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Sábado, 7 de Fevereiro de 2004 I Série - Número 49

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 6 DE FEVEREIRO DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Fernando Santos Pereira
Ascenso Luís Seixas Simões

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas.
A Câmara apreciou, em conjunto, os projectos de resolução n.os 197/IX - Institui o Dia Nacional do Sapador Florestal (PSD e CDS-PP) e 198/IX - Programa Especial de Voluntariado "Jovem e as Florestas" (PSD e CDS-PP), sobre os quais se pronunciaram os Srs. Deputados Jorge Nuno Sá (PSD), Rodeia Machado (PCP), Miguel Paiva (CDS-PP), Zelinda Marouço Semedo (PS) e João Moura (PSD).
Procedeu-se também à discussão conjunta das petições n.os 76/VIII (3.ª) - Apresentada por "Pais para Sempre", Associação para a Defesa dos Filhos e dos Pais Separados, solicitando que a Assembleia da República proceda à alteração de alguns diplomas legais, designadamente o Código Civil, a Organização Tutelar de Menores e a Lei de Protecção da Maternidade e da Paternidade, e 24/IX (1.ª) - Apresentada pela Associação dos Profissionais da Guarda e outros, solicitando iniciativa por forma a consagrar o horário de serviço de 35 horas semanais na GNR. Intervieram no debate, a diverso título, os Srs. Deputados Isménia Franco (PSD), Odete Santos (PCP) - que também interveio na qualidade de relatora da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre a petição n.os 76/VIII (3.ª) -, Maria do Rosário Carneiro (PS), Isabel Gonçalves (CDS-PP), João Teixeira Lopes (BE), Isabel Castro (Os Verdes), Custódia Fernandes (PS) - que interveio na qualidade de relatora da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais sobre a petição n.º 24/IX (1.ª) -, Francisco José Martins (PSD), Vitalino Canas (PS) e António Filipe (PCP).
Entretanto, foi anunciada a entrada na Mesa do projecto de resolução n.º 219/IX.
Foi, ainda, apreciado o relatório da Comissão Parlamentar de Execução Orçamental sobre a dívida pública e garantias pessoais do Estado em 2003, tendo feito intervenções os Srs. Deputados José Ribeiro (PSD) - na qualidade de relator da Comissão Parlamentar de Execução Orçamental -, Joel Hasse Ferreira (PS), Pinho Cardão (PSD), Herculano Gonçalves (CDS-PP) e Tavares Moreira (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 11 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Henriques de Pinho Cardão
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Miguel Gonçalves Miranda
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira

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Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscata Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Mário Patinha Antão
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Pedro Filipe dos Santos Alves
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Guilherme Valdemar Pereira D'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva

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José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Manuel Capoulas Santos
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
José Helder do Amaral
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares

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Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há expediente para anunciar à Câmara, vamos dar início à ordem do dia com a discussão conjunta dos projectos de resolução n.os 197/IX - Institui o Dia Nacional do Sapador Florestal (PSD e CDS-PP) e 198/IX - Programa especial de voluntariado "Jovem e as Florestas" (PSD e CDS-PP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Nuno Sá.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com satisfação que hoje, enquanto subscritor destes dois projectos de resolução, os vejo discutidos no Plenário da Assembleia da República. São ambos relacionados com a floresta - e muito temos debatido nesta Casa este tema -, mas permitam-me que fale particularmente do projecto de resolução n.º 198/IX, que recomenda que seja criado um programa especial de voluntariado "Jovem e as Florestas".
Em primeiro lugar, quero salientar a generosidade dos jovens portugueses. Não é por acaso, não é por obra do destino que Portugal se encontra entre os primeiros da Europa no que toca a voluntariado jovem. Em momentos de crise, em momentos de dificuldade, em momentos em que a sociedade portuguesa se tem ressentido de alguns acontecimentos, os jovens portugueses têm estado na primeira linha da resolução desses problemas e têm-se mostrado, numa participação solidária, generosos, afirmando-se cidadãos plenos e responsáveis.
Em segundo lugar, quero também salientar que, no último Verão, como todos sabemos, Portugal foi fustigado por uma vaga de incêndios florestais, acontecimento este que nos deixou profundas marcas a todos. Não esquecemos, ainda hoje, as imagens que todos vimos e que, infelizmente, partilhámos no Verão passado. Não importa hoje, aqui, travar razões sobre as causas, sobre o que esteve na origem, mas constatar que temos um problema de relacionamento com a floresta.
Mas estou certo de que, perante esta dificuldade e perante este novo cenário que decorre de uma situação de crise, os jovens portugueses dirão "presente". Sempre assim foi no passado.
Transformemos, pois, e tenhamos nós a capacidade de transformar a floresta numa causa, voltando a ligar a população e os jovens à floresta e à sua ideossincrasia. Mobilizemo-nos, então, neste objectivo. Estou certo de que, se o conseguirmos, se conseguirmos travar esta batalha em conjunto, o País ganhará e teremos uma floresta melhor, na qual os portugueses se revejam e tenham interesse e gosto.
Este programa especial de voluntariado pode ser um primeiro e importante passo no sentido de voltarmos a ganhar a floresta, de voltarmos a viver a floresta, como tem sido no passado de Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje os dois projectos de resolução propostos pelos Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP, cujos conteúdos abordam matérias da prevenção dos fogos florestais.
O projecto de resolução n.º 197/IX visa instituir o dia 21 de Maio como Dia Nacional do Sapador Florestal, invocando a data em que os mesmos foram criados através de normativo legal, como consequência directa da Lei de Bases da Política Florestal, aprovada por unanimidade nesta Assembleia da República.

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Em relação à referida Lei de Bases já muito se disse nesta Casa nos últimos tempos quanto à sua regulamentação e falta de aplicação plena no sentido da protecção da floresta portuguesa. Não vou, por agora, deter-me mais aprofundadamente sobre esta matéria, mas quero aqui abordar a questão dos sapadores florestais e a necessidade real de, efectivamente, contribuírem para a prevenção dos fogos florestais.
É reconhecido o seu contributo na prevenção dos incêndios, mas é necessário e fundamental muito mais do que isso: é necessária a sua articulação com as entidades em presença, nomeadamente com os bombeiros, a nível de coordenação do combate a incêndios; mas também é necessário que os bombeiros estejam devidamente equipados e com estabilidade suficiente para que seja promovida a sua formação, mas, acima de tudo, para que possam, fora das épocas de crise, ou seja, de menor incidência de incêndios, proceder às tarefas de limpeza da floresta.
Hoje, tanto quanto se conhece, as suas tarefas não são avaliadas e as equipas não têm qualquer coordenação entre si e entre os restantes agentes que actuam no teatro de operações. Aguardamos que o normativo já anunciado pelo Governo no âmbito da resolução do Conselho de Ministros venha colmatar estas deficiências.
Quanto ao financiamento destas equipas é necessário e fundamental que esteja assegurado, mas não vemos no Orçamento do Estado para 2004 verbas suficientes que consigam atingir tal desiderato.
O objectivo de instituir o Dia Nacional do Sapador Florestal é bem intencionado, mas é manifestamente insuficiente face às questões que aqui deixo. No entanto, o Grupo Parlamentar do PCP irá votá-lo favoravelmente porque entende que devemos sempre homenagear aqueles que, de uma forma abnegada, trabalham no sentido da protecção das populações. As insuficiências que os sapadores florestais têm não são, naturalmente, da sua responsabilidade.
No que diz respeito ao projecto de resolução n.º 198/IX, que propõe a criação de um programas especial de voluntariado para jovens, visando a defesa da floresta, não vemos qualquer inconveniente na sua criação, antes pelo contrário. A nossa dúvida reside na vontade política do Governo ou antes na ausência dessa vontade política, porque falta de instrumento legislativos e de recomendações não tem existido.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O que tem existido é falta de vontade política para executar essas recomendações. E lembro aqui, como exemplo, a recomendação proposta pelo Grupo Parlamentar do PCP e aprovada por unanimidade nesta Assembleia, que, se tivesse sido levada à prática por este Governo, talvez no Verão passado a situação fosse diferente daquela que se viveu.
Pese embora aquilo que fica dito, iremos viabilizar a sua aprovação e esperamos que o Governo passe das palavras aos actos, para bem da floresta portuguesa e para bem de Portugal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP):- Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A instituição de um dia nacional tem, geralmente, e no essencial, dois grandes objectivos, que, por vezes, são cumulativos. Desde logo, tributar a alguém méritos reconhecidos, que, desse modo, se procuram evidenciar e, por outro lado ou paralelamente, sensibilizar a comunidade para algo que se considera importante. De um e de outro modo motivam-se as pessoas, quando destinatárias da iniciativa, e potencia-se o exercício da actividade em causa.
Este é um dos casos em que a criação de um dia nacional tem todas essas vantagens e objectivos, e estes não são questionáveis, pelo menos, não se me afigura que o sejam nesta Câmara.
É evidente que outras poderiam ter sido as opções: a publicação pela Assembleia da República de um livro, a inauguração de uma exposição ou a realização de um qualquer concurso ou a atribuição do nome a uma sala deste Palácio, eventualmente com uma cerimónia solene presidida, obviamente, pelo Sr. Presidente da Assembleia. Enfim, tantas e tantas poderiam ter sido as alternativas.
No entanto, importa reter que, com a apresentação desde logo do projecto de resolução n.º 197/IX, o CDS-PP e o PSD, isto é, a maioria, prestam homenagem aos sapadores florestais, que, por todo o País, têm desempenhado um papel vital para as organizações florestais e para as autarquias.
De facto, as equipas de sapadores florestais têm desenvolvido, ao longo dos anos, um trabalho de grande utilidade, designadamente na execução de acções de silvicultura preventiva, como, por exemplo, na limpeza de matos; na manutenção e beneficiação da rede divisional e outras estruturas; no apoio ao combate a incêndios e também ao rescaldo dos mesmos; e até na sensibilização das pessoas e das comunidades, essencialmente das residentes nas áreas de maior densidade de povoamento florestal.

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Num momento em que tão insistentemente, e nem sempre com o devido rigor, se fala de incêndios florestais, importa reter e relevar, efectivamente, o papel dos sapadores florestais na prevenção desta autêntica tragédia nacional, que, convém recordar, de há muitos anos se vem repetindo, ano após ano, ano após ano, ano após ano, tarefa essa que os sapadores vêm desenvolvendo com sucesso.
É um dado estatístico que as áreas vigiadas por sapadores florestais ardem menos do que as restantes; há uma mais rápida detecção do foco de incêndio; há uma mais célere intervenção e, portanto, naturalmente, é mais eficaz; há melhores condições no combate; em suma, há um melhor resultado final.
Daí que uma das medidas que o Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas tenha considerado essencial na reforma estrutural do sector florestal seja precisamente o reforço da melhoria operacional dos sapadores florestais, recuperando as respectivas equipas e reforçando substancialmente o seu número. A verdade, porém - e todos nós temos consciência disso -, é que a adequada gestão do nosso património florestal e uma acrescida eficácia no combate aos incêndios florestais exigem um esforço hercúleo, mas abrangente, e muito bem concertado.
Esta a razão do outro projecto de resolução, ora também em discussão, que propugna a realização de um programa de voluntariado jovem, destinado especificamente à vigilância e limpeza de matas e florestas nacionais. A mesma preocupação, o mesmo esforço, o mesmo apelo, aqui, com acentuada confiança na generosidade dos jovens, mas também seguramente na sua dedicação às grandes causas.
Eu diria que este projecto de resolução n.º 197/IX é um acto de fé na vontade e na capacidade dos jovens para mudar o mundo, naturalmente, para melhor.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Finalizando, eu diria ainda que os diplomas que a maioria aqui apresenta pretendem, no fundo, dizer desde logo aos sapadores florestais "bem hajam, pelo vosso trabalho e pelo brio profissional com que o executam", mas pretendem igualmente reconhecer aos jovens portugueses a importância da sua participação com o empenho que sempre devotam às causas que abraçam, na modificação para melhor da sociedade e do mundo. Dizendo-o dizemos simultaneamente ao País que se deve orgulhar dos seus sapadores florestais e que deve acreditar nos seus jovens.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zelinda Marouço Semedo.

A Sr.ª Zelinda Marouço Semedo (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A criação da figura do sapador florestal - um trabalhador especializado, com perfil e formação específica adequados ao exercício das funções de prevenção dos incêndios florestais - deve-se à iniciativa do Partido Socialista.
O objectivo inicial era implementar no terreno, até 2002/2003, nas zonas mais vulneráveis e fustigadas ciclicamente, pelo menos 500 equipas de sapadores florestais que pudessem prevenir a devastação da nossa floresta. De forma progressiva foram investidas nessas funções cerca de 100 equipas.
O Governo actual, mais uma vez numa política de contenção cega, desvaloriza esta situação, a tal ponto que apenas pouco mais de uma escassa dúzia de equipas foram colocadas no terreno em cerca de dois anos.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

A Oradora: - É, pois, para nós, Partido Socialista, merecedora do maior respeito a figura do sapador florestal - homens que de uma forma abnegada se colocam, pese embora muitas vezes o risco pessoal, ao serviço das populações e em prol da sustentação do manto florestal, na defesa de todo o ecossistema.
Porém, não nos parece que, limitando-se a instituir o Dia do Sapador Florestal, isso traga uma mais-valia significativa para a solução de um tão grave problema, como, pelo contrário, a implementação rápida de um número importante de equipas no terreno, tal como previsto, acarretaria, o que ficou lamentavelmente demonstrado na última catástrofe que atingiu o País no Verão de 2003.
Assim, mais do que instituir o Dia do Sapador Florestal, através do projecto de resolução n.º 197/IX, agora em apreço, é mais urgente, mais importante, diria mesmo decisivo, que este Governo tome decisões, adopte medidas e diga ao País, de forma clara, qual o ritmo a que pretende colocar no terreno equipas destes trabalhadores especializados que possam prevenir futuramente uma nova catástrofe ambiental, reduzindo ao mínimo as condições favoráveis à ocorrência e propagação de incêndios, bem como os riscos sociais, ambientais e económicos daí decorrentes.

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Para quando uma maior aposta na prevenção? Para quando o reforço e a expansão do corpo especializado de sapadores florestais, previsto na alínea c) do artigo 21.º da Lei de Bases da Política Florestal?

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Há que transformar o apoio a este sector numa primeiríssima prioridade. Não, necessariamente, com o acenar de uma bandeira - a criação deste dia -, qual cortina de fumo, ou manobra de diversão, que parece ter apenas como objectivo desviar as atenções da descoordenação, do desnorte que se verificou aquando da tragédia que consumiu, em 2003, 430 000 ha.

Vozes do PS: - Exactamente! Muito bem!

A Oradora: - Ou mesmo, ainda, com a dificuldade manifesta em regulamentar matérias importantes que previnam a repetição da tragédia.
Sr.as e Srs. Deputados: A floresta tem de ser pensada globalmente, tem de constituir efectivamente um projecto nacional devido à importância estratégica para o País (pelo valor acrescentado para o desenvolvimento rural, o emprego, a economia); um projecto que respeite a biodiversidade local, baseada em normas de silvicultura preventiva, gerando descontinuidade na paisagem, apostando em espécies mais resistentes ao fogo, e alternando áreas agrícolas com áreas florestais e de pastorícia; mas também, efectivamente, recorrendo a processos que permitam uma actuação rápida e eficaz, através de mecanismos que agilizem e optimizem toda a actuação no terreno, quer através dos PROF (Planos Regionais de Ordenamento Florestal) quer através da acção do Conselho Nacional de Reflorestação e das quatro comissões regionais respectivas que urge implementar.
Sr.as e Srs. Deputados: Não basta anunciar medidas. Há que agilizar procedimentos que protejam, rápida e eficazmente, o nosso tão fustigado mundo rural, não esquecendo, nunca, a importância vital da floresta, enquanto suporte dos recursos naturais e obstáculo aos processos de desertificação.
Diminuir o risco de incêndio é urgente, tal como é urgente reforçar o número de brigadas de sapadores florestais, bem como a certificação e a dignificação do seu trabalho, com o devido enquadramento da profissão, e simultaneamente promover a sua formação continuada, a avaliação do seu desempenho, o nível de eficácia e principalmente a coordenação da sua actividade e as taxas de sucesso.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Moura.

O Sr. João Moura (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Hoje, mais do que discutir a questão da floresta, como já tivemos oportunidade de fazer, há pouco tempo atrás, estamos a falar na dignificação de uma classe, a classe dos sapadores florestais que é uma classe fundamental em matéria de prevenção de fogos florestais, num primeiro combate aos fogos florestais, e também, ainda, na fase de rescaldo aos fogos florestais.
Estes sapadores florestais são, sem dúvida, uma aposta do actual Governo.

Vozes do PS: - Do actual Governo?!…

O Orador: - Do actual Governo, Srs. Deputados! E vou dar-lhes dados concretos sobre isso: o actual Governo vai criar novas 50 brigadas de sapadores florestais e, como se não bastasse, vai dignificar esta classe. No passado, investia-se de certo modo algum montante e algum valor na formação destes profissionais, mas eles sentiam-se desamparados pelo governo anterior.

Vozes do PSD: - Exactamente!

Protestos do PS.

O Orador: - A prova concreta é que este investimento que o governo fazia, no passado, na formação (que era caríssima!) a estes profissionais, levava a que eles abandonassem facilmente as suas tarefas porque não se viam recompensados monetariamente.
Aquilo que vamos fazer, para além da formação intensa de que vão ser objecto, é apostar e aumentar, até, a sua qualificação profissional e remuneratória.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É com esta dignificação e é com este reconhecimento que o PSD, hoje, propõe aqui a criação do dia nacional do sapador florestal.
Entendemos que o sapador florestal tem uma importância fundamental na floresta que desejamos, a mesma floresta que foi esquecida, durante tantos anos…

Protestos da Deputada do PS Zelinda Marouço Semedo.

Não foi só durante os seis anos do governo socialista, foi também no passado, mas a floresta, hoje, está a ser encarada de outra forma.
Estamos a aplicar - porque aquilo já estava previsto há tanto tempo na lei, mas faltou coragem para aplicar - uma lei de bases, existente desde 1996, mas que faltava regulamentar. É isto o que estamos a fazer, isto dos sapadores florestais é apenas uma "gota de água num imenso oceano" que este Governo está a trabalhar, na floresta portuguesa.

Protestos da Deputada do PS Zelinda Marouço Semedo.

Estamos a reordenar a floresta, estamos a pensar a floresta como ela merece - como a Secretaria de Estado das Florestas que tivemos a coragem de criar.
Os PROF vão estar todos aplicados - pasme-se! -, até 30 de Junho, deste ano, aquilo de que há tantos se falava e não se conseguia fazer.
Com isto, termino, Sr. Presidente, dizendo que hoje é o dia em que vamos aqui tratar de uns elementos, que consideramos chave na prevenção e no primeiro combate aos incêndios florestais, que são uma classe digna, que são os sapadores florestais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais oradores inscritos, declaro encerrado, o debate dos projectos de resolução n.os 197/IX e 198/IX, que votaremos na primeira oportunidade regimental.
Passamos imediatamente ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos, que é a discussão conjunta das petições n.os 76/VIII (3.ª) - Apresentada por "Pais para Sempre", Associação para a Defesa dos Filhos e dos Pais Separados, solicitando que a Assembleia da República proceda à alteração de alguns diplomas legais, designadamente o Código Civil, a Organização Tutelar de Menores e a Lei de Protecção da Maternidade e da Paternidade, e 24/IX (1.ª) - Apresentada pela Associação dos Profissionais da Guarda e outros, solicitando iniciativa por forma a consagrar o horário de serviço de 35 horas semanais na GNR.
Relativamente a ambas as petições, está prevista a atribuição a cada grupo parlamentar de 10 minutos, que cada um gerirá como entender.
Para se pronunciar sobre a petição n.º 76/VIII (3.ª), tem a palavra a Sr.ª Deputada Isménia Franco.

A Sr.ª Isménia Franco (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Cabe agora ao PSD dizer algumas palavras sobre a petição n.º 76/VIII (3.ª).
Antes de mais, queremos elogiar o trabalho da associação peticionante e a sua particular preocupação, que muito nos sensibiliza, com a necessidade de alteração da forma de pensar da sociedade no que respeita às relações familiares e na correspondente adequação do Direito às novas realidades da família, bem como às novas formas de as encarar relativamente a pais separados.
A associação peticionante "Pais para Sempre" propõe-se defender os filhos de pais separados e, no cumprimento desse objectivo, recolheu cerca de 4600 assinaturas pretendendo, por meio desta petição, que o Plenário da Assembleia da República discuta e se pronuncie sobre as propostas de alteração ao Código Civil, à Lei Tutelar de Menores e ao Código de Processo Civil.
Nestes pressupostos, em concreto, pedem e propõem: a substituição, no texto da lei, dos termos "poder paternal" e "direito de visita" por "responsabilidade parental" e "tempos com", respectivamente; a fixação, como norma, do exercício conjunto da responsabilidade parental; a promoção da mediação familiar como forma de obtenção do acordo de regulação do exercício da responsabilidade parental; a penalização dos comportamentos impeditivos dos tempos da criança com qualquer um dos progenitores como crime contra a criança; que as decisões provisórias tomadas nos processos de regulação do exercício da responsabilidade parental sejam obrigatoriamente revistas de seis em seis meses, em função do interesse superior da criança; finalmente, que os magistrados dos tribunais de família e menores tenham

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formação específica para o exercício destas funções.
Consideramos importante começar por reconhecer que se trata de matérias sempre em aberto, onde não existem verdades inabaláveis nem soluções inquestionáveis. Cada pai ou mãe - para o caso é indiferente - é único, tal como cada filho e cada família tem os seus particulares circunstancialismos a que devemos atender, ou seja, trata-se de matérias onde não funcionam dogmas nem é fácil estabelecermos regras estanques.
Quanto ao objecto da petição e às reivindicações que avança, temos várias opiniões.
Em primeiro lugar, quanto à substituição das expressões actualmente consagradas na lei, a este propósito, por "responsabilidade parental" e "tempos com", afigura-se-nos que não será pela mudança das designações que se alcançará uma melhor justiça de menores, pelo que tal alteração, a ser feita, teria de ser pensada seriamente e em conjunto com alterações substantivas ao direito da filiação, que aqui não se propõem.
O direito da filiação carecerá de alguma revisão, pelo menos quanto aos aspectos processuais, mas afigura-se que tal não deverá ser feito sem um estudo aprofundado de todas as implicações das possíveis soluções, devendo evitar o esquema dos "remendos" à lei, que em regra apenas potenciam descoordenações e incoerências.
Segundo: no que respeita, particularmente, à substituição da expressão "direito de visita" por "tempos com", há ainda que acrescentar que se trata de uma alteração com a qual discordamos, porquanto é uma decorrência da fixação da regra da guarda conjunta dos filhos de pais separados, proposta pelos peticionantes, com a qual não estamos de acordo.
Terceiro: com efeito, outra proposta dos peticionantes é a fixação, como norma, do exercício conjunto da responsabilidade parental em vez do regime actual.
Ora, o artigo 1906.º do Código Civil, na redacção dada pela Lei n.º 59/99, de 30 de Junho, consagra já como regime regra que em caso de divórcio ou de separação dos progenitores o exercício do poder paternal é feito em comum, por ambos os progenitores, como na constância do matrimónio, desde que para tanto haja acordo dos pais, só em caso de falta de acordo para a chamada guarda conjunta o tribunal atribuirá o exercício do poder paternal apenas a um dos progenitores, devendo mesmo assim fundamentar a sua decisão. Ou seja, a legislação em vigor reconhece já que o superior interesse do menor beneficia com o exercício em comum do poder paternal, estabelecendo, por isso, o legislador a regra da guarda conjunta sempre que haja o acordo dos pais. E sem quaisquer pretensões de tudo saber nesta matéria ou de ser detentora de verdades absolutas, como já atrás fizemos questão de referir, parece-nos que a solução adoptada pelo nosso legislador é sensata.
Efectivamente, em caso de desacordo dos pais, que possibilidades tem a guarda conjunta? Não será antes uma forma de prejudicar o menor, na medida em que se dificulta a tomada de resoluções que ao mesmo dizem respeito? Não serão, deste modo, o superior interesse da criança e o seu bem-estar postergados para segundo plano, em favor de uma luta de igualdade de poderes e de posições dos seus pais? Não é a imposição da guarda conjunta que vai certamente acabar com muitos dos intensos e constantes litígios dos pais em relação aos filhos e, nessa medida, defendemos a solução legislativa vigente.
Quarto: apontam ainda os peticionantes a promoção da mediação familiar como forma de obtenção do acordo de regulação do exercício da responsabilidade parental, em substituição da habitual conferência de pais.
A mediação familiar não é obrigatória em face da nossa lei, mas é possível, sempre que se mostre justificável, recorrer a ela, nos termos do artigo 147.º-D, sob a epígrafe "Mediação", da Lei n.º 133/99, de 28 de Agosto, que introduziu alterações à Organização Tutelar de Menores.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - E é assim que o PSD entende que deve continuar a ser, aliás, em conformidade com uma recomendação de 1998 do Conselho da Europa sobre a mediação familiar, segundo a qual esta mediação não deverá ser obrigatória.
Os pais devem poder ter a oportunidade de se porem de acordo quanto às decisões que respeitam à vida dos filhos e, em princípio, deverão ser as pessoas mais bem posicionadas para o fazer; e se assim não acontecer, no caso concreto, se os pais não forem capazes de encontrar as melhores soluções, como também sabemos que acontece frequentemente nas situações de ruptura familiar, então estará lá o juiz da causa, para zelar pelo superior interesse da criança e ponderar da necessidade de mediação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A mediação familiar parece-nos, por outro lado, uma boa solução, não em substituição

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da conferência de pais mas antes como apoio preliminar, como forma de alcançar esse acordo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Quinto: a penalização dos comportamentos impeditivos dos tempos da criança com qualquer um dos progenitores como "crime contra a criança".
Atendendo aos princípios da proporcionalidade e da subsidiariedade, que devem dominar o Direito Penal e que constituem um imperativo constitucional, deve ser pensada com muito cuidado a criminalização das condutas, como aqui vem sugerido, dada a delicadeza do domínio em causa, que supõe uma cuidada ponderação dos interesses, eventualmente conflituantes, da criança entre manter uma relação com cada um dos pais e vê-los punidos por condutas contra o seu interesse.
Sexto: outra das reivindicações dos peticionantes é a de que as decisões provisórias tomadas nos processos de regulação do exercício da responsabilidade parental sejam obrigatoriamente revistas de seis em seis meses.
Ora, o artigo 157.º da Organização Tutelar de Menores, sobre decisões provisórias e cautelares, já prevê que estas decisões possam ser alteradas pelo tribunal, sempre que o entender conveniente.
Acresce que consagrar uma tal obrigatoriedade de revisão das decisões com uma periodicidade de seis meses acabaria por desencadear uma sobrecarga de trabalho para os tribunais de família e de menores e, em última análise, por contribuir para uma ainda maior morosidade da justiça que ninguém, nem certamente os peticionantes, desejaria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sétimo: finalmente, solicitam os peticionantes que os magistrados dos Tribunais de Família e de Menores tenham formação específica para o exercício destas funções.
Justamente na senda do espírito dos autores da petição, a Lei n.º 31/2003, de 22 de Agosto, prevê, no respectivo artigo 11.º, a formação dos magistrados colocados nos Tribunais de Família e de Menores, dispondo de forma clara (e passo a citar): "O Centro de estudos Judiciários assegura regularmente formação adequada aos magistrados colocados nos tribunais com competência em matéria de família e menores".

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos para apresentar o relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, de que sou relatora, faz a resenha de algumas legislações da Europa, salvo erro, de 10 países, sendo a maior parte dessa informação recolhida através de um estudo do Senado francês sobre uma alteração, que depois foi aprovada em 4 de Março de 2002 na Assembleia Nacional Francesa, e verifica-se que nem em todos os países da Europa vigora o sistema da guarda conjunta.
Faz-se, ainda, uma referência a outros ordenamentos jurídicos, nomeadamente à lei do Estado da Califórnia, nos Estados Unidos da América, porque a Federação dos Movimentos da Condição Paterna francesa cita-a como exemplo. Por isso mesmo, vem referida no relatório para se verificar que nem nessa lei há a solução que os peticionantes pretendem.
Depois, analisam-se as várias propostas alínea por alínea.
Relativamente à primeira proposta, de substituição da expressão "poder paternal" por "responsabilidade parental", parece-me justa e de acolher, na medida em que "poder paternal" é ainda um resquício que temos, na nossa legislação, da família patriarcal, onde as crianças tinham simplesmente que obedecer ao pai. Segundo artigos, que também cito, do Código Civil que estavam em vigor na altura do 25 de Abril, a mãe, sobre os assuntos mais importantes para o filho, só tinha o direito de ser ouvida, era o pai quem decidia. E ela tinha a seu cargo - e isto é secular - o bem-estar físico e moral do filho, o que teve profundas implicações naquilo que veio a seguir-se.
A expressão "tempos com" tem a ver, como digo no relatório, com a guarda conjunta. E, relativamente à guarda conjunta, refiro que já em 1999 este Parlamento, aliás, também por sugestão da Associação para a Defesa dos Filhos e dos Pais Separados, procedeu a uma alteração no Código Civil, no sentido de colocar em primeiro lugar a guarda conjunta quando os pais estivessem de acordo. Penso que é isto que os peticionantes querem alterar, pretendendo que a guarda conjunta possa ser atribuída por imposição do

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juiz.
Continuando e abreviando, pois não tenho tempo para falar de tudo, assinalo que a criminalização do incumprimento não é solução, pois o direito penal é a extrema ratio da política social, é um direito de intervenção mínima e as neo-criminalizações, como diz o Professor Figueiredo Dias, não devem estabelecer-se relativamente a comportamentos que já existem há muito tempo na sociedade. Por isso, esta reivindicação parece-me até contrariar o artigo 18.º da Constituição da República.
Relativamente às decisões provisórias e cautelares, a lei actual já permite que, a qualquer tempo, o juiz altere as decisões provisórias e cautelares. Qualquer progenitor o pode requerer, o curador de menores pode requerê-lo e, portanto, parece-me que isso iria trazer mais morosidade aos processos.
Quanto à regulamentação de condicionantes às decisões de mudança de residência dos progenitores, ela está prevista, por exemplo, na lei francesa mas creio que isso, embora não o diga no relatório, viola a Constituição da República, dado que é inconstitucional impor estas restrições à liberdade de circulação.
Por último, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em relação à mediação familiar, o Conselho da Europa é, de facto, categórico, ou seja, a mesma não deve ser obrigatória. Perante isto, temos de nos inquirir porquê. E a razão de ser também está na recomendação do Conselho da Europa, num artigo onde se diz que, quando há mediação, o próprio mediador tem de se assegurar de que não há uma história de violência na vida daquela família que possa colocar a parte mais fraca como sendo ainda vítima, naquela tentativa de chegarem a um acordo que não será um acordo.
Penso, portanto, que, para decidir sobre o que fazer, é importante ter em atenção os números da violência doméstica que cito no relatório, e que são da APAV, e saber que a maior percentagem de vítimas de violência doméstica é das mulheres, isto é, representam oitenta e tal por cento das vítimas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro.

A Sr.ª Maria do Rosário Carneiro (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: De facto, estamos aqui a apreciar a petição, cujo primeiro peticionante é a Associação "Pais para Sempre", e não vou repetir o conjunto de elementos já citados pelas Sr.as Deputadas Isménia Franco e Odete Santos, que me precederam, vou, antes, focar a minha intervenção, sobretudo, na circunstância de, como referiu a Sr.ª Deputada Odete Santos, tendo-se verificado, em 1999, uma alteração ao Código Civil - aliás, devo dizer que correspondeu a uma iniciativa legislativa do PS -, que colocou a guarda conjunta como regra, desde que obtido o acordo dos pais, e tendo-se verificado posteriormente a apresentação desta petição, já há cerca de dois anos, nós pudemos apurar que, neste período de tempo, infelizmente, houve uma lentíssima alteração nos comportamentos que pretenderíamos ver introduzidos na definição da guarda das crianças filhas de pais divorciados ou separados. É que o objectivo que está aqui em apreço é o de tentar evitar que, permanentemente, as crianças, nestas circunstâncias, sejam, elas próprias, arrastadas na ruptura que se estabelece entre os pais e, por isso mesmo, fiquem como que, exclusivamente, à guarda de um único progenitor, estando, assim, arredadas do convívio que se presume que deve ser saudável e salutar com ambos os progenitores.
No entanto, e por termos um claro entendimento das circunstâncias de violência que estão sempre associadas às situações de divórcio, de ruptura familiar, etc., introduzimos o princípio de que esta guarda conjunta só deveria ser decretada mediante o acordo entre os pais e considerámos que se tratava, claramente, de uma propositura de natureza pedagógica que provocaria alterações nos modelos a adoptar nos tribunais, nos modelos a adoptar nas conciliações que se estabelecem em famílias nestas circunstâncias. Infelizmente, não foi isto que se verificou, porque o número de sentenças visando a fixação da guarda conjunta é de tal forma exíguo que não podemos dizer que tenha sido o modelo que tenha feito ou que venha a fazer escola em Portugal.
Gostava também de referir que, relativamente às outras propostas dos peticionantes, nos merece especial destaque aquela que se refere a uma alteração da terminologia, nomeadamente a que se refere à transferência das referências sistemáticas ao "poder paternal" para "guarda" ou para "responsabilidade parental", porque são de todo em todo adequadas, na medida em que significam a desejável perspectiva de envolvimento simultâneo de ambos os progenitores. Aliás, prova desta perspectiva têm sido as introduções que progressivamente se têm feito nos vários diplomas que, entretanto, se têm produzido, designadamente nas alterações que foram introduzidas na Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, aquando da revisão recente do instituto da adopção.
Gostava ainda de salientar que, no que se refere à necessidade de formação dos magistrados, dos funcionários, do pessoal que trabalha nestas áreas dos tribunais de família e de menores, nós também entendemos que estas pessoas devem ter uma formação especializada e a que existe ainda não é suficiente. Mas

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trata-se de matéria de grande melindre, relativamente à qual, normalmente, quem decide não tem a necessária e adequada formação.
Nesse sentido, e também retomando as introduções feitas na legislação relativa à adopção, porque também aí são introduzidos princípios significativos que induzem à formação especializada deste tipo de pessoas, aliás, têm vindo a surgir várias iniciativas de formação especializada na área das crianças e do direito da família.
A concluir, gostava de dizer que, naturalmente, qualquer decisão e qualquer intervenção nesta matéria têm de ser sempre mediante o acordo mútuo. As crianças não podem ser, de qualquer forma, envolvidas nos conflitos dos seus pais e…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, esgotou-se o tempo de que dispunha.

A Oradora: - Muito obrigada, Sr. Presidente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apresenta a "Pais para Sempre", Associação para a Defesa dos Filhos e dos Pais Separados, uma petição em que solicita a alteração de diplomas legais, como o Código Civil, a Organização Tutelar de Menores e a Lei de Protecção da Maternidade e da Paternidade.
Na presente petição, pretendem os peticionantes ver alteradas disposições legais relativas ao exercício do poder paternal, com vista à defesa dos interesses dos filhos menores de pais separados ou divorciados.
Entendem que o crescente número de divórcios e de filhos a viverem com apenas um dos progenitores, a morosidade dos processos de regulação do poder paternal, a obrigação positiva do Estado e da sociedade em geral de garantir a efectividade dos direitos das crianças, o dever dos pais de desempenharem a sua função parental, a importância da relação próxima dos filhos com ambos os progenitores e o papel social e familiar desempenhado pelo pai e pela mãe nas estruturas familiares presentes na sociedade justificam as alterações legislativas pretendidas.
As alterações consubstanciam-se na substituição dos termos "poder paternal" e "direito de visita" pelas expressões "responsabilidade parental" e "tempos com", respectivamente. Ora, em nosso entender, não será pela substituição destas expressões que se alcançará uma melhor justiça de menores, pelo que, a fazer-se, esta alteração teria de ser pensada seriamente em simultâneo com alterações substantivas de fundo no regime em causa, o que aqui não é proposto.
Propõem também os peticionantes o estabelecimento do exercício conjunto da responsabilidade parental como padrão ou norma, deixando a guarda única para todas as situações em que a manifesta incapacidade de um dos progenitores assim o exigisse. Esta alteração seria a ideal, mas não será de todo praticável se não for implementada em simultâneo com mecanismos de mediação, sendo certo que a conflitualidade nos processos de regulação paternal é muita e não é a imposição da guarda conjunta que vai acabar com os litígios constantes e intensos de muitos pais em relação aos filhos.
Propõem, igualmente, a penalização da inviabilização dos tempos da criança com qualquer um dos progenitores, tipificando-a como crime contra a criança. Ora, a criminalização dos comportamentos dos pais que se traduzem em inviabilizar o exercício do direito de visita é manifestamente excessiva, atendendo ao princípio da proporcionalidade e da subsidiariedade que deve dominar o Direito Penal, a que acresce a circunstância relevantíssima de, em nosso entender, tal criminalização ser mais um forte contributo para a agudização do conflito familiar e do sofrimento de uma criança que se sentiria a causa, no limite do absurdo, do seu pai ou da sua mãe estarem presos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O direito de filiação carecerá, efectivamente, de revisão, pelo menos quanto aos aspectos processuais, mas alterações tão profundas não devem ser feitas sem um intenso estudo de todas as implicações das possíveis soluções, devendo evitar-se alterações pontuais, aqui e ali, sem a sistemática que o rigor desta matéria exige, tendo em conta a defesa do superior interesse da criança.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição em análise parte de

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alguns pressupostos verificáveis empiricamente nas sociedades contemporâneas. De facto, mudou hoje o conceito de masculinidade e de feminilidade, mudaram as relações de género, mudaram os papéis sociais de homem e de mulher, mudaram, inclusivamente, os modelos familiares. Face àquilo que era um modelo único de família, temos, hoje, modelos plurais e as chamadas famílias recompostas, resultantes, por exemplo, de uma situação anterior de divórcio.
O que move os subscritores desta petição é, por isso, o desfasamento entre o Direito da Família, a realidade, por um lado, e os próprios valores sociais da contemporaneidade, por outro.
Os subscritores, eles próprios vítimas dessa discrepância, chamam a atenção para a necessidade de adequação do Direito da Família ao desejo de aumentar a autonomia e a independência da mulher, mas também ao despertar do homem para um maior empenhamento na sua relação afectiva com os filhos e ao interesse da criança na manutenção de uma relação de proximidade com ambos os pais face à ruptura da vida conjugal. Não mais faz sentido pensar que ao homem cabe o papel instrumental de ganha-pão e à mulher o papel expressivo de cuidar ou guardar os filhos; esses papéis cabem tanto a um como a outro cônjuge.
Além destas, adiantaríamos ainda a necessidade de adequar o Direito da Família às novas e plurais formas de família e às famílias recompostas. Recorde-se que também o recente Congresso da Justiça reflectiu sobre esta matéria, recomendando, entre as suas conclusões, que se preste uma especial atenção à procura de meios eficazes para o cumprimento forçado das obrigações alimentares devidas a menores e de outras obrigações emergentes da regulação do exercício do poder paternal, ao estatuto jurídico dos membros das famílias recompostas e à promoção da mediação familiar. É verdade que a mediação familiar já hoje existe, mas não é ainda prática corrente, como nós e os peticionantes gostaríamos que fosse.
É fundamental, por isso, reflectir sobre esta matéria e retirar as consequências possíveis desta petição, seguindo o exemplo da Assembleia Nacional Francesa, que, após audição de associações congéneres da "Pais para Sempre", alterou a legislação, adequando-a à realidade.
É fundamental criar medidas que determinem efectivamente o respeito pelo interesse superior da criança e que não o façam depender de quaisquer filtros que advêm de preconceitos existentes na legislação.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A próxima oradora é a Sr.ª Deputada Isabel Castro, a quem peço desculpa por não ter dado antes a palavra, uma vez que estava inscrita primeiro que o orador anterior.
Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição que a Câmara está hoje a apreciar, que tem como primeira subscritora a associação "Pais para Sempre", remete-nos para um problema relativamente ao qual cada vez mais cidadãos têm apelado à intervenção da Assembleia da República. No fundo, esse problema reside na evolução natural da sociedade, no aumento de divórcios, na evolução das famílias, consideradas de modo alargado, e nas rupturas familiares.
Refere-se esse problema à forma como, perante esses contextos, se concilia os direitos das crianças com o exercício de uma maternidade e paternidade responsáveis e conscientes; à forma como se consegue que, com rupturas familiares, seja salvaguardado o direito das crianças, ou seja, a possibilidade de manterem uma relação afectiva regular com os dois progenitores e, por outro lado, à forma como conseguem os dois progenitores exercer com equilíbrio o direito que têm, e que beneficia a criança, a fazer o acompanhamento dos seus filhos.
Se, para Os Verdes, é essencial conseguir que uma ruptura numa família, ou seja, o fim dos afectos entre os pais, não seja um elemento penalizador para as crianças e conseguir preservar aquilo que é essencial na relação, isto é, uma forte ligação de afecto com as crianças e o seu equilíbrio, o problema está em saber se o que hoje nos é proposto pelos peticionários - a possibilidade de responsabilidade parental e guarda conjunta - é possível no quadro actual.
Na opinião de Os Verdes, se esse é, seguramente, o caminho do futuro, se essa é, seguramente, ainda hoje, uma experiência residual, que quando consegue valer e é possível é a melhor solução, parece-nos que na actual situação não estão ainda criadas condições para que tal possa acontecer, porquanto há uma condição prévia que não é equacionada na petição: só há possibilidade de partilha igual de responsabilidades e de guarda conjunta quando a vontade de uma mãe e de um pai o permitem. Quando essa vontade não existe, não pode ser administrativamente ditada nem imposta.
Portanto, parece-nos que há aqui um desajuste que resulta do modo ainda conflituoso como, após dissolução de um casamento ou de uma união de facto, se relacionam os dois progenitores.
Esta é, seguramente, uma questão que tem actualidade e que a terá cada vez mais, até num quadro em

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que casamentos entre pessoas de diferentes nacionalidades vem colocar de modo novo problemas delicados em termos da permanência e dos tempos que as crianças estão com cada um dos progenitores, sabendo-se que alguns vivem em países diferentes. Estas são questões delicadas.
Em conclusão, gostava de dizer que, do ponto de vista de Os Verdes, sendo este o modelo ideal e sendo este, seguramente, o modelo do futuro, a situação actual em que prevalece ainda a violência e em que a possibilidade de a criança ser, como ainda é, um instrumento de prolongamento da conflitualidade e do litígio parece-nos ser ainda incompatível não com a guarda conjunta mas com a guarda conjunta imposta administrativamente e pela lei.
Duas outras questões gostaria de sublinhar, prendendo-se uma delas com a criminalização proposta. Não subscrevemos, por princípio, a criminalização como meio de prevenir e evitar situações como as que esta proposta suscita. Por outro lado, há um aspecto, de algum modo menos valorizado nesta petição mas que para nós é importante: a necessidade de preparar não só magistrados mas todos aqueles que se debruçam sobre estes processos para lidar com um assunto cuja delicadeza extrema remete, necessariamente, para um olhar atento, para uma preparação que, hoje, manifestamente não existe.
Portanto, do nosso ponto de vista, a petição, tal como nos é apresentada, procura uma solução de utopia para a qual a sociedade e, sobretudo, os casais ainda não estão, lamentavelmente, preparados.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, apenas mais duas ou três questões.
Nem eu nem o meu grupo parlamentar temos dúvidas de que, de facto, a guarda conjunta será o caminho do futuro, como também não temos dúvidas nenhumas de que a esse caminho tem conduzido não a luta dos pais, que é muito recente, mas a luta das mulheres.
Na verdade, foi a sua luta pela entrada no mercado de trabalho, pela igualdade, pela partilha de tarefas que tem conduzido àquilo a que, embora ainda numa percentagem não muito significativa, Elisabeth Badinter chamou de revolução paterna. É essa luta que tem conduzido, de facto, a que haja, hoje, pais que estão muito mais presentes na vida dos filhos. Portanto, um dia, a guarda conjunta há-de servir o interesse das crianças, mesmo quando imposta por um juiz em caso de desacordo.
Porém, não nos parece - e foi por isso que há pouco citei dados da violência doméstica e a percentagem das vítimas da violência doméstica do sexo feminino - que este seja o momento para alterar o que está no Código Civil, porque isso traria, pelo contrário, maiores traumas para as crianças.
Impor uma guarda conjunta a uma família em conflito traria, penso eu, maiores perturbações à vida das crianças. Aliás, os peticionantes não referem qual a modalidade. É que não há só uma modalidade. Há a guarda legal, que é a igual à do casamento mas em que a residência não pode ser alternada, e há aquela que tem residências alternadas, que muitos tribunais consideram que não é conveniente para as crianças pela instabilidade que lhes cria.
É certo que surgiram há pouco tempo movimentos - são muito recentes - de associações de pais que lutam por isto, porque, na opinião deles, estarão mais presentes na vida das crianças. A Assembleia Nacional Francesa ouviu a Associação Allo Pappa - Allo Maman e, lamentavelmente, não ouviu outras associações que sobre esta matéria tinham uma opinião divergente como a Solidarité Femme ou a Associação Mères en Lutte. De facto, não encontramos a posição que essas associações tomaram.
A terminar, mais duas observações. Primeira, a solução da guarda conjunta está a ser posta em causa mesmo por pessoas, especialistas e peritos, que, no início, apoiaram essa solução. Não vou ter tempo de ler tudo, mas chamo a atenção para o relatório que elaborei, onde vem a opinião de uma conceituada investigadora nesta área, Judith Wallerstein, segundo a qual "(…) quando a guarda conjunta é imposta pelo tribunal as famílias lutando pela guarda das crianças, as piores consequências da luta recaem sobre o membro mais fraco da família - a infeliz e desamparada criança."
Terminaria, porque me parece muito importante, citando Elisabeth Badinter no livro XY, A Identidade Masculina, onde diz que a revolução paterna irá trazer "grandes transformações…" - e nós também entendemos que vai trazer - "… nas gerações vindouras e nomeadamente uma nova masculinidade, mais diversificada e mais subtil."
Tratando depois da oposição que, normalmente, as mulheres fazem à entrega das crianças aos cuidados do pai, afirma: "(…) Para explicar a sua atitude de recusa, muitas mulheres invocam a incompetência dos maridos, que acabam por lhes dar mais trabalho do que o que lhes poupam. Mas, mais profundamente, elas sentem a sua preeminência maternal como um poder que não querem repartir (…)."
Ora, quero dizer que quem entregou este poder às mulheres foi, de facto, a família patriarcal. Não estou de acordo com isto, como é óbvio, mas as mulheres sentem esse poder.
Diz, ainda, Elisabeth Badinter que pode admitir-se que a mentalidade "não mudará substancialmente, enquanto o conjunto da sociedade não tiver ratificado uma nova distribuição dos poderes masculinos e

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femininos. (…) Estes pais que partilham as tarefas a 100%, sem qualquer distinção dos papéis, não são de todo representativos da sociedade familiar actual." Os pais que não aceitam "não são 'pais impedidos' pelas mulheres, mas os herdeiros do homem duro, que interdita a si próprio ser pai."

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos, declaro encerrada a discussão da petição n.º 76/VIII (3.ª).
Passamos à discussão da petição n.º 24/IX (1.ª) - Apresentada pela Associação dos Profissionais da Guarda e outros, solicitando iniciativa por forma a consagrar o horário de serviço de 35 horas semanais na GNR.
Tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Custódia Fernandes para apresentar o relatório da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais.

A Sr.ª Custódia Fernandes (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição n.º 24/IX (1.ª), da iniciativa da Associação dos Profissionais da GNR, subscrita por 13 169 cidadãos, foi admitida pela Assembleia da República em 6 de Maio de 2003.
Os peticionários vêm, através da presente petição, solicitar à Assembleia da República a adopção de uma medida legislativa que consagre o horário de serviço de 35 horas semanais para os profissionais da GNR.
De uma análise do teor da petição, concluiu-se que, objectivamente, a pretensão dos peticionários só poderá ser satisfeita através de uma medida legislativa que altere o actual Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana, aprovado através do Decreto-Lei n.º 265/93, de 31 de Julho, nos termos do qual os seus membros estão sujeitos à disponibilidade permanente no desempenho das suas funções.
Com efeito, nos termos do referido diploma legal (artigo 9.º), os militares da Guarda Nacional Republicana estão sujeitos ao dever de disponibilidade permanente, não se encontrando, assim, fixado um horário de trabalho para o desempenho das suas funções.
Dado que se afigurava útil para o debate em torno desta matéria conhecer a posição do Governo, nomeadamente do Ministério da Administração Interna, quanto à pretensão dos peticionários, a Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, na sua reunião de 17 de Novembro de 2003, deliberou, sob proposta da relatora, o envio da petição ao Ministério da Administração Interna para que se pronunciasse sobre o respectivo conteúdo.
Em resposta à solicitação que lhe foi feita, o Sr. Ministro da Administração Interna transmitiu à Assembleia da República a posição do seu Ministério sobre a matéria em debate e que consta do relatório final aprovado pela Comissão Parlamentar de Trabalho e dos Assuntos Sociais.
Na opinião do Governo, como se infere da informação recebida, o dever de disponibilidade para o serviço decorre das próprias características das missões cometidas à GNR, as quais só serão cabalmente prosseguidas se for mantido em vigor o dever de disponibilidade permanente para o serviço.
Finalmente, e considerando que a pretensão ora em apreço implica a adopção de uma medida legislativa sobre o horário de trabalho dos militares da GNR; que a adopção de uma tal medida legislativa se inscreve no âmbito das competências próprias dos grupos parlamentares; e que se encontravam esgotados os mecanismos de intervenção da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, a referida Comissão aprovou, sob proposta da relatora, o parecer no sentido da petição n.º 24/IX (1.ª), dado que é subscrita por mais de 4000 cidadãos, ser enviada ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acompanhada do competente relatório e demais elementos instrutórios, para que, nos termos legais aplicáveis, seja apreciada por este Plenário.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais, queria agradecer ao CDS-PP e a Os Verdes a cedência de tempo à minha bancada para esta minha intervenção.
Sr.as e Srs. Deputados: É hoje debatida a petição n.º 24/IX (1.ª), apresentada pela Associação dos Profissionais da Guarda, cujos dirigentes estão presentes nas galerias e que aproveito para saudar, subscrita por 13 169 cidadãos, solicitando iniciativa legislativa por forma a consagrar o horário de serviço de 35 horas semanais na GNR.
A circunstância de esta petição ter sido subscrita por mais de 4000 cidadãos determina a sua apreciação em Plenário da Assembleia da República, com isto sublinhando, desde logo, a importância que a

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matéria reveste no âmbito daquela força de segurança.
É sabido que, para o Partido Social Democrata, a segurança é um valor essencial de uma sociedade democrática e factor imprescindível para o desenvolvimento social e económico do País.
Por isso e na linha de pensamento e acção desenvolvidos pelo actual Governo, aqui reafirmamos a necessidade de acentuar a autoridade democrática do Estado no sentido da defesa do prestígio e da dignidade das forças e serviços de segurança e dos seus elementos.
Daí que o Partido Social Democrata considere relevante e, até, urgente a revisão das leis orgânicas, a aposta na qualificação de recursos humanos, incluindo a formação e valorização das forças policiais, e ainda a modernização de instalações e equipamentos.
Neste particular, acentuamos a importância das condições em que é prestada a actividade dos profissionais das forças de segurança, com isto significando o relevo com que encaramos a matéria relativa aos horários de trabalho - aquela que é objecto da petição que hoje apreciamos.
A fixação de um horário de trabalho na Guarda Nacional Republicana (GNR) carece de adequada regulamentação, e isto porque importa ter presente as características específicas e natureza desta força de segurança.
Na verdade, a regulamentação do horário de trabalho na GNR impõe a necessária adequação com os diversos preceitos normativos constantes do Estatuto dos Militares da GNR, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 256/93, de 31 de Julho, bem como do Regulamento Geral do Serviço da GNR, aprovado pela Portaria n.º 722/85, de 25 de Setembro. Ou seja, teremos de considerar que o dever de disponibilidade para o serviço decorre, assim, das próprias características das missões cometidas à GNR, as quais só serão cabalmente prosseguidas se for mantido em vigor o dever de disponibilidade permanente para o serviço.
De resto, os diversos suplementos remuneratórios abonados aos militares da GNR têm na génese da sua criação a compensação pelas condições específicas de disponibilidade dos militares, no cumprimento da missão da Guarda, significando a revogação do dever de disponibilidade permanente um repensar da forma de compensar a prestação de serviço que ultrapasse o limite de um eventual horário de trabalho.
Em todo o caso, importa considerar que, sem prejuízo dos estudos que estão a ser desenvolvidos no sentido de se proceder à regulamentação do horário de trabalho na GNR, em articulação com o Estatuto dos Militares da Guarda, já hoje existe uma preocupação assumida pelo Comando Geral desta força de segurança, que tem vindo a adoptar medidas conducentes à normalização dos horários actualmente praticados.
Mais, é ainda verdade que nas diferentes unidades e subunidades existem normas internas que garantem períodos de descanso proporcionais aos tempos de trabalho efectivamente prestados pelos militares.
Porém, queremos significar a bondade da petição que apreciamos, com isto considerando o sentimento da necessidade de analisar com especial atenção os tempos de trabalho praticados pelos militares da GNR com a indispensável salvaguarda dos intervalos de descanso.
Sabemos que o Governo, no estrito cumprimento do seu Programa aprovado nesta Câmara, vem realizando grandes reformas na área da Administração Interna, aqui realçando que 2004 significará o ano das reformas das leis orgânicas da PSP e da GNR.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Social Democrata considera e está ciente de que as preocupações trazidas pelos profissionais da Guarda, no âmbito da petição que hoje apreciamos, serão objecto de análise cuidada e a matéria tratada com a profundidade que exige.
Mais, estamos convictos de que, por via dos novos estatutos, serão tomadas as medidas indispensáveis à clarificação dos horários de trabalho na Guarda Nacional Republicana, assim compatibilizando as exigências da missão desenvolvida pelos militares da GNR com o respeito e a dignidade que estes merecem, sempre a bem de Portugal e dos portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Sr. Presidente, começo por agradecer ao Sr. Deputado João Teixeira Lopes a cedência de tempo por parte do Bloco de Esquerda.
Quero saudar os promotores desta petição pela pertinência do tema que aqui nos trazem e que urge, de facto, discutir: a fixação de um horário de trabalho para os militares da GNR.
Não podemos ignorar o contexto em que esta petição é discutida. É um contexto de desmotivação dos militares da GNR, em que se sentem ainda ondas de choque de decisões políticas erradas, controversas, e de algumas questões que têm ocorrido no interior da GNR. É um contexto de desinvestimento, tanto mais surpreendente pelo discurso securitário do passado que os partidos que compõem a maioria governamental tiveram. É um contexto de envelhecimento de equipamentos, de postos e de quartéis da GNR. É um

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contexto, também, de aumento da criminalidade, que tem, obviamente, implicado maior empenho da parte das forças de segurança.
Portanto, a discussão deste tema tem de ter em conta este contexto, tem de ser feita com seriedade e com equilíbrio, para se conseguirem orientações no sentido de uma determinada decisão que possa, de alguma forma, satisfazer o que é de satisfazer e que está implícito nesta petição.
Aliás, devemos procurar evitar soluções típicas do actual Ministério da Administração Interna, como aquelas que já conhecemos: "estamos a estudar; daqui a uns tempos, iremos dizer qualquer coisa sobre isto".
Os parâmetros do tema desta petição também são claros. Os militares da GNR estão sujeitos a um regime de disponibilidade permanente, não podendo ausentar-se do sítio onde prestam funções sem autorização dos seus superiores, estando, por isso, frequentemente sujeitos a um regime de trabalho que leva a que, durante largos períodos, se mantenham afastados das suas próprias famílias, com tudo o que isso implica em termos de mobilização e de empenho.
Este regime que está em vigor parece provocar alguns excessos. Ouve-se falar de militares - e temos ouvido tais alegações, nomeadamente, da parte da Associação dos Profissionais da Guarda Nacional Republicana - que são forçados a trabalhar 50, 60, 70 horas por semana. Ora, isto é manifestamente inaceitável, desde logo numa perspectiva humanista, uma vez que não é possível exigir-se aos militares da GNR o cumprimento de missões desta forma, com este sacrifício, mas também é inaceitável na perspectiva do eficaz cumprimento das missões de segurança, que são exigentes. Por isso, há que ponderar se o sistema deve manter-se assim, com este regime de disponibilidade permanente, ou se deve evoluir.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, a questão é a de saber se é essencial que o sistema se mantenha assim. Sendo essencial que assim se mantenha, deve manter-se exactamente como está ou pode haver alguma evolução?
A este propósito, vale a pena atentar no que se passa em Espanha. Procurei fazer essa pesquisa e, de acordo com os elementos que recolhi relacionados com a Guardia Civil, organização semelhante à nossa GNR, verifiquei que os respectivos elementos estão sujeitos a um regime de disponibilidade permanente, como cá, mas tal não obsta a que haja um número de horas de trabalho de referência. Aliás, mais rigorosamente, há um número de horas de referência que está fixado na lei - 37,5 horas, 40 horas -, mas isso não impede que eles estejam sujeitos a um regime de disponibilidade permanente e que, a qualquer momento, possam ser chamados a desempenhar funções. Parece, contudo, que a regra é um número de horas fixo e a excepção é a possibilidade de serem chamados por via da disponibilidade permanente. Creio que é uma solução que merece ser estudada ente nós.
É certo que poderia fazer-se aqui um "número" demagógico e dizer "sim, senhor, 35 horas já, imediatamente; vamos fazê-lo!" Creio que não deve fazer-se nenhum "número" desse género, portanto, a nossa posição é no sentido de sugerir que se pense nesta questão e se possa ter em conta os impactos de natureza financeira, organizacional e funcional que pode provocar a evolução para horário de funcionamento estabelecido com antecedência, mas temos de procurar uma solução de equilíbrio. Sugiro, pois, quatro aspectos de evolução para essa solução de equilíbrio.
Em primeiro lugar, admitir que a solução que venha a ser assumida seja uma solução gradual e não brusca, de passagem brusca do sistema actual para um sistema diferente, o que pode provocar problemas graves no âmbito do funcionamento da GNR.
Em segundo lugar, aceitar que se deve regular o horário do trabalho, de modo a evitar situações de desumana prestação do serviço, como parece verificar-se hoje.
Em terceiro lugar, reconhecer que, no quadro actual, não se pode prescindir do regime de disponibilidade permanente, embora este deva evoluir, porventura, para um sistema semelhante ao que existe em Espanha, isto é, a disponibilidade permanente é o último recurso, apenas quando é absolutamente necessário, e tem de ser fundamentado o recurso a tal disponibilidade, sendo que a regra é a existência de um horário de trabalho fixado.
Em quarto lugar, e finalmente, conceber soluções inteligentes, flexíveis, que permitam que os militares da GNR possam, inclusive, optar entre o regime de disponibilidade permanente, porventura mais bem remunerado, e um outro regime de natureza diversa.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É previsível que, tal como já o fez, a maioria nos traga a mensagem de que o Governo está a pensar, está, há dois anos, a pensar intensamente numa solução e que, daqui a uns tempos, haverá essa solução.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - E é a verdade!

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O Orador: - Como sabemos, o Sr. Ministro da Administração Interna já nos prometeu, há muito tempo, que haveria um novo estatuto dos militares da GNR. Prometeu-o há quase dois anos, num dos primeiros discursos que fez nesta Casa. Tenho algumas dúvidas que esse estatuto venha assim tão rapidamente, mas é necessário encontrar uma solução para este que é um problema grave.
Os militares da GNR, em alguns casos, estão sujeitos a situações de prestação de serviço que são desumanas e, portanto, é necessário transmitir-lhes um sinal de apreço pelo seu trabalho, o que, de facto, tarda a vir do Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apresenta a Associação dos Profissionais da Guarda Nacional Republicana a presente petição, solicitando à Assembleia da República a adopção de uma medida legislativa que consagre o horário de serviço de 35 horas semanais.
Mais concretamente, pretendem os peticionantes que se altere o actual Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 256/93, de 31 de Julho, nos termos do qual é exigido aos profissionais da Guarda Nacional Republicana disponibilidade permanente.
Esta disponibilidade permanente implica a inexistência de um horário de trabalho para o desempenho das suas funções, o que, de certa forma, decorre das características específicas desta força de segurança.
O próprio Estatuto dispõe que, face à especificidade da missão, o militar da Guarda encontra-se permanentemente em serviço e deve manter, permanentemente, disponibilidade para o serviço, ainda que com sacrifício dos interesses pessoais.
Neste sentido, entendemos que o dever de disponibilidade decorre das próprias características das missões cometidas à Guarda Nacional Republicana, as quais só serão prosseguidas se for mantido o dever de disponibilidade para o serviço.
Importa, igualmente, referir que os diversos suplementos remuneratórios abonados aos militares da Guarda Nacional Republicana foram criados precisamente para compensar as condições específicas de disponibilidade dos militares.
Assim, se, porventura, se revogar o dever de disponibilidade permanente, grande parte dos suplementos serão necessariamente retirados, uma vez que a total disponibilidade deixará de existir.
Paralelamente, no que se refere aos tempos de descanso, importa referir que estes períodos são proporcionais aos tempos efectivamente prestados pelos militares.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A fixação de um horário de serviço de 35 horas semanais e a revogação do dever de disponibilidade permanente, como é proposto pelos peticionários, é totalmente incompatível com o cabal cumprimento das missões que se lhes encontram cometidas.
O CDS-PP entende que o dever de disponibilidade permanente não é uma mera decorrência da condição militar do pessoal da Guarda Nacional Republicana, mas, sim, uma forma de assegurar a capacidade de resposta às solicitações que são feitas diariamente a esta força de segurança.
A fixação de um horário de trabalho na Guarda Nacional Republicana carecerá, assim, de um estudo aprofundado das várias soluções, para uma adequada regulamentação dadas as características específicas desta força de segurança.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, para uma intervenção.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por saudar, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, todos os subscritores desta petição, na pessoa dos seus representantes que, nas galerias destinadas ao público, assistem a este debate.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O princípio da disponibilidade permanente, tal como está consagrado no estatuto da GNR, é uma das consequências mais abusivas do estatuto militar que tem vindo a ser imposto a esta força de segurança e constitui uma forma inaceitável de exploração (é esse o termo) dos cidadãos que prestam serviço na GNR.
É do conhecimento geral - e já foi referido neste debate - que os profissionais da GNR são, por vezes, obrigados a cumprir ritmos de trabalho que chegam a atingir as 80 horas semanais, o que é desumano e incompatível com um Estado de Direito e, aliás, com a Constituição da República.
Dessa forma, encontrou-se um processo muito simples de ter agentes de segurança sem limite de

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horário de trabalho e sem olhar para as consequências que essa situação traz, obviamente, para os próprios e para as suas famílias, mas também para o próprio serviço que é prestado, porque ninguém pode exigir que alguém esteja em perfeitas condições de prestar um serviço adequado aos cidadãos sendo sujeito a ritmos de trabalho dessa natureza.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Com certeza!

O Orador: - Obviamente que, para nós, seria inteiramente justificado que se encontrasse um regime de horário de trabalho para a GNR que fosse basicamente semelhante àquele que se estabeleceu para a PSP, que, diga-se de passagem, funciona sem que daí decorram problemas para essa força de segurança. Estabelece-se que o serviço na PSP é de carácter permanente e obrigatório, existindo, no entanto, um horário normal de serviço, fixado por despacho do Ministro da Administração Interna.
Ora, é isso que, do nosso ponto de vista, deveria ser estabelecido para a GNR. Pode haver um serviço que seja de carácter permanente e obrigatório, existindo, no entanto, um horário de trabalho de referência. E não se compreende por que é que não existe também para a GNR.
Não se diga que isso é incompatível com o estatuto da GNR, porque, que eu saiba, a GNR é uma força de segurança, tal como a PSP. Mas, se o problema é de estatuto, o que está mal é o estatuto. E, então, o que há a fazer é alterar o estatuto e não forçar as pessoas a terem a sua vida condicionada, de uma forma arbitrária, por um estatuto que é inadequado e manifestamente injusto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Dir-se-á que isto traz mais encargos para o Estado português e provavelmente trará. O problema é que, hoje em dia, os únicos a ter de suportar esses encargos são os profissionais da GNR e não é justo que sejam unicamente eles a pagar com a sua disponibilidade pessoal e familiar o facto de o Estado português não querer assumir mais encargos com o funcionamento desta força de segurança.
Pode consagrar-se um dever de apresentação pontual ao serviço, um dever de comparecer sempre que circunstâncias especiais o exijam, um dever de não se ausentar sem autorização - até aí, muito bem, todos nós compreendemos que o serviço numa força de segurança impõe sacrifício de interesses pessoais, em certos momentos.
Só que a consagração do princípio da disponibilidade permanente, tal como está actualmente, implica a manutenção de um princípio, que é absurdo, de sacrifício permanente de interesses pessoais perante regimes de trabalho que podem ser definidos arbitrariamente pelo comando.
Não é admissível que, sem que haja circunstâncias excepcionais que o exijam, um profissional da GNR seja obrigado a um regime de duração do trabalho que está acima de tudo o que é razoavelmente exigível a qualquer cidadão.
Obviamente que os profissionais da GNR, homens e mulheres da GNR, têm direito a ter a sua família. E não é admissível que o dever e o direito de um profissional da GNR de acompanhar os seus filhos, de ter uma situação familiar normal, fique dependente da boa-vontade de um qualquer comando. Isto é absolutamente inadmissível.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Como é do conhecimento geral, o PCP já apresentou um projecto de lei sobre esta matéria. Seria lógico que, sendo discutida a petição, houvesse a possibilidade de as iniciativas legislativas com ela relacionadas serem também debatidas, por arrastamento. Essa é, aliás, uma solução que o PCP tem vindo a propor em sucessivas revisões do regime de exercício do direito de petição mas que ainda não foi consagrada. Portanto, apesar de já ter sido apresentado um projecto de lei sobre esta matéria, ele não está hoje em discussão.
No entanto, julgamos que esta discussão não deve ser afastada e, portanto, que a Assembleia da República não deve perder de vista a ideia de, o mais brevemente possível, poder legislar sobre esta matéria ou pronunciar-se sobre ela, se eventualmente aparecer uma proposta de revisão do estatuto da GNR.
Esta situação absurda, hoje existente, de disponibilidade permanente irrestrita dos profissionais da GNR para o serviço, deve ser alterada e deve ser encontrada uma solução razoável, que obviamente consagre a especial disponibilidade que o serviço numa força de segurança exige mas que também preveja um horário de trabalho de referência, mediante o qual as pessoas possam organizar minimamente a sua vida pessoal e familiar.
Pela nossa parte, continuaremos a bater-nos por isto e esperamos que a Assembleia da República, nesta Legislatura, possa resolver este problema de uma vez por todas.

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Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais oradores inscritos, declaro encerrado o debate conjunto das petições n.os 76/VIII (3.ª) e 24/IX (1.ª).
Antes de passarmos ao último ponto dos trabalhos, há um anúncio a fazer à Câmara. Para o efeito, tem a palavra o Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Fernando Santos Pereira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de resolução n.º 219/IX - Orientações para uma política tarifária justa para os transportes públicos colectivos urbanos e para o passe social intermodal em Lisboa e Porto (BE).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos, agora, à apreciação do relatório da Comissão Parlamentar de Execução Orçamental sobre a dívida pública e garantias pessoais do Estado em 2003.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Ribeiro, relator da comissão.

O Sr. José Ribeiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A apresentação deste relatório vem dar continuidade ao estabelecido no plano de actividades da Comissão de Execução Orçamental, que consagra a elaboração de relatórios de acompanhamento sobre diversas matérias que têm enquadramento na sua competência específica.
Por outro lado, vem também dar cumprimento e sequência ao controlo político consagrado na lei de enquadramento orçamental, que, como é sabido, atribui ao Parlamento um papel central.
Nesta temática, este é o sétimo relatório apresentado, tendo todos os anteriores sido aprovados por unanimidade, o que, só por si, demonstra o seu interesse e a sua importância.
Contudo, antes de se avançar para a apreciação do mesmo, inevitavelmente sintética dada o limitado tempo de que se dispõe, importa expor, de forma resumida, algumas notas prévias.
O trimestre começou com uma forte subida das taxas de rendibilidade, sobretudo no longo prazo, em antecipação a um cenário de recuperação económica pós-conflito do Iraque, que foi entretanto posto em causa pela divulgação de indicadores económicos menos favoráveis, quer para os Estados Unidos da América quer para a Europa. As taxas continuaram a cair até meados de Junho, altura em que atingiram novos mínimos históricos.
No curto prazo, as taxas de rendibilidade acompanharam parcialmente estas quedas, antecipando novas descidas nas taxas directoras dos bancos centrais, que vieram a concretizar-se em Junho, tendo o Banco Central Europeu e a Reserva Federal Americana reduzido as suas principais taxas de refinanciamento em 50 e em 25 pontos base, respectivamente, níveis mínimos também históricos.
Contudo, as taxas de rendibilidade de longo prazo começaram a subir novamente, pelo que, no final do trimestre, as taxas de rendibilidade das obrigações do Tesouro estavam, em média, cerca de 30 pontos base mais elevadas em todos os prazos. As descidas foram mais pronunciadas nos prazos mais curtos, verificando-se, por isso, um ligeiro aumento da inclinação da curva.
Por outro lado, os diferenciais de custo de financiamento da República em relação aos restantes emitentes soberanos da área do euro continuaram a reduzir-se neste trimestre, atingindo, em meados de Junho, o mais baixo diferencial face à Alemanha, desde a introdução do euro, ou seja, cerca de 6 a 7 pontos base, o que deve ser positivamente destacado, dado a sua grande importância.
Esta situação assume maior relevância quando se efectua uma comparação com outros países europeus com finanças públicas mais reforçadas.
Esta evolução é reflexo da consistência da actual política de financiamento, da liquidez e eficiência do mercado das obrigações do Tesouro, mas também da avaliação positiva do desempenho das finanças públicas de Portugal no contexto da zona euro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Consideradas estas notas prévias, importa agora apresentar abreviadamente algumas das conclusões que julgamos mais pertinente destacar.
No final do trimestre em apreço, o saldo da dívida directa do Estado, na óptica das contas públicas ao valor nominal e a câmbios correntes, ascendeu a 80 639 milhões de euros, resultando um acréscimo de 1174 milhões de euros face ao início do ano, o que não chega a representar 20% do valor previsto em sede de Orçamento do Estado para 2003.
Do valor total da dívida, 97,2% respeita à dívida em euros, enquanto os 23,8% se referem a dívida não negociável.

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As obrigações do tesouro permanecem como o principal instrumento financeiro do Estado, com o montante de 52 140 milhões de euros no final deste trimestre, o que corresponde a 64,7% do sotck total da dívida.
Por seu lado, os encargos da dívida pública ascenderam a 2512 milhões de euros, o que se traduz num aumento de 3,1% face ao período homólogo de 2002.
No final do semestre, as dívidas contraídas pela administração local ascendiam a 98 milhões de euros, enquanto as dívidas das administrações regionais se elevavam a 13 milhões de euros.
No que diz respeito às garantias pessoais do Estado, e considerando valores acumulados nos dois primeiros trimestres de 2003, constata-se que o valor adicional líquido das garantias prestadas se fixou em 21 milhões de euros. Este valor representa uma utilização muito diminuta das mesmas, visto que não chega a representar 2% do valor estabelecido no Orçamento do Estado para 2003.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, faço uma referência final ao rating da República: as principais agências internacionais do sector têm confirmado sistematicamente as suas notações em bom plano, quer para o emitente soberano, quer para a dívida em concreto, nomeadamente a de longo prazo.
Mais recentemente, já em Janeiro deste ano, a empresa de rating Standard & Poor's manteve o risco de crédito concedido a Portugal, fundamentando esta decisão no facto de o nosso país "ter uma economia relativamente próspera e diversificada nos progressos e compromissos das autoridades com reformas estruturais que incluem consolidação orçamental".
Mas dizem mais, apontando dois factores condicionantes do risco de crédito da República, a saber: "o constante desafio de inverter a deterioração orçamental registada em finais da década de 90 e a necessidade de aumentar a produtividade e reforçar a competitividade".
Termino, Sr. Presidente, referindo que as medidas que o Governo tem desenvolvido para o equilíbrio e a consolidação das finanças públicas têm tido reflexos óbvios, o que tem vindo a permitir o reforço da credibilidade financeira e orçamental de Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: No âmbito da gestão da dívida pública, o valor da sua relação percentual com o produto interno bruto foi um critério essencial na determinação das condições para que os Estados europeus que o pretendessem pudessem participar na criação da moeda única, o euro.
É importante relembrar que a dívida pública, gerando encargos para o futuro, condiciona, no seu volume e estrutura, a própria sustentabilidade dos processos de desenvolvimento económico e social.
Hoje, na própria revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, o critério da dívida pública ganha mais importância.
Sr. Presidente, em Portugal, durante a governação socialista, todo o processo de gestão da dívida pública mereceu grande atenção, tendo o IGCP, aliás, uma boa herança da anterior maioria, desenvolvido um conjunto de instrumentos e uma metodologia sofisticada e ulteriormente aperfeiçoada no quadro dos mercados da nova moeda europeia, o euro. Não foram boys ou girls a geri-lo, mas excelentes profissionais ao serviço da República, utilizando todas as suas capacidades e competências.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, em termos de apreciação política, nesta Câmara política eleita, é importante analisarmos como tem evoluído a dívida pública nos últimos anos. Em 1990, estava em 58,3% do PIB; em 1991, ano da última vitória eleitoral do cavaquismo, subiu a dívida pública para 60,7% do PIB, ultrapassando o limite "euro-maastrichtiano"; após a baixa em 1992 para 54,4%; até ao final do cavaquismo, em 1995, a dívida pública subiu para 64,3%, dando, pois, um salto de 10 pontos percentuais nestes três anos finais da legislatura, a ultima da governação do PSD. Foi também essa uma das heranças legadas pelo mago das finanças, hoje candidato presidencial, Cavaco Silva, na sua terceira encarnação de primeiro-ministro, quando a Dr.ª Manuela Ferreira Leite encarnava pela primeira vez como governante.
Sr. Presidente, durante o primeiro (tão excessiva e em boa parte injustificadamente atacado) governo de António Guterres, de 1995 a 1999, a dívida pública voltou a descer de 64,3% para 54,3% do PIB, descendo essa dívida pública em 10 pontos percentuais, invertendo, assim, o processo de endividamento agravado nos últimos anos do governo de Aníbal Cavaco Silva.
E o governo socialista logrou esta significativa redução da dívida, ao mesmo tempo que se aumentavam os gastos com a protecção social, se fazia crescer o emprego e se aumentava o investimento, garantindo

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também a sustentabilidade da segurança social. Entretanto, Portugal entrou no euro, tendo cumprido todos os critérios, enquanto três Estados, Itália, Bélgica e Grécia, não cumpriam, nomeadamente, o critério da dívida pública.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, em 2000, continua a descida da dívida pública, até 53,3 % do PIB. É claro que no segundo governo de Guterres se voltou, dada a modificação da conjuntura, a 55,6%…

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: -…de dívida sobre o PIB, mas muito longe dos 64,3% com que terminou o último governo cavaquista.

Aplausos do PS.

Em suma, os governos socialistas dirigidos por Guterres baixaram drástica e sistematicamente a dívida pública, assegurando uma das condições fundamentais para o desenvolvimento sustentável.
E, hoje em dia, o que se passa? O IGCP não pode fazer milagres, embora tenha feito o seu melhor. A questão é política, é de estratégia económica e financeira. Em 2003, segundo o Programa de Estabilidade e Crescimento, a dívida pública atinge 59,5% do PIB, ou seja, recua-se para um nível entre o de 1996 e de 1997. Em 2004, prevê o mesmo Programa chegar aos 60%, o consagrado limite máximo da dívida pública, isto é, recuamos mais de sete anos, ficamos novamente entre os níveis de 1996 e de 1997.
Srs. Deputados, quanto à contenção de custos tão falada há que referir, mesmo sem entrarmos em linha de conta com as baixas das taxas de juro, que as despesas financeiras correspondentes do Estado cresceram 5,3% de 2002 para 2003, a fazer fé nos dados divulgados pela Secretaria de Estado do Orçamento sobre execução orçamental. Se isto é contenção, estamos conversados!
Sr. Presidente, Srs. Deputados, é claro que o relatório em apreciação não cobre todo este período, mas é bom apreciarmos a questão politicamente, numa perspectiva evolutiva, sem desmerecer os méritos do relatório. Esta Câmara é política, a apreciação fundamentada também deve ser política!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Cardão.

O Sr. Pinho Cardão (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, julgo que o que está em discussão é um relatório da Comissão de Execução Orçamental, nada tendo a ver com a evolução da dívida pública.
O Partido Socialista, de facto, troca "alhos" por "bugalhos" e confunde tudo. E, já agora, no contexto da intervenção do Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, gostaria de lhe perguntar como é que concilia a sua enorme preocupação com o aumento da dívida pública com a sua obsessão pelo défice orçamental. É que o Partido Socialista tem dito e repetido à saciedade que o Pacto é estúpido e que o défice orçamental deveria aumentar como forma de desenvolvimento da economia. Incorrem, pois, sempre, em contradição absoluta.
De facto, como é que a dívida pode diminuir, se os senhores pretendem que aumente o défice? Com o aumento de impostos?
Gostaria que o Sr. Deputado me esclarecesse esta contradição em que incorrem a todo o momento, em cada minuto e mesmo em cada segundo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pinho Cardão, mesmo assim, tenho mais gosto em falar consigo do que com a Ministra Celeste Cardona.

Protestos do PSD.

O Sr. Deputado quer analisar o relatório que se chama "dívida pública e garantias pessoais do Estado em 2003", relativo ao terceiro trimestre. Vamos analisar trimestre a trimestre… E nós, como sabe, achamos que esta apreciação deveria ser aqui feita no plano semestral ou anual. Mas temos de dar a isto a perspectiva política da evolução durante estes quinze anos, pois é isso que interessa.

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Em segundo lugar, nós nunca dissemos que o Pacto era estúpido, foi Romano Prodi que o disse; nós achamos que há leituras mais e menos inteligentes do Pacto.
Aliás, quem subscreve a primeira versão do Pacto é o ex-Ministro Sousa Franco, uma pessoa de invulgar relevo e categoria.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Invulgar é!

O Orador: - Por outro lado, quanto ao défice e ao aumento de impostos, quero dizer que está muito enganado, nós não aumentámos impostos. A crítica que, aliás, se faz - discussão que VV. Ex.as, aliás, não tiveram coragem de fazer em público, fizeram-na em privado - é que descemos demasiado alguns impostos; os senhores é que aumentaram o IVA, os senhores é que têm aumentado os impostos. Nós combatemos a fraude e a evasão fiscais, tivemos uma eficiência fiscal que os senhores nunca tiveram.
Nós consideramos que é absurda a obsessão pelo défice; o caminho deverá ser o da consolidação orçamental séria e o do desenvolvimento sustentável, e isso passa, obviamente, por escolher os instrumentos que se devem utilizar para fazer a redução do défice e a redução da dívida. Portanto, toda esta espécie de consolidação não é consolidação nenhuma é uma fraude completa em termos contabilísticos e em termos financeiros.

Protestos do Deputado do PSD Duarte Pacheco.

Nós temos proposto métodos de redução do défice, e algumas das despesas que conseguimos controlar foi… Nós, quando éramos governo, para fazer passar Orçamentos - e na altura não tinham tanta preocupação com o consenso -, fizemos cedências a propostas do PP e do PSD, para não falar de outros partidos, pelo que, efectivamente, não se conseguiram controlar tanto as despesas públicas como gostaríamos.

Risos do PSD.

É esse o caminho. O que nós queremos é o seguinte: consolidação das finanças públicas, desenvolvimento sustentável.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Gonçalves.

O Sr. Herculano Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, começo por cumprimentar o Sr. Deputado relator pelo excelente trabalho que apresentou a esta Câmara.
O relatório sobre a actividade financeira do Estado, mesmo numa leitura rápida, permite compreender a extrema complexidade, e mesmo a sofisticação, de que hoje se reveste esta actividade.
No ano de 2003 a política orçamental foi fortemente condicionada pela necessidade de corrigir o desequilíbrio das finanças públicas que, no ano anterior, 2002, se traduziu num défice das administrações públicas de 4,2% do PIB acima do limite superior fixado no Pacto de Estabilidade e Crescimento, da União Europeia.
A estratégia de correcção do défice orçamental, concretizada num contexto de abrandamento económico superior ao antecipado, e a consequente diminuição das receitas fiscais obrigaram a um controlo apertado, a cortes na despesa pública e à adopção de medidas extraordinárias no sentido de incrementar as receitas.
Estas medidas permitiram que o défice orçamental do ano 2003 se tenha situado dentro do objectivo de 3% do PIB fixado no Orçamento do Estado.
Deste modo, a gestão do financiamento do Estado teve de responder a um aumento significativo das necessidades de financiamento face ao previsto no início do ano.
Colocadas estas notas prévias, importa, agora, salientar algumas das conclusões que consideramos mais relevantes: neste período, as finanças do Sector Público Administrativo registam uma melhoria constante, passando de um défice de 4,1% do PIB, em 2002, para se situar abaixo dos 3%, em 2003; a dívida pública bruta diminuiu de 58,8% do PIB, em 2002, para 57,5%, em 2003, e os encargos da dívida pública no período em análise diminuíram em cerca de 19,5%, registando um decréscimo de cerca de 195,2 milhões de euros; as políticas económicas, tal como reflectidas nas medidas projectadas do Programa de Estabilidade e Crescimento, respeitam as orientações gerais para as políticas económicas da União Europeia, com vista a assegurar finanças sãs e crescimento sustentado.

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As medidas em curso da reforma estrutural deverão gerar efeitos benéficos do lado da oferta, o que permitirá à economia basear-se num maior dinamismo das exportações.
Neste contexto, assumiu a maior importância aplicar com determinação os planos orçamentais para 2003 que tinham como objectivo a redução do défice e adoptar as medidas orçamentais necessárias para assegurar que o défice orçamental em 2004 voltasse a ser reduzido para um nível inferior a 3% do PIB e para que o ratio da dívida pública fosse mantido a um nível inferior ao valor de referência de 60% do PIB.
Registamos com satisfação que, de acordo com o relatório, o défice do Sector Público Administrativo foi reduzido para um nível inferior a 3%, em 2003, apesar de o comportamento da economia não ter correspondido ao esperado.
Não pode deixar de se reconhecer a firme determinação do Governo em prosseguir a consolidação orçamental.
A evolução orçamental ao longo de 2003 revelou-se menos favorável do que o previsto no Orçamento do Estado devido, principalmente, ao abrandamento da actividade económica, mas igualmente a receitas inferiores às previstas nas receitas fiscais e na venda de activos públicos.
Registamos, ainda, a intenção de reduzir o nível da dívida para 52% do PIB em 2007, invertendo a acentuada tendência de deterioração registada nos anos anteriores entre 2000 e 2002.
A manutenção das finanças públicas sólidas a longo prazo permitirá assegurar uma redução significativa do ratio da dívida antes que se materialize o impacto orçamental decorrente do envelhecimento da população.
Por conseguinte, a aplicação determinada das reformas estruturais destinadas a atenuar o crescimento das despesas relacionadas com o envelhecimento da população, alargar a base de incidência da tributação e aumentar o potencial global de crescimento da economia é essencial para alcançar a estabilidade a longo prazo.
Principais conclusões: há uma dívida pública que evidencia controlo, nomeadamente na área das administrações locais e regionais.
Para terminar, deixo uma nota final para o rating da República, que continua a manter-se a um excelente nível. O rating continua a manter-se com uma boa notação, facto que temos de salientar por ser extremamente positivo e que revela a posição financeira reforçada de Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Tavares Moreira.

O Sr. Tavares Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de fazer duas breves observações ao relatório do Sr. Deputado José Ribeiro, sendo a primeira para relevar, se é que tal se mostra necessário, a qualidade desse relatório e também o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido por este Sr. Deputado, com uma regularidade sistemática, apresentando à Comissão as suas conclusões sobre a evolução da gestão da dívida pública, das garantias pessoais do Estado e outros aspectos da dívida de outros subsectores da Administração Pública.
Estamos aqui a apreciar o relatório do 1.º semestre e na próxima a terça-feira a Comissão terá oportunidade de apreciar o relatório do 3.º trimestre e creio que o mais tardar em Abril teremos oportunidade de apreciar na globalidade a gestão da dívida pública do ano de 2003, o que, se não é em tempo real é quase, é uma boa contemporaneidade.
Em segundo lugar, quero referir um ponto focado no relatório que me parece ser da maior relevância, infelizmente omisso no debate político sobre as finanças públicas e sobre a política económica em Portugal, e que tem a ver com os diferenciais de taxas de juro entre as dívidas dos Estados-membros da zona euro.
Convém referir que este critério das taxas de juro relativas da dívida pública destes Estados é o critério mais rigoroso que existe em relação à apreciação das dívidas públicas, das políticas financeiras e do estado das finanças públicas dos diferentes países, pela simples razão de que é o mais independente e o mais democrático, pois resulta de uma avaliação diária de centenas de investidores sobre a qualidade das finanças públicas dos diferentes países, investidores independentes entre si e independentes em relação a outros Estados, como é evidente.
Por outro lado, convém lembrar que estes diferenciais no período pré-euro estavam ligados à qualidade de diversos aspectos da economia dos países, que convergiam, em última análise, na credibilidade das respectivas moedas, e aí é evidente que a posição do marco alemão era imbatível.
No período pós-euro esta situação mudou e, hoje em dia, estes diferenciais de taxas de juro, os spreads, estão ligados sobretudo, ou quase exclusivamente, à qualidade das finanças públicas. Por isso,

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recentemente, no final do ano passado, assistimos a uma inovação neste capítulo, que é o facto de alguns países da zona euro apresentarem taxas de juro de dívidas melhores que as taxas da dívida alemã. É o caso concreto da Irlanda, da Finlândia e da Espanha, que está perfeitamente a par com as taxas de juros da dívida alemã.
Convém referir que a dívida portuguesa tem tido um muito bom comportamento, a taxa de juro da dívida pública portuguesa tem hoje um melhor spread do que o da Grécia, da Itália, da Bélgica e da Áustria, embora estejamos a seis ou sete pontos de base do da dívida alemã, mas esta é uma posição historicamente favorável, e isso reflecte a apreciação que o mercado faz da qualidade das finanças públicas portuguesas e sobretudo do esforço que tem sido feito no sentido de controlar o défice público.
Finalmente, gostaria de referir que este ponto, que é de fundamental importância na apreciação das políticas orçamentais, tem estado estranhamente omisso no debate político sobre a política económica e as finanças públicas. Aliás, ainda na quarta-feira assistimos aqui a um debate longo sobre esta matéria e não houve uma única referência ao critério mais importante de aferição da qualidade das finanças públicas e das políticas orçamentais, o que para mim, Sr. Presidente, é um sinal estranho e negativo de alguma vacuidade substancial do debate político desta matéria.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Como não há mais oradores inscritos, dou por encerrado o debate do relatório da Comissão Parlamentar de Execução Orçamental sobre a dívida pública e garantias pessoais do Estado em 2003.
Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje.
Lembro que na próxima terça-feira haverá reuniões de comissão, como é habitual, e na quarta-feira haverá sessão plenária à hora regimental, que terá como ordem do dia a apreciação da proposta de lei n.º 105/IX, do projecto de lei n.º 407/IX, da proposta de lei n.º 110/IX e ainda da proposta de resolução n.º 56/IX e do projecto de lei n.º 408/IX.
Srs. Deputados, amanhã, conjuntamente com uma delegação parlamentar, parto para Timor, onde me desloco em visita oficial, a convite do Presidente do Parlamento Nacional de Timor, retribuindo a visita que ele nos fez em Outubro de 2002. Levarei, de certo, o abraço solidário de todos os membros do Parlamento português.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 11 horas e 55 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Fernando Jorge Pinto Lopes
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
João Carlos Barreiras Duarte
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
José António de Sousa e Silva
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Assunção Andrade Esteves
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos

Partido Socialista (PS):
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
António Bento da Silva Galamba
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Fernando Ribeiro Moniz

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Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
José Manuel de Medeiros Ferreira
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Carvalho Carito
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Nelson da Cunha Correia
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

Partido Popular (CDS-PP):
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Rodrigo Pinho de Almeida

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Carlos de Sousa Pinto
António Fernando de Pina Marques
António Joaquim Almeida Henriques
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
Judite Maria Jorge da Silva
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
António de Almeida Santos
Francisco José Pereira de Assis Miranda
João Barroso Soares
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves

Partido Popular (CDS-PP):
Paulo Daniel Fugas Veiga

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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