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Sexta-feira, 16 de Maio de 2003 I Série - Número 121

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 15 DE MAIO DE 2003

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
Ascenso Luís Seixas Simões



S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves (CDS-PP), na passagem do Dia Internacional da Família, salientou o papel que a família desempenha para o desenvolvimento dos países, tendo ainda feito referência às iniciativas legislativas que o seu partido e o Governo apresentaram nesse âmbito. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento das Sr.as Deputadas Elisa Ferreira (PS) e Isménia Franco (PSD).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Pedro Duarte (PSD), ao assinalar o 29.º aniversário do Partido Social Democrata, salientou o trabalho que o seu partido está a levar a cabo ao nível da acção governativa, tendo ainda respondido a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Diogo Feio (CDS-PP).
O Sr. Deputado António Costa (PS), a propósito do requerimento, apresentado pelo PSD, solicitando a audição de ex-Ministros da Saúde pela Assembleia da República para prestarem esclarecimentos em relação a um relatório do Tribunal de Contas, deu conta da disponibilidade daqueles de comparecerem em sede de comissão parlamentar, mas defendeu a não obrigatoriedade de o fazerem. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento e de defesa da honra dos Srs. Deputados Guilherme Silva (PSD) e Telmo Correia (CDS-PP).
O Sr. Deputado António Filipe (PCP), tendo por base uma peça publicada no Diário de Notícias em Dezembro de 2002, que dava conta de factos preocupantes quanto ao funcionamento do SIEDM, relativamente aos quais o Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional disse que apresentaria uma queixa-crime, inquiriu o Governo sobre a existência ou não da dita queixa e da data em que ela foi apresentada. No fim, respondeu ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Narana Coissoró (CDS-PP).
O Sr. Deputado Carlos Luís (PS) criticou o actual Governo pela actuação que tem tido para com as comunidades portuguesas, acusando-o de não cumprir as promessas eleitorais, tendo, no fim, respondido aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Carlos Alberto Gonçalves e Maria Manuela Aguiar (PSD).

Ordem do dia. - Foram aprovados os n.os 101 a 107 do Diário.
Após a Sr.ª Deputada Odete Santos (PCP), em interpelação, ter alertado a Mesa para o facto de a proposta de lei n.º 50/IX - Autoriza o Governo a legislar sobre a insolvência de pessoas singulares e colectivas - poder ser declarada inconstitucional por não ter sido sujeita a consulta pública nos termos legais, tendo-se também pronunciado os Srs. Deputados Luís Marques Guedes (PSD) e José Magalhães (PS), a Câmara procedeu à discussão conjunta, na generalidade, da citada proposta de lei e do projecto de lei n.º 273/IX - Adopta medidas dissuasoras do recurso às falências fraudulentas e desenvolve medidas de protecção dos trabalhadores (BE). Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça (João Mota de Campos), os Srs. Deputados Vítor Ramalho (PS), Odete Santos (PCP), João Teixeira Lopes (BE), Jamila Madeira (PS), Isilda Pegado (PSD), Osvaldo Castro (PS), Diogo Feio (CDS-PP) e Joel Hasse Ferreira e António Costa (PS).
Entretanto, e a propósito da votação de um requerimento, apresentado pelo PSD e CDS-PP, solicitando a baixa à Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, sem votação, da proposta de lei n.º 50/IX e do projecto de lei n.º 273/IX, para efeitos de consulta pública às organizações de trabalhadores, antes da conclusão da discussão na generalidade dos dois diplomas, usaram da palavra os Srs. Deputados Luís Marques Guedes (PSD), Lino de Carvalho (PCP), José Magalhães (PS) - que também solicitou a baixa à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias -,

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Telmo Correia (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP) e António Costa (PS), tendo, no fim, o Sr. Presidente sugerido que os diplomas baixassem às Comissões de Trabalho e dos Assuntos Sociais e de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, o que foi aceite. Em interpelação à Mesa, o Sr. Deputado António Costa (PS) solicitou também a baixa à Comissão de Economia e Finanças, sobre o que a que a Sr.ª Presidente se pronunciou negativamente após o Sr. Deputado Luís Marques Guedes (PSD) também ter usado da palavra sobre o assunto.
A Câmara aprovou o voto n.º 59/IX - De congratulação pela decisão do Governo português em participar no esforço internacional de apoio à reconstrução do Iraque e à segurança do seu povo (PSD e CDS-PP), sobre o qual se pronunciaram os Srs. Deputados José Correia (PSD), João Teixeira Lopes (BE), António Filipe (PCP), Marques Júnior (PS), Telmo Correia (CDS-PP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Foi também aprovado o voto n.º 60/IX - De congratulação pelo Dia Internacional da Família (PSD e CDS-PP), tendo intervindo os Srs. Deputados António Pinheiro Torres (PSD), Luís Fazenda (BE), Isabel Gonçalves (CDS-PP), Luísa Mesquita (PCP), Sónia Fertuzinhos (PS) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
A requerimento do PSD, e nos termos do n.º 5 do artigo 79.º do Regimento, foi adiada a discussão e votação do voto n.º 61/IX - De congratulação pelo Dia Internacional da Família (PS), tendo usado da palavra, em interpelação à Mesa, os Srs. Deputados José Magalhães (PS) e Ana Manso (PSD).
Mereceram aprovação o projecto de resolução n.º 152/IX - Viagem do Presidente da República a Sevilha (Presidente da AR) e, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º 53/IX - Autoriza o Governo a legislar em matéria de tratamento e interconexão dos dados constantes das informações a prestar pelas instituições de crédito mutuantes em relação aos contratos de empréstimo à habitação bonificados.
Foi também aprovado o projecto de resolução n.º 86/IX - Relatório da participação de Portugal no processo de construção europeia - 16.º ano (Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa).
A Câmara aprovou um requerimento, apresentado pelo PSD e CDS-PP, no sentido de o projecto de lei n.º 53/IX - Aprova o regime penal especial para jovens entre 16 e 21 anos (PS) baixar à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem votação, e rejeitou, na generalidade, o projecto de lei n.º 226/IX - Cria mecanismos de controlo da importação e exportação de armas (BE).
Foram igualmente aprovados, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º 60/IX - Autoriza o Governo a criar regras específicas sobre o acesso à profissão de motorista de táxi, através da concessão de uma autorização excepcional que vigorará por um período máximo de 3 anos, e dois requerimento, um, apresentado pelo PSD e CDS-PP, e outro, apresentado pelo PS, PCP e BE, no sentido de o projecto de lei n.º 143/IX - Adopta medidas para assegurar a efectiva administração regional do antigo Hospital Militar da Boa Nova, em Angra do Heroísmo (PS) baixar à Comissão de Educação, Ciência e Cultura, sem votação.
Mereceu ainda aprovação, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Finanças, relativo à proposta de lei n.º 46/IX - Procede à segunda alteração da Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto (Lei de enquadramento orçamental).
Procedeu-se à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 52/IX - Autoriza o Governo a fixar as condições de idoneidade e as incompatibilidades que condicionam o acesso e o exercício da actividade de inspecção técnica de veículos a motor e seus reboques, tendo-se pronunciado, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Nuno Magalhães), os Srs. Deputados Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP), Carlos Rodrigues (PSD), Nelson Baltazar (PS) e Bruno Dias (PCP).
Por último, a Assembleia procedeu à apreciação do Orçamento Suplementar da Assembleia da República, tendo usado da palavra o Sr. Deputado João Moura de Sá (PSD), na qualidade de presidente do Conselho de Administração da Assembleia da República.
A Sr.ª Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Jorge Fidalgo Martins
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia

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Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
Bernardino José Torrão Soares
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Vicente José Rosado Merendas

Bloco de Esquerda (BE):
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, nas reuniões plenárias de 7, 8 e 9 de Maio, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: aos Ministérios da Cultura, da Educação e da Ciência e do Ensino Superior, formulados pelos Srs. Deputados Fernando Cabral, António Filipe, Bernardino Soares, Vasco Cunha e Luísa Mesquita; à Ministra de Estado e das Finanças, ao Ministério da Segurança Social e do Trabalho e à Secretaria de Estado da Juventude e Desportos, formulados pelos Srs. Deputados Odete Santos e Laurentino Dias; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados Rodeia Machado e Ana Manso; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelos Srs. Deputados Luís Fazenda, Isilda Pegado e Manuel Oliveira; ao Ministério da Saúde, formulados pelas Sr.as Deputadas Joana Amaral Dias e Heloísa Apolónia; ao Ministério da Economia, formulado pela Sr.ª Deputada Paula Malojo; ao Ministério das Finanças, formulados pelos Srs. Deputados Helena Roseta e Osvaldo Castro; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Honório Novo; e ao Ministro da Presidência, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Luís.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou, em 20 de Setembro de 1993, o dia 15 de Maio como Dia Internacional da Família, com o objectivo de chamar a atenção de todos, de todo o mundo, para a importância da família, como núcleo principal e vital da sociedade. O primeiro Dia Internacional da Família foi, assim, em 15 de Maio 1994.

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Decorridos que são quase 10 anos, reconhece-se cada vez mais a importância da celebração deste dia e a importância de se reconhecer à família um papel determinante e preponderante de progresso social, cultural e moral e de motor de desenvolvimento e fortalecimento dos países.
A família é o meio natural de crescimento e de educação das novas gerações, futura população activa dos países.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Apostar na família é, assim, também contribuir para a construção do futuro.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na Constituição da República Portuguesa a família é considerada como elemento fundamental da sociedade, com direito à protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - A família, que constitui um valor fundamental da sociedade actual, reconhecido pela Constituição da República Portuguesa, necessita da devida protecção e assistência, para que possa concretizar o desenvolvimento pleno das suas funções no seio da sociedade.
Ciente de tal realidade, o CDS-PP apresentou na actual Legislatura a Lei de Bases da Família, no sentido de valorizar a família, dar unidade e sentido à política familiar e estabelecer um quadro global e coerente para as várias políticas sectoriais com relevância para a família, enquanto célula fundamental de suporte da sociedade. A família constitui um dos eixos fundamentais da orientação política e social do actual Governo.
No respeito pelos valores e princípios da pessoa humana, a família é considerada o pilar da sociedade portuguesa. E é exactamente isso que é reconhecido no Programa do actual Governo, que destaca a família como espaço privilegiado e natural de realização da pessoa e de solidariedade entre gerações.
A família constitui um dos eixos fundamentais da orientação política e social do actual Governo. No respeito pelos valores e princípios da pessoa humana, a família é considerada o pilar da sociedade portuguesa.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Governo vê a política da família como uma política transversal, razão pela qual entendeu necessária a existência de um Coordenador Nacional para os Assuntos da Família.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS-PP orgulha-se também de fazer parte de um Governo que, preocupado com a situação da adopção em Portugal, apresentou o novo regime jurídico da adopção, na salvaguarda do superior interesse da criança e da sua integração numa estrutura familiar, espaço natural de crescimento e de educação, espaço natural de aprendizagem da vida em sociedade e espaço natural indispensável ao desenvolvimento das crianças.
Para a criança é imprescindível não só ter uma família mas especialmente que quem exerce as funções parentais lhe preste os cuidados e afectos de que necessita. A família é o espaço onde naturalmente se desenvolvem esses laços afectivos e solidários, onde naturalmente se dá e se recebe a ternura, o carinho, a segurança e o amor.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

É na estabilidade da família que diariamente se assume o compromisso de cada pessoa que se preocupa em fazer o outro feliz.
Ter uma política familiar significa, assim, centrar na família o fundamento essencial e natural de análise dos problemas das pessoas e de encontrar as soluções para esses mesmos problemas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este Governo, apesar de todos os constrangimentos decorrentes da situação que encontrou de finanças públicas completamente desequilibradas, pôs mãos à obra e começou por equilibrar - e bem - as contas.
Só com contas equilibradas é que se conseguirá tirar o abono de família a quem dele não precisa para o dar às famílias mais pobres.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Estou a referir-me, Srs. Deputados, às várias medidas de apoio efectivo à família, como sejam as recentes medidas do novo regime do subsídio familiar a crianças e jovens, com a consagração de prestações familiares de segurança social mais selectivas, privilegiando as famílias de menores rendimentos e mais diferenciadas em função do número de filhos.
Há que, efectivamente, "tratar de forma igual o que é igual e de maneira diferente o que é diferente". Há que evitar a fragilização da estrutura familiar, porque a fragilização nas famílias é geradora de disfunções sociais e de desequilíbrios e os problemas avolumam-se e multiplicam-se.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - A família é e continuará a ser a nossa principal referência, onde se pode encontrar o nosso espaço de realização e de desenvolvimento e consolidação da personalidade, o espaço onde todo o indivíduo se afirma como pessoa e como cidadão.
Desta forma, valorizar a família é apostar no futuro, num futuro que se pretende mais estável, mais equilibrado e mais solidário, consolidando cada vez mais o respeito pelos valores e princípios da pessoa humana.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Guimarães Ferreira.

A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves, ouvi com muita atenção a intervenção que fez e, antes de mais, gostaria de informar que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentou na Mesa um voto sobre esta matéria, que será discutido às 18 horas, hora regimental de votações.
Gostaria também de sublinhar que o voto que apresentámos vai no sentido agregador do conceito de família inserido no contexto da própria Constituição. O conceito de família tem de ser modernizado, tem de acompanhar a dinâmica da própria sociedade, não pode ser um conceito que

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divide, que exclui ou que nos prende às tradições mais limitativas da interpretação dos direitos dos homens, das mulheres e das crianças.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Por isso, o voto que apresentámos é um voto que agrega, um voto que não divide e um voto em que a família não é uma entidade estática na sociedade mas, sim, uma entidade que muda, que acompanha e que se adapta àquilo que são as novas realidades sociais.
Gostava de perguntar-lhe, Sr.ª Deputada, qual é a sua concepção relativamente a estas duas leituras, que não me parecem, de todo, iguais ou fungíveis uma na outra, do que é a sociedade actual, do que são as famílias de hoje e de qual o papel das famílias de hoje na sociedade actual.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Elisa Ferreira, agradeço a sua pergunta e quero dizer-lhe que foi com agrado que ouvi que o PS apresentou na Mesa um voto, que espero seja de congratulação, sobre o Dia Internacional da Família.
A Sr.ª Deputada falou na questão da realidade actual da família. Se é certo que a realidade "família" se reporta a um conceito estável na sua essência, também é certo que esse conceito é evolutivo e sensível à realidade social e aos tempos que correm. Ora, essa evolução e essa adaptação aos tempos que correm também está no espírito das medidas adoptadas por este Governo no que respeita à família.
Todos sabemos que as constantes mutações sociais com que nos vamos deparando e os novos desafios das sociedades justificam um acompanhamento permanente da evolução e do impacto que essas mutações têm nas políticas familiares, isto para evitar a fragilização da própria estrutura familiar, porque, quando se começa a fragilizar a estrutura familiar, começam os problemas. Ora, as medidas adoptadas pelo actual Governo vão no sentido de evitar essa fragilização e de conferir às famílias a maior estabilidade possível.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - É mentira!

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isménia Franco.

A Sr.ª Isménia Franco (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves, comemoramos hoje o Dia Internacional da Família. Vem, pois, a propósito, relembrar o discurso proferido, no passado dia 8 de Maio, pelo Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho no âmbito da comemoração do Dia da Segurança Social, onde, a par de alguma medidas de protecção social anunciadas, foram também proclamadas medidas de promoção da família enquanto núcleo natural da solidariedade geracional, no pressuposto - em nosso entender, verdadeiro - de que o apoio à família não é uma despesa mas, sim, um investimento, nas próprias palavras do Sr. Ministro, que corroboramos na íntegra.
Assim, no que respeita às prestações familiares, apostou-se na discriminação positiva das famílias com menos recursos e mais numerosas e instituiu-se o 13.º abono, destinado a compensar os encargos escolares ocasionados pela abertura do ano escolar.
No domínio do apoio à maternidade, foram tomadas medidas destinadas a facilitar a assistência a filhos menores e outras tendentes a permitir uma melhor conciliação das responsabilidades familiares, educativas e profissionais dos beneficiários, como seja o assegurar do direito à atribuição das pensões em caso de passagem voluntária dos pais e das mães a regime laboral de tempo parcial nos primeiros anos de vida dos seus filhos.
Foi ainda estipulada a bonificação na formação das pensões das mulheres em função do número de filhos ou a possibilidade de uma contagem acelerada do tempo para terem direito a uma pensão completa.
Em face das medidas apontadas e anunciadas pelo Governo, gostaria de saber o entendimento da Sr.ª Deputada relativamente ao impacto destas medidas ao nível da promoção do bem-estar da família.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isménia Franco, muito obrigada pela sua pergunta.
V. Ex.ª referiu algumas das medidas adoptadas por este Governo, que tem tido a preocupação de uma melhor distribuição com uma maior dignidade. E quando se adoptam medidas como aquelas que referiu é certo que o impacto vai ser plenamente positivo.
Ainda que se julgue que são pequenos passos, são passos dados na direcção certa e com toda a certeza de que vai haver um maior reequilíbrio da estrutura familiar, porque, como disse, os ricos não precisam, quem mais precisa são os pobres. E quando se faz uma distribuição mais equitativa, dando mais aos pobres e não dando aos ricos aquilo de que eles já não precisam, com certeza que estas medidas vão ter impacto bastante positivo na nossa sociedade e nas nossas famílias.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na passada semana, o Partido Social Democrata comemorou o seu 29.º aniversário. Esta comemoração, como provavelmente todas as efemérides desta índole, comportam um valor essencialmente simbólico, permitindo-nos relembrar o passado, reflectir no presente e perspectivar o futuro. É isso que igualmente me proponho hoje, aqui, na Casa da democracia portuguesa.
O PSD é um partido que se orgulha da sua história.
Sabemos que os nossos militantes fundadores e todos aqueles que a estes se foram juntando contribuíram de

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forma decisiva para a conquista e para a consolidação da democracia no nosso país.
Os valores do humanismo, da liberdade e da social-democracia foram, desde a primeira hora, as pedras basilares em que assentaram o nosso pensamento e a nossa acção política.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Foi com base nestas premissas teóricas que os ideais do PPD, hoje PSD, foram erguidos, com singular e irrepetível convicção, pela nossa primeira referência de sempre: Francisco Sá Carneiro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sá Carneiro, estadista de primeira linha, grande líder partidário e homem de coragem, ética e responsabilidade políticas irrepreensíveis representa, como ninguém, a alma do PSD.
Somos, por estes dias, um partido de bases que busca a sua força, nos seus anónimos militantes e apoiantes; a sua energia, na sua juventude inigualável; o seu maior emblema, na acção dos seus autarcas; o seu exemplo, na atitude construtiva dos seus que vivem o mundo sindical; e a sua permanente regeneração, no mérito dos seus quadros e dirigentes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - Mas, essencialmente, o PSD é um partido que se confunde com os portugueses. É com os portugueses e para os portugueses que o PSD existe e quotidianamente pugna por um Portugal melhor.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Lutamos, hoje, de facto, com mais vontade do que nunca por Portugal.
E é por isso que, ao evocarmos 29 anos de militância, de dedicação e de trabalho pelo nosso país, preferimos olhar para o futuro.
A comemoração desta data não pode, com efeito, ser dissociada da missão notável e patriótica que o PSD está a desempenhar na vida e na sociedade portuguesas, em conjugação e total consonância, diga-se, com o CDS.
Assumimos esta responsabilidade, num momento histórico de particular dificuldade, quando outros, numa teatral fuga, concluíram um lancinante processo de destruição das oportunidades de futuro para Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Esta não é, de resto, uma circunstância ímpar para o PSD. É já indissociável dos nossos anais esta particularidade: nas horas difíceis, para o confronto com as adversidades, os portugueses exortam o PSD a assumir a governação de Portugal.
Foi assim sob a liderança de Francisco Sá Carneiro, no momento da afirmação e consolidação da nossa jovem democracia; foi assim com Cavaco Silva, trilhando o rumo do progresso e do desenvolvimento, a par com a Europa; e é também assim, actualmente, sob a égide de Durão Barroso, recuperando o tempo perdido e criando as condições essenciais para que possamos "dar o salto" no dealbar do século XXI, vivendo num País relevante e afirmativo no plano internacional, modernizado nas suas infra-estruturas, valorizado na qualificação dos seus recursos humanos, activo no combate às injustiças sociais, equilibrado do ponto de vista regional e preparado para enfrentar os desafios do amanhã.
Hoje, no Governo de Portugal e em coerência com a sua postura de sempre, o PSD confirma as suas mais marcantes características: sentido de Estado, vocação reformista, consciência social e visão de futuro.
Sentido de Estado bem evidente na coragem que a actuação deste Governo tem ostentado, assumindo "de cabeça erguida" decisões tão difíceis quão essenciais, remando contra a maré do facilitismo, da popularidade imediata e dos interesses instalados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Restituindo, assim, a perdida credibilidade externa ao nosso país, bem perceptível, por exemplo, na prioridade e urgência conferida à redução do défice orçamental ou na posição de grande responsabilidade e afirmação perante as delicadas opções assumidas na recente crise iraquiana.
Vocação reformista bem patente no incontável número de reformas que o Governo está a empreender nas mais distintas áreas da nossa vivência comum: da educação à segurança social, da defesa à saúde, da justiça à economia, passando por tantos outros sectores, onde se sente a verdadeira e real mudança para um País moderno, mais justo e melhor preparado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas também consciência social. Ao contrário do que os nossos adversários, em consequência de um indisfarçável complexo, gostam de proclamar, a consciência social é, inequivocamente, o primordial património do PSD.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Demos provas, como ninguém, ao longo da nossa História, deste compromisso de honra e por convicção com a justiça social.
Não faltam exemplos de medidas concretas que combateram real e verdadeiramente as desigualdades sociais no nosso país e que ilustram os mais sólidos pilares do nosso património histórico.
Lembramo-nos, com orgulho, da devolução das Misericórdias à sociedade civil, da institucionalização do 14.º mês para os pensionistas ou do lançamento e concretização do plano de erradicação de barracas, nas áreas metropolitanas, por exemplo.
Esta prioridade, que sem qualquer hesitação conferimos à justiça social, ficou igualmente bem expressa nestes últimos dias, com medidas concretas assumidas pelo actual Governo, podendo, a título de exemplo, referir-me às medidas de aumento das pensões da segurança social, de combate à fraude e evasão fiscais, ou de reformulação do abono de família e concessão do 13° mês a crianças e jovens de famílias mais desfavorecidas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Mas também visão de futuro. A aposta estratégica do PSD baseia-se na esperança de um País melhor e sustenta-se na coragem de agarrar as oportunidades de futuro.
Esta é uma marca indelével que nos distingue de qualquer outro partido.
Caracteriza-se, antes de mais, por uma incomensurável capacidade de sonhar, que nos permite, contra as marés e tentações do facilitismo, perspectivar para além da rente linha do horizonte, acreditando sempre nos portugueses e, assim, acreditando sempre no futuro de Portugal.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes são momentos de dificuldade, de exigência e de esforço nacional para compor um "País vítima" das asneiras passadas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O PSD exorta o Governo a prosseguir no rumo traçado, tornando assim possível desenvolver e aprofundar as políticas sociais, fundadas em contas públicas sólidas e num desenvolvimento económico sustentado.
Estamos hoje, mais do que ontem, profundamente convictos da justeza e acerto das opções definidas pelo nosso Governo. Os mais recentes números relativos à evolução das nossas exportações ou à redução do nosso défice externo são já muito mais do que indícios da ansiada retoma. São verdadeiros sinais de esperança que voltaremos a viver num País sedimentado no "pelotão da frente" da Europa e do mundo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O PSD congratula-se por estar ao lado dos portugueses a trilhar o caminho do futuro e do desenvolvimento para Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio, que beneficia de cedência de tempo por parte do PSD.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, começaria por felicitar, no plano institucional, e em nome do Grupo Parlamentar do PSD…

Vozes do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes: - Do PSD?!

Risos.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Meus senhores, eu sei que os deixa nervosos o entendimento que temos com o PSD, mas vão ter de ficar nervosos durante muito tempo!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Orador: - Mas, como com toda a certeza bem perceberam, é em nome do Grupo Parlamentar do CDS que quero dar os parabéns ao PSD pelos seus 29 anos!
Há um conjunto de partidos representados nesta Assembleia que, com toda a certeza, se confundem com o nosso regime democrático. O PSD está entre eles!
Não poderíamos, pois, saudando-o a si, Sr. Deputado Pedro Duarte, deixar de saudar a direcção do Partido Social Democrata, e, já agora, Sr. Deputado, endereçar-lhe também saudações no plano pessoal pelo novo cargo que exerce, de porta-voz do Partido Social Democrata, no qual esperamos tenha as melhores venturas.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

V. Ex.ª disse, e bem, que o PSD, em conjunto com o CDS, assumiu uma missão patriótica. Aliás, nada de normal, e, se calhar, até normal na história da nossa democracia. É que, quando uns fogem, nós assumimos os desafios; quando uns desaparecem, nós estamos na linha da frente!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

E será isso, precisamente, o que pretendemos manter. Aquilo que temos de fazer é de pugnar por um Portugal melhor, por um Portugal que siga numa via claramente reformista - o País bem precisa -, e reformista em várias áreas, que têm sido, aliás, áreas de intervenção do actual Governo de Portugal.
Mas há uma delas que eu não posso deixar de salientar: a área social. Muitos "enchem a boca" para falar da questão social; acontece que apenas alguns, quando é necessário, tomam as iniciativas que é preciso tomar!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Aquilo que quero perguntar-lhe, Sr. Deputado, é se considera que, realmente, a área social deve ser, para um Governo de centro-direita, uma prioridade, como tem sido. Ou, melhor, se deve continuar a ser a prioridade que todos nós temos vindo a assumir.
Terminaria, dizendo, para aqueles que ficam mais exaltados nestas ocasiões, que, contra tudo e contra alguns, fizemos uma coligação; tentaram, por todas as formas, que a mesma não resultasse, mas nós demos a resposta que os portugueses, por via dos votos, nos determinaram, isto é, entendemo-nos, a bem de Portugal.
Posso garantir-lhe, Sr. Deputado, que, em nome do Grupo Parlamentar do PSD,…

Vozes do PCP: - Outra vez?!

… assim nos manteremos, porque, acima de tudo, temos um objectivo que se chama Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Vozes do PCP: - Isso está mal!

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte para responder, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

Risos.

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O Sr. Pedro Duarte (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente, mas não tenho essa veleidade. Falarei em nome do Grupo Parlamentar do PSD e será suficiente, certamente.

O Sr. António Costa (PS): - Chega e sobra!

O Orador: - Agradeço as palavras do Sr. Deputado Diogo Feio, a quem também saúdo e cumprimento vivamente, e quero, antes de mais, registar a consonância de posições e a coesão que temos sabido implementar no nosso país, ao nível do Governo, formado pelos partidos que ambos integramos, mas também aqui, na Assembleia da República, com grupos parlamentares distintos, mas que têm demonstrado - corroboro as suas palavras- uma coesão e uma solidez que deixa tão confusos e até com alguma inveja, indisfarçável inveja,…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Inveja de quê?

O Orador: - … esta "frente de esquerda" que não consegue (por muito que tentem não conseguem!) atingir esses patamares de coesão e de solidez. Mas um dia talvez consigam. Continuamos todos na expectativa.
Relativamente à questão que me colocou, gostaria de dar nota do seguinte: há, e os nossos adversários têm tido essa tentação permanente, uma ideia preconcebida, que por vezes se tenta passar manipulando as opiniões, de que as questões sociais são monopólio, eventualmente, dos partidos de esquerda.
Ora, a História diz-nos, o presente diz-nos e, certamente, o futuro continuará a dizer-nos que assim não é verdade. A esquerda tem tido, isso sim, o monopólio do desperdício. Aquilo que são reais e concretas medidas no âmbito social têm sido implementadas no nosso país quando estão no poder governos do PSD ou governos de coligação entre o PSD e o CDS. Aconteceu assim nos tempos da AD; aconteceu assim nos tempos do Prof. Cavaco Silva;…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … e está actualmente a acontecer, apenas com um ano e poucos meses de mandato, com o Governo liderado por Durão Barroso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ouçam!

O Orador: - Há vários exemplos de medidas muito concretas que podem ser dados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Passo, de memória, a enumerar alguns: a lei da gestão hospitalar; a reforma da segurança social; os genéricos; a legislação laboral; a lei de imigração; a tributação do património; a reformulação do abono de família; o 13.º mês para crianças e jovens desfavorecidos;…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): - Daqui a nada estou a chorar!

O Orador: - … o aumento das pensões de segurança social! Há um conjunto incomensurável de medidas concretas, reais, que foram tomadas, que têm a ver com o dia-a-dia dos portugueses e que são evidentes.
Mas há algo que deve ser referido: é que nós herdámos uma situação verdadeiramente dramática. E a culpa disso sabemos bem de quem é!
Tivemos a preocupação e o sentido de Estado de perceber que, antes de conseguirmos atingir estas medidas sociais, tínhamos de repor a ordem nas contas públicas e de dinamizar a economia portuguesa. Sem termos uma economia saudável, uma economia pujante, não teremos recursos em condições para podermos tomar medidas sociais. É esta a preocupação.
Ao contrário da "nuvem" que alguns tentam levantar, a prioridade que é concedida ao rigor nas contas públicas, à aposta na dinâmica da economia é, de facto, um instrumento para, então sim, podermos ter medidas sociais concretas e, no fundo, melhorarmos a vida dos portugueses, que é aquilo que todos pretendemos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção sobre assunto de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, esta Legislatura tem tido uma originalidade que se arrisca a converter rapidamente numa aberração: a Assembleia da República renuncia à fiscalização do actual Governo para esgotar a sua competência na tentativa de fiscalização do anterior governo, que já cessou funções. A maioria foge para o passado, porque a maioria tem medo de assumir as suas responsabilidades perante o presente.

Aplausos do PS.

A maioria fala do défice de 2001, porque, no fundo, tem medo das manigâncias sobre o défice de 2002.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A maioria fala do desequilíbrio eterno da balança de transacções para fugir ao tema central, que é o desemprego, que é da responsabilidade da maioria e do actual Governo.

Aplausos do PS.

É caso para dizer que o presente é tão insuportável que já é insuportável para a própria maioria que o constrói.

Aplausos do PS.

O último episódio deste desvelo da maioria pela vida do passado é o requerimento, apresentado pelos Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP, para a audição dos anteriores Ministros da Saúde na Comissão de Execução Orçamental e na Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais.

Vozes do PSD: - Oh!…

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O Orador: - Convém, desde já, dizer que, quer a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, quer o Sr. Prof. António Correia de Campos, quer a Sr.ª Prof.ª Manuela Arcanjo, estão disponíveis para comparecer perante estas Comissões.

Aplausos do PS.

Quer a Deputada Maria de Belém Roseira quer o Prof. António Correia de Campos já o manifestaram publicamente e a Prof.ª Manuela Arcanjo já me transmitiu que só aguarda que a Comissão a contacte (o que ainda não fez) e conhecer o próprio resultado da auditoria do Tribunal de Contas, que também desconhece, porque nem o Tribunal nem a Assembleia ainda lho enviaram.
Não estamos, portanto, a falar do caso concreto. Quanto a esse, as Comissões decidiram, e os directamente visados aceitaram comparecer perante a Comissão. Do que se trata é de uma questão de princípio e, sobre essa questão de princípio, o Grupo Parlamentar do PS gostaria, desde já, de deixar muito clara e definitivamente fixada a sua posição sobre esta matéria.
Em primeiro lugar, a competência de fiscalização do Governo pela Assembleia da República significa a competência da actual Assembleia da República para fiscalizar a acção e a actuação do Governo que está em funções.

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, a competência da fiscalização da Assembleia da República é, nos termos da Constituição, e só, a fiscalização para efeitos de responsabilidade política; e esta, ao contrário da responsabilidade civil, criminal ou financeira, cessa no dia em que o titular do cargo cessa funções.

Aplausos do PS.

O que significa que nem a Assembleia da República tem competência para convocar antigos membros do governo a responderem perante a Assembleia da República, nem antigos membros do governo têm o dever de comparecer perante a Assembleia da República para responder por qualquer facto sobre o qual a Assembleia da República os queira ouvir. Podem vir, mas não têm o dever de vir!

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Oh!

O Orador: - Respeitamos, por isso, a posição assumida, de grande responsabilidade, pela Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira e pelos Prof. António Correia de Campos e Manuela Arcanjo. Mas esta posição não se constitui precedente, nem legitima qualquer interpretação subversiva dos poderes constitucionais, atribuindo à Assembleia da República um poder que ela não tem, nem fazendo impender sobre qualquer cidadão um dever, que sobre nenhum cidadão impende, de comparência em qualquer comissão parlamentar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A Assembleia da República não tem competência e, pior, a maioria não tem legitimidade política para o fazer,...

Aplausos do PS.

… porque a maioria, que foi cúmplice na fuga à responsabilidade política do Ministro de Estado e da Defesa Nacional, não tem legitimidade para dar lições de responsabilidade a quem quer que seja!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Não temos medo de assumir as nossas responsabilidades!
O relatório do Tribunal de Contas foi remetido, como é de lei, ao Ministério Público para apuramento de eventuais responsabilidades financeiras. Ao contrário da maioria, nós confiamos na justiça e não fugimos a responder perante ela!

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Fartaram-se de fugir!

O Orador: - Por isso, aguardaremos serenamente que o Ministério Público aprecie o relatório e, se for caso disso, responderemos no lugar próprio, que é o Tribunal de Contas.
Mas o que deixamos muito claro à maioria é que não confundimos justiça com julgamentos político-populares em comissões parlamentares.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Aceitamos a jurisdição do Tribunal de Contas, mas não aceitamos a jurisdição da maioria.

Aplausos do PS.

O Tribunal de Contas não é para nós, nem nunca foi, uma força de bloqueio. Foi por isso que, durante a nossa maioria, os poderes e as condições de independência e de funcionamento do Tribunal de Contas foram reforçados. É, pois, perante o Tribunal de Contas que responderemos! Não aceitamos a jurisdição da maioria!
Só o desespero da maioria justifica esta sua fuga para o passado e esta atitude persecutória, sem precedente em Portugal, sobre quem, democraticamente e por voto do povo português, exerceu responsabilidades governativas.
Por motivos óbvios, não recordo o caricato episódio em que me vi envolvido pela minha ilustre sucessora. Nem vale a pena, sequer, recordar a atitude vergonhosa da maioria ao ter escondido, na gaveta de um membro do Governo, o relatório do Ministério Público que ilibava o Secretário-Geral do PS de todas as acusações que a maioria queria impor e fabricar.

Aplausos do PS.

O caricato já chegou mesmo ao ponto, felizmente "escovado" pela Comissão de Ética desta Assembleia, de o

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actual Ministro da Agricultura se ter permitido instaurar - pasme-se! - um processo disciplinar ao seu antecessor, tendo designado uma jovem jurista do Ministério para instrutora, que convocou o Deputado Capoulas Santos para comparecer perante ela, no Ministério da Agricultura, para depor em processo disciplinar!

O Sr. José Magalhães (PS): - É uma vergonha!

Aplausos do PS.

O Orador: - Isto só revela o estado de desespero da maioria. E à maioria dizemos: nós, com toda a serenidade, cumpriremos a nossa função; com toda a serenidade, Maria de Belém Roseira, Correia de Campos e Manuela Arcanjo comparecerão, porque querem, e de sua livre e exclusiva vontade, nessas comissões.

A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - É verdade!

O Orador: - Mas dizemos também à maioria que, por muito que queira refugiar-se no passado, de uma coisa não se livra: do presente e das "ruas da amargura" para as quais tem conduzido o País e pelas quais será responsabilizada, politicamente, nesta Assembleia da República!

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa, como líder do maior partido da oposição, o Sr. Deputado, daquela tribuna, teve a prestação de um grupo parlamentar acossado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Está acossado com um incidente que é desagradável para o Partido Socialista. Mas, Sr. Deputado, não se sirva da maioria, como cortina, para atacar, disfarçadamente, o Tribunal de Contas. Não diga que não lhe chama força de bloqueio, mas não se sirva da maioria para o atacar, como o fez, da tribuna.
Sr. Deputado, o que está em causa é um relatório que foi enviado a esta Assembleia da República e que ela não pode ignorar, porque estão em causa milhões de contos, milhões de euros de dinheiros públicos!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E quando, a pretexto de um relatório que esta Assembleia tem de conhecer e de debater, vem dizer que a maioria está a voltar-se para o passado para esconder o presente, lembre-se, Sr. Deputado, que quando estava no poder promoveu aqui comissões de inquérito a actos de governos anteriores, designadamente em matéria de privatizações. Vieram cá ministros de governos anteriores por vossa iniciativa, que centraram a atenção no passado.
Que ética têm os senhores para virem agora dar-nos lições de moral?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Deputado deve ter escrito esta intervenção há muitos dias e escolheu o pior momento para falar em não fugas à responsabilidade, em não fugas à justiça. Sr. Deputado, está aí, na opinião pública, a pior vergonha de fuga à justiça que alguma vez se deu em Portugal: a da Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

V. Ex.ª escolheu o pior momento para invocar que o seu partido não foge à justiça! O seu partido fugiu à responsabilidade política de governação ao conduzir o País para o abismo e os responsáveis do seu partido fogem à justiça quando são por ela confrontados com as suas responsabilidades.

Vozes do PS: - E o Cruz Silva?

O Orador: - O Sr. Deputado quis aqui reparar as divisões internas do seu partido nessa matéria, quis criticar o único Deputado que teve um sentido institucional neste caso, o Deputado Joaquim Pina Moura. Todos os outros seguem, com certeza, V. Ex.ª no caminho da fuga que trilharam quando estiveram no governo, no caminho da fuga que adoptam quando têm de enfrentar a justiça.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, o seu tom de intervenção foi o exemplo da serenidade que vive...

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Igual ao seu!

O Orador: - O Sr. Deputado Guilherme Silva não ouviu da minha parte um único ataque ao Tribunal de Contas, porque nós o respeitamos. Eu disse aqui que aceitamos a jurisdição do Tribunal de Contas, o que não aceitamos é a jurisdição da maioria. Não aceitamos que os senhores sejam julgadores de quem quer que seja, porque, para tal, não têm competência, nem legitimidade, nem autoridade. Portanto, a nós não julgarão!

Aplausos do PS.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas a Assembleia tem legitimidade.

O Orador: - Por isso, Sr. Deputado Guilherme Silva, como aquele semanário de extrema-direita que costuma ter interesse em ouvi-lo já pré-anunciou - tive a oportunidade de ler - que após esta audição haverá um inquérito parlamentar, fica também desde já a saber que quando propuserem o inquérito parlamentar, que é a peça seguinte do guião que está definido, terá o nosso voto contra, porque não aceitamos a instrumentalização da Assembleia da República no sentido do branqueamento da actuação do actual Governo e na fuga para o passado em que vocês estão empenhados.

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Aplausos do PS.

O Sr. Deputado Guilherme Silva terá certamente consciência do seu profundo mau gosto em querer responsabilizar este grupo parlamentar pela actuação individual de uma camarada nossa que fugiu à justiça, comportamento que obviamente é, de todos os pontos de vista, eticamente censurável.
Nunca pensei que o Sr. Deputado fosse capaz de tal deselegância nem que, sobretudo, fosse capaz de falar dessa fuga, porque se é grave fugir para o Brasil muitíssimo mais grave é fugir, e com a sua cumplicidade, para a Assembleia da República para escapar à justiça. Isso é que é da maior gravidade!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Sr. Deputado Guilherme Silva, nesse caso não se trata do comportamento individual de quem quer que seja, trata-se do comportamento político desta maioria…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Isso não é verdade!

O Orador: - … e de uma mancha institucional, da maior gravidade, sobre a credibilidade e o prestígio do Parlamento de todos os portugueses, da Assembleia da República.

Aplausos do PS.

A interpretação que a maioria impôs, e com a qual pretende confundir o estatuto de Deputado com o estatuto de refugiado, mancha a credibilidade das instituições,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Queira terminar.

O Orador: - … envergonha a nossa democracia e envergonha, sobretudo, ou devia envergonhar, a maioria que a impôs, com a sua votação nesta Assembleia da República.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental de defesa da consideração devida à sua bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Deputado António Costa, o senhor levantou uma questão que deixa aqui a nu a gravidade da actuação do seu grupo parlamentar…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … e que eu sintetizo muito rapidamente.
O Sr. Deputado teve, na sua bancada, Deputados em situação exactamente igual à do Deputado que citou, como, por exemplo, o Sr. Deputado António Saleiro.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Têm fraca memória!

O Orador: - Foi votado, por unanimidade, conceder a esse Deputado, tal qual sempre se fez, a possibilidade de ser ouvido por escrito. Agora, o Sr. Deputado e o seu grupo parlamentar quebraram uma regra de ouro que aqui tem sido sempre seguida: a de não instrumentalizar partidariamente estas matérias do âmbito da ética.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - VV. Ex.as quebraram a regra que estava estabelecida para todos os Deputados! Mas há uma coisa que eu lhe vou dizer, Sr. Deputado: custe o que custar mediaticamente, custe o que custar de instrumentalização por parte do seu partido ou de qualquer outro, eu nunca vou deixar que nenhum Deputado desta bancada seja discriminado em relação aos demais! Em relação a isso pode estar completamente descansado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Custe o que custar!
Custa muito ver a vossa instrumentalização, custa muito ver a vossa falta à verdade, mas não vou abdicar desse caminho, custe o que custar!
Não confunda essa situação com a grave atitude de fuga da Sr.ª Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras, que é completamente distinta. E é mau, muito mau, que V. Ex.ª tenha aqui "sacudido o capote", quando em causa está uma companheira vossa, que também deveria merecer a vossa solidariedade nos bons e nos maus momentos!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Deputado Guilherme Silva, espero que esta seja a última vez que uso da palavra nesta sessão, para não agravar o seu problema com a serenidade, que tanto preza...

Vozes do PSD: - Ah!…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não me peça para faltar à verdade! Não me peça!

O Orador: - Sr. Deputado Guilherme Silva, há uma distinção fundamental entre nós dois:…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Há muitas!

O Orador: - … eu considero eticamente reprováveis quaisquer fugas à justiça; o Sr. Deputado Guilherme Silva tem dois pesos e duas medidas,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não é verdade!

O Orador: - … acha que umas são legítimas e outras são ilegítimas!
Não aceito essa diferenciação e, sobretudo, não aceito que o Estatuto dos Deputados, que deve servir para proteger a sua independência, a sua dignidade institucional, seja conspurcado por uma interpretação abusiva para protecção

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de amigos, de fugitivos da justiça, que o senhor e a sua maioria entendem dever proteger!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas foi isso o que o senhor fez em relação ao Deputado António Saleiro!

O Orador: - Isso é inaceitável!

Protestos do PSD.

E não aceito a extensão de responsabilidade que pretende estabelecer relativamente a um acto individual com aquilo que não é um acto individual! Eu nunca o responsabilizaria, Sr. Deputado Guilherme Silva, pela actuação do militante A ou B do PSD ou mesmo do Deputado A ou B do PSD! Só o responsabilizo porque, nesse caso, não se tratou de uma actuação individual, mas de uma actuação política da maioria, comandada por si, com os votos organizados e impostos por si, aqui, nesta Assembleia da República!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Guilherme Silva, é por estas e por outras, é pela falta de legitimidade, pela falta de autoridade, pela falta de cultura democrática desta maioria…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… que eu digo e repito: não aceitamos a vossa jurisdição, aceitamos, sim, a de quem tem competência, isenção e imparcialidade…

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - … e não estamos disponíveis para ser joguetes de uma manobra da vossa fuga do presente,…

Vozes do PSD: - É falso! Foram vocês que fugiram!

O Orador: - … porque até para vocês o presente que constroem é insuportável e, por isso, querem fugir para o passado! Não contarão connosco e não nos silenciaremos nem fingiremos que não percebemos!.
Sr. Deputado, prossiga o seu "guião", que nós prosseguiremos com a nossa verticalidade e fidelidade aos princípios!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado António Costa, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, que beneficia de cedência de tempo por parte do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa, com toda a serenidade, quero dizer-lhe que considero esta sua intervenção mais uma intervenção lamentável.

Vozes do PS: - Oh!…

O Orador: - É lamentável, porque o Sr. Deputado e o seu grupo parlamentar têm tido, sistematicamente, em matérias deste tipo, dois pesos e duas medidas.

Os Srs. Manuel Alegre e Vicente Jorge Silva (PS): - E o Ferreira Torres?

O Orador: - Os senhores lançam, com a maior facilidade, ataques, suspeitas e críticas a toda a gente, mas se é o Partido Socialista que é atacado…

Vozes do PS: - E o Ferreira Torres?

O Orador: - … os senhores respondem perdendo não o sentido democrático, mas, pura e simplesmente, o sentido das regras elementares de educação parlamentar.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Deputado, vamos a perguntas directas e serenas: o que é que quer? Que um relatório do Tribunal Contas, com esta relevância e gravidade, seja escondido debaixo da carpete?!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É isso que ele quer!

O Sr. António Costa (PS): - Não!

O Orador: - Que a Assembleia ignore o relatório?! Qual é a nossa obrigação, senão a de fiscalizar e saber o que se passou?!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Claro!

O Orador: - Não pode ser outra, e o Sr. Deputado sabe isso muito bem!
Tudo o que sejam actos da administração e actos de responsáveis do governo - deste Governo, do anterior, ou do outro antes -, esta Assembleia tem a obrigação de fiscalizar, como fez em inúmeros casos!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Tantas vezes!

O Orador: - O que é que se fez no caso da Casa Pia? Não se chamaram cá todos os responsáveis desde que o problema surgiu?! Os senhores, noutros processos, não propuseram chamar todos os responsáveis?!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Claro!

O Orador: - Por que é que, agora, não se podem chamar todos os responsáveis?
O requerimento é do PSD - o Sr. Deputado aí também se enganou -, mas viabilizámo-lo, e viabilizámos bem, porque a Assembleia tem o dever de fiscalizar e esclarecer.
A pergunta é óbvia: de que é que o PS tem medo que se apure e se esclareça?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. António Costa (PS): - De nada!

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O Orador: - Por outro lado, do ponto de vista pessoal, penso que o Sr. Deputado António Costa é dos Deputados nesta Casa que tem menos legitimidade para levantar questões sobre essa matéria. O Sr. Deputado, que subiu à tribuna deste Hemicíclo com um relatório de polícia na mão para fazer um ataque político, não quer, agora, que se discuta um relatório do Tribunal Contas?! Como é que é possível?!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Deputado, depois, resvala da cortesia parlamentar - desculpe que lhe diga, conheço-o há muitos anos e tenho pena que tenha essas atitudes - quando fala em "fuga" e usa essa expressão para o Dr. Paulo Portas.

O Sr. António Costa (PS): - Foi o Sr. Deputado Guilherme Silva que falou em fuga!

O Orador: - Qual fuga? Uma pessoa que é testemunha num processo e que pediu ao tribunal para ser ouvida?! Qual fuga, Sr. Deputado? Sr. Deputado, tenha vergonha! Fuga só conhecemos uma, e parece que foi para o Brasil!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, falou em dois pesos e duas medidas, mas tem uma curiosa interpretação dos poderes da Constituição, pois considera que a Assembleia da República tem competência para fiscalizar ex-membros do governo e não tem competência para fiscalizar actuais membros do Governo.

Vozes do PS: - Exactamente!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Nada disso! Para fiscalizar actos de administração!

O Orador: - Vindo do Sr. Deputado, que é uma pessoa que muito respeito há muitos anos, tenho de considerar, forçosamente, esta teoria respeitável. Mas é só porque vem de si e sou obrigado a isso, porque, obviamente, essa teoria não tem pés nem cabeça e é um perfeito absurdo.
O Sr. Deputado, quando esteve em causa apurar da responsabilidade política do actual Ministro de Estado e da Defesa Nacional, veio aqui fazer uma bravata, dizendo que ele não vinha à Assembleia, pelo que, se o Sr. Deputado Ferro Rodrigues quisesse, fosse debater com ele para a TVI.
Portanto, para si, a responsabilidade política dos actuais Ministros debate-se na TVI, a responsabilidade política dos ex-membros do governo debate-se aqui!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Não considera que isto é um bocado ridículo?

Vozes do PSD e do CDS-PP: - É ridículo, é!

O Orador: - Não tem a noção do ridículo do que está a dizer?
O Sr. Deputado Telmo Correia pergunta-me quem tem medo. Bom, não somos nós! Nós reforçámos os poderes do Tribunal de Contas, não o entendemos como força de bloqueio, demos-lhe mais meios e mais independência!
O processo foi remetido, e bem, do Tribunal Contas ao Ministério Público para averiguação de eventuais responsabilidades financeiras e aguardamos serenamente pelo resultado, ao contrário do Sr. Deputado Guilherme Silva, que já foi para o semanário de extrema-direita ao qual dá entrevistas dizer que espera que o Ministério Público agora os prenda todos,…

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Que coisa mais deselegante!

O Orador: - … como se esta pressão sobre o Ministério Público fosse aceitável.
E eu disse mais: que a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, o Sr. Prof. Correia de Campos e a Sr.ª Prof.ª Manuela Arcanjo já aceitaram vir cá.
Portanto, a questão não se coloca em relação a este caso concreto, trata-se de uma questão de princípio, de não nos fazermos de "anjinhos" e de percebermos qual é a manobra política que o senhores desencadearam.

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - Os senhores querem evitar que a Assembleia fiscalize o actual Governo e que as pessoas se concentrem nos problemas de hoje!

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, querem que a Assembleia fiscalize o governo de ontem e que as pessoas olhem para o passado em vez de verem o presente. Esta é a manobra política que não podemos aceitar, como não aceitamos a instrumentalização da Assembleia da República para esse fim por via da maioria.
Os senhores, como são a maioria, porão a Assembleia da República a fazer o que bem entenderem - têm maioria, podem fazê-lo. Mas é preciso que fique claro que não somos cúmplices nesse processo de descredibilização da Assembleia da República e de subversão das regras do jogo.
É o actual Governo que responde perante esta Assembleia da República, porque é quem ainda tem responsabilidade política!

O Sr. Presidente: - O seu tempo esgotou-se, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
A responsabilidade política dos membros do governo cessa no dia em que cessam as suas funções e a partir daí a Assembleia da República não tem mais competência. Existem, nesses casos, outras instâncias que têm competência para outro tipo de responsabilidades que não cessaram e pelas quais responderemos. Porém, não aceitamos a jurisdição da maioria!

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Telmo Correia pediu a palavra para defesa da consideração da bancada.
Faça favor, Sr. Deputado. Peço-lhe que seja breve.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Serei breve, Sr. Presidente.
Quero apenas, sempre com a mesma serenidade, dizer ao Sr. Deputado António Costa que não tem razão quando refere a minha posição nesta matéria como absurda ou ridícula, porque esquece um ponto que referi, que é tão-só um ponto central: considero que a Assembleia tem competência de fiscalização. Posso, até, trazer-lhe inúmeros exemplos em que o Partido Socialista pediu a fiscalização de actos de governos anteriores.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Não tenho dúvidas nenhumas sobre isso!
A Assembleia tem toda a competência de fiscalizar todos os actos da administração - foi isto que disse nessa altura, é isto que lhe digo agora e que lhe direi sempre. Somos um órgão de competência de fiscalização política! Todos os actos praticados por membros de governos, de todos os partidos - do PSD, do PS, do CDS-PP (tirando este Governo, teríamos de recuar 23 anos, mas se quiserem lá estaremos) -, a Assembleia tem competência e deve fiscalizar!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Claro!

O Orador: - É esta a minha tese! Actos praticados no âmbito de uma actividade privada, pessoal, de uma pessoa que, quando praticou esses actos, nem sequer exercia funções políticas, não é aceitável que sejam fiscalizados pela Assembleia - então, onde é que iríamos parar?!

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Exactamente!

O Orador: - É esta a questão!
Os senhores, que fazem uma gritaria contra uma testemunha num processo que não foi nem está acusada de coisa nenhuma, quando se trata de uma pessoa acusada, que é do Partido Socialista, com a projecção mediática que tem, dizem que não é nada convosco nem querem ouvir falar - fininho, fininho, fininho…

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Exactamente!

É essa contradição que lhe aponto, é essa contradição que é lamentável e é essa contradição que demonstra, do nosso ponto de vista, muito pouca ética no tratamento destas matérias.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para dar explicações, o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, creio que o Sr. Deputado Telmo correia, pura e simplesmente, não conhece o relatório do Tribunal de Contas,…

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não leu!

O Orador: - … porque o relatório não acusa ninguém, muito menos qualquer um dos três ex-Ministros da Saúde.
O relatório do Tribunal de Contas contém um conjunto de recomendações ao actual Governo, de alteração de procedimentos, e aos serviços, porque, ao contrário do que o Sr. Deputado diz, o problema não é Administração. O problema é que os senhores não chamaram à Assembleia a Administração. Não chamaram ninguém da Administração. Chamaram cá alguém do governo. E fizeram-no porquê? O senhor ouviu a conferência de imprensa dada pelo Sr. Deputado Guilherme Silva, já ouviu aqui a intervenção da Sr.ª Deputada Ana Manso, já leu, com certeza, a entrevista dada pelo Sr. Deputado Guilherme Silva ao jornal de extrema-direita…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O que o motiva não é saber o que é que estava errado e que deve ser alterado, nem ouvir do actual Governo o que é que, estando errado, foi alterado, nem saber dos serviços que responsabilidades é que existiram, ou o que é que foi mudado, ou o que é foi melhorado… Não. O que querem é chamar à Assembleia três ex-membros do governo, que não foram sequer ouvidos, porque não tinham de o ser, nesta auditoria - o auditório é feito com a instituição e quem foi ouvido, para efeitos de contraditório, foram os actuais membros do Governo, que nada disseram,…

Vozes do PS: - Nada!

O Orador: - … e quem exerceu o contraditório efectivo foram os serviços.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Porque são os principais responsáveis!

O Orador: - Portanto, chamam cá três pessoas, que não conhecem sequer o relatório, que nunca são referidas em todo o relatório, única e exclusivamente para operação política.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Isso é o relatório da Judiciária!

O Orador: - Sr. Deputado Telmo Correia, insisto, não é o caso concreto que está em causa, porque, quanto a esse, as pessoas, por que querem, de sua livre e exclusiva vontade, comparecerão. O que é necessário recordar e ficar claro é que a competência da Assembleia é relativamente ao actual Governo. A responsabilidade política é do actual Governo e não do anterior governo. Quem tem o dever de comparecer é o actual Governo e não quem já não é membro do governo, estes não têm esse dever - pode comparecer se quiser, mas não tem o dever, nem é obrigado a vir; aceita o convite, mas não se submete a uma convocatória.

A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - Exactamente!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Mas é ou não é útil?

O Orador: - Portanto, é esta diferença que é essencial ter ciente. E meditem bem se este é o caminho que efectivamente desejam.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E, por favor, de uma vez por todas, sejam crescidinhos e assumam as vossas responsabilidades!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Ao fim de um ano, já é altura de assumirem as vossas responsabilidades e de não se esconderem atrás de quem já assumiu as suas, de quem já foi julgado politicamente e que agora, com toda a legitimidade, foi substituído por alguém da vossa área política, para que assuma as responsabilidades governativas e, pelo seu resultado, responda perante o País e a Assembleia da República.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, assistimos aqui a debates acalorados, a trocas de impressões políticas veementes, a acusações políticas, enfim, àquilo que é normal em democracia e no exercício do contraditório.
Há, no entanto, da parte da Mesa, a responsabilidade de conduzir os trabalhos no sentido de que esses debates políticos se contenham no âmbito do aceitável e daquilo que, dentro da cordialidade democrática, é possível ser exercido nesta Assembleia.
Já no debate realizado na semana passada - e, na altura, a minha bancada optou por não fazer qualquer observação à Mesa -, o líder do maior partido da oposição utilizou uma expressão aqui, no Plenário, relativamente à qual a Mesa nada fez,…

Risos do Deputado do BE João Teixeira Lopes.

… enquanto que, num outro debate anterior, a Mesa havia chamado atenção, e bem, de um Deputado da minha bancada. Agora, o líder da bancada socialista dirige-se a outros Srs. Deputados, dizendo-lhes que devem ser "crescidinhos" para poderem participar no debate.
Sr. Presidente, permita-me que lhe diga, com toda a franqueza, que considero que a Mesa não deve permitir que os debates atinjam este tipo de linguagem, porque não configura ataques políticos mas ataques pessoais…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Quer censura!

O Orador: - … que visam, exclusivamente, denegrir a honra e a dignidade dos Deputados presentes na Sala.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Vicente Jorge Silva (PS): - Que descaramento!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, registo a sua observação.
Quanto ao tratamento desigual que refere, não tenho memória de tal. Se, porventura, ocorreu, penitencio-me.
Em repetidas ocasiões, tenho exortado todos os membros do Parlamento a respeitarem-se uns aos outros, porque a veemência do debate não justifica que se passe as marcas. É a recomendação que sempre faço e que mantenho.
Para uma intervenção sobre assunto de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No início do mês de Dezembro de 2002, o Diário de Notícias publicou uma peça sobre o Serviço de Informações Estratégicas de Defesa e Militares (SIEDM) que dava conta de factos profundamente preocupantes quanto ao funcionamento desse Serviço, cuja importância e especial melindre é por demais evidente.
Aludindo a relatórios internos do SIEDM, a que informou ter tido acesso, o Diário de Notícias referiu-se a factos relativos à actividade desse serviço de informações, usando termos como "anarquia", "desmotivação", "trabalho de campo reduzido", "ausência de fontes credíveis", "relatórios que merecem pouco crédito junto dos seus destinatários", "violações dos limites jurídico-constitucionais de actuação", "clima de turbulência e quase autogestão", "desrespeito total pelas regras de hierarquia interna", e noticiou que determinadas figuras de nacionalidade portuguesa teriam sido objecto de tentativas de constituição de dossiers pessoais.
A esse respeito, foi tornado público pelo Diário de Notícias que personalidades, como o Dr. Dias Loureiro, o Eng.º Cardoso e Cunha, o Dr. Manuel Monteiro, ou o Eng.º Ângelo Correia, teriam sido alvo de investigações ilegais do SIEDM e, em declarações ao Expresso, o ex-Director do SIEDM, Embaixador Bramão Ramos, afirmou que o chefe de gabinete do Ministro Paulo Portas lhe terá exibido uma lista de cidadãos alegadamente sujeitos a acções de vigilância ilegal, de onde constavam nomes como o Eng.º Jardim Gonçalves e o Dr. Jaime Nogueira Pinto.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - Confrontado com estas notícias públicas, no início de Dezembro de 2002, o Ministro de Estado e da Defesa Nacional, responsável pela tutela do SIEDM, admitiu que, uns meses antes - sublinho, "uns meses antes" -, lhe havia chegado um rumor de que poderia ter havido investigações sobre algumas pessoas, daí, segundo as suas próprias palavras, ter mandado o Director do Serviço (note-se, do próprio serviço visado) investigar e foi-lhe dito que não houve, pelo que entendeu não ter razões para duvidar.
No entanto, uns meses depois dos tais rumores terem chegado aos ouvidos do Ministro de Estado e da Defesa Nacional, tornaram-se do domínio público. E só nessa altura o Sr. Ministro se dignou a pedir inquéritos sobre tais rumores à nova direcção do SIEDM, à Comissão de Fiscalização das Bases de Dados dos Serviços de Informações, dependente da Procuradoria-Geral da República, e ao Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações, tendo, inclusivamente, solicitado uma reunião de emergência a este último Conselho. E foi, aliás, no final dessa reunião que o

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Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional afirmou peremptoriamente aos jornalistas que a notícia da vigilância efectuada sobre vários cidadãos portugueses "é grave, porque ou corresponde à verdade, e isso significa um gravíssimo atentado aos direitos, liberdades e garantias, ou não corresponde à verdade, e é também grave por se tratar de uma difamação com sérios prejuízos para os Serviços".

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em 20 de Dezembro de 2002, o Ministro de Estado e da Defesa Nacional compareceu na Comissão de Defesa Nacional desta Assembleia, depois de a maioria ter recusado a audição, solicitada pelo PCP e pelo BE, do Embaixador Bramão Ramos e do chefe de gabinete do Sr. Ministro, e, nessa altura, quer perante a Comissão, quer em declarações à comunicação social, o Ministro de Estado e da Defesa Nacional anunciou, na convicção de que as acusações de vigilância ilegal de vários cidadãos pelo SIEDM não eram verdadeiras, que iria apresentar na Procuradoria-Geral da República uma queixa-crime por difamação, para que fossem apuradas as responsabilidades criminais dos autores de tais acusações, que, segundo as próprias palavras do Sr. Ministro, implicaram sérios prejuízos para os Serviços.
Tendo esta reunião ocorrido em 20 de Dezembro, todo o País ficou a aguardar que a anunciada queixa-crime fosse apresentada. E como não houve notícia pública dessa apresentação nos dias seguintes, deixámos passar um lapso de tempo razoável e, em 31 de Janeiro de 2003 - mais de um mês depois -, entregámos um requerimento na Mesa desta Assembleia, solicitando ao Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional que informasse se apresentou ou não a anunciada queixa à Procuradoria-Geral da República e, em caso afirmativo, em que data. Acontece que até hoje, dia 15 de Maio de 2003, passados três meses e meio, não obtivemos qualquer resposta ao requerimento da parte do Ministro de Estado e da Defesa Nacional.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Porque será?!

O Orador: - Pelo que, de duas, uma: ou o Sr. Ministro é relapso a responder aos requerimentos dos Deputados, e deixa passar os prazos regimentais, ou o Sr. Ministro não apresentou qualquer queixa-crime, e, neste caso, mais uma vez, mentiu ao Parlamento e aos portugueses.

Aplausos do PCP e do BE.

E sendo legítimo presumir, na falta de prova em contrário, que seja este o caso, é legítimo exigir ao Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional uma explicação clara das razões que o levaram a não apresentar a queixa-crime que havia prometido, pela simples razão de que, quando o SIEDM é difamado na praça pública, mesmo que o Sr. Ministro não se importe, os Deputados têm o direito e o dever de se importar e de exigir um sério apuramento das responsabilidades por tais difamações.

Vozes do PCP e do BE: - Exactamente!

O Orador: - Quando o Chefe de Gabinete do Ministro de Estado e da Defesa Nacional exibe uma lista de cidadãos alegadamente vigiados pelo SIEDM, que alguém lhe fez chegar, e quando o próprio Ministro reconhece ter tido conhecimento de rumores de tais actuações, há uma investigação criminal que se impõe. Se tais rumores são falsos, os seus autores não podem deixar de ser criminalmente responsabilizados por difamação.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E se o Sr. Ministro não actuou, como era seu dever e como prometeu que actuaria, todos temos o direito de saber porquê.

Vozes do PCP e do BE: - Exactamente!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É certo que este facto é apenas mais um dos muitos factos que fazem com que a credibilidade pública do Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional ande pelas ruas da amargura…

Vozes do PCP e do BE: - Muito bem!

O Orador: - … e que tornam evidente a sua falta de idoneidade política para exercer funções ministeriais,…

Aplausos do PCP, do BE e de Os Verdes.

… mas é um facto muito revelador.
O Governo de Portugal não pode ter um Ministro de Estado e da Defesa Nacional cuja idoneidade política é constantemente arrasada na barra do tribunal, nas colunas da imprensa e nas conversas do dia-a-dia de todos os portugueses,…

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - … um Ministro que insiste em só assumir responsabilidades políticas perante o Parlamento quando lhe convém…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … e que, mesmo quando decide comparecer na Assembleia da República, falta à verdade de forma pública e notória.

Vozes do PCP e do BE: - Exactamente!

O Orador: - A democracia portuguesa vive um momento difícil. Mesmo que outros factores não contribuíssem para o descrédito da vida política aos olhos dos cidadãos, a soma de casos do foro criminal que envolvem titulares e ex-titulares de altos cargos políticos é mais do que suficiente para que se crie um clima de suspeição generalizada sobre a política e os políticos e que pode corroer perigosamente os próprios alicerces do regime democrático.
A exigência ética para o exercício de funções públicas é, mais do que nunca, um imperativo democrático a que ninguém se pode furtar. Compete a todos e a cada um dos responsáveis políticos dar o exemplo e assumir as suas próprias responsabilidades. A manutenção em funções do Ministro de Estado e da Defesa Nacional é, nas actuais circunstâncias, um mau exemplo e um péssimo serviço à democracia.

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Aplausos do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró, que beneficiará de tempo cedido pelo PSD.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, é óbvio que o seu partido não tem assunto de relevância política para tratar nesta Assembleia da República.

Risos do Deputado do PCP António Filipe.

Ri-se porquê? Se é este o assunto de interesse político relevante, vê-se o nível - zero - a que chegou o Partido Comunista Português.
Em primeiro lugar, faz tábua rasa de que todos inquéritos feitos sobre a atoarda suscitada no Diário de Notícias, relativamente à possível investigação de alguns cidadãos, eram uma pura mentira, uma falsidade.

O Sr. Honório Novo (PCP): - E a queixa-crime?!

O Orador: - Foram feitos inquéritos internos e externos, intervieram órgãos de fiscalização nomeados por esta Assembleia da República e, após tudo quanto pôde ser feito para apurar a verdade, chegou-se a uma única conclusão: era falso, não tinha qualquer fundamento, não tinha qualquer vezo de realidade o que se publicou no Diário de Notícias.
Foi o Embaixador Bramão Ramos quem disse que iria processar a comunicação social sobre as atoardas suscitadas contra ele próprio.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não foi isso!

O Orador: - Foi sim, senhor.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Já se confundiu!

O Orador: - Foi em entrevista concedida à revista Visão que o Sr. ex-Embaixador Bramão Ramos disse que iria processar a comunicação social por difamação.
O que o Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional disse aqui, à saída - e eu próprio ouvi -, foi que iria apoiar, repito, apoiar, o Sr. Embaixador Bramão Ramos quando ele apresentasse essa queixa.
No Estado de direito e com o processo penal que temos, de forma alguma podemos investigar quem apresentou a queixa, quando e contra quem. Se V. Ex.ª tiver esse poder - e há a memória histórica de o Partido Comunista Português dominar o poder judicial e de saber "por dentro" quem apresenta queixa contra quem, como e quando -,…

Risos do PCP.

… naturalmente, terá canais que lhe permitam saber.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de terminar.

O Orador: - Nós, nesta bancada, não podemos saber quem apresentou queixa contra quem.
Se o Sr. Deputado António Filipe tem a certeza de que não foi apresentada queixa e sabe a razão por que ela não foi apresentada,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de terminar, senão ser-lhe-á desligado o microfone.

O Orador: - … gostaria que dissesse aqui, publicamente, quais as provas que tem de que não existe nenhum…

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, passo por cima de alguns afirmações que fez pouco abonatórias para o poder judicial.

Protestos do Deputado do CDS-PP Narana Coissoró.

Ficam consigo.
Relativamente à questão de fundo, não sei se são ou não verdade as acusações que foram feitas no Diário de Notícias. Não sei, nem estou em condições de saber.

Protestos do Deputado do CDS-PP Narana Coissoró.

O que sei é que o Sr. Ministro manifestou aqui a sua convicção de que constituíam uma difamação, de que eram falsas, e anunciou que, por isso mesmo, iria apresentar na Procuradoria-Geral da República uma queixa-crime por difamação.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Quem disse que não apresentou?

O Orador: - Assim, fizemos um requerimento ao Sr. Ministro a perguntar em que data é que apresentou a queixa que anunciou aqui, tanto na comissão como fora dela, que iria apresentar.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Ora, o Sr. Ministro não respondeu ao requerimento.
Portanto, compete ao Ministro provar se apresentou ou não queixa, como tinha anunciado que faria. No caso de não ter apresentado a queixa, então, que nos diga por que razão não o fez.

Vozes do PCP, do BE e de Os Verdes: - Exactamente!

O Orador: - É que a questão não pode ficar assim. Esta questão não pode ficar assim!
Então, o chefe de gabinete do Ministro apresenta listas de pessoas que teriam sido visadas pelo SIEDM - por exemplo, o Embaixador Bramão Ramos, como veio noticiado no Expresso em declarações do próprio -, a maioria não permite que sejam chamados à Assembleia da República para prestar declarações nem o Embaixador Bramão Ramos nem o referido chefe de gabinete do Ministro, apenas permite que venha cá o Ministro… O Ministro vem prometer que vai apresentar uma queixa por difamação e, depois, não o faz. Nós queremos saber porquê.

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O Sr. Ministro mentiu. Ou nos demonstra em que data apresentou a queixa-crime que disse que iria apresentar, ou, então, mentiu-nos e tem de nos explicar por que razão não quis apresentar a queixa-crime que disse que apresentaria.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Esta é uma questão muito séria. O Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional não pode brincar com o Serviço de Informações Estratégicas de Defesa e Militares (SIEDM), não pode instrumentalizá-los e tem de responder perante o País relativamente à tutela que exerce sobre esse Serviço.

Vozes do PCP e do BE: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro não pode tomar atitudes que só desprestigiam aquele Serviço, o Estado português e as funções que ele próprio exerce.

Aplausos do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, quero chamar a atenção da Mesa para o facto de o Sr. Deputado António Filipe estar a acusar o Sr. Ministro e este não estar presente. E eu não tenho procuração do Sr. Ministro para defender a sua honra pessoal, apenas o posso apoiar politicamente.

O Sr. António Filipe (PCP): - Então, ele que venha cá!

O Orador: - Penso que a Mesa deveria chamar atenção o Sr. Deputado António Filipe que, no calor da discussão e na falta de razão, chama mentiroso a um ministro de Portugal.
Peço à Mesa que registe este facto. Eu não posso protestar contra uma ofensa pessoal dirigida a um ministro de Portugal, mas V. Ex.ª tem o dever de chamar atenção o Sr. Deputado António Filipe de que não pode chamar mentiroso a um ministro, quando, ainda por cima, o mesmo se encontra ausente.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, manifestamente, hoje, estou em falta, por distracção, pelo menos, pelo que me diz o Sr. Deputado.
É óbvio que não se pode chamar mentiroso a alguém, pode considerar-se que uma determinada afirmação feita não é verdadeira. A utilização do termo "mentiroso" é, de facto, ofensiva.
Se o Sr. Deputado António Filipe utilizou esse termo, tenho de reconhecer que não é um termo parlamentar.

O Sr. António Filipe (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - É para dar algum esclarecimento, Sr. Deputado António Filipe?

O Sr. António Filipe (PCP): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, a Acta demonstrará que não utilizei esse termo.

Risos do Deputado do CDS-PP Narana Coissoró.

O Sr. Presidente: - Ainda bem, Sr. Deputado.

O Orador: - Limitei-me a registar o facto de o Sr. Ministro não ter cumprido a promessa que fez publicamente, aquando de uma reunião a que compareceu nesta Assembleia.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Felizmente, tudo o que se passa em Plenário fica gravado, o que permite esclarecer as questões que surjam posteriormente.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Veremos! Chamou três vezes!

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, sendo hoje a segunda vez que a maioria chama a atenção de V. Ex.ª a propósito da condução dos trabalhos…

O Sr. Presidente: - Também lhe dou a palavra para uma chamada de atenção. A Mesa não é infalível.

O Orador: - … e estando V. Ex.ª em iminente risco de ser convocado para uma audição numa qualquer comissão, é para testemunhar que, pela nossa parte, também lhe daremos a nossa solidariedade quando for convocado para alguma audição.

Risos do PS, do BE e de Deputados do PCP.

O Sr. Presidente: - Pensei que também iria censurar-me…!
Srs. Deputados, falta-nos muito pouco tempo para o términos do período de antes da ordem do dia, não sei se o Sr. Deputado Carlos Luís, que se encontra inscrito para uma intervenção sobre assunto de interesse político relevante, conseguirá produzi-la nesse pouco tempo de que ainda dispomos.
Sr. Deputado Carlos Luís, a sua intervenção será breve?

O Sr. Carlos Luís (PS): - Relativamente, Sr. Presidente.

Vozes do PSD: - É de 15 minutos!

O Sr. Presidente: - Não pode ser de 15 minutos, porque apenas dispomos de 7 minutos.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Serei relativamente breve, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Sendo assim, tem a palavra, mas peço-lhe que seja de facto sintético.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Decorrido um ano após a tomada de posse do actual Governo PSD/CDS-PP, os portugueses residentes no estrangeiro vêem-se confrontados com a maior crise governativa no sector das comunidades, enquanto assistem à suspensão, paralisação e extinção das estruturas de apoio às comunidades portuguesas.
A política do logro e da farsa, levada a cabo pelo actual Governo, com particular destaque para o Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas e para o seu Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Cesário, lançou no seio das comunidades portuguesas um ambiente de descrença colectiva que se vem adensando cada vez mais com as muitas promessas feitas por cumprir.
O incumprimento das promessas eleitorais verificou-se logo no dia da tomada de posse do actual Governo, em que o prometido ministro adjunto para as comunidades deu lugar a um Secretário de Estado fragilizado e sem peso político.
Este foi o primeiro sinal das reais intenções do actual Governo PSD/CDS-PP: marginalizar e esquecer as comunidades portuguesas. Para tanto, pôs em prática uma verdadeira estratégia de desmantelamento e liquidação das estruturas e sistemas de apoio às comunidades portuguesas.
Observemos, pois, o que se passa em algumas áreas que têm sido particularmente atingidas: deu-se a extinção das delegações regionais da Direcção-Geral dos Assuntos Consulares. Para poupar cerca de 27 000 contos, a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas encerrou oito das nove delegações regionais dos assuntos consulares, em Portugal, que prestavam um importante serviço de apoio aos emigrantes portugueses.
Em contrapartida, e contrariamente ao anunciado, os alegados gabinetes de apoio aos emigrantes, junto de algumas câmaras municipais, na maioria dos casos, não estão minimamente estruturados e, pior ainda, não funcionam, pois não passaram da simples assinatura do respectivo protocolo.
Há também uma gestão caótica do ensino de Português no estrangeiro. Desde a entrada em funções do actual Governo, o sistema do ensino de Português no estrangeiro foi e está a ser alvo de um atentado, nunca antes imaginável.
A primeira agressão teve lugar, ainda o concurso para a colocação dos docentes portugueses no estrangeiro ia a meio, quando uma decisão irresponsável do Conselho de Ministros, de 23 de Maio de 2002, procurou alterar as regras do referido concurso. Tal decisão teve como consequência um início de ano lectivo dos cursos de língua e cultura portuguesas no estrangeiro em condições desastrosas e altamente negativas para a imagem de Portugal.
Diminuição de professores destacados, redução de horas de cursos, apesar de haver mais alunos, contratação de professores locais prejudicada, ocupação de consulados, milhares de alunos sem aulas e os respectivos pais a viverem numa angústia desesperante, tutela indefinida, responsabilidades diluídas e a tentativa por parte do Governo de se "desembaraçar" do pouco que existe, quando pretendeu entregar à cadeia de supermercados suíça Migros alguns cursos de português, foram os condimentos que originaram uma situação tão gravosa como nunca se tinha assistido até hoje, ainda mais difícil de aceitar porque veio contrariar todas as promessas que tinham sido feitas pelo actual Governo.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O anunciado plano de reestruturação consular, anunciado pelo Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, traduz apenas um pequeno episódio de uma comédia trágico-cómica, que vai deixar marcas profundas na capacidade de afirmação e no próprio orgulho dos nossos compatriotas residentes no estrangeiro, que se sentem ludibriados e enxovalhados pela incompetência e irresponsabilidade do actual Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.
Esta reestruturação consular, conduzida de forma trapalhona e assente em critérios discricionários, já mostrou ao que pode levar: à revolta das comunidades e à má imagem de Portugal no estrangeiro.
Como é que se pode levar a sério esta reforma consular, quando, num dia, o Ministro da tutela diz uma coisa e, no outro dia logo a seguir, o seu Secretário de Estado o contraria?
Como é que se pode levar a sério uma reforma consular que visa apenas o encerramento de consulados exemplares que servem com grande dignidade importantes comunidades portuguesas e, em sua substituição, se promete a abertura de "baiucas" consulares, como alguém já lhe chamou?
Como é que se pode levar a sério uma reforma consular que começa por despedir dezenas e dezenas de trabalhadores e deixa amontoados mais de 30 000 pedidos de bilhetes de identidade de emigrantes portugueses e as repartições consulares e diplomáticas na penúria?
Como é que se pode levar a sério uma reforma consular, cujos mentores não respeitam os seus próprios funcionários, subtraindo-lhes verbas indevidas dos seus ordenados e deixando-os em situações familiares precárias?
Como é que se pode levar a sério uma reforma consular, quando o actual Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, em declarações ao jornal Espanhol El Mundo, de 24 de Junho de 2001, afirmava "Não prevejo grande futuro aos consulados portugueses dentro de 15 a 20 anos, por lo que creo que habrá que cerrarlos todos"?
Como é que se pode levar a sério uma reforma consular, quando José Cesário, "de chapéu na mão", mendiga ao Presidente da Câmara de Osnabrück o pagamento da manutenção do consulado de Portugal na referida cidade, o que levou alguns portugueses a tornarem público que irão renunciar à nacionalidade portuguesa?
Como é que se pode levar a sério uma reforma consular em que os decisores não ouviram sequer aqueles a quem mais directamente diz respeito tal reforma, nem os seus representantes?
Para que serviram dezenas de viagens (e milhares de contos gastos do erário público) feitas pelo actual Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas?
Basta de incompetência! Basta de humilhação às comunidades portuguesas!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Alberto Gonçalves.

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O Sr. Carlos Alberto Gonçalves (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Luís, ao ouvir a sua intervenção, pareceu-me que estava, há cerca de um ano, em campanha eleitoral. O retrato que fez da situação das comunidades portuguesas é praticamente similar àquilo que tive oportunidade de discutir, em campanha eleitoral, com outras pessoas que estão neste Hemiciclo.
O senhor fez aqui um balanço de um ano de governo, esquecendo-se de que uma legislatura são quatro anos e meio.
Mas deixe-me que lhe faça algumas observações. Quanto ao que o Sr. Deputado referiu sobre não termos um ministro adjunto para as comunidades, devo dizer-lhe que, efectivamente, temos um Ministro das Comunidades Portuguesas e, além disso, temos um Primeiro-Ministro, que, quando se desloca ao estrangeiro, nunca esquece as comunidades portuguesas, numa atitude nunca vista, em Portugal, e que só honra este Governo e este País.
Gostava de referir-me ainda a outro assunto, de que o Sr. Deputado falou muito: a reestruturação consular. Disponho de pouco tempo, mas tenho de dizer-lhe o seguinte: ó Sr. Deputado, os nossos emigrantes, sobretudo no Círculo Eleitoral da Europa onde vai haver alguns encerramentos e aberturas, emigraram há 30 anos e integraram-se na vida desses países, os quais, por seu lado, sofreram evoluções no aspecto demográfico e a nível dos eixos rodoviários e ferroviários, sendo hoje países diferentes! Só que a nossa rede consular ficou parada! Inacreditavelmente, temos países em que, hoje, há poucos portugueses e consulados de grande dimensão, e, por outro lado, países, como o Reino Unido - e ainda hoje tivemos oportunidade de ler nos jornais uma notícia sobre este assunto -, onde os senhores nos deixaram uma situação em que os portugueses, antes de serem atendidos no consulado, têm de esperar na rua (foi pena não o ter dito aqui), situação esta que estamos agora a resolver. Situação idêntica existe no Luxemburgo, assim como em outros locais.
Ora, o que estamos agora a fazer é a repartir os meios que Portugal tem no estrangeiro pelos sítios em que há mais necessidade e, daí, a abertura de consulados no Círculo Eleitoral Fora da Europa. Haverá também a abertura de um consulado na Córsega e de um outro no Reino Unido.
E, deixe-me que lhe diga, Sr. Deputado, não foi este Governo que se foi embora depois de ter aumentado todos os funcionários da Administração Pública, esquecendo-se de aumentar os funcionários consulares.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto aos funcionários de que falou, está a referir-se a contratados a termo certo, o que só demonstra a inépcia do seu governo, que não foi capaz de implementar o estatuto profissional, apesar de, felizmente (e aí teve valor), o ter publicado.
E, Sr. Deputado, não é fazer política "de chapéu na mão" o Governo tentar, junto das autoridades estrangeiras, defender os interesses de Portugal. Muito valem os portugueses que residem no estrangeiro! E, se houve um acto de um governante a pedir algo a um país estrangeiro, isso só demonstra o interesse e a dedicação que tem por aqueles que residem fora de Portugal. Para melhor prova do que lhe digo, Sr. Deputado, já que o senhor falou do encerramento das delegações do ex-Instituto de Apoio à Emigração, peço-lhe que me cite só um emigrante que tenha achado mal o encerramento de uma estrutura que apenas existia para ter lá alguns directores a ganhar chorudos salários, mas não para servir as comunidades portuguesas. Gostaria que me respondesse a isto.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Manuela Aguiar. Chamo-lhe a atenção de que só dispõe de 24 segundos, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Manuela Aguiar (PSD): - Sr. Presidente, serei muito breve.
Sr. Deputado Carlos Luís, é sempre bom que fale das questões da emigração. Nunca é demais debatê-las aqui.
Por aquilo que o Sr. Deputado diz, parece que este Governo teria recebido das mãos do governo anterior uma situação ascendente. Ora, a situação da emigração, tal como a vejo, estava, há muito, num plano inclinado, Sr. Deputado. E o que este Governo tem de conseguir - e ainda tem mais de três anos para o fazer - é reverter essa situação.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado: em que estado deixou o governo do Partido Socialista o ensino do Português no estrangeiro? Em que estado deixou a rede consular, nomeadamente, fora da Europa? Em que estado deixou a assistência social aos portugueses no estrangeiro? É que o ASIC-CP foi um começo, mas foi também uma ilusão, que os emigrantes, hoje, estão a pagar caro, porque esperam uma pensão social e têm apenas, quando têm, um subsídio absolutamente insignificante.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se.

A Oradora: - Então, terminei, Sr. Presidente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados Carlos Alberto Gonçalves e Maria Manuela Aguiar, agradeço os pedidos de esclarecimento, a que irei responder em conjunto.
Dada a chamada de atenção do Sr. Presidente, tive de cortar o meio da minha intervenção, mas a matéria social, designadamente a referente ao ASIC-CP e ao ASEC-CP, era aí desenvolvida.
O Sr. Deputado Carlos Alberto Gonçalves, como funcionário consular, sabe que sempre, mas sempre, o actual Primeiro-Ministro negou a aplicação aos funcionários consulares do estatuto de funcionários do Estado. De facto, quando Durão Barroso era Ministro dos Negócios Estrangeiros, o senhor era contratado, era assalariado; já com o Ministro dos Negócios Estrangeiros Jaime Gama, o senhor passou a ser funcionário do Estado e funcionário público, estatuto este que, como referi, sempre lhe foi negado pelo actual Primeiro-Ministro enquanto Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Sr. Deputado, nós não temos essa visão redutora dos consulados. Durante cinco anos, abrimos seis novos consulados; informatizámos, pela primeira vez, os postos consulares; dignificámos os trabalhadores; e, em matéria social,

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criámos o ASIC-CP e o ASEC-CP. O ASIC-CP destina-se a dar uma pensão social, que hoje é recebida por mais de 3000 portugueses, e o ASEC-CP, que se destina aos portugueses carenciados e em perigo, é para uma ajuda de emergência. Por exemplo, no ano transacto, na África do Sul, foram mortos 28 portugueses, vítimas da criminalidade. Ora, apesar de nós termos deixado 100 000 contos em orçamento para acudir a esses portugueses, para a viúva da 27.ª vítima, uma mulher de 26 anos com dois filhos de colo, um padre teve de mendigar numa igreja o dinheiro necessário para a compra do bilhete de regresso à Madeira.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Esta política está a ser liquidada pelo actual Governo. E, até hoje, é a maior revolta nas comunidades portuguesas…

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Como já tinha alertado, o seu tempo terminou.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 40 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.os 101 a 107 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 19, 20, 21, 26, 27 e 28 de Março e 2 de Abril.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, vamos, agora, dar início à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 50/IX - Autoriza o Governo a legislar sobre a insolvência de pessoas singulares e colectivas e do projecto de lei n.º 273/IX - Adopta medidas dissuasoras do recurso às falências fraudulentas e desenvolve medidas de protecção dos trabalhadores (BE).

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação tem a ver com a condução dos trabalhos.
Sr. Presidente, estamos perante uma autorização legislativa que tem matéria relativa a direitos dos trabalhadores. Isto já resultava claramente do diploma anexo à proposta de lei de autorização legislativa, mas fica agora bem claro pela proposta de aditamento, apresentada pelo PSD, ao artigo 1.º e de um artigo 2.º-A, ontem entregue na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Fica, portanto, bem claro que esta autorização legislativa tem matéria relativa aos direitos dos trabalhadores.
Segundo o Acórdão n.º 107/88, de 21 de Junho, publicado no Diário da República, que se destinou a sindicar se havia inconstitucionalidades num diploma da Assembleia da República, a lei de autorização legislativa não é por ser de autorização legislativa que dispensa a consulta pública quando toque matéria dos direitos dos trabalhadores. Isto consta claramente deste acórdão, que declarou inconstitucional o diploma saído da Assembleia, entre outras razões, por não ter havido consulta pública aos trabalhadores e aos seus organismos.
Pergunto ao Sr. Presidente o que pensa fazer para dar cumprimento a um preceito constitucional que impõe a consulta pública aos organismos representativos dos trabalhadores.

Vozes do PCP, do BE e de Deputados do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, a competência para determinar a consulta pública é da comissão respectiva. Se, porventura, ela não o fez, esse é um problema que poderá ser dirimido durante este debate, mas não era da responsabilidade da Mesa proceder a essa consulta.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, peço, então, para fazer outra interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - V. Ex.ª pode indicar-me em que data baixou este diploma à Comissão do Trabalho e dos Assuntos Sociais, para que ela pudesse deliberar nesse sentido?

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, esta proposta de autorização legislativa foi enviada à 1.ª Comissão por se tratar de matéria da sua competência. A Mesa também não foi alertada pela Comissão do Trabalho e dos Assuntos Sociais para o aspecto que a Sr.ª Deputada agora salientou.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa sobre a mesma matéria.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, genericamente, a preocupação manifestada pela Sr.ª Deputada Odete Santos é uma preocupação que as duas bancadas da maioria também já tinham equacionado.
Do nosso ponto de vista, a solução mais azada - assim haja também da parte do autor da iniciativa, neste caso, o Governo, abertura necessária para isso, o que me parece também evidente - é a de que, realizado este debate, se proceda a uma baixa sem votação destes dois diplomas a uma das comissões, a fim de se realizar imediatamente a consulta pública (e, até ao final da Sessão Legislativa, parece-nos que há mais do que tempo útil para percorrer os 30 dias de publicação obrigatória), e, assim, permitir que a Assembleia possa votá-los ainda nesta Sessão Legislativa, mas já depois de feita a consulta pública nos termos legais.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado. Então, foi oportuno ser levantado esse assunto e espero que este procedimento permita evitar qualquer dúvida sobre a constitucionalidade do diploma. Aliás, havendo referências

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do Tribunal Constitucional sobre esta matéria, esta dúvida seria mais do que fundamentada.
Fica então determinada, após a decisão do Plenário sobre essa matéria, a baixa de ambos os diplomas à Comissão do Trabalho e dos Assuntos Sociais, que é a comissão competente para o diálogo com os organismos representativos dos trabalhadores.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa sobre a mesma matéria.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, depois do que V. Ex.ª acaba de dizer, só me resta, em nome da minha bancada, congratular-me, sendo essa a solução que merece consenso e que merecerá cooperação institucional do Governo, porque julgamos que ela é um bom ensejo para dar cumprimento a regras que são imperativas, criando-nos, simultaneamente, um espaço, que a comissão, de resto, tem de ponderar adequadamente, para, tratando-se de uma autorização legislativa muito complexa, fazermos trabalho preparatório em relação a várias componentes. Há uma proposta de alteração apresentada pelos partidos da maioria parlamentar, haverá seguramente outras, pelo que este compasso de espera permitir-nos-á trabalhar num duplo sentido e, simultaneamente, dar cumprimento, de maneira formal, com publicações, consultas, etc., a tudo aquilo que, constitucional e legalmente, é obrigatório.
É, portanto, um bom resultado.

O Sr. Presidente: - Muito bem, congratulo-me então com esse resultado, mas chamarei a atenção da comissão competente e, desde logo, dos Srs. Deputados para, durante o debate, se determinar se, porventura, será preciso proceder da mesma maneira relativamente ao diploma da iniciativa do Bloco de Esquerda, que também é discutido juntamente com este, se, porventura, também afecta os direitos dos trabalhadores.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de perguntar a V. Ex.ª se vamos esperar pela Sr.ª Ministra da Justiça para dar início ao debate, ou se há a certeza de que a Sr.ª Ministra, apesar da importância do diploma referenciado já pelo Sr. Primeiro-Ministro, não comparecerá.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa não tem conhecimento de quais são os membros do Governo que irão apresentar este diploma. Pelo que vejo através do vídeo encontram-se na bancada do Governo o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e, suponho, um dos Srs. Secretários de Estado do Ministério competente, e, de acordo com as praxes, será ele a apresentar a proposta de lei.
Peço à Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza o favor de me substituir na condução dos trabalhos, uma vez que tenho outros trabalhos a realizar.

Neste momento, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 50/IX e projecto de lei n.º 273/IX (BE).
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça (João Mota de Campos): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para que uma economia possa ser saudável, é necessário que se conheça com rigor as enfermidades de que em cada momento padece e que necessitam de tratamento.
O facto de se desconhecer a situação real de uma empresa que está insolvente não torna a economia melhor; pelo contrário, torna-a menos transparente e menos justa.
A subsistência no mercado de situações de insolvência desconhecidas não aproveita a ninguém. Quando assim acontece, há prejuízo para os trabalhadores que ignoram que a entidade patronal não está capaz de cumprir as suas obrigações; os fornecedores são lesados, porque vendem desconhecendo que podem não ser pagos; o crédito bancário é abusado, pondo em causa o sistema creditício e, pior do que tudo, as dificuldades de uma empresa repercutem-se em cascata sobre o conjunto do mercado, porque as regras da concorrência estão postas em causa.
Nenhum governo deseja a falência de uma qualquer empresa,…

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não é o que parece!

O Orador: - … mas este Governo opta com clareza por um sistema que conduza à transparência do mercado e à verdade na economia.
São estas as razões que nos trazem aqui hoje a propor à Assembleia da República um código da insolvência que tome as opções certas, partindo de uma diagnóstico correcto.
Comecemos pelo diagnóstico da situação, cujo consenso é, aliás, elucidativo.
Em 1995, a iniciativa do processo era repartida em iguais partes entre devedor e credor. Desde então esta igualdade foi diminuindo, em favor da iniciativa do credor. Segundo os dados de 2001, cerca de 74% dos processos iniciaram-se a requerimento do credor e somente cerca de 21% por iniciativa do devedor.
Havia, pois, que pensar em mecanismos que levem o primeiro e principal conhecedor da situação da empresa a propor-se ao processo de recuperação, ou de falência. O que é que a menor iniciativa do devedor significa? Em termos concretos, que os processos chegam tarde aos tribunais e os créditos demasiado tarde, ou mesmo nunca, aos credores.
Da análise efectuada concluímos, também, que as providências de recuperação têm uma aplicação muitíssimo reduzida no nosso país, conclusão que, aliás, não difere, substancialmente, da situação verificada na generalidade dos países europeus.
Mais grave ainda em todo o diagnóstico é, insisto, a constatação da escassa eficácia da falência, pois os credores recebem pouco e recebem tarde, e, por vezes, tarde demais.
Neste contexto, assumimos pois a empreitada da revisão do direito falimentar, com o propósito de apresentar um novo código adequado às necessidades da economia real e actual.

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Há quatro objectivos claros que o Governo assume nesta revisão do código de insolvência:…

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - O primeiro é aniquilar património!

O Orador: - … o início atempado dos processos; criar maiores possibilidades de sucesso para a recuperação;…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … garantir que processo decorre com maior celeridade; e assegurar uma maior preparação técnica dos intervenientes.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tendo presente o diagnóstico efectuado e os objectivos a que nos propomos, o novo código de insolvência condensa um conjunto de medidas muito concretas e devidamente ponderadas.
Restringe-se às empresas o foro dos tribunais de comércio, cabendo aos tribunais comuns os processos relativos a pessoas singulares não titulares de empresas, conferindo-se, assim, maior eficácia aos processos com mais importantes consequências sociais e económicas.
Agiliza-se a actuação judicial, reservando a intervenção do juiz aos domínios verdadeiramente jurisdicionais e aos outros intervenientes a intervenção na decisão concreta quanto ao destino da empresa.
É consagrada uma forma única de processo, o processo especial de insolvência, no âmbito do qual cabe aos credores, em assembleia realizada no prazo de 45 a 75 dias, sobre a declaração de insolvência, decidir quanto à recuperação ou liquidação da empresa.
Simplifica-se o conceito de insolvência, limitando-se este à impossibilidade de cumprimento das obrigações vencidas.
Eliminam-se actos inúteis, tais como a duplicação de actos processuais que actualmente se verifica com a cumulação da justificação com a reclamação de créditos, assim como outros actos com efeitos gravosos para a credibilidade das empresas. Por exemplo, o fim dos anúncios para convocação de credores quando a insolvência é requerida por um credor, porque sabemos que a imagem da empresa no mercado deve ser preservada até efectiva decisão judicial de reconhecimento da situação de insolvência.
Prevê-se também, no âmbito da celeridade processual, por um lado, o imediato reconhecimento da situação de insolvência, quando o processo é requerido pelo devedor, e, por outro, a restrição dos recursos a apenas uma instância como regra.
Vai neste sentido o reforço do regime de encerramento imediato de processos sem bens, poupando o sistema judicial à prática de actos inúteis, reservando-se os recursos existentes para os processos com efectivas perspectivas de obtenção de resultados para os credores. De igual forma, torna-se facultativa a comissão de credores em processos de menor importância, podendo a mesma ser dispensada quando os credores assim o entenderem.
Assume particular relevância a concessão aos credores de um papel na nomeação do administrador da insolvência que passa, inclusivamente, pela possibilidade destes procederem à substituição daquele, que foi nomeado pelo juiz, por outrem que entendam mais qualificado para o lugar.
Procurou-se a consagração de um sistema remuneratório adequado, garantido em primeira instância pela massa insolvente e não pelo Cofre Geral dos Tribunais.
Para não penalizar os credores privados, foi decidido manter os privilégios creditórios do Estado apenas em relação às dívidas respeitantes aos seis meses anteriores à declaração de insolvência, assim conjugando, de forma justa, os interesses do Estado com os interesses dos restantes credores, pois a inércia do Estado na cobrança dos seus créditos não penalizará os demais credores.
Numa perspectiva de consagrarmos um regime também ele mais justo, é estipulada a concessão de um privilégio creditório ao credor requerente da insolvência correspondente a um quarto do valor do seu crédito, por forma a compensar os custos incorridos por este na instrução do processo.
É criada uma nova categoria de créditos: os créditos subordinados, que permitem relegar para segundo plano os créditos detidos por pessoas especialmente relacionadas com o insolvente, designadamente pessoas com estreitas relações familiares ou, no caso de sociedades comerciais, sociedades do mesmo grupo. Este regime permite afastar boa parte das suspeições que hoje surgem relativamente à efectiva existência de determinados créditos em sede de falência.
No mesmo sentido, facilita-se a resolução de negócios prejudiciais à massa insolvente, procurando evitar negócios que visam dissipar o património da empresa em prejuízo dos credores.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este código faz uma opção clara pela recuperação das empresas: sempre que for um caminho possível, é esse o caminho que deve ser seguido.
Por isso, no elenco das medidas que visam criar condições mais propícias à recuperação de empresas destaco: a atipicidade das medidas de recuperação, podendo os credores escolher livremente o melhor modo de viabilização da empresa, sem que o legislador imponha medidas típicas que constituíam, até hoje, um dos principais entraves à obtenção de uma viabilização efectiva; a generalização do regime de manutenção dos contratos vigentes, que constituem frequentemente activos importantes das empresas; na liquidação dos activos, a preferência concedida à venda da empresa como um todo, assim permitindo a salvaguarda das unidades produtivas e respectivos postos de trabalho; e a obrigatoriedade, para o próprio devedor que pretende a recuperação, de apresentação de plano de recuperação, sob pena de perda da administração.
Há nesta proposta de lei também uma opção clara pelos trabalhadores. Pela particular importância e pelo impacto social e económico que assume, opera-se a consagração de um regime de rateios parciais, facilitando e assim obviando situações de arrastamento em que os credores, e em especial os trabalhadores, aguardam anos pelo pagamento dos seus créditos, apesar de estarem depositadas à ordem do processo quantias suficientes para efectuar o respectivo pagamento.
No mesmo sentido de defender os direitos dos trabalhadores, deve salientar-se o importante reforço que lhes é atribuído nas decisões sobre a empresa insolvente, através da consagração da integração na comissão de credores de, pelo menos, um representante dos trabalhadores.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

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O Orador: - Por último, ainda no domínio da legislação laboral, cumpre registar a inovação - advinda do novo Código do Trabalho - que constitui a consagração definitiva de um privilégio imobiliário especial sobre os bens imóveis do empregador nos quais o trabalhador preste a sua actividade, pondo-se termo a uma incerteza doutrinal e jurisprudencial por uma opção clara em favor dos direitos dos trabalhadores.
Relativamente quer aos administradores quer aos devedores e no sentido de uma maior responsabilização, é instituído um incidente obrigatório de apreciação da conduta dos mesmos.
Pela primeira vez no direito português, é consagrado um regime que pretende resolver situações de sobreendividamento de pessoas singulares, através da denominada "exoneração do passivo restante", que permite às pessoas singulares que não logrem, no decurso do processo de insolvência, pagar todas as suas dívidas não ficarem oneradas com as mesmas ad eternum.
Assim, qualquer pessoa singular nestas circunstâncias poderá requerer a exoneração do passivo, após um período de cinco anos em que procederá a pagamentos aos seus credores, na medida do seu rendimento disponível. Findo tal prazo, ainda que as dívidas não estejam completamente satisfeitas, a pessoa singular ver-se-á exonerada de todo esse passivo, podendo recomeçar - o que é justo - uma vida normal.
Como consequência desta reforma, procede-se também à adaptação dos tipos penais consagrados no respectivo código, com a introdução de uma agravação de pena para os crimes de insolvência dolosa, ou culposa, em que haja frustração de créditos pertencentes a trabalhadores.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por último, proceder-se-á, igualmente, à reformulação do estatuto profissional dos actuais gestores e liquidatários judiciais, unificando-se tais figuras na figura do administrador da insolvência, ao qual serão exigidos requisitos de idoneidade, disponibilidade e controlo disciplinar de que, até hoje, o regime legal aplicável aos gestores e liquidatários carecia.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este novo código da insolvência e da recuperação de empresas é o corolário de um processo que partiu de um diagnóstico rigoroso e assentou em propósitos e objectivos concretos, pretendendo ser - e é nossa convicção que é - um impulso suplementar para uma economia mais saudável, mais de acordo com as legítimas exigências dos cidadãos, das empresas e da sociedade em geral.
As leis são sempre aquilo que delas fazemos. Estou seguro de que uma boa lei ajuda a fazer melhor.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Inscreveram-se, para pedirem esclarecimentos, os Srs. Deputados Vítor Ramalho e Odete Santos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ramalho.

O Sr. Vítor Ramalho (PS) - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça, este projecto de decreto-lei, a eventualmente a entrar em vigor, representará uma gravíssima modificação do nosso tecido económico e empresarial com consequências verdadeiramente imprevisíveis.
Passo a explicar. Ao arrepio do que há na União Europeia, mas também noutros países, e na nossa tradição, a lógica da empresa não é vista como uma realidade envolvente com objectivos sociais mas com uma única dimensão patrimonial, cuja determinação, em termos dos pressupostos filosóficos subjacentes ao diploma, é levar rapidamente a empresa à falência sem qualquer mecanismo prévio de recuperação, determinando-se a seguir que os despojos fiquem dependentes dos abutres. Desculpe-me por afirmar isto tão "pesadamente".
Por outras palavras, se este código estivesse em vigor à data em que um conjunto vastíssimo de empresas apresentava dificuldades sérias, encontrando-se algumas delas falidas - e dou-lhe como exemplos a Lisnave, todas as empresas da zona envolvente da Serra da Estrela, de Gouveia, Seia, etc., da Marinha Grande, particularmente a M. Pereira Roldão, que, como todos sabemos, existiu e deixou de existir como problema, a própria Cabos d'Ávila, e por aí fora -, significaria que todas estas empresas iriam, inexoravelmente, à insolvência com repercussões dramáticas do ponto de vista económico.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É verdade!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Esta é a realidade.
Qual é a lógica? A lógica é forçar à insolvência e só a seguir levar proceder à recuperação. Não há pior mecanismo do que este.
Mas, para se ver ao ponto a que chegámos, é estranho que um governo defensor da família, e muito defensor da família, destrua-a completamente a partir deste momento e impossibilite que qualquer pessoa que queira ser empresário case.

Vozes do PS: - Muito bem!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - O quê?!

O Orador: - Passo a explicar, se me derem atenção.
Convertem os créditos dos familiares do titular da empresa, seja ele cônjuges, irmão, ascendente, descendente ou com quem o empresário viva em créditos subordinados. Isto quer dizer que nas empresas de pequena dimensão, familiar, não se pode ser solidário para com o empresário sob pena de que, ao pretender-se ser solidário, ao se apoiá-lo, a própria hipoteca é extinta na data da liquidação.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo terminou. Peço-lhe que conclua, por favor.

O Orador: - Sr. Secretário de Estado, o meu pedido de esclarecimento é relativo aos créditos subordinados e às consequências que, a seguir, resultam da penalização empresarial desta articulação.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça informou a Mesa de que responderá no fim a todos os pedidos de esclarecimento.

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Assim, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr.ª Presidente, terei de ser muito breve dado o pouco tempo de que disponho.
Queria começar por felicitar V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, por ter vindo a este debate, pois penso que é uma prova de dignidade e de coragem. Espero que V. Ex.ª não se limite a dizer à Sr.ª Ministra da Justiça o que ouvimos dizer numa série famosa da televisão - "Sim, Sr.ª Ministra!" - e que o facto de aqui estar seja uma verdadeira opção.
Pergunto-lhe se considera que a alteração introduzida no artigo 152.º do Código dos Processos Especiais de Recuperação de Empresas e de Falência, que estabelece a manutenção dos privilégios creditórios do Estado relativos aos créditos dos seis meses anteriores à declaração de insolvência (e os anteriores perdem os privilégios), reforça ou não a posição do Estado para garantir os créditos a apresentar a um devedor à falência. Pelo menos, foi o que destacou a Ordem dos Advogados, entidade que teve um papel importante na elaboração deste diploma. Ou seja, que esta alteração se destinava a impulsionar as falências!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - V. Ex.ª referiu ainda que os rateios parciais resolviam os problemas dos trabalhadores, mas o que consta do artigo 160.º da proposta de lei sobre os rateios parciais já existe hoje - refiro-me a esta "história" de "uma distribuição não inferior a 5% (…)" - e não é por isso que os trabalhadores têm recebido. Pelo contrário, nada têm recebido, rigorosamente nada!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - E ficam, anos e anos - como os trabalhadores da Mundet -, à espera que termine o processo de falência.
Pergunto por que é que o Governo optou por mandar para os tribunais os particulares, aplicando-lhes um processo de insolvência, que é destinado às empresas, e recusou outras formas alternativas e fora dos tribunais para resolver estas questões, sendo certo que existem na União Europeia experiências muito interessantes sobre a resolução destes problemas, nomeadamente após a presidência belga da União Europeia, durante a qual foi realizado um colóquio sobre esta questão. Além de que há as comissões sobre endividamento, etc., que retiram aos tribunais estas questões. Portanto, por que razão manda as famílias para os tribunais?

Vozes do PCP e do BE: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça: - Sr.ª Presidente, a Sr.ª Deputada Odete Santos é muito corajosa e determinada,…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Tal como o Sr. Secretário de Estado. É a mesma coisa!

O Orador: - … mas quero dizer-lhe que a Sr.ª Ministra da Justiça, por quem tenho o maior apreço, como sabe - e a quem digo muitas vezes "sim" -, também é uma mulher extremamente determinada e corajosa, e só aqui não está hoje porque não pode.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Agradeço-lhe, portanto, as palavras que me dirigiu e transmiti-las-ei à Sr.ª Ministra da Justiça como um elogio que nos foi feito a ambos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Vítor Ramalho, gostava de dizer-lhe o seguinte: esta proposta de lei implica gravíssimas alterações com profundas implicações no actual regime falimentar. Nesse ponto estamos os dois de acordo.
Contudo, o Sr. Deputado, que conhece bem esta matéria - se bem me recordo, até foi Secretário de Estado do Trabalho -,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Entre outras coisas!

O Orador: - … saberá que o que aqui está em causa não é "criar despojos que ficam dependentes dos abutres". Dar-lhe-ei um exemplo para que possa compreender melhor.
Se este novo código da insolvência estivesse em vigor há dois anos atrás, a Molin seria hoje uma empresa viável e em funcionamento,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - E porquê?

O Orador: - … porque a Molin tinha interessados que estavam na disposição de, rapidamente, a comprar como uma unidade produtiva, com as suas marcas, os seus contratos, o seu pessoal, o seu know-how e tudo o mais que, com o regime actualmente em vigor, desapareceu.
Infelizmente, o regime actualmente em vigor demonstrou-nos… Penso que este assunto não é polémico, Srs. Deputados, mas, sim, consensual…

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Não, não é!

O Orador: - … junto de qualquer português, cidadão ou empresário que esteja inserido na economia real. Todos sabem que o grande problema das leis de falência e de recuperação de empresas é a morosidade, e em matéria de salvação de uma empresa o mais eficaz a fazer é atalhar rapidamente os seus males! Como os Srs. Deputados sabem perfeitamente, os processos de recuperação são - quantas vezes - processos puramente artificiais que apenas se destinam a prolongar a agonia das empresas.
Consequentemente, depois de verificada a insolvência, porque esse é um facto - um facto contabilístico -, o juiz do processo remeterá à assembleia de credores a responsabilidade de decidir qual o futuro da empresa e qual a melhor forma de salvaguardar o maior valor possível para os credores, o que significa salvaguardar o maior valor possível para a sociedade.

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O que a Sr.ª Deputada Odete Santos disse vai muito no mesmo sentido. E devo esclarecer, Sr.ª Deputada, que não foi a Ordem dos Advogados que redigiu nem foi a Ordem dos Advogados que teve uma grande responsabilidade na redacção desta proposta de lei; foi mesmo o Ministério da Justiça, o Gabinete de Planeamento Legislativo do Ministério da Justiça e, para o comprovar, se a Sr.ª Deputada quiser, terei muito gosto em envia-lhe as actas do Conselho Consultivo do Ministério da Justiça, no qual, ao longo de mais de 8 meses, este assunto foi sendo sucessivamente discutido - já agora acrescento - com a anuência geral dos intervenientes que representam as várias sensibilidades envolvidas quanto à proposta apresentada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Por que é que mudaram de posição nos últimos 4 meses?!

O Orador: - Para concluir, Sr.ª Deputada Odete Santos, quero dizer-lhe o seguinte: como calcula, em matéria de Direito Comparado, todos fazemos o nosso "trabalho de casa". As soluções que nele estudámos, adaptadas à realidade nacional, permitiram-nos concluir que estas são as melhores soluções. Eu não vou sustentar que não era possível encontrar outras melhores noutro mundo ou noutro país! Apenas quero dizer que, em Portugal, à luz das estatísticas, da realidade de que dispomos e da experiência colhida, não temos dúvidas de que estas são as melhores soluções.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para apresentar o projecto de lei n.º 273/IX, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Código dos Processos Especiais de Recuperação de Empresa e Falência actualmente em vigor não dá resposta a questões essenciais para os trabalhadores.
Desde logo, não contempla medidas que protejam efectivamente os direitos dos trabalhadores, permitindo a dissipação dos bens que compõem o património da empresa e que possibilitariam o pagamento dos credores - veja-se a situação vivida por numerosos trabalhadores vítimas de processos falência que são obrigados a vigiar a empresa para garantir a existência do património até ao momento da sua venda.
Por outro lado, o arrastamento dos processos durante anos a fio, nalguns casos décadas a fio, prolonga o desespero económico dos trabalhadores que perderam os seus postos de trabalho e ficaram desempregados. E muitos deles estão condenados a não voltarão a trabalhar em virtude da sua idade e da falta de qualificações, aguardando anos pelo pagamento dos seus créditos e compensações.
A legislação actualmente em vigor não dá resposta efectiva ao recurso à fraude, a qual está na origem da maior parte dos processos de falência.
Estas preocupações têm sido reiteradamente colocadas pelos trabalhadores vítimas de falências, inclusivamente foram já objecto de uma petição com mais de 6000 assinaturas que deu entrada nesta Assembleia.
Perante a pertinência e a urgência de respostas, o Bloco de Esquerda entendeu apresentar um projecto de lei que viesse ao encontro destas preocupações. Assim, propomos a consagração da obrigatoriedade de um arrolamento dos bens a realizar nos 10 dias subsequentes ao pedido de recuperação de falência. A adopção desta medida visa evitar situações como as da Vestus ou da Bawo, entre tantas outras, em que os trabalhadores se organizam para vigiar os bens que garantem a possibilidade de os seus créditos serem pagos, nem que seja numa ínfima parte.
Ao proceder-se a uma inventariação dos bens e ao responsabilizar alguém pela sua não dissipação evitaremos a penosidade acrescida das horas passadas em frente às empresas, dia após dia, semana após semana, mês após mês.
O Bloco propõe a cessação do sigilo bancário relativamente a todos os sócios e a todos os que, nos últimos 5 anos, tenham exercido funções de gestão, administração ou direcção na empresa. De acordo com as principais vítimas destes processos, as falências fraudulentas são preparadas, na sua maior parte, com alguns anos de antecedência, sendo comum o desvio de verbas e de bens para o património próprio dos sócios, ou dos administradores, ou gestores, e dos seus familiares.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Bem lembrado!

O Orador: - Com a quebra do sigilo bancário - tenhamos a coragem de o dizer - daremos um significativo passo em frente no combate e na dissuasão do recurso à fraude.
O projecto consagra também a oficiosidade da decisão do juiz relativamente à responsabilização solidária de todos os que intervieram na gestão, administração ou direcção da empresa falida e que contribuíram para a situação de falência ou insolvência.
Relativamente à questão da celeridade dos processos, temos consciência de que existe um grande abismo entre a realidade dos tribunais e a legislação em vigor, ou a vigorar. Claro que podemos criar meios para facilitar essa celeridade, mas não podemos impô-la ao sistema judicial que temos sobrecarregado de processos e com notória falta de recursos humanos. Assim, entendemos que a melhor forma de responder a este anseio dos trabalhadores, sob pena de tudo não passar de belas e bonitas intenções, é a alteração do Fundo de Garantia Salarial para que o mesmo passe a antecipar aos trabalhadores a totalidade dos créditos por estes reclamados no processo de falência, quando este se arraste para além de um ano, prazo razoável para que os trabalhadores possam retomar a sua vida.
Por fim, pretendemos uma clarificação do teor do artigo 4.º da Lei n.º 96/2001, que estende os privilégios creditórios dos trabalhadores a todos os que não estavam abrangidos pela Lei n.º 17/86, a lei dos salários em atraso. Este artigo tem suscitado alguma polémica, porque tem conduzido a interpretações divergentes. Há decisões judiciais que consideram a indemnização dos trabalhadores como crédito privilegiado, graduando-a entre os demais créditos privilegiados; contudo, outras há que consideram que a indemnização não está abrangida pela referida norma legal e, consequentemente, graduam-na entre os créditos comuns. Importa, pois, clarificar. É o que nos propomos fazer.

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O Governo, por seu lado, propõe um novo código, código esse que pretende contribuir para a celeridade e simplificação do regime, o que, aparentemente, viria ao encontro das exigências dos trabalhadores. No entanto, trata-se de um rebuçado com o pior dos recheios: a falência dos direitos dos trabalhadores.
Vejamos.
A proposta do Governo prevê o aumento do número de créditos concorrentes com os dos trabalhadores. Com isto, o Governo retrocede em relação à legislação actual e privilegia os créditos do Estado relativos aos últimos 6 meses.
A proposta do Governo prevê um prémio para a celeridade e prontidão no pedido de falência, privilegiando um quarto dos créditos do requerente. Também estes concorrerão com os dos trabalhadores, que vêem assim, uma vez mais, as suas hipóteses de ressarcimento bastante diminuídas.
No entanto, não precisamos de "bola de cristal" para saber que esta situação raramente terá aplicação, já que a proposta contempla, em opção, um esquema que permite reduzir a "cinzas" os créditos dos trabalhadores através do plano de insolvência. Este esquema permite que dois terços dos credores, desde que detenham a maioria do crédito reclamado, elaborem um plano que derroga as regras do código, permitindo que os credores decidam quanto à liquidação dos bens e repartição do produto obtido, sem ter que atender a quaisquer regras a não ser as do próprio plano. Este plano conduzirá, sem dúvida, a alianças entre os vários credores contra os trabalhadores, considerados como um obstáculo.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

O Orador: - Outro pormenor curioso é o facto de a possibilidade de recuperação da empresa ser decidida no âmbito deste mesmo plano. Não acreditamos que o Governo seja tão ingénuo que acredite que os principais credores, como as instituições bancárias, a segurança social ou as finanças, preferem a recuperação ao pagamento dos seus créditos. Obviamente que quem sai lesado, uma vez mais, são os próprios trabalhadores.
Esta proposta do Governo conduzirá a um aumento incomensurável do número de processos de insolvência, o que, aliás, é um objectivo declarado expressamente pelo próprio Governo na exposição de motivos. Desta forma, dá-se o golpe final aos direitos dos trabalhadores, que entram efectivamente em falência. Diz o Ministro que estes processos serão um acto normal e profilático - um acto de tragédia, dizemos nós.
Já agora, permitam-me alertar-vos para a quantidade de exemplos - tal como a Associação de Solidariedade com as Vítimas das Falências tem no seu site da internet - de inúmeras empresas que encerram sem pagar salários nem indemnizações; empresas, inclusivamente, que tendo aplicado, no âmbito de institutos públicos…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Terminarei de imediato, Sr.ª Presidente.
… uma série de fundos na tentativa de resolver os problemas das empresas, acabam por encerrá-las sem qualquer direito creditório para os trabalhadores; ou empresas ainda em que os credores, neste caso os bancos, faltam à própria assembleia de credores, obrigando o tribunal a decretar falências. Assim vai a economia da fraude em Portugal!

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Na qualidade de relatora do projecto de lei n.º 273/IX, do BE, e para apresentar o relatório, tem a palavra a Sr.ª Deputada Jamila Madeira.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 273/IX (BE) propõe-se adoptar um conjunto de medidas dissuasoras do recurso às falências fraudulentas e desenvolver medidas de protecção dos trabalhadores que enfrentem esta situação.
O grupo parlamentar proponente considera que "há que produzir legislação que acautele os interesses das inúmeras famílias que ficam sem sustento em consequência de processos de falência morosos, quer combatendo a possibilidade de 'desaparecimento' das garantias dos seus créditos quer prevendo a antecipação do pagamento destes". Nesse sentido, entendem os proponentes que o facto de, com especial incidência nos últimos meses, as notícias de falências de empresas terem surgido em número particularmente elevado as torna em mais do que uma questão meramente económica: confronta-nos inevitavelmente com a dimensão desse problema no plano social.
Assim, os proponentes argumentam, entre outras informações, que, em 2002, os processos de falências envolveram 2417 sociedades, ou seja, houve um aumento do número de empresas que fecharam as suas portas em 146% face a 2001, e ficaram em dívida para com os trabalhadores, entre indemnizações e salários, mais de 350 milhões de euros. Através destes números os proponentes consideram que o tecido nacional produtivo e o "saber fazer" estão a ser destruídos. Dizem ainda que, em 2002, segundo dados do Instituto Informador Comercial, 794 empresas abriram falência, o que constitui um aumento de mais de 20% relativamente ao ano de 2001. Para além do elevado número de falências, deram entrada 172 pedidos de recuperação financeira e 964 autos de falência.
Nalguns concelhos, as falências provocam situações alarmantes e de grande repercussão social, quando uma elevada percentagem da mão-de-obra local estava afecta a determinada fábrica, como aconteceu no Fundão com as Confecções Eres, onde tudo corria bem, boas encomendas e, de repente, o patronato começou a deslocar matérias-primas e maquinaria para a Bulgária. Resultado: 483 trabalhadoras no desemprego - diz o projecto de lei.
Também nesse mesmo projecto de lei se referem: a Melka, em Palmela, 170 trabalhadores; a Schuh-Union, na Maia, empresa de calçado, 460 despedidos; são exemplos que se seguem a uma Vestus, à Confélis, à Siemens, Longa Vida/Nestlé, Texas Instruments, entre outras, quase todas empresas dependentes de multinacionais - é também referido nesse projecto de lei.
Os proponentes consideram ainda que, recentemente, situação idêntica ter-se-á passado com a empresa de calçado C&J Clarks, 588 trabalhadores, em Castelo de Paiva (considerada, aliás, a mais produtiva do grupo), em processo de deslocalização para a Roménia e para a China, e com a ECCO'let; a Gerry Weber e a Bawo, cujos trabalhadores, à semelhança de trabalhadores de outras empresas, estiveram junto aos muros a garantir que bens e maquinaria

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não saíssem da empresa, procurando, assim, assegurar o direito ao pagamento dos seus salários e indemnizações.
Assim, conclui-se neste relatório que o projecto de lei n.° 273/IX se propõe adoptar um conjunto de medidas dissuasoras do recurso às falências fraudulentas e desenvolver medidas de protecção dos trabalhadores que enfrentem essa situação. Propõe-se igualmente alterar o Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência no sentido de estipular a obrigatoriedade de um arrolamento dos bens da empresa; de consagrar a quebra do sigilo bancário relativamente a todos os sócios e a todos os que, de alguma forma, estiveram envolvidos na gestão, administração ou direcção das empresas falidas, como forma de dissuasão do recurso à fraude; de permitir a decisão oficiosa do juiz quanto à responsabilização solidária de todos os que, tendo intervindo na gestão, administração ou direcção da empresa falida, tiverem praticado actos que contribuíram para a situação de insolvência, o que, até ao momento, só é possível a requerimento de algum dos credores ou do Ministério Público.
O projecto de lei n.° 273/IX, do BE, pretende ainda estender os privilégios creditórios mobiliários e imobiliários dos trabalhadores às indemnizações devidas por cessação do contrato de trabalho para tanto propondo a alteração do artigo 12.° da Lei n.° 17/86, de 14 de Junho, e do artigo 4.° da Lei n.° 96/2001, de 20 de Agosto. Deverá, no entanto (e faço referência no relatório), ser concedida especial atenção desta Câmara à norma ínsita no artigo 7.° do projecto de lei por forma a elucidar potenciais violações de princípios fundamentais enformadores do nosso ordenamento jurídico-constitucional.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isilda Pegado.

A Sr.ª Isilda Pegado (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Abordar a questão das falências, a que agora, numa linguagem não estigmatizante, se vem chamar lato sensu insolvências, é não só tratar de uma questão económica como também, e sobretudo tratar de uma questão social. Daí que todo o cuidado é pouco para, de uma forma equilibrada e justa, harmonizar os diferentes interesses tuteláveis. Cabe ao legislador encontrar o caminho que reduza este mal a um mal menor. Na verdade, a insolvência é já em si um mal, uma fase patológica da vida da empresa, que deve ser preventivamente cuidada mas, uma vez instalada, não pode arrastar-se ficticiamente - tem de ser saneada. É saudável e regenerador que assim se proceda.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Ora, esta patologia pode, muito naturalmente, resultar do risco inerente ao comércio, à actividade empresarial; mas, também pode resultar de actos ilícitos, fraudulentos e ilegítimos do comerciante, do administrador ou do gerente. Cabe à lei distinguir o que é diferente. Como nasci e cresci num tempo e lugar onde o comerciante era o homem digno e respeitado na sociedade, o homem capaz de colher a confiança social, entendo que tudo deve ser feito para que, desta mesma confiança e honorabilidade, continue a gozar quem administra, quem gere enfim, nesse sentido clássico, quem é comerciante.
A lei e o direito têm o dever axiológico de se adaptar aos tempos e às suas necessidades. Nesse sentido, desde 1993, foi criado este novo conceito de que a falência/insolvência deveria, atentas as especificidades, ter regime jurídico autonomizado, onde, a par da falência, se vem exigir a recuperação judicial da empresa. Corridos 10 anos e apesar da reforma levada a cabo em 1997, o processo especial de recuperação de empresas e falências não se mostrou virtuoso. Pelo contrário! Não precisamos sequer de correr os tribunais, onde aqueles processos são vistos com enfado, desprezo e arrastados tanto quanto possível. Basta ver o mal-estar social que se sente com o arrastar de processos de falência, com a incapacidade para a recuperação de empresas, com os trabalhadores sem salários e com expectativas defraudadas, com credores que se trituram numa engenharia judicial que afinal lhes dá uma mão cheia de nada! Empresários, trabalhadores, agentes da justiça, o descontentamento é generalizado! Só uma política cinzenta, de cegueira social e pacto com a ilusão permitiu que durante a governação socialista tal quadro tenha sido criado e até cultivado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Também aqui o efeito do "balão" desses seis anos é notório.
Na esteira desta análise, vem o Bloco de Esquerda apresentar o projecto de lei n.º 273/IX onde, em suma, se apontam quatro medidas tendentes a colmatar alguns dos vícios do regime vigente, mas que, no nosso modesto entender, não podem colher provimento por serem medidas desgarradas e inconsequentes. Senão, vejamos: obrigação de arrolamento inicial dos bens na falência - já está prevista na actual lei; porquê repeti-lo? A quebra do sigilo bancário automaticamente, mesmo para os que não tiveram poderes de gerência na empresa, sem ser decretado pelo juiz, Srs. Deputados? De meros accionistas, pequenos accionistas? Porquê, Srs. Deputados? Ampliar o fundo garantia salarial de seis para 12 meses, seria manifestamente incomportável e com consequências perversas para o sistema. Por fim, pretende o BE alterar a lei dos salários em atraso, alargando o direito dos trabalhadores com privilégio creditório à indemnização por cessação ou violação do contrato de trabalho; mas tal previsão e estatuição já se encontram no Código de Trabalho que esta Câmara aprovou há cerca de um mês.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - É falso!

A Oradora: - Esta Assembleia da República não se pode permitir legislar em duplicado.
Em boa hora, veio o Governo apresentar a proposta de lei n.º 50/IX, que autoriza o Governo a legislar sobre a insolvência de pessoas singulares e colectivas. Recolhendo, é certo, alguns dos aspectos que parecem positivos da anterior legislação, vem no entanto apresentar uma nova tramitação processual para a insolvência. Repito, trata-se de uma tramitação judicial da insolvência, que não obvia a outras soluções de natureza social paralelas a este regime. A proposta de lei apresenta soluções já experimentadas e testadas no Direito Comparado. Sem a carga estatista absoluta do regime actual vigente apresenta esta autorização legislativa propostas que conferem responsabilidade e liberdade a quem directamente tem interesses na resolução do problema que é a insolvência. Impõe-se que a lei cumpra

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a sua função reguladora, informadora e dignificante; não interventora e capaz de minorar o papel dos que estão aptos a cumprir com os deveres que lhes estão cometidos.
Por isso, vamos acabar com os dois processos; teremos apenas um só processo, que poderá admitir a recuperação. Vamos acabar com a intervenção onerosa e excessiva do juiz, a quem se exigia decisões de políticas económicas! Teremos um juiz árbitro que afere da legalidade. Acaba-se com os prazos dilatados, a suspensão obrigatória do processo por seis meses, e teremos um processo célebre a que é dada natureza urgente em todas as suas fases. Acabamos com a imposição do gestor ou liquidatário judicial, e teremos um gestor judicial escolhido pelas partes. Acaba-se com esta publicidade que era dada à falência ainda antes de haver um juízo e teremos uma publicidade só apenas após fundamentação judicial. Acaba-se com a distribuição dos resultados da liquidação que chegava tarde e a más horas - diria eu - e teremos rateios parciais logo após o depósito de, pelo menos, 5% dos créditos privilegiados. Acaba-se com a recuperação da empresa espartilhada e exaustivamente legislada em 100 artigos, e teremos toda a liberdade para encontrar a melhor forma de recuperar empresas, a que agora apenas se dedicam dez artigos.
Sr.as e Srs. Deputados, é outra a nossa face da política! No II Capítulo, importa registar a transparência e responsabilização que se vem exigir: cria-se, por isso, a categoria dos créditos subordinados; referem-se estes a créditos em que se levanta uma suspeição social atenta à relação familiar ou de grupo entre o devedor e o credor - serão graduados, por isso mesmo, depois dos créditos comuns. Prevê-se o registo da insolvência de pessoas singulares na Conservatória do Registo Civil. Criam-se incentivos ao insolvente para se apresentar à insolvência. Fixa-se a obrigação imposta ao juiz de apreciação da natureza da insolvência, se esta é fortuita ou dolosa, retirando este ónus ao credor.
Importa que, em todos os processos de insolvência, se apure se esta resultou do risco, e por isso fortuita, ou se, ao invés, terá sido culposa. Importa também que aquele que tem uma unidade de produção saiba que os seus actos vão ser apreciados. É uma nova mentalidade social! Registe-se por fim, que pela primeira vez se vem consignar a obrigatoriedade de, na Comissão de credores, estar presente um representante dos trabalhadores.
Além disso, na esteira das preocupações sociais que se têm feito sentir, atenta à política de convite ao consumo desenfreado dos últimos anos, à consequente destruição de pessoas e famílias com encargos incomportáveis e aos níveis de sobre-endividamento criados pelos particulares, cria-se, digo, pela primeira vez, um instituto jurídico - que chega tarde, mas "mais vale tarde de que nunca…!" - a que se chama a exoneração do passivo das pessoas singulares. Recordar aqueles que, por razões diversas, numa determinada altura da vida, se vêm incapacitados para solver as dívidas que acumularam, e entram num mundo de expedientes, arrastando consigo o cônjuge ou companheiro, os filhos, às vezes menores, pai ou mãe idoso, é rever o filme que muitos de nós já vimos, com cenas de violência e marginalidade que nos envergonham. Importa reabilitar estas pessoas, estabelecendo um período para cumprimento do diligentemente possível, findo o que o devedor estará reabilitado para a vida económica.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A reabilitação encerra em si, concomitantemente, uma função correctora e formadora de acordo com as suas circunstâncias pessoais, familiares e sociais do insolvente. Instituto jurídico a que tem feito apelo o Observatório do Endividamento dos Consumidores. E ele aqui está! O qual não vem, por si só, resolver o problema do sobre-endividamento, mas é já um grande passo para a criação de uma nova mentalidade social.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, se algum conceito pode ser utilizado para definir o presente diploma ele é certamente o da subsidiariedade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Mais sociedade menos Estado. A sociedade faz, o Estado fiscaliza. O empresário, o comerciante, o gerente, o administrador merecem dignidade, respeito e honorabilidade seja ele o pequeno empresário ou o grande administrador com centenas de trabalhadores que dependem daquela unidade para com dignidade poder viver. Queremos fazer leis que valorizem as pessoas e os agentes, não queremos uma sociedade podre por dentro e fictícia por fora.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Este diploma é um voto de regeneração e confiança que, com toda a propriedade, conferimos aos nossos empresários, aos nossos comerciantes.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Partido Ecologista Os Verdes cedeu quatro minutos ao PCP e dois minutos ao BE.
Para um pedido de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, ficamos então a perceber qual é o objectivo do diploma do Governo: é a regeneração, como a Sr.ª Deputada disse, dos empresários e, curiosamente - numa distinção que faz entre empresários e comerciantes, como se estes não fossem também empresários… -, a regeneração dos empresários. Eis o objectivo do diploma do Governo!
Permita-me, Sr.ª Deputada, dois esclarecimentos breves, antes de lhe colocar uma questão. Devo lembrar-lhe, Sr.ª Deputada, que, em relação às questões do arrolamento dos bens da empresa, o Código de Processo Civil prevê que esse arrolamento seja feito. Mas o que nós propomos é diferente: é que o arrolamento seja automaticamente feito, o que é uma diferença essencial. Permita-me também dizer-lhe que, no que diz respeito ao levantamento do sigilo bancário (e sempre que se fala do sigilo bancário lá cai o Carmo e a Trindade!), nós estamos, obviamente, a falar de sigilo bancário levantado por um juiz - quanto a isso, não há quaisquer dúvidas. O que queremos acentuar é que os processos de falência são meticulosamente preparados, em boa parte dos casos, bastante tempo antes das falências se decretarem. Já agora, permita-me falar do aditamento que os senhores propõem ao diploma do Governo: propõem esse aditamento num artigo em que falam dos direitos do trabalhadores; e os direitos dos trabalhadores são os

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direitos de informação e de participação. Sr.ª Deputada, esta norma é inconstitucional…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Terminarei já, Sr.ª Presidente.
Viola o artigo 54.º da Constituição e a Lei n.º 46/79, das Comissões de Trabalhadores, que prevê o direito de intervenção para além da informação e participação. O que os senhores estão, de facto, é a retirar direitos aos trabalhadores.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isilda Pegado.

A Sr.ª Isilda Pegado (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Teixeira Lopes, agradeço as suas questões. Quero dizer que, tal já disse na minha intervenção, os senhores fazem a mesma análise da situação que nós fazemos, a mesma análise caótica de que isto precisa de mudar. Eu não pretendo regenerar os empresários - eu pretendo dignificar as unidades de produção; é preciso dignificar todo o conjunto da empresa, incluindo o empresário que, realmente, está ao leme, muitas vezes, e com isso dignificar o trabalho.
Relativamente ao arrolamento dos bens que o Sr. Deputado vem propor no seu projecto, devo dizer-lhe que ele já está previsto, não é obrigatório e, no nosso diploma, vai manter-se. No nosso diploma vai manter-se esse expediente só que não é obrigatório porque isso seria criar mais um empecilho ao próprio diploma. Sr. Deputado, há empresas que nem sequer têm bens! O que é que vamos arrolar? Vamos manter o processo à espera de que surjam bens e só nessa altura é que podemos dar continuidade ao processo?
Falências fraudulentas, Sr. Deputado, é isso que nós queremos evitar; é esta transparência que este diploma vem exigir, em que nós vamos apostar, e vamos acabar com essas falências fraudulentas.
Quanto aos direitos dos trabalhadores, Sr. Deputado, devo dizer-lhe que nunca os trabalhadores viram consignados, de forma tão ampla como agora, os seus direitos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Deputado, na assembleia de credores, os trabalhadores têm exactamente o mesmo direito de voto, tenham crédito de 10 contos (permita-me que fale assim) ou um crédito de 100 contos - é exactamente o mesmo direito que um credor que tenha um crédito de 500 mil contos! Sr. Deputado, se isto não são direitos para os trabalhadores, pergunto-lhe o que são direitos. Sr. Deputado, aquilo que se vem fazer aqui é acrescentar um novo direito: é o direito a estar presente na comissão de credores, que é uma entidade completamente distinta. Sr. Deputado, é preciso olharmos para a realidade do processo de falência, perceber o que é o processo de falência e, depois, conseguirmos entender em que pontos é que os trabalhadores são beneficiados efectivamente neste processo.
No entanto, quero ainda aproveitar para, de uma forma clara e perante a Câmara, referir um ponto a que não aludi na minha intervenção, que é a possibilidade que vamos passar a ter de ampliar a própria jurisdição dos tribunais de comércio. E neste caso gostaria até de ouvir o Governo para especificar o que é que podemos fazer em relação a isto, uma vez que é uma matéria em que importa haver celeridade, celeridade esta que irá permitir que os trabalhadores beneficiem.
Portanto, deixo este apelo e agradeço.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo Castro.

Vozes do PS: - Vá para a tribuna!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não vou lá para cima porque quero olhar olhos nos olhos para o Sr. Ministro e para o Sr. Secretário de Estado, não estando presente a Sr.ª Ministra da Justiça…
Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto, Srs. Deputados: A autorização legislativa que o Governo aqui nos submete tem como finalidade a liquidação do património de devedores insolventes e a repartição do produto obtido pelos credores. E estas palavras cruas, que certamente julgarão fazerem parte do léxico crítico de um Deputado da oposição, são nem mais nem menos a substância do n.º 2 do artigo 1.º da proposta de lei n.º 50/IX. Exactamente! São as próprias palavras do Governo e consubstanciam o escopo central de toda a filosofia do diploma: liquidação do património dos particulares e liquidação do património das empresas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O mesmo é dizer, dissolvendo as empresas, o tecido empresarial, arruinando a economia e fazendo crescer ainda mais a mais alta taxa de crescimento do desemprego da Europa, nos dias de hoje.
E quanto às pessoas singulares? E quanto às famílias? Ouvi hoje uma Sr.ª Deputada falar muito sobre a família… A verdade é que as pessoas singulares não se podem dissolver só porque possam deixar de ser "economicamente viáveis". Mas, é isso que o Governo, não obstante, pretende e reitera afincadamente no desumano arrazoado do seu diploma.
E tudo, Sr. Deputados, porque o Governo subverteu completamente a filosofia de recuperação de empresas e de concordata de particulares (que era algo que já existia) que vigora no nosso país desde a publicação do Decreto-Lei n.º 132/93, com a redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 315/98, sendo que - pasme-se! - o diploma de 1993, como se adivinha, tem a assinatura de Cavaco Silva e de Laborinho Lúcio.
O Governo, agora ultraliberal, preferiu trilhar o caminho da uniformização do processo de insolvência encaixando na mesma bitola, e nas suas grandes linhas, empresas e particulares, tratando por igual o que é desigual, assim desconsiderando as empresas e fragilizando os particulares.
O Governo, insistindo na ideia de que o importante é, de forma acelerada, liquidar património para satisfazer a voracidade dos credores, erige um complexo normativo substancialmente idêntico para as empresas e para os particulares. E desse modo, em nome da sacrossanta salvação dos

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créditos, de forma imprudente, negligente, quase culposa, prepara-se para lançar no precipício da miséria milhares e milhares de sobre-endividados, em razão de desemprego por emprego precário por falecimento de familiares, por acidentes, em suma, causas e circunstâncias alheias e infelizes da vida actual de muitos portugueses.
São estes particulares, estas famílias, que o Governo, através da presente autorização legislativa, parece querer ver de "corda ao pescoço", defronte dos tribunais, perante os olhos, seguramente esbugalhados, de um juiz de beca negra, que sabe-se lá se alguma vez terá tempo para apreciar criteriosamente um plano de insolvência entre um primeiro interrogatório de arguido e o julgamento de um despejo.
E mais: tal cortejo de desafortunados ou se apresentem como insolventes em tribunal, apenas se atrasem três ou quatro meses na sua prestação de crédito de habitação, ou mesmo de rendas de qualquer tipo de locação, ou de prestações de consumo de equipamentos indispensáveis à vida, ou serão objecto do respectivo requerimento de insolvência por parte dos credores, sem prejuízo das eventuais consequências de natureza penal que a qualificação da insolvência pode acarretar.
Sr. ª Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto, Srs. Deputados: A presente proposta de lei, ao uniformizar o processo de insolvência, metendo no mesmo "saco" empresas e particulares, não apenas incentiva a volúpia dos credores dos particulares como instiga a avidez dos credores das empresas.
E mais: tal proposta de lei desconsidera as empresas, ao fingir ignorar e ao escamotear que a realidade empresarial possui e deve nortear-se por efeitos jurídicos próprios.
É também na linha de tal desconsideração das empresas que a proposta, pura e simplesmente, extingue a recuperação da empresa como instituto jurídico, que, aliás, é verdadeiramente o frontispício do Código vigente, como se pode verificar desde logo no seu título, no seu artigo 1.º e nos capítulos a tal matéria dedicados.
É certo que a proposta também refere a existência de um plano de insolvência, mas como forma tímida e ineficiente da recuperação de empresas, já que, reconheça-se, abdica do regime de natureza substantiva vocacionado para a realidade empresarial, até agora vigente, o que vale por dizer que "deita para o caixote do lixo" o procedimento especial de insolvência destinado a reabilitar e a recuperar as empresas viáveis.
E assim, ao descentrar, no caso das empresas, o processo de recuperação, desgraduando-o e minimizando-o, óbvio se torna que a voracidade dos credores tenderá a confinar-se à liquidação célere dos patrimónios, muitas vezes com graves prejuízos para a economia e com efeitos sociais imperscrutáveis.
Ou ainda, pressurosamente, na linha ávida da concentração empresarial, poderão tomar de assalto, com a força dos seus créditos, a própria empresa devedora, integrando-a no seu património. É tal proposta a que aqui apreciamos que o permite - está lá bem explícito!
Até agora a empresa era tomada numa óptica institucional, como algo que, mesmo podendo atravessar situações económicas de dificuldade, poderia e deveria ser recuperada e salva desde que fosse patenteada a sua viabilidade e pudesse no futuro cumprir as obrigações assumidas, voltar a gerar riqueza, manter o emprego e contribuir para a economia nacional.
A ruptura agora anunciada consubstancia-se no regresso à visão liquidadora de patrimónios do século XIX e até do Código de Processo Civil de 1939, o que vale por dizer que estamos, mais uma vez, perante uma significativa realidade de injusta desconsideração da empresa e dos empresários.
Sr. ª Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto, Srs. Deputados: Do que fica dito, pode salientar-se que a presente iniciativa visa alterar radicalmente o paradigma vigente relativo aos processos especiais de natureza falimentar das empresas e dos particulares, que, aliás, não estava sequer suficientemente testado e amadurecido, atenta a sua escassa vigência - estamos a falar de 1993, de 10 anos!...
Insiste-se: parece inquestionável que, na actual conjuntura económica, as opções legislativas propostas se consubstanciarão num muito maior apelo à insolvência imediata das empresas, mesmo no caso em que estas se encontrem em difícil situação económica e possam, não obstante, ser ainda viáveis.
E indiscutível se torna que se poderá a assistir a um forte recrudescimento dos processos de dissolução do património dos particulares e das famílias. Sendo que, como já disse, se as empresas podem ser dissolvidas, já o mesmo não se poderá dizer, nem deverá, das pessoas e das famílias, que, mesmo falidas ou sobre-endividadas, vão ter de continuar a viver.
Adite-se ainda que, numa fase em que se vão admitindo, já com algum êxito, formas de aliviar os tribunais da enorme carga de litígios que os vem emperrando, o Governo opta por soluções que poderão mais do que sobrelotar os dois actuais tribunais de comércio, aos quais, além dos mais, também competem questões de concorrência e propriedade industrial, ao remeter para a sua competência especializada os processos de insolvência que ocorram em qualquer ponto do País, repito, em qualquer ponto do País.
E do mesmo modo se sublinha que a aplicação dos planos de insolvência aos particulares tenderá a inundar os tribunais de competência genérica, sobretudo num tempo em que o desemprego se aproxima perigosamente da média europeia, o que, inevitavelmente, por ausência de soluções de mediação e conciliação, também despertará a voracidade dos credores, com todo o cortejo de litígios que tal acarretará.
É por tudo isto que a presente proposta de lei é um retrocesso muito significativo no direito falimentar português.
É uma proposta imprudente e inadequada e vai agudizar a tragédia humana de milhares de famílias.
É uma proposta irrealista e desajustada à realidade económica portuguesa e vai afundar no caldeirão da desgraça, de forma célere e abrupta, milhares de empresas portuguesas.
É isto, Sr. Secretário de Estado, que quero que transmita à Sr.ª Ministra.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A matéria da revisão do regime jurídico relativo ao processo de insolvência de pessoas singulares

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e colectivas foi assumida pelo XV Governo Constitucional, quer no seu Programa quer no Programa para a Produtividade e Crescimento da Economia, como uma das reformas essenciais a estabelecer para um melhor funcionamento de todo o tecido económico.
Fundamentalmente, era posta em causa a excessiva morosidade dos processos judiciais, que, aliás, trazia como consequências situações verdadeiramente dramáticas para os trabalhadores e empresários e para a própria viabilidade das empresas.
Infelizmente, são conhecidos vários casos em que empresas se sujeitam a situações processuais que duram vários anos, o que faz com que aqueles que poderiam tentar viabilizar uma empresa acabem por desinteressar-se da mesma, levando ao seu desaparecimento. É precisamente com isto que este projecto pretende acabar.
A nossa economia precisa de muitas empresas e de muito investimento. A nossa economia precisa de boas empresas e de bom investimento. Esteve, está e estará o CDS-PP na linha da frente da defesa destes princípios. Não pertencemos àqueles que olham para as empresas e para os empresários com desconfiança.
Também não pretendemos dramatizar esta discussão. Não é propriamente da morte das empresas que hoje aqui se está a tratar. Bem pelo contrário, aquilo que se pretende é a concessão de um instrumento jurídico que possa dar mais saúde às empresas e melhores condições a todos aqueles que nestas trabalham. Tudo isso não é compatível com processos que se demoram e que fazem com que os activos das empresas percam constantemente valor.
Para que isso deixe de acontecer é essencial que se aprove a autorização legislativa, que vai permitir ao Governo dotar a nossa economia de um sistema mais consentâneo com as suas necessidades.
Ao fazer a análise do novo sistema, denota-se uma clara aproximação a modelos aplicados noutros Estados da União Europeia - relembro, por exemplo, que o modelo que está na base é precisamente o alemão. Já sabíamos que o Partido Socialista desconfiava e discordava do Sr. Blair, agora ficamos a saber que também desconfiam e discordam do Sr. Schröeder. Qualquer dia já não têm mais ninguém de quem desconfiar…
Continuando: nota-se ainda nesta proposta uma clara vertente do reforço da eficácia do processo e uma outra vertente que consagra um princípio de reserva do juiz para os actos materialmente jurisdicionais, o que, aliás, sempre obteve um amplo acordo nesta Câmara.
Para além destes princípios, é clara a tendência de apoio a uma melhor preparação e adequação técnica de todos os interventores nos processos.
É evidente o objectivo de assegurar que os processos se iniciem atempadamente, sendo assim tutelados os interesses dos credores e permitindo que exista uma viabilização económica.
É elementar o objectivo de impedir que o processo sirva para manter as situações de concorrência desleal ou de má gestão empresarial.
É objectivo o intuito de adequar a legislação às determinações comunitárias e à nova legislação do trabalho, também ela uma reforma essencial que este Governo encetou.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Convém atender a algumas soluções que em concreto se consagram e que têm uma marca claramente inovadora.
Destaco, então: o aparecimento de uma só forma de processo, em que o juiz se limita essencialmente à declaração de insolvência; uma maior especialização dos tribunais de comércio, que se poderão centrar nos processos socialmente mais relevantes; a generalização da urgência processual, que limitará fases processuais que provocam grandes atrasos; o alargamento dos fundamentos que possibilitam o início de um processo por impulso de um credor; a eliminação dos anúncios para citação de credores, evitando-se, desta forma, a descredibilização pública da empresa em causa que tantas vezes tem produzido efeitos irreversíveis; a declaração por parte do juiz da situação de insolvência, que se limita a esta matéria, consagrando-se uma decisão judicial mais simples e a eliminação de controvérsias sobre o despacho de prosseguimento como recuperação ou falência; a aceitação de privilégios creditórios para o Estado limitados quanto aos seus requisitos temporais, permitindo, assim, uma situação de incentivo ao Estado para alertar quanto a situações de incumprimento.
Destaco ainda como soluções inovadoras: a preferência pela venda da empresa com um todo, o que vai permitir a continuação da sua laboração e de todos os postos de trabalho em causa; a graduação dos créditos detidos por pessoas especialmente relacionadas com o devedor; a determinação de incentivos para que o administrador judicial tenha um bom desempenho; a maior celeridade no pagamento aos credores; a flexibilização das medidas de recuperação; a apreciação obrigatória das condutas do insolvente e respectivos administradores; a responsabilização daqueles que actuaram com culpa grave; a admissibilidade de um só grau de recurso e, por fim, a importante previsão da possibilidade de reestruturação do passivo dos particulares.
Ainda poderia continuar a descrever soluções inovadoras, e bem positivas desta proposta lei, mas sinto que me poderia tornar cansativo, tantas são as novidades.
Direi apenas, em resumo, que esta proposta sublinha os princípios da celeridade, da transparência e da responsabilização.
É um passo essencial para uma maior saúde do nosso meio económico e empresarial.
Defende, o que é fundamental para um partido democrata-cristão, as famílias e os trabalhadores.
Acredito que será um meio de suster uma tendência de acordo com a qual nos últimos anos se tem acentuado o número de processos que terminam em falência, e diminuído substancialmente os que terminam em recuperação.
Creio que será possível diminuir o tempo médio destas pendências.
Com tudo isto ganham o País e a sua economia.
Mas não estamos aqui apenas a discutir aquilo que o Governo nos veio propor. Também o Bloco de Esquerda avançou com um projecto de lei, cuja exposição de motivos deixa algumas perplexidades, confundindo situações de deslocalização com situações de falência, entrando em algumas contradições nos seus números. Enfim, uma baralhada e uma confusão.
Aliás, referem-se a uma legislação que brevemente deixará de existir porque estamos aqui precisamente a tratar da sua revogação e a soluções já preconizadas, por exemplo, na legislação laboral.
Mas, para além do mais, há outros aspectos curiosos, porque o Bloco de Esquerda considera que é falando muito

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no sigilo bancário que vai resolver as questões. Ninguém deixa de ouvir e de tratar com seriedade a matéria do sigilo bancário, mas prever que, em relação a todos os sócios de uma sociedade, possa ser levantado o regime de sigilo bancário, por exemplo, em sociedades que até podem estar cotadas em bolsa e que têm milhares de sócios, parece-me uma coisa não só descabida como completamente inexequível.
Para além do mais, em relação à lei relativa ao fundo de garantia social, propõem algo que, a meio do ano, seria incondicional, porque, como sabem, estamos limitados, na nossa iniciativa, pela lei-travão, prevista na Constituição, isto é, propõem um aumento inexplicável e, sobretudo, inqualificável (porque não saberíamos de quanto seria), das despesas do Estado. Não é desta forma que se resolvem as situações e por isso mesmo o nosso voto em relação a este projecto de lei - porque, felizmente, continuaremos sempre no mesmo lugar - será contra.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, pois, entrar no período regimental de votações, mas, antes de mais, procederemos à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.

Pausa.

Pode ser accionado o mecanismo de votação em curso.
Srs. Deputados, estamos em condições de assinalar a nossa presença, premindo a tecla verde "sim".

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 160 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações. Há mais alguns Srs. Deputados presentes, para além do que ficou registado, mas o que interessa é verificar que há quórum, para o que são bastantes 116 presenças.
O primeiro texto que será submetido a votação é o voto n.º 59/IX - De congratulação pela decisão do Governo português em participar no esforço internacional de apoio à reconstrução do Iraque e à segurança do seu povo (PSD e CDS-PP).
Nos termos regimentais, cada grupo parlamentar pode usar da palavra por 2 minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Correia.

O Sr. José Correia (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Parlamento português tem constituído um palco privilegiado do debate político sobre a questão do Iraque.
Numa atitude de profundo respeito democrático, tão diversa da praticada pelo seu antecessor, o Sr. Primeiro-Ministro aqui veio, por diversas vezes, antes, durante e após o conflito, dar conta dos motivos que estiveram e estão na base da acção desenvolvida pelo Governo.
Neste processo, algumas forças políticas da oposição não souberam ou não quiseram ser fieis ao seu passado. Julgaram ver aqui uma oportunidade para criar dificuldades ao Governo. Deixaram que os seus complexos político-ideológicos se sobrepusessem à compreensão daquilo que é o interesse nacional. Diferente foi a atitude do Governo, que soube sempre identificar a natureza dos desafios e agir, em cada momento, de acordo com esse mesmo interesse nacional.
A condução da política externa constitui, como todos sabemos, competência exclusiva do Governo. Nada obsta, porém, a que este Hemiciclo dê conta do seu regozijo com o acerto de uma orientação e lhe manifeste o seu inequívoco apoio. Sabemos, até, como isso pode ser útil, pois contribui para reforçar a posição internacional do nosso País e a legitimidade das posições que assume.
Por isso aprovámos, em Fevereiro, um voto de saudação ao Governo, pela clareza das suas atitudes e de identificação com a orientação política por ele seguida.
Vive-se, agora, no Iraque uma nova fase, em que as preocupações centrais devem ser a estabilização, a reconstrução económica e a implementação da democracia política.
Portugal não pode alhear-se destes novos desafios e das dificuldades por que passam os cidadãos iraquianos.
O envolvimento do nosso país, aqui mesmo anunciado pelo Sr. Primeiro-Ministro, quer por via da ajuda humanitária quer através do envio de uma companhia da GNR, é assim, desde logo, um imperativo de solidariedade para com um povo que começa agora a trilhar um novo caminho, após a deposição de uma das mais bárbaras ditaduras do século XX.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas é também uma decisão que interpreta adequadamente, de novo, o sentido do interesse nacional e que compreende que tal interesse se defende colocando Portugal na primeira linha dos grandes temas da política internacional.
É por isso justo que a Assembleia da República exprima, através do voto em discussão, a sua congratulação com a decisão do Governo de participar no esforço internacional de apoio à reconstrução do Iraque e à segurança do libertado povo iraquiano. Como é justo e devido que a Assembleia da República, em nome de todos os portugueses que lhe cabe representar, manifeste incondicional apoio às forças de segurança portuguesas que estarão envolvidas nesse esforço.

O Sr. Presidente: - O tempo de que dispunha esgotou-se, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Àqueles que integrarão essas forças queremos dizer, daqui, que podem contar connosco, que temos orgulho neles e que os nossos pensamentos estarão com eles todos os dias em que pelo seu esforço, pelo seu valor e pelo seu…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este não é voto de congratulação pela queda de uma ditadura, nem é tão-pouco um voto pela defesa dos direitos humanos!

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É, é!

O Orador: - É o voto pela diplomacia dos interesses!
Neste caso, Sr.as e Srs. Deputados, basta atentar à realidade. O que é que as forças da ocupação se preocuparam em proteger de imediato no Iraque? Os poços de petróleo! O que é que as forças da ocupação não conseguiram resolver? O quotidiano das populações, o direito à saúde, a educação, o dia-a-dia.
Está bem patente que este voto pretende, apenas, legitimar uma ocupação. Está bem patente que este voto quer exprimir, como o Sr. Ministro Paulo Portas teve ocasião de dizer em Washington, a glória dos vencedores e quer colocar Portugal, de uma forma que veementemente condenamos, do lado dos vencedores de uma guerra de ocupação.
Com este voto e com a ida de militares para o terreno da ocupação, Portugal quer, sem sombra de dúvida, dar a impressão de que está no lado certo da história. Mas não está!
Os vencedores perderam no que diz respeito à dignidade. Os vencedores perderam no que diz respeito à justiça. Os vencedores perderam no que diz respeito, inclusivamente, ao prosseguimento das normas mais elementares de conduta civilizacional.
Por isso mesmo, Sr.as e Srs. Deputados, não poderemos de forma alguma dar aval a este voto. Por isso mesmo, Sr.as e Srs. Deputados, a ida de militares portugueses para o terreno da ocupação, no seguimento daquilo que foi a Carta dos Oito e no seguimento daquilo que foi a Cimeira dos Açores, é mais um acto que só nos envergonha perante o mundo e que só nos tira aquilo que pretendíamos ser: uma voz autónoma e independente e não, simplesmente, mais um "cão de guarda" de Washington.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este voto que a maioria se propõe aprovar não dignifica a Assembleia da República, assim como a posição que o Governo português tomou neste processo e a sua disposição de enviar um contingente da GNR para o Iraque não prestigia o Estado português perante a comunidade internacional, nem perante nós próprios.
Não é o facto de os Estados Unidos e a Grã-Bretanha terem vencido militarmente a guerra - como, aliás, se sabia de antemão que ia acontecer - que legitima esta guerra em face do direito internacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esta guerra não está legitimada, esta guerra foi, e é, uma guerra ilegal, porque foi, e é, uma guerra em violação do direito internacional. Os Estado Unidos e a Grã-Bretanha configuram uma força ocupante e nunca uma força para a paz ou para a manutenção da paz. Foi uma guerra contra as Nações Unidas, e esta participação que o Governo português se propõe agora efectuar é uma participação a mando dos Estados Unidos, completamente à margem de qualquer legitimidade internacional e por isso não a podemos aceitar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esta ocupação foi desencadeada à margem e contra as Nações Unidas, em nome de umas supostas armas de destruição maciça que cada vez é mais claro que não existiam, isto é, até à data, não foi demonstrada de maneira alguma a sua existência.
Portugal não se propõe, assim, ajudar humanitariamente o povo iraquiano, propõe-se, sim, participar na ocupação do seu país e concitar contra si o natural repúdio por parte do povo iraquiano.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Guarda Nacional Republicana existe para salvaguarda da segurança dos portugueses no seu próprio território. A Guarda Nacional Republicana não existe para ir ocupar outros países ou para oprimir povos que deveriam merecer a nossa solidariedade e o nosso respeito para com a sua autodeterminação.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Só podemos votar contra este voto que a maioria aqui propõe e que, repito, não dignifica esta Assembleia.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este voto foi anunciado quando do debate com o Sr. Primeiro-Ministro e, independentemente das questões políticas do enquadramento deste voto, que já foram sobejamente debatidas nesta Assembleia da República, o Governo decidiu enviar forças de segurança para o Iraque.
Na altura, coloquei um conjunto de questões ao Sr. Primeiro-Ministro, às quais, recordo, o Sr. Primeiro-Ministro não respondeu, dizendo que não tinha informações suficientes para fornecer à Assembleia da República.
Permito-me voltar a colocar algumas dessas questões, para vermos como esta decisão é, no mínimo, precipitada.
As forças de segurança vão participar numa operação militar, na chamada "fase de estabilização e segurança", questão que, curiosamente, foi herdada do voto de congratulação apresentado pelo PSD, mas permanecem sem resposta questões que considero absolutamente fundamentais.
Por exemplo: qual é a missão concreta das forças de segurança? Não sabemos! Em que condições vão actuar? Não sabemos! Com que enquadramento? Não sabemos! Em que sector vão actuar? Não sabemos! Sob que comando vão actuar? Não sabemos! Com que nível de comando? Não sabemos! A que nível de responsabilidade? Não sabemos! Que estrutura de comando nas suas relações com outras forças? Não sabemos! Quanto custa isto? Não sabemos! Quantos efectivos? 120. É um efectivo adequado? Como não sabemos nada do anterior, não podemos saber se este é um efectivo adequado.
Por isso, não nos podemos congratular com o envio das forças de segurança, até porque ignoramos quase tudo, conforme procurei demonstrar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas apoiamos incondicionalmente as nossas forças, com a certeza de que farão o melhor e farão

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bem, até porque a decisão de participarem não é da sua responsabilidade,…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … e exigimos que lhes sejam dadas todas as condições ao bom desempenho das suas funções e para a sua própria segurança.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Resultam deste pequeno debate, que vem na sequência, como aqui foi dito pelo Sr. Deputado Marques Júnior, de um debate anterior, várias posições claras sobre esta matéria: há os que continuam a criticar, a falar do passado, a falar na intervenção militar e no desejo dos iraquianos de não terem a ocupação - e em relação a este aspecto devo dizer que há um momento em que não sei se não vão mesmo falar no desejo dos iraquianos de voltarem a ter a ditadura de Saddam Hussein (sinceramente, fico nessa dúvida porque parece que todo esse discurso aponta nesse sentido) -,…

Protestos do PS.

… já o Partido Socialista e o Sr. Deputado Marques Júnior têm uma posição mais equilibrada.
Em todo o caso, as questões que o Sr. Deputado levanta, permita-me que lhe diga com todo o respeito e com toda a simpatia, são essencialmente de ordem técnica. Qual é o sector? Qual é a localização? Qual é o comando? Que tipo de armamento é que levam? Onde é que ficam a dormir?, são questões operacionais e técnicas.
Ora, a questão não é operacional e técnica mas é uma decisão política!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Portugal deve ou não participar? Nós, os partidos da maioria, dizemos claramente que Portugal deve participar, sem dúvida alguma! A questão é política, não é técnica, Sr. Deputado! A decisão é política e decorre, obviamente, da posição coerente e firme que Portugal tomou desde o início.
Falam em diplomacia de interesses. Que sejam interesses!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Ah!

O Orador: - Não vejo interesse mais nobre nem mais louvável do que ser solidário com os nossos aliados, do que apoiar os nossos aliados, do que estar ao lado da democracia, da liberdade e dos nossos parceiros. Se isso são interesses, são louváveis, são interesses que Portugal, em boa hora e em bom momento, decidiu apoiar.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, se Portugal teve esta posição no início, era inadmissível que agora Portugal não participasse numa missão que é de apoio, de ajuda e de reconstrução do Iraque.
A última palavra, Sr. Presidente, para dizer que, como é evidente, não ponho em causa, de nenhum grupo parlamentar, e muito menos do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, a solidariedade para com os homens da GNR que vão para o Iraque.

O Sr. Presidente: - O tempo de que dispunha esgotou-se, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Mas não é a mesma coisa ter ou não ter apoio político.
Por isso, a nossa palavra é para eles, este voto é para eles e é um voto de orgulho no trabalho que vão fazer.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Refere este voto, num determinado parágrafo, o "lado certo".
Gostaria de começar por referir que o Governo não esteve do "lado certo" nesta matéria, por duas razões: primeira, porque esteve do lado da guerra; segunda, porque esteve contra os portugueses. Os senhores deveriam envergonhar-se de falar em nome de Portugal, porque a generalidade dos portugueses esteve contra esta guerra e contra as decisões tomadas pelo Governo português nesta matéria.

Protestos do CDS-PP.

Isso foi visível pela forma como o povo português se empenhou nas diferentes formas de manifestação contra este acto belicista.
Por outro lado, relativamente ao envio de forças de segurança para o Iraque, gostaria de referir que esse acto procura legitimar uma ocupação perfeitamente ilegítima, que, como aqui já foi referido, só tem um objectivo: o controlo de um território rico em reservas petrolíferas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Isto, Srs. Deputados, deve envergonhar a humanidade.
É por isso, Srs. Deputados, que não só votaremos contra como condenamos totalmente este voto, não só porque ele não representa mais do que a continuação de uma submissão total aos Estados Unidos da América e a tudo aquilo que os Estados Unidos representam neste momento mas também porque aquilo que traduz é totalmente vergonhoso para os portugueses.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação…

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para solicitar a votação separada dos primeiro e segundo parágrafos.

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O Sr. Presidente: - Muito bem. Fá-la-emos em separado.
Srs. Deputados, vamos, então, votar o primeiro parágrafo da parte dispositiva do voto n.º 59/IX - De congratulação pela decisão do Governo português em participar no esforço internacional de apoio à reconstrução do Iraque e à segurança do seu povo (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

É o seguinte:

Nestes termos, a Assembleia da República congratula-se com a decisão do Governo de Portugal em participar no esforço internacional de apoio à reconstrução do Iraque e à segurança do libertado povo iraquiano, decisão que considera coerente e consequente com a correcta visão do interesse nacional e da afirmação de Portugal, e dos valores que defendemos, no mundo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o segundo parágrafo da parte dispositiva do citado voto.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

É o seguinte:

A Assembleia da República manifesta, ainda, o seu apoio incondicional às forças de segurança portuguesas que estarão envolvidas neste esforço, confiante do valor e do brio que como sempre saberão emprestar à representação de Portugal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos ao voto n.º 60/IX - De congratulação pelo Dia Internacional da Família, apresentado pelo PSD e pelo CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, verificámos que deu entrada na Mesa um requerimento subscrito por Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do PSD e, porventura, do CDS-PP, solicitando o adiamento da discussão e votação do voto n.º 61/IX, apresentado pelo Partido Socialista, que incide precisamente sobre o mesmo tema do voto n.º 60/IX, sobre o Dia Internacional da Família, mas exprimindo, naturalmente, a visão que aqui já foi sintetizada pela Sr.ª Deputada Elisa Ferreira no início da reunião plenária.
Gostávamos de apelar à maioria parlamentar para não exercer esse seu direito potestativo, que, evidentemente, o Regimento prevê, mas para outras circunstâncias. É que, havendo dois votos sobre o mesmo tema, faz todo o sentido que se adie tudo ou, então, que se vote tudo. O que faz muito pouco sentido é que a Assembleia da República discuta hoje o voto n.º 60/IX, que incide sobre a problemática do Dia Internacional da Família, e que tenha de discutir o voto n.º 61/IX, do Partido Socialista, que incide sobre a mesma problemática, na próxima semana.
Não utilizaremos qualquer subterfúgio regimental do tipo de transformar o nosso voto em propostas de alteração e obrigar à sua discussão hoje. Gostávamos que os dois votos fossem discutidos tendo em conta o normal diálogo entre as bancadas e, também, a vantagem de a Assembleia da República se pronunciar pluralmente sobre esta matéria.
Sr. Presidente, é este o apelo que, em nome da minha bancada, gostava de deixar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, o requerimento apresentado tem o número suficiente de assinaturas, pelo que é regimental. Por isso, a Mesa o recebeu.
Em todo o caso, creio que a sua interpelação se dirige mais aos grupos parlamentares da maioria.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, peço também a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, em nossa opinião, e com todo o respeito, aquilo que o Sr. Deputado José Magalhães disse não faz sentido. E não faz sentido pelo seguinte: os Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP apresentaram com muita antecedência, e foi distribuído nos termos regimentais, o voto de congratulação comemorativo do Dia Internacional da Família.
Por sua vez, o Partido Socialista esqueceu-se de apresentar qualquer voto relativo ao tema e, à última hora, talvez a reboque, veio apresentar um, substancialmente inútil,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é que não faz sentido!

A Oradora: - … porque é uma repetição do nosso. E isso, Sr. Deputado José Magalhães, é que não faz qualquer sentido.
Mesmo assim, às 15 horas e 15 minutos, isto é, logo que tivemos conhecimento da apresentação do voto de congratulação do Partido Socialista, disponibilizámo-nos para fundir os textos dos dois votos,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E não quiseram!

A Oradora: - … aceitando uma ou outra sugestão, acrescento ou alteração, mas o Partido Socialista recusou liminarmente a nossa proposta. Apesar disso, ainda estivemos até às 17 horas e 30 minutos à espera que o Partido Socialista aceitasse a nossa sugestão, com uma disponibilidade total, o que não veio a acontecer.
Por isso, não faz sentido estarmos agora com esta discussão, porque não podemos aceitar do Partido Socialista um comportamento desta natureza, que, de todo, é contra o Regimento e contradiz em absoluto a boa-fé e a disponibilidade com que o Partido Social Democrata apresentou o problema ao Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço novamente a palavra para interpelar a Mesa.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado, mas peço-lhe que seja breve, porque temos muitas votações a fazer.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que estranhamos imenso esta postura.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Nós é que estranhamos!

O Orador: - Não existe qualquer deslealdade nem qualquer quebra de boa-fé na impossibilidade de se fundirem dois votos. O que é absurdo é, gorada essa hipótese, retaliar, obrigando ao adiamento da discussão e votação do nosso voto.
Mas, se VV. Ex.as querem retaliar, façam favor. Nós votaremos de acordo com a nossa consciência hoje e votaremos de acordo com a nossa consciência na próxima semana, mas é uma solução absurda da vossa única responsabilidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Para a próxima, portem-se como deve ser!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, então, proceder à discussão do voto n.º 60/IX - De congratulação pelo Dia Internacional da Família, apresentado pelo PSD e CDS-PP. Cada grupo parlamentar dispõe de 2 minutos para o efeito.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Pinheiro Torres.

O Sr. António Pinheiro Torres (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fruto de uma decisão da Assembleia Geral das Nações Unidas, celebra-se desde 1994, no dia 15 de Maio, o Dia Internacional da Família.
É esta, assim, uma ocasião privilegiada para evocar a importância da família, célula base da sociedade, anterior ao Estado, e o nosso compromisso em assegurar o cumprimento, também neste domínio, dos princípios fundamentais que constam da nossa Constituição.
Relembram-se estes princípios constitucionais: "A família, como elemento fundamental da sociedade, tem direito à protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros".
É claro o texto constitucional no desenho do relacionamento que estabelece entre o Estado e a instituição familiar, nas exigências que assinala àquele e nos direitos e deveres que atribui à família e às pessoas enquanto seus membros. É dever do Estado cooperar, apoiar e estimular o desenvolvimento da cada família, facultando-lhe os meios indispensáveis ao cumprimento da sua missão e não se lhe substituindo nas funções e nas responsabilidades que lhe são próprias, mas estando atento e pronto a suprir as dificuldades ou falhas na protecção dos direitos inalienáveis de cada pessoa.
Mas a família é para cada um de nós, que teve ou tem a sorte de a ter, muito mais do que qualquer texto ou lei pode alguma vez exprimir. Dificilmente saberemos pronunciar a palavra "eu" sem convocar à consciência a imagem da nossa mãe e do nosso pai e a memória do ambiente familiar em que nos fizemos e crescemos ou olhar para nós próprios e para o fundamental do que somos sem associarmos a família que teremos sido capazes de criar e com quem vivemos os nossos momentos de maior proximidade.
Ao mesmo tempo que, no Parlamento Europeu, é hoje entregue uma petição, subscrita por centenas de associações de todos os países europeus, em que se pede que a família seja colocada no centro das preocupações dos decisores políticos, desejamos, também aqui, assinalar este dia especial e evocar a necessidade de que entre nós esteja presente a dimensão familiar nas políticas e nas definições de medidas.
Mas não é só isto que justifica este voto de congratulação. Os Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP pretendem ainda manifestar a sua satisfação com a importância atribuída pelo XV Governo Constitucional no seu Programa, e sobretudo na sua prática…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois já esgotou o tempo.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, queremos manifestar a nossa satisfação com a importância atribuída pelo XV Governo Constitucional no seu Programa, e sobretudo na sua prática, à política de família e às medidas concretas que vem tomando de apoio e protecção às pessoas e às famílias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É verdadeiramente extraordinário que a maioria se congratule com o Dia Internacional da Família e, mais, que se congratule com a actividade governativa em relação à política de família.
O que é que verificamos? Verificamos, no código de trabalho, dificuldades para a conciliação com o tempo familiar, instabilização dos horários e das prestações de trabalho, redução de direitos de assistência a filhos e a pessoas a cargo…

A Sr.ª Joana Amaral Dias (BE): - Muito bem!

O Orador: - … e, na lei da imigração, um verdadeiro atentado ao direito ao reagrupamento familiar, obrigando cidadãos estrangeiros a esperar 5, 6 e 7 anos para esse reagrupamento.

A Sr.ª Joana Amaral Dias (BE): - Muito bem!

O Orador: - É, pois, absolutamente pura hipocrisia este voto de congratulação sobre a família e sobre o Dia Internacional da Família, porque na produção legislativa concreta não são esses os sinais que entendemos da actividade governativa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Nessa medida, colhe-nos uma repulsa em relação a essa atitude de cinismo político.
Acrescentaria um outro ponto, para nós muito negativo: o de querer, por esta via, utilizar, voto a voto, um método que é uma espécie de hossana continuado da actividade governativa!

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Creio que os Srs. Deputados da maioria deviam falar com o Sr. Ministro Marques Mendes, porque, julgo, estão mortinhos por um novo voto de confiança. Talvez seja isso que queiram! Porque, a propósito de cada efeméride, fazem moções e votos perfeitamente sectários. A propósito de uma efeméride internacional estarem vinculados ao elogio, ao louvor e ao incensar do Governo é manifestamente um excesso, é manifestamente um abuso da maioria parlamentar.
Nesse aspecto, o voto n.º 60/IX só pode merecer a rejeição da oposição, em particular daquela que aqui é protagonizada pelo Bloco de Esquerda.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois já esgotou o tempo.

O Orador: - Portanto, Srs. Deputados da maioria, não há motivo para nos congratularmos com este voto e muito menos com a concepção subjacente de uma família estática e não de uma família moderna e evolutiva.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com este voto de congratulação, ao assinalar a importância deste Dia Internacional da Família, que não é uma efeméride qualquer, manifestamos total apoio às políticas sociais do Governo e satisfação pela importância que o actual Governo confere à política da família, reconhecendo a família como a pedra basilar da sociedade em que vivemos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Então, porque é que a prejudicam tanto?!

A Oradora: - Constitucionalmente, a família é feita de pessoas e existe para a realização dessas mesmas pessoas. Famílias unidas são o garante do desenvolvimento e do fortalecimento do País. É no quadro da unidade familiar que encontramos a resposta para a realização humana plena, porque esta é baseada em laços indestrutíveis de solidariedade e de afectividade, no respeito pelos valores e princípios da pessoa humana.
Congratulamo-nos pelo facto de a família constituir um dos eixos fundamentais da orientação política e social do actual Governo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O voto em análise tem como objectivo assinalar o Dia Internacional da Família e, de facto, é crucial assinalar o facto de numerosas famílias portuguesas constituírem, diariamente, os alvos preferenciais de opções políticas retrógradas e atentatórias dos mais elementares direitos de cidadania.

Vozes do PCP e do BE: - Muito bem!

A Oradora: - De facto, um ano de governação do PSD e do CDS desencadeou um ataque sem precedentes a direitos constitucionalmente consagrados, como o direito ao trabalho, o direito à educação, o direito à saúde, o direito à segurança social e à solidariedade, o direito à realização pessoal da família e dos seus membros.
Com efeito, o texto matricial consagra o direito da família à "protecção da sociedade e do Estado" e é claro no que se refere às incumbências do Estado, ao dizer que deve promover "a independência social e económica dos agregados familiares".
E como é que o Governo e a maioria que o sustenta entendem esse direito? Atacando deliberadamente as funções sociais do Estado - da educação à saúde, do emprego à solidariedade social.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - E um Governo e uma maioria que perfilham as opções políticas que maltratam tantas e tantas famílias portuguesas deveriam, pelo menos, reconhecer no voto apresentado as consequências dessas políticas.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - Um Governo e uma maioria que consagram, por diploma, a devassa da vida privada de homens e mulheres (naturalmente também das suas famílias), que consagram, por diploma, acrescidas dificuldades à conciliação da vida familiar com a vida profissional, que consagram, por diploma, a degradação da vida familiar dos portugueses e das portuguesas com a flexibilização dos horários e mobilidade geográfica deveriam, pelo menos, reconhecer estes factos no voto apresentado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Um Governo e uma maioria que decretaram, em nome da redução de custos, que muitas e muitas crianças, muitos e muitos jovens, neste ano lectivo não teriam o direito ao ensino especial, apesar de estarmos no Ano da Deficiência, deveriam, pelo menos, reconhecer que optam pela exclusão de algumas famílias.

Vozes do PCP e do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o tempo de que dispunha esgotou-se. Tem de terminar, senão desligar-se-á o microfone.

A Oradora: - Vou concluir, Sr. Presidente.
O PCP assinala este dia como mais um dia em que as famílias portuguesas terão de continuar a lutar pelos direitos que estão consagrados na Constituição, onde homens e mulheres, crianças e jovens…

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.

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A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PS associa-se à celebração do Dia Internacional da Família. Mas, se faz sentido congratularmo-nos com este dia, faz ainda mais sentido recordar e reafirmar os pressupostos da decisão da Assembleia Geral da ONU, nomeadamente, quando afirma que a igualdade entre mulheres e homens, a igualdade da participação das mulheres no mercado do trabalho e a partilha da responsabilidade parental são elementos essenciais de uma política de família moderna, quando afirma que existem vários conceitos de família ou, ainda, quando afirma a necessidade de planos globais de acção que definam verdadeiras políticas de família.
As famílias são, de acordo com a nossa Constituição, o elemento fundamental da sociedade. No entanto, as famílias só conseguem contribuir para o desenvolvimento sustentável da nossa sociedade se tiverem condições de estabilidade e qualidade de vida. E são as famílias as primeiras a sofrer com o desemprego, com a precarização do emprego, com a pobreza, com o desinvestimento nas políticas sociais.
Era, por isso, essencial, hoje, conseguirmos aprovar um voto que gerasse o consenso desta Câmara. Por isso, e só por isso, o PS apresentou o seu voto de congratulação, que a maioria prepotentemente não quer discutir. E não quer discutir, porque a sua verdadeira intenção não é a de aprovar um voto de congratulação pelo Dia Internacional da Família mas, sim, aprovar um voto de congratulação pelas políticas do actual Governo, Governo que tem, ou que pretende ter, um discurso pró-família, mas que tem uma prática anti e contra a família.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - É esta a razão pela qual o PS não pode aprovar o voto em discussão, porque não entra neste tipo de farsas e porque entende que, de facto, as famílias devem estar acima de qualquer estratégia ou brilhantismo político do momento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ora aqui está uma iniciativa parlamentar, neste caso um voto de congratulação, que considero que contribui profundamente para a descredibilização da vida política portuguesa.
Sinceramente, acho que há alturas em que mais valia que a maioria parlamentar, neste caso constituída pelo PSD e pelo PP, optasse por alguma inércia parlamentar, porque, de facto, acho que já é gozar um pouco demais apresentar estas coisas.
Como já aqui foi referido, olhemos para algumas medidas concretas já tomadas por este Governo.
Foi aqui lembrada - e muito bem - a revisão da legislação laboral, com a introdução de mecanismos de flexibilidade e de mobilidade geográfica, que vêm criar más condições de acompanhamento da vida familiar de muitos trabalhadores, nomeadamente, em relação aos seus filhos; vejam-se os índices de desemprego a crescer assustadoramente; veja-se, em termos de educação, algumas questões problemáticas, como o acompanhamento a crianças que necessitam de apoio especial e que estão impossibilitadas de ter esse apoio devido a algumas medidas restritivas tomadas por este Governo; relembremos o aumento das propinas, questão em que o Governo continua a acentuar o factor pagamento da educação sobre as famílias portuguesas; veja-se que estamos no País onde as famílias pagam mais pela educação do que em todos os outros restantes países da União Europeia, através da compra dos manuais escolares e de todo o material escolar; veja-se, por exemplo, uma medida já tomada por este Governo, como a eliminação do crédito jovem à habitação, dificultando a autonomização de muitos jovens para a constituição da sua família…
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, de facto, o que há a olhar é às medidas concretas que muito têm prejudicado as famílias portuguesas, e os senhores não têm moralidade nem legitimidade para virem invocar uma congratulação relativa ao Dia Internacional da Família.

O Sr. Presidente: - O tempo de que dispunha esgotou-se, Sr.ª Deputada.

O Orador: - Não posso terminar, Sr. Presidente, sem referir que a concepção de uma família única é uma visão muito retrógrada da sociedade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 60/IX - De congratulação pelo Dia Internacional da Família, apresentado pelo PSD e CDS-PP.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

É o seguinte:

Fruto de uma decisão da Assembleia Geral das Nações Unidas, celebra-se desde 1994 o Dia Internacional da Família em 15 de Maio.
É esta, assim, uma ocasião privilegiada para evocar a importância da família, célula base da sociedade, anterior ao Estado, e o nosso compromisso em assegurar o cumprimento, também neste domínio, dos princípios fundamentais que constam da nossa Constituição.
Relembram-se esses princípios: a Família, "elemento fundamental da sociedade, tem direito à protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros".
É claro o texto constitucional no desenho do relacionamento que estabelece entre o Estado e a instituição familiar, nas exigências que assinala àquele e nos direitos e deveres que atribui à família e às pessoas, enquanto seus membros. É dever do Estado cooperar, apoiar e estimular o desenvolvimento de cada família, facultando-lhe os meios indispensáveis ao cumprimento da sua missão e não se lhe substituindo nas funções e nas responsabilidades que lhe são próprias, mas estando atento e pronto a suprir dificuldades ou falhas, na protecção dos direitos inalienáveis de cada pessoa.
Mas a família é para cada um de nós, que teve ou tem a sorte de a ter, muito mais do que qualquer texto ou lei pode alguma vez exprimir. Dificilmente saberemos pronunciar a palavra "eu" sem convocar à consciência a imagem

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da nossa mãe e do nosso pai e a memória do ambiente familiar em que nos fizemos e crescemos ou olhar para nós próprios e para o fundamental do que somos sem associarmos a família que teremos sido capazes de criar e com que vivemos os nossos momentos de maior proximidade.
Ao mesmo tempo em que, no Parlamento Europeu, é hoje entregue uma petição, subscrita por centenas de associações de todos os países europeus, em que se pede que a família seja colocada no centro das preocupações dos decisores políticos, desejamos, também aqui, assinalar este dia especial e evocar a necessidade de que entre nós esteja presente a dimensão familiar nas políticas e nas definições de medidas.
Mas não só isso justifica este voto de congratulação.
Os Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP pretendem ainda manifestar a sua satisfação com a importância atribuída pelo XV Governo Constitucional no seu programa, e sobretudo na sua prática, à política de família e às medidas concretas que vem tomando de apoio e protecção às pessoas e às famílias.
Na verdade, na própria estrutura do Executivo (com a criação da Coordenação Nacional para os Assuntos da Família) e nas políticas sociais, de que destacamos, pela sua enorme relevância, a reestruturação de apoio às crianças e a reforma da adopção, tem sido uma constante a preocupação do Governo com os valores de promoção da família, num caminho de conciliação de rigor e generosidade, sensibilidade social e responsabilidade, exigência e solidariedade.
Pretendemos encorajar o Governo a prosseguir no caminho encetado de afirmação da importância insubstituível da família.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, seguidamente, vamos votar um requerimento, subscrito pelo PSD, solicitando o adiamento da discussão e votação do voto n.º 61/IX, apresentado pelo Partido Socialista…

O Sr. José Magalhães (PS): - É potestativo!

O Sr. Presidente: - De facto, não há lugar a votação.
Assim, o voto n.º 61/IX será apreciado e votado na próxima sessão em que haja votações.
Passamos à votação do projecto de resolução n.º 152/IX - Viagem do Presidente da República a Sevilha (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 53/IX - Autoriza o Governo a legislar em matéria de tratamento e interconexão dos dados constantes das informações a prestar pelas instituições de crédito mutuantes em relação aos contratos de empréstimo à habitação bonificados.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Visto tratar-se de uma proposta de lei de autorização legislativa, vamos votá-la imediatamente na especialidade e em votação final global. Caso não haja objecções, julgo que poderíamos fazer as duas votações em conjunto.

Pausa.

Uma vez que ninguém se opõe, assim se fará.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, segue-se a votação do projecto de resolução n.º 86/IX - Relatório da participação de Portugal no processo de construção europeia - 16.º ano (Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos agora votar um requerimento, apresentado pelo PSD e CDS-PP, no sentido de o projecto de lei n.º 53/IX - Aprova o regime penal especial para jovens entre 16 e 21 anos (PS) baixar à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Uma vez que o requerimento foi aprovado, não vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei.
Segue-se a votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 226/IX - Cria mecanismos de controlo da importação e exportação de armas (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 60/IX - Autoriza o Governo a criar regras específicas sobre o acesso à profissão de motorista de táxi, através da concessão de uma autorização excepcional que vigorará por um período máximo de 3 anos.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do BE e abstenções do PS, do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, uma vez que se trata de uma proposta de lei de autorização legislativa, vamos votá-la na especialidade

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do BE e abstenções do PS, do PCP e de Os Verdes.

Vamos, agora, votá-la em votação final global.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do BE e abstenções do PS, do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, caso não haja objecções, e uma vez que são iguais, vamos proceder à votação de dois requerimentos, um, apresentado pelo PSD e CDS-PP, e outro, apresentado pelo PS, PCP e BE, no sentido de o projecto de lei n.º 143/IX - Adopta medidas para assegurar a efectiva administração regional do antigo Hospital Militar da Boa Nova, em Angra do Heroísmo (PS) baixar à Comissão de Educação, Ciência e Cultura, sem votação.

Pausa.

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Uma vez que não há objecções, vamos votá-los em conjunto.

Submetidos a votação, foram aprovados por unanimidade.

O projecto de lei n.º 143/IX não será votado na generalidade.
Srs. Deputados, vamos votar, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Finanças, relativo à proposta de lei n.º 46/IX - Procede à segunda alteração da Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto (Lei de enquadramento orçamental).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PS e do BE.

Srs. Deputados, temos ainda um requerimento, subscrito pelo PSD e CDS-PP, que já foi circulado e que, portanto, todos conhecem, do seguinte teor: "Para efeitos da realização da consulta pública às organizações de trabalhadores, a ter lugar e estar concluída até ao final da actual sessão legislativa, os Deputados abaixo assinados requerem a baixa, sem votação, da proposta de lei n.º 50/IX e do projecto de lei n.º 273/IX à 8.ª Comissão."
Pergunto se há acordo em que se vote de imediato este requerimento. É que só se houver consenso é que poderá ser votado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas ainda não acabou a discussão!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, com o devido respeito, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, independentemente de ainda não ter terminado o debate da proposta de lei n.º 50/IX e do projecto de lei n.º 273/IX, o requerimento nada tem a ver com isso, podendo ser apresentado a todo o tempo até ao final do debate. Só que convém que esse requerimento seja votado hoje para que o Sr. Presidente, já amanhã, possa fazer baixar os diplomas à respectiva comissão, sob pena de se perder uma semana no processo de consulta, o que não faz qualquer sentido.

O Sr. Presidente: - Então, Srs. Deputados, vamos votar…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, o requerimento pode ser apresentado a todo o tempo. Não pode é ser votado antes de terminar o debate da matéria sobre a qual incide o requerimento.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Porquê?

O Orador: - Porque não. É óbvio, regimentalmente!

Protestos do PSD.

Não se fazem votações, mesmo que sejam de baixa à comissão, dos diplomas que estamos a discutir, sem que os mesmos sejam discutidos até ao fim. Poderão, eventualmente, ocorrer outros incidentes pelo caminho.

Protestos do PSD.

Poderão surgir outras propostas…, poderá o Governo retirar a proposta. Teoricamente, todas as alternativas estão em aberto.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, dar-lhe-ei a palavra a seguir, porque tenho inscrito, primeiro, o Sr. Deputado José Magalhães para interpelar a Mesa sobre esta matéria.
Tem a palavra, Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, há, de facto, dois problemas, sendo um deles o que acaba de ser abordado, que é de carácter técnico-jurídico.
Ir pelo seguro é não ir, neste caso, com velocidade excessiva, embora sendo possível preparar tudo. Convém ir pelo seguro, julgo eu (mas, enfim, a maioria decidirá!) e votar na próxima semana. É mais cautelar. Mas farão, naturalmente, o que entender.
Agora, chamo a atenção para a questão da sede onde este processo deve ser conduzido. A proposta de lei baixou à 1.ª Comissão, foi nessa Comissão que ouvimos as entidades competentes - aliás, vamos ter ocasião de ouvir ainda as que não puderam ser ouvidas, tais como o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho Superior do Ministério Público e outras entidades -, pelo que, julgamos, há toda a vantagem em que seja a 1.ª Comissão que continue a conduzir esse processo.
Por isso, Sr. Presidente, pedia que esse ponto de vista fosse considerado e que não se deliberasse, se for esse o caso (mas espero que não seja) nesse sentido. Há tempo, numa semana, para ponderar tudo isto.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes, vou pôr à consideração da Câmara a possibilidade de, eventualmente, votarmos o requerimento no final do debate dos dois diplomas. Como só estão previstas mais duas intervenções, poderíamos votar o requerimento no final do debate, desde que haja acordo da Câmara.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, com o devido respeito pelo que foi dito pelo Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho, eu não concordo. E não concordo, porque ele não aduziu qualquer argumento. Limitou-se a dizer que não podia, mas não disse por que é que não podia, ou seja, disse que não podia "porque não podia". Ora, do meu ponto de vista, e como devido respeito, isso não é verdade.

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Protestos do Deputado do PCP Lino de Carvalho.

E a prova de que não é verdade é que amiúde é a própria Conferência de Líderes que pré-acorda e pré-determina que a votação não terá lugar naquele dia e que o diploma baixa à comissão, sem votação.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Mas isso não implica qualquer votação!

O Orador: - Da mesma maneira que a Conferência de Líderes o pode fazer dias antes de iniciar o debate, por maioria de razão, no próprio dia do debate, seguramente que o Plenário, que é soberano (e é-o até sobre a Conferência de Líderes), pode, a todo o tempo, através de um requerimento dirigido à Mesa, como é este (que é votado pelo Plenário), determinar que este diploma verá a respectiva votação suspensa, baixando à comissão, para que se proceda à consulta pública.
Relativamente à questão colocada pelo Sr. Deputado José Magalhães, não temos qualquer objecção. No requerimento que apresentámos consta a 8.ª Comissão, porque, da intervenção do Sr. Presidente feita no início desta sessão plenária, a minha bancada ficou com a ideia de que o Sr. Presidente tinha apontado no sentido da 8.ª Comissão. Porém, não temos qualquer objecção à sugestão do Sr. Deputado José Magalhães e, uma vez que foi a 1.ª Comissão que tratou de uma série de consultas sobre esta matéria, do nosso entendimento, também poderá ser ela a proceder à consulta pública, nos termos da lei.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, sobre a questão da comissão em si, é um assunto que pode ser regulado posteriormente, porque julgo que o nosso interlocutor habitual com as organizações de trabalhadores é a 8.ª Comissão. Acho que seria perfeitamente natural ser ela a fazê-lo.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, penso que não valeria a pena estarmos a prolongar este debate.
Em todo o caso, tenha a bondade.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Tem toda a razão, Sr. Presidente.
Gostava apenas de interpelar V. Ex.ª no sentido de dizer que, em minha opinião, a sua sugestão resolveria o problema. Realmente, se pudéssemos votar dentro de momentos resolveríamos o problema.
Portanto, é para aderir à sua sugestão e perguntar se há ou não consenso nesse sentido.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, diz o Sr. Deputado Marques Guedes que nós não aduzimos argumentos. No entanto, o que diz o Regimento é que, finda a discussão, os diplomas em causa serão objecto de votação - é essa a norma regimental -, até porque, Sr. Deputado Marques Guedes, até ao final do debate, poderá haver outros incidentes processuais.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não!

O Orador: - Em teoria, os autores podem retirar a proposta.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD) - Caía o requerimento!

O Orador: - Portanto, não tem lógica votarmos o requerimento antes do final do debate, senão abrimos um precedente tanto para requerimentos como para outras soluções.
Em todo o caso, Sr. Presidente, do mal, o menos: se o Sr. Presidente entender que pode fazer a votação do requerimento no final do debate, não colocaremos objecções. Mas que, no mínimo, se respeitem as regras processuais da votação no final da discussão!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas o requerimento não tem a ver com a votação!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Mas a votação tem a ver com o requerimento!

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a solução económica seria, de facto, votar na próxima semana.
De qualquer maneira, Sr. Presidente, talvez seja possível organizar uma forma de discussão parlamentar que cometa a uma comissão a sua tradicional função de organização de um certo tipo de debate, mas preservar a intervenção da 1.ª Comissão junto dos conselhos superiores e de outras entidades que têm de ser ouvidas.

O Sr. Presidente: - Isso, com certeza!

O Orador: - Certamente, não haverá dificuldade em organizar isso.
Quanto a votar mais tarde, tudo dependerá do quórum parlamentar e de outros factores. Eu julgo que seria de adoptar prudência,…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Também acho!

O Orador: - … mas enfim!… V. Ex.ª decidirá como entender.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Marques Guedes, aceita a sugestão de fazermos a votação do requerimento no final da discussão dos dois diplomas ou insiste em que a façamos agora? É que o resultado é o mesmo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é evidente que eu não vou levantar problemas se o resultado for o mesmo. Mas só se o resultado for o mesmo. Para mim, esta teimosia só pode ser justificada com o facto de haver alguma vontade de criar um problema, que não existe de facto.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não me diga!…

O Orador: - Porque o problema, Sr. Presidente, é que eu não sei se no final do debate haverá quórum na Sala.

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Neste momento, temos quórum, verificado pela Mesa, mas, no final do debate, não sei se o teremos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Teremos de assegurar esse quórum, Sr. Deputado.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, nós tentámos ajudar. Aliás, fomos nós que levantámos a questão, evitando um eventual problema de inconstitucionalidade mais adiante. Temos estado a proceder com a toda a boa vontade e aceitámos, em determinado momento, a sugestão do Sr. Presidente. Mas com estas suspeições, entendo que não dá mais!
Portanto, Sr. Presidente, pela nossa parte, não há consenso. Se não se vota agora, vota-se para a semana.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Claro!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não há consenso o quê?! Isto não tem a ver com consenso!

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado Bernardino Soares. Se não se votar no final do debate, vota-se agora, o que é diferente.
Sr. Deputado António Costa, tem a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, podia resultar da intervenção do Sr. Deputado Marques Guedes um equívoco sobre o motivo da existência do problema.
Ora, o problema só existe porque este debate parlamentar não foi instruído nos termos a que a Constituição obriga.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Isto porque, nos termos da lei, é obrigatória a audição dos conselhos superiores (e eles não foram ouvidos) e porque, nos termos da Constituição, é necessário ouvir as associações sindicais (e a Constituição não foi respeitada), pelo que o diploma não tem condições para ser votado. A razão é simplesmente esta.
Portanto, a única coisa que há a fazer é cumprir aquilo a que a Constituição e a lei obrigam. Neste caso concreto, é muito recomendável que sejam ouvidas estas entidades, porque estamos a tratar de uma proposta de lei particularmente importante e particularmente mal feita.
Ora, todos teríamos a ganhar se, numa matéria onde deveria haver consenso, não se gerasse mais um daqueles incidentes em que a maioria é loquaz para criar um problema técnico. A última vez que o Sr. Deputado Marques Guedes teve uma inspiração deste tipo foi com a reforma, aliás, foi com aquelas alterações à lei da segurança social, em que o resultado prático foi este: para não se perderem 24 horas, perdemos mais de um mês!…
Portanto, talvez fosse muito prudente haver calma e serenidade. O que era normal, se o debate tivesse sido encerrado, era que esta votação se fizesse hoje; o debate não está encerrado, a votação não pode ser feita hoje e, portanto, se as coisas decorrerem com calma e serenidade, para a semana votaremos o que se tem de votar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nem pensar!

O Orador: - De outra forma, creio que vamos por um caminho que o Sr. Deputado Marques Guedes julgará que será o mais célere, mas que se verificará ser bastante menos célere.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou fazer uma proposta que, talvez, resolva o problema
Hoje, não estamos em condições de votar, na generalidade, esse diploma, porque as votações regimentais terminam antes de o debate estar concluído. Poderíamos ter prolongado um pouco mais esse debate antes das votações regimentais, mas, como não o fizemos, não estamos em condições de votar.
Depois dos problemas que aqui se levantaram, julgo que cabe perfeitamente na autoridade do Presidente remeter o diploma às comissões competentes, que acertarei às tarefas que cada uma delas deve fazer, para se proceder a requisitos que, afinal, são determinados pela própria Constituição.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - E assim dispensar-nos-íamos de introduzir um elemento perturbador com a votação desse requerimento.
Portanto, eu despacharei para as comissões, não vamos votar hoje, também não votaremos da próxima vez, porque o diploma só virá a votação quando tiver cumprido os devidos trâmites constitucionais.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Se ninguém se opõe a esta minha decisão, o assunto fica resolvido.

Pausa.

Srs. Deputados, vamos retomar o debate conjunto, na generalidade, da proposta de lei n.º 50/IX e do projecto de lei n.º 273/IX.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tendo abandonado a intenção de proceder a alterações ao actual Código de Recuperação de Empresas e de Falências, fruto de uma outra conjuntura, o Governo optou por enfileirar com as orientações traçadas em todo o mundo pelo FMI, nomeadamente, nos países em que este se alapardou (vide o caso da Argentina e os acesos debates travados no Parlamento).
Para o Governo é preciso pôr as falências em dia para que a economia seja saudável, mas o que resulta do diploma é que o mesmo conduzirá a exclusões sociais, melhor dizendo, à pobreza.
A economia poderá vir a ser saudável para os capitalistas - e cada vez menos, porque há alguns, os mais pequenos, que vão sendo excluídos -, mas assentará num sociedade em que cada vez mais, e a coberto do equívoco da palavra "neoliberal", os seres humanos vão sendo privados de direitos fundamentais. Mesmo as empresas que já ultrapassam a dimensão das pequenas e médias empresas vão sendo privadas do direito a subsistir, do direito de enriquecer o tecido produtivo.

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O caminho da exclusão e da pobreza está claramente definido para os consumidores que quiseram ter o direito ao mínimo de conforto exigível no século XXI, ou seja, o direito a um tecto, o direito a lazeres, o direito dos jovens à educação, o direito aos direitos sociais, que sonharam realizar apesar do Estado e contra o Estado.
Colhidos nas políticas monetaristas, que têm causado recessão, pobreza e exclusões, os consumidores portugueses, como, aliás, os consumidores dos países da União Europeia, são agora colhidos por este diploma que os coage a apresentarem-se no tribunal, ou que coage outros a apresentá-los no tribunal, para que seja declarada a sua insolvência, sem quaisquer apoios que os ajude a superar o risco da pobreza.
A solução encontrada pelo Governo merece fortes críticas: aponta preferencialmente, e sobretudo, para a insolvência e não para a recuperação dos particulares; atira para os tribunais, ignorando as formas alternativas de tratamento do problema e da prevenção,…

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - … a estigmatização dos cidadãos; enxameia, ou quer enxamear, os tribunais de acções, recusando as formas alternativas de resolução do problema.
Longe de representar um novo começo de vida, corre-se o risco sério de o sistema contribuir para as exclusões.
Além disso, o diploma acelera a exclusão dos devedores sobreendividados, afastando-os dos circuitos económicos pela limitação, senão pela exclusão, do recurso ao crédito bancário e adopta medidas que podem levar à obrigatoriedade, para o insolvente, de aceitar um trabalho desqualificado, se quiser manter o plano de exoneração. Nós já sabíamos que no Código do Trabalho era assim, e agora mais se acentua!…
Em suma, as famílias, de que tanto fala a maioria, têm pela frente o calvário do processo de insolvência, sem perspectivas de recuperação no horizonte.
De facto, basta atender ao artigo 47.º, salvo erro, do texto anexo à proposta de lei, onde até se proíbe - acaba por ser esse o resultado! -, a solidariedade entre membros das famílias, porque quem emprestar ao devedor algum dinheiro acaba relegado, na graduação, para último lugar.
Portanto, os Srs. Deputados da maioria não têm nenhuma moralidade - nenhuma! - para virem aqui falar nas famílias, porque a vossa política é, efectivamente, contra as famílias, contra os agregados familiares!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - A proposta de lei contém alguns mecanismos destinados a acelerar, por intervenção do próprio Estado ou das autarquias, por exemplo, a liquidação do património das empresas. Estou a referir-me ao artigo que subverte o que está estabelecido e que diz que os créditos para além de seis meses antes da apresentação à falência perdem a garantia do privilégio creditório.
Quer isto dizer que o Estado, que hoje, face ao actual artigo 152.º, cumpria o seu dever de solidariedade social, perdendo, de facto, os privilégios creditórios dos seus créditos, passa agora a ser o principal interessado em liquidar empresas.
A lógica agora é outra: como se trata de acelerar insolvências, mantêm-se privilégios de créditos das mesmas entidades, como se diz, mas nos seis meses anteriores à apresentação da insolvência.
Mais: a proposta de lei diminui os poderes do juiz, sobrepondo-lhe a comissão de credores. A proposta de lei permite que a comissão de credores, soberanamente, exclua como entender os próprios representantes dos trabalhadores nessa comissão.
Remeto a Sr.ª Deputada Isilda Pegado, bem como quem me está a ouvir, para o artigo 64.º do texto anexo à proposta de lei, onde claramente se diz que a comissão de credores pode substituir-se, como entender e sem obediência a regras, por outra comissão de credores, por ela eleita.

Vozes do PCP: - Exactamente!

A Oradora: - E sem obediência a regras!… Aliás, nos termos do artigo anterior também não se diz que é um trabalhador com créditos, diz-se que é alguém que, por acordo dos trabalhadores, fica a representá-los.
Portanto, há que, quando se fazem afirmações, ter os pés assentes no chão.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - É isto que se passa em relação aos trabalhadores credores, que são relegados para as margens de um processo de insolvência. Também a própria comissão de trabalhadores é relegada para essas margens, contra o que a Constituição estabelece, porque apenas fica com a faculdade - repito, a faculdade - de participar na assembleia de credores, quando o texto constitucional dá às comissões de trabalhadores muito mais poderes do que uma mera faculdade.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - O que vem aqui traduz um dos dogmas do chamado "neoliberalismo": o de que os trabalhadores são sempre os culpados (este é o dogma do neoliberalismo!) por todos os desastres que afectam o tecido produtivo. Ganham mais, reivindicam demais e, portanto, se quisessem ter emprego, ganhariam menos. Portanto, são eles os culpados!… E isto podemos até ler num livro bastante interessante do Prof. Avelãs Nunes, Neoliberalismo e Direitos Humanos.
A terminar faria uma referência ao projecto de lei do Bloco de Esquerda, o qual apresenta algumas alterações com um sentido de interpretação autêntica, de clarificação de artigos anteriores. Nesse sentido vamos aprová-lo, porque, se o diploma não fosse de clarificação, poderíamos estar a pôr em risco, pelo menos, um recurso, que conheço, do Tribunal Constitucional, sobre a questão de saber se a indemnização está ou não abrangida pelos privilégios creditórios.
Mas há uma questão que temos de encarar de frente. É que, depois dos dois acórdãos do Tribunal Constitucional, de Outubro e, salvo erro, de Novembro do ano passado, que consideraram que os privilégios imobiliários gerais não podiam passar à frente das hipotecas, porque, como não eram registáveis, violava-se dessa maneira o princípio da confiança no Estado de direito democrático, esta questão dos privilégios imobiliários tem, de facto, de ser resolvida de uma outra maneira e com outras soluções, face a estes acórdãos.

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O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Isso é verdade!

A Oradora: - Por último, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solução encontrada pelo Governo para este problema, em relação aos particulares, passa pelo abandono de soluções constantes de outros ordenamentos jurídicos, nomeadamente o da Bélgica e o de França - aliás, o Senado francês aprovou um relatório condenando a legislação da Alsácia, que atirava os particulares para a insolvência (podem consultar isso na Internet, que é bastante interessante), afirmando que isso levava a exclusões e a pobrezas.
O Governo não quer apenas que as empresas sejam liquidadas, mas também que uma pessoa, que, coitada, é pobre e se farta de trabalhar, seja liquidada,…

Entretanto, reassumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente: - Sr.ª Deputada, o tempo de que dispunha terminou.

A Oradora: - … porque, se calhar, falta-lhe inteligência!… Digo isto com ironia, porque é também uma ideia veiculada pelo neoliberalismo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Disse o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça que esta proposta de lei foi devidamente ponderada. Ora, a perspectiva de ligação deste texto jurídico, como aparece no articulado, com a realidade social e económica, do meu ponto de vista, é completamente errada.
Por exemplo, a forma como se trata a diferença entre activos e passivos como critério de verdade é formal e juridicamente aceitável, mas é um erro completo para avaliar da situação económica da empresa e muito menos da sua rendibilidade. Isto é um erro de palmatória, logo na concepção básica do projecto.
Portanto, a empresa pode ter solvabilidade e não ter futuro do ponto de vista económico, pode não estar solvente e ter rendibilidade - é algo que o projecto ignora completamente. Este enfoque é claramente errado.
Por outro lado, há um claro desprezo pelos processos sérios de recuperação - o alongamento do número de artigos apenas esconde a forma como se dificultam no texto da lei os processos sérios de recuperação! - e não há uma consideração correcta de planos para protecção efectiva dos trabalhadores.

A Sr.ª Isilda Pegado (PSD): - Leia a lei!

O Orador: - Importa sublinhar que os trabalhadores não devem ser considerados como mercadoria, pelo que esta fusão de uma lei que trata efectivamente da questão da insolvência das pessoas singulares e da insolvência das pessoas colectivas é um erro de base, é um erro ideológico, como aqui já foi referido.
No fundo, a proposta é clara. Prevê, em primeiro lugar, a liquidação do património dos devedores considerados insolventes e, secundariamente, a satisfação dos credores num plano de insolvência.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Na minha perspectiva, o diploma proposto piora a actual situação, contribuindo, aliás, para a deterioração da situação económica nacional, já bastante deteriorada pela acção do actual Governo. Esta proposta, a ser aprovada, agudizará, pois, o desemprego, poderá liquidar empresas eventualmente viáveis e não salvaguarda devidamente os direitos dos trabalhadores.
Como já referimos, misturar indevidamente os processos de sobreendividamento das pessoas singular e das empresas é, de facto, um erro político e de base grave.
Quanto a nós, preparámos um projecto de lei sobre a prevenção e o tratamento do sobreendividamento das pessoas singulares, que foi entregue na Mesa, que trata das pessoas como pessoas, como seres humanos,…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … e não apenas como equiparadas a empresas, como unidades de produção de riqueza, como unidades de produção do lucro que, se não produzem, devem ser tratadas como empresas falidas, que é a proposta dominante na ideologia com que o Governo apresenta aqui este texto.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, a nossa perspectiva é outra: queremos tratar as empresas como empresas, como unidades capazes efectivamente de produzir riqueza para os seus trabalhadores, para os seus accionistas, para a comunidade, e as pessoas como pessoas.
O Governo fugiu a isto, dentro de uma concepção ideológica claramente ultrapassada nos tempos de hoje em qualquer país civilizado do mundo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É verdade!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, não há mais inscrições…

O Sr. António Costa (PS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Sr.ª Presidente, já que o debate não se encerra hoje do ponto de vista da votação e tendo o Sr. Presidente anunciado que, para além da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, a proposta de lei vai baixar à Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, para efeito de audição das organizações sindicais, creio que seria útil que este diploma também pudesse baixar à Comissão de Economia e Finanças,…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … visto que esta matéria da legislação sobre falências tem uma grande incidência no funcionamento da nossa economia.

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Creio que não haverá prejuízo para o trânsito legislativo que, já que tem de baixar a duas comissões, baixe a três, visto que há ainda o processo de consulta pública a que vai ter de ser sujeita, e creio que seria vantajoso para o nosso trabalho parlamentar que a Comissão de Economia e Finanças também pudesse ter uma intervenção nesta matéria.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Nenhum grupo parlamentar deseja pronunciar-se sobre esta hipótese?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr.ª Presidente, se a Mesa pergunta, o PSD pronuncia-se. Contudo, não queria pronunciar-me, porque penso, em primeiro lugar, que essa decisão é competência exclusiva da Mesa e, em segundo lugar, é uma situação perfeitamente ultrapassada, porque a baixa às comissões é deliberada pela presidência aquando da entrada dos diplomas na Mesa e, do meu ponto de vista, não faz qualquer sentido que, a meio do processo, o diploma baixe a mais uma, duas, três ou quatro comissões.
Ainda por cima, há aqui uma contradição quase insanável. Ainda há pouco, ouvíamos a bancada do Partido Socialista, e com razão!, à qual o PSD se associou, chamar a atenção de que, mesmo para a consulta pública, porventura, não faria muito sentido baixar à 8.ª Comissão, uma vez que todo o processo tinha sido conduzido, até ao momento, na 1.ª Comissão. Agora, vem o Partido Socialista dizer que não só não quer concentrar o processo numa comissão como o quer abrir a outra comissão.
Sr.ª Presidente, para nós, a questão continua apenas a ser uma: a da celeridade legislativa e da utilidade prática no processo legislativo. Este processo legislativo entrou em tempo aqui, na Assembleia, que, politicamente, o deve ultimar e votar até ao final da presente sessão legislativa. Desde que tudo possa ser feito para que isto seja cumprido, o Partido Social Democrata não levantará qualquer obstáculo apenas por levantar.
No entanto, não percebo a lógica de fazer baixar, a meio do processo, à Comissão de Economia e Finanças, sendo certo que, se há Deputados do Partido Socialista (o que considero perfeitamente legítimo) que não sejam da 1.ª Comissão, mas da 5.ª Comissão, e tenham interesse em participar nesse debate, seguramente que a Sr.ª Presidente da 1.ª Comissão tem as portas abertas dessa para qualquer reunião com qualquer Sr. Deputado.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, é claro que esta é uma competência da Mesa, mas a Mesa também pode perguntar aos grupos parlamentares qual é o entendimento que têm sobre a questão.
Se houvesse um amplo entendimento no sentido de que os diplomas baixassem a mais uma comissão, a Mesa acederia. Contudo, foram levantadas objecções - embora, evidentemente, deixando à Mesa a possibilidade de decidir, como é seu direito e dever -, pelo que mantemos a decisão tomada há pouco pelo Sr. Presidente, de baixa às 1.ª e 8.ª Comissões.
Tem, ainda, a palavra, para uma intervenção, beneficiando de tempo cedido pelo PSD, o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Foram feitas algumas observações e alguns comentários sobre a presente proposta de lei que gostaria de comentar e tentar explicar um pouco melhor a esta Câmara, porque dá-me a impressão de que os propósitos do Governo nesta matéria não terão sido inteiramente bem compreendidos, sobretudo pelos Srs. Deputados da oposição.
Ouvi aqui coisas apocalípticas, designadamente por parte do Sr. Deputado António Costa, que, com a autoridade muito particular que lhe advém de excelente legista que é - e já foi classificado de melhor Ministro da Justiça desde o tempo de D. Maria I! -, qualificou esta proposta de lei de muito má.
É claro que aconselharia os Srs. Deputados, sobretudo os que se encontram sentados na primeira fila da bancada do Partido Socialista, a consultarem um médico de otorrinolaringologia. Os senhores estão com um problema de ouvido!
Há lá fora 10 milhões de portugueses que consideram que a actual situação das falências é péssima.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não é a situação que é má! A proposta é que é má!

O Orador: - Os senhores consideram que não, que a situação das falências é boa e se deve manter! Há lá fora centenas de milhares de empresários que consideram que a situação das falências é péssima, mas os senhores consideram que não, que a situação das falências é muito boa! Há uma sociedade que, do ponto de vista económico, funciona neste momento mal, mas os senhores consideram que não, que está a funcionar muito bem!
Por outro lado, não posso deixar de me referir, em termos mais específicos, aos comentários tecidos sobre a solução que foi encontrada de insolvência para os particulares.
Sr.as e Srs. Deputados, a solução que o Governo propugna nesta proposta de lei para os particulares é uma solução infinitamente melhor do que aquela que actualmente existe.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não diga asneiras!

O Orador: - Não quero ensinar nada aos Srs. Deputados, mas, como sabem, a possibilidade das execuções e das insolvências já existe e está na lei e aquilo que esta proposta de lei permite, precisamente, é que alguém faça o balanço e o recenseio da totalidade das suas dívidas a terceiros e resolva de uma vez a sua situação, conseguindo uma exoneração do passivo restante daquilo que não lhe for possível pagar. É uma solução legislativa que, além de extremamente inovadora, é extremamente boa!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - É muito melhor que a anterior!

O Orador: - Custa-me até a aceitar, Srs. Deputados, para lhes ser inteiramente franco, que soluções desta natureza não sejam pelo menos acolhidas com um espírito mais aberto à discussão e mais propício a procurar, eventualmente, no decreto-lei habilitado, soluções que poderiam acolher, aqui ou acolá, um retoque que só pode melhorar.

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Os Srs. Deputados da oposição vieram aqui dizer coisas tremendas sobre uma proposta de lei que, claramente, melhora muito a situação actual, que é uma situação - essa sim - desastrosa, como é reconhecidamente dito por todos os intervenientes no sector.
Toda a gente diz que a situação das falências necessita de remédio. O Governo traz aqui uma proposta de remédio e os senhores, pelos vistos, consideram que a situação está óptima. Muito bem! É para isso que servem as maiorias, é para isso que servem as votações. VV. Ex.as exprimem o vosso ponto de vista. Muito daquilo que é dito (que merece sempre ser ouvido, como é evidente) colherá, eventualmente, algum eco, mas quero dizer-lhes que o tom geral da intervenção dos Deputados da oposição, sinceramente, não é de todo em todo construtivo.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - É o costume!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - O vosso projecto é que é destrutivo!

O Orador: - No que diz respeito ao problema particular colocado em relação aos tribunais de comércio, gostava de dizer o seguinte: os tribunais de comércio são reconhecidamente o meio mais rápido para decidir este tipo de processos e de casos. A média de decisão de um caso num tribunal de comércio é da ordem dos 10 meses e num tribunal comum é da ordem dos 20 meses.
A pergunta que me foi colocada por dois Srs. Deputados é no sentido de saber se temos a perspectiva da sobrelotação (julgo que foi assim que o Sr. Deputado Osvaldo Castro lhe chamou) que esta legislação vai originar nos actuais tribunais de comércio. Temos! Temos plena consciência de que só há dois tribunais de comércio.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Então, vão criar mais!

O Orador: - Portanto, o Governo tem a intenção de proceder à criação cautelosa e vagarosa, porque cautelosa, de mais tribunais de comércio,…

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Finalmente, uma boa notícia!

O Orador: - … estando a encarar a criação necessária de vários no conjunto do País e tendo, designadamente, já encarado a criação de um possivelmente no distrito de Aveiro,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Em Coimbra, em Viseu…

O Orador: - … entre outras medidas que prevê.
Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, esta é uma boa proposta de lei, que deve merecer a vossa aprovação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Deputado António Costa pediu a palavra para defesa da consideração da bancada.
Pode fazer o favor de especificar o motivo do seu agravo?

O Sr. António Costa (PS): - Sr.ª Presidente, sentimo-nos ofendidos pelas referências do Sr. Secretário de Estado ao nosso estado de saúde.

Risos.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra.

O Sr. António Costa (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, o facto de uma pessoa lhe dizer que o remédio proposto não é bom não significa que seja fã da doença. Entendemos que a situação actual é má e gostaríamos que houvesse um remédio, e que fosse bom.
Como o Sr. Secretário de Estado sabe, já era essa a nossa opinião e, por isso, quando cessámos funções, estávamos a trabalhar para encontrar um remédio. Havia um grupo de trabalho do conselho consultivo, integrando parceiros sociais e diversos especialistas em Economia e em Direito, para elaborar um novo modelo.
Ora, as coisas foram como foram e o novo modelo não foi elaborado. Entendemos que a legislação deve ser mudada, mas para melhor.
Vejamos o que quero dizer com isto.
Como o Sr. Secretário de Estado sabe, há dois grandes modelos de intervenção nesta matéria: um modelo que privilegia a liquidação do ente empresarial e um outro que diferencia as situações de liquidação das situações de recuperação, em função de realidades de natureza económica que distinguem o que os economistas consideram falência financeira e falência económica.
Quando se trata de falência económica, deve-se avançar para a liquidação. Quando se trata de uma situação de insolvência, deve-se avançar para a recuperação. Este é o primeiro problema, e que os senhores resolvem mal.
Os senhores desprezam a possibilidade de recuperação e, com este novo código, têm um único objectivo, que é a liquidação. É uma opção errada. Aliás, é uma opção que se revelou errada em todas as legislações em que vigorou, tendo sido afastada, e, desde logo, foi considerada errada na legislação dos EUA, país cuja legislação sobre esta matéria é a melhor que existe e na qual há uma clara diferenciação entre as modalidades tratadas nos respectivos Capítulo VII e XI.
O segundo problema é o da celeridade.
A celeridade exige que existam mecanismos de alerta e, para melhorar a situação actual, é essencial estabelecer mecanismos de alerta obrigatória para as entidades públicas que estão em condições de o fazer, designadamente as entidades da segurança social e do fisco, que são as primeiras a detectar a existência de situações de incumprimento no pagamento das obrigações.
Passo ao terceiro problema fundamental.
Devemos tratar nos tribunais o que tem natureza litigiosa e que é questão jurídica. Devemos tratar fora do tribunal, desjudicializando-as, questões que são técnicas e para cuja resolução o tribunal é um espaço inadequado.

A Sr.ª Isilda Pegado (PSD): - É isso que vamos fazer!

O Orador: - Por isso, é pena terem abandonado algo que constava, e bem, no primeiro projecto que colocaram em discussão pública, que era a existência de uma entidade extra-judicial que fizesse a análise prévia da situação e encaminhasse esta para o destino correcto, a recuperação ou a liquidação.

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No caso de o destino ser a liquidação, a questão deve ser encaminhada judicialmente, não precisa de legislação própria, deve ser-lhe dado o mesmo tratamento que a liquidação de património, em sede de acção executiva.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado António Costa…

O Orador: - Vou já terminar, Sr.ª Presidente.
Se a situação da empresa for irrecuperável, então, deve ter um outro tratamento extra-judicial. É que, com certeza, todos estamos de acordo em que o tribunal não é a entidade adequada para acompanhar, determinar e aprovar planos de recuperação de empresas, o que extravasa o âmbito da própria intervenção do tribunal.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, tenho estado a ouvi-lo e a tentar discernir quais são as suas palavras de defesa da consideração da bancada, mas não consigo…

Risos.

O Orador: - Vou mesmo terminar, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Mas termine mesmo, se faz favor.

O Orador: - Portanto, Sr. Secretário de Estado, se quiser contar connosco para encontrar um bom remédio, estamos disponíveis e trabalharemos nesse sentido. Se quer um mau remédio, pela nossa parte, não queremos nem a doença nem o mau remédio, queremos é um bom remédio, e creio que se o Sr. Secretário de Estado e o Governo quiserem poderão encontrá-lo.
Se querem legislar desta forma, paciência! É uma opção exclusivamente vossa.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder nos mesmos termos, não, obviamente, para dar explicações, porque não houve defesa da consideração da bancada, e com o mesmo tempo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Costa, verifico que numa coisa estamos de acordo: há um problema!

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - Noutra coisa também estamos de acordo: é preciso um remédio!

O Sr. António Costa (PS): - É! Estamos de acordo!

O Orador: - Mas VV. Ex.as vão permitir-me que ponha em causa, já não a vossa saúde, que verifico ser excelente, mas os vossos dotes farmacêuticos. É que VV. Ex.as andaram seis anos à procura de um remédio e não encontraram nenhum!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E este Governo, no espaço de um ano,…

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Inventou uma droga venenosa!

O Orador: - … compreendendo o clamor que existe sobre esta matéria, estudou e propôs uma legislação que é, seguramente, um bom remédio. E vou dizer-lhe porquê, Sr. Deputado, independentemente de outros remédios que houvesse.
Quando existe um problema e quando uma ferida está aberta, este remédio tem, pelo menos, o mérito da velocidade, o mérito da rapidez, o mérito de atalhar um problema que existe.
Mas não é só esse o mérito.
Se o Sr. Deputado, com um mínimo de bondade de análise, quiser ver o que esta proposta de lei efectivamente propõe - e pondo de lado as parangonas e as demagogias -, verificará que tem muito de bom. Este diploma tem alguns pontos polémicos, mas tem muitos inovadores.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Regressou ao Código do Processo Civil de 1939!

O Orador: - Mas, olhe, Sr. Deputado, nunca vi fazer nada suficientemente bom que não tivesse algo de polémico e de inovador, e o Sr. Deputado sabe-o tão bem quanto eu próprio.
Portanto, quero dizer-lhe que agradeço as lições, sobretudo as lições de gestão de empresas que os Srs. Deputados do Partido Socialista tiveram a amabilidade de dar-nos e em que, consabidamente, são especialistas. Agradeço-vos, pois, as lições.
Quero dizer-lhe que partilho inteiramente o que disse o Sr. Deputado. Ou seja, se há possibilidade de discutir com seriedade o remédio proposto pelo Governo e melhorá-lo, agradecemos todos os contributos. Mas, Sr. Deputado, não foi esse o discurso que, hoje, aqui ouvi por parte do Partido Socialista. Antes ouvi um discurso de completa desqualificação da proposta de lei, o qual, confesso, não me agradou e, sobretudo, não me pareceu construtivo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, está encerrado o debate conjunto, na generalidade, da proposta de lei n.º 50/IX e do projecto de lei n.º 273/IX (BE).
Vamos iniciar a apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 52/IX - Autoriza o Governo a fixar as condições de idoneidade e as incompatibilidades que condicionam o acesso e o exercício da actividade de inspecção técnica de veículos a motor e seus reboques.
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Nuno Magalhães): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei n.° 52/IX, hoje apresentada pelo Governo à Assembleia da República, vem de encontro ao previsto no Programa do Governo que, no âmbito da Administração Interna, preconiza a elaboração e execução de uma estratégia global e conjugada entre todos os sectores da Administração Pública e da sociedade civil, de forma a

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reduzir drasticamente os números da sinistralidade em Portugal.
Neste contexto, no passado dia 1 de Março, o Governo, com a presença de S. Ex.ª o Sr. Primeiro-Ministro (testemunhando o particular empenhamento existente nesta área), apresentou o primeiro Plano Nacional de Prevenção Rodoviária que, de forma plurianual e multidisciplinar, prevê a realização de um conjunto de medidas e acções de carácter técnico, com vista à redução gradual, progressiva e sustentada da sinistralidade em cerca de 50% de vítimas mortais e feridos graves até ao ano 2010, conforme proposta da Comissão Europeia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este conjunto de acções assume um carácter transversal e abrangente a todas as áreas que, directa ou indirectamente, estão relacionadas com a sinistralidade, preconizando um conjunto de medidas legislativas, administrativas e operacionais nas diferentes áreas identificadas.
É, pois, na estrita execução do Programa do Governo e do Plano Nacional de Prevenção Rodoviária que, hoje, o Governo solicita autorização legislativa para fixar as condições de inidoneidade e incompatibilidades que condicionam o exercício da actividade de inspector para a inspecção técnica de veículos a motor e seus reboques.
Na verdade, importa criar um conjunto de condições que permitam que, também no sector das inspecções (actividade fundamental para garantir um ambiente rodoviário seguro enquanto uma das áreas estruturantes identificadas no Plano Nacional de Prevenção Rodoviária), Portugal possa dar um salto qualitativo que se exige, contribuindo para a criação de um sector mais forte, mais preparado, mais competitivo e mais transparente.
Trata-se de um esforço para e com o sector (e não contra ele), razão pela qual contámos, para a elaboração do diploma que ora apresentamos a VV. Ex.as, com a participação activa e interessada das diversas associações, nomeadamente com a audição prévia da Associação Nacional dos Centros de Inspecção Automóvel, a Associação Nacional de Técnicos de Inspecção de Veículos e o Agrupamento Nacional de Inspecções Automóveis.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 550/99, de 15 de Dezembro, que veio consagrar o novo regime das inspecções técnicas de veículos a motor e seus reboques, tornou-se indispensável estabelecer as condições de licenciamento dos inspectores, para realização, não só das inspecções periódicas às quais todos estamos habituados, mas também das inspecções extraordinárias, já que este diploma prevê a sujeição dos veículos a este tipo de inspecções técnicas.
Considerando que estão decorridos mais de três anos sobre a entrada em vigor do referido Decreto-Lei, importa dar cumprimento ao estipulado no artigo 34.°, n.° 2, que, por razões diversas que não serão importantes discutir neste momento, não foi possível serem fixadas pelo anterior Governo.
Assim, importa definir as condições de acesso, de formação e de avaliação dos inspectores, bem como a validade das suas licenças, para além da necessária actualização para efeitos da sua revalidação.
Considerando que, para este Governo, é fundamental assegurar uma formação de elevada qualidade, por forma a permitir uma adequada qualificação dos inspectores de veículos; considerando, ainda, que é nossa preocupação assegurar a competência, isenção e imparcialidade desta actividade (indo de encontro às legítimas preocupações do sector, bem como dos utilizadores que, no fundo, somos todos nós); torna-se necessário definir, através de diploma legal, um conjunto de incompatibilidades e inidoneidades no exercício desta actividade, atento o interesse público que reveste.
Neste esforço (esclareça-se) não nos move qualquer pré-conceito ou preconceito em relação a nada nem a ninguém, mas tão-só a firme vontade de, em conjunto com as associações representativas do sector, estabelecer regras que permitam um eficaz e transparente exercício desta actividade.
Neste contexto, atenta a importância do diploma ora em discussão e o facto de estabelecer um conjunto de limitações ao exercício de uma actividade profissional no estrito cumprimento da lei, o Governo entendeu tratar-se de matéria da reserva de competência legislativa da Assembleia da República, testemunhando o seu desejo de, neste desafio nacional (que é de todos), submeter a presente proposta de lei de autorização à justa apreciação de VV. Ex.as.
Assim, e de forma muito sucinta, porquanto o tempo escasseia, o Governo, através da presente proposta de lei, solicita autorização para legislar.
Primeiro, em matéria de inidoneidades, no sentido de declarar inidóneos todos aqueles que estejam proibidos do exercício da actividade de inspecção técnica de veículos, bem como os que tenham sido judicialmente declarados delinquentes por tendência, com base em sentenças transitadas em julgado.
Segundo, e em matéria de incompatibilidades, definir um conjunto de regras inibidoras do exercício da actividade, nomeadamente quando sejam proprietários, sócios, gerentes ou administradores das entidades autorizadas em cujos centros de inspecção exerçam a actividade de inspecção de veículos, proprietários, sócios, gerentes, administradores ou trabalhadores de empresas transportadoras, proprietários, sócios, gerentes, administradores ou trabalhadores de empresas que se dediquem ao fabrico, importação, comercialização ou reparação de veículos a motor e seus reboques, bem como de equipamentos para os mesmos. Finalmente, e ainda, quando sejam inspectores dos veículos dos quais sejam proprietários, locatários ou usufrutuários.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos certos que, neste esforço, através da aprovação por esta Assembleia da presente proposta de lei, contamos com todos vós para que Portugal possa dar um passo importante nesta matéria, de forma a que, de Norte a Sul e também nas Ilhas, possamos ter inspectores mais qualificados, mais preparados e com melhores condições para, de uma forma clara e transparente, exercerem as suas funções e, desta forma, ajudar a atingir os objectivos propostos no Plano Nacional de Prevenção Rodoviária, objectivo que, mais do que uma mera meta de convergência com a União Europeia, deve constituir um desafio nacional para o qual todos devem sentir-se convocados.
É esta a firme convicção do Governo e é esta a única motivação que nos move.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

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O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, os meus cumprimentos por esta exposição de motivos. Vou ser breve. O assunto é importante, mas a hora é adiantada.
Sr. Secretário de Estado, relativamente a esta actividade, que se insere claramente no Plano Nacional de Segurança Rodoviária, começo por perguntar-lhe quais são os cálculos do Ministério quanto ao número de detentores de certificados que aproveitarão o período de seis meses previsto para passarem a inspectores de classe B.
Em segundo lugar, pergunto se se prevê que, imediatamente após o esgotamento daquele prazo, comecem os cursos de capacitação para inspectores de classe C.
Finalmente, há um conceito que não está muito bem materializado na proposta de lei, o conceito de nova matrícula. Assim, gostaria que nos dissesse se o que está previsto se refere a medidas de antecipação do novo sistema de matrículas, como vem sendo tratado nos meios da especialidade.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia, antes de mais, quero saudá-lo.
Fez três perguntas muito concretas às quais, devido ao adiantado da hora, procurarei dar respostas muito breves.
Quanto à primeira questão, e dado tratar-se de uma matéria que depende da vontade dos inspectores, embora, obviamente, o Ministério saiba que ela existe e até de uma forma pressionante, como, aliás, o testemunham as próprias notícias, devo dizer que a esmagadora maioria dos inspectores irão requerer e procurar obter a licença tipo B. Neste momento, existem 900 inspectores, dos quais cremos que uma percentagem muitíssimo significativa irá requerer essa mesma licença.
A este propósito, embora não tenha feito a pergunta, aproveito para complementar a informação, dizendo, relativamente aos inspectores de classe C, que o seu número deverá rondar 100, porquanto, neste momento, existem 50 centros autorizados para este tipo de inspecções.
Quanto ao início dos cursos, já temos conhecimento de várias entidades interessadas na matéria, algumas das quais já se candidataram, e, portanto, a muito curto prazo, os cursos irão ter o seu início.
Por fim, relativamente à questão da especificação do conceito de nova matrícula, também tem a ver indirectamente com essa questão do novo modelo que será necessário estabelecer na matéria. No entanto, neste caso concreto, tem a ver, sobretudo, com inspecções destinadas a veículos que nunca tiveram matrícula nacional, nomeadamente veículos importados, do corpo diplomático, do Exército, etc.
São estes os esclarecimentos que queria dar, agradecendo não só as suas palavras amáveis como também as suas perguntas concretas e concisas, como é seu hábito formular.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Rodrigues.

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, Sr.as e Srs. Deputados: Está hoje em debate a proposta de lei que visa autorizar o Governo a fixar as condições de idoneidade e as incompatibilidades que condicionam o acesso e o exercício da actividade de inspecção técnica de veículos a motor e seus reboques.
A regulação e o enquadramento legal da actividade de inspecção deram o seu primeiro passo através do Decreto-Lei n.º 154/85, onde se instaurou o regime de concessão. Na prática, este diploma não teve qualquer consequência, tendo como sequência outro decreto (o Decreto-Lei n.º 352/89), que também acabou por não ser aplicado.
Efectivamente, só em 1992, e através do Decreto-Lei n.º 254/92, de 20 de Novembro, assistimos à primeira verdadeira regulação desta actividade. No seguimento desta legislação mais adequada, surgiram os primeiros centros de inspecção que, rapidamente, se multiplicaram, respondendo às exigências do mercado. Esta profusão de empresas a exercer a actividade acima definida, associada à evolução acelerada das características técnicas dos veículos, despertaram a real necessidade de as empresas que actuam nesta área se apetrecharem e adoptarem novas práticas de bem fazer e novos métodos de trabalho.
Esta nova realidade, com alterações ao nível tecnológico, ao nível da qualificação dos recursos humanos, ao nível da qualidade de serviço e ao nível das capacidades financeiras das empresas, teve como consequência a indispensabilidade de criação de legislação que clarificasse o acesso a esta actividade, a sua fiscalização e o respectivo quadro sancionatório das infracções.
É desta forma que surge o Decreto-Lei n.º 550/99, de 15 de Dezembro, e o Decreto-Lei n.º 554/99, de 16 de Dezembro, cumprindo este último a transposição da Directiva 96/96/CE, do Conselho, alterada pela Directiva 1999/52/CE, da Comissão, para a ordem jurídica interna.
Passados quatro anos da data da promulgação dos Decretos-Leis atrás referenciados, e analisando o panorama actual desta actividade, é possível concluir que os objectivos dos referidos Decretos-Leis não estão a ser totalmente cumpridos, uma vez que subsiste a necessidade de aprimorar alguns factores e salvaguardar algumas acrescidas exigências inerentes a esta actividade.
Tem de ser reconhecido o objectivo, quer da Directiva comunitária, quer dos Decretos-Leis que enquadram a respectiva transposição, de regular eficazmente, com implicações óbvias e directas na segurança rodoviária e na protecção ambiental.
No entanto, e independentemente da bondade do objectivo, subsistem algumas lacunas no instrumento legal, que implicam o não cumprimento integral do referido objectivo.
É com esta perspectiva, de dotar a nossa ordem jurídica de um complemento importante e corrigir eventuais lacunas existentes, que surge a proposta de lei n.º 52/IX. Concretamente, esta proposta de diploma incide sobre dois aspectos: primeiro, a definição mais clara e criteriosa das incompatibilidades no desempenho da actividade de inspecção; segundo, o estabelecimento das condições necessárias à emissão de licenças de inspector e a fixação das condições de reconhecimento dos cursos de formação profissional.
Neste segundo ponto, importa ainda destacar, de forma genérica, as relevantes alterações que são introduzidas: a definição de quatro tipos de licenças de inspector, atendendo

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quer ao tipo de inspecção quer ao tipo de veículo; a regulação e o estabelecimento de novas exigências no que diz respeito à formação e subsequente certificação; e, finalmente, novas disposições no que se refere ao aspecto da renovação das licenças.
Da leitura da proposta de lei é fácil depreender a inegável importância destas pormenorizações: são óbvias as preocupações em clarificar e dignificar esta actividade; afastam potenciais dúvidas acerca da postura destes intervenientes; acentuam a credibilização de uma actividade que se quer ainda mais isenta e transparente, garantindo os benefícios e mais-valias decorrentes da mesma.
Efectivamente, aprovando esta proposta de lei, fica o nosso quadro legal habilitado a regular, de forma efectiva, esta actividade. Existem notórias melhorias e foram feitos aditamentos indispensáveis.
Ao fim e ao cabo, com a aprovação desta proposta de diploma, estamos a dar um passo qualitativo muito positivo. Esta é uma das nossas funções e dela devemos estar todos orgulhosos, nomeadamente quem propõe: melhorar o que existe. Somos obrigados a adoptar uma atitude progressista, de melhoria contínua e evolução positiva. E se há governo que tem lutado contra qualquer tipo de postura imobilista e de cobarde conformismo tem sido, de facto, este Governo PSD/CDS-PP.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Baltazar.

O Sr. Nelson Baltazar (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há cerca de dois meses, tive a oportunidade de assistir, num colóquio sobre segurança rodoviária, à intervenção de um acreditado comunicador europeu, portanto, da nossa Europa, que dizia exactamente isto: se tirássemos a sinistralidade portuguesa das estatísticas, a esperança de vida em Portugal era idêntica à esperança de vida na Suécia. Quer isto dizer o quê? Essencialmente que, devido à sinistralidade registada em Portugal, que é realmente um problema grave ao qual temos de dar muita atenção, são ceifadas muitas vidas jovens - e isto porque, como todos sabemos (e temos discutido este assunto várias vezes), a mortalidade incide muito sobre os veículos de duas rodas e também sobre veículos antigos, veículos com poucas condições de circulação.
É nessa base do combate à sinistralidade automóvel - e sei-o agora porque o Sr. Secretário de Estado aqui o referiu - que surge este documento como um documento importante também nesse combate. Além dos problemas de ordem comportamental, que temos de combater, da falta de civismo e do sistemático incumprimento do Código da Estrada, as deficiências técnicas dos veículos, em particular ao nível dos seus parâmetros fundamentais de segurança, contribuem, de forma clara, para os números negros da sinistralidade nas nossas estradas.
As estatísticas, ao longo dos anos, têm demonstrado que quer o número de acidentes quer o índice de mortalidade e também o número de feridos, felizmente, têm descido muito em Portugal. E também verificamos que eles têm descido bastante após a aplicação de algumas medidas essenciais, concretamente a das inspecções aos veículos, que aqui nos é trazida. Isto são verdades inalienáveis e que vale a pena continuar a perseguir.
Neste último aspecto, a inspecção a viaturas que foi tentada, em Maio de 1985, falhou; em Outubro de 1989, voltou a falhar, sendo reposta em Novembro de 1992. Nessa altura, as tais empresas, já aqui referidas, assumem-se como concessionárias da inspecção destas viaturas.
A crescente tecnicidade dos veículos levou naturalmente a uma também necessária e crescente tecnicidade dos equipamentos, que têm de estar adstritos a estas inspecções. Daí também a necessidade (com carácter obrigatório) de exigirmos maior rigor na formação e na actualização técnica dos inspectores e a obrigatoriedade da presença de um responsável técnico em cada um dos centros de inspecção, como também já está vertido em lei. Mais ainda, depois de 1999, quando surge não só o diploma, já aqui referido, para as inspecções técnicas, por parte do governo, mas também a directiva comunitária que valida o controlo técnico de viaturas de uma forma muito mais exigente do que aquela que tínhamos até esse momento.
Portanto, a apreciação do Partido Socialista nesta matéria vem ao encontro daquilo que é a vontade do Governo. Assim, esta proposta, aqui apresentada enquanto proposta de lei, contém termos muito técnicos, naturalmente especifica conceitos e formata a credenciação profissional, que é uma questão essencial.
É um diploma difícil, não tanto do ponto de vista jurídico mas essencialmente porque é um diploma técnico, mas é também um diploma político, um diploma político no sentido positivo. Efectivamente, ao contrário daquele que, ontem, discutimos neste Plenário, este é um diploma político no sentido positivo, porque vem ao encontro daquilo que o Sr. Secretário de Estado já referiu e que nós dissemos e defendemos aqui ontem, que é a qualificação dos profissionais, a certificação profissional e a melhoria da qualidade técnica prestada a este nível, de forma a podermos combater tudo o que já referimos.
Relativamente ao diploma, Sr. Secretário de Estado, quero deixar algumas questões no ar, que são de somenos importância, algumas até técnicas, mas às quais talvez ainda possa responder, e dizer o seguinte: no artigo 4.º, prevê-se que caiba ao Director-Geral de Viação, por despacho, aprovar o Manual de Licenciamento Profissional, que consideramos extremamente importante, "(…) contendo a descrição dos procedimentos relativos à apresentação e avaliação das candidaturas, (…)". Fica a dúvida quanto ao estado de elaboração deste Manual, porque o diploma prevê um prazo de 120 dias, após a publicação, para começar a fazer a credenciação profissional. Tanto mais que é neste Manual que se vai regulamentar e validar as licenças profissionais, o âmbito das respectivas validações e o acompanhamento da formação que é necessária para estes profissionais. E se, como aqui foi dito pelo Sr. Secretário de Estado, já foram ouvidos os parceiros sociais deste sector, considero (e gostaria de saber se assim também entende) que também estas entidades deverão ser consultadas para a execução deste Manual. Portanto, há aqui, se calhar, pouco tempo para abordar estes assuntos, mas gostaria de saber em que pé está e qual é a dinâmica existente para a elaboração deste Manual, central para a credenciação dos profissionais.
No artigo 11.º, n.º 2, definem-se incompatibilidades no exercício da função de inspector. Prevê-se que os inspectores estão impedidos de "Ser proprietários, sócios, gerentes ou administradores das entidades autorizadas, (…)", mas apenas, tanto quanto consegui ler, nos centros de inspecção em que exercem a actividade de inspecção. Não

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seria de ponderar, Sr. Secretário de Estado, que o regime de incompatibilidades dos inspectores se alargasse a todos os centros de inspecção? Isto, aliás, na sequência daquilo que são as restantes regras de incompatibilidades propostas pelo Governo neste documento. É uma questão que, penso, poderemos ponderar, temos tempo para a afinar, e eventualmente também ouvir os parceiros sociais.
Termino, Sr. Secretário de Estado, com um pequeno pormenor, muito pequeno mas que, se calhar, daqui para a frente, começa a ser importante: no diploma, dever-se-ia substituir o termo "Comunidade Europeia" por "União Europeia".

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem observado!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de diploma que é presente a esta Câmara, e em que o Parlamento é solicitado a autorizar o Governo a legislar, visa estabelecer as condições de emissão de licenças de inspector para o exercício da actividade profissional de inspecção técnica de veículos a motor e seus reboques e fixar as condições de reconhecimento dos cursos de formação profissional, necessários à obtenção e renovação das referidas licenças.
Por conter matéria relativa a idoneidades e a incompatibilidades, situa-se na reserva de competência legislativa da Assembleia da República, razão pela qual realizamos hoje este debate.
Este diploma visa regular alguns aspectos do Decreto-Lei n.º 550/99, de 15 de Dezembro, estando em vigor, neste momento e nesses domínios, o normativo de 1992 (Decreto-Lei n.º 254/92, que foi substituído por aquele decreto-lei de 1999).
O diploma que nos é proposto pretende dar satisfação a normativos europeus e a novas necessidades, designadamente a inspecções extraordinárias e a inspecções para novas matrículas - e aqui registo, Sr. Secretário de Estado, a resposta que me deu há momentos, que me elucidou, e reitero a importância de ser bastante duro nas inspecções aos veículos importados em segunda mão, entre os quais, infelizmente, temos presentes na nossa memória alguns casos de veículos que foram importados em muito más condições.
Trata-se, pois, de um texto indispensável para completar o edifício legislativo nacional em matéria tão sensível como a das inspecções técnicas a veículos, em que a transparência deve imperar. Por isso, e desde logo, saudamos o alargamento do regime de incompatibilidades, em nome dessa mesma transparência.
Apesar de a linguagem utilizada no diploma, como já há pouco aqui foi referido, ser muito técnica, quase necessitando, por vezes, de ser desencriptada ou descodificada, parece-nos muito importante neste diploma realçar, ainda, alguns factos, que são os seguintes: estarem previstos quatro tipos de licenças de inspector, cobrindo graus de exigência crescentes; que a progressão na "carreira" se faça, fundamentalmente, com base na experiência e na actualização científica e técnica; e que esteja prevista a forma como deve ser feito o reconhecimento dos cursos e a avaliação técnica.
Não podemos, ainda, esquecer de referir que se possibilita o acesso às licenças por possuidores do título profissional emitidos em Estados-membros da União Europeia e que se prevê um regime de reciprocidade em relação a países terceiros.
Do que nos foi dado estudar e consultar parece-nos um projecto tecnicamente correcto. Satisfaz a necessidade de colmatar vazios legislativos e a Direcção-Geral de Viação, na sua elaboração, contou com a colaboração do Instituto de Emprego e Formação Profissional, entidade essencial nestas questões de credenciação nacional, da Associação Nacional de Centros de Inspecção Automóvel (ANCIA), da Associação Técnica de Inspecção Periódica Obrigatória de Veículos (ATIPOV) e do Agrupamento Nacional de Inspecções Automóveis (ANIVAP-ACE) que, para o efeito, foram ouvidos, e é de bom augúrio que estejam envolvidos os mais importantes actores da concretização prática daquilo que estamos prontos a aprovar.
Se é um projecto tecnicamente correcto e visa, como objectivo final, uma actividade útil, a de reforçar a segurança da nossa circulação rodoviária - e mais uma vez o cumprimento por este esforço que está a dirigir em várias frentes -, lembramos a actividade que se tem revelado como muito positiva ao longo dos 10 últimos anos de existência, que é a das inspecções periódicas aos veículos, como já aqui foi referido, como um dos tais factores que provocou uma baixa nos parâmetros da nossa sinistralidade.
Daremos, portanto, o nosso apoio à proposta de lei n.º 52/IX e desejamos apenas, Sr. Secretário de Estado, que o normativo que dela resultar se mantenha em vigor por largos anos. Isso seria a prova de que, além de ser tecnicamente correcta e visar objectivos muito nobres, como já tive ocasião de dizer, iremos aprovar um normativo adequado. A sua adequação resulta do grau de longevidade que ela vai obter.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, Sr.as e Srs. Deputados: Como já aqui foi dito, a questão da inspecção dos veículos automóveis, dos reboques, etc., é um aspecto fundamental da segurança rodoviária até porque está directamente relacionada com a garantia de qualidade e segurança que tem de ser, efectivamente, garantida e de estar, efectivamente, presente em termos da utilização do parque automóvel nacional. Apesar da experiência, que os Srs. Deputados que já intervieram referem como importante e positiva, da última década, há, no entanto, necessidade de a aprofundar quanto ao rigor, à transparência e à clareza da actividade em termos das empresas que ocorrem e do estatuto dos seus profissionais no nosso país.
Estabelecido o quadro legal actualmente em vigor para as empresas deste sector, através do já referido Decreto-Lei n.º 550/99, continua, apesar de tudo, a faltar, e é urgente resolver esta falta, toda uma série de regulamentação actualizada e adequada para os aspectos fundamentais da carreira profissional dos técnicos de inspecção de veículos. Faltava, e continuará a faltar até se publicar o diploma, a certificação do licenciamento no ordenamento jurídico,

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do acesso e do exercício para a profissão do técnico de inspecção de veículos em apreciação neste debate, mas não podemos esquecer, não podemos ignorar, que continua a faltar o estatuto do técnico de inspecção de veículos, as carreiras profissionais e retributivas desta profissão, um código deontológico desta profissão e, não menos grave, certamente, continua a faltar um contrato colectivo de trabalho ao cabo de 11 anos de actividade, repartidos, quase fraternalmente, entre a governação PS (seis anos) e a governação PSD (cinco anos).
Há uma questão, a meu ver, central neste debate, Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados, que é a situação laboral dos trabalhadores técnicos de inspecção de veículos perante os recorrentes testemunhos de diversas formas de pressão e represálias, com mais ou menos nuances, com maior ou menor subtileza, exercidas sobre esses técnicos, sendo que, de acordo com o desabafo que muitas vezes é dado neste sector, um bom inspector é, muitas vezes, visto como um mau funcionário. Aliás, recentemente, o Sr. Secretário de Estado e vários Srs. Deputados citaram, a este respeito, a associação nacional dos técnicos de inspecção de veículos automóveis. Também já há algum tempo atrás, num fórum, num encontro de discussão e reflexão sobre este sector e a actividade neste sector, foram apresentados testemunhos e alertas sobre essas pressões e represálias no sentido de determinada actuação e do abandono de boas práticas fundamentais para garantir a qualidade e a segurança. E o Instituto do Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho, o IDICT, que se encontrava presente, apenas afirmou que não é conhecedor da actividade em profundidade e que, nessa medida, os centros de inspecção apenas representam mais empresas, sendo que a intervenção do IDICT será, desse ponto de vista, igual à que existe noutros sectores de actividade.
Assim, as coisas vão passando, vão acontecendo, e o Estado não tem dado resposta nesta matéria, e temos demasiadas situações, Sr. Secretário de Estado, de opção por uma certa estratégia comercial incompatível, claramente, com a garantia de qualidade e segurança que é fundamental nesta matéria.
Portanto, é importante relembrar que a inspecção de veículos, que é um serviço público e obrigatório, universalizado, para todo o parque automóvel, não pode ser visto como um negócio.
A este propósito, e já tendo sido aqui referida a questão das incompatibilidades em termos profissionais, do exercício dos profissionais do sector, interessa recordar neste debate, embora a questão que vou referir tenha mais a ver com o exercício por parte das empresas do sector, que o próprio Decreto-Lei n.º 550/99, no seu artigo 7.º, cuja epígrafe é "Incompatibilidades", impede, efectivamente, que as empresas se dediquem a outras matérias e objectos que não a certificação e a inspecção automóvel e que o mesmo proprietário tenha, por exemplo, uma empresa de transportes, mas não impede a existência de empresas participadas ou detidas por uma espécie de holding, e vemos, no terreno, no concreto do nosso país, isso a acontecer, o que leva a uma tendência de promiscuidade que não é saudável e que, em muitos casos, é perigosa, porque o responsável, em termos de holding e de detentor da participação, acaba por ser sempre o mesmo.
Portanto, a taxa de reprovação que existe em Portugal, que é da ordem dos 20%, seria, porventura, bem superior, em termos de parque automóvel reprovado nas inspecções, se todas as normas e as boas práticas, em termos de controlo de qualidade, fossem garantidas nesta matéria.
Logo, a questão da certificação e do licenciamento, sendo importantes, não resolvem a questão das relações laborais e das pressões a que, em termos de empresas, estão sujeitos estes técnicos de inspecção.
Uma outra questão central semelhante em alguns pontos ao diploma relativo à profissão de motorista de táxi, que ontem aqui discutimos - e, curiosamente, não foi o Sr. Secretário de Estado quem ontem aqui esteve, foi o Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, mas os Srs. Deputados que participaram nesse debate tiveram oportunidade de reflectir sobre esta matéria -, tem a ver com o problema da certificação e da formação profissional. Nesse diploma considera-se a certificação profissional desses trabalhadores como prioritária e obrigatória e aponta-se a formação profissional, até para esse objectivo, como indispensável, determinante e obrigatória, mas não se tomam as medidas de fundo necessárias para viabilizar e garantir a estrutura de formação.
O testemunho que temos, a avaliação que conhecemos, é o de que os cursos necessários à oferta formativa necessária para efectivamente garantir a qualidade e a capacidade de resposta desta formação praticamente não existem. Em Portugal, há uma entidade que intervém nesta matéria, em parceria com o IEFP, é insuficiente, no entender dos profissionais do sector, apesar de, salvo as devidas diferenças, não estarem em causa dezenas de milhar de profissionais, como no sector no táxi, mas talvez um milhar. Porém, é importante dar resposta a esta matéria, porque as competências e as capacidades que se exigem aos técnicos do sector - e são exigidas até no diploma hoje sujeito a apreciação e no projecto de decreto-lei - não são proporcionadas da forma eficaz e necessária que seria exigível, em termos de expectativas de resposta. Aliás, é importante garantir, no concreto, a adequação das temáticas de formação às necessidades reais da actividade e do sector no nosso país.
Ora, também a propósito da discussão que ontem travámos sobre o transporte do táxi, enquanto serviço público, isto leva-nos a reafirmar o nosso princípio essencial nesta matéria, que é o de que não há serviços públicos de qualidade ao serviço da população e da economia do nosso país sem a garantia da formação e dos direitos laborais dos seus trabalhadores, e a própria formação tem de ser ela mesma um serviço público. Os serviços públicos assumem-se como tal, ainda para mais um serviço como este que não só é público como também obrigatório para todos os que detém uma viatura, seja ela ligeira, pesada, etc.
Portanto, perante esta obrigatoriedade, tem de se garantir transparência, qualidade, segurança, rigor, credibilidade e isto não se faz com medidas isoladas.

Aplausos do PCP.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna: - Sr.ª Presidente, não vou responder às intervenções dos Srs. Deputados porque não foram pedidos de esclarecimento,

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mas, já agora, aproveito os poucos minutos de que ainda disponho para fazer alguns comentários muito rápidos e, sobretudo, para esclarecer a Câmara, como é meu dever, sobre alguns números.
Começo por agradecer ao Sr. Deputado Carlos Rodrigues as palavras que me dirigiu e por dizer que concordo com o teor da informação que prestou, bem como com aquilo que o Sr. Deputado Nelson Baltazar disse, sobretudo ao nível da importância que a inspecção tem para a criação de um ambiente rodoviário seguro e, desde logo, para a redução da sinistralidade.
Neste contexto, não respondendo, mas informando o Sr. Deputado Bruno Dias da necessidade de uma aposta num rigor e no reforço das acções de fiscalização, gostaria de dizer à Câmara que, de 2001 para 2002, no que toca ao número de inspecções realizadas, ocorreu um aumento de aproximadamente 13,5%, o que registo, obviamente, com agrado, significando isto mais 500 000 inspecções feitas em 2002, relativamente a 2001, e, sobretudo, uma maior atenção e um enormíssimo esforço e reforço das acções de fiscalização da DGV, que passaram de 306, em 2001, para 720, mais do dobro, em 2002, e este ano a tendência será nesse caminho. Esta será a razão pela qual o Sr. Deputado disse - e muito bem - que a taxa de reprovação, que, em 2001, era de 15%, passou, também devido ao esforço e reforço da fiscalização, para 20%, em 2002, e iremos procurar incrementar esta situação.
Relativamente às observações do Sr. Deputado Bruno Dias, quero dizer, muito rapidamente, que há, de facto, uma aposta na fiscalização, como forma de combater as situações que teve oportunidade de expor, e que tudo passa sobretudo por aí. Passa pelas leis, pelas disposições legais - obviamente que sim! -, mas é, sobretudo, pela exigência do cumprimento dessas leis, dessas disposições legais e do reforço das acções de fiscalização, e temos já este sinal, de mais do que a duplicação das acções de fiscalização. Logo, é aqui que devemos e vamos apostar.
Por último, quero assegurar ao Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia o empenho - diria mais, o empenho intransigente - do Governo nesta área para que o sector da inspecção seja de facto credível, transparente, pujante, com certeza, mas que permita um ambiente rodoviário seguro, que é o objectivo, estou certo, de todos nós.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos, dou por encerrada a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 52/IX.
Vamos agora proceder à apreciação do Orçamento Suplementar da Assembleia da República.
Para uma intervenção, na qualidade de Presidente do Conselho de Administração da Assembleia da República, tem a palavra o Sr. Deputado João Moura de Sá.

O Sr. João Moura de Sá (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Está hoje presente para discussão no Plenário desta Assembleia o Orçamento Suplementar da Assembleia da República para 2003.
Este Orçamento Suplementar reajusta os montantes totais das despesas e receitas do Orçamento da Assembleia da República para 2003, aprovado em Outubro último, sendo de destacar que, em termos quantitativos, o aumento imputado ao Orçamento decorre da integração do diferencial apurado entre a previsão do valor do saldo de gerência inscrito no Orçamento da Assembleia da República para 2003, inicial, e o efectivamente apurado. Este situou-se em 6,591 milhões de euros, dois quais 2,024 milhões de euros correspondem a encargos transitados.
O aumento da receita integra ainda 7500 euros, correspondentes a 50% da receita que a Comissão Nacional de Protecção de Dados prevê cobrar ao abrigo do disposto no artigo 42.º da Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro.
Assim sendo, passamos de um Orçamento inicial de 75,427 milhões de euros para 79,922 milhões de euros (um aumento de 6%), o que, comparativamente ao Orçamento corrigido de 2002, com um total de 83,187 milhões de euros, corresponde a um decréscimo de 4%, representando, pois, uma preocupação de contenção, que converge com os objectivos de cumprimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento e de consolidação das finanças públicas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Para além destes dois aspectos, integração do saldo e reforço orçamental da Comissão Nacional de Protecção de Dados (aliás, os únicos com reflexos no aumento da receita), o presente Orçamento procede a alguns movimentos em matéria de despesa, de que destaco: a actualização das dotações onde se registam as componentes remuneratórias, tendo em conta a actualização do salário mínimo; a actualização das subvenções, de acordo com a actualização do salário mínimo; o reajustamento das dotações de diversas rubricas, de modo a compensar os encargos assumidos em 2002 e para elas transitados em 2003; e a correcção das dotações de algumas rubricas em função da projecção da tendência verificada na execução orçamental até meados de Março de 2003.
Estes são, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, os aspectos mais relevantes que importa destacar neste Orçamento Suplementar, Orçamento que possibilitará, certamente, continuarmos a ter uma gestão rigorosa e eficiente da Assembleia da República,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … mas que permitirá, também, a procura de soluções mais modernas e inovadoras, indo ao encontro dos objectivos e anseios de quem, aos mais diversos níveis, desenvolve a sua actividade profissional na Casa da democracia portuguesa.
É para cumprir este objectivo que todos trabalhamos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por concluída a apreciação do Orçamento Suplementar da Assembleia da República e, com ela, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 10 horas, e da ordem do dia constam perguntas ao Governo.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
Bruno Jorge Viegas Vitorino

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Henrique José Monteiro Chaves
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís José Vieira Duque

Partido Comunista Português (PCP):
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Joana Beatriz Nunes Vicente Amaral Dias

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Maria Eduarda de Almeida Azevedo

Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Maria Amélia do Carmo Mota Santos

Partido Popular (CDS-PP):
João Rodrigo Pinho de Almeida

Partido Comunista Português (PCP):
António João Rodeia Machado

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Almeida Henriques
Daniel Miguel Rebelo
Hugo José Teixeira Velosa

Partido Socialista (PS):
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
José Apolinário Nunes Portada
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro

Partido Popular (CDS-PP):
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro

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