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Quinta-feira, 8 de Janeiro de 2004 I Série - Número 35

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 7 DE JANEIRO DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Ascenso Luís Seixas Simões
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Foi anunciado o resultado da eleição de um Secretário da Mesa da Assembleia da República, não tendo sido proclamado eleito, pela segunda vez, o Sr. Deputado Henrique Campos Cunha (CDS-PP).
Deu-se conta da apresentação da proposta de lei n.º 106/IX, da proposta de resolução n.º 55/IX, dos projectos de lei n.os 393 e 394/IX, das apreciações parlamentares n.os 65 a 67/IX, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) falou sobre as alterações climáticas e o comércio de emissões poluentes, após o que respondeu aos pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Pedro Silva Pereira (PS).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Francisco Louçã (BE) pronunciou-se sobre os efeitos da crise da justiça na democracia e, depois, deu resposta aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Telmo Correia (CDS-PP) e José Magalhães (PS).
Em interpelação à Mesa, e a propósito de uma notícia sobre o processo da Casa Pia publicada hoje numa revista, o Sr. Deputado Manuel Alegre (PS) solidarizou-se com o Sr. Presidente da Assembleia Mota Amaral, no que foi secundado pelos Srs. Deputados António Costa (PS), Guilherme Silva (PSD), Bernardino Soares (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Francisco Louçã (BE), Isabel Castro (Os Verdes) e Assunção Esteves (PSD).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Jorge Neto (PSD) teceu considerações acerca do Boletim Económico do Banco de Portugal recentemente divulgado e das projecções para a economia portuguesa para os próximos dois anos nele contidas.
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Bernardino Soares (PCP) referiu-se às dificuldades económicas, sociais e laborais que os portugueses vão enfrentar no ano de 2004 face às políticas desenvolvidas pelo Executivo.
Por último e também em declaração política, o Sr. Deputado António Costa (PS) fez uma análise comparativa entre os resultados publicados pelo Eurostat sobre a convergência do desenvolvimento da economia portuguesa com a europeia no período da governação socialista e a divergência que considera existir actualmente, tendo

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depois respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Guilherme Silva (PSD), Telmo Correia (CDS-PP) e Jorge Neto (PSD).
Foi aprovado um parecer da Comissão de Ética relativo à substituição de um Deputado do PS.

Ordem do dia. - Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.os 100/IX - Aprova o regime jurídico do contrato individual de trabalho da Administração Pública e 101/IX - Cria o sistema integrado de avaliação do desempenho da Administração Pública. Pronunciaram-se, a diverso título, além da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Manuela Ferreira Leite), os Srs. Deputados Vieira da Silva (PS) - que interveio para apresentar o relatório da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais sobre a proposta de lei n.º 100/IX, o que suscitou o uso da palavra dos Srs. Deputados Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Patinha Antão (PSD), Guilherme Silva (PSD) e José Magalhães (PS) -, Patinha Antão (PSD), Luís Fazenda (BE), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Fausto Correia (PS), Isabel Castro (Os Verdes), Carlos Andrade Miranda (PSD), Pedro Roque (PSD), Jerónimo de Sousa (PCP) e Artur Penedos (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos de Sousa Pinto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira

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José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Isilda Viscata Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho

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Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Guilherme Valdemar Pereira D'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia

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Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Hélder do Amaral
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai ler a acta da eleição de um Secretário da Mesa da Assembleia

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da República e dar conta do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a acta da eleição para o cargo de Secretário da Mesa da Assembleia da República é do seguinte teor:
"Aos dezanove dias do mês de Dezembro de dois mil e três, procedeu-se à eleição de um Secretário da Mesa da Assembleia da República, tendo sido proposto, pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, o candidato Henrique Jorge Campos Cunha.
O resultado obtido foi o seguinte:
Votantes - 164
Votos 'sim' - 94
Votos 'não' - 39
Abstenções - 18
Votos brancos - 13
Face ao resultado obtido, declara-se não eleito o candidato proposto.
Para constar se lavrou a presente acta, que vai ser devidamente assinada.
Os Deputados Escrutinadores: Fernando Santos Pereira - Manuel Oliveira."
Sr. Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 106/IX - Autoriza o Governo a regular o exercício das actividades de mediação imobiliária e angariação imobiliária; proposta de resolução n.º 55/IX - Aprova, para ratificação, o protocolo de alteração da Convenção de 23 de Julho de 1990, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros entre empresas associadas, incluindo a Acta Final, assinada em Bruxelas, em 25 de Maio de 1999; projectos de lei n.os 393/IX - Criação da freguesia de Malta, no concelho de Pinhel (PCP), 394/IX - Elevação da povoação de Arcozelo, no concelho de Ponte de Lima, à categoria de vila (PCP); e apreciações parlamentares n.os 65/IX (PS) - Decreto-Lei n.º 305/2003, de 9 de Dezembro (Revoga os regimes de crédito bonificado regulados pelo Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de Novembro, relativamente à contratação de novas operações de crédito, destinados à aquisição, construção e realização de obras de conservação ordinária e de beneficiação de habitação própria permanente); 66/IX (PCP) - Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10 de Dezembro (Cria a Entidade Reguladora da Saúde) e 67/IX (PS) - Decreto-Lei n.º 293/2003, de 19 de Novembro (Transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2002/30/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Março, relativa ao estabelecimento de regras e procedimentos para a introdução de restrições de operações relacionadas com o ruído nos aeroportos comunitários).
Foram apresentados na Mesa os requerimentos seguintes:
No dia 2 de Dezembro de 2003 e nas reuniões plenárias de 27 e 28 de Novembro e 3, 4 e 5 de Dezembro de 2003: ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Moniz; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Paula Duarte e Bernardino Soares; à Secretaria de Estado da Segurança Social, formulado pela Sr.ª Deputada Custódia Fernandes; à Comissão Nacional de Eleições, formulado pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelos Srs. Deputados Miranda Calha e Heloísa Apolónia; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Administração Interna, da Saúde, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e ao Procurador-Geral da República, formulados pelos Srs. Deputados Fernando Cabral, Bruno Dias, Manuel Oliveira, António Filipe e José Miguel Medeiros; ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; e ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
No dia 9 e nas reuniões plenárias de 5, 10, 11 e 12 de Dezembro de 2003: aos Ministérios da Administração Interna, da Saúde, da Segurança Social e do Trabalho, da Ciência e do Ensino Superior, das Finanças, da Economia e da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Isabel Gonçalves, João Teixeira Lopes, Honório Novo, Bernardino Soares, Bruno Dias, Luísa Mesquita, António Filipe, Rodeia Machado, Jerónimo de Sousa, José Miguel Medeiros, Helena Roseta e Lino de Carvalho; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelos Srs. Deputados António José Seguro e Miranda Calha; à Ministra de Estado e das Finanças, formulados pelos Srs. Deputados Joel Hasse Ferreira e Medeiros Ferreira; aos Ministérios da Educação, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, dos Negócios Estrangeiros, da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, da Ciência e do Ensino Superior e da Economia, formulados pelos Srs. Deputados Isabel Castro, Carlos Alberto Gonçalves e Luís Fazenda; ao Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro e à Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; ao Sr. Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Luís; ao Ministério da Economia e à Câmara Municipal da Guarda, formulados pela Sr.ª Deputada Ana Manso; e ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado José Saraiva.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:

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No dia 9 de Dezembro de 2003: Fernando Pedro Moutinho, na sessão de 22 de Janeiro de 2003; Vicente Merendas, na sessão de 28 de Março de 2003; António Filipe, na sessão de 28 de Maio de 2003; Odete Santos, na sessão de 8 de Julho de 2003; Vasco Cunha, Afonso Candal e Bruno Dias, na sessão de 15 de Julho de 2003; Rodeia Machado, no dia 24 de Julho de 2003; Heloísa Apolónia, no dia 4 de Setembro de 2003; Lino de Carvalho, nas sessões de 24 de Setembro e de 15 de Outubro de 2003; Miranda Calha, na sessão de 2 de Outubro de 2003; Fernando Gomes e Luís Fazenda, no dia 6 de Outubro de 2003; Maria Manuela Aguiar, na sessão de 17 de Outubro de 2003; José Apolinário, no dia 31 de Outubro de 2003; e Vitalino Canas, no dia 12 de Novembro de 2003.
No dia 11 de Dezembro de 2003: Ana Manso, na sessão de 18 de Junho de 2003; Vicente Merendas, na sessão de 1 de Julho de 2003; Laurentino Dias, na sessão de 24 de Setembro de 2003; Isabel Castro, no dia 30 de Setembro de 2003; Rodeia Machado, no dia 1 de Outubro de 2003; Miranda Calha e Luís Carito, nas sessões de 8 de Outubro e de 6 de Novembro de 2003; e Honório Novo, na sessão de 15 e no dia 28 de Outubro de 2003.
No dia 15 de Dezembro de 2003: Bernardino Pereira, na sessão de 6 de Março de 2003; Honório Novo, na sessão de 8 de Maio e no dia 11 de Julho de 2003; Lino de Carvalho, na sessão de 15 de Julho de 2003; Carlos Luís, no dia 30 de Julho de 2003; e Maria do Carmo Romão, na sessão de 17 de Outubro de 2003.
No dia 17 de Dezembro de 2003: Isabel Castro, na sessão de 23 de Abril e no dia 9 de Setembro de 2003; Augusto Santos Silva, na sessão de 3 de Julho de 2003; Fernando Pedro Moutinho, na sessão de 22 de Janeiro de 2003; Honório Novo e José Junqueiro, no dia 17 de Julho e na sessão de 22 de Outubro de 2003; Luís Fazenda, no dia 2 de Setembro de 2003; Custódia Fernandes, no dia 15 de Setembro de 2003; Luísa Mesquita, na sessão de 19 de Setembro de 2003; Luiz Fagundes Duarte, no dia 23 de Setembro de 2003; Rui Miguel Ribeiro, na sessão de 24 de Setembro de 2003; António Filipe, na sessão de 2 de Outubro de 2003; e Carlos Luís, na sessão de 8 de Outubro de 2003.
Foram respondidos os requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:
Nos dias 26 de Novembro a 12 de Dezembro de 2003: Jorge Nuno de Sá, na sessão de 2 de Julho de 2003; Manuel Oliveira, na sessão de 1 de Outubro de 2003; e Herculano Gonçalves, no dia 7 de Novembro de 2003.
Em matéria de expediente é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos aguardar alguns momentos em virtude de existirem problemas técnicos com o som da Sala.

Pausa.

Srs. Deputados, estamos já em condições de retomar os nossos trabalhos. Gostava de aproveitar esta oportunidade, após a natural interrupção do período natalício, para desejar a todos um bom ano novo. Vamos ter muito trabalho e hoje, para começar, há inscrições de Deputados de todos os grupos parlamentares para declarações políticas.
Antes de dar a palavra ao primeiro orador inscrito, quero comunicar à Câmara que, esta manhã, a Mesa da Assembleia da República esteve no Palácio de Belém a apresentar cumprimentos de ano novo ao Sr. Presidente da República. Julgo ter exprimido o sentir de todos ao dirigir ao Sr. Presidente da República uma palavra de solidariedade e estima face à infame calúnia divulgada recentemente a seu respeito e que a todos nos indignou.
Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por desejar um bom ano a todos. Infelizmente, iniciamos um novo ano com muitos problemas que requerem respostas urgentes.
Do aumento incompreensível do custo de vida às previsões de um crescimento económico do nosso país por baixo da média europeia, muito longe de alterar a tendência de crescimento do desemprego no ano que se inicia, até à recusa de um Governo em enfrentar a realidade dramática do aborto clandestino, num País onde, dentro de dias, se continuará um julgamento de mulheres que ninguém quer ver condenadas, mas que o PSD, para salvar uma coligação com o PP, insiste em condenar, mantendo em vigor uma lei vergonhosa que as torna criminosas.
Perante tudo isto, e muito mais que aqui se poderia enunciar, ficam as certezas sobre o rumo negativo que estão a prosseguir as orientações deste Governo.
Ficam, ainda, as incertezas sobre o que nos oferecerá o novo ano em muitas matérias, como os escândalos alimentares, num País que nem consegue ter a funcionar uma agência para a segurança alimentar,

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ou as incertezas sobre o que poderá acontecer no próximo Verão em matéria de incêndios florestais, ou até, ainda neste Inverno, em matéria de cheias.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o ano de 2003 foi dos mais quentes. Um recente relatório da Organização Mundial de Saúde deixa claro que, pelo menos, 150 000 pessoas morreram no ano de 2000 por causas directas relacionadas com as alterações climáticas; torna claro que as catástrofes naturais triplicaram na década de 90, em relação aos valores da década de 60, e que as doenças infecciosas atingiram níveis que começam a chegar ao limiar do dramático.
Perante este cenário, nada para que relatórios do IPCC não tivessem já alertado, o ano de 2003 terminou com uma Conferência das Partes da Convenção-Quadro sobre as Alterações Climáticas, em Milão, que conheceu o recuo da Rússia na ratificação do Protocolo de Quioto e que ficou marcada pelas declarações posteriores da Comissária Europeia da Energia, exímia defensora do nuclear, afirmando o seu desejo de que a Europa opte também pelo não cumprimento das metas de Quioto, o que é extremamente preocupante.
Em Portugal, o Ministro Amílcar Theias elegeu, em Maio de 2003, o dossier das alterações climáticas como uma das suas três prioridades de acção. Referiu, então, três alternativas: "A primeira é sujeitarmo-nos a multas extremamente elevadas (…). A segunda hipótese é entrarmos no comércio internacional de direitos de emissão, a preços que certamente não saberemos controlar. Estaremos, nestes casos, a despender dinheiro no estrangeiro, quando o deveríamos estar a investir na eficiência da nossa economia. Seremos forçados, por isso, a uma terceira opção, que passa por enveredarmos, decididamente, pela via das energias renováveis, da utilização de biocombustíveis e da melhoria da eficiência energética (…). Se não for seguida esta terceira alternativa, a indústria portuguesa deixará de ser definitivamente competitiva e muitos sectores poderão desaparecer da paisagem industrial portuguesa".
O Ministro não referiu os impactes ambientais, de ordenamento e de saúde pública das alterações climáticas, que já são conhecidos para Portugal (e que, nomeadamente, o projecto SIAM tem estudado), mas importa realçar que também esses são profundamente preocupantes.
O Sr. Ministro veio, entretanto, anunciar a criação de uma taxa para a criação de um fundo financeiro com vista, designadamente, à entrada de Portugal no comércio europeu e internacional de compra e venda de créditos de poluição, contrariando as afirmações que tinha feito. E agora, com a apresentação, em Dezembro de 2003 - embora prometido para 2002 -, das medidas adicionais ao Programa Nacional para as Alterações Climáticas, que aposta fortemente no comércio de emissões para cumprir os objectivos de Quioto, sem apresentar contudo uma estimativa do que isso poderá representar na redução das nossas emissões de gases com efeitos de estufa, o Governo PSD/PP deixa claro que não foram desenvolvidas em Portugal as medidas necessárias que em Maio do ano passado o Sr. Ministro do Ambiente ainda acreditava que era possível implementar, nomeadamente nos sectores da energia e dos transportes.
A inacção que o Governo tem tido em relação a esta matéria é profundamente incompreensível. Em 2000, um Estudo da Universidade Nova da Lisboa estimava que em 2010, em vez do aumento de 27% de emissões de gases com efeito de estufa, permitido a Portugal no âmbito do Acordo de Partilha de Responsabilidades da União Europeia, se pouco ou nada se fizesse, atingiríamos um aumento de 52%.
O Programa Nacional para as Alterações Climáticas, conhecido em Março de 2002, reconhecia que em 2000 já tínhamos ultrapassado a meta dos 27%, mas considerava "ser possível cumprir as metas de redução com recurso apenas às políticas e medidas internas".
O Plano Nacional para as Alterações Climáticas, de Janeiro de 2003, esse, já estimava para 2010, em Portugal, um aumento de emissões no sector da energia entre os 53% e os 64%, nos transportes de 114% a 121% e nos outros sectores de 80% a 89%, considerando que tal se revelava bastante preocupante.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Governo não tomou as medidas que deveria ter tomado para combater as alterações climáticas. A incompetência do Governo vai pesar sobre os portugueses em geral com a proliferação de taxas para investir no estrangeiro na compra de créditos de poluição e vai pesar sobre as indústrias portuguesas e, através destas, sobre os consumidores e sobre os potenciais desempregados. E, mesmo assim, não se têm quaisquer certezas sobre o cumprimento das metas de Quioto, por parte de Portugal, porque falta o essencial: faltam a acção do Governo, as medidas do Governo nos sectores que estão mais que identificados e que só por falta de vontade política têm sido ignorados.
Este, Srs. Deputados, é certamente um assunto que fará correr muita água durante o ano de 2004 e que tem consequências muito sérias nos planos económico, social e ambiental.
Os Verdes propuseram ontem um debate no Parlamento sobre a questão e é urgente que ele se faça porque, entre outras razões, é real a ameaça de os portugueses pagarem muito caro, do seu bolso e com a sua saúde, a incompetência do Governo.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Silva Pereira.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, é verdade que o Sr. Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, quando aqui veio pela primeira vez, enunciou-nos três prioridades, e é verdade que uma delas foi a das alterações climáticas. Mas, se no domínio das alterações climáticas as coisas não têm corrido bem ao Governo, também no domínio das outras duas prioridades a situação não é melhor!
O Ministério do Ambiente enunciou também como prioridades a nova lei da água e a revisão de todo o enquadramento jurídico dos recursos hídricos e prometeu-nos que entregaria, nesta Assembleia, a nova lei da água até ao final do mês de Novembro, depois adiou para o mês de Dezembro, mas a verdade é que essa lei, hoje, não foi sequer aprovada em Conselho de Ministros, nem sequer submetida ao Conselho Nacional da Água. Portanto, também nessa prioridade, o Ministério do Ambiente "meteu água"!
A outra prioridade dizia respeito aos resíduos industriais perigosos, à famosa alternativa à co-incineração. A promessa do Governo era a de desenvolver o procedimento relativo à instalação dos centros. Porém, sabemos hoje que o Governo não faz a menor ideia onde esses centros vão ser instalados, nem sequer iniciou o procedimento de escolha dos locais onde esses centros poderão ser instalados no futuro.

Vozes do PS: - É um escândalo!

O Orador: - Portanto, não vamos ter alternativa, no terreno, em matéria de resíduos industriais perigosos até ao final desta legislatura - todos já o compreenderam!
Sr.ª Deputada, sobretudo queria questioná-la sobre o seguinte: é verdade que o Governo esteve dois anos para apresentar medidas adicionais ao Programa Nacional para as Alterações Climáticas, o que apresentou foi uma mão cheia de nada e quer fazer uma discussão pública sobre coisa nenhuma! Vejamos: fala de uma taxa de carbono cuja implicação sobre os combustíveis se resume a isto: "podem subir ou podem baixar"; fala de uma revisão do imposto automóvel que não sabe dizer em que vai concretizar-se e fala de um comércio de emissões sobre o qual nada acrescenta, rigorosamente nada!
Pergunto-lhe, Sr. Deputada, por que é que isto acontece e se a Sr.ª Deputada acredita em coincidências, ou se este fracasso do Governo em matéria de alterações climáticas é ou não sinal de um Ministério do Ambiente frágil, que perdeu todos os combates nos domínios das políticas sectoriais, designadamente em matéria de licenciamento industrial, em matéria de turismo (como podemos constatar com aquele procedimento "expedito" de viabilizar tudo em todo o lado), em termos da revisão do regime da REN, da RAN e da Rede Natura 2000, bem como noutros domínios que são conhecidos.
Sr.ª Deputada, tudo isto é fruto de coincidências ou, afinal de contas, temos um Ministério frágil, como nunca tivemos na política de ambiente em Portugal?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Silva Pereira, muito obrigada pelas considerações que teceu e pelas questões que colocou.
É evidente que, se todas as organizações de ambiente e todos os que seguem a política de ambiente em Portugal, no final do ano passado, puderam caracterizar a política deste Governo em matéria de ambiente como de profunda inacção e de redução total em termos das prioridades assumidas, este ano penso que a leitura não pode ser outra.
Na verdade, mais um ano passou com este Governo e, no âmbito do Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, o que verificamos em termos de políticas concretas é a não concretização do que seria fundamental quanto às prioridades assumidas por este Governo, referidas pelo Sr. Ministro, em termos de água, alterações climáticas e resíduos. Portanto, a inacção continua a caracterizar a posição deste Governo em matéria de política de ambiente e nomeadamente naquilo que diz respeito ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente.
Relativamente à questão concreta que o Sr. Deputado me colocou sobre as medidas adicionais ao Programa Nacional para as Alterações Climáticas, concordo profundamente com o que referiu.
Penso que este plano deve ser caracterizado como tendo profundas insuficiências porque, por um lado, ele faz o reconhecimento das insuficiências que em Portugal existem em termos de medidas relativas ao combate às alterações climáticas, mas, por outro lado, ele é profundamente insuficiente nas propostas em termos de políticas e de medidas internas para promover esse combate às alterações climáticas.

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Não passa de um plano de intenções sem absolutamente nada de concreto. E daqui decorre, obviamente, uma grande preocupação nesta matéria, porque estamos a chegar a 2005, data em que o comércio de emissões em princípio vai avançar, e, por um lado, o Governo português está perfeitamente desnorteado em tudo aquilo que lhe é oferecido relativamente a esta matéria e, por outro, profundamente ineficaz nas políticas e medidas internas que era fundamental tomar nomeadamente no sector da energia e dos transportes.
É por isso, Sr. Deputado, que gostaríamos que todos os grupos parlamentares fizessem força nesta Assembleia, com veemência, para que o debate que Os Verdes propuseram que se realizasse a curto prazo sobre as alterações climáticas tivesse lugar para percebermos exactamente o que é que este Governo pretende com as medidas adicionais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pela segunda vez, o Presidente da República teve de se dirigir ao País por considerar que "as instituições da República" e o "adequado funcionamento do Estado de direito" são postos em causa pela crise da justiça. E só o facto de o mais alto magistrado da Nação ter sentido a necessidade de discutir a divulgação, primeiro, de escutas telefónicas ilegais e, depois, de insultos anónimos, seria suficiente para que o silêncio deste Parlamento fosse inaceitável.
Por dever de solidariedade institucional com o Presidente contra a inadmissibilidade da calúnia, mas ainda mais pelo dever de defender a justiça como condição para a vida democrática, este Parlamento deve uma palavra ao País.
O Bloco de Esquerda reafirma, a esse propósito, a posição aqui tomada em devido tempo. Os erros processuais e a confusão instalada não devem levar à absolvição de culpados ou à condenação de inocentes. Existe um crime brutal e continuado de violação de crianças que tem de ser punido. O processo da Casa Pia deve ser julgado pelo valor das provas produzidas e esse julgamento decorre em tribunal, e só em tribunal. O respeito pela lei deve começar por todos os agentes da justiça. A comunicação social tem o dever e o direito de informar com rigor e respeito pelo bom nome das pessoas e cabe ao Procurador-Geral da República pôr a casa na ordem - e é tempo de fazê-lo!

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - Sobre o conteúdo do processo, no entanto, sobre as culpas e as inocências, nada temos a dizer nem a comentar, mas sobre os efeitos desta crise da justiça na democracia não ficaremos calados, assim como não o ficou o Presidente da República. Não podemos assistir ao desmoronamento da vida democrática com silêncio que seria cumplicidade.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - E é em nome da separação de poderes que lembramos que é o Parlamento quem tem a autoridade legislativa para determinar o presente e o futuro da justiça.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - A democracia não pode, pois, aceitar que qualquer processo que seja se transforme numa festa canibal em que todos são suspeitos para que ninguém seja culpado.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

O Orador: - E não pode aceitar que a justiça seja descredibilizada pela inconsequência, muito menos perante crimes de imensa gravidade que terão mobilizado meios poderosos, protecções e favorecimentos.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - Sabemos que o processo da Casa Pia irá entrar agora numa fase crítica. Exige-se por isso a maior serenidade já que todos os dias haverá novos casos de contra-informação e de intoxicação lamacenta. Mas não temos qualquer dúvida, aliás, de que uma parte da comunicação social - salvo digníssimas e notáveis excepções que honram o jornalismo português - continuará mergulhada na vertigem

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do populismo mediático em que a insinuação é a notícia e a manipulação é um facto.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - Ao longo dos próximos meses a confusão e a guerrilha mediática vão aumentar e não é seguro que a sentença final tranquilize os defensores de uma justiça exigente e ponderada.
A distância em relação a estes desenvolvimentos não deve por isso ser confundida com demissão. Ao Parlamento, aos parlamentares, cabe a defesa das condições essenciais da vida democrática, e é por isso que o Bloco de Esquerda deixa aqui um desafio à maioria: em 2004, e não mais tarde do que em 2004, deve esta Assembleia encaminhar medidas refundadoras do sistema da justiça portuguesa.
A reforma da justiça é uma das grandes tarefas inconcluídas da democracia do pós-25 de Abril, visto que, tendo a justiça mudado tanto, muito mais ainda tem de se desenvolver para que haja justiça igual para todos e não subordinada ao privilégio da riqueza, célere e não subordinada ao poder da interferência, garantística dos direitos fundamentais e não subordinada ao poder do arbítrio.
Há, portanto, que mudar, a partir da experiência concreta do actual quadro legal, em particular no Código Penal e no Código do Processo Penal. E há não só que mudar nas escutas, na prisão preventiva, no segredo de justiça, mas também na definição de prazos, de regras, de responsabilidades e de processos. Para isso, Sr.as e Srs. Deputados, é precisa uma grande maioria para uma reforma. Mas é tempo de começá-la, como nos apela o Congresso da Justiça.
Irresponsável seria recusar essa prioridade política e social - 2004, aliás, só será um ano de viragem para a esperança e para a confiança se se realizarem duas condições: se for imposta uma nova política económica para o crescimento e para o emprego e se os portugueses puderem acreditar na reforma da justiça.
O País continuará fraco e descrente se a justiça falhar, se a confusão e o barulho se continuarem a instalar, se o desemprego crescer, se o poder absoluto continuar indiferente às dificuldades, ao sofrimento, ao esforço e às soluções.
Perante isto, não podemos deixar de condenar energicamente a estratégia da maioria que elege como tema central para o ano de 2004 uma revisão constitucional que procura alibis para o seu próprio vazio.
Ao apontar a Constituição como a nova força de bloqueio, a maioria nada de novo inventa, mas procura reinventar-se a si própria no extremismo de uma reconstrução ideológica, que, sob a tutela profética de Paulo Portas e Santana Lopes, quer ajustar contas com o passado e afirmar o "salve-se quem puder" liberal como a doutrina do Estado.
É certo que esta revisão tem esse passado - todas as derrotas da direita -, mas não tem presente e não tem futuro, porque, ao procurar abrir as portas a uma revisão constitucional que possa permitir a restauração da monarquia, destino apaixonante dos nostálgicos da Casa de Bragança, ou ao impor o primado da Constituição europeia na Constituição Portuguesa antes mesmo de aquela estar escrita, a direita mostra que vale como capela mortuária de ideologias tristes e desistentes, usadas agora para entreter o País à falta de se saber governar.
Não! As dificuldades não se podem solucionar com a irrelevância política! À tragédia não se pode responder com a comédia! Depois de dois anos de degradação da vida política e da economia portuguesa, é tempo de parar este delírio em que se tem vivido, de abandonar o "voyeurismo" colectivo sobre a Casa Pia, de não perder tempo com irrelevâncias como as formas da revisão constitucional.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Vou já concluir, Sr. Presidente.
É tempo de voltar ao que é importante e de impedir que as formas mais rasteiras do combate político obscureçam o que é fundamental: a construção de uma alternativa. Porque com a sua escolha da revisão constitucional como prioridade, a direita exibe as danças nupciais que bem podia fazer em recato. E é, portanto, à esquerda, só à esquerda e agora à esquerda que compete a responsabilidade da alternativa.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Deputado Francisco Louçã, vou começar por retirar da sua intervenção as apreciações finais, que, obviamente, não nos levam a lado algum, porque o senhor compreenderá que quem escolhe a agenda do CDS-PP e do PSD é a maioria, não são os senhores, que, por muito arrogantes que sejam, não têm o direito de escolher os nossos temas e a nossa agenda.

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O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Em matéria de revisão constitucional não percebeu uma coisa fundamental: é que o que está em causa não é o primado de qualquer ideologia mas, pelo contrário, o primado da democracia, que é o que queremos!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Queremos uma Constituição sobre a qual os portugueses se possam pronunciar e os senhores querem uma Constituição estática, parada no tempo e, no seu caso pessoal, de preferência, parada a meio do "período revolucionário em curso" (PREC).

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Para além disso, o senhor fala de justiça, mas como essa não é uma questão ideológica, Sr. Deputado Francisco Louçã, não vamos ter uma divisão ideológica quanto a esta questão sobre a qual lhe quero dizer algumas coisas.
Em primeiro lugar, gostaria de dizer-lhe que não é uma questão ideológica e penso que o senhor se indigna como todos nos indignámos - aliás, creio que todos os partidos reagiram de imediato às declarações do Sr. Presidente da República, pelo que a indignação é comum. Diria mesmo mais: a indignação começa com a utilização, com objectivos políticos, de instrumentos que não são aceitáveis em tipo algum de regime, mas que, obviamente, o são muito menos em democracia, que são os instrumentos anónimos para fazer calúnias e para denegrir pessoas. Neste caso, estamos de acordo com esta indignação.
No entanto, Sr. Deputado Francisco Louçã, a questão é a de que estamos perante um processo em concreto, no qual o Bloco de Esquerda parece querer discutir na Assembleia, designadamente em relação a esta questão, matéria que tem a ver com a existência ou não de erros do processo. E, portanto, o Bloco de Esquerda ao ter proposto (e pergunto-lhe se assim é) a discussão de matéria relativa a essa situação e à forma como o processo foi tratado entra em contradição com o Presidente da República, que nos pede que se respeite o processo, que se deixe a justiça funcionar e, sobretudo, que haja contenção nesta matéria.
É evidente que a contenção é o mais difícil e considero lamentável que o Presidente da República tenha tido de falar duas vezes sobre a mesma matéria ao fazer dois pedidos de contenção.
A mim indigna-me inclusivamente que haja pessoas que não são arguidos no processo (aliás, isso sempre nos indignou) e que vêem o seu nome manchado na praça pública! Isto não é aceitável de forma alguma em relação a ninguém.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Telmo Correia, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
No entanto, Sr. Deputado Francisco Louçã, temos de reconhecer que a justiça deve funcionar. V. Ex.ª quer discutir a justiça este ano e pergunto-lhe só, para terminar, se não se apercebeu de que o repto que acabou de lançar à maioria foi respondido pelo Sr. Primeiro-Ministro e pela Sr.ª Ministra da Justiça que, no encerramento dos trabalhos do Congresso da Justiça, anunciaram que este ano, uma das nossas prioridades, como a Constituição e como a reforma da Administração Pública, é precisamente discutir e melhorar a questão da justiça, sem o fazer em relação a processos concretos, onde queremos que seja essencialmente feita justiça, como os portugueses querem.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Francisco Louçã, V. Ex.ª ecoou neste Plenário os apelos e as advertências do Sr. Presidente da República, os quais julgamos que são absolutamente cruciais como facto de estabilidade e de funcionamento regular das instituições em Portugal.

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Serenidade e contenção são as únicas armas contra a intoxicação lamacenta, tal como sublinhou - e bem! Temos também essa posição. Mas isto não significa inércia em relação ao exercício das competências de cada órgão de soberania e de cada entidade responsável, e é essa a postura que nos leva a considerar que a Assembleia da República deve exercer eficazmente as suas competências como factor de estabilidade e não de paralisação institucional face a um quadro difícil. E isto torna a questão da agenda para 2004 uma questão essencial.
Estamos de acordo em que não vale a pena transformar a revisão constitucional num factor de querela político-ideológica como se estivéssemos em 1975, ou em 1976, ou mesmo nos anos 80. Não é assim! Portugal não tem necessidade de qualquer inversão de sinal constitucional, nada na Constituição impede a acção governativa. Há alterações concretas a fazer e o PS disponibilizou-se a fazer essas, e só essas, alterações, designadamente as que revigoram a autonomia regional, numa altura em que se comemorará o trigésimo aniversário da implementação das autonomias. Só isso acontecerá. Pela nossa parte, em mais nada colaboraremos.
A eficácia é necessária também em relação à reforma da justiça, sem dúvida absolutamente alguma! E aí o teste, Srs. Deputados, não são as palavras; o teste é…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - É o compromisso!

O Orador: - … fazer!
Pela nossa parte, há um ano apresentámos uma resolução que, atempada e serenamente, propôs uma reavaliação do funcionamento das instituições de processo penal, a qual foi aprovada, aliás, por unanimidade.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Nós temos projectos!

O Orador: - E, na sequência dessa iniciativa, a 1.ª Comissão conduziu um conjunto de audições que permitiram um consenso crítico em relação a vícios manifestos do sistema, que estão documentadíssimos, sendo impressionantes. Sobre cada um deles foram prestados depoimentos verdadeiramente impressionantes que têm de ser tidos em consideração pelo Parlamento, pela maioria, por todos nós. É esta nossa posição.
Simultaneamente, Srs. Deputados, acompanhámos, participámos, aliás, no Congresso da Justiça, que, na sua parte final - sublinhe-se -, colocou ênfase na importância das alterações em matéria de justiça processual penal. Para isso, o PS também está preparado.
Vimos desenvolvendo desde há meses um esforço, traduzido, aliás, num anteprojecto da autoria do Sr. Deputado Jorge Lacão, que nos permitirá dar uma contribuição fundamentada, cientificamente ponderada para o debate concreto virado não para a querela político-ideológica, ou para a "lama", mas concretamente para a reforma processual penal eficaz, capaz de dar à justiça penal um rosto que todos os portugueses possam respeitar e que inspire confiança.
É esta, portanto, Sr. Deputado, a nossa postura, e respondemos com um "sim" à questão essencial que coloca de centrar a agenda no que é verdadeiramente essencial, e apenas nisso.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã, dispondo do tempo máximo de 5 minutos.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, estou de acordo com as suas considerações e com os seus comentários e conclusões, e por isso responderei contraditoriamente ao que disse o Deputado Telmo Correia.
O Sr. Deputado Telmo Correia refere-se (tem-no feito várias vezes) à "arrogância" por parte do Bloco de Esquerda. Devo dizer-lhe sobre isto, agora e por uma única e última vez, Sr. Deputado,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Ora aí está a arrogância!…

O Orador: - … que os portugueses olharão para a minha cara e para a sua, e então decidirão quem é que é arrogante. E assim saberão!

Aplausos de alguns Deputados do PSD e do CDS-PP.

Ora, é em nome do primado da democracia que estamos a discutir as consequências que a crise da justiça tem sobre a vida democrática!!

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O Sr. Deputado, que me ouviu, percebeu que não comentei nem comentarei aspecto processual algum da Casa Pia, porque isso tem de ser dirimido no local próprio. Mas sublinho - porque não fazemos qualquer jogo de hipocrisia - que o processo da Casa Pia domina a agenda política portuguesa, domina a crise da justiça em Portugal, e nós temos a responsabilidade (a que não fugimos) de responder no debate político sobre a solução para a crise da justiça, introduzindo reformas e respostas.
Desgraçado será o Parlamento se não tem a capacidade para corrigir os erros que a prática judiciária tem sublinhado, se não consegue responder ao que muda no mundo da criminalidade e se não consegue modernizar-se do ponto de vista da relação difícil que há entre o recato da justiça e a publicidade da comunicação social. Porque todos bem sabemos que nos próximos meses continuará, a níveis ainda desconhecidos, a tendência tablóide de uma parte não insignificante da comunicação social, continuará a guerra de intoxicação e contra-intoxicação de todas as fontes, com abuso do segredo de justiça, e estaremos mais longe - porque mais confusos - do esclarecimento, em sede própria, de um crime horrível que sabemos que foi cometido em Portugal. E se nunca houver a dúvida de que foi cometido o crime mas houver todas as dúvidas sobre a solução do crime, a justiça estará mais fraca. E uma justiça mais fraca é uma democracia mais pobre. Foi sobre isto que o Bloco de Esquerda colocou aqui o problema, porque não suportaríamos o silêncio.
Bem sei que todos os partidos falaram em solidariedade com o Sr. Presidente da República (e o Sr. Presidente da Assembleia da República começou por fazê-lo no início desta sessão). Mas sendo este um aspecto tão dominante da política nacional, que exige ao Presidente da República falar duas vezes, de olhos nos olhos, ao País, compete ao Parlamento um dever institucional, um dever de solidariedade, e, muito mais do que isso, um dever político de debate em profundidade.
Por isso, no dia em que nomes como o de Mário Soares, do Cardeal Patriarca, do Dr. Mota Amaral e outros vão aparecendo na imprensa, é preciso reafirmar determinadamente que não se pode suportar esta via degradante do debate e da actualidade nacional como tem vindo a ocorrer.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

Protestos do Deputado do PSD Fernando Pedro Moutinho.

O Orador: - A resposta tem de ser o esclarecimento no debate político das posições de cada um, certamente!, mas essencialmente a intervenção na correcção da crise da justiça, que ao Parlamento compete.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Essa é outra discussão!

O Orador: - E aí, Sr. Deputado Telmo Correia, devo dizer-lhe, com muita frontalidade, que não tenho a confiança que o Sr. Deputado tem no Governo.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Isso é normal!

O Orador: - E a desconfiança não é só do Bloco de Esquerda. Ouvi o Bastonário da Ordem dos Advogados dizer na antena de uma das rádios de referência, no primeiro dia do Congresso da Justiça, que o pior que tinha acontecido nesse Congresso tinha sido a intervenção da Ministra da Justiça.
Dir-me-á que é uma opinião.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - É isso mesmo!

O Orador: - É certo que é uma opinião, mas é uma opinião considerável! Porque o Governo, a respeito da justiça, tem tido aquela posição de Pilatos que é a de fugir da solução dos problemas, de apresentar inventários administrativos, de leis, decretos e portarias somados a algumas piedosas intenções. Ora, aquilo que o País precisa de perceber é que a vida democrática está hoje enfraquecida no seu cerne, sem justiça credível, confiável, célere, igualitária, garantística. Sem o predomínio de uma lei igual para todos, não há vida democrática.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha terminou. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Esse é o esforço que temos de fazer ao longo deste tempo, olhando para bons códigos (como os que temos tido) à luz da prática que os tem recebido e fazendo todas as correcções que permitam reforçar a

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credibilidade da justiça, que é certamente um dos pilares mais essenciais da vida democrática e da crise democrática em Portugal.

Aplausos do BE.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Peço a palavra para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Francisco Louçã acabou de exprimir a sua indignação pela forma como se pretendeu pôr em causa o Sr. Presidente da República. Tenho aqui, à minha frente, uma revista onde se põe em causa a figura do Sr. Presidente da Assembleia da República, a figura de um ex-Presidente da República e a do próprio Cardeal Patriarca. Ou seja, estão a pôr-se em causa as principais figuras do Estado e as principais figuras da vida portuguesa.
Para além da dignidade das pessoas, que importa salvaguardar, penso que chegou a hora, também, de salvaguardar as instituições democráticas e a dignidade do Estado democrático.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Estado democrático tem não só o direito como o dever de se defender. Nesse sentido, quero exprimir a minha indignação e a minha solidariedade com V. Ex.ª, mas quero também interpelá-lo no sentido de saber que iniciativas pensará V. Ex.ª tomar para que se cumpra a obrigação deste órgão de soberania de contribuir para a defesa do Estado democrático.
Uma vez que já estão postos em causa quatro ou cinco Conselheiros de Estado, atrever-me-ia a sugerir que V. Ex.ª se encontrasse com o Sr. Presidente da República e propusesse a convocação do Conselho de Estado, com vista a pôr termo, de uma vez por todas, a esta tentativa de transformar um processo cuja independência deve ser respeitada num processo contra a República e contra a democracia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Alegre, registo as suas palavras de solidariedade e o apoio que recebo da Câmara, que, no que me toca, me sensibiliza.
Quanto à sugestão que apresenta, vou reflectir sobre ela. Não há dúvida de que estamos perante uma situação de extrema gravidade. Aliás, ainda hoje o Sr. Presidente da República, em conversa com os membros da Mesa, a ela se referiu com abundância.
As iniciativas do Parlamento situam-se no âmbito da sua capacidade legislativa, sendo que todo o sistema comunicacional e judiciário passa por leis estipuladas pela Assembleia da República. Se verificamos que as leis existentes são insuficientes, manifestamente, teremos de as alterar. É esta a nossa responsabilidade perante a democracia, perante o Estado democrático e perante os nossos concidadãos, que, chocados e indignados, assistem a este espectáculo tristíssimo.

O Sr. António Costa (PS): - Peço a palavra para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, gostaria de dar-lhe uma justificação, já que nem eu nem os membros da primeira fila da bancada do PS tínhamos conhecimento da publicação da revista que acaba de ser citada e que contém uma referência ao Sr. Presidente da Assembleia. Foi apenas por esta razão que não tomámos logo a iniciativa que, desde já, agradeço ao Sr. Deputado Manuel Alegre ter tomado.
Considero que as palavras de solidariedade pessoal, política e cívica do Sr. Deputado Manuel Alegre para com V. Ex.ª foram prestadas em nome de todo o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, porque é esse o nosso dever cívico para com V. Ex.ª.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Peço a palavra também para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

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1997 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PS): - Sr. Presidente, naturalmente que já percebemos todos que há uma campanha orquestrada de intoxicação da opinião pública para pôr em causa a credibilidade das instituições, designadamente das instituições judiciais e judiciárias, a propósito de um processo que se pretende descredibilizar.
Temos, pois, de manter a maior serenidade, para que não sejamos nós, responsáveis políticos e as instituições da República, a dar mais eco a essa situação e a esse propósito.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É importante que a justiça funcione. Há vítimas que têm de ver reparada, através da justiça, a ofensa que durante anos e anos se prolongou. Temos, portanto, que deixar que as instituições judiciárias funcionem, com vista a condenar os culpados e a absolver aqueles que venham a ser inocentados.
Mas, com todo o respeito, não me parece que o Conselho de Estado possa, a este propósito, ter outras soluções para além da indignação que todos aqui sentimos e da solidariedade que temos de manifestar ao Sr. Presidente da República pela forma absolutamente canhestra e inaceitável com que foi envolvido neste processo. Porque a notícia publicada hoje nesta revista vai pelo mesmo caminho sujo e indigno, e é tão canhestra que não merece a menor atenção ou credibilidade.
Toda esta situação leva-me a expressar a total solidariedade do Grupo Parlamentar do PSD para com o Sr. Presidente e para com as personalidades visadas de forma tão baixa nessas publicações, mas também a fazer o apelo à serenidade, para que não sejamos "câmara de ressonância" e eco desta linha, que está traçada, que tende a descredibilizar a justiça.
Repito: temos de deixar a nossa justiça funcionar, temos de respeitar o princípio da separação dos poderes. Não podemos embarcar nesta confusão que querem fazer de modo a que as instituições percam a serenidade e entrem em interferências que não nos compete ter.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Temos de demonstrar uma solidariedade total para com as figuras que estão a ser enxovalhadas e que merecem a nossa total consideração e respeito.
É isto que quero aqui deixar claro: que deixemos funcionar a justiça, não permitindo que esta tentativa de descredibilização prossiga.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Peço a palavra para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, fomos também alertados para esta questão pela intervenção do Sr. Deputado Manuel Alegre e não queríamos deixar de manifestar a nossa solidariedade para com o Sr. Presidente nesta matéria e dizer, como já foi dito, que estão aqui em causa valores que têm a ver não só individualmente com o Sr. Presidente da Assembleia e com os outros visados neste tipo de notícias mas com as instituições democráticas, como a Assembleia da República cada um dos seus Deputados e cada um dos seus grupos parlamentares. É desse ponto de vista, também, que temos de nos preocupar com esta questão.
Pela nossa parte, continuaremos a usar, nas palavras e nos actos, da contenção, que, aliás, tem sido sugerida pelo Sr. Presidente da República e que tem pautado a nossa intervenção. Não seremos a "câmara de ressonância" da agenda mediática que a todo o momento "atira" notícias sobre este processo e esta questão. Continuaremos a defender que este processo necessita de um rápido e eficaz apuramento da verdade e a punição pelos crimes que foram praticados durante todos estes anos.
Ao mesmo tempo é preciso dizer que é inaceitável que haja derivas que ponham em causa o bom nome de diversas instituições e de pessoas, e que se acumulem erros que levem a resultados como os que temos visto nos últimos dias, que não abonam a favor da justiça nem do prosseguimento dos seus objectivos de apuramento da verdade.

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1998 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Peço a palavra para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria de sublinhar, como já o tinha feito anteriormente em pergunta colocada ao Sr. Deputado Francisco Louçã, que sobre esta matéria dizemos sempre uma única e mesma coisa (que já tinha referido, ainda que não de forma tão explícita como nalgumas das intervenções que agora ouvimos), isto é: que nos indigna profundamente não só a utilização de instrumentos que são cobardes, vergonhosos e anónimos, como as referências feitas a pessoas, e nessas se incluem, obviamente, V. Ex.ª, o ex-Presidente da República Mário Soares, S. E. o Cardeal Patriarca e outras pessoas que também têm vindo a ser referidas, que não são arguidos no processo e cujo nome é atingido por esta voragem e por este espectáculo mediático.
Isso indigna-nos, é, do nosso ponto de vista, inaceitável e deve ser firmemente denunciado. Deve, no entanto, ser denunciado com a consciência de que estamos efectivamente, como tem sido dito várias vezes, a assistir, com toda a probabilidade, a manobras de intoxicação da opinião pública, e isso justifica, em larguíssima medida, a nossa contenção e a nossa responsabilidade.
Exige a nossa contenção basicamente por duas razões:
Primeiro, porque temos de ter a contenção suficiente para não querermos nós ter interferência directa num processo que, como disse - e bem! - o Sr. Presidente da República, deve seguir o seu curso, e o lugar da justiça é nos tribunais e não aqui, no Plenário da Assembleia da República. A realização da justiça deve ser feita nos tribunais. São os tribunais que devem absolver quem não tenha culpas e condenar aqueles que sejam culpados. Temos de ter essa contenção.
Segundo, e como aqui foi dito também por outros líderes parlamentares, devemos ter contenção para não sermos nós agora a ser o eco e a amplificação destes instrumentos, que são inaceitáveis. A calúnia e o boato vivem sempre da amplificação, da reprodução e da dimensão que atingem. Portanto, temos de ter nós também esse cuidado.
Há uma certeza, porém, Sr. Presidente: a nossa responsabilidade como políticos é a de procurar elevar a discussão e dizer ao País que há um processo que é grave e que é importante, mas, como disse o Primeiro-Ministro de Portugal - e bem! -, há muito País para além deste processo e nós temos a obrigação de elevar o nível do debate e de nos mantermos, obviamente e sempre, serenos e solidários com quem é atingido!!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, na intervenção inicial referi-me às calúnias lançadas sobre o Presidente da República e também sobre o Presidente da Assembleia da República, sobre o Sr. Cardeal Patriarca e sobre o ex-Presidente Mário Soares. E creio que, do ponto de vista da Assembleia da República, o debate que aqui tivemos foi não só um debate ponderado como também, e sobretudo, um debate necessário.
A Assembleia da República, quando todos os telejornais abrem com a calúnia, não finge que esse problema não é discutido no País,…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - … discute-o da forma que merece, ou seja, separando a calúnia do respeito pela justiça, valorizando a justiça como um pilar da democracia e contribuindo da melhor forma, agora e no futuro, para o reforço da vida democrática, que é a única prevenção que temos contra derivas populistas, como as que surgem nas campanhas de intoxicação, que temos vivido com tanta intensidade e com tanto dramatismo ao longo do ano passado.
Desse ponto de vista o Presidente da República teve uma atitude exemplar: agiu quando entendeu necessário, não em defesa de si próprio mas em defesa de um princípio essencial da vida constitucional portuguesa, que compete também à Assembleia da República, como fórum de debate político, como órgão de soberania e como um conjunto de responsáveis eleitos pelo povo português, acautelar, defender e desenvolver.
A este respeito quero ainda acrescentar que há caminhos que têm de ser seguidos e caminhos que não podem ser tentados. A agenda da reforma da justiça é indispensável. O povo português, porventura, não perdoaria que a Assembleia da República fingisse ou ignorasse a importância deste tema, mas o Bloco de

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Esquerda, certamente, não acompanhará em caso algum - e esperamos que ninguém o faça - qualquer forma de resposta ao populismo mediático que passe pela tentação censória ou pela tentação da redução da liberdade de imprensa. Quando o abuso de alguma comunicação social é tão intenso, é quando o valor da democracia mais firmemente tem de ser levantado,…

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - … e por isso tem de ser valorizado que só a responsabilidade, a capacidade de discernimento e a deontologia, escolha dos próprios profissionais da comunicação social e da opinião pública com que contactam, podem e devem assegurar a protecção contra o abuso.
Por isso mesmo, porque esse caminho censório não existe, é a valorização do debate democrático e, portanto, é também a valorização deste Parlamento que devem ser ressaltadas.
Era isto que eu também queria deixar aqui, com estas palavras de solidariedade e de protesto contra todas as formas de calúnia, nomeadamente aquelas que atingiram o Sr. Presidente.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, gostaria de me pronunciar sobre a questão que foi suscitada pelo Sr. Deputado Manuel Alegre.
Penso que todos temos consciência da gravidade do que está a acontecer e daquilo que, de algum modo, como deriva da justiça, está a procurar ser colocado na praça pública, por isso gostaria de, em nome de Os Verdes, manifestar a minha total solidariedade em relação ao Sr. Presidente da República, mas também em relação a todas as pessoas que têm visto o seu nome "enlameado" diariamente.
Penso que há um problema grave que exige que a justiça funcione naturalmente, que exige, porventura, bem mais do que mudança de leis e que exige uma cultura democrática na sua aplicação e competência técnica. É essa ausência que eu julgo que é inquietante e penso que esse tem de ser o apelo e o poder fiscalizador da Assembleia da República, de que, particularmente neste momento, não se pode demitir.

O Sr. Presidente: - Já todos os grupos parlamentares, através dos seus líderes, puderam pronunciar-se sobre esta matéria, no entanto a Mesa regista mais um pedido de palavra da Sr.ª Deputada Assunção Esteves.
Sr.ª Deputada, qual é a matéria sobre a qual se pretende pronunciar?

A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Sr. Presidente, pretendo interpelar a Mesa nos mesmos termos em que o fez o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Presidente: - Então, tenho de dar-lhe a palavra.

A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para, num minuto, convidar o Parlamento a dar os nomes às coisas, no sentido de que o problema que aqui debatemos, sendo grave, sendo um problema da República e sendo um problema de dignidade institucional e, neste caso, também de direitos fundamentais, não se situará verdadeiramente no plano do funcionamento da justiça nem no plano das funções do Conselho de Estado. É um problema que tem a ver com a liberdade de comunicação em relação com os direitos fundamentais e que aponta directamente para uma incumbência do Parlamento de reflectir sobre ele.
Nesse sentido, eu diria que, provavelmente, o Parlamento terá de tomar a responsabilidade, no âmbito constitucional ou no âmbito legislativo, de ponderar os limites da liberdade de comunicação em relação com os processos judiciais. Não se trata da afirmação de um princípio censório. Trata-se de um problema concreto, situado, em que há limites constitucionais à liberdade de comunicação, limites que têm de ser assumidos em nome da Constituição e dos direitos fundamentais. Não é um problema de censura, é um problema de restrição constitucionalmente justificada da comunicação, quando se trata de processos judiciais em curso.
Penso que o Parlamento é o lugar da solução deste problema.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, eu não queria que a questão se alastrasse. É evidente que toda a

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gente deseja, com certeza, dar as suas opiniões, mas, como todos os grupos parlamentares já intervieram e houve outras intervenções, proponho que retomemos o decurso dos nossos trabalhos de hoje.
Estou, certamente, comovido com as palavras de solidariedade que me foram dirigidas, no entanto devo dizer que não me sinto minimamente afectado pela atitude irresponsável…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… de alguns jornais ou de algumas revistas - aliás, veio em todos os jornais que nem sequer tinha ligação em concreto.
Indigna-me, isso sim, que a mistura sistemática de cada vez mais nomes no processo genericamente chamado da Casa Pia esteja a ser utilizada irresponsavelmente por pessoas que deviam medir a sua responsabilidade - e todos os agentes da comunicação têm uma altíssima responsabilidade social - como uma maneira que objectivamente está contribuindo para aviltar as instituições da República e para fazer decair mais ainda a nossa autoconsideração. Julgo que há aqui necessidade de modificações.
Sobre a referência que a Sr.ª Deputada Assunção Esteves fez, agora que está aberto o processo de revisão constitucional, gostava de lembrar aos Srs. Deputados constituintes que se há, realmente, três ou quatro artigos fundamentais sobre a liberdade de imprensa, que, do ponto de vista histórico, afirmam na Constituição do 25 de Abril a rejeição da censura, a rejeição do Estado censório e a rejeição dos controlos estabelecidos pela ditadura, há apenas uma vaga referência nos vários números desses artigos à garantia do bom nome e da reputação dos cidadãos, os quais temos visto, nos últimos tempos, serem sistematicamente destroçados num ambiente da maior irresponsabilidade. Esta matéria merece, certamente, consideração legal e constitucional.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, vamos retomar os nossos trabalhos.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, pese, embora, este momento difícil e penoso que atravessamos, permita-me que, sendo esta a primeira reunião do Plenário no ano de 2004, lhe deseje e a todas as Sr.as e Srs. Deputados um bom ano de 2004.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito se tem dito e escrito sobre a actual situação económica portuguesa e a sua evolução expectável. Do lado da oposição têm sido sistemáticos os pronunciamentos cáusticos, eivados de um pessimismo militante, em que se responsabiliza o Governo por todos os males da situação.
Da propalada obsessão do défice à invocação de uma suposta visão contabilista das finanças públicas, passando pela atribuição da autoria da recessão ao Governo, não têm faltado argumentos, por mais tíbios e desconchavados que sejam, com que a oposição vai alimentando o combate político.
Importa, porém, relembrar que o Governo sempre disse que a política económica de rigor e disciplina orçamental era para ser mantida e não iria sofrer qualquer tipo de derivas. Mais disse o Governo: que esta política económica implicava, naturalmente, medidas difíceis e impopulares, mas que elas eram absolutamente essenciais para preparar o futuro com honestidade, coragem e perseverança, porque esse era o único caminho para aproveitar a recuperação da economia mundial e europeia e a única via para Portugal voltar a crescer, para que Portugal viesse a ser um país moderno e desenvolvido.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na espuma do debate político, não raras vezes arredio da discussão da substância das coisas, convenhamos que nem sempre é fácil aos portugueses discernir de que lado está a razão, se do lado da oposição, se do lado do Governo. A primeira porque, tendencialmente, é propensa à crítica destrutiva e negativista; o segundo porque, naturalmente, procura defender a bondade e o acerto das sua políticas.
Por tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o recente Boletim Económico do Banco de Portugal, com as projecções para a economia portuguesa para os próximos dois anos, não podia vir em melhor altura para dissipar dúvidas, clarificar situações e perscrutar os caminhos do futuro.
Em termos gerais, dir-se-á que o que avulta, em primeiro lugar, deste documento do Banco de Portugal é o anúncio da retoma, embora moderada, num sinal claro de que se iniciou uma inversão do ciclo económico - esta é uma expressão da lavra do Banco de Portugal -, como há dias, aliás, sublinhou o Primeiro-Ministro na sua mensagem de Ano Novo ao proclamar que "o pior já passou".

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Oh, oh…!!

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Risos do PCP.

O Orador: - Pese embora Portugal vá crescer menos do que a média europeia de 2002 a 2005, é necessário compreender que tal decorre de uma situação meramente conjuntural. Após um período de excesso de aumento de despesa, era inevitável um ajustamento que produzisse uma desaceleração da economia. Mas, sejamos claros, directos e frontais: a economia conserva o seu potencial de crescimento para prosseguir com sucesso a convergência com os demais parceiros europeus, e é isto o que releva, o resto são minudências espúrias.
Outrossim e ao arrepio daqueles que antecipam, em tom premonitório e atrabiliário, o fim do Pacto de Estabilidade e Crescimento, o Banco de Portugal, também ele, vem reafirmar que a disciplina orçamental continua a ter razão de ser, e, nesse sentido, o Pacto para Portugal não é letra morta.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Na esteira do que tem vindo a sustentar a Sr.ª Ministra das Finanças, independentemente das vicissitudes actuais e vindouras do Pacto de Estabilidade e Crescimento, o facto é que Portugal tem de continuar a respeitar as suas regras.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Di-lo a Sr.ª Ministra das Finanças, di-lo o Banco de Portugal.
É que Portugal é um pequeno país, vulnerável e com uma situação orçamental muito desequilibrada, a que acresce a necessidade de recuperação a prazo do seu papel anticíclico, para lá, naturalmente, da imperiosidade de uma solidez da situação orçamental como garante do sistema de segurança social.
Curiosa e pedagógica, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é ainda a observação feita neste relatório do Banco de Portugal sobre as receitas extraordinárias, tantas vezes diabolizadas com imputações luciferinas pela oposição, onde se diz que elas são aceites pelo Eurostat para reporte de défices excessivos e são até vantajosas, uma vez que podem ser usadas para substituir parte das receitas reduzidas temporariamente em virtude da recessão.
Sempre sem desdouro da prossecução da consolidação orçamental, para a qual será desejável um consenso alargado, como bem acentua o relatório do Banco de Portugal, são fundamenta a contenção efectiva da despesa corrente e também medidas do lado da receita, mormente por via de melhores resultados no combate à evasão fiscal. Como, aliás, também o Sr. Primeiro-Ministro na mensagem de Ano Novo enunciou, essa é uma prioridades das políticas públicas do Governo para 2004, é um combate efectivo, eficaz e com sucesso à fraude e à evasão fiscais.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por último, o Banco de Portugal - e bem! - enfatiza que o grande problema com que Portugal se debate é o aumento da taxa de crescimento potencial da nossa economia, sobretudo num contexto de crescente concorrência, por força da globalização e do alargamento da União Europeia já em Maio deste ano. Impõe-se, pois, um acréscimo da competitividade das nossas empresas, com reforço da inovação e sem esquecer a moderação salarial. Só através de um maior aumento de produtividade será possível ter taxas de crescimento que alcandorem o País à desejável convergência com os níveis de vida dos países mais desenvolvidos.
É esse o desafio exigente deste novo modelo económico assente no investimento e nas exportações e não na procura interna e no consumo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em consonância com as políticas públicas que o Governo tem defendido, o Banco de Portugal sublinha que "temos que trabalhar mais, reformar mais, inovar mais". Regozijamo-nos com esta sintonia de pontos de vista e com esta mensagem de esperança e de confiança.
O que os portugueses querem é, efectivamente, melhores níveis de vida e estabilidade em relação ao futuro, e isso reclama aumentar o nosso potencial de crescimento, que depende de todos, depende de nós, depende da nossa capacidade colectiva.
Os tempos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, são exigentes, mas são estimulantes. Estamos a vencer as dificuldades, estamos no bom caminho e estamos a construir uma nova era de progresso, de desenvolvimento e de modernidade para Portugal e para os portugueses. Di-lo o Banco de Portugal, di-lo o Governo

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e di-lo a maioria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quem ouviu o Primeiro-Ministro nas suas mensagens de Natal e Ano Novo reparou certamente no tom compungido com que reconheceu as dificuldades que o País e a maioria dos portugueses atravessam e no ardor com que procurou convencer-nos de que em 2004 está garantida uma melhoria da grave situação que hoje vivemos.
Os de melhor memória lembrar-se-ão de que já no final de 2002 o discurso tinha sido semelhante, prometendo para 2003 o que agora nos anuncia como certo para 2004. Só que 2003 foi o que se viu.
A anunciada preocupação com as dificuldades dos portugueses e a fingida certeza na melhoria da situação do País não resistem a um pequeno, a um pequeníssimo, pormenor: é que a responsabilidade pelo momento grave que o País atravessa é em primeiro lugar do Governo e da sua política.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E já ninguém acredita no discurso da inevitabilidade das medidas, nem na hipocrisia de que nenhum governo gosta - e este também não - de não aumentar os salários ou de diminuir o investimento público. Estas opções nem são inevitáveis nem inconscientes. São deliberadas.
A política do Governo compromete o desenvolvimento do País, prolonga a nossa divergência em relação ao crescimento médio na União Europeia e degrada a vida dos portugueses,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … ao mesmo tempo que continua a concentrar a riqueza e a favorecer os interesses dos grandes grupos económicos.
Certamente algum dia existirá, apesar do Governo, uma retoma da economia. Mas Durão Barroso e o seu Executivo não podem deixar de ser responsabilizados por uma política que condiciona e atrasa esta retoma e o seu vigor e que aprofunda a crise e as dificuldades dos portugueses.
Infelizmente, a esperança numa vida melhor em 2004, anunciada pelo Primeiro-Ministro, cai por terra quando confrontada com a realidade concreta que os portugueses enfrentam no seu dia-a-dia.
Milhares de portugueses vão ser atingidos com o continuado aumento do desemprego, aliás, previsto pelo próprio Governo, em resultado de uma política de fragilização do aparelho produtivo nacional, mas também da impunidade de que continuam a beneficiar gestões ruinosas ou fraudulentas em que os trabalhadores são sistematicamente os principais lesados.
Em 2004, a maioria dos portugueses vai enfrentar uma nova quebra do seu poder de compra e a consequente degradação das suas condições de vida e subsistência. E o Governo é responsável, directa ou indirectamente, pelos factores que conduzem a esta degradação.
Aí está a previsão de um aumento dos salários reais abaixo da inflação, à semelhança do que já aconteceu em 2003, apoiada na política salarial restritiva para a Administração Pública, a que o Governo resolveu acrescentar um aumento nominal do salário mínimo nacional inferior à inflação prevista, prolongando em 2004 a diminuição real do seu valor que já vem de 2003.
O Governo opta assim, mais uma vez, por penalizar os trabalhadores de mais baixos rendimentos, como fez com os reformados e pensionistas, que viram novamente defraudadas justas expectativas de uma valorização digna das suas pensões.
Como se isso não bastasse, com o novo ano a política do Governo trouxe consigo aumentos generalizados dos preços de bens e serviços essenciais, cujo peso é tanto maior quanto menores são os rendimentos das famílias. Ao contrário do tradicional ditado "ano novo, vida nova", com este Governo aplica-se a máxima "ano novo, política velha".

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mais uma vez, se utiliza a velha técnica de anunciar elevadas taxas de aumento dos preços para depois as reduzir parcialmente e tentar esconder a gravidade dos aumentos reais aplicados. Aumenta, assim, o pão entre 10% e 30%; as rendas de casa em 3,7%; os seguros automóveis em, pelo menos, 5% a 7%; as portagens em 2,8%; os táxis em 5%; as despesas com a educação e com a saúde, os serviços jurídicos; a electricidade que, lembre-se, é a mais cara da União Europeia para os consumidores

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2003 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

domésticos aumenta em 2,1% e, até, em parte os combustíveis, apesar das repetidas garantias de que a liberalização dos preços não traria aumentos para os consumidores. Lá virão ainda outros aumentos, designadamente de outros bens alimentares ou dos transportes públicos.
A maioria dos portugueses vai deste modo enfrentar o ano de 2004 com menos dinheiro e maiores custos nos bens essenciais para a sua subsistência familiar. Esta é a situação concreta que vivemos e que se anuncia para 2004.
O discurso da miragem, repetido por Durão Barroso e por vários ministros, não resiste, portanto, à prova da realidade do País.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Ao mesmo tempo a política do Governo está a conduzir, e conduzirá em 2004, a um ainda maior aprofundamento das desigualdades. A riqueza que o País produz continua a estar crescentemente concentrada nas mãos de poucos, enquanto se alarga a mancha da pobreza e da exclusão social.
Mas se não bastasse a grave situação económica em que o Governo afundou o País, 2004 pode vir a ser, a concretizarem-se as intenções do Governo, um ano de novos e graves retrocessos sociais e democráticos em relação a muitos direitos essenciais.
O ataque à Administração Pública e aos seus trabalhadores, a privatização de maior número de serviços públicos, a degradação de outros por insuficiência de recursos financeiros ou humanos, a continuada ofensiva contra o Serviço Nacional de Saúde, avançando com a sua crescente privatização, a desvalorização do sistema público de ensino agravarão as dificuldades de acesso de vastas camadas da população a prestações fundamentais, designadamente de carácter social.
Por outro lado, o aprofundamento dos graves retrocessos na legislação laboral, apesar de, mesmo em estudos encomendados pelo Governo se constatar que não é na legislação laboral que residem os obstáculos ao aumento da produtividade, demonstram que o Governo continua a apostar no trabalho sem direitos como regra a impor aos trabalhadores deste país.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A continuação da política de direita não traz, portanto, qualquer sinal de esperança para os portugueses no ano que agora começa. E que para que 2004 fosse um ano de melhoria das condições de vida das populações e de desenvolvimento do País uma outra política era necessária.
Uma política que rompesse com o esgotado modelo de desenvolvimento assente nos baixos salários e na precariedade laboral; uma política de promoção do emprego e de aposta no investimento produtivo; uma política de valorização dos direitos da população e dos trabalhadores e da sua garantia pelo Estado como instrumento do progresso social e do combate às desigualdades; uma política de valorização real dos salários, com destaque para o salário mínimo nacional, e das pensões e reformas; uma política que enfrente o aumento de custo de vida em bens essenciais e em que o papel do Estado face ao sacrossanto mercado não se resuma a assistir à maximização dos lucros à custa das dificuldades da generalidade da população, nem a ineficazes intervenções reguladoras sem efeito concreto e em tempo pouco útil.
Neste início do ano de 2004, cada vez mais portugueses responsabilizam justamente o Governo pela situação em que o País se encontra e contestam a sua política de direita. Esta política não serve e tem de ser substituída. Essa é a tarefa da esquerda. É na derrota desta política e na sua substituição que verdadeiramente reside a esperança dos portugueses para uma vida melhor.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria, antes de mais, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, desejar a V. Ex.ª, Sr. Presidente, aos membros da Mesa e a todos os colegas votos de um bom ano de 2004.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O ano abriu com uma boa notícia e com uma má notícia para os portugueses. Infelizmente, a boa notícia refere-se ao passado e a má notícia refere-se ao presente e ao nosso próximo futuro.
A boa notícia é que o Eurostat veio confirmar, procedendo à revisão dos índices de paridade do poder de compra, que Portugal e os portugueses convergiram com a média europeia entre 1995 e 2001.

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Aplausos do PS.

A revisão pelo Eurostat do índice de paridade do poder de compra demonstra a falsidade da campanha do PSD antes das eleições e o erro de análise feita pelo actual Governo no último debate orçamental. Ao contrário do que disseram, em 1997, em 1998, em 1999, em 2000 e em 2001 Portugal cresceu mais do que a média europeia, Portugal convergiu com a média europeia.

Aplausos do PS.

De 1995 a 2001, Portugal cresceu de 66% para 71% da média europeia. Connosco Portugal convergiu; convosco, Portugal diverge.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - A má notícia é precisamente essa, e deu-a ontem o Sr. Governador do Banco de Portugal.
Cada ano da presente legislatura será um ano de divergência com a União Europeia. Desde 2002 e até 2005, ano após ano, Portugal vai divergir da União Europeia. Em vez de nos aproximarmos, afastamo-nos; em vez de estarmos mais ricos, estaremos mais pobres. Esta Legislatura já tem um nome: a Legislatura da divergência com a média europeia.

Aplausos do PS.

É conhecido o percurso e são conhecidas as consequências. O PIB começou a cair no terceiro trimestre de 2002 e trimestre após trimestre, por cinco trimestres consecutivos, tem vindo a cair. É um recorde europeu. Portugal é o único país da União Europeia com cinco trimestres consecutivos de crescimento negativo. Mas é também um recorde nacional. Para quem já não se recorde, importa lembrar que esta recessão é já a mais longa e mais profunda do que a de 1993.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Este Governo do Dr. Durão Barroso já conseguiu fazer pior que o pior governo do Professor Cavaco Silva.

Aplausos do PS.

A evolução foi tão má que desacreditou todas as projecções do Governo. O Governo começou por prever um crescimento de 1,75 em 2003, acabou a prever que, em 2003, decrescemos 0,70. Mas, pior, obrigou entidades credíveis, como o Banco de Portugal, a sucessivas revisões em baixa das suas próprias previsões.
Começou o Banco de Portugal, com optimismo, em Junho de 2002, a prever que em 2003 Portugal cresceria 1,25. Disse, então, a maioria que o Banco de Portugal era pessimista. Como estava enganada a maioria!
Em Dezembro de 2002, o Banco de Portugal fez a primeira revisão em baixa, e já só previa o crescimento de 0,75.
Mas ainda teve de rever uma segunda vez em baixa, em Junho de 2003, agora para 0,50 de crescimento negativo.
Mas não foi, infelizmente, a última revisão em baixa. Ontem mesmo, o Sr. Governador procedeu à terceira revisão em baixa das previsões de crescimento em 2003, dizendo que afinal não crescemos 1,25, não crescemos 0,75, não decrescemos 0,50, decrescemos, segundo o Banco de Portugal, 1,13 durante o ano de 2003.
Não há optimismo que resista a tamanho descalabro da nossa economia!

Aplausos do PS.

Dir-me-ão que este percurso são números. Mas estes números têm consequências na vida das pessoas, e essas são as consequências da política desta maioria.
Desde Abril de 2002, o número de desempregados aumentou 36%; o número de jovens desempregados

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2005 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

aumentou 43%; o número de licenciados desempregados aumentou 86%.
Este é também, infelizmente, um outro recorde europeu. Portugal é o País com maior taxa de crescimento do desemprego em toda a União Europeia. O desemprego cresceu em Portugal seis vezes mais do que na União Europeia. Pior era difícil, e o pior foi conseguido por esta maioria!

Aplausos do PS.

E essas consequências reflectem-se também na perda do poder de compra das famílias. É o próprio Governo que o reconhece no novo Programa de Estabilidade e Crescimento e confessa que, em 2003, os salários tiveram crescimento negativo.
É certo que a inflação atingiu os 3%, mas alguns dos produtos e serviços essenciais à vida das famílias tiveram um crescimento claramente acima da média de inflação: habitação, água, electricidade e gás tiveram 4,3% de aumento em 2003; transportes de passageiro, 5,7%; vestuário e calçado, 9,5%; e - escândalo absoluto! - as despesas com educação tiveram um aumento de encargos para as famílias de 13,9%.
Não é, por isso, possível que nos surpreendamos com o pessimismo que reina em Portugal. Ontem, uma sondagem da RTP e do Público dizia-nos que 47% dos portugueses esperam pior situação económica para 2004 e que 64% esperam um aumento do desemprego.
Mas não são só as sondagens que o dizem. É o Instituto Nacional de Estatística que, ontem, nos veio dizer que foi interrompida a recuperação do índice de clima económico e que em Dezembro houve um novo retrocesso na confiança dos empresários na economia portuguesa. Pior: houve um novo retrocesso no índice de confiança dos consumidores. Permitam-me que cite o Instituto Nacional de Estatística: "Em média anual o valor alcançado em 2003 é o mais baixo de toda a série, superando o anterior mínimo histórico registado em 1994".
Nunca Portugal esteve tão pessimista e tão deprimido. Só este clima de pessimismo derrotista pode explicar, aliás, a satisfação com que a maioria acolheu o relatório ontem apresentado pelo Banco de Portugal.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Concluo, Sr. Presidente, dizendo que o relatório veio, pela segunda vez consecutiva, rever em baixa as previsões de crescimento económico para 2004, as previsões de investimento para 2004, as previsões de crescimento das exportações para 2004 e rever em alta - esta, em alta! - a previsão da inflação para 2004!
Qual é o motivo de satisfação da maioria, se a maioria não está conformada e derrotada perante o seu próprio balanço?!

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero terminar,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Já devia ter terminado!

O Orador: - … recordando que a maioria ganhou as eleições prometendo crescer todos os anos dois pontos acima da média comunitária. A maioria falhou o seu objectivo e a única coisa que a maioria garantiu foi que, até ao final da Legislatura, todos os anos cresceremos menos do que a média comunitária.
Estamos quase a chegar a meio da Legislatura. É tempo de a maioria olhar para os factos e mudar de política.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A maioria ainda está a tempo e Portugal e os portugueses não podem perder mais tempo.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

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O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa, a sua intervenção veio, mais uma vez, confirmar que entre o PSD e o PS continua a haver distinções muito claras. Nós somos pela verdade,…

Vozes do PS: - Oh!…

O Orador: - … os senhores vão sempre pela falta à verdade, pela fantasia. Nós somos pela responsabilidade,…

Vozes do PS: - Vê-se, vê-se!

O Orador: - … VV. Ex.as rejeitam as responsabilidades, têm a cultura da fuga. E vou dizer-lhe porquê: veio V. Ex.ª dizer que nestes anos tem havido um decrescimento em relação à Europa.

O Sr. José Sócrates (PS): - Está enganado!

O Sr. António Costa (PS): - "Nestes anos" não!

O Orador: - Durante os anos de governação do actual Governo.
O Sr. Primeiro-Ministro foi o primeiro a assumir muito claramente a gravidade da situação. VV. Ex.as não gostaram, não queriam que se dissesse que o País estava "de tanga", quando, de facto, os senhores deixaram o País "de tanga". Ora, teve de se dizer e assumir a verdade.
O Sr. Primeiro-Ministro disse que íamos sentir mais restrições, mais dificuldades, designadamente mais desemprego. Assumiu essa verdade. E V. Ex.ª não tem a responsabilidade, a atitude aberta e franca e a humildade de vir dizer "isto está a acontecer porque nós desgovernámos o País,…

Vozes do PS: - Eh!…

O Orador: - … entrámos no despesismo".

O Sr. José Sócrates (PS): - É a "pesada herança"!

O Orador: - Ainda por cima tem a falta de honestidade intelectual de não ler o relatório do Banco de Portugal e um escrito do Dr. Vítor Constâncio, em que ele diz…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Na primeira página!

O Orador: - … pura e simplesmente isto: "Após um período de excessos de aumento de despesa, era inevitável um ajustamento que sempre daria origem a uma desaceleração do crescimento."

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E associa uma outra causa, que V. Ex.ª também imputa a este Governo: a crise da economia internacional, que, segundo V. Ex.ª também é culpa do Governo da coligação e que, segundo as palavras do Dr. Vítor Constâncio, é um factor que determinou o não crescimento, a não convergência nestes anos.
Mas diz outra coisa: que a política que o Governo tem prosseguido vai permitir que a economia portuguesa conserve o seu potencial de crescimento "para prosseguir no futuro com sucesso a aproximação aos nossos parceiros europeus." Ou seja, a alternativa de V. Ex.ª era a de que continuássemos no caminho em que estávamos.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Exactamente!

O Orador: - VV. Ex.as não sentiram na pele o que nós estamos a sentir, porque em 1995 o governo do PSD não deixou o País no estado em que os senhores o deixaram agora, quando fugiram!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Página 2007

2007 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa, a sua intervenção veio, mais uma vez, confirmar que entre o PSD e o PS continua a haver distinções muito claras. Nós somos pela verdade,…

Vozes do PS: - Oh!…

O Orador: - … os senhores vão sempre pela falta à verdade, pela fantasia. Nós somos pela responsabilidade,…

Vozes do PS: - Vê-se, vê-se!

O Orador: - … VV. Ex.as rejeitam as responsabilidades, têm a cultura da fuga. E vou dizer-lhe porquê: veio V. Ex.ª dizer que nestes anos tem havido um decrescimento em relação à Europa.

O Sr. José Sócrates (PS): - Está enganado!

O Sr. António Costa (PS): - "Nestes anos" não!

O Orador: - Durante os anos de governação do actual Governo.
O Sr. Primeiro-Ministro foi o primeiro a assumir muito claramente a gravidade da situação. VV. Ex.as não gostaram, não queriam que se dissesse que o País estava "de tanga", quando, de facto, os senhores deixaram o País "de tanga". Ora, teve de se dizer e assumir a verdade.
O Sr. Primeiro-Ministro disse que íamos sentir mais restrições, mais dificuldades, designadamente mais desemprego. Assumiu essa verdade. E V. Ex.ª não tem a responsabilidade, a atitude aberta e franca e a humildade de vir dizer "isto está a acontecer porque nós desgovernámos o País,…

Vozes do PS: - Eh!…

O Orador: - … entrámos no despesismo".

O Sr. José Sócrates (PS): - É a "pesada herança"!

O Orador: - Ainda por cima tem a falta de honestidade intelectual de não ler o relatório do Banco de Portugal e um escrito do Dr. Vítor Constâncio, em que ele diz…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Na primeira página!

O Orador: - … pura e simplesmente isto: "Após um período de excessos de aumento de despesa, era inevitável um ajustamento que sempre daria origem a uma desaceleração do crescimento."

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E associa uma outra causa, que V. Ex.ª também imputa a este Governo: a crise da economia internacional, que, segundo V. Ex.ª também é culpa do Governo da coligação e que, segundo as palavras do Dr. Vítor Constâncio, é um factor que determinou o não crescimento, a não convergência nestes anos.
Mas diz outra coisa: que a política que o Governo tem prosseguido vai permitir que a economia portuguesa conserve o seu potencial de crescimento "para prosseguir no futuro com sucesso a aproximação aos nossos parceiros europeus." Ou seja, a alternativa de V. Ex.ª era a de que continuássemos no caminho em que estávamos.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Exactamente!

O Orador: - VV. Ex.as não sentiram na pele o que nós estamos a sentir, porque em 1995 o governo do PSD não deixou o País no estado em que os senhores o deixaram agora, quando fugiram!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Página 2008

2008 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

O Orador: - Esta é a diferença entre vocês e nós!

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PSD Guilherme Silva.

E não venha falar-me da contenção da despesa. A maioria tem procurado sustentar perante o País que o grande objectivo de todos estes sacrifícios e desta lógica suicida para o conjunto do País é o da redução do défice - este é o único objectivo político e económico Ora, como o Sr. Deputado sabe, há um falhanço absoluto do ponto de vista da consolidação do défice.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O relatório do Banco de Portugal, que o Sr. Deputado tanto citou, diz, a certa altura, o seguinte: "(…) temos ainda uma situação orçamental muito desequilibrada quando excluímos os efeitos das medidas extraordinárias e irrepetíveis (…)". O Sr. Deputado sabe que se descontarmos as manigâncias,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quais manigâncias?!

O Orador: - … o défice de 2003 é superior a 5%, como, aliás, o próprio relatório do Banco de Portugal deixa muito claro.
Finalmente, Sr. Deputado Guilherme Silva, devo dizer-lhe que eu nada disse sobre o índice de confiança,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas disse eu!

O Orador: - … eu limitei-me a ler o que vem no Boletim do Instituto Nacional de Estatística ontem publicado e, porventura, ainda desconhecido do relatório do Banco de Portugal, também ontem publicado. E o que diz - vou ler para reter bem - é o seguinte: "Em média anual o valor alcançado em 2003 é o mais baixo de toda a série, superando o anterior mínimo histórico registado em 1994". O que o Instituto Nacional de Estatística veio dizer-nos ontem - o Sr. Deputado não gosta! - foi que o índice de confiança dos consumidores atingiu em Dezembro um mínimo histórico, em Portugal.

Protestos do Deputado do PSD Guilherme Silva.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, vou concluir.
O que lamento e considero preocupante, até mais preocupante do que estes resultados, é o vosso conformismo perante estes resultados e a vossa satisfação com um desemprego que aumentou 36%, com um défice que não consolidou e com uma divergência continuada com a União Europeia. Pior do que os resultados é o vosso conformismo e a vossa satisfação com tal mediocridade!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa, um bom ano. Verifico, no entanto, que no início deste ano V. Ex.ª continua a viver na ilusão.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Pois é!

O Orador: - V. Ex.ª fez parte de um governo que viveu na ilusão gastando, gastando e gastando mais do que aquilo que o País tinha e, hoje em dia, continua a viver completamente na ilusão. Quase que faltaria explicar por que é que o anterior Primeiro-Ministro se foi embora e por que é que os senhores perderam as eleições se estava tudo tão bem e se era tudo tão perfeito!…

Página 2009

2009 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não dá para compreender.
Dizem VV. Ex.as que o argumento é estafado. Mas o argumento não é só meu, Sr. Deputado António Costa, o argumento, ainda que estafado, não é só meu. Mas a questão não é a de saber se o argumento é estafado mas a de saber se é verdadeiro ou falso, se os senhores gastaram ou não demais. Esse é que é o problema!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Pois é!

O Orador: - E aquilo que o senhor refere, que é o relatório do Governador do Banco de Portugal é, nesse ponto, claríssimo. É verdade, como o senhor diz, que estamos a crescer menos do que aquilo que desejaríamos. É verdade!

Vozes do PS: - Ah!

O Orador: - Mas atenção! O Governador do Banco de Portugal também diz porquê,…

O Sr. José Sócrates (PS): - Quatro anos de divergência!

O Orador: - … exactamente no mesmo parágrafo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não leram!

O Orador: - O que diz o Governador do Banco de Portugal, nesse mesmo parágrafo? Diz o seguinte: "Após um período de excessos de aumento de despesa…" - foi o vosso! -,…

Protestos do PS.

… "… era inevitável um ajustamento que sempre daria origem a uma desaceleração de crescimento."

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Está explicado! A responsabilidade é vossa! Isso é claríssimo, não há dúvida nenhuma!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Por outro lado, V. Ex.ª vê só más notícias. Eu li o mesmo relatório - e espero que o senhor o tenha lido - e não vejo só más notícias. Quer ouvir boas notícias? O que nós dizemos é que gastar muito mesmo crescendo a despesa pública e o consumo público não é o modelo correcto. Qual é o modelo correcto? Investimento privado e exportações.
Quer boas notícias? Vamos ao relatório e falemos, por exemplo, de investimento privado: "O investimento privado deverá ter já uma evolução ligeiramente positiva este ano e uma recuperação mais relevante no próximo."

O Sr. António Costa (PS): - Aonde?!

O Orador: - Isso não é claro?
Quer falar de exportações? Diz o relatório o seguinte: "Admite-se (…) que a procura externa tenha uma recuperação significativa, permitindo que as nossas exportações de bens e serviços passem de um crescimento de 3% no ano passado para 4,75 a 6,75% em 2004 e para 6 a 9% em 2005."

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Eh!

O Orador: - Quer mais notícias positivas? Antecipa-se que, ao contrário do que aconteceu em 2003, o rendimento disponível das famílias volte a ter crescimento positivo em 2004.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Exactamente!

Página 2010

2010 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

O Orador: - Isto é o que diz o relatório do Banco de Portugal. Os senhores podem dizer o que quiserem, o senhor pode sustentar em sondagens o seu absoluto pessimismo, eu sustento-me na análise isenta e rigorosa do Governador do Banco de Portugal o meu optimismo moderado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado terá de explicar qual é o outro modelo e a outra política que defende, porque também aí o relatório é claro.
O único caminho é o da Ministra Ferreira Leite, o único caminho é o da contenção para apanhar a retoma e para pôr Portugal a crescer novamente.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, começo por agradecer os seus pedidos de esclarecimento.
Quanto a viver na ilusão, devo dizer-lhe que quem vive na ilusão é quem vive da retórica e se recusa a olhar para a realidade, expressa nos números. E a realidade, expressa nos números, é a que passo a expor.
Primeiro, o Boletim do Instituto Nacional de Estatística, serviço dependente da Sr.ª Ministra das Finanças, publicado ontem, diz-nos que Portugal atingiu o nível histórico mais baixo do índice de confiança. Mais: que o índice de clima económico, que é o índice agregado da confiança dos agentes económicos, teve uma nova quebra e interrompeu a melhoria que estava a ter, embora ligeira, desde Maio. Números são números!
O Eurostat diz-nos, muito claramente, que de 1995 a 2001 Portugal cresceu sempre mais do que a média europeia e convergiu sempre com a média europeia, desmentindo as falsidades que os senhores, então na oposição e agora no governo, inventaram de que em 1997 tínhamos começado a divergir da União Europeia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É falso! Estivemos sempre a convergir; agora, estamos sempre a divergir. Números são números! Desde 2002 que Portugal, com os senhores, tem estado sempre a crescer abaixo da média europeia. Nós estamos a afastar-nos da média europeia.
Ora, o que temos de saber é o que queremos para o País, e eu digo-lhe o que queremos para o País. Nós não queremos que Portugal seja um país medíocre na Europa, queremos que Portugal tenha os melhores níveis de rendimento da Europa,…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: … queremos aproximar-nos dos melhores, não queremos afastar-nos dos melhores.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Mas qual é o caminho?!

O Orador: - Connosco no governo aproximámo-nos dos melhores; com os senhores no governo estamos a afastar-nos dos melhores!

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado, ao ler o relatório, confunde desaceleração, que é crescer a um ritmo mais lento, com recessão, que não é crescer a um ritmo mais lento, é decrescer, é chegarmos ao fim do ano mais pobres do que estávamos.
O que o Sr. Governador do Banco de Portugal diz - e isso é uma evidência - é que há ciclos naturais de ajustamento da economia em que, depois de momentos de grandes crescimentos exponenciais, como os que tivemos entre 1995 e 2001, é natural que haja uma certa acomodação. O que não é natural é que, mais do que uma desaceleração, haja uma recessão no crescimento económico.

Página 2011

2011 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

Protestos do Deputado do PSD Guilherme Silva.

Os Srs. Deputados dizem o seguinte: "Nós vamos aumentar as exportações". Contudo, o Governador de Portugal diz que o pequeno crescimento que podemos antever para 2004 de 0,75% (1,25% abaixo da média da União Europeia,…

Protestos do PSD.

… porque para o ano já vamos divergir da média europeia em mais 1,25%) resultará da retoma da economia mundial e da retoma…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, eu sei. Estou a ver se consigo terminar, mas os Srs. Deputados da primeira fila do PSD estão nervosíssimos.

Risos do PSD.

O que isso significa é que o Governo tem uma atitude estática perante a economia portuguesa e tem uma fé incomensurável no bom funcionamento das economias governadas pelos outros,…

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Exactamente!

O Orador: - … em particular pela França e pela Alemanha, motores da retoma europeia e que seguem precisamente a política económica e orçamental oposta à que os senhores resolvem adoptar.

Aplausos do PS.

Portanto, a vossa lógica é a seguinte…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem mesmo de terminar!

O Orador: - A vossa lógica - para nós, uma má política - é muito simples: cresceremos parasitando a boa política dos outros!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa, um bom ano para si, pese embora, no seu caso, ano novo discurso velho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª vem sempre repristinar os velhos argumentos e não traz nada de novo ao debate.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado António Costa, ao ouvir a sua intervenção lembrei-me de Voltaire. Voltaire escreveu uma obra, Cândido, em que, a dado passo, há um filósofo, de seu nome Pangloss, que, com o mundo a desabar, diz sempre que vai tudo no melhor dos mundos; é um optimista militante.

O Sr. José Magalhães (PS): - É como o Deputado Guilherme Silva!

Página 2012

2012 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

O Orador: - Ao invés do Pangloss, o senhor é um pessimista militante. O senhor é um Pangloss invertido, Sr. Deputado António Costa!
Se V. Ex.ª fizer apelo à probidade intelectual, à seriedade, à sensatez, à perspicácia (e V. Ex.ª é uma pessoa sagaz, perspicaz e séria), seguramente, não terá o arrojo, o desplante e o descaro de dizer que este relatório do Banco de Portugal vem ao encontro daquilo que a oposição, particularmente o Partido Socialista, tem vindo a zurzir nos últimos tempos relativamente à política económica deste Governo.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Veja a parte da inflação!

O Orador: - É que o que está neste relatório, de lés a lés, de fio a pavio, é, sem dúvida alguma, um elogio à política económica e orçamental deste Governo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado António Costa, chamo a sua atenção, desde logo, para o primeiro ponto que é referenciado neste relatório e que assume, de facto, foros de grande relevo, que é a inversão do ciclo económico.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Os senhores têm vindo a sustentar, até hoje, que estamos em recessão e que esta política está a aprofundar a recessão. O que o relatório do Banco de Portugal diz é exactamente o contrário disso.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não diz, não! Não, não!

O Orador: - O relatório diz que se inverteu o ciclo económico e que estamos, de facto, no bom caminho para recuperar a economia. Há uma retoma moderada mas há já uma retoma, há sinais de retoma.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Segundo ponto, Sr. Deputado António Costa, sejamos claros: os senhores zurzem forte e feio sobre a política orçamental, dizendo que ela leva ao descalabro; o relatório do Banco de Portugal diz que esta política orçamental é a única possível.
Mais: os senhores, que diabolizaram o Pacto de Estabilidade e Crescimento, que o mandaram às malvas, que anunciaram a sua morte prematura, esqueceram-se de que o próprio Banco de Portugal, também ele, diz que o Pacto de Estabilidade e Crescimento não é letra morta, que é fundamental respeitar as suas regras, que temos um problema orçamental interno que exige o respeito pelas regras do Pacto.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E as tais manigâncias, Sr. Deputado António Costa, de que aqui veio falar, fazendo, naturalmente, uma referência sub-reptícia às receitas extraordinárias,…

O Sr. António Costa (PS): - Ah! Percebeu do que eu estava a falar! É sagaz!

O Orador: - … têm, da parte do Banco de Portugal, uma referência. Quanto às manigâncias, Sr. Deputado António Costa, diz o relatório do Banco de Portugal, e passo a citar: "Note-se que as medidas extraordinárias de realização de receita são legítimas e aceites pelo Eurostat para efeitos do reporte de défice excessivos. A vantagem de usá-las reside em que elas substituem em parte as receitas reduzidas temporariamente pela recessão." Ou seja, quanto àquilo que o Sr. Deputado vê como um inconveniente atroz e suez, que são as tais manigâncias, o Banco de Portugal diz que são necessárias, que são legítimas e que têm plena justificação numa situação de recessão como aquela em que vivemos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas também diz que são provisórias!

O Orador: - Em que é que ficamos, Sr. Deputado António Costa?!

Página 2013

2013 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por último e para concluir, lanço-lhe um repto, Sr. Deputado António Costa. O relatório do Banco de Portugal também é claro ao dizer que é fundamental manter esta política de consolidação orçamental, esta política de rigor e disciplina a que os senhores, no passado, deram tratos de polé.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Já vou terminar, Sr. Presidente.
Fazendo o relatório do Banco de Portugal um apelo relativamente à necessidade de um consenso alargado na sociedade portuguesa quanto à consolidação orçamental, pergunto-lhe, Sr. Deputado António Costa, se o senhor e o seu partido estão dispostos a fazer um acto de contrição relativamente àquela que é a vossa tradição histórica de despesismo…

Risos do PS.

… e a colaborar numa efectiva e verdadeira consolidação orçamental, longe da retórica e da espúria meramente retórica, com uma efectiva redução da despesa corrente, com uma efectiva implementação de medidas que permitam, de facto, maior arrecadação de receita, enfim, uma verdadeira consolidação orçamental e não a mera e vã retórica parlamentar. É este o apelo que lhe faço e peço-lhe que responda mas que responda de uma forma directa e frontal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Neto, cumprimento-o pela sua sagacidade, pois percebeu que as manigâncias, de facto, eram as receitas extraordinárias. Louvo a sagacidade da sua observação.
Mas também foi sagaz quando reteve que, infelizmente, trimestre após trimestre, temos de subir à tribuna…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Para fazer sempre o mesmo discurso!

O Orador: - … para sublinhar à maioria que estamos piores do que já estávamos no trimestre anterior. Isso, efectivamente, tem sido um calvário pungente e doloroso para nós mas, o que é pior, muito mais pungente e doloroso para os portugueses.

Vozes do PS: - Claro!

O Orador: - É que as empresas e os trabalhadores é que têm pago, com "língua de palmo", esta política irresponsável que os senhores têm vindo a seguir.

Aplausos do PS.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Os erros que os senhores cometeram!

O Orador: - E, Sr. Deputado Jorge Neto, o senhor é jurista como eu, somos dados à retórica mas, depois, também somos obrigados a perceber que contra factos não há argumentos. E os factos são simples e estão no Eurostat.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - E estão no relatório!

O Orador: - Enquanto nós governámos, Portugal cresceu mais do que a média europeia e convergiu com a União Europeia; desde que os senhores estão no Governo, Portugal cresce menos do que a União Europeia e estamos a divergir da União Europeia.

Página 2014

2014 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

Vozes do PS: - Essa é que é essa!

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Deputado, seja sério! A explicação está no relatório do Banco de Portugal!

O Orador: - E pior, Sr. Deputado Jorge Neto: não divergimos apenas em 2002 e em 2003, vamos continuar a divergir todos os anos da presente legislatura.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E porquê?!

O Orador: - Srs. Deputados, quando chegarmos ao fim desta Legislatura, Portugal terá uma riqueza ao nível da que tinha em 1998. A vossa obra, em quatro anos, será a de nos fazer andar oito anos para trás. Este será o resultado da vossa política! Isto são factos e contra factos não há argumentos!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pergunta o Sr. Deputado Jorge Neto se queremos ir ao encontro do relatório do Banco de Portugal. Sr. Deputado, o que nós queremos é ir ao encontro da realidade da economia portuguesa.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Não parece!

O Orador: - E a realidade da economia portuguesa, que está, aliás, espelhada no relatório do Banco de Portugal, é muito clara: temos a maior taxa de crescimento do desemprego da Europa - mais 36% de desempregados, desde que os senhores estão no Governo; temos a quebra acentuada do poder de compra das famílias portuguesas;…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Tudo pelo vosso excesso de despesismo!

O Orador: - … temos o record das empresas em falência e do crédito mal parado, na última década e meia. Este é o resultado da vossa política! E, quer queira quer não, Sr. Deputado, as políticas avaliam-se previamente pela bondade dos objectivos e a posteriori pela efectividade dos resultados.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Exactamente! Nisso, estamos de acordo!

O Orador: - A parte relativa à bondade dos vossos objectivos já passou, foi na fase da campanha eleitoral e ganharam as eleições. Agora, estão na outra fase, ou seja, têm de responder pelos resultados da vossa política. E os resultados da vossa política…

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Estão no relatório! Já se começam a ver!

O Orador: - … são estes! São estes hoje e, pior, serão estes no final da presente legislatura, se não tiverem o bom senso de mudar de política.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha.

O Orador: - Termino, dizendo-lhe o seguinte, Sr. Deputado Jorge Neto: estamos quase a chegar a meio da Legislatura, os senhores ainda estão a tempo de mudar…

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Não, não! Não vamos mudar! Vamos seguir exactamente os conselhos do relatório do Banco de Portugal!

O Orador: - … mas Portugal e os portugueses é que já têm muito pouco tempo a perder com a vossa obstinação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, o Sr. Deputado Diogo Feio estava inscrito

Página 2015

2015 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

para fazer hoje uma declaração política mas prescinde da insistência em usar, hoje mesmo, da palavra, reservando o seu uso para amanhã.
Srs. Deputados, antes de passarmos à ordem do dia, temos de apreciar e votar um relatório e parecer da Comissão de Ética relativo a mandatos de Deputados, uma vez que convém sempre ter a Assembleia da República com a sua composição plena.
Peço ao Sr. Secretário que nos dê conta desse relatório e parecer.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório refere-se à substituição, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 5.º do Estatuto dos Deputados, do Sr. Deputado Paulo Pedroso (PS), do Círculo Eleitoral de Setúbal, pelo Sr. Deputado José Manuel Epifânio, com início em 7 de Janeiro de 2004, inclusive.
O parecer é no sentido de que a substituição em causa é de admitir.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Deputado José Manuel Epifânio pode ocupar o seu lugar no Hemiciclo a partir deste momento.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 55 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a ordem do dia de hoje é preenchida com a discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.os 100/IX - Aprova o regime jurídico do contrato individual de trabalho da Administração Pública e 101/IX - Cria o sistema integrado de avaliação do desempenho da Administração Pública.
Antes de dar início ao debate, e está já inscrita a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, para apresentar os referidos diplomas, peço à Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza o favor de me substituir na presidência da Mesa.

Neste momento, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente: - Para apresentar as propostas de lei, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Manuela Ferreira Leite): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Todos estão de acordo que o modo como funciona a Administração Pública influencia decisivamente o grau de produtividade do País, quer pela dimensão dos meios que consome, quer pela generalizada influência nos diferentes sectores.
A reforma da Administração Pública é, por isso, uma matéria de interesse nacional,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - … que exige coragem política na decisão, coerência no propósito e estabilidade na sua execução.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - O alcance e a profundidade das medidas e a capacidade para produzirem a mudança dependem, essencialmente, da mobilização em torno dos objectivos consensuais.
Nesta medida, é essencial um esforço de carácter nacional e não partidário, porque se trata de uma questão estrutural e não conjuntural.
É fundamental para o sucesso desta reforma que o debate contribua para o esclarecimento e não para o lançamento de dúvidas e receios infundados…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

Página 2016

2016 | I Série - Número 035 | 08 de Janeiro de 2004

 

A Oradora: - … e que estimule o compromisso e a participação.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Não podemos dar-nos ao luxo de impedir ou dificultar uma mudança necessária ao progresso do País, ao bem-estar dos cidadãos e ao prestígio e motivação dos funcionários.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Hoje, apresentamos aqui os diplomas sobre o sistema de avaliação de desempenho e o regime do contrato individual de trabalho na Administração Pública, que consideramos de uma enorme importância estratégica e que completam o conjunto dos principais diplomas que integram a reforma da Administração Pública.
No centro da reforma e modernização da Administração Pública está a gestão dos recursos humanos, baseada no mérito e no contributo de cada pessoa para o resultado do serviço.
Quero sublinhar que o sistema de avaliação proposto é um sistema integrado de avaliação, que inclui a avaliação dos desempenhos não só individuais mas também dos dirigentes e dos serviços. Não é, portanto, ao contrário do que se tem tentado divulgar, um sistema de avaliação só dirigido aos funcionários.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Não se trata apenas da mudança do quadro legal desta matéria. É uma proposta de mudança cultural que implica uma verdadeira ruptura com modelos de funcionamento ultrapassados e pouco motivadores de boas práticas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É também um instrumento próprio para identificar desequilíbrios funcionais e para criar condições de maior motivação profissional, através da adequada política de qualificação e formação dos recursos humanos.
A profunda alteração traduzida nesta proposta tem um alcance tanto maior quanto se instalou na Administração Pública uma quase total ausência de cultura de avaliação. Esta situação dá origem a uma enorme desmotivação por parte de todos os funcionários, que encaram a sua função com ambição e vontade de progredir, e sustenta um clima de desresponsabilização e incapacidade de intervenção por parte dos dirigentes.
É uma questão de justiça, é uma questão de moral.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Quem trabalha e cumpre deve ver o seu esforço recompensado e diferenciado daquele que pouco ou nada cumpriu.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É por isso também elementar e justo que o sistema contenha os mecanismos necessários para assegurar a aplicação equilibrada de critérios e a utilização de padrões normais de aferição. Sem estas garantias, o sistema fica ferido na sua exequibilidade e a tarefa dos avaliadores é extremamente dificultada.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Neste sentido, a nossa proposta aponta para a adopção de um sistema de quotas, tema que tem sido objecto de fortes críticas. E não se entendem tais críticas, porque não tem qualquer sentido que se defendam e proclamem as virtudes de um sistema de avaliação exigente e, de imediato, se recuse um sistema que acautele a sua correcta aplicação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Ou seja, não se pode concordar com a teoria para, de seguida, se destruírem todas as

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hipóteses da sua concretização.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - O sistema integrado de avaliação de desempenho é universal mas comporta um grau de flexibilidade que permitirá a sua adaptação a sectores ou grupos profissionais específicos. Representa uma ruptura com a cultura vigente, porque garante a diferenciação pelo mérito e reforça os níveis de responsabilidade e controlo, prevendo o envolvimento dos avaliados em todo este processo.

Aplausos do PSD.

Deve ainda salientar-se que o sistema de avaliação promove a transparência e a responsabilidade institucional, porque implica a divulgação de resultados e a criação de uma base de dados, como suporte indispensável à definição das políticas de recursos humanos, designadamente no que se refere ao recrutamento e formação.
É um sistema que reforça a responsabilidade das chefias, porque implica a preparação e a divulgação dos objectivos a prosseguir e em que todos estão envolvidos.
Julgo que a importância estratégica da avaliação é unanimemente reconhecida, sendo certo que nenhuma instituição, pública ou privada, consegue afirmar-se plenamente sem avaliar totalmente as suas funções, a sua organização e os seus resultados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - O mérito e o alcance da proposta hoje em discussão foram também reconhecidos no processo de negociação desenvolvido com as diferentes frentes sindicais, cujas propostas de melhoria foram reflectidas no texto final. O acordo de princípio da FESAP perspectiva, desta forma, uma concretização serena e firme do modelo que se pretende adoptar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Um ambicioso projecto de reforma da Administração Pública tem, necessariamente, de equacionar novas formas de prestação de trabalho, abrindo espaço a uma maior flexibilidade de regimes, de acordo com a natureza e a diversidade das funções a assegurar.
De facto, a crescente competitividade entre o sector público e o sector privado, em parte decorrente do crescente número de funções que o Estado passou a desempenhar, e o recurso a diversos modelos de estreitamento da relação entre o Estado e a sociedade civil impõem que se equacione a necessária aproximação de estatutos laborais e respectivos códigos de funcionamento.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - É nesta perspectiva que se considera como um importante passo na modernização do sector a abertura ao contrato individual de trabalho e o seu enquadramento no âmbito da Administração Pública.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Há que reconhecer que o contrato individual de trabalho existe há muito na Administração Pública, ainda que admitido de forma casuística, sem linha de rumo e sem qualquer padrão quanto às regras a observar.
De facto, assistiu-se com frequência, no passado, à criação de institutos - imensos! -, apenas para permitir a celebração de contratos individuais de trabalho, sem regras nem controlo.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Uma vergonha!

O Sr. Vieira da Silva (PS): - É verdade! O melhor é verem as datas em que isso sucedeu!…

A Oradora: - Desde já deverá salientar-se que o novo enquadramento proposto salvaguarda em absoluto os direitos já constituídos. Isto significa que se trata de um regime a adoptar apenas em novas admissões, não estando em causa a alteração dos actuais vínculos dos funcionários ou os seus direitos.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, a natureza privada da relação contratual não poderá sobrepor-se aos princípios incontornáveis de actuação no sector público, como a isenção, a imparcialidade, a igualdade de acesso e de oportunidades, que terão sempre de ser salvaguardadas.
É consensual que a existência de contrato individual de trabalho no âmbito público sem um regime disciplinador evidenciava crescentes dificuldades, pelo que o actual Código do Trabalho previu, desde logo, a necessidade de adaptação de algumas das suas normas ao sector público.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Exactamente!

A Oradora: - A presente proposta de lei passa a admitir o recurso ao contrato individual de trabalho na Administração Pública, excluindo os sectores que justificam, pela sua natureza, a existência de um regime estatutário, como os poderes de autoridade e de soberania. No entanto, para além da abertura em concreto das funções administrativas e auxiliares a este tipo de contrato, o alargamento será progressivo e sempre dependente de diplomas legais específicos, sujeitos a negociação sindical.
Inova-se também no âmbito da contratação colectiva, pondo termo a uma indefinição e a uma dispersão de regimes, muitas vezes apontados pelas próprias organizações sindicais como de difícil execução.
Resolvem-se, ainda, as questões referentes aos fundamentos para a cessação do contrato individual de trabalho dentro do estrito limite previsto no Código do Trabalho e formulam-se soluções inovadoras de grande simplicidade e flexibilidade que permitam a mobilidade e a convivência de regimes.
Trata-se de um diploma de grande rigor jurídico e de profundo alcance político, que abre caminho, sem preconceitos nem demagogias, a uma nova forma de trabalho na Administração Pública, em condições de transparência e de igualdade com o sector privado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Queremos uma Administração Pública centrada na eficiência, com uma cultura de resultados e de valores éticos merecedora de confiança dos cidadãos, prestigiante e motivadora para todos os que nela trabalham.
É verdade que o proclamado consenso sobre os objectivos desta reforma só assumirá verdadeiro significado se se traduzir num efectivo apoio à sua realização.
Passar das críticas à acção correndo riscos e aceitando responsabilidades é o grande passo que separa os que acreditam nas pessoas e nas suas capacidades dos que apenas lamentam as oportunidades perdidas.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - O Governo faz parte do grupo dos que acreditam que é possível cumprir este projecto e que, nessa medida, a Administração Pública, os seus dirigentes e os seus funcionários vão ser seguramente parte activa e empenhada no progresso de Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para apresentar o relatório da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais relativo à proposta de lei n.º 100/IX, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira da Silva, dispondo de 3 minutos.

O Sr. Vieira da Silva (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Cabe-me apresentar o relatório da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais referente à proposta de lei n.º 100/IX.
Através da proposta de lei objecto do presente relatório e parecer visa o Governo generalizar na Administração Pública a possibilidade de recurso ao contrato individual de trabalho, instituindo, na decorrência do Código do Trabalho, um enquadramento jurídico especial aplicável a esses contratos, designadamente estatuindo normas específicas no que concerne aos deveres que impendem sobre estes trabalhadores, aos critérios de selecção, aos limites à contratação, às formalidades a observar, aos contratos a termo, às condições de trabalho, ao despedimento e ao regime de negociação colectiva.
Importa recordar que já coabitam há muitos anos diferentes regimes contratuais no seio da Administração Pública, nomeadamente em diversos institutos públicos. Na opinião do relator, a utilização do

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contrato individual de trabalho no quadro da Administração Pública, modalidade contratual mais flexível, pode, se formulada de modo adequado, constituir em muitas situações um importante instrumento de gestão, permitindo, nomeadamente, alcançar melhores resultados no plano da prestação dos serviços públicos aos cidadãos. Contudo, tal opção não passa claramente, na opinião do relator, pelo modelo desenhado pelo Governo nesta iniciativa.
Com efeito, a proposta vertente encerra um vasto conjunto de soluções normativas que, salvo melhor e mais qualificado entendimento, não asseguram minimamente o imperativo constitucional da segurança no emprego, densificam a ocorrência de desigualdades relativas, precarizam os vínculos laborais na Administração Pública e, inclusive, permitem o recurso ao despedimento de trabalhadores em condições que considero inaceitáveis.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - As opções normativas plasmadas nesta iniciativa, quando comparadas com o Código do Trabalho, afiguram-se fortemente penalizadoras para os trabalhadores da Administração Pública que venham a ser contratos por este vínculo contratual. Vou dar alguns exemplos muito breves: a determinação da nulidade do contrato de trabalho por tempo indeterminado mesmo se o cumprimento das exigências que não foram efectuadas não dependam do trabalhador; a determinação da nulidade do contrato por termo indeterminado no caso da não redução por escrito ou por falta de certas menções do contrato, o que se afigura de igual modo muito injusto e gravoso para os trabalhadores da Administração Pública; interdição absoluta da conversão de contrato a termo em contrato sem termo ou, ainda, a determinação da nulidade do contrato por incumprimento de certas normas quando a responsabilidade não é do trabalhador.
Estes e outros exemplos, que o tempo não me permite explicitar devidamente, levam-me a crer que, de facto, não é esta a solução, já que conduz a uma situação em que o Estado aplica para os seus trabalhares com um regime de contrato individual de trabalho soluções mais gravosas do que aquelas que exige para os empregadores privados. Esta foi também a opinião da generalidade das instituições, nomeadamente sindicais, que participaram na consulta pública a que este diploma esteve sujeito.

Aplausos do PS.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, gostaria que, se possível, a Mesa me explicitasse se o exercício que acabou de ser feito em sede parlamentar traduziu a apresentação de um relatório ou a opinião do Sr. Deputado Vieira da Silva, com considerações puramente pessoais.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Quando o Deputado relator diz que, no seu entendimento, estas iniciativas legislativas têm que ver com isto, com aquilo ou com aqueloutro, o que me parece contender com a opinião da maioria, não vejo como isso possa traduzir a apresentação de um relatório. De qualquer forma, interpelo a Mesa para, se conseguir, me dar o devido esclarecimento.

O Sr. Vieira da Silva (PS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vieira da Silva (PS): - Sr.ª Presidente, gostaria de interpelar a Mesa relativamente ao entendimento do Regimento no que toca aos relatórios.
No âmbito das comissões respectivas, responsabiliza-se o relator no que diz respeito à componente relatório. É este o entendimento que se deve ter do Regimento da Assembleia da República, o qual, aliás, já foi aqui utilizado por diversas vezes.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

Protestos do Deputado do PSD Luís Marques Guedes.

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O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr.ª Presidente, gostaria de esclarecer a Câmara que estas opiniões do Sr. Deputado Vieira da Silva apenas o vinculam a ele próprio, de forma alguma as conclusões e o parecer aprovados em sede de comissão.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Aliás, aproveito o ensejo para dizer que a maioria rejeita categoricamente, ponto por ponto, todas as alusões e considerações que o Sr. Deputado Vieira da Silva acabou de fazer.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, há regras na Assembleia da República, há o Regimento, pelo que é lamentável que um relator não tenha a honestidade de distinguir as suas posições pessoais daquilo que foi votado na Comissão e que lhe incumbe transmitir em Plenário enquanto relator.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Claro!

O Orador: - Se o não quiser fazer, renuncie a essa função e deixe outro Sr. Deputado assumi-la e cumprir o Regimento e as regras da democracia. Quando se é vencido, é-se vencido, aceita-se com humildade esse vencimento, exprime-se e distingue-se as posições institucionais de um relatório de uma comissão de que se é relator da posição pessoal.
É este incidente e este procedimento que gostaria de deixar aqui claramente repudiado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr.ª Presidente, tenho grande dificuldade em compreender…

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - … a estranheza revelada pela maioria em relação à manifestação de um direito de todos os relatores desta Casa, na sequência, aliás, da revisão do Regimento da Assembleia da República.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Tive ocasião de discutir longamente com o Sr. Deputado Marques Guedes, em trabalhos preparatórios e, depois, no próprio processo de aprovação da revisão do Regimento, a importância do novo direito conferido aos relatores de serem responsáveis pela parte do texto da comissão a que se chama relatório.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E o outro texto?!

O Orador: - Há dois textos examinados pela comissão: o relatório, da responsabilidade do relator, e o parecer, que tem conclusões.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, o Sr. Deputado Vieira da Silva teve ocasião de, ao longo da sua intervenção, ir sublinhando sempre a expressão "na opinião do relator". Os Srs. Deputados querem castrar esse direito de opinião!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Castrar? Quer é castrar a opinião de todos os demais!

O Orador: - Já se sabe que o Sr. Deputado Vieira da Silva não poderia exibir uma atitude adorativa em relação à proposta de lei, mas não pode ser proibido de exprimir a sua opinião enquanto relator.

Vozes do PS: - Com certeza!

O Orador: - Quanto ao mais, o relatório e o parecer são o que consta dos autos, e isso é completamente inquestionável! Não percebemos o sururu em torno desta questão banal.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, não tenho em meu poder o relatório em causa, pelo que não posso verificar o que quer que seja em termos de correspondência entre aquilo que foi dito e o que está no texto. Posso, no entanto, referir-me àquilo que o Regimento diz sobre esta questão.
No artigo 154.º, n.º 1, é dito que "O debate é introduzido pelo autor da iniciativa, após o que o relator apresentará a síntese do relatório e as suas conclusões mais relevantes".

Vozes do PSD e do CDS-PP: - E não apresentou!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Nos termos do artigo 35.º, n.º 5, o conteúdo do relatório é designado pelo nome do seu autor. Diz-se ainda, no n.º 6, que "As conclusões e o parecer são formulados em articulado e sujeitos a votação em comissão".

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Com certeza!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Portanto, aquilo que, nos termos do artigo 154.º, n.º 1, deve ser dito pelo relator quando apresenta o relatório é o conteúdo essencial do mesmo e as conclusões, as quais são sujeitas a votação, como se sabe.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não as disse!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Houve abuso de direito!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Caso não tenha sido suficientemente clara, sublinho que as conclusões são aquelas que foram votadas na comissão.
Srs. Deputados, vamos prosseguir os trabalhos.
Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, os Srs. Deputados Patinha Antão, Luís Fazenda, João Pinho de Almeida, Fausto Correia, Isabel Castro e Carlos Andrade Miranda.
Para formular o seu pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, a oposição vem para este debate de mãos vazias.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Pior é ter um Governo de mãos cruzadas!

O Orador: - Esperar-se-ia que a oposição se apresentasse a debate - recordo que se trata dos dois diplomas que completam a arquitectura da reforma da Administração Pública - nos seus próprios termos, isto é, com propostas alternativas, mas, afinal, Srs. Deputados, estamos a discutir as propostas do Governo.
Surpreendentemente, o PS abdicou do esforço que fez no debate dos três primeiros diplomas estruturantes da reforma da Administração Pública. Nessa altura, apresentou propostas alternativas e até houve ensejo, no debate na especialidade, de aproveitar para a redacção final algumas das sugestões que tinha apresentado.

O Sr. Fausto Correia (PS): - Nem uma!

O Orador: - Surpreendentemente, o PS vem para este debate de mãos vazias, sem propostas alternativas.
Srs. Deputados da oposição, estar num debate desta natureza sem propostas é como estar num navio

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sem bússola - nunca se chega a bom porto e não se sabe sequer onde se quer chegar.
Pergunto aos Srs. Deputados do PS se, porventura, a posição que têm é a de seguir o folclore demagógico que os seus colegas mais à esquerda radical têm feito sobre as questões que estamos aqui a discutir ou se, porventura, reconhecem que, pela qualidade e rigor das propostas apresentadas pelo Governo, não têm de contribuir para a qualidade e elevação deste debate com propostas alternativas mas, sim, reservar para o debate na especialidade as achegas que nos querem dar. Parece-me que esta é uma pergunta a fazer serenamente, nesta sede do debate.
Dito isto, vamos ao essencial.
A Sr.ª Ministra teve o ensejo de referir, relativamente ao diploma da avaliação do desempenho, uma questão que, do nosso ponto de vista, é crucial e não tem sido ainda suficientemente aflorada e reflectida, que é o facto de o novo sistema pressupor um exigente, novo e inovador sistema de fixação de objectivos, não apenas por serviço mas também por funções e por trabalhadores.
A exigência contida nesta proposta tem, além da qualidade do sistema de avaliação de desempenho, este pressuposto. Por isso, Sr.ª Ministra, é adequado e oportuno, neste momento, perguntar a V. Ex.ª quais são as linhas que, efectivamente, o Governo pretende seguir do ponto de vista da execução prática de tudo o que está a montante do sistema de avaliação e desempenho, já que, do nosso ponto de vista, o que está espelhado no diploma é tão claro, tão natural como a vida, tão decorrente daquilo que se faz não só na Administração Pública na União Europeia como também nas empresas em geral,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … que nós, sobre essa matéria, não temos questões a colocar.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo terminou. Conclua, se faz favor.

O Orador: - Termino já, Sr.ª Presidente.
Gostava também, Sr.ª Ministra, que V. Ex.ª evidenciasse se, porventura, no diploma que faz a adequação do regime do contrato individual de trabalho ao Código do Trabalho e às orientações gerais da Administração Pública, há a mais leve incorrecção relativamente ao facto de, pela primeira vez, esses trabalhadores passarem a dispor de uma legislação sistemática, que garante na íntegra os direitos que têm, e, mais do que isso, se fornece - sim ou não - uma oportunidade verdadeira e nova de haver contratação colectiva para estes trabalhadores, que de outra forma ficariam completamente esquecidos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Vá lá, Sr.ª Ministra, dê "Excelente" ao Sr. Deputado Patinha Antão!

Risos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, como a Sr.ª Ministra pretende responder a três perguntas em conjunto, tem a palavra, para formular um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, ninguém rejeitará que os objectivos de modernização da Administração Pública (de eficiência, de aproximação dos cidadãos, de celeridade administrativa e operativa, de cultura de exigência de avaliação) são positivos e que todos querem prosseguir. A questão não é a de que haja aqui uma única via, aquela que é aqui enunciada pelo Governo, para atingir esses objectivos.
A Sr.ª Ministra referiu-se, em passagem, ao dever de imparcialidade da Administração Pública, que é, aliás, um preceito constitucional. E aqui a nossa questão é, desde logo, muito clara: apontando a Constituição que para atingir esse cometimento do dever de imparcialidade a admissão dos funcionários na Administração Pública deve ser feita, em regra, por concurso, como é que isso se compatibiliza com a larguíssima generalização do contrato individual de trabalho, que, como percebemos, independentemente das suas considerações sobre a competitividade do sector público e do sector privado, não têm a mesma natureza e não prosseguem os mesmos objectivos.
Assim, pensamos que esse princípio de imparcialidade da Administração Pública está aqui ferido de morte e que há que acautelar regras. Não é apenas o provimento de contratos individuais de trabalho com as regras que têm - e são as que têm - que vem substituir a regra, que é apontada constitucionalmente, do

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concurso.
Também na avaliação do desempenho individual, a forma estabelecida - e que eu diria parecer uma forma de modelo de confessionário, em que o funcionário, em processo confidencial, depois da autoavaliação é avaliado pelo seu dirigente -…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Devia ser por quem?!… Pelo seu subordinado?

O Orador: - … pode vir a lesar este princípio da imparcialidade na Administração Pública, porque o "yes chefe", sucedendo a uma admissão por via de contrato individual de trabalho, o que vai criar é o espectro, a possibilidade real e concreta do clientalismo e da partidarização política na Administração Pública, que se supõe ser imparcial.
Esta questão não está resolvida pelas propostas de lei que o Governo aqui nos traz, muito pelo contrário! A filosofia da competitividade com o sector privado que aqui expendeu não se aplica a uma entidade que tem uma natureza completamente diversa da esfera privada e que prossegue objectivos constitucionalmente consagrados, que são verdadeiramente diferentes.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Termino, Sr.ª Presidente.
Sr.ª Ministra, disse-nos o Sr. Primeiro-Ministro que não haveria despedimentos na função pública e diz-nos a sua proposta de lei que haverá despedimentos colectivos na função pública, por extinção de entidade pública e por reestruturação de serviços.
Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, quantas palavras tem o Governo? Diga ao País se há ou não previsão de despedimentos colectivos na função pública, que é isso o que está vertido na proposta governamental.

Vozes do BE: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, numa altura em que discutimos aqui dois diplomas que completam esta fase da reforma da Administração Pública, é importante fazermos um pequeno balanço do que está realmente em causa e do que tem sido feito.
Em primeiro lugar, há que considerar a inevitabilidade desta reforma. O nosso actual modelo de Administração Pública, que vem do século XIX e que está esgotado, sofreu pequenas reformas mas não sofreu nunca as necessárias para adequá-lo aos dias de hoje.
Mas também facilmente perceberíamos que é inevitável fazer esta reforma se fossemos ver o que diz cada um dos intervenientes que com ela lida, se falássemos com o cidadão comum, que olha sempre para a Administração Pública não como uma forma de resolver os seus problemas - e era isso o que deveria fazer -, mas, muitas vezes, como uma forma de criar novos problemas nas suas vidas e novas situações complicadas.
Os funcionários públicos não vêem aí uma forma de facilmente, e com qualidade, se realizarem nas suas vidas, mas vêem muitas vezes, olhando para o lado, que trabalhar ou não trabalhar com qualidade vai dar mais ou menos no mesmo, porque não são essas as regras que definem a sua progressão na carreira e o reconhecimento que lhes é devido.
As empresas nacionais não olham para a Administração Pública como um factor de competitividade, que possa pô-las lá fora, em competição com outros parceiros, numa posição vantajosa. E os investidores estrangeiros, aqueles que poderiam procurar em Portugal novas formas de investimento, também não vêem na nossa Administração Pública uma forma de facilitar esse investimento e essa aproximação ao nosso País.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Então, por que é que não se privatiza o País?!

O Orador: - Portanto, hoje em dia, todos os intervenientes se queixam da forma como funciona a Administração Pública portuguesa. Houve, também por isso, várias comissões, vários grupos de trabalho,

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várias formas de reflectir sobre esta questão, que nunca conseguiram resolver o problema. Há, neste momento, a coragem de assumir que a reforma tem de ser global, e que acaba hoje, exactamente, com os dois diplomas que analisamos, que têm objectivos claros.
Em primeiro lugar, o de assegurar a qualidade do serviço prestado pela Administração Pública, porque só com essa qualidade a Administração Pública poderá ser um factor de competitividade essencial para o nosso país, que está inserido não só numa lógica europeia mas também numa lógica global.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Bem dito!

O Orador: - Mas é preciso saber como queremos atingir essa qualidade, que os nossos objectivos são a modernização dos organismos, introduzindo novas práticas de gestão, mas também, e acima de tudo, qualificando e estimulando os funcionários da Administração Pública portuguesa. E é exactamente aí que devemos fazer incidir a nossa principal preocupação, tendo muito a ver com isso um dos diplomas que hoje aqui aprovamos, o da formação e valorização dos funcionários públicos.
Por isso, Sr.ª Ministra, as duas perguntas que lhe coloco têm a ver exactamente com o seguinte: no que respeita à competitividade, gostava de saber em que medida estas duas propostas vão contribuir, de forma decisiva,…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Vou já terminar, Sr.ª Presidente.
… para que asseguremos esse aumento de competitividade em função de um novo modelo para a Administração Pública. Em segundo lugar, no que respeita ao factor decisivo da qualificação, de que forma a formação vai estar presente para que aqueles que exercem funções na Administração Pública portuguesa não recebam só mais exigência, recebam também mais formação, para que possam responder de uma forma positiva a este desafio?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder ao primeiro conjunto de três pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr.ª Presidente, começarei por responder ao Sr. Deputado Patinha Antão, que levantou questões relacionadas com o novo sistema de avaliação do desempenho na Administração Pública, a sua execução prática e a adequação do Código do Trabalho a determinado tipo de direitos.
Sr. Deputado, reafirmando o que disse há pouco, quero dizer-lhe que tanto o contrato individual de trabalho como o regime de avaliação já existem na Administração Pública, resta saber como funcionam ou como não funcionam. Portanto, neste aspecto não há nada de novo.
No que respeita ao contrato individual, nada dá mais insegurança a quem trabalha do que desconhecer o regime jurídico a que está sujeito e, neste momento, existe o contrato individual de trabalho sem qualquer regime jurídico. Portanto, parece que as pessoas estavam satisfeitas com a insegurança natural que lhes era dada pela inexistência de um regime jurídico.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Isso é nivelamento por baixo!

A Oradora: - Neste momento, esse regime jurídico passa a existir e vai dar, com certeza, mais segurança a quem ao seu abrigo trabalha.
O aspecto fundamental que o Sr. Deputado João Pinho de Almeida levantou tem a ver com mais exigência mas também mais formação.
Sr. Deputado, é evidente que um ponto essencial da reforma é uma aposta grande na formação, para que a exigência feita aos funcionários possa, de alguma forma, ser compensada com essa circunstância.
O Sr. Deputado Luís Fazenda está preocupado, basicamente, com uma ou duas questões que estão muito ligadas à ideia da igualdade de acesso à função pública…

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Penso que "imparcialidade" é a palavra certa!

A Oradora: - … e ao combate ao clientalismo. Quero recordar-lhe que, de entre os diplomas que até já foram aprovados nesta matéria, fomos nós, nesse conjunto de diplomas, que introduzimos pelo

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menos três pontos que não existiam na legislação e que são essenciais para combater aquilo a que o senhor chama de clientalismo. São eles o princípio da limitação dos mandatos dos altos cargos da Administração Pública - fomos nós que o introduzimos -, a proibição de os governos nomearem, em final de mandato, quaisquer novos dirigentes da Administração Pública,…

A Sr.ª Isménia Franco (PSD): - Exactamente!

A Oradora: - … um princípio elementar de combate ao clientalismo, e a própria necessidade de os dirigentes serem avaliados e de os seus mandatos só poderem ser renovados caso a avaliação seja positiva.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, mais isenção do que isto parece-me um pouco improvável, na questão da avaliação.
Por outro lado, o Sr. Deputado disse que deve haver imparcialidade na função pública e eu penso que o Sr. Deputado queria dizer igualdade de acesso, porque imparcialidade na função pública é o exercício da função de forma imparcial. E aí o Sr. Deputado tem o artigo 5.º do decreto-lei que acompanha este diploma, que fala no processo de selecção e na obrigação a concurso.
Mas o que me causa uma certa estranheza na sua dúvida é o facto de os senhores, mais exactamente a oposição, terem levantado contra estes projectos um ponto que tem a ver com a impossibilidade, que nós introduzimos no diploma, da transformação dos contratos com termo em contratos sem termo, e os senhores lutam por isso. Mas isso é a porta escancarada para admitir na Administração Pública pessoas sem concurso!…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Exacto!

A Oradora: - É a porta escancarada!… As pessoas entram contratadas a termo e depois passam a contratos sem termo! E como o contrato sem termo não tem qualquer espécie de limitação de concursos, isso é rigorosamente o contrário daquilo que os senhores têm defendido!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - E somos nós quem introduz essa impossibilidade, ou seja, se um contrato é a termo não passa para contrato sem termo. Para poder entrar em contrato sem termo tem de ter os referentes elementos de concurso.

Aplausos do PSD e do CDS-PP

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fausto Correia.

O Sr. Fausto Correia (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, como é justo e devido, ouvi com atenção a sua intervenção, em que falou em coerência e em objectivos consensuais e não partidários.
Sr.ª Ministra, a coerência é óbvia: este pacote vai no mesmo caminho do anterior, ou seja, ignora os cidadãos e as empresas e combate os funcionários públicos. E o insucesso da reforma está exactamente aí: é que, como é sabido, não os mobiliza os agentes da Administração Pública para potenciar a reforma. E avança aqui, apenas e só, com um pequeno acordo da FESAP (Frente Sindical da Administração Pública) que, como sabe, não é um acordo total e global no que toca à avaliação de desempenho, sobre a classificação de serviço, mas apenas um apoio parcelar a essa mesma proposta de diploma.
Agora, há aqui uma questão que gostaria de colocar à Sr.ª Ministra. Gostaria de saber se fez alguma demarche junto dos partidos que compõem a Assembleia, se houve alguma tentativa por parte do Governo no sentido de discutir estas questões - esta magna questão -, quer no primeiro quer no segundo pacote, ou seja, se falou com os partidos e se avaliou as suas posições relativamente a cada matéria.
Depois, gostaria também de lhe perguntar, Sr.ª Ministra, se vai aplicar este regime de avaliação que agora anuncia às carreiras especiais, aos militares, à justiça, à saúde, entre outras carreiras especiais que podia enumerar. É uma questão fundamental nesta matéria.
A bancada do PSD, há pouco, em consequência de uma reacção da bancada do PS, falou em vergonha.

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Não quero utilizar essa expressão, na exacta medida em que quem esteve mais anos à frente da Administração Pública, em Portugal, foi a Sr.ª Dr.ª Manuela Ferreira Leite, enquanto Secretária de Estado do Orçamento, entre 1985 e 1994. Foi a Secretária de Estado com mais tempo, nove anos, à frente da Administração Pública.
De resto, ainda no que toca à avaliação e ao desempenho, gostaria de dizer que o que se prevê em todo o diploma é reduzir o número das progressões e das promoções, para que seja mais barata a gestão da função pública.
Isto tudo leva-me a chegar também a uma outra conclusão: é que, em matéria de Administração Pública, esta maioria só cumpre o que não prometeu. Gostava de ter visto apresentarem estas propostas todas, a seu tempo, de modo sério e leal, em pré-campanha e em campanha eleitoral.

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é o que faltava!

O Orador: - Por agora, fechava com uma resposta ao Sr. Deputado Patinha Antão, que falou numa obsessão da esquerda radical do Partido Socialista.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Não!

O Orador: - Sr. Deputado, não tenho nenhuma obsessão pela esquerda radical.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Vou já terminar, Sr.ª Presidente.
Não estou aqui de mãos a abanar ou com problemas de consciência.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Eu disse alinhamento!

O Orador: - Não sou obsessivo por coisa alguma. Não tenho, Sr. Deputado, problemas de consciência a esse nível. Garanto-lhe!
Finalmente, quero dizer-lhe que também não tenho, nesta matéria, uma atitude de hipocrisia, na exacta medida em que, dos três diplomas que apresentámos no primeiro pacote, nem uma das medidas que avançámos foi adoptada pelo Governo que o Sr. Dr. apoia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso não é verdade!

O Sr. Fausto Correia (PS): - Diga qual! Qual? Diga!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, o Governo vem apresentar este pacote como uma segunda fase da sua reforma da Administração Pública, mas, em nosso entendimento, há um problema de fundo que marca estas propostas, como, aliás, as anteriores.
Esse problema de fundo reside no não envolvimento e na incapacidade de conseguir dialogar, efectivamente, com os próprios destinatários desta reforma, que terão de ser, em nossa opinião, os trabalhadores da função pública. Temos enorme dificuldade em ver como é que pode ter algum sucesso uma reforma em que não são parceiros e envolvidos os próprios trabalhadores desse sector.
Há coisas aparentemente consensuais, em relação às quais, teoricamente, ninguém tem nada a opor. A necessidade de introduzir uma rotina de avaliação, a necessidade de uma outra cultura de responsabilidade, a necessidade de trabalhar por objectivos são propósitos que todos, julgo, subscreverão. Agora, não faz sentido que, implícito a esses propósitos, aquilo que se procure - e, no fundo, acaba por ser essa a leitura política destas reformas - seja tornar precário, inseguro e instável um sector que a prazo, tal qual as propostas aparecem, estará condenado a gerar desemprego e enorme exclusão em relação a muitas das pessoas.
Há, no entanto, Sr.ª Ministra, uma questão em concreto que gostaria de lhe colocar. Normalmente, quando se fala na burocracia dos serviços, na pouca capacidade de concretização, na incapacidade de

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atingir objectivos, colocam-se sempre como suspeitos os trabalhadores. Curiosamente, este sistema de avaliação pensa em funcionários e em dirigentes intermédios mas, pura e simplesmente, não pensa nos dirigentes de topo.
Pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, como é que entende, tão curiosamente, que quem está no topo tem qualificações tão grandes que está imune e, pura e simplesmente, se pode dispensar de ser avaliado pelos seus subordinados em relação à sua capacidade, ou não, de funcionar por objectivos? Esta é a primeira pergunta.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr.ª Deputada, o seu tempo terminou. Conclua, por favor.

A Oradora: - Gostaria ainda de saber que sentido faz considerar um sistema que permite promoções e avaliação extraordinária independentemente de concurso. Este é um sistema transparente ou é um sistema que favorece o clientelismo?

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Andrade Miranda.

O Sr. Carlos Andrade Miranda (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, esta proposta de lei da criação de um sistema integrado de avaliação do desempenho da função pública é, efectivamente, um bom presente de Ano Novo para o País e, sobretudo, para os funcionários públicos portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Sr.ª Ministra, aquilo para que me permitiria chamar a atenção é que este novo sistema de avaliação de desempenho é, efectivamente, um acto de grande coragem do Governo, na medida em que se sabe que, como V. Ex.ª ressaltou na sua intervenção, vai expor ao País a radiografia dos pontos fortes e dos pontos fracos da nossa Administração Pública. É, quanto a mim, esse grau de transparência que faz a oposição rebelar-se em relação ao diploma que nos é proposto neste momento, pois pretendem evitar que essa transparência ocorra.
Mas este diploma tem ainda uma novidade, que não existia no nosso ordenamento jurídico, que tem a ver com o facto de ser um sistema integrado em que a avaliação dos serviços, dos dirigentes intermédios e dos funcionários ocorrerá em paralelo. E tem ainda uma outra vantagem, que decorre da realização do princípio elementar na gestão e nos sistemas de gestão de recursos humanos, que é atrair, manter e desenvolver os colaboradores, os trabalhadores que trabalham nas organizações.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Ora, é precisamente sobre esta nota de registo fundamental neste diploma que gostaria de ouvir V. Ex.ª. Gostaria de ouvir o desenvolvimento do seu pensamento quanto ao facto de, neste diploma, a questão da classificação individual dos funcionários e dos trabalhadores da função pública não ser, sequer, a nota marcante, sendo mesmo, a meu ver (e perdoe-me, se estiver enganado), quase um assunto secundário, na medida em que a repercussão da classificação dos funcionários é mínima na sua carreira e no seu futuro.
Aquilo que ressalta deste diploma - e V. Ex.ª me dirá se é assim ou não - é o desenvolvimento das capacidades das pessoas e da qualidade dos serviços. É assim, ou não, Sr.ª Ministra?
Era isso que gostaria que V. Ex.ª nos esclarecesse.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Fausto Correia, sendo uma pessoa conhecedora destas matérias, que durante algum tempo esteve ligada a estas tarefas, deve ter, com certeza, subscrito muitas das medidas que foram tomadas pelo seu governo nesta área.
Sr. Deputado, o ponto central que levantou tem a ver com a ideia de que é necessário um consenso nesta matéria e que os partidos deveriam ter sido mais envolvidos nesta discussão. Estamos os dois completamente de acordo, Sr. Deputado: estas propostas de reforma que hoje discutimos mereciam e merecem

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o consenso pelo menos dos dois partidos alternativos no poder, para que, de alguma forma, ficasse subjacente a ideia de uma continuidade que era desejável manter, já que se tratam de leis enquadradoras.
Por esse motivo, e isso é público - não estou aqui, neste momento, a denunciar nenhum facto que não seja público -, o Sr. Primeiro-Ministro, num encontro que teve com o líder do seu partido sobre esta reforma, mostrou abertura por parte dos partidos que neste momento integram a coligação para dialogar e chegar a um consenso em matérias sobre a Administração Pública. Provavelmente, sabe o Sr. Deputado Fausto Correia melhor do que eu qual foi o seguimento dado a essa proposta feita pelo Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Não! Quem sabe melhor é a Sr.ª Ministra!

A Oradora: - O Sr. Deputado diz também que não eram públicas as intenções do Governo nesta matéria. Julgo que o Sr. Deputado deve ter lido não só o programa eleitoral como o Programa do Governo onde pode ver aquilo que dizíamos sobre a reforma da Administração Pública e, nomeadamente, sobre o contrato individual de trabalho.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Contudo, também acredito que, sobre o contrato individual de trabalho, o Partido Socialista não tivesse grandes coisas a dizer. Vou só citar-lhe uma frase que os senhores escreveram num diploma que foi por vós publicado, que diz, relativamente a determinado serviço: "(…) optou-se pela adopção do regime do contrato individual de trabalho como quadro normativo de aplicação geral, e consequentemente por um estatuto de carreiras profissionais de natureza privatística, por se considerar ser tal regime o mais consentâneo com as elevadas qualificações técnicas e profissionais dos recursos humanos, (…) para a adequada prossecução das suas atribuições e competências,…"

O Sr. Fausto Correia (PS): - Claro!

A Oradora: - "… e ainda por ser tal regime aquele que permitirá aproximar as condições de trabalho do pessoal deste instituto daquelas que para outras profissões vigoram nas principais empresas do sector".
Portanto, foram os senhores que escreveram isto num diploma feito por vós! O que significa também que, quando falamos do contrato individual de trabalho, não estamos rigorosamente a dizer nada de novo. Já existe, é subscrito por todos. O que não havia, Sr. Deputado, era uma legislação enquadradora desta regra.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, acredito que os senhores não tenham grandes argumentos para poder contrariar a existência de contrato individual de trabalho, que já existe na Administração Pública e que, neste momento, passa a dar segurança aos trabalhadores, que não a tinham até à data, porque não estavam enquadrados.
Sr.ª Deputada Isabel Castro, peço desculpa por lhe dizer isto, mas, com o seu tipo de afirmações, não contribui para a tranquilidade que deve existir em relação aos funcionários públicos. A Sr.ª Deputada, através da existência do contrato individual de trabalho, tenta arranjar um "papão" e dizer: "Agora os funcionários podem ser despedidos". Sr.ª Deputada, se existe, esse "papão" a que se refere já existia e nunca vi a Sr.ª Deputada falar sobre isso!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Estava tranquila, quando havia um papão encapotado!
Sr.ª Deputada, estamos a regular uma forma de contratar pessoas e não uma forma de despedir pessoas. O contrato individual de trabalho é uma forma de dar trabalho às pessoas e não uma forma de as despedir!
Portanto, Sr.ª Deputada, é disso que estamos a tratar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto à promoção por mérito excepcional, apenas quero recordar-lhe que já está consagrada na lei

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desde 1989. Portanto, neste aspecto, não houve qualquer contribuição da nossa parte.
Quanto à avaliação dos directores-gerais, vai passar a existir através da análise dos serviços, verificando se cumpriram ou não os respectivos objectivos. Se um serviço não cumprir os seus objectivos, é óbvio que o responsável é o director-geral.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Onde é que isso está escrito na lei?

A Oradora: - Passo à questão de premiar o mérito e dar motivação aos funcionários.
Sr.ª Deputada, faço parte das pessoas que consideram que a grande maioria dos funcionários públicos tem muito mérito, trabalha com muita dedicação e que os mesmos, com certeza, não aceitam de bom grado que o seu trabalho seja tão reconhecido quanto o daqueles que efectivamente não trabalham.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, estamos a trabalhar para a grande maioria dos funcionários públicos e não para pôr todos em situação de igualdade, como a Sr.ª Deputada pretende. Isso nós recusamos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roque.

O Sr. Pedro Roque (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: No contexto da reforma da Administração Pública que o XV Governo Constitucional tem vindo a empreender na prossecução do seu Programa, é presente ao Parlamento, para debate na generalidade, a proposta de lei n.º 100/IX, para a definição do regime jurídico do contrato individual de trabalho na Administração Pública.
Tal proposta constitui, aliás, um dos aspectos fulcrais dessa reforma, porventura polémico, porque alguns tudo têm feito para a denegrir e para desvalorizar o papel importantíssimo reservado aos trabalhadores do sector público no seio de uma administração moderna que se constitua como um factor de desenvolvimento económico, social e cultural de Portugal e que, para os seus cidadãos, se reflicta em menos burocracia e mais efectividade na prestação de serviços públicos.
Convirá que todos os que exercem responsabilidades políticas nunca percam de vista a indelével premissa de que a Administração Pública só existe porque os cidadãos existem e, paralelamente, que o factor humano é o principal activo de uma organização e a Administração Pública não é excepção.
Trata-se de dar corpo legislativo a uma reforma que, nos últimos anos, constituiu um tema recorrente no discurso político e que mobilizou tanta retórica, demasiada promessa, inúmeros diagnósticos e estudos e muita medida casuística e avulsa, mas que, no plano concreto da realização, nunca se efectivou, já que, aliada à falta de ousadia política, sempre faltou urna visão estratégica única e integrada.
Encontramo-nos já em pleno século XXI. Quase tudo mudou em Portugal, na Europa e no mundo. Só a nossa Administração Pública continua teimosamente com a mesma estrutura e, basicamente, com o mesmo modelo e as mesmas regras que vêm do século XIX, que sobreviveram, se consolidaram e cristalizaram durante as décadas do Estado Novo e que, se nada fosse feito, se perpetuariam com claro prejuízo para todos os portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Desde há muito que se vem admitindo a opção pelo contrato de trabalho como alternativa ao regime da função pública, para enquadrar o trabalho subordinado na administração directa do Estado em funções que não impliquem o exercício de poderes de autoridade ou de soberania nacionais.
A modernização e a flexibilização da Administração Pública impõem novas formas de gestão e de recrutamento dos recursos humanos. Em paralelo, uma Administração Pública moderna, eficiente e rápida a decidir estimula e motiva o trabalhador, dá-lhe outra realização pessoal e profissional, confere-lhe um estatuto de maior prestígio, respeito e credibilidade.
Assim sendo, o contrato de trabalho constitui um importante instrumento na prossecução desse desiderato, desde que utilizado nas situações em que possa configurar-se como uma alternativa adequada ao regime de trabalho da função pública e igualmente apto à prossecução do interesse público.
Admitir, como algumas vozes adversas a esta reforma, que este regime jurídico do contrato individual

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de trabalho na Administração Pública cria insegurança ou "leva à precarização dos trabalhadores" seria admitir, paradoxalmente, que aqueles que não trabalham para o Estado, ou seja, os trabalhadores do sector privado, cujas relações laborais se encontram reguladas pelo Código do Trabalho, são uma espécie de "filhos de um deus menor" no contexto socio-laboral em Portugal, face ao universo dos trabalhadores da Administração Pública. Rejeitamos liminarmente essa ideia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sem embargo, a utilização do contrato de trabalho na Administração Pública implica especificidades decorrentes do interesse público do empregador Estado, pelo que importa adaptar as normas constantes do Código do Trabalho (Lei n.° 99/2003, de 27 de Agosto) a esta realidade incontornável, o que, de resto, já estava previsto no artigo 5.º do referido diploma, assim como conformá-lo ao regime da função pública, constante do artigo 269.° da Constituição. É esse o objectivo primordial da proposta de lei n.º 100/IX ora em debate.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Roque, disse o líder do seu partido, e Primeiro-Ministro, tranquilizando o mundo da Administração Pública, que, apesar da reforma da Administração Pública, não haveria despedimentos.
Assim, insisto: relativamente aos artigos 17.º e 18.º da proposta de lei em discussão, sobre o contrato individual de trabalho e previsão da figura do despedimento colectivo em inúmeras situações e com uma latitude e uma abstracção enormes para que tal se verifique, em que ficamos, Sr. Deputado? Há ou não despedimentos?
O que foi dito na mensagem de Natal do Primeiro-Ministro é uma coisa, o que está na proposta de lei parece ser outra. Quererá o Sr. Deputado esclarecer-nos?

Vozes do BE: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roque.

O Sr. Pedro Roque (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, o que foi dito pelo Primeiro-Ministro, e é público, é que não haverá despedimentos na função pública, o que tem toda a razão de ser porque os funcionários públicos não são passíveis de despedimento.
O que V. Ex.ª refere tem a ver com os artigos da proposta de lei que invocou e a resposta é simples. No fundo, é aplicar o regime do Código do Trabalho, que é o que vale para a generalidade dos trabalhadores portugueses, e, portanto, também para a Administração Pública, sem qualquer tipo de diferença.

Vozes do BE: - Então?! Como é?

O Orador: - Com a introdução, na Administração Pública, do contrato individual de trabalho passará a não existir qualquer diferença entre um trabalhador do sector privado e um outro da Administração Pública portuguesa.

Vozes do PCP: - Aí está!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Discutem-se hoje mais duas iniciativas legislativas no âmbito da reforma da Administração Pública que, em boa hora, o Governo estabeleceu como uma verdadeira prioridade.
Todos os especialistas, todos os investidores nacionais, mas também estrangeiros, todos os cidadãos que diariamente têm de recorrer à Administração Pública reclamam há muitos anos reformas urgentes.
A Administração Pública que temos é pesada, é burocratizada até ao limite, é lenta, muitas vezes é ineficaz e tudo isto vem sendo apontado como um dos principais entraves ao nosso desenvolvimento, ao

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desenvolvimento que a esquerda, quando lhe convém, tantas vezes invoca. Por isso também sucessivos foram os governos que declararam a necessidade da urgente reforma da Administração Pública. Todavia, foi o Governo desta maioria o primeiro que está a levar a cabo tal reforma.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Trata-se de uma reforma que é feita a pensar nos portugueses mas também em favor dos investidores, como instrumento fundamental para o nosso desenvolvimento e, ainda, como é óbvio, a pensar nos próprios trabalhadores da Administração Pública.
Esta não é uma reforma contra os trabalhadores da Administração Pública,…

Vozes do PCP: - Não!…

O Orador: - … como alguns, poucos, cujos rostos já quase conhecemos e manifestamente instrumentalizados pelo PCP, querem fazer crer à população portuguesa.

Risos do PCP.

Por isso, não serão manifestações de carácter político realizadas lá fora ou, às vezes, até dentro do Plenário, diga-se que contra as regras regimentais, que nos farão mudar de opinião.
É que sabemos que o grosso dos trabalhadores da Administração Pública em Portugal, eles próprios afectados todos os dias pela ineficácia dessa mesma Administração, aqueles a quem os cidadãos apontam o dedo quando são mal servidos, são os primeiros a desejar, a reclamar esta reforma.

O Sr. António Filipe (PCP): - Até vai haver uma manifestação a exigir a reforma!

O Orador: - Por muito que custe ao Deputado António Filipe, que está excessivamente nervoso ao ponto de eu próprio quase não conseguir ouvir-me, sabemos que sem aqueles trabalhadores esta reforma será difícil. Mas sabemos também que, para esta reforma, o Governo contará com o apoio dos trabalhadores. Porquê? Porque temos uma Administração pensada para o início do século XX, que, claramente, não está capaz de fazer face às exigências da modernidade e que penaliza, em primeira linha, os trabalhadores.
Perante a ineficácia da máquina, para muitos cidadãos, para muitos investidores, para muitos empresários, a culpa vai quase sempre, injustamente, para os trabalhadores que os atendem.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Mas esses trabalhadores não são culpados de uma deficiência que é do sistema e que os estigmatiza.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Portanto, com esta reforma pretende-se beneficiar os trabalhadores.
Por isso, os trabalhadores da Administração Pública têm de ser eles próprios instrumentos da reforma - e assim esperamos e temos a certeza que sucederá -, beneficiando de uma legislação que é nova mas protagonizando essa reforma no contacto com todos os sectores da população. É que é daí que vêm as queixas, dada a incapacidade de satisfazer de forma eficiente as necessidades dos cidadãos, pelo facto de os processos de decisão serem demasiado longos e complexos, impedindo a resolução em tempo útil de muitos problemas que exigem resolução urgente, pela desmotivação dos funcionários, pela própria desvalorização do conceito de missão do serviço público. É que o actual modelo esgotou-se.
É importante sublinhar que esta reforma tem uma influência directa ou indirecta em muitas outras reformas sectoriais que o Governo tem vindo a desenvolver. O País precisa de uma nova Administração Pública com qualidade e em condições de gerar competitividade.
Será assim com o contrato individual de trabalho que hoje se discute, e que o Deputado Luís Fazenda manifestamente não compreendeu, porventura também por deficiência de formação, já que, como não é jurista, não se lhe exige que compreenda mais do que o permite a leitura apressada do diploma, mas igualmente no que diz respeito ao novo sistema de avaliação.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Tenha juízo! Que falta de chá!

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O Orador: - A este propósito, relembro ao Partido Socialista um muito curioso artigo de opinião, escrito pelo ex-Deputado João Carlos da Silva, que foi Presidente do Conselho de Administração da RTP e que, portanto, conhece a fundo a Administração Pública, no qual retratava o caricato - e ele próprio é um socialista que, hoje, certamente alinhará com o Governo quanto a esta reforma que discutimos. Falava ele de um trabalhador da Administração Pública que, tendo sido avaliado com a nota de 8, de uma escala que vai de 1 a 10, participou criminalmente contra o avaliador - pasme-se! - por entender que, na base dessa avaliação, estava a ser difamado. Como vêem, Srs. Deputados, chegamos a isto! E porquê? Porque o dito sistema de avaliação, que o PCP reclama que existe, é uma fraude na verdadeira acepção da palavra, é uma aparência de avaliação, é um pró-forma que se cumpre na expectativa de a todos satisfazer mas que, na realidade, não avalia coisa nenhuma.

Aplausos do CDS-PP.

Assim, com estes dois diplomas que hoje se discutem, dar-se-ão dois importantíssimos passos no sentido da reforma da Administração Pública. Votá-los-emos favoravelmente porque estamos com a modernidade e com o desenvolvimento do nosso país. Certamente que quem votar contra estes diplomas estará com o passado, estará com a Administração do século XIX, mesmo que tal muito custe ao meu amigo, Deputado Fausto Correia, o qual tenho a certeza que, no seu íntimo, concorda com esta reforma,…

O Sr. Fausto Correia (PS): - Não, não!

O Orador: - … mas, hoje, está obrigado a desempenhar este triste papel em favor dos interesse inconfessados do Partido Socialista.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Há dois dias atrás, o Presidente da República promulgou a lei PSD/CDS-PP que altera o regime das aposentações na Administração Pública e elimina justas expectativas e garantias a milhares de trabalhadores.
O PS avançou sozinho com o pedido de fiscalização sucessiva da lei. Tal acto não tem efeitos suspensivos em relação à mesma, mas fica o registo político para o futuro que há-de vir.
Daqui a poucos dias, os trabalhadores deste sector vão conhecer a proposta salarial do Governo, já precedida pelos avisos da Ministra das Finanças para se conformarem com a continuação da desvalorização dos seus salários.
É neste quadro que apreciamos hoje mais duas peças desta ofensiva sem precedentes contra os direitos dos trabalhadores da Administração Pública, ofensiva que tem um programa, um calendário, uma lógica submetidos ao objectivo supremo de destruição do conceito e do papel do Estado, consagrado na Constituição da República, numa linha de privatização de serviços públicos e funções sociais em articulação com a privatização e a precarização dos vínculos laborais, do ataque ao regime das aposentações e aos salários.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo PSD/CDS-PP, a coberto da real necessidade de modernizar, democratizar e desburocratizar a Administração Pública, sustentado no capital de queixa das entidades e populações que recorrem à Administração Pública, erigiu os trabalhadores como os principais responsáveis da situação, para os isolar da opinião pública e dos trabalhadores do sector privado.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Com o risco de termos razão antes de tempo, esta opção privatizadora, esta receita inspirada nas teses de um neoliberalismo retrógrado, visa arredar o Estado do seu papel nas áreas da segurança social, da saúde e do ensino, ou, noutro plano, dos resíduos sólidos, da água e das florestas, segurando

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com rigidez as áreas da autoridade e da justiça.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Ou seja: menos e pior Estado para os trabalhadores e cidadãos em geral, mais e melhor Estado para o grande capital privado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E, no entanto, estamos hoje tão-só a discutir as propostas sobre o contrato individual de trabalho e um novo sistema de avaliação. O Governo, colocando a Assembleia da República a trabalhar à peça, foge à caracterização do todo.
Simultaneamente, quando os trabalhadores estão a tentar responder a uma questão, já estão a ser confrontados com outra. Julga o Governo que, assim, pode impedir a acção, a convergência, a luta e a consciencialização dos trabalhadores perante os perigos que se lhe ocorrem.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Ainda assim, sobre o contrato individual de trabalho, o Governo não se limita a aplicar os normativos contidos no recente e incompleto Código do Trabalho; quer piorar o regime, quando comparado com o sector privado.
A saber: submete estes trabalhadores não só aos deveres gerais do Código do Trabalho como também ao regime de incompatibilidades do funcionalismo público; exige, com carácter imperativo e claramente inconstitucional, a articulação entre convenções colectivas nacionais e sectoriais; impõe que a contratação por tempo indeterminado, ou seja, o contrato sem prazo, só seja possível se existir um quadro de pessoal para esse efeito, imposição inexistente no direito laboral privado e inevitavelmente conducente a proliferação da precariedade; incorrem na inconstitucionalidade alguns dos fundamentos para o despedimento colectivo previstos na proposta, tal como é inaceitável a figura da cedência ocasional e o lay-of (leia, Sr.ª Ministra, leia os fundamentos e verifique que razões de mercado podem levar ao despedimento na Administração Pública em relação a estes trabalhadores com contrato individual de trabalho!); visa também a desregulamentação e o aumento do horário de trabalho e propõe, sem nenhuma sustentabilidade, a retroactividade da lei.
O Governo tem vindo a proclamar aos trabalhadores da Administração Pública que não se preocupem com tal ou tal proposta, porque não é para eles mas para os que hão-de entrar, para os jovens, para o futuro. Nem que fosse tão-só por razões de solidariedade geracional e de classe, haveria que dar combate a estas malfeitorias!

Aplausos do PCP.

Mas mesmo os trabalhadores actuais conhecem a lei dos supranumerários, sabem o que podem significar os processos de reestruturação, extinção e fusão de serviços, incorrendo na pressão e na chantagem que os leve a assumir também o contrato individual de trabalho.
Por último, tendo em conta que a proposta transforma o contrato individual como regra geral para todas as áreas, salvo nas da justiça, da segurança e dos órgãos de soberania, e olhando para os mecanismos de admissão, apetece citar o Deputado, ausente, Telmo Correia, quando aqui, há pouco mais de dois anos, afirmava que "um regime de função pública nada prestigiado tem ao lado um contrato individual de trabalho que é um regime de cartão partidário e de emprego político". É isso, mas é muito mais do que isso! O que aqui estamos a tratar é da contradição e do conflito insanável entre quem, como o PSD e o CDS-PP, tem uma visão instrumental do direito do trabalho e quem, como nós, defende o trabalho com direitos.
Quanto ao sistema de avaliações, a proposta não pode ser dissociada de outra proposta aqui discutida e votada que tratava do estatuto do pessoal dirigente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O que se propõe é a acentuação do favoritismo e da partidarização, um cutelo permanente levantado por um avaliador que não é avaliado, onde a confidencialidade é a alma do negócio.
Pode discutir-se muito sobre critérios de avaliação, mas não lembrava ao diabo (e, com certeza, nem à Sr.ª Ministra Ferreira Leite) o critério da quota, que, seja em que situação for, o chefe não pode ultrapassar,

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ainda que haja trabalhadores com méritos provados.
E, agora, imaginemos se o chefe fosse, por exemplo, o Sr. Deputado Patinha Antão: com certeza, na quota dos excelentes, só contariam os amigos, aqueles que demonstrassem, por critérios partidários, que estariam ao serviço da causa.

Risos do PCP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O que hoje se está aqui a passar é mais uma etapa, mais um passo na escalada contra o Estado democrático, que arrasta consigo os direitos e a dignidade dos trabalhadores da função pública.
Com o seu determinismo, o Governo não vai querer reconsiderar, tão apressado está nos seus objectivos estratégico; enfrentará a determinação dos trabalhadores, mesmo daqueles que porventura acreditaram que o PSD (particularmente o PSD) ia encetar uma reforma da Administração Pública e não um ataque aos trabalhadores da Administração Pública.
Pode, hoje, dar mais um passo. Há que impedir que faça muito caminho. Há que promover uma reforma que tenha como matriz o projecto constitucional, como participantes activos os trabalhadores e as suas organizações representativas, como protagonistas as forças políticas que defendem um Estado democrático, responsabilizado na sua tarefa de promoção de justiça social, de progresso e de modernidade.
Para isto, estará o PCP disponível. Tão disponível como convicto de um não, claro e combativo, a estas injustas propostas.
E, Sr. Deputado do CDS-PP, olhe que não são só os trabalhadores comunistas que estão contra esta vossa ofensiva, são muitos e muitos mais, que, um dia, também no plano das eleições, vos hão-de levar à derrota.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para exercer o direito de defesa da sua honra, o Sr. Deputado Patinha Antão, a quem darei a palavra no momento oportuno, e, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, o Sr. Deputado acredita mesmo, com essa força que da tribuna nos quis transmitir, que tudo vai bem na Administração Pública, em Portugal?!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não ouviu?! Não ouviu nada?!

O Orador: - O Sr. Deputado acha mesmo que o nosso país não é penalizado todos os dias pela forma como a Administração Pública funciona, em Portugal? E isto, não por culpa dos trabalhadores, a quem o Sr. Deputado se quer colar, criando a aparência ilusória de que neste diploma se trabalha contra eles.

O Sr. Honório Novo (PCP): - É, é!

O Orador: - O Sr. Deputado acha que essa Administração não penaliza o nosso país? O Sr. Deputado acha mesmo que os cidadãos, de entre os quais muitos trabalhadores que não apenas os da Administração Pública mas todos os outros (e a maior parte do País é composta por trabalhadores) - e, de resto, Sr. Deputado, se todos os trabalhadores votassem no PCP, o PCP ganhava as eleições com maioria absoluta, o que demonstra bem que o PCP não é o único partido que representa os trabalhadores -, que todos os dias se deslocam aos mais diversos sectores da Administração Pública não são penalizados por essa mesma Administração Pública? O mesmo se diga dos empresários, dos investidores, nacionais e estrangeiros, e de todos os demais.
O Sr. Deputado acredita mesmo que é motivador para um trabalhador da Administração Pública, que todos os dias se levanta cedo e todos os dias dá o máximo no desempenho das suas funções, saber que ao lado há um trabalhador que nada faz, ou é preguiçoso, ou está ali por "frete", e que, no final, vai ser avaliado exactamente da mesma forma e com a mesma nota?
O Sr. Deputado acha mesmo que isso beneficia a Administração Pública e, logicamente, o nosso país, a nossa economia e o nosso desenvolvimento?

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Tenho a certeza que não, mas, de todo o modo, o Sr. Deputado terá agora a oportunidade de, em mais um exercício de retórica, tentar explicar por que assim não é.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Isso é que não é!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, efectivamente, disse na minha intervenção que existe um capital de queixa em relação ao funcionamento da Administração Pública. Naturalmente, consideramos ser necessário democratizar, modernizar e desburocratizar a Administração Pública, afirmei-o na minha intervenção.
A grande diferença é que nós consideramos que os principais responsáveis pela situação, hoje, "passaram como cão por vinha vindimada", criando uma dinâmica em que os trabalhadores da Administração Pública aparecem como bodes expiatórios, como uma casta de privilegiados - aliás, referiu-o na sua intervenção -, procurando fazer um nivelamento por baixo em relação aos trabalhadores do sector privado. O que os senhores e, designadamente, o Governo pretendem com esta proposta nem sequer é um nivelamento por baixo, é, sim, pôr ainda mais abaixo, relativamente ao sector privado, este nível do contrato individual de trabalho.
Ora, nós, que continuamos a considerar que é possível fazer mais e melhor na Administração Pública, estamos em total desacordo com esta proposta. E o que nos separa é o facto de os senhores quererem entregar as partes rentáveis, aquilo que interessa, ao capital, ao sector privado, enquanto que nós consideramos que uma reforma da Administração Pública pressupõe o respeito pela matriz constitucional e pelos direitos dos trabalhadores.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Penedos.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A instituição de um regime jurídico do contrato individual de trabalho e a definição de um sistema de avaliação de desempenho aplicáveis à Administração Pública assumem reconhecida importância no quadro da gestão da Administração Pública.
A reforma da Administração Pública exige, sempre o afirmámos, que se avance para modelos desburocratizados e mais flexíveis de gestão, o que passa pela diversificação de vínculos laborais adaptáveis às necessidades dos serviços e pela criação de mecanismos que permitam uma efectiva responsabilização de funcionários, dirigentes e organismos da Administração Pública.
No plano dos princípios que devem enformar uma Administração Pública mais eficiente, transparente e moderna, não somos contra, sublinho, não somos contra a aplicação à Administração Pública, em determinadas circunstâncias, de modalidades contratuais centradas na figura do contrato individual de trabalho, nem contra a instituição de modelos de avaliação de desempenho assentes na responsabilização, na dignificação e na qualificação dos serviços e dos trabalhadores da Administração Pública.
Porém, deste modelo que nos é presente pelo Governo e da sua aprovação resultará uma maior precarização e degradação dos vínculos laborais no seio da Administração Pública, a partidarização e instrumentalização inaceitáveis da máquina administrativa e, consequentemente, a desmotivação profissional e a desmoralização dos trabalhadores.
A reforma da Administração Pública só deve ser feita se tiver como pano de fundo a melhoria do serviço público, mas sempre com respeito pelos direitos dos trabalhadores.
Este Governo não é de confiança! Anunciou, com pompa e circunstância, uma reforma da Administração Pública que, sob o ponto de vista dos objectivos enunciados, mereceu concordância generalizada dos portugueses. Materializou essa reforma com iniciativas avulsas e parcelares, desprovidas de conteúdo útil para uma efectiva modernização da Administração Pública.
Em todas as propostas do Governo, existe um traço comum: os responsáveis pela falta de eficiência na Administração Pública e noutros sectores de actividade são os trabalhadores!
Este Governo não nos merece confiança! A sua prática tem sido a de iludir os problemas e afastar os agentes políticos e sociais das soluções colectivas indispensáveis ao mais amplo consenso político e social.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A discussão que travamos hoje não é a de saber se, pelo menos em alguns casos, é ou não justificável que possam existir na Administração Pública contratos de trabalho semelhantes ou equiparados aos aplicáveis no sector privado.

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Aliás, a coabitação entre várias modalidades contratuais, ou seja, a nomeação, os contratos administrativos de provimento e os contratos individuais de trabalho, é uma realidade presente em alguns sectores da Administração Pública, como é o caso dos institutos públicos.
Admitimos, pois, como possível e adequado, em determinadas situações, estender à Administração Pública, com as necessárias adaptações, o modelo do contrato individual de trabalho que vigora para o sector empresarial privado.
Contudo, tal opção desaconselha em absoluto o modelo e as soluções adoptadas pelo Governo.
De facto, o que ali se propõe, para conviver com relações de emprego público, inclusive dentro de uma mesma unidade organizativa da Administração Pública, é um modelo degradado e precarizado de contrato individual de trabalho, modelo que nem o Código do Trabalho tem como admissível para as empresas privadas.
O mínimo que se pode exigir a quem aprovou um Código do Trabalho é que siga as soluções nele plasmadas.
Não existem razões objectivas que justifiquem, no quadro da Administração Pública, a opção pela generalização do recurso ao contrato individual de trabalho e, muito menos ainda, que tal modalidade contratual assente num modelo mais gravoso e degradado que o aplicável ao sector privado.
Com esta proposta de lei, o Governo e os partidos que o apoiam fazem do Estado o pior de todos os empregadores!
Com esta proposta de lei, o Governo e os partidos que o apoiam querem que o Estado imponha a "lei da selva" nas relações de trabalho, pondo em causa a qualidade e a segurança do emprego dos trabalhadores da Administração Pública.
Com esta proposta de lei, o Governo e os partidos que o apoiam consagram a nulidade dos contratos de trabalho sem termo, sempre que os seus requisitos não sejam respeitados pelo empregador, ou seja, pelo Estado.
Com esta proposta de lei, o Governo e os partidos que o apoiam instituem a nulidade do contrato de trabalho sem termo, no caso de não haver redução a escrito ou por falta de certas menções no contrato, o que se revela de igual modo muito injusto, desigual e contrário à lei em vigor para a generalidade dos trabalhadores.
Com esta proposta de lei, querem proibir em absoluto a conversão dos contratos a termo em contratos sem termo.
Com esta proposta de lei, querem, ainda, consagrar a nulidade dos contratos a termo em razão do incumprimento de certas normas, o que contraria flagrantemente o princípio da segurança no emprego previsto na Constituição da República Portuguesa e impõe um regime mais gravoso que o previsto no próprio Código do Trabalho.
Com esta proposta de lei, permitem a cedência ocasional de trabalhadores, independentemente de convenção colectiva e, em alguns casos, mesmo sem a anuência do trabalhador.
Com esta proposta de lei, querem também abranger os trabalhadores da Administração Pública pelo regime jurídico do lay-off, como se o Estado fosse uma mera empresa que vê no lucro e na rentabilidade económica a sua única finalidade.
Com esta proposta de lei, introduzem nas relações de trabalho da Administração Pública a figura do despedimento colectivo, nos termos previstos no Código do Trabalho. Não há a menor ponderação sobre se as razões previstas no Código - motivos de mercado, motivos estruturais e motivos tecnológicos - são passíveis de vir a ser aplicadas à Administração Pública.
O Sr. Primeiro-Ministro pode fazer as declarações piedosas que entender sobre a intenção de não proceder a despedimentos na Administração Pública. A verdade é bem diferente! A possibilidade de despedir está, de forma clara e inequívoca, materializada na proposta de lei em discussão!
A todos estes malefícios, Sr.as e Srs. Deputados, dizemos não!
Não contem com o Partido Socialista para pactuar com a consagração de soluções ainda mais gravosas do que as previstas no Código do Trabalho. Não contem com o Partido Socialista para soluções que irão penalizar fortemente os trabalhadores da Administração Pública, porque são discriminatórias, e muito menos para soluções que tão-pouco contribuirão para a melhoria da eficácia e eficiência do serviço público, Sr. Deputado Nuno Melo.
A opção seguida nesta proposta de lei é incoerente com a filosofia que o próprio Governo adoptou no Código do Trabalho: não está devidamente fundamentada em especificidades da Administração Pública; degrada direitos individuais e colectivos dos trabalhadores e não dignifica os autores da iniciativa, que deveriam aplicar a si mesmos um maior grau de exigência; põe em causa direitos constitucionalmente protegidos de todos os trabalhadores portugueses; e, a ser aprovada, constituirá um foco adicional de tensões e não melhora as expectativas quanto aos necessários ganhos de efectividade da Administração Pública.

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É, por todas estas razões, uma proposta de lei globalmente inaceitável.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: No que concerne à proposta de lei n.º 101/IX, que visa instituir o sistema integrado de avaliação do desempenho da Administração Pública, importa sublinhar que a existência de mecanismos que permitam tal desiderato se afigura imprescindível, do ponto de vista quer da responsabilização e da dignificação dos trabalhadores, quer da melhoria efectiva da eficiência dos serviços.
O Partido Socialista sempre se manifestou favorável à incrementação de um modelo de avaliação para a Administração Pública que pudesse concorrer para a sua credibilização e eficácia e ser conforme aos interesses do País.
O modelo de avaliação que defendemos e queremos para a Administração Pública assenta em princípios de transparência, rigor, justiça, simplificação e participação e co-responsabilização dos seus interessados, como, aliás, acontece na vizinha Espanha, que VV. Ex.as tanto gostam de citar.
Contudo, também neste domínio, o Governo trilha caminhos sinuosos, apostando num modelo de avaliação caracterizado por uma forte complexidade, indefinição e opacidade, abrindo a porta, por esta via, à discricionariedade e à instrumentalização da gestão das carreiras.
Com efeito, a proposta de lei em apreço avança para um modelo de avaliação do desempenho centrado na fixação de objectivos a atingir pelos serviços, nas competências comportamentais dos trabalhadores, bem como na sua atitude pessoal e na sua auto-avaliação, sem materializar tais conceitos e sem explicitar em concreto os mecanismos e procedimentos para os atingir.
Da exposição de motivos da proposta de lei, fica-se com a ilusão de que os objectivos do Governo são nobres, dado que o modelo proposto, diz-se, "(…) tem como objectivo fundamental a promoção da pessoa humana e do seu desenvolvimento integral em liberdade, bem como contribuir para a concretização dos seus direitos consagrados na Constituição (…)".
No entanto, o conteúdo da referida proposta de lei, bem como do projecto de diploma regulamentar que já é conhecido, não espelha os princípios que o Governo diz defender.
Afirma-se que a transparência será um dos grandes objectivos a atingir. Esquecem, contudo, que, ao conferir um carácter de confidencialidade ao sistema de avaliação, escondem as classificações e impedem que cada um dos trabalhadores possa conhecer as dos restantes. Que transparência é esta? Que modelo é este que, envolto no secretismo, pode conduzir à arbitrariedade e ao favorecimento?
Por outro lado, como concretizar objectivos como o de "potenciar o trabalho em equipa, promovendo a comunicação e cooperação entre serviços, dirigentes e trabalhadores"? Será através da imposição do secretismo da avaliação e da suspeita que ele pode gerar?
Como vai ser concretizado o efectivo reconhecimento do mérito dos trabalhadores da Administração Pública, com a imposição de quotas que inibem e impossibilitam avaliações autênticas?
Como acreditar que se pretende implementar um modelo de excelência na função pública se essa excelência não pode ser superior a 25% (5% para "Excelente" e 20% para "Muito Bom")?
Importa ainda questionar que razões objectivas existem para o estabelecimento de distinções entre a avaliação dos funcionários públicos e a avaliação dos dirigentes intermédios. Por que razão ficam os dirigentes máximos isentos de qualquer espécie de avaliação? A tão propalada responsabilização recai apenas sobre uma parte da Administração Pública?
Será que todas estas interrogações encontram resposta no último dos objectivos enunciados na proposta de lei, a saber, "fortalecer as competências de liderança e de gestão (…)"? É desta maneira que se fortalecem as competências de gestão?
Desde quando é que a imposição do autoritarismo e da "ditadura do chefe", que obedece às directivas ou intenções de quem o nomeou, pode conduzir à melhoria e a qualidade do serviço público?
A resposta a estas questões encontra-se no Programa de Estabilidade e Crescimento para o período 2003-2006, onde o Governo afirma que vai "rever o regime de avaliação do desempenho de modo a instituir mecanismos de diferenciação de que resultará uma política de contenção das promoções e das progressões automáticas".
VV. Ex.as já nem se preocupam em esconder o "rabo" do gato! São taxativos: o objectivo não é o de modernizar ou credibilizar o sistema; o objectivo não é valorizar, dignificar e responsabilizar os trabalhadores; o objectivo é, isso sim, impor, de forma cega e sem qualquer critério, a redução da despesa na Administração Pública.
A reforma, Sr. Primeiro-Ministro, deve ser feita para servir os cidadãos e para se concretizar não pode ser feita contra os trabalhadores mas também com eles porque só assim se poderá contar com o seu empenhamento e a sua dedicação à causa pública.
Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, ainda estão a tempo de criar condições para introduzir um conjunto de alterações nestas propostas de lei que levem o Partido Socialista, em sede de apreciação na especialidade, a ter voto diferente daquele que anunciou.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Miranda.

O Sr. Carlos Miranda (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.ª Secretária de Estado da Administração Pública, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo tem na sua posse o relatório produzido pelo Mckinsey Global Institute a pedido dos Ministérios da Economia e da Segurança Social, sobre a produtividade em Portugal.
Esse relatório concluiu que a produtividade portuguesa está 48% abaixo dos cinco melhores países europeus, sendo a mais baixa da União Europeia.
Uma das seis principais causas deste estado de coisas prende-se directamente com a prestação de serviços públicos, e pois, com o desempenho da Administração Pública.
As insuficiências na prestação de serviços públicos contribuem em cerca de 22% para o diferencial negativo de produtividade não estrutural identificado naquele estudo, com impactos negativos terríveis na sociedade portuguesa.
Os deficientes resultados obtidos na prossecução do interesse público - que lhe está confiado - ferem profundamente a legitimação democrática da Administração Pública. Ora, essa legitimação democrática depende da sua capacidade para satisfazer, de forma eficaz e atempada, as necessidades dos cidadãos, da economia e do País.
É, pois, necessário e urgente pôr fim a este estado de coisas e reabilitar a legitimidade da Administração Pública portuguesa. Para isso, têm de se criar condições que permitam que a Administração adopte rapidamente uma cultura de rigor, de qualidade, de responsabilidade e de responsabilização, prestando-nos contas do seu desempenho.
Sr.as e Srs. Deputados, este Governo apostou forte na reforma da Administração Pública, conferindo-lhe carácter de urgência, porque o País não tem mais tempo a perder para ganhar a batalha da competitividade.
Para tanto, a reforma foi perspectivada em torno de três eixos: organização do Estado e da Administração; liderança e responsabilidade e mérito e qualificação.
O diploma que hoje o Governo nos propõe - uma lei-quadro da avaliação do desempenho na Administração Pública - percorre e atravessa aqueles três eixos.
A avaliação constitui, sem sombra de dúvidas, não apenas um instrumento privilegiado no conjunto de ferramentas de gestão dos recursos humanos mas o elemento nuclear para a reforma da Administração Pública.
Por sua vez, este sistema integrado de avaliação, que é proposto, afasta-se, no entanto, radicalmente do sistema que tem vigorado neste País nos últimos 20 anos.
Até agora, a preocupação única do sistema era a classificação ou a notação individual do funcionário; a partir de agora, a avaliação terá como objectivo principal a melhoria da qualificação das pessoas e da qualidade dos serviços.
Assim se compreende que os procedimentos de avaliação não sejam instrumentos de punição mas, sim, processos que têm como objectivo último a optimização das pessoas e dos serviços prestados.
Ora, a avaliação do desempenho dos funcionários constitui um processo contínuo e ininterrupto, de ciclo anual, que se desenrolará por fases e pressupõe uma correcta definição de funções, quer de natureza permanente quer de natureza eventual ou conjuntural.
Assenta numa fixação participada dos objectivos, assumindo a forma de um verdadeiro contrato individual de desempenho, exigindo que o funcionário seja posto ao corrente e se compenetre do conjunto de orientações estratégicas do seu sector (e do respectivo plano de actividades); dos objectivos da sua unidade orgânica e da sua equipa e se oriente, individual e colectivamente, para os resultados previstos no plano de actividades.
A avaliação do desempenho dos funcionários compreende não só a responsabilização pelos resultados alcançados mas, principalmente, a avaliação das competências comportamentais e da atitude pessoal.
A diferenciação dos desempenhos de mérito e excelência, por sua vez, é garantida pela fixação de quotas para as classificações de "muito bom" e "excelente", assim se evitando a perversão ocorrida no sistema vigente, com a atribuição generalizada de notas máximas de desempenho.
Mas este sistema integrado de avaliação vai, pela primeira vez, mais longe: paralelamente, decorrerá no âmbito deste sistema a própria avaliação dos dirigentes intermédios.
Como vimos, a propósito do já aprovado Estatuto do Pessoal Dirigente, só merece o estatuto de dirigente quem revele capacidade de liderança qualificada para uma rigorosa gestão por objectivos, associada a uma capacidade mobilizadora de equipas coesas. A manutenção da qualidade de dirigente depende,

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precisamente, do desempenho demonstrado e aferido pela avaliação institucionalizada. A avaliação de desempenho inferior a "bom" constitui fundamento da cessação da comissão de serviço.
Mas mais: paralelamente ainda, decorrerá a avaliação dos próprios serviços - avaliação através da auto-avaliação e da avaliação externa.
Sr.as e Srs. Deputados, a avaliação integrada do desempenho representa para a Administração Pública o mesmo que a tomografia axial computorizada representa para a Medicina, ou seja, serve para validar os métodos de recrutamento e selecção; permite medir o contributo individual e da equipa para o atingir dos objectivos estratégicos do serviço.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se, tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Como dizia, permite gerir os sistemas de progressão na carreira; identificar o potencial dos funcionários e dos dirigentes; diagnosticar as necessidades de formação; constitui um factor de motivação dos funcionários e permite reorganizar os próprios serviços.
Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me, nestas circunstâncias, manifestar a minha profunda convicção de que, com a implementação deste sistema integrado de avaliação do desempenho, a Administração Pública portuguesa passará a estar, efectivamente, ao serviço do cidadão; portar-se-á como "amiga" da economia; e motivará todos quantos nela trabalham.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Fazenda, pediu a palavra para um pedido de esclarecimento, mas o Sr. Deputado Carlos Miranda não tem tempo para responder-lhe.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, uma vez que tenho 2 minutos e 25 segundos, gastaria um minuto para fazer o meu pedido de esclarecimento e cederia o restante tempo ao Sr. Deputado Carlos Miranda para responder.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é muito simpático da sua parte. Tem a palavra.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Miranda, em relação à avaliação individual do desempenho dos funcionários públicos temos três referentes: um deles de carácter objectivo, um cumprimento de tarefas pré-indicadas e dois de carácter subjectivo, actividade comportamental e atitude pessoal.
A questão aqui é que a introdução de factores subjectivos, quando não possam ser compensados por garantias de vária ordem, introduz uma discricionariedade enorme na avaliação e, por isso, em Espanha os critérios são absolutamente objectivos e em França onde há introdução de alguns critérios subjectivos o processo não é confidencial é aberto e, além do mais, a avaliação é paritária entre os serviços e os representantes dos trabalhadores.

O Sr. Fausto Correia (PS): - Deixou de ser paritária.

O Orador: - Portanto, esta questão é sensível e deve ser tomada em conta, pelo que pergunto-lhe como é que pensa que se pode evitar a discricionariedade das chefias avaliadoras e como é que pensa que assim se fará uma cultura de exigência e não uma cultura de "amén" ao chefe.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Miranda.

O Sr. Carlos Miranda (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, começo por agradecer-lhe o tempo que me cedeu para responder à sua questão, o que tenho muito gosto em fazer.
De facto, tenho alguma dificuldade em ser exaustivo na resposta, por uma questão técnica: hoje, temos em discussão, neste Plenário, uma proposta com vista a criar a lei-quadro da avaliação do desempenho na Administração Pública e sabemos - eu particularmente tenho conhecimento - que os próprios sindicatos dispõem já de um projecto de decreto-regulamentar onde, efectivamente, se densificam os critérios e os itens que integram a parte das competências comportamentais e da atitude pessoal.
Não concordo inteiramente consigo no sentido de que a atitude e a valência pessoal sejam elementos inteiramente subjectivos na avaliação, pois ela comporta, ou pode comportar, elementos claramente objectivos que depois, em sede regulamentar, se podem melhor precisar.

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Acerca da segunda questão que me coloca, quanto à existência de uma comissão paritária, digo-lhe o seguinte: esse é o sistema que está ainda em vigor em Portugal e que tem uma função de reclamação ou de recurso em relação às notações individuais.
Agora, abandonou-se completamente essa ideia visando-se a criação de um conselho consultivo tanto quanto podemos prever que seja, ou que venha a ficar, inserida no decreto-regulamentar, mas mesmo aí, não podemos, hoje, em sede de generalidade, avançar mais do que isto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para defesa da honra, tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - O Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, da tribuna, acusou-me de que se eu fosse avaliador na função pública daria a notação de "excelente" aos meus amigos.
Ora, isto trata-se de uma calúnia, mas de uma calúnia tão disparatada - é aquilo a que se chama um dislate -, que, de facto, nem vale a pena responder-lhe.
Apesar de tudo, Sr. Deputado, gostaria de dizer-lhe o seguinte: antes de ser Deputado a minha carreira profissional é a de professor universitário, não de "aviário" mas com carreira completa, de mais de 20 anos… Avaliei milhares de alunos que podem testemunhar se em relação à avaliação a fiz ou não com rigor e com critério e isenção.
Mas, como lhe digo, não quero responder a isso. O que quero fazer, isso sim, é interpretar a sua atitude.
V. Ex.ª habituou-nos a ser uma pessoa equilibrada e da tribuna teve um destempero, um deslize, um dislate, que não tinha, sequer, nada a ver com a sua intervenção, pelo que sou forçado a interpretá-la de duas maneiras: queria sublinhar a minha estranheza por V. Ex.ª, enquanto Deputado do PCP, de o PCP não ter estado neste debate, sobretudo no seu momento fundamental que era, de facto, o da interpelação ao Governo. Se eu quisesse utilizar a sua forma de agir neste debate dir-lhe-ia que o PCP revelou uma atitude cobarde, mas não é com essa entoação que eu lhe respondo. Dir-lhe-ei apenas que não teve coragem democrática para vir à liça no momento próprio dirimir argumentos objectivos com a Câmara, nomeadamente com os Deputados da maioria e com o Governo.
Termino, Sr. Deputado, dizendo-lhe, ainda, o seguinte: se eu quisesse responder-lhe no mesmo tom pessoal diria que V. Ex.ª, naquele momento infeliz, parecia Robespierre a falar, mas respondo-lhe não com esse tipo de atitude mas com a atitude e o tom democrático de Victor Hugo, quase um contemporâneo. Victor Hugo disse: "o odioso é a porta de saída do ridículo" e V. Ex.ª com aquele dislate foi simplesmente ridículo.

Aplausos de alguns Deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Patinha Antão, em primeiro lugar, gostaria de dizer que posso ter utilizado uma figura de estilo, mas sem qualquer ofensa pessoal, pelo que nem sequer lhe peço desculpa, porque, repito, não quis ofendê-lo pessoalmente.
Porém, naturalmente que perante a pergunta "profunda" que fez à Sr.ª Ministra eu - impulsivamente, com certeza… - pensei: "ora aqui está um excelente candidato à quota dos 5%"… E depois, em relação à sua intervenção, quando diz que a oposição vem para aqui de "mãos vazias" e que não é capaz de apresentar propostas, eu - repito, impulsivamente, com certeza… - pensei: "ai de mim, da minha bancada e da oposição se fossemos avaliados pelo Sr. Deputado Patinha Antão!…"

Risos do PCP.

Portanto, neste sentido não tem de levar a mal algum excesso, admito, algum carácter impulsivo da minha parte.
Mas, em relação à crítica inaceitável que fez da forma como nós nos posicionamos neste debate, eu direi que é o que se chama fazer o mal e a caramunha… Quer dizer, estamos limitados no tempo, tínhamos uma grelha de 9 minutos e o Sr. Deputado Patinha Antão queria que gastássemos o nosso precioso tempo com a sua "profunda" pergunta à Sr.ª Ministra das Finanças!!…
Não fazemos isso! O nosso tempo, por enquanto, gerimos nós!

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim do nosso debate, pelo que o declaro encerrado.

Neste momento, elementos do público presente nas galerias exibiram vários cartazes relativos ao assunto em discussão.

O público presente nas galerias não pode manifestar-se. Os cidadãos estão fartos de saber isto, pois é uma gravíssima incorrecção.
Srs. Agentes da PSP, queiram evacuar as galerias e proceder à identificação dos cidadãos que se manifestam para que se proceda contra eles nos termos da lei, uma vez que estas situações são contrárias ao respeito devido ao Parlamento e não podem de forma alguma ser consentidas.

Pausa.

Srs. Deputados, uma vez chegados ao fim do debate das propostas de lei n.os 100 e 101/IX a sua votação será feita amanhã no respectivo período da sessão plenária.
A próxima sessão terá lugar amanhã à tarde, estando agendada a discussão do projecto de lei n.º 291/IX, do projecto de resolução n.º 188/IX e do inquérito parlamentar n.º 11/IX.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 55 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD):
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
José Manuel Pires Epifânio

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD):
Gonçalo Nuno Mendonça Perestrelo dos Santos
José Luís Ribeiro dos Santos
José Manuel Pereira da Costa
Manuel Joaquim Dias Loureiro

Partido Socialista (PS):
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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