Vinhos, que é do Partido Socialista. Será que foi por isso, Srs. Deputados?!

Vozes do PS: - Bem perguntado!

O Orador: - Lamento que haja dois pesos e duas medidas, porque no tempo dos governos do Partido Socialista havia medidas para todas as situações, independentemente da cor do partido político.
Pessoalmente, não poderia sair daqui de bem com a minha consciência se não dissesse isto. Efectivamente, lamento que, só pelo facto de Figueiró dos Vinhos ser um pequeno concelho do interior e porque não houve o mediatismo ou não "caíram" lá as câmaras mediáticas, o Sr. Presidente da Câmara de Figueiró dos Vinhos e, certamente, outros deste país, que não conheço, não tiveram voz nem gestos mediáticos de solidariedade da parte de Srs. Ministros. De facto, neste caso, só faltou o Sr. Primeiro-Ministro vir dizer que o País iria parar para lá ir ele, pessoalmente, tratar do assunto. Parece-me muito bem que o faça mas não pode haver portugueses de primeira e de segunda, nem concelhos de primeira e de segunda e, sobretudo, não pode haver concelhos de primeira, quando são da maioria, e concelhos de segunda, quando são das minorias.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não me pareceu que fosse um pedido de esclarecimento; em todo o caso, gostava de saber se o Sr. Deputado Antero Gaspar pretende responder.

O Sr. José Magalhães (PS): - In dubio, é melhor responder!

O Sr. Antero Gaspar (PS): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Antero Gaspar (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Miguel Medeiros, quero agradecer as palavras que me dirigiu e dizer-lhe que a situação dramática que se vive em Castelo de Paiva e que julgo ser, hoje, do conhecimento de todos os portugueses, através da comunicação social, está a ter uma visibilidade que merece também, da nossa parte, uma atenção especial. E parece que tem sido esse o entendimento de todos os grupos parlamentares.
Em relação a outras situações, nomeadamente no norte do distrito de Leiria, no distrito de Coimbra e, eventualmente, noutras localidades do nosso país, elas também são tratadas em pé de igualdade no projecto de resolução que foi agora mesmo apresentado à Mesa da Assembleia da República.
O caso pontual de Figueiró dos Vinhos é, pois, também, motivo de preocupação da minha parte e, com certeza, a partir de agora, de todos os parlamentares.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 30 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia refere-se à apreciação do projecto de lei n.º 201/IX - Designação de titulares de cargos exteriores à Assembleia da República (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).
Porém, tratando-se de um diploma plenamente consensual, foi entendido que não seria distribuído tempo para a

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sua discussão em sessão plenária. A comissão competente pôde apreciá-lo e vai, de resto, proporcionar-nos um relatório antes da votação, cuja realização está prevista para hoje, pelo que podemos avançar nos nossos trabalhos e passar, de imediato, ao ponto seguinte.
Assim, Srs. Deputados, vamos proceder, de imediato, à apreciação da proposta de lei n.º 34/IX - Estabelece um regime específico de reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais.
Sobre esta proposta, quero assinalar um pequeno problema de ordenação do trabalho, relativamente ao qual assumo a responsabilidade: remeti esta proposta de lei para a Comissão de Educação, Ciência e Cultura mas, rigorosamente, a matéria que nela se trata releva na competência da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, já que envolve direitos dos trabalhadores, e implica o respeito da prerrogativa constitucional de os trabalhadores serem ouvidos, através das suas organizações representativas, sobre a matéria. Só hoje é que mandei publicar este diploma para o efeito dessa audição pública, pelo que faço o apelo de que este aspecto seja tido em conta, no que diz respeito à votação posterior do diploma, que espero que, através dos mecanismos regimentais adequados, venha a ser feita mais tarde.
De qualquer forma, isso não implica que não possamos proceder à sua apreciação, na generalidade, e é o que vamos fazer.

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem observado!

O Sr. Presidente: - Antes, porém, peço ao Sr. Vice-Presidente Manuel Alegre que me substitua na presidência da Mesa, já que tenho de me ausentar para receber a Sr.ª Embaixadora da Índia.

Neste momento, assume a presidência o Sr. Vice-Presidente Manuel Alegre.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Bernardino Soares inscreveu-se para interpelar a Mesa, pelo que lhe pergunto em que termos o pretende fazer.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, quero interpelar a Mesa sobre a condução dos trabalhos e sobre a matéria cuja discussão vamos iniciar.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, referindo-me às palavras há pouco proferidas pela Mesa, quero dizer que, na verdade, é essencial que a votação desta proposta não se faça sem que esteja decorrida a discussão pública, porque essa é a forma legal de cumprir o disposto constitucionalmente sobre a audição das organizações dos trabalhadores e não entendemos que possa ser suprível com a audição posterior à votação na generalidade. A audição deve ser feita integralmente antes da votação na generalidade.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, a minha interpelação é exactamente no mesmo sentido.
Esta matéria foi discutida na 8.ª Comissão, a Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, exactamente a propósito da proposta de lei hoje em discussão, mas já se verificou também em relação a outras propostas de lei, nomeadamente a proposta de lei de bases da segurança social, e há o entendimento na Comissão, aliás, já o houve mais do que uma vez, de que o período de discussão pública não é prejudicado pela discussão, na generalidade, em Plenário, da proposta de lei. É exactamente isso que consta do relatório aprovado em Comissão e, obviamente, nessa medida, penso que estão reunidas todas as condições para que discutamos hoje, aqui, a proposta de lei n.º 34/IX.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado que se segue, quero dizer que creio que o Sr. Presidente da Assembleia foi claro: uma coisa não prejudica a outra, ou seja, a falta de audição pública não impede que se faça o debate; a votação é que só pode ser feita depois da audição.
Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, V. Ex.ª acabou de dizer quanto baste, na sequência, aliás, do que foi dito pelo Sr. Presidente Mota Amaral.
Razoável será que os grupos parlamentares possam, por exemplo, entender-se sobre esta matéria, para que a proposta baixe à Comissão sem qualquer votação no dia de hoje. Isto para não nos valermos da figura que o Sr. Presidente Mota Amaral sugeriu, e bem, que resolvia também o problema da não existência de discussão pública deste diploma antes de chegar a Plenário.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Ainda para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Sr. Presidente, o Governo não tem qualquer objecção àquilo que foi sugerido, isto é, a realizar-se o debate, o processo ser submetido a discussão pública e, depois, em momento posterior, fazer-se a votação.
Em qualquer circunstância, quero deixar claro que é um entendimento no sentido de facilitar e de não enquistar o debate, porque, do ponto de vista jurídico, não perfilhamos o entendimento de que tenha de ser necessariamente assim. De resto, a Assembleia da República, há poucos meses, fez exactamente o oposto em relação à lei de bases da segurança social e, do meu ponto de vista e do ponto de vista do Governo, fez bem.
Portanto, sem prejuízo de o Governo não ter o entendimento aqui expresso por algumas bancadas, não temos, todavia, correspondendo ao apelo do Sr. Presidente da Assembleia da República, qualquer objecção, tanto mais que o importante é resolver esta matéria rapidamente, porque ela está pendente na Assembleia há um mês e meio e, de facto, em circunstâncias normais, a própria discussão pública já deveria ter tido lugar e ter expirado. Facilitamos, pois, as coisas, mas deixamos claro de que é apenas por esta razão e para secundar o apelo do Sr. Presidente e não por outras razões aqui invocadas.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem, vamos ao debate!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Muito obrigado, Sr. Ministro. Com bom senso e boa vontade tudo se resolve.
Vamos, então, dar início à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 34/IX - Estabelece um regime específico de reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Juventude e Desportos.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e Desportos (Hermínio Loureiro): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta hoje esta proposta de lei, antes de qualquer outra razão, por reconhecer que o regime geral do seguro de acidentes de trabalho não se ajusta à especificidade das carreiras dos praticantes desportivos profissionais.
Todos reconhecemos que a carreira de um desportista profissional tem como objectivo o alto rendimento, o que resulta na inevitável conclusão, aliás, já reconhecida em sede fiscal, de que se enquadra naquilo a que podemos chamar uma profissão de desgaste rápido.
O regime geral não foi pensado para profissões de desgaste rápido e de baixa média etária, como acontece com os desportistas profissionais, cujas carreiras são de duração muito inferior à das demais carreiras profissionais.
Daqui decorre que, em muitas situações, estes desportistas profissionais auferem vencimentos elevados e, há que o reconhecer, impossíveis de transformar em pensões vitalícias idênticas, por parte de qualquer entidade ou mecanismo, em caso de acidente resultante do exercício da sua actividade profissional.
Assentes que estão estas premissas e no caso deste regime específico que agora propomos não poder vir a ser aplicado, essa pensão vitalícia continuaria a ser decretada pelos tribunais, sem enquadramento específico.
Desta situação resultam naturais dificuldades para os clubes desportivos e para as sociedades anónimas desportivas, nomeadamente no aumento exponencial das despesas num tempo que, todos reconhecemos, é de grande dificuldade.
A conclusão é simples: de acordo com a legislação em vigor, a prática desportiva profissional deixaria, a muito breve trecho, de beneficiar destas garantias fundamentais e obrigatórias. Como sabem, a legislação das competições de carácter profissional obriga à apresentação da apólice de acidentes de trabalho na data de inscrição do praticante desportivo.
Assim sendo e para criar um quadro mais justo e onde situações desta natureza não ocorram, propõe o Governo que, para a reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais, ao valor final das pensões anuais calculadas nos termos do regime geral, se aplicam limites máximos, consoante a idade do atleta.
Em caso de morte, incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho e incapacidade permanente parcial até o praticante desportivo completar 35 anos de idade, o limite máximo será de 14 vezes o valor correspondente a 15 salários mínimos nacionais.
Após o praticante completar 35 anos, o limite máximo da pensão passará para 14 vezes o valor correspondente a 8 salários mínimos nacionais, para os casos de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e incapacidade permanente parcial.
Esta redução tem em conta que estamos a falar de incapacidades que não são absolutas nem para todo e qualquer trabalho, pelo que permitem uma reconversão profissional e uma reinserção no mercado de trabalho.
A forma de cálculo da pensão, nos termos exactos da presente proposta, respeita integralmente a lei geral, ao ter em conta a retribuição e a incapacidade. Assim sendo, só no montante global apurado é que propomos a aplicação de um limite.
Se este limite fosse fixado na retribuição, aí sim, estaríamos a violar o regime geral, nomeadamente ultrapassando os critérios de cálculo dessa retribuição, fixados no artigo 26.º da Lei n.º 100/97.
Por outro lado e finalmente, atendemos à natureza da incapacidade, aplicando à tabela nacional de incapacidades uma tabela de invalidez permanente específica, que, para além de ter em consideração a profissão e a idade, tem também em conta a incapacidade do sinistrado - uma aplicação em tudo semelhante ao que já ocorre em países como a Itália, a Espanha, a Alemanha e a Inglaterra.
Aqui, como noutros exemplos em tantas outras áreas, está mais uma vez demonstrada a vontade reformadora deste Governo.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A reforma do sistema legislativo desportivo está em curso e este é o momento de apelar também à participação de todas as forças políticas com assento na Assembleia da República.
No lugar da ilusão, colocámos a verdade. Vivemos um novo tempo. A hesitação deu lugar à decisão, a imagem deu lugar ao conteúdo e a retórica deu lugar à acção.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Juventude e Desportos, confesso que fiquei sem saber o que é que tem a ver o último parágrafo da sua intervenção com a proposta de lei que trás, hoje, à Assembleia. Certamente, terá oportunidade de me explicar.
Contudo, quero dizer-lhe, desde já, no início do debate, em nome do PS, que aderimos aos objectivos e aos propósitos desta proposta de lei. Conhecemo-los e sabemos quanto é necessário o seu cumprimento para introduzir bom-senso e segurança nas relações entre segurados - trabalhadores no exercício da actividade específica do desporto profissional - e seguradoras.
Apesar da nossa adesão, não podemos aceitar que ela implique driblar aquilo que a lei obriga, no caso concreto a discussão pública, que espero que seja feita, bem como o debate nas comissões parlamentares respectivas.
Gostaria de perguntar a V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, de forma muito breve - já que a posição específica do PS, quanto ao conteúdo da proposta, será oportunamente explicitada no debate -, se está disponível para, no contributo a receber da discussão pública e daquilo que resultar da discussão na especialidade em Comissão, entender

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que algumas das propostas, designadamente as que se referem aos montantes e às idades, são susceptíveis de ser discutidas e, eventualmente, aperfeiçoadas ou modificadas, tendo em consideração que esta proposta, naquilo que é o seu sentido e objectivo, merece a nossa adesão.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, se assim entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Juventude e Desportos.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e Desportos: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Laurentino Dias, como sabe, visto que tem acompanhado esta matéria com a preocupação e a atenção devidas, precisamos de ultrapassar rapidamente este problema e esta dificuldade. Em tempos de dificuldades e com o aumento das despesas que neste momento esta situação acarreta aos clubes e às SAD, é importante resolvê-la rapidamente.
Como a baixa à Comissão permite a melhoria desta proposta de lei, estaremos, obviamente, atentos à discussão e disponíveis para encontrar, se for caso disso, uma ainda melhor solução.
Sr. Deputado Laurentino Dias, quando apresentámos esta proposta de lei, já tínhamos feito o trabalho de casa: fizemos muitas audições e recolhemos muitos pareceres. Reunimos com a Liga Portuguesa de Futebol Profissional, com o Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol, com a Liga dos Clubes de Basquetebol, com o Instituto de Seguros de Portugal, com o IDICT (Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho), com a Associação Portuguesa de Seguradores e com os meus colegas das Secretarias de Estado da Segurança Social, do Orçamento, do Tesouro e Finanças.
Portanto, este trabalho que agora vai ser iniciado na audição pública já teve muitos desses contributos, antes de apresentarmos a proposta de lei na Assembleia da República.
Obviamente que acompanharemos a audição pública e a discussão na especialidade em Comissão, e, conforme lhe disse, Sr. Deputado, se for caso disso, procederemos a algumas alterações de pormenor, que, obviamente, sirvam para melhorar esta proposta de lei.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - O Governo já fez a discussão pública entre si!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Alves.

O Sr. Pedro Alves (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: O Governo, ao apresentar na Assembleia da Republica uma proposta de lei relativa aos acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais, está a colmatar uma lacuna do regime vigente e a proceder em conformidade com a reforma do sistema legislativo desportivo, que se quer mais simples e mais rigoroso.
No que respeita aos acidentes pessoais inerentes à actividade desportiva, a legislação reconhece expressamente as particularidades do sector. O mesmo não se pode dizer quanto aos acidentes de trabalho, uma vez que aos desportistas independentes ou trabalhadores por conta de outrem se aplica o Regime Jurídico dos Acidentes de Trabalho e das Doenças Profissionais, aprovado pela Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro.
Com efeito, a actividade desportiva orientada para um elevado rendimento, ao exigir dos atletas um intenso ritmo competitivo, bem como uma concentrada calendarização das provas desportivas profissionais, aumenta as probabilidades de ocorrerem acidentes pessoais e/ou de trabalho. Acresce o facto de o regime geral não ter em conta as especificidades do contrato de trabalho desportivo, especificidades essas que, no entanto, foram reconhecidas no âmbito do Regime Jurídico do Contrato de Trabalho do Praticante Desportivo.
O regime geral não foi pensado para profissões de desgaste rápido, de baixa média etária, como sucede com os desportistas profissionais, que prosseguem carreiras de duração bastante inferior à das demais opções profissionais. Ou seja, a prática regular destas profissões só acontece durante alguns anos. Há, por isso, que considerar a idade com a qual os praticantes desportivos terminam a sua actividade ou a expectativa de longevidade da carreira a situar-se, na melhor das hipóteses, nos 35 anos.
Por outro lado, o regime também não se coaduna com os custos dos acidentes de trabalho, que podem ser muitíssimo onerosos em razão dos montantes elevados das remunerações auferidas por muitos desportistas profissionais, tornando assim incomportável para as entidades seguradoras o encargo respeitante a pensões vitalícias elevadíssimas, à semelhança do que aconteceu com a sentença do Tribunal de Cascais, de Maio de 2002, a António Brassard, guardião sinistrado, que aufere agora uma pensão vitalícia de 6000 €/mês, sem que se discuta o merecimento da mesma.
Deste modo, a proposta tem como objectivo o princípio de igualdade na atribuição das pensões devidas aos acidentes de trabalho, acabando com o regime injustificado, não razoável ou arbitrário vigente para estes profissionais.
A estes profissionais, que têm valores elevados em risco, aplicam-se indemnizações temporais iguais aos trabalhadores que têm carreiras de muito maior duração, sem que se tenha em conta a relação causa/efeito entre as verbas e a idade do praticante.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A presente proposta do Governo visa preencher um vazio legal, prevendo como máximo para os casos de morte ou incapacidade permanente absoluta o valor de 14 vezes o montante correspondente a 15 vezes o salário mínimo nacional, tal como para situações de incapacidade permanente parcial com reservas para atletas com mais de 35 anos, e o valor de 14 vezes o montante correspondente a 8 vezes o salário mínimo nacional para os casos de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e incapacidade parcial após os 35 anos de idade, uma vez que o atleta poderá sempre reconverter-se profissionalmente, porque a sua incapacidade não é para qualquer tipo de trabalho.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ainda assim, sabendo-se da dificuldade de reinserção profissional, fixa-se uma pensão que consideramos razoável.
Deste modo, têm-se simultaneamente em conta para cálculo das pensões dois factores previstos na lei geral: a retribuição e a incapacidade.

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Esta proposta destaca, igualmente, o acompanhamento clínico e reabilitação do sinistrado, pois prevê, por exemplo, em casos de discordância sobre o diagnóstico da lesão ou o uso de técnicas de tratamento do sinistrado, a prevalência do parecer do médico indicado pela federação da modalidade praticada pelo acidentado. Deste modo se salvaguarda a integridade e a recuperação do atleta, bem como se responsabiliza as seguradoras e as entidades empregadoras do sinistrado a conduzir o processo clínico, terapêutico e medicamentoso da recuperação deste.
Nestes termos, importa não olvidar que a criação de um regime específico de reparação de danos emergentes de acidentes de trabalho de desportistas profissionais ganha um carácter complementar e necessário dos seguros pessoais e de grupo a favor dos sinistrados.
Esta importante medida visa, por tudo isto, a modernização do sistema legislativo desportivo, na certeza de contribuir para um maior rigor e transparência no desenvolvimento do desporto profissional em Portugal.
Está, por isso, de parabéns o Governo, por mais um passo decidido e decisivo na dignificação do nosso desporto.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Fernando Cabral (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Fernando Cabral (PS): - Sr. Presidente, para formular um pedido de esclarecimento.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Mas o Sr. Deputado não se inscreveu oportunamente.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Carito.

O Sr. Luís Carito (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Através da proposta de lei n.º 34/IX, hoje em discussão, visa o Governo estabelecer um regime jurídico específico de reparação de danos emergentes de acidentes de trabalho aplicável aos praticantes desportivos profissionais.
Partindo das especificidades que encerram a actividade laboral dos praticantes desportivos profissionais, prevista na Lei n.º 28/98, de 26 de Junho, bem como dos custos inerentes ao seguro de acidentes de trabalho aplicável aos praticantes desportivos profissionais, o Governo vem propor à Assembleia da República a criação de um regime jurídico específico de reparação de acidentes de trabalho para aqueles profissionais, que assenta fundamentalmente em quatro aspectos.
Primeiro, a fixação de limites máximos para as pensões anuais por morte ou incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho, por incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e por incapacidade permanente parcial; segundo, a criação de uma tabela de comutação especifica para a actividade de praticante desportivo profissional; terceiro, a possibilidade de celebração de acordos e protocolos entre as seguradoras e os empregadores, no sentido de serem estes a conduzirem o processo clínico, terapêutico e medicamentoso da recuperação do sinistrado, através de departamentos especializados, podendo a seguradora através de um representante acompanhar o processo clínico do sinistrado; por último, a possibilidade de remissão das pensões, no caso de morte ou incapacidade permanente e absoluta de trabalhador estrangeiro que abandone o País.
Tratam-se, pois, de soluções normativas relevantes, cujo sentido e impacto importa, antes de mais, analisar, já que da sua aprovação resultam objectivamente dois tipos de consequência: em primeiro lugar, determinam uma diminuição do grau de protecção dos praticantes desportivos profissionais, face ao regime jurídico de reparação de acidentes de trabalho em vigor, previsto na Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, e, em segundo lugar, implicam uma diminuição dos custos do trabalho por parte das entidades empregadoras.
O regime jurídico da reparação dos acidentes de trabalho, independentemente do sector de actividade a que se dirija, constitui uma das traves mestras do direito infortunístico. Além da prevenção, a reparação da sinistralidade laboral assume uma importância vital no quadro da subsistência e da inserção sócio-profissional do trabalhador vítima de um acidente de trabalho e da sua família.
Neste contexto, ao longo da história, as sociedades têm vindo a consagrar e a aprofundar o regime jurídico da reparação dos acidentes de trabalho como um dos direitos fundamentais dos trabalhadores. Também o nosso ordenamento jurídico-laboral tem vindo a adaptar-se às mudanças e à necessidade do reforço dos direitos dos trabalhadores em matéria de prevenção dos riscos profissionais e de reparação dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais.
A protecção dos trabalhadores em caso de acidente de trabalho constitui um imperativo constitucional, previsto no artigo 59.º, n.º 1, alínea f) da Constituição da República Portuguesa. Em 1997, através da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, foi aprovado, por esta Câmara, um novo Regime Jurídico da Reparação dos Acidentes de Trabalho e das Doenças Profissionais, substituindo aquele que vigorava, entre nós, desde 1965 e que se mostrava desadequado e injusto.
O novo regime jurídico estabelecido em 1997, que se aplica igualmente aos praticantes desportivos profissionais, veio não só adaptar-se às novas realidades, como comportou um avanço inegável no plano dos direitos sociais, porquanto procedeu a um alargamento do âmbito de reparação dos acidentes de trabalho, aprofundando direitos existentes e consagrando novos direitos, como por exemplo o direito ao subsídio por morte e ao subsídio para readaptação.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista reconhece as especificidades que encerram o sector de actividade ligado à prática desportiva profissional e, nesse sentido, está disponível para discutir, aberta e profundamente, a pertinência e a necessidade da aprovação de um regime jurídico específico de reparação dos acidentes de trabalho aplicável àqueles profissionais. Contudo, não nos parece que algumas das soluções normativas espelhadas na proposta de lei em análise sejam as mais adequadas para responder às especificidades deste sector de actividade, bem como ao necessário equilíbrio que importa encontrar para uma matéria tão sensível como a que estamos a discutir.
Com efeito, e admitindo mesmo a hipótese da fixação de um tecto para as pensões resultantes de acidente de

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trabalho, não se compreende a opção dos proponentes em conferir tratamento igual às situações de morte ou incapacidade permanente e absoluta para todo e qualquer trabalho, de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e de incapacidade permanente parcial. O que está em causa são situações diferentes, com graus de gravidade e consequências distintas ao nível da capacidade para o trabalho e que, como tal, à semelhança do que se encontra previsto na Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, carecem de uma tutela diferenciada.
Por outro lado, não se compreende que o nível de protecção dos trabalhadores vítimas de acidente de trabalho, no caso de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual ou no caso de incapacidade permanente parcial, dependa da idade do trabalhador e não do grau de desvalorização da capacidade para o trabalho. O critério da idade para este efeito, para além de não se encontrar devidamente fundamentado pelos proponentes da iniciativa legislativa em discussão, pode ser indutor de injustiça relativa.
Importa também perceber qual a intenção do Governo quanto às situações vigentes. É manifesto que a aprovação do regime específico de reparação dos acidentes de trabalho agora proposto terá como consequência imediata uma redução do grau de protecção dos praticantes desportivos profissionais em matéria de reparação de acidentes de trabalho. A questão que se coloca é, pois, a de saber se o regime preconizado faz tábua rasa dos direitos adquiridos dos trabalhadores ou se aceita que o regime a aprovar se aplique só, e apenas, aos contratos de trabalho celebrados ao abrigo do novo diploma.
Por último, não pode o Grupo Parlamentar do Partido Socialista deixar de lamentar que esta discussão ocorra sem a verificação dos requisitos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis em matéria de participação das organizações de trabalhadores e empregadores. O Regime Jurídico dos Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais constitui uma das matérias de legislação laboral, sendo, como tal, exigível a ocorrência de discussão pública, que, de acordo com o Tribunal Constitucional, tem de verificar-se em momento prévio à discussão na generalidade.
Em suma, sem prejuízo do que se acaba de dizer, reafirma-se desde já a disponibilidade e abertura do Partido Socialista para discutir em sede de especialidade as melhores soluções, de modo a que o regime jurídico específico de reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho aplicável aos praticantes desportivos profissionais possa consubstanciar uma maior justiça social e reunir o consenso generalizado desta Assembleia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Fonseca de Almeida.

O Sr. Ricardo Fonseca de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Carito, aproveito a ocasião para saudar o Governo e o seu impulso reformador e o exemplo dado, mais uma vez, de que, quando existe um problema, o Governo resolve-o.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Só faltava isto!

O Orador: - Esta proposta de lei vai ao encontro de uma nova mentalidade e de uma nova visão relativamente a todo o desporto português, aliás anunciada ontem pelo Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro, Dr. José Luís Arnaut.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, se considera que as soluções propostas pelo Governo não são as mais indicadas, então, pergunto-lhe quais são as que o Partido Socialista entende que são indicadas.
É que enquanto o Governo, suportado pelo PSD e pelo CDS-PP, teve a coragem de apresentar soluções através de uma proposta de lei concreta, o Partido Socialista não o fez, pelo que, hoje, ignoramos qual a posição do PS em relação a esta matéria, que é importante para os clubes, para o meio desportivo no seu geral e não só para o futebol.
Qual é, pois, a posição do Partido Socialista em relação a esta matéria e quais são as soluções que preconiza?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Carito, a quem peço que tenha em atenção que apenas dispõe de 1,45 minutos.

O Sr. Luís Carito (PS): - Sr. Presidente, serei muito rápido, até porque há mais um Deputado da minha bancada inscrito para usar da palavra.
Sr. Deputado Ricardo Fonseca de Almeida, devo dizer-lhe que a minha intervenção foi clara no sentido do que entendemos dever ser alterado e que tem que ver com a questão das incapacidades, que não está bem definida, e com a da idade dos praticantes desportivos. Se a proposta de lei for objecto de apreciação em especialidade, apresentaremos as nossas propostas nessa altura.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Temos para discussão a proposta de lei n.º 34/IX, que versa sobre uma matéria fundamental para os praticantes desportivos profissionais, uma vez que estabelece o seguro, que não existe hoje, relativamente aos acidentes de trabalho que os mesmos podem sofrer durante a sua prática desportiva.
Isto não é novidade, porque já a Lei de Bases do Sistema Desportivo prevê a institucionalização de um sistema de seguro obrigatório para praticantes desportivos, enquadrado na prática desportiva formal - refiro-me ao n.º 1 do artigo 16.º daquela lei de bases.
Aliás, já houve um desenvolvimento desta mesma Lei de Bases do Sistema Desportivo. Na verdade, institucionalizou-se a obrigação do sistema de seguro através do Decreto-Lei n.º 146/93, de 26 de Abril, no que toca aos acidentes pessoais de desporto. Ou seja, o seguro desportivo que este diploma prevê cobre os riscos pessoais inerentes à prática desportiva, incluindo os decorrentes de transportes e viagens em qualquer parte do mundo, e é

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obrigatório para todos os agentes desportivos inscritos em federações dotadas de utilidade pública desportiva.
Há ainda uma outra referência no Decreto-Lei n.º 125/95, de 31 de Maio, no que diz respeito ao seguro específico e obrigatório para desportistas de alta competição. Este último diploma estabelece medidas específicas de apoio ao desenvolvimento da alta competição, dispondo-se, no seu artigo 34.º, que aos praticantes da alta competição é garantido o seguro desportivo especial que terá em conta a especificidade da sua actividade desportiva e os respectivos graus de risco. Este seguro também é obrigatório.
Por último, é de salientar que o contrato de trabalho de praticante desportivo tem um regime legal específico distinto do regime do contrato de trabalho e decorre da Lei n.º 28/989, de 26 de Julho.
Apesar da existência de todas estas disposições especiais de protecção aos praticantes desportivos, falta, de facto, regulamentar a questão do acidente de trabalho para os praticantes desportivos. Não há previsão de um seguro de acidente de trabalho específico para os praticantes desportivos, hipótese que apenas está prevista no Regime Jurídico dos Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais. O problema é que a prática desportiva é substancialmente diferente da prática normal em termos de trabalho. Portanto, os acidentes de trabalho e as doenças profissionais previstas naquele regime jurídico não cobrem de forma eficaz o que se passa no mundo desportivo.
A prática desportiva profissional é uma actividade com elevada probabilidade de ocorrência de acidentes de trabalho dada a necessidade de um elevadíssimo rendimento e de um intenso ritmo competitivo.
Por outro lado, o regime geral não foi pensado para profissões de desgaste rápido e envolvendo pessoas de faixas etárias bastante baixas, como é o caso dos desportistas profissionais.
Hoje em dia, há uma realidade que, de facto, é preocupante.
Por um lado, os prémios destes seguros são incomportáveis para quem tem de pagá-los - os clubes e as sociedades anónimas desportivas são quem tem de suportar o pagamento dos seguros dos respectivos praticantes desportivos e não têm capacidade para fazê-lo. Por outro lado, no caso de acontecer um acidente de trabalho, as próprias seguradoras têm muita dificuldade em responder perante a legislação actual, uma vez que os vencimentos auferidos pelos praticantes desportivos profissionais, por se tratar de uma prática desportiva limitada no tempo, são substancialmente superiores ao que é o vencimento normal de qualquer outro trabalhador.
Há, portanto, a necessidade clara de criar um sistema específico para esta situação, o que tem vindo a ser solicitado por várias ligas profissionais, como, por exemplo, a Liga Portuguesa de Futebol Profissional, que já suscitou esta questão por várias vezes. Sempre que se aborda a questão das dificuldades dos clubes de futebol em Portugal, um dos problemas tem que ver precisamente com a dificuldade dos mesmos em suportar o pagamento dos prémios de seguros de acidentes de trabalho dos seus praticantes desportivos.
A este propósito, recordo um caso concreto já aqui referido, o caso Brassard, que muito contribuiu para a mediatização desta matéria por se tratar de um praticante desportivo conhecido, um atleta que foi por duas vezes campeão do mundo ao serviço da selecção portuguesa, que passou por vários clubes da 1.ª Liga de futebol e que sofreu um acidente de trabalho que o incapacitou totalmente para a prática desportiva, até pelo lugar específico que ocupava na equipa. De facto, Brassard era guarda-redes, sofreu uma lesão numa mão, o que o incapacitou totalmente para a prática desportiva. Este foi um caso prático concreto que deve levar-nos a pensar que é preciso haver uma legislação específica para esta matéria.
Não somos sequer pioneiros neste domínio, embora Portugal seja inovador, como foi referido pelo Sr. Secretário de Estado. Há países onde a prática desportiva profissional tem qualidade, como, por exemplo, em Itália, na Alemanha, em Espanha ou na Argentina, cujas ligas de futebol são consideradas como tendo um nível bastante superior à da nossa própria, e é de salientar que este Governo acompanha os que são melhores nesta área, os que estão mais avançados.
Este Governo caminha, pois, no sentido da modernização do sistema legislativo ao nível desportivo, conseguindo suprir uma falha, o que é positivo, não só para os praticantes, como para as respectivas entidades patronais - clubes e SAD -, como também para as entidades seguradoras.
O que aqui se propõe é uma medida legislativa que vai ao encontro das necessidades e das aspirações de todos. Assim, mais uma vez, saliento este espírito reformador e a capacidade que o Governo manifestou ao tomar esta medida.
Aliás, em relação aos outros dois tipos de seguros, se atendermos às datas em que foram elaborados os respectivos diplomas, verificaremos que, no que respeita aos acidentes pessoais dos praticantes desportivos, o decreto-lei é de 1993, no que se refere aos praticantes de alta competição, o decreto-lei é de Maio de 1995 e, agora, temos uma proposta de lei apresentada em finais de 2002. É curioso estabelecermos o paralelismo entre quem desempenhava funções governativas em cada um destes momentos e atentarmos no hiato de tempo havido quanto à produção de medidas legislativas no sentido de proteger os praticantes desportivos profissionais.
Na verdade, curiosamente, durante um determinado número de anos, absolutamente nada se passou e este mecanismo que faltava à área relativa aos acidentes de trabalho não foi accionado pelo Partido Socialista. Assim, agradecemos ao Governo e ao Sr. Secretário de Estado por terem tomado esta medida de forma tão célere, a qual, obviamente, era uma necessidade imperiosa sentida por toda a comunidade desportiva profissional.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Cabral, mas recordo-lhe que dispõe de pouco tempo.

O Sr. Fernando Cabral (PS): - Sr. Presidente, a questão que pretendo colocar era para ser dirigida ao Sr. Deputado Pedro Alves, mas pode ser respondida pelo Sr. Deputado João Almeida, dado que ambos integram a maioria parlamentar a quem a questão é dirigida.
Já foi mostrada disponibilidade para que, em sede de especialidade, este diploma possa sofrer melhorias, mas queria deixar uma pergunta que também é uma proposta.
Assim, dado que esta matéria tem que ver com o desporto e também com o trabalho, pergunto se estão disponíveis

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para constituir um grupo de trabalho conjunto entre as 7.ª e 8.ª Comissões, para poder trabalhar este diploma e ouvir os vários parceiros envolvidos, as ligas, os sindicatos, etc.
Por último, não deixo de fazer um breve comentário.
Tem sido referida pelos Deputados da maioria a capacidade reformadora do Governo. De facto, nalgumas áreas, o Governo tem efectuado reformas, mas mal. Nesta área do desporto, à excepção de duas ou três entrevistas do Sr. Ministro e do Sr. Secretário de Estado da tutela, e ao fim de nove meses, esta é a primeira iniciativa legislativa que apresentam neste Parlamento. Portanto, aqui não há reforma, há uma total inoperância.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Com certeza, Sr. Presidente. Aliás, a disponibilidade que há da parte da maioria é exactamente aquela que permite que uma pergunta formulada a um Sr. Deputado seja respondida por outro. Tal atesta, desde logo, que estamos disponíveis a todo o tempo para responder às questões do Partido Socialista, embora, mais uma vez, tenha chegado atrasado. Neste caso, o PS chegou atrasado ao pedido de esclarecimento, mas como esta é uma maioria plural, por nós, não há qualquer problema em responder.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Não parece!

O Orador: - No entanto, no que respeita a soluções que são substancialmente diferentes das adoptadas no tempo dos governos socialistas, já há um problema quanto a termos de aceitar e de estar disponíveis para utilizar processos idênticos aos de então.
Acontece que, agora, há um governo que tem iniciativa, que apresentou uma proposta de lei, a qual tem uma tramitação própria, nos termos legais e regimentais. Estamos disponíveis para cumprir esta tramitação, nomeadamente no que diz respeito à discussão pública da proposta de lei, mas, Sr. Deputado, quanto a grupos de trabalho… É que nem sequer foi constituído um grupo de trabalho para resolver o problema do seguro dos acidentes de trabalho dos profissionais desportivos. Portanto, não faz sentido constituirmos um grupo de trabalho agora.
Como V. Ex.ª sabe, em determinadas circunstâncias, os Deputados de uma comissão podem assistir aos trabalhos de uma outra, pelo que nenhum Sr. Deputado está impedido de participar no processo de discussão pública desta proposta de lei.
Estamos disponíveis para que todos os Deputados que o queiram participem nos trabalhos da comissão competente, principalmente para ouvir todos os parceiros que têm intervenção nesta área. Esse é o trabalho que entendemos que deve ser feito e para o qual estamos disponíveis, mais uma vez, numa lógica pró-activa e não numa lógica de discussões sempre abertas que não conduzem a absolutamente nenhuma conclusão.
Queremos concluir este processo depressa e bem e achamos que há quem. Este Governo é capaz de o fazer, e esta Assembleia, que somos todos nós, é capaz de o fazer.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta de lei em apreciação pretende dar resposta a um vazio legal que tem subsistido no enquadramento normativo, nesta área dos acidentes de trabalho dos atletas profissionais.
De facto, a legislação em vigor aplica-se, de forma específica, aos acidentes pessoais e a desportistas não profissionais, sejam ou não atletas de alta competição. E aqui está a diferença de fundo: é que, de alguma forma, esta questão seria mais uma questão laboral do que uma questão de desporto, em Portugal, porque, se ocorrer um acidente com um desportista profissional, trata-se de um acidente de trabalho, mas se o mesmo acidente ocorrer com um desportista não profissional, mesmo sendo de alta competição, com os mesmos níveis de exigência e de elevado rendimento desportivo, essa situação já está salvaguardada.
Agora, interessa verificar as especificidades que, no plano do desporto profissional, se colocam nesta matéria. Efectivamente, para atletas profissionais, um acidente de trabalho deve ter enquadramento legal e seguro obrigatório. Porém, na ausência de legislação adaptada às suas especificidades, essas situações têm estado subordinadas à lei geral dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais.
Ora, tendo em conta que o cálculo habitual para definir os prémios anuais dos seguros, regra geral, é apontado para cerca de 2% do volume salarial, rapidamente se verifica uma divergência entre aquilo que são os salários mais frequentes em Portugal (o salário médio, que o PCP costuma ser o primeiro a denunciar ser o mais baixo da Europa) e aquilo que, no nosso país, se verifica serem alguns - e sublinho "alguns" - dos elevados salários de atletas profissionais.
Dou um exemplo: nesta matéria, uma favorável taxa de cálculo para o prémio do seguro seria de 3%, neste caso. Ora, para quem paga 20 000 contos de salário a um desportista, o prémio anual do seguro seria de 10 000 contos, o que seria um encargo muito difícil de suportar por parte de alguns clubes e não deixaria a própria seguradora tranquila nem alegre ao ter de pagar esta pensão. Isto demonstra o afastamento da realidade prática face àquilo que a lei geral prevê. É que a negociação entre clubes e companhias de seguros acaba, na prática, por assumir contornos muitas vezes de carácter ad hoc, localizado e de excepção.
Entretanto, há duas questões que podem suscitar-se neste debate, bem como um equívoco que pode surgir nesta discussão, se não acautelarmos a clarificação necessária.
Em primeiro lugar, há uma questão que se prende com o articulado que tem a ver com a diferença de idades, a questão dos 35 anos. Ora bem, no dia em que um atleta profissional faz 35 anos de idade, a pensão calculada passa, de um dia para o outro, de quinze vezes o salário mínimo nacional para oito vezes.
A questão do desgaste rápido associada às carreiras profissionais desportivas tem naturalmente de ser acautelada e tida em conta e é algo que não podemos ignorar, mas é preciso acautelar possíveis situações de injustiça ou mesmo de frustração. Longe vá o agoiro, se um atleta profissional tem um acidente deste género dois dias depois do seu aniversário! Há-de lamentar que isso não lhe

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tivesse acontecido dois dias antes, já que teve de acontecer…
Portanto, há aqui questões de falta de gradualismo e de alteração abrupta de circunstâncias, que valia a pena acautelar.
Por outro lado, outra questão que importa ter em conta tem a ver com o facto de o desporto de alta competição e o esforço pessoal que exige não ser acompanhado, em Portugal, pela aquisição por parte das entidades patronais, mas também com a promoção necessária que o Estado devia garantir, dos conhecimentos técnicos e científicos adequados às exigências do treino (à excepção de meia dúzia de clubes que têm garantida essa possibilidade), o que está a provocar um crescimento de lesões graves e incapacitantes dos profissionais para o exercício da sua actividade. Esta é uma questão real que se tem verificado no nosso país e que é fundamental que se acompanhe também nesta vertente do problema.
O equívoco em que podemos laborar, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, tem a ver com a seguinte questão: é necessário ter em conta, nas eventuais opções em presença, que mais de 90% dos cerca de 2500 profissionais de desporto em Portugal auferem baixos salários ou, mais grave ainda, têm salários em atraso. Portanto, aquela situação que tem sido o cliché mais habitual, das dezenas de milhares de contos/mês, atinge uma minoria dos praticantes desportivos profissionais. E há uma realidade social, raramente abordada e referida, que é a de a grande maioria dos atletas profissionais, neste país, ter baixos salários e, de alguma forma, na sua grande maioria, não ter o seu futuro acautelado do ponto de vista financeiro. E muito menos estarão em condições de, muito jovens, poderem fazer face às implicações de uma lesão grave ou incapacitante.
Para terminar, Sr. Presidente, gostava de referir uma questão que tem a ver com o debate político que está a desenvolver-se. O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, há pouco, falava numa preocupação de não enquistar o debate. Ora bem, o próprio relatório da comissão parlamentar, de admissão a Plenário deste diploma, deve ser decorrente da discussão pública a que a lei nos obriga. E é significativo e importante para o debate político que seja tida em conta essa mesma discussão pública, que não pode ser menorizada no processo legislativo. Nós estamos, hoje, a trocar ideias e a debater políticas que deviam já integrar aquilo que são os testemunhos, as experiências e as opiniões de quem, no plano concreto, na prática, no terreno, vive esta realidade e sobre ela se pode pronunciar.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - E devíamos ter em conta essa realidade, essa experiência, esse conhecimento e esse contributo, na discussão que, politicamente, agora, estamos a desenvolver. Por isso, esta discussão devia ter lugar depois da discussão pública.
Mais preocupante ainda é que, para o Sr. Ministro, a própria votação de um diploma deste tipo devesse ser feita antes da discussão. Esta é uma preocupação que importa salientarmos porque há uma nova teoria que parece estar a surgir, que é perigosa e tem de ser referida.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Juventude e Desportos.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e Desportos: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero congratular-me com o reconhecimento que aqui foi feito da especificidade desta matéria por todas as forças político-partidárias, assim como da necessidade de resolver e ultrapassar este problema, criando um regime específico.
Obviamente que há sempre disponibilidade para melhorarmos, disponibilidade essa já manifestada pelo Governo na intervenção inicial.
Aproveito também esta oportunidade para apresentar duas ou três questões que reputo de elevada importância. Não nos podemos esquecer de que existe um contrato colectivo de trabalho entre a Liga Portuguesa de Futebol Profissional e o sindicato dos jogadores. E esse contrato colectivo de trabalho, no n.º 2 do seu artigo 31.º, é extremamente claro, ao dizer "tendo como máximo mensal quinze vezes o salário mínimo nacional". Ou seja, estamos a falar de um contrato colectivo de trabalho, que foi aceite, negociado e acordado entre o sindicato e a Liga.
É evidente que as seguradoras, ao assumirem o risco, assumiram-no com base neste contrato colectivo de trabalho, que, como sabem, num caso específico, não foi respeitado, tendo sido mesmo ignorado.
Portanto, as previsões matemáticas e as taxas de prémio de seguro de que o Sr. Deputado Bruno Dias fala, de 2% ou 3%, eram com base neste contrato colectivo de trabalho. Sr. Deputado Bruno Dias, posso dizer-lhe que, segundo informações que conseguimos recolher, as taxas de acidentes de trabalho triplicaram, quadruplicaram e, em muitos casos, quintuplicaram, pelo que as reservas e as previsões matemáticas que as seguradoras têm de fazer para assumir o risco de salários elevados é muito maior. Daí a necessidade de criarmos este regime específico. Isto, para segurança de todos - dos clubes, mas fundamentalmente dos praticantes desportivos que, conforme já aqui foi dito e reconhecido por todas as forças políticas, têm uma profissão de desgaste rápido e de elevado risco. Portanto, há necessidade de definirmos com clareza, sem ambiguidades, este mesmo regime específico.
Devo também dizer que esta é mais uma etapa na reforma do sistema legislativo que estamos a fazer.
E, Sr. Deputado Fernando Cabral, é evidente que esta reforma do sistema legislativo foi sempre prometida, mas também foi tanto prometida como adiada. Por isso, há finalmente este impulso reformador. E sabe, Sr. Deputado, o nosso país, neste caso o nosso país desportivo, não precisa de mais leis, mas de melhores leis. Daí eu ter começado a minha intervenção pedindo a colaboração de todas as forças político-partidárias, nomeadamente do Partido Socialista, que, até pelas ilustres personalidades que tem no mundo desportivo e pelos vários contributos dados nesse campo, pode também participar na reforma do sistema legislativo - e não espero outra coisa a não ser essa colaboração e essa participação activa e interventiva, porque precisamos de melhorar as nossas leis.
O que importa dizer é que esta reforma foi sempre prometida, mas também sempre adiada, e que finalmente existe este impulso reformador. Porém, não temos aqui necessidade de fazer muitas leis, não estamos aqui a competir para dizer que fizemos estas ou alterámos aquelas.

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Não! Queremos é, com a participação de todo o movimento associativo, de todas as forças políticas - temos inclusivamente um site na Internet, onde pedimos a colaboração de todas as federações e de todas as instituições relevantes no panorama desportivo -, e também, obviamente, de todos os Srs. Deputados, melhorar as leis e fazer essa mesma reforma. Não para dizer que fizemos muito, mas para dizer que fazemos melhor e que estamos atentos. Este é um caso concreto, mas o problema não é de hoje, existe há muitos anos. Daí este impulso reformador por parte do Governo.
Espero sinceramente que, durante o tempo de discussão deste diploma em sede de comissão, possamos eventualmente melhorá-lo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, esta proposta de lei vai agora ser objecto de discussão pública, pelo prazo de 20 dias, conforme aconselhou o Sr. Presidente da Assembleia da República, e com a aquiescência do Governo, embora o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares tenha explicitado a sua posição.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a ver com a ordem de trabalhos, Sr. Deputado?

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Tem, sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, tendo nós recebido agora o guião das votações a efectuar hoje, gostaria de saber se a votação relativa a esta proposta de lei, aí constante, é considerada sem efeito.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Parece-me lógico, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos passar à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 50/IX - Regula a protecção dos direitos de autor dos jornalistas (PS).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Arons de Carvalho.

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Debateremos hoje um tema importante não apenas para os jornalistas mas, muito mais do que isso, para o sector da comunicação social.
Importa, por isso, apreciá-lo em relação à sua oportunidade, formalização, grau de inovação, ao equilíbrio das soluções preconizadas, à sua eficácia e, finalmente, à margem de consenso possível que existe sobre esta matéria.
Em primeiro lugar, a questão da oportunidade. A importância da aprovação de uma iniciativa legislativa sobre a definição legal dos direitos de autor dos jornalistas não oferece dúvidas. Decorre, desde logo, do artigo 21.° do Estatuto do Jornalista (Lei n.° 1/99, de 13 de Janeiro), que os Deputados se comprometeram a aprovar no prazo, porventura demasiado curto, de 120 dias. Esta iniciativa legislativa torna-se igualmente inadiável, se tivermos em conta a própria evolução dos media, a sua enorme mudança tecnológica, a expansão do "jornalismo electrónico" e, igualmente, a acentuação da concentração empresarial no sector. Finalmente, importa realçar a evidente desactualização do articulado do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, no que concerne a esta matéria, nomeadamente face à modernidade da actual legislação portuguesa sobre os direitos dos jornalistas e a liberdade de imprensa em geral, que, aliás, motivou uma recente consagração por uma prestigiada organização internacional do sector; ao considerar Portugal como um dos países do mundo onde a legislação em vigor mais adequadamente garante essa liberdade.
Importa, em segundo lugar, apreciar este projecto do ponto de vista do seu enquadramento na restante legislação sobre direitos de autor e sobre direitos dos jornalistas.
No decorrer dos trabalhos da comissão parlamentar da anterior Legislatura, que debateu na especialidade os projectos de lei sobre esta matéria, houve quem considerasse mais curial que a regulamentação dos direitos de autor dos jornalistas figurasse no articulado do Código do Direito de Autor e não num diploma específico, não se avolumando deste modo a legislação avulsa. É, porém, possível argumentar diversamente, assinalando a inconveniência em introduzir naquele Código uma exaustiva regulamentação sobre apenas um dos seus aspectos.
Optámos, pois, por voltar a apresentar um diploma próprio, que poderá ter como acrescida vantagem uma sistematização mais adequada das normas directamente aplicáveis a esta matéria, desde que, como se pretende, não exista qualquer colisão com os aspectos fundamentais do direito de autor.
O terceiro aspecto que gostaríamos de sublinhar refere-se já directamente ao conteúdo do projecto de lei. Uma parte relevante do diploma contém normas já enunciadas no actual Código, embora, na maior parte dos casos, de forma menos adequada à problemática do jornalismo e, sobretudo, sem as evidentes vantagens da sua sistematização e de maiores visibilidade e transparência, garantias acrescidas da eficácia prática das normas.
Cito os principais exemplos. Desde logo, excluem-se de protecção as obras ou criações intelectuais dos jornalistas que careçam de originalidade, nomeadamente as notícias do dia e os relatos de quaisquer acontecimentos com carácter de simples informações, norma decorrente, aliás, do artigo 2.°, n.º 8, da Convenção de Berna.
Estabelece-se, depois, de forma insofismável, que, independentemente da natureza da relação jurídica mantida pelo jornalista com determinado órgão de comunicação social, a titularidade sobre a obra protegida nasce na esfera jurídica do seu autor, desde que identificável. Deste modo, retoma-se o princípio geral de que o titular originário da obra é o seu criador intelectual, a quem se reconhece a faculdade de dispor sobre o uso a conferir à obra protegida, nomeadamente no que toca à disposição dos inerentes direitos patrimoniais.
Mantém-se a proibição de cláusulas que excluam ou limitem o direito de o jornalista assinar ou fazer identificar as obras da sua autoria, qualquer que seja o modo de comunicação ao público, ou confiram à entidade para a qual os trabalhos são produzidos, ou a terceiros, a faculdade de alterar a estrutura ou o sentido da obra protegida ou de introduzir quaisquer modificações que a desvirtuem ou possam afectar o bom nome e a reputação do autor.
Do mesmo modo, continuarão a ser proibidas cláusulas que estabeleçam indiscriminadamente as formas e respectivas

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condições de utilização das obras protegidas ou incluam modos de exploração não conhecidos na altura da celebração do contrato, e ainda as que excluam o direito a uma remuneração especial ou à obtenção de uma compensação suplementar em determinadas condições.
Proíbem-se, igualmente, agora, de forma clara, cláusulas que visem obter o consentimento do autor para utilizações da sua obra em órgãos de comunicação social indeterminados, ainda que ligados ao mesmo grupo económico daquelas especificamente identificadas no contrato como beneficiárias das obras protegidas pelo direito de autor. Previnem-se assim situações cada vez mais frequentes que decorrem do processo de concentração empresarial no sector da comunicação.
Nos exemplos que acabei de referir, a originalidade do projecto de lei consiste, essencialmente, na sua maior adequação às normas do sector e, como referi há pouco, na sua sistematização e visibilidade. Existem, todavia, outras normas, cujo carácter inovador, para a legislação em vigor no nosso país, justifica uma referência mais detalhada.
Em primeiro lugar, alarga-se o regime especialmente adoptado no actual Código, quanto às publicações periódicas, a todos os meios de comunicação social.
Em segundo lugar, estabelece-se, igualmente, que são proibidas as cláusulas contratuais que consagrem a disposição antecipada do direito de autor sobre as obras que este vier a produzir por um período superior a dois anos, ou excluam a possibilidade de revisão das cláusulas relativas ao direito de autor findo esse prazo. Na prática, ao jornalista passa a assistir o direito de rever as cláusulas contratuais relativas a direitos de autor decorridos dois anos sobre a sua celebração. E esta redução dos actuais 10 para dois anos visa atenuar as consequências de eventuais, mas, infelizmente, frequentes, situações de precariedade laboral do jornalista aquando da assinatura do contrato, repondo um maior equilíbrio negocial.
Um terceiro ponto fulcral do projecto hoje em debate consiste no elenco de cláusulas contratuais nulas - e não apenas anuláveis -, que tem como pressuposto a necessidade de a matéria relativa ao direito de autor se encontrar expressamente prevista por escrito em sede contratual.
Um último ponto inovador merece referência: pretende-se que esta lei se aplique aos contratos de trabalho vigentes à data da sua entrada em vigor, bem como às obras jornalísticas identificáveis, mantidas em arquivo ou na posse de terceiros, cuja titularidade não tenha sido validamente transmitida nos termos das normas legais à data vigentes.
Abordemos agora a quarta das seis questões colocadas no início da minha intervenção: a razoabilidade e o realismo das soluções preconizadas.
A questão não é, como calculam, de somenos importância: a precariedade da situação laboral de muitos jornalistas decorre directamente da fragilidade do tecido empresarial do sector; a procura de soluções de defesa dos legítimos interesses dos jornalistas não invalida, pelo contrário, que não se tenha em consideração a situação do sector, que, aliás, se agravou no último ano, nomeadamente com a crise económica e os seus inevitáveis reflexos no mercado publicitário.
Deste modo, parece idealista considerar a possibilidade de fixar por lei o valor das retribuições adicionais pela cedência da obra a terceiros ou a empresas participadas por aquela a cujo quadro redactorial o autor pertence, ou que integrem o mesmo grupo económico, ou ainda pela sua divulgação em suporte diferente do originalmente utilizado, com absoluto desprezo pelas virtualidades da negociação em sede contratual.
A variedade de tipos de jornalismo, consoante o meio utilizado, os diferentes modos de exercício da profissão, de participação e função no processo de criação de uma peça jornalística aconselham claramente um regime mais flexível e contratualizado.
Importa, no entanto, extrair as devidas ilacções do processo de elaboração deste diploma. Creio que a fase de audições dos diferentes actores do sector da comunicação social, que teve lugar na Legislatura passada, permitiu concluir ser muito variado o leque de opiniões e muito estreita a porta para um consenso alargado sobre esta matéria.
A desejável aprovação de um diploma sobre esta matéria, que certamente terá um importante significado para os jornalistas portugueses, como tem sido tantas vezes assinalado pelo respectivo sindicato, não deveria ser feita sem uma nova audição das entidades interessadas, designadamente, como é natural, jornalistas, Confederação Portuguesa dos Meios de Comunicação Social e respectivas associações e representantes dos autores.
Este projecto, retomando a iniciativa legislativa, já apresentada há cerca de dois anos, constitui, assim, um mero ponto de partida com vista a esse debate alargado e nunca um ponto de chegada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Arons de Carvalho, tivemos já ocasião de, na Legislatura passada, discutir esta questão com alguma precisão, e devo dizer que foi com alguma perplexidade que ouvi agora V. Ex.ª referir que na anterior Legislatura houve lugar a uma grande audição que permitiu que a solução hoje apresentada - aliás, a mesma foi apresentada na anterior Legislatura, sendo esta uma cópia exacta e fiel da mesma - propiciou uma solução que seria a ideal.
Sr. Deputado, devo recordar-lhe que se na anterior Legislatura houve facto que ficou claramente esclarecido em sede plenária foi, desde logo, o de as entidades representativas das empresas jornalísticas não terem sido ouvidas. Recordo até a oposição forte que houve então a este projecto por parte do Sindicato dos Jornalistas.
Assim, o que eu gostaria que V. Ex.ª, hoje, nos esclarecesse é se, entretanto, desde que este projecto de lei - muito embora com outro número - foi discutido, na anterior Legislatura, até hoje, V. Ex.ª procedeu a audições que na altura não tiveram lugar.
Por outro lado, também gostaria que precisasse, hoje, uma vez que ontem não conseguiram, aquele que é o conceito claro de obras jornalísticas inserto no projecto de lei. Qual é a amplitude deste conceito de obras jornalísticas e como é que, depois, vai fazer a conexão, desde logo, com o suporte onde essas obras jornalísticas, eventualmente, se encontram?
Como é evidente, isto não prejudica a posição que vamos tomar relativamente a este projecto de lei, que será em tudo idêntica à que tomámos na anterior Legislatura,

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por razão de coerência não há razão para a mudar. Mas esta precisão fazia todo o sentido e agradecia-lhe que na oportunidade o fizesse.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Arons de Carvalho.

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, sucintamente, gostaria de dizer-lhe o seguinte: não referi, na minha intervenção, e também não tenho a certeza de que foi isso o que foi dito pelo Sr. Deputado, que o nosso projecto de lei resultava, ou era matriz, de um consenso estabelecido no decorrer das audições que foram feitas na 1.ª Comissão, em sede de Subcomissão de Comunicação Social, há dois anos.
Porém, de qualquer forma, e em relação a outros aspectos da intervenção do Sr. Deputado, gostaria de dizer que basta compulsar os documentos relativos aos trabalhos da 1.ª Comissão Parlamentar para se perceber que naquela ocasião foram ouvidas variadíssimas entidades. Tenho em meu poder documentos que têm a ver com a audição de vários grupos empresariais dos jornalistas, e sei que estiveram aqui, na Assembleia da República, o Dr. Pinto Balsemão, os representantes do Grupo Media Capital, o Dr. José Eduardo Moniz, um conjunto de especialistas relacionados com o direito de autor. Confesso, na altura, eu não era Deputado, e, portanto, não sou testemunha presencial desse acontecimento, mas tenho informações precisas do conjunto variado de entidades que, na ocasião, foram ouvidas. Porém, isso não invalida, pelo contrário, que voltemos a ouvi-las, até porque o sector da comunicação social evoluiu, naturalmente, e hoje poderemos encontrar soluções que naquela altura as entidades em causa não acolheriam.
De qualquer forma, tenho presente, tenho a certeza, que, desde jornalistas às entidades representativas, à Confederação Portuguesa dos Meios de Comunicação Social, houve um conjunto de entidade, bastante alargado, que foi ouvido pelos Deputados na Assembleia da República.

O Sr. António Costa (PS): - Foram questionado por, Sr. Deputado! Nas actas há perguntas suas!

O Orador: - Assim, quero referir que, em relação à segunda pergunta que formulou, do próprio Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, na sua versão actual, se retira a resposta a essa pergunta. A obra jornalística está definida e o mesmo se pode inferir do diploma actualmente em vigor.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputa Maria Elisa Domingues.

A Sr.ª Maria Elisa Domingues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É naturalmente com íntima satisfação que tomo a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, neste debate sobre o direito de autor dos jornalistas.
Possuidora, há longos anos, de uma carteira profissional de jornalista, anualmente revalidada, a matéria hoje em apreço, neste Plenário, interessa-me e preocupa-me particularmente.
É discutível se era necessário legislar em diploma autónomo o direito de autor dos jornalistas, ou se essa definição legal não poderia fazer-se por integração no Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos. Este é, por exemplo, o entendimento de um ilustre jurista, porventura o maior especialista português deste ramo do direito, o Dr. Luís Francisco Rebelo, Presidente - como sabem - da Sociedade Portuguesa de Autores. Mas não temos quaisquer dúvidas de que era urgente verter, em articulado legal, a especificidade da actividade jornalística.
Aliás, como já foi dito pelo Dr. Arons de Carvalho, depois de ter sido aprovado a 13 de Janeiro de 1999, por unanimidade, nesta Câmara, o Estatuto do Jornalista, a discussão sobre a forma passou a ter carácter meramente académico, uma vez que tal diploma estabelecia um prazo de 120 dias para regular o direito, nele consagrado, da protecção da autoria dos textos, imagens, sons, ou desenhos.
Este prazo alargou-se, contudo, como também sabem, na anterior Legislatura, a quase 1000 dias, tendo sido aprovados na generalidade, a 3 de Outubro de 2001, dois projectos de lei sobre o direito de autor dos jornalistas, apresentados, respectivamente, pelo PCP e pelo PS, que vieram a caducar com o fim prematuro da legislatura.
Daí que faça todo o sentido retomar, neste Plenário, a apreciação de uma iniciativa legislativa sobre esta matéria, neste caso, a proposta que o PS voltou a apresentar, exactamente nos termos em que o havia feito em Outubro de 2001. Corresponde, assim, este Plenário à chamada de atenção que, logo no início da Legislatura, em Abril de 2002, a Direcção do Sindicato dos Jornalistas - a quem saúdo na pessoa do seu Presidente, aqui presente - dirigira às diversas bancadas.
Creio que terá cabimento recordar aqui hoje, porque muitos dos que nos ouvem e vêem, porventura, não o saberão, que a história do direito de autor tem na sua origem, por um lado, a técnica de impressão, através de caracteres móveis, na segunda metade do século XV, e, por outro, o domínio da energia eléctrica, na transição do século XVII para o século XVIII. Sendo inicialmente um privilégio outorgado pelos príncipes, adquire a forma de estatuto, o Estatuto da Rainha Ana, em 1710, garantindo já, aos autores de livros e depois também de gravuras, direitos sobre o número de exemplares vendidos.
Em Portugal, caminhou-se mais devagar: a primeira lei da propriedade literária data de 1851 e deve-se a Almeida Garrett.
Julgo que convém referir estes antecedentes, porquanto é desde aí que se degladiam dois conceitos distintos do direito de autor: o conceito anglo-americano do copyright, segundo o qual a génese do direito se situa na reprodutividade da obra, e o conceito do direito de autor continental, segundo o qual o direito de autor se situa no próprio facto da sua criação, sendo, portanto, independente da sua divulgação, publicação, utilização ou exploração. Neste se insere o conceito português.
Entretanto, diversos instrumentos internacionais vieram, naturalmente, enquadrar a protecção das obra literárias e artísticas. Desde logo, em 1986, a Convenção de Berna, à qual Portugal aderiu em 1911 e que já conheceu quatro revisões imperativas com a explosão de novas invenções técnicas, a começar pela fixação de imagens e sons em suportes materiais duradouros e susceptíveis de duplicação.

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Quão longínquas e rudimentares nos parecem esta técnicas quando hoje convivemos e nos tornámos já dependentes das chamadas "auto-estradas da informação".

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - E é, com efeito, a entrada da informática no mundo do direito de autor, com a crescente exploração comercial on-line de criações de jornalistas, que torna urgente a regulamentação do direito de autor dos jornalistas, que detêm o direito, irrenunciável, de assinarem os textos da sua autoria e de não os verem amputados, ou alterados, sem o seu expresso consentimento.
Aliás, Portugal, seria sempre obrigado a legislar, ou a adaptar a legislação existente nesta matéria, por força da directiva comunitária sobre a Sociedade de Informação, aprovada em Abril de 2001, e que deveria ter sido transposta para as leis nacionais até ao fim de 2002 - apenas a Grécia, a Itália e a Dinamarca cumpriram este prazo. Posso, no entanto, anunciar que o anteprojecto, que começou a ser elaborado no âmbito do governo anterior, foi concluído pelo Ministério da Cultura, estando para muito breve a sua apreciação em Conselho de Ministros e a sua posterior discussão neste Plenário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Uma outra directiva comunitária que contempla também diversos aspectos jurídicos do comércio electrónico, regulamentando a responsabilidade dos prestadores de serviços e dos contratos on-line, encontra-se em fase de apreciação no Ministério da Justiça.
Estes são instrumentos fundamentais para balizarem, de forma justa e eficaz, a actividade dos jornalistas e, simultaneamente, permitirem a viabilização económica das empresas de comunicação. A este propósito convirá aqui recordar algumas especificidades do nosso país e, também, de algum modo, o enquadramento internacional.
Com efeito, Portugal é um dos países da Europa onde é mais baixa a taxa de leitores de jornais - estima-se em 65 por cada 1000 o número de portugueses que lêem um jornal/dia. Em Espanha, este número salta para o dobro, enquanto que na Grã-Bretanha, ou nos países do Norte da Europa, ele é de 400 a 500 leitores por cada 1000 habitantes.
É esta a realidade da dimensão do nosso mercado! É ela que justifica a criação dos grupos multimédia que vieram dar outra solidez aos jornais nacionais. Sem a criação destes grupos - alguns deles, naturalmente, hoje, com ligações internacionais -, provavelmente, certos jornais nacionais de referência, que todos nos habituámos a ler, corriam o risco de já não existirem.
No entanto, mesmo a situação desses grupos multimédia não é fácil. Em 2001, registou-se uma acentuada quebra das receitas de publicidade, em particular depois do 11 de Setembro; em 2002, esta quebra foi ainda muito maior, situando-se em 10% a 15% a redução das receitas relativamente ao ano anterior. Este fenómeno é, aliás, extensivo a grande parte da comunicação social europeia para a qual 2002 foi aquilo a que poderemos chamar um autêntico annus horribilis.
Hoje mesmo, o Diário Económico publica dados recentes do Observatório Europeu do Audiovisual, organismo do Conselho da Europa que conta com 35 países-membros, segundo o qual o sector audiovisual europeu atravessa uma crise sem precedentes, apesar de o sistema digital ter permitido multiplicar o número de canais, tornando-se num factor dinamizador da economia e representando 19 000 postos de trabalho permanentes. Mas a crise do sector está a originar despedimentos maciços na Europa e, em Portugal, essa crise também apresenta sinais inquietantes.
É muito triste assistir, por exemplo, como tem acontecido, à partida prematura de brilhantes profissionais de televisão, no auge das suas capacidades, justamente por a sua qualidade e o facto de estarem no topo das carreiras os tornar demasiado "caros", ou tomar conhecimento de vergonhosos contratos a termo que empresários sem escrúpulos, e não necessariamente os chamados grandes grupos económicos, fazem assinar a jovens na busca difícil do primeiro emprego.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sabemos - e estes também são dados do Sindicato dos Jornalistas - que, dos cerca de 5000 jornalistas profissionais, mais de 10% se encontram desempregados. Em 2001, mais de 200 jornalistas foram despedidos; em 2002, cerca de 500 tiveram o mesmo destino, ainda que, muitas vezes, sob forma de rescisão do contrato de comum acordo.
É neste contexto, difícil e frágil, para os jornalistas, mas também, é preciso dizê-lo, para os empresários da comunicação social, que discutimos, Sr.as e Srs. Deputados, o direito de autor dos jornalistas.
Se não queremos ver este direito restringido, amputado, ou coarctado, porque a pluralidade e a autenticidade da informação são um dos garantes do regime democrático, cabe-nos, no entanto, como o partido responsável, lembrar que, em sede própria, quando discutirmos, na especialidade, a regulamentação deste projecto de lei (no caso de o mesmo vir a ser aprovado por esta Câmara), haverá que buscar consensos entre os vários parceiros da comunicação social, porque, como ainda ontem se lembrava neste Plenário, não há trabalhadores sem empresas, sendo estas comunidades de interesses de empregadores e empregados, onde só há sucesso se a gestão empresarial for capaz de estimular a iniciativa e a criatividade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos a discutir hoje o projecto de lei do Partido Socialista que retoma o debate da Legislatura anterior acerca da protecção dos direitos de autor dos jornalistas. Acolhemos, com agrado e apoiamo-la, esta iniciativa, porque ela permite um debate sobre a matéria e algumas das condições constitutivas da liberdade de imprensa e de comunicação social em Portugal.
Temos, hoje, situações profissionalmente aberrantes, como seja a utilização indiscriminada do trabalho dos jornalistas em diferentes suportes e publicações, a reutilização do seu trabalho sem a garantia da protecção de direitos de autor a que se referiram os Deputados que intervieram até agora. Portanto, neste contexto, há uma relação desigual

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entre contratante e contratado que importa corrigir, determinando as normas legais admissíveis destes contratos.
O diploma do Partido Socialista trata grande parte desta matéria, e fá-lo com soluções que aprovamos, tais como: impede cláusulas abusivas que retiram aos jornalistas o direito de assinar os seus artigos ou as suas obras e, em consequência, impede a outros a possibilidade de alterar o conteúdo destas obras.
Quero, no entanto, sublinhar que, na forma final do texto, deve ser mais clara a relação entre o que constitui a base do pagamento de direitos de autor e os diversos meios, que são o suporte dos trabalhos que os jornalistas produzem. Até porque, com o aparecimento da televisão digital, dos canais por cabo e de outros suportes na comunicação social, estas medidas são muito urgentes, talvez mais urgentes agora do que quando as discutimos há alguns meses atrás, tornando-se também mais necessário que elas sejam concretizadas em relação a um panorama comunicacional cuja base tecnológica muda tão depressa, e vai continuar a mudar tão depressa.
Por esta razão, também acolhemos com grande apreço a distinção entre o trabalho noticioso, regular, dos jornalistas e o que é especificamente o trabalho criativo de conteúdos.
Dito isto, queremos sugerir que parte deste debate deva ser feito, paralelamente, a montante do actual projecto de lei, porque há uma situação de precariedade crescente do jornalismo em Portugal, situação esta que é um perigo para a liberdade de imprensa. A dependência de um jornalista (quando é precário), em relação aos "humores" da sua empresa, é um risco para a autonomia profissional, e, portanto, para a qualidade do trabalho informativo e para a liberdade de informação.
Há órgãos de comunicação social com falsos colaboradores, com estagiários não remunerados, que cumprem funções noticiosas fundamentais que estão relacionadas com a carteira de jornalistas. Há, de facto, situações inadmissíveis; há profissionais pagos e com carteira profissional para os quais a lei não existe efectivamente.
Devo sublinhar que, no dia seguinte à discussão do código do trabalho, existem situações laborais entre os jornalistas que são virtualidades absolutas e que, portanto, devem ser combatidas. Se não relacionarmos esta defesa, coerente, da liberdade de informação com a dignidade do estatuto profissional do jornalista não haverá surpresa alguma se, um dia, tivermos um "Berlusconi à portuguesa", aproveitando estes vazios da lei.
É constituindo um combate efectivo contra a concentração e em nome da oposição a todos os abusos que podemos perceber a gravidade da situação, entre outras, que se poderá criar. Por exemplo, se um trabalhador instaurar um processo contra uma empresa - por exemplo, a PT Multimédia -, é muito provável que tenha dificuldade em encontrar trabalho ou que enfrente problemas profissionais, pelo menos, em relação a dois canais por cabo, uma rádio, uma agência noticiosa, cinco diários, dois semanários e onze revistas.
O grau de concentração extraordinário da comunicação social em Portugal é um risco para a liberdade de informação e para a liberdade de imprensa. Por isso mesmo, votando a favor deste projecto de lei e esperando que os trabalhos em sede de especialidade sejam produtivos, rápidos e permitam registar consensos, queremos assinalar a importância de um debate célere nesta Assembleia acerca de legislação contra a concentração dos meios de comunicação social e todas as outras matérias que possam defender aquele que é um factor constitutivo indispensável da democracia: a liberdade de informação.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por analisar o curioso conceito de diálogo do Partido Socialista. Na VIII Legislatura, o Partido Socialista apresentou-nos um projecto de lei sobre esta matéria - o projecto de lei n.º 464/VIII - e, entretanto (relembraram-nos agora pela voz avisada do Sr. Deputado Arons de Carvalho), numerosas entidades foram ouvidas pela 1.ª Comissão, inclusivamente representantes de empresas jornalísticas.
Ora, hoje, o Partido Socialista volta a apresentar um projecto de lei - o projecto de lei n.º 50/IX - que, bem vistas as coisas, é em tudo igual ao apresentado na anterior Legislatura: palavra por palavra, vírgula por vírgula! A única coisa que mudou foi o número do projecto - vê-se bem o conceito de "diálogo" do Partido Socialista…
Então, para que ouviram todas essas entidades? Para que ouviram sindicatos representativos dos jornalistas? Para que ouviram entidades representativas das empresas jornalísticas? Afinal, o que é que retiraram dessas audições? Apenas dizer que as fizeram?!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - De facto, o PS traz-nos hoje um projecto de lei que é rigorosamente igual ao apresentado antes da realização dessas audições. É bom constatar, mais uma vez, qual é a noção de "diálogo" do Partido Socialista, se bem que com uma evolução… É que, há pouco, tentei explicar isto mesmo, pelo telefone, ao Sr. Deputado António Costa, líder da bancada socialista; na ocasião, não quis falar comigo e fez-me um gesto significando que não queria conversa. Pelo menos, verificamos que houve uma evolução: a hipocrisia já não é tanta. Agora não brincam aos diálogos: quando não querem falar, não falam! De todo o modo, é uma evolução face ao passado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Quanto à questão de fundo, a verdade é que se trata aqui, tão-somente, de retomar uma discussão que teve lugar na última Legislatura, então a propósito de dois projectos de lei: um apresentado pelo Partido Comunista Português - o projecto de lei n.º 404/VIII - e outro da autoria do Partido Socialista - o projecto de lei n.º 464/VIII -, ambos com o mesmo objecto, ou seja, o de regular a protecção dos direitos de autor dos jornalistas.
Hoje, discute-se apenas um projecto de lei da autoria do Partido Socialista e, devo dizê-lo, com pena nossa, porque o então projecto de lei do Partido Comunista Português, em alguns aspectos, como então referi, era mais avisado do que o projecto de lei do Partido Socialista.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ora bem!

O Orador: - Na altura, referimos que se tratava de dois projectos de lei em confronto: o projecto de lei do Partido Comunista Português, como honestamente se referia…

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O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, peço o favor de fazerem silêncio para podermos ouvir a intervenção do Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo. É obrigação de todos seguirem os debates.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Como à data referi, o projecto de lei do Partido Comunista Português assentava - aliás, isso mesmo era referido na própria justificação de motivos - numa proposta publicamente suscitada pelo Sindicato dos Jornalistas, em 3 de Maio de 2000. Tiveram a honestidade de referi-lo.
Também o Partido Socialista, embora não o assumindo, apresentou um projecto de lei que se baseava apenas na proposta formulada pela então Secretaria de Estado da Comunicação Social. Hoje, vemos o Sr. Deputado Arons de Carvalho defender o projecto de lei, o que nos leva a dizer que, desta vez, assumiram a paternidade - fizeram-no com algum tempo de distância mas, pelo menos, já a assumiram.
Por uma razão de coerência, as críticas que então suscitámos relativamente ao projecto de lei do Partido Socialista mantêm-se na íntegra.
Em primeiro lugar, há que fazer justiça e dizer que o projecto de lei que hoje discutimos visa colmatar uma lacuna que existe no Estatuto do Jornalista no que toca à protecção dos direitos de autor dos jornalistas (artigo 7.º, n.º 3).
Em todo o caso, voltamos a salientar que se impõe, a este propósito, uma audição efectiva, tal como estatui o artigo 21.º do Estatuto do Jornalista, das associações representativas dos jornalistas e das empresas de comunicação social interessadas. E volto a falar na necessidade de efectiva audição desses interessados por uma razão óbvia: é que, tendo em conta o projecto de lei do Partido Socialista, é evidente que essa audição não ocorreu! Por outro lado, estamos numa nova legislatura, por isso novos argumentos devem e serão certamente invocados e, nesse sentido, muito trabalho há a fazer em sede de especialidade.
Recordo apenas algumas das críticas que então foram feitas pelo Sindicato dos Jornalistas…
Sr. Presidente, peço-lhe que use da mesma diligência de há pouco, pois ela seria mais uma vez oportuna. De facto, gostaria de me fazer ouvir.

O Sr. Presidente: - Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Entendia o Sindicato dos Jornalistas que este projecto de lei era insuficiente e desajustado às condições de utilização do trabalho jornalístico. Refiro, também, a crítica então feita pelo Provedor de Justiça (que mantém hoje toda a actualidade), em comunicação dirigida aos grupos parlamentares, a 29 de Março de 2001, a propósito da utilização da Internet e das potencialidades daí decorrentes, na qual chamou a atenção para as novas questões no âmbito desta matéria que importa ter em conta e que o projecto de lei do Partido Socialista de então não acolhia - tal como continua a não acolher hoje.
Também as questões da fragilidade negocial dos jornalistas, a parcimónia dos salários, o excesso de mão-de-obra e, enfim, toda uma série de circunstâncias que o projecto de então não contemplava continuam hoje por contemplar.
Finalmente, chamo a atenção para o facto de, muitas vezes, as próprias empresas proporem aos jornalistas contratos de trabalho nos quais estes eram forçados a ceder, genérica e definitivamente, os seus direitos morais e patrimoniais, havendo mesmo contratos que iriam ao ponto de vincular a publicação de colectâneas de trabalhos a autorização da empresa.
É evidente que havia aqui alguma posição estática própria do Partido Comunista Português que, naturalmente, também se reflectia neste sindicato em concreto, e que não relevamos. Mas relevamos, ainda assim, algumas críticas que foram justas (mas não colhidas) e que se mantêm.
Relativamente ao reparo que fiz ao Sr. Deputado Arons de Carvalho, ao qual ele não me respondeu, volto a suscitá-lo no que toca ao conceito vago de "obras jornalísticas".
Não se define com a devida precisão nem sequer se percebe bem até que ponto se deve estender a protecção legal (se aos textos, se às imagens impressas ou televisivas, se aos sons ou desenhos ou se a tudo o que seja objecto da actividade jornalística), sendo que, mais uma vez, reafirmo também as preocupações expressas pelo Provedor de Justiça da necessidade de protecção destas obras, textos, imagens, sons, desenhos, o que seja, mas também de qualquer que seja o suporte dessas obras.
Sr. Deputado Arons de Carvalho, daí a conexão que estabeleci há pouco entre o suporte e a obra e à qual V. Ex.ª não respondeu.
Se quiser prestar-me atenção, até lhe dou o exemplo das fotografias comemorativas do casamento do actual Deputado Manuel Maria Carrilho, na altura Ministro da Cultura, com a jornalista Bárbara Guimarães. Como se devem recordar, à data, supostamente havia um semanário que teria o exclusivo dessas imagens. No entanto, houve um jornal que, não tendo qualquer impedimento legal - não teve e fê-lo -, foi "picar" essas imagens e publicou-as, furando aquilo que supostamente seria um exclusivo de um semanário. Ora isso resulta porque há uma protecção legal que não está consagrada.
Mas também, no que toca às novas potencialidades que a Internet permite, há um suporte que permite a divulgação jornalística que tem de ter consagração legal e que o projecto de lei do Partido Socialista não contempla.
Nesse sentido, é necessário contemplar neste projecto de lei, uma vez que ele não contempla, em sede de especialidade e na qual daremos um contributo sério, os direitos de autor dos jornalistas, bem como os seus interesses conjugados com os interesses das empresas jornalísticas, num esforço de diálogo sério que o Partido Socialista não teve no passado, mas que esta maioria saberá demonstrar.
Feitas as audições, no futuro se verá que o texto que vai sair não será exactamente igual àquele que o Partido Socialista apresenta, porque para nós o diálogo é efectiva concertação.
Já o demonstrámos no passado e vamos demonstrá-lo no futuro.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, peço a vossa atenção e a vossa indulgência para a minha proposta.
Há apenas mais um orador inscrito sobre esta matéria. Este assunto já foi debatido na anterior Legislatura e julgo que era penoso que ficássemos, mais uma vez, sem nos pronunciarmos sobre esta matéria na generalidade

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Logo após esta intervenção, procedermos às votações e já poderemos votar este diploma para o efeito de seguir o seu processo na especialidade.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, começo a minha intervenção por saudar esta decisão da Mesa que assim permitirá que uma matéria tão importante e com tanta pertinência como é a esta da protecção dos direitos de autor dos jornalistas possa ser, hoje mesmo, votada na generalidade e se possa iniciar, sem mais demoras, o processo de discussão na especialidade com as audições que vão, seguramente, ser necessárias e com a discussão que, embora deva ser célere, tem de ser devidamente ponderada.
Começo também por saudar a presença dos jornalistas Alfredo Maia e Anabela Fino, dirigentes do Sindicato dos Jornalistas, que se encontram a assistir a este debate e que têm tido uma acção muito importante na sensibilização de todos os grupos parlamentares e desta Assembleia para a necessidade de cumprir o disposto no Estatuto do Jornalista, aqui aprovado por unanimidade, e que obriga à regulamentação dos direitos de autor.
O primeiro voto que formulamos é para que este processo legislativo tenha melhor destino do que o anterior. Efectivamente, tivemos, aqui, oportunidade de debater e de aprovar na generalidade duas iniciativas legislativas: uma delas corresponde, no essencial, a esta que consta do projecto de lei do Partido Socialista que agora é apresentada e que hoje discutimos; a outra era um projecto de lei do PCP que originou, aliás, o processo de discussão na anterior Legislatura e que correspondia basicamente a uma proposta que tinha sido publicamente apresentada pelo Sindicato dos Jornalistas.
Não se tratava de nenhuma violação dos direitos de autor do Sindicato dos Jornalistas mas, sim, de corresponder, assumidamente, a um apelo que o Sindicato havia publicamente feito para que os grupos parlamentares subscrevessem uma proposta apresentada por esse Sindicato em termos públicos. Foi isso que fizemos, embora com algumas alterações de pouca monta, mas assumimos que era uma correspondência da nossa parte a essa proposta.
Congratulamo-nos por esta matéria voltar à discussão nesta Legislatura.
Embora o processo não se tenha concluído - e isso é que foi pena -, teria sido possível, se tivesse havido outra determinação na aprovação de uma lei sobre direitos de autor dos jornalistas, concluir o processo legislativo que se iniciou na VIII Legislatura.
Porventura, após o processo de audições que se verificou, soçobrou-se de certa forma perante algumas dificuldades que surgiram e perante alguns argumentos de sentido contrário à regulamentação de direito de autor dos jornalistas.
Foi pena, pois, hoje, esta matéria poderia já estar aprovada e poderíamos já ter ultrapassado uma situação em que os jornalistas continuam a ver-se completamente desprotegidos relativamente à remuneração do seu trabalho intelectual.
Importa lembrar, embora já tenha sido feito aqui, que os jornalistas passam em Portugal, neste momento, por uma situação muito difícil a vários níveis devido ao processo de concentração dos mass media que se tem vindo a verificar nos últimos anos e que limita a sua liberdade de opinião e o pluralismo de expressão da comunicação social pela submissão tendencial ao poder económico.
Os jornalistas passam um momento difícil devido à precariedade extrema dos vínculos laborais que afectam muitos profissionais desse sector e muito especialmente os jovens jornalistas sujeitos a condições laborais impensáveis e injustas. Vivem uma situação muito difícil pela pressão da concorrência que se verifica entre os media e que vai degradando as condições de exercício da profissão.
Os jornalistas vivem também um momento difícil por uma questão não menos importante que é a falta de protecção dos seus direitos autorais e que é a matéria que, hoje, fundamentalmente nos ocupa.
Efectivamente, hoje, os jornalistas vêm o seu trabalho ser reproduzido em diversos órgãos de comunicação social por vários veículos sem que muitas vezes isso seja do seu conhecimento.
É frequente que o jornalista que trabalha para um determinado órgão de comunicação social venha a saber que o seu trabalho foi reutilizado em diversos órgãos, em outras zonas do País, com diferentes veículos de informação, sendo que só muito tardiamente, e por vezes por acaso, é que sabe dessa situação.
Isto só é possível devido à falta de regulamentação que existe nesta matéria e por a matéria se encontrar ainda por regulamentar, quatro anos depois da aprovação do Estatuto do Jornalista que determinava que no prazo de 120 dias fossem regulamentados os direitos de autor.
Segundo parece, este projecto de lei será aprovado na generalidade - pareceu-nos ser esse o conteúdo das intervenções que foram feitas e, embora se tivesse verificado uma dissonância sensível entre os partidos da maioria, espero que não se dividam nesta matéria. Os senhores têm estado unidos em matérias tão más, ao menos que não se desunam agora que temos perante nós um projecto de lei razoável. Não nos desiludam hoje.
Esperemos que esta matéria seja aprovada na generalidade e que se inicie sem demora o processo na especialidade com a audição dos jornalistas através do seu Sindicato e com a audição das empresas de comunicação social. Esperamos também que este processo de audições não sirva para evitar que se legisle sobre esta matéria.
Há que ter em atenção os vários interesses envolvidos. Mas se é importante que os jornalistas e a Assembleia da República tenham em atenção o ponto de vista do patronato da comunicação social, também é importante que o patronato não perca de vista que tem jornalistas ao seu serviço e que o trabalho prestado por esses jornalistas também merece a justa remuneração.
É importante salientar que nas audições realizadas na anterior Legislatura não houve da parte dos empresários da comunicação social flexibilidade e boa vontade para se encontrar uma solução consensual, o que pode, em larga medida, ter evitado que o processo legislativo se tenha concluído na VIII Legislatura.
Fazemos, portanto, aqui um apelo para que haja consenso nesta matéria, mas que se tomem decisões e que essa necessidade de procurar um amplo consenso não signifique paralisia.
É preciso que Portugal não fique atrás de outros países europeus na regulamentação dos direitos de autor dos jornalistas. É preciso que os jornalistas portugueses, nesta matéria, não sejam tratados como "profissionais de segunda".

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É fundamental que este projecto de lei não seja protelado, que seja aprovado e que não seja daqueles diplomas que fica com um texto tão vago que acaba por não ser realidade. É, pois, preciso evitá-lo.
É preciso ainda que a lei aprovada na conclusão deste processo seja suficientemente precisa para que os jornalistas possam dizer que após a aprovação desta lei têm um mecanismo legal que defende a justa remuneração e a justa protecção do seu trabalho intelectual.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, são estes os votos que formulamos. Pela nossa parte afirmamos aqui o nosso total empenhamento para que, rapidamente, seja aprovada a lei que se espera que resulte do processo legislativo que hoje iniciamos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais oradores inscritos, declaro encerrado o debate na generalidade do projecto de lei n.º 50/IX.
Vamos passar então às votações.
Para começar, vamos verificar o quórum por meio electrónico, conforme dispõe o novo Regimento.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, visto que vamos começar as votações, é o momento oportuno para lhe anunciar e pedir, em consequência, o tempo para, nos termos do artigo 91.º do Regimento, apresentar recurso de uma decisão do Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Qual é essa decisão, Sr. Deputado?

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Há dois dias atrás, na Conferência de Líderes, como estará recordado, ouvida a Conferência de Líderes, o Sr. Presidente decidiu que a partir de hoje - é a primeira sessão com votações em que essa decisão entra em vigor - passará a ser contado o quórum com a utilização, se possível, do método electrónico, através da soma total do número de Deputados, interrompendo, portanto, uma prática anterior que quero defender que continue de pé.

O Sr. Presidente: - Estou a recordar o que diz o artigo 91.º acerca dos recursos.
Como todos sabem, todas as decisões da Mesa são recorríveis para o Plenário e, portanto, esta também é.
Nestas condições, admito o recurso.
Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Francisco Louçã, que é quem recorre, ao abrigo do artigo 91.º n.º 2, dispondo para o efeito de três minutos, tenho de perguntar ao Sr. Deputado Bernardino Soares se é sua intenção também recorrer desta minha decisão. Isso tem influência para a organização deste debate.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, não complicaríamos dessa forma o andamento do debate. Discutiremos o recurso apresentado e sobre a matéria nos pronunciaremos, na certeza também de que conforme o resultado desta discussão exerceremos, ou não, o direito de pedir a contagem dos votos por bancada, que nos assiste regimentalmente.

O Sr. Presidente: - Muito bem. No entanto, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Francisco Louçã, e porque é bom que fique claro que a minha decisão não é uma decisão tomada no ar, quero argumentar sobre os seus fundamentos, facilitando, assim, a tarefa do Sr. Deputado Francisco Louçã.
A minha decisão fundamenta-se na aplicação dos novos preceitos regimentais. O Regimento, neste domínio, alterou as regras anteriores. Parto do princípio de que o quadro parlamentar é de todos conhecido, é conhecido pelo povo português. A distribuição dos votos por bancadas resulta da escolha livre dos portugueses e das portuguesas em eleições. Portanto, o princípio é o de que a contagem se faz por bancadas. E mais: o Regimento revisto introduz disposições novas que tornam a contagem excepcional.
Ora, se, para a questão fundamental de demonstração de vontade do Parlamento, se colocam estas cautelas suplementares, eu entendo que, por maioria de razão, elas se aplicam, dispensando a contagem, no caso da simples verificação do quórum. É por isso que, com a aplicação do processo electrónico (espero que ele funcione hoje, com a colaboração de todos irá funcionar, com certeza, não me verei forçado a recorrer a meios sobrenaturais, conforme já humoristicamente foi assinalado!), espero que tudo de faça com presteza. No entanto, conforme a vontade do Sr. Deputado Francisco Louçã, vamos, então, discutir o recurso interposto.
De acordo com o artigo 91.º do Regimento, o Sr. Deputado recorrente tem direito a 3 minutos, bem como os restantes grupos parlamentares, para se pronunciarem sobre a matéria.
Tem a palavra, Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, agradeço ter já apresentado a argumentação de resposta à minha, certamente que isso facilita.
Como todos estaremos recordados, desde o lamentável incidente da Lei de Programação Militar, desde então, sem excepção, inicialmente por pedido da minha bancada e de outras e depois por decisão permanente do Presidente da Assembleia da República na legislatura anterior, prática mantida nesta legislatura pelo actual Presidente, foi sempre, sem excepção, repito, contado o quórum e anunciada a composição partidária desse quórum. Assim se garantiu uma norma fundamental da democracia, que é a da transparência destas decisões que tomamos, com o impacto e o significado legal que elas têm.
Desde então, no entanto, entrou em funcionamento o sistema do voto electrónico. Devo, aliás, começar por esclarecer que, por força do artigo 104.º do Regimento, não haverá voto electrónico ou, por outras palavras, ele será sempre absolutamente excepcional. Raro será o dia, numa legislatura, em que o cartão que temos sirva para mais do que verificar o quórum, visto que a norma habitual de votação estabelecida pelo Regimento será sempre sentados e levantados, o que é, por força regimental, incontornável - é assim que será! Também é certo que continua incontornável uma votação por bancadas, registando o peso da maioria e das oposições.
No entanto, o facto de, ao determinar que existe quórum para as votações, o Presidente ter feito sempre (agora o Presidente Mota Amaral, antes o Presidente Almeida Santos), desde esse incidente, o anúncio da composição do números de Deputadas e Deputados presentes por cada bancada funcionou, com grande transparência, como um

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instrumento de coerção democrática, de garantia do esforço de presença de todos os Deputados. Porque a lei permitiria uma situação tão absurda, mas tão legal, como esta: se houvesse 100 Deputados das bancadas da oposição, 10 Deputados do PSD e 10 Deputados do CDS, as leis seriam aprovadas por maioria PSD/CDS. A lei permite isto!
Ora, ao anunciar e tornar transparente e visível a presença do número de Deputados por cada bancada, o Presidente estará a dizer, em cada reunião plenária, que todas as bancadas devem, salvo força maior, ter todas as Deputadas e todos os Deputados presentes no momento em que assumimos essa imensa responsabilidade de votar uma iniciativa legislativa. E dessa forma, contribui, com essa declaração de transparência, para que não aconteça um absurdo legalmente possível mas politicamente inaceitável.
Por isso, Sr. Presidente, concluindo, ao recorrer da sua decisão, pretendo que se mantenha a norma anterior, que nenhuma boa razão se vê para que seja interrompida.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Houve, na Conferência de Líderes, uma inclinação maioritária - pelo menos, das bancadas da maioria -, com a oposição do PCP e do BE, que ficou, aliás, registada, em relação a este entendimento quanto à forma de votações. E é preciso lembrar que esta questão das votações tem uma história, aliás, um pouco triste - tem origem na famosa votação da Lei de Programação Militar, mas teve depois desenvolvimentos em vários pareceres pedidos pelo Sr. Presidente da República e analisados na Assembleia da República sobre a forma de votação, em que se analisava não só o problema do quórum e, por maioria de razão, o quórum para as votações que exigem maioria qualificada, mas também o problema, nalguns deles analisado, da correspondência entre a maioria das presenças, de facto, de Deputados no momento da votação e as maiorias que resultam da correlação de forças na Câmara que, nalguns momentos, poderão ser diferentes.
Ora, como já aqui foi dito, não se vislumbra qualquer razão, Sr. Presidente, para que, depois da prática que temos vindo a levar a efeito, de anunciar as presenças por bancada, agora se retroceda nessa matéria sem qualquer justificação e voltemos a ter aqui um sistema de incerteza, que algum dia nos pode trazer dissabores semelhantes aos que já tivemos no passado, em que não se sabe ou pode não se saber exactamente se, na Sala, os Deputados que votam, por exemplo, a favor são mais do que os que votam em sentido contrário e, portanto, se o resultado anunciado por bancada - e deve ser anunciado por bancada! - corresponde à realidade das presenças na Sala. Não estamos livres, portanto, de, como no passado, uma qualquer imagem vir desmentir aquilo que aqui é validado pela declaração da Mesa.
Queremos poupar a Assembleia a essa situação…

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - … e proceder da forma que garanta, como tem garantido até hoje, a segurança total nesta matéria. E essa forma é a de que, quando se verifica o quórum, se diga quantos Deputados estão presentes por cada bancada - é tão simples quanto isso - e não impor agora aqui um regresso a um acordo que já existiu em tempos mas que, agora, não tem justificação. Em primeiro lugar, porque não houve acordo de todas as bancadas; em segundo lugar, porque não há qualquer situação de empate entre a maioria e a oposição, que era a que justificava esse acordo; em terceiro lugar, porque houve um problema, seguido de um processo de discussão, que nos levou a adoptar determinadas medidas que não podem agora ser postas em causa sem nenhuma razão plausível, que até agora não foi explicada, porque, por maioria de razão e por acordo em relação a isso, na Conferência de Líderes, o Regimento não impõe nem proíbe esta forma que agora estamos a propor, mas não há qualquer razão para que, tendo ela provado neste passado recente, seja abandonada sem que daí venha qualquer vantagem - muito pelo contrário! - para a certeza e a fiabilidade das votações na Assembleia da República.

Vozes do PCP e de Os Verdes : - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, gostava de me pronunciar sobre esta matéria porque não estive na Conferência de Líderes quando a maioria propôs uma modificação no sentido da forma de aferir o número de Deputados presentes na Sala antes de cada votação.
Em primeiro lugar, é bom dizer que a necessidade de ter uma noção exacta do número de Deputados tem uma história e essa história resultou de uma votação que causou problemas a esta Câmara.
Em segundo lugar, quero dizer, Sr. Presidente, que penso que - não só porque, em tese, é possível, como já foi referido anteriormente - uma votação por bancada poderá determinar algo absolutamente espantoso para quem, porventura, siga os trabalhos parlamentares, que é observar uma minoria de Deputados, representando embora a maioria de bancadas, a aprovar um diploma. Mas, mais do que isso, penso que a explicitação do número de Deputados que está presente antes de cada votação é um elemento clarificador e tem a vantagem adicional de ser um elemento responsabilizador daqueles que, por razões porventura legítimas, não participam de uma decisão, porque uma votação é sempre uma decisão e uma escolha.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - É em nome da clarificação, é em nome da responsabilização, é em nome da transparência e, sobretudo, para evitar novas interpretações erradas ou novos conflitos que nos fazem desperdiçar tempo e que não asseguram uma melhor imagem do Parlamento que, pensamos, se deve manter a decisão de preceder cada votação de uma contagem do número de Deputados por cada uma das bancadas.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, sobre esta matéria, quero dizer que partilho da posição aqui expressa por V. Ex.ª. Como Vice-Presidente da Assembleia da República,

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estou solidário com a posição expressa pelo Presidente.
Quero, ainda, dizer, com todo o respeito, que me desagradou uma expressão aqui utilizada pelo Sr. Deputado Francisco Louçã, a da "coerção democrática" - é uma expressão que profundamente me desagradou. E o quórum não é soma dos grupos parlamentares. O quórum é a soma indiferenciada dos Deputados que constituem o Plenário da Assembleia da República.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Agradeço a solidariedade do Sr. Vice-Presidente Manuel Alegre.
Srs. Deputados, dado que não há mais oradores inscritos, vamos, então, votar o recurso interposto pelo Sr. Deputado Francisco Louçã.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS-PP e de Deputados do PS, votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PS.

Srs. Deputados, vamos agora proceder à verificação do quórum. É simplicíssimo. Peço a atenção de todos: em primeiro lugar, é preciso introduzir o cartão na consola respectiva e verificar se se apaga a luz vermelha que fica imediatamente abaixo do local de inserção do cartão.

Pausa.

Devo informar que ontem foi feita, pelos serviços, a verificação de todas as consolas e que estão em perfeito funcionamento.
Vamos, agora, abrir o sinal para que se possa fazer funcionar o mecanismo de votação, que é a luz vermelha que se acendeu sobre a frase "votação em curso"; no seguimento disso, vamos assinalar a nossa presença carregando na tecla "sim", a verde.

Pausa.

Está assim concluída a votação e a última manifestação de vontade é a que vai contar.
Srs. Deputados, está encerrada a votação em curso.
Estão presentes 212 Srs. Deputados. Temos quórum mais do que suficiente.
O sistema funcionou, felizmente!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Sobre que matéria, Sr. Deputado?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, para fazer um requerimento oral à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, é evidente que o quórum se afere pelo número de Deputados, independentemente das bancadas presentes no Hemiciclo, mas as maiorias aferem-se tendo em conta o número de Deputados presentes em cada bancada.
Portanto, requeiro à Mesa que nos informe de quantos Deputados estão presentes em cada bancada, Sr. Presidente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso é exactamente o contrário da orientação estabelecida, por isso não posso satisfazer o seu requerimento. Se o Sr. Deputado quiser requerer a contagem de cada uma das votações, fá-lo-á nos termos previstos no Regimento, sendo também aplicados os princípios regimentais.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Essa agora!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Queremos saber!

O Sr. Presidente: - Mas devo dizer-lhe que a Mesa, em privado, até para garantir que o sistema está a funcionar bem, fez a contagem e pode garantir que as maiorias estão perfeitamente asseguradas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Faltam 18 Deputados do PSD!

O Sr. Presidente: - Mais acrescento: embora as regras regimentais disponham nos termos que ouvimos ler, a Mesa jamais poderá admitir que o excesso de positivismo jurídico nos leve a situações absurdas. Ou seja, garantiremos que tudo funcionará conforme a natureza do nosso mandato representativo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Aqui estamos para isso!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, não quero prolongar esta discussão, mas entendemos que não se trata de uma questão de positivismo jurídico.
Pergunto, apenas, à Mesa e ao Sr. Presidente se o sistema permite ou não que este processo que acabámos de fazer seja feito discriminado por bancadas.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado sabe perfeitamente que os sistemas informáticos podem fazer tudo! É apenas uma questão das instruções que se lhes dão. E as instruções são dadas em função daquilo que consta do nosso Regimento revisto e aprovado no passado mês de Dezembro.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, não gostaríamos que ficasse registado no Diário qualquer equívoco, pelo que quero recordar que, na Conferência de Líderes, se concluiu que não havia qualquer impedimento regimental à contagem do número de Deputados presentes em cada bancada…

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … e que o que se estabeleceu na Conferência de Líderes foi o entendimento de que, por opção política, não se faria a contagem de Deputados por bancada.
Porém, não gostaria que ficasse registado no Diário qualquer equívoco no sentido de que concordávamos, pelo nosso silêncio, com o entendimento de que haveria um qualquer impedimento regimental. Não existe, e isso ficou claro no debate que travámos na Conferência de Líderes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, na Conferência de Líderes prevaleceu, na verdade, o entendimento que V. Ex.ª refere. Mas V. Ex.ª decerto reconhecerá que o Presidente da Assembleia da República é livre de ter opinião diferente. Na minha leitura, o próprio texto do Regimento revisto, confrontado com o anteriormente em vigor, é que impõe o modo de verificação do quórum de votação que passaremos a praticar. Pela razão simples de ter consagrado nos seus preceitos a opção política a que V. Ex.ª aludiu.
Srs. Deputados, vamos passar ao voto n.º 35/IX - De pesar pela morte do actor-pintor José Viana, apresentado pelo PS.
Devo dizer que foi entendimento da Conferência de Líderes estabelecer uma diferenciação de tratamento sobre estas matérias. Por isso, atendendo à personalidade em questão, darei a palavra à primeira subscritora deste voto de pesar para que proceda à respectiva leitura e, de seguida, faremos a votação do referido voto, sem que haja lugar a intervenções.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Edite Estrela.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

Morreu José Viana. O combatente de tantas batalhas e adversidades não resistiu aos traumatismos resultantes de um acidente de viação. No passado dia 5, por volta das 20 horas, na auto-estrada de Cascais, o actor-pintor seguia num automóvel conduzido pela mulher, a actriz Dora Leal, quando uma carrinha embateu por trás, deixando-o gravemente ferido. Transportado para o Hospital São Francisco Xavier, aqui veio a falecer três dias depois.
José Viana nasceu em Lisboa, sua musa inspiradora, faz 80 anos. Foi uma vida cheia e dedicada à arte. No teatro recreou a comédia, popularizou rábulas e construiu personagens. Ao senhor milhões de O Doido e a Morte de Raul Brandão, o Guiné de Maria Emília de Alves Redol dos primeiros anos da sua actividade, junta-se o vagabundo de Esta Lisboa que eu amo. Das suas incursões no cinema e na televisão, recordem-se filmes como Perdeu-se um Marido, A Fuga e O Fim do Mundo e a telenovela Chuva na Areia e programas como Ora Viva e Grande Noite.
José Viana era um homem de múltiplos talentos. Com eles encheu os palcos e as telas para satisfação pessoal e do público. A estreia do actor deu-se nos anos 40, no Teatro Apolo, na farsa de Labiche Um Chapéu de Palha de Itália. Como pintor a sua estreia foi ainda mais precoce. Tinha ele três anos quando o Diário de Notícias lhe publicou um desenho. Os seus três mundos - o do teatro, o das artes plásticas e o dos afectos - complementavam-se e interagiam, entrelaçando-se numa malha tecida pela sensibilidade e a arte.
Em 1997 foi homenageado pela Câmara de Oeiras - município onde residia - com a Medalha de Mérito Municipal. E o Presidente da República, Dr. Jorge Sampaio, atribui-lhe a Ordem do Infante D. Henrique. Lauro António, autor do livro José Viana - 50 anos de Carreira, considera-o "um dos maiores vultos da sua geração".
Tive o privilégio de conhecer pessoalmente este talentoso pintor, de lhe admirar a firmeza do traço e do carácter, a bonomia e a simpatia.
José Viana era um homem de convicções, afectos e solidariedades. Um homem bom. Desgostavam-no os conflitos interpessoais e sofria com a violência do mundo. Por isso, recusava ser um passivo telespectador, tendendo a fechar-se numa solidária solidão. O seu riso aberto e franco foi-se transformando em sorriso compreensivo e generoso.
Na sua última peregrinação por Lisboa, desde a Basílica da Estrela até ao Cemitério do Alto de São João (onde foi cremado), foi acompanhado por muitos companheiros e amigos e pelo povo de Lisboa que o acarinhou com um último e genuíno aplauso e dele se despediu trauteando "o Zé Cacilheiro, dedicado companheiro", " (…) e, navegando, a idade foi passando, os cabelos branqueando mas o Tejo é sempre novo".
À família enlutada a Assembleia da República endereça sentidas condolências.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 35/IX - De pesar pela morte do actor-pintor José Viana, apresentado pelo PS.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos guardar 1 minuto de silêncio em memória do falecido.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, vamos proceder às votações, segundo o guião que foi distribuído em devido tempo, começando pela votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 29/IX - Aprova o Código do Trabalho.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

A proposta de lei n.º 29/IX baixa à 8.ª Comissão.
Srs. Deputados, relativamente ao diploma seguinte, a proposta de lei n.º 34/IX - Estabelece um regime específico de reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais, que hoje foi discutido, entendeu-se durante o debate que melhor seria que o mesmo baixasse à Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, sem votação, para que seja concluído o prazo dado para o debate prévio desta matéria, que envolve os direitos dos trabalhadores.
Assim, a proposta de lei n.º 34/IX não será votada agora, baixando à referida comissão, que organizará os seus trabalhos para que possamos fazer a votação na altura em que o prazo para apreciação em comissão esteja cumprido.

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Srs. Deputados, vamos passar à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 50/IX - Regula a protecção dos direitos de autor dos jornalistas (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o projecto de lei n.º 50/IX baixa à 1.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 48/IX - Previne e proíbe a discriminação com base na deficiência (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o projecto de lei n.º 48/IX baixa à 8.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 160/IX - Proíbe as discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência ou na existência de risco agravado de saúde (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o projecto de lei n.º 160/IX baixa à 8.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 162/IX - Proíbe as discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência (BE).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o projecto de lei n.º 162/IX baixa à 8.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 166/IX - Define medidas de prevenção e combate à discriminação com base na deficiência (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o projecto de lei n.º 166/IX baixa à 8.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 167/IX - Proíbe as discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na deficiência (CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o projecto de lei n.º 167/IX baixa à 8.ª Comissão.
Seguidamente, vamos proceder à votação conjunta na generalidade, na especialidade e final global do texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 201/IX - Designação de titulares de cargos exteriores à Assembleia da República (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, julgo que se justifica a dispensa de redacção final, uma vez que o texto foi visto em sede de Comissão às 14 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado. Se ninguém se opõe, trata-se de facto uma belíssima sugestão, já que nos convém que este diploma seja enviado ao Sr. Presidente da República, para que, uma vez promulgado pelo Sr. Presidente da República, no exercício das suas competências constitucionais, dê ocasião a que possamos proceder a algumas designações de cargos exteriores à Assembleia da República.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global da proposta de lei n.º 99/VIII - Altera o Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, relativo ao regime jurídico dos terrenos do domínio público hídrico (ALRM).

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Chamo a atenção da Câmara para o facto de que a Mesa tem ainda, para serem votados, diversos pareceres da Comissão de Ética sobre matéria de relevância, mas o Sr. Deputado Maximiano Martins solicitou a palavra, ao abrigo do Regimento, para proceder a uma declaração de voto oral em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Tem a palavra, Sr. Deputado. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputado: O Partido Socialista votou contra a alteração ao regime jurídico dos terrenos do domínio público hídrico para as regiões autónomas, da iniciativa da Assembleia Legislativa Regional da Madeira, porque entende que esta alteração, nos termos em que está formulada, põe em causa a salvaguarda dos interesses públicos que o domínio público marítimo visa proteger.
Desde logo, o novo regime jurídico parece conter uma inconstitucionalidade quanto à redução do domínio público decorrente de simples deliberação dos governos regionais em resultado da construção de uma estrada, visto que a definição dos bens do domínio público está constitucionalmente reservada à Assembleia da República.
Por outro lado, não pode esquecer-se que a salvaguarda da margem, para além de outros fins públicos relevantes, é também parte integrante do próprio sistema de defesa nacional, o que motivou o parecer negativo da Comissão do Domínio Público Marítimo, parecer esse homologado pelo Sr. Chefe do Estado-Maior da Armada, por despacho de 21 de Janeiro de 2002.
Infelizmente, porém, esta Assembleia da República não chegou a beneficiar nesse processo legislativo de qualquer tomada de posição do Sr. Ministro da Defesa Nacional, visto que o mesmo optou por não responder ao requerimento escrito que diversos Deputados do PS subscreveram a 11 de Julho de 2002, questionando o Ministro sobre as implicações desta proposta de lei para a política de defesa nacional.
Acresce que a fundamentação apresentada pela maioria que aprovou esta iniciativa na Assembleia Legislativa Regional da Madeira, maioria do PSD contra todos os partidos, incluindo o Partido Popular, ao contrário do que fez aqui, confessa o propósito de remover o regime próprio

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do domínio público numa extensão significativa das áreas com capacidade de uso urbano, o que revela a intenção de corresponder às pressões imobiliárias e de favorecer indirectamente a urbanização e a edificação dos terrenos junto à costa, o que contrasta com a paralisação que se verifica na Região Autónoma da Madeira quanto à elaboração dos planos de ordenamento da orla costeira.
Entende o PS que podem e devem ser atendidas as especificidades da orografia das regiões autónomas. Do mesmo modo entende o PS que o regime do domínio público marítimo não deve constranger e expropriar os órgãos do governo próprio das regiões autónomas das responsabilidades que devem ser suas na gestão territorial da orla costeira.
O PS, aliás, continua obrigado pelo seu Programa Eleitoral a prosseguir a transferência de competências para os órgãos do governo próprio dos licenciamentos em área do domínio público marítimo das ilhas que não venham a ser identificados como de interesse para defesa nacional. Todavia - e termino -, a solução encontrada na proposta de lei, tal como formulada e não obstante as alterações introduzidas nesta Assembleia da República, não se afigura, de modo algum, aceitável, nomeadamente porque ameaça importantes interesses públicos protegidos pelo regime do domínio público marítimo, incluindo para efeitos do exercício das funções de defesa nacional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para além de questões determinantes de natureza constitucional, o PCP anuncia e declara que votou contra as alterações ao Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, relativo ao regime jurídico dos terrenos do domínio público hídrico pelas seguintes quatro razões, que passo a expor:
Em primeiro lugar, as alterações aprovadas pela maioria visam exclusivamente servir as pretensões do Governo Regional da Madeira, que pretende abrir à especulação imobiliária vastas zonas da orla marítima da Região Autónoma da Madeira, mesmo que para tal se abra a hipótese de eliminar ou de destruir tudo aquilo que faz parte do domínio público marítimo.
Em segundo lugar, com estas alterações impostas pela maioria parlamentar, confere-se, de forma implícita e explícita, aos governos regionais a competência de poderem decidir em matéria desse domínio público marítimo, sendo certo que toda esta área está sujeita à tutela da Comissão do Domínio Público Marítimo, sob jurisdição do Ministério da Defesa Nacional.
Em terceiro lugar, a maioria impôs a aprovação destas alterações sem ouvir de novo, como lhe competia e politicamente era aconselhável, a Comissão do Domínio Público Marítimo e sem querer aceitar a necessidade de fazer depender as decisões de gestão territorial do domínio público, que agora confere ao governo regional da Madeira, da emissão de um parecer prévio vinculativo por parte daquele organismo.
Em quarto lugar, o conjunto das alterações, feitas propositada e intencionalmente na última sessão do ano de 2002 - é importante não esquecer este facto! - e hoje meramente repetidas por razões circunstanciais de erro formal, visavam, e continuam a visar, única e exclusivamente, dar cumprimento a uma lista de obrigações que o governo da Região Autónoma da Madeira impôs para votar favoravelmente o Orçamento do Estado para 2003.
Isto é, para além dos "sacos azuis" e dos avales especiais do Governo e para além da criação de artifícios para excepcionar as disposições limitativas do recurso ao crédito que atingem o País em 2003, o Presidente do Governo Regional da Madeira consegue, agora e também, que a gestão territorial plena da orla marítima passe para a sua posse, para que a especulação imobiliária passe a vingar nas ilhas da Madeira e do Porto Santo.

Vozes do PCP e de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A aprovação deste diploma pela maioria, para além das questões constitucionais que possa suscitar é, em nosso entendimento, grave, porque, em primeiro lugar, é o sinal claro da submissão total do interesse público aos interesses privados e, em segundo lugar, a desconsideração e um sinal de ignorância, hoje totalmente inaceitáveis, da importância que a preservação da orla costeira tem, fundamentalmente, do nosso ponto de vista, não em matéria de defesa nacional mas, sim, numa perspectiva de defesa de bens e pessoas.
A orla marítima, a sua defesa e a existência de uma faixa de protecção é essencial para a defesa do património, é essencial tendo em conta a mudança climática e é essencial do ponto de vista da defesa do ambiente e de valores patrimoniais, que não são passíveis de troca.
Por último esta cedência escandalosa e despudorada, que é, seguramente, um convite e um "cheque em branco" para o betão, é, do nosso ponto de vista e na atitude esclarecedora do Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, o sinal mais claro e, porventura, a mais nítida forma de compreendermos que nas regiões autónomas o Primeiro-Ministro não tem do ambiente uma concepção de elemento estruturante para o desenvolvimento, que não garante, seguramente, nas regiões autónomas, que continuam, nesta matéria, a ser ignoradas e a estar, pura e simplesmente, abandonadas.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Duas palavras apenas sobre este diploma.
Pensava que, passados todos estes anos sobre a instituição das autonomias regionais com assento constitucional, se tinha criado nesta Câmara, nas várias forças políticas, a assimilação e a apreensão do alcance dessa solução.
Pensava também que, com a evolução que o mundo tem tido, já se tinha percebido que os conceitos de defesa e de estratégia não são aqueles que presidiam à ideia destes domínios públicos marítimos assentes em preocupações particulares de defesa.
Pensava ainda que havia o conhecimento por parte das várias forças políticas das regiões autónomas, em termos de perceberem o alcance que tem serem as administrações públicas regionais a poderem decidir sobre esta matéria do

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domínio público marítimo, atendendo a que, como se compreenderá, a orla marítima tem uma particular importância para aquilo que é uma das principais actividades da Região Autónoma da Madeira, o turismo.

O Sr. António Costa (PS): - Ora bem!

O Orador: - Não é aceitável que haja um processo de intenções, como vi confirmado pelas vossas bancadas, relativamente a uma preocupação de pôr ao serviço de especulações imobiliárias esta faculdade. Há preocupações primeiras, de ordem ecológica e ambiental,…

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Não é verdade!

O Orador: - … que os governos regionais têm demonstrado, e naturalmente que essas preocupações estarão e continuarão a estar em primeiro lugar.
Também queremos aqui dizer que é importante que empecilhos a empreendimentos que sejam perfeitamente conciliáveis com esses princípios de ordem ecológica e ambiental, mas que permitam o usufruto da orla marítima, são perfeitamente defensáveis e realizáveis.
Mas o meu lamento maior vai, naturalmente, como se compreenderá, para a circunstância de ser um Deputado eleito pela Madeira a revelar esta incompreensão por esta realidade regional. Tenho pena que o Deputado do Partido Socialista Maximiano Martins tenha alinhado no coro anti-autonomista e centralista…

Protestos do PS.

O Orador: - … que ouvi nas diferentes bancadas. Tenho pena que isso tenha acontecido.
Sr. Deputado, pensei que o trabalho de sensibilização para as autonomias dentro da sua bancada era feito por si, mas também temos de continuar a fazer esse trabalho dentro do Partido Socialista. Felizmente, já não é necessário fazer esse trabalho dentro do Partido Social Democrata nem dentro do Partido Popular.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, agora, apreciar três pareceres da Comissão de Ética, para concluirmos os nossos trabalhos.
Peço ao Sr. Secretário que proceda à sua leitura.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer sobre a retoma de mandato é do seguinte teor:
"1 - Em reunião da Comissão de Ética, realizada no dia 16 de Janeiro de 2003, pelas 14.30 horas, foi observada a seguinte retoma de mandato:
Retoma de mandato nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 3/2001, de 23 de Fevereiro):
Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) - Luís Fazenda (Círculo Eleitoral de Lisboa) cessando Ana Drago, em 21 de Janeiro corrente.
2 - Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
3 - Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
A retoma de mandato é de admitir."

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Polícia Judiciária, Processo n.º NUIPC 3160/02.2TDLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Junqueiro (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito do referido processo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz, Processo n.º 1100/01.5TAFIG, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Rosário Cardoso Águas (PSD) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito do referido processo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, a próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, sexta-feira, às 10 horas, sendo a sua ordem de trabalho composta por um período de antes da ordem do dia e por um período da ordem do dia, com a discussão das apreciações parlamentares n.os 10/IX e 11/IX e com a discussão conjunta das apreciações parlamentares n.os 12 a 42/IX.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 5 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
José Manuel de Matos Correia

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3190 | I Série - Número 075 | 17 de Janeiro de 2003

 

Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
António Luís Santos da Costa
Carlos Manuel Luís
João Barroso Soares
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Apolinário Nunes Portada
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Manuel Alegre de Melo Duarte

Partido Popular (CDS-PP):
José Miguel Nunes Anacoreta Correia

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira

Partido Socialista (PS):
Júlio Francisco Miranda Calha

Partido Popular (CDS-PP):
Narana Sinai Coissoró

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Paulo Martins Pereira Coelho
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes

Partido Socialista (PS):
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
José Carlos Correia Mota de Andrade
Manuel Maria Ferreira Carrilho

Bloco de Esquerda (BE):
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes

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3186 | I Série - Número 075 | 17 de Janeiro de 2003   O Sr. Bernardino Soares

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