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5102 | I Série - Número 121 | 16 de Maio de 2003

 

créditos, de forma imprudente, negligente, quase culposa, prepara-se para lançar no precipício da miséria milhares e milhares de sobre-endividados, em razão de desemprego por emprego precário por falecimento de familiares, por acidentes, em suma, causas e circunstâncias alheias e infelizes da vida actual de muitos portugueses.
São estes particulares, estas famílias, que o Governo, através da presente autorização legislativa, parece querer ver de "corda ao pescoço", defronte dos tribunais, perante os olhos, seguramente esbugalhados, de um juiz de beca negra, que sabe-se lá se alguma vez terá tempo para apreciar criteriosamente um plano de insolvência entre um primeiro interrogatório de arguido e o julgamento de um despejo.
E mais: tal cortejo de desafortunados ou se apresentem como insolventes em tribunal, apenas se atrasem três ou quatro meses na sua prestação de crédito de habitação, ou mesmo de rendas de qualquer tipo de locação, ou de prestações de consumo de equipamentos indispensáveis à vida, ou serão objecto do respectivo requerimento de insolvência por parte dos credores, sem prejuízo das eventuais consequências de natureza penal que a qualificação da insolvência pode acarretar.
Sr. ª Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto, Srs. Deputados: A presente proposta de lei, ao uniformizar o processo de insolvência, metendo no mesmo "saco" empresas e particulares, não apenas incentiva a volúpia dos credores dos particulares como instiga a avidez dos credores das empresas.
E mais: tal proposta de lei desconsidera as empresas, ao fingir ignorar e ao escamotear que a realidade empresarial possui e deve nortear-se por efeitos jurídicos próprios.
É também na linha de tal desconsideração das empresas que a proposta, pura e simplesmente, extingue a recuperação da empresa como instituto jurídico, que, aliás, é verdadeiramente o frontispício do Código vigente, como se pode verificar desde logo no seu título, no seu artigo 1.º e nos capítulos a tal matéria dedicados.
É certo que a proposta também refere a existência de um plano de insolvência, mas como forma tímida e ineficiente da recuperação de empresas, já que, reconheça-se, abdica do regime de natureza substantiva vocacionado para a realidade empresarial, até agora vigente, o que vale por dizer que "deita para o caixote do lixo" o procedimento especial de insolvência destinado a reabilitar e a recuperar as empresas viáveis.
E assim, ao descentrar, no caso das empresas, o processo de recuperação, desgraduando-o e minimizando-o, óbvio se torna que a voracidade dos credores tenderá a confinar-se à liquidação célere dos patrimónios, muitas vezes com graves prejuízos para a economia e com efeitos sociais imperscrutáveis.
Ou ainda, pressurosamente, na linha ávida da concentração empresarial, poderão tomar de assalto, com a força dos seus créditos, a própria empresa devedora, integrando-a no seu património. É tal proposta a que aqui apreciamos que o permite - está lá bem explícito!
Até agora a empresa era tomada numa óptica institucional, como algo que, mesmo podendo atravessar situações económicas de dificuldade, poderia e deveria ser recuperada e salva desde que fosse patenteada a sua viabilidade e pudesse no futuro cumprir as obrigações assumidas, voltar a gerar riqueza, manter o emprego e contribuir para a economia nacional.
A ruptura agora anunciada consubstancia-se no regresso à visão liquidadora de patrimónios do século XIX e até do Código de Processo Civil de 1939, o que vale por dizer que estamos, mais uma vez, perante uma significativa realidade de injusta desconsideração da empresa e dos empresários.
Sr. ª Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto, Srs. Deputados: Do que fica dito, pode salientar-se que a presente iniciativa visa alterar radicalmente o paradigma vigente relativo aos processos especiais de natureza falimentar das empresas e dos particulares, que, aliás, não estava sequer suficientemente testado e amadurecido, atenta a sua escassa vigência - estamos a falar de 1993, de 10 anos!...
Insiste-se: parece inquestionável que, na actual conjuntura económica, as opções legislativas propostas se consubstanciarão num muito maior apelo à insolvência imediata das empresas, mesmo no caso em que estas se encontrem em difícil situação económica e possam, não obstante, ser ainda viáveis.
E indiscutível se torna que se poderá a assistir a um forte recrudescimento dos processos de dissolução do património dos particulares e das famílias. Sendo que, como já disse, se as empresas podem ser dissolvidas, já o mesmo não se poderá dizer, nem deverá, das pessoas e das famílias, que, mesmo falidas ou sobre-endividadas, vão ter de continuar a viver.
Adite-se ainda que, numa fase em que se vão admitindo, já com algum êxito, formas de aliviar os tribunais da enorme carga de litígios que os vem emperrando, o Governo opta por soluções que poderão mais do que sobrelotar os dois actuais tribunais de comércio, aos quais, além dos mais, também competem questões de concorrência e propriedade industrial, ao remeter para a sua competência especializada os processos de insolvência que ocorram em qualquer ponto do País, repito, em qualquer ponto do País.
E do mesmo modo se sublinha que a aplicação dos planos de insolvência aos particulares tenderá a inundar os tribunais de competência genérica, sobretudo num tempo em que o desemprego se aproxima perigosamente da média europeia, o que, inevitavelmente, por ausência de soluções de mediação e conciliação, também despertará a voracidade dos credores, com todo o cortejo de litígios que tal acarretará.
É por tudo isto que a presente proposta de lei é um retrocesso muito significativo no direito falimentar português.
É uma proposta imprudente e inadequada e vai agudizar a tragédia humana de milhares de famílias.
É uma proposta irrealista e desajustada à realidade económica portuguesa e vai afundar no caldeirão da desgraça, de forma célere e abrupta, milhares de empresas portuguesas.
É isto, Sr. Secretário de Estado, que quero que transmita à Sr.ª Ministra.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A matéria da revisão do regime jurídico relativo ao processo de insolvência de pessoas singulares

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