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Sexta-feira, 9 de Maio de 2003 I Série - Número 118

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 8 DE MAIO DE 2003

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
Ascenso Luís Seixas Simões
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.
Em debate mensal com o Parlamento, sobre o tema "A situação internacional e a posição do Governo português perante a questão do Iraque", usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Primeiro-Ministro (Durão Barroso), que proferiu a intervenção inicial, os Srs. Deputados Eduardo Ferro Rodrigues (PS), Guilherme Silva (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Carlos Carvalhas (PCP), Luís Fazenda (BE), Isabel Castro (Os Verdes), António José Seguro (PS), Teresa Patrício Gouveia (PSD), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP) e Marques Júnior e António Costa (PS).
De seguida e após o Sr. Deputado Lino de Carvalho (PCP) ter interpelado a Mesa no sentido de solicitar um parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados acerca da proposta de lei n.º 53/IX - Autoriza o Governo a legislar em matéria de tratamento e interconexão dos dados constantes das informações a prestar pelas instituições de crédito mutuantes em relação aos contratos de empréstimo à habitação bonificados, sobre o que também intervieram, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes), os Srs. Deputados José Magalhães (PS) e Luís Marques Guedes (PSD), procedeu-se ao debate, na generalidade, da citada proposta de lei. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças (Francisco Esteves de Carvalho), os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Joel Hasse Ferreira (PS), Pinho Cardão (PSD), João Teixeira Lopes (BE), Jamila Madeira (PS), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Jorge Nuno Sá (PSD) e Leonor Coutinho (PS).
Entretanto, a Câmara aprovou dois requerimentos de baixa à 4.ª Comissão, sem votação, pelo prazo de 60 dias, um, apresentado pelo PS, PSD e CDS-PP, relativo ao projecto de lei n.º 24/IX - Cria o sistema de vigilância e controlo do exercício da actividade de dragagens e extracção de inertes (PS) e o outro, apresentado pelo PS, PCP, BE e Os Verdes, relativo ao projecto de resolução n.º 64/IX - Sobre a informação, avaliação e disciplina na actividade de extracção de areias em meio hídrico (Os Verdes).
O projecto de lei n.º 165/IX - Estabelece a inversão do ónus da prova no âmbito da prestação de serviço público (PCP) não mereceu aprovação na generalidade.
Por último, foi aprovada, em votação final global, a proposta de lei n.º 55/IX - Altera o n.º 22 do artigo 11.º e o artigo 33.º do Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 41 969, de 24 de Novembro de 1958. Produziram declarações de voto os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Eduardo Cabrita (PS) e Hugo Velosa (PSD).
A Câmara procedeu, ainda, à apreciação do relatório sobre a participação de Portugal no processo de construção da União Europeia - 2001, tendo feito intervenções os Srs. Deputados António Nazaré Pereira (PSD), João Teixeira Lopes (BE), Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP), Alberto Costa (PS) e Honório Novo (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Jorge Fidalgo Martins
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Eduardo Artur Neves Moreira
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela

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Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares
João Cardona Gomes Cravinho
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís José Vieira Duque
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Vicente José Rosado Merendas

Bloco de Esquerda (BE):
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos aguardar um momento que os membros do Governo dêem entrada na Sala.

Pausa.

Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, vamos dar início aos nossos trabalhos. A ordem do dia de hoje começa com o debate mensal com o Primeiro-Ministro.
Para iniciar o debate, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, que dispõe, para o efeito, de 12 minutos.

O Sr. Primeiro-Ministro (Durão Barroso): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Escreve-se no Iraque uma página marcante da História Contemporânea. É a vitória da liberdade. É a derrota da ditadura e do terrorismo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - No Mundo em que vivemos - um Mundo quantas vezes sem referências, sem princípios e sem orientações -, os valores nem sempre se impõem por si mesmos. É preciso muitas vezes a coragem de os defender

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e fazer prevalecer. Foi o que sucedeu no Iraque - a vitória da coragem contra o medo de assumir convicções.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Portugal orgulha-se de ter estado do lado certo da História. Do lado das convicções e dos valores democráticos. Do lado da liberdade e da justiça.
Por isso, juntamos hoje a nossa voz à dos democratas do Mundo inteiro para exprimir duas palavras muito simples.
Uma palavra de congratulação pelo fim de uma ditadura cruel que oprimia o Iraque e ameaçou a comunidade das Nações; a brutalidade e a crueldade do regime deposto encontram-se, finalmente, a nu; a miséria em que vive o povo iraquiano e o contraste com o regime cleptocrático deposto são evidentes. Pelo que, neste caso, não ver a realidade é mau, mas não desejar vê-la é muito pior!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Uma palavra, também, de apoio e solidariedade ao povo iraquiano. Este povo, com cultura, memória e história, precisa do nosso apoio e merece a nossa ajuda. Temos a obrigação de ajudar a nação iraquiana a cumprir a esperança e a construir a liberdade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em 9 de Abril, dia em que foi derrubada a estátua de Saddam Hussein no centro de Bagdade, afirmei publicamente que era "importante iniciar-se um movimento de unidade da comunidade internacional de apoio a um Iraque que todos desejamos ver livre e democrático". Com esta afirmação quis significar que mais relevante do que recordar o passado era, e é, preparar o futuro.
As divergências que condicionaram este processo devem ser superadas. Uma coligação global de apoio ao povo iraquiano deve ser empreendida.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Ajudar à estabilização do país, garantir a satisfação das necessidades básicas da sua população e pôr em marcha o processo de reconstrução económica e política do Iraque - são estas as três grandes prioridades.
Uma resolução adequada da crise do Iraque contribuirá também para uma melhoria da situação regional, podendo gerar sinergias positivas para o processo de paz do Médio Oriente.
Portugal apoia totalmente os esforços do quarteto para implementar o chamado "Roteiro para a Paz" e deseja que, no mais curto prazo possível, co-existam em paz os Estados de Israel e da Palestina.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Aquilo que nos une no futuro - trabalhar pela paz, ajudar à construção de um novo Iraque, livre e democrático - é mais importante do que aquilo que conjunturalmente nos possa ter dividido no passado.
Foi esta, também, a mensagem que o Secretário-Geral das Nações Unidas há dias nos deixou.
Kofi Annan foi muito claro quando afirmou perante o Conselho de Segurança: "Peço-vos que ponham de lado divergências passadas e que se interroguem sobre o que melhor poderá ajudar o povo iraquiano. O seu interesse deverá vir primeiro. O objectivo supremo deverá ser possibilitar ao povo iraquiano tomar conta do seu próprio destino".
À semelhança dos nossos parceiros, acreditamos que as Nações Unidas deverão desempenhar um papel central no Iraque. E como? Através daquilo que elas sabem fazer melhor, nos domínios humanitário e político, e um papel crescente no que diz respeito à reconstrução do Iraque.
Mas importa, desde logo, assegurar dois objectivos: primeiro, garantir que caberá aos iraquianos assumirem progressivamente o papel central na sua governação, devendo toda a presença internacional ser instrumental em relação a tal objectivo; segundo, evitar solicitar às Nações Unidas que tentem fazer mais do que aquilo que realmente podem dar, porque tal poderia revelar-se fatal para a credibilidade da própria Organização.
Noto, a propósito, que Kofi Annan nunca reclamou para a Organização que dirige o papel de administrar o Iraque.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Foi esta orientação que nos levou a fazer parte da coligação política que apoiou de forma vitoriosa a intervenção no Iraque. É esta mesma orientação que pautará a nossa acção futura.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O tempo, agora, não é de discussões semânticas ou formais. O tempo, agora, não é de debates estéreis sobre o passado. O tempo, agora, é de agir.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Iraque é, actualmente, a mais relevante questão da agenda internacional. Estou seguro de que o modo como olharmos para esta questão vai condicionar (e muito!) o futuro das relações internacionais.
Portugal não pode passar ao lado desta questão, sob pena de ser, no plano político e diplomático, um País periférico, marginal ou irrelevante.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Temos de ter uma voz credível e respeitada no exterior. Respeitada pelos valores que defende, mas também pelas acções concretas que tem coragem de empreender.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Nas grandes questões de política externa só realmente conta quem está presente, quem intervém, quem participa.
Fazer parte, como fizemos, da coligação política que apoiou a intervenção no Iraque reforçou o prestígio e a credibilidade de Portugal. Estou seguro de que, hoje, contamos mais do que contávamos há um ano atrás.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Participar agora na ajuda à estabilização e reconstrução do Iraque é a única via consistente, coerente e consequente com o interesse nacional. Seria incompreensível, e altamente lesivo do interesse nacional, que agora, depois de tudo aquilo que fizemos, nos auto-excluíssemos desse esforço global.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por estas razões, de defesa de valores humanistas e de afirmação do interesse de Portugal, o Governo, no quadro das suas competências constitucionais, tomou a decisão que hoje, em primeira mão e por respeito para com o Parlamento, aqui, publicamente, anuncio: a decisão de participar no esforço internacional de apoio à estabilização e reconstrução do Iraque.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Esta decisão será materializada por três formas.
Primeira, Portugal irá disponibilizar uma Companhia da Guarda Nacional Republicana, num total de cerca de 120 elementos, para colaborar na segurança do Iraque. Estamos também abertos a ponderar, numa fase subsequente, o eventual envio de um contingente militar, caso seja obtido um enquadramento apropriado em termos internacionais.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Segunda, Portugal decidiu reforçar a ajuda humanitária de emergência, nomeadamente através do incremento do apoio às organizações não-governamentais portuguesas que desejem intervir no Iraque.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Terceira, noutro plano, os Ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Economia estão a trabalhar em conjunto no apoio a empresas portuguesas potencialmente interessadas em trabalhar no Iraque. Este processo será acelerado com a reabertura, ainda esta semana, da nossa representação diplomática naquele país.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Desejo, a este respeito, deixar claras as nossas orientações. Se empresas portuguesas vierem a trabalhar no Iraque, isso é bom para o Iraque, é bom para as empresas portuguesas e é bom para Portugal!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Considero, por isso mesmo, uma grande irresponsabilidade afirmações produzidas nos últimos dias por dirigentes do maior partido da oposição, segundo as quais a ida de empresas portuguesas para o Iraque seria uma actuação censurável e ilegal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Afirmações dessa natureza, devo dizê-lo, revelam um sectarismo primário e são claramente contra o interesse nacional.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A afirmação de Portugal na Europa e no Mundo é uma prioridade da nossa acção.
Portugal afirma-se construindo uma economia sólida e um País competitivo. É o que estamos a fazer, com uma política económica correcta e clara, que vamos manter, prosseguir e aprofundar. Só esta política económica nos vai permitir ultrapassar a crise, construir o progresso e vencer no futuro.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Portugal afirma-se sendo um País activo, não um País neutral, tendo uma voz firme, não uma voz hesitante, assumindo a coragem de agir e de intervir, e não o medo de falar ou de participar.
É o que estamos a fazer, na União Europeia, na Aliança Atlântica, nas Nações Unidas. Nunca nos remeteremos à posição de uma mera região da Europa ou da Península. Afirmamos posições, tomamos decisões, participamos nas mais relevantes acções no plano internacional.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Esta é também, na questão do Iraque, a única escolha válida, a opção pelo interesse nacional.
Mais uma vez, quando está em causa a mudança internacional, Portugal diz: "Presente!". Estaremos presentes, como sempre, em nome de Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o debate inicia-se, como sempre, com a intervenção do líder do primeiro partido da oposição.
Tem, portanto, a palavra o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues. Dispõe, para o efeito, de cinco minutos.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, perante o agravamento da insegurança e da desconfiança em Portugal, tive ocasião, há 15 dias, de incentivar V. Ex.ª a responder através da Assembleia da República sobre vários temas. Nomeadamente sobre o que iria fazer perante o desemprego crescente; se vai ou não "dar luz verde" ao investimento público, que tão necessário é para recuperar da recessão em que nos afundamos; que medidas vai tomar para combater a pobreza; se vai desistir daquilo que já foi referido como "manigâncias à volta da tentativa de resolução artificial do descalabro orçamental deste ano", através dos fundos de pensões dos CTT; e também sobre este sobressalto que é a estabilidade e a imagem governativas estarem dependentes de depoimentos num julgamento.
Sr. Primeiro-Ministro, nos últimos 15 dias, todos estes problemas, todos estes indicadores de instabilidade se agravaram - do desemprego à recessão, dos fracassos orçamentais à desconfiança dos portugueses.
Quis, no entanto, V. Ex.ª vir falar-nos de uma escalada no envolvimento português no Iraque. É também um assunto grave! Vamos, portanto, discutir, hoje, apenas este assunto. Até porque, infelizmente, as outras matérias vão manter-se muito actuais durante os próximos meses e, Sr. Primeiro-Ministro, queira ou não queira, no debate sobre o estado da Nação, vai ser obrigado a responder a

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essas questões, às quais não se pode furtar. Haverá mais oportunidades para debater estes problemas!…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, as sucessivas acções e declarações do Governo de V. Ex.ª, no apoio explícito ao desencadear de uma acção ilegítima e ilegal à margem do Conselho de Segurança, constituíram actos de extrema gravidade para Portugal, que quebraram o consenso nacional na política externa.
Com esta posição, Portugal ficou ligado a acções ilegítimas que puseram, directa e frontalmente, em causa a ordem internacional vigente e que, além do mais, têm consequências ainda incalculáveis para a construção da União Europeia.
Sr. Primeiro-Ministro, não queremos que a ligação de Portugal a acções ilegítimas se intensifique. Já basta o que basta, Sr. Primeiro-Ministro!

Aplausos do PS.

As forças que ocupam o Iraque, nos termos das Convenções de Genebra, têm a obrigação de assegurar a lei e a ordem no Iraque. Não o têm feito eficazmente, como está à vista desde o início da ocupação. Por isso, tratam de alijar para cima de uma missão de estabilização essas responsabilidades que não cumprem.
Sr. Primeiro-Ministro, o PS veria favoravelmente uma intervenção apoiada pela União Europeia, suportada pela NATO, e com "luz verde" das Nações Unidas. Não é isso que o senhor nos vem aqui dizer. O senhor vem aqui propor-nos o envio de forças portuguesas - e para nós é indiferente que sejam militares, paramilitares ou policiais - para participar numa missão no Iraque, sem estar legitimamente apoiada, a nível internacional.
Portanto, não pode contar com o nosso apoio nessa matéria!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Mas pode contar com o apoio do BE!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, não vimos os cravos e as rosas por parte da população do Iraque!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É pena!…

O Orador: - Parecia, pelo tom épico da sua intervenção, que todo o mundo teria visto, depois da intervenção anglo-americana!…
Sr. Primeiro-Ministro, consideramos que há, efectivamente, que apoiar a reconstrução do Iraque, mas num quadro de legalidade internacional.
Convém não esquecer que a guerra pode ter terminado, mas as hostilidades não cessaram ainda e, sejam soldados, sejam forças militarizadas ou de segurança, não temos dúvidas de que esses homens e essas mulheres aceitarão pôr as suas próprias vidas ao serviço de missões em defesa dos interesses e do prestígio nacional. Mas para isso é absolutamente necessário que haja um respaldo na legalidade internacional de tais missões. De outra forma, isso será muito mau para quem arrisca a vida a favor do nosso país.

Aplausos do PS.

Para terminar, Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de dizer-lhe o seguinte: se no plano internacional o direito e a legalidade são questões formais e teológicas, então, Sr. Primeiro-Ministro, por que não considera também na ordem interna portuguesa essas questões de legalidade como questões teológicas e como questões formais?
São palavras - essas, sim - irresponsáveis e levianas. E é gravíssimo o precedente que este Governo quer abrir: o de colocar Portugal, pela primeira vez, com forças no terreno, numa missão que não está escudada nem apoiada, mesmo a posteriori, por qualquer resolução das Nações Unidas.
Por esse caminho não vá, Sr. Primeiro-Ministro! Assim não, Sr. Primeiro-Ministro!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, dispondo, para o efeito, de cinco minutos.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues, em primeiro lugar, tomo nota de que V. Ex.ª nem sequer quis ter uma palavra de congratulação pela queda de uma das mais brutais ditaduras do século XX.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em relação às outras questões económicas e sociais que V. Ex.ª evocou, quero dizer-lhe que não me furto, nunca me furtei, nem nunca fugi de qualquer debate. Estou aqui hoje também pronto a responder a qualquer uma das vossas questões, tal como estarei, naturalmente com muita satisfação, no debate do estado da Nação. Nós, nesta matéria, podemos, de facto, afirmarmo-nos como um exemplo em termos de debate com a Assembleia da República.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não nos furtamos e não fugimos desse debate.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª diz que, sem o mandato das Nações Unidas, Portugal não pode tomar esta decisão. Já pensou bem no que está a dizer, Sr. Deputado? Quer isto dizer que, se, amanhã, um país nosso amigo, vamos supor Angola, Cabo Verde ou S. Tomé e Príncipe, nos pedir para integrarmos uma força de segurança ou uma força de paz nesse país, não poderemos intervir sem uma mandato explícito das Nações Unidas?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

V. Ex.ª adere à doutrina da soberania limitada para um país como Portugal? A França, para intervir na Costa do Marfim, precisou de algum mandato das Nações Unidas?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado, para além dos Estados Unidos e do Reino Unido, já anunciaram que participarão nesta força de

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estabilização a Holanda, a Itália, a Dinamarca, a Noruega, a República Checa, a Polónia, a Bulgária, a Roménia, a Hungria, a Eslováquia e a nossa vizinha Espanha. V. Ex.ª quer que a Espanha esteja na primeira linha e que Portugal se remeta a uma posição de indiferença ou de irrelevância.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Uma vergonha!

O Orador: - A verdade é que tomámos a posição que é coerente e consequente com o apoio político que afirmámos na fase do conflito. Disponibilizaremos uma força de cerca de 120 elementos da GNR, que serão recrutados numa base de adesão voluntária.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Estaremos presentes no plano da estabilização, no plano da ajuda humanitária e também, porque não dizê-lo, no plano da cooperação empresarial.
V. Ex.ª, agora, tentou corrigir as afirmações da sua porta-voz para as questões externas, que disse que só com um mandato das Nações Unidas, porque nem uma decisão da União Europeia seria suficiente para que Portugal participasse numa operação de paz ou numa missão de estabilização.
Sr. Deputado Ferro Rodrigues, deixe-me dizer-lhe que essa não é, de facto, a nossa visão de Portugal. A nossa visão de Portugal é a de um país na primeira linha…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … em tudo o que tem a ver com a liberdade; na primeira linha em tudo o que tem a ver com a reconstrução de uma nova ordem internacional; na primeira linha em tudo aquilo que tem a ver com a afirmação do País no plano internacional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não nos podemos demitir de estar presentes.
Esta questão do Iraque será decisiva neste novo século. Poderá ser muito positiva também para se encontrar, finalmente, um avanço sensível na questão do Médio Oriente e, sobretudo, para os direitos do povo palestiniano. É, por isso, pena que, mais uma vez, o Partido Socialista, em vez de estar com a maioria, procure juntar-se às forças mais radicais do espectro político e não esteja disponível para, nesta ocasião, reconstruirmos o consenso sobre a política externa que, ao longo de tantos anos, foi património da nossa democracia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para replicar, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues. Dispõe, para o efeito, de 3 minutos.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, efectivamente temos divergências muito fortes: o senhor quer estar na primeira linha em tudo, independentemente da moral, da ética e do direito internacional; nós estaremos na primeira linha quando for respeitado o direito internacional.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PSD: - Da moral?!…

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, em matéria de luta contra a ditadura não recebemos, ninguém desta bancada recebe lições nem do Sr. Primeiro-Ministro, nem do PSD, nem do seu parceiro de coligação. Não recebemos lições!!

Aplausos do PS.

É evidente que a queda do regime de Saddam Hussein era algo de absolutamente natural…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Natural?!

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - Depois daquilo que aconteceu, do cerco e da invasão americana, é a única parte positiva de tudo isto - por isso, não é preciso "estar a chover no molhado"…!

Protestos do PSD.

Vejo que a bancada do PSD também defende ela própria a "lei da selva", a lei dos mais fortes, dos com mais número!

Vozes do PSD: - Oh!…

O Orador: - Podem gritar à vontade que não intimidam ninguém nesta bancada!
A defesa dessa lei do mais forte não é aquilo que nós prezamos!
Devo dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que soberania limitada é Portugal estar às ordens e de cócoras perante a Administração Bush ou num seguidismo de "macaquear" o Sr. Aznar. Isso é que é soberania limitada!

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, as Nações Unidas fizeram um apelo à contribuição dos Estados para a recuperação da situação humanitária no Iraque e o Ministério dos Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas anunciou, recentemente, a concessão de 1 milhão de euros para a ajuda humanitária ao Iraque. Gostaria de lhe perguntar se essa contribuição beneficiou algumas ONG portuguesas, como a AMI, cujos médicos e paramédicos voluntários nem facilidades de licença receberam dos seus empregadores estatais ou outros, como a imprensa portuguesa recentemente noticiou? Sobre isso o que tem feito o Governo português?
O que tem feito o Governo português para disponibilizar centros de saúde e hospitais em Portugal para os feridos que, no Iraque, não têm tratamento? Essa, sim, seria uma acção que honraria Portugal e a sua posição

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humanitária à escala internacional. Mas em relação a isso nada fazem.

Aplausos do PS.

A vossa única preocupação é estarem com os senhores da guerra. A única preocupação do Dr. Durão Barroso é estar ao lado do Sr. Bush, quer ele aja bem ou mal, quer ele tenha uma posição correcta ou incorrecta,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois esgotou o seu tempo.

O Orador: - … quer ele esteja na legalidade ou na pura ilegalidade, como ainda continua a estar.
Não, Sr. Primeiro-Ministro!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues, a verdade é esta: se o mundo tivesse seguido a posição do Partido Socialista, o ditador Saddam Hussein ainda estava em Bagdade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António José Seguro (PS): - E os outros?!…

O Orador: - O Sr. Deputado recusa qualquer envolvimento de forças militares ou de segurança nesta fase. Qual é a alternativa? Qual é a alternativa perante a situação de facto que existe no Iraque?

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - A humanitária!

O Orador: - Só a ajuda humanitária? Nós estamos a favor da ajuda humanitária. Mas para ela chegar ao seu destino é necessário que haja forças de segurança e estabilidade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Na prática, o Sr. Deputado arranja um pretexto, porque não tem a coragem de decidir. Pela minha parte, quero dizer-vos que, para mim, soberania é ter a coragem de tomar de decisões,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … sem estar sistematicamente à espera de que os outros tomem decisões e de que Portugal se limite a ir atrás dessas decisões.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Somos a favor da ajuda humanitária. Anunciámos já um determinado montante e, hoje mesmo, disse da minha disponibilidade para aumentarmos a contribuição,…

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Onde é que foi?

O Orador: - … respondendo aos pedidos que, nesse sentido, nos forem dirigidos pelas Organizações Não Governamentais portuguesas. No que diz respeito à AMI, em concreto, foi por iniciativa do Ministério dos Negócios Estrangeiros que se estabeleceu esse contacto.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Não têm médicos!

O Orador: - Essa organização não nos pediu, até à data, qualquer apoio financeiro para o Iraque.

Protestos do PS.

Estamos disponíveis para apoiar a ajuda humanitária, mas o seu discurso de ajuda humanitária é uma fuga à coragem de tomar a decisão para a estabilização do Iraque.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Nós estamos a favor de uma acção de conjunto no Iraque.

Protestos do PS.

Por isso, digo, Sr. Deputado, a terminar: sim, de facto, é verdade, queremos estar na primeira linha. Queremos estar na primeira linha na Europa, no mundo e sempre que estiver em causa o futuro da comunidade internacional.
Não me resigno à ideia de que Portugal seja uma mera região da Europa ou da Península. Não me resigno a que tenhamos uma política externa própria e que digamos "presente", lá quando os nossos vizinhos e outros países, nossos parceiros, também afirmam a sua capacidade de tomar decisões no mundo contemporâneo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva. Dispõe de cinco minutos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de entrar na matéria do debate, quero abordar aqui uma questão prévia. Hoje, é o Dia Nacional da Segurança Social e tal não podia deixar de merecer aqui uma especial referência. O Governo resolveu, e bem, assinalar esta circunstância…

Risos do PCP.

… com um anúncio público, ontem, por seu intermédio, de duas importantes medidas de protecção das famílias mais pobres. Refiro-me às novas regras do abono de família que beneficiam as famílias mais numerosas e as mais carenciadas; refiro-me à criação de um 13.º mês de abono de família para apoiar as famílias mais pobres, na compra de material escolar para os seus filhos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Estão, assim, V. Ex.ª e o Governo, bem como os portugueses, em especial os mais carenciados, de parabéns!

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - É preciso ter lata!...

O Orador: - Isto prova bem que o rigor nas contas públicas tem, de facto, a sua razão de ser: é a razão de ser instrumental de que V. Ex.ª, ontem, falava e que tem aí os seus resultados positivos.

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

Poupa-se no desperdício para se investir mais na solidariedade e justiça social. Prova-se que há, realmente, "mais vida" para além das contas públicas e do défice; e essa "mais vida" é esta justiça social que este Governo está a fazer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Primeiro-Ministro, antes de mais, quero aqui saudá-lo pela circunstância de, mais uma vez, ter tido a atitude de respeito e procurar, como Primeiro-Ministro, colaborar na dignificação da Assembleia da República.

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª e outros Membros do Governo foram insistentemente assediados para dizerem qual seria o grau de intervenção de Portugal nesta fase de consolidação da paz no Iraque, mas fez questão de vir aqui, à Assembleia da República,…

Protestos de alguns Deputados do PS.

… em primeira mão, anunciar qual vai ser essa intervenção. Obrigado, pelo contributo que dá para o reforço da nossa democracia parlamentar!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quero aqui salientar três pontos. Em primeiro lugar, a queda da ditadura de Saddam Hussein que foi um momento histórico de particular significado para todos, repito: para todos os democratas. É um momento de esperança para o povo iraquiano. Portugal, através do seu Governo, esteve do lado certo deste conflito: do lado da democracia e da liberdade contra a tirania e o despotismo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Assumimos as nossas responsabilidades. Não temos a cultura da fuga, temos a cultura de dignificação do País; temos a cultura de credibilidade externa do País; temos a cultura de dignificação das instituições. Esta é a nossa forma de estar!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Venceu a democracia, triunfou a comunidade internacional. Portugal também saiu vencedor: Portugal reforçou o seu prestígio e a sua credibilidade na Europa e no mundo. Parabéns, Sr. Primeiro-Ministro, pela posição de Portugal, pela posição assumida pelo Governo português!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A segunda questão que aqui quero referir é a circunstância de termos apoiado politicamente a intervenção no Iraque e de, em coerência, termos agora de estar presentes nesta fase de conciliação da paz e de reconstrução do Iraque. Esta é a única posição que defende o interesse nacional e afirma correctamente Portugal na ordem externa.
Seria irresponsável que Portugal estivesse ausente, quando a Espanha, como V. Ex.ª já referiu, está presente; quando a maioria dos países da União Europeia está presente; quando a maioria dos países da NATO está presente. Portugal já não está, felizmente, no "orgulhosamente só"; Portugal não está numa posição isolada. Portugal tem de estar na defesa dos princípios e valores que, secularmente, através da sua História, ajudou a consolidar e a espalhar pelo mundo fora. Portugal tem de participar. É assim que se defendem o interesse nacional e o respeito externo do País.
Sr. Primeiro-Ministro, tem V. Ex.ª reparado que algumas personalidades, nos últimos dias, vieram defender a retirada imediata das forças internacionais do Iraque. O que quero perguntar-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, é se a posição desses cidadãos, para ajudar Portugal, não seria melhor a de não terem ressentimentos pelo facto de as coisas terem corrido bem ao contrário do que pensavam e se não deveriam assumir agora uma posição clara, de solidariedade, de apoio, do tal consenso da política externa de que V. Ex.ª falava.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É pelos valores e pelos princípios que este Governo se move, interna e externamente. É com esses valores e esses princípios que o Grupo Parlamentar do PSD está, e vai apresentar, conjuntamente com o CDS-PP, um voto de apoio a esta decisão desta intervenção de Portugal nesta fase de consolidação da democracia e da liberdade no Iraque.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, muito obrigado, desde logo, pela mensagem que nos endereça a propósito da decisão, ontem, anunciada, em relação ao novo regime do abono de família. No que diz respeito à questão do Iraque, mais uma vez venho a esta Assembleia. É a quinta vez que venho ao Plenário da Assembleia da República, o que é um sinal do meu profundo respeito por este órgão de soberania. Por isso, congratulo-me com a decisão que os dois partidos da maioria anunciam de apresentarem uma nova resolução sobre esta matéria. O Governo sente-se apoiado nesta orientação.

Protestos do PS.

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É importante que a Assembleia da República, ao contrário do que aconteceu no passado, onde nunca um primeiro-ministro veio, antes da intervenção,…

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - … apresentar a sua posição em Plenário…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É importante, dizia eu, que a Assembleia da República diga, claramente, onde está e o que quer.

O Sr. José Magalhães (PS): - Qual é a credencial legal?

O Orador: - A verdade é que notei, na intervenção do líder do maior partido da oposição, alguma incomodidade por termos escolhido este tema.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Está a falar comigo ou com o Deputado Guilherme Silva, Sr. Primeiro-Ministro?…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - O Jaime Gama já se foi embora!

O Orador: - Mas…

Protestos do PS.

Contraprotestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tenham calma, por favor. Os vossos apartes não podem impedir o Sr. Primeiro-Ministro de usar da palavra, conforme é seu direito. Peço silêncio!

O Orador: - Essa incomodidade, que, agora, é confirmada por este sinal de nervosismo,…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… não é compreensível.

Vozes do PS: - É um frente a frente!

O Orador: - Porque este tema devia ser, hoje, desejado por todos os partidos da oposição. A verdade é que lhe deram grande importância. Se não fosse importante, por que razão é que apresentaram quatro moções de censura ao Governo, precisamente sobre a questão do Iraque?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado Guilherme Silva, respondendo à sua pergunta, em política temos de pensar, sempre, em termos de alternativas, senão, não estamos a ser responsáveis.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Exactamente!

O Orador: - A ética da responsabilidade obriga-nos a pensar na alternativa. É completamente irresponsável, neste momento, defender a retirada das forças da coligação do Iraque. Isso seria entregar o Iraque à "lei da selva".

Vozes do PSD: - Claro!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - À "lei do PS"!

O Orador: - Isso seria entregar o Iraque a uma situação de total imprevisibilidade, à desordem, à anarquia, ao caos. Por isso, em termos de responsabilidade, temos o dever de defender uma intervenção da comunidade internacional, no Iraque. Dir-se-á: devem ser as Nações Unidas,…

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

… mas já repararam, Srs. Deputados, que, até agora, o Secretário-Geral das Nações Unidas não reivindicou nem pediu esse papel? Precisamente, porque o Secretário-Geral das Nações Unidas está interessado, isso sim, em levar as Nações Unidas para aquilo que podem fazer melhor e não em sacrificar ou em prejudicar as Nações Unidas, numa missão que dificilmente poderia desempenhar.

Protestos do Deputado do PCP Carlos Carvalhas.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Mas a GNR já pode!

O Orador: - Por isso, a nossa posição é correcta e, mais uma vez, equilibrada: queremos as Nações Unidas no processo, queremos a União Europeia no processo.
Mas há que reconhecer a situação de facto que existe no Iraque. Há que participar na estabilização e há que, progressivamente, ir aumentando o papel das Nações Unidas, com um objectivo central que não é uma questão meramente formal. O objectivo central é trabalhar para que, tão cedo quanto possível, o povo iraquiano possa, ele próprio, tomar conta do seu destino, mas desta vez, agora, vai mesmo fazê-lo, porque desta vez terá a liberdade que não tinha durante o regime de Saddam Hussein.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Informo a Câmara de que o Sr. Deputado Guilherme Silva fez saber à Mesa que não utilizará o direito de réplica. Assim, vou dar a palavra ao orador seguinte, para uma intervenção.
Faça favor, Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Começo, Sr. Primeiro-Ministro, por uma primeira palavra normal e natural para, na pessoa de V. Ex.ª mas também na do Sr. Ministro Bagão Félix, saudar particularmente as medidas ontem anunciadas.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - O Governo demonstra que num período de dificuldade, num período de crise, como tinha feito já, por exemplo, com o rendimento mínimo, o quer dar mais a quem mais precisa e dar menos aos mais abastados.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Não somos neoliberais. A justiça social é o nosso critério e é o critério deste Governo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Indo directamente à questão e ao tema de hoje, Sr. Primeiro-Ministro, dizer-lhe que Portugal teve, desde o início, uma posição correcta,…

Risos do Deputado do PCP Honório Novo.

… do nosso ponto de vista, e, por isso, subscreveremos o voto a apresentar.
Nós estivemos, desde o início, inquestionavelmente, pelo derrube da ditadura e da tirania.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Portugal foi corajoso no apoio aos aliados. Era só o que faltava que não tivesse agora o direito, mas também o dever, de participar nas operações de paz…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … e na reconstrução do Iraque.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Falam-nos em ética e em moral. Mas que ética e que moral é que podem sustentar um regime como o de Saddam Hussein?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Eu não gosto, sequer, das carantonhas e não gosto sequer de representação.

Risos do PS e do PCP.

Mas aqueles que não levantaram a mão, aqueles que não levantaram um dedo para que os tiranos de Bagdade caíssem,…

Vozes do PS e do PCP: - Oh!…

O Orador: - … os que não mexeram uma palha para que os tiranos de Bagdade caíssem -, …

Protestos do PS e do PCP.

… Saddam Hussein e os outros todos, o filho e todos os outros assassinos -, agora que eles caíram, o que é que querem?

Protestos do PS e do PCP.

Eram contra a guerra. Agora, são contra a paz?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Podemos perguntar se os senhores que, todos juntos, andaram debaixo da bandeira do Che Guevara, a gritar contra a guerra e contra o governo português,…

Protestos do PS.

… agora, também se vão manifestar, no próximo sábado, contra as iniciativas humanitárias,…

Risos do PCP.

… contra a segurança no Iraque, contra as operações de paz, contra a ajuda humanitária?

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Com uma bandeira do Saddam!

O Orador: - Vão? É uma pergunta que faz todo o sentido.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No momento em que o Sr. Primeiro-Ministro nos diz que tantos países, como a Espanha, a Holanda, a Dinamarca, a Roménia, a Hungria, a Eslováquia, todos aqueles que aqui foram mencionados pelo Sr. Primeiro-Ministro, quando todos estes países…

Vozes do CDS-PP: - Até a Alemanha!

O Orador: - … vão participar numa coligação internacional para garantir a reconstrução do Iraque, estarão todos errados?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Estarão todos estes países fora do Direito internacional? Só o PS e o Dr. Ferro Rodrigues é que estão no Direito internacional? Todas estas nações estão fora?
Só há uma coisa que pode justificar esta posição, Sr. Primeiro-Ministro: é que estiveram errados, no princípio, estiveram errados em relação à intervenção, continuam agora mais errados do que nunca, porque agora não há, sequer, um argumento. Só um enorme ressentimento pode justificar esta posição; só por ressentimento podem defender esta posição!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O ressentimento de quem não é capaz de dar o braço a torcer!
Sublinho, Sr. Primeiro-Ministro, dirigindo-me a si,…

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Ah! Até que enfim!

O Sr. José Magalhães (PS): - Finalmente!

O Orador: - … que a questão que se coloca, neste momento, como foi referido por si e pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, várias vezes, é a de saber o que é útil para a comunidade internacional.
Reparemos nos sinais que a própria Alemanha dá de apaziguamento, de tentativa de junção de posições.
Reparemos que a única coisa útil para a comunidade internacional, neste momento, em que o conflito parou, é juntar esforços, é apaziguar divergências, é unir a Europa, é trabalhar com os Estados Unidos, é reforçar a relação transatlântica. Este é o único sentido útil, este é o sentido da História e este é o sentido em que Portugal deve estar.

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Mas está aqui também em causa a ideia que temos de Portugal: nós não aceitamos um Portugal pequeno, a pensar pequeno, a pensar, forçosamente, pequeno,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … um Portugal fora do mundo, isolado das outras nações. Nós não aceitamos esta ideia! Portugal não é um mero mandatário, Portugal é um Estado soberano que toma as suas decisões em função do interesse nacional.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Não somos um mero mandatário!
Quero sublinhar, Sr. Primeiro-Ministro, que se, de hoje para amanhã, Portugal tiver de prestar auxílio, por exemplo, a um país lusófono, não ficará à espera de ninguém para o fazer. Certamente, isso não sucederá e Portugal irá dar esse apoio humanitário, como vai fazer agora.

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é um cenário parecido!

O Orador: - A última palavra que quero deixar aqui, Sr. Primeiro-Ministro, e que deveria ser uma palavra de todos nesta Assembleia,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas não é!

O Orador: - … vai no sentido de dizer que aqueles que vão para o Iraque, os homens das nossas forças policiais que vão para o Iraque deviam ser apoiados, bem como o seu acto de coragem.
O que eu sinto, e toda a Assembleia devia senti-lo, é orgulho no trabalho deles, porque, com eles, vai o nome e o prestígio de Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, agradeço as palavras de apoio ao Governo, no que diz respeito à decisão relativa ao abono de família, e a muito justa referência ao Sr. Ministro do Trabalho e da Segurança Social Bagão Félix.
Procurei, ontem, sublinhar um ponto que me parece importante repetir aqui: muitas vezes há tendência para colocar no debate político, de um lado, o rigor, do outro, a justiça social, de um lado, o controlo das contas públicas, do outro lado, o apoio a uma política mais redistributiva… Nada mais errado nessas dicotomias!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É precisamente com uma política de rigor que libertamos recursos para uma política de justiça social mais ambiciosa, e é essa a nossa via!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É cortando no desperdício que podemos investir na justiça social.
Ontem, anunciei a medida que os primeiros esforços de rigor já permitiram concretizar, mas, até ao final da Legislatura, vamos fazer muito mais, em termos de reforma social e de justiça social.
Por isso, vamos continuar a manter a nossa linha, sem vacilar, sem tergiversar, no que diz respeito à política económica de rigor, porque é esse rigor que nos vai permitir ser um país com mais justiça social.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Telmo Correia, V. Ex.ª falou, e bem, no sectarismo de alguns, na "cultura do ressentimento".
Fiz hoje, aqui, um apelo a que nos uníssemos,…

O Sr. José Magalhães (PS): - E que plataforma ofereceu!…

O Orador: - … como, aliás, está a suceder na comunidade internacional. Neste momento, a comunidade internacional procura unir-se! Houve divergências, houve,…

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - E há!

O Orador: - … na União Europeia também houve divergências, houve,…

Vozes do PS: - Há!

O Orador: - … mas estamos a trabalhar para as ultrapassar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Então, trabalhem!

O Orador: - E, neste momento, em que era melhor unirmos esforços, verificamos que, pelo menos, o principal partido da oposição se recusa a uma colaboração com o Governo.
Disse V. Ex.ª que deveríamos estar todos unidos em torno daqueles que, em nome de Portugal, irão participar nesta missão. Deixem-me dizer-vos que escolhemos a GNR,…

O Sr. António José Seguro (PS): - Escolheram mal!

O Orador: - … em larga medida, pelo grande trabalho que fizeram em Timor.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Fiquei extremamente sensibilizado quando vi, em Timor, o Governo, o Presidente da República, os bispos, personalidades importantes, todos, pedirem para que a GNR tivesse ali uma presença efectiva.

O Sr. António Filipe (PCP): - Em Bagdade até já fazem manifestações!

Risos do PCP e do PS.

O Orador: - A verdade é que vos posso dizer que, nos contactos preliminares que já tivemos com alguns dos

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nossos aliados, para a eventual contribuição de forças portuguesas, fiquei extremamente honrado por verificar que não apenas as forças de segurança mas também forças militares portuguesas são extremamente desejadas por alguns dos nossos parceiros.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Isto quer dizer que as nossas Forças Armadas, as nossas forças de segurança já têm, hoje, prestígio internacional e dão a Portugal uma capacidade de intervenção que há alguns anos não tinha.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, vamos ter de esperar mais algum tempo para construir um consenso mais alargado em relação a questões tão importantes da nossa política externa mas, por isso mesmo, quero saudar a maioria por não se abster de tomar a decisão, sem estar à procura de todos para essa tomada decisão.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Uma decisão difícil!

O Orador: - Isso também nos distingue!

O Sr. José Magalhães (PS): - É heróico!

O Orador: - Nós queremos o máximo de consenso nestas matérias, mas, atenção, não ficamos neutralizados nem inibidos pela vossa abstenção ou pela vossa oposição. A nossa convicção não está à espera de que, finalmente, os senhores tomem as vossas decisões.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Telmo Correia fez saber à Mesa que também não utilizará o seu direito de réplica, pelo que dou a palavra, para formular perguntas, ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o que fica cada vez mais claro é que o que esteve em causa no Iraque não foi o derrube de Saddam mas, sim, o controlo dos poços de petróleo e o domínio da região.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - Portugal esteve ao lado da guerra, do bombardeamento do Iraque, e continua na mesma posição.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Fale de Cuba!

O Orador: - Para o Sr. Primeiro-Ministro, as posições da França, da Alemanha, do Papa,…

Vozes do CDS-PP: - Do Papa?!…

O Orador: - … das opiniões públicas são posições contra a liberdade.
O porta-voz das Nações Unidas para o Médio Oriente disse, há dois dias, Sr. Primeiro-Ministro, que a guerra do Iraque era uma guerra ilegítima, que as forças que estão no Iraque são forças de ocupação…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - … e que, como forças de ocupação, à luz da Convenção de Genebra, têm a responsabilidade da protecção civil e da satisfação das necessidades básicas das populações.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Vergonhosamente, a nação mais poderosa do mundo, com todos os meios de que dispõe, 13 semanas depois, repito, 13 semanas depois da ocupação, ainda não conseguiu abastecer os hospitais com medicamentos.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Aceitou o saque de museus e de bens públicos porque a estabilidade que os preocupa é uma única: é a estabilidade dos poços de petróleo.
Várias organizações da ONU queixam-se de que não podem actuar no Iraque. A organização Médicos Sem Fronteiras afirmou, anteontem, que ainda não há, em Bagdade, um hospital a funcionar plenamente, responsabilizando as forças de ocupação por tal facto.
O envio de forças portuguesas, Sr. Primeiro-Ministro, neste quadro, sem um mandato da ONU - e a ONU não pode vir a legitimar, a posteriori, uma guerra preventiva e de rapina -, será sempre, à luz do Direito internacional, um acto ilegítimo e de ocupação. Não serão forças humanitárias que vão promover a manutenção da paz, serão forças de ocupação.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E o Sr. Primeiro-Ministro toma essa responsabilidade, a responsabilidade de transformar as forças portuguesas, policiais e militarizadas, que não vão exercer um acto de administração interna, vão levar a força ao exterior, em forças de ocupação, a realizar um acto ilegítimo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Para o Sr. Primeiro-Ministro isto é tudo natural; do nosso ponto de vista, isto é um acto de subserviência, que teve o ponto mais alto na visita do moderníssimo Ministro de Estado e da Defesa Nacional a Washington e continua a pôr em sobressalto a coligação.
Para o Sr. Primeiro-Ministro, o seu afã de agradar ao império e de levar as forças portuguesas a violar o Direito internacional são questões formais e teológicas, como, certamente, questão formal e teológica é o facto de até hoje ainda não se ter preocupado com as armas de destruição massiva, que existiriam no Iraque e que terão dado origem a tal guerra.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É verdade!

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O Orador: - Credibilização da ONU para o Sr. Primeiro-Ministro é o facto de os Estados Unidos se oporem a que os inspectores respectivos possam verificar das tais armas de destruição massiva.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - O Governo português, Sr. Primeiro-Ministro, associou Portugal a um acto vergonhoso de agressão e de ocupação, que levou ao Iraque a morte, os estropiados, a poluição da água, a penúria de alimentos e de medicamentos, as minas e numerosas bombas que não explodiram, muitas das quais se encontram ainda em locais de grande densidade residencial, a destruição dos serviços públicos, as pilhagens, o desemprego crescente, e quer associar Portugal às rapinas que se vão seguir.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Tudo isto, Sr. Primeiro-Ministro, não são questões teológicas e formais, e não são questões teológicas e formais sobretudo para aqueles que entendem que Portugal deve estar aberto ao mundo, deve ter um papel humanitário e humanista, deve ser um Portugal de progresso e justiça, numa Europa e num mundo de paz e cooperação.

Aplausos do PCP.

Vozes de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Fale de Cuba!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, as questões do Iraque são muito importantes, mas era também muito importante que nos dissesse se a sua política nada tem a ver com o disparo do desemprego, com as deslocalizações, com a concentração da riqueza, com as dificuldades que estamos a viver. Seria bom que o Sr. Primeiro-Ministro dissesse se isto tem a ver com o Divino Espírito Santo e nada tem a ver, de facto, com a política que tem vindo a ser seguida.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, tenho também de notar que não ouvi, de V. Ex.ª, nem uma palavra de congratulação pela queda da ditadura de Saddam Hussein.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso já é habitual!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Nem a dirá!

O Orador: - Devo dizer-lhe que tomei nota, por exemplo, de que, no 1.º de Maio, em Bagdade, pela primeira vez, desde há muitos anos, foi possível um partido comunista iraquiano manifestar-se livremente. Isso não era possível durante a ditadura de Saddam Hussein!

O Sr. António Filipe (PCP): - Não nos dá nenhuma novidade!

O Orador: - Esperava que V. Ex.ª falasse, por exemplo, da "cleptocracia" de Saddam e da sua família, do que agora se veio a descobrir, do roubo do banco nacional pela família do ditador, pelo seu filho, da exibição de um luxo que é absolutamente contra a miséria daquela população, das valas comuns, das pessoas que foram torturadas, amputadas, violadas, dizimadas, do genocídio que Saddam Hussein praticou contra uma parte da sua população, nomeadamente contra o povo curdo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PCP.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Com o apoio de quem?!

O Orador: - Mas V. Ex.ª nem uma palavra disse sobre isso.
A verdade, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, é que a democracia ou, pelo menos, a liberdade e a possibilidade de construir uma verdadeira democracia merece, no mínimo, o benefício da dúvida, mas V. Ex.ª não mostra grande sensibilidade a esta questão da democracia, que, para mim e para a maioria desta Câmara, é, de facto, muito importante.
Depois, disse: "Forças de segurança, não! Ajuda humanitária, sim!". Mas eu pergunto: é possível enviar ajuda humanitária, consistentemente, que chegue à população, sem que haja um mínimo de ordem e segurança num país?!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É óbvio!

O Orador: - É óbvio e é uma questão de bom senso que a primeira condição para a paz, para a democracia e para a ajuda humanitária é a existência de um mínimo de ordem e de segurança.
Eu estive em Atenas na reunião em que o Secretário-Geral da ONU disse isso!… As primeiras necessidades do povo iraquiano são a ordem e a segurança, de um lado, a ajuda humanitária, do outro. E a ordem e a segurança têm de ser garantidas!
Há uma situação de facto no Iraque e nós não podemos ignorá-la. É por isso que damos o nosso contributo nos planos que eu referi, no plano da ajuda humanitária, com certeza, mas também, por que não dizê-lo, no plano da ordem e da segurança. E fazemo-lo porque entendo que para além de ser esse o nosso dever de solidariedade é também uma forma de Portugal estar presente numa crise internacional importante, ao lado dos nossos aliados, com certeza, ao lado dos Estados Unidos da América do Norte, com certeza, mas também ao lado de muitos dos nossos aliados europeus.
O Partido Comunista, coerente com a posição que tomou relativamente à Bósnia e ao Afeganistão, não mostra grande satisfação pela acção internacional para mudar o status quo no Iraque.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Pela agressão?!…

O Orador: - Há, de facto, aqui uma grande divergência e eu, quando em matéria de Direito internacional, em matéria de política internacional, verifico a posição do Partido

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Comunista e vejo que estamos em posições diferentes, então tenho quase sempre a certeza de que nós estamos certos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para replicar, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas, que dispõe de 3 minutos.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro veio lembrar toda a Câmara…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Às vezes precisam de ser lembrados!…

O Orador: - … o que era o regime de Saddam. Lembrou até alguma dimensão da sua riqueza e do seu nepotismo, mas eu não lhe ouvi nenhuma palavra, nem ontem nem hoje, sobre os seus vizinhos, sobre a Arábia Saudita (é muito diferente?...) ou sobre os Emiratos Árabes (é muito diferente?...).
O Sr. Primeiro-Ministro, que já tem alguma idade, também sabe que os comunistas que agora celebraram 1.º de Maio no Iraque eram perseguidos por Saddam, mortos ou condenados. No entanto, sobre isso nunca ouvi, de si ou dos Estados Unidos da América, uma palavra.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Ai não?!…

O Orador: - Nessa altura colaboravam com o regime de Saddam.

Aplausos do PCP.

São dois pesos e duas medidas, Sr. Primeiro-Ministro.
E vem o senhor falar da sensibilidade para a liberdade, para a democracia?!… Quem? O senhor?!… O senhor ou alguém das bancadas do Governo ou da maioria pode dar-nos alguma lição sobre liberdade e democracia?!…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

Vozes do PSD: - Pode.

O Orador: - Não, não pode! Nenhuma!!

Aplausos do PCP.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Pode.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, queiram fazer silêncio para podermos ouvir o orador.

O Orador: - O Sr. Primeiro-Ministro está muito contente, muito satisfeito. Está muito satisfeito com os bombardeamentos? Está muito satisfeito com os mortos, com os estropiados? O Sr. Primeiro-Ministro não tem a imagem daquela criança amputada dos braços, que perguntou se era aquela a libertação que vieram trazer-lhes? Não se sente chocado com isso?

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Não.

O Orador: - Não tem filhos? Não olha para as crianças?

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Não.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - Veio o Sr. Primeiro-Ministro dizer-nos que para haver auxílio militar é preciso segurança. Mas a força poderosa de ocupação, os Estados Unidos, não pode estabelecer a segurança? As organizações não governamentais não podem exercer a ajuda humanitária? São precisos a GNR e os polícias portugueses para assegurar a ajuda humanitária portuguesa? Ou o Sr. Primeiro-Ministro, pura e simplesmente, quer também colaborar na ocupação do Iraque para depois ter um dedalzito de petróleo?
Olhe: com esse dedal de petróleo Portugal pode ficar mais rico, mas do ponto de vista da ética, da moral, fica enxovalhado - o seu Governo, não Portugal nem os portugueses!!

Aplausos do PCP.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, durante o conflito, e até antes dele, discutimos várias vezes a questão que colocou, nomeadamente a necessidade ou não da intervenção no Iraque. Tornei, então, clara a nossa posição e expliquei por que é que havia condições para intervir no Iraque, depondo aquela brutal ditadura, e não as havia em relação a outras ditaduras: porque o Iraque violou sistematicamente o Direito Internacional, invadiu dois dos seus vizinhos e apoiou activamente o terrorismo. Foram esses acontecimentos, que não ocorreram nem ocorrem noutros regimes ditatoriais ou autocráticos, que legitimaram uma intervenção da comunidade internacional.
Deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado, que a sua intervenção passou os limites aceitáveis em termos de demagogia. Em termos de demagogia, a sua intervenção pode competir com as mais demagógicas que alguma vez foram feitas nesta Assembleia.
Para nós, tudo o que é uma violação dos direitos humanos é mau, independentemente do regime que pratica essa violação. E eu considero reprovável a violação dos direitos humanos, seja ela feita por um regime de direita ou por um regime de esquerda.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Mas pelos americanos não.

O Orador: - Não faço distinção.
Gostava de saber se o Partido Comunista já tem uma posição clara, por exemplo, quanto a Cuba, se considera que o regime de Cuba é ou não uma democracia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Isso é fuga para a frente!

O Orador: - Gostava de saber se V. Ex.ª condena o assassinato, a frio, de cubanos que lutam pela liberdade, praticados pelo ditador Fidel Castro! Gostava, pois, de

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ouvir, nesta Assembleia, uma declaração clara, simples, de V. Ex.ª sobre isso!
Sr. Deputado, quando condenar Fidel Castro talvez eu o oiça e respeite em matéria de democracia; até lá, as suas posições não me merecem respeito nenhum.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, na verdade, o cinismo da política internacional não tem limites. O que se invocou, errada, ilegal e injustamente como grande argumento para esta intervenção militar foi a existência de armas de destruição maciça. Devo fazer notar que, no longo tempo que leva este debate, o Sr. Primeiro-Ministro não fez sequer uma única referência a este facto.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Esse é, hoje, o embaraço de George Bush, de Aznar, de Tony Blair, e será também o embaraço de Durão Barroso.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Esse é o embaraço de ontem de Collin Powell.
"Provavelmente não encontraremos as armas, mas temos de saber o que é que lhes aconteceu" - foi esta a justificação que o Sr. Primeiro-Ministro aqui deu hoje.
O Sr. Primeiro-Ministro espraiou-se por várias considerações, manifestou o seu regozijo pela libertação do Iraque, mas não nos trouxe uma explicação sobre aquilo que aqui disse ser um factor fundamental do seu apoio à coligação política que ia invadir o Iraque.
De facto, o Iraque está sob uma situação de ocupação por parte de um exército invasor de uma potência ocupante.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - O cinismo na política internacional é manifesto. Temos visto, nos últimos dias, que os Estados Unidos continuam a desenvolver a estratégia Helms-Burton, das companhias detidas por alguns dos principais homens do poder nos Estados Unidos, com interesses no meio petrolífero e no meio da construção, e nós, talvez em miniatura, procuramos agora seguir o mesmo processo.
Disse o Sr. Primeiro-Ministro que o que é bom para o Iraque é bom para Portugal e que bom para Portugal será as empresas portuguesas poderem trabalhar no Iraque.
Sr. Primeiro-Ministro, pensa que se justifica a participação de Portugal numa dita reconstrução do Iraque quando isso é feito a crédito das receitas do petróleo e quando, ainda ontem, o Secretário de Estado do Tesouro norte-americano pedia, instava, que rapidamente as Nações Unidas levantassem as sanções contra esse país, porque os investidores norte-americanos, amigos do povo iraquiano, querem investir rapidamente no Iraque?
É esse o tipo de moralidade, é essa a hipocrisia daquilo que só pode ser descrito como uma operação de saque do Iraque, a crédito das suas receitas futuras. Nada tem a ver com a devolução do Iraque e das suas infra-estruturas aos iraquianos nem com o facto de estes poderem programar, democrática e participativamente, a evolução da vida do seu país e do seu regime.
Sr. Primeiro-Ministro, Portugal já indicou empresas que podem participar nessa operação. Querem, de facto, que, em miniatura, Portugal tenha uma participação do género da que Dick Cheney tem nos Estados Unidos - é o "Portugal dos Pequeninos" associado a esta operação iraquiana.
Sr. Primeiro-Ministro, a participação de forças de segurança e de forças militares portuguesas na actual situação do Iraque é, queiramos ou não, uma colaboração com as forças de ocupação; é mais uma violação do Direito Internacional, que não apaziguará nenhuma das divergências hoje existentes na comunidade internacional e que será contestada, mais uma vez, como todas as outras, por todos aqueles que, no mundo inteiro, querem verdadeiramente o caminho da paz e do Direito Internacional.
Sr. Primeiro-Ministro, a questão que se coloca é a de não ficarmos associados àquilo que é mais uma lesão ao Direito Internacional e ao progresso dos povos. Não é esse o caminho do Governo, mas é o caminho do Bloco de Esquerda e de todos aqueles que, em quaisquer sábados e em todas as partes do mundo, queiram o CDS-PP e o PSD ou não, se manterão na defesa da retirada dos exércitos invasores.
Há formas de devolver o poder àqueles que devem detê-lo. Não vamos pactuar com uma política de protectorado, sabe-se lá por quanto tempo e em que condições. Será que obtiveram alguma informação relevante do General Tommy Franks ou do Secretário de Estado da Defesa dos Estados Unidos sobre quanto tempo aquela administração de plantão, aquele protectorado vai continuar no Iraque? Têm informações acerca disso? Há informações fidedignas e sólidas sobre qualquer processo de transição de poderes, sobre qualquer processo de entrega democrática do poder ao povo iraquiano?
É assim, com um verdadeiro cheque em branco, que participamos numa missão que não pode ser outra senão a da estabilização da ocupação. E de facto, Sr. Primeiro-Ministro,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Termino, Sr. Presidente, repetindo que há cinismo na política internacional. É que, contrariamente ao que o Sr. Primeiro-Ministro aqui disse hoje, não vamos ajudar os iraquianos, vamos, sim, ajudar os americanos.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, na política internacional Portugal tem estado presente com posições orientadas por valores e por interesses. Não é pecado nenhum ter interesses também no plano internacional.
Contudo, quero deixar bem claro que a posição que nós definimos em relação à questão do Iraque, antes ainda do conflito se desencadear, foi exclusivamente ditada por valores. Não houve qualquer cálculo de natureza económica

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ou comercial na decisão que Portugal tomou. Foi uma decisão tomada em função do interesse nacional de um País democrático e livre que se orienta por valores.
Por isso, não estou nada embaraçado hoje. Pelo contrário, estou perfeitamente à vontade e confortável com a posição que o Governo português tomou ao longo destes tempos. Embaraçados estão, talvez, aqueles que não querem ver a realidade.
Desculpem-me que vos diga, mas, às vezes, a posição de alguns dos Srs. Deputados faz-me lembrar a postura do trágico-cómico ministro da informação de Saddam Hussein, que se recusava a ver a realidade.
Sr. Deputado Luís Fazenda, a realidade mudou e a questão que se coloca é a de saber se queremos ou não participar construtivamente nesta nova fase da vida do Iraque, da vida do Médio Oriente e da vida internacional.
Em relação às armas de destruição maciça, o que posso dizer-lhe é que não sei se as encontrarão ou não, mas sei que prosseguem os esforços de investigação. Mas sei uma coisa: é que, hoje, o Iraque não apoia nenhuma rede terrorista internacional!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sei que, agora, qualquer país que pense fazê-lo vai pensar pelo menos duas vezes! Sei que, hoje, o Médio Oriente é mais seguro! Sei que, hoje, também há mais condições para que avance o processo de paz palestiniano! Sei que, hoje, ficou dado um sinal extremamente claro contra o terrorismo internacional! Sei que o campo e o espaço para os Estados que violam sistematicamente o Direito Internacional é hoje menor do que era há alguns anos atrás.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado Luís Fazenda, não deixei de considerar irónica a sua referência constante ao Direito Internacional, quando, se bem me lembro, foi V. Ex.ª e o seu partido, o Bloco de Esquerda, que disseram aqui, nesta Assembleia da República, que, mesmo com uma resolução das Nações Unidas, não aceitariam qualquer intervenção no Iraque.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por isso, Sr. Deputado, não fale em saque do Iraque. Quem fez esse saque, ao longo de décadas, foi o ditador Saddam,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - O seu ex-amigo!

O Orador: - … a sua família e a clique no poder em Bagdade. Esses é que fizeram o saque. E estou absolutamente seguro de que a coligação democrática, que neste momento está disponível…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sufragada por quem?

O Orador: - … para estabilizar, pacificar e ajudar a reconstruir o Iraque, não está lá para ocupar, como V. Ex.ª disse. Isto não é a Hungria em 1956!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Isto não é a Checoslováquia em 1968!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Isto não é o Pacto de Varsóvia! Isto é uma coligação democrática que vai fazer tudo para devolver a liberdade ao povo iraquiano!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para replicar, o Sr. Deputado Luís Fazenda. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, houve tempos, há uns anos, em que o Sr. Primeiro-Ministro participava em manifestações, tal como eu, dizendo: "Nem NATO nem Pacto de Varsóvia!". Portanto, o Pacto de Varsóvia não tem nada a ver com o Bloco de Esquerda, com aquilo que sempre pratiquei na vida política. E o Sr. Primeiro-Ministro sabe bem quais os grupos políticos que, de facto, se distanciavam completamente de quaisquer máquinas de guerra.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Devo notar que os valores que o Sr. Primeiro-Ministro diz que mudaram e que devem ser impostos hoje à ordem internacional são os da guerra preventiva, da guerra de agressão, da ocupação de facto; são os protectorados que os Estados Unidos querem multiplicar pelo mundo; são os valores do império. São esses os valores a que o Governo aderiu!
Os interesses, esses, são permanentes e, na verdade, não há saques bons nem saques maus.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - O saque de Saddam Hussein ou o saque que hoje está a ser preparado por um conjunto de empresas norte-americanas, inglesas e outras não tem distinção do ponto de vista da ética. É, verdadeiramente, de uma forma ou de outra, um saque aos verdadeiros interesses do povo iraquiano e dos povos de todo o mundo, que vêem nisso um espelho sobre o que pode acontecer aos seus recursos naturais, às suas riquezas próprias.
Sr. Primeiro-Ministro, reparo que nada nos disse sobre uma qualquer previsão da evolução política no Iraque. Falou-nos aqui, várias vezes, em responsabilidade, não hesita em enviar forças de segurança e, eventualmente, forças militares, mas não deixa, sequer, um apontamento quanto à estabilidade política e à organização do poder no Iraque.
Como vai acontecer? Como será devolvido o poder aos iraquianos? Quanto tempo demorará? Que compromissos têm os Estados Unidos? O que é que o Governo português sabe e não diz? Membros do Governo português têm tido inúmeras conversações com autoridades norte-americanas, mas tal não é trazido à Assembleia da República, nem em perspectiva nem sequer em enfoque geral, apesar da importância que esta questão tem.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

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O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, não cometemos o equívoco de confundir o Direito Internacional com toda e cada uma resolução de uma organização internacional.
Disse aqui, e bem, que o Bloco de Esquerda seria contra uma intervenção militar no Iraque - e tem razões reforçadas para o ser! -, houvesse, ou não, mandato das Nações Unidas. Não nos arrependemos dessa posição e digo-lhe frontalmente, neste debate, que também somos contra qualquer envio de forças militares ou de segurança, mesmo que venha a haver um mandato de uma organização internacional.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Contudo, isso não pode ser confundido com a invocação do Direito Internacional. Todos sabemos que o Direito Internacional é muito mais do que uma ou outra resolução de uma organização internacional.
Sr. Primeiro-Ministro, o seu Governo também não concordou com uma resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas e isso não diminuiu a perspectiva do Direito Internacional.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, em termos práticos e concretos, qual seria, então, a solução do Bloco de Esquerda? Abandonar o Iraque à sua sorte. Não está, com certeza, a pensar agora num exército de libertação para retirar de lá a coligação democrática!?

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É cá uma democracia!

O Orador: - Portanto, o que é que se faz?

O Sr. Luís Fazenda (BE): - O Iraque não tem autoridades?

O Orador: - Deixa-se o povo iraquiano entregue, espontaneamente, à situação de guerra civil, à situação de desordem, de caos, de anarquia, que VV. Ex.as, aliás, condenaram quando viram o saque do museu de Bagdad?!

O Sr. Luís Fazenda (BE): - E quem deixou?

O Orador: - A verdade é que é necessário, de forma realista, durante algum tempo, uma estabilização do Iraque que garanta a ajuda humanitária e que permita a reconstrução daquele país.
Não faço previsões, Sr. Deputado, para não falhar, como VV. Ex.as falharam em todas as previsões: previam uma guerra extremamente longa e foi curta!

O Sr. Luís Fazenda (BE): - É falso!

O Orador: - Previam milhões de mortos e nada disso aconteceu!

O Sr. Luís Fazenda (BE): - É falso!

O Orador: - Previram que o combate em Bagdade fosse uma nova batalha de Estalinegrado e nada disso aconteceu!

O Sr. Luís Fazenda (BE): - É falso!

O Orador: - Falharam todas as previsões!

O Sr. Luís Fazenda (BE): - É falso!

O Orador: - Não faço previsões, mas afirmo que tenho a convicção absoluta de que a coligação democrática que está a liderar o processo no Iraque vai fazer tudo o que estiver ao seu alcance para que, tão cedo quanto possível, o povo iraquiano se possa auto-governar, porque é uma coligação democrática, que acredita na liberdade e na democracia. E Portugal pode sentir-se honrado de estar ao lado dos países democráticos com quem tem colaborado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, na sua intervenção justificou aquilo de que agora vem dar conhecimento à Câmara a pretexto de que o seu Governo quer estar à frente, quer ser campeão.
Sr. Primeiro-Ministro, penso que há muito melhores causas em que o seu Governo possa ser campeão. Contudo, posso dizer-lhe, desde já, que é campeão em domínios como o desperdício energético e a poluição! São domínios em que detém o primeiro lugar, mas esse primeiro lugar não é propriamente honroso.
Obviamente que aquilo que está em discussão é enquadrar e situar a disponibilidade do Governo, no sentido de continuar a pactuar e a comprometer-se politicamente com uma agressão militar, que, julgo, porque a memória parece curta, tem determinados contornos.
Essa agressão militar foi justificada em nome da necessidade de impedir o perigo de armas de destruição maciça, que não foram encontradas; em nome do Direito, mas, curiosamente, foi feita à margem do Direito e da comunidade internacional; pela preocupação em relação a um povo, e nem por isso as forças agressoras tiveram preocupações em atingir alvos civis, em atingir jornalistas, em utilizar armamento proibido, nomeadamente bombas de fragmentação e de urânio, e, tão-pouco, estes valores civilizacionais, supostamente mais avançados, se preocuparam, para além do petróleo, em preservar aquilo que era um património da humanidade e que foi, pura e simplesmente, pilhado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, julgo que é bom que nos situemos para saber de que é que falamos quando dizemos que é preciso ajudar.
Sr. Primeiro-Ministro, como imagina, Os Verdes não têm dúvida nenhuma de que é preciso ajudar um povo que está numa situação gravíssima: há milhares e milhares de refugiados, sabe-se que mais de 60% são crianças; há escassez de água e de alimentos; o sistema de transportes não

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funciona; há, ao fim destas semanas todas, por parte das forças ocupantes anglo-americanas, uma total desresponsabilização em relação àquilo que são as consequências de um acto, que, de acordo com as regras internacionais, lhes cabe precisamente resolver.
O Sr. Primeiro-Ministro diz-nos algo que é espantoso: que é preciso ajuda humanitária - e concordamos -, mas que essa ajuda não chega, como se essa ajuda não chegasse porque os norte-americanos, as forças inglesas, os milhares e milhares de ocupantes não são capazes e como se fossem precisos 150 agentes da GNR para o fazer. Parece-me demasiado cinismo, Sr. Primeiro-Ministro, para uma questão de tanta gravidade.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, como era de esperar, pela sua formação académica, atacou o Governo português em matéria de ambiente, mas poderia lembrar que um dos maiores desastres ambientais da História foi, precisamente, feito pelo ditador Saddam Hussein, quando, na anterior guerra do Golfo, mandou queimar os poços de petróleo. Se tivesse falado disso seria uma posição com alguma coerência da sua parte.
No que diz respeito à ajuda humanitária, já respondi. Consideramos importante a ajuda humanitária, estamos disponíveis para ajudar as nossas organizações não-governamentais e também já contribuímos e vamos aumentar a contribuição para ajudar as organizações multi-laterais.
Contudo, é insensato não reconhecer que é necessário um esforço no plano da segurança do Iraque. Há um trabalho a fazer. A realidade é que aquela guerra foi diferente de outras travadas no passado.
O saque dos bens culturais do museu de Bagdade não foi feito por aquilo a que VV. Ex.as chamam as forças de ocupação.

O Sr. António Filipe (PCP): - Era o que faltava!

O Orador: - Pelo contrário, essas forças de ocupação foram as que lutaram contra esse saque! E posso dar-vos uma informação: neste momento, já há no museu de Bagdade mais bens culturais do que havia antes da intervenção.

Risos do PCP.

E sabem porquê? Porque muitos iraquianos, voluntariamente, entregaram ao museu da sua cidade e do seu país bens que, no passado, não aceitavam que estivessem naquele mesmo museu,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - E aqueles que estão nas mãos dos americanos?

O Orador: - … lembrando aquilo que fez o povo de Estalinegrado ou de São Petersburgo quando os nazis ocuparam aquelas cidades.
Por isso, Sr.ª Deputada, não tente colar a nossa posição à daqueles que praticaram as ilegalidades. Nesta matéria, estamos, como sempre estivemos, do lado da civilização, da democracia.
Sr.ª Deputada, aqueles que abriram as portas dos campos de concentração do nazismo não foram os pacifistas, mas os combatentes!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - A resistência contribuiu!

O Orador: - Às vezes, é necessário combater para libertar e para fazer triunfar a democracia!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para replicar, a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, diz-me que não foram as forças ocupantes que pilharam. Devo dizer-lhe, aliás, que foi Kofi Annan quem utilizou a expressão "forças ocupantes", de quem o Sr. Primeiro-Ministro se lembrou hoje, pela primeira vez.
Não era preciso recordar Saddam e os desastres ecológicos causados pela guerra do Golfo, pois podemos dizer que ocorreram outros desastres graves, esses, com a cumplicidade, designadamente do silêncio, na época do governo PSD. Aliás, se enveredarmos pelo caminho de saber quem são os maiores poluidores - e há um concorrente directo que são os EUA, como bem sabe -, porventura o que temos de concluir é que as guerras deixam uma herança de destruição e morte, uma herança de catástrofe humanitária e ecológica que é gravíssima, razão pela qual deveriam ser evitadas.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

A Oradora: - Há outra questão em relação à qual gostaria de debruçar-me.
O Sr. Primeiro-Ministro vem referir a necessidade de ajuda humanitária. Porque é que o Sr. Primeiro-Ministro ficou de repente tão preocupado com os milhares e milhares de vítimas, desalojados e refugiados, crianças e mulheres que estão na iminência de poder vir a morrer, mas não se questiona quanto às razões pelas quais, ao fim destas semanas, os hospitais não estão a funcionar em Bagdade?
Quando pensa na vida, o Sr. Primeiro-Ministro não se questiona, não considera estranha a inércia, não lhe parece estranho que a AMI e a Plataforma das Organizações não Governamentais para o Desenvolvimento sejam as próprias a vir dizer que são contra qualquer presença de forças de segurança ou militares no Iraque, porque querem estar no terreno, mas com as Nações Unidas, sob a égide do Direito Internacional, não querem estar no terreno, ao contrário do que desejam o senhor e o seu Governo, a perpetuar uma presença que, para todos os efeitos, é de ocupação?

Aplausos de Os Verdes.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

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O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, V. Ex.ª não colocou nenhuma pergunta, repetiu posições.
O que posso dizer-lhe é que temos de ser responsáveis. É completamente irresponsável dizer que toda a guerra é condenável. A verdade é que há guerras que são legítimas. A guerra contra o nazismo foi legítima! A guerra contra o totalitarismo é legítima!
Portanto, essa posição de pacifismo arrogante acaba por ser, objectivamente, uma posição de apoio à perpetuação de ditaduras intoleráveis.
No que diz respeito às organizações não governamentais, não vejo contradição.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Não?!

O Orador: - As organizações não governamentais estão no terreno, merecem o nosso apoio.
V. Ex.ª interroga-se por que razão é que, ao fim de tanto tempo, não está a funcionar melhor a ajuda humanitária ou, de uma forma geral, o sistema iraquiano.
Até agora, o que houve foi, essencialmente, uma intervenção militar. Estamos agora a passar a uma outra fase, a da estabilização, da reconstrução e da ajuda humanitária.
Precisamente para termos alguma palavra a dizer é que temos de estar presentes, não é estando fora, a criticar. Portugal pode dar um contributo positivo se estiver presente. Nesse domínio é que há, também, uma divergência, neste Hemiciclo, entre a maioria e a minoria. A minoria entende que Portugal não deve estar presente; o Governo sente que Portugal deve estar na primeira linha, na estabilização, na reconstrução do Iraque. Felizmente, o Governo não está só; quanto a isso, está apoiado pela maioria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos à fase de segunda volta de perguntas.
Relembro que, nesta volta, todos os oradores dispõem de apenas 3 minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Caras e Caros Colegas, Sr. Primeiro-Ministro, as minhas primeiras palavras são para lhe dar as boas-vindas pelo anúncio de ontem, relativamente à execução das políticas que, no passado, o PS, em particular o Dr. Ferro Rodrigues, apresentou em matéria de diferenciação positiva das prestações sociais.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Bem-vindo, Sr. Primeiro-Ministro!

Aplausos do PS.

A segunda nota tem a ver com a ausência de razões para comparar situações que são incomparáveis. O Iraque não é comparável a Timor.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Timor resultou de um processo excepcional, bem conduzido, com as Nações Unidas, que legitimou essa intervenção.
Mas há mais.
Devo dizer-lhe que, naquele momento, o caso de Timor, pela maneira exemplar como foi executado, foi visto como uma forma de revitalizar o papel das Nações Unidas na gestão de conflitos, coisa que não acontecia em Caxemira nem, por exemplo, no Sara Ocidental.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Recordo aqui a coragem do governo anterior, em particular a do anterior Primeiro-Ministro, para que se fizesse a consulta em Timor. E aqui, páro, Sr. Primeiro-Ministro, porque não queria recordar nem aprofundar posições infelizes que o senhor tomou nessa altura, na sua qualidade de líder da oposição.

Aplausos do PS.

Em terceiro lugar, gostava de recordar-lhe que a intervenção no Iraque não foi para derrubar um regime ditatorial. O Sr. Primeiro-Ministro veio dizer que havia necessidade de fazer uma guerra preventiva para destruir um regime que tinha armas de destruição maciça. Ora, essas armas ainda não foram encontradas.
Todos nós somos contra as ditaduras, mas, Sr. Primeiro-Ministro, há, pelo menos, um regime no mundo que é uma ditadura militar e tem armas de destruição maciça, no mínimo a partir de 1998, que se saiba, que é o Paquistão. Quero, pois, perguntar-lhe, olhos nos olhos, qual é a sua posição, sem tibieza: considera que, a seguir, deve fazer-se uma intervenção no Paquistão, com o apoio de Portugal, para derrubar essa ditadura e para destruir o regime, que dispõe de armas de destruição maciça?

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Queria, pois, saber qual é a sua resposta.
Em quarto lugar, Sr. Primeiro-Ministro, revelou aqui uma opção clara. O seu Governo está, politicamente, a virar as costas à construção de uma União Europeia política, porque a mesma só existirá se tiver capacidades de política externa e de defesa.
Sr. Primeiro-Ministro, o seu Governo tem os pés na Europa, mas tem o coração na Administração Bush. Não se compreende que, ao contrário das posições equilibradas e sensatas manifestadas pelo seu Ministro dos Negócios Estrangeiros, o seu Ministro da Defesa tenha criticado a reunião dos "quatro" no Luxemburgo. De igual modo, não se entende que o seu Ministro da Defesa tenha estado reunido com Donald Rumsfeld para preparar uma posição conjunta para a próxima cimeira da NATO, quando se sabe que é Donald Rumsfeld quem considera que a NATO é um mito e que a sua manutenção é muito elevada!
Gostava que me respondesse a estas perguntas e, ainda, que dissesse qual é a posição do Governo em matéria de estender a cooperação reforçada às questões de defesa no âmbito da União Europeia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, como perderam o debate no que

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se refere à questão de fundo de hoje, estão agora a tentar desviar para outras questões.
Quanto à questão do Kosovo, à de Timor, estive do lado certo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Estive sempre do lado da libertação do povo timorense. Penso até, talvez com imodéstia, que, como Ministro dos Negócios Estrangeiros, dei um contributo para a visibilidade da questão.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António José Seguro (PS): - É verdade!

O Orador: - Se V. Ex.ª perguntar ao Presidente e a todas as autoridades de Timor, eles próprios poderão dizer-lhe o apreço que têm pela minha posição.

O Sr. António José Seguro (PS): - Não preciso de perguntar. Estou de acordo!

O Orador: - V. Ex.ª, simpaticamente, reconhece-o.
No que diz respeito à questão do Kosovo, apoiei a posição do anterior governo apesar de o anterior Primeiro-Ministro ter demorado 12 dias a vir justificar publicamente aquela posição. Critiquei o facto de não ter debatido a questão publicamente, mas disse "estamos consigo!". Portanto, não vejo por que é que traz agora essas questões do passado porque, quanto às mesmas, temos uma posição coerente: sempre ao lado dos povos oprimidos - o povo timorense, o povo da Bósnia ou o povo do Iraque -, contra as ditaduras e contra as ocupações. Essa tem sido a nossa posição.

O Sr. António José Seguro (PS): - E quanto ao Paquistão?

O Orador: - No que diz respeito ao Paquistão, Sr. Deputado, a situação é completamente diferente da do Iraque.

Vozes do PS: - Ah!

O Orador: - Que eu saiba, o Paquistão não está condenado por nenhuma resolução das Nações Unidas, não invadiu nenhum país vizinho.

O Sr. António José Seguro (PS): - Invadiu Caxemira!

O Orador: - Quanto a armas de destruição maciça, por esse mundo fora há muitos países que as têm.
O Paquistão não é um país que, neste momento, esteja sob qualquer forma de escrutínio particular por parte das Nações Unidas.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes ): - É verdade!

O Orador: - Quanto à questão da defesa europeia, a nossa posição é clara. Nós, Governo - e o Governo tem apenas uma política na matéria -, somos a favor de uma entidade europeia de segurança e defesa, somos a favor do reforço das capacidades europeias de defesa desde que não se assumam como contrariando a solidez da Aliança Atlântica, desde que sejam consideradas como o reforço do pilar europeu, numa relação transatlântica que queremos cada vez mais forte. Julgava que era essa a posição do Partido Socialista!

Vozes do PS: - E é!

O Orador: - Muito bem! Então, é a mesma posição, Srs. Deputados. Se estão de acordo, por que razão estão a discutir comigo?

Risos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É só para criticar o Governo, mas, pelos vistos, também temos alguns pontos em que estamos de acordo.
O Sr. Ministro da Defesa esteve recentemente nos EUA para participar numa cimeira da NATO com a Ucrânia, para ter consultas com o Governo norte-americano, tendo sido recebido pelo Vice-Presidente e pelo Secretário de Estado da Defesa dos EUA para discutir a questão do Comando da NATO em Oeiras, que esperamos permaneça em Portugal, e, também, para discutir algum equipamento militar que pode ser fornecido pelos EUA a Portugal.
O Sr. Ministro da Defesa e o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros têm prestado relevantes serviços a Portugal na relação transatlântica e na construção europeia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, penso que é relevante para o debate que eu entregue na Mesa uma proposta de alteração à proposta de um praesidium, sobre os trabalhos da Convenção Europeia relativa a matéria de defesa europeia, apresentada pelo representante do Governo português, a qual contradiz, em parte, a intervenção do Sr. Primeiro-Ministro.
Queria também que ficasse em acta que o Sr. Primeiro-Ministro, porventura por lapso, não respondeu à pergunta que lhe coloquei quanto a saber qual é a posição do Governo português sobre a possibilidade de se estender as cooperações reforçadas às questões de defesa. Com certeza que o Sr. Primeiro-Ministro não levará a mal se puder responder-me durante este debate.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça o favor de fazer chegar à Mesa o documento a que aludiu.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia.

A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, queria felicitá-lo pela consistência política das posições que tem tomado nesta questão e pela maneira como as tem explicitado, quer junto dos portugueses, representados neste Parlamento, quer junto da comunidade internacional, que, mais uma vez, ficou a saber que Portugal

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é um parceiro credível que responde às chamadas com responsabilidade e com generosidade perante a comunidade internacional. E isso é bom para Portugal.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Quando, há um mês, o PS sacrificou a tradição atlantista à procura de uma popularidade fácil, previ que esse seria um ganho de curto prazo, mas estava longe de imaginar que iria ter razão tão depressa.
Vemos agora os Estados que condenavam a intervenção no Iraque congratularem-se com a queda de um ditador. Vemos agora o PS, através do seu Secretário-Geral, lamentar a quebra de uma ordem internacional que permitia que ditadores não a respeitassem, nem os seus fundamentos, nem as suas recomendações.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Agora, o PS vem dizer-nos que a sua posição em política externa é já não uma posição atlantista mas um alinhamento pelo eixo Paris-Berlim-Moscovo. É isso que vemos o PS fazer.
Vêmo-lo também procurar uma nova identidade, a sua nova identidade, no albergue do anti-americanismo,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - … que acolhe os deserdados da ideologia e outros descontentes mais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Primeiro-Ministro, ao contrário do PS, o Governo, mais uma vez, é consistente e responsável.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - E ser responsável significa estar agora no Iraque, junto da coligação, que tenta a reconstrução de um país, a recuperação de uma economia, finalmente a favor dos iraquianos, e atender a uma situação de emergência humanitária.
Isso é ser responsável; não o é esperar por um mandato de uma organização internacional que não está em condições de o dar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Recordo as palavras de Kofi Annan, ainda há pouco tempo, ao questionar: será que preferiríamos que outros países ficassem passivos em face de um problema humanitário, quando o Conselho de Segurança não consegue agir? Isso é ser irresponsável.
É nossa obrigação estar lá e não com os que perderam o comboio e que, ofegantes, agora tentam apanhá-lo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Primeiro-Ministro, quero felicitá-lo e perguntar-lhe se não acha que, se tivéssemos seguido a posição do PS, não só Saddam Hussein estaria sentado no seu palácio mas a Palestina estaria mais longe de uma solução, a região estaria mais insegura.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se.

A Oradora: - Vou terminar, Sr. Presidente.
A própria Europa - também para responder ao Sr. Deputado António José Seguro - não estaria incapaz para enfrentar problemas que estavam latentes mas que não tinham surgido e que agora estão talvez em condições de ser enfrentados, na procura de consensos e de soluções institucionais operativas, para um mundo que mudou, quer o PS tenha dado por isso quer não?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Gouveia, agradeço-lhe também as suas palavras de apoio à posição do Governo nesta matéria.
Com a sua autorização, Sr.ª Deputada, gostava de aproveitar para responder a uma questão, que me escapou há pouco, do Sr. Deputado António José Seguro. É que ainda tenho a esperança de que, ao menos na questão europeia, consigamos algum consenso com o maior partido da oposição. Quero, aliás, dizer-vos que vamos tomar a iniciativa de, proximamente, vir aqui ao Parlamento discutir as questões institucionais, porque gostávamos que houvesse um consenso tão alargado quanto possível para que Portugal defenda, de forma mais unida, a sua posição no que diz respeito à construção da Europa.
Quanto a cooperações mais reforçadas na defesa, como sabe, Sr. Deputado, elas já foram expressamente rejeitadas duas vezes: em Maastricht e em Nice. A Convenção Europeia não concluiu ainda os seus trabalhos sobre essa matéria. Quanto à posição portuguesa, posso dizer-lhe que nós não estaremos contra, desde que tenhamos garantia de que essa cooperação reforçada no domínio da segurança e defesa é feita sem prejuízo da relação transatlântica.
Srs. Deputados, não procuremos problemas onde eles não existem. Este Governo e eu próprio somos pró-europeus; para nós, a primeira prioridade está na Europa. Já o disse como Ministro dos Negócios Estrangeiros e, hoje, como Primeiro-Ministro: a primeira prioridade de Portugal está na Europa. Mas temos uma determinada visão da Europa. A nossa visão da Europa não é a de uma Europa fechada; compartilhamos, no essencial, os valores com as grandes democracias Estados Unidos da América e Canadá, do outro lado do Atlântico.
Por isso, Srs. Deputados do Partido Socialista, não se deixem levar por um frentismo recente, em que a esquerda, para se unir, procura o único ponto comum, que é um certo antiamericanismo. Sobretudo da sua parte, Sr. Deputado António José Seguro, não esperava isso, porque V. Ex.ª é uma pessoa ainda relativamente jovem e, para mim, o antiamericanismo é a doença senil do socialismo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Risos do Deputado do PS António José Seguro.

Na questão europeia, nós, este Governo e o Partido Socialista, temos tido basicamente as mesmas posições. Tem havido, aliás, uma excelente cooperação entre os Deputados,

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quer da Assembleia da República quer do Parlamento Europeu, dos principais partidos que estão na Convenção.
Por que razão é que havemos de estar agora a criar um conflito artificial? Só porque os senhores estão na oposição e nós estamos no Governo?!

O Sr. António José Seguro (PS): - Os senhores estão com o coração em Washington!

O Orador: - Algum dia - bem longe! -, os senhores voltarão ao Governo. Por isso, não se crie aqui um conflito artificial.
Nós somos a favor de uma Europa forte, mas entendemos que a Europa forte se constrói com Portugal forte, na primeira linha, e daí também a posição que tomamos agora nesta questão do Iraque.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, começo por referir que vi hoje, na intervenção do Sr. Deputado António José Seguro, uma posição clarificadora, diria quase com efeitos retroactivos, relativamente àquela que foi a posição do Partido Socialista e do governo socialista na resolução do problema de Timor.
Afirmou o Sr. Deputado António José Seguro que, relativamente a Timor, houve uma intervenção que foi acertada, desde logo, porque foi legitimada pelas Nações Unidas. Significa isso que se, depois de anos de luta de sucessivos governos de Portugal, no sentido da autodeterminação do povo timorense, da devolução da liberdade aos timorenses, uma qualquer coligação internacional, fosse ela liderada pelos Estados Unidos, pela França ou pela Alemanha, se determinasse a devolver a liberdade a este povo, o governo socialista, que então conduzia o processo, não o aceitaria. Não o aceitaria, porque essa intervenção não estaria legitimada pela dita deliberação das Nações Unidas, e, com isso, porventura, o povo de Timor estaria ainda hoje nas condições em que estava.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Isso, Sr. Deputado António José Seguro, foi uma posição importante, porque clarificadora, não apenas para os portugueses mas também certamente para os timorenses, que poderiam ter laborado em equívoco.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E é clarificadora até pela posição tomada, aquando da intervenção, pelo Sr. Ministro José Ramos Horta. Por uma razão: porque ele próprio afirmou, então, dando apoio ao Governo de Portugal, que bem fez o Governo de Portugal, pois, estabelecendo a comparação com o caso de Timor, pudesse Timor ter beneficiado de uma intervenção sem mandato da ONU, ele não hesitaria e seria o primeiro a estar na primeira linha a exigi-la.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, é bom de ver que teve razão, também por isso, o Governo de Portugal hoje, e que pecou por de menos, porventura, a posição do governo socialista de ontem.
De todo o modo, Sr. Primeiro-Ministro, terminando, gostava de colocar uma questão a V. Ex.ª. Verifica-se o grande esforço do Governo português, desde a primeira hora, no sentido do envolvimento da ONU no processo de libertação e do respeito pelos direitos humanos em Timor. Isso foi nítido antes e é nítido hoje. E, de resto, ontem, o Secretário de Estado norte-americano Colin Powell, após uma reunião com o Secretário Geral da ONU Kofi Annan, anunciou já que o projecto de resolução que vai apresentar para levantar as sanções ao Iraque reservará à ONU um papel vital, no sentido da reconstrução do Iraque.
Verifica-se, hoje, que a própria França e a Alemanha também já se começam a aproximar destes esforços da coligação. A Alemanha, ainda durante a intervenção, quando permitiu que as suas bases fossem utilizadas - e de que forma! -, dando apoio aos Estados Unidos, e a França, hoje, quando sabemos as declarações que foram prestadas pelo Presidente da França mas que também foram noticiadas desde logo pela comunicação social internacional.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - O que solicito a V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, é se nos pode dar mais alguma informação sobre o essencial da reunião que manteve com o Presidente francês, no sentido de se perceber aquilo que vai ser também o essencial dos esforços da França e da ONU neste processo de reconstrução do Iraque.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, fez V. Ex.ª muito bem em lembrar essas declarações de Ramos Horta, que, na altura, me impressionaram bastante. Ramos Horta disse, como aliás também disse o Governo português, que todos teríamos preferido uma resolução expressa que habilitasse aquela intervenção. Mas também disse que ele apoiaria uma intervenção contra aquele tipo de opressão e ditadura que existia no Iraque. É importante verificar a declaração desse Prémio Nobel da Paz, porque é talvez uma lição para alguns pacifistas de última hora que surgiram no nosso país.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto à questão concreta que V. Ex.ª me coloca, o que posso dizer-lhe, com muito gosto, é o seguinte: há hoje uma vontade grande, no âmbito europeu - sou testemunha disso e o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros também -, de se superarem divergências que existiram na questão do Iraque.
Nós próprios conseguimos tomar uma posição - digo-o com satisfação -, que foi uma posição de colaboração com os Estados Unidos, sem nunca ter havido da minha parte uma crítica aos nossos parceiros europeus que tomaram uma posição diferente - repararam nisso, certamente.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portugal não prejudicou em um átomo a sua posição europeia pelo facto de ter tomado a posição que tomou no Iraque. Ainda ontem, ouvimos aqui o Sr. Presidente da República Federal da Alemanha, que está em Portugal a convite do Sr. Presidente da República, dizer isso, ou seja, que as divergências que houve de forma alguma a prejudicaram - e o sucesso que está a ter a visita de Estado do Presidente da Alemanha é bem a prova da excelência das relações que temos com esse grande país europeu que é a Alemanha.
No meu recente encontro com o Presidente Jacques Chirac, posso dizer-lhe, Sr. Deputado, que grande parte da nossa conversa, e onde houve, aí sim, divergências, foi acerca da questão institucional para a União Europeia. É a tal questão acerca da qual quero voltar aqui em breve para a discutir com toda a Assembleia. Aí sim, neste momento, temos uma divergência, pois não aceitamos qualquer directório dos grandes na União Europeia.

O Sr. António José Seguro (PS): - Não há divergência!

O Orador: - Esperamos, no entanto, que a França evolua na sua posição. Estamos disponíveis para algum compromisso, mas não concordamos com a posição tal qual está a ser exposta hoje pelas autoridades francesas.
Mas na questão do Iraque houve uma total compreensão da França pela posição de Portugal durante essa crise. Explicámo-la com toda a franqueza, com toda a sinceridade, e mantivemo-nos, usando a fórmula popular, "amigos como dantes".
Por isso, lhes digo, com algum orgulho, que o Governo português conseguiu, ao longo desta crise, o melhor possível do ponto de vista diplomático: estar do lado da coligação liderada pelos Estados Unidos, ter aí uma posição absolutamente clara e sem ambiguidades, corajosa e frontal, sem nunca aparecer, diferentemente de outros, como um país relutantemente europeu; pelo contrário, com muito orgulho de ser um país europeu, mas dando o seu contributo activo para a própria visão da Europa nesse conflito.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular uma pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, já que o Sr. Primeiro-Ministro se referiu também, embora de passagem, na sua primeira intervenção, a questões da política económica do Governo, quero retomar algumas dessas questões para dizer que, quando o Sr. Primeiro-Ministro tanto fala na necessidade de pôr Portugal na primeira linha em todos os aspectos, há matérias em que o Governo e o Sr. Primeiro-Ministro puseram, de facto, Portugal na primeira linha.
Olhe, Sr. Primeiro-Ministro, puseram Portugal na primeira linha do crescimento do desemprego…

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Sr. António Costa (PS): - É verdade!

Vozes do PSD: - Oh!

O Orador: - Foi o país onde mais cresceu o desemprego, nos últimos meses, na União Europeia, afectando especialmente as mulheres, cujo desemprego é ainda mais alto no nosso país, atingindo 8,3%, em Março, segundo os últimos dados do EUROSTAT. Há até quem já faça contas e chegue à conclusão de que, por dia, perdem o emprego 100 portugueses, devido à política do Governo. Esta primeira linha é também da responsabilidade deste Governo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Disse também o Sr. Primeiro-Ministro, a propósito da questão do Iraque, que, em algumas matérias, não faz previsões. Mas em relação à situação económica, o Governo fez previsões. Fez, por exemplo, a previsão de que o crescimento do PIB ia ser de 1,75% e, afinal, o dado que surge agora é de 0,5%, havendo até já quem diga que o crescimento vai ser negativo.
Portanto, esta previsão foi feita pelo Governo e redundou, como, aliás, dissemos, na altura, num completo falhanço. Podia, noutra situação, o Governo dizer que a crise, em Portugal, é o reflexo da crise noutros países com os quais nos integramos na União Europeia, só que a crise, em Portugal, está mais acentuada do que nesses países. Podia o Sr. Primeiro-Ministro dizer que o desemprego em Portugal acompanha o crescimento do desemprego nos outros países, mas Portugal é o campeão do crescimento do desemprego na União Europeia.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - É verdade!

O Orador: - Faltam as medidas de fundo para inverter esta tendência e não se atacam as causas desta crise. Em face do enorme agravamento desta situação social e das dificuldades crescentes da família, só por crueldade e cinismo se pode dizer, como fez o Sr. Ministro do Trabalho, que o Código do Trabalho vai resolver muitos destes problemas. Mas, Sr. Primeiro-Ministro, se segundo a propaganda do Governo este Código vai trazer mais investimento e mais emprego, explique-nos porque é que então, assistindo o Governo impávido e sereno, sistematicamente se encerram empresas, se deslocalizam empresas, deixando atrás de si um rasto de desemprego e de pobreza, tendo o Código de Trabalho já sido aprovado nesta Assembleia da República. Então, com o Código à vista, os efeitos não se fazem sentir?!
Este Código, afinal, não traz mais emprego nem traz mais riqueza, o que traz é a continuação do modelo de baixos salários, de exploração com menos direitos, que é o modelo que tem arrastado o nosso país para a crise em que estamos neste momento. E quando tanto falamos em reconstrução, pegando mais uma vez nas palavras do Sr. Primeiro-Ministro, era bom que algum dia o Governo se lembrasse de tomar as medidas necessárias para a reconstrução da nossa economia e para a reconstrução do nosso tecido social. Essas medidas continuam a não aparecer.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

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O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, vejo que desistiu do tema Iraque, mas agora, que fala de economia, esperava da sua parte uma palavra de congratulação ao Governo pela decisão que tomámos de modificar o regime de abono de família, retirando aos mais ricos para aumentar os mais pobres, criando um 13.º mês para os filhos de famílias mais carenciadas, mas V. Ex.ª não ligou a essa medida social importante que ontem mesmo anunciei.
Sr. Deputado Bernardino Soares, o desemprego está, de facto, a subir em Portugal - V. Ex.ª devia saber que uma política económica demora algum tempo a produzir os seus efeitos. Mas o desemprego está a subir como resultado de políticas económicas erradas do passado e também por causa da situação internacional. O nosso desemprego está ainda abaixo da média da zona euro, mas isso não nos dá nenhuma satisfação porque cada desempregado é, para nós, uma tragédia.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Vê-se!

O Orador: - Mas digo-lhe uma coisa: não é com as suas medidas, não é criando emprego artificial, não é criando empregos não sustentados que se corrigiria o desemprego. A solução é prosseguir a política que reduz o endividamento externo, que reduz o défice público, que promove as exportações, que promove a produtividade e a competitividade das nossas empresas. Só criando mais riqueza é que podemos criar mais postos de trabalho. É essa a nossa política, e estou absolutamente seguro de que não há outra, nas actuais circunstâncias de Portugal, que possa gerar emprego que não seja esta.
Deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado, que caiu no ridículo ao atribuir ao Código do Trabalho os actuais despedimentos,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não foi isso que eu disse!

O Orador: - … quando o Código ainda nem sequer está em vigor. É uma total desonestidade intelectual falar no Código do Trabalho, que ainda nem sequer está em vigor, ligando-o ao aumento do desemprego que tem vindo a fazer-se sentir.
O aumento do desemprego, hoje, em Portugal é consequência da situação má da economia internacional e europeia e é consequência também de políticas erradas do período anterior. Estamos a mudar o modelo de desenvolvimento económico de Portugal; com isso, vamos gerar mais emprego. De qualquer modo, para acorrer às situações de maior emergência, aprovámos dois programas: o Programa Emprego e Protecção Social e o Programa para as Áreas e Sectores Deprimidos. Estamos a actuar de emergência relativamente àqueles que mais precisam, mas sem cair no erro que seria estatizar empresas que não têm viabilidade, criar empregos artificiais, garantir, à partida, emprego a todos na função pública, porque foi precisamente essa via que conduziu o País à situação em que estamos. Seria, pois, um descalabro se o País agora não mantivesse com persistência a orientação económica que tem vindo a implementar e que vai continuar a implementar sem uma dúvida e sem uma hesitação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para defesa da honra, inscreveu-se o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, muito brevemente, e sem retribuir as amabilidades de discurso do Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de lembrar que eu não disse que o crescimento do desemprego era consequência do Código do Trabalho. O que lhe perguntei (e era essa a resposta que queria ouvir) é como é que as empresas, que na opinião do Governo tanto iriam beneficiar e tanto iriam ser aliciadas para ficar em Portugal com este novo Código do Trabalho, estão a sair, a fechar e a deslocalizar-se. Não estou a dizer que isso é consequência do Código do Trabalho, o que estou a dizer é que a propaganda que dizia que o Código ia trazer mais investimento e mais emprego falhou redondamente e o resultado está à vista.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não se tratou, rigorosamente, de uma defesa da honra, mas enfim…
De qualquer modo, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro para dar explicações.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, a desonestidade intelectual do seu argumento está em jogar com o facto de o Código do Trabalho já ter sido aprovado - de facto, já foi aprovado, nesta Assembleia, pela maioria -, mas não está ainda em vigor! Por isso, estar a insinuar, de qualquer modo, que o Código do Trabalho ou a sua previsível entrada em vigor já está a condicionar o desemprego é ridículo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Eu não disse isso!

O Orador: - O que nós dizemos é que o Código do Trabalho é uma medida, entre outras, para tornar o nosso sistema económico mais flexível, mais competitivo, mais moderno. Não é tanto como nós gostaríamos, mesmo assim é positivo, como reconheceu há dias o ex-Ministro da Economia e actual Deputado do PS Pina Moura. Mesmo assim, é um passo na boa direcção.
Gostaríamos de ir mais longe, mas constrangimentos conhecidos impedem-nos. No entanto, é um passo, entre outros, para garantir maior flexibilidade e competitividade, e nós estamos seguramente convencidos de que a promoção dessas condições vai gerar maior riqueza e de que, assim, se vão criar mais postos de trabalho no nosso país.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos à terceira volta de perguntas.
O primeiro orador inscrito é o Sr. Deputado Marques Júnior, a quem dou a palavra.

O Sr. Marques Júnior (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, colocada a questão no quadro político da participação das Forças Armadas ou das forças de segurança na fase de estabilização e segurança do Iraque, e reafirmada a posição do PS, permanecem algumas questões que gostaria de colocar a V. Ex.ª.

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Desde logo, o Sr. Primeiro-Ministro, em reposta a uma pergunta, colocou a questão de comparar a intervenção no Iraque a uma eventual cooperação com países da CPLP, países com os quais temos acordos de cooperação nomeadamente na área da defesa, pelo que acho que tal é um absurdo e só pretende confundir as pessoas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O envolvimento das Forças Armadas portuguesas, neste caso forças de segurança, sem qualquer legitimação internacional, vem reforçar a violação do Direito Internacional e, sendo coerente com a posição política do Governo relativamente à guerra, contradiz a afirmação de que não seriam envolvidas forças portuguesas na guerra. Sim, na guerra! Na verdade, terminaram acções militares de grande envergadura, mas permanece um ambiente operacional militar não estabilizado e de grandes dificuldades, às quais não será estranho o desejo de substituição das forças da coligação por forças de outros países. Eu diria que o ambiente operacional é agora eventualmente mais complexo e, segundo todos os relatos, de grande desnorte por parte das forças da coligação. Em que ambiente operacional vão actuar as forças de segurança?

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem perguntado!

O Orador: - O facto de serem forças de segurança e não Forças Armadas, não será, neste momento, desde logo, o reconhecimento, por parte do Sr. Primeiro-Ministro, de que o enquadramento internacional não é o adequado para a intervenção das Forças Armadas? Não será o reconhecimento da falta de legitimação internacional?

Vozes do PS: - Será?

O Orador: - Nesse sentido, justificam-se alguns esclarecimentos. Desconhece o Sr. Primeiro-Ministro que a fase de estabilização e segurança é ainda uma fase de operação militar? Esta análise não justificaria uma mais ponderada reflexão sobre o envio de forças de segurança? Não está em causa o prestígio das forças de segurança e das Forças Armadas que, nas missões que têm desempenhado no exterior, têm sido largamente e merecidamente elogiadas?

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Primeiro-Ministro referiu, por exemplo, o caso da GNR em Timor. Mas, para além das questões de que já se falou de enquadramento internacional, recordo que, em Timor, essas forças eram apoiadas, eventualmente, por mais de 99% da população, o que não será, necessariamente, o caso do Iraque.

Vozes do PS: - Claro!

O Orador: - Por outro lado, e depois da reunião de Londres sobre o inventário das capacidades, que missões vão ter as forças de segurança? Vão fazer o quê, como e em que condições? Com que enquadramento? Com que efectivos? O Sr. Primeiro-Ministro referiu 120 elementos - não é despiciendo o número de elementos, porque tem a ver com a sua própria segurança, como tem a ver o treino e como tem a ver o seu próprio equipamento. Espero que isto esteja suficientemente ponderado. E por quanto tempo? Vamos actuar em que sector? Vamos integrar que comando? Com que nível de comando e a que nível de responsabilidade? Que estruturas de comando na sua relação com outras forças? Como sabemos, a NATO não está - pelo menos ainda - envolvida.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Como justifica a nossa saída do Afeganistão quando entra a NATO e a ida para o Iraque sem qualquer enquadramento? E a questão financeira? Como não estamos no âmbito da ONU, vamos suportar todos os custos, e nós sabemos das dificuldades que o IPAD tem para ressarcir o Exército de custos insuportáveis que, efectivamente, lhe estão a criar grandes dificuldades.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Como enquadrar a estratégia de diminuição de efectivos por razões orçamentais noutras missões com esta intervenção no Iraque, repito, sem legitimação internacional?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Marques Júnior, em relação aos acordos de cooperação com os países de língua oficial portuguesa de África, deixe-me dizer-lhe que, dos cinco que existem, eu assinei quatro em nome de Portugal. Por isso, conheço-os muito bem. A verdade é que são acordos de cooperação técnico-militar, não são acordos de defesa ou de cooperação militar pura.
Portanto, se, amanhã, tivermos um pedido, que pode surgir, de um país de língua portuguesa, para uma operação de manutenção de paz ou de ordem pública, Portugal estará à espera de um mandato de uma organização internacional para intervir? A minha resposta é "não"; não é necessário esse mandato!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Além do mais, se quer falar em acordo de cooperação e defesa, pode falar, isso sim, do acordo de cooperação e defesa que temos com os Estados Unidos da América, que foi assinado por vários governos - eu também assinei uma das versões desse acordo -, e é por isso que temos, de facto, uma relação especial com os Estados Unidos da América.
V. Ex.ª diz que pode ser arriscado enviar elementos das forças de segurança neste momento porque a situação ainda não está estabilizada. Bom, mas é precisamente porque a situação ainda não está estabilizada que é necessária uma força de estabilização. Senão não seria necessário enviar essa força de estabilização. E eu tenho a certeza de que os elementos da GNR que forem - vão, aliás, por sua livre

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escolha - vão cumprir com coragem, profissionalismo e competência a sua missão.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Mesmo por livre escolha, a responsabilidade é vossa!

O Orador: - Embora sem terem o apoio do maior partido da oposição, elas vão, com certeza, lembrar-se disso.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Os militares portugueses e as forças de segurança portuguesas vão, sem dúvida, tomar nota de que, num momento destes, o maior partido da oposição não está a apoiar a sua missão quando estiverem lá, no terreno, no Iraque.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto à questão da forma concreta de participação, ainda estão a decorrer os trabalhos de geração de forças; ainda não está decidido em que sector ficará o nosso contingente. O que posso dizer, com algum orgulho, é que, nos contactos informais que já tiveram lugar, vários países, Forças Armadas e forças de segurança de vários países já nos pediram que estivéssemos presentes e que nos associássemos a eles, o que é um sinal da competência e da forma como são vistas as nossas Forças Armadas e as nossas forças de segurança.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Oportunamente, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Sr. Ministro da Administração Interna virão à respectiva Comissão deste Parlamento dar todas as informações que o Parlamento requerer nesta matéria. Não está ainda decidido nada de concreto, apenas sabemos que vamos integrar um sector, mas estamos a ver exactamente em que moldes o faremos, a analisar os custos, e alguns aspectos dos custos estão a ser partilhados com outros. Logo, como esta questão ainda não está completamente esclarecida, não posso dar-vos aqui, hoje, a posição definitiva.
Para terminar, quero apenas dizer-vos, Srs. Deputados, que, de facto, gostaria que, nesta questão, houvesse um consenso mais alargado. Infelizmente, ainda não é possível, mas quero acreditar que será possível mais tarde.
Por último, quero agradecer especialmente à maioria a sua coesão, a sua determinação, pois, mais uma vez, este Governo sente-se confortado por estar apoiado por uma maioria que não hesita em estar presente quando se trata de tomar decisões difíceis.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Costa (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, muito rapidamente, para que não se gere qualquer equívoco no decurso dos trabalhos, para que não haja confusão entre o não apoiarmos a decisão do Governo português e o não apoiarmos um português, porque apoiaremos sempre, em qualquer circunstância, qualquer português que, ao serviço do Estado, preste serviço no Iraque, ainda que em cumprimento de uma decisão errada.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É um "nim"!

O Orador: - Não confundimos a condenação da posição do Governo português com a falta de solidariedade para com qualquer agente da força de segurança ou militar português que preste serviço, em nome de Portugal, em qualquer parte do mundo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - A Mesa regista a posição do Sr. Deputado António Costa e congratula-se com ela.

O Sr. António Costa (PS): - Falei em nome do Partido Socialista.

O Sr. Presidente: - Em nome do Partido Socialista, evidentemente.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Primeiro-Ministro?

O Sr. Primeiro-Ministro: - Para fazer uma interpelação à Mesa, nos termos semelhantes…

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, gostaria de registar com satisfação a posição que o Sr. Deputado António Costa acaba de anunciar, dizendo que, embora discorde da decisão do Governo, apoiará as forças de segurança portuguesas que estiverem no Iraque.

O Sr. António Costa (PS): - Claro!

O Orador: - Tomo esta posição como tendo sido manifestada no bom sentido.

Vozes do PS: - Com certeza!

O Orador: - Espero que da próxima vez, quando tomarmos decisões de política externa, não tenham medo, nem vergonha, de fazer o consenso com a maioria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

O Sr. António Costa (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

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O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, gostaria que fosse para uma interpelação, porque, com certeza, não pode passar sequer pela minha cabeça, nem decerto pela de V. Ex.ª, que o Sr. Primeiro-Ministro tenha querido ofender a honra da bancada do Partido Socialista.

Vozes do PSD: - Oh!…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ofender?!

O Sr. Presidente: - Com certeza que não, mas tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, quero apenas dizer que não fica bem ao Sr. Primeiro-Ministro esse mau sentido de humor, que sabe que é insultuoso. Não lhe admitimos sequer que alguma vez lhe possa passar pela cabeça que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, o Partido Socialista ou qualquer um dos seus Deputados, não apoiasse, sempre e em quaisquer circunstâncias, as forças portuguesas, militares ou de segurança, que, em nome de Portugal, prestem serviço em qualquer ponto do mundo.

Aplausos do PS.

Não admitimos sequer que esta dúvida lhe passe pela cabeça.
Uma coisa é a divergência política entre nós e o Governo, outra é o dever de solidariedade, que todos sempre teremos e que honraremos como sempre fizemos, para com aqueles que, em nome de Portugal, prestam serviço em qualquer ponto do mundo.

Aplausos do PS.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Primeiro-Ministro?

O Sr. Primeiro-Ministro: - Também para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa, por que é que está tão azedo e tão agressivo? Eu disse, sinceramente, que me congratulava com a vossa posição.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - E penso que ela constitui um progresso na boa direcção.
Mas, atenção, a verdade é esta: se não fosse eu ter dito o que disse, os senhores não teriam clarificado, como agora fizeram, a vossa posição.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António José Seguro (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa, mas a questão está encerrada. Não darei mais a palavra para este fim. Tenha paciência.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, tenho o direito de colocar questões à Mesa.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado? Porém, se for sobre este mesmo incidente, estamos esclarecidíssimos.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, a interpelação que quero fazer é sobre a condução dos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Se é sobre a condução dos trabalhos, é contra mim.

Risos.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas não ouvi o aparte…

O Sr. Presidente: - Dizia eu que a interpelação, se era sobre a condução dos trabalhos, era contra mim.

O Orador: - Não é contra o Sr. Presidente, quanto muito poderá ser uma divergência.
O Sr. Presidente sabe, porque preside a esta Assembleia, que, na distribuição dos tempos, é atribuído mais tempo ao Governo do que ao Partido Socialista.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Claro!

O Orador: - Não sei de memória qual é o tempo, mas é capaz de triplicar.
Acontece que os Deputados do Partido Socialista não podem, em cada momento, clarificar as suas posições - eu, por exemplo, fiz uma intervenção, que foi comentada por vários Srs. Deputados, e, depois, não pude clarificar a minha posição. Portanto, é normal que o Sr. Deputado António Costa, como líder do grupo parlamentar, tenha clarificado a nossa posição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não aceitamos que uma clarificação de posição, porque não dispomos do mesmo tempo que o Governo, sobre esta matéria seja manipulada pelo Sr. Primeiro-Ministro como se fosse uma evolução do pensamento do Grupo Parlamentar do PS.
Esta é uma situação inaceitável, Sr. Presidente, porque tem a ver com a forma como é feita a organização dos trabalhos.
Agradeço, Sr. Presidente, que me tenha sido concedida a palavra.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António José Seguro, a distribuição dos tempos pelos vários grupos parlamentares obedece a uma lógica de proporcionalidade.

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O Governo, pela sua parte, tem de responder a todos os grupos parlamentares, e, por isso, como é natural, dispõe de mais tempo do que o Partido Socialista. Faz parte das regras do jogo.
De qualquer modo, penso que não vale a pena prolongarmos este incidente, porque o que interessa é que a declaração do Partido Socialista foi feita, com a qual me congratulei.
Assim, apliquemos aquele velho princípio: "Tout est bien qui fini bien".
Srs. Deputados, como não há mais oradores inscritos, dou por encerrado o debate mensal, cujo tema era a situação internacional e a posição do Governo português perante a questão do Iraque.
Antes de prosseguirmos os trabalhos, aproveito para lembrar os Srs. Deputados de que às 18 horas terão lugar as votações agendadas para hoje, sendo, portanto, indispensável terem convosco os respectivos cartões electrónicos.
Vamos dar início à discussão da proposta de lei n.º 53/IX - Autoriza o Governo a legislar em matéria de tratamento e interconexão dos dados constantes das informações a prestar pelas instituições de crédito mutuantes em relação aos contratos de empréstimo à habitação bonificados.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, a proposta de lei n.º 53/IX, cujo debate vamos dar início, tem a ver com o tratamento de dados pessoais relativos ao crédito à habitação. Normalmente, este tipo de diplomas é acompanhado de um parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados, nos termos, aliás, da lei e das competências da Comissão. É normal, é prática que isto aconteça, mesmo na fase de preparação.
Ora, como não temos, nos documentos que nos foram distribuídos, esse parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados, pergunto se a Mesa tem esse parecer, se o Governo o pediu e se ele pode ser distribuído. No caso de isto não se verificar, gostaria de saber como é que vamos trabalhar, isto é legislar, sem esse elemento que me parece essencial para o debate.

O Sr. Presidente: - Obrigado, Sr. Deputado, pela sua chamada de atenção, pois trata-se de um pedido de autorização legislativa.
Em todo o caso, o que posso dizer é que a Mesa não tem o documento a que o Sr. Deputado aludiu, mas é possível que o Governo tenha algum esclarecimento a prestar sobre esse assunto no decurso do debate.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Peço a palavra para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de poder esclarecer este ponto, que me parece pertinente.
O que posso dizer é que o Governo, na preparação desta proposta de lei, consultou a Comissão Nacional de Protecção de Dados, pediu o parecer - logo, ele existe - e teve-o em atenção na elaboração da proposta de lei. E, aquando da elaboração do decreto-lei, o Governo fará naturalmente aquilo que lhe compete: ouvirá novamente a Comissão Nacional de Protecção de Dados, embora o seu parecer, nesta fase preliminar, já seja suficiente.
Quero com isto dizer que, sem prejuízo de poder enviar esse parecer aos vários grupos parlamentares, para dele terem conhecimento, está cumprida esta formalidade, e, repito, na elaboração do decreto-lei, que terá lugar em momento posterior, voltará a ser cumprida.
Portanto, esta questão é tão simples e clara quanto isto, pelo que, a meu ver, não haverá qualquer problema, qualquer dificuldade.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que, obviamente, não temos qualquer razão para não acreditar nas palavras do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, mas, como é evidente, seria importante que o Governo, se possível ainda durante o debate do diploma, nos fizesse chegar o parecer, para termos sobre a mesa todos os elementos essenciais ao debate.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares já se disponibilizou para esse efeito.
Portanto, logo que ele chegue à Mesa, fá-lo-ei distribuir por todos os grupos parlamentares.

O Sr. José Magalhães (PS): - Peço a palavra para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação é exactamente sobre o mesmo tema e no seguinte sentido: compreendo que o Governo tenha feito as diligências que foram agora sintetizadas pelo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, mas, no quadro das regras de separação de poderes, qualquer consulta que o Governo tenha feito tem um carácter preliminar.
Após a entrada de um diploma na Assembleia da República, como o Sr. Presidente sabe, ela própria não pode eximir-se do dever de accionar as entidades que devem emitir parecer. Aliás, a Comissão Nacional de Protecção de Dados tem chamado a atenção do Parlamento, o que ainda aconteceu há dias em relação à 1.ª Comissão, para o facto de, frequentemente, por equívocos quanto à natureza dos diplomas, essa consulta não se realizar.
Neste caso, Sr. Presidente, há tempo para a tal consulta, dadas as condições em que vamos iniciar o debate, que não permitirão sequer que se faça a votação na generalidade

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do diploma hoje quanto mais a votação na especialidade. Portanto, como contamos com alguns dias de delonga, não há qualquer razão para que a proposta de lei não seja enviada de imediato à Comissão Nacional de Protecção de Dados, que, atentos os seus trabalhos anteriores, que assumem carácter preparatório, certamente não terá dificuldade em pronunciar-se sobre os termos do articulado do pedido de autorização.
Julgo, Sr. Presidente, que a não consulta da Comissão Nacional de Protecção de Dados resultou apenas do facto de os pedidos de autorização legislativa, como V. Ex.ª sabe, não terem trabalho prévio de comissão. Se tivessem esse trabalho prévio, certamente que esta questão teria sido detectada e diagnosticada.
Assim, Sr. Presidente, propomos que se aproveite este compasso de espera para, em adequada articulação institucional, consultar de imediato a Comissão Nacional de Protecção de Dados, informando-a da tramitação e do calendário previsto para a aprovação do diploma.
Por último, é evidente que o Governo, quando elaborar o decreto-lei ao abrigo desta autorização legislativa, terá de consultar de novo a Comissão Nacional de Protecção de Dados face a esse articulado. Mas desta multiplicidade de consultas não resulta qualquer perda, são garantias de segurança,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Claro!

O Orador: - … de boa qualidade e de protecção dos direitos dos cidadãos.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para intervir ainda sobre este assunto.

O Sr. Presidente: - Dar-lhe-ei a palavra, Sr. Ministro, e depois responderei às várias interpelações.
Tem a palavra, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, vou fazer uma interpelação bastante mais breve do que a do Sr. Deputado José Magalhães, é apenas para referir, de uma forma simples e prática, dois aspectos.
O primeiro é o de que já fiz chegar à Mesa e a V. Ex.ª o parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados, a que fiz referência há instantes, pedindo que seja distribuído a todos os grupos parlamentares.
O segundo é o de que, para sermos práticos, não é o Governo que recomenda o que quer que seja à Assembleia da República, mas não vê qualquer inconveniente em que, no espaço desta semana, entre o debate, que ocorre hoje, e o dia da votação, que será na próxima semana, a Assembleia entenda também consultar a mesma Comissão. É tão simples quanto isto. Simplifiquemos aquilo que pode e deve ser simplificado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sobre a matéria da interpelação do Sr. Deputado José Magalhães devo dizer que o facto de esta proposta de lei não ter sido objecto de trabalho em comissão resulta do próprio Regimento, que exclui a baixa à comissão, excepto em casos excepcionais, que se têm obviamente verificado, das propostas de lei de autorização legislativa.
Em todo o caso, como há acordo, podemos perfeitamente ouvir a Comissão Nacional de Protecção de Dados. De qualquer modo, penso que seriam respeitadas as suas prerrogativas e as garantias, solicitadas na sua intervenção, na fase da execução da autorização legislativa.
Mas, uma vez que há acordo, pediremos um parecer à Comissão Nacional de Protecção de Dados e, em princípio, não haverá qualquer problema em que assim se faça; não haverá certamente por parte da Mesa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, concordando com tudo aquilo que foi dito, sugiro, para que não haja perdas de tempo, que seja a própria Mesa a tomar a diligência de solicitar o parecer à Comissão Nacional de Protecção de Dados, uma vez que só para a semana é que as comissões poderão reunir, se se determinasse a baixa à comissão da proposta de lei, e sabendo nós, porque já consta do texto do projecto de decreto-lei e porque já tínhamos consultado os membros da Comissão Nacional de Protecção de Dados nesse sentido, que a Comissão conhece o diploma e que já se pronunciou sobre ele, conforme, de resto, disse o Governo, através do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares. E, aliás, esse parecer acaba de ser distribuído pelos vários grupos parlamentares.
Portanto, proponho que seja a própria Mesa a comunicar, hoje mesmo, à Comissão Nacional de Protecção de Dados a necessidade de obter a sua posição formal sobre este diploma.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, é uma boa sugestão, que vou seguir imediatamente.
Enviarei esta proposta de lei à Comissão Nacional de Protecção de Dados, embora, com toda a franqueza, me pareça ser uma diligência superlativa. Mas, em todo o caso, fá-la-ei sem qualquer problema.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Sr. Presidente, nos termos do n.º 2 do artigo 133.º do Regimento, "Os projectos e as propostas de lei definitivamente rejeitados não podem ser renovados na mesma sessão legislativa". O que é facto é que da proposta de lei que o Governo nos apresenta

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e que vai estar em discussão de seguida consta, em anexo, um texto legislativo que é, excepto duas pequenas alterações absolutamente espúrias, um projecto de lei do Partido Socialista já "chumbado" nesta Sessão Legislativa pela maioria parlamentar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Estava mal feito!

A Oradora: - Antes de darmos início à discussão do projecto de decreto-lei, gostaria de saber se o mesmo está prejudicado, ou se a dificuldade regimental foi ultrapassada pela habilidade do pedido de autorização legislativa.
Julgo que, em benefício dos trabalhos, seria importante clarificar este ponto.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Jamila Madeira, não estamos perante o projecto de lei do PS. Além de que a impossibilidade de repetição diz respeito à iniciativa dos Deputados.
De qualquer modo, parece-me tratar-se de uma proposta diferente, embora eu não seja capaz de dizer se é ou não exactamente igual ao projecto de lei apresentado por VV. Ex.as. De resto, julgo que assinalou a existência de algumas pequenas diferenças, mas essas diferenças já bastariam para a fazer diferente.
Da minha parte, em termos regimentais, não há qualquer obstáculo à discussão deste diploma.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Essa interpretação é nova!

O Sr. Presidente: - Sem mais delongas, vamos, então, dar início à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 53/IX - Autoriza o Governo a legislar em matéria de tratamento e interconexão dos dados constantes das informações a prestar pelas instituições de crédito mutuantes em relação aos contratos de empréstimo à habitação bonificados.
Para apresentar o diploma, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças (Francisco Esteves de Carvalho): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a autorização legislativa ora em discussão tem como objectivo, no enquadramento actual, controlar o mais possível as chamadas fugas fiscais que, eventualmente, se tenham verificado. Isto é, tendo-se constatado que as actuações anteriormente desenvolvidas no mesmo sentido não estavam devidamente quantificadas, resolveu o Governo avançar com a presente proposta de lei.
Esta proposta de lei, obviamente, tem em conta o parecer da Direcção-Geral do Tesouro e, portanto, de todos os serviços envolvidos e que são pertinentes para o controlo do objectivo em causa.
Por conseguinte, é perfeitamente natural que não haja diferenciações de fundo entre o actual projecto de decreto-lei, que enforma esta proposta de lei, e os projectos de decretos-lei anteriores, que versam sobre a mesma matéria, até porque, fundamentalmente, o corpo técnico que desenvolveu a actuação de preparação dos documentos é exactamente o mesmo.
Na altura, houve a decisão de parar com o avanço do projecto de decreto-lei que estava em causa e que foi oportunamente apresentado com o objectivo de fazer um levantamento efectivo daquilo que estava em causa quer em termos de montantes actuais quer em termos de responsabilidades futuras, que deverão, obviamente, preocupar todos os Srs. Deputados e que preocupam, sobremaneira, o Governo.
Portanto, o objecto é, efectivamente, aquele que já foi referido. Isto é, procura-se, de maneira perfeitamente consentânea com a realidade, cruzar determinado tipo de informações, sem pôr em causa a segurança que essas informações devem ter, e, desta maneira, evitar o abuso, que tem vindo a verificar-se ao longo de vários anos, em termos de atribuição de bonificações a entidades que, de facto, não estavam em condições adequadas para delas beneficiar.
É este, no fundo, o objectivo, que é tão simples, que o Governo procura prosseguir, dentro da linha, aliás, daquilo que tem sido a sua actuação no passado recente.
Basicamente, é isto que tenho a dizer quanto à proposta de lei e ao respectivo projecto de decreto-lei em anexo, ficando à disposição dos Srs. Deputados para responder às questões que entendam por convenientes.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Lino de Carvalho e Joel Hasse Ferreira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, a minha pergunta destina-se a satisfazer uma curiosidade política, é certo, mas uma curiosidade.
Recordo-me que, aquando do anterior debate relativo ao projecto de lei da autoria do Partido Socialista, o Governo da maioria argumentou com a falta de oportunidade do projecto de lei, no que diz respeito à criação de uma base de dados, uma vez que o Governo tinha extinto o regime jurídico do crédito bonificado à habitação.
A minha pergunta, Sr. Secretário de Estado, é muito simples: o que é que mudou de então para cá?

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Isto é, o Governo está a pensar repor o regime do crédito bonificado à habitação? Chegou à conclusão de que os contratos anteriores, apesar de tudo, existem e que, portanto, se justificava essa criação da base de dados? Mas, se é assim, então por que é que entretanto mudou de posição?
São muitos simples as perguntas que faço, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas não é fácil de responder!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, penso que

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a primeira hipótese que colocou é apenas uma figura de retórica, não a considero de outra maneira.
O Sr. Deputado pergunta-me o que é que mudou. Sr. Deputado, no fundo, aquilo que tem orientado a actuação deste Governo é uma política de rigor. Logo, interessava ao Governo ter a perfeita noção quer dos montantes que estavam em causa em termos de bonificações futuras quer do nível de risco que envolvia eventuais fraudes que teriam a ver com bonificações indevidamente atribuídas.
Ora bem, aquilo que mudou foi, apenas, o conhecimento, que é aprofundado.

Protestos do Deputado do PCP Lino de Carvalho.

Diga.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É um aparte!

O Orador: - É uma aparte?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É um aparte.

O Orador: - Com certeza.
Portanto, importa, apenas, montar determinados esquemas que combatam essa fraude, em função daquilo que se pensa ser o prejuízo devidamente fundamentado no que toca às bonificações indevidamente prestadas.
Assim, a única coisa que mudou foi apenas uma perfeita ou uma mais profunda clarificação, na óptica do Governo, daquilo que efectivamente merece a pena ser controlado.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, com ou sem mérito, esta não é a primeira legislatura de que faço parte (mas, de qualquer maneira, estou cá com o voto), e não tenho ideia de alguma vez me ter deparado com uma situação destas.
De facto, o objecto do texto anexo ao pedido de autorização legislativa é idêntico, com umas minudências, que eu diria relevantes (citando um dos Deputados do PSD), ao projecto de lei há uns meses apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista e rejeitado nesta Câmara. O texto é análogo.
Portanto, com a abundante cópia de argumentos, V. Ex.ª tem alguma explicação para a razão de os Deputados da maioria parlamentar terem, há alguns meses, votado contra um texto praticamente análogo ao que hoje V. Ex.ª vem aqui defender, e bem - bem, mas não de uma maneira muito detalhada, embora seja para um fim análogo? Até pensei que o Sr. Secretário de Estado viria dizer: "Os senhores conhecem a proposta. É idêntica à outra. Vamos votá-la!".
Há uma outra pergunta que se impõe, que é a seguinte: na altura, os senhores não tinham uma ideia dos montantes envolvidos? Sei que é uma questão delicada, porque, na altura, o Sr. Secretário de Estado não estava a desempenhar estas funções, e agora vem, aqui, desempenhar o papel ingrato, ainda por cima "desacompanhado" pelo Ministro dos Assuntos Parlamentares, de defender um texto de uma maioria parlamentar, que é a mesma.
Entendemos a situação, e daí, também por razões de consideração, a cordialidade com que estamos a questioná-lo, mas questionamo-lo por entendermos que este é um assunto muito importante - e tanto assim é que somos favoráveis a que vá para a frente este pedido de autorização legislativa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ai que bom!

O Orador: - Sim, nós não somos daquelas pessoas que votam, como alguns que nós conhecemos, pelas assinaturas…
Sr. Secretário de Estado, vou dizer-lhe qual foi a mudança mais relevante neste texto. Foi as assinaturas! Agora, vem a assinatura do Dr. Durão Barroso e do Dr. Luís Marques Mendes, enquanto que a outra iniciativa legislativa apenas tinha as assinaturas de um conjunto de Deputados socialistas. E, nessa altura, alguns Deputados de relevo da maioria, que não sei se estarão presentes - são capazes de ter ido tomar um cafezito -,…

Risos do PS.

… esgrimiram os mais variados argumentos de carácter económico, ideológico, político e moral, no âmbito europeu, nacional, regional e outro que tal para, com uma veemência e uma violência inauditas, "chumbarem" esse projecto de lei, o tal que V. Ex.ª, hoje, tranquilamente, vem aqui defender, alterado apenas com as tais minudências. E tem toda a razão em vir defendê-lo! O que eu penso, no meu modesto entender, é que os que o atacaram não teriam lido bem ou, então, só leram as assinaturas na altura.

Vozes do PS: - Claro!

O Orador: - E agora leram as assinaturas, e foram, efectivamente, tomar um cafezinho, ou fumar cigarrito!
Portanto, a questão final é saber se o Sr. Secretário de Estado nos pode dar uma ideia, ou uma estimativa, de quanto custou essa preocupação de rigor, que o senhor tem ao trazer aqui o diploma mas que, pelos vistos, mais ninguém teve. Ou seja, o Sr. Secretário de Estado pode dar-nos uma ideia do custo do adiamento, de Outubro até Maio, desta não-fiscalização e do adiamento desta decisão, que foi causado por uma maioria, onde há elementos que estão sempre a falar do grande sentido de decisão, e, neste caso, quem está a tê-la é o Sr. Secretário de Estado? Mas houve quem, antes de si, não a tivesse e houve, numa maioria parlamentar, quem tivesse uma má decisão?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, devo dizer que, nas intervenções que foram feitas, estranhei, com toda a franqueza, a apresentação de propostas, através de processos que, obviamente, não domino mas que têm, com certeza, a sua fundamentação no Regimento e na lei portuguesa, que levam a um adiamento da implementação de qualquer coisa, que, no fundo, a meu ver, é no interesse de todos nós.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

Protestos do Deputado do PS Joel Hasse Ferreira.

O Orador: - Exactamente, e o Sr. Deputado acabou de referir isso. Portanto, não quero deixar passar a oportunidade de mostrar a minha estranheza por essa actuação.
Obviamente, não sou capaz de lhe dizer com rigor, com aquele rigor matemático que seria desejável e que o Sr. Deputado, com certeza, gostaria de ter, quanto é que o Estado português terá perdido em termos de bonificações dadas sem fundamentação efectiva.
No entanto, para ter uma ordem de grandeza, posso referir-lhe aqueles que são os montantes das bonificações previstas para este ano, para o próximo ano e para o futuro próximo. Trata-se de montantes extremamente significativos, pela amostragem que, entretanto, os serviços competentes - e repare que, quando falo em serviços competentes, não estou a ver aqui qualquer enviesamento de natureza política, nem nada que tenha a ver com as assinaturas de quem subscreve as propostas de lei ou os decretos-lei - detectaram, tendo os mesmos serviços apurado que há um conjunto de situações que merecem, de facto, um tratamento adequado.
Daí termos avançado com este projecto de decreto-lei, que é, e posso dizê-lo sem qualquer rebuço, muito idêntico àquele que foi apresentado oportunamente.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - É igual, Sr. Secretário de Estado! É igual!

O Orador: - Aliás, desde o princípio que o refiro, o que mostra, de facto, uma bondade alargada relativamente a este projecto de decreto-lei. Agora, como tudo na vida, há momentos mais e menos oportunos para lançar ou para implementar determinadas medidas legislativas.
Em suma, quisemos ter um conhecimento exacto da situação, antes de fazer a implementação de uma medida que consideramos correcta.
É o que tenho a dizer.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Cardão.

O Sr. Pinho Cardão (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 53/IX visa autorizar o Governo a legislar em matéria de tratamento e interconexão dos dados constantes das informações a prestar pelas instituições de crédito mutuantes em relação aos contratos de empréstimo à habitação bonificados.
Esta autorização legislativa tem como finalidade permitir o cumprimento do estabelecido no Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de Novembro, que sistematizou legislação referente ao regime de crédito à habitação, considerando também as alterações resultantes do Decreto-Lei n.º 137-B/99, de 22 de Abril, e do Decreto-Lei n.º 320/2000, de 15 de Dezembro. Isto é, o Governo pede autorização para completar leis ainda do anterior governo, ainda em velocidade de cruzeiro e não já em fim de ciclo, dado que a legislação data de 1998, 1999 e 2000.
O Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de Novembro, veio substituir o Decreto-Lei n.º 328-B/86, que regulava a aquisição e construção de habitação nos regimes gerais de crédito, crédito bonificado e crédito jovem bonificado.
O tratamento da informação respeitante ao crédito bonificado e ao pagamento das bonificações não aparece explicitamente previsto no Decreto-Lei n.º 349/98.
Com efeito, não há a previsão nem o estabelecimento de um acompanhamento sistemático de uma verificação continuada e até da própria obrigação de informação, na medida em que o modelo de informação é remetido para despacho normativo posterior.
Para colmatar esta lacuna, o Governo fez sair o Decreto-Lei n.º 137-B/99, de 22 de Abril, que contém uma norma subordinada ao título "Acompanhamento, verificação e obrigação de informação". Como pressuposto deste acompanhamento, este novo diploma prevê no artigo 3.º a necessidade de tratamento dos dados, estabelecendo-se nesse artigo que "O tratamento e interconexão de dados necessários em matéria de acompanhamento, verificação e fiscalização de execução do disposto no Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de Novembro, serão objecto de diploma específico".
É da autorização legislativa para este diploma específico que estamos a tratar, quatro anos após a publicação do corpo da legislação que o previu, tendo o governo do PS disposto de três anos para o fazer.
A proposta de lei de autorização legislativa agora em apreciação cumpre plenamente as disposições constitucionais, nomeadamente o n.º 2 do artigo 165.º da Constituição, que estabelece que "As leis de autorização legislativa devem definir o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização (…)".
Com efeito, a proposta de lei define: o objecto de autorização - legislar em matéria de tratamento e interconexão de dados referentes a cada um dos contratos de crédito bonificado à habitação; o sentido da autorização - permitir o acompanhamento, verificação e fiscalização do cumprimento do disposto no Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de Novembro, e nos decretos-leis subsequentes; a extensão da autorização; as condições, garantias e limites a observar no acesso, tratamento, transmissão e conservação dos dados, no respeito da Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro; e a duração da autorização - 90 dias.
Em anexo, o Governo apresenta uma formulação do futuro diploma, em relação ao qual interessa salientar os seguintes aspectos: é criada uma base de dados junto da Direcção-Geral do Tesouro; o tratamento dessa base de dados é cometido àquela Direcção-Geral; e prevê-se a subcontratação do tratamento dos dados a outro organismo público, por conta do organismo responsável, aparecendo a figura do subcontratante já prevista na Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro - Lei da Protecção de Dados Pessoais.
O pedido de autorização legislativa é justificado pelo facto de a matéria sobre a qual se pretende legislar caber na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República e respeita as normas constitucionais em vigor, como também respeita o estabelecido na Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro - Lei da Protecção de Dados Pessoais.
Neste âmbito, o Governo ouviu a Comissão Nacional de Protecção de Dados, que emitiu o respectivo parecer, que, aliás, já foi distribuído, sendo o mesmo positivo. Tal situação não ocorria em 16 de Outubro de 2002, quando um diploma semelhante foi discutido nesta Câmara.

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Caberá ainda referir a importância da criação do tratamento e interconexão dos dados em causa, como forma de moralizar e prevenir fraudes, de disciplinar a continuação da concessão das bonificações e de punir quem delas vem beneficiando fora das normas em vigor.
Assim sendo, justifica-se plenamente a aprovação pela Assembleia da República do pedido de autorização legislativa, pelo que o PSD lhe dá o seu voto favorável.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por último, tem interesse referir que o Decreto-Lei n.º 349/98 remetia para legislação posterior muitas matérias: acesso ao crédito bonificado, condições de empréstimo, modelo de informação a prestar pelas instituições de crédito, taxa de referência para o cálculo das bonificações, mudança de regime de crédito e de instituição de crédito mutuante e transição de regime.
Apesar de não existir esta legislação posterior, o diploma, assinado pelo Primeiro-Ministro e por três ministros, referia que entraria em vigor no dia imediato ao da sua promulgação, ou seja, em 13 de Outubro de 1998.
Mas o Decreto-Lei n.º 137-B/99, de 22 de Abril, que veio aperfeiçoar algumas disposições do diploma anterior e preencher lacunas existentes, também remete várias matérias para legislação posterior. Este diploma tem apenas cinco artigos e em três deles remete-se para legislação posterior.
Também o Decreto-Lei n.º 320/2000, de 15 de Dezembro, remete para legislação posterior pelo menos seis matérias e, uma vez mais, o modelo de informação a prestar. No entanto, o diploma estabelece a entrada em vigor imediata de certas disposições, de outras passados 120 dias e ainda bastantes regimes específicos.
Julgo que esta caótica situação, que dificulta ou inviabiliza a entrada em funcionamento dos diplomas, perdendo-se o seu efeito substancial, deveria merecer a devida atenção desta Câmara.
Utilizando uma metáfora, a situação relatada, se transportada da esfera jurídica para a da engenharia, equivaleria à entrega de uma barragem, à EDP, por exemplo, em que o construtor deixasse para momento posterior a montagem do equipamento de descarga de fundos, ou da instalação das turbinas, ou das comportas.
De facto, para eventuais efeitos de propaganda e para ser inaugurada, a empresa lá estava; produzir os seus efeitos, isto é, produzir energia, seria coisa secundária, daqui a uns anos as turbinas seriam montadas.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Ou, noutro campo, seria como começar uma competição oficial de futebol, em que as regras do jogo não estivessem todas definidas e as normas disciplinares ficassem para momento posterior.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - No fundo, valeria tudo. Mas, afinal de contas, era capaz de haver jogo.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Decreto-Lei n.º 349/98 saiu e o Governo mostrou serviço em matéria bem sensível: apareceu na televisão e projectou uma imagem de trabalho e de preocupação social.
Passados cinco meses, saiu o Decreto-Lei n.º 137-B/99, e o Governo continuou a mostrar serviço: aperfeiçoou a lei, procurou maior transparência, e, com isso, melhorou imagem.
Passados 20 meses, saiu o Decreto-Lei n.º 320/2000 para "maior simplicidade e clarificação legislativa", e o Governo continuou a apresentar serviço no que respeita ao crédito à habitação.
Se, mesmo assim, algumas disposições do diploma de 1998 ainda não estavam em vigor, bom, isso era de somenos importância. No entanto, não deixa de ser um modo iníquo de governar, porque as matérias não são bem estudadas (o importante é tratar da imagem e fazer sair diplomas no momento certo), porque não são preparados em tempo útil todos os diplomas referidos no corpo legislativo, vindo estes diplomas complementares a ser sucessivamente adiados, porque a lei perde eficácia em disposições importantes e decisivas, porque em alguns aspectos a lei não pode, pura e simplesmente, ser aplicada - mas, para efeitos de imagem, importa mais a saída de 10 diplomas sucessivos mal feitos sobre a mesma matéria do que uma lei muito bem feita -, porque, infelizmente, não contavam com os custos de alterações sucessivas, com a manta de retalhos em que os diplomas se tornavam, com as dificuldades de interpretação que geravam, com a ineficácia e burocracia que provocavam e continuam a provocar, com o descrédito das instituições que acarretavam e continuam a acarretar e com a falta de ética que se instalava, aproveitando-se da situação, obviamente, os prevaricadores.
Têm culpa os governos, e, neste caso, o governo do Partido Socialista, mas os juristas também não ficam isentos de culpa na obra que se apresenta.

Vozes do PS: - Não apoiado!

O Orador: - Quase apetecia glosar o poema A Balada da Neve, do excelente poeta Augusto Gil, "Mas as crianças, Senhor,/porque lhes dais tanta dor?!…/Porque padecem assim?!…", dizendo: "Mas os cidadãos, Senhor,/porque lhes dais tanta dor?!…/Porque padecem assim?!…" ou, em relação aos juristas, "Mas os juristas, Senhor,/porque trabalham assim?!…".

Risos.

O Sr. José Magalhães (PS): - "Mas os Deputados, Senhor,/porque discursam assim?!…".

Risos.

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não se compreende esta situação. Uma lei, ou um corpo de leis, deveria ser imediatamente posta em execução na sua globalidade, deveria obrigatoriamente anexar toda a legislação para ser promulgada.
Também aqui, mas sobretudo aqui, deveria haver a preocupação da qualidade e da produtividade. Mas, infelizmente, apenas somos bons a aconselhar a qualidade e a produtividades aos outros. E nisto, francamente, o PS continua a ser um emérito mestre.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - É a maior desclassificação pessoal que eu já vi!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como já está na hora regimental de votações, vamos interromper o debate, que será posteriormente retomado, com o pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, em mais um gesto que reconhece e, do meu ponto de vista, enobrece a Assembleia da República enquanto centro do debate político, o Sr. Primeiro-Ministro veio hoje aqui, em primeira mão, fazer um anúncio importante à Assembleia, facto que, por parte das bancadas da maioria, como foi anunciado pelo Sr. Deputado Guilherme Silva, deu origem à apresentação de um voto de congratulação pelas medidas hoje aqui anunciadas pelo Governo.
As bancadas da maioria estão cientes de que, atendendo a que não foi possível apresentar à Câmara este voto antes de o Sr. Primeiro-Ministro anunciar estas medidas, só com o consenso de toda a Câmara será possível fazer hoje a sua votação.
No entanto, quer pelo gesto importante de o Governo ter vindo aqui hoje anunciar, em primeira mão, esta medida relevante para o País, quer pela importância que o assunto tem, solicito à Mesa que tente obter junto das outras bancadas o consenso para que, independentemente da posição de cada um, com clareza, o Parlamento tome hoje uma posição relativamente ao voto que foi apresentado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Marques Guedes coloca o problema nos termos exactos. A Mesa recebeu este documento em condições diferentes daquelas que o Regimento exige, não o podendo, portanto, pôr à votação, a não ser que haja consenso de todas as bancadas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não damos consenso, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Vejo que existe uma bancada que não dá o seu consenso…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Nós também não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Já são duas as bancadas a oporem-se. Portanto, não há consenso para que se proceda à votação do voto apresentado pelo PSD e CDS-PP.
Sr. Deputado Luís Marques Guedes, este voto será discutido e votado na próxima semana e, nessa altura, teremos oportunidade de fazer as intervenções que estão previstas no Regimento sobre a substância do voto em causa.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, a questão que quero suscitar tem a ver com um requerimento, apresentado por nós e demais Deputados, já que contém 10 assinaturas, de baixa à 4.ª Comissão, sem votação, do projecto de resolução n.º 64/IX, de Os Verdes, que esteve em debate na semana passada.
Neste requerimento pedimos a baixa à comissão por 60 dias, no pressuposto de que a sua votação ocorreria na semana passada. Ora, não tendo ele sido votado na semana passada, significa que o prazo de 60 dias vai para além da data limite que a Assembleia da República fixou para a conclusão dos seus trabalhos. Assim, pergunto, Sr. Presidente, se há possibilidade de esse prazo de 60 dias ser encurtado para 50 por razões que me parecem evidentes.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, a sua questão dirige-se não à Mesa mas aos outros subscritores do requerimento.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Também!

O Sr. Presidente: - Chamo, no entanto, a atenção dos Srs. Deputados de que existe um outro requerimento sobre matéria análoga referente a um projecto de lei do Partido Socialista.
De qualquer modo, pergunto à Câmara se há consenso para essa alteração.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, Sr. Presidente.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr. Presidente, acho que os dois requerimentos devem ter tratamento igual.
Este é um prazo máximo e, portanto, esperamos que seja possível que estes assuntos possam ser tratados em comissão num prazo inferior aos 60 dias, até para dar azo a que, na últimas reuniões desta Sessão Legislativa, eles possam subir a Plenário, se assim for entendimento das comissões que os vão analisar.
Pela nossa parte não sentimos necessidade de alterar o prazo previsto no requerimento. Mas, como é evidente, a nossa bancada tem toda a disponibilidade para procurar que o documento esteja em condições de subir a Plenário ainda durante esta Sessão Legislativa.

O Sr. Presidente: - Faremos um pedido nesse sentido ao Sr. Presidente da 4.ª Comissão.
Srs. Deputados, agora sim, vamos dar início ao período regimental de votações, começando por proceder à verificação do quórum de votação, utilizando, para isso, o cartão electrónico.

Pausa.

Srs. Deputados, de acordo com o quadro electrónico, há 180 presenças, pelo que temos quórum mais do que suficiente para procedermos às votações.

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Em primeiro lugar, vamos votar o requerimento, apresentado pelo PS, PSD e CDS-PP, de baixa à 4.ª Comissão, sem votação e pelo prazo de 60 dias, do projecto de lei n.º 24/IX - Cria o sistema de vigilância e controlo do exercício da actividade de dragagens e extracção de inertes (PS). Subentende-se que o prazo máximo é de 60 dias.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, aprovado o requerimento de baixa à Comissão, fica prejudicada a votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 24/IX.
Vamos, agora, votar o requerimento, apresentado pelo PS, PCP, BE e Os Verdes, de baixa à 4.ª Comissão, sem votação e pelo prazo de 60 dias, do projecto de resolução n.º 64/IX - Sobre a informação, avaliação e disciplina na actividade de extracção de areias em meio hídrico (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, aprovado o requerimento fica, portanto, prejudicada a votação, na generalidade, do projecto de resolução n.º 64/IX.
Vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 165/IX - Estabelece a inversão do ónus da prova no âmbito da prestação de serviço público (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global da proposta de lei n.º 55/IX - Altera o n.º 22 do artigo 11.º e o artigo 33.º do Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 41 969, de 24 de Novembro de 1958.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma declaração de voto oral.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Chegámos ao fim do processo de discussão da proposta de lei que altera as taxas do Código da Sisa. Chegámos ao fim, depois de um caminho atribulado, devido à forma como o Governo, inicialmente, apresentou a proposta. Mas chegámos ao fim, apesar de tudo e ainda de algumas modificações do texto final, com uma forma melhor do que a que a proposta de lei tinha quando deu entrada na Assembleia.
Regista-se, sem dúvida, um recuo político do Governo nesta matéria. Se, por um lado, para nós, nunca mereceu dúvidas a bondade da baixa da taxa da sisa e o desaparecimento total do imposto, era óbvio, como dissemos na altura, que o Governo não poderia fazer um desagravamento fiscal à custa de receitas que pertenciam a outras entidades, no caso, aos municípios.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo iniciou este processo dizendo que se recusava a compensar a diminuição das receitas fiscais das autarquias e que insistia numa redução da taxa da sisa a favor dos cidadãos, mas à custa destas receitas.
No decurso do processo de debate que fizemos da Comissão de Economia e Finanças e após a audição da Associação Nacional de Municípios Portugueses, o Governo achou por bem recuar nesta matéria, aceitando a inserção do princípio da compensação aos municípios pela quebra da receita que vier a verificar-se em resultado da aplicação do diploma, princípio este que será estabelecido em sede do Orçamento do Estado. Como é sabido, o PCP, juntamente com outras bancadas, apresentou uma proposta para que o princípio da compensação fosse já inserido a partir do próximo Orçamento do Estado.
O PSD e o CDS-PP, aliás na linha do que o Sr. Deputado Guilherme Silva se tinha comprometido publicamente,…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sim, sim!

O Orador: - … entendeu rejeitar essas propostas e apresentar uma outra em que admite o princípio da compensação sem fixar uma data.
Sr. Presidente, em nossa opinião, é esta a nossa interpretação, este dispositivo, que agora aparece no texto final, é para ser cumprido e já no próximo Orçamento do Estado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, em Outubro, aquando do seu debate, aqui estaremos a exigir ao Governo que dê cumprimento àquilo que acaba de ser aprovado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Segunda questão, Sr. Presidente, congratulamo-nos também com o facto de a proposta que fizemos, no sentido de se procurar iniciar um processo de combate à fraude e invasão fiscais em matéria de sisa com a apensação às escrituras dos documentos de celebração dos contratos-promessa de compra e venda, quando os houver, tenha sido aprovada por unanimidade.
Sabemos que isto não resolve o problema do combate à fraude, mas é um elemento constrangedor que, no mínimo, obrigará os notários, nos casos em que esses contratos existam e sejam apresentados, a ver da verdade do negócio.

O Sr. Presidente: - O seu tempo esgotou-se, Sr. Deputado. Queira terminar.

O Orador: - Foi neste contexto que votámos a favor.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: estamos aqui a terminar, hoje, um processo que não é o processo de discussão da reforma da tributação do património. Essa discussão será feita, atempadamente, com a participação activa e construtiva do Partido Socialista.

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Estamos, hoje, a fazer aqui um debate que só foi necessário pela forma atribulada como o Governo apresentou a dita reforma da tributação do património, na sequência do Conselho de Ministros de Fronteira. O Governo, não tendo medido, a seu tempo, as consequências da forma como ultrapassou essa semana difícil de governo, viu-se forçado a vir apresentar uma proposta visando minorar as consequências para o sector da habitação de uma medida que, anunciada à distância, aparentemente visava reduzir impostos a todos. São as consequências dessa efectiva medida que iremos aqui discutir.
Aliás, esta proposta só é votada hoje porque o Partido Socialista tomou a iniciativa, numa sexta-feira de manhã, de esperar, aqui, que ela desse, de facto, entrada na Mesa, ao contrário do que tinha sido anunciado. Esta proposta é votada hoje com características que resultam, por um lado, da iniciativa do Partido Socialista e de outras forças da oposição e, por outro, também de um verdadeiro levantamento nacional suscitado pelos autarcas de todo o País, face a um desagravamento de impostos feito a meio do ano, violando o princípio da estabilidade das receitas correntes, o princípio da estabilidade orçamental e fazendo um ensaio de um "choque fiscal" que o Governo prometeu, mas não fez, à custa das receitas dos municípios.
Sempre dissemos que estaríamos de acordo com a redução da taxa da sisa. O Governo acabou por ser forçado a aceitar o princípio político da compensação da perda de receitas, que, aliás, foi sempre dizendo que não existiria. Não fez qualquer estudo sobre os efeitos económicos e orçamentais desta medida. Foi, aliás, a Associação Nacional de Municípios Portugueses que ontem anunciou ter encomendado a realização de um estudo para monitorar os efeitos desta medida nos orçamentos municipais.
Estaremos atentos à preocupação com as receitas municipais e certamente, no debate do Orçamento do Estado para 2004, tomaremos as iniciativas necessárias…

O Sr. Presidente: - O seu tempo esgotou-se, Sr. Deputado. Agradeço que termine.

O Orador: - … para que as alterações feitas a esta lei sejam efectivamente cumpridas. É neste princípio e pressuposto que as aprovamos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O sentido da nossa declaração de voto é de uma grande saudação ao Governo deste país que teve a coragem de iniciar uma reforma, em contraponto com um governo que, durante seis anos, nunca a fez, embora sempre a tenha prometido.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É bom que nos lembremos de que, quando o Sr. Primeiro-Ministro se foi embora e "fugiu" das suas funções, o Partido Socialista também "fugiu". Logo, quanto à reforma de todos estes impostos, ela nunca surgiu; a sisa não acabou.
Deste modo, ao ouvir a declaração de voto do Partido Socialista, aquilo que podemos dizer é que não entendemos, depois do que o Partido Socialista fez enquanto governo em relação à matéria fiscal, como é que é possível que tenham vindo agora votar favoravelmente esta proposta de lei,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Queriam que votássemos contra?!

O Orador: - … que é uma proposta de coragem, de reanimação do mercado imobiliário, e, talvez por isso, todos os grupos parlamentares a tenham votado favoravelmente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Aquilo que pensamos é que esta aprovação por unanimidade é um bom indício de que este é o primeiro passo para uma verdadeira reforma da tributação do património, para uma reforma sustentada já apresentada pelo Governo a este Parlamento. E fazemos votos para que esta unanimidade se mantenha por ser uma prova de que o Governo apresenta propostas credíveis numa área fundamental para o País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, este foi o início de uma reforma da tributação do património positiva, e também positiva para os municípios, porque, e é bom que se diga, quando se fala em alarido, o Governo não recuou coisa nenhuma. O Governo e a maioria têm a convicção de que com estas alterações das taxas da sisa e com a reforma da tributação do património não haverá diminuição da receita fiscal. Pelo contrário, a diminuição da receita fiscal já existe, porque, como é conhecido, existe no mercado imobiliário alguma paralisação e alguns problemas. E estamos convictos de que os municípios irão ser beneficiados com estas alterações.
Portanto, o início da reforma da tributação do património é o início da reanimação do mercado e é, mais uma vez, o cumprimento, por parte do Governo, de uma reforma que, durante anos, os portugueses viram adiada. E, talvez tarde, o Partido socialista também chegou à conclusão de que tinha de votar favoravelmente algo que é muito útil para o País.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto hoje não haver pareceres da Comissão de Ética para votar, as votações regimentais estão concluídas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é para, relativamente à proposta de lei n.º 55/IX, que acabámos de votar, cuja urgência é por todos conhecida e que levou, de resto, a que, na semana passada, este Plenário tenha concedido, por unanimidade, oito dias para a votação final global, solicitar a dispensa de redacção final, uma

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vez que o diploma é não só curto como um texto muito simples, além de que foi muito escalpelizado em sede de Comissão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há alguma objecção a este requerimento?

Pausa.

Como não objecções, o requerimento é deferido.
Srs. Deputados, vamos retomar o debate da proposta de lei n.º 53/IX.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Pinho Cardão, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Narana Coissoró.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pinho Cardão, verificámos, há pouco, que o projecto de decreto-lei que o Governo apresenta é uma cópia quase integral do projecto de lei n.º 140/IX, que aqui foi discutido em Outubro. Aliás, não sei se os autores deste projecto de lei (no caso, o Partido Socialista) irão abrir algum processo judicial ao Governo por plágio!… Em todo o caso, Sr. Deputado, basta compulsar e comparar os articulados para se verificar que eles são rigorosamente iguais.

O Sr. Pinho Cardão (PSD): - Não, não!

O Orador: - Onde está artigo 3.º, n.os 1, 2 e 3 do projecto de lei, os senhores dividiram os três números em dois artigos, e assim sucessivamente.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Então, já não é igual mas parecido!

O Orador: - O conteúdo é idêntico.

O Sr. Honório Novo (PCP): - É uma cópia mal feita!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - É parecido!

O Orador: - Ora bem, em 16 de Outubro, o Sr. Deputado Hugo Velosa, em nome do PSD, disse isto:…

O Sr. José Magalhães (PS): - Disse coisas más!

O Orador: - … "Portanto, não era a criação da base de dados que vinha resolver o problema da fraude no crédito bonificado." O Sr. Deputado, agora, argumentou que a proposta do Governo se destina a moralizar e a punir as fraudes.
Foi também dito, ainda pelo Sr. Deputado Hugo Velosa, em Outubro de 2002, que o projecto de lei não assegurava "de forma transparente e no respeito pela reserva da vida privada, os direitos, liberdades e garantias fundamentais a que deve obedecer o tratamento dos dados pessoais", que não remetia, "como deveria fazer, para a Comissão Nacional de Protecção de Dados" e, finalmente, que o tal projecto de lei criava "uma base de dados que, com a extinção dos contratos futuros, se aplicaria somente aos contratos existentes, tratando-se de uma intenção mínima em relação ao que poderia fazer." Esta era a posição do PSD. E com este argumento votaram contra.
Sr. Deputado Pinho Cardão, como o projecto de decreto-lei é igual em tudo (se quiser, eu leio-o), artigo a artigo, ao projecto de lei do PS que, com este argumento, os senhores votaram contra, a minha pergunta é a de saber se o PSD se prepara para votar contra a proposta de lei do Governo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Cardão.

Pausa.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não vai responder? Também vai tomar café?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não diga que está enganado! O Sr. Deputado Pinho Cardão está calado, porque tem vergonha!

O Sr. Pinho Cardão (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, julgo que, às vezes, nem tudo o que parece é. E, de facto, aqui aquilo que parece não é. E não é porquê? Porque no projecto de lei do Partido Socialista não estava explicitamente regulada, por exemplo, a questão das medidas de segurança,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Estava, estava!

O Orador: - … quer quanto à transmissão da informação, que me parece importante em termos de direitos, liberdades e garantias do cidadão, quer quanto à informação, controle de acesso e autenticação das diversas entidades que tratam esta matéria.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, temos algo importante e fundamental que não aparecia no projecto de lei mas que aparece explicitamente no artigo 6.º, creio eu, do projecto anexo a este pedido de autorização legislativa.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Afinal, o Sr. Deputado Lino de Carvalho não sabia do que estava a falar!

O Orador: - Trata-se de uma alteração que, do meu ponto de vista, é fundamental.
Mas o enquadramento também é diferente. É que, em 7 de Outubro,…

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - 16 de Outubro, Sr. Deputado!

O Orador: - … aquando da apresentação do projecto de lei n.º 140/IX, do Partido Socialista, não havia um parecer positivo da Comissão Nacional de Protecção de Dados. Aliás, tinha sido apresentado um projecto, por parte do Partido Socialista, que teve bastante reticências da parte dessa Comissão Nacional. Por aquilo que verifiquei no documento que foi divulgado, o parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados foi feito em 22 de Outubro e, em 30 de Outubro, foi comunicado ao Chefe de Gabinete do Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças.

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Portanto, o projecto de lei do Partido Socialista não tinha um parecer favorável da Comissão Nacional de Protecção de Dados e este diploma tem-no,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Isto é importante!

O Orador: - … o que significa que, por força das alterações que foram introduzidas, este documento não é idêntico ao anterior; antes pelo contrário, este foi aperfeiçoado e teve um parecer positivo, enquanto o anterior tinha muitas reticências.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Mentira!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Não é mentira, é verdade!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Você não sabe do que está a falar! É mentiroso! Leia o dossier!

O Orador: - Sr. Presidente, terei de interromper para exercer o direito regimental de defesa da honra.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Sr. Deputado, pensei que tivesse concluído a sua resposta.

O Orador: - Não terminei, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Mas deve terminar, porque já ultrapassou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Srs. Deputados, basta lerem o parecer da Comissão Nacional para verificarem que aquilo que eu disse é verdade.
Mais ainda, Sr. Deputado Lino de Carvalho: a criação de bases de dados não vem resolver a situação das fraudes. Aliás, nenhum facto, em si, sozinho, a resolve. Vem, isso sim, ajudar a resolver a situação das fraudes em matéria de crédito bonificado. E não temos qualquer dúvida sobre isso.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Deputado, tenha vergonha! Depois desta intervenção, mais vale renunciar ao mandato!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Sr. Deputado Pinho Cardão, se não terminar de imediato, terei de lhe retirar a palavra.

O Orador: - Sr. Presidente, terminei, até porque julgo que estou a ser insultado pela bancada do Partido Socialista e tenho dignidade própria para não continuar a ser insultado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apresenta-nos hoje o Governo um pedido de autorização legislativa para elaborar um diploma cujo objectivo é o de permitir a fiscalização do cumprimento de legislação relativa ao crédito bonificado. Triste é que o Governo tenha começado por eliminar o crédito jovem bonificado, invocando a existência de fraudes, o que trouxe inúmeras consequências, hoje bem reais, para todos os jovens que contavam com essa possibilidade para adquirir a sua própria habitação, não podendo fazê-lo de outra forma. Acarretou, tal medida, prejuízos económicos para todos os jovens que haviam celebrado contratos-promessa, que pagaram um sinal e que, posteriormente, devido a tal medida, perderam todo o dinheiro entregue, pois, sem a bonificação, não poderiam concretizar o negócio. Talvez o Governo pudesse ter começado por implementar medidas como as que aqui traz hoje, em vez de ter partido da presunção de que todos os jovens eram prevaricadores e de que todos os contratos de crédito jovem bonificado eram fraudulentos.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Relativamente à proposta em apreço, levanta-nos uma especial perplexidade a possibilidade de subcontratação para o tratamento da base de dados, prevista no artigo 2.º, a apresentar na sequência da autorização legislativa. Qualquer organismo público poderá ser subcontratado, desde que ofereça garantias suficientes. Mas quem determina quais são essas garantias e se as mesmas são suficientes?
A possibilidade de subcontratação extravasa o pedido de autorização legislativa que determina que o Governo deve designar as entidades que, não sendo directamente responsáveis pelo tratamento de dados pessoais, poderão aceder a essas bases de dados. Ora, o que se verifica no projecto de decreto-lei é uma norma em branco, ou seja, pode ser encarregue outro organismo público mas não se designa, efectivamente, qual o organismo em concreto.
Outra questão que nos causa preocupação é a do acesso aos dados, prevista no artigo 6.º do projecto de diploma, que, aparentemente, limita o acesso, ao permitir que o mesmo só seja possível a pessoas devidamente credenciadas. Mas, na realidade, e perante a hipótese de subcontratação, é muito abrangente, já que possibilita essa credenciação às entidades intervenientes.
Assim, considerando que é importante que se legisle urgentemente sobre esta matéria, lamentamos, por um lado, que o Governo não o tenha feito antes mas, por outro lado, entendemos que o diploma a apresentar, na sequência da autorização legislativa, não garante totalmente os direitos e os interesses dos titulares dos dados.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Srs. Deputados, chamo a atenção das direcções dos diferentes grupos parlamentares para criarem as condições que nos permitam ter quórum de funcionamento.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Jamila Madeira.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje foi aqui dito, já por várias vezes, e muitas, em particular, pelo Sr. Primeiro-Ministro, que os Srs. Deputados deveriam ter vergonha, entre outras expressões muito associadas a esta ideia.

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O certo é que os Srs. Deputados Hugo Velosa, Diogo Feio e Jorge Nuno Sá, três dos Deputados que esgrimiram dos mais fortes argumentos contra o projecto de lei que agora se plagia, através do Governo, tiveram de tomar um cafezinho e, obviamente, não se encontram nesta Sala…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Mas olhe que na sua bancada também não está muita gente!

A Oradora: - … para não terem de fazer precisamente o argumentário contraditório a todo aquele que esgrimiram em 16 de Outubro nesta Sala.
Mas estranho é, particularmente estranho é, quando o contraditório se passa precisamente neste mesmo Plenário, o Sr. Secretário de Estado assumir que o projecto de decreto-lei é uma cópia do projecto de lei aqui apresentado e o Sr. Deputado Pinho Cardão dizer que, afinal, esta é uma boa proposta e o projecto de lei, que é igual, não era um bom projecto, apenas porque o momento não era o certo.
Portanto, estamos, efectivamente, a falar de vergonha e, de facto, deveria haver vergonha.
Mas, se vergonha deveria haver, em 16 de Outubro de 2002, precisamente no dia em que este projecto de lei, apresentado pelo Partido Socialista, foi discutido nesta Assembleia, depois de a maioria ter inviabilizado a discussão do projecto de lei que repunha o crédito bonificado, com argumentos da ordem de que a Assembleia da República não tinha poder nem competência para aprovar medidas naquele âmbito, só o Governo tinha essa incumbência, de que aquela medida vinha agravar e impossibilitar o combate à fraude, de que a reposição do crédito bonificado aumentaria a despesa pública e os níveis de poupança não seriam os mesmos - estes foram alguns dos argumentos esgrimidos, antes deste debate, neste mesmo Plenário -, discutimos, num período absolutamente aceso, com um contraditório de argumentos, esta proposta socialista para combater a fraude.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - E, enquanto o Partido Socialista avisou que, através deste projecto de lei, se poupava dinheiro e a economia e os contribuintes eram beneficiados com ele, enquanto tudo isto foi dito e, muitas vezes, sustentado, durante todo o debate, o PSD e o PP foram dizendo que o projecto de lei era extemporâneo,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E era!

A Oradora: - … que não fazia qualquer sentido que saísse dissociado do anterior, devendo ser retirado, aliás, que esperavam que isso tivesse sido feito durante o debate, porque só em conjunto é que os dois projectos faziam sentido, que se tratava apenas de um "número" político do Partido Socialista, que não tinha qualquer base, nem solidez, nem sequer estudo preliminar, que não servia para resolver os problemas da fraude e, mais, violava a protecção dos dados pessoais,…

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Exactamente!

A Oradora: - … sendo, mais uma vez, a política de laxismo do Partido Socialista. Estes foram alguns dos argumentos sucessivamente esgrimidos por qualquer um dos Deputados que anteriormente referi.
Depois de tudo isto, depois de um debate muito aceso, o PSD e o PP não pensaram mais e o seu "esquadrão armado", como tive oportunidade de referir, chumbou liminarmente o projecto de lei.
Qual não é o nosso espanto quando, volvidos quatro meses, temos uma novidade na história desta Assembleia: pela primeira vez, há um plágio legislativo. É uma vergonha! Efectivamente, é uma vergonha! E, de facto, há duas diferenças menores e muito espúrias que os separam.
O facto de estarmos a falar de um decreto anexo a uma autorização legislativa, não é, com certeza, de somenos, porque não acredito que o Sr. Ministro Marques Mendes não tenha tido essa necessidade para ultrapassar uma questão absolutamente regimental que está muito bem expressa no artigo 13.º do Regimento, que é a não apresentação do mesmo projecto duas vezes na mesma sessão legislativa.
Portanto, estamos, obviamente, perante um problema regimental que, habilmente, e como é seu timbre, o Sr. Ministro Marques Mendes tentou superar.
Srs. Deputados, se tudo isto foi dito, se tudo isto foi esgrimido e se, efectivamente, o contraditório entre o Governo e a bancada do PSD parece continuar, ou seja, o Governo, neste momento, já considera que este é um bom projecto e a bancada que apoia o Governo continua a achar que este projecto não é o projecto contra o qual o PSD esgrimiu tantos e tão veementes argumentos em 16 de Outubro, estamos perante um problema.
Mas, Srs. Deputados, o Partido Socialista soube, desde logo, que a suspensão do crédito bonificado não resolvia os problemas da despesa pública. Aliás, por isso mesmo, na execução do primeiro trimestre de 2003, já temos um acréscimo homólogo de despesa pública em relação a 2002 de mais cerca de 28 milhões de euros.
Embora o PS considere que o País escusava de ter sido penalizado com o adiamento desta proposta, entende que o Governo, tardiamente, abriu os olhos. Estamos ainda na dúvida de que o Governo, nesta perspectiva de experimentação que tem assumido, consiga convencer o PSD de que esta é uma proposta que já veio à Assembleia e que o mérito do PS deve estar em cima da mesa. De qualquer forma, mérito seja dado ao Governo, pois mais vale tarde do que nunca. Pela sua parte, o PS alertou a tempo e horas.
No entanto, é preciso que o PSD e o PP demonstrem que não é quem assina os projectos que condiciona a sua posição de "esquadrão armado" nesta Assembleia da República. É preciso que seja demonstrado que a posição dos respectivos grupos parlamentares tem a ver com o conteúdo dos projectos e das propostas de lei que aqui são apreciados.
Por isso, Srs. Deputados, depois de tudo o que foi dito em 16 de Outubro e de tudo o que foi dito hoje, o desafio é absolutamente claro: é o de que não penalizem mais o País e os justos deste país! Para isso, é preciso que, paralelamente com aquilo que foi dito por todos os Deputados que referi no dia 16 de Outubro, o Governo revogue, desde já, a suspensão do crédito bonificado para que mais cedo, em vez de mais tarde, a razão e o País deixem de ser penalizados.

Aplausos do PS.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E como é que se revoga?!

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O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Jamila Madeira, quero apenas referir aqui alguns aspectos complementares para esclarecermos bem as posições.
O termo plágio, se a Sr.ª Deputada me permite, é, pelo menos, um termo impróprio. E é um termo impróprio, porque não corresponde minimamente à verdade.
Devo dizer-lhe - e não sei mas admito que a Sr.ª Deputada não tenha experiência em termos de funcionamento de serviços - que são, efectivamente, os serviços que ajudam os membros do Governo na preparação dos documentos, na preparação dos projectos de decreto-lei, etc.
Quando fala em plágio, talvez tenha em mente a origem do documento que foi apresentado pelo PS na Assembleia, pelos vistos em Outubro do ano passado, porque o documento que aqui trazemos, que representa uma correcção e uma adaptação nos aspectos considerados pertinentes, foi feito através dos serviços e não representa qualquer plágio, não representa nada de especial, é apenas um processo normal de trabalho.
Quero referir também um aspecto que me parece fundamental: é que não há uma posição de divergência entre o Governo e a bancada do Partido Social Democrata, porque os documentos, embora com aspectos similares, têm aspectos fundamentais que os distingue.
Portanto, tudo aquilo que represente melhoramentos e uma efectiva maneira de tornar o projecto de decreto-lei mais compreensível, mais adaptado e correspondendo às formalidades legais, não pode ser considerado plágio, é, antes, uma preocupação, que considero perfeitamente pertinente e razoável, de melhoria constante em termos legislativos. Basicamente, era isto que queria referir.
Sr.ª Deputada, a noção de plágio talvez deva ser aplicada a outras entidades que não propriamente ao Governo ao apresentar este projecto de decreto-lei.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Jamila Madeira, se assim entender.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Sr. Presidente, gostaria de responder ao Sr. Secretário de Estado de uma maneira muito simples.
Suponho que o Sr. Secretário de Estado não conhece o modo de funcionamento da Assembleia da República e que, portanto, não tem noção de que, quando um projecto de lei dá entrada na Mesa e é discutido na generalidade, isso significa que, caso seja aprovado ou baixe à comissão sem votação, poderá ser discutido na especialidade e que larguíssimos pormenores podem ser alterados, pormenores profundos ou pormenores tão espúrios como os que foram alterados em relação a um projecto de lei relativamente ao qual não houve uma abstenção por parte da maioria, houve um voto contra, houve uma argumentação fortíssima para combater esta mesma ideia e toda a estrutura que estava à volta dela.
Portanto, se o Sr. Deputado Pinho Cardão está a dar esse trabalho como reciclado, considero que ele não é, obviamente, reciclado, é, antes, um trabalho que foi trazido à Assembleia para que ela o concretizasse. É nesse sentido que o Sr. Secretário de Estado está a considerar que o Governo não é a Assembleia, quando a Assembleia tem competência, tem matéria, tem facto e tem democracia suficiente, neste espectro, para conseguir mudar pormenores tão espúrios como este e para os fazer aprovar.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças, Sr.as e Srs. Deputados: Apresenta-nos o Governo uma proposta de lei de autorização para legislar numa matéria de algum modo sensível, mas cuja regulamentação é absolutamente necessária.
Esta autorização legislativa destina-se a dar exequibilidade a várias disposições do Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de Novembro, com as alterações decorrentes do Decreto-Lei n.º 137-B/99, de 22 de Abril, e do Decreto-Lei n.º 320/2000, de 15 de Dezembro.
No fundo, está o Governo da maioria a criar condições para dar aplicação efectiva a legislação do anterior governo do PS, no sentido de proteger o erário público, permitindo que os recursos financeiros do Estado não sejam malbaratados com quem não precisa e possam ser reorientados para quem verdadeiramente deles carece.
Não podemos, de todo o modo, deixar de recordar que, datando a legislação a que esta autorização legislativa pretende dar exequibilidade de um período em que estava em funções um governo socialista, a única tentativa que conhecemos para lhe dar exequibilidade data de Outubro de 2002, quando já estava em funções o Governo da maioria PSD/CDS-PP. Foi nesta altura que o Partido Socialista apresentou o projecto de lei n.º 140/IX, que cuidava de criar "uma base de dados em que constam as informações a prestar pelas instituições de crédito mutuantes em relação a cada um dos contratos de empréstimo bonificado à habitação".
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Aquando da discussão do referido projecto de lei do Partido Socialista, recordo-me bem do que disse a Sr.ª Deputada Jamila Madeira, desde logo citando um parecer imaginário de um assessor do Sr. Primeiro-Ministro. E o que disse, Sr.ª Deputada, foi o seguinte: "(…) o Governo tem de passar a ideia de que vai apoiar o arrendamento e que assim as coisas estão compensadas: anuncia que pretende fazer um novo esforço financeiro, traduzido na vontade de atribuir novos incentivos ao arrendamento jovem.
Tudo isto só pode ser anúncio, pois esta medida é muito cara, muito mais cara do que o crédito bonificado (custa cerca de quatro vezes mais, por mês, por contrato de apoio), o que implicaria um aumento do esforço financeiro do Estado, para além de que a existência de alguns casos de utilização fraudulenta podem torná-la ainda mais pesada.
Teria ainda o Governo de alargar o prazo dos empréstimos para além de 30 anos, porque esta é uma medida inócua para os jovens e, sobretudo, para aqueles que têm menores recursos, pois não é crível que as instituições

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bancárias concedam empréstimos a jovens e a famílias mais carenciadas para além do prazo de 30 anos, uma vez que estas pessoas apresentam mais riscos. Esta medida vai apenas beneficiar os interesses estabelecidos e os poderosos lobbys,…" - a dita cassete!- "… mas, no entanto, não custa nada ao Estado."

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Ainda ninguém viu o arrendamento jovem e já passou um ano!

O Orador: - Sr.ª Deputada, como vê, não tinha razão.
A verdade é que nem um mês depois era publicado o Decreto-Lei n.º 231/2002, de 2 de Novembro, que alterou o Decreto-Lei n.º 349/98, eliminando a fixação do limite do prazo máximo para o crédito de aquisição a habitação. Primeiro engano, Sr.ª Deputada!
Mas não foi só aqui.
A Lei n.º 32-A/2002, de 30 de Dezembro, mais conhecida por Lei das Grandes Opções do Plano para 2003 claramente consagra, como opção governativa para o corrente ano, a revisão da legislação sobre incentivos do arrendamento jovem, com vista à maior disseminação deste tipo de acesso à habitação em condições mais favoráveis, em particular para quem tenha 30 anos ou menos.
Cabe, ainda, observar, a propósito, que, das palavras da Sr.ª Deputada Jamila Madeira, não consta que a avisada medida que o Governo tomou no que respeita à bonificação do crédito à habitação tenha sido a causa directa de qualquer retracção do volume de crédito à habitação concedido pelos bancos portugueses. Não consta. A não ser que a Sr.ª Deputada tenha outros dados que nós não temos.
E vou dizer-lhe porquê, Sr.ª Deputada. Porque a extensão do prazo dos empréstimos para além dos 30 anos tem beneficiado precisamente quem mais necessidade tem de recorrer ao crédito à habitação, ou seja, aquelas famílias de menores recursos e os jovens, que continuam a ser os principais clientes deste tipo de crédito.
Como vê, Sr.ª Deputada, não se alterou nada e não tinha razão. Lamento dizer-lhe. Certamente que os portugueses não o lamentam!
Como vê, Sr.ª Deputada, as suas previsões estavam erradas. Tinha apenas a Sr.ª Deputada razão, retomando o tal imaginário parecer citado por V. Ex.ª, que eu não encontrei - e procurei-o -, no que respeita ao combate à fraude, que é necessariamente um caminho a trilhar.
É por isso também que o CDS-PP votará favoravelmente a presente proposta de lei de autorização legislativa, que, devo dizer, Sr.ª Deputada, nem que fosse igual à vossa - e não é, por razões que o Sr. Deputado Pinho Cardão já referiu -, devia enchê-la de satisfação. Mas não. A Sr.ª Deputada, em vez de dizer "Olhe, mais vale tarde do que nunca. Afinal, tínhamos razão", ou o que quer que fosse,…

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Foi o que fizemos!

O Orador: - … parece que está ressentida por alguma coisa que o PS defendeu - ainda que não quando estava no Governo, porque os senhores mudam consoante estão no Governo ou na oposição!… Isto devia ser razão de regozijo, Sr.ª Deputada… Mas, quem sabe?, um dia será!…

Protestos do PS.

Terminando, Sr.ª Deputada, porque o tempo é escasso, infelizmente, com pena minha, com a presente autorização legislativa e, como melhor se vê, com o projecto de decreto-lei que à mesma vem apensa, o Governo propõe-se criar uma base de dados junto da Direcção-Geral do Tesouro destinada a tratar e a interconectar os dados constantes das informações a prestar pelas instituições de crédito mutuantes em relação a cada um dos contratos de empréstimo bonificado à habitação.
O objectivo é o de evitar a fraude e, por isso, é óbvio que a Direcção-Geral dos Impostos e a Inspecção-Geral de Finanças podem aceder aos dados armazenados para efeitos de controlo do cumprimento, pelas instituições de crédito mutuantes, das obrigações subjacentes à atribuição do crédito bonificado.
Assim, a Direcção-Geral dos Impostos fica autorizada, através do processamento informático, a relacionar os dados tratados com os dados do seu próprio sistema informático, para efeitos da indispensável confirmação da informação relativa aos rendimentos do agregado familiar relevantes para enquadramento na classe de bonificação do juro a suportar pelo Estado. Porque é aqui que está o cerne da fraude: em esconder rendimentos para obter maiores bonificações, coisa que, com alguma demagogia, o Partido Socialista nunca referiu. Falava sempre em "bonificação, bonificação, bonificação…" e sobre o cerne da questão, ou seja, a fraude na bonificação, curiosamente, nada dizia.

Protestos da Deputada do PS Jamila Madeira.

Não sei se é pelo facto de, à data, o Algarve ser particularmente favorecido com esta coisa de o crédito e de a bonificação serem, como parece, em número muito superior àquilo que era suposto serem residências!… Mas, enfim…!

Protestos do PS.

O governo socialista sabia disto, o Partido Socialista sabia disto, toda a gente sabia disto, mas, como já vem sendo habitual, tem de ser um Governo da maioria a pôr em execução aquilo que o Partido Socialista, com alguma demagogia, vai defendendo em alguns momentos!…
A finalizar não resisto a citar, mais uma vez, a Sr.ª Deputada Jamila Madeira no dito debate: "O projecto de lei n.º 140/IX, que estamos a discutir, não se sente amputado pela perda do seu par. A sua legitimidade e a sua oportunidade política mantêm-se inabaláveis.
O projecto de lei que discutimos assume-se como instrumento de política social, mas também como uma prova de responsabilidade e um desafio para avaliar quem está verdadeiramente empenhado na luta contra a fraude.
É a diferença entre quem corta de forma cega e só aumenta os impostos aos cumpridores e quem, militante da justiça social, insiste em lutar para que a lei não beneficie o infractor."

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A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - E vocês votaram contra!…

O Orador: - O "par" a que a Sr.ª Deputada se referia, explique-se, era o projecto de lei n.º 139/IX, que pretendia revogar as alterações que este Governo introduziu no regime do crédito bonificado.
Fica dada a explicação, Sr.ª Deputada Jamila Madeira e Srs. Deputados do Partido Socialista, sendo que no mais, naturalmente, concordaria e subscreveria por baixo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - A evolução é sempre positiva! Mais vale tarde do que nunca!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Srs. Deputados, inscreveu-se, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge Nuno Sá, que não poderá fazê-la porque não dispõe de tempo. Aliás, o tempo atribuído ao seu partido é já negativo. A não ser que algum grupo parlamentar lho ceda.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Sr. Presidente, o PCP e o PP cedem-me tempo.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Então, tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Sr. Presidente, agradecendo, desde já, ao Partido Comunista Português e ao Partido Popular a cedência de tempo, aproveito para lamentar que a Sr.ª Deputada Jamila Madeira tivesse aproveitado a minha ausência momentânea do Plenário para me acusar de estar a tomar um cafezinho. Sr.ª Deputada, cafezinhos andaram a tomar, durante seis anos, muitos dos que se sentam nessa bancada, distraídos com o que se passava neste país! Mas essa é outra questão!…
Certamente, a Sr.ª Deputada tomou hoje alguma coisa que perturbou a sua intervenção de forma muito séria. Isto porque, além de o projecto de decreto-lei, como já ficou demonstrado à exaustão, não ser igual ao projecto de lei do Partido Socialista - e o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo já lhe disse que devia estar a regozijar-se com a intervenção do Governo e com esta alteração legislativa -, a Sr.ª Deputada disse, mais uma vez, uma série de não verdades, de inverdades, sobre a questão do crédito bonificado.
Sr.ª Deputada Jamila Madeira, use números. Nos últimos meses, baixou a compra de habitação por parte dos jovens em Portugal? Não baixou! O crédito bonificado não alterou a venda de habitação aos jovens em Portugal!

Protestos da Deputada do PS Jamila Madeira.

Sr.ª Deputada, sabe o que devia ter feito hoje? Devia, na sua intervenção, ter-se regozijado pela alteração ao Código da Sisa,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … porque vem beneficiar exactamente os jovens pela compra da primeira habitação e os valores mais baixos de habitação. O seu discurso está completamente fora de tempo.
Já debatemos aqui o crédito bonificado, que é uma falsa questão, três ou quatro vezes, a seu pedido, e sempre pela sua boca, mas, claramente, não sabe do que está a falar, claramente está a fugir aos números e ao rigor deste debate. Aliás, em vários debates já lhe perguntei, e nunca me respondeu, por que é que o crédito bonificado tem a terceira maior taxa de incidência no Algarve. A Sr.ª Deputada nunca me respondeu a essa pergunta. Como por responder está a questão de saber por que razão, em Portugal, os números de vendas de casas a jovens não baixou nos últimos meses. Segundo as suas teorias, que ainda há pouco foram lembradas, já teriam baixado e não teríamos jovens a comprar habitação em Portugal. Ora, isso não aconteceu, Sr.ª Deputada! As alterações ao Código da Sisa, que hoje votámos, vêm beneficiar e dar condições aos jovens portugueses, porque as habitações de valor mais baixo ficarão isentas de sisa, o que será, certamente, uma ajuda e uma mais-valia para os jovens portugueses.
Sr.ª Deputada, apelo a que, em vez de se preocupar com os cafezinhos dos outros, comece a preocupar-se com as suas intervenções e em ter mais rigor nelas, pois com isso beneficiamos todos nós e também o País.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Jamila Madeira.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Sr. Presidente, não é para fazer uma pergunta, porque julgo que a intervenção do Sr. Deputado não se coaduna a perguntas, é para um protesto.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Então, tem a palavra para protestar.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Sr. Presidente, protesto porque este discurso era extemporâneo em 16 de Outubro, continua a ser extemporâneo hoje e o plágio, seja ele legislativo, seja ele interpretado como se quiser, continua a não ser assumido pelo Sr. Deputado. Mas a história contará a verdade dos factos, pela simples comparação e sobreposição dos dois textos, o que me parece indiscutível!…
De qualquer forma, considero absolutamente lamentável que o Sr. Deputado, conhecedor das formas de funcionamento desta Assembleia, venha hoje esgrimir fundamentados argumentos em relação à proposta de lei em discussão, quando esgrimiu argumentos contrários em 16 de Outubro passado.
Portanto, considero absolutamente ridículo que se mude de posição - mais uma vez, volto a dizê-lo - quando apenas mudam as pessoas que assinam as propostas que vêm a discussão a este Plenário. Isso é lamentável e é razão do meu mais profundo protesto, porque não só esta Câmara mas também a Comissão têm um espaço sério de discussão democrática, que deve ser tomada a sério e não pode, em momento algum, ser desconsiderada.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Tem a palavra, para formular um contraprotesto, o Sr. Deputado Jorge Nuno Sá.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Sr. Presidente, no debate do dia 16 de Outubro, foram discutidos dois diplomas…

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Um, Sr. Deputado! Só foi o projecto de lei do Partido Socialista!

O Orador: - … e eu não me pronunciei quanto ao diploma sobre a criação de uma base de dados, a que a Sr.ª Deputada se refere. É preciso algum rigor e alguma seriedade.
Assim, com rigor e seriedade, é preciso saber o que motivou a apresentação do projecto de lei. Quando o PS o apresentou, era a reposição do crédito bonificado, que foi proposto pela Sr.ª Deputada, como hoje voltou a insistir nessa mesma tecla.
Está provado que os argumentos em que a Sr.ª Deputada baseia o seu raciocínio não são pressupostos verdadeiros, não existem, não são reais na sociedade portuguesa.

O Sr. José Magalhães (PS): - São verdadeiros!

O Orador: - Portanto, Sr.ª Deputada, a seriedade da sua intervenção seria, se calhar, pedir desculpa e não tentar explicar o processo legislativo, tanto a mim como ao Sr. Secretário de Estado, num acto de extrema deselegância, que já praticou duas vezes, hoje. Seria pedir desculpa e dizer que se enganou em todo o prognóstico que fez sobre a situação da compra de habitação, que estava errada e que agora, sim, estão a ser tomadas medidas discriminatórias positivas para a aquisição de habitação por parte dos jovens portugueses.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - À custa dos orçamentos familiares!

O Orador: - Isso é o que interessa, Sr.ª Deputada, e não a retórica e a demagogia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.

A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece-me que fica claro qual foi a política do PSD.
O Sr. Deputado Pinho Cardão, na intervenção que fez, esqueceu-se do principal. E o principal tem a ver com uma lei de 1991 que permitiu o crédito bonificado sem qualquer controlo e que deu azo a toda a corrupção que houve nesse domínio. Felizmente, o governo do PS, enquanto esteve em funções, através dos diplomas de 1998, 1999 e 2000, que aqui foram citados, veio alterar esta situação.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Tenho dúvidas!

A Oradora: - Nessa altura, para regulamentar esta fiscalização do crédito, foram pedidos à Comissão Nacional de Protecção de Dados pareceres, aqueles que aqui foram citados, a que deram os n.os 7/99 e 15/99.
E foi justamente na decorrência desses pareceres que houve uma discussão, que, infelizmente, demorou dois anos, entre a União de Bancos, a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais, a Direcção-Geral do Tesouro e o meu próprio Gabinete para se chegar a este texto final, que resulta de um compromisso que, infelizmente, demorou todo este tempo. Ora, este texto final foi transmitido pelo meu Gabinete ao novo Governo, uma vez que ele estava em condições de ser aprovado imediatamente e ter-se-ia poupado um ano de corrupção se, pura e simplesmente, o Governo tivesse tido como prioridade governar o País e não dizer mal do PS.

Aplausos do PS.

Repito, este diploma foi transmitido ao novo Governo. Por isso, o PS, nos primeiros meses, aqui não o apresentou, esperando que o Governo, que tinha o diploma pronto - e tanto assim é que o projecto de decreto-lei que agora apresenta é exactamente igual - o fizesse. Só que o Governo nada apresentou. Pelo contrário, acabou com o crédito bonificado sem se preocupar com a fraude, porque, segundo o PSD aqui disse, julgava que o problema era dos novos contratos. Não! O problema é dos contratos antigos, daqueles que foram permitidos pela lei de 1991. O problema reporta-se ao tempo em que não havia qualquer controlo.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Esse é que foi o problema!

O Sr. José Magalhães (PS): - Assumam-no!

A Oradora: - São centenas de milhares de contratos que fazem com que, mesmo neste ano de 2003, sem novos contratos, a Direcção-Geral do Tesouro tenha de gastar mais 28 milhões de euros do que no ano passado para bonificação de juros. Porque a fraude continua!

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Felizmente, o Governo deu conta de que o anterior governo lhe tinha transmitido algo que lhe resolvia o problema e, felizmente, como mais vale tarde do que nunca, este diploma vem hoje a este Plenário.
Só lamento que se tenha perdido um ano, em que permitiram a fraude e em que, num período de crise, milhões de contos foram esbanjados do erário público,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Assumam-no!

A Oradora: - … apenas porque os senhores decidiram atacar aqueles que têm poucos recursos e o crédito limitado por diplomas nossos, inviabilizando uma medida que vinha permitir o acesso à habitação em condições justas, como aconteceu no passado.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Persistem no erro!

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A Oradora: - Inviabilizaram essa medida e decidiram punir os novos contratos, deixando persistir a fraude por mais um ano.
Mas, como mais vale tarde do que nunca, ainda bem que o diploma vem hoje a Plenário. Perderam-se milhões de contos do erário público por causa da vossa arrogância!

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Por causa de contratos feitos no vosso tempo!

A Oradora: - Mais: beneficiando do actual momento histórico da taxa de juro mais baixa - e oiçam bem, porque daqui a um ano vão lembrar-se do que estou a dizer-vos hoje e, nessa altura, falaremos! -, a solução que arranjaram de aumentar os prazos de pagamento do crédito bonificado, neste momento, camufla os problemas, porque as taxas de juro estão baixas (apesar de que, nestas condições, as pessoas chegam a pagar três vezes o preço da sua casa ao banco), mas, quando as taxas de juro subirem, será muito mais sensível o aumento das prestações e haverá, nessa altura, centenas de milhares de casos de insolvência, tal como aconteceu no governo Tatcher quando a mesma medida se deu num momento de aumento da taxa de juro.
Veremos, no próximo ano, se a medida que tomaram de aumentar o prazo do crédito bonificado não se vai virar contra os portugueses e lançar no desespero centenas de milhares de famílias, logo que as taxas de juro aumentem.
O PSD tem de assumir essa responsabilidade pela sua arrogância, por não aceitar as coisas que lhe são transmitidas, por perder um ano e por tomar, mais uma vez, medidas erradas, como o fez em 1991.

Aplausos do PS.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Continua a persistir no erro de que o crédito bonificado é solução para todos os problemas!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou passar, mais uma vez, por cima de aspectos extremamente desagradáveis, porque, quando estamos a falar depreciativamente em termos de plágio (volto a acentuá-lo) e de reciclagem, penso que é uma terminologia que pode ser corrente nalguns ambientes, mas eu não estou habituado a isso. Parece-me estranho e fora do normal.

O Sr. Honório Novo (PCP): - O melhor é começar a treinar!

O Orador: - Depende daquilo que o Sr. Deputado me diga.
Gostaria, no entanto, de referir que considero extraordinariamente estranho que um decreto-lei, que foi melhorado em aspectos extremamente significativos relativamente ao projecto de lei que, em determinada altura, foi apresentado, seja, neste momento, posto em causa pelo próprio grupo parlamentar que apresentou essa posição.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ou não o leu ou não percebeu!

O Orador: - Considero isso muito estranho.
Por outro lado, se, de facto, há uma preocupação muito grande, como a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho referiu, relativamente aos custos que representam para o Estado português…

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Sr. Secretário de Estado, o tempo de que dispunha terminou, mas vou dar-lhe mais 45 segundos, em igualdade com os outros intervenientes no debate.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, se há, de facto, essa preocupação, que considero extremamente salutar, tudo apontaria no sentido de sairmos o mais rapidamente possível com a aprovação deste projecto de decreto-lei.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Já podia estar aprovado, Sr. Secretário de Estado!

O Orador: - Espero que, reconsiderando as posições que têm sido assumidas e explicitadas pela bancada do Partido Socialista, esta situação seja ultrapassada, porque vai no interesse de todos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este debate foi extremamente útil, porque permitiu à Assembleia e ao País entenderem bem o que está em cima da mesa, e, mais, convém que uma ou outra pessoa que não tenha entendido bem seja esclarecida.
Em nosso entender, é claro como água que - basta comparar os textos, aliás, até temos assinaladas a bold as semelhanças para esclarecer alguma dúvida que possa existir - os textos são praticamente idênticos, como o Sr. Secretário de Estado teve a hombridade de reconhecer na primeira intervenção. E estou a referir-me não ao texto da proposta de lei de autorização legislativa, porque se fosse uma proposta de lei, como sabemos, poderia ser mais complicado, mas, em termos formais, ao anexo da proposta de lei. Contudo, em termos formais, nunca levantaríamos qualquer problema. Como eu disse na primeira intervenção, somos favoráveis a esta medida. Somos tão favoráveis que ela foi estudada detalhadamente e propusemo-la. Portanto, quanto ao facto de não haver pareceres, etc., há algum fogo de vista que tentou aqui ser feito.

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - Reconheçamos, no entanto, que, apesar de tudo, algumas intervenções da maioria tiveram enquadramentos um pouco diversos: houve quem tentasse, com alguma habilidade, fugir um pouco a alguns

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aspectos que estão em cima da mesa e houve quem, enfim, não tivesse essa habilidade e fizesse intervenções, as quais, um dia, cortará dos livros que publique delas!…
Portanto, o que é que se passa? A medida é boa - aliás, é tão boa que fomos nós, PS, que a propusemos. Mas não é só por isso que ela é boa: é que é mesmo boa! E foi a maioria parlamentar que apoia o Governo que a rejeitou. Enfim, são dias que correm mal…! Mas é preciso que isso fique claro.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Têm de ler os textos!

O Orador: - As coisas correram mal, usaram argumentos absurdos, incorrectos e, em meu entender, continuo a pensar que foi por causa das assinaturas…! O resto não faz qualquer sentido.

O Sr. José Magalhães (PS): - Perderam tempo, é claro!

O Orador: - Portanto, o que é que, efectivamente, se passa? Perdeu-se um ano,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Pelo menos!

O Orador: - … perdeu-se tempo.
Contudo, entendo que esta medida é boa - aliás, estamos sempre a favor de qualquer proposta que nos seja apresentada, de combate, de prevenção, de luta contra a fraude e evasão fiscais, seja quem for que a assine! -, apenas divergimos, como é óbvio, da maioria parlamentar quanto à questão do crédito bonificado. Como já aqui foi explicado, foi uma peça legal do tempo do Prof. Cavaco Silva que abriu as portas, às escâncaras, à fraude. Porém, tudo o seja combater e pôr em ordem essa matéria foi sendo feito (aliás, há várias medidas que foram nesse sentido) e o debate que hoje estamos a travar permitiu tornar claro que esta proposta - que, por acaso, é do Grupo Parlamentar do PS, mas que, na altura, foi chumbada - é boa. Há um certo arrependimento do Governo, íntimo, que vem nesse sentido e o Sr. Secretário de Estado, que tomou posse há pouco tempo, não tem culpa nenhuma deste processo. Tentaram enrodilhá-lo na manta de asneiras que foram feitas por alguns Deputados, que também não terão culpa, pois foi-lhes dado o recado para votarem contra!… Mas nós compreendemos esses "papéis"!…
Agora, volta tudo à boa norma. O texto da proposta, com uma ou outra minudência diferente, é igual ao texto do projecto de lei que apresentámos. Mas a proposta é boa não só por isso. É que podia ser igual ao que apresentámos e não ser tão boa, mas o que é facto é que é mesmo boa, uma vez que vai ser uma peça nesse combate. Ela não resolve os problemas do crédito à habitação, era preciso pôr em funcionamento outro tipo de medidas, mas lá chegaremos.
Portanto, saudamos esta proposta. Quisemos apenas que ficasse claro, perante o País, esta forma de trabalhar, porque pensamos que o que conviria, nestes casos, não é pagar direitos de autor mas reconhecer que há todo um trabalho dos serviços, de instituições, dos Deputados, enfim, reconhecer o papel de cada um.
O País pagou caro e, portanto, quanto antes, vamos para a frente com este diploma. O texto é bom, vamos pô-lo em vigor e em funcionamento! É isto que, efectivamente, queremos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Srs. Deputados, terminada a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 53/IX, vamos passar à apreciação do relatório sobre a participação de Portugal no processo de construção da União Europeia - 2001. Informo que cada grupo parlamentar dispõe de 5 minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Nazaré Pereira.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Temos em apreciação parlamentar não só o relatório da participação de Portugal no processo de construção da União Europeia, no seu 16.º ano, mas, igualmente, o projecto de resolução que visa que esta Câmara faça essa mesma apreciação.
A grande questão que se coloca num momento tão importante, para Portugal e para a Europa, das diferentes etapas de alargamento e de repensar a arquitectura institucional da União Europeia, é a de este relatório só poder ser discutido hoje. De facto, estamos a apreciar o que foi a participação de Portugal no processo de construção da União Europeia em 2001. Portanto, muito do que, na altura, foram momentos decisivos da União é, hoje, já uma história com um largo passado.
Apesar de tudo, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, queria referir desde já que, no âmbito dos trabalhos da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, pudemos contar com a colaboração de outras comissões para que esta apreciação fosse efectuada com o empenho generalizado da Assembleia. Nomeadamente, as Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Defesa Nacional, Economia e Finanças, Educação, Ciência e Cultura, Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e Obras Públicas, Transportes e Comunicações participaram intensamente no trabalho que hoje estamos a apreciar em Plenário.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em 2001, na opinião do Partido Social Democrata, a marca relevante da actividade da União Europeia foi o desenvolvimento de estruturas internas com o objectivo de a União se preparar para o alargamento que, como sabemos, teve a sua marca fundamental recentemente, no Conselho Extraordinário que reuniu em Atenas e permitiu a adesão à União, a partir de 1 de Junho de 2004, de 10 novos países.
Esse trabalho foi acompanhado, simultaneamente, do reforço e do desenvolvimento em comum da área da justiça e assuntos internos que, ao longo de 2001, deu passos importantes.
Estamos a debruçar-nos sobre o relatório referente ao ano em que ocorreu o 11 de Setembro, com os atentados terroristas em Nova Iorque. Diria que também esse foi um marco que fez importar para a Europa uma clara necessidade de a área da justiça e assuntos internos ser objecto de um maior desenvolvimento. De igual modo, áreas como a da energia e a do ambiente tiveram particular relevo nesse ano de 2001.

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Porém, não poderia deixar passar este momento sem acentuar o Conselho Europeu de Laeken que, com a decisão de Laeken, deu origem à Convenção sobre o Futuro da Europa, na qual Portugal está profundamente empenhado e que irá dar lugar a uma conferência intergovernamental cujos documentos de trabalho serão constituídos pelos resultados da Convenção e que, certamente, possibilitará fundamentar a Europa em bases que sejam mais democráticas, de maior transparência e maior legitimidade e legibilidade para os cidadãos europeus que, com o alargamento, serão cerca de 540 milhões.
A União afirma-se, assim, como o espaço de maior dimensão de democracia e, também, como o maior espaço de livre troca comercial.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Além do mais, há um aspecto que convém recordar no que diz respeito ao ano de 2001 na União Europeia.
2001 foi marcado pela presidência sueca e pela presidência belga como um momento decisivo de construção de uma União mais forte. Em nosso entender, isto demonstra que a Europa pode e deve continuar a ser - foi no passado, como o demonstra muito bem o ano 2001, e continua a ser no presente - um espaço em que os países de média dimensão têm um papel fundamental para a dinamização do espírito europeu, para a criação de um espaço que, cada vez mais, é um espaço de paz e de desenvolvimento.
Este trabalho das presidências sueca e belga no desenvolvimento da Europa mostra bem o papel que os países de média e pequena dimensões podem desempenhar no futuro da União.

Aplausos do PSD, do CDS-PP e do Deputado do PS Alberto Costa.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O relatório que estamos a apreciar tem de ter uma apreciação política e não meramente técnica. Aliás, o próprio relatório peca por ser excessivamente técnico e por dissimular, digamos, o que são as opções políticas do próprio Governo no processo de construção europeia. Por isso mesmo, o que aqui farei será uma apreciação de cariz político.
Nós temos um projecto de sociedade que, evidentemente, passa pela Europa. Hoje em dia, não faz sentido pensarmos qualquer tipo de transformação social que não seja também sentida e não se opere ao nível europeu. Temos consciência disso. O que não queremos é o rumo que esta Europa está a seguir.
A Europa do Pacto de Estabilidade e Crescimento, do dogma neo-liberal, a Europa que, tal como este documento bem evidencia, aposta muito mais - e avança nesse campo - na privatização da água, da energia, dos transportes e comunicações, mas que não é capaz de avançar, por exemplo, na reforma fiscal, é uma Europa que se arrisca a ser, como muitos têm dito, um anão político e, principalmente, um anão social.
Este relatório tão-pouco fala das medidas para implementar o reforço da ligação à participação das populações no processo de construção europeia, ignora os aspectos sombrios e obscuros das novas leis de imigração, não refere a deriva securitária que surgiu a pretexto de um espaço de justiça e de segurança comum que, a propósito do 11 de Setembro e da luta anti-terrorista, começa a cercear alguns dos direitos e das liberdades fundamentais dos cidadãos.
O presente relatório não refere, ainda, a questão da degradação dos serviços públicos a nível europeu e do desinvestimento nos mesmos, facto que está indissociavelmente ligado ao dogma patente na utilização do Pacto de Estabilidade e Crescimento, no desinvestimento público e, acima de tudo, no furor de privatização que, aliás, o Presidente da República já criticou nesta Assembleia. Esta é uma Europa que recuou nas políticas de pleno emprego e naquilo que a Estratégia de Lisboa tinha de mais positivo.
Por isso mesmo, não podemos deixar de fazer uma apreciação política que se traduzirá, com frontalidade e com consequência, no nosso voto contra o projecto de resolução apresentado.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A publicação anual do relatório sobre a actividade da União Europeia, pela Comissão Europeia, e do documento Portugal na União Europeia, por parte do nosso Ministério permite à Assembleia da República apreciar e observar as linhas de actuação seguidas por Portugal na União Europeia, mais concretamente, no ano de 2001, o 16.º ano pós-adesão.
Não poderia deixar de me juntar à voz do Sr. Deputado Nazaré Pereira para referir o atraso com que este tipo de relatórios são apreciados pela Assembleia da República, o que, com certeza, não está em consonância com outros votos que temos formulado nesta mesma Câmara, noutras ocasiões.
Reportando-me ao ano 2001, destaco, pela sua importância, algumas das acções que se realizaram.
Em primeiro lugar, o desenvolvimento das estruturas internas, com o objectivo de a União Europeia se preparar para o alargamento a mais 10 Estados.
Em segundo lugar, as decisões tomadas no Conselho Europeu de Laeken que originaram um importantíssimo e inovador debate sobre o futuro da União - e, naturalmente, estamos a falar da Convenção.
Finalmente, o esforço no desenvolvimento de várias áreas, nomeadamente nas da justiça e assuntos internos, da energia e do ambiente.
Destaco, pela sua importância, os progressos assinaláveis que se verificaram, quer nas negociações de adesão com a maior parte dos países candidatos, quer na transposição do acervo comunitário para a generalidade desses Estados.
Não nos podemos esquecer que todo este trabalho foi efectuado com a difícil realidade de se tratar do maior alargamento de sempre na história da construção europeia.
Também os debates no quadro da Convenção Europeia, que têm como fim máximo a preparação da próxima Conferência Intergovernamental de 2004, foram formalmente lançados em 2001 e a discussão pública sobre o futuro da

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Europa constitui uma oportunidade única para o aprofundamento da União, para o melhoramento das instituições europeias e para a adopção partilhada dos objectivos estratégicos dos Estados da União.
Tais objectivos, como a afirmação da democracia, o respeito pelos direitos humanos, a primazia do Estado de direito, ao mesmo tempo que a promoção do progresso económico e social e o reforço dos mecanismos de coesão europeia, devem merecer, por parte de Portugal, a maior atenção.
Ao longo do ano 2001, verificaram-se avanços importantes na área da cooperação judiciária e em matéria penal.
Na realidade, o objectivo de criação de um espaço de liberdade, segurança e justiça na União Europeia, depois de um largo período de estagnação, sentiu um significativo impulso após o que se passou em Nova Iorque, em 11 de Setembro.
Neste domínio, alcançaram-se importantes acordos políticos no sentido de promover medidas operacionais, como a que estabelece a definição de terrorismo, o mandado de captura europeu, o estreitamento da coordenação entre directores dos serviços de informação e chefes de polícias dos diferentes Estados-membros e, ainda, a criação da Rede Europeia de Prevenção da Criminalidade.
Este conjunto de acordos permite concluir que os instrumentos normativos no âmbito dos domínios da justiça e assuntos internos cresceram em número no ano de 2001, abarcando cada vez mais temáticas mais diversas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não ficaria bem com a minha consciência, até porque se está a tratar de justiça e assuntos internos, se não fizesse uma referência de que Portugal, através do seu Comissário António Vitorino, está associado ao grande avanço que se verificou nestes domínios, justamente durante o ano 2001.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Sr. Presidente, permita-me fazer, sucintamente, uma referência, em matéria de ambiente, ao Conselho Europeu de Gotemburgo, que decorreu em Junho de 2001, que aditou à Estratégia de Lisboa, estratégia que permanece plenamente actual, como vem sendo reconhecido, e é indispensável à garantia do nosso progresso futuro. A vertente ambiental, dizia, permitirá aos Estados-membros elaborarem as suas estratégias nacionais de desenvolvimento sustentável, implicando uma clara modificação qualitativa das suas políticas nacionais.
Em síntese, podemos dizer que, no ano 2001, Portugal cumpriu com a sua quota de participação na construção europeia.
Agora, fora do contexto de apreciação do relatório, permita-se-me que refira alguns pontos.
É necessária uma maior participação dos cidadãos em todo este processo, como já tivemos oportunidade de manifestar em debate que teve lugar nesta Câmara; é imperativo o reforço da participação da Assembleia da República em todo este processo, mesmo ao nível do processo legislativo - e aqui, sim, bastante mais a montante -,….

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … e congratulamo-nos com o esforço que, sabemos, está a ser feito no sentido de uma mais rápida transposição do normativo comunitário, como nos foi afirmado recentemente, em sede de comissão, pelo Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Dr. Costa Neves.

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Costa.

O Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na história das instituições e da participação na vida das instituições, há momentos de funcionamento corrente e há momentos extraordinários. 2001 foi um ano com momentos extraordinários, que mudaram regras, que abriram perspectivas e outros que permitiram processos de grande importância e que estão em curso.
Nesta linha, quero começar por lembrar Nice.
Nice acabou, foi assinado o Tratado e foi aprovado, para ratificação, nesta Assembleia, em 2001.
Nice trouxe um conjunto de soluções que, com a passagem do tempo e a evolução dos debates, percebemos que são, afinal, mais positivas e mais meritórias do que ao tempo podíamos supor.
O alargamento que está em marcha enraíza em Nice. As soluções por que nos batemos, em matéria de presidência, em matéria de reforma da Comissão, radicam em Nice. Foi Nice que trouxe para os tratados europeus a ideia de um Estado-membro/um Comissário, uma ideia valiosa a que temos de agarrar-nos para conseguir que essa mensagem, essa solução institucional, passe e triunfe no processo actualmente em curso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nice trouxe-nos, também, uma ideia valiosa de abertura ao futuro que, depois, se expressou em Laeken.
Por isso, podemos homenagear os negociadores de Nice - eles merecem-no -, como devemos homenagear os decisores de Laeken, porque eles souberam assumir a iniciativa de vanguarda de convocar uma assembleia, a que chamaram de Convenção, no sentido da preparação de um novo tratado constitucional e de não repetir os processos diplomáticos do passado. Bem avisados andaram os governantes, os chefes de Estado e os chefes de governo, que, em Laeken, desencadearam esse processo democrático renovado, que dá aos parlamentos nacionais - e, por isso, faço questão de sublinhá-lo aqui - um papel que não tinham, no passado. É que, no passado, os parlamentos recebiam o "produto" das negociações intergovernamentais para aprovar ou não aprovar e não eram chamados, a montante do processo de elaboração convencional, a intervir e a participar como agora o estão a ser.
Mas, para além destes dois momentos, queria distinguir, em particular, um outro, sempre condenado a ser esquecido. Foi em 2001 que esta Assembleia aprovou a segunda revisão extraordinária europeia da Constituição - a primeira foi a propósito de Maastricht e foi ex post facto (depois de negociado o Tratado, seguiu-se a revisão da Constituição), método digno de ser melhorado. Mas, em 2001, despertámos

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a tempo dessa tradição de distracção constitucional e, graças a uma iniciativa pertinente e fundamentada e a um acordo dentro desta Assembleia que viabilizou essa inovação, introduzimos, primeiro, a credencial constitucional para nos habilitar à construção do espaço europeu de liberdade, segurança e justiça, que já aqui foi devidamente sublinhado pelos Colegas que me antecederam. Nós inaugurámos um método correcto de, primeiro, rever a Constituição e, depois, assumir acordos no domínio europeu.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É a Constituição ao serviço dos acordos!

O Orador: - Por isso, aproveito a circunstância para dizer que, justificando-se, eventualmente, em função das conclusões que venham a ser atingidas, a convocação de um referendo sobre os resultados da conferência intergovernamental que se vai seguir à Convenção, seria bom que se começasse a pensar nas alterações que a Constituição necessita para viabilizar um referendo sério sobre esse "produto" da conferência intergovernamental. Isto para que não sejamos confrontados, no futuro, como no passado, com a circunstância desagradável de, primeiro, ajustar compromisso no plano europeu e, depois, rever a nossa Constituição.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, quando revemos o "filme" de 2001 no plano europeu, quando revemos o desempenho dos nossos representantes, do primeiro-ministro António Guterres, do ministro dos negócios estrangeiros Jaime Gama e do Comissário Europeu António Vitorino, temos razão para nos sentirmos satisfeitos com os desempenhos e os resultados alcançados.

A Sr.ª Maria Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ora, o voto que formulo é o de que, quando aqui discutirmos, no futuro, o "filme" de 2003, possamos, em consciência, estar igualmente satisfeitos.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de resolução que culmina a apreciação parlamentar sobre o 16.º ano da participação de Portugal na União Europeia, em nossa opinião, não traduz, nem perspectiva, de forma adequada, alguns dos principais problemas da construção europeia e das suas incidências no nosso país.
Se bem que o relatório parlamentar - e bem, em nossa opinião - enuncie a necessidade de a Assembleia da República observar criticamente "as linhas de orientação seguidas", apesar de esse relatório afirmar - e bem - que a documentação analisada é pouco explícita relativamente às "implicações em Portugal das decisões tomadas a nível comunitário", a verdade é que nenhuma destas ideias é transcrita para o projecto de resolução - nem uma destas ideias. E não é certamente a observação, sistematicamente repetida, ano após ano, de que os sucessivos governos apresentam relatórios sobre a participação do País na União Europeia excessivamente factuais, que poderá constituir resposta àquelas observações inscritas, e bem, no relatório parlamentar.
Dou três exemplos apenas sobre questões que ou não são abordadas, ou são mal traduzidas no projecto de resolução, em nossa opinião.
O primeiro é o relativo ao facto de, em 2001, se ter continuado a constatar uma diminuição significativa das transferências financeiras e dos fluxos financeiros da União para Portugal. Esta redução, já ocorrida em 2000 e, na altura, imputada ao facto de se tratar de um ano de transição entre o II e o III Quadros Comunitários de Apoio, não nos parece facilmente explicável, até porque se verificou mesmo uma redução desses fluxos relativamente ao ano de transição. Não são, assim, aprofundadas as razões que determinaram os baixos níveis de execução e, sobretudo, não é dada nota, no projecto de resolução, das consequências que as reduções desses fluxos podem ter tido na divergência do desenvolvimento face à União Europeia ou no aprofundamento das assimetrias internas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Um segundo exemplo tem a ver com a constatação de que algumas políticas comuns (agrícola, de pescas e de transportes) constituem "efectivas condicionantes da actividade dos sectores". Uma tal constatação exigiria, no mínimo, que o projecto de resolução traduzisse tais preocupações e emitisse recomendações de que manifestamente se demite. Da mesma forma e em igual medida, nenhuma observação é feita sobre a necessidade de alterar o Pacto de Estabilidade e Crescimento, ainda por cima num momento em que muitos já questionavam essa necessidade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Um último exemplo tem a ver com o alargamento. Ele é, no fundamental, abordado no âmbito da auto-designada Convenção sobre o Futuro da Europa, isto é, no quadro das alterações do Tratado.
Em nenhum momento, porém, é suscitada a necessidade de se conhecerem, analisarem e proporem soluções para enfrentar as consequências económicas e sociais do alargamento, quer nos actuais e futuros membros da União, quer, por maioria de razão, em Portugal, que, segundo observadores independentes, pode vir a ser o país mais prejudicado, do ponto de vista económico e social.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Neste aspecto, as ideias generalistas incluídas no projecto de resolução limitam-se a enunciar objectivos para os quais é discutível que se venha a dispor dos meios e dos instrumentos necessários à respectiva concretização. A abordagem das questões institucionais do alargamento no estrito contexto da Convenção - e não obstante o projecto de resolução anunciar propósitos que nem sequer estão em discussão no âmbito específico da Convenção, o que é, de facto, extraordinário - é uma opção profundamente limitadora, na qual o PCP não se revê e da qual discorda.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - Estes são apenas três exemplos, que manifestamente nos provocam um distanciamento claro relativamente ao projecto de resolução sobre a participação de Portugal no processo de construção da União Europeia.
Da nossa parte, continuaremos empenhados em ajudar a construir uma Europa melhor, uma Europa onde os interesses dos países que a compõem sejam respeitados, uma Europa de justiça, de progresso e de desenvolvimento social para todos os países e, portanto, também para Portugal e para os futuros novos membros da União Europeia.
O que os portugueses esperam do PCP é que sejamos capazes de incorporar todos esses objectivos de solidariedade e ainda o objectivo da paz, que tão longe anda das preocupações europeias e tão desprezado tem sido pelo Governo português nos últimos tempos, nas grandes orientações da construção europeia.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Sr.as e Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, chegámos ao fim dos nossos trabalhos. A próxima reunião plenária realizar-se-á amanhã, pelas 10 horas, dela constando um período de antes da ordem do dia e tendo como ordem do dia a discussão dos projectos de lei n.os 53/IX (PS) e 226/IX (BE).
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Paulo Martins Pereira Coelho
Carlos Alberto Rodrigues

Partido Socialista (PS):
António Luís Santos da Costa
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Fausto de Sousa Correia
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro

Partido Comunista Português (PCP):
Maria Odete dos Santos

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Jorge Martins Pereira
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares

Partido Socialista (PS):
João Rui Gaspar de Almeida
José Eduardo Vera Cruz Jardim

Partido Popular (CDS-PP):
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio

Bloco de Esquerda (BE):
Joana Beatriz Nunes Vicente Amaral Dias

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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