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Quinta-feira, 27 de Novembro de 2003 I Série - Número 24

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 26 DE NOVEMBRO DE 2003

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação da proposta de lei n.º 104/IX, dos projectos de lei n.os 376 e 377/IX, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Lino de Carvalho (PCP), a propósito da posição da Ministra de Estado e das Finanças no ECOFIN sobre a questão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, criticou as políticas seguidas pelo Governo em nome do Pacto e solicitou esclarecimentos à Sr.ª Ministra. No fim, respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Jorge Neto (PSD), António Costa (PS) e Telmo Correia (CDS-PP). Na sequência do solicitado, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes), em interpelação à Mesa, informou a Câmara da disponibilidade do Governo para o efeito.
A Sr.ª Deputada Teresa Morais (PSD), em declaração política, lembrou o Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres e condenou a violência doméstica, nomeadamente a exercida sobre as mulheres, tendo, no fim, respondido aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Sónia Fertuzinhos (PS), Luís Fazenda (BE) e Bernardino Soares (PCP).
O Sr. Deputado José Miguel Medeiros (PS) fez um balanço político da acção do Governo na área dos fogos florestais e, a propósito da recente entrevista dada a um jornal pelo ex-presidente do SNBPC, Eng.º Leal Martins, condenou a posição do PSD e do CDS-PP de inviabilizarem a sua audição na Comissão Eventual de Acompanhamento dos Incêndios Florestais. Depois, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Rodeia Machado (PCP), Marco António Costa (PSD) e Miguel Paiva (CDS-PP), tendo o Sr. Deputado Francisco José Martins (PSD) prestado esclarecimentos à Câmara sobre o mesmo assunto.

Ordem do dia. - Foram aprovados os n.os 11 a 18 do Diário.
Procedeu-se à discussão conjunta das propostas de resolução n.os 45/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República da Bulgária, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003, 46/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República Eslovaca, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003, 47/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República da Eslovénia, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003, 48/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República da Estónia, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003, 49/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República da Letónia, assinado em Bruxelas, em 26 de

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Março de 2003, 50/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República da Lituânia, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003, e 51/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República da Roménia, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional (Paulo Portas) e da Sr.ª Secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação (Maria Manuela Franco), os Srs. Deputados Telmo Correia (CDS-PP), Luís Fazenda (BE), Leonor Beleza (PSD), Vítor Ramalho (PS), João Rebelo (CDS-PP), António Filipe (PCP), Rui Gomes da Silva (PSD) e José Lello (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos de Sousa Pinto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Gonçalo Nuno Mendonça Perestrelo dos Santos
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra

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José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro
José Luís Ribeiro dos Santos
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscata Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís

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Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Guilherme Valdemar Pereira D'Oliveira Martins
João Cardona Gomes Cravinho
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira

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Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 104/IX - Estabelece o regime de autorização a que estão sujeitas a instalação e a modificação de estabelecimentos de comércio a retalho, de comércio por grosso em livre serviço e a instalação de conjuntos comerciais, baixou à 5.ª Comissão; projectos de lei n.os 376/IX - Aprova medidas de combate à evasão e fraude fiscais e de contribuições ao regime da segurança social (PCP), baixou à 1.ª Comissão; e 377/IX - Prevê a obrigatoriedade da divulgação detalhada das remunerações dos administradores das sociedades emitentes de acções admitidas à negociação em mercado regulamentado (altera o Código das Sociedades Comerciais) (PCP), baixou à 5.ª Comissão.
Foram apresentados na Mesa diversos requerimentos.
Nas reuniões plenárias de 22 e 23 de Outubro: aos Ministérios da Cultura e da Economia, formulados

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pelos Srs. Deputados Abílio Almeida Costa e Rui Miguel Ribeiro; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Ciência e do Ensino Superior, da Administração Interna, da Saúde e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados José Junqueiro, Bernardino Soares, Bruno Dias e Miguel Coelho; ao Governo e ao Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro, formulados pelo Sr. Deputado António Galamba; aos Ministérios da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e das Obras Públicas, Transportes e Habitação e às Câmaras Municipais de Tavira e Silves, formulados pelos Srs. Deputados José Apolinário e Rodeia Machado; aos Ministérios da Defesa Nacional, da Administração Interna e da Economia, formulados pelos Srs. Deputados António Filipe e José Saraiva; à Ministra de Estado e das Finanças e a diversos Ministérios, formulados pelos Srs. Deputados Honório Novo, Lino de Carvalho e Jerónimo de Sousa; à Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais, formulado pelo Sr. Deputado Paulo Batista Santos; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Luís; e ao Ministério das Finanças, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
Na reunião plenária de 24 de Outubro: ao Ministério da Ciência e do Ensino Superior, formulado pela Sr.ª Deputada Ana Manso; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Maximiano Martins; aos Ministérios da Educação e dos Negócios Estrangeiros, formulados pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; e ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulado pelo Sr. Deputado Honório Novo.
Nos dias 27 e 28 de Outubro: aos Ministérios da Economia, das Finanças, da Segurança Social e do Trabalho e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados Luís Fazenda e Heloísa Apolónia; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado José Lello; e ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado António Galamba.
Nos dias 28 e 29 e na reunião plenária de 30 de Outubro: ao Sr. Primeiro-Ministro e aos Ministérios da Segurança Social e do Trabalho e da Economia, formulados pelos Srs. Deputados Honório Novo, Vítor Ramalho e Odete Santos; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros, da Educação e da Economia, formulados pelos Srs. Deputados Luísa Mesquita e Bernardino Soares; ao Ministério da Cultura, formulados pelos Srs. Deputados José Apolinário e Manuela Melo; à Secretaria de Estado do Ordenamento do Território, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; ao Ministério da Administração Interna e à Secretaria de Estado da Administração Local, formulado pelo Sr. Deputado José Miguel Medeiros; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado José Saraiva; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados Fernando Cabodeira e António Filipe; e ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelos Srs. Deputados Rodeia Machado e Bruno Dias.
Na reunião plenária de 30 e no dia 31 de Outubro: ao Governo e aos Ministérios da Administração Interna e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados Isabel Castro, José Apolinário e Heloísa Apolónia; ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Luís Fazenda; e ao Ministro da Presidência, aos Ministérios das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e da Saúde e à Secretaria de Estado da Habitação, formulados pelo Sr. Deputado João Teixeira Lopes.
Nos dias 3, 7 e 10 e nas reuniões plenárias de 4, 5 e 6 de Novembro: ao Ministério da Cultura, formulado pela Sr.ª Deputada Goreti Machado; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros, da Administração Interna, da Ciência e do Ensino Superior e da Defesa Nacional, formulados pelos Srs. Deputados Carlos Luís, Eduardo Moreira e Carlos Alberto Gonçalves; ao Tribunal de Contas, formulado pela Sr.ª Deputada Helena Roseta; à Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, formulado pelo Sr. Deputado João Teixeira Lopes; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulado pelo Sr. Deputado Abílio Almeida Costa; ao Sr. Primeiro-Ministro e ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados António Galamba, Odete Santos e João Rui de Almeida; aos Ministérios das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, da Economia, das Finanças, da Segurança Social e do Trabalho, das Obras Públicas, Transportes e Habitação e à Câmara Municipal de Setúbal, formulados pelos Srs. Deputados Maria Santos, Bruno Dias, Leonor Coutinho, Isabel Gonçalves, Maria de Belém Roseira e Honório Novo; ao Governo e a diversos Ministérios, formulados pelos Srs. Deputados Miranda Calha e José Apolinário; ao Ministério da Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados António Filipe, Luís Carito e Vitalino Canas; e a diversas Câmaras, formulados pelo Sr. Deputado Herculano Gonçalves.
Nos dias 10, 11, 12, 13 e 17 de Novembro: ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação e à Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais, formulados pelos Srs. Deputados Renato Sampaio, Leonor Coutinho, Fernando Cabral e Custódia Fernandes; aos Ministérios da Administração Interna, da Segurança Social e do Trabalho, da Justiça, das Finanças, da Saúde, da Educação e da Defesa Nacional, formulados pelos Srs. Deputados Vitalino Canas, Rui Cunha, Ascenso Simões, Rodeia Machado e Honório Novo; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado José Apolinário; e ao Sr. Primeiro-Ministro

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e aos Ministérios da Saúde e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.
No dia 27 de Outubro: António Galamba, Alberto Antunes, Edite Estrela, José Augusto de Carvalho, Miguel Paiva, Laurentino Dias, Miranda Calha, Narana Coissoró, João Moura, Heloísa Apolónia, Fernando Cabral, Custódia Fernandes e Luísa Mesquita.
No dia 29 de Outubro a Vitalino Canas.
No dia 30 de Outubro: Ana Manso, Luís Carito, Heloísa Apolónia, Fernando Cabral, José Junqueiro, Honório Novo, José Apolinário, Vicente Merendas, Luís Rodrigues, João Teixeira Lopes, Fernando Pedro Moutinho, Joana Amaral Dias, Odete Santos, Marco António Costa, Rodeia Machado, Luís Fazenda, Miguel Coelho, Lino de Carvalho e Isabel Castro.
No dia 3 de Novembro: Fernando Pedro Moutinho, António Galamba, Luísa Mesquita, Luís Fazenda, Lino de Carvalho, Fernando Serrasqueiro e Rodeia Machado.
No dia 5 de Novembro a Isabel Gonçalves.
No dia 11 de Novembro: Fernando Serrasqueiro, Joana Amaral Dias, Heloísa Apolónia, Artur Penedos, Honório Novo, António Galamba, Miranda Calha, Vítor Ramalho, José Apolinário, Jamila Madeira, Bruno Dias, José Miguel Medeiros, Lino de Carvalho e Rodeia Machado.
No dia 13 de Novembro: José Apolinário, Duarte Pacheco, Abílio Almeida Costa, Carlos Carvalhas, António Galamba, Manuela Melo, Heloísa Apolónia, Miguel Paiva, Fernando Cabral, Bruno Dias, Ascenso Simões, Bernardino Soares, José Miguel Medeiros, Honório Novo, Vicente Merendas, Odete Santos, Paulo Veiga, Nelson Correia, Isabel Castro, Luísa Mesquita, Paulo Batista Santos e Miranda Calha.
No dia 18 de Novembro: Heloísa Apolónia, António Galamba, Luísa Mesquita, Luís Fazenda, João Teixeira Lopes, Lino de Carvalho, José Apolinário e Osvaldo de Castro.
Entretanto, foram respondidos, nos dias 24 a 30 de Outubro e 3 a 18 de Novembro, os requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados António Galamba, Jorge Nuno Sá, Luís Fazenda, Miguel Paiva e Manuel Oliveira.
Em termos de expediente é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Finalmente, a Ministra Manuela Ferreira Leite parece ter querido recuperar algum bom senso com o voto com que ontem, no ECOFIN, apoiou, e bem, as posições da França e da Alemanha de ruptura com o Pacto de Estabilidade e Crescimento, contra as recomendações da Comissão Europeia.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É uma atitude de relevantíssimo significado político, porque, apesar de sensata - não deixamos de o reconhecer -, põe a total descoberto a completa incoerência e contradição dos discursos e da política orçamental do Governo da maioria e, em particular, da Ministra Manuela Ferreira Leite.
Em Portugal, o Governo exige sacrifícios aos portugueses em nome do ortodoxo cumprimento das receitas de Bruxelas; em Portugal, a pretexto da necessidade de diminuir a despesa para cumprimento do sacrossanto limite do défice instituído no Pacto, o Governo impõe uma política cega de redução da despesa pública de investimento e de desvalorização das funções sociais do Estado.
Para português ler, a Ministra das Finanças escreve, e diz, que "O Pacto de Estabilidade e Crescimento congrega medidas de estrito bom senso em matéria de política orçamental, essenciais ao funcionamento da União Económica e Monetária" e que uma opção contrária à obsessão, de que a Ministra Manuela Ferreira Leite já confessou estar possuída, seria escolher o "facilitismo", em vez da "responsabilidade".
Em Portugal, o Governo contribui, com a sua política contraccionista, para o processo de recessão em que o País mergulhou.
Em Portugal, é isto tudo; mas em Bruxelas, no Conselho de Ministros das Finanças da União Europeia, o Governo português, e aí bem, faz exactamente o contrário. Que citações fará agora a Ministra das Finanças do seu novo guru, o Comissário Pedro Solbes, quando este diz que "A Comissão lamenta profundamente a decisão, que não respeita nem as regras nem o espírito do Pacto de Estabilidade"?! E o que responde a Sr.ª Ministra ao Ministro das Finanças de França, quando este afirma que as políticas orçamentais seguidas em Portugal para cumprimento das decisões da Comissão Europeia são responsáveis por terem levado o nosso país à recessão?!

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Boa pergunta!

O Orador: - É evidente que o Governo e a Sr.ª Ministra das Finanças devem uma explicação ao País sobre a evidente contradição das suas orientações e sobre a sua política orçamental de dois pesos e duas medidas.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Ou será que o voto da Ministra das Finanças significa que ela própria, ao contrário do que tem sustentado, não acredita que o valor dos défices, de 2003 e 2004, em Portugal fiquem abaixo dos 3% e está a preparar o terreno para, amanhã, poder também ficar isenta de sanções por violação do Pacto?! Mas, se assim é, então, o que tal comportamento indicia é uma atitude dúplice em relação ao que tem afirmado e ao que a maioria fez aprovar, ainda na semana passada, no Orçamento do Estado para 2004.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Exactamente!

O Orador: - E, no futuro, Srs. Deputados, quando estiverem em causa países de menor dimensão económica, terá, para com eles, o ECOFIN o mesmo tratamento que agora obtiveram os mais poderosos, a Alemanha e a França?!
Mas, porventura, o significado maior desta decisão do Conselho ECOFIN, com o voto favorável do Governo português, é o de que o Pacto de Estabilidade e Crescimento, a partir de agora, fica totalmente descredibilizado; já não existe, é um mero documento político sem nenhuma sustentação técnica, que se aplica só aos pequenos países, como, aliás, o PCP várias vezes assinalou.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Assim sendo, então, esta é a altura ideal para se "enterrar" o Pacto e substituí-lo por outro instrumento de coordenação das políticas monetárias da Zona Euro, menos rígido, menos estúpido e adaptado às diferentes realidades económicas da União Europeia.
Esta é a altura ideal para pôr termo a uma política que, em nome do obsessivo cumprimento do défice e das opções neoliberais, acelerou a recessão no nosso país e é em grande parte responsável pelo brutal aumento do desemprego, pela diminuição do investimento público e pela desvalorização das funções sociais do Estado, porque é a pretexto do Pacto e do cumprimento do limite do défice que é diminuído o financiamento do ensino superior público,…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Exactamente!

O Orador: - … transferindo crescentes encargos para as famílias, através do aumento incomportável das propinas, porque é a pretexto do Pacto e do cumprimento do limite do défice que se reduzem as responsabilidades do Estado no sistema de saúde, entregando a privados aquilo que é uma responsabilidade primeira das políticas públicas,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … porque é a pretexto do Pacto e do cumprimento do limite do défice que se reduz o investimento público, com as repercussões que ele tem na economia das empresas e no crescimento do desemprego, porque é a pretexto do Pacto e do cumprimento do limite do défice que, hoje, os portugueses vivem pior.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo deve uma explicação ao País. A Ministra das Finanças deve vir à Assembleia da República explicar-se, como já propusemos na Comissão de Economia e Finanças. Sobretudo, importa aproveitar a oportunidade para suspender e rever o Pacto; importa que o Governo português aproveite a oportunidade para colocar em cima da mesa o debate com vista à substituição do Pacto por um instrumento que respeite as soberanias orçamentais de cada Estado-membro,…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

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O Orador: - … que opte por pôr termo às opções monetaristas e fundamentalistas do Banco Central Europeu, assentes na chamada "política de estabilidade dos preços", que aponte para soluções que sejam instrumentos de desenvolvimento e de coesão e não de recessão, de aprofundamento das desigualdades entre Estados e de desemprego.
Saudámos a Ministra Manuela Ferreira Leite pelo bom senso que readquiriu entre o final do debate do Orçamento do Estado para 2004, na sexta-feira, e a posição que tomou no ECOFIN de ontem.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Exactamente! Bem lembrado!

Risos de Deputados do PCP.

O Orador: - Porém, desafiamo-la, a ela e ao Governo, para que mantenham esse rumo, aceitando o desafio da reavaliação do Pacto, pondo termo às políticas orçamentais restritivas sem sentido, assumindo outra sensibilidade social para os problemas do País e dos portugueses. Se quiserem, até podem apresentar um novo Orçamento com novas orientações.
É este o desafio que aqui deixamos!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Jorge Neto, António Costa e Telmo Correia.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto, dispondo, para o efeito, de 3 minutos.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, antes de mais, deixe-me dizer-lhe que é sempre bom ouvir o PCP elogiar e considerar positiva a actuação do Governo, nomeadamente da Ministra das Finanças.

Risos do PCP.

É coisa rara, mas é sempre bom ouvir da parte do PCP essa sinceridade e genuinidade relativamente ao acerto deste Governo e dos seus membros, em concreto da Ministra das Finanças, pese embora, em relação ao conteúdo, a nossa discordância seja total.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Com a Ministra?!

O Orador: - De qualquer modo, fica desde já aqui definida claramente a nossa disponibilidade para, em momento oportuno, discutir, com toda a abertura e profundidade, a temática do Pacto de Estabilidade e Crescimento, seja quanto à sua configuração actual, seja quanto à sua evolução futura. Da nossa parte não há qualquer parti pris, não há qualquer anátema relativamente a essa matéria; estamos disponíveis, como sempre estivemos - mas hoje mais do que nunca -, para debater com o PCP e com os partidos da oposição essa matéria quando chegar o momento azado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Pode ser já amanhã!

Vozes do PS: - Boa!

O Orador: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, no que respeita à questão que aqui traz à colação, a nossa posição é muito clara: consideramos que é mau haver uma violação do Pacto de Estabilidade e Crescimento; consideramos que as regras do Pacto devem ser respeitadas e cumpridas.
No caso concreto, entendemos que a posição do Governo português não poderia ser outra, desde logo por uma questão de solidariedade e de cumplicidade europeia para com a França e a Alemanha - e é bom não esquecer que, em Novembro de 2002, esses dois países estiveram ao nosso lado, impedindo que fosse cortado o Fundo de Coesão em virtude de ter sido iniciado o procedimento de défice excessivo de Portugal. Não nos podemos esquecer deste gesto da França e da Alemanha, daí também esta atitude de gratidão, de compreensão e de solidariedade da nossa parte relativamente a estes dois países,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - … mas sempre sem esquecer que a França e a Alemanha são os dois "motores" da Europa. E nós necessitamos, como de pão para a boca, que, de facto, a retoma se verifique na Europa, na esteira do que está já a acontecer nos Estados Unidos da América,…

O Sr. António Costa (PS): - Diz bem!

O Orador: - … e a França e a Alemanha são fundamentais para que essa retoma seja uma realidade.
Sem prescindir do que vai dito, Sr. Deputado Lino de Carvalho, temos para nós como certo que a disciplina das finanças públicas que subjaz ao Pacto de Estabilidade e Crescimento é boa para Portugal e para a Europa, porque é uma condição fundamental para um crescimento económico sustentado.
Entendemos, efectivamente, que as regras do Pacto, impondo essa disciplina nas finanças públicas, são fundamentais para assegurar, a médio e a longo prazo, um crescimento económico sustentado e a criação de emprego. Mais do que isso: temos uma tradição histórica, que vem desde a monarquia e que se verificou na I República e mesmo nos primeiros anos do Estado Novo, de um laxismo e de um facilitismo na despesa pública que levou ao descalabro. Portanto, há uma tradição latente, inata de descalabro nas nossas finanças públicas e, nesta medida, as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento, impondo essa disciplina, esse rigor, vão no bom sentido, vão no sentido da disciplina como condição basilar para um crescimento sustentado e uma retoma da economia.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se, tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Permita-me apenas que termine, Sr. Presidente.
Pergunto, Sr. Deputado Lino de Carvalho: não acha que a nossa situação, em termos orçamentais, é diferente da da Alemanha?

O Sr. António Costa (PS): - É!

O Orador: - Que o nosso problema concreto é estrutural e nada tem a ver com o problema conjuntural da Alemanha? Daí a diferença de aferição e de actuação relativamente à Alemanha e à França, porque um é um problema estrutural, que é o nosso, e o outro é um problema conjuntural, que é o da Alemanha.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Informo a Câmara que o Sr. Deputado Lino de Carvalho responderá no fim a todos os pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino da Carvalho, começo por felicitá-lo pela oportunidade da sua intervenção, visto que reina em toda a Europa e, em particular, em Portugal uma enorme perplexidade na sequência do último ECOFIN.
Neste sentido, nós próprios apresentámos hoje ao Sr. Presidente uma proposta para a realização de um debate de urgência, para a avaliação do que resta do Pacto de Estabilidade e Crescimento e para saber que consequência as decisões do ECOFIN têm na nossa política económica e orçamental.
Aliás, aproveito esta oportunidade para solicitar ao Sr. Presidente a maior urgência na convocação de uma Conferência de Líderes, para que o debate de urgência possa realizar-se se não esta semana pelo menos na próxima.
A perplexidade, em Portugal, é tanto maior, em primeiro lugar, porque constatamos uma enorme contradição entre aquilo que o Governo diz em Portugal e aquilo que ele faz lá fora, entre a preocupação que o Governo revela pela necessidade do crescimento das economias francesa e alemã e o desleixo e desprezo que tem pela necessidade de crescimento da economia portuguesa, entre a preocupação que a Sr.ª Ministra das Finanças revela para travar o crescimento do desemprego em França e na Alemanha e o laxismo com que o Governo encara o aumento do desemprego em Portugal.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Esta contradição, a de dizer uma coisa cá dentro e a de fazer outra coisa lá fora, cria a maior perplexidade no País e não pode, obviamente, passar sem reparo.
Mas a questão de fundo é saber se, agora, o Governo está ou não disponível para cumprir a Resolução

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que a Assembleia da República aprovou o ano passado,…

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

O Orador: - … cujo segundo ponto foi aprovado, tanto quanto creio, por unanimidade, e que mandatava o Governo português para, no seio da União Europeia, defender uma reavaliação, uma reinterpretação do Pacto que favorecesse o crescimento económico e a criação de emprego. Mas o Governo, ao longo deste ano, empenhou-se em violar a Resolução da Assembleia da República, e a verdade é que dentro de um mês o Governo estará aqui a apresentar uma actualização do seu Programa de Estabilidade e Crescimento e, com certeza com a maioria, a pedir novamente para se aprovar, em consenso, uma resolução que, ao longo deste ano, o Governo simplesmente não cumpriu.
Por isso, é essencial, do nosso ponto de vista, que se faça um debate de urgência com o Governo, com a Sr.ª Ministra das Finanças mas também com o Sr. Primeiro-Ministro, porque, em Portugal, que eu saiba, o Primeiro-Ministro ainda não é Ministro das Finanças e, que eu saiba, o responsável pelo Governo é o Primeiro-Ministro; logo, é inaceitável esta subjugação do Primeiro-Ministro e de toda a política do Governo à actuação e aos preconceitos ideológicos da Sr.ª Ministra das Finanças.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo já está largamente excedido, pelo que tem de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Felicito-o, Sr. Deputado, pela oportunidade da sua intervenção e gostaria de saber se podemos contar com o seu apoio para a realização do debate de urgência.
Insisto também junto do Sr. Presidente no sentido de que, com a máxima urgência, convoque uma Conferência de Líderes para que o debate de urgência possa ser agendado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, o Partido Socialista apresentou o seu pedido de debate de urgência ao abrigo do n.º 4 do artigo 78.º do Regimento, e estava, portanto, a exercer um direito potestativo,…

O Sr. António Costa (PS): - Exactamente!

O Sr. Presidente: - … que, como é óbvio, ser-lhe-á garantido. Nem poderia ser de outra maneira. Espero poder convocar amanhã a Conferência de Líderes para acertarmos a data em que se irá realizar, mas, se for possível, ainda será feito esta semana, senão será, com certeza, na próxima semana. Aliás, há ainda um outro pedido formulado pelo BE sobre a mesma matéria.
Tem a palavra, Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, também eu, em nome da bancada do CDS-PP, quero agradecer-lhe a oportunidade que nos dá de, discutindo esta matéria, deixar clara a nossa posição, pondo à sua consideração, Sr. Deputado, se, nesta análise, não há, às vezes, um erro fundamental, que é exactamente aquele que, por norma, o Partido Socialista tem e que teve, designadamente, quando estava no governo e que se traduz em duas realidades fundamentais: a primeira é a de, quando está no governo, entender que é dono do País, confunde o País com o próprio governo; e a segunda é a de não ter uma visão institucional em relação ao País e à nossa política externa.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Muito bem.

O Orador: - Digo isto porque o que está em causa é Portugal. E quando a Sr.ª Ministra das Finanças ou o Sr. Primeiro-Ministro falam não o fazem em nome deste Governo, porque, de facto, não foi este o governo que incumpriu as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento; a culpa não é deste Governo mas, sim, de um governo do Partido Socialista. No entanto, lá fora, é Portugal que está em causa e, quando é Portugal que está em causa, a única coerência possível e aceitável é não ter dois pesos e duas medidas.
Srs. Deputados Lino de Carvalho e António Costa, seríamos incoerentes se defendêssemos agora sanções para os outros, quando, no passado, nenhum de nós nesta Câmara defendeu sanções para Portugal.

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Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. António Costa (PS): - O problema não é esse!

O Orador: - Isto é que seria uma incoerência total e absoluta. E que fique claro: se não defendemos a aplicação de sanções a Portugal temos pouca legitimidade para defender a aplicação de sanções aos outros países.
Mas, no aspecto estrutural, a nossa posição não muda, é inalterável. E o estrutural aqui é o que está bem, o que está certo, é o cumprimento do défice; a boa regra é cumprir o défice, é consolidar as contas públicas. Quem está errado é o governo francês, quem está errado é o governo alemão, quem esteve errado no passado foi o governo do Partido Socialista, não tenhamos qualquer dúvida sobre isto.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

Risos de Deputados do PS e do PCP.

O Orador: - Todos os economistas o reconhecem. Os senhores leram hoje as declarações do Deputado Joaquim Pina Moura, ex-Ministro das Finanças do Partido Socialista, em que diz que só cumprindo as regras da consolidação das finanças públicas é possível garantir o emprego, o crescimento e a própria sustentabilidade da segurança social?! É exactamente o contrário do que os senhores dizem!
Só cumprindo estas regras é possível desenvolver Portugal no futuro,…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Quais regras?

O Sr. José Magalhães (PS): - As regras de um Pacto "morto"?!

O Orador: - … o que é exactamente o contrário do que os senhores dizem.
O Governo de Portugal sempre disse que não queria cumprir estas regras por mera imposição externa. Repito, não as queremos cumprir por mera imposição externa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente. Peço só a mesma tolerância que teve para com o Sr. Deputado António Costa, para eu poder concluir.

O Sr. Presidente: - Dou a mesma tolerância a todos os Srs. Deputados.

O Orador: - Peço apenas a que foi dada ao orador anterior, Sr. Presidente.
Não queremos cumprir estas regras por mera imposição externa mas por considerarmos que se trata de uma regra de bom governo.
Querem debate de urgência sobre esta matéria?

Vozes do PS: - Queremos!

O Orador: - Sr. Deputado António Costa, por nós, poderia começar agora mesmo o debate de urgência.

O Sr. António Costa (PS): - Que bom! Mande vir o Governo!

O Orador: - Tem, desde já, o nosso assentimento para o mesmo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Querem discutir o assunto? Vamos discuti-lo, com um princípio que, para nós, é inalterável: o Governo português está a agir bem; cumprir o défice é uma regra de bom governo, e deveria ser elogiada e não criticada por quem não o conseguiu cumprir no passado.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho. Dispõe, no máximo, de 5 minutos.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, começo por agradecer as perguntas que me foram dirigidas.
Srs. Deputados Jorge Neto e Telmo Correia, estou há muitos anos no Parlamento e nunca vi uma pirueta tão grande. Não vi!

Aplausos do PCP e risos de Deputados do PS.

É a completa quadratura dos círculos, Srs. Deputados.
O Sr. Deputado Telmo Correia disse aqui: "Não, não foi este Governo que aprovou este Pacto de Estabilidade e Crescimento, ele já vinha de trás, temos de o cumprir! Quem está mal são os governos da França e da Alemanha".
Ó Sr. Deputado, então os governos da França e da Alemanha estão mal e o Governo português dá o seu voto a essa política, que o senhor reconhece estar mal?!

Risos do PCP e do PS.

Isto é que não entendo, Sr. Deputado! Há aí qualquer coisa que não joga, Sr. Deputado!
Diz o Sr. Deputado Jorge Neto: "Há uma violação do Pacto, que deve ser sancionada, mas tivemos de intervir por solidariedade com a construção europeia e com a França e a Alemanha".
Sr. Deputado, saúdo essa sua jovem adesão ao eixo franco/alemão, coisa que não vimos aqui ainda há pouco tempo a outro propósito, mas, que eu saiba, Sr. Deputado, no Pacto não há qualquer diferença - e, porventura, deveria haver - entre desequilíbrios conjunturais e desequilíbrios estruturais. Há regras, que, quando são violadas, devem ser sancionadas, e, no caso concreto, há claramente regras que foram violadas pela França e pela Alemanha e que não são sancionadas devido ao voto favorável do Governo português.
Mais, Srs. Deputados: sabem o que é que a Sr.ª Ministra ainda aprovou mais? Aprovou mais do que aquilo que tem vindo a público, porque não só aprovou a não aplicação de sanções como ainda que os cortes a que a França e a Alemanha estarão obrigados em 2004, 2005 e em anos seguintes só serão exigidos se o crescimento económico nestes dois países ficar acima do esperado. Ainda há mais uma condição: não só se anularam as sanções agora como, para o futuro, só haverá sanções se as condições de crescimento ficarem abaixo do esperado.
Portanto, Srs. Deputados, é, de facto, uma política de dois pesos e duas medidas. E eu vislumbrei no Sr. Deputado Jorge Neto uma leve crítica à Sr.ª Ministra das Finanças, porque o Sr. Deputado elogiou-me por eu dizer bem da Sr.ª Ministra das Finanças, mas, depois, disse que estava em desacordo comigo. Ora, se o Sr. Deputado me elogiou…

Neste momento, dá entrada na Sala o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

Sensatamente, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares vem dar a resposta às questões.
Como eu estava a dizer, vislumbrei no Sr. Deputado uma leve crítica à Sr.ª Ministra das Finanças, porque, se o Sr. Deputado me elogiou por eu ter deixado aqui um voto positivo ao bom senso da Sr.ª Ministra e depois diz que discorda de mim, então, discorda da atitude de bom senso da Sr.ª Ministra. Não há volta a dar, Sr. Deputado!
Sr. Deputado António Costa, é verdade que reina a perplexidade no País e é verdade que esta questão exige um debate, para procurar perceber a contradição que existe entre a política do Governo no país, a política orçamental, e a atitude que ele toma lá fora.

O Sr. Jorge Neto (PS): - Não há contradição!

O Orador: - Sr. Deputado Telmo Correia, há sanções, há! E o melhor exemplo de sanção é aquele que o Governo tem dado aos portugueses com um Orçamento para cumprimento de um défice que, lá fora, outros não querem cumprir. Esta é a sanção que já existe, Sr. Deputado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - É exactamente o contrário!

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O Orador: - Por isso, Sr. Deputado António Costa, agradeço as suas palavras e digo-lhe que também pensamos que é necessário fazer esse debate para percebermos, e para os portugueses perceberem, por que é que o Governo português exige sacrifícios ao país quando é condescendente com outros lá fora - e bem! -, por que é que o Governo português tem uma política fundamentalista, ortodoxamente monetária, em Portugal e concede que a França e a Alemanha tenham outras condições para recuperar a sua economia e aumentar o emprego. Isto é essencial para percebermos a fraude de uma política que está em cima da mesa, obviamente, mas também para fazermos um debate sobre a reavaliação do Pacto e até para permitir ao Partido Socialista que, finalmente, se junte a nós na reavaliação do Pacto de Estabilidade e Crescimento…

Aplausos do PCP.

… e na sua substituição por um outro instrumento de coordenação das políticas de monetária.
Neste aspecto, Sr. Deputado, nós próprios também propusemos, hoje de manhã, na Comissão de Economia e Finanças, a vinda da Sr.ª Ministra das Finanças, e o PSD pediu para pensar até à próxima reunião - tem algumas dúvidas. Mas, em todo o caso, estamos disponíveis para ouvir a Sr.ª Ministra das Finanças na Comissão de Economia e Finanças ou para um debate de urgência; estamos disponíveis para um caso ou para o outro, pois o que queremos é que o debate se faça, que se perceba a contradição da política do Governo e que se crie a oportunidade para reavaliar o Pacto e para o substituir por outro instrumento, menos estúpido, mais inteligente e mais adequado às nossas necessidades.

Aplausos do PCP.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Sobre que tema, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, a interpelação tem a ver com o debate de urgência solicitado…

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro, mas peço-lhe que seja breve.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Serei breve, Sr. Presidente.
Há instantes foi solicitado publicamente a realização de um debate de urgência com o Governo sobre a questão do Pacto de Estabilidade e Crescimento e eu vim aqui, propositadamente, tão rápido quanto as circunstâncias mo permitiram, dizer que o Governo tem todo o gosto e…

Neste momento, caiu um painel da bancada do Governo.

Vozes do PS e do PCP: - Está tudo a cair!

Risos.

O Orador: - Devo dizer aos Srs. Deputados que pelo Governo respondo eu; agora, por aquilo que diz respeito à Assembleia da República respondem VV. Ex.as, já não sou eu o responsável.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto ao Governo ele está firme, firmíssimo, podem ficar absolutamente descansados e tranquilos.
Continuando, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero dizer que, relativamente ao debate de urgência solicitado, o Governo tem todo o gosto e todo interesse em que ele se realize, porque é da maior importância e acrescenta urgência, se podemos assim dizer, à urgência solicitada. E, por isso, não apenas quero aqui exprimir a total disponibilidade do Governo para a realização desse debate, como me permito até sugerir - e a decisão é de V. Ex.ª e de todos os Srs. Deputados - que ele se realize ainda esta semana, já amanhã ou na próxima sexta-feira, porque, primeiro, quem não deve não teme, segundo, por uma questão de respeito para com a Assembleia da República e para com os portugueses e, sobretudo, que é o mais importante, para que fique claro, uma vez mais, a coerência da política económica que o País tem vindo a

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seguir, que nos vai levar a sair da crise e a que os sacrifícios e esforços de hoje resultem em benefícios para todos os portugueses no futuro.
Por isso, quanto mais rápido se realizar este debate melhor, pois é da maior importância, e faço até um apelo para que ele se realize já amanhã, quinta-feira, ou na sexta-feira. O Governo nunca foge a nenhum debate, ainda por cima quando está certo e seguro de que esta é a política correcta que nos vai levar a bom porto.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, a sua interpelação introduz um elemento de interesse para a organização dos trabalhos. Assim, será necessário reunirmo-nos em Conferência de Líderes ainda hoje para podermos agendar esta debate para amanhã, se for possível.
Tem, agora, a palavra, para uma declaração política, a Sr.ª Deputada Teresa Morais.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O mundo assinalou ontem o Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres, instituído pelas Nações Unidas através da Resolução 53/134, de 1999.
A análise estatística da violência doméstica em Portugal no 1.º semestre de 2003 continua a revelar uma situação preocupante.
Só a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) registou 8914 crimes, 89% dos quais são de violência doméstica e destes 86% são de violência contra as mulheres.
Em 71% dos casos, o local de agressão foi o domicílio comum e na maioria deles a agressão não aconteceu pela primeira vez. Aliás, a duração da vitimação é outro dado assustador: em cerca de 12% das situações, a sujeição a maus tratos físicos e psicológicos dura entre 5 e 15 anos.
O perfil da vítima mostra bem que este tipo de violência atravessa grupos sociais vários e tem causas intrincadas que ultrapassam largamente a real, mas, porventura, simplista, explicação que coloca a droga e o álcool no centro do problema.
Temos um novo Plano Nacional Contra a Violência Doméstica, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 88/2003 e destinado a vigorar até 2006, que tem já uma coordenadora nacional no âmbito da Comissão para a Igualdade dos Direitos das Mulheres (CIDM), a Dr.ª Conceição Lavadinho. Nele se afirma claramente o empenho do Governo no comprometimento de toda a sociedade no combate a um crime público que tem proporções inaceitáveis.
Deste Plano destaco as medidas destinadas à protecção da vítima e à sua integração social. Realço, ainda, no domínio da justiça, o esforço de motivação dos magistrados para a aplicação da pena acessória de proibição de contacto com a vítima, que continua a não ser aplicada em número significativo pelos juízes.
Estão constituídos e a funcionar os grupos de trabalho de cada área temática prevista no Plano, da educação à integração social, da área da justiça ao apoio às mulheres imigrantes. Dentre eles, gostaria de destacar o das autarquias, que, contactadas e motivadas, irão receber módulos de formação que serão ministrados com o apoio da Comissão.
Durante este ano, deu-se também continuidade ao processo de alargamento da rede de casas-abrigo para vítimas desta violência. À actual estrutura constituída por 25 casas, com capacidade para acolher 385 mulheres, acrescerão 6 novas casas, que abrirão progressivamente entre Dezembro de 2003 e Outubro de 2005 e que somarão 141 novos lugares de acolhimento. É um crescimento superior a um terço da actual capacidade de abrigo da rede nacional, o que nos oferece motivo de optimismo.
Mas mais depressa crescem os esforços, surgem novos instrumentos normativos, se multiplicam os meios de acolhimento do que se fazem ceder mentalidades e comportamentos face ao tremendo peso do autoritarismo, da discriminação, do desrespeito pela integridade física e psicológica das mulheres que, em grande parte dos casos, envolve também as crianças.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Este não é, obviamente, um problema exclusivamente nosso, nem o é numa escala superior à que atinge outros países, com os quais nos gostamos de comparar.
Espanha tem uma situação dramática e alguns outros países da Europa, como a Grécia, não têm sequer legislação suficientemente abrangente ou medidas programadas de combate a este fenómeno. Disto dá conta o relatório Penélope sobre a violência doméstica no sul da Europa, entregue esta semana mesmo nesta Assembleia, que aponta para a necessidade de elaboração de um plano europeu contra a violência doméstica.

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É, no entanto, claro que o facto de não estarmos nesta matéria na pior das posições não nos pode permitir entorpecer.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Enquanto houver uma mulher brutalizada, enquanto houver mulheres queimadas com pontas de cigarro, desfiguradas com ácido, violadas, humilhadas, tantas vezes até à morte, isso nunca poderás acontecer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP e de Deputados do PS.

Mas há, igualmente, hoje, uma crescente preocupação quanto a uma forma especialmente cruel de violência sobre as mulheres, falo da mutilação genital feminina, cuja prática entre nós é ainda dificilmente determinável, dado o secretismo de que se reveste e a reserva a que se submetem quer as vítimas quer os agentes desta violência.
Este conhecimento tem de ser aprofundado, é absolutamente imperioso garantir que tal prática não se está a realizar aqui mesmo ao nosso lado, rodeada de um sigilo impenetrável. Uma violação dos direitos humanos desta gravidade, cometida em território português, não pode nunca ficar encoberta e impune.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Mas punir não é, também aqui, a primeira via a seguir, há que agir sobre um comportamento culturalmente enraizado, através da motivação das populações, contra o conjunto de consequências gravíssimas deste costume.
A excisão é um exemplo claro de uma forma de violência que a muitos de nós só provocou, até hoje, um arrepio e um virar de cara mas que deve começar a merecer-nos outra atitude.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Mesmo quando se passa noutros países - em 28 países, para ser precisa! -, como a Somália, o Egipto, o Gana, a Libéria a Guiné-Conakry ou a Guiné-Bissau. Em alguns destes Estados, a dimensão desta prática chega aos 98% da população feminina, o que é verdadeiramente brutal. Na Guiné-Bissau estima-se que o problema atinja 50% das mulheres.
As mulheres mutiladas, que as Nações Unidas calculam serem mais de 130 milhões, remeteram-se a um silêncio sofrido e humilhado. Algumas, porém, decidiram falar e estão hoje envolvidas em ONG que tentam recolher apoios para esta luta contra uma poderosa e resistente adversária, a tradição! Cruel, irracional, indiferente ao sentimento das raparigas, que cada vez mais meninas são cortadas pelas facas das velhas fanatecas e assim ficam marcadas, física e psicologicamente, para o resto das suas vidas.
Numa das organizações que realiza no terreno o projecto Direitos das Mulheres na Guiné-Bissau, mulheres e homens lutam pela modificação do chamado "fanado", tentam preservar deste ritual as cerimónias de iniciação e educação das meninas para a vida adulta, mas eliminando a mutilação. Mas são enormes as resistências a esta nova versão do fanado, a que chamam "alternativo". Os tradicionalistas desvalorizam-no, consideram-no uma fraude. E porquê? Porque lhe falta o sacrifício da menina! Em suma, falta-lhe o corte.
Não nos esqueçamos de que a excisão é feita com uma faca velha, frequentemente enferrujada, que é o instrumento de trabalho de uma vida inteira para as fanatecas, quando não mesmo com uma lâmina ou com um pedaço de vidro. O que isto significa, em termos de saúde pública, são infecções várias, é tétano, gangrena, risco de contágio pelo HIV, obstrução no trabalho de parto. É um sofrimento atroz para as meninas, mas também para as suas famílias, impotentes para lutarem contra os poderes tradicionais.
Quem vê a imagem de uma menina, atada pelos dedos dos pés, com os braços amarrados junto ao corpo e um pano entalado na boca, lutando contra a dor, nunca mais a esquece.
Hoje, quando terminarmos o nosso dia de trabalho, 6000 novas crianças poderão ter sido mutiladas.
Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, não faz, para mim, qualquer sentido que quem, unanimemente e muito bem, condena a prática da lapidação das mulheres nigerianas não rejeite, com a mesma veemência e empenho, a mutilação genital que faz vítimas aos milhares.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS-PP, do BE e do Deputado do PCP Honório Novo.

Trata-se de uma brutal violação dos direitos humanos, em que o facto de estar envolvido um país

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irmão só nos preocupa mais e, portanto, mais nos deve motivar.
Muitos guineenses já se envolveram em ONG, como a Sinin Mira Nasiquê ou os jovens de Bafatá, mas deparam-se com uma tremenda falta de meios.
Estas organizações tentaram, no passado recente, pedir o apoio do Estado. A resposta que obtiveram de Kumba Ialá foi a de que não se pode mudar a tradição. Grande argumento, na verdade!
Se assim fosse, na Península Ibérica estaríamos, ainda hoje, a provar a nossa inocência, agarrando num ferro em brasa ou mergulhando as mãos em caldeiras de água fervente.
Estas mulheres precisam de ajuda, não paternalista, que essa qualquer povo emancipado muito bem rejeitaria.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, não queria interrompê-la, mas o seu tempo está largamento esgotado.

A Oradora: - Termino imediatamente, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, estas mulheres precisam de uma atitude solidária, deixando obviamente às mulheres da terra a condução deste processo.
E se da nossa acção resultar, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, que uma menina - uma só que seja - se liberte desta tortura, tudo o que fizermos terá valido a pena.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS-PP, do BE e de Deputados do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Morais, como é óbvio, quero, antes de mais, saudá-la por ter trazido este tema à discussão.
De facto, o retrato que fez fala por si; os números são dramáticos, devem fazer-nos reflectir e, até certo ponto, interpelam-nos na nossa capacidade de, enquanto decisores políticos, sermos capazes de encontrar as melhores respostas.
Ainda ontem, o PS e o Departamento Nacional de Mulheres Socialistas tiveram oportunidade de lançar uma campanha, que vai continuar, não só para alertar para esses mesmos números e para o retrato que fez mas também para identificar o que melhor se pode fazer para combater este flagelo, que é a violência doméstica.
Há uma noção, clara e consensual, de que o problema não é tanto de falta de leis mas do cumprimento dessas mesmas leis, como, aliás, em outras áreas, mas que nesta área se revela particularmente importante.
Por isso, seria importante - e gostava de saber da disponibilidade da maioria para isto mesmo -, nomeadamente em sede da 1.ª Comissão, fazer-se a avaliação da aplicação das leis e, assim, identificar-se o que é preciso fazer-se para que sejam melhor cumpridas e se é preciso alterá-las nesse sentido.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Há um Plano Nacional Contra a Violência Doméstica (e é importante falar nele aqui, hoje) que precisa de ser cumprido e também avaliado. E, portanto, deve haver disponibilidade - e faremos uma proposta neste sentido ao Governo - para se fazer uma avaliação anual, que deverá ser entregue à Assembleia da República para que também possamos fazer a avaliação do cumprimento desse mesmo Plano.
Ontem, também tivemos oportunidade de visitar duas casas-abrigo, uma no Montijo e outra em Lisboa. E, já que a Sr.ª Deputada falou de uma componente importantíssima, que é o envolvimento das autarquias, devo dizer que, quanto à casa que visitámos no Montijo, a autarquia envolveu-se, deu o terreno e construiu a casa que está pronta, mas a casa está fechada, há uma ano e meio, por falta de acordo de cooperação com a segurança social. Na outra casa-abrigo que visitámos, a de Lisboa, há 12 mulheres em lista de espera. Imaginar mulheres vítimas de violência em lista de espera com casas prontas a funcionar é incompreensível; imaginar lista de espera para mulheres vítimas de violência doméstica é claramente assustador.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Gostava ainda de lhe perguntar, e a questão é colocada frequentemente, se não considera que, no segundo plano, o papel das ONG é secundarizado e se isso não é um erro. Pergunto-lhe

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porque, até agora, a intervenção que tem sido feita em Portugal tem sido muito à custa do trabalho das ONG, e o seu não envolvimento neste segundo plano é um ponto fraco que não contribui para as respostas que é preciso dar, e a nossa convicção é a de que as respostas que existem são poucas e mal articuladas, e também é da sua articulação que depende a nossa melhor capacidade de resposta.
Por isso, a sua intervenção foi importante, mas mais importante ainda é sermos capazes de avaliar o que somos, o que temos conseguido fazer e, sobretudo, se somos capazes de fazer melhor. Portanto, este é o nosso compromisso; temos a vontade manifesta de trabalhar para encontrar melhores respostas. No entanto, este também tem de ser um esforço conjunto, pelo que gostava de saber, Sr.ª Deputada, da disponibilidade da sua bancada para, de facto, melhorarmos e avaliarmos a aplicação das leis.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Teresa Morais informou a Mesa que responderá no final a todos os pedidos de esclarecimento.
Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Morais, convergimos e coincidimos nas preocupações sobre a violência que é exercida sobre as mulheres, sobre as crianças, em particular na questão da violência doméstica que se "abastece" do silêncio, mas que é uma realidade trágica no nosso país, desmentindo, afinal, aquela ideologia tão proclamada dos portugueses de brandos costumes. Todos nos vamos redescobrindo nisso, sejam os abusos sobre menores sejam os abusos e a violência doméstica.
No entanto, a Sr.ª Deputada disse na sua intervenção - que sublinho e saúdo - que tinha optimismo em relação ao desenvolvimento das casas-abrigo. Não poderei compartilhar esse optimismo. Seguramente e daquilo que conheço, houve uma excessiva morosidade na contratualização entre a segurança social e as instituições que promovem as casas-abrigo para mulheres vítimas de violência e aquilo que vai ser o acréscimo é manifestamente insuficiente em relação às necessidades que estão, desde já, identificadas. Para além de que diversos e diversas dirigentes das casas-abrigo nos têm frequentemente contado da sua extraordinária limitação de meios.
Atendendo ao carácter verdadeiramente essencial, humanista e emergencial deste problema, não considera que o seu optimismo se deveria alicerçar num plano bem mais amplo? Encontramo-nos também disponíveis para reavaliar o Plano Nacional Contra a Violência Doméstica.
Gostaria ainda de lhe dizer, em relação a um ponto muito particular e extraordinariamente chocante dessa prática que é a excisão, a mutilação genital feminina, que nos trouxe na sua intervenção (e o Bloco de Esquerda deixou isso aqui já muito claro em anteriores debates) que os limites da multiculturalidade, a intersecção das tradições e das renovações tem de ter sempre um patamar, que é o dos direitos humanos e que é absolutamente intransponível, sem o qual não há justificações nem de historicidade nem de carácter social, quaisquer que sejam.
Evidentemente que há a via legal, a via da punição, mas a Sr.ª Deputada Teresa Morais acentuou também - e bem, a meu ver - que há um envolvimento e um diálogo cultural a fazer para que sejam mudadas práticas e tradições, de forma a que sejam denegadas e renovadas com outro sentido, como o de preservar a integridade psicológica, física das meninas atingidas. Em todo o caso, digo-lhe que não bastará (embora isso seja uma trave importante deste processo) apoiar e financiar ONG femininas que tenham uma capacidade de acção cultural nestas comunidades.
Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada, se não é de reactivar os programas dos mediadores culturais, particularmente para estas comunidades que estão razoavelmente identificadas e que poderiam ter aí uma mais-valia de uma mais fácil intimidade e contacto com culturas que estão a ser claramente ultrapassadas.
Não será esta a oportunidade de reactivar aquilo que o Governo do PSD e do CDS-PP fez, que foi esvaziar esse programa de mediação cultural?

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Morais, queria registar a sua intervenção e a importância do tema que nos trouxe. A questão do combate à violência doméstica continua a ser um flagelo da nossa sociedade tantas vezes escondido.
De facto, é uma prioridade dos poderes públicos, das associações, das entidades que trabalham nesta área combater este flagelo, combater na nossa sociedade a violência doméstica escondida, mas que, de

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facto, existe. São precisos mais apoios, instrumentos e meios orçamentais para que não continuemos a ter situações, como tantas vezes são descritas, sem resposta por insuficiência de meios.
Esta luta e este combate passam por muita alteração de mentalidades, mas também pelas medidas concretas, que são ainda insuficientes e em relação às quais só podemos estar insatisfeitos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Morais, para o que dispõe de 5 minutos.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): - Sr. Presidente, começo por agradecer aos Srs. Deputados as perguntas que me colocaram. Dificilmente poderei dar resposta a todas nos 5 minutos de que disponho, mas tentarei agrupá-las e fazer o meu melhor.
No que toca à questão da disponibilidade para, no âmbito da 1.ª Comissão, avaliar a legislação sobre violência doméstica, não tenho a certeza de ter compreendido perfeitamente a que leis se referia a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.
Na verdade, a legislação que pune os comportamentos de violência doméstica é de natureza penal. Que eu saiba, essa legislação está a ser cumprida e quando não está a cumprir as nossas expectativas é porque, em muitos casos, os processos judiciais não são abertos mas, sobretudo, porque os juízes não aplicam a pena acessória de afastamento do agressor excepto em meia dúzia de casos num universo de centenas de processos. Por causa disso, dá-se origem a situações de reincidência em que os actos de violência praticados são ainda mais graves que da primeira vez, o que, com frequência, torna a situação absolutamente irresolúvel.
Se a Sr.ª Deputada se referia ao Plano Nacional Contra a Violência Doméstica, devo dizer que, como sabe, está em vigor há alguns meses e está a ser executado. Aliás, um dos aspectos que referi na minha intervenção foi o da nomeação, há cerca de dois meses, da Dr.ª Conceição Lavadinho para Coordenadora Nacional daquele Plano. Estão constituídos grupos de trabalho que, neste momento, já estão a tomar medidas quanto às várias áreas temáticas previstas no referido Plano. Nomeadamente em relação à área da justiça, já foram estabelecidos contactos com o Centro de Estudos Judiciários no sentido da celebração de um protocolo que permita a sensibilização dos juízes para a questão da aplicação da pena acessória de afastamento do agressor. De igual modo, no que respeita às autarquias, domínio especialmente importante, que eu saiba já foram enviadas cartas a todas as autarquias do País, algumas das quais já responderam, interessadas em promover debates. A Comissão está a preparar módulos de formação sobre violência doméstica que, com o seu apoio, serão ministrados nas autarquias.
O Plano está em vigor apenas há meses. Naturalmente, virá o momento de avaliá-lo. Muito sinceramente, não estou certa de que seja já o momento certo para fazê-lo, porque, repito, o Plano entrou em vigor há muito pouco tempo e vigorará até 2006, pelo que estamos muito longe de poder saber se vai ou não ser cumprido, mas espero bem que o seja.
Acresce que este Plano foi objecto de um período de consulta pública e, portanto, alguns dos aspectos que a Sr.ª Deputada refere, nomeadamente o de saber se há um suficiente envolvimento das ONG, poderia ter sido uma questão suscitada, se era essa a opinião do Partido Socialista, quando o Plano esteve em debate público.
Neste momento, o Plano está a ser aplicado e pode sempre ser reavaliado. Por mim, estou sempre disponível a reavaliar tudo no sentido de poder melhorar tudo, julgo é que, com apenas três ou quatro meses de vigência, é provavelmente um pouco cedo para se poder fazer juízos sobre se o Plano tem ou não condições de implementação. Espero que as tenha.
No que diz respeito à abertura de casas-abrigo e à falta de condições e de meios nalguns casos, questão que, aliás, também se relaciona com as perguntas colocadas pelos Srs. Deputados Luís Fazenda e Bernardino Soares, sei que representantes do Partido Socialista e o seu líder visitaram uma casa que está pronta há um ano e meio mas que não está em funcionamento. Era sabido que havia ainda um outro caso de dificuldade de financiamento por parte da segurança social.
Naturalmente, sou de opinião que estas coisas têm de ser ultrapassadas com urgência, mas, Sr.ª Deputada, também é certo - e esta resposta dirijo-a a si, em especial - que se uma casa está pronta há um ano e meio e não está a funcionar, então, quer dizer que foi construída durante o tempo do governo do Partido Socialista. Portanto, esperava-se que também tivessem sido feitos os contactos com a segurança social com vista a obter o financiamento. Isto porque o Governo - e, neste aspecto, tenho de defendê-lo - não pode deixar abrir casas espontaneamente por iniciativa de autarquias, de particulares ou de quem quer que seja que, depois, apresentam a conta à segurança social.
Uma vez, quando, nesta sede, perguntei se havia disponibilidade do Governo para aumentar o número

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dessas casas, o Ministro respondeu que sim, mas de maneira sustentada, e compreendo-o. A segurança social tem de orçamentar e, portanto, tem de saber o que vai pagar no ano seguinte.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Por favor conclua.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Apenas responderei à questão colocada pelo Sr. Deputado Luís Fazenda, de grande importância para mim própria, relacionada com a reactivação dos programas de mediadores culturais.
Devo dizer que as ONG que estão no terreno, na Guiné-Bissau, constituídas por guineenses, mas também as organizações internacionais, como é o caso do Projecto Defesa dos Direitos das Mulheres na Guiné-Bissau, financiado pela Alemanha, têm mediadores no terreno. Se o Sr. Deputado se referia a mediadores que actuem em Portugal, junto das comunidades africanas, estou perfeitamente de acordo consigo em que esses mecanismos, a não estarem activos neste momento, devem ser reactivados, porque só se ultrapassará um flagelo destes mostrando às populações, não de forma paternalista mas solidária, que o que referiu é uma prática dramática, absolutamente contrária aos direitos humanos e perigosa para a saúde pública das mulheres.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): - Sr. Presidente, é para informar que faremos entrega na Mesa de um documento em que explicaremos que não é verdade o que referiu a Sr.ª Deputada acerca da casa do Montijo, quando disse que, tendo a respectiva construção sido iniciada no tempo do governo do Partido Socialista, o mesmo deveria ter estabelecido um protocolo com a segurança social.
De facto, o que houve neste caso foi o incumprimento, por parte do actual Governo, de um compromisso anteriormente assumido. Assim, aquela casa não está a funcionar exclusivamente devido a falta de vontade e a outras prioridades estabelecidas por este Governo quanto a gastar o seu dinheiro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, fico a aguardar a entrega desse documento na Mesa. De qualquer modo, julgo que o seu conteúdo já ficou convenientemente divulgado.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Medeiros, para uma intervenção sobre assunto de interesse político relevante.

O Sr. José Miguel Medeiros (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Passados dois meses desde o final do Verão e suficientemente afastados do período crítico dos fogos florestais, é já possível e desejável proceder a um primeiro balanço político da acção do Governo neste domínio.
O ano de 2003 foi verdadeiramente catastrófico do ponto de vista das consequências dos fogos florestais, tanto pelo número de vítimas como pela dimensão da área ardida.
De facto, 20 mortos e meio milhão de hectares ardidos são números claramente elucidativos e que nos obrigam a reflectir e, sobretudo, a retirar ilações para o futuro.
Não basta, como tem feito o Governo, refugiarmo-nos atrás das condições meteorológicas excepcionais ou dos problemas estruturais das florestas nacionais para explicar o sucedido e iludir as responsabilidades políticas que lhe cabem, designadamente no falhanço da prevenção, da preparação e da coordenação dos meios de combate.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Das múltiplas audições que têm vindo a ser feitas em sede de comissão parlamentar especializada é já claro que, para além das questões estruturais e das condições meteorológicas ocorridas, assistimos a um completo falhanço na preparação e no lançamento do dispositivo de combate.
É incompreensível que a reestruturação e a fusão do Serviço Nacional de Bombeiros, do Serviço Nacional de Protecção Civil e da CNEFF (Comissão Nacional Especializada de Fogos Florestais) tenha diferido para o mês de Março o que devia estar concluído em Novembro ou Dezembro do ano anterior.
Por outro lado, é também já hoje claro que a evidente descoordenação e incapacidade com que a nova

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estrutura enfrentou o fenómeno potenciou as suas consequências e favoreceu a tragédia a que todos, infelizmente, assistimos.
A desorientação dos responsáveis e do Governo atingiu proporções tais que chegou mesmo a ser patética e surrealista a forma como alguns ministros reagiram no terreno.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Todos estarão lembrados das declarações do Ministro do Ambiente a responsabilizar os ex-combatentes, deixando incomodados não apenas os visados como o próprio Governo que se apressou a desmenti-lo.
E é certamente por receio do rebentamento de mais alguma "granada política" com origem no Ministério do Ambiente que o PSD se tem esforçado, em sede de Comissão, por evitar a vinda do Sr. Ministro, escondendo-o, e sugerindo a vinda, em seu lugar, de um dos seus Secretários de Estado, num claro e indisfarçável sinal da incomodidade crescente que a presença deste Ministro no Governo vem provocando.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - As coisas chegaram a tais proporções que o próprio Primeiro-Ministro se viu obrigado a ir para o terreno, durante o período crítico, numa tentativa de travar a espiral de descoordenação e desvario que atingiu o seu Governo - pelos vistos sem grande êxito, se atendermos ao balanço final da campanha. Aliás, outra coisa não seria de esperar face aos sintomas de contágio que, a partir de certa altura, o próprio Primeiro-Ministro evidenciou.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ensaiou, mais uma vez, uma fuga em frente, anunciando um Livro Branco quando deveria ter anunciado um "Livro Negro" e, ao mesmo tempo, sugerindo estarmos perante uma conspiração criminosa, clamando por fantasmas sempre úteis nestas circunstâncias.

A Sr.ª Manuela Melo (PS): - Exactamente!

O Orador: - Tentando dar corpo à ideia, até chamou o Director da Polícia Judiciária a São Bento, publicitando a audiência e proferindo declarações com a solenidade devida.
No entanto, e enquanto tudo isto acontecia, o País continuava a arder e, no terreno, aquilo que vimos foram os bombeiros, generosa e empenhadamente, a combater os incêndios até à exaustão.

Aplausos do PS.

Ou seja e em síntese, o Governo comportou-se durante a crise dos fogos como a orquestra do Titanic que continuou a tocar enquanto o barco se afundava!
Mas como se tudo isto não bastasse, e apesar das sucessivas e reiteradas profissões de fé no sistema de coordenação e nos seus responsáveis que o Sr. Ministro da Administração Interna foi fazendo, dia sim, dia não, durante o período crítico, vem agora o seu louvado ex-presidente, Eng.º Leal Martins, desmenti-lo, assumindo a descoordenação do Serviço e, mais grave, acusando autarcas e membros do Governo de estarem na origem de pressões totalmente ilegítimas e com óbvia interferência na operacionalidade e no direccionamento dos meios.
O Eng.º Leal Martins chega a afirmar, inclusive, que terá havido obstaculização, por parte de autarcas, no que respeita ao accionamento dos Planos Municipais de Emergência e Protecção Civil, condição sine qua non para que possam ser accionados os planos de nível superior.
Tudo isto são dados novos e relevantes, de enorme gravidade, cujo esclarecimento é indispensável para se poder compreender cabalmente o que se passou neste Verão.
E não se diga que o facto de o Sr. Ministro ter assumido publicamente a existência de alguma descoordenação constitui uma resposta suficiente e tranquilizadora ou satisfatória.
E nem sequer me refiro às eventuais situações denunciadas e passíveis de procedimento criminal que o Sr. Ministro, e muito bem, já remeteu para a sede própria, a Procuradoria-Geral da República.
Dois meses volvidos e apesar dos factos, o Governo e a maioria que o suporta persistem em manter a mesma atitude que a avestruz perante o perigo, optando por "enterrar a cabeça na areia".
Hoje mesmo, em reunião de coordenação da Comissão Eventual para os Incêndios Florestais, a maioria

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inviabilizou a vinda do Eng.º Leal Martins, com o duplo argumento de que a Comissão não deveria andar a reboque de entrevistas a jornais.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Não é verdade!

O Orador: - Por outro lado, diz que o conteúdo das mesmas ou é do foro da justiça ou, naquilo que não é, não constitui novidade e estará mesmo no anexo do Livro Branco cuja execução terá sido da responsabilidade do Eng.º Leal Martins.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não pretendendo nem permitindo que, das minhas palavras, seja extraída qualquer leitura no sentido de corroborar ou validar, a priori, as declarações do Eng.º Leal Martins, permito-me, no entanto, chamar a atenção para o facto de que uma recusa com estas características por parte da maioria em ouvir e, portanto, esclarecer algumas das suas afirmações politicamente relevantes e até em confrontá-lo com o facto de, enquanto responsável, nunca as ter denunciado ou, se o fez, de as fazer chegar a quem de direito, legitimará, isso sim, a leitura mais óbvia na ausência de um contraditório, a mais perversa das leituras e que é aquela que considera que, "em política, o que parece é",…

Aplausos do PS.

… sobretudo se nada for feito para o desmentir por parte de quem tem essa responsabilidade e que, no caso vertente, são os Deputados desta Câmara.
Já se suspeitava que o Ministro da Administração Interna havia produzido um Livro Branco cuja feitura assumiu ter conduzido pessoalmente, ao que parece, tendo mesmo redigido parte dele, o que explica que estejamos em presença de um relatório dos respectivos serviços e do próprio Ministro sobre a sua visão do problema, sem qualquer distanciamento crítico. Diria mesmo, um relatório quase intimista, assim inaugurando uma nova era na feitura de livros brancos no nosso país.
Compreendem-se, assim, melhor algumas das conclusões vertidas na introdução, aliás verdadeiramente espantosas, como aquela que aponta como única falha na prevenção o falhanço das campanhas de sensibilização e informação ao público - veja-se pág. 10 do Livro Branco.
Curiosamente, para a concretização do Livro Branco foram ouvidos todos os ex-presidentes do SNB (Serviço Nacional de Bombeiros), mesmo os mais antigos, com excepção dos dois presidentes que antecederam o Eng.º Leal Martins e que estiveram sob a tutela do anterior governo. Naturalmente, é um caso que nos suscita algumas interrogações.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O tempo é de esclarecimentos.
A gravidade política das afirmações contidas na entrevista do Eng.º Leal Martins vai ao ponto de este assumir ter recebido pressões de ministros a pedido de autarcas certamente desesperados com a tragédia.
Se outros indícios não houvesse da falta de coordenação e organização, de preparação e planeamento, bem como da condução da operacionalidade no terreno, eis que, pela voz do primeiro responsável de então, elas aí estão.
De facto, a melhor prova disso é o facto de o Sr. Ministro ter reagido à entrevista, no plano exclusivamente judicial, solicitando - e bem! - uma investigação à PGR sobre as denúncias de corrupção, mas nada ter dito sobre as restantes acusações que implicam responsabilidade política.
Por tudo isto, o País tem de saber o que efectivamente se passou neste Verão "negro" e em tudo aquilo que o antecedeu. Por isso o PS requereu a audição com a máxima urgência do Eng.º Leal Martins, na Comissão Eventual, visando o cabal esclarecimento de todas as situações referidas.
A maioria rejeitou, de forma incompreensível, a nossa pretensão e com esta atitude prestou um mau serviço ao País. O PS não se conforma com esta decisão e não deixará, na altura própria, de pedir responsabilidades políticas ao Governo e ao Sr. Primeiro-Ministro.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a pior coisa que podemos fazer, e o pior serviço, que poderíamos prestar à democracia e ao País, seria pactuar com lógicas que não favoreçam a transparência. Por isso, e em nome deste princípio, não nos demitimos das nossas responsabilidades, nem podemos "meter a cabeça na areia" ou "assobiar para o lado" em face de tão graves acusações. Achamos mesmo que isso seria um insulto a todos aqueles que viram as suas famílias e o seu património duramente atingidos, bem como a todos os que abnegadamente no terreno deram o seu melhor, até à exaustão, para evitar ou, pelo menos, minorar a tragédia.
Assim, exortamos o Governo, e a maioria que o suporta, a deixarem de comportar-se como vítimas e a fugir dos problemas, mas passarem a assumir as suas responsabilidades, que é isso que o País e os portugueses

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lhes exigem.

Aplausos do PS.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Sobre que matéria, Sr. Deputado?

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, é uma interpelação à Mesa, na sequência daquilo que foi, agora, a intervenção do Sr. Deputado José Miguel Medeiros e no que concerne à inexactidão das suas afirmações face ao que se passou hoje na reunião de coordenadores.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não sei bem se isso cabe na figura regimental de interpelação à Mesa ou se será melhor inscrever-se para um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado José Miguel Medeiros.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Miguel Medeiros fez aqui afirmações que não correspondem à verdade e por respeito a todos os que estiverem presentes, nomeadamente a esta Assembleia, cujas declarações que proferiu, repito, não são exactas, merece, com o devido respeito, ser dado um esclarecimento de forma atempada e deve ser agora.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, com certeza que sim, dou-lhe a palavra na altura própria, ou seja, não agora, Sr. Deputado, mas a seguir.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Miguel Medeiros, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Miguel Medeiros, naturalmente que a questão dos fogos florestais é uma questão que precisa de ser analisada com calma, com tranquilidade, e tirar, na Comissão Eventual para os Incêndios Florestais, as responsabilidades que tiverem de ser tiradas sobre esta matéria.
Ouvi atentamente a sua intervenção, comungo de algumas questões que o Sr. Deputado aqui colocou e, efectivamente, aquilo que ouvimos até hoje na Comissão Eventual já dá para fazer um balanço e uma análise, ainda que sintéticos e não totalmente feitos, sobre algumas das causas, e também das consequências, dos incêndios florestais em Portugal.
É evidente que disse - e bem! - que esta situação foi uma catástrofe para Portugal e há situações que ainda teremos de ouvir em sede de Comissão nomeadamente algumas das entidades a quem cabe a responsabilidade por pagamentos e apoios directos a muitas das vítimas que ainda não receberam qualquer quantia.
De facto, há algumas situações que deveriam ter sido - e ainda não foram - de ajuda aos rendimentos daqueles que ficaram sem nada e que precisam desse apoio. Mas a questão principal é a de saber que fazer para o futuro com base na análise daquilo que falhou e daquilo que esteve mal.
Há já, hoje, um levantamento de situações, mas a entrevista do ex-presidente do Serviço Nacional de Bombeiros e de Protecção Civil, Eng.º Leal Martins, merecia - e merece, em nosso entender e por isso a pedimos na Comissão Eventual, tal como o PS fez - a vinda do Eng.º Leal Martins à Assembleia, tendo sido de facto lamentável o que se passou hoje na Comissão de Coordenadores presidida pelo Sr. Presidente.
Houve, de facto, da parte do coordenador do Grupo Parlamentar do PSD na Comissão Eventual e do CDS-PP o negar a vinda à Assembleia do Eng.º Leal Martins, porque diziam não ser oportuno e poderia vir ainda "incendiar" mais a Comissão Eventual.
Na verdade, não comungamos dessa opinião! O que há a fazer é esclarecer, com profundidade, aquilo que ele não foi capaz de verter para o Livro Branco e hoje veio dizer, através da comunicação social. Há que fazer uma análise serena e cuidada, mas também tão exaustiva quanto possível e isso só pode ser feito com a presença do Eng.º Leal Martins.
Esperamos que o PSD e o CDS-PP reflictam sobre esta matéria e que, quando isto for proposto ao plenário da Comissão Eventual, não venham a criar o obstáculo que hoje criaram, prático e real, da não vinda aqui do Eng.º Leal Martins.
Isto porque aquilo que ele disse é demasiado grave e há que ter em atenção. Ele referiu na entrevista, entre outras coisas, questões de ordem criminal, que como também já disse, vão ser remetidas pelo Sr.

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Ministro à Procuradoria-Geral…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo terminou, tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Mas além do que referi há também coisas que ele disse que têm que ver com pressões políticas inadmissíveis e nós queremos saber quais são essas pressões políticas.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Miguel Medeiros dispõe de tempo mais do que suficiente para responder aos diversos pedidos de esclarecimento que tem separadamente, mas faço-lhe um apelo, porque a ser assim vai prejudicar outros oradores inscritos.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Miguel Medeiros (PS): - Sr. Presidente, parece-me que a consideração que me merecem os meus pares me leva a responder-lhes separadamente…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, fique com essa na consciência.

O Sr. José Miguel Medeiros (PS): - Sr. Presidente, aceito o seu conselho avisado, mas responderei separadamente.

O Sr. Presidente: - Está no seu direito, Sr. Deputado, pelo que tem a palavra.

O Sr. José Miguel Medeiros (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rodeia Machado, agradeço-lhe a questões que me colocou, pois, no fundo, vêm ao encontro das preocupações do Partido Socialista que tive oportunidade de comunicar-vos da Tribuna.
De facto, achamos que não estamos em presença de matéria exclusivamente criminal que, naturalmente, terá de ser tratada pela PGR. Mas há aqui, claramente, indícios ou, pelo menos, acusações gravíssimas que têm de ser ou desmentidas categoricamente ou, então, evidentemente comprovadas de que houve interferências ou pressões políticas, ou terão havido pressões políticas, isto para sermos mais justos e, sobretudo, mais honestos na apreciação, sobre o ex-presidente do SNBPC.
Aliás, a sua audição na Comissão Eventual esteve prevista e só, ainda, não se realizou porque o calendário da Comissão não nos permite fazermos todos os dias audições, como temos, apesar de tudo, estado a fazer a um ritmo bastante elevado. Isto porque, com o hiato que existiu entre a sua saída, ou a sua demissão, e a sua substituição, teria havido tempo para ouvi-lo, o que, certamente, teríamos feito.
Na verdade, não fará sentido, uma vez que foram ouvidos todos os ex-presidentes do SNB para fazer-se o Livro Branco, que agora não ouvíssemos este, mais a mais depois de ter dito o que disse.
Não me compete a mim, e penso que a nenhum grupo parlamentar, avaliar dos níveis de educação ou de civilidade do Sr. Eng.º Leal Martins, se ele o quis dizer na comunicação social e não o disse previamente ao Sr. Ministro, isso tem que ver com padrões éticos e deontológicos… A nós compete-nos fazer avaliações políticas e desse ponto de vista é preciso fazer-se uma avaliação, e se a Comissão Eventual não o ouvir ninguém vai entender isso no País. Essa é que é essa!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Marco António Costa.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Miguel Medeiros, é com algum espanto que ouvimos a intervenção do Partido Socialista, hoje, em Plenário.
Há, de facto, duas dimensões completamente distintas: a dimensão dos trabalhos em sede de Comissão e a dimensão das intervenções políticas em Plenário.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E há uma plena disparidade entre o comportamento do Partido Socialista, quanto a esta matéria, em Comissão e em Plenário.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, à revelia e ao arrepio daquilo que era previsível, o Sr. Deputado veio aqui fazer esta intervenção numa tentativa apressada de procurar cobrir com uma "nuvem de fundo" aquilo que são

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as conclusões que as várias audições nos têm trazido de uma forma clara:..

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … é que os fogos florestais tiveram duas bases essenciais: uma base estrutural, assente num problema de educação cívica, e uma base estrutural de falta de uma política florestal.
Aliás, sugiro que responsabilizemos todos os governos para evitarmos polémicas públicas relativamente a isto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado, não me escapou o facto de o Sr. Deputado em toda a intervenção que fez não ter referido o problema da floresta e a falta de uma política de gestão da mesma como uma das causas dos fogos florestais deste Verão.
Primeira pergunta que lhe deixo: será que isso revela má consciência?
Uma outra questão que me parece importante é a de que das audições que fizemos todas elas coincidem no sentido de existirem duas causas conjunturais que fizeram a situação assumir uma proporção nunca antes vista: o problema do clima e o problema do "incendiarismo".
Todas as audições apontaram nesse sentido, recordo mesmo duas que são particularmente exemplificativas: a Associação Nacional de Freguesias num inquérito que fez a mais de 1000 presidentes de juntas apontou o "incendiarismo" e o fogo posto como a primeira causa dos fogos florestais no ano 2003.
Lembro-lhe, ainda, um outro exemplo: o Presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses estabeleceu um paralelismo claro entre as condições climatéricas que se viveram, em Portugal, no Verão de 2003 e aquilo que se viveu recentemente na Califórnia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador. - Estes dois exemplos são exemplos claros do trabalho tranquilo que esta Comissão estava a fazer, mas os Srs. Deputados não conseguiram resistir à tentação de, mais uma vez, e pela segunda vez, durante o decorrer destes trabalhos, procurarem aqui, em Plenário, trazer matéria que não corresponde à verdade do que se passou na Comissão.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, Sr. Deputado, sobre essa matéria do que se passou na Comissão, o Sr. Deputado Francisco José Martins poderá, daqui a pouco, esclarecer melhor.
Porém, há uma coisa de que quero lembrá-lo: o Sr. Eng.º Leal Martins escreveu, e assinou, este documento que aqui tenho comigo, com mais de uma centena de páginas onde teve o cuidado de assinar página a página…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se, queira concluir.

O Orador. - Termino já, Sr. Presidente!
Como dizia, teve o cuidado de assinar página a página e em nenhuma dessas páginas existe aquilo que ele referiu nas entrevistas.
Para ser avaliado com todo o rigor o que ele disse deve caber à Procuradoria-Geral da República essa responsabilidade; não é uma Comissão que deve fazer recomendações ao Governo e às outras instituições, mas, sim, a Procuradoria para que não fique qualquer dúvida relativamente àquilo que ele disse.
Aliás, ele teve oportunidade de fazê-lo enquanto era responsável e não o fez, vá-se lá saber porquê!...

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Então, deixe-o vir cá esclarecer!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Medeiros.

O Sr. José Miguel Medeiros (PS): - Sr. Deputado Marco António Costa, agradeço-lhe as questões que colocou, e, para já, desminto com toda a veemência que esteja a faltar à verdade relativamente àquilo que se passou, mas deixarei para o debate com o Sr. Deputado Francisco José Martins o contraditório

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dessa situação.
De facto, não é meu apanágio faltar à verdade!
Porém, há outra questão que o senhor levantou aí e muito bem: o senhor falou no "incendiarismo" e, na verdade, o Sr. Director Nacional da Polícia Judiciária - e o Sr. Deputado estava lá quando ele afirmou isto - disse que os níveis de "incendiarismo" deste ano foram iguais aos anos anteriores, o que admitiu foi que, dadas as condições climatéricas se tivessem potenciado as circunstâncias.
E disse mais: disse que até que o problema que se colocava…

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Não, não!

O Orador: -… tinha que ver com o facto de estar identificado o perfil do incendiário tipo, estarem até basicamente identificados, em grande número, quem são e que deveria pensar-se não numa alteração da moldura penal mas numa alteração dos tempos de libertação, prisão, enfim… Não sei dizer os termos técnico-jurídicos, mas ele disse-os claramente.
Portanto, não vale a pena estar a mistificar e o senhor ir buscar a ANAFRE para justificar "incendiarismo" quando o Director Nacional da Polícia Judiciária, que é a quem compete tratar o crime, não disse isso.
O Sr. Deputado falou também das políticas florestais: naturalmente que elas responsabilizam todos com excepção, talvez, de D. Dinis a quem deveremos prestar homenagem por ter sido o primeiro rei português e o primeiro responsável político a preocupar-se a sério com a floresta.
Bom, os senhores dizem que não querem esconder o que se passa, mas não querem cá trazer os responsáveis, e o que é facto é que, quando cá veio o Sr. Ministro da Agricultura e nós suscitámos a vinda à Comissão do Sr. Secretário de Estado das Florestas, os senhores disseram que não era preciso porque o Sr. Ministro é quem tem a competência e as competências das florestas são delegadas por ele, portanto não fazia sentido.
Porém, quando veio o Sr. Ministro do Ambiente - e o Sr. Deputado Francisco José Martins não me desmentirá - o que o senhor sugeriu foi que o Sr. Ministro do Ambiente não viesse, porque não seria necessário, uma vez que viriam os Srs. Secretários de Estado que têm competências delegadas.
Pergunto-lhe: que critério é este? É esconder o Ministro!! Só pode ser isso!
Eu sei que têm medo das "granadas" que possam rebentar vindas daquele ministério, mas não fui eu que escolhi o Sr. Ministro

Aplausos do PS.

Olhe, e já agora, em relação ao Sr. Eng.º Leal Martins também não foi o Partido Socialista que o escolheu para Presidente do SNBPC, foram os senhores e o Sr. Ministro e, se ele não diz no Livro Branco aquilo que disse na entrevista, então mais uma razão para o chamarmos cá e esclarecer-nos, porque não podemos ficar com este equívoco assim!!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Miguel Medeiros, se V. Ex.ª não integrasse a Comissão Eventual para os Incêndios Florestais, eu, embora, com alguma benevolência, até poderia tentar compreender o que aqui nos veio dizer.
Mas a partir do momento em que V. Ex.ª não só integra essa Comissão como tem acompanhado com assiduidade os respectivos trabalhos, confesso que tenho alguma dificuldade em perceber como é que consegue vir aqui dizer-nos que a maioria se está a refugiar nas condições climatéricas.
Bom, pegando nisso, eu diria que V. Ex.ª vem aqui, isso sim, tentar atear um "incêndio", mas sem que para tal tenha matéria combustível, sem que tenha ignição e até - permita-me que o diga, com toda a simpatia - sem jeito!
Efectivamente, Sr. Deputado, V. Ex.ª sabe tão bem como eu que, das várias audições que temos realizado na Comissão Eventual para os Incêndios Florestais, resulta claramente - e só quem lá não esteve é que pode não ter percebido - que há causas conjunturais e estruturais para o que ocorreu.
Como causas estruturais, desde logo, há a registar ineficiências e inadequações de décadas, décadas e décadas. Portanto, não vale a pena atribuir responsabilidades a quem quer que seja, pois trata-se de uma responsabilidade partilhada por todos nós.
Das causas conjunturais muito concretas, destaco o clima. Tivemos um Inverno excessivamente húmido,

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chuvoso que levou a um excesso de vegetação que, meses depois, foi fustigada - permitam-me a expressão - com semanas de calor intenso.
Ainda no passado fim-de-semana, na Câmara Municipal de Matosinhos, participei num colóquio sobre protecção civil e foi lá dito, por técnicos credenciados (e foram exibidos gráficos), que a temperatura máxima, durante dias seguidos, foi superior a 40ºC! Não tenho presente qual era a temperatura mínima, mas havia uma amplitude térmica diminuta, situação que se manteve durante semanas, o que, naturalmente, criou condições não só para o elevado número de incêndios como para a propagação dos mesmos.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Também há que ter em conta o "incendiarismo", os focos simultâneos e estratégicos em alguns cenários, mas é evidente que estes factores não nos podem levar a tirar outra conclusão.
O que o Director da Polícia Judiciária afirmou na Comissão foi que, dos factos apurados até agora, não resultavam ainda indícios nesse sentido, mas se bem se recordará V. Ex.ª, eu próprio referi (e o Sr. Director da Polícia Judiciária confirmou-o) que uma coisa são factos comprovados e outra coisa são factos ainda não comprovados, ou que nem sequer se conseguem provar.
V. Ex.ª também não terá esquecido que, por exemplo, o Sr. Presidente da ANAFRE disse que, num inquérito feito aos presidentes das juntas de freguesia - salvo erro, falou em mais de mil -, uma percentagem elevadíssima desses presidentes, da ordem dos 80%, dizia que não era assim.
Para concluir, pergunto ao Sr. Deputado se, neste contexto difícil, não concorda que o Governo agiu de forma célere no pagamento das indemnizações e das habitações destruídas, tendo desencadeado mecanismos para o fazer não só em termos nacionais como no âmbito europeu, com uma celeridade e uma eficácia a que, de todo, não estávamos habituados.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Medeiros.

O Sr. José Miguel Medeiros (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Paiva, agradeço as questões que me colocou. Naturalmente, V. Ex.ª "ajeita-se" muito melhor do que eu ao papel, porque eu não me ajeito a esse papel de estar sempre a recorrer aos mesmos argumentos, já estafados, das condições excepcionais - toda a gente sabe que houve condições excepcionais!
A questão que se coloca, já lho disse nesta Câmara, é a de saber se essas condições não eram perspectiváveis logo em Maio, quando tivemos temperaturas médias superiores em 7ºC ao que é normal, em termos de média climática portuguesa. E nada foi feito!
O Sr. Deputado não consegue desmentir nem desdizer que várias das pessoas que foram ouvidas na Comissão Eventual para os Incêndios Florestais, designadamente o Sr. Presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, quando instado, por várias vezes, a dizer que a principal causa dos incêndios tinham sido as condições meteorológicas excepcionais, confirmou-o mas sempre ex aequo com as condições estruturais e com a organização dos serviços.

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Disse-o várias vezes e reafirmou-o! Está gravado, podemos tirar as teimas ouvindo as gravações.
Também o Presidente da Associação dos Industriais de Madeiras, que esteve na Comissão há 8 ou 15 dias atrás, quando um dos Srs. Deputados do PSD fez uma intervenção inicial saudando a acção dele e felicitando o Governo pela rapidez com que o Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas tinha actuado, ele disse: "Alto aí! Depois de tudo estar a arder, chamaram-nos e então, sim, foi rápido". São realidades diferentes.
Portanto, os senhores têm tentado permanentemente, em sede de Comissão Eventual, condicionar as opiniões de quem é ouvido, levando-os a concluir o mesmo que os senhores! Falo em condicionar politicamente, de uma forma correcta; não estou a dizer que o fazem com uma pistola apontada!

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Só faltava dizer isso!

O Orador: - Mas procuram interpretar a vosso favor as palavras dos depoentes, o que compreendo.
Os senhores têm um problema a resolver: um Ministro que já "morreu" politicamente há muito tempo

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e que continua, como um cadáver, a arrastar-se no Ministério da Administração Interna. Ainda hoje, foi noticiada pela imprensa mais uma vaga de demissões no SNBPC…
Por outro lado, temos um Ministro do Ambiente que faz o que faz e diz o que diz… Ou seja, há uma guerra aberta entre o Ministério da Agricultura e o Ministério do Ambiente por via da tutela das florestas, já que os senhores designaram para Secretário de Estado alguém que é um dos responsáveis - pelo menos diz-se ideólogo da política de celuloses - por parte do território nacional ser hoje uma "barriga de aluguer" das celuloses.
Os senhores estão "embrulhados" em todo este processo, por isso compreendo a vossa posição, que é difícil! Louvo-vos o esforço, mas desculpem que vos diga que não conseguem sair disso. Só a verdade nos permitirá, com transparência, responder aos anseios dos portugueses. Lamentavelmente, não é esse o caminho que os senhores têm seguido e, mais grave, têm impedido que se siga, o que já não vos fica tão bem.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, sendo coordenador adjunto dos Deputados do PSD na Comissão Eventual para os Incêndios Florestais, estive presente na reunião por impossibilidade do meu colega, Deputado Marco António Costa, por razões políticas, e pedi agora a palavra para, serenamente, esclarecer o que de menos correcto foi dito pelo Sr. Deputado José Miguel Medeiros - aliás, as suas intervenções complementares à inicial vieram aduzir um conjunto de questões que não estão correctas nem correspondem à verdade, o que constituiu mais uma razão para eu intervir.
Sr. Presidente, permita-me uma nota prévia.
Realmente, quem está "embrulhado" em contradições permanentes é o Partido Socialista, designadamente nas que resultam das afirmações do Sr. Deputado José Miguel Medeiros.
Tenhamos presente o seguinte: na primeira reunião da Comissão Eventual para os Incêndios Florestais, o Partido Socialista começou por pedir que a esta Comissão fosse atribuído um mandato muito curto, se possível até ao fim do ano, para resolver tudo depressa; o Partido Social-Democrata - corroborado pelos restantes partidos - afirmou, de forma inequívoca, que o tempo de mandato será o mais célere possível, mas que permita esclarecer, de uma forma clara, tudo quanto está subjacente ao que ocorreu, por respeito às pessoas, ao País e a todos aqueles que perderam os seus haveres e familiares. Este é ponto de honra.
Mais do que isso, o Partido Socialista quer contrariar, porventura, a normalidade com que a Comissão está a funcionar, trabalhando de forma célere e eficaz, sem quaisquer questiúnculas. Enfim, a mensagem que o Sr. Deputado aqui trouxe tenta tão-somente esconder que temos resolvido, de comum acordo, realizar as audições de todos quantos entendemos.
Mais: na reunião de hoje, esclareceu-se, de uma forma pacífica, quais as entidades e personalidades que teremos de ouvir até ao fim. Tudo se passou dentro de um clima de normalidade com vista ao objectivo perfeito de ouvirmos e percebermos o que estamos a fazer.
Mas a grande questão, repito, são as contradições do Partido Socialista.
O que o Sr. Deputado José Miguel Medeiros aqui disse é falso, porque eu afirmei claramente que estávamos disponíveis para ouvir o Sr. Ministro do Ambiente mas que, em todo o caso - é pena que não haja gravação -, se assim o entendessem, à luz dos interesses da audição das matérias concretas, poderíamos ouvir o Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território ou o Sr. Secretário de Estado do Ambiente, dado que as questões de ambiente estão em aberto e importa esclarecê-las.
Mais um equívoco do Sr. Deputado: quando o Sr. Ministro da Agricultura se deslocou à Comissão, fê-lo por razões próprias, com o acordo de todos, e disse claramente que era o responsável pelo plano florestal, pela reestruturação, enfim, pela reforma que se vai produzir. Portanto, politicamente poderia dar todas as explicações necessárias.

O Sr. Presidente: - O tempo de que dispunha esgotou-se. Tenha a bondade de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Como não poderei ir mais longe, gostaria de esclarecer o seguinte: discutimos abertamente o que o Sr. Eng.º Leal Martins viria ou não fazer à Comissão, adiantámos que, no Anexo I ao Livro Branco dos Incêndios Florestais ocorridos no Verão de 2003, o Sr. Eng.º Leal Martins explicou tudo quanto tinha a ver com os incêndios e, se não acrescentou quaisquer outros elementos, foi porque entendeu não fazê-lo.

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Ora, os factos novos têm de enquadrar-se no objecto da Comissão, que consiste em apurar o que se passou e o porquê dos incêndios, em particular em 2003, e quais as medidas a tomar no futuro.
Sr. Deputado, porque não disponho de mais tempo, concluo desta forma: a falência da sua observação, como dos argumentos aduzidos pelo Sr. Deputado Rodeia Machado, resulta do facto de, hoje mesmo, o Sr. Eng.º Leal Martins ter dito na rádio que não é nesta sede que ele tem de esclarecer as questões, porque elas têm contornos de natureza criminal. A sede própria é aquela a que o Ministro e o Governo recorreram: a Procuradoria-Geral da República.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Medeiros.

O Sr. José Miguel Medeiros (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Martins, lamento imenso, mas não posso, de forma alguma, concordar consigo. Aliás, compreendo a posição incómoda em que se encontra: o senhor não teve o tempo esgotado, o senhor estava esgotado nos argumentos e gastou redondamente todo o tempo, sem conseguir contestar ou rebater uma única questão das que lhe coloquei. Nenhuma! Zero!
Mais: o que o senhor aqui fez foi chamar irresponsável ao Ministro do Ambiente.

Protestos do PSD.

De facto, disse que o Ministro da Agricultura era responsável, que assumiu essa responsabilidade, mas não perguntou ao Ministro do Ambiente se ele se sentia responsável!? Não, propunha-se que o convite se dirigisse imediatamente ao Secretário de Estado do Ambiente! Desculpe, mas foi essa a sua proposta.

Vozes do PSD: - Não, não!

O Orador: - Não me desminta, porque é verdade! Desafio esta Câmara… Não quero evocar a presença da Sr.ª Presidente da Comissão, mas o senhor sugeriu que o convite fosse dirigido ao Secretário de Estado do Ambiente. Aliás, a própria Sr.ª Presidente afirmou que era normal que o convite se dirigisse ao Sr. Ministro. E mais não digo!
Sr. Deputado Francisco Martins, vai desculpar-me, mas os senhores têm um problema complicado a resolver…

Protestos do PSD.

Claro que o Sr. Deputado Rodeia Machado confirma o que estou a dizer, porque subscreveu tudo o que afirmei em Comissão sobre esta matéria. Em todo o caso, ele falará por si.
A verdade é que o Sr. Deputado não conseguiu rebater um único aspecto de que falei. Os senhores continuam a refugiar-se, têm receio de ser confrontados com a vossa própria política e com o desastre em que ela se tem traduzido nesta matéria. Lamento, mas é a verdade!

Protestos do Deputado do PSD Marco António Costa.

Vale mais assumirem rapidamente que assim é e partirem para uma solução adequada do que sujeitarem o País a uma situação que não tem solução alguma à vista. Os senhores estão a meter-nos num autêntico e completo atoleiro numa área sensível. Vem aí o Inverno, a erosão e todo o problema das cheias… Veremos, com o SNBPC neste estado, o que vai acontecer. Mas depois não digam que o Partido Socialista não os alertou!

Aplausos do PS.

Srs. Deputados, ficam inscritos para a próxima sessão os Srs. Deputados Carlos Antunes e Nuno Teixeira de Melo.
Terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 35 minutos.

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ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Quero comunicar à Câmara o seguinte: chegou-se a acordo entre todos os grupos parlamentares e o Governo para que o debate de urgência requerido pelo Partido Socialista - no qual também converge o Bloco de Esquerda, com um pedido semelhante - seja realizado na sessão plenária de amanhã, em substituição do período de antes da ordem do dia, ficando assim satisfeitas as diversas solicitações que foram feitas à Mesa.
Não será, pois, necessário convocar qualquer Conferência de Líderes para o efeito. Procedemos com a máxima rapidez.
Srs. Deputados, como primeiro ponto da ordem do dia, estão em aprovação os n.os 11 a 18 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 10, 15, 16, 17, 22, 23, 24 e 30 de Outubro.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
O segundo ponto da ordem do dia de hoje é preenchido com a discussão conjunta das propostas de resolução n.os 45/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República da Bulgária, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003, 46/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República Eslovaca, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003, 47/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República da Eslovénia, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003, 48/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República da Estónia, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003, 49/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República da Letónia, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003, 50/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República da Lituânia, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003, e 51/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da República da Roménia, assinado em Bruxelas, em 26 de Março de 2003.
Convidei para assistir à sessão plenária de hoje os Srs. Embaixadores dos países candidatos à adesão, que saúdo, que acompanham os nossos trabalhos na tribuna reservada ao Corpo Diplomático.
Srs. Deputados, vamos aguardar alguns minutos pela chegada do Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional.

Pausa.

Para fazer a apresentação das propostas de resolução, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional.

O Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional (Paulo Portas): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Aliança Atlântica mantém, ao cabo de mais de meio século, a sua reputação de eficácia e rigor. A Aliança Atlântica é fundamental como instrumento de uma solidariedade política que encontra aí a sua expressão militar. É um caso de sucesso sem precedente na história das organizações de defesa e de segurança: garantiu à Europa o mais longo período de paz que este continente conheceu.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A NATO soube reinventar-se com o fim da "guerra fria". Contra as expectativas de alguns não só sobreviveu como demonstrou a sua necessidade e flexibilidade indispensáveis para se adaptar às mudanças. Desenvolveu o diálogo com a Rússia, estabeleceu a cooperação no âmbito da Parceria para a Paz, pôs em marcha a política da porta aberta com a entrada de três novos países em 1999, cumpriu - e continua a fazê-lo - a sua importante função de vector de paz e estabilidade.
Os terríveis ataques terroristas de 11 de Setembro levaram a Aliança Atlântica a evocar, pela primeira vez na sua história, o artigo do Tratado de Washington que obriga os aliados à defesa colectiva. Ao contrário do que sempre se pensou, não foi em defesa da Europa mas como resposta a um ataque aos Estados Unidos. Sinal de um tempo marcado por ameaças que se modificaram, marcado pelo terrorismo, pela proliferação de armas de destruição maciça em relação às quais nenhum Estado pode considerar-se imune.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Estas novas ameaças têm como alvo as sociedades abertas, democráticas, multiculturais e tolerantes. Levaram-nos a adoptar, na Cimeira de Praga, em 2002, novas estratégias e novos objectivos

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com vista a adaptar a Aliança Atlântica ao ambiente estratégico do século XXI.
Em Praga, foram convidados sete novos Estados, cujo processo de ratificação nos traz hoje aqui - a Estónia, a Letónia, a Lituânia, a Eslováquia, a Eslovénia, a Bulgária e a Roménia -, definindo novas capacidades com reestruturação da estrutura de comandos, criação de uma força de reacção rápida, desenvolvimento e modernização das capacidades militares e estabelecendo novas parcerias estratégicas.
A estreita cooperação entre a NATO e a União Europeia permitiu que a União realizasse com sucesso, na antiga República Jugoslava da Macedónia, a sua primeira operação militar. A operação "Concórdia" é, como sabem, neste momento, comandada por um oficial general português. Devo testemunhar perante o Parlamento de Portugal os elogios, o reconhecimento unânime por parte das autoridades locais e por parte de todos os nossos parceiros do trabalho dos militares portugueses na operação "Concórdia".

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É este o modelo de cooperação entre a NATO e a União Europeia que Portugal defende. Uma cooperação transparente, de complementaridade, sem duplicações, que permita acentuar a prioridade da relação transatlântica e que contribua para o reforço do pilar europeu da Aliança. É uma cooperação lógica e necessária, baseia-se na partilha e na defesa dos mesmos valores que são sempre os essenciais: a liberdade, a democracia, a tolerância e a justiça.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É para defender estes valores e estes princípios que a NATO está hoje no Afeganistão, conduzindo a sua primeira operação militar fora do teatro europeu. Julgo, aliás, que o conceito "fora de área" tenderá a caracterizar o futuro das operações militares da NATO, porque as novas ameaças, sobretudo o terrorismo, não conhecem áreas ou fronteiras previamente traçadas e determinadas.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Não têm ideologias ou planos políticos, não obedecem a escrúpulos morais ou religiosos, interessa-lhes apenas semear a anarquia, aproveitar vantagens da globalização e espalhar o caos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Portugal considera que a NATO deve estar na primeira linha da defesa dos princípios que caracterizam as sociedades democráticas. A NATO é um instrumento-chave na defesa dos portugueses. Não pode, sobre este aspecto, haver qualquer ilusão, dúvida ou equívoco.
Daí que devamos valorizar as nossas contribuições, assente numa posição geográfica ímpar e valiosa, reconhecida e confirmada com a manutenção de um dos três comandos operacionais da Aliança Atlântica em Oeiras e na presença permanente das nossas Forças Armadas em operações militares da Aliança.
No plano puramente militar, a NATO colmata parte das nossas insuficiências e, sobretudo, é hoje um factor decisivo de estímulo à reforma e à modernização das nossas próprias Forças Armadas.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dizia o Presidente Waclav Havel, à época, em Praga, durante a Cimeira, que este alargamento é muito importante não só porque vários pequenos e médios países terão direito a novas garantias de defesa e de segurança mas porque esses mesmos países irão viver em liberdade no seio deste grande espaço que é o espaço euro-atlântico.
Em 21 de Novembro de 2002, na Cimeira de Praga, os 19 líderes da NATO convidaram, formalmente, a Estónia, a Letónia, a Lituânia, a Eslováquia, a Eslovénia, a Bulgária e a Roménia a aderir à NATO. Trata-se do maior alargamento da história da Organização do Tratado do Atlântico Norte. Inclui, tal como em 1999, países que pertenceram ao antigo Pacto de Varsóvia, mas também - e isto dá a medida da importância do ganho de espaço da liberdade - países que pertenciam à ex-União Soviética.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - São Estados que conhecem bem a opressão, a ditadura, o totalitarismo, a ausência de democracia, a violação dos direitos humanos e, portanto, o valor da liberdade.

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Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - São Estados que aspiram a reocupar o lugar que lhes pertence enquanto nações livres e independentes, que procuram uma garantia de segurança que dê estabilidade ao seu enquadramento no mundo livre. São Estados que aderem não apenas a uma organização política de segurança e defesa mas, antes disso, a uma comunidade de valores e de princípios.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É por isso que este alargamento, tal como o anterior, é muito mais do que uma soma aritmética. Resulta, objectivamente, numa multiplicação dos valores da democracia, da liberdade e da paz.
Ao ratificarmos, como é parecer do Governo que devemos fazer, a adesão dos sete novos países da NATO, estaremos, sobretudo, a enviar ao mundo uma mensagem clara de apoio à liberdade e à democracia.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Ratificar, apoiar a adesão de sete novos países que pertenceram ao Pacto de Varsóvia e, até, à União Soviética a esse espaço de liberdade e de segurança, que é a Aliança Atlântica, é como deitar abaixo mais sete pedras das pedras que ainda possam restar no Muro de Berlim.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde a contenção da ameaça totalitária soviética, passando pelo apoio às novas democracias, até ao combate ao terrorismo, a NATO tem sido um pilar central da luta pelos valores em que acreditamos. Esta é, talvez, a razão mais simples, mas a suficiente para apoiarmos todos, sem qualquer hesitação, este alargamento da Aliança Atlântica, que é desejado pelos povos que vão aderir à NATO e que é, obviamente, entendido e compreendido pelos países fundadores e membros da NATO.
É por isso que, em nome do Governo, quero saudar este momento especial, que é o momento em que Portugal, através do seu Parlamento, dá valor à ratificação da entrada de novos parceiros e novos países num esforço comum de liberdade e de segurança para proteger os valores em que acreditamos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional, antes de mais, queria cumprimentá-lo e registar que V. Ex.ª fez referência à política de defesa e à situação actual de Portugal em função da política de defesa.
Objectivamente, do ponto de vista do conceito estratégico e da sua revisão, do ponto de vista da dignificação das Forças Armadas e da sua modernização e reequipamento e do ponto de vista do prestígio internacional de Portugal - e ainda recentemente nós, parlamentares, tivemos oportunidade de constatar isso numa viagem que fizemos com o Sr. Presidente da Assembleia da República aos Açores a propósito da Base das Lajes - muito caminho se andou.
Ainda que, como é consabido nesta Câmara, eu o faça sempre com enorme gosto, creio que hoje posso dispensar-me de citar S. Ex.ª o Presidente da República e dizer que, em relação a esta matéria, todos temos razões para estar muito mais optimistas do que estávamos há cinco ou seis anos atrás e muito optimistas em relação ao que poderíamos estar há cerca de um ano e tal atrás, antes de este processo ter sido iniciado.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Por outro lado, em nome da bancada do CDS-PP, gostaria de dizer que este alargamento deve ser firmemente saudado não só pelas razões que há pouco referi mas também por se tratar da adesão de países que viveram sob uma das mais ferozes tiranias do século passado, designadamente as repúblicas bálticas, que fizeram parte da ex-União Soviética e por isso sujeitas ao jugo da tirania soviética.

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - São razões para apoiarmos firmemente esta adesão.
No entanto, queria reflectir com o Sr. Ministro e questioná-lo sobre uma matéria que me parece importante. Do ponto de vista da Aliança, quais serão as consequências estratégicas deste objectivo fundamental, que é o de a Aliança Atlântica, a NATO, num mundo que é hoje dominado por um novo conceito estratégico - o do combate ao terrorismo -, passar a incluir, como pensamos que deve incluir, todos os países europeus, ou seja, toda a Europa, designadamente quando, do ponto de vista europeu, se discute, e sabemos que se discute, a possibilidade ou de estreitamento da colaboração transatlântica ou de uma espécie de concorrência europeia com o papel que é feito do outro lado do Atlântico? Qual é a relevância desta adesão e do novo modelo NATO em relação a essa questão?
Sr. Ministro, esta é a pergunta que lhe deixo, sublinhando a alegria com que vemos países que conquistaram a pulso a sua liberdade e que são, hoje, nações livres e aliados sólidos poderem entrar na NATO e connosco partilhar este espaço de valores, de liberdade e de segurança.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, está inscrito mais um orador para lhe pedir esclarecimentos. Deseja responder já ou depois desse pedido de esclarecimento?

O Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional: - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra, Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional.

O Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, quero agradecer a sua pergunta e dizer-lhe que, embora seja uma reflexão que em certo sentido contextualiza a matéria que estamos a discutir, a posição de Portugal nessa matéria tem sido, é e será realista e prudente.
Há, pelo menos, três argumentos consideráveis para defender que, do ponto de vista da segurança e da defesa, a NATO e a União Europeia devem ser complementares e não concorrentes.
Primeiro, o argumento histórico. Nós, europeus, devemos à aliança entre a Europa e os Estados Unidos da América mais de 50 anos de paz. Quando, num continente atravessado pelas divisões e pelos conflitos que a história europeia conhece, se atinge meio século de paz, através da contenção e da formação de uma aliança de segurança, convém não deitar fora esse valor, porque ele é demasiado importante.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Devemos a paz à aliança entre os europeus e os norte-americanos, e esse é um modelo que, com as devidas adaptações, deve continuar. Observadas as capacidades militares, pô-lo em causa é pôr em risco a nossa segurança.
Segundo, o argumento estratégico, que especificamente aconselha que Portugal tenha essa posição. É a nossa própria geografia que determina, em grande medida, opções constantes da nossa história diplomática. Não podemos deixar de ter uma visão equilibrada, complementar e integrada entre as fronteiras continental e marítima de que dispomos. Faz parte do nosso valor estratégico, faz parte da posição que podemos ocupar, especialmente reconhecida no diálogo entre os dois lados do Atlântico.
Terceiro, e finalmente, não é sustentável um esforço de duplicação financeira, com investimentos do mesmo carácter e do mesmo volume, em duas organizações de segurança e defesa se pudermos organizar, como devemos, se pudermos articular, como podemos, o investimento e a recuperação da credibilidade em segurança e defesa através de uma visão em que NATO e União Europeia sejam complementares e não haja duplicações. Duplicar é gastar duas vezes! A meu ver, nenhum contribuinte europeu está disponível para gastar duas vezes, embora esteja interessado em investir o suficiente para garantir a sua paz e a sua segurança todos os dias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.

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Ministro de Estado e da Defesa Nacional, a propósito desta resposta do Sr. Ministro, creio que há uma contradição entre aquilo que já está vertido no texto do Tratado que institui uma Constituição Europeia e a posição que aqui expressou. Diz, se não me falha a memória, o projecto de Tratado que os países europeus se comprometem ao aumento gradual das despesas, inclusivamente uma agência especial de alargamento, e nada aí está compaginado pelos pilares europeus ou não europeus da Organização do Tratado do Atlântico Norte.
Por outro lado, creio que há bem pouco tempo, num Conselho de Ministros da Defesa europeu, o Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional se comprometeu com qualquer coisa deste género: um conjunto de investimentos militares seria a excepção ao cálculo do défice. Questão, que, misteriosamente, nunca foi muito bem decifrada, nunca aqui tivemos um cabal esclarecimento em relação a ela, pelo que, aproveitando a circunstância, a deixaria.
Mas, Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional, devo dizer que nunca fui simpatizante do Pacto de Varsóvia e nunca fui simpatizante da NATO.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Era da Albânia!

O Orador: - Estou muito preso à orientação constitucional (que alguns hoje querem rever) da dissolução dos blocos político-militares e sou por uma verdadeira paz, distensão e desarmamento simultâneo e controlado do mundo.
Percebo que o Governo não tenha a mesma "onda" que tem essa orientação constitucional. Em todo o caso, lhe digo que não entendo o seu entusiasmo, patente na intervenção que fez, pelo aumento da responsabilidade da NATO no que chamou o "out of area", que é rigorosamente o teatro planetário.
Ou seja, na modificação do conceito estratégico da NATO, aquilo que se proclamava como uma organização defensiva, não cuidando agora de saber se o era, passou a ser uma organização com um carácter ofensivo, cujo terreno já não está circunscrito àquilo que era a defesa dos espaços dos países signatários e contratantes mas é, hoje, todo o terreno planetário, o espaço do Planeta.
Como se compagina esse seu entusiasmo pelo incremento das operações "out of area" com a Carta das Nações Unidas, em relação à qual, pensamos, se deve manter fidelidade e que tem por base uma filosofia que não aceita guerras preventivas nem de agressão?
Não me justifique com o terrorismo, com a ameaça difusa e sem rosto, porque há muitas formas de combater o terrorismo que não passam, designadamente, pela construção de uma organização militar que tem um espaço universal.
Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional, entendemos que o sinal simbólico, político, está dado, sabemos que dele compartilha, mas basta o próprio mecanismo estruturante de acreditação e de certificação deste alargamento: todos os instrumentos são entregues junto do Governo dos Estados Unidos da América e, depois, difundidos pelas outras organizações. O sinal simbólico está dado. No entanto, ele está prenhe de consequências na Europa, porque hoje as relações com a Rússia são o que são,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - … mas nos próximos tempos não saberemos!…
Por outro lado, creio que a sua intervenção passou ao lado de um ponto fundamental: o de saber quais serão as consequências, do ponto de vista da paz europeia, das relações entre a União Europeia e a Rússia quando a Organização do Tratado do Atlântico Norte chegar às "portas" da Rússia.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional.

O Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, sei que pessoalmente nunca teve simpatia pelo Pacto de Varsóvia, o que não quer dizer que, institucionalmente, o Bloco a que pertence não tenha tido facções que tinham simpatias pela Albânia!… E tenho a certeza de que vamos todos assistir aqui a um momento importante. Uma de duas: ou o Bloco de Esquerda compreende a importância da NATO ou a Albânia entra primeiro na NATO, porque, como sabe, também quer ser país da Aliança!
Mas, tirando isto, penso que há uma coisa que todos nós devemos evitar e que me lembra aquele filme muito interessante, o Adeus Lenine: o sono profundo em que algumas pessoas querem entrar como se o mundo não tivesse mudado!…
Achei interessante a última reflexão que o Sr. Deputado fez: a de saber o que pode acontecer à paz na

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Europa chegando a Aliança Atlântica às "portas" da Rússia. A minha resposta é a de que o desafio da liberdade vale a pena, Sr. Deputado!
Aqueles povos que viveram debaixo de uma tirania que durou décadas quiseram ser independentes, quiseram ser livres, têm direito à sua liberdade, têm direito, como nós, a viver em democracia e precisam de um espaço de segurança e de liberdade que os organize e enquadre. E esse espaço de segurança e de liberdade já não é um clube, é verdadeiramente uma organização que engloba o continente europeu e que tem com a Rússia uma relação de respeito, de articulação e de informação mútua.
A verdade é que poderemos dizer que, havendo problemas, como sempre haverá, o relacionamento entre a Europa Ocidental - usemos um velho chavão - e a Rússia é, hoje, certamente mais estável do que era no passado, e por isso mesmo não tenho qualquer receio. Pelo contrário, considero um avanço muito importante este alargamento.
Quanto à questão do terrorismo, voltamos a ter uma diferença. E é aqui que me lembra o sono profundo, tão bem exemplificado no Adeus Lenine, que, tal como eu, já o viu, certamente. Nesse filme, há uma senhora que adormece antes de o mundo mudar e acorda quando o mundo já mudou. Olha, então, para um anúncio em néon da Coca-Cola e pergunta: "Camarada, o que é que aconteceu?"!…
Meu caro, prezado e respeitado Sr. Deputado Luís Fazenda, o mundo mudou! E o terrorismo, hoje, está em Moscovo, está em Istambul, está em Nova Iorque, está em Cabul, está fora de qualquer fronteira definida previamente, está fora de qualquer área geograficamente determinada.
É por isso que o combate ao terrorismo e à total ausência de escrúpulos dos grupos terroristas deve mobilizar todos os países, todas as nações que querem partilhar uma comunidade de liberdade, de tolerância, de justiça contra quaisquer tiranias e fanatismos, nomeadamente aqueles que protegem ou são protegidos pelos grupos terroristas.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É por isso que entendo que a Aliança Atlântica, nas suas actuações "fora de área", correndo riscos, faz, evidentemente, uma determinação de coragem, que é proteger, em nosso nome, esses valores.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Leonor Beleza.

A Sr.ª Leonor Beleza (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Embaixadores, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo submete hoje à apreciação do Parlamento as propostas de resolução n.os 45 a 51/IX, que aprovam, para ratificação, os Protocolos ao Tratado do Atlântico Norte sobre a adesão da Bulgária, da Eslováquia, da Eslovénia, da Estónia, da Letónia, da Lituânia e da Roménia.
Nos termos do artigo 10.º do referido Tratado, podem os Estados-membros convidar outros Estados europeus a aceder ao mesmo, desde que se encontrem em posição de reforçar os seus princípios e de contribuir para a segurança da área do Atlântico Norte. Tal convite, necessariamente por unanimidade, foi formulado na cimeira da Aliança de Praga de 2002 e deverá conduzir ao quinto alargamento em toda a história da NATO e ao segundo desde o fim da "guerra fria". O último alargamento, que teve lugar em 1999, e o que se aproxima ocorrem no contexto de substanciais transformações da Aliança e fazem parte dessas transformações.
Com efeito, o colapso do império soviético significou a um tempo o êxito último e único da Aliança Atlântica e o questionar da sua missão futura. Nascida para defender os países da área atlântica da ameaça comunista, viveu e fortaleceu-se com o cimento provocado pela percepção por todos da força de tal ameaça.
A profunda alteração de circunstâncias não podia deixar de ter profundas repercussões na consciência da necessidade da manutenção da Aliança com o conteúdo, os membros, os objectivos e o aparelho militar de que em 1989 dispunha.
Desenvolveu-se imediatamente um processo de discussão e modificações que, numa primeira fase, se traduziu numa vivíssima discussão sobre o sentido e a razoabilidade da própria manutenção da Aliança, pelo menos na forma essencial que até então tinha assumido, e sobre o sentido e a razoabilidade da ligação, mais precisamente da liderança, dos Estados Unidos no que respeita à segurança europeia.
Por outro lado, o fim do Pacto de Varsóvia, em Junho de 1991, e da União Soviética, em Dezembro do mesmo ano, consumaram a "libertação" de um conjunto de países da Europa Central e de Leste, que se sentiram na necessidade de equacionar e de resolver em novos termos a questão da sua segurança.
Para muitos desses países, incluindo alguns que estavam integrados na União Soviética, desde muito

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cedo surgiu o sentimento da necessidade de "ancoragem" no Ocidente e nas suas instituições, percepcionados como os vencedores e garantes da segurança, da democracia, da estabilidade e do bem-estar.
À partida, não era evidente que caberia à NATO um papel determinante no restabelecimento de uma ordem no domínio da segurança. A Rússia opunha-se, então, a tal caminho e queria uma solução baseada na então CSCE, onde dispunha da possibilidade de influenciar de forma determinante.
Por sua vez, a Alemanha, recém-unificada (em Outubro de 1990), não considerava tolerável que o enorme espaço que a separava da Rússia entrasse numa qualquer instabilidade.
Diversas hipóteses existiam teoricamente com o objectivo de regulamentar a segurança de toda essa zona.
A verdade é que veio a caber à NATO rapidamente propor soluções e constituir em torno de si uma nova ordem. O simples facto, aliás, de um alargamento da União Europeia se ter mostrado mais demorado deixou um papel claramente liderante à Aliança Atlântica neste processo.
O que se chama a transformação da NATO corresponde, de facto, a um largo conjunto de factores e foi, e é, condicionado por acontecimentos, processos e conflitos que, historicamente, decorreram na sequência da queda do Muro de Berlim e da implosão da União Soviética. Mas os sentimentos, as atitudes e os interesses que se moveram, e movem, reflectem a memória e as feridas que, para não recuar mais no tempo, são o pesado legado da história do século XX na Europa e nas relações transatlânticas.
As decisões de alargar, e como, envolveram, e envolvem, questões relacionadas com o papel dos Estados Unidos na Europa, a importância da NATO na Europa Central e de Leste, a relação entre os alargamentos da União Europeia e da Aliança Atlântica, a situação da Rússia e o impacto nesta, o tratamento dos países que não são objecto de inclusão e as modificações na própria NATO.
Só faz, aliás, sentido alargar aquilo que existe e que se decide que continue a existir. O sinal mais firme de que os aliados desejam a manutenção da própria Aliança é o processo de alargamento dela mesma.

O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - A consciência desta necessidade foi-se consolidando de forma progressiva. Mas dois factores, a juntar e intimamente ligados ao fim da "guerra fria", foram, numa primeira fase, determinantes nas discussões e nas decisões que foram sendo adoptadas no que respeita à configuração da defesa da segurança europeia: a reunificação alemã e a guerra na ex-Jugoslávia.
A reunificação da Alemanha dominou largamente na Europa as preocupações dos principais actores, influenciando o que veio a ficar instituído no Tratado de Maastricht, quanto à União Europeia, e os termos da discussão, quanto à presença norte-americana na Europa, ao papel da Aliança e à sua configuração depois da "guerra fria".
A guerra na ex-Jugoslávia teve também influência em praticamente tudo o que tem a ver com o papel actual e a transformação da NATO.
A reunificação alemã, sucedida ainda por cima no contexto do fim da "guerra fria", que significava também a capacidade de a Alemanha influir na vasta zona "libertada" a Leste, fazia facilmente reacender todos os medos em relação ao aumento - ainda - do poderio alemão. Multiplicava, assim, o receio que, para os países ocidentais, já significava de qualquer maneira a ideia de que os Estados Unidos pudessem desinteressar-se da segurança europeia.
Desde cedo os Estados Unidos se aliaram à Alemanha no apoio à reunificação, tendo tido um importante papel na negociação dos acordos da França, do Reino Unido e da então ainda União Soviética. Simultaneamente, tiveram, desde o início, a noção de que a NATO devia manter-se.
A NATO sempre foi para os americanos - e agora é muito mais visível - muito mais do que uma forma de defender os europeus e o mundo ocidental contra o perigo da União Soviética. Foi também, e é, uma forma privilegiada de cooperação política entre os dois lados do Atlântico e um instrumento da liderança dos próprios Estados Unidos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Liderança que, aliás, defendia os europeus contra si próprios - contra tudo o que no passado lhes retirou o papel de liderança mundial, contra os ódios e as guerras do que desejamos passado, mas também contra as competições de poder que a renacionalização das suas defesas poderia gerar.
É uma presença no interesse mútuo, como não podia deixar de ser, dos Estados Unidos e da Europa Ocidental que, se ajuda a garantir a paz e a estabilidade - e o progresso, que têm garantido as poupanças dos europeus em defesa -, tem custado aos europeus a confiança do essencial da sua segurança aos Estados Unidas.
Para estes, que desejavam manter a NATO e apoiavam a reunificação da Alemanha, os dois elementos

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iam a par, como se compreende. A reunificação tinha de se verificar no interior da NATO, para o que também esta devia manter-se; a reunificação sem a permanência na NATO significava um enorme risco para todos, ao passo que a NATO sem a Alemanha ficaria destituída de sentido. A reunificação com toda a Alemanha no interior da NATO significou, de facto, o primeiro alargamento do espaço da Aliança a Leste e condicionou tudo o resto.
A solidificação da proeminência da NATO em questões de segurança europeia esteve, pela via acima descrita, largamente ligada à reunificação da Alemanha. Mas efeitos semelhantes acabaram por ter os dramas da ex-Jugoslávia, em parte ainda antes do primeiro alargamento à Polónia, à República Checa e à Hungria.
Os países europeus não puderam, ou não souberam, entender-se e actuar para conter o drama na Jugoslávia. Não foi possível entendimento político entre eles em relação a questões muito importantes, como se viu não serem capazes de eficácia relevante e não disporem dos respectivos meios. Entre os europeus e os americanos também a crise jugoslava demonstrou os limites do entendimento, tal como ficou provada a possibilidade da existência de graves crises na segurança europeia a que os americanos se pudessem sentir alheios - o que, na Jugoslávia, foi a posição inicial dos EUA.
Mas, simultaneamente, a evolução da situação teve o efeito, à primeira vista paradoxal, de também pôr à prova, de forma positiva, a eficácia da relação entre europeus e entre estes e americanos, quer na medida em que as divergências acabaram por ser contidas, quer sobretudo pela provada necessidade de manutenção da NATO e do envolvimento americano na Europa, que a guerra acabou por fornecer.
A Jugoslávia abriu ainda de forma profundamente eficaz a porta a operações militares da NATO no quadro das chamadas "novas missões", e a que estas tenham lugar out of area, bem como à colaboração, nessas operações, de países não NATO - e sobretudo dos entretanto incluídos na Parceria para a Paz, e, entre estes, dos países do Leste e Centro da Europa, muito em particular da própria Rússia. A Jugoslávia é, com efeito, o exemplo acabado das operações da NATO não artigo 5º e da eficácia da nova cooperação com o Leste e Centro da Europa, num país justamente situado nessa zona.
As alterações da NATO pós-Guerra Fria processaram-se logo a partir de 1990.
A Declaração de Londres, de 1990, proclama a necessidade de fortalecer a componente política da Aliança e inclui, desde logo, uma série de propostas de cooperação com a Europa Central e de Leste. Propõe à ainda União Soviética afastar a ideia de que são adversários, convida o ainda Pacto de Varsóvia a estabelecer uma ligação diplomática com Bruxelas e propõe o fortalecimento da OSCE.
Em 1991, a NATO aprova um novo conceito estratégico, correspondente às profundas alterações entretanto verificadas, e esse conceito é publicado, o que é uma novidade, porque o conceito da NATO então em vigor, de 1967, era um conceito secreto.
A chamada Declaração de Roma, também então aprovada, reafirma a existência de uma "identidade europeia de segurança e defesa" e a consciência do processo europeu de integração em marcha. As relações com a União Soviética e os outros Países de Leste ocupam o maior espaço, sendo objecto de uma série de propostas, incluindo a criação do Conselho de Cooperação do Atlântico Norte.
Mas é Janeiro de 1994, em Bruxelas, que viria a ficar de facto na história da Aliança como um momento decisivo do arranque das reformas, em quatro pontos essenciais: o lançamento da Parceria para a Paz, para envolver os países do Centro e Leste da Europa, o reconhecimento formal da Identidade Europeia de Segurança e Defesa, a adopção do conceito de Forças Operacionais Conjuntas e Combinadas (CJTF) para missões que não sejam do artigo 5.º, e o envolvimento num programa de não-proliferação e de contra-proliferação de armas NBQ.
Correspondente a uma fase de um novo maior empenho dos Estados Unidos na Europa e na sequência do Tratado da União Europeia, uma parte fundamental da Declaração reconhece a importância da política externa e de segurança comum e de que a Europa tome uma maior responsabilidade em assuntos de defesa, reforçando o pilar europeu da Aliança e devendo esta continuar a ser o fórum essencial de consulta entre os seus membros.
Após uma declaração de que a Aliança está aberta à integração de outros Estados europeus, é lançada a Parceria para a Paz, na qual, no princípio, se não colocaram muitas expectativas, mas que veio, de facto, a revelar-se um instrumento essencial na actuação da Aliança Atlântica e na capacidade de ela envolver nessa actuação países do Centro e do Leste da Europa e mesmo outros países da Europa não pertencentes à Aliança Atlântica.
A essa Parceria aderiram 23 países em 1994 - de entre os quais a Rússia - e em 1995 mais quatro.
A partir de 1994, começou a tornar-se claro que haveria um alargamento da Aliança. Um Estudo sobre o Alargamento da Nato, publicado em 1995, constituiu uma espécie de "bíblia" onde se justificavam as razões, se enunciavam os princípios e a forma de os assegurar para futuras admissões na Aliança.
É particularmente interessante - e foi eficaz - a exigência de que os candidatos resolvessem prévia e pacificamente quaisquer eventuais disputas étnicas ou de território dentro deles ou entre eles.

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Em 1997, a nova Cimeira da NATO, agora em Madrid, retoma as questões fundamentais da Aliança e avança com o primeiro alargamento.
A cooperação com todos os países europeus ocupa no essencial o documento. Dois pontos são de destacar: o convite dirigido à República Checa, à Hungria e à Polónia para iniciarem conversações de adesão com a NATO e a formulação da política chamada de "porta aberta", isto é, do princípio de que outros Estados podem vir a ser convidados.
A questão do alargamento fez correr muita tinta, e extremar posições. Para alguns, sem alargamento, a NATO não subsistiria; para outros, com ele, a NATO descaracterizar-se-ia completamente. Eram muitos e muito relevantes os que apoiavam o alargamento e muitos também os que não queriam que aí se chegasse. O principal argumento dos detractores era a Rússia e a ideia de que precisamente a segurança no Centro da Europa, que, com o alargamento, se procurava, seria por ele fortemente prejudicada, já que o efeito seria o reacender do que seria o carácter agressivo de Moscovo. Mas a Rússia constituía também, para os que defendiam o alargamento, pelo menos, uma das razões por que o faziam ou, pelo menos, um factor determinante da forma como entendiam que o alargamento deveria ocorrer.
Entre aqueles que favoreciam ou admitiam o alargamento da NATO, havia formas muito diversas de encarar tal passo, consoante as razões que se admitiam aí deverem conduzir, a visão sobre a situação estratégica da Europa e a percepção do risco para a segurança internacional que a Rússia significava.
Três caminhos fundamentais se apresentavam nessa altura. O primeiro caminho assentava nas convicção de que os problemas dos países de Centro e Leste europeus eram de carácter económico e político, e não de imediata ameaça à segurança, e de que esses países se encontravam a proceder às reformas convenientes. A União Europeia devia ter a primazia em abranger esses países. O segundo caminho atribuía a prioridade à procura de estabilidade e partia da convicção de que a situação política e de segurança na Europa Central e de Leste era frágil. Caberia, então, à NATO tomar a iniciativa e não esperar pela possibilidade de integração na União Europeia. O terceiro caminho fazia depender o "se" e o "quando" do alargamento da atitude da Rússia. Só deveria haver alargamento se a Rússia se tornasse de novo ameaçadora para os países do Centro e do Leste da Europa. Para todos, o Ocidente não devia criar nenhuma dificuldade ao triunfo das "boas forças" na Rússia. Caso isso não acontecesse e a Rússia retomasse um papel de ameaça, a Aliança deveria estar preparada para um alargamento rápido, neste entendimento.
O primeiro e o terceiro caminhos atrasariam substancialmente o calendário do alargamento e tinham em comum serem os que facilitavam mais o relacionamento com a Rússia. O segundo, que foi o escolhido, era evidentemente o que, por si, levantava mais dificuldades nesse domínio, mas era aquele que deixava ao Ocidente, e nomeadamente à Aliança Atlântica, a escolha do caminho imediato a seguir. Foi esse o escolhido, e ele permitiu um novo desenho de segurança na ordem europeia.
Mas é preciso ter em atenção o que simultaneamente foi feito nos relacionamentos entre a Aliança Atlântica e a Rússia, com o objectivo de evitar que o alargamento conduzisse a qualquer situação que pudesse ser entendida como agravando ou pondo em causa a segurança. O Acto Fundador entre a NATO e a Rússia viria a estabelecer um equilíbrio entre os dois pratos da balança que parece encontrar uma compatibilização entre alargamento e aliança com a Rússia, dois objectivos que alguns achavam difíceis e até impossíveis de prosseguir em simultâneo.
É certo que, na altura, vinham muitos sinais de intranquilidade e de oposição por parte da Rússia, mas esta abandonara entretanto as ilusões de transformar a OSCE no quadro fundamental da segurança europeia, bem como a veleidade de se opor eficazmente a um qualquer alargamento, e obteve, pois não só em vários aspectos o alargamento se fez tendo em atenção salvaguardar a relação entre a NATO e a Rússia, um quadro de relacionamento que alguns vêem como de privilégio. Este quadro consta, fundamentalmente, do Acto Fundador, que foi depois reforçado, Actos Fundador esse que foi assinado em vésperas do convite dirigido aos três primeiros convidados a integrar a Aliança Atlântica.
Desde que a ideia do alargamento se pôs verdadeiramente em cima da mesa, foi claro que atingiria basicamente os países de Visegrad, e que provavelmente só atingiria, ao menos nesta fase, parte ou todos esses países. Ficaram de fora (e isto tem obviamente a ver com a preservação das relações com a Rússia) todos os países que foram repúblicas soviéticas, nessa fase, e, de entre estes, muito em particular os Estados Bálticos, apesar dos fortes apoios com que contavam em alguns países da NATO e do sentido que se podia fazer, do ponto de vista da segurança, inclui-los desde logo. Não entrou, então, ninguém do chamado near abroad, ninguém que tenha fronteira com a Rússia (excepto, a situação especial do enclave de Kaliningrad, junto da Polónia), ninguém que tenha no seu território em números expressivos cidadãos de etnia russa, nem ninguém que tenha com a Rússia relações de grande proximidade ou afinidade, como, aliás, não entrou ninguém daqueles que então se pudessem sentir verdadeiramente ameaçados pela Rússia.
Interessante é ainda notar que uma parte importante do texto da Resolução do Senado dos Estados Unidos da América, que autorizou os EUA a ratificar os protocolos de adesão dos três novos membros da

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NATO, expressamente pretendesse afastar qualquer hipótese de interferência da Rússia na vida da Aliança, como que pretendendo também limitar o alcance do Acto Fundador.
Foi o conjunto dos textos e das declarações, do que ficou escrito e do que ficou subentendido, que seguramente terá permitido ao então Ministro dos Negócios Estrangeiros Jaime Gama dizer, durante a discussão parlamentar do alargamento, em 1998, que a adesão "foi também objecto de uma convalidação negocial por parte da Federação Russa".
Embora tendo sido decidido em Madrid, por unanimidade, como o Tratado exige, quem seria convidado a integrar a Aliança, sabe-se que não foi pacífica a identificação dos três convidados. Dois países tiveram uma intervenção óbvia no desencadear efectivo do processo de alargamento, depois de todas as hesitações, negociações e meias-promessas, bem como na escolha daqueles que entrariam - os Estados Unidos e a Alemanha.
No conjunto, terão pesado múltiplos factores e as escolhas feitas foram muito discutidas na própria Cimeira e na sua sequência.
A decisão limitou-se, como se sabe, na altura, a admitir a entrada de três candidatos. Eram três países com ligações estreitas ao Ocidente antes da Rússia se lhes ter imposto, com particular proximidade com a Alemanha, cuja fronteira oriental é ocupada pela Polónia e pela República Checa, os três tinham créditos que ninguém discutia na mudança pacífica de regime a caminho da democracia, como os tiveram em momentos dramáticos do domínio soviético.
Pelo caminho ficaram as pretensões de alguns países candidatos, mas também de alguns países membros, como Portugal, como aqui explicou também na altura o Ministro Jaime Gama, que, ao apoiarem a Roménia e a Eslovénia, gostariam de ter visto algum equilíbrio nas novas admissões entre o Norte e o Sul da Europa.
Ficou então a promessa de que o processo seria revisto em 1999. E foi-o!
Entretanto, uma nova sucessão de factos rapidamente produziu alterações profundas - ou confirmações inesperadas - nas ameaças e nos riscos antevistos e aí está agora um novo alargamento, processado e decidido em termos que, em si, parecem surpreendentemente mais simples do que os acima referidos.
A adesão dos três primeiros contemplados consumou-se no dia 12 de Março de 1999.
Menos de duas semanas depois, a NATO lançava uma campanha aérea contra a agressão sérvia no Kosovo, alargando a intervenção no território da ex-Jugoslávia e levando, mais tarde, à primeira operação puramente europeia com meios NATO, agora em curso desde 31 de Março de 2003, na Macedónia.
O que aconteceu durante os anos 90 e a instabilidade crescente no Médio Oriente e na Ásia Central ajudou a reforçar a convicção dos que já viam na NATO uma vocação para intervenções fora de área, numa reformulação essencial da sua natureza já longínqua dos tempos da Guerra Fria.
Os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001 fizeram finalmente compreender a dimensão do que tinha mudado e que as novas ameaças já não faziam parte apenas de temores antevistos por alguns visionários.
Na Cimeira da NATO de 1999, portanto, antes destes últimos factos, foi aprovado o conceito estratégico da NATO que substituiu o de 1991 e que visa fazer face aos desafios do novo século.
É então lançado, na sequência do que fora prometido na Cimeira de Madrid, o Plano de Acção para a Adesão, com o objectivo de acompanhar e ajudar os países candidatos que ainda não tinham entrado, com programas individualmente concebidos, que não substitui, antes complementa e exige a participação na Parceria para a Paz e, neste contexto, em acções da responsabilidade ou com intervenção da Aliança.
Para os candidatos cujos Protocolos de adesão agora apreciamos, o momento decisivo ocorreu na Cimeira de Praga, de Novembro de 2002, a qual adoptou os instrumentos cruciais de transformação que o mundo pós-11 de Setembro exigia.
A Cimeira de Praga, ocorrida cerca de um ano depois, correspondeu à necessidade de abordar a transformação da NATO de forma global, para criar e garantir capacidades operacionais em áreas críticas, dar resposta a pedidos de alargamento, desenvolvimento da cooperação com a Rússia e outros parceiros, adaptação às mudanças em curso na colaboração com a União Europeia, garantir o papel da NATO no Afeganistão e nos Balcãs, levando a cabo as suas missões de forma eficaz.
A luta contra a proliferação de armas de destruição maciça e contra o terrorismo, a defesa contra tais ameaças e o reequipamento, a informação e as capacidades militares necessárias são objecto de planeamento e compromissos detalhados.
O convite aos países cujos Protocolos de adesão agora discutimos insere-se na estratégia global adoptada e assenta no reconhecimento dos progressos que alcançaram e na sua capacidade para reforçar as missões da Aliança e contribuir para a estabilidade e a segurança. Acresce que todos, sob variadas formas, têm colaborado em operações de manutenção de paz.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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A Oradora: - Os países convidados a aderir à NATO são os mesmos que deverão aderir à União Europeia em Maio de 2004, com excepção da Polónia, da República Checa e da Hungria, que pertencem à NATO desde 1999, e ainda aqueles que deverão aderir em 2007. Por algum tempo, a NATO continuará a ter membros da Europa de Leste que ainda não são membros da União Europeia, como agora já acontece.
O processo de ratificação das novas adesões já regista pelo menos 13 aprovações, com uma interessante unanimidade no Senado dos Estados Unidos que contrasta com o debate aceso que teve lugar na anterior adesão.
Desde os anos 90, e sobretudo desde 1998, a União Europeia empreendeu iniciativas para se dotar de meios militares de actuação no quadro europeu que podem não envolver os Estados Unidos. Tem sido muito intenso o diálogo sobre os termos em que tais operações terão lugar e sobre a ligação das mesmas à NATO. São conhecidas as divergências, particularmente postas a nu a propósito do Iraque, e estão a desenrolar-se debaixo dos nossos olhos as diligências de uns e outros, nomeadamente na questão crucial da relevância dos meios de defesa à disposição dos europeus e da respectiva relação com a Aliança Atlântica, ou, melhor dizendo, do papel actual dos Estados Unidos na defesa da Europa.
Pelo nosso lado, não vemos razão para sermos forçados a escolher entre a nossa pertença europeia e a nossa vocação atlântica e queremos continuar a participar no núcleo fundamental da construção europeia e a ser um membro leal e activo da NATO.
A nossa resposta afirmativa à adesão dos novos membros da NATO deve ser vista neste contexto. Sejam bem-vindos para reforçar a segurança, a estabilidade, a solidariedade e a união na Europa,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - … no contexto da manutenção dos laços que nos ligam à América do Norte e da manutenção da NATO como a principal garante da segurança em toda a área euro-atlântica em que nos incluímos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ramalho.

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Embaixadores, Sr.as e Srs. Deputados: Este mundo de hoje não é o mesmo de ontem. Ontem, neste planeta, que é cada vez mais um só, equilibrávamo-nos por pólos antagónicos, com visões diferenciadas da liberdade, da concepção económica, em suma, do próprio mundo. Um dos pólos só se compreendia em função do outro pólo.
A NATO tinha como contraponto o Pacto de Varsóvia. A entrada em vigor do tratado que instituiu a NATO, em 24 de Agosto de 1949, depois da ratificação dos 14 Estados europeus e dos Estados Unidos e do Canadá, obedecia a essa lógica, imposta pelo rescaldo do maior conflito mundial. E porque a comunidade internacional soube forjar e forjou, então, um farol multilateral institucionalizado para prevenir e dirimir de forma pacífica os conflitos, a ONU, com adequação à realidade, a NATO não poderia ser criada fora dos princípios desta.
É útil e proveitoso que nunca o esqueçamos, uma vez que logo no artigo 1.º do Tratado que criou a Organização há a referência expressa aos princípios da Carta das Nações Unidas e o compromisso assumido pelos Estados signatários de tudo fazerem para regularem por meios pacíficos os diferendos internacionais, abstendo-se de recorrer à força por meios incompatíveis com os objectivos das Nações Unidas.
Queiramos ou não reconhecê-lo, o quadro em que, no mundo bipolarizado, actuou esta aliança defensiva, concebida nestes termos e tendo como génese uma Europa devastada pela guerra, foi um elemento dissuasor para que o velho continente experimentasse um longo período de paz, alimentado também pelo próprio movimento europeu.
Não podemos esquecer a intensificação dos contactos Este/Oeste no final dos anos 70, a política da Ostpolitik da Alemanha, responsável pelos tratados outorgados com a ex-URSS, a Polónia, a RDA e a então Checoslováquia, o acordo de limitação de armas estratégicas, os acordos SALT II, a redução dessas armas estratégicas (START) e forças nucleares intermédias, a Conferência de Segurança e Cooperação na Europa e, com ela, a introdução dos mecanismos de segurança e confiança para o desarmamento na Europa e o mais que é sabido.
O conceito de guerra fria, enquadrado por este pano de fundo, tinha por conteúdo estabilizador a dissuasão assente na lógica de que a paz tinha por pressuposto a preparação da guerra, mas como elemento predominantemente dissuasor dela, repito.

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Claro que este estado de coisas não se estendeu como um manto a todas as latitudes. Ainda temos presente na memória as guerras quentes que larvaram na Coreia, no Vietnam e em Angola, ou aquelas que se evitaram no limite, dependurando o mundo à beira de um abismo, como sucedeu em Cuba, evidenciando que o mundo era então mesmo bipolar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Como todos sabemos - e repito - este mundo não é, hoje, aquele que legitimou a criação da NATO. Vivemos hoje a gestação para uma outra realidade, e estamos no centro dessa gestação. Os contornos finais desta realidade, e o que dela resultará, estão em marcha, são indefinidos, mas estamos a construí-la. A adesão à NATO da Polónia, da República Checa e da Hungria, recentemente operada, após a queda da bipolaridade, evidenciam-no, se outros elementos não existissem.
Isto é o resultado da implosão de um dos pólos da bipolaridade, que arrastou a unipolaridade e com ela a crescente consciencialização de que este mundo, agora unipolar, é cada vez mais um só, com fronteiras esbatidas, quando não mesmo abolidas.
Por isso mesmo, com avanços significativos, a própria União Europeia deu-se também conta de que teria de estugar o passo para o reforço, com vista a novos reequilíbrios, em que reassumisse o papel que tem e que crescentemente deve ter. A moeda única, a Convenção e agora o projecto de tratado constitucional são disso exemplos, que, na essência, nesta hora e nesta discussão não podemos deixar de saudar. Tal como saudamos o alargamento de mais 10 países, alguns dos quais, que agora pretendem aderir à NATO, farão brevemente parte integrante da União Europeia, enquanto outros, como candidatos a esta, se associarão também num futuro mais ou menos próximo.
Não poderemos nem deveremos dissociar a apreciação das propostas de resolução submetidas à nossa apreciação da Bulgária, República Eslovaca, Eslovénia, Estónia, Letónia, Lituânia e Roménia para que adiram à NATO, porque são países que, tarde ou cedo, passarão de pleno direito a serem membros da União Europeia, tal como já fazem parte os países europeus signatários do Tratado do Atlântico Norte, à excepção, como é sabido, da Turquia, e os que ulteriormente aderiram.
Neste Tratado não se instituiu limite temporal de duração da organização. Por isso mesmo, a queda do velho mundo não determinou a extinção dela, agora objecto de reestruturação, que este alargamento denuncia, inclusive nos seus objectivos, tal como ocorre com outras instâncias internacionais, como sucede com a própria ONU. Todos sentimos e sabemos que assim é. E é-o porque neste novo mundo, globalizado e unipolar, as ameaças que hoje temos diante dos nossos olhos são de outra natureza e conteúdo, eventualmente mais difusas e incertas, que se exprimem pela intolerância e fanatismos étnicos e religiosos mas também por organizações poderosas que se alimentam do tráfico das armas e da droga e pela especulação financeira, não conhecendo limites e concorrendo para que se socapem, ou desejam que se socapem, os valores, incluindo os da própria liberdade, como aliás esteve implícito na Declaração de Praga, de Novembro de 2002, da NATO.
Esta realidade, que temos de ter agora bem presente como pano de fundo, implica também a consideração séria do agravamento das desigualdades que estamos a verificar que ocorrem no mundo, e que são a causa primeira das guerras.
Como país subscritor do Tratado do Atlântico Norte, com uma concepção universalista e tolerante, e por isso ardentemente amante da paz, sinto ser minha obrigação, ao saudar os novos países candidatos, na presença dos Srs. Embaixadores, e ao manifestar o voto favorável do Partido Socialista à adesão deles à NATO, invocar esta evidência. Os povos que integram os países candidatos foram objecto e vítimas de outras intolerâncias e do significado do peso hegemónico de terceiros, que lhes coarctaram o direito à própria dignidade, sob a capa da sua defesa.
Podem, devem e vão seguramente emprestar um novo impulso à organização e não apenas pela lógica decorrente do espaço geo-estratégico em que se integram, a justificaram os pedidos de adesão. Além do mais, no seio da NATO prevalecem os mecanismos de consulta e consensualização, pressuposto do respeito pela igualdade no plano das relações multilaterais e no seu próprio seio.
É por isso que, tendo presente esta nova realidade unipolar, nunca é demais reiterar os princípios ínsitos à Carta das Nações Unidas, invocados no próprio Tratado da NATO, e com eles os esforços que devem e têm de ser empreendidos para que se assegurem as condições propícias a relações internacionais pacíficas, bem como ao desenvolvimento e bem-estar dos povos. Esforços esses que estão muito para além da natureza militar defensiva da organização e das próprias parcerias que tem desenvolvido, por forma a que a dissuasão dos conflitos seja feita também pelo ataque consequente às causas das guerras e que se traduzem na defesa do emprego e não do desemprego, na tolerância e no diálogo e não no exacerbamento da intolerância e do fanatismo, em suma, no combate aos flagelos dos nossos dias, com estreitamento das relações de amizade entre os povos, fundadas no respeito recíproco e na frontalidade de

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posições.
Um grande teórico e estratega militar escreveu, há mais de 2000 anos, que a guerra é uma coisa demasiado séria (porque é o reino da morte e da destruição) para ser encarada levianamente. Sabe-se sempre como começa mas nunca se sabe como acaba.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Vivemos hoje um período em que esta conclusão é evidentemente notória e clara, e basta abrir a televisão para sabermos que assim é.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - A NATO foi criada para as evitar e para assegurar a paz, o desenvolvimento e a prosperidade. É com este espírito, e exclusivamente com este espírito, neste mundo incerto, que reiteramos o voto favorável às resoluções que hoje nos são presentes, para que haja um mundo melhor - de mais bem-estar, prosperidade, com a diminuição e a superação das desigualdades, que são, é útil recordar e lembrar, a causa primeira das guerras - e para que a globalização caminhe num sentido ético, defendendo o emprego e não o desemprego, a tolerância e não a intolerância.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Narana Coissoró.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República discute hoje a aprovação de sete protocolos sobre a adesão ao Tratado do Atlântico Norte de países que há poucos anos atrás pertenciam ao Bloco de Leste.
Esta adesão é significativa, como significativa foi a posição de vários destes países aquando do início da intervenção no Iraque. Nessa altura, o Leste, martirizado por anos de ditadura comunista, reagiu e afirmou peremptoriamente a sua solidariedade transatlântica por oposição à afirmação hegemónica da França e da Alemanha.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O diálogo, numa NATO alargada, deve manter-se e é vital para o futuro da defesa comum do Ocidente e para a essência da relação transatlântica, num momento em que, como se verificou na recente Cimeira Franco-Britânica, a palavra de ordem é, tanto quanto possível, enterrar divergências e definir o futuro da segurança. Quero, aliás, lembrar em relação a isto um recurso recente da Sr.ª Ministra da Defesa de França, que disse que a NATO continuava a ser a principal organização para garantir a segurança e a defesa da Europa.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Portugal é membro da NATO desde a sua fundação e acompanhou todas as vicissitudes e sucessos desta organização desde a data da sua criação, em Abril de 1949.
Logo na década de 50, começou a delinear-se a principal função de Portugal na NATO: a de importante ponto de apoio à mobilidade estratégica e ao reforço da presença militar da Aliança na Europa. Também é evidente que, historicamente, a Aliança foi o garante da paz e da estabilidade no espaço europeu não comunista, garantindo o vínculo transatlântico fundamental aos interesses europeus.
Com o advento do fim da União Soviética, porém, tudo mudou. A Aliança, até então, estritamente defensiva, com um adversário perfeitamente identificado, com uma área geográfica bem delimitada e inquestionavelmente apoiada na legitimidade jurídica da Carta das Nações Unidas, viu todos estes pressupostos serem colocados em causa.
Perante o espectro da extinção, a NATO conseguiu gerar no seu seio o movimento refundador que concluiria pela sua manutenção como Aliança defensiva no espaço Europeu, com legitimidade jurídica reconfirmada pela Carta das Nações Unidas.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

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O Orador: - Contudo, houve que trabalhar pacientemente e ao longo de quase sete anos, o processo de alargamento da Aliança aos países do Leste europeu, que viria a culminar na Cimeira de Madrid, em Julho de 1997, onde se decidiu convidar formalmente à adesão a Polónia, a Hungria e a República Checa e se definiu uma política aberta de acolhimento dos novos países de Leste.
Para chegar a este alargamento, foi necessário associar aos interesses da Aliança a generalidade dos países de Leste, através das parcerias para a paz ou do Conselho de Parceria Euro-Atlântico, ao mesmo tempo que se firmavam determinados compromissos com a Ucrânia e com a Federação Russa, nomeadamente no âmbito da gestão do armamento nuclear, mas, sobretudo, foi necessário iniciar a reformulação dos objectivos e da estratégia da Aliança e redefinir as suas missões e estrutura, muito por impulso dos Estados Unidos.
Foi por isso que, em 1999, o conceito estratégico da NATO foi alterado em vários aspectos, sendo de destacar: a alteração de natureza, que de apenas defensiva passaria também a ser de iniciativa na prevenção e gestão de crises;…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … a mudança de adversário, que deixaria de estar confinado a um bloco, que desapareceu - graças a Deus, desapareceu! - e passaria a ser constituído por outro tipo de ameaças à paz e segurança em países com interesse para o Ocidente; a mudança de área geográfica, com alargamento da área de intervenção potencial das forças aliadas; e a mudança de legitimidade jurídica, na medida em que as futuras intervenções da NATO seriam não já baseadas apenas na Carta das Nações Unidas ou com mandato expresso do Conselho de Segurança, mas poderiam provir da própria iniciativa da NATO. Foi este novo conceito estratégico que obteve consagração no dia 25 de Abril de 1999.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Recordo que é uma data que também diz muito ao nosso país.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O CDS-PP pertence ao grupo de partidos atlantistas que vê na NATO e nas suas relações privilegiadas com os Estados Unidos a melhor forma de garantir a manutenção da paz e do legado da cultura e do modelo civilizacional ocidentais.
O fim da Guerra Fria, em 1991, representou a derrota da tirania comunista na Europa, 46 anos depois da derrota da tirania nazi-fascista. Ficou, então, claro que a Europa, dividida por alianças político-militares antagónicas ao longo de meio século, devia orientar-se para um caminho de unidade e integração das novas democracias do Leste europeu.
Neste sentido, no início dos anos 90, alguns países europeus chegaram à conclusão de que a melhor maneira de dar uma resposta adequada às suas necessidades futuras, no âmbito da sua segurança e defesa nacional, seria aderirem à NATO e, como tal, exprimem a sua intenção de se tornarem membros.
Para iniciar as negociações são convidados três antigos parceiros - Hungria, Polónia e República Checa -, cujas candidaturas são exaustivamente analisadas e, em 1997, na Cimeira de Madrid, é feito o convite a estes países para que adiram à Aliança; em Março de 1999, dá-se a adesão à Aliança da Hungria, da Polónia e da República Checa, sendo que o número de países membros da NATO se eleva para 19.
Já em Abril de 1999, na Cimeira de Washington, que assinalou o 50.º aniversário da Aliança, dirigentes dos países da Aliança vêm afirmar o desejo de continuar o alargamento como um meio para estender ainda mais amplamente a segurança proporcionada pela organização e para reforçar a estabilidade da Europa no seu conjunto.
A perspectiva de uma eventual adesão incita os países candidatos a resolverem os diferendos que possam ter com os seus vizinhos e a redobrarem os seus esforços de reforma e democratização. Por outro lado, é necessário que os novos membros possam não só beneficiar das vantagens proporcionadas pela adesão mas também contribuir activamente para a segurança de todos os países membros.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em 1999, a OTAN lança um plano de acção para adesão, através do qual é dado aos países parceiros interessados um auxílio ao nível da preparação para a futura adopção do estatuto de membros e através do qual - e isto é muito importante - se exige o cumprimento de determinados objectivos políticos, nomeadamente a resolução dos diferendos territoriais, o respeito pelos procedimentos democráticos e pela primazia do direito e o controlo democrático das forças armadas.

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Na Cimeira de Praga, que teve lugar a 21 e 22 de Novembro de 2002, é feita uma reavaliação do processo de alargamento da Aliança por parte dos Chefes de Estado e de Governo dos países da OTAN. A Estónia, a Bulgária, a Letónia, a Lituânia, a Roménia, a Eslováquia e a Eslovénia são convidadas a aderir à NATO.
A Cimeira de Praga foi, por isso, um momento capital para a NATO e para a Europa. As decisões tomadas pelos dirigentes da Aliança em Praga puseram fim, definitivamente, às divisões que sobressaltaram a Europa no século XX e iniciaram um processo de modernização para garantir que a NATO seja capaz de enfrentar os desafios de segurança do século XXI tão eficazmente como enfrentou os do século passado.
A necessidade da existência da NATO, hoje, é mais do que evidente e resulta das alterações que se verificaram no ambiente estratégico global, das quais destaco: o terrorismo internacional e a grave ameaça ao Estado de direito, à sua autoridade, aos valores humanistas e às sociedades livres; as chamadas "novas ameaças", com a consciência da vulnerabilidade perante as mesmas; a proliferação crescente de armas de destruição maciça, nas suas dimensões nuclear, biológica e química e ainda de meios convencionais de médio e longo alcance, como a sua acessibilidade a organizações não estaduais; o novo mapa europeu, consolidado após o fim da Guerra Fria, com incidência no novo quadro de relações com a Rússia e a adesão de países de Leste à Aliança Atlântica; a globalização e os seus reflexos no xadrez internacional; e o redimensionamento da importância dos conflitos regionais à escala global.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, saudando também a presença aqui dos Srs. Embaixadores dos países aderentes e outros diplomatas, queria dizer que, pelo que foi aqui exposto, o CDS-PP não pode deixar de manifestar todo o seu apoio a este novo alargamento e de desejar as boas vindas aos sete novos membros da Aliança Atlântica.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O alargamento da NATO a diversos países do Centro e Leste da Europa, cujos processos de ratificação por Portugal hoje debatemos, decidido na Cimeira de Praga ocorrida há um ano, decorre das opções assumidas no conceito estratégico da NATO de 1999 e deve ser hoje analisado à luz da aplicação da "doutrina Bush" sobre o papel dos Estados Unidos no mundo, formulada após os trágicos acontecimentos de 11 de Setembro de 2001 e posta em prática, de forma brutal, no Afeganistão e no Iraque.
O papel da NATO como aliança militar tinha a sua auto-justificação política na existência do Pacto de Varsóvia e na confrontação global Leste/Oeste. Dissolvido o Pacto de Varsóvia, a NATO perderia a razão de ser, em benefício de sistemas de segurança e, particularmente, a favor da OSCE e da ONU.
Importa acentuar que a NATO foi criada como uma aliança político-militar, reunindo Estados e as suas forças armadas para se organizarem para o combate contra inimigos. Ao contrário, um sistema de segurança e cooperação baseia-se na junção num mesmo fórum político de todos os que partilham uma região, mesmo que com interesses contraditórios, para estabelecer regras de cooperação, medidas de confiança, troca de informação estratégica, acordos de equilíbrio militar e de transparência e tudo o mais que possa contribuir para prevenir, impedir e controlar conflitos.
Um sistema de segurança e cooperação pode reunir forças militares preparadas para missões determinadas, mas sempre sob a autoridade do Conselho de Segurança, nos termos da Carta das Nações Unidas.
Mas esse não era o caminho que interessava à superpotência única, os Estados Unidos, nem aos mais poderosos países europeus. À esperança dos povos de se construir a paz, as lideranças desses países opuseram a política dos interesses, garantidos pelo domínio político-militar.
Assim, após o desmantelamento do Pacto de Varsóvia, a NATO procurou novas justificações e recebeu um novo impulso; manteve a mesma doutrina de emprego da força; reorganizou o aparelho militar, privilegiando não as clássicas unidades territoriais vocacionadas para a defesa mas forças integradas multinacionais e abrangendo os vários ramos vocacionadas para o ataque e possuindo rápida mobilidade e flexibilidade; reorganizou o sistema de comandos, que, de qualquer forma, manteve o completo domínio americano; e desenvolveu uma política de absorção e controlo de outros Estados, onde se inserem o anterior e o presente alargamento.
Os anos 90 do século XX, que prometiam maior segurança e cooperação, foram, afinal, anos que serviram para reforçar a capacidade agressiva da NATO e o comando superior americano, que não abdica de

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nenhuma das suas prerrogativas essenciais.
A aprovação do novo conceito estratégico da NATO, em 1999, rematou este processo da pior maneira possível e representou um brutal retrocesso no direito internacional. Os princípios do respeito da soberania e do recurso à força, limitado nos termos da Carta das Nações Unidas, foram substituídos pela arrogante afirmação do poder imperial dos Estados Unidos e da NATO, fundada no juízo em causa própria e na auto-atribuição de um poder de intervenção militar à margem e contra a Carta das Nações Unidas.
A NATO assumiu-se, desde então, claramente como organização ofensiva, abandonando de vez a autoproclamada natureza defensiva, que foi, durante anos, um ponto-chave da sua propaganda, e alargou a sua área de actuação, abandonando a circunscrição ao território definido no artigo 85.º do Tratado constitutivo e alargando-a a toda a zona dos interesses políticos que prossegue.
O conceito estratégico da NATO contém objectivos e conceitos incompatíveis com normas de direito internacional e de pactos internacionais e com normas internas de natureza constitucional.
Na verdade, o artigo 7.º da Constituição da República diz que "Portugal rege-se nas relações internacionais pelos princípios da independência nacional, do respeito dos direitos do homem, dos direitos dos povos, da igualdade entre os Estados, da solução pacífica dos conflitos internacionais, da não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados e da cooperação com todos os outros povos para a emancipação e o progresso da humanidade". E diz ainda que "Portugal preconiza a abolição do imperialismo, do colonialismo e de quaisquer outras formas de agressão, domínio e exploração nas relações entre os povos, bem como o desarmamento geral, simultâneo e controlado, a dissolução dos blocos político-militares e o estabelecimento de um sistema de segurança colectiva, com vista à criação de uma ordem internacional capaz de assegurar a paz e a justiça nas relações entre os povos".
Ora, esta disposição da nossa Lei Fundamental está a anos-luz do conceito estratégico da NATO aprovado em 1999 e está nos antípodas da doutrina que a administração Bush pretende impor à Aliança neste início do século XXI.
Após o 11 de Setembro de 2001, tornou-se claro o objectivo dos Estados Unidos de utilizar a chamada "guerra ao terrorismo" para adaptar a NATO ao papel coadjuvante que entenderam reservar-lhe na sua ambição de hegemonia mundial.
Daí que, a partir da reunião de Reiquejavique, de Maio de 2002, e da Cimeira de Praga, de Novembro do ano passado, que decidiu o presente alargamento, os Estados Unidos tenham decidido configurar a NATO para actuar de acordo com as exigências da guerra ao terrorismo na versão Bush.
A Cimeira de Praga aprovou um conjunto de iniciativas impressionantes nesse domínio.
Aprovou um "Compromisso de Capacidades", concebido para assegurar que as forças armadas europeias estejam equipadas para se deslocar mais rapidamente e para mais longe, para aplicar força militar com mais eficácia e para subsistirem por si próprias em combate. A implementação desde Compromisso deverá, pelo menos, quadruplicar o número de grandes aviões de transporte na Europa, aumentar significativamente a capacidade de reabastecimento em voo dos membros europeus da NATO e criar uma frota de 10 a 15 aviões tanques.
Aprovou a criação de uma "Força de Reacção", integrando forças terrestres, marítimas e aéreas, apta para responder rapidamente a uma emergência, onde quer que seja, e para suportar operações prolongadas.
Aprovou um Plano de Acção do Planeamento Civil de Emergência e a implementação de cinco iniciativas sobre a defesa contra armas nucleares, biológicas e químicas, que reforçarão as capacidades da Aliança contra as armas de destruição maciça.
É sabido que a posição tomada pelos Estados Unidos e pela Grã-Bretanha de invadir o Iraque, em violação flagrante do Direito Internacional e da Carta das Nações Unidas, provocou uma crise no seio da Aliança Atlântica devido à discordância manifestada por diversos membros, entre os quais, lamentavelmente, não pudemos incluir Portugal.
É claro, porém, que os estrategas norte-americanos têm consciência dessas divergências e da necessidade de as contornar, adaptando a NATO à prossecução dos seus objectivos.
Numa recente publicação da própria NATO, um especialista em assuntos de defesa e segurança nacional dos Estados Unidos, ligado ao American Enterprise Institute, não podia ser mais claro a este respeito, quando disse: "No seguimento da guerra do Iraque, Washington está a começar a compreender que mesmo a única superpotência do mundo precisa de ajuda. A institucionalização da actual Pax Americana - ou qualquer nome mais adequado para a actual ordem internacional - é inevitável. Garantir a ordem mundial 'unilateralmente' não é uma opção realista. Portanto, a questão, para os americanos, é saber se e como adaptar a OTAN às novas circunstâncias estratégicas.
As divergências políticas ainda podem ser resolvidas ou, pelo menos, melhor geridas. O valor da Aliança como 'fornecedor de forças' pode ser tão grande que as divergências políticas podem ser ignoradas.

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A resposta dependerá, em larga medida, das políticas e programas dos EUA nos próximos anos. A mudança aproxima-se e os Estados Unidos e os seus parceiros mais chegados da Aliança ou efectuarão as reformas que permitam à OTAN adaptar-se ao mundo pós-Guerra Fria para se tornar um parceiro na Pax Americana, ou a Aliança definhará. Se Washington permitir que a OTAN definhe, terá que criar uma outra qualquer base institucional para servir de esteio a futuras coligações de interessados."
E prossegue: "Muitos europeus, como alguns americanos, tiveram dificuldade em adaptar-se à mudança da política e da estratégia dos EUA depois do 11 de Setembro de 2001. Desde então, o Presidente George W. Bush enunciou um novo sentido de missão nacional, que gradualmente se tornou uma 'doutrina Bush' formal, melhor considerada como um renovado sentido de objectivo para o poder dos EUA no mundo. Os Estados Unidos estão agora empenhados numa forma activa de liderança mundial e envolveram-se numa iniciativa ambiciosa de refazer a ordem política no Próximo Oriente, de que será impossível desistir sem admitir a derrota.
Muitos europeus ainda estão longe de partilhar este novo sentido de missão dos EUA ou de formular qualquer corolário europeu da doutrina Bush. Em termos gerais, e mesmo depois da guerra no Iraque, muitos europeus ainda vivem num mundo 'pré-11/9' e 'pré-doutrina Bush'. Acreditam que as instituições internacionais ou os mecanismos legais podem assegurar um mundo pacífico, próspero e liberal. E continuam relutantes em empregar a força militar, particularmente para atingir objectivos ambiciosos como os que actualmente os Estados Unidos procuram atingir no Próximo Oriente.
Contudo, também é verdade que, para o Reino Unido e outros países, a nova missão dos Estados Unidos é uma missão atlântica. Querem manter os Estados Unidos plenamente envolvidos na Europa. Estão cada vez mais desejosos de se envolver noutros locais do mundo juntamente com os Estados Unidos. Tendo apreciado o primeiro sabor da ordem internacional liberal dirigida pelos Estados Unidos, a Pax Americana, não estão interessados em criar um 'contrapeso' europeu.
Dum ponto de vista estritamente dos EUA, mesmo esta fractura da base geopolítica é suficiente para tornar a OTAN um instrumento útil da política e estratégia dos EUA, desde que a Aliança possa reformar as suas estruturas militares para superar a fraqueza militar da Europa."
A citação foi longa, mas foi esclarecedora, e as conclusões da Cimeira de Praga demonstram até que ponto a NATO está disposta a desempenhar o papel de "fornecedor de forças" que lhe foi atribuído pela Administração Bush.
Como já alguém referiu, uma tal divisão de trabalho entre os dois lados do Atlântico, poria a Europa a fazer a "limpeza" depois das intervenções dos EUA. Os Estados Unidos, com alguns aliados, forneceriam a dura capacidade de combate, a NATO forneceria uma força de imposição de paz para os problemas imediatos pós conflito e a União Europeia ficaria com o policiamento das sociedades desfeitas.
O Governo português aceita que o nosso país se preste a desempenhar esse papel. Nós não aceitamos!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - No respeito pela Constituição da República e pela Carta das Nações Unidas, Portugal deveria defender no plano internacional uma prática de cooperação, de segurança, de diplomacia, de confiança e de paz, em vez de políticas de agressão, de imposição da força militar, de exacerbação de conflitos, de má fé, de golpismo e de guerra, que estão dramaticamente a marcar os tempos em que vivemos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, uma vez que deduzi que o PCP irá votar contra os tratados de adesão destes novos países à NATO, e tendo em conta que nestes países foram feitos referendos que deram votações a favor da adesão da ordem dos 60%, 70% ou 80%, consoante os casos, pergunto-lhe se, apesar de tudo, para o PCP, a vontade expressa dos povos desses sete países de entrar para a NATO não conta para a formulação da sua decisão.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Rebelo, a resposta é muito fácil.

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Naturalmente que, de forma democrática, respeitamos a posição tomada por outras forças políticas de outros países europeus e a de todos os povos que, maioritariamente, tomaram uma determinada opção, assim como também entendemos que todos têm de respeitar a nossa posição, que é uma posição de princípio, uma posição de fundo, contrária ao alargamento da NATO.
Portanto, como representamos o ponto de vista de muitos cidadãos portugueses que nos elegeram, a nossa posição, que assumiremos coerentemente, também tem de ser respeitada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.

O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Embaixadores: Uso da palavra na qualidade de Presidente da Delegação Portuguesa à Assembleia Parlamentar da NATO, eleito pelo Parlamento português. Em meu nome e em nome da Delegação Portuguesa não poderia deixar de me congratular pela decisão que vamos tomar.
Em Abril deste ano, em reunião havida com todos os Srs. Embaixadores dos futuros novos países membros da NATO, tive a oportunidade, na presença e com o testemunho do Deputado Correia de Jesus, também ele membro da Delegação Portuguesa e Presidente da Comissão Parlamentar de Defesa, de transmitir a possibilidade de Portugal ser um dos primeiros países a concluir o processo de ratificação, o que, de facto, agora acontece. Eis-nos a cumprir essa palavra.
Desde Praga, em 21 e 22 de Novembro de 2002, até hoje, percorreu-se, porventura, um pequeno caminho que mudará definitivamente a vida dos novos países membros - Bulgária, Estónia, Letónia, Lituânia, Roménia, Eslováquia e Eslovénia - e, muito especialmente, a dos seus povos, que decidiram livremente, em conjunto com os 19 países membros da Aliança Atlântica, dar um passo mais para pôr fim às divisões que caracterizaram a Europa no século XX.
Novos membros, novas capacidades e um novo relacionamento é, como já aqui foi referido, uma fórmula feliz para sintetizar esta nova etapa da NATO, que, criada em 1949, mantém toda a actualidade e toda a justificação para a sua existência.
É importante, na nossa perspectiva, preservar e fortalecer o relacionamento transatlântico, sem falsas divisões entre a Europa e os Estados Unidos, sem duplicações desnecessárias de despesas militares e sem imaginações de fantasmas que apenas poderão dificultar o relacionamento com os nossos aliados mais importantes.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Este novo espírito da Aliança será, também ele, acompanhado por um maior empenhamento nas estruturas da Assembleia Parlamentar da NATO.
De facto, desde a última eleição, aquela em que fui eleito presidente, os Deputados portugueses conseguiram passar de um lugar de relator, que eu próprio desempenhava, para os cinco lugares que hoje detemos a nível da estrutura da Assembleia Parlamentar: a Vice-Presidência da Comissão Política e a participação na Comissão Mista NATO/Rússia, que eu próprio assumo; a Vice-Presidência da Comissão de Ciência e Tecnologia, para que foi eleito o Deputado José Lello; a Presidência da Subcomissão para a Cooperação Transatlântica em Matéria de Defesa e Segurança, assegurada pelo Deputado Miranda Calha; e a Vice-Presidência da Subcomissão para o Futuro das Capacidades de Segurança e Defesa, para que foi eleito o Deputado Rui Miguel Ribeiro. Tudo isto em cerca de ano e meio e sem falar da eleição do Deputado Alberto Costa como Vice-Presidente da Subcomissão para a Governação Democrática, cargo para o qual não aceitou ser reeleito pelas responsabilidades entretanto assumidas em nome da Assembleia da República no âmbito da Convenção Europeia, para além do empenho e do trabalho desenvolvido por todos os restantes Deputados da delegação portuguesa, que é justo aqui realçar.
Uma palavra especial para o Vice Presidente da Delegação, Deputado Jaime Gama, cuja experiência e capacidade políticas, sobejamente reconhecidas, têm representado para mim, enquanto Presidente da Delegação, uma ajuda tão valiosa quanto imprescindível, de que aqui quero dar público testemunho.
Portugal poderá vir a ser anfitrião da reunião plenária da Assembleia Parlamentar da NATO a realizar na Primavera de 2007, data que poderá coincidir com outros momentos importantes para a própria NATO, que, estou certo, Portugal não deixará de apoiar, num claro compromisso com os princípios da liberdade, da paz, da segurança e da democracia, em conjunto com todos os que o desejam não só na área do Atlântico Norte, com base no Tratado de Washington, mas em todo o mundo.

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Srs. Embaixadores que aqui representam os governos e os povos da Bulgária, da Estónia, da Letónia, da Lituânia, da Roménia, da Eslováquia e da Eslovénia, sejam bem-vindos à NATO, a um espaço de liberdade, de paz, de segurança e de democracia, de que Portugal é membro fundador e a que pertence com muito orgulho.

Aplausos do PSD, do CDS-PP e do Sr. Deputado do PS José Lello.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Embaixadores: Após o fim do confronto bipolar, a Aliança Atlântica depara-se, hoje em dia, com outro tipo de ameaças que, de igual modo, põem em causa a paz, os valores democráticos e a sã convivência cívica em liberdade. Valores que foram a base de uma coligação de vontades, responsável pelo clima de paz que prevaleceria na Europa durante os últimos 53 anos, apenas pontualmente posto em causa na sua periferia balcânica.
Assim, desde o fim da "guerra fria", a Aliança desenvolveu um conjunto de acções tendentes à revisão da sua doutrina estratégica e à adequação das suas estruturas militares ao novo quadro de ameaças. Um cenário configurado por uma situação de crescente instabilidade no mundo, onde ressalta o impacto do terrorismo como factor maior de desafio para a ordem internacional estabelecida, conjugado com o colapso na ordem interna de Estados soberanos que, assim, se convertem em centros de recrutamento terrorista, em paraísos para actividades ilícitas do crime organizado, do tráfico de drogas e armas, perante o espectro, cada vez mais plausível, da eventualidade da proliferação de armas de destruição massiva, biológicas, nucleares e químicas.
Assim, tendo em conta os actuais desenvolvimentos que relevam quanto a luta contra o terrorismo globalizado e outras ameaças assimétricas igualmente perversas constituem o objectivo prioritário da agenda estratégica aliada, foram sendo estabelecidos novos quadros de parceria, novas vias de cooperação militar foram desenvolvidas, novas missões foram configuradas e, naturalmente, novos membros foram admitidos no seio da organização.
Nestes termos, este quinto alargamento da NATO - e será bom recordar tal situação, porque reveladora da capacidade evidenciada pela Aliança na sua adaptação aos desafios que a História lhe tem colocado - relevará a consolidação do espaço europeu em termos segurança comum. Mas confirma o papel da Aliança como instrumento de consenso e de diálogo, reforçando a sua capacidade para promover a paz e a segurança no todo da região euro-atlântica.
Porventura como nenhuma outra instituição, a NATO será o instrumento mais activo na incorporação dos potenciais europeu e americano na acção militar concreta, mas também na potenciação dos aspectos do multilateralismo e da eficácia na racionalização de meios. Daí, as reformas desenvolvidas no seio da organização, marcadas pela estruturação de um novo Comando Aliado, pelo processo em curso da estruturação de uma força de intervenção e pela modernização global do potencial militar da Aliança.
Neste enquadramento se inseriu o alargamento da NATO a estes sete países, outrora partes do extinto Pacto de Varsóvia, cujos protocolos de adesão são aqui objecto de apreciação para inerente processo de ratificação que aprovamos. É este um processo consentâneo com aquele outro também em curso do alargamento da União Europeia.
Novas democracias integraram o subsequente alargamento e já hoje contribuem para as missões NATO, seja no Afeganistão, seja nos Balcãs, num claro contributo para o fortalecimento operacional e respaldo político de uma Aliança que se pretende continue a ser um espaço de valores democráticos e civilizacionais.
As populações daqueles e destes novos países aderentes ao Pacto do Atlântico ainda retêm memórias amargas de uma vivência sob a repressão e a ditadura. Daí, o seu respaldo e empenhamento relativamente às garantias de defesa colectiva que a NATO lhes configura, afastando do seu quotidiano o espectro da guerra e da discórdia, e afirmando perspectivas de estabilidade e de progresso. Um cenário consubstanciado numa nova e biunívoca relação de segurança entre a NATO e a Rússia, hoje em dia envolvida em estruturas de cooperação mútua, capazes de responderem às mais instantes ameaças de segurança, num claro contributo para o reforço dos níveis de confiança mútua e de transparência das políticas de defesa de ambas as partes, está em curso
O alargamento aqui analisado justifica-se do ponto de vista da coerência de uma política europeia de segurança, contribui para um mais adequado equilíbrio entre os dois pilares da Aliança e concorre para o reforço de um euro-atlantismo fundado numa perspectiva solidária que releva do passado, se afirma no presente e se projecta para o futuro, mas também numa visão multilateralista de relacionamento para além da área tradicional de intervenção aliada.

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Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.

A Sr.ª Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação (Maria Manuela Franco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Embaixadores: É a primeira vez que tomo a palavra neste Parlamento e sinto-me muito honrada por ter a oportunidade de o fazer.
Mediante a ratificação dos protocolos de adesão à NATO, a Aliança acolherá os sete novos membros por ocasião da sua próxima Cimeira, em Istambul. Este será o maior alargamento da história da NATO e, a par do igualmente ambicioso alargamento da União Europeia, constituirá porventura um passo decisivo para a reunificação política da Europa. Os líderes dos Aliados convidaram estes sete países por entenderem que cada um deles atingiu os parâmetros de ordem político-económica, militar e outros que os qualificam para aderir à Aliança Atlântica.
A decisão foi tomada com base na convicção de que o alargamento a estes países contribuirá para fortalecer a NATO política e militarmente. A nível político, o presente alargamento tornará a NATO uma imensa comunidade geográfica e de valores, aumentando a zona da Europa onde primam os princípios democráticos e de Estado de direito. Além disso, o alargamento da NATO representa uma significativa ampliação, do Báltico ao mar Negro, da área de paz e estabilidade no continente europeu. Esse aumento da área segura, por assim dizer, é de extrema importância, nomeadamente face às novas ameaças terroristas, sobretudo na medida em que nos permite alargar mais o âmbito de protecção ao nosso alcance. Portugal será beneficiário directo da expansão dessa zona de estabilidade na Europa, não só por via do contributo específico dos novos membros para o esforço colectivo de defesa, mas também pelo significado para a nossa defesa nacional de uma NATO revitalizada.
Na verdade, este alargamento representa um importante elemento do processo de adaptação e transformação da Aliança aos novos cenários, no início do século XXI.
Os futuros membros da NATO assumiram importantes compromissos que se empenham em cumprir. Todos fizeram grandes progressos que foram ajustados às situações de cada um e que foram integrados em programas nacionais, cuja execução tem vindo a ser cuidadosamente acompanhada pela Aliança. Cada um deles está em condições de contribuir para o reforço da segurança na zona euro-atlântica e para manter a relevância da NATO no mundo actual. Estes países têm demonstrado, de forma clara, considerar a NATO a fundação insubstituível da sua segurança e do conjunto da comunidade euro-atlântica. Daí, o firme propósito de aderirem, apesar dos esforços que, nós sabemos, tal lhes exigiu e exige.
Esta vontade, aliás, tem sido reiterada não só pelos governantes dos países candidatos, mas também pelas respectivas populações; através de diversas manifestações públicas, o considerável apoio popular tem sido uma constante em todos os futuros membros. Ao darem primordial importância nos respectivos processos de reforma a questões como os direitos das minorias, as relações regionais, o combate à corrupção, a luta contra o crime organizado e a boa governação, foi patente o firme compromisso e o empenhamento destes países para com a comunidade de valores que a NATO representa.
Caberá a todos os Aliados, nesta fase de transição, o papel vital de apoio e encorajamento aos novos membros. O sucesso de tais esforços representa um benefício para os próprios, mas também um importante factor estabilizador a nível europeu, e eu diria mundial. Antevemos como resultado uma NATO maior, mais forte e mais capaz. E a Aliança precisa de novos membros que participem nos esforços globais para fazer face aos desafios do mundo actual que os recentes ataques terroristas em Istambul vieram mais uma vez pôr em evidência, se preciso fosse.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Portugal sempre apoiou a "política de porta aberta" da Aliança Atlântica aos países que, cumprindo os critérios exigidos para a adesão, desejassem fazê-lo. Consideramos que estas sete jovens democracias europeias estão nestas condições. Por isso, julgamos que a corrente de alargamento é um imperativo histórico-político que corresponde à vontade legítima dos candidatos e aos valores intrínsecos da própria Aliança.
Sejam bem-vindos!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Srs. Deputados, a Mesa já não regista mais inscrições, pelo

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que dou por encerrado este debate.
Convidamos todos os Srs. Deputados para a Sala do Senado, onde se vai realizar uma representação que encerra as comemorações do Centenário da Sala das Sessões.
A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, quinta-feira, dia 27, às 15 horas, com um período de antes da ordem do dia, a que se seguirá a discussão, na generalidade, dos projectos de lei n.os 362/IX, 374/IX e 236/IX.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
Arménio dos Santos
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
António Luís Santos da Costa
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Rui Gaspar de Almeida

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
Jaime José Matos da Gama

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Henrique José Monteiro Chaves
João José Gago Horta
José Manuel Pereira da Costa
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Mário Patinha Antão
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Francisco José Pereira de Assis Miranda
João Barroso Soares
Luísa Pinheiro Portugal
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves

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Partido Popular (CDS-PP):
Paulo Daniel Fugas Veiga

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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