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5446 | I Série - Número 131 | 07 de Junho de 2003

 

Nacional à Igreja de Santa Cruz, em Coimbra, onde repousam os restos mortais do primeiro rei de Portugal.
Numa formulação particularmente feliz, Kant afirmou que a mitologia sem história é vazia e que a história sem mitologia é cega.
Apesar de toda a historiografia mítica da fundação, D. Afonso Henriques é um exemplo paradigmático das oscilações da nossa auto-estima colectiva. Apesar de assumir um lugar único e indisputável como fundador da nacionalidade, estranhamente esse facto não se tem reflectido na importância histórica e simbólica que lhe tributamos. Prova material disso mesmo é o local onde se encontra sepultado: a Igreja de Santa Cruz, em Coimbra.
Este templo, mandado erigir pelo próprio monarca, assumiu um papel crucial na afirmação da identidade nacional e na consolidação do seu poder político. Santa Cruz foi, ao mesmo tempo, o centro político e cultural de uma nova entidade político-administrativa. Este templo constituía a expressão sólida do vínculo do monarca com o poder divino.
Segundo José Mattoso, ao fixar a sua residência em Coimbra, D. Afonso Henriques tomou, talvez, "a mais transcendente de todas as suas decisões para a sobrevivência de Portugal como nação independente".
Segundo o mesmo autor, as consequências complexas desta deslocação espacial concorreram, todas elas, para o alargamento e consolidação do seu poder, mas também para a definição de uma identidade nacional.
Hoje em dia, esta Igreja passa despercebida no, felizmente vasto, conjunto dos monumentos nacionais. A maioria das pessoas desconhece que D. Afonso Henriques aí se encontra sepultado por sua vontade e ignora que o mosteiro é a herança material dos momentos mais significativos da fundação e, portanto, símbolo da nossa independência e da nossa identidade.
Não deixa de ser significativo que tenha sido D. Manuel I, durante um período excepcional de afirmação do nosso destino singular e universal, a indignar-se com as condições do sepulcro do nosso rei fundador e a promover uma grandiosa reabilitação.
Actualmente, apesar da recuperação da fachada e da limpeza dos claustros, o interior da Igreja atingiu níveis de degradação física absolutamente incompatíveis com a dignidade que o espaço deve merecer.
No seu testamento, D. Afonso Henriques deixou bem expressa a sua vontade, com as seguintes palavras: "(…) ao Mosteiro de Santa Cruz onde desejo sepultar o meu corpo (…)".
Este espaço é, portanto, o seu panteão há mais de oito séculos. Hoje, pretendemos apenas que este facto seja reconhecido pela força das leis de um país democrático, numa homenagem que se projecta também num tributo a todas as gerações que a História distinguiu pela sua grandeza.
D. Afonso Henriques, pela independência na determinação do seu próprio destino, pelo empenho que colocou na concretização dos seus planos, pela tolerância que evidenciou no relacionamento com as diferentes culturas das novas áreas conquistadas, é um símbolo elementar dos valores que constituem a matriz da nossa identidade nacional.
Termino, como comecei, citando Eduardo Lourenço, que escreveu que "a hora de nascimento de um povo não se compara a nenhuma outra. A de Portugal foi ao mesmo tempo simples e interminável".

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fausto Correia.

O Sr. Fausto Correia (PS): - Sr. Presidente, Sr. Presidente da Câmara Municipal de Coimbra, Sr.as e Srs. Deputados: Sr. Deputado Miguel Coleta, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, cumpre-me saudá-lo pelo projecto de lei que, em nome do seu grupo parlamentar, acaba de aqui apresentar, visando atribuir o estatuto de Panteão Nacional à Igreja de Santa Cruz, em Coimbra, com a consequente prestação de honras ao primeiro rei de Portugal e aos seus sucessores aí sepultados.
Quero dizer-lhe, de modo claro, que o seu projecto de lei merece o nosso apoio, porque se trata efectivamente de uma referência da fundação de Portugal, matriz da identidade nacional e símbolo da nossa independência.
Ressalve-se, no entanto - e devemos fazê-lo -, o efeito repetitivo, mimético, de eventuais consequências multiplicadoras de iniciativas semelhantes - assim a jeito de quem queria, e propõe, todos os anos, a criação de novas freguesias e de novos concelhos -, que não merecerão naturalmente o acordo que hoje aqui prestamos.
Sr. Deputado Miguel Coleta, a melhor homenagem que posso render-lhe é afirmar que estou certo de que V. Ex.ª tem como único e firme propósito o de homenagear D. Afonso Henriques e seus descendentes e não, naturalmente, o de fazer ressaltar ou ressurgir a sua figura de Deputado eleito pelo Círculo Eleitoral de Coimbra.
Uma outra homenagem que posso prestar-lhe é a de acreditar que esta iniciativa legislativa não procura esconder a hemorragia dos serviços descentralizados do Estado, que se tem verificado, nos últimos meses, em Coimbra. Recordo-lhe o encerramento do Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Rodoviária (ICERR), com sede em Coimbra, que, como sabe, foi uma iniciativa concreta de descentralização dos serviços no nosso país, levada a cabo pelo anterior governo; o encerramento do Instituto da História da Ciência e da Técnica - Museu Nacional da Ciência e da Técnica Doutor Mário Silva, com o ataque que se verificou ao patrono deste Instituto, por verbas ridículas; o encerramento do Centro de Medicina Desportiva de Coimbra, numa cidade com 45 000 estudantes universitários; o encerramento da delegação regional do IAPMEI…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Fausto Correia, desculpe-me chamá-lo à ordem, mas a ordem do dia de hoje não é o encerramento dos serviços do Estado em Coimbra, tema muito digno, que certamente poderá tratar numa intervenção no período de antes da ordem do dia. A ordem do dia de hoje é a discussão do projecto de lei sobre as honras do Panteão Nacional à Igreja de Santa Cruz, em Coimbra.
Chamo-o à ordem e peço-lhe que acate o meu apelo.

O Orador: - Com o devido respeito que tenho por V. Ex.ª, quem formata a minha intervenção de Deputado, eleito pelo Círculo Eleitoral de Coimbra, sou eu próprio.

O Sr. Presidente: - Mas quem impõe o respeito pela ordem do dia sou eu, Sr. Deputado.

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